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Descentralização da gestão dos recursos hídricos

em bacias nacionais no Brasil

Dilma Seli Pena Pereira


Rosa Maria Formiga Johnsson

RESUMO: Desde o início dos anos 1990, o Bra- ABSTRACT: Since the early 90s, Brazil has
sil vem implementando novos modos de gestão been building a new water resource manage-
das águas, tendo como princípios básicos a des- ment system, based on the following principles:
centralização em nível de bacia hidrográfica, a the decentralization to the river basin level, the
participação dos envolvidos e/ou interessados participation of stakeholders within basin com-
na gestão das águas, no âmbito de colegiados mittees and water councils, and the concept of
de tomada de decisão, e a valorização da água water as an economic good. The water resourc-
como bem público de valor econômico. Esse es management can be very complex in the case
processo de descentralização pode assumir of national river basins, i.e. basins where feder-
grande complexidade, quando se trata de baci- al and state management agencies and basin in-
as nacionais, isto é, bacias que demandam a ação stitutions are to interact in integrated manner.
integrada e harmônica da União, dos estados e This article aims at analyzing the current de-
dos organismos de bacia. Este artigo tem por centralization process in national river basins
objetivo principal analisar o processo atual de in Brazil, following principles and concepts of
descentralização em bacias nacionais no Brasil, public policy literature and, particularly, those
a partir de conceitos e princípios que regem e of water resources policy and management. We
determinam a atuação do Estado nas políticas seek principally to address this issue to more
públicas, em geral, e na política de recursos in-depth studies to be carried out later, since
hídricos, em particular. Busca-se, sobretudo, en- national river basin management has revealed
dereçar esse tema para análises futuras mais the complexity and challenges in question, and
aprofundadas, tendo em vista a sua complexi- has been understood in a different way by sev-
dade, desafios e as profundas diferenças no seu eral stakeholders.
entendimento. KEY-WORDS: Water resources, management,
PALAVRAS-CHAVE: Recursos hídricos, gestão, decentralization, national basins, challenges,
descentralização, bacias nacionais, desafios, Brasil Brazil

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INTRODUÇÃO
Descentralização na política de recursos hí- nejamento e gestão – princípio estabelecido na
dricos significa a institucionalização, em nível lei federal 9.433/97 e leis dos estados da fede-
local, de condições institucionais, técnicas, fi- ração – em referência ao fenômeno geomorfo-
nanceiras e organizacionais para a implemen- lógico e geográfico de área de drenagem que
tação das tarefas de gestão, conforme atribui- forma uma bacia, e condiciona a sua gestão e
ções designadas na lei de recursos hídricos, ga- planejamento, seja no que concerne à quanti-
rantindo continuidade no fluxo da oferta dos dade ou à qualidade de suas águas.
bens e serviços. O conceito de local refere-se A descentralização de uma política públi-
aqui à bacia hidrográfica como unidade de pla- ca depende de diversos fatores, o principal
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deles concerne ao interesse, de uma parte, POLÍTICAS PÚBLICAS


em descentralizar, e da outra, de receber e E DESCENTRALIZAÇÃO1
desempenhar a função descentralizada. To-
davia, diversos atributos – tais como a enge-
nharia operacional das políticas, o legado das Globalização e descentralização
políticas e, sobretudo, as regras constitucio- Desde os anos 1980, a América Latina vive
nais que normatizam as condições de oferta um processo de transformação sem preceden-
ou de regulação de uso de determinado ser- tes em termos econômicos, políticos, culturais
54 viço ou bem público, como a água – têm im- e sociais, fruto da globalização da economia,
plicações sobre o processo de descentraliza- das transformações dos processos produtivos
ção; de fato, o comportamento destas variá- e da estrutura e dinâmica do trabalho e, so-
veis pode implicar custos e benefícios, políti- bretudo, da profunda e intensa mudança nos
cos e financeiros, para os envolvidos (Ärre- padrões de comunicação. Trata-se de transfor-
tche, 2000). mações complexas, imbricadas entre si, que se
No Brasil, as peculiaridades das competên- manifestam e condicionam as políticas públi-
cias constitucionais na gestão dos recursos hí- cas da região. Uma das principais evidências
dricos determinam a emergência de acordos dessas manifestações consiste no movimento
e barganhas federativas, uma vez que estabele- do Estado em direção à sociedade e no movi-
ce, como imposição legal, o domínio compar- mento dos níveis centrais de decisão para os
tilhado entre a União e os Estados sobre as níveis locais, ou seja, a descentralização. Esses
águas de bacias nacionais, isto é, bacias cujo movimentos criam e articulam estruturas e
rio principal atravessa mais de um Estado da processos em novas configurações de poder,
Federação. O processo de gestão nessas bacias nos níveis central, regional, da bacia hidrográ-
deve assim conformar entendimentos, interes- fica e local.
ses, capacidades institucionais das burocracias A nova configuração do Estado, que se tem
e vontades políticas em diferentes esferas de hoje na América Latina, encontra-se em está-
atuação (federal e dos estados onde se situa a gios diferentes de transformação, embora evo-
bacia). Portanto, a gestão de bacias hidrográ- lua sob os mesmos princípios de equidade,
ficas nacionais é um caso típico de políticas transparência, integração, participação, desen-
públicas cuja descentralização tem que ser volvimento sustentável e sustentado, acolhi-
pactuada caso a caso, fazendo com que a go- mento e respeito às minorias. Ela é resultante
vernabilidade – isto é, a capacidade do gover- de um movimento de contraponto às transfor-
no de mobilizar os recursos necessários para mações da economia pela sociedade, que se
sua implementação –, torne-se complexa, im- organiza e se mobiliza para a expansão de luta
plicando no manuseio de um conjunto signi- social contra a exclusão e pela participação
ficativo de variáveis. cidadã nas decisões de políticas públicas. Isso
Este texto tem por objetivo analisar o pro- também exige mudança nas instituições do
cesso atual de descentralização da gestão de Estado, fazendo surgir estruturas e processos
bacias nacionais brasileiras que vem sendo im- estatais capazes de refletir, impulsionar e aco-
plementado no âmbito da Política Nacional de lher movimentos de participação política de
Recursos Hídricos. Para tanto, serão conside- grupos de população, espaços territoriais, es-
rados os conceitos e princípios que regem e feras administrativas e setores até então mar-
determinam a atuação do Estado nas políticas ginalizados do poder decisório.
públicas em geral, e na política de recursos hí- Conseqüentemente, são engendradas e
dricos em particular, bem como os condicio- construídas novas articulações entre Estado,
nantes legais e as condições operacionais da
gestão dos recursos hídricos no Brasil. Busca-
se, sobretudo, endereçar esse tema para análi- 1
Este capítulo utiliza-se de conceitos e análises de vários au-
ses mais aprofundadas, no futuro, visto a sua tores, dentre os quais destacamos: ANA, 2002a; Arretche, 2000;
complexidade e as profundas diferenças no seu Castells, 1999; Dagnino, 2002; Fleury, 1999 e 2003; Pereira,
entendimento. Dilma, 1999 e 1998; Pereira, Potyara, 2000; e Raichelis, 1998.
Pereira, D. S. P.; Formiga-Johnsson, R. M. Descentralização da gestão dos recursos hídricos em bacias nacionais no Brasil

Economia e Sociedade mediante novos acor- mentos para se auto-governar, enfrentar e re-
dos institucionais, requerendo a existência de solver os problemas agendados. Portanto, este
leis, normas e valores, bem como, de proces- sistema, mantendo e aprofundando a ordem
sos inovadores de inserção, integração, coor- democrática, não se restringe à simples capa-
denação e de gestão pública. Espera-se, desse cidade estatal de governar. Ele envolve, tam-
conjunto de processos, a organização das inte- bém, a capacidade do governo de articular e
rações coletivas que gere condições propícias institucionalizar a política pública e, nela, os
para uma ação corporativa entre os diferentes esforços de múltiplos atores que intervém, ou
atores e agentes sociais, de natureza pública e devem intervir, na gestão da água; atores estes 55
privada, para assegurar, em bases diferentes, que buscam conciliar seus interesses e orien-
os bens públicos demandados pela sociedade. tar suas ações em direção a objetivos socialmen-
Desta forma, as demandas democráticas cana- te aceitáveis.
lizaram as reivindicações em direção à cons- O desafio sobre qual temos que refletir é
trução de um novo padrão de políticas públi- quanto ao papel e capacidade do Estado e de
cas, com participação, transparência e descen- suas políticas públicas de gerar, implementar
tralização, para conformar um novo Estado. e manter mecanismos institucionais capazes de
No Brasil, essas demandas resultaram na Re- assegurar a governabilidade e a governança
forma Constitucional de 1988, e como decor- adequadas, uma vez incorporado o conjunto
rência, entre outros acordos institucionais de variado de entidades e atores, no seio das ins-
política pública, na institucionalização de Po- tituições de gestão pública, de maneira efetiva
lítica Nacional de Recursos Hídricos, por meio e com poderes específicos. Os principais re-
da Lei Federal nº 9.433, de Janeiro de 1997. quisitos da governabilidade e governança são
Essa política reflete e sintetiza, de maneira os seguintes:
significativa, o conceito e princípios que pre- capacidade técnica e administrativa das
sidiram a reconstrução das políticas públicas, entidades/ atores do sistema (governo,
como parte dos processos de democratização usuários e organizações civis);
da articulação política e econômica da socie-
dade. E nela ficou instituído que a política bra- capacidade econômica, financeira e téc-
nica para conceber, construir, manter e
sileira de recursos hídricos é descentralizada,
administrar a infra-estrutura hídrica e,
pela amplitude e relevância que organizações
governamentais, empresariais (usuários) e or- principalmente, os serviços de abasteci-
mento de água, esgotamento sanitário e
ganizações sociais de uma bacia hidrográfica,
saneamento ambiental. Não há possibi-
unidade de planejamento e gestão, assumem
na definição e implantação de políticas e na lidade de uma política de recursos hídri-
cos ser eficiente e eficaz, quando as polí-
articulação de ações públicas.
ticas públicas dos setores usuários são
Fica evidenciada a evolução da relação Esta- ineficientes e não respondem às deman-
do/Sociedade, revelada pela política pública de das econômicas e sociais;
recursos hídricos, de estruturas de representa-
capacidade política (gestão) para coor-
ção centralizadas e monopólicas de governo,
para sistemas policêntricos, nos quais os pro- denar ações e concertar interesses.
cessos decisórios de concepção e de implanta- O conceito de governabilidade das políti-
ção da ação pública em recursos hídricos apre- cas públicas, no novo formato, deixa então de
sentam dispersão espacial e setorial de poder, ser um monopólio exclusivo de governos, para
para incorporar interesses diferenciados. incorporar atores/entidades da sociedade di-
retamente envolvidos e/ou interessados nos
resultados e na condução dessas políticas. O
Governabilidade em recursos hídricos exercício efetivo do papel de cada um desses
A Governabilidade do Sistema Político e do atores, governamentais e não-governamentais,
Sistema de Gerenciamento de Recursos Hídri- requer a cooperação e participação, bem como
cos, naquele inserido, se constitui em um sis- a definição clara do papel dos atores no siste-
tema de leis, normas, regulamentos e instru- ma de gestão. E é nesse processo de dedicar
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esforços e recursos exclusivamente para a re- Regulação e regulamentação


solução das questões coletivas agendadas, que dos recursos hídricos
os atores passam a enfatizar princípios inter- A necessidade da regulação dos bens natu-
organizacionais tais como a participação, trans- rais, de consumo essencial, é inquestionável e
parência, equidade, honestidade de atitudes e aceita por todos. Como escreveu Hardin (1968),
a gestão negociada dos conflitos de interesse ao descrever a tragédia dos bens comuns,
em torno do uso de água. Por outro lado, as
tensões entre conflito/consenso, igualdade/ como ser racional, cada fazendeiro busca maxi-
56 diferença são intrínsecas e constitutivas do Es- mizar os seus ganhos, utilizando mais terra e mais
tado Moderno; elas estão presentes em todas água para criar mais um animal. Qual a utilida-
as discussões sobre acordos/arranjos instituci- de para um fazendeiro individual de adicionar
onais que sejam capazes de garantir o exercí- um animal a mais ao seu rebanho? Existe um
cio de cidadania, a participação, a descentrali- componente positivo, o incremento de um ani-
zação, a representação e a execução de políti- mal, e possivelmente um aumento da renda in-
dividual deste fazendeiro, e um componente
cas públicas.
negativo que é o consumo a mais, de recursos
O capital social criado em uma bacia hi- naturais (água e pastagem) que o animal vai cau-
drográfica dotada dos instrumentos de ges- sar e que atinge a todos os fazendeiros, portanto
tão de recursos hídricos (plano, comitê, co- o impacto negativo atinge a todos. Quando este
brança, agência), pode ser definido tanto fato é compartilhado por todos é conceituado
como um conjunto de recursos, reais e po- como a tragédia do bem comum. Portanto, se
tenciais, ligados por uma rede de relações de cada um segue perseguindo seu máximo inte-
resse na sociedade, agindo livremente sobre o
interesses, durável e institucionalizada, quan-
ambiente geral e apropriando dos bens naturais,
to como o reconhecimento interno e exter- leva à ruína de todos.
no ao sistema (Franco, 2001). Neste sentido,
o sistema de gestão dos recursos hídricos A apropriação dos recursos hídricos é exem-
transcende o papel de mero instrumento ge- plar quanto à possibilidade de causar uma tra-
rencial na medida que gera e mantém rela- gédia comum. Essa apropriação, em benefício
ções políticas, com base em processos cientí- privado, pode ser tanto uma sobrexploração
ficos de tomada de decisão, mas também, exi- dos mananciais, superficial e/ou subterrâneo,
ge, para o seu funcionamento, a construção em termos de quantidade quanto em termos
do consenso e de decisão sustentada pela con- de poluição, adicionando aos corpos hídricos
fiança entre os atores. componentes como esgotos domésticos e eflu-
Em nossas sociedades cada vez mais frag- entes químicos, etc. Para Hardin, nessa situa-
mentadas, a conformação de uma esfera pú- ção, os cálculos são os mesmos:
blica democrática depende de negociação dos
interesses, da aceitação das diferenças e da o homem racional entende que sua parte nos
geração de objetivos comuns que permitam custos de lançar os resíduos que ele produz no
ambiente comum, é menor do que o custo que
o desenvolvimento de ações solidárias. Esta
ele teria se os tratasse, antes de devolvê-los à na-
nova esfera pública requer, por conseguinte, tureza. Como isto é verdade para todos estamos
inovadores aparatos de gestão, tecnologia e presos em um sistema individualista, nos com-
processos para o exercício do poder, que se- portando apenas como empreendedores livres,
jam capazes de inserir, de forma correta, as independentes e racionais.
relações de poder na estrutura organizacio-
nal do Estado. Todavia, faz-se necessário es- Embora o problema da poluição seja con-
clarecer que sistemas de gestão, mesmo que seqüência do crescimento e concentração da
constitutivos no aparato governamental esta- população e das atividades econômicas, deve-
tal, não se prestam ao exercício de compe- se considerar o notável desenvolvimento de
tências exclusivas de Estado como a regula- meios tecnológicos e financeiros para resolvê-
ção de funções públicas e a garantia de direi- lo. Contudo, resta ainda o grande problema
tos fundamentais (Pereira, 2000; Franco, da disponibilização desses meios, que é forte-
2001; Haddad, 2004). mente diferenciada entre os diferentes países
Pereira, D. S. P.; Formiga-Johnsson, R. M. Descentralização da gestão dos recursos hídricos em bacias nacionais no Brasil

do planeta. Nesse caso, a convergência é per- públicos de energia, telecomunicações, sane-


versa. Nos países subdesenvolvidos e em de- amento básico,etc; e regular o uso de bens
senvolvimento o crescimento da população é naturais públicos como o da água.
maior, ao mesmo tempo em que os recursos No Brasil, o tema água é regulamentado
tecnológicos e financeiros para mitigar os pro- pela Constituição Federal de 1988.2 O artigo
blemas da poluição são escassos. Portanto, o referente à competência da União para “insti-
processo de aproveitamento dos recursos na- tuir o Sistema Nacional de Gerenciamento de
turais para o desenvolvimento econômico e Recursos Hídricos (SINGREH)”, materializou-
para o bem estar pode ser muito mais oneroso se com a aprovação pelo Congresso Nacional, 57
para as gerações futuras, sobretudo se regras após seis anos de negociação, da Lei Federal
regulatórias claras e rígidas não forem aplica- nº 9.433, de 8 de janeiro de 1997, também co-
das. Além disto, nos ensina Hardin, ainda, nhecida como “lei das águas” que instituiu a
Política Nacional de Recursos Hídricos, cons-
não interessa, hoje, como e quanto os antepas- tituindo-se assim em um marco importante na
sados poluíram, que diziam, e era, então com- história da regulamentação do setor. Essa lei
provado, que a poluição gerada estaria diluída incorpora modernos instrumentos e princípi-
dez quilômetros rio abaixo. A questão atual é que os de gerenciamento de recursos hídricos e
a população cresceu, ficou densa e os processos
apresenta conceitos inovadores no que concer-
naturais de natureza química e biológico fica-
ram saturados e levaram a uma nova redefinição ne à organização do setor, no âmbito nacional
dos direitos de propriedade. e estadual e em termos de participação dos
diferentes atores envolvidos e interessados na
Acrescentaríamos, ainda, a responsabilida- questão dos recursos hídricos. Ressalta-se, en-
de dos Estados em estabelecer os limites des- tretanto, nesse processo de regulamentação da
tes direitos e os deveres em relação ao bem lei das águas, o pioneirismo do Estado de São
comum. A tragédia dos bens comuns pode, Paulo, que aprovou, em 1991, a sua lei estadu-
portanto, ser impedida, pela regulação. Con- al de gerenciamento de recursos hídricos.
tudo, como ressalta Harvey (1998), hoje o Es- Desde então, outros 25 estados e o Distrito
tado está numa posição muito problemática. Federal adotaram suas legislações respectivas
É chamado a regular as atividades econômicas (Formiga-Johnsson e Moreira, 2003).
e os recursos naturais de uso privado e públi- Porém, a reforma institucional do setor de
co, no interesse da nação, mas é forçado, ao recursos hídricos no Brasil, somente veio a
mesmo tempo, também no interesse nacional, consolidar-se em 2000, com a edição da Lei
a criar um “bom clima de negócios” para atra- Federal nº 9.984, de 20 de junho, que criou a
ir investimentos. E é a este mesmo Estado que Agência Nacional de Águas (ANA). O País
tem sido cada vez mais exigido como fator de passou então a dispor de entidade com auto-
coesão dos níveis de uma formação social e das nomia, estabilidade e agilidade suficientes para
partes dos sistemas que conformam as diferen- fazer frente ao desafio de implantar o Sistema
tes políticas públicas, mantendo a unidade do Nacional de Gerenciamento de Recursos Hí-
sistema, posto que o equilíbrio jamais é reali- dricos (SINGREH), preconizado pela Consti-
zado, no âmbito do mercado pelos atores eco- tuição Federal de 1988. A ANA, para sua atua-
nômicos, mas é responsabilidade e atribuição ção, se subordina aos fundamentos, objetivos,
intrínseca das entidades do Estado. diretrizes e instrumentos da Política Nacional
A exemplo dos países da América Latina, o de Recursos Hídricos e articula-se com órgãos
papel do Estado brasileiro, face ao estágio de e entidades públicas e privadas, integrantes do
desenvolvimento e às disparidades regionais e SINGREH.
interpessoais de renda, assume significativa
relevância. Poderíamos citar, entre outros: de-
finir as políticas econômica, social, de infraes- 2
Artigos 20 (inciso III), 21 (inciso XIX) e 22 (inciso IV). Res-
trutura e ambiental do país, dado que consti- salta-se que a primeira legislação relevante para a gestão
tuem a própria razão de ser da função gover- das águas, incluindo a sua regulação, foi adotada em 1934
namental; regular a prestação dos serviços (“Código de Águas”).
REGA – Vol. 2, no. 1, p. 53-72, jan./jun. 2005

O exercício da competência exclusiva de Adoção da bacia hidrográfica como uni-


Estado na regulação dos recursos hídricos, em dade de planejamento e gestão das águas:
um ambiente de governabilidade denso, par- gestão descentralizada;
ticipativo, descentralizado e policêntrico, como Participação dos diferentes níveis do po-
o é o SINGREH, do qual a ANA e os gestores der público, dos usuários e da sociedade
estaduais fazem parte, é uma tarefa árdua e civil no processo de tomada de decisão:
em fase de construção, como veremos ao lon- gestão participativa.
go dos próximos capítulos.
58 São cinco os instrumentos de gestão previs-
tos na lei das águas: planos de recursos hídricos
GESTÃO DE RECURSOS HÍDRICOS ou de bacia hidrográfica; enquadramento dos
NO BRASIL: PRINCÍPIOS, INSTRUMENTOS corpos de água em classes, segundo os usos pre-
E ORGANIZAÇÃO INSTITUCIONAL ponderantes da água; outorga de direito de uso
Os princípios, instrumentos e organização de recursos hídricos; cobrança pelo uso da água
político-institucional estabelecidos pela “lei bruta; e sistema de informações sobre recursos
das águas” confirmam a escolha feita pela so- hídricos. A implementação desses instrumen-
ciedade brasileira por uma forma de gestão, tos de gestão, fortemente interdependentes e
que atualmente é praticada em quase todos complementares do ponto de vista conceitual,
os países que avançaram na gestão dos re- demanda não somente capacidades técnicas,
cursos hídricos e que, também, é recomen- políticas e institucionais, mas requer também
dada pelas grandes cartas e organismos in- tempo para sua definição e operacionalização,
ternacionais. pois sua implantação é, antes de tudo, um pro-
cesso organizativo social, o qual demanda a par-
ticipação e a aceitação por parte dos atores en-
Princípios e instrumentos de gestão volvidos, dentro da compreensão de que have-
A Política Nacional de Recursos Hídricos do rá um benefício coletivo global.
Brasil tem como objetivo principal assegurar à O sistema de informação tem como objeti-
atual e às futuras gerações a necessária dispo- vo principal o de produzir, sistematizar e dis-
nibilidade de água, em padrões de qualidade ponibilizar dados e informações que caracte-
adequados aos respectivos usos, ao mesmo tem- rizam as condições hídricas da bacia em ter-
po em que busca a prevenção e defesa contra mos de quantidade e qualidade da água nos
eventos hidrológicos críticos e o desenvolvi- diversos usos, e em termos das condições do
mento sustentável, através da utilização racio- ecossistema, traduzido pelas pressões antrópi-
nal e integrada dos recursos hídricos. cas nela existentes. Estas últimas assumem di-
Para atingir esses objetivos adotou-se um versas formas possíveis de caracterização por
conjunto de princípios, de instrumentos téc- mapas de uso e ocupação do solo, declivida-
nicos e um arranjo institucional que, de for- de, cobertura vegetal e cargas pontuais, refe-
ma integrada, garantem a gestão participati- rentes a captações e lançamentos em diferen-
va e descentralizada do uso da água. Os prin- tes pontos da rede hidrográfica, expressas no
cípios sobre os quais se baseia a política de cadastro de usuários da água na bacia.
gestão dos recursos hídricos estabelecidos na O plano de bacia hidrográfica requer do
Lei 9.433/97 podem ser resumidos da seguin- sistema de informação, dados sobre disponi-
te forma: bilidade de água em quantidade e qualidade,
Reconhecimento da água como um acrescidos das informações sobre pressões dis-
bem público, finito e vulnerável, dotado de tribuídas, para a caracterização do estado atu-
valor econômico; al da bacia e proposição de medidas destina-
Necessidade do uso múltiplo das águas: das a sua melhoria. Os planos de bacias são
gestão integrada; planos diretores que visam fundamentar e ori-
entar a implementação da política de gestão
Prioridade do uso dos recursos hídricos,
dos recursos hídricos em nível de bacias hidro-
em situações de escassez: consumo hu-
gráficas, definindo os usos prioritários e o pro-
mano e dessedentação de animais;
grama de investimento para a recuperação e
Pereira, D. S. P.; Formiga-Johnsson, R. M. Descentralização da gestão dos recursos hídricos em bacias nacionais no Brasil

conservação dos recursos hídricos e do ecos- vez, além dos seus objetivos de racionalização
sistema da bacia. do uso da água e de estímulo a não poluir, é o
O enquadramento visa determinar níveis instrumento de gestão que permite o aporte
de qualidade ao longo do tempo nos diversos de recursos para financiar o programa de in-
trechos da malha hidrográfica, em função dos vestimentos da bacia.
usos e dos programas e metas para a consecu-
ção destes objetivos. As definições nele pre- Estrutura Político-Institucional do SINGREH
vistas afetam diretamente a outorga, que se
dará pelas vazões de diluição, as quais são, por
Um aspecto fundamental da legislação bra-
sileira de recursos hídricos foi a criação de um
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sua vez, é função dos níveis de qualidade es- sistema institucional que possibilita à União,
tabelecidos. aos estados, aos municípios, aos usuários de
A outorga é um instrumento que tem como recursos hídricos e à sociedade civil de atuar,
objetivo assegurar o controle quantitativo e de forma harmônica e integrada, na resolução
qualitativo dos usos da água; é o direito de aces- dos conflito, e na definição das regras para o
so à água, ou a habilitação para o seu uso. A uso da água em nível de bacia hidrográfica.. O
garantia do uso ou da disponibilidade da água Sistema Nacional de Gerenciamento de Recur-
se efetiva através do exercício da gestão inte- sos Hídricos (SINGREH) é, portanto, o arca-
grada dos recursos hídricos em nível de bacia bouço institucional para a gestão descentrali-
hidrográfica. Para sua implementação, a ou- zada e compartilhada do uso da água no Bra-
torga demanda do sistema de informações sil, do qual fazem parte o Conselho Nacional
dados relativos à disponibilidade hídrica e de de Recursos Hídricos (CNRH), a Secretaria de
qualidade, os quais, juntamente com o cadas- Recursos Hídricos (SRH/MMA), a Agência
tro de usuários, constituem insumos funda- Nacional de Águas (ANA), os Conselhos de
mentais para o seu exame e concessão. Recursos Hídricos dos Estados (CERHs), os
Sobre o conjunto de usuários submetidos à órgãos gestores federais e estaduais, os muni-
exigência da outorga é estabelecida a cobran- cípios, os Comitês de Bacia e as Agências de
ça pelo uso dos recursos hídricos. Esta por sua Água (Figura 1).

Figura 1. Estrutura político-


institucional do SINGREH.
Fonte: Agência Nacional de
Águas, 2001.
REGA – Vol. 2, no. 1, p. 53-72, jan./jun. 2005

A inovação institucional ocorreu na incorpo- tos legais complementares, fez-se necessário


ração da demanda por participação e descen- estabelecer estratégias para a implementação
tralização da sociedade ante a criação de orga- dos princípios, instrumentos de gestão e orga-
nismos de tomada de decisão em nível nacio- nização política-institucional. Essas estratégias
nal, estadual e de bacia (conselhos e comitês) – concebidas pela ANA, órgão responsável pela
que passaram a incorporar novos atores (muni- implantação da Política Nacional de Recursos
cípios, usuários e organizações civis) ao proces- Hídricos – são fortemente influenciadas pelas
so de gestão. A descentralização do processo de peculiaridades jurídicas da federação brasilei-
60 planejamento e gestão deverá ser ainda mais ra e pela diversidade regional do país (Pereira
fortalecida quando as Agências de Bacia forem e Formiga-Johnsson, 2003; Agência Nacional
criadas. Estas deverão se constituir na prática de Águas, 2002a e 2002b).
em instituições executivas, ágeis e flexíveis para
dar suporte técnico, administrativo e financei- Uma descentralização complexa:
ro às deliberações dos comitês de bacia. Salien- dominialidade dos corpos d’água
ta-se que a criação de tais agências está estreita- e gestão de bacias nacionais
mente vinculada à implantação da cobrança
pelo uso da água, instrumento, que no Brasil, Em termos técnicos, políticos e institucio-
encontra-se em fase inicial de implantação. nais, os pontos sensíveis no exercício de práti-
cas de gestão integrada dos recursos hídricos
É importante notar que os comitês de bacia concentram-se nas interfaces entre setores usu-
hidrográfica, como órgãos públicos de Estado, ários e gestores e na compatibilização e har-
constituídos pelos segmentos envolvidos e inte- monização da gestão entre gestores estaduais
ressados nas águas da bacia, têm atribuições e res- e federal e entre comitês de uma mesma bacia
ponsabilidades que lhes são próprias, tal como hidrográfica.
definido na Lei 9433/97, não devendo ser con-
fundidas com as atribuições e responsabilidades Ao adotar a bacia hidrográfica como uni-
de Estado de regulação e fiscalização, constitucio- dade territorial de planejamento e gestão e
nalmente definidas. A emissão do ato administra- permitir a criação de organismos de bacia sob
tivo da outorga com poderes de polícia, e o exer- jurisdição federal ou estadual, as leis das águas
cício de sua fiscalização, é de competência exclu- intensificam essa complexidade de forma sig-
siva dos órgãos públicos gestores, isto é, da ANA, nificativa, pois aumentam as interfaces institu-
nos rios de domínio da União, e dos gestores esta- cionais. Esse é o caso principalmente de baci-
duais, nos rios de domínio dos estados da federa- as nacionais, por envolverem a União e dois
ção. Cabe ainda a essas instituições gestoras a apli- ou mais Estados da Federação.3 Nessas bacias,
cação da cobrança, em articulação com os comi- a dupla dominialidade configura um sistema
tês de bacia, conforme normas rigorosas e ade- de gestão em duas esferas de atuação (federal
quadas, com o intuito de atingir os objetivos do e estadual), que possuem a mesma missão ins-
desenvolvimento sustentado e sustentável; cabe titucional e são profundamente interdepen-
ainda ressaltar que essas instituições, por serem dentes no seu conteúdo e aplicação. A Lei
individualmente identificadas, respondem por 9.433/97 estabelece que a União articular-se-á
seus atos perante a sociedade. A regulação do uso
dos recursos hídricos passa assim a ser caracteri-
zada pela concepção e aplicação de um conjunto
de leis, normas e taxas que são operacionalizadas 3
A Constituição Federal de 1988 classificou todas as águas
por meio da outorga de direitos de uso e pela co- brasileiras como um bem público de domínio dos Estados ou
brança pelo uso da água bruta. da União. Os rios que constituem fronteira entre estados ou
país ou, ainda, atravessam mais de um estado ou país per-
tencem ao domínio da União; todos os outros rios bem como
A ESTRATÉGIA DE DESCENTRALIZAÇÃO as águas subterrâneas constituem águas estaduais. A princi-
DA GESTÃO DE RECURSOS HÍDRICOS pal exceção à essa regra concerne às águas estaduais reti-
NO BRASIL das em obras de domínio da União, que deixam de pertencer
Diante do caráter geral dado à gestão de ao domínio dos Estados (Constituição Federal de 1988, art.
bacias hidrográficas pela Lei 9.433/97 e tex- 20 e art. 26).
Pereira, D. S. P.; Formiga-Johnsson, R. M. Descentralização da gestão dos recursos hídricos em bacias nacionais no Brasil

com os estados para o gerenciamento dos re- à resolução, à negociação e à superação dos
cursos hídricos de interesse comum; da mes- problemas e das lacunas existentes nos arca-
ma forma, as leis estaduais estabelecem que os bouços jurídico-legais. Esses ambientes são for-
estados deverão se articular com a União, ou- mados pela trama de múltiplos fatores, dentre
tros estados e municípios para o aproveitamen- os quais são decisórios:
to, controle e monitoramento dos recursos a convergência de objetivos;
hídricos de interesse comum.
o entendimento por todos os atores das
Porém, nenhum texto legal delineia ou de-
talha a forma como deve se dar essa articula-
questões e desafios envolvidos; 61
ção em bacias hidrográficas nacionais, seja no a criação de laços de confiança através
de um processo de gestão ético, transpa-
tocante aos instrumentos de gestão (outorga,
rente e democrático, que conduza à equi-
fiscalização e cobrança) ou aos organismos de
bacia (relação entre o comitê do rio principal dade, racionalidade e eficiência na toma-
da de decisões; e
e os comitês de rios afluentes, sob jurisdição
federal ou estadual). a construção de um sentido de identida-
Ou seja, a implantação e operacionalização de da bacia, um sentido de unidade de
atuação harmônica, de co-responsabili-
do sistema de gestão e seus instrumentos em
dade e co-dependência.
bacias nacionais – com vistas à recuperação,
proteção, conservação e uso racional dos re- A criação desse ambiente de confiança e con-
cursos hídricos – não é uma tarefa fácil. Faz-se senso pode ser abordada por intermédio de um
necessário a concepção de estratégias opera- processo de construção de um “pacto” entre
cionais para tornar possível a aplicação dos todos os atores sociais relevantes da bacia, que
princípios, conceitos e instrumentos instituí- consiste no compromisso de tornar realidade
dos nas leis das águas vigentes, federal e esta- os princípios e objetivos previstos na legislação.
duais, superando as incompatibilidades jurídi- Tal iniciativa, em bacias nacionais, requer a exis-
co-administrativas e suprindo as omissões le- tência do comitê do rio principal (sob jurisdi-
gais, mediante processos de negociação entre ção federal) enquanto instância principal de
as partes envolvidas e preservando e aperfei- integração do planejamento e da gestão da ba-
çoamento ao fundamentos da Política. cia hidrográfica na sua totalidade.

Estratégia para a ação: Operacionalização da estratégia:


a governança de bacias nacionais no Brasil pacto de gestão
O entendimento e a cooperação compõem A ANA propôs e está implementando uma
a base inteligente e possível para enfrentar e estratégia para avançar. Baseia-se na constru-
superar os desafios da gestão integrada em ção de acordos sociais estabelecidos nos comi-
bacias nacionais. Trata-se essencialmente de tês de bacia hidrográfica, visando a formação
criar as condições para a governança dos re- de consensos sobre a utilização dos recursos
cursos hídricos, ou seja, criar ambiente e me- hídricos e evitando assimetrias entre usuários
canismos de atuação harmônica das autorida- ou entre os órgãos gestores. É, portanto, com
des federal e estadual na gestão das águas. a construção de pactos de gestão, conceito que
a ANA vem desenvolvendo no exercício de sua
Criação de um ambiente institucional missão no campo institucional, que se podem
de negociação e consensos superar as lacunas existentes na legislação
quanto à questão da dupla dominialidade dos
A gestão compartilhada dos recursos hídri- corpos d’água e tornar efetiva a bacia hidro-
cos requer, necessariamente, compatibilizar os gráfica como unidade de planejamento e ges-
diversos conflitos de interesses e demandas. tão de recursos hídricos.
Deve-se evitar, sobretudo, tensões e embates
O pacto de gestão em bacias nacionais tem
conceituais e jurídicos. A gestão compartilha- como ponto fundamental o entendimento e a
da requer, portanto, entre outros aspectos, a
cooperação entre a ANA e os órgãos gestores
criação de ambientes institucionais adequados
REGA – Vol. 2, no. 1, p. 53-72, jan./jun. 2005

estaduais no exercício de seus poderes de po- tadual (órgãos estaduais de recursos hídricos)
lícia das águas, sobretudo, quanto à harmoni- e o comitê da bacia hidrográfica (comitê da
zação de critérios e procedimentos para a im- bacia do rio principal e, eventualmente, comi-
plantação dos sistemas de outorga, fiscalização tês dos afluentes).
e cobrança pelo uso de recursos hídricos. Por- Como representado na figura 2, abaixo, o
tanto, ele requer dos Estados a criação de ca- Convênio de Integração constitui importante
pacidade operacional de seus sistemas de ges- ferramenta de construção do pacto federativo
tão, ou seja, é necessário conferir prioridade, para a gestão integrada de bacias compartilha-
62 disposição e decisão política quanto à implan- das, pois articula tanto os entes federados e
tação, fortalecimento e/ou reestruturação dos seus órgãos técnicos responsáveis pela gestão
Sistemas Estaduais de Gerenciamento de Re- de recursos hídricos quanto os comitês de ba-
cursos Hídricos, em especial no que concerne cia que, por sua vez, são constituídos pelas es-
aos órgãos gestores de recursos hídricos. feras governamentais (União, Estados e Muni-
O pacto de gestão envolve, ainda, o comitê cípios) e não-governamentais (usuários e or-
da bacia do rio principal por constituir-se am- ganizações da sociedade civil).
biente de negociação e consensos, de impor- O apoio aos Estados deve ser objeto de con-
tantes questões relativas à operacionalização vênios específicos de cooperação a serem fir-
da gestão em nível de bacia hidrográfica, so- mados entre a ANA e cada um dos Estados in-
bretudo aquelas que demandam atuação con- tegrantes da bacia. Prevê-se ainda, no escopo
junta com os órgãos gestores tais como a co- desses convênios de cooperação, o estabeleci-
brança pelo uso da água e a criação da agên- mento e integração de normas, critérios e pro-
cia de bacia. É por essa razão que o Convênio cedimentos que permitam o uso adequado e
de Integração, instrumento de operacionali- eficaz do instrumento de delegação de com-
zação do pacto de gestão, é firmado entre os petências da ANA para os órgãos gestores es-
gestores do poder público federal (ANA), es- taduais.
O Convênio de Integração para a gestão
integrada de uma bacia nacional deve assim
ser estabelecido caso a caso, de modo a se ade-
quar à diversidade regional brasileira, às capa-
Figura 2 - Interação de atores no cidades técnicas e institucionais dos sistemas
processo de gestão da bacia: o estaduais envolvidos e à dinâmica sócio-políti-
pacto de gestão pela água. ca da bacia hidrográfica em questão. Por essa
Fonte: Agência Nacional de Águas,
2001.
Pereira, D. S. P.; Formiga-Johnsson, R. M. Descentralização da gestão dos recursos hídricos em bacias nacionais no Brasil

razão, o Convênio de Integração – além de tra- Flexibilidade-avaliação-revisão:


tar questões técnicas relativas à outorga, fisca- a prática definindo caminhos e aplicando lições
lização e cobrança – pode inserir também no A implantação dos instrumentos de gestão
seu escopo ações e atividades de curto, médio em uma bacia hidrográfica resulta de um ato
e longo prazo, necessárias à total operaciona- de vontade dos atores institucionais – gestores
lização da gestão da bacia, no respeito das rea- públicos de recursos hídricos, usuários e soci-
lidades regionais, tais como: edade organizada. Este ato de vontade resul-
criação da agência de águas que, devido ta, de um lado, da percepção coletiva da pres-
às peculiaridades brasileiras, necessita a são e competição pelo uso de recurso hídrico 63
celebração de Contrato de Gestão com e, de outro lado, do conhecimento e do enga-
o poder público federal, no caso de águas jamento no sistema de governabilidade para a
de domínio da União, ou com o poder regulação dos usos e para a recuperação hi-
público estadual, quando se tratar de rios dro-ambiental da bacia.
de domínio dos Estados; De fato, as experiências pioneiras da ANA
integração técnica e institucional do sis- em bacias nacionais têm confirmado o pressu-
tema de informações e monitoramento posto inicial que a governabilidade dos recur-
da quantidade e qualidade dos corpos sos hídricos – além de condições jurídicas,
hídricos federais e estaduais; administrativas e financeiras necessárias ao
implantação de programas indutores de exercício da gestão –, é também credora de
aplicação dos instrumentos técnicos de duas condições principais: i) o acúmulo do
gestão, mediante investimentos em conhecimento sobre as condições e problemas
ações aprovadas pelos comitês de baci- da bacia, e ii) o capital social da bacia hidro-
as, a exemplo do Programa de Despo- gráfica, ou o nível de construção de laços soci-
luição de Bacias lançado pelo MMA/ ais e redes de cooperação entre os diferentes
ANA em 2001; ou, ainda, atividades di- atores envolvidos com a gestão da bacia. Isso
versas de capacitação dos atores envol- significa que o processo de implementação dos
vidos e interessados pela gestão de baci- novos modos de gestão demanda tempo – em
as hidrográficas. maior ou menor intensidade, segundo as ca-
racterísticas da bacia – para construir e/ou
Dessa forma, o Convênio de Integração
acumular capital social e de conhecimento na
pressupõe um processo permanente de nego- bacia. Isso exige também do gestor flexibilida-
ciação – um dos princípios basilares da Lei
de na implementação da estratégia de gestão,
9.433/97 e do modelo institucional por ela
capacidade contínua de avaliação desse pro-
preconizado – e pode ser considerado como cesso e, quando necessário, uma revisão do
um marco importante no processo de consoli-
mesmo de forma a melhor adequá-lo às carac-
dação da gestão dos recursos hídricos no Bra-
terísticas da bacia.
sil, refletindo os princípios da democratização,
da descentralização e da ética. Em suma, embora a estratégia de descen-
tralização da gestão em bacias nacionais seja a
mesma, as peculiaridades de cada bacia hidro-
OS DESAFIOS DA PRÁTICA: gráfica – geopolítica, econômica e social – têm
DETERMINANTES DO SUCESSO grande influência sobre os modos de imple-
DO SISTEMA DESCENTRALIZADO DE GESTÃO mentação da lei, fazendo com que a seqüên-
Os processos pioneiros de implementação cia de operacionalização dos instrumentos de
da gestão integrada em bacias nacionais con- gestão seja, por vezes, fortemente diferencia-
duzidos pela ANA, desde 2001, permitiram da de uma bacia a outra. É a prática definindo
identificar os maiores desafios à operaciona- caminhos e aplicando lições, conforme obser-
lização de novas práticas de gestão dos recur- vado na vivência das experiências pioneiras de
sos hídricos, descentralizada em nível de ba- gestão de bacias nacionais, iniciadas nas baci-
cia hidrográfica e compartilhada entre múl- as dos rios Paraíba do Sul, Piracicaba-Capiva-
tiplos atores. Este capítulo dedica-se à sua dis- ri-Jundiaí, São Francisco, Doce, Paranaíba e
cussão. Verde Grande.
REGA – Vol. 2, no. 1, p. 53-72, jan./jun. 2005

Observando mais detalhadamente a dinâmi- cionais já criados, somente o Comitê de Inte-


ca na Bacia do rio Paraíba do Sul, bacia piloto gração da Bacia do rio Paraíba do Sul – CEI-
da ANA para implementação dos instrumentos VAP dispõe hoje de sua agência de bacia, a
de gestão (CEIVAP, 1999),4 constata-se que o AGEVAP, instalada em setembro de 2004; por
processo foi impulsionado de maneira signifi- enquanto, o CEIVAP é também o único comi-
cativa com a decisão de iniciar a cobrança pelo tê de bacia nacional que já instituiu, juntamen-
uso das águas de domínio da União (Pereira, te com a ANA, a cobrança pelo uso de rios de
Dilma e Formiga-Johnsson, R.M., 2003). Trata- domínio da União. Além do CEIVAP, instalado
64 se de uma decisão conjunta do Comitê de Inte- em 1997, existem vários outros comitês e con-
gração da Bacia do Paraíba do Sul (CEIVAP) e sórcios de usuários atuando em sub-bacias ou
da ANA, acordada com os Estados da bacia (São partes da bacia desde 1994; os usos das águas
Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro). A opera- foram regularizados no final de 2002; foi insti-
cionalização da cobrança na bacia teve como tuída a cobrança pelo uso de águas fluminen-
condição prévia a implementação imediata de ses em 2004; e os recursos arrecadados estão
outros instrumentos de gestão, estreitamente sendo aplicados de acordo com o programa de
inter-relacionados – plano de bacia e cadastra- investimentos aprovado pelo CEIVAP, no âmbi-
mento/regularização/outorga de direitos de to do plano de bacia (Quadro 1). Restam, con-
uso –, além da criação e instalação da Agência tudo, para o fortalecimento da gestão na ba-
de Bacia (Deliberação CEIVAP n. 08, de 06 de cia, importantes desafios a serem superados,
dezembro de 2001). tal como a delegação, pela ANA, da outorga
A estratégia adotada para a implementação de direitos de uso aos gestores estaduais, sob
de todos esses instrumentos de gestão, em tem- regras de regulação pré-estabelecidas e, sobre-
po relativamente curto, foi possível graças às tudo, a assimetria entre os usuários atualmen-
características da bacia, uma das mais prepa- te pagadores e os usuários de águas mineiras e
radas do país, do ponto de vista técnico e de paulistas. Embora este problema demande
mobilização social, para implementar com uma solução o mais breve possível, pode-se afir-
maior agilidade o novo sistema de gestão, de- mar que houve mais benefícios que prejuízos
lineado pela lei federal das águas. Isso se deve, com este acordo, pois a cobrança foi imple-
de um lado, ao importante capital acumulado mentada, está regular e todo a receita é aplica-
em termos de planejamento, o que permitiu a da na bacia, a qual dispõe de todos os instru-
apreensão e conhecimento profundo dos re- mentos previstos na lei, implantados e em fun-
ais problemas da bacia; de outro lado, as su- cionamento.
cessivas tentativas de mobilização institucional Em condições sócio-econômicas e ambien-
para a sua proteção e recuperação, ao longo tais semelhantes, as Bacias dos rios Piracica-
das décadas, traduz-se hoje no considerável ba, Capivari e Jundiaí (Minas Gerais e São
nível de politização dos atores da bacia. Paulo)5 têm igualmente um capital acumula-
Atualmente, a Bacia do Paraíba do Sul é a do bastante significativo, em termos de conhe-
bacia nacional mais avançada na implantação cimento da bacia e, sobretudo, em termos de
do novo sistema de gestão de recursos hídri- mobilização dos atores locais em torno da sua
cos no Brasil. Dentre os comitês de bacias na- gestão; o conjunto dessas bacias vem se orga-
nizando de forma intensa para o enfrenta-
mento da gravidade da problemática de suas
águas desde o início dos anos 1990, no âmbi-
4
A Bacia do rio Paraíba do Sul foi considerada prioritária pelo to da implementação do sistema paulista de
planejamento estratégico da ANA em razão da necessidade
de recuperação, proteção e uso racional das suas águas que
constituem insumo vital para a sustentação econômica de uma
região fortemente urbanizada e industrializada, responsável 5
Segundo pólo industrial do estado de São Paulo, as bacias
por cerca de 10% do PIB do país, e manancial de abasteci- Piracicaba-Capivari-Jundiaí produzem em torno de 7% da ri-
mento de cerca de 14 milhões de pessoas, incluindo mais de queza do país e abastecem 4.5 milhões de pessoas, no inte-
8 milhões de habitantes da Região Metropolitana do Rio de rior da bacia, e parte da Região Metropolitana de São Paulo
Janeiro, situada fora dos limites da bacia. (9 milhões), através da transposição de suas águas.
Pereira, D. S. P.; Formiga-Johnsson, R. M. Descentralização da gestão dos recursos hídricos em bacias nacionais no Brasil

QUADRO 1
Descentralização estratégica em bacias nacionais:
comitês de bacia e estágio de implementação do Sistema de Gestão de Recursos Hídricos

65

Fonte: Agência Nacional de Águas, 2004, adaptado e atualizado.


REGA – Vol. 2, no. 1, p. 53-72, jan./jun. 2005

gestão. A ampliação do seu processo organi- atores da bacia, condição indispensável para
zativo no âmbito do sistema nacional de ges- assegurar eficácia na representação, e na re-
tão – incluindo, portanto, a União (ANA, Se- presentatividade.
cretaria Nacional de Recursos Hídricos) e o E assim, sucessivamente, foram iniciados
Estado de Minas Gerais – segue os mesmo outros processos de descentralização estraté-
objetivos de implementação dos instrumen- gica da gestão de bacias nacionais considera-
tos de gestão em bacias nacionais. O princi- das prioritárias, indicadas no quadro 1, apre-
pal resultado desse processo até agora con- sentado anteriormente. Esses processos pionei-
66 cerne à delegação da função exclusiva da ros permitiram também a identificação de al-
União – a outorga em rio de domínio da guns desafios, discutidos ao longo das próxi-
União – aos Estados de São Paulo e Minas mas seções, que deverão ser superados para
Gerais, reconhecendo assim a capacidade tornar efetiva a gestão integrada e descentrali-
operacional e técnica dos seus órgãos gesto- zada de bacias nacionais.
res (Departamento de Águas e Energia Elé-
trica-DAEE e Instituto Mineiro de Gestão de
Águas-IGAM, respectivamente). Formação e capacitação dos atores:
órgãos gestores
A implementação dos novos modos de ges-
tão na Bacia do rio São Francisco, situada em O sucesso da descentralização da gestão de
grande parte no semi-árido brasileiro, tem sido bacias nacionais, no âmbito da implantação do
bastante diferenciada das experiências indica- Sistema Nacional de Gerenciamento de Recur-
das acima, de bacias nacionais ricas, úmidas, sos Hídricos (Figura 1), exige das instituições
urbanizadas e industrializadas da região sudes- integrantes o compromisso e a responsabiliza-
te (Christofidis, 2001).6 De fato, o essencial do ção pelo desempenho de seus papéis em suas
esforço para aquela bacia concerne à criação respectivas esferas de atuação (AGÊNCIA NA-
e instalação do comitê de bacia, um gigantes- CIONAL DE AGUAS, 2003). Nesse processo,
co processo de mobilização de atores locais ao cabe destacar o papel dos órgãos gestores, fe-
longo dos anos 2001 e 2002, envolvendo sete deral e estaduais, porque cabe a eles apoiar a
unidades da federação (AGÊNCIA NACIO- implantação do sistema como um todo, além
NAL DE AGUAS, 2002b, 2003 e 2004).7 Foi no de implementar os instrumentos de gestão em
decorrer dessa experiência que uma importan- nível de bacia hidrográfica, sobretudo a outor-
te lição foi aprendida: a criação de comitê deve ga de direitos de uso e sua fiscalização. Pela
ser precedida do conhecimento prévio das con- vinculação, no Brasil, da cobrança pelo uso da
dições da bacia e de seus principais usos e usu- água com a outorga, cabem também aos ór-
ários das águas, mediante processo de regula- gãos gestores, competências compartilhadas
rização de usos dos recursos hídricos. Um dos com os comitês de bacia para a implantação
problemas encontrados quando da criação do de sistemas de cobrança e para a criação de
comitê de São Francisco foi justamente a insu- agências de bacia.
ficiência do conhecimento e identificação dos O sucesso do novo sistema de gestão requer,
portanto, estruturas gestoras de recursos hídri-
cos implantadas, fortes e em funcionamento,
com competência técnica e gerencial compatí-
6
Com uma superfície de 631mil km², a Bacia do São Francis-
vel com as suas novas responsabilidades de ges-
co compreende o Distrito federal e seis unidades da federa- tão. Um exemplo particularmente ilustrativo
ção: Minas Gerais, Bahia, Pernambuco, Sergipe, Alagoas e concerne à criação da ANA, em nível federal,
Goiás, 503 municípios e 12,5 milhões de pessoas. que deu um grande impulso no movimento de
7
Na Bacia do Paraíba do Sul, o CEIVAP precedeu a criação implantação da política nacional de gestão das
da ANA. Nas Bacias Piracicaba-Capivari-Jundiaí, a criação águas e representa uma mudança significativa
do comitê sob jurisdição federal não demandou grandes es- no equacionamento dos problemas hídricos
forços por parte da ANA, diante do importante capital social brasileiros. Em nível estadual, a criação da agên-
da bacia, traduzido institucionalmente pelo Consórcio Inter- cia de águas do Estado do Ceará (COGERH),
municipal (1991) e o Comitê Paulista (1994). em 1994, é simbólica da criação e desenvolvi-
Pereira, D. S. P.; Formiga-Johnsson, R. M. Descentralização da gestão dos recursos hídricos em bacias nacionais no Brasil

mento de novas capacidades gestoras para o Os Convênios de Cooperação entre a ANA


enfrentamento dos problemas de recursos hí- e os Estados buscam superar esse desafio, me-
dricos na escala territorial do estado. diante apoio institucional para criação, estru-
Entretanto, a maioria das agências gestoras turação e/ou fortalecimento dos órgãos esta-
existentes, notadamente nos estados do sul e duais de recursos hídricos, e à implementação
sudeste brasileiros, ou aquelas criadas recen- harmônica dos instrumentos de gestão em
temente, necessitam, de apoio para o fortale- bacias nacionais.
cimento de suas capacidades técnicas e geren-
ciais, inclusive para receber e desempenhar Formação e capacitação dos atores: 67
competências da União, no processo de des- comitês de bacia
centralização. É o que aconteceu na bacia do No processo de gestão integrada de bacias
Piracicaba, Capivari e Jundiaí, onde a ANA hidrográficas nacionais, cabem aos comitês de
delegou, sob condições estabelecidas no âm- bacia decisões importantes que fazem parte do
bito de um convênio de Integração com os rol de suas atribuições, tais como:
estados de São Paulo e Minas Gerais, a compe-
tência de outorgar o uso do recurso hídrico, promover o debate das questões relacio-
nos cursos de água de seu domínio, nestas ba- nadas a águas e arbitrar, em primeira ins-
cias, conforme aqui analisado. tância administrativa, os conflitos relaci-
onados aos recursos hídricos;
Quando se trata de bacias nacionais, além
das capacidades individuais de cada órgão ges- estabelecer metodologia e critérios de
tor, faz-se necessário um esforço adicional do cobrança pelo uso de recursos hídricos
conjunto de instituições envolvidas para se e propor os valores a serem cobrados aos
chegar ao entendimento e à cooperação dese- órgãos competentes;
jados, notadamente, no que concerne à im- propor os valores de usos insignificantes
plantação harmônica dos instrumentos de das captações, derivações, e lançamentos
outorga e cobrança pelo uso dos recursos hí- de efluentes para efeito de isenção da
dricos em nível da bacia. obrigatoriedade de outorga e cobrança;
Diante da estratégia de descentralização de aprovar o Plano de Recursos Hídricos da
competência traçada pela ANA de delegar aos bacia, acompanhar a sua execução e su-
Estados a concessão de outorga de rios de do- gerir providências necessárias ao cumpri-
mínio da União, conforme pactuado no âmbi- mento de suas metas;
to do Convênio de Integração já instituído aprovar a proposta de plano de investi-
(Piracicaba, Capivari e Jundiaí), a questão das mentos previsto no Plano de Recursos Hí-
competências (técnica, financeira, etc.) dos dricos para a aplicação de recursos finan-
órgãos gestores estaduais torna-se ainda mais ceiros oriundos da cobrança; e
importante e a sua assimetria, no âmbito da criar a Agência das Águas, juntamente
bacia hidrográfica, torna-se um dos maiores
com a ANA, que deverá ser a figura jurí-
desafios do processo de descentralização de
dica e o braço executivo do comitê.
bacias nacionais. É o que vem ocorrendo na
Bacia do rio Paraíba do Sul e certamente ocor- Trata-se de decisões que requerem um co-
rerá com maior intensidade na Bacia do rio nhecimento técnico mínimo, por parte dos
São Francisco, por exemplo. membros e participantes do processo decisório,
de modo a dar consistência às discussões e rei-
Ressalta-se que foi firmado no âmbito do
vindicações no âmbito dos comitês de bacia.
pacto para a gestão dos recursos hídricos da
bacia do Paraíba do Sul, o respectivo Convênio Entretanto, o que se observa, freqüente-
de Integração, todavia sem a delegação de com- mente, na vivência de muitos comitês são dis-
petência pela ANA aos gestores estaduais da torções conceituais significativas e debates
bacia, para a emissão das outorgas, sobretudo acalorados, frutos de considerável grau de de-
por dificuldades do Estado do Rio de Janeiro sinformação por parte dos membros. A dis-
em assumir esta função, devido à deficiência cussão do Plano da Bacia do São Francisco
técnica e operacional de seu órgão gestor. ilustra essa questão. É competência dos co-
REGA – Vol. 2, no. 1, p. 53-72, jan./jun. 2005

mitês aprovar o plano da bacia, todavia trata- dição indispensável à participação qualificada
se de um instrumento técnico de grande com- e à democratização do processo decisório
plexidade. No caso em tela, a discussão apai-
xonada do plano, motivada por posições po- O saber técnico a serviço
líticas contrárias ao projeto de transposição da gestão descentralizada
de águas para outras bacias do semi-árido
nordestino, e da desinformação de grande A informação e capacitação dos atores dire-
parte de seus membros quanto aos conceitos tamente envolvidos no processo decisório re-
68 básicos que regem o planejamento e a gestão querem, dentre muitas questões, a existência
do conhecimento técnico sobre o objeto de
dos recursos hídricos, redundou em altera-
ções técnicas da proposta original, compro- decisão e, sobretudo, sua disponibilização em
metendo o produto final. A principal polê- conteúdo e forma adequados aos diferentes
mica sobre o projeto da transposição reside atores do processo. O saber técnico e sua apro-
na decisão política sobre a alocação do volu- priação por parte dos decisores – sobretudo
me dos recursos públicos disponível para a no âmbito dos colegiados – são, portanto, con-
implantação do projeto, francamente escas- dicionantes de processos decisórios democrá-
so, face à necessidade global de investimen- ticos, eficazes e tecnicamente qualificados.
tos, para o financiamento do projeto da revi- Muitas bacias brasileiras dispõem, hoje, de
talização da bacia, por exemplo. É sabido que considerável conhecimento sobre seus proble-
a disponibilidade hídrica, como é de conhe- mas e propostas de solução. Contudo, rara-
cimento de muitos, não representa um impe- mente esse saber técnico é plenamente utili-
dimento ou problema para a execução da zado nos processos decisórios, mesmo porque
transposição, como demonstrado no Plano de é ainda costume não tratá-lo de forma ade-
Recursos Hídricos da Bacia do São Francisco quada ao processo de tomada de decisão en-
(AGÊNCIA NACIONAL DE AGUAS, 2004). volvendo atores não-técnicos. Este é, sem dú-
Mesmo em comitês de bacia mais ativos, vida, um dos grandes desafios enfrentados
observa-se significativa assimetria no processo atualmente na gestão das águas no Brasil, pois
decisório entre os diferentes setores ali repre- superá-lo implica inclusive em mudanças na
sentados. Um bom exemplo foi o processo de cultura ainda predominante de produzir in-
implementação da cobrança na Bacia do rio formações qualificadas para ambientes pre-
Paraíba do Sul, ao longo dos anos 2001 e 2002. dominante técnicos.
Pela importância dos interesses em jogo, esse Um exemplo positivo do saber técnico à
processo permitiu identificar os atores mais serviço da gestão descentralizada foi a renova-
atuantes na bacia, sua postura em relação à ção da outorga do Sistema Cantareira, no Es-
cobrança, sua organização e liderança bem tado de São Paulo, que transpõe águas da Ba-
como suas capacidades propositivas (UFRJ, cia do rio Piracicaba, para o abastecimento
2002a e 2002b; Formiga-Johnsson e al., 2003). público de parte da Região Metropolitana de
São os agentes privados, usuários das águas – São Paulo-RMSP, executado pela empresa es-
em particular os usuários industriais e as em- tadual de águas e esgotos (SABESP). Foi um
presas do setor elétrico – que demonstraram processo decisório complexo, devido aos inte-
maior capacidade organizativa imediata para resses conflitantes em jogo entre a região be-
a questão, inclusive para a defesa dos seus in- neficiada (RMSP) e a bacia doadora (Piracica-
teresses no processo de negociação. Pode-se ba), que desde os anos 1980 tem se mobiliza-
afirmar que foram eles os mais mobilizados e do em torno dessa questão. A precisão das in-
os mais propositivos durante todo o processo formações técnicas foi de suma importância
de discussão e negociação. para a solução de compromisso encontrada
A capacitação dos membros dos comitês de entre as partes, que parece ter sido positiva
bacia, sobretudo dos setores tradicionalmen- para ambos os lados do processo de negocia-
te mais periféricos no processo decisório, cons- ção. É o saber técnico e a negociação política
titui, portanto, o maior desafio da gestão par- a serviço da resolução de conflitos em ambi-
ticipativa em bacias nacionais. Trata-se de con- ente complexo.
Pereira, D. S. P.; Formiga-Johnsson, R. M. Descentralização da gestão dos recursos hídricos em bacias nacionais no Brasil

CONSIDERAÇÕES FINAIS faz-se necessário pactuar mecanismos e


regras de convivência que permitam
Ao analisar o processo atual de descentrali-
articular e integrar os diferentes orga-
zação da gestão de recursos hídricos no Brasil,
nismos de bacia, harmonizando a atu-
evidenciamos a sua grande complexidade que
ação do conjunto. Nesse contexto, cabe
requer o efetivo enfrentamento e a superação
destacar a importância do comitê da
de desafios de diferentes tipos e magnitudes,
bacia do rio principal para o estabele-
com destaque para os seguintes:
cimento do pacto interno com a visão
Implementação da gestão harmonizada. estratégica de construir a identidade da 69
Diz respeito à construção de mecanismos bacia hidrográfica enquanto unidade
de convivência – e não de subordinação – principal de planejamento e gestão das
que permitam articular e harmonizar a águas;
atuação dos órgãos gestores de recursos
Aperfeiçoamento da legislação. Trata-se
hídricos, federal e estadual, em nível de
de compatibilizar, por intermédio de pro-
bacia hidrográfica;
cesso de negociação e via experiência
Construção de uma lógica territorial de adquirida na prática da gestão, a legisla-
gestão. Ao instituir a bacia hidrográfica ção da União com a dos estados e supe-
como unidade de planejamento e gestão, rar a questão da dominialidade dos cor-
busca-se superar uma lógica puramente pos de água, de forma que os procedi-
setorial, que tem dominado a gestão das mentos técnicos, jurídicos e administra-
águas no Brasil, e criar uma lógica terri- tivos sejam conciliados. Essa questão im-
torial de gestão integrada dos usos múl- põe um dos maiores desafios para o ge-
tiplos; renciamento integrado dos recursos hí-
Operacionalização e fortalecimento do dricos do país, sobretudo diante da di-
comitê de bacia. Trata-se de promover versidade política, econômica, social e
o funcionamento do comitê com sus- ambiental das regiões brasileiras que se
tentabilidade, de forma que o colegia- reflete nos ritmos de regulamentação e
do tenha garantia de apoio técnico, fi- implementação dos sistemas estaduais de
nanceiro e administrativo. A atuação gestão dos recursos hídricos, fortemen-
dos Comitês deve primar pela clareza, te diferenciados de um ente federado
transparência e explicitação de propó- para outro.
sitos, amparados pelo profundo conhe- No decurso da elaboração deste texto, pu-
cimento técnico. Na nova concepção de demos igualmente confirmar o quanto a po-
gestão compartilhada, o conhecimen- lítica pública de recursos hídricos no Brasil
to técnico-científico deve ser colocado é ainda carente de um referencial teórico
à disposição do comitê de forma clara conceitual que possa embasar e dar susten-
e objetiva, para que ele possa se conso- tação às estratégias de implementação, ges-
lidar como espaço efetivo de delibera- tão e avaliação das ações e do próprio Siste-
ção sobre programas estratégicos para ma Nacional de Gerenciamento de Recur-
a bacia, com vistas à revitalização dos sos Hídricos. Afinal, o sucesso e a perenida-
rios e à garantia e otimização de seus de de uma política pública requerem o res-
usos múltiplos, de forma eficiente e de- paldo de teorias criteriosamente elaboradas
mocrática; e colocadas a serviço do interesse público
Estabelecimento de regras de convivên- (Pereira, Potyara, 2000; Pereira, Dilma,
cia entre comitês. Poderão ser criados 1998).
vários comitês de bacia, sob jurisdição Um referencial teórico conceitual para a
federal ou estadual, ou seja, poderá política de recursos hídricos deve se basear em
existir o comitê da bacia do rio princi- visões ou posicionamentos estreitamente vin-
pal e comitês de sub-bacia ou de tre- culados aos princípios, fundamentos e instru-
chos de bacia. Por causa das indefini- mentos de gestão, consensados na legislação
ções legais quanto à relação entre eles, do setor, que tem como paradigma a garantia
REGA – Vol. 2, no. 1, p. 53-72, jan./jun. 2005

do acesso de todos à água, para o consumo Podemos, portanto, afirmar que, em que
humano e o desenvolvimento de atividades pesem os princípios, fundamentos e instru-
produtivas, bem como a sua utilização racio- mentos previstos na Lei 9.433 e a própria cria-
nal e integrada com vistas ao desenvolvimento ção da Secretaria de Recursos Hídricos e da
sustentável. Ele deve ser capaz de identificar e Agência Nacional de Águas, a política pública
orientar, com parcimônia e eficácia, os dife- de recursos hídricos no Brasil carece ainda de
rentes atores e interesses em torno do uso e um referencial que lhe garanta rationale e con-
da gestão da água. Esse referencial deve ainda duza ao entendimento consensual de que esta
70 constituir-se em ferramenta para a conscienti- política é um processo complexo e que englo-
zação e exercício técnico-político dos atores ba ao mesmo tempo caráter racional, ambien-
nos aspectos ligados ao seu comprometimen- tal, ético e cívico (Pereira, 2000).
to ético com a causa da justiça no acesso à água, A racionalidade da política de recursos hí-
tanto na sua alocação para o desenvolvimento dricos determina que a base de suas decisões
sustentável e sustentado, quanto na recupera- deve estar assentada em estudos e pesquisas
ção e preservação hidro-ambiental dos ecos- científicas, bem como em processos contínu-
sistemas das bacias hidrográficas. os de monitoramento e avaliação, especialmen-
Portanto, um referencial teórico coerente te no que concerne às condições da disponibi-
e consistente deve possibilitar a compreensão lidade do recurso hídrico e aos resultados e
adequada acerca dos aspectos políticos, soci- impactos dos programas, projetos e atos regu-
ais, econômicos e ambientais em torno dos latórios oriundos da Política de Recursos Hí-
objetivos principais da política de gestão dos dricos. Baseando-se em indicadores científicos,
recursos hídricos e de como alcançá-los de for- as decisões são, ou devem ser, tomadas e pac-
ma democrática, descentralizada e justa. Isso tuadas no âmbito do Sistema Nacional de Ge-
significa que esse referencial deve ser capaz de renciamento de Recursos Hídricos-SINGREH.
articular o conhecimento científico próprio do Por ter caráter policêntrico, descentralizado e
setor de recursos hídricos com os conhecimen- heterogêneo, conforme analisado ao longo
tos de outras ciências, tais como a economia, a deste artigo, o SINGREH confere à política de
ciência política, a sociologia e a administração recursos hídricos particularidades e densida-
pública. Trata-se inclusive de condição para des que requerem processos sofisticados de
amenizar a intransigência do cientificismo que coordenação e gestão, nem sempre assimila-
domina a política de recursos hídricos no Bra- dos adequadamente no setor de recursos hí-
sil, o qual constitui condição necessária, mas dricos. Esta questão nos remete a outra com-
não é suficiente para a efetividade e integrida- plexidade e especificidade do setor que é cru-
de desta política (Formiga-Johnsson, R.M. e cial mas extrapolam os seus limites de atuação,
P.D. Lopes (org.), 2003).8 isoladamente: embora seja o objeto principal
da política, a alocação dos recursos hídricos e
a resolução de conflitos, suas ações, bem como
seus resultados refletem-se, também, nas polí-
8
Essa constatação já vem inclusive despertando interes- ticas setoriais, relativas aos setores usuários do
ses de acadêmicos e profissionais oriundos ou interessa- recurso hídrico como as políticas de saneamen-
dos por abordagens próprias das ciências sociais e huma- to, irrigação, hidroeletricidade, navegação, etc.
nas. Dentre desse universo, destaca-se o Projeto Marca Portanto, a integração e a complementarida-
d’Água (www.marcadagua.org.br), criado em 2001 com o de entre estas políticas é, ou deve ser, uma pau-
objetivo de acompanhar e analisar o desenvolvimento do ta de trabalho constante, e a racionalidade téc-
novo sistema de gestão das águas no Brasil, sobretudo os nica um pressuposto.
organismos de bacia. Trata-se de um projeto multidiscipli-
nar, comparativo (entre cerca de 20 bacias hidrográficas) e O caráter ético da política tem o endereça-
de médio prazo (de 5 a 10 anos). Ele tem como premissa a mento geral e comum de todas as políticas
crença de que outros fatores, além daqueles estritamente públicas do Estado moderno, que consiste no
técnicos, têm um impacto decisivo nesse processo de trans- compromisso e responsabilidade moral com a
formação político-institucional e podem variar tanto regio- justiça social no ato administrativo que os ato-
nalmente quanto temporalmente. res assumem, cotidianamente, em nome das
Pereira, D. S. P.; Formiga-Johnsson, R. M. Descentralização da gestão dos recursos hídricos em bacias nacionais no Brasil

entidades que representam. Toda política pode cia e a eficácia no uso deste recurso ambiental
e deve ser melhorada, a partir de avaliações. encerra moralidade, justiça social, preservação,
Contudo, ainda que a política de recursos hí- conhecimento científico e participação social,
dricos seja considerada eficiente e eficaz, ha- como condições de continuidade da vida.
verá sempre um descontentamento amplo, O caráter cívico da política de recursos hí-
principalmente da sociedade, enquanto hou- dricos está intimamente integrado tanto à sua
ver poluição dos cursos de água e população forma de implementação (sistêmica, participa-
sem acesso à água potável. tiva e descentralizada), quanto ao seu objeto
O caráter ambiental da política de recursos (a água, direito de todos), ou ainda à sua polí- 71
hídricos é a dimensão que a diferencia das tica (obrigação exclusiva do Estado). Portan-
demais políticas. Parte do princípio de que a to, a eficácia da política deve ser medida, tam-
água disponível no planeta terra é constante bém, pela sua capacidade de concretizar os
em quantidade. Todavia, o consumo e a polui- direitos sociais básicos. Como garantidora de
ção crescem, exponencialmente, devido ao direitos sociais e ambientais essenciais, a polí-
crescimento da população e às mudanças cul- tica de Estado de recursos hídricos apresenta-
turais e tecnológicas. Por outro lado, recursos se, ao mesmo tempo, como uma ação regula-
financeiros não são aportados com o mesmo tória e de disponibilização de bem essencial
ritmo e intensidade para a recuperação e pre- para garantir qualidade de vida, saúde, desen-
servação dos mananciais. Portanto, a eficiên- volvimento e o pleno exercício da cidadania.

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dilmapena@brturbo.com.br;
Dilma Seli Pena Pereira
dilmapena@planejamento.sp.gov.br

Rosa Maria Formiga Johnsson aformiga@terra.com.br;


formiga@hidro.ufrj.br

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