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A ESC R EV I V ÊN C IA N A E SC R ITA

A C A D ÊM I C A : O D ESC O LO N IZA R D E U M
P EN S A R E FA ZER C R ÍTIC O

Profª. Ms. Ângela Márcia dos Santos Façanha


O que vocês entendem por Escrevivência?

Qual o lugar das suas vivências dentro da Universidade?

Suas produções acadêmicas se relacionam com seu eu sujeita(o) negra(o) na


sociedade?
O QUE É A ESCREVIVÊNCIA? ORIGEM E
SIGNIFICADO:

“A imagem fundante do termo é a figura da mãe


preta, aquela que vivia a sua condição de
escravizada dentro da casa-grande. Essa mulher
tinha como trabalho escravo a função forçada de
cuidar da prole da família colonizadora. Era a
mãe de leite, a que preparava os alimentos, a que
conversava com os bebês e ensinava as primeiras
palavras, tudo fazia parte de sua condição de
escravizada. E havia o momento em que esse
corpo escravizado, cerceado em suas vontades,
em sua liberdade de calar, silenciar ou gritar,
devia estar em estado de obediência para cumprir
mais uma tarefa, a de ‘contar histórias de
adormecer os da casa-grande’.” (EVARISTO,
2020a, p. 29-30).
ESCREVIVÊNCIA – RESGATE DE UMA VOZ
ANCESTRAL

A Escrevivência, em sua concepção inicial, se realiza


como um ato de escrita das mulheres negras, como uma
ação que busca borrar, desfazer uma imagem do
passado, em que o corpo-voz de mulheres negras
escravizadas tinha sua potência de emissão também sob
o controle dos escravocratas, homens, mulheres e até
crianças (EVARISTO, 2020a, p. 30).
Escrevivência – resgate da potencialidade discursiva, da voz de mulheres negras
silenciadas;

Silenciamentos diversos: Na Academia; nas ruas e vielas que nos corpos estão
inseridos;

Resgate mediante um ato inscrever essas vozes no meio social.


Vozes-Mulheres A minha voz ainda ecoa versos
perplexos com rimas de sangue
A voz de minha bisavó ecoou E
criança nos porões do navio. fome.
Ecoou lamentos de uma
infância perdida. A voz de minha filha recolhe
todas as nossas vozes recolhe em
A voz de minha avó ecoou si as vozes mudas caladas
obediência aos brancos-donos engasgadas nas gargantas.
de tudo.
A voz de minha filha recolhe em
A voz de minha mãe ecoou si a fala e o ato.
baixinho revolta no fundo das O ontem – o hoje – o agora. Na
cozinhas alheias debaixo das voz de minha filha se fará ouvir a
trouxas roupagens sujas dos ressonância O eco da vida-
brancos pelo caminho liberdade.
empoeirado rumo à favela (EVARISTO, 2017, p. 14).
ESCREVIVÊNCIA – FAZER ESTÉTICO E ÉTICO

• Resgate de vozes do passado – inscrição de uma voz do presente – experiência;


vivência e oralidade;

A minha linguagem
• Por que estético e ético? literária é fruto da minha
subjetividade, que é
formada na vivência, na
experiência de várias
condições (EVARISTO,
2020a, p. 36).
ESCREVIVÊNCIA: ATRAVESSAMENTOS DE
VOZES X ESCRITA DE SI

A Escrevivência extrapola os campos de uma escrita que gira em


torno do sujeito individualizado. Creio mesmo que o lugar
nascedouro da Escrevivência já demande outra leitura.
Escrevivência surge de uma prática literária cuja a autoria é
negra, feminina e pobre. Em que o agente, o sujeito da ação
assume o seu fazer, o seu pensamento, a sua reflexão, não
somente como um exercício isolado, mas atravessado por um
grupo, por uma coletividade. (EVARISTO, 2020a, p. 38).
EM RESUMO A ESCREVIVÊNCIA...

É um fazer estético, ético, analítico e


crítico pensado por Conceição Evaristo
em torno de sua produção literária que
tem sua gênese nas suas vivências e
experiências e na relação com os
corpos-voz de outras mulheres.
A (ESCRE)VIVÊNCIA NA UNIVERSIDADE

• Fazer estético e ético – atravessamentos de vozes; vivências e experiências;

• Fazer crítico, discursivo e epistemológico – ato de resistência ao


silenciamento;

• Nossas vivências e subjetividades no meio acadêmico e na constituição do ser


pesquisadora.
Questão 1 Como você compreende o local destinado as suas vivências e experiências, assim
como de outras mulheres negras, no meio acadêmico?

Questão 2 Como você entende o processo de se constituir pesquisadora em um espaço


acadêmico que historicamente se constitui em meio as bases eurocêntricas da
pesquisa?  

Questão 3 Ao longo do tornar-se pesquisadora o local enunciador ético-vivenciado de sujeita,


mulher, negra, que se constitui também na relação com as outras sujeitas negras,
contribuiu para sua constituição de sujeita pesquisadora? Por quê?

Questão 4 Como a linguagem, enquanto forma de empoderamento e instrumento social de


emancipação política, constituída mediante sua ética de mulher negra na sociedade
brasileira, contribuiu para o processo de sua constituição enquanto sujeita
pesquisadora no espaço da academia?
• Ser mulher negra na sociedade +

• Ser pesquisadora mulher negra na Universidade +

• O lugar de nossas vivências e experiências no espaço acadêmico.


Em linhas gerais as vivências não são muito bem aceitas pela Universidade. Mas há setores,
principalmente na contemporaneidade, que procuram dialogar com essas vivências, alguns
professores mais dotados com uma práxis é... libertadora acabam dando mais vasão as
experiências, é, principalmente a partir dos anos dois mil há uma abertura maior dos espaços
acadêmicos às espeficidades e subjetividades, uma educação mais vinculada às experiências das
pessoas. Mas essa abertura ela é muito direcionada, e ela tem sim cor e ela tem sim uma pauta
especifica, então, eu observo muito que nesse meio acadêmico as mulheres e homens brancos,
eles recebem muito mais destaques em relação ao que eles falam sobre si e quando a pessoa negra
dialoga sobre suas concepções de mundo ou o que aconteceu com ela que talvez possa servir de
forma pedagógica no contexto de sala de aula, ela recebe pouquíssima atenção, isso quando ela
consegue falar, a maioria não consegue, mas quando ela se impõe e fala, é, a sua vivência é
completamente descartada. Então, no cotidiano, no mestrado, eu observo muito isso,
enquanto a branquitude recebe passe livre para falar qualquer absurdo, é... a pessoa negra
por mais construtos que ela tenha, por mais que as vivências sejam, inclusive, embasadas
em dados e estatísticas ainda, assim, não há uma devida atenção. Há um cerceamento dessas
produções . (ESTUDANTE – 1, transcrição nossa) 
Silenciamento = Cerceamento de nossa voz, de nossas produções;

Cerceamento que ganha diferentes formas e espaços dentro da universidade.


Constituir discursivo – locus ético-vivenciado

[...] Vou parafrasear Paulo Freire aqui, eu me movo, e vou


fazer uma modificação, eu me movo como pesquisadora
porque eu me movo como gente, então, eu não sou uma
pesquisadora na academia, eu sou primeiro uma pessoa, e
enquanto pessoa, eu tenho uma série de questões, uma série
de atravessamentos, uma série de percepções, subjetividades
e especificidades que são intrínsecas e eu carrego dentro
desses espaços. E esses espaços, como eu falei no primeiro
áudio, não estão preparados para o que eu tenho a carregar.
Logo, eu, enquanto pessoa primeiro, pessoa negra, e depois
pesquisadora, sinto que esse espaço ainda está muito longe,
anos luz, de estar adaptado a uma educação das relações
étnicos-raciais na perspectiva da teoria emancipadora da
educação. (ESTUDANTE – 1, transcrição nossa).
O SER PESQUISADOR ESCREVIVENTE: ESPAÇOS DE
PESQUISA

Espaços de construção de conhecimentos

Redes sociais
(Grupos de Sala de aula Reuniões de amigos.
WhatsApp;
Facebook; Telegram;
Stagram; Twitter).

Eventos: culturais; Conversas de rua –


palestras; congressos; com os mais velhos.
minicursos, etc.
O SER PESQUISADOR ESCREVIVENTE: A FORMA DE NOS
RELACIONARMOS COM OS CORPORA DE PESQUISA

Sujeita(o) Social
(as vivências;
experiências e os
Corpora de estudos Ser pesquisador atravessamentos
éticos que
constituem sua
corporeidade.
O SER PESQUISADOR ESCREVIVENTE: OS RECURSOS
TEÓRICOS E CRÍTICOS PARA ANÁLISE DOS OBJETOS
DE ESTUDOS E CONSTITUIÇÃO DESSES OBJETOS

Portais e sites de
divulgação de
Entrevistas/Roda
produção cientifica
de conversa e cultural da
população negra

Pesquisador
Escrevivente Filmes/
Peças teatrais
Documentários
A pesquisa Autores
negros

Livros; ensaios;
Eventos e
artigos;
manifestações
dissertações; Dialogo com
culturais;
teses. outras áreas
Fazer pesquisador escrevivente – político

“Não é fácil dar nome à nossa dor, teorizar a partir desse lugar” (hooks, 2013, p.
103).
REFERÊNCIAS
EVARISTO, Conceição. A escrevivência e seus subtextos. IN. DUARTE, Constância Lima; NUNES, Isabela Rosado.
Escrevivência: a escrita do nós: reflexões sobre a obra de Conceição Evaristo. Rio de Janeiro: Mina Comunicação e Arte, 2020b.
p. 26-48.
EVARISTO, Conceição. Da grafia-desenho de minha mãe, um dos lugares de nascimento de minha escrita. IN. DUARTE,
Constância Lima; NUNES, Isabela Rosado (orgs.). Escrevivência: a escrita do nós: reflexões sobre a obra de Conceição Evaristo.
Rio de Janeiro: Mina Comunicação e Arte, 2020a. p. 48-58.
EVARISTO, Conceição. Gênero e etnia: uma escre(vivência) de dupla face. IN. MOREIRA, Nadilza Martins de Barros;
SCHNEIDER, Liane (Orgs.). Mulheres no mundo. Etnia, marginalidade e diáspora. João Pessoa. Editora Universitária; Ideia,
2005.
EVARISTO, Conceição. Vozes-mulheres. In: Poemas de recordações e outros movimentos. Rio de Janeiro: Malê, 2017. p. 14.
HOOKS, bell. A teoria como prática libertadora. IN. HOOKS, bell. Ensinando a transgredir: a educação como prática da
liberdade. Tradução de Marcelo Brandão Cipolla. São Paulo: Editora WMF Martins Fontes, 2013. p. 83-104.
HOOKS, bell. Pedagogia engajada. IN. HOOKS, bell. Ensinando a transgredir: a educação como prática da liberdade. Tradução
de Marcelo Brandão Cipolla. São Paulo: Editora WMF Martins Fontes, 2013. p. 25-36.
LORDE, Audre. A transformação do silêncio em linguagem e ação. IN. LORDE, Audre. Irmã outsider. Tradução: Stephanie
Borges. 1.ed. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2019. p. 57-66.
SOUZA, Lívia Maria Natália. Intelectuais escreviventes: enegrecendo os estudos literários. IN. DUARTE, Constância Lima;
NUNES, Isabela Rosado (orgs.). Escrevivência: a escrita do nós: reflexões sobre a obra de Conceição Evaristo. Rio de Janeiro:
Mina Comunicação e Arte, 2020. p. 206-225.
 

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