Você está na página 1de 3

CONTRAPONTO AO POETA CAMPONÊS

Dari Sortica
Vou te falar da poesia De uma arte porcaria
Que reside aqui na roça Pois perante à academia
Que dorme nesta carroça Ela não vale um vintém
Sem nenhuma mordomia
Que não vive a hipocrisia Pois que não valha um vintém
De mostrar o que não é Pois arte não é dinheiro
Que pega bicho-de-pé Te falo, por verdadeiro
E o arranca numa boa Que a vida a arte sustém
Essa poesia é pessoa Arte e vida se entretém
Não é arte pangaré E aí está a beleza
Se quiseres ter certeza
Não é arte pangaré? Fica aqui uma temporada
Que me dizes, companheiro No final darás risada
Da poesia do terreiro Desta tua estreiteza
Que pega bicho-de-pé?
Boa coisa ela não é Me acusas de estreiteza?
Não é arte, não é nada Devias me conhecer!
E palavra enchiqueirada Sei que estás a defender
Deve ter cheiro de bosta Que há poesia na rudeza
E pessoa descomposta Se ficasse, a tristeza
Não faz arte refinada Me mataria num dia
Pensa na minha agonia
Ela é arte refinada Viver aqui neste mato
Fala da vida e da morte Distante do fino trato
Desfaz da pessoa forte E perto da estrebaria!
Eleva a discriminada
E por ser originada E perto da estrebaria...
No seio da resistência Te entendi, camarada
Não aceita a prepotência A fala é direcionada
Ditada pelos de cima A desfazer, quem diria
E se te enfrento com rima A nossa filosofia
Rio de tua indigência! E o nosso modo de ser
Se ficares, vais saber
Tu ris da minha indigência Aqui a vida é sofrida
Se dizendo superior Não tem férias, é corrida
Deves sentir-se doutor Mas é bom de se viver
Dotado de inteligência
Mas te falta a competência Mas é bom de se viver?
E o bom gosto também Me mostre o que há de bom
Não se pode falar bem Porque não é de bom tom
Levar a vida a sofrer Mas eu penso em desistir
Tua poesia há de ter E ir pro mundo de vocês
A voz do teu sofrimento
Não é cantiga, é lamento E vir para o mundo nosso?
Vamos, me mostre o que tens Mas que conversa esquisita!
E terás meus parabéns Vamos tomá uma birita
Se mostrares a contento E acabar com esse troço
Eu sei que se hoje almoço
Te mostrarei a contento É porque tu trabalhaste
Se me deres atenção Vai, desculpa este traste
Mas, desarma o coração Que pensando só na rima
E terás discernimento Ofendeu tua autoestima
Eu vivo no assentamento Investindo no contraste
Tenho amor por esta terra
Minha poesia encerra Investimos no contraste
O que há de bom e ruim Pensando na poesia
Desculpa se canto assim Vamos comer ambrosia
Eu fui talhado na guerra Que lá na mesa avistaste
Também desculpa este traste
Foste talhado na guerra Que em nome da vaidade
E o que eu tenho a ver com isso Contrapôs campo e cidade
Te vejo como um ouriço Como um recurso de fala
Espinhando toda terra Pois na trova quem se abala,
O bom cabrito não berra Já perdeu na realidade
Tu és cabrito chorão
Se tens amor pelo chão Com os pés na realidade
Cuides dele com carinho Vamos chegando ao final
Pois te vejo, meu maninho Nossos versos são sinal
Sempre com o cu na mão Desta nossa ambiguidade
Que opõe campo e cidade
Sempre com o cu não mão Julgando a aparência
É o que dizes companheiro Exercitando a paciência
Pois a falta de dinheiro Realizamos poesia
Me acompanha a um tempão Me desculpa a vilania
Se sou cabrito chorão Do poeta sem vivência!
Tu és cabrito mimado
Vê se olha para o lado
E enxerga o camponês
E o sacrifício que fez
Pra te criar até aqui

Você também pode gostar