Você está na página 1de 18

Jacques Demajorovic

Marcia Lima

Cadeia de reciclagem
UM OLHAR PARA OS CATADORES

Senac Sesc
Cadeia de reciclagem
UM OLHAR PARA OS CATADORES

Jacques Demajorovic
Márcia Lima
Pal Leomardo Gongaves Comes

Dados Internacionais de Catalogaço na


Publicação (CIP)
Jeane Passos Santana - CRB 8/6189)

Demajorovic, Jacques
Cadeia de reciclagem: um olhar para os catadores/
Jacques
Demajorovice Márcia Lima. - São Paulo: Editora Senac São
Paulo; São Paulo: Edições Sesc SP, 2013.

Bibliograña
ISBN
978-85-396-0441-8 (Editora Senac São Paulo)
ISBN 978-85-7995-085-8 (Edições Sesc São Paulo)
1.
Reciclagem: Gestão de resíduos sólidos 2. Catadores de
material reciclável:
Cooperativas (Reciclagem) 3. Cadeia de reci-
clagem: Cooperativa de catadores 4. Cooperativa de catadores:
Logistica reversa I. Lima, Márcia, II. Título.

-174s CDD - 363.7282

Indice para catálogo sistemático:


Cadeia de Reciclagem : Catadores de SenaC Sdicões
material
reciclável 363.7282
DESENVOLVIMENTO URBANO E GESTÃO DE REsiDUos sóLIDOS

A DÉCADA DE 1950, em contraste à economia esfacelada re-


sultante do período de insanidade vivido durante a Segunda
Guerra Mundial, representou o início de uma fase de pros-
peridade econômica sem precedentes na história, que mu-
daria o cotidiano de pessoas nos quatro cantos do planeta
pelos sessenta anos seguintes. O período denominado Anos
Dourados foi caracterizado pelo baixo índice
desempre- de
go, crescimento econômico acelerado e grande expansão do
consumo. Sem se preocupar com o expressivo aumento do
uso de recursos naturais, a população dos países desenvolvi-
dos parte da dos países em desenvolvimento comemoravam
e

os Anos Dourados como uma festa sem hora


para terminar.
A consolidação das indústrias automobilistica e
petrolí-
fera motores dessa economia focada na produção e no
como

consumo de massa alterou


profundamente o perfil dos an-
siosos novos consumidores. Carros, eletrodomésticos e uma
infinidade de produtos em embalagens variadas, além de
no
vos
espaços de consumo, como supermercados shopping e

Os Anos Dourados
correspondem ao período que vai de 1950 até a Crise do Pe-
tróleo em 1973 e são caracterizados pelo intenso crescimento da economia mun-
dial iniciado pelo Plano Marshall - o financiamento da
reconstrução da econo-
mia europeia destruída durante a Guerra Mundial.
Segunda
PARA OS CATADORES
OLHAR
UM
RECICLAGEM:

DE
CADEIA

DESENVOLVIMENTO URBANO E GESTÃO DE REsIDuOS 5ÖLIDOS


o dla a dia de uma parcela
passaram a integrar cre

centers,
mundial, principalmente nos grandes
cente da população 2005, a
Avaliação Ecossistêmica do Milênio,
urbanos. O crescimento do numero de consumidores que envolveu 1.360
uma
pesquisa
centros cientistas em 95 paises, concluiu que,
uma engrenagem baseada no
alimentava continuamente an- ao mesmo tempo em que as atividades
antrópicas conse-
vertiginoso da produção, distribuiço
e consumo
mento guiram assegurar grandes conquistas para melhorar o bem-
mercadorias. -estar humano e o desenvolvimento
econômico, o aumento
Mesmo com o fim dos Anos Dourados, no início da dé da demanda nos últimos
cinquenta anos, associado ao uso
cada de 1970, e os problemas econômicos enfrentados por insustentável dos recursos naturais,
comprometeu severa-
diversos países, como o Brasil, durante a década de 1980,2 o mente os serviços prestados
pelo ecossistema, o que traz im-
total de recursos financeiros gerados na economia global não pactos negativos para esse bem-estar (Millenium Ecosystem
parou de crescer. Se em 1960 o produto interno bruto mun- Assessment, 2005).
dial registrava parcos USS 1,3 trilhão, no fim do ano de 2010 Essas modificações no ecossistema foram feitas como

o valor gerado na economia mundial registrou US$ 63 tri nunca antes na história. A diminuição da disponibilidade
Ihoes (Banco Mundial, 2011). Embora os países desenvolvi- para consumo de água potável, madeira, fibras e combusti-

dos continuem a representar a maior parcela do PIB mundial, veis tem ameaçado beneficios até agora alcançados para
os

observa-se crescimento mais do PIB as gerações futuras. A pesquisa mostra ainda que o aumento
um rápido nos países
em desenvolvimentoe nas economias emergentes, tais como da demanda mundial ameaça severamente 15 dos 24 ser-

China, India e Brasil. E nesses países que emprego, renda e viços prestados pelo ecossistema, como pode ser visto na

de forma tabela 1.
consumo crescem
significativa.
O sistema produtivo não apenas consome recursOs, mas
Tamanha expansão da economia mundial, associada
também devolve ao meio ambiente quantidades crescentes de
ao
grande aumento do consumo, tem gerado uma série de
materiais na forma de resíduos. Dados da Associação Brasileira
problemas socioambientais. Para sustentar o aumento da
demanda mundial, os recursos naturais são consumidos em das Empresas de Limpeza Públicae Residuos Especiais (Abrelpe,
2008) mostram que a coleta mundial de residuos sólidos ur-
quantidadee velocidade sem precedentes, levando os pesqui
Sadores banos é estimada em 1,2 bilhão de toneladas. Naturalmente, a
a alertarem sobre perigo de Em
o seu esgotamento. países entre os
contribuição para esse total é bastante desigual
mais ricose os mais pobres, pois a geração
de resíduos está dire-
A década de
1980 ficou conhecida no Brasil como a "década razao da desenvolvimento econômico. Assim,
queda dos investimentos e do baixo perdida" em tamente ligada ao grau de
crescimento da economia no periodo
18
TABELA 1. ESTADO GERAL DOS SERVIÇOS DE PROVISÃO, REGULADORES E CULTURAIS
Serviços Subcategoria Condiçoes Observação
Serviços de provisãa
Alimentos Lavouras aumento substancial da produção
Animais de criação aumento substancial da produção
Pesca de captura produção em queda devido à exploração predatória
Aquicultura aumento substancial da produção
Alimentos silvestres produção em queda
Fibras Madeira perda de floresta em algumas regiões, crescimento em
Outras

Algodão, çânhamo e seda +/ produção de algumas fibras em queda, crescimento de


outra

Combustivel de madeira produção em queda


Recursos genéticos
perda por extinção e perda de recursos genéticos da
lavoura
Produtos bioquímicos
remédios naturais, produtos perda por extinção, exploração predatória
farmacêuticos

Agua Agua doce uso não sustentável para consumo humano, indústria
e
irrigação;
volume de energia hidráulica não alterado,
mas os diques aumentam nossa capacidade de utilizar
essa energia

Senviços Subcategoria Condições Observação


Serviços reguladores
Regulação da qualidade do ar capacidade da atmosfera para se despoluir diminuiu
Regulação cimática Global fonte de sequestro de carbono desde meados
do século XX

Regional e local preponderäncia de impactos negativos


Regulação hidrica +1 varia dependendo da mudança e do local do
ecossistema
Regulação da erosão aumento da degradaç o do solo

Purificação da água
tratamento de residuos
e piora da qualidade da água

Regulação de doenças varia dependendo da mudança do ecossistema

Regulação de pragas controle natural degradado por uso de pesticidas


Polinização aparente queda global do volume de polinização
Regulação de ameaças perda de isoladores naturais (zanas úmidas,
naturais manguezais)
Serviças culturais
Valores espirituais e religiosos rápido declinio de bosques e espécies sagradas
Valores estéticos declinio da quantidade e da qualidade
Recreaçãoe ecoturismo mais areas acessiveis, muitas delas degradadas
Fonte: Milenium Ecosystem Assessment, 2005
RECICLAGEM: UM OLHAR PARA OS CATADOREs
CADEIA DE

DESENVOLVIMENTO URBANO E GESTAO DE RESíDUOS sÓLIDOS

enquanto os paises ricoS, integrantes da OCDE, são responsá


veis por 50% desse total, o restante do mundo - Ásia, América importante ressaltar que a natureza dos problemas enfrenta-

Central, América do Sul e Africa,onde se concentra a maior dos pelos países ricos e pelos paises pobres é bastante distinta.
parte da população mundial, gera conjuntamente a outra me-
Nos países desenvolvidos, como já está garantido que o lixo
tade dos resíduos coletados. Tais números são explicados produzido tenha como destino aterros sanitários
incinera e
pela
enorme variedade observada dores, o debate centra-se políticas redução do volume
nas de
no consumo
por habitante em di de lixo gerado, ampliação da reciclagem e
versos países. Se a coleta per capita anual um cidadão norte-
de implementação de
-americano é de cerca de 800 kg, nas Filipinas essa quantidade tecnologias de tratamento menos poluentes. Já nos países em
se reduz a cerca de 180 kg. desenvolvimento, como no caso do Brasil, os problemas se
Independentemente das disparidades encontradas, a ampliam, pois parcela significativa dos resíduos sequer étra-
tada adequadamente, sendo seu destino os lixões ou a
questão do lixo traz enormes desafios para as políticas públi- queima
céu aberto, o que amplia a
cas, seja nos países industrializdos ou nos países em desen-
a
poluição do ar, da água e do solo
volvimento. A expansão da
e
potencializa impactos sobre a saúde humana. Nesse contex-
população urbana e o aumento do
to, implantar programas que diminuam a
consumo de produtos descartáveis e menos duráveis fizeram geração de resíduos
sólidos e seus impactos são desafios
que afetam todos os paí-
crescer a quantidade final de resíduos gerados, que precisam ses, demandando do setor
ser coletados, transportados e destinados adequadamente
público, empresas e de cidadãos
de
um novo olhar para a
questão.
pelo poder público.
Ainda que esse crescimento indique a necessidade pre-
A evolução dos resíduos sólidos
mente do desenvolvimento de alternativas em todos os paí- na sociedade
e seus desafios
ses para gerenciar uma quantidade cada vez maior de lixo, é .

Procurar alternativas para lidar com o lixo


gerado nas co-
munidades não constitui um
problema novo na humanidade.
Esse problema se
A Organização para Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE) é uma agravou quando os homens decidiram se
fixar
organização internacional e intergovernamental integrada hoje por 34 paises,
entre eles aqueles considerados mais industrializados da economia do mercado.
cidades: vida sedentária fez com que os indivíduos
nas a
eo lixo
passassem a dividir o mesmo espaço.
Com sede em Paris, na França, representantes dos membros se reúnem para
tr Em pouco tem-
car
informações e definir fim de maximizar seu crescimento
políticas, a econo po, percebeu-se que tal convivência
mico e seu desenvolvimento (CGU, 2007). de implicava desagradáveis
Apesar de contar com a força palses impactos ao ser humano. Mau cheiro,
como Estados Unidos, Alemanha, Japão e França, nenhum dos integrantes do
atração de animais e
chamado BRIC (Brasil, Rússia, India China) faz parte deste grupo. doenças indicavam a necessidade de
e
separar urgentemente os
22
3
CADEIA DE REC1CLAGEM: UM OLHAR PARA OS CATADORES

DESENVOLVIMENTO URBANO E GESTAO DE RESídUOS SÓLIDOS

seres humanos de seus dejetos. Russo (2003) lembra que, no


século XIV, metade da população da Europa foi dizimada pela a contaminação de individus que tenham contato com esse
peste bubonica, ou peste negra. O costume dos habitantes de material.
No entanto, é interessante notar que, ao mesmo
tempo
jogar o lixo de suas casas nas ruas e terrenos vazios atraiu
em que se torna cada vez mais premente encontrar novas so-
milhares de ratos, que, por meio de suas pulgas, infectaram
luçöes para destinar o lixo, a visão da sociedade sobre seus
grande parte da população europela. rejeitos pouco se alterou. Nesse sentido, é interessante obser-
Uma primeira alternativa foi levar tais rejeitos para lon- var a definição de lixo encontrada nos diversos dicionários
ge do convívio dos moradores urbanos, dispondo-os além da lingua portuguesa. A própria Prefeitura de Säo Paulo, em
dos muros das cidades. Tal medida, no entanto, não teria sua página na internet, por exemplo, define o lixo da seguinte
vida longa, uma vez que o crescimento dos aglomerados ur- forma:
banos ultrapassou esses muros, reaproximando os cidadãos
. os restos das atividades humanas, considerados pe-
de seus resíduos. Essa situação se tornaria ainda mais insus-
los geradores como inuteis, indesejveis ou descartáveis.
tentável com a intensificação da industrialização e a grande
Normalmente, apresentam-se sob estado sólido, semissólido
diversidade de organizações que passariam a compor a nova
ou semiliquido (com conteúdo líquido insuficiente para que
paisagem urbana. esse liquido possa fluir livremente)
Até o da industrialização; os resíduos eram com-
advento
material orgånico. Hoje, o cenário é
postos basicamente de
bastante distinto: do lixo domiciliar, passando-se pelo
co-
As pilhas e âmpadas fluorescentes presentes no lixo municipal contêm metais
mercial - incluindo-se os diversos estabelecimentos de co-
pesados que podem contaminar o solo e as águas superficiais
ou subterråneas.

Parte dos resíduos hospitalares, os denominados residuos sépticos, podem con-


mércio e de serviços, como escritórios, bares e restaurantes, ter germes patogènicos, representando grande perigo potencial à população por
e remédios com
com os rejeitos de hospitais, ae meio de seringas, bandagens, gazes, órgãos e tecidos removidos
agora também divide espaço prazo de validade vencido. Já o entulho, gerada na construção civil, em processos

e de cons-
roportos, indústrias, portos, propriedades agrícolas
de demolição ou restos de obras, apesar de grande parte poder ser reaproveitado,
de restos de tin-
diversidade de resíduos, cuja muitas vezes
pode apresentar toxicidade em razão da presença
trução civil. A quantidade e a tas e solventes. Já na agricultura, uma das grandes preocupações
édestinação
a

um poten defensivos agricolas. Por fim, o lixo


materiais tóxicos, apresentam adequada das embalagens de fertilizantes
ou

composição inclui industrial apresenta diferentes niveis de toxicidade pela presença


de óleos e metais
0
maior para saúde humana e para
cial de risco cada vez a
pesados.
para evi http://www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/secretarias
ecossistema, demandando ações do poder público
Intormaço disponivel em

servicos/resíduos_solidos. Acesso em 4-10-2013.


mesmo
e do solo ou
tar a degradação da qualidade da água

24
CADEIA DE RECICLAGEM: UM OLHAR PARA OS CATADORES

DESENVOL.VIMENTo URBANO E GESTÃO DE REsíDUOS SÓLIDOS

o dicionário, por sua vez, pouco nos auxilia na


diminui
cão do preconceito em relaçao ao lixo e no domésticos, diferente dos lixões muito.comuns Brasil -
esclarecimento no

sobre nossa responsabilidade como geradores. O Novo onde o lixo é jogado sem nenhuma estrutura para evitar im-
dicio-
nário Aurélio da lingua portuguesa define o lixo como "aquilo pactos socioambientais. Seu principal objetivo é propiciar
que se varre de casa, do jardim, da rua e se joga fora" ou uma tecnologia adequada para recebimento dos resíduos,
ainda
"coisas inúteis, velhas e sem valor" (Ferreira, 1986) impedindo seu contato com a água subterrånea e o ar. Para
tanto, a construção de um aterro deve obedecer a uma série
Sem atribuir valor ou alguma utilidade aos
resíduos, mas de requisitos.
reconhecendo seu potencial de causar impactos socioambien
Nenhum aterro hoje pode ser implementado sem a autori-
tais, as autoridades públicas em diversos países começam a
zação de um órgão ambiental, considerando-se os resultados
implantar políticas mais amplas de gestão de resíduos sólidos.
de um Estudo de Impacto Ambiental. Esse estudo deve con-
No caso dos países desenvolvidos, a
primeira fase, que pre- templar a área a ser ocupada, as características do terreno, os
valeceu até início da década de 1970, foi caracterizada por
o
impactos na vizinhança, na fauna e na flora. Como não se tra-
uma prioridade em garantir apenas sua coleta e
disposição. ta apenas de um local para jogar os resíduos, os aterros sanitá-
Essa ação, concentrada no fim da cadeia produtiva, igno- rios ocupam uma área muito maior do que aquela destinada à
rava a importância de qualquer iniciativa focada na redução sua principal função, ou seja, o aterramento do lixo. Sua área
de resíduos nas diver_as etapas do processo produtivo. Essa construída e ocupada deve contemplar espaço para sistemas de
visão contribuiu, por um lado, para o crescimento acelerado drenagem de chuva e estações para tratamento de chorume.
do volume final de residuos, proporcional à expansão da Se o excesso de chuva não é coletado, a água poderá inva-
produção e do consumo. Por outro, como consequêncià dir terrenos vizinhos, facilitando processos de contaminação.
du- Da mesma forma, o chorume näo tratado pode contaminar
mais positiva dessa política, registrou-se a eliminação,
rante a década de 1960 e o início da década de 1970, dos
O Estudo de Impacto Ambiental é um relatório técnico no qual são identificados
últimos lixões a céu aberto na maioria dos países da OCDE, 0s
principais impactos ambientais da construção e operação de um empreendi-
sendo a maior parte dos resíduos encaminhada para aterros mento. Nesse relatório são apresentadas também medidas para mitigar os im-
pactos identificados. No Brasil, desde 1986, o Estudo de Impacto Ambiental foi
e incineradores. integrado à Política Nacional de Meio Ambiente por meio da Resolução 001/86
Os aterros sanitários constituem, até hoje, o meio mais do Conama, tornando-o
obrigatório para todos os empreendimentos que possam
gerar danos às pessoas, à fauna e à flora.
tratamen-
utilizado para a disposição de resíduos com algum O chorume é um liquido tóxico resultante da decomposiço de material orgänico
to em todo o mundo. Um aterro sanitário é um equipamento presente no lixo doméstico. Também pode ser visto em nossas casas quando o lixo
permanece na lixeira por vários dias.
para receber
resíduos sólidos
de destinação final planejado
RECICLAGEM: UM OLHAR PARA OS CATADORES
CADEIA DE
RESÍDUOs SOLIDOS
DESENvoLVIMENTO URBANO E GESTÃO DE

o lençol freático. Além disso, o solo escolhido deve ser com- série de Dessa
responsáveis pela transmissão de uma doenças.
pactado e não apresentar fraturas, de forma a evitar a conta- sendo construídas ao lado e em cima
forma, as células v o
minação da água subterrânea. Por fhim, os aterros sanitários de
de outras, recebendo assim a maior quantidade possível
não devem ser instalados próximos a rios ou córregos, para
resíduos.
impedir que um possível vazamento prejudique a qualidade importante dos aterros sanitários é a
Uma característica
consti-
da água, decomposição da matéria orgànica, que gera u m gás
Por se tratar de um grande empreendimento, seus cus- tuído de aproximadamente 55% de metano e 45% de dióxido
tos de instalação também são bastante elevados. Quanto de carbono, além de pequenas quantidades de outros gases,

mais rígida a legislação, maior o custo. Nos Estados Unidos, como nitrogênio (Atcha & Van Son, 2002). Gás extremamen-
Wake County Landfil, localizado; volátil, o metano em alta concentração nesse espaço conh-
por exemplo, a North te

Carolina do Norte, ocupa uma área de 93 hectares ou 930 mil nado aumenta os riscos de explosão e de incêndios nos aterros
metros quadrados e seu custo de construção foi de US$ 19 sanitários. Para evitar a sua ocorrência, devem ser instalados

milhoes. Do total da área ocupada, apenas 35% são utilizados tubos que possam coletar o metano presente nas células. Em
para o aterramento dos resíduos, sendo o restante ocupado alguns aterros, o metano é simplesmente descartado no am-
biente ou queimado em um equipamento denominado flare.
pelos equipamentos descritos anteriormente (Freudenrich,
Além do problema de segurança, o metano gerado é um
2004). dos principais gases que contribuem para o efeito estufa,
Como o principal objetivo de um aterro sanitário é re-
apresentando um potencial 23 vezes maior do que o do dió-
ceber resíduos sólidos e aterrá-los, seu elemento central são
xido de carbono." Grande parte da emissão global de metano
as células construídas para a disposição do material. Durante tem origem nos aterros sanitários. Nos Estados Unidos, por
o dia, caminhões carregados de lixo despejam nessas células sanitários são por 35% de
responsáveis
exemplo, Os aterros
o material recolhido nos centros urbanos. Distintamente dos
toda a emissão de metano (Atcha & Van Son, 2002). Já um
lixões, onde os resíduos apenas são despejados, nos aterros
c
sanitários, o lixo é compactado por meio do uso de tratores 8
Dados do Banco Mundial revelam que oito das dez temperaturas mais altas regis-
escavadeiras. A compactação desse materialé essencial, pois, tradas na humanidade ocorreram nos últimos dez anos. Tais dados comprovam
que as emissões de gases geradas pelas atividades antrópicas estão contribuindo
dessa forma, é garantido o aumento da vida útil do aterro. significativamente para a aceleração do efeito estufa. Estima-se que a temperatura
No fim do dia, o material compactado é recoberto com terra média global nos próximos cem anos seelevará de 1,4oCa 5,8 oC, sendo que seus
e novamente compactado. Esse procedimento é importante efeitos mais danosos serão observados nos países em desenvolvimento (cf. Kossoy,
2004).
insetos, comuns nos lixoes e
para evitar a presença de ratos e

28
SOLIDOS
DESENVOLVIMENTO URBANO E GESTAO DE RESIDUOS
CADEIA DE REClCLAGEM: UM OLHAR PARA OS CATADORES

atribuí-
estudo feito por Fernandez (2011) mostra que os resíduos só- Até o fim da década de 1960, a pouca importância
dessa
lidos gerados nos grandes centros urbanos contribuem com da aos ambientais relacionados ao emprego
problemas
incineradores operassem
3% do total da emissão de gases estufa. Nas grandes cidádes
os
tecnologia contribuiu para que
dos países em desenvolvimento, porém, a contribuição pode sem preocupações de limitar seu impacto socioambiental.
ser ainda maior. Fernandez mostra ainda que a proporção Em 1970, porém, com maior questionamento de seu empre-
de emissão de gases ligada aos residuos sólidos varia de 3%, go, desenvolveram-se os primeiros padrões de emissão para
do
nos Estados Unidos e Canadá, e até 136, na América Latina. os processos de incineração. Tais padrões, que ao longo
tornando mais restritivos, passaram a estabe-
Isso decorre da maior presença de conteúdo orgånico noa re- tempo foram se
óxido
síduos desses países, associada à falta do uso de tecnologia lecer limites para a emissão de materiais particulados,
&
que evite a emissão do metano diretamente para a atmosfera. de nitrogênio e dióxido de enxofre, entre outros (Dempsey
Nesse contexto, a redução da geração de metano lançado na Oppelt, 1996).
Mesmo apresentando um custo de operação mais elevado
atmosfera deve ser uma das principais preocupações na ope-
dissemi-
do que os aterros sanitários, a tecnologia acabou se
ração de aterros sanitários.
Os incineradores, por sua vez, surgem de uma longa tra- nando pelos países desenvolvidos e, em alguns deles, tornou-
-se a principal forma de destinação.
Países ricos, mas com
dessa
dição de queimar o lixo. A Bíblia já mencionava o uso

problemas para disponíveis para a cons-


encontrar espaços
técnica em Jerusalém. Fora dos muros da cidade, no mesmo
trução das grandes estruturas demandadas pelos
aterros sa-
local utilizado para sacrificios, restos do lixo eram queima-

dos. Também há registros do uso desse instrumento na Idade nitários, como Japão, Dinamarca e França, optaram por essa
incinerador móvel, de alternativa.
Média. O "vagão de fogo'", primeiro do dos incineradores é sua
A principal vantagem uso
técnica bastante inovadora na época, circulava pelas ruas da resíduos só-
capacidade de "sumir com a maior parte dos
cidade, possibilitando a seus moradores o descarte de seus re-
lidos enviados para essas unidades. O principal objetivo de
jeitos dentro da fogueira em movimento (Dempsey &Oppelt,
um incinerador é a decomposição dos resíduos por queima
a

1996). relativamente
O processo de incineração como conhecemos hoje, no en-
altastemperaturas, o que exige uma estrutura
tanto, tem uma história bem mais curta, de aproximadamente simples. E preciso um local no qual os caminhões municipais
de resíduos sólidos possam despejar os resíduos. Desse local,
cem anos. Seu precursor foi um destruidor de lixo domés-
Os resíduos são encaminhados para uma câmara de combus-
tico municipal instalado em Nottingham, na Inglaterra. No
temperaturas de aproximadamente 800 °C ou
século XX, a incineração se disseminou por diversos países. tão onde, a

30
DESENVOLVIMENTO URBANO E GES T O DE REsidUos sóLIDOS
CADEIA DE RECICLAGEM: UM OLHAR PARA Os CATADORES

mais, boa parte dos resíduos sólidos se transforma em gases. resíduos sólidos que prioriza o reaproveitamento da energia

Dependendo da eficiência do processo, a massa dos resíduos presente nos resíduos antes de dispò-los em aterros.
Ainda que o emprego dessas tecnologias tenha represen-
pode ser reduzida em 70% e seu volume em 90% (D'Almeida
tado grande avanço em relação às formas anteriores de
&Vilhena, 2000). um

destinação de resíduos, inicia-se, na década de 1980, uma


Isso significa que o uso da incineração não pode prescindir
de um local para a disposição final, assim como nos aterros série de criticas emprego exclusivo de aterros sanitários e
ao

sanitários. Componentes inorgånicos presentes nos resídu- de incineradores. Além do potencial de gerar impacto socio-

os domésticos, como metais, no podem ser completamente ambiental, como a contaminação do soloe do ar, as críticas
estão igualmente relacionadas ao fato de que esses métodos
destruídos pelo processo de incineração, transformando-se
em cinza depositada na base da câmara de combustão. Esse em nada contribuiam para que houvesse uma redução efetiva
material precisa então ser inertizado, ou seja, ter seu potencial de resíduos sólidos antes de sua disposição final. A ênfase nos
métodos tradicionais para disposição de residuos ignora a im-
tóxico diminuído, devendo depois ser enviado para disposi-
portância da adoção, por parte das empresas e dos cidadãos,
ção final no solo.
de práticas e de comportamentos que permitam dinminuir a
Mesmo considerando-se que a incineração não elimina a
geração dos resíduos que necessitam ser encaminhados para
disposição final por completo, suas vantagens são, evidentes.
Ao conseguir desviar cerca de 90% do volume de residuos algum tipo de tratamento. A inovação em processos produ-
tivos nas empresas, por exemplo, pode transformar resíduos
sólidos dos aterros sanitários, a vida útil destes se expande
gerados novamente em matéria-prima. Já um consumidor
significativamente, retardando a necessidade de construção
consciente pode produzir menos resíduos ao comprar produ-
de novas unidades. Além disso, o local ocupado pelos incine-
tos que utilizem menos embalagens ou ao recusar sacolas de
radores não apresenta uma predeterminada, como
vida útil
plástico em suas compras.
os aterros sanitários. Com melhorias tecnológicas
em seus
Nesse contexto, as crítiças aos métodos tradicionais de
indefinida-
equipamentos, os incineradores podem operar gestão de resíduos sólidos associadas à percepção do agrava-
mente no mesmo local. Ademais, ao se decidir encerrar suas
mento dos problemas ambientais relacionados ao lixo e à mo-
operações, o simples do que o de todas
processo é muito mais bilização crescente dos diversos atores envolvidos na questão
as atividades de monitoramento envolvidas
no encerramento
ambiental resultaram em mudanças importantes, que, por
de atividade dos aterros sanitários. Por fim, os incineradores sua vez, levaram ao estabelecimento de novas prioridades
já vêm sendo utilizados há muito tempo como fonte energéti- para o tratamento de resíduos.
de
ca, em acordo com as novas prioridades de gerenciamento

32
CADEIA DE RECICLAGEM: UM OLHAR PARA Os CATADORES

DESENvOLVIMENTO UR BANO E GESTÃO DE RESíDUOS SOLIDOS

Do lixo aos residuos sQlidos: as novas


prioridades
Os novos objetivos da política ambiental e, consequente-
As prioridades destacam que, mais do que dimi-
novas
mente, o estabelecimento de novas prioridades da gestão de
nuir a produção de determinados produtos, é prioritário
que resíduos sólidos em nível internacional implicam uma mu-
eles nem sejam produzidos. Em vez de reciclar
deternminados dança radical nos processos de coleta e disposição de resídu-
insumos, é prioritário que eles sejam reutilizados. Antes de os. Em contraposiço aos antigos sistemas de tratamento de
depositar os produtos em aterros sanitários, é necessário reu resíduos sólidos, que tinham como prioridade sua disposição,
tilizar energia presente
a nos resíduos por meio de incinera- os atuais sistemas devem ter como prioridade um ciclo de
dores. Por fim, aquilo que pode ser reaproveitado deve
não manejamento e gerenciamento ecológico, isto é, a montagem
ser tratado e disposto de forma adequada, de um sistem circular no qual a quantidade de resíduos a
minimizando-se
os impactos socioambientai_. A figura 1 serem reaproveitados dentro do sistema produtivo seja cada
representa essa nova
vez maior e a quantidade a ser disposta, menor (Vogel, 1993).
hierarquia na gestão de resíduos sólidos.
Assim, o principal objetivo passa a ser a redução do vo-
lume de resíduos já no início do processo produtivo, conti-
nuando nas demais etapas da cadeia produtiva. Além disso,
produtos com difculdade de reciclagem precisam ser devol-
vidos aos fabricantes, que devem ser responsáveis por seu tra-
Evitar ou diminuir tamento e disposição.
Esse modelo exige uma série de mudanças no comporta-
mento dos diversos atores envolvidos em todas as etapas do
Reutilizar
processo, muitas ainda bastante dificeis de serem alcançadas,
pois prioridades como evitar e reduzir a produção de resídu-
Reciclar os na própria fonte geradora exigem mudanças significativas
já no processo produtivo.
Gerar energa O êxito desse processo depende,
portanto, de medidas que
atuem desde a fase do
design do produto. Os novos produtos
Inertizar e devem priorizar
dispor a
utilização de materiais que possam ser rea-
adequadarmente proveitados ou, quando isso não for possível, reciclados. Alem
FIGURA 1. HIERARQUIA NA GESTÃO DE RESÍDUOS SÕLIDOS disso, os produtos devem ter uma vida longa e apresentar fa-
cilidade para serviços de reparaço (Vogel, 1993).
Fonte: adaptada pelos autores a partir de Vogel (1993)

34
CADEIA DE RECICLAGEM: UM oLHAR PARA Os CATADORES
RESÍDUOS SOLIDOS
DESENVOLVIMENTO URBANO E GESTÃ0 DE

Uma segunda mudança refere-se às alterações no modelo


80
de produção. O processo deve ser realizado de tal forma que
se utilize menor quantidade de energia e de matérias-primas, 60

além de se produzirem menos resíduos. Estratégias de ecoefi


40
cência, baseadas no emprego de tecnologias limpas, assumem
20
um papel fundamental para o alcance desses objetivos no sis-
tema produtivo.
O setor de também representa parte importante
consumo
Dinamarca Suecia Noruega
japao
Bélgica
. França
desse processo. Modificações dos hábitos de consumo, como
priorizar a compra de produtos que utilizem menos emba-
lagens ou produtos que possam ser reciclados, constituem GRAFICO 1. PORCENTAGEM DE RESÍDuos ENVIADOS PARA INCINERADORES
EM PAISES SELECIONADOS
exemplos disso. Fonte: elaborado pelos autores a partir da Abrelpe (2011).
Apesar da evolução das prioridades, os aterros sanitários e
incineradores continuam a ser a principal forma de destina-
ção da maior parte dos resíduos coletados em vários países.
Os gráficos 1 e 2 mostram alguns países e suas principais for-
mas de destinação de resíduos. 100

Já é possível observar, em alguns países, mudanças signi- 80

ficativas a fim de se adequarem seus programas de gestão às


60

novas de
prioridades. plano gerenciamento
O de resíduos de
40
Tóquio, no Japão, trabalha com uma meta de zerar a quan-
20
tidade de resíduos enviada para aterros. Em 1994, a cidade
destinou 1,7 milhão de toneladas de resíduos para aterros,
Turquia China
enquanto, em 2009, apenas 355 mil toneladas tiveram
esse Austrália Reino
Unido Estados Espanha
destino (Takiya, 2011). Mais significativo ainda é o fato de o
total de resíduos gerados na cidade ter diminuído ao longo
GRÁFICO 2. PORCENTAGEM DE RES*DUOS ENVIADOS PARA ATERROS EM
do tempo. Em 2009, foram gerados 4,7 milhões de tonela- PAISES SELECIONADOS

das, contra 5,8 milhðes em 1994. Também a cidade de São Fonte: elaborado pelos autores a partir da Abrelpe (2011).

36
RECICLAGEM: UM OLHAR PA RA OS CATADORES
CADEIA DE

DESENVOLVIMENTO uRBANO E GESTÃO DE REsíDUOs sóLIDOS

Francisco, no estado da Califórnia, nos Estados Unidos, 1 emissão de metano em créditos de carbono. Em 2007, foi re
como meta zerar a quantidade de resíduos enviados para
alizado o primeiro leilão de carbono no Brasil, quando fo-
aterros e incineradores até 2020. Para tanto, gestores públicos
ram vendidos cerca de 800 mil créditos, que geraram cerca de
tomaram várias medidas, como exigir de supermercados a tonelada
e 12 milhões. Cada crédito é equivalente a uma

utilização de sacolas de plástico compostável e a cobrança de- de gás no lançada na atmosfera, sendo o preço obtido pela
las. Foi expandida a compostagem de matéria orgànica para a da
prefeitura de ¬ 16,20 por crédito. Segundo informações
produção de adubo, e a coleta seletiva abrange toda a cidade prefeitura, projetava-se para até 2012 a geração
de 8 milhões

(Nutter, 2011). de créditos de carbono, que, vendidos, poderão ser investi-


Progressos também têm sido feitos em vários países para de projetos no
dos construção de praças e parques, além
na

estimular a redução de geração de resíduos já no setor produ Programa de Urbanização de Favelas (Delbin, 2011).
tivo. A legislação obriga um número cada vez maior de em- Por fim, o resultado mais visível e difundido na maioria
até o momento consiste na grande expansão da ati-
presas a se responsabilizar pela destinação correta de resíduos dos países
vidade da coleta seletiva e da reciclagem observadas nos paí-
pós-consumo, como os setores de eletroeletrônicos, pneus,
ses desenvolvidos e em desenvolvimento.
pilhas e baterias, automóveise agrotóxicos. Isso tem estimu
lado muitas empresas a utilizar cada vez mais componentes
45
recicláveis em seus produtos. 40
35
número crescente de aterros sa-
Ressalta-se igualmente o 30
diretamente
nitários que captam o metano, antes despejado 25
20
na atmosfera ou queimado, contribuindo para o aquecimen- 15
10
toglobal. Diversos aterros pelo mundo estão utilizando o me-

tano como combustível para gerar energia elétrica.

exemplos mais conhecidos no Brasil é o Aterro


Um dos
Bandeirantes,
localizado na Região Metropolitana de São Paulo. Tendo ope-
re-
ill
rado por 27 anos, até ser desativado em 2007, o aterro
cebeu cerca de 40 milhões de toneladas de resíduos.
Desde
PARA
GRAFICO 3. PORCENTAGEM DE RESiduos ENCAMINHADOS
elétrica.
2004, o gás metano é aproveitado para gerar energia A RECICLAGEM EM PAISES SELECIONADOS

Além desse benefícioe da redução do impacto ambiental, a Fonte: elaborado pelos autores a partir de Eurostat News Release (2013).

Prefeitura de São Paulo conseguiu transformar a redução da

38
CADEIA DK REC1CLAGEM: UM O1.HAR PARA OS CAT'ADORES
sLID9S
DESENV9L.VIMENTO URBA NOE GESTÁD DE PESÍo tyos

Os dados mostram quc, excluindo-se a Alemanha, que já


o processo se amplie como forma de diminuir os
preciso que
destina 45% de resíduos para a reciclagem, países desen-
seus
impactos socioambientais dos resíduos gerados.
volvidos como Irlanda, Bélgica, Suécia, Holanda e Dinamarca,

conseguem redirecionar para a atividade de reciclagem pouco


interesse econômico, social e ambiental
mais de 306 do total coletado,ou seja, mesmo como aumen- Reciclagem:
to da reciclagem no mundo, grande quantidade de resíduos
da história, podemos encontrar diversas razões
Ao longo
ainda é encaminhada para as formas tradicionais de desti-
que explicam a expansão dessa atividade. E necessário, po-
países mais avançados. Nesse contexto, é
nação, mesmo rém, antes de avançar na discussão, entender exatamente o
nos

uma atividade funda-


importante ressaltar que, apesar de ser
que significam as atividades de coleta seletiva reciclagem,
e

mental do ponto de vista socioambiental, ela não pode ser um Cornieri & Fracalanza (2010), muitas
pois, como explicam
objetivo final quando se pensa em sustentabilidade. Uma das vezes esses termos são utilizados incorretamente como si-
críticas da ènfase à reciclagem é que ela não obriga produtores nonimos. A coleta seletiva é a atividade de recolhimento de
e consumidores a mudanças radicais em seu comportamento, materiais previamente separados nas fontes geradoras (do-
pois quantidades crescentes de resíduos continuam a ser ge- micílios, empresas e comércio). Materiais como papel, plás-
radas: depois, elas devero ser coletadas e reutilizadas. Além tico e vidro são, ainda nessa fase, separados por cores e tipos,

disso, a própria atividade de reciclagem consome recursos prensadose enfardados, sendo posteriormentevendidos para
naturais, gerando também algum tipo de impacto ambiental. asempresas recicladoras. A reciclagem, por sua vez, implica a
Há que se considerar, fora isso, os argumentos de Grimberg efetiva transformação dos residuos sólidos, que envolve alte
& Blauth (apud Gonçalves-Dias, 2009), que questionamse rações fisicas e fisico-químicas, convertendo-os em matéria-
haveria uma capacidade efetiva de reciclagem, caso todos os -prima para a fabricação de novos insumos ou produtos.
materiais disponíveis para essa atividade fossem coletados. As atividades de coleta e reciclagem já fazem parte da rea-
Assim, não se pode focar exclusivamente na coleta seletiva lidade dos grandes centros urbanos há muito tempo. Baeder
em detrimento de políticas mais amplas que reduzam efeti- (2009) afirma que, desde o inicio do século XX, háregistros
de coleta informal na cidade de São Paulo. Tratava-se, contu-
vamente a geração de resíduos nas esferas de produção e con-
do, de iniciativas isoladas, sem grande significado econômico,
sumo. Essa ressalva, no entanto, não
diminui a importância muito diferente do que ocorre nos dias atuais, em que a ati-
do incentivo a programas de coleta seletiva para a reciclagem
vidade se caracteriza pela presença de múltiplos atores que
como uma das prioridades das políticas públicas. E, mesmo
trabalham com a reciclagem nos grandes centros urbanos.
já sendo uma atividade em crescimento em diversos países, é
41
40
RECICLAGEM: UM OLHAR PARA OS CATADORES
CADIA DF
DESENVOLVIMENTO URBANO E G STÃO DE RESíDUOS SÖLI DOS

Um dos principais fatores que explicam essa mudança foi a


requalificação do lixo produzido nos sistemas de produção
e consumo. Os materiais presentes no lixo deixaram de ser Ver Mnngen

materiais inúteis, conforme as dehnições apresentadas, para


assumirum outro significado. Especialistas substituíram
termo "lixo" por "resíduos sólidos. Não se trata de uma mu-
dança meramente retórica, mas sim de uma
estratégia para
que os resíduos sólidos gerados nos processos de produção Lngpamerts
e consumo sejam qualificados de forma correta. Os resíduos
emCre
sólidos não são um mero súbproduto do sistema produtivo,
sem utilidade, e sim um insumo, uma vez que possuem valor FIGURA 2. FLUXO DA CADEIA DE PRODuÇÃO DO ALUMÍNIO PRIMÁRIO
econômico agregado, ou seja, trata-se de um bem com valor Fonte: Abal, 2012.

económico e, dessa forma, ele pode e deve ser reintegrado ao


sistema produtivo, gerando, em alguns casos, ganhos socio- das latas de alumínio apresenta inúmeras vantagens do ponto
ambientaise econômicos. de vista econômico para as empresas do setor. Um estudo do
Embora não seja o único exemplo, nada mais representati- Instituto de Pesquisa Economica Aplicada (Ipea, 2010) esti-
vo nessa nova fase do que o interesse das empresas produtoras mou em R$ 6,1 mil o custo para produzir uma tonelada de
de latas de alumínio apoiare estimular coleta alumínio a partir de matéria-prima virgem, enquanto a pro-
em
pós- sua

-Consumo, para que esse insumo volte ao processo produtivo dução da mesma quantidade a partir da reciclagem sai por
por meio de sua recicagem. Para as empresas, o grande moti- R$ 3,4 mil. O mesmo estudo revela que, se fossem considera-

vador de dos todos os beneficios econômicos e ambientais da atividade


seu interesse é a
possibilidade de ganho econômico
com a atividade. Para a fabricação de uma tonelada de alumi- de reciclagem, com o reaproveitamento da totalidade dos re-
síduos recicláveis que são hoje enviados
nio, primeiro é necessário extrair cerca de cinco toneladas de para aterros e lixões,
os beneficios
bauxita, passando-se por diversas fases, conforme ilustrado chegariam a R$ 8 bilhões., Para chegar a esse
na figura 2. número,o lpea considerou quanto a atividade de reciclagem
contribui para o menor consumo de recursos naturais e de
custo envolvido nesse processo é extremamente alto em
energia em relação ao processo tradicional. Em relação aos im-
razao das características da produção, como o elevado con-
pactos ambientais, foi considerada
Sumo de
a
redução de danos devido
energia elétrica. Nesse contexto, o reaproveitamento
42
CADEIA DE RECICLAGEM: UM OLHAR PARA OS CATADORES DESENVOLvIMENTO, URBANO E GESTÃO DE REsiDUOs sóLIDOS

à diminuição do energia, da geração de gases de


consumo de fim, a expansão da reciclagem também está ligada à
Por
de biodiversida- dos habitan-
efeito estufa, do consumo de água e da perda crescente valorização dessa atividade por parte
de custos as- tes de grandes centros urbanos. Uma parcela importante
dos
de. A tabela 2 mostra estimativas para a redução
sociados à reciclagem para quatro dos materiais pesquisados. resíduos sólidos gerados, diferentemente dos resíduos liqui
Outro fator que tem estimulado programas de reciclagem dos e encontra-se diretamente nas residências dos
gasosos,
é a percepção dos gastos desnecessários feitos pelo poder pú- centros urbanos, o que possibilita uma contribuição imediata
minimizar os efeitos negati-
blico com as alternativas tradicionais de destinação, como por parte dos habitantes para
aterros sanitários e incineradores. As áreas disponíveis para vos de sua ação sobre o meio
ambiente. Ao se engajarem emn

iniciativas de coleta seletiva, separando materiais recicláveis


e escassas nos centros
a construção são cada vez mais caras contribuir
urbanos, tornando a atividade de transporte cada vez mais para posterior reciclagem, os moradores podem
dos resíduos gera-
dessa reali- para a redução dos impactos ambientais
dispendiosa e ineficiente. Um bom exemplo consciência ambien-
dade é a cidade de Nova York, que gasta aproximadamente dos. Assim, numa época de aumento da
entender apoio crescente das comunidades
US$ 1 bilhão por ano com as atividades de coleta e transporte
tal, é possível o

resíduos que
de diversos programas de gestão de
países aos
de resíduos, sendo que só no transporte säo gastos US$ 300
milhões. Para os próximos anos, esse custo deverá crescer sig- estimulam sua recuperação em vez de sua mera disposição.
desse cenário.
alguns dos que recebem esses
aterros OBrasil é hoje um dos grandes exemplos
nificativamente, já que as diversas contradi-
Na verdade, os resíduos sólidos refletem
resíduos se localizama cerca de mil quilómetros da cidade mundial e
a sétima maior economia
ções do país que hoje é
(Nova York, 2011). socioambientais. Por um lado, o país
possui imensos desafios
lixões
destina umaparcela significativa de seus resíduos para
TABELA 2. COMPARAÇÃO DE CUSTOS DE PRODUÇ PRIM EA PARTIR DA
ou vazadouros a céu
aberto. Dados da Pesquisa Nacional de
RECICLAGEM
Saneamento Básico, realizada pelo
IBGE (2010) em 2008,
Custos de produção Custos de Beneficiosliquidos 5.565 municípios brasileiros ainda
Materiais
produção a partir da reciclagem
mostram que 50,8% dos
primáia (R$/t)
os dados m o s -
da reciclagem (R$/t) destinam seus resíduos para lixões. Ainda que
(R$/t) ao ano 2000, quando
72,3%
trem uma evolução em relação
552 425 127
AçO faziam isso, essasinformações sinalizam os
Alumínio 162 3.477 2.715
dos municípios
Por outro
enormes desafios a serem superados (IBGE, 2002).
Plåstico 1.790 626 1..164
nos últimos
Brasil foi ampliando significativamente,
Vidro 263 143 120 lado, o

Fonte: Ipea, 2010.

44
CADEIA DE RECiCLAGEM: UM OLHAR PARA os CATADORES

anos, a quantidade de coleta de materiais recicláveis. Segundo


Besen (2011), entre os anos de 1999 e 2008, o índice de reci-
clagem cresceu de 4% para 13%, sendo que, ao se conside-
rar apenas a fração seca, ou seja, papel, papelão, vidro, latas e
plásticos, esse valor sobe para 25%. Assim, o Brasil vem con-
seguindo atingir índices de recuperação de material muitas
vezes maiores do que os de países desenvolvidos. Diversas ra-
zões explicam esses resultados, como o apoio de prefeituras a
programas de reciclagem, o aumento do número de empre-
sas privadas interessadas em investir na atividade no país e
o apoio crescente da população às iniciativas de reciclagem,
tópicos que serão aprofundados no próximo capítulo. No
entanto, este traballho salienta que o sucesso da cadeia de re-
ciclagem no país vem sendo viabilizado por um grande con-
tingente de trabalhadores pouço valorizados e reconhecidos.
Separando material reciclável em lixões, puxando suas carro-
ças pelos centros urbanos ou trabalhando em cooperativas
eles integram a cadeia de reciclagem no São país. responsáveis
pela maior parte do material que circula pela cadeia produti-
va e, ao mesmo
tempo, são os que recebem a menor parcela
do valor gerado na atividade. Assim, a
expansão da atividade
de coleta e reciclagem se beneficia dessa
situação de explora-
ção e desigualdade, sendo necessário nos aproximarmos dela
para melhor entender essa realidade.

A6

Você também pode gostar