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A ficção modernista do início do séc. XX, da qual se destaca, nos países de língua
uma estética dita do feio e do choque. Porém, uma perspectiva que creio ser mais fértil
recomenda que esta estética seja abordada sob o signo da violência. Nesta prosa, a
extremamente complexa com a modernidade, que apenas a palavra paradoxo será capaz
uma continuidade mais acutilante – continuidade que, aliás, entre muitos outros
factores, sustenta uma concepção de forte unidade destes dois períodos do modernismo,
ao carácter dito mais explosivo do Expressionismo. Parece-me que esta unidade se torna
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O resultado desta investigação pode ser lido, sobretudo, na minha tese de doutoramento. Cf. Martins,
2007.
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particularmente evidente na ficção ensaística, uma das manifestações mais originais do
Por esta razão, focalizo a minha atenção, não nos profusos textos de uma
insignificante. Falo de Carta de Lorde Chandos (Ein Brief, 1902) de Hugo von
nova leitura. Esta leitura faz-se, obrigatoriamente, na corda bamba do paradoxo, tendo
violentas.
aniquilado por uma racionalidade totalitária que impôs uma mediação omnipresente,
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O paradoxo aparece como um dos princípios estruturais fundamentais do ensaísmo do romance maior de
Robert Müller: Tropen. Der Mythos der Reise. Urkunden eines deutschen Ingenieurs (1915) (Tróp(ic)os.
O Mito da Viagem. Testemunhos de um Engenheiro Alemão). O próprio romance enuncia esta sua
premissa poetológica como “a proclamação do paradoxo” (Müller, 1993: 57). A este respeito, ver
igualmente Martins, 2007.
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todo heterogéneo, pretendendo preservar o indivíduo e a experiência individual numa
filósofo, segundo um dicionário ou uma linguagem pessoais (Adorno, 1972: 72). Assim,
construção duma nova narrativa que toma como princípio estrutural a (auto)reflexão
ensaística, numa dinâmica espiral inspirada na ironia romântica. Não é, pois, por acaso,
alemã, a qual tem na crise do sujeito uma das problemáticas centrais. A prosa narrativa
sublinha o respectivo cariz construído e estético –, ou seja, o seu limite essencial. Por
aquilo que diz no “fazer” do corpo textual. Pela mesma razão, nestes textos, o autor
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da modernidade de raiz iluminista. Não é por acaso que o destinatário da carta de Lorde
Chandos é Bacon, que Adorno e Horkheimer elegeriam algumas décadas mais tarde
Chandos. Este tem início, por um lado, com projectos académicos que correspondem a
obras reais de Bacon (Bosse, 2003: 200) e, por outro, com composições líricas
cronologia ficcional da carta, datada de 1603). Estas composições revelam não somente
uma crença, por parte do jovem aristocrata inglês, na forma estética como fonte e
Para resumir em poucas palavras: nessa altura, numa espécie de embriaguês permanente,
toda a existência me parecia uma grande unidade: o mundo espiritual e o mundo físico
pareciam não se encontrar em oposição, tal como a criatura cortês e a criatura
animalesca, a arte e a não-arte, a solidão e a companhia. Em tudo sentia a natureza, tanto
nas aberrações da loucura como nos refinamentos exteriores da etiqueta espanhola; não a
sentia menos na rusticidade de jovens camponeses do que nas mais doces alegorias; e em
toda a natureza me sentia a mim próprio. (Hofmannsthal, 1959: 10, trad. de António
Sousa Ribeiro, in Scheidl, 1996: 183)
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Segundo o jovem Chandos, estas ideias de unidade e identidade estão
10), cuja concepção se assemelha à dos Essais de Montaigne, uma vasta série de
fragmentos reflexivos sobre uma larga variedade de assuntos, que o ensaísta francês
eu próprio a mim mesmo, como argumento e como assunto” (Montaigne, 1972:7, trad.
minha).
início do séc. XX. Chandos abandona quer o paradigma epistemológico baconiano, quer
o seu Nosce te ipsum enciclopédico, substituindo-os por uma alegada mudez – e pela
carta que envia a Bacon. Num outro plano, Hofmannsthal reage a este segundo
Carta de Lorde Chandos, texto que, simultaneamente, enuncia a crise do real, do sujeito
aristocrata confessa a Bacon que perdeu a compreensão das relações semânticas que
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Porém, este problema tem raízes mais profundas. A razão pela qual os signos
mundo e do Eu, que parecem esvaziar-se. Chandos confessa que renunciou à actividade
vórtice de espelhos fragmentários que devolvem o reflexo do sujeito como vazio, que
Tudo se me dividia em partes, essas partes, noutras partes ainda, e já nada se deixava
abranger por um conceito. As palavras flutuavam em meu redor; coalhavam formando olhos
que me cravavam em mim e que, por minha vez, não consigo deixar de fixar: são turbilhões,
cuja visão me faz vertigens, que giram sem parar, e através dos quais se vai dar ao
vazio.(Hofmannsthal, 1959: 13.trad. de António Sousa Ribeiro, in Scheidl, 1996: 185)
Esta é, de facto, a tese de partida deste ensaio ficcional, tese que é confrontada
pelo autor com o facto contraditório de ele próprio escrever, de Chandos também
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Recordo os seguintes trechos do Livro do Desassossego de Bernardo Soares:
“Penso sempre, sinto sempre; mas o meu pensamento não contém raciocínios, a minha emoção não
contém emoções. Estou caindo, depois do alçapão lá em cima, por todo o espaço infinito, numa queda
sem direcção, infinitupla e vazia. Minha alma é um maelstrom negro, vasta vertigem à roda de vácuo,
movimento de um oceano infinito em torno de um buraco em nada […].
E eu, verdadeiramente eu, sou o centro que não há nisto senão por uma geometria do abismo; sou o nada
em torno do qual este movimento gira, só para que gire, sem que esse centro exista senão porque todo o
círculo o tem. Eu, verdadeiramente eu, sou o poço sem muros, mas com a viscosidade dos muros, o centro
de tudo com o nada à roda.” (Pessoa, 1982: 28)
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escrever, e de o texto, mesmo quando compara as palavras à decomposição de
perspectiva performativa, pode ser considerado um texto sobre a palavra estética, feito
dizer, através do seu uso. Tem início aqui, de um modo significativo, a “proclamação do
Hofmannsthal como a chave principal para compreender a Carta: “Mas porque recorro
brotam em torrente imagética imparável, não tanto para exprimir o seu vazio interior,
momentos de epifania.
leitura do seu ensaio ficcionado. Este crescendo, que se estende praticamente até ao
final do texto, diz respeito ao foro emocional da personagem que se escreve, e cujo
efeitos retóricos, o qual converge numa reflexão sobre a metáfora ou o tropos, enquanto
Entre o que considero serem as duas partes da Carta – uma primeira parte em
que Chandos descreve a perda de capacidade de usar a linguagem, a qual se conclui com
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a constatação da dissociação do real e do Eu, acima citada (Hofmannsthal, 1959: 13); e
(Hofmannsthal, 1959: 13). A partir deste ponto, começa a evidenciar-se uma nuance no
Fiz uma tentativa de me salvar deste estado, transportando-me para o mundo espiritual
dos Antigos. Evitei Platão, porque tinha medo do perigo dos seus voos de imagens.
Sobretudo, pensei fixar-me em Séneca e Cícero. Esperava curar-me nesta harmonia de
conceitos limitados e ordenados. Porém, não conseguia atingi-los. Os conceitos,
percebia-os bem: via o seu maravilhoso jogo de relações erguer-se perante mim como
repuxos magníficos, brincando com esferas de ouro. Conseguia pairar em torno delas e
ver o que faziam umas às outras. Mas só tinham a ver umas com as outras, e o mais
profundo, o mais pessoal do meu pensamento, permanecia à margem da sua dança de
roda. No meio delas, fui assolado por um sentimento de terrível solidão; sentia-me
como alguém que estivesse encarcerado num jardim rodeado só por estátuas sem olhos.
Fugi novamente para o exterior (Hofmannsthal, 1959: 13, trad. minha).
Repare-se como Chandos inclui apenas filósofos do mundo clássico nesta sua
tentativa de redenção, e não autores literários, e que, inclusivamente, evita aquele cuja
linguagem classifica de imagética, porque esta comporta riscos que tem pavor de
caracterizados pela ordem e pela delimitação, cujas relações internas são inteligíveis de
porque, apesar da relação intelectual que com ela estabelece, o seu Eu não é tocado por
ela. Tal significa que o dizer do sujeito não passa (só) pela racionalidade, o que
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modernidade. Em segundo lugar, apesar de evitar o abismo da metáfora, que entrevê em
Platão, é a ela que acaba por recorrer como âncora inevitável, conforme o seu próprio
desesperada por uma nova linguagem: aquela que devolve o Eu, ao contrário das
“estátuas sem olhos”, ou sem espelho subjectivo, do jardim do discurso conceptual. Esta
Chandos pela linguagem do Eu é uma busca por uma nova imagética (um novo
Chando sublinha que as suas epifanias ocorrem nas mais inesperadas situações:
grandioso, que pudesse anular os automatismos do olhar que o texto menciona. Não é o
caso, já que o próprio Chandos sublinha a banalidade dos objectos de percepção. Uma
mundo e pelo respectivo dicionário, e uma vez que, com eles, desapareceu a dissonância
(a qual pressupõe uma determinada ordem como pano de fundo), a epifania não pode
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signatário da carta se isentar de responsabilidades na criação destes momentos
revelação que acontece a Chandos, mas o recipiente que o revela a ele. E que, por ser
recipiente, recebe algo que alguém nele coloca – esse alguém só pode ser quem o olha e
nele investe algum significado, mesmo que supostamente intraduzível por palavras e
manifesto apenas numa reacção emocional. O processo que Chandos descreve é, afinal,
o da criação da “sua” metáfora, aquela que mantém uma relação semântica com o Eu.
facto de não ser apenas suscitado pelo mundo “empírico” (presente ou evocado), mas
ratazanas que infestava as suas leitarias, o jovem aristocrata inglês é arrebatado pela
visão da agonia dos animais moribundos, a que não assistiu. Relata-a a Bacon como
mais um momento de revelação, o qual surge toda “dentro de si”, distante, no espaço e
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morte das ratazanas é também o passo do texto hofmannsthaliano que mais dúvidas tem
suscitado entre os críticos.4 Parece-me lícito atribuir grande parte destas dúvidas à
passam por notas claramente irónicas. Estas denunciam uma sábia manipulação autoral
facto, a visão violenta de Chandos dura apenas muito breves instantes, dando de
caracterizadas pela dimensão maior dos acontecimentos, bem como pela grandiosidade
– do “ranger de dentes” pseudo-bíblico das vítimas não podem constituir senão uma
prova de ironia, que funciona como espelho deformante sobre a epifania imediatamente
anterior:
O meu amigo lembra-se daquele quadro maravilhoso de Tito Lívio, sobre as horas que
precederam a destruição de Alba Longa? Como percorrem as ruas que não tornarão a ver
… como se despedem das pedras da calçada. Pois, digo-lhe, meu amigo, isso estava em
mim, e também a Cartago em chamas; mas era mais do que isso, era uma coisa mais
divina e mais animal; e era o presente, o presente mais completo e mais sublime. Via
uma mãe com as crias agonizantes puxadas para si e que não olhava para as impiedosas
paredes de pedra, mas para o ar vazio, ou através do ar na direcção do infinito,
acompanhando estes olhares com um ranger de dentes! – Se um escravo se quedou,
estarrecido, junto à Niobe que se convertia em pedra, terá vivido o que eu vivi, quando
em mim a alma deste animal mostrava os dentes ao destino monstruoso.(Hofmannsthal,
1959: 15, trad. minha)
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A bibliografia sobre este texto é imensa, tornando-se impossível enumerar as diferentes leituras de que
este episódio é objecto. A título ilustrativo, considere-se, por exemplo, apenas o número especial da
revista Hofmannsthal-Jahrbuch (11/2003) dedicado à Carta de Lorde Chandos. No conjunto de artigos
ali contidos, as leituras do episódio das ratazanas estendem-se da perspectiva da teoria da percepção
(Bosse), passando pela interpretação poetológica (Schneider), incluindo ainda análises psicanalíticas
(Wellberry). Uma das leituras mais correntes é a mística e religiosa, que passa pela identificação de
Chandos com a “criatura muda” como manifestação do divino (por exemplo, em Böschenstein, 1993). Em
nenhum destes textos é considerada a dimensão ensaística do texto, e muito menos o elemento irónico.
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Deixando de lado, nesta fase da minha reflexão, o espelho irónico, concentro-me
no instante da visão propriamente dita. Esta adquire a sua força, em grande medida, da
de sensações, num mundo reduzido a uma percepção subjectiva marcada pelo constante
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partindo os ramos, e a cidade envolta numa nuvem de pó, quando ouvimos o rebate dos
sinos nas suas torres, quando, para além disso, os fenómenos subterrâneos, que à data
ainda desconhecemos, surgem perante os nossos olhos de um modo tão sensível que
vemos o terramoto aproximar-se como um veículo à distância, até sentirmos finalmente o
abalo debaixo dos pés, então não podemos exigir mais conhecimento.(apud Bosse, 2003:
191)
experiência de si. Para além disso, implica a invenção do Eu, no momento da percepção,
como centro integrador de um corpo sensível, composto de matéria estética. É por isso
que Mach refere uma espécie de incorporação do dado sensível, por parte do sujeito,
através de uma estética que pretende ser, primordialmente, criação de efeito e criação do
real como efeito – ou, se quisermos, do real como violência –, um processo do qual o
Eu é agente e receptor e que acaba por constituir, para o mesmo Eu, a única ontologia
possível.
Este processo, que no fundo responde à crise modernista do Eu, tem várias
vertentes. Em primeiro lugar, passa por dar ao sujeito a faculdade de sentir. O discurso
imediaticidade na relação com o real. Para além disso, o efeito desta violência da
sentindo, mesmo que se trate apenas de uma experiência artificial. Chandos cria uma
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espécie de espelho que não devolve uma imagem ou um conteúdo identitários, mas a
racional do mundo.
indizível e necessita, desta feita para Adorno, da explicação filosófica para ser
ser revivida e partilhada quando reencenada através da trama material formada pelas
outras, tais como aqueles que são propostos por Robert Musil nos seus ensaios –
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Adorno afirma: “…a experiência estética genuína tem de se tornar filosofia ou não chega a ser”
(Adorno, 2002: 197, trad. minha). Porém, acrescenta: “Por isso, a arte necessita da filosofia, que a
interpreta, para dizer o que ela não consegue dizer, apesar de isto só poder ser dito pela arte, não o
dizendo” (Adorno, 2002: 113, trad. minha).
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(emoções do pensamento) (Musil, 1981: 1324) – e que Chandos também intui nos seus
pudéssemos encetar uma nova relação intuitiva com toda a existência, se começássemos
ao mesmo tempo que ela é usada. Uma vez que a linguagem perdeu o referente,
Parece-me que tudo, tudo o que existe, tudo o que recordo, tudo o que os meus
pensamentos mais confusos tocam, tudo é alguma coisa. Até a própria melancolia, a
apatia do meu cérebro nos outros momentos, me parecem alguma coisa; sinto um jogo
de contrastes encantador e verdadeiramente infinito em mim e à minha volta, e não
existe, entre as matérias que jogam umas contra as outras, nenhuma em que eu não
consiga desaguar. Então, é como se o meu corpo fosse composto de puros sinais
secretos, que tudo me revelam. Ou como se pudéssemos encetar uma nova relação
intuitiva com toda a existência, se começássemos a pensar com o coração.
(Hofmannsthal, 1959: 16-17).
Este código assume como relação semântica base, não a conceptual, mas a
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Creio que é no potenciar deste excesso retórico que se situa alguma da prosa curta da década
expressionista, que a crítica apelida de “textura” (Baßler, 1994), por se assumir como mera materialidade
e se eximir à conceptualidade parafraseável, assumindo a incompreensibilidade que Adorno, na Teoria
Estética, também considera distintiva do modernismo (Adorno, 2002: 9).
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enunciação que escolhe arbitrariamente a metáfora e produz a respectiva relação de
um modo vago, para o respectivo criador. Desta forma, o sujeito, que o modernismo
unidade e uma identidade com o todo que derivam do facto de converter todas as coisas
pelo respectivo choque, tensão ou violência. Como o próprio Chandos reconhece, é uma
solução precária, um vórtice novo, cuja vaga sensação de paz resulta do facto de, no
outro lado, não se entrever o abismo, mas uma emoção que constitui a certeza possível
estetizada e perde a sua materialidade. Isto significa que, muito embora o Eu modernista
procure a violência para adquirir uma ontologia precária através da experiência sensível,
é uma alienação profunda em relação ao real que surge como sentença definitiva, bem
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como a dependência estrita de uma ontologia estética. Apesar de este processo de
procura do sujeito acontecer no âmbito do texto ensaístico, que representa uma tentativa
Contudo, não é esta a única diferença entre os dois tipos de mediação. O inverso
não permite que a ilusão de imediaticidade, presente numa primeira leitura, se instale,
criando uma lucidez constante sobre o facto de se tratar não da coisa em si, mas de
empírica, mas sim, ou como violência discursivamente representada e lida (no caso de
numa carta, que um editor ficcional apresenta (ou seja, objecto de múltiplas
um paradigma regulador. Todavia, é uma escolha tão desesperada e tão pouco livre
quanto a do sujeito modernista, que sabe que a sua identidade se reduz ao texto como
máscara estética, e que, apesar de tudo, se força a acreditar nesta máscara como se fosse
a sua verdadeira face. A emoção perante o efeito violento é, ela própria, uma construção
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do “Eu irremediavelmente perdido”, que se vê forçado pela lucidez sobre a sua condição
uma linguagem que ele próprio inventa, nos respectivos elementos e fundamentos. A
“Represento”, “Finjo”, logo “sinto” e, assim, só assim, “existo”. O passo que é dado
radicalmente diferente. É por isso que Bacon continua a ser o único interlocutor
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