Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
DOUGLAS CAVALCANTE
PATRICIA PASSOS SAMPAIO
FORTALEZA-CE
[2021]
DOUGLAS CAVALCANTE
PATRICIA PASSOS SAMPAIO
FORTALEZA-CE
[2021]
DOUGLAS CAVALCANTE
PATRICIA PASSOS SAMPAIO
Banca Examinadora
________________________________________________________
Patricia Passos Sampaio
Orientadora – Universidade de Fortaleza (UNIFOR)
________________________________________________________
Thiago Costa Matos Carneiro da Cunha
Universidade de Fortaleza (UNIFOR)
________________________________________________________
Juçara Rocha Soares Mapurunga
Universidade de Fortaleza (UNIFOR)
Esse trabalho é dedicado a todos aqueles que têm coragem de
amar; que mesmo bambos, tropeços ou com medo, vão lá e
amam como podem.
AGRADECIMENTOS
Queria agradecer a todos que fizeram parte dessa experiência linda e trágica, que foi
estudar um pouquinho sobre o amor. Confesso que pensei em desistir, mas o apoio e o
semblante materno da minha orientadora Patrícia Passos me fez aguentar o suficiente. Não
ficaria feliz em denotar cada pessoa que me ajudou porque eu, certamente, esqueceria de
muita gente. Então, meus mais sinceros agradecimentos à minha mãe e ao meu pai, por me
darem apoio em cada queda; aos meus amigos que vibraram comigo a cada nova etapa dessa
pesquisa, às pessoas que entusiasmadamente cederam um pouco de suas narrativas no
processo das entrevistas e, não menos importante, aos meus seguidores do Instagram que
pareciam esperar por esse resultados muito mais do que eu.
“Todo grande amor tem um começo, um meio e
um foda-se. ”
Autor Desconhecido
RESUMO
O amor tem sido construído a cada período histórico, desde o advento da escrita, passando
pela Grécia com seus mitos que tentavam explicar os sentimentos humanos, os casamentos
romanos, o advento do cristianismo, períodos históricos importantes como a Renascença e o
Romantismo até a chegada do século XX, onde houve grandes repressões sexuais e hoje
vivemos em uma modernidade líquida, onde emoções são fugazes e há grande dificuldade em
se desconectar do meio virtual. O presente estudo tem como objetivo geral compreender as
relações amorosas na contemporaneidade. Trata-se de uma pesquisa qualitativa, empírica na
qual se realizou entrevistas semiestruturadas com participantes recrutados através da técnica
snowball. Após leituras criteriosas dos dados colhidos, criou-se quatro categorias: Amor em
Tempos Líquidos; Experiência Amorosa; Amor e as Redes Sociais e Amores Não
Correspondidos. Concluiu-se que as pessoas entrevistadas adoeceram devido a rapidez que
ocorre nos laços românticos atualmente, onde facilmente se conhece alguém e facilmente se
enjoa desta pessoa, procurando já uma próxima
1 INTRODUÇÃO 13
2 MATERIAL E MÉTODOS 20
3 RESULTADOS 23
4 CONCLUSÃO 30
REFERÊNCIAS 31
O LUGAR DOS AMORES LÍQUIDOS NOS TEMPOS DO ONLINE
Liquid Love's Place In The Age of On-line
DOUGLAS CAVALCANTE ¹
PATRICIA PASSOS SAMPAIO ²
¹graduando em psicologia.
²orientadora de TCC.
Contato: douglascavalcante@edu.unifor.br.
Universidade de Fortaleza – UNIFOR.
Av. Washington Soares, 1321 - Edson Queiroz, Fortaleza - CE, 60811-905.
ORCID: https://orcid.org/0000-0002-4706-1201
O amor tem sido construído a cada período histórico, desde o advento da escrita, passando
pela Grécia com seus mitos que tentavam explicar os sentimentos humanos, os casamentos
romanos, o advento do cristianismo, períodos históricos importantes como a Renascença e o
Romantismo até a chegada do século XX, onde houve grandes repressões sexuais e hoje
vivemos em uma modernidade líquida, onde emoções são fugazes e há grande dificuldade em
se desconectar do meio virtual. O presente estudo tem como objetivo geral compreender as
relações amorosas na contemporaneidade. Trata-se de uma pesquisa qualitativa, empírica na
qual se realizou entrevistas semiestruturadas com participantes recrutados através da técnica
snowball. Após leituras criteriosas dos dados colhidos, criou-se quatro categorias: Amor em
Tempos Líquidos; Experiência Amorosa; Amor e as Redes Sociais e Amores Não
Correspondidos. Concluiu-se que as pessoas entrevistadas adoeceram devido a rapidez que
ocorre nos laços românticos atualmente, onde facilmente se conhece alguém e facilmente se
enjoa desta pessoa, procurando já uma próxima
1 INTRODUÇÃO
O estudo que ocupa as páginas que seguem discorre acerca dos impasses e das
possibilidades do amor, a partir de considerações históricas sobre a constituição do amor
dentro da cultura ocidental, imprescindíveis para auxiliar o entendimento e enriquecimento
das articulações aqui consideradas; leituras psicanalíticas, dentro das concepções de
modernidade líquida, propostas por Zygmunt Bauman (2001); das leituras sobre as
experiências de usuários do aplicativo Tinder, concepções sobre a sociedade da transparência,
provindas dos estudos de Byung Chul-Han (2017) e reflexões advindas do campo da
Psicanálise.
Freud (2011) enuncia que o âmago do que se compreende como amor trata de relações
voltadas à união entre os sexos, mas que há ainda o amor a si mesmo, aos pais, aos filhos,
entre amigos e o amor aos humanos em geral. Platão forja ideias em cima de Eros, que
coincidem com a força amorosa psicanalítica. É também comum que impulsos sexuais diretos
transformem-se em ternura, tendo aberturas para concepções amorosas envolvendo “casais”.
Dentro dessas diversas formas de amor, as leituras de amor romântico aqui feitas serão
concebidas à luz desse amor platônico.
Para Lins (2012a), ainda que se possa considerar longínquo o primeiro arranjo
romântico, não é possível afirmar que suas configurações tenham existido antes de 3000 a.C,
ou seja, quando se iniciaram os sistemas de escrita. Antes desconhecia-se a participação do
sexo masculino na procriação e, assim, machos e fêmeas ainda relacionavam-se livremente
entre si, onde a sexo feminino muitas vezes chegava a ser reconhecido como divindade, como
afirma Gerda Lerner (2019), mas, após percepção do macho sobre seu papel, ele tomou-se do
senso de posse dos filhos, da terra e inclusive da fêmea, que poderia ser vendida, trocada ou
comprada, subordinando-a ao macho e entronizando-o como patriarca.
Na Grécia Antiga o amor teve muitas de suas concepções formadas a partir dos
poemas de Homero, apesar de terem sido raras as relações sentimentais entre homens e
mulheres, como comenta Lins (2012a). De acordo com a trama homérica, Afrodite, Deusa do
Amor, prometeu a Páris, príncipe troiano, a mulher mais bela do mundo, Helena, rainha de
Esparta, e com influências de Eros, Deus do Amor, decidiu fugir com Páris para Tróia e isso
teria resultado em uma enorme guerra (HOMERO,2013). Após a guerra, Odisseu, um dos
14
combatentes troianos, regressa à Tróia numa viagem que durou dez anos. A mulher de
Odisseu chamava-se Penélope e durante longos anos em sua ausência foi importunada por
numerosos pretendentes, mas esta dizia sempre estar ocupada, ganhando tempo suficiente até
o regresso de seu esposo para os dois novamente poderem viver seu casamento, de acordo
com Homero (2011).
O casamento na Grécia Clássica não possuía relação com o amor e pode ser
compreendido como um arranjo dito monogâmico, de exclusão da mulher das tarefas externas
ao lar, que não deviam ser vistas em público, e tendo como finalidade principal o aumento da
prole, afirma Tôrres (2001). Para a maioria dos homens gregos, era um estado dispendioso e
um incômodo à liberdade, mas casamentos eram inevitáveis, já que era preciso ter uma
mulher que cuidasse de suas casas e filhos, além da obrigação para com o estado e com a
religião de darem continuidade à sua linhagem, visto em Lins (2012). O lugar do amor neste
contexto era o de um rápido jogo sedutor que poderia ser encontrado apenas na adolescência
ou com prostitutas.
O povo romano desenvolveu uma concepção receosa sobre o amor apaixonado, é o
que indicam os estudos de Cuatrecasas (1997), pois esse amor criava hábitos irracionais,
desgastando energias importantes do apaixonado e, por vezes, chegou a ser considerado
desilusão e loucura. Grimal (1991) conclui que o amor aceito em Roma circulava de forma
sexual, similar aos jogos de arenas, não tangendo a noção de pecado, mas que, ainda assim,
possuía um status negativo por depender de mulheres, consideradas moralmente inferiores, e
por levar o apaixonado à decisões pouco refletidas e tendenciosamente vistas como
irracionais.
Porém, o cristianismo trouxe consigo a ligação entre prazer carnal e o pecado original,
culminando em uma desvalorização do corpo, onde a falta de higiene era sinônimo de
salvação da alma e um sentimento de culpa se instaura a respeito do prazer sexual, visto como
uma transgressão contra Deus. Para manter-se dentro da castidade esperada, deveria-se privar
do sono, do conforto e da alimentação, e neste contexto que a autoflagelação foi
compreendida como forma de expurgar as culpas ligadas aos desejos sexuais. A monogamia
foi transformada em um contrato para toda a vida e sem a possibilidade de dissolução. O
casamento era a saída mais aceita para o sexo, mas o arranjo do ideal cristão à época era o
casamento continente, sem nenhuma relação sexual, expõe Grimal (1981).
15
Durante a Idade Média o amor deveria ser unicamente dirigido a Deus, sendo a sua
única forma positiva, relata Lins (2012a). Até que, por volta do fim do século XI, houve uma
grande transformação com a passagem desse amor unilateral para o amor recíproco, que teve
sua origem com poetas e trovadores franceses, conhecido como amor cortês, que enalteceu o
adultério como triunfo do amor além de reconhecer o desejo sexual como parte natural no
processo de amar e o ciúme era retratado como um sentimento nobre dos amantes.
No período da Renascença, as damas eram adoradas como se fossem referências
religiosas. O amor cortês deu espaço ao amor romântico, onde todo sentimento era baseado
em expectativas desmedidas, criadas pelos amantes sobre a dama ideal, que não mais era a
mulher distante e inacessível, com base nos estudos de Lins (2012a), e casava-se por amor em
uma cerimônia religiosa e o amor aceito era livre de atos sexuais para que permanecesse belo
e casto.
Foi com a chegada do Iluminismo, conhecido como século das luzes, que o amor
entrou em derrocada. O ato de amar tornou-se parte do desejo sexual e havia uma etiqueta que
conduzia a ocultar os sentimentos dos homens e das mulheres, mesmo somente entre eles.
Também era habitual camuflar as emoções com expressões secas e abstratas para, assim, não
lhes dar força. Neste período os bailes de máscaras ganharam notoriedade, onde poucas
identidades eram reveladas e era permitido expressar-se melhor que no cotidiano ordinário,
comenta Lins (2012b).
Após este breve período de abstratismos rasos no amor, emoções e sensações
possuíram lugar privilegiado na Era Vitoriana, com discursos cunhados à metáforas religiosas,
afirma Lobato (2019), os amantes deste período eram fascinados pelas suas capacidades
hiperemocionadas de melancolização e sentimentalismo e falavam de suas adorações e
sofrimentos. Neste momento eram muito comuns cartas de amor e casais que nunca haviam se
visto sem roupa, pois o sexo era tido como extremo tabu.
Já quando se fala no século XX grandes revoluções surgem e acontecem. Após a
Primeira Guerra Mundial se enunciou um período de desilusão e desânimo com as
experiências casuais, a maioria das pessoas carecia de uma segurança amorosa. Neste
contexto, o amor romântico conseguiu manter-se e ocupou um lugar central em diversos
níveis culturais do ocidente, combinando desejos sexuais, amizade e afeto nas relações que se
formavam. E foi com o surgimento da pílula anticoncepcional, na década de 60, que as
16
mulheres puderam decidir se queriam ou não procriar com seus parceiros. A chegada dos
telefones e o fim do casamento arranjado também foram novidades importantíssimas nas
relações amorosas. Após a Segunda Guerra Mundial as mulheres passam a viver totalmente
voltadas ao casamento e ao lar e o sentimento amoroso precisou estar junto a uma sensação de
estabilidade conjugal e familiar. Os flertes eram feitos visando o casamento, mas nunca
através de atividades sexuais que comprometesse o status de “moça direita” para casar, relata
Lins (2012b).
Na compreensão do século XXI é importante ressaltar que trata-se de um período
ainda em construção, tendo a aceleração como um de seus maiores signos. É neste contexto
onde a liberdade sexual tomou grande ápice, a moral tornou-se mais flexível aos movimentos
de contracultura e, mais recentemente, com a chegada das nanotecnologias, a conectividade
do online criou raízes sólidas, e os apaixonados anseiam por uma felicidade plena ao
conhecerem pessoas selecionadas, ou podem jamais chegar a revelar sua verdadeira
identidade e ainda assim desfrutar dos prazeres da vida amorosa e sexual virtual, discute Lins
(2012b). Os sites e aplicativos de encontro tendem a ser vistos por um viés duplo: ao passo
em que são reconhecidos como grandes oportunidades, também têm colocado corpos eróticos
em vitrines virtuais. Sujeitos têm demonstrado adoecimento ao utilizar estas ferramentas e
outros já não mais se veem sem o suporte que elas lhes oferecem, indicam Couto, Souza e
Nascimento (2013).
Dito isto sobre a história do amor, o que significaria dizer que a contemporaneidade
vive em um contexto de amores líquidos? Para começar a compreender melhor essa questão,
reportamo-nos, neste lugar, a uma concepção da paixão na modernidade:
O amor só pode ser, e frequentemente é, tão aterrorizante quanto a morte. Só que ele
encobre essa verdade com a comoção do desejo e do excitamento [...] Assim, a
tentação de apaixonar-se é grande e poderosa, mas também o é a atração de escapar.
E o fascínio da procura de uma rosa sem espinhos nunca está muito longe, e é
sempre difícil de resistir (BAUMAN, 2004, p. 23).
Deste modo, uma leitura possível é que as relações amorosas atuais são marcadas por
uma carência social e pelo desapego. Mostra-se muito atrativo conhecer pessoas, mas o que
realmente é uma marca de nossas relações é a dificuldade de se desconectar, segundo Bauman
(2001).
17
Sujeitos estão conectados vinte e quatro horas por dia e têm os celulares como
extensões do próprio corpo, do mesmo modo que o cigarro costumava ser, com protagonismo,
há algum tempo. “Você nunca perde de vista o seu celular. Sua roupa de jogging tem um bolso
especial para ele, e você nunca sai com aquele bolso vazio, da mesma forma que você não vai
correr sem seu tênis. Na verdade, você não iria a nenhum lugar sem o celular” (BAUMAN,
2004, p. 23).
Segundo os escritos de Botton (2017), a modernidade comum planeja uma visão de
mundo prática e sem introspecção, sobrando pouquíssimo tempo e com medo excessivo para
qualquer movimento. Nisto, os sujeitos são guiados pelo instinto de autopreservação,
forçando o avanço e se vingando quando atingidos, colocando a culpa em outros, além de
reprimir questões desagradáveis.
Nos estudos sobre a cultura da pós-modernidade facilmente nos encontramos com a
noção da rapidez e agilidade, tanto difundidas no mercado comercial como nas relações
humanas. De acordo com a teoria de Han (2017), a sociedade da transparência é um conceito
que evidencia o mundo atual, imerso em exposições desenfreadas.
Nas conceituações de transparência, Han (2017) descreve as sociedades positivas,
onde os sujeitos são tendenciosamente levados a uma ânsia pela igualdade, causando um
esvaziamento de si e afastando-se de uma lógica castrativa, já que um novo objeto se
evidencia: o fetiche. Em contrapartida, para que se compreenda melhor as sociedades
positivas, o autor denota as sociedades negativas: cheias de culpa, lideradas pela ordem do
desejo e dos processos particulares de cada sujeito. Estas concepções são utilizadas para
narrar as instâncias que regem o social contemporâneo.
No que se encontra o amor na sociedade da transparência, percebe-se, de acordo com
Han (2018), que a exposição aniquila a interioridade. Em um caráter de opostos, o que se
entendia como cárcere do amor cede lugar ao inferno da liberdade. Havendo uma recusa ao
afastamento, a lógica das sociedades negativas se diverge do curtir, criado no online, que traz
consigo a positividade, acumulando seguidores e perdendo a distinção de amigos e inimigos.
Freud, fundador da psicanálise, forjou sua teoria em cima de alguns conceitos
fundamentais e um deles foi o amor, associando-o a angústia, de acordo com Roudinesco
(2019), e o compreendendo como parte da relação com um outro, sendo assim também um
desamor, ou “amódio”. O conceito de narcisismo também é de suma importância para que se
18
campo acadêmico, os estudos sobre o amor são bastante difundidos, mas não são tantas as
pesquisas que descrevem e observam as redes sociais de relacionamento e seus impactos no
sujeito.
Tendo em vista a liquidez (Bauman) das relações sociais, os vínculos amorosos
apresentam-se frágeis, fugazes na atualidade, com notável dificuldade de se sustentar no
contato presencial, bem como nas rápidas interações virtuais. Sendo o objetivo deste trabalho
compreender as relações amorosas na contemporaneidade.
Deste modo, a presente pesquisa visa contribuir com a compreensão da influência do
virtual e do presencial nas relações românticas e, consequentemente, do mal-estar romântico
da pós-modernidade, contribuindo para o avanço nos estudos nesta área da psicologia, além
de oferecer uma possibilidade para que o sujeito possa repensar suas relações ordinárias e
entender por que se ama como se ama atualmente, podendo, assim, tornar-se protagonista
ativo nestes processos e transformações.
20
2 MATERIAL E MÉTODOS
Para a elaboração do presente trabalho foi utilizada uma pesquisa qualitativa, pela
capacidade de aprofundar em questões sociais e impasses de construção do conhecimento. A
pesquisa qualitativa, como afirma Minayo (2004), atinge aspectos específicos,
conhecimentos, contempla as condições históricas e se articula com as ciências, entre
identidade do pesquisador e seu objeto, e uma crítica interna e externa na objetivação do
saber. Segundo Gil (2010), a pesquisa qualitativa depende de diversos fatores, bem como a
natureza dos dados coletados, os instrumentos de pesquisa, a extensão da amostra e os
pressupostos teóricos que guiaram a investigação. Deste modo, trata-se de uma sequência de
atividades em que envolve a redução dos dados, a categorização desses dados, sua
interpretação e a redação do relatório.
Os estudos relatados também se utilizaram de pesquisa empírica, de cunho
exploratório. Para Minayo (2012), é preciso imergir na realidade empírica em busca de
informações previstas ou não previstas no roteiro inicial, pois é através do trabalho de campo
que o entrevistador constrói o relato a partir da fala dos entrevistados, consolidando o seu
trabalho de pesquisa. Ressalta que o trabalho de campo não é um exercício de contemplação,
onde o investigador é sempre um ator ativo que indaga, interpreta, desenvolvendo um olhar
crítico.
O cunho exploratório da pesquisa, segundo Gil (2008), tem como objetivo
desenvolver, esclarecer e modificar conceitos e ideias, tendo em vista a formulação de
problemas mais precisos ou hipóteses pesquisáveis para estudos posteriores. Sendo bastante
comum, neste tipo de pesquisa, o levantamento bibliográfico e entrevistas semiestruturadas.
O trabalho foi construído a partir de uma revisão da literatura, que se destaca como
pré-condição para a realização de toda e qualquer pesquisa, onde se é inserido como uma
parte indispensável do processo de investigação. Segundo Bento (2012), a revisão de
literatura envolve localizar, analisar, sintetizar e interpretar a investigação prévia em revistas
científicas, livros, resumos, etc., daquilo que seja relacionado com a sua área de estudo.
Os critérios de inclusão dos participantes da pesquisa abrangiam pessoas acima de 18
anos, de qualquer gênero e que já tivessem se relacionado romanticamente; como critério de
21
exclusão foi delimitado que não poderiam participar as pessoas menores de idade e as com
algum comprometimento no desenvolvimento.
A coleta de dados foi feita através de entrevistas semi-estruturadas que, segundo
Triviños (1987), possui questionamentos básicos que são apoiados em teorias e hipóteses que
se relacionam ao tema da pesquisa. Estes questionamentos originam outras hipóteses, a partir
das respostas coletadas. Afirma também que esse tipo de entrevista favorece não só as
descrições dos fenômenos sociais, mas a uma melhor compreensão da leitura de sua
totalidade.
O recrutamento para a amostra foi feito através da técnica bola de neve que, de acordo
com Baldin e Munhoz (2011), é um arranjo de amostra não probabilística utilizada em
pesquisas onde os primeiros participantes de uma pesquisa indicam novos participantes, que
também indicam mais participantes, e assim segue o processo até o momento onde o objetivo
é alcançado, conhecido como “ponto de saturação”, que é atingido quando os novos
entrevistados passam a repetir os conteúdos já obtidos em entrevistas anteriores, sem
acrescentar novas informações relevantes à pesquisa.
As entrevistas foram realizadas de forma online, através da ferramenta Google Meet,
onde o participante disponibilizou o horário de acordo com sua agenda, não prejudicando-o
em sua rotina. O roteiro de entrevista foi composto por 8 perguntas: 1) O que é amor pra
você?; 2) Durante sua história de vida, você já amou alguém romanticamente?; 3) Durante sua
história de vida, você acha que já foi amado romanticamente?; 4) Quais as dificuldades
enfrentadas por você nas suas relações amorosas românticas?; 5) De que forma as redes
sociais influenciam as relações amorosas atualmente?; 6) Você utiliza redes sociais para
encontros? Caso "sim", quais e por que decidiu se utilizar disto? Caso "não", por que não se
utiliza destes recursos?; 7) Quais seriam as vantagens de se utilizar os apps de encontro?; 8) E
quais seriam as desvantagens de se utilizar os apps de encontro?
A análise de conteúdo é uma técnica muito utilizada para pesquisas qualitativas, e o
método apresentado por Bardin (2016) apresenta detalhadamente os passos que um
pesquisador precisa para realizar uma análise científica, cada etapa que deve cumprir e quais
técnicas devem ser aplicadas. No início foi realizada uma pré-análise, leituras do material,
para captar os conteúdos e formatar um sistema de categorização. Em seguida, houve a
exploração do material, onde identificou-se os trechos de narrativas que correspondem a cada
22
categoria, formando assim o quadro de análise, também conhecida como etapa de codificação.
Por fim, o tratamento dos resultados foi onde os dados coletados foram estruturados em
quatro categorias que nortearam este trabalho.
3 RESULTADOS E DISCUSSÕES
O Bauman acha que é tudo muito fácil. Hoje em dia nós conhecemos pessoas muito
facilmente e a gente também enjoa delas muito facilmente. (E6)
Se algo não te interessa no teu parceiro ou se existe ali alguma dificuldade, é muito
comum que automaticamente se pule pra próxima pessoa. (E6)
[...] as coisas hoje em dia são muito líquidas. Tipo, você tá aqui e de repente você
começa a ficar com alguém e de repente aconteceu alguma coisa que aquilo dali já
não faz mais sentido e tu já consegue outro cara em questão de horas. (E3)
Estar apaixonado é olhar através da pessoa e com isso perdê-la. Somente a lâmpada
que ilumina o amor traz a realidade de volta. Quantos dias perdi você, olhando para
mim, dentro do seu corpo. Enfiando-me em ti, e tu em mim, para revogar a dor de
sermos Dois. – e Dois sempre tão longe… (YOUNG, 2011, p. 11).
O começo foi algo mágico, eu não sei explicar... é muito tema de de filme e as
pessoas fazem com que seja uma coisa muito importante. (E5)
Pra mim, no começo, foi muito gostoso. Tipo, foi algo que eu realmente não sabia
descrever porque era algo muito grande, muito genuíno, dentro de mim. Quando eu
pensava em alguém eu sempre dizia assim “caramba, eu não consigo imaginar eu
sem essa pessoa na minha vida.” (E3)
O começo do amor recebe uma atenção imensurável porque não é visto como um
momento qualquer, mas contém tudo o que é priorizado no amor pelo apaixonado, de acordo
com Botton (2017), e é tido como o maior momento de completude, já que nas grandes
novelas de amor o narrador, após suceder inúmeros desafios enfrentados pelos apaixonados,
resta somente a lhes desejar o “felizes para sempre”.
Neste tão valorável início da relação amorosa é que o apaixonado se defronta com o
amante e começa a nutrir expectativas e anseios, sejam estes positivos ou negativos. Em nossa
segunda categoria, Experiência Amorosa, observamos que o amor pode ser uma forma de
aprendizagem, mas que no processo dessa experiência alguns enfrentamentos existem como a
adoração do outro, expectativas excessivas e a abdicação de si mesmo em prol das relações.
Essas questões ganham nota nos recortes a seguir:
[...] francamente, eu acho que eu gosto mais de outros tipos de amor, assim…
porque, tal hora, esse amor totalmente romântico, essa coisa meio idealizada, de
alguma forma, sobe a minha cabeça e eu começo ignorar um pouco as minhas
próprias prioridades, meus limites, e eu não acho isso uma coisa muito legal, nao.
(E2)
25
[...] a minha intensidade sempre fez com que tudo ficasse maior na minha
perspectiva do que na visão dos parceiros que eu tive, então acabava que eu tinha
uma entrega muito maior e isso gerava muita dificuldade pra mim, porque eu não
percebia o mesmo retorno. Expectativas minhas, né… (E1)
Uma das narrativas colhidas para este artigo ilustra este contexto:
[...] os dois morriam de amores um pelo outro e em muitos momentos a gente meio
que tentava se encaixar na mão do outro, apesar que não era possível e isso causava
muita dor. Estávamos perto demais, sabe? Como num quadro em um museu, o amor
deve ser visto um pouco de longe, senão ele se desmonta. O segredo do amor está
em resistir a um certo mistério. (E6)
No que se entende como estar “perto demais”, Han (2017) aponta que a falta de
distância não é a proximidade, mas justamente o oposto, aniquilando-a. Compreende que a
alma precisa de um caráter impermeável para existir. Em contrapartida, as relações
transparentes são mortas, já que estas são avessas ao mistério, à fragilidade e à ocultação,
exaltando a evidência, anulando a sedução e priorizando procedimentos. Isto retira o atrativo
do amor, proibindo a fantasia, numa tentativa de fruir na imediatez, concebida como
pornográfica.
Neste raciocínio, o ser amado é transformado num quadro empalidecido para não
contrastar com a figura do pintor, o apaixonado. “Meu ser amado poderia ser um quadro no
qual minha perfeição fosse retratada em toda sua magnificência [...] depois de observar
cuidadosamente para garantir que traços das antigas imperfeições não venham a surgir [...]”
(BAUMAN, 2004, p. 34)
Com estas leituras sobre o amor na contemporaneidade, nossa terceira categoria
contempla o Amor e as Redes Sociais, onde foram expostas algumas razões para se estar ou
não se estar nos aplicativos de encontros, das suas facilidades e das suas dificuldades.
De acordo com os estudos de Nogueira e Silva (2016), mesmo que o tinder seja um
aplicativo para relações amorosas, muitas pessoas têm utilizado como “passatempo” e
“interação divertida”, tendo a interação prioridade antes dos possíveis romances; e em nossa
coleta de dados foi possível averiguar que os objetivos sociais são, de fato, bem mais comuns,
para além dos desejos sexuais:
Eu sou uma pessoa muito comunicativa e eu gosto muito de fazer amizades. Mas
não só por amizades, mas também tentava encontrar uma pessoa que, digamos,
pudesse preencher aquela lacuna que até o momento eu estava sentindo necessidade.
(E3)
[...] esses aplicativos me davam a oportunidade de conhecer pessoas sem ter que sair
do meu lugar, e tinha conversas sobre os mais variados temas. (E6)
27
Ao mesmo tempo que estes arranjos de interação aproximam pessoas, eles repelem na
mesma medida, numa velocidade onde é preciso produzir para ser. Bonavitta (2015) comenta
que o desejo de satisfação é da ordem do aqui e agora, prevalecendo o caráter erótico e
sensual das relações, sem a expectativa de projeções ou trocas muito complexas de emoções;
assim, os sujeitos sentem-se protegidos.
Nisto, queixas sobre a exposição virtual, o apelo sexual dos aplicativos utilizados
parecem ser um signo nestas experiências. Han (2017) denota que os tempos atuais são sem
destino e sem evento, sendo um abismo do igual. Na sociedade positiva, concebida como
pornográfica, tudo é desvelado, exposto e despido e, assim, transformado em mercadoria que
precisa ser exposta para “ser”, perdendo o sentido de sua existência. A adaptação popular da
polêmica frase de Descartes emprega-se com valor: “sou curtido, logo existo”. As seguintes
exposições retratam bem este contexto:
[...] embora exista a parte da tecnologia que facilita a comunicação, eu acho que,
como a gente vive num mundo muito de aparências, acho que dificulta mais ainda
você conhecer uma pessoa de verdade. (E5)
Tem um ditado que diz assim “quem não visto não é lembrado”, né, e eu acho que as
redes sociais lembram as pessoas da nossa existência, honestamente. (E4)
que esta é superada. Nos dados coletados, observamos que existe uma espera constante e
teimosa por um amor verdadeiro que vá completar e finalmente tirar os apaixonados deste
contexto de buscas. Esta falta existente no mito da vida humana é conceituado por Lacan
(1988) como Objeto α, o objeto da pulsão, inexistente, que se furta ao sujeito, entendido como
resto e que não se permite representar; e diante desta concepção cabe a leitura da origem da
melancolia fundante do psiquismo humano.
No que tange às dificuldades no amor atualmente, o alcance da comunicação autêntica
é visto como uma grande dificuldade, de acordo com os relatos dos entrevistados que tentam
manter-se nos aplicativos de relacionamentos. Bauman (2004) exibe que de forma contrária à
antiga proximidade física entre apaixonados, as relações atuais não exigem laços construídos
previamente e nem tem como objetivo principal a estabilidade da relação, pois estar
“conectado” mais vale que “estar engajado”. O recorte abaixo narra uma pequena esfera desse
raciocínio:
Acho que é mais um sintoma de alguma coisa do que uma causa, sabe? Eu acho que
é mais uma consequência da da época e das formas das relações de hoje, do que ser
a causa dos problemas. (E2)
Aquelas outras questões não são trabalhadas. E eu acho que outra grande dificuldade
é que nós estamos todos doentes, temos muitas questõezinhas aí que precisam ser
trabalhadas e as pessoas não trabalham e isso acaba entrando no relacionamento
também. E aí, então, pessoas confusas machucam pessoas e, depois, pessoas
machucadas machucam pessoas. É uma droga. (E6)
[...] com os aplicativos tudo se torna tudo muito prático e as pessoas não tem mais
aquela aquela vontade de construir e de solidificar uma relação. [...] qualquer briga,
qualquer discussão, por menor que seja, quebra pilares e a relação desmorona. (E3)
Uma narrativa colhida traz uma uma autoreflexão de que investiu o quanto pode na
outra pessoa, mas compreende que que esta pessoa estava pronta para retribuir o amor ou ela
não sabia se estava pronta, talvez estando um pouco confusa.
29
Assim, com todo o exposto, fica mais fácil compreender as vicissitudes do amor de
hoje e que lugar os ditos amores secos querem e conseguem ocupar dentro dos arranjos
sociais que são oferecidos.
30
4 CONCLUSÃO
REFERÊNCIAS
BAUMAN, Zygmunt. Amor líquido: sobre a fragilidade dos laços humanos. Rio de
Janeiro: Zahar, 2004.
BAUMAN, Zygmunt. Modernidade líquida. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2001.
COUTO, Edvaldo Souza; SOUZA, Joana Dourado França; NASCIMENTO, Sirlaine Pereira.
Grindr E Scruff: Amor E Sexo Na Cibercultura. Disponível em:
<http://gitsufba.net/anais/wp-content/uploads/2013/09/13n1_grindr_49464.pdf> Acesso em:
03 de junho de 2021.
FREUD, Sigmund. Psicologia das massas e análise do eu e outros textos (1920-1923). São
Paulo: Companhia das Letras, 2011.
GIL, A. C. Como elaborar projetos de pesquisa. 5. ed. São Paulo: Atlas, 2010.
32
GIL, A. C. Métodos e técnicas de pesquisa social. 6. ed. São Paulo: Atlas, 2008.
HOMERO. Ilíada. São Paulo: Penguin Classics Companhia das Letras, 2013.
HOMERO. Odisseia. São Paulo : Penguin Classics Companhia das Letras, 2011.
MINAYO, Maria Cecília de Souza. Análise qualitativa: passos e fidedignidade. Ciência &
Saúde Coletiva, Rio de Janeiro, v. 17, n. 3, p. 621-626. mar. 2012.
NOGUEIRA, Maria Francisca Magalhães; SILVA, Thálita Teles. O amor em suas mãos: um
estudo sobre a sociabilidade entre os indivíduos no aplicativo tinder. Panorama, Goiânia,
v. 6, n. 2, p. 99-102, ago/dez, 2016.