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BIBLIOTEC A J URÍDICA
-3 ÈJ ^ CLÁUD IO GUIM ARÃ ES
.1
OBRA N°: 960
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. "I‘>h ,H.(‘ A! \ n 1111ng schwererMenschenrechtsverl etzungen:
I i " Um i|< inlc I )onlunstõsse zum internationalen Strafrecht”. In:
VV| NI »l ,1 'íin "I)<*i Pro zcssge gen K arlI (16 49 )und dieEng Üsch eRev olution”.
In I Ji1M A N D T, Al exan der (H rsg .). Macht undRec ht. Grosse Prozesse in
ili i ( ífjfhio htc . .Míi nche n, 1990. p. 171 -186 .
Sum ário: I - Considerações int rod utó rias - II - O pri meir o grupo d e
dúvid as: o conceito de bem jurídi co: 1. Co nceito dogm ático e conc eito
polít ico-criminal de bem j urídico; 2. O primeiro problema: é possíve l
um conceito po líti co-crim inal de bem j urídico?; 3. O segundo proble
ma: esse conceito políti co-crim inal de bem jurídico pod e ser cond ição
necessária para a incriminação?; 4. O ter ceir o problem a: com o distin
guir bens juríd icos coletivos autênticos de falsos b ens jurídico s colet ivos? ;
5. Sí ntese das cons ider ações sobr e o bem jur íd ico -III - O segundo grupo
de dúvidas : a estrutura do deli to: 1. Introdução; 2. A primeira dúv ida : o
que se deve entender por perigo c oncreto?; 3 . A segunda dúvid a: cri mes
de perigo ab strato e falsos bens jurídicos coletiv os; 4 . O caminho pro
missor: abandon o de soluções globais em favor de um detalhado desen
volvimento das divers as estruturas do delito; 5. Síntese das co nsidera
ções sobre o b em jurídico; 6. Síntese das considerações sobre a estr utura
do deli to —IV —Co nclusão - Bibli ograf ia.
Re sum o: O autor tom a a cada vez dif undida tese da incons tituci onal idad e
dos crimes de perigo abstrat o co m o po nto de p artida para uma anál ise da teori a
do bem jurídico e das estruturas do deli to (is to é, dos problem as rel ati vos aos cri
mes de perigo concret o e ab strato). Suas conclusões cam inham n o sentido da
Direito Penal 89
Luís G rec o
imp ossibili dade de crité rios simples e globais, fazend o-se n ecessári a um a abor
da gem tão di ferenci ada quanto os pro blem as que ela se propõe a reso lver.
Palavras-chave: P rincípio da lesivi dade; bem jurídi co; crimes de perigo; pe
rigo abstrato; fins do direito penal.
1. O primeiro a defender esta tese entre nós, segu ndo vejo, foi Lu iz Flávio Go me s, “A contraven
ção do art. 32 da Le i das Contravenções Penai s é d e perigo abstrat o ou concre to? (A questão da in-
constitucionalidade do perigo abstrato o u presu mid o)”, RBCCrim 8/69 et seq. Dep ois, seguiram-se
Paulo Queiroz, Do caráter subsidiário do direitopenal, Belo Horizonte: D el Rey, 1998, p. 112 e 150;
Dam ásio de Jesus, Crimes de trânsito,4 . e d. ,São Paulo: Sarai va, 2000, p. 2 et seq., Leiantitóxicos, 6.
ed., São Pau ío: Saraiva ,2000 , p. 15 et se q.; Lui z Flávi o Go me s, Norma ebemjuridico no direitopenai,
São Paulo: Ed. RT, 2002, p. 30; Mariângela Magalhãe s G om es, Oprincipio da proporcionalidade no
direitopenal, São Paulo: Ed . RT, 2003, p. 120 e t seq.; Alice Bianchini, Pressupostos materiais mínimos
da tutelapenal, São Paul o: Ed. RT ,200 3,p. 67 et seq. Ma is cont ido, Angelo Robert o Ilha da Silva,
Dos crimes depertgo abstrato emface da Constituição,SI o VtüAo :E d. R T,2003,p. 95 etseq., que admi te
alegitimidade destes crimes, desde que respe itados certos princ ípios.
A doutrina italiana, que é a mais importante fonte de inspiração dos críticos nacionais do perigo
abstrato, parecejá há muito ter abandd hado a atitud e meramente negativa em favor de u ma análise
mais diferenci ada (cf. Fiandaca e M usc o, Dirittopenale. Parte generale , 3. ed., Bolo gna: Zanichelli,
1995, p. 1 76 etseq .; Fiore, Diritto penale. Parte generale, Torin o:Utet, 1999, vol. I.,p . 183 etseq .;
Mantovani, Dznrto/«?w/e, 3 - ed., Padova: Ce dam , 1999, p. 232 , n. 70a; Marinucci e D oicini, Corso di
dirittopen ale,! . ed.,Milano: Giu ífrè,1 99 9,p.4 16 et seq.; Padovani, Diritto penale,h. ed., Milano:
Giu firè,1995,p.l7 2;Pagiiaro ,PnW (£z^tV ín/í0JÊ£?2i2/i?,8.ed.,Milano: Giu ffrè,2 003 ,p.24 6 etseq.).
Radical, ainda, Ferrajoli, Dir itto e ragione, 5. ed., Rom a/B ari: Laterza, 1996, p. 482 e 739.
2. Por exemplo, Lu iz Flávio Go m es, Principio da ofensividade no direitopenal, São Paulo: Ed.
RT, 20 02, p. 14.
ra preenchido sem que o bem j urídico seja sequer exposto a um perigo con cre to,
neles o dito pr incípio da lesividade estari a vi olado. Um a vez que este princípi o
teria hierarquia constitucional,3 os crimes de perigo abstrato seriam sim plesm ente
das seg uintes reflexões será unicam ente a prime ira linha argum entativa, a s aber, a
da m edida em que o princípio da lesi vida de pode levar a que se reconheç a a in
constitucionalidade de todos os crimes de perigo abstrato.
O que m ais imp ressiona em toda essa argum entação é, ao lado de sua
evidente coesão lógica, o grau de convicção daqueles que a desenvolvem. Por
trás dessa atitude está o justificado descontentamento c om um legisl ador que
não pára de cria r novo s crimes - para cit ar um exemplo recente , a nova L ei so
4. C£ , quanto ao i mpreciso conce ito de “direito penal míni mo”, Greco, “Pr incipio da subsidi a-
nedade n o direit o penal”, Dicioná rio deprincípiosjurídicos , no prelo.
5. O dispositi vo reza: ‘‘Disparar arma de fogo ou aci onar muni ção emlu gar habitado ou em s uas
adjacências, em viapública ou em direção a ela , desde que essa conduta não tenha como finalidade
a prática de outro crime. Pen a-re clus ão, de dois a quatro anos, e multa . Parágrafo único. O crime
previsto nes te artigo é inafiançável”. Est a condu ta era, até então, mera contravenção penal.
Direito Pon.il 91
| h » n*" Hi-titt i u mo seguras com o par ec em sup or os
92 RBCCRIM49 - 2004
"Princípi o da ofensividade" e cr imes de perigo abstrato
ciai na norm alidade da v ida sexual”.ç Q uan to a este concei to, não há qualqu er
dúvi da ou problema. Ele nada m ais é qu e o intere sse protegido po r determ ina
da norm a, e on de houv er um a norm a, haverá um tal inter ess e.
M as quando discutimos os limites do po der l egal de i ncri minar, não é ess e
o conceito de bem jurídico que nos interess a. Afinal, es te conceit o está à com ple
ta disposição do legis lador. Co m base n este concei to, só se poderá dizer s e algo é
um bem jurídico se o legislador assim houver deci dido. O que precisamo s saber é
se é possí vel t rabalhar co m um concei to não m ais dogm ático, e úxa. polític o-cri
m ina l àe. bem jurídico; noutras palavras, se se pode espera r do conceito de bem
ju rídic o alg um a eficácia no sentido de lim itar o p oder de p unir do Esta do.
N este trabalho, não trataremos do conceito dog m ático de bem jurídico,
Direito Penal 93
Luís Greco
11. Cf. Hungri a, in: H U N GR IA , Nels on; FR A G O SO , Hel eno. Comentários ao Código Penal.
5. ed. Rio de Jane iro: Forense, 1978. t. II, vol. I, p. 10 et seq.; Bruno, Direitopenal. Parte geral,
3. ed., Rio de Janeiro: Forense, 1967, t . II, p. 212 ; Maga lhães N oronha, Direito -penal, 32. ed.,
São Paulo: Saraiva, 1 997, vol . I, p. 115; Fragoso , Lições de direitopenal. Parte geral, 5. ed., Rio de
Janei ro: Forense, 1 983, p. 268 et seq.
12. Um a pequena amostra, ordenada alfabeticamente, sem qualquer pretensão de ser comple
ta: Nilo Batista, Introdução critica ao direito pe nal brasileiro, 4. ed.,R io de Janeiro : Revan, 1999,
p. 94 et seq .; Fernando C apez , Consentimento do ofendido e violência desportiva, São Paulo ; Sa
raiva, 20 03 ,p. 114; Yuri Carneiro Coe lho , Bemjurídico-penal. Belo Horizonte: Mandamentos,
2003, pa ssim; Luiz Flávio Gom es, Norm a e bemjurídico..., cit.; Ilha da Silva, op. cit., p. 29 et
seq.; Ma galhães Gom es, op. cit., p. 90 et seq.; Lu ís Régis Prado, Bem jurídico -penale Constitui
ção, 3. ed., São Paulo: E d. RT , 2003, p assim; Jua rez Tavare s, Teoria do injus to pe na l,2. ed., Belo
Horizonte: De l Rey ,2002 ,p. 197 et s eq.
13. Co m o estudo “Critérios de selação de crimes ecomina ção de penas ”, RBC Crim, São Paulo,
número especial de lançamento, p. 78 et seq,, 199 2. ,
14. Por exemplo, Freund, in: H E IN TS C H E L- H E IN E G G , Bemd v on (Ed.) . Münchener
Komm entarzum Strafgesetzbuch. München: Beck, 2003. vor §§ 1 3 ff/4 2 et seq.; Hass emer,
“Gru ndlini en ei ner person alen Rechts gut slehre ”, in : PH ILIP S; S C H O L L E R {&à.).Jenseits
des Funktionalismus. Heidelberg: Decker u. Müller, 1989. p. 91-92); “Darfe s Straftatengeben,
die ei n straf rech diche s R echtsgut nic ht in Mítl eidenschaft z iehen? ”, i n: H E F E N D E H L ;
W OH LE RS ;v.H IR SC H (Ed s.).Z)?> fo’i:to(g'Zí/j^écní’.B adenBaden :Nom os,2003.p. 64,par a
o qual proibições penais sem be m jurídico seriam “terrori smo estatal"; Herend ehl, Koílektive
Rechtsgüterim Strafrecht, Kóln: Heym anns etc.,2 00 2, p. 18 er seq.; “Da s R echtsgut ais m aterialer
Ang elpun kt e iner Strafnorm”, in: H E FE N D EH L; W O H LE RS: v . H IR SC H (Eds. ). Die
Rechtsgutstheorie.Baden Baden: N om os,2003. p. 119 et seq.;“DieTagun g aus derP ers pekt ive
eines R echtsgutsbe fiinvor ters”, in: H E F E N D E H L ; W O H LE RS ; v. H IR SC H (Eds.). Die
94 RBCCR 1M 49 - 2004
"Princípi o da o fensividade" e crimes de perigo ab strata
Recbtsguístheorie. Baden : N om os,2003 .p.38 6 ets eq. ; Ott o, Grundkurs Strafrech t, 6.ed.,
Berlin/NewYork: D eGruyter, 2 000, § 1/40; Roxin, “ W andlung der S traf rechtswi ssens chaft”,
JA , p. 22 3,1 98 0; “Zu r Entw icklung der Kriminalpoli tik seit den Alte rnati v-Encwürfen’ ’,J/í, p.
546 ,1980; Rudolph i,“Die verschi edenenAspek te des Rechts gutsbe griffs”, FestschriftfürHomg,
Gottingeiv. O tto S chwarz 8c Co ., 1970, p . 163 et seq. ; SystematischerKommentar,6. ed., Neuwied:
Luchterhand etc., 1997, vor § 1/8 ; Schünemann, “Strafrechtsdogmatik a is Wissensch aft”, in :
SCH ÜN EM AN N erai. (JL<is.).FestscbriftfurC!ausR o x i n . DeGruyter,2001.p.26 etseq.;
“Das Rechtsgüterschutzprinzip ais Fluchtpunkt det verfassungsrech.dich.en Grenzen der
Strafta tbestande und ihrerlnterpretation”,in: H E F E N D E H L ; W OH LE RS ;v. H IR SC H (Eds. ).
Die Rechtsgutstbeorie. Baden Baden: N omos, 2003. p. 133 etseq.; Stãc helin, Strafgesetzgebungim
Verfassungsstaat,Ber lin: Dun cker ô tHu mb lot, 1 998. p. 80 et seq.
15. Amelung,“DerBegriffdesRechtsgutsinderLehrevomstrafrechttichenRechtsgüterschutz”,
m: H EF EN D EH L; W OH LE RS ;v.H IR SC H (Eds. Baden Baden: Nomos ,
200 3. p. 154 etseq. (a traduçã o deste estudo pa ra o português, feita por mim , encontra.-se no prelo);
Appel, Verfassung undStrafe, Berlin: D uncker ôcHu mbloy, 1998, p. 206; “Rechtgüterschutz dur ch
Strafrecht?”, KritV, p. 27 8 et seq., 1999; Bockelmann e Vòlk , Strafrecht- Allgeme iner Teil, 4. ed.,
Münc hen: Beck , 198 7, p. ll;F risc h ,“Anden Grenzend es Stra frechts”,in: K Ü PE R ;W EL P( Ed s.).
FestscbriftfürStree und Wessels.Heidelb erg: C . F. Müller, p. 71 etseq.; “ Wesendich e Voraussetzungen
einermodernenStrafgesetzgebung”,in:ESER(Ed.). VomtotalttãrenzumrecbtstaatlichenStrafrecht.
Freiburg: Max P íanck Insti tut, 1993. p. 203 et seq.; ‘‘St raftat und Straftatsy stem”, in: W O LT ER;
FREU ND (Ed s .). Straftat, StrafzumessungundStrafprozeflimgesamten Strafrechtssystem.Heidelberg:
C. F. Müll er, 1996. p . 136 ets eq.; “Rech tsgut, Recht , Deliktsstr uktur und Zurechnu ngim Rahm en
der Legi tima tionstaa dichenS trafens”,in:H E FE N D E H L; W OH LE RS ;v.HI R SC H (Eds.).-Dzá
Baden Baden: Nom os, 2003. p. 21 6 et seq.;Jak obs ,“Kriminalisi erungimVorfel d
einer Rechtsgutsverletzung
DeGruyter, ”, ZSiW97/752,
1991, §2 /1 etseq.;Mich aelKóhle r,1985; Sirafrecht
Strafrecht- - AllgemeinerBerlin:
Allgemeiner'Teil, Teii, 2.Spr
ed.,inge
Berlin:
retc .,
1997, p. 24 et seq.; Kuhlen,“Strafi:echtsbegrenzung durch einen materiellen Straftatbegriffr”, in:
W OTTER;FR EU N D (Eds.). Straftat, StrafzumessungundStrafprozefiimgesamten Strafrechtssystem.
Heidelberg: C. F. Müller, 1996. p. 89 e 96; Lagodny, Strafrecht vor den Schranken der Grundrechte,
Tüb inge n: Mo hr-Sieb eck, 1996 , p. 144; Naucke, “Di e Reichweite des Vergel tunsstraírechts bei
Kant”, Überdie Zerbrechlicbkeit des rechtsstaatlichen Strafens, Baden Baden: N omos, 2000 , p. 81;
Stratenwerth, “Zuku nftssicherung m it den Mitteln des Strafrechts”, ZStW 105/692,1993; Da s
Strafrecht in derKrisederlndustriegesellschafi, Basei: Ver lag Heibing & Lichtenhahn, 1993. p. 17;
“Zum Begriffdes ‘Rechtsg utes’”, in: ES E R et al. (Eds.). Festscòrftfur TheodorLenckner. München:
Beck,1998.p.391;“KriminalisierungbeiDeliktengegenKolldaivrechtsgüter”,in: HEFENDEHL;
WOH LERS ;v.HIRSCH (E.ás. ). Die Rechtsgutstbeorie. Baden Baden: Nom os, 2003. p. 255 etseq.;
Vogel, “Strafrechtsgi iter und Rechtsgüterschutz durch Strafrecht im S piege l der Rechtsprechung
des Bundesverfassungsgeric hts", StV, p. 112 ,199b;WohleTs,De/iktstypendesPráventionsstrafrechts
'-z urD og m adk “moderner” Geíâhr dungsdel ikte, Berlin: Duncker 6c Humblot, 1999, p. 279.
16. C f principalmente os manuais e comentários: Lenckn er,em Schónke e Schrõder, Strafgesetzbzicb
Kommentar, 26. ed.,München: Be ck ,2001, vor §§ 13 et se q./10; Gropp, Strafrecht- Allgemeiner
Direit o Penai 95
Luís Greco
m inar a probl emá tica da proibição do porte de haxix e para uso pessoal, fez
questão de não o fazer.1 7D esd e e ssa d ecisão p od e-se afi rmar que os defensores
do conce ito políti co-cri m inal de bem jurídico se encontr am na defensiva, ha
vendo m esmo quem brinque com a me táfora de estar o conc eit o de bem jurídi
co moribund o, no leit o de mo rte, ou declarad o mo rto por seus opo sitore s.18
Ain da assim, o concei to político-cri m inal de bem jurí dico teve, ao menos
hist oricamente, um a gr an de conquista', orientou amplas descriminalizações no
direito pen al se xual alemão. Para lemb rar unicamente o exemplo m ais significati
vo: na Alem anha, o hom ossexualis mo masculino era um a conduta punível até a
década de 70. Algun s autores valera m -se de um conceito crí tico, político-cri m i
nal de bem jurídi co para dizer que tais incri minações de condutas me ramente
imo rais não tutel avam bem j urídico alg um , sendo, portanto, ilegítim as.19 E ssa
argumentação acabou p or convence r o legis lador, que abol iu o referido dispo siti
vo, iio la do de mu itos out ros. M a s m esm o essa conquista é at ualmente questiona-
dii [)oi muitos. Para Frisch20 e Stratenwerth,21 por exemplo, o conceito de bem
|m idii o aqui pouco fez; a descrim inaliza ção do hom ossexualism o ma sculino de-
» niMMiii ilc m ud an ças cultu rais , elas s im de cisiv as.
M,u'» ii!|;uns autores não vê em no bem j urídico qua lquer conteúdo
liliruli. MHIr, tKV icnlido que lhe é atribuíd o p or mu itos, e sim um m ecan ism o que
Jh l, llnltn ' itijií» i M , V27 ct &eq.; Jesche ck e W eige nd, Leh rb uc h d es S tr a fr e c k ts -
All ^emr Min íill, i u l , Un lin 1hnt i kcr W íum blot, 1996,p. 7etseq.;W essekeB eulke,
All flciiioiuei iu l, * I o l , I Imiotlici n t ’. !r,M ul ler ,20 03 ,n .9.
17 . BVal t; cm NJW W . p , \STl et wq.
18. Cfo sdoiadflvniicimu ltnoniT ilopollfi io c'rí mm ddebem jurí dicoHetendehl,“DasR echtsgut
ais ma terialer ...", cír., p. 1 1 c Hi lilt iimiitnii ,"1 ) íih Rcchtsgüterschutzprinzi p...” ,cit.,p . 13 3.
19. E m espec ial He rbcnjíl^o i, S/iafyctcfz^ r/jringu rid RsebtsgúterscòutzèeiSiíí/ichke itsdelikten,
Stuttgart: Ferdinand Enke Wrlug, 1 0^7, p, 6 ct seq.; Roxin, Tãtench aft und Tatherr schaji,
Ham burg: Cram de Gr uyter, 1963, p . 41.} ct 'icq ,,! lan ack /Ein ptie hlte ssich .die Grenzen des
Sexualstrafirechtsneuzubestimmen?”, (hiCachtcnAfúrder! 47 Deutschenjuristentag,
Beck, 1968 , n. 29 et seq.
20. Frisch ,“Rech tsgut,Rech t,De!ik£sstruk tur,..”,cit., p. 218.
21. Stratenwertb, “Zum Beg riff.. .”,cit.,p. 3 89 ct seq .
96 RBCCRI M 49 - 20 04
"Principio da otensividade" e crimes de perigo abstrato
mais e m ais serve de base p ara legitimar a e xpansão do direito penal.2 2 Pod emos
mencionar aqui Jak obs , pa ra o qual a idéia de bem jurídico pode n o máxim o che-
o-ar a um direit o p enai de inimigo, oposto ao direito pena l cidadão, s end o a fina
lidade deste não a proteç ão de bens jurídicos, e sim a max imização d e esf eras de
liberdade,2 3 e Volk , que verifica que o conceito de be m jurídico mu dou com pleta
mente de função, aban don and o a função crític a para passar a fundamen tar as nov as
incriminações do direito penal econômico e ambiental.24
E nfim , o concei to de bemjurídico po de ser tudo, menos amp lamente ac eito.
Pelo c ontrário, tanto no B rasil, como na A leman ha, ele é def endido p or uma
doutrina m inoritária. A ún ica diferença entre nós e os alemães parece ser que aqui
está na m oda falar de b em j urídico, enquanto lá a m oda a gora é recusá- lo. Tais
observaç ões n ão signifi cam, porém , que essa doutrina minoritári a não po ssa ter
razão; ela s val em, a inda assim , como pr imeiro sinal de cuidado, no sentido de que
é me lhor parar e refleti r a respeito d e nossas certezas. E o que faremos a seg uir.
b) A problemática do conc eito polít ico- cri minal de bem jurídico: onde
fundamentá-lo?
Qu eremo s um conceit o de bem jurídico capaz de rest ringi r o po der de
incriminar do legisl ador.2 S O problem a é, ass im, d e onde ext raí -lo . N a Ale m a-
22. Es te p erigo, em especial no que se refere a bens jurídicos coletivos , é apontado mesm o por
defensor es do conceito político-crim inal de bem j urídi co, com o repetidamente faz Ha ssemer,
“Grundli nien einer personalen. . cit., p. 89; “ Symbolisc hes S trafrec htund Rechts güte rchut z”,
NSíZ, p . 557,1989 ; Einfü hm ng in die Grundlagen de s Strajrechts, 2. ed., Münc hen: Beck , 1990,
p. 27 5; “Straf rechtswiss enschaft in de r Bundesrepubl ik Deutschíand’ ’, in: S IM O N (Ed.).
Rechtswissenschaft in de rBo nn er Republik. Frankfurt a. M.: Suhrkamp, 1994. p. 299 e 307;
“Perspekt iven einer neuen Krim inalpoíitik”, StV, p. 484,1995.
23. Jako bs, “Kriminalisierung im Vorfeld...”, cit., p. 756.
24. Volk, “Strafrech tund Wirtsc haftsl criminai itàt^.yZ, p . 88,1 982 .
25. Esta mos abstraindo da pergunta, ta mbém relevante, quanto a se esta limitaçã o ao poder do le
gislador tem necessariamente de ser prestada pelo conceito de bemjurídico, e não por alternativas.
Uma alternativa que vem gan hand o cada vez mais adeptos é a teoria da lesão a direit os, que remonta
iTtneib .à\{c£.Ye.\izib/ich.,R.evisionderGrundsàtzeundGrunàbegriffèdespositivenpein[ichenR£chts,
2
Erfurt: Hennings cheBuc hhand lung, 17 99,reimp. Aalen, 1966, vol. I,p. f>5',R£n)isionderGrundsátze
und Gnmdbegriffe despoútiven peinílcben Rechts, Tasche: Chem nitz, 1800,reim p. Aalen, 1966, vol .
Direito Penai 97
Luís Greco
ului, as propostas são as mais variadas. E xiste m autores que bu scam insp iração na
filosofi a de K ant e Fichte,2 6 com o ou tros que a procuram na filosofia da lingua
gem anglo-saxò nica.2 ' Pod e-se observar, contudo, q ue a m aior parte desta s pro
postas fi cou sem continuidade . Um a ún ica del as parece de algum modo prospe
rar: a de definir o bem jurídico c om arr im o na Constituiçã o.2S Estar-se-ia, assim,
diante de um conceito político-cri minal de bem jurídi co vincul ante para o legis la
dor, porque ele seria e xtraído diretamente da Co nstituiçã o, sendo portan to dotado
de hierarqui a consti tucional. E ss e pa rece ser igualmente o ca minho preferido pelos
defensores brasi leiros do conceito p olítico-crim inal de be m jurídico.2 9
c) A prob lemática do conceito constitucional de bem jurídico (I): o cará
ter abe rto e impreciso das C onstituiçõ es
O problema que tal conceito con stitu cion al de bem ju ríd ico coloca sa lta aos
olhos já à prim eira vista. S e a C ons tituiç ão é necess ariamente aberta, s e inúmeros
valor es, m esm o conflitantes , encontram acolhid a em seu sei o, como se po de fàlar
numa limit ação ao pod er do legislador? Ta is dúvidas, que são colocadas mesmo
98 RB CC RL M 49 -20 04
"Princípio da ofensividade" e crimes de perigo ab strato
em face da L e i Fundam ental alemã,3 0 aplicam -se com m uito m ais razão diante
de um a Co nstit uição analí tic a como a do B rasil . Exem pli ficando: nem m esm o a
incriminação do h omossexualismo po deria ser deslegiti m ada com b ase ex clus iva
na C onstituiçã o, porque esta tem disposit ivos tut elando a família (art . 226 et seq.)
e a moralidade (art . 221, IV ). Foi simi lar, a liá s, a argumen tação da Co rte C on s
titucional al emã, quando, em 1957, se viu obrigad a a exam inar a constitucionali-
dad e da pr oibição, que foi d ecidid a em sentido afir mativo.3 1 A per gunt a é, por
tanto, se a Constituição-, ab erta como ela reconhecidamente é, pode ex cluir algu m inte
resse, algum valor, pa ra considerá-l o impa ssíve l de tutel a p o r meio do direito pe na l.
Parece-me que, apesar das considerações acima tecidas, a resposta deve
recair em sentido positivo, porque, por exempl o, uma norma como a L ei de Prote
ção do Sangue Alem ão e da Ho nra Alem ã, de 15.09.1935, que , em seus §§ 1. ° e
2 .°, proibia a “maculação da raça” ( Rassenschande ) pel o casamen to ou pelo coi to
entre alemães e jud eu s,32 seria manife stame nte ilegítima em face da ordem c on s
tit ucional tanto ale mã, com o brasil eira, vez que am bas vedam discriminações po r
motivos de raça o u srcem .33M ais : me sm o a norma que proíbe o homo ssexualismo
pod eria ser cri tica da com argum entos de direit o const ituc iona l, atinent es a direi
tos fundamentais como a liberdade, a privacidade e a intimidade, que teriam de
Direito Penal 99
Luís Greco
o parágrafo an terior. Não seri a o con ceit o de bem jurídico algo dispensável ? N ão
bastaria afir mar que o direi to pena l só pod e tutel ar valores acolhidos , ou ao menos
não-vedad os, pe la Constituição? C om isso estamos diante do próximo problema,
que diz respeito à necessidade ou não de um conceito constituci onal de bem j ur í
dico ao lado da C onstituição de que já dispomo s.
d) A probl emática do concei to const itucio nal de bem jurídico (II )
prescindível ou m era duplicação conceit uai?
O conce ito de bem jurídico ter ia alguma função ao lado do conj un
valores constitucionais? Nã o se po deria dizer que o fim do direito penal é pro
teger valores consti tucionais, sem precisar propo r um novo termo, tornand o sem
razão de ser as intermináveis discussõ es a seu respeit o? Pa rece-m e que grande
34. Obse rve-se que não tr abalhei a qui com as t radicionais formulações do princípio, segundo
as quai s a pena seria a mais grave das san ções, à qual porta nto só se poderia recorrer uma vezque
o legislador não dispusesse de nenhum outro meio men os grave, c omo o direito administ rativo
Pedro II, ao qual d edica disposi tivo própri o, em que decl ara : “O C olégio Pedro
II, l ocalizado na C idad e do R io de Janeiro, ser á m antido na órbita federal” (ar t.
242, § 2.°). E necessár io, muito m ais, que o bem sej a dotado de algum a rel e
vância, de fund am ental r elev ância, d e rel evância tamanh a que se po ssa j us tifi
car a gravidade da sanção que a sua viol ação em regra a carr eta. D aí por que pre
cisam os de um a d efi nição de bem j urídico mais rest rit a do que a m era ref erên
cia a valores con stit ucionais.
e) A problemática do conceit o consti tucional de bem jurídi co (III): como
defini-lo?
Co m o que estamos diante do segui nte desaf io: s e o conceito de bem jurí
dico não pode servi r de mero espel ho da Co nstituição, m as tem de nec essaria
m ente exc lui r algo, com o d efini-l o? A qu i, as propo stas doutrinárias realmente
abun dam , e ao contrário do que declara o conhecido brocardo l atino, esta abun
dância de fato prej udica, porque ela implica em confus ão, em desor ient ação, quan
do o que se quer é justam ente u m parâm etro para orient ar o le gis lador . Já se pro
puseram as ma is diversas definições de bem jurídico, que vão desde “interesse
ju ridic am en te prote gid o”35 a “valor objetivo que a lei reconhece com o nec essita-
ou o direito civil. E de se dar razão a Tiedemann, que aponta que, muitas vezes, estes outros
ram osdod ireitopod em ser bem mais limit adores da l iberda de do qu e o direi to penal (Tiedem ann,
Tatbestandsfunktionen im Nebenstrafreckt, Tübingen: M ohr-Siebeck, 1969, p . 145, n . 22;
"Wirtschaftskriminalitát ais Problem der Gesetzgebung”, In:TIEDEMANN, Klaus (Ed.).
Die Verbrecben in der Wirtscbaft, 2.Aufl. Karlsruhe: C. F. Müller , 1972. p. 9 e t seq., SS . 16-17;
“Wirt schaf tss tra fre cht - Einfuhrung und Ube rsic ht”, / ^ , p. 690,1989 ; “Straf recht in der
Markt wirt scha ft”. In: K ÜP ER ; W EL P (Eds. ). Festschriftfúr Stres und Wessels. Heidelberg: C.
F. Müller, 1993. p. 530-531; de acordo também Schünemann, “Alternative Kontrolle der
Wirts chaft skri mininal itàt”, i n: D O R N SE IF E R et a l. (Eds. ). Gedãchtnisschriftfür Armin
Kaufmann. Koln: Heym anns etc., 1989. p. 632 ; Hefendehl, Koileklive Rechtsgüíer..., cit., p. 234 ).
Parece-me, portanto, qu e um a tarefa urgente diante da qual a moderna doutrina do direito penai
se encontra é reestudar o princípio da subsidiariedade, levando em consideração este problema.
Para ma is reflexões, c£ G reco , “Princípio da subs idiaried ade...”, c it.
35. Principalmen te Lis zt, “De r Beg riff des Rechtsguts im Strafrecht und in der Encyklopádie
der Rechtswissenschaft”, ZStW 8/133 et seq., 1888; Liszt e Schmidt, Lehrbuch des Deutscben
Strafrechts, 26. ed., Berlin/ Leipzig : DeGru yter, 1932, p. 4. Simi lar, Figueiredo D ias, “A questão
Direito Penal 10 1
Luís Greco
iln d* "vsilor de m en tar d a vid a em com un idade ”,3' “un idad e funcio-
tiijl i<k uI V ^M C lcn são de respeito”, 39 “relação real da pesso a com u m valor c on-
i id o iTion hccid o pela com un idad e”40 etc.
Cre io que este cansat ivo deb ate é, em grande m edida, terminológico, e
talvez seja por isso que se observa um crescente desinteresse da doutrina a seu
res pei to. Tem -se a impressã o d e estarem todo s a dizer aproximadamente a m es
ma coisa, mas valendo-se d e palavr as distintas. N a verdade, parece-m e que o es
sencia l é, de fato, comp reender que existem nad a m ais do que três questões fun
damentais no mome nto de defini r o conceito de bem jurídico. A primeira dela s
diz respeito a que este interes se, valo r, unida de fun cional, pretensão de respeit o
etc. seja de importância fundamental par a alguém, de mod o que a exist ência ou o
bem -estar des te alguém estariam severame nte ameaçados caso a incri minação
ine xis tisse . Aqui, não háp roblem a algum ,parece haver grande acord o ou ao m enos
possibil idade de acord o na doutri na. A segunda questão diz r espei to a este m en
cionado “ alguém”: para q uem o bem juríd ico deve ter importância fundam ental?
Para os indivíduos, para a coletividade ou para os dois?
E ste tópico é cal orosam ente debatido atual mente na Alem anha. S ão
imagináveis tr ês posições, ape sar de, na prática, s erem defendidas unicamente
duas. De um lado, encontram-se os adeptos da chamada concepção dualista de
do conteúdo m aterial do conceito de crime ( ou fato pu nível)”, in: Questõesfundam entais de direito
pen al revisitadas. São Paulo: Ed. RT , 1999. p. 63.
36. Mezger, Strafrecbt- Ein Lehrbuch, 3. e d., Berlin: Duncker ScHumblot, 1949, p.201. Sim i
lar, B itencourt, Tratado de direitopenal, 8. ed., Sã o Paulo: Saraiva,2003, p. 204; Carneiro Coelho,
op. dt.,p. 130.
37. Welzei, Dasdeutsche Strafrecbt, 11. ed., Beriin: DeG ruyter, 196 9,p. 1-2.
38. Rudo lphi, “Die verschiedenen A sp ek íe. ..”, cit., p. 163; de acordo, Fiand aca e Mu sco , op.
cit.,p.5.
39. Schmidhàus er, <fr rcj/r«Ã/-Allger neinerTe il)2. ed.,Tüb ingen:M ohr, 1984, § 5/27. De acor
do, Gropp, op. cit., § 3/28.
40. Otto, op. cit., § 1/32.
102 RB CCR1 M 4 9 - 20 04
"Princípi o da oten sivi dad e" e crimes de perigo ab strato
bemjurídico, entre os qu ais se enco ntr am T ied em an n ,41K uh len ,42Sc hü ne m an n,43
Hefendehl44 e, em Portugal, Figueiredo Dias,45 e que parece ser a posição do
minante: pa ra esta concepção, há bens jurídicos tanto individuais, quan to cole
tiv os, e não se po de reduzir os bens jurídicos individuais à sua dim ensão de in
teres se colet ivo e nem v ice-versa os bens jurídicos coletivos à sua dim ensão de
interesse individual. Ben s jurídicos individuais e col etivos seriam a m bos igual
mente legítimos e admissíveis. Do outro lado, encontram-se os que pugnam
por uma concepção monista- pesso ai de bem jurídico. Para estes autores, atualmen
te encabeçad os po r Ha ssem er, pon to de pa rtida são os interesses individuais.4 6
Bens j urídicos d a coletiv idade só podem ser reconhecidos n a m edida em que
refe ríve is a indivíduos concretos. A coletiv idade po r si só não é objeto de prote
42. Kuhlen, “Umweltstraft recht - Au fder Suche nach einer neuen Dogm atik'’, ZStWlOS/704,
1993.
43. Schünemann, “Kritische Anmerkungen zur geistigen Situation der deutschen
Strafrechtswissenschaft”, G/ í, p. 20 8 et seq., 1994, em áspera polêmica contra o conceito monista-
pessoai de bem jurídic o.
44. Hefendehl, Kollektive Rscbts güter..., cit.,p. 73.
45. Figueiredo D ias , op. cit., p. 63 e 74.
46. Hassemer, “Grund linien einer personalen... ”, cit., p. 91-9 2; “K enn zeid ien und ÈCrisen des
modemensonalenRechtsgutsbesãmmungimUmweltstrafrecht”
einerper Str afrechts” , ZR P,p .37 9,1992; de acordo, também, Hohm
, GA,ann
p. 76,“VondenKonsequenzen
etseq.,1992;Stãchelin,
op. cit., p. 100. En tre nós, decid ido e enfático, Tavares, Teoria do injusto..., cit., p. 216 et seq.; próxi
mos, ademais, Zaffa roni e Pierangeli, Manual de direitopenai brasileiro,São Paulo: Ed . RT, 19 97, p.
464 et seq., n . 236.
47. Binding, DieNorm enundihre Übertretung, 4. ed., Leipzig: FelixMeiner, 1922, voí. I,p. 358.
48. Weigend, “Úber dieBeg riindun gder Straflosigke itbei Einwilligung des Betroffenen”, ZStW
98/59,1986.
49. Próximos, também, S érgio Salomã o Shec ariae Alce u Corrêa Jr ./ A finalid ade da sanção penal”,
Penas Constituição, São Paulo: E d.R T , 1995, p. 44 : “a função da pena é a de proteger os bens ju
rídicos para garantir a s obrevivência do Esta do ”.
50. Nesse sentido , enfati camente Sch ünem ann,“ Kriõsche Anmerkungen...”, cit., p. 20 9; “Zu r
Do gm atikun d Krirmn alpolitik des U mwei tstrafrecht s'’, in: SC H M O LL E R (Ed.). Festscòriftfèr
Otto Triffterer. W ien/Ne w York: Springer, 1 996. p. 437 et seq.; “Vom Untersch icht- zum
Obers chic htst rafrecht . E in Paradi gmawechsel im morali schen Anspruch?”, i n: K Ü H N E ;
MF /AZÂW A (Ed.). Ahe Strafrecbtsstruktvren und neuegesellschaftiicbe Herausforderung inJapan
undDtuischiand. Berli n: Duncker ScH umblot, 200 0. p. 27; tTizàzmvn.TL,DieNeuordnimgdes...,
cit., p. 10,1 8 e2 8; “W irtschaftsstraí recht..." , cit., p. 693; Kuhlen, "Umwe i tstr aftre cht... ”, dt. ,p.
70S; Heiende-hl, Ko/fekiive Recòtsgüter..., cit., p. 3 07.
51. As sim, especialmente,Hohm ann, op. cit., p. 82.
10 4 RBCCRIM 49 - 20 04
"Princípio da ofen sívidade" e cri m es de per igo abstrato
ju ríd ic os in dividu ais. Verem os que, ao con trário do q ue d efende a teoria m onista-
pessoal, quan to m enos u m bem jurídico colet ivo se deix ar r efer ir a indivíduos,
menos problemático eie será. Além do mais, nem sempre será possível referir o
bem juríd ico coletivo aos intere sses de indiví duos concr eto s. Para dar um exem
plo:52 a pretensão de arrecadar os im pos tos d evidos continua a se r um be m jur íd i
co, aind a que o dinhei ro obtido seja utili zado p ara com prar tanques de guerra e
não para a const rução de jardins de infâ ncia. D a m esma forma, e agora o exemplo
é meu , pou co im porta que nenhum interesse individual seja afetado pe la con duta
do particular que em segred o gratifica o funcionário público para que este realiz e,
já depois do exped iente, u m ato vinculado a que o pard cular tinha de qualquer
form a dire ito, mas que só seria praticado bem depois. Se ainda assi m, apesar de
ausente qu alquer r eferênci a a interesse s individuais, os defensores da teoria pes-
soal-m on ista quiser em ad m iti r a punibilidade nestes doi s casos (alegando que,
por exemplo, a arr ecadação de imp ostos ou a honestida de da A dm inistração afe
ta, bastan te indiretamente, interes ses individuais) , então acab am por trabalhar co m
um a noç ão d e “refe rênci a indireta ao indivíduo” tão ampla, que só pa recem d iferi r
da con cepção d ualista no qu e se re fere à terminologia. O u seja: temos dep a rt ir de
se refe rem a u m a 'un idade social f uncional” ou a um a “relação real ” bu scam fixar o
bem juríd ico na realidad e.53 M uita s vezes, porém, não é da definiçã o do conce ito de
Oim tu P-enal 10 5
Luís Greco
bem jurídico, e sim da explic ação que dá o autor s obre as rel açõe s entre bem jurídico
e o bjeto da ação que veremos se de fende ele um concei to realist a ou idealista de
be m jurídi co. Assim , por exemplo, Liszt, q ue definia bem j urídico como interes se
ju ridic am en te protegido , parece à prim eira vista trab alhar co m um conceito realis
ta, m as, ao dif erenciar bem j urídico e objeto d a ação, diz que só o objeto da ação
po de ser lesi onado, enquant o o bem jurídico , encontrando-se alé m do mun do
fenom ènico, ou seja, além do d omínio da lei causa i, é impassível de q ualquer agres
são .54Es ta qu estão não é, ao contrário do que po ss a parecer, meram ente termino lógica,
porq ue ela está estrei tamente li gada ao problem a dos b ens jurídicos aparentes ou fal
sos, de que abaixo trataremos . Sem adiantar o que log o além se irá d izer, declare- se
106 RBCCRI M 49 - 2 00 4
"Princípio da ofensividade" e cri m es de perigo abstrat o
usar o term o “dado s”, pela sua m aior conotação fática:58bens jurídic os seriam , por
tanto, dados fundam entais p ar a a realização pessoal d os indi víduo s oupa ra a subsistên
cia do sistem a social, nos limites de u ma ordem constitucional. Por isso é que o fato d e o
C olégio Pedro II ser manti do na órbit a federal não é um bem jurídico, enquanto a
vida, a liberdade, a au tenticidade da moe da e a pr obid ade d a Ad m inistra ção59o são.
A gor a tocaremos num a das questões mais del icad as em torno da teoria do
bem jurídico. Definim os bem jurídico como dado neces sár io pa ra a rea lização
pessoal e para a subsistência de um sistema social. M as estará o dir eito pen al adstri to
à exclus iva proteção de bens jurídicos? S er-lhe -á realmente vedado incriminar
um a conduta para prote ger al go que não um bem jurídico?
E m regra, especialmente no Brasil, que m se val e de um concei to político-
criminal de be m jurídico não duvida desta vedação. Lem brem os unicamente a afir
mação d e Hassemer, segundo a qual incriminações sem bens jurídicos não passariam
de “terrorismo estatal”.60Afin al, de que valeria a idéia d e be mjur ídico, se o legislador
não est ivesse adstr ito a ela ? Já na Aleman ha, a situação começa a modificar- se. Pou
cos, mas cada vez mais autores, m esm o entre os defensor es da teoria poií tico-crimi-
nal do bemjurídi co, c omeçam a aceitar, ainda q ue em caráter excepcional, incri minações
sem bem jurídic o, por alguns chamadas de delitos de comportamento.61
58. N ão se ignorara as crít icas à utilização deste t erm o (por exe mplo, Stratenwerth, “Zu m
Begriff... ”, cit., p. 381), mas, como dissem os, elas não atingem o cerne da questão, uma vez que
ao falar em dad os quero apenas sug erir que o bem jurídic o é um a reali dade, e que não pode ser
fruto da simp les fantasia do legislado r (ou do intérprete).
59. Qu anto a estes doi s últimos bens jurídico s coletivos, há porém séria controvérsia doutrin ária
a respeito da formulação adequ ada. C f. a nota 143, sobre o segundo deies, por exemplo.
60. Hassemer, “ D a rf es Straf taten geben...”, cit., p. 64.
61. Entre os defen sores do conceit o de bem jurídico , mencionem-se Hefendehl, Kollektive
Rscbtsgúter...,cit., p. 52 et seq. (em especia l p. 64 e p. 73 );“D asR ech tsgu tals materialer ...”,cit.,p.
o tortur a, par a depois abando ná-lo m utilado, deixando-o agon izar por ho ras, n ão
consigo duvid ar do caráter criminoso desta conduta . C ontu do, tam pouco consi
go vis lumbra r aqui qualque r bem jurídico afet ado, porque defi nimos b em jurídi
co co mo dado funda mental de titulari dade ou do indi víduo, ou d a colet ividade.
C au sar horr íve is s ofrimentos a um cão nã o afeta de m odo algum qualquer esfe ra
indivi dual. E tampouco se pode dize r que est e comportam ento fira be ns jurídi
cos da coletividade.
Talvez o lei tor obj ete : com o não? A revolta que senti mos diante de tal
comp ortamento dá indíc ios da exi stênci a de um bem jurídico, sim. Ele pode ria
formu lar-se como o sentimento de s olidariedade pa ra com cert os anima is s upe
riores . E ste senti mento tratar -se-i a, obviam ente, d e um be m jurídico coletivo.
Ta l formulação, não o nego, seria possível e defensável . E la ali ás fora pro
po sta p or Roxin na terceira edição de seu trata do .62 Oc orre q ue ela c ria um grande
pro blem a, talvez ma ior do que aquele que ela pretende sol ucionar , porque a partir
do mo mento em que s entimentos d e revolt a pel a prát ica de dado comp ortamen
to servem de base para legit imar a sua punição, pode -se até mesm o declarar o
ho m ossexualismo um a condu ta pun íve l, vez que há mu itíss imas p essoas que
m anifestam similar revo lta diante de tal comp ortam ento. O u, para usar um exem
plo de Jak ob s, até a violaç ão de normas d e etique ta à me sa poderia ser considera
da um crime:63 imagine-se a revolta que não decorria do fato de alguém liberar
sonoram ente g ases malvindos num jant ar oficia l. N outra s palavr as: o preço de se
128;
W O Andr
H L E RewS; v.
v.HHirsch,
IR SC H“De r Rechtsgur
(Eds. sbegriffó&e<?
).D«i? eftegw£t und n'í.Bad
das hartn principie”,
enBad i n: HE
en:Nomos, 2003FEN
.p.21DEetseq.
H L;
(em especial p. 25); Roxin, Nova versão § 2 para a 4. ed. de Strafrecbt - Allgemeine r Teil, ago.
2003, inédi to, n.52 etseq.;Ru dolphi, Systematischer Kommentar, cit., vor § 1/11.
62. Roxin, Strafrecbt, cit., § 2/21 .
63. Jakobs, Strafrecbt, cit., § 2/19 .
tutela pena l de animais, está- se diante de incriminações sem bem juríd ico.64
Roxin fal a ainda em m ais du as exceç ões à idéi a de bem j urídico com o
condição necessári a da pun ição. Além da proteção de anim ais e plantas,6 5 m en
ciona ele a proteçã o ao em brião 66 e aos interesses de geraçõ es futura s,67 porque,
se é verdade que nenhum destes dois interesses é passível de referência aos in
divíduos hoje concretamente existentes, nem às condições de subsistência do
atuaí sis tem a social , tam bém é verda de que a sua excepc ional fragilidade jus ti
fica uma intervenção do direito penal. Ou seja, seria necessário reconhecerem-
64. ^oyim. ,Novaversão § 2...,áx .., n. 52 et seq.; assim também Jakobs, Strafrecht, cit., § 2/1 9, e
Rudolphi, SystematischerKommentar, cit., vor §1 /1 1. Par a um curto c não muito atualizado pan o
rama das di scussõe s em tomo do objeto tutelado pel o deiito de maus tratos a animai s, c£W ;egan d,
Die Tierquálerei, Lübeck: Sc hm idt-Rõ mh ild, 1979 , p. 125 et s eq.
65. Roxin, No va versão §2 ..., cit., n. 55 et seq.
66. Idem,ibidem,n.52etseq.
67. Idem ,n. 57 et seq.
68. Nesse s entido, pouquíssimos autores , como ,por exem plo,Dulce Santana Ve,%3.,Laprotección
penal de los bienesjurídicos colecúvos, Madrid: Dykinson, 2000, p. 58.
Direito Penal 10 9
Luís G rec o
11 0 RBCCRI M 49 - 20 04
"Princípi o da ofen sividade" e cri m es de perigo abstrato
sistema social . Se há outras exceçõe s, s e elas são as três apo nta da spo r Roxin, ou
se também outras, qual o seu fundamento, tais são problemas relativamente
recentes e que no âmbito deste sucinto trabalho têm de ficar em aberto. Eles
marcam porém pontos nevrálgicos para futuras investigações.
Direito Penai
Luís Greco
isto é , reconhecemos ben s jurídicos coletivos em seu pleno direito, ao lad o de bens
ju ríd icos individu ais. M a s um r ápid o apanhado de ben s ju rídicos co letivo s já de
monstra que nem todos apres entam o mesm o pedigree. D e um lado, temos ben s
lesão. E mais: co m o ago ra haveri a ve rdadei ra lesã o, e não mais mero per igo abstra
to, como a saúde púb lica seria lesionada, e não som ente posta em pe rigo abstrato
pelo porte de entorpecentes (art . 16 da L e i de Tóx icos), desaparece m tod os e quais
quer problemas de legitim idade. Afin al, o tal princí pio da lesividade, que exi ge
lesão (ou perig o concreto) a um bem jurídico, estaria atendido - com o que sur
ge m dúvi das a respe ito d e se nã o dem os um a grande vol ta para acabar em situa
ção pior daquela da qual s aímo s, po is ao menos os crimes de perig o ab strato tinh am a
virtude de não ocultar o fa to de que o direi to pe n al está realme nte se an tecipando, j á
certos bens juríd icos coletivos res olvem tudo, acabam com todos os problemas, e
é nisto, justam ente, que está o m aior problema.
Pois bem, este artifíci o n ão é um a construção nacional. Já há décadas
em penham -se vári os autores em inventa r bens jurídicos col eti vos a todo mom ento
qu e necessi tam de um fundam ento pa ra legiti m ar uma proibi ção um tanto estra
nh a.75 E isso não tem intere sse m eramente teórico, porque a postuiação de um
bem jurídico coleti vo acaba tendo um segundo e feito p ráti co, al ém d a já aponta
da legitimação da criminalização antecipada por meio de sua ocuitação: um a
legitimação da sanç ão exasperada. Vejamos alguns exemplos.
O art . 311 da L ei de Trânsit o define como crime a conduta de “veloci dade
incompatível”, definida n os seguinte s termos: “trafegar em velocidade incompa
tíve l com a seguran ça nas prox imidad es de escolas, hospitais, estações de emb ar
que e desembarque de passageiros, logradouros estreitos, ou onde haja grande
movimentação o u concent raçã o de pessoas, gerando perigo de dano . Pen a - de
tenção, de seis me ses a um ano, ou multa”. J á a lesão corp oral culposa (ar t. 121, § 6.°,
do C P ) é punida com detenção de doi s m ese s a um ano. Dam ásio de Jesus consi de
ra o referido crime um delito de lesão ao bem juríd ico cole tivo incolumidad e públi
75. C£ ,além dos autores citados na s notas ante riores, principalmenteTiedemann, por exe mplo,
Wirtschaftsbetrug,cit., § 2 65 /6, onde argumenta ser necessár io postular um bemjurídico cole tivo
no crime de fraude con tra seguro, pois doutro modo não se conseguiria “e xplicar” (isto é,justificar)
a eleva da cominação penai. Tam bém admitindo u m b emjurídico coletivo neste cri me, Lack ner e
KüM, op. cit., § 26 5/3 .
Direito Penal 11 3
Lu ís Grec o
ca;76 por isso, sequer se vê diante do pro blem a da sanção absurda. Já que m con
sidere tal crime um cri me d e perigo7 7 terá em suas mãos o instrumentário ade
quado p ara crit icar a comin ação legal . Afinal, pun iu-se a mera exposição a pe
rigo com p ena m ais grav e do que a p róp ria l esão ao bem jurídico individual in
tegridade fís ica.
O utro exemplo ainda m ais gritante , aliás um d os mais gritantes de todos,
é a Le i de Tó xico s,qu e pune o trá fico de entorpecente c om pena de 3 a 15 anos d e
reclusão e multa (art. 12). Se temos um bemjurídico saúde pública, é mais facil
tentar explicar o porquê de tal sanção draconiana.78 O crime passa a ser, afinal,
crime de lesão!7 9 Se dispensarm os, porém , esse bem jurídico coletiv o e trabalhar
mos unicamente com bens jurídicos individuais, em especial com a integridade
física de quem recebe o tóxi co, transforma ndo estes crimes em crimes d e perigo
abstrato, ganh am os duas coisas. Primeiram ente, vem os a cri ticabil idade da proi
biçã o, que tutel a um bem jurídico individual mesmo cont ra a vont ade de seu tit u
lar. E com isso abrimos as portas pa ra um a interpretação teleológica res trit iva do tipo:
este tipo s ó deverá aplicar-s e caso a von tade do titul ar do bem jurídico seja jurid i
cam ente irreleva nte, por es tar viciad a de erro, p or ser el e doen te me ntal, menor,
louco ou incu lpáve l por qualquer outro motivo.8 0 O segundo problem a de ste bem
ju rídico coletivo é legitim ar a sanç ão absurd a , pois se o tráfi co de tóxico nad a mais
é do que uma conduta q ue gera um pe rigo abstrato de lesão à i ntegrida de físi ca,
esta conduta não pode sofrer pena m ais grave do que a do res pectivo cri me de
les ão, no cas o as lesões corporai s. Es tas são punidas em sua form a simp les com
detenção, de t rês meses a, no máxim o, um ano.
E é por isso que parte da doutrina e m barcou num em preendimen to que,
segun do m e parec e, se rá um a das m ais fecundas utili zações da teoria do bem
ju ríd ic o : a desconstrução de bens jurídicos só aparentemente coletivos. Ro x in ,31
Sch ün em an n,82 H efen de hl83 e A m elu ng ,S4 entre outros, esforç am -se p or criti
car certos bens jurídicos, com o os acima ap ontad os, e m ais alguns, interpretan
do os respectivos tipos como crimes de perigo abstrato para um bemjurídico
indi vidual . Argum enta-se em especi al qu e os referi dos bens jurídicos só são apa
rent emente colet ivos, um a vez que el es não passam da som a de vári os ben s ju
rídicos individuais . 8SA som a de vários ben s jurídic os ind ividuais não é suficiente,
porém , para constituir um be m jurídico col eti vo, porque este é c aracterizado
pela elementar da não-distributividade, isto é, ele é indivisível entre diversas
pe sso as.36A ssim , cada qual tem a sua vi da, a sua propriedade, indepen den te das
dos dem ais , mas o mei o am biente ou a probi dade da Adm inist ração P úblic a
são gozado s por todos em sua totali dade, não havendo uma part e do m eio am
bient e ou da probidade da Ad m inistração Pública que assist a exclusi vamente a
Direito Pünal 11 5
Luís Greco
Este emp enho no sent ido de d esconstrui r pseudo-bens j urídicos col etivos é
extre mamente recente e tem sido levado adiante d e m odo ainda mu ito intu itivo.
Não está claro se e em que medida o critério da não-distributividade é realmente
capaz d e efetiva r aquilo que e le promete, a separação entre o joio e o trigo, porque os
defensores de tais bens coleti vos não se cansa m de afirm ar que eles são mais do que
a som a dos diverso s ben s individuais.8 7 E o m om ento , a meu ve r, de se pe nsar em
critérios para a p ostulação de bens jurídico s coletivos, para impedir que se legitimem
leis absurdas com construções adhoc , sem qualquer fundamento, mantend o a cons
ciênci a dos p enalistas limpa e imper turbada, em razão de estar em respeitando o tal
princí pio da lesividade - ao men os da boc a para fora. M as esta necess idade de se
formularem critéri os para postulação de be ns jurídico s coletivos não foi vista nem
me smo na Alem anha. Aqu i se ab re todo u m campo para um tra bal ho pi onei ro.
116 RBCCRIM 49 - 20 04
"Princípio da ofensividade" e crimes de perigo abstrato
animais, não será possível fal ar em b em jurídico no sentido acima prop osto. Para
evit ar um a total dil uiçã o do c onceito de bem jurídi co, com sac rifído de seu cará
ter c rítico, é me lhor ad m itir e xceções -* ainda q ue com enorm e cautela. Abre-se,
co m isso, todo u m novo ca m po pa ra a investi gação cientí fic a, que diz r espei to aos
crit érios com bas e nos quais se po dem reconhecer tais exceçõe s.
- Por fim, éprec iso cuidado compseudo-bensjurídicos coletivos. Falar e m saú
de ou incolumidade púb lica, por exemplo, esconde o s défici ts de legiti m idade de
antecipações da tutel a penal. A categoria do s crimes de perigo abstr ato, ref eri da
a u m bem jurídico in dividual, é mu ito mais crítica , porque expõe estes problema s
com toda clarez a. E necessá rio, po rém , form ular cri térios pa ra a distinção entre
bens jurídicos cole tivos autênticos e aparent es, al go que nem mesm o na Alem a
nh a se vi u s er n ecess ário.
alguns autores com eçam a cham ar de “ estrut ura do delit o” {Deliktstruktur). Ao t rata r
88. Um a aparente exceção seria Lu iz Flávio Gom es, Princípio da ofensividade..., cit., p. 43, em
suas considerações a respeito da relação entre o que ele chama de “princ ípio da ofensividade” e o
“princípio da proteção de bens juríd icos” . M as aleitura do resto do trabalho dem onstra que ele de
fato não diferencia suficientemente as duas questões.
do bemj urídico, está-se diante da pergu nta : o que proteger? Ao t ra tar d a estrutura do
delito, oproblem a j á não é mais o que proteger, e sim: como proteger?
E neste “ com o”, na questão d a estrutura do delit o, que devem os exam inar a
dor proíbe a rixa (art. 13 7) n ão só no in teresse da incolum idade púb lica,92 como,
principalmente, porque essa conduta pode provocar mortes.
Como vimos, entre nós tornou-se costumeiro declarar inconstitucionais
in totum os crimes de perigo abstrat o. D iz- se que is so resul taria do princípio da
89. Ape sar de parte da doutrina falar em úm bem jurídic o “segurança” (Bitencourt, Código Penal
comentado,cit., p. 482).
90. Ape sar de parte da doutrina falar n o pse udo- bem jurídi co coletivo “incolumidade pública”
(Bitencourt, Código Penal comentado, cit., p. 954).
91. Mais detalhes a r espeito deste conceito nor mativo de perigo conc reto abaix o, 2.
92. Para alguns autores, este bem juríd ico figura ao lado do bem jurídico i ndividual com o objeto
de tutela penal (Bitencourt, Código Penal comentado, cit., p. 511). Pa ra a posição aqui defendida,
trata -se de um falso bemjurídico.
lesi vidade, da necessária r efer ência a um bem jurídico. Po dem os afirmar, já de agora,
que tal colocação do prob lema é falha , por tratar-se de um erro categorial. Nos
crimes de perigo abstrat o, o problem a, em geral, não está no bem j urídico a ser
protegido, pois este é o mesmo dos crimes de perigo concreto e dos crimes de
lesão, a respeito de cuja legiti m idade m uitas vezes nã o se po de duvidar . O que se
está afirm ando , a rigor, é que as estru turas do delito legítim as se rest ringem a uni
cam ente dua s formas: à do delito de lesão e à do delito de pe rigo concreto. E ssa
afi rmativa já pouco te m a ver com o problem a do bem j urídico, pr evi amente
tratado. O próprio termo “ princípio da lesividade” ou “ ofensividad e” convida a
que se confi inda a questão do bem jurídico com a quest ão da estr utura do deli
to. Sã o es tas as duas que stões verdadeiramente decisivas , e é po r iss o qu e par ece
m elhor não t rabalharmos m ais com a denom inação princípi o da ofensi vidade
ou lesivi dade, e sim co m a dist inção entre proteção de bens jurídicos e estrutura
do del ito. J á tratamos acima do primei ro destes tópicos, a tinente ao b em juríd i
co. Res ta-no s o segund o, refer ente às estr uturas do delit o, co m o que surge toda
uma série de questionamentos, a que agora daremos voz.
Ponto comum à gr ande m aioria dos que se importam em definir o que seja
perigo concreto é a perspecti va com base na q ua l ele deve ser ajuizado: trata-se da
perspectiva expost, isto é, levam -se em co nta toda s as circunstâncias rea is, m esmo
as som ente conhecidas e cognoscíveis ap ós a reali zação do fato.9 3 Q uan to a isto,
não parece haver dúvida na doutrina aiemã. Ain da assim, os crít icos do perigo
abst rato só rarament e escla rece m se partem de um a pers pectiva ex ante ou expost.9*
E mais: a principal fonte de i nspiração d os críticos nacionais do pe rigo abstrat o,
a doutrina i tal iana, c onsidera amp lamen te que o juíz o de perigo concre to deve
for mular-se segundo um aperspectiva ex ante, isto é, l evando em conta unicamente
as circunstânci as conhecidas e cognoscíveis no m om ento da práti ca do fato .95C om
isso, os autores itali anos acabam tendo u m con ceito de perigo concreto que é mu ito
mais amplo do que o dos alemães, um conceito que compreende grande parte
daquilo que os alemães cham am de pe rigo abstrato .96
Continuem os, porém, a no ssa exposição, para depois ti rarmos conclusões .
H á, fundamentalment e, duas posturas aresp eito do que seja perigo conc ret o. Um a,
de na ture za ontológica, proposta sobretudo p or H orn e que acabou por encont rar
pouquíssimos segui dores, afi rma exist ir perigo concret o quando a n ão-ocorrên-
cia do resultado nã o é cientifi came nte exp licável p or meio de u m a lei natura l.97
Segundo H orn , se não fosse possí vel afirmar em razão d e qual lei natu ral o res ul-
93. Hirsch, “G efahr und Gefàhrlichkeit", in: H A F T et al. (Ed.). Festschriftfür Arthur
Kaufmann. Heidelberg: C. F. Mül ler, 1993. p. 557 e tse q.; Ro xin, Strafrecht,c it., § 11/12 1; con
tra, pela perspectiva exante, Koriath, “Zum Streit um die Gefáhrdungsdelikte”, GA, p. 52, p. 60
et seq., 2001.
94. Um a aparente exceção éJesus. Crimes de trâ nsit o, cit., p. 6, que fala em perspe ctiva expost,
digo aparente, porque, c orno veremos, este autor logo introduz m ecanismos que comp ensam a
restriç ão de punibili dade resultant e da adoção de sta p erspectiva (“peri go comum, difuso ou co
letivo").
95. C f Fior e, op. dt.,p . 183;Mantovan i,op. cit.,p. 2 23 etseq.;Padovan i,op. ci t.,p. 170.
96. Ao leitor que ainda não est iver famil iariza do c om os termos ex ante e ex post, peço que tenha
i paciência de prosseguir naleitu ra, pois logo adiante , em dois parágrafos, trarei um exem plo que
deve esclarecer o teor da argumentação.
97. Horn, Kankrete Gefãhrdungsdeiikte,Kóln: O tto Schmidt, 1973, p. 1 59.
12 0 RBCCRI M 49 - 2 00 4
Princípio G a ofen sívid ad s/r a crimes de perigo ab strato
um final feliz par a os acontecimentos. E ste concei to nor mativo de perigo parte
de longa tradiç ão, tradi ção e ssa tanto doutrinária , podendo encontrar -se f orm u
lações similares ao men os desd e Bind ing, que falava em “ abalo da certeza exis
tenci al de um be m jurídi co” ,99com o juris prudencial, h avend o vários juigad os em
que apare ce a idé ia da n ão-oco rrência do resultado p or mero acaso.1 00 E este o
conceito de perigo concreto hoje majoritário.101
A gor a surge a segu inte i ndagação: ser á esta a c ompreensão de perigo con
cre to aco lhida por aqueles que consideram ilegít imos os crimes de perigo a bs
tra to? Para dar um exemplo: digam os que alguém , em estado de em briaguez,
ultrapasse um motociclista pela direita, além disso saindo de sua faixa e avan
çando bastante sobre a do m otociclis ta. O corre que este motocicl ist a compete
em motocross e não tem a m enor dificul dade em re cu ar um pouco a própria
Direit o Penal 1 21
Luís Greco
m otocicleta, evi tando, assim , um acide nte. Se rá que aqui a doutrina brasilei ra
conside raria i naplicável o dispositivo do art. 30 6 do C ód igo d e Trân sito, o qual
incrimina a condu ta de “ condu zir veículo autom otor, na via pública, sob influên
cia de álcool ou de sub stância de efei tos an álogos, expondo a dan o potenc ial a
incolum idade d e out rem”? Se realmente o entender como cri me de perigo con
creto, a resposta só pod e ser afirmativa , um a vez que, aqui, o result ado não dei
xou de ocorrer por acaso, e sim pelas superiores capacidades do motociclista.
D e um ponto de vis ta expost, essas superiores capacidades devem ser levadas
em conta , e e las refut am a suspeita de que haveri a peri go. M as L uiz Flávio
G om es, po r exemplo, insiste que o t ipo “ não exige peri go concret o para pessoa
determinada, ao contrário, trata-se de perigo a um número indeterminado de
pe sso as (perigo indir eto ou comu m ), que entraram no r aio de ação da conduta
cau sad ora de riscos” .102 D a m esm a form a, Dam ásio de Jesus, que, apesar de
adotar o conceito de perigo concreto da moderna doutrina dominante,103 o faz
só nominalmente, uma vez que se limita a exigir um “ perigo comu m (dif uso ou
coletivo)”, declarando que, no crime de em briagu ez ao volante, “ainda que ne
nhu m indivíduo da coleti vidade venha a ser exposto a peri go, há cri me, desde
que o co rra reba ixam ento do nível de seg ur an ça d o tráfeg o” .104-105 E que m en
122 RBCCRIM 49 - 2 00 4
"Pri ncípi o da ofen sividad e" e cr imes de peri go a bstrato
menos severo, do que o proposto pela doutrina alemã, porque se até “perigo co
m um ”, perigo para número indeterminado de pessoas, é perigo concret o, s e exis
te u m a “teoria do perigo concreto indireto”,1 06 entã o gran de parte daquilo que a
A radica lid ade da tese defendida pelos inimigos do crime de perigo abs
trato l evari a, se foss e ela r eal, à inconstitucionalidade de m uitos m ais dispo sitivos
do que eles parece m im aginar. Isso porqu e é muito facil recusar globalm ente e s
tes crimes, se se continua a trabalha r com aqueles bens juríd icos “coletivos” que
acim a crit icamos, com o a p az pú blica, a incolumidade pública, a saúde púb lica
etc. M as, um a vez que se recuse m tais bens jurídicos, que dev em ser decom postos
em bens j urídicos ind ividuais que na ve rdade são, ver-se-á qu e m uitíssi m as
incrimina ções ant es incont rover sas não pa ssam de cr imes de p erigo abstrato - e
que nada há de errado com isso.
Vejamos, por exem plo, o crime de enve nena mento de águ a potá ve l ou de
substância alimentícia ou medicinal (art. 270): “envenenar água potável, de
uso comu m ou par tic ular , ou substância ali men tíci a ou m edicinal destina da a
consumo”. A doutri na dominante ainda tr abalha co m um bem jurídico cole-
Direito Penal 12 3
Luís Greco
tivo: a incolum idade púb lica.l ü/ Se com preend ermo s este del ito co mo um deli to
para a proteção de bens jurídicos individuais, c om o a vida e a integridade fí
sica, será ele transformado em um crime de perigo abstrato.108 Duvidará al
guém d a legiti m idade desta incriminação? A liás, uma vez que se recus e tanto
o bem jurídico incolum idade pública, quanto a saúde públi ca, quase todo s os
crime s do Título V III (“D os crimes de per igo comum”), Cap ítul o III (“Do s
cri mes co ntra a saúde púb lica” ), pa ssarão a ser cr imes de pe rigo abstrat o con
tra bens jurídicos indivi duais.
E isso com o ganho acim a explic itado: pr imeir amente, abre-se todo um
novo campo p a r a interpretar restritivamente o alcance da proibiçã o n os referidos t ipos.
Por exemplo, o cri me de charlatanism o (art. 283 ), que pune o ato de “incul car
ou anunciar cura por meio secr eto ou infalív el”, um a vez entendido com o crime
de perigo abstrato em defesa especialmente da integridade fí sica, mas em ca sos
limite tam bém da vida da pessoa en gana da, tem seus alic erc es profundam ente
abalados, po is, em princípio, a vítima po de a utocolocar-se em perigo, sem que
ist o gere qua lquer responsabilidade p ara tercei ros que venham a partici par de
tal ação pe rig os a.109 Q ue m acred ita em “cura po r me io secreto ou infalível” o
faz, em regra, a próprio risco, porque, nos dias de hoje, é amplamente sabido
que tais m eios não existem. A exceç ão a esta regra s erá o caso em que a vítima
12 4 RBCCRIM 49 - 2 00 4
"Princípio da ofensividade ' e crimes de perigo abstrato
llO.A ssim , especialme nte, Jesus, Crimes de trânsito, ci t., p. 23; LuizFlá vio Gom es , Princípio da
ofensividade..., cit.,p, 1 03 , que fala na necessidade de “descobrir” o bem supra-índivid ual afetado,
Direito Penal 12 5
Luís Greco
E é por iss o que um setor da doutrina moderna vem propondo uma ter
ceir a via, que renunc ia às pretensões das quais parte um v asto setor de pe nalis tas
não só brasil eiros , no sentido de que seja possível uma solução global. P ropõe-se,
muit o mais, um a solução dife renciad a : da mesm a forma que, na questão do bem
ju rí dic o, tentou-se separar o jo io do tr ig o, e xc luindo ben s ju ríd ic os s ó apare nte
mente coleti vos, ag ora, em face do p roblem a da est rutura do delit o, tentar -se-
á form ular critérios pa ra dis tin gu ir os crimes de perigo a bstrat o legítimos dos ilegí-
timos, p orque, se por um lado tem os d elitos de perigo abstrato indubitavelmen te
legítimos, de outro temos crimes como o disparo de armas de fogo, recente
mente introduzi do pel a nova Le i de A rm as de Fogo, acima men cionado. Ou
sej a, é pr ecis o formular crit érios de distinção um pouco mais com plexos do
que um mero tudo ou nada, nu m a postura que não pode ser nem de aceitação
global, nem de obsti nada recusa, mas de busca de um sadio m eio termo , ci en
te da heterogeneidade dos problemas com que se está lidando, o que faz da
procura de uma sol ução unitária algo no m ínimo ingênuo. U m v asto grupo de
autores subscr eve esta linha de pe ns am en to, entre el es se en con tran do R ox in, 111
para que, com isso, o t ipo seja posto em consonância co m a idéiad e ofensivida de, o qu e é um a clara
transformação do conceito dogmá tico de bem jurídico em conceito políti co-criminal.
111. Roxin, “Política criminaly dogm ática jurídico-penal em la actualidad ", crad. Carmem Gdm ez
Rivero, in: L a evolución de la-política criminal, elderechopenaly elprocesopenal. Valencia : Tira nt lo
Blanch,2QQ0. p.91RBCCrim
trad. Luís Greco, etseq .^So35/16,2001.
breafu nda me ntaç âo politico-cri minaldo sistemaj urídico-penal ”,
126 RBCCRJM 49 - 2 00 4
"Princípio da ofensividad e" e crimes de peri go ab str ato
de preparação.
O primeiro destes grupos de delitos, o dos delitos de ação concretamente
perigosa — minha tradução de konkrete Gefàhrlichkeitsdelikte refere-se àqueles
tipos que proíbem um a ação que lev a, tipicamente, a um a sit uação não m ais con
trolá vel pelo agente e, portan to, perig osa p ar ao bem juríd ico.117U m exem plo ser ia,
no d irei to alemão, a c ond uta de em briagu ez ao volante.1 18A qu i, a proibição só é
11 2.Schünemann
Obersch ichtstrafrec, “Kritische
ht... ”, cit.,Anmerkungen
p. 27 et seq. ...”, cit ., p. 213 et seq.; “Vòm Unterschicht- zum
11 3.Frisch, “And en G renze n...”,cit.,p . 91 et seq.; “ Wesentliche Voraussetzungen. cit., p. 214
et seq.
114.Jak obs, “Kriminalisierung im Vorfeld. ..”, ci t., p. 768 et seq.
11 5.Inclusi ve a teoria do bem jurídico, diante da qual ele adota postura declaradamente cé tica:
Wohlers, op. cit., p . 279; Hefendeh l, “Die Ta gu ng aus der Perspe ktive...”, cit., p. 282.
116. Wohl ers,op. cit.,p. 278; Hefendehl, Woh lers ev.H irsch ,D >i?£cte^M/í/Ãeon'e,BadenBaden:
2
a um bem j urídi co, mas se limitam a criar um perigo de que o próprio a gente ou
considerar tal crime de les ão e de me ra condu ta, dispensando a comprova ção do perig o a pessoa
concreta (Crim esde trânsito, p. 166).
119. Wohlers e v . Hirsch, “Rechtsgutstheorie un d Deiiktsst ruktur.. .", d t.,p .21 3.
120. Wohlers, op. cit., p. 314.
121. Kuhlen, “Der Handlungseríòlg der strafbaren Gewàsserverunreinigung’’, GA, p. 716 e t
seq., 1986.
122. Wohlers, op. cit. , p. 218; W ohlers ev. Hirs ch , “Rechtsgutstheorie und Deiiktsstru ktur...’ ’,
cit., p. 19 9.
123 . Wohlers, op. cit.,p. 322 et seq.; Wohlers ev, Hirsch,"Rechtsgutstheorie undD eüktsstrukt
cit., p.208 -209.
124 .Wohlers e v. Hirsch, “Re chtsgu tstheori e un d Dei iktsstruktur...”, c it., p. 210.
128 RBCCRI M 49 - 20 04
"Princí pio da o fensividade" e cri me s de peri go abstrato
nos cri m es de perigo: um a vez que nel es o bem jurídico não é causalmente
lesionado, surge a pergunta quanto ao que poderá legitimar a proibição.132 Este
equivalente material pod erá ser, nos d elitos ambie ntais e nos delitos de corrupçã o,
125. Wohlers, op. cit., p. 328; Wohlers e v. Hirsch , “Rechtsgutstheorie un d Deliktsstruktur...”,p. 198.
126. Wohlers ev. Hirsch, “Rechtsgutstheorie und Delikt sstruktur. ..”,cit., p. 200-2 01.
127.1dem, ibid em, p. 205 .
128. Wohlers, op . c it , p. 335.
129.Hefendehl, KollektiveRechtsgüter..., cit., p. 113 ets eq.
130.1de m, ibidem, p. 148; “D as Rechtsgu talsmaterialer...”, cit ., p. 129.
13lHe fende hl,i6V/€M ^ifor/to^ter ...,cit. ,p.200;“DasRecht sguta lsmater ialer ...”,cit., p. 131.
l32.ííe£endehl,KotlektiveRecbtsgüter...,cit.,p. 182 et seq .; “Da s Rechtsgutalsma terialer...", ci t.,
p. 131.
Direito Penal 12 9
Luís Greco
a idéia da cum ulação, que ac abam os de ver em W ohlers,1 33 e que tam bém tem em
H efen deh l um de se us m ais importantes defensores . Já ao direi to penal de al i
mentos (. Lebensmittehtrajrecht ), em que se trata de proteç ão de ben s jurídicos in
dividuais ( integ ridad e física do s consum idores, e não saúde púb licaJ ), a estrut ura
do delito de pot en cial lesivo será a mais ade qua da.134 E sta figu ra, a do delito de
potencial lesivo, é uma modalidade de crime de perigo abstrato defendida por
alguns autores , cujo tipo objetivo é limitado pe la idéia de criaç ão de um risco, nos
mo ldes d a m od ern a teoria da im putação objetiva.1 35As sim , não havendo cria ção
de risco ex ante par a os b ens jurídicos individuais, d everá ser excluída a tipicidade
dos delitos no direito penal de alimentos.
M as H efe nd eh l não se c ontenta em analisar a questão da estrut ura do del ito.
E le prossegue, pergu ntan do, num a próxim a etapa, a respe ito dos limite s da pro i
bição : aqui entrarã o considerações referidas a al ternat ivas a o direito penal (prin
cípio d a su bsid iar ied ad e)136e ao p rincípio da pr oporcion alidad e.137M as o p rinci
pa l mérito de H efen de hl, a m eu ver, é ter construído a sua sistemática levando em
conta não somente delitos tradicionalmente considerados questionáveis (em ge
ral pertencen tes à legislação p en al ext ravaga nte) , m as também incriminações tra
dicionais, pr esentes no seio do C ód igo P enal, cuja legiti midade pou co se discute ,
133.Hefendehl,.fo/M^i?rcMgw/i?r...,át.,p.l83etseq.,sobreosdelitosdecorrupção,ademais
p- 321 et seq. ; “Da s Rec htsgu t ais ma terialer.. .’ , cit., p. 131.
134.Hefendehl, Kollektiv
delitos de poten cial lesiv o devem ser realmente entendi dos como equi valentes materiais à causa
lidad e, porqu e H efe nd eh l trata dd es antes d e chegar a esta q uestão.
135. Arespeito, detalhadame nte, Hoyer, DieEignungsdehkte, Berlin: Duncker ôcH um blot, 198
p. 18 ets eq.C f.ad em ais Frisch,“ Aa de nG ren ze n...”,cit.,p.9 3;'fW esentUcheVoraussetzungen...’’,
cit., p. 215, o qual propõe uma substituição global dos crimes de perigo abstrato por crimes de
potenciallesivo.
l3(>.HeímâehL,KollektiveRerbtsgüter...,út.,p.213 et seq. Observe-se que Hefen dehl, na esteira
de Tied ema nn, n ão trab alh a com a formulação tradicional do princípio da subsidi ariedade, v ez
que não lhe par ece q ue a sanção penal seja sempre a mais grave (idem, ibidem, p . 234).
137.1dem, ibidem , p. 8 3 et seq.
com o a falsificação de m oed a,138 ou a corru pção. C o m isso, acabou ele por ele var a
discussão a um outro n ível de complexidade, porqu e ap ós seu trabal ho não me pa
rece m ais possível avançar teses radicais, sem que se com prov e chegarem elas a re
sultados desejáv eis tam bém no s tipos que o pro po sitor d a tese não tinha em m ente.
A pres ente exposi ção, u m tanto apertada, da s form ulações de Wohle rs e
H efend ehl t eve por objetivo dem onstrar em que situ ação se encontra o atual de
bate. N ão nos cabe, nos limites estr eito s deste trabalho , avaliar se os s istemas de
deli tos de perigo propostos po r cada qu al se mostram acertados. O que podemos
e devem os observar é apenas que se t ratam de prop osta s consistentes, que mere
cem um a ref lexã o muito mais detid a e cuidado sa do qu e aquelas com que e stamos
acostumados. En fim : Wohlers e Hefendehl, defato , não resolveram tudo , masaomenos
demonstraram que caminho se deve seguir, um caminho muito mais árduo, muito mais
tortuoso, do aqu ele em que ai nda nos encontramos , um c amin ho em que não exis tem
fór m ula s m ágicas, nem soluções globais, mas que consiste n a determi nação cuidad osa
dos limites entre o perigo ab strato legítimo e o ilegítimo. Aliás, também a doutrina
itali ana, que na décad a de 70 formu lou crít ica acirrada ao s crimes de perigo abs
trato, parece hoje favorec er um a solução dife ren ciad ora .139
(Jm a vez que se reco nheça, portanto , que não é correto cond enar a tota
lidade dos crimes de perigo abstrato, fazend o-se n ecessá rio, iss o sim, dist inguir
os crimes de perigo abstrato legítimos dos ilegítimos, ter-se-á aberto todo um
novo campo de inves tiga ção, e m que W ohler s e H efen de hl n ão dera m sen ão os
primei ros passos. Lon ge de aprese ntar um a tipo logia própria, o que ser ia p re
tensão demais, limitar-me-ei a colocar uma série de questões que terão de ser
resolvida s já logo de iníc io, para que as futuras in vest igaçõ es p ossam trazer bons
resultados.
13 8.0 bjet o também de um estudo ante rior, “Zur Vorverlagerung d es Rechtsg utschutze s am
Beispiel der Geldfâlsch ungsta tbestãnd e",//?, p. 353 et seq., 19 96.
139. C f as dife rentes tipologias e c ritér ios em Fiand aca e M us co , op . cit., p . 176 et seq.; Fiore, o p.
cit., p. 183 etse q.;M arinu ccieD olcini, op. cit.,p. 416 et seq.
Direito Penal 13 1
Primeiramente, é preciso pergun tar se o conceit o crime de perig o abstra to
é um referencial suficiente para a discussão, ou se é necessário ser mais preciso.
Tem -se de refl etir, assim, se por trás da denom inação única “ crime de perigo abs
tra to” não se escon de um a gam a de fenômenos bastant e h etero gêneos, faze ndo
necessár io distinguir grupos de crimes de perigo abstrato, para q ue se po ssa dar
início a um a análi se separada d a legitimidade de cad a qual destes grupos.
C aso se considere necessári o dissecar o conceito de perigo abstrato, t er-
se-á, em seguida, de discuti r quais seriam as novas estr uturas . A doutrina fala atual
mente nu m a vari edade de espécies de crime de perigo abstrato, que vão desde as
já vistas, ao ex por m os Wohlers e H efendehl, até algum as o utras, com o a do d elito
de perigo abstrato-concreto. Q ua is destas serão necessári as, quais dispensávei s?
senti do n o caso d e bens jurídicos coleti vos, d e m odo que os deli tos para a sua tu
tela são crimes de m era c ond uta.142 E u m último grupo d e autores, entre os quai s
se enc ontra , como vim os, Hefend ehl, consi dera que a cada espéci e de bem jurídi
co col etiv o corresponde um a certa estrutura d o delit o. A questão preliminar ser á,
certamente, determinar com clareza o qu e se entende ria por lesão no ca so de bens
140.Por exemplo, Hassem er, “Grundlinien einer p ersonaien....”, cit, p. 89. Entre n ós, M ello Jor
ge Silveira, Direito pen al supra -indivi dual, p. 66.
141 .Jesus, “N ova visão da natureza d os crim es...”, cit ., p. 86; Crimes de trânsito, cit., p. 18 e t seq.;
Leiantitóxicos , cit., p. 16.
142.Tiedemann, Wirtschaftsbetrug,d t., § 264/17, § 264a/16.
132 RBCCRIM 49 - 2 00 4
"Princípi o da o fensividade " e crimes de perigo abstrato
ju ríd ic os coletivos - algo que de m odo alg um se pode co nsiderar r esolvido. A fi
nal , o crime de corrupção passiva (art . 3 17 d o C P ), por exemplo, será de l esão, de
perigo concreto ou pe rigo abstrato em relação ao bem juríd ico p roteg ido ?143 E ssa
pergu nta só poderá ser respon dida quand o se tiv er um cri tér io com b ase no qual
se difer encie a lesão do me ro perigo e m tais bens juríd icos coleti vos.
E m quarto lugar , e aqui se situa a q uestã o d ecis iva, cumpre en unciar s e e
sob qu ais condições as diferentes espécies de crim e de pe rigo abstrato 144se m o s
tram legítimas. Parece-m e especi almente problemá tica a categoria dos d eli tos de
cumulação, pela tendência de criminalizar bag atelas que l he é ínsi ta: com o vimos,
nos delitos de cum ulação já seri a punível aquele com portam ento em si inó cuo,
mas que se torna perigoso caso praticado em grande número.145 Por outro lado,
parece-m e bastante prom issora a pro po sta de tr ansform ar alguns cri mes de peri
go abstrato em crimes de pot encia l lesivo ,146 restringindo o tipo à pr oibiçã o d a
quelas condutas ex ante per igosas . Este s m eus juízos, por ém, não passam de me
ras suspeitas , que apenas indicam a necessidade de estudar ma is a fund o o tema
antes de sair pregando soluções.
143 .Isso se m falar qu e o próprio bem jurídico proteg ido é aqui objet o de controvérsias. N a doutri
na brasileira, costuma -se dize r que os tipos de cor rupção tutelam o bem jurídico Admin istração
Pública,pura e simples mente (cfBite nco urt, CódigoPenai comentado,cit., p . 1086). Já na doutrina
alemã, faz-s e um esforço no sentido de concretizar um pouco mais que aspecto da Administração
Pública é afetado, falando alguns autores na probida de no exercício d o cargo (Arthur Kaufmann,
“Coment ário a B G H JZ , n. 59, p. 375 et seq.”,/ Z , p. 376 et seq.),outros na conf iança da popula
ção nesta pr obidade (Lackner e Kühl, op.cit., § 3 31/1 ; Cramer, em Schõnke e Schrõder , op. ci t.,
§ 331/3 ), outros na capacidad e de funcionamento da Administração P ublicae dajustiça (Rudoiphi,
SysfámatischerKommsntar, cit ., vor § 331/7), outros combin am alguns deste s aspectos (Ka rgl,“Über
die Bekãmpfang des Ans chei ns der K riminal itát”, 25 /^1 14 /78 7,2 00 2) .
144. Ou o próprio crime de perigo abstrat o, caso se tenha dado resposta negati va à pri meira
questão.
145. Cf. o m ais atualizado trabalho sobre o delito de cumulação, detalhada e cr iticamente, Ioanna
Anastasopolou, Deliktstypen zum Schutze kollektiver Rechtsgúter und der Kumulationsgedanke,
Dissertation, Münche n, 200 3, p. 199 et se q., ainda em fase de publicação.
146. Como querem Frisch, cf. acima, nota 135, e Hefendehl, Kollektive Rechtsgüter..., cit., p.
167; já Roxin, Strafrecht, cit., § 11/12 9, propõe u ma tal r estrição para um grupo de crimes de
perigo abstrato.
147. Roxin, Funcionalismo e imputação ..., ci t., § 7/82 et seq.; “Einige Bemerkungen zum
Verháltnis vo n Rec htsidee und Re ch tsstoff in der Syste m atik unseres Strafrechts”, in:
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trodução à dogm ática funcionalista...” , cit., p. 136 et se q., e “Impu tação objeti va: uma introdu
ção”, in: ROXIN, Claus. Funcionalismo e imputação objetiv a no direito pen al. Rio de J aneiro:
Renovar, 2002. p. 69 et seq .
13 4 RBCCRIM 49 - 20 04
"Princípio da ofen sividade" e cri m es de peri go abstrato
tem a ver com a idéia de bem jurídico, ma s tão-só com a estr utura dos delitos de
que se vale o legislador para protegê-l o;
- a radicalidade da recusa total aos crim es de perigo abstrato é meramente
dade. T alvez seja necessári o inclusi ve distingu ir alguns grup os de c asos, segundo
um critéri o diferenciador que aind a há de ser formulado. A utopia das soluç ões
globais deve ser abandonada.
IV - Conclusão
Co m o que concluímos que a s cert ezas dos crít icos do peri go abstrato não
são, de mod o algum , justificada s. E las derivam d e um a sim plificação exces siva de
quest ões alt amente complexas. M uito s ignora m vários do s problemas atinen tes
ao conceito de bem j urídico, achando-se q ue basta ancorá-lo numa Constitui ção
que considera valor relevant e até o caráter federal do Co légio Pedro II. O fato de
que um conceito m ais restri to de bem jurídico se ja necessário e as conseqüênci as
que ist o gera especialmen te para certos crimes amb ientais não são discutidos,
quando sequer vistos. Tra ba lha-se com bens j uríd icos coleti vos sem a m enor preo
cupaçã o, ignorando seu p otencial legi t imado r não só de proibições abusivas, como
também de sanções penai s draconianas. Con íund e-se a questão do bem j urídico
(o que proteger ?) com a da estrutu ra do delito (com o proteger: por m eio de cr ime
de lesão, perigo concreto ou abstrato?). E ainda que reformulássemos a tese dos
críticos do perigo abstrato na nova roup agem , dizend o que ela não se refe re a um
falsamente col eti vos , opta-se po r um conceit o de perigo concret o que transforma
m uitos perigos meramente abstr atos em perigos concret os. E ignora-se de todo
que parte da do utrina mode rna tenha acabad o de reconhecer com o sua futura tarefa
vasculhar os divers os tipos e formular crit éri os de legit imidade tanto de ben s ju
rídicos coletivos com o, principalmente, d e crimes de perigo abstr ato.
O principal erro dos inimigos do perigo abstrato é achar que, criticando
esta figura, r esol veram todos o s problemas. A rigor, os problemas apenas co m e
çaram a aparecer.
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Direito Penal 14 7
m inar a problemática da proibiç ão do porte de haxixe para us o p essoal, fe z
questão de não o fazer.1 7D esd e e ssa de cisão pod e-se afirmar que o s defensores
do concei to político-criminal de bem juríd ico se encon tram n a defensiva, h a
vendo mesmo quem bri nque com a m etáfora de estar o c oncei to de bem jurídi
co moribundo, no le ito de m orte, ou de clarado m orto por seus op ositore s.18
Ain da assi m, o concei to político-cri m inal de bem jurídi co teve, ao menos
historicamente, uma gran de conquis ta : orientou amplas descriminalizações no
direito p en alsex ual alemão. P ara lembrar unicamente o exemplo mais significati
vo: na Alema nha, o homo ssexuali smo masculino era uma conduta punível até a
déca da de 70. Algun s autores va leram -se de um con ceito cr ítico, político-crim i-
nal de bem jurídico pa ra dizer que tais incriminações de condutas m eramente
imorais não tutel avam be m jurídico algu m , sendo, portanto, ilegítim as.19 Es sa
argum entação acabou por convencer o legislador, que aboliu o referi do disp ositi
vo, ao l ado de muitos outr os. M a s m esm o essa conqui sta é atual mente questiona
da p or mu itos. Para Frisch 20 e S traten w erth ,21 po r exemp lo, o conceito d e bem
ju ríd ic o aqu i pouco fez ; a desc rim in alização do h om ossex ualism o m asc ulino de
correria de mudanças culturais, elas sim decisivas.
Mais: alguns autores não vêem no bem jurídico qualquer conteúdo
libera lizant e, no senti do q ue lhe é atribuído p or m uitos, e si m um me canismo que
Teil, Berlin: Springer etc., 1998, § 3/27 et seq.; Jescheck e Weigend, Lehrbuch des Strafrechts -
AIlgemeiner Teil,5. ed,B erlim Du ncke rôcH um blot, 1996,p. 7etseq.;Wesselse Beuike,o/ rfl?r? rfe
- AIlgemeinerTe il, 33. e d , Heidelberg: C. F. Müller, 2003, n. 9.
17. BVerfG em N JW 19 94 ,p. 1.577 et seq.
18. Cf. os dois defênsoresdoco nceitopoiítico-criininaldebem jimdicoHefe ndehl,“D as Rechrsgut
ais mater ialer...”,cit.,p . 119; e Schünemann, “D a s Rechtsgüterschutzp rinzip...”, cit., p. 133.
19. Em especial Herbe rt Jâger, StrafgesetzgebungundRechtsgüterscbutz beiSittüchkeitsdelikten,
Stuttgart: Ferdinand Enke Verlag, 1957, p. 6 et seq.; Roxin, Tãterschaft und Tatberrscksft,
Ham burg: Cra m de Gruyt er, 1963, p. 413 et se q.; Hanac k, “Empfiehlt es si ch, di e G renzen des
Sexual strafrechts neuzubestim men ?”, /Sr München: Deucschenjuristentag,
Beck, 1968, n. 29 et seq.
20. Frisch,“Rech tsgut, Recht,Deli ktsstruktur. ..”,d t.,p .2 l8 .
21. Strat enwerth, ‘:Zu m Be griff...”,d t.,p . 389 etseq.
96 RBCCR IM 49 - 20 04
'•'Princípio da ofensividade" e crimes de perigo abstrato
lidade deste não a proteção d e ben s jurídicos, e sim a m aximização de esfe ras de
liberdade,2 3 e Vòlk, que ve rifica que o conceito de bem jurídico mu dou com pleta
mente de função, abandon ando a função cr ítica para passar a fundam entar as nova s
incriminações do direito penal econômico e ambiental.24
E nfim , o concei to de bem jurídico po de ser tudo, menos am plamente ace ito.
Pelo contrár io, tant o no Brasil, como na Aleman ha, ele é def endido por um a
doutr ina mino ritária. A única diferença ent re nós e os alemães parece ser que aqui
está na m oda fal ar de bem jurídico, enquanto l á a m oda agora é r ecusá -lo. Tais
observações não signif icam, porém, que essa d outrina minoritá ria não po ssa ter
razão ; elas valem , ainda assim , como prim eiro sinal de cuidado, no sentido de que
é m elho r para r e refletir a respeito de no ssas certezas. E o que faremos a seg uir.
b) A problem ática do concei to polít ico-c riminal de bem jurídico: onde
fundamentá-lo?
Q uerem os um conceit o de bem jurídico ca paz de r estr ingi r o poder de
incriminar do legislador.2 5 O problem a é, assim, de onde extr aí- lo. N a A lem a-
22. Es te perigo , em especial n o que se r efere a bens jurídicos coleti vos, é apontado mesm o por
defensores do conceito po lítico-crimin al de bem jurídic o, como repetidamente faz Hassemer,
“Grundli nien e iner p e rs o n a le n .c it ., p. 89; "Symbolisc hes Straf recht und Rechts güterc hutz”,
NStZ, p . 557 ,1989 ; Ein fuhrun g in die G rundlagen des Strafrechts, 2. ed.,München: Bec k, 1990,
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23. Jako bs, “Kriminalisierung im Vorfeld. ..”, cit., p. 756.
24. Volk, “Strafrecht und Wirtsch aítskriminalitãt; ’,/Z , p. 88,19 82 .
25. Esta mo s abstraindo da pergunta, também r elevante, quanto a se es ta limitação ao poder do le
gislador tem necessaria mente de ser prestada pelo conceito de bemjurídico, e não por alternativas.
Um a alternativa queve m ganh ando ca da vez mais adeptos é a teoria dale sãoadire itos, que remont a
■iFt\itTb-ãch.{cí.Fcucthach.,R£vistcmderGrundsdtzeundGrundòegrtffedespositivenpeinííchenR£chts,
Erfm t:Henn ingsch eBuc hhan dlung , 1799, reimp. Aalen, 1966 ,vol. I, p. 65;R£viswnderGrundsãtze
und Grundbegriffe despositiven -peinlichen&?c ièís,Tasche: Chem mtz, 1800, reimp. Aaien, 1966 , vo l
Direito Pen al 9/
Luís Greco
premissas que nao são de m aneir a algum a tão seguras como parecem supor os
defensores deste posicionamento.
92 RBCCRIM 49 - 20 04
"Princípi o da o fensividad e" e cri m es de perigo abstrat o
o conceit o de be m jurídic o qu e nos interessa. A final, est e conceito está à com ple
ta disposição do l egis lador . C om base neste concei to, só se poderá dizer se algo é
um bem jurídico se o legislador assi m houver dec idi do. O que preci samos saber é
se é possível tra balhar com um conceito não m ais dogmático, e sim político-cri-
minal de b em jurídico; noutras pala vras, s e se pode esperar do conceito de bem
ju rídico alg um a eficácia no sentido de limitar o p oder de punir d o Esta do.
Neste trabalho, não trataremos do conceito dogmático de bemjurídico,
mas unicament e d o políti co-cri minal. Ta l não implica separ ar dogm ática de po-
lítica-crimina l,10nem d esconh ecer em que m edida o conceito dogm ático dep en
derá do concei to polít ico-cr iminal . A rigor , penso que o conceito dogm ático d e
verá ser construído nos m old es que lhe sejam fornecidos pelo conceito polít ico-
criminal , e al guns a pontam entos ne sse sentido serão feitos no corr er do estudo.
Ocorre que , por razões d e espaço, concentrarei as atenções no exame do conceit o
políti co-cri minal de bem jurídico, fazendo só observ ações pontuais a respei to d a
relevância dogmática dessa categoria político-criminal.
9. Maurach, DeutuhesStrafrecbt- Beso ndererTe il,4. ed-, Karlsr uhe: C .F.Müller, 196 4,p. 411.
Política crimin ale
10. O que não se mostra ed.
sistemajurídico-penal,2. mais, trad.
possível desdeRio
Luís Greco, o fundamental estudo de,200
dejane iro: Renovar Roxin,
2 ( l.1 edi ção publ icada
srcinalmente em 1970). Ma is detalhes sobre essa abordagem, chamada “f uncional”, em Grec o,
“Introdução à dogmática íuncionalista do delito”, RBCCrim 32/120 et seq.,2000.
Direito Penal 93
Revista Brasileira de 49
CIÊNCIAS CRIMINAIS
Espéci es de sanções penais - Direito penai ante a informática e a
tel emátic a - Violação dos direitos hum anos e o direito penal