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20 22 de Fevereiro de 2023

PERGUNTAS&RESPOSTAS

Transexuais
Bruno Horta

S
erá que as crianças portuguesas vão po-
der mudar de sexo sem autorização dos
pais ou encarregados de educação? Esta
interrogação paira na mente de muita gente.

a ferver
E não é mera especulação. Nos EUA, por
exemplo — como contava há poucos dias o
New York Times — uma mãe da Califórnia
descobriu subitamente que a filha de 15 anos
era tratada no masculino na escola secundária
que frequentava e tinha autorização para usar
a casa de banho dos rapazes. Tudo nas costas
da mãe, que nunca tinha sido informada pela
escola de que a rapariga se apresentava como
transexual aos colegas e professores. Falta pouco para a Assembleia da República
O episódio dá conta do ambiente de guerri- votar três projectos sobre transexualidade den-
lha que hoje rodeia as questões da identidade
de género. Na América — onde há registo, en- tro das escolas. Se acontecer por cá o que se vê
tre 2017 e 2020, de 1,4% de transexuais en- noutros países, os ânimos vão-se exaltar
tre os jovens dos 13 aos 17 anos, e de 1,3%
dos 18 aos 24 (contra 0,5% entre adultos), há ainda uma do PAN, anterior àquelas duas: pessoal docente e não-docente, no exercício
segundo um estudo do Williams Institute, de Março de 2022. Têm em comum a defesa de dos seus direitos, acedam às casas de banho
Los Angeles — muitas escolas querem garan- medidas em contexto escolar para presumivel- e balneários, tendo sempre em consideração
tir o que dizem ser um “ambiente inclusivo” mente proteger os direitos das pessoas trans. a sua vontade expressa e assegurando a sua
que permita a “transição segura” de crianças Em rigor, os textos são decalcados uns dos segurança e bem-estar”.
e adolescentes que consideram ter um género outros. O PS quer “assegurar a autonomia, Num parecer enviado ao Parlamento, o
(homem, mulher) sem correspondência com o privacidade e autodeterminação dos estudan- Conselho Nacional de Ética para as Ciências
sexo biológico de nascimento (macho, fêmea) tes e do pessoal docente e não-docente que da Vida defendeu que as escolas devem, sim,
ou com o quadro psíquico que lhes atribuem realizem transições sociais de identidade e criar casas de banho neutras, ou “não refe-
(masculino, feminino). expressão de género”. Ou seja, no limite, as renciadas pelo género/sexo e que garantam

‘‘
Não falta muito para que o assunto chegue crianças e jovens podem viver na escola uma condições de privacidade a quem os utiliza,
a Portugal. Dentro de semanas, a Assembleia realidade identitária diferente daquela que sendo acessíveis de forma indiscriminada, in-
da República irá votar projectos do PS, Bloco mostram aos pais. dependentemente da sua identidade de géne-
de Esquerda e PAN relativos à maneira como O Bloco fala em “formação específica” para ro”. Em declarações à Rádio Observador, em
as escolas públicas devem tratar a Dezembro último, Filinto Lima,
“autodeterminação da identidade presidente da Associação Nacional
de género”. Para não se perder o de Directores de Escolas Públicas,
Paira o medo de que as crianças sejam admitiu que a criação de casas de
fio à meada, o Tal&Qual prepa-
rou um conjunto de perguntas e industriadas pela escola e em função banho neutras “não é um problema
respostas. para as escolas”.
disso queiram mudar de sexo, mas da
As escolas portuguesas leitura dos projectos em dicussão no Em que ponto está a discussão
vão incentivar os miúdos e que passos se seguem?
a mudarem de sexo?
Parlamento não se tira essa conclusão A Assembleia da República está
Quem apresenta o assunto desta maneira à espera de pareceres que pediu a
parece estar a diabolizar a questão transexual. estudantes, professores e funcionários das es- algumas entidades. Até ao início de Março,
No entanto, há preocupações legítimas. Está colas acerca de “orientação sexual, identidade os deputados já deverão ter todos os docu-
em vigor uma lei de 2018 que prevê no artigo de género, expressão de género e protecção mentos do seu lado, disse esta semana ao
12.º que “em todos os níveis de ensino e ciclos das características sexuais”. E também quer Tal&Qual Fernando Negrão, presidente da
de estudo” o Estado “deve garantir a adopção mudanças de nome nos documentos da escola Comissão de Assuntos Constitucionais, Di-
de medidas que promovam o exercício do di- em conformidade com o “género auto-atribuí- reitos, Liberdades e Garantias. A seguir, os
reito à autodeterminação da identidade de gé- do” pela criança ou jovem. parlamentares decidem qual a data para a
nero e expressão de género e do direito à pro- Por seu lado, o PAN defende “mecanismos discussão na especialidade (artigo a artigo),
teção das características sexuais das pessoas”. de detecção e intervenção” e “condições para ainda na comissão parlamentar. É possível,
No Parlamento estão a ser discutidas três pro- uma protecção adequada” de crianças e jovens mas improvável, que nessa fase as três pro-
postas de regulamentação do artigo 12.º. “que realizem transições sociais de identidade postas se fundam numa só. Só depois haverá
e expressão de género”. lugar a uma votação final global no plenário
da Assembleia da República. Até ao Verão o
Que propostas são estas? O que pode mudar em breve?
assunto pode estar resolvido.
Uma é do PS e foi apresentada em Setembro Comum aos três projectos é a ideia — com
do ano passado. Outra é do Bloco de Esquer- potencial de polémica — de que as escolas Porque é que estas propostas surgiram?
da, com data de Outubro do ano passado. E “devem garantir que estudantes e membros do Porque em Junho de 2021 o Tribunal Cons-

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