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ÍNDICE DO CAPÍTULO 7

LISTA DE FIGURAS 7.2

LISTA DE QUADROS 7.3

7 ÁGUA NO SOLO 7.4

7.1 INTRODUÇÃO 7.4

7.2 CLASSIFICAÇÃO DE SOLOS 7.4

7.3 QUANTIDADE DE ÁGUA NO SOLO 7.7

7.4 TENSÃO SUPERFICIAL E CAPILARIDADE 7.10

7.5 POTENCIAL HIDRÁULICO 7.15

7.6 RELAÇÕES ENTRE O TEOR DE HUMIDADE E A SUCÇÃO 7.17

7.7 GENERALIZAÇÃO DA LEI DE DARCY. EQUAÇÃO DE RICHARDS 7.20

7.8 RELAÇÕES ENTRE A CONDUTIVIDADE HIDRÁULICA E A SUCÇÃO 7.22

7.9 FUNÇÕES DE PEDOTRANSFERÊNCIA 7.24

7.10 INFILTRAÇÃO 7.25

7.11 REDISTRIBUIÇÃO DA ÁGUA NO SOLO 7.34

EXERCÍCIOS 7.35

BIBLIOGRAFIA 7.36
Água no Solo

Lista de Figuras
Figura ‎7.1 – Ilustração das fases existentes num solo 7.4
Figura ‎7.2 – Diagrama triangular para a classificação textural de solos (USDA) 7.5
Figura ‎7.3 – Diagrama triangular para a classificação textural de solos (LNEC E219) 7.6
Figura ‎7.4 – Representação de uma coluna de solo com as fases aglutinadas 7.7
Figura ‎7.5 – Ilustração de teores volúmicos de humidade médios em função da classe textural do
solo 7.10
Figura ‎7.6 – Superfície interfacial de dois fluidos 7.11
Figura ‎7.7 – Ilustração do fenómeno da capilaridade 7.12
Figura ‎7.8 – Ilustração para conjuntos de tubos 7.13
Figura ‎7.9 – Efeito de alargamentos e estreitamentos na posição da superfície interfacial 7.14
Figura ‎7.10 – Teor volúmico de humidade em função da altura acima da superfície freática para
um solo grosseiro mal graduado (areia) e para um solo fino bem graduado (argila) 7.15
Figura ‎7.11 – Ilustração da pressão da água no solo 7.17
Figura ‎7.12 – Esquema de instalação para análise da relação entre o teor de humidade e a sucção
(adaptada de Hillel, 2004) 7.18
Figura ‎7.13 – Relações entre o teor de humidade e a sucção 7.19
Figura ‎7.14 – Condutividade hidráulica do solo saturado (cm/h) (adaptada de Rawls et al., 1993)
7.21
Figura ‎7.15 – Esquema de instalação para análise da condutividade hidráulica 7.22
Figura ‎7.16 – Condutividade hidráulica em função do potencial matricial e do tipo de solo 7.23
Figura ‎7.17 – Perfis de humidade para infiltração à capacidade dos solos 7.26
Figura ‎7.18 – Curvas de capacidade de infiltração 7.27
Figura ‎7.19 – Modelo para a capacidade de infiltração 7.28
Figura ‎7.20 – Sucção na frente de humedecimento (cm) (adaptada de Rawls et al.,1993) 7.30
Figura ‎7.21 – Modelo para o tempo de encharcamento com alimentação constante 7.31
Figura ‎7.22 – Infiltração acumulada e intensidade de infiltração à capacidade de um solo arenoso
(modelo de Green e Ampt com Ks = 34 cm/h, s = 0,287 e  f = –16 cm) 7.32
Figura ‎7.23 – Intensidades de infiltração à capacidade de um solo franco-arenoso e com
alimentações constantes de 2,0 mm/min e 1,5 mm/min (modelo de Green e Ampt com Ks = 3 cm/h,
s = 0,37, i = 0,1,  f = –12 cm) 7.33
Figura ‎7.24 – Redistribuição da água num solo arenoso 7.34

7.2
Água no Solo

Lista de Quadros
Quadro ‎7.1 – Designação de classes de solo em função do tamanho das partículas que o constituem
(µm) 7.5
Quadro ‎7.2 – Designações texturais de solos em função da sua composição 7.6
Quadro ‎7.3 – Designações texturais de solos em função da sua composição (LNEC E219) 7.7
Quadro ‎7.4 – Teores volúmicos de humidade médios em função da classe textural do solo (adaptado
de Rawls et al., 1993) 7.9
Quadro ‎7.5 – Ângulo de contacto entre a água e diversos materiais em presença do ar (adaptado de
Dingman, 1994) 7.13
Quadro ‎7.6 – Modelos de Horton, Philip e Kostiakov 7.33

7.3
Água no Solo

7 ÁGUA NO SOLO

7.1 INTRODUÇÃO

A transformação da precipitação em escoamento adquire características próprias em cada


local, em virtude do clima e das diferentes formações geológicas que se manifestam na superfície da
crosta terrestre nesse local. Efetivamente, a meteorização das rochas de origem, por desintegração
mecânica ou decomposição química, o transporte das partículas resultantes, pelas correntes de ar ou
de água, e a sua sedimentação moldam ao longo do tempo a superfície da crosta, definindo a rede
hidrográfica das bacias, a natureza das encostas e o tipo de solos presentes.

Os solos atuam na fase terrestre do ciclo hidrológico como reservatórios de regulação,


controlando a alimentação dos aquíferos e atrasando a descida das águas que neles penetram e,
portanto, amortecendo o caudal drenado superficialmente.

Partícula de solo

Ar
Água

Figura 7.1 – Ilustração das fases existentes num solo

O solo é formado por materiais que se apresentam em três estados termodinâmicos ou fases:
sólida, líquida e gasosa (Figura 7.1). A fase sólida encontra-se fragmentada em numerosas
partículas minerais ou orgânicas, de composição variada e de maiores ou menores dimensões, que
no seu conjunto apresentam por unidade de volume uma área interfacial elevada. A fase líquida é
constituída por soluções aquosas que ocupam porções variáveis do espaço entre partículas sólidas.
Essas soluções aquosas são geralmente referidas por água no solo. O restante espaço, não ocupado
pela fase sólida nem pela fase líquida, é ocupado por ar. Assim, o solo pode ser definido como um
sistema físico heterogéneo, polifásico, particuloso, disperso, poroso e anisotrópico.

No estudo da água no solo que se faz neste capítulo considerar-se-ão as fases sólida e líquida
do solo incompressíveis e não se consideram fenómenos como os de expansão e de retração.

7.2 CLASSIFICAÇÃO DE SOLOS

Embora os solos sejam classificáveis em relação a diversas características, aquela que mais
diretamente respeita o conteúdo e o movimento da água nos espaços intergranulares é o tamanho das
suas partículas, ou seja, a sua textura.

Apresenta-se no Quadro 7.1 em função do tamanho das partículas a designação usual de


classes de solos com características uniformes, de acordo com algumas das normas mais utilizadas.

7.4
Água no Solo

Quando existam, em cada coluna figura o limite superior da classe cuja designação a encabeça e, na
coluna à esquerda dessa, o respetivo limite inferior.

Quadro 7.1 – Designação de classes de solo em função do tamanho das partículas que o constituem
(m)

Designação Argila Silte Areia Seixo Calhau Pedra


International
Society of Soil <2 < 20 < 2000
Science
U. S. Dep. of
Agriculture <2 < 50 < 2000

British Standards
Institution <2 < 60 < 2000 < 60 000 < 150 000

LNEC E219
<2 < 60 < 2000 < 60 000 < 150 000

DIN <2 < 60 < 2000


ASTM USCS < 75 < 4750

Verifica-se que não existe uniformidade apenas em relação aos limites de tamanhos para as
areias. Efetivamente, o limite superior da classe dos siltes para a International Society of Soil
Science é 20 m, para o U. S. Department of Agriculture (USDA) é 50 m, para os British
Standards, LNEC e as normas DIN é 60 m e para o American Society for Testing and Materials
Unified Soil Classification System (ASTM USCS) é 75 m. Para este último sistema também se
evidencia que o limite superior das areias é 4750 m, enquanto para os restantes é 2000 m.

3
2

5 6
4

8
9
7
11 12
10

Figura 7.2 – Diagrama triangular para a classificação textural de solos (USDA)

Os solos raramente se apresentam numa única das classes texturais, sendo geralmente
constituídos por partículas cujos tamanhos se apresentam em várias classes. Quando a distribuição
granulométrica se concentra em redor de um determinado tamanho, o solo diz-se mal graduado e,

7.5
Água no Solo

pelo contrário, quando a distribuição granulométrica compreende uma gama variada de tamanhos, o
solo diz-se bem graduado.

Quadro 7.2 – Designações texturais de solos em função da sua composição

Zona Designação USDA Designação


1 Clay Argiloso
2 Sandy Clay Argilo-arenoso
3 Silty Clay Argilo-siltoso
4 Sandy Clay Loam Franco-argiloso-arenoso
5 Clay Loam Franco-argiloso
6 Silty Clay Loam Franco-argiloso-siltoso
7 Sandy Loam Franco-arenoso
8 Loam Franco
9 Silt Loam Franco-siltoso
10 Sand Arenoso
11 Loamy Sand Arenoso-franco
12 Silt Siltoso

Na Figura 7.2 apresentam-se em diagrama triangular as zonas que se consideram para


definir em função da composição granulométrica em fração de peso as designações texturais dos
vários tipos de solos, e no Quadro 7.2 a respetiva designação para o U. S. Department of
Agriculture e a nomenclatura mais utilizada em agronomia. Por vezes, a palavra franco é
substituída por limo ou por limoso.

B C

D E

G H
F I

Figura 7.3 – Diagrama triangular para a classificação textural de solos (LNEC E219)

Na Figura 7.3 apresentam-se, também apenas para referência, as zonas consideradas na já


referida especificação LNEC E219, e no Quadro 7.3, as respetivas designações.

7.6
Água no Solo

A classificação ASTM USCS, que utiliza designações literais para as classes de solo, além
da separação mecânica das partículas, utiliza ainda os limites de liquidez e o conteúdo em matéria
orgânica para definir as classes de solos. Por este motivo apenas se apresentam no Quadro 7.1 os
limites correspondentes à areia, que são também o limite inferior dos seixos e o limite superior dos
siltes.

Quadro 7.3 – Designações texturais de solos em função da sua composição


(LNEC E219)

Zona Designação
A Argila
B Argila arenosa
C Argila siltosa
D Areia argilosa
E Silte argiloso
F Areia
G Areia siltosa
H Silte arenoso
I Silte

Neste capítulo adoptar-se-ão para descrição das propriedades do solo as designações que
correspondem às zonas definidas pelo U. S. Department of Agriculture, por serem as mais frequente-
mente referidas na literatura deste âmbito.

7.3 QUANTIDADE DE ÁGUA NO SOLO

A quantidade de água contida num solo é avaliada, em geral, em relação à fase sólida ou em
relação à totalidade do solo. Na Figura 7.4, onde se consideram aglutinadas cada uma das fases de
uma coluna de solo, apresentam-se as grandezas que permitem a definição dessas quantidades
relativas.

Va Ar Ma  0

Vf
Vw Água Mw

Vt Mt

Vs Sólidos Ms

Figura 7.4 – Representação de uma coluna de solo com as fases aglutinadas

Do lado esquerdo da coluna de solo figuram o volume de ar, Va, o volume de água, Vw, o
volume de sólidos, Vs, o volume ocupável por fluidos, Vf, e o volume total, Vt. Do lado direito da
coluna de solo figuram a massa de ar, Ma, praticamente desprezável devido à pequena massa
volúmica do ar, a massa de água, Mw, a massa de sólidos, Ms, e a massa total, Mt.

7.7
Água no Solo

Designa-se por teor volúmico de humidade, , a razão entre o volume de água de uma
porção de solo e o seu volume total:

Vw
 (7.1)
Vt

O teor volúmico de humidade pode ainda ser encarado como a relação entre a altura do
volume da água contida numa coluna vertical de solo, aglutinada e uniformemente distribuído sobre
a base da coluna, e a altura da coluna de solo. Então, em vez de adimensionalmente, poderá ser
expresso em mm de água por m de coluna de solo (mm m-1).

Designa-se por teor mássico de humidade, w, a razão entre a massa de água de uma porção
de solo e a massa da fase sólida dessa porção:

Mw
w (7.2)
Ms

Designa-se por grau de saturação, S, a razão entre o volume de água de uma porção de solo,
Vw, e o volume que nessa porção é ocupado por fluidos,Vf:

Vw
S (7.3)
Vf

Note-se que, sendo a porosidade de um solo, n, definida por

Vf
n (7.4)
Vt

então, será

  nS (7.5)

ou seja, o teor volúmico de humidade é igual ao produto da porosidade pelo grau de saturação.

Repare-se que, enquanto o grau de saturação pode concetualmente variar entre zero e um,
respetivamente quando o solo não contiver água, completamente seco, e quando o solo estiver
saturado, com os espaços intergranulares completamente preenchidos por água, já o teor volúmico
de humidade apenas pode concetualmente variar entre zero e a porosidade.

O grau de saturação de um solo raramente atingirá aqueles valores extremos em condições


naturais. Efetivamente, em condições naturais, no extremo mais seco, alguma água ficará sempre
aderente aos grãos do solo e, no extremo mais húmido, algum ar ficará sempre aprisionado nos
espaços intergranulares.

Outras relações de interesse no que diz respeito ao conteúdo de água de um solo são

d
n  1 (7.6)
s

 t  d
 (7.7)
w

7.8
Água no Solo

w
w (7.8)
d

como facilmente se deduz e onde

Ms
d  representa a massa volúmica aparente do solo seco (kg m-3),
Vt
M
 s  s , a massa volúmica dos sólidos do solo (kg m-3),
Vs
M  Mw
t  s , a massa volúmica aparente do solo (kg m-3), e
Vt
M
 w  w , a massa volúmica da água (kg m-3).
Vw

Designa-se por capacidade de campo,  cc ou w cc , o valor final do teor de humidade de um


solo natural, de características uniformes, que tenha sido saturado e deixado drenar livremente
durante dois a três dias, ou seja, o teor de humidade que corresponde à quantidade residual de água
que um solo consegue reter contra a ação prolongada da aceleração da gravidade.

Designa-se por ponto de emurchecimento permanente,  ep ou w ep , o valor máximo do teor


de humidade de um solo, tal que, para menores valores desse teor, a água nele existente deixe de ser
captável pelas raízes das plantas, ou seja, a humidade na zona das raízes das plantas a partir da qual
elas murcham e não conseguem recuperar a turgidez, ainda que posteriormente colocadas numa
atmosfera saturada durante 12 h.

Embora qualquer dos conceitos anteriores, capacidade de campo e ponto de emurchecimento


permanente, seja pouco preciso e não corresponda a propriedades físicas características dos solos
(Hillel, 1980), eles têm, no entanto, sido tradicionalmente utilizados e aceites por hidrologistas e
agrónomos. Na Secção 7.6 do texto precisar-se-ão estes conceitos.

A diferença entre a capacidade de campo e o ponto de emurchecimento permanente


corresponde à totalidade da água utilizável pelas plantas. Porém, perto do ponto de emurchecimento
permanente, já as plantas se encontram em desconforto hídrico, com rendimento inferior ao ótimo.
Na prática considera-se que cerca de 50 por cento dessa diferença corresponderá à água facilmente
utilizável pelas plantas em condições de bom rendimento.

A máxima dessecação de um solo,  r ou w r , é também indicada frequentemente como


característica de cada classe textural.

Apresentam-se no Quadro 7.4 e na Figura 7.5 valores médios de teores volúmicos de


humidade para cada classe textural dos solos (Rawls et al., 1993). Nos referidos quadro e figura, as
classes encontram-se ordenadas da menor para a maior capacidade de campo. Assim, verifica-se que
as areias são os solos com menor capacidade de campo e que as argilas são os solos com maior
capacidade de campo. No entanto, no que diz respeito ao total de água utilizável pelas plantas, já os
solos siltosos e franco-siltosos são os que apresentam maior capacidade média.

Quadro 7.4 – Teores volúmicos de humidade médios em função da classe textural do solo
(adaptado de Rawls et al., 1993)

7.9
Água no Solo

Designação n= s  cc  ep  r  cc- ep


Arenoso 0,437 0,091 0,033 0,020 0,058
Arenoso-franco 0,437 0,125 0,055 0,036 0,070
Franco-arenoso 0,453 0,207 0,095 0,041 0,112
Franco-argiloso-arenoso 0,398 0,255 0,148 0,068 0,107
Franco 0,463 0,270 0,117 0,029 0,153
Siltoso 0,490 0,293 0,083 0,015 0,210
Franco-argiloso 0,464 0,318 0,197 0,155 0,121
Franco-siltoso 0,501 0,330 0,133 0,015 0,197
Argilo-arenoso 0,430 0,339 0,239 0,109 0,100
Franco-argiloso-siltoso 0,471 0,366 0,208 0,039 0,158
Argilo-siltoso 0,479 0,387 0,250 0,056 0,137
Argiloso 0,475 0,396 0,272 0,090 0,124

0,600
s
0,500
Teor volúmico de humidade

cc
0,400

0,300
ep

0,200

0,100
r

0,000
so
so
o

so
co

so
o

so

so
o

os
nc
os

os
os
no

an
no

ilo

lo
lto

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fr a

en
en

ilt
ilt

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re

rg
Fr
re

Si

-s

-s
-s

Ar
ar
o-
Ar

-a

-a
-a

so

lo
co

o-
os

so

co
co

gi
an

ilo
l
en

gi

Ar
an
ilo
an

rg
Fr

Ar
Ar

rg

Fr
Fr

-a
-a

co
co

an
an

Fr
Fr

Classe textural

Figura 7.5 – Ilustração de teores


n=qs volúmicos
qcc qep de humidade
qr médios
em função da classe textural do solo

Do ponto de vista agronómico, a profundidade útil de um solo é definida pela profundidade


radicular da cultura que nele se instalou. A profundidade atingida pelas raízes das plantas no solo
depende da espécie vegetal e é da ordem de 0,5 m para plantas herbáceas anuais e pode chegar a
profundidades da ordem de 2,5 m ou mais para árvores de grande porte.

7.4 TENSÃO SUPERFICIAL E CAPILARIDADE

Considere-se a superfície de separação de dois fluidos imiscíveis, superfície interfacial. Ao


contrário do que acontece no interior de cada um dos fluidos, onde cada molécula é atraída
isotropicamente pelas suas vizinhas, na superfície de separação, as moléculas são atraídas de forma
diferente pelas vizinhas de cada um dos fluidos. Esta diferença dá origem ao estabelecimento de
uma tensão superficial que concetualmente define a superfície interfacial como uma membrana que
separa os dois fluidos.
Na

7.10
Água no Solo

Figura 7.6 representa-se uma superfície interfacial com a forma de uma calote esférica com raio R e
eixo vertical. A diferença de pressões de um lado e do outro da superfície, que se considera
uniformemente distribuída, atua radialmente e é representada por p. O centro de curvatura
encontra-se obviamente do lado onde a pressão é maior. Para equilibrar a diferença de pressões
admite-se que a superfície cuja espessura é nula está sujeita a tensões tangenciais de tração,
uniformemente distribuídas, que se designam por tensões superficiais, , e têm as dimensões de uma
força por unidade de comprimento. A tensão superficial depende da natureza e propriedades dos dois
fluidos.



p

Figura 7.6 – Superfície interfacial de dois fluidos

Considere-se que o ângulo que a tangente à calote esférica no seu bordo faz com a vertical é
. Então, a resultante das tensões que atuam tangencialmente no bordo da calote, R  , será

R   2  R cos 2 () (7.9)

e a resultante da diferença de pressões, R p , que atua em sentido contrário, será

R p   R 2 p cos 2 () (7.10)

Em condições de equilíbrio, R   R p , será

2
R (7.11)
p
ou seja, o raio da calote depende apenas da tensão superficial e da diferença de pressões nas duas
faces da superfície.

A tensão superficial da água em contacto com o ar diminui ligeiramente com a temperatura


sendo 0,0756 N m-1 a 0 ºC, e 0,0720 N m-1 a 20 ºC.

Considere-se que a superfície interfacial, que no restante texto passa a considerar-se entre a
água e o ar, encontra-se no interior de um tubo cilíndrico de raio r, pequeno, aberto nas duas
extremidades, com a extremidade inferior mergulhada em água contida numa tina (Figura 7.7). A
tina deverá conter água em quantidade suficiente para a subida máxima da água no tubo, caso
contrário a subida será mais pequena.

O perímetro do bordo da calote esférica fica definido e será igual ao perímetro do tubo
( 2  r ). A água subirá ou descerá no tubo, de acordo com a maior ou menor atração que exista entre
as moléculas do material de que o tubo é feito e as moléculas da água e do ar. A água subirá, se o

7.11
Água no Solo

material do tubo tiver maior adesão à água, e descerá, se o material do tubo tiver maior adesão ao
ar. Diz-se no primeiro caso que a água molha o tubo e, no segundo caso, que não o molha.

Como por cima da superfície interfacial está o ar à pressão atmosférica, a diferença de


pressões ao longo dessa superfície dependerá do seu deslocamento, sendo em valor absoluto tanto
maior quanto maior for esse deslocamento em relação ao nível da água na tina. Em termos
absolutos, a pressão no eixo do tubo imediatamente abaixo da superfície interfacial será

pa   w h c

onde
p a representa a pressão atmosférica,
 w , o peso volúmico da água, e
h c , a altura a que a água sobe no tubo, altura capilar, medida no respetivo eixo.

r 

hc

Figura 7.7 – Ilustração do fenómeno da capilaridade

A diferença de pressões de um lado e do outro da superfície interfacial será

p  p a  (p a   w h c )   w h c (7.12)

e o raio da calote fica então determinado por (7.11).

Assim, sendo também

R cos   r (7.13)
obtém-se

2  cos ()
hc  (7.14)
w r

que permite o cálculo da altura capilar conhecidos os restantes fatores.

Designa-se por ângulo de contacto, , o ângulo entre a tangente à superfície interfacial no


respetivo bordo e a superfície sólida que a limita. Se o ângulo for inferior a 90º, a água é mais
atraída do que o ar pelo material da parede, sobe no tubo capilar (hc > 0) e diz-se que a água molha

7.12
Água no Solo

a superfície sólida; se o ângulo for superior a 90º, o ar é mais atraído do que a água pelo material da
parede, a água desce no tubo capilar (hc < 0) e diz-se que a água não molha a superfície sólida.

O ângulo de contacto é característico do material que limita a superfície da água em


presença do ar, como se apresenta no Quadro 7.5. No entanto, para uma gota de água sobre um
plano inclinado, a superficie interfacial deixa de ser uma calote esférica e é observável que o ângulo
de contacto na zona mais baixa do plano é superior ao ângulo de contacto na zona mais elevada.

Quadro 7.5 – Ângulo de contacto entre a água e diversos materiais em presença do ar


(adaptado de Dingman, 1994)

Material da  (º)
parede
Vidro 0
Sílica 0
Gelo 20
Platina 63
Ouro 68
Parafina 108

Considere-se um conjunto de tubos do mesmo material mergulhados na água da tina que os


molha (Figura 7.8).

hfc
hfc

a) Diâmetros iguais b) Diâmetros diferentes

Figura 7.8 – Ilustração para conjuntos de tubos

Se os tubos tiverem todos o mesmo diâmetro (Figura 7.8, a)), a água subirá neles até à
mesma altura acima da superfície da água na tina. Até essa altura todos os tubos estarão cheios. Se
os tubos tiverem diâmetros diferentes (Figura 7.8, b)), a água subirá em cada um até uma altura
acima da superfície da água na tina, que é inversamente proporcional ao seu diâmetro.

A altura acima da superfície da água na tina até à qual todos os tubos estão cheios designa-
-se por altura da franja capilar. A partir dessa altura, para cima, no caso dos diâmetros iguais (a)),
os tubos deixam de ter água e, no caso dos diâmetros diferentes (b)), à medida que se sobe, vão
deixando sucessivamente de ter água os tubos mais grosseiros. Neste caso (b)), quanto mais fino for
o tubo, tanto mais alto chegará a água.

7.13
Água no Solo

Faz-se notar que a altura a que chega a água, para tubos do mesmo material, depende apenas
da dimensão da secção do tubo definida pela sua intersecção com a superfície interfacial entre a
água e o ar. Efetivamente, uma vez atingida a posição de equilíbrio, o facto de o tubo abaixo da
superfície interfacial ser vertical, inclinado, retilíneo ou tortuoso não influencia a posição dessa
superfície.

No entanto, como se ilustra na Figura 7.9, o estabelecimento da posição da superfície


interfacial depende da forma dos tubos quando se desce ou se eleva a superfície livre da água na
tina.

a) b)

Figura 7.9 – Efeito de alargamentos e estreitamentos na posição da superfície interfacial

Com efeito, considere-se que a superfície livre da água na tina se encontra a descer com a
superfície interfacial acima de um alargamento (Figura 7.9, a)). Se o tubo tivesse uma secção
transversal uniforme, a água desceria no tubo tanto quanto a superfície da água na tina. No entanto,
devido à existência do alargamento, a descida da água no tubo ocorrerá de modo brusco até depois
do alargamento máximo.

Quando a superfície livre da água na tina estiver a subir com a superfície interfacial abaixo
de um estreitamento (Figura 7.9, b)), então a subida da água no tubo ocorrerá bruscamente até
depois do estreitamento máximo.

Nos movimentos em sentido contrário notar-se-ão fenómenos de índole semelhante, mas com
grande atraso no início do movimento da água no tubo relativamente ao movimento da água na tina.
Estes fenómenos, entre outros, justificam uma histerese de que adiante se tratará.

Designa-se por superfície freática o lugar geométrico dos pontos onde a água num solo
saturado se encontra à pressão atmosférica. Se a água estiver em repouso, a superfície freática será
horizontal. A superfície freática é assimilável à superfície da água na tina (Figura 7.8). Para cima da
superfície freática, o solo continuará saturado, com os espaços intergranulares preenchidos por água
até uma altura que depende da dimensão desses espaços. Quanto mais fino for o solo, tanto maior
será a espessura da camada saturada acima da superfície freática. Designa-se essa camada por franja
capilar. Para cima da franja capilar, apenas os canalículos definidos nos espaços intergranulares de
menores dimensões continuarão preenchidos por água, enquanto os espaços de maiores dimensões
incapazes de por capilaridade elevar a água tão acima da superfície freática estarão preenchidos por
ar. Quanto mais acima da superfície freática se considere uma secção horizontal, menor será o
número de canalículos ainda preenchidos por água.

Na Figura 7.10 apresenta-se a relação qualitativa entre o teor volúmico de humidade e a


altura acima da superfície freática para um solo grosseiro mal graduado (areia) e para um solo fino
bem graduado (argila). Para ambos os solos, considera-se que foram saturados e deixados drenar por
dois ou três dias, de modo a tenderem para a capacidade de campo, e tomou-se a cota da superfície
freática como referência para as cotas.

7.14
Água no Solo

z
areia

argila

hfc
hfc
s areia s argila 

Figura 7.10 – Teor volúmico de humidade em função da altura acima da superfície freática
para um solo grosseiro mal graduado (areia) e para um solo fino bem graduado (argila)

Na superfície freática, ambos os solos se encontram saturados, apresentando a areia um teor


volúmico de saturação inferior ao da argila. A areia apresenta uma franja capilar com menor altura
do que a da argila, porque sendo as suas partículas mais grosseiras é de esperar que os espaços
intergranulares também apresentem maiores dimensões e que, portanto, a água não se eleve neles
por efeito da capilaridade a cotas tão altas quanto as atingidas na argila.

Dado que o solo grosseiro se apresenta mal graduado, com partículas de dimensões muito
uniformes, é de esperar que os espaços intergranulares tenham também dimensões muito uniformes
e que, portanto, a água suba por capilaridade nesses espaços a uma altura também muito
semelhante. Assim, com o aumento de cota acima da superfície freática o decrescimento do teor
volúmico de humidade será bastante acentuado (de modo assimilável ao que se ilustra na Figura
7.8, a)). No solo fino bem graduado, com partículas de dimensões mais distribuídas, é de esperar
que os espaços intergranulares tenham também dimensões mais distribuídas e que, portanto, a água
suba por capilaridade nesses espaços tanto mais quanto menores forem as suas dimensões. Assim, o
decrescimento com o aumento de cota acima da superfície freática do teor volúmico de humidade
será mais suave (de modo assimilável ao que se ilustra na Figura 7.8, b)).

Nas condições admitidas, os teores volúmicos de humidade de ambos os solos tenderão para
a respetiva capacidade de campo com o aumento da cota acima da superfície freática.

7.5 POTENCIAL HIDRÁULICO

A água do solo, tal como outros corpos naturais, dispõe de energia em quantidades variáveis
e em diferentes formas, sendo usual considerar, de entre as formas reconhecidas pela física clássica,
apenas a sua energia potencial. Efetivamente, a reduzida velocidade de deslocamento dessa água, ao
longo dos reduzidos espaços intergranulares, onde o percurso é muito tortuoso, torna desprezável a
respetiva energia cinética. Assim, a água do solo desloca-se das zonas de maior energia potencial
para as de menor energia potencial, ou seja, na direção e sentido contrário ao do gradiente dessa
energia potencial.

Vários fenómenos contribuem para o estabelecimento da energia potencial da água do solo.


Entre esses contam-se, como mais importantes, a aceleração da gravidade e a pressão a que a água
está sujeita, quer hidrostática, quer proveniente da tensão superficial, quer ainda da sua adesão às

7.15
Água no Solo

partículas do solo. Tradicionalmente, considera-se a contribuição de cada um dos referidos


fenómenos para a energia potencial como formas daquela energia.

Assim, designa-se por energia potencial gravítica, E g , o trabalho armazenado numa massa
elementar de água, m, quando esta é deslocada, apenas contra a ação da aceleração da gravidade, g,
de um comprimento z medido verticalmente e para cima a partir de uma cota de referência:

Eg  m g z (7.15)

ou, por unidade de peso,

Hg  z (7.16)

Designa-se por energia potencial de pressão, E p , o trabalho armazenado numa massa


elementar de água, com um volume v, quando esta é deslocada de um campo onde o valor da
pressão é o de referência, tradicionalmente a pressão atmosférica, para um campo onde o valor local
da pressão relativa é p, ambos à mesma cota:

Ep  p v (7.17)

ou, por unidade de peso,

p
Hp  (7.18)

Nas ciências do solo representa-se frequentemente o potencial de pressão por unidade de


peso por

p
  Hp  (7.19)

A água no solo, em virtude do seu peso, encontra-se a pressões positivas abaixo da superfície
freática e, em virtude da tensão superficial e da capilaridade que se manifesta nos espaços inter-
granulares, encontra-se a pressões negativas acima da superfície freática.

Como o potencial de pressão acima da superfície freática depende também da textura e da


disposição das partículas do solo e da sua afinidade com a água, ou seja, da matriz sólida do solo,
designa-se muitas vezes por potencial matricial. É também usual designar-se o simétrico da pressão
negativa (–p) ou o simétrico do potencial matricial por unidade de peso (–) por sucção.

Na Figura 7.11 ilustra-se a medição da pressão da água no solo em dois pontos de uma
amostra contida num reservatório onde se instalaram dois piezómetros. A tomada de pressão é feita
através de cápsulas de material cerâmico com uma porosidade tal que a cápsula seja impermeável
ao ar e ao solo mas permeável à água.

7.16
Água no Solo

Superfície do solo


a
Superfície freática

b

Figura 7.11 – Ilustração da pressão da água no solo

No piezómetro instalado em B, como se sabe da hidrostática, a água sobe em relação à


tomada de pressão uma altura:

pb
b 

No piezómetro instalado em A, onde a pressão da água é negativa, como se fosse sugada, a


água desce em relação à tomada de pressão uma altura:

 pa
 a 

A superfície freática, onde a pressão é nula (em termos absolutos igual à pressão
atmosférica), é identificada pelo nível atingido pela água em qualquer dos piezómetros. Embora não
se represente na Figura 7.11, faz-se notar que o solo na franja capilar continua saturado.

Designa-se por potencial hidráulico a energia potencial total, gravítica e de pressão, por
unidade de peso:

H  z (7.20)

No solo da Figura 7.11 o potencial hidráulico é nulo em toda a amostra quando se toma
para cota de referência a cota da superfície freática e para pressão de referência, como
habitualmente, a pressão atmosférica. Nessas condições, o potencial de pressão por unidade de peso
varia de modo simétrico à variação da cota

  z (7.21)

7.6 RELAÇÕES ENTRE O TEOR DE HUMIDADE E A SUCÇÃO

Na Figura 7.12 apresenta-se o esquema de uma instalação para fazer variar a sucção numa
amostra de solo de pequena dimensão, mas suficiente para ser representativa.

7.17
Água no Solo

z = -

Figura 7.12 – Esquema de instalação para análise da relação entre o teor de humidade e a sucção
(adaptada de Hillel, 2004)

A instalação consiste numa tina com água, na qual se introduz um tubo extensível ou
flexível, aberto na extremidade inferior e que dispõe na extremidade superior, após alargamento, de
uma placa cerâmica permeável à água, mas não ao ar. Comunica-se assim à amostra de solo uma
sucção (–) que é igual à altura (z) a que esta se encontra acima da superfície livre da água na tina.
Evidentemente, com este tipo de instalação, a altura máxima a que se pode colocar a amostra sem
que ocorra a vaporização da água no tubo (zmax), que implicará a interrupção da ligação entre a
água da amostra e a água da tina, é a que corresponde a uma pressão absoluta na placa cerâmica
igual à tensão do vapor de água à temperatura da água, esw(Tw),

e sw (Tw )
z max  10,33  (7.22)
w

Num solo, a adesão molecular da água às partículas sólidas ganha relevância em relação à
capilaridade para sucções superiores à que corresponde a zmax.

Considere-se que se dispõe uma amostra de solo previamente saturado sobre a placa
cerâmica perto da superfície livre da água na tina até não se observar qualquer eventual movimento
da água e que, após medição, se anota o teor de humidade e a sucção. Repetindo o processo descrito
para elevações crescentes da placa cerâmica, o que corresponde a aumentos sucessivos da sucção,
poder-se-ia desenhar uma curva como a que se apresenta na Figura 7.13, a. Repetindo o processo
em sentido inverso, a partir da maior elevação da placa até perto da superfície livre da água na tina,
o que corresponde à diminuição da sucção, tendo o cuidado de aguardar entre medições até não se
observar movimento da água, obter-se-ia uma curva como a que se representa na Figura 7.13, b.
Repetindo o processo novamente em sentido ascendente, do ponto onde se ficou anteriormente,
obter-se-ia uma curva como a que se representa na Figura 7.13, c.

7.18
Água no Solo

-

b
a

Figura 7.13 – Relações entre o teor de humidade e a sucção

Designa-se a curva a por curva primária de drenagem. A curva tem origem no teor de
humidade de saturação com sucção nula. À medida que a sucção aumenta, depois de passada a
sucção que corresponde à que existe no topo da franja capilar (sucção de entrada de ar), o teor de
humidade vai diminuindo, com a água da amostra a drenar, e tende para a capacidade de campo.
Quando se diminui a sucção, ao longo da curva b, que se designa por curva principal de
humedecimento ou de embebição, com a amostra a humedecer por embebimento de água, o teor de
humidade vai aumentando até um valor máximo compatível com o ar que fica aprisionado pela
água nos espaços intergranulares. Quando se aumenta novamente a sucção, ao longo da curva c, que
se designa por curva principal de drenagem, o teor de humidade vai diminuindo, mas sem
sobreposição nem com a curva a nem com a b. Partindo de outros pontos, obter-se-iam outras curvas
entre as curvas b e c. A não existência de biunivocidade e os laços como o definido pelas curvas-
limite b e c constituem um fenómeno que se designa por histerese.

A histerese tem origem principalmente no efeito anteriormente descrito de alargamento e


estreitamento dos espaços intergranulares. Para a existência da histerese contribuem também a
diferente conetividade dos espaços intergranulares em humedecimento ou em drenagem e a variação
do ângulo de contacto com as diversas partículas nesses espaços.

Designam-se por curvas características de humidade as curvas como as que se apresentam


na Figura 7.10, com z   , que representam consoante a utilização que delas se faz a curva
principal de drenagem ou a curva principal de humedecimento ou, ainda, uma curva média.

Precisaremos agora os conceitos de capacidade de campo e de ponto de emurchecimento


permanente. Designa-se por capacidade de campo o teor de humidade que corresponde a uma
sucção de 0,33 atm, e por ponto de emurchecimento permanente o teor de humidade que
corresponde a uma sucção de 15 atm. Estas sucções, especialmente em solos grosseiros, encontram-
-se acima da gama de sucções representadas na Figura 7.13, em zona onde a dispersão dos valores
de  para cada sucção é pequena. Os valores médios da capacidade de campo e do ponto de
emurchecimento permanente que se apresentam no Quadro 7.4 e na Figura 7.5 correspondem a
estas sucções.

Note-se que a sucção que corresponde ao ponto de emurchecimento permanente, 15 atm,


apenas existirá na água que fica aderente aos grãos de solo por adesão molecular ou por adsorção,
em películas muita finas, e não é atingível por capilaridade com a água suspensa desde a superfície
freática nos espaços intergranulares.

7.19
Água no Solo

Curvas características de humidade têm sido representadas por expressões matemáticas


empíricas como as seguintes:

– Brooks e Corey (1966):


  r  
  e  (7.23)
s   r   

onde  e representa o potencial matricial no topo da franja capilar (potencial de entrada de


ar), e é um parâmetro a ajustar;

– Haverkamp et al. (1977):

 ( s   r )
 
  r , para um solo arenoso (7.24)
 

 ( s   r )
   r , para um solo argiloso (7.25)
  ( ln  ) 

onde os parâmetros  e  são parâmetros a determinar;

– van Genuchten (1980):

  r
s   r

 1  n  m
(7.26)

onde  , m e n são parâmetros a determinar.

7.7 GENERALIZAÇÃO DA LEI DE DARCY. EQUAÇÃO DE RICHARDS

A lei que Henry Darcy estabeleceu em 1856 para o escoamento aparente em meios porosos
saturados, homogéneos e isotrópicos é em termos vetoriais:

V  K s grad (H) (7.27)

onde V representa a velocidade aparente ou caudal específico, Ks, o coeficiente de permeabilidade
ou condutividade hidráulica do solo saturado, e H, o potencial hidráulico.

O módulo da velocidade aparente obtém-se dividindo o caudal que atravessa determinada


secção transversal ao escoamento pela área total dessa secção, não procedendo aos descontos da área
ocupada pelas partículas do solo atravessadas pela secção.

Apresentam-se na Figura 7.14 valores médios da condutividade hidráulica do solo saturado


em função da respetiva textura.

7.20
Água no Solo

0.005
0.01

0.05

0.2 0.1
0.4

1.0 0.6

10 5.0 2.0
20

Figura 7.14 – Condutividade hidráulica do solo saturado (cm/h)


(adaptada de Rawls et al., 1993)

Se o solo não estiver saturado, é natural que a secção transversal ao escoamento atravesse
ainda bolsas de ar, ficando a secção real do escoamento tanto mais reduzida quanto menor for a
quantidade de água no solo, ou seja, quanto maior for a sucção.

Buckingham, em 1907, estendeu a aplicabilidade da lei de Darcy aos escoamentos em meios


porosos insaturados, fazendo depender a condutividade hidráulica do potencial matricial da água no
solo:

K  K() (7.28)

com K  K s se o potencial matricial for superior ao de entrada de ar,    e , ou seja, se o solo


estiver saturado,   s . Assim, o efeito da diminuição da secção real por entrada de ar fica
integrado na condutividade hidráulica.

A lei de Darcy generalizada para meios porosos saturados ou insaturados é



V  K() grad (H) (7.29)

com H  z   .

A aplicação da lei de conservação da massa de água a um volume unitário de solo, que por
unidade de tempo se traduz pela igualdade entre a variação do volume de água armazenado e a
diferença entre a água que entra e a água que sai do referido volume, conduz à seguinte equação:

7.21
Água no Solo

 
  div (V) (7.30)
t

Quando o solo permanece saturado,   s , será evidentemente



div (V)  0 (7.31)

e, no caso mais geral, solo saturado ou solo insaturado, será


 divK() grad (z  )  (7.32)
t

A equação (7.32), que se designa por equação de Richards, pode escrever-se em termos do
potencial matricial ou em termos do teor de humidade com recurso à curva característica de
humidade e, depois de definidas as condições iniciais e as condições de fronteira adequadas ao
problema em análise, pode ser resolvida em geral através de métodos numéricos. Faz-se notar que
esta equação não tem em conta o fluxo de ar que ocorre em simultâneo com o de água, quando o
solo não está saturado.

7.8 RELAÇÕES ENTRE A CONDUTIVIDADE HIDRÁULICA E A


SUCÇÃO

Considere-se a instalação representada na Figura 7.15, onde uma amostra de solo de


comprimento L, com uma secção transversal cuja área é A, se encontra entre duas placas de
cerâmica permeáveis à água mas não ao ar e onde o escoamento aparente é horizontal e da direita
para a esquerda.

-1
-2 L

Figura 7.15 – Esquema de instalação para análise da condutividade hidráulica

O potencial matricial médio no solo da amostra será   (1   2 ) / 2 e, tomando como


referência das cotas o eixo da amostra, então, o potencial hidráulico nos extremos direito e esquerdo
da amostra será respetivamente H1  0  1 e H 2  0   2 .

7.22
Água no Solo

Assim, se depois de atingido o regime permanente for V o volume de água que se acumulou
na proveta do lado esquerdo durante o tempo t, será

V L
K ( )  (7.33)
A t 1   2

Fazendo variar as posições das tinas e da amostra podem obter-se curvas da condutividade
hidráulica em função da sucção, como as que se apresentam na Figura 7.16 para um solo arenoso e
para um solo argiloso.

K (

Solo argiloso

Solo arenoso

-

Figura 7.16 – Condutividade hidráulica em função do potencial matricial e do tipo de solo

Verifica-se que o solo arenoso quando saturado (= 0) tem uma condutividade hidráulica
muito superior à do solo argiloso saturado e que, quando a sucção aumenta, a condutividade
hidráulica decresce no solo arenoso muito mais rapidamente do que no solo argiloso, tornando-se
para sucções elevadas menor naquele tipo de solos.

Efetivamente, quando a sucção aumenta, o ar penetra com mais facilidade nos espaços mais
grosseiros dos solos arenosos do que nos espaços mais finos dos solos argilosos e, portanto, a secção
real disponível para o escoamento da água diminui mais rapidamente no primeiro tipo de solos,
provocando a diminuição mais brusca da condutividade hidráulica.

Embora mais ligeira, é conveniente notar que a condutividade hidráulica apresenta também
uma relação histerética com a sucção.

Curvas da condutividade hidráulica em função do potencial matricial ou do teor de


humidade têm sido representadas por expressões matemáticas como as seguintes:

 Brooks e Corey (1966):

2
3
   r  
K  K s   (7.34)
 s   r 

 Haverkamp et al. (1977):

7.23
Água no Solo

A
K  Ks B
(7.35)
A 

 van Genuchten (1980):

2
1  1 m 
    r
K  Ks  2 1  1   m 
  ,   (7.36)
    s   r
   

onde  e m são os parâmetros já referidos para as curvas características de humidade propostas


pelos mesmos autores, e A e B são os parâmetros do modelo de Haverkamp.

A condutividade hidráulica do solo saturado, Ks, pode ser estimada pela Figura 7.14 ou pela
fórmula de Kozeny-Carmen:

K s  1058 (s   cc ) 4 (7.37)

com Ks em cm/h.

7.9 FUNÇÕES DE PEDOTRANSFERÊNCIA

As curvas características de humidade e as curvas definidoras da condutividade hidráulica


em solos não saturados são difíceis de obter por medição direta nos solos, consumindo tempo e
recursos financeiros no processo.

Muitas tentativas têm sido feitas para as relacionar com propriedades facilmente disponíveis
ou obteníveis, tais como a composição granulométrica, o conteúdo em matéria orgânica, a massa
volúmica aparente do solo seco e a porosidade. Designam-se as relações deste tipo, geralmente
obtidas por análise de regressão, por funções de pedotransferência.

A título de exemplo, apresentam-se as seguintes funções para os parâmetros de Brooks e


Corey, indicadas por Rawls et al. (1993):

 e = –EXP(5,3396738 + 0,1845038 C – 2,48394546 n – 0,00213853 C2 –


0,04356349 S n – 0,61745089 C n + 0,00143598 S2 n2 – 0,00855375 C2 n2 –
0,00001282 S2 C + 0,00895359 C2 n – 0,00072472 S2 n + 0,0000054 C2 S +
0,5002806 n2 C)

= EXP(-0,7842831 + 0,0177544 S – 1,062498 n – 0,00005304 S2 –0,00273493 C2 +


1,1113496 n2 – 0,03088295 S n + 0,00026587 S2 n2 – 0,00610522 C2 n2 –
0,00000235 S2 C + 0,00798746 C2 n – 0,00674491 n2 C)

r = –0,0182482 + 0,00087269 S + 0,00513488 C + 0,02939286 n – 0,00015395 C2 –


0,0010827 S n – 0,00018233 C2 n2 + 0,00030703 C2 n – 0,0023584 n2 C

onde C e S representam as percentagens em peso de argila e de areia, respetivamente, e n, a


porosidade.

7.24
Água no Solo

Para os parâmetros de van Genuchten apresentam-se as seguintes funções, indicadas por


Vereecken (1989):

s = 0,81 – 0,283 d + 0,001 C

r = 0,015 + 0,005 C + 0,014 Cb

= –exp(–2,486 + 0,025 S – 0,351 Cb – 2,617 d – 0,023 C)

n = exp(0,053 – 0,009 S – 0,013 C + 0,00015 S2)

onde C e S representam as percentagens em peso de argila e de areia, respetivamente, Cb, a


percentagem em peso de carbono orgânico, d, a massa volúmica aparente do solo seco, e se toma m
= 1.

7.10 INFILTRAÇÃO

A entrada de água num solo pela sua superfície terrena constitui um fenómeno que se
designa genericamente por infiltração.

O caudal específico de água (caudal por unidade de área em planta) que atravessa a
superfície terrena de um solo designa-se por intensidade de infiltração e tem as dimensões de uma
velocidade. O volume de água que por unidade de área em planta atravessa a superfície terrena de
um solo em determinado intervalo de tempo designa-se por infiltração acumulada nesse intervalo de
tempo e tem as dimensões de um comprimento.

A infiltração de água num solo permeável depende essencialmente de três fatores: da


disponibilidade de água à superfície do solo, das características hidráulicas do solo e do conteúdo de
água no solo. Efetivamente, quando à superfície do solo não existir água, não poderá haver
infiltração e, quanto maior for a disponibilidade de água à superfície, tanto maior poderá ser a
infiltração; se o solo for impermeável à água, não ocorrerá infiltração; se o solo estiver saturado e
não ocorrer drenagem inferiormente, também não ocorrerá infiltração.

Designa-se por capacidade de infiltração de um solo a infiltração que ocorre quando à


superfície do solo se dispõe e se mantém ao longo do tempo uma fina película de água. Nessa fina
película, a água encontra-se evidentemente à pressão atmosférica (= 0). Para especificar a
intensidade de infiltração, diz-se que esta ocorre à capacidade do solo, intensidade de infiltração à
capacidade do solo. Para especificar a infiltração acumulada, diz-se infiltração acumulada à
capacidade do solo.

A infiltração de água num solo pode ser estudada por integração numérica da equação de
Richards (7.32), com as condições iniciais e de fronteira adequadas.

Apresentam-se na Figura 7.17 os perfis de humidade que ao longo do tempo se obteriam


através da equação de Richards num solo arenoso (a)) e num solo argiloso (b)), ambos inicialmente
com humedecimento uniforme ao longo da vertical, se a infiltração à superfície ocorresse à
capacidade dos solos.

7.25
Água no Solo

Figura 7.17 – Perfis de humidade para infiltração à capacidade dos solos

O solo arenoso tem uma condutividade hidráulica, quando saturado, de 34 cm/h, um teor
volúmico de saturação de 0,287 e um teor volúmico de humidade inicial, uniformemente distribuído
ao longo da vertical, de 0,1. O solo argiloso tem uma condutividade hidráulica, quando saturado, de
0,04 cm/h, um teor volúmico de saturação de 0,495 e um teor volúmico de humidade inicial,
uniformemente distribuído ao longo da vertical, de 0,24. Os perfis de humidade são representados
por isócronas de    (z, t ) , para a areia nos instantes 900 s (0,25 h), 1800 s (0,50 h) e 2700 s
(0,75 h), e para a argila nos instantes 100 000 s (1,16 d), 500 000 s (5,8 d) e 1 000 000 s (11,6 d).

No solo arenoso (Figura 7.17, a)), em cada um dos instantes considerados, o teor de
humidade mantém-se igual ao de saturação desde a superfície até uma profundidade próxima da
profundidade onde o teor de humidade ainda é o inicial. A concordância dos teores de humidade
entre as duas profundidades é feita num espaço relativamente curto, cerca de 20 cm. A transição
entre o solo saturado e o solo ainda nas condições iniciais é feita de um modo brusco.

Designa-se por frente de humedecimento a região do solo onde em determinado instante


começa a aumentar o teor volúmico de humidade e a água dessa região inicia o seu deslocamento
para baixo. No solo arenoso, ao fim de 900 s, a frente de humedecimento encontra-se a cerca de 78
cm de profundidade, e, ao fim de 1800 s, a cerca de 130 cm. Este facto mostra que a velocidade de
deslocamento vai diminuído ao longo do tempo. Efetivamente, se a velocidade de deslocamento da
frente de humedecimento se mantivesse, ao fim de 1800 s ela deveria encontrar-se a cerca de 78  2
cm, ou seja, 156 cm. Note-se, ainda, que a velocidade média de deslocamento da frente de
humedecimento até qualquer dos instantes considerados é bastante superior à condutividade
hidráulica do solo arenoso saturado. Efetivamente, para t = 900 s, obtém-se 312 cm/h e, para t =
1800 s, 260 cm/h.

No solo argiloso (Figura 7.17, b)), em cada um dos instantes considerados, o teor de
humidade varia mais gradualmente do que no solo arenoso desde a superfície até à frente de
humedecimento. Esta variação mais gradual num solo argiloso do que num arenoso foi já observada
nas curvas características de humidade (Figura 7.10). No solo argiloso, em concordância com a
pequena condutividade hidráulica, o avanço da frente de humedecimento é muito mais lento do que

7.26
Água no Solo

no solo arenoso. Observa-se também que a velocidade média da frente de humedecimento, embora
sempre superior à condutividade hidráulica do solo argiloso saturado, vai diminuindo ao longo do
tempo, tal como ocorria no solo arenoso. Efetivamente, ela é de cerca de 1,1 cm/h ao fim de
100 000 s, e de 0,5 cm/h, ao fim de 500 000 s.

Na Figura 7.18 apresentam-se as intensidades de infiltração à capacidade dos solos


anteriores, quando o teor volúmico inicial de humidade (i ) é o que nela se indica na mesma ordem
das respetivas curvas. Em ordenadas representa-se a intensidade de infiltração adimensionalizada
por divisão pela condutividade hidráulica do solo saturado; em abcissas, o tempo decorrido desde o
início da infiltração.

Figura 7.18 – Curvas de capacidade de infiltração

O andamento das curvas de intensidade de infiltração à capacidade de cada um dos solos,


descontando a diferença nas escalas utilizadas, é muito semelhante: inicialmente a capacidade de
infiltração é muito grande e, à medida que o tempo vai passando, essa capacidade vai diminuindo,
parecendo tender para um valor assintótico.

No solo arenoso a redução da capacidade de infiltração adimensionalizada é muito mais


rápida do que no solo argiloso. Efetivamente, no primeiro solo, a intensidade de infiltração reduz-se
a um valor perto do dobro da condutividade hidráulica do solo saturado em cerca de 100 s (f(100) =
68 cm/h) e, no segundo solo, a redução da intensidade de infiltração a um valor cerca de dez vezes
maior do que a condutividade ocorre em 10 000 s ( f(10 000) = 0,4 cm/h).

Em cada um dos solos, quanto maior é o teor volúmico de humidade inicial, tanto menor é a
intensidade de infiltração à respetiva capacidade ou, de modo inverso, quanto mais seco estiver o
solo, tanto maior é a infiltração.

A integração numérica da equação de Richards (7.32) fornece respostas quantitativas para


os mais variados problemas relacionados com a infiltração. Contudo, a sua utilização para os
problemas mais comuns não é prática. No que segue, para ilustrar alguns desses problemas, utilizar-
-se-ão conceitos simplificados, aplicáveis com melhor propriedade a solos grosseiros, e não se
considerará também o fluxo de ar.

7.27
Água no Solo

Considere-se um solo homogéneo, isotrópico e uniformemente humedecido, (z,0) = i, no


interior do qual a superfície freática se encontra a grande profundidade Para analisar o processo de
infiltração à capacidade do solo utilizar-se-ão dois gráficos (Figura 7.19 ). Nas ordenadas dos dois
gráficos marca-se a cota arbitrariamente referida a um ponto abaixo da superfície e abaixo da cota
mínima atingida pela frente de humedecimento. Em abcissas, no gráfico da esquerda representa-se o
teor volúmico de humidade e, no da direita, o potencial hidráulico respetivo.

H = z + i
H = z + f H=z
z z
t = t0
zs B A zs B’ A’
zf1 t = t1 D’
E D E’
zf2 t = t2
G F G’ F’

Hi

C C’ 45º
i  s  H

Figura 7.19 – Modelo para a capacidade de infiltração

Na abcissa do gráfico do teor volúmico de humidade estão marcados os teores inicial, i, e
de saturação, s.

No gráfico do potencial hidráulico encontram-se desenhadas três retas auxiliares, inclinadas


a 45º, com as seguintes equações: H  z , H  z   f e H  z   i .  f representa o simétrico da
sucção a que a água está sujeita na frente de humedecimento, que se supõe constante e característico
do solo.  i representa o simétrico da sucção que no solo corresponde ao teor volúmico de
humidade inicial,  i .

No início do processo, t  t 0 , dispõe-se uma fina película de água à superfície do solo,


z  z s , que se mantém ao longo do tempo. À superfície, o teor volúmico de humidade é
representado pelo ponto A, onde   s , e para baixo, o solo estará ainda com o teor de humidade
inicial,   i . O perfil de humidade será representado nesse instante pela linha ABC.

A pressão a que a água está sujeita à superfície do solo será igual à pressão atmosférica,
  0 , e o potencial hidráulico será representado pelo ponto A’, onde H  z s  0  z s . Para baixo,
a água no solo terá um potencial matricial    i que corresponde ao teor de humidade inicial.
Assim, a linha que representa o potencial hidráulico será A’B’C’.

Passado algum tempo, em t  t1 , a frente de humedecimento estará em z  z f 1 . Acima


dessa cota, entre zs e zf1, o solo estará saturado, e abaixo dessa cota o solo estará ainda na condição
inicial. O perfil de humidade será representado pela linha ADEC.

Em primeira aproximação, considerando linear a variação do potencial hidráulico até à


frente de humedecimento, este será representado nesse instante pela linha A’D’E’C’.

De modo análogo, em t  t 2 , o perfil de humidade será representado pela linha AFGC, e o


potencial hidráulico, pela linha A’F’G’C’.

7.28
Água no Solo

A equação de Darcy expressa na direção vertical, direção do movimento da água, pode


escrever-se:

H
Vz  K s (7.38)
z

e, tendo a intensidade de infiltração o sentido contrário ao do eixo das cotas, será

f  Vz (7.39)

A componente vertical do gradiente do potencial hidráulico, no instante genérico t, é

H (z s  0)  (z f   f )
 (7.40)
z zs  zf

Sendo a infiltração acumulada até ao instante genérico t definida por

F  (z s  z f ) (s  i ) (7.41)

então, a profundidade da frente de humedecimento, z s  z f , será

F
zs  zf  (7.42)
s  i

Das equações anteriores obtém-se a fórmula de Green e Ampt (1911) para a intensidade de
infiltração à capacidade de um solo

  (   i ) 
f  K s 1  f s  (7.43)
 F 

Apresentam-se na Figura 7.20 valores médios da sucção na frente de humedecimento


(   f ) em função da textura do solo. Como regra grosseira, pode dizer-se que a sucção na frente de
humedecimento, para a infiltração à capacidade do solo, é de cerca de 3/4 da altura da franja
capilar.

A infiltração acumulada, F, é o integral ao longo do tempo da intensidade de infiltração e,


portanto, para o modelo de Green e Ampt será

dF   (   i ) 
 K s 1  f s  (7.44)
dt  F 

cuja integração fornece

b  KsF 
F  Ks t  ln 1   (7.45)
Ks  b 

com

b  K s  f (s  i )

7.29
Água no Solo

150

100

60
40
30
20

10

Figura 7.20 – Sucção na frente de humedecimento (cm)


(adaptada de Rawls et al.,1993)

A equação (7.45), por explicitação de t, permite a determinação do tempo que levará a


infiltrar determinada altura de água. Já o problema inverso, determinação da altura de água
infiltrada num determinado intervalo de tempo, só poderá ser resolvido por iterações.

Em alternativa à capacidade de infiltração, quando se pretende analisar a infiltração que


ocorre em resultado de alimentação com intensidade constante à superfície de um solo, os conceitos
anteriores conduzem a uma representação gráfica que se apresenta na Figura 7.21.

Designando a intensidade da alimentação à superfície por p, com as dimensões de uma


velocidade e que pode ser assimilado a uma precipitação com intensidade constante, e considerando
(7.38) e (7.39) será à superfície

dH p
 (7.46)
dz K s

onde se fez f  p , porque inicialmente a capacidade de infiltração é muito grande e, portanto, toda a
alimentação superficial será infiltrada, pelo menos inicialmente.

7.30
Água no Solo

H = z + i
H = z + f H=z
z z
t = t0
zs B A zs B’ A’
zf1 t = t1
E D E’ D’
zf2 t = t2 arc tg (p/Ks)
G F G’ F’

Hi

C C’ 45º
 i s  H

Figura 7.21 – Modelo para o tempo de encharcamento com alimentação constante

Na Figura 7.21, a linha definida por A’D’F’ corresponde ao gradiente indicado pela
equação (7.46) e, portanto, representará o potencial hidráulico da água acima da frente de
humedecimento. A sucção na frente de humedecimento será representada, à cota onde a frente
estiver, pela distância horizontal entre a linha A’D’F’ e a linha H  z . Por exemplo, em t = t1, a
sucção na frente de humedecimento será representada pela distância horizontal entre D’ e a linha
H  z.

Verifica-se que, enquanto a infiltração se mantiver igual à alimentação, f  p , a sucção na


frente de humedecimento vai aumentando à medida que esta vai descendo no solo. Em t  t 2 , com
a frente à cota z f 2 , a sucção atinge o valor que corresponde à infiltração à capacidade do solo,
  f . A partir desse instante, a infiltração passa a ocorrer à capacidade do solo, ou seja, deixa de
ser constante e igual a p e vai diminuindo ao longo do tempo, como ocorre à capacidade do solo. A
diminuição da infiltração acompanha a diminuição do gradiente vertical do potencial hidráulico e
corresponde à manutenção na frente de uma sucção igual a   f , como acontecia na capacidade de
infiltração.

Designa-se por tempo de encharcamento, t e , o instante em que a diminuição da intensidade


de infiltração começa a ocorrer. A partir desse instante, fica disponível à superfície o excesso de
água que corresponde à diferença entre a alimentação e a capacidade de infiltração.

A infiltração acumulada no instante t e é Fe  p t e e, como se viu, a intensidade de


infiltração é f  p . Então, substituindo estes valores em (7.43) e explicitando t e , obtém-se

  f ( s   i )
te  , p  Ks (7.47)
 p 
p  1
 s
K 

Quando a alimentação (p) for menor do que a condutividade hidráulica do solo saturado
( K s ), a infiltração será sempre igual à alimentação, não ocorrendo qualquer redução do seu valor.

Depois do tempo de encharcamento, a infiltração prossegue à capacidade do solo, sendo


representada por uma translação temporal da curva de intensidade de infiltração à capacidade do
solo.

7.31
Água no Solo

O instante t  t p em que a intensidade de infiltração à capacidade do solo é igual à


alimentação obtém-se de (7.45) com F  P  p t e

1  b  KsP 
tp   P  ln 1    (7.48)
Ks  K s  b 

e a translação temporal a efetuar na intensidade de infiltração à capacidade do solo será t e  t p .

Na Figura 7.22 apresenta-se a infiltração acumulada e a intensidade de infiltração à


capacidade do solo arenoso referidas na Figura 7.17 e na Figura 7.18, calculadas pelo modelo de
Green e Ampt com  f  16 cm.

45 150

40
125
35

30 100

25 f (cm/h)
F (cm)

i = 0,10 75
20
i = 0,20
15 50
i = 0,10
10
25 i = 0,20
5

0 0
0,00 0,25 0,50 0,75 1,00 0,00 0,25 0,50 0,75 1,00
t (h) t (h)

Figura 7.22 – Infiltração acumulada e intensidade de infiltração à capacidade de um solo arenoso


(modelo de Green e Ampt com Ks = 34 cm/h, s = 0,287 e  f = –16 cm)

Os valores do teor volúmico de humidade inicial mostram que a capacidade de infiltração é


tanto maior quanto mais seco estiver o solo.

Na Figura 7.23, comparam-se para um solo franco-arenoso, com 60 por cento de areia e 10
por cento de argila, com Ks = 3 cm/h, s = 0,37, i = 0,1 e  f = –12 cm, as intensidades de
infiltração à capacidade do solo e com alimentações constantes de 2,0 mm/min e de 1,5 mm/min.

Como seria de esperar, o tempo de encharcamento é tanto maior quanto menor for a
alimentação.

7.32
Água no Solo

3,0

2,5

te = 0,09 h
2,0

f (mm/min) t e = 0,18 h
1,5

1,0

0,5

0,0
0 0,1 0,2 0,3 0,4 0,5
t (h)

Figura 7.23 – Intensidades de infiltração à capacidade de um solo franco-arenoso e


com alimentações constantes de 2,0 mm/min e 1,5 mm/min
(modelo de Green e Ampt com Ks = 3 cm/h, s = 0,37, i = 0,1,  f = –12 cm)

No Quadro 7.6 apresentam-se três outros modelos de infiltração com larga utilização
prática.

Quadro 7.6 – Modelos de Horton, Philip e Kostiakov

Modelo f F tp te

f f f 
F  fct  t e  c ln 0 c 

1  f0  fc  k p  p  fc 
Horton f  f c  (f o  f c )e kt f f

 0 c 1  e kt
k
 tp  ln
k  p  f c


 f p
 0
kp

1 
1 1 1  2 
2
( 2p  K s ) S 2
Philip f  S t 2  Ks tp   S  4 K P  S  te 
F  Ks t St 2 4K s2 
s
 4p ( p  K s ) 2
2

1 1
Kostiako   1  (1  )P  1 1 
f t F t tp   te   
v 1   1    p 
  

O modelo de Horton (1939) utiliza três parâmetros, f0, fc e k. O primeiro representa a


intensidade de infiltração inicial à capacidade do solo, o segundo, a intensidade ao fim de um tempo

7.33
Água no Solo

longo, ou seja, a condutividade hidráulica do solo saturado, e o terceiro é um fator de escala


temporal.

O modelo de Philip (1957) utiliza dois parâmetros, S e Ks. O primeiro tem sido designado
por sorvabilidade, e o segundo é a condutividade hidráulica do solo saturado. No instante inicial, tal
como no modelo de Green e Ampt, a intensidade de infiltração à capacidade do solo é infinita.

O modelo de Kostiakov (1932) utiliza também dois parâmetros,  e . Quando se compara


com o modelo de Philip, reconhece-se que o valor de  deve ser de cerca de 1/2, e o de  de cerca de
metade da sorvabilidade. O modelo de Kostiakov é muito utilizado em Portugal, ligado ao estudo da
rega, eventualmente, com a condutividade hidráulica do solo saturado adicionada à intensidade de
infiltração.

7.11 REDISTRIBUIÇÃO DA ÁGUA NO SOLO

A água infiltrada em excesso em relação à capacidade de campo continua a descer no solo,


mesmo que à superfície a infiltração tenha terminado. Neste caso, uma vez parada a infiltração à
superfície do terreno, a superfície tende rapidamente para a capacidade de campo, enquanto a frente
de humedecimento continua a descer no solo. Se a superfície freática estiver muito abaixo da
superfície do solo, então a camada superior do solo acabará por ficar à capacidade de campo, não
chegando a água que se infiltrou a alimentar os aquíferos freáticos; se a superfície freática estiver
mais próxima da superfície do solo, então parte da água acabará por alimentar os aquíferos
freáticos.

Na Figura 7.24 ilustra-se o processo descrito para um solo arenoso a cuja capacidade se
infiltrou água durante 900 s, tendo-se a partir desse instante suspendido a infiltração. Na obtenção
dos perfis de humidade, tal como foi referido para a Figura 7.17, utilizou-se a integração numérica
da equação de Richards (7.32) e o mesmo solo arenoso.

-50

t = 900 s
z (cm)

-100
2700

-150

-200
0,0 0,1 0,2 0,3
 (-)

Figura 7.24 – Redistribuição da água num solo arenoso

7.34
Água no Solo

Entre os instantes t = 900 s e t = 2700 s, intervalo de tempo de meia hora, ocorre a


redistribuição da água ou a drenagem interna, que continuará para lá dos 2700 s. Observa-se a
rápida secagem do solo à superfície e a continuação da descida da frente de humedecimento em
profundidade. Designa-se por percolação profunda o movimento da água para a superfície freática
abaixo da zona radicular.

Faz-se notar que o volume de água armazenado no solo por unidade de área superficial
mantém-se constante depois do instante em que se para a infiltração, se a evaporação da água no
solo for nula.

EXERCÍCIOS

7.1 Uma amostra de um solo ocupa um cilindro com 5 cm de diâmetro e 10 cm de altura.


Sabendo que as massas húmida e seca da amostra são respetivamente 331,8 g e 302,4 g e
que a massa volúmica dos sólidos é 2650 kg/m3, determine o teor volúmico de saturação e o
teor volúmico de humidade da amostra.

7.2 Um vaso munido de um orifício no fundo contém 5 l de um solo com um teor volúmico de
humidade de 0,15. Sabendo que a capacidade de campo do solo corresponde a um teor
volúmico de humidade de 0,28, calcule a quantidade de água que sairá pelo orifício quando
se deitar no vaso 1 l de água.

7.3 Num terreno com 1 ha, o solo é fundamentalmente constituído por 30 por cento de areia, 60
por cento de silte e 10 por cento de argila, e a cultura instalada tem uma profundidade
radicular de 0,5 m. Sabendo que para uma produção ótima o teor de humidade não deve
baixar de 50 por cento da água total utilizável pelas plantas, estime o volume de água de
rega (m3) necessário para passar do mínimo teor admissível à capacidade de campo.
Sabendo que a evapotranspiração real média é de 3 mm/d, estime o intervalo de tempo entre
duas regas sucessivas.

7.4 Desenhe o diagrama de pressões ao longo do eixo do tubo capilar da Figura 7.7, desde o
fundo da tina até ao topo do tubo, já no ar.

7.5 Duas gotas esféricas de água com diferentes raios são postas em contacto. Será a gota maior
que cresce à custa da menor ou será a gota menor que cresce à custa da maior? Justifique.

7.6 Desenhe as curvas características de humidade e de condutividade hidráulica para um solo


arenoso, segundo o modelo de Haverkamp et al. com s = 0,287, r = 0,075, =
1,611  106, = 3,96, Ks = 9,44  10-3 cm/s, A = 1,175  106 e B = 4,74.

7.7 Mostre que o avanço da frente de humedecimento para o solo arenoso da Figura 7.17 a) é
proporcional a t e determine a constante de proporcionalidade.

7.8 Mostre que a integração da equação (7.44) conduz à equação (7.45).

7.9 Calcule a infiltração acumulada ao fim de 0,5 h no solo da Figura 7.23 quando a
intensidade de alimentação é constante e tem o valor de 2,0 mm/min. Calcule também o
excedente da alimentação em relação à infiltração (mm).

7.35
Água no Solo

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