Você está na página 1de 377

LÚCIA DE ARAÚJO RAMOS MARTINS

(ORG.)

DESAFIOS DA
INCLUSÃO ESCOLAR

Ideia – João Pessoa – 2021


Todos os direitos da organizadora. A responsabilidade sobre textos e imagens é
do respectivo autor(a).

Editoração/Capa: Magno Nicolau

Ilustração da capa
Imagem da capa: Autor Desconhecido. Imagem licenciada em CC BY-NC-ND

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) de acordo com ISBD

D441 Desafios da inclusão escolar [recurso eletrônico] / Lúcia de Ara-


újo Ramos Martins, organizadora. – João Pessoa: Ideia,
2021.
3.6mb; pdf

ISBN 978-65-5608-116-8

1. Educação especial e inclusiva. 2. Formação e prática edu-


cacionais inclusivas - pessoa com deficiência. 3. Gestão de es-
paços educacionais inclusivos. I. Martins, Lúcia de Araújo Ra-
mos. II. Título.

CDU 376-056.26

Ficha Catalográfica elaborada pela Bibliotecária Gilvanedja Mendes, CRB 15/810

EDITORA
contato@ideiaeditora.com.br
www.ideiaeditora.com.br
A Deus, por nos conceder condições de vivenciar,
aprender e compartilhar os
conhecimentos construídos.

À nossa família, base para toda a nossa cami-


nhada em busca de um mundo
mais justo e inclusivo.

A todos e todas que colaboraram com a constru-


ção deste livro, com base nas experiências e nos
resultados das pesquisas empreendidas, em
busca de uma escola e de uma
sociedade inclusiva.
SUMÁRIO

PREFÁCIO ........................................................................................ 9
Sonia Lopes Victor

CAPÍTULO 1
A INCLUSÃO DE CRIANÇAS COM DEFICIÊNCIA VISUAL NA EDUCAÇÃO
INFANTIL: O ATENDIMENTO EDUCACIONAL ESPECIALIZADO E A
PEDAGOGIA DA INFÂNCIA ............................................................. 12
Marilda Moraes Garcia Bruno

CAPÍTULO 2
ESTUDANTES COM DEFICIÊNCIA VISUAL E SURDOCEGUEIRA NA
REDE MUNICIPAL DE ENSINO DE NATAL/RN .................................. 35
Luzia Guacira dos Santos Silva

CAPÍTULO 3
A EDUCAÇÃO DE SURDOS NO BRASIL E NA FRANÇA: DIÁLOGOS E
DISTANCIAMENTOS ....................................................................... 78
Ivanilde Apoluceno de Oliveira
Janete Benjamin
Waldma Maíra Menezes de Oliveira

CAPÍTULO 4
DIMENSÕES DE UMA TRAJETÓRIA AUTOFORMATIVA COMO
ALFABETIZADORA BILINGUE DE CRIANÇA SURDA ........................ 101
Elizabete Siqueira Ribeiro
Luzia Guacira dos Santos Silva
CAPÍTULO 5
CONSULTORIA COLABORATIVA: MEDIAÇÃO QUE FOMENTA NOVOS
SABERES E NOVAS PRÁTICAS ....................................................... 144
Neiza de Lourdes Frederico Fumes
Eliane Cristina Moraes de Lima
Maria Quitéria da Silva
Soraya Dayanna Guimarães Santos

CAPÍTULO 6
FUNCIONAMENTO DAS SALAS DE RECURSOS MULTIFUNCIONAIS
(SRM) NO ESTADO DO RN: FORMAÇÃO E EXPERIÊNCIAS DOS
PROFESSORES QUE ATUAM NESTE DISPOSITIVO .......................... 164
Sonia Medeiros
Izabel Hazin
Taciana Pontual Falcão

CAPÍTULO 7
NARRATIVAS DE AUTISMO: CONTRIBUIÇÕES PARA A
ANÁLISE DE VIVÊNCIAS ................................................................ 207
Ivanise Gomes de Souza Bittencourt
Neiza de Lourdes Frederico Fumes

CAPÍTULO 8
FRACASSO ESCOLAR, CULPABILIZAÇÃO DOS ALUNOS
INOCENTIZAÇÃO DA ESCOLA: UM OLHAR SOBRE AS
DIFICULDADES TRANSFORMADAS EM DEFICIÊNCIAS ................... 229
Janine Marta Coelho Rodrigues
Silvestre Coelho Rodrigues

CAPÍTULO9
DIFICULDADES PARA A APRENDIZAGEM OU TRANSTORNOS
ESPECÍFICOS DA APRENDIZAGEM? ............................................... 299
Ana Maria Leite Cavalcanti
Geraldo Bezerra Cavalcanti Neto
CAPÍTULO 10
CONTRIBUIÇÕES DA LITERATURA INFANTIL PARA O PROCESSO DE
INCLUSÃO ESCOLAR ..................................................................... 308
Maria Arlyz Ferreira Domingos
Martha Milene Fontenelle Carvalho
Francileide Batista de Almeida Vieira

CAPÍTULO 11
A INCLUSÃO ESCOLAR DE ALUNOS COM DEFICIÊNCIA
INTELECTUAL ............................................................................... 334
Lúcia de Araújo Ramos Martins

CAPÍTULO 12
O OLHAR DAS MÃES SOBRE O FILHO COM SÍNDROME DE
DOWN ......................................................................................... 351
Benedita Cruz Macedo
Lúcia de Araújo Ramos Martins

SOBRE OS AUTORES ..................................................................... 370


Des af i os da Incl us ão Es col ar |9

PREFÁCIO

R
ecebi o honrado convite de realizar o prefácio dessa obra
que trata sobre os desafios da inclusão. O livro é formu-
lado em um momento de muitas dificuldades e enfrenta-
mentos para a manutenção da vida e dos direitos humanos e soci-
ais à sociedade brasileira e, principalmente, às pessoas com defici-
ência, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades
e superdotação.
A sociedade capitalista vem se reformulando de tempos em
tempos e, talvez, estejamos vivendo uma de suas piores versões,
agravada por uma crise sanitária que tem deixado todos/as ainda
mais vulneráveis. No campo da Educação Especial, políticas de in-
clusão que foram implementadas nas últimas três décadas estão
sendo colocadas à prova, deixando ainda mais difícil a tarefa de re-
fletir sobre diferentes formas de organização escolar e social, que
acolhem a diversidade.
A organizadora e os(as) autores(as) e coautores(as) assumi-
ram a responsabilidade de refletir nos doze capítulos dessa coletâ-
nea temáticas de suma importância ao debate da Educação Espe-
cial na perspectiva da Educação Inclusiva. Essas temáticas desta-
cam, em linhas gerais, os desafios da escola para inclusão desses
estudantes; as proposições de práticas e saberes necessários à efe-
tivação dessa inclusão; a discussão da inclusão nos diferentes ní-
veis, etapas e modalidade de ensino; os diferentes grupos sob a
identificação de público-alvo da Educação Especial; a formação de

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 10

profissionais da educação; a implantação e o funcionamento das


Salas de Recursos Multifuncionais no âmbito do Atendimento Edu-
cacional Especializado; as contribuições da leitura e da literatura
infantil à inclusão escolar dos estudantes da Educação Especial; e,
por fim, a polêmica discussão do fracasso escolar e das dificuldades
de aprendizagem.
Todos/as envolvidos/as nessa obra sinalizam a preocupação
de retrocessos com o declínio da política de Educação Especial na
perspectiva da inclusão ao se esforçarem na reflexão das diferen-
tes temáticas, apontando em direção às possibilidades da inclusão
escolar de estudantes da Educação Especial, sem deixar de realizar
uma avaliação responsável dos percursos já cumpridos na garantia
desse propósito, apontando em seus estudos e experiências pers-
pectivas, desafios e problematizações.
A proposta dessa coletânea, a meu ver, foi tratar de questões
que compõem a inclusão escolar de estudantes da Educação Espe-
cial sem perder de vista às questões macro que as determinam no
âmbito da sociedade capitalista. Sem perder de vista as contradi-
ções e a discussão do binômio inclusão/exclusão presente nesse
debate.
Parabenizo a todos/as pela coletânea e faço votos que os tra-
balhos reunidos nela possam contribuir para afastarmos os riscos
da segregação desses estudantes em instituições e escolas especi-
alizadas presentes na implementação de uma “nova” política de
Educação Especial. Aproveito para finalizar este prefácio com as
palavras da organizadora dessa obra que nos diz que “a nova polí-
tica representa um retrocesso (...). Traz de volta uma política supe-
rada, fracassada e institucional, esquecendo os avanços ocorridos
no processo inclusivo, recolocando recursos públicos nas institui-
ções especializadas e isolando os educandos (...)” (MARTINS, 2002,
p. 10).
SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 11

Por último, expresso minha alegria por compartilhar da lei-


tura desse livro e poder dividi-la com os/as leitores/as. Seguimos
dialogando e lutando pela manutenção e avanços dos direitos con-
quistados.

Vitória (ES), 07 de dezembro de 2020.

Profa. Dra. Sonia Lopes Victor


Universidade Federal do Espírito Santo
Centro de Educação
Departamento de Teorias do Ensino e Práticas Educacionais
Programa de Pós-Graduação em Educação

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 12

CAPÍTULO 1
A INCLUSÃO DE CRIANÇAS COM DEFICIÊNCIA
VISUAL NA EDUCAÇÃO INFANTIL:
O ATENDIMENTO EDUCACIONAL
ESPECIALIZADO E A PEDAGOGIA DA INFÂNCIA

Marilda Moraes Garcia Bruno

INTRODUÇÃO

Visão é recurso da imaginação para dar às pala-


vras novas liberdades? (Manoel de Barros
(2015, p. 59)

Este capítulo tem a intenção de trazer alguns questiona-


mentos e reflexões sobre a implementação da proposta de inclusão
de bebês e crianças pequenas com deficiência visual em creches e
pré-escolas no sistema educacional brasileiro.
Nesse sentido, não pretendemos abarcar todas as questões,
pois trata-se de uma tarefa complexa e pouca discutida na litera-
tura, nos documentos e nas diretrizes nacionais para a Educação
Especial. Particularmente, elegemos alguns aspectos da política
para a infância numa perspectiva de educação inclusiva, o papel do
Atendimento Educacional Especializado e algumas reflexões sobre
a cultura e a Pedagogia da Infância.
Em um amplo estudo realizado sobre a inclusão na Educa-
ção Infantil, Mendes (2010) levantou as produções científicas
SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 13

nessa etapa de ensino, observando que as investigações ocorriam,


em maior frequência, na área da deficiência intelectual. Pesquisa
realizada pela autora em 25 centros de Educação Infantil, sendo 12
creches, na cidade de São Carlos, apontou que das crianças identi-
ficadas (46,1%) eram considerados como “crianças de risco”, e/ou
por apresentarem dificuldades de socialização (37%) e/ou lingua-
gem (29%).
Conforme Mendes (2010, p. 67), “o referido estudo desta-
cou ainda a importância da formação de educadores para a cons-
trução de um sistema de creches inclusivas e demonstrou o desafio
que é, para a pesquisa, ir além dos discursos dos educadores e ten-
tar avaliar os efeitos dos programas de formação continuada”.
Kassar e Marcelo (2016) investigaram o Atendimento Edu-
cacional Especializado (AEE) para crianças pequenas no estado de
Mato Grosso do Sul. Os resultados indicaram a presença do AEE em
45 escolas especiais. A filantropia e o assistencialismo se desenvol-
viam dentro de “parcerias” institucionais em que se desqualificava
a educação como direito.
Diante do quadro encontrado, os autores entendem que,
“em relação à educação da criança pequena com deficiência, a po-
lítica atual ainda não conseguiu romper com a hegemonia das ins-
tituições especiais privadas no Estado de Mato Grosso do
Sul”(KASSAR; MARCELO, 2016, p. 40). Acrescentam ainda que a
quase ausência de espaços de AEE em centros de Educação Infantil,
pode ser responsável pela pequena frequência de crianças peque-
nas no setor público sul-mato-grossense (KASSAR; MARCELO,
2016).

Dados deste estudo mostram que, em Mato Grosso do Sul, preva-


lece um número maior de matrículas de crianças pequenas com
deficiências em espaços privados, principalmente em instituições
filantrópicas, se comparadas às matrículas em espaços públicos

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 14

(escolas ou Centros de Educação Infantil). Em relação ao atendi-


mento especializado público, verificamos que a maioria das crian-
ças matriculadas no ensino comum não está recebendo Atendi-
mento Educacional Especializado (AEE). Essa evidência levanta a
suspeita de que a política de Educação Inclusiva, construída a par-
tir do atendimento complementar/suplementar pelo Programa de
Salas de Recursos Multifuncionais, ou não “chegou” à EI [Educação
Infantil] ou não é adequada a essa etapa de educação (KASSAR;
MARCELO, 2016, p. 39).

As pesquisas no campo da educação para o atendimento de


bebês e crianças bem pequenas com deficiência visual em ambien-
tes coletivos são praticamente inexistentes. Publicações que abor-
dem as estratégias pedagógicas e o papel do AEE nessa primeira
etapa da Educação Básica são escassas.
A temática da oferta de Educação Infantil, incluindo as cri-
anças com deficiência, já se fazia presente na legislação brasileira
desde a Constituição Federal (1988), do Estatuto da Criança e do
Adolescente (1990), da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Na-
cional (1996) e das Diretrizes Curriculares Nacionais para a Edu-
cação Infantil (1999; 2012), cujos documentos, referenciados soci-
almente, afirmam a garantia dos direitos e a participação social de
todas as crianças.
Esses documentos já preconizavam que os sistemas de en-
sino deveriam elaborar uma proposta pedagógica própria para a
infância, respeitando as singularidades, as diferentes culturas, con-
templando as diferenças e especificidades de cada criança e do co-
letivo nos centros de Educação Infantil.
No Brasil, a atenção precoce como direito, no âmbito da
Educação Especial, surge com as Diretrizes Nacionais para a Edu-
cação Especial na Educação Básica (2001), orientando a interface
entre a educação, os serviços de saúde e assistência social para o
atendimento às necessidades educacionais de crianças com qual-
quer tipo de deficiência (BRASIL, 2001).
SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 15

A participação de crianças com deficiências em Programas


de Intervenção Educacional Precoce foi prevista na Política Nacio-
nal de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva
(2008), por meio do AEE. Mais recentemente, a Lei Brasileira de
Inclusão (2015a) assegurou esse direito, entendendo que, como as
demais crianças, estas devem usufruir das melhores oportunida-
des de aprendizagem e se tornarem membros efetivos de suas fa-
mílias, escolas e comunidades.
A Resolução CEB/CNE n. 5 de 2009 entende que o acesso, a
permanência e a participação das crianças com deficiência de zero
a três anos de idade na creche e dos 4 aos 5 anos na pré-escola são
imprescindíveis para a consolidação de um sistema educacional in-
clusivo (BRASIL, 2009b).
A formação de bebês e crianças pequenas com deficiência
visual, em creches e pré-escolas, leva-nos a refletir sobre questões
centrais para a infância: Quais as concepções de desenvolvimento
e aprendizagem fundamentam a prática pedagógica nos centros de
Educação Infantil? Como os professores lidam com as diferenças
sociais, culturais, sensoriais, intelectuais e afetivas? Qual a função
do AEE nessa etapa de ensino? Como se dá a articulação da Educa-
ção Especial em creches e pré-escolas? De que maneira organizar
a complementação e suplementação da proposta pedagógica? Qual
o papel da família no processo de inclusão das crianças pequenas?
Essas são questões instigantes sobre as quais devemos nos debru-
çar para construir alguns conhecimentos para o avanço da área.

A criança com deficiência visual e suas necessidades específi-


cas
Conforme Bruno (2006, p. 13):

As crianças com deficiência visual não são muito diferentes das ou-
tras crianças; têm as mesmas necessidades afetivas, físicas,

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 16

intelectuais, sociais e culturais. As necessidades básicas das de-


mais crianças: atenção, cuidado, relação e interação positiva, afeto
e segurança são essenciais para as crianças com deficiência visual.
Gostam de brincar, passear, conhecer pessoas e conviver com ou-
tras crianças.

A Lei Brasileira de Inclusão concebe pessoa com deficiência


como “aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza
física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com
uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efe-
tiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pes-
soas” (BRASIL, 2015a).
A deficiência visual compreende dois grupos: a cegueira e a
baixa visão. A definição educacional diz que são cegas as crianças
que não têm visão suficiente para aprender a ler em tinta, e neces-
sitam, portanto, utilizar outros sentidos (tátil, auditivo, olfativo,
gustativo e cinestésico) no seu processo de desenvolvimento e
aprendizagem. O acesso à leitura e escrita dar-se-á pelo sistema
braile (BRUNO, 2006).
No Brasil, a incidência da deficiência visual é de seis milhões
e meio, sendo seis milhões de pessoas com baixa visão e 500 mil
pessoas cegas (IBGE, 2010). Os casos de deficiência visual podem
ser minimizados com medidas preventivas na primeira infância.
Torna-se muito importante que os pais e professores observem o
comportamento visual das crianças desde a mais tenra idade: se
realizam contato visual, seguem pessoas e objetos, prestam aten-
ção em figuras, na TV, identificam objetos distantes; se piscam com
frequência, se esbarram ou tropeçam em obstáculos.
Na presença de algum sintoma ou sinal, a criança deve ser
encaminhada para o oftalmologista, pois são frequentes os erros
de refração como a hipermetropia, miopia, astigmatismo que pre-
judicam o desenvolvimento visual e as possibilidades de aprendi-
zagem das crianças. Essas alterações de refração não se constituem
SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 17

deficiência visual, pois com óculos a visão é corrigida, mas a falta


de correção poderá levar ao estrabismo e à ambliopia. A ambliopia
é corrigida totalmente até os três anos de idade e parcialmente até
os sete anos. Muitos bebês necessitam de óculos para correção dos
erros de refração o que poderá acontecer a partir dos seis meses
de idade.
As crianças com baixa visão são as que apresentam redução
significativa da função visual, utilizam o pequeno potencial visual
para explorar o ambiente, conhecer o mundo e aprender a ler e es-
crever. “Essas crianças se diferenciam muito nas suas possibilida-
des visuais. Embora necessitem aprender a utilizar a visão da me-
lhor forma possível, podem utilizar também os outros sentidos
para aprendizagem, aquisição de conceitos e construção do conhe-
cimento” (BRUNO, 2006, p. 13).
As crianças com baixa visão apresentam as mais diferentes
condições visuais. É importante que o professor saiba quais são as
possibilidades visuais, quais as necessidades específicas dessas
crianças, como e de que maneira elas podem ver melhor. “Para isso,
é necessário que a família e a escola recebam informações do oftal-
mologista especializado em baixa visão e orientação do professor
especializado acerca do funcionamento visual dessas crianças”
(BRUNO, 2006, p.14).
Conforme Bruno (2006), há crianças com baixa visão que
podem apresentar uma ou mais condições visuais:

a) Dificuldade para ver de longe – necessita aproximar-se


bastante para poder ver bem pessoas e objetos, mesmo que
utilize recursos ópticos. “Muitas crianças podem apresentar
dificuldades para encontrar objetos, descrever figuras, de-
finir detalhes, formas complexas, identificar cores, letras,

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 18

ler, escrever e desenhar como as outras crianças” (BRUNO,


2006, p. 14).
b) Campo visual restrito - pode prejudicar a percepção de
obstáculos, sua orientação e locomoção no espaço. Há cri-
anças que não enxergam para baixo e poderão ter dificul-
dade para andar, descer e subir escadas. “Outras apresen-
tam alteração no campo visual central, o que dificultará o
processo de identificação de figuras; elas poderão ver ape-
nas uma pequena parte de um objeto ou figura; a leitura
torna-se difícil e lenta” (BRUNO, 2006, p. 14).
c) Visão de cores e sensibilidade aos contrastes. Algumas
crianças podem ter dificuldades para distinguir determina-
das cores como verde, vermelho, azul, marrom; outras cri-
anças distinguem apenas cores vibrantes, com bastante lu-
minância (amarelo, laranja e verde fluorescente). Para
Bruno (2006, p. 14), “há crianças que podem ver objetos,
formas e letras com contraste (preto/branco, ama-
relo/preto, amarelo/azul, roxo/verde e laranja/verde)”.
Portanto, é importante que o professor pesquise, “junta-
mente com a família, quais as cores que despertam inte-
resse nas crianças e com as quais elas podem visualizar me-
lhor” (BRUNO, 2006, p. 14).
d) Adaptação à iluminação. De acordo com Bruno (2006, p.
14), “algumas crianças com baixa visão podem apresentar
sensibilidade exagerada à luz, que ocasiona desconforto vi-
sual, ofuscamento, irritabilidade, lacrimejamento, dor de
cabeça e nos olhos”. Para a melhoria das respostas e do con-
forto visual dessas crianças, é importante o controle dos ín-
dices de iluminação no ambiente e a utilização de lentes fil-
trantes. Há, entretanto, crianças que necessitam de muita
iluminação e luz dirigida aos objetos, figuras e livros para
que possa enxergar melhor.
SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 19

Em decorrência da deficiência sensorial, as crianças cegas e


com baixa visão apresentam necessidades específicas, caminhos e
formas peculiares de aprender e compreender o mundo. Entende-
mos necessidades específicas como aquelas decorrentes da condi-
ção de deficiência que a pessoa vivencia nas diversas situações da
vida cotidiana, no contexto familiar, escolar e comunitário
(BRUNO, 2006). Já as necessidades educacionais especiais são as
que requerem, estratégias pedagógicas para que o aluno obtenha
sucesso no ambiente escolar. Por exemplo: o sistema braile é uma
necessidade específica da pessoa cega para o acesso à leitura e es-
crita em diferentes contextos. Os recursos, os materiais adaptados,
os leitores de telas são ferramentas que possibilitam o atendi-
mento às suas necessidades educacionais especiais.
As necessidades específicas de crianças cegas e de baixa vi-
são na Educação Infantil vão além da oferta de recursos de acessi-
bilidade, estratégias e matérias didáticos adaptados às suas condi-
ções sensoriais; necessitarão de atividades de acessibilidade na co-
municação por meio da audiodescrição, atividades de orientação e
mobilidade para o desenvolvimento da autonomia e independên-
cia no contexto escolar.
As crianças com deficiência visual necessitam de mais
tempo para vivenciar e organizar suas experiências, aprender e
construir conhecimentos. Se tiverem a oportunidade de conviver
desde cedo em ambientes organizados para favorecer a construção
do vínculo, trocas afetivas e sociais favoráveis em um ambiente de
aprendizagem significativa, que atenda às suas necessidades sen-
soriais e de comunicação, não se diferenciam em inteligência em
relação às outras crianças. Conforme Bruno (2006, p. 13), “com-
preendidas essas especificidades pela família e professores, as cri-
anças com deficiência visual poderão se beneficiar e obter sucesso
na inclusão escolar e social”.

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 20

O PAPEL DO ATENDIMENTO EDUCACIONAL ESPECIALIZADO


NA EDUCAÇÃO INFANTIL

A Lei Brasileira de Inclusão entende o processo de habilita-


ção de crianças com deficiência como essencial para o desenvolvi-
mento de potencialidades, talentos, habilidades e aptidões físicas,
cognitivas, sensoriais, psicossociais, atitudinais, de forma que con-
tribua para a conquista da autonomia e de sua participação social,
em igualdade de condições e oportunidades com as demais crian-
ças (BRASIL, 2015a).
O Decreto n. 7.611, de 17 de novembro de 2011, concebe o
AEE, como o conjunto de atividades, recursos de acessibilidade e
pedagógicos organizados institucionalmente, prestado de forma
complementar ou suplementar à formação dos alunos no ensino
regular. O AEE deve integrar a proposta pedagógica da escola, en-
volver a participação da família e ser realizado em articulação com
as demais políticas públicas (BRASIL, 2011).
A Resolução n. 4 de 12 de outubro de 2009 (institui Diretri-
zes Operacionais para o AEE na Educação Básica) traz como
avanço a função do AEE de elaboração, produção e distribuição dos
recursos educacionais para a acessibilidade e ajudas técnicas que
possibilitam o acesso ao currículo (BRASIL, 2009a). No entanto, os
seus objetivos são restritos, pois, ao indicarem a centralidade das
salas de recursos multifuncionais – entendidas como “ambientes
dotados de equipamentos, mobiliários e materiais didáticos e pe-
dagógicos para a oferta do atendimento educacional especiali-
zado” (BRASIL, 2009a) –, sinalizam para uma compreensão instru-
mental da Educação Especial (BRUNO, 2010).
É importante ressaltar que a Política Nacional de Educação
Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva (2008) propõe que,
além do atendimento às necessidades específicas, as atividades de-
senvolvidas no AEE complementem e suplementem a formação
SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 21

dos alunos com vistas à autonomia e independência na escola e


fora dela (BRUNO, 2010). Torna-se, então, mais abrangente que as
diretrizes do AEE.
Quanto ao papel do professor especializado apresentado
nessas diretrizes, a prioridade deixa de ser o desenvolvimento de
todas as possibilidades humanas, a autonomia e a independência e
sim “orientar professores e famílias sobre os recursos pedagógicos
e de acessibilidade utilizados pelos alunos” e “ensinar a usar a tec-
nologia assistiva de forma a ampliar suas habilidades funcionais,
promovendo autonomia e participação” (BRASIL, 2009a). O direito
à informação e o acesso ao currículo são indiscutíveis, mas tão im-
portantes quanto estes aspectos, tornam-se: a independência, o di-
reito de ir e vir, a autonomia pessoal, moral, social e a participação
na vida cultural e comunitária.
Mais recentemente, a Nota Técnica n. 02/2015 define Ori-
entações para a Organização do Atendimento Educacional Especi-
alizado na Educação Infantil, sem, entretanto, trazer modificações
substanciais em relação à Resolução n. 04/2009, as quais serão ne-
cessárias tendo em vista tratar-se da inclusão de bebês e crianças
pequenas em creches e pré-escolas.
Essa Nota Técnica recomenda: “[...] o acesso, a permanência
e a participação das crianças com deficiência de 0 a 3 anos de idade
na creche e dos 4 aos 5 na pré-escola, são imprescindíveis para a
consolidação do sistema educacional inclusivo” (BRASIL, 2015b, p.
2). Para tanto, o documento traz como objetivos do AEE na Educa-
ção Infantil: proporcionar a acessibilidade física, pedagógica, aos
brinquedos e mobiliários; cria estratégias de acessibilidade à co-
municação e informação (BRASIL, 2015b). O foco continua sendo a
tecnologia, em detrimento ao desenvolvimento integral das crian-
ças com deficiência.

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 22

Estabelece como atribuições do professor do AEE na Educa-


ção Infantil: elaborar o plano de AEE; identificar e selecionar os re-
cursos de tecnologia assistiva necessários; produzir e adequar ma-
teriais e brinquedos; acompanhar o uso dos recursos verificando
sua funcionalidade; analisar o mobiliário; orientar professores e as
famílias quanto aos recursos de acessibilidade a serem utilizados
e o tipo de atendimento destinado à criança; articular-se com as
demais áreas setoriais, visando ao fortalecimento de uma rede de
apoio ao desenvolvimento integral da criança (BRASIL, 2015b, p.
5).
No campo da deficiência visual, Bruno (2006) tem defen-
dido, como papel do AEE na Educação Infantil, que, além do acesso
ao currículo, este atendimento tenha a função de formação hu-
mana que compreende: atividades de intervenção precoce para o
desenvolvimento integral das crianças cegas e com baixa visão de
0-3anos; dar apoio e suporte ao professor da sala comum e à famí-
lia quanto a construção de vínculos e interações positivas; oferta
de atividades lúdicas que potencialize o desenvolvimento da lin-
guagem, sensório-motor e perceptivo; otimizar a função simbólica,
a formação de conceitos e a capacidade de resolução de problemas;
proporcionar a participação ativa da criança cega e de baixa visão
com as demais crianças nas vida cultural por meio da audiodescri-
ção de histórias, filmes, teatro infantil, museus.
É também papel do professor do AEE realizar a avaliação
das funções visuais e orientar o uso funcional da visão em todas as
atividades pedagógicas e lúdicas; orientar à escola e à família
quanto as atividades de vida autônoma e de orientação e mobili-
dade, tendo em vista a independência em todos os espaços do cen-
tro de Educação Infantil (BRUNO, 2006).
Contraditoriamente, essas atividades essenciais para o de-
senvolvimento humano e aprendizagem desaparecem nessa forma
redutora de organização do AEE como sala de recursos
SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 23

multifuncionais. Torna-se importante questionar onde essas ativi-


dades serão desenvolvidas. Nos Centros Educacionais Especializa-
dos ou no reduzido espaço das salas de recursos multifuncionais?
(BRUNO, 2010).
Autores que discutem o desenvolvimento infantil na abor-
dagem sociocultural ecológica, tais como Bronfenbrenner (1996) e
Sameroff e Fiese (2000) entendem que o desenvolvimento hu-
mano depende de múltiplos sistemas: da família, das interações, do
ambiente, da cultura; sendo que esses sistemas interagem e influ-
enciam-se mutuamente. O indivíduo não pode ser considerado iso-
ladamente, pois as relações que se estabelecem entre os vários am-
bientes em que a criança vive exercem influência sobre o processo
de aprendizagem e a qualidade de vida dos pequenos.
Para esses autores, a criança se desenvolve como resultados
das interações entre os pais, cuidadores, professores e outras cri-
anças. Assim, a intervenção precoce não deve ser centrada apenas
na criança, mas no contexto familiar, escolar e no ambiente comu-
nitário. Nessa perspectiva, a avaliação realizada em conjunto com
a família, por meio de registros contínuos das observações da cri-
ança e das conversações entre pais e profissionais, seria a base
para as decisões acerca da intervenção precoce.
Nesse processo, além da observação do desenvolvimento
da criança, as formas de interação e comunicação, deve-se dar
atenção aos rituais familiares, às rotinas diárias e às brincadeiras
que refletem os padrões da vida da família; observar também os
sistemas de apoio e o nível de satisfação dos pais – esses seriam os
meios pelos quais a intervenção pedagógica seria elaborada.
Os registros servem para ajudar o professor a trabalhar
com a família; obter informações ao longo do tempo sobre a cri-
ança, tais como as interações, o perfil de desenvolvimento, as

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 24

percepções, os objetivos, as necessidades, as expectativas da famí-


lia, e informações sobre o ambiente. Esses registros devem conter
informações sobre os recursos disponíveis e sobre suportes do am-
biente.
Essa proposta de atuação do AEE para bebês e crianças pe-
quenas vem ao encontro às características das atuais políticas da
Educação Infantil, que desempenham um papel fundamental para
o atendimento integral das crianças, inclui aspectos relacionados à
educação, à saúde, à cultura e à proteção, o que torna imprescindí-
vel a interlocução com outras áreas dos serviços públicos.
Mendes (2010, p. 57) relata resultados de revisão abran-
gente das pesquisas sobre a inclusão nos Estados Unidos da Amé-
rica, realizado por Sailor (2002), cuja conclusão indica que a inclu-
são na Educação Infantil “traz benefícios nos relacionamentos so-
ciais; podendo ser viabilizada por meio de adequações curricula-
res, ensino colaborativo, envolvimento da família, participação da
comunidade, e que, além disso, é menos custosa do que os progra-
mas segregados”.
A autora complementa que:

As adaptações necessárias neste nível educacional consistem em


adequações de materiais e atividades com o intuito de favorecer a
participação de crianças com necessidades educacionais especiais
e podem ser facilmente adotadas. O ensino colaborativo, envol-
vendo professores da educação regular e especial aliada ao envol-
vimento das famílias e da comunidade, produz resultados mais po-
sitivos (MENDES, 2010, p. 57).

Articular o debate sobre o significado da inclusão das crian-


ças pequenas em estabelecimentos educacionais e suas práticas,
torna-se essencial para a transformação da cultura escolar, na qual
o suporte da Educação Especial, da família e da comunidade possa
ser efetivado. A intersetorialidade é o caminho para garantir o

SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 25

bem-estar de todos: famílias, crianças, professores e demais pro-


fissionais. Os responsáveis pela educação das crianças em espaços
coletivos têm o compromisso de problematizar e viabilizar essa in-
terlocução para poder qualificar o atendimento pedagógico e tam-
bém para contribuir na defesa dos direitos inalienáveis das crian-
ças.
Bondioli (1998), ao defender a educação precoce, destaca
que as crianças têm o direito, antes de tudo, de viverem experiên-
cias prazerosas. Nesse sentido, a inclusão de crianças com defici-
ência visual em programas pedagógicos, o mais cedo possível, pos-
sibilitará, além da optimização do potencial de aprendizagem e de
desenvolvimento, a participação em espaço lúdico coletivo e a vi-
vência de um mundo de alegria, arte, imaginação e cultura.
No aspecto pedagógico, Educação Infantil tem sido conce-
bida como espaço e tempo de formação humana, de aquisição de
experiências significativas, construção da identidade, do conheci-
mento e participação na vida cultural da comunidade como pode-
mos ver na proposta de uma Pedagogia da Infância.

A INCLUSÃO DE CRIANÇAS COM DEFICIÊNCIA VISUAL E A PE-


DAGOGIA DA INFÂNCIA

Pesquisas desenvolvidas no Brasil, como a de Amorim e


Barretos (2020), vêm apontando que a inclusão em instituições de
Educação Infantil possibilita aos bebês, possivelmente pela pri-
meira vez, a construção de uma gama variada de interações sociais
em um espaço coletivo. Na opinião das autoras, seria um equívoco
negar que as vivências compartilhadas nas instituições coletivas
de cuidado e educação – que respeitam os parâmetros de quali-
dade e valorizam as infâncias em sua potência possam ampliar o

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 26

processo de desenvolvimento dos bebês e demais crianças (AMO-


RIM; BARRETOS, 2020).
Ampla revisão da literatura sobre a inclusão de crianças
com necessidades educacionais na Educação Infantil revela que
ocorrem aprendizagem e desenvolvimento por meio da participa-
ção em ambientes mais desenvolvidos.

Ambientes inclusivos podem favorecer o desenvolvimento das cri-


anças por oferecer um meio mais estimulador (cognitivamente, so-
cialmente e linguisticamente) do que ambientes segregados. Os es-
tudos indicam ainda que, com suporte necessário e apropriado, as
crianças pequenas com necessidades educacionais especiais po-
dem adquirir habilidades complexas e participar com sucesso de
ambientes inclusivos (MENDES, 2010, p. 58).

O que temos discutido para a inclusão de crianças com defi-


ciência nos centros de Educação Infantil é o grande desafio que se
impõe: a construção de propostas pedagógicas que levem em con-
sideração as demandas da infância e as necessidades específicas
dessa população. Haja vista a criança com deficiência visual como
as demais crianças são sujeitos ativos, com experiências sociais e
culturais diversas que as possibilitam agir e compreender o mundo
a partir de contextos que atendam às suas singularidades e das
oportunidades de aprendizagem que lhes são ofertadas desde a
mais tenra idade.
O que diferencia uma criança cega ou com baixa visão são
as singularidades e necessidades específicas decorrentes da situa-
ção de ausência total ou parcial de visão que as constituem, que
implicarão em um novo olhar dos professores e cuidadores sobre
as formas de interagir, de se relacionar e de se comunicar com es-
ses pequenos.
Há ainda a necessidade de mudança da cultura escolar so-
bre a percepção das pessoas com deficiência, que deixa de ser so-
bre as incapacidades ou dificuldades e passa a focar as
SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 27

possibilidades: o que gostam de fazer, quais as preferências, as


brincadeiras que já sabem; como se comunicam, se gostam de es-
cutar, cantar ou ouvir estórias; quais as experiências e significados
construídos.
A criança, antes de tomar consciência de si, necessita do ou-
tro. É na relação e interação com as pessoas de sua família, com
educadores, meninos e meninas na escola e com o mundo que a
cerca que ela desenvolve suas possibilidades e se estrutura como
pessoa. A interação social depende da forma como a criança é re-
cebida, acolhida, observada, ouvida e compreendida em suas ne-
cessidades. Essa forma de relação e comunicação influencia o de-
senvolvimento afetivo e as relações interpessoais, determina a ma-
neira como a criança vai interagir com as pessoas, objetos e o meio
em que vive.
As crianças com deficiência visual necessitam, nos primei-
ros anos de vida, encontrar pessoas desejosas de interagir e se co-
municar com elas. Os pais, educadores e cuidadores devem estar
atentos às manifestações de intenção comunicativa, os pequenos
gestos aos quais devem interpretar e reagir mediante o toque e a
confirmação verbal (BRUNO, 1992; 2006).
De acordo com Bruno (2006, p. 15),

Os professores das creches e pré-escolas podem aprender com os


pais os meios que encontraram e quais os códigos que estabelece-
ram para se comunicar com suas crianças. Os pais, geralmente, são
bons conhecedores de seus filhos, compreendem suas necessida-
des, seus desejos e interesses. Sabem sobre as brincadeiras, obje-
tos e situações que lhes proporcionam alegria, satisfação e despra-
zer.
O diálogo contínuo e a participação da família no projeto educaci-
onal são fatores preponderantes para o atendimento às necessida-
des específicas e o sucesso na inclusão das crianças com deficiên-
cia visual em creches e pré-escolas.

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 28

Quando uma criança com deficiência visual chega pela primeira


vez a um centro de Educação Infantil, a comunidade escolar sente-
se insegura quanto às atitudes adequadas e positivas frente à defi-
ciência visual. É importante que os profissionais que trabalham na
escola e os professores levem em conta que inclusão significa tam-
bém postura e atitude positiva na interação com essas crianças.

Como temos defendido, os bebês e crianças pequenas ne-


cessitam de pais e educadores dispostos a acolherem suas necessi-
dades, interagir, relacionar-se de forma positiva e principalmente,
compreenderem suas diferentes formas de comunicação e serem
responsivos a elas. As práticas educativas devem estar focadas nas
experiências cotidianas, nos significados construídos, na cultura
familiar e, principalmente, nas possibilidades da criança e nos pro-
cessos de aprendizagem em espaço coletivo (BRUNO, 2006).
A Resolução CEB/CNE n. 5 de 17 de dezembro de 2009 con-
cebe a criança como o centro da proposta pedagógica, pois nas suas
interações, relações e práticas cotidianas vivenciadas, constrói-se
continuadamente, brinca, imagina, aprende, observa, experimenta,
questiona e estabelece sentidos sobre a natureza e a sociedade e
produz cultura (BRASIL, 2009b).
Outra questão que precisamos problematizar, além dessa
Pedagogia própria para a Infância, será como criar uma cultura in-
clusiva na Educação Infantil? Qual é o lugar da criança? Qual o pa-
pel dos professores e da família? Como eliminar as barreiras ati-
tudinais, físicas e de comunicação? Como organizar práticas peda-
gógicas que dêem conta das especificidades da criança com defici-
ência visual no coletivo de creches e pré-escolas?
Nessa perspectiva de cultura inclusiva, as crianças têm par-
ticipação ativa, são colocadas no centro da ação pedagógica, são
acolhidas em escuta empática, são cuidadas nas suas necessidades
básicas de sobrevivência e bem-estar; estimuladas no seu desen-
volvimento integral: interações afetivas, linguagem significativa,
SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 29

experiências sensório-motoras, brincadeiras de faz de conta, jogos


e atividades que favoreçam o pensar e a resolução de problemas.
Essa função social de educar e cuidar das creches e pré-es-
colas precisa ser compartilhada com as famílias, que, por sua vez,
também necessitam de escuta empática de comunicar suas dife-
rentes culturas, desejos, expectativas e dúvidas. As famílias parti-
cipam como colaboradores do processo de desenvolvimento e
aprendizagem de suas crianças trocam pontos de vista e o conhe-
cimento sobre as possibilidades, dificuldades e necessidades espe-
cíficas dos bebês e crianças pequenas.
A função da Educação Infantil nas sociedades contemporâ-
neas é a de possibilitar a vida em comunidade, aprendendo a aco-
lher a diversidade dos demais, “a sair da percepção exclusiva do
seu universo pessoal, assim como a ver o mundo a partir do olhar
do outro e da compreensão de outros mundos sociais” (BARBOSA,
2009, p.12). Isso implica em uma profunda aprendizagem das prá-
ticas sociais e culturais “que se aprendem através do conheci-
mento de outras culturas, das narrativas tradicionais e contempo-
râneas que possam contar sobre a vida humana por meio da litera-
tura, da música, da pintura, da dança” (BARBOSA, 2009, p.12).
Atualmente, os estabelecimentos de educação infantil ocu-
pam “importante lugar como produtores e divulgadores de uma
cultura de defesa da infância, ou seja, possuem o compromisso po-
lítico e social de garantir as especificidades das infâncias na socie-
dade contemporâneas” (BARBOSA, 2009, p. 22-23). Isso porque
“as crianças, nas suas diferenças e diversidades, são completas,
pois têm um corpo capaz de sentir, pensar, emocionar-se, imagi-
nar, transformar, inventar, criar, dialogar: um corpo produtor de
história e cultura” (BARBOSA, 2009, p. 23). Isto implica compreen-
der que, brincando, são capazes de agirem incorporando elemen-
tos do mundo no qual vivem; “essas ações e interações, geralmente

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 30

lúdicas, são denominadas de culturas infantis e são transmitidas


através de gerações de crianças” (BARBOSA, 2009, p. 24).

O objetivo da educação infantil, do ponto de vista do conhecimento


e da aprendizagem, é o de favorecer experiências que permitam às
crianças a apropriação e a imersão em sua sociedade, através das
práticas sociais de sua cultura, das linguagens que essa cultura
produz, e produziu, para construir, expressar e comunicar signifi-
cados e sentidos (BARBOSA 2009, p. 47-48).

Nessa direção, talvez tenhamos que “focar o currículo nas


crianças e em suas relações e concebê-lo como construção, articu-
lação e produção de aprendizagens que acontecem no encontro en-
tre os sujeitos e a cultura” (BARBOSA, 2009, p. 50). Assim:

[...] o currículo acontece na participação das crianças nos proces-


sos educacionais, que envolvem os momentos de cuidado físico, a
hora de contar e ouvir histórias, as brincadeiras no pátio ou na
sala, a hora de cantar e de garatujar, ou seja, ele está continua-
mente em ação. O professor observa e compreende, na ação, o pen-
samento se configurando, e ele não se restringe a transmitir uma
informação, mas propõe desafiar a criança a continuar pensando
(BARBOSA, 2009, p. 50).

A criança cega ou com baixa visão não necessita de um cur-


rículo diferenciado, ela necessita da adequação das atividades e de
adaptações dos recursos pedagógicos a sua condição sensorial.
Além dessa proposta pedagógica vivenciada junto com os demais
colegas em sala de aula, ela necessitará da complementação curri-
cular: as atividades de vida autônoma, orientação e mobilidade, o
ensino do braile e do sorobã adaptado. Esses conteúdos devem es-
tar disponíveis desde os quatro anos na Educação Infantil para que
as crianças com deficiência visual possam usufruir das mesmas
oportunidades de aprendizagem em sala de aula.

SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 31

Já as estratégias de audiodescrição como recurso de acessi-


bilidade à informação e comunicação precisa ser utilizada pelo
professor na sala de aula: narrar e descrever objetos, pessoas, ima-
gens, eventos, balões, gráficos, como forma de garantir a participa-
ção da criança com deficiência visual em todas as atividades como
contar histórias, leitura de imagens, brincadeiras e jogos.
De forma semelhante, a criança com deficiência visual deve
usufruirde toda a tecnologia disponível na Educação Infantil: com-
putadores, tabletes e celular para os quais há leitores de tela sim-
ples e gratuitos como o Dosvox, entre outros.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

É indiscutível o avanço das diretrizes políticas e propostas


pedagógicas para a Educação da Infância no Brasil nesta última dé-
cada. No entanto, observa-se uma política de investimento e ex-
pansão do atendimento na pré-escola, e escassos investimentos
para a expansão com qualidade do atendimento em creches, como
também do AEE nessa etapa da Educação Básica.
A promoção dos direitos das crianças à educação e à infân-
cia começa a ser efetivada desde a defesa de princípios como opor-
tunidades iguais, inclusão com qualidade, apoio e suporte do AEE
e a qualidade no atendimento com a proposta pedagógica para a
infância, enquanto promotores dos direitos humanos, especial-
mente os dos bebês e das crianças pequenas.
Como vimos, os desafios para a implementação da política e
da prática de Educação Especial para a inclusão com qualidade das
crianças com deficiência visual na Educação Infantil passam por
revisão conceitual da própria função da Educação Especial como
também da adoção de novas formas de atendimento. Qual seja:
para além da instrumentalização e redução da Educação Especial à

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 32

tecnologia, priorizar o desenvolvimento integral e a formação hu-


mana em creches e pré-escolas.
Nesse sentido, urge ações que contemplem a formação de
professores do AEE para atuação na Educação Infantil; apoio e su-
porte às famílias e participação das mesmas na elaboração e avali-
ação do Plano de Atendimento Educacional Especializado; adoção
de medidas do ensino ou consultoria colaborativa para possibilitar
a atuação conjunta entre o professor especializado e o professor
da sala comum.
Por fim, torna-se necessária a ampliação de pesquisas sobre
a inclusão de crianças com deficiência visual em creches e pré-es-
colas, principalmente as que aprofundem a compreensão da rela-
ção bebê-professores-família, o que implicaria na adequada forma-
ção inicial e continuada das professoras de creches e de crianças
pequenas na pré-escola.

REFERÊNCIAS

AMORIM, K. S.; BARRETO, M. R. Continuando o debate sobre o cuidado e a edu-


cação de crianças nos primeiros anos de vida. Teoria e Prática da Educação,
v. 23, n. 1, p. 22-35, jan./abr. 2020. Doi:
https://doi.org/10.4025/tpe.v23i1.49985.

BARBOSA, M. C. S. Práticas cotidianas na educação infantil: bases para a re-


flexão sobre as orientações curriculares. Brasília, DF: MEC/UFRGS, 2009.

BARROS, Manoel. Menino do mato. Rio de Janeiro: Objetiva, 2015.

BONDIOLI, A. Manual de educação infantil de 0 a 3 anos. Porto Alegre: Ar-


tmed, 1998.

BRASIL. Resolução CNE/CEB n. 2, de 11 de setembro de 2001. Institui Dire-


trizes Nacionais da Educação Especial na Educação Básica. Brasília, DF:
MEC/CNE, 2001.

SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 33

BRASIL. Política Nacional de Educação Especial na perspectiva da educa-


ção inclusiva. Brasília: MEC/SEESP, 2008.

BRASIL. Resolução CNE/CEB n. 4, de 2 de outubro de 2009. Institui Diretri-


zes Operacionais para o Atendimento Educacional Especializado na Educação
Básica, Modalidade Educação Especial. Brasília: MEC/CNE/CEB, 2009a.

BRASIL. Resolução CNE/CBE n. 5, de 17 de dezembro de 2009. Fixa as Dire-


trizes Curriculares para a Educação Infantil. Brasília: MEC/CNE/CEB, 2009b.

BRASIL. Decreto n. 7.611 de 17 de novembro de 2011. Dispõe sobre a edu-


cação especial, o atendimento educacional especializado e dá outras providên-
cias. Brasília: Presidência da República, 2011.

BRASIL. Lei n. 13.146 de 6 de julho de 2015. Institui a Lei Brasileira de Inclu-


são da Pessoa com Deficiência (Estatuto da Pessoa com Deficiência). Brasília:
Presidência da República, 2015a.

BRASIL. Nota Técnica Conjunta n. 02/2015. Orientações para a organização


e oferta do Atendimento Educacional Especializado na Educação Infantil. Brasí-
lia, DF: MEC/SECADI/DPEE, 2015b.

BRONFENBRENNER, U. A ecologia do desenvolvimento humano. Porto Ale-


gre: Artes Médicas, 1996.

BRUNO, M. M. G. O desenvolvimento integral do portador de deficiência vi-


sual: da intervenção precoce à integração escolar. São Paulo: Loyola,1992.

BRUNO, M. M. G.Educação infantil: Saberes e Práticas da Inclusão. Dificuldade


de comunicação e sinalização. Deficiência Visual. 4. ed. Brasília: MEC/SEESP,
2006.

BRUNO, M. M. G. A política pública de educação especial na perspectiva da edu-


cação inclusiva: algumas reflexões sobre as práticas discursivas e não discursi-
vas. In: ANPED, 33ª Reunião, Caxambu/MG, 2010.

IBGE. Censo demográfico 2010. Disponível em: <


https://censo2010.ibge.gov.br/>. Acesso em 05 ago. 2020.

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 34

KASSAR, M.C.M; MARCELO, R. M. O atendimento educacional especializado a


crianças pequenas com deficiência: o caso de Mato Grosso do Sul. Comunica-
ções, Piracicaba v. 23 n.3, Número Especial, 2016. DOI:
http://dx.doi.org/10.15600/2238-121X.

MENDES, E. G. Inclusão marco zero: começando pelas creches. Araraquara,


SP: Junqueira &Marin, 2010.

SAMEROFF, A; FIESE, B. H. The developmental ecology of early interven-


tion. Cambridge University, 2000.

SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 35

CAPÍTULO 2
ESTUDANTES COM DEFICIÊNCIA VISUAL E
SURDOCEGUEIRA NA REDE MUNICIPAL DE
ENSINO DE NATAL/RN

Luzia Guacira dos Santos Silva

INTRODUÇÃO

No Brasil, a partir da década de 1990, estudantes com defici-


ência visual – cegueira e baixa visão e com surdocegueira, assim
como outros estudantes, que já faziam parte da modalidade de en-
sino Educação Especial tiveram, por força da Lei, as portas de es-
colas regulares abertas para a aprendizagem, em salas de aula co-
mum, junto àqueles com visão normal. O que têm sido um desafio
para muitos educadores, que não tiveram em sua formação inicial
o acesso aos conhecimentos e saberes específicos que subsidias-
sem a sua prática pedagógica, de forma a possibilitar respostas e
soluções para as situações com as quais se defrontam cotidiana-
mente no contexto escolar.
Desafio, também, para as instituições formadoras e órgãos
centrais responsáveis pela educação de estados e municípios, que
têm como uma de suas responsabilidades ofertar formação conti-
nuada aos seus professores. Formação essa, atrelada a medidas
que possam minimizar as dificuldades da pratica docentes, muitas
vezes decorrentes, em concordância com Gadotti (2011), da

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 36

exaustão provocada pelo aumento da quantidade de trabalho e


pela despersonalização advinda da baixa valorização social e redu-
zida realização pessoal e profissional.
Compreendendo a importância da formação continuada
como vetor de retroalimentação de saberes e provocadora de mu-
danças no fazer pedagógico, desenvolvemos em 2019-2020 uma
pesquisa em torno do processo educacional de pessoas com defici-
ência visual – cegueira e baixa visão, e com surdocegueira, na rede
pública de ensino do estado do Rio Grande do Norte. O que resul-
tou numa obra publicada em E-book, ao dispor dos leitores, gratui-
tamente, no site da editora Ideia. O objetivo deste capítulo, no en-
tanto, no entanto é o de apresentar resultados da pesquisa reali-
zada, apontando dados da história e realidade da escolarização de
tais estudantes, no contexto da rede pública de ensino do municí-
pio de Natal1, capital do Rio Grande do Norte2, a partir dos docu-
mentos legais que circunscrevem as políticas de educação desse
município, de dados advindos de entrevistas e de outras fontes.

1
Natal, capital do estado de Rio Grande do Norte, se encontra na extremidade nor-
deste do Brasil. Tem uma área de 169,3 km². Está dividida em quatro regiões admi-
nistrativas ou zonas: Norte, Sul, Leste e Oeste. Juntas, as quatro regiões administra-
tivas se dividem em um total de 36 bairros. A população do município de Natal, se-
gundo o IBGE (2020) é de 890.480 habitantes, em sua maioria descendente, princi-
palmente, de indígenas, africanos e portugueses. Quem nasce em Natal é “Nata-
lense”.

2
O Rio Grande do Norte se encontra localizado na extremidade do nordeste do Bra-
sil. Está dividido em 167 municípios e tem uma área total de 52 811,126 km². Sua
população está estimada em torno de 3.534.165 de habitantes, segundo o Instituto Bra-
sileiro de Geografia e Estatística (IBGE, 2020). Quem nasce no RN é “norteriograndense”
ou “Potiguar”.
SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 37

DA PESQUISA E DOS CONCEITOS

Para nós, que consideramos a pesquisa como um meio de fa-


vorecimento de compreensão do mundo, de mudança de conceitos,
de práticas e de atitudes pessoais e pedagógicas, foi de fundamen-
tal importância procurar conhecer, para bem compartilhar, sobre
como o sistema de ensino público estadual do Rio Grande do Norte,
assim como do município de sua capital – Natal, estão promovendo
o acesso e garantindo a permanência de uma parcela dos estudan-
tes - aqueles com deficiência visual e surdocegueira –, tomando
como base o modelo de escola inclusiva. O que justificamos por
quatro razões:
a) Primeira razão: pelo direito de Todos à educação se encon-
trar assegurado pela Constituição Federal (1988), no Art. 205, e ra-
tificado na Constituição do Estado do Rio Grande Norte, de 03 de
outubro de 1989, no Art. 134: “A educação, direito de todos e dever
do Estado e da família, é promovida e incentivada com a colabora-
ção da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa,
seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o
trabalho”;
b) Segunda razão: pelo respaldo de cursos de extensão uni-
versitária, que coordenamos como consequência de pesquisas que
realizamos (SILVA, 2008; 2014; 2017), na área da educação de pes-
soas com deficiência visual. Por exemplo, os cursos desenvolvidos
em 2017 e 2018, respectivamente: “A criança com deficiência vi-
sual nos espaços do brincar, cantar e contar: corpos em movi-
mento” e “Tenho alunos com deficiência visual. E agora, o que fa-
zer?”, cujas avaliações apontaram, entre outros aspectos, para a
necessidade de se conhecer mais detalhadamente sobre aspectos
inerentes aos processos de ensino e aprendizagem do público

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 38

sobre o qual tais cursos chamam à visibilidade nos espaços escola-


res onde se encontram matriculados;
c) Terceira razão: pela carência de pesquisas e de ações afir-
mativas no processo de escolarização que envolvam tais estudan-
tes, assim como pelo despreparo de muitos dos profissionais, já
confirmado em pesquisas realizadas por Silva (2008; 2014; 2017),
Bedaque (2012; 2014), Severo (2012), Silva e Silva (2019), em
atender estudantes com cegueira, baixa visão e surdocegueira que,
anual e paulatinamente, se inserem nos diferentes níveis e moda-
lidades de ensino; e
d) Quarta razão: por encontrar respaldo, na meta 3 do Plano
Estadual de Educação do Rio Grande do Norte (2015-2025), Meta
3 - Estratégia 21: “Incentivar e apoiar a produção de pesquisas
no âmbito da educação inclusiva, assim como promover a di-
vulgação dos resultados em especial daqueles voltados para o
desenvolvimento de tecnologias inovadoras que assegurem à
aprendizagem dos estudantes”. (Grifos nossos)
Tais prerrogativas nos deram a possibilidade de desenvolver
a pesquisa3, intitulada: “Retratos de escolarização: pessoas cegas,
surdocegas e com baixa visão no estado do Rio Grande do Norte”
(2020)4, de abordagem qualitativa e quantitativa do tipo explora-
tória, utilizando os recursos da pesquisa bibliográfica em literatura
específica e em documentos relativos à Educação e à Educação Es-
pecial do Estado e de sua capital, tais como: resoluções, portarias,

3
Em decorrência da Pandemia da Covid-19, não foi possível a realização da pesquisa
em seu desenho original, que previa a ida a escolas da redemunicipal, com registro
dematrícula de estudantes com deficiência visual e surdocegueira para entrevistar
os professores.

4
Pesquisa: “Retratos de escolarização: pessoas cegas, surdocegas e com baixa visão
no estado do Rio Grande do Norte” aprovada pelo Conselho de Ética da UFRN –
CAEE - 27523019.3.0000.5292. Ano: 2020.
SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 39

decretos, boletins informativos e estatísticos e referenciais curri-


culares.
A busca e a construção dos dados ainda se deram, por meio
de informações recolhidas em sites de instituições especializadas
nacional, regional e local, e concedidas por membros das equipes
dos setores responsáveis, nas secretarias de educação, pela Educa-
ção Especial do Estado e do município de Natal/RN, por meio de
entrevistas on line e/ou questionário, enviado via e-mail, com as
três questões:
a) Como é realizada a formação de professores na área da defi-
ciência sensorial – cegueira, baixa visão e surdocegueira nas
escolas da rede?
b) Quais os cursos, em 2019 e/ou anos anteriores, foram ofere-
cidos pela equipe central de Educação Especial na área da
deficiência sensorial – cegueira, baixa visão e surdoce-
gueira?
c) Quantos professores da rede municipal/estadual foram con-
templados com formação na área da deficiência sensorial –
cegueira, baixa visão e surdocegueira em 2019 e/ou anos
anteriores?

Dessa forma, por meios de dados quantitativos e qualitativos,


buscamos configurar a realidade da escolarização de estudantes
com cegueira, baixa visão e surdocegueira, presentes nas redes de
ensino pública estadual e municipal do RN, em tempos em que os
princípios da escola inclusiva e democrática no país carecem ser
fortemente afirmados.
Para fins da pesquisa empreendida e dos registros expostos
neste capítulo, consideramos como deficiência visual, para fins
educacionais, toda perda total ou parcial, congênita ou adquirida
da visão, que varia de acordo com o campo de visão e a acuidade

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 40

visual. Dentro da classificação da deficiência visual se encontram a


cegueira e a baixa visão, assim definidas:

Cegueira - [...] alteração grave ou total de uma ou mais das funções


elementares da visão que afeta de modo irremediável a capacidade
de perceber cor, tamanho, distância, forma, posição ou movimento
em um campo mais ou menos abrangente (SÁ, CAMPOS e SILVA,
2007, p. 15)

A baixa visão, também conhecida como ambliopia, visão sub-


normal e visão reduzida é a

[...] alteração significativa da capacidade funcional, decorrente de


fatores isolados ou associados, tais como: baixa acuidade visual
significativa, redução importante do campo visual, alterações para
visão de cores e sensibilidade aos contrastes, que interferem ou li-
mitam o desempenho visual” (SÁ, CAMPOS e SILVA, 2007, p. 16).

A surdocegueira5, por sua vez, que está dentro da classifica-


ção de deficiências sensoriais múltiplas, caracteriza-se como uma
deficiência singular que apresenta perdas auditivas e visuais con-
gênitas e/ou adquiridas, em diferentes graus, levando a pessoa
surdocega a desenvolver várias formas de comunicação, como:

5
A surdocegueira é causada por doenças contraídas na gravidez, como rubéola, to-
xoplasmose e citomegalovírus. “Síndromes como a de Usher (degeneração da retina
em função de retinose pigmentar) também são a causa. Nesse caso, a origem é ge-
nética, ou seja, nasce-se com a síndrome que se manifesta na infância ou mais tarde.
Muitas pessoas nascidas surdas podem ser portadoras da síndrome de Usher e apre-
sentar perda gradativa da visão na adolescência ou maturidade. A retinose pigmen-
tar, que gera perda visual progressiva, também pode estar associada a outras sín-
dromes, mas a mais conhecida é a de Usher. Abuso de álcool e drogas por parte da
gestante, caxumba, meningite, acidente vascular cerebral (AVC), sífilis congênita,
herpes, aids e hidrocefalia, entre outros, também podem causar surdocegueira”
(Sem luz e sem som: vencendo a barreira do isolamento. In: http://www.ame-
sp.org.br/noticias/jornal/novas/tejornal14.shtml)

SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 41

Tadoma6, Libras Tátil, Sistema de Escrita Braille, Alfabeto Dactilo-


lógico, para entender e interagir com as pessoas e o meio ambiente
(CAMBRUZZI e COSTA, 2016; COSTA e RANGNI, 2015; ALVARÉZ
REYS, 2004; MAIA, 2005) e ter acesso ao conhecimento acumulado
pela humanidade.
É importante frisar que a condição de surdocegueira, devido
ao comprometimento simultâneo da audição e da visão, pode tra-
zer prejuízos ao desenvolvimento, à aprendizagem, à comunicação
e à socialização, principalmente nos casos da perda total dos dois
sentidos. Porém, a aprendizagem escolar, por meio de recursos de
tecnologia assistiva (CCTV7, Tellethouch8)e de formas específicas
de comunicação, como as já citadas anteriormente, tem favorecido
e alargado as possibilidades de desenvolvimento, aprendizagem e
de participação social por pessoas surdocegas.
Feitas essas considerações, sigamos com os dados encontra-
dos sobre a escolarização de estudantes com deficiência visual e
surdocegueira, na rede municipal de ensino de Natal/RN. Assim
como, os caminhos para aquisição de saberes específicos, que pro-
fessores e professoras tiveram nesse campo, com vistas a

6
Tadoma, método criado por Shophia Alcom, também chamado de "leitura labial
tátil”. Sendo conhecedor da língua oral, a pessoa surdocega coloca uma das mãos
na face do interlocutor próxima à boca para então fazer a “leitura” da articulação
das palavras e sentir também a vibração dos sons. (BRASIL, 2006)
7
CCTV é um ampliador de imagens que visa auxiliar a pessoa que tem um resíduo
visual muito pobre a ler e escrever, o CCTV amplia em até sessenta vezes o tamanho
da figura. (BRASIL, 2006)

8
Tellethouch: É um aparelho com teclado de máquina braille e de máquina de dati-
lografia. Os dois levantam na parte de trás do aparelho uma pequena chapa de me-
tal, a cela braille, uma letra de cada vez. Ao interlocutor do surdocego basta saber
ler para pressionar as teclas da máquina comum da tellethouch como se estivesse
redigindo um texto escrito qualquer. (BRASIL, 2006)

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 42

promoverem um ensino acessível e equitativo para tais estudan-


tes, que ingressaram no sistema público de ensino municipal.

A REDE MUNICIPAL DE ENSINO DE NATAL/RN NA ESCOLARI-


ZAÇÃO DE ESTUDANTES COM DEFICIENCIA VISUAL E SURDO-
CEGUEIRA

A secretaria Municipal de Educação de Natal/RN tem como


uma de suas atribuições “assegurar às crianças, jovens e adultos,
no âmbito do sistema educacional do Município, as condições ne-
cessárias de acesso, permanência e sucesso escolar”. Faz parte
desse universo crianças, jovens e adultos em condição de deficiên-
cia, transtornos globais de desenvolvimento, altas habilidades/su-
perdotação9, que desde a década de 1990, com a promulgação da
Lei Orgânica do Município de Natal, de 3 de abril de 1990, têm seu
direito à educação escolar assegurado não apenas em relação ao
acesso, mas sobretudo, à permanência com gratuidade e ao aten-
dimento educacional especializado na escola comum nos termos
da Lei, em seu capítulo VII – DA EDUCAÇÃO:

Art. 154 - O sistema de ensino do Município, observadas as diretri-


zes e bases da educação nacional e as disposições suplementares
da legislação estadual, compreende, em caráter de obrigatorie-
dade e de gratuidade:

III - atendimento educacional especializado aos portadores de de-


ficiência física, mental ou sensorial, através da rede regular de en-
sino municipal.

Art. 165 - É assegurada aos deficientes matrícula na rede munici-


pal, na escola mais próxima de sua residência em turmas comuns,

9
Público-alvo da Educação Especial da atualidade, conforme Lei de Diretrizes e Bases
da Educação Nacional (1996).
SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 43

ou, quando especiais, conforme critérios determinados para o tipo


de deficiência.

Nos anos de 1993 e 1994, foi elaborada e implantada, respectiva-


mente, a Proposta de Ensino Especial, inicialmente aplicada em 10
escolas da rede municipal de ensino. Essa proposta de acordo com
os registros de Silva (2006, p. 8) tinha como objetivo a:

Promoção e desenvolvimento de programas que contemplem a in-


serção do aluno portador de deficiência (Sic) no contexto regular
de ensino, de modo a garantir sua integração através de situações
educacionais que o tornem capaz de se autoconstruir mental, afe-
tiva e socialmente, tendo respeitados os seus direitos de produzir
e exprimir ideias, desejos e sentimentos.

Tal proposta, portanto, destinava-se, exclusivamente, à defi-


nição de diretrizes norteadoras da denominada Política de Educa-
ção Especial do Município. Política esta, afirmada pela Resolução
Nº 001/1996, que fixa normas relativas à educação de alunos com
“deficiência mental, física, sensorial e múltipla”, considerando a
Constituição Federal (1988); a Lei n. 8.069/1990, que dispõe sobre
o Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA; a Lei Federal Nº
7.853/1998, que dispõe sobre o apoio à interação social e assegura
o pleno exercício dos direitos individuais a pessoas com deficiên-
cia; a Lei Nº 10.172/2001, que aprova o Plano Nacional de Educa-
ção, o qual contempla 27 objetivos e metas para a Educação Espe-
cial, entre outros documentos, assim como a pressão social e os
avanços nos estudos e pesquisas realizados em torno do desenvol-
vimento humano e da aprendizagem dessa parcela da população.
No Plano Municipal de Educação de Natal, para o período de
2003-2012, baseado no Plano Nacional de Educação – PNE, na aná-
lise situacional do ensino municipal de Natal e nos resultados das
discussões realizadas com a participação de representantes de en-
tidades civis, políticas e educacionais, foram definidas quatro

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 44

grandes metas: Universalização da Educação Infantil e do Ensino


Fundamental; Melhoria da qualidade de ensino; Ampliação e me-
lhoria da rede física e Valorização Profissional. Também foram de-
finidas prioridades e estabelecidas metas de curto, médio e longo
prazo, por níveis e modalidades de Ensino: Educação Infantil; En-
sino Fundamental; Educação de Jovens e Adultos e Educação Espe-
cial.
Na meta 10, dessa última modalidade de ensino, já pensada
na perspectiva da escolarização dos educandos com deficiência em
sala de aula comum com os demais estudantes, encontramos refe-
rência àqueles com deficiência visual no que tange ao forneci-
mento, em cinco anos, “[...] de material didático específico e auxílio
óptico para os portadores10 de necessidades educativas especi-
ais”11 [Sic.] (p. 10). Grifo nosso.
Silva (2006, p. 38-39) afirma que após a regulamentação das
normas contidas na Resolução Nº 001/1996 “[...] houve um signi-
ficativo aumento de matrícula nas escolas da rede municipal de en-
sino de Natal/RN”, que contava, no ano de 2003, com 433

10
O termo “portador de (deficiência)” tornou-se bastante popular, acentuadamente
entre 1986 e 1996. Após debate mundial, os termos “pessoa com deficiência” e
“pessoas com deficiência” foram aprovados e são utilizados no texto da Convenção
sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, aprovada em 13/12/2006, pela As-
sembléia Geral da ONU (SASSAKI, 1999). Essa Convenção foi ratificada no Brasil em
julho de 2008, no documento da Política de Educação Especial na perspectiva da
Educação Inclusiva.

11
O termo “necessidades educativas especiais”, segundo Sassaki (1999)é incorreto,
uma vez que a palavra “educativo” significa algo que educa enquanto que “necessi-
dades” não educam. Assim que o termo correto seria “necessidades educacionais
especiais”, ou seja, aquilo que são concernentes à educação. O termo “necessidades
educacionais especiais”, originário do Relatório de Warnock (1978), foi adotado
pelo Conselho Nacional de Educação / Câmara de Educação Básica (Resolução nº 2,
de 11/9/2001, com base no Parecer CNE/CEB nº 17/2001, homologado pelo MEC
em 15/8/2001).

SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 45

estudantes com deficiência atendidos em vinte e uma (21) escolas,


das setenta e duas (72) existentes. Dentre esse número de matrí-
culas, oito (08) estudantes foram registrados com deficiência vi-
sual – baixa visão.
No ano seguinte, 2004, o número de estudantes com defici-
ência caiu para 432 e o número de estudantes com deficiência vi-
sual subiu para dezesseis (16), no Ensino Fundamental (13) e na
Educação de Jovens e Adultos – EJA (03). Não há nos registros, dos
dois anos, nenhum estudante com cegueira. Estes, geralmente,
eram atendidos no Instituto de Cegos do Rio Grande do Norte até
o 4º ano do Ensino Fundamental. A partir do 5º ano eram encami-
nhados para uma escola comum da rede estadual de ensino nas
proximidades do Instituto, com apoio de professores itinerantes
da secretaria municipal de educação. (SILVA, 2006)
Em 2008, a Secretaria Municipal de Educação reedita e lança,
com base nos preceitos do paradigma da Inclusão, os “Referenciais
Curriculares para a Educação Infantil e Ensino Fundamental - Edu-
cação Especial”, para os nominados “alunos com necessidades edu-
cacionais especiais”, com o objetivo e função de

promover a inclusão educacional desse contingente da população


escolar – com extensão social – o documento configura-se como
um suporte para a melhoria de qualidade no ensino e na aprendi-
zagem, assim possibilitando a acessibilidade desses alunos aos sa-
beres e fazeres, no conjunto das práticas sociais às quais são ex-
postos. (NATAL, 2008, p.8)

Outro objetivo a que se prestam os Referenciais Curriculares


é o de: “esclarecer possíveis dúvidas acerca do processo de inclu-
são, bem como subsidiar sua [dos professores] prática pedagógica,
na perspectiva de contribuir para a superação das dificuldades en-
contradas em sala de aula e por extensão em toda a escola” (p.9). A

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 46

inclusão, por sua vez, é compreendida como um processo para “en-


tender e admitir a heterogeneidade, enquanto uma oportunidade
para otimizar o desenvolvimento pessoal e social do aluno, com re-
flexos nos resultados de suas aprendizagens” (p. 9)
Neste documento há, em relação aos documentos anteriores,
além da mudança de paradigma, a ampliação do público-alvo me-
recedor de atenção das ações educativas da rede municipal de en-
sino, que levam em consideração

[...] não só a capacidade intelectual dos indivíduos, mas seus inte-


resses e motivações, contemplando alunos com condições físicas,
intelectuais, sociais e econômicas diferenciadas; com deficiência
e bem-dotados; alunos trabalhadores que vivem nas ruas; de po-
pulações distantes ou nômades; de minorias linguísticas, étnicas e
culturais e de grupos socioeconomicamente menos favorecidos.
(NATAL, 2008, p. 8)

Muitos desses alunos recebiam atendimento educacional es-


pecializado nas denominadas Salas de Apoio Pedagógico – SA-
PES12, cujos serviços eram diversificados e se configuravam como
“complementares e suplementares aos conteúdos curriculares, uti-
lizando procedimentos, equipamentos e materiais específicos
junto ao aluno com necessidades especiais” (NATAL, 2008, p.16),
atendendo, portanto, às determinações das Diretrizes Nacionais
para a Educação Especial na Educação Básica/2003.
Entre o conjunto de “alunos com necessidades educacionais
especiais” atendidos nas SAPES, encontramos:

12
“Inicialmente, foram eleitas sete escolas, denominadas escolas-pólo, em localida-
des estratégicas, nas diversas regiões da capital, sendo seis com funcionamento ma-
tutino e vespertino e uma nos três turnos. A cada escola corresponde um universo
de no mínimo cinco outras – circunvizinhas – cujos alunos se constituem em clien-
tela da escola-pólo, caso as vagas não tenham sido preenchidas.” (REFERENCIAL
CURRICULAR, 2009, p. 17)
SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 47

[...] alunos com síndrome de Down, surdos, com perdas auditivas


leves, deficientes mentais, paralisados cerebrais, considerados
hiperativos, autistas, crianças com dificuldade de aprendizagem
sobretudo na leitura e escrita, não se registrando, até então, super-
dotados ou talentosos (NATAL, 2008, p.17).

Pelo registro encontrado, verificamos que além de superdo-


tados ou talentosos, também, não houve frequência de estudantes
com deficiência visual e surdocegueira nas SAPES, embora o aten-
dimento se destinasse, também, “àqueles que apresentam dificul-
dades de comunicação e sinalização diferenciadas dos demais alu-
nos, demandando adaptações de acesso ao currículo, com utiliza-
ção de linguagens e códigos aplicáveis, a exemplo de Braille, So-
robã e LIBRAS” (NATAL, 2008, p.17).
A deficiência visual e a surdocegueira estão assim denomina-
das nos Referenciais (2008, p.20):

DEFICIÊNCIA VISUAL - perda total ou parcial, congênita ou adqui-


rida, variando de acordo com o nível ou acuidade visual da se-
guinte forma: a) CEGUEIRA - perda total ou o resíduo mínimo de
visão que leva a pessoa a necessitar do Sistema Braille como meio
de leitura e escrita e b) BAIXA VISÃO OU VISÃO SUBNORMAL -
comprometimento do funcionamento visual de ambos os olhos,
mesmo após tratamento ou correção. A pessoa com baixa visão
possui resíduos visuais em grau que lhe permite ler textos impres-
sos ou ampliados com o uso de recursos ópticos especiais.

SURDOCEGUEIRA - É uma deficiência singular que apresenta per-


das auditivas e visuais concomitantemente em diferentes graus,
necessitando desenvolver diferentes formas de comunicação para
que a pessoa surdacega possa interagir com a sociedade.

Para o trabalho escolar com estudantes com as característi-


cas concernentes à cegueira e à baixa visão é recomendado, nos
Referenciais Curriculares (2008), o ensino por meio do Sistema de

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 48

Leitura e Escrita Braille, o uso de reglete e do sorobã, textos im-


pressos ou ampliados com o uso de recursos ópticos especiais e de
tecnologias assistivas como sintetizadores de voz e softwares le-
dores de tela.
Também são pontuadas considerações quanto ao comporta-
mento dos (as) professores(as) em relação a estudantes com defi-
ciência visual em sala de aula: ler o que está no quadro ou no su-
porte utilizado; disponibilizar o material de estudo em áudio, dis-
quete, braile ou textos ampliados, com antecedência; substituir
gráficos, fluxogramas e tabelas por demonstrações alternativas, ou
gráficos simples com relevo; possibilitar ao aluno responder as
provas nas linguagens que lhe forem mais acessíveis; não diferen-
ciar as prova; tocar o braço ou chamar o estudante pelo nome
quando estiver se dirigindo a ele (a); guiar ações como sentar, su-
bir escadas, tomar ônibus, passar pela porta de entrada da sala,
sem posicionar ou carregar o estudante.
Para os estudantes surdocegos, o foco da aprendizagem está
voltado para o desenvolvimento de sua independência, a fim de
torná-los ativos, comunicativos e capazes de fazerem suas próprias
escolhas. Assim que todas as ações educativas deveriam primar
por atividades significativas que compreendam a aprendizagem de
novas formas de comunicação e de orientação e mobilidade, consi-
derando suas características individuais de surdocego pré-linguís-
tico ou pós-linguístico13. A comunicação podendo ser estimulada
por meio de instrumentos como: “o desenho, a fotografia, o sistema

13
Surdocego pré-linguístico diz-se da pessoa que nasce surdocega ou adquire a sur-
docegueira ainda em bebê, antes de adquirir uma língua, como a Língua Portuguesa
ou a Língua de Sinais. O surdocego pós-linguístico é aquela pessoa que já se apre-
senta com uma deficiência sensorial (auditiva ou visual) e adquire a outra, após ter
apreendido uma língua. Ou ainda, que adquiriu a surdocegueira sem ter tido ne-
nhuma deficiência sensorial preexistente e já ter aprendido e ser usuária de uma
língua.

SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 49

Braille, a leitura, língua de sinais, a escrita e o tadoma (este confi-


gurado como código específico à comunicação do surdocego, pelo
qual ocorrem seus aprendizados)” (NATAL, 2008, p.29).
No ano seguinte, 2009, é publicada a Resolução Nº 05, de 29
de dezembro de 200914 - que Fixa normas relativas à educação das
pessoas com necessidades educacionais especiais no Sistema Mu-
nicipal de Ensino do Natal/RN. Neste documento, a Educação Es-
pecial é compreendida como uma modalidade de ensino transver-
sal a todos os níveis, etapas e demais modalidades de ensino e tem
por finalidade possibilitar apoio curricular de caráter complemen-
tar e suplementar à formação dos educandos por meio do Atendi-
mento Educacional Especializado, viabilizando o acesso, à partici-
pação e à aprendizagem dos educandos com deficiência, transtor-
nos globais do desenvolvimento e altas habilidades/superdotação.
Quanto aos estudantes com deficiência visual, a dita Resolu-
ção faz referências no Capítulo V, onde trata do Processo de En-
sino-Aprendizagem; no Capítulo VI, que discorre sobre o Atendi-
mento Educacional Especializado (AEE) e Atendimentos Clínicos e,
no Capítulo VII, que trata da formação e da função docente na es-
cola com estudantes, então considerados, com necessidades edu-
cacionais especiais. Vejamos de forma mais específica:
No capítulo V, Art. 29, Item II - é recomendada a utilização do
sistema de escrita Braile para os estudantes cegos, cabendo à Se-
cretaria disponibilizar tecnologia assistiva e material didático-pe-
dagógico adequado que garantam a esses estudantes a possibili-
dade de demonstrarem suas competências de aprendizagem. Já o
Capítulo VI, Art. 39 diz que o docente atuante no Atendimento Edu-
cacional Especializado deverá “[...]conhecer e usar o sistema

14
Essa Resolução substituiu a Resolução nº 01/96 do Conselho Municipal de Educa-
ção. Ainda está em vigor, contudo se encontra em processo de reformulação.

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 50

Braille; conhecer os procedimentos para a orientação e mobilidade


dos educandos cegos; conhecer e usar o Sorobã, as Tecnologias As-
sistivas15, a Informática [...]” (p. 9). Por fim, no Capítulo VII - Art. 49
– é reafirmado que esse mesmo professor do AEE – para atuar
junto a alunos com

[...] deficiência visual (cegueira, baixa visão e surdocegueira) de-


verá, obrigatoriamente, conhecer e usar o sistema Braille, o sorobã
e os recursos da tecnologia assistiva [...], efetuando transcrições de
códigos e possibilitando o acesso aos recursos de leitura e escrita
alternativos (p.11).

Percebemos que no referido documento, a surdocegueira é


colocada no mesmo grupo da deficiência visual. Porém, nos Refe-
renciais Curriculares para a Educação Infantil e Ensino Fundamen-
tal - Educação Especial é apresentada como “uma deficiência sin-
gular” e como “deficiência múltipla”. O que é contraditório, pois
como já afirmamos, a surdocegueira é uma deficiência sensorial
única, provocada pela síndrome de Uscher, de origem genética, que
apresenta variações se associando à surdez presente no nasci-
mento à perda visual gradual que se inicia na infância ou na ado-
lescência. A cegueira, parcial ou total, é causada pela Retinose Pig-
mentar16, que pode atingir quem não tem a síndrome. Logo, não se

15
Tecnologia Assistiva (TA) é a área do conhecimento (de caráter interdisciplinar)
que engloba produtos, recursos, metodologias, estratégias, práticas e serviços que
objetivam promover a funcionalidade, relacionada à atividade e participação de
pessoas com deficiência, incapacidade ou mobilidade reduzida, visando sua auto-
nomia, independência, qualidade de vida e inclusão social.

16
Retinose pigmentar ou retinose pigmentosa se refere a um grupo de doenças he-
reditárias que causam a degeneração da retina, região do fundo do olho humano
responsável pela captura de imagens a partir do campo visual. Pessoas com retinose
pigmentar apresentam um declínio gradual em sua visão porque as células fotorre-
ceptoras (cones e bastonetes) morrem, podendo conduzir à cegueira.
(https://www.sindromedeusherbrasil.com.br/retinose-pigmentar)
SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 51

caracteriza como deficiência múltipla, nem como deficiência vi-


sual. Desta, faz parte a cegueira e a baixa visão.
Explicamos que a deficiência múltipla concebida como “[...]
associação, no mesmo indivíduo, de duas ou mais deficiências pri-
márias (mental, visual, auditiva, física) com comprometimentos
que acarretam atrasos no desenvolvimento global e na capacidade
adaptativa” está em consonância com a Política Nacional de Edu-
cação Especial (BRASIL, 1994, p.15) e os Subsídios para Organiza-
ção e Funcionamento de Serviços de Ensino Especial – área de De-
ficiência Múltipla (BRASIL, 1994, p.17).
Para Contreras& Valente (1993) citado por Rocha e Plesch(
2015, p. 121), a caracterização da deficiência múltipla exige a ob-
servância dos seguintes aspectos:

- tem de haver simultaneamente, na mesma pessoa, duas


ou mais deficiências (psíquicas, físicas e sensoriais);
- essas deficiências não têm de ter relação de dependência
entre si, quer dizer, uma das deficiências não condiciona
que exista outra ou outras deficiências;
- também não tem de haver uma deficiência mais impor-
tante do que a outra ou outras. Estabelecer a importância
ou o predomínio de uma deficiência sobre a outra é difícil
e não conduz a nada [...]

Logo, não é a soma da associação de deficiências que irá ca-


racterizar a deficiência múltipla, mas sim o “nível de desenvolvi-
mento, as possibilidades funcionais, de comunicação, interação so-
cial e de aprendizagem que determinam as necessidades educaci-
onais dessas pessoas” (GODÓI, 2006, p. 11).
No trabalho pedagógico com estudantes múltiplos, há de se
considerar, assim como nos demais, suas necessidades educativas
e capacidades, a fim de que lhe sejam oferecidos os meios, os

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 52

recursos didáticos, as tecnologias assistivas a eles compatíveis,


com vistas ao desenvolvimento integral e a sua participação efetiva
no meio educacional e social. (BOATO, 2009)
De 2015 a 2018, os registros apontam acréscimo e decrés-
cimo de matrícula de estudantes com deficiência visual e surdoce-
gueira, tal como demonstrado no quadro 1 e gráfico 1, da taxa de
matrícula:

QUADRO 1 - MATRÍCULA INICIAL DE ESTUDANTES COM DEFICIÊNCIA


VISUAL E SURDOCEGUEIRA, POR ANO E UNIDADES DE ENSINO – 2015
a 2018.

ANO CONDIÇÃO VI- UNIDADES DE ENSINO TOTAL TO-


SUAL CMEI ESCOLA PAR- TAL-
CIAL GERAL
cCMEI sCMEI
2015 CEGUEIRA 03 0 04 07
BAIXA VISÃO 07 01 52 60 68
SURDOCE- 0 0 01 01
GUEIRA
2016 CEGUEIRA 05 12 17
BAIXA VISÃO 13 103 116 136
SURDOCE- 0 03 03
GUEIRA
2017 CEGUEIRA 03 13 16
BAIXA VISÃO 12 102 114 134
SURDOCE- 0 4 4
GUEIRA
CEGUEIRA 03 07 10
2018 BAIXA VISÃO 7 72 79 90
SURDOCE- 0 01 01
GUEIRA

Fonte: SEEC/ATP/GAEE-SME/APA/Equipe Estatística e Censo Escolar


In: Boletim Estatístico Censo Escolar, 2015, 2016, 2017 e 2018.
SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 53

GRÁFICO 1 - MATRÍCULA INICIAL POR CONDIÇÃO VISUAL E ANO


DE REFERÊNCIA – 2015-2028.

140

120

100

80 cegueira

60 baixa visão
surdocegueira
40

20

0
2015 2016 2017 2018

Fonte: SEEC/ATP/GAEE-SME/APA/Equipe Estatística e Censo Escolar


In: Boletim Estatístico Censo Escolar, 2015, 2016, 2017 e 2018.

Na leitura do quadro e do gráfico, observamos que nos anos


de 2016 e 2017, houve uma maior concentração do número de ma-
triculas de estudantes com deficiência visual e surdocegueira. Em
2016, 136 estudantes, e 2017, com 134 estudantes. Esse número
cai para 90 alunos no ano de 2018. Como no boletim de matrícula
não traz dados qualitativos, não se sabe a razão da queda de 67%
no número de matrícula de 2017 para 2018.
O ingresso desses estudantes nas escolas da rede municipal,
assim como a dos demais que fazem parte do público alvo da Edu-
cação Especial, ocorre, desde 2009, por meio da matrícula anteci-
pada que acontece no último trimestre letivo, considerando o ca-
lendário de matrícula proposto pela SME/Natal. A matrícula ante-
cipada tem por objetivo, de acordo com a Resolução nº 05/2009,

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 54

em seu Art. 20, “[...] favorecer a organização do ambiente escolar


no que tange à formação das turmas, do quadro de professores e
do Atendimento Educacional Especializado (AEE), da acessibili-
dade, adequações arquitetônicas e ambientais, material pedagó-
gico adequado” (NATAL, 2009, p.5).
Ainda conforme a referida Resolução (2009, p. 5), no ato da
matrícula dos estudantes com deficiência, se faz necessário que:

I – Os pais ou responsáveis apresentem laudo clínico que constate


a deficiência real da criança, do adolescente ou do jovem pleiteante
à vaga na unidade de ensino;

II - Na inexistência do citado documento prevalece a efetivação da


matrícula, mediante o compromisso da apresentação desse laudo
até o início das atividades pedagógicas do ano letivo seguinte;

III - Persistindo essa inexistência, o professor deverá observar e


avaliar pedagogicamente o processo de aprendizagem desse edu-
cando, tendo como base os parâmetros do ano de escolaridade (se
houver), nível de ensino em que está inserido e sua idade cronoló-
gica;

IV - O professor, em articulação com o gestor e o coordenador pe-


dagógico, procederá ao registro, por escrito, dos avanços e dificul-
dades do desenvolvimento escolar do educando, mediante o que
receberá, do Setor de Educação Especial da SME/Natal, orienta-
ções necessárias ao encaminhamento desse aos profissionais es-
pecializados, para possíveis diagnósticos e atendimentos clínicos;

V - Na escola em que houver sala de recursos multifuncionais i, o


professor responsável por esta sala, o gestor, o coordenador peda-
gógico e o professor regente da sala de aula realizarão a avaliação
diagnóstico-pedagógica desse educando. (NATAL, 2009, p.5)

Assim que, nenhum aluno poderá ficar de fora da escola por


não apresentar um laudo médico para os gestores o registrarem no
Censo Escolar. O que vai ao encontro das orientações dispostas na
SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 55

Nota Técnica Nº 04, de 23 de janeiro de 2014 do MEC/SE-


CADI/DPEE, que faz cair por terra a exigência de um laudo médico
para incluir uma criança com deficiência, transtornos globais do
desenvolvimento e altas habilidades/superdotação na escola regu-
lar, por considerar que essa exigência restringe o direito universal
de acesso à escola. Assim, conforme o texto:

A exigência de diagnóstico clínico dos estudantes com deficiência,


transtornos globais do desenvolvimento, altas habilidades/super-
dotação, para declará-lo, no Censo Escolar, público-alvo da educa-
ção especial e, por conseguinte, garantir-lhes o atendimento de
suas especificidades educacionais, denotaria imposição de barrei-
ras ao seu acesso aos sistemas de ensino, configurando-se em dis-
criminação e cerceamento de direito (BRASIL, 2014, p.3)

Dessa forma, a declaração dos estudantes público-alvo da


educação especial, no âmbito do Censo Escolar, deve alicerçar-se
nas orientações contidas na Resolução CNE/CEB, nº 4 de 4 de ou-
tubro de 2009, que Institui Diretrizes Operacionais para o Atendi-
mento Educacional Especializado na Educação Básica, modalidade
Educação Especial.
No ano de 2019, a Secretaria Municipal de Educação da capi-
tal do Rio Grande do Norte – Natal/RN contava com 144 Unidades
de ensino, dispostas em 72 Centros de Educação Infantil – CMEI e
72 escolas de Ensino Fundamental – Anos Iniciais e Anos Finais,
EJA Fundamental.
Os dados de matrícula cedidos pelo Setor de Educação Espe-
cial da SME/2019 indicam que havia 85 estudantes com deficiên-
cia visual matriculadas nos três segmentos de ensino da rede mu-
nicipal de ensino de Natal/RN: Educação Infantil (15); Ensino Fun-
damental – Anos Iniciais ( 34) e Anos Finais (29), e Educação de
Jovens e Adultos (07). Dentre eles, 73 com baixa visão e 12 com

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 56

cegueira, conforme sintetizado no gráfico 2. Nenhum registro de


estudante com surdocegueira.

GRÁFICO 2 - MATRÍCULA INICIAL DE ESTUDANTES COM DEFICI-


ÊNCIA VISUAL E SURDOCEGUEIRA POR NÍVEL E MODALIDADE DE
ENSINO – SME/2019.

30
25
20
15
CEGUEIRA
10
BAIXA VISÃO
5
SURDOCEGUEIRA
0

Fonte: Relatório de Matrícula Inicial – SME, Natal/RN, 2019.

Dos 73 estudantes com baixa visão, 27 se encontravam sem


diagnóstico. No entanto, foram contabilizados no Censo da Rede
Municipal de Ensino de Natal/RN com baixa visão em razão de
“apresentarem características e comportamento visual condizen-
tes com quem tem perda severa da visão, mas ainda faz uso dela”
(ENTREVISTA, COORDENADORA DO SETOR DE EDUCAÇÃO ESPE-
CIAL DA SME/NATAL, 2019). Tais características e comporta-
mento visual se referem a: indicação de dificuldade e cansaço
SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 57

visual constantes ao ler; aproximação excessiva do material de es-


tudo (livros, cadernos, textos, imagens etc) à face; queixa de visão
embaçada; posturas corporais inadequadas na tentativa de evitar
a luz solar ou artificial ou ainda, para encontrar o ângulo mais ade-
quado para enxergar material escrito e objetos, entre outras.
Nos quadros que seguem, apresentamos o quantitativo de
alunos com deficiência visual – cegueira e baixa visão por seg-
mento de ensino:

1. Educação infantil - De acordo com o registro dos dados cedidos


pelo Setor de Educação Especial da SME/Natal-RN (QUADRO 1),
havia em 2019, em quinze Centros de Educação Infantil – CMEI do
município, 15 crianças com deficiência visual e nenhuma com sur-
docegueira.

QUADRO 2 - MATRÍCULA INICIAL DE ESTUDANTES COM DEFICIÊNCIA


VISUAL E SURDOCEGUEIRA NA EDUCAÇÃO INFANTIL – SME/NATAL-RN

NÍVEL BAIXA VI- CEGUEIRA SURDOCE- TOTAL


SÃO GUEIRA
II 4 2 0 6

III 4 0 0 4

IV 4 1 0 5

TOTAL 12 3 0 15

Fonte: Relatório de Matrícula Inicial – SME-Natal/RN, 2019

Cinco (05) dos centros de Educação Infantil com matrícula de


alunos com DV se encontram na Zona Sul da cidade, quatro (4) na
zona oeste, um (01) na zona leste e, cinco (5), na zona Norte.

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 58

Das 15 crianças matriculadas nos CMEIs, 12 crianças têm


baixa visão e 03 são cegas (01 na Zona Oeste e 02 na Zona Norte).
Do total de crianças com baixa visão, os dados informam que 03
crianças se encontravam sem diagnóstico oftalmológico, porém,
foram contabilizadas porque apresentam características e com-
portamento visual condizentes com a baixa visão.
Salientamos que estudantes com baixa visão podem acessar
o sistema de escrita convencional, embora necessitem de auxílios
ópticos ou não ópticos para fazê-lo. Por responderem à mesma
abordagem metodológica que aqueles estudantes sem problemas
de visão, muitas vezes são desconsiderados em sua maneira pró-
pria de ver e, assim, em suas necessidades específicas para ter
acesso a materiais e textos e até mesmo ao que está escrito na lousa
pelo (a) professor (a).
Na formação escolar desses estudantes, há que se considerar
além das características de cada um e seu contexto, o nível e o ano
escolar pelo qual transitam. Em qualquer que seja a condição vi-
sual do estudante, é imprescindível o estabelecimento de colabo-
ração entre os professores da sala de aula comum, de apoio peda-
gógico, das Salas de Recursos Multifuncionais17 e/ou de institui-
ções especializadas, que por ventura seja frequentada pelo estu-
dante.
Além de buscar estabelecer parceria com suas famílias, inde-
pendente do nível e/ou modalidades de ensino, principalmente
dos estudantes da Educação Infantil e Ensino Fundamental - anos
iniciais. Pois, as decisões conjuntas entre esses atores implicarão
em modificações, reformulações, em novas decisões para o

17
A Sala de Recursos Multifuncionais é o espaço, na unidade de ensino, onde se re-
aliza o Atendimento Educacional Especializado (AEE) para alunos público alvo da
Educação Especial, por meio do desenvolvimento de recursos e estratégias de apoio
que viabilizem a aprendizagem escolar satisfatória à construção do seu conheci-
mento.
SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 59

desenvolvimento e uso de novas estratégias, recursos e projetos


tendo como centro, o sujeito da aprendizagem.
No Ensino Infantil, quando se inicia a preparação das crian-
ças para a aquisição da leitura, escrita e cálculo é importante a pre-
sença sistemática e contínua de um professor de atendimento edu-
cacional especializado e/ou de um professor de apoio pedagógico-
educacional (RESOLUÇÃO Nº 05/2009), em sala de aula regular
para auxiliar as crianças cegas e surdocegas no desenvolvimento
das atividades previstas em planejamento conjunto, por esse pro-
fessor e o professor titular, e propostas a toda a turma.
Presença essa, não para marcar a divisão entre o seu trabalho
e o do professor titular da turma, mas para apoiar este e a criança,
de forma individualizada, dentro do espaço coletivo em seu pro-
cesso de aquisição da leitura e escrita que se dá por meio do Sis-
tema de leitura e escrita Braille, para as crianças cegas e com sur-
docegueira (do tipo cegueira e surdez), e por meio da libras tátil
para crianças surdocegas que apresentam surdez, ou resíduos au-
ditivos e com baixa visão.
Reforçamos que essa prática será favorável, desde que o
princípio da colaboração esteja presente entre esses professores
para trazer, tanto à criança quanto ao professor titular da turma,
em particular, tempo para adquirir segurança na incorporação de
estratégias em sala de aula, que levem à autonomia e à indepen-
dência da criança. É de igual modo importante, que a presença
do(a) professor do AEE e/ou do professor de apoio pedagógico-
educacional (a) especializado seja aos poucos diminuída, com vis-
tas a uma maior participação ativa e independente da criança, no
contexto da sala de aula.
Prática que requer o desenvolvimento de saberes e fazeres
em formações, dentro ou fora da escola, em que professores do

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 60

apoio pedagógico educacional, do AEE e de sala de aula comum,


sempre que possível, estejam presentes.

2. Ensino Fundamental – Anos Iniciais, Anos Finais e Educação


de Jovens e Adultos – EJA

a) Ensino Fundamental - Anos Iniciais e Anos Finais - No


quadro 3, abaixo, visualizamos que nos Anos Iniciais do En-
sino Fundamental havia em 2019, 34 estudantes matriculados
com deficiência visual. Entre esses, 29 com baixa visão e 05
com cegueira. Nenhum estudante com surdocegueira.

QUADRO 3 - MATRÍCULA INICIAL DE ESTUDANTES COM DEFICIÊNCIA


VISUAL E SURDOCEGUEIRA NO ENSINO FUNDAMENTAL – ANOS INICI-
AIS E ANOS FINAIS – 2019

CONDI- ENS.FUNDAMENTAL ENS. FUNDAMENTAL


ÇÃO VI- ANOS INICIAIS TOTAL ANOS FINAIS TOTAL
SUAL PARCIAL PARCIAL
1º 2º 3º 4º 5º 6º 7º 8º 9º
ANO ANO ANO ANO ANO ANO ANO ANO ANO
Baixa 4 2 6 8 9 29 8 6 8 4 26
Visão
Cegueira 2 0 0 1 2 5 1 1 0 1 3
Surdoce- 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0
gueira
TOTAL 6 2 6 9 11 34 9 7 8 5 29
GERAL

Fonte: Relatório de Matrícula Inicial – SME-Natal/RN, 2019

Também podemos verificar que nos Anos Finais, o total de


matrícula corresponde a 29 estudantes, dentre os quais 26 com
baixa visão e 03 com cegueira. Nenhum caso de surdocegueira.
Destacamos que os Anos Iniciais são uma etapa de grandes
expectativas e mudanças para as crianças que vem da Educação

SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 61

Infantil, devido ao novo formato de sala de aula, aos novos profes-


sores, novos tempos de realização de atividades, novas aprendiza-
gens. No caso das crianças cegas, com baixa visão e surdocegueira
não é diferente.
Nesse nível de ensino, é preciso considerar de forma mais in-
tensa, particularidades para a ocorrência da aprendizagem por es-
sas crianças, tais como o tempo que levam para a execução das ta-
refas, a pertinência de recursos pedagógicos e do ambiente para a
aprendizagem das diferentes áreas do conhecimento, as interações
possíveis de serem provocadas no contexto de sala de aula, entre
outras.
Logo, o apoio e a intervenção pedagógica do (a) professor (a)
de apoio pedagógico educacional ou do atendimento educacional
especializado, em sala de aula, ganha relevância para o processo de
alfabetização no tocante à apropriação, pelas crianças, das técnicas
de uso de recursos específicos para a aprendizagem da leitura e
escrita Braille, como o manuseio da reglete e do punção.
Estando o processo de alfabetização consolidado, o professor
de AEE pode concentrar suas ações nos Anos finais e demais níveis
e modalidades de ensino, no contraturno escolar, orientando-as
em áreas curriculares específicas como: Orientação e Mobilidade
(OM) no espaço escolar e em seu entorno; adequação de alguns re-
cursos materiais e/ou tecnológicos, em atividades do cotidiano es-
colar como o uso da biblioteca, de espaços de leitura, do laborató-
rio de informática, por exemplo, com vistas a minimização de des-
vantagens ou segregação sofridas por muitos desses alunos em
eventos marcantes da vida escolar para qualquer aluno, como:o
acesso à informação e a formação em tempo real, autonomia para
ir e vir de forma independente, participação em jogos e brincadei-
ras com os colegas no recreio, participação em eventos sociais com
os colegas da turma, em aulas de campo, de educação física, artes,

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 62

dança, teatro, música (GUÉDEZ, 2012; MORALES, VILORIA e BOLÍ-


VAR, 2018) a depender do que é oferecido na escola.
Outro campo que merece atenção pedagógica do professor
do AEE, para com esses alunos, no contraturno de suas atividades
comuns, seria o trabalho de orientação de uso das tecnologias as-
sistivas ou, para se referir de forma mais específica, aos recursos e
meios da Tiflotecnologia (FIGURA 1), um dos ramos da Tiflologia –
ciência que estuda as condições e problemas das pessoas com de-
ficiência visual de forma a propor soluções que permitam a sua in-
tegração social e cultural.

Figura 1: Recursos Tiflotecnológicos

Fonte: Disponível em: https://epoca.globo.com/tecnologia/expe-


riencias-digitais/noticia/2017/12/o-poder-da-tecnologia-na-in-
clusao-de-pessoas-com-deficiencia.html. Aceso em 01/09/2020,
às 14h32.

[Descrição da figura]: Foto de Daniele Amorim/EPOCA (2017),


onde se vê, parte da coleção de gadgets do programador cego Leo-
nardo Gleison, técnico de tecnologia no Instituto Laramara/ SP. Ela
inclui teclados em Braille, soroban para fazer cálculos e dispositi-
vos de áudio. [Fim da descrição]
SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 63

Assim que, a tiflotecnologia, palavra de raízes gregas:


Thyphlos (cego) e teknne (técnica), mais o sufixo-logia (estudo,
tratado), cujo significado é “estudo de tecnologias para curar a ce-
gueira”, se diz do conjunto de teorias e técnicas que permitem a
utilização dos conhecimentos tecnológicos aplicados a pessoas
com cegueira e baixa visão e surdocegueira sendo, portanto, uma
tecnologia assistiva. (GUÉDEZ, 2012; MORALES, VILORIA e BOLÍ-
VAR, 2018; GONZÁLEZ, 2015)
Faz parte dos meios tiflotecnológicos desde os recursos e ma-
teriais específicos mais simples e de fácil manejo àqueles que, por
sua complexidade, requerem formação mais especializada e trei-
namento prévio para fazer um uso eficaz. Por exemplo: mapas tá-
teis, reglete, sorobã, máquina Braille, calculadora sonora de mesa
e de bolso, teclados adaptados, impressoras Braille; periféricos
adaptados que possibilitam melhor interação com o PC, a exemplo
de: teclados expandidos, teclados Braille ou linha Braille sintetiza-
dores de voz, softwares ledores de tela como o NVDA (Non Visual
Desktop Access), desenvolvido por Michael Curran e James Teh,
dois desenvolvedores cegos, Jaws, Voice Over, Dos Vox entre ou-
tros recursos que possibilitarão aos estudantes com ausência total
ou parcial da visão o acesso ao conhecimento (González, 2015) de
forma mais abrangente.
É certo que para o ensino do uso desses recursos ser posto a
termo pelos professores do AEE, como disposto na Resolução de
Nº 05, de 29 de dezembro de 2009 – CME, que ele “[...] deverá, obri-
gatoriamente, conhecer e usar o sistema Braille, o sorobã e os re-
cursos da tecnologia assistiva”, mais especificamente, dos recursos
tiflotecnológicos, se faz necessário que a Secretaria lhes proporci-
one cursos específicos, a fim de que se apropriem dos conhecimen-
tos de sua técnica e aplicação no ensino e para a aprendizagem, nas
diferentes áreas do saber .

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 64

Antes de passarmos para os dados de matrícula da Educação


de Jovens e Adultos – EJA se faz importante frisar, que na medida
em que os estudantes cegos, com baixa visão e surdocegueira vão
cumprindo os objetivos e competências requeridos em cada nível
de ensino, assim como se apropriado de saberes que os permitam
seguir com autonomia, segurança e com iniciativa em sala de aula,
o apoio pedagógico individualizado deverá ter seu tempo diminu-
ído, tanto no caso da assessoria prestada ao professor e ao estu-
dante em sala comum, quanto no atendimento na Sala de Recursos
Multifuncionais.

a) Educação de Jovens e Adultos – EJA - Na Educação


de Jovens e Adultos – EJA (QUADRO 4), encontramos no Relatório
de Matrícula Inicial, 07 estudantes com deficiência visual – ce-
gueira (01 estudante) e baixa visão (6 estudantes) distribuídos em
quatro níveis de escolarização, conforme disposto no quadro 4 e
gráfico 3, que segue. Nenhum estudante com surdocegueira.

QUADRO 4 - MATRÍCULA INICIAL DE ESTUDANTES COM DEFICIÊNCIA


VISUAL E SURDOCEGUEIRA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS –
2019.

NÍVEL BAIXA VISÃO CEGUEIRA SURDOCEGUEIRA TOTAL


I 1 0 0 1

II 2 0 0 2

III 1 1 0 2

IV 2 0 0 2

TOTAL 6 1 0 7

Fonte: Relatório de Matrícula Inicial – SME/Natal/RN, 2019

SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 65

GRÁFICO 3 - MATRÍCULA INICIAL DE ESTUDANTES COM DEFICIÊNCIA


VISUAL NO ENSINO FUNDAMENTAL E NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E
ADULTOS – 2019.

35
30
25
20 CEGUEIRA

15 BAIXA VISÃO

10 SURDOCEGUEIRA

5
0
Anos Iniciais Anos Finais EJA

Fonte: Relatório de Matrícula Inicial – SME/Natal/RN, 2019

Os85 estudantes com deficiência visual – cegueira e baixa vi-


são, dos três segmentos de ensino, foram matriculados em 41 es-
colas e 15 CMEIs, ou seja, em 56 unidades de ensino situadas nas
zonas: Oeste (20 estudantes), Leste (14 estudantes), Sul (16 estu-
dantes) e Norte (35 estudantes). Os onze estudantes com cegueira
estão em escolas das Zonas: Sul (01), Leste (03), Oeste (01) e Norte
(06).
Apresentados os dados de matrícula nos segmentos de en-
sino geridos pela Secretaria Municipal de Educação do município
de Natal/RN, vejamos como essa Secretaria pensa e oferta forma-
ção continuada aos professores, nos campos da deficiência visual e
da surdocegueira.

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 66

FORMAÇÃO DE PROFESSORES QUANTO A SABERES ESPECÍFI-


COS NO CAMPO DA DEFICIENCIA VISUAL E SURDOCEGUEIRA

A formação de professores na Lei Orgânica do Município de


Natal/RN, de 03 de abril de 1990, é referida no Art. 157, Parágrafo
Único, como “O aperfeiçoamento e a atualização profissional são
considerados experiências inerentes à carreira do magistério,
sendo-lhes favorecidas as condições para tanto”. Compreende-se
que no campo da modalidade de ensino Educação Especial, as con-
dições oferecidas para a formação dos professores estão contidas
na Resolução Nº 05, de 29 de dezembro de 2009, que traz o CAPÍ-
TULO VII - Da formação e da função docente na escola com educan-
dos com NEESP, tratando especificamente sobre o tema. Em seu
Art. 42 reza, que:

a Secretaria Municipal de Educação de Natal deve articular convê-


nios com Instituições de Ensino Superior para garantir a formação
continuada dos educadores, a investigação e a avaliação perma-
nente do processo educacional inclusivo na rede de ensino muni-
cipal de Natal.

Tal articulação fica a encargo do Setor de Educação Especial


da SME, que tem como um de seus objetivos:

III – Articular a formação continuada dos educadores das unidades


de ensino municipais com os demais Departamentos e Setores, in-
troduzindo temas referentes à educação geral e à educação espe-
cial, desta forma assegurando sua participação sistemática na exe-
cução desse processo, ao longo do ano letivo. (Art. 6º)

Nos cursos de formação continuada que tratam de questões


relativas à educação de modo geral e específica, há a orientação de
que primem pela relação entre a teoria e a realidade encontrada
nas unidades de ensino, envolvendo gestores, coordenadores,
SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 67

professores, educadores infantis, professores de apoio, funcioná-


rios e familiares de forma a estimular a responsabilização de todos
pela aprendizagem dos educandos matriculados nas escolas.
No tocante à formação específica voltada para a área da defi-
ciência visual a Resolução Nº 05/2009 refere em seu Art. 49, desta
feita aqui trazido na íntegra, que:

O professor do Atendimento Educacional Especializado para edu-


candos com deficiência visual (cegueira, baixa visão e surdoce-
gueira) deverá, obrigatoriamente, conhecer e usar o sistema
Braille, o sorobã e os recursos da tecnologia assistiva para esta
área de deficiência, efetuando transcrições de códigos e possibili-
tando o acesso aos recursos de leitura e escrita alternativos.

Note-se o caráter de “obrigatoriedade” quanto à apreensão


de saberes específicos, pelos professores do AEE, sobre materiais
tiflotécnológicos já referidos nesse capítulo, para que educandos
com deficiência visual e com surdocegueira possam ter acesso ao
conhecimento, adquirir autonomia pessoal, independência e plena
integração social, educacional, cultural e laboral. O que reforça a
necessidade de formação continuada dos professores para adqui-
rirem tais saberes. Nos inquieta saber por que a formação especí-
fica deve voltar-se apenas aos professores do AEE? Tal proceder
não estaria contribuindo para a terceirização dos estudantes pú-
blico alvo da Educação Especial?
Sabemos que a SME por certo tempo - os dados obtidos não
nos permitiram precisar quanto, não dispunha de profissional es-
pecializado na área da deficiência visual e surdocegueira na equipe
responsável pela educação especial no município. Para suprir essa
lacuna, no ano de 1998, encaminhou uma servidora, professora
atuante no Departamento de Ensino Fundamental, para fazer o
“Curso de Especialização de Professores na área da Deficiência da

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 68

Visão”, com carga horária total de 600h, no Instituto Benjamim


Constant, no Rio de Janeiro.
Com a sua ida ao Benjamin Constant, a professora assumiu o
compromisso junto a SME de, ao retornar, fazer parte do Departa-
mento de Educação Especial, desempenhando as atribuições de su-
pervisão e acompanhamento de estudantes com deficiência matri-
culados nas escolas comuns; organização de eventos e de formação
dos professores da rede de ensino, na área da Educação Especial,
em geral e, específica, no campo da deficiência visual.
No período de sua participação na Equipe, foram ofertados
cursos de Braille, Sorobã e Oficinas de produção de recursos didá-
ticos para professores do Atendimento Educacional Especializado
e professores de sala comum, em parceria com o Instituto de Edu-
cação e Reabilitação de Cegos do RN.
Nos anos de 2004 e 2005, foram realizados eventos e cursos
de formação continuada, com carga horária de 40h, por meio da
parceria estabelecida pela SME com a Secretaria de Educação Es-
pecial – SEESP/MEC, no Programa Nacional de Formação de Pro-
fessores: “Educação Inclusiva – Direito à Diversidade”, implantado
em 2003, na gestão do governo do Presidente Luís Inácio Lula da
Silva. Este programa tinha entre suas diretrizes: “Disseminar a po-
lítica de educação inclusiva nos municípios brasileiros e apoiar a
formação de gestores e educadores para efetivar a transformação
dos sistemas educacionais em sistemas educacionais inclusivos.
(BRASIL, 2006, p. 1). Segundo Kassar e Rabelo (2018),

O Programa Educação inclusiva: direito à diversidade é reconhe-


cido pelo governo posterior (de Dilma Rousseff) como o marco ini-
cial da educação inclusiva no país, que possibilitou "a construção
de uma nova política de educação especial que enfrenta o desafio
de se constituir, de fato, como uma modalidade transversal desde
a educação infantil à educação superior" (KASSAR e RABELO,
2018, p. 58). Grifos das autoras.

SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 69

Nesses eventos formativos, entre os eixos temáticos traba-


lhados estavam: “[...] Surdocegueira: processo de ensinar e apren-
der; Inclusão de alunos cegos/deficiência visual” (BRASIL, 2006, p.
4). A partir de então, outras ações formativas foram implementa-
das, tendo como foco principal a garantia da matrícula e a frequên-
cia de estudantes com deficiência visual, com surdocegueira e de-
mais estudantes da Educação Especial, nas escolas da rede pública
municipal de Natal/RN, tal como cursos e oficinas isolados de
Braille, Sorobã, Orientação e Mobilidade e o Curso ‘Instrumentos e
estratégias didáticas na educação de alunos cegos e com visão sub-
normal’, em parceria com a Universidade Federal do Rio Grande do
Norte e o Instituto de Educação e Reabilitação de Cegos do RN.
Pesquisando na página da Secretaria de Educação do Estado,
no link: https://natal.rn.gov.br/noticia, encontramos algumas ma-
térias sobre cursos na área da deficiência visual, com a participa-
ção de professores da rede municipal de ensino, a saber:
a) Em 2016, professores das salas de recursos multifuncionais da
rede municipal de ensino de Natal participaram do Curso “Tecendo
Práticas Pedagógicas para a Educação Inclusiva das Pessoas com
Deficiência Visual”, cujo objetivo era o de possibilitar momentos de
troca de conhecimentos e experiências aos profissionais que
atuam na educação de estudantes com deficiência visual, contribu-
indo para as práticas pedagógicas.
O Curso foi realizado pela Secretaria de Estado da Educação
e da Cultura, por meio da Subcoordenadoria de Educação Especial
e do Centro de Atendimento à pessoa com Deficiência Visual Pro-
fessora Iapissara Aguiar (CAP), em parceria com a, então, Comis-
são Permanente de Apoio a Estudantes com Necessidades Educa-
cionais Especiais da Universidade Federal do Rio Grande do Norte
– CAENE/UFRN, hoje denominada Secretaria de Inclusão e

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 70

Acessibilidade - SIA, com a Secretaria de Educação à Distância (SE-


DIS) e a Secretaria Municipal de Educação de Natal (SME).

b) Em abril de 2017 - Professores da Rede Municipal de Ensino de


Natal participaram da segunda edição do curso “Tecendo Práticas
Pedagógicas para a Educação Inclusiva das Pessoas com Deficiên-
cia Visual”, no Centro Municipal de Referência em Educação Aluí-
zio Alves (Cemure).
Esse curso de carga horária de 60 horas e aulas quinzenais,
foi promovido pela Subcoordenadoria de Educação Especial do RN
(SUESP), via Centro de Apoio Pedagógico (CAP), com a parceria da
Secretaria Municipal de Educação de Natal e a colaboração da Uni-
versidade Federal do Rio Grande do Norte. A matriz curricular es-
tava composta pelo tema da palestra proferida na aula inaugural:
“Orientação Didática e Pedagógica – Avaliação Funcional do Aluno
com Deficiência Visual” e os módulos: “Ensino de Braile”, “Soro-
ban”, “Tecnologia Assistiva”, “Audiodescrição, Orientação e Mobi-
lidade”.

b) No período de 10 a 12 de agosto de 2017, profissionais da educa-


ção participaram do encontro pedagógico: “Compartilhando Sabe-
res e Experiências de Inclusão – Deficiência Visual e Deficiência
Múltipla”. Esse encontro ocorreu por meio do estabelecimento de
parceria entre a Secretaria Municipal de Educação de Natal e a Ir-
mandade Santa Casa de Misericórdia de São Paulo, dentro do pro-
jeto Lavelle/Perkins Internacional, da Perkins School for the Blind,
em Boston (EUA).
Assim, durante três dias, no Centro Municipal de Referência
em Educação Aluízio Alves (CEMURE), 110 professores das salas
de recursos multifuncionais, professores de sala de aula comum
com alunos com deficiência, gestores e coordenadores pedagógi-
cos ouviram os especialistas da Santa Casa de Misericórdia de São
SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 71

Paulo falar sobre “Anatomia e Fisiologia do Sistema Visual, Patolo-


gias e Alterações Funcionais” - tratando sobre anatomia do olho, as
diferentes funções visuais e as patologias mais comuns como o
Glaucoma Congênito, a Catarata Congênita, as Infecções Congêni-
tas, Albinismo, a Retinopatia da Prematuridade e a Deficiência Vi-
sual Cerebral (DVC).
Também foram contemplados, nesse encontro, os temas:
avaliação da visão para identificação de aluno com baixa visão; es-
tratégias para auxiliar os alunos com Deficiência Visual e Deficiên-
cia Múltipla; definição de deficiência visual, baixa visão, deficiência
múltipla e surdocegueira; avaliação e intervenção junto à criança
com baixa visão e deficiência múltipla; avaliação da aprendizagem,
comportamentos e dificuldades comumente apresentadas por cri-
anças com baixa visão e com deficiências múltiplas; sugestões de
adaptações de materiais, atividades e ambientes para crianças com
deficiência visual e deficiência múltipla, com vistas a contribuir
para o seu desenvolvimento e aprendizado escolar.

c) Em 2018, o Setor de Educação Especial da Secretaria Municipal


de Educação (SME) promoveu formações continuadas sobre defi-
ciência visual e classe hospitalar, no Centro Municipal de Referên-
cia em Educação Aluízio Alves (CEMURE). Outro curso no qual
houve a participação de professores da SME foi a terceira edição
do “Tecendo Práticas Pedagógicas para a Educação Inclusiva das
Pessoas com Deficiência Visual”, que teve a participação de 18 pro-
fessores da rede municipal de ensino, em grande parte responsá-
veis pelas Salas de Recursos multifuncionais.

d) No ano de 2019, a equipe do Setor de Educação Especial


trabalhou a temática da deficiência visual nas formações sistemá-
ticas com os professores do Atendimento Educacional

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 72

Especializado, atuantes nas salas de recursos multifuncional por


meio de oficinas pedagógicas, e também, nas Jornadas Pedagógicas
ocorridas a cada início de semestre letivo, em palestras que con-
templam os processos de ensino a estudantes com cegueira e baixa
visão.
A temática da surdocegueira não tem tido assento nas forma-
ções promovidas pela Secretaria Municipal de Educação de Na-
tal/RN. Certamente, por que não há registro de matrícula de estu-
dantes nessa condição sensorial.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A escolarização de estudantes com deficiência visual – ce-


gueira e baixa visão, em escolas da rede municipal de ensino de
Natal/RN, é crescente. No entanto, a matrícula de estudantes sur-
docegos ocorreu apenas nos anos de 2015 (01 estudante), 2016 (3
estudantes), 2017 (4 estudantes) e 2018 (1 estudante). Os regis-
tros não indicaram os tipos de surdocegueira, nem o que ocorreu
com tais estudantes, se houve desistência, se foram para institui-
ções especializadas, se houve evasão. O que pode explicar o não in-
vestimento da Secretaria municipal de educação em promover for-
mação continuada nessa área. Apenas no ano de 2017 a temática
foi tratada em um curso ministrado por especialistas da Santa Casa
de Misericórdia de São Paulo. Em 2019, não ocorreu matrícula de
tais estudantes e, em 2020, não tivemos acesso aos dados.
É imperativa, necessária e urgente que se faça uma revisão
dos documentos oficiais da rede municipal de ensino, a fim de que
se revejam conceitos e sejam ampliadas as possibilidades de
acesso ao saber por estudantes com cegueira, baixa visão e surdo-
cegueira, bem como os possíveis caminhos de acesso dos professo-
res aos saberes específicos,

SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 73

A formação continuada no campo da deficiência visual tem


sido escassa e restrita àqueles professores que tem, em suas salas
de aula, estudantes em tais condições e, com mais acento, àqueles
que se encontram nas Salas de Recursos Multifuncionais, o que em
nosso parecer contribui para a terceirização de tais estudantes
dentro das instituições de ensino.
Advogamos que as formações aconteçam numa perspectiva
mais ampla, crítica, reflexiva e, não, apenas na exclusividade da
mera aprendizagem de novas técnicas, da renovação de modelos
pedagógicos ou da aprendizagem das inovações tecnológicas para
sua implementação em busca por resultados. O que, em nosso pa-
recer, distancia ainda mais esses profissionais do questionamento
das intencionalidades do ensino e do reconhecimento da impor-
tância que cada um, e todos, têm no desenvolvimento das crianças,
bem como da visão dos saberes da prática docente como interde-
pendentes e/ou complementares.
Para que as mudanças acontecem na prática docente é im-
prescindível que às instâncias responsáveis pela educação no mu-
nicípio, tracem possíveis linhas de intervenção formativa, conside-
rando as necessidades de aprendizagem dos professores e profes-
soras no campo da deficiência visual e surdocegueira, situada num
plano de formação coerente com a realidade dos contextos escola-
res e dos estudantes, tendo como objetivo a melhoria das condi-
ções do trabalho docente e o sucesso da aprendizagem dos estu-
dantes. O que envolve assumir posturas adequadas a uma institui-
ção moderna, onde a qualidade deve prevalecer sobre a quanti-
dade, a cooperação sobre a competição e a parceria sobre a domi-
nação; onde todos possam aprender na interação com o outro e
onde haja comprometimento de todos os envolvidos.

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 74

REFERÊNCIAS

ÁLVAREZ REYES, Daniel. La sordoceguera: una discapacidad singular. In:


Viñas, Pilar Gómez. Romero Rey, Eugenio. (Coordinadores) La sordoceguera.
Un análisis multidisciplinar. Primera edición. Madrid: Organización Nacional
de Ciegos Españoles (ONCE), 2004. p. 5-54. Disponível em: http://riber-
dis.cedd.net/handle/11181/3407 Acesso em: 30/07/2020. Hora: 15h25.

BOATO, Elvio Marcos. Henri Wallon e a deficiência múltipla: uma proposta


de intervenção pedagógica. São Paulo: Edições Loyola, 2009.

BEDAQUE, Selma Andrade de Paula. Por uma prática colaborativa no AEE –


Atendimento Educacional Especializado. Curitiba, PR: Appris, 2014.

__________. O atendimento educacional especializado no processo de inclu-


são escolar, na rede municipal de ensino de Mossoró/RN. 2012. 160 f. Dis-
sertação (Mestrado em Educação) - Universidade Federal do Rio Grande do
Norte, Natal, 2012.

BRASIL. Ministério da Educação e da Cultura. Saberes e Práticas da Inclusão.


Dificuldades de comunicação e sinalização: Surdocegueira/múltipla defici-
ência sensorial. Secretaria de Educação Especial – Brasília: MEC/SEESP –
2006.

BRASIL. Política Nacional de Educação Especial - educação especial, um


direito assegurado. Brasília: MEC / SEESP, 1994. Livro 1.

BRASIL. Política Nacional de Educação Especial na perspectiva inclusiva


(2008) Disponível em: http://portal.mec.gov.br/arquivos/pdf/politicaeduces-
pecial.pdf.Acesso em 20/08/2020, às 10h.

BRASIL. Nota Técnica Nº 04, de 23 de janeiro de 2014/ MEC / SECADI /


DPEE. Orientação quanto a documentos comprobatórios de alunos com defici-
ência, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades/superdota-
ção no Censo Escolar. Disponível em: http://portal.mec.gov.br/. Acesso em:
20/08/2020, às 15h

SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 75

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponí-


vel em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constitui-
cao.htmAcesso em: 21/07/2020, às 8:40.

CAMBRUZZI, Rita de Cássia Silveira. COSTA, Maria da Piedade Resende da. Sur-
docegueira – níveis e formas de comunicação. São Carlos: EDUFSCar, 2016.

COSTA, Maria da Piedade Resende da. RANGNI, Rosemeire de Araújo. (Orgs)


Surdocegueira – estudos e reflexões. São Carlos: Pedro & João Editores,
2015.

ENTREVISTA. Alceu Kuhn. 13 de dezembro - Dia Nacional do cego reafirma os


direitos da pessoa com deficiência visual. Ministério da Educação. Assessoria
de Comunicação. Disponível em: http://portal.mec.gov.br/compo-
nent/tags/tag/31872, Acesso em: 21/08/2020.

GADOTTI, Moacir. Boniteza de um sonho – ensinar-e-aprender com sentido.


2ª ed. São Paulo: Editora e Livraria Instituto Paulo Freire, 2001.

GODÓI, Ana Maria de. Educação Infantil. Saberes e Práticas da Inclusão: di-
ficuldades acentuadas de aprendizagem: deficiência múltipla. 4. ed. Brasí-
lia: MEC, 2006.

GONZÁLEZ, Tibisay. PARRA, Jesús. (2015). Tiflotecnologías aplicables a estudi-


antes con ausencia total de visión, una perspectiva desde la educación mate-
mática. Memorias del IX Congreso Venezolano de Educación Matemática.
Universidad de Carabobo – Venezuela. Disponível em: https://na-
nopdf.com/download/tgonzalezpdf_pdf . Acesso em 01/09/2020, às 17h.

GOVERNO DO ESTADO DO RN. Referências Básicas para a Organização do


Trabalho Pedagógico das Escolas Estaduais do Rio Grande do Norte. Natal:
SEECD/ VUNESP/BANCO MUNDIAL, 2018.

GUÉDEZ, M. (2012). Tiflotecnologías: nuevas oportunidades para la inclusión de


personas con discapacidad visual en el ámbitouniversitario. Revista Informe
de Investigaciones Educativas. Vol. XXVI, Nº 2.

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 76

Grupo Brasil de Apoio ao Surdocego e ao Múltiplo Deficiente Sensorial. Sur-


docegueira. Disponível em: http://www.grupobrasil.org.br Acesso em:
30/07/2020. Hora:15h

IMBERNÓN, Francisco. Formação Docente e Profissional: formar-se para a


mudança e a incerteza. 3. Edição. São Paulo: Cortez, 2002

MAIA, Shirley Rodrigues. Processos de ensinar e de aprender em alunos


com surdocegueira. SORRI-BRASIL (Organização) In: Ensaios pedagógicos -
construindo escolas inclusivas : 1. ed. Brasília : MEC, SEESP, 2005.

MORALES, Génesis. VILORIA, Patricia. BOLÍVAR, Aligraciela. Aplicación de la ti-


flotecnología para la enseñanza de la aritmética elemental en estudiantes con
disfunción visual total o parcial. In: ARJÉ. Revista de PostgradoFaCE-UC. Vol.
12 N° 22. Ed. Esp. Ene-Jun. 2018/pp.593-598. ISSN Versión electrónica
2443-4442, ISSN Versiónimpresa 1856-9153.

PREFEITURA MUNICIPAL DO NATAL. Resolução Nº 05 de 29 de dezembro


de 2009 – Fixa normas relativas à educação das pessoas com necessidades
educacionais especiais no Sistema Municipal de Ensino do Natal/RN. Disponí-
vel em: https://natal.rn.gov.br/sme/Acesso e:23/08/2020, às 14h.

RIO GRANDE DO NORTE. Lei nº 10.049, de 27 de janeiro de 2016. Aprova o


Plano Estadual de Educação do Rio Grande do Norte (2015-2025) e dá ou-
tras providências. Disponível em: https://portal.ifrn.edu.br/campus/reito-
ria/arquivos/plano-estadual-de-educacao
http://adcon.rn.gov.br/ACERVO/seec/DOC/DOC000000000103587.PDF.
Acesso em: 31.06. 2020. Hora: 20h11.

RIO GRANDE DO NORTE. Lei Orgânica do Município de Natal/RN de 03 de


abril de 1990. Disponível em:https://leismunicipais.com.br/lei-organica-na-
tal-rn Acesso em: 27/05/2020.Hora: 21h

RIO GRANDE DO NORTE. Constituição do Estado do Rio Grande Norte, de 03


de outubro de 1989. Disponível em: https://www2.se-
nado.leg.br/bdsf/item/id/70437. Acesso em 28/10/2020.Hora: 16h

SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 77

ROCHA, Maíra Gomes de Souza da. PLETSCH , Márcia Denise. Deficiência Múlti-
pla: disputas conceituais e políticas educacionais no Brasil. In: Cad. Pes., São
Luís, v. 22, n. 1, jan./abr. 2015 p.112-125

SEVERO, Maria do Carmo de Souza. Um estudo sobre a trajetória de profes-


sores itinerantes na escola regular, Natal/RN (1971-2011). Natal, RN,
2012. (Dissertação de Mestrado)

SILVA, Linda Carter Souza da. SILVA, Luzia Guacira dos Santos. Educação em
Direitos Humanos e Educação Inclusiva: concepções e práticas pedagógi-
cas. Curitiba,PR: Appris Editora, 2019.

SILVA, Luzia Guacira dos Santos. Escolarização de Estudantes com cegueira,


baixa visão e surdocegueira no Estado do Rio Grande do Norte: Da matrí-
cula à formação de professores. João Pessoa: Editora Ideia, 2020.

_________. Cartas Pedagógicas: processos de ensinar a quem enxerga sem o


sentido da visão. São Paulo: Paulinas, 2017.

_________. Educação Inclusiva: por uma escola sem exclusões! São Paulo: Pauli-
nas, 2014.

_________. Inclusão, uma questão, também, de visão – o aluno cego na escola


comum. João Pessoa: Editora da UEPB, 2008.

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 78

CAPÍTULO 3
A EDUCAÇÃO DE SURDOS NO
BRASIL E NA FRANÇA:
DIÁLOGOS E DISTANCIAMENTOS

Ivanilde Apoluceno de Oliveira


Janete Benjamin
Waldma Maíra Menezes de Oliveira

INTRODUÇÃO

Neste capítulo analisa-se a política de educação de surdos


do Brasil, em diálogo com a política de educação de surdos da
França, e destaca-se a influência tanto da Língua de Sinais Francesa
(LSF) quanto da política de integração com o modelo terapêutico-
clínico na educação especial brasileira. Há de se destacar, contudo,
alguns distanciamentos em termos de encaminhamento da política
de inclusão, já que os dois países se pautam em documentos inter-
nacionais, como a Declaração de Salamanca (UNESCO, 1994).
Dessa forma, tem-se como objetivo identificar, nas políticas
de educação de surdos, estabelecidas no Brasil e na França, aspec-
tos de diálogo e de distanciamento, com vistas a refletir de forma
crítica sobre essas políticas.
Consiste em uma pesquisa de campo de abordagem qualita-
tiva, realizada pelas autoras no Instituto Nacional de Jovens Surdos
de Paris, no ano de 2019. Os procedimentos metodológicos foram:
SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 79

pesquisa bibliográfica e documental; entrevista semiestruturada-


com professores, técnicos pedagógicos, assistentes sociais e siste-
matização e análise organizadas por meio de categorizações temá-
ticas.1
Inicialmente apresenta-se a influência da LSF e da política
de integração no Brasil, seguida de uma reflexão crítica sobre a po-
lítica de inclusão, destacando-se os pontos de diálogo e de distan-
ciamento.

INFLUÊNCIA DA LSF E POLÍTICA DE INTEGRAÇÃO NA EDUCA-


ÇÃO DE SURDOS NO BRASIL

A influência da LSF na educação de Surdos no Brasil iniciou-


se em função da ida de Eduard Huet ao Rio de Janeiro, por volta de
1855, a convite do imperador D. Pedro II, com o objetivo de fundar
uma escola para surdos no Brasil. Assim, no dia 26 de setembro de
1857, foi fundada a primeira escola para surdos no Rio de Janeiro,
o “Imperial Instituto dos Surdos-mudos”, atual “Instituto Nacional de
Educação de Surdos” (INES). De acordo com Strobel (2009, p. 24),
“[...] foi nesta escola que surgiu da mistura da LSF com os sistemas já
usados pelos surdos de várias regiões do Brasil”.
Huet, que era ex-aluno do Instituto Nacional de Surdos de
Paris e professor surdo com experiência de mestrado e de cursos
em Paris, foi o primeiro gestor e professor de surdos no Brasil. Ele
utilizava como método de ensino, sinais datilológicos para aquisi-
ção da leitura e escrita de seus alunos surdos. Nesse sentido, Rocha
(2009) pontua que a influência da LSF não se deu somente na sina-
lização, mas também nos métodos de ensino, nos materiais didáti-
cos e na prática educativa do professor Huet.

1
Neste artigo, o nome da Assistente Social é fictício.

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 80

Dessa forma, o Instituto de Paris tornou-se “[...] uma refe-


rência importante no desenvolvimento dos trabalhos realizados na
instituição. Grande parte dos primeiros livros que tratavam da
educação de surdos, publicados no Brasil, eram traduções de obras
de professores franceses” (ROCHA, 2009, p. 43).Somando-se a isso:

Foi na gestão do Doutor Tobias Leite que a comunicação gestual,


hoje reconhecida como LIBRAS (Língua Brasileira de Sinais), de
forte influência francesa, em função da nacionalidade do fundador
do Instituto, foi espalhada por todo Brasil pelos alunos que regres-
savam aos seus locais de origem quando do término do curso e,
também, pela disseminação de algumas publicações feitas no Ins-
tituto (ROCHA, 2009, p. 42).

É inegável a influência direta e indireta da LSF na constitui-


ção da Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS), tanto no aspecto gra-
matical quanto no aspecto educacional. Todavia, faz-se necessário
ilustrar, com base na Lei nº 10.436, de 24 de abril de 2002, que “[...]
a LIBRAS é oriunda das comunidades surdas brasileiras” (BRASIL,
2002, p. 1).
Assim, a LIBRAS pode até ter sido proveniente da LSF, en-
tretanto, ganha status linguístico, mediante os movimentos sociais
surdos e suas articulações com o Ministério da Educação, pelo re-
conhecimento da sua diferença linguística, que apresenta a Libras
como um artefato cultural e o sujeito surdo, como o seu usuário.
Outra influência francesa recebida pelo Brasil foi o modelo
terapêutico-clínico, implantado na política de integração, por meio
do acesso da pessoa com deficiência em classes especiais e escolas
especializadas.
Para Plaisance (2019), somente no século XIX é que a ques-
tão da educabilidade das crianças, público da educação especial, é
iniciada na França, tendo Désiré Magloire Bourneville um papel
fundamental, porque propôs a criação de classes especiais situadas

SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 81

nas escolas primárias públicas de Paris. No entanto, Alfred Binet e


Théodore Simon foram os que possibilitaram criar classes especi-
ais, as quais foram reconhecidas pela lei de 1909 e entraram em
funcionamento nos anos de 1960, com a finalidade de atender às
crianças inadaptadas.
A França, então, estabelece a política de integração, por
meio da educação obrigatória às pessoas com deficiência em salas
regulares, a partir da lei estabelecida em 30 de junho de 1975, que
mantém o atendimento de pessoas com deficiências na educação
escolar e nas instituições especializadas. Esse modelo integracio-
nista permanece até 2013 quando a educação inclusiva, criada na
Lei nº 2005-102 de 2005, é, de fato, implantada (PLAISANCE,
2019).
Na verdade, quando se fala em inclusão, não há como negar
os malefícios da exclusão social, em sua natureza classificatória,
gerando uma imensa batalha entre opressores e oprimidos, entre
justiça e injustiça, entre igualdade e desigualdade.
Sobre o conceito de exclusão, Sawaia (2009, p.7) chama a
atenção para a ambiguidade que o norteia, destacando que duas
formas de análises sobre o mesmo se destacam entre as demais: as
que são centradas no econômico, abordando a questão como “[...]
sinônimo de pobreza e as centradas no social, que privilegiam o
conceito de discriminação, minimizando o escopo analítico funda-
mental da exclusão que é o da injustiça social.”
A exclusão, discutida mundialmente nas mais diversas con-
cepções e não somente a da miséria, representa a desqualificação
social e a identidade negativa, provocadoras do descrédito junto
aos excluídos, representando, como diz Sawaia (2009, p. 9), um

[...] processo complexo e multifacetado, uma configuração de di-


mensões materiais, políticas, relacionais e subjetivas. É processo
sutil e dialético, pois só existe em relação à inclusão como parte

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 82

constitutiva dela [...] É um processo que envolve o homem por in-


teiro e suas relações com os outros. É produto do funcionamento
do sistema.

Os processos de exclusão são, pois, constituídos de confron-


tos que dão origem aos movimentos em prol da inclusão, operando
nas dimensões do natural, do social e do psicológico, de tal forma
que “[...] o papel de excluído engole o homem. Aquilo que, inicial-
mente, é um comportamento social, configurado no processo de in-
clusão do excluído, acaba por naturalizar-se [...]” (SAWAIA, 2009,
p. 12), colocando o sujeito em um espaço necessário para a manu-
tenção da ordem social, resultando, muitas vezes, em intenso sofri-
mento para o mesmo.
A condição de excluído, que significa não só carência mate-
rial, mas, sobretudo o não reconhecimento do sujeito, que muitas
vezes, além de ignorado é “[...] considerado nefasto ou perigoso à
sociedade” (MARTINS, 1997, p. 16-17). Isto provoca uma situação
de marginalidade social, que se faz presente nas mais diversas ca-
tegorias historicamente estigmatizadas.
É nesse contexto permeado por contradições e pelas inúme-
ras discussões, que comprovam o sofrimento de determinados
grupos de excluídos, em função de necessidades éticas e afetivas,
de necessidade de valorização da diversidade (SAWAIA, 2009),
que os estudos acerca da inclusão social se delineiam, se intensifi-
cam e buscam se materializar, diminuindo as injustiças sociais per-
petuadas ao longo da história.
Sassaki (1997, p. 41) define inclusão social como

[...] processo pelo qual a sociedade se adapta para poder incluir,


em seus sistemas sociais gerais, pessoas com necessidades especi-
ais e, simultaneamente estas se preparam para assumir seus pa-
péis na sociedade. A inclusão social constitui, então, um processo
bilateral, no qual as pessoas, ainda excluídas, e a sociedade,

SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 83

buscam, em parceria, equacionar problemas, decidir sobre solu-


ções e efetivar a equiparação de oportunidades para todos.

Além da definição, o autor chama a atenção para o fato de


que a prática da inclusão se fundamenta nos seguintes princípios:

[...] a aceitação das diferenças individuais, a valorização de cada


pessoa, a convivência dentro da diversidade humana, a aprendiza-
gem através da cooperação. A diversidade humana é representada
principalmente por origem nacional, sexual, religião, gênero, cor,
idade, raça e deficiência (SASSAKI, 1997, p. 42).

A construção de um projeto societário inclusivo, como vi-


mos anteriormente, não é tão simples como faz parecer a definição
e princípios acima especificados, uma vez que isso depende, prio-
ritariamente, de fatores como aqueles apontados por Omote
(2004, p. 303), quando o mesmo analisa que no modelo vigente, a
sociedade se apresenta

[...] amplamente diversificada na sua constituição, desigual nos di-


reitos e iníqua na distribuição das riquezas. A administração dessa
diversidade, em direção a uma sociedade mais inclusiva, implica
igualdade de direitos na diversidade – inclusive diversidade na ca-
pacidade de contribuir para o bem comum – e implica ampla pos-
sibilidade de mobilidade social.

No entanto, são justamente esses indicadores que solicitam


a construção de uma sociedade inclusiva, em busca da valorização
e do respeito aos direitos das pessoas e priorizando as possibilida-
des de ação de cada cidadão ou cidadã.
Construir e viver um projeto inclusivo em uma sociedade
que historicamente tem buscado superar as diferenças, as injusti-
ças, a discriminação e o preconceito, como afirma Padilha (2004),
representa o grande desafio na luta contra a exclusão que se faz

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 84

presente, através da opressão, da negação de participação social


efetiva para todos.
A vivência de um processo de inclusão exige, antes de tudo,
uma atitude de indignação, de não aceitação a qualquer forma de
preconceito, discriminação, injustiça. Exige, como diz Freire
(2000), uma atitude de rebeldia, de enfrentamento, de disponibili-
dade para a mudança, que mesmo sendo difícil, é possível. Exige
um contínuo conflito entre o que incluir e o que excluir, provo-
cando reflexões permanentes acerca das ações planejadas e execu-
tadas, com aceitação às necessidades de mudança.
A mudança, por sua vez, acontecerá a partir da revisão de
conceitos que historicamente perpassam os processos de relações
sociais, interferindo diretamente na vida das pessoas e nas suas
oportunidades reais de desenvolvimento. Isso significa revisão de
concepções, o que “[...] não é uma atitude isolada ou individual. É
tomada de decisão política” (PADILHA, 2007, p.96).
Dessa forma, a inclusão é uma discussão que necessita de
mecanismos que, além do protagonismo arbitrário de alguns seto-
res que regem as práticas de vida em sociedade, possibilitem o con-
vívio e a participação das pessoas com as mais diversas diferenças,
em situações de vida que, ao mesmo tempo, favoreçam e assegu-
rem seus direitos civis e sociais, o que implica, seguramente, em
uma mudança radical de valores e crenças culturalmente constru-
ídos ao longo da história da humanidade, em vigor até os dias atu-
ais.
Assumindo a configuração de movimento de luta e resistên-
cia, a inclusão se constitui foco de intensos debates que resultam
em decisões jurídicas voltadas para a garantia de direitos huma-
nos, o que – vale salientar – nem sempre significa o exercício pleno
desses direitos nas experiências de vida das pessoas. É possível
afirmar que o exercício do direito conquistado e implementado por
força da lei, sem a aprovação social, muitas vezes reveste-se de
SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 85

uma desigualdade maior do que a vivida anteriormente, gerando


uma contradição perniciosa, onde a lei passa a ter um valor inqui-
sitivo à realidade concreta.
A história da humanidade tem sido perpassada por esse
movimento contraditório e isso se torna especificamente mais no-
tório, ao analisarmos a Declaração de Direitos do Homem e do Ci-
dadão, promulgada em 1789 pelos franceses e acatada mundial-
mente. Mais de dois séculos depois, os ideais de liberdade, frater-
nidade e igualdade não se transformaram em realidade para a mai-
oria da população que se encontra na situação de pobreza, bem
como aqueles que se encontram em situação de exclusão por qual-
quer outro motivo.
Outro documento que pode ser mencionado nessa reflexão
é a Declaração Universal dos Direitos Humanos, promulgada em
1948, pela Organização das Nações Unidas – ONU, cujo teor ideo-
lógico nunca saiu do papel para uma imensa parcela populacional
no mundo inteiro.
No âmbito das questões relativas às pessoas com deficiên-
cia, os processos históricos, culturais e sociais não tiveram um
rumo diferente e, a partir da Declaração Universal dos Direitos Hu-
manos, são inúmeros os documentos normativos em prol da garan-
tia de direitos para esse segmento da população.
Um documento que representa o marco dessa luta é a De-
claração dos Direitos das Pessoas Deficientes, promulgado em
1975, pela ONU, garantindo, em seu artigo 2º, direitos a todas as

[...] pessoas deficientes, sem qualquer descrição ou discriminação


com base em raça, cor, sexo, língua, religião, opiniões públicas ou
outras, origem social ou nacional, estado de saúde, nascimento, ou
qualquer outra situação que diga respeito ao deficiente ou a sua
família (ONU, 1975, p. 1).

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 86

De acordo com a Declaração, as pessoas com deficiência têm


direito “[...] ao respeito por sua dignidade humana” (Art. 3º); “[...]
a medidas que visem capacitá-las a tornarem-se tão autoconfiantes
quanto possível” (Art. 5º); “[...] a serviços que lhes possibilitem o
máximo desenvolvimento de sua capacidade e habilidades e que
acelerem o processo de sua integração social (Art. 6º).
Ainda com relação à luta pelos direitos, 1981 foi ratificado
pela ONU como o Ano Internacional das Pessoas Deficientes, oca-
sião em que foi elaborado o “Programa de Ação Mundial Relativo
às Pessoas com Deficiência”, com o objetivo de garantir “[...] o di-
reito das pessoas com deficiência as mesmas oportunidades dos
demais cidadãos, e a desfrutar, com equidade, da melhoria das con-
dições de vida resultantes do desenvolvimento econômico e social”
(ARANHA, 2004, p. 39).
Em 1993, durante a Assembleia Geral da ONU, foi elaborado
o documento “Normas sobre a equiparação de oportunidades para
pessoas com deficiência”, em cujo teor se faz presente “[...] um
firme compromisso moral e político da parte dos Estados, no sen-
tido de adotar medidas destinadas a garantir a igualdade de opor-
tunidades para as pessoas com deficiência” (ARANHA, 2004, p. 40).
Durante a Reunião da Cúpula Social, realizada em Copenha-
gue, em 1995, evento que teve o objetivo de buscar ações inclusi-
vas, extensivas às pessoas com deficiência, no sentido de erradicar
a pobreza, o desemprego e a marginalização, foi firmado pelos re-
presentantes de ONGs do mundo inteiro, o compromisso de “Ga-
rantir em todos os níveis, oportunidades educacionais igualitárias
para as crianças, jovens e adultos com deficiência em ambientes
integrados, considerando-se integralmente as diferenças e situa-
ções individuais (MITTLER, 2003, p. 46).
A Convenção de Guatemala, realizada em maio de 1999, na
capital daquele país, denominada “Convenção Interamericana para

SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 87

a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Contra as Pes-


soas Portadoras de Deficiência”, teve como objetivo de prevenir e
eliminar todas as formas de discriminação, bem como propiciar a
plena integração das pessoas com deficiência à sociedade. O docu-
mento apresenta no corpo de seu texto, as seguintes definições so-
bre a deficiência e a discriminação:

Deficiência – o termo deficiência significa uma restrição física,


mental ou sensorial de natureza permanente ou transitória, que li-
mita a capacidade de exercer uma ou mais atividades essenciais da
vida diária, causada ou agravada pelo ambiente econômico e so-
cial.
Discriminação contra as pessoas portadoras de deficiência – a) o
termo discriminação contra as pessoas portadoras de deficiência
significa toda diferenciação, exclusão ou restrição baseada em de-
ficiência, antecedente de deficiência, consequência de deficiência
anterior ou percepção de deficiência presente ou passada, que te-
nha o efeito ou propósito de impedir ou anular o reconhecimento
gozo ou exercício por parte das pessoas portadoras de deficiência
de seus direitos humanos e suas liberdades fundamentais. b) Não
constitui discriminação a diferenciação ou preferência adotada
pelo Estado Parte para promover a integração social ou o desen-
volvimento pessoal dos portadores de deficiência, desde que a di-
ferenciação ou preferência não limite em si mesma o direito à
igualdade dessas pessoas e que elas não sejam obrigadas a aceitar
tal diferenciação ou preferência. Nos casos em que a legislação in-
terna preveja a declaração de interdição, quando for necessária e
apropriada para o seu bem-estar, esta não constituirá discrimina-
ção (ONU, 1999, p.3).

POLÍTICA DE INCLUSÃO E EDUCAÇÃO DE SURDOS: DIÁLOGO E


DISTANCIAMENTO ENTRE BRASIL E FRANÇA

Brasil e França implantam suas políticas de inclusão, influ-


enciadas por documentos internacionais, entre os quais a

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 88

Declaração de Salamanca (UNESCO, 1994). Porém o Brasil inicia


esta política nos anos 1990 e a França no ano de 2005.
Assim, na França, apesar de sua trajetória no campo da edu-
cação de surdos ser mais antiga que no Brasil, em termos de polí-
tica inclusiva, o marco histórico é o ano de 2005. A concepção de
inclusão, que não se restringe ao campo educacional, está relacio-
nada à inclusão social, envolvendo o sistema público de modo ge-
ral, ou seja, saúde, educação, transporte, etc. Por isso, alguns auto-
res franceses utilizam o termo acessibilidade no lugar de inclusão.
A inclusão é referida à escola ou à educação inclusiva.
O objetivo é, portanto, garantir a igualdade de direitos e de
chances de participar da vida social. Nesta perspectiva, estão os di-
reitos assegurados pela Lei de 11 de fevereiro de 2005 das pessoas
com deficiência, que estabelece: (a) compensação em estabeleci-
mentos e domicílio, por meio de atendimento individual no domi-
cílio, orientação em estabelecimentos e na escolarização, orienta-
ção profissional, o acesso a cão guia, entre outras; (b) escolari-
dade/escola, com o direito de estar matriculado em escola de refe-
rência próxima de seu endereço domiciliar, acompanhamento pe-
dagógico adaptado, além de serviço médico-social; (c) emprego
por meio do acesso a emprego de instituições privadas e públicas;
(d) acessibilidade, no acesso à vida da cidade, aos edifícios e aos
transportes.
Esse olhar mais amplo possibilita a integração entre as di-
versas políticas necessárias à vida da pessoa com deficiência em
sociedade: educação, saúde, assistência social, transporte, acessi-
bilidade, etc.
Na escola há um projeto personalizado que acompanha o
progresso escolar do aluno com deficiência em todas as ações edu-
cacionais, psicológicas, sociais e médicas, que complementam a
educação escolar e que são necessárias para garantir a

SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 89

continuidade do percurso escolar e viabilizar a sua autonomia no


âmbito da escola e sociedade.
No Brasil, a educação inclusiva é estabelecida nos anos
1990, superando a política de integração, e está relacionada ao
processo de exclusão que a maioria das pessoas com deficiência
tem sofrido no meio socioeducacional. Entretanto, a política de in-
clusão centra-se no âmbito da escola, visando à garantia do direito
de todos à educação, cujo enfoque é o institucional, isto é, depende
de mudanças estruturais na escola, sendo necessário que essa
mesma escola modifique sua estrutura, seu currículo, sua prática e
suas atitudes para atender ao aluno deficiente (OLIVEIRA, 2005).
No entanto, encontram-se entraves na interseção entre as políticas
da educação, saúde, transporte, etc.
O público da Educação Especial, desde 2008, é constituído
pelas pessoas com deficiência, com transtorno global do desenvol-
vimento e com altas habilidades; e o objetivo da inclusão é a per-
manência desse público na escola regular com direito a Atendi-
mento Educacional Especializado (AEE) em salas de recursos mul-
tifuncionais, realizado por professores especializados no campo da
educação especial.
No Brasil, as políticas públicas de Libras foram implantadas
a partir da década de 1990, no período de implantação da política
inclusiva no campo educacional. É importante destacar que as po-
líticas linguísticas apresentam raízes nas políticas públicas, na me-
dida em que estas se pautam em movimentos de reivindicações so-
ciais e de lutas de direitos de segmentos sociais historicamente ne-
gados, entre os quais o movimento das pessoas surdas.
Lenzi (2018, p. 1) explica que as políticas públicas são:

Ações e programas que são desenvolvidos pelo Estado para garan-


tir e colocar em prática direitos que são previstos na Constituição
Federal e em outras leis. São medidas e programas criados pelos

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 90

governos dedicados a garantir o bem-estar da população. Além


desses direitos, outros que não estejam na lei podem vir a ser ga-
rantidos através de uma política pública. Isso pode acontecer com
direitos que, com o passar do tempo, sejam identificados como
uma necessidade da sociedade.

As políticas públicas visam, então, garantir, por meio de le-


gislações, programas e de estratégias de ações, os direitos de todos
os cidadãos, em termos de saúde, transporte, educação, entre ou-
tros.
Ao pensar nas políticas públicas, no campo da surdez, enfa-
tiza-se a importância de um espaço e de uma educação bilíngue
para surdos e profissionais capacitados em Libras, ou seja, instru-
tores e intérpretes.
Desse modo, as políticas linguísticas são, segundo Oliveira
(2016, p. 382), “[...] uma área das políticas públicas, concebidas e
executadas por instituições que têm ingerência na sociedade, como
os Estados, os governos, as igrejas, as empresas, as ONGs, e até as
famílias”. Nessa perspectiva:

A política linguística não é mais compreendida como uma inter-


venção na língua no âmbito de um Estado-nação, mas também está
presente em quaisquer níveis que envolvam decisões relacionadas
a línguas e suas variedades. Desse modo, essas decisões podem ser
realizadas por diferentes agentes como indivíduos, instituições su-
pragovernamentais, por exemplo, em diferentes espaços sociais
como na família, em lugares públicos, no ambiente de trabalho
(SOUSA; AFONSO, 2017, p. 41).

No campo da surdez, as políticas linguísticas são descritas,


principalmente, pela Lei de Libras nº 10.436, de 24 de abril de
2002, e pelo Decreto nº 5.626, de 22 de dezembro de 2005, o qual
legitima a Lei de Libras.
Lopes (2007, p. 47) reafirma o pensamento de Wrigley
(1996) ao mencionar que foi somente “[...] no final do XVIII que a
SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 91

surdez se torna um espaço de cultura e, por isso, de interesse para


uma reflexão de cunho filosófico”. A partir desse momento, o su-
jeito Surdo começa a ser problematizado e conceituado por sua di-
ferença linguística e não somente pela sua deficiência. Nessa pers-
pectiva, a surdez se efetiva no lugar da diversidade cultural e dife-
rença, pois: “Não se trata [...] de simplesmente negar a surdez para
começarmos a fazer um discurso da diferença surda; trata-se de
pensar outras formas de significação que permitem a criação de elo
entre semelhantes. É preciso compreender que uma distinção cul-
tural sempre passa pela diferença” (LOPES, 2007, p. 52).
Autores dessa política, entre os quais Klein (2010), Lopes
(2007) e Lodi (2013), destacam que, no momento em que a socie-
dade ancorou o surdo pelo ato de não ouvir e o materializou como
incapaz, impossibilitou-se de observar outros elementos que cons-
tituíam o sujeito Surdo como: a Língua Brasileira de Sinais; a apre-
ensão do mundo por suas experiências visuais; o fato de serem su-
jeitos bilíngues, dentre outros.
Assim, esse reconhecimento da diferença linguística surda
reafirma-se nas políticas linguísticas da LIBRAS. Em 2002, a LI-
BRAS ganha status de Língua, sendo reconhecida como meio de co-
municação e/ou expressão utilizado pelo sujeito surdo. A lei nº
10.436 destaca que: “Entende-se como Língua Brasileira de Sinais
– LIBRAS – a forma de comunicação e expressão, em que o sistema
linguístico de natureza visual-motora, com estrutura gramatical
própria, constitui um sistema linguístico de transmissão de ideias
e fatos, oriundos de comunidades de pessoas surdas do Brasil”
(BRASIL, 2002, p. 1).
Ao considerar a LIBRAS uma língua pertencente à comuni-
dade Surda, afirma-se “a língua de sinais como instrumento cultu-
ral” (LOPES, 2007, p. 28), o que está de acordo com a política lin-
guística do Decreto nº 5.626/05, que regulamenta a Lei de Libras

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 92

nº 10.426/02, que é referência para o campo da Libras, pois rea-


firma ser esta a língua natural do sujeito surdo, demarcando o iní-
cio de implantações dessa política nas áreas da inclusão educacio-
nal, social e linguística, e também no campo da saúde.
A partir do reconhecimento da LIBRAS como meio de comu-
nicação (BRASIL, 2002), o sujeito surdo conquista o direito linguís-
tico, mediante a diferença linguística presente nesse grupo mino-
ritário. De acordo com Coelho (2010, p. 200), “[...] passou a existir
um dispositivo legal que, não apenas reconhece a língua de uma
comunidade linguística minoritária, como garante o direito ao
acesso à educação das crianças surdas através dela”.
O reconhecimento da LIBRAS, enquanto língua da comuni-
dade surda, pode ser descrita mediante as lutas dos movimentos
sociais surdos e suas articulações com o Ministério da Educação.
Essas discussões e negociações ocorreram, de acordo com Lodi
(2013, p. 52-53), a partir da década de 1990.

As primeiras discussões relativas ao reconhecimento e à legaliza-


ção da língua de sinais e seu uso nos espaços educacionais tiveram
início no ano de 1996, a partir da realização da Câmara Técnica O
Surdo e a Língua de Sinais (BRASIL, 1996), promovida pela Coor-
denadoria Nacional para Integração da Pessoa Portadora de Defi-
ciência (Corde), vinculada à Secretaria dos Direitos da Cidadania
do Ministério da Justiça. Participaram da Câmara Técnica repre-
sentantes de universidades públicas e privadas do Brasil, estabe-
lecimentos de ensino para surdos, instituições voltadas ao desen-
volvimento de estudos e pesquisas sobre a Libras e representantes
da Federação Nacional de Educação e Integração do Surdo (Fe-
neis), por meio dos quais as comunidades surdas puderam ter voz
em todas as discussões realizadas. A Câmara Técnica caracterizou-
se como um fórum democrático que teve como objetivo principal
subsidiar as discussões referentes ao Projeto de Lei nº 131/96 em
tramitação no Senado Federal, que dispunha sobre o reconheci-
mento da Libras. Após quatro dias de intensos trabalhos, traçou-
se, no documento final, o contexto em que as pessoas surdas vi-
viam e apresentou-se a necessidade de legalização da Libras, a fim
SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 93

de ser possível a participação social dos membros das comunida-


des surdas como cidadãos brasileiros [...] O documento final serviu
de base para as discussões do Projeto de Lei nº 131/96 nas Comis-
sões Técnicas do Senado Federal e, após quase seis anos em trami-
tação, culminou na Lei nº 10.436/02.

A autora ainda destaca a participação da Câmara Técnica “O


surdo e a Língua de Sinais” e da instituição Federação Nacional de
Educação e Integração do Surdo (FENEIS) na elaboração do pro-
jeto de Lei nº 131/96, o qual versava sobre o reconhecimento da
LIBRAS. Todavia, ela só foi reconhecida oficialmente com meio le-
gal de comunicação e expressão em 22 de abril de 2002, por meio
da Lei nº 10.436.
De acordo com Klein (2010), a década de 1990 é caracteri-
zada como um período de intensas mobilizações da comunidade
surda, dos pesquisadores da Língua Brasileira de Sinais e dos fami-
liares das pessoas surdas, pelo reconhecimento da Libras como
primeira língua dos surdos. Por isso, ela pontua a importância dos
movimentos surdos na efetivação da política linguística: os “[...]
movimentos surdos são entendidos como movimentos sociais ar-
ticulados a partir de aspirações, reivindicações, lutas das pessoas
surdas no sentido do reconhecimento de sua língua, de sua cul-
tura” (KLEIN, 2010, p. 75).
Lodi (2013) descreve que, em 2004, uma comissão de tra-
balho começou a elaborar uma proposta de regulamentação da Lei
de LIBRAS (BRASIL, 2002), que se efetivou em 22 de dezembro de
2005 com o Decreto Federal nº 5.626 (BRASIL, 2005). Esse Decreto
versa sobre as medidas destinadas para a formação de profissio-
nais para atuação com sujeitos surdos, como: professores bilín-
gues; professores de LIBRAS e de Língua Portuguesa como L2 para
surdos; instrutores e intérpretes de LIBRAS. Somando-se a isso a
inclusão social e educacional, a garantia de acessibilidade à pessoa

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 94

surda em todos os espaços sociais e o tratamento de saúde a ela.


Nesse sentido, destacam-se dois pontos importantes no Decreto: a
implementação da Libras como disciplina obrigatória nos cursos
de licenciatura e a conceituação de pessoa surda.
O Decreto 5.626, de 22 de dezembro de 2005, destaca a in-
clusão da LIBRAS como disciplina curricular nos cursos de forma-
ção de professores. No Art. 3º estabelece que:

Art. 3º A Libras deve ser inserida como disciplina curricular


obrigatória nos cursos de formação de professores para o
exercício do magistério, em nível médio e superior, e nos
cursos de Fonoaudiologia, de instituições de ensino, públi-
cas e privadas, do sistema federal de ensino e dos sistemas
de ensino dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios
(BRASIL, 2005, p. 1).

O marco da inserção de disciplinas sobre a educação espe-


cial nos currículos de formação docente, neste caso a Educação dos
Surdos, deu-se após a promulgação da Lei nº 10.436, que reco-
nhece a Língua Brasileira de Sinais como língua oficial dos surdos.
Em seu Art. 4º, expressa a obrigatoriedade de as instituições de
formação docente inserirem em seus currículos a disciplina LI-
BRAS.
Segundo Brasil (2005, p. 1), “Considera-se pessoa surda
aquela que, por ter perda auditiva, compreende e interage com o
mundo por meio de experiências visuais, manifestando sua cultura
principalmente pelo uso da Língua Brasileira de Sinais-LIBRAS”.
Nessa perspectiva, “[...] a surdez como diferença refere-se a uma
minoria linguística que faz uso de outra língua, a Língua de Sinais”
(KLEIN, 2004, p. 89).
Reconhecer a alteridade da pessoa Surda parte do pressu-
posto de aceitá-la não somente como excluída por uma sociedade
a qual busca o padrão da normalização, mas também como sujeito

SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 95

de sua própria história social e cultural. Dessa maneira, quando eu


aceito o outro, eu o aceito com todas suas particularidades, peculi-
aridades e individualidades, tendo sob ele o olhar da “[...] diferença
dentro da diferença, uma visão mais complexa do diferente, para
além do paradigma da diversidade” (FLEURI, 2006, p. 495).
No posicionamento conceitual da diferença surda, Lopes
(2007, p. 71) argumenta que:

[...] ela não se dá no fato de o indivíduo ser surdo, mas de este viver
em comunidade e compartilhar, com seus pares, uma língua viso-
gestual, uma forma de viver e de organizar o tempo e o espaço; en-
fim, é entre sujeitos semelhantes de uma mesma comunidade que
os surdos são capazes de se colocar dentro do discurso da dife-
rença cultural.

Outrossim, compreende-se que o Surdo precisa de outro(s)


Surdo(s) para construir sua identidade de Surdo e isso ocorre por
meio da partilha do encontro dialógico, afetivo, linguístico e iden-
titário, presente na comunidade surda.
Na França, a educação bilíngue é estabelecida em 2005, vin-
culada ao direito dos alunos com deficiência à educação, ou seja, as
ações realizadas em favor da escolarização dos alunos surdos pelo
Ministério da Educação Nacional têm por base a lei de 11 de feve-
reiro de 2005, aplicada em 01 de janeiro de 2006, que visa garantir
a igualdade de direitos, a participação e cidadania às pessoas com
deficiência. A lei afirma o direito dos alunos com deficiência à edu-
cação, bem como a responsabilidade do sistema educativo em pos-
sibilitar a continuidade do percurso de formação de cada um.
Desta forma, o ano de 2005 foi importante para a educação
de surdos tanto da França e do Brasil, porque foi implantada, nesse
período, a educação bilíngue para surdos nos dois países. Porém,
no Brasil, apesar de estar legalmente estabelecida, a educação bi-
língue ainda não está presente em todas as escolas especializadas.

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 96

Já na França, apesar do discurso inclusivo, a educação especial


mantém laços fortes com o modelo terapêutico-clínico, conside-
rando sua proximidade com a área da saúde.
De acordo com professores e assistentes sociais entrevista-
dos na França, a educação de surdos, em termos de utilização da
LSF, faz parte da luta dos movimentos sociais, e vem crescendo
gradativamente, porém, a política de inclusão atende a todas as de-
mandas das pessoas surdas: oralizados, por meio da sinalização, e
os que utilizam implante coclear. É a pessoa surda que escolhe o
tipo de educação que deseja e a escola garante o atendimento edu-
cacional. Quando criança é a família que determina qual a educação
dos filhos surdos.
A Assistente Social Mirela explicou: “É mesmo uma opção, de-
pende do aluno, se ele escolher ser uma comunicação oral, nós o
deixamos usar a oralidade. Se ele escolher ser uma comunicação
por sinal, nós aqui em Saint Jacque o deixamos utilizar sinais”.In-
formou também que “[...] os professores do Instituto Nacional de
Jovens Surdos – INJS se adaptam completamente ao modo de co-
municação do aluno. Isto é bom”, e acrescentou que “[...] os profes-
sores possuem formação para se comunicar direto com aluno e ex-
plicar seja em código, em sinal ou oral”.
No Brasil, apesar de termos a mesma demanda de surdos, o
processo educacional na política inclusiva centra-se no acesso à LI-
BRAS, não sendo possibilitado à pessoa surda o direito de escolha.
É claro que o uso da LIBRAS é necessário, porque viabiliza a comu-
nicação entre surdos e entre surdos e ouvintes, mas é preciso le-
var-se em conta também as especificidades históricas, culturais e
sociais de cada pessoa. Nesse caso há necessidade de considerar-
se a presença na educação brasileira de surdos oralizados e com
implante coclear, que precisam ter acesso à educação sem serem
discriminados.

SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 97

É importante destacar que as políticas linguísticas (BRASIL,


2002; 2005), os movimentos sociais e as pesquisas acadêmicas no
campo da surdez tornaram possível enxergar o sujeito Surdo não
mais pela ótica da correção acerca de um corpo com dano, mas
como sujeito social, capaz de ser ensinado, de trabalhar e viver ple-
namente na sociedade. Mas precisamos avançar na luta em favor
da educação de surdos, que contemple a diversidade e a complexi-
dade dessa educação.
A “[...] língua de sinais é oficialmente reconhecida, então sua
presença dever ser efetiva em qualquer espaço” (LOPES, 2007, p.
76). Isso não significa deixar de reconhecer as demandas de outros
segmentos da população surda, que perpassa pelo reconhecimento
do outro em sua diferença de alteridade.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O Brasil vem recebendo historicamente, em termos de polí-


tica de educação especial e educação de surdo, influência da
França, inicialmente por meio da criação daprimeira escola para
surdos no Rio de Janeiro, o “Imperial Instituto dos Surdos-mudos”,
atual “Instituto Nacional de Educação de Surdos”. Depois, por meio
da política de integração, com a criação das classes especiais nas
escolas regulares e o atendimento educacional, realizado nas esco-
las especializadas e nas classes especiais, tendo como modelo o te-
rapêutico-clínico.
A implantação dessa educação inclusiva vai ser motivada
nos dois países pela Declaração de Salamanca, sendo que o Brasil
inicia o processo nos anos 1990, direcionando o olhar para a es-
cola, e a França, mais tardiamente, com um olhar para a política
social, envolvendo todas as políticas públicas, não apenas a educa-
cional.

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 98

A proposta de educação bilíngue é um ponto de diálogo en-


tre os dois países, iniciado no mesmo ano, em 2005, bem como o
olhar para a educação inclusiva como direito. Entretanto, no Brasil,
a educação bilíngue ainda não está presente em todas as escolas
especializadas e, na França, a educação especial mantém laços for-
tes com o modelo terapêutico-clínico, considerando seu vínculo,
inclusive financeiro, com a área da saúde.
Vemos, então, existir um diálogo entre a educação do Brasil
e a da França, mas os distanciamentos perpassam pela consolida-
ção, no Brasil, da LIBRAS, com especificidades próprias, e que vem
crescendo significativamente no país, com garantia na legislação
brasileira; a política de inclusão que, no Brasil, ao focar predomi-
nantemente na escola, obstaculiza a interseção com as demais po-
líticas públicas, estando a educação de surdos voltada para a sina-
lização, apesar de, na escola e na sociedade, haver presença de sur-
dos oralizados e de surdos com implante coclear, que, por sua situ-
ação, sofrem discriminação social.
Há, portanto, necessidade de se pensar as políticas públicas
de forma integrada, voltadas para a inclusão, mas de forma que
possibilitem o diálogo entre as teorias e as práticas, respeitando a
diversidade de sujeitos e a complexidade da educação especial,
mantendo os princípios democráticos de pensar e agir diferente-
mente com respeito ao outro em sua alteridade.

REFERÊNCIAS

BRASIL. Casa Civil. Lei n. 10436 de 24 de abril de 2002. Dispõe sobre a Lín-
gua de Sinais e outras providências. Brasília, DF, 2002. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/2002/L10436.htm. Acesso em: 28
fev. 2019.

______. Casa Civil. Decreto n. 5.626 de 22 de dezembro de 2005. Regulamenta


a Lei n. 10.436, de 24 de abril de 2002, que dispõe sobre a Língua Brasileira de
SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 99

Sinais – Libras. Brasília, DF, 2005. Disponível em: http://www.pla-


nalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004.../2005/decreto/d5626.htm. Acesso em: 08
fev. 2019.

COELHO, Orquídea. Da lógica da justificação à lógica da descoberta. Ser surdo


num mundo ouvinte: um testemunho autobibliográfico. Cadernos de Educa-
ção, FaE/PPGE/UFPel/Pelotas, v. 36, p. 197-221, maio/ago. 2010. Disponível
em: https://periodicos.ufpel.edu.br/ojs2/index.php/caduc/arti-
cle/view/1607/1490. Acesso em: 1 set. 2019.

FLEURI, Reinaldo Matias. Políticas da Diferença: Para além dos Estereótipos na


Prática Educacional. Educ. Soc., Campinas, v. 27, n. 95, p. 495-520, maio/ago.
2006. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/es/v27n95/a09v2795.pdf.
Acesso em: 22 jan. 2019.

KLEIN, Madalena. Cultura Surda e a inclusão no mercado de trabalho. In:


THOMA, Adriana da Silva; LOPES, Maura Corcini (org.). A invenção da surdez:
cultura, alteridade, identidade e diferença no campo da educação. Santa Cruz
do Sul, SC: EDUNISC, 2004. p. 83-102.

______. Os discursos sobre surdez, trabalho e educação e a formação do surdo


trabalhador. In: SKLIAR, Carlos (org.). A surdez: um olhar sobre a diferença.
Porto alegre: Mediação, 2010. p. 75-92.

LENZI, Tié. O que são as políticas públicas? Toda Política, 26 abr. 2018. Dispo-
nível em: https://www.todapolitica.com/politicas-publicas/. Acesso em: 12
mar. 2019.

LODI, Ana Claudia Balieiro. Educação bilíngue para surdos e inclusão segundo
a política nacional de educação especial e o decreto nº 5.626/05. Educação e
Pesquisa, São Paulo, v. 39, n. 1, p. 49-63, jan./mar. 2013. Disponível em:
http://www.scielo.br/pdf/ep/v39n1/v39n1a04.pdf. Acesso em: 26 set. 2019.

LOPES, Maura Corcini. Surdez e Educação. Belo horizonte: Autêntica, 2007.

OLIVEIRA, Gilvan Müller de. Políticas Linguísticas: uma entrevista com Gilvan
Müller de Oliveira. ReVEL, v. 14, n. 26, p. 382-399, 2016. Disponível em:

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 100

http://www.revel.inf.br/files/e92f933a3b0ca404b70a1698852e4ebd.pdf.
Acesso em: 26 fev. 2019.

OLIVEIRA, Ivanilde Apoluceno de. Saberes, imaginários e representações na


educação especial: a problemática ética da “diferença” e da exclusão social,
Petrópolis, RJ: Vozes, 2005.

PLAISANCE, Eric. O Especial na Educação: significados e usos. Revista Educa-


ção & Realidade, Porto Alegre, v. 44, n. 1, 2019. Disponível em:
http://www.scielo.br/scielo. Acesso em: 9 ago. 2019.

ROCHA, Solange Maria. Antíteses, Díades, Dicotomias no Jogo entre Memó-


ria e Apagamento Presentes nas Narrativas da História da Educação de
Surdos: um olhar para o Instituto Nacional de Educação de Surdos
(1856/1961), 160 f. 2009. Tese (Doutorado em Educação) – Departamento de
Educação, Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro.
2009. Disponível em: https://sites.google.com/site/pesquisassobresurdez/so-
lange-maria-da-rocha. Acesso em: 28 set. 2019.

SOUSA, Socorro Cláudia Tavares de; AFONSO, Lília dos Anjos. Políticas linguís-
ticas sobre a Libras: as crenças dos estudantes de letras. Revista de Letras,
Fortaleza, v. 2, n. 35, jun. 2017. Disponível em: http://www.periodi-
cos.ufc.br/revletras/article/view/19335. Acesso em: 26 mar. 2019.

STROBEL, Karin. História da Educação dos Surdos. Florianópolis: Universi-


dade Federal de Santa Catarina, 2009. (Coleção Letras-Libras: eixo Formação
Específica. Licenciatura em Letras-LIBRAS na modalidade a distância). Dispo-
nível em: http://www.libras.ufsc.br/colecaoLetrasLibras/eixoFormacaoEspe-
cifica/historiaDaEducacaoDeSurdos/assets/258/TextoBase_HistoriaEducaca-
oSurdos.pdf. Acesso em: 28 set. 2019.

UNESCO. Declaração de Salamanca e linha de ação sobre necessidades


educativas especiais. Brasília, DF: CORDE, 1994.

WRIGLEY, Owen. The politics of deafnes. Washington: Gaullaudet University


Press, 1996.

SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 101

CAPÍTULO 4
DIMENSÕES DE UMA TRAJETÓRIA
AUTOFORMATIVA COMO ALFABETIZADORA
BILINGUE DE CRIANÇA SURDA

Elizabete Siqueira Ribeiro


Luzia Guacira dos Santos Silva

INTRODUÇÃO

Neste capítulo trataremos sobre uma trajetória auto forma-


tiva no campo da alfabetização bilíngue, em contexto informal,
como constituinte da realidade profissional e da transformação de
si mesmo. Para tanto, refletimos com base na literatura sobre for-
mação de professores e sua importância no processo auto forma-
tivo, vislumbrando a formação do profissional para ensino da Li-
bras. O estudo aponta que: a) para uma prática consciente no
campo da autoformação, o indivíduo deve buscar o autoconheci-
mento, utilizando todas as ferramentas disponíveis para tal; b) a
inexistência de escolas ou centros de formação específicos para
professores de surdos, os levaram a assumirem a responsabilidade
por sua formação e autoformação; c) que alunos surdos, assim
como os demais, precisam de professores comprometidos com a
sua formação e autoformação contínuas de modo que possam ob-
ter o domínio não apenas de conteúdos técnicos, mas que sejam
conhecedores de si mesmos, e das peculiaridades de seus alunos.

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 102

A autoformação pode apresentar dimensões sobre as quais não se


tem clareza durante o processo autoformativo.

FORMAÇÃO E AUTOFORMAÇÃO NO CONTEXTO GERAL DA


EDUCAÇÃO

A priori, é relevante iniciarmos nossa reflexão sobre a auto-


formação no contexto geral da educação, tratando brevemente do
tema formação de professores, que passou a ser posto em evidên-
cia, no Brasil, a partir da década de 1980, quando a escola tinha seu
papel como um aparelho ideológico do Estado e, o ensino, como
uma ação reprodutora dos conhecimentos. Nesse período,a ordem
era “reciclar” os professores por meio de cursos e oficinas de
tempo reduzido, com ênfase nos conteúdos de sala de aula e em
aspectos específicos do ensino, para que pudesse reverter o caos
em que haviam colocado o ensino e, assim, romper com o quadro
de fracasso da educação (SILVA, 2011).
Desse período para o atual século XXI, podemos afirmar que
muitas ações em torno da formação de professores foram e veem
sendo desenvolvidas em busca de se estabelecer mudanças que le-
vem à melhoria da educação, de forma a atender as novas deman-
das da sociedade. Para Silva (2011, p. 10), nessas formações tem
faltado:

[...] análise crítica da situação em que se encontram as escolas onde


esses sujeitos [os professores] trabalham e da discussão crítica so-
bre os diferentes fatores sociais, psicológicos, econômicos e políti-
cos que interferem sobremaneira no fazer pedagógico de qualquer
professor, mesmo que esse não tenha plena consciência disso
(SILVA, 2011, p. 10).

SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 103

Concordamos com Silva (2011), pois diante das novas medi-


das educacionais voltadas para a inclusão escolar de crianças, que
até meados da década de 1990 estudavam em escolas e/ou classes
especiais, em escolas e salas de aula comuns, é imperioso conhecer
as razões sociais, econômicas e políticas que levaram a tomada da-
quelas medidas e como elas interferem nas práticas escolares nos
dias atuais. Assim como é urgente formações que levem aos pro-
fessores novos saberes da ordem do específico, para que possam
criar possibilidades para a produção de novos conhecimentos em
atenção à diversidade de alunos que demandam de outras formas
de ensinar, pois aprendem de forma diferente do como se ensina
nas escolas comuns, como é o caso das crianças surdas.
Para Dominicé (2014, p.90) a formação:

[...] depende do que cada um faz do que os outros qui-


seram, ou não quiseram, fazer dele. Numa palavra, a
formação corresponde a um processo global de auto-
nomização, no decurso do qual a forma que damos a
nossa vida se assemelha – se é preciso utilizar um
conceito – ao que alguns chamam de identidade.

Entendemos “identidade”, como um conjunto de fatores de


ordem cultural, familiar, físico e comunitário que compõe um su-
jeito. E como formação, os eventos, as atitudes e os saberes que re-
cebemos de alguém ou buscamos de forma voluntária ao longo de
nossa trajetória. Porém, uma questão ressoa, a fim de nos fazer re-
fletir. Quando e como nos formamos? Gattegno, citado por Jo-
sso (2010, p.71) nos diz que:

Formamo-nos quando integramos na nossa consciência, e nas


nossas atividades, aprendizagens, descobertas e significados efe-
tuados de maneira fortuita ou organizada, em qualquer espaço so-
cial, na intimidade com nós próprios ou com a natureza.

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 104

A formação é essencial para uma prática relevante, ou seja,


para atender a diversidade de formas de ser e de aprender dos alu-
nos, e precisa acontecer de forma continuada, para instrumentali-
zar os professores a fazerem bem o seu trabalho, também com
aqueles alunos considerados “especiais” por sua condição de sur-
dez, e para que não continuem a serem responsabilizados pelas fa-
lhas existentes nos sistemas de ensino, pois como afirma Nóvoa
(1999) citado por Silva (2011, p. 11): “ Os professores enfrentam cir-
cunstâncias de mudança que os obrigam a fazer mal o seu trabalho, tendo
de suportar a crítica generalizada, que, sem analisar essas circunstâncias,
os considera como responsáveis imediatos pelas falhas dos sistemas de
ensino”.
Entendemos que os professores carecem de reconhecimento
social e de serem valorizados pelo que fazem com salários dignos,
com uma carga horária de trabalho que permita estarem em conti-
nua formação; que os levem a desenvolver cada vez mais a capaci-
dade investigativa e propositiva; que os encorajem a enfrentar os
desafios que o trabalho com a diferença nos traz.
De acordo com Bicudo (2003 apud SILVA, 2011, p. 11), a for-
mação implica em “[...] reconhecimento das trajetórias próprias
dos homens e mulheres, bem como exige a contextualização histó-
rica dessas trajetórias, assumindo a provisoriedade de propostos
de formação de determinada sociedade”. Percebe a formação como
algo inacabado, com lacunas, mas profundamente comprometida
com uma maneira de olhar, explicar e intervir no mundo.
É fato que a necessidade de formação docente foi pensada ini-
cialmente por Comenius, no século XVII. Porém, de acordo com
Borges, Aquino e Puentes (2011),

O Seminário dos Mestres, instituído por São João Batista de La


Salle, em 1684, foi o primeiro estabelecimento de ensino destinado
à formação de professores. Mas, somente após a Revolução Fran-
cesa, mais precisamente no fim do século XVIII, iniciou-se o
SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 105

processo de valorização da instrução escolar, período em que fo-


ram criadas as Escolas Normais com a finalidade de formar profes-
sores (BORGES, AQUINO E PUENTES, 2011, p. 95)

No entanto, não havia ainda uma formação específica para


professores de língua de sinais. Contudo, de acordo com Stro-
bel (2008), a língua de sinais já existia antes de Cristo e está pre-
sente em muitas histórias no mundo. Diante tais fatos, levantamos
a hipótese de que um dos fatores que serviram de vetor da não for-
mação de professores na língua de sinais tenha sido a concepção
existente em torno da pessoa surda que, à época, era vista e tra-
tada como um ser amaldiçoado, possesso de demônios, desprivile-
giado, incapaz de aprender, e ainda, associavam a surdez à defici-
ência intelectual.

A EDUCAÇÃO DE SURDOS

Os poucos relatos históricos encontrados na bibliografia es-


pecializada apontam parao uso da língua gestual na antigui-
dade, em contextos não-formais e, notadamente, por pessoas ou-
vintes, tal como relatado por Lacerda (2014, p.67): “[...] na Itália do
século 530 d.C monges beneditinos empregavam uma forma de si-
nais para comunicação entre si, a fim de não violar o rígido voto de
silêncio”. Martins (2015), por sua vez, ressalta que:

No Renascimento, surgiram as primeiras experiências educacio-


nais com pessoas com deficiência, com a propagação das ideias
chamadas humanistas. Direcionadas, principalmente para as então
denominadas pessoas surdas-mudas (MARTINS, 2015, p. 28)

Em sua maioria, os casos registrados de atendimento educa-


cional às pessoas surdas, eram de surdos de famílias abastadas,
que ora os pais pagavam por preceptores para auxiliá-los em sua

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 106

educação, ora os próprios pais tentavam educá-los criando meto-


dologias próprias, quer por motivos nobres em mostrar a socie-
dade preconceituosa que seu filho surdo também era capaz de
aprender, quer por motivos de herdades financeiras.
No século XVI, o médico Girolamo Cardano, estudou o caso de
seu filho surdo e passou a afirmar que a surdez não alterava a in-
teligência e, que surdos eram capazes de aprender, sendo o pro-
cesso de leitura e escrita a melhor forma de ensiná-los (LACERDA,
2014).
Neste período,haviam muitos educadores que criavam dife-
rentes tipos de metodologias experimentais para ensinar os sur-
dos, por vezes baseada na oralidade, em datilologias ou na criação
de sinais convencionais. Outros, apenas prestavam o assistencia-
lismo, com base na perspectiva médica, aplicando exercícios fono-
lógicos de repetições, com intuito de tentar transformar os surdos
em meros modelos ouvintistas. Temos relatos de Lacerda (2014),
que destaca que, ainda no século XVI, na Espanha, o monge bene-
ditino Pedro Ponce de Leon (1520 – 1584):

Estabeleceu um método formal para a educação de surdos em um


monastério de Valadolid. Inicialmente ensinavam Latim, Grego e
Italiano, conceitos de física e astronomia a dois irmãos surdos.
Francisco e Pedro Velasco, membros de uma importante família de
aristocratas espanhóis. Francisco conquistou o direito de receber
a herança como marquês de Berlanger e Pedro se tornou Padre,
com a permissão do Papa. Ainda Pedro Leon criou métodos para
educar surdos por meios de datilologia, escrita e oralização e criou
também uma escola para professores surdos. Após sua morte não
houve publicação e seu método caiu no esquecimento, pois a tra-
dição na época era guardar segredo sobre os métodos de educação
de surdos. (LACERDA, 2014, p.67)

Como se vê, Pedro Ponce de Leon chegou a criar métodos e


a fundar uma escola para professores surdos. Algo inédito para

SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 107

aquela época! Infelizmente, por não haver uma troca e publicação


de conhecimentos, muitos de seus trabalhos não tiveram divulga-
ção nem continuidade.
Ao longo da história, como citado acima, constata-se casos de
sucesso na instrução e educação de surdos. Muitos desses precep-
tores foram considerados autodidatas, buscando conhecimento
através de leituras e experimentos com os próprios alunos surdos.
E, como não havia escolas ou centros de formação específicos para
professores de surdos, verifica-se que os próprios assumiram a
responsabilidade por seu conhecimento e autoformação.
Outro nome que se destacou na educação de surdos foi Juan
Pablo Bonet (1579 – 1623). De acordo com Martins (2015, p.31):

Juan Pablo Bonet escreveu sobre as causas da deficiência audi-


tiva e dos problemas da comunicação, condenando os métodos
brutais e gritos para ensinar a alunos surdos, que eram muitas ve-
zes usados, em 1620 ele publicou a obra “redação das letras e arte
de ensinar os mudos a falar”, que é considerado o primeiro manual
de ensino de surdos-mudos, exercendo grande influencia nesta
área também em outros países. Demonstrou também, pela pri-
meira vez o alfabeto sobre a forma de sinais.

Grande parte do atendimento aos surdos se deu com base


em metodologias da oralização, ou da desmutização. Lacerda
(2014) nos aponta que em 1775, na Alemanha, Samuel Heinicke
foi o pioneiro do método do Oralismo puro. Se opôs fortemente a
utilização das línguas de sinais. Esse tipo de atendimento priori-
zava transformar surdos em falantes, e ensinar-lhes a leitura labial,
desprezando dessa forma todo um contexto formativo essencial
para formação educacional de um surdo.
Contudo, a situação educacional dos surdos começa a mu-
dar na França em 1760, com a primeira escola pública para

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 108

surdos, criada com recursos próprios do abade L’Epée, conforme


registrou Honora (2014,p.53):

A primeira instituição educacional pública para surdos foi o Insti-


tuto Nacional para surdos-mudos, criada em 1760 pelo abade
Frances Charles Michel de L’Epée, que atualmente recebe o nome
de Instituto nacional de jovens surdos de Paris. Considerado o “pai
dos surdos” e defensor da língua de sinais. Em 1776, publicou o
livro: “A verdadeira maneira de instruir surdos-mudos. Faleceu
em 1789, tendo fundado um total de 21 escolas para surdos na
França e em outros países da Europa.

A escola de L’Epée foi precursora no atendimento aos sur-


dos e inspirou a abertura de várias outras escolas de surdos pelo
mundo no final do século XVIII. Lacerda (2014) nos descreve
que, L’Epée, aprendeu a língua de sinais usada pela comunidade
dos surdos franceses. A partir dessa língua criou os sinais metódi-
cos, respeitando a língua já utilizada pela comunidade surda
usando-a em práticas educacionais.
De acordo com Goldfeld (2002), o século XVIII é conside-
rado o período mais fértil da educação dos surdos. L’Epée e seu se-
guidor Sicard acreditavam que todos os surdos, independente-
mente do nível social, deveriam ter acesso a educação pública e
gratuita. Nas palavras de Sacks (2010, p.37):

Esse período que agora parece uma espécie de época áurea na his-
tória dos surdos, testemunhou a rápida criação de escolas para
surdos, de um modo geral dirigidos por professores surdos, em
todo o mundo civilizado, a saída dos surdos da negligência e da
obscuridade, sua emancipação e cidadania, a rápida conquista de
posições de eminência e responsabilidade - escritores surdos, en-
genheiros surdos, filósofos surdos, intelectuais surdos, antes in-
concebíveis, tornaram-se subitamente possíveis.

SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 109

A educação de surdos avançava. Muitas escolas e universi-


dades foram criadas, e neste momento já não era apenas em cará-
ter de assistencialismo. O potencial da pessoa surda passou a ser
explorado e valorizado, tendo como base a língua de sinais.
O ensino se tornou promissor para a comunidade surda, in-
centivando e despertando interesse ao redor do mundo para fun-
dação de outras escolas de surdos. E, então, chega à vez das Amé-
ricas. Lacerda (2014) nos conta que no século XIX:

[...] o americano Thomas Gallaudet parte para a Europa para bus-


car métodos de ensinos aos surdos. Na Inglaterra, Gallaudet foi co-
nhecer o trabalho realizado por Braidwood, na escola Wat-
son´s Asylum, a primeira escola inglesa para surdos, privada, onde
se valorizava a leitura orofacial. Como a metodologia era guardada
de modo secreto e se recusaram a expor, Gallaudet foi para França,
onde foi bem acolhido e se impressionou com o método da língua
de sinais usado pelo abade Sicard. Em 1864, Edward Gallau-
det fundou a primeira universidade norte americana para sur-
dos, a Gallaudet University, em Washington. (LACERDA, 2014,
p.68)

Método que também se fez repercutir no ensino a surdos


aqui no Brasil, com a vinda, durante o Império, do professor fran-
cês surdo Hernest Huet com objetivo de fundar um colégio para
surdos. (HONORA, 2014). Podemos ratificar esse fato histórico nas
palavras de Goldfeld (2002, p.32), quando diz que:

No Brasil, em 1855, chegou aqui o professor surdo francês Her-


nest Huet, trazido pelo imperador D. Pedro II, para iniciar o traba-
lho de educação de duas crianças surdas, com bolsas de estudo pa-
gas pelo governo. Em 26 de setembro de 1857 é fundado o instituto
nacional de surdos-mudos, atual instituto nacional de educação de
surdos (INES), que utilizava a língua de sinais. Criado pela lei nº
939 de 26 de setembro de1857.

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 110

O neto de D. Pedro II seria uma das duas crianças beneficia-


das com a chegada do professor. (HONORA, 2014) Percebe-se que
desde essa época a classe abastada já se apoderava das verbas pú-
blicas em benefício próprio. Assim, sob o interesse inicial de bus-
car uma educação de qualidade para seu neto surdo, o atual INES
foi fundado por D. Pedro II, no Rio de Janeiro no bairro de Laran-
jeiras, desenvolvendo o trabalho educacional na perspectiva bilín-
gue. É, na atualidade, considerado o maior colégio brasileiro de re-
ferência no ensino de surdos, com oferta de atendimento da edu-
cação básica até a pós-graduação, além de opcionalmente, ofertar
atendimentos médicos e fonoaudiológicos aos alunos. Eis o por-
quê da Língua de Sinais brasileira - Libras, ter origem na Língua
Francesa de Sinais.
É possível afirmar, com base em Honora (2014) que um
marco negativo para a educação de surdos foi o II Congresso Inter-
nacional sobre instrução de Surdos, em Milão, no ano de 1880.
Houve uma votação sobre o melhor método de instrução de sur-
dos, porém, os professores surdos foram impedidos de votar, ven-
cendo, portanto, o método Oralista, como nova referência mundial
para a educação de surdos.
Em 1911, o INES aboliu o uso da LIBRAS na educação dos
surdos, visto as determinações do congresso de Milão, passando a
redirecionar a educação de surdos, a métodos de repetições foné-
ticas e leitura labial, baseados na metodologia do Ora-
lismo puro. De acordo com Goldfeld (2002, p.34) “O Oralismo per-
cebe a surdez como deficiência que deve ser minimizada pela esti-
mulação auditiva. O objetivo do Oralismo é fazer uma reabilitação
da criança surda em direção da normalidade, à “não surdez”.
Tal percepção e determinação trouxeram sérios prejuízos
ao desenvolvimento dos surdos. A proibição do uso de sinais, fato
que perdurou por cem anos, levou a um grande insucesso na edu-
cação de surdos daquela época que, “após oito ou dez anos de
SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 111

escolarização, se tornaram sapateiros ou costureiros, não che-


gando a oralização, e assim eram considerados retardados”. (HO-
NORA, 2014, p. 57).
Em 1987, de acordo com Gesser (2009), foi fundada a FE-
NEIS – Federação Nacional de Educação e Integração dos Surdos,
no Rio de Janeiro, responsável, dentre várias coisas, pela luta dos
surdos em defesa do direito ao uso da LIBRAS.
Nos Estados Unidos, em 1960, com a publicação do traba-
lho de W. Stokoe, comprovando cientificamente que as Línguas de
sinais são línguas naturais como quaisquer outras, fez com que a
educação de surdos mudasse o foco metodológico para a Comuni-
cação Total. (SÁ, 1999)
Aqui no Brasil, outro instituto importante para a história da
educação e formação de surdos, foi o Instituto Santa Terezinha,
fundado em 1929, sendo inicialmente um internato para meninas
surdas. (HONORA, 2014)
De acordo com Mazzotta (2001), em 1952, no estado de São
Paulo, a escola municipal Helen Keller foi fundada e reconhecida
como I Núcleo Educacional para crianças surdas do estado. Outra
instituição que muito contribuiu para a educação de surdos é o Ins-
tituto educacional São Paulo – IESP, fundado em 1954 e depois do-
ado para a Pontifícia Universidade Católica de São Paulo –
PUCSP. (HONORA, 2014)
Estas instituições, criadas para o atendimento educacional
de surdos no exterior e no Brasil. Atualmente, trabalham na pers-
pectiva do ensino bilíngue.

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 112

APARATOS LEGAIS EM TORNO DA FORMAÇÃO DO PROFISSIO-


NAL DA EDUCAÇÃO ESPECIAL E PARA ENSINO DA LIBRAS NO
BRASIL

A Política Nacional de Educação Especial numa perspectiva


Inclusiva (2008) foi criada com base em vários outros documentos
nacionais e internacionais, que determinam que a educação seja
inclusiva, tais como: Constituição Federal (1988), a Lei de Diretri-
zes e Bases da Educação – LDB – (1996), a Declaração de Sala-
manca sobre Princípios, Política e Prática na área das Necessidades
Educativas Especiais (1994) e a Declaração da Guatemala criada
na Convenção Interamericana para a Eliminação de Todas as For-
mas de Discriminação para Pessoa Portadora de Deficiência
(1999), dentre outros.
De acordo com Lodi (2013, p.165), a educação inclusiva, en-
tende os processos educacionais inclusivos como “uma ação polí-
tica, cultural, social e pedagógica, desencadeada pelo direito de to-
dos os alunos de estarem juntos, aprendendo e participando, sem
nenhum tipo de discriminação.” Em outras palavras, a proposta
ressalta a importância da interação e troca entre alunos, a fim de
aprenderem a partir de suas diferenças.
Mazzota, citado por Lacerda (2014), nos diz que a nossa Po-
lítica Nacional de Educação Especial numa perspectiva Inclusiva -
PNEE, baseada na Declaração de Salamanca (1994), preconiza que
todas as crianças com transtornos globais do desenvolvimento e
com altas habilidades/superdotação em idade escolar devem ser
introduzidas em sala de aula regular, entendendo que a heteroge-
neidade propiciada pela diversidade desses sujeitos em sala de
aula aconteça de forma a enriquecer o grupo.
A história da Educação Especial deixa notórias as mudanças
ocorridas no paradigma de atendimentos a tais alunos, que

SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 113

passaram pela fase de total exclusão em centros específicos. Garcia


(1989, apud SILVA, 2009 p.26), nos esclarece que:

Já no século XVII e XVIII, na forma de atrair a caridade, compra-


vam-se nos asilos, crianças deficientes, que eram barbaramente
mutiladas e abandonadas à sua sorte quando, com o avançar da
idade, deixavam de ter utilidade. Ao longo do século XIX e da pri-
meira metade do século XX os deficientes foram inseridos em ins-
tituições marcadas por serem assistencialistas. Estas instituições
eram construídas longe das povoações, onde as pessoas deficien-
tes, afastadas de suas famílias e vizinhos, permaneceriam incomu-
nicáveis e privadas de liberdade.

O conceito de deficiência estático e permanente cedeu lu-


gar a uma visão mais dinâmica e humanística da deficiência. Uma
das consequências fundamentais da normalização é a integra-
ção. A ideia é oferecer com o passar do tempo, a exclusão total, na
qual a deficiência era considerada como algo estático e perma-
nente, começou a ser questionada por segmentos sociais, surgindo
à fase da Integração, nos anos de 1960, sob os fundamentos da Te-
oria da Normalização. Nesta teoria, a deficiência era vista de forma
mais dinâmica e humanista. Baseava-se na ideia de que às pessoas
com deficiência deveriam ter condições de vida semelhantes à do
resto da sociedade, tendo como principal princípio a socialização.
No meio escolar, na década de 1970 em solo brasileiro,
essa fase configurou-se com o ingresso daquelas pessoas nas esco-
las comuns, porém em classes separadas e sem nenhum tipo de
adaptação metodológica para atender as especificidades dos alu-
nos. Na opinião de Rodrigues (2006), “a integração pressupõe uma
‘participação tutelada’, uma estrutura com valores próprios
aos quais o aluno ‘integrado’ tem que se adaptar”.
Em meados da década de 1990, com a Declaração de Sala-
manca (1994), eclodiu um novo paradigma de atenção às pessoas

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 114

com deficiência, denominado de Inclusão. De acordo com Silva


(2014, p.11) essa nova fase é concebida como: “aceitação das dife-
renças individuais, a valorização de cada pessoa, a convivência
dentro da diversidade humana e aprendizagem por meio da coo-
peração”.
Em relação à educação de surdos, especificamente, há algu-
mas leis, que são reconhecidas pela comunidade surda como um
marco de grande conquista especialmente a lei nº 10.436/ 2002.
Estas leis dão orientações de como deve ser a formação dos pro-
fessores, acessibilidade do surdo em geral, como se dará a educa-
ção dos surdos de todos os níveis, etc.
A aprovação da Lei Federal nº 10.436, de 24 de abril de
2002, que dispõe sobre a Língua Brasileira de Sinais, popular-
mente conhecida como a Lei da Libras, define-a em seu Art. 1º, Pa-
rágrafo Único, como “[…] a forma de comunicação e expressão, em
que o sistema linguistico de natureza visual motora, comestrutura
gramatical própria, constituemum sistema linguístico de trans-
missão de ideias e fatos, oriundos de comunidades de pessoas sur-
das do Brasil (BRASIL, 2002).
A referida lei, além de reconhecer a Libras como meio de
comunicação oficial da comunidade de pessoas surdas do país,
ainda responsabiliza, obriga e determina a garantia de apoio para
seu uso e difusão em empresas e concessionárias de serviços pú-
blicos, além da implementação da disciplina de Libras em cursos
de formação de Educação Especial, de Fonoaudiologia e de Magis-
tério, em seus níveis médio e superior, tal como podemos apreciar
nos artigos da Lei 10.436/2002:

Art. 2o Deve ser garantido, por parte do poder público em geral e


empresas concessionárias de serviços públicos, formas institucio-
nalizadas de apoiar o uso e difusão da Língua Brasileira de Sinais -
Libras como meio de comunicação objetiva e de utilização corrente
das comunidades surdas do Brasil.

SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 115

Art. 3o As instituições públicas e empresas concessionárias de ser-


viços públicos de assistência à saúde devem garantir atendimento
e tratamento adequado aos portadores de deficiência auditiva, de
acordo com as normas legais em vigor.

Art. 4o O sistema educacional federal e os sistemas educacionais


estaduais, municipais e do Distrito Federal devem garantir a inclu-
são nos cursos de formação de Educação Especial, de Fonoaudio-
logia e de Magistério, em seus níveis médio e superior, do ensino
da Língua Brasileira de Sinais - Libras, como parte integrante dos
Parâmetros Curriculares Nacionais - PCNs, conforme legislação vi-
gente.

Parágrafo único. A Língua Brasileira de Sinais - Libras não poderá


substituir a modalidade escrita da língua portuguesa

Posteriormente, a Lei 10.436/ 2002 foi regulamentada pelo


Decreto nº 5.626, de 22 de dezembro de 2005, que trata com maior
riqueza de detalhes da educação de surdos em todos os níveis de
ensino e da formação de professores bilíngues, instrutores surdos
e intérpretes de Libras.
O capítulo III, Art. 4º e 5º do Decreto nº 5.626/2005, trata da
formação do professor de libras e do instrutor de libras:

Art. 4º A formação de docentes para o ensino de Libras nas séries


finais do ensino fundamental, no ensino médio e na educação su-
perior deve ser realizada em nível superior, em curso de gradua-
ção de licenciatura plena em Letras: Libras ou em Letras: Li-
bras/Língua Portuguesa como segunda língua. Parágrafo único. As
pessoas surdas terão prioridade nos cursos de formação previstos
no caput.
Art. 5º A formação de docentes para o ensino de Libras na educa-
ção infantil e nos anos iniciais do ensino fundamental deve ser re-
alizada em curso de Pedagogia ou curso normal superior, em que
Libras e Língua Portuguesa escrita tenham constituído línguas de
instrução, viabilizando a formação bilíngüe.

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 116

§ 1º Admite-se como formação mínima de docentes para o ensino


de Libras na educação infantil e nos anos iniciais do ensino funda-
mental, a formação ofertada em nível médio na modalidade nor-
mal, que viabilizar a formação bilíngüe, referida no caput.
§ 2º As pessoas surdas terão prioridade nos cursos de formação
previstos no caput. Brasil (2005).

De acordo com Lacerda (2014), em decorrência do referido


decreto, várias iniciativas na área educacional para o ensino
de pessoas com surdez foram criadas, entre elas:
• Em 2006 iniciou-se a primeira turma do curso de gradua-
ção na modalidade de ensino a distância – Letras/Libras –
em nove polos espalhados por todo Brasil, ministrados por
instituições de ensino superior públicas, federais e estadu-
ais, sob a coordenação da Universidade Federal de Santa Ca-
tarina. Trata-se de um curso de graduação que oferta dois
tipos de formação: licenciatura e bacharelado. O primeiro é
para formação de professores de Libras e o segundo para
formação de intérpretes de língua de sinais.
• Em 2008, foi oferecida a segunda turma desse curso em 15
pólos em todo pais.
• Em 2009, foi criada a primeira turma do curso de graduação
Letras/Libras de modalidade de ensino presencial na Uni-
versidade Federal de Santa Catarina.

Há também a Lei 12.319 de 10 de setembro 2010, que regu-


lamenta a profissão dos TILS - tradutor/intérprete de Libras,
dando orientações como deve ser a formação para os profissionais
interpretes:
• Define que “o tradutor e intérprete terá competência para
realizar interpretação das 2 (duas) línguas de maneira si-
multânea ou consecutiva e proficiência em tradução e inter-
pretação da Libras e da Língua Portuguesa” (Art. 2º);
SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 117

• Trata da formação do profissional do TILS;


• Delimita os campos de atuação do TILS;
• Apresenta princípios éticos que devem respaldar as ações
do TILS;
• Permite a contratação dos TILS em nível federal;
• Propulsionou a criação do cargo a nível estadual e munici-
pal em inúmeras localidades.
O artigo 4º, por sua vez, nos traz as seguintes orientações:

Art. 4º- A formação profissional do tradutor e intérprete de Libras-


Língua Portuguesa, em nível médio, deve ser realizada por meio
de:

I - cursos de educação profissional reconhecidos pelo Sistema que


os credenciou;

II - cursos de extensão universitária; e

III - cursos de formação continuada promovidos por instituições


de ensino superior e instituições credenciadas por Secretarias de
Educação.

Parágrafo único. A formação de tradutor e intérprete de Libras


pode ser realizada por organizações da sociedade civil representa-
tivas da comunidade surda, desde que o certificado seja convali-
dado por uma das instituições referidas no inciso III. (BRASIL,
2010)

Mais recentemente, temos a LBI - Lei Brasileira de Inclusão


13.146 de 6 de julho de 2015 (Estatuto da Pessoa com Deficiência),
destinada a assegurar a pessoas com deficiência, direitos humanos
universais como a vida, a saúde, a moradia e o trabalho, a partici-
pação na vida pública, além de outros direitos, igualmente

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 118

relevantes, como os direitos à educação e à cultura, ao transporte


e à mobilidade, assim como à comunicação e ao acesso à tecnolo-
gia.
No capítulo da Educação, a referida Lei trata, dentre muitos
temas relevantes, da formação do intérprete. Discorre, também,
sobre como devem ser aplicadas as provas, vestibulares e concur-
sos:
Art. 28. IV - Oferta de educação bilíngue, em Libras como primeira
língua e na modalidade escrita da língua portuguesa como segunda
língua, em escolas e classes bilíngues e em escolas inclusivas.

VIII - Participação dos estudantes com deficiência e de suas famí-


lias nas diversas instâncias de atuação da comunidade escolar.

IX - Adoção de medidas de apoio que favoreçam o desenvolvi-


mento dos aspectos linguísticos, culturais, vocacionais e profissio-
nais, levando-se em conta o talento, a criatividade, as habilidades
e os interesses do estudante com deficiência.

Mesmo diante de todo este aparato de leis e decretos, que


dão as orientações e subsídios legais, para uma atuação profissio-
nal, estamos cientes que os alunos precisam de professores com-
prometidos com a sua formação e autoformação contínuas. Neces-
sitam de professores que dominem não apenas conteúdos técni-
cos, mas que sejam conhecedores de si mesmos, e das peculiarida-
des de seus alunos. Conscientes de que, em concordância com Silva
(2014, p.12),

[...] devemos nos especializar no aluno, independente da condição


que ele esteja – não em sua deficiência. Acreditamos que, assim,
estaremos contribuindo para uma escola, para uma sociedade, em
que as diferenças não sejam apenas toleradas, mas ressignifica-
das e celebradas.

SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 119

Trabalhemos, portanto, para que essa escola e sociedade che-


guem a se estabelecer um dia. Pois é notório que há uma lacuna
existente entre a formação inicial dos profissionais de educação e
a exigência de uma formação continuada com conhecimentos es-
pecíficos no campo, para fins do nosso estudo, no campo da surdez.
Entendemos que o ofício de ensinar, juntamente com os edu-
candos, reivindicam mais conhecimentos por parte do professor,
uma vez que, na perspectiva de uma educação voltada para a di-
versidade, cada aluno deve ser visto em sua individualidade, com
seu perfil, dificuldade e potencialidades e, que o ato de ensinar vai
muito além do que transmitir conhecimentos. Como nos ensinava
Freire (2002, p.13), “Ensinar não é transferir conhecimento, mas
criar as possibilidades para a sua própria produção ou a sua cons-
trução”.
Quando falamos de formar, ensinar e educar estamos transi-
tando numa esfera humanística, onde consideramos como ganho,
cada avanço e desenvolvimento dos alunos com e sem sur-
dez. Desde a sua interação social com os seus pares e com os pro-
fessores, na aquisição da aprendizagem de regras de convivência,
no desenvolvimento de fatores sócio emocionais, entre outros.
Muitos professores têm buscado conhecer mais sobre como
ensinar e como seus alunos surdos aprendem, por meio da auto-
formação. Referimo-nos aqui, a profissionais que mesmo com
pouco investimento financeiro em estrutura escolar, material di-
dático e capacitação por parte dos governos ou empresários donos
de escolas, buscam desempenhar um trabalho comprometido com
a aprendizagem do seu alunado com e sem surdez.
Referimo-nos, também, àqueles professores formados em
uma determinada área, por exemplo, Letras, mas que pela força
das circunstâncias se vêem alfabetizando crianças, sem ao menos
entenderem o conceito e os processos da alfabetização. Muitos

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 120

desses professores aprenderam a buscar conhecimentos específi-


cos e aliá-lo aos saberes já existentes e a sua criatividade, mos-
trando-se, assim, um ser ativo de seu próprio processo de conheci-
mento, formando-se continuamente.
Teixeira, Silva e Lima (2010, p. 6) afirmam que a autoforma-
ção é:

Processo permanente de desenvolvimento docente que se reflete


diretamente na maneira de como o professor constrói a sua reali-
dade profissional, transformando a si mesmo, no bojo das ativida-
des concretizadas na cotidianidade da prática pedagógica.

Segundo Sanches (2010), existe a heteroformação que é


o processo de formação que vem de fora do sujeito; e a autoforma-
ção que é o processo de formação que é elaborado pelo próprio su-
jeito na interação com o mundo e com os outros. À exemplo, cita-
mos a experiência da primeira autora desse capítulo, como profes-
sora licenciada em Letras, que se viu na iminência de alfabetizar
uma criança surda.
A autoformação não é, e nem pode ser concebida como um
processo isolado. A autoformação se concebe quando o profissio-
nal se apropria de conteúdos formativos ligados à área em que ele
mesmo se encontra inserido, de modo a contribuir para o aperfei-
çoamento de suas habilidades. No caso do exemplo, transitou-se
de uma área de formação – Letras, para outra área de certa forma
desconhecida – a Alfabetização. Contudo em uma situação que faz
parte do seu cotidiano que é o envolvimento direto como mãe de
uma criança surda. Em nosso parecer, em concordância com Castro
e Carvalho (2001), algo que veio favorecer o questionamento sobre
si mesmo, sobre a escola e a sociedade, permitindo o redimensio-
namento de sua relação com a realidade vivida.
No dizer de Galvani (2002, p.2), a autoformação “[...] é um
componente da formação considerada como um processo tripolar,
SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 121

pilotado por três pólos principais: Si (autoformação), os outros


(heteroformação), as coisas (ecoformação).” É um modelo de
aprendizagem onde o aprendiz se torna responsável e autor de seu
próprio processo de formação, onde ele assume um lugar central
no seu processo formativo, se engajando numa busca contínua pelo
conhecimento. Tal como Freire (2002, p.17), nos fala sobre esta
busca de conhecimentos no próprio ato de ensinar e de pesquisar:

Enquanto ensino, continuo buscando, reprocurando. Ensino por-


que busco, porque indaguei, porque indago e me indago. Pesquiso
para constatar, constatando, intervenho, intervindo educo e me
educo. Pesquiso para conhecer o que ainda não conheço e comuni-
car ou anunciar a novidade.

Contudo, mesmo se tratando do modelo de aprendizado


autoformativo, que parte do “eu”, ainda assim o profissional ao fi-
nal do seu processo formativo terá influências dos meios externos,
tais como da cultura, família, educação, o meio ambiente em que
vive ou, até mesmo ao clima em que vive exposto, etc. Logo, isso
envolve também, a eco e heteroformação ressaltadas por Galvani
(2002):

A autoformação é um processo paradoxal que se alimenta de suas


dependências. Ela é constituída pela tomada de consciência e de
retroação sobre as influências heteroformativas e ecoformativas.
Assim, a autoformação ultrapassa, integrando-os, os limites da
educação entendida transmissão aquisição de saberes e de com-
portamentos (GALVANI, 2002, p. 3)

Para Dumazedier (2004), autoformação é reforço do desejo


e da vontade dos sujeitos de regular, orientar e gerir cada vez
mais eles próprios o seu processo educativo. É quando o sujeito
toma às rédeas de seu próprio desenvolvimento educacional. Cor-
robora-se com Sanches (2010, p.113), quando este esclarece que:

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 122

A autoformação é a conscientização do caminhar para si e com o


outro, num ato de partilhas de significados consigo mesmo e com
o grupo. O aprendente é um caminhante, que caminha con-
sigo mesmo, mas também acompanhado.

Para nós, a autoformação é um processo contínuo e perma-


nente de buscas constantes e atualizações sobre o autoconheci-
mento, que é o conhecimento de si, relacionado à autoformação, ao
heteroconhecimento que está relacionado aos outros, relacionado
à heteroformação. E o reconhecimento que está relacionado ao am-
biente que lhe envolve, ligado a ecoformação.
Portanto, entende-se que, para que haja uma prática cons-
ciente no campo da autoformação, o indivíduo deve buscar o auto-
conhecimento, utilizando todas as ferramentas disponíveis para
tal, por exemplo: a escrita de si, relatos autobiográficos acrescidos
de um tempo de reflexão sobre cada situação elencada e apresen-
tada. Que utilize as perguntas autorreflexivas, tais como me tornei
quem sou? Por que exerço esse tipo de prática em minhas ações di-
árias?. A fim de tomar consciência da própria história e estar apto
a inferir nas histórias de seus alunos.
A autoformação nunca termina, pois o indivíduo autônomo,
e consciente da importância do aprendizado, nunca deixa de bus-
car o conhecimento através da formação continuada, fazendo uso
de cursos on line, leituras de livros, participações em congressos e
eventos, entre outros meios.
Enquanto educadores e formadores, urge a latente necessi-
dade de se entender nosso próprio processo de formação. Finger e
Nóvoa (2010) alertam que, sem antes ter procurado compreender
o nosso próprio processo de formação, dificilmente pode-se pre-
tender interferir na formação dos outros.
Tardif (2002) aponta saberes que são estruturais na forma-
ção e atuação docente: Teórico, técnico e prático. Os conhecimen-
tos teóricos e técnicos são alcançados ao longo da formação inicial
SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 123

e continuada. Porém, o conhecimento prático é adquirido en-


quanto se caminha, no dia a dia da ação docente e na reflexão crí-
tica que pode ser alcançado através do exercício do autoconheci-
mento. Levando isto a termo, na sessão seguinte discorreremos so-
bre o fazer-se professora alfabetizadora bilíngue na ação e reflexão
crítica do ser mãe e alfabetizadora numa sociedade em que a pes-
soa surda ainda é instigada a viver segregada em decorrência do
predomínio de uma única forma de linguagem.

A PESQUISA

Para a realização de nossa pesquisa de mestrado 1, e por sua


natureza, optamos pela pesquisa do tipo Narrativa Autobiográfica,
numa modalidade qualitativa (NÓVOA e FINGER, 2010); (PASSEGI,
2010); (PINEAU, 2010); (SOUZA e CORDEIRO, 2010); (DELORY-
MOMBERGER, 2014), pois ela privilegia as escritas de si para o es-
tudo das relações que se estabelecem entre a experiência, o pro-
cesso de formação e de atuação docente (MARIE-CHRISTINE JOSSO,
2004).
As investigações sobre as escritas de si se desenvolvem se-
gundo dois eixos (PASSEGGI, 2010): Ato de narrar e Narrativas au-
tobiográficas, tal como representados no esquema, a seguir:

1
A pesquisa “Entre a casa e a escola: percurso autoformativo como alfabetizadora
bilingue de criança surda – um estudo autobiográfico”, de Elizabete Siqueira Ri-
beiro, foi submetida ao comitê de ética em pesquisa do hospital universitário Ono-
fre Lopes, por se tratar de uma pesquisa envolvendo seres humanos, e aprovada em
31/01/2019, sob o registro CAAE: 05219218.5.0000.5292.

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 124

Como é possível observar, o Primeiro Eixo - focaliza o ato de


narrar como um dispositivo de formação e compreende dois dire-
cionamentos: o da formação do adulto e o da formação do forma-
dor.
No primeiro direcionamento se investiga as atividades autore-
flexivas e suas repercussões nos processos de formação e inserção
na vida profissional e, no segundo direcionamento, a mediação bi-
ográfica como prática que implica a formação de formadores para
o acompanhamento das escritas de si.
Segundo Eixo - considera as narrativas autobiográficas
como método de investigação e compreende, por sua vez, dois di-
recionamentos: o estudo da constituição e da análise de fontes
(auto)biográficas e o estudo das tradições discursivas referentes aos
diferentes modos de autobiografar.

SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 125

O objetivo desse eixo é depreender das trajetórias de vida


aspectos históricos, sociais, cognitivos, multi(inter)culturais, insti-
tucionais da formação e da profissionalização docente.
Os dois eixos permitem o aprofundamento da perspectiva
teórico-metodológica da pesquisa (auto)biográfica que dá sequên-
cia ao movimento das histórias de vida em formação, inaugurado
pelos pioneiros Gaston Pineau, no Canadá, BernadetteCourtois e
Guy Bonvalot, na França, Marie-Christine Josso e Pierre Dominicé,
na Suíça, Guy de Villers, na Bélgica, António Nóvoa, em Portugal e
Passegi, no Brasil - UFRN.
Para responder ao problema de pesquisa levantado: Em
quais aspectos uma experiência de alfabetização bilíngue não esco-
lar informal poderia contribuir para discutir o processo de letra-
mento de pessoas surdas? Traçamos como objetivo geral: Analisar o
processo auto formativo do tornar-se professora alfabetizadora bi-
língue de criança surda, em contexto não escolar informal e formal.
E, como objetivos específicos: Identificar nas narrativas da autora
dimensões do seu processo autoformativo; Descrever as dimen-
sões do processo autoformativo da autora, nos campos da alfabe-
tização e do letramento bilíngue de uma criança surda, ocorrida em
contextos não escolar informal e formal; Indicar aspectos das
ações didáticas do contexto não escolar informal que poderão con-
tribuir para discutir o processo de letramento de crianças surdas
em contexto formal.
Para o alcance dos objetivos procedemos na pesquisa, para
efeitos didáticos, da seguinte forma:
a) Pesquisa documental - em documentos legais internacio-
nais, nacionais e locais sobre educação de surdos e em al-
guns registros selecionados, das ações didáticas de alfabe-
tização e letramento desenvolvidas no período 2012 a
2019, com meu filho surdo.

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 126

b) A escrita de si mesmo - a narrativa do processo autoforma-


tivo a partir das duas questões propostas por Josso (1988):
Como me tornei no que sou? Como tenho as ideias que te-
nho?

Tais escritas foram organizadas considerando os seguintes


passos: 1) Registro das memórias do processo autoformativo - a
partir do desenvolvimento do processo de alfabetização e letra-
mento da criança surda, num diário de bordo, ordenando-as por
área e por ano, bem como as informações sobre o cotidiano pessoal
ligado aos eventos vividos; 2) Revisão da narrativa autobiográfica
de forma a alterar e/ou complementar; 3) Análise dos dados por
agrupamento de categorias (JOSSO, 1988) e 4) Cruzamento dos da-
dos obtidos, para identificação de dimensões constitutivas da expe-
riência não formal, na tentativa de responder à questão proposta.
Esses procedimentos, essencialmente indutivos, culminaram
na construção de categorias ou tipologias que foram delimitadas de
forma progressiva, iniciando de modo mais abrangente sobre alfa-
betização bilíngue formal e não formal e autoformação. Sequencial-
mente formulamos questões analíticas, aprofundando as temáticas
com o resultado dos achados na pesquisa bibliográfica e documen-
tal, a testagem de ideias, o uso extensivo de comentários, observa-
ções e especulações que forem surgindo ao longo da escrita das nar-
rativas.
O lócus investigativo, a casa da primeira autora desse capí-
tulo, foi o campo inicial alfabetizador da criança surda. Como sujei-
tos da pesquisa, compreendidos como o resultado das relações in-
terpessoais e sociais, da negociação e da produção dos sentidos
partilhados entre si, a própria pesquisadora e o filho com surdez.
A pesquisadora como autora e tutora direta das ações alfabetiza-
doras, uma vez que as elaborou e desenvolveu.

SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 127

Logo, a pessoa que sofre a ação transformadora da autofor-


mação provocada pelo outro sujeito (o filho surdo), ao qual se des-
tina a ação alfabetizadora. Ambos complementando-se, provo-
cando transformações mútuas, afetando-se, respondendo constan-
temente às perguntas: De quê? Para quê?De quem?Para quem? Em
quem?; entre outras que constituem a dor e o prazer do saber, do
conhecer, do dar sentido a existência, da descoberta do outro dife-
rente de si na apreensão do mundo.
O critério de inclusão das narrativas foi a consideração de al-
gumas das ações desenvolvidas, selecionadas e devidamente regis-
tradas durante oito anos, no período de 2012 a 2019. E os critérios
de exclusão: Qualquer material produzido fora desse período.
Na coleta dos dados foi utilizada a Autoentrevista narrativa
autobiográfica desenvolvida em três fases: 1ª fase-Narrativa auto-
biográfica inicial; 2ª fase - O pesquisador-entrevistador inicia ex-
plorando o potencial narrativo que foi cortado na fase inicial em
fragmentos e foram resumidos supondo-se não serem importantes
ou por se tratarem de situações dolorosas estigmatizadoras; e 3ª
fase - Consiste, por um lado, no incentivo a descrição abstrata de
situações, percursos e contextos sistemáticos que se repetem Wel-
ler (2010).
Nesse caminho traçado compreende-se a surdez como “[...]
uma construção histórica e social, efeito de conflitos sociais, anco-
rada em práticas de significação e de representações compartilha-
das entre os surdos” (MCLAREN, 1995 apud SKLIAR, 1998, p.13).
Para fundamentar as narrativas da experiência trouxemos à
luz da discussão, as temáticas nela contidas, apoiada em seus res-
pectivos autores:
• Pesquisa autobiográfica: (NÓVOA e FINGER, 2010);
(PASSEGI, 2010); (PINEAU, 2010); (SOUZA e COR-
DEIRO, 2010); (DELORY-MOMBERGER, 2014)

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 128

• Formação de professores: (PERRENOUD, 1999, 2001);


(NÓVOA,1992; 2009); (TARDIF, 2002); (TRILLA e
GHANEM, 2008); (TARDIF E LESSARD,2002;2008)
(FREIRE,1992), (GAUTHIER, 1998), (GARCIA,1999),
(IBERNÓN,2002).
• Aprendizagem, desenvolvimento, bilinguismo e surdez:
(VYGOTSKY,1991, 1998); (CAPOVILLA,2004); (QUA-
DROS,2000;2007); (SKLIAR,1998;2001)
• Alfabetização e letramento:(SOARES,2007); (FER-
REIRO,1985; 1993; 2016).

A análise dos dados deu-se por agrupamento de categorias


(JOSSO, 1988) e seu cruzamento, para identificação de dimensões
constitutivas da experiência não formal, na tentativa de responder
à questão proposta: Em quais aspectos uma experiência de alfabe-
tização bilíngue não escolar informal poderá contribuir para a
(auto)formação e para a inclusão social e escolar de estudantes
surdos? O desenvolvimento do discurso analítico está dado pela
relação dialética entre o socioestrutural (aquilo que é dado pelo
contexto social onde a vida dos sujeitos é desenvolvida) e o socio-
simbólico (o mundo vivido por esses mesmos sujeitos).
Para fins desse capítulo, portanto, apresentaremos os resul-
tados concernentes ao segundo objetivo traçado em nosso estudo:
“Descrever as dimensões do processo autoformativo da autora,
nos campos da alfabetização e do letramento bilíngue de uma cri-
ança surda, ocorrida em contextos não escolar informal e formal”.

DAS DIMENSÕES REVELADAS NO PROCESSO

Podemos afirmar que escrever e analisar a própria experiên-


cia de vida como alfabetizadora bilingue, quer no espaço formal de
ensino, quer dentro de casa, assim como em diferentes espaços
SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 129

sociais, nos fez apreender a existência e o porquê de dimensões


antes desapercebidas: a dimensão política e a dimensão pedagó-
gica, sobre as quais trataremosa seguir. As dimensões política e pe-
dagógica falaram mais alto na tessitura da trajetória narrada,
quando da escrita do trabalho dissertativo. Esta última, sendo
construída na autoformação, enquanto professora alfabetizadora
bilíngue de uma criança surda.

a) A dimensão política

Sobre a dimensão política podemos afirmar a percepção da


ação do poder central sobre àqueles que historicamente vêm so-
frendo o espólio de ser o ‘que’ é ‘como’ é, e de ser considerado
como cidadão de direitos. As leis existentes, embora sejam antidis-
criminação e advoguem ações afirmativas, parecem retratar um
poder autoritário que não enxerga às necessidades e prioridades
daqueles considerados “minorias”, deixando-os a mercê de si mes-
mos e/ou de suas famílias na busca cotidiana em se fazer cumprir
o que está posto nos textos das leis. Assim como no que deveria ser
oferecido nas escolas. O que nos faz entender a opressão existente,
também, na dimensão pedagógica, que não deixa de ter seu caráter
político, uma vez que a educação não é neutra.
Percebemos, ainda, a dimensão política fundida em nossa
atitude de mãe, de mulher e cidadã em busca de fazer valer os di-
reitos prescritos na legislação brasileira - Constituição Federal –
CF, 1988; Lei de Diretrizes e Bases da Educação - LDB, 1996; Lei
Brasileira de Inclusão - LBI, 2015 -, quanto à matrícula do meu filho
numa escola comum; quanto aos serviços de atendimento educaci-
onal especializado (CF Art. 208 – item III; LDB, Art. 4 – item III);
quanto à participação e aprendizagem em todo o processo de en-
sino, “[...] por meio da oferta de serviços e de recursos de

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 130

acessibilidade que eliminem as barreiras e promovam a inclusão


plena” (LBI, 2015, Art. 28 – item II), em sendo tratado em “igual-
dade de condições para o acesso e permanência na escola” (CF,
1988 - Art. 206 – item I), “[...] de forma a alcançar o máximo desen-
volvimento possível de seus talentos e habilidades físicas, sensori-
ais, intelectuais e sociais, segundo suas características, interesses
e necessidades de aprendizagem” (LBI, 2015 – Art. 27), e, o direito
de dispor de um intérprete e tradutor de Libras.
Esta dimensão política se faz perceber ao longo da minha
narrativa de vida, nas afirmações, nas atitudes, através do meu po-
sicionamento humano diante de uma circunstância singular, pes-
soal e intransferível. Na autoconstrução da minha própria identi-
dade militante, na luta pelos direitos e contra a exclusão.
Depreende-se esta dimensão por concordar que a educação
é um ato político, ideológico e emancipador, que firma compromis-
sos com o futuro, de formação do aluno de modo integral. Freire
(1987) afirma que, não existe um processo de educação neutra.
Educamos com propósito de luta pela liberdade; de luta para que
leis sejam, de fato, cumpridas; pelo direito a igualdade de condi-
ções; para que o educando com deficiência tenha os mesmos direi-
tos que qualquer outro aluno, pela luta contra o preconceito au-
dista2.
Em nossa narrativa, a dimensão política é expressa em dife-
rentes momentos:
- quando optamos pela luta diante da dor e do sofrimento.
Utilizo-me da narrativa autobiográfica como um instrumento
de reflexão para a reinvenção de mim mesma;
- ao tomarmos a decisão de parar o uso do anticoncepcional,
com o intuito de ser mãe.

2
Audismo é a forma de dominação dos ouvintes, reestruturando e exercendo a au-
toridade sobre a comunidade surda (Lane 1992, p.52).
SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 131

- na decisão, diante de um laudo de surdez de um filho, em optar


pelo aprendizado de um novo idioma, com modalidade visuo-espa-
cial. Aprendi buscando informações sobre a deficiência, procurei
por novas terapias fonoaudiológicas, novos remédios, novas espe-
cialidades. Resistimos a uma sociedade preconceituosa que só en-
xergava mais um laudo, mais uma deficiência, enquanto eu lutava
pelos direitos do ser humano-filho.
- quando resolvemos abrir mão de tudo, vendendo todos os meus
bens e, partirmos para outro lugar, até então desconhecido, a fim
de conseguir melhores tratamentos para nosso filho, optando pelo
implante coclear.
Essa decisão provocou um choque cultural entre a comuni-
dade surda, com sua visão socioantropológica e a comunidade mé-
dica, com sua visão clínica. Sobre esta perspectiva médica, Lane
(1992) cita a frase de um médico audista, referindo-se aos trata-
mentos, implantes cocleares, terapias orais de fala, que deveriam
ser impostos a comunidade surda a qualquer preço, com o objetivo
de combater esta enfermidade trágica:

Os surdos acreditam que são iguais em todos os aspectos. Devemos


ser generosos e não destruir essa ilusão. Mas, independente da-
quilo em que acreditam, a surdez é uma enfermidade e devemos
curá-la, independente de perturbar ou não a pessoa que dela sofre.
(LANE 1992, p.191)

Para a comunidade surda ver uma criança ser implantada


é como imolar uma identidade a custo da normalização. Lane
(1992) fala sobre a visão que a comunidade surda tem de si
mesma, como minoria linguística:

Essas pessoas consideram-se essencialmente visuais, com uma lin-


guagem visual, uma organização social, uma história e valores mo-
rais que lhes são próprios, ou seja, essas pessoas têm a sua própria

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 132

maneira de ser e possuem uma linguagem e culturas próprias.


(LANE 1992, p.21)

O destino de uma criança surda, o meu filho, aguardava no


impasse entre duas fortes correntes filosóficas. Aqui vemos forte-
mente expressa, a dimensão política, desta feita manifestada pela
força da comunidade surda a lutar pela defesa e conservação dos
fortes traços identitários que caracterizam os surdos; linguagem
visual gestual e ausência de audição. E, era justamente isso que se-
ria alterado com a minha decisão pelo implante coclear de João.
Essa atitude, que hoje considero que foi uma péssima escolha, me
estigmatizou, diante da comunidade surda por um longo tempo,
muitos surdos ressentidos, ficaram sem falar comigo.
Por outro lado, fui severamente advertida pela comunidade
médica para que não sinalizasse com meu filho. Caso ele fizesse
qualquer sinal pedindo comida, água, biscoito. A ordem era ignorar
completamente.
Meu posicionamento enquanto mãe foi o de, a cada sinal
que ele fazia eu oralizava a palavra e atendia ao pedido dele. E si-
nalizava para falar com ele sempre dando ênfase nos lábios para
que ele pudesse perceber as palavras de modo oral.
Dentre duas concepções opostas, tive que criar um terceiro
caminho a seguir: o de nunca ignorar a comunicação com meu fi-
lho, preservando-a seja ela por sinais, pela oralidade, gestual, es-
crita ou apenas com expressões faciais.
O posicionamento político também se exterioriza no que é
narrado na página 78, quando da decisão de ir para a escola co-
mum como voluntária para mediar o processo educativo de João
Pedro interpretando, no ano de 2012, devida a ausência de profis-
sionais intérpretes na escola. Aqui já não era somente uma resis-
tência, mas um ato de luta para garantir o direito de João Pedro
assistir as aulas e entender o conteúdo dado; Quando da matricula
de João Pedro no Centro de Atendimento ao Surdo – CAS significou
SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 133

uma imersão na comunidade surda, pois, ali ele estudava e eu fazia


cursos, tínhamos contatos diários com outros alunos e professores
surdos. E, para minha alegria mais tarde fui contratada como pro-
fessora, para ensinar Libras na classe das mães de surdos. Nesse
ambiente pude aprender e compartilhar o que recebi.
Quando em 2013, diante da impossibilidade de João Pedro
prosseguir o ano letivo na escola, por falta de profissionais e por
questões de inflexibilidade da direção, tomei as rédeas da educa-
ção de João Pedro em casa; Em 2015, novamente como interprete
voluntária fui acompanhar meu filho em sala de aula, ajudando na
adaptação de materiais, no ensino de libras para as crianças e me-
diando a interação em Libras entre João Pedro e os alunos da
turma.
No ano de 2016 fui novamente para a escola como voluntá-
ria intérprete, pela ausência do profissional nas escolas da rede pú-
blica. Não havia naquela escola uma professora regente para
classe, as crianças ficaram três meses sem aulas. A estrutura física
da sala era comprometida, havia várias goteiras, não tinha ventila-
dor e depois enfrentamos um período de greve. Procurei o minis-
tério público e fiz a denúncia das péssimas condições estruturais,
e falta de profissionais na escola na tentativa de acelerar o envio
de uma professora para o local. Mas, não fui ouvida o poder público
que ignorou todos os meus pedidos.
A dimensão política aqui se apresenta na perspectiva da de-
nuncia. É percebida em função de uma luta pelos direitos da mu-
lher como mãe de um filho como pessoa com condição singular. Da
falta de cumprimento das leis pelas autoridades e a exigência para
que os direitos sejam satisfeitos. A militância se efetivou nas par-
ticipações em campanhas pelas redes sociais com propósito de mo-
bilização das autoridades, a fim de que contratassem intérpretes
para os alunos surdos da rede pública no ano de 2014. No apoio às

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 134

greves dos profissionais da educação por melhores remunerações


e condições de trabalho no ano de 2015, participando de passeatas
junto com os alunos surdos, em apoio aos professores.
É importante dizer que a exclusão implícita se expressa es-
condida, no cotidiano e a gente naturaliza, absorve achando que
não há como fazer nada. Destarte, devemos nos posicionar politi-
camente, militando, para superarmos as barreiras impostas pelos
opressores, para nos livrarmos dessa exclusão que nos algema ao
medo, e que impede o acesso das minorias ao conhecimento. Freire
(1997) nos alerta sobre como deve ser esta superação: que seja
para o surgimento do homem novo – não mais opressor, não mais
oprimido, mas homem libertando-se.
É perceptível a ação do poder central sobre àqueles que his-
toricamente vêm sofrendo o espólio de ser o ‘que’ e ‘como’ é, e de
ser considerado como cidadão de direitos. As leis existentes, em-
bora sejam antidiscriminação e advoguem ações afirmativas, pare-
cem retratar um poder autoritário que não enxerga às necessida-
des e prioridades daqueles considerados “minorias”, deixando-os
a mercê de si mesmos e/ou de suas famílias na busca cotidiana em
se fazer cumprir o que está posto nos textos das leis. Freire (1997)
afirma que: Lavar as mãos do conflito entre os poderosos e os im-
potentes significa ficar do lado dos poderosos, não ser neutro. O
educador tem o dever de não ser neutro.
A militância que teve início por uma causa particular, a do
meu filho surdo, se transformou, através da empatia por um grupo
minoritário, o dos surdos, numa causa pública. Perceber que este
grupo sofre por ter seus direitos negados, fez com que eu me posi-
cionasse militantemente diante das autoridades, diante das exclu-
sões, e diante das leis que apesar de existirem não são cumpridas.

SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 135

b) A Dimensão Pedagógica

Na dimensão pedagógica percebemos o caráter de opressão


que se estabelece, por exemplo, no contexto formal de ensino de
várias escolas pelas quais João Pedro passou, quer seja pela nega-
ção de sua cultura surda, de sua língua como fator de aprendiza-
gem e de comunicação com o outro; quer seja no currículo escolar,
na prática pedagógica e avaliações desenvolvidas, que desconside-
ram o nível de aprendizagem, a necessidade de reorganização e fle-
xibilização dos conteúdos, a visualidade como meio propício a
aprendizagem por quem é surdo. Assim como a dizer à criança
surda: aqui não é o seu lugar!
Negação essa que tem impedido a pessoa surda de participar
plenamente da elaboração social, de ser reconhecida como ser de
potencialidades para a aprendizagem e produtivo na sociedade.
Acreditamos que em virtude de concepções marcadas pela igno-
rância, pelo desconhecimento científico sobre a surdez, suas cau-
sas e suas implicações, tal como professado por uma senhora de
uma religião de origem oriental, ao colocar, citando a fala de seu
dirigente espiritual que, a surdez era o “resultado de mulheres que,
no período da gestação, se negam a ouvir a sogra, ou alguém pró-
ximo, com quem ela tenha inimizade”.
Concepções e atitudes que tem o poder de neutralizar o “ser”,
o “eu” de quem, por alguma razão, não corresponde ao modelo de
ser humano socio culturalmente construído e sedimentado pelo
grupo social dominante, permitindo como consequência, a desper-
sonalização ou coisificação de quem é diferente (BOAVENTURA
SANTOS, 2006).
Não lutar contra esse tipo de percepção seria uma temeri-
dade! Daí as idas e vindas à secretaria de educação e ao ministério
público com vistas a fazer valer os direitos assegurados

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 136

constitucionalmente ao meu filho e demais pessoas em sua condi-


ção de surdez.
Entendemos, assim como posto no Relatório Mundial sobre
Deficiência – RMD (2012), que é necessária uma mudança sistê-
mica para remover barreiras e fornecer instalações e serviços de
apoio razoáveis e garantir que crianças com surdez não sejam ex-
cluídas do sistema educacional comum em razão de sua forma pe-
culiar de comunicação. Pois,

[...] para as crianças com deficiência, como para todas as crianças,


a educação é vital em si mesma, mas também instrumental para
sua participação na empregabilidade e outras áreas da atividade
social. Em algumas culturas, frequentar a escola é parte da forma-
ção de uma pessoa completa. As relações sociais podem mudar o
status das pessoas com deficiência na sociedade e afirmar seus di-
reitos. Para as crianças sem deficiências, o contato com crianças
com deficiência num cenário inclusivo pode, a longo prazo, aumen-
tar a familiaridade e reduzir o preconceito.(RELATÓRIO MUNDIAL
SOBRE DEFICIÊNCIA, 2012, p. 213)

A dimensão pedagógica das ações empreendidas no contexto


informal também se revela na criação da metodologia que nomea-
mos como ‘alfabetização bilíngue de criança surda em tempo real’.
Metodologia que presa pelo ensino bilíngue utilizando as experi-
ências da rotina de uma família. Trabalha-se com o que tem em
casa. Planeja-se a partir dos passeios rotineiros ou extras. Criam-
se atividades baseadas em experiências futuras ou passadas expe-
renciadas pela criança. Utiliza-se a família como personagens para
criação de histórias, ou como destinatários de nossas correspon-
dências. Avaliamos a aprendizagem da criança de acordo com seu
empenho, interação e participação nas atividades.
Revela-se na busca cotidiana por informações teóricas e prá-
ticas em livros especializados na temática da surdez e da alfabeti-
zação, em vídeos, nas aulas de libras. Nas estratégias de ensino, nos
SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 137

materiais didáticos adaptados confeccionados e utilizados nas au-


las diárias; no aproveitamento de situações do cotidiano para en-
sinar meu filho a ler, a escrever, a se comunicar. Nas atividades
propostas e, também, na postura pedagógica assumida nos mo-
mentos em que assumíamos a nossa casa como uma sala de aula.
A dimensão pedagógica é concebida neste trabalho no uso de
metodologias visuais, que foram sendo criadas para estimular a
memória visual de João Pedro, que representa a base para o letra-
mento e alfabetização de surdos. Seria inútil, incluir palavras alea-
tórias sem um contexto e significado especial, pois o aluno surdo
teria dificuldade em organizar a palavra com a sequência correta
de letras quando precisasse escrever. Logo, a rotulação de ambien-
tes e objetos de dentro de casa foi feita, a fim de que ele entendesse
o conceito que as palavras da língua portuguesa contêm, além de
saber que tudo possuía um sinal em Libras. Cada vez que ele tinha
vontade de comer uma banana, ele visualizava colado na fruteira a
palavra: FRUTEIRA e uma lista ao lado com figuras e nomes em
português e sinal em Libras de cada fruta. A fim de trabalhar o sig-
nificado e significante das palavras dentro da rotina.
Trabalhamos na contação de histórias para João Pedro, a
aquisição de vocabulário em L2 – Língua Portuguesa, e entendi-
mento dos conceitos as palavras da história continha. Quanto mais
ele gostava da história, mais as palavras contidas no livro lhe fa-
ziam sentido e melhor ele memorizava e depois conseguia rees-
crevê-las. João Pedro Passou a criar suas próprias revistas em qua-
drinhos, fazendo uso das palavras que ele já sabia e aprendendo
novas palavras, que ele encaixava na narrativa dos personagens
que ele mesmo havia criado. As palavras eram adaptadas às expe-
riências dele de mundo, a sua cultura e modo peculiar de encarar a
vida de modo visual.

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 138

Utilizamos a pedagogia visual, na criação de atividades inte-


ressantes, coloridas, significativas, por vezes construídas em EVA,
cartolina, dobraduras, massa de modelar, tudo a fim de que lhe o
interesse pelo saber lhe fosse despertado. Pelos inúmeros planeja-
mentos de aula, e replanejamentos além de adaptações dos conte-
údos para ministrar aulas para João.
Ainda visualizamos a dimensão pedagógica de nossa autofor-
mação, na criação do método: “Letramento bilíngue de criança
surda em tempo real.” Que usa objetos, ambientes, passeios, con-
versas com a família como textos, fatos do dia a dia de uso comum
da criança para letrá-lo.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Consideramos, com o estudo realizado durante a pesquisa,


assim como por meio dos dados aqui apresentados que:
• Para a ocorrência de uma prática consciente no campo da
autoformação, o indivíduo deve buscar o autoconheci-
mento, utilizando todas as ferramentas disponíveis para tal,
por exemplo: a escrita de si, relatos autobiográficos acres-
cidos de um tempo de reflexão sobre cada situação elencada
e apresentada. Que utilize as perguntas autorreflexivas, tais
como me tornei quem sou?, porque exerço esse tipo de prá-
tica em minhas ações diárias?. A fim de tomar consciência
da própria história e estar apto a inferir nas histórias de
seus alunos.
• A autoformação nunca termina, pois o indivíduo autônomo,
e consciente da importância do aprendizado, nunca deixa
de buscar o conhecimento através da formação continuada,
fazendo uso de cursos on line, leituras de livros, participa-
ções em congressos e eventos, entre outros meios.

SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 139

• A inexistência de escolas ou centros de formação específi-


cos para professores de surdos os conduziram assumir a
responsabilidade por sua formação e autoformação no de-
correr da história da educação de pessoas surdas;
• Alunos surdos, assim como os demais, precisam de profes-
sores comprometidos com a sua formação e autoformação
contínuas de modo que possam obter o domínio não apenas
de conteúdos técnicos, mas que sejam conhecedores de si
mesmos, e das peculiaridades de seus alunos;
• A autoformação pode apresentar dimensões sobre as quais
não se tem clareza durante o processo autoformativo.

O tornar-se professora alfabetizadora bilíngue por força das


circunstâncias, fazendo do espaço familiar o local de aprendiza-
gens próprias do contexto formal de ensino trouxe-nos, por meio
de narrativas descritas da realidade vivenciada, a percepção clara
de dimensões que foram se constituindo nas relações estabeleci-
das como mulher, mãe, alfabetizadora em autoformação e cidadã,
na luta diária por educação escolar de qualidade para o seu filho
surdo, considerado “diferente” por sua condição de surdez.

REFERÊNCIAS

BORGES, Maria Célia. AQUINO, Orlando Fernández. PUENTES, Roberto Valdés.


Formação de professores no Brasil: História, Políticas e Perspectivas. In: Re-
vista HISTEDBR On-line, Campinas, n.42, p.94-112, jun2011 -ISSN: 1676-
2584. Disponível em: https://periodicos.sbu.unicamp.br/ojs/index.php/his-
tedbr/article/view/8639868/7431 Acesso em 05/02/2020. Hora: 17h

BRASIL, Decreto nº 5.626 de 22 de dezembro de 2005. Dispõe sobre a regu-


lamentação da Lei no 10.436, de 24 de abril de 2002, que dispõe sobre a Língua
Brasileira de Sinais - Libras, e o art. 18 da Lei no 10.098, de 19 de dezembro de

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 140

2000. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-


2006/2005/decreto/d5626.htm. Acesso em: 03/11/2018.

BRASIL. Lei nº 13.146, de 6 de julho de 2015. Institui a Lei Brasileira de In-


clusão da Pessoa com Deficiência (Estatuto da Pessoa com Deficiência)
Brasília/DF: Casa Civil, 2015. Disponível em: http://www.pla-
nalto.gov.br/CCIVIL_03/_Ato2015-2018/2015/Lei/L13146.htm. Acesso em:
17 abril de 2019.

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil, de 05 de outubro


de 1988. Institui a República Federativa do Brasil. Brasília/DF: Senado Federal,
1988. Disponível em: https://presrepublica.jusbrasil.com.br/legisla-
cao/91972/constituicao-da-republica-federativa-do-brasil-1988. Acesso em:
09 de abril de 2020. Hora: 13:50.

BRASIL. Lei n.10.172, de 9 de janeiro de 2001. Aprova o Plano Nacional de


Educação e dá outras providências. Brasília/DF: Casa Civil, 2001b. Disponível
em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/leis_2001/l10172.htm. Acesso
em: 22 maio 2019.

BRASIL. Lei n. 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as diretrizes e


bases da educação nacional. Brasília/DF: Casa Civil, 1996a. Disponível em:
https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L9394.htm. Acesso em: 22 maio
2019.

CARVALHO, RositaEdler. Educação Inclusiva com os Pingos nos Is. 2. ed.


Porto Alegre: Mediação, 2001.

DOMINICÉ, Pierre. A biografia educativa: instrumento de investigação para a


educação de adultos. In: NÒVOA, Antonio; FINGER, Matthias. O método (auto)
biográfico e a Formação. Natal, EDUFRN; São Paulo:Paulus, 2010.

DUMAZEDIER, Joffre. Lazer e cultura popular. São Paulo: Perspectiva, 1976.

FREIRE, Paulo. A educação na cidade.4. ed. São Paulo: Cortez, 2002.

______. Educação como prática de liberdade. 23. ed. Rio de Janeiro: Paz e
Terra, 1987.

SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 141

GALVANI, P. A autoformação, uma perspectiva transpessoal, transdiscipli-


nar e transcultural. In: Educação e Transdisciplinaridade, II/coordenação
executiva do CETRANS. São Paulo:TRIOM, 2002.

GESSER, Audrei. LIBRAS? Que língua é essa? : crenças e preconceitos em


torno da língua de sinais e da realidade surda - São Paulo : Parábola Editorial,
2009.

GOLDFELD, Márcia. A Criança Surda. Linguagem e Cognição Numa Perspec-


tiva Sócio-Interacionista. São Paulo: Plexus Editora, 2002.

HONORA, Márcia. Inclusão educacional de alunos com surdez. São Paulo:


Cortez Editora, 2014.

JOSSO, Marie- Christine. Da formação do sujeito... Ao sujeito da formação. In:


Nóvoa, António; Finger, Matthias. O método (auto)biográfico e a formação.
2ed. Natal, RN - Edufrn, 2014.

LACERDA, Cristina. Tenho um aluno surdo e agora? Introdução à Libras e


educação de surdos. São Carlos: EDUFCar, 2014.

LODI, Ana Cláudia, SKILIAR, Carlos [et al.] Letramento e minorias. 8 ed. Porto
Alegre: Mediação, 2017.

MARTINS, Lúcia de Araújo Ramos. História da educação de pessoas com de-


ficiência. São Paulo: Mercado de Letras, 2015.

MAZZOTTA, Marcos Jose Silveira. Educação especial no Brasil: História e po-


líticas. 3. ed. São Paulo: Cortez, 2001.

NÓVOA, Antonio. Os professores e as histórias de vida. In: NÓVOA, Antonio


(org.) Vida de professores. 2 ed. Porto: porto editora, 2000.

NÓVOA, António; FINGER, Matthias (Org.). O método (auto)biográfico e a


formação. Natal, RN: EDUFRN; São Paulo: Paulus, 2010.

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 142

ONU – ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS. Declaração de Salamanca. In:


OMOTE, Sadao (org). Inclusão: intenção e realidade. Marília: Fundepe, 2004. p.
1136.

ONU – ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS. Declaração Universal dos Di-


reitos Humanos. Paris: ONU, 1948. Disponível em: http://por-
tal.mj.gov.br/sedh/ct/legis_intern/ddh_bib_inter_universal.htm. Acesso em: 20
jun. 2019.

ONU – ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS. Relatório Mundial sobre a Defi-


ciência / World Health Organization, The World Bank ; tradução Lexicus Servi-
ços Linguísticos. São Paulo :SEDPcD, 2012. Disponível em: http://www.pesso-
acomdeficiencia.sp.gov.br/usr/share/documents/RELATORIO_MUN-
DIAL_COMPLETO.pdf Acesso em: 11 de fev. de 2019. Hora: 23h

RODRIGUES, David (org.) “Inclusão e Educação: doze olhares sobre a Educa-


ção Inclusiva”, S. Paulo. Summus Editorial, 2006.
SÁ, Nídia Regina Limeira de. Educação de surdos. A caminho do bilinguismo.
RJ: EDUFE. 1999.

SANCHES, Roberto. O saber da narração: Paul Ricoeur e Marie - Christine Jo-


sso. In: ABRAHÃO, Maria Helena Menna Barreto (org). (Auto)biografia e for-
mação humana. Porto Alegre: EDPUCRS, 2010.

SACKS, Oliver. Vendo vozes: uma viagem ao mundo dos surdos. São Paulo :
Companhia das Letras, 2010.
SANTOS, Boaventura de Sousa. A gramática do tempo: para uma nova cul-
tura política. São Paulo: Cortez, 2006. (Coleção para um novo senso comum;
v.4)

SILVA, José Edmilson Felipe da.A construção da língua portuguesa escrita


pelo surdo não oralizado.Dissertação (Mestrado em ciências da Linguagem)
Universidade Federal Católica. Recife, p.46, 2009.

SILVA, Luzia Guacira dos Santos. A formação docente e a inclusão escolar.


Natal/RN: UFRN, 2011.
SILVA, Luzia Guacira dos Santos. Educação Inclusiva: por uma escola sem ex-
clusões! São Paulo: Paulinas, 2014.

SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 143

STROBEL, Karin. As imagens do outro sobre a cultura surda. Florianópolis.


Editora UFSC. 2008.

TARDIF, Maurice. LESSARD, Claude. O trabalho docente: elementos para uma


teoria da docência como profissão de interações humanas. 6ª Ed. Rio de Ja-
neiro: Vozes, 2011.

TEIXEIRA, Francisca dos Santos. SILVA, Maria de Jesus Assunção e. LIMA, Maria
da Glória. O desenvolvimento docente na perspectiva da (auto) formação
profissional. Disponível em: file:///C:/Users/jube/AppData/Local/Packa-
ges/Microsoft.MicrosoftEdge_8wekyb3d8bbwe/TempState/Downlo-
ads/419329486.dissertacao_completa2%20(1).pdf. Acesso em 09/04/2020.

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 144

CAPÍTULO 5
CONSULTORIA COLABORATIVA:
MEDIAÇÃO QUE FOMENTA NOVOS SABERES E
NOVAS PRÁTICAS

Neiza de Lourdes Frederico Fumes


Eliane Cristina Moraes de Lima
Maria Quitéria da Silva
Soraya Dayanna Guimarães Santos

INTRODUÇÃO

Ter uma prática pedagógica que oportunize a todos os alu-


nos à participação nas atividades acadêmicas e consequentemente
à aprendizagem constitui-se em uma das demandas do processo
inclusivo. Porém, muitos docentes apresentam dificuldades para a
sua efetivação, seja pelas barreiras atitudinais e/ou pela falta de
uma formação. Especificamente, quando se trata da inclusão de
alunos com deficiência, é vastíssima a literatura (PRAIS, ROSA,
2017; BAZON, et al, 2018) que demonstra que a formação docente
deixa muito a desejar.

Se analisado o contexto formativo inicial sobre a docência univer-


sitária de modo geral, são evidenciadas problemáticas com relação
à fragilidade no preparo do professor para ensinar no ensino su-
perior, a preocupação se amplia quando tratamos da temática do
ensino assim como da inclusão de pessoas com deficiência no con-
texto universitário [...] (MARTINS, 2016, p. 102).
SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 145

Em consonância com a autora, para a superação dessa situ-


ação é necessário ter possibilidade de se envolver em ações forma-
tivas, principalmente, no decorrer do exercício profissional, que
supram as necessidades da atividade docente. Muitas dessas lacu-
nas são advindas de uma formação inicial precarizada e que não
considera uma perspectiva inclusiva de educação, como ainda de
uma formação pós-graduada de pesquisadores e não de professo-
res (SANTOS, 2016).
Para Bazon et al (2018, p. 4), precisamos estar atentos às
condições necessárias para a efetivação do processo inclusivo,
sendo que a formação de professores se constitui como um dos re-
quisitos fundamentais para que o referido processo se torne efe-
tivo". Dentre essas condições, destacamos que esse professor pre-
cisa reconhecer a importância e saber se engajar em um processo
colaborativo com um profissional especialista, no sentido de cons-
truir qualitativamente uma prática pedagógica que atenda às espe-
cificidades do aluno com deficiência e promova sua inclusão na
aula (PRAIS; ROSA, 2017). Nessa circunstância, a formação e a prá-
tica pedagógica inclusiva são elementos que não se descolam no
processo educacional inclusivo.
Nessa perspectiva, a mediação, mais do que nunca, é elevada
a elemento articulador dos participantes e das atividades que se
dão nessa realidade. Desse modo, são movimentos que não acon-
tecem de forma direta, mas, que se utilizam de instrumentos e sig-
nos, principalmente a linguagem, os quais se apresentam como
ponte para a construção do conhecimento. Em uma perspectiva,
sócio-histórica, “a categoria mediação não tem, portanto, a função
de apenas ligar a singularidade e a universalidade, mas de ser o
centro organizador objetivo dessa relação (AGUIAR; OZELLA,

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 146

2013, p. 302)”. É na mediação que os elementos internos e exter-


nos se relacionam para novas constituições e novas aprendizagens.
Essa dinâmica considera o que Vigotsky chama de Zona de
Desenvolvimento Proximal (ZDP), em que o sujeito necessita da
mediação para ter um avanço na aprendizagem. Vigotsky (2007)
explica que a ZDP é:

[..] a distância entre o nível de desenvolvimento real, que se cos-


tuma determinar através da solução independente de problemas e
o desenvolvimento potencial, determinado através da solução de
problemas sob a orientação de um adulto ou em colaboração com
problemas sob a orientação de um adulto ou em colaboração com
companheiros mais capazes (p. 97).

Considerando as proposições de Vigotsky, a consultoria co-


laborativa e a auto confrontação, técnicas utilizadas nesse estudo,
se configuram como instrumentos com o potencial de fomentar no-
vas mediações, que vão atuar na ZDP do docente e, consequente-
mente, contribuir com novos aprendizados.
Araújo e Almeida (2014) afirmam que as técnicas supraci-
tadas se apresentam como importantes ferramentas para auxiliar
o professor nesse processo de aquisição de conhecimentos especí-
ficos para a inclusão. Podem atuar como elemento mediador da
prática docente, trazendo contribuições para o alcance de uma
proposta didática que permita a aprendizagem e a participação do
aluno com deficiência nas atividades acadêmicas.
A consultoria colaborativa pode ser explicada como “[...] o
compartilhamento do trabalho (planejamento, avaliação, expecta-
tivas) entre um especialista e o professor de Educação Comum –
tem sido apontada com um dos componentes para uma inclusão
bem sucedida” (ARAÚJO; ALMEIDA, 2014, p. 343). Nessa relação,
“o papel do consultor é auxiliar o professor a construir estratégias
e rever as potencialidades de seus alunos para que possam, de

SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 147

forma efetiva, se desenvolver academicamente” (MACHADO; AL-


MEIDA, 2014, p. 225). Na consultoria, busca-se identificar os desa-
fios e as barreiras encontradas no processo de ensino e aprendiza-
gem para propor formas de eliminá-las e assim possibilitar a inclu-
são efetiva do aluno com deficiência.
Gasparotto e Menegassi (2016) explicam que a consultoria
colaborativa como instrumento mediador da construção do conhe-
cimento possibilita ao docente a ressignificação da sua prática,
tendo em vista que sua proposta é dar subsídios teórico-metodo-
lógicos por meio da autoavaliação do docente.
Nessa tessitura, a consultoria colaborativa, como já colo-
cado, atua na ZDP, à medida que cria possibilidades do docente se
envolver de uma nova maneira, adotando novas ações a partir dos
novos conhecimentos construídos. “Assim esse modelo propõe
contribuir de forma salutar para que [...] seja viável a construção
de ações que potencializem o seu trabalho e atenda às necessida-
des do seu alunado” (MACHADO; ALMEIDA, 2014, p. 224).
É nessa dinâmica entre o especialista e o professor da sala
de aula comum, de parceria e colaboração, de troca de conheci-
mento e reflexão, que se constituem novos saberes educacionais,
especificamente na perspectiva da educação inclusiva, os quais
contribuem com a formação e a prática docente.
Por sua vez, a Autoconfrontação Simples (ACS) e a Autocon-
frontação Cruzada (ACC) também evidenciam a mediação. Na pri-
meira, o docente se observa nas imagens em vídeo em sua situação
de trabalho e reflete verbalmente sobre suas ações. “As verbaliza-
ções servem sem dúvida para trazer à luz a realidade do trabalho”
(CLOT, 2007, p. 135). Na segunda, além de ter o recurso do vídeo,
também há a presença de um especialista na área de estudo ou de
um colega de trabalho mais experiente na mesma área para trazer
orientações e provocar na docente, reflexões da sua prática e novos

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 148

conhecimentos a partir da realidade vista nas imagens para sua


melhor atuação.
Considerando os desafios no campo da docência na Educa-
ção Superior para promover uma prática pedagógica inclusiva,
nesse artigo procuraremos analisar a consultoria colaborativa e a
auto confrontação (simples e a cruzada) como mediadores de no-
vos saberes docentes para inclusão educacional da pessoa com de-
ficiência.

O PROCESSO DE PRODUÇÃO E ANÁLISE DE DADOS

As discussões que serão realizadas a seguir partem de dados


de uma pesquisa realizadas a partir dos pressupostos teórico-me-
todológicos da Psicologia Sócio-Histórica (PSH), que postula que o
homem é um sujeito histórico e dialético, constituído nas relações
sociais vivenciadas ao longo da vida (AGUIAR; SOARES; MA-
CHADO, 2015).
Os participantes da pesquisa foram: Lilli1, professora uni-
versitária, 43 anos de idade, graduada em Educação Física e Mestre
em Ciências da Saúde. A docente lecionava a disciplina “Ginástica
de Academia”, no 7º período do Curso de Bacharelado em Educação
Física, de uma IES privada da cidade de Maceió. Atuava na Educa-
ção Superior desde 2006.
Ainda que as análises dos dados incidiram na professora
universitária, também participaram desta pesquisa três consulto-
res colaborativos: João, Ana e Maria, que colaboraram com orien-
tações didático-pedagógica à Lilli para o ensino e a aprendizagem
do estudante surdo. João era Mestre em Educação, com experiência
na área de Educação, com ênfase na educação de surdos e surdos
cegos. Ana também era Mestre em Educação, com experiência na

1
Todos os nomes apresentados no corpo do texto são fictícios com o propósito de
garantir o anonimato, respeitando os princípios éticos da pesquisa.
SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 149

área de Educação Especial, com ênfase em educação de surdos, e


Maria era Mestre em Ensino em Ciências da Saúde, com experiên-
cia em Atividade Física Adaptada.
Ainda fizeram parte da pesquisa, a pesquisadora do PRO-
CAD , o estudante surdo Luan e o tradutor/intérprete de Libras Le-
2

onardo.
O local de realização da pesquisa foi em um Curso de Bacha-
relado em Educação Física de uma Faculdade de Ensino Superior
privada de Maceió/AL.
Foi utilizado como instrumento de pesquisa a observação
participante, compreendida como “[...] processo pelo qual um pes-
quisador se coloca como observador de uma situação social, com a
finalidade de realizar uma investigação científica” (DESLANDES;
GOMES, 2013, p. 70) e como recurso metodológico a consultoria
colaborativa que “consiste do suporte de profissionais especialis-
tas [...]” (FERREIRA, et al., 2007, p. 7).
Ainda foi utilizada a técnica da ACS como um dos recursos
metodológicos de colaboração, que consiste no sujeito estudado
em se autoavaliar ao se observar em sua atividade de trabalho por
meio de vídeo (CLOT, 2007). E, também a ACC que se constitui em
"[...] tornar o trabalho um objeto do pensamento. É um método
centrado numa perspectiva reflexiva, isto é, propõe-se uma ativi-
dade de reflexão sobre a atividade habitual de trabalho" (SANTOS,
2006, p. 38).
Clot (2007, p. 135), precursor dessa técnica, postula que a
ACS “é na verdade orientada por um pesquisador, [...] trata-se de

2
Consideramos importante esclarecer que os dados aqui analisados integram uma
das pesquisas (SANTOS, 2016) desenvolvida no âmbito do Programa de Cooperação
Acadêmica (PROCAD) “Tecendo redes de colaboração no ensino e na pesquisa em
Educação: um estudo sobre a dimensão subjetiva da realidade escolar”. Integrantes
da rede: PUC-SP UERN, UFPI e UFAL (Edital nº 071/2013).

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 150

uma atividade em si em que o trabalhador descreve sua situação


de trabalho para o pesquisador”. Assim, quando o docente se vê
diante das imagens, ele verbaliza sobre sua atuação e ao mesmo
tempo reflete nas possibilidades, pensando em mudanças na sua
atividade.
A ACC “trata-se de uma atividade dirigida [...] em que a lin-
guagem, longe de ser para o sujeito apenas um meio de explicar
aquilo que ele faz ou aquilo que se vê, torna-se um meio de levar o
outro a pensar, a sentir e a agir sendo a perspectiva do sujeito”
(idem, p. 135).
Clot (2007) afirma que na ACC “a ação do especialista em
resposta à ação do sujeito é decisiva na produção de descrições do
trabalho. Ela circunscreve, ainda que sem o saber ou o querer, as
possibilidades que o sujeito mantém ou não na apresentação de
sua ação” (p. 140). Dessa maneira, a mediação da especialista pode
provocar mudanças e internalização de novas formas de agir do
docente que passa por esse processo de ACC.
O processo de produção de dados durou três meses e dezes-
seis dias e foi antecedido pela aprovação da pesquisa pelo Comitê
de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de Alagoas – proto-
colo n.º 439.400.
Durante esse período ocorreu consultoria colaborativa, com
a discussão de alguns episódios acontecidos em sala de aulas, prin-
cipalmente aqueles que Lilli não sabia como lidar. Com isso, a con-
sultoria focou em orientações didático-pedagógicas à professora,
na perspectiva de contribuir com sua prática inclusiva. Em cada
sessão estavam presentes, a professora universitária, o/a consul-
tor/a colaborativo/a e a pesquisadora do PROCAD. Também, ao
final de cada aula, a pesquisadora do PROCAD tecia algumas suges-
tões à professora com o propósito de colaborar com a autonomia e
aprendizagem do estudante surdo. Vale salientar que todo o

SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 151

processo de consultoria foi filmado e, posteriormente, transcrito


fielmente para análise.
Aconteceram também sessões de auto confrontação. Na
ACS, a professora universitária analisou sua atuação docente ao as-
sistir episódios de sua aula em vídeo. Clot (2007, p. 141) discorre
que “ao se transformar em linguagem, as atividades se reorganizam
e se modificam”. Na ACC, a professora foi levada a assistir episódios
de suas aulas com a especialista Maria, que tecia comentários so-
bre os mesmos, com o intuito de fomentar o processo reflexivo. A
pesquisadora do PROCAD também estava presente participando
de ambos processos de reflexão.
Os dados produzidos foram analisados com base na análise
de conteúdo, que segundo Bardin (2011),

é um conjunto de técnicas e análise das comunicações visando ob-


ter por procedimentos sistemáticos e objetivos de descrição do
conteúdo das mensagens indicadores (quantitativas ou não) que
permitam a inferência de conhecimentos relativos às condições de
produção/recepção (variáveis inferidas) dessas mensagens (p.
48).

Nesse processo foram formadas duas categorias: Categoria


1: Inclusão do surdo na sala de aula: “não há receita pronta” e Ca-
tegoria 2: Recursos pedagógicos acessíveis para a inclusão do uni-
versitário surdo em sala de aula.

RESULTADOS E DISCUSSÕES

1 - Inclusão do surdo na sala de aula: não há receita pronta


Esta categoria vem abordar as orientações, advindas das ses-
sões de consultoria colaborativa, no sentido de promover uma prá-
tica docente com características mais inclusivas e que atenda às

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 152

especificidades do estudante surdo. Conforme as orientações dos


consultores, as estratégias pedagógicas precisavam ser construí-
das considerando as necessidades pedagógicas do aluno e sempre
objetivando a sua participação nas aulas.
Uma das orientações dadas pela consultora Ana foi a res-
peito da forma de aprendizagem do estudante surdo, quando de-
clarou que:

[...] todo campo de aprendizagem do surdo é um campo visual, en-


tão para ele só vai ser acessível se tiver formas visuais de mostrar
isso; e, [...] a Língua de Sinais é uma língua gesto-visual.

De forma semelhante, a consultora Maria orientou que: “a


única coisa que eu colocaria era realmente um boneco anatômico,
mostrando realmente a musculatura ou talvez uns slides mos-
trando aquela peça que você está querendo. [...] Eu colocaria ima-
gem”.
Corroborando com as orientações das consultoras, Rodri-
gues e Quadros (2015, p. 72) afirmam que o sujeito surdo “[...] com-
preende a linguagem como o visual, o gestual, o simbólico, o midi-
ático, o expressivo, o comunicacional, o interativo, e de tantas ou-
tras maneiras que estão o tempo inteiro ressignificando nossa no-
ção do que vem a ser linguagens”.
Com essas e outras mediações fomentadas pelo processo de
pesquisa, a professora Lilli pareceu ter internalizado novos conhe-
cimento e refletiu sobre novas formas de realizar a sua aula: “agora
eu faria um monte de coisas diferentes, [...] colocaria um boneco de
anatomia para ele [estudante surdo] mostrar no boneco de Anato-
mia [o músculo] para depois mostrar no aluno [...]”.
Esses excertos também demonstram a necessidade do do-
cente ter esse conhecimento específico a respeito da aprendiza-
gem do surdo para poder fazer uso de recursos pedagógicos

SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 153

prioritariamente visuais e assim ampliar as possibilidades de


aprendizagem de seu aluno.
Outro elemento a ser destacado é a relevância da mediação
para a ressignificação de saberes e transformação da sua prática
pedagógica quando declarou: "talvez [se] tivesse trazido outros re-
cursos, talvez tivesse prendido mais [a atenção]". Em outro mo-
mento, Lilli refletiu: "eu poderia ter trazido um elástico, por exem-
plo, para mostrar a elasticidade do tendão, [...], uma corda mais rí-
gida que mostre realmente o que é ligamento, o que é tendão, o
próprio vídeo com um pedacinho de uma aula [...]".
Nos recortes anteriores vemos uma professora universitá-
ria refletindo sobre possibilidades de transformação de sua prática
a partir dos novos conhecimentos construídos no processo colabo-
rativo. Dentre essas, estava a introdução de recursos pedagógicos
visuais e concretos, os quais poderiam ter utilizado para facilitar a
aprendizagem do estudante surdo.
Apesar desses novos conhecimentos, a consultora Ana fez
uma ressalva que merece ser destacada: “[...] não há uma receita
de bolo, mas você trazendo essas formas visuais, com certeza vai
facilitar a vida dele, a sua e a do intérprete”. Botelho e Oliveira
(2020) compartilham dessa ideia e acrescentam que as particula-
ridades de cada aluno não precisam ser respeitadas. Com isso, é
preciso romper a ideia de um modelo ideal de aulas que funcione
para qualquer aluno e em qualquer lugar.
Outro aspecto discutido no decorrer da pesquisa diz res-
peito ao papel do intérprete de Libras no processo de ensino e
aprendizagem. A princípio, ressalta-se que a sua função no ambi-
ente de aprendizagem não é a de “professor particular” do aluno
surdo, substituindo o professor no ato de ensinar. Acreditamos que
sua função é de ser ponte entre o professor e o aluno surdo e vice-
versa. Nessa direção, a consultora Maria explica sobre o papel do

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 154

intérprete para a professora Lilli: “a gente tem que deixar claro


para o intérprete que ele não é professor. Ele estava tentando ali
explicar e não é a função dele”. De modo semelhante, o consultor
João explica: “[...] o papel do intérprete, ele é como ponte, ele é
ponte”.
Ratificando essa posição, Vargas e Gobara (2014, p. 451) es-
clarecem que “o intérprete educacional é aquele que atua como in-
térprete de Línguas de Sinais em sala de aula e no ambiente esco-
lar, ou seja, ele atua como intérprete na educação. Assim, o intér-
prete deve intermediar as relações entre o aluno com surdez e os
colegas e professores ouvintes”.
Continuando com o processo de consultoria colaborativa, a
pesquisadora do PROCAD contribuiu com orientações acerca da
metodologia de ensino, especificamente quanto à forma de expli-
car os conteúdos de ensino: “[...] fala um pouco mais devagar e
sempre depois de uma discussão perguntar se entendeu. Fechar
um bloco de ideias”.
Diante das orientações da pesquisadora do PROCAD, consi-
deramos importante destacar que: “A fala e a escrita excessiva do
professor em sala e o uso de vocabulários muito rebuscados aca-
bam dificultando o entendimento dos conteúdos por parte dos alu-
nos e principalmente dos alunos com surdez [...]” (ALVES et al,
2013, p. 201). Isso implica dizer que para o surdo as explicações
devem ser diretas, objetiva, sem muitos recursos linguísticos, visto
que o surdo pode não possuir um domínio da língua portuguesa.
Nesse sentido, o consultor João sugere que “[...] a ideia é trabalhar
o sujeito de acordo com sua especificidade e diferença linguística
também”.
A partir dessas ressignificações e transformação da prática
pedagógica, iremos discutir a seguir sobre o uso de recursos peda-
gógicos acessíveis para a inclusão do universitário surdo em sala
de aula
SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 155

RECURSOS PEDAGÓGICOS ACESSÍVEIS PARA A INCLUSÃO DO


UNIVERSITÁRIO SURDO EM SALA DE AULA

Nesta categoria, iremos apresentar os recursos pedagógicos


acessíveis ao universitário surdo e que permitem sua participação
nas atividades discutidos e implementados no decorrer da pes-
quisa. Seguindo as sugestões dos consultores, a professora Lilli uti-
lizou em suas aulas recursos pedagógicos pensando na inclusão do
Luan nas aulas, assegurando-lhe a aprendizagem dos conteúdos de
sua disciplina.
As consultoras Ana e Maria sugeriram o uso de um mesmo
recurso – o vídeo, com a gravação dos movimentos: “[...] seria bom
o vídeo. Você [professora] executando [o movimento]” (Consultora
Ana) e “[...] seria interessante também os vídeos para fixar” (Con-
sultora Maria).
Para as consultoras, o vídeo, além de ser um recurso peda-
gógico que permite a acessibilidade do assunto ao surdo, ainda
desperta o interesse pela aula. As demais orientações configuram-
se na possibilidade de utilização de imagem relacionadas ao conte-
údo que estava sendo ensinado:

[...] você [professora] tem uma figura mesmo do corpo humano lá,
para que ele [surdo] possa apontar, sem precisar fazer a datilologia
de toda parte da musculatura e que tenha também os nomes (Con-
sultora Ana)
[...] colocar mais figuras nos slides [...] e exemplos mais concretos
(Pesquisadora do PROCAD),
[...] [usa] recurso imagético. A importância de estar comunicando
com todos, utilizando as expressões, o máximo possível (Consultor
João)
[...] a questão mesmo do fazer material, confeccionar. Pensar nele
enquanto sujeito visual [...] (Consultor João).

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 156

Seguindo as orientações da consultoria colaborativa, a pro-


fessora procurou em suas aulas utilizar recursos pedagógicos que
permitiram a participação ativa do aluno surdo. Assim, a profes-
sora Lilli declarou: “Eu usei o retroprojetor para poder mostrar as
fotos, aí eu usei as carinhas, [...] o cavalete e usei aquele fio de
prumo para poder regular a bicicleta”.
Observamos que a professora passou a utilizar recursos pe-
dagógicos acessíveis para o estudante surdo, os quais também fa-
voreciam a aprendizagem dos demais alunos. Além de fazer as mo-
dificações nas suas aulas, Lilli reconheceu que, foi a partir dos mo-
mentos de consultoria colaborativa que sua prática, começou a ter
um caráter mais inclusivo: “[...] na hora que eu for montar o crono-
grama eu vou estar pensando [em incluir]”. E, acrescentou: “Eu
acho que a participação [dos consultores] desde o início foi espe-
tacular. [...] tudo que eu faço agora, eu fico pensando [...]”.
Tendo em vista esse cenário, Dainez e Smolka (2014, p.
1097) ponderam que para Vigotsky “a educação não é vista como
auxílio, complemento e/ou suprimento de uma carência (orgânica
e/ou cultural), mas é a produção de uma ação que torna possíveis
novas formas de participação da pessoa na sociedade”. Nessa con-
cepção, a construção de possibilidades para a aprendizagem do su-
jeito com deficiência e, consequentemente para o seu desenvolvi-
mento, se insere numa proposta de caráter educacional.
Também merece destaque o papel da mediação na aprendi-
zagem do estudante (no caso, surdo), pois, de uma perspectiva vi-
gotskiana, o desenvolvimento cognitivo do indivíduo acontece
através das relações sociais. Soares (2011) explica que,

É a categoria mediação, portanto, que nos possibilita compreender


que as características tipicamente humanas, à medida que são me-
diadas pelas particularidades das objetivações históricas, são ao
mesmo tempo singulares e universais. Isso significa que o homem

SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 157

singular jamais pode se constituir a partir do isolamento social (p.


36).

Nessa mesma ótica, Aguiar e Ozella (2013) enriquecem a


discussão com suas contribuições:

Ao utilizarmos a categoria mediação possibilitamos a utilização, a


intervenção de um elemento/processo em uma relação que antes
era vista como direta, permitindo-nos pensar em objetos/proces-
sos ausentes até então. Logo, [...] subjetividade e objetividade, ex-
terno e interno, nessa perspectiva, não podem ser vistos numa re-
lação dicotômica e imediata, mas como elementos que, apesar de
diferentes, se constituem mutuamente, possibilitando a existência
do outro numa relação de mediação (p. 302).

Para sintetizar podemos afirmar que é, por meio da media-


ção, que ocorre no espaço interpsicológico que se dá a constituição
humana e, portanto, ocorre novas aprendizagens e a transforma-
ção da realidade.
Percebemos ainda que, as mediações ocorridas na consulto-
ria colaborativa, a professora modificou aspectos de sua prática
pedagógica e considerou as particularidades do aluno surdo. Desse
modo, ela passou a incluir a demonstração da posição correta para
montar na bicicleta através de figuras projetadas nos slides; ela fez
referência às figuras (que representam a percepção de esforço) co-
locadas na parede da sala; e também apontou para as figuras de-
monstrando cada método, entre outras estratégias e recursos que
atendessem a todos, inclusive ao aluno surdo.
Também destacamos que, na perspectiva da PSH, ao utilizar
recursos pedagógicos adaptados ou estrategicamente planejados
como mediação para permitir a aprendizagem da pessoa com defi-
ciência, se está propondo uma educação emancipatória, pautada
nas potencialidades do sujeito e não no seu defeito biológico.

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 158

Em seus estudos, Dainez e Smolka (2014, p. 1097) afirmam


que Vigotsky, defende “uma instrução orientada para o potencial
de desenvolvimento das funções humanas complexas (atenção vo-
luntária e orientada, memória mediada, percepção verbalizada,
trabalho de imaginação, pensamento generalizado, nomeação e
conceptualização do mundo)”. Isto posto, compartilhamos a ideia
que, independentemente do sujeito ter deficiência ou não, a apren-
dizagem deve ser focada nas funções psicológicas superiores e,
para isso, as condições de acessibilidade devem ser oferecidas.
No caso específico do estudante surdo, os recursos visuais a
serem utilizados pela docente configuram-se em importantes ele-
mentos da metodologia de ensino, como defendem Rodrigues e
Quadros (2015):

Nas salas de aula, por exemplo, encontramos novas configurações


decorrentes do uso de uma língua gesto-visual e do lugar da visu-
alidade na aprendizagem dos surdos. Uma nova organização física
do espaço, a presença de intérpretes, outra dinâmica dos proces-
sos, novas possibilidades de interação, tudo é negociado (p. 85).

Os resultados mostram que a consultoria colaborativa veio


agregar conhecimentos à docente em questão ao desencadear no-
vas mediações, as quais colocou em andamento processos mentais
que regulam sua atividade docente, uma vez que,

Ao apropriar-se dos elementos culturais que foram construídos


pela humanidade, por intermédio da interação, o sujeito utiliza-os
como instrumentos (ferramentas) que lhe permitem ampliar e re-
finar sua relação e seu entendimento sobre o mundo em que está
inserido. Desta forma, orientado e regulado pelo outro, o sujeito
investe esforços na tarefa de entender e dar sentido a objetos e fa-
tos da sua realidade e, a partir desta dinâmica, passa a se auto re-
gular, a ter domínio sobre suas ações e escolhas. O processo de in-
teração e de mediação assume, nesta perspectiva, papel e função

SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 159

primordial no desenvolvimento dos indivíduos e na organização


da vida em sociedade (SOUZA; ROSSO, 2011, p. 5896).

Ao analisar a situação em estudo, podemos ponderar ainda


que as transformações em sua prática pedagógica “proporcionará
criticidade e criatividade suficientes para o docente [ela] poder
preparar suas ações/aulas/projetos para que também o estudante
possa se ‘situar’, de forma mais atuante no interior das relações
culturais e sociais” (TREVIZAN; GEBRAN; GUIMARÃES, 2017, p.
184).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Na perspectiva da formação docente para uma prática inclu-


siva foi notório que a consultoria colaborativa e a auto confronta-
ção são ferramentas capazes de engendrar novos processos subje-
tivos, os quais desencadeiam mudanças de saberes e fomentar prá-
ticas como novas estratégias que favorecem a aprendizagem do es-
tudante surdo.
A parceria entre consultores, pesquisadora e professora
participante trouxe contribuições de vários aspectos para a do-
cente que ressignificou sua prática e incluiu recursos pedagógicos
para que o estudante surdo pudesse participar das aulas ativa-
mente. Também acreditamos que tenha trazido contribuições para
os consultores, ainda que não tenhamos nos debruçados para ana-
lisar esse processo.
Observamos que o processo de mediação ocorrido e promo-
vido na/pela consultoria colaborativa trouxe elementos que pro-
moveram uma prática docente inclusiva, uma vez que eles amplia-
ram as possibilidades de aprendizagem do aluno surdo e de seus
colegas.

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 160

Por fim, entendemos que a formação continuada é uma


questão central na atividade pedagógica, principalmente quando
se trata de inclusão de alunos com deficiência, sendo um direito
dos professores e um dever dos órgãos empregadores.

REFERÊNCIAS

AGUIAR, W. M. J.; OZELLA, S. Apreensão dos sentidos: aprimorando a proposta


dos núcleos de significação. Revista brasileira de Estudos Pedagógicos. Bra-
sília: v. 94, n. 236, p. 299-322, jan./abr. 2013. Disponível em <http://www.sci-
elo.br/pdf/rbeped/v94n236/15.pdf> Acesso: 14 jun. 2019.

AGUIAR, W. M. J.; SOARES, J. R.; MACHADO, V. C. Núcleos de significação: uma


proposta histórico-dialética de apreensão das significações. Cadernos de Pes-
quisa, v.45 n.155, 2015, p.56-75. Disponível em <https://www.sci-
elo.br/pdf/cp/v45n155/1980-5314-cp-45-155-00056.pdf> Acesso 19 ago
2020

ALVES, T. P; et al. Inclusão de alunos com surdez na educação física escolar.


Revista Eletrônica de Educação, v. 7, n. 3, p.192-204, 2013. Disponível em
<http://www.reveduc.ufscar.br/index.php/reveduc/search/search?simple-
Query=Inclus%C3%A3o+de+alunos+com+sur-
dez+na+educa%C3%A7%C3%A3o+f%C3%ADsica+escolar&searchFi-
eld=query> Acesso: 08 de jun 2019.

ARAÚJO, L. S.; ALMEIDA, M. A. Contribuições da consultoria colaborativa para a


inclusão de pessoas com deficiência intelectual. Revista Educação Especial, v.
27, n. 49, p. 341-352, maio/ago. 2014. Santa Maria. Disponível em:
<https://periodicos.ufsm.br/educacaoespecial/article/view/8639/pdf>
Acesso em 08 jun 2019.

BARDIN, L. Análise de Conteúdo. 1ª ed.São Paulo: Edições 70, 2011.

BAZON, F. V. M; et al. Formação de formadores e suas significações para a edu-


cação inclusiva. Educ. Pesqui., São Paulo, v. 44, e176672, 2018. Disponível em
<http://www.scielo.br/pdf/ep/v44/1517-9702-ep-44-e176672.pdf> Acesso:
15 jun 2019.
SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 161

BOTELHO, D. H. O.; OLIVEIRA, V. M. Desafios da inclusão no ensino superior:


narrativas de uma universitária com síndrome de Down. Revista Valore, [S.l.],
v. 5, p. 156-170, jan. 2020. ISSN 2526-043X. Disponível em: <https://revistava-
lore.emnuvens.com.br/valore/article/view/408>. Acesso em: 19 ago. 2020.

CLOT, Y. A Função Psicológica do Trabalho. Tradução de Adail Sobral. 2.


ed. - Petrópolis, RJ: Vozes, 2007.

DAINEZ, D; SMOLKA, A. L. B. O conceito de compensação no diálogo de Vigotski


com Adler: desenvolvimento humano, educação e deficiência. Educ. Pesqui.,
São Paulo, v. 40, n. 4, p. 1093-1108, out./dez. 2014. Disponível em
<http://www.scielo.br/pdf/ep/v40n4/15.pdf> Acesso: 15 jun 2019.

DESLANDES, S. F.; GOMES, M. R. Pesquisa social: teoria, método e criativi-


dade; Maria Cecília Minayo (organizadora). 33 ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2013.

FERREIRA, B. C. et al. Parceria colaborativa: descrição de uma experiência en-


tre o ensino regular e especial. Rev. Educação Especial, n. 29, p. 1-7, 2007.
Disponível em <https://periodicos.ufsm.br/educacaoespecial/arti-
cle/view/4137/2454>. Acesso em 15 fev 2017.

GASPAROTTO, D. M.; MENEGASSI, R., J. Aspectos da pesquisa colaborativa na


formação docente. Perspectiva, Florianópolis, v. 34, n. 3, p. 948-973, set./ago.
2016. Disponível em <https://periodicos.ufsc.br/index.php/perspectiva/arti-
cle/view/2175-795X.2016v34n3p948> Acesso: 08 jun 2019.

MACHADO, A. C; ALMEIDA, M. A. Efeitos de uma proposta de consultoria cola-


borativana perspectiva dos professores. Meta: Avaliação. Rio de Janeiro, v. 6,
n. 18, p. 222-239, set./dez. 2014. Disponível em <http://revistas.cesgran-
rio.org.br/index.php/metaavaliacao/article/view/160/pdf> Acesso: 09 jun
2019.

MARTINS, L. M. S. M. Práticas e formação docente na UFRN com vistas à in-


clusão de estudantes cegos. 2016. 154f. Dissertação (Mestrado em Educação)
- Centro de Educação, Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal,
2016.

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 162

PRAIS, J. L. S; ROSA, V. F. A Formação de professores para inclusão tratada na


Revista Brasileira de Educação Especial: uma análise. Revista Educação Espe-
cial v. 30 n. 57, p. 129-144 | jan./abr. 2017. Disponível em <https://periodi-
cos.ufsm.br/educacaoespecial/article/view/19833/pdf> Acesso: 15 jun 2019.

RODRIGUES, C. H. R.; QUADROS R. M. Diferenças e linguagens: A visibilidade


dos ganhos surdos na atualidade. Revista Teias. v. 16, n. 40, 72-88 • (2015):
Diferenças e Educação. Disponível em <http://www.e-publicacoes.uerj.br/in-
dex.php/revistateias/article/view/24551/17531> Acesso em: 10 set 2017.

SANTOS, M. Análise psicológica do trabalho: dos conceitos aos métodos. Re-


vista Laboreal. Volume II. nº1. 2006. p. 34-41. Disponível em < http://labo-
real.up.pt/files/articles/2006_07/pt/34-41pt.pdf> Acesso 19 ago 2020.

SANTOS, S. D. G. Docência no processo do estudante com deficiência em


cursos de Educação Física: análise do contexto universitário brasileiro e por-
tuguês. Tese (Doutorado em Educação) Universidade Federal de Alagoas, Ma-
ceió. 2016.

SOARES, J. R. Atividade docente e subjetividade: sentidos e significados


constituídos pelo professor acerca da participação dos alunos em atividade de
sala de aula. Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (Tese de doutorado
em Educação), 2011.

SOUZA, A. P. de; ROSSO, A. J. Mediação e zona de desenvolvimento proximal


(ZDP): entre pensamentos e práticas docentes. X Congresso Nacional de Edu-
cação-EDUCERE. I Seminário Internacional de Representações Sociais,
Subjetividade e Educação-SIRSSE. Pontifícia Universidade Católica do Pa-
raná, Curitiba, 7-10 nov 2011. Disponível em: <https://edu-
cere.bruc.com.br/CD2011/pdf/4604_3097.pdf>. Acesso em 14 jun 2019.

TREVIZAN, Z; GEBRAN, R. A; GUIMARÃES, C. F. A mediação docente no ensino


da leitura literária. Teias v. 18 • n. 49 • 2017(abr./jun.). Disponível em
<https://www.e-publicacoes.uerj.br/index.php/revistateias/arti-
cle/view/26708/20960> Acesso: 15 jun 2019.

VARGAS, J. S; GOBARA, S. T. Interações entre o Aluno com Surdez, o Professor e


o Intérprete em Aulas de Física: uma Perspectiva Vygotskiana. Rev. Bras. Ed.
Esp., Marília, v. 20, n. 3, p. 449-460, Jul.-Set., 2014. Disponível em:
SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 163

<http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1413-
65382014000300010&lang=pt>. Acesso: 12 jun 2019.

VIGOTSKY, L. S. A formação social da mente: o desenvolvimento dos proces-


sos psicológicos superiores; organizadores Michael Coles … [et al]; tradução
José Cipolla Neto, Luís Silveira Menna Barreto, Solange Castro Afeche. - 7ª ed. -
São Paulo: Martins Fontes, 2007.

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 164

CAPÍTULO 6
FUNCIONAMENTO DAS SALAS DE
RECURSOS MULTIFUNCIONAIS (SRM) NO
ESTADO DO RN: FORMAÇÃO E EXPERIÊNCIAS
DOS PROFESSORES QUE ATUAM
NESTE DISPOSITIVO

Sonia Medeiros
Izabel Hazin
Taciana Pontual Falcão

1. INTRODUÇÃO

O presente capítulo constitui-se de um estudo que objetiva


mapear a realidade da implementação das Salas de Recursos Mul-
tifuncionais (SRM) no Estado do Rio Grande do Norte (RN) e, ainda,
investigar a formação e experiências dos professores que atuam
nestas salas.
No campo específico desta pesquisa debruçou-se sobre as
especificidades que cercam o funcionamento das SRM, que tratam
de um programa promovido pela Secretaria de Educação Especial,
vinculado ao Ministério de Educação e Cultura - MEC, implemen-
tado no ano de 2005, que objetiva apoiar o Atendimento Educaci-
onal Especializado (AEE). O referido programa é destinado às es-
colas das redes estaduais e municipais de educação e intenta pro-
mover o ensino com qualidade para alunos com deficiência, trans-
tornos globais do desenvolvimento e altas habilidades/
SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 165

superdotação - público alvo da educação especial. Este programa é


desenvolvido de forma complementar e suplementar à escolariza-
ção, sendo oferecido no contra turno em que a criança frequenta
na escola regular em que está matriculada (BRASIL, 2007). Nos
atendimentos do AEE, são ofertados serviços voltados para avalia-
ção, organização e implementação de recursos didáticos e de aces-
sibilidade, que tem como objetivo promover uma melhor aprendi-
zagem por parte desta clientela (BRASIL, 2008).
O AEE é entendido na legislação brasileira como sendo um
conjunto de atividades, recursos de acessibilidade e pedagógicos
organizados institucionalmente, prestado de forma complementar
ou suplementar à formação dos alunos no ensino regular (BRASIL,
2008). Sendo assim, este serviço não pode ser considerado como
algo separado do contexto da escola, ele é parte integrante, que
transpassa todos os níveis e modalidades de ensino, atendendo à
política de educação inclusiva. Neste contexto, a prática do profis-
sional da sala de recursos encontra-se pautada por uma política
pública que tem como subsídio a diversidade e a atenção aos alu-
nos em suas especificidades, assegurando-lhes o atendimento em
horário contrário a sala de aula, evitando a retirada do aluno no
horário de aula. Destaca-se que as SRM ainda estão disponíveis
para o atendimento de alunos que porventura não possuam laudo,
mas que a equipe escolar identifique que necessite dos serviços.
De forma geral, os investimentos para o AEE envolvem a
aquisição de equipamentos, mobiliários e materiais didático-peda-
gógicos e de acessibilidade para a organização das SRMF. Porém,
um dos maiores desafios está na circunscrição das atribuições e na
formação dos professores que atuarão no AEE.
Nas políticas que norteiam o AEE, a implementação das
SRM é compreendida como equipamento indispensável a efetiva-
ção do processo inclusivo. Entendendo que a inclusão é um

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 166

paradigma que propõe o acesso, a permanência e a aprendizagem


dos discentes, não se trata apenas de garantir o acesso, mas de con-
tribuir com sugestões que podem levar a alterações nos aspectos
pedagógicos, atitudinais e arquitetônicos da escola.
As SRM são divididas em dois tipos, I e II, onde o primeiro
tipo, destina-se a atender os educandos com Transtornos Globais
do Desenvolvimento, deficiência física, auditiva, intelectual ou
múltipla, além daqueles que se enquadra nos diagnósticos de altas
habilidades/superdotação. Já na sala do tipo II, também são aten-
didos os discentes com deficiência visual, pois estas, são acrescidas
de equipamentos específicos para esta limitação.
Quanto aos equipamentos específicos da sala tipo II, des-
taca-se a máquina de datilografia em braille que, inclusive, pode
ser utilizada pelo aluno não somente na SRMF, mas também na sala
de aula regular, bem como em sua residência ou outro espaço que
o educando dela possa vir a necessitar. Sendo ainda destacado em
nota técnica que “os recursos pedagógicos de acessibilidade po-
dem ser utilizados pelo estudante em sala de aula ou em domicílio,
sendo vedado o desvio com outros propósitos” (BRASIL, 2015) 1.
Na organização das SRMF, existe uma diversidade de jogos
que podem auxiliar o professor a melhorar aprendizagem dos alu-
nos com NEE ou deficiência. Os jogos que compõe esta sala, podem
auxiliar o processo de ensino-aprendizagem dos alunos com ne-
cessidades especiais, sendo um mecanismo potencializador, capaz
de modificar a prática pedagógica dos educadores. Nesta situação,
Rizzi e Haydt (2001) afirmam que enquanto o aluno joga, os esque-
mas cognitivos, afetivos e motores são estimulados, incentivando
o pensamento e a aprendizagem.

1
Nota técnica nº 42 de 16 de junho de 2015, que orienta aos sistemas de ensino
quanto a destinação dos materiais e equipamentos disponibilizados por meio do
Programa de Salas de Recursos Multifuncionais.
SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 167

No entanto, conforme discutido por Garcia (2013), a ideia


de multifuncionalidade da sala de recursos é transferida para o
professor, exigindo-se deste uma formação eclética. Porém, a ques-
tão atual, em especial em regiões mais desfavorecidas do Brasil, é
mapear se realmente existem professores que atuam nestas salas
e se estes foram formados para atuar de acordo com as especifici-
dades necessárias ao pleno desenvolvimento das competências e
habilidades das crianças com necessidades especiais.
No entanto, apesar dos esforços dispostos na política pú-
blica de educação especial na perspectiva de educação inclusiva
(2008), especialmente as ações que se destinam a implementação
do AEE nas escolas comuns, o mapeamento realizado neste estudo,
demonstra que o Rio Grande do Norte enfrenta dificuldades em
efetivar a oferta deste serviço nas escolas estaduais e municipais,
provocando distorções em relação ao processo de ensino e apren-
dizagem do público alvo da educação especial. Tal contexto pode
provocar uma lacuna entre o desejável e o esperado na política pú-
blica de atendimento à pessoa com deficiência, especialmente no
que se refere ao direito a atendimento educacional especializado,
visto que os educandos ficam sem conseguir desenvolver suas
aprendizagens como esperado.
Diante desta problemática, a respeito da implementação
dos serviços ofertados nas SRM, construiu-se a seguinte indagação:
qual a realidade da implementação das Salas de Recursos Multifun-
cionais (SRM) no estado do Rio Grande do Norte (RN), e ainda, que
formação e experiências dos professores que atuam nestas salas
encontram-se presentes no contexto do estado?
Trata-se de estudo exploratório, com aspectos quali/quan-
titativos, que tem como objetivos apontar as características essen-
ciais da execução da Política das SRMF no Estado do RN, ampliando

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 168

a compreensão acerca das vivências dos docentes junto a tais dis-


positivos.
Este estudo tem como objetivo mapear a realidade da im-
plementação das Salas de Recursos Multifuncionais (SRM) no Es-
tado do Rio Grande do Norte (RN), e investigar a formação e expe-
riências dos professores que atuam nestas salas. Os sujeitos parti-
cipantes foram os funcionários da Subcoordenadoria de Educação
Especial - SUESP, órgão subordinado à Secretaria Estadual de Edu-
cação e Cultura do estado do Rio Grande do Norte, os secretários
municipais de educação e ainda, professores lotados na rede esta-
dual de ensino, em Salas de Recursos Multifuncionais. Onde traba-
lhou-se com a aplicação de questionários com questões
quali/quantitativas que a partir das análises destas respostas, con-
seguiu-se compreender os principais obstáculos experienciados
pelos professores e gestores, no tocante a garantia e a ofertado dos
serviços de Atendimento Educacional especializado.
Nesse sentido, espera-se que tal mapeamento aponte cami-
nhos que possam efetivar as políticas de acesso e permanência dos
educandos com deficiência no contexto da escola comum, possibi-
litando que a inclusão escolar se torne um direito acessível a todos
os discentes público alvo da educação especial.

PERCURSO METODOLÓGICO

O estudo constituiu-se de estudo exploratório com o obje-


tivo de identificar a natureza do fenômeno, apontando as caracte-
rísticas essenciais da execução da Política das SRM no Estado do
RN, ampliando a compreensão acerca das vivências dos docentes
junto a tais dispositivos. A pesquisa exploratória justifica-se como
sendo necessária quando objetiva-se adquirir maior familiaridade
com o assunto a ser pesquisado, buscando ainda, construir

SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 169

hipóteses ou deixar o assunto mais explícito, ampliando as ideias e


intuições (GIL, 2010).
Ainda na perspectiva metodológica, tem-se um estudo com
aspectos descritivos, para o qual Gil (2010) ressalta a necessidade
de se descrever os fenômenos estudados, traduzidos nas respostas
dos sujeitos envolvidos na pesquisa, analisando-os posteriormente
frente aos teóricos que se dedicam a estudar a problemática tra-
çada para este estudo.

PARTICIPANTES DA PESQUISA E INSTRUMENTOS UTILIZADOS

Os sujeitos envolvidos na primeira etapa do estudo foram:


os funcionários responsáveis pela Subcoordenadoria de Educação
Especial – SUESP2; e os Secretários Municipais de Educação do Es-
tado do RN. Os dois grupos responderam a um questionário com
informações sobre as Salas de Recursos Multifuncionais do Estado.
O questionário apresentava os aspectos descritos na tabela abaixo.
O objetivo do questionário foi identificar por município as
seguintes informações: a) quantidade de Salas de Recursos Multi-
funcionais; b) quantidade de professores efetivos alocados nas sa-
las; c) formação dos professores; d) tipo de salas; e) quantidade de
alunos; f) horário de funcionamento. Do primeiro grupo de sujeitos
(funcionários da SUESP), conseguiu-se mapear 100%3 das escolas
estaduais, uma vez que a Subcoordenadoria possui um cadastro
atualizado com todas as informações que o questionário solicitava.

2
A SUESP é uma Subcoordenadoria de Educação Especial, ligada diretamente a Se-
cretaria Estadual de Educação do estado do Rio Grande do Norte. Tem como obje-
tivo organizar, orientar e oferecer subsídios ao processo inclusivo nas escolas da
rede estadual.

3
Enfatiza-se que a coleta dos dados foi autorizada pela então, Secretária Estadual
de Educação do Rio Grande do Norte

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 170

No entanto, a rede municipal, composta por 167 municípios, ape-


nas 119 retornaram o e-mail com o questionário respondido.
A segunda etapa do diagnóstico teve como alvo os professo-
res da rede estadual que atuam nas SRM. Escolheu-se trabalhar
com esta rede de ensino, por se tornar mais fácil o contato com es-
tes profissionais, pois a Secretaria Estadual é dividida em 16 Dire-
torias Regionais de Ensino e Cultura - DIREC, organizadas com se-
tores de educação especial, inclusive com cadastro dos educadores
que atuam nas SRMF.
Após as respostas do questionário enviado à Secretária Es-
tadual e Secretários Municipais, foi realizado o levantamento do
quantitativo de professores alocados nas Salas de Recursos Multi-
funcionais da rede estadual do RN. Esta informação foi conseguida
junto a Secretaria Estadual de Educação e as Diretorias Regionais
de Ensino e Cultura. A listagem com os dados de nome e e-mail dos
professores foi elaborada e foi enviado um convite eletrônico,
junto com o questionário. Foram identificados 281 professores,
mas foram obtidos os contatos de apenas 120 deles. Destes, 50 res-
ponderam à solicitação de participação.
Com este instrumento, composto por 7 questões, sendo 4
objetivas e 3 subjetivas, foram avaliados os seguintes domínios: a)
o tempo de atuação na sala de recursos; b) a deficiência que sente
mais dificuldade em trabalhar; c) o entendimento do professor so-
bre o que é tecnologia assistiva; d) se os professores utilizam a tec-
nologia assistiva nos atendimentos; e) os benefícios percebidos da
tecnologia assistiva para a aprendizagem; f) as dificuldades de tra-
balhar com a tecnologia assistiva; g) a tecnologia assistiva utilizada
com mais frequência nos atendimentos.

SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 171

ANÁLISE DOCUMENTAL

A análise documental constituiu-se em uma importante


fonte de informações, para a pesquisadora, pois esta teve acesso
aos dados que não foram tratados analiticamente, ou que podem
ser analisados novamente. Neste sentido, a análise documental
permite que sejam estudados de modo qualitativo os fenômenos a
serem compreendidos. De acordo com Gil (2010, p. 45) a pesquisa
documental é conceituada como a análise “de materiais que não
receberam ainda um tratamento analítico, ou que ainda podem ser
reelaborados de acordo com os objetos da pesquisa”. Yin (2005, p.
112) diz que a utilidade da pesquisa documental “é corroborar e
valorizar as evidências oriundas de outras fontes”, ou seja, o pes-
quisador ancora-se na pesquisa documental para esclarecer ou
consolidar informações obtidas em outros instrumentos da pes-
quisa. Nesta perspectiva, analisaram-se os seguintes documentos:
relatórios e site do MEC, dados estatísticos do IBGE, leis, decretos
e notas técnicas que discutiam as questões relacionadas ao objeto
de estudo.

PROCEDIMENTOS

Os dados oriundos dos questionários foram analisados se-


guindo-se por duas estratégias, a saber, análise estatística descri-
tiva para as questões objetivas e análise das questões apresenta-
das pelos sujeitos, onde estas foram organizadas de acordo com
as categorias apresentadas pelos próprios sujeitos.

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 172

RESULTADOS E DISCUSSÕES

A primeira parte deste estudo ocorreu no estado do Rio


Grande do Norte, cuja a capital é a cidade do Natal, localizado na
Região nordeste do Brasil, que é composta por nove estados. Tem
clima tropical úmido e semiárido, com área geográfica de
52.811.107 (dados de 2016), sua densidade demográfica é de
59,99 (hab/km²) (dados de 2010), seu índice de Desenvolvimento
Humano - IDH é de 0,684, apresentando um grau de urbanização
de 77,8%. Está dividido em 167 municípios, onde residem
3.507.003 (dados de 2017)4 apresentando um total de domicílios
de aproximadamente 899.498, com expectativa de vida ao nascer
de 74,97 anos, e taxa de mortalidade infantil de 44,8 a cada mil nas-
cidos vivos. O rendimento mensal domiciliar per capita é de R$
845,00 (dados de 2017) (IBGE, 2018).5
Buscando ainda aproximar a realidade do estado ao tema
do referido estudo, procurou-se identificar os dados educacionais
do estado, principalmente no tocante ao acesso à educação básica.
De acordo com a LDB 9.394/96, é responsabilidade dos municípios
a oferta da educação infantil e ensino fundamental e, o Estado seria
o ente que deveria responsabilizar-se pela oferta do ensino médio.
No site do IBGE (2018) estão descritas as informações mostradas
no Gráfico 7 sobre o ranking de atendimento, a demanda a nível
nacional e o total de estudantes matriculados nestas etapas de en-
sino.

4
Informações disponíveis no site: www.ibge.gov.br/estatisticas-novoportal/por-ci-
dade-estado-estatisticas.html?t=destaques&c=24.
Acessado em 01 de junho de 2018

5
Informações disponíveis no site: www.ibge.gov.br/estatisticas-novoportal/por-ci-
dade-estado-estatisticas.html?t=destaques&c=24.
Acesso em 01 de jun. de 2018.
SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 173

Gráfico 01 - Acesso à educação básica

Fonte: IBGE (2018).

Percebe-se que nas matrículas no estado, cerca de 705.338,


apenas 89.326 (18%) encontram-se frequentando a educação in-
fantil, sendo estes, dados significativamente abaixo do número es-
perado. Contexto similar é identificado onde estão matriculados
aproximadamente 486.560 (69%). Quanto ao ensino médio, a pro-
cura por este nível também é pequena, pois apenas 129.452 (13%)
encontram-se cursando este nível.
O Gráfico 1 expõe os dados relacionados à quantidade de do-
centes e número de estabelecimentos de ensino no RN, coletados a
partir das informações no site do IBGE (2018).

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 174

Gráfico 2 - Número de estabelecimentos de ensino e de docentes


no RN6

Fonte: IBGE (2018).

Percebe-se nas informações acima expostas que o número


de docentes que atuam no ensino fundamental é de 25.065, ultra-
passa os que lecionam na educação infantil, 2.801. Tal fato parece
estar relacionado com a política pública que até 2015 deixava a
educação infantil como uma etapa opcional, ou seja, pais decidiam
se os filhos deveriam cursar ou não esta etapa. No tocante ao fato
do número de docentes que atuam no ensino médio (7.146) ser
menor que os do ensino fundamental, acredita-se que a evasão no
ensino médio, ainda é alta, ocasionando uma formação menor de
turmas e, consequentemente uma menor contratação dos profes-
sores.
Quanto aos estabelecimentos de ensino do RN, a menor
oferta encontra-se destinada ao ensino médio, com

6
Informações oferecidas pelo IBGE, coletadas por este órgão em 2015. Disponível
no site: cidades.ibge.gov.br/brasil/rn/panorama. Acesso em 01 de jun. de 2018.
SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 175

aproximadamente 438 instituições. Neste nível, ressalta-se que o


ensino é de responsabilidade do Estado, e que, as escolas, muitas
vezes, ofertam o ensino médio em três turnos, diferentes do que
ocorre na educação infantil e no ensino fundamental, nos quais são
dois, ou apenas um turno. Neste sentido, a oferta do nível médio
em três turnos, reduz a quantidade de prédios escolares a serem
utilizados.
Em pesquisa realizada no portal do SIGETEC (2018), órgão
responsável pela distribuição7 das Salas de Recursos Multifuncio-
nais - SRM no Brasil, pôde-se constatar que dos 167 municípios do
Rio Grande do Norte, apenas oito não receberam os Kits da sala de
recursos.
No Gráfico 3, encontra-se a quantidade de cidades de cada
região que receberam estes kits.

7
Estes equipamentos foram distribuídos entre os anos de 2008 a 2014. Informações
obtidas
no site: www.fnde.gov.br/sigetec/sisseed_fra.phpwww.fnde.gov.br/sigetec/sis-
seed_fra.php. Acesso em 24 de maio de 2018.

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 176

Gráfico 3 - Distribuição das Salas de Recursos da Rede Municipal


pelo Ministério da Educação.

Fonte: Dados da pesquisadora8 (2018).

Percebe-se que a rede municipal está bem assistida pelo Mi-


nistério da Educação, no tocante à oferta dos equipamentos das
SRM. Tal contexto certamente direciona-se pela oferta da educação
infantil e do ensino fundamental ser realizada pelos municípios e
ainda, as crianças com deficiência estarem entrando nestes níveis
mais cedo.
No entanto, apesar dessa assistência oferecida pelo MEC, es-
tas ações não estão traduzindo-se em efetivação da oferta do ser-
viço, pois como percebe-se no gráfico acima dos 167 municípios do
estado, 159 receberam os kits das SRM e apenas 99 tem a SRM fun-
cionando.

8
Gráfico elaborado com as informações disponíveis no site: www.fnde.gov.br/sige-
tec/sisseed_fra.phpwww.fnde.gov.br/sigetec/sisseed_fra.php. Acessado em 24 de
maio de 2018.
SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 177

A aplicação dos questionários na rede estadual, mediada pela


SUESP, órgão responsável pela orientação, funcionamento e orga-
nização da educação especial e inclusiva na rede estadual de en-
sino, forneceu as informações exposta no Gráfico 04.
Os números expostos no gráfico destacam que dos 167 mu-
nicípios que ofertam o Ensino Estadual no Estado, apenas 134 9fo-
ram contemplados e 33 não receberam os kits. Já na rede estadual,
percebe-se uma discreta diferença dos municípios que foram equi-
pados pelo Ministério da Educação e Cultura - MEC.

Gráfico 04 - Distribuição das Salas de Recursos da Rede Estadual


pelo Ministério da educação e a Implementação do AEE

Fonte: Dados da pesquisadora (2018).

9
Estes dados referem-se aos dados disponibilizados pelo MEC, onde as informações
estão disponíveis em: www.fnde.gov.br/sigetec/sis-
seed_fra.phpwww.fnde.gov.br/sigetec/sisseed_fra.php. Acessado em 24 de maio
de 2018

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 178

Verifica-se também que a rede municipal recebeu os equipa-


mentos em maior quantidade, em relação às escolas estaduais, com
uma diferença de 25 municípios. Tal realidade ocorre devido a po-
lítica da educação especial na perspectiva da educação inclusiva
desencadeada em 2008, onde o processo inclusivo passou a ter
maior ênfase, e as escolas especiais deixaram de ofertar o ensino
regular. Assim, a rede municipal, responsável pela oferta da educa-
ção infantil e fundamental, passa a receber os alunos com deficiên-
cia mais rápido que a rede estadual, responsável pela oferta do en-
sino médio.
Consequentemente, os alunos, público da educação especial,
passaram a ser informados no censo escolar e, deste modo, as es-
colas foram contempladas com os recursos da política de educação
especial, entre eles, as Salas de Recursos Multifuncionais.
As informações acima expressam um contexto preocupante
da oferta do AEE na rede estadual de ensino do RN, uma vez que,
dos 167 municípios, apenas 64 oferecem o AEE. Outra preocupa-
ção ainda perceptível relaciona-se aos dados do SIGETEC (2018),
quando este disponibiliza que do total dos municípios do RN que
ofertam o ensino na rede estadual, foram entregues a 134 kits para
as SRMF, porém de acordo com a SUESP, estão atualmente funcio-
nando apenas 64 salas, questionário com perguntas aos Secretá-
rios Municipais e Estaduais de Educação. No entanto, os dados
acima ainda diferem da realidade atual, pois ao enviar um perce-
beu-se que alguns municípios, mesmo tendo sido contemplados
com os equipamentos das SRM, não oferecem este serviço aos edu-
candos que dele necessitam.
A tabela acima expõe a realidade da rede municipal de en-
sino no tocante à oferta do AEE, infelizmente, dos 167 municípios
do estado, 119 retornaram o e-mail com as informações solicita-
das. Neste contexto, compreende-se que existe uma quantidade
significativa de municípios, sendo 99 que ofertam o AEE e apenas
SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 179

20 não conseguiram ainda implementar tal serviço. Há de se pen-


sar que, naturalmente os educandos que estão concluindo o ensino
fundamental, oriundos da rede municipal de ensino, terão que ma-
tricular-se na rede estadual e, que consequentemente ficarão sem
a oferta do AEE. A diferença entre as redes municipais, hoje é de 35
municípios que não ofertam.
Através da Portaria Ministerial nº 13 de 2007, institui o
Atendimento Educacional Especializado - AEE, o qual objetiva ga-
rantir a matrícula e permanência na escola dos alunos com defici-
ência, transtornos globais do desenvolvimento e/ou altas habilida-
des/superdotação.
A escolha das instituições que receberão as SRMF é reali-
zada pelos gestores da rede estadual ou municipal de ensino, atra-
vés do Sistema de Gestão Tecnológica do Ministério da Educação –
SIGETEC. Para tanto, é firmado um termo de adesão entre o MEC e
o gestor, no qual o último se responsabiliza por assegurar instala-
ções físicas acessíveis e ainda, disponibilizar professores para rea-
lizar os atendimentos.
Em 2012, o Programa alcançou 5.020 municípios (90%). No
período de 2005 a 2014, foram disponibilizadas 41.801 salas em
escolas públicas de ensino regular, com registro de matrículas de
estudantes público alvo da Educação Especial, em classes comuns
(BRASIL, 2015, p. 17).
Entre os anos de 2005 e 2007, este crescimento apesar de
existente ainda era incipiente. No entanto, em meados de 2007
identifica-se expansão significativa da distribuição destas salas,
saindo de um patamar de 250 salas para um número expressivo de
28.500. Tal realidade encontra-se ancorada no aumento de alunos
da Educação Especial - EE matriculados na rede regular de ensino
(BRASIL, 2015).

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 180

Evidentemente que não basta apenas o MEC equipar as SRM


com o mobiliário e equipamentos tecnológicos e pedagógicos, é ne-
cessário que os gestores assumam a responsabilidade sobre o fun-
cionamento destas salas, disponibilizando professores e espaço fí-
sico suficiente para a realização das atividades.
Ainda em relação aos dados oferecidos pelos Secretários
Municipais de educação, o questionário indagava em qual nível de
ensino o AEE é ofertado. As respostas são ilustradas no Gráfico 05.

Gráfico 05 - Nível de Ensino em que o AEE é ofertado

Fonte: Dados da pesquisadora (2018).

A inserção desta oferta de serviço nas escolas faz parte da


Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação
Inclusiva (2008), que tem como objetivos:

Apoiar a organização da educação especial na perspectiva da edu-


cação inclusiva; Assegurar o pleno acesso dos alunos público alvo
da educação especial no ensino regular em igualdade de condições
com os demais alunos; Disponibilizar recursos pedagógicos e de
acessibilidade às escolas regulares da rede pública de ensino; Pro-
mover o desenvolvimento profissional e a participação da comuni-
dade escolar (BRASIL, 2016, p. 9).
SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 181

Nesta vertente, pode-se compreender que o Ministério da


Educação e Cultura - MEC demonstra uma preocupação em equi-
par as escolas de ensino regular, formar e capacitar a equipe das
escolas e assegurar que o processo inclusivo ocorra com mais efi-
ciência, permitindo que os alunos consigam ampliar e desenvolver
suas habilidades e competências.
Outro aspecto evidenciado no questionário foi a quanti-
dade de professores envolvidos na oferta do AEE na rede estadual,
para o qual as respostas da SUESP e dos gestores municipais apre-
sentaram os dados dispostos na Tabela 2:

Quadro 2 - Professores que atuam nas salas de recursos das redes


municipais e estaduais

ENSINO PROFESSORES ATUANDO


Municipal 42110
Estadual 281
Total 707

Fonte: Dados da pesquisadora (2018).

Como se pode perceber a quantidade de professores da


rede municipal é maior que a da rede estadual, evidenciando que,
a maioria dos alunos também se encontra na rede municipal. No
tocante ao contexto estadual, atuam hoje 281 professores. Em re-
lação à quantidade de alunos, somente conseguiu-se coletar na
rede municipal, na qual se encontram, em média, 3676 alunos
sendo atendidos nas salas de recursos.

10
Este número corresponde há uma realidade de 99 municípios que retornaram os
e-mails com as informações solicitadas

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 182

Outra indagação do questionário objetivou identificar a gra-


duação dos educadores que trabalhavam na oferta do AEE no Es-
tado (rede estadual e municipal). Os resultados são apresentados
no Gráfico 06.

Gráfico 6 - Formação inicial dos professores

Fonte: Dados da pesquisadora (2018).

Ressalta-se que estas habilitações atendem aos requisitos


do MEC, o qual exige que os educadores que atuem nas SRMF te-
nham formação inicial que o habilite para o exercício da docência
(BRASIL, 2010).
Em termos históricos, a formação de professores sempre foi
permeada por discussões e análises, uma vez que este profissional
precisa adequar-se constantemente às modificações que ocorrem
na sociedade, no conhecimento e nos modos de ensinar e aprender
na escola. Com as reflexões advindas do paradigma inclusivo, par-
ticularmente ocorridas após a Declaração de Salamanca (1994), a
formação de professores passa a ser compreendida como um pres-
suposto indispensável para a efetivação desta política educacional.
SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 183

Para atuar nas SRM o professor precisa atender às exigên-


cias dispostas na Resolução nº 4/2009, que em seu Art. 12 refe-
renda que este profissional precisa ser habilitado para exercer as
funções docentes nos termos da legislação nacional (LDBEN, 1996)
e ainda, ser detentor de uma formação específica na área de edu-
cação especial. Nesta vertente, entende-se que este professor deve
estar em constante formação, permitindo-o, compreender e acom-
panhar os estudos relacionados à complexidade do ato de ensinar
e aprender, ou seja, “pensar a diversidade na escola nos impõe con-
ceber a amplitude das formas como esta se apresenta no cotidiano
escolar” (MAGALHÃES, 2014, p. 05). Pautado nestas concepções de
inacabamento, esse professor deve motivar-se sempre a construir
e ampliar seus conhecimentos, num processo permanente de
aprendizagem (FREIRE, 2002).
Na pergunta seguinte, questionou-se se os educadores ti-
nham pós-graduação. As respostas encontram-se apresentadas no
Gráfico 07:
Gráfico 07 - Tipo da Pós-graduação dos educadores do AEE

Fonte: Dados da pesquisadora (2018).

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 184

Nos documentos do MEC (BRASIL, 2010) enfatiza-se que o


professor deverá ter formação específica na área de educação es-
pecial. Tais dados deixam evidente a necessidade de se implemen-
tar uma formação específica para os profissionais que atuam nes-
tas salas, visto que apenas o curso a nível de pós-graduação que
destaca os conhecimentos específicos para atuar nas SRM é o AEE
e o de educação especial.
Nesse sentido, compreende-se que o professor do AEE ne-
cessita de uma formação consistente, específica e contínua para
atuar com as inúmeras especificidades que sua profissão exige, de
modo que este consiga promover o desenvolvimento das habilida-
des e competências dos seus alunos. De acordo com os documentos
nacionais, o professor do AEE deve articular a educação especial
com a classe comum, o uso das tecnologias e os procedimentos pe-
dagógicos adaptados, utilizando ainda o sistema de comunicação
alternativa, LIBRAS e braille, evidenciando-o assim, como fio con-
dutor do sucesso ou fracasso do processo inclusivo.
A este respeito ressalta-se a necessidade da formação dos
professores como elemento indispensável para o sucesso da polí-
tica de inclusão no Brasil, compreendendo que “alunos e professo-
res são tidos como sujeitos constituintes deste processo, e não ví-
timas de decisões do “sistema” (MICHELS, 2011, p. 4).
A pergunta seguinte objetivava caracterizar o tipo de sala
de Recursos que o município dispõe, tendo-se o contexto apresen-
tado no Gráfico 08.

SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 185

Gráfico 08 - Tipo de sala de Recursos

24%

76%

Sala tipo I Sala Tipo II

Fonte: Dados da pesquisadora (2018).

O cenário acima exposto é delineado pela presença maciça


(76%) das salas de recursos do Tipo I, ou seja, são locais que se
destinam a atender alunos com deficiência (exceto a visual), trans-
torno global do desenvolvimento e altas habilidades/superdota-
ção. Já a sala do Tipo II encontra-se com um percentual de 24%,
sendo estas dotadas, além dos equipamentos da sala do Tipo I, de
equipamentos que atendem às especificidades dos educandos com
Deficiência Visual.
O MEC iniciou em 2007 a implantação das SRM no âmbito das
escolas da rede municipal e estadual de educação. A função da SRM
é facilitar a acessibilidade da aprendizagem do aluno com recursos
tecnológicos adaptados, considerando suas necessidades específi-
cas, trabalhando a inclusão nos aspectos político, cultural e social-
pedagógico, em defesa de todos os alunos, estando assim juntos

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 186

aprendendo e participando sem nenhum tipo de discriminação


(BRASIL, 2010).
De acordo com a Portaria nº 13 de 2007, para atender melhor
às especificações das escolas e das pessoas com NEE, as SRM divi-
dem-se em dois tipos. Na sala tipo I, estão presentes materiais pe-
dagógicos acessíveis aos alunos, com exceção daqueles que apre-
sentam deficiência visual. Na sala de tipo II, além de todos os ma-
teriais que compõem a sala tipo I, são acrescidos materiais especí-
ficos para trabalhar e atender às necessidades das pessoas que
apresentam deficiência visual (ROPOLLI, 2010).
De acordo com os dados oferecidos pelo Ministério da Edu-
cação, até 2013, o número de salas instaladas em todo o território
nacional era de 36.272, assim distribuídos: Tipo I – 36.431; Tipo II
- 1.433; e kits de atualização – 1.500 (BUENO, 2016).
Ainda procurou-se identificar o horário de funcionamento
das Salas de recursos, cujos resultados são mostrados no Gráfico
09:

Gráfico 09 - Horário de funcionamento das SEM

Fonte: Dados da pesquisadora (2018).

SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 187

Constata-se que as salas funcionam em 83% dos municípios


pesquisados nos dois turnos, manhã e tarde, e, em aproximada-
mente 8% atendem apenas em um turno. Tal realidade se dá por
uma ausência de educandos nestes turnos, ou ainda, indisponibili-
dade do profissional em atender os dois turnos.
O horário de funcionamento das sem, também devem estar
de acordo com as orientações do Decreto nº 7611, de 2011, onde
direciona-se para que esse atendimento deva ser ofertado em
turno contrário às aulas regulares, complementa ou suplementa a
formação dos alunos com vistas à autonomia e à independência na
escola e fora dela.
Ainda nas pesquisas realizadas pelo SIGETEC11, consta na
base de dados desta plataforma, a doação de equipamentos para as
SRM para Instituições específicas, que se encontram listadas no
quadro 03:

Quadro 03 - Centros de formações e recursos


contemplados com SRMF

Nome da instituição Município


NA NAAHS12 - Centro Estadual de Educação Especial Natal
CAS13 - Centro de Capacitação de Profissionais da Edu- Natal
cação e de Atendimento às pessoas com Surdez

11
Informações disponíveis no site: www.fnde.gov.br/sigetec/sisseed_fra.php.
Acesso em 20 de maio de 2018.

12
Núcleos de Atividades de Altas Habilidades/ Superdotação): Apoiar a formação
continuada de professores para atuar no atendimento educacional especializado a
estudantes com altas habilidades/superdotação.

13
Centro de Capacitação de Profissionais da Educação e de Atendimento às Pessoas
com Surdez): Promover a educação bilíngue, por meio da formação continuada de

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 188

CAP/Natal - Centro de Apoio para Atendimento às Natal


Pessoas com Deficiência Visual
UFRN - Universidade Federal do Rio Grande do Norte Natal
CAS - Centro de Capacitação de Profissionais da Edu- Mossoró
cação e de Atendimento às Pessoas com Surdez
CAP - Centro de Apoio Pedagógico às Pessoas com Mossoró
Deficiência Visual
NAPPB14 Mossoró - Centro de Apoio para Atendi- Mossoró
mento às Pessoas com Deficiência Visual

Fonte: Dados da pesquisadora (2018).

De acordo com os dados acima destacados na tabela, infere-


se que dos 167 municípios do estado, apenas duas cidades concen-
tram a oferta do AEE em instituições especializadas. Na capital, es-
tão equipadas SRM no NAAHS, que atende a educandos com Altas
habilidades/superdotação, um Centro para alunos com Surdez, ou-
tra Instituição para alunos com Deficiência Visual e ainda a Univer-
sidade Federal do Rio Grande do Norte. Na cidade de Mossoró, es-
tão equipadas o Centro de apoio à Deficiência Auditiva, ainda, dois
centros de apoio às pessoas com Deficiência Visual
Em relação à formação dos professores que atuam nas SRMF
do estado, os dados apontam que 90% destes são graduados em
pedagogia e os demais em áreas específicas da educação. Desta to-
talidade, 50% possuem pós-graduação lato sensu em psicopedago-
gia, 20% em Atendimento Educacional Especializado e 30% em
áreas afins. Tal realidade revela a necessidade de realização de

profissionais para oferta do AEE a estudantes surdos e com deficiência auditiva e da


produção de materiais didáticos acessíveis.

14
Centro de Apoio para Atendimento às Pessoas com Deficiência Visual /NAPPB:
Apoiar a formação continuada de professores para o atendimento educacional es-
pecializado e a produção de material didático acessível aos estudantes com defici-
ência visual.
SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 189

formações continuadas direcionadas aos professores recém admi-


tidos, garantindo a ampliação das habilidades e competências, pro-
movendo uma prática pedagógica mais significativa e eficiente.
Mendes (2011) ressalta que tal formação é complexa, pois o edu-
cador precisa conhecer os documentos que norteiam o processo
inclusivo, as orientações em relação à Educação Especial na pers-
pectiva da Educação Inclusiva, devendo ainda saber trabalhar com
a diversidade de limitações e/ou habilidades que os alunos apre-
sentam.
Nota-se ainda que existe um percentual de 80% de salas do
tipo I (atende aos educandos com deficiência, exceto visual, trans-
torno global do desenvolvimento e altas habilidades/superdota-
ção); e as demais, são as salas do tipo II (aquelas que dispõem de
equipamentos específicos para atender aos educandos com defici-
ência visual). O número de alunos envolvidos nos atendimentos
das SRM ainda não foi contabilizado, pois a inserção dos dados no
Censo escolar não havia sido realizada no sistema de informação
utilizado pela rede estadual no momento da coleta dos dados.
Quanto aos horários, 85% das salas da rede estadual funcionam
nos dois turnos (manhã e tarde), as demais em apenas um turno.
Os dados oriundos da aplicação do segundo questionário (su-
jeitos 02), direcionado aos professores, abarcam aspectos mais es-
pecíficos sobre sua atuação e formação dos profissionais que
atuam nas SRM, conforme ilustra o gráfico abaixo.

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 190

Gráfico 10 - Tempo de atuação dos professores nas SRM.

Fonte: Dados da pesquisadora (2018).

Identifica-se que 30% dos professores que atuam nas SRMF


têm um tempo de experiência de mais de cinco anos, 20% dos pro-
fessores atuam no intervalo de um a cinco anos, enquanto 50% es-
tão trabalhando há menos de um ano nestas salas. Vale salientar
que esse último dado provavelmente reflete o fato do Estado do
Rio Grande do Norte ter realizado recentemente concurso público
com cargo específico para professor para atuar nas SRM recente-
mente.
Nestes termos tem-se que a formação de professores deve
ser um ponto discutido, analisado e contextualizado dentro da prá-
tica diária dos educadores, pautada em suas necessidades reais,
permitindo, uma construção mais significativa das aprendizagens
e, consequentemente, que ocorram modificações no interior das
escolas.
Naturalmente que as discussões destacadas nos estudos de
Oliveira et al (2013), Pletsch (2014), Araújo e Martins (2018), Pri-
eto e França (2018) dentre outros, relacionadas à formação de pro-
fessores na área de educação inclusiva sempre provocaram ques-
tionamentos, reflexões e discursos intensos.
SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 191

No entanto, há de se compreender que esta vertente é uma


necessidade urgente, que não pode ser compreendida como polí-
tica apenas de governo, mas com a inserção de uma política contí-
nua que assegure aos professores a possibilidade de ressignificar
seus conhecimentos e práticas, ampliação de aprendizagens e, con-
sequentemente estes fatores possam solidificar-se no chão da es-
cola, como uma educação de qualidade oferecida para todos os
educandos.
A segunda pergunta, indagava qual seria a deficiência que
os professores enfrentam mais dificuldade para selecionar estra-
tégias pedagógicas. As respostas encontram-se descritas no gráfico
abaixo.

Gráfico 11 - Deficiência que mais apresenta dificuldade para sele-


cionar estratégias pedagógicas

Fonte: Dados da pesquisadora (2018).

A realidade acima descrita, demonstra a DI como sendo uma


das que mais apresenta dificuldade em organizar estratégias

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 192

pedagógicas, isso ocorre devido não existir materiais específicos


para esta deficiência, diferente das demais que dispõem da LIBRAS
(Deficiência Auditiva) e Braille (deficiência Visual) e software ou
Equipamentos das Tecnologias Assistivas para alunos com parali-
sia cerebral.
Trabalhar com a DI ainda mostra-se necessária e urgente de
uma vez que, à prevalência desta deficiência na nossa sociedade,
de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística -
IBGE (2000), tem-se a existência de 24,5 milhões de brasileiros que
apresentam alguma deficiência, e se estima que 50% deles tenham
algum grau de DI (SCHWARTZMAN, LEDERMAN, 2017). Ainda
nesse contexto, os dados disponibilizados pelo Instituto Nacional
de Pesquisa e Estudos Educacionais Anísio Teixeira - INEP (2014)
aponta que o maior número de estudantes atendidos pela educa-
ção especial, tem diagnóstico de DI.
Ressalta-se ainda que a DI representa um percentual signifi-
cativo de crianças matriculadas/incluídas na escola, a escassez de
recursos direcionados a este público, assim como, a ideia veiculada
pelo senso comum da incapacidade de aprendizagem desse grupo
(MILANESI e MENDES, 2018). Também são acrescentadas a esta
estatística a dificuldade que muitos educadores ainda enfrentam
no tocante ao entendimento sobre a DI, as dificuldades que ela
pode provocar, mas também ao desconhecimento sobre o aprendi-
zado desses educandos (MILANEZ e OLIVEIRA, 2013).
A terceira pergunta do questionário investigou acerca do pa-
drão de uso de tecnologias assistivas na sala de recursos. A totali-
dade dos educadores informou que utilizam as tecnologias assisti-
vas em suas práticas cotidianas. Destaca-se aqui a importância que
estas têm em relação ao desenvolvimento das aprendizagens dos
educandos. Sob esta premissa, os documentos do Ministério da
Educação (BRASIL, 2006) preconizam que a tecnologia assistiva

SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 193

deve ser inserida nas escolas, como um meio de ampliar e melho-


rar o processo inclusivo das pessoas com deficiência.
A quarta pergunta investigou a concepção dos professores
sobre tecnologias assistivas. Por se tratar de uma pergunta subje-
tiva, as respostas foram organizadas por categorias apresentadas
pelos próprios sujeitos da pesquisa. Para tanto, identificou-se as
temáticas mais prevalentes nas respostas e, posteriormente, estas
foram agrupadas em categorias semelhantes.
Destacam-se as principais e/ou mais recorrentes concepções
no Quadro 04.

Quadro 04 - Concepções sobre tecnologias assistivas por parte dos


professores das SRMF

Abrange todo tipo de recurso, estratégias, metodologias, que po-


dem ser utilizadas para ensinar,
reabilitar e proporcionar mais independência às pessoas com de-
ficiência;
São recursos e serviços que contribuem para proporcionar ou
ampliar habilidades das pessoas com deficiência;
Uma área do conhecimento, de característica interdisciplinar,
que engloba produtos, recursos,
metodologias, estratégias, práticas e serviços.

Objetiva a promoção da funcionalidade, relacionada à atividade


e participação de pessoas com
deficiência ou mobilidade reduzida.
Visa a autonomia, independência, qualidade de vida e inclusão
social.

Fonte: Dados da pesquisadora (2018).

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 194

Ao analisar os conceitos do Quadro 12, pode-se refletir que


os professores apresentam conceitos amplos sobre as tecnologias
assistivas, uma vez que estes conseguem identificá-las como recur-
sos capazes de melhorar a qualidade de vida das pessoas com de-
ficiência. No entanto, em suas falas, estes profissionais não sinali-
zaram a perspectiva da tecnologia assistiva melhorar as aprendi-
zagens dos alunos no ambiente escolar, conforme expresso na le-
gislação brasileira:

O termo recurso de TA significa qualquer item, peça de equipa-


mento ou um sistema de produto, quer seja adquirido comercial-
mente, modificado ou customizado [...] que diretamente assiste um
indivíduo com uma deficiência. (BRASIL, 2009b, p.15).

No tocante ao texto destacado acima, foram identificadas,


na fala de um dos sujeitos pesquisados, as orientações das políticas
brasileiras, quando este afirma que TA “são recursos e serviços que
contribuem para proporcionar ou ampliar habilidades funcionais
de pessoas com deficiência e consequentemente promover vida in-
dependente e inclusão” (SUJEITO 16). Portanto, os conceitos res-
saltados pelos professores estão coerentes com as orientações do
Ministério da Educação, o que nos leva a compreender que este en-
tendimento pode efetivar-se na prática diária dos profissionais.
Por sua vez, a quinta pergunta investigou o entendimento
dos professores acerca de qual seria a utilidade da inserção da TA
no processo de ensino e aprendizagem dos alunos com deficiência.
A indagação foi formatada em contexto de múltipla escolha, no
qual os sujeitos podiam marcar mais de uma alternativa, de acordo
com seu(s) entendimento(s).

SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 195

Gráfico 12 - Concepções acerca da utilização das TAS no processo


de ensino aprendizagem por parte dos professores das SRM.

Fonte: Dados da pesquisadora (2018).

Os dados expressos no Gráfico 12 revelam que 33% dos pro-


fessores ressaltam que a inserção das tecnologias assistivas facilita
a inclusão e ainda, 33% contribui para a comunicação entre alunos,
assim como entre alunos e profissionais da educação. Ainda se
identifica que 28% marcaram que a TA melhora a aprendizagem.
Acerca do posicionamento assumido pelo conjunto dos pro-
fessores, Scherer e Dal’Igna (2015 p. 421) observam que:

As competências das professoras do AEE são construídas e trans-


formadas por diferentes discursos: legais, psicológicos, psicopeda-
gógicos e, de forma mais incipiente, pedagógicos. Tais discursos
conformam as práticas desenvolvidas, que são reguladas pelas
ideias do que seria a ‘boa prática’ e, inclusive, ‘o bom professor’
para atuar no AEE.

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 196

A partir do exposto, verifica-se que as respostas acima des-


critas coincidem com a diversidade de experiência, aprendizagens
e práticas realizadas pelos professores, o que evidencia que estes
profissionais percebem que a TA contribui eficientemente para a
promoção e desenvolvimento da inclusão escolar.
Na sexta pergunta, os sujeitos discorreram sobre eventuais
dificuldades enfrentadas na utilização das tecnologias assistivas
nas Salas de Recursos Multifuncionais - SRM. Dada a complexidade
das respostas subjetivas, fez-se uma categorização das respostas
mais recorrentes, conforme apresentado Quadro 05.

Quadro 05 - Eventuais dificuldades enfrentadas na utilização das


Tecnologias Assistivas nas SEM

Formação e competência profissional insuficientes


Ausência de recursos e serviços
Ausência de acessibilidade das SRMF
Não vejo
Internet ruim
Um local adequado para a manipulação de instrumentos e servi-
ços para melhor interação com os alunos.

Fonte: Dados da pesquisadora (2018).

A partir das categorias elencadas, contata-se que as princi-


pais dificuldades enfatizadas pelos professores foram: a formação
para profissional insuficiente, a ausência de recursos e serviços, as-
sim como a inadequação dos locais de trabalho. Tais categorias
abarcam dimensões distintas da problemática, porém todas são
necessárias ao pleno desenvolvimento das atividades profissionais
e, consequentemente, estão envolvidas na melhoria das aprendi-
zagens dos alunos.
SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 197

Nestes aspectos, Fialho, Carvalho e Pinel (2016 p. 129) com-


plementam que:

A reconfiguração desses espaços de vida pulsante traz ao nosso en-


trelaçar questões relevantes quando tratamos de inclusão, uma
vez que essas possibilidades de comunicação nos proporcionam
vivências de autonomia, autoria e acesso essenciais à Educação
com equidade e inclusão.

Exemplificando as categorias supracitadas, destaca-se a fala


do sujeito 22 quando este diz que “uma das maiores dificuldades
em trabalhar com as Tecnologias Assistivas está relacionada à ori-
entação em como utilizá-las e, ainda não sabem ou não conseguem
encontrar”. Nesta perspectiva, o professor denuncia uma demanda
essencial ao processo de inclusão, a saber, o compartilhamento
deste com toda a escola. Há que se defender a oferta permanente
de capacitação docente, para que a sua prática ganhe sentido e seja
efetiva no processo de desenvolvimento-aprendizagem destas cri-
anças.
Por fim, na última questão, os professores foram convidados
a destacar quais eram as TAS que utilizavam com mais frequência
nas SRM.

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 198

Gráfico 13 - TAS utilizadas com mais frequência nas SEM

Fonte: Dados da pesquisadora (2018).

Partindo-se das respostas descritas no Gráfico 13, identifica-


se que os professores destacam as pranchas de comunicação alter-
nativa e as atividades adaptadas como a TA mais frequente nos
atendimentos da SRM. O sujeito 10 ressalta que “atividades adap-
tadas como desenhos e leituras, jogos lúdicos, aulas de música e
participação em projetos interdisciplinar”, são muito bem aceitas
pelos alunos, ampliando suas aprendizagens. Posteriormente, são
mencionadas o sistema dosvox, o braille fácil o scanner de voz.
Acerca desta temática, Alves, Pereira e Viana (2017, p. 166)
complementam que “o professor deve romper as barreiras no que
se refere à utilização de todas as formas de tecnologias”. Assim, a
inclusão das pessoas com deficiência traz a ela subjacente o que a
lei preconiza, a saber, para além do acesso, a garantia de aprendi-
zagens cada vez mais significativas e contextualizadas.

SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 199

CONSIDERAÇÕES FINAIS

De acordo com o diagnóstico realizado, percebeu-se que no


Estado do Rio Grande do Norte, uma parcela significativa das esco-
las ainda não conseguiu efetivar o funcionamento das SRM no seu
interior. Adicionalmente, existem escolas que possuem o disposi-
tivo, mas não têm profissional especializado para atuar nestes es-
paços ou não possuem a infraestrutura básica necessária. Além
disso, as escolas que dispõem destes serviços ainda enfrentam obs-
táculos para a implementação e/ou oferta de modo eficiente desta
modalidade de ensino.
A partir de questionários enviados a SUESP e às Secretarias
Municipais, assim como, a busca em sites oficiais do MEC, consta-
tou-se que: algumas escolas e/ou municípios que receberam os
kits para as salas de Recursos Multifuncionais, não conseguiram
efetivar os atendimentos; às salas de recursos atendem, em sua
maioria (cerca de 96%), aos educandos matriculados no Ensino
Fundamental; dos professores que atuam nestas salas, 92% são pe-
dagogos e 56% são especialistas. No entanto, apenas 41% dos pro-
fessores atendem as orientações do MEC, de acordo com as quais
estes profissionais precisam estarem habilitados para atuarem nas
SRMF com estudos a nível de pós-graduação em educação especial.
Evidenciou-se que maioria (79%) das salas de recursos são
caracterizadas por “Tipo I”, ou seja, não dispõem de equipamentos
para atender as especificidades das pessoas com deficiência Visual.
E ainda que 83% destas salas funcionam nos turnos matutino e
vespertino.
Assim, tem-se que as tecnologias assistivas configuram-se
como um suporte necessário ao pleno desenvolvimento das habi-
lidades e competências das pessoas com deficiências, além de pos-
sibilitar a inserção qualitativa destes sujeitos na escola e na vida

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 200

social. No tocante ao contexto educacional, percebe-se que o uso


destas tecnologias encontra-se em ascensão, uma vez que as SRMF
dispõem de vasto material capaz de proporcionar práticas pedagó-
gicas voltadas para o desenvolvimento deste grupo específico de
alunos.
Um fator importante é que todos os profissionais ressaltaram
que utilizam as tecnologias assistivas em suas práticas pedagógi-
cas, e demonstraram ter conceitos bem definidos sobre o uso das
tecnologias assistivas. Destaca-se ainda que os profissionais afir-
maram que a inserção das tecnologias assistivas no atendimento
educacional especializado contribui para a comunicação entre alu-
nos/alunos/profissionais da educação, facilitando a inclusão des-
tes alunos, e melhorando significativamente o processo inclusivo,
uma vez que proporcionam um processo de aprendizagem mais
significativo.
No tocante às muitas dificuldades destacadas pelos professo-
res, são mais recorrentes a ausência de formação específica para
atuação na área das tecnologias assistivas e ainda, a dificuldade em
selecionar estratégias para os alunos com DI, por não existir ne-
nhuma TA construída especificamente para esta deficiência. Tal as-
pecto é concebido como um fator que dificulta esta inserção, bem
como, a ausência de algumas tecnologias que poderiam ampliar e
melhorar o desenvolvimento das aprendizagens dos alunos com
necessidades educacionais especiais. Por fim, identifica-se que
dentre as tecnologias assistivas utilizadas, os softwares são apon-
tados como as mais prevalentes, seguidos da confecção de pran-
chas de comunicação alternativa e demais atividades adaptadas
pelos próprios professores.
Neste sentido, percebe-se que o maior desafio para a imple-
mentação das políticas de inclusão no estado do RN é a garantia
deste direito à toda a população e em todos os municípios do es-
tado, uma vez que hoje menos de 50% destes possuem SRM.
SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 201

Adicionalmente, verifica-se que não há programas de formação do-


cente e de dotação das salas com o equipamento necessário para o
exercício de qualidade da prática docente. Conclui-se, portanto,
que se trata de necessidade premente o investimento na educação
inclusiva, de modo a superar as fragilidades identificadas, garan-
tindo o pleno direito de toda criança de desenvolver-se e de apren-
der de modo significativo.
A atual situação em que se encontram os sistemas educacio-
nais revela dificuldades para atender às necessidades especiais
dos alunos na escola regular. Um enorme aparato de leis, decretos
e resoluções são publicadas com uma frequência muito grande,
mas somente isto não basta, é preciso realmente exigir dos gover-
nantes investimentos necessários para essa área. Não é hora de
cruzar os braços e esperar que a ajuda venha, as crianças com de-
ficiência estão necessitando de educadores que consigam desen-
volver suas potencialidades.
Ressalta-se que nesta pesquisa, conseguiu-se mapear a situ-
ação de funcionamento das SRMF do estado, inclusive identifi-
cando as cidades que ainda não ofertam o serviço. Percebeu-se que
a maioria dos educadores que atuam nas SRM não possuía forma-
ção em nível de pós-graduação para atuarem nestas, uma vez que
a Lei coloca que o professor do AEE precisa ter formação na área
de educação. Diante dos dados coletados, ainda surgiu a Deficiên-
cia Intelectual, como umas das que mais careciam de materiais de
apoio para as SRM. Identificou-se nas falas dos educadores que a
Tecnologia é utilizada por eles nos atendimentos do AEE, porém
de uma forma bastante incipiente, dada a ausência de formação es-
pecífica nesta área.
Sendo assim, destaca-se que a implementação das SRM se
apresenta como um dispositivo capaz de apoiar, complementar
e/ou suplementar o serviço educacional, de modo que garanta uma

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 202

educação escolar que promova o desenvolvimento das potenciali-


dades dos educandos, tanto quanto possível. É na realidade um
serviço que também oferece subsídios didáticos e pedagógicos aos
professores que atuam nas salas comuns.

REFERÊNCIAS

ALVES, Maria Dolores Fortes; PEREIRA, Guilherme Vasconcelos; VIANA, Maria


Aparecida Pereira: Tecnologia assistiva na perspectiva de educação inclu-
siva: o ciberespaço como lócus de autonomia e autoria. Laplage em Revista
(Sorocaba), vol. 3, n. 2, maio-agosto, 2017.

ARAÚJO, Erika Soares de Oliveira e MARTINS, Lúcia de Araújo Ramos: O aten-


dimento educacional especializado e seus desdobramentos na prática escolar.
In: MARTINS, Lúcia de Araújo Ramos e MAGALHÃES, Rita de Cássia Barbosa
Paiva (organizadoras). Processos formativos e desafios atuais da educação
especial: olhares que se intercruzam. Fortaleza/CE: EDUECE, 2018.

BRASIL. Decreto Nº 6.571, de 17 de setembro de 2008. Dispõe sobre o aten-


dimento educacional especializado, regulamenta o parágrafo único do art. 60
da Lei no 9.394, de 20 de dezembro de 1996, e acrescenta dispositivo ao De-
creto no 6.253, de 13 de novembro de 2007.

BRASIL. Decreto Nº 7.611, de 17 de novembro de 2011. Dispõe sobre a edu-


cação especial, o atendimento educacional especializado e dá outras providên-
cias.

BRASIL. Lei 13.146, de 6 de julho de 2015. Institui a Lei Brasileira de Inclu-


são da Pessoa com Deficiência (Estatuto da Pessoa com Deficiência).

BRASIL. Lei n° 9394 das diretrizes e Bases da Educação. 1996.

BRASIL. Lei Nº 13.409, de 28 de dezembro de 2016. Altera a Lei no 12.711,


de 29 de agosto de 2012, para dispor sobre a reserva de vagas para pessoas
com deficiência nos cursos técnico de nível médio e superior das instituições
federais de ensino.

SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 203

BRASIL. Ministério da Educação e Cultura. Portaria Normativa Nº- 13, DE 24


DE ABRIL DE 2007. Dispõe sobre a criação do "Programa de Implantação de
Salas de Recursos Multifuncionais, 2007.

BRASIL. Ministério da Educação e Cultura. Secretaria de Educação Especial:


Política Nacional da Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva.
Brasília, 2008.

BRASIL. MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO. Secretaria de Educação Continuada, Alfa-


betização, Diversidade e Inclusão. A Consolidação da Inclusão Escolar no
Brasil 2003 a 2016, 2016. Disponível em: http://www.ufpb.br/cia/con-
tents/manuais/a-consolidacao-da-inclusao-escolar-no-brasil-2003-a-2016.pdf.
Acessado em 20 de abril de 2018.

BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Especial. Manual de


Orientação: Programa de Implantação de Sala de Recursos Multifuncionais.
Brasília: A secretaria, 2010.

BRASIL. Nota técnica nº 42 de 16 de junho de 2015. Orienta aos sistemas de


ensino quanto a destinação dos materiais e equipamentos disponibilizados por
meio do Programa de Salas de Recursos Multifuncionais, 2015.

BRASIL. Orientações para Implementação da Política de Educação Espe-


cial na Perspectiva da Educação Inclusiva, 2015. Disponível em: http://por-
tal.mec.gov.br/index.php?option=com_docman&view=down-
load&alias=17237-secadi-documento-subsidiario-2015&Itemid=30192. Aces-
sado em 10 de maio de 2018.

BRASIL. Subsecretaria Nacional de Promoção dos Direitos da Pessoa com Defi-


ciência. Comitê de Ajudas Técnicas Tecnologia Assistiva. Brasília: CORDE,
2009.

BUENO, José Geraldo Silveira Bueno. O Atendimento Educacional Especiali-


zado (AEE) como Programa Nuclear das Políticas de Educação Especial
para a Inclusão Escolar. Tópicos Educacionais. Recife, v.22, n.1, jan./jun.
2016. Disponível em: https://periodicos.ufpe.br/revistas/topicoseducacio-
nais/article/viewFile/22433/18624. Acessado em 20 de maio de 2018.

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 204

DECLARAÇÃO DE SALAMANCA. Sobre Princípios, Políticas e Práticas na


Área das Necessidades Educativas Especiais. Espanha, 1994. Disponível em:
>. Acesso em: 20 abril. 2018.

FIALHO, Rejane Gandini, CARVALHO, Janete Magalhães e PINEL, Hiran: Tecno-


logias, formação humana e equidade na escola, 2016. Disponível em:
https://onlinelibrary.wiley.com/doi/epdf/10.1111/1471-3802.12247. Aces-
sado em 20 de março de 2019.

FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática edu-


cativa-21ª Edição- São Paulo. Editora Paz e Terra, 2002.

GARCIA, Rosalba Maria Cardoso. Política de educação especial na perspec-


tiva inclusiva e a formação docente no Brasil. Revista Brasileira de Educa-
ção. Santa Catarina, v. 18, n. 52 jan./mar. 2013. Disponível em: http://sci-
elo.br/pdf/rbedu/v18n52/07.pdf. Acesso em: 15 ABRIL. 2018.

GIL, Antônio Carlos: Como elaborar projetos de pesquisa. 5. ed. - São Paulo:
Atlas, 2010.

IBGE. Dados estatísticos. Disponível em: www.ibge.gov.br/estatisticas-novo-


portal/por-cidade-estado-estatisticas.html?t=destaques&c=24. Acessado em
01 de junho de 2018.

MAGALHÃES, Rita de Cássia Barbosa Paiva. Aprendiz de mim mesma: traves-


sias de uma professora/pesquisadora em Educação Especial, 2014. Disponível
em: http://www.uece.br/endipe2014/ebooks/livro4/55.%20APREN-
DIZ%20DE%20MIM%20MESMA_%20travessias%20de%20uma%20profes-
sora_pesquisadora%20em%20Educa%C3%A7%C3%A3o%20Especial.pdf.
Acessado em 21 de setembro de 2019.

MENDES, E. G. A formação do professor e a política nacional de Educação Espe-


cial. In: BAPTISTA, C. R; CAIADO, K. R. M; JESUS, D. M (Orgs.) Professores e
Educação Especial: formação em foco. Porto Alegre: vol. 2, Mediação, 2011.

MICHELS. Maria Helena. Gestão, formação docente e inclusão: eixos da re-


forma educacional brasileira que atribuem contornos à organização escolar,
2011.

SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 205

MILANESI, Josiane Beltrame; MENDES, Enicéia Gonçalves: Atendimento educa-


cional especializado para alunos com Deficiência Intelectual: considerações so-
bre o ensino, os recursos e o planejamento. In: In: MARTINS, Lúcia de Araújo
Ramos e MAGALHÃES, Rita de Cássia Barbosa Paiva (organizadoras). Proces-
sos formativos e desafios atuais da educação especial: olhares que se in-
tercruzam. Fortaleza/CE: EDUECE, 2018.

MILANEZ, S. G. C; OLIVEIRA, A. A. S. de. O atendimento educacional especia-


lizado para alunos com deficiência intelectual: a política, as concepções e a
avaliação. In:

MILENEZ, S. G. C (orgs.): Atendimento educacional especializado para alu-


nos com deficiência intelectual e transtornos globais do desenvolvi-
mento. São Paulo: Cultura Acadêmica, 2013.

OLIVEIRA, A. A. S.. de; et al. Atendimento educacional especializado na área da


deficiência intelectual: questões sobre a prática docente. In: MILENEZ, S. G. C
(orgs.): Atendimento educacional especializado para alunos com deficiên-
cia intelectual e transtornos globais do desenvolvimento. São Paulo: Cul-
tura Acadêmica, 2013.

PLETSCH, Márcia Denise. Educação Especial e Inclusão Escolar: Políticas,


Práticas Curriculares e Processos de Ensino E Aprendizagem, 2014. Disponível
em: https://www.revistas.ufg.br/poiesis/article/download/31204/16802.
Acessado em 6 de maio de 2018.

PRIETO, Rosângela Gavioli e FRANÇA, Marileide Gonçalves. Políticas atuais de


educação numa perspectiva inclusiva: desafios á formação de professores.
In:

MARTINS, Lúcia de Araújo Ramos e MAGALHÃES, Rita de Cássia Barbosa Paiva


(organizadoras). Processos formativos e desafios atuais da educação espe-
cial: olhares que se intercruzam. Fortaleza/CE: EDUECE, 2018.

RIZZI, L.; HAYDT, R. Atividades lúdicas na educação da criança. São Paulo:


Ática, 2001.

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 206

ROPOLLI, Edilene Aparecida et al. A educação especial na perspectiva da in-


clusão escolar: A escola comum inclusiva. Brasília: MEC, 2010.

SCHERER, R. P., & DAL’IGNA, M. C.: Professoras do atendimento educacional es-


pecializado: intervenção clínica ou pedagógica? 2015. Acta Scientiarum. Edu-
cation, 37(4), 415-425. Disponível em: https://doi.org/10.4025/actascie-
duc.v37i4.24642. Acessado em 20 de março de 2019.

SCHWARTZMAN, José Salomão; LEDERMAN, Vivian Renne Gerber. Deficiência


intelectual: causas e importância do diagnóstico e intervenção precoces. Dis-
ponível em: http://revista.ibict.br/inclusao/article/viewFile/4028/3364.
Acessado em 02 de janeiro de 2019.

SIGETEC. Fundo de Desenvolvimento da Educação. Programa Implantação de


Salas de Recursos Multifuncionais. Informações obtidas no site:
www.fnde.gov.br/sigetec/sisseed_fra.phpwww.fnde.gov.br/sigetec/sis-
seed_fra.php. Acessado em 24 de maio de 2018.

SILUK, Ana Cláudia Pavão (org.). Atendimento Educacional Especializado -


contribuições para a prática pedagógica. Santa Maria: UFSM, CE, Laboratório
de Pesquisa e Documentação, 2014.

YIN, R. K. Estudo de caso: planejamento e métodos. 3. ed. Trad. Daniel Grassi.


Porto Alegre: Bookman, 2005.

SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 207

CAPÍTULO 7
NARRATIVAS DE AUTISMO:
CONTRIBUIÇÕES PARA A
ANÁLISE DE VIVÊNCIAS

Ivanise Gomes de Souza Bittencourt


Neiza de Lourdes Frederico Fumes

INTRODUÇÃO

É imperativo investigar as vivências de pessoas adultas com


Transtorno do Espectro Autista (TEA) para o fortalecimento da
discussão acerca das potencialidades e/ou fragilidades dos seus
espaços de vida no seu desenvolvimento. Suas narrativas poderão
colaborar na compreensão de suas experiências escolares e os as-
pectos estruturantes /desestruturantes na sua constituição en-
quanto sujeito.
A preocupação em promover uma discussão sobre a relação
dos espaços de vida com o desenvolvimento de pessoas com TEA
se justifica por algumas razões. Primeiro, pelo que enfatizou
Vygotski (1997) quanto ao desenvolvimento e aprendizagem do
indivíduo. Estes são processos com raízes sociais, portanto, orien-
tam-se pela dimensão sócio histórica e constituem-se nas intera-
ções no espaço social.
Outra justificativa é que conhecer o percurso de vida possi-
bilita reflexões sobre como esse ser social se constituiu, o que

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 208

aprendeu e como se desenvolveu a partir das relações e interações


que lhes foram possibilitadas e das práticas em que foi inserido
(CHIOTE, 2013). Assim, esse estudo teve como objetivo analisar as
vivências de uma pessoa adulta com TEA a partir das suas narrati-
vas relacionadas às suas experiências em seus espaços de vida.
Quanto as narrativas, estas possibilitam a profundidade de
aspectos específicos a partir das histórias de vida, tanto do sujeito
como do contexto situacional (MUYLAERT et al., 2014). Esse mé-
todo permite estudar um fragmento particular da realidade social-
histórica, um objeto social em seus contextos sociais, compreender
como ele funciona e se transforma, destacando-se as configurações
de relações sociais, os mecanismos e os processos (BERTAUX,
2010). Baseia-se em testemunhos da experiência vivida, por natu-
reza, subjetivos, possibilitando numerosos indícios sobre as rela-
ções e os processos sociais que se procura identificar e compreen-
der. Conforme esse autor, as narrativas de vida descrevem a expe-
riência vivida, enriquecendo-a e permitindo apreender as lógicas
da ação em seu desenvolvimento biográfico e as configurações de
relações sociais em seu desenvolvimento histórico.
Muylaert et al (2014) também destacam que as entrevistas
narrativas contribuem com a construção histórica da realidade e a
partir do relato de fatos do passado promove-se o futuro. As nar-
rativas, de acordo com esses autores, combinam histórias de vida
a contextos sócio históricos onde foram construídas; revelam ex-
periências individuais e identidades dos indivíduos, ou seja, as
imagens que eles têm de si próprio.
Possibilitar o envolvimento de pessoas com TEA consigo
próprio, significa permiti-las serem narradoras das suas próprias
experiências e estimulá-las a expressarem seus pensamentos. O
uso de narrativas como fonte de investigação parte do reconheci-
mento da pessoa com TEA enquanto sujeito de direito, de expres-
sar suas opiniões, de ser ouvida sobre assuntos que lhes dizem
SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 209

respeito. Portanto, ao estudar as vivências de pessoas com TEA,


são estas que devem ser ouvidas, e oportunizadas a expressarem
os significados dos seus espaços de vida e o que lhes são importan-
tes, na compreensão do que lhes são estruturantes para seu desen-
volvimento. O que justificou a escolha pelo método da pesquisa
narrativa nesse estudo.

O PROCESSO DE APREENSÃO DA NARRATIVA DE VIDA

A protagonista desse estudo, era do sexo feminino, com


idade de 31 anos e diagnóstico de TEA. Encontrava-se em acompa-
nhamento em Centro de Atenção Psicossocial (CAPS) localizado no
município de Maceió-AL.A mãe da protagonista foi convidada e
aceitou participar como colaboradora na pesquisa, no forneci-
mento de algumas informações acerca do percurso/espaços de
vida da filha desde o seu nascimento.
Para apreensão da narrativa utilizou-se de uma entrevista
narrativa com a mãe (Etapa 1) de forma a obter a descrição de todo
o percurso de vida da protagonista com TEA do estudo. E, posteri-
ormente, foi realizada uma entrevista narrativa com a protago-
nista (Etapa 2) para que esta pudesse relatar sobre as suas vivên-
cias.
Considerando que pessoas com TEA podem, segundo Pas-
serino, Ávila e Bez (2010, p. 1), apresentar dificuldades em contar
histórias, visto que “nem todas possuem as competências de comu-
nicação capazes de possibilitar a sua interação com o meio”, ou seja,
a apropriação da linguagem oral, utilizou-se o Sistema de Comuni-
cação Alternativa para Letramento de Pessoas com Autismo
(SCALA) na construção de histórias e promoção de narrativas
como apoio nesse processo (Etapa 3).

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 210

O SCALA tem como objetivo apoiar o desenvolvimento do


letramento de pessoas com autismo (BEZ et al, 2013). O primeiro
protótipo foi desenvolvido em 2009, por pesquisadores do grupo
de Tecnologia em Educação para Inclusão e Aprendizagem em So-
ciedade (TEIAS) da Universidade Federal do Rio Grande do Sul
(UFRGS), para computadores desktop e nos anos subsequentes ad-
quiriu novas versões para funcionar na web e em dispositivos mó-
veis como celular, tablets, entre outros (BEZ; PASSERINO, 2012). O
referidosoftware é gratuito e foi desenvolvido sob a licença Crea-
tive Commons.
Em 2011, o SCALA 2.0 (http://scala.ufrgs.br) iniciou a pro-
posta multiplataforma, de conteúdo aberto, para atender a de-
manda de aplicativos para tablet. Possui dois módulos, prancha e
histórias, e apresenta mais de 4.000 (quatro mil) imagens, dividi-
das nas categorias (pessoas, objetos, natureza, ações, alimentos,
sentimentos, qualidades) conforme Bez et al., (2013), as quais po-
dem ser escolhidas pelos indivíduos na construção das suas histó-
rias.
As pranchas de comunicação, de acordo com essas autoras,
são recursos de tecnologia assistiva que facilitam a comunicação
entre pessoas com déficit de comunicação e outros participantes,
além de contribuir para a interação e autonomia dos indivíduos.
Nesse estudo, optou-se por utilizar o módulo “Narrativas Visuais”,
que serve para construção de histórias, e apresenta flexibilidade
na elaboração. Este módulo disponibiliza diversificados layouts, in-
serção de imagens e edição das mesmas, escolha de cores e cená-
rios.
Dessa forma, o módulo de “Narrativas Visuais” (construção
de histórias), do SCALA foi apresentado a protagonista com TEA
para que conhecesse todos os seus recursos, de forma a promover
a construção de suas histórias e narrativas sobre as suas experiên-
cias em seus espaços de vida.
SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 211

Na primeira etapa da produção de dados, a mãe da protago-


nista foi entrevistada em um local previamente agendado e e par-
tiu-se da seguinte questão disparadora: Me relate todo o percurso
de vida da sua filha do nascimento aos dias atuais. A entrevista nar-
rativa foi realizada em um único momento com a mãe. Teve dura-
ção de aproximadamente uma hora e foi gravada na íntegra.
Na segunda etapa da produção de dados, realizou-se inici-
almente a entrevista narrativa com a protagonista, utilizando-se,
de forma similar à mãe, a seguinte questão: Me relate todo o seu
percurso de vida até os dias atuais. Esse relato teve a duração de
vinte minutos. E, num segundo encontro com a protagonista, reali-
zou-se a atividade com o SCALA.
A protagonista com TEA construiu suas histórias individu-
ais, a partir dos seguintes temas que lhes foram sugeridos: “Minha
família”,“A escola”,“O CAPS”,“O autismo” e “O futuro”. Logo em se-
guida, foi convidada para narrar sobre o conteúdo das histórias, os
personagens inseridos, os significados das imagens e sentimentos
implícitos. Portanto, essa atividade no SCALA, também compôs os
textos de campo desta pesquisa, como orientaram Clandinin e Con-
nelly (2015) quanto as formas de registro das experiências.
Importante destacar que essa pesquisa foi aprovada pelo
Comitê de Ética em Pesquisa da UFAL, sob parecer n o 1.340.279.
Foram respeitados os procedimentos éticos, estabelecidos na re-
solução 466/12, tendo sido apresentado o Termo de Consenti-
mento Livre e Esclarecido (TCLE) para a participante com TEA e
sua mãe. Como forma de preservar a identidade da protagonista da
pesquisa, esta, optou por receber o nome fictício de Juliana.

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 212

CONHECENDO A NARRATIVA DE VIDA DE JULIANA


a) O percurso de Juliana a partir do relato da mãe

Juliana, 31 anos, era solteira, possuía Ensino Médio com-


pleto, não exercia nenhuma profissão e seu local de tratamento era
em um CAPS, com frequência de três vezes na semana.
Nasceu no município de Maceió-AL, de parto cesáreo, sem in-
tercorrências durante todo o período gestacional e com todo o
acompanhamento de pré-natal. Era o primeiro caso de TEA na fa-
mília. Residia na capital alagoana, com sua mãe de 67 anos (profes-
sora aposentada, formada em Letras), seu pai de 61 anos (aposen-
tado, técnico em Segurança do Trabalho) e sua irmã, mais nova, de
29 anos (fisioterapeuta).
Aos nove meses de idade, sua mãe começou a ensinar os
parabéns para a sua festa de um ano. Juliana inicialmente apresen-
tava ter assimilado e batia palmas, porém, nos outros dias, quando
novamente era estimulada, não mais respondia. Sua mãe ficou na
dúvida quanto a algum problema em sua audição, pois passou a fi-
car alheia ao mundo. Foram os primeiros sinais de alerta de alguma
alteração em seu desenvolvimento. Com um ano de idade, realiza-
ram a primeira consulta com um psiquiatra na busca por um diag-
nóstico e assim prosseguiram durante anos por diversos destes
profissionais, mas estes apresentavam dificuldades para deter-
miná-lo. Aos dois anos pronunciava palavras de forma incompleta
(dificuldade na linguagem) e andou com dois anos e sete meses
(atraso no desenvolvimento motor), despertando ainda mais a
atenção da mãe. O pai considerava que era dengo demais por parte
da mãe, mas esta, já estava na expectativa de que alguma alteração
existia.
Em meio a essa indefinição quanto ao diagnóstico, Juliana
ingressou na escola aos três anos de idade, tendo todo o seu per-
curso somente por escolas regulares e privadas e com consecutivas
SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 213

mudanças de escola, por motivos diversos, mas principalmente


pela fragilidade do sistema escolar, percebida pela mãe, em lidar
com o ser diferente. Na primeira escola em que ingressou ficou por
um período de apenas três meses, pois sofreu bullying de um co-
lega de outra turma, que era seu vizinho de residência e ia para a
porta da sua sala para ofendê-la. Ao saber disso, sua mãe a mudou
de escola.
A nova escola em que ingressou era grande em sua estru-
tura e com quarenta crianças em uma sala de aula, impossibili-
tando-a de uma assistência mais próxima pela professora. Uma das
responsáveis pela escola falou para sua mãe que ali não era lugar
para Juliana, mas a mãe insistiu na sua permanência. Posterior-
mente, decidiu mudá-la desta escola, sendo que desta vez buscou
uma escola menor. Nesse período, os psiquiatras consideraram-na
com o diagnóstico de Desvio de Aprendizagem e Hiperatividade.
Nesta outra escola, onde permaneceu dos quatro aos cinco anos,
foi exigido que a família providenciasse uma acompanhante para
Juliana e que se responsabilizasse pelos custos. A mãe contratou
uma pessoa sem formação pedagógica, até mesmo pelas dificulda-
des de encontrar professores com especialização para lidarem com
esses casos. Porém, Juliana regrediu. E em casa, tudo o que ia fazer,
solicitava que pegassem na sua mão, alegando não saber mais fazer
o que já havia aprendido, inclusive para realizar as refeições.
A partir do nascimento da sua irmã mais nova, ambas fo-
ram estudando sempre nas mesmas escolas. Sua irmã foi desenvol-
vendo, obtendo um bom desempenho e Juliana começou a não
avançar nas séries. O que constrangia a mãe, pois era difícil para
Juliana entender que a sua irmã, mais nova, já cursava séries mais
avançadas do que ela e por isto pedia sempre para acompanhar sua
irmã nas séries. Juliana desejava fazer as mesmas coisas que sua
irmã, portanto, também não aceitava realizar o que ela não fazia.

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 214

Não frequentou escola especial, apesar das tentativas da mãe em


duas dessas escolas.
Alfabetizou-se aos sete anos de idade e sua mãe destacou o
respeito, a admiração e a interação dos colegas de turma com ela,
embora tivesse um comportamento evasivo e, muitas vezes, não se
concentrar nas tarefas. Porém, sua aceitação nas escolas, apesar da
rejeição destas, foi devido a insistência da mãe, que sempre procu-
rou o melhor em termos dessas instituições. Comentou a mãe, que
a opinião do pai era a de não a colocar na escola, pois este achava
que não haveria retorno em termos de aprendizagem, visto que
não identificava as possibilidades e perspectivas para Juliana.
A mãe considerou o percurso escolar como difícil, porque as
escolas não queriam aceitá-la e quando a aceitavam, exigiam o pa-
gamento de uma taxa extra, por suas especificidades. Devido as di-
versas dificuldades quanto a sua matrícula, Juliana passou cinco
anos sem frequentar escola. No ato da matrícula, a mãe sempre in-
formava às escolas sobre as características da filha e consequente-
mente muitas se negavam a recebê-la. Durante esse tempo, sua
mãe não soube mais o que fazer e Juliana ficava triste ao ver a irmã
ir para a escola e ela não. Depois deste período, a jovem retornou
à escola e cursou da quinta a oitava série, ainda que, por diversas
vezes, tivesse sido encontrada fora da sala de aula, no pátio da es-
cola. O fato de estar matriculada não significava a sua inclusão
nesse sistema. Apesar das reclamações da mãe ao diretor, este jus-
tificou que Juliana era muito rápida nas tarefas e que depois não
dava para controlá-la em sala de aula. Somente saiu dessa escola
com o encerramento de suas atividades, pelo fato de a mãe não
mais aguentar procurar outra instituição.
Na última escola que ingressou, em 2008, Juliana cursou o
Ensino Médio, embora também alegarem não terem condições de
recebê-la e de lhe darem um devido acompanhamento. Sua mãe, já
esgotada de tantas dificuldades encontradas para sua inclusão,
SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 215

comunicou que iria procurar pelos devidos direitos e, então, a dei-


xaram ficar.
Juliana era a única aluna com deficiência da instituição e só
no ano seguinte uma outra aluna foi matriculada. Os professores
providenciavam tarefas avulsas para ela realizar enquanto eles da-
vam aula e, desta forma, ela concluiu o Ensino Médio em 2010, aos
vinte e cinco anos. Contudo, não possuía certificado de conclusão
por ter havido um acordo com a escola de que nada seria exigido
para que lhe aceitassem.
Quanto ao Ensino Superior, sua mãe alegou que não a incen-
tivou por receio de que sofresse bullying dos colegas e que se satis-
fazia pela conclusão do seu Ensino Médio.
Já fora do espaço escolar, ao ingressar em um CAPS, em
2012, através do encaminhamento de uma psicóloga, Juliana foi
acompanhada pelos profissionais do serviço e inserida em diver-
sas atividades. Neste espaço foi diagnosticada com TEA, aos vinte
e nove anos de idade no ano de 2015. Quanto ao TEA, a mãe infor-
mou que, mesmo com todas as atividades realizadas pelo CAPS, Ju-
liana não aceitava o diagnóstico. A intensa busca de sua mãe por
sua inclusão, fez Juliana reconhecer os preconceitos e as discrimi-
nações da sociedade. Em virtude disso, evitava falar sobre o TEA,
exercendo sempre atitudes de fuga por não se reconhecer com este
diagnóstico. Não possuía independência para ir sozinha aos luga-
res, estando sempre sob o acompanhamento da mãe.

b) Os relatos de Juliana e narrativas construídas a partir


do SCALA

Em suas narrativas através do SCALA, Juliana realçou a im-


portância do espaço escolar em sua vida. Demonstrou o

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 216

sentimento relacionado à escola em que concluiu o Ensino Médio


e sempre pedia para voltar:

Eu fui liberada por mim mesma do colégio. Deixei os meus amigos


sozinhos, sem mim... [momento de pausa, baixou a cabeça e en-
tristeceu-se]. Mas, se eu não fosse liberada, eu não ia ser liberada
não! Eu ia ficar lá pra passar de ano. Eu fiz tudo pelos meus amigos
de lá. Os professores já estão com saudade de mim no colégio, os
amigos também! Aí fica difícil se... eu for liberada de novo e os ami-
gos me segurar para eu não sair. Eu não deveria ter saído de lá não!
Gosto de estudar desde a quinta série. Eu vou fazer de tudo. Eu vou
fazer o melhor de tudo para que me chamem para ir para o colégio.
Queria voltar, né? Eu não posso abandonar os meus amigos. Se eu
abandonar os meus amigos vai ficar terrível para mim... Se depen-
desse de mim, eu voltava para ficar por lá o tempo todo da minha
vida (JULIANA).

Verifica-se, em seu depoimento sobre essa última escola, a


ênfase nos amigos. O que justifica que, ao contrário da sua irmã,
Juliana não tinha amigos para se relacionar fora do espaço escolar.
Ainda sobre a experiência escolar acrescentou:

Eu tenho as minhas três camisetas do colégio guardadas de lem-


brança e uma calça guardada de lembrança. Foi muito bom! Eu gos-
tava da lanchonete...Eu fazia atividade... tirei nota dez em tudo!
Tudo o que eu fiz na minha vida eu tirei dez! (JULIANA).

É possível compreender a importância desse espaço na sua


vida, pelas declarações e pelo ato de guardar seu uniforme como
objeto de lembrança. Elaborou a história sobre a escola, Figura 1,
utilizando um cenário de sala de aula e imagens representando a
si, seus amigos, professores, biblioteca e seu sentimento quanto a
esse espaço.

SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 217

Figura 1: A escola para Juliana

Fonte: http://scala.ufrgs.br

Quanto às imagens, explicou: “Aqui é meu amigo... Eu, a bi-


blioteca da escola... eu adorava a biblioteca! Meus colegas, meus
amigos, os professores... Eu me sentia muito feliz na escola!” (JULI-
ANA). Há a recordação dos nomes dos seus colegas, provavelmente
os mais próximos, com quem interagia e a evidência da sua satisfa-
ção nesse espaço e com a experiência escolar. Do mesmo modo, a
escola representava um espaço de relações e socialização para Ju-
liana.
Frequentar escola especial ou demais espaços para a edu-
cação de pessoas com deficiência era algo que não lhe fazia sentido,
pela referência de sua irmã que não frequentava este tipo de insti-
tuição. Aceitou frequentar o CAPS, alegando sentir-se melhor ali e
em suas produções incluiu diversos profissionais do serviço, seus
colegas e as diversas atividades que realizava. Sobre o CAPS rela-
tou: “Aqui no CAPS eu faço atendimento. Faço tudo. Faço tudo o que

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 218

eu devo fazer na minha vida. Poderia ser que sim... que eu gosto de
vir aqui pro CAPS.” (JULIANA).
Ao construir a história do CAPS, Figura 2, escolheu como ce-
nário um ambiente com área verde e inseriu imagens simbolizando
a si, os profissionais do serviço, os colegas, e as atividades que de-
senvolvia.

Figura 2: O CAPS para Juliana

Fonte: http://scala.ufrgs.br

E, explicou sobre cada imagem: “O faxineiro, a enfermeira, o


guarda, a fonoaudióloga, minha colega de grupo, meu amigo e Eu.
Me sinto melhor aqui no CAPS. Eu adoro! No CAPS faço atendimento,
caminhada, alongamento, grupo e lancho” (JULIANA).
Juliana apresentava dificuldades para aceitar o diagnóstico
de TEA e disse conhecer algumas coisas, mas que preferia não falar
sobre esse assunto, evidenciando sua fuga quanto a isso e a ima-
gem desvalorizada de si quanto ao seu diagnóstico. Neste sentido,
disse: “Sobre o autismo... é... sobre... o autismo [baixou a cabeça].

SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 219

Conheço! Algumas coisas. Mas, é melhor não falar sobre isso!” (JULI-
ANA).
Para relatar sobre o autismo (Figura 3), Juliana utilizou um
cenário de pôr-do-sol com pássaros voando e imagens de senti-
mentos sobre si e seus amigos com TEA. Representou-se contente
pela relação com os seus colegas de CAPS que possuíam o mesmo
diagnóstico e que estes eram felizes e satisfeitos em suas vidas.

Figura 3: O autismo para Juliana

Fonte: http://scala.ufrgs.br

Sobre essas imagens e personagens explicou: “Meu colega...


[referiu nome] é agradável. Essa contente sou eu. O... [referiu nome
de um colega] é feliz e... [referiu nome de uma colega] é satisfeita”
(Juliana). Por ser o CAPS, seu ambiente para a sua socialização com
os colegas, Juliana expressou sentimento de contentamento.
Quanto a sua família, Juliana referiu sentir-se feliz e amada
por seus familiares e a contextualizou, Figura 4, utilizando o cená-
rio de um quarto e imagens representando a si e seus entes.

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 220

Figura 4: A família para Juliana

Fonte: http://scala.ufrgs.br

A respeito dessa produção, descreveu: “Essa é minha avó...


[referiu o nome da avó paterna], mãe do meu pai. A minha irmã...
[referiu o nome] que é fisioterapeuta, meus pais, eu e meus primos.
Eu me sinto feliz com a minha família! ” (Juliana). E também narrou:
“Sou amada e sou feliz! Eu quero muitas coisas... Adoro festa de ani-
versário e gosto de abrir os olhos por conta das pessoas”. Verifica-se
que, como dito pela mãe, Juliana se sentia amada pela família e se
considerava feliz por isso.
Com relação ao futuro, Juliana falou que estaria jogando ví-
deo game. Seus sonhos e desejos eram relacionados ao uso do com-
putador que gostaria de possuir para fazer pesquisa. Organizou a
representação sobre o que desejava para o futuro, Figura 5, com
um cenário espacial e imagens de si e de atividades que gostaria de
realizar.

SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 221

Figura 5: O futuro para Juliana

Fonte: http://scala.ufrgs.br

Quanto a essa criação, explicou: “Gostaria de fazer a facul-


dade do Colégio... [referiu o nome do colégio em que concluiu o en-
sino médio], desenhar, recortar e colar e escrever um livro!” (Juli-
ana). A partir desses aspectos foi possível compreender as relações
das experiências de vida de Juliana com a sua escolaridade, seu de-
senvolvimento e suas concepções de vida.

ALGUMAS DISCUSSÕES

Conforme visto, Juliana apresentou alterações em seu de-


senvolvimento aos nove meses de idade, as quais foram percebidas
por sua mãe. De acordo com o DSM V, as primeiras manifestações
de alteração no desenvolvimento são variadas entre os indivíduos
de acordo com as suas características e seu ambiente, podendo ser
reconhecidas antes dos 12 meses de idade e a surdez pode ser sus-
peita porque a atenção é prejudicada (APA, 2013), situações que
ocorreram com a participante.

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 222

No período em que Juliana vivenciou as primeiras experiên-


cias escolares, estava em vigência a Lei n. 7.853, de 1989, que dis-
punha sobre a inserção de estudantes com deficiência no sistema
educacional privado ou público (BRASIL, 1989). Também na oca-
sião, em 1990, a Lei 8.069 dispôs sobre o Estatuto da Criança e do
Adolescente, cujo artigo 54 determinava como dever do Estado, o
atendimento educacional especializado a pessoa com deficiência,
preferencialmente na rede regular de ensino (BRASIL, 1990). Ape-
sar da existência de uma base legal, que garantia seus direitos, as
escolas mostraram-se indiferentes a esta realidade, de modo a re-
cusar a matrícula, exigir pagamento adicional, não apoiar o apren-
dizado e mesmo não emitir a certificação da aluna, dentre outros.
Essa resistência para a inclusão de alunos do público alvo
da Educação Especial está em consonância com o estudo de Gulec-
Aslan, Ozbey e Yassibas (2013), quanto aos problemas enfrentados
para a permanência desses indivíduos na escola, no tocante aos ar-
gumentos e às dificuldades impostas pelas autoridades escolares
para a desistência dos pais. Em segundo lugar, na relação com a
estrutura do sistema escolar em lidar com o ser diferente e com os
vários diagnósticos no contexto da deficiência, influenciada pelo
momento da história da humanidade e sociedade em que se vivia.
Também a inabilidade do sistema escolar que produziu a
exclusão ao lidar com Juliana em sala de aula, por exemplo, iso-
lando-a das atividades comuns aos colegas. Tal situação também
foi descrita no estudo de Gulec-Aslan, Ozbey e Yassibas (op.cit), em
que um professor negligenciava um aluno com TEA, deixando-o
isolado.
A mãe também enfrentou a recusa para matrícula de Juliana
nas escolas. Essa recusa resultou em um período de cinco anos em
que a protagonista ficou afastada do sistema escolar, com compro-
metimento em sua escolaridade. Bagarollo e Panhoca (2011)

SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 223

enfatizaram que as condições inadequadas da escola podem causar


prejuízos nos anos decorrentes de escolaridade.
As experiências escolares vivenciadas por Juliana permiti-
ram identificar a relação que a escola tinha com a sua organização
quanto aos alunos com deficiência. Um período de processo de
construção das políticas quanto à formação de professores para a
atenção à diversidade (BRASIL, 2002) e a perspectiva da educação
inclusiva (BRASIL, 2008). O eixo da relação social com o saber en-
contrava-se fragilizado para o atendimento das demandas de Juli-
ana que concluiu o Ensino Médio no ano de 2010.
A comparação de Juliana com sua irmã mais nova e a con-
duta diferenciada entre seus pais, com sua mãe insistindo na sua
inserção escolar e o seu pai desacreditado em suas possibilidades
e perspectivas em termos de aprendizagem, tem consonância com
Vygotski (1997), que destacou que o meio social em que se vive e
sua relação influenciam na constituição e no desenvolvimento do
indivíduo. Alude-se que esses fatores a influenciaram quanto a não
aceitação da sua diferença e do seu diagnóstico de TEA, devido às
implicações sociais desse diagnóstico.
Os vínculos que contribuem para o desenvolvimento de um
indivíduo foram rompidos e outros não estabelecidos nas experi-
ências de vida de Juliana em virtude de suas especificidades. De
acordo com Vygotski (1997), é preciso encarar esse problema,
como um problema social, por suas consequências na constituição
do indivíduo, pela exigência imanente da sociedade humana
quanto a um modelo do ser social. O percurso de vida de Juliana,
suas relações nos espaços da família, da escola e do CAPS, ou seja,
em seu meio cultural como dito por Vygotski (1997), foram deter-
minantes em sua constituição, visto que o processo de desenvolvi-
mento e formação de um indivíduo é socialmente orientado.

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 224

Apesar de todas as dificuldades em aceitar o CAPS, local não


frequentado por sua irmã, Juliana o considerava como importante
para a sua interação e socialização com os outros, além da sua fa-
mília. De acordo com a linha de cuidado para a atenção às pessoas
com TEA no CAPS (BRASIL, 2013), este tem promovido espaços de
convívio em variados espaços do território e da cidade. Neste, Juli-
ana realizava atendimentos individuais ou em grupo; atividades
comunitárias e de reabilitação psicossocial e atenção aos seus fa-
miliares (BRASIL, 2013).
As dificuldades enfrentadas para a sua inclusão escolar es-
gotaram as esperanças e perspectivas da mãe quanto a Juliana, em
virtude disso, conformou-se com a sua conclusão do Ensino Médio.
Tal situação foi também verificada no estudo de Gulec-Aslan, Oz-
bey e Yassibas (2013) – o fato de um jovem com deficiência (TEA)
ter concluído o Ensino Médio já era o suficiente para sua mãe.
Por outro lado, é importante destacar que a interrupção de
sua escolaridade, para Vygotski (1997), resulta uma grave pertur-
bação de todo o sistema de correlações sociais, nos vínculos com
as pessoas, no seu papel e destino como partícipe da vida. Remete
perda de funções sociais que implicam na realização psicossocial.
E, a ruptura desse processo de escolarização em relação aos cole-
gas remete impactos quanto às suas esperanças e perspectivas.
No ano de 2012, instituiu-se a Política Nacional de Proteção
dos Direitos da Pessoa com TEA sob a Lei 12.764 (BRASIL, 2012) e
demais garantias de direitos, mas a participante já havia tido o seu
percurso escolar concluído.
Juliana teve seu diagnóstico de TEA definido de forma tar-
dia, em 2015, aos vinte e nove anos de idade. Todos esses aspectos
impactaram na sua forma de inscrição em uma rede de relações
com os outros.

SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 225

CONSIDERAÇÕES FINAIS

As experiências de escolarização e de vida da protagonista


evidenciaram os inúmeros desafios para a família das pessoas com
TEA quanto à inclusão escolar. A fragilidade do espaço escolar em
lidar com o ser diferente produziu empecilhos para a matrícula e a
permanência nesse sistema. A potencialidade do espaço familiar
foi verificada quanto a mobilização por conhecimentos quanto ao
transtorno, ao cuidado e na luta por seus direitos para a inclusão
social e escolar.
O percurso de vida apresentado permitiu compreender que
a pessoa com TEA pode desenvolver uma imagem desvalorizada
de si devido rupturas em suas expectativas, refletindo em conse-
quências sociais na sua relação com o mundo e com a sociedade. O
espaço do CAPS também contribui quanto ao cuidado, acolhimento
e enquanto espaço de socialização e convívio de pessoas com TEA.
Os espaços de vida, em suas potencialidades e fragilidades, consti-
tuem esses indivíduos sendo que a educação e as relações pessoais
desempenham um papel constitutivo para pessoa com TEA.
Essas questões revelaram a importância das narrativas de
vida para as investigações nas áreas de Ciências Humanas, Sociais
e da Saúde, de forma a contribuir para o desenvolvimento de ou-
tros estudos qualitativos. Com a técnica da entrevista narrativa foi
possível oportunizar Juliana ser ouvida em suas vivências e signi-
ficações das suas experiências. Também deve ser destacado o uso
do SCALA que permitiu promover a produção de narrativas de uma
pessoa com TEA, pois, mesmo que sejam oralizadas, o processo de
construção de histórias proporciona uma maior riqueza de deta-
lhes que podem não ter sido relatados na técnica da entrevista nar-
rativa sobre as suas experiências de vida.

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 226

Estudos que envolvam pessoas adultas com TEA produ-


zindo narrativas sobre as suas vivências, apoiados no uso da tec-
nologia assistiva, especificamente na comunicação alternativa,
ainda são pouco explorados nas pesquisas e se demonstram rele-
vantes na compreensão dos aspectos estruturantes/desestrutu-
rantes para o seu desenvolvimento. Conhecer esses aspectos im-
plica na possibilidade de se construir caminhos e estratégias de in-
tervenção singularizadas às necessidades específicas e com refe-
rência a história de vida desses sujeitos. Assim, são necessários no-
vos desdobramentos através de futuras investigações nesse âm-
bito, que possam contribuir no desvelamento da pessoa com TEA
para ações que promovam o seu desenvolvimento.

REFERÊNCIAS

APA. Diagnostic and statistical manual of mental disorders. 5. ed. Washing-


ton, D. C.: American Psychiatric Association. 2013.

BAGAROLLO, M.; PANHOCA, I. História de vida de adolescentes autistas: contri-


buições para a Fonoaudiologia e a Pediatria. Rev Paul Pediatr, p. 100-107,
2011.

BERTAUX, D. Narrativas de vida: a pesquisa e seus métodos. Natal: Edufrn,


São Paulo: Paulus, 2010.

BEZ, M. R. et al. Desenvolvimento de narrativas visuais no SCALA: estudo de


caso de uma turma de inclusão da Educação Infantil. Informática na Educa-
ção: teoria e prática. Porto Alegre, v. 16, n. 2, jul./dez, 2013.

BEZ, M. R.; PASSERINO, L. M. Scala 2.0: software de comunicação alternativa


para web. AVANCES Investigación en Ingeniería, v. 9, n. 1, 2012.

BRASIL. Lei n. 7.853, de 24 de Outubro de 1989. Coordenadoria Nacional


para Integração da Pessoa Portadora de Deficiência – Corde. 1989. Disponível

SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 227

em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L7853.htm. Acesso: 27 dez.


2015.

______. Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990. Estatuto da Criança e do Adoles-


cente. 1990. Disponível em: http://portal.mec.gov.br/seesp/arqui-
vos/pdf/lei8069_02.pdf. Acesso: 28 dez. 2015.

______. Resolução CNE/CP 1, de 18 de fevereiro de 2002. Diretrizes Curricu-


lares Nacionais para a Formação de Professores da Educação Básica. 2002.
Disponível em: http://pr1.ufrj.br/images/stories/_pr1/dmdocu-
ments/lic-res1-2002.pdf. Acesso: 30 dez. 2015.

______. Política nacional de educação especial na perspectiva da educação


inclusiva. 2008. Disponível em: http://portal.mec.gov.br/arquivos/pdf/politi-
caeducespecial.pdf. Acesso: 30 dez. 2015.

______. Lei nº 12.764 de 27 de dezembro de 2012. Política Nacional de Prote-


ção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista. 2012. Disponí-
vel em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-
2014/2012/lei/l12764.htm. Acesso em: 26 dez. 2015.

______. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de


Ações Programáticas Estratégicas. Linha de cuidado para a atenção às pes-
soas com Transtornos do Espectro do Autismo e suas famílias na Rede de
Atenção Psicossocial do SUS / Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à
Saúde. Departamento de Ações Programáticas Estratégicas. Brasília: Ministério
da Saúde, 160 p, 2013.

CHIOTE, F. A. Inclusão da criança com autismo na Educação Infantil: traba-


lhando a mediação pedagógica. Rio de Janeiro: Wak, 2013.

CLANDININ, D. J.; CONNELLY, F. M. Pesquisa narrativa: experiência e história


em pesquisa qualitativa. 2. ed. rev. Uberlândia: EDUFU, 2015.

GULEC-ASLAN, Y.; OZBEY, F.; YASSIBAS, U. I have lived an autism experience.


autism is an interesting disease: the life story of a young man with autism. In-
ternational Education Studies; v. 6, n. 1, 2013.

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 228

MUYLAERT, C. J. et al. Entrevistas narrativas: um importante recurso em pes-


quisa qualitativa. Rev Esc Enferm USP, 48(Esp2), p.193-199, 2014.

PASSERINO, L. M.; ÁVILA, B. G.; BEZ, M. R. SCALA: um sistema de comunicação


alternativa para o letramento de pessoas com autismo. Renote, Novas Tecno-
logias na Educação, CINTED-UFRGS, v. 8, n. 2, julho, 2010. Disponível em:
http://seer.ufrgs.br/renote/article/view/15224/8987. Acesso: 18 jun. 2015.

VYGOTSKI, L. S.. Los problemas fundamentales de la defectologíacontempo-


ránea. In: Obras escogidas- Tomo V. Madrid: Visor Dis, 1997b. Texto original
de 1929.

SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 229

CAPÍTULO 8
FRACASSO ESCOLAR, CULPABILIZAÇÃO DOS
ALUNOS INOCENTIZAÇÃO DA ESCOLA: UM
OLHAR SOBRE AS DIFICULDADES
TRANSFORMADAS EM DEFICIÊNCIAS

Janine Marta Coelho Rodrigues


Silvestre Coelho Rodrigues

INTRODUÇÃO

A perversidade em adotar uma postura equivocada de culpa-


bilização da criança por seus fracassos, faz com que essa idéia ex-
trapole os muros locais e globais das instituições educacionais,
quando analisa as transformações das teorias, dos projetos peda-
gógicos e psicopedagógicos que pretensamente poderiam ser de-
senvolvidos frente a compreensão do papel da escola, dos profes-
sores e das famílias.
Com um novo sentimento educativo, os profissionais ligados
aos atendimentos especializados de prevenção e estimulação, se
propõem a construir um olhar integral sobre a multidimensionali-
dade e complexidade do ser humano, que tem alguma dificuldade
em aprender ou apresenta deficiência ou descompassos em seu de-
senvolvimento.
Organizando apontamentos sobre cultura, saúde e educação,
pensamos que a Educação entre suas várias finalidades, deve se

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 230

permitir formar profissionais capacitados para desenvolver ativi-


dades que atendam não só de necessidades psicopedagógicas mas
também que sejam capazes de planejar e executar atividades vol-
tadas ao aconselhamento familiar, conhecendo e identificando os
problemas encontrados nos processos de aprendizagem nos con-
textos familiares das crianças.
Discutir com professores, familiares e demais interessados,
os argumentos mais aceitos como políticas públicas para que os
processos constitucionais compartilhados e garantidos nos desa-
fios cotidianos da convivência social, sejam processos efetivos de
inclusão social, favorecendo a continuidade das ações aqui consi-
deradas foco dos fenômenos estudados: direitos construídos e
constitucionalmente garantidos, instituindo as questões da res-
ponsabilização social, nos levam a experiências enriquecedoras de
construções pessoais e sociais, onde se aborda e se reflete sobre as
possibilidades de uma cidadania plena, numa sociedade justa e
igualitária.
A Educação Infantil é o marco inicial das aprendizagens,
desse modo ao frequentar uma instituição de educação infantil, as
crianças desenvolvem sua convivência social, seu desenvolvi-
mento cognitivo, psicomotor, afetivo e social, através do comparti-
lhamento das atividades compatíveis a sua idade, construindo
também, suas identidades como pessoas, como cidadãs.
Torna-se difícil então compreender, por que segundo dados
oficiais, 8 milhões de crianças menores de três anos estão fora das
creches no Brasil. A meta atual do governo ainda está longe de ser
cumprida. O governo queria construir seis mil creches até o fim de
2018. Até agora, 1.180 foram entregues e o déficit de vagas chama
a atenção. Segundo dados do Ministério da Educação, o país tem
quase dez milhões e meio de crianças entre zero e três anos. Só dois
milhões e meio foram matriculadas no ano de 2018, menos de
25%.
SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 231

Da Declaração Universal dos Direitos Humanos, de 10 de de-


zembro de 1948, os seus desdobramentos nos documentos que se
seguiram, surgiu a Declaração Universal dos Direitos da Criança e
do Adolescente (1959), a Constituição da República Federativa do
Brasil (1988), a Convenção Internacional dos Direitos da Criança e
do Adolescente (1989), e outros que corporificaram no Brasil, o
Estatuto da Criança e do Adolescente.
A Constituição Federal garante, em seu artigo 205, que “a
educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será pro-
movida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao
pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da
cidadania e sua qualificação para o trabalho”.
A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, LDB/96,
determina que o ensino infantil, é de responsabilidade dos municí-
pios, embora o Governo Federal repasse recursos às prefeituras
municipais, os municípios, segundo a Confederação Nacional dos
Municípios, alegam que a verba repassada é insuficiente para man-
ter creches em funcionamento. O Plano Plurianual varia de muni-
cípio para município, pela especificidade e territorialidade de suas
demandas, apesar da Constituição Federal ter determinado o pro-
cesso de descentralização político-administrativa e municipaliza-
ção.
Desde que foi sancionada a Lei Federal 8.069, de 13 de julho
de 1990, conhecida como Estatuto da Criança e do Adolescente,
ECA, os direitos e deveres da criança e do (a) adolescente, as res-
ponsabilidades do Estado, da sociedade e da família, com o futuro
das novas gerações, os princípios de direito, além de transformar
essa parcela da população brasileira como prioridade, destina re-
cursos para que políticas e programas sociais sejam executados no
sentido do acolhimento, desenvolvimento e oferecimento de opor-
tunidades para as crianças, os(as) adolescentes e suas famílias.

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 232

O Estatuto da Criança e do Adolescente veio a construir uma


rede de espaços sociais, para que, em sistema de colaboração, de
efetivação de parcerias publicas, privadas e do terceiro setor, res-
peite, atenda e desenvolva ações capazes de promover e garantir
os direitos fundamentais de crianças e adolescentes nos municí-
pios brasileiros. E enfatiza o atendimento em relação às políticas
prioritárias de saúde e educação, aos direitos constitucionais de
vida, saúde, alimentação educação, cultura, proteção especial, ado-
tadas no país como meio eficaz de reduzir o abandono das crianças,
minimizar as desigualdades sociais e diminuir a evasão e repetên-
cia escolar.
Direito à Educação, à Cultura, ao Esporte e ao Lazer, obser-
vando o desenvolvimento pessoal e social da criança e do(a) ado-
lescente, tem na portaria 1.656, de 28 de novembro de 1994, a pre-
missa de que: "toda educação, por definição, deve ser preventiva
para o exercício da cidadania e para a melhoria da qualidade de
vida, bem como recomenda a inclusão da prática da educação pre-
ventiva integral nos conteúdos e atividades curriculares da educa-
ção infantil, fundamental e ensino médio. Esses marcos legais em
geral, apontam para as violações mais frequentes a este direito.
No Art. 53. Do ECA, a criança e o adolescente têm direito à
educação, visando ao pleno desenvolvimento de sua pessoa, pre-
paro para o exercício da cidadania e qualificação para o trabalho,
assegurando-lhes:
I - Igualdade de condições para o acesso e permanência na
escola;
II- Direito de ser respeitado por seus educadores;
III- Direito de contestar critérios avaliativos, podendo recor-
rer às instâncias escolares superiores;
IV- Direito de organização e participação em entidades estu-
dantis;

SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 233

V- Acesso à escola pública e gratuita próxima de sua resi-


dência.

Parágrafo único. É direito dos pais ou responsáveis ter ciên-


cia do processo pedagógico, bem como participar da definição das
propostas educacionais.
Alguns documentos institucionais, frutos de lutas e movi-
mentos sociais, expressam um olhar cuidadoso e preocupado com
o desenvolvimento integral desses brasileiros, na perspectiva de
dar condições concretas e ações organizadas que viabilizem as
programas e políticas para que saiam do papel e aconteçam.
A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (1996) res-
salta, que a Educação abrange processos formativos mais amplos
que se desenvolvem na vida familiar e na convivência humana
junto à sociedade como um todo, em sua dinâmica histórica e cul-
tural.
Estudos que foram realizados, consideram o fracasso do
aluno na escola como um tema polêmico sobretudo quando se pro-
cura entender o que interfere produção desse fracasso até porque
são poucos os estudos na direção da relação criança / aluno como
aquele que antes de entrar na escola já se encontra excluído. Em
uma sociedade marcada pela desigualdade social, com um grande
número de jovens e adultos(as) analfabetos(as), com políticas edu-
cacionais restritivas em relação ao acesso às vagas nas escolas pú-
blicas, a baixa valorização do magistério, com salários insignifican-
tes destinados aos(às) professores(as),além da desqualificação do
atendimento necessário e especializado oferecido as pessoas com
deficiência, aos constrangimentos sofridos pelos diferentes na
ótica da diversidade, é urgente que medidas sejam adotadas para
que o direito à Educação, à Cultura, ao Esporte e ao Lazer seja des-
tacado e respeitado. O que provoca o fracasso do aluno na escola?

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 234

Preferimos chamar de (in)sucesso escolar dos alunos, que aparece


cristalizado sob forma de repetências e evasões, que se constitui
um dos fatores contribuintes para a exclusão social.
Discutir fracasso escolar no ponto de vista do aluno, é desa-
creditar nas potencialidades inerentes ao ser humano e em sua ca-
pacidade de aprender. Nesse aspecto de garantias sociais, a discus-
são é mais ampla, tem como cenário as oportunidades sociais e as
condições de vida dadas ao sujeito e as dimensões de suas perdas
pessoais e sociais, frente à qualidade de vida que lhe é oferecida
desde o seu nascimento. Pensamos em discutir aqui, algumas
ideias que achamos importantes não só para a compreensão do
(in) sucesso dos alunos, mas sobretudo por serem ideias capazes
de provocar reflexões e mudanças nas atitudes profissionais, da-
queles que lidam com o tema. Muitos alunos, ao ingressarem na
escola não se adaptam à realidade e exigências dela.
A visão interacionista do desenvolvimento, contribui com a
prática pedagógica no sentido de entender a construção e elabora-
ção do pensamento do aluno a partir da formação de conceitos, co-
nhecimentos, habilidades e significação mediados pelo professor,
que organiza situações de aprendizagem. A construção de uma
rede de interações professor/ aluno, aluno /alunos, passa por com-
portamentos como: perguntar, expor, incentivar, escutar, coorde-
nar e participar de debates. Atuando em diferentes oportunidades
pedagógicas e em diferentes modos de expressão oral, escrita, grá-
ficos, expressões corporais, etc, o aluno vai relacionando o que foi
aprendido através de esquemas de significações mais flexíveis,
complexas e criativas. As diferentes linguagens: verbal, visual, so-
nora, tátil ou de movimento dá sustentação ao desenvolvimento
cognitivo fundamentam determinados padrões de ação e reação
que permitem a convivência entre os indivíduos ampliando as pos-
sibilidades de aprender.

SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 235

As áreas do desenvolvimento infantil a serem trabalhadas,


com vistas a aprendizagem dos alunos, reconhecem que a natureza
das disfunções na aprendizagem não deve ser considerada um fra-
casso escolar, mas resultado de um conjunto de fatores em qual-
quer idade, de várias origens,
Toda programação pedagógica envolve: psicomotricidade,
cognição, expressão livre e afetividade que podem e devem ser su-
peradas.
A psicomotricidade: a integração de várias funções mentais e
motrizes. Sendo ainda afetada pela afetividade e autoestima.
As crianças podem apresentar dificuldades na formação dos
conceitos, falhas nas percepções, discriminação, na orientação es-
paço temporal, atrasos nos níveis de desenvolvimento psicomotor
como sentar engatinhar e andar, dificuldades de coordenação mo-
tora, dificuldades de leitura e escrita, problemas de fala e de lin-
guagem lentidão na realização dos trabalhos escolares, dificulda-
des de copiar do plano vertical (quadro) para o plano inclinado ou
horizontal (caderno)., pode apresentar disgrafias e lateralidade in-
definida.
A educação psicomotora, é indispensável a toda criança, seja
especial ou não a fim de assegurar o desenvolvimento mental aju-
dar sua afetividade e expandir sua aprendizagem.
No aspecto da Cognição: o ato ou ação de conhecer e produzir
conhecimentos. Para desenvolver a cognição pressupõe a estimu-
lação de: percepção e discriminação, memorização, compreensão,
atenção, raciocínio e a formação de conceitos. Todos estes esque-
mas mentais são expressados através da linguagem.
Alunos com dificuldades cognitivas costumam ser vagarosos,
distraídos com abstração prejudicada e pensamento lento e con-
creto. Demoram a compreender e assimilar e esquecem rapida-
mente o que aprendem.

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 236

Por outro lado, um olhar sensível do profissional da educação


em relação a Expressão Livre, o leva a planejar as atividades de Ex-
pressão livre que são geradoras de prazer resultante da realização
do potencial do aluno. É a sensação de prazer e bem estar que per-
mite um relacionamento satisfatório consigo e com o outro.
Em geral é desenvolvida com atividade de expressão plástica,
musical e corporal. São indispensáveis nos processos de alfabeti-
zação para ajudar na compreensão da sonoridade, de discriminar
os sons com clareza, e na exploração das possibilidades de movi-
mento. É importante na escola como fator de integração social,
projetando e trabalhando as emoções. A expressão desempenha
fator primordial nos processos cognitivos, reforçando e desenvol-
vendo a linguagem favorecendo a organização de experiências so-
ciais que colaboram no desenvolvimento geral do aluno.
Um espaço escolar que realce e estimule a Afetividade, para
os alunos com dificuldades de aprendizagem, a relação de causa e
efeito é percebida quando sua “diferença” é esquecida e ele passa a
ser mais um da “turma”.
Todo ser humano, precisa de sentir-se aceito e a redução da
ansiedade, também é tarefa da ação docente, quando permite a cri-
ança reagir sem tensões, viver mais relaxada e com maiores chan-
ces de sucesso.
O acompanhamento do progresso do aluno considerado com
dificuldades de aprendizagem pela família precisa ser uma ativi-
dade rotineira, é dividir as responsabilidades. A transferência de
aprendizagem, a utilização do que aprendeu, os conhecimentos e
as habilidades adquiridos em sala de aula, tem seu espaço revela-
dor também na família.
Os irmãos e os pais precisam ser informados da programação
desenvolvida com seus filhos para colaborar em casa e melhor
ajuda-los. Programar e sistematizar encontros com os pais é tarefa
imprescindível para o docente que trabalha na escola inclusiva.
SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 237

O apoio mútuo e a troca de experiências, são muito significa-


tivas e servem de aprendizado a como lidar com os alunos.

O PAPEL DA ESCOLA E DO PROFESSOR

A universalização da educação fundamental, de boa quali-


dade e que deve resultar no progresso de todas as crianças. O mais
importante é oferecer um ensino de qualidade com atitudes pre-
ventivas não segregativas, voltadas a aceitação e não apenas a in-
serção do aluno na escola. Justifica-se então a necessidade de asse-
gurar o acesso, a permanência e a conclusão dos estudos na educa-
ção fundamental.
A atitude de inclusão, envolve inúmeras variáveis que com-
põem a dimensão política do projeto educacional da escola, a ên-
fase no respeito as diferenças individuais e a conscientização dos
docentes e daqueles que fazem a escola.
A avaliação continuada da criança, ajustando seu ritmo de
aprendizagem, facilitando a superação de suas dificuldades, requer
um interesse do (a) professor (a) no sentido de desenvolver o po-
tencial do aluno frente as condições da escola, da motivação para
viabilizar o processo educativo no contexto social.
A ênfase no desenvolvimento diferenciado dos alunos e na
importância de sua inclusão social deve ser o princípio norteador
do atendimento educacional.
Instigar discussões sobre o atendimento especializado a par-
tir do enunciado dos alunos e do professor, provoca o aprofunda-
mento na temática abordada, objetivando contribuir com os estu-
diosos e interessados nas questões da educação como possibilida-
des de ascensão social e inclusão sócio educacional, apontam para
a perspectiva da acessibilidade e permanência dos alunos com

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 238

dificuldades sendo a escolarização e a acessibilidade entendida


como espaço de construção de cidadania .
Um estudo mais aprofundado nas questões das políticas pú-
blicas, advindas dos direitos da pessoa deficiente, dos participan-
tes da sociedade em geral, da legislação especifica baseada na LDB
/ 96, ECA e outros documentos institucionais, demonstra que é
preciso discutir mais profundamente, a legislação que planeja e
executa as políticas educacionais. O tema é complexo. A legislação
é frágil, desde a Constituição que não é cumprida, a cidadania que
não é exercida, a LDB que não é executada.
Este trabalho, aponta para a necessidade de uma continui-
dade, de avanços a partir de um estudo desafiador, permeado de
aspectos significativos, tomando como regra maior o respeito à
dignidade humana, que serve de norte ao sistema educacional, vi-
sando a aplicação das políticas educacionais, com um aporte jurí-
dico nacional. Esse aporte, como valor, implica dotar os princípios
da igualdade e da isonomia de potencialidade que devem transfor-
mar ideias, direitos adquiridos, escritos e publicados em ações fora
de gabinetes e que precisam sair do papel. Os autores lidos para
realização desse trabalho, entre livros, textos e documentos, insti-
gam discussões sobre as formas de inclusão. Neste sentido, opor-
tunizaram o surgimento de comentários tornando possível propor
mais, ousar mais, elaborando sínteses temáticas, hoje até conside-
radas complexas, polêmicas e desafiadoras para a Educação: as
políticas educacionais, a ascensão social, a escolarização e condi-
ções de permanência, onde se solidificam os direitos humanos, te-
mas tão desafiadores e diante da gravidade de algumas situações,
com publicações ainda tão tímidas, quando nos dedicamos ao do
ensino e as condições de qualificação e profissionalização, o que
adquire dimensões muitas vezes irrecuperáveis para aqueles viti-
mizados pelas circunstâncias e preconceitos. Muitas vezes pela au-
sência de um outro espaço educativo, esses alunos veem no
SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 239

trabalho pedagógico, momentos de romper a rotina angustiante de


suas vidas, resgatando sua autoestima com acessos educacionais e
profissionalizantes em condições reais de desenvolvimento e
aprendizagens. Alguns questionamentos mais como reflexão:
• Que conjunto de competências, deveriam ter a escola, as fa-
mílias e a sociedade, para favorecerem o surgimento e efe-
tivação de uma política de direitos mais que humanos, de-
mocrática e inclusiva?
• O cotidiano das escolas, com problemas e desafios, a convi-
vência com as dos alunos considerados diferentes com
seus pares, permite o surgimento de representações /per-
cepções mais próximas do trabalho pedagógico inclusivo
que será necessário desenvolver? (principalmente nas
questões do bullyng)
• Como identificar, os diferentes significados para os indiví-
duos, para a família na ambiência escolar? São respostas
com conteúdos socioemocionais diferentes, em épocas di-
ferentes e dependem dos arranjos sócio- familiares que fo-
ram feitos por famílias diferentes. As questões sociais, eco-
nômicas e políticas ultrapassam as questões individuais e
pessoais.

A escola por sua vez, não considera como válido o repertório


de aprendizagens que o aluno traz de seu cotidiano, enquanto ci-
dadão advindo dos mais diversos e comprometidos contextos so-
ciais. Embora seus desempenhos até então tivessem sido suficien-
tes na vida fora da escola, são considerados agora, inadequados,
uma linguagem insuficiente, uma resposta educativa abaixo dos
padrões esperados pela escola. Os alunos por não adquirirem e
produzirem os conhecimentos necessários as atividades escolares,
são considerados deficientes, incompetentes ou com baixo

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 240

rendimento escolar. A escola não está preparada para receber os


alunos que representam uma diversidade cultural ou que difiram
do aluno padrão.
Estudar a culpabilização do aluno e a inocentalização da es-
cola favorece compreender como os processos de aprendizagens
se dão como essas crianças que fracassam são desqualificadas
Por outro lado, percebe-se a presença marcante de estereóti-
pos, preconceitos e situações de discriminação norteados por pro-
cessos normativos e avaliativos legitimados pela escola. Em 1992
há 28 anos atrás, Mello (1992) realizou uma pesquisa, a partir dos
dados de um bairro periférico de São Paulo, caracterizado por um
conjunto de moradias que chamamos hoje comunidade, onde tra-
ços de comportamento social foram marcantes como colaboração
e solidariedade. Propositadamente, resgatamos essa pesquisa de-
monstrando que em 28 anos a realidade pouco mudou. Para Mello
(1992), eram estruturas familiares desorganizadas na ótica da es-
cola, que, por esse critério diferenciavam as crianças justificando
não uma escola desinteressante, árida, mas a capacidade baixa de
aprendizagem daqueles que fracassavam por advirem de contex-
tos familiares diversos
O sentimento de incapacidade e as dificuldades em aprender,
provocam as evasões da escola logo nas 1ª séries do ensino funda-
mental. Tais alunos vão constituir no futuro os números da estatís-
tica da economia informal, sobrevivendo como biscateiros, catado-
res, etc,, enfim, prestadores de serviços gerais, que representam a
mão – de- obra barata e desqualificada.
O papel da escola hoje, como responsável também, pela vi-
vência da cidadania plena, seria intervir nos processos responsá-
veis pela evasão da criança da escola, tanto oferecendo uma me-
lhor formação e qualificação de seus profissionais como difun-
dindo meios de tornar o ensino instigante, interessante e desafia-
dor, capaz de manter o aluno ocupado, pelo tempo necessário à sua
SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 241

preparação para à vida e para o trabalho, com uma educação de


qualidade.
Um tema provocativo e desafiador como este, nos leva a pen-
sar na responsabilidade da nação, do estado em suas diversas ins-
tâncias entre elas a escola, os professores e os pais, que mais ime-
diatamente, são responsáveis pelos caminhos da educação dos alu-
nos sob sua responsabilidade. Refletir sobre essas questões, já é
um primeiro passo na busca de minimizar o problema.
Ao analisar todo o processo que constitui o (in) sucesso es-
colar, a partir da incapacidade da Escola tanto em formar profissi-
onais capazes de identificar e entender as dificuldades de aprendi-
zagem dos alunos, como em avaliar o “real” potencial dos alunos,
faz-nos logo perceber a distância, entre o conhecimento formal
oferecido pela escola e o conhecimento prático(informal) que o
aluno já dispõe, “traz” de casa. É preciso antes de tudo, considerar
este corte, estabelecido entre os conteúdos formais (da escola) e
os conhecimentos informais, trazidos da prática, da realidade (dos
alunos).
Por outro lado, as formas de avaliação da aprendizagem, in-
sistem, explicitamente ou implicitamente, em ignorar os processos
de construção do conhecimento do aluno quando estes o expres-
sam com palavras não enquadradas no código linguístico formal,
acadêmico. Desta maneira logo estes alunos são rotulados de
“bons”, “maus”, “fracos” e “fortes”, “aptos” e “inaptos” Carvalho, diz:

As previsões sobre o futuro desses alunos pareciam relacionar-se,


porém, muito mais à prática discursiva (re)construída e negociada
por eles e pela professora, a partir de seus contextos culturais do
que às diferenças econômicas. A cultura escolar, em geral hegemô-
nica e rotuladora, se confrontaria diretamente com as outras for-
mas de interação social e discursivas trazidas pelos alunos. (CAR-
VALHO, 2006: 31)

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 242

O (in) sucesso escolar expressado sob a forma de evasões e


repetências, logo aparece para os alunos economicamente menos
favorecidos. Para cada aluno que fracassa na Escola, variáveis di-
versas são responsáveis. Uma infinidade de fatores, colaboram
para este empobrecimento: o desemprego, o achatamento salarial,
os cortes no orçamento público exatamente para as verbas desti-
nadas às questões sociais, como atenção à saúde, às necessidades
educacionais, etc. Pouco se fez, por nossas crianças, continua o tra-
balho infantil, pela necessidade de “ajudar” ou até “sustentar” inte-
gralmente a família, continua a escola desinteressante, desperso-
nalizadora.
A criança que consegue chegar à escola, não é nem “dona” de
seu material didático, em particular de seu livro, que não pode
riscá-lo, tê-lo como seu. As campanhas “educativas” do MEC, veicu-
ladas na mídia (sobretudo na televisão) dizem que deve zelá-lo,
não por ser útil, seu, mas pelo fato de ser este livro, usado depois
por outras crianças. Será mesmo, que o governo que gasta tanto em
outras coisas, como propaganda de seus “feitos”, em horários no-
bres da televisão por exemplo, não tem verbas para comprar livros
para todas as crianças? Note-se, que em algumas escolas a criança
não leva sequer o livro para casa, tem que deixá-lo na escola para
ser utilizado em outro horário, por outra turma. Com certeza, é
uma forma perversa e punitiva de economizar para a renda do
país, sobretudo um governo que tem como um dos lemas o direito
constitucional de “garantia de acesso e permanência para todos na
escola”.
A escola recebe a cada ano, um quantitativo de alunos que
detém, por sua própria origem e realidade de vida, marcas que os
tornam diferentes. São crianças advindas de contextos socioeconô-
micos e culturais que comprometem seu desenvolvimento harmo-
nioso. A escola parece não enxergá-los e trata-os por igual, oportu-
nizando o surgimento dos grupos de alunos bem sucedidos (que
SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 243

certamente tiveram melhores oportunidades de estimulação ante-


riores à entrada na escola) e os grupos de alunos fracassados e que
tem na escola suas únicas, e às vezes até as últimas, oportunidades
de acesso ao saber). Estes últimos fortalecerão a manutenção da
organização social que os rotulou e a escola continuará impotente
para tentar igualar o que a realidade social distingue.
Será que é este o papel da escola? De elemento de nivela-
mento social? Ou devemos assumir que a sociedade não oferece
oportunidades iguais para todas as crianças. Constatar a necessi-
dade de democratizar o ensino e lutar pela ampliação de vagas na
Escola, pode não ser o melhor caminho na tentativa de oferecer
oportunidades iguais para todos. A Escola Pública, gratuita e obri-
gatória, não assegura o caráter democrático. Numa consideração à
teoria de aptidões, a Escola parece camuflar a desigualdade da sala
de aula, onde os “fracassados” em geral, são os “carentes”, as crian-
ças de classes populares, cujos resultados de contínuos (in)suces-
sos, acarretam para Educação, números cada vez maiores de eva-
são e repetências.
O trato autoritário da Escola nas questões do fracasso esco-
lar, merece análise também do ponto de vista da dependência ini-
cial da criança pelo adulto. A inquestionável autoridade onde “pro-
fessor manda e aluno obedece”, “professor ensina, aluno aprende” e
outros tantos posicionamentos que mostram um distanciamento
afetivo e pessoal, na relação professor aluno. Este comportamento
é comum em todos os grupos sociais no cotidiano das escolas.
A superação do (in)sucesso escolar requer novas formas de
avaliar o aluno, novas formas de entender os processos de apren-
dizagem. São questões estritamente individuais, embora se deem
no coletivo da sala de aula. É preciso que a escola, seus professores,
equipe técnica e diretores, assumam a dimensão social que o ato
educativo representa.

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 244

As diferentes formas de obtenção do saber advêm, mais facil-


mente, com a adoção de metodologias diferenciadas no trabalho
pedagógico. A pesquisa, como um recurso pedagógico, vivenciado
logo nas séries iniciais, permite que o aluno seja o construtor de
seu próprio saber, que possa dirigir sua própria aprendizagem
com autonomia, através da busca, da curiosidade e criatividade
que o processo de investigação desperta.
A iniciação de estudantes em projetos de pesquisa, de acordo
com seu nível de escolaridade, traz para eles, a oportunidade da
formação da atitude de descobrir, de investigar, de envolver-se em
aspectos básicos para o desenvolvimento de qualquer investigação
em torno de um problema, para o qual se busca um maior número
de respostas.
Embora saibamos que as diferentes respostas dadas pelos
alunos, não necessariamente significam capacidades ou incapaci-
dades deles em aprender, é preciso que a ação pedagógica reco-
nheça e tenha mais espaços dinâmicos de aprendizagem, respei-
tando e compreendendo os diferentes ritmos, as diferentes formas
de construções de conhecimento de seus alunos, e, a pesquisa
pode tornar-se uma grande aliada de alunos e de professores nos
processos de ensino-aprendizagem.
A Escola, reproduzindo a estrutura social através do ensino
de hábitos e valores aceitos socialmente, seleciona aqueles alunos
cujas respostas individuais, não a satisfez. Eles são avaliados então
por padrões onde as diferenças culturais e sociais confundem-se
com deficiências intelectuais.
Por outro lado, a escola tem seu discurso pedagógico frag-
mentado, as atividades oferecidas pouco se aproximam da reali-
dade de seus alunos, embora já se perceba em muitos educadores
a preocupação com o resgate da totalidade, da apreensão do aluno
concreto, situado num determinado contexto histórico: ele , a

SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 245

comunidade onde vive e as relações que estabelecem, num con-


texto mais amplo de análise. Para Klein,

no discurso dos educadores, a discussão acerca da fragmentação e


da totalidade se assenta, enfaticamente, em dois aspectos: no aluno
e no conteúdo. Em outras palavras, tem-se insistido na necessi-
dade de que tanto o aluno quanto o conteúdo sejam aprendidos
enquanto totalidade (KLEIN, 2007, p. 57)

E que conteúdos são esses? Que realidade é essa? O aluno não


se “vê” na escola, não se sente parte dela, não domina nem a lingua-
gem dos professores, nem a linguagem dos textos dos livros didá-
ticos que às vezes, retratam até uma região geográfica diferente da
sua.
Considerar a pluralidade e diversidade dos alunos, seria uma
forma de minimizar os problemas de aprendizagem? Uma reorde-
nação de conteúdos seria a solução? Pensamos que, enquanto não
houver uma preocupação, em facilitar a aquisição, compreensão,
elaboração e produção do conhecimento por parte do aluno, que,
ativamente e interativamente, deve ser capaz de refletir sobre o
que aprendeu, generalizando suas experiências pedagógicas, en-
tenderemos, porque alunos repetentes, lentos com comporta-
mento social diferente, que apresentam um vocabulário simples
composto por poucas palavras (em geral, termos do convívio fami-
liar) com muitas gírias e vícios de linguagem, são aqueles que são
encaminhados aos programas especiais.
Por sua vez, as famílias dos alunos egressos das classes po-
pulares, geralmente aqueles que detêm os (in)sucessos escolares -
não percebem a sucessão de disfarces sociais e mascaramentos
educacionais que os impedem de vivenciar a plena democracia no
contexto social do qual fazem parte.

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 246

A inclusão de novas metodologias didático-pedagógicas, a in-


formação e a discussão de uma proposta de trabalho pedagógico
continuado, sistematizado, na qual os diferentes níveis de ensino
não sejam uma crescente sequência de obstáculos ameaçadores
que o aluno apto ou não preparado ou não tem que superar.
Esperamos que este estudo, contribuir para evidenciar al-
guns pontos, que formam um conjunto de fazeres e de dizeres pe-
dagógicos, que permitem construir análises e ajustes ao ato peda-
gógico, como por exemplo, o cuidado do professor em corrigir ou
prevenir a circulação de informações distorcidas ou aprendidas
parcialmente por seus alunos, revelando o contexto socioeconô-
mico e cultural que se originam, que a inabilidade ou falta de do-
mínio do aluno para executar determinada tarefa, seja contornada
pelo preparo profissional do professor competente e comprome-
tido, capaz de lidar com as dificuldades de seus alunos.
Não se pretende aqui encontrar soluções mágicas para o
(in)sucesso escolar, mas espera-se que as responsabilidades de re-
fletir criticamente sobre estas questões, favoreçam algumas trans-
formações na escola e nos que dela fazem parte. Se isto acontecer,
já se terá dado alguns passos para que os equívocos, os rótulos ob-
servados e atribuídos aos alunos, sejam pelo menos discutidos.
Com um novo olhar da Educação, profissionais ligados aos
atendimentos especializados de prevenção e estimulação, se pro-
põem a construir um olhar integral sobre a dificuldade em apren-
der ou apresenta deficiência ou descompassos em seu desenvolvi-
mento.
Discutir, com propriedade, à luz das teorias cientificas, as de-
sigualdades sociais responsáveis pelo desagrupamento das crian-
ças com alguma deficiência, com transtornos invasivos do desen-
volvimento, com mobilidade reduzida e outras síndromes, crianças
em situação de vulnerabilidade social, a partir de concepções mais
colaborativas entre os diversos segmentos sociais que organizados
SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 247

em parcerias, os profissionais com tais aportes, poderiam vir a


configurar um novo contexto de desinstitucionalização para ques-
tões amplas e especificas da aprendizagem que envolvem os seg-
mentos sociais, daqueles sujeitos considerados menos favorecidos.
Os profissionais que lidam com essa parcela da população,
numa atitude geradora e multiplicadora de ações mais positivas,
efetivariam situações minimizadoras de conflitos, que se instalam
com a desinformação e discriminação para os sujeitos partícipes
desses segmentos sociais, quando se constroem para eles precon-
ceitos, desalento e desconfiança em suas capacidades individuais
de aprendizagem. Vitimizar a criança ou adolescente com alguma
diferença, vislumbra a importância do trabalho competente e qua-
lificado em todos os espaços institucionais ou não.
O desenvolvimento das ciências e a apreensão dos conheci-
mentos organizados, representam abordagens científicas que, uma
vez experimentadas, farão surgir através da sociabilização, avan-
ços e também retrocessos que certamente favorecerão o surgi-
mento de ações mais otimizadoras pertinentes e atuais e que terão
como desdobramentos, o atendimento especializado, qualificado e
potencializador de pessoas que fazem parte do universo da discri-
minação, do preconceito e da inclusão escolar.
Sabemos que as instâncias institucionais ainda atendem as
necessidades de uma minoria que no contexto econômico globali-
zado gravita na produção da miséria; da marginalidade; da nega-
ção de acesso aos bens públicos e também da Escola
As dificuldades de reconhecer o outro, nas ideias de Costa
(2008), configuram-se mundialmente em 852 milhões de desnutri-
dos, 2 bilhões de excluídos de habitação, saneamento e alimentos
No Brasil, a inclusão tem suporte constitucional (1988) nosso
ordenamento jurídico fundamenta: cidadania e dignidade humana
(artigo 1°). Promoção do bem de todos, sem preconceitos ou

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 248

discriminação (artigo 3) Igualdade de condições de acesso e per-


manência na escola (artigo 206) Constitucionalmente, a Educação
é dever do estado, efetivado com a garantia de acesso aos níveis
mais elevados de ensino, pesquisa e criação artística (artigo 208).
Mas para que tais premissas aconteçam, é preciso que os pró-
prios profissionais se reconheçam como sujeitos culturais, media-
dores e potencializadores da educação articulando a cultura os alu-
nos ao conhecimento escolar. Acreditamos que, a função do profis-
sional que lida com a educação, no assessoramento desse docente,
tanto na sua formação inicial e continuada, imbrica para as neces-
sidades formativas do saber fazer, de priorizar valores éticos, sen-
sibilidade, criatividade, da estimulação do espírito crítico do aluno,
difundindo o conhecimento construído pelas reflexões, resgatando
o sentido político da ação formativa educativa.
Os papeis sociais vivenciados pelos educadores, em seu as-
pecto socializador situa-se no interior dos grupos humanos, mobi-
lizando instrumentos de comunicação e transmissão para as novas
gerações, das conquistas sociais e processos de educação, nos gru-
pos de trabalho e produção. Para tanto, ao longo da história dife-
rentes formas de transmissão de conhecimentos foram usadas e a
função da escola, configurada para transmissão do conhecimento
com seus conteúdos, sistemas de organização apresentados às no-
vas gerações, assume aspectos tradicionais para garantir a repro-
dução social e cultural.
A inculcação e as ideologias, propaladas de forma sutil, sinu-
osa e subterrânea, representações sociais objetivas e subjetivas
efetiva a culpabilização do aluno, quando o responsabiliza pelos
seus fracassos por questões orgânicas, econômicas ou culturais.
Nesse sentido, o trabalho pedagógico se constitui numa teia
de relações ampliando ou reduzidos focos de analises das práticas
sociais, diluídos em teorias, currículos, condutas numa aprendiza-
gem acadêmica seletiva. A convivência de um currículo comum, a
SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 249

diversidade pedagógica, a atenuação dos efeitos da desigualdade,


pluralidade de formas de viver, pensar e agir, expressão genuína
da comunidade humana, provoca e facilita a reconstrução do co-
nhecimento.
A Escola, enquanto espaço formal de garantia de acesso à
educação de qualidade, ao esporte, à cultura e ao lazer, passa a fa-
zer parte integrante e importante na Rede de Proteção à Infância e
Adolescência, constituída a partir do Estatuto da Criança e do Ado-
lescente, como é possível visualizar nos Art. 55 e 56.

Art. 55. Os pais ou responsáveis têm a obrigação de matricular seus filhos


ou pupilos na rede regular de ensino.
Art. 56. Os dirigentes de estabelecimentos de ensino fundamental comu-
nicarão ao Conselho Tutelar os casos de:
I-maus-tratos envolvendo seus alunos;
II-reiteração de faltas injustificadas e de evasão escolar, esgotados os re-
cursos escolares;
III-elevados índices de repetência.

Os maus-tratos a que se refere o inciso I são relativos à ação


da família, da sociedade e Estado e nem sempre são facilmente per-
cebíveis. É preciso compromisso, envolvimento e dedicação à
causa da infância e da adolescência para tornar visível a prática dos
maus-tratos que, em geral, tem início nas relações de poder que se
encontra nas famílias.
Esta forma de conceber a escola direciona a importância do
investimento do Estado nas políticas de Educação e Cultura: am-
pliação da rede de ensino público e de qualidade para todos(as)
os(as) que dela necessitarem, adequação dos currículos à reali-
dade local, respeitando os ritmos e processos dos(as) estudantes,
suas culturas e possibilidades, oportunizando a educação continu-
ada e permanente ao(à) professor(a), bem como o acesso à cultura,
capacitando-os(as) para responderem às demandas do complexo

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 250

cotidiano da educação. Sem destinação de parcela significativa dos


recursos para a Educação, Cultura, Esporte e Lazer, esse direito es-
tará fadado ao fracasso. Sua garantia, no entanto, encontra-se res-
paldada no art. 54 do Estatuto da Criança e do Adolescente.
O direito à cultura, à educação, esporte e lazer é direito hu-
mano porque a necessidade de se expressar, manifestar pensa-
mentos e valores é intrínseca à condição humana. Vivemos tempos
onde os espaços culturais para manifestação são escassos, onde a
cultura se mercantilizou e somente tem acesso quem pode pagar
por um ingresso de cinema e teatro. Porém, há toda uma dinâmica
cultural, onde diversos grupos sociais, a partir das suas próprias
percepções e referenciais, criam cidadania cultural.
A arte, lazer e esporte é a linguagem mais compreendida pe-
los jovens e tem se tornado instrumental importante para a cons-
trução da cidadania desses grupos. Pessoas com de deficiência, ne-
gros, homossexuais, ciganos, mulheres e idosos, vêm também en-
contrando no esporte e cultura razões para expressar a sua própria
singularidade.,
A educação é um direito humano e meio indispensável para
realizar outros direitos, como os individuais e sociais. É referencial
para a construção de conhecimentos, desenvolvimento de valores,
crenças e atitudes em favor de uma sociedade mais humanizada.
Todos os processos educativos devem estar direcionados ao pleno
desenvolvimento humano e de suas potencialidades
Eduardo Galeano, em "A cultura do terror", cita que a extor-
são, o insulto, a ameaça, o cascudo, a bofetada, a surra, o açoite, o
quarto escuro, a ducha gelada, o jejum obrigatório, a comida obri-
gatória, a proibição de sair, a proibição de se dizer o que se pensa,
a proibição de se fazer o que se sente, a humilhação pública, são
alguns dos métodos de penitência e tortura tradicionais da família.
Esta afirmação reafirma o papel da educação preventiva integral
na escola.
SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 251

A este respeito, o Laboratório de Estudos da Criança (LACRI),


do Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo, divulgou
a Petição por uma Pedagogia Não Violenta: Toda criança tem di-
reito de ser educada sem violência, seja física, psicológica ou se-
xual. A criança precisa aprender com palavras e atitudes de com-
preensão e respeito e não com empurrões, safanões, tapas, humi-
lhações...
Naturalmente, essa postura não significa sermos contra a ne-
cessidade de disciplina e limites na educação infantil. Significa, isso
sim, que repudiamos o uso da violência como estratégia de educar
as novas gerações, mesmo que esta violência assuma a forma de
um tapa (ainda tão defendido na pedagogia familiar) ou de castigos
físicos e/ou degradantes (ainda adotados em escolas e instituições
ditas de proteção da infância). Por isso, defendemos o princípio de
que se queremos um mundo não-violento, devemos começar edu-
cando sem violência as futuras gerações!
Os artigos 205, 206 da Constituição da República Federativa
Brasileira/88 estabelecem que a educação, direito de todos e dever
do Estado e da família, será promovida e incentivada com a cola-
boração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pes-
soa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação
para o trabalho.
O Estatuto da Criança e do Adolescente/1990 (ECA), com vis-
tas a cumprir os preceitos constitucionais assegura à criança e ao
adolescente preferencialmente uma educação voltada ao integral
desenvolvimento da pessoa, com prática para a cidadania de forma
clara e objetiva e capacitação para o trabalho, sempre preconi-
zando o absoluto respeito aos direitos fundamentais das crianças
e dos adolescentes.
O ECA no Art. 57, determina que o poder público estimulará
pesquisas, experiências e novas propostas relativas a calendário,

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 252

seriação, currículo, metodologia, didática e avaliação, com vistas à


inserção de crianças e adolescentes excluídos do ensino funda-
mental obrigatório.
No art. 58. o ECA explicita que no processo educacional res-
peitar-se-ão os valores culturais, artísticos e históricos próprios do
contexto social da criança e do adolescente, garantindo-se a estes
a liberdade de criação e o acesso às fontes de cultura.
Afirma, também, o ECA, em seu art. 59, que os municípios,
com apoio dos estados e da União, estimularão e facilitarão a des-
tinação de recursos e espaços para programações culturais, espor-
tivas e de lazer voltadas para a infância e a juventude.
Para cumprimento destes artigos, faz-se necessária uma po-
lítica integrada das Secretarias de Educação, da Cultura, do Esporte
e da Ação Social, no âmbito municipal, bem como no estadual e no
federal, de tal forma a garantir o atendimento integral da criança e
do(a) adolescente, no que tange aos seus direitos fundamentais.
Infelizmente, o que se vê, são ações isoladas, quando existentes,
muitas vezes contraditórias, denunciando a inexistência de políti-
cas públicas que respeitem a criança e o(a) adolescente como pri-
oridade absoluta.
Isto também se verifica no processo educativo e cultural para
além da escola. As famílias das classes populares apresentam baixa
escolaridade e pouco acesso à cultura, o que acaba reforçando
nessa e nas futuras gerações a dependência ao Estado para a so-
brevivência, para o pensar, para o agir.
Nas entidades de abrigo, relativo ao Direito à Educação, à Cul-
tura, ao Esporte e ao Lazer há, quase que exclusivamente, a garan-
tia da escolaridade, com dificuldades de acesso prioritário à saúde,
às atividades esportivas diversificadas, aos bens culturais e a dife-
rentes formas de lazer.
O Direito à Educação, à Cultura, ao Esporte e ao Lazer é um
baluarte do movimento dos direitos humanos na medida em que
SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 253

garante à criança e ao(à) adolescente o acesso ao conhecimento


histórica e culturalmente construído, permitindo-lhe o desenvolvi-
mento integral. Tendo por base os pilares da educação preconiza-
dos pela UNESCO para o século XXI, pela Educação, Cultura, Es-
porte e Lazer fica assegurada à criança e ao(à) adolescente a opor-
tunidade de aprender a SER, de aprender a Conhecer, de aprender
a Fazer, de aprender a Conviver e também de aprender a Sonhar,
aprendizagens essas precursoras das competências nas dimensões
pessoal, cognitiva, produtiva, social e relativa ao projeto de vida.
Atualmente, a existência de organizações não-governamen-
tais (ONGs), bem como de Organizações da Sociedade Civil de Inte-
resse Público (OSCIP) têm substituído o Estado em suas ações es-
senciais: oferecer um pouco de dignidade à vida das crianças, bem
como o direito à educação de qualidade para que possam exercer
plenamente sua cidadania.
Como minimizar a distância entre o que se acredita ser pos-
sível fazer e o que ocorre na prática? Como auxiliar os professores
a retomarem seu papel educador e transformarem sua prática?
Como mobilizar os meninos a acreditarem que a escola vai fazer a
diferença significativa em suas vidas e em seus projetos de futuro?
Como a universidade brasileira pode contribuir com as políticas
públicas de inclusão a partir da formação permanente dos profes-
sores? (ASINELLI-LUZ, 2005, p. 201)
Os direitos da criança e do(a) adolescente são soberanos, não
podendo ser violados ou ameaçados. Mesmo à revelia da criança e
do(a) adolescente, têm que ser respeitados. No caso de violação ou
ameaça cabe ao Conselho Tutelar receber a queixa, encaminhar o
caso e fazer a devida notificação no Sistema de Informação para a
Infância e Adolescência - SIPIA.
O SIPIA estabelece três condições básicas para caracterizar
uma violação de direito:

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 254

a) A existência de um sujeito de 0 a 18 anos que tenha sofrido


a violação;
b) A prática de uma ação contrária ao direito assegurado, ou
mesmo a ausência da ação necessária ao cumprimento do
direito assegurado;
c) Um(a) responsável pela ação ou pela omissão que resultou
no descumprimento do direito (pais ou responsáveis, o Es-
tado, a sociedade e a própria criança ou adolescente, em
decorrência de sua conduta).

As violações mais frequentes ao Direito à Educação, à Cul-


tura, ao Esporte e ao Lazer foram agrupadas em seis indicadores, a
saber:
1. Impedimento de acesso à educação: falta de escola, falta
de vagas, falta de oferta de ensino noturno regular ao(à)
adolescente trabalhador(a), incompatibilidade do calen-
dário escolar com as atividades socioeconômicas e inexis-
tência de ensino fundamental completo.
2. Impedimento de permanência no sistema escolar: puni-
ções abusivas, critérios avaliativos discriminatórios, ex-
pulsão indevida e constrangimento de qualquer espécie.
3. Ausência ou impedimento de acesso à creche ou pré-es-
cola (ciclo inicial): falta de creche ou pré-escola, falta de
vagas em creche ou pré-escola, não-cumprimento, por
parte das empresas, da obrigatoriedade da creche, falta de
equipe especializada para atendimento de criança de 0 a 6
anos, distância física entre empresa/creche ou casa/cre-
che e distância física entre empresa/pré-escola ou
casa/pré-escola.
4 Ausência de condições educacionais adequadas: ausência
de merenda escolar, professores(as) despreparados(as),
falta de segurança nas escolas, ausência de serviços
SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 255

especializados, alto índice de repetência, ausência de in-


formações aos pais sobre a frequência, interrupções siste-
máticas do processo de ensino, falta de material didático,
condições insalubres dos estabelecimentos escolares e im-
pedimento de acesso aos critérios avaliativos.
5. Ausência ou impedimento de uso de equipamentos de cul-
tura, esporte ou lazer: ausência de equipamentos e pro-
gramas de esporte, lazer e cultura, falta de manutenção
dos equipamentos existentes, falta de segurança nos locais
destinados à cultura, ao esporte e ao lazer, impedimento
do uso de equipamentos e espaço de lazer existentes.
6. Atos atentatórios ao exercício da cidadania: ausência ou
impedimento de acesso a meios de transporte, impedi-
mento de acesso à escola, restrição ao direito de organiza-
ção e participação de entidades estudantis; não comunica-
ção ao Conselho Tutelar de situação de maus-tratos, ex-
cesso de faltas injustificadas, evasão escolar ou elevado ín-
dice de repetência, impedimento legal de garantias educa-
cionais a crianças indígenas.

Ressalte-se aqui a importância do Profissional da Educação,


no processo de mediação entre a criança, o adolescente e a escola,
visando à melhoria da qualidade de vida de todos os envolvidos no
contexto educacional, crianças, adolescentes, professores, pais,
mães e familiares responsáveis pela atenção e promoção da infân-
cia e adolescência cidadã. Cabe ao Estado efetivá-la e à Rede de
Proteção monitorá-la. Muito tempo já se perdeu, inúmeros hoje
adultos se tornaram péssimos estudantes, penso que não existe um
fator isolado são vários problemas a serem resolvidos sociais,
econômicos, culturais, psicológicos e sobretudo mudar o discurso
da escola.

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 256

Pesquisas como as de Patto (1996); Cruz (1987); Machado


(1994); Souza, (1991); Souza (1991) entre outros autores, há
muito também vem estudando o fracasso escolar em diferentes
óticas. E o mais importante, é que tantos estudos e a ações mal
saem do papel, talvez falte vontade política, em valorizar os estu-
dos e as pesquisas na área.
Todos os seres humanos constroem conhecimentos de várias
maneiras e por diferentes razões. As experiências cotidianas vi-
venciadas criadas pelos indivíduos, constituem-se espaços de
aquisições de conhecimentos. Nessa perspectiva, a profissão do-
cente tem um conhecimento específico, que é utilizado e transmi-
tido no ato de ensinar e aprender, de uma geração para outra, de
transmitir o conhecimento produzido em diferentes manifestações
e formas de expressão. Assim, pensamos que reconhecer nos alu-
nos, os saberes que trazem já construídos em diferentes espaços e
nas suas relações cotidianas, é reconhecer as aprendizagens, as vi-
venciadas sociais estimular transformações desses saberes em co-
nhecimentos, respeitando sobremaneira os níveis que escolariza-
ção e considerando as aquisições e habilidades que os alunos já
dispõem considerando as relações entre os profissionais da educa-
ção, os aprendentes e aprendizes convivem, ambos, em espaços
não formais de educação e escolarização. Nessa perspectiva, a atu-
ação do psicopedagogo assessorando e orientando o professor é
fundamental para otimização da atividade educativa.
Neste sentido, mobilizando esses saberes a Educação, a es-
cola e aqueles que com elas colaboram, serão capazes de trabalhar
à favor da inclusão e da diversidade, executando as políticas públi-
cas para práticas educativas menos excludentes, reconhecendo as
diferenças sem inferiorizá-las e superando os preconceitos, enten-
dendo e reconhecendo o outro, partilhando e acolhendo sem ne-
nhuma forma de discriminação.

SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 257

Os profissionais que lidam com essa clientela tão especial,


elementos de discussão desse estudo, aprendem juntos a valorizar
as identidades socioculturais e raciais; a enfrentar os desafios de
reunir e mediar as ações psicopedagógicas de ensino e aprendiza-
gem para todos. Um destaque importante no processo formativo
desses profissionais em particular, deverá ser manter um enfoque
integrado de investigação e pesquisa com articulação imediata, te-
oria–prática nas ações psicopedagógicas na sala de aula, na escola
e/ou em espaços não formais de educação.
Caberia as agências de formação, reforçar nos currículos dos
cursos, espaços para estimular o estudo e a pesquisa, através das
atividades planejadas com os/as alunos/as, oportunizando a vi-
vencia em sala de aula e nas comunidades envolvidas de ações afir-
mativas de inclusão e respeito a diversidade.
Uma questão se coloca como norte de nosso estudo: como se
capacita uma/a profissional da educação, dentro de uma dinâmica
social que sabemos ser movida por fatores econômicos, sociais e
políticos e cuja meta é a formação do humano? É nosso interesse,
analisar a formação do humano, como um dos aspectos fundamen-
tais da educação e diversidade, a partir do estudo dos processos
formativos dos profissionais que atuam na escola e a partir da
constatação das várias direções da trajetória formativa e profissi-
onal de um psicopedagogo.
Parece-nos que quanto mais clara for a visão, quanto mais de-
finida for a compreensão dos espaços profissionais que um profis-
sional qualificado pode ocupar, mais há a necessidade de conhecer
as Ciências da Educação ancorada em seus Códigos de Ética. É im-
portante para o profissional da Educação, compreender o processo
da aprendizagem humana; as condições normais e patológicas da
aprendizagem, o contexto familiar, a escola, transitarem nos espa-
ços formais e não formais onde a escolarização pode acontecer, tais

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 258

elementos constituem-se os procedimentos específicos da Apren-


dizagem, do Ensino e da Educação. Analisando e discutindo os fe-
nômenos da aprendizagem à luz desses elementos e considerando
o desenvolvimento psicossocial- educacional e físico da criança e
do adolescente, estes profissionais, juntos, podem sem sombra de
dúvida, minimizar os problemas de aprendizagem, tão comum hoje
em nossas escolas.
Nos processos formativos dos profissionais que lidam com o
desenvolvimento humano, verificamos a existência de vários fato-
res intervenientes, entre eles, a influência de vários modelos for-
mativos, das dificuldades dos mercados de trabalho, da (des)valo-
rização profissional e outras questões como gênero e classe. Tais
questões, tem influenciado desde então, os caminhos de uma edu-
cação mais tolerante e inclusiva.
Todos os seres humanos constroem conhecimentos de várias
maneiras e por diferentes razões. As experiências cotidianas vi-
venciadas, criadas pelos indivíduos, constituem-se espaços de
aquisições de conhecimentos. Nessa perspectiva, a profissão do-
cente tem um conhecimento específico, que é utilizado e transmi-
tido no ato de ensinar e aprender, de uma geração para outra, de
transmitir o conhecimento produzido em diferentes manifestações
e formas de expressão. Assim, pensamos que reconhecer nos alu-
nos, os saberes que trazem já construídos em diferentes espaços e
nas suas relações cotidianas, é reconhecer as aprendizagens, as vi-
venciadas sociais estimular transformações desses saberes em co-
nhecimentos, respeitando sobremaneira os níveis que escolariza-
ção e considerando as aquisições e habilidades que os alunos já
dispõem considerando as relações entre os profissionais da educa-
ção, os aprendentes e aprendizes convivem, ambos, em espaços
não formais de educação e escolarização. Nessa perspectiva, a atu-
ação do psicopedagogo assessorando e orientando o professor é
fundamental para otimização da atividade educativa.
SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 259

O reconhecimento do trabalho psicopedagógico é redimensi-


onado em parcerias institucionais, que acenam para a construção
de um status profissional distinto, que é construído no individual
e no social que se articulam e se complementam, sobretudo
quando pensamos em atividades psicopedagógicas integradoras
entre a escola e a comunidade.
A construção de uma nova atitude ética, pedagógica, a esco-
lha de ser um/a profissional com fazeres, dizeres, contradições e
compromissos profissionais, uma maior mobilização do pensa-
mento crítico, sinalizam as oportunidades de refletir sobre as prá-
ticas psicopedagógicas, do que fazem e porque fazem o trabalho
educativo dentro de uma realidade social posta. Saviani (2003, p.
21) diz: se para formar homens, é necessário um profundo conhe-
cimento da realidade humana e se a realidade humana é essencial-
mente histórica, então o educador precisa dominar, precisa conhe-
cer a história da diversidade. Daí, pensamos que, a ênfase na com-
preensão e aceitação dos diferentes contextos sócio históricos e
econômicos dos alunos e suas famílias, podem significar as primei-
ras iniciativas para reconhecimento das diferenças e da diversi-
dade.
Por outro lado, o desenvolvimento e cultivo de sentimentos
de responsabilidade e pertencimento, concretizam a necessidade
de formar profissionais na ótica do humano.
A inclusão sócio educacional, que expressa a pluralidade e a
diversidade, no âmbito da escola, passa por vários segmentos : a
inclusão digital, que define hoje um quadro internacional de cone-
xão à informação e ao conhecimento, visando evitar que pessoas e
países fiquem à margem da sociedade informatizada, a exemplo
disso, a ONU, segundo Monteiro (2001), passa a exigir que os paí-
ses abram suas atividades econômicas, mercado, à tecnologia. Isto
significa considerar o ciberespaço como uma rede comunicacional

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 260

global. Neste sentido, os espaços virtuais encurtam as distancias


do desconhecimento e da desinformação.
A sociedade da informação, a sociedade do conhecimento,
utiliza uma intensa rede de informática e telecomunicações, que
disponibiliza com mais eficiência conhecimentos, ignorando fron-
teiras geográficas ou limites espaciais tornando a educação, mais
que um processo de ensino e de aprendizagem. O profissional da
educação, como mediador das informações tecnológicas, precisa
desenvolver suas próprias competências para lidar com o avanço
das tecnologias. O uso de tv, videoconferências, de vídeos, telecon-
ferências, plataformas virtuais e da pesquisa através das infovias,
propicia nos cursos de formação de profissionais da educação, a
aprendizagem de uma atitude investigativa construindo entre
os(as) alunos(as), perfis de pesquisadores. Tais ações didático pe-
dagógicas, inovam os contextos educacionais, renovam antigas
práticas e permitem o acesso mais imediato às informações e à
produção e disseminação do conhecimento.
Compreendemos que os computadores e os softwares educa-
cionais, trazem em si duas faces em relação à democratização de
sua utilização. A tecnologia não escapa do bem ou do mal histori-
camente percebido nas mudanças sociais. O uso de um simples
computador na escola torna-se fator de diferenças, realçando as
desigualdades sociais e de ações educativas, dentro de uma pers-
pectiva de avanços e superação.
Os desafios desta era tecnológica para as escolas e seus pro-
fissionais são inúmeros. Por outro lado, pensamos que é preciso
rever os conteúdos dos cursos de formação de profissionais que
lidam com a formação do Outro. A formação dos/as professores
que atuam nas escolas, dos psicopedagogos que os assessoram,
precisa passar por mudanças que implicam na formação do pró-
prio homem. Freire (2002), na Pedagogia da Autonomia, apresenta
o que ele considera os saberes necessários à prática educativa. Tais
SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 261

saberes, que aglutinam aspectos da docência enquanto especifici-


dade da atividade humana, exigem rigorosidade, método, respeito,
criticidade, ética, alegria e esperança, disponibilidade para o diá-
logo, tais questões sem dúvida representam uma prática pedagó-
gica responsável pela formação de um(a) profissional comprome-
tido com a mudança que a educação é capaz de promover.
Freire (1999) já antevisava a necessidade da educação e
conscientização do homem, enquanto sujeito social, inserido numa
realidade que ele deveria compreender e transformar. Cabe a es-
cola e aos que nela atuam desempenhar este papel transformador,
evitando uma prática bancária assumindo uma prática pedagó-
gico-social que tem como suporte uma pedagogia da esperança,
que liberta e faz pensar.
O/a professor/a à luz das ideias freireanas, é o outro, é
aquele que entende a importância do ato de ler como uma leitura
da vida como prática de uma liberdade de pensamento que liberta
da opressão, descortinando o entendimento do mundo, das coisas
e das pessoas, sem medo e com a ousadia que a educação como
prática da liberdade inspira. Educação é mudança, é viver e apren-
der cada dia, através das ações de cultura e educação que podem
ser desenvolvidas na escola da vila, na escola da vida.
Uma escola considerada inclusiva, na ótica da diversidade,
parte da revisão e instalação de papeis deste(a) novo/a ou reno-
vado/a professor/a que deve ser acompanhado(a) e assesso-
rado(a) por um/a psicopedagogo (a), este/a, como elemento faci-
litador e mediador de aprendizagens e de desenvolvimento dos/as
alunos/as.
Mudar a escola, embora considerando-a ainda como um dos
espaços de apreensão e produção do saber acessível como direito
de todos conforme os dispositivos legais brasileiros é esperar que
a escola seja capaz de trazer provocar e trazer mudanças sociais

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 262

formando novos sujeitos capazes de interagirem, de inserirem-se,


inclusivamente, na sociedade de forma crítica e participativa.
Em vez de programas assistencialistas, paliativos de pana-
ceias sociais é preciso que se planeje e se efetive políticas públicas
inclusivas e atitudes sociais integradoras
No atual momento da escola, da educação do país, necessário
se faz refletir sobre as práticas pedagógicas trabalhadas nas salas
de aula, no cotidiano do universo escolar, observando quais as ne-
cessidades para redirecionar os processos de ensino e aprendiza-
gem.
Provocar um debate, sobre a importância das formas de atu-
ação dos pedagogos, dos psicopedagogos, dos psicólogos, dos pro-
fessores frente a complexidade do ato educativo, é fundamental
quando se pretende dar uma melhor qualidade na dinâmica esco-
lar. Refletir sobre os processos de avaliação, diante do conjunto de
relações sociais, entendendo o significado político da avaliação e
as contradições encontradas no ambiente escolar, faz lembrar
Freire quando diz:

a ideologia tem que ver diretamente com ocultação da verdade dos


fatos, com o uso da linguagem para penumbrar ou opacizar a re-
alidade ao mesmo tempo em que nos torna míopes. (FREIRE, 1996,
142)

A cada ano, diminuem os recursos do governo federal para a


educação e vem sendo transferidos para os Estados e Municípios,
a implantação e execução das atividades escolares, sem haver por
parte do governo federal, responsável pelas políticas traçadas para
a educação, a preocupação com as condições econômicas, pedagó-
gicas e sociais, que estes governos estaduais ou municipais têm,
para oferecer uma educação de qualidade, ao contingente de seus
estudantes. A falta de investimento na educação, em todos os ní-
veis faz surgir um número de profissionais despreparados que por
SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 263

sua vez preparam mal seus alunos. A timidez presente, nas formas
de enfrentar o fracasso dos alunos na escola se perpetuam na
busca de soluções.
As pesquisas vêm revelando um discurso reprodutivista em
relação as competências e habilidades conforme os contextos soci-
oculturais da origem dos alunos que fracassam. Patto, em 1996, há
20 anos atrás, nos advertia que, propositadamente, trazemos para
esse estudo, práticas escolares preconceituosas e desvalorizantes,
inclusive aquelas apregoadas pelas políticas educacionais. Então
perguntamos, o que mudou?
Os profissionais da educação, numa atitude geradora e mul-
tiplicadora de ações mais positivas, efetivariam situações minimi-
zadoras de conflitos, que se instalam com a desinformação e dis-
criminação para os sujeitos partícipes desses segmentos sociais,
quando se constroem para eles preconceitos, desalento e descon-
fiança em suas capacidades individuais de aprendizagem. Vitimi-
zar a criança ou adolescente com alguma diferença, vislumbra a
importância do trabalho psicopedagógico em todos os espaços ins-
titucionais ou não.
Alguns pontos estimulam nossa discussão: como desenvol-
ver um processo formativo que reconheça a educação como espaço
de formação do humano? Que medidas de superação dos entraves
na escola, oportunizam a concretização de uma prática psicopeda-
gógica democrática e inclusiva? Que elementos de influência dos
modelos formativos favoreceriam a formação continuada de um
profissional da educação enquanto uma busca individual realizada
no coletivo? Como a Pedagogia, Psicopedagogia e a Psicologia po-
dem auxiliar a Educação, na construção de novas atitudes docentes
éticas, sociais e pedagógicas?
Pensamos que essa atuação conjunta e inter complementar
com as ciências consideradas ciências humanas, viabiliza os

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 264

processos de inclusão social, cultural e digital. As atividades inter-


disciplinares tendo como foco a minimização da marginalização na
sociedade informatizada, aponta também para a formação de pro-
fessores/as com novos significados, novas exigências sociais. Pa-
rece-nos e a sociedade vem nos mostrando, a necessidade do sur-
gimento de novos saberes para a prática educativa.
Nesse sentido discutir o fracasso escolar, extrapola o que fa-
vorece ao surgimento do próprio fracasso do aluno? Da escola? Do
método? Ou do sistema?
Para Fernandez (2001), é na escola, através dos processos de
ensino e aprendizagem que o ato de aprender perpassa por toda a
vida do ser aprendente, através de processos cognitivos que se
operam no seu inconsciente, como um processo de caráter subje-
tivo. É o querer do aprendente associado ao querer o ensinante.
Partindo desse pressuposto, a aprendizagem se dá através de
um processo de construção que o sujeito vai fazendo a partir de
seu saber, transformando as informações em conhecimento.
Como podemos observar, a aprendizagem é muito diferente
do fracasso escolar. Para Fernández (2001) no fracasso escolar an-
tes de ser um problema da criança, o profissional da educação tem
que perceber que existe algo de errado na sua forma de ensinar
para com essa ou aquela criança. Na concepção da autora, esse pro-
blema pode expressar um sintoma de outros conflitos vivenciados
pelo aluno ou ainda uma inibição cognitiva.
Ao procurar na escola como ela vem trabalhando na busca da
formação integral do aluno, abordando conceitos como democra-
cia, igualdade, veremos que a escola, por não se preocupar com tais
aspectos, não consegue alcançar seu objetivo maior. Assim, seja de
que forma for, a dificuldade na aprendizagem está associada a uma
série de relações sociais estabelecidas pelo aluno, que está associ-
ada às relações de poder entre os grupos sociais.

SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 265

A prática da compreensão e aceitação das diferenças e o res-


peito as deficiências, depende muito da conscientização, da sensi-
bilidade, do respeito, do conhecimento dos processos de desenvol-
vimento, da aceitação e muito menos da legislação. Acreditamos
que signifique, uma atitude construída, um engajamento indivi-
dual, social e coletivo de superação de preconceitos.
Entendemos a educação e a diversidade, como pontos de
partida para que se constitua um processo dinâmico de muitas fa-
ces, desenvolvido através de um trabalho social e pedagógico onde
a atitude deaceitação das diferenças, extrapola a simples colocação
dos alunos com algum tipo de deficiência na sala de aula ou se es-
tabeleçam cotas de inserção de minorias sociais nas Universida-
des.
Os princípios da diversidade e da inclusão, podem ser com-
preendidos como a celebração das diferenças, da liderança, do di-
reito de pertencer, da valorização da diversidade humana, da soli-
dariedade, da importância das minorias, da cidadania e enfim, da
qualidade de vida, do padrão de excelência dos resultados educa-
cionais, da colaboração e cooperação com estratégias de apoio com
novos papéis e responsabilidades, envolvendo todos que fazem a
escola e os parceiros comunitários nos processos educativos.
Nessa perspectiva, fica claro que para uma compreensão mais apu-
rada sobre o problema do fracasso escolar, faz-se necessário o de-
senvolvimento de uma ampla ação de todos os segmentos da co-
munidade escolar, bem como de uma maior interação entre a aca-
demia e as redes de ensino, procurando trazer para mais próximo
dessa realidade o apoio dos trabalhos de pesquisa nessa área.
Dessa maneira, acreditamos que a escola possa começar a assumir
a sua verdadeira função de favorecer a construção do conheci-
mento por sujeitos que sejam capazes de interagir com a sua pró-
pria realidade, capazes de construir uma sociedade democrática.

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 266

A escola precisa começar a atender aquele aluno que não é o


ideal. Os alunos e os professores/as, não podem ser reféns de um
currículo pedagógico mal organizado, incoerente, que não abre es-
paço para o talento das crianças e quem não acompanha o conte-
údo está fadado à exclusão e ao fracasso.
Por muitos anos estas crianças foram mal diagnosticas, mal
tratadas ou ignoradas. Muitas são negras ou vindas das camadas
sociais mais comprometidas economicamente, rotuladas como
lentas, preguiçosas, até deficientes, estes adjetivos escondem uma
prática docente ineficiente ou desinteressada e uma escola que não
atende as necessidades dos alunos ou ainda demonstra a falta de
conhecimento dos que fazem a escola sobre a questão. Muitos pro-
fessores, ainda ignoram que crianças, adolescentes e adultos, po-
dem apresentar algum problema de aprendizagem de ordem orgâ-
nica, psicológica ou social ou cultural. Se admitirmos que a base
para a aprendizagem, são as necessidades individuais e que a força
motriz da conduta humana são os motivos, as aspirações, desejos
e interesses que se organizam em aprendizagens, estamos acei-
tando a ideia de que o conhecimento aprendido é advém de uma
diversidade de necessidades que a maioria dos autores as dividem
em: materiais, espirituais, biológicas e culturais. De tais necessida-
des derivam-se muitas outras, que implicam nas diversas formas
de organização da sociedade, das questões da cultura e religião,
das identidades dos grupos sociais e sobretudo nos sentidos de
classe e raça entre os indivíduos.
O desenvolvimento sociocultural leva o ser humano a outras
necessidades. Vigotsky (1999:85) diz que a ação do homem surge
no processo de desenvolvimento cultural e histórico através de uma
ação dirigida ao futuro. A forma de ensinar extrapola a sala de aula,
a observação do aluno para verificar suas aprendizagens, envolve
brincar, ouvir, observar como se organizam diante do mundo, das
coisas e das pessoas, demonstra a importância do trabalho
SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 267

psicopedagógico, que se evidencia no processo de observação, ava-


liação e intervenção, para minimizar as dificuldades dos alunos .
O/a professor, a família e a escola, envolvem aspectos socio-
culturais importantes para a aprendizagem. Ensinar e aprender,
são questões complexas, exigem a participação da família e dos téc-
nicos da escola, necessita de muita reflexão, além de configurar-se
como um compromisso social e político e como anteriormente co-
locamos, implica em um conhecimento específico sobre as teorias
e processos de aprendizagem. São inúmeras as contribuições do
trabalho psicopedagógico, especializado e competente, no sentido
de estruturar a construção ou reconstrução da aprendizagem
dos/as alunos/as, compensando ou minimizando as limitações,
ajudando o/a aluno/a, a dirimir ou conviver com suas dificuldades,
reavaliando ou redirecionando suas necessidades.
A questão da formação dos profissionais para atuarem junto
a educação inclusiva se torna um desafio quando se pensa na cons-
trução de um perfil profissional que possa ser adequado às exigên-
cias da demanda, tanto do mercado de trabalho quanto do exercí-
cio das práticas profissionais cotidianas, frente aos avanços da ci-
ência, das inovações tecnológicas e da própria da sociedade. As
áreas de saúde e de educação, no aspecto formativo de seus profis-
sionais, parecem ser as mais carentes, pois necessitam de atualiza-
ção permanente de seu corpo de conhecimentos, de seus métodos,
de seus procedimentos e de qualificação / capacitação de seus pro-
fissionais, para acompanhar as técnicas inovadoras que constante-
mente surgem no cenário profissional e o percurso da produção do
conhecimento, que por sua própria característica, é sequenciado,
cumulativo, dinâmico e em constante evolução.
Rodrigues (2009) aponta para a necessidade de uma forma-
ção profissional não fragmentada e contínua, com o domínio de te-
orias e práticas que tenham como objetivo entender como se

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 268

aprende e entender por que não se aprende e a partir desse enten-


dimento, o que fazer?
Avanços se dão, nos processos formativos, quando se planeja
uma atualização contínua dos profissionais, no sentido de estimu-
lar e garantir os espaços que investigações acadêmicas, através de
cursos que, distantes de conteúdos apenas teóricos, permitam o
exercício de atividades metodológicas que ensinem a pesquisar, a
desenvolver uma atitude profissional de investigação que seja in-
corporada, não só aos profissionais de saúde ou educação, mas
aqueles que desejem estar sempre atualizados na busca do conhe-
cimento e de práticas profissionais competentes.
O desenvolvimento científico e tecnológico, afeta a forma-
ção e o exercício profissional, contudo as mudanças nem sempre
são positivas em relação à proliferação de cursos aligeirados de
formação para atender o mercado ou a redução significativa da
qualidade curricular com a minimização de carga horária compro-
metendo a formação no tocante aos conteúdos teórico-metodoló-
gicos e as práticas e o estágio, por outro lado, é importante não
perder de vista como valorização do próprio profissional às exi-
gências na formação dos balizadores da ética, da competência e da
cidadania.
As diretrizes para atualização profissional, passam pela te-
oria, pela prática, pela busca do conhecimento. Nesta perspectiva,
a pesquisa, enquanto procedimento acadêmico e profissional,
vem se revelando um espaço, onde teoria e prática se encontram,
resultando em conhecimentos produzidos, a partir das constata-
ções dos dados avaliados e analisados, no percurso metodológico
da pesquisa. Tais achados, sugerem novos rumos, novas alterna-
tivas para os problemas estudados, fazendo surgir então 'um pro-
fissional com conhecimento mais amplo, com uma formação de
bases mais sólidas tanto do ponto de vista científico quanto com
uma visão mais humanista de si e do outro.
SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 269

É preciso também, observar a proposta pedagógica dos cur-


sos de formação enquanto discurso e enquanto prática, se os des-
dobramentos dos cursos atendem as necessidades básicas da
profissão. A atenção à pesquisa dentro do percurso teórico-meto-
dológicos dos cursos, estreitam os vínculos com o núcleo forma-
tivo e o núcleo profissionalizante, aliando a teoria prática.
A interrelação entre o ensino formativo, técnico e profissio-
nal, determina a prioridade dos cursos formativos, levando em
conta a ética, o rigor científico e intelectual e o enfoque multi e in-
terdisciplinar, especialmente na área da educação e saúde.
O compromisso com a competência da ação profissional, im-
plica no conhecimento de questões sociais fundamentais como a
eliminação da pobreza, a preservação do diálogo cultural, a cons-
ciência clara da relevância social de suas funções, onde quer que
as desempenhem, aplicando os princípios da ética humana em to-
dos os seus campos de ação.
Promover e desenvolver a pesquisa nas ações tanto formati-
vas dos profissionais da saúde e da educação como em suas práti-
cas no exercício profissional, são passos necessários na trajetória
formativa e profissional, dada sua relevância para o desenvolvi-
mento de estudos objetivos e oportunos, que garantam um pro-
cesso contínuo em busca do acesso aos bens culturais, a saúde e a
educação como direito assegurado constitucionalmente, para to-
dos.
A pesquisa como instrumento de busca e produção do co-
nhecimento, favorece o reconhecimento do ensino e aprendiza-
gem em diferentes contextos. A divulgação de resultados de pes-
quisa mundiais, vem criando oportunidades de diminuição da dis-
tância entre países considerados mais desenvolvidos e países
considerados emergentes ou menos desenvolvidos, no âmbito da
produção do conhecimento.

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 270

As ações cooperativas, os grupos integrados de pesquisado-


res, são uma realidade. Integrados e interligados, através das re-
des, dos sites da Internet, conversando por e-mail, navegando nos
espaços pelo mundo da tecnologia, via virtual ou não, os pesquisa-
dores do mundo inteiro hoje dialogam, desenvolvem ações colabo-
rativas e os resultados positivos das pesquisas, são socializados,
continuados, havendo uma cooperação internacional visando a
melhoria da qualidade de vida dos povos.
Faz parte hoje, dos planos da Organização das Nações Unidas,
da Organização Mundial da Saúde e do Fórum Internacional de
Educação, informes atualizados, sobre a situação dos conhecimen-
tos relativos a estas áreas, em relação ao ensino superior, em todas
as regiões do mundo, promovendo projetos inovadores de forma-
ção e pesquisa, destinados a valorização da educação cívica e ao
desenvolvimento sustentável para a paz, intensificando inclusive,
os estorços institucionais para pesquisa, para a liberdade acadê-
mica e para o exercício da responsabilidade social. o mundo psí-
quico dos seres humanos, está estreitamente ligado ao contexto
que ele está inserido e a forma com que ele vive no decorrer da sua
história.
Vigotsky (1996) já destacava em seus estudos, a importância
de considerar, nos processos de aprendizagem, a origem e os con-
textos socioculturais dos alunos. Nesse sentido, discutimos aqui a
importância do estudo das concepções e visões do conhecimento,
cujo objetivo é capturar como se dão as interações num contexto
social escolar e os significados, mediados por procedimentos psi-
copedagógicos, capazes de perceber e atuar como facilitadores das
análise das diferenças humanas, enquanto configuração de uma in-
tervenção psicopedagógica, política e sócio-histórica.
Os estudos, pesquisas e aplicações práticas e teórico meto-
dológicas dos aportes psicopedagógicos oferecem um espaço de
discussão sobre um leque de ideias até então estabelecidas, sobre
SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 271

aprendizagens, sobre a participação dos pais, sobre o envolvi-


mento da equipe escolar e atendimento psicopedagógico, consoli-
dando assim o trabalho do profissional que atua na ótica da inclu-
são.
Sabemos que durante muito tempo, qualquer pessoa dife-
rente das consideradas normais, as pessoas com espectro autista,
os considerados hiperativos e as pessoas com deficiência, aqueles
com dificuldades de aprendizagem tiveram o acesso à educação
negado, sendo até muitas vezes consideradas incapazes de assimi-
lar conhecimento.
Contudo é sabido também que nos últimos anos, aprofunda-
ram-se as discussões sobre a inclusão, sobre os processos psicope-
dagógicos que permitem o acesso dessas pessoas á educação, atra-
vés da elaboração de políticas de ações inclusivas.
A relevância da construção desse estudo, parte da necessi-
dade de oferecer aos leitores interessados subsídios para analisar
e refletir como o processo de inclusão das pessoas, como os pro-
blemas de aprendizagem, como se desenvolvem os indivíduos com
diferentes síndromes, o que contribuirá de maneira significativa,
para aprofundamento teórico metodológico dos processos forma-
tivos dos psicopedagogos e dos profissionais que lidam com o hu-
mano, levando em consideração questões que caminham desde a
necessidade de favorecimento às acessibilidades físicas e pedagó-
gicas, às dificuldades pessoais, individuais e coletivas aqui estuda-
das.
As discussões, pautadas em diferentes abordagens metodo-
lógicas e aportes teóricos, retratam trechos de observação, identi-
ficação e atendimento para a permanência na escola e na sociedade
inclusiva, de pessoas com deficiência, pessoas com dificuldades de
aprendizagens e com outras ocorrências, que comprometem um
desenvolvimento psicossocial e afetivo harmonioso.

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 272

É importante ter a justa medida de que, é preciso efetivar


ações que valorizem as diferenças, garantindo oportunidades
iguais de acesso ao conhecimento sociocultural construído, sem
discriminações e segregações, bem como contribuir para a supera-
ção dos estigmas ao qual se encontram os alunos com deficiência,
para que possam nela ingressar e participar da construção desse
conhecimento.
Em relação as questões da criação de vínculos afetivos no
universo escolar, a romantização da figura da tia, se confunde com
o fazer por dever e o fazer por gostar, situações que tem desdobra-
mentos na condição de um (a) profissional que desenvolve diferen-
tes funções em diferentes etapas da vida escolar.
Acreditamos que o foco de atenção, são as experiências que
já vêm sendo desenvolvidas e as lacunas existentes na perspectiva
de estabelecer diretrizes para as políticas de ações inclusivas, que
precisam fazer parte de um processo de discussão e de intervenção
na realidade, com base na compreensão de que não basta apenas
atender aos dispositivos legais, mas fazer uma opção por uma po-
lítica institucional que privilegie a inclusão social como uma ação
fundante.
Nesse sentido, a permanência e a efetividade na qualidade do
atendimento especializado inclusivo oferecido, o acesso a indepen-
dência e autonomia através da parceria com a reabilitação, assim
como a aprendizagem das várias formas de comunicação, faz com
que esse livro, coloque à disposição dos leitores uma produção in-
telectual, que num esforço de transposição didática, disponibili-
zam textos de leitura consistente e agradável.
Estamos conscientes de que o texto ora discute e defende, o
que cabe a escola, através das atividades desenvolvidas em proje-
tos, que deve proporcionar ao aluno oportunidades formativas, ora
discute e elabora e reelabora pontos de partida, com uma base con-
sistente e uma pratica psicopedagógica capaz de potencializar aa
SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 273

aprendizagens, procurando ter como princípios, os conceitos da


educação inclusiva fazendo uma ponte com o desenvolvimento e a
aprendizagem, na tentativa de resgatar as deficiências dos discen-
tes e exclusão destes, no processo de ensino aprendizagem por
meio de um trabalho psicopedagógico.
Uma criança inquieta, com traços de agressividade a si e aos
demais, que move-se constantemente, fala sem parar, tem movi-
mentos circulares em torno da sala de aula, dos colegas, não con-
segue terminar suas tarefas, atrai para si a atenção dos colegas per-
turbando o andamento do trabalho pedagógico, tem problemas de
atenção consequentemente de aprendizagem, por apresentar um
comportamento hiperativo. A hiperatividade em geral tem causa
neurológica, provoca desconforto para a criança para sua família e
para a escola que não sabe o que fazer com ela. A capacidade de
atenção implica nas diferenças individuais, na capacidade de adap-
tação da criança, em sua organização emocional e mental. A aten-
ção é elemento importante na memorização e um tempo muito
curto de atenção compromete demais o rendimento escolar. Estes
problemas afetam a conduta socioemocional da criança, provocam
atrasos na aquisição da leitura e da escrita, apresentando um ren-
dimento escolar incompatível com a idade.

DEFICIENTES, QUEM SÃO, ONDE ESTÃO?

A caracterização e atendimento das pessoas com deficiên-


cias, vem se tornando ao longo da história de seu atendimento uma
mudança constante de terminologia. Já foram denominados excep-
cionais; alunos especiais; pessoa portadora de deficiência; pessoa
com necessidades especiais; pessoa com necessidades educativas
especiais e desde 2000 pessoa com deficiência. Calcula-se que 12%
da população brasileira possua algum tipo de deficiência

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 274

Nesse contexto, o movimento de democratização da socie-


dade brasileira, vem pouco a pouco procurando reverter este ce-
nário, quando todos os que se inserem no universo da escola, pas-
sam não só a questioná-la como também a pensar caminhos novos
a serem seguidos pela mesma no enfrentamento desse problema.
Dentre os mitos existentes no meio escolar, sobre as causas
do fracasso dos alunos, um dos mais pujantes é o da criança ca-
rente que não aprende. Conforme nos aponta Cunha (2000), tudo
se explica e se justifica a partir de uma elaboração social e histori-
camente construída de forma acrítica, apoiadas por ideologias de
uma classe dominadora em detrimento de uma classe dominada,
onde ainda se olha sem querer de fato enfrentar os graves proble-
mas de parcela majoritária da nossa população.
Neste sentido, mobilizando esses saberes a Educação, a es-
cola e aqueles que com elas colaboram, serão capazes de trabalhar
à favor da inclusão e da diversidade, executando as políticas públi-
cas para práticas educativas menos excludentes, reconhecendo as
diferenças sem inferiorizá-las e superando os preconceitos, enten-
dendo e reconhecendo o outro, partilhando e acolhendo sem ne-
nhuma forma de discriminação.
Um destaque importante no processo formativo desses pro-
fissionais em particular, deverá ser manter um enfoque integrado
de investigação e pesquisa com articulação imediata, teoria–prá-
tica nas ações psicopedagógicas na sala de aula, na escola e/ou em
espaços não formais de educação.
Caberia as agências de formação, reforçar nos currículos
dos cursos, espaços para estimular o estudo e a pesquisa, através
das atividades planejadas com os alunos, oportunizando a vivencia
em sala de aula e nas comunidades envolvidas de ações afirmativas
de inclusão e respeito a diversidade.
Uma questão se coloca como norte como se capacita um edu-
cador, dentro de uma dinâmica social que sabemos ser movida por
SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 275

fatores econômicos, sociais e políticos e cuja meta é a formação do


humano? É nosso interesse, analisar a formação do humano, como
um dos aspectos fundamentais da educação e diversidade, a partir
do estudo dos processos formativos dos profissionais que atuam
na escola e a partir da constatação das várias direções da trajetória
formativa e profissional para atuar na área da educação.
Parece-nos que quanto mais clara for a visão, quanto mais de-
finida for a compreensão dos espaços profissionais que um profis-
sional da Educação pode ocupar, mais há a necessidade de conhe-
cer a ciências pedagógicas ancoradas em seus Códigos de Ética
sobretudo quando explica a área de estudo e os diversos espaços
de atuação no contexto de Saúde e Educação.
É importante para o profissional da Educação, compreender
o processo da aprendizagem humana; as condições normais e pa-
tológicas da aprendizagem, o contexto familiar, a escola, transita-
rem nos espaços formais e não formais onde a escolarização pode
acontecer, tais elementos constituem-se os procedimentos especí-
ficos da Educação. Analisando e discutindo os fenômenos da
aprendizagem à luz desses elementos e considerando o desenvol-
vimento psicossocial- educacional e físico da criança e do adoles-
cente, estes profissionais, juntos, podem sem sombra de dúvida,
minimizar os problemas de aprendizagem, tão comum hoje em
nossas escolas.
Nos processos formativos dos profissionais que lidam com o
desenvolvimento humano, verificamos a existência de vários fato-
res intervenientes, entre eles, a influência de vários modelos for-
mativos, das dificuldades dos mercados de trabalho, da (des)valo-
rização profissional e outras questões como gênero e classe. Tais
questões, tem influenciado desde então, os caminhos de uma edu-
cação mais tolerante e inclusiva.

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 276

Todos os seres humanos constroem conhecimentos de várias


maneiras e por diferentes razões. As experiências cotidianas vi-
venciadas criadas pelos indivíduos, constituem-se espaços de
aquisições de conhecimentos. Nessa perspectiva, a profissão do-
cente tem um conhecimento específico, que é utilizado e transmi-
tido no ato de ensinar e aprender, de uma geração para outra, de
transmitir o conhecimento produzido em diferentes manifestações
e formas de expressão. Assim, pensamos que reconhecer nos alu-
nos, os saberes que trazem já construídos em diferentes espaços e
nas suas relações cotidianas, é reconhecer as aprendizagens, as vi-
venciadas sociais estimular transformações desses saberes em co-
nhecimentos, respeitando sobremaneira os níveis que escolariza-
ção e considerando as aquisições e habilidades que os alunos já
dispõem considerando as relações entre os profissionais da educa-
ção, os aprendentes e aprendizes convivem, ambos, em espaços
não formais de educação e escolarização.
.A profissionalização de um/a profissional da educação, é
uma busca difícil, complexa mas possível se perseguida através de
atitudes de valorização da pesquisa no processo formativo, da so-
cialização de resultados e de estudos psicopedagógicos que conso-
lidam um modelo, um caminho de profissionalização que se espera
obter, uma profissionalização capaz de preparar o/a psicopeda-
gogo/a, para conviver e trabalhar com a diversidade nos diversos
espaços sociais, o/a instrumentalize para o exercício de uma prá-
tica profissional responsável e inclusiva.
.A construção de uma nova atitude ética, pedagógica, a esco-
lha de ser um profissional com fazeres, dizeres, contradições e
compromissos profissionais, uma maior mobilização do pensa-
mento crítico, sinalizam as oportunidades de refletir sobre as prá-
ticas psicopedagógicas, do que fazem e porque fazem o trabalho
educativo dentro de uma realidade social posta. Saviani (2003:21)
diz: se para formar homens, é necessário um profundo
SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 277

conhecimento da realidade humana e se a realidade humana é es-


sencialmente histórica, então o educador precisa dominar, precisa
conhecer a história diversidade. Daí, pensamos que, a ênfase na
compreensão e aceitação dos diferentes contextos sócio históricos
e econômicos dos alunos e suas famílias, podem significar as pri-
meiras iniciativas para reconhecimento das diferenças e da diver-
sidade.
Por outro lado, o desenvolvimento e cultivo de sentimentos
de responsabilidade e pertencimento, concretizam a necessidade
de formar profissionais na ótica do humano.
Boff nos inspira quando em seus artigos, comenta a necessi-
dade de“[...] zelar e cuidar de nossas crianças e adolescentes e
apresenta a ideia de que cuidar é mais que um ato; é uma atitude
[....]abrange mais que um momento de atenção.... representa ocu-
pação, preocupação, responsabilização e envolvimento afetivo
com o outro” (BOFF, 2001, p. 33).
Pelas práticas do cotidiano vivenciado, percebemos que a
partir da constatação das várias direções e espaços da trajetória
profissional dos/as psicopedagogos/as, estes caminhos teóricos
metodológicos, as posturas profissionais assumidas sofrem a in-
fluência de vários modelos formativos, da (des)valorização profis-
sional e outras questões como gênero e classe e que tais questões,
tem determinado desde então, os caminhos da profissionalização,
sobretudo na perspectiva de uma educação mais tolerante e inclu-
siva.
A inclusão sócio educacional, que expressa a pluralidade e a
diversidade, no âmbito da escola, passa por vários segmentos: a in-
clusão digital, que define hoje um quadro internacional de conexão
à informação e ao conhecimento, visando evitar que pessoas e pa-
íses fiquem à margem da sociedade informatizada, a exemplo
disso, a ONU, segundo Monteiro (2001), passa a exigir que os

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 278

países abram suas atividades econômicas, mercado, à tecnologia.


Isto significa considerar o ciberespaço como uma rede comunica-
cional global. Neste sentido, os espaços virtuais encurtam as dis-
tancias do desconhecimento e da desinformação.
Até para pessoas consideradas normais, situações como o
uso de cartões eletrônicos, robôs, aparelhos eletrodomésticos, fo-
tocopiadoras, fax, celulares, tv, dvd e computadores, representam
a captura e apresentação de informações que os sujeitos sociais
precisam dominar. Assim, cabe a escola passar aos seus alunos, to-
das as funções da informática, inserindo-os na sociedade informa-
tizada, que para Levy (1996:46) constituem-se: captura, digitaliza-
ção, memória, tratamento e apresentação. São funções que na pers-
pectiva geral de uma educação tecnológica oportunizará a inclusão
dos alunos e da escola no mundo virtual. Para tanto, a formação
do(a) psicopedagogo(a), na sociedade do conhecimento, implica
numa relação entre os processos formativos e os novos significa-
dos trazidos à sociedade pela informatização e novas tecnologias.
A sociedade da informação, a sociedade do conhecimento,
utiliza uma intensa rede de informática e telecomunicações, que
disponibiliza com mais eficiência conhecimentos, ignorando fron-
teiras geográficas ou limites espaciais tornando a educação, mais
que um processo de ensino e de aprendizagem. contextos educa-
cionais, renovam antigas práticas e permitem o acesso mais imedi-
ato às informações e à produção e disseminação do conhecimento.
Os desafios desta era tecnológica para as escolas e seus pro-
fissionais são inúmeros. Por outro lado, pensamos que é preciso
rever os conteúdos dos cursos de formação de profissionais que
lidam com a formação do Outro. A formação dos/as professores
que atuam nas escolas, dos(as) psicopedagogos/as que os assesso-
ram, precisa passar por mudanças que implicam na formação do
próprio homem.

SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 279

Freire (2002), na Pedagogia da Autonomia, apresenta o que


ele considera os saberes necessários à prática educativa. Tais sa-
beres, que aglutinam aspectos da docência enquanto especifici-
dade da atividade humana, exigem rigorosidade, método, respeito,
criticidade, ética, alegria e esperança, disponibilidade para o diá-
logo, tais questões sem dúvida representam uma prática pedagó-
gica responsável pela formação de um profissional comprometido
com a mudança que a educação é capaz de promover.
Freire (1999) já antevisava a necessidade da educação e
conscientização do homem, enquanto sujeito social, inserido numa
realidade que ele deveria compreender e transformar. Cabe a es-
cola e aos que nela atuam desempenhar este papel transformador,
evitando uma prática bancária assumindo uma prática pedagó-
gico-social que tem como suporte uma pedagogia da esperança,
que liberta e faz pensar.
O professor à luz das ideias freireanas, é o outro, é aquele que
entende a importância do ato de ler como uma leitura da vida como
prática de uma liberdade de pensamento que liberta da opressão,
descortinando o entendimento do mundo, das coisas e das pes-
soas, sem medo e com a ousadia que a educação como prática da
liberdade inspira. Educação é mudança, é viver e aprender cada
dia, através das ações de cultura e educação que podem ser desen-
volvidas na escola da vila, na escola da vida.
Os termos inclusão, exclusão e diversidade expressam uma
abordagem educacional, que vem se mostrando benéfica para os
que devem ser considerados cidadãos aceitos como iguais e tam-
bém benéfica, para os considerados normais que conseguem exer-
citar a estruturação de suas personalidades, convivendo com as di-
ferenças.
A proposta inclusiva representa uma política pública na área
da pesquisa e trabalho e de práticas educativas com atividades que

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 280

precisam sair do discurso, romper com o caráter assistencialista e


paternalista que sempre envolveu a educação para todos. A inclu-
são dos excluídos em todos os níveis de ensino, assume uma ban-
deira acima de tudo humanista e democrática.
A prática da compreensão e aceitação das diferenças e o res-
peito à deficiências, depende muito da conscientização, da sensibi-
lidade, do respeito, do conhecimento dos processos de desenvolvi-
mento, da aceitação e muito menos da legislação. Acreditamos que
signifique, uma atitude construída, um engajamento individual, so-
cial e coletivo de superação de preconceitos.
Entendemos a educação e a diversidade, como pontos de par-
tida para que se constitua um processo dinâmico de muitas faces,
desenvolvido através de um trabalho social e pedagógico onde a
atitude de aceitação das diferenças, extrapola a simples colocação
dos alunos com algum tipo de deficiência na sala de aula ou se es-
tabeleçam cotas de inserção de minorias sociais nas Universida-
des.
Os princípios da diversidade e da inclusão podem ser com-
preendidos como a celebração das diferenças, da liderança, do di-
reito de pertencer, da valorização da diversidade humana, da soli-
dariedade, da importância das minorias, da cidadania e enfim, da
qualidade de vida, do padrão de excelência dos resultados educa-
cionais, da colaboração e cooperação com estratégias de apoio com
novos papéis e responsabilidades, envolvendo todos que fazem a
escola e os parceiros comunitários nos processos educativos.
A escola deve ser o reflexo da vida da sociedade e como tal,
deve viver a experiência de conviver com as diferenças. Os alunos
e os professores não podem ser reféns de um currículo pedagógico
mal organizado, incoerente, que não abre espaço para o talento das
crianças e quem não acompanha o conteúdo está fadado à exclusão
e ao fracasso.

SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 281

As dificuldades de aprendizagem são questões vivenciadas


diariamente nas escolas, despertando o interesse dos educadores
e chamando a atenção para um grande número de crianças que fre-
quentam a escola e são traídas por suas dificuldades de adaptação,
de metodologia ou de desenvolvimento desarmônico.
Por muitos anos estas crianças foram mal diagnosticas, mal
tratadas ou ignoradas. Muitas são negras ou vindas das camadas
sociais mais comprometidas economicamente, rotuladas como
lentas, preguiçosas, até deficientes, estes adjetivos escondem uma
prática docente ineficiente ou desinteressada e uma escola que não
atende as necessidades dos/as aluno/as ou ainda demonstra a
falta de conhecimento dos que fazem a escola sobre a questão.
Muitos professores, ainda ignoram que crianças, adolescen-
tes e adultos, podem apresentar algum problema de aprendizagem
de ordem orgânica, psicológica ou social ou cultural.
O desenvolvimento sociocultural leva o ser humano a outras
necessidades. Vigotsky diz que a ação do homem surge no processo
de desenvolvimento cultural e histórico através de uma ação diri-
gida ao futuro (VIGOTSKY, 1999, p. 85)
A forma de ensinar extrapola a sala de aula, a observação do
aluno para verificar suas aprendizagens, envolve brincar, ouvir,
observar como se organizam diante do mundo, das coisas e das
pessoas, demonstra a importância do trabalho psicopedagógico,
que se evidencia no processo de observação, avaliação e interven-
ção, para minimizar as dificuldades dos alunos.
O professor, a família e a escola, envolvem aspectos sociocul-
turais importantes para a aprendizagem. Ensinar e aprender, são
questões complexas, exigem a participação da família e dos técni-
cos da escola, necessita de muita reflexão, além de configurar-se
como um compromisso social e político e como anteriormente co-
locamos, implica em um conhecimento específico sobre as teorias

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 282

e processos de aprendizagem. São inúmeras as contribuições do


trabalho psicopedagógico, especializado e competente, no sentido
de estruturar a construção ou reconstrução da aprendizagem
dos/as alunos/as, compensando ou minimizando as limitações,
ajudando o/a aluno/a, a dirimir ou conviver com suas dificuldades,
reavaliando ou redirecionando suas necessidades.
Com objetivos multidimensionais, o profissional da educa-
ção, adota enfoques integrados de investigação científica e viven-
cias de práticas psicopedagógicas em suas atividades, trabalhando
os aspectos preventivos e atuando como agente facilitador dos
processos cognitivos, beneficiando os/a alunos /as sejam quais fo-
rem suas dificuldades
A questão da formação dos profissionais, para atuarem junto
a educação inclusiva se torna um desafio quando se pensa na
construção de um perfil profissional que possa ser adequado às
exigências da demanda, tanto do mercado de trabalho quanto do
exercício das práticas profissionais cotidianas, frente aos avanços
da ciência, das inovações tecnológicas e da própria da sociedade.

ENTENDER COMO SE APRENDE E ENTENDER POR QUE NÃO SE


APRENDE E A PARTIR DESSE ENTENDIMENTO, O QUE FAZER?

Avanços se dão, nos processos formativos, quando se planeja


uma atualização contínua dos profissionais, no sentido de estimu-
lar e garantir os espaços que investigações acadêmicas, através de
cursos que, distantes de conteúdos apenas teóricos, permitam o
exercício de atividades metodológicas que ensinem a pesquisar, a
desenvolver uma atitude profissional de investigação que seja in-
corporada, não só aos profissionais de saúde ou educação, mas
aqueles que desejem estar sempre atualizados na busca do conhe-
cimento e de práticas profissionais competentes.

SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 283

O desenvolvimento científico e tecnológico, afeta a formação


e o exercício profissional, contudo as mudanças nem sempre são
positivas em relação à proliferação de cursos aligeirados de forma-
ção para atender o mercado ou a redução significativa da quali-
dade curricular com a minimização de carga horária comprome-
tendo a formação no tocante aos conteúdos teórico-metodológicos
e as práticas e o estágio, por outro lado, é importante não perder
de vista como valorização do próprio profissional às exigências na
formação dos balizadores da ética, da competência e da cidadania.
As diretrizes para atualização profissional, passam pela teo-
ria, pela prática, pela busca do conhecimento. Nesta perspectiva, a
pesquisa, enquanto procedimento acadêmico e profissional vem se
revelando um espaço, onde teoria e prática se encontram, resul-
tando em conhecimentos produzidos, a partir das constatações dos
dados avaliados e analisados, no percurso metodológico da pes-
quisa. Tais achados, sugerem novos rumos, novas alternativas para
os problemas estudados, fazendo surgir então 'um profissional
com conhecimento mais amplo, com uma formação de bases mais
sólidas tanto do ponto de vista científico quanto com uma visão
mais humanista de si e do outro.
A interrelação entre o ensino formativo, técnico e profissio-
nal, determina a prioridade dos cursos formativos, levando em
conta a ética, o rigor cientifico e intelectual e o enfoque multi e in-
terdisciplinar, especialmente na área da educação e saúde.
O compromisso com a competência da ação profissional, im-
plica no conhecimento de questões sociais fundamentais como a
eliminação da pobreza, a preservação do diálogo cultural, a cons-
ciência clara da relevância social de suas funções, onde quer que as
desempenhem, aplicando os princípios da ética humana em todos
os seus campos de ação.

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 284

O mundo psíquico dos seres humanos, está estreitamente li-


gado ao contexto que ele está inserido e a forma com que ele vive
no decorrer da sua história. Vigotsky (1996) já destacava em seus
estudos, a importância de considerar, nos processos de aprendiza-
gem, a origem e os contextos socioculturais dos alunos. Nesse sen-
tido, discutimos aqui a importância do estudo das concepções e
visões do conhecimento, cujo objetivo é capturar como se dão as
interações num contexto social escolar e os significados, mediados
por procedimentos psicopedagógicos, capazes de perceber e atuar
como facilitadores das análise das diferenças humanas, enquanto
configuração de uma intervenção psicopedagógica, política e só-
cio-histórica.
Os estudos, pesquisas e aplicações prático e teórico- metodo-
lógicas dos aportes psicopedagógicos oferecem um espaço de dis-
cussão sobre um leque de ideias até então estabelecidas, sobre
aprendizagens, sobre a participação dos pais, sobre o envolvi-
mento da equipe escolar e atendimento psicopedagógico, consoli-
dando assim o trabalho do psicopedagogo.
Sabemos que durante muito tempo, qualquer pessoa dife-
rente das consideradas normais, as pessoas com espectro autista,
os considerados hiperativos e as pessoas com deficiência, aqueles
com dificuldades de aprendizagem tiveram o acesso à educação
negado, sendo até muitas vezes consideradas incapazes de assimi-
lar conhecimento. Contudo é sabido também que nos últimos anos,
aprofundaram-se as discussões sobre a inclusão, sobre os proces-
sos psicopedagógicos que permitem o acesso dessas pessoas à
educação, através da elaboração de políticas de ações inclusivas.
A relevância da construção desse estudo, parte da necessi-
dade de oferecer aos leitores interessados subsídios para analisar
e refletir como o processo de inclusão das pessoas, como os pro-
blemas de aprendizagem, como se desenvolvem os indivíduos com
diferentes síndromes, o que contribuirá de maneira significativa,
SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 285

para aprofundamento teórico metodológico dos processos forma-


tivos dos psicopedagogos e dos profissionais que lidam com o hu-
mano, levando em consideração questões que caminham desde a
necessidade de favorecimento às acessibilidades físicas e pedagó-
gicas, às dificuldades pessoais, individuais e coletivas aqui estuda-
das.
As discussões, pautadas em diferentes abordagens metodo-
lógicas e aportes teóricos, retratam trechos de observação, identi-
ficação e atendimento para a permanência na escola e na sociedade
inclusiva, de pessoas com deficiência, pessoas com dificuldades de
aprendizagens e com outras ocorrências, que comprometem um
desenvolvimento psicossocial e afetivo harmonioso.
É importante ter a justa medida de que, é preciso efetivar
medidas que valorizem as diferenças, garantindo oportunidades
iguais de acesso ao conhecimento sociocultural construído, sem
discriminações e segregações, bem como contribuir para a supera-
ção dos estigmas ao qual se encontram os alunos com deficiência,
para que possam nela ingressar e participar da construção desse
conhecimento.
Em relação as questões da criação de vínculos afetivos no
universo escolar, a romantização da figura da tia, se confunde com
o fazer por dever e o fazer por gostar, situações que tem desdobra-
mentos na condição de um (a) profissional que desenvolve dife-
rentes funções em diferentes etapas da vida escolar.
Acreditamos que o foco de atenção, são as experiências que
já vêm sendo desenvolvidas e as lacunas existentes na perspectiva
de estabelecer diretrizes para as políticas de ações inclusivas, que
precisam fazer parte de um processo de discussão e de interven-
ção na realidade, com base na compreensão de que não basta ape-
nas atender aos dispositivos legais, mas fazer uma opção por uma

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 286

política institucional que privilegie a inclusão social como uma


ação fundante.
Nesse sentido, a permanência e a efetividade na qualidade do
atendimento especializado inclusivo oferecido, o acesso a inde-
pendência e autonomia através da parceria com a reabilitação, as-
sim como a aprendizagem das várias formas de comunicação, faz
com que esse livro, coloque à disposição dos leitores uma produ-
ção intelectual, que num esforço de transposição didática, disponi-
bilizam textos de leitura consistente e agradável.
Na observação, avaliação e intervenção das dificuldades de
aprendizagem, o psicopedagogo realiza essas atividades especifi-
cas de sua função profissional, e faz parte de seu trabalho, auxiliar
o professor a estimular o aluno a superar suas dificuldades. O es-
tabelecimento de um diagnóstico deve ser muito mais relevante no
sentido de descobrir as potencialidades e estabelecer um plano de
trabalho que avaliar para elencar os problemas.
Além do encaminhamento do professor, das informações ob-
tidas com a anamnese familiar o profissional membro de uma
equipe multidisciplinar deve considerar indícios das condições de
desenvolvimento psicofísico da criança, seu contexto familiar so-
cial e cultural, o histórico escolar observando seus avanços e re-
cuos no processo de aprendizagem e o comportamento da criança
observada, construindo assim um diagnóstico circunstanciado e
diferencial onde possa a partir dele estabelecer relações de ajuda
profissional.
Os considerados hiperativos, ancorada nas ideias aqui discu-
tidas baseadas nos estudos de Alan Ross (1999) e Genário Barbosa
(2000), apresentamos as ideias para discutir problemas que vem
se tornando muito constantes nas salas de aula: a dificuldade de
atenção das crianças e os comportamentos hiperativos.
A atenção é fator fundamental para a aprendizagem. Esse en-
tendimento ajuda no enfrentamento dos casos de insucesso
SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 287

escolar. O desenvolvimento cognitivo é responsável pela amplia-


ção de nossas aprendizagens e para que isso aconteça é necessário
deter-se sobre o objeto de estudo, refletir, analisar, realizar gene-
ralizações e fixar a aprendizagem.
Uma criança inquieta, com traços de agressividade a si e aos
demais, que move-se constantemente, fala sem parar, tem movi-
mentos circulares em torno da sala de aula, dos colegas, não con-
segue terminar suas tarefas, atrai para si a atenção dos colegas per-
turbando o andamento do trabalho pedagógico, tem problemas de
atenção consequentemente de aprendizagem, por apresentar um
comportamento hiperativo. A hiperatividade em geral tem causa
neurológica, provoca desconforto para a criança para sua família e
para a escola que não sabe o que fazer com ela.
Um dos aspectos mais significativos de uma escola compe-
tente, cidadã, é a formação e capacitação de seus professores, de
modo que, a esses professores, sejam dadas condições práticas
educacionais e pedagógicas de trabalhar com seus alunos com total
participação na sala de aula.
Através da informação e reflexão a respeito das necessidades
educacionais especiais, de atividades integradas orientadas por
um/a professor/a que invista nos processos inclusivos, da refor-
mulação de currículos, da articulação de conteúdos evitando a fra-
gmentação teórica descontextualizada da prática, do conheci-
mento dos processos diferenciados de ensino–aprendizagem ofe-
recidos ao/a professor/a certamente, os resultados psicopedagó-
gicos dessa escola cidadã, esperados pelos pais e pela sociedade
em geral, demonstrarão uma inclusão socioeducacional possível e
sobretudo previne e minimiza as situações de risco que esses/as
alunos/as estão expostos e que fazem com que representem por
qualquer motivo, um grupo vítima de opressão ou discriminação

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 288

Diante das discussões postas até aqui, o que é uma situação


de risco social? Como prevenir/proteger os alunos? Parece-nos
que este cuidado psicopedagógico e formativo, precisa ser constru-
ído a partir da interiorização da aceitação, da ação colaborativa e
da convivência com as diferenças, com a diversidade dos seres hu-
manos. É a nossa capacidade de entender e reconhecer o outro,
partilhando e acolhendo todas as pessoas sem exceção. Entende-
mos que inclusão antes de tudo é atitude, assim sendo, não pode
ser imposta. A escola deve ser o reflexo da vida da sociedade e
como tal, deve viver a experiência de conviver com as diferenças.
Um professor, preocupado com a formação do humano, na pers-
pectiva da inclusão, precisa ser capacitado e a escola cumpre seu
papel, dando ao professor suporte pedagógico adequado através
da construção de parcerias profissionais e institucionais, que po-
derão ser muito produtivas para seus alunos e para os seus profes-
sores.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A escola precisa começar a atender aquele aluno que não é o


ideal. Os(as) alunos(as) e os(as) professores(as) não podem ser
reféns de um currículo pedagógico mal organizado, incoerente,
que não abre espaço para o talento das crianças e quem não acom-
panha o conteúdo está fadado à exclusão e ao fracasso. a figura do
psicopedagogo com um (a) profissional atuante que coordena as
atividades educacionais otimizadoras, quando aliadas ao conheci-
mento proporcionado pela psicologia, pelas ciências da educação
que trazem como consequência imediata, o sucesso do desempe-
nho acadêmico do(a) aluno(a), especialmente daquele (a) que
apresenta alguma dificuldade de aprendizagem, facilitando sua in-
serção na comunidade que vive.

SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 289

As dificuldades de aprendizagem, são questões vivenciadas


diariamente nas escolas, despertando o interesse dos(as) educa-
dores(as) e chamando a atenção para um grande número de crian-
ças que frequentam a escola e são traídas por suas dificuldades de
adaptação, de metodologia ou de desenvolvimento desarmônico.
por muitos anos estas crianças foram mal diagnosticas, mal trata-
das ou ignoradas. muitas são negras ou vindas das camadas sociais
mais comprometidas economicamente. rotuladas como lentas,
preguiçosas, até deficientes.
Seria ingênuo pensar, que uma escola seja capaz de mudar
este estado de coisas, ter domínio de tantos conteúdos, de todo co-
nhecimento produzido, mas a escola pode fazer muito, tendo
um(a) professora qualificado(a) e comprometido(a), política e so-
cialmente com a causa, tendo um currículo desafiador, que esti-
mula e faz pensar as condições da comunidade, nas questões das
relações de discriminação racial, étnica e na defesa dos direitos hu-
manos, certamente estaríamos mudando a escola e consequente-
mente mudando a sociedade.
A necessidade de uma nova atitude educacional, junto aos
cursos de formação de professores (as), a partir do paradigma da
promoção da qualidade de vida e cidadania, com novas propostas
pedagógicas para os contextos socioculturais e da análise do qua-
dro educacional, onde certamente se constatará o grave problema
instalado que cotidianamente expõe os alunos.
Observamos que, nos processos formativos de profissionais
aqui em estudo, tanto na formação universitária, como em nível de
especialização, não existe uma preocupação específica com a for-
mação, para lidar com as diferenças na sala de aula ou na escola.
Algumas disciplinas, de forma isolada, referem-se à formação
do cidadão ou da cidadã, em particular, aquelas disciplinas que li-
dam com a educação inclusiva, contudo, não são momentos

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 290

suficientes de preparação profissional que certamente terão alu-


nos vítimas de discriminação e preconceito.
A aquisição de saberes, competências e habilidades para en-
sinar, nos cursos de formação, caminha muito mais para a instru-
mentalização do(a) docente em adquirir métodos e técnicas de en-
sino.
Os (as) professores (as) percebem na prática profissional,
que a visão fragmentada que vivenciaram nos cursos de formação
e as teorias que não foram desvendadas, os(as) levam a entender
que a aprendizagem e a formação dos alunos representam uma
complexa rede de relações. estes são fatos que em geral, só são per-
cebidos quando os (as) docentes se formam e vão para o mercado
de trabalho e então se sentem despreparados para “enfrentar” a
sala de aula e seus problemas. Pensamos que é preciso reformar os
currículos formativos e modificar a sala de aula, os meios que a es-
cola dispõe para enfrentar a violência, a discriminação, o racismo
e despertar a consciência dos alunos para as mazelas sociais, en-
contra na organização e construção do currículo, um espaço pro-
missor. Rodrigues diz:

entendemos que o currículo não é apenas um processo lógico de


disciplinas articuladas e interdependentes, mas uma construção
em diferentes pontos de vista, que devem ser considerados e
analisados como produção do conhecimento e como expressão in-
dividual e coletiva, com a preocupação com a verdade e vali-
dade este conhecimento, a partir da historicidade e das dinâ-
micas sociais (RODRIGUES, 2005, p.3)

Se não houver no espaço escolar onde este currículo é viven-


ciado, uma concepção de educação que incorpore e integre o ato
pedagógico como causa e consequências inseparáveis, o currículo
diante disto, fica como que solto, sem sentido e a escola perde o seu
papel como tarefa política e social, voltada para uma educação

SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 291

mais democrática e efetiva na comunidade, promovendo assim a


construção da cidadania e cidadania
Não queremos com isso, esquecer da realidade vivenciada
pela maioria dos alunos das escolas brasileiras, em especial as es-
colas públicas, que vivem desprovidas das condições mínimas de
sobrevivência, desde a alimentação deficiente até mesmo aos mo-
delos familiares hoje encontrados na nossa sociedade, que não fa-
vorece o bem esta dessas crianças, que não encontram carinho em
suas casas, além da necessidade de ajuda, seja trabalhando, seja to-
mando conta dos irmãos. Dada a sua situação social, os mesmos
não dispõem sequer de espaço para poderem estudar em suas ca-
sas.
Para Cunha (1989), conhecer esta realidade é condição pri-
meira para que de fato possa se pensar em uma prática educativa
capaz de favorecer a construção do conhecimento e não como fa-
zemos atualmente, aproveitando desse quadro social, para justifi-
carmos e minimizar o papel da escola na produção do fracasso es-
colar.
É importante lembrar a ação conjunta das Ciências Humanas
e Sociais, no favorecimento do processo de construção do conheci-
mento do aluno que desenvolve sua capacidade de argumentação.
Essas competências do agir pedagógico implicam em novas
formas de ensino, a reorganização do espaço escolar com a pre-
sença de outros profissionais advindo de outros campos do saber
como: Neurologia, Fonoaudiologia, Psicologia, entre outros parcei-
ros, que trazem novos significados pedagógicos na luta contra ex-
clusão social construindo entre eles, a disponibilidade para um di-
álogo de múltiplas faces em diferentes espaços sociais.
Esperamos com estas colocações, ter contribuído para apro-
fundar as discussões sobre a importância das práticas psicopeda-
gógicas e educativas, na ótica da diversidade, a partir da formação

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 292

pessoal e profissional, embasada na perspectiva da educação como


formação do humano.
Nesse sentido, o trabalho psicopedagógico se constitui numa
teia de relações ampliando ou reduzidos os focos de análises das
práticas sociais, diluídos em teorias, currículos, condutas numa
aprendizagem acadêmica seletiva. A convivência de um currículo
comum, a diversidade pedagógica, a atenuação dos efeitos da desi-
gualdade, pluralidade de formas de viver, pensar e agir, expressão
genuína da comunidade humana, provoca e facilita a reconstrução
do conhecimento.
Cabe ao profissional da educação, avaliar psicopedagogica-
mente, diagnosticar as interpretações da realidade oferecendo ele-
mentos para construção da criticidade e pautas de conduta, provo-
cando a organização racional das informações com experiências e
intervenções psicopedagógicas nos processos de aprendizagem.
Promover e desenvolver a pesquisa nas ações tanto formati-
vas dos profissionais da saúde e da educação como em suas práti-
cas no exercício profissional, são passos necessários na trajetória
formativa e profissional, dada sua relevância para o desenvolvi-
mento de estudos objetivos e oportunos, que garantam um pro-
cesso contínuo em busca do acesso aos bens culturais, a saúde e a
educação como direito assegurado constitucionalmente, para to-
dos.
A pesquisa como instrumento de busca e produção do conhe-
cimento, favorece o reconhecimento do ensino e aprendizagem em
diferentes contextos. A divulgação de resultados de pesquisa mun-
diais, vem criando oportunidades de diminuição da distância entre
países considerados mais desenvolvidos e países considerados
emergentes ou menos desenvolvidos, no âmbito da produção do
conhecimento.
As ações cooperativas, os grupos integrados de pesquisado-
res, são uma realidade. Integrados e interligados, através das
SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 293

redes, dos sites da Internet, conversando por e-mail, navegando


nos espaços pelo mundo da tecnologia, via virtual ou não, os pes-
quisadores do mundo inteiro hoje dialogam, desenvolvem ações
colaborativas e os resultados positivos das pesquisas, são sociali-
zados, continuados, havendo uma cooperação internacional vi-
sando a melhoria da qualidade de vida dos povos.
Refazer passos de aprendizagem, construir atalhos psicope-
dagógicos aponta para a reconstrução crítica do pensamento e da
ação transformadora das práticas psicopedagógicas que oportuni-
zam o resgate da cidadania, põe as “análises” nos seus devidos lu-
gares quando destaca as causas dos comprometimentos e anuncia
como minimiza-los, distanciando da ideia de que, se a criança não
aprende, é por culpa, por falta de capacidade individual. Novas al-
ternativas para os problemas estudados, fazendo surgir então 'um
profissional com conhecimento mais amplo, com uma formação de
bases mais sólidas tanto do ponto de vista científico quanto com
uma visão mais humanista de si e do outro. É preciso também, ob-
servar a proposta pedagógica dos cursos de formação enquanto
discurso e enquanto prática, se os desdobramentos dos cursos
atendem as necessidades básicas da profissão. A atenção à pes-
quisa dentro do percurso teórico-metodológicos dos cursos, es-
treitam os vínculos com o núcleo formativo e o núcleo profissiona-
lizante, aliando a teoria prática. A interrelação entre o ensino for-
mativo, técnico e profissional, determina a prioridade dos cursos
formativos, levando em conta a ética, o rigor cientifico e intelectual
e o enfoque multi e interdisciplinar.
Promover e desenvolver a pesquisa nas ações tanto formati-
vas dos profissionais da saúde e da educação como em suas práti-
cas no exercício profissional, são passos necessários na trajetória
formativa e profissional, dada sua relevância para o desenvolvi-
mento de estudos objetivos e oportunos, que garantam um

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 294

processo contínuo em busca do acesso aos bens culturais, a saúde


e a educação como direito assegurado constitucionalmente, para
todos.
Faz parte hoje, dos planos da Organização das Nações Unidas,
da Organização Mundial da Saúde e do Fórum Internacional de
Educação, informes atualizados, sobre a situação dos conhecimen-
tos relativos a estas áreas, em relação ao ensino superior, em todas
as regiões do mundo, promovendo projetos inovadores de forma-
ção e pesquisa, destinados a valorização da educação cívica e ao
desenvolvimento sustentável para a paz, intensificando inclusive,
os estorços institucionais para pesquisa, para a liberdade acadê-
mica e para o exercício da responsabilidade social.

REFERÊNCIAS

ASINELLI-LUZ, Araci. Educação e cidadania: a formação continuada de profes-


sores e a perspectiva da não-exclusão na escola In: ASSIS, Múcio Camargo de;
ASSIS, Orly Z. Mantovani (orgs.). Educação e cidadania. XXII Encontro Nacio-
nal de Professores do PROEPRE. Campinas: FE, 2005.

BRASIL. Secretaria de Estado de Assistência Social. Projeto Centro Nacional


de Formação Comunitária. Brasília, [1998].

_______. Estatuto da Criança e do Adolescente, Lei Federal n. 8.069/90, de 13


de julho de 1990, dispõe sobre a proteção integral à criança e ao adolescente.
Brasília: Ministério da Justiça, 1995.]

_______. Constituição da República Federativa do Brasil. Promulgada em 5


out. 1988. São Paulo: Atlas, 1999.

BASSEDAS, EULÁLIA et all. Intervenção Educativa e Diagnóstico Psicopeda-


gógico. Porto Alegre. Artmed. 1996.

BECKER F. Educação e Construção do Conhecimento. Porto Alegre. Ar-


tmed.2001.
SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 295

CADERNOS CEDES. n.º 35. Implicações Pedagógicas do Modelo Histórico


Cultural. 2a. ed. Julho/2000.

CARVALHO, Janet M; MACHADO, Mª Cristina G. Imaginário Social e processos


de institucionalização da produção acadêmica científica sobre a questão do
professor in: Revista Estudos. Mestrado em Educação da UCDB. MT. nº 14.
2002.

CIASCA, S.M. & ROSSINI, S.D.R.: Distúrbio de aprendizagem: mudanças ou


não? Correlação de uma década de atendimento. Temas sobre desenvolvi-
mento, 8(48): 11-16, 2000.

COSTA, ANTONIO CARLOS GOMES DA. O Estatuto da criança e do Adolescente


e a política de atenção à infância e à juventude. In: Ciclo de Seminários: discu-
tindo a assistência social no Brasil, 1995.

FRANZOI NAIRA L Entre a Formação e o trabalho trajetória de identidades


profissionais. Porto Alegre. Ed UFRGS.2006.

FREIRE. PAULO. Pedagogia do Oprimido. RJ Paz e Terra.1997

_______________ Pedagogia da Autonomia. Paz e Terra. 2002.

FONSECA, V. Introdução às dificuldades de aprendizagem. 2 ed. Porto Ale-


gre: Artes Médicas, 1995.

JESUS N. Manual de Dificuldades de Aprendizagem. Porto Alegre Artmed.


1998.

GALEANO, E. Revista Memorial da América Latina. n52 2015.

GRÉGOIRE.J. Avaliando as Aprendizagens. Os aportes da Psicologia Cogni-


tiva. Porto Alegre, Artmed. 2000.

GOMEZ E SACRISTAN. Compreender e transformar o ensino. Porto Alegre,


Artmed 2009.

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 296

IPEA - Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada. PNAD, 2007. Disponível em:


<http://www.ipea.gov.br/sites/000/2/comunicado_presidencia/
08_10_07_Pnad_PrimeirasAnalises_N11demografia.pdf>. Acesso em: 15 maio
2008.

MACHADO. N. Epistemologia e Didática. SP: Cortez 1999.

MINAYO, M. C. de S. O desafio do conhecimento. São Paulo: Hucitec, 1993.

NEGRINI.A. Aprendizagem e Desenvolvimento Infantil. RS: Prodil. 1996.

NOGUEROL, A. Aprender na escola. Porto Alegre. Artmed. 1999.

OLIVEIRA. V. F.(org) Imagens de Professor. Ijuí: Ed. Inijui, 2000.

PARANÁ. Conselho Estadual de Defesa da Criança e do Adolescente. Política


de atendimento dos direitos da criança e do adolescente no Estado do Pa-
raná. 3 ed. Curitiba: CEDCA, 2000.

PADILHA.ANNA M.L. Práticas Pedagógicas em Educação Especial. Campinas.


SP. 2001.

PLACCO. VERA (0rg) Psicologia e Educação: revendo contribuições. SP. Educ.


2000.

PRADA. L. Formação Participativa de Docentes em Serviço. Taubaté. Cabral


Editora Universitária.1998.

POZO. J. Aprendizagens e Mestres.Porto Alegre. Artmed,2002.

RICCIO. C Neurological basis of attention déficit hyperactivy disorder. The


Concil for exceptional Children. n.2. 1999.

RODRIGUES, Janine Marta C; Toscano de Brito. Galdino E. Rodrigues Silvestre


Coelho. O Insucesso escolar. João Pessoa. Revista Conceitos. Aduf.

_________. RODRIGUES, Silvestre Coelho. Construindo trilhas refazendo cami-


nhos. João Pessoa: Ed Ideias, 2013.

SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 297

_________. Afetos e desafetos na educação Infantil. Artigo. Creche. UFPB, 2001.

_________. Um estudo sobre a dislexia. UFPB/CE/JP. 2001.

_________. e GAUDENCIO R.(org) Formação docente: coletando textos, discu-


tindo ideias. JP. Ed. Universitária. 2004.

________. Construindo a profissionalização docente. JP. Ed Universitária.


2003.

________. O autista e sua educação. Ed Universitária JP.2005.

_________. Autismo: um estudo psicopedagógico. Rio de Janeiro: Wak ed.


2010.

_________. Fernandes W, Lucena. V (org). Trabalhando as diferenças com os


(des)iguais. João Pessoa: Ed Universitária. .2004.

ROSS. ALAN. Aspectos Psicológicos dos Distúrbios de Aprendizagem da


Leitura e da Escrita. Mac Graw Hill, 1997.

SANTOS, E. A. dos. Criança e adolescente sujeitos de Direito. Revista IBCT.


Disponível em: <http://revista.ibict.br/inclusao/index.php/inclusao/arti-
cle/view/56/78>. Acesso em: 9 jul. 2008.

SAVIANI. Formação de Professores, aspectos históricos. Revista Brasileira de


Educação v.14, 2008.

SOARES Magda. Linguagem e Escola uma perspectiva social SP. Ed. Ática,
2000.

SCHON. D. Educando o profissional reflexivo. Porto Alegre. Artmed. 2002.

SCRIPTORI, CARMEN CAMPOY. Cidadania e escola: alguns pontos de reflexão


sobre os caminhos de uma educação para a cidadania. In: Assis, Mucio Camargo
de; Assis, Orly Z. Mantovani (Orgs). Educação e cidadania. XXII Encontro Na-
cional de Professores do PROEPRE. Campinas: FE, 2005.

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 298

VALLE E ASSUMPÇÃO (org) Aprendizagem, Linguagem e Pensamento. RJ:


WAK Ed.2004.

VERONESE, J. R. P.; RODRIGUES, W. M. A figura da criança e do adolescente


no contexto social: de vítimas a autores de ato infracional. Brasília: ABMP,
2001.

VIGOTSKY, L. S. Formação Social da Mente. SP: Cortez, 2000

SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 299

CAPÍTULO 9
DIFICULDADES PARA A APRENDIZAGEM
OU TRANSTORNOS ESPECÍFICOS
DA APRENDIZAGEM?

Ana Maria Leite Cavalcanti


Geraldo Bezerra Cavalcanti Neto

Nos últimos anos, o avanço dos estudos das Neurociências


permitiu maior entendimento sobre o ato de aprender, incluindo-
se os transtornos da aprendizagem. Tais estudos têm sido funda-
mentais na medida que afastam o preconceito e crenças sobre es-
ses transtornos, conferindo ao sujeito, com algum tipo de trans-
torno de aprendizagem, possibilidades de vivenciar estratégias de
intervenção voltadas para a prevenção e para o tratamento.
Sabemos que o ato de aprender está sediado no sistema
nervoso central-SNC. Trata-se, portanto, de um processo complexo
e dinâmico, no qual ocorrem modificações estruturais e funcionais
permanentes no sistema nervoso, constituindo-se como aprendi-
zagem, ou seja, alterações plásticas - a plasticidade cerebral é a ca-
pacidade que o cérebro tem de se adaptar e de se modificar ao
longo da vida em resposta às experiências – as quais dependem de
adequadas situações internas (condições do corpo, integridade
anátomo funcional e cognitiva) e externas (estímulos ambientais).
O cérebro é formado por 100 bilhões de células conhecidas
como neurônios, células formadas no início da vida embrionária

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 300

responsável pela condução do impulso nervoso do organismo.


Cada neurônio é composto por dendritos, pequenas ramificações
que recebem informações proximais, de corpo celular ou soma e
de axônios, prolongamentos maiores que emitem informações
distais. As informações são repassadas por sinais elétricos e quí-
micos de neurônio a neurônio por meio de pequenos espaços
(fenda sináptica) chamados sinapses.
Sem dúvida, o cérebro se modifica em contato com o meio
durante toda a vida. Isto quer dizer que as constantes interações
com o ambiente causam mudanças anatômicas e funcionais no cé-
rebro e que as conexões entre os neurônios – sinapses – promovem
mudanças dependendo das experiências vivenciadas. A neuroplas-
ticidade, nesse sentido, está intimamente envolvida nos fenôme-
nos adaptativos de aquisição de novos comportamentos aprendi-
dos.
Diante do exposto, a discussão dos dois temas supracitados,
nos parece oportuna, uma vez que ainda existe certa confusão con-
ceitual quanto à aplicação deles, pautada muitas vezes em crenças
sobre o assunto.
A dificuldade em diferenciar dificuldades e transtorno de
aprendizagem parece estar alicerçada no entendimento de que to-
das as dificuldades para a aprendizagem se devem a problemas do
sistema nervoso central.
Nessa perspectiva, um cérebro com estrutura normal, com
condições funcionais e neuroquímicas corretas, não passaria por
dificuldades no que se refere ao processo de aprendizagem. No en-
tanto, os estudos mais recentes sobre o assunto e a prática psico-
pedagógica exercida ao longo dos anos têm mostrado a necessi-
dade de diferenciar esses dois termos, para fins de diagnóstico e
intervenção.
Para fins de classificação, o Manual Diagnóstico e Estatístico
de Transtorno Mentais (DSM-5) e a Classificação Estatística
SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 301

Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde (CID-


10)confirmam a necessidade de diferenciar transtornos da apren-
dizagem das diferentes dificuldades normais que acontecem no
percurso escolar.
Em sua última publicação (2014), o DSM-5 propõe modifi-
cação na terminologia, referindo-se aos Transtornos da Aprendi-
zagem como Transtornos Específicos da Aprendizagem.

DIFICULDADES PARA A APRENDIZAGEM

Dificuldades para a aprendizagem envolvem uma circulari-


dade de causas, que podem prejudicar a capacidade de o aluno
aprender, sendo chamadas dificuldades de percurso, isto é, são di-
ficuldades que poderão ocorrer em qualquer período do processo
escolar. Os fatores envolvidos nas dificuldades para a aprendiza-
gem envolvem três categorias: fatores relacionados com a escola,
coma família e com o próprio aluno.

a) Fatores relacionados com a escola


Os fatores que dizem respeito à escola, visando o bom de-
sempenho do aluno, incluem:
- Estrutura e condições físicas da sala de aula, que se relacionam
às condições do ambiente;
- Condições pedagógicas, que se referem à abordagem pedagó-
gica, à adequação e à disponibilidade do material didático, à oti-
mização do tempo, à cooperação escola-família etc.
- Condições do corpo docente, que envolvem fatores como: moti-
vação, dedicação, qualificação, respeito, renumeração adequada,
jornada de trabalho etc.

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 302

b) Fatores relacionados com a família


Para que o ensino-aprendizagem se realize dentro do espe-
rado, destacamos algumas condições que se relacionam
com a família:
- O valor atribuído pela família à aprendizagem escolar;
- Estimulação, rotina de estudo, hábito de leitura;
- A efetiva participação dos pais na vida escolar;
- A escolaridade dos pais;
- Condições socioeconômicas, etc.

c) Fatores relacionados com o aluno


Os fatores envolvidos nas dificuldades para a aprendiza-
gem, que se relacionam com o aluno, são distintos, inter-
ferem no desempenho escolar e envolvem de modo ge-
ral:
- Problemas físicos em geral (dificuldades sensoriais);
- Doenças crônicas (hipotireoidismo e outras patologias endó-
crinas, anemia, doenças reumáticas, cardiopatias, doenças
imunoalérgicas etc.);
- Problemas psicológicos (ansiedade, baixa autoestima, timi-
dez, insegurança, falta de motivação etc.);
- Problemas neurológicos (epilepsia, paralisia cerebral etc.).
Nessas situações neurológicas, as dificuldades para a aprendi-
zagem não são consideradas causas primárias das dificulda-
des para aprender.

d) Características diagnósticas

Diante do exposto, para avaliar as dificuldades de aprendi-


zagem, o profissional, ao promover a investigação diagnóstica,
deve considerar na investigação fatores orgânicos, fatores psicoló-
gicos, fatores ambientais e acrescentar na investigação dificulda-
des relacionadas à apropriação do conhecimento escolar acumu-
lado.
SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 303

Nesse sentido, ao finalizar a investigação, os resultados de-


verão nomear o tipo de dificuldade encontrada, em uma das se-
guintes categorias: dificuldade natural, evolutiva e, portanto, tran-
sitória, dificuldade secundária a outras patologias ou se se trata de
um transtorno específico da aprendizagem. Esses resultados, mui-
tas vezes, requerem uma visão multidisciplinar, para agir sob as
dificuldades mais urgentes, sejam elas: sensitivo-sensoriais, per-
ceptomotoras, motoras, emocionais e sociais.

TRANSTORNOS ESPECÍFICOS DA APRENDIZAGEM

Os transtornos específicos da aprendizagem ocorrem com


crianças que não conseguem um desempenho escolar compatível
com sua capacidade cognitiva e que não apresentam problemas au-
ditivos, visuais, sensoriais ou psicológicos significativos que pos-
sam explicar tais dificuldades. Esses transtornos não têm relação
com estimulação inadequada e esses comprometimentos no pro-
cesso de aprendizagem escolar não são resultado direto de outros
transtornos, mas podem ocorrer simultaneamente.
Dessa forma, os transtornos específicos do desenvolvi-
mento, relacionados às habilidades escolares, compreendem gru-
pos de transtornos, os quais se manifestam desde os estágios inici-
ais do desenvolvimento, evidenciado pelo atraso e persistentes di-
ficuldades de aquisição de habilidades acadêmicas fundamentais e
compreendem, de acordo com o DSM-5, basicamente três tipos de
transtornos específicos: o transtorno de leitura, o transtorno da
expressão escrita e o transtorno da matemática.

a) O transtorno da leitura
Se traduz por uma dificuldade específica em compreender
a escrita das palavras e com dificuldades para decodificar os

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 304

atributos falados da palavra. Para afirmar que se trata de um trans-


torno específico das habilidades requeridas pela leitura, faz-se ne-
cessário eliminar outras causas, especificando prejuízos na leitura
como:

Precisão na leitura de palavras;


Velocidade ou fluência da leitura;
Compreensão da leitura.

A dislexia é, também, um termo alternativo usado em refe-


rência a um padrão de dificuldades de aprendizagem relacionados
à leitura e às dificuldades de ortografia, que se manifestam pela di-
ficuldade de aprender a correlacionar letras a sons do próprio idi-
oma, ou seja, dificuldade para ler a palavra impressa.

b) O transtorno da expressão escrita


Implica uma inabilidade ou atraso no desenvolvimento da
escrita, com erros restritos à ortografia ou à caligrafia e não está
associado a problemas de ordem sensorial. Nesse transtorno, as di-
ficuldades se expressam:
Na capacidade de compor textos escritos;
Na precisão gramatical e pontuação;
Na clareza na organização da expressão escrita.

c) O Transtorno da matemática
As dificuldades relacionadas à aprendizagem dessa área são
também conhecidas como discalculia e não estão associadas à au-
sência de habilidades matemáticas básicas, e,sim, à forma como a
criança lida com essas habilidades no meio em que se insere.
Nesse transtorno, a aquisição de conceitos e o raciocínio
matemático são afetados, no entanto, a baixa capacidade para lidar
com números e conceitos matemáticos não tem como origem

SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 305

lesões cerebrais ou outra causa orgânica. De modo geral, o prejuízo


na matemática é caracterizado por:
Senso numérico;
Memorização de fatos aritméticos;
Precisão ou fluência de cálculo;
Precisão no raciocínio matemático.

d) Características diagnósticas
O transtorno específico da aprendizagem, de acordo com o
DSM-5, é um transtorno do neurodesenvolvimento com uma ori-
gem biológica que é a base das anormalidades no nível cognitivo,
as quais são associadas com as manifestações comportamentais.
Para classificar um determinado transtorno, é recomendado con-
siderar que:
As dificuldades persistentes para aprender habilidades aca-
dêmicas fundamentais (leitura, expressão escrita e ortografia, cál-
culo aritmético e raciocínio matemático) estão presentes desde os
primeiros anos de escolarização,
- O desempenho nas habilidades acadêmicas afetadas é
abaixo do esperado para uma criança com a mesma idade, nível
mental e de escolaridade;
- As dificuldades de aprendizagem são percebidas desde os
primeiros anos de escolaridade. Entretanto, há casos em que
algumas dificuldades podem se manifestar mais tardiamente,
período em que as demandas de aprendizagem aumentam e
excedem as capacidades individuais limitadas.
- A avaliação cognitiva afasta deficiência intelectual.
- Causas como dificuldades de percurso ou secundárias fo-
ram afastadas.
- Existe na família história de antecedentes com dificuldade
de aprendizagem.

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 306

A avaliação diagnóstica para o transtorno específico da


aprendizagem deverá ser abrangente, envolvendo profissionais
especializados nesse campo de atuação e em avaliação psicoló-
gica/cognitiva.

CONSIDERAÇÕES

É importante pontuar que o transtorno específico da apren-


dizagem é uma dificuldade vitalícia, porém, sintomas que estão
presentes em um ponto do desenvolvimento não estarão necessa-
riamente evidentes em outro, sendo, não raro, determinados défi-
cits serem compensados com o passar do tempo. Tais modificações
têm, como premissa, a plasticidade cerebral, reorganização da es-
trutura neural do indivíduo que se modifica ao longo da vida e se
transforma em alicerce facilitadores para novas estruturas cogni-
tivas.
A reflexão sobre as dificuldades de aprendizagem, aqui ci-
tadas, indicam, como foi descrito, em dificuldades cognitivas, com
etiologia multifatorial, que prejudicam o desempenho funcional do
indivíduo, desempenho responsável por respostas inadequadas na
vida familiar, escolar e social.
Por fim, destacamos que os estudos da neurociência trazem
hoje, importantes contribuições para a prática educativa, no sen-
tido de elucidar as dúvidas de como o cérebro aprende, ou seja,
como se dá o processo de aprender e desfazer crenças em relação
a estruturas cognitivas cristalizadas no sujeito.

REFERÊNCIAS

AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION: Manual diagnóstico e estatístico


de Transtornos mentais: DSM-5, 5, ed. Porto Alegre: Artmed, 2014.

SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 307

BORUCHOVITCH, Evely; BZUNECK, José Aloyseo (Org.). A motivação do


aluno: contribuições da psicologia contemporânea. 4. ed. Petrópolis, RJ:
Vozes, 2019.

COSENZA, Ramon M. Neurociência e educação: como o cérebro aprende.


Porto Alegre: Artmed. 2011.

FUENTES Daniel, [et al]. Neuropsicologia: Teoria e Prática. Porto Alegre: Ar-
tmed, 2008.

DUCKWORTH, Angela. Garra. O poder da força e da perseverança. Tradução


de Donaldson M. Garschagen e Renata Guerra. Rio de Janeiro: Intrínseca, 2016.

PESSOA, Rockson Costa. Como o cérebro aprende? São Paulo: Vetor, 2018.

ROTTA, Newra Tellechea; César Augusto; Bridi Filho, Fabiane Romano de


Souza Bridi. (Org.). Neurologia e aprendizagem: abordagem multidisciplinar.
Porto Alegre: Artmed, 2016.

SÁNCHEZ-CANO, Manoel; BONALS, Joan. Avaliação psicopedagógica (Org.).


Porto Alegre: Artmed, 2008.

STERNBERG, R. Psicologia Cognitiva. Porto Alegre: Artes Médicas, 2000.

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 308

CAPÍTULO 10
CONTRIBUIÇÕES DA LITERATURA INFANTIL
PARA O PROCESSO DE INCLUSÃO ESCOLAR

Maria Arlyz Ferreira Domingos


Martha Milene Fontenelle Carvalho
Francileide Batista de Almeida Vieira

INTRODUÇÃO

O desenvolvimento da nossa sociedade em relação à ampli-


ação do acesso a diferentes formas de escrita fez com que a litera-
tura Infantil ganhasse grande destaque e, assim, com o passar do
tempo, ela vem se tornando um instrumento de grande importân-
cia para a formação e desenvolvimento das crianças. De acordo
com Coelho (2010), a literatura infantil é um recurso que impacta
no desenvolvimento das crianças porque a leitura de histórias traz
muita influência para todos os aspectos da constituição humana,
tais como a afetividade, a sensibilidade e a cognição, além de con-
tribuir para a formação de valores a atitudes.
No campo da educação, há o reconhecimento de que a lite-
ratura infantil é parte inseparável da cultura de um povo, reve-
lando seus modos de viver, despertando o interesse das crianças
pela leitura e formando pessoas de modo integral. Dessa forma, ela
pode ser considerada como instrumento pedagógico valioso no
processo de construção e desenvolvimento dos conhecimentos ati-
tudinais e conceituais. Quando o professor oportuniza o contato
SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 309

dos seus alunos com a literatura, geralmente, consegue promover


desejo, curiosidade e prazer, pois oportuniza a criança experimen-
tar descobertas e encantos através de sua imaginação criadora,
que é inerente à literatura.
Reconhecendo a relevância da literatura na formação de to-
das as pessoas, focamos a discussão deste trabalho na relação en-
tre ela e os processos de inclusão escolar. Assim, o presente traba-
lho tem por objetivo compreender como a literatura infantil pode
contribuir para o processo de inclusão escolar envolvendo pessoas
com deficiências ou com outras necessidades educacionais especi-
ais. Esperamos que a leitura deste texto promova reflexões profí-
cuas, contribuindo para a formação docente, especialmente daque-
les que atuam na perspectiva da educação inclusiva.
Assim, os objetivos norteadores da pesquisa que culminou
neste trabalho foram apresentar uma breve abordagem sobre a li-
teratura infantil, apresentando elementos históricos e conceituais;
discutir aspectos relativos à inclusão escolar de alunos/as com de-
ficiência e analisar a contribuição da literatura infantil para o pro-
cesso de inclusão escolar.
O despertar pelo tema surgiu por motivações políticas e
profissionais. No que concerne à primeira, foi a necessidade de
pautar a temática central do artigo nas práticas cotidianas das au-
toras, pois em cada espaço de atuação que ocupam, sentem o com-
promisso profissional de contribuir para consolidar práticas peda-
gógicas que favoreçam a inclusão de pessoas com deficiência ou
com outras necessidades especiais, historicamente excluídas pela
sociedade.
O trabalho realizado é de natureza qualitativa, pois é uma
abordagem de investigação científica que foca no caráter subjetivo
do objeto analisado. A pesquisa também apresenta características

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 310

de uma pesquisa bibliográfica a qual segundo Severino (2007, p.


122),

[...] é aquela que se realiza a partir do registro disponível, decor-


rente de pesquisas anteriores, em documentos impressos, como li-
vros, artigos, teses etc. Utiliza-se de dados ou de categorias teóri-
cas já trabalhados por outros pesquisadores e devidamente regis-
trados. Os textos tornam-se fontes dos temas a serem pesquisados.
O pesquisador trabalha a partir das contribuições dos autores dos
estudos analíticos constantes dos textos.

Para embasar esse tema do artigo, estivemos pautadas em


discussões teóricas de autores/as que apresentam uma reflexão
acerca da temática escolhida, que foram respectivamente: Vieira
(2015), Barros (2013), Frias (2008), entre outros/as autores/as.
O presente capítulo encontra-se organizado em três eixos.
Inicialmente, tratamos da literatura de forma geral, citando o con-
ceito de literatura infantil e de que forma ela surgiu, destacando
alguns aspectos da sua trajetória, onde apresentamos de que forma
a literatura foi inserida na sociedade. O segundo tópico fala da im-
portância da inclusão escolar de alunos com deficiência e como a
escola se faz presente nessa inclusão, como profissionais da edu-
cação devem agir em sociedade para promover a inclusão de alu-
nos/as com deficiência. O terceiro eixo de discussão aborda a con-
tribuição da literatura infantil no processo de inclusão escolar e
nele apresenta-se de que forma a literatura deve ser usada em prol
da inclusão, apontando métodos já utilizados e razões pelas quais
é importante o trabalho com a literatura para as crianças com de-
ficiência.

SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 311

AFINAL, O QUE É LITERATURA INFANTIL

Consideramos que compreender a literatura, é conhecer so-


bre possibilidades de aprendizagem e conhecimento, é aprender
sobre o fantasioso, a capacidade criadora, sobre a vida.

A literatura infantil é, antes de tudo, literatura; ou melhor, é arte:


fenômeno de criatividade que representa o mundo, o homem, a
vida, através da palavra. Funde sonhos e a vida prática, o imaginá-
rio e o real, os ideais e sua possível/impossível realização (COE-
LHO, 2000, p. 26).

A literatura infantil é uma ferramenta que pode ser capaz


de trabalhar a interação e contribuir para o desenvolvimento da
criança. Os livros apresentam um caráter formador e por esse en-
sejo torna-se de extrema importância o contato de cada criança
com obras literárias.
A literatura para a infância torna-se, portanto, um mundo
de possibilidades e conhecimento. Contudo, essa compreensão so-
bre a relevância das obras literárias nem sempre existiu e a sua
construção passou por diferentes momentos na história. Ao longo
de uma revisão bibliográfica, retomando trajetórias, percebemos
que nem sempre foi possível visualizar uma preocupação em aten-
der às exigências e expectativas da infância nos livros de literatura
infantil. Segundo Barros (2013), a literatura infantil surge como
um meio de educar as crianças e até hoje é utilizada para esse pro-
pósito:

A Literatura Infantil surge no século XVIII juntamente com a preo-


cupação com a infância até então esquecida. Surge com o intuito de
formar moral e socialmente as crianças. Essa visão prorrogou-se
por muitos anos e ainda hoje a literatura é utilizada como meio de
transmitir valores às crianças (BARROS, 2013, p.11).

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 312

A literatura infantil surgiu por volta do século XVII, com his-


tórias que só posteriormente viriam a se tornar literatura apropri-
ada para crianças, como as fábulas de La Fontaine (1668), e Os
Contos da Mamãe Gansa. Na França e Inglaterra, os contos de fadas
se expandiram e, em 1812, os irmãos Grimm publicam, com adap-
tações, a coleção de contos de fadas. Ainda estiveram presentes, as
histórias nas quais havia animais, e que sendo engraçadas, acaba-
ram se tornando sinônimo de literatura infantil.

A história da literatura infantil tem relativamente poucos capítu-


los. Começa a delinear-se no início do século XVIII, quando a cri-
ança passa a ser considerada um ser diferente do adulto, com ne-
cessidades e características próprias, pelo que deveria distanciar-
se da vida dos mais velhos e receber uma educação especial, que a
preparasse para a vida adulta (CUNHA, 1987, p. 19).

O termo literatura infantil não era utilizado, pois não havia


a preocupação com livros direcionados para crianças. Elas eram
vistas como se fossem adultos em miniatura e isso fazia com que a
literatura destinada às crianças e aos adultos fossem a mesma.
Para Vieira (2015 apud SILVA e GUIMARÃES, 2012):

As histórias, e os contos populares são incertos. Por fazerem parte


de uma tradição oral, os contos eram constantemente manipula-
dos e alterados de acordo com cada narrador, fato que torna difícil
a tarefa de pensar em “versões originais” dos contos de fada (p.15).

O século XIX foi um período de profundas mudanças na so-


ciedade brasileira. Com a abolição da escravatura e o fim da mo-
narquia surgem as novas relações de produção, com o sistema ca-
pital-trabalho, sendo nesse momento que começou a crescer, no
Brasil, a necessidade de uma literatura nacional para as crianças.
Assim, os primeiros livros direcionados às crianças ocorreram no
âmbito escolar, pois o conceito de educação estava vinculado à
SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 313

literatura. Segundo Cunha (1987), como não poderia deixar de ser,


a literatura infantil tem início com obras pedagógicas e, sobretudo,
adaptadas de produções portuguesas, demonstrando a dependên-
cia típica das colônias.
Nesse momento, a literatura infantil surgirá com Monteiro
Lobato, por volta do século XX, com a “Turma do Sítio do Pica-Pau
Amarelo”, obra que era totalmente voltada para o público infantil,
diferente daquelas dos séculos anteriores onde adaptavam histó-
rias, consideradas, hoje, de teor adulto, para que as crianças tives-
sem acesso à leitura. Atualmente, as histórias de Monteiro Lobato
são criticadas pelo cunho racista, mas naquela época, eram refe-
rência em Literatura Infantil.
Segundo o site Geledés, constata-se que Monteiro Lobato
dedicava-se à produção de obras de ficção, mas também era um
grande entusiasta da eugenia, conforme ocorria com muitos sani-
taristas e outras personalidades contemporâneas do referido au-
tor. Assim, ele mantinha uma íntima relação com Renato Kehl, tido
como o pai da eugenia no Brasil.
Nos anos de 1970, a literatura volta a se preocupar com o
desenvolvimento intelectual e cultural da criança o que acarretou
um aumento na produção e edição de livros infantis. Na sescolas, a
literatura se apresentará com características pedagógicas, com o
intuito de formar e instruir as crianças. Como é possível notar no
excerto, os “[...] laços entre a literatura e a escola surgem com ca-
racterísticas pedagógicas, por meio dos quais a literatura tem a fi-
nalidade de instruir e formar o caráter da criança, ainda hoje em
muitas instituições de ensino essa visão se perpetua” (BARROS,
p.11).
Apesar das histórias infantis surgirem também como meio
de educar as crianças, observa-se que, em algumas dessas histó-
rias, há conteúdos nos quais meninas devem obedecer e esperar

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 314

por parceiros a fim de serem felizes para sempre, crianças brancas


e princesas, histórias como as da Cinderela, Rapunzel e Branca de
Neve, nas quais as meninas deviam se inspirar. Histórias que não
contemplam todas as crianças e até mesmo cria um padrão no qual
a criança tenta se encaixar. O mesmo acontece com crianças com
deficiência que, por muito tempo, foram excluídas da sociedade,
inclusive em espaços geradores de imaginação, como as histórias
infantis.
Barros (2013) diz que, a “[...] Literatura Infantil surge com
caráter pedagógico, ao transmitir valores e normas da sociedade
com a finalidade de instruir e de formar o caráter da criança, uma
formação humanística, cívica, espiritual, ética e intelectual”(p.17).
Por esse motivo, é importante a representação da criança que te-
nha alguma deficiência no livro, para que ela possa, cada vez mais,
se sentir parte integrante da sociedade.
Souza apud Zilberman (1982, p.15) afirma que, a literatura
infantil é “um gênero incompreensível sem a presença de seu des-
tinatário [...] não pôde surgir antes da infância”. Os conceitos de in-
fância e os cuidados com elas evoluíram de acordo com o tempo e
com a sociedade, por isso a literatura infantil só será considerada
a partir do momento em que surge o conceito de infância e de cri-
ança.

Esta faixa etária não era percebida como um tempo diferente, nem
o mundo da criança como um espaço separado. Pequenos e gran-
des compartilhavam dos mesmos eventos, porém nenhum laço
amoroso especial os aproximava. A nova valorização da infância
gerou maior união familiar, mas igualmente os meios de controle
do desenvolvimento intelectual da criança e a manipulação de suas
emoções. Literatura infantil e escola, inventada a primeira e refor-
mada a segunda, são convocadas para cumprir essa missão (ZIL-
BERMAN, 1982, p. 15).

SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 315

A leitura aliada às práticas educativas ajuda a criança no de-


senvolvimento intelectual, da percepção de mundo além do desen-
volvimento moral, pois trarão resoluções de conflitos e maneiras
de conviver em sociedade. A forma como as histórias infantis são
retratadas é importante para a formação de um leitor/a crítico,
cuja temática deve servir como suporte para que a criança inter-
prete a história a sua maneira. Souza apud Moretti (2009, p. 50)
diz que:

Os contos de fadas, ao serem aliados com a prática educativa, con-


tribuem em muito com o desenvolvimento moral, pois os mesmos
trazem resoluções de conflitos que as crianças podem projetar in-
conscientemente com seus próprios conflitos internos, e conforme
elas procuram a solução, se tornam capazes de produzir opiniões,
justificativas e julgamento do bem e do mal, certo e errado.

Nesse sentido, entende-se que é necessária a literatura in-


fantil para crianças com deficiência, não só pela inclusão que se faz
obrigatória, mas também a necessidade de educar a criança atra-
vés dos exemplos seguidos por histórias repletas de modelo de
moral e ética.

Sabemos da grande importância que a literatura infantil tem na


vida da criança e da influência que ela exerce em seu desenvolvi-
mento cognitivo e emocional. Na maioria das vezes é na escola que
a criança tem seu primeiro contato com este tipo de leitura e de-
pendendo da forma com que seja apresentada, pode-se descorti-
nar um mundo de magia e encantamento, fazendo com que ela se
apaixone pelos livros e cresça um adulto leitor, cheio de imagina-
ção e criatividade (LIMA, 2016, p.4).

Também é importante a representação das crianças com


deficiência para que, ao ler e ao aprender o conceito de bem/mal e
certo/errado, aprendam que a diversidade se faz presente na

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 316

sociedade e que é crucial o respeito ao próximo.Nesse sentido,


Souza apud Conde(1996) ainda diz que acredita que o conteúdo
das histórias de contos de fadas exerce grande fascínio sobre os
leitores iniciantes porque a natureza da criança é eminentemente
imaginativa, e a relação que é estabelecida pelas crianças com a
história supera a lógica adulta, sendo assim, a temática vem ao en-
contro das expectativas e sonhos delas.
A representação de personagens com deficiência começa a
se fazer presentes nesse espaço do mundo literário, podendo, ou
não,colaborar com a transmissão de valores e compreensão da di-
versidade. A atenção está nesse momento para como foram e ainda
são representados nos livros de literatura infantil. Por este motivo,
torna-se fundamental observar se os livros literários contemplam
em suas propostas o respeito às diferenças e às singularidades, tão
necessárias ao fazer inclusivo.
Assim, compreender obras que considerem personagens
com deficiência para apreciação e leitura da criança, dentro ou fora
do espaço escolar, é pensar na literatura para transformação, e
permitir a compreensão da diversidade humana, nesse sentido,

Acreditar em uma literatura em prol da pessoa com qualquer outro


tipo de deficiência é o mesmo que acreditar e defender uma litera-
tura que transforme. Principalmente na literatura infantojuvenil, a
qual possa ajudar as crianças a entenderem a complexidade e as
diversidades humanas (FIGUEIRA, 2017, p.139).

Nesse contexto, a literatura infantil age também para com-


preensão das particularidades de cada ser, para a construção de
um senso crítico e tolerância frente às diferenças tão presente em
nosso cotidiano, podendo transpor barreiras e até quebrar precon-
ceito. Conforme Mallmann (2011, p.14), “[...] a literatura infantil é
um recurso fundamental e significativo, para a formação do sujeito,
de um leitor crítico e ainda pode desenvolver os valores morais”.
SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 317

Assim, a literatura infantil deve ser trabalhada a fim de en-


sinar não somente bons modos, mas acima de tudo valores huma-
nos e culturais, como respeito ao próximo, bem como desenvolvi-
mento da criatividade, das formas humanas de reflexão sobre a
vida e desconstrução de conceitos e estereótipos que se criaram a
respeito de pessoas com deficiência. Segundo Lima:

A literatura infantil vem se destacando como uma forma eficaz de


debater a inclusão, pois durante o processo imaginativo, a criança
tem a oportunidade de criar de forma prazerosa e de experimentar
sensações e sentimentos que revelam sua visão sobre o mundo, so-
bre as pessoas e sobre suas atitudes (2016, p.3).

Debater sobre a inclusão vai além de adaptar a escola para


receber um/a aluno/a, pois deve haver um engajamento de to-
dos/as para que possa garantir a estadia e permanência da criança
com deficiência na escola com reais condições de aprendizagem e
de desenvolvimento. Sobre esse tema iremos abordar de forma
mais específica no próximo tópico, onde explanaremos sobre a in-
clusão escolar.

A INCLUSÃO ESCOLAR DE ALUNOS/AS COM DEFICIÊNCIA

Durante o século XX, houve uma crescente defesa de que a


escola tem a tarefa de atender a todas as pessoas. Além da meta de
atingir a escolarização de crianças das classes populares, jovens e
adultos que não foram incluídos nesse processo durante a infância,
passa a ser defendida a meta de atender a todas as crianças, inclu-
sive àquelas que apresentam algum tipo de deficiência ou de des-
vantagem de caráter social, intelectual ou de outra natureza. Os
alunos da educação especial também passam a ser considerados

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 318

como público das classes de ensino regular, o que constitui um


grande desafio para os educadores.
Nesse contexto, a educação inclusiva apresenta-se como
uma perspectiva educacional que exige uma mudança de para-
digma, desafiando a escola a oferecer respostas educativas ade-
quadas às necessidades de todos os alunos (MANTOAN, 2006;
MARTINS, 2008), possibilitando-lhes aprendizagem e desenvolvi-
mento, que constitui o papel da educação escolar, mas que não tem
se efetivado na realidade brasileira.
A matrícula desses alunos nas escolas regulares indica que
está ocorrendo acesso, mas isso não é condição suficiente para a
inclusão, pois, além da presença física, é necessário que todos os
alunos sejam atendidos em suas necessidades e possam aprender
e se desenvolver na escola. Nesse sentido, Figueiredo (2002, p. 68)
afirma que “[...] a inclusão significa um avanço educacional com im-
portantes repercussões políticas e sociais, visto que não se trata de
adequar, mas de transformar a realidade das práticas educacio-
nais”.
A importância da inclusão de alunos/as com deficiência
está relacionada com o desenvolvimento e efetivação de ações que
promovam uma educação para todos, com recursos e estratégias
necessárias que atendam às necessidades específicas de cada edu-
cando, opondo à integração, na qual os/as alunos/as devem se
adaptar às condições que a escola lhes oferece. Segundo Lima
(2016, p.6):

A escola precisa, sobretudo, ter uma equipe unida, que fale a


mesma língua e projete formas de diminuir a distância existente
entre o espaço escolar e a educação inclusiva. O conhecimento so-
bre a temática deve ser aprofundado, e o respeito às diferenças
deve ser constante, presente em nossos discursos, mas principal-
mente em nossa prática.

SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 319

Torna-se necessário nesse processo criar pontes para que


essas pessoas sejam cotidianamente inseridas em espaços que ten-
tam privá-las de acesso, entendendo que a educação é um direito
social de todos/as e, assim, proporcionar condições equânimes
para o desenvolvimento e aprendizagem dessas pessoas. A inclu-
são acaba por ser humanística e democrática e rompe com o mo-
delo padrão de ensino, pois garante que toda criança deve ter aten-
dimento escolar que reconheça e valorize a diversidade de cada in-
divíduo dentro da sociedade.

Para que a igualdade seja real, ela tem que ser relativa. Isto signi-
fica que as pessoas são diferentes, têm necessidades diversas e o
cumprimento da lei exige que a elas sejam garantidas as condições
apropriadas de atendimento às peculiaridades individuais, de
forma que todos possam usufruir as oportunidades existentes. Há
que se enfatizar aqui, que tratamento diferenciado não se refere à
instituição de privilégios, e sim, a disponibilização das condições
exigidas, na garantia da igualdade (ARANHA, 2004, p.9).

Não podemos desconsiderar as dificuldades provenientes


de uma sociedade que constantemente exclui pessoas que apre-
sentam alguma necessidade. No entanto, não pode haver isenção
no processo inclusivo, todos/as podem/devem participar de al-
guma maneira. Na perspectiva da educação inclusiva, a escola
consciente de sua função, coloca-se à disposição do/a aluno/a se
fazendo um espaço de inclusão.
O fato de uma escola receber muitos/as alunos/as com de-
ficiência não a torna inclusiva. É necessário haver um novo olhar
sobre as práticas e posturas desenvolvidas na escola, pois,para que
seja possível a inclusão de alunos/as com deficiência na escola,
todo o núcleo escolar tem que estar preparado e engajado, bus-
cando conviver integrando e garantindo os direitos e deveres da

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 320

pessoa com deficiência, fortalecendo a permanência do/a aluno/a


na vida escolar.
Por muito tempo, a pessoa com deficiência esteve à margem
da sociedade, da proposta de inclusão no ensino regular, rece-
bendo apenas uma assistência em escolas ou classes especializa-
das, segregadas. De acordo com Frias (2008, p.9) “sendo a escola,
o espaço primeiro e fundamental da manifestação da diversidade,
decorre a necessidade de repensar e defender a escolarização
como princípio inclusivo, reconhecendo a possibilidade e o direito
de todos que não são por ela alcançados”.
Desde a promulgação da Constituição Federal de 1988, há
uma preocupação com a garantia legalmente instituída em relação
ao direito de pessoas com deficiência, inclusive à educação. De
acordo com o art. 208, inciso III, da Constituição Federal, bem
como no art. 54, inciso III do Estatuto da Criança e do Adolescente
– ECAé dever do Estado garantir um atendimento especializado, de
forma que venha auxiliar no processo de desenvolvimento desse
educando.
Uma criança com deficiência tem o direito de cursar o en-
sino comum como qualquer outra criança, sendo obrigação do Es-
tado garantir esse direito, bem como garantir suporte especiali-
zado, através da adaptação necessária e atendimento direcionado
para suas necessidades.

[...] com o objetivo de trabalhar a literatura inclusiva, o professor


deve estar bem formado e informado sobre termos, nomenclaturas
e situações que façam parte do cotidiano da pessoa com deficiên-
cia, para que não seja ele um multiplicador de ações indiretamente
excludentes. Deve proporcionar uma diversidade textual de modo
que a literatura voltada para inclusão também faça parte dessa di-
versidade, contribuindo assim para que o aluno com deficiência se
identifique com a leitura e para que seus colegas o reconheçam en-
quanto ser social e apto a partilhar de todos os momentos de de-
senvolvimento e aprendizagem(LIMA, 2016, p.6).
SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 321

É dever dos/as professores/as elaborar atividades inclusi-


vas fazendo com que a criança não se sinta excluída da turma. Tra-
tar a criança com indiferença ou desigualdade pode gerar cons-
trangimento, fazendo com que não dê continuidade à vida escolar.
O respeito mútuo e a empatia também devem ser pautados em sala
de aula, pois com essas atitudes as crianças conseguirão enxergar
o/a colega como sujeitos autônomos.
O plano de aula dos/as professores/as deve abranger, de
forma equânime, todas as pessoas que estão participando da aula,
fazendo com que os/as que não são deficientes também possam
aprender a conviver e respeitar a diversidade do/a colega. Se-
gundo Aranha (2004),

A identidade pessoal é construída na trama das relações sociais


que permeiam sua existência cotidiana. Assim, há que se esforçar
para que as relações entre os indivíduos se caracterizem por atitu-
des de respeito mútuo, representadas pela valorização de cada
pessoa em sua singularidade, ou seja, nas características que a
constituem (ARANHA, 2004, p.9).

A inclusão escolar também se faz necessária para que a pes-


soa com deficiência se sinta parte da sociedade e tenha visibili-
dade, reparando os silenciamentos que passaram durante a histó-
ria. Além disso, a escola será o principal espaço de convívio com
outras pessoas, fazendo com que a pessoa com deficiência aprenda
a ter autonomia e desenvolva habilidades bem próximas as das ou-
tras crianças. Deve-se dá possibilidades iguais a todos/as, desen-
volvendo seus potenciais com estratégias específicas a cada um/a.
Segundo Frias (2008),

Na educação inclusiva, uma escola deve se preparar para enfrentar


o desafio de oferecer uma educação com qualidade para todos os

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 322

seus alunos. Considerando que, cada aluno numa escola, apresenta


características próprias e um conjunto de valores e informações
que os tornam únicos e especiais, constituindo uma diversidade de
interesses e ritmos de aprendizagem, o desafio da escola hoje é tra-
balhar com essa diversidade na tentativa de construir um novo
conceito do processo ensino e aprendizagem, eliminando definiti-
vamente o seu caráter segregacionista, de modo que sejam incluí-
dos neste processo todos que dele, por direito, são sujeitos (FRIAS,
2008, p.10).

Uma escola que efetiva, em suas ações, propostas de inclu-


são escolar estará auxiliando no processo de desenvolvimento dos
seus educandos com deficiência. Para isso, torna-se necessária a
preparação dos profissionais de ensino, através de capacitação da
área, estratégias de ensino que promovam o desenvolvimento de
todos os educandos e não apenas uma parcela. Com essas ações,
poderemos visualizar melhores caminhos para pessoa com defici-
ência, que poderá dar continuidade aos estudos, incluindo-o/a no
ensino superior, bem como estar inserindo-o/a no ambiente de
trabalho e na sociedade.
Dentro das estratégias necessárias de ensino que podem ser
desenvolvidas nas escolas que recebem todos os alunos, incluindo
aqueles que apresentem alguma especificidade como é o caso do
aluno com deficiência, estão os trabalhos relacionados com a lei-
tura de textos e contos, auxiliando-os/as a despertar o senso crí-
tico e promovendo o desenvolvimento cognitivo e social. Sobre es-
sas questões iremos abordar no tópico a seguir.

CONTRIBUIÇÃO DA LITERATURA INFANTIL PARA O PRO-


CESSO DE INCLUSÃO ESCOLAR

A contribuição da literatura infantil como ferramenta que


ajuda no desenvolvimento da pessoa com ou sem deficiência, se dá
das mais diversas formas e caminhos, podendo contribuir de forma
SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 323

significativa para o processo. Para que isso ocorra, algumas ques-


tões devem ser destacadas, tais como a possibilidade de disponibi-
lização dos livros de forma acessível, atendendo às especificidades
de cada educando.
A leitura será responsável por oferecer um universo de ima-
ginação para a criança. Para que toda criança tenha acesso a esse
universo e para que seja feito um bom trabalho com uso da litera-
tura há de haver a adequação de materiais, bem como livros e es-
paços físicos, para que os/as professores/as os usem na aula de
forma interativa e inclusiva. “As crianças realizam sua leitura de
mundo através do que veem e das histórias que os adultos contam.
Assim, elas precisam ser estimuladas com histórias prazerosas que
lhes permitem compreender melhor o mundo” (VIEIRA, 2015,
p.16).
A literatura também é humanizadora e ajuda a criança a de-
senvolver sua sensibilidade, bem como aprender a analisar os fa-
tos que ocorrem em seu contexto de vida. Vieira apud Zardo
(2004) afirma que a “[...] literatura possui uma função social de fa-
cilitadora da compreensão humana, possui uma função libertadora
e que promove uma prática sociocognitiva, além de ser uma repre-
sentação social que ajuda a superar conflitos”.
Quando falamos em literatura infantil, remetemos a pensar
em como os alunos com deficiência terão acesso à leitura dos tex-
tos. Nessa perspectiva, torna-se necessário realizar uma adaptação
para que a leitura possa chegar até eles. A literatura é conveniente
para o ensino de qualquer crianças e esse processo de adaptação
só vem a somar na vida escolar daquelas que antes eram segrega-
das. “Embora a literatura inclusiva ainda seja escassa, os professo-
res podem explorar a imaginação da criança, proporcionando pos-
sibilidades para a produção de histórias personalizadas que tra-
tem de problemas reais vividos por eles” (LIMA, 2016, p.5).

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 324

Pensar em adaptação de livros de literatura é pensar em di-


versas possibilidades. Nesse sentido, podemos dizer que se tornam
necessários livros em Braille. Para realização desse processo é pos-
sível a utilização de impressoras em Braille, que tem a possibili-
dade de fazer a adaptação dos textos em Braille, do texto que está
contido nos livros, além de, dependendo da impressora, fazer a
adaptação inclusive dos desenhos que, muitas vezes, estão presen-
tes nos livros de literatura infantil.
Na imagem abaixo, nota-se a adaptação do livro Peter Pan
ao sistema Braille. Este trabalho foi realizado na Universidade Re-
gional do Cariri - URCA, na disciplina de Braille, que tem como mi-
nistrante a professora Me. Martha Milena. Na ocasião, as duplas fi-
zeram a adaptação de livros infantis para o Braille, usando a pun-
ção e a reglete, que é um dos primeiros instrumentos criados para
a escrita Braille. Ela foi adaptada do próprio criador deste alfabeto,
Louis Braille.
Adaptações como essa são cruciais para que haja um bom
trabalho com crianças com deficiência. Na sala de aula o/a profes-
sor/a pode utilizar livros com histórias resumidas e fazer um tra-
balho manual, no qual as crianças também podem aprender o
Braille. Com essas atitudes, o que poderia ser visto como diferença
ou incapacidade será vista como diversidade, o que não impossibi-
lita o desenvolvimento das crianças. Esse é um exemplo de adap-
tação realizada para atender a alunos cegos, mas outras diferentes
adaptações podem ser realizadas visando a inclusão de crianças
com outras necessidades nas atividades inerentes ao trabalho com
a literatura infantil nas escolas.

SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 325

Imagem 1: Adaptação do Livro Peter Pan para o Braille

Fonte: Arquivo pessoal de uma das autoras (2018)

Outra possibilidade de adaptação dos livros está na produ-


ção de áudio livros que são de suma importância para pessoas com
deficiência visual, para que essas pessoas tenham acesso a obras
literárias, entre outros textos de sua preferência, além de ser uma
opção para as pessoas que não estão adaptadas a ler por meio do
Braille.

Podemos afirmar que as pessoas com deficiência visual não têm


canais sensoriais privilegiados, apenas utilizam esses sentidos
conforme a necessidade. Podemos citar como exemplo o sentido
da audição, pois o mesmo não é utilizado apenas para a comunica-
ção verbal, mas também para a identificação de objetos e pessoas,
não esquecendo aqui do papel importantíssimo da audição para a
aprendizagem das pessoas cegas [...]. Podemos constatar que há
uma carência no acesso desse tipo de recurso para os alunos que
buscam se apropriar de informações nas diversas áreas do conhe-
cimento. O audiolivro vem suprir essa necessidade, pois, aproxima

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 326

a literatura dos deficientes visuais para serem agentes de transfor-


mação na sociedade(BEZERRA, 2015, p.76).

É possível verificar a existência de livros adaptados tam-


bém para a Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS). Em alguns livros
é possível visualizar a imagem dos sinais, além de conter um DVD
com a narrativa da história em Libras. Pode-se observar, na ima-
gem abaixo, um bom exemplo desse tipo de adaptação, que con-
siste no livro Cinderela Surda, obra que é resultado da pesquisa de-
senvolvida por Lodenir Becker Karnopp, Caroline Hessel e Fabiano
Rosa.

Imagem 2: Livro que retrata Cinderela Surda

SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 327

Fonte: Cinderela Surda: Marcas da Cultura Surda


(MARTINS, 2007, p.14).

Quando defendemos a realização de adequações para pos-


sibilitar uma real inclusão de todos os estudantes, pensamos em
diferentes frentes de atuação, desde aquelas mais relacionadas à
estrutura da escola até aquelas de menor porte, que ocorrem nas
salas de aula e podem ser realizadas pelo professor. De acordo com
Bezerra (2015, p.76),

Disponibilizar audiolivros nas bibliotecas de todo o Brasil é mais


do que uma obrigatoriedade, é tornar possível a leitura para as
pessoas com deficiência visual, oportunizando aos mesmos a liber-
dade de escolher as obras que eles querem ter acesso, por isso é
importante que haja mais investimentos nesse formato de livro,
por parte do governo federal e das organizações não governamen-
tais.

Dessa forma, a literatura estará mais acessível às pessoas


com deficiências e também ajudará em seu desenvolvimento, aju-
dando-os a exprimir sentimentos, como forma de enriquecer a cul-
tura e como forma de conhecer o mundo. Outra importante

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 328

contribuição é a seleção e utilização da literatura infantil que tenha


a representação de personagens com algumas deficiências. Consi-
deramos que a presença destes personagens poderá oportunizar
um processo de compreensão e aceitação da diversidade, a uma
perspectiva de inclusão e combate ao preconceito, tão necessário
e emergente acerca das diferenças e desigualdades, além de favo-
recer para as crianças capacidades de leitura e escrita, além do in-
centivo à imaginação e à criatividade.
Neste sentido, consideramos oportuna a inclusão de obras
que contemplem personagens com deficiência para apreciação e
leitura dentro e fora do espaço escolar como forma de contribuir
para a transformação e para possibilitar a compreensão da diver-
sidade humana. Nesse sentido, Figueira (2017, p.139) menciona
que:

Acreditar em uma literatura em prol da pessoa com qualquer outro


tipo de deficiência é o mesmo que acreditar e defender uma litera-
tura que transforme. Principalmente na literatura infantojuvenil, a
qual possa ajudar as crianças a entenderem a complexidade e as
diversidades humanas.

Assim, é preciso acreditar e defender essa literatura como


forma de ajudar para um processo tão necessário de transforma-
ção e de combate à descriminação. Contudo, para muitas crianças,
a escola é o único espaço que lhe oferece a vivência da leitura, além
de despertar o gosto pela leitura, que tornará a criança uma pessoa
crítica, desenvolvendo também a atenção e a concentração.
Segundo Vieira (2015, p.12), “ao professor cabe a ação de
acolher, educar, incluir com o compromisso de que está formando
cidadão do futuro, independente da forma e conteúdo aplicados”.
Ainda que os/as professores/as desacreditem da capacidade de
seus/suas alunos/as com deficiência, precisam passar a enxergá-
los/as como pessoas capazes, cujo desenvolvimento se dará
SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 329

quando pararem de trata-los/as como incapazes, e cientes de que


quanto antes a criança tiver autonomia, ela se desenvolverá para
viver em sociedade.
Com a leitura não é diferente, quando a criança ingressa na
vida escolar e, desde então, começa a praticar o gosto da leitura,
com o acompanhamento adequado às suas especificidades, logo
ela desenvolverá habilidades próximas de seus/suas colegas. Vi-
eira ainda defende que a leitura e a escrita são atividades de grande
relevância para a criança porque podem despertar e oportunizar
outros contatos e outras experiências com o mundo, sendo a lite-
ratura uma ponte para novos caminhos.
Faz-se importante ressaltar que o/a professor/a deve ser o
agente principal no enfrentamento de preconceitos que podem vir
a acometer seus/suas alunos/as. A criança não se sentirá limitada
apenas no ambiente escolar, pois, na maioria das vezes, a família já
a submete a essas condições. E a escola, juntamente com o/a pro-
fessor/a, precisa se posicionar de forma benéfica no combate ao
preconceito vindo do ambiente familiar.
Vieira apud Abenhaim (2006, p. 51), defende que “para pen-
sar em inclusão é fundamental romper com o conceito de normal
como igual e adotar que normal é a diversidade, pois o aluno é
único, e tem que ser tratado como tal”. As crianças precisam de
uma educação que se paute na diversidade e ensine a respeitar as
pluralidades.
Além da escola, a família também pode favorecer esse pro-
cesso de inclusão através do uso da literatura infantil, oportuni-
zando aos seus filhos o acesso à diversidade através dos livros e a
transposição de pontes discriminatórias. Neste sentido Werneck
(1997, p.140) defende que:

Quando o adulto nega a seu filho o direito de receber informações


sobre o que ele considera serem anormalidades, praticam uma das

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 330

formas mais sutis de discriminação. Ao optar por só falar do bom,


do bonito e do belo, o adulto vira um deturpador da realidade.
Passa a sonegar dados sobre um mundo real “nele estão incluídos
as doenças e deficiências” que as crianças percebem como sendo
parte do mundo delas, mas que nós insistimos em ignorar ou es-
conder.

Nesse processo, compreendemos que a literatura poderá


aproximar os educandos, proporcionar momentos de socialização,
desenvolvimento, inclusão, criatividade, imaginação, podendo
possibilitar a aprendizagem e autonomia para a vida. Tendo todas
essas importantes características que necessitam ser desenvolvi-
das, torna-se necessário que essa literatura possa chegar a todos
os alunos, independente da sua condição de deficiência.

ALGUMAS CONSIDERAÇÕES

Neste trabalho foi explanado como o/a professor/a pode


utilizar a Literatura Infantil para inclusão de crianças com defici-
ência e de que forma essa literatura pode ser apresentada às crian-
ças, pois, além da importância de estar inserida na história, se faz
necessário que as crianças encontrem esses livros de forma aces-
sível às suas especificidades.
Se faz importante por abordar a Literatura Infantil como ca-
nal para a promoção da Educação Inclusiva e essa união se torna
desafiadora em uma sociedade que não consegue pensar em dife-
rentes metodologias no desenvolvimento de suas práticas pedagó-
gicas. Com base nisso, um/a bom/a profissional, comprometido
com a inclusão de todos os seus alunos adaptará o plano de aula às
diversidades dos/as alunos/as.
Ficou evidente que ainda há barreiras a serem enfrentadas
pelos/as professores/as na educação inclusiva, principalmente a
de influenciar positivamente a escola, bem como a sociedade, de
SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 331

forma geral, a participar ativamente no processo de inclusão, bus-


cando, então, compreender a diversidade que existe e a se opor ao
segregamento tendencioso de crianças e jovens com deficiência.
Perceber a deficiência como responsabilidade de todos/as
faz parte do processo de inclusão, pois o desempenho da educação
inclusiva exige a modificação dos princípios e das práticas que co-
mandam as atividades pedagógicas e sociais, o que gera um esforço
coletivo para identificar e superar as barreiras para a plena parti-
cipação de todos/as na escola.
Dessa forma, é possível perceber que as crianças, indepen-
dente das deficiências, compreendem tudo ao seu modo e que
basta que o/a professor/a procure entendê-las e ajudá-las no pro-
cesso de aprendizagem, auxiliando-as na superação de conflitos,
reconhecendo que as crianças com deficiência são pessoas como
quaisquer outras, e que, apesar dos seus limites, conseguem se de-
senvolver plenamente. Por fim, conseguimos compreender que a
Literatura Infantil é ponte para o desenvolvimento dessas crian-
ças, tanto na concentração como na criatividade, desenvolvimento
e aprendizagem, formando para viver uma vida mais plena e feliz.

REFERÊNCIAS

ALONSO, Ricardo Pinha, DANTAS, Lucas Emanuel Ricci. Direitos humanos e


fundamentais da pessoa com deficiência: a superação de uma condição
deficiente. Centro Universitário Eurípides de Marília/SP. s/d. Disponível em:
<http://www.publicadireito.com.br/artigos/?cod=7b7324f8841c5f9a> Acesso
em 06 out. 2018.

ARANHA, Maria Salete Fábio (Org.). Educação inclusiva: a fundamentação fi-


losófica. V.1. Coordenação Geral SEESP/MEC. Brasília: Ministério da Educação
Especial, 2004.

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 332

BARROS, Paula Rúbia Pelloso Duarte. A contribuição da literatura infantil


no processo de aquisição da leitura. Monografia (Graduação em Pedagogia).
Centro Universitário Católico Salesiano Auxilium – UNISALESIANO, Lins-SP,
2013. 53p.

BEZERRA, Fernanda Antônia. A importância do audiolivro para o deficiente vi-


sual no estudo de Literatura. In: Festival Literário de Paulo Afonso – Edição
2015. Paulo Afonso/ Bahia. Anais. Faculdade Sete de Setembro. p. 74 a 82.

COELHO, Nelly Novaes. Literatura Infantil: teoria, análise, didática. São Paulo:
Moderna, 2000.

CUNHA, Maria Antonieta Antunes. Literatura Infantil: Teoria e Prática. São


Paulo: Ática, 1987.

FIGUEIRA, Emílio. Letras Despercebidas. Ensaios sobre as relações Deficiên-


cias & Literatura nos anos 80 e 90 que deram origem à Escrita Inclusiva. São
Paulo: Figueira Digital/Agbook, 2017.

FIGUEIREDO, Rita Vieira. Política de inclusão: escola-gestão da aprendizagem na


diversidade. In: ROSA, E. G. de.; SOUZA, V. C. (Orgs.). Políticas organizativas e
curriculares, educação inclusiva e formação de professores. Rio de Janeiro:
DP&A, 2002. p. 67-78.

FRIAS, Elzabel Maria Alberton. Inclusão escolar do aluno com necessidades


educacionais especiais: contribuições ao professor do Ensino Regular. Para-
navaí, 2008/2009

LIMA, Iviana Gonçalves de et al. A literatura infantil como recurso facilitador


no processo da inclusão escolar. Anais II CINTEDI. Campina Grande: Realize
Editora, 2016. Disponível em: <http://editorarealize.com.br/artigo/visuali-
zar/22613>. Acesso em: 28/08/2020.

MANTOAN, Maria Tereza Eglér. O direito de ser, sendo diferente, na escola. In:
RODRIGUES, David (Org.). Inclusão e educação: doze olhares sobre a educação
inclusiva. São Paulo: Summus, 2006.

SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 333

MARTINS, Lúcia de Araújo Ramos. Educação e diversidade:um breve preâmbulo.


In: MARTINS, Lúcia de Araújo Ramos (Org.). Escola inclusiva: pesquisa, refle-
xões e desafios. João Pessoa: Idéia, 2008.

MINAYO, Maria Cecília de Souza. Trabalho de campo: contexto de observação,


interação e descoberta. In: MINAYO, Maria Cecília de Souza (Org.) et al. Pes-
quisa Social: teoria, método e criatividade.15. ed. Rio de Janeiro: Vozes, 1994,
p. 51 a 66.

RIBEIRO, Rodrigo de Oliveira. Literatura e racismo: uma análise sobre Mon-


teiro Lobato e sua obra. Disponível em: <https://www.geledes.org.br/litera-
tura-e-racismo-uma-analise-sobre-monteiro-lobato-e-sua-obra/ > Acesso em:
23 de out. 2018.

SEVERINO, Antônio Joaquim. Metodologia do trabalho científico. 23. ed. São


Paulo: Cortez, 2007.

SOUZA, Damaris Leme de. Literatura infantil: origens e contribuições na edu-


cação infantil. Rio Claro/SP: UNESP, 2016.

VIEIRA, Emili Silva. A contribuição da Literatura Infantil para crianças com


necessidades educativas especiais. Monografia (Curso de Especialização em
Desenvolvimento Humano, Educação e Inclusão Escolar).Brasília: PED/IP –
UnB/UAB, 2015.

WERNECK, C. Ninguém será mais bonzinho na sociedade inclusiva. Rio de


Janeiro: WVA, 1997.

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 334

CAPÍTULO 11
A INCLUSÃO ESCOLAR DE ALUNOS COM
DEFICIÊNCIA INTELECTUAL

Lúcia de Araújo Ramos Martins

INTRODUÇÃO

Os profissionais da educação constantemente se deparam


com a diversidade dos educandos. O atendimento às diferenças é
algo imprescindível nas práticas pedagógicas. Neste sentido, é im-
portante discutir sobre a educação destinada a alunos com defici-
ência intelectual, buscando responder à questão sobre como o pro-
cesso educacional inclusivo de pessoas com a Síndrome de Down,
que foi desenvolvida em escolas regulares no Rio Grande do Norte.
Segundo Foucault (2000, p.14), falar sobre a inclusão é pro-
vocar, especialmente, numa perspectiva cultural, uma mudança
“[...] sobretudo e acima de tudo, contra os efeitos centralizadores
do poder que são vinculados à instituição e ao funcionamento de
um discurso científico no interior de uma sociedade como a nossa”,
dominada pelo exercício das classes dominantes.
No tocante à situação brasileira, a herança histórica das desi-
gualdades regionais, explicam um conjunto de situações reforçam
a desigualdade e a marginalidade.
Em geral, a segregação de pessoas com Necessidades Educa-
cionais Especiais torna-se uma regra social apoiada pela família em
suas crenças, valores, angústias e perspectivas, visando superar o
problema.

SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 335

Por muito tempo, havia dificuldade de inserção das pessoas


com deficiência no ambiente escolar. Esta fase é marcada por uma
total descrença nas possibilidades das pessoas com deficiência,
pois as mesmas não eram sequer percebidas como dignas de viver.
Para Barr (1913); Lindmar y McIntyre (1961), os rótulos de
atrasos mentais se encontram nos registros sobre os gregos, em
1552 AC e dos romanos em 449 AC, assim como existem passagens
bíblicas que falam de pessoas com deficiência. Para Hewetta
(1977), a superstição, a ciência e serviços sociais no tratamento de
pessoas com deficiência intelectual durante diferentes períodos
históricos.
Segundo Mazzotta (2001), no Brasil a preocupação com a
educação dos deficientes iniciou-se no século XIX, devido influên-
cia das experiências concretizadas na Europa e EUA. No entanto,
apenas no final da década de cinquenta do século XX houve a inclu-
são da educação para deficientes na política educacional brasileira,
pois antes eles eram segregados em casa ou em hospitais.
A criação de classes especiais foi uma conquista importante
para aqueles que lutavam pela educação de pessoas com deficiên-
cia, assim como das pessoas com outras Necessidades Educacio-
nais Especiais, pois propiciava a escolarização dessa população nas
escolas comuns. Refere que as críticas existentes às classes especi-
ais ocorrem não porque estas constituem um recurso inadequado
em si, mas porque foi um recurso mal utilizado através de encami-
nhamentos inadequados de alunos e despreparo dos profissionais.
Assim, a educação aos deficientes, que inicialmente favorecia
o estabelecimento e desenvolvimento de novas técnicas e aborda-
gens, no sentido de valorizar e trabalhar com o potencial remanes-
cente da pessoa com deficiência, passou, com o mal uso das classes
especiais, a ser um movimento que mais segregava do que incluía
a pessoa com deficiência na sociedade.

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 336

Este movimento nos evidencia mais uma vez a coexistência


de posturas diferentes em determinado contexto histórico, ou seja,
posturas que visavam à educação do deficiente, mas pautadas em
paradigmas segregatórios. Este fato é confirmado por Sassaki
(1998), quando relata que as classes especiais dentro de escolas
comuns ocorreram não por motivos humanitários, mas sim para
garantir que as crianças deficientes, que exigiam maior esforço do
professor no processo de ensino, não interferissem no ensino a
ponto de o professor não poder atender as crianças sem deficiên-
cias.
Esta questão não deixa de ser um fato real, pois para pensar
em inclusão há de se levar em conta a necessidade de preparar o
meio (recursos físicos/ tecnológicos), as pessoas (recursos huma-
nos) e conscientizar a comunidade local. Sem esses procedimentos,
a inclusão não é possível, pois a problemática fica centrada só na
pessoa com deficiência. Ou seja, há uma inserção da criança no
meio escolar, mas não a própria integração ou inclusão, de acordo
com diversos autores, tais como Ribas (1985), Bieler (1990), SILVA
(1991), Fleming (1988), MARTINS (2008), entre outros.
A deficiência é vista como algo incomum, diferente, desper-
tando reações de curiosidade, de medo e espanto pela sociedade.
Muitos são os tipos de pessoas que são classificados como porta-
dores de deficiência. Em geral, estas classificações decorrem de
modelos clínicos, podendo também ser associadas a modelos edu-
cacionais e/ ou psicológicos. É neste modelo educacional que nos
deteremos prioritariamente. São considerados como deficientes
aqueles que apresentam deficiência intelectual, sensorial, física,
distúrbios da comunicação, de conduta e deficiências múltiplas.
Conforme Amaral (1995), a deficiência nunca passa desper-
cebida, pois mesmo que haja a intenção de inclusão de todos na
escola, isto causa ameaças, desorganiza e mobiliza. Isto “[...] foge
ao esperado, ao belo, ao eficiente, ao perfeito” (p.12), ao mesmo
SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 337

tempo que ressalta, segundo sua experiência pessoal, relatos e ob-


servações: “essa hegemonia desorganizadora do emocional [...]
cede o passo a uma convivência não atípica [...] depois de supera-
das as fases iniciais de impacto e descompensação psíquica” (AMA-
RAL, 1995, p.112).
No que diz respeito à Deficiência Intelectual, segundo a Asso-
ciação Americana de Deficiência Mental (AAMR) e o Manual Diag-
nóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM-IV), Deficiência
Intelectual ou Deficiência Mental (DM – como não é mais chamada)
é o estado de redução notável do funcionamento intelectual, signi-
ficativamente abaixo da média, oriundo no período de desenvolvi-
mento e associado à limitações de pelo menos dois aspectos do
funcionamento adaptativo ou da capacidade do indivíduo em res-
ponder adequadamente às demandas da sociedade em comunica-
ção, cuidados pessoais, competências domésticas, habilidades so-
ciais, utilização dos recursos comunitários, autonomia, saúde e se-
gurança, aptidões escolares, lazer e trabalho.
Embora este conceito seja oficialmente assumido no Brasil,
podemos perceber que apresenta uma noção de aprendizagem da
pessoa que apresenta deficiência de maneira adaptativa e natura-
lista sobre os processos de aprendizagem. Porém, os aportes apre-
sentados pela perspectiva histórico-social nos ofertaram possibili-
dades de problematizarmos tal concepção, por ser nesta concep-
ção a deficiência ser entendida como a construção social e o sujeito
é considerado na sua singularidade (ANACHE; MARTINEZ, 2009).
No Brasil, existem 24% das pessoas com deficiência, segundo
o Recenseamento Demográfico de 2010, o evidencia um aumento
significativo de acordo com o de 2000, em que constituíam 14,48%
da população, o que mostra o quanto é crítica a situação. Mostra o
quanto é crítica a situação existente em nosso país, pois vem au-
mentando consideravelmente o quantitativo de pessoas com

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 338

Deficiência Intelectual, que corresponde atualmente a 11% da po-


pulação brasileira. Destes, a Síndrome de Down que é uma condi-
ção decorrente de alteração no cromossomo de número 21, é a pa-
tologia mais frequente, associada à Deficiência Intelectual, sendo
responsável por cerca de 18 a 20% dos casos de déficits intelectu-
ais existentes (GUIDETTI; TOURETTE, 1996; MARTINS, 2002).
Segundo Lang e Berberichy (1995), a sala de aula deve ser
um local onde as necessidades humanas básicas devem ser tidas
em consideração. É importante que haja intervenções focadas no
educando, com vistas a adaptações das práticas, baseados em da-
dos contínuos de maneira a responderem às suas necessidades,
que estão constantemente em mudança. Os procedimentos utiliza-
dos necessitam ser sistemáticos intra ambientes e extra ambien-
tes, atividades e rotinas a fim de promoverem a aprendizagem e a
participação ativa dos educandos.
Para Bourdieu (1966, p. 336-337),

Para favorecer os mais favorecidos e desfavorecer os mais desfa-


vorecidos, é necessário e suficiente que a escola ignore no conte-
údo do ensino transmitido, nos métodos e nas técnicas de trans-
missão e nos critérios de julgamento, as desigualdades culturais
entre as crianças provenientes de diferentes classes sociais; em
outros termos, ao tratar todos os ensinados, por mais desiguais
que eles sejam, como iguais em direitos e deveres, o sistema esco-
lar é levado a sancionar as desigualdades frente à cultura. A igual-
dade formal que regula a prática pedagógica, na verdade, serve de
máscara e de justificação às desigualdades reais frente à cultura
ensinada ou, mais exatamente, exigida. (BOURDIEU, 1966, p. 336-
337)

Um docente, que passa, geralmente, cerca de 20 a 30 horas


de aula semanais com os alunos, em geral tem uma visão diferen-
ciada a respeito dos mesmos, tem um relacionamento com cada um

SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 339

de maneira diversa, mas esta diferenciação não basta para impedir


problemas na sala de aula.
O docente deve levar em consideração o histórico escolar dos
alunos e sua maneira atual de interação com os colegas. As relações
dos pais e professor também precisam ser analisadas especifica-
mente, pois

a família perfila-se por trás da criança, que se torna explicitamente


produto e portador de uma cultura familiar, de atitudes e de hábi-
tos que herdou mais ou menos docilmente. Às vezes o conheci-
mento do background familiar pode atenuar a “responsabilidade”
da criança, esclarecer sua conduta e favorecer melhor relação.
Também pode acontecer de a criança e sua família serem confun-
didas e em uma mesma rejeição. (SERMET, 1981)

As práticas pedagógicas inclusivas, portanto, requerem a


participação das famílias em casa, reforçando o funcionamento fa-
miliar, baseadas nos pontos fortes e nas competências. Incluindo-
se os integrantes das famílias, tomam-se decisões e trabalham em
conjunto, de maneira funcional, de maneira a responder às neces-
sidades dos filhos e das famílias com vistas à aprendizagem, a par-
tir de atividades da rotina diária.
É imprescindível considerar as informações acerca do filho
com Deficiência Intelectual e de sua educação, serem esclarecidos
sobre normas e regras que regem o funcionamento das escolas e
que dizem respeito a todos os educandos, em especial aos que
apresentam Necessidades Educacionais Especiais; dialogar sobre
o processo educativo; manifestar suas opiniões e seu sentir (De-
creto-Lei n. 319/91 - Ministério da Educação de Portugal, 1992).

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 340

PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

Para a obtenção dos dados da pesquisa de natureza qualita-


tiva, utilizamos a pesquisa bibliográfica, documental e de campo. A
pesquisa de campo foi empreendida na cidade de Natal / RN, en-
volvendo a aplicação de entrevistas semi estruturas com docentes
de 22 escolas, da Rede Pública de Ensino.
De maneira geral, verificamos que nos cursos de formação
que participaram a utilização de técnicas mais tradicionais de en-
sino, tais como aulas expositiva (84,3 %) e estudo em grupo com
apresentação (78,1%), embora tenhamos percebido a utilização de
técnicas que permitem maior interação verbal entre professores e
alunos, ou entre estes, com o método de discussão e debate (75%),
embora tenha ocorrido muitas vezes uma repetição de técnicas de
ensino nos cursos, causando, muitas vezes, desinteresse dos cur-
sistas para o conteúdo exposto, o que pode exercer influência na
sua prática pedagógica.

FORMAÇÃO DOS PROFESSORES

Para Fonseca (1987), é imprescindível tomar medidas para


elevar o nível dos docentes de Educação Especial, de maneira a
avançarem na sua formação, em nível de licenciaturas e na Pós-
graduação, para que possam utilizar métodos, técnicas, materiais
pedagógicos e formas de avaliação adequadas. A falta de acessibi-
lidade das escolas é, também, ainda algo a ser pensado.
A formação é um processo, que deve ser inicial e permanente,
desenvolvida por instituições superiores de ensino para garantir
reflexões e ações dos professores, de coordenadores pedagógicos
de gestores em serviço, objetivando um ensino de qualidade para
todos, sem exceção. Não existe uma receita pronta, pois eles são
pessoas com diferenças individuais, em decorrência de heranças
SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 341

familiares, experiências de vida e preparação diferenciada, assim


como tiveram ou têm acesso a serviços de estimulação e reabilita-
ção diferentes.
O termo formação, que é utilizado para nomear processos vi-
venciados pelos docentes, têm diversos significados. De maneira
geral é concebida como sinônimo de forma o que significa um mo-
vimento que busca enformar, moldar o professor nos limites de
ações educativas centradas nem exigências definidas a priori. Se-
gundo DUEK, NAUJORKS (2008), pode ser percebida como um con-
tinuum, implicando numa visão ampliada da docência e do pro-
cesso formativo, sinalizando para a estreita relação entre o que o
professor é, como ele vê e o modo como desempenha a sua função
docente.
A respeito disso, Arroyo, destaca que:

pensar sobre falta de esclarecimento, que antes de implementar


uma proposta inovadora os docentes têm que ser treinados, pois
não se resolve problemas que são mais que são mais complicados
[...] Que fácil resulta equacionar as reações dos mestres frente às
inovações educacionais no campo mental, de como falta de escla-
recimento teórico, de reflexão e tematização, de leitura, cursos ou
treinamentos. [...]Apenas treinar, esclarecer, não muda a práticas.
(ARROYO, 2002, p.69-70)

A formação do professor, inicial ou continuada, não pode ser


completa, devendo abarcar não apenas habilidades e conhecimen-
tos técnicos, mas também reflexões sobre os conteúdos internos
desses profissionais.
De acordo com Mantoan (2004), a inclusão nos leva a refletir
que sobre a diferença como um valor universal, disponível para to-
das as pessoas a partir de elementos étnicos, religiosos e de gê-
nero. Salienta que a valorização da diversidade, porém, nos leva a
questionar sobre se a igualdade teria perdido o seu valor, pois essa

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 342

igualdade pela qual lutamos, que requer o mesmo tratamento legal


e político para todos, estaria sendo desvalorizada em favor do culto
à diferença.
Construir uma comunidade que seja consciente requer vin-
cular a aprendizagem interpessoal à arquitetura social escolar. A
responsabilidade da escola, segundo Pacheco (2007), requer ori-
entação às famílias de educandos com necessidades educacionais
especiais, plano de preparação de docentes e da escola, preparação
de outras crianças da turma e de seus pais, colaboração entre os
integrantes da instituição escolar, preparar o aluno com Deficiên-
cia Intelectual para ingressar na escola.
Os docentes precisam aprender a escutar e aceitar os outros
demonstrar tolerância, providenciar tarefas em que o aluno tenha
sucesso, ajudar os pais a aceitarem os sentimentos como algo nor-
mal, focar em aspectos positivos, assegurar o sucesso em momen-
tos educativos, ensinar novas estratégias educativas, elogiar os
pais (SERRANO, CORREIA, 1999)
O processo de profissionalização docente, representa uma
mudança na preparação de professores, em especial, no que diz
respeito ao conhecimento que precisam ter sobre os saberes que
se fazem necessários para o desenvolvimento de suas atividades
na sala de aula. Neste sentido, Ramalho, Nuñez e Gauthier situam
que:

Esses saberes, embora separados metodologicamente, estão todos


presentes na ação do professor, pois o saber, como sistema com-
plexo de pensamento profissional, é resultado das suas interações,
constitui-se num sistema em constante reformulação, reconstru-
ção. (NUÑEZ e GAUTHIER, 2004, p.158)

Segundo Gauthier et al. (2006), embora os saberes da experi-


ência, que são constantemente validados no cotidiano escolar, con-
tribuam para a aprendizagem dos alunos, a preparação escolar
SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 343

precisa fazer diferença, a partir de quando são estudados sistema-


ticamente.
O compartilhamento de saberes e a formação docente possi-
bilitam a descoberta de novos questionamentos, no intuito de com-
preender que o sujeito do processo educacional não é aquele que
estrutura ou organiza, porém todos os que se comprometem em
fazê-los. Freire explica que “[...]como professor precisa conhecer
diferentes dimensões que caracterizam o exercício da minha prá-
tica, o que me pode tornar mais seguro no meu próprio desempe-
nho” (FREIRE, 1996, p. 76).
A inclusão de alunos com Necessidades Educacionais Especi-
ais numa escola é um processo que demanda muito interesse e
uma permanente procura por conhecimentos que conduzam à
construção de conhecimentos pelos docentes e pela comunidade
educacional sobre o tema. Neste sentido, deve ser estimulada a
troca de conhecimento entre docentes e colegas da turma, a partir
daquilo que é observado no cotidiano escolar, possibilitando-lhes
um aprimoramento de conhecimentos e atitudes.
Para as famílias, há muita necessidade de ajuda para que pos-
sam desenvolver suas emoções, sentimentos e atitudes perante o
filho com Deficiência Intelectual, pois estes desempenham um pa-
pel muito relevante no processo educacional inclusivo na escola e
também na sociedade, quando bem orientados (HEWARD, 1998).
Para Lynch e Hason (1992), compreender e apreciar a diver-
sidade que existe entre os alunos com deficiência e suas famílias é
o primeiro passo para entender a e apreciar nossa própria cultura
é imprescindível para a educação multicultural, para que o docente
possa atender a

[...] un grupo de ninõs descapacitados de distintos grupos cultura-


les y linguísticos deve tener un estilo de ensenãnza flexible, ser ca-
paz de crear un clima positivo en classe, y utilizar una variedade

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 344

de recursos y estratégias para responder a las necessidades de su


alumno. (LYNCH e HASON, 1992)

Os professores sozinhos não conseguem refletir e mudar a


sua prática docente, implicando numa ação colaborativa para favo-
recer a inclusão escolar. As atividades requerem a participação de
muitos segmentos da escola, em especial a participação direta dos
pais no processo inclusivo, pois muitas vezes precisam mudar pos-
turas e atitudes frentes aos filhos com deficiência.
A inclusão escolar de educandos com Deficiência Intelectual
não é de responsabilidade apenas dos poderes públicos, reque-
rendo o envolvimento de toda a comunidade escolar. Segundo
Martins,

[...] para cada profissional, cada pessoa, cada entidade, cada família
– mesmo as que não têm hoje crianças com necessidades educaci-
onais especiais – deve procurar colaborar com esse processo in-
clusivo, fazendo com que ele não se restrinja à escola, mas ultra-
passe os seus limites,, atingindo a sociedade de uma maneira mais
ampla. Só assim, ele poderá se efetivo e permanente, produzindo
uma escola mais aberta às diferenças e ajudando a construir um
mundo um pouco amis justo e humano (MARTINS, 2008, p. 201-
202)

Há necessidade de flexibilização do planejamento pedagó-


gico, a redução do número de alunos nas turmas, aprimoramento
da formação inicial e continuada dos docentes, entre outros aspec-
tos.
Existem necessidades de maiores informações sobre as ne-
cessidades dos alunos com Deficiência Intelectual, entre os quais o
problema da sexualidade desses educandos, aos conteúdos peda-
gógicos relativas ao manejo de técnicas pedagógicas, de recursos
de ensino, visando o dia-a-dia na sala de aula.

SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 345

Do grupo pesquisado, 4 docentes consideraram que nenhum


aspecto deixou de ser enfocado durante o curso, 3 (6,8%) emitiram
respostas extremamente vagas, 7 (15,9%) nada responderam – en-
tre os quais professores que participaram apenas de cursos de atu-
alização, de um trabalho de orientação aos funcionários sobre essa
clientela, dos colegas no sentido de aceitá-los sem discriminação,
entendendo as suas dificuldades e propiciando melhores condi-
ções para a sua efetiva inclusão.
Há necessidade de melhores condições de ensino e aprendi-
zagem; oferta de cursos de formação continuada; inovação no que
diz respeito às técnicas de ensino que sejam adequadas aos alunos
e ao material didático adequados aos educandos; orientação frente
aos problemas que surgem no cotidiano escolar; troca de ideias;
planejamento; convivência; troca de ideias.
A maioria dos docentes pesquisados (78,1%) demonstraram
que o curso de Especialização lhes proporcionou uma melhoria da
ação pedagógica que desenvolviam na área. Apenas 18,8% consi-
deraram que o curso lhes contribuiu “em parte” para o aprimora-
mento do trabalho empreendido. Um docente não respondeu
(3,1%), em virtude de não ter participado do curso de Especializa-
ção, embora dois outros docentes que se encontravam na mesma
situação tenham respondido afirmativamente, afirmando que es-
tavam buscando aperfeiçoamento.
As dificuldades apontadas no trabalho pedagógico com alu-
nos com Deficiência Intelectual (DI) envolveu: turmas heterogê-
neas demais (5,8%); mudanças nas formas de atendimento aos
alunos com DI (1,9%); críticas recebidas na escola (1,9%), ausên-
cia de dados relativos à aprendizagem dos educandos (5,8%); falta
de participação e apoio dos pais no trabalho pedagógico (5,8%);
falta de acompanhamento familiar pela equipe da Secretaria de
Educação do Estado (7,8%); falta de acompanhamento e apoio

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 346

pelos órgãos competentes dos problemas ocorridos no dia a dia na


escola (7,8%); atendimento complementar oferecido aos alunos
com DI são insatisfatórios, em decorrência da distância (Escola e
Centro de Educação Estadual (1,9%); falta de material didático e
pedagógico para uso em classe (11,7%); falta de ambiente ade-
quado (3,8%); discriminação dos colegas da escola (1,9%); falta de
conscientização da comunidade escolar (3,8%); não responderam
(3,8%).
No que diz respeito à visão que tinham do educando com DI,
verificamos que possuíam uma noção de que eram pessoas, seres
humanos, com potencialidades e direitos, embora tenham dificul-
dades, carências, lentidão na aprendizagem, de afeto, de atenção,
de compreensão. São vistos como capazes de aprender, depen-
dendo dos cuidados educativos empreendidos, às orientações rea-
lizadas com as famílias, atenção, apoio, carinho de todos, especial-
mente da professora.
Quanto à percepção dos gestores, muitos os veem como alu-
nos iguais aos demais, com carinho, como diferentes, com limita-
ções, crianças problemáticas, que não se ajustam à normas da es-
cola, requerendo um Atendimento Educacional Especializado
(AEE).
Pelos docentes são percebidos com aceitação, com discrimi-
nação, dificuldades de aprendizagem e relacionamento, proble-
mas, não adaptação à demais pessoas da instituição escolar, ha-
vendo carência de orientação sistemática aos As sugestões impli-
caram na oferta de cursos de aperfeiçoamento; práticas que pos-
sibilitem avanços nos educandos; apoio de professores especiali-
zados; orientação familiar e à comunidade escolar, entre outros as-
pectos.
Percebem a necessidade de preparação dos outros docentes
da escola, pois muitos ainda não os percebem como os demais edu-
candos, mas precisam entender mais que o déficit dos mesmos não
SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 347

pode ser negado, mas que precisam vê-los como seres em desen-
volvimento, como pessoas, o que requer maior investimento da
parte dos sistemas públicos de educação.
A igualdade de oportunidades nunca será alcançada e o fu-
turo da criança com Necessidades Educacionais Especiais será
sempre incerto no que diz respeito a uma verdadeira Inclusão, in-
dependentemente das suas condições. Isto é algo que não podemos
esquecer e que devemos disseminar para outras pessoas na socie-
dade, pois implica em uma vida com qualidade para todos, na con-
cretização dos seus direitos, que estão previstos na Constituição
Brasileira, que se constitui um passo relevante para a realidade vi-
venciada na escola.
A prática docente na escola, numa perspectiva inclusiva, é
algo muito importante para todos que estão envolvidos no pro-
cesso educacional é uma tarefa dos que se envolvem com o pro-
cesso educacional pois

supõe não apenas o domínio de um conhecimento profissional que


se torna explícito ao encontrar situações inesperadas, mas além
disso, o de um sistema valorativo que também começa ase tornar
explícito, a desenvolver a sua significação e a redefinir seus limites
quando se está obrigado a desenvolver sua significação e a redefi-
nir seus limites quando se está obrigado a tomar decisões que su-
peram os limites do que se considera aceitável, quando se analisa
o alcance social de suas próprias ações ou quando em situações de
dilemas ou conflitos valorativos para os quais os critérios existen-
tes se tornam insuficientes (CONTREAS, 2002, p.112).

Desta maneira, a formação inicial e continuada dos docentes,


deve ser uma responsabilidade dos sistemas educacionais que es-
tão comprometidos com a qualidade do processo educacionais, na
perspectiva da Educação Inclusiva. Assim, devem buscar novas for-
mas de dar respostas às necessidades de todos alunos,

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 348

possibilitando que haja participação também dos alunos com Ne-


cessidades Educacionais Especiais.

ALGUMAS CONSIDERAÇÕES

Realizar a inclusão de educandos com Deficiência Intelectual


na escola tem siso um grande desafio, pois é muito difícil garantir
não apenas o acesso – pela força da lei – mas também a sua apren-
dizagem.
Sabemos que a inclusão não se limita apenas ao acesso à es-
cola regular, devendo haver uma preocupação no sentido de reali-
zar formação continuada, orientações às famílias, aos colegas, à
equipe da instituição escolar, na busca de estratégias de ensino que
possam possibilitar aquisição de materiais e recursos pedagógicos
adequados para possibilitarem avanços na aprendizagem, na for-
mação docente, no sentido de propiciar avanços pedagógicos e so-
ciais aos alunos em geral.
É necessário investir na estruturação dos espaços das insti-
tuições escolares, maior contato com colegas da equipe de traba-
lho, de maneira que possam compartilhar suas inquietações sobre
a Educação Inclusiva, refletindo sobre as suas práticas e sobre seus
educandos com Deficiência Intelectual, suas necessidades e senti-
mentos.
Os sistemas educacionais devem se preocupar com a conti-
nuidade da preparação de pessoas com Deficiência Intelectual,
pois se não tiverem oportunidade de desenvolver suas potenciali-
dades passarão a ser eternamente dependentes da família e perce-
bidas na sociedade como seres incapazes e improdutivos.
Estes pontos aqui destacados buscam implementar ações
educacionais inclusivas de qualidade. A individualização do ensino
de qualidade em resposta às necessidades dos educandos são as-
pectos essenciais dos quais dependem o sucesso da educação
SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 349

inclusiva, que inclua uma planificação e uma programação eficazes


para alunos com Necessidades Educacionais Especiais, preparação
de professores, um conjunto de práticas e serviços de apoio de
apoio necessários ao bom atendimento aos educandos com Neces-
sidades Educacionais Especiais.
Esperamos que os resultados do estudo aqui registrados pos-
sam contribuir para uma reflexão e para o aprimoramento das prá-
ticas docentes frente a alunos com Deficiência Intelectual, numa
perspectiva inclusiva.

REFERÊNCIAS

AMARAL, Lígia Assunção. Pensar a diferença / deficiência. Brasília: CORDE,


1994.

ANACHE, Alexandra Ayach; MARTINEZ, Albertina Mitjáns. O sujeito com defici-


ência mental: processos de aprendizagem na perspectiva histórico-cultural. In:
JESUS, Denise Meyrelles de; BAPTISTA, Cláudio Roberto; VICTOR, Sonia Lopes
(Orgs). Inclusão, práticas pedagógicas e trajetórias de pesquisa. Porto Ale-
gre: Mediação, 2011.

ARROYO, Miguel G. Ofício de Mestre:imagens e auto imagens. Petrópolis: RJ:


Vozes, 2000.

BERKELEY, T.R; LUDLOW, B.L. toward a reconceptualization of the develop-


mental reconception of the developmental model. Topic in Early Childhoom
Special Education, 9. 1998, p. 51-66.

BRASIL. Ministério da Justiça. Declaração de Salamanca e linha de ação so-


bre Necessidades Educativas Especiais. Brasília: CORDE, 1994.

CORREIA, L.M. Alunos com Necessidades Educativas Especiais em classe


regular. Porto: Porto Editora, 1977.

DUEK, Viviane Pleichard. MARTINS, Lúcia de Araújo Ramos. O potencial dos


Casos de Ensino para a formação de Professores na perspectiva inclusiva.

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 350

Inclusão escolar e social: novos contextos, novos aportes. Natal: EDUFRN,


2012.

FOUCAULT, M. A. A Arqueologia do Saber. 6 ed. Rio de Janeiro: Forense Uni-


versitária, 2000.

GIUDETTE, Michèle; TOURRETTE. Handicaps et development physi-


ologiques de les enfantes. Paris: Armand Colin, 1996. P. 116-126 (1996).

HEWARD, William L. Niños Execepcionales: una introducción a la educa-


cion especial. Madrid, Prentichwe Hall, 1998.

LAKATOS, Eva Maria; MARCONI, Marina de Andrade. Fundamentos de Meto-


dologia Científica. 2010.

MANTOAN, Maria Teresa Eglér. Ser ou estar: eis a questão. Rio de Ja-
neiro:WVA, 1997.

___________. O direito à diferença na escola – Cadernos. Santa Maria: Centro de


Educação, 2004. n. 23.

MARTINS, Lúcia de Araújo Ramos. A inclusão escolar do portador da Sín-


drome de Down: o que pensam os educadores? Natal: EDUFRN, 2008.

MAZZOTTA, Marcos J. S. Fundamentos de Educação Especial. São Paulo: Pio-


neira, 1982.

PACHECO José; Eggesdóttir, Rósa; MARINÓSSON, Gretar L. (2007). Caminhos


para a Inclusão: um guia para o aprimoramento da equipe escolar. Porto Ale-
gre: Artmed, 2007.

PORTUGAL. Decreto-Lei n. 319/91. Ministério da Educação de Portugal


(1992).

RAMALHO, Betânia Leite; NUÑES, Isauro; GAUTHIER, C. Formar o professor,


profissionalizar o ensino: perspectivas e desafios. Porto Alegre: Sulina, 2004.

SASSAKI, Romeu. Kazumi. Inclusão. Construindo uma inclusão para todos. Rio
de Janeiro: 1988.

SERMET, G. Essai d’ une autre forme de collaboration entre la famille et


l’éscole. Genève: Sevice de la Recherche Sociologique, 1981.

SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 351

CAPÍTULO 12
O OLHAR DAS MÃES SOBRE O FILHO COM
SÍNDROME DE DOWN

Benedita Cruz Macedo


Lúcia de Araújo Ramos Martins

PASSADO, PRESENTE E FUTURO

A Síndrome de Down foi, durante muitas décadas, perce-


bida de forma estereotipada, olhada como Deficiência Intelectual
severa, cujo prognóstico impreciso e negativo propicia uma per-
cepção distorcida para aqueles que convivem com ela.
Nas últimas décadas, principalmente a partir do avanço da
Medicina, deu-se início a estudos mais aprofundados sobre as alte-
rações cromossômicas, afecções genéticas e outras desordens re-
lacionadas à síndrome e muitas indagações que a envolvem, sendo
gradativamente desvendadas. Desta forma, as informações vão se
tornando mais esclarecedoras e animadoras para as mães destes
filhos assim caracterizados.
Seguindo o percurso histórico, registros datados do século
XX fazem crer que, aparentemente, a Síndrome de Down surgiu
nesta época. No entanto, estudiosos deste assunto indicam que
sempre esteve presente na espécie humana. Segundo Pueschel et
al (1999), a ausência de registros históricos que confirmem esta
hipótese pode se dar em razão da precariedade ou inexistência de
meios de divulgação, publicações médicas, e até mesmo devido a

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 352

outros fatores, entre os quais, envolvendo interesses por enfermi-


dades calamitosas, doenças infecto contagiosas, desnutrição e tam-
bém outras doenças pelo perigo do contágio.
No período da Renascença, tem-se conhecimento de vários
pintores que registram pessoas com deficiência, como é o caso do
artista Andrea Mantegna (1431-1506), que retratou uma mulher
com o filho e este quadro representa a Virgem Maria com Jesus,
cujo rosto mostra traços característicos da Síndrome de Down
(Madona e a Criança). A não ser por pinturas e de alguns raros re-
gistros, essas crianças eram desconhecidas e não faziam parte do
cotidiano familiar, que deveria ser o preconceito da época. E, como
acontecia com os deficientes em geral, eram isolados e distancia-
dos do seu meio familiar.
Segundo Pueschel et al. (1995), Jean Equirol, clínico e orto-
frenista, publicou um dicionário médico, tendo sido o primeiro a
divulgar um caso de um paciente com esta síndrome. Eduard Se-
guin, considerado o primeiro especialista em Deficiência Mental e
ensino para estas pessoas, descreveu, em 1846, o caso de uma me-
nina cujos traços se assemelhavam à síndrome, a quem denominou
de “Idiota Furfurácia”. com “cabeça pequena e redonda, olhos lem-
brando os dos chineses, língua ampla protusa que conhecia poucas
palavras”.
A descrição feita por Ducan (apud Mustach, 1997), realçava
as características negativas que ainda hoje fazem parte do imagi-
nário social, sendo a Síndrome de Down associada à ausência de
beleza estética, à deformidade e às limitações quanto ao conheci-
mento.
Foi com a descoberta de Jerome Lejeune que o mundo pas-
sou a mudar seus conceitos em relação à síndrome. Sua pesquisa
propiciou condições para o início a outros estudos, numa cientifi-
cidade mais humanizada. Avanços científicos e reações contrárias

SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 353

ao uso do termo “mongolóide”, antes utilizado, levaram a posicio-


namentos discriminatórios.

CRIANÇAS COM SÍNDROME DE DOWN

As crianças com Síndrome de Down apresentam, em geral,


uma diversidade fatores biológicos. Evidencia-se a presença de um
terceiro cromossomo 21, que traz como consequência uma maior
diversidade em vários aspectos relacionados à memória, ao equilí-
brio, à iniciativa, à fala, à atenção, à associação e análise, assim
como ao seu desempenho, interferindo na aprendizagem e na con-
duta.
Precisam superar uma série de obstáculos para atingir o de-
senvolvimento de determinadas habilidades, comumente típicas
das demais crianças, a exemplo: placidez excessiva, hipotonia, fra-
queza dos músculos, que dificultam (por exemplo, atividades de
sentar, rolar, saltar, subir, descer, empurrar objetos, pular), o pro-
cessamento mais lento de informações, que a faz demorar mais a
se interessar pelo mundo a sua volta, a demonstrar curiosidade pe-
las pessoas e objetos (MARTINS, 2003).
Mesmo com todas as dificuldades, tem capacidade para uti-
lizar a linguagem e desenvolvê-la melhor, desde que lhe sejam ofe-
recidas as mais diversas oportunidades e estímulos, no seu con-
texto social e educacional.
No que diz respeito ao comportamento e ao padrão de de-
senvolvimento, é importante assinalar que não há um padrão este-
reotipado e previsível que uma criança com Síndrome de Down irá
apresentar, uma vez que o comportamento não depende somente
da alteração cromossômica, mas também do restante do potencial
genético, bem como das influências do meio.

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 354

FAMÍLIA FRENTE À SÍNDROME DE DOWN

De acordo com Macedo (1991), a família é considerada


como primeiro espaço psicossocial, protótipo de relações a serem
estabelecidas com o mundo. Desta forma, a família é entendida
como um sistema aberto, que proporciona aos seus membros, a
construção de uma identidade pessoal e social, oportunizando-
lhes, também, um ambiente propício ao desenvolvimento afetivo,
cognitivo e social.
A família pode ser conceituada como sendo um sistema de
vínculo afetivo, ao considerar as relações afetivas / emocionais
como propulsoras dos processos de aprendizagem. Embora cada
família seja única, o nascimento de uma criança com deficiência
gera sentimentos contraditórios que afetam diversos aspectos na
sua dinâmica, surgindo problemas econômicos, social e emocional
(CASARIN, 1999). Com a chegada do bebê, os pais não sabem com
lidar com ele e o desconhecimento a respeito da deficiência gera
uma fonte de tensão que compromete a situação atual e seus pro-
jetos futuros.
Normalmente, o diagnóstico clínico pode ser feito depois do
nascimento, pois é importante que a família retorne para casa
tendo conhecimento do diagnóstico, porém, muitas vezes isto não
ocorre pelo fato dos pais não terem as condições emocionais para
assimilar as informações.
Neste sentido, Pupo (1997) concorda que a notícia deve ser
dada por um profissional atualizado e preparado, dentro das pri-
meiras 24 horas, após a primeira mamada, sem a intenção de dar
uma aula sobre a síndrome. É importante que oferecer formas de
contatos com associação de pais de com Síndrome de Down, pro-
curando compreender eventuais reações negativas e, na medida do
possível, estar disponível para responder às dúvidas.

SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 355

Várias estratégias podem ser utilizadas pelos próprios pais,


em casa, neste processo estimulativo. Para tanto, além de serem
ajudados quanto à mudança de imagem ou representação do filho,
é importante sensibilizar os pais a observarem e interpretarem
pistas verbais, a se comunicarem com ele, a jogar, brincar, entre
outras atividades.
Os pais tornam-se os principais elementos para o desenvol-
vimento da criança, pois sua vinculação é uma relação especial. O
desenvolvimento de uma criança, que apresente ou não a Sín-
drome de Down, é uma experiência única. É preciso reconhecer
que o desenvolvimento é indissociável das experiências de mundo
que a criança vai vivenciando, sendo isto o que vai diferenciar, em
grande parte, a pessoa que a criança vai ser.
A criança com Síndrome de Down pode apresentar déficit
de atenção e de aquisição e desenvolvimento da linguagem. algu-
mas, poucas ou todas as características descritas na literatura.
Existe um grande leque de variações na linguagem, pois não há um
padrão definido de fala na Síndrome de Down.
No que diz respeito ao comportamento padrão de desenvol-
vimento que irá apresentar, é interessante assinalar que não existe
um padrão estereotipado e previsível em todas as crianças com a
síndrome, dependendo do restante do potencial genético, bem
como das influências do meio (WHISHARD, JONHSTON apud
SCHWARTZMAN, 1999).
Desta forma, existem grandes variações no desenvolvi-
mento de uma criança com Síndrome de Down, no que se refere
aos aspectos genéticos, raciais, familiares e socioculturais, que são
poderosos modificadores e determinantes do comportamento a
ser definido como característico dele. Desta forma, fica evidente
que têm grandes diferenças no que diz respeito ao seu

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 356

desenvolvimento, à personalidade, da mesma forma que outras


sem a síndrome.
A família é considerada como o principal espaço psicosso-
cial, protótipo das relações a serem estabelecidas com o mundo,
proporcionando aos seus membros a construção de uma identi-
dade pessoal e social, oportunizando-lhes, também, um ambiente
propício ao desenvolvimento afetivo, cognitivo e social.
A família representa a união entre pessoas que possuem la-
ços sanguíneos, de convivência, baseados no afeto. Segundo a
Constituição Brasileira de 1988, no artigo 226, traz o conceito de
família, abrangendo diversas formas de organização fundamenta-
das na relação afetiva entre seus membros. No entanto, não se trata
de um conceito rígido ou imutável, pois ao longo da história já as-
sumiu diversos significados.
Quando os pais adaptam as suas atitudes ao nível de desen-
volvimento da criança, esta tende a melhorar como qualquer outra
pessoa. Ela precisa encontrar um lugar e uma função para si
mesma no contexto em que vive e este fator é muito importante
para o seu desenvolvimento saudável.
Pode-se também registrar o esforço de alguns pais para
vencerem as dificuldades inerentes à síndrome e normalizar a cri-
ança. O aspecto positivo visto é a mobilização no acompanhamento
do desenvolvimento infantil. No entanto, é importante que isto não
se torne uma ideia tão centrada que os impossibilite de ver a reali-
dade.
Toda a educação e todo o desenvolvimento de uma criança
com Síndrome de Down dependerão do envolvimento dos pais
neste processo. O apoio educacional às crianças deve ser iniciado
o mais cedo possível. A estimulação precoce deve começar nos pri-
meiros dias de vida e os pais devem ser envolvidos neste processo,
a fim de que possa atuar com a criança com a Síndrome de Down
no seu cotidiano. Mesmo a partir de do conhecimento dos pais
SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 357

sobre a deficiência do filho, observa-se mais tendência a continua-


rem a lhe dispensar cuidados especiais, apesar da criança não mais
necessitar.
A atitude de superproteção pode prejudicar o desenvolvi-
mento da autonomia e identidade da criança. Há também, muitas
vezes, dificuldade das mães em colocar limites nos filhos, sendo
isto mais evidente na idade escolar, pois consideram-na uma
“eterna criança”. Esta postura demonstra que a proteção ultra-
passa as limitações e necessidades da criança.
Quando os pais se adaptam ao nível de desenvolvimento do
filho, este tende a melhorar como qualquer outro. A pessoa com
Síndrome de Down precisa encontrar um lugar e uma função para
si mesmo no contexto em que vive e este é um fator muito impor-
tante para um desenvolvimento saudável.
Podemos registrar, também, o esforço de alguns pais para
vencerem as dificuldades inerentes à síndrome e normalizar a cri-
ança. O aspecto positivo visto é a sua mobilização no acompanha-
mento e no desenvolvimento infantil. Mas é importante que isto
não se transforme numa ideia tão centrada que os impossibilite de
ver a realidade.

MÃES DIANTE DO FILHO COM SÍNDROME DE DOWN

Os dados analisados e detalhados a seguir, dizem respeito


às respostas expressas pelas mães, com base no espaço vivenciado
por elas, no intuito de fornecer um sentido mais real e objetivo, a
par de todo um contexto amplo e subjetivo que caracteriza qual-
quer tipo de existência humana.

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 358

a) Perfil das Mães


Em relação ao grau de instrução, observamos que o grupo
de mães cujos filhos com Síndrome de Down estudavam em esco-
las regulares, estas possuíam um nível médio e superior, delas 40%
apresentavam nível superior, 40% concluíram o Ensino Médio, e
apenas 20% apresentavam nível Fundamental incompleto.
Em contrapartida, detectamos que no grupo de mães com
filhos em Escolas Especializadas, o nível de escolaridade é baixo,
pois 70% das entrevistadas cursaram o Ensino Fundamental, em-
bora não tenham concluído, 10% iniciaram o Ensino Médio, mas
também ao concluíram e 20% é constituído de analfabetas. A dife-
rença do nível de instrução aponta, também, para uma visão dife-
renciada sobre o mundo e, consequentemente, sobre o filho com
Síndrome de Down e sua educação.
Observamos, também, que 90% das mães em escolas regu-
lares desenvolvem atividades profissionais fora do lar, dentre as
quais: 50% são funcionárias públicas de âmbito federal (1 biblio-
tecária, 1 socióloga e 1 técnica administrativa) e estadual (1 pro-
fessora que exerce atividade de bibliotecária e outra que atua na
parte administrativa); 30% são comerciantes, e 10% exercem ati-
vidades de recepcionistas na empresa. Apenas uma mãe é apenas
dona de casa.
No que se refere à renda familiar, constatamos que as mães
com filhos em escolar regulares apresentam melhor padrão econô-
mico (40%), com renda superior a 6 salários mínimos e as mães
que têm filhos em escolas especializadas (80%) possuem renda de
até 3 salários mínimos.

b) O Momento da notícia
Outro aspecto importante é o denominado momento da no-
tícia, envolvendo o modo como foi comunicado o diagnóstico

SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 359

relativo à alteração genética existente e suas consequências na


vida da criança.
O diagnóstico torna-se, em geral, um marco na vida de cada
família, merecendo especial atenção, uma vez que poderá facilitar
ou dificultar a ligação afetiva entre pais e a criança.
Em relação à primeira pessoa a ser informada sobre o diag-
nóstico do filho com Síndrome de Down, verificou-se que – em re-
lação ao grupo de mães que têm filhos nas escolas regulares que
em 30% dos casos a notícia foi recebida pelos pais; em outros 30%
foi direcionada à mãe; em 10% dos casos foi dada a outra pessoa
da família presente por ocasião do nascimento. Esta equitativi-
dade, porém, não ocorreu no grupo de mães de escolas especiali-
zadas, pois em 90% dos casos foi transmitida apenas às mães,
tendo estas vivenciado este momento de maneira solitária, sem po-
der compartilhar o sofrimento com outra pessoa, além de ter que
ter a difícil tarefa de transmitir a notícia para os familiares.
O não comunicado imediato da deficiência e a falta de uma
adequada orientação à família pelo profissional responsável após
o nascimento do filho, pode trazer consequências irreparáveis.
Pode, inclusive, ocorrer risco de vida para o bebê, pois necessita de
atendimento específico, em decorrência de problemas congênitos
(ex. cardiopatia, que às vezes requer intervenção cirúrgica).
No grupo de mães com filhos em escolas especializadas,
constatamos que grande maioria foi informada do diagnóstico ao
sair da maternidade, por ocasião da consulta médica de rotina, en-
quanto que a maioria recebeu a notícia ainda na maternidade. Di-
ante destes fatos ficou evidenciada a falta de conhecimento espe-
cífico sobre a importância deste momento da notícia ao casal; a ori-
entação de uma conduta terapêutica adequada para que possa ser
estabelecido um vínculo satisfatório entre a criança e seus pais, de

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 360

maneira que possam acolhê-la com suas limitações, mas também


confiantes em suas potencialidades.
Ao serem indagadas sobre a maneira como foi transmitida
a notícia, a maioria das mães de filhos matriculados em escolas re-
gulares e especializada informou que a notícia foi dada de maneira
vaga, sem terem dada a informação com segurança das informa-
ções e que, em diversas ocasiões, foram utilizados termos inade-
quados, tais como “mongolóide”, “mongol”, “mongolzinho”, expres-
sões pejorativas revestidas da conotação de incapacidade e inutili-
dade para definir a situação da criança, deixando-as emocional-
mente instáveis e sem perspectivas. Isto evidencia a necessidade
de atualizar, também, os profissionais da saúde, oferecendo-lhes
maior embasamento no conhecimento das síndromes e das abor-
dagens hoje utilizadas com vistas a adotarem uma abordagem mais
humanizada e preventiva.

c) Vivenciando os primeiros anos de vida do filho


Saber como se deu a convivência de uma mãe com o filho
com Síndrome de Down é importante para que possamos entender
o seu desenvolvimento nas fases posteriores e o envolvimento ma-
terno.
Ao serem indagadas sobre a forma de relacionamentos com
seus filhos nos primeiros meses, a maioria das mães (70%), cujos
filhos estão em escolas regulares, disse que foi muito difícil, inici-
almente, pois tiveram medo de perder o filho em decorrência das
condições de saúde, de que nunca iam falar, ler, escrever ou traba-
lhar, mas esta visão vai mudando a partir do momento em que per-
cebem que poderão se desenvolver, passando a ter uma ligação
afetiva maior, que é importante para o seu desenvolvimento. Po-
rém, 80% das mães de filhos em escolas especializadas disseram
que foi normal, mesmo reconhecendo que ele era “diferente”, “mo-
linho”.
SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 361

d) Participação dos filhos com Síndrome de Down em


serviços de reabilitação
A maioria das crianças participou de serviços de reabilita-
ção, embora diferenciasse quanto ao período de início do atendi-
mento e ao tipo de serviço prestado a eles. No que diz respeito às
mães com filhos em escolas regulares, ficou claro que a estimula-
ção precoce facilitou a sua relação com o filho. Relataram, ainda,
que durante este atendimento receberam apoio e orientação
quanto à forma adequada de estimularem o bebê. As demais mães
de escolas especializadas não fizeram referências a este processo,
em grande maioria.
Nos dois grupos, os filhos participaram de serviços de rea-
bilitação, no que se refere à fisioterapia, terapia educacional e na-
tação, embora tenham sido salientadas dificuldades para obter
uma vaga na instituição governamental na qual os filhos tinham
atendimento. Os atendimentos devem ser planejados de acordo
com as condições das crianças, pois não existem modelos únicos
(SASSAKI, 2020).
Existem diversas formas de estimulação em relação às que
eram inicialmente utilizadas, ocorrendo uma relação mais com-
pleta em relação às famílias, pois se reconhece que as crianças
aprendem mais com as famílias, onde crescem e aprendem mais.
Um fato, porém, que já foi evidenciado é que estas crianças embora
demonstrem atraso em todas as áreas de função biológica, apre-
sentam progresso constante em seu desenvolvimento global
(MARTINS, 2008).
Um componente chave para a intervenção precoce é a opor-
tunidade que é oferecida a todas as partes para trabalharem con-
juntamente no planejamento e na implementação de programas,
de maneira a obterem um maior impacto nas vidas das crianças em
situação de vulnerabilidade e de suas famílias.

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 362

No que diz respeito à intervenção precoce para crianças


com Síndrome de Down deve ir de encontro às necessidades de
cada criança e de sua família, no que diz respeito à sua indepen-
dência, estabilidade e desenvolvimento, bem como devem ser sen-
síveis às necessidades e especificidades de cada uma.
Os programas devem suscitar na comunidade o empenho
no planejamento de ações favoráveis às crianças e famílias mais
vulneráveis.
Finalmente, devem maximizar recursos humanos e finan-
ceiros existentes, em nível estadual e local, para ajuda-las (GALLA-
GHER, SERRANO, 2000).

e) Convivendo com o filho na escola


Até algumas décadas atrás, era inadmissível pensar em uma
criança com Síndrome de Down numa escola regular. Aliás, de ma-
neira geral, as crianças com deficiência intelectual eram percebi-
das como inúteis, incapazes, e sua deficiência era percebida como
algo inalterável (MARTINS, 2008; CURRINGHAM, 1990).
É relevante conhecermos maiores detalhes sobre como se
deu o processo de entrada do filho com Síndrome de Down na es-
cola e como as mães perceberam o atendimento educacional que
lhes era proporcionado. Algumas matricularam tardiamente por-
que desconheciam, na época, a existência de uma escola regular
que recebesse alunos com Síndrome de Down.
Apesar de existir todo apoio legal à inclusão, os pais desco-
nheciam tal respaldo ou não lutam pelos direitos dos filhos e se
veem ainda diante destas dificuldades ainda hoje e aceitando que
os dirigentes das escolas regulares determinem que tipo de enca-
minhamento a ser feito. Em 40% dos casos, as orientações recebi-
das pelas mães com filhos em escolas regulares foram dadas por
profissionais da área da saúde, que também orientaram a respeito
da escolha da escola regular, ou seja, de um ambiente menos
SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 363

restritivo para eles. Em 40% dos casos, foram as próprias mães que
escolheram a escola, não esquecendo que receberam orientações
por parte da Associação Síndrome de Down (ASD / RN) e de pro-
fissionais de educação, através de seminários e publicações.

a) Motivos para escolha da modalidade educacional


Em relação aos motivos da escolha da modalidade educaci-
onal, 100% das mães que optaram pela escola regular, acentuaram
a respeito da convivência de seus filhos com alunos, na maioria,
sem apresentarem deficiência, onde seriam mais desafiados à
aprendizagem e também porque elas acreditavam nas suas poten-
cialidades.
Dentre as que escolheram escolas especializadas, 80% das
mães não acreditavam que seus filhos pudessem aprender em ou-
tras escolas, pelo motivo delas não terem recebido informações so-
bre o trabalho lá empreendido e tinham sido orientadas que esta
seria a melhor opção, pois não acreditavam que eles estavam pron-
tos para ser incluídos num ambiente comum de ensino, onde po-
deriam ser discriminados e maltratados, em decorrência de serem
indefesos, bem como pelo fato de acharem que os docentes não te-
riam paciência com eles e preparo para ensiná-los.

b) Nível de satisfação com a escola do filho


No que diz respeito ao nível de satisfação, as mães com fi-
lhos em escolas regulares fazem referências aos benefícios que do
processo de inclusão trouxe para eles e dizem que estão satisfeitas
porque: “a escola tem uma metodologia dinâmica”, “proporciona
várias modalidades de esportes”, “facilita a autonomia do filho”, há
respeito mútuo entre os alunos”.
Somente uma mãe não estava satisfeita com a escola regular
porque considera que a professora não tem conhecimentos sobre

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 364

a deficiência, pois, na sua opinião, “ele é muito inteligente e tudo


que é ensinado em casa ele aprende. O que não ocorre na escola,
onde, a seu ver, a aprendizagem não está ocorrendo como deveria”.
Entretanto, 20% das mães que se dizem satisfeitas com a
escola especializada, não pensam o mesmo com relação à aprendi-
zagem dos filhos, pois situam: “o filho, até então, mesmo estudando
há vários anos na instituição, só faz riscar o papel e não consegue
escrever nada”. Outras situam: “meu filho não participa do coral da
instituição, o que a deixa triste”; “acho a escola muito parada, não
manda dever de casa”.
Apreende-se, nestas colocações, que suas queixas são volta-
das para a metodologia utilizada na escola, aspectos socialmente
mais relevantes no processo ensino-aprendizagem, envolvendo a
comunicação oral, a escrita, a leitura e a psicomotricidade.
No que se refere à escrita, 20% das mães consideraram
muito significativa as mudanças ocorridas, dizendo que os filhos
escrevem e fazem exercícios , necessitando apenas de pequenas
orientações, enquanto que 20% assinalaram que os avanços obser-
vados caracterizam-se como razoáveis, referindo-se que eles sa-
bem escrever letras e seus nomes. No entanto, 50% das mães fala-
ram que as mudanças na escrita têm ocorrido de maneira signifi-
cativa. 10% das mães, porém, disseram que não ocorreu nenhum a
avanço nesta área.
No que se refere à leitura, apenas 10% dos alunos sabem
ler sem ajuda; outros 10% necessitam de ajuda; 50% fazem leitura
de seu próprio nome, dos números de 1 a 10, de algumas palavras,
a partir de desenhos. As demais mães (30%) disseram que os fi-
lhos estão iniciando a escolaridade, não alcançando ainda a etapa
da leitura.
No que diz respeito à psicomotricidade, as mudanças
ocorridas são percebidas como significativas, no tocante ao manu-
seio de objetos, ligar e desligar aparelhos eletrônicos, tirar
SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 365

utensílios da mesa, calçar sapatos, vestir roupas, entre outras ati-


vidades da vida diária.
Quanto aos avanços pedagógicos, em escolas especializa-
das, no que diz respeito à comunicação oral, 30% das mães avali-
aram ter ocorrido mudanças razoáveis e 50% salientam que os fi-
lhos quando chegaram à escola não sabiam falar nada e naquele
momento, outras situam que : “falam alguma coisa”, sabem os no-
mes dos colegas”, outros, falam quando são interrogados”; outras
que “não ocorreram mudanças”.
No que diz respeito à escrita e à leitura, 100% colocaram
com tristeza que não perceberam mudanças significativas, pois os
filhos com idade já mais avançada não escrevem, nem leem, “só fa-
zem garranchos, só riscam”, “só sabem fazer bolinhas, não escrevem
nada”. As mães fazem uma avaliação diversificada nessa área, di-
zendo ter ocorrido mudanças em graus variados. A melhoria neste
aspecto, na sua percepção, apresentou-se sempre relacionado às
atividades da vida diária.
Aquelas que disseram ter havido muitas mudanças (20%)
salientaram que os filhos melhoraram quanto às atividades de ves-
tir, bem como para executar algumas atividades de vida diária
como: tomar banho, alimentar-se, vestir-se, bem como para o de-
sempenho de determinadas tarefas que exigem uma coordenação
mais fina, por exemplo, encher um copo de água sem derramar,
abrir um cadeado, abrir a porta com chave, escovar os dentes, en-
tre outras atividades.

c) Mudanças significativas observadas em outras áreas

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 366

No que se refere ao relacionamento interpessoal, 100%


das mães com filhos em escolas regulares avaliaram como muito
significativo os avanços ocorridos, pois eles se relacionam bem os
professores, compartilham das atividades nos momentos de es-
tudo na classe e participam das brincadeiras e das atividades des-
portivas.
Quanto ao conhecimento e respeito aos limites sociais
por seus filhos, a maioria (60%) percebeu ter ocorrido mudanças
e que a escola desempenhou um papel importante no que se refere
ao estabelecimento de normas para todas as atividades realizadas,
destacando algumas atitudes aprendidas como: respeitar a vez do
outro, esperar a sua vez, organizar seu material, dentre outros as-
pectos. Por sua vez, 30% das mães relataram ter ocorrido mudan-
ças razoáveis e 10% avaliaram que a escola tinha negligenciado es-
tes aspectos.
Diante destes fatos salientados, é urgente a efetiva inclusão
de disciplinas e conteúdos propostos pelo MEC, assim como a rea-
lização de atividades diversas voltadas para a formação continu-
ada de professores neste campo de conhecimento. Neste sentido,
perguntamos: quais os conhecimentos necessários à formação de
professores para responder aos desafios frente às diversidades e
/ou complexidade do cotidiano escolar? A formação continuada de
docentes da Educação Básica, especialmente, nas etapas da Educa-
ção Infantil e Ensino Fundamental, à modalidade de ensino na Edu-
cação Especial.
Se a formação do pedagogo tem deixado a desejar, a respon-
sabilidade dos sistemas de ensino em assegurar aos seus docentes
o alcance de patamares mais altos de conhecimento para garantir
a aprendizagem de todos os educandos deve se manter elevada,
com base inclusive em políticas governamentais (PRIETO,
FRANÇA, 2018).

SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 367

No entanto, até agora, não tem sido garantido a elevação do


conhecimento específico na área, devido à precariedade de da sua
inserção na formação geral, requerendo um aprofundamento dos
referenciais sobre a educação numa perspectiva inclusiva. Apro-
fundar estudos relativos à inclusão educacional é algo imprescin-
dível a realização de estudos, nas escolas, sobre a diversidade do
alunado precisa ser algo inserido no Projeto Político Pedagógico
das escolas.
As mães cuja percepções sobre os filhos com Síndrome de
Down foram positivas acerca de suas condições e que acreditavam
que estes tinham possibilidades de avançar foram as mais motiva-
das a buscar informações e orientações junto a profissionais espe-
cializados e conhecer trabalhos realizados em instituições. Apesar
do reconhecimento das limitações de seus filhos, elas procuraram
ajudar, buscando encontrar espaço no qual pudessem no qual pu-
dessem desenvolver seu potencial.
A partir das informações adquiridas, elegeram aquele am-
biente menos segregador, oportunizando-lhes o convívio com vá-
rios tipos de crianças consideradas dentro dos padrões normais.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Como ponto de reflexão, ressaltamos a importância de ha-


ver não apenas no campo educacional, mas também na área da sa-
úde, um investimento maior no estudo a respeito das Necessidades
Especiais, entre as quais a Síndrome de Down para atenderem me-
lhor as mães após o nascimento do filho, para lhes dar uma mensa-
gem positiva sobre ele, com vistas a serem olhados com mais oti-
mismo e confiança no futuro.
Necessário se faz, portanto, um investimento maior na for-
mação inicial continuada dos profissionais, esclarecendo não

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 368

somente aspectos relacionados às deficiências, mas também


quanto às potencialidades deles, à forma de atuação e reabilitação,
às técnicas e aos recursos que podem ser utilizados com vistas a
avançarem no desenvolvimento dos filhos e na sua educação; nas
atividades de lazer e esportes; de trabalho existentes, entre outras.
Assim sendo, desmistificam-se conceitos errôneos, trans-
mitidos pelo senso comum, a partir da ministração de ensinamen-
tos cientificamente corretos sobre a Síndrome de Down e demais
Necessidades Educacionais Especiais, assim como orientações so-
bre procedimentos a serem empreendidos nas diversas fases de
acompanhamento dos alunos e de sua família.
Salientamos, por fim, a necessidade desta postura positiva
e de apoio possa ser extensiva às famílias das crianças com Sín-
drome de Down de todas as camadas sociais, para que, assim, es-
clarecimentos mais reais, desmistifiquem medos e as culpas tão co-
muns em famílias. É relevante, também, que estas informações não
fiquem restritas só às famílias, mas que – através de mecanismos
diversos – sejam divulgadas à comunidade mais ampla, derru-
bando barreiras atitudinais e pedagógicas ainda existentes.

REFERÊNCIAS

CUNNINGHGHAM, Cliff. El síndrome de Down: uma introducción para pa-


dres. Barcelona: Paiddos/ Fundació Catalana Sindrome de Down. Porto Alegre:
Artes Médicas, 1995.

GALLAGHER, Rayamand P; SERRANO, Ana Maria. Alargando o âmbito da inter-


venção precoce: a convergência entre as necessidades e serviços. Inclusão.
Braga: Instituto de Estudos da Criança da Universidade do Minho, 2001.

MACEDO, Benedita Cruz. Visão das mães sobre o processo educativo dos fi-
lhos com Síndrome de Down. Natal: UFRN/ PPGED, 2004.

SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 369

MARTINS, Lúcia de Araújo Ramos. A inclusão escolar do aluno com Sín-


drome de Down: o que pensam os educadores? Natal: EDUFRN, 2008.

PRIETRO, Rosangela Gavioli, FRANÇA, Marileide Gonçalves. Políticas atuais de


Educação numa perspectiva inclusiva: desafios à formação de professores. In:
MARTINS, Lúcia de Araújo Ramos, MAGALHÃES, Rita de Cássia Barbosa Paiva
(Orgs). Processos formativos e desafios atuais da Educação Especial: olha-
res que se entrecruzam. Fortaleza: EDUECE, 2018.

SASSAKI, Romeu. Inclusão e barreiras: biônimo a ser repensado. Palestra do


PPGEESP, 26 / 8/ 2020.

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 370

SOBRE OS AUTORES

Ana Maria Leite Cavalcanti–Tem graduação em Pedagogia. Espe-


cialização em Psicopedagogia e Mestrado em Educação pela
UFRN.Atuou por muitos anos no Serviço de Psicologia Aplicada na
UFRN. Professora aposentada do curso de Psicologia da UFRN.

Benedita Cruz Macedo– Graduação em Psicologia. Especialização


em Gestão de Recursos Humanos e Mestre em Educação pela
UFRN. Atuou por muitos anos no Serviço de Psicologia Aplicada na
UFRN. Atualmente é Servidora aposentada da Universidade Fede-
ral do Rio Grande do Norte.

Elizabete Siqueira Ribeiro - Mestre na área de Educação na linha


de educação e inclusão em contextos educacionais pela UFRN com
foco principal no estudo da Libras; Graduada em Letras - Portu-
guês e Inglês pela UNIG - Universidade Iguaçu (2003), Especializa-
ção em LIBRAS - Docência, tradução/interpretação e proficiência
(2012). Membro do grupo de estudos na UFRN no campo da sen-
sorialidade - Orientação, investigação e elaborações didáticas. Ên-
fase - Deficiência visual.

Eliane Cristina Moraes de Lima - Graduada em Pedagogia pelo


Centro Universitário - CESMAC (1997). Graduada em Educação Fí-
sica - Licenciatura pela Universidade Federal de Alagoas - UFAL.
Atualmente é agente administrativo do Governo do Estado de

SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 371

Alagoas. Tem experiência na área de Educação, com ênfase em


Educação.

Francileide Batista de Almeida Vieira- Professora Adjunta do


Departamento de Educação do Centro de Ensino Superior do Se-
ridó – CERES/Universidade Federal do Rio Grande do Norte –
UFRN. Mestrado e Doutorado em Educação pela Linha de Educação
e Inclusão em Contextos Educacionais pela UFRN com foco princi-
pal no estudo da

Geraldo Bezerra Cavalcanti Neti–Tem graduação em Psicologia,


Especialização em Avaliação Neuropsicológica, Formação em Te-
rapia Cognitivo Comportamental da Infância e Adolescência, e
Formação em Neurofeedback.

Ivanilde Apoluceno de Oliveira –Com pós-doutoramento em


educação na Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro
Doutorado em Educação pela Pontifícia Universidade Católica de
São Paulo eUNAM e UAM-Iztapalapa no México, com estudos sobre
ética com o filósofo Enrique Dussel. Mestrado em Educação Popu-
lar na UFPB. É graduada em Filosofia pela UFPA. Docente do Pro-
grama de Pós-Graduação em Educação e professora titular da Uni-
versidade do Estado do Pará. Atua na área de Educação, com ênfase
em Filosofia da Educação, Educação Popular e Educação Inclusiva,
envolvendo ações educacionais com infância, crianças e com jo-
vens e adultos.

Ivanise Gomes de Souza Bittencourt - Professora do curso de


Graduação em Enfermagem da UFAL - Campus Maceió, atuando
principalmente nos seguintes temas: Pessoa com Deficiência,
Transtorno do Espectro Autista, Saúde Mental, Tecnologias

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 372

Digitais da Informação e Comunicação na Educação, na Promoção


da Saúde e na Habilitação Psicossocial. Faz parte do grupo de pes-
quisa Atenção Integral à Saúde da Criança e Adolescente (AISCA)
na linha de Cuidado à Criança e Adolescente com Deficiência.

Izabel Augusta Hazin Pires - Graduada em Psicologia, Especia-


lista em Neuropsicologia, Doutora em Psicologia Cognitiva pela
Universidade Federal de Pernambuco e Pós-Doutorado pela Uni-
versité René Descartes - Paris V. É professora do Departamento de
Psicologia da Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Coor-
dena o Grupo de Pesquisa LAPEN (Laboratório de Pesquisa e Ex-
tensão em Neuropsicologia da UFRN), Coordenadora do Programa
Talento Metrópole do Instituto Metrópole Digital da UFRN.Bolsista
de Produtividade do CNPq - Nível 2

Janete Benjamin - Doutoranda e Mestre em Educação da linha de


Políticas Públicas Educacionais com ênfase na pesquisa trabalho-
educação-deficiência pelo PPGED/UFPA. Especialista em Educação
Ambiental Escolar pela UEPA; Graduada em Pedagogia pela UFPA.
É professora assistente efetiva da Universidade do Estado do Pará-
UEPA.

Janine Marta Coelho Rodrigues - Doutora e Mestre em Educação


com pós-doutorado em Psicologia da Educação. Coordenadora do
Grupo de Estudos e Pesquisas sobre Formação Docente
(GEPEFD)/UFPB; atuando no Programa de Pós Graduação stricto
sensu em Educação/Mestrado e Doutorado. Coordenadora do Nú-
cleo de Estudos Projetos e Pesquisas sobre Formação Docente,
NEPESF, Pesquisadora Senior da Linha de Pesquisa Transtornos de
aprendizagem e deficiência. Tem se dedicado a pesquisas sobre a
formação e profissionalização docente, diversidade, educação

SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 373

especial, dificuldades de aprendizagem, atendimento psicopeda-


gógico e processos formativos.

Lúcia de Araújo Ramos Martins -Possui graduação em Pedago-


gia, pela UFPE, Mestrado e Doutorado em Educação pela UFRN.
Atualmente é Professora Titular aposentada da Universidade Fe-
deral do Rio Grande do Norte, atuando como Professora Voluntária
no Programa de Pós-Graduação em Educação e no Mestrado Pro-
fissional do Programa de Pós-Graduação em Educação Especial da
UFRN. Tem experiência na área de Educação, com ênfase em Edu-
cação Especial, atuando principalmente nos seguintes temas: His-
tória da Educação Especial; educação inclusiva, inclusão escolar de
educandos com deficiência; educação de pessoas com deficiência
intelectual; formação docente numa perspectiva inclusiva; Atendi-
mento Educacional Especializado. Integra a Associação Brasileira
de Pesquisadores em Educação Especial.

Luzia Guacira dos Santos Silva - Pedagoga, Mestre e Doutora em


Educação pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte, com
Pós doutorado na Universidad de La Coruña – Espanha. Professora
Voluntária do Programa de Pós-Graduação em Educação Especial
– PPGEEsp/UFRN, na Linha de pesquisa: Processos de ensino e
aprendizagem na perspectiva da Educação Especial, e no Programa
de Pós-Graduação em Educação/UFRN, na Linha de Pesquisa: Edu-
cação e Inclusão em contextos educacionais. Dedica-se, especifica-
mente, aos estudos, pesquisa e formação continuada de professo-
res na área da Educação Especial na perspectiva da Educação In-
clusiva, verticalizando suas ações para o campo dos processos de
ensino e aprendizagem de estudantes com deficiência visual – ce-
gueira e baixa visão.

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 374

Marilda Moraes Garcia Bruno - Atualmente é professora Associ-


ada, aposentada na Universidade Federal da Grande Dourados
(UFGD). Docente do Programa de Pós Graduação em Educação da
Faculdade de Educação. Pesquisadora da Linha Educação e Diver-
sidade. Possui Graduação em Pedagogia com Habilitação em Edu-
cação Especial (Ensino do deficiente Visual), Graduação em Letras,
Especialização em Intervenção Precoce, Mestrado em Educação e
Doutorado em Ensino da Educação Brasileira.

Maria Arlyz Ferreira Domingos - Graduada em Letras/ Língua


Portuguesa e suas respectivas Literaturas, pela Universidade Regi-
onal do Cariri (URCA) e Pós-graduanda em Língua Portuguesa e Li-
teratura pelo Centro Universitário de Juazeiro do Norte – (UNIJU-
AZEIRO).

Maria Quitéria da Silva- Mestranda em Educação (PPGE) da Uni-


versidade Federal de Alagoas (UFAL). Especialização em Psicope-
dagogia Clínica e Institucional pelo Centro de Ensino Superior Ar-
canjo Mikael de Araripaca. Graduada em Educação Física pela
UFAL. Graduada em Pedagogia pela Universidade Norte do Paraná.
Membro do Núcleo de Estudos em Educação e Diversidade.

Martha Milene Fontenelle Carvalho - Professora auxiliar do de-


partamento de Línguas e Literaturas da Universidade Regional do
Cariri (URCA) – UERN. Doutoranda em Letras pela Universidade do
Estado do Rio Grande do Norte. Mestrado em Ensino pela UERN;
Especialista em Educação Especial – formação continuada de pro-
fessores para o Atendimento Educacional Especializado (UFC). Es-
pecialista em Psicopedagogia pela Faculdade Integrada de Patos
(FIP). Professora da Universidade Regional do Cariri (URCA), no
Departamento de Línguas e Literatura, com a disciplina de Braille-

SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 375

Sistema de Leitura e Escrita. Membro do Grupo Gestor do Núcleo


de Acessibilidade da Universidade Regional do Cariri (NUARC).

Neiza de Lourdes Frederico Fumes– Doutorado em Ciências do


Desporto e Educação Física pela Universidade do Porto, Portugal (2002)
Presidente da Sociedade Brasileira de Atividade Motora Adaptada (Bra-
sil). Mestrado em Ciências do Movimento Humano pela Universidade Fe-
deral de Santa Maria (1995). Docente Titular da Universidade Federal de
Alagoas (UFAL) .Atua na graduação e na Pós Graduação na área de Edu-
cação, focalizando os seguintes temas: Educação Especial; Educação Fí-
sica Adaptada; Escolarização de alunos com Deficiência Intelectual; For-
mação de Professores; Psicologia Sócio Histórica. É representante para a
América Latina da International Association of Adapted Physical Activity
(ISPA). Presidente da Associação Motora Adaptada (SOBAMA) e membro
da Diretoria da Associação de Pesquisadores em Educação Especial (AB-
PEE)

Soraya Dayanna Guimarães Santos - Doutora e Mestre em Edu-


cação Graduada em Educação Física. Especialista em Educação Fí-
sica na Educação Básica. É Membro-pesquisadora do Núcleo de Es-
tudos em Educação e Diversidades (NEEDI/UFAL). Membro do
Conselho Fiscal da Associação Brasileira de Atividade Motora
Adaptada (SOBAMA), membro da Comissão Coordenadora da Pós-
Graduação Stricto Sensu em Educação - PPGE/UFV e uma das co-
ordenadoras da Ludoteca da UFV.

Silvestre Coelho Rodrigues –Graduada em Sociologia e Mestree


doutor em Educação. Professor assistente, DE, da Universidade Fe-
deral da Paraíba, do Curso de Psicopedagogia. É professor colabo-
rador do projeto de extensão atendimento a criança hospitalizada
- HULW/UFPB. Participa do Grupo de Pesquisa sobre Formação
Docente.Membro do Corpo editorial da Revista brasileira Políticas

SUMÁRIO
L ú c i a d e A r a ú j o R a m o s M a r t i n s ( O r g . ) | 376

Educação e Diversidade PED/NEPESF/UFPB. Pesquisador Senior


da linha de pesquisa Diversidade Étnica do Núcleo de Estudos Pro-
jetos e Pesquisa NEFESP/UFPB.

Sonia Azevedo de Medeiros – Doutoranda em Educação pela


UFRN, Mestre em Inovação em Tecnologias Educacionais pela
UFRN, Especialista em Psicopedagogia Institucional e Clínica, Es-
pecialista em Gestão Pública da Educação Municipal, Especialista
em Educação, Desenvolvimento e Políticas Educativas; Graduada
em Pedagogia - Faculdades Integradas de Patos (2000). Atual-
mente faz parte do Núcleo de Apoio ao discente da Faculdade Ca-
tólica Santa Teresinha, é membro do Núcleo de Acessibilidade e In-
clusão da Faculdade do Seridó. Professora da Faculdade Católica
Santa Teresinha, Professora e psicopedagoga efetiva da Prefeitura
Municipal de Jardim do Seridó. Atua desde 2011, como psicopeda-
goga clínica no Centro de Reabilitação Prof.ª Wilde Santos de Me-
deiros.

Taciana Pontual Falcão – Doutorado pelo Institute of Education


(IOE)- Universidade de Londres. Graduação em (2004) e mestrado
(2007) em Tecnologia e Gestão em Educação à Distância (PPGTEG)
da Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE) e em In-
formática Aplicada (PPGIA -UFRPE). É professora e pesquisadora
da UFRPE na área de Interação Humano – Computador e membro
do Programa de Pós Graduação em Tecnologia e Gestão em Educa-
ção à Distância (PPGTEC- UFRPE).

Waldma Maíra Menezes de Oliveira - Mestrado em Educação


pela Universidade do Estado do Pará, Brasil (2015)
Professora Assistente II da Universidade Federal do Pará Brasil.
Doutoranda em Educação pela Universidade do Estado do Pará
(UEPA). Coordenadora do Grupo de Estudos Surdos na Amazônia,
SUMÁRIO
D e s a f i o s d a I n c l u s ã o E s c o l a r | 377

da Especialização em Educação Inclusiva no Campo e da Divisão de


Inclusão Educacional – DIE da Universidade Federal do Pará –
Campus Cametá.

SUMÁRIO

Você também pode gostar