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ESCOLA MANDALA:

uma nova concepção para o ensino


tecnológico na rede Faetec
Fernando S. Mota
Márcio F. Campos
Ronaldo R. Goldschmidt (orgs.)

Andréia De Luca H. de Sá
Cládice N. Diniz
Edirlane C. de Souza
Fernando S. Mota
Horácio C. Ribeiro
Márcia M. Freire
Márcio A. Vianna
Márcio F. Campos
Marcos P. Monteiro
Regina C. de Souza
Ronaldo R. Goldschmidt
Sibele Calazans
Themis A. C. dos Santos
Vasco M. M. do Amaral

ESCOLA MANDALA:
uma nova concepção para o ensino
tecnológico na rede Faetec

2ª Edição
2007
© 2006 por autores

Direitos para essa edição reservados aos autores

Os textos desta obra poderão ser reproduzidos e copiados desde que


sejam dados os créditos aos autores e à obra.

Projeto gráfico e editoração eletrônica: Alexander Daltio Vialli


Capa: Cláudio César da Costa Mota
Revisão Textual: Márcia Marques Freire
Normalização: Edirlane Carvalho de Souza

E74 A escola mandala: uma nova concepção para o ensino tecnológico


na rede Faetec / Fernando da Silva Mota, Márcio Francisco Campos
e Ronaldo Ribeiro Goldschmidt. (organizadores).
Rio de Janeiro: Nov, 2006.

ISBN 85-98931-03-9
978-85-98931-03-6

1. Educação. 2. Projeto pedagógico. 3. Tempo e espaços educativos.


4. Concepções educativas e tecnológicas. I. Título. II. Mota, Fernando da
Silva. II. Campos, Márcio Francisco. III. Goldschmidt, Ronaldo Ribeiro

CDD 370
Aos alunos e professores da
área tecnológica e a todos
que acreditam no ensino
público de qualidade.
SUMÁRIO

Apresentação.............................................................................................09
A mandala e a concepção pedagógica do ISTCC
Regina Célia de Souza e Andréia De Luca Heredia de Sá .......................13
O jogo dos termos mandala e rede
Cládice Nóbile Diniz.................................................................................21
O poder da identidade: uma leitura da obra de Manuel Castells
Marcos Paulo Monteiro ............................................................................41
O homem e a imagem mandala no círculo pedagógico
Sibele Calazans .........................................................................................49
Repensando o contexto educacional
Márcia Marques Freire .............................................................................53
Estrutura Organizacional Mandala: uma nova forma de trabalhar
em equipe.
Fernando da Silva Mota ...........................................................................67
Integração Ensino-Pesquisa-Extensão no ISTCC-RJ: perspectivas
e ações
Ronaldo Ribeiro Goldschmidt...................................................................73
Célula de desenvolvimento de competência: uma proposta
pedagógica para substituição da sala de aula em cursos tecnológicos.
Horácio Ribeiro, Gloria Maria Dias de Oliveira e
Rafael Dias Ribeiro...................................................................................87
Salas de aulas híbridas: o movimento dialético no uso da matemática
e a da informática no cotidiano do ISTCC-RJ
Márcio de Albuquerque Vianna.................................................................95
Um novo olhar sobre a Biblioteca do Inovador Instituto Superior
em Ciência da Computação do Rio de Janeiro.
Edirlane Carvalho de Souza ...................................................................103
O ambiente virtual e a qualidade de vida
Vasco Manuel Martins do Amaral...........................................................109
O direito numa perspectiva holística
Themis Aline Calcavecchia dos Santos...................................................113
Dimensões da avaliação e o portfólio avaliativo em base tecnológica
Márcio F. Campos e Fernando S. Mota ..................................................131
Conclusão................................................................................................139
APRESENTAÇÃO

Educar tem sido uma tarefa difícil nos últimos anos. O mundo mudou
radicalmente: uma nova configuração de países emergiu, novas forças políticas
se estabeleceram, novas demandas sociais afloraram, novas formas de se
organizar o trabalho emergiram. Apesar de tantas mudanças a nossa volta,
quando olhamos a escola, esta permanece a mesma. Pedro Demo em seu artigo
Ensino Superior no Século XXI: Direito de Aprender Reflexões 2005 PUCRS,
citando Duderstadt destaca a seguinte passagem “Imagine as reações de um
médico do século XIX, de repente transportado para frente no tempo dentro de
uma sala moderna de cirurgia, repleta de todos os avanços tecnológicos da
medicina moderna. O médico de ontem reconheceria muito pouco talvez nem
sequer o paciente e certamente não seria capaz de funcionar em nenhum modo
significativo. Contraste isso com um professor do século XIX, transportado
para uma sala de aula da universidade contemporânea. Aí tudo seria familiar os
mesmos púlpitos para preleção, quadros negros e estudantes prontos para tomar
notas. Mesmo os assuntos literatura, história, línguas seriam familiares e
ensinados precisamente dos mesmos modos”.
Apesar deste contraste, vemos na literatura várias tentativas de se tornar a
escola alinhada a seu tempo. Entretanto, a realidade continua sendo dura e as
práticas continuam sendo aquelas do século XIX. Em algum ponto, a passagem
das concepções contemporâneas às práticas cotidianas é falha. Tentamos
importar modelos, mas nossa realidade de alunos, de cultura e de dimensão de
país é muito diferente. Temos que buscar alternativas próprias e valorizar a
experiência local.
Talvez uma das razões para este fracasso seja a adoção de práticas
pontuais que acabam por serem superadas pela força da tradição conservadora
de se fazer escola. Assim, mesmo mudando a forma de se avaliar, as práticas de
relação entre aluno e professor permanecem, o enfoque centrado no programa
da disciplina se impõe, entre outras ações.
Este livro apresenta uma alternativa de se conceber a escola. Não se trata
de apontar práticas isoladas, mas de, antes de tudo, apresentar uma concepção
de escola onde todos os seus pontos se inter-relacionam e colaboram, em igual
importância, para o resultado final, caracterizando um rizoma de ações: uma
mandala. Além da concepção, este livro apresenta o que tem sido a prática desta
concepção com seus defeitos e qualidades.
Assim para apresentar a concepção proposta e a sua prática, segue uma
visão geral da estrutura e organização do texto.
O primeiro capítulo (Profª Regina Célia de Souza e Andréia De Luca
Heredia de Sá) trata da apresentação do conceito e simbologia de mandala e sua
relação com o mundo contemporâneo em que real e virtual são combinados e
transformados por meio de modernas tecnologias. Fornece, portanto, as bases
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para a compreensão dos demais capítulos, fundamentando idéias para a
construção do projeto pedagógico do ISTCC-RJ.
Em complemento ao capítulo anterior, o segundo capítulo (Profª Cládice
Nóbile Diniz) apresenta o significado do símbolo Mandala como uma rede
fortemente interconectada e dinâmica de informações e conhecimento. Desde o
surgimento das redes de computadores, diversos significados foram atribuídos
ao termo rede. Estes são apresentados ao longo do texto e discutidos. Sob a
óptica da concepção Mandala, a autora explica como os diversos setores
institucionais e pessoas se apresentam como elos de uma grande teia em busca
de seus objetivos, desfazendo desvios, conflitos e humanizando idéias.
O terceiro capítulo (Profº Marcos Paulo Monteiro) descreve como a
evolução da área da Tecnologia da Informação vem desencadeando uma crise
de legitimidade nas instituições da era industrial, que, no novo contexto, se
ressentem de forte esvaziamento de sentido e de funções. Em seguida, o autor
discorre sobre como o ISTCC-RJ, por meio de seu projeto Mandala, unem
conceitos, conteúdos, práticas acadêmicas e profissionalizantes,
relacionamentos humanos, sociais e ambientais para enfrentar essa crise e
construir uma forte identidade institucional plenamente inserida na rede virtual
da informação e do conhecimento.
Em complemento ao exposto no capítulo anterior, o capítulo quatro
(Profª Sibele Calazans) enfatiza a importância da qualidade dos
relacionamentos em locais de trabalho e sua influência no desenvolvimento do
ser humano como indivíduo e da equipe como uma rede produtiva de
conhecimento. A autora relata sua experiência, sua inserção e ações no contexto
da concepção mandala adotada pelo instituto. Em uma perspectiva mais geral, o
capítulo reflete a importância da união da equipe para o sucesso e
desenvolvimento da proposta do projeto Mandala.
Também como reforço ao capítulo três, o quinto capítulo (Profª Márcia
Marques Freire) busca destacar a importância de se repensar a relação
professor, alunos e o processo de ensino-aprendizagem. Apresenta abordagens
sócio-interacionais e o afeto como instrumentos facilitadores e coerentes com a
concepção Mandala para criar um ambiente favorável para maior participação e
colaboração dos alunos na construção de identidades, relações e significados.
No sexto capítulo (Profº Fernando da Silva Mota), o diretor do ISTCC-
RJ relata inicialmente como a proposta de gestão institucional participativa se
enquadra na concepção Mandala, viabilizando uma maior agilidade e dinâmica
das ações gestoras. Em seguida descreve a realidade do instituto na prática das
células de competência e sua relevante importância no projeto pedagógico
institucional. Nesse cenário, apresenta como todos os espaços do ISTCC-RJ se
integram em uma grande rede de informação e conhecimento.

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O sétimo capítulo (Profº Ronaldo Ribeiro Goldschmidt) destaca a
importância da integração das dimensões de ensino, pesquisa e extensão para o
desenvolvimento institucional. Nele, o autor descreve um conjunto de ações em
desenvolvimento pelo ISTCC-RJ que, norteadas pela concepção do Projeto
Mandala, favorecem a integração efetiva e harmoniosa das referidas dimensões.
Como exposto no quarto capítulo, as células de desenvolvimento de
competência têm papel de grande importância na prática pedagógica do ISTCC-
RJ. Em sintonia com a concepção mandala e à semelhança da Escola de Sagres, as
células de competência são descritas no oitavo capítulo (Profº Horácio da Cunha e
Souza Ribeiro) como agentes de um processo de construção de conhecimento por
meio da solução de problemas práticos em uma perspectiva interdisciplinar,
necessária ao tratamento de problemas, e de trabalho cooperativo, importante na
formação de profissionais para o trabalho em equipes.
O capítulo nove (Profº Marcio de Albuquerque Vianna) relata a
experiência do autor com a utilização das chamadas salas híbridas, nas
disciplinas “Matemática Aplicada” e “Álgebra Linear” do Curso de Análise de
Sistemas Informatizados do ISTCC-RJ. Uma sala híbrida é um espaço dotado
de equipamentos multimídia em que aulas teóricas, atividades práticas e
desenvolvimento de projetos são mesclados em ações de ensino e
aprendizagem. No caso da matemática, os alunos são levados a perceber e
construir a própria estrutura do conceito matemático, formando, assim, um
movimento dialético entre o geral e o particular na formação do saber. Em
consonância com a concepção Mandala e as células de competência descritas
no sétimo capítulo, esse capítulo apresenta o modelo aplicado no ISTCC-RJ.
Ao longo dos anos, o homem vem preservando um acelerado aumento no
volume de informações em todas as áreas do conhecimento humano. Por outro
lado, inúmeras tecnologias têm surgido e contribuído não somente para o
armazenamento dessas informações mas também para sua disseminação e
facilidade de recuperação.
As Bibliotecas, tradicionais e importantes centros de informação, vêm
procurando continuamente se adaptar a esse novo cenário.
O capítulo dez (a Bibliotecária Edirlane Carvalho de Souza) tem como
principal objetivo descrever, sob a perspectiva da concepção mandala, as
mudanças ocorridas na Biblioteca do ISTCC-RJ, com ênfase sobretudo nas
tecnologias e nos novos serviços prestados às comunidades do Instituto.
A utilização de computadores na vida moderna vem se tornando uma
prática cada mais freqüente e popular em diversos segmentos da sociedade.
Apesar dos benefícios proporcionados pela tecnologia, alguns cuidados com a
saúde e o bem-estar devem ser tomados quando essa utilização se prolonga por
longos e contínuos períodos de tempo. O décimo primeiro capítulo (Profº Vasco
Manuel Martins do Amaral) procura orientar quanto aos problemas de saúde

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física e mental decorrentes dessa exposição excessiva. A concepção Mandala
enfatiza a preocupação com a saúde e com o bem-estar, como importantes
elementos no desenvolvimento do ser humano e na contribuição desse em
ambientes sociais, sejam eles reais ou virtuais.
No décimo segundo capítulo (Profª Themis Aline Calcavecchia dos
Santos), a autora descreve sua experiência no ISTCC-RJ em que apresenta a
disciplina de Direito em uma abordagem holística, em consonância com a
concepção Mandala, como contraponto à abordagem de ensino tradicional.
Para tanto, apresenta a origem do Direito, sua função social no paradigma da
modernidade vigente.
Toda ação pedagógica requer reflexão quanto aos resultados produzidos. O
décimo terceiro capítulo (Profs. Márcio Francisco Campos e Fernando da Silva
Mota) discute a necessidade de se melhorar o processo de avaliação continuada,
tendo como base referências existentes e relatando a experiência dos portfólios
avaliativos no ISTCC-RJ, segunda prática pedagógica do projeto Mandala.
Em resumo, este livro representa o plantio de idéias para que a escola se
torne “contemporânea” de seu tempo e que seja um modelo para reflexão e de
ação educativa da gestão escolar. Boa leitura!

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A MANDALA E A CONCEPÇÃO PEDAGÓGICA DO ISTCC

Regina Célia de Souza*


Andréia De Luca H. de Sá**

Introdução

Em sânscrito, a palavra mandala (tib. kyilkhor / dkil


'khor, jap. mandara) significa círculo, o centro, o círculo
mágico, o mistério. No buddhismo Vajrayana, mandala
refere-se a um tipo de diagrama (sânsc. yantra)
simbólico de uma mansão sagrada, o palácio de uma
divindade meditacional, a dimensão pura da mente
iluminada. Geralmente, as mandalas são representadas
tridimensionalmente em madeira ou metal ou construídas
com areia colorida sobre uma plataforma. Sua forma é em círculo e sua
característica mais importante é que seu traçado é feito em torno de um centro,
geralmente obedecendo eixos de simetria e pontos cardeais. No caso da areia, a
mandala é desfeita após algumas cerimônias e a areia é jogada em um rio
próximo, para que as bênçãos se espalhem. A dissolução de uma mandala serve
também como exemplo da impermanência.
Este conceito de impermanência é de fundamental importância no século
XXI, pois tudo, hoje, parece impermanente, em movimento, razão da mandala
ser representada pelo círculo. Essa sensação de mudança permanente sentimos
na avalanche de informações que recebemos sobretudo com o advento da
tecnologia da informação - TI.
Mesmo o conhecimento científico, até o século passado, considerado
certo, absoluto e inabalável, hoje é visto de outra forma. Um conceito ou
conhecimento científico hoje pode muito bem ser repensado, reelaborado e
reconstruído adiante, a partir de novos dados e leituras e da comunhão das
diversas áreas de conhecimento, com a integração do avanço tecnológico com o
pensamento humano.
Pensamento humano - parece redundante, e talvez, o correto seja dizer
pensamento humanista, pois conhecimento, ciência e tecnologia só têm sentido
se forem pensadas, realizadas, construídas a favor da humanidade, de toda
humanidade e não só a favor de alguns.

* Psicóloga, Mestre em Psicologia Social (FGV-RJ); Professora do ISTCC-RJ e da FABES


Faculdade do Liceu de Artes e Ofícios.
** Psicóloga Clínica e Escolar, Especialista em Psicanálise (UERJ); Coordenadora do NADD do
ISTCC-RJ e Professora da FEBF.

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Por isso, integrando os conceitos da Psicologia Analítica de JUNG , dos
conceitos de auto-conhecimento e elevação da MANDALA e de ciberespaço de
,
JANE LOVATO este capítulo pretende apresentar a concepção pedagógica do
ISTCC.

A Mandala

(Mandala da Sabedoria Marcos Winther)

Uma Mandala representa o Universo abrigando de


forma simbólica as forças da natureza. Desta forma, cada
mandala é capaz de gerar um campo de poder energizado
permitindo, através da meditação, o encontro com Deus e
consigo mesmo. Todo esse simbolismo é representado
integrado às formas da mandala, construindo redes de energia
capazes de levar o homem a entrar em contato consigo mesmo
e se re-ligando às suas características humanísticas.
Fé, Sabedoria, Perfeição, Amor, Consagração, Alegria, Paz, Verdade,
Criatividade são virtudes humanas muito distantes do homem contemporâneo.
A Mandala por despertar um grau maior de consciência e auto-
conhecimento acaba por levar a transformação, trazendo de volta o conceito de
impermanência. O homem que não muda, que não se transforma, não
acompanha o processo de evolução e nem se permite evoluir está condenado à
involução e à desintegração de sua identidade.
As bases fundamentalistas que norteiam hoje as ações de grandes
potências mundiais mostram que tecnologia e desenvolvimento econômico não
são suficientes para evitar violência e intolerância com o que não se conhece ou
não entende.
Se pensarmos no planeta Terra, configurado por vários países com
culturas diversas, línguas diversas, com diversos ecossistemas, percebemos
uma grande Mandala. O que acontece em cada lugar do planeta, com qualquer
espécie animal, vegetal ou mineral repercute no planeta como um todo, e as
catástrofes “naturais” estão aí para provar isso.
Jung descobriu que desenhar, pintar e sonhar com mandalas é parte
natural do processo de individuação do ser humano. A cada mandala desenhada
descobrimos como estamos naquele momento, que conflitos nos “guiam” e
podemos, assim, descobrir também o caminho para o restabelecimento do
equilíbrio, mas já transformados, pois cada aprendizagem sentida nos
transforma.

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A Psicologia Analítica de Carl Gustav Jung

JUNG (1875/1961) era suíço e médico de


formação, filho de um pastor protestante. Depois de
algum de tempo de atuação na medicina, conhece Freud e
após 5 horas de conversa, torna-se seu discípulo na
formação psicanalítica. Freud o tem como seu sucessor e a
relação entre ambos durante muito tempo foi como pai e
filho. No entanto, à medida que estudava, Jung vai
construindo pensamento próprio, rompe relações com
Freud e após 06 anos de reclusão, em depressão, elabora sua própria teoria
conhecida, então, como Psicologia Analítica.
Jung se diferencia de Freud ao explicar o comportamento humano
através da causalidade e da teleologia.

! Causalidade = história individual e racial


! Teleologia = alvos, aspirações - uma finalidade, um objetivo.
Para Jung, então, a personalidade é produto e depositário do passado
ancestral. Seus fundamentos são arcaicos, primitivos, inatos, inconscientes e,
provavelmente, universais.
A origem da personalidade para Jung é racial, são predisposições ligadas
pelos ancestrais = PERSONALIDADE COLETIVA. A PERSONALIDADE
INDIVIDUAL, então, seria o resultado das interações internas e externas.
Desta forma, pode-se visualizar a estrutura de personalidade pensada por
Jung, como uma mandala, à medida que nosso self será construído a partir de
interações entre o externo e o interno, construindo redes de comunicação com
nossa ancestralidade através do conceito de inconsciente coletivo, com o social
através do conceito de persona (nossa personalidade pública) e com a cultura
através das Artes.
O self é o ponto central da personalidade em torno do qual todos os outros
sistemas se organizam formando constelações. Ele sustenta a união desses
sistemas e fornece unidade, equilíbrio e estabilidade à personalidade.
Cabe ressaltar que durante os anos que passou recluso, Jung sentiu
grande necessidade de se expressar artisticamente e ao conversar com um
Monge descobriu que desenhava Mandalas e que ao desenhá-las ia saindo de
seu estado depressivo.
Jung, então, liga o conceito de Mandala à Psicologia e a entende como
representação do processo de individuação regido pelo Self.

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O Ciberespaço

Ciberespaço é um conceito que está longe de ser


definido e compreendido em sua plenitude.
O que se entende sobre ele é o que se vive nas
navegações internáuticas, quando se pode acessar, ao
mesmo tempo, vários sites e links que possibilitam uma
viajem planetária sem sair do lugar.
Pode-se navegar por cidades, museus,
universidades, bibliotecas, bancos, lojas, comunidades,
chats e acessar todo e qualquer tipo de conhecimento e experiência virtual.
Apesar da apropriação de palavras da navegação para explorar este novo
mundo, virtual - parece ser a palavra mágica como abracadabra para abrir as
portas de algum entendimento sobre as sensações nesta exploração.
Bem, o que isso tem a ver com mandala?
Jane Regina Muller Lovato (2000) em seu artigo O Ciberespaço - uma
mandala virtual apresenta muito bem esse link :
1. Integração Multipolar - assim como a mandala na navegação no ciberespaço
as noções de espaço e tempo são desconstruídas para a reconstrução de uma
unidade espaçotempo pode-se ter acesso a tudo ao mesmo tempo, falar com
muitos ao mesmo tempo e estar em muitos lugares ao mesmo tempo.
“O círculo nos remete à uma forma espiralada permitindo a representação da
unidade tempo e espaço. Com isso, poderíamos andar para frente e para trás (e
para qualquer outra direção, em função da multipolaridade) pois, como já
vimos, o tempo no ciberespaço é um presente continnum e o espaço
desterritorializado. O tempo no ciberespaço seria regido não pelo tempo físico,
mas pelo tempo da consciência.”
2. A Valoração do Percurso - esta valoração reside na possibilidade da
construção de conhecimento a partir dos percursos percorridos pelo internauta,
na reflexão sobre o que vai encontrando pelo caminho, da mesma forma que o
cérebro vai formando sinapses nas redes neuronais a cada aprendizagem feita.
“Resumindo, o caminho percorrido no ciberespaço (os endereços, os links
selecionados, a exibição na tela do computador) faz parte do plano de expressão;
ao percorrer o caminho selecionado (através dos links, por exemplo), vai-se
construindo um conhecimento no plano do conteúdo. Sempre que se percorrer
um caminho, tem-se um novo conhecimento; logo, o plano do conteúdo também
sofre alterações. Observa-se que no plano da expressão, a substância é a
virtualidade, a magneticidade, por exemplo. Já no plano do conteúdo, a
substancia é sempre mental.”
3. O Equilíbrio do Intelecto e a Emoção:
Navegar no ciberespaço envolve simultaneamente a utilização da razão e
da emoção, do corpo e da alma, pois as escolhas feitas: sites, links, comunidades
são feitas com a emoção, com o interesse, com o sentido - sentimento -
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significado que só eu sei. O novo conhecimento só será construído se fizer
sentido com esta rede. E assim também é com a mandala que se inicia pelo sentir
que deverá, então, ser refletido, refletindo quem sou eu, como sou eu, como eu
estou.
“O equilíbrio da emoção com o intelecto, reside no fato de que o intelecto não
reprimiria a emoção, assim como esta não ignoraria a presença do intelecto.
Este equilíbrio ocorreria através de um processo consciente de auto-
organização em que emoção e intelecto seriam forças recursivas visando uma
complementaridade entre pólos enganosamente antagônicos.”
O simbolismo da mandala carrega consigo a idéia de magia (algo que
todo ser humano também carrega consigo e que está presente na educação).
Magia é transformação, é mudança, movimento constante, exatamente o
processo que ocorre no ser humano através da educação e, quando se pensa
processo, a concepção pedagógica mais próxima é representada pela
metodologia dos projetos. Projetar significa lançar-se. Juntando a teoria sobre
essa concepção pedagógica e os conceitos constitutivos de mandala renasce a
idéia de “sonhar” um projeto e, através dos efeitos mágicos do processo psico-
pedagógico educacional, concretizados em movimentos circulares,
tridimensionais, atingir o objetivo, concretizar o que foi projetado.
Ainda na conceituação de mandala aparece a expressão pensamento
humano, e sobre o pensar, ALVES, parafraseando NIETZCHE (“para aprender
a pensar é preciso aprender a dançar”) afirma que os pensamentos são as idéias
dançando e acrescenta que há danças dos tipos mais variados. Assim, pela
analogia, o pensamento pula de uma coisa que ele conhece para uma coisa que
ele desconhece. Ora, o sonho também nasce de algo que conhecemos e nos
impulsiona, por caminhos mágicos, para algo que projetamos mas não sabemos
como atingiremos.
Ainda segundo Rubem Alves, a analogia não dá conhecimento preciso
sobre o desconhecido, mas o torna familiar e apesar de não nos oferecer o
conhecimento exato das coisas, nos introduz no campo da familiaridade. Por isso,
os cientistas, que consideram que a ciência é conhecimento exato, desprezam as
analogias. Mas os educadores que apesar de serem levados constantemente à
prática da pesquisa (características do processo científico) se permitem ao direito
de sonhar e se utilizam de analogias. Então, Rubem Alves explicita seu
pensamento afirmando que, “como Nietzche disse que para pensar é preciso saber
dançar eu (ALVES) digo que para ensinar é preciso amar”. (2004 p.72)
Aristóteles, na primeira frase com que abre sua Metafísica, diz o
seguinte: “Todos os homens têm naturalmente, um impulso para adquirir
conhecimento”. Novamente as idéias contidas no conceito de mandala são
reforçadas por essa afirmativa, quando Aristóteles utiliza a palavra impulso
para designar uma ação mágica, característica do ser humano que nos conduz,
novamente, a conceitos como brisa, movimento e transformação.

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Também Jung declarou, quando descobriu que pintar, desenhar e sonhar
com mandalas nos conduz a um equilíbrio já transformado, que cada
aprendizagem sentida nos transforma, reforçando a ousadia do ISTCC-RJ em
pensar numa concepção pedagógica estruturada a partir de mudanças, de
integração e utilização do cyber espaço atingido pela tecnologia da informação.
Se estamos conduzindo nosso raciocínio através das nuances da magia,
podemos, mais uma vez, citando Rubem Alves, afirmar que “feiticeiras sabem
que os banquetes não se iniciam com a comida que se serve. Eles se iniciam com
a fome. A verdadeira cozinheira é aquela que sabe a arte de produzir fome.”
(2004 p.52)
Agora, a analogia é nossa: buscamos incessantemente, como
educadores, que nossos alunos tenham fome de saber, fome de informação,
fome de partilha, fome de construção. Por isso, nós, os educadores do ISTCC-
RJ, acreditamos numa concepção pedagógica inspirada na mandala. Porque
para saciar toda essa fome, não é possível seguir apenas numa direção fixa, nem
caminhos já desenhados, mas, sobretudo, buscar no afeto, representado por esse
movimento da alma na busca do objeto de sua fome, vários caminhos, muitas
intercessões, enfim, para provocar em nossos alunos muitos tipos de fome
porque temos certeza de que conhecimentos são extensões do corpo para
realização do desejo e uma dessas extensões é, sem dúvida, o pensamento. Não
existe nada mais aprisionador, mais mortal para o pensamento do que o ensino
das respostas certas. Por isso, queremos que os nossos alunos sejam capazes de
“lançar-se” em todas as direções da mandala, numa constante troca de afetos com
seus professores, equipe gestora, funcionários, para que possam locomover-se e
ocupar os cyber espaços desenvolvendo e utilizando a Integração Multipolar, a
Valorização do Percurso e o Equilíbrio do Intelecto e da Emoção.

Conclusão

Portanto, podemos concluir que o círculo da Mandala se completa ao


pensarmos na ação pedagógica, na sala de aula, na educação à distância , no
Curso de Análise de Sistemas Informatizados no ISTCC - Quintino e na relação
professor-aluno.
Uma instituição de ensino que tem como concepção a gestão
participativa, na qual direção, funcionários, corpo docente e discente
participam de sua gestão criando uma rede energizante e pensante de relações
interpessoais e de ensino, na qual os alunos pensam, tem voz e participam da
estrutura da construção da nova sede, com salas de aula híbridas, possibilitando
o desenvolvimento de projetos, reuniões, discussões, pesquisa e AÇÃO. Tudo
isto, permite que essa rede cibernética deixe de ser virtual e se torne real.

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Referências

ALVES, Rubem. Ao professor com meu carinho. São Paulo: Versus Editora,
2004.
DAHLKE, Rüdiger. Mandalas: formas que representam a harmonia do
cosmos e a energia divina. São Paulo: Pensamento, 1995.
LOVATO, Jane Muller. O ciberespaço: uma mandala virtual. Revista de
Educação da UFRGS, Porto Alegre: Porto Alegre, v.6, n.2, dez. 2000.
SILVEIRA, Nise da. Jung: vida e obra. Rio de Janeiro: José Álvaro, 1968.
WINTHER, Marcos. Mandalas dos nove caminhos do eneagrama. São
Paulo: Pensamento, 2003.

19
O JOGO DOS TERMOS MANDALA E REDE

Cládice Nóbile Diniz*

Introdução

Ao pensar-se o projeto das instalações de um instituto tecnológico, viu-se


a oportunidade de se repensar a escola em uma proposta inovadora, divulgando-
se a idéia norteadora e estrutural na denominação do projeto, de “Mandala”.
Nas explicações subseqüentes, observava-se que o referenciar à mandala
deveu-se à idéia de inúmeras possibilidades de criação de formas, que o objeto
referenciado permite.
A denominação, portanto, teve uma finalidade mais metafórica do que
mítica, apesar de que, o aspecto mítico do termo “mandala”, universalizado por
sincretismos religiosos e místicos que o trouxeram ao presente, não tem como
ser apagado. Isto é, usou-se a idéia de mandala na busca de uma estrutura para
apresentar modelos mentais e, não, de busca de uma programação inconsciente
para estabelecer-se consenso no direcionamento dos comportamentos.
Fortalecendo o aspecto de metáfora, no projeto explica-se a mandala
como uma estrutura em rede. No entanto, apesar de ser de uso generalizado, o
termo “rede” não tem um só significado e, em seu uso, não corresponde para
todos os que recebem a sua emissão, a um único conceito indicador de um
conjunto objetivo de referências. À rede, não há uma universalidade na sua
imagem. Diferentes objetos podem ser mentalmente evocados quando ao
entrar-se em contato com o termo “rede”: a teia de aranha, a rede do pescador, as
linhas de transmissão das redes de telefonia etc.
Os modelos mentais adotados na busca de solução de um problema estão
relacionados à esperada obtenção de sucesso na comunicação de informações
que permitam ao receptor, por meio de uma imagem simbólica, elaborar uma
esquematização dos fatos e passos envolvidos para empreender uma ação
pretendida.
Iser (1996) observa que os modelos mentais possibilitam ao “eu”
adaptar-se à realidade, a partir de um esquema que age como um o ponto de
partida para outras simbolizações que servirão em alguns pontos para a
superação de carências. Para explicar como se dá o uso do esquema mental,
explica ainda esse autor:
Em vez de imitar o mundo dos objetos, o uso
assimilativo do esquema permite apropriar-se do não-

* Doutora em Ciências da Informação (UFRJ), Mestre em Administração Pública (FGV) e Engenheira Naval
(USP). Atuou na pesquisa, no projeto e na construção naval, em que é especialista pelo IRI-Itália, e na gestão
de empresas na área tecnológica, especializando-se em Engenharia de Produção, pelo COPPE. Docente no
ensino superior, onde pesquisa a aprendizagem da tecnologia da informação.

21
disponível.[...] A imagem é pois um esquema já
anteriormente acomodado e se põe a serviço de uma
assimilação atual igualmente interiorizada, enquanto
“signo” em relação às coisas designadas ou aos
significados. A imagem é, portanto, (mais do que o
indício) um suporte diferenciado do significado [...].
(ISER, 1996, p. 309)

O jogo das significações do esquema se torna simbólico e, não mais


simplesmente, um exercício sensório motor ou de experimento intelectual.
A imagem simbólica, em sendo simbólica, está definida por meio de
símbolos, isto é, signos. Por sua vez, os signos são formados por significados -,
também denominados conceitos -, e por um suporte, o significante -, que lhes
permitem serem percebidos por aquele com quem se comunica.
Explicando que, o ser humano ao conjeturar, em geral, o faz valendo-se
de sua faculdade de simbolização, - cada coisa só existindo mentalmente
quando nomeada -, Geertz (1983, p.142) afirma que “só se pode dominar os
fenômenos na medida em que o pensamento puder, através das palavras, agir
sobre eles, construindo uma sua imagem simbólica de posterior realização
material”. Também para Kant apud Deleuze (1976), os juízos que podem levar
ao conhecimento são formulados graças à representações.
Os signos definem uma linguagem e, em relação às coisas que designa,
isto é, aos significados, são convencionados para representar a realidade,
encontram-se agrupados de forma sistêmica e estão sendo utilizados na
comunicação de uns com os outros, explica Novellino (2000).
Por ser a linguagem o principal elemento da socialização humana e o que
levou ao espaço humanizado e ao tempo socializado, manifestando-se em rede
de símbolos que agem até sobre o pensar, de acordo com Geertz op. cit.,
preocupa o fato de existirem diferentes significados para o termo “rede”, pois a
comunicação entre pessoas que mentalizam diferentes objetos está prejudicada.
Para sentido do termo requer específicas metodologias, como modelo mental
para a modelização dos problemas. E que, possivelmente, cada uma delas leve a
diferentes resultados.
Por outro lado, uma vez que a evolução da linguagem é pressionada pelo
método de desenvolver novos instrumentos para pensar os problemas, pelas
novas teorias científicas e pelos novos padrões de seleção de problemas,
segundo Popper (1975), pode-se pensar que, em longo prazo, a sociedade
mantendo o significante “rede” e mudando o seu sentido, se força à evolução de
sua linguagem, inovando, conseqüentemente, os seus modelos mentais.
Em vista disso, resolveu-se investigar as diferentes significações em
jogo nos termos “mandala” e “rede”, a fim de contribuir para a adoção de um
sistema simbólico comum, para uma melhor socialização das idéias no projeto.

22
O Modelo Conceitual de Rede pela Imagem

Devido à rede Internet, entre as redes, ter preponderância de uso, seja


privado ou nas organizações, o que lhe dá uma situação ímpar, podem delimitar-
se a ela, os estudos sobre o modelo conceitual de rede.
A difusão do modelo conceitual de rede é creditada ao sucesso da Rede
Mundial de Computadores Internet e às radicais transformações que causou na
sociedade (Castells, 2003). Uma das causas é que, nessa rede de computadores,
interagem miríades de atores, os quais, para comunicarem-se, criam códigos.
Destes, alguns se impõem pelo uso e generalizam-se, como é o caso do código
que se pode considerar como o mais básico, de fundamentação das
comunicações por esse meio, que é o do qual se valem os atores envolvidos,
para referenciarem o meio, a sua estrutura e o processo de comunicação, que é
de “rede Internet”, ou simplesmente de “Internet” ou de “rede”.
Nesse uso intensivo do código, estruturam-se modelos conceituais de rede,
uma vez que não há uma imagem única para “rede”, segundo as referências que
surgem no discurso, na linguagem dos seus usuários e estudiosos. A imagem,
talvez, atualmente a mais difundida, que relaciona a Internet à noção de rede
estruturalmente assemelhada às redes de pesca, mas o seu primeiro ícone
representativo foi o de uma teia de aranha, universalmente propagado na última
década, na qual muito se usou a expressão “teia mundial de computadores”.
A idéia de teia para a rede Internet generalizou-se rapidamente,
sugerindo haver algum relacionamento de modelos mentais utilizados para essa
rede de computadores e os artefatos mentais que o homem desenvolveu apoiado
na imagem mental da teia produzida pela aranha.
Alguns autores falam de malhas e elos da “rede”, como se fossem
guiados pela idéia das malhas dos guerreiros medievais. E, para outros, pelas
construções de seus discursos, a imagem da “rede” remete às redes da
Engenharia, à idéia de redes de tubulações, à de redes de transportes, à de
transmissão de energia elétrica e. até mesmo, às de treliças estruturais. Ainda,
notou-se, também, o uso do termo “rede” com discursos que se apóiam em
conceitos de matrizes matemáticas. Mas, diferentemente do caso da rede de teia
de aranha e da rede de pesca, estes outros sentidos de “rede” estão, atualmente,
limitados a usuários singulares, passando tal referenciar despercebido, ou
então, julgado como proveniente de um erro.
O aparecimento de tantos modelos mentais para pensar a rede Internet,
modelos que se sucedem, é devido a ela resultar não só de avanços da
microeletrônica, da telecomunicação e dos softwares para a comunicação
humana, mas, sobretudo, de mudanças no entendimento humano para que se
obtenha um certo conhecimento visado.
Essas mudanças no entendimento humano, ao ver de Gomez (1997),

23
ocorrem a fim de solucionar os problemas causados à comunicação pela
distância física entre a informação e os usuários e a pouca disponibilidade de
tempo para se acessar, ou se distribuir informações. Para superar a excessiva
distância e o tempo escasso, a rede de comunicação eletrônica anulou todas
formas prévias existentes de vinculação gnosiológica da informação, passando
a fazer valer apenas o “saber socialmente legitimado e auto-referente” existente
naquela rede e naquele momento, como base para o conhecimento. Com isso,
criou novos modelos conceituais para a informação, para a linguagem e o
conhecimento, seja em suas unidades, seja em suas totalidades.
Para essa autora acima referenciada (1997), esses modelos conceituais se
contrapõem àquele da sociedade moderna, em voga até a década de 60, na qual,
o Estado era o observador privilegiado que realizava diversas formas de
sínteses e totalizações intelectuais e discursivas, como oficializando linguagens
e formatos padronizados e normas técnicas, que agiam como códigos
unificadores, orientando a sociedade. A partir das redes de comunicação
eletrônica, os pólos geradores das unidades e das totalidades do conhecimento,
da linguagem e da informação foram sendo transferidos para a sociedade,
levando à criação dos códigos unificadores da comunicação humana de uma
forma difusa, por forças que agem na sociedade a partir dessas redes.
A importância dessas forças fortaleceu o modelo conceitual estabelecido
a partir das redes de comunicação eletrônica o modelo conceitual de rede para
o conhecimento, para a linguagem e para a informação, e que passou a ser
utilizado intensamente para pensar e explicar inúmeros fenômenos sociais.
Por exemplo, Bochi e Cerruti (1999, p. 162), falando de Edgard Morin e da
complexidade do devir humano, usam termos como “rede de sabedorias”, “rede
de conhecimentos” e “tecer”. Castells (1999) trata da “sociedade em rede”. Até
quando a imagem da rede não é diretamente apresentada pelos teóricos mais
recentes, em seus escritos encontram-se referências que remetem às
características e às propriedades da rede. Em alguns, a imagem da rede é especial
referência, como destaque ou à guisa de conclusão.
Refletindo-se sobre os modelos mentais de redes, comentam-se a seguir
aqueles, para os quais, notou-se uma significativa presença na pesquisa
bibliográfica e no uso por organizações a partir dos anos setenta.
São eles: (a) a rede estrutural da Engenharia; (b) a rede de pesca; (c) a
rede das malhas metálicas das roupas de combate medievais; (d) a rede
determinada pelas linhas de uma matriz, e (e) a rede da aranha, a teia.

A Gênese da Rede na Engenharia

No modelo da rede estrutural da Engenharia, a modelagem se pauta nas


estruturas usadas como arcabouços de construções. Este tipo de imagem foi
24
largamente empregado para redes e, por essa razão, foi levantado com muitos
detalhes.
O que caracterizaria uma rede dessa como tal, é de ser uma estrutura
mentalmente modelizada por linhas imaginárias, cujas intersecções são
denominadas nós, aos quais se atribuem valores representativos do problema
real, devendo o nó suportar a carga sobre ele e algumas linhas, transmitindo, às
outras linhas, parte dessa carga. E essa estrutura deve manter a forma
determinada pelas linhas e suas intersecções, sendo permitido pequeníssimos
deslocamentos dos nós, dos ângulos determinados pelas linhas, do
comprimento das linhas e de suas outras características atribuídas, em prol de
uma propriedade que, também, seria sua característica, a elasticidade.
Essa rede é sustentada por forças internas, estabelecidas nos nós, apoiada
em um certo número de pontos do mundo, suportando outras forças desse
mesmo mundo. Os nós, sendo determinados pelos cruzamentos das linhas,
seriam pontos indissociáveis das linhas que os originaram, estando em
indissolúvel vinculação, ligados às linhas. Portanto, essa rede é rígida, bem
como, os seus nós e as suas linhas, que teriam atributos, tais quais as
intersecções rígidas que amarram as também rígidas vigas das treliças de
estruturas da Engenharia.
Nessa rede estrutural, a imagem remete a abrigo e a apoio estrutural para
solucionar os problemas do mundo, apoiando-se em alguns pontos dessa
realidade.
O arcabouço imaginário resultante era um construto de treliças, que
requeria para sua aplicação uma sofisticada, mas possível de ser realizada no
cotidiano, modelagem matemática. Em resumo, o modelo mental do mundo,
nessa época, era rígido e era possível de ser apresentado por cálculos, apesar das
dificuldades que impunha, e se apoiava na imagem do reticulado treliçado da
estrutura cristalina da matéria. Era um modelo voltado para certos problemas e
para alguns usuários.
Neste caso, a referência explícita de partes do modelo mental, na sua
utilização, permite a conclusão que esses usos da imagem de rede da
Engenharia, a que se denominou estrutural neste estudo, se dá por um recurso
metafórico. Apoiou-se, para chegar a tal conclusão, nos ensinamentos do
estudioso do uso metafórico de imagens nas organizações, Morgan (1983). E,
também, daqueles outros que tratam especificamente da metáfora
arquitetônica, que são Nadler, Gerstein e Shaw (1994).
Aparentam, também, originar da idéia de arcabouço rígido projetado
pelo homem, os conceitos de “estrutura da rede” e de “arquitetura da rede”.
Como resultado da idéia de construto rígido, surgiram imagens apoiadas
nas redes de transporte, nas das redes de tubulações e nas redes de distribuição e
transmissão de energia elétrica, todas originadas na Engenharia. Não é à toa que

25
os primeiros softwares de rede eram chamados por “transport system” ou
“transmisssion systems”, conforme se encontra em Tanenbaum (1981, p. 7,
grifo do autor).
Nesse modelo mental originado na Engenharia, o cálculo das suas
características se vale de matrizes, uma vez que, nos cálculos de vigas, os
cálculos das equações para determinação das tensões, obtidas, então,
manualmente, como pode ser verificado em Feodosiev (1972, p. 45), foram
sendo substituídas por cálculos matriciais computadorizados, pelo método dos
elementos finitos.
Pesquisando-se em Tanenbaum (1981, p. 2), encontra-se que o alerta de
que o velho modelo de um único computador servindo às necessidades
organizacionais, com os usuários levando seus trabalhos a ele, ao invés de
levarem o computador para si, estava sendo trocado por um novo modelo no
qual um grande número de computadores separados, mas interconectados,
fazem o trabalho, sendo esse sistema de trabalho denominado de redes de
computador. Ele relata o início das redes de computadores.

A Rede nas Redes de Computadores

A explicação de Tanenbaum op. cit., na publicação de 1981, apresenta a


rede de computadores como uma coleção de computadores autônomos
interconectados, que seriam capazes de trocar informações entre si, qualquer
que fosse o meio utilizado para tal, por fio de cobre, lasers, microondas ou
satélites. E nessa publicação, o autor referenciado emprega termos como
internetworking, como pode ser exemplificada na citação, aqui livremente
traduzida: “Atrás dos multiprocessadores há redes reais, computadores que se
comunicam trocando mensagens. Finalmente, a conexão de dois, ou mais,
distintos computadores é denominada internetworking”. Tanenbaum (1981. p.
4, grifo do autor).
Observa Tanenbaum (1981) haver considerável confusão na literatura de
então, entre rede de computadores e os sistemas distribuídos de computadores,
os quais não seriam redes, mas sim virtuais uniprocessadores, ainda que partes
desse processamento ocorressem em diversos computadores. Alerta, ainda, de
que outras opiniões, diferentes da sua e que consideravam os sistemas
distribuídos como um tipo especial de rede, redes essas que se caracterizariam
pelo que denominou “alto grau de coesão e transparência”. Por isso,
Tanenbaum (1981) resolveu adotar o termo rede com um sentido genérico,
cobrindo os dois pontos de vista.
Essa decisão de Tanenbaum (1981) possivelmente teve sérias
implicações para os conceitos atualmente em voga, pois foi um dos autores
mais usados nos cursos de redes.

26
A taxionomia das redes, quanto à estrutura física, foi motivo de uma
revisão técnica por parte de Jensen e outros (1976), segundo relata Tanenbaum
(1981. p. 10).
A publicação oficial da Rede Nacional de Pacotes (Rede, 1994), para redes
locais, de 1994, em plena febre da instalação da rede Internet no Brasil, também,
em nenhum momento referencia a imagem da teia de aranha, buscando um
referencial terminológico cuidado para ser independente de imagens. Mesmo
assim, usa os termos “camadas da rede” e explica que a disposição física dos
computadores a topologia física onde topologia é palavra de origem na
Engenharia Militar, que recebe classificação conforme a forma física que assume,
por exemplo, estrela, anel, barramento e árvore, diferindo da disposição lógica,
que, no entanto, continua a receber a terminologia assemelhada ao modelo físico
correspondente a que se modela. Então, pode haver uma rede fisicamente em
estrela, mas, logicamente em anel. (LAN, 1994).
Por sua vez, Tanenbaum (1994), na edição revista de seu livro sobre
projeto e instalação de redes, referencia as camadas físicas das redes e trata da
instalação de redes conectáveis à rede Internet, abandona o ensino dos grafos e
deixa de citar Jensen. Nessa obra, originalmente escrita em 1992, atualmente
básica e mundialmente adotada no ensino de redes de computadores, assim
como, o foi a sua publicação de 1981, encontra-se citada uma única vez a
palavra “tecido”; poucas vezes, as palavras “balde”, “árvore”, “tronco”,
“codificação em treliça” e “ponte”, e em nenhum momento foi encontrado
nessa publicação o termo teia para a rede de computadores. Verifica-se dessa
explicação que, nas origens do hardware e do software da Internet, não houve
sequer referências longínquas ao atual símbolo da rede Internet.
Mais tarde, a palavra “aranhas” (spiders, grifo do autor) aparece uma única
vez Tanenbaum (1994. p. 824), junto aos termos “crawlers”, “worms” e
“knowbots”, referenciando os dispositivos de pesquisa (“search engines”, grifo
do autor), os quais, explica o autor serem programas comercializados para a
localização das páginas na Internet, e que funcionam como índices para a WEB;
orientando, também, para que se procure dois autores, ambos de 1994, caso se
queira saber mais sobre os dispositivos de pesquisa.
Pesquisando no livro de Soares, Lemos e Colcher (1995), também, sobre
projeto e instalação de redes computadores, não se encontraram os termos teia e
aranha, sugerindo que a hipótese da imagem da teia ter-se originado no
mecanismo de busca spider, seja verdadeira.
A teia surge do sucesso de um dispositivo de busca de informação,
spinders, com a datação do fenômeno a 1994. É essa, também, a provável forte
ligação da Ciência da Informação com a imagem da teia, provavelmente se
originando do nome spider do dispositivo de busca da informação.
Pesquisando-se nessa área, verifica-se que, em 1993, Gomez (1993. p. 221,
grifo nosso) usa a idéia de arcabouço social de transferência da informação. Em
27
1995, Gomez (1995. p. 78, grifo nosso) cita a tessitura de redes sociais.
Nesse interregno, entre 1993 e 95, o esquema mental da teia vence o jogo
dos termos. E, apesar de que, em seu início, sequer seu inventor, Berners-Lee
(1999), relacionava Word Wide Web (WWW) à uma teia de aranha, o final da
década de noventa vai encontrar a maioria dos usuários associando “rede” à
essa imagem.

Outras Redes Enredadas pela Teia

Derfler (1994, p. 3) usa para o termo “rede” a imagem da arquitetura,


diretamente, a ponto de escrever que “PCs baratos e poderosos são as peças
fundamentais, os “tijolos” com que se constroem as redes. Se tiver tijolos fortes
e baratos, você precisará de uma argamassa de qualidade igualmente alta para
uni-los”.
Em outro momento, na mesma publicação, esse autor acima referenciado
(p. 5) fala de “as peças e as partes das redes locais”, de “tráfego telefônico” e
“tráfego nas redes de dados” (p. 2), denotando uma busca de imagem
apropriada, o que é explicitado, quando escreve (p. 7) que “os avanços
tecnológicos são permanentes e modificam a própria maneira como
categorizamos os produtos no mercado de redes locais. Antes de 1989,
tínhamos duas arquiteturas [...]”.
Mas nem Tanenbaum (1981), nem Derfler (1994), em algum momento,
usam termos relativos a outros tipos de redes que não sejam provenientes de
imagens da engenharia, preponderando as estruturais.
Entretanto, em 1994 já havia se passado algum tempo de uso de uma
segunda representação de imagens mentais para o termo rede, remetendo um
outro significado: uso da palavra rede para computadores, com a imagem da
rede de pesca. Era uma segunda geração de significado para o termo, se é que se
pode assim classificar as palavras em gerações de sentidos.
Estariam a conviver, diferentes significados para o mesmo termo “rede”.
A representação das redes de pesca era voltada para permitir ao usuário
de computadores imaginarem-se participando tal qual um nó da rede, resultante
da interligação dos inúmeros computadores por meio de cabos físicos de
ligação, os quais, permitiam a comunicação com determinado número de outros
computadores. Essa imagem de rede de pesca nasce, possivelmente, na
descentralização da informática, com os serviços e produtos para ligações
remotas dos computadores de grande porte e das redes locais dos
microcomputadores: a rede de pesca traz alimentos do mundo e ampara de
quedas contra o mundo, é proteção contra o mundo e nos serve dele tal qual, a
nova tecnologia de computadores descentralizados, de então, propõe ao
usuário.
28
Nos anos oitenta, os fabricantes de placas de rede e os de softwares de
comunicação, divulgavam seus produtos com imagens de redes de pesca e
forneciam explicações dos mesmos mostrando cada computador interligado da
rede, como se fosse um nó dessa rede.
A imagem de rede de pesca sucedia à imagem de esqueleto de edifício, de
vigas imaginárias de uma torre, na qual se modelava o mundo para cálculos de
engenharia usando o computador, a partir da modelagem de elementos finitos,
no início dos anos setenta. Nessa época, os desafios para a modelagem do
mundo com uso dos computadores eram muitos.
Para cálculo das características das redes de computadores, partia-se da
teoria dos grafos para cálculo das características da rede, como pode ser visto
em Tanenbaum (1981. p. 36-87), também, em parte, se calculando
manualmente.
Começou-se a difusão do uso de “pacotes” de softwares pelas empresas.
Como conseqüência desses pacotes, o usuário deixou de fazer cálculos difíceis,
por estar a partir de então, apoiados nas novas técnicas de desenvolvimento de
softwares que surgiam e no desenvolvimento da informática. No final dos anos
setenta e durante todo os oitenta, os cálculos, e até os modelos, passaram a ser
feitos automaticamente, por programa de computador. E, no desenvolvimento
dos cálculos, ou no entendimento das ferramentas computacionais, o usuário
passou a ser alijado do processo.
Se, de uma parte, havia a questão econômica de preços dos computadores,
cujos preços exorbitantes impediam o seu uso generalizado e até mesmo o
experimental, que com isso diminuía o conhecimento a seu respeito e a possibilidade
de novas idéias para seu próprio desenvolvimento, de outra, continuaram a haver
questões ligadas aos softwares, como, por exemplo, as referentes a “como modelar as
comunicações humanas”, que ainda não estavam resolvidas.
As características das redes com imagem remetendo à de pesca, é que
essa rede é determinada por linhas flexíveis que se entrecruzam, passando suas
propriedades aos nós, distinguindo-se esses nós porque o entrecruzamento das
linhas lhes dá certa rigidez, sendo o conjunto todo flexível. A rede de pesca não
se estrutura em uma determinada forma, isto é, tem a forma determinada pelas
forças externas que agem sobre ela, a cada instante, vindas do mundo.
Uma importante utilização dessa significação para o termo “rede”, que
aparenta oferecer um fértil campo de aplicações sobre questões sociais é a
metodologia desenvolvida por Burt (2000), na qual o autor considera questões
como a de tensões em redes e os seus decorrentes buracos estruturais pelo
esgarçamento das relações entre pessoas, que se comportam no modelo como
nós de uma rede.
Wellman e Berkowitz (1988), como Burt também autores da Sociologia,
usam o termo “rede” com características de rede de pesca.

29
Já, no modelo mental de rede que se reporta à imagem das redes formadas
por elos de malhas metálicas das roupas de combate medievais, usadas para
proteção contra flechas nos combates, a rede é determinada pelos elos, nos
quais se confundem linhas e nós, pois é o elo todo participando da união.
Qualquer ponto de suas linhas sendo nó, o elo em si participa da união:
tem-se que o todo da rede, apesar de resultar de elos e linhas inflexíveis, tem
alguma flexibilidade. A sua forma é determinada pela forma do que deve
proteger, devendo ser suportada pelo que lhe dá forma. Esta imagem remete a
proteção vital nos embates do mundo, apoiando-se na própria forma que deve
ser protegida.
No caso da rede determinada pelas linhas de uma matriz, os pontos e as
linhas são apenas suportes determinantes de um espaço, as casas ou caselas, ao
qual se atribuem propriedades.
Esses dois últimos esquemas mentais são pouco usados. Não é essa a
situação do esquema da teia. Na idéia de rede que remete às teias de aranha, as
linhas que determinam os nós com seus cruzamentos, são muito flexíveis no
sentido de seu comprimento, os nós recebem as propriedades de todas as linhas,
sendo muito flexíveis, também. A rede total resultante é muito flexível, móvel
em qualquer direção. Apóia-se minimamente no mundo, resistindo muito
pouco às forças externas, prendendo nela pequenas coisas do mundo e
enredando-as, as obriga a integrar a rede. E, caso não queiram dela participar,
por ter vida própria, por exemplo, ao debater-se para tentar se desprender, o
enredado tem esses seus movimentos comunicados através das linhas, à rede
toda, alertando a aranha.
O uso desta última imagem requer que se defina, se é do ponto de vista do
enredado, preso à rede, tomando parte dela e definhando nela, ou do ponto de
vista da aranha, com a rede determinada e fabricada por ela, sustentando-a no
mundo e alimentando-a do mundo que vem a ela.

Os Limites da Rede como Metáfora

Atualmente, na Internet, o termo “rede” não referencia uma estrutura


rígida para os diversos usuários, mas, flexível. Tal como a teia de aranha.
Moraes (2001. p. 70) em uma obra que trata do avanço tecnológico
avassalador, da convergência multimídia, da mundialização cultural e da
globalização econômica, apresentando o movimento de vida e morte das
tecnologias, empresas e conglomerados relativos à Internet, cita a teia “a teia
cibernética” no momento em que fala de significações, de novos paradigmas da
comunicação virtual. Se a “teia cibernética” significa pela sua imagem, então,
sugere ser a idéia de “teia” mais que uma metáfora.
Não aparentam, nesse caso, estarem apenas se valendo de uma metáfora.
30
Levy (1993. p. 73), trabalhando a metáfora do hipertexto, lembra que texto é um
termo que se origina, etimologicamente, na técnica feminina de tecer, tricotar,
lembrando que:
[...] a roupa pacientemente tecida nos contém, nos limita, forma uma interface
colorida entre o calor de nossas peles e a rigidez do mundo. Os coletivos também
cosem, através da linguagem e de todos os sistemas simbólicos de que
dispõem, uma tela de sentidos destinada a reuni-los e talvez protegê-los dos
estilhaços dispersos, insensatos, do futuro; [...]. (grifo nosso)

O tecer de tecidos tem uma ligação mitológica com a teia, já que, na


mitologia grega, é Ariadne aquela que ensina o homem a tecer.
Levy (1993) observa que as metáforas são embasadas em “conceitos de
conceitos” princípios de causa-e-efeito que passam de um território do saber a
outro, geralmente, originados entre pessoas de origem humilde, filhos de
camponeses, artesãos, técnicos, trabalhadores manuais, entre outros. Lembra
esse mesmo autor que a palavra arquétipo vem de arché, primeiro, e typos, de
marca, isto é, ferramenta, combinando a experiência com modelos concretos à
imaginação, sendo a metáfora uma tecnologia da inteligência. Alguns anos após
a apresentação dessas idéias, em LEVY (1999), ele apresenta a metáfora do
impacto, do espaço sideral (ciberespaço) e da árvore.
Johnson (2001) dedica um livro ao estudo das metáforas em uso nas
interfaces da Internet, estudando a cultura subjacente ao seu emprego. Trata-se
das janelas, dos arquivos, das lixeiras e inúmeras outras, destacando-se entre
elas o próprio termo “computador”, que é originado no cargo de um profissional
antigo, que trabalhava fazendo cálculos em réguas de cálculos. Diz ele, sobre
essas metáforas:
A ruptura tecnológica decisiva reside antes na idéia do computador como um
sistema simbólico, uma máquina que lida com representações e sinais e não com
a causa-e-efeito mecânica do descaroçador de algodão ou do automóvel. Sob esse
aspecto, os computadores têm certa semelhança superficial com tecnologias
mais antigas a prensa de Gutemberg, por exemplo, ou uma câmara de
cinemascope. Mas há uma diferença importante. Uma máquina impressora ou
uma câmera lidam com representações como produtos finais ou resultados; são
máquinas representacionais porquanto imprimem palavras em papel ou
registram imagens em filme, mas os processos subjacentes são de natureza
puramente mecânica. Um computador, por outro lado, é um sistema simbólico
sob todos os aspectos. O mais das vezes, essa representação assume a forma de
uma metáfora. (JOHNSON, 2001. p. 17-18)

Observa-se que, no uso da metáfora, há necessidade de se ter em mente a


imagem a partir da qual se faz os paralelos e é necessário explicitar a imagem e
os paralelos, que Johnson (2001. p. 167) explica como “seguir os códigos e
convenções do mundo real”. E isso deve ser seguido, a ponto de Morgan (1996)
recomendar o estudo de aspectos não imediatamente reconhecíveis, nos casos
do uso proposital de metáforas na busca de soluções de problemas, uma
31
imagem metafórica podendo ser abandonada ou substituída por outra
considerada mais conveniente.
As metáforas requerem o uso de aspectos da imagem metafórica -, no
caso da teia, por exemplo, ter-se-ia o de ser flexível, mutante e de buscar
prender quem nela toque. E, na verdade, a teia é muito pouco estruturada, quase
uma não-estrutura.
O próprio Johnson (2001. p. 174), apesar de somente tratar de metáfora,
parece observar o limite dessa categoria, ao final de seu estudo, quando escreve:
A interface veio ao mundo sob o manto da eficiência, e está agora emergindo tal
uma crisálida como forma de arte genuína. Tudo isso em menos de meio século
de inovação. [...] Nossas interfaces são histórias que contamos para nós mesmos
para afastar a falta de sentido, palácios de memória construídos de silício e luz.
Elas vão continuar a transformar o modo como imaginamos a informação, e ao
fazê-lo irão nos transformar também para melhor e para pior. Como poderia ser
diferente?

A imagem da teia não é citada uma única vez por Johnson (2001), apesar
dele tratar exaustivamente dos símbolos utilizados nas interfaces gráficas da
Internet. É uma situação que aponta além da metáfora, na direção de uma
natureza mítica na idéia da teia, tendo-se em vista a seguinte consideração de
Balandier (1999. p.18) sobre o mito: “Por natureza o mito não possui evidência,
o que resulta na incerteza de sua identificação [...] o discurso mítico impõe-se
pela autoridade, dispensa a hermenêutica (interpretação) e a exegese
(explicação)”.

O Mito e a Rede Mítica

A questão de uma imagem mental da “rede” ser mítica e não metafórica


implica especialmente no aspecto de pouco, ou nada, buscar-se referenciar-se de
sagrado ao usar-se uma metáfora. O mito difere da metáfora por ter o caráter de
“tradução sagrada, revelação primordial, modelo exemplar”, sendo a
sacralização o que leva aos mitos terem “um poder mágico, graça ao qual é
possível dominá-los, multiplicá-los ou reproduzi-los à vontade” Eliade (1998, p. 8
e 19). Este autor observa que o mito referencia algo que não existe, sequer como
ilusão ou de algo falso, ou daquilo que se contrapõe ao logos e à história, sua
importância sendo a de dar significação e valor à existência humana e a de fornecer
pistas para a identificação e o entendimento dos modelos da conduta humana.
O ato de navegar na Internet estaria ligado às ações arquetipicas, isto é, às
estruturas básicas e míticas de cada um, segundo é sugerido pelo relato de Le
Moigne in Pena-Vega e Nascimento (1999), que, para guiar a modelagem de
sistemas computadorizados e interpretar os seus modelos, propõe o uso de
símbolos, esquemas e estruturas simbólicas apenas “em condições

32
identificáveis e localmente modelizáveis” - porque as representações de ações,
memorizáveis por símbolos, generalizadas, estariam cobertas de equívocos e
ambigüidades, razão pela qual alerta sobre o uso da Internet:
Trata-se da ação de navegar em um arquipélago de símbolos diversamente
conectados, apoiando-se num pequeno numero de ações arquetipicas (comparar,
ramificar, etc...) e respeitando algumas “regras de navegação” que as lógicas
utilizadas determinam. (LE MOIGNE in PENA-VEGA e NASCIMENTO,1999,
p. 67-68)

Observa-se que, apesar das reclamações quanto às dificuldades no uso de


ferramentas de busca e na perícia em certas tecnologias, rapidamente, a maioria
dos usuários aparentam sentirem-se com mais poder em dominar um assunto
quando usam a Internet em sua pesquisa, e aparentam ficarem mais confiantes
em temas se trocam idéias a respeito, por e-mails ou conversando em chats. As
pessoas aparentam se sentir “empoderadas” pelo uso da Internet e consideram-
na como um bem a se aspirar, surgindo movimentos para que todos venham a ter
acesso a ela, como um direito fundamental. E, quando as pessoas referenciam a
Internet como uma teia de aranha, provavelmente se veêm como a própria
aranha. Poucos se sentem como vítimas da aranha.
É como se a teia fosse um mito fundador das atividades da Internet.E o
mito molda a vida das pessoas, mas as pessoas não se dão conta disso porque
está, em sua maior parte, abaixo da superfície da consciência, alerta Keen in
Keen e Valley-Fox (1995, p.13), afirmando: “para a pessoa que vive dentro dos
limites do horizonte mítico, ele é quase invisível”.
Esse autor op. cit. (p. 10) reitera a idéia de Carlos Jung, de ser a mais
importante questão a de colocar-se aquela pergunta: “Que mito estamos
vivenciando?”, pois, para ele, a história recente da humanidade tem sido
moldada não só pela “Ciência esclarecida” , como também, pelo “mito
inconsciente”. Explicando ainda o mesmo autor op.cit. (p. 14-15), a razão
porque é importante se saber qual o mito que se vive, apresenta-se da seguinte
forma:
O mito organizador de qualquer cultura funciona de maneira criativa ou destrutiva,
saudável ou patológica. Por proporcionar uma descrição do mundo e um conjunto
de histórias que explicam por que as coisas são como são, ele estabelece consenso,
sanciona a estrutura social e dá ao indivíduo um mapa autorizado do percurso da
vida.[...] Na medida, porém, que o mito nos proporciona segurança e identidade,
também, cria uma cegueira seletiva, limitação e rigidez por ser intrinsecamente
conservador. [...] Visto que nenhuma mudança radical se faz necessária para a
sobrevivência, o status quo continua inalterável, o mito e o ritual não são
questionável, e os padrões de vida, assim como as estações do ano, se repetem. Mas,
quando sobrevém uma crise uma catástrofe natural, uma derrota militar, a
introdução de uma nova tecnologia a mente mítica fica perplexa e não se sabe como
lidar com a novidade. Conforme disse Marshall McLuhan, ela tenta “caminhar para o
futuro olhando através de um espelho retrovisor”.

33
O mito está ligado a fatos primordiais que “modificaram a condição
humana como tal”, segundo Eliade (op. cit., p.15), isto é, não se tem sido como
se é desde os primórdios da humanidade, certos fatos ocorreram para isso,
produtos preciosos e exemplares da cultura, hoje contados pelos mitos. Esses
fatos referenciam o problema mítico, que, para Diel (1986. p. 56-57), está
oculto no mito e trata-se do esforço sensato para vencer o terror ante o
desconhecido, pela sublimação, incorporando-o à imaginação com um
significado simbólico e verídico, mas não real.

A Mandala da Teia

A teia como representação da rede “internetiana”, sendo um mito, é


usada como uma imagem básica. Sendo assim, a imagem da teia é uma
mandala, infere-se, das observações “junguerianas”, cujo expoente nesse
assunto, no Brasil, foi Nise da Silveira. Isto é, são formas da natureza, básicas,
em que o homem estrutura seu mundo mental. E, são as últimas estruturas
cerebrais que, na loucura, ficam em comunicação com o mundo dos sãos,
fazendo parte daquilo que impede as estruturas do pensamento perderem o
contacto com nossa forma de pensar.
Quanto à teia ser uma mandala, tem-se confirmação em Dahle (1999. p.
192), que a apresenta como “a mandala da teia”, explicando que mandalas “são
formas que representam a harmonia do cosmo e a energia divina”.
Cunningham (2001) considera a mandala como a síntese de distintos
elementos em um esquema unificado, representando o básico natural da
existência. E citando Jung, afirma que, para ele, a mandala simboliza um
refúgio seguro à impossibilidade da reconciliação das partes do mundo em um
todo completo.
Ainda Cunningham (2001), no site do “The Mandala Project”, explica
que a palavra mandala vem do sânscrito, significando círculo, “o circulo da
eternidade”, existindo definições na ciência, na religião e na arte, com suas
figuras sendo encontradas em muitas culturas, o que lhe seria um indicativo de
esses povos chegaram a um mesmo meio de expressar as idéias.
Dahle op. cit. estudando o significado de inúmeras mandalas, considera
que a mandala da teia de aranha representa o nosso enredamento com o mundo,
por isso, ela produziria nojo em algumas pessoas. Observa esse autor, que a
vítima só toma ciência da teia quando nela está presa, sob ameaça da morte. No
entanto, vê-se que essa é uma ótica da vítima. Da ótica da aranha, é o que lhe
manterá a vida. E na Internet, como já se comentou, muitos se sentem mais
como aranha, do que como vítima, isto é, mais tecendo ou percorrendo o mundo
“internetiano”, do que sendo devorado nele.
Mas, nas duas situações, se sendo aranha ou sua vítima, se está preso ao
34
enredamento, pois a aranha é desajeitada fora da teia.
Essa idéia de se estar na teia entre a vida e a morte, remete à idéia do portal
de Eros e Tanatos, um momento na vida de uma pessoa onde ela está à beira da
morte ou de decidir-se por continuar a viver, o qual é explicado por Marcuse
(1981. p. 194) como sendo a situação onde agem forças do instinto do desejo e
forças da razão. Lembra esse autor que “[...] para as coisas finitas a hora do seu
nascimento é a hora de sua morte”. Marcuse op. cit. (p. 199-200) coloca que o
ideal do prazer é a “intemporalidade”, “a alegria quer eternidade”, porque a
morte é a “negatividade final do tempo”. A esse ponto, observando-se que a
dimensão do dilema de Eros e Tanatos destacada é apenas o tempo.
Essa observação leva a se considerar Diel op. cit. (p. 70), que explicando
sobre a “harmonização da causa intrapsíquica de uma atividade pelo desejo”,
relata que essa harmonização é conseguida pelo mito quando este remete ao tempo
passado, ao presente e ao futuro. Explica, também nesse caminho, Eliade op. cit.
(p.19) que, pelo mito, entra-se em um tempo qualitativamente diferente do que se
está normalmente, primordial e recuperável tantas vezes quanto se queira.
As duas situações relatadas por Eliade op. cit. (p. 164-165) são
encontradas na Internet: a da saída do tempo histórico e pessoal, para um tempo
fabuloso, trans-histórico, com mais liberdades, e a de se estar na Internet, como
“se estando em lugar nenhum”. A heterotopia é a denominação, proposta por
Foucault (2001, p.418), para um local, ou objeto, que tenha o poder de justapor
em um só lugar vários espaços que são incompatíveis entre si. A heterotopia está
relacionada a cortes temporais em uma cultura, mudando no desenrolar da
civilização considerada. Na heterotopia, se acredita penetrar por meio de gestos
e permissão, mas, ao se nela entrar, se é excluído do espaço e tempo real,
permitindo uma ruptura absoluta com o tempo tradicional, cria um espaço
próprio de percepção etéreo, em contraponto aos espaços reais públicos;
privados; sociais; úteis; do lazer, e do trabalho, entre tantos que existem.
É nessa heterotopia que parece se inserirem certas redes de pessoas e
organizações que buscavam novos espaços coletivos sócio-culturais para
transferência de conhecimentos e comunicação organizada, que falava Gomez
op. cit. (p. 157), na busca de maior legitimação social dos conhecimentos e das
informações.
Considerando-se a teia da Internet mítica, remete-se-á a uma mandala
que é uma heterotopia e simboliza a unidade das partes do mundo, bem como a
impossibilidade de se ter a unidade de outra forma que não seja pelo mito.

CONCLUSÕES

Pesquisando-se os modelos utilizados nos esquemas mentais para pensar


sobre os problemas do mundo e suas soluções, a partir da denominação de um

35
projeto de escola como Projeto-Mandala, pesquisou-se o sentido da mandala
como rede e os significados dados ao termo “rede” desde o surgimento das redes
de computadores.
Verificou-se que foram mantidas a mesma designação “rede” para
imagens diferentes, de origens diversas, que se sucederam no tempo, algumas
sobrevivendo, em espaços específicos, concomitantemente às que as
sucederam e que foram mais empregadas.
Atualmente, encontrou-se o uso do termo remetendo a um modelo mítico, o
da da teia da aranha, propagado pelos usuários e pelos estudos da Internet. Na
comunicação da informação em redes políticas, observou-se que prevalece o
modelo metafórico estrutural, oriundo da Engenharia. Na Administração, ora se
encontra a metáfora estrutural e, em outras vezes, o mito da teia de aranha.
A importância do mito da teia da aranha em um projeto-escola na área da
Ciência da Computação, é que ele revela a rede Internet como uma heterotopia,
pela qual se é excluído do espaço e tempo real, permitindo uma ruptura absoluta
com o tempo tradicional, criando um espaço próprio de percepção, em
contraponto aos espaços reais públicos e privados.
É nessa heterotopia que parece se inserirem certas redes de pessoas e
organizações que buscavam novos espaços coletivos sócio-culturais para
transferência de conhecimentos e comunicação organizada, buscando
conseguir maior legitimação social para seus conhecimentos e informações, o
que é um caminho para o Projeto-Escola Mandala explorar.
Outro caminho que se apresenta, para soluções de um problema é o de
“fazer uma viagem no mito”, trabalhando-se sobre dimensões determinadas de
um problema, a partir do mito, como se fossem categorias estruturais. Nessa
situação, sugere-se uma viagem ao mito da mandala para se buscar soluções
para os problemas que podem advir ao projeto-escola. E, no campo da
Educação, a pesquisa urge em ser continuada.
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39
O PODER DA IDENTIDADE
UMA LEITURA DA OBRA DE MANUEL CASTELLS

Marcos Paulo Monteiro*

O autor

Manuel Castels nasceu na Espanha em 1942 e é, desde 1979, catedrático


de sociologia e planejamento urbano e regional na Univeridade da Califórnia,
Berkeley. Foi também professor na École Pratique des Hautes Études en
Sciences Sociales (Escola Prática de Estudos Avançados em Ciências Sociais)
em Paris, catedrático e diretor do Instituto de Sociologia de Novas Tecnologias
da Universidade Autônoma de Madri, professor do Conselho Superior de
Pesquisas Científicas em Barcelona e professor visitante em 15 universidades
da América Latina. Publicou 20 livros em várias línguas. É membro da
Academia Européia. A trilogia A era da informação já foi publicada em inglês,
espanhol, francês, chinês, russo, sueco, japonês, coreano, croata, italiano e
turco.

A construção da identidade

Identidade é a fonte de significado e experiência de um grupo, com base


em atributos culturais relacionados que prevalecem sobre outras fontes. Não se
deve confundi-la com papéis, pois estes determinam funções e a identidade
organiza significados.
A construção da identidade depende da matéria-prima proveniente da
cultura obtida, processada e reorganizada de acordo com a sociedade. Há uma
distribuição entre três formas e origens de construção de identidades:
! Identidade legitimadora: introduzida pelos dominantes para expandir e
racionalizar sua dominação em relação aos atores sociais, é o caso dos países
comunistas e dos Estados Unidos da América;
! Identidade de resistência: criada por atores contrários a dominação
atual, criando resistências com princípios diferentes ou opostos a sociedade
como um todo ou naquela, específica, na qual estão inseridos, é o caso do
Movimento dos Sem Terra ou dos vietcongues na década de 40/50.
! Identidade de projeto: quando os atores, usando a comunicação, a
união e a diversificação de métodos e processos constroem uma nova
identidade para redefinir sua situação na sociedade. Neste caso, incluímos

* Mestre em Tecnologia, Doutorando em Engenharia Nuclear, Consultor de Informática,


Palestrante e Conselheiro da ABT. Diretor-adjunto do ISTCC-RJ

41
nosso projeto de identidade e do nosso projeto pedagógico, Mandala e, no
aspecto social, os diversos movimentos atualmente em ação juntos às
comunidades carentes, como exemplo, podemos citar o Grupo Afro-Reggae;
É obvio que uma sociedade de resistência pode acabar como de projeto
ou até mesmo legitimadora, foi o que aconteceu no Vietnã, legitimando sua
dominação. No nosso caso específico, devemos empregar uma metodologia
para identificar nosso egresso, como detentor dos conhecimentos que venham a
torná-lo destaque no mundo do trabalho. Assim, cada tipo de identidade leva a
resultados distintos: a identidade legitimadora dá origem à uma sociedade, com
organizações e instituições; a de resistência forma comunidades, formas de
resistência coletiva à alguma opressão; e as de projeto produzem sujeitos,
atingindo seu significado e objetivos pela sua experiência, fica claro que nosso
Projeto de Identidade, Mandala, deve procurar romper com as identidades
opressoras, que moldam perfis de profissionais da área de informática, com
base em suas instituições de origem, tradicionais e consagradas.
A proposta envolve o surgimento da identidade e entidade do ISTCC do
Rio de Janeiro, que com um projeto totalmente inovador de formação, trará um
novo foco para o nosso aluno. As identidades, em relação a como foram
construídas, devem ser vistas dependentes do contexto social. Em nosso caso,
está inserida no surgimento da sociedade em rede, que reforça novas formas de
transformações sociais.

Era da Globalização : sociedade reais x sociedades virtuais

A era da globalização é também a era do ressurgimento de um


nacionalismo menos focado nas nações reais e mais nas nações virtuais,
construídas através da rede e que vêm a se manifestar na reconstrução de uma
nova identidade formacional e educacional, onde os casos de sucesso estão
muito mais em evidência do que há trinta anos atrás, disseminando-se pela
sociedade com uma velocidade alucinante e criando novos ícones a cada
momento. Este modelo não se compara ao da era pós-Revolução Francesa, onde
os sucessos individuais levavam décadas e mesmo séculos para serem
reconhecidos. É neste novo momento, em pleno século XXI que nosso Projeto
Identidade, com sua nova consideração pedagógica, Mandala, vem permitir que
nós, aqui no Brasil, especialmente no Rio de Janeiro, criemos ícones mundiais.
E o sucesso deste projeto só dependerá de nós, docentes e discentes trabalhando
para um só propósito.

A etnia e a origem social nesta nova sociedade em rede

A etnia é uma base para surgimento de revoltas por justiça social. Ela e a
raça são questões fulcrais e sua forma de manifestação são alteradas pela atual
42
tendência social, sendo também, uma forma de identidade. Os problemas de
classe também são importantes, pois eles provêm grande parte de diferentes
raças e são responsáveis por muitos movimentos em defesa de uma vida melhor.
Apesar de serem fatores muito importantes, ainda é dificil dizer que possam
constituir significados que construam uma identidade capaz de produzir
grandes mudanças. Não serão, nem a etnia nem a origem social, obstáculos para
implantação de um plano de metas a ser atingido pelo nosso projeto, visto que o
mesmo está acima de quaisquer diferenças, pois a Mandala, vista como um
círculo, põe todos há “cabeceira” e, assim será dada a todos, a mesma
oportunidade e, com certeza faremos vários expoentes, o que , como já disse
anteriormente, individualizará nosso aluno frente aos das demais instituições de
ensino similares, possibilitando uma participação igual na disputa por uma vaga
no mundo do trabalho.

O que pretendemos com o projeto

Os movimentos feitos por uma comunidade local são voltados para três
conjuntos de metas principais: coletivismo, identidade cultural local e maior
autonomia política local. Esses três unidos e diferenciados em cada caso
chegam a produzir algum significado para a comunidade, e esses movimentos
são a principal resistência ao unilateralismo dado pelo capitalismo, estatismo e
informalismo. Assim, o que pretendemos é promover nossa maior participação
na sociedade, participação no desenvolvimento da comunidade, a conservação
de nosso próprio espaço em um processo de sobrevivência coletiva de
comunidades. No nosso caso específico, como bem definiram as professoras
Regina Célia e Andréia De Luca, a nossa procura é a manutenção da
impermanência típica do círculo, da transformação, do mimetismo, oferecendo
o nosso conhecimento tecnológico benefício real para a sociedade. Como
estamos em uma Mandala, todos somos atores e partícipes nesse projeto de
transmutação do conhecimento. As comunidades locais, que montam seu
próprio movimento, constituem fontes específicas de identidades, que se
defendem em ordem global construindo não um paraíso, mas sim um bom
abrigo. E é o nosso caso.

Globalização, informacionalização e movimentos sociais

Seu problema é o mesmo que o de muita gente. Está relacionado à


doutrina socioeconômica conhecida como “neoliberalismo”. Trata-se de um
problema metateórico. É o que lhe digo. Você parte da premissa de que o
“neoliberalismo” é uma doutrina. E tomando você como exemplo refiro-me a
todos aqueles que acreditam em esquemas tão rígidos e quadrados como suas
cabeças. Você acha que o “neoliberalismo” é uma doutrina capitalista criada
para enfrentar crises econômicas que o capitalismo atribui ao “populismo”.
43
Bem, na verdade o “neoclassicismo” não é uma teoria para explicar ou enfrentar
crises. Ao invés disso, é a própria crise, transformada em teoria e doutrina
econômica! Isso quer dizer que o “neoliberalismo” não tem a mínima
coerência, muito menos planos ou perspectivas históricas. Em outras palavras,
é pura baboseira teórica.
(Durito, conversando com o subcomandante Marcos na Floresta de
Lacandon, 1994.)

Durito é um personagem das histórias do subcomandante


Marcos, o porta-voz dos zapatistas. Ele é um besouro muito
inteligente: na verdade trata-se do conselheiro intelectual de
Marcos. Aqui eu incluo um ponto de vista particular, para o nosso
Projeto Identidade, cada grupo de alunos deveria ter um Durito,
um professor conselheiro e orientador que o acompanhasse desde
sua entrada na Mandala até sua saída e, depois se certificasse de
seu posicionamento no mercado, dando feed-back, para
retroalimentarmos nosso projeto pedagógico, corrigindo antes,
durante e depois os possíveis e inevitáveis erros de um projeto tão
grandioso.

Nosso mundo, tal qual o conhecemos, está sendo transformado através


da globalização e da informacionalização, determinadas pelas redes de
riqueza, tecnologia e poder. Isso, sem dúvida, possibilita a melhoria de nossa
capacidade produtiva, criatividade cultural e potencial de comunicação, mas,
por outro lado, está privando as sociedades de direitos políticos e privilégios.
Ou seja, à medida que as instituições do Estado e as organizações da sociedade
civil fundamentam-se na cultura, história e geografia, a repentina aceleração no
tempo histórico, aliada à abstração do poder em uma rede de computadores,
vem desintegrando os mecanismos atuais de controle social e de representação
política. À exceção de uma elite reduzida de globopalitanos (meio seres
humanos, meio fluxos), as pessoas em todo o mundo se ressentem da perda de
controle sobre suas próprias vidas, seu meio, seus empregos, suas economias,
seus governos, seus países e, em última análise, sobre o destino do planeta.
É nesse contexto que se insere uma antiga lei da evolução social,
segundo a qual a resistência enfrenta a dominação, a delegação de poderes reage
contra a falta de poder e projetos alternativos contestam a lógica inerente à nova
ordem global. É aqui o verdadeiro foco do nosso trabalho e do nosso projeto de
identidade.

A nossa integração ao social e ao ambiental

A política verde é um tipo de celebração. Reconhecemos que cada um de

44
nós faz parte dos problemas do mundo, e que também fazemos parte da solução.
Os perigos e as perspectivas de cura não estão apenas no meio que nos cerca.
Começamos a atuar onde estamos. Não há necessidade de esperar até que as
condições se tornem ideais. Podemos simplificar nossas vidas e viver em
harmonia com valores humanos e ecológicos. Haverá melhores condições de
vida porque nos permitimos começar... Portanto, podemos dizer que o principal
objetivo da política verde é uma revolução interior, “o verdejar do ser”: Petra
Kelly, Pensando Verde.
O movimento ambientalista do último quarto deste século conquistou, se
considerarmos seu impacto em valores culturais e instituições da sociedade,
uma posição de destaque no cenário da aventura humana. No século XXI, mais
de 80% da população mundial, que compartilha seu conhecimento na rede
mundial, considera-se ambientalista. Daí, nós, em nosso projeto, além de
claramente, através de plantas e jardins em nosso Espaço Identidade, devemos
incorporar ações que liguem a tecnologia ao meio ambiente, socializando com a
“sociedade verde”, pois, no fundo todos dependemos do meio ambiente e se
pudermos contribuir com nossa inteligência, além de ser um ponto de destaque
para o ISTCC, será um marco diferencial nas escolas de tecnologia, servindo
assim, ao nosso propósito de criarmos uma identidade única.

A dissonância criativa do ambientalismo: uma tipologia

A grande diversidade de ações coletivas, políticas e discursos agrupados


sob a égide do ambientalismo torna praticamente impossível considerá-lo um
único movimento. Contudo, é essa diversidade que caracteriza o ambientalismo
como uma nova forma de movimento social descentralizado, multiforme,
orientado à formação de redes e de alto grau de penetração.
É importante ressaltar a diferença entre ambientalismo e ecologia.
Ambientalismo refere-se a todas as formas de comportamento coletivo que
visam corrigir formas destrutivas de relacionamento entre o homem e seu
ambiente natural. Ecologia, do ponto de vista sociológico, é um conjunto de
crenças, teorias e projetos que contempla o gênero humano como parte de um
ecossistema mais amplo, e visa manter o equilíbrio desse sistema em uma
perspectiva dinâmica e evolucionária. Ou seja, o ambientalismo é a ecologia na
prática, e a ecologia é o ambientalismo na teoria.
O quadro, a seguir, exemplifica movimentos ambientais que vêm sendo
desenvolvidos atualmente.

45
Tipologia dos Movimentos Ambientalistas
Tipo (exemplo) Identidade Adversário Objetivo
Preservação da Amantes da natureza Desenvolvimento Vida selvagem
natureza (Grupos não-controlado
do Dez, EUA)
Defesa do próprio Comunidade local Agentes Qualidade de
espaço (Não no poluidores vida / saúde
seu quintal
Contracultura, O ser "verde" Industrialismo, "Ecotopia"
ecologia profunda tecnologia e
(Earth First!, patriarcalismo
ecofeminismo
Save the planet Internacionalistas na Desenvolvimento Sustentabilidade
(Greenpeace) luta pela causa global
ecológica desenfreado
"Política verde" Cidadãos Estabelecimento Oposição ao
(Die Grünen) preocupados com a político Poder
proteção do meio
ambiente

O significado do "verdejar": questões societais e o desafio dos


ecologistas

Há uma relação estreita e ao mesmo tempo ambígua do movimento


ambientalista com a ciência e a tecnologia. Isso ocorre porque o ambientalismo
nasceu a partir da revolta da ciência contra a própria ciência por volta do final do
século XIX e se intensificou na década de 70. Ou seja, o ambientalismo é um
movimento com base na ciência.
Os conflitos sobre a transformação estrutural são sinônimos da luta pela
redefinição histórica das duas expressões fundamentais e materiais da
sociedade: o tempo e o espaço. Com efeito, o controle sobre o espaço e a ênfase
na localidade é outro tema recorrente dos vários componentes do movimento
ambientalista.
Da mesma forma que o espaço, o controle sobre o tempo está em jogo na
“sociedade em rede”, e o movimento ambientalista é, provavelmente, o
protagonista do projeto de uma temporalidade nova e revolucionária.

O ambientalismo em ação: fazendo cabeças, domando o capital,


cortejando o Estado, dançando conforme a mídia

O movimento ambientalista deve boa parte do seu sucesso ao fato de

46
demonstrar notável capacidade de adaptação às condições de comunicação e
mobilização apresentadas pelo novo paradigma tecnológico, e aqui está um
bom modelo para seguirmos. Embora boa parte do movimento dependa de
organizações de base, suas ações ocorrem em razão de eventos que sejam
apropriados para a divulgação na mídia. Ao criar eventos que chamam a atenção
da mídia, os ambientalistas conseguem transmitir sua mensagem à uma
audiência bem maior do que a representada por suas bases diretas. Além disso, a
presença constante de temas ambientais na mídia dotou-lhe de uma
legitimidade bem maior que a atribuída a outras causas.
Mas o ambientalismo não pode ser considerado meramente um
movimento de conscientização. Desde o início, procurou exercer influência na
legislação e nas atitudes tomadas pelos governos. Na verdade, as principais
organizações ambientalistas concentram seus esforços na formação de
“lobbies” para obter conquistas na legislação, e no apoio ou oposição a
candidatos a cargos eletivos com base em sua postura política em relação a
determinadas questões. Em alguns países, principalmente na Europa, os
ambientalistas entraram na disputa por cargos políticos, tendo logrado algum
sucesso.

Conclusão: Nossa ação na transformação social na sociedade em


rede

Esta releitura em viés do livro “O PODER DA IDENTIDADE”, nos


mostra que surge às portas da Era da informação, em pleno século XXI, uma
crise de legitimidade que esvazia de sentido e de função as instituições da era
industrial. O Estado perde suas bases políticas, desorganizando as bases da
democracia liberal dos últimos dois séculos.
As identidades legitimadoras secaram, dando espaço para a difusão das
identidades de resistência na sociedade em rede, mas por serem indiviualizadas,
acabam não sendo muito bem-vindas, fazendo com que as duas existam, mas
não coexistam pacificamente, pois são mutuamente exclusivas. Iremos
enfrentar esta situação, até iconizarmos a Mandala como projeto formativo de
profissionais da área técnica com visão para o social e o ambiental.
Isso faz com que apareçam as identidades de projeto como principal
potencial de reestruturar o mundo do trabalho, sendo desenvolvidas a partir das
atuais identidades de projeto, mas nem sempre isso acontece, podendo apenas a
nossa comunidade permanecer na condição defensiva dos nosso princípios e
ideais.
Diante de todos os modos de identidade estudados anteriormente, vemos
que a lógica dominante na sociedade em rede lança seus próprios desafios, tanto
como identidades de resistência quanto como de projetos, e o poder dentro
dessa estrutura social está agora difundido na sociedade em rede, mas ele não
47
desaparece, é o caso da introdução na esfera educacional de uma filosofia
voltada para uma forte união entre conceito, conteúdos, ensino, prática e
projeto, e, principalmente, relacionamento humano, social e ambiental, que
nós, do INSTITUTO SUPERIOR DE TECNOLOGIA EM CIÊNCIA DA
COMPUTAÇÃO - ISTCC da FAETEC, estamos implantando sob o nome de
PROJETO MANDALA. Todo o nosso projeto está de acordo com a sociedade
em rede e estamos seguindo suas linhas mestras dentro de um universo
específico, a educação de tecnólogos em análise de sistemas. Visto que os
sujeitos principais da era da informação são os movimentos sociais que surgem
a partir da resistência comunal a globalização, reestruturação do capitalismo,
formação de redes organizacionais, informacionlismo desenfreado e
patriarquismo, agindo de forma a transformar códigos culturais, nossa Mandala
surge, aqui, como um ponto de união, não esotérica nem pragmática, sob
qualquer ponto de vista, mas como uma visão totalmente nova do “ensinar”,
posto que formaremos tecnólogos com alma, e abriremos uma janela de onde se
poderá descortinar a união, até então inexistente, entre o técnico e o humanista,
dentro de uma sociedade cada vez mais distanciada dos seus valores humanos,
justamente, pelo fato de estar em rede. Os agentes que dão voz a esses projetos
de identidade devem ser mobilizadores de símbolos. Verifica-se a existência de
dois principais agentes: o Profeta, personalidade simbólica que tem o papel de
falar pelos rebeldes, que assim tem uma chance de vencer e dar à sua identidade
uma participação nas lutas simbólicas e o outro, o principal agente é “uma
forma de organização e intervenção descentralizada e integrada em rede”,
característica dos novos movimentos sociais.
Pelo fato de termos um visão histórica de mudanças sociais meio
fechada, nos perdemos com as mudanças simbólicas processadas por redes
multiformes. São nesses “recônditos da sociedade”, em redes múltiplas, que se
nota o surgimento de uma nova sociedade, “germinada nos campos da história
pelo poder da identidade”, a sociedade MANDALA.

Referências
CASTELLS, Manuel. O poder da identidade: economia, sociedade e cultura.
São Paulo: Paz e Terra, 2001. (Coleção a Era da Informação, v.2.)

48
O HOMEM E A IMAGEM MANDALA NO CÍRCULO PEDAGÓGICO

Sibele Calazans*

Introdução

A idéia Mandala é fundamentar a proposta e ultrapassar todos os


percalços que possam vir.
Construir, reformar, pesquisar, solidificar essa justaposição das referidas
dimensões fazem com que suas múltiplas implicações e relações tracem idéias
em várias situações.
Interessa neste texto, a ação e o desejo de que todos adquiram informações e
interações entre os diferentes modelos de atuação. Que o homem, a vontade e o
conhecimento sejam incluídos em nosso Espaço Mandala.
Para realização deste trabalho, optou-se em abordar sobre PESSOAS em
vários pensamentos em seu círculo de trabalho.
O que chamamos de Circulo Mandala ou Rede Mandala, como queiram,
em uma instituição de ensino é o nosso familiar diário.

Ambiente Mandala

A importância do Ambiente Mandala faz com que as pessoas


gradativamente se sintam envolvidas e comprometidas umas com as outras. E
as palavras de JUNG (1964) confirmam esse entendimento:
“Sobem em espiral por sobre um assunto como um pássaro que voeja em
torno de uma árvore. No início tudo o que vê, perto do chão, é uma
confusão de galhos e folhas. Gradativamente, à medida que voa mais
alto repetindo-se formam um todo que se integra no ambiente em torno.”

Imagem Mandala

A Imagem Mandala em nosso círculo Pedagógico do ISTCC-RJ, não


sentimos como sofismas e sim, com firmeza do que queremos, com esforço e
decisões de toda a equipe. Desse modo, Direção, funcionários, corpo docente e
discente se relacionam com as diferenças, aprendendo a conviver com o outro
para alcançar um único objetivo reconhecer e adaptar as diferenças.
O objetivo da Imagem Mandala é esse: saber conviver, acreditando na
predisposição de cada um.

* Secretária Acadêmica do ISTCC-RJ, graduada em Pedagogia - SUAM e Psicologia - Faculdade


Maria Thereza, Especializada em Psicopedagogia - Assoc. Educac. Plínio Leite e Administração e
Supervisão Escolar - Centro Universitário Plínio Leite. Psicóloga Escolar do Centro Educ. Saviani
49
Sentimento Mandala

Vamos pensar no Sentimento Mandala entre as diferenças no ciclo


Pedagógico. Do ponto de vista de cada um, as relações interpessoais são
suficientemente alimentadas pela cortesia e amizade, e desse modo, mesmo
havendo hiatos, as relações se harmonizam.
Portanto, se refletirmos sobre as palavras de Jung em relação ao pássaro
que voa em torno de uma árvore, percebemos que os hiatos se dissolvem e a
integração acaba sendo recuperada.

Concepção Mandala

O grupo social na Concepção Mandala, nos faz envolver uns com os


outros em várias reuniões ou situações.
Como diz Pichon-Rivière:
“pode-se falar em grupo quando um conjunto de pessoas movidas
por necessidades semelhantes se reúnem em torno de uma tarefa
específica. No cumprimento e desenvolvimento das tarefas, deixam
de ser um amontoado de indivíduos para cada um assumir-se
enquanto participante de um grupo, com um objetivo único.”
O ISTCC-RJ tem essa semelhança, todos dependem uns dos outros para
essa sobrevivência dentro do grupo. As adaptações, os limites e os desejos não
fazem dessas pessoas, sem identidade, elas só continuam diferentes umas das
outras. Todos os integrantes desse grupo chamados colegas de trabalho do
ISTCC-RJ, estão presentes na hora de qualquer ação.
Para Pichon, esse tipo de grupo denomina-se grupo interno.

Grupo Mandala

É fácil perceber que a concepção do Grupo Mandala em sua estrutura


dentro do grupo, está presente na proposta de trabalho de todos.

Espaço Mandala

O Diretor do ISTCC-RJ, sempre atento não deixa o desânimo


parmanecer. Seu comprometimento em encontrar novos caminhos nos faz
peceber que o Espaço Mandala passou a ser o desejo de todos, que acreditam na
importância de atuarem de forma integrada.
Nos diferentes capítulos deste livro, encontraremos, muitas indagações
como: de que modo posso incorporar meu espaço de trabalho em um círculo

50
único? Como posso integrar meu saber com os outros saberes?
As pessoas criativas, que atuam em busca de fazer o melhor em suas
tarefas são satisfeitas e capazes de compartilhar suas experiências positivas
com todos.
A secretaria do ISTCC-RJ, trabalha de forma integrada, ciente das
diferenças, que são discutidas e respeitadas, dissolvendo os hiatos, com o
principal objetivo de converter e desenvolver suas tarefas para as diferentes
sessões dentro e fora do ISTCC-RJ.

Ação Mandala

No ISTCC-RJ não existe unilateralidade, visto que existe a comunhão


entre os parceiros de trabalho. A capacidade de atuação dos gestores e
funcionários se completam, e deixam o compromisso de fazer e acertar próximo
da conquista da Ação Mandala.

Qualidade Mandala

Na administração da Qualidade Mandala, a produtividade fica mais


visível porque sua imagem passa a ser respeitada, uma vez que os gerentes têm a
visão ISTCC-RJ como um todo.
Neste perfil, observa-se:
! Integração de todos;
! Aumento da produtividade;
! Aumento também do número de funcionários realizando suas funções;
! Preocupação com a imagem social;
! Produção do intercâmbio entre o visual e o descanso;
! Promoção e parcerias entre os alunos e instituição;
! Estímulo a um maior contato entre gestores e professores

Encontramo-nos aqui diante de uma tentativa inspirada na criatividade,


estímulo e perspectiva a fim de desenvolver com satisfação esse momento de
integração no Espaço Mandala.

Conclusão

Conforme foi exposto neste capítulo, o Espaço Mandala se propõe a


possibilitar uma nova visão de trabalhos e ações entre professores, alunos,
funcionários e gestores.
Em contraponto, a esta visão foi realizado um enfoque em torno de
perspectivas de ações, que, além de colocar o ISTCC-RJ como mediador do

51
processo educativo, promove um melhor desenvolvimento em sua estrutura
visando a todos.

Referências

JUNG, Carl Gustav. O homem e seus símbolos. Rio de Janeiro: Nova


Fronteira, 1964.
Pichon-Rivière, E. O processo grupal. São Paulo: Martins Afonso: [s.d.]

52
REPENSANDO O CONTEXTO EDUCACIONAL

Márcia Marques Freire*

Introdução

A sala de aula pode ser explicada por muitos apenas como um espaço
caracterizado por relações assimétricas, mecânicas e ritualísticas entre
professores, alunos e o processo de ensino-aprendizagem. Nesse contexto, o
professor detém todo o saber e o aluno deve apenas assimilar este saber e
devolvê-lo ao professor por meio das avaliações periódicas. Essa visão tem
levado muitos aprendizes a uma atitude passiva, desinteressada e pouco
participativa em sala de aula. Esse não-envolvimento dos participantes acaba
gerando o baixo aproveitamento e, até mesmo, um alto índice de evasão escolar.
Diante dessa atitude tão negativa, é quase impossível não nos
indagarmos:
O que é o aluno para mim? Objeto que observo e sobre o qual derrubo o
“meu saber” ou um sujeito com o qual compartilho experiências? Alguém a quem
não concedo o direito de se expressar, o direito da autoria? Ou quem sabe, apenas
reconheço sua voz quando ela é um espelho da minha? Aceito o seu discurso
apenas quando reproduz o meu? O que acontece em minha sala de aula? Ela é um
espaço para monólogos ou o lugar onde muitas vozes diferentes intercruzam? Que
tipos de interações aí transcorrem? Falo para um aluno abstrato ou ele existe para
mim marcado pelo tempo e espaço em que vive? Conheço o seu contexto, os seus
valores culturais? O conteúdo das disciplinas tem a ver com esse meio cultural,
com a vida dos alunos? Minha sala de aula é um espaço de vida ou apenas um
espaço assepticamente pedagógico? FREITAS (1996. p.172)
Desse modo, o professor se envolve em um processo reflexivo sobre a
sua própria prática, a fim de compreender se a sua abordagem de ensinar é
compatível ou conivente com a abordagem de aprender desses alunos.
Considero, portanto, que esse desencontro seja a fonte básica de problemas,
resistências, dificuldades, fracasso e desânimo no ensino e na aprendizagem em
diversos contextos pedagógicos.
Adotando esta perspectiva, o educador percebe, então, a necessidade de
uma releitura da relação entre professor e alunos e da implementação de uma
mudança na sala de aula. Para encaminhar tal processo de mudança, é
necessário repensar o padrão interacional na sala de aula com base nas
premissas sócio-interacionistas, na visão sócio-política de letramento e em

* Graduada em Letras, Especializada em Língua Inglesa na PUC-Rio, defendeu dissertação de


mestrado na PUC-Rio; Leciona Língua Inglesa em uma Escola Municipal do Rio de Janeiro e
Língua Portuguesa e Inglês Instrumental no ISTCC-RJ/FAETEC

53
estudos sobre afetividade que possibilitam a co-construção do sentido através
de tensões, negociações e da valorização da voz dos alunos.

O sócio-interacionismo

As premissas do sócio-interacionismo trazem importantes implicações


para a educação e favorecem reflexões acerca do papel do professor, do aluno e
do processo de construção de conhecimento.
Os conceitos sócio-interacionistas trazem à baila noções como
“dialogismo”, “apropriação”, “ZPD” e “andaimes” que fundamentalmente
situam a aprendizagem e a cognição na interação social. Todas estas premissas
dão primazia ao contexto e defendem que as informações armazenadas em nossos
cérebros provêm de experiências vivenciadas pelos nossos corpos ao interagirem
nos ambientes físico, psíquico, social e cultural em que nos situamos.
A visão do discurso como co-construção social foi introduzida por
BAKHTIN, pai da noção de dialogismo. BAKHTIN defende que cada voz é
uma concepção de mundo e que do somatório das diferenças nasce uma nova
visão. Reconhece o outro como sujeito, voz e texto, salientando sua
importância para a construção do sentido que emerge da síntese dialética de
todas as vozes polifônicas. Para BAKHTIN, a produção de idéias, do
pensamento, dos textos tem sempre um caráter coletivo, social. Assim, é com
as palavras e com as idéias do outro que o nosso próprio pensamento é tecido.
BAKHTIN (1981), mesmo mais centrado nas questões da estética e da
literatura, introduz uma concepção nova na Pedagogia e Psicologia. Sugere que o
indivíduo deve apreender a realidade e construir a realidade a partir da relação
social com o outro e esta relação constitui e é constituída pela linguagem. Em
decorrência dos estudos Bakhtinianos, muitos educadores têm enfatizado a
relevância do aspecto dialógico no processo de ensino-aprendizagem. Para eles, a
produção do conhecimento só é possível caso tenhamos como referência o
“outro”. Ou seja, a cognição é eminentemente social.
Seguindo essa perspectiva, a sala de aula deixa de ser um espaço de
transmissão/recepção de um conhecimento arbitrário e passa a ser um “evento
social no qual, através de procedimentos interacionais, professor e alunos tentam
construir significado e conhecimento” MOITA LOPES (1995. p.349). A sala de
aula passa a ser um lugar de encontro de diferentes vozes, as quais mantêm
relações de controle, negociação, compreensão, concordância, discordância e
discussão. Neste espaço, a aprendizagem é uma atividade social de co-
construção, resultante das trocas dialógicas, uma vez que, na perspectiva
bakhtiniana, o significado não é inerente à linguagem, mas elaborado socialmente.
FREITAS (1996. p.173) expressa o olhar de Bakhtin sobre o processo
educativo de forma exemplar:
54
Educar não é homogeneizar, produzir em massa, mas produzir
singularidades. Deixar vir à tona a diversidade de modos de ser, de fazer, de
construir, permitir a réplica, a contra-palavra. Educar é levar o aluno a ser autor,
a dizer a própria palavra, a interagir com a língua, a penetrar numa escrita viva e
real. O professor precisa também ser autor, penetrar na corrente da língua,
recuperar sua palavra, sua autonomia, sem fazer dela uma tribuna para o poder,
mas um meio de exercer uma autoridade que se conquista no conhecimento
partilhado. Nesse sentido, o professor pode ser visto como um orquestrador de
diferentes vozes.
BAKHTIN, no entanto, não tinha preocupações pedagógicas.
VYGOTSKY, ao contrário, teve a intenção explícita de produzir uma teoria
pedagógica (cf. Freitas, 1994). Foi um psicólogo ligado às questões
educacionais e do desenvolvimento humano. Para VYGOTSKY (1984), a
aprendizagem e o desenvolvimento estão inter-relacionados desde o primeiro
ano de vida da criança. Assim, a aprendizagem escolar nunca parte do zero,
pois antes de ingressar na escola, a criança vive uma série de experiências,
como, por exemplo, aprende a falar, nomeia objetos, conversa com adultos,
adquire informações e imita comportamentos. Segundo VYGOTSKY, o
desenvolvimento é fruto de uma grande influência das experiências do
indivíduo e cada um dá um significado particular à estas vivências.
VYGOTSKY (1978. p.86) introduziu um outro conceito que particularmente
nos interessa: a Zona de Desenvolvimento Proximal (ZPD), que é “a distância entre o
nível de desenvolvimento real do aprendiz, conforme representado pela sua
capacidade individual de resolver problemas, e o seu nível de desenvolvimento
potencial, conforme determinado pela capacidade de resolver problemas através da
ajuda de um adulto ou em colaboração com um par mais competente”. O conceito de
ZPD caracteriza a natureza social da aprendizagem.
BRUNER (1986), seguindo a mesma linha teórica de VYGOSTSKY
(1984), também destaca a educação como um processo essencialmente cultural e
social no qual alunos e professores interagem em prol da construção de um
conhecimento coletivo. Ou seja, propõe uma teoria educacional que questiona a
chamada aprendizagem centrada no aprendiz, posto que interação implica ação
conjunta para o desenvolvimento de um conhecimento comum. Para ele, a
aprendizagem em sala de aula é caracterizada pela interação social entre os
significados do professor e os dos alunos na tentativa de construção de um
contexto mental comum. Representa, então, os procedimentos pedagógicos
como “andaimes” (scaffolding) para a aprendizagem e coloca a própria interação
como um dos “andaimes” principais na construção conjunta do conhecimento.
Segundo BRUNER (1985. p.24-25), a função central do professor é
construir “andaimes” para o aluno aprender, de modo que o aprendiz converta o
conhecimento externo em seu próprio, desenvolvendo controle consciente sobre o
mesmo. O conceito de “andaime” pressupõe assim a avaliação constante do nível

55
de desenvolvimento cognitivo do aluno, a crescente retirada do suporte pelo
professor e a ação do aluno para assumir cada vez mais o trabalho antes realizado
pelo professor até tornar-se autônomo MAGALHÃES (1990).
O que parece subjazer ao pensamento destes pesquisadores é o
distanciamento de um tipo de psicologia do indivíduo, que trata os processos
psicológicos dentro de um vácuo social, e a aproximação com a uma psicologia
que tenta explicar como a aprendizagem/cognição é entendida como sendo
socialmente constituída.
Assim, o ponto de partida são as concepções prévias já construídas e o
ponto de chegada são estas mesmas concepções ressignificadas pelo aluno, que
possui uma vivência que lhe permite construir estruturas cognitivas que são
projeções do senso comum do meio social e das representações que ele mesmo
constrói em função de experiências próprias e da experiência em sala de aula.
Os princípios delineados por BAKHTIN (1981), VYGOSTKY (1978.
1984) e BRUNER (1985. 1986) atribuem um papel de destaque à interação
entre alunos e entre professor-alunos, ou seja, a co-participação social tomando
a concepção de que é através dos outros que as relações entre sujeito e objeto de
conhecimento são estabelecidas e o conhecimento construído. A partir do
momento em que professor e aluno tornam-se sujeitos ativos na construção do
saber, a noção de conhecimento é reestruturada, passando a ser entendido como
“uma construção social” (MOITA LOPES, 1996. p.96). Contudo, o conceito de
sala de aula também é reformulado, visto que, estimulando o aluno à maior
participação, o professor permite que o espaço da sala de aula torne-se um
espaço para a socialização do conhecimento (cf. DEMO, 1996. p. 54) e não
mais um espaço para as certezas e verdades pré-concebidas (cf. MOITA
LOPES, 1996. p. 184) dentro de um modelo aristotélico de categorização.
Esta proposta aponta para uma escola que se pretende democrática, onde os
alunos são introduzidos no exercício da cidadania, constituindo-se em sujeitos do
saber, ou seja, para uma escola que procura aguçar a visão crítica dos alunos.

O Processo de Letramento

Partindo de uma abordagem que soma linguagem, cognição e contexto


social, o processo de letramento passa a ser entendido como um conjunto
dinâmico de processos lingüísticos, sociais e cognitivos que são culturalmente
motivados. Em um estudo que aborda a relação ensino-linguagem-
aprendizagem, discutir como estudiosos em Lingüística Aplicada (KERN,
2000; JOHNS, 1997; CELANI, 1997; HEATH, 1983) vêem o processo de
letramento torna-se imperioso.
Enquanto na visão tradicional, o letramento é visto como a produção
perfeita de modelos de língua e de discursos formalmente organizados, na visão
56
papel de facilitador entre alunos e os possíveis mundos que os cercam e sinaliza
que textos são socialmente construídos através de tensões e negociações entre
os propósitos individuais e os limites dos contextos e da realidade dos
interlocutores.
Esta perspectiva de letramento valoriza o conhecimento da
comunidade e da cultura em que textos são produzidos e das influências do
contexto nos discursos, acreditando que a qualidade da aprendizagem advém
da relevância das práticas para os alunos e suas vidas. Igualmente, esta
perspectiva reforça o pressuposto de que cada indivíduo é refém cognitivo
das experiências socioculturais as quais está exposto, destacando que as
especificidades do grupo sociocultural ao qual o indivíduo pertence estão, de
maneira ora sutil ora imperceptível, manifestas na construção de sentidos
(CHIAVEGATTO, 2002, p.136).
No trabalho etnográfico sobre as comunidades de Roadville e Trackton,
HEATH (1983) assume a perspectiva contemporânea de letramento, destacando
que o letramento refere-se à compreensão, discussão, organização e produção de
textos, ao contexto social em que um discurso é produzido e a uma variedade de
experiências prévias, não somente com textos, mas também com pais, professores
e outros que são letrados. Por exemplo, ela relata que após tornarem-se
etnógrafos, conhecerem a realidade dos alunos, alguns professores adotaram
outros métodos em suas aulas, já que os alunos não percebiam o papel da leitura e
da escrita em suas vidas. Uma professora, por exemplo, organizou a sala de aula
com sinais de tráfego, propagandas, pôsteres políticos e notícias de promoções,
reproduzindo as ruas das comunidades de Trackton e Roadville na sala de aula.
Assim, ela preparou atividades que revelassem aos alunos o quanto a leitura e a
escrita fazem parte do dia-a-dia de todos eles. Em uma destas atividades, os
alunos tinham que cortar as letras dos pôsteres e depois separá-las em pilhas com
letras maiúsculas e minúsculas. Em uma outra atividade, a interação entre dois
alunos que simulavam estar em uma mercearia era gravada. Enquanto o aluno
“freguês” lia a lista de compras, o aluno “balconista” anotava os preços de cada
item adquirido. Ao terminarem a atividade pedagógica, ouviam a gravação,
recontavam toda a história para a turma e no dia seguinte a professora distribuía
folhas com a história datilografada. Esta professora trouxe o contexto social e as
experiências vivenciadas pelos alunos para dentro da sala de aula. No nosso
entender promoveu o letramento. Esta professora deu sentido à leitura e à escrita
através de práticas pedagógicas alinhadas com a realidade psicológica dos
participantes. Muitos professores como esta aprenderam a acreditar que os alunos
eram capazes de aprender e que também poderiam aprender com os alunos.
Talvez a postura negativa de muitos alunos possa ser explicada dentro
desta perspectiva, pois se a prática pedagógica não condiz com as experiências
socioculturais dos aprendizes, podemos, então, compreender a razão para a
resistência observada em muitos contextos educacionais.

57
KERN (2000), JOHNS (1997), CELANI (1997), HEATH (1983) e
FREIRE (1974) acreditam que professores e alunos vão para a sala de aula com
crenças sobre como desenvolver o letramento, e também apontam para a
necessidade de refletirmos sobre tais crenças, sobre como estas crenças tomam
a forma de práticas pedagógicas e como encorajar os alunos a verem o
letramento como um processo capaz de torná-los sujeitos do discurso.
Trabalhando com a produção de textos acadêmicos na universidade,
JOHNS (1997) contrapõe a perspectiva tradicional de letramento, na qual o
professor é visto como fonte do saber e o aprendiz como um recipiente passivo
de conhecimento, à perspectiva contemporânea, centrada na interação através
de contextos onde o professor é um facilitador do processo de produção de
textos e os alunos participantes ativos. Propõe o que chama de “Orientação
Social” para o desenvolvimento do letramento (The socioliterate classroom).
Segundo ela, uma sala de aula com orientação social para o letramento leva os
aprendizes a trabalharem com uma variedade de textos, exemplares de diversos
gêneros, criando hipóteses sobre os tipos de conhecimento que leitores e
escritores precisam adotar para criar significado. Os aprendizes também
discutem como leram cada um dos textos e porque e como responderam a cada
um deles, conversam sobre experiências passadas e hábitos do presente em suas
comunidades de discurso e acabam desenvolvendo intuitivamente uma teoria
abrangente sobre gêneros e estratégias de processamento de discurso. Em
suma, são encorajados a refletir sobre o conteúdo e as dificuldades para
processá-lo, questionando valores e crenças de diversas comunidades de
discurso e vivenciando a interatividade inerente ao processo de ler e escrever.
Se o letramento é uma forma de prática social, então ele também é um
meio de crítica à prática social. KERN (2000), FREIRE (1974) e CELANI
(1997) argumentam que um importante aspecto do letramento é a reflexão
crítica sobre como a língua dá formas às representações de nossas experiências
e do mundo. Ao contrário de JOHNS (1997) e HEATH (1983), assumem uma
visão política de letramento, destacando que se trata não somente de um
processo de adquirir e compartilhar informação, mas um estado de consciência
social e política, que permite um exame crítico de ordem social FREIRE
(1974); CELANI (1997). Envolve a relação dinâmica e dialetal entre palavras e
mundos.
Para FREIRE (1974), por exemplo, o ato de ensinar deve sempre iniciar
com a própria vida e cultura dos alunos. Nisto, alinha-se com Heath e os outros
estudos revisados. Mas enfatiza o papel do letramento na transformação social e
pessoal dos cidadãos de cada comunidade, como o faz GIROUX (1992) e
FAIRCLOUGH (1992).
Parece claro que a literatura recente elegeu um novo papel para o
letramento e vem assinalando por conseqüência inúmeras implicações para o
ensino. O letramento passou a ser visto como um conjunto dinâmico de

58
processos lingüísticos, sociais e cognitivos que são culturalmente motivados e
politicamente guiados.
Ao adotarmos esta visão de letramento, estamos destacando a
necessidade do professor estar ciente de que letramento é mais do que um
conjunto de habilidades acadêmicas, mais do que codificar e decodificar
palavras, e mais do que prescrever padrões de pensamento. Envolve também
uma consciência crítica de como os usos da linguagem são pistas para sentidos
sócio-culturalmente situados e instrumentos de transformação. Portanto,
assumo que o ensino de deve ser visto como um instrumento para o
desenvolvimento do letramento do aprendiz, um processo intimamente
amarrado às práticas socioculturais e aos usos da língua em sociedade.

A dimensão afetiva

Ao reconhecer os participantes do evento aula como agentes sociais que


carregam para o ambiente pedagógico experiências de vida e afetividades
particulares, educadores e demais envolvidos na prática pedagógica acabam
por tornar o contexto de sala de aula mais concreto e real para todos os
envolvidos no processo de aprendizagem.
Esta percepção tem levado diversos autores a analisar os componentes
afetivos da sala de aula, relacionando-os com uma aprendizagem mais
significativa e verdadeira ARNOLD & BROWN (1999). Estes pesquisadores
afirmam que, assim como o elemento social, o estudo dos aspectos afetivos
torna-se essencial para a compreensão do comportamento dos participantes das
interações escolares. Ao privilegiarem um estudo do afeto em sala de aula, os
autores também realçam que, enquanto os professores ensinam um
determinado conteúdo, igualmente educam os alunos a viverem vidas mais
satisfatórias e a serem membros responsáveis da sociedade. Para que isto
ocorra, é necessário que haja uma constante preocupação por parte dos
envolvidos na prática social de ensinar/aprender em considerar também a
dimensão afetiva do ambiente pedagógico.
BROWN (1987) aponta que as manifestações afetivas agem nas
interações sociais como um apelo ao “outro” social, sendo criadas, expressas e
reproduzidas a partir das interações sociais e através do discurso produzido
pelos participantes da sala de aula.
Devido ao seu caráter contagiante, o afeto aproxima as pessoas,
integrando-as aos grupos sociais e revelando seu espírito cooperativo.
Podemos concluir, portanto, que o afeto é um construto social que permeia e
interage constantemente com as estruturas sociais e cognitivas do contexto
escolar. Cabe ao professor o desafio de usar o afeto, fazendo com que o aluno
situe a si mesmo e aos outros no contexto no qual está inserido.

59
Durante muito tempo, as civilizações ocidentais concentraram seus
estudos e observações nas funções cognitivas e racionais da mente humana,
geralmente abandonando a área das emoções e das funções não-racionais. Isto
acabou de gerar o que GOLEMAN (1995) caracteriza como ignorância
emocional. Como forma de reverter esta situação, este autor propõe que as
escolas eduquem o aluno como um todo, trazendo para a aula “mente e
coração”.
Apesar de freqüentemente merecerem um olhar privilegiado por parte de
diversos profissionais e pesquisadores, as atividades cognitivas não podem
caminhar sozinhas, visto que cada participante de um determinado contexto
pedagógico é um agente social que carrega para o ambiente pedagógico
expectativas, crenças, valores, anseios, etc. e que atua de forma ativa e integral
na construção do conhecimento pedagógico, bem como na construção de seus
significados de mundo.
Tais fatos apontam para que é pouco provável que os objetivos finais do
ensino sejam atingido, caso os aspectos afetivos inerentes aos participantes da
interação (professor e aluno) não sejam considerados. Os estados emocionais
são um suporte necessário à construção do conhecimento, fazendo com que o
professor não apenas atue como mediador do conhecimento, mas que
igualmente assuma o papel de mediador no desenvolvimento afetivo dos alunos
ALMEIDA (2001).
Essa perspectiva aponta para o ambiente de sala de aula como uma
manifestação de uma variedade de discursos que convivem em harmonia, fazendo
deste contexto uma unidade sistêmica, composta pela relação de interdependência
entre as dimensões social, afetiva e cognitiva. Estas três dimensões são
evidenciadas durante o processo de construção de conhecimento, quando os
participantes da interação escolar carregam para a sala de aula o que vivem fora da
mesma: seus sentimentos, emoções, identidades, etc.
Portanto, é necessário reconhecermos que a sala de aula não existe
isolada do mundo que a cerca, encontra-se inserida em uma determinada
sociedade, não existindo fronteiras entre o ambiente escolar e o mundo externo.
Assim, este contexto deve ser entendido como qualquer outro ambiente de
interação social, com suas características particulares, sem dúvida, mas não
dissociado da sociedade que o cerca.

Um relato sobre o papel do afeto na sala de aula

Todo professor tem alguma experiência positiva para contar e acredito


que relatar como teve início meu processo de auto-análise possa mobilizar
outros professores em torno da necessidade de uma mudança na qualidade de
vida da sala de aula.
60
Essa experiência surgiu a partir da pesquisa que desenvolvi para minha
Dissertação de Mestrado cujo objetivo principal era minimizar a atitude
negativa e indiferente sentida pelos alunos frente a minha própria aula. A
princípio, decidi investigar as realidades sociais, culturais, cognitivas e
lingüísticas desses sujeitos com o objetivo de desenvolver atividades
pedagógicas alinhadas com esta realidade, visto que muitas literaturas
TAYLOR (1989) HEATH (1983) indicam que estar ciente sobre os diferentes
processos de categorização pode evitar o distanciamento entre o “universo do
professor” e o “universo dos aprendizes”.
Para atingir tais objetivos, conduzi entrevistas baseadas em conversas
informais a fim de deixá-los mais à vontade para revelar as verdadeiras crenças,
confirmando, assim, a perspectiva de TANNEN (1984) de que uma conversa
informal pode ser considerada um instrumento eficaz para estabelecer um maior
grau de envolvimento dos participantes. Essas entrevistas me permitiram
enxergar a face real dos alunos, que não só mostraram-se receptivos às entrevistas,
como também muitas vezes me solicitaram para serem entrevistados, o que
evidencia o quanto eles sentiam-se valorizados e respeitados quando participavam
dessas conversas que não foram apenas uma ferramenta do processo de coleta de
dados, mas também um importante instrumento de aumento da auto-estima dos
alunos que pertencem à comunidades discursivas onde a voz deles não é
normalmente valorizada. Considero, portanto, essas conversas como o ponto de
partida da relação de afeto entre professora e alunos, que me permitiu conhecer
maiores detalhes sobre o processo de socialização dos mesmos, uma vez que,
esses sujeitos se sentiam bem confortáveis para falarem.
Entretanto, nessa fase da investigação, eu ainda ignorava a importância
que esse envolvimento teria não apenas para o estudo, mas, principalmente,
para o planejamento de minhas futuras aulas.
Tomando a voz dos aprendizes como norte, busquei selecionar temas e
atividades que se adequassem ao contexto social, cultural, cognitivo e
lingüístico desses aprendizes. Portanto, decidi elaborar atividades voltadas
para a aprendizagem colaborativa, envolvimento cinemático e temas da
preferência dos alunos e estabeleci que o foco de todas as atividades seria a
interação, enfatizando mais a produção de sentidos socialmente construída
Vygotsky (1930). Materiais desta natureza, no meu entender, agregariam valor
a um processo de socialização que deixou de privilegiar esses sujeitos como
sujeitos do discurso.
Para cada tema, foram implementadas quatro atividades distintas que
envolviam inúmeras oportunidades de falarem, opinarem e discutirem sobre
assuntos de interesse do grupo. A última atividade de cada tema era uma atividade
de reflexão, onde a voz do aluno foi mais uma vez valorizada, já que a atividade
oferecia aos alunos um espaço para opinarem sobre o grau de dificuldade das
aulas, os momentos mais e menos positivos, sobre o que aprenderam, assim como,

61
para oferecerem sugestões de atividades para outras aulas.
Durante esse processo reflexivo, os alunos apresentaram colocações que
indicaram uma atitude positiva diante do material instrucional desenvolvido.
Por exemplo, quando questionados sobre a atividade que estava exposta no
mural, muitos alunos demonstraram um sentimento de orgulho por terem
participado de uma atividade que havia modificado o mural que se encontrava
até então freqüentemente abandonado, pichado e, até mesmo, rasgado.
Colocações como “Que bonito!”, “O mural está lindo, professora!” e “A gente
fez esse mural com a professora de inglês... ficou lindo!” revelam um forte
sentimento de orgulho e confirmam a existência de uma importante relação
afetiva entre professora e alunos.
Um outro momento que também merece ser destacado foi a premiação
das atividades lúdicas. Ao serem premiados com chocolate, os alunos pareciam
estar maravilhados com a surpresa. O segmento a seguir ilustra a percepção
desses alunos diante da atitude da professora:

Segmento
(140) Eliana: professora, foi uma demonstração de carinho.
(141) Alunos: eh:: ((aplausos))
(142) José: repete que eu não ouvi.
(143) Eliana: é porque ela gosta da gente.
Para esses aprendizes, as mudanças estabelecidas em sala de aula eram
demonstrações de que como professora eu me importava por eles e cuidava
deles. Percebi, então, que entre todos os resultados de minha pesquisa, o mais
importante podia ser resumido na frase “porque ela gosta da gente”.
Aparentemente, ao dar voz aos aprendizes, consegui desestabilizar a
atitude negativa em relação à minha aula e fazer com que os alunos participassem
ativamente de todas as atividades propostas. O elo afetivo instalado entre
professora e alunos acionou a motivação, a participação, a aprendizagem e a auto-
estima em cadeia. Entretanto, é importante destacar que essa relação de afeto só
foi possível graças ao clima de confiança estabelecido em sala de aula. Os alunos
encontraram uma oportunidade de dialogar e alguém para escutá-los, ao contrário
do que normalmente acontece nas comunidades de discurso onde são
socializados. Mostrando-me sempre disposta a ouvir, valorizando opiniões nas
atividades reflexivas, acabei estabelecendo com os sujeitos uma relação de
confiança, palavra que gostaria de destacar, pois nas comunidades onde o grupo de
alunos vive trata-se de ingrediente raro.
Essa experiência foi essencial para minha compreensão da palavra afeto
como “fórmula mágica” capaz de desencadear um processo de reconstrução de
conceitos sobre o que é ensinar e aprender.

62
Conclusão

Como profissionais envolvidos em contextos pedagógicos, é necessário


reconhecermos que é impossível ensinar e aprender sem levarmos em conta que
os aspectos sociais, culturais, afetivos e cognitivos convivem harmonicamente
nas interações típicas do evento aula. Quando o ambiente da sala de aula passa a
ser entendido a partir de uma relação entre esses aspectos, os aprendizes são
levados a uma atitude menos passiva, mais participativa e colaborativa.
Acreditando que o educador precisa romper com as concepções mais
tradicionais de currículo como um conjunto de conhecimentos “a serem
ensinados”, para entendê-lo como um conjunto de conhecimentos do qual o
aluno deve apropriar-se para o pleno exercício da cidadania, o Corpo Docente
do ISTCC-RJ (Instituto Superior de Tecnologia em Ciência da Computação do
Rio de Janeiro) tem desenvolvido projetos, atividades interdisciplinares e
diversos tipos de práticas pedagógicas dentro e fora da sala de aula, no sentido
de criar um ambiente favorável para a participação ativa dos alunos no processo
de construção de identidades e significados. Esse comprometimento de alunos
e professores só tem sido possível graças à relação de confiança e afeto
estabelecida dentro deste ambiente educacional.
Hoje percebo que seria melhor se os professores não aplicassem, mas
experimentassem, com crescente sentido de auto-análise, ações e materiais que
fujam dos métodos “pré-empacotados” que eles próprios não metabolizaram,
principalmente quando o contexto tem as características do ensino público no
Brasil. Promover a própria habilidade de saber como desenvolver uma
abordagem reflexiva sobre o ensino, como analisar e avaliar a própria prática,
como iniciar uma mudança na sala de aula e como monitorar os efeitos de tais
mudanças emerge como a espinha dorsal da prática pedagógica em qualquer
contexto educacional.
A aparente complexidade de uma real mudança na sala de aula pode ser
minimizada pela certeza de que quando as práticas reforçam o intercâmbio de
sentimentos e estimulam a imaginação criativa, ou seja, quando o novo é
apresentado ao aluno de maneira viva e afetiva, essa mudança acaba ocorrendo
de maneira plena, eficaz e gradativa, principalmente, em instituições
educacionais com uma filosofia voltada para a integração entre ensino e
relacionamento humano, ou seja, baseada na concepção da “mandala”.

63
Referências

ALMEIDA, A. A emoção na sala de aula. São Paulo: Papirus, 2001.


ARNOLD, J. & BROWN, H. D. Introduction: a map of the terrain. In: J.
Arnold. Affect in Language learning. Cambridge: Cambridge University
Press, 1999. p. 1-24
BAKHTIN, M. Marxismo e filosofia da linguagem. São Paulo: Hucitec, 1981.
BROWN, D. H. Principle of language learning and teaching. New Jersey:
Prentice-Hall, 1987.
BRUNER, J. Vygotsky: a historical and conceptual perspective. In: A. Sinclair,
R. Jarvella, W. J. M. Levelt. The child's conception of language. New York:
Springer-Verlag, 1985.
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Press, 1986.
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CHIAVEGATTO, V. C. Gramática: uma perspectiva sócio-cognitiva. In: Pistas
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1996.
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FREITAS, M. T. A. O pensamento de Vygotsky e Bakhtin no Brasil.
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com Bakhtin. Curitiba: UFPR, 1996. p. 165-187.
GIROUX, H. Escola crítica e política cultural. São Paulo: Cortez, 1992.
GOLEMAN, D. Inteligência emocional. Rio de Janeiro: Objetiva, 1995.
HEATH, S. B. Ways with Words: language, life and work in communities and
classrooms. Cambridge: Cambridge University Press, 1983.
JOHNS, A. M. Text, Role and Context: developing dcademic literacies.
Cambridge: Cambridge University Press, 1997.
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University Press, 2000. p. 13-41.
MAGALHÃES, M. C. C. A study of teacher collaboration on reading
instruction for chapter one students. Blackburg: Virginia Polytechnic State

64
University, 1990. (Tese de doutorado)
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Letras, 1996.
______What is this class about? Topic formulation in a L1 reading
comprehension classroom. In: G. Cook, B. Seidlhofer. Principle and practice
in applied linguistics. Oxford: Oxford University Press, 1995. p.349-362.
TANNEN, D. Conversational style: analyzing talk among friends. Norwood:
Ablex, 1984.
TAYLOR, J. R. Linguistic categorization: prototypes in linguistic theory.
Oxford: Clarendon Press, 1989.
VYGOTSKY, L. S. Interação entre aprendizado e desenvolvimento. In: M.
Cole et al. Mind in society. Cambridge, MA: Harvard University Press, 1930.
______. Mind in society. Cambridge, MA: Harvard University Press, 1978.
______. A formação social da mente. São Paulo: Martins Fontes, 1984.

65
ESTRUTURA ORGANIZACIONAL MANDALA: UMA NOVA FORMA
DE TRABALHAR EM EQUIPE.

Fernando da Silva Mota*

Introdução

Uma escola democrática, para uma sociedade democrática, adota


processos de gestão democráticos. A legislação educacional brasileira define
dois princípios para esta gestão: a participação dos profissionais da educação na
elaboração do Projeto Pedagógico da escola e a participação da comunidade
escolar.
Ambos os princípios vêm sendo seguidos pelo Instituto Superior de
Tecnologia em Ciência da Computação do Rio de Janeiro em seu Projeto
Político Pedagógico Mandala: Uma nova concepção para a educação
tecnológica na Rede FAETEC.
O Projeto Pedagógico do ISTCC-RJ resultou de um trabalho
participativo da Equipe Gestora, dos docentes, funcionários e discentes
envolvendo ao longo destes quatro anos de existência da Instituição a soma das
contribuições de todos.
Acreditando que na Gestão Escolar, devem-se considerar os papéis de
todos os atores do processo, levamos em consideração a existência de um
Conselho Diretor e um Conselho Acadêmico, ambos contando com a
participação de representantes, eleitos, de professores, funcionários, alunos e
comunidade. Além dos Conselhos, nossa proposta incorporou uma Equipe
Gestora composta de: Diretor, Diretor-Adjunto, Coordenadores: Acadêmico,
de Extensão e Pesquisa, de Estágios, Secretária Acadêmica, Bibliotecária,
Responsável pelos Recursos e Laboratórios, conferindo-lhes a importância que
têm na condução do processo educacional, pois em suas mãos está a
responsabilidade final pelo ensino ministrado na instituição, numa ação
conjunta com os Docentes e funcionários.
O privilegiamento dos assuntos administrativos tem sido responsável, no
sistema educacional em geral, por uma gestão ausente e descomprometida com
o projeto político pedagógico da escola.
A escolha dos modelos de gestão escolar deve ter como referência
principal sua capacidade de resolver problemas concretos da instituição e de
ganhar eficácia nas práticas destinadas aos objetivos de um ensino público
comprometido com a qualidade.

* MBA em Gestão do Ensino Profissional - Administração Escolar. Pós-graduado em


Administração Escolar. Professor do Ensino Superior/Gestão. Diretor do ISTCC-RJ.

67
Nossa proposta de gestão democrática e participativa pretende, antes de
mais nada:
! Promover o diálogo e a participação de toda a comunidade escolar no
processo educativo;
! Buscar o envolvimento e a integração de todos os agentes responsáveis
pelo desenvolvimento das atividades propostas no processo ensino-
aprendizagem;
! Respeitar princípios estabelecidos nas bases epistemológicas,
metodológicas e institucionais;
! Articular-se com agentes externos à comunidade acadêmica, buscando
parcerias com os organismos vinculados à Fundação de Apoio a Escola Técnica
do Estado do Rio de Janeiro, em especial com os sediados no Campus do
CETEP de Quintino, e em outras dimensões com organismos da Comunidade
Tecnológica do Estado do Rio de Janeiro e o comprometimento da sociedade;
! Promover uma articulação entre a administração da Rede
FAETEC/Diretoria de Desenvolvimento do Ensino/Coordenação dos Institutos
Superiores, tendo em vista os princípios da identidade única, unidade de ação e
determinação para o alcance dos objetivos institucionais.
Educar é criar espaços. Essa afirmação nos remete à visão do educador
como um criador de condições para que a educação aconteça de forma plena e
significativa. Criar espaços, nesse sentido, não é apenas a atuação do educador
na escolha e estruturação do lugar em que o processo educativo vai se
desenvolver. Criar espaços é criar acontecimentos. É articular o espaço, tempo,
recursos humanos e tecnológicos para produzir momentos que possibilitem ao
educando ir, cada vez mais, assumindo-se como sujeito, ou seja, como fonte de
iniciativa, responsabilidade e compromisso.
Atendendo esta concepção assumimos a gestão Mandala,
descentralizada, participativa. Uma gestão que sabe ouvir, que sabe decidir de
forma colegiada que dá autonomia e que descentraliza as ações. Não podemos
mais conceber alunos solitários, escola “silenciosa” e “organizada”. Situado
organicamente no mundo, o aluno que busca ser tecnólogo, não pode e não deve
ser enquadrado, encaixado no encadeamento do processo social como dente na
engrenagem, um elo a mais na concatenação dos acontecimentos.
Ao contrário, devemos possibilitar que ele se contextualize, que
compreenda e que adquira um nível de distanciamento crítico em relação às
determinações de sua circunstância pessoal e social de modo a não ser conduzido
por elas como um “cachorro morto na correnteza”. Empreender, ele próprio a
construção de seu ser. Este é o momento da afirmação da subjetividade do
educando. É aqui que ele troca a condição de ator de um roteiro determinado por
vontades alheias à sua vontade, pela condição de autor, em medida progressiva, do
seu próprio destino. É por isso que, em nossa visão do processo educativo, o papel
68
do educando é educar-se e do educador é ajudá-lo nesta tarefa.
A nova tendência de gestão neste início de século está voltada para a
construção de uma organização que aprende. Isso supõe uma quebra da
dicotomia entre o processo pedagógico e os administrativos e uma
reformulação da hierarquia vertical de gerência.
Segundo MOTTA (2003) o poder no sentido positivo muda ambos os
lados, visto que pressupõe liberdade e participação para o alcance de objetivos
comuns. Assim, a organização que aprende pretende encontrar formas mais
democráticas de administrar a busca do aumento de eficácia na gerência do
poder e do conflito.
A figura 1 nos apresenta as bases sociais da participação, introduzidas
por Paulo Roberto Motta em seu livro Gestão Contemporânea: A Ciência e a
arte de ser dirigente.
Bases Sociais da Participação

Causa Conseqüência
Democratização das relações sociais Novo relacionamento social mando-
subordinação
Desenvolvimento da consciência de classe Agregação mais acentuada de interesses
e do agrupamento profissional entre
trabalhadores
Aumento do nível educacional Novas aspirações profissionais
Velocidade das mudanças Desatualização mais rápida das estruturas
estabelecidas
Intensidade da comunicação Acentuação dos mimetismos e pressões
ideológicas

Figura 1.

O antigo modelo requeria aceitação inquestionável de decisões tomadas


de modo centralizado e autoritário.
Segundo ARROYO (2000) “A cultura escolar tende a curricularizar,
gradear, disciplinar e normatizar saberes sociais, relações e até ciclos de
desenvolvimento”. Nesse sentido, ele nos fala da beleza de se chegar a uma escola,
onde adolescentes convivem, trabalham em grupos, em interações múltiplas,
dialogam, produzem, inventam em coletivos... Espaços abertos reinventados.
O novo modelo, de acordo com a concepção de uma gestão participativa
e democrática (ver figura 1), atende as expectativas apresentadas por Arroyo em
relação às práticas escolares e amplia estas expectativas para a ação gestora.

69
Este novo modelo coloca todas as pessoas num mesmo barco: o de que
somos todos falíveis porque somos prisioneiros de um modo particular de ver os
fatos; por conseguinte, dependemos uns dos outros para discutirmos nossos
pontos de vista e é assim, com essa colaboração mútua, que podemos nos
enriquecer em diversos aspectos do desenvolvimento: pessoal, organizacional,
social, cultural e econômico. É preciso que nos esforcemos na busca da
cooperação de todos os níveis organizacionais não só na identificação de
problemas, na formulação de soluções tentativas e na sua implementação, como
também no que diz respeito ao comprometimento com o acompanhamento do
processo, detectando-lhe as falhas e corrigindo-as, no interesse de melhoria
constante da qualidade.
Nossa proposta evidenciou a energia das competências existentes no
grupo e canalizou-a para a estrutura gerencial Mandala (ver figura 2) que traz
uma ação circular que envolve os profissionais que desempenham funções de
grande importância na estrutura organizacional de nosso Instituto Superior:
Direção, Direção-adjunta, Coordenação Acadêmica, Coordenação de Extensão
e Pesquisa, Coordenação de Estágios, Secretaria Acadêmica, Bibliotecária,
Responsável pelos Recursos e Laboratórios.

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Figura 2

70
Estrutura Organizacional “Mandala”

Nesta imagem reproduzimos a Estrutura “Mandala” proposta para o


ISTCC-RJ.
O conhecimento já está intrinsecamente vinculado à tecnologia da
informação e vai estar, cada vez mais, no futuro. A convergência da psicologia,
da neurofisiologia e da informática já está acontecendo FRAW (1997). Os
computadores estão se transformando em sócios populares da aprendizagem
cognitiva, mesmo nas áreas da aprendizagem “inteligente”.
Nosso Instituto é tecnológico na área da ciência da computação e por essa
razão entendemos estar plenamente identificados com a idéia da rede, da teia,
da interação.
A conseqüência das mudanças de postura no processo gerencial em uma
instituição educacional será imediatamente sentida na ação metodológica dos
docentes em seu trabalho em salas de aula. Desse modo, os docentes precisam
mudar os estilos de trabalhar: interagindo com seus alunos.
As práticas adotadas no modelo de gestão tendem a ser replicadas nos
espaços de aprendizagens: Salas Híbridas tratadas no capítulo Salas de Aulas
Híbridas: O Movimento dialético no uso da matemática e da informática no
cotidiano do ISTCC de autoria do Professor Márcio de Albuquerque Vianna;
Sala Múltipla; Biblioteca e Espaço Cultural; Área de Convivência;
Laboratórios com desenhos adequados as diversas práticas propostas Free,
Workstation, Núcleo de Pesquisa etc...

Considerações Finais

MORIN (2001) nos traz à necessidade de se ensinar a compreensão: a


comunicação não garante a compreensão. A informação se for bem transmitida
e compreendida, traz inteligibilidade, condição primeira necessária, mas não
suficiente para a compreensão. Ainda segundo o autor, “há duas formas de
compreensão: a compreensão intelectual ou objetiva e a compreensão humana
intersubjetiva. Compreender significa intelectualmente aprender em conjunto,
compreendere, abraçar junto o texto e o seu contexto, as partes e o todo, o
múltiplo e o uno”. Diante dessa perspectiva, nós da Comunidade Tecnológica
do IST do Rio de Janeiro estamos em pleno processo: aprendendo uns com os
outros, interagindo, buscando caminhos coletivos. E um destes caminhos
encontra-se expresso neste livro que traz o pensamento de cada ator deste
projeto, buscando a compreensão do todo, esperamos atingir o nosso objetivo.

71
Referências

MOTTA, Paulo Roberto. Gestão Contemporânea: a ciência e a arte de ser


dirigente. 14.ed. Rio de Janeiro: Record, 2003.
ARROYO, G. Miguel. Ofício de Mestre: imagens e auto-imagens. Petrópolis,
RJ: Vozes, 2000.
MORIN, Edgar. Os sete saberes necessários à educação do futuro. 3.ed. São
Paulo: Cortez, 2001.
MOTA, Fernando da Silva. Educar é criar espaços: reformulações gerenciais,
curriculares e metodológicas. Disponível em: <www.ensinofernandomota.
hpg.ig.com.br> Acesso em: 13 nov. 2006.

72
INTEGRAÇÃO ENSINO-PESQUISA-EXTENSÃO NO ISTCC-RJ:
PERSPECTIVAS E AÇÕES

Ronaldo Ribeiro Goldschmidt*

Introdução

Atualmente no Brasil, muitas instituições de ensino superior tratam as


dimensões de ensino, pesquisa e extensão de forma dissociada, acarretando
vários desvios na formação do aluno, nas práticas institucionais e nas ações
junto à sociedade. Algumas delas sequer atuam em pesquisa e extensão,
restringindo suas atividades à prática em sala de aula. Tal postura contraria o
princípio obrigatório à instituição de ensino superior que preconiza a integração
e a indissociabilidade das referidas dimensões.
O Instituto Superior de Tecnologia em Ciência da Computação do Rio de
Janeiro, ISTCC-RJ, é uma instituição pública de ensino superior que busca uma
formação profissional qualificada de seus alunos e uma produção efetiva de
pesquisa aplicada e de tecnologia na área de software. Para viabilizar tais
objetivos, torna-se necessário traçar um planejamento integrado de atuação dos
diversos setores do Instituto que consiga combinar de forma efetiva e
harmoniosa as dimensões supracitadas.
Considerando a atual situação de consolidação do ISTCC-RJ, aliada à
expectativa de sua atuação junto às comunidades acadêmica e científica e à
Sociedade, esse capítulo tem como objetivo principal descrever as ações do
instituto voltadas à integração das dimensões de ensino, pesquisa e extensão
sob o foco de uma concepção mandala.
A seção 2 (Considerações Gerais), apresenta algumas premissas básicas a
partir das quais as ações de ensino, pesquisa e extensão no ISTCC-RJ estão
sendo realizadas. Nas seções 3 (Ensino), 4 (a Pesquisa) e 5 (a Extensão) são
descritas as ações nas dimensões de ensino, pesquisa e extensão,
respectivamente, em desenvolvimento no instituto e suas principais
contribuições nas demais dimensões. Nessas seções são enfatizados os esforços
de integração segundo as três dimensões. As perspectivas futuras e a produção
atual do instituto são resumidas na seção 6 (Considerações Finais).

Considerações Gerais

Pelo exposto anteriormente pode-se perceber que, no contexto atual do


ISTCC-RJ, a palavra chave é integração, conceito fortemente associado ao
* Doutor em Engenharia Elétrica na área de Métodos de Apoio à Decisão - PUC-Rio, 2004. Mestre
em Sistemas e Computação - IME, 1991. Bacharel em Matemática - UFF, 1989

73
símbolo mandala, base para o projeto pedagógico do instituto. A integração
decorre de um processo intenso e contínuo envolvendo várias perspectivas de
ação que se realimentam, promovendo o desenvolvimento institucional e os
movimentos de colaboração atuante junto às comunidades acadêmica,
científica e social.
É importante ressaltar que a missão do ISTCC-RJ serve de base para
nortear, de forma geral, as ações em andamento em quaisquer das três
dimensões institucionais.
Uma das premissas básicas de atuação do instituto reside na intenção de
otimizar o aproveitamento dos espaços físicos. Atualmente as instalações do
ISTCC-RJ são intensamente ocupadas nos turnos da manhã e da noite com
atividades acadêmicas no ensino de graduação. No turno da tarde concentram-
se as atividades de pesquisa e extensão, procurando eliminar a ociosidade em
termos de ocupação física dos espaços.
! Considerando o tamanho, a juventude e a intenção do instituto em
evitar dispersão de esforços, a equipe vem procurando concentrar suas ações
em eixos temáticos de atuação. Um eixo temático é uma área na qual o ISTCC-
RJ tenha interesse em atuar por meio do desenvolvimento e da aplicação de
recursos computacionais. São exemplos de eixos temáticos: Educação, Saúde,
Entretenimento, Tecnologia Assistiva, dentre inúmeros outros. Foram adotados
pelo ISTCC-RJ, em um primeiro momento (2006.1), três eixos temáticos inter-
relacionados:
! Educação - Nesse eixo temático encontram-se inseridos o
desenvolvimento e a aplicação de recursos computacionais que apóiem direta
ou indiretamente o processo de ensino-aprendizagem.
! Tecnologia Assistiva - Compreende a pesquisa, a criação e a
operacionalização de ferramentas que auxiliem pessoas portadoras de
necessidades especiais.
! Inclusão Digital - Ações de desenvolvimento de aplicações e prestação
de serviços que estimulem ou viabilizem o uso da informática, contribuindo
para a redução do número de pessoas sem acesso a recursos computacionais.
Um aspecto de extrema relevância na atual concepção mandala do ISTCC-
RJ refere-se à socialização das informações sobre as ações em andamento no
instituto. A divulgação exaustiva dessas informações proporciona o surgimento
de novas idéias, estimulando o desenvolvimento da escola. É a percepção de
que a criatividade pode atuar como mola propulsora para ações integradoras e
de que idéias discutidas em equipe de forma harmoniosa tendem a evoluir mais
rapidamente. São exemplos de iniciativas que têm como um de seus objetivos a
disseminação das informações sobre as ações do instituto:
! Publicação das informações do site oficial do ISTCC-RJ no endereço:
www.faetec.rj.gov.br/istquintino. A internet apresenta-se, indiscutivelmente,
74
como um excelente recurso para compartilhamento e divulgação de dados.
! O envio periódico de informativos eletrônicos por e-mail para a
comunidade do ISTCC-RJ e da FAETEC, relatando as principais ocorrências
relacionadas ao instituto.
! A divulgação das informações em quadros de aviso fisicamente
espalhados pelas instalações do instituto.
! A realização de reuniões periódicas nas seguintes instâncias: Conselho
Diretor, Conselho Acadêmico, Equipe Gestora, Representação de Turmas,
diretamente com as próprias turmas e com a Comunidade do Instituto.
Encontra-se atualmente em análise a discussão pela comunidade do ISTCC-RJ
o projeto pedagógico institucional, incluindo as definições de missão e visão do
próprio instituto.
! A realização de palestras dentro e fora do instituto. Estão incluídas
entre as últimas, as participações em feiras de profissões, conferências
acadêmicas e científicas, sempre com o objetivo principal de projetar o instituto
e suas ações junto à comunidade de uma forma geral.
Um aspecto importante para viabilizar a atuação institucional integrada é
a formalização de intenções. No ISTCC-RJ todas as ações devem, na medida do
possível, ser formalizadas. Nessa formalização, são indicadas quais
contribuições devem ser esperadas em cada dimensão. Assim, o planejamento
de cada ação deve estimular a reflexão de forma a especificar, quando aplicável,
as contribuições acadêmicas (no ensino), as contribuições científicas (na
pesquisa) e as contribuições sociais (na extensão).
De forma a sistematizar e melhor atender à demanda da comunidade
junto ao ISTCC-RJ no que se refere às ações institucionais, convencionou-se
que toda demanda deverá ser analisada, discutida, formalizada e conduzida,
sempre que possível, de forma integrada nas dimensões de ensino, pesquisa e
extensão.
Vale a pena ressaltar que grandes projetos a serem desenvolvidos no
âmbito do ISTCC-RJ recebem o status de macro-projetos. Um macro-projeto é
um projeto que, dada sua complexidade e porte, subdivide-se em vários projetos
menores que sejam desenvolvidos e integrados de forma coordenada pelos
diversos setores do instituto.
Todo projeto a ser desenvolvido pelo ISTCC-RJ deverá ser enquadrado
em uma das seguintes modalidades:
! Projeto de Iniciação Científica (PIC)
! Trabalho de Conclusão de Curso (TCC)
! Trabalho de Disciplina (TDD)
! Projeto de Infra-Estrutura (INF)
! Projeto da Empresa Júnior (EMP)
! Projeto de Imagem e Divulgação Institucional (IDI)
75
Os procedimentos internos de acompanhamento e apoio ao
desenvolvimento de cada projeto são definidos previamente para cada
modalidade de projeto. Estimula-se no instituto a realização de projetos
integrados em que os resultados de um projeto possam ser utilizados em outros.

O Ensino

Normalmente percebida mais facilmente pela sociedade, a principal


contribuição decorrente da dimensão do ensino consiste dos egressos do curso,
profissionais prontos para atuar no mercado de trabalho.
A formação destes profissionais requer o cumprimento de uma matriz
curricular cuja carga horária se distribui por disciplinas, atividades de estágio e
atividades de extensão. A organização de conteúdos e práticas nessa matriz
curricular favorece o desenvolvimento paulatino de habilidades e
competências.
No ISTCC-RJ, toda disciplina é formalizada a partir da especificação de
objetivos, ementa, bibliografia e do plano de disciplina correspondente. O
plano de disciplina, além de fornecer a distribuição de conteúdos pelos
encontros, deve conter a especificação das contribuições acadêmicas,
científicas e sociais esperadas a partir da oferta da disciplina.
Apostilas, tutoriais e resenhas são alguns exemplos de contribuições
acadêmicas produzidas em disciplinas no instituto. Todas essas contribuições
têm como objetivo prover informações de forma didática para futuros alunos da
própria disciplina.
Entre as contribuições científicas geradas durante a oferta de disciplinas no
instituto estão relatórios técnicos, pesquisas e artigos científicos. Essas
contribuições devem estar relacionadas a projetos do PIC (Programa de Iniciação
Científica) do ISTCC-RJ. A definição de temas para a realização de ações dessa
natureza deve atender às demandas específicas dos projetos do PIC, promovendo
assim um nível de integração entre as dimensões de ensino e pesquisa.
Contribuições de cunho social são fortemente estimuladas no ISTCC-RJ.
Um desafio à imaginação de professores e alunos, cada disciplina deve idealizar
ações de extensão a serem desempenhadas no desenvolvimento dessas
disciplinas. Prestação de serviços, desenvolvimento e implantação de sistemas
de pequeno porte, entre outros, são exemplos de contribuições do ensino com
relação à dimensão de extensão, pois extrapolam os limites físicos das salas de
aula. Uma ação de importante relevância social recentemente realizada no
escopo da disciplina Empreendedorismo do ISTCC-RJ foi a oferta bem
sucedida de um serviço para confecção de imposto de renda para idosos. Um
excelente exemplo comunitário voltado ao eixo temático de apoio à inclusão
digital. Novas disciplinas piloto deverão experimentar esse modelo,
procurando, à semelhança do exemplo mencionado, estimular o envolvimento
76
com outras instituições de ensino superior.
Um aspecto importante a ser mencionado refere-se à integração de
disciplinas da estrutura curricular. Essa integração ocorre no instituto em duas
modalidades: integração vertical e integração horizontal. Em ambas, a
integração tem como foco fazer com que um mesmo problema (estudo de caso)
seja desenvolvido por um conjunto de disciplinas, fornecendo diferentes
perspectivas sobre uma mesma situação e ampliando a visão do discente. A
diferença entre as modalidades está no grau de maturidade discente diante das
diferentes perspectivas. Na integração vertical, todas as disciplinas de um
mesmo período discutem um mesmo problema. Nesse caso, o aluno discute o
problema em um grau de maturidade compatível com o período em que ele se
encontra. Na medida em que o aluno progride de período, o mesmo problema é
apresentado sob novas perspectivas que vão se moldando à evolução do grau de
maturidade adquirido pelo corpo discente. Os problemas propostos podem
variar desde situações abstratas até situações reais, com diferentes níveis de
complexidade. Problemas trazidos das dimensões de pesquisa e extensão são as
preferências do ISTCC-RJ na formulação de casos. Assim, o desenvolvimento
de um caso proporciona, além do aprendizado a partir de situações reais, um
subproduto que é a própria solução para o problema. Nesse momento, o ensino
contribui com as demais dimensões.
O ISTCC-RJ dispõe de disciplinas em sua estrutura curricular que
realizam ações de integração social para aproximação do grupo, reduzindo
barreiras entre as classes e facilitando o desenvolvimento de trabalhos em
equipe. A realização dos jogos internos do ISTCC-RJ, promovidos pela
disciplina de Desenvolvimento Humano e Qualidade de Vida (DHQ) é um
excelente exemplo de ação facilitadora do processo de integração social. Tal
ação se enquadra no eixo temático de saúde que, conforme mencionado,
constitui-se em um dos focos de atual interesse do instituto.
Algumas disciplinas do instituto (tais como Direito em Informática,
Tópicos Avançados e Metodologia Científica) vêm promovendo a realização de
seminários, denominados internamente de workshops. Esses workshops são
eventos abertos à comunidade nos quais os alunos das disciplinas apresentam os
trabalhos por eles desenvolvidos ao longo do período letivo.
Os dois parágrafos acima são mais dois exemplos em que a dimensão de
ensino contribui para a dimensão de extensão.
No contexto da integração do ensino faz-se relevante citar a criação do
NADD Núcleo de Apoio Docente e Discente. Este núcleo, conforme o próprio
nome sugere, tem como objetivo apoiar o processo de ensino fornecendo
atendimento a alunos e professores de forma a facilitar a integração social intra
e entre as classes.
Duas disciplinas da matriz curricular são voltadas exclusivamente ao

77
desenvolvimento e à aplicação de sistemas de informação em situações reais do
mercado. Tratam-se das disciplinas “Projeto de Software” e “Trabalho de
Conclusão de Curso”, posicionadas no 4o. e no 5o. períodos da matriz,
respectivamente. Os temas são propostos pelos alunos e validados pelos
docentes no início do período letivo. Todos os temas devem ter aplicação em
instituições (empresas, escolas, órgãos públicos e privados), cuja existência
deve ser comprovada como requisito básico para a aceitação dos temas.
Pretende-se, portanto, que os sistemas de informação elaborados nestas
disciplinas tenham assegurada a sua aplicabilidade na sociedade. Espera-se que
uma boa parcela destes sistemas possa ser trabalhada junto à Empresa Júnior do
ISTCC-RJ, de forma a disponibilizar produtos com boa penetração no mercado.
Além disso, a Empresa Júnior pode sugerir temas de projetos a serem
desenvolvidos nas referidas disciplinas. As sugestões de temas devem surgir a
partir de demandas reais solicitadas à Empresa Junior que não tenham sido
atendidas por falta de recursos.
Diversos temas de trabalhos de conclusão de curso (TCC) estão situados
nos eixos temáticos de interesse atual do instituto. Abaixo encontram-se indicados
alguns exemplos de temas de TCC no eixo temático de apoio à educação:
! SIAPE Sistema de Apoio a Eventos no ISTCC-RJ
! e-RevISTa Revista eletrônica do ISTCC-RJ
! e-Journal Jornal eletrônico do ISTCC-RJ
! Diário on-Line
! Ferramenta de Integração Professor-Aluno
! Sistema Acadêmico
! Biblioteca On-Line
! Livro de Ocorrências On-line do Laboratório de Informática
! Sistema de Apoio ao Projeto Pedagógico do ISTCC-RJ
! Secretaria Escolar na WEB
A carga horária de estágio prevista na matriz curricular pode ser
cumprida pelo aluno junto a empresas credenciadas. Para tanto, o aluno deverá
realizar atividades de desenvolvimento, avaliação e implantação de sistemas
em situações reais do mercado de trabalho. Periodicamente, o aluno apresenta
um relato das atividades de estágio realizadas sob a supervisão de um
profissional indicado pela empresa. A coordenação de estágios valida as
atividades desenvolvidas e recomenda, sempre que necessário, ajustes quanto
aos tipos de ação que o aluno deverá atuar a partir de então.
Cada aluno pode cumprir a carga horária de extensão prevista na matriz
curricular em função dos seus interesses específicos de formação. Nesse contexto,
as atividades de extensão oferecidas pelo instituto se integram ao ensino como
fontes alternativas para promover as especificidades de formação discente.
Uma importante contribuição do ensino para a pesquisa atualmente em
desenvolvimento no instituto é a oferta de disciplinas extras na matriz curricular

78
que preparem os discentes que tenham interesse para futuros programas de pós-
graduação strictu sensu. São disciplinas não obrigatórias com conteúdos
importantes para a formação de alunos que pretendam seguir carreira
acadêmica na área da computação. Temas como Teoria da Computação,
Cálculo Diferencial e Integral, Estruturas de Dados Avançadas e Análise
Combinatória estão incluídos nessas disciplinas.
O Programa de Monitoria do ISTCC-RJ tem como objetivo principal
apoiar as atividades de ensino em determinadas disciplinas curriculares.
Procura, assim, melhorar o desempenho acadêmico dos alunos nestas
disciplinas onde, em geral, há maior dificuldade de aprendizagem. No entanto,
o Programa de Monitoria contribui também para promover uma maior
integração discente, além de despertar e desenvolver nos monitores um perfil
docente e investigativo na busca de soluções de problemas. Percebe-se,
portanto, que o Programa de Monitoria também atua como instrumento de
integração entre as dimensões de ensino, pesquisa e extensão.

A Pesquisa

O ISTCC-RJ dispõe de um Programa de Iniciação Científica (PIC) próprio.


Este programa busca promover o desenvolvimento acadêmico, inserindo
alunos de graduação no processo de investigação científica, despertando
vocações, incentivando talentos, e preparando os discentes para o ensino
continuado e para as exigências profissionais do mundo contemporâneo.
Os objetivos específicos do PIC estão relacionados direta ou indiretamente
à questão da integração das dimensões de ensino, pesquisa e extensão. São eles:
a) Objetivos em relação à Comunidade Científica:
! Contribuir para o desenvolvimento científico e tecnológico no Estado
do Rio de Janeiro e no Brasil;
! Contribuir para a formação de recursos humanos para a pesquisa;
! Contribuir para reduzir o tempo médio de permanência dos alunos na
pós-graduação;
! Contribuir para o aumento, com qualidade, da produção científica;
! Proporcionar um canal de cooperação entre instituições de pesquisa,
por meio da realização de trabalhos de pesquisa integrados.
b) Objetivos em relação ao ISTCC-RJ e a FAETEC:
! Contribuir para a sistematização e para a institucionalização de
práticas investigativas aplicadas;
! Fomentar a interdisciplinaridade nos cursos e outras atividades afins;
! Fortalecer a integração das atividades de ensino, pesquisa e extensão;
! Promover o crescimento institucional;
! Consolidar a participação da instituição junto à comunidade científica
como empreendedora efetiva em atividades de pesquisa;
79
! Apoiar o desenvolvimento de projetos de computação aplicada à
prestação de serviços para a Sociedade;
! Possibilitar uma maior integração entre cursos de graduação e de pós-
graduação.
c) Objetivos em relação ao Corpo Discente:
! Estimular o desenvolvimento do pensar cientificamente e da
criatividade, decorrentes das condições criadas pelo confronto direto do aluno
com os problemas de pesquisa;
! Proporcionar a aprendizagem de métodos e técnicas de pesquisa
científica, além de tecnologias computacionais atuais;
! Estimular a participação em eventos científicos e a publicação dos
trabalhos.
d) Objetivos em relação ao Corpo Docente:
! Estimular professores e pesquisadores a envolver estudantes de
graduação em suas atividades e projetos de pesquisa científica, formando
equipes de trabalho produtivas;
! Estimular o professor à participação em atividades de pesquisa
aplicada;
! Incentivar o aperfeiçoamento acadêmico;
! Proporcionar condições para progressão no plano de carreira;
! Estimular o envolvimento de novos orientadores;
! Estimular o aumento, com qualidade, da produção científica docente;
! Estimular o corpo docente a estabelecer propostas de pesquisa em suas
disciplinas, visando ao enriquecimento dos conteúdos e das aulas.
É importante ressaltar que, de uma forma geral, ações de pesquisa
realizadas no instituto buscam contribuir também para a melhoria da prática em
sala de aula. Novas tecnologias e exemplos desenvolvidos no contexto da
pesquisa podem ser apresentados e explorados nas práticas docentes,
enriquecendo o conteúdo das disciplinas. Em contra-partida, o conteúdo
desenvolvido em sala proporciona subsídios e estimula o engajamento discente
em novas ações de pesquisa e iniciação científica.
A realização de qualquer projeto do ISTCC-RJ deve ser precedida pela
formalização e aprovação de intenções e ações. Essa formalização deve ser feita
por meio de um anteprojeto cujo roteiro padroniza a forma de apresentação e de
acompanhamento. Tal roteiro, proposto pela dimensão da pesquisa, é adotado
também por projetos acadêmicos e de extensão. Todo anteprojeto do instituto
deve vir acompanhado da especificação das contribuições do projeto nas
dimensões de ensino, pesquisa e extensão. Estimula-se no ISTCC-RJ a
realização de projetos integrados em que os resultados de um projeto possam
ser utilizados em outros. Por exemplo: um trabalho de disciplina pode coletar
dados a serem utilizados no âmbito de projetos de pesquisa.

80
É importante destacar a preocupação do ISTCC-RJ em desenvolver
projetos de pesquisa que possam ser aplicados, revertendo-se em contribuições
sociais e acadêmicas de real utilidade prática. Daí a ênfase no desenvolvimento
de pesquisa aplicada e direcionada segundo perspectivas empreendedoras que
possam produzir renda. Dessa forma, trabalhos desenvolvidos no âmbito de
projetos de pesquisa podem e devem ser revertidos em projetos conduzidos pela
Empresa Júnior na formulação de produtos e na efetiva aplicação desses
produtos junto à sociedade.
Um outro aspecto que demonstra a integração das ações de pesquisa ao
ensino é a possibilidade que o aluno do instituto possui de formalizar suas
atividades de pesquisa no ISTCC-RJ para integralização de horas de estágio e
de extensão, previstas na matriz curricular do curso. Estimula-se com isso que
alunos com interesse em carreira acadêmica possam iniciar suas atividades de
pesquisa sob a forma de estágio desenvolvido no próprio instituto.
O processo seletivo para o PIC do ISTCC-RJ requer a comprovação do
desempenho acadêmico dos discentes. Alunos com melhores resultados nas
disciplinas cursadas têm preferência para absorção nos projetos de pesquisa do
instituto.
Os melhores trabalhos desenvolvidos nos projetos de iniciação científica
do instituto são recomendados para publicação na RevISTa publicação técnico-
científica do ISTCC-RJ. Tal indicação é considerada pela comunidade do instituto
como uma premiação pelo desenvolvimento de trabalhos bem qualificados.
O ISTCC-RJ dispõe do NUPE (Núcleo de Pesquisa), que tem como
objetivo principal apoiar o desenvolvimento de projetos no instituto.
Atualmente o NUPE dispõe de três projetos de iniciação científica voltados à
organização e ao desenvolvimento de recursos computacionais que auxiliem o
ensino nas disciplinas de Redes de Computadores, Banco de Dados e Tópicos
Avançados. Um desses projetos, o NUPE - IC, promoveu em 2006.1 a oferta de
um curso de extensão denominado “Inteligência Computacional” em conjunto
com a disciplina de graduação Tópicos Avançados. A idéia foi oferecer tanto
para alunos do instituto quanto para a comunidade em geral, uma capacitação
para o desenvolvimento de sistemas de apoio à decisão com recursos de
Inteligência Computacional.
O projeto de iniciação científica denominado “Data Warehouse e
Mineração de Dados nos Institutos Superiores da FAETEC”, tem como
objetivos a criação e a implantação de um data warehouse que auxilie na
identificação de práticas institucionais que promovam o desenvolvimento do
ISTCC-RJ e da própria FAETEC. Para tanto, está sendo desenvolvido um Data
Mart para o ISTCC-RJ como projeto piloto. Esse projeto situa-se no eixo
temático de apoio à educação e exemplifica como o ISTCC-RJ pode apoiar o
próprio desenvolvimento institucional.

81
A Extensão

As ações de extensão no ISTCC-RJ se refletem nas seguintes


modalidades: cursos de extensão, semanas tecnológicas e culturais, visitas
técnicas, espaço aberto, passeios e atividades culturais, confraternizações,
conferências, laboratórios pedagógicos, parcerias, Semana Um, workshops e
encontros marcados.
Os cursos de extensão promovidos pelo instituto têm como objetivo
oferecer à sociedade oportunidades de ensino e aprendizagem gratuitos sobre
temas relacionados à área da informática que sejam de interesse da
comunidade. Como contribuição para dimensão do ensino, os cursos de
extensão podem ser voltados a temas complementares aos apresentados em
nível curricular. Além disso, também podem ser oferecidos cursos que reforcem
o conteúdo praticado nas disciplinas de graduação. Professores, alunos e
funcionários do instituto, assim como, pessoas da comunidade devidamente
credenciadas junto ao ISTCC-RJ, podem oferecer cursos de extensão. Qualquer
pessoa da comunidade pode participar de um curso de extensão desde que
apresente os requisitos mínimos solicitados para o assunto em questão. Um
curso de extensão pode ser utilizado no âmbito da pesquisa como laboratório
para experimentação de novas ferramentas computacionais, metodologias,
práticas e produtos.
Semestralmente o ISTCC-RJ realiza a chamada Semana Tecnológica e
Cultural (STC), oportunidade em que são realizados encontros abertos à
comunidade para tratar de temas de interesse do instituto. Palestras, oficinas,
mesas redondas, debates são alguns tipos de atividades realizadas durante as
STCs. Toda STC tem uma temática para nortear os assuntos abordados. Como
exemplo, pode ser citada a VII STC cuja temática foi “Tecnologia e Saúde”. A
escolha dos temas tem como objetivo atender à demanda da própria
comunidade, sobretudo dos alunos e professores da graduação. Planeja-se que a
VIII STC trate do tema “Software Livre vs. Software Proprietário”, ampliando
os interesses manifestados em sala de aula nas disciplinas do instituto. As STCs
também promovem a realização de atividades culturais tão importantes no
estímulo à criatividade e à expansão de habilidades e capacidades.
De forma análoga as STCs, existem os workshops e encontros marcados.
Estes ocorrem mensalmente no instituto, ou conforme demanda. Também
procuram tratar de assuntos de interesse da comunidade, detectados, sobretudo,
em sala de aula. Os workshops são apresentações de alunos e professores do
ISTCC-RJ sobre trabalhos desenvolvidos no instituto, divulgando os conteúdos
trabalhados nas disciplinas e nos projetos. Os encontros marcados consistem de
palestras feitas por convidados externos ao instituto. Uma visita técnica,
conforme o próprio nome sugere, envolve passeio a instalações fora do ISTCC-
RJ.

82
STCs, encontros marcados, workshops e visitas técnicas também
procuram envolver assuntos que possam ser explorados em ações de pesquisa e
estímulo à iniciação científica, complementando temas e discutindo tópicos
mais avançados, estimulando a reflexão, a formulação e aplicação de novas
soluções computacionais.
Diversas das ações mencionadas acima são apoiadas pela Empresa
Júnior do ISTCC-RJ. Um exemplo disso foi o desenvolvimento e implantação
de um sistema na ABEn Associação Brasileira de Enfermagem. Esse mesmo
sistema, situado no eixo temático da saúde, serve como exemplo apresentado
em sala de aula nas disciplinas relacionadas à análise e ao projeto de sistemas.
Também de forma análoga às STCs, a chamada Semana Um ocorre no
início de cada período letivo e tem como objetivo principal receber e integrar os
calouros do instituto. Nesta oportunidade, cada novo aluno é apresentado ao seu
“Personal Mentor”. Um “Personal Mentor” é um aluno antigo do ISTCC-RJ
cuja missão é promover a inserção do novo aluno na comunidade do instituto.
Cada personal mentor assessora, no máximo, 5 calouros, fornecendo-lhes
orientações, de forma personalizada, sobre a estrutura, a equipe e o
funcionamento da instituição. Também durante a Semana Um são realizadas
palestras e atividades sobre a profissão o instituto, outros temas.
Os laboratórios pedagógicos atualmente disponíveis no ISTCC-RJ são
os Laboratórios de Texto (Português e Inglês) e de Matemática. Ambos servem
à comunidade de uma maneira geral, mas também apóiam as dimensões de
ensino e pesquisa.
A Biblioteca do ISTCC-RJ promove periodicamente passeios e
atividades culturais, além do espaço aberto. O espaço aberto é uma
oportunidade em que convidados falam de temas de interesse (não apenas de
cunho tecnológico), para a comunidade. O planejamento e operacionalização
desses tipos de evento pela Biblioteca são realizados em conjunto com a
Coordenação de Extensão e Pesquisa do instituto.
Também de forma periódica, o ISTCC-RJ promove confraternizações
envolvendo a comunidade de forma a estreitar os laços e relacionamentos entre
seus membros.
A participação dos alunos em quaisquer dos eventos mencionados acima
pode ser convertida em horas de atividades de extensão necessárias à
integralização curricular pelo discente.
As parcerias promovidas pelo ISTCC-RJ têm um papel muito importante
no processo pedagógico do instituto. Algumas delas têm como um dos objetivos
aproximar o aluno de graduação de cursos de pós-graduação de qualidade. Um
exemplo é a parceria com o Instituto Militar de Engenharia e com o Centro
Universitário da Cidade do Rio de Janeiro, que prevê o desenvolvimento e a
aplicação de projetos conjuntos. Outras parcerias procuram situar o ISTCC-RJ

83
como um provedor de soluções de tecnologia em informática em determinadas
áreas. É o caso da parceria com a GPI Gerência do Programa de Inclusão da
rede FAETEC. Nessa parceria o instituto busca desenvolver recursos voltados à
Tecnologia Assistiva, em ações de extensão fortemente integradas com as ações
de pesquisa na área.
A própria publicação desse livro reflete o espírito de integração de ações
de extensão que podem se refletir em sala de aula e nos projetos de pesquisa.
Nele, os autores, todos membros da equipe do ISTCC-RJ, buscam contribuir
com suas visões e experiências na democratização da filosofia de atuação
segundo a concepção mandala.
De uma maneira geral, o ISTCC-RJ percebe as ações em extensão como
possíveis laboratórios para experimentação e avaliação de novas ferramentas
computacionais, metodologias, práticas e produtos. Nessa perspectiva, as ações
de extensão podem fornecer valiosos subsídios para a avaliação e
direcionamento dos esforços na dimensão da pesquisa.

Considerações Finais e Perspectivas Futuras

Este capítulo teve por objetivo descrever as principais ações em


desenvolvimento pelo ISTCC-RJ de forma a promover, em uma concepção de
escola mandala, a integração das dimensões de ensino, pesquisa e extensão.
Um ponto importante a ser destacado diante de todas as ações
integradoras descritas nas seções anteriores diz respeito à avaliação, tema de
outro capítulo desse livro. A comunidade do ISTCC-RJ tem procurado refletir,
definir e aplicar mecanismos que busquem expressar de forma clara e objetiva
os efeitos das ações realizadas, permitindo uma melhoria contínua do processo
institucional.
De uma maneira geral pode-se resumir em três os principais tipos de
contribuição gerados pelo ISTCC-RJ: os profissionais competentes, egressos
do curso de graduação, a produção científica decorrente das pesquisas e as
ações e projetos desenvolvidos e disponibilizados junto à sociedade.
De forma a melhor planejar e desenvolver suas ações junto à sociedade, o
instituto vem procurando definir um procedimento institucional que envolva:
! A recepção de novas demandas;
! Reflexão sobre a melhor forma de atender às novas demandas;
! Encaminhamento de providências;
! Execução de ações;
! Avaliação de resultados.
O ISTCC-RJ planeja a criação de novos cursos de graduação na área da
Ciência da Computação de forma a ampliar seu espectro de atuação na região.
Embora de forma mais remota, estuda-se ainda a possibilidade de criação de
84
cursos de pós-graduação na área.
O ISTCC-RJ pretende futuramente oferecer cursos preparatórios para
provas de certificação em determinadas tecnologias. Esta ação tem como
objetivo reforçar a integração entre extensão e ensino, aprimorando a formação
discente e facilitando o acesso aos egressos em segmentos específicos do
mercado de trabalho.
Entre as ações futuras pretendidas pelo instituto planeja-se ainda a busca
de patrocínios de projetos pela iniciativa privada. Espera-se que a qualidade dos
resultados decorrentes das ações atuais projete o ISTCC-RJ, angariando maior
credibilidade junto a órgãos de fomento, públicos e privados, para
investimentos em novas ações do instituto e de sua equipe.

Referências

PROJETO para Implementação da Flexibilização Curricular nas Universidades


Públicas Brasileiras. In: FÓRUM de Pró-Reitores de extensão das
universidades públicas brasileiras, 2005. Disponível em:
<http://www.udesc.br/reitoria/procom/pagina/flexibilizacao.doc> Acesso em:
23 mar. 2006.
Regimento Interno, INSTITUTO SUPERIOR DE TECNOLOGIA EM
CIÊNCIA DA COMPUTAÇÃO DO RIO DE JANEIRO, Rio de Janeiro,
2002.
GOLDSCHMIDT, R. R., CAMPOS, M. F. A Pesquisa no Instituto Superior de
Tecnologia em Ciência da Computação do Rio de Janeiro: perspectivas e ações.
In: RevISTa, Rio de Janeiro, v.1, n.1, p.9-15, 2006.
INSTITUTO SUPERIOR DE TECNOLOGIA EM CIÊNCIA DA
COMPUTAÇÃO DO RIO DE JANEIRO. Coordenação de Extensão e
Pesquisa. Regulamento do Programa de Iniciação Científica. Rio de Janeiro,
2005.

85
CÉLULA DE DESENVOLVIMENTO DE COMPETÊNCIA: UMA
PROPOSTA PEDAGÓGICA PARA SUBSTITUIÇÃO DA SALA DE
AULA EM CURSOS TECNOLÓGICOS.
Horácio Ribeiro*
Gloria Maria Dias de Oliveira**
Rafael Dias Ribeiro***

Contextualização

No contexto da tecnologia de informação associada às novas formas de


organizações do trabalho, emerge um novo paradigma na formação profissional e
uma substituição do modelo vigente voltado para postos de trabalho fragmentado
e parcelado onde a tônica é a separação entre a execução e a concepção.
O novo modelo de profissional polivalente baseado na eficiência através
da flexibilidade da produção e da organização, no setor industrial e no de
serviços, transforma-se na direção de uma considerável competência teórica
com sólidos conhecimentos sobre o produto e o processo de trabalho, além de
um saber empírico proveniente de uma experiência direta com o processo.
Acrescenta-se à essas habilidades práticas:
I capacidade de raciocínio abstrato e de análise, que leve a pensar
estrategicamente e a responder com criatividade as novas situações.
II capacidade sociocomunicativa que lhe dê condições de desenvolver
trabalho cooperativo em equipe e conhecimentos ampliados, que possibilitem
autonomia e independência profissional. DELUIZ (1995).
O papel da educação profissional e fundamental para a elevação da
qualificação da força de trabalho e a proposta da formação polivalente, assumida
hoje, levanta algumas questões básicas: Em que medida a formação que se realiza
junto ao sistema educacional contribui na construção de novas competências?
Será possível desenvolver competências com a estrutura que se repete na forma de
sala de aula que conhecemos? Até que ponto as novas tecnologias introduzidas em
sala de aula atendem aos anseios por novas metodologias de ensino que viabilizem
o desenvolvimento das competências requeridas?
O Ministério de Educação e Cultura (MEC) através da resolução
CNE/CP3 de 18/12/2002 publicada no DOU (Diário Oficial da União) em
23/12/2002 estabelece uma série de artigos incentivando à novas práticas de
ensino, em que a ênfase é o desenvolvimento das competências dos estudantes.

* Mcs. Professor do ISTCC-RJ / Faetec, professor da UNESA.


** Professora da UNESA.
*** Professor da UNESA. professor da FEUC.

87
Temos assistido especialistas da área de educação proporem a
modernização do ensino através de teorias construtivistas, interdisciplinares,
transdisciplinares, dialéticas, e outras. Porém, quando suas propostas são
implementadas, professores e instituições de ensino limitam-se a introduzir
modernas tecnologias de apresentação ou comunicação associados aos trabalhos
em grupos. Assim, telões, computadores e software de apoio à apresentação,
televisores de tela plana acoplada com câmeras e toda uma parafernália eletrônica
são introduzidos na sala de aula. Entretanto, o ensino é feito da mesma forma,
apenas com modernização ou substituição do antigo quadro de giz e a troca da aula
expositiva do professor pela apresentação de seminários por grupos de alunos. Os
hábitos e os problemas continuam os mesmos. O conhecimento continua sendo
fragmentado em disciplinas com problemas de continuidade FRAGA (1992);
aulas expositivas com os seus já conhecidos males VASCONCELLOS (1972)
continuam sendo ministradas tratando os alunos de forma homogênea. O modelo
que se perpetua considera o aluno como um banco de dados que precisa ser
completado. Entretanto, no modelo de qualificação profissional flexível, o aluno
deve ser considerado como uma CPU (unidade central de processamento) capaz
de descobrir novas formas de usar e desenvolver o conhecimento. Alguns
exemplos de modelos, como a escola de Sagres, em que grupos de pessoas se
reuniam para estudar e discutir problemas inerentes à época, buscam responder
aos desafios do futuro. O sucesso deste modelo é inegável, pois de lá saíram os
grandes navegadores, novos métodos foram desenvolvidos. Eram pessoas
reunidas em grupos que trocavam informações, raciocinavam em grupo, faziam
novas propostas e as testavam. Estavam em constante busca de novas formas.
As experiências, mais modernas, como escola de garçons, em que o
aprendiz serve em uma escola restaurante, e outras oficinas têm se mostrado
mais eficientes do que as escolas profissionais tradicionais.

Objetivos e justificativas.

Com o propósito de contribuir para a elevação profissional no âmbito da


formação educacional tivemos por objetivo apresentar uma proposta pedagógica
de uma nova prática de ensino baseada em níveis de complexidade de problemas.
Esta prática possui uma estrutura que viabiliza ao aluno o desenvolvimento
de competências de forma natural, possibilitando ao aluno atuar como em uma
empresa, resolvendo problemas com mecanismos formais de apresentação e
solução. Chamamos esta estrutura de célula de desenvolvimento de competência.
Consideramos que a relevância desta proposta se prende não somente a atender
aos interesses do mercado de trabalho por um profissional criativo e competente
nem as diretrizes do Ministério de Educação e Cultura (MEC), mas também, sob a
ótica do aluno, esta proposta viabiliza a elevação da qualificação da formação
pessoal do indivíduo, proporcionando o enfrentamento de ações adversas em um

88
contexto de mudanças constantes, ampliando os seus horizontes e a partir de maior
domínio sobre o processo produtivo e sobre o desenvolvimento da consciência
individual e coletiva, atender às necessidades humanas de realização e
emancipação.
A experiência em coordenação e criação de cursos nas áreas de
tecnologia de informação levou-nos a fazer uma revisão em todo o processo de
elaboração de um curso. Para exemplificar, a título de ilustração, vamos mostrar
o processo de elaboração da grade curricular de um curso cujo objetivo é
ensinar as pessoas a andar de bicicleta.
Para andar de bicicleta a pessoa deve conhecer as partes de uma bicicleta e
assim especifica-se a primeira disciplina: Bicicleta I. O objetivo desta cadeira é
permitir identificar as partes de uma bicicleta e suas características físicas e
mecânicas. Como existem bicicletas especiais surge a segunda cadeira: Bicicleta
II. O objetivo, agora, é identificar bicicletas especiais do tipo: monociclos,
triciclos, velocípedes, para enduro, para corridas, etc... Estas disciplinas usam
conceitos de mecânica (freios, amortecedores, transmissões, etc...) surge à terceira
disciplina: Mecânica, com o objetivo de apresentarem-se os conceitos de
mecânica usados em bicicletas. Esta última cadeira exige uma nova disciplina que
lhe antecede: Física, onde se apresentam os conceitos da mecânica clássica:
velocidade da partícula, velocidade angular, aceleração, etc..., que por sua vez
exige o conhecimento de matemática. Assim, sucessivamente, na forma
tradicional, para se formar ciclistas tem-se um curso com no mínimo cinco
disciplinas, a saber: Bicicleta I, Bicicleta II, Física, Mecânica e Matemática. Um
bom aluno do curso saberá exatamente de quantos centímetros é a bitola do pneu
da bicicleta, saberá calcular com exatidão o número de pedaladas para andar cem
metros em dois minutos, entre outras questões. Então pergunta-se: Se entregarmos
uma bicicleta ao melhor aluno do curso ele saberá andar de bicicleta?
Qualquer um, pelo menos que já andou de bicicleta, sabe que a resposta é
não. Este aprendizado é feito na prática com desenvolvimento de pequenas
habilidades: equilibrar, pedalar em linha reta; parar; fazer curvas; etc...
Adquirindo competência para cada nível de dificuldade.
Tradicionalmente, por uma questão de hábito, ou facilidade sempre
elabora-se cursos grupando saberes em disciplinas (tendência Taylorista),
esquecendo-se a natureza dos problemas em que os saberes estão inseridos.
Conseqüentemente, perdem-se os objetivos iniciais dos cursos da área
tecnológica: resolução de problemas, em um determinado contexto.
As disciplinas de um curso tecnológico têm seus saberes discriminados
detalhadamente enquanto nenhum tratamento e dado ao nível da competência
que o futuro profissional deverá ter.
A idéia subjacente é que saberes implica em competência, sendo
considerado no âmbito deste texto:

89
Saberes: conhecimentos teóricos e práticos que hoje são segmentados e
agrupados logicamente em formas de disciplinas.
Competência: capacidade de solucionar problemas, principalmente em
ambientes complexos.
Esta abordagem exacerba-se quando o conhecimento já está formatado
em grupos, bastando selecionar tópicos e dar nome às disciplinas. Assim, da
matemática, cria-se matemática I, matemática II... Apresentam-se saberes
absolutamente desnecessários aos objetivos da disciplina e do curso, que, por
sua vez, na grande maioria, não são claros, mascarando os verdadeiros
objetivos com frases evasivas como, por exemplo: “o profissional terá
competência para resolver os problemas da prática e da ação social” que são
comuns nos projetos pedagógicos, quando se referem a competências.
Em particular, algumas abordagens feitas em sala de aula cobram a
aprovação dos alunos como uma maratona, no sentido de se buscar apenas a
aprovação final, reforçando a Indústria do Diploma.
O que propomos na célula de desenvolvimento de competências é uma
estrutura pautada na idéia de que competência implica em saberes, no
desenvolvimento natural de uma competência em um ambiente análogo ao
ambiente de trabalho de uma empresa. O aluno aprende o saber necessário, e a
sua utilização na medida necessária para o desenvolvimento de sua atual
competência. A competências e saberes se fundem e o aluno passa a almejar
novas competências e, portanto, novos saberes.

Metodologia para o planejamento de cursos voltados para o


desenvolvimento da competência.

Para se solucionar um problema, deve-se ter vários saberes e


criatividade. Assim, um coordenador de curso pode organizar o conjunto de
situações - problemas a serem resolvidos e os respectivos saberes necessários.
Deve-se identificar, de forma clara, que problemas o profissional deverá
revolver. Para cada nível de dificuldade destes problemas, em um determinado
grupo de problemas, pode-se determinar os grupos de saberes necessários para
a solução, independentemente de como o saber está inicialmente classificado.
Montar um curso desta forma, em princípio é mais complexo, pois não
existe nenhuma classificação prévia, como no caso das disciplinas tradicionais.
É necessário que os elaboradores de cursos trabalhem em duas categorias
de classificação: tipologia e grau de dificuldade.
i) Tipologia: classificação de um conjunto de problemas, a ser resolvido,
por um profissional, em uma determinada área profissional, como, por
exemplo, armazenamento de dados, programação de computadores, infra-
estrutura para informática.

90
ii) Grau de dificuldade: determina o grau de complexidade do problema.
Iniciando-se com problemas concretos, do tipo como executar tarefas de forma
mecânica por memorização de etapas. Segue-se apresentando problemas que
começam a envolver a criação de modelos até a elaboração de meta-modelos.
Para cada grau de dificuldade são apresentados os saberes necessários.
Quando o aluno consegue resolver os problemas de um nível, atingiu o grau de
competência na solução de problemas e, portanto, deve evoluir para outro nível.
Muitas empresas já vislumbraram este novo modelo de certificação para
a solução de problemas. Esta prática é comum entre os fabricantes de software
que fazem a certificação de profissionais em seus produtos independente da
formação escolar (embora de forma pouco clara, com relação aos objetivos).

Organização da célula

Uma célula de competência é dedicada a uma tipologia de problemas.


Nas células organizam-se grupos de alunos. Cada grupo é constituído de alunos
com vários níveis de competência. Um curso de informática, por exemplo, pode
ter as células de: tratamento de dados, programação, gestão de requisitos,
suporte, gerencia de projetos, entre outras.
Cada célula pode, por exemplo, ter oito grupos com seis níveis de
competência, por exemplo. Isto nos daria um total de vagas para iniciantes
correspondentes ao número de células multiplicado com o número de grupos
que constitui a célula. Uma célula de competência seria organizada como
mostrada na figura 1.
Dinâmica nos grupos

Fontes de
Grupo Grupo Grupo Grupo
1 3 5 7 conhecimento:

Biblioteca,
Grupo Grupo Grupo Grupo
2 4 6 8 Vídeos...

Figura 1: Layout da célula.

91
Em uma célula, os alunos devem trocar informações, de modo que os de
maior competência ajudem os de menor competência da mesma forma que
acontece em um ambiente de trabalho.
Os alunos iniciantes fazem um rodízio percorrendo todas as células de
modo a formarem uma visão contextual e abrangente dos tipos de problemas.
Recomenda-se um período de três semanas em cada célula. Estes alunos devem
resolver problemas de apoio (mecânicos), que não comprometam o trabalho,
sob orientação dos mais experientes. Os alunos mais experientes devem ser
estabilizados, isto é, ter um período maior de permanência em um tipo de célula
ou mesmo fixado por opção destes.
Todo trabalho na célula deve ser orçado, planejado e feito pelos
componentes do grupo usando-se padrões aceitos pelos principais órgãos de
normalização, autores ou mesmo pelos professores. Sempre se deverá fazer um
memorial descritivo do trabalho, incluindo as referências bibliográficas e
citando trabalhos anteriormente desenvolvidos.

Avaliação da competência

A avaliação pode ser feita por dimensões diretas e indiretas:


Dimensão direta: Avalia-se a responsabilidade profissional quanto à
assiduidade, pontualidade. Pode-se definir um conjunto de critérios diretos,
como, por exemplo, tirar um ponto por falta ao “serviço”, ou juntar três atrasos
ou antecipações do horário para contabilizar uma falta, etc...
Avalia-se o envolvimento e comprometimento no trabalho,
contabilizando-se cumprimento de prazos, número de erros, revisões de
qualidade, refere-se a métricas que podem ser medidas.
Dimensão indireta: Avalia-se a competência técnica, constituída de
testes, provas, vivências. Esta avaliação deverá ser feita por um ou mais
professores e deverá ter maior peso.

Implantação do modelo

Quando uma célula está funcionando de forma completa vai abrindo novas
vagas para os iniciantes substituírem os participantes que são certificados (para
cada nível). O problema é como iniciar um grupo. Esta implantação exige um
maior esforço por parte dos professores. Neste momento, os professores
“participam” do grupo como os elementos de maior experiência e saem à medida
que possam ser substituídos em cada nível de competência pelos alunos.
Para receber os alunos, os problemas de nível concreto já devem estar
formulados, bem como, a sua forma de apresentação. Os serviços devem ser
orçados pelos professores. As novas categorias de problema podem ser
92
desenvolvidas e à medida que os alunos forem se tornando experientes, os
professores vão assumindo o papel de facilitadores destes grupos.

Conclusão

A implantação de uma célula não é tão simples quanto colocar os alunos


em sala de aula para uma disciplina. Porém, após a sua implantação, suas
vantagens são muitas. Respeita-se o rítmo de cada aluno. Os integrantes
cooperam mutuamente. Os problemas didáticos são minimizados. Não existe
segmentação em disciplinas e, principalmente, o aluno é mantido em estado de
“pesquisa” na busca constante de soluções para problemas perfeitamente
identificados. Assume uma postura ativa na busca de conhecimentos.
Quanto à problemas que hoje aparecem entre os professores, tais como:
faltas, didática inadequada, avaliação incoerente, e outros... também são
minimizados.
O modelo de célula, de alguma forma, já existe em cursos que colocam o
aluno em condições de trabalho. Os cursos de medicina, odontologia, hotelaria
são exemplos de estruturas que enfatizam a competência.
A formalização desta forma de aprendizado, em cursos da área
tecnológica exige um esforço de adaptação por parte dos docentes e das
instituições de ensino, mas o aluno, ao ter a sua competência certificada, não
terá a sensação de não saber fazer nada. O aluno terá confiança, segurança e os
saberes necessários para a sua profissão.
Este modelo está sendo implementado, em forma experimental, fora do
curso regular, no curso de Formação de Analistas de Sistemas da Fundação de
Apoio à Escola Técnica (FAETEC) no Instituto Superior de Tecnologia em
Ciência da Computação do Rio de Janeiro (ISTCC-RJ), com alunos voluntários.
Os instrumentos de controle, avaliação e acompanhamento de ensino
estão sendo definidos e elaborados.

Referências

NAGEL, Thomas S. et al - Ensino para competência: uma estratégia para


eliminar o fracasso. 4.ed. Porto Alegre: Globo, 1977
FERRETI, Celso João, et al. Novas Tecnologias, trabalho e educação: um
debate multidisciplinar. 2.ed. Petropolis, RJ: Vozes, 1994
BECKER, Fernando. et al. Metodologia e Interdisciplinaridade. Revista de
Educação, Brasília, DF, v.21, n.83, abr/jun, 1992.
BRASIL. Congresso. Senado. Resolução Conselho Nacional de Educação/CP
nº.3, 18 dez. 2002 Diário Oficial da União, Brasília, DF, 23 dez. 2002.
93
SALAS DE AULAS HÍBRIDAS: O MOVIMENTO DIALÉTICO NO
USO DA MATEMÁTICA E A DA INFORMATÍCA NO COTIDIANO
DO ISTCC-RJ

Márcio de Albuquerque Vianna*

Introdução

Ao longo do planejamento e da implantação do “Projeto Mandala” na


construção do Espaço de Identidade e Pesquisa proposto pela atual gestão do
Instituto Superior Tecnológico (ISTCC) unidade Quintino na Cidade do Rio de
Janeiro, que vem, sobretudo, romper com algumas estruturas tradicionais e
conservadoras de Institutos Superiores diversos, apresentou-se a idéia de salas
de aulas híbridas como elemento fundamental para a fusão entre salas de aulas
convencionais e laboratórios de informática.
Tendo em vista que o instituto demanda de uma constante utilização de
recursos tecnológicos na formação de analistas de sistemas, o uso de micro-
computadores dentro da sala de aula pode favorecer uma aprendizagem mais
significativa dos conceitos matemáticos na busca por generalizações dos
saberes a partir da constante manipulação e experimentação dos casos
específicos e particulares de conteúdos matemáticos por estudantes e
professores em um movimento dialético. Em outras palavras, quando o aluno
experimenta casos e exemplos de atividades matemáticas particulares com o
recurso de planilhas e gráficos eletrônicos, manipulando e alterando seus
valores e estruturas, e, observando a mudança nos resultados, ele abstrai o
conceito, pois está significando e re-significando constantemente, a partir da
experiência e da observação das diversas possibilidades particulares. Dessa
forma, ele interage constantemente com o conhecimento através da linguagem
seja ela matemática, da informática, da língua materna na busca por conclusões
gerais do conhecimento, analisando as verdades e contradições, criando
conjecturas acerca das particularidades experimentadas.
Todavia, essa experiência não se restringe somente ao componente
curricular da matemática, mas a todas às áreas do conhecimento que assumam a
necessidade dessa tecnologia na promoção de uma aprendizagem mais
significativa e consciente.
As salas de aulas híbridas podem ser um caminho para esse objetivo.

* Mestre em Educação Matemática pela USU, Professor de Matemática Aplicada e Álgebra


Linear do ISTCC-RJ

95
O geral e o particular: o movimento dialético do saber matemático

O movimento dialético entre as partes e o todo serve de analogia ao que


consideramos como o particular e o geral, acerca de um conhecimento sobre o
qual queremos inferir.
Matematicamente falando, o que se sugere como particular seria um
exemplo ou um caso específico e, entre os demais exemplos existentes, segue a
busca pela generalização do conceito, retornando a outras particularidades,
extraindo de cada uma delas as verdades, contradições e conjecturas que
compõem a organização do pensamento matemático analítico. Esse movimento
incessante de ida e volta entre o particular e o geral é o que compõe o
movimento dialético e que, sobretudo, estabelece condições para uma análise
mais consciente dos conceitos matemáticos.
Nesse sentido, percebemos que na dialética tudo tem a ver com tudo, os
diversos aspectos da realidade se entrelaçam e, em diferentes níveis, dependem
uns dos outros, de modo que as coisas não podem ser compreendidas
isoladamente KONDER (1981. p. 58).
Nas palavras de COUTINHO:
“A dialética não pensa o todo negando as partes abstraídas do
todo. Ela pensa tanto nas contradições entre as partes como na
união entre elas”.
No caso do ensino da matemática, diversos aspectos conservadores
restringem o uso do método dialético no sentido de se reproduzir um
conhecimento estático, unilateral, dissociado de qualquer significação entre os
seus elementos suas partes. Por outro lado, a visão conceitual do método
dialético se refere a todo processo que é incessante, progressivo, movido por
oposições violentas e que avança por rupturas Mini Dicionário Aurélio (2001).
O ensino da matemática pautado na relação estática de
transmissão/recepção de conhecimentos nega a beleza da complexidade que é a
busca pelas rupturas e pelas uniões entre as partes que compõem o
conhecimento. Isso ocorre quando se reconhece a aprendizagem como um
movimento incessante, na busca pela generalização dos conceitos o todo que,
certamente, retornará às partes para a sua corroboração, refutação ou para a
elaboração e análise de outros conceitos e particularizações na organização do
pensamento complexo.
Nos exemplos que virão a seguir, cabe ao professor estabelecer um
ambiente onde as partes ou particularidades são analisadas através dos
cálculos obtidos com o uso de planilhas e gráficos eletrônicos como, por
exemplo, o Microsoft Excel® o que possibilitará uma organização mais
dinâmica das conjecturas e contradições que poderão surgir na manipulação dos
casos particulares pelos alunos. Essa experimentação constante poderá facilitar

96
uma generalização mais abstrata e consciente dos conceitos, fornecendo
subsídios para compreensão mais sólida e significativa do todo o
conhecimento matemático.

Um exemplo do uso de software de fácil acesso nas construções


matemáticas

Um trabalho que venho desenvolvendo em alguns momentos das aulas


de Matemática Aplicada nessa perspectiva, é o estudo de funções com o auxílio
de planilhas eletrônicas como o EXCEL® onde reestruturamos constantemente
as particularizações do conceito de função em casos específicos.
O trabalho pode se iniciar com um caso de uma função afim, como por
exemplo, f(x) = 2x +1. Atribuindo valores de x na planilha e com o uso de
fórmulas como vemos na tabela abaixo, o aluno observa a sua representação
gráfica instantânea:
O gráfico que será gerado instantaneamente, quando solicitada a sua
A B
1 X Y = 2x +1
2 -2 = 2*A2 + 1
3 -1 = 2*A3 + 1
4 0 = 2*A4 + 1
5 1 = 2*A5 + 1
6 2 = 2*A6 + 1
execução, será:

6
4
2
0
-4 -2 0 2 4
-2
-4

Quando o aluno altera os valores dos coeficientes numéricos “a” e “b” da


forma geral f(x) = ax + b, ele percebe automaticamente algumas mudanças no
gráfico e as contradições entre essas particularidades:

97
A B
1 X Y = -2x + 3
2 -2 = -2*A2 + 3
3 -1 = -2*A3 + 3
4 0 = -2*A4 + 3
5 1 = -2*A5 + 3
6 2 = -2*A6 + 3
O aluno irá perceber que o gráfico agora será decrescente, que ele não
terá valores suficientes no domínio para obter o zero da função a sua raiz que o
deslocamento vertical da reta é de 3 pontos acima do eixo x, etc.

0
-4 -2 0 2 4

Em seguida, se alterar a forma para f(x) = -2x2 + 3 perceberá o surgimento


de uma parábola, e, experimentando as diversas particularizações desse
formato, poderá abstrair os conceitos de estudo da concavidade, das raízes, do
deslocamento vertical e horizontal da parábola, etc.
Partindo para outros casos de funções exponenciais do tipo f(x) = ax, o
aluno irá perceber o novo comportamento do gráfico levantando novas
conjecturas, novas contradições extraindo dessa experiência uma compreensão
mais significativa e dinâmica dos conceitos e, sobretudo, entre os casos
específicos.
Percebendo todos esses fatos ao experimentar esses casos e exemplos
particulares, o aluno interagindo com os resultados da planilha, poderá criar
várias conjecturas (Borba, p. 289) o que o fará alcançar as generalizações que
vão organizando o pensamento matemático, nesse movimento dialético de
tensão entre o particular e o geral; ou seja, entre as partes e o todo, o que
proporcionará a busca pela análise de outras particularidades ocasionando
novas generalizações como mostra a figura 1.

98
Casos particulares

f(x) = x+1
f(x) = x f(x) = x-3
f(x) = -2x

Geral Casos particulares


Função Linear
f(x)=ax+b f(x) = x²

Geral f(x) = -x²


Função
quadrática
f(x)=ax²+bx+c f(x) = -x²+3x-2

Geral
Função
Casos particulares
exponencial
f(x)=ax x
f(x) = 2

x
f(x) = (1/2)

Figura 1

Outros exemplos podem ser citados como os das aulas de Álgebra


Linear fazendo uso da mesma planilha eletrônica na construção das
estruturas das matrizes com suas operações, determinantes e sistemas
lineares, até mesmo e principalmente em tratamentos estatísticos, fazendo o
uso de fórmulas onde, substituindo valores numéricos percebe-se
instantaneamente a alteração dos resultados e, conseqüentemente, das
estruturas seguindo o modelo da figura 2.

99
Estrutura Exemplo
matemática específico

Composição do
verificação exemplo no
da estrutura EXCEL comparação
entre os
resultados
Alteração dos numéricos
Manutenção valores e e gráficos
ou mudança da formatos
estrutura
Figura 2

As salas de aulas híbridas como facilitadoras desse processo

A importância das salas híbridas dotadas de recursos midiáticos como o


data-show, micro computadores, vídeos, DVDs, etc., se percebe na praticidade
cotidiana da realização de atividades mais dinâmicas e contextualizadas com o
universo tecnológico, facilitando o desenvolvimento dessa proposta
pedagógica de se fazer constante a interação entre homem e máquina no sentido
de proporcionar experimentações na busca por uma (re)organização do
pensamento matemático de forma mais significativa.
Segundo BORBA (1999. p.294):
(...) transpassando a noção do sistema ser-humano-mídias-... está
um rompimento com a dicotomia entre a técnica e ser humano (...)
ao mesmo tempo que as técnicas se tornam cada vez mais
humanizadas, na medida em que interfaces amigáveis são
desenvolvidas buscando seduzir o usuário em geral, em nosso
caso o estudante, vemos que as técnicas permeiam e condicionam
o pensamento humano. As mídias, vistas como técnicas, permitem
que “mudança ou progresso do conhecimento” sejam vistas como
mudanças paradigmáticas impregnadas de diferentes técnicas
desenvolvidas ao longo da história.

Nesse sentido, a inter-relação entre homem e máquina se faz necessária,


bem como o surgimento de novos espaços físicos e pedagógicos, na busca por
uma relação que contemple a produção de um conhecimento crítico, dinâmico e

100
consciente, nesse movimento de (re)organização do pensamento, não visando a
sobreposição de idéias, mas, sobretudo, na análise e na integração entre as
partes que compõem o todo, dialeticamente, utilizando as ferramentas
tecnológicas disponíveis na atualidade.

Considerações finais

Os projetos inovadores que dispõem múltiplas possibilidades


pedagógicas no processo educacional, sobretudo no tocante aos recursos
tecnológicos que “invadem” a vida das pessoas e das escolas, fazem parte da
mudança de um paradigma que se manteve inerte por muitos anos salas de
aulas com cadeiras, mesas, giz branco e quadros-negros para um movimento de
superação da situação estática que, até então, era a relação ensino-
aprendizagem convencional.
Salas de aulas dotadas destes recursos inovadores e tecnológicos
facilitam o trabalho de formação de uma consciência crítica, consciente e
dialética, pois proporciona atitudes investigativas pelos alunos, através das
ferramentas que o professor pode vir a utilizar no sentido de desenvolver uma
aprendizagem mais significativa.
É importante ressaltar que a relação homem-computador não deve ser
compreendida como a superação das capacidades do homem, mas que, na
atualidade e no futuro, pode servir de instrumento para uma (re)organização
mais complexa e consciente do pensamento humano na escola, e não tê-la
meramente como reprodutora dos conhecimentos legitimados pelo meio
acadêmico, o que romperá com a relação passiva e inerte de
transmissão/recepção do saber institucionalizado.

Referências

BORBA, Marcelo. Tecnologias Informáticas na Educação Matemática e


Reorganização do Pensamento. In Pesquisa em Educação Matemática:
concepções e perspectivas. Maria Bicudo. (Org). São Paulo: UNESP, 1999.
CHASSOT, Áttico. Alfabetização científica: questões e desafios para a
educação. Ijuí: UNIJUÍ, 2000.
FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Mini Dicionário da Língua
Portuguesa. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1993.
KONDER, Leandro. O que é dialética. São Paulo: Brasiliense, 1981.
VALLADARES, Renato C. O Jeito Matemático de Pensar. Rio de Janeiro:
Ciência Moderna, 2003
VYGOTSKY, L.S. A formação Social da Mente. São Paulo: Martins Fontes,
1984.
101
UM NOVO OLHAR SOBRE A BIBLIOTECA DO INOVADOR
INSTITUTO SUPERIOR EM CIÊNCIA DA COMPUTAÇÃO DO RIO
DE JANEIRO

Edirlane Carvalho de Souza*

Introdução

Ao longo dos anos, o homem vem presenciando o acelerado aumento de


informações.
A história do livro nos revela a madeira, a argila, o papiro, o pergaminho
e, finalmente o papel, que foram usados como suporte para a escrita. A
imprensa, a invenção de Gutemberg, permitiu a criação das palavras por
caracteres móveis.
A comunidade universitária e a igreja foram os principais clientes dos
livros produzidos no século passado. A necessidade de comunicação à distância
estimulou o interesse pela informação e a rápida difusão da imprensa, com isso,
a produção do livro aumentou significativamente.
Ao longo de sua existência, as bibliotecas foram adquirindo e
implementando procedimentos e técnicas visando o melhor tratamento,
armazenagem e recuperação de dados, de forma a atender adequadamente a
demanda de seus usuários.
As tecnologias de redes de computadores provocaram mudanças
significativas em diversos segmentos da sociedade.
Dentre os segmentos afetados por essa inovação tecnológica, destacam-
se a Biblioteca, o centro de documentação, enfim, as unidades de informação.
Mantendo os mais variados tipos de acervo, as Bibliotecas foram se
especializando e organizando seus documentos para oferecer informações
conforme as necessidades específicas de seus usuários.
Esse capítulo aborda a Biblioteca frente a essa mudança tecnológica,
assim como, as mudanças ocorridas a partir da inserção do uso dessas novas
tecnologias nos serviços de Bibliotecas associando a um novo conceito
pedagógico de educação e administração institucional que visa a Biblioteca
como parte integrante do processo de formação de nossos alunos.

A Biblioteca

O desenvolvimento nos serviços de informação tem sido determinado,


sobretudo, pelos profissionais empenhados em oferecer os serviços de

* Bacharel em Biblioteconomia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro UNIRIO. Bibliotecária


do Instituto Superior de Tecnologia em Ciência da Computação ISTCC-RJ/FAETEC.

103
disseminação à luz das discussões e filosofias profissionais contemporâneas.
Entretanto, durante as últimas décadas, compreendeu-se que, assim como a
indústria produtiva teve que avançar do progresso de fábricas isoladas em
direção a padrões de crescimento determinados pela estrutura da economia
nacional, também as necessidades educacionais, informativas e culturais das
comunidades têm que ser estudadas, e os serviços destinados a atendê-las
organizados. Desta maneira, devem ser encarados como partes integrantes de
sistemas maiores, e não como operações unitárias relacionadas tão somente
com seus ambientes imediatos, por mais importantes que estes sejam.
A mudança na própria função da Biblioteca acrescentou uma nova
dimensão em seu planejamento de serviços deixando de ser mero depósito. A
palavra Biblioteca na antiguidade em grego significava “caixa para guardar
livros” e, por extensão, um local onde os livros seriam colocados, de forma
organizada, para consultas e leituras.
Infelizmente ainda nos dias de hoje em algumas instituições, a Biblioteca
é vista “ainda” como “depósito”, não somente para a provisão de livros
destinados a atender às necessidades expressas ou presumidas dos usuários
conforme forem surgindo, mas também são usadas para guardar móveis
quebrados, aparelhos eletrônicos com defeitos, funcionários impossibilitados
de exercerem suas funções seriam transferidos para a Biblioteca, a fim de,
cumprirem com suas respectivas cargas horárias de trabalho.
O profissional Bibliotecário era visto como mal humorado e de poucas
palavras. Com o passar dos anos, pelo menos o perfil do bibliotecário mudou,
infelizmente algumas direções institucionais vêem a Biblioteca com a mesma
visão retrógada e em algumas instituições como sendo “à parte” da educação. A
Biblioteca não desenvolve seu papel em conjunto com docentes, pedagogos e
coordenadores. E por esse motivo falamos aqui do Instituto Superior de
Tecnologia em Ciência da Computação do Rio de Janeiro/FAETEC (daqui em
diante designadas abreviadamente por ISTCC) cuja direção, comandada pelo
Prof. Fernando da Silva Mota, tomou a iniciativa de fazer uma educação
modernizada, aliada aos recursos informatizados disponíveis.
A Biblioteca do ISTCC desempenha funções de integração,
receptividade, lazer, entretenimento e completa o aprendizado com seu acervo
impresso. Não vivenciamos em nossa realidade o perfil de “depósito” para
nossa Biblioteca.
Tratando-se de uma instituição tecnológica, o desafio é ainda maior, com
o aprimoramento da tecnologia aliada à velocidade da informação, a Biblioteca
precisou atualizar seu perfil e modernizar-se. O tradicional “silêncio” é visto
com outros olhos, não somos uma Biblioteca tradicional que não se deve sequer
sussurrar em seu interior, sussurremos em prol do conhecimento, do
desenvolvimento científico e intelectual, utilizando seus recursos eletrônicos e
impressos. Mantemos características de Biblioteca, com suas normas de boa
104
utilização, porém, acoplada ao fantástico mundo da tecnologia que é deveras
dinâmico, interativo e expansivo o que se torna um desafio de toda Biblioteca
eletrônica e o verdadeiro desafio não diferirá grandemente daquele que as
Bibliotecas hoje enfrentam: administrar um acervo multimídia para a sua
comunidade ou usuários.
TROLLEY (1995) define Biblioteca eletrônica como “a visão comum
que bibliotecários, editores, tecnólogos e pesquisadores têm a cerca do acesso a
todas as informações, em qualquer lugar, a qualquer instante”.
Esse conceito de universalidade de acesso é compartilhado.
BECKMAN (1993) argumenta que a diferença entre Biblioteca
eletrônica e Biblioteca virtual está em que a eletrônica ainda pode ter uma
presença física, enquanto a Biblioteca virtual, posto que é percebida como
transparente, possuirá instalações físicas transparentes e bibliotecários
transparentes.
Mantenhamos a visão de uma Biblioteca multimídia que reflita as
diferentes formas e formatos que a comunidade de usuários julgue conveniente
para comunicação e armazenamento de informações.
Provavelmente com essa visão dinâmica, interativa e expansiva que o
matemático e cientista da computação Vinton Cerf em meados dos anos 70
ajudou a desenvolver o “protocolo de controle de transferência/protocolo de
internet TCP/IP”.
Essa mesma visão de partilhar, contribuir, interagir com os grupos,
independente de onde se encontram, contribui para repensar em uma “mandala”
que segundo DAHLE (1999) “formas que representam à harmonia do cosmos e
a energia divina”.

Projeto Mandala

Com o projeto de criação da nossa “sede”, surgiu a oportunidade de


inovar, de se repensar a educação com a proposta do “projeto mandala” que
seria a interação mútua, um círculo, o centro, a teia, o espaço de interação em
forma de um enorme círculo.
Atualmente sem nos darmos conta, vivenciamos esse círculo vicioso de
informação. Podemos de qualquer parte que estejamos, seja no trabalho, em
casa, na instituição de ensino, disponibilizarmos de meios informatizados para
obtermos qualquer tipo de informação, interagirmos pela internet por qualquer
link de nossa preferência, lançamentos bibliográficos, atividades culturais,
consultarmos prefácio de obras bibliográficas e identificarmos se convém aos
nossos interesses literários, pesquisas em enciclopédias etc. Com o advento da
internet, a pesquisa on-line de acervos diversos de várias instituições de ensino
e de outras Bibliotecas facilitaram a busca à pesquisa, ao compartilhamento, a
105
permuta, o empréstimo, doações, uma mandala de interação com o
conhecimento entre pessoas de partes diferentes no IST. Para tal, pensou-se em
uma maneira acessível de circulação e de visão ampla dos diversos ambientes,
acabando com salas de aula organizadas de cadeiras enfileiradas. Todas as salas
com pontos de rede na intenção de informatizá-las. Seus laboratórios perdendo
a identidade de ser apenas o único espaço físico centralizador de interação dos
alunos à tecnologia. Organizado de forma híbrida, compartilhando a tecnologia
com os demais setores que compõem o IST, incluindo obviamente a Biblioteca,
que disponibilizará de terminais de consulta e pesquisa, informando sua agenda
de atividades, seu acervo, novas aquisições e novidades de lançamentos
bibliográficos de interesse dos seus usuários. A Biblioteca, o laboratório e os
micros disponíveis em locais estratégicos do Instituto, facilitando aos usuários
a opção de escolha em que local desejarão disponibilizar-se dos meios
informatizados para sua busca on-line, seja de interesse particular ou
acadêmico.
É com essa visão de interação que a equipe do IST empenha-se em
implantar esse novo conceito de educação. Queremos manter o espírito de
humanidade, de relacionamento, de olharmos uns para os outros, de estarmos
próximos. O IST existe para formar profissionais tecnólogos, porém, ainda
seres humanos providos de emoções, utilizando-se de recursos tecnológicos
facilitadores, mas sem perderem a essência de humanidade.

Conclusão

Não há como compreender a Biblioteca tradicional sem considerar sua


evolução. O templo do saber, freqüentado por uma minoria privilegiada
preservava o conhecimento cujas informações estavam basicamente contidas
em livros. Depois disso, o acervo passou a ser considerado sob diversos
suportes de registro da informação. O armazenamento da informação
sobrepujou a sua disseminação.
As tecnologias da informação foram incorporadas às atividades de rotina
da Biblioteca, a fim de, disponibilizar serviços e produtos existentes dentro e
fora do âmbito da Biblioteca, buscando melhorar a qualidade dos serviços
prestados e marcando um novo perfil para o bibliotecário que deverá enquadrar-
se a esse novo paradigma tecnológico que surgiu para facilitar a interação em
forma de uma imensa mandala, entre pessoas diferente, em localidades
diferentes, porém, sem perder a essência de serem humanos, com sentimento e
emoções.

106
Referências

BAZERQUE, G. Chaves de informática. Rio de Janeiro: Civilização


brasileira, 1972.
CERF, Vinton. Ele inventou a internet... Entrevistador: Alessandro Greco.
VEJA ESPECIAL TECNOLOGIA, São Paulo, jul. 2006.
DAHLE, R. Mandalas. São Paulo: Pensamento, 1999.
FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo dicionário da língua
portuguesa. 2.ed. Ver. Aum. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1996.
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informação: técnicas aplicadas especialmente em bibliotecas universitárias e
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KENT, Allen. Manual da recuperação mecânica da informação. São Paulo:
Polígono, 1972.
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PENNA, C. V. Serviços de informação e biblioteca: um manual para
planejadores. São Paulo: Pioneira, 1979.
ROWLEWY, Jennifer. A biblioteca eletrônica. Brasília, DF: Brinquet de
Lemos, 2002.

107
O AMBIENTE VIRTUAL E A QUALIDADE DE VIDA

Vasco Manuel Martins do Amaral*

O Ambiente virtual e a qualidade de vida

Desde a revolução industrial, a sociedade descobriu e ampliou as


facilidades da produção em escala e da automação, adequando e sofisticando
maquinários e aparelhos, influenciando nas diversas culturas desenvolvidas
pelo ser humano. Com isso, foram criadas novas necessidades e ferramentas,
acelerando o desenvolvimento tecnológico.
Uma das coisas mais extraordinárias nos últimos anos foi o surgimento
dos computadores pessoais, os quais tornaram-se utensílios fundamentais em
diversas atividades profissionais e domésticas.
Se recordarmos a vida cotidiana das pessoas na última década,
perceberemos que, nesse pequeno espaço de tempo, a dependência na
utilização dos computadores foi potencializada de tal forma que, na maioria das
sociedades são remotas as possibilidades de alguém exercer suas atividades
diárias, sem de alguma maneira utilizar-se de algum aparelho digital.
O comportamento humano apresentou, nesse pequeno período,
mudanças nas necessidades e na conduta social, visto que não era comum se
deparar com pessoas falando em telefones móveis nas ruas, no metrô, nos
ônibus ou em outros ambientes. Atualmente se enviam e-mails, mensagens de
texto, torpedos, houve-se músicas, tiram-se fotos.
Outro aspecto relevante é o aprimoramento da tecnologia aliada à
velocidade da informação. A redução do tamanho dos aparelhos e a eficiência
dos sistemas informatizados expandiram-se de tal maneira que, poucos, de
alguma maneira, não têm acesso ou conhecimento da existência e utilização
deles, e os têm como objetivo de bem de consumo.
Mesmo no que chamamos de exclusão digital, percebe-se que de algum
modo, crianças, adultos e idosos, por maior que seja a dificuldade de acesso,
convivem e obtêm informações sobre a utilização de diversos aparelhos
computadorizados, modificando sua expectativa, relação e comportamento
social.
Outras mudanças e aprimoramentos ocorreram na comunicação e
informação. A Internet é formada com o mais sofisticado recurso para contato e
comunicação. Através dela, o sujeito se comunica, obtém informação, se
relaciona e se entretém, dentro de um ambiente virtual.
* Mestre em Ciência da Motricidade Humana - UCB, Pós-graduação em Voleibol - UERJ, Licenciatura
em Educação Física e Desportos - UFRJ, Professor de Pós-graduação em Psicomotricidade AVM -
UCAM, Professor da Universidade Metodista -RJ, Professor de Educação Fisica do Municipio - RJ,
Coodenador de Estágios e Professor do ISTCC-RJ

109
O ambiente virtual é formado na tela do monitor do computador ou
aparelho digital, criando a impressão, para a mente humana, de que as figuras e
os objetos ali contidos interagem com o indivíduo.
Todo esse desenvolvimento tornou a informática mais eficiente e
dinâmica, vinculando-a às mais diversas áreas do conhecimento e da sociedade.
A medicina, a engenharia, a educação, a agricultura, a comunicação, o lazer e
outros conjugaram os seus conteúdos às possibilidades proporcionadas pelos
sistemas informatizados, adquirindo mais eficiência e precisão nos resultados.
Alguém que utiliza um computador, em qualquer situação, o faz por
variados períodos de tempo, os quais, podem ocorrer em pequenas ou grandes
sessões de envolvimento. Tais circunstâncias nos levam a um questionamento.
Será que uma pessoa ao utilizar um computador por várias horas trabalhando, se
comunicando ou envolvido com algum tipo de entretenimento pode ter algum
prejuízo na sua saúde?
O tempo ininterrupto de permanência diante da tela do computador,
sendo longo ou extremamente longo, pode provocar alguns distúrbios,
interferindo na qualidade de vida do indivíduo, principalmente no que diz
respeito à saúde psíquica e física.
No que concerne aos aspectos psíquicos, pode ser verificado mudança de
comportamento do indivíduo, eficiência da percepção e interação com o meio e
as relações interpessoais, devido ao isolamento por diversas horas diante da tela
do computador.
Sabe-se que atualmente os psicólogos já definem o excesso de
permanência no ambiente virtual por algumas pessoas como uma dependência
a ser tratada clinicamente, visto que, o ser humano necessita do convívio social
e interação com o meio físico desde o nascimento, para formar, desenvolver e
manter sua identidade e personalidade.
Os longos períodos de permanência, inerte, jogando vídeo games,
utilizando a Internet, ou trabalhando em computador, reduzem as possibilidades
de estímulos e reações que exijam movimentos contínuos e de coordenação geral.
O corpo humano foi desenvolvido para estar em movimento
constantemente. A nossa locomoção apresenta um esquema sofisticado. Para
um simples passo, acionam-se diversos sistemas de alavancas, organizadas no
esqueleto, movimentados pelos músculos e tendões, no momento em que nosso
cérebro decide a ação.
Além disso, nosso cérebro recebe informações do aparelho vestibular,
que é um analisador cinestésico, conduzindo informações constantes aos
centros superiores sobre a posição da cabeça no campo gravitacional da Terra.
Também obtém informação da propriocepção, o que envolve a identificação
senso-receptora das características dos movimentos do corpo e dos membros,
permite a orientação, localização espacial, velocidade e ativação muscular.
110
A carência na estimulação dessas áreas através dos movimentos
contínuos e da manutenção da coordenação geral, podem causar deficiências na
percepção e reação a estímulos provindos do ambiente, visto que, essas áreas,
devem ser ativadas durante toda a nossa vida, contribuindo para maior
autonomia de locomoção na idade mais avançada.
Podemos notar que a automação proporcionada pela tecnologia reduziu
significativamente as exigências de movimentos e atividade física,
principalmente entre usuários do computador, que pela comodidade na
interação com o ambiente virtual, reduzem cada vez mais a execução dos
movimentos amplos e coordenados.
A redução do período de atividade física diária pode levar também o
sujeito à obesidade, visto que, com pouca atividade, o consumo das calorias
pelo organismo diminui, ampliando as possibilidades de elevação do colesterol,
pressão arterial, risco de infarto, do diabetes, e acidente vascular cerebral.
A obesidade contribui para a baixa da auto-estima do indivíduo obeso,
que muitas vezes se isola ou é discriminado socialmente.
Atento a estes fatores, o Instituto Tecnológico em Ciências da
Computação (ISTCC-RJ) incluiu na sua grade curricular a disciplina
Desenvolvimento Humano e Qualidade de Vida (DHQ), na intenção de
conscientizar seus alunos, por meio estudos de debates, sobre as possíveis
implicações na qualidade de vida, causadas pelo uso contínuo e excessivo do
computador. Com isso, espera-se que eles busquem alternativas para manterem
equilibrados a sua saúde e o bem estar.
O conteúdo programático se integra também aos conteúdos da disciplina
Relações Interpessoais (TRI), visto que, trata principalmente da
conscientização da manutenção da saúde do sujeito e a relação com ele e o
outro, levando-o a compreensão do conceito Ser Humano e a relação social.
A disciplina DHQ aborda inicialmente a concepção de consciência,
identidade e percepção, enfocando as influências ambientais, culturais e da
mídia, no desenvolvimento do sujeito e na sua relação social.
Outra abordagem da disciplina é o desenvolvimento humano sob os
aspectos filogenético/histórico e ontogenético/fisiológico, ampliando a
compreensão do aluno sobre as causas e os efeitos do comportamento.
O conteúdo envolve também a compreensão das conseqüências da má
alimentação, da preocupação no controle da pressão arterial, dos males
causados pelo fumo, álcool e drogas, dos cuidados com a postura e da
organização postural. O mesmo refere-se a elaboração de atividades físicas e de
convívio, alternativas.
Atualmente os alunos do ISTCC-RJ desde o primeiro período,
participam e desenvolvem atividades culturais, sociais e esportivas,
envolvendo turmas e turnos, professores e funcionários.
111
Isto prova que é possível formar pessoas que conciliem ciência,
tecnologia, desenvolvimento e humanidade.
Certamente a tecnologia sempre trouxe benefícios para a humanidade.
Em alguns momentos do desenvolvimento Humano, ela, quando apresentava
soluções, também apresentava seqüelas.
Sempre o Homem se preocupou, uns mais que outros, em equilibrar as
descobertas tecnológicas com o meio ambiente e ele próprio. Muitas vezes essa
preocupação só surgia quando uma das partes apresentava alguma deficiência.
Com as possibilidades tecnológicas atuais, é possível que o homem dê
passos bem calculados, respeite sua natureza e a própria Natureza. Enfim, que
ele possa caminhar com a certeza de que cada passo dado, não o fará tropeçar.

Referências

FEIJÓ, O. G. Psicologia para o Esporte: corpo e movimento. Rio de Janeiro:


Shape, 1998.
GAARDER J. O Mundo de Sofia: romance da história da filosofia. São Paulo:
Schwarcz, 2000.
GUYTON, A. C., HALL, E. J. Fisiologia humana e mecanismos das doenças.
Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 1998.
McARDLE, W D., KATCH, I. F. Fisiologia do Exercício: energia, nutrição e
desempenho humano. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 1998.
OSTROWER, F. Criatividade e Processos de Criação. Petrópolis, RJ: Vozes,
1978.
WEIL,P. O Corpo Fala: a linguagem silenciosa da comunicação. Petrópolis,
RJ: Vozes,1999.

112
O DIREITO NUMA PERSPECTIVA HOLÍSTICA

Themis Aline Calcavecchia dos Santos*

Introdução

"Portanto, num dia virão as suas pragas, a morte, e o pranto, e a


fome; e será queimada no fogo, porque é forte o Senhor que julga.
E os reis da Terra, que se prostituíram com ela, e viveram em
delícias, a chorarão, quando virem o fumo do seu incêndio;
estando de longe pelo temor do seu tormento dizendo: Ai! Ai
daquela grande Babilônia, aquela forte cidade! Pois numa hora
veio o seu juízo. E sobre ela choram e lamentam os mercadores da
terra; porque ninguém mais compra as suas mercadorias:
mercadorias de ouro e de prata, e de pedras preciosas, e de
pérolas, e de linho fino, e de púrpura, e de seda, e de escarlata; e
toda a madeira odorífera, e todo vaso de marfim, e todo vaso de
madeira preciosíssima, de bronze e de ferro e de mármore."
APOCALIPSE (18. 8-12).
A realidade contemporânea parece ter encarnado as profecias do
Apocalipse. A grave crise que assola o mundo, quer de alimentos, quer de
valores éticos e morais (vide as recentes guerras no Afeganistão e no Iraque,
promovidas pelos E.U.A., os recentes escândalos na política brasileira etc.),
revelam que o Apocalipse é agora (parafraseando o filme Apocalipse Now).
Para compreendermos esta realidade é necessário analisar os paradigmas
que nortearam os pensadores até então e partir para a discussão de um novo
paradigma, cujos pressupostos estejam voltados para o entendimento das
razões que levam ao "homem ser o lobo do homem".
Acreditamos que o Direito é fundamental para esta discussão. Cabe-nos,
então, a pergunta: como ensinar Direito num mundo onde os princípios que
marcaram o início da Era dos Direitos estão sendo ignorados?
Estamos vivendo o início de um novo milênio. Cabe aos intelectuais a
árdua tarefa de pensar sobre que caminhos seguir, visto que os modelos
apresentados e existentes não se mostraram capazes de fazer valer a máxima
que embalou a Revolução Francesa: liberdade, igualdade e fraternidade.
A realidade brasileira nos coloca diante de um impasse: o modelo
civilizatório da modernidade, onde se privilegiava o “império da lei” em
detrimento das paixões, parece ter sucumbido diante da máxima do “rouba, mas
faz” que vem há anos acompanhando a política nacional.

* Socióloga, Advogada, Mestre em Direito pela PUC-Rio, Prof. de Direito em Informática do


ISTCC-RJ /FAETEC.

113
Neste contexto, temos o enorme desafio de responder a pergunta
formulada anteriormente. Como falar em direitos, deveres, cidadania,
soberania, num mundo que parece ter se esquecido de toda a sua história?
Neste trabalho, procuraremos tratar do ensino do Direito à luz de uma
visão holística, tendo como base o paradigma da modernidade que,
paradoxalmente, na atualidade, mostra-se contraditório aos seus princípios,
colocando-nos diante de um enorme desafio, qual seja: como ensinar Direito
nos dias de hoje?

O Direito

O Direito é um produto das transformações sociais de determinado povo,


num dado momento histórico e seguindo a uma ideologia dominante. Todavia,
várias são as concepções acerca da origem do Direito, notadamente,
apresentadas pelas diferentes escolas de pensamento jurídico.
Para a Escola Teológica, o Direito era a vontade de Deus, escrito por Ele e
entregue aos homens. Existe um Direito Natural imutável, permanente e estável
que os homens têm que obedecer seguindo a determinação divina.
A Escola Jusnaturalista acreditava que existiam regras na natureza (as
leis da natureza), não escritas, independente da vontade dos homens, e que, de
acordo com estas regras, todos os indivíduos nasciam com determinados
direitos que eram inalienáveis, imprescritíveis, irrenunciáveis, impenhoráveis,
intransferíveis e imutáveis, são os chamados Direitos Naturais.
De origem grega, os Direitos Naturais vão ser resgatados no final da
Idade Média e na Idade Moderna vão fundamentar, também, a chamada Escola
Contratualista ou Racionalista. Para esta escola, o Direito é fruto da razão
humana. Os homens renunciam às paixões que predominavam no Estado de
Natureza, para viver sob o domínio da razão. Para os contratualistas, os homens
fizeram um pacto social para viverem sob o “império da lei” e esta seria
elaborada por representantes escolhidos que teriam, entre outras atribuições,
que garantir os Direitos Naturais.
Com a Declaração de Direitos da Virgínia e, depois, com a Revolução
Francesa, entre outros documentos, esses Direitos Naturais foram positivados
passando a integrar o que hoje é conhecido como Direitos Fundamentais, ou
Direitos Humanos.
Outra escola é a Positivista, cujo principal representante foi Hans Kelsen.
Para esta escola o Direito tem origem no Estado, não sendo admissível a sua
interpretação pelo magistrado, que deve decidir segundo a lei em vigor. É o
conhecido positivismo jurídico.
Temos, ainda, a Escola Histórica, cujo maior expoente foi Savigny, que
acreditava ser o Direito um produto da história dos povos, ou seja, o Direito não
114
tem origem na razão humana, mas sim na história, de acordo com as tradições de
cada povo. Esta escola em muito contribuiu para que se passasse a perceber o
caráter social do fenômeno jurídico, através da mudança do foco para os
fundamentos do Direito, não mais como produto da razão, mas na sociedade,
através, entre outros, dos costumes.
A Escola Marxista afirma que, ao contrário do Direito ser entendido
como a expressão de ideais abstratos, tais como: igualdade, liberdade, etc. e
estes serem os valores orientadores dos ordenamentos jurídicos, o Direito é,
sim, um pressuposto do Estado burguês, que tem a finalidade de manter as
desigualdades sociais, sendo orientado pelas relações econômicas.
As doutrinas marxistas, dadas suas colocações e interpretações
de cunho histórico, estabeleceram um trabalho crítico com
relação ao direito. Contribuíram, de maneira eficaz, para a
secularização, para a desmistificação do direito, permitindo
considerá-lo nem mais nem menos ao que um dado normal da vida
social, dado este a ser observado como outros elementos de toda a
sociedade, tais como: a arte, a linguagem, etc.
Fica aberto, pois, a partir das doutrinas marxistas, um novo
caminho para a concepção positiva dos fatos jurídicos, para a
concepção professada pela Escola Sociológica.
Por fim, temos a Escola Sociológica que atribui a origem do Direito às
transformações sociais dos povos. Durkheim (1999) afirmava que o Direito é
fato social. Segundo o autor, fato social é “toda maneira de fazer, fixada ou não,
suscetível de exercer sobre o indivíduo uma coerção exterior”. A sociedade
possui vínculos e as relações sociais dão-se entre os indivíduos de uma dada
sociedade. Tendo em vista que o homem é um ser social, toda e qualquer
convivência, necessariamente, gera normas de conduta. O Direito, então, seria
proveniente das relações sociais, de indivíduos e grupos, de uma determinada
sociedade. Para a Escola Sociológica, o Direito é fato social.

A Teoria Tridimensional do Direito

Interessa-nos, no tocante à função social do direito, a abordagem das


Escolas Contratualista/Racionalista, Positivista e Sociológica. Quando
mencionamos que o Direito é produto do Estado estávamos nos referindo à
Escola Positivista, vez que esta assim considera a origem do Direito. De outro
lado, também nos referimos à Escola Contratualista/Racionalista, que afirma
ser o Direito um produto da razão humana e que os homens fizeram um pacto
social para viverem sob a égide de um Governo, sob o “império da lei”. Desta
forma, o Estado é o poder constituído que tem como funções primordiais o
Poder Legislativo, o Executivo e o Judiciário, cabendo ao primeiro a tarefa de

115
elaborar as leis, ao segundo executá-las e ao terceiro solucionar os conflitos,
aplicando a lei. Trata-se do Estado como juiz imparcial, assim definido pelos
contratualistas. Ainda, foi destacada a Escola Sociológica que considera que o
Direito é fato social.
A importância da Escola Histórica, como já assinalado, reside no fato de
ter desviado o eixo de análise da origem do Direito, direcionando-o para a sua
dimensão social, o Direito consuetudinário. Como afirmou Savigny, o Direito
revela o “espírito do povo”. Tal mudança de eixo vai ser refletida, também, na
Escola Sociológica.
Então, temos que: o Direito é norma positivada, elaborada pelo Estado,
que é o poder constituído e, portanto, competente para tal; o Direito é fato
social. Através destas premissas pode-se perceber uma dualidade no Direito. De
um lado, a norma posta, imposta, de caráter hipotético, de outro, a sociedade,
através das condutas humanas, das práticas reiteradas de determinados atos que
se transformam em costumes, gerando a necessidade de ordenar as relações
sociais. Entretanto, resta, ainda, um outro aspecto que vai ser expresso na norma
posta, nos fatos sociais e nos costumes, que é o valor que cada sociedade atribui
a cada conduta humana. É esta combinação de fato, valor e norma, que estão
inseridos no Direito, que fundamenta a chamada Teoria Tridimensional do
Direito, que Miguel Reale aprimorou, dando o significado atual à proposição
acerca dos elementos que compõem o Direito fato, valor e norma.
REALE afirma que:
a) onde quer que haja um fenômeno jurídico, há, sempre e
necessariamente, um fato subjacente (fato econômico, geográfico,
demográfico, de ordem técnica, etc.); um valor, que confere determinada
significação a esse fato, inclinando e determinando a ação dos homens no
sentido de atingir ou preservar certa finalidade ou objetivo; e, finalmente, uma
regra ou norma, que representa a relação ou medida que integra um daqueles
elementos ao outro, o fato ao valor;
b) tais elementos ou fatores (fato, valor e norma) não existem separados
um dos outros, mas coexistem numa unidade concreta;
c) mais ainda, esses elementos ou fatores não só se exigem
reciprocamente, mas atuam como elos de um processo (já vimos que o Direito é
uma realidade histórico-cultural) de tal modo que a vida do Direito resulta da
interação dinâmica e dialética dos três elementos que a integram.
Ao analisarmos o Direito sob os três elementos que o compõem, estamos
diante de três perspectivas diferentes que serão estudadas pelas diferentes áreas
do conhecimento, a saber: “um aspecto normativo (o Direito como
ordenamento e sua respectiva ciência), um aspecto fático (o direito como fato,
ou em sua efetividade social e histórica) e um aspecto axiológico (o Direito
como valor de Justiça)”. REALE (2004) completa, ainda, afirmando:

116
“cada vez mais me parecia necessário ir além de Radbruch, não
me limitando a vislumbrar na experiência jurídica a existência de
três perspectivas: a do fato (objeto por excelência da Sociologia
Jurídica), a do valor do justo (objeto da Filosofia do Direito) e a
da norma (objeto essencial da Ciência do Direito), tal como ainda
pensava ao redigir Fundamentos do Direito, em 1940.
O que ocorreu foi minha progressiva convicção de que o
tridimensionalismo deve ser por inteiro o mesmo para o jurista, o
sociólogo e o jusfilósofo, com mudança apenas no enfoque do
tema em apreço, ou, por outras palavras, que o jurista, examina a
norma jurídica em função do fato e do valor; o sociólogo, o fato
social em função dos dois outros fatores; e o filósofo do Direito o
valor tendo em vista o fato e a norma.
A solução para essa forma de entendimento só encontrei quando
tive a idéia de que fato, valor e norma se dialetizam, a meu ver
segundo a dialética de complementaridade, e não a de oposição
aplicada por Hegel. Segundo o jusfilósofo espanhol Sanchéz De
La Torre, antes dessa idéia de dialetização dos três apontados
fatores, não se poderia falar, apropriadamente, em ‘Teoria
Tridimensional do Direito’”.

A Função Social do Direito

Várias são as acepções dadas ao Direito. Para KANT (1954), “Direito é o


conjunto de condições pelas quais o arbítrio de um pode conciliar-se com o
arbítrio do outro, segundo uma lei geral de liberdade”. Para KELSEN (1974),“o
Direito se constitui primordialmente como um sistema de normas coativas
permeado por uma lógica interna de validade que legitima, a partir de uma
norma fundamental, todas as outras normas que lhe integram”. De acordo com
EHRLICH (1986), “O direito é ordenador e o suporte de qualquer associação
humana e, em todos os lugares, encontramos comunidades porque
organizadas”. Portanto, temos aqui exemplos das diferentes concepções sobre o
Direito, através das diferentes áreas do conhecimento. Kant com a ótica da
Filosofia, Kelsen dando uma perspectiva da Ciência do Direito e Ehrlich com a
concepção da Sociologia.
Guardados os devidos contextos históricos de cada um desses autores,
observa-se que, apesar de distintas as definições para um mesmo objeto
(Direito), pode-se notar uma interseção entre elas. Todas afirmam que o Direito
tem a função de regular as condutas do homem dentro da sociedade, quer seja
limitando a liberdade, quer seja utilizando-se da coação, quer relacionado à
organização das associações humanas. Inquestionável o caráter coercivo do
Direito, como também é inquestionável o seu conteúdo moral. Portanto, o

117
Direito ao estabelecer valores (moral) às condutas humanas (fatos) e
estabelecer os limites (norma) tem a finalidade de prevenir e compor os
conflitos oriundos das relações entre indivíduos e entre grupos de indivíduos.
O Direito seria, então, um conjunto de normas de conduta abstratas,
universais, obrigatórias e mutáveis, que tem a função de prevenir e compor os
conflitos oriundos das relações entre os indivíduos e entre grupos de indivíduos,
num dado momento histórico e seguindo a uma ideologia dominante. Daqui
podemos extrair a função social do Direito, que é a de exercer o controle social,
através da prevenção e da composição de conflitos.
Se o Direito é condicionado pelo fato social, pelos costumes, pela
sociedade, também exerce um papel condicionante. As normas de conduta, de
tão repetidas aplicações, acabam por introjetar nos indivíduos os conceitos de
certo ou errado, de bem ou mal, enfim, a dicotomia que permeia as condutas
humanas, seja estabelecida por valores morais ou religiosos, seja estabelecida
pela própria lei. Isto não ocorre, necessariamente, pelo caráter coercivo das
normas de conduta, mas pelos valores, estrutura axiológica, que estão presentes
nas mesmas.
O caráter condicionante da norma pode ser observado, também, quando
uma norma deixa de vigorar e a população continua agindo como se ainda
existisse a regra, ignorando que ela já foi revogada. Um exemplo é o caso do
Afeganistão, que com a queda do regime Talibã as mulheres foram dispensadas
de usarem a burka (vestimenta que cobre totalmente o rosto e o corpo),
entretanto, observa-se, nas reportagens sobre este país, que muitas mulheres
ainda a usam. Neste caso, percebe-se a força coerciva do Direito como fator
fundamental de controle social e, conseqüentemente, a manutenção de uma
ideologia dominante.
Segundo Castro,
“controle social é um conjunto de dispositivos sociais usos,
costumes, leis, instituições e sanções que objetivam a integração
social dos indivíduos, o estabelecimento da ordem, a preservação
da estrutura social, alicerçado nos valores e expresso na
imposição de vontade dos líderes, da classe dominante ou do
consenso grupal.
O Controle social pode ser formal ou informal. Os usos, os
costumes e a opinião pública são expressões do controle informal,
enquanto a lei define o controle formal. Em todas as sociedades, o
direito encontra-se coligado com noções morais e mesmo com
usos.”
Existem vários tipos de controle social exercidos por diferentes
instituições existentes dentro de uma sociedade, como a família, a escola, a
religião, o Estado, a Justiça e as instituições econômicas.

118
Dentre os diferentes tipos de controle social existentes nas sociedades
complexas, o Direito é o que se caracteriza como o de maior poder em
conseqüência da coerção, ou seja, a sanção que inibe que as condutas sejam
contrárias às determinações legais.
Uma das funções sociais do Direito é prevenir os conflitos. As normas de
conduta, de caráter obrigatório, portanto coercivas, visam estabelecer as regras
que devem ser observadas por todos os seus destinatários. Assim, a
bilateralidade do Direito atribui direitos e deveres a cada uma das partes
envolvidas na relação jurídica.
Dentro da função social preventiva, citada por ROSA (2001), podemos
destacar as funções educativa, conservadora e transformadora do Direito.
A função educativa é manifesta através do condicionamento que o
Direito exerce em determinados grupos sociais que introjetam as noções de bem
e mal, justo e injusto etc., que orientam os indivíduos a agirem de acordo com as
determinações legais, fazendo com que acreditem ser a melhor, a mais justa,
forma de agir. Muitas vezes, não é a sanção a maior responsável pela
observância da norma, mas, sim, o seu conteúdo axiológico. Entretanto, nem
sempre o que determina a lei é justo. Inúmeros são os casos em que a lei é
injusta, como por exemplo, quando procura manter os interesses das classes
dominantes, contrariando princípios fundamentais do Direito, desconsiderando
as desigualdades sociais dela decorrentes. O salário mínimo, por exemplo,
como estipulado em lei ordinária não atende ao prescrito no art. 7°. da nossa
Carta Magna.
Ao manter os interesses das classes dominantes, o Direito assume a sua
função conservadora, que pode ser associada, algumas vezes, à função
educativa. O poder legiferante atua para a manutenção de valores, instituições,
que deseja ver preservados. Com o fenômeno da Globalização, cada vez mais os
poderes soberanos estão sendo influenciados a legislar no sentido de assegurar
uma hegemonia global. A atuação do FMI (Fundo Monetário Internacional),
determinando as diretrizes que as economias dos países do Terceiro Mundo têm
que seguir para atingir as metas por ele estabelecidas, é um exemplo dessa
hegemonia global, dessa manutenção de interesses dominantes. CASTRO
(1969) Confirma essa perspectiva:
“as pessoas que desfrutam de uma posição privilegiada escreve
Recaséns Siches procuram conservá-la e se convertem em
sustentáculos da ordem existente mediante a defesa dos direitos
que lhe confere o sistema em vigor. Dizem necessária a situação
presente da sociedade e perigosa qualquer reforma. Pregam
resignação aos desafortunados, procuram socorrer aos
desfavorecidos, pondo em prática um paternalismo protetor, que
não exclui sentimentos de caridade, mas que contém também o
medo à exasperação provocada pela miséria”.
119
Outra função social do Direito é a função transformadora. A nosso ver, a
mais importante das funções do Direito, à medida em que o direito material é
um mecanismo de garantia de Direitos e manutenção de princípios
fundamentais, principalmente quando governos progressistas assumem o
poder. UNGER (2004) refere-se a países que possuem um Direito forte e países
que possuem um Direito fraco. Os primeiros seriam as grandes democracias
existentes, os segundos são paises em que a democracia ainda está se
consolidando e, em razão disto, produzem um Direito fraco, levando à crença
de que efetivamente há uma garantia de direitos, vez que integram o direito
material, mas é camuflado, pois este direito não se materializa em ações. A
existência do direito material nessas democracias incipientes dá a ilusão de ser
efetivamente um Direito.
A função transformadora também está associada ao desenvolvimento
tecnológico das sociedades, às transformações culturais, às normas reguladoras
da economia.
Os “Novos Direitos” são exemplos da função transformadora do Direito.
Muitas vezes, para se modificar comportamentos, conscientizar a população
acerca da necessidade de uma mudança de conduta, há a necessidade de se criar
leis para que tal objetivo seja atendido. Para que houvesse uma mudança de
atitude em relação ao meio ambiente, por exemplo, foram elaboradas leis para a
sua preservação, dando origem ao Direito Ambiental. A conscientização para a
importância de se preservar a natureza vem aumentando graças à existência da
lei, apesar de estar longe do ideal. Também podemos citar o Biodireito, que é
conseqüência das transformações tecnológicas da medicina, biologia e da
agroindústria, e que está gerando uma grande polêmica, principalmente no
tocante aos alimentos geneticamente modificados.
Um outro exemplo é o Código de Defesa do Consumidor, que mudou
as relações de consumo, gerando, no consumidor, uma maior conscientização
acerca dos seus direitos e, conseqüentemente, por parte dos fornecedores
uma maior atenção em relação aos produtos a serem comercializados.
Exigências como a informação da data de fabricação, data de validade do
produto, da composição, etc. contribuíram para a conscientização do
consumidor acerca da qualidade do produto que está consumindo, por
exemplo. A crescente utilização da informática e o desenvolvimento da
chamada Tecnologia da Informação, estão obrigando ao legislador a elaborar
leis que regulem a atividade. Pode-se, também, citar as Ações Afirmativas
que são produto de leis elaboradas para modificar situações de injustiça
social, gerando direitos àqueles que, por algum motivo, estavam relegados a
um segundo plano nas ações do Estado. Tais Ações visam a inclusão das
chamadas minorias e originaram, por exemplo, os Direitos da Mulher e uma
maior inserção de negros e índios no sistema educacional de terceiro grau, no
caso brasileiro.

120
SABADELL (2002) aponta duas esferas de manifestação do Direito
Moderno. Uma interna e outra externa. No que tange às transformações sociais,
a autora afirma que estas podem ocorrer em ambas esferas. No âmbito da esfera
interna, tais transformações podem ser decorrentes tanto da constatação, por
parte do governo, de um problema social, ou por pressões de grupos
desfavorecidos. Quanto às transformações na esfera externa, estas podem ser
conseqüência de pressões internacionais para que haja mudanças. Neste caso,
trata-se de uma transferência de direito, que pode ocorrer sob duas formas, a
saber: o empréstimo jurídico, que consiste na assimilação voluntária de normas
provenientes de outros Estados; e a aculturação jurídica, que é “o processo de
recepção de um direito alienígena que provoca alterações globais no direito do
país receptor”.
Todavia, existe a possibilidade de resistência ao cumprimento das
obrigações, gerando, naquele que tem o seu interesse resistido, uma frustração.
A fim de distribuir a Justiça, o Estado, através da sua função judiciária, é
chamado para exercer o seu dever jurisdicional, solucionar o conflito. É o juiz
imparcial que julga de acordo com a lei, como afirma AMADO (2004):
“O Direito não é, na concepção de Luhmann, tanto um meio de
evitar conflitos quanto de prevê-los e prepará-los, porém
processados. Na própria estrutura de suas normas está implícita a
previsão do conflito, pois sempre se coloca como alternativa de
cumprimento e descumprimento.”
Tomemos, por exemplo, os direitos autorais. O autor recebe os direitos
autorias patrimoniais de sua obra toda vez que ela é comercializada, exibida ou
reproduzida. Não sendo satisfeita a prestação pela editora, pela gravadora ou
pelo exibidor da obra, portanto, resistindo ao interesse do autor, este tem o
direito de chamar o Estado, o juiz imparcial, ou seja, provocá-lo para solucionar
o conflito, exercer o seu dever jurisdicional. É o Direito de Ação, que expressa a
função compositiva do Direito.
Importante observar que, muitas das transformações do Direito ocorrem
no seio do Poder Judiciário, desempenhando o papel de atualizador da lei. Isto
ocorre porque a sociedade transforma-se a uma velocidade que nem sempre o
Direito é capaz de acompanhar. Assim sendo, existem leis que acabam por
tornar-se obsoletas, em desacordo com a realidade. Quando isto ocorre estamos
diante de uma lei que perdeu a sua eficácia.

Uma sociedade sem educação não prioriza o Direito

O controle social é a principal função do Direito e se dá,


fundamentalmente, com a função preventiva do Direito. Assim, os fatores
instrumentais de eficácia da lei realizam esta função. Quando a norma é
elaborada seguindo a um rigor técnico, produto não só da técnica jurídica
121
propriamente dita, mas, de estudos específicos sobre a matéria que se quer
legislar, considerando, inclusive, os custos que serão impingidos aos
destinatários para o seu cumprimento, não gera dúvidas por parte daqueles que
deverão cumpri-la. A divulgação é requisito imprescindível para que a norma
seja cumprida, principalmente porque em Direito existe a máxima de que
“ninguém pode alegar o desconhecimento da lei em defesa própria”.
Já mencionamos, anteriormente, a função educativa da norma que é
manifesta através do condicionamento que o Direito exerce em determinados
grupos sociais que introjetam as noções de bem e mal, justo e injusto etc.,
orientando os indivíduos a agirem de acordo com as determinações legais. A
utilização de métodos educacionais, de propagandas esclarecedoras nos meios
de comunicação, desempenham a função educativa da norma. Um exemplo que
pode ser citado são as campanhas contra as drogas, veiculadas nos diferentes
meios de comunicação.
A função conservadora da norma é a manifestação do caráter estático da
norma que tem a finalidade de garantir e manter a ordem social existente. Tal
função é importante para a manutenção de determinadas instituições e também
do próprio Estado, daí as normas Constitucionais de organização do Estado e
dos Poderes. Podemos, aqui, mencionar o fator de eficácia social da lei, que
consiste na adequação da norma à situação política e às relações de força
dominante. Eis aqui uma dicotomia da norma. Se, de um lado, é imperiosa a
manutenção de determinadas instituições, para garantir a segurança, de acordo
com alguns doutrinadores, de outro lado, contribui para a manutenção do status
quo, assegurando privilégios às classes dominantes e dificultando a inclusão
social dos desfavorecidos. Esta resistência à distribuição da Justiça Social,
presente na função conservadora do Direito, é uma das causas da ineficácia da
lei, que será abordada adiante.
Por fim, a função transformadora da norma que, como mencionado
anteriormente, liga-se à função educativa. Aqui é manifesto, de uma forma mais
direta, o caráter condicionante do Direito. Trata-se de um dos efeitos positivos
da lei na medida em que possibilita uma conscientização acerca da necessidade
de se modificar condutas e comportamentos, introduzindo novos valores e
princípios que, paulatinamente, vão sendo incorporados pelos cidadãos.
No Brasil, temos a expressão “essa lei não pegou”. Tal assertiva ilustra
nossa afirmação anterior de que, muitas vezes, as condutas determinadas pela
lei ficam de tal forma introjetadas no seio social, que quando há uma
modificação na lei, não necessariamente revogando a anterior, a sociedade, ou
alguns setores da sociedade, não cumprem a nova lei. Isto denota a influência
dos costumes decorrentes da norma anterior que não são modificados.
Existe, também, a lei que “não pega” por seu caráter transformador. Há
uma resistência, por parte de determinados grupos sociais, a modificar a
conduta e acatar a prescrição legal. Um exemplo disso pode ser observado,
122
principalmente, quando tais condutas representam a introdução de direitos
anteriormente não assegurados pelo direito material, mas presentes nos
princípios do Direito. À guisa de exemplo, temos as leis de Direito Autoral, que
ainda não são totalmente cumpridas por alguns de seus destinatários, os casos
de pirataria são cada vez maiores. Mais do que o descumprimento dessas leis,
tem-se o não cumprimento de princípios do Direito.
Outro aspecto que merece ser destacado é “a ideologia do favor”, que ao
lado da chamada “via prussiana”, constitui um fator de integração social
presente na história brasileira. De acordo com CERQUEIRA FILHO (1981), “a
'ideologia do favor' está sendo vista como um mecanismo de deslocamento
relativo das idéias liberais, que encontra seu apogeu na forma como o
liberalismo do século XVIII combinou-se e articulou-se de forma (des)ajustada
com a escravidão no Brasil.” A “via prussiana” (Lênin, Lukáks, Gramsci)
traduz a realidade brasileira no que diz respeito às transformações sociais. No
Brasil, todas as transformações sociais ocorridas, ao longo da história, não
foram produto de Revoluções, de movimentos oriundos das bases da sociedade
brasileira, mas, ao contrário, aconteceram através da conciliação, da “ideologia
do favor”, entre os “representantes dos grupos opositores economicamente
dominantes”; foram soluções apresentadas de cima para baixo. “Não há
oposição entre o “favor”, que rege a vida ideológica propriamente dita e a “via
prussiana”, a violência, que rege a esfera da produção e as relações entre as
classes sociais fundamentais.” O “favor” não é o oposto da violência que ele
procura disfarçar, ele consiste na violência de ocultar a violência. “A “ideologia
do favor” está presente seja no pensamento político dominante no Brasil, seja
na interpretação da realidade nacional e na veiculação de nossa história, seja na
socialização dos brasileiros e nas relações sociais. A sua presença vem sempre
combinada com a “via prussiana”.
Ao lado do “favor” encontramos as origens do “jeitinho brasileiro” e da
expressão “você sabe com quem está falando?” Todas manifestações de como
as elites relacionam-se com as leis. Estas são elaboradas por aqueles que detêm
a hegemonia do Poder, mas não são cumpridas por eles. Encontramos aqui
resquícios do pensamento hobbesiano, pois, para Hobbes, as leis deveriam ser
elaboradas pelo monarca e, em conseqüência disto, ele não se submetia a elas.
Estas considerações são fundamentais para a compreensão dos efeitos
negativos da lei, que são: a ineficácia, a omissão da autoridade em aplicá-la e a
inexistência de estrutura adequada à aplicação da lei CAVALIERI FILHO
(2002).
As causas da ineficácia da lei são: a) desatualização; b) misoneísmo e c)
antecipação da lei à realidade social existente.
A desatualização é a primeira causa de ineficácia da lei, isto ocorre
porque a sociedade é dinâmica e a lei é estática. A sociedade está em constante
transformação, valores que antes eram basilares, hoje já perderam importância
123
e o legislador não consegue ter a mesma rapidez na elaboração das leis. No caso
brasileiro, vários podem ser os fatores para a morosidade legislativa,
independentemente do fato de ocorrerem as transformações sociais, que muitas
vezes são conseqüências do desenvolvimento tecnológico e, portanto,
imprevisíveis. O mais grave, a nosso ver, é o descompromisso existente com as
questões públicas. Como mencionado acima, as transformações histórico-
sociais brasileiras não se originaram do embate daqueles desprivilegiados
reivindicando um lugar na sociedade, mas ocorreram como conseqüência de
um consenso, do “favor”, entre os diferentes atores sociais e econômicos,
pertencentes às elites, num processo de liberalização da economia. O que
encontramos em nosso sistema representativo são grupos definidos que estão
no poder para garantir a manutenção de seus privilégios. Citamos, acima, a
polêmica dos trangênicos, o salário mínimo, a reforma da previdência social,
como exemplos do descumprimento da lei. Como se pode observar, o Estado é o
primeiro a não cumprir a lei e isto gera uma descrença por parte da população,
não só em relação à Justiça, como também em relação aos governantes. Como
pode o Estado aplicar a coerção do Direito se ele próprio não se submete às
regras estabelecidas?
Outro aspecto, que pode ser destacado, é o abuso cometido pelo Poder
Executivo em editar Medidas Provisórias, nem sempre sobre matérias que
tenham caráter emergencial, emperrando e atrasando a pauta do Congresso
Nacional.
A segunda causa da ineficácia da lei é o Misoneísmo, que é a “aversão
sistemática às inovações ou transformações do status quo, o que em nosso país
constitui na realidade uma forte causa da ineficácia da lei” CAVALIERI FILHO
(2002). Aqui encontramos o aspecto negativo da função conservadora do
Direito, abordado anteriormente. A intenção é manter os privilégios adquiridos
ao longo da história.
A terceira causa é a antecipação da lei à realidade existente, como é o caso
do Estatuto da Criança e do Adolescente. Neste caso, ao contrário do
misoneísmo, houve a promulgação da lei, mas muito pouco foi feito pelo Estado
para o seu cumprimento. O Código estabelece, por exemplo, que todas as
crianças tem direito à escola, mas muito poucas foram as escolas construídas
pelo Poder Público.
No que tange aos demais efeitos negativos da norma, temos a omissão
das autoridades em aplicar a lei. Isto pode ser verificado no exemplo
mencionado anteriormente (pirataria etc.), como também se vê a presença da
“ideologia do favor”. Os “crimes do colarinho branco”, até recentemente,
praticamente, não eram punidos. Atualmente, em conseqüência do processo
democrático, da liberdade de imprensa, há uma preocupação maior em punir
tais crimes. Mas, ainda é incipiente. Vê-se que fortunas são desviadas dos cofres
públicos e não retornam, indo parar nos “paraísos fiscais”. Entre tantos casos,

124
destacamos o caso do PC Farias, braço direito do ex-Presidente Fernando
Collor, que foi denunciado por corrupção e outros crimes, no início dos anos 90,
ficou pouco tempo preso e nunca teve os seus bens confiscados. De outro lado, a
omissão da autoridade fez com que o tráfico de drogas e, conseqüentemente, a
violência que gira em torno desta atividade, aumentasse consideravelmente e, o
conluio entre alguns membros da polícia e os traficantes, gerasse um total
desrespeito por parte destes em relação àqueles. As recentes manifestações de
violência (ataques de metralhadoras) perpetradas pelos traficantes contra
policiais, delegacias de polícia, a sede administrativa da Prefeitura e o Palácio
do Governo do Estado são conseqüência desta omissão.
Por fim, a inexistência de estrutura adequada à aplicação das leis pode ser
verificada nos aparelhos repressivos do Estado. As Delegacias de Polícia estão
praticamente sucateadas, apesar de terem sido criadas as Delegacias Legais,
que prestam um melhor serviço à comunidade, ainda não são em número
suficiente. A polícia ainda está pouco equipada em comparação aos criminosos,
principalmente em relação àqueles que vivem do tráfico de drogas e do
contrabando de armas. Neste caso, mesmo que as leis sejam eficazes, sem o
aparelhamento adequado para a sua aplicação, elas não atingirão os seus
objetivos sociais.

O Novo Ensino de Direito nas Universidades

É cada vez maior o número de cursos não jurídicos que incluem em seu
Projeto Pedagógico o ensino de disciplinas jurídicas pertinentes as suas áreas de
atuação, como é o caso do curso de Tecnólogo em Análise de Sistemas do
IST/FAETEC (Instituto Superior de Tecnologia). Diante do exposto até o
momento, pode-se ter uma noção da dificuldade em se ministrar as disciplinas
jurídicas para um alunado que não está diretamente interessado neste tipo de
conhecimento. Todavia, como ficou claro ao longo do presente trabalho, o
Direito permeia o nosso cotidiano, as nossas atividades, enfim, a nossa vida.
Como mobilizar o aluno para um tema de vital importância, quando a
realidade mostrada, diariamente, nos jornais é completamente contraditória ao
que se fala em sala de aula e, pior, ao que está escrito nas próprias leis?
No início deste trabalho mencionamos a crise de paradigma, do
paradigma da modernidade, onde o tripé liberdade, igualdade e fraternidade,
atualmente, não vem sendo observado, seja do ponto de vista interno do país,
seja do ponto de vista das relações internacionais.
Para Rouanet (1993),
o projeto civilizatório da modernidade tem como ingredientes
principais os conceitos de universalidade, individualidade e
autonomia. A universalidade significa que ele visa todos os seres

125
humanos, independentemente de barreiras nacionais, étnicas ou
culturais. A individualidade significa que esses seres humanos são
considerados como pessoas concretas e não como integrantes de
uma coletividade e que se atribui valor ético positivo à sua
crescente individualização. A autonomia significa que esses seres
humanos individualizados são aptos a pensarem por si mesmos,
sem a tutela da religião ou da ideologia a agirem no espaço
público e a adquirirem pelo seu trabalho os bens e serviços
necessários à sobrevivência material.
Para a modernidade, as paixões combatidas até então, principalmente
pela Igreja como sendo fruto do insano, tem lugar assegurado ao lado da razão,
consistindo no que se poderia chamar de "fiel da balança", na medida em que, de
acordo com ROUANET (1993), o ser racional é aquele cujas paixões,
interagindo com a razão, o levam ao saber imparcial - razão sábia.
A razão sábia, interagindo com a paixão, produz a autonomia.
Isto significa que o ego é suficientemente maduro para
administrar sua vida passional sem levar em conta nem os
imperativos irracionais da moralidade externa, nem os
imperativos muito mais irracionais da moralidade interiorizada
no superego. Ele é o seu próprio tribunal, e só ele julga que
impulsos podem ser atendidos, como e quando, ignorando as
tutelas, internas ou externas. A razão louca regula a vida moral
pela defesa inconsciente, a razão sábia pelo julgamento
intencional.
O modelo econômico burguês, o capitalismo, distanciou-se dos
pressupostos da igualdade, reforçando a desigualdade da distribuição da
riqueza. O Estado não intervencionista deixa de atender a finalidade precípua
para o qual foi criado, qual seja, a garantia do bem-comum.
A Declaração dos Direitos do Homem, resultado da Revolução Francesa,
estabelece que todo homem tem direito à vida e que todos são iguais.
Entretanto, estas máximas adotadas em quase todas as nações do mundo,
parecem ser esquecidas, entrando, apenas, no direito formal.
O ideário da modernidade, em voga até os dias atuais, ressalvadas as
proporções históricas, parece sustentar a própria destruição de seus valores
intrínsecos (liberdade, igualdade e bem-comum), na medida em que dá lugar à
desenfreada "corrida do ouro", desprezando os "meios" em favor dos "fins". É a
máxima de que "os fins justificam os meios".
Do pensamento da modernidade foi confundida a idéia de individualidade
com individualismo, preponderando o segundo, que significa a exacerbação do
narcisismo, do culto ao Eu em detrimento do sujeito coletivo, da organicidade. Isto
pode ser, facilmente, observado nas salas de aula, através do comportamento dos

126
alunos. Hoje, tem-se a “ditadura do alunado”. Se, de um lado, os métodos didático-
pedagógicos necessitam ser revistos, como têm alertado grandes nomes da área,
de outro, é imperioso o cuidado para não repetir o equívoco através da liberalidade
sem propósito. O aluno é o centro do processo de aprendizagem e não o senhor a
quem o professor tem que se submeter. As pseudo-práticas construtivistas,
equivocadas, pois são aplicadas por pessoas desconhecedoras dos fundamentos
destes métodos (virou moda), transformam o aluno num verdadeiro ditador em
sala de aula, desrespeitando de todas as maneiras a figura do professor, seja através
de atitudes, seja através do descumprimento das atividades exigidas.
Entendemos que a universalidade e a individualidade não estão
dissociadas, ao contrário, andam juntas, principalmente quando se trata de
educação. É imperioso observar o aluno em seu contexto e na sua relação com a
disciplina. É preciso ler as entrelinhas do texto falado, corporal, que o aluno
transmite em sala de aula.
Como mobilizar o aluno para o exercício da cidadania quando o que ele
vê a sua volta é um total abandono por parte daqueles que deveriam protegê-lo?
Falamos do Estado, da família, da própria escola etc.
O fundamental, ao contrário de se trabalhar com a noção dogmática,
essencialmente com a letra da lei, é fazer com que o aluno tenha uma visão
crítica da lei e da sociedade em que ele vive. Trata-se de fazer com que ele
conheça o que está escrito na lei, mas, principalmente, os princípios que
nortearam a elaboração de determinada lei, visto que as leis mudam, como
vimos, são produto, na maioria das vezes, de uma transformação social e da
ideologia dominante num dado momento, mas os princípios são a base sobre a
qual será erigida a legislação.
Não podemos reduzir o ensino do Direito a uma mera repetição decorada de
normas/leis como se as relações sociais fossem reduzidas a um sem número de
artigos inseridos em diferentes Códigos. Lamentavelmente, esta tem sido a prática
na maioria das Escolas de Direito. Não se trabalha com a reflexão acerca da norma,
mas, tão somente, com o exercício da memorização mecânica. A relação professor
x aluno, ou como querem alguns professor x aprendiz, traduz-se numa relação de
poder onde a moeda de troca é a repetição de um conteúdo maçante e frio, livre de
qualquer reflexão ou crítica, transforma-se num “cabo de guerra”, de um lado, o
professor e de outro, o aluno puxando para ver quem vai cair primeiro. O resultado
é a formação de maus profissionais, desprovidos de ética e, como se tem visto nos
noticiários recentes, associados ao crime. O importante dever de defender inerente
a função do advogado foi confundido com trabalhar incondicionalmente para o
cliente, criando todo tipo de “expediente” para evitar que a Justiça seja realizada.
De outro lado, uma prática dialética, privilegiando o diálogo, a crítica e a
reflexão, possibilita uma apreensão muito mais eficaz do conteúdo pretendido,
majormente, considerando-se a contradição vivenciada entre o ideal (o
conteúdo programático) e o real (as práticas cotidianas apresentadas nos
127
jornais).
Considerações Finais

O ensino jurídico é fundamental em qualquer área do conhecimento pois


ele permite ao aluno a conscientização de seu papel na sociedade, não apenas
técnico, mas, principalmente, como agente transformador da realidade através
de seu conhecimento. Portanto, ao trabalharmos com as disciplinas jurídicas é
importante darmos a dimensão transdisciplinar que está imbutida no Direito e a
noção que tão bem foi colocada por Reale, mencionada anteriormente, da
tridimensionalidade do Direito (fato, valor e norma), que dão a dimensão
dinâmica do Direito.
Como foi visto ao longo deste trabalho, o Direito é muito mais que um
mero elenco de leis. É muito mais importante e enriquecedor do que o
reducionismo a que foi submetido nas salas de aula, por métodos de ensino
antiquados, desestimulantes e conservadores, para além do fato de a realidade
reclamar um questionamento constante acerca de que indivíduos queremos
formar, haja visto tudo o que foi trazido à baila neste trabalho.
A isso podemos chamar de visão holística do Direito, onde existe a
compreensão de que a disciplina visa, muito mais do que informar, formar uma
consciência cidadã de que somos parte de um universo e que somos diretamente
responsáveis por nossas ações e suas conseqüências.
O IST, ao incluir o Direito dentro de seu projeto pedagógico aprofundou
a concepção do Projeto Mandala, na medida em que a formação do aprendiz vai
muito além do aspecto técnico, mas, sobretudo, privilegia o aspecto social e
humano que não podem ser dissociados do aprendizado. Não se aprende apenas
a programar computadores, mas, antes de tudo, se apreende que computadores
são máquinas e que por detrás delas existem seres humanos que devem ser
respeitados e valorizados em sua integridade.
O ensino do Direito em cursos que não são jurídicos, como mencionado
anteriormente, descolado de uma visão dogmática, priorizando uma
perspectiva holística, é fundamental para a formação dos indivíduos que
constituem a universalidade da sociedade. Somente com a educação e o
conhecimento dos princípios fundamentais do Direito é que se transforma uma
sociedade que cada vez mais está distorcida e distante do paradigma que
marcou o processo civilizatório ocidental. Na realidade, o ensino do Direito
deveria iniciar-se já nos tenros anos de vida, no ensino fundamental e médio,
pois, assim, teríamos cidadãos comprometidos com a realização de um mundo
melhor.
O Direito é o dever do indivíduo de ser feliz numa sociedade justa que se
pauta por princípios fundados na ética.

128
Referências

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1999.
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KANT, Emmanuel. Introducción a la teoría del derecho. Madrid: Instituto de
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KELSEN, Hans. Teoria pura do direito. 3.ed. Coimbra: Armênio Amado
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REALE, Miguel. Lições preliminares de Direito. 2.ed. São Paulo: José
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SABADELL, Ana Lucia. Manual de Sociologia Jurídica. 2.ed. São Paulo:
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UNGER, Mangabeira. O Direito e o Futuro da Democracia. São Paulo:
Boitempo, 2004.
129
DIMENSÕES DA AVALIAÇÃO E O PORTFÓLIO AVALIATIVO
EM BASE TECNOLÓGICA

Márcio F. Campos*
Fernando S. Mota**

Introdução

Se perguntar a qualquer professor sobre qual a atividade mais difícil do


processo de ensino, este provavelmente lhe responderá que é a atividade de
avaliação. Esta atividade torna-se ainda mais complicada se analisarmos o
papel da escola frente a sociedade, pois, no atual momento, exige-se um papel
multifacetado dos profissionais egressos. Sugere-se que a avaliação seja
considerada sob os seguintes aspectos: a) um processo e não uma atividade
pontual, b) que esta atividade não seja meramente técnica, mas política, c) que
esteja baseada na construção de cidadãos competentes, d) que não seja um
instrumento de controle e e) que seja baseada em dimensões de avaliação.
Entretanto, a escola, em muitos de seus aspectos, ainda não conseguiu se
atualizar para acompanhar a formação deste novo profissional e cidadão. As
razões para tal descompasso podem estar associadas a:
! Processo de gestão escolar.
! Qualificação dos professores.
! Espaço de aula.
! Resistência do corpo discente.
Esta resistência à mudança impede que a escola analise seu processo de
avaliação, causando um descompasso com a nova sociedade que se delineia
neste início de novo século.
Mas afinal, quais as demandas neste novo século? Algumas são
conhecidas:
! Aprendizado contínuo.
! Melhorias no relacionamento interpessoal.
! Melhor gestão do tempo.
! Trabalho em equipe.
! Melhor formação profissional.
! Maior uso de carga cognitiva: uso das tecnologias da Informação e
separação do sujeito e de seu objeto de trabalho.

* graduado em Tecnologia de Processamento de Dados pela PUC-Rio (1986) e mestrado em


Engenharia de Sistemas e Computação pela UFRJ (1996). Professor ISTCC-RJ/FAETEC,
professor das Faculdades Integradas da Jacarepagua.
** MBA em Gestão do Ensino Profissional - Administração Escolar. Pós-graduado em
Administração Escolar. Professor do Ensino Superior/Gestão. Diretor do ISTCC-RJ.

131
Todas estas mudanças são provenientes da forma extrema de como a
sociedade tem aproveitado as oportunidades disponibilizadas pelo
conhecimento científico e tecnológico. Já é hora da escola oportunizar estas
mudanças, apesar das mudanças estruturais necessárias, podemos começar esta
mudança no cerne da escola: o processo de avaliação em sala de aula.
Nesse contexto a avaliação deve considerar as incertezas do
conhecimento volátil, do processo de aprendizado permanente, da colaboração
efetiva entre os pares e pensar criticamente.

Avaliação no novo contexto.

Avaliar é uma atividade multidimensional. Desta forma, uma nota não


reflete o conhecimento de um discente. Quais seriam, então, as dimensões de
avaliação do ensino?
Sabe-se que o ensino superior está estruturado sobre três eixos básicos: do
ensino, da extensão e da pesquisa. No eixo do ensino estão associadas todas as
atividades de formação acadêmica dos cursos superiores. É nesse eixo que
transcorrem as disciplinas, que são abertas as turmas, que são alocados os
professores, que são feitos projetos de monitoria, trabalhos acadêmicos, entre outros.
No eixo da extensão, são desenvolvidas as atividades de interface com a
sociedade através de cursos livres, treinamentos, desenvolvimento de
tecnologia, transferência de tecnologia entre outras.
No último eixo, da pesquisa, os cursos superiores tratam da produção de
conhecimento científico através das ações de iniciação científica, seminários,
simpósios, intercâmbio de alunos e professores entre outros. É o eixo da
geração de conhecimento.
De forma similar, outras dimensões de ações de ensino podem ser
consideradas. Por exemplo, o curso de Ciência da Computação [Santos et all,
2003] organizou suas atividades acadêmicas em torno de seis estratégias,
identificadas como programas, que podem servir como referência. Tais como:
! Programa de Iniciação Científica: este programa incentiva os
estudantes à prática das pesquisa através de atividades que propiciam a
familiarização com instrumentos de produção de conhecimentos, seja através
de pesquisa, monografias ou trabalhos de conclusão de curso, artigos, ensaios
com apresentação pública externa ou interna, divulgação de trabalhos.
! Programa de Extensão: este programa compreende todas as ações de
execução, intervenção e interação por serviços, assistência com ou para
públicos específicos interna ou externamente propiciando o desenvolvimento
da práxis (ação-reflexão-ação) e a integração com a comunidade.
! Programa de Práticas Acadêmicas: este programa se refere ao
132
conjunto de atividades com o objetivo principal de ligar teoria e prática.
Exemplos dessas atividades incluem estágios, seminários, eventos e práticas
interdisciplinares.
! Programa de Formação Continuada: este programa visa através de
encontros pedagógicos e científicos, cursos, palestras, seminários, simpósios
atualizar a instrumentação teórico-prático de estudantes, egressos e docentes.
! Programa de Ensino: este programa diz respeito à grade curricular
com suas disciplinas, carga horária e respectivos créditos.
! Programa de Orientação e Apoio ao Discente: diz respeito a
atividades de orientação e acompanhamento dos alunos naquilo que lida com
sua formação anterior, ao seu aprendizado e rendimento acadêmico.
Estas estratégias, representadas por ações práticas, visam organizar e
estruturar todas as ações realizadas pelo curso. Assim, um curso livre oferecido
por um aluno à comunidade de ex-alunos pode ser classificado, sob o ponto de
vista do aluno, como uma ação de prática acadêmica, o curso em si como uma ação
de extensão, para os ex-alunos como um programa de formação continuada.
Por último, o Inep (2006) ampliou seu processo de avaliação
institucional. Neste processo alguns itens se destacam, tais como: o já citado
eixo do ensino, pesquisa e extensão e de outros, tais como: a responsabilidade
social da instituição no que se refere a contribuição da instituição em relação a
sociedade, à defesa do meio ambiente, da memória cultural, da produção
artística e cultural.
Desta forma, caminha-se para um novo arcabouço avaliativo, onde a
avaliação pontual fica descaracterizada e emergem as dimensões de avaliação.

Incorporando instrumento de avaliação neste novo contexto.

Em face da nova diversidade de dimensões que se apresentam configuradas


neste novo século, como transformar estas ações para itens de avaliação em de sala
de aula? Assim, três aspectos podem ser considerados, inicialmente:
O aspecto do planejamento: repensar a avaliação é repensar a própria
disciplina. Sob esta ótica é necessário reinterpretar a execução do programa da
disciplina com avaliações apenas pontuais do saber técnico. Ampliar a
avaliação é considerar quais as contribuições da disciplina, além dos aspectos
técnicos, como também, das contribuições sociais, de extensão e de pesquisa.
O aspecto da sala de aula: a avaliação da sala de aula ocorre
normalmente através de provas. Esta é uma realidade que necessita ser
modificada. Existem vários instrumentos de ação que podem ser empregados
de forma contínua ao longo de uma disciplina.
O aspecto da avaliação final: é necessário avaliar o trabalho sem ter
receio de errar. Deve-se considerar a avaliação como um processo contínuo de
aperfeiçoamento. Cada ação de avaliação deve ser avaliada de forma a verificar
133
sua utilidade. Sem o emprego de ações para avaliação em suas várias
dimensões, o docente nunca se sentirá seguro em realizá-las.
O aspecto do contexto dos alunos: é importante sintonizar a didática ao
contexto dos alunos em sala de aula. Cada sala de aula, cada localidade possui
alunos com cultura e histórias diferentes. Neste caso, é necessário considerar o
ambiente de ensino como fator de avaliação.
Algumas destas ações avaliativas, organizadas pelas dimensões, podem
ser citadas, tais como:

Dimensão do Ensino:
! Aulas expositivas: para introduzir assuntos do contexto
conhecimento.
! Trabalho de conclusão de curso: como forma de integração com as
demais disciplinas do curso.
! Eixos temáticos: os eixos temáticos propiciam o desenvolvimento de
casos e de trabalhos conjuntos ao longo de diversas disciplinas.
Programa de Iniciação Científica:
! Participação em eventos científicos e de inciação científica:
familiarizar o aluno com a ciência e as descobertas científicas e
compartilhamento de conhecimento com seus pares. Aprofundamento
de estudos e técnicas.
Programa de Orientação e Apoio ao Discente:
! Acompanhar o aluno: conhecer sua origem, suas potencialidades e
suas deficiências.
Programa de Formação Continuada:
! Prática de laboratórios: com o enfoque no desenvolvimento de
competências técnicas e sociais; trabalho em equipe quando apropriado.
Programa de Práticas Acadêmicas:
! Seminários: para aprofundar estudos realizados através de leitura
dirigida e de pesquisas. Desenvolvimento de habilidades de estudo em
grupo e à distância. Desenvolver a capacidade de comunicação e
expressão dos alunos;
! Participação em programas de monitoria: com enfoque no
desenvolvimento de liderança, responsabilidade, iniciativa e
cooperação.
Programa de Extensão:
! Participação em atividades de extensão: propiciar ao aluno o
enriquecimento social e a aplicação prática de seus conhecimentos.
Todas estas ações podem ser empregadas ao longo da disciplina servindo
para a avaliação multifacetada do discente. Assim, ao final do período letivo o
aluno possuirá um conjunto de avaliações e de produções construídas ao longo
do período letivo, criando condições de avaliações globais e contínuas.

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Instrumento de registro das atividades em suas várias dimensões:
o portfólio.

O portfólio não é uma modalidade de avaliação recente. Esta modalidade


já é utilizada no campo das artes de forma a registrar as diversas formas de
inteligência artística. O portfólio se caracteriza por um conjunto de trabalhos.
Um portfólio possui evidências de um trabalho individual de um estudante ao
longo do tempo e que retrata o crescimento profissional e educacional do
indivíduo[Sistêlos et all, 2003].
Os portfólios podem ser úteis de várias formas: para auxiliar na evolução
do aprendizado, para se utilizar na avaliação em substituição a testes e provas e
para instigação à pesquisa.
Várias são as experiências com portfólio avaliativos, dentre as quais
pode-se citar MOTA ( 2006) e ANATASIOU e ALVES (2003).
Os portfólios possibilitam o emprego de diversas ações de avaliação que
podem ser utilizados ao longo da disciplina. Este conjunto de avaliações, em
suas variadas dimensões, é o que caracteriza o portfólio avaliativo de base
tecnológica. As dimensões sugeridas são aquelas relatadas no item anterior.

A experiência do Instituto Superior de Tecnologia.

A experiência no processo de avaliação deste instituto não tem sido


diferente em relação a outras escolas. Ainda se utiliza o processo de avaliação
pontual das provas, apesar da gestão escolar estar aberta e apoiar novos
processos avaliativos. O ensino tradicional cria uma cultura, difícil de ser
alterada, tanto para alunos quanto para professores.
Entretanto algumas ações estão sendo realizadas de forma a possibilitar o
portfólio de avaliação de base tecnológica:
Os conteúdos programáticos das disciplinas foram alterados para
acomodar também as contribuições daquela disciplina às dimensões de
pesquisa e de extensão. Este item no programa amplia a percepção do professor
quanto a disciplina lecionada e possibilita vislumbrar novas formas de
avaliação.
A adoção de eixos temáticos no curso otimizou os esforços dos
professores que podem trabalhar de forma conjunta e integrada. Os diversos
produtos gerados pelas diversas disciplinas possibilitam seu reaproveitamento
em outras. Os eixos temáticos têm sido utilizados com sucesso na confecção
dos Trabalhos de Conclusão de Curso, que, por sua vez, servem de fatos
acadêmicos para análise e avaliação de outros alunos e professores.
Os trabalhos das disciplinas têm sido realizados de forma integrada.

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Disciplinas tais como: Metodologia da Pesquisa, Inglês Instrumental e Língua
Português realizam atividades em conjunto, por exemplo.
Ações fora de sala de aula têm sido incentivadas. Disciplinas, tais como:
de Empreendedorismo e Administração realizam trabalhos de campo.
Práticas de laboratório avaliam não apenas o conteúdo lecionado em
sala, como também servem para avaliar posturas profissionais.
Foi criado o Núcleo de Apoio Docente e Discente que atenderá e
aproximará a necessidades e premências tanto de alunos como de professores.
Estas ações fazem parte do dia-a-dia das ações do Instituto Superior de
Tecnologia do Rio de Janeiro.

Conclusão.

A escola é umas das organizações mais tradicionais. Assim, qualquer


mudança é sempre lenta e difícil de ser realizada. Somente uma ação integrada,
mandala, é capaz de realinhar a escola aos novos tempos. No que refere, então,
ao processo de avaliação, o que se verifica, de forma geral, é o tradicionalismo
em sua plenitude. Tratar a avaliação como um processo e em dimensões é um
fato incomum.
Algumas barreiras ainda se estendem pelo caminho, tais como: a
redefinição do conceito de disciplina, da avaliação resumida a uma única nota e
do conceito de aprovação e reprovação.
A experiência com as diversas formas de avaliação e através de um
portfólio, está sendo positiva, apesar de alguns desgastes. Estes possibilitam
atender às diversas características dos alunos, permitem melhor caracterização
da evolução do aluno, asseguram maior qualidade dos trabalhos e possibilita o
comprometimento do aluno.
Tratando a avaliação através de um portfólio, e considerando mais de
uma dimensão, incorporando a extensão e a pesquisa, se consegue refazer e
recaracterizar o processo avaliativo ora em curso e aproximar um pouco mais a
escola daquilo que se espera dos formandos universitários: a formação técnica
competente, integrada a formação humana e a coletividade.

Referências
ANASTASIOU, L. G. C.; ALVES, L. P. Processos de Ensinagem na
Universidade: pressupostos para estratégias do trabalho em aula. Joinville:
Editora Univilla, 2003.
INSTITUTO NACIONAL DE ESTUDOS E PESQUISAS (INEP). Avaliação
Institucional, Legislação e Normas. [s.l.;s.n.], 2006. Disponível em
136
<http://www.inep.gov.br/superior/avaliacao_institucional/legislacao.htm>
Acesso em: 24 jul. 2006.
MOTA, Fernando S. As Tecnologias Aplicadas a Avaliação. In:
SEMINÁRIO BRASILEIRO DE TECNOLOGIA EDUCACIONAL, 37,
Rio de Janeiro, 2006.
SANTOS, Regina C. F.; et al. Inovando a Dimensão Estratégica do Ensino de
Ciência da Computação. In: Workshop de Educação Informática.
Congresso da Sociedade Brasileira de Computação. [s.l.; s.n.] 2003.
SISTÊLOS, Antônio J.C.M.; Schiel, Ulrich; Dominguez, Arturo Hernandez.
Um sistema de Apoio ao Método de Avaliação Autêntica. XIV Simpósio
Brasileiro de Informática na Educação SBIE. NCE/UFRJ, Rio de Janeiro,
2003.

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Conclusão

A Escola Mandala não é um conceito simples de ser adotado nem tão


pouco imediato. O ISTCC-RJ vem construindo essa proposta fundamentada na
Concepção Mandala desde 2003, com enormes resistências, acertos e erros.
Propor e implementar uma nova visão de escola parece algo natural, afinal a
universidade é um espaço de transformação, que se propõe a acompanhar e
conviver com a sociedade em seu tempo.
Entretanto, não é exatamente isso o que vemos ao nosso redor, Pedro
Demo, em Reflexões 2005 Ensino Superior no Século XXI: Direito de Aprender
em conferência em 21/10/2005 na PUCRS, questiona a postura das
universidades quando afirma:
“Neste ensaio preliminar, tento dimensionar alguns desafios da
educação superior no século XXI, tomando em conta o cenário de
mudanças que vivemos hoje, cada vez mais veloz, conturbado,
complexo, não linear, imprevisível, estonteante. A universidade
seria a instituição mais adequada para dar conta desta
avalanche, até porque se esperaria dela que pudesse estar à frente
dos tempos e os conduzir”.
E complementa suas reflexões destacando:
“Mudam as sensibilidades, as subjetividades, as materialidades,
as espiritualidades, enquanto a universidade permanece
impassível... Queria também saber, por que a universidade é esta
velharia!”.
A Escola Mandala é uma tentativa de sacudir a “velharia”, de deixar as
certezas e nos lançar em algo novo, que venha recolocar a escola em seu tempo.
Para tal pressupõe-se que:
! Não bastam ações isoladas, é importante tratar o todo de forma
conjunta: não adianta um único professor modificar sua concepção e prática no
processo ensino-aprendizagem se os outros continuarem com a mesma postura
tradicional de ensino; é necessário modificar a relação professor-aluno,
repensar o espaço físico, as formas de avaliação e a metodologia de ação.
! É fundamental mudar o comportamento das pessoas e suas crenças: é
necessário trabalhar com o modelo mental dos indivíduos daquilo que é
concebido como uma escola, na mudança de posturas, no incentivo ao tentar e
errar, na participação com comprometimento, na maturidade de atitudes, na
busca da melhoria constante. Esse é um processo contínuo e doloroso que
necessita ser vivenciado por todos da equipe: professores, funcionários e
alunos.

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! É relevante considerar o processo tecnológico: a tecnologia tem
oferecido novas alternativas nos processos organizacionais das escolas e novas
formas de atender as necessidades da sociedade. Entretanto, a resistência à
adoção de tecnologias em sala de aula é grande, e, mesmo quando se possui
tecnologia disponível, não se considera a tecnologia como parceira. Percebe-se
o quanto esta vem nos auxiliando nas ações do dia a dia. É hora de trazê-la com
todo o seu potencial para a escola.
! É preciso estar ciente das novas formas de gestão: as formas de gestão
estão cada vez mais voltadas para a participação e a autonomia, na busca do
aproveitamento das potencialidades individuais, em todos os níveis. É
necessário deixar o modelo compartimentalizado de escola e adotar outros mais
integrados e autônomos.
! É necessário maior interação com a sociedade: A escola deve estar
integrada com sua comunidade e não sendo vista como um objeto distante e
apenas um espaço de pesquisa.
Essa proposta oferece uma visão que unifica estes conceitos e que pode
servir de rumo para o processo de transformação. Pedro Demo, ainda no artigo
supracitado, afirma “Agora sei: perdi-me nas certezas ilusórias da universidade
perdida!”. Essa concepção de escola é uma tentativa de nos encontrarmos com
as nossas trajetórias de professores transformadores, de nos encontrarmos com
uma escola pública de qualidade, de nos encontrarmos com os nossos ideais e
com nós mesmos em nosso ambiente de trabalho, como cidadãos do século XXI
em uma Escola Mandala.

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