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Capítulos 1 ao 9

CARREIRA JURÍDICA

Direito Internacional
Capítulo 1
Olá, aluno!

Bem-vindo ao estudo para os concursos de Carreiras Jurídicas. Preparamos todo esse


material para você não só com muito carinho, mas também com muita métrica e
especificidade, garantindo que você terá em mãos um conteúdo direcionado e distribuído de
forma inteligente.

Para isso, estamos constantemente analisando o histórico de provas anteriores com fins
de entender como cada Banca e cada Carreira costuma cobrar os assuntos do edital. Afinal,
queremos que sua atenção esteja focada nos assuntos que lhe trarão maior aproveitamento,
pois o tempo é escasso e o cronograma é extenso. Conte conosco para otimizar seu estudo
sempre!

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estrutura do PDF Ad Verum foi feita em capítulos, de modo que você possa consultar
especificamente os assuntos que estiver estudando no dia ou na semana. Ao final de cada
capítulo você tem a oportunidade de revisar, praticar, identificar erros e aprofundar o assunto
com a leitura de jurisprudência selecionada.

E mesmo você gostando muito de tudo isso, acreditamos que o PDF sempre pode ser
aperfeiçoado! Portanto pedimos gentilmente que, caso tenha quaisquer sugestões ou
comentários, entre em contato através do email pdf@cers.com.br. Sua opinião vale ouro para
a gente!

Racionalizar a preparação dos nossos alunos é mais que um objetivo para Ad Verum,
trata-se de uma obsessão. Sem mais delongas, partiremos agora para o estudo da disciplina.

Faça bom uso do seu PDF Ad Verum!

Bons estudos 

1
Abordaremos os assuntos da disciplina de Direito Internacional da seguinte forma:

CAPÍTULOS

Capítulo 1 – Introdução ao Direito Internacional Público

Capítulo 2 – Fontes do Direito Internacional Público

Capítulo 3 – Direito dos Tratados

Capítulo 4 – Sujeitos do Direito Internacional Público

Capítulo 5 – Nacionalidade e condição jurídica do estrangeiro

Capítulo 6 – Responsabilidade internacional e solução pacífica de controvérsias

Capítulo 7 – Domínio público internacional

Capítulo 8 – Introdução ao Direito Internacional Privado e aplicação da lei no espaço

Capítulo 9 – Direito Processual Internacional

Capítulo 10 – Outros ramos do Direito Internacional

2
SUMÁRIO
DIREITO INTERNACIONAL, Capítulo 1 .......................................................................................... 4

1. Introdução ao Direito Internacional Público ....................................................................... 4

1.1. A sociedade internacional ......................................................................................................................... 4

1.2. Conceito de Direito Internacional Público ......................................................................................... 8

1.3. Fundamentos do Direito Internacional Público ............................................................................... 9

1.4. Objetos do Direito Internacional Público ........................................................................................ 10

1.5. Direito Internacional Público e direito interno ............................................................................. 11

QUADRO SINÓTICO ......................................................................................................................... 15

QUESTÕES COMENTADAS ............................................................................................................. 17

GABARITO .......................................................................................................................................... 26

LEGISLAÇÃO COMPILADA .............................................................................................................. 27

JURISPRUDÊNCIA ............................................................................................................................... 28

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ........................................................................................................ 30

3
DIREITO INTERNACIONAL

Capítulo 1

1. Introdução ao Direito Internacional Público

1.1. A sociedade internacional

O Direito Internacional é constituído pelas normas jurídicas internacionais, sendo os


costumes e princípios importantes para a concretização de acordos, tratados, convenções,
emendas e protocolos. As normas jurídicas subdividem-se dois tipos: público e privado.

A sociedade internacional é atualmente formada pelos atores de Direito Público


Internacional, bem como pelos vínculos que os unem. Sua dinâmica é pautada por diversos
fatores, associados, por exemplo, à política, economia, cultura e os gerais interesses humanos.
Ela é integrada, principalmente, pelos seguintes sujeitos: Estados, organizações internacionais
intergovernamentais e os próprios indivíduos, porém, não se restringe a eles. O termo
“sociedade” pressupõe a existência de vontade de seus integrantes em associar-se para atingir
fins comuns, qual seja, o bem maior da humanidade.

O conceito de sujeitos é mais restrito que o de atores, que engloba também outras
entidades. Porém, eles serão usados como sinônimos neste material.

4
O Direito Internacional Público disciplina e rege a atuação e a conduta da sociedade
internacional, visando alcançar as metas comuns da humanidade, consubstanciando-se em um
conjunto de princípios e regras jurídicas que disciplinam as relações jurídicas internacionais.

Isso porque nenhum Estado é autossuficiente; as relações internacionais são necessárias


para que se possa atingir os objetivos comuns da humanidade. Este ramo do direito é
responsável por criar uma nova concepção de soberania, não mais algo absoluto, mas sujeito
a limites juridicamente estabelecidos.

Suportabilidade: a relação que os Estados devem ter entre si, sem uso da força, sendo
regulada pelo Direito Internacional e suas regras.

No entanto, destaca-se que os Estados ainda são soberanos, tendo várias competências
exclusivas no âmbito do território sob sua jurisdição. No plano internacional, isso pode ser
demonstrado através do exercício da vontade de cada nação, por exemplo, em celebrar ou
não tratados, bem como em aceitar submeter-se à jurisdição de órgãos internacionais para
resolver controvérsias, dentre outros.

Alguns dos temas que esta disciplina trata são: as relações internacionais entre Estados
e órgãos, os tratados internacionais, a questão da nacionalidade, a Lei de Migração brasileira,
as organizações internacionais, dentre outros.

A ordem jurídica da sociedade internacional é formada por preceitos voltados a


regular seus membros e também o tratamento de temas de interesse global. Comparando-a a
ordem jurídica interna, a internacional possui algumas características específicas, apesar de
ambas serem obrigatórias e, muitas vezes, preverem a possibilidade de sanções no caso de
seu descumprimento. A sociedade internacional é, portanto:

 Descentralizada: cada Estado é soberano, independente e autônomo, não


existindo um órgão ou poder central que impõe suas decisões aos Estados.
Cada Estado deve abdicar parte de sua soberania em prol da suportabilidade.
As organizações internacionais funcionam para congregar alguns temas,
trazendo a discussão para si, onde as partes podem debate-los. Não há um
poder central internacional ou um governo mundial, mas sim vários centros de

5
poder (Estados e organizações), que não estão subordinados a qualquer outra
autoridade superior. Além disso, há também a descentralização quanto a
produção normativa internacional, que ocorre em vários âmbitos de
negociações.1

Destaca-se que a União Europeia é o único organismo internacional com poder


supranacional.

 Horizontalidade: ninguém manda em ninguém, ou seja, todos os Estados são


soberanos, independentes e autônomos da mesma forma. Significa que os
sujeitos de Direito Internacional Público participam das convenções e tratados
por livre e espontânea vontade, não sendo obrigados a tal. Não obstante, não
existe hierarquia também entre as normas de direito internacional, sendo
eventuais conflitos resolvidos caso a caso, porém, um tratado não poderá
conflitar com uma norma do jus cogens de âmbito global, atentando-se
também aos princípios globais.

 Coordenação: diferentemente do que ocorre no âmbito do direito interno, a


relação entre os Estados é de coordenação, não de subordinação ou de
obrigação, a fim de se alcançarem os objetivos comuns da humanidade, além
da definição de regras que regulam a convivência dos sujeitos internacionais.
Há vontade e consentimento, apesar de existir um sistema de sanções. Já que
não existe um poder central, cabe aos Estados e demais sujeitos internacionais
articularem-se para construir e desenvolver o ordenamento jurídico
internacional. Ademais, a cooperação internacional influi também no combate
aos problemas mundiais e no auxílio do desenvolvimento econômico e social
dos Estados ou regiões.

 Proibição do uso da força: o uso da força deve ser evitado ao máximo, sendo
considerado o último recurso a ser utilizado, apenas sendo admitido em
situações específicas, como é o caso da legítima defesa.

1
Vide questão 1.
6
 Humanização do Direito Internacional: os tratados internacionais têm o ser
humano como centro de proteção, especialmente após o fim da 2ª Guerra
Mundial, que culminou na criação da ONU e dos sistemas de proteção dos
Direitos Humanos, tanto regionais quanto internacionais. A proteção ocorre
pelos direitos internos e externos.

 Heterogênea (diversidade de atores e de normas): o Estado, apesar de ser o


principal sujeito do Direito Internacional, não é o único, especialmente no
contexto atual de globalização. Quanto às normas, há variedade nas matérias
disciplinadas e nas condições em que elas são elaboradas.

Apesar das características supramencionadas, existem também órgãos internacionais


responsáveis por apaziguar controvérsias, aplicando suas normas aos casos concretos,
exercendo, portanto, jurisdição internacional. Esses entes são normalmente criados por
tratados, nos quais são definidas suas competências e regras de funcionamento; ou seja, as
normativas são estabelecidas pelos seus próprios destinatários, os sujeitos internacionais.

Esses mecanismos de jurisdição internacional podem ter amplo escopo de atuação


(tanto com relação geográfica – global – ou quanto ao conteúdo – não há restrições) ou mais
reduzida (regional ou apenas trata sobre determinado assunto).

A priori, tais órgãos vinculam apenas os Estados que criaram os tratados e/ou que
aceitarem submeter-se a sua competência e jurisdição.

Ademais, apesar do atual movimento de ampliação do rol de sujeitos internacionais,


destaca-se que a maioria dos órgãos internacionais de jurisdição ainda só permite a
participação de Estados e organismos internacionais em seus procedimentos. Algumas
exceções a isso são os seguintes entes, que permitem a participação de indivíduos (pessoas
naturais) como peticionários ou como acusados: Corte Europeia de Direitos Humanos, Tribunal
Penal Internacional e Comissão Interamericana de Direitos Humanos.

7
1.2. Conceito de Direito Internacional Público

Existem inúmeros possíveis definições para o que viria ser “Direito Internacional
Público”, levando-se em consideração tanto um viés mais clássico quanto um mais moderno,
que leva em consideração os mais recentes sujeitos da sociedade internacional. No entanto,
alguns elementos permanecem constantes nos diversos conceitos:

 Conjunto de regras internacionais que regulam os comportamentos dos Estados


(viés clássico) e dos demais atores internacionais (viés moderno);
 Regulamentação das relações dos Estados;
 Sistema de normas para disciplinar as atividades exteriores da sociedade;
 Direito aplicado à sociedade internacional, dentre outros.

Desse modo, tem-se que o Direito Internacional Público consiste nas relações entre os
atores/sujeitos, as quais se regem através de um conjunto de vários princípios, costumes,
convenções, tratados etc., no âmbito internacional, tutelando seus interesses.2

O Direito Internacional Público, conhecido também como “direito das gentes” (jus
gentium do Direito Romano), é o sistema de normas jurídicas (incluindo-se também os
princípios e costumes) que visa disciplinar e regulamentar as atividades exteriores da
sociedade dos Estados, ou seja, a sociedade internacional, cujo conceito muda com o
surgimento de novos sujeitos nas relações internacionais.

O Direito Internacional Público é o ramo da ciência jurídica que regula as complexas


relações internacionais, a fim de mediar e conciliar a convivência dos membros da sociedade
internacional (não apenas seus atores ou sujeitos), com o objetivo principal de alcançar os fins
precípuos da humanidade em dado momento histórico.3

2
Vide questão 7.
3
Vide questão 6.
8
1.3. Fundamentos do Direito Internacional Público

Os fundamentos do Direito Internacional Público são fatos ou motivos que lhe


atribuem sua obrigatoriedade. Existem duas doutrinas majoritárias:4

 Teoria voluntarista (positivista ou subjetivista): o Direito Internacional seria


fundamentado apenas nas decisões, na aceitação, na vontade dos Estados, da parte
subjetiva. Ou seja, os Estados permitem que o Direito Internacional exista; os sujeitos de
direito internacional seguem suas regras porque expressaram sua concordância em
fazê-lo. Está baseado no consentimento e na vontade comum dos Estados, de modo
expresso (tratados) ou tácito (costumes).
Essa doutrina é criticada, pois condiciona toda a regulamentação internacional
apenas à vontade dos Estados. Ademais, não explica como um novo Estado será
obrigado por norma internacional de cuja formação não participou. Não obstante, existe
também a possibilidade de insegurança jurídica, caso um Estado mudasse de ideia.

 Teoria objetivista: o Direito Internacional existiria, pois tem fontes, princípios, costumes
e regras próprios, existindo independentemente da vontade dos Estados. Advém de
princípios e normas superiores àqueles presentes no direito interno, tendo prevalência
sobre estas. Ou seja, depende não da vontade dos Estados, mas sim da necessidade
advinda de fatores sociais e da realidade fática, sendo responsável pela existência da
sociedade internacional e também pelo seu desenvolvimento.
Essa doutrina é alvo de críticas, pois desconsidera totalmente o consentimento dos
Estados, que são sujeitos de Direito Internacional Público e que têm um importante
papel a ser desempenhado. Ao minimizar a vontade dos atores internacionais na criação
das normas internacionais, acaba por causar uma situação de insegurança,
proporcionando situações que não correspondem à vontade dos sujeitos.

Como modo de contrapor às duas teorias acima mencionadas, apesar de serem


majoritárias na doutrina, há também uma posição menos extrema, denominada:

4
Vide questão 8.
9
 Teoria objetivista temperada (pacta sunt servanda):5 o Direito Internacional teria
caráter de regra objetiva e obrigatória, que impõe aos Estados o dever de cumprir com
a obrigação que foi acordada com consentimento e vontade, sem coerção, de boa-fé.
Tendo em vista a extremidade das doutrinas majoritárias, o que ocorre, na prática, é
um misto de ambas, na forma do pacta sunt servanda.

Conclui-se que, na prática, o fundamento do Direito Internacional Público contém


elementos das supramencionadas teorias, havendo a obrigação de os atores internacionais em
cumprir com as normas consentidas. Porém, o exercício da vontade estatal não pode violar o
jus cogens (preceitos imperativos que regulam o exercício estatal), nos termos do art. 53 da
Convenção de Viena.

1.4. Objetos do Direito Internacional Público

O objeto inicial do Direito Internacional Público foi a redução da anarquia na


sociedade internacional (no contexto pós-2ª Guerra Mundial), bem como a delimitação das
competências dos órgãos e sujeitos internacionais.

Em decorrência da expansão do número de sujeitos ou atores de Direito Internacional


Público, seu rol de objetos também aumentou. Ele passou a regular, para além dos vínculos
estabelecidos entre Estado e organização internacional, ou entre dois ou mais Estados,
também outras questões de interesse dos demais atores da sociedade internacional.

Tradicionalmente, o objeto do Direito Internacional Público restringia-se a delimitar as


competências de seus sujeitos, ou seja, os Estados e as organizações internacionais, de modo
a regulamentar sua convivência em âmbito internacional através de normas de conduta,
frente à falta de um “poder central” que limitasse seus poderes, tendo em vista, contudo, a
característica da coordenação (em oposição à subordinação) e a cooperação internacional.

No entanto, com o advindo de outros sujeitos de Direito Internacional Público (como as


organizações não governamentais, as empresas e até mesmo os indivíduos), o objeto desta

5
Vide questão 10.
10
matéria ampliou-se a ponto de incluir também a cooperação internacional a fim de se atingir
os objetivos comuns da sociedade internacional, disciplinando, para isso, os comportamentos
de todos os sujeitos nela inclusos.

Também é possível incluir no rol de objetos a tutela adicional a bens jurídicos aos
quais a sociedade internacional decidiu atribuir importância, como os direitos humanos e o
meio ambiente.

1.5. Direito Internacional Público e direito interno

A sociedade internacional e a ordem jurídica interna não estão separadas, mas podem
trabalhar em conjunto. Muitos dos atos de Direito Internacional dependem, primeiramente, de
regras do direito interno (por exemplo, a competência para celebrar tratados) ou da ação de
autoridades estatais. Do mesmo modo, muitas regras de Direito Internacional precisam ser
incorporadas no âmbito do direito interno para garantir sua eficaz aplicação.

Contudo, é possível que ocorram conflitos entre as normas de Direito Internacional e de


direito interno sobre assuntos congêneres, havendo a necessidade de estabelecer qual
preceito prevalecerá em detrimento do outro. 6

Em geral, sobre o assunto, existem duas teorias.

Geralmente, a Constituição de cada Estado estabelece a relação entre o Direito


Internacional e o direito interno, optando por uma dessas teorias, escolhem elementos de
ambas, não se afiliam a nenhuma delas ou optam pela primazia da norma mais favorável ao

6
Vide questão 2.
11
ser humano. A despeito disso, ressalta-se que a Constituição Federal brasileira não disciplinou
acerca do reconhecimento do direito internacional pelo direito interno.

 Dualista7: as duas ordens (interna e externa) não se misturam, visto que o Direito
Internacional Público e o direito interno apresentam diversidade de fontes, sujeitos e
objetos, sendo dois ordenamentos jurídicos independentes e distintos, embora
igualmente válidos. Como não se comunicam, jamais poderia haver confronto entre
suas normas.8
A eficácia de uma norma internacional não dependeria de sua compatibilidade com
a norma interna, nem o direito interno precisaria se conformar com os preceitos
internacionais.
Se um Estado quiser aplicar uma norma internacional como algo mais que uma
fonte para o direito interno, deve primeiro transformá-la em norma de direito interno
(“teoria da incorporação” ou “teoria da transformação de mediatização”). Com esse
processo de incorporação, eventuais conflitos seriam entre normas internas, e não mais
entre uma interna e uma internacional.
Em caso de eventual contradição entre normas, prevalecerá a norma interna (mesmo
que equivocada), até que se faça a conversão da internacional no âmbito interno.

No Brasil, não se exige tal conversão, mas exige um processo legislativo de


incorporação de uma regra internacional no país, que ocorre após a aprovação do tratado
pelo Congresso Nacional e sua ratificação e promulgação por meio de um decreto executivo.
As ordens do processo são diferentes, mas haverá um procedimento específico para a norma
internacional adentrar na ordem interna, bastando apenas a incorporação dos tratados ao

7
Vide questão 4.
8
Vide questão 9.
12
ordenamento jurídico nacional. Isso caracteriza o dualismo moderado, posição aplicada pelo
Supremo Tribunal Federal.

 Monista9: as ordens (interna e internacional) se misturam, ou seja, há unicidade do


conjunto de ambas as normas jurídicas, interdependentes entre si. Os direitos
internacional e interno fazem parte do mesmo sistema jurídico, baseado na identidade
dos sujeitos e das fontes. Uma norma internacional aceita por um Estado está apta a
ser aplicada internamente, não sendo necessário ser transformada em direito interno,
pois este integra o internacional10. É a posição da maioria da doutrina brasileira, porém,
quanto à hierarquia (ou seja, qual norma prevalece em caso de conflito), a teoria
subdivide-se em:

a) Nacionalista: a norma interna se sobrepõe à norma internacional em caso de conflito,


com base no princípio da supremacia da Constituição: o direito internacional só é
obrigatório no Estado porque o direito interno permitiu. Essa corrente nega o
fundamento de validade do direito internacional, baseando-se no valor superior da
soberania estatal absoluta. Os Estados só se vinculariam às normas com as quais
consentissem, nos termos estabelecidos por seus ordenamentos jurídicos.

b) Internacionalista: a norma internacional se sobrepõe à norma interna em caso de


conflito, pois o direito interno deriva do internacional, sendo esta uma norma jurídica
superior, com respaldo no princípio pacta sunt servanda (dever de cumprir com o
acordado). Neste caso, um ato internacional prevalece sobre uma norma interna que lhe
contradiz, devendo ser esta declarada inválida.

c) Internacionalista dialógico: é mais moderada que a anterior; a avaliação de qual norma


será aplicada depende do caso, mas a tendência é de se aplicar a regra mais favorável
ao ser humano, especialmente quando a matéria da norma for de direitos humanos,
devendo haver um diálogo entre a norma internacional e a norma interna. Neste caso,

9
Vide questão 3.
10
Vide questão 5.
13
se a norma interna for aplicada, será em decorrência de concessão pela norma
internacional, com base na hierarquia de valores (transdialogismo).

Não obstante, ambas as teorias ensejam controvérsia na doutrina, muitas vezes


ofuscando o principal: o valor que as normas pretendem salvaguardar. Neste caso, o Direito
Internacional dos Direitos Humanos consagrou o princípio da primazia da norma mais
favorável ao indivíduo, devendo prevalecer, em caso de conflito, aquela que melhor promova
a dignidade humana, objetivando a proteção da pessoa humana.

De acordo com o art. 27 da Convenção de Viena, nenhum sujeito internacional pode


invocar as disposições de seu ordenamento jurídico interno para se esquivar de cumprir o que
foi internacionalmente acordado. Para a doutrina, a teoria adotada por este artigo foi o
monismo internacionalista, no entanto, muitos Estados acabam adotando entendimentos
próprios sobre o tema dos conflitos, diferentemente do que estabeleceu a Convenção.

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QUADRO SINÓTICO

FUNDAMENTOS DO DIREITO INTERNACIONAL


Caráter subjetivo;
VOLUNTARISMO Papel central da vontade;
A norma é obrigatória pela concordância livre dos Estados.
OBJETIVISMO Caráter objetivo;
Irrelevância da vontade;
A norma é obrigatória pelo caráter de primazia que
naturalmente assume.

DIREITO INTERNACIONAL PÚBLICO X DIREITO INTERNO


Duas ordens jurídicas distintas e independentes entre si;
Uma ordem jurídica internacional e uma ordem jurídica interna;
Conflito entre Direito Internacional e direito interno:
DUALISMO
impossibilidade;
Necessário diploma legal interno que incorpore o conteúdo da
norma internacional: teoria da incorporação
Uma só ordem jurídica, com normas internacionais e internas;
MONISMO Conflito entre Direito Internacional e direito interno:
possibilidade;
Não há necessidade de diploma legal interno.

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DIVISÃO DA TEORIA MONISTA
Monismo nacionalista Monismo internacionalista Monismo internacionalista
dialógico
Norma interna > norma Norma internacional > norma Análise casuística
internacional interna
Superioridade da soberania Direito interno deriva do Aplicação da regra mais
estatal absoluta Direito internacional favorável ao ser humano

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QUESTÕES COMENTADAS

Questão 1

Ano: 2010. Banca: CESPE. Órgão: OAB. Prova: CESPE - 2010 - OAB - Exame de Ordem - 3 -
Primeira Fase

No âmbito do direito internacional, a soberania, importante característica do palco


internacional, significa a possibilidade de:

A) um Estado impor-se sobre outro.


B) a Organização da Nações Unidas dominar a legislação dos Estados participantes.
C) celebração de tratados sobre direitos humanos com o consentimento do Tribunal Penal
Permanente.
D) igualdade entre os países, independentemente de sua dimensão ou importância
econômica mundial.

Comentário:

Como visto, a soberania é uma característica dos Estados-nações, que são soberanos,
independentes e autônomos entre si. No entanto, do ponto de vista internacional, a soberania
funciona de modo diferente do que ocorre nos âmbitos internos, onde demonstra a
supremacia do Estado sobre as pessoas, bens e relações jurídicas dentro de seu território. No
âmbito internacional, a soberania funciona como uma qualidade de poder que o Estado
poderá exercer ou não, visto que o Direito Internacional é responsável por limitar, em certas
medidas, a soberania estatal, que antes era absoluta. Refere-se à igualdade entre os Estados,
que são todos soberanos, e à independência e autonomia de um em relação aos outros.
Ressalta-se também que as características da sociedade internacional impedem que haja

17
qualquer forma de autoridade ou coerção de um Estado sobre os outros, ou de um organismo
internacional sobre um Estado, o que exclui as demais alternativas da questão.

Questão 2

Ano: 2009. Banca: CESPE. Órgão: OAB. Prova: CESPE - 2009 - OAB - Exame de Ordem - 2 -
Primeira Fase

Comparando-se as instituições do direito internacional público com as típicas do direito


interno de determinado país, percebe-se que, no direito internacional,

A) há uma norma suprema como no direito interno.

B) há órgão central legislativo para todo o planeta.

C) há cortes judiciais com jurisdição transnacional.

D) há um governo central, que possui soberania sobre todas as nações.

Comentário:

No âmbito internacional, não há uma norma suprema, nem um órgão central legislativo
para todo o planeta, nem um governo central, que possui soberania sobre todas as nações.
Diferentemente do que ocorre no direito interno, em razão das supramencionadas
características da sociedade internacional, os Estados apresentam-se de modo soberano,
autônomo e independente nas suas relações internacionais, não havendo verticalidade,
hierarquia ou superioridade entre eles, nem nenhum tipo de órgão ou governo que lhes
controle. Contudo, existem tribunais com jurisdição internacional, responsáveis por atuar em
diversas demandas, de acordo com sua competência específica, criados no âmbito de
organizações internacionais, podendo ser de âmbito regional ou internacional. Pode-se citar,
como exemplos, a Corte Internacional de Justiça, o Tribunal Penal Internacional e a Corte
Interamericana de Direitos Humanos.

18
Questão 3

Ano: 2004. Banca: ESAF. Órgão: PGFN.

Tradicionalmente o direito internacional concebeu duas teorias com referencia à relação


entre os ordenamentos jurídicos nacionais e internacionais: o dualismo e o monismo. Para esta
última:

A) não se aceita a existência de duas ordens jurídicas autônomas, independentes e não


derivadas, defendendo-se por vezes a primazia do direito interno e por vezes a primazia
do direito internacional;
B) aceitam-se várias ordens jurídicas, com aplicabilidade simultânea, configurando-se um
pluralismo de fontes, porém aplicadas por um único ordenamento;
C) aceita-se a existência de duas ordens jurídicas, independentes e derivadas, uma nacional
e outra internacional, sendo que esta última é que confere validade a primeira;
D) não se aceita a validade de uma ordem jurídica internacional, dado que desprovida de
sanção e de conteúdos morais, fundamentada meramente em princípios de cortesia
internacional;
E) aceita-se a validade de uma ordem jurídica internacional, conquanto que não
conflitante com a ordem interna, e cujos critérios de validade sejam expressamente
definidos pela ordem jurídica nacional.

Comentário:

Segundo a doutrina, a letra A corretamente descreve o entendimento da teoria monista.


A letra B está incorreta, pois, no monismo, só há uma ordem jurídica. A letra C está incorreta,
pois só no monismo internacionalista a norma internacional confere validade à interna, só
havendo um ordenamento jurídico, com normas internas e internacionais. A letra D está
incorreta, pois as normas internacionais são jurídicas e, logo, obrigatórias. Por fim, a letra E
está incorreta, pois a validade concomitante das normas internacionais e internas é
característica do monismo internacionalista dialógico (moderado). Ressalta-se que, para os
19
adeptos da teoria dualista, direito interno e internacional representam sistemas distintos e
independentes entre si. A regra internacional, quando aplicável na seara interna de um Estado,
só ocorreria após sua incorporação no direito interno, ou seja, após tornar-se norma interna.

Questão 4

Ano: 2006. Banca: ND. Órgão: OAB-DF. Prova: ND - 2006 - OAB-DF - Exame de Ordem - 1
- Primeira Fase

Na relação entre o direito nacional e internacional, a teoria que entende que são sistemas
independentes e distintos é a:

A) dualista;

B) independentista;

C) unidade normativa;

D) monista.

Comentário:

A resposta correta é a letra A, pois é a teoria dualista que entende que o direito interno
e o direito internacional são dois sistemas diferentes e independentes entre si. Por sua vez,
para a teoria monista, o direito interna e o direito internacional misturam-se, sendo
interdependentes entre si. Assim, por exclusão, chega-se à resposta certa.

Questão 5

CESPE – 2011 – TRF – 2ª REGIÃO - JUIZ

O Estado regulamenta a convivência social em seu território por meio de legislação nacional, e
a comunidade internacional também cria regras, que podem conflitar com as nacionais. A

20
respeito das correntes doutrinárias que procuram proporcionar solução para o conflito entre
as normas internas e as internacionais, assinale a opção correta.

a) A corrente monista e a dualista apresentam as mesmas respostas para o conflito entre as


normas internas e as internacionais.

b) Nenhum país adota a corrente doutrinária monista.

c) Consoante a corrente monista, o ato de ratificação de tratado gera efeitos no âmbito


nacional.

d) De acordo com a corrente dualista, o direito interno e o direito internacional convivem em


uma única ordem jurídica.

e) De acordo com a corrente monista, a norma interna sempre prevalece sobre a internacional.

Comentário:

A letra A está incorreta, pois, para a corrente dualista, é necessário que haja um
processo de incorporação de normas internacionais no âmbito interno, assim, eventuais
conflitos seriam entre normas internas, e não mais entre uma interna e uma internacional; já
para a corrente monista, existem 3 entendimentos: o nacionalista (a norma interna se
sobrepõe à norma internacional), o internacionalista (a norma internacional se sobrepõe à
norma interna) e o internacionalista dialógico (avaliação caso a caso). A letra B está incorreta,
pois a corrente doutrinária monista é considerada a majoritária. A letra C está correta, pois
basta que uma norma internacional seja aceita por um Estado para estar apta a ser aplicada
internamente, não sendo necessário ser transformada em direito interno, pois este integra o
internacional. A letra D está incorreta, pois a assertiva trata da doutrina monista, não da
dualista. A letra E está incorreta, pois, como visto, existem 3 possíveis entendimentos.

21
Questão 6

Câmara dos Deputados (CD) 2014. Cargo: Analista Legislativo - Área Consultor Legislativo.
Banca: Centro de Seleção e de Promoção de Eventos UnB (CESPE/CEBRASPE). Nível:
Superior

Considerando que a história da evolução do direito internacional público é, em certa medida,


a história da evolução do Estado nacional moderno, julgue os itens subsequentes.

O direito internacional público surgiu na Idade Moderna, como disciplina jurídica subsidiária
ao poder absolutista dos soberanos europeus e do Estado nacional moderno, a partir de
estudos sobre direitos referentes à guerra e à paz entre as nações.

Comentário:

A assertiva está correta, pois o início do Direito Internacional Público se deu durante a
Idade Moderna, como forma de os Estados Absolutistas tratarem das relações internacionais,
que, à época, além do comércio, resumia-se a questões de guerra. Foi a partir desse momento
que tratados começaram a ser firmados e a estrutura da sociedade internacional que se tem
hoje começou a ser formada.

Questão 7

Centrais Elétricas Brasileiras S.A. (ELETROBRÁS). 2007. Cargo: Relações Internacionais.


Banca: Núcleo de Computação Eletrônica UFRJ (NCE). Nível: Superior

O direito internacional público concerne às relações abaixo descritas, EXCETO entre:

A) os Estados e as organizações internacionais;

B) as organizações internacionais;

22
C) as pessoas jurídicas e pessoas físicas, desde que de distintas nacionalidades;

D) as instituições internacionais e as pessoas jurídicas;

E) as instituições internacionais e as pessoas físicas.

Comentário:

As assertivas A, B, D e E estão corretas, então, a resposta da questão é a alternativa C.


Isso porque o Direito Internacional Público trata das relações internações entre: os Estados, as
organizações (ou instituições) internacionais, e as pessoas (físicas e jurídicas), dentre outros
sujeitos internacionais. No entanto, a relação internacional entre uma pessoa jurídica e uma
pessoa física de distintas nacionalidades compreende uma relação internacional de Direito
Internacional Privado, como será visto posteriormente.

Questão 8

Senado Federal (SF) 2002. Cargo: Consultor Legislativo - Área Relações Internacionais e
Defesa Nacional. Banca: Centro de Seleção e de Promoção de Eventos UnB
(CESPE/CEBRASPE). Nível: Superior

Julgue os itens seguintes.

Duas doutrinas principais fundamentam o direito internacional público: a voluntarista e a


objetivista. A primeira sustenta que é na vontade dos Estados que está o fundamento do
direito das gentes; nela se inseriria a teoria dos direitos fundamentais. A segunda, por sua vez,
sustenta o fundamento do direito internacional na pressuposta existência de uma norma ou
princípio acima dos Estados, como, por exemplo, a teoria do consentimento.

Comentário:

23
A assertiva está incorreta, pois apesar de a teoria voluntarista ser baseada na vontade
dos Estados, para a qual o Direito Internacional só existiria pois é da vontade dos Estados
permitir que ele exista, a teoria objetivista não está fundamentada no preceito de uma norma
ou princípio acima dos Estados, mas nas fontes, princípios, costumes e regras próprios do
Direito Internacional, existindo independentemente da vontade dos Estados, mas dependendo
da necessidade advinda de fatores sociais e da realidade fática de dado momento histórico.

Questão 9

Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) 2002. Cargo: Advogado


de Empresa. Banca: Fundação para o Vestibular da Universidade Estadual Paulista
(VUNESP). Nível: Superior.

Quanto ao DUALISMO e ao MONISMO, é correto afirmar que

A) o dualismo aceita a existência de ordens jurídicas coexistentes, independentes e autônomas.

B) o monismo defende a primazia do direito interno do país, haja vista a aplicação do direito
ao caso em concreto.

C) a "teoria da incorporação" advém da corrente monista, que defende a primazia do direito


internacional.

D) o dualismo incorpora a ideia de que, na ordem interna se obedece a um sistema de


coordenação entre as normas e, no âmbito internacional, a uma relação de subordinação.

E) o dualismo tem como preceito a ideia de que todos os Direitos emanam de uma única
fonte.

Comentário:

A alternativa A está correta, pois é esse o preceito do dualismo: a ordem jurídica interna
e a ordem jurídica internacional são coexistentes, independentes e autônomas, não se

24
misturando ou confundindo. A alternativa B está incorreta, pois existem 3 possíveis
entendimentos da corrente monista sobre eventual conflito de normas: o nacionalista (a
norma interna se sobrepõe à norma internacional), o internacionalista (a norma internacional
se sobrepõe à norma interna) e o internacionalista dialógico (avaliação caso a caso). A
alternativa C está incorreta, como já visto na justificativa da assertiva “B”. A alternativa D está
incorreta, pois não há relação de subordinação, só de independência. A alternativa E está
incorreta, pois este é o entendimento da teoria monista.

Questão 10

Advogado da União – 2006 – Adaptada.

Julgue o item a seguir: o princípio pacta sunt servanda, segundo o qual o que foi pactuado
deve ser cumprido, externaliza um modelo de norma fundada no consentimento criativo, ou
seja, um conjunto de regras das quais a comunidade internacional não pode prescindir.

Comentário:

A norma pacta sunt servanda é princípio que se impôs objetivamente como


fundamental para a convivência humana, significando o dever de cumprir com o que foi
acordado. Portanto, a assertiva está incorreta, pois o conjunto de regras das quais a
comunidade internacional não pode renunciar são as normas de jus cogens, de natureza
obrigatória e imperativa.

25
GABARITO

Questão 1 - D

Questão 2 - C

Questão 3 - A

Questão 4 - A

Questão 5 - C

Questão 6 - Correta

Questão 7 - C

Questão 8 - Errada

Questão 9 - A

Questão 10 - Errada

26
LEGISLAÇÃO COMPILADA

Nesta matéria, faz-se de extrema importância a leitura de:

Constituição Federal:

 Art. 1º, I
 Art. 4º

Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados (Decreto Executivo nº


7.030/2009)

 Art. 27
 Art. 53

27
JURISPRUDÊNCIA

Jurisprudência do STF sobre a teoria dualista moderada:


ADIn n. 1.480-DF (parte da ementa):
“Paridade normativa entre atos internacionais e normas infraconstitucionais de
direito interno. – Os tratados ou convenções internacionais, uma vez regularmente
incorporados ao direito interno, situam-se, no sistema jurídico brasileiro, nos mesmos
planos de validade, de eficácia e de autoridade em que se posicionam as leis ordinárias,
havendo, em conseqüência, entre estas e os atos de direito internacional público, mera
relação de paridade normativa. Precedentes. No sistema jurídico brasileiro, os atos
internacionais não dispõem de primazia hierárquica sobre as normas de direito interno.
A eventual precedência dos tratados ou convenções internacionais sobre as regras
infraconstitucionais de direito interno somente se justificará quando a situação de
antinomia com o ordenamento doméstico impuser, para a solução do conflito, a
aplicação alternativa do critério cronológico ("lex posterior derogat priori") ou, quando
cabível, do critério da especialidade. Precedentes. ADI 1480 MC / DF – Medida Cautelar
na Ação Direta de Inconstitucionalidade, Relator Min. Celso de Mello. j. 04.09.1997”
Órgão Julgador: Tribunal Pleno Publicação: DJ 18.05.2001.

CR 8279 AgR/AT-Argentina
“Mercosul – Carta rogatória passiva – Denegação de exequatur – Protocolo de
medidas cautelares (Ouro Preto/MG) – Inaplicabilidade, por razões de ordem
circunstancial – Ato internacional cujo ciclo de incorporação, ao direito interno do brasil,
ainda não se achava concluído à data da decisão denegatória do exequatur, proferida
pelo presidente do supremo tribunal federal – relações entre o direito internacional, o
direito comunitário e o direito nacional do brasil – Princípios do efeito direto e da
aplicabilidade imediata – Ausência de sua previsão no sistema constitucional brasileiro –
Inexistência de cláusula geral de recepção plena e automática de atos internacionais,
mesmo daqueles fundados em tratados de integração – Recurso de agravo improvido.

28
A recepção dos tratados ou convenções internacionais em geral e dos acordos
celebrados no âmbito do Mercosul está sujeita à disciplina fixada na Constituição da
República" (CR 8279 AgR/AT-Argentina, Relator(a): Min. Celso de Mello. Julgamento:
17/06/1998, Publicação: DJ Data-10-08-00).

29
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

AMARAL JÚNIOR, Alberto do. Introdução ao direito internacional público.


São Paulo: Atlas, 2008.

CANÇADO, Trindade, Antônio Augusto. Princípios do direito internacional


contemporâneo – 2. ed. rev. atual. – Brasília: FUNAG, 2017.

CASELLA, Paulo Borba; Hildebrando Accioly e G. E. do Nascimento e Silva.


Manual de direito internacional público.— 20. ed. — São Paulo: Saraiva,
2012.

MAZZUOLI, Valerio de Oliveira. Curso de direito internacional público. 9. ed.


rev., atual. e ampl. -- São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2015.

PORTELA, Paulo Henrique Gonçalves. Direito Internacional Público e Privado.


9ª ed. Salvador: Juspodivm, 2017.

REZEK, Francisco. Direito internacional público – Curso Elementar. 17ª ed. São
Paulo: Saraiva, 2018.

SOARES, Guido Fernando Silva. Curso de direito internacional público. São


Paulo: Atlas, 2002.

30
CARREIRA JURÍDICA

Direito Internacional
Capítulo 2
SUMÁRIO

DIREITO INTERNACIONAL, Capítulo 2 .......................................................................................... 3

1. Fontes do Direito Internacional Público ............................................................................... 3

1.1 Conceito: fontes materiais e fontes formais ......................................................................................... 3

2. Fontes primárias ........................................................................................................................ 7

2.1. Tratados ............................................................................................................................................................ 7

2.2. Costumes internacionais ............................................................................................................................ 7

2.3. Princípios gerais de direito .................................................................................................................... 11

3. Meios auxiliares e novas fontes (secundárias).................................................................. 13

3.1. Jurisprudência .............................................................................................................................................. 13

3.2. Doutrina ......................................................................................................................................................... 14

3.3. Analogia ......................................................................................................................................................... 15

3.4. Equidade ........................................................................................................................................................ 16

3.5. Atos unilaterais dos Estados ................................................................................................................. 16

3.6. Decisões de organizações internacionais ........................................................................................ 18

3.7. Obrigações erga omnes, jus cogens e soft law ........................................................................... 19

QUADRO SINÓTICO ......................................................................................................................... 24

QUESTÕES COMENTADAS ............................................................................................................. 27

GABARITO .......................................................................................................................................... 35

LEGISLAÇÃO COMPILADA .............................................................................................................. 36

JURISPRUDÊNCIA ............................................................................................................................... 37

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ........................................................................................................ 39

2
DIREITO INTERNACIONAL

Capítulo 2

1. Fontes do Direito Internacional Público

1.1 Conceito: fontes materiais e fontes formais

Definir o que viria a ser “fontes” do Direito é uma dificuldade para toda a doutrina
desta ciência jurídica. Contudo, a doutrina internacionalista conceitua “fontes do Direito
Internacional Público”, dentre outras definições, como:

 Instrumentos pelos quais fazem surgir ou possibilitam identificar a norma;


 Razões que determinam a produção e a demonstração da norma;
 Motivos que acarretam no surgimento da norma e sua aplicação;
 Elementos básicos do ordenamento jurídico internacional.

As fontes estão em constante interação, não sendo homogêneas ou centralizadas,


havendo um movimento atual de “descentralização das fontes”. Já que não existe uma
autoridade superior no Direito Internacional, as fontes ganham validade dependendo da forma
pela qual ela foi elaborada, e também pela forma como ela se tornará obrigatória e coercitiva.

A doutrina geralmente divide as fontes do Direito Internacional Público em duas


categorias: materiais e formais.

As fontes materiais são responsáveis por fazer surgir a norma jurídica, juntamente com
seu conteúdo, determinando sua elaboração. Referem-se à avaliação de todos os fatores
sociológicos, econômicos, culturais etc., pertencendo não à Ciência do Direito, mas sim à
Política do Direito.

3
Como exemplo de fonte material, pode-se destacar a 2ª Guerra Mundial, cujo estrago
foi responsável por despertar a necessidade de salvaguardar a dignidade da pessoa humana
acima de tudo, impulsionando o início do Direito Internacional Público que existe atualmente.
São, portanto, as bases teóricas, os valores e ideais que servem de inspiração para elaboração
das normas jurídicas internacionais, bem como de sua interpretação, sentido e alcance,
determinando o conteúdo ou a matéria do preceito jurídico.

As fontes formais, por sua vez, são os métodos ou processos de criação das normas
jurídicas, que vinculam os sujeitos para os quais as mesmas são dirigidas. São consideradas o
modo de exteriorização da norma e dos valores que ela tutela. Seu aparecimento geralmente
está relacionado ao surgimento das fontes materiais, uma levando à elaboração jurídica da
outra.

As fontes formais indicam as formas pelas quais o Direito pode desenvolver-se a fim de
impor suas normas para disciplinar as relações da sociedade internacional. Por este motivo, é
escopo do Direito Internacional Público o estudo das fontes formais, que são o modo como as
fontes materiais (conteúdo) dispõem-se na sociedade internacional.

As fontes (formais) foram inicialmente consolidadas no art. 38 do Estatuto da Corte


Internacional de Justiça (do ano de 1945), também conhecida com “Corte de Haia”, que
estabelece um rol EXEMPLIFICATIVO das fontes de Direito Internacional Público.

Não obstante, é necessário mencionar que parte da doutrina confere supremacia ao


tratado em detrimento das demais fontes, por ter a forma escrita, o que conferiria maior
clareza e precisão. Contudo, ressalta-se que, apesar de suas diferenças, não existe hierarquia
entre as fontes, não sendo a ordem de disposição um ranking de importância, especialmente
quando se considera a íntima relação que as fontes apresentam entre si no momento da
aplicação de uma norma jurídica internacional.

Destaca-se que “hierarquia das fontes” não deve ser confundida com “hierarquia das
normas”. Enquanto as fontes são modos de manifestação das disposições jurídicas, normas
são os instrumentos responsáveis por exteriorizar as próprias regras de conduta. Assim, é

4
possível que normas, advindas da mesma fonte, ocupam níveis hierárquicos diferentes dentro
do ordenamento jurídico internacional.

Há exceções quanto à hierarquia entre as fontes. A primeira é relativa ao art. 103 da Carta
das Nações Unidas, que atribui primazia à Carta sobre todos os demais compromissos
internacionais realizados por quaisquer de seus membros. A segunda é com relação às normas
jus cogens (norma interpretativa geral), que prevalecem sobre as demais obrigações
internacionais, como será visto.

Além disso, na prática, nos tribunais internacionais estão prevalecendo as disposições


específicas dos tratados internacionais em detrimento dos costumes, não porque os tratados
seriam hierarquicamente superiores aos costumes, mas sim em decorrência do caráter
obrigatório daqueles, bem como por trazerem maior segurança e estabilidade jurídicas às
relações internacionais.

De acordo com o Estatuto da Corte Internacional de Justiça, são as fontes:

a) as convenções internacionais, gerais ou especiais, que estabeleçam regras


expressamente reconhecidas pelos Estados litigantes;
b) costumes internacionais, que são práticas gerais aceitas como se fossem direito;
c) princípios gerais do direito, reconhecidos pelas nações;
d) decisões judiciárias e a doutrina qualificada como meios auxiliares para determinação
das regras de direito.

5
O Estatuto da Corte Internacional de Justiça utilizou “convenção” para referir-se ao
“tratado”. No entanto, apesar de serem empregados como sinônimos, destaca-se que, na

verdade, a convenção é apenas uma espécie de tratado, como será posteriormente visto.

Não obstante o caráter meramente exemplificativo do dispositivo acima referido, à


época de sua confecção, foi de suma importância, pois conferiu uniformização dentro do
Direito Internacional Público. Isso porque quase todos os Estados comprometeram-se a
observar suas disposições, reconhecendo, desse modo, as fontes elencadas como modo de
disciplinar as relações na sociedade internacional.

Para fins didáticos, as fontes podem ser também divididas em primárias, ou principais,
e secundárias, ou novas fontes, ou meios auxiliares. As primárias seriam as clássicas, as
tradicionais, as mais antigas, efetivamente estabelecendo qual o direito aplicável no caso
concreto. Não obstante, as secundárias seriam as fontes mais recentes, relativas às
transformações ocorridas na sociedade internacional com o acréscimo de novos sujeitos nas
relações internacionais, bem como de novos meios de produção (ou seja, fontes formais) de
normas jurídicas internacionais, contribuindo para elucidar o conteúdo da norma jurídica a ser
aplicada. É o que será visto a seguir.

6
2. Fontes primárias

2.1. Tratados

Os tratados consistem na fonte considerada mais segura, estável e concreta do Direito


Internacional Público, sendo normas convencionais formais e escritas. Os tratados são o meio
através do qual os sujeitos do Direito Internacional Público (Estados e organizações
internacionais) têm de acomodar seus interesses contrastantes e cooperar na satisfação das
necessidades comuns, consubstanciado em suas vontades livres e conjugadas. Possuem a
força normativa para regular diversas matérias relevantes para a sociedade internacional.

A despeito de existirem desde a Antiguidade, só atingiram seu atual nível de


importância com a Paz de Vestfália (uma série de tratados que, a partir de 1648, encerraram a
Guerra dos Trinta Anos, dentre outras matérias), desde onde começou a substituir o costume
como a “principal” fonte do Direito Internacional Público.

Visto que o Direito dos Tratados possui especificações que as demais fontes de Direito
Internacional Público não têm, este será tratado com mais profundidade em capítulo próprio.

2.2. Costumes internacionais

O costume é a fonte formal mais antiga do Direito Internacional Público, podendo ser
considerada a fonte-base deste ramo do direito. Pode ser definido como:

 Uma prática geral, uniforme, reiterada e consistente a ponto de ser aceita como
direito, entendida como obrigação legal, válida e juridicamente exigível;
 O conjunto de atos de consenso, em contexto universal, regional ou local (não
há limites máximos ou mínimos na geografia dos costumes);
 A prova de uma prática geral (como previsto no Estatuto da Corte Internacional
de Justiça), mas também o seu resultado: o costume resulta da prática geral,
consistente, contínua e uniforme dos Estados;
 A união de elemento objetivo ou material (a prática generalizada, reiterada,
uniforme e constante de um ato) e subjetivo ou psicológico (a aceitação da
prática que se entende ser obrigatória). Esse tema será aprofundado.

7
“Prática generalizada” não significa o mesmo que “unânime” ou “universal”. Basta que ela seja
compreendida como regra obrigatória por um grupo amplo e representativo, não precisando
também ser universal, podendo se tratar de uma prática regional ou local.

Além disso, a “prática generalizada” pode significar um comportamento comissivo


(ação) ou um comportamento omissivo (omissão).

A maior importância dos costumes decorre do fato de não existir um “centro integrado”
de produção de normas de Direito Internacional, sendo mais amplamente difundido. É,
portanto, a fonte responsável por estabelecer um grupo de normas universalmente aplicáveis
no âmbito universal, além de permitir a criação de preceitos gerais de direito, mais facilmente
aplicáveis ao caso concreto. Ademais, apresenta também um caráter “residual”, no sentido de
poder regular as diversas matérias que os tratados ainda não disciplinaram, contribuindo
também para interpretação e aplicação do conteúdo que se encontra nos tratados.

Com relação ao procedimento de internalização de um costume internacional, no Brasil,


não é necessário passar por um processo para entrar em vigor no plano interno. Os costumes
são aplicados independentemente de qualquer manifestação do Congresso Nacional e/ou do
Presidente da República, diferentemente do que ocorre com os tratados internacionais.1

A extinção do costume pode se dar por sua codificação ou normatização (ou seja,
quando é transformado em tratado, o que ocorreu com muitos costumes), quando é
substituído por um novo costume ou quando simplesmente deixa de ser aplicado.2

1
Vide questão 3.
2
Vide questão 11.
8
A positivação dos costumes em tratados não extingue completamente o costume, que
continua a ser considerado como tal para os sujeitos internacionais que não são partes deste
eventual tratado, e também para aqueles que vierem a se retirar do mesmo. A positivação de
um costume é meramente um modo de facilitar a verificação da concretude do costume.

 Discussões doutrinárias

Existe uma polêmica na doutrina quanto a maneira de aceitação de um costume. Para


alguns, ele poderia ser aceito de maneira expressa ou tácita. Para aqueles adeptos à teoria
voluntarista, o costume seria decorrência de um acordo tácito entre sujeitos internacionais (o
tratado seria um acordo expresso), então, ele valeria apenas para os atores que concordassem
com a prática. Para os filiados à teoria objetivista, o costume teria eficácia erga omnes,
vinculando todos os Estados, até os que não concordaram com a prática.

Não obstante essa discussão doutrinária, em caso de eventual litígio, a parte que alega
o costume deve provar sua existência e aplicação, podendo ser diretamente aplicável tanto na
ordem interna quanto na internacional. Geralmente, os costumes são “provados” através da
jurisprudência internacional ou pela confirmação da doutrina internacional.

Nesse sentido, é importante mencionar que a corrente voluntarista formulou a teoria


do objetor persistente, na qual caso um Estado nunca tenha concordado com um costume,
expressa ou tacitamente, ele não o irá vincular. Essa teoria, assim, apresenta o caso de um
Estado não estar obrigado a um costume internacionalmente aceito como sendo o direito,
quando o Estado estabelecer um comportamento permanente de discordância e não aceitação
do referido costume, não sendo vinculado a ele.3

3
Vide questão 4.
9
Ressalta-se, porém, que os costumes aos quais se aplicaria essa teoria são somente
aqueles que surgem posteriormente aos Estados. Contudo, para a corrente objetivista, esta
teoria apresenta uma ideia equivocada e superada, pois o costume já formado haveria de
valor igualmente para todos os sujeitos de Direito Internacional Público.

Ademais, caso surja um novo Estado, o efeito em relação aos costumes também é
objeto de discussão doutrinária. Para a corrente objetivista, o Estado estará obrigado aos
costumes já aceitos independentemente de sua vontade; para a subjetivista, a vinculação
apenas existirá pela concordância expressa ou tácita por parte do Estado.

 Elementos formadores dos costumes


a) Elemento objetivo ou material: é a repetição generalizada, reiterada e
uniforme de atos praticados pelos sujeitos internacionais frente a um
quadro fático. Nos termos do Estatuto da Corte Internacional de Justiça, é
a “prova de uma prática” adotada como decorrência da repetição dos
precedentes costumeiros que objetivam a afirmação de um princípio
jurídico internacional. Não é possível estabelecer um rol de critérios
exaustivos de condutas que podem virar costumes, dependendo das
circunstâncias do caso específico e da natureza da referida prática.4

b) Elemento subjetivo ou psicológico: além da prática geral, deve existir


também, para se formar um costume, a convicção e a crença de que aquilo
que está sendo praticado possui uma coercibilidade jurídica, sendo “aceito
como sendo direito”, podendo também ser chamada de opinio juris
(convicção do direito). Sem esse elemento, o ato reiterado não passará de
um simples uso, sem qualquer obrigatoriedade.5

 Processos de formação de costumes

Uma vez estabelecido o costume, ele valerá igualmente para todos os sujeitos de
Direito Internacional Público, independente de o ator ter se oposto a ele, ou ter deixado de

4
Vide questão 12.
5
Vide questão 9.
10
participar de sua elaboração. Existem métodos clássicos e contemporâneos de formação de
costumes, que atualmente coexistem, serão vistos a seguir:

a) Método clássico: quando surge uma nova relação ou algo ainda não
disciplinado entre os Estados  esta relação passa a ser regulada através
dos princípios gerais de direito ou de acordo com o sentimento vigente à
época  esta forma de disciplina repercute positivamente no ordenamento
jurídico internacional, sendo repetida  a prática passa a ser aceita como
se fosse direito  formação de um novo costume.

b) Método contemporâneo: ocorre no âmbito das organizações


internacionais, através de práticas normativas que são o início da formação
de um costume, sendo formado por atos de consenso dentro desses novos
atores internacionais.

2.3. Princípios gerais de direito

O conceito de “princípios gerais de direito” significa que eles são aceitos por todos os
ordenamentos jurídicos, são as normas de caráter mais genérico e abstrato, que incorporam
valores responsáveis por fundamentar diversos ordenamentos jurídicos internos.

Eles conferem coerência ao ordenamento jurídico internacional, auxiliando na


elaboração e aplicação das normas de Direito Internacional e as ações dos sujeitos
internacionais. Essa fonte está relacionada ao reconhecimento de tais princípios, pelos sujeitos
internacionais, como formas legítimas de expressão do Direito Internacional Público.

Não obstante não existir hierarquia entre as fontes de Direito Internacional Público, sua
aplicação possui um caráter supletivo, devendo ser empregado para suprir lacunas nas regras
codificadas (tratados) ou nos costumes, ou ainda para interpretar tais regras de maneira mais
coerente com o caso concreto e o momento histórico em que ele ocorreu.6

Ressalta-se que a expressão “princípios gerais de direito” não se refere aos princípios do
direito internacional, mas sim aos princípios reconhecidos e aceitos por vários dos sistemas

6
Vide questão 6.
11
jurídicos nacionais ou estatais. Isso porque eles provêm da ordem estatal e ascendem para a
ordem internacional, geralmente através de sua aplicação por uma corte internacional em um
caso concreto, ganhando notoriedade regional ou até universal.

Os princípios gerais de direito também não podem ser confundidos com os princípios
gerais de direito interno, que podem variar de um sistema jurídico para outro, não tendo,
desse modo, a generalidade necessária para serem aplicados em âmbito internacional.

Assim como acontece com os costumes, muitos dos princípios gerais de direito foram
codificados em tratados internacionais, mas também existem aqueles que se tornaram em
direito costumeiro.

Como exemplos, pode-se citar os princípios da boa-fé, da soberania nacional, da


proteção da dignidade da pessoa humana, da prevalência dos direitos humanos, da não-
intervenção, do respeito à coisa julgada, do direito adquirido, da responsabilidade do Estado,
do pacta sunt servanda, dentre muitos outros.

Os princípios também são responsáveis pela orientação, elaboração, interpretação e


aplicação dos preceitos do direito nas relações sociais, podendo até mesmo decorrer da
ordem estatal e ascender à ordem internacional. Os princípios possuem papel supletivo na
interpretação das normas, segundo o caso concreto e o momento histórico.

Os princípios são citados como fontes no já mencionado art. 38 do Estatuto da Corte


Internacional de Justiça. Porém, há o acréscimo de que eles são “reconhecidos pelas nações
civilizadas”; essa expressão é alvo de críticas por seu viés etnocêntrico, colonialista e
discriminatório, não sendo mais a interpretação dada ao dispositivo. Atualmente, os princípios
gerais abrangem todas as normas estáveis que incorporem valores amplamente reconhecidos
pelo mundo como um todo.

12
3. Meios auxiliares e novas fontes (secundárias)

Existem as fontes secundárias que estão mencionadas no art. 38 do Estatuto da Corte


Internacional de Justiça, como “meios auxiliares para a determinação das regras de direito”,
que são: as decisões judiciárias (jurisprudência) e a doutrina internacional. São assim
denominadas, pois delas necessariamente não nasce o direito, mas atuam como instrumentos
acessórios para que se determine corretamente o direito alegado no caso concreto.

Porém, existem também as novas fontes, advindas da evolução do Direito Internacional


e do acréscimo de novos atores na sociedade internacional, que são: a analogia, a equidade,
os atos unilaterais e as decisões das organizações internacionais.

Todos os meios auxiliares e as fontes supramencionadas serão vistos a seguir.

3.1. Jurisprudência

A jurisprudência (assim como no direito interno) consiste no conjunto de decisões


reiteradas, no mesmo sentido, em assuntos semelhantes, mas que, no caso do Direito
Internacional Público, são proferidas por órgãos internacionais de solução de controvérsias.

No âmbito internacional, a jurisprudência contribui meramente como meio auxiliar do


Direito Internacional, atuando no auxílio da aplicação das normas jurídicas e favorecendo a
criação de novos direitos e novas regras costumeiras internacionais. Sua maior importância
reside justamente nesta função: a jurisprudência é responsável por interpretar direitos,
costumes e até princípios gerais, de modo que eles possam continuar consistentes em
diversos momentos históricos.

As decisões judiciárias referidas no art. 38 do Estatuto da Corte Internacional de


Justiça são aquelas proferidas pela própria Corte Internacional de Justiça, como se conclui do
disposto no art. 94 da Carta da ONU, onde se tem que os membros da Organização
aceitarão as decisões da Corte nos casos em que forem partes.

Além disso, essa fonte também pode incluir decisões de outras cortes internacionais,
das quais se pode citar: o Tribunal Penal Internacional (TPI) e a Corte Interamericana de

13
Direitos Humanos (CIDH), bem como é possível incluir as decisões de tribunais ad hoc ou de
outros órgãos além dessas cortes, como os foros arbitrais e as comissões encarregadas de
executar tratados, por exemplo.

Ressalta-se que o art. 59 do Estatuto da Corte Internacional de Justiça dispõe que,


apesar de as decisões judiciais também serem responsáveis por criar direito, o que for
decidido só será obrigatório para as partes litigantes, apenas quanto ao caso concreto que
está sendo discutido judicialmente. Esse dispositivo não só confere às decisões da Corte a
autoridade de res judicata, mas também afasta a hipótese de um sistema de precedentes
obrigatórios, vinculando a decisão apenas para as partes em conflito.

Não obstante, ainda que uma decisão jurídica internacional só atinja as partes litigantes
a respeito daquele caso concreto, não há obste para que o tribunal faça uso de sua própria
jurisprudência como modo de reafirmar um posicionamento seu previamente realizado.

Ademais, a jurisprudência internacional também pode apresentar efeitos no âmbito do


direito interno, influenciando a jurisprudência interna, visto que pode fundamentar pretensões
no Poder Judiciário dos Estados, que, por sua vez, criará jurisprudência interna com inspiração
nos preceitos do Direito Internacional.

3.2. Doutrina

A doutrina (“dos juristas mais qualificados das diferentes nações”, como dispõe o art. 38
do Estatuto da Corte Internacional de Justiça) é o conjunto de estudos, interpretações, teses,
entendimentos, dissertações etc., daqueles que estudam o Direito Internacional Público,
compiladas em trabalhos acadêmicos, e também o material proveniente de instituições
especializadas na pesquisa de Direito Internacional (por exemplo, a Comissão de Direito
Internacional das Nações Unidas e a Academia de Direito Internacional de Haia). Relevante
acrescentar também nesta lista a produção doutrinária das secretarias das organizações
internacionais.

Foi uma das fontes responsáveis pela efetiva criação do Direito Internacional que se tem
atualmente, mas, agora, sua principal função é a de contribuir na interpretação e na aplicação

14
da norma internacional. Desempenha um papel essencial para o ramo do Direito Internacional
Público, não gerando modelos jurídicos (ou seja, não possui o caráter vinculante ou
obrigatório), mas sim modelos dogmáticos ou hermenêuticos de direito.

Além disso, também tem como máxima importância a formulação de novos princípios e
novas normas, de modo a contribuir no desenvolvimento deste ramo da ciência jurídica em
consonância com os novos anseios, interesses e necessidades da sociedade internacional, bem
como os valores a serem salvaguardados. A doutrina faz isso ao esclarecer os significados dos
modelos jurídicos através do tempo, além de propor novas formas de interpretação
correspondentes aos valores e momentos históricos supervenientes.

Por fim, apesar de não ser propriamente uma “fonte”, mas um “meio auxiliar” de Direito
Internacional Público, a doutrina também é um meio de consulta para que os diversos
tribunais internacionais possam solucionar os litígios de modo mais condizente com o
entendimento geral da sociedade internacional.

3.3. Analogia

A analogia consiste na aplicação, à determinada situação concreta, de fato de uma


norma jurídica feita para ser aplicada a caso semelhante ou parecido, no caso da falta ou
inutilidade de preceito para regular este determinado caso concreto. É uma forma de regular
as relações jurídicas que, apesar de não serem o objeto exato de uma norma jurídica expressa,
podem ser a ela empregada, em decorrência de serem casos similares.

Ressalta-se que parte da doutrina não acredita que a analogia seja uma fonte do Direito
Internacional Público, mas meramente um meio de integração do ordenamento jurídico.

Ademais, em decorrência da falta de previsão desse instituto no art. 38 do Estatuto da


Corte Internacional de Justiça, geralmente é pouco aplicada no Direito internacional,
principalmente nos casos que envolvam questões de soberania dos Estados ou nos casos
relativos a restrição de direitos humanos fundamentais (como a liberdade).

Tanto a analogia quanto a equidade (que será vista a seguir) objetivam encontrar
soluções eficientes para enfrentar a questão da falta de uma norma jurídica regulamentadora

15
para uma situação concreta, a fim de poder solucionar um conflito de interesses do modo
mais justo possível, dada a lacuna normativa.

3.4. Equidade

A equidade significa aplicar considerações tidas como justas a uma relação jurídica, quando
não há norma ou preceito cabível para regular e/ou solucionar tal situação de conflito, ou
quando ela existe, mas é ineficaz para soluciona-la com justiça e razoabilidade.

A equidade não vai preencher a falta de previsão legal num determinado caso concreto,
pois ela é o método a ser utilizado, e não a norma jurídica propriamente dita. Por isso, parte
da doutrina não acredita que ela seja uma fonte do Direito Internacional Público, pois seria
meramente uma forma de aplicação do direito pelas cortes internacionais.

Além de ser considerada um princípio geral do direito, a equidade é tida também como
meio de solução de controvérsias internacionais, a partir da anuência das partes conflitantes,
como disposto no art. 38 do Estatuto da Corte Internacional de Justiça, requisito que
contribui, na prática, para o pouco uso que os tribunais internacionais fazem desse
instrumento na solução de conflitos.7

3.5. Atos unilaterais dos Estados

Para a doutrina voluntarista, os atos unilaterais dos entes estatais não poderiam ser
considerados fontes do Direito Internacional Público, em decorrência da premissa do
consentimento dos sujeitos internacionais. No entanto, apesar de não estar previsto no rol
(exemplificativo) do já citado art. 38 do Estatuto da Corte Internacional de Justiça, a atual
dinâmica das relações internacionais ocasiona em situações em que atos unilaterais acabam
por influenciar e produzir consequências jurídicas para outros atores internacionais,
independente do consentimento ou envolvimento destes, portanto, deve ser considerado
como uma das novas fontes de Direito Internacional Público.8

7
Vide questão 5.
8
Vide questão 7.
16
Tanto os atos unilaterais dos Estados quanto as decisões das organizações
internacionais (tema que será tratado a seguir), por serem expressão da vontade de um sujeito
internacional, são, portanto, considerados como modos de formação voluntários de Direito
Internacional Público, passíveis de produzir efeitos jurídicos, sejam eles erga omnes ou inter
partes, capazes de criar direitos e/ou obrigações. Desse modo, os atos unilaterais podem criar
precedentes de Direito Internacional.

Ato unilateral estatal seria a manifestação expressa de vontade formulada por uma
autoridade competente, a fim de produzir efeitos jurídicos numa relação jurídica internacional
(seja entre Estados ou entre um Estado e uma organização internacional), independente do
consentimento expresso da outra parte afetada. Portanto, são emanados de um único sujeito
de Direito Internacional Público, sem a participação de outras partes (mesmo que possa existir
o conhecimento da existência do ato).

Os atos unilaterais dos Estados têm de ser, obrigatoriamente, internacionais, ou seja,


seu valor coercitivo é determinado pela ordem jurídica internacional, e não a interna. Além
disso, havendo a intenção expressa de produzir efeitos jurídicos, responsabilizando o Estado
por esta manifestação de vontade, que deve ser pública e notória, já se pode considerar que o
ato unilateral estatal é válido. Assim, o Estado torna-se imputável por este ato.

Além do caso de vício de forma (onde o ato será nulo), a forma de expressar um ato
unilateral do Estado não tem muita importância, só sendo preciso que suas manifestações
sejam claras. Funciona o princípio do acta sunt servanda, onde todo ato unilateral em vigor
obriga o Estado que o formulou, devendo ser cumprido de boa-fé.

Os atos unilaterais dos Estados podem ser classificados em: expressos (seja na forma de
declaração escrita ou oral, mas sendo uma declaração formal) e tácitos (de modo implícito,
pelo silencio ou pela prática de ações compatíveis com o objeto do ato).

Quanto aos seus efeitos jurídicos, os atos podem ser divididos em: autonormativos (que
criam deveres e obrigações para os Estados que o manifestam) ou heteronormativos (aqueles
que atribuem direitos e prerrogativas a outros sujeitos de Direito internacional Público).

17
São considerados atos unilaterais dos entes estatais: protestos, notificações, renúncias,
denúncias, reconhecimentos, promessas, rupturas de relações diplomáticas, dentre outros.

3.6. Decisões de organizações internacionais

Também chamadas de “atos unilaterais das organizações internacionais” ou “atos das


organizações internacionais”, essas decisões são resultado das atividades de entidades como a
Organização das Nações Unidas (ONU) ou da Organização Internacional do Trabalho (OIT),
concretizadas através de atos que geram efeitos jurídicos para si (o ente) e até para os demais
sujeitos de Direito Internacional.

Apesar de tais decisões não estarem previstas no rol (exemplificativo) do já citado art.
38 do Estatuto da Corte Internacional de Justiça, devem ser consideradas como uma das
novas fontes de Direito Internacional Público, especialmente porque à época da criação do
Estatuto, as organizações internacionais estavam apenas começando a adquirir maior
importância e relevância no contexto internacional.9

As decisões das organizações internacionais são atos institucionais realizados com base
nas normas que disciplinam cada organização internacional específica, a partir de tratados
internacionais que as criaram e permitiram seu funcionamento nos termos acordados, inclusive
podendo prever eventuais sanções jurídicas. Desse modo, a participação dos Estados é apenas
indireta, pois votaram no momento de criação dessas organizações ou nas suas assembleias
gerais.

Destaca-se que as organizações internacionais podem praticar os mesmos atos


unilaterais que os Estados, mas há também atos específicos daquelas, como os atos
preparatórios para negociação de tratados, recomendações, resoluções, dentre outros,
apresentando também maior variedade na forma e no conteúdo. Porém, do mesmo modo
que ocorre com os atos unilaterais dos Estados, também é preciso que essas decisões tenham
caráter internacional para serem consideradas fontes de Direito Internacional Público.

9
Vide questão 10.
18
Nesta seara, é importante mencionar que as referidas decisões podem ser:

 Internas (quanto ao funcionamento da entidade) ou externas (quanto à tutela de


direitos e obrigações de outros sujeitos internacionais);
 Obrigatórias (caráter vinculante para seus destinatários; EX: recomendação da OIT ou do
Conselho de Segurança da ONU) ou facultativas (caráter de recomendação, são
propostas de ação, com força moral e política, mas não jurídica; EX: resolução da
Assembleia Geral da ONU);
 Resultado das deliberações: dos Estados-membros da entidade ou dos próprios órgãos
da organização.

Ademais, importante ressaltar a função das decisões das organizações internacionais em


facilitar a demonstração de um costume, bem como fomentar a criação de normas a respeito
de um assunto versado em seu âmbito, podendo chegar, inclusive, ao status de tratado ou de
soft law, como será visto.

3.7. Obrigações erga omnes, jus cogens e soft law

Em decorrência do constante desenvolvimento da sociedade internacional, surgiram


esses três novos modelos de obrigação jurídica, que estão intrinsicamente conectados à
reformulação das fontes do Direito Internacional Público, visto que atingem os sujeitos
internacionais de diferentes formas das fontes ditas “clássicas”.

Essas novas fontes são: obrigações erga omnes, jus cogens e normas de soft law.

a) Obrigações erga omnes

As obrigações erga omnes10 são aqueles que obrigam a todos os destinados,


independentemente de aceitação e sem possibilidade de objeção. Essas obrigações constituem
um conjunto de deveres, sendo impostas a todos os sujeitos do Direito Internacional Público,
sem exceções.

10
Vide questão 1.
19
Essas obrigações têm a característica da obrigatoriedade relacionada ao seu âmbito de
aplicação universal, e não em decorrência de sua hierarquia. Desse modo, nem toda obrigação
erga omnes será incondicional e inderrogável, sendo essa a sua diferença para as normas jus
cogens. Não obstante, qualquer sujeito internacional pode reclamar o descumprimento de
uma dessas obrigações contra um sujeito infrator, a fim de se preservar os valores
fundamentais da sociedade internacional.

As obrigações erga omnes são compostas pelas normas costumeiras internacionais; em


regra, não são compostas pelas normas firmadas por tratados, pois estes geralmente têm
caráter inter partes.

b) Jus cogens

Diferentemente do que ocorre com as obrigações erga omnes, as normas jus cogens11
são hierarquicamente superiores a todas as demais normas no plano internacional, tendo,
assim, uma noção mais ampla do que a anterior, já que se tratam de normas imperativas e
inderrogáveis (cuja aplicação é inafastável), quer por tratados, por costumes ou por princípios
gerais de Direito Internancional.

Todas as normas de jus cogens incluem obrigações erga omnes, mas a recíproca não é
verdadeira: nem todas essas obrigações constituirão àquelas normas.

Jus cogens são normas imperativas de Direito Internacional, cuja definição está prevista
no art. 53 da Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados. Assim, trata-se de uma
norma aceita e reconhecida pela comunidade internacional como uma norma da qual

11
Vide questão 2.
20
nenhuma confrontação é permitida, só podendo ser modificada através de outra norma
imperativa de Direito Internacional da mesma natureza.

A sociedade internacional atribui-lhe a maior importância, adquirindo primazia em


detrimento das demais normas, a fim de salvaguardar certos valores compreendidos como
essenciais para a convivência e cooperação da sociedade internacional. Desse modo, o jus
cogens representa uma restrição direta da soberania em prol da defesa de certos valores
internacionais, sendo quase que absolutamente imperativa.

A definição do que viria a configurar uma norma imperativa jus cogens é resultado de
um processo histórico, já que não está presente em nenhum tratado internacional, no qual a
sociedade internacional reconheceu a primazia de certos valores, a fim de salvaguardar a vida
e a dignidade humanas, bem como a coexistência pacífica e cooperativa dos sujeitos
internacionais.

Como exemplos, pode-se citar as normas que tutelam: os direitos humanos, o meio
ambiente, a paz e a segurança internacionais, o banimento de armas de destruição em massa,
dentre outras. O principal exemplo concreto de norma jus cogens é a Declaração Universal
dos Direitos Humanos (1948).

São, assim, características das normas jus cogens: a imperatividade de seus preceitos, a
rigidez no processo de alteração de seus preceitos e o conteúdo variável.

Portanto, em caso de eventual conflito de norma internacional com uma norma jus
cogens, a primeira será simplesmente inaplicável frente ao caso concreto. Afasta-se, assim,
critérios como o da especificidade e o cronológico de solução de conflitos de normas,
privilegiando apenas a hierarquia superior da norma jus cogens sobre todas as demais.

Apesar da previsão do art. 53 da Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados,


conclui-se que é um entendimento muito extremo, por isso, na prática, tem-se que a
superioridade da norma jus cogens não necessariamente levará à nulidade ou extinção de
todo o tratado que tenha a norma confrontante.

21
Neste sentido, segundo o art. 64 da Convenção de Viena sobre o Direito dos
Tratados, em caso de conflito entre norma de tratado e norma jus cogens superveniente, o
dispositivo do tratado será nulo a partir de seu aparecimento (o que não significa que haverá
efeitos retroativos, nem afetará a validade de acordos anteriormente realizados).

Apesar de ter inspiração jusnaturalista, as normas jus cogens não se confundem com as
normas de Direito Natural, pois não são preceitos imutáveis, mas que podem ser alteradas
conforme a evolução da sociedade internacional, desde que modificadas por normas ulteriores
da mesma natureza imperativa.

c) Soft law

O soft law consiste em uma nova modalidade normativa, de caráter mais flexível e
maleável, como indicado por sua nomenclatura (em oposição ao hard law, o direito
tradicional). É uma forma alternativa de orientar a conduta dos membros da sociedade
internacional, frente às transformações sociais de contexto global, que levaram à necessidade
de se estabelecer modos mais ágeis e maleáveis de disciplinar normas de convivência
internacional.

Desse modo, o soft law compreende todas as regras com valor normativo menos
obrigatório que o das normas jurídicas tradicionais, deixando aos seus destinatários uma certa
margem de aplicação no tocante ao seu conteúdo. A despeito de, por suas características,
existir a falta de meios que garantam sua efetiva aplicação, consiste em um instrumento que
privilegia noções como autonomia da vontade e arbitragem, a fim de atingir maior
flexibilização e rapidez na resolução de conflitos.

22
A priori, seriam regras de valor normativo limitado, seja por conta do seu instrumento
ou da disposição em causa, não criando obrigações de direito positivo, ou, caso venham a
cria-las, de modo menos constringente. No entanto, apesar de seu cumprimento estar mais no
sentido de “recomendação” do que de “obrigação”, isso não significa que não exista um
sistema de sanções, podendo repressões morais ou extrajurídicas.12

Como exemplos, pode-se citar: normas que prevejam mecanismos de solução de


controvérsias, atos entre Estados que não sejam tratados nem obrigatórios, atos não
obrigatórios das organizações internacionais, comunicados e declarações conjuntos, atas de
reuniões internacionais, códigos de conduta, leis-modelo, dentre outros.

A formação da soft law ocorre através de negociações (entre sujeitos internacionais ou


dentro de órgãos das organizações internacionais) rápidas, sem as tradicionais dificuldades
políticas na elaboração de tratados. Por isso, tais normas têm, muitas vezes, caráter de meras
recomendações.

Tais normas incluem, muitas vezes, preceitos que ainda não chegaram ao nível de
norma internacional jurídica vinculante (ou pouco vinculante). Assim, podem posteriormente
vir a ser incorporadas a fontes tradicionais de Direito Internacional Público (como tratados), ou
até mesmo vir a gerar leis internas.

Por fim, tem-se que o conteúdo jurídico da soft law ainda se encontra em construção, e
sua natureza jurídica ainda não está totalmente formada, sendo um instrumento internacional
em desenvolvimento.

12
Vide questão 8.
23
QUADRO SINÓTICO

TIPOS E CARACTERÍSTICAS DAS FONTES

FONTES CARACTERÍSTICAS DESTAQUES

Resultado de acordos É o tipo de fonte mais estudado


por ser considerado mais
Forma escrita
TRATADOS juridicamente seguro

Apenas celebrado por Estados e


organizações internacionais

Prática reiterada, geral e uniforme Primeira fonte de Direito


(elemento objetivo) Internacional
COSTUMES
Consciência da juridicidade da prática
(elemento subjetivo)

Normas de caráter genérico e Caráter normativo


PRINCÍPIOS abstrato
GERAIS DE
DIREITO Teor axiológico (valores tutelados
pelo Direito Internacional)

Decisões reiteradas de órgãos Fonte auxiliar de Direito


internacionais de solução de Internacional
JURISPRUDÊNCIA controvérsias, no mesmo sentido, em
casos semelhantes, em matérias de
Direito Internacional

24
Estudos de especialistas na matéria Fonte auxiliar de Direito
Internacional
DOUTRINA Pode incluir ramos do direito interno
relacionados ao Direito Internacional

Aplicável na falta de norma Seu caráter de fonte não é


adequada para o caso concreto, unânime
ANALOGIA
aplicando-se norma que regule
situação semelhante

Considerações de justiça em um caso Seu caráter de fonte não é


concreto na falta de norma unânime
EQUIDADE
regulamentadora ou na presença de
norma inadequada

Formulados sem a participação de Podem ser expressos ou tácitos


ATOS outros sujeitos internacionais
UNILATERAIS
DOS ESTADOS Influenciam juridicamente outros
sujeitos internacionais

Formulados sem a participação de Podem ter caráter impositivo ou


DECISÕES DE outros sujeitos internacionais facultativo
ORGANIZAÇÕES
INTERNACIONAIS Atos oriundos de organismos
internacionais

OBRIGAÇÕES
ERGA OMNES

Normas inderrogáveis, imperativas, Modificável apenas por norma da


obrigatórias mesma natureza

NORMAS JUS Valor primordial para a convivência


COGENS humana

São superiores a todas as demais


normas de Direito Internacional

25
Obrigatoriedade limitada ou Seu caráter de fonte não é
inexistente unânime, sendo o modelo mais
SOFT LAW
recente
Elaboração rápida e flexível

26
QUESTÕES COMENTADAS

Questão 1

MPF - Procurador da República – 2016

As obrigações erga omnes foram previstas expressamente no Estatuto da Corte


Internacional de Justiça, porém não autorizam o início de processo naquele tribunal contra
determinado Estado que as tenha descumprido.

Comentário:

As obrigações erga omnes não estão expressas no Estatuto da CIJ, porém, sua violação
permite que se busque a responsabilidade internacional do Estado que as tenha descumprido.
Questão errada.

Questão 2

MPF - Procurador da República – 2014

As normas de direito internacional peremptório (jus cogens) não guardam nenhuma


relação com o conceito de obrigação erga omnes.

Comentário:

27
Como visto, todas as normas jus cogens consistem em obrigações erga omnes, então,
pode-se dizer que existe uma forte relação entre normas jus cogens e obrigações erga omnes.
Questão errada.

Questão 3

Advogado da União – 2015

Diferentemente dos tratados, os costumes internacionais reconhecidos pelo Estado


brasileiro dispensam, para serem aplicados no país, qualquer mecanismo ou rito de
internalização ao sistema jurídico pátrio.

Comentário:

A assertiva está correta, pois costumes não estão sujeitos a um rito de internalização ao
sistema jurídico pátria, como os tratados internacionais, não sendo necessário qualquer
instrumento de incorporação ao ordenamento jurídico interno, pois a aceitação de um
costume ocorre de maneira tácita.

Questão 4

Juiz Federal TRF 5a Região – 2015

Admite-se a escusa de obrigatoriedade de um costume internacional se o Estado provar de


forma efetiva que se opôs ao seu conteúdo desde a sua formação.

Comentário:

A questão está incorreta, pois segundo a teoria do objetor persistente, de viés


voluntarista, o Estado pode se escusar da obrigatoriedade de um costume se provar que, de
forma persistente, se opôs ao seu conteúdo desde a sua formação.
28
Questão 5

Instituto Rio Branco – 2015

Aos juízes de Haia, autorizados pelo estatuto da Corte Internacional de Justiça, é conferido o
poder de aplicar, de forma automática, tanto normas escritas quanto normas não escritas,
além de costume, de equidade e de princípios gerais do direito.

Comentário:

A questão estaria correta, no entanto, a equidade não pode ser aplicada de forma
automática pela Corte Internacional de Justiça, somente sendo possível por expressa
concordância das partes, como previsto no art. 38 do Estatuto. Questão errada.

Questão 6

Consultor Legislativo / Câmara dos Deputados – 2014

A prática reiterada e uniforme adotada com convicção jurídica, denominada direito


costumeiro, possui no direito internacional hierarquia inferior às normas de direito escrito.
Logo, no direito das gentes, tratados não podem ser revogados por direito consuetudinário.

Comentário:

A assertiva está incorreta, pois o costume é uma prática geral, uniforme e constante
aceita como sendo o direito. Os costumes não têm hierarquia inferior às normas de direito
escrito (os tratados), pois não existe hierarquia entre as fontes de Direito Internacional Público.
Portanto, é plenamente possível que um costume revogue um tratado.

29
Questão 7

Consultor Legislativo/ Câmara dos Deputados – 2014

Atos unilaterais de Estados são modernamente admitidos como fontes extraconvencionais de


expressão do direito internacional, embora não estejam previstos como tal no Estatuto da
Corte Internacional de Justiça.

Comentário:

Os atos unilaterais dos Estados, embora não previstos no art. 38 do Estatuto da Corte
Internacional de Justiça, são considerados novas fontes do Direito Internacional Público.
Questão correta.

Questão 8

Procurador BACEN – 2013

Essas normas não têm o mesmo grau de atribuição de capacidades nem são tão
importantes quanto as normas restritivas, mas os Estados comprometem-se a cooperar e a
respeitar os acordos realizados, sem submeter-se, no entanto, a obrigações jurídicas. O
fragmento de texto citado acima refere-se a:

a) costumes.

b) soft norms.

c) princípios gerais de direito.

d) umbrella conventions

30
e) tratados.

Comentário:

O enunciado refere-se à soft law (ou soft norms), compromissos não vinculantes feitos
pelos Estados. Gabarito: B.

Questão 9

Instituto Rio Branco – 2012

Considerando as fontes de direito internacional público previstas no Estatuto da Corte


Internacional de Justiça (CIJ) e as que se revelaram a posteriori, bem como a doutrina acerca
das formas de expressão da disciplina jurídica, assinale a opção correta.

a) De acordo com o Estatuto da Corte da Haia, a equidade constitui, apesar de seu caráter
impreciso, fonte recorrente e prevista como obrigatória na resolução judicial de contenciosos
internacionais.

b) A expressão não escrita do direito das gentes conforma o costume internacional como
prática reiterada e uniforme de conduta, que, incorporada com convicção jurídica, distingue-se
de meros usos ou mesmo de práticas de cortesia internacional.

c) As convenções internacionais, que podem ser registradas ou não pela escrita, são
consideradas, independentemente de sua denominação, fontes por excelência, previstas
originariamente no Estatuto da CIJ.

d) Em face do caráter difuso da sociedade internacional, bem como da proliferação de


tribunais internacionais, verifica-se no direito internacional crescente invocação de decisões
judiciais antecedentes, arroladas como opinio juris, ainda que não previstas no Estatuto da CIJ.

31
e) Ainda que não prevista em tratado ou no Estatuto da CIJ, a invocação crescente de
normas imperativas confere ao jus cogens manifesta qualidade de fonte da disciplina, a par de
atos de organizações internacionais, como resoluções da ONU.

Comentário:

Letra A: errada, pois a equidade não é fonte obrigatória para a solução de litígios
internacionais, só podendo ser empregada quando houver a concordância das partes
litigantes. Letra B: correta, pois costumes não são meros usos ou práticas de cortesia
internacionais. Além de ser uma prática reiterada e uniforme de conduta, os costumes
possuem também um elemento subjetivo: a convicção jurídica. Letra C: errada, pois os
tratados são fonte escrita do direito internacional público. Letra D: errada, pois as decisões
judiciais internacionais é uma fonte de Direito Internacional Público prevista no art. 38 do
Estatuto da Corte Internacional de Justiça. Letra E: errada, pois o jus cogens não pode ser
considerado uma fonte do direito internacional, significando apenas atribuir a uma norma um
qualificativo especial, por ser imperativa, inderrogável a não ser por outra de mesmo nível.

Questão 10

Procurador BACEN- 2001

O estudo das fontes do Direito Internacional Público principia com a leitura do artigo
38 do Estatuto da Corte Internacional de Justiça. Ao citado dispositivo poder-se-ia acrescentar,
na hora atual, as seguintes fontes:

a) Contratos internacionais e decisões de organizações internacionais.

b) Algumas decisões de organizações internacionais e Constituição dos Estados.

c) Constituição dos Estados e lex mercatoria.

d) Lex mercatoria e determinados atos unilaterais dos Estados.

32
e) Determinados atos unilaterais dos Estados e algumas decisões de organizações
internacionais.

Comentário:

Letra A: contratos internacionais não são fontes de Direito Internacional Público, mas
decisões das organizações internacionais são consideradas fontes. Letra B: as Constituições dos
Estados não são fontes. Letra C: a lex mercatoria e as Constituições dos Estados não são
fontes. Letra D: os atos unilaterais dos Estados são considerados fontes e poderiam ser
incluídos no rol do art. 38, mas a lex mercatoria não é fonte de DIP. Letra E: tanto os atos
unilaterais quanto as decisões das organizações internacionais são consideradas fontes de
Direito Internacional Público, podendo ambas ser inclusas no rol do art. 38 do Estatuto da
Corte Internacional de Justiça.

Questão 11

Instituto Rio Branco- 2010

O costume, fonte do direito internacional público, extingue-se pelo desuso, pela adoção
de um novo costume ou por sua substituição por tratado internacional.

Comentário:

A assertiva descreve corretamente as três formas de extinção de um costume: desuso,


adoção de um novo costume e substituição por um tratado internacional (codificação do
direito consuetudinário). Questão correta.

Questão 12

33
Advogado da União-2006

Para que um comportamento comissivo ou omissivo seja considerado como um


costume internacional, é necessária a presença de um elemento material, qual seja: uma
prática reiterada de comportamentos que, de início, pode ser um simples uso.

Comentário:

A existência de um costume internacional pressupõe a existência de um elemento


material (objetivo) e um elemento psicológico (subjetivo). Inicialmente, a prática reiterada
pode ser um simples uso, não possuindo ainda o elemento subjetivo, ou seja, a convicção de
que ela seja juridicamente exigível. Desse modo, o mero uso pode evoluir a ponto de tornar-
se um costume. Questão correta.

34
GABARITO

Questão 1 - Errada

Questão 2 - Errada

Questão 3 - Correta

Questão 4 - Errada

Questão 5 - Errada

Questão 6 - Errada

Questão 7 - Correta

Questão 8 - B

Questão 9 - B

Questão 10 - E

Questão 11 - Correta

Questão 12 - Correta

35
LEGISLAÇÃO COMPILADA

Nesta matéria, faz-se de extrema importância a leitura de:

Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados (Decreto Executivo nº


7.030/2009)

 Art. 53
 Art. 64

Carta das Nações Unidas

 Art. 94
 Art. 103

Estatuto da Corte Internacional de Justiça

 Art. 38
 Art. 59

36
JURISPRUDÊNCIA

Jurisprudência do STJ sobre tratados e costumes


internacionais:

 AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL Nº 1.074.507 - SP (parte da ementa):

DECISÃO 1. Cuida-se de agravo interposto por NORDIC TRUSTEE ASA contra decisão
que negou seguimento ao seu recurso especial, por sua vez manejado em face de
acórdão do eg. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, assim ementado: HIPOTECA
MARÍTIMA Embarcação destinada à exploração de petróleo na costa brasileira Bandeira
liberiana, com hipoteca em favor da agravante, registrada sob a lei liberiana Bem que é
penhorado em execução movida por terceiro Credora hipotecária que pretende a
preferência sobre o produto da arrematação Reconhecimento da hipoteca estrangeira
no Brasil Impossibilidade Estado da Libéria que não é signatário de tratados e
convenções internacionais a esse respeito, a que o Brasil tenha aderido Costume
internacional nesse sentido não verificado: Inviável o reconhecimento da validade no
Brasil de hipoteca registrada sob as leis liberianas, incidente sobre embarcação de
bandeira liberiana, para o fim de garantir ao credor hipotecário a preferência sobre o
produto da alienação da embarcação, penhorada em execução ajuizada por outro
credor, uma vez que a Libéria não é signatária de tratados e convenções internacionais
a esse respeito a que o Brasil tenha aderido, e que não se verifica a existência de
costume internacional nesse sentido. (...) (STJ - AREsp: 1074507 SP 2017/0065899-5,
Relator: Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, Data de Publicação: DJ 27/09/2017).

37
Jurisprudência do TST sobre doutrina internacional

 TST - RECURSO DE REVISTA: RR 540-15.2013.5.04.0662 (parte da ementa):

(...) RECURSO DE REVISTA. CONTRATO DE APRENDIZAGEM. CRITÉRIO DE CÁLCULO


PARA O NÚMERO DE APRENDIZES A SEREM CONTRATADOS. EMPRESA DE VIGILÂNCIA.
POSSIBILIDADE DE INTEGRAÇÃO NA BASE DE CÁLCULO DA COTA DE APRENDIZAGEM.
A Constituição Federal de 1988, em seu art. 227, acolheu inteiramente os fundamentos
da aclamada doutrina internacional da proteção integral e prioritária da criança, do
adolescente e do jovem, inaugurando no ordenamento jurídico brasileiro um novo
paradigma de tratamento a ser destinado ao ser humano que se encontra na peculiar
condição de pessoa em desenvolvimento. Dentro desta nova cultura jurídica, o art. 7º,
XXXIII, da CF/88 conferiu aos menores de 16 anos o direito fundamental ao não
trabalho (com o fim de preservar o seu desenvolvimento biopsicossocial), salvo na
condição de aprendiz a partir dos 14 (quatorze) anos - em perfeita harmonização com o
também direito fundamental à profissionalização (art. 227, caput). Constata-se, assim,
que o contrato de aprendizagem foi ressalvado pela própria Constituição (art. 7º, XXXIII;
art. 227, § 3º, I), sendo tradicionalmente regulado pela CLT (arts. 428 a 433). (...) Recurso
de revista conhecido e parcialmente provido. (TST - RR: 5401520135040662, Relator:
Mauricio Godinho Delgado, Data de Julgamento: 11/10/2017, 3ª Turma, Data de
Publicação: DEJT 27/10/2017).

38
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

AMARAL JÚNIOR, Alberto do. Introdução ao direito internacional público. São Paulo: Atlas,
2008.

CANÇADO, Trindade, Antônio Augusto. Princípios do direito internacional contemporâneo


– 2. ed. rev. atual. – Brasília: FUNAG, 2017.

CASELLA, Paulo Borba; Hildebrando Accioly e G. E. do Nascimento e Silva. Manual de


direito internacional público.— 20. ed. — São Paulo: Saraiva, 2012.

MAZZUOLI, Valerio de Oliveira. Curso de direito internacional público. 9. ed. rev., atual. e
ampl. -- São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2015.

PORTELA, Paulo Henrique Gonçalves. Direito Internacional Público e Privado. 9ª ed.


Salvador: Juspodivm, 2017.

REZEK, Francisco. Direito internacional público – Curso Elementar. 17ª ed. São Paulo:
Saraiva, 2018.

SOARES, Guido Fernando Silva. Curso de direito internacional público. São Paulo: Atlas,
2002.

39
CARREIRA JURÍDICA

Direito Internacional
Capítulo 3
SUMÁRIO
DIREITO INTERNACIONAL, Capítulo 3....................................................................................... 3

1. Direito dos Tratados............................................................................................................. 3

2. Condições ou requisitos de validade dos tratados ......................................................... 6

3. Terminologia e espécies ...................................................................................................... 9

4. Estrutura ............................................................................................................................... 11

5. Classificação ......................................................................................................................... 13

6. Etapas do processo de elaboração dos tratados ........................................................... 15

7. Processualística constitucional de celebração de tratados no Brasil ......................... 23

QUADRO SINÓTICO .................................................................................................................... 29

QUESTÕES COMENTADAS ......................................................................................................... 32

GABARITO .................................................................................................................................... 42

LEGISLAÇÃO COMPILADA ......................................................................................................... 43

JURISPRUDÊNCIA .......................................................................................................................... 45

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .................................................................................................... 50

2
DIREITO INTERNACIONAL

Capítulo 3

1. Direito dos Tratados

1.1. A Convenção de Viena de 1969: conceito e natureza jurídica

A Convenção de Viena sobre Direito dos Tratados, de 1969, começou a vigorar em


1980, sendo ratificada pelo Brasil apenas em 2009, através do Decreto Executivo nº 7.030. Esta

Convenção é o principal instrumento internacional acerca da elaboração e aplicação dos


tratados internacionais.

Tratados são instrumentos que consistem em acordos escritos e formais (quer seja
através de um instrumento único ou em instrumentos conexos – anexos ou protocolos

adicionais), entre Estados, entre Estados e Organizações Internacionais ou entre Organizações

Internacionais, regidos pelos ditames do Direito Internacional Público, a fim de produzir efeitos
jurídicos acerca de temas de interesse compartilhado por suas partes.

É uma manifestação de vontades que pressupõe controle democrático, com fulcro no

princípio do livre consentimento, a fim de criar um vínculo juridicamente exigível, produzindo

efeitos em âmbito internacional. O tratado internacional é um instrumento que pode ser


identificado tanto por seu processo de produção, como por sua forma final.

No entanto, ressalta-se que indivíduos, apesar de serem sujeitos de Direito Internacional

Público, não são capazes (requisito de validade) de celebrar tratados internacionais.

Como fonte de Direito Internacional Público, os tratados produzem efeitos jurídicos no

sentido de criar, modificar ou extinguir direitos e obrigações internacionais, estabelecendo

também eventuais sanções em caso de descumprimento de seus preceitos, pois possuem

3
caráter vinculante (tanto em âmbito interno quanto internacional) para os sujeitos que são

destinatários de suas normas. 1

Em virtude das características inerentes dos tratados, como ser um acordo escrito e,

logo, oferecer mais clareza, legitimidade, segurança e estabilidade jurídica aos atores, a maior

quantidade de normas internacionais são consagradas na forma de tratados, dentre as demais


fontes de Direito Internacional Público.

Apesar de os tratados terem seu conteúdo estabelecido pelas próprias partes

contratantes, devendo haver consentimento expresso com seu teor para que tal acordo seja
juridicamente vinculante, eles são regidos pelos preceitos do Direito Internacional Público,

devendo obedecer a suas exigências formais e procedimentos. 2 Ademais, a despeito de seu

conteúdo “livre”, os tratados não podem violar as normas jus cogens, que, como visto, são

hierarquicamente superiores a todas as normas internacionais, nem os princípios gerais do

Direito e do Direito Internacional.

Desse modo, pode-se dizer que o Direito dos Tratados regula:

a) a forma de os Estados ou organizações internacionais negociarem;


b) os órgãos encarregados de tais negociações;
c) o modo de interpretação do texto convencionado;
d) as formas de assegurar a autenticidade do texto convencionado;
e) o modo de os contratantes expressarem seu consentimento;
f) o modo como se dá a entrada em vigor do referido texto;
g) o modo como será incorporado ao direito interno;
h) quais os vícios aptos a anular ou nulificar o tratado;
i) os efeitos produzidos sobre as partes e/ou terceiros;
j) o modo como são extinguidos os atos internacionais.

Ademais, ressalta-se que a Convenção de Viena tem autoridade jurídica mesmo para os
Estados não signatários a ela. Além disso, foi estabelecido que os tratados não ratificados têm

valor de costume positivado até sua eventual ratificação.

1
Vide questões 1 e 4.
2
Vide questão 3.
4
 Princípios norteadores da elaboração de tratados internacionais:
a) Livre Consentimento Mútuo: As partes são livres para pactuar as obrigações, não
podendo haver nenhum tipo de coação, sob pena de o tratado ser anulado.
b) Boa-fé: Deve haver comportamento com padrão ético de confiança e lealdade.
c) Pacta sunt servanda: Tudo o que for pactuado no tratado, de livre e espontânea
vontade, deve ser obrigatoriamente cumprido.
d) Solução Pacífica de Controvérsia: Os Estados devem cumprir com o que foi pactuado,
buscando tentar solucionar, pacificamente, eventuais conflitos, antes da adoção de
meios coercitivos e, até mesmo, extremos (como a guerra).
e) Continuidade do Estado: O Estado para sempre existirá, independentemente de
modificações expressivas em sua titularidade e soberania.

A Convenção de Viena de 1969 versou apenas sobre o direito do tratado entre Estados,
que era considerado o único sujeito de Direito Internacional Público à época. Porém, no

contexto pós-2ª Guerra Mundial, com o número crescente de organizações internacionais,

tornou-se necessário a existência de regulamentação da matéria.

Assim, para disciplinar os tratados de que são partes organizações internacionais, foi

criada a Convenção de Viena de 1986 (Convenção de Viena Sobre Direito dos Tratados entre
Estados e Organizações Internacionais ou entre Organizações Internacionais). No entanto,

destaca-se que ela ainda não entrou em vigor internacional por não ter atingido o quórum

mínimo estipulado em seus dispositivos de 35 ratificações de Estados.

5
2. Condições ou requisitos de validade dos tratados

Existem condições específicas e obrigatórias que condicionam a validade de todo os


tratados internacionais. Esses requisitos serão dispostos em ordem a seguir:

a) Capacidade das partes

Primeiro, é necessário que o sujeito internacional tenha capacidade para celebrar um

tratado; ser capaz é ser sujeito de Direito Internacional Público, mas nem todo sujeito
internacional é capaz de celebrar tratados.

Um Estado é automaticamente um sujeito capaz, através principalmente de seu Poder


Executivo nacional. O art. 21, I, da Constituição Federal, estabelece que a União é o ente

federativo responsável pela conclusão de tratados. Já o art. 84, incisos VII e VIII, da
Constituição Federal, prevê que o Presidente da República é a autoridade competente para

celebrar tratados em nome do Brasil. Há também a participação do Congresso Nacional na

incorporação dos tratados internacionais no âmbito interno, que será analisada em breve.

Com relação às organizações internacionais, elas só podem celebrar tratados

internacionais relativos a seus objetivos, portanto, possuem uma capacidade parcial,

decorrente da habilitação dada por seu ato constitutivo. É também uma capacidade derivada,

pois advém da decisão dos Estados-membros da organização internacional em celebrar


tratados em seu âmbito. Ademais, cada organização internacional estabelece os órgãos

internos competentes para celebrar tratados e representá-la.

b) Habilitação dos agentes signatários

Após a capacidade, deve haver também a habilitação de quem está representando o

sujeito internacional. Cada Estado ou organização internacional têm competência para definir

quais os indivíduos habilitados para representar o sujeito na negociação e celebração do


tratado internacional. Destaca-se que o art. 7º da Convenção de Viena de 1969 estabelece

um rol de agentes habilitados a celebrar tratados, independente de comprovação de poder

para tal.

6
Com relação aos Estados, para o Presidente da República, este ato é delegável para

outros representantes, geralmente embaixadores, diplomatas ou o Ministro das Relações

Internacionais, pois tal competência é exclusiva. No Brasil, essa competência pode ser
delegada para alguém “comum”, ou seja, sem essas titulações decorrentes de cargo; neste

caso, o Presidente da República deve conceder poderes especiais através de uma Carta de
Plenos Poderes. No entanto, um ato internacional praticado por quem não tem habilitação, em

regra, não produz efeitos jurídicos, a não ser que o ato seja posteriormente confirmado pelo

Estado mal representado. Ressalta-se que não precisam da Carta de Plenos Poderes: o

Presidente da República, o Ministro das Relações Exteriores e o Embaixador.

Com relação às organizações internacionais, cada ato constitutivo estabelecerá os

agentes que podem assinar um tratado em seu nome.

c) Consentimento mútuo e regular:

Deve haver concordância das partes, sem coerção, como expressão do fundamento da
vontade e do consentimento dos sujeitos no âmbito do Direito Internacional. A vontade deve

ser livre e não estar influenciada por vícios, sob pena de a norma ser considerada inválida.

Os vícios de consentimento que podem prejudicar a validade dos tratados

internacionais são: o erro, o dolo, a coação e a corrupção do representante do Estado. As três


primeiras espécies de vícios já são conhecidas pelo estudo do Direito Civil, no entanto, a

quarta espécie está prevista no art. 50 da Convenção de Viena de 1969, onde se elucida que

a corrupção do representante do Estado se dá por fruto da ação direta ou indireta de outro


Estado negociador.

d) Objeto lícito e possível

O objeto do tratado deve ser lícito e possível, não podendo violar normas internacionais

já existentes, a não ser nos casos que seja possível substituí-las em decorrência das novas

serem mais justas e condizentes com a nova realidade internacional, nem violar normas de jus

cogens.

Ademais, em nível de hierarquia, normas de tratados regionais não devem violar as

normas de âmbito universal, só sendo permitido ampliar as normas para que estas se

7
adequem as particularidades regionais a fim de fortalecer a norma, mas nunca para excluir

direitos.

8
3. Terminologia e espécies

O tratado é um gênero do qual existem várias espécies, no entanto, o emprego dos


termos que indicam o tipo de tratado é usado de forma indiscriminada na prática

internacional, como se fossem sinônimos. Porém, usar a terminologia inadequada para

denominar um tipo de tratado não retira dele seu caráter jurídico, sendo vinculante

independente da denominação.

A doutrina traz uma séria de terminologias, cada uma adequada para situações
diferentes nas relações internacionais, segundo o conteúdo ou o objetivo. São exemplos de

espécies de tratado, em um rol não exaustivo:

a) Ato internacional: é sinônimo de tratado, aplicável a compromissos mais solenes e

formais, com maior importância política.

b) Convenção: geralmente é um termo empregado para acordos multilaterais cujo


objetivo é fixar normas gerais de Direito Internacional para assuntos de interesse
mundial (como direito ambiental e direitos humanos).

c) Acordo: costuma ser usado para compromissos com menor número de participantes e
menor importância política.

d) Pacto: são compromissos com grande importância política, mas com maior
especificação quanto ao tratamento do conteúdo abordado.

e) Protocolo: termo geralmente referente a compromissos menos formais, como aqueles


meramente complementares ou interpretativos de outros tratados.

f) Ajuste complementar: objetiva detalhar ou executar outro tratado de escopo mais


amplo, geralmente um do tipo “acordo”.

9
g) Carta: é o tipo de tratado que cria organizações internacionais, seus objetivos, órgãos e
modo de funcionamento (por exemplo, a Carta da ONU). O termo “estatuto” é utilizado
para os tratados que criam tribunais internacionais (por exemplo, Estatuto de Roma do
Tribunal Penal Internacional).

h) Memorando de entendimento: é um tipo específico, que visa a registrar princípios


gerais que virão a orientar as relações internações entre seus participantes.

i) Convênio: geralmente é relacionado a tratados de natureza mais específica, como


econômica, comercial, cultural, científica, dentre outras, a fim de regular a cooperação
entre as partes signatárias.

j) Declaração: termo usado para os tratados que consagram princípios, afirmando uma
posição comum entre os sujeitos contratantes acerca de certas circunstâncias e fatos.

k) Concordata: aplica-se apenas aos compromissos firmados pela Santa Sé em assuntos


de cunho religiosa, sendo a espécie mais específica de todas.

l) Acordo por troca de notas: geralmente utilizado para conteúdos de natureza


administrativa, bem como para interpretar ou alterar dispositivos de tratados já
conclusos. É constituído por uma nota diplomática do proponente e uma nota de
resposta.

m) Modus vivendi: destinada para tratados de menor importância e de vigência


temporária, geralmente enquanto as partes não avançam nos termos de seu
compromisso.

10
4. Estrutura

O fato de os tratados internacionais serem acordos escritos e formais pressupõe que


existe uma estrutura mínima como modo de identificar o tipo de instrumento que externa o

acordo internacional. A despeito disso, as diferentes circunstâncias da prática internacional

influenciam tanto no conteúdo quanto na forma de cada tratado.

Assim, em geral, os tratados internacionais possuem as seguintes partes:

a) Título

É a parte que retrata o tema, o assunto ou a matéria de que versa o tratado.

b) Preâmbulo ou exórdio

Consiste na enumeração dos contratantes, das partes do tratado, quem está pactuando,

dos sujeitos que fazem parte dele, e também das credenciais dos representantes a fim de se

comprovar sua competência para celebrar tratados internacionais. O preâmbulo não tem força

obrigatória ou vinculante, ou seja, não integra a parte jurídica do acordo, sendo mero

instrumento de interpretação do tratado.

Além disso, é composto também pelos “considerandos”: os motivos, as intenções,

justificativas, circunstâncias que levaram os Estados à negociação desse acordo. Não é

elemento obrigatório, mas também serve apenas para a interpretação do texto.

c) Articulado ou dispositivo

É a parte principal, das disposições, suas normas, seus artigos, obrigações e direitos.

Consiste na sequência de artigos numerados, em linguagem jurídica, que estabelece as

cláusulas de operatividade do acordo, possuindo obrigatoriedade jurídica.

Após o corpo do tratado e as disposições de direito subjetivo, vem o testemunho: as


cláusulas finais, de natureza adjetiva, relativas à ratificação e à troca dos instrumentos, a

entrada em vigor, a eventual possibilidade de denúncia ou prorrogação, eventual prazo de

vigência, possibilidade de adesão ou revisão etc.

11
Além disso, é costume ainda a menção do testemunho: “em fé do que...”.

d) Fecho

É a parte que discrimina o local de celebração do tratado e a data, quantos exemplares

originais existem, em quais idiomas ele foi redigido (parte formal). Com isso, o instrumento

estará apto às próximas etapas.

e) Assinaturas

As assinaturas das autoridades que representam as partes do tratado servem para

convalidar o acordo internacional. Nos tratados bilaterais, a assinatura obedece ao sistema de


alternância ou inversão: cada negociador põe primeiro sua assinatura no exemplar que ficará

com o sujeito internacional que representa. Já nos tratados multilaterais, as assinaturas são
postas de acordo com a ordem alfabética dos nomes dos negociadores. Há, ainda, a
possibilidade de sortear a ordem de disposição das assinaturas.

f) Selo de lacre

Através da aposição das armas das altas partes-contratantes, sela-se o compromisso


estabelecido entre eles.

g) Anexos ou apêndices

Os anexos ou apêndices são partes eventuais dos tratados, consistindo em algum

complemento que se faça necessário. Apesar de não obrigatórios, se existirem, integram o

tratado e os seus dispositivos com natureza de norma jurídica convencional.

12
5. Classificação

A seguir, algumas das classificações dos tratados feitas pela doutrina:

a) Quanto ao número de partes ou quantidade de signatários: bilaterais ou particulares


(2 partes) e multilaterais, coletivos, gerais ou plurilaterais (3 ou mais partes).

b) Quanto ao tipo de procedimento para conclusão (etapas de elaboração): bifásico ou


solene (maioria dos Estados emprega esse tipo; uma fase de negociação e assinatura e
uma fase de aprovação e ratificação interna) e unifásico ou simplificado (menos usado,
mais célere, menos etapas; ratificação automática com assinatura; geralmente utilizado
para os tratados que meramente dão execução a um outro tratado anterior, com
escopo mais amplo). O Brasil adota, predominantemente, a forma solene, permitindo o
modo simplificado quando o ato não trouxer compromissos adicionais ao Estado
brasileiro.

c) Quanto à execução no tempo: permanentes (efeitos amplos e indeterminados, sem


“prazo de validade”, cuja execução ocorre durante o período em que estão em vigor) e
transitórios (tem uma limitação temporal, mas são aplicados imediatamente).

d) Quanto à estrutura de execução: mutalizável (permite divisão na sua execução, como,


por exemplo, a saída de uma parte não obstar sua continuação) e não-mutalizável (não
permite a divisão na sua execução).

e) Quanto à possibilidade de adesão posterior: aberto (outras partes, que não


participaram da negociação, podem entrar posteriormente, de modo parcial ou total;
além disso, o tratado aberto pode ser limitado: só determinados sujeitos podem entrar,
como, por exemplo, os tratados do Mercosul, ou ilimitado: qualquer ente pode entrar,
como a Carta da ONU) e fechado (apenas as partes que participaram da negociação
podem entrar, mesmo que após sua finalização, não permitindo adesão posterior).

13
f) Quanto à natureza das normas: tratado-contrato (visa conciliar interesses convergentes
das partes, através de prestações, concessões e contrapartidas) e tratado-lei ou tratado-
normativo (estabelece normas gerais de direito a partir da vontade convergente das
partes, fixando um tratamento comum e uniforme a certa temática). O que
normalmente ocorre, na prática, é um tratado ter ambas essas características, podendo
ser chamado de “misto”.

g) Quanto aos efeitos: limitados (efeitos restritos às partes signatárias; é a regra no


Direito Internacional, em virtude do princípio da vontade dos sujeitos) e ilimitados
(geram consequências jurídicas a entes que não participaram de seu processo de
formação, quando se trata de normas de manutenção da paz e da segurança
internacional; por exemplo, a Carta da ONU).

14
6. Etapas do processo de elaboração dos tratados

Os tratados internacionais são constituídos através de um processo, cuja observância


condiciona sua validade. Existem etapas ou fases internacionais da formação dos tratados, que

são obrigatórias para sua preparação, só gerando efeitos quando cumpridas todas elas.

Não obstante os ritos internos de incorporação dos tratados internacionais no âmbito

nacional de cada Estado serem diferentes, as etapas internacionais são padronizadas para
todos os sujeitos de Direito Internacional Público, conforme segue, na ordem:

a) Negociações preliminares

É a fase inicial do processo de elaboração do tratado, onde as partes discutem e

estabelecem os termos do acordo. É um processo que pode ter longa duração, variando de
acordo com a complexidade do objeto e o nível de convergência dos interesses dos sujeitos.

A competência para conduzir as negociações preliminares é não só do Poder Executivo,


mas também pode ser de todas as já citadas autoridades competentes para concluir os
tratados, podendo haver também o auxílio de especialistas no tema, dependendo do caráter

técnico e especializado de certos temas. Independente disso, o agente que for conduzir as

negociações deve saber coincidir os diversos interesses daqueles envolvidos na questão, como

os diversos atores sociais, empresas, organizações não governamentais, dentre outros.

b) Adoção do texto

Concluído o tratado, chancela-se sua redação.

c) Autenticação

O texto do tratado é autêntico e definitivo; consiste em documentar a adoção.

d) Assinatura

É o ato através do qual os negociadores, chegando a um acordo, encerram as

negociações. Com a assinatura, já podem decorrer obrigações para as partes contratantes,


porém, no caso de tratados que adotam a forma solene, a assinatura consiste apenas em uma
15
anuência preliminar, que ainda não vincula as partes, o que só ocorrerá após a aceitação

definitiva, na etapa seguinte.

No entanto, existem também tratados (aqueles que adotam a forma simplificada) que já

produzem efeitos a partir da assinatura das partes, vinculando suas partes a não atuarem de

forma a comprometer seu objeto, com base no princípio da boa-fé.

Ademais, a assinatura impede que o texto acordado seja alterado de modo unilateral.

Antes da entrada em vigor do tratado, eventuais mudanças só poderão ser feitas com a

reabertura das negociações; com o tratado já em vigor, por meio de emendas.

e) Ratificação

Também chamado de “ato de confirmação formal”, a ratificação é o ato pelo qual o


Estado confirma seu interesse em concluir e estabelecer os termos do tratado, obrigando-se

por suas normas. Enquanto a assinatura pode ser a anuência provisória, a ratificação é a
aceitação definitiva. 3

Apesar de ser um ato de Direito Internacional, cabe a cada ordenamento jurídico


interno estabelecer que agentes têm competência para praticar esse ato. Para garantir a

segurança jurídica e o Estado Democrático de Direito, a ratificação no Brasil tem caráter

privativo, ou seja, é uma competência indelegável do Presidente da República, sendo um ato

discricionário (não está vinculado a um prazo específico após a assinatura), mas condicionado

à autorização do Congresso Nacional, nos termos do art. 49, I, da Constituição Federal.

Se houver referendo parlamentar, o texto do tratado retorna ao Poder Executivo, que

tem a faculdade de referendar o tratado (consentimento definitivo do Estado). Após isso,

haverá a expedição da carta de ratificação para comunicar às partes que o tratado foi aceito

internamente e será cumprido. Depois, haverá a troca (tratado bilateral) ou o depósito (tratado

multilateral) da ratificação, representando este ato a entrada em vigência do tratado.


Posteriormente a isso, o Estado só poderá desvincular-se das obrigações estabelecidas no

tratado através do instrumento da denúncia.

3
Vide questão 8.
16
f) Entrada em vigor em âmbito internacional

Existem várias formas pelas quais um tratado pode começar a gerar efeitos jurídicos; a

ratificação vincula o sujeito internacional a cumprir o tratado, mas não gerará efeitos no caso

de um tratado bilateral que ainda não foi ratificado pela outra parte, ou um tratado

multilateral que ainda não atingiu o número mínimo de ratificações para produzir efeitos, ou
ainda no caso de um tratado que tenha estabelecido a produção de efeitos depois de

determinado prazo temporal.

Ressalta-se que a entrada em vigor de um tratado em âmbito internacional não se

confunde com a exigibilidade no âmbito interno, que depende de outros procedimentos que
serão posteriormente estudados.

Nos tratados bilaterais, a produção de efeitos está vinculada ou à notificação da

ratificação ou à troca dos instrumentos de ratificação entre as partes. Já nos tratados

multilaterais, há o processo do depósito, onde o depositário (que não precisa ser parte do
tratado) guardará os instrumentos de ratificação dos contratantes e, quando atingir o número

mínimo de ratificações estabelecido no tratado, este produzirá efeitos, mas apenas para

aqueles sujeitos que já o ratificaram.

No Brasil, uma vez ratificado o tratado, este também deve ser promulgado através de
decreto executivo do Presidente da República, produzindo efeitos também dentro do

ordenamento interno.

g) Registro e publicidade

Parte da doutrina considera a disposição do art. 102 da Carta da ONU como condição

final para que o tratado entre em vigor. No entanto, na prática, o registro serve apenas para
contribuir na consolidação das normas de Direito internacional, dando publicidade ao ato para

a sociedade internacional. Confirme a previsão acima mencionada, o registro consiste, na

verdade, em condição para que uma norma internacional seja invocada nos órgãos das

Nações Unidas.

Existem também outros instrumentos que podem vir a desempenhar papeis importantes

no curso do processo de formação de um tratado internacional, que serão vistos a seguir.

17
a) Adesão

A não participação de um Estado ou organização internacional em um processo de

elaboração de um tratado internacional não significa, necessariamente, que o sujeito não

poderá ingressar nele posteriormente, vinculando-se aos compromissos já estabelecidos por

outras partes. Isso se dá através do instrumento da adesão, que é o ingresso ao tratado

quando já concluídas as negociações; é um ato de manifestação de vontade dos sujeitos de


Direito Internacional.

A adesão possui natureza jurídica de ratificação, sendo normalmente condicionada à


observância dos critérios estabelecidos no próprio tratado, ou seja, a adesão só será possível

se o tratado for multilateral, estiver em vigor e permitir o instituto da adesão (for aberto).

A adesão pode envolver negociações preliminares, e também apenas vincular o novo


aderente após um prazo temporal, ou de modo imediato. Tudo depende do que for previsto
no tratado específico.

Sua principal função é a celeridade: é um instrumento que evita a necessidade de se

iniciar novas negociações de novos tratados internacionais, facilitando a aderência à norma de

sujeitos que não participaram, por inúmeros motivos, das negociações inicialmente.

b) Emendas

Sabe-se que a sociedade internacional não é estática, mas está em constante mudança
e adaptação, segundo as necessidades de regulamentação e os interesses de seus membros.

Desse modo, se, para introduzir normas mais condizentes com esses novos anseios sociais,

fosse necessário iniciar um novo processo de elaboração de tratados, isso não seria nem

célere, nem eficaz.

Por isso, existem instrumentos como a emenda, que consiste no meio pelo qual o teor

dos atos internacionais é revisto, podendo seu texto ser acrescentado de outros dispositivos,
ser alterado ou até ser suprimido do conteúdo normativo.

18
Internacionalmente, a emenda é regulamentada pelo próprio texto do tratado a ser

emendado, a partir da proposta de uma parte signatária deste tratado. Para entrar em vigor,

ambas as partes em um tratado bilateral devem concordar com seu teor e um número mínimo
de partes no compromisso multilateral. Já no âmbito interno, no Brasil, a emenda também

deve passar pelo crivo do Congresso Nacional, sendo posteriormente ratificada.

Destaca-se que, de acordo com o art. 40, § 1º, da Convenção de Viena de 1969, em

um tratado multilateral, existe uma “duplicidade de regimes jurídicos”: o tratado emendado


vale para as partes que aprovaram a emenda, enquanto o tratado original vale para as partes

que não aprovaram a emenda.

Ademais, em regra, no caso de adesão a um tratado já emendado, os novos sujeitos

signatários obrigam-se à observância do compromisso internacional em conformidade com os

termos da emenda quanto àquelas partes que a ratificaram; quanto àquelas que não

aprovaram a emenda, comprometem-se no teor do tratado original.

c) Reservas

O instituto da reserva surge como forma de contribuir para que os atores internacionais

possam entrar em consensos em seus acordos internacionais, a fim de firmar compromissos,

mas de modo a não obrigar totalmente todas as partes contratantes, ou ainda sem se
comprometer com todas as normas previstas no tratado.

É, assim, uma declaração unilateral aplicável geralmente para tratados multilaterais,

quando há muitos interesses conflitantes dos mais diversos sujeitos internacionais, porém, não

é consenso na doutrina se também podem existir reservas em tratados bilaterais.

Durante o processo de elaboração de um tratado, a reserva poderá ser formulada em

qualquer momento, mas a produção de efeitos variará dependendo da etapa em que a

reserva for realizada. Contudo, de acordo com o art. 19 da Convenção de Viena de 1969,
não será possível realizar uma reserva se este instrumento for proibido pelos dispositivos do

19
tratado, se for relativa a dispositivos sobre os quais o próprio tratado proíba reservas, ou

ainda no caso de ser incompatível com a finalidade e objeto do tratado. 4

Em regra, já que a reserva é um ato unilateral de um sujeito de Direito Internacional

Público, ela não exigiria o consentimento das demais partes contratantes, porém, o art. 20 da

Convenção de Viena de 1969 prevê exceções a essa regra: no caso de a aplicação na íntegra
do tratado ser condição essencial para o consentimento das partes ou quando for um ato

constitutivo de uma organização internacional.

Ademais, em conformidade com o art. 21 da Convenção de Viena de 1969, os efeitos


dos tratados passam a ser regulados nos moldes da reserva, quanto às relações entre o autor

da reserva e os demais atores signatários.

d) Extinção

Em regra, os tratados internacionais podem ser extintos pela vontade comum das
partes, pela alteração das circunstâncias que motivaram sua celebração, pela vontade de uma
das partes (o que configura a denúncia), execução integral do tratado, condição resolutória,

redução do número de partes, ab-rogação por outro tratado, dentre outras eventuais

hipóteses. Ressalta-se que o descumprimento do tratado não é causa para sua extinção,

havendo apenas a possibilidade de sanções para o sujeito que tenha violado suas normas.

Válido salientar que a denúncia é a principal forma de extinção, tendo o objetivo de

validar a pretensão do Estado referente ao afastamento do tratado. Atualmente, a denúncia é

um ato discricionário do Presidente da República.

e) Denúncia

A denúncia consiste no ato unilateral do Estado de terminar sua participação no

tratado, desvinculando-se ao compromisso anteriormente feito e desobrigando-se de cumprir


com as obrigações estabelecidas. Assim, no caso de ações incompatíveis com os termos do
tratado, após a denúncia, não poderá mais haver a aplicação de sanções para este sujeito

4
Vide questão 12.
20
internacional. Porém, ressalta-se que a denúncia produz efeitos ex nunc, não desvinculando as

partes de obrigações assumidas antes da data da denúncia.

Em um tratado bilateral, a denúncia extingue o acordo. Já em um multilateral, a

denúncia (que também pode ser conhecida, nesse caso, como “retirada”) não influencia as

demais partes, implicando apenas na retirada da parte denunciante.

A possibilidade de denúncia geralmente é regulamentada pelo próprio tratado, devendo

haver previsão expressa da permissão, mesmo que seja estipulado sem definir um prazo para

realizá-la. Pode estar previsto também procedimentos específicos para sua realização, a fim de
evitar prejuízos para as demais partes contratantes. Além disso, em regra, só é possível

denunciar o texto inteiro, e não apenas partes dele (sob pena de confundir este instituto com

o da reserva ou da emenda).

Em regra, de acordo com o art. 56, § 2º, da Convenção de Viena de 1969, o sujeito

internacional deve entregar um “aviso prévio”: significa oficializar a denúncia com

antecedência mínima de 12 meses da data que pretende efetivar sua saída. É um prazo de

acomodação, dentro do qual o Estado pode até vir a retratar-se, desde que ainda não tenha
gerado efeitos jurídicos; porém, findo este prazo, o Estado só poderá retornar ao tratado por

meio de nova adesão.

Cabe ao governo interno de cada Estado, e os órgãos de cada organização

internacional, definir quais as autoridades competentes para os atos de denúncia. Em geral,


sendo ato de relações internações, seriam as mesmas competentes para celebrar os tratados.

No Brasil, a denúncia não está ainda regulada: a denúncia consiste em ato privativo e

discricionário do Presidente da República, materializado por meio de decreto, sem demais


formalidades internas, sob o fulcro do art. 84, incisos VII, da Constituição Federal. Ou seja,

não há participação do Congresso Nacional, diferentemente do que ocorre no processo de

incorporação ao ordenamento interno de tratados internacionais. Assim, há um verdadeiro

problema de desrespeito do princípio da separação dos poderes.

21
Ressalta-se que quando se trata de tratados de direitos humanos que tenha sido

aprovado sob o mesmo quórum da emenda constitucional, como previsto no art. 5º, § 3º, da

Constituição Federal (como será visto posteriormente), não admitem denúncia.

No entanto, há uma discussão no STF, na forma da Ação Direta de

Inconstitucionalidade nº 1625, na qual parece estar prevalecendo a orientação onde não é


possível que o Presidente da República denuncie tratados sem o consentimento do Congresso

Nacional.

22
7. Processualística constitucional de celebração de

tratados no Brasil

O estabelecimento de compromissos internacionais necessariamente impõe que a

obrigação seja cumprida não apenas no âmbito externo, mas também no âmbito interno dos
entes estatais. Porém, para que essas normas internacionais possam ser melhores aplicadas no

âmbito interno, é necessário que haja sua incorporação no ordenamento jurídico nacional, ao

adquirir status semelhante ao das demais espécies normativas estatais.

Destaca-se, no entanto, que o tratado só produzirá efeitos jurídicos na ordem interna

quando: primeiro, for ratificado pelo Estado e, depois, quando o tratado entrar em vigor em
âmbito internacional.

No Brasil, a processualística de incorporação segue o modelo tradicional, pelo qual o

processo é condicionado a procedimentos jurídicos espaciais. Ocorre em sentido estrito

(bifásico): o Presidente assina e negocia o tratado, e, posteriormente, há o Referendo

Parlamentar (Congresso Nacional).

A seguir, será visto o passo a passo da processualística constitucional da incorporação


de tratados internacionais no âmbito interno brasileiro. 5

a) Negociação preliminar e assinatura

De acordo com o art. 84, VIII, da Constituição Federal, é competência privativa do

Presidente celebrar tratados e convenções internacionais; como visto, é uma competência


passível de delegação. O ato de assinatura de um tratado internacional tem como

consequência o encaminhamento do dispositivo à ratificação, processo que ocorre no âmbito


interno do país que pode levar ao comprometimento internacional e à incorporação ao

ordenamento jurídico pátrio.

5
Vide questão 5.
23
Após a assinatura do tratado, é elaborada uma Carta com Exposição de Motivos, do

Presidente da República pelo Ministro das Relações Exteriores, expondo a relevância e as

consequências jurídicas do tratado, solicitando posteriormente o seu envio para que o


Congresso Nacional realize a ratificação do texto internacional.

b) Referendo parlamentar

Segundo o art. 49, I, da Constituição Federal, é competência exclusiva (ou seja, não

delegável) do Congresso Nacional resolver, definitivamente, sobre tratados, acordos ou atos


internacionais que acarretem encargos. Além disso, o Congresso pode aprovar ou não o

tratado, porém, seu aceite não é suficiente para incorporação do tratado.

O tratado é enviado primeiro para a Câmara dos Deputados, e depois para o Senado

Federal, envolvendo as respectivas comissões competentes de ambas as Casas, bem como a

votação no plenário de cada uma delas, em regra, em turno único, pela maioria dos votos,

presente a maioria absoluta de seus membros, em conformidade com os preceitos do o art.


47 da Constituição Federal. Ou seja, a ratificação é fruto da conjugação da vontade de ambas

as Casas do Congresso Nacional.

A aprovação do Congresso Nacional ocorre por emissão de Decreto Legislativo do

Presidente do Senado Federal, consistindo em um mero instrumento de encaminhamento (não


vincula nem ordena o cumprimento) do tratado de volta para o Presidente da República, para

decidir sobre a ratificação. No entanto, caso o Congresso não aprove o tratado, o Presidente

da República fica impossibilidade de realizar a ratificação, sob pena de incorrer em crime de


responsabilidade. 6

c) Ratificação ou adesão

A ratificação é ato discricionário, realizado pelo Presidente da República, pois nem

sempre o Presidente que assina o tratado é o mesmo que o ratifica, portanto, ele não está

6
Vide questão 6.
24
obrigado a tal ato. O instrumento da ratificação é dirigido aos demais signatários do acordou

ou a seu depositário. 7

Quando os atos internacionais são postos em vigor, por meio do qual o Presidente

expressará seu consentimento definitivo com as obrigações do tratado, pode-se concluir o

processo de incorporação por meio da promulgação. 8

Ressalta-se que é possível exercer o direito de cláusula de reserva: afastar a

aplicabilidade de determinados pontos do tratado, quando o tratado, por previsão expressa,

aceitar tal cláusula. Essa capacidade não é delegável.

Ademais, o Presidente da República, nesta fase, não pode alterar as eventuais mudanças

realizadas no tratado pelo Congresso Nacional: ou ratifica como foi disposto pelo Congresso
Nacional ou não adere ao tratado.

Porém, há uma EXCEÇÃO à discricionariedade do Presidente da República no ato de


ratificação: as convenções da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que têm força

vinculante de tratado, devem ser ratificadas pelo Presidente da República obrigatoriamente

quando aprovadas pelo Congresso Nacional.

d) Promulgação e publicação

A promulgação e a publicação são fases complementares da processualística de


incorporação de um tratado internacional no âmbito interno do Estado. Consiste no ato pelo

qual o Presidente da República ordena a publicação do acordo e sua execução em território


nacional.

A promulgação é realizada por meio de um Decreto Executivo, documento que


reconhece o tratado no ordenamento jurídico interno, após o qual o tratado entra em vigor

no país através da sua (do Decreto) publicação no Diário Oficial da União.

Porém, destaca-se que há discricionariedade aqui também: além de não ser obrigado a

enviar o tratado assinado para o Congresso Nacional, nem a ratifica-lo, o Presidente da

7
Vide questão 9.
8
Vide questão 11.
25
República também não é obrigado a realizar a promulgação e a publicação do Decreto que,

por fim, introduz o tratado no ordenamento jurídico interno.

Ressalta-se também que não necessariamente há vacaccio legis para aplicação e

produção de efeitos do tratado internacional (agora, Decreto Executivo) no ordenamento

jurídico nacional.

Ademais, a entrada em vigor de um tratado internacional no âmbito internacional

depende de um número mínimo de participantes no tratado internacional o terem ratificado;

enquanto não atingido esse número mínimo, sua entrada em vigor fica no aguardo . Assim, o
registro ou o depósito dos documentos oficiais de um tratado internacional ratificado

geralmente é realizado na sede da ONU, mas o depositário pode ser outro.

 Hierarquia dos tratados internacionais no âmbito interno

O tratado, uma vez promulgado, incorpora-se completamente ao ordenamento jurídico


interno, possuindo caráter vinculante, fixando direitos e deveres, podendo ser invocado para

fundamentar pretensões jurídicas no Poder Judiciário e trazendo sanções no caso de seu

descumprimento. Em princípio, após serem incorporados no ordenamento jurídico, todos os


tratados internacionais comuns possuem a mesma hierarquia de lei ordinária federal. Porém,

existem importantes exceções, que serão vistas a seguir:

a) Tratados internacionais que versem sobre Direito Tributário

Segundo preceitua o art. 98 do Código Tributário Nacional, os tratados e as


convenções internacionais revogam ou modificam a legislação tributária interna, e serão

observados pela que lhes sobrevenha, ou seja, as normas de tratados sobrepõem-se às

normas anteriores de âmbito interno.

Em decorrência da má redação do dispositivo supracitado, existem importantes


discussões no âmbito dos Tribunais Superiores (STF e STJ) no sentido de entender a natureza

dessa revogação, se é que o ato consiste mesmo em uma revogação. Também se está
discutindo qual seria o nível hierárquico de tratados internacionais de matéria tributária, pois,

assim como os de direitos humanos, eles também têm superioridade no ordenamento jurídico

interno, mas o STF ainda não decidiu de qual nível seria.

26
b) Tratados internacionais que versem sobre Direitos Humanos

Em conformidade com os preceitos do art. 5º, § 3º, da Constituição Federal, terão

status de emenda constitucional os tratados internacionais que versem sobre Direito Humanos,

se aprovado no Congresso Nacional com quórum especial (o mesmo para a aprovação de

emendas constitucionais): devem ser aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em


dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros. 9

No entanto, caso não tiverem conseguido quórum de emenda constitucional, ainda


terão superioridade hierárquica com relação ao restante do ordenamento jurídico, tendo

eficácia de norma supralegal: estarão abaixo da Constituição Federal, mas ainda acima da
legislação infraconstitucional.

Os únicos tratados internacionais com status de emenda constitucional, até agora, no


Brasil são: a Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e seu

Protocolo Facultativo de 2007 (promulgados pelo Decreto nº 6.949/2009) e, o mais recente, o

Tratado de Marraqueche para Facilitar o Acesso a Obras Publicadas para Pessoas Cegas de

2013 (promulgado pelo Decreto nº 9.522/2018).

O Pacto San José da Costa Rica, apesar de ser norma supralegal (não atingiu o
quórum de emenda constitucional), revogou tacitamente a previsão do art. 5º, LXVII, da

Constituição Federal, acerca do depositário infiel, onde “não haverá prisão civil por dívida,
salvo a do responsável pelo inadimplemento voluntário e inescusável de obrigação alimentícia

e a do depositário infiel”, pois o Supremo Tribunal Federal entendeu que deveria vigorar a

norma mais benéfica ao ser humano, prevista no supramencionado Pacto.

9
Vide questões 2, 7 e 10.
27
 Incidente de deslocamento de competência

Segundo o art. 109, § 5º, da Constituição Federal: ”nas hipóteses de grave violação de

direitos humanos, o Procurador-Geral da República, com a finalidade de assegurar o

cumprimento de obrigações decorrentes de tratados internacionais de direitos humanos dos

quais o Brasil seja parte, poderá suscitar, perante o Superior Tribunal de Justiça, em qualquer
fase do inquérito ou processo, incidente de deslocamento de competência para a Justiça

Federal”. Assim, o incidente de deslocamento de competência é um instrumento que tem

como objetivo garantir a obediência aos tratados internacionais através de eventual

deslocamento de competências, pois estes estão acima de leis infraconstitucionais.

28
QUADRO SINÓTICO

PRINCIPAIS ETAPAS DO PROCESSO DE ELABORAÇÃO DOS TRATADOS


ETAPA PARTES ENVOLVIDAS OBJETIVO
NEGOCIAÇÕES Em regra, o Poder Executivo Elaborar o texto do tratado
PRELIMINARES nacional, mas também: que está sendo acordado
embaixadores, diplomatas, o
Ministro das Relações
Internacionais ou aquele
detentor de uma Carta de
Plenos Poderes
ASSINATURA Idem da etapa acima Encerrar as negociações
Não há ainda vinculação Concordar e adotar o texto
jurídica Condicionar eventuais
alterações no texto a
emendas
Obrigar a não agir contra o
objeto do ato
RATIFICAÇÃO No sistema brasileiro, cabe ao Confirmar a vinculação ao
Presidente da República, após tratado, passando a conferir
autorização do Congresso vinculação e obrigação
Nacional jurídica ao seu texto

ENTRADA EM VIGOR NO - Tratado bilateral: notificação


ÂMBITO INTERNACIONAL da ratificação ou troca dos
instrumentos
Tratado multilateral: quando
atingido o número mínimo

29
REGISTRO E PUBLICIDADE Poder Executivo nacional, Dar publicidade ao ato para a
junto à ONU sociedade internacional
Condição para que a norma
do tratado seja invocada nos
órgãos das Nações Unidas

OUTROS INSTRUMENTOS DO PROCESSO DE ELABORAÇÃO DOS TRATADOS


INSTRUMENTO OBJETIVO
ADESÃO Ingresso de um sujeito internacional em um tratado, do qual
não participou do processo de elaboração. Só possível nos
tratados que permitam esse instrumento, estiver em vigor e
for multilateral.
EMENDAS Instrumento que permite a revisão dos atos internacionais,
através do acréscimo, alteração ou supressão de dispositivos.
RESERVAS Declaração unilateral para facilitar a entrada em consensos
dos sujeitos internacionais.
DENÚNCIA Principal tipo de extinção de tratados. Ato unilateral de um
sujeito terminar sua participação no tratado, desobrigando-se
aos compromissos firmados.

PROCESSO DE INCORPORAÇÃO DOS TRATADOS NO ORDENAMENTO


JURÍDICO INTERNO
ETAPA PARTES ENVOLVIDAS OBJETIVO
NEGOCIAÇÕES Em regra, o Poder Executivo Após as negociações e a
PRELIMINARES, nacional, mas também: assinatura do tratado, é

30
ASSINATURA E CARTA DE embaixadores, diplomatas, o elaborada uma Carta com
EXPOSIÇÃO DE MOTIVOS Ministro das Relações Exposição de Motivos, do
Internacionais ou aquele Presidente da República pelo
detentor de uma Carta de Ministro das Relações
Plenos Poderes Exteriores, solicitando
eventual ratificação

REFERENDO PARLAMENTAR Exame pela Câmara dos Autoriza ou não a ratificação


(DECRETO LEGISLATIVO) Deputados pelo Presidente da República
Exame pelo Senado Federal O Decreto só é emitido
Decreto emitido pelo quando há a autorização
Presidente do Congresso
Nacional
RATIFICAÇÃO (DECRETO No sistema brasileiro, cabe ao Confirmar a vinculação ao
EXECUTIVO) Presidente da República, após tratado, passando a conferir
autorização do Congresso vinculação e obrigação
Nacional jurídica ao seu texto

PROMULGAÇÃO E Diário Oficial da União Dar publicidade ao ato para a


PUBLICAÇÃO publica o Decreto Executivo sociedade nacional
Entrada em vigor do tratado
no âmbito interno

31
QUESTÕES COMENTADAS

Questão 1

Banca: FGV - Órgão: OAB - 2018 - Exame de Ordem Unificado – XXVI

Em 14 de dezembro de 2009, o Brasil promulgou a Convenção de Viena sobre o Direito

dos Tratados de 1969, por meio do Decreto no 7.030. A Convenção codificou as principais

regras a respeito da conclusão, entrada em vigor, interpretação e extinção de tratado s


internacionais. Tendo por base os dispositivos da Convenção, assinale a afirmativa correta.

A) Para os fins da Convenção, “tratado” significa qualquer acordo internacional concluído

por escrito entre Estados e/ou organizações internacionais.

B) Os Estados são soberanos para formular reservas, independentemente do que disponha o


tratado.

C) Um Estado não poderá invocar o seu direito interno para justificar o descumprimento de
obrigações assumidas em um tratado internacional devidamente internalizado.

D) Os tratados que conflitem com uma norma imperativa de Direito Internacional geral têm

sua execução suspensa até que norma ulterior de Direito Internacional geral da mesma natureza

derrogue a norma imperativa com eles conflitante.

Comentário:

Alternativa A está incorreta, pois os tratados são acordos internacionais concluídos por

escrito entre Estados, não envolvendo organizações internacionais como signatárias, de acordo

com o artigo 2º, § 1º, “a”, da Convenção de Viena. Alternativa B está incorreta, pois, ao

assinar, ratificar, aceitar ou aprovar um tratado, ou a ele aderir, os Estados podem formular

32
reserva, EXCETO: a) se a reserva for proibida pelo tratado; b) se o tratado dispor que só

possam ser formuladas determinadas reservas, entre as quais não figure a reserva em questão;

ou c) nos casos não previstos nas alíneas “a” e “b”, se a reserva for incompatível com o objeto
e a finalidade do tratado (artigo 19 da Convenção de Viena). Alternativa C está correta,

conforme o disposto no artigo 27 da Convenção de Viena. Alternativa D está incorreta, pois,


segundo o artigo 53 da Convenção de Viena, “é nulo um tratado que, no momento de sua

conclusão, conflite com uma norma imperativa de Direito Internacional geral. Para os fins da

presente Convenção, uma norma imperativa de Direito Internacional geral é uma norma aceita

e reconhecida pela comunidade internacional dos Estados como um todo, como norma da

qual nenhuma derrogação é permitida e que só pode ser modificada por norma ulterior de

Direito Internacional geral da mesma natureza.”.

Questão 2

Banca: FGV - Órgão: TJ/RJ – 2014

A partir da Emenda Constitucional n. 45/2004, os tratados e convenções internacionais


sobre direitos humanos:

A) Sempre terão a natureza jurídica de lei, exigindo a sua aprovação, pelo Congresso Nacional

e a promulgação, na ordem interna, pelo Chefe do Poder Executivo;

B) Sempre terão a natureza jurídica de emenda constitucional, exigindo, apenas, que a sua

aprovação, pelo Congresso Nacional, se dê em dois turnos de votação, com o voto favorável de

dois terços dos respectivos membros;

C) Podem ter a natureza jurídica de emenda constitucional, desde que a sua aprovação, pelo

Congresso Nacional, se dê em dois turnos de votação, com o voto favorável de três quintos dos

respectivos membros;

D) Podem ter a natureza jurídica de lei complementar, desde que o Congresso Nacional venha
a aprová-los com observância do processo legislativo ordinário;

E) Sempre terão a natureza jurídica de atos de direito internacional, não se integrando, em

33
qualquer hipótese, à ordem jurídica interna.

Comentário:

Alternativa A está incorreta, pois nem sempre terão a natureza jurídica de lei. Os tratados e
convenções internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados mediante o artigo 5º

da Constituição Federal serão equivalente às emendas constitucionais, enquanto os demais são


equiparados à norma supralegal. Alternativa B está incorreta, pois é necessário que se dê em

dois turnos de votação, com o voto favorável de três quintos dos respectivos membros.

Alternativa C está correta, pois, de acordo com o art. 5º, § 3º, da Constituição Federal, os

tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados, em cada

Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos

membros, serão equivalentes às emendas constitucionais. Alternativa D está incorreta, pelas

mesmas justificativas da alternativa A. Alternativa E está incorreta, pois nem sempre terão a
natureza jurídica de atos de direito internacional.

Questão 3

Advogado da União – 2009

Os tratados internacionais constituem importante fonte escrita do Direito Internacional,


a qual vale para toda a comunidade internacional, tenha havido ou não a participação de
todos os países nesses tratados.

Comentário:

Ao contrário do que afirma a questão, os tratados vinculam exclusivamente os sujeitos


de direito internacional que a eles manifestaram seu consentimento. Questão errada.

Questão 4

34
Ano: 2009 Banca: CESPE Órgão: OAB Prova: CESPE - 2009 - OAB - Exame de Ordem - 1

- Primeira Fase

Com relação aos tratados internacionais, assinale a opção correta à luz da Convenção de

Viena sobre Direito dos Tratados, de 1969.

A) Reserva constitui uma declaração bilateral feita pelos Estados ao assinarem um tratado.

B) Apenas o chefe de Estado pode celebrar tratado internacional.

C) Ainda que a existência de relações diplomáticas ou consulares seja indispensável à

aplicação de um tratado, o rompimento dessas relações, em um mesmo tratado, não afetará


as relações jurídicas estabelecidas entre as partes.

D) Uma parte não pode invocar as disposições de seu direito interno para justificar o
inadimplemento de um tratado.

Comentário:

A letra A está incorreta, pois a reserva é um ato unilateral de Estado. A letra B está
incorreta, pois não só o Chefe de Estado pode celebrar tratados, mas também Chefes de

Governo, Ministro das Relações Exteriores, chefes da missão diplomática, além daqueles que
têm carta de plenos poderes para a celebração (plenipotenciários). A letra C está incorreta,

pois, conforme a Convenção, no geral, o rompimento de relações diplomáticas ou consulares


não implica em descumprimento das normas jurídicas que regulam o tratado. A letra D está

correta, pois condizente com o art. 27 da Convenção de Viena.

Questão 5

Ano: 2006 Banca: ND Órgão: OAB-DF Prova: ND - 2006 - OAB-DF - Exame de Ordem -

1 - Primeira Fase

Indique a assertiva CORRETA:

35
A) os tratados internacionais, segundo o entendimento jurisprudencial brasileiro, possuem

status de Emenda Constitucional;

B) a Constituição admite a submissão de nacionais à jurisdição de Tribunal Penal

Internacional a cuja criação o país tenha manifestado adesão;

C) em hipótese alguma será concedida a extradição de brasileiro;

D) a competência para celebrar tratados, convenções e atos internacionais é exclusiva do

Presidente da República e estão sujeitos a referendo do Congresso Nacional.

Comentário:

A letra A está incorreta, pois apenas os tratados e convenções internacionais aprovados,

em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos

respectivos membros, é que serão equivalentes às emendas constitucionais (art. 5º, § 3º, da
Constituição Federal). A letra B está correta, pois, de acordo com o art. 5º, § 4º, da

Constituição Federal, o Brasil se submete à jurisdição de Tribunal Penal Internacional a cuja

criação tenha manifestado adesão. A letra C está incorreta, pois o art. 5º, LI, da Constituição

Federal prevê a possibilidade de extradição do brasileiro naturalizado em certas hipóteses. A

letra D está incorreta, pois a competência não é exclusiva, mas sim privativa, podendo ser

delegada, de acordo com o art. 84, VIII, da Constituição Federal.

Questão 6

Ano: 2009 Banca: CESPE Órgão: OAB Prova: CESPE - 2009 - OAB - Exame de Ordem - 3

- Primeira Fase

Tratados são, por excelência, normas de direito internacional público. No modelo jurídico

brasileiro, como nas demais democracias modernas, tratados passam a integrar o direito
interno estatal, após a verificação de seu iter de incorporação. A respeito dessa temática,

assinale a opção correta, de acordo com o ordenamento jurídico brasileiro.

36
A) Uma vez ratificados pelo Congresso Nacional, os tratados passam, de imediato, a

compor o direito brasileiro.

B) Aprovados por decreto legislativo no Congresso Nacional, os tratados podem ser

promulgados pelo presidente da República.

C) Uma vez firmados, os tratados relativos ao MERCOSUL, ainda que criem compromissos

gravosos à União, são automaticamente incorporados visto que são aprovados por parlamento

comunitário.

D) Após firmados, os tratados passam a gerar obrigações imediatas, não podendo os


Estados se eximir de suas responsabilidades por razões de direito interno.

Comentário:

A letra A está incorreta, pois após a aprovação parlamentar mediante decreto


legislativo, para que o tratado possa integrar o direito brasileiro, é necessária ainda a

ratificação pelo Presidente da República e a promulgação do texto por decreto executivo. A

letra B está correta, como visto na justificativa acima. A letra C está incorreta, estando correto

apenas se não acarretassem compromissos gravosos para a União, devendo haver, nesse caso,

participação do Congresso Nacional. A letra E está incorreta, pois os tratados não

necessariamente gerarão obrigações imediatas.

Questão 7

Ano: 2010 Banca: CESPE Órgão: OAB Prova: CESPE - 2010 - OAB - Exame de Ordem - 3

- Primeira Fase

Os tratados internacionais sobre direitos humanos firmados pela República Federativa do

Brasil serão equivalentes às emendas constitucionais, se forem aprovados, em cada Casa do


Congresso Nacional,

A) em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros.

37
B) em dois turnos, por maioria absoluta dos votos dos respectivos membros.

C) em único turno, por maioria absoluta dos votos dos respectivos membros.

D) em único turno, por três quintos dos votos dos respectivos membros.

Comentário:

A letra A está correta, em conformidade expressa com o art. 5º, § 3º, da Constituição

Federal. Por exclusão, as demais alternativas estão incorretas.

Questão 8

TRF – 2º Região – Juiz - 2009

Considera-se aperfeiçoado e obrigatório o tratado internacional multilateral:

A) com ratificação;

B) com sua assinatura;

C) com o depósito da ratificação no organismo previsto no tratado;

D) quando se atinge o quorum de ratificações previsto no tratado em caso de tratados.

Comentário:

A letra A está incorreta, pois a ratificação só torna o tratado obrigatório para o Estado

que realizou a ratificação quando o acordo já está em vigor. A letra B está incorreta, pois a

assinatura tem efeitos jurídicos limitados, não incluindo neles a obrigatoriedade de seus

dispositivos. A letra C está incorreta, pois o depósito só gera efeitos jurídicos para o Estado

depositante quando o tratado já está em vigor. A letra D está correta, pois só o número

mínimo de depósitos é que aperfeiçoa o tratado internacional multilateral.

38
Questão 9

TRF – 2º Região – Juiz – 2009

Considera-se o tratado incorporado ao direito brasileiro:

A) com o decreto legislativo que aprova sua ratificação;

B) com a remessa ao país contratante ou à organização do texto ratificado;

C) com o decreto do Presidente da República que promulga o tratado;

D) com a assinatura do tratado.

Comentário:

A letra A está incorreta, pois o decreto legislativo que aprova a ratificação apenas

autoriza que o Presidente o ratifique. A letra B está incorreta, pois tais atos são condições de
vinculação ao tratado à nível internacional, e não no âmbito interno. A letra C está correta, em

consonância com o art. 84, VIII, da Constituição Federal. A letra D está incorreta, pois a
assinatura não exclui a necessidade das fases posteriores para conferir a efetiva incorporação

no ordenamento jurídico pátrio.

Questão 10

TRT – 1ª Região – Juiz – 2005

Os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados, em

cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos
membros, serão equivalentes:

A) às leis complementares;

B) às emendas constitucionais;

C) às leis ordinárias;

39
D) às portarias;

E) às normas coletivas.

Comentário:

A resposta correta é a letra B, conforme expressa previsão do quórum especial disposto

no art. 5º, § 3º, da Constituição Federal. Ademais, ressalta-se que tratado não pode regular
matéria reservado à lei complementar e que todos os demais tratados (exceto os de direitos

humanos e de Direito Tributário) terão natureza de lei ordinária.

Questão 11

TRF – 5ª Região – Juiz - 2006

No Brasil, a vigência interna de um tratado não coincide, necessariamente, com a sua

entrada em vigor no plano do direito internacional.

Comentário:

A assertiva acima está correta, visto que a entrada em vigor de um tratado no âmbito

interno pode depender ainda da ratificação do tratado pelo Brasil, e também da sua

promulgação pelo Presidente da República.

Questão 12

Ano: 2009 Banca: CESPE Órgão: TRF - 1ª REGIÃO Prova: CESPE - 2009 - TRF - 1ª
REGIÃO - Juiz Federal

Considere que os Estados A, B e C tenham assinado um tratado sobre cooperação em

matéria científica. No tratado constava cláusula segundo a qual o instrumento somente

40
entraria em vigor quando todos os Estados signatários o ratificassem. Os Estados A e B

ratificaram-no, mas o Estado C, não. Nessa situação, os Estados A e B

A) podem cobrar do Estado C a ratificação do tratado.

B) podem cobrar do Estado C que respeite o preâmbulo do tratado.

C) podem cobrar do Estado C que não frustre o objeto e a finalidade do tratado.

D) podem exigir do Estado C que transforme o tratado em lei interna antes de ratificá-lo.

E) não podem cobrar do Estado C nenhuma obrigação, pois este goza de autonomia

absoluta nessa questão.

Comentário:

A alternativa A está incorreta, pois a ratificação de um tratado é ato discricionário do


Estado; não sendo obrigatório, não poderá ser cobrado. A alternativa B está incorreta, pois o

preâmbulo, normalmente, é empregado apenas com o objetivo de guiar a interpretação do


dispositivo, não sendo considerado norma jurídica vinculante. A alternativa C está correta, de
acordo com o art. 18 da Convenção de Viena. A alternativa D está incorreta, pois a eventual

transformação do tratado em lei interna é, também, um ato discricionário do Estado, podendo


ocorrer até mesmo depois da ratificação (como ocorre no Brasil). A alternativa E está incorreta,

pois a autonomia do Estado não é absoluta, a fim de que não sejam praticados atos que
venham a frustrar o objeto e a finalidade do tratado.

41
GABARITO

Questão 1 - C

Questão 2 - C

Questão 3 - Errada

Questão 4 - D

Questão 5 - B

Questão 6 - B

Questão 7 - A

Questão 8 - D

Questão 9 - C

Questão 10 - B

Questão 11 - Correta

Questão 12 - C

42
LEGISLAÇÃO COMPILADA

Nesta matéria, faz-se de extrema importância a leitura de:

Constituição Federal de 1988

 Art. 5º, § 3º
 Art. 21, I
 Art. 47
 Art. 49, I
 Art. 84, VII e VIII
 Art. 109, § 5º

Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados (Decreto Executivo nº


7.030/2009)

 Art. 2º
 Art. 7º
 Art. 19
 Art. 20
 Art. 21
 Art. 27
 Art. 40, § 1º
 Art. 50
 Art. 56, § 2º

43
Carta das Nações Unidas

 Art. 102

Súmulas Vinculantes do Supremo Tribunal Federal (STF)

 Nº 25: é ilícita a prisão civil de depositário infiel, qualquer que seja a modalidade
do depósito.

44
JURISPRUDÊNCIA

Notícia do STF sobre a ADI 1625 (em 14/09/2016): Pedido de vista


suspende julgamento sobre denúncia da Convenção 158 da OIT

Pedido de vista do ministro Dias Toffoli interrompeu o julgamento, pelo Plenário do


Supremo Tribunal Federal (STF), da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 1625, na
qual a Confederação Nacional dos Trabalhadores da Agricultura (Contag) questiona o
Decreto 2.100/1996. Nele, o presidente da República deu publicidade a denúncia à
Convenção 158 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que trata do término
da relação de trabalho por iniciativa do empregador e veda a dispensa injustificada. A
análise da questão foi retomada com a apresentação do voto-vista do ministro Teori
Zavascki, que acompanhou a orientação de que é necessária a participação do Poder
Legislativo na revogação de tratados e sugeriu modulação de efeitos para que a
eficácia do julgamento seja prospectiva. “Esse é um caso daqueles precedentes cuja
decisão do Supremo fica como marca na história do constitucionalismo brasileiro”,
ressaltou. O ministro destacou que a discussão da matéria visa saber qual é o
procedimento a ser adotado no âmbito do direito interno para promover a
denúncia de preceitos normativos decorrentes de acordos internacionais. Em seu
voto, propôs tese segundo a qual “a denúncia de tratados internacionais, pelo
presidente da República, depende de autorização do Congresso Nacional”. “Todavia
proponho que se outorgue eficácia apenas prospectiva a esse entendimento a fim de
que sejam preservados dos efeitos da declaração de inconstitucionalidade não só o
decreto aqui atacado como os demais atos de denúncia isoladamente praticados pelo
presidente da República até a data da publicação da ata do julgamento da presente
ação, o que conduz, no caso concreto, a um juízo de improcedência”, explicou o
ministro, ao frisar que julga improcedente o pedido unicamente em razão dos efeitos
da modulação. O ministro Teori Zavascki salientou a relevância que os tratados têm
atualmente, principalmente os tratados sobre direitos humanos que, ao serem
aprovados com procedimento especial, incorporam-se como norma de hierarquia

45
constitucional. Embora considere indiscutível que o Poder Executivo tenha papel de
destaque no âmbito das relações exteriores, na opinião do ministro “fica difícil
justificar que o presidente da República possa, unilateralmente, revogar tratados
dessa natureza”. (...).

Jurisprudência do STF sobre incorporação de tratados internacionais


 STF: ADI-MC 1480/DF (parte da ementa)

(...) É na Constituição da República - e não na controvérsia doutrinária que antagoniza

monistas e dualistas - que se deve buscar a solução normativa para a questão da


incorporação dos atos internacionais ao sistema de direito positivo interno brasileiro. O

exame da vigente Constituição Federal permite constatar que a execução dos tratados
internacionais e a sua incorporação à ordem jurídica interna decorrem, no sistema
adotado pelo Brasil, de um ato subjetivamente complexo, resultante da conjugação

de duas vontades homogêneas: a do Congresso Nacional, que resolve,

definitivamente, mediante decreto legislativo, sobre tratados, acordos ou atos

internacionais (CF, art. 49, I) e a do Presidente da República, que, além de poder


celebrar esses atos de direito internacional (CF, art. 84, VIII), também dispõe - enquanto

Chefe de Estado que é - da competência para promulgá-los mediante decreto. O iter


procedimental de incorporação dos tratados internacionais - superadas as fases prévias

da celebração da convenção internacional, de sua aprovação congressional e da

ratificação pelo Chefe de Estado - conclui-se com a expedição, pelo Presidente da


República, de decreto, de cuja edição derivam três efeitos básicos que lhe são inerentes:

(a) a promulgação do tratado internacional; (b) a publicação oficial de seu texto; e (c) a
executoriedade do ato internacional, que passa, então, e somente então, a vincular e a

obrigar no plano do direito positivo interno. (...) Os tratados ou convenções

internacionais, uma vez regularmente incorporados ao direito interno, situam-se, no


sistema jurídico brasileiro, nos mesmos planos de validade, de eficácia e de autoridade

em que se posicionam as leis ordinárias, havendo, em conseqüência, entre estas e os


atos de direito internacional público, mera relação de paridade normativa. Precedentes.

No sistema jurídico brasileiro, os atos internacionais não dispõem de primazia

46
hierárquica sobre as normas de direito interno. A eventual precedência dos tratados ou

convenções internacionais sobre as regras infraconstitucionais de direito interno

somente se justificará quando a situação de antinomia com o ordenamento doméstico


impuser, para a solução do conflito, a aplicação alternativa do critério cronológico (" lex

posterior derogat priori ") ou, quando cabível, do critério da especialidade. (STF -
ADI: 1480 DF, Relator: Min. CELSO DE MELLO, Data de Julgamento: 26/06/2001, Data de

Publicação: DJ 08/08/2001 PP-00003)

 STF: CR 8279 AT (parte da ementa)

(...) Não obstante tais considerações, impende destacar que o tema concernente à

definição do momento a partir do qual as normas internacionais tornam-se vinculantes

no plano interno excede, em nosso sistema jurídico, à mera discussão acadêmica em

torno dos princípios que regem o monismo e o dualismo, pois cabe à Constituição da
República – e a esta, somente – disciplinar a questão pertinente à vigência

doméstica dos tratados internacionais. Sob tal perspectiva, o sistema constitucional

brasileiro – que não exige a edição de lei para efeito de incorporação do ato
internacional ao direito interno (visão dualista extremada) – satisfaz-se, para efeito de

executoriedade doméstica dos tratados internacionais, com a ação de iter


procedimental que compreende a aprovação congressional e a promulgação

executiva do texto convencional (visão dualista moderada). Uma coisa, porém, é

absolutamente inquestionável sob o nosso modelo constitucional: a ratificação – que

se qualifica como típico ato de direito internacional público – não basta, por si só,
para promover a automática incorporação do tratado ao sistema de direito positivo
interno. É que, para esse específico efeito, impõe-se a coalescência das vontades

autônomas do Congresso Nacional e do Presidente da república, cujas deliberações


individuais – embora necessárias – não se revelam suficientes para, isoladamente,

gerarem a integração do texto convencional à ordem interna (...). O exame da Carta

Política promulgada em 1988 permite constatar que a execução dos tratados

internacionais e a sua incorporação à ordem jurídica interna decorrem, no sistema

47
adotado pelo Brasil, de um ato subjetivamente complexo, resultante da conjugação de

duas vontades homogêneas: a do Congresso Nacional, que resolve, definitivamente,

mediante decreto legislativo, sobre tratados, acordos ou atos internacionais (CF, art. 49,
I) e a do Presidente da República, que, além de poder celebrar esses atos de direito

internacional (CF, art. 84, VIII), também dispõe – enquanto Chefe de Estado que é – da
competência para promulga-los mediante decreto. (...) (STF – CR 8279 AT, Relator: Min.

PRESIDENTE, Data de Julgamento: 04/05/1998, Data de Publicação: DJ DATA-14-05-98

P-00034).

Jurisprudência do STJ sobre hierarquia dos tratados internacionais que


versem sobre Direito Tributário
 STJ: Resp: 1304157 PA (parte da ementa)

(...) O art. 98 do CTN prescreve que os tratados e as convenções internacionais revogam


ou modificam a legislação tributária interna, e serão observados pela que lhes

sobrevenha. Partindo dessa premissa, prevalecem os Tratados e as Convenções


Internacionais sobre o direito interno, como anota o Professor LEANDRO PAULSEN, não

obstante a norma tributária fale em revogação ou modificação da legislação

interna, o que efetivamente ocorreria seria a mera suspensão da eficácia da norma

tributária nacional, que poderá adquirir aptidão para produzir efeitos se e quando o

tratado for denunciado. (...) O que ocorre, explica, é tão somente uma revogação
funcional, isto é, uma limitação de eficácia normativa que recai, exclusivamente, sobre

pessoas, coisas ou situações, fáticas ou jurídicas, relacionadas aos dois Estados


Contratantes. Nos demais casos, ou seja, pessoas, coisas ou situações não atreladas aos
dois Estados Contratantes, vigora, em plenitude, a regra de tributação interna sem

qualquer revogação ou derrogação. (...). Assim, o art. 98 do CTN deve ser interpretado à
luz do princípio da especialidade, não havendo, propriamente, revogação ou

derrogação da norma interna pelo regramento internacional, mas apenas suspensão de


eficácia que atinge, tão só, as situações envolvendo os sujeitos e os elementos de

estraneidade descritos na norma da convenção. (...). (STJ – Resp: 1304157 PA

48
2012/0010564-2, Relator: Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Data de Publicação: DJ

24/11/2016).

Jurisprudência do STF sobre hierarquia dos tratados internacionais que


versem sobre Direitos Humanos
 STF: RE: 466343 SP

PRISÃO CIVIL. Depósito. Depositário infiel. Alienação fiduciária. Decretação da medida


coercitiva. Inadmissibilidade absoluta. Insubsistência da previsão constitucional e das
normas subalternas. Interpretação do art. 5º, inc. LXVII e §§ 1º, 2º e 3º, da CF, à luz do
art. 7º, § 7, da Convenção Americana de Direitos Humanos (Pacto de San José da Costa
Rica). Recurso improvido. Julgamento conjunto do RE nº 349.703 e dos HCs nº 87.585 e
nº 92.566. É ilícita a prisão civil do depositário infiel, qualquer que seja a
modalidade do depósito. (STF – RE: 466343 SP, Relator: Min. CEZAR PELUSO, Data de
Julgamento 03/12/2008, Tribunal Pleno, Data de Publicação: DJe-104 DIVULG 04-06-
2009 PUBLIC 05-06-2009 EMENT VOL-02363-06 PP-01106 RDECTRAB v. 17, n. 186, 2010,
p. 29-165).

49
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

AMARAL JÚNIOR, Alberto do. Introdução ao direito internacional público.


São Paulo: Atlas, 2008.

CANÇADO, Trindade, Antônio Augusto. Princípios do direito internacional


contemporâneo – 2. ed. rev. atual. – Brasília: FUNAG, 2017.

CASELLA, Paulo Borba; Hildebrando Accioly e G. E. do Nascimento e Silva.


Manual de direito internacional público.— 20. ed. — São Paulo: Saraiva,
2012.

MAZZUOLI, Valerio de Oliveira. Curso de direito internacional público. 9. ed.


rev., atual. e ampl. -- São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2015.

PORTELA, Paulo Henrique Gonçalves. Direito Internacional Público e Privado.


9ª ed. Salvador: Juspodivm, 2017.

REZEK, Francisco. Direito internacional público – Curso Elementar. 17ª ed. São
Paulo: Saraiva, 2018.

SOARES, Guido Fernando Silva. Curso de direito internacional público. São


Paulo: Atlas, 2002.

50
CARREIRA JURÍDICA

Direito Internacional
Capítulo 4
SUMÁRIO

DIREITO INTERNACIONAL, Capítulo 4 .......................................................................................... 3

1. Sujeitos do Direito Internacional Público............................................................................. 3

1.1. Personalidade internacional ..................................................................................................................... 3

2. Estado ........................................................................................................................................... 5

2.1. Introdução........................................................................................................................................................ 5

2.2. Elementos constitutivos ............................................................................................................................. 5

2.3. Surgimento, reconhecimento e extinção dos Estados ................................................................. 8

2.4. Imunidades do Estado: de jurisdição e de execução ................................................................. 11

3. Organizações Internacionais ................................................................................................. 17

3.1. Conceito e natureza jurídica ................................................................................................................. 17

3.2. Elementos essenciais, características e competências ............................................................... 19

3.3. Classificações ............................................................................................................................................... 19

3.4. Organização das Nações Unidas (ONU) .......................................................................................... 20

4. Outros sujeitos ......................................................................................................................... 22

4.1. Indivíduos ...................................................................................................................................................... 22

4.2. Santa Sé e o Estado da Cidade do Vaticano................................................................................. 22

4.3. Organizações não governamentais .................................................................................................... 23

4.4. Sujeitos não formais ................................................................................................................................. 24

QUADRO SINÓTICO ......................................................................................................................... 26

QUESTÕES COMENTADAS ............................................................................................................. 28

GABARITO .......................................................................................................................................... 37

LEGISLAÇÃO COMPILADA .............................................................................................................. 38

JURISPRUDÊNCIA ............................................................................................................................... 39

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ........................................................................................................ 41


2
DIREITO INTERNACIONAL

Capítulo 4

1. Sujeitos do Direito Internacional Público

1.1. Personalidade internacional


A “personalidade internacional” está relacionada à aptidão ou à capacidade para a

titularidade de direitos e de obrigações na seara internacional. Também alude à possibilidade


de atuar diretamente na sociedade internacional, como nos atos de criar as normas e de
recorrer a mecanismos internacionais de solução de controvérsias.

Apesar do entendimento clássico, segundo o qual apenas os Estados e as organizações


internacionais seriam sujeitos de Direito Internacional, existe também uma concepção mais
moderna, para a qual, baseando-se na evolução que ocorreu nas relações internacionais, os

indivíduos, as empresas e as organizações não governamentais (ONGs), por exemplo, também


possuem personalidade internacional.

A ordem jurídica internacional passou a regulamentar outros entes para além dos

Estados e das organizações internacionais, que passaram a exercer um papel mais ativo na
sociedade internacional, tendo direitos e obrigações estabelecidos por suas normas. Por isso, a

doutrina atual entende que os indivíduos, as empresas e as ONGs podem invocar normas
internacionais e devem cumpri-las, por possuírem personalidade internacional. Destaca-se,

porém, que esses são conhecidos como “sujeitos fragmentários”, pois sua capacidade é
limitada, não tendo todas as prerrogativas dos Estados e das organizações internacionais,
como a de celebrar tratados.

3
Ademais, a dinâmica das relações internacionais conta também com a participação de
coletividades não-estatais, como a Santa Sé, a Cidade do Vaticano, o Comitê Internacional da

Cruz Vermelha, dentre outros sujeitos não formais, que serão vistos posteriormente.

4
2. Estado

2.1. Introdução
O Estado é uma pessoa jurídica que rege a vida em sociedade em um local. É o ente

composto por um território onde vive uma comunidade humana governada por um poder
soberano e independente, cujo surgimento não depende da anuência de outros membros da

sociedade internacional, dotado da capacidade de exercer direitos e contrair obrigações. Isso


porque os Estados são sujeitos autônomos: apesar de terem limites aos seus poderes, eles
possuem certo “livre-arbítrio” nas suas relações internacionais.

Parte da doutrina atribui ao Estado personalidade internacional originária, pois está


atrelado ao surgimento do Direito Internacional e de suas normas, bem como pela formação
das organizações internacionais. Ademais, atualmente, o Estado ainda tem um importante

papel no âmbito internacional, sendo um dos principais atores internacionais.

O ente estatal é o sujeito internacional que cria a maior parte das normas de Direito
Internacional, especialmente através dos tratados, forma as organizações internacionais,

participa da cooperação dos povos e estabelece parâmetros de atuação para os demais


membros da sociedade internacional.

2.2. Elementos constitutivos


O Estado possui três elementos essenciais, cuja definição foi decorrência de extensos

debates doutrinários: território, povo e governo soberano (ou soberania). Posteriormente,


esses elementos foram consagrados através do art. 1º da Convenção de Montevidéu sobre

Direitos e Deveres dos Estados, de 1933.

Importante destacar que parte da doutrina ainda acredita ser necessário mais um
elemento para constituir o que viria a ser o Estado, qual seja, o reconhecimento por outros

entes estatais. No entanto, embora importante, acredita-se que a anuência dos outros Estados
não é essencial para que um Estado exista para a sociedade internacional. Esse entendimento

5
foi consagrado no art. 3º da Convenção de Montevidéu sobre Direitos e Deveres dos
Estados, para o qual a existência política de um Estado independe de seu reconhecimento.

Agora, estudar-se-á os elementos constitutivos dos Estados:

a) Território

É o espaço geográfico no qual o Estado exerce seu poder soberano, a jurisdição estatal.
Consiste no espaço terrestre, marítimo (até 12 milhas náuticas), aéreo (que compreende a terra

e o mar até a atmosfera), incluindo-se o subsolo, as águas internas e fronteiriças.

Segundo o princípio da extraterritorialidade, o Estado pode, em casos específicos,


exercer sua soberania para além da extensão do território brasileiro, tanto em outras nações

(por exemplo, dentro de embaixadas) quanto em territórios de Estados estrangeiros (no caso
de embarcações e aeronaves oficiais).

Apesar de o ente estatal exercer jurisdição sobre esses lugares, não fazem parte do
território do Estado: as embaixadas e os consulados no exterior, as embarcações e aeronaves

oficiais onde estiverem e as embarcações e aeronaves civis em áreas internacionais.

A jurisdição de um Estado sobre seu território é:

 Geral, pois abrange todas as competências estatais, de ordem administrativa, legislativa


e judicial;
 Exclusiva, pois, naquele espaço geográfico, não há outra ordem soberana.

Além disso, a norma estatal soberana tutela bens, relações jurídicas e pessoas presentes
dentro do seu território, independente de serem nacionais ou não, aplicando-se, portanto,
a toda população (que, como será visto, difere-se de “povo”). No entanto, essa
competência estatal não é absoluta, havendo exceções, quando diante dos casos de

6
imunidade gozados por Estados e autoridades estrangeiros e organizações internacionais,
além das hipóteses de regulamentação pelo Direito Internacional Privado.

b) Povo

É o elemento humano do Estado, sendo formado pelo conjunto de pessoas naturais


vinculadas juridicamente a um ente estatal por meio da nacionalidade; inclui tanto aqueles

presentes no território nacional quanto aqueles no exterior.

Povo não é sinônimo de população. Enquanto o conceito de população pode conter

pessoas apátridas e estrangeira, pois é composto por todas as pessoas presentes no território
do Estado, nem determinado momento, sendo um dado meramente quantitativo, a noção de

povo é qualitativo: o que é fundamental é o vínculo do indivíduo com o Estado através da


nacionalidade ou cidadania.

Ademais, ressalta-se que, de acordo com o Tratado de Latrão, o único Estado que não

tem nacionalidade pelo nascimento é o Estado da Cidade do Vaticano.

c) Governo soberano (soberania)

O poder soberano é a autoridade maior que exerce o poder político no Estado. A

soberania é o atributo do poder estatal para exercer suas vontades em seu território, para
aqueles que estão sob sua jurisdição, inclusive outros núcleos de poder (como estados-

membros e cidades, famílias, empresas etc.).

Importante destacar que a noção de soberania não se confunde com “poder ilimitado e
absoluto”, prevalecendo a noção de Estado de Direito Democrático, no qual o ente estatal

atua dentro de limites impostos tanto pelo ordenamento jurídico nacional (no âmbito interno)
quanto internacional (no âmbito externo).

7
Assim, no âmbito interno, a soberania refere-se a um poder com supremacia sobre
pessoas, bens e relações jurídicas dentro de seu território. Por sua vez, no âmbito externo, a

soberania refere-se à igualdade entre os Estados, a independência do ente estatal com relação
aos outros Estados, vigorando também os princípios da igualdade jurídica entre os Estados

soberanos e o da não-intervenção nos assuntos internos.

Uma questão importante é a dos microestados: Estados com território pouco extenso,
pequena quantidade de nacionais e prerrogativas estatais inerentes à soberania exercidas por
países vizinhos (como defesa, emissão de moeda e política externa). Exemplos desses
microestados seriam: Andorra, Liechtenstein e Mônaco. O entendimento majoritário (e também

da Corte Internacional de Justiça) é que não há a exigência de que o Estado tenha uma
extensão territorial mínima ou um número mínimo de nacionais para que o ente estatal seja

uma personalidade internacional.

2.3. Surgimento, reconhecimento e extinção dos Estados


Os casos de surgimento, reconhecimento e extinção dos Estados são decorrência de

processos históricos e práticas internacionais, e serão vistos a seguir.

 Surgimento de Estados

No geral, o aparecimento dos Estados resulta diretamente de processos históricos,


sejam decorrentes de conflitos armados (guerra, guerra civil ou conquista do território de
outros Estados), de movimentos de independência ou de unificação nacional, da divisão de

outros Estados (desmembramento ou secessão) ou de sua fusão, de negociações políticas,


pelo voto popular, terra nullius (ocupação da “terra de ninguém”), da dissolução de entes
estatais, dentre outras hipóteses.

8
Porém, o surgimento de Estados pode ser influenciado também pelo próprio Direito
Internacional; como exemplo, há a descolonização da África e da Ásia e a criação do Estado

de Israel, com fundamento no princípio da autodeterminação dos povos.

Como visto, o surgimento de um Estado não depende do reconhecimento estrangeiro;


países podem surgir de guerra, fusão, expansão, divisão, incorporação, ocupação, união de

territórios etc. Esses são os mesmos modos em que um país pode ser extinto.

 Reconhecimento de Estados

Para o bom funcionamento de um ente estatal, é necessário que os países transacionem


entre si, de modo expresso ou tácito, pois nenhum Estado é autossuficiente, sendo a

interdependência uma das principais características das relações internacionais. Desse modo,
tanto o reconhecimento de Estado quanto o de Governo é imprescindível para as relações

internacionais de um ente estatal.

O reconhecimento de Estado é um ato unilateral através do qual um Estado constata a


existência de outro ente estatal, admitindo as consequências jurídicas deste fato e

reconhecendo a possibilidade de manter relações com este novo Estado, como personalidade
internacional, segundo os preceitos do art. 8º da Convenção de Montevidéu sobre Direitos
e Deveres dos Estados.

O reconhecimento é um ato declaratório, não tendo caráter constitutivo (não define a


existência do Estado). Além disso, é também um ato discricionário: nenhum Estado é obrigado
a reconhecer o outro, assim como não se precisa de reconhecimento para existir, pois é

fundamentado em considerações de interesse nacional; por esse motivo, tampouco é


condicionado a um prazo-limite.

O reconhecimento é também um ato, em princípio, incondicionado, ou seja, não pode

vincular o ato a condições ou exigências, mas podem existir requisitos vinculados ao respeito
de normas que devem ser obedecidas por todos os membros da sociedade internacional: as

normas jus cogens. Assim, se o Estado surgiu a partir da violação grave de uma norma de
Direito Internacional, ele não deve ser reconhecido.

9
Ademais, o reconhecimento tem caráter retroativo, gerando efeitos a partir do instante
em que se forma o Estado, e é irrevogável. O reconhecimento pode ser solicitado (pelo novo

Estado) ou concedido (pelos demais Estados). O reconhecimento pode ser também expresso
(através de declarações) ou tácito (através de atos condizentes com o reconhecimento). Pode

ser também individual ou coletivo (concedido por um grupo de Estados).

Apesar de não ser elemento constitutivo do Estado, o reconhecimento é importante


para conferir ao novo Estado efetiva participação na sociedade internacional e ampla

competência para exercer suas prerrogativas como sujeito internacional.

Por sua vez, o reconhecimento de governo ocorre quando há um novo governo a


partir de uma ruptura na sucessão de poder ou na ordem constitucional estabelecida, por

exemplo, nos casos de revoluções ou golpes de Estado. O reconhecimento de governo não


altera o reconhecimento de Estado dado anteriormente (como visto, este é irrevogável), mas
pode influenciar as relações internacionais desse país, caso não haja o reconhecimento desse

novo governo como o devido representante daquele Estado nas relações internacionais.

O reconhecimento de governo também é ato unilateral, discricionário, não obrigatório,


irrevogável e, em regra, incondicionado. Porém, muitas vezes, está vinculado ao compromisso

do governo com as normas do Direito Internacional e com o restabelecimento da normalidade


institucional e do regime democrático, caso este tenha sido rompido.

 Extinção de Estados

Em regra, a extinção de um Estado ocorre a partir da perda de algum de seus

elementos constitutivos. No geral, se dá pelas mesmas hipóteses pelas quais um Estado pode
também surgir na sociedade internacional.

A extinção de um Estado traz um problema na esfera internacional: a questão da

sucessão dos direitos e obrigações que este possuía, ou seja, a mudança do titular da
soberania sobre um território e/ou povo e/ou governo. Não existe uma regra exata definindo
o que ocorrerá em cada hipótese para cada direito ou obrigação do Estado, podendo a

decisão ficar a cargo das normas costumeiras, dos próprios Estados envolvidos (definindo os
termos da sucessão), ou das Convenções de Viena sobre a Sucessão de Estados em Matéria

10
de Tratados (de 1978; Decreto Legislativo nº 166 de 2018) e sobre Sucessão de Estados em
Matéria de Bens, Arquivos e Dívidas (1983).

Destaca-se que a sucessão não afeta as fronteiras estabelecidas com outros Estados,

nem as obrigações e os direitos relativos à zona fronteiriça. Além disso, não são válidas as
sucessões quando as mudanças de soberania sejam resultado da violação de normas de

Direito Internacional.

2.4. Imunidades do Estado: de jurisdição e de execução


A soberania do ente estatal sob seu território não é absoluta, por isso, existem exceções, as
quais não se submetem à jurisdição ou à execução estatal. Caracterizada como um princípio de

Direito Internacional, a imunidade exclui, em algumas ocasiões, a probabilidade de um Estado ou


uma organização internacional ser submetido à jurisdição e execução estatal.1

 Imunidade de jurisdição do Estado

Em virtude do princípio da igualdade soberana, o Direito Internacional desenvolveu a


regra de imunidade de jurisdição, com fundamento no costume internacional. A imunidade de

jurisdição está baseada na proteção das pessoas naturais e jurídicas, que atuam nas relações
internacionais, e tem a prerrogativa de exercer suas funções livremente, desde que não

causem problemas (internos ou internacionais).

A imunidade de jurisdição é uma limitação direta à soberania estatal, estando regulada


pelo Direito Internacional. Assim, o Estado é protegido (ou seja, não será demandado

juridicamente) por qualquer ato por ele praticado.

1
Vide questão 2.
11
Não existem tratados, no Brasil, que tenham como objeto a imunidade de jurisdição de
Estados, sendo um tema regulamentado, no âmbito internacional, por normas costumeiras e,

subsidiariamente, pela doutrina e jurisprudência.

A questão é: pode um Estado soberano ser julgado por outro Estado soberano contra a

sua vontade? Para responder essa pergunta, atualmente, existem duas correntes que
ponderam acerca da natureza da imunidade de jurisdição:

a) Teoria clássica

Para essa corrente, os Estados gozariam de imunidade total de jurisdição, pois a


imunidade seria absoluta, não podendo ser julgado pelas autoridades de outro Estado contra

sua vontade, com base no princípio: “par in parem non habet judicium” (entre pares não há
jurisdição). 2

A teoria clássica, desenvolvida ainda na Idade Média (no Estado Absolutista), permitia
que um Estado se submetesse à jurisdição de outro no caso que haja consentimento daquele,
podendo haver renúncia da imunidade. Porém, em regra, o Judiciário estatal deveria declarar-

se incompetente para julgar um Estado soberano.

b) Teoria moderna

Com o desenvolvimento das relações estatais, a imunidade absoluta dos Estados


começou a ser um problema para a sociedade internacional. Assim, foi-se desenvolvendo uma
teoria que relativizasse a imunidade, permitindo que os Estados gozassem de uma imunidade

parcial de jurisdição, e podendo ser levados ao Judiciário nacional em hipóteses específicas, a


partir da diferenciação dos atos de império dos atos de gestão.

2
Vide questão 6.
12
Os atos de império (atos públicos) são aqueles praticados pelo Estado no exercício de
suas prerrogativas soberanas, gozando de imunidade total de jurisdição. Exemplos: atos

praticados em períodos de guerra, atos de concessão ou denegação de visto, atos de


admissão ou deportação de estrangeiro em seu território, dentre outros.

Por sua vez, os atos de gestão (atos privados) são aqueles em que o ente estatal pode

ser comparado a um particular; aqui, os Estados só gozam de imunidade parcial de jurisdição.


Exemplos: atos na seara trabalhista (o consulado americano no Brasil poderá ser condenado

em ação trabalhista quanto à relação de trabalho com seu jardineiro), aquisição ou venda de
bens (comercial), casos que envolvam responsabilidade civil, dentre outros.3

Antes da Constituição Federal de 1988, vigorava no Brasil a corrente clássica; mas com o

advento da nova ordem constitucional, o Supremo Tribunal Federal mudou seu


entendimento e consagrou a teoria moderna como a adotada nas relações internacionais do
país quanto à imunidade de jurisdição. Esse também é o entendimento geral dos demais

Estados.

Ademais, a possibilidade de um Estado estrangeiro se submeter ao Judiciário local só


poderá ser examinada em juízo, após o qual poderá ter prosseguimento da demanda judicial,

ou sua extinção.4

 Imunidade de execução do Estado

A questão acerca da possibilidade ou não de executar, forçadamente, os bens de um


Estado estrangeiro após demanda judicial ainda é uma polêmica. Parte da doutrina acredita

que, assim como ocorre com a imunidade de jurisdição, a de execução também deveria ser
relativa, a fim de dar seguimento ao processo.

Porém, parte da doutrina se manifesta no sentido de a imunidade de Execução do

Estado ser absoluta, com base na Convenção de Viena sobre Relações Diplomáticas (1961) e
na Convenção de Viena sobre Relações Consulares (1963), que consagram a inviolabilidade
dos bens das missões diplomáticas e consulares. Destaca-se, especialmente, o art. 22, § 3º, da

3
Vide questão 5.
4
Vide questão 4.
13
Convenção de 1961, que expressamente estabelece que os bens de missões diplomáticas não
podem ser objeto de busca, requisição, embargo ou execução.

Ademais, o STF já se posicionou no sentido de que a imunidade de execução deve ser

absoluta, ou seja, mesmo no caso do Estado ser julgado, o mesmo não poderá ser executado,
pois todos os bens do Estado estrangeiro são protegidos por tratados internacionais.

O Estado pode ser executado caso haja renúncia da imunidade. Ademais, para pagar
um débito judicial, o Estado pode ser executado sobre bens não afetos às atividades

diplomáticas ou consulares, ou através da expedição de carta rogatória ao Estado estrangeiro.


Além disso, o Estado também pode pagar o débito de modo voluntário, sem ser necessária

sua execução.

Não obstante, as imunidades de jurisdição e de execução são autônomas,


independentes entre si; a renúncia a uma não implicará a renúncia à outra, devendo ocorrer

de modo expresso.

 Imunidades das Organizações Internacionais

Para as organizações internacionais, as imunidades permitem sua atuação e exercício de

maneira mais livre, sendo estabelecidas no âmbito de seus atos constitutivos ou em tratados
específicos, celebrados com os Estados. Então, as regras sobre imunidade das organizações
internacionais podem ser estabelecidas por normas costumeiras, por tratados e até mesmo por

analogia (de normas celebradas por outras organizações e/ou outros Estados).

No Brasil, os principais instrumentos sobre essa matéria são: os Decretos Executivos nº


27.784/1950 (promulgou a Convenção sobre Privilégios e Imunidades das Nações Unidas), nº

14
52.288/1963 (promulgou a Convenção sobre Privilégios e Imunidades das Agências
Especializadas das Nações Unidas) e nº 59.308/1966 (promulgou o Acordo Básico de

Assistência Técnica com a Organização das Nações Unidas, suas Agências Especializadas e a
Agência Internacional de Energia Atômica).

Desse modo, tanto o STF quanto o TST já decidiram sobre as imunidades da

Organização das Nações Unidas; ambos posicionaram-se no sentido de que a ONU goza de
imunidade de jurisdição e de execução, inclusive na seara trabalhista.

 Competência nacional para julgamento de pessoa jurídica de Direito Internacional


Público

Na forma do art. 102, I, e, da Constituição Federal, compete ao STF processar e julgar,

originariamente, o litígio entre Estado estrangeiro ou organismo internacional e a União, o


Estado, o Distrito Federal ou o Território.

Segundo o art. 109, II, da Constituição Federal, compete à Justiça Federal processar e

julgar as causas entre Estado estrangeiro ou organismo internacional e Município ou pessoa


domiciliada ou residente no País. Com relação a tais causas, atesta o art. 105, II, c, da
Constituição Federal, que compete ao STJ processar e julgá-las, em grau de recurso

ordinário.

Ademais, em causas trabalhistas, a competência é da Justiça do Trabalho, na forma do


art. 114, I, da Constituição Federal. Não há imunidade de jurisdição, como visto.

 Imunidade do agente diplomático:

O agente diplomático é o Chefe ou um membro diplomático da Missão. O marco jurídico

que regula esta imunidade é a Convenção de Viena, a qual dispõe para o agente a prerrogativa
cível, penal e administrativa.

➢ Estado que envia: acreditante;

➢ Estado que recebe: acreditado.

Relacionado a estes agentes, há três exceções à imunidade, derivadas apenas do Estado

acreditado:
15
a) Uma ação real sobre imóvel privado situado no território do Estado acreditado, salvo se o
agente diplomático o possuir por conta do Estado acreditado para os fins da missão.

b) Uma ação sucessória na qual o agente diplomático figure, a título privado e não em nome
do Estado, como executor testamentário, administrador, herdeiro ou legatário.

c) Uma ação referente a qualquer profissão liberal ou atividade comercial exercida pelo agente
diplomático no Estado acreditado fora de suas funções oficiais.

16
3. Organizações Internacionais

3.1. Conceito e natureza jurídica


As organizações internacionais foram criadas a partir da percepção de que os Estados

possuem interesses comuns, sendo interessante, para esses fins, estruturar esquemas de
cooperação permanentes para articular os esforços estatais dirigidos a fins objetivos. Assim, a

partir da associação voluntária de Estados e/ou de outras entidades, surgiram as organizações


internacionais, constituídas por meio de tratados internacionais, com aparelho institucional
permanente e personalidade jurídica própria.5

Por serem sujeitos de Direito Internacional, as organizações internacionais possuem ampla


capacidade de ação: possuem direitos e obrigações internacionais, podem celebrar tratados e
recorrer a mecanismos internacionais de solução de controvérsias6. Porém, parte da doutrina

acredita que sua personalidade jurídica seja “derivada”, já que as organizações são estabelecidas
pelos Estados, entes que teriam personalidade jurídica originária7. Destaca-se também que as

organizações internacionais não possuem soberania, atributo conferido apenas para os Estados.

Os entes estatais não só criam os organismos internacionais, como também contribuem


para sua manutenção e funcionamento através de recursos financeiros e humanos. A despeito
disso, são personalidades próprias e independentes dos Estados no Direito Internacional,
podendo ser sujeitos de direitos e de obrigações, a partir de quando começam efetivamente a

funcionar. Isso significa que as decisões das organizações internacionais não requerem a
aceitação unânime de seus membros.8

5
Vide questão 8.
6
Vide questão 3.
7
Vide questão 1.
8
Vide questão 7.
17
A personalidade jurídica internacional das organizações internacionais foi reconhecida a
partir do parecer da Corte Internacional de Justiça que reconheceu o direito da ONU à

reparação pela morte de seu mediador para o Oriente Médio, Folke Bernadotte, em Jerusalém,

no ano de 1948. 9

O tratado (geralmente denominado “Carta”, a exemplo da Carta da ONU) que institui a


organização internacional estabelece a sua estrutura, seus objetivos, a forma de

funcionamento, dentre outros pontos relevantes para sua organização. Há também um


representante máximo da organização, eleito de acordo com o ato constitutivo da

organização.

Apesar de cada estrutura dos organismos poderem ser diferentes entre si, é comum a
existência dos seguintes órgãos:

a) Órgão plenário: participação de todos os membros para negociar os tratados e discutir


temas de grande relevância para o trabalho da organização.
b) Órgão executivo: normalmente denominado de “conselho”; para executar as principais
políticas da organização; participação de apenas alguns dos Estados-membros;
c) Secretariado: apto para cuidar de questões administrativas da organização.

Ademais, é também de competência das organizações internacionais estabelecerem


mecanismos de implementação e controle dos tratados por ela firmados, podendo fiscalizar

sua efetiva execução e aplicar sanções nos casos de descumprimentos.

9
Vide questão 9.
18
Além da capacidade de auto-organização, as organizações internacionais também
podem exercer direito de legação e gozam de imunidade de jurisdição, como visto

anteriormente, regulada por seus atos constitutivos, pelos tratados firmados sobre a matéria
ou até mesmo por analogia.

3.2. Elementos essenciais, características e competências


Os elementos básicos para que as organizações internacionais existam são:

 Os Estados que as compõem;


 Os seus atos constitutivos;
 Os órgãos permanentes que a compõem;
 Personalidade jurídica (adquirida com seu efetivo funcionamento);
 Objetivos voltados à cooperação em temas de interesse comum.

Já as características das organizações internacionais são:

 Multilateralidade: devem ter pelo menos três membros;


 Permanência: devem funcionar por prazo indeterminado, de modo duradouro e estável
(ressalta-se que podem deixar de existir por decisão de seus membros);
 Institucionalização: órgãos próprios e agentes responsáveis por suas atividades.

Por fim, são as competências das organizações internacionais:

 Competência normativa: capacidade de regular suas próprias atividades e de


estabelecer normas dirigidas aos outros sujeitos internacionais (de caráter obrigatório
ou não);
 Competência operacional: capacidade de formular e executar operações, políticas,
projetos, a fim de ter seus objetivos atingidos;
 Competência de controle: supervisionar a aplicação das normas elaboradas, podendo
ser político, técnico ou jurisdicional;
 Competência impositiva: impor suas decisões e/ou eventuais sanções, de acordo com o
que foi definido no seu ato constitutivo.

3.3. Classificações

Quanto ao âmbito de participação, abrangência ou alcance:

19
a) Universais: qualquer Estado do mundo pode fazer parte dessa organização;
b) Regionais: abarcam um espaço limitado, para determinada região, geralmente por
aproximação geográfica (EX: Mersocul) ou histórica-cultural (EX: Comunidade dos
Países de Língua Portuguesa).

Destaca-se que, em regra, as disposições de um organismo regional não podem

contrariar as normas de uma organização universal.

Quanto ao objeto ou domínio temático:

a) Fins específicos: relacionado a um único objeto (EX: FMI e UNESCO);


b) Fins gerais: englobam vários objetos, uma ampla gama de competências, mas de
cunho predominantemente político (EX: ONU).

Quanto à natureza dos poderes exercidos:

a) Intergovernamentais: a atuação dessas organizações depende da atuação


coordenada de seus membros, sendo formadas por representantes dos Estados;
b) Supranacionais: essas organizações não dependem de uma atuação coordenada,
pois têm poder de subordinar os Estados que a compõem; seus órgãos atuam em
nome próprio, e não como representantes estatais.

Quanto aos poderes recebidos ou estruturas institucionais:

a) De cooperação: objetivam coordenar as atividades para atingir fins comuns;


b) De integração ou subordinação: têm capacidade de impor as suas decisões.

3.4. Organização das Nações Unidas (ONU)

Após a Segunda Guerra Mundial se viu a necessidade de criar uma Organização que
buscasse impedir mais um conflito como aquele, bem como efetuar a manutenção da paz e

da segurança internacionais. Assim, foi criada, em 1945, a Organização das Nações Unidas
(ONU), formada por países que se reuniram voluntariamente em busca de mecanismos que
promovam o progresso das nações.

Ademais, referente a esse Órgão é importante salientar três corporações presentes no


mesmo. A primeira diz respeito à Assembleia Geral, a qual é considerada o principal órgão
20
deliberativo da ONU, composta por todos os membros das Nações Unidas, e também pode
expulsar um Estado-membro que tenha violado os princípios da Carta das Nações Unidas. 10

A segunda é o Conselho de Segurança, o mesmo é formado por quinze Estados

membros: 5 permanentes (Estados Unidos, França, Reino Unido, China e Rússia) e 10 rotativos
(a cada 2 anos). Já a terceira é o Secretariado-Geral da ONU, principal órgão administrativo,

chefiado pelo Secretário-Geral (o mais alto funcionário e representante da ONU), eleito pela
Assembleia Geral, a partir da recomendação do Conselho de Segurança, tendo funções

administrativas e diplomáticas, para um mandato de 5 anos, passível de uma reeleição.

Além da ONU, existem também outras organizações internacionais importantes, das


quais se destaca: o Fundo Monetário Internacional (FMI), que tem a finalidade básica de

prestar auxílio emergencial a países em crise econômico-financeiro; o Banco Internacional para


a Reconstrução e Desenvolvimento (BIRD), que tem a finalidade básica de prestar auxílio
financeiro para projetos de longo prazo; a Organização Mundial do Comércio (OMC), que tem

a finalidade de estimular o comércio internacional como forma de desenvolvimento


econômico e combater suas práticas desleais; dentre outras.

10
Vide questão 10.
21
4. Outros sujeitos

4.1. Indivíduos
Em decorrência da premissa de que a sociedade internacional era composta apenas por

entes estatais, a pessoa natural consistia em mero objeto das normas internacionais e da ação
estatal no âmbito externo, tendo uma atuação extremamente reduzida. No entanto, com a

evolução do Direito Internacional e da própria sociedade internacional, o indivíduo passou a,


cada vez mais, atuar independentemente dos Estados, sendo aos poucos entendido que o
indivíduo também possuiria personalidade internacional, que ainda é objeto de discussão

doutrinária atualmente.

A despeito da controvérsia, existem diversas normas que estabelecem diretamente


direitos e obrigações aos indivíduos, como, por exemplo, nos tratados de direitos humanos ou

as convenções de direito laboral da Organização Internacional do Trabalho (OIT). Além disso,


existe também a possibilidade dos indivíduos participarem dos mecanismos internacionais de

solução de controvérsias, exigindo, por exemplo, a observância de algum direito que lhe foi
conferido pela ordem jurídica internacional, estando o indivíduo, ainda, obrigado a observar as

normas internacionais, podendo responder por seus atos em foros internacionais.

Ressalta-se que indivíduos não podem celebrar tratados, e que a possibilidade de


acesso de pessoas naturais a foros internacionais é extremamente restrita.

4.2. Santa Sé e o Estado da Cidade do Vaticano


Apesar de serem entes distintos, a Santa Sé e o Estado da Cidade do Vaticano possuem

vínculo com a Igreja Católica Apostólica Romana, havendo controvérsia quanto a


personalidade jurídica de ambos.

Parte da doutrina não confere ao Vaticano como Estado com base na suposta

incompatibilidade de seus fins com os típicos propósitos de um ente estatal. No entanto, o


Vaticano possui todos os elementos de um Estado: território, nacionais e um governo

22
soberano, cuja autoridade maior reside na figura do Papa. Sua principal função é dar suporte
material para que a Santa Sé possa exercer seu papel.

Se for considerado o Vaticano como um ente estatal, este possui personalidade jurídica

internacional. Possui também capacidade de atuação internacional, podendo celebrar tratados


e participar de organizações internacionais, embora o direito de legação seja exercido pela

Santa Sé.

Por sua vez, a Santa Sé teve sua personalidade internacional contestada a partir da
incorporação dos Estados Pontifícios à Itália. Porém, a partir do Tratado de Latrão (celebrado

entre a Itália e a Santa Sé em 1929), parte de um território em Roma foi cedido à Santa Sé,
onde foi criado o Estado da Cidade do Vaticano, diminuindo a corrente da doutrina que não

atribui personalidade internacional à Santa Sé.

Assim, a Santa Sé é a cúpula da Igreja Católica, também chefiada pelo Papa, e


composta pela Cúria Romana (conjunto de órgãos que assessora o Papa em sua missão de

fins espirituais). Sua sede fica no Estado da Cidade do Vaticano, e seu poder não é limitado
por nenhum Estado. Sendo sujeito de Direito Internacional, pode celebrar tratados, participar
de organizações internacionais e exercer o direito de legação (direito de enviar e receber

agentes diplomáticos).

Ademais, o Papa goza do status e das prerrogativas de um Chefe de Estado, e, em


virtude da estreita vinculação entre o Estado da Cidade do Vaticano e a Santa Sé, os

compromissos internacionais assumidos por um, influenciam o outro, e vice-versa.

4.3. Organizações não governamentais


As organizações não governamentais (ONGs) são entidades privadas sem fins lucrativos

que atuam em áreas de interesse público, promovendo a aplicação de normas internacionais


nos mais diversos campos, como os direitos humanos e o direito ambiental. Ademais, podem
contribuir para a expansão ou o cumprimento do arcabouço normativo internacional.

As ONGs podem participar de organizações internacionais como observadores e podem


recorrer a determinados foros internacionais em prol de direitos ou interesses relacionados a
suas áreas de atuação. Porém, não podem celebrar tratados internacionais.

23
Os exemplos mais famosos de ONGs internacionais são: a Anistia Internacional, o
Comitê Olímpico Internacional, o Greenpeace, o Médicos Sem Fronteiros e o Comitê

Internacional da Cruz Vermelha.

4.4. Sujeitos não formais


 Empresas

Parte da doutrina reconhece a personalidade internacional das empresas, em vista da

participação das mesmas no cenário internacional, beneficiando-se das normas, devendo


seguir os padrões estabelecidos em tratados (em matérias como trabalho e meio ambiente,

por exemplo), podem ter acesso a mecanismos internacionais de solução de controvérsias


(como no Mercosul) e podem contribuir na evolução do Direito Internacional. No entanto, não

podem celebrar tratados, mas apenas contratos entre as empresas e Estados ou organizações
internacionais.

 Beligerantes

Os beligerantes são movimentos contrários ao governo de um Estado, objetivando


conquistar o poder ou criar um novo ente estatal; são grandes revoluções, guerras civis. Seu

estado de beligerância deve ser reconhecido por outros membros da sociedade internacional,
geralmente através de uma declaração de neutralidade, mas é ato discricionário para os

demais Estados. Como consequência do reconhecimento de beligerância, há a obrigação de os


beligerantes observarem as normas aplicáveis aos conflitos armados e a possibilidade de
celebrarem tratados internacionais com os Estados neutros.

 Insurgentes

Os insurgentes, por sua vez, também são grupos contrários a governos, mas cujas ações

não assumem as mesmas proporções da beligerância. É o caso de ações localizadas, de


revoltas de organizações militares, cujo status de insurgência é reconhecido por outros
Estados. O reconhecimento de insurgência também é ato discricionário para os demais

Estados, dentro do qual estão fixados seus efeitos (diferentemente da beligerância, não são
pré-determinados), geralmente no sentido de definir a obrigação de respeitar as normas
internacionais de direitos humanos.

24
 Nações em luta pela soberania

As nações em luta pela soberania são movimentos de independência nacional que

adquirem grande notoriedade internacional, podendo ter origem na beligerância ou na


insurgência. Neste caso também é necessário o respeito a normas internacionais de direitos

humanos, de direito humanitário e de outros ramos aplicáveis a qualquer conflito armado ou


situação instável. Como exemplo, tem-se que a Palestina é reconhecida como nação em luta

pela soberania.

25
QUADRO SINÓTICO

IMUNIDADES ESTATAIS
IMUNIDADE DE JURISDIÇÃO IMUNIDADE DE JURISDIÇÃO IMUNIDADE DE EXECUÇÃO
TEORIA CLÁSSICA TEORIA MODERNA
Imunidade absoluta Imunidade relativa Imunidade absoluta
(entendimento majoritário)
Princípio par in parem non Atos de império Convenções de Viena sobre:
habet judicium X Relações Diplomáticas e
Atos de gestão sobre Relações Consulares

Imunidade para qualquer tipo Imunidade apenas para os Imunidade de execução é


de ato atos de império autônoma à imunidade de
jurisdição
Perda de imunidade apenas Não há imunidade para os A renúncia da imunidade tem
mediante renúncia atos de gestão que ser expressa
Teoria já ultrapassada Teoria prevalecente no Hipóteses de execução:
âmbito internacional e Renúncia da imunidade
interno Bens não afetos
Carta rogatória
Pagamento voluntário

26
FUNÇÕES DOS PRINCIPAIS ÓRGÃOS DA ONU
ASSEMBLEIA-GERAL CONSELHO DE SEGURANÇA SECRETARIADO-GERAL
Discutir os temas de interesse Manter a paz e a segurança Órgão administrativo da ONU
da ONU internacionais
Emitir recomendações sobre Investigar situações instáveis Funções diplomáticas
os temas deliberados e tomar as medidas cabíveis

Aprovar orçamento Implementar sanções Secretário-Geral: maior


funcionário e representante
da ONU
Acompanhar as atividades da Decidir sobre a formação de Eleito pela Assembleia
ONU forças de paz Nacional por recomendação
do Conselho de Segurança
Solicitar atenção ao Conselho Opinar sobre admissão, Alertar o Conselho de
de Segurança para situações suspensão e expulsão de Segurança sobre situações
que possam vir a configurar membros da ONU instáveis
ameaça à paz e à segurança

27
QUESTÕES COMENTADAS

Questão 1

TRT 7ª Região – Juiz – 2005

A propósito da personalidade jurídica do Estado e das organizações internacionais, na


percepção da doutrina, especialmente em Francisco Rezek, pode-se afirmar que:

A) a personalidade jurídica do Estado é originária e a personalidade jurídica das

organizações internacionais é derivada.

B) porque o Estado tem precedência histórica, sua personalidade jurídica é derivada; e


porque as organizações resultam de uma elaboração jurídica resultante da vontade de alguns

Estados, sua personalidade jurídica é originária.

C) a personalidade jurídica do Estado fundamenta-se em concepções clássicas de Direito


Público, formatando-se como realidade jurídica e política; a personalidade jurídica das

organizações internacionais centra-se na atuação de indivíduos e de empresas, que lhes


conferem personalidade normativa, assumindo feições públicas e privadas.

D) a personalidade jurídica do Estado é definida por seus elementos normativos internos,

aceitos na ordem internacional por tratados constitutivos de relações nas esferas públicas e
privadas; a personalidade jurídica das organizações internacionais decorre da fragmentação

conceitual do Estado contemporâneo, decorrência direta de crises de ingovernabilidade


sistêmica e de legitimidade ameaçada pelo movimento de globalização; não se lhes aplicam

referenciais convencionais, e consequentemente não se vislumbram personalidades jurídicas


distintas.

28
E) o direito das gentes não identifica a personalidade jurídica das organizações
internacionais, dado que aplicado, especialmente, aos Estados, que detém natureza jurídica

definida por elementos de Direito Público.

Comentário:

A alternativa A está correta, segundo classificação doutrinária. A alternativa B está incorreta,


pois está invertida: o Estado apareceu primeiro, então sua personalidade é originária,

enquanto a da organização internacional é derivada. A alternativa C está incorreta, pois a


personalidade das organizações internacionais nasce da ação dos Estados que a criaram, e não
decorre de outros entes internacionais. A alternativa D está incorreta, pois a personalidade dos

Estados não depende dos tratados; quanto à personalidade das organizações internacionais,
esta se fundamenta em tratados feitos pelos Estados. A alternativa E está incorreta, pois as

organizações internacionais têm personalidade jurídica internacional.

Questão 2
Banca: FGV - Órgão: OAB - 2014:

Um agente diplomático comete um crime de homicídio no Estado acreditado. A respeito


desse caso, assinale a afirmativa correta.

A) Será julgado no Estado acreditado, pois deve cumprir as leis desse Estado.

B) Poderá ser julgado pelo Estado acreditado desde que o agente renuncie a imunidade de
jurisdição.

C) Em nenhuma circunstância pode ser julgado pelo Estado acreditado.

D) Poderá ser julgado pelo Estado acreditado, desde que o Estado acreditante renuncie

expressamente à imunidade de jurisdição.

Comentário:

29
Alternativa A está incorreta, pois, para que o agente diplomático seja julgado, deverá haver
a renúncia à imunidade. Alternativa B está incorreta, pois apenas o Estado acreditante pode

renunciar à imunidade. Alternativa C está incorreta, pois o agente diplomático poderá ser
julgado, desde que haja a renúncia à imunidade. Alternativa D está correta, pois, após o

Estado acreditante renunciar expressamente à imunidade de jurisdição, o mesmo poderá ser


julgado.

Questão 3

TRT 16ª Região – Juiz – 2005

As organizações internacionais contemporâneas,

A) são sujeitos soberanos de Direito Internacional.

B) são sujeitos de Direito Internacional em decorrência das normas da Carta da ONU.

C) são sujeitos de Direito Internacional por terem capacidade jurídica própria.

D) não são sujeitos de Direito Internacional.

E) só adquirem personalidade jurídica depois de homologadas pela Corte Internacional de


Justiça.

Comentário:

A alternativa A está incorreta, pois a soberania é atributo exclusivo dos Estados. A alternativa B

está incorreta, pois o reconhecimento das organizações internacionais como sujeitos de Direito
Internacional não decorrem das normas da Carta da ONU, mas sim da evolução das relações

internacionais. A alternativa C está correta, pois as organizações internacionais têm capacidade


jurídica própria. A alternativa D está incorreta, pois, apesar de no início de sua existência não terem
sido consideradas sujeitos internacionais, agora são. A alternativa E está incorreta, pois a existência
das organizações internacionais depende exclusivamente dos Estados que a criaram, não havendo
necessidade da homologação de nenhum outro ente.
30
Questão 4

TRF 3ª Região - Juiz - 2006

Em uma ação promovida contra um Estado estrangeiro, deve o juiz:

A) julgar-se incompetente e enviar a ação para o Tribunal Superior.

B) determinar a citação do representante legal do Estado.

C) indeferir a inicial por falta de jurisdição.

D) encaminhar a inicial ao Ministério das Relações Exteriores.

Comentário:

A alternativa A está incorreta, pois, no Brasil, o Juiz Federal de 1º Grau é competente


para julgar Estados estrangeiros nos casos do art. 109, II, da Constituição da República. A

alternativa B está correta, pois, para que seja possível estabelecer se o caso é ou não de
imunidade de jurisdição do Estado, é preciso que haja apuração processual. A alternativa C
está incorreta, pois, “falta de jurisdição” não é uma das hipóteses do processo civil para

indeferir a petição inicial. A alternativa D está incorreta, pois a via diplomática só é


empregada, eventualmente, na fase de execução.

Questão 5

TRF 1ª Região – Juiz - 2009

Pedro, cidadão brasileiro, presta serviços como cozinheiro na embaixada do Estado X no Brasil.

Após constatar que vários dos direitos trabalhistas previstos na Consolidação das Leis do
Trabalho estavam sendo desrespeitados, Pedro decidiu ajuizar ação na justiça do trabalho

brasileira. Com base nessa situação hipotética, assinale a opção correta.

31
A) Deve ser seguido o procedimento descrito na Convenção das Nações Unidas sobre
Imunidades de Jurisdição e Execução do Estado.

B) Em matéria trabalhista, não há imunidade de jurisdição do Estado estrangeiro no Brasil.


C) A imunidade de jurisdição do Estado estrangeiro é absoluta por força de uma norma jus

cogens.
D) A competência para conhecer da ação é da justiça federal.
E) Em matéria trabalhista, não há imunidade de execução do Estado estrangeiro no Brasil.

Comentário:

A alternativa A está incorreta, pois não há normativa escrita (em convenções, tratados)
sobre imunidade do Estado, sendo decorrente do direito costumeiro. A alternativa B está

correta, pois os atos relacionados à matéria trabalhista são atos de gestão, e, de acordo com a
teoria moderna da imunidade de jurisdição, não há imunidade para o Estado para esse tipo de

ato. A alternativa C está incorreta, pois a imunidade de jurisdição do Estado não é mais
considerada absoluta, nem norma jus cogens. A alternativa D está incorreta, pois, de acordo
com o art. 114, I, da Constituição Federal, a competência é da Justiça do Trabalho. A

alternativa E está incorreta, pois as imunidades de jurisdição e de execução são independentes


e autônomas, havendo imunidade de execução, em regra.

Questão 6

BACEN – Procurador - 2009

O aforismo par in parem non habet judicium dá fundamento à norma de direito internacional

que dispõe acerca de


A) imunidade de jurisdição estatal.

B) desenvolvimento sustentável.
C) liberdade dos mares.

D) efetividade.
E) cláusula da nação mais favorecida.

32
Comentário:

A assertiva correta é a letra A, pois há imunidade de jurisdição estatal para os atos de


império. Por exclusão, as demais alternativas estão incorretas, pois não dão fundamento a

normas de Direito Internacional.

Questão 7

TRF 1ª Região – Juiz – 2009


Assinale a opção correta acerca das organizações internacionais:

A) Podem ser membros dessas organizações apenas Estados;


B) Suas imunidades de jurisdição e execução têm base no direito costumeiro;

C) Sua capacidade para celebrar tratados é inerente a sua personalidade no direito


internacional;

D) Não podem ser responsabilizadas diretamente por seus atos;


E) Estados que não sejam membros de determinada organização internacional podem opor-se

à personalidade internacional dessa organização.

Comentário:

A alternativa A está incorreta, pois nada impede que uma organização internacional faça
parte de outra. A alternativa B está incorreta, pois a base das imunidades das organizações

internacionais são os tratados, não o direito costumeiro. A alternativa C está incorreta, pois ter
personalidade de direito internacional não pressupõe ter capacidade para celebrar tratados. A

alternativa D está incorreta, pois a responsabilidade internacional também se aplica para as


organizações internacionais. A alternativa E está correta, de acordo com o art. 9º da Carta da

ONU, para a qual todos os membros da Assembleia Geral têm igual direito a voto.

33
Questão 8

Ano: 2015 Banca: FCC Órgão: TRT - 6ª Região (PE) Prova: FCC - 2015 - TRT - 6ª Região

(PE) - Juiz do Trabalho Substituto


As organizações intergovernamentais

A) serão dotadas de personalidade jurídica internacional, desde que isso esteja expressamente
previsto em seu tratado constitutivo.

B) podem celebrar tratados internacionais entre si e com Estados, embora a esses acordos não
se apliquem as disposições da Convenção de Viena sobre Direitos dos Tratados de 1969,

sendo tais tratados ainda objeto de regulação por normas costumeiras.


C) gozam das mesmas imunidades de jurisdição, perante o judiciário brasileiro, que os Estados

estrangeiros, fundadas no princípio par in parem non habet judicium.


D) dotadas de personalidade jurídica internacional podem demandar Estados perante órgãos
jurisdicionais internacionais, inclusive a Corte Internacional de Justiça.

E) não podem ser membro de outra organização intergovernamental.

Comentário:

A alternativa A está incorreta, pois não é o tratado constitutivo de uma organização que

lhe confere personalidade jurídica internacional, mas sim o mero ato de sua criação e efetivo
funcionamento. A alternativa B está correta, pois há a Convenção de Viena entre Estados e
Organizações Internacionais e entre Organizações Internacionais, de 1986, que regula a

matéria. A alternativa C está incorreta, pois não são fundadas no mesmo tipo de imunidade:
enquanto as imunidades dos Estados são formadas pelo direito costumeiro, as imunidades das

organizações são regulamentadas por tratados. A alternativa D está incorreta, pois o estatuto
da Corte Internacional de Justiça veda a demanda por organizações internacionais; apenas

Estados podem ser parte. A alternativa E está incorreta, pois não há impedimentos para que
uma organização internacional integre outra.

34
Questão 9

Instituto Rio Branco - 2008

É considerado divisor de águas no direito internacional o parecer consultivo da Corte

Internacional de Justiça no caso Reparação de danos a serviço das Nações Unidas acerca da
morte de Folke de Bernadotte, mediador que, no exercício de suas funções, foi assassinado

por extremistas israelenses em Jerusalém, em 1948. Essa consideração justifica-se porque o


parecer

a) declarou a existência da Palestina como território insurgente.

b) homologou a jurisdição penal do Estado de Israel.

c) reconheceu a personalidade jurídica das organizações internacionais.

d) incorporou o princípio da legítima defesa internacional.

e) consagrou o pacifismo e a não-violência como deveres jurídicos.

Comentário:

A resposta correta é a letra C, a partir do parecer da Corte Internacional de Justiça que


reconheceu o direito da ONU à reparação pela morte de seu mediador para o Oriente Médio,
reconhecendo, com isso, a personalidade jurídica internacional das organizações

internacionais. Por exclusão, as demais alternativas estão incorretas. Destaca-se, porém, que a
Palestina é reconhecida como nação em luta pela soberania; o surgimento de um Estado não

depende de reconhecimento externo; a legítima defesa foi reconhecida nas normas da ONU.

Questão 10

PFN – 2006

De acordo com a Carta das Nações Unidas, de 1945, a Assembleia Geral:


35
a) será composta de quinze membros, observando-se que a República da China, a França, o

Reino Unido, a Rússia, a Inglaterra e os Estados Unidos são membros permanentes.


b) será constituída por todos os membros das Nações Unidas.

c) é composta por cinquenta e quatro membros das Nações Unidas, eleitos pelo Conselho
Econômico e Social, respeitando-se a presença dos membros permanentes.
d) será constituída por todos os países signatários da Carta, com exceção da Suíça e de países

que estejam sob fiscalização internacional, no que toca ao desrespeito a pauta de direitos
humanos.

e) será composta pelos signatários originários da Carta, como membros permanentes, e por
signatários supervenientes, como membros aderentes, outorgando-se direito de voto àqueles

primeiros.

Comentário:

A alternativa A está incorreta, pois os Estados mencionados são os membros do


Conselho de Segurança. A alternativa B está correta, de acordo com o art. 9 da Carta da ONU.

A alternativa C está incorreta, pois o Conselho Econômico e Social é que é composto por 54
membros da ONU. A alternativa D está incorreta, pois não há exceções: é composta por todos

os membros da ONU. A alternativa E está incorreta, pois todos os membros da Assembleia


Geral têm o mesmo direito ao voto, não havendo distinção nesse sentido.

36
GABARITO

Questão 1 - A

Questão 2 - D

Questão 3 - C

Questão 4 - B

Questão 5 - B

Questão 6 - A

Questão 7 - E

Questão 8 - B

Questão 9 - C

Questão 10 - B

37
LEGISLAÇÃO COMPILADA

Nesta matéria, faz-se de extrema importância a leitura de:

Convenção de Montevidéu sobre Direitos e Deveres dos Estados

 Art. 1º
 Art. 3º
 Art. 8º

Convenção de Viena sobre Relações Diplomáticas

 Art. 22, § 3º

Constituição Federal

 Art. 102, I, e
 Art. 105, II, c
 Art. 109, II
 Art. 114, I

38
JURISPRUDÊNCIA

Jurisprudência do STF sobre imunidade de jurisdição aos organismos


internacionais, garantida por tratado firmado pelo Brasil:
 REPERCUSSÃO GERAL NO RE Nº 1.034.840 - DISTRITO FEDERAL

RECURSO EXTRAORDINÁRIO. ORGANISMO INTERNACIONAL. ORGANIZAÇÃO DAS

NAÇÕES UNIDAS ONU. PROGRAMA DAS NAÇÕES UNIDAS PARA O


DESENVOLVIMENTO PNUD. CONVENÇÃO SOBRE PRIVILÉGIOS E IMUNIDADES DAS

NAÇÕES UNIDAS DECRETO 27.784/1950. CONVENÇÃO SOBRE PRIVILÉGIOS E


IMUNIDADES DAS AGÊNCIAS ESPECIALIZADAS DAS NAÇÕES UNIDAS DECRETO
52.288/1963. ACORDO BÁSICO DE ASSISTÊNCIA TÉCNICA COM AS NAÇÕES UNIDAS E

SUAS AGÊNCIAS ESPECIALIZADAS DECRETO 59.308/1966. IMPOSSIBILIDADE DE O


ORGANISMO INTERNACIONAL VIR A SER DEMANDADO EM JUÍZO, SALVO EM

CASO DE RENÚNCIA EXPRESSA À IMUNIDADE DE JURISDIÇÃO. ENTENDIMENTO


CONSOLIDADO EM PRECEDENTES DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. CONTROVÉRSIA

CONSTITUCIONAL DOTADA DE REPERCUSSÃO GERAL. REAFIRMAÇÃO DA


JURISPRUDÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. RECURSO EXTRAORDINÁRIO

PROVIDO. (STF – RE Nº 1.034.840 - SP, Relator: MIN. LUIZ FUX, Data de Julgamento:
01/06/2017, Tribunal Pleno, Data de Publicação: DJ 30-06-2017).

Jurisprudência do STF sobre a teoria moderna da imunidade de

jurisdição

 ACi Nº 9696 – SÃO PAULO

39
ESTADO ESTRANGEIRO. IMUNIDADE JUDICIÁRIA. CAUSA TRABALHISTA. NÃO HÁ
IMUNIDADE DE JURISDIÇÃO PARA O ESTADO ESTRANGEIRO, EM CAUSA DE

NATUREZA TRABALHISTA. EM PRINCÍPIO, ESTA DEVE SER PROCESSADA E JULGADA


PELA JUSTIÇA DO TRABALHO, SE AJUIZADA DEPOIS DO ADVENTO DA

CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988 (ART. 114). NA HIPÓTESE, PORÉM, PERMANECE A


COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL, EM FACE DO DISPOSTO NO PARÁGRAFO 10 DO
ART. 27 DO A.D.C.T. DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988, C/C ART. 125, II, DA E.C. N.

1/69. RECURSO ORDINÁRIO CONHECIDO E PROVIDO PELO SUPREMO TRIBUNAL


FEDERAL PARA SE AFASTAR A IMUNIDADE JUDICIÁRIA RECONHECIDA PELO JUÍZO

FEDERAL DE PRIMEIRO GRAU, QUE DEVE PROSSEGUIR NO JULGAMENTO DA CAUSA,


COMO DE DIREITO. (STF – ACi: 9696 SP, Relator: SYDNEY SANCHES, Data de

Julgamento: 31/05/1989, Tribunal Pleno, Data de Publicação: DJ 12-10-1990 PP-11045


EMENT VOL-01598-01 PP-00016 RTJ VOL-00133-01 PP-00159).

Jurisprudência do STJ sobre imunidade de execução

 Ag 230.684 – Distrito Federal

RECLAMAÇÃO TRABALHISTA. EXECUÇÃO MOVIDA CONTRA ESTADO ESTRANGEIRO.


PENHORA. INADMISSIBILIDADE. IMUNIDADE DE EXECUÇÃO. EXPEDIÇÃO DE CARTA
ROGATÓRIA PARA A COBRANÇA DO CRÉDITO. – Os bens do Estado estrangeiro são
impenhoráveis em conformidade com o disposto no art. 22, inciso 3, da “Convenção de
Viena sobre Relações Diplomáticas (Decreto nº 56.435, de 8.6.1965)”. Agravo provido

parcialmente para determinar-se a expedição de carta rogatória com vistas à cobrança


do crédito. (STJ – Ag: 230684 DF 1999/0019680-5, Relator: Ministro BARROS MONTEIRO,

Data de Julgamento: 25/11/2002, T4 – QUARTA TURMA, Data de Publicação: --> DJ


10/03/2003 P. 222 RSTJ vol. 178 p. 299).

40
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

AMARAL JÚNIOR, Alberto do. Introdução ao direito internacional público.


São Paulo: Atlas, 2008.

CANÇADO, Trindade, Antônio Augusto. Princípios do direito internacional


contemporâneo – 2. ed. rev. atual. – Brasília: FUNAG, 2017.

CASELLA, Paulo Borba; Hildebrando Accioly e G. E. do Nascimento e Silva.


Manual de direito internacional público.— 20. ed. — São Paulo: Saraiva,
2012.

MAZZUOLI, Valerio de Oliveira. Curso de direito internacional público. 9. ed.


rev., atual. e ampl. -- São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2015.

PORTELA, Paulo Henrique Gonçalves. Direito Internacional Público e Privado.


9ª ed. Salvador: Juspodivm, 2017.

REZEK, Francisco. Direito internacional público – Curso Elementar. 17ª ed. São
Paulo: Saraiva, 2018.

SOARES, Guido Fernando Silva. Curso de direito internacional público. São


Paulo: Atlas, 2002.

41
CARREIRA JURÍDICA

Direito Internacional
Capítulo 5
SUMÁRIO
DIREITO INTERNACIONAL, Capítulo 5 .......................................................................................... 3

1. Nacionalidade e condição jurídica do estrangeiro............................................................. 3

1.1. Conceito e noções gerais da nacionalidade ..................................................................................... 3

1.2. Nacionalidade originária (ou primária)................................................................................................ 4

1.3. Nacionalidade adquirida (ou secundária): naturalização ............................................................. 6

1.4. Perda da nacionalidade.............................................................................................................................. 8

1.5. Conflitos de nacionalidade: polipatridia e apatridia...................................................................... 9

1.6. Estatuto da Igualdade entre brasileiros e portugueses ............................................................ 10

2. Condição jurídica do estrangeiro: a Lei de Migração ...................................................... 12

2.1. Noções gerais .............................................................................................................................................. 12

2.2. Admissão de entrada e permanência no território nacional: vistos .................................... 13

2.3. Saída do estrangeiro: deportação, expulsão e extradição ....................................................... 14

2.4. Asilo e refúgio ............................................................................................................................................. 17

QUADRO SINÓTICO ......................................................................................................................... 20

QUESTÕES COMENTADAS ............................................................................................................. 22

GABARITO .......................................................................................................................................... 31

LEGISLAÇÃO COMPILADA .............................................................................................................. 32

JURISPRUDÊNCIA ............................................................................................................................... 34

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ........................................................................................................ 37

2
DIREITO INTERNACIONAL

Capítulo 5

1. Nacionalidade e condição jurídica do estrangeiro

1.1. Conceito e noções gerais da nacionalidade


É de extrema importância traçar um debate sobre a nacionalidade, cujo vínculo jurídico-
político une o indivíduo ao Estado soberano, do qual decorrem direitos e obrigações
recíprocas. A nacionalidade consiste em um agrupamento de indivíduos unidos por laços mais
sociológicos que jurídicos.

A atribuição de uma nacionalidade às pessoas naturais leva ao princípio da atribuição


estatal da nacionalidade: cada Estado deve ter competência exclusiva para legislar sobre sua
nacionalidade e os interesses desses indivíduos, observados os princípios do Direito
Internacional.

A decisão acerca da concessão da nacionalidade pelo Estado é ato soberano, baseado


no princípio da efetividade, cabendo exclusivamente a cada Estado definir as normas que
decidirão sobre a atribuição da nacionalidade e acerca de sua obtenção pelos indivíduos.1 A
nacionalidade é importante também no sentido de formar o povo, que é um dos elementos
essenciais (elemento humano) na formação de um Estado soberano.

Apesar disso, o Direito Internacional limita a soberania estatal, fixando regras gerais de
nacionalidade, pautadas na proteção da dignidade humana e na estabilidade da sociedade
internacional.

1
Vide questão 6.
3
Ressalta-se que a nacionalidade é um direito humano consagrado na Declaração
Universal dos Direitos Humanos, e ninguém pode ser arbitrariamente privado de sua
nacionalidade (art. XV, § 1º e 2º).

Nacionalidade é diferente de naturalidade, que é o local físico onde se nasce, a cidade.

Nacionalidade é diferente também de cidadania, que consiste na possibilidade de exercer os


direitos políticos.

Por fim, nacionalidade também é diferente de nação; dentro de um só Estado, pode haver

várias nações diferentes, cujos membros possuam a mesma nacionalidade.

1.2. Nacionalidade originária (ou primária)


É aquela advinda do nascimento, tendo quase nenhuma relação com a vontade
humana. Existem dois critérios que ajudam a determinar a nacionalidade de um indivíduo,
podendo os Estados adotar um, ou outro ou ambos. Veremos a seguir:

a) Jus sanguinis (critério sangue): a nacionalidade do ascendente determina a


nacionalidade do descendente. É a nacionalidade que os pais tinham na época do
nascimento do filho, independente de ele ser adotado, ou de os pais mudarem de
nacionalidade depois ou do local onde nasça. É o critério mais antigo, sendo adotado
por Estados mais velhos, para vincular os filhos de imigrantes, que nascerem em outros
territórios, à sua nação.
b) Jus solis (critério solo): a nacionalidade é uma consequência do lugar do nascimento,
adquirindo a nacionalidade em função do Estado em cujo território nasce, independente
da nacionalidade de seus ascendentes. É adotado por Estados novos, para vincular os
filhos de imigrantes à sua nação.

4
c) Sistema misto: a nacionalidade é a junção do jus sanguinis com o jus soli, ou seja, há a
uma união das nacionalidades admitindo que o indivíduo tenha duas (polipátrida).
Alguns autores criticam o critério misto por defender que os dois são necessariamente
adotados, mas geralmente se escolhe os dois critérios para evitar choques de
nacionalidade (apátrida). Pode-se dizer que o Brasil adota esse critério.

No território brasileiro, em regra, é adotado o critério da nacionalidade decorrente do


nascimento em solo brasileiro, ou seja, o indivíduo que nasceu no Brasil possui a
nacionalidade brasileira. Porém, existem exceções, levando à aplicação do critério sanguíneo:
nos casos em que ambos os pais forem estrangeiros e um deles estiver a serviço oficial do seu
país de origem.

A disciplina está prevista no art. 12, I, da Constituição Federal, segundo o qual é


considerado brasileiro nato aquele:

a) Nascido na República Federativa do Brasil, ainda que de pais estrangeiros, desde que
estes não estejam a serviço de seu país (jus soli).2

“A serviço de seu país” significa que deve ser um serviço público e relativo ao Estado
estrangeiro, não precisando ser permanente no Brasil, mas deve ser a serviço do país de sua
nacionalidade, devendo ambos ser estrangeiros (mesmo que apenas um dos pais com o
cargo). EX: um casal italiano prestando serviços para a França -> o filho será brasileiro.

b) Nascido no estrangeiro, mas que seja filho de pai brasileiro ou de mãe brasileira, desde
que qualquer deles esteja a serviço da República Federativa do Brasil (jus sanguinis).

Quem deve estar a serviço do Brasil deve ser brasileiro para o filho também ser. Se o
estrangeiro estiver a serviço não será brasileiro nato o filho, independente que o pai seja nato
ou naturalizado.

c) Nascido no estrangeiro de pai brasileiro ou de mãe brasileira, desde que sejam


registrados em repartição brasileira competente ou venham a residir na República

2
Vide questão 8.
5
Federativa do Brasil e optem, em qualquer tempo, depois de atingida a maioridade,
pela nacionalidade brasileira (jus sanguinis).3

Somente a pessoa pode optar pela nacionalidade quando atingida a maioridade.

1.3. Nacionalidade adquirida (ou secundária): naturalização


É a adquirida após o nascimento, através do processo de naturalização, em decorrência
da vontade do ente soberano em conceder sua nacionalidade (ato discricionário) e da vontade
do indivíduo em adquiri-la. Os brasileiros naturalizados são os estrangeiros que pleitearam
obter a nacionalidade brasileira.4

Só será obtida a nacionalidade se preenchidos os requisitos e as exigências legais


estabelecidas pela nação. Como regra, a pessoa que preenche os requisitos necessários para
que se possa conceder a naturalização tem apenas expectativa de direito de adquiri-la,
dependendo da vontade do Estado em concedê-la.

Ressalta-se que o Brasil não adota o casamento como critério de atribuição de


nacionalidade adquirida. Porém, o cônjuge estrangeiro de brasileiro pode fazer uso de uma
facilitação no processo de naturalização, que será visto posteriormente. O Brasil também não
adota o critério do vínculo funcional com o Estado, adotado pelo Vaticano.

Ressalta-se também que a concessão de naturalização tem efeito ex nunc e será


fornecida por critérios de conveniência e oportunidade política, preenchidos os requisitos
legais. O Estado não está obrigado a fundamentar eventual recusa (ato de império,
discricionário, de soberania).

São efeitos da naturalização: transforma estrangeiro em natural, desvinculando esse ex-


estrangeiro ex nunc de sua nacionalidade anterior, mas não às obrigações de antes. A
natureza da naturalização é sempre constitutiva (sem efeitos coletivos ou ex tunc). Não existe
a possibilidade de o nacional renunciar a sua nacionalidade, pois é um direito personalíssimo
e indisponível.

3
Vide questões 1 e 4.
4
Vide questão 9.
6
A disciplina está prevista no art. 12, II, da Constituição Federal, segundo o qual é
considerado brasileiro naturalizado aquele:

a) Que, na forma da lei, adquira a nacionalidade brasileira, exigidas aos originários de


países de língua portuguesa apenas residência por um ano ininterrupto e idoneidade
moral.

Essa modalidade é conhecida como naturalização ordinária, sendo a forma mais


facilitada de aquisição da nacionalidade brasileira, disciplinada, atualmente, pela Lei de
Migração (Lei nº 13.445/2017). Para as pessoas originárias de países de língua portuguesa,
exige-se apenas residência por um ano ininterrupto e idoneidade moral.

A matéria também é regulada no art. 65 da Lei de Migração, que estabelece condições


para a concessão de naturalização ordinária:

I - ter capacidade civil, segundo a lei brasileira;

II - ter residência em território nacional, pelo prazo mínimo de 4 (quatro) anos;

III - comunicar-se em língua portuguesa, consideradas as condições do naturalizando; e

IV - não possuir condenação penal ou estiver reabilitado, nos termos da lei.

Segundo dispõe o art. 66 da Lei de Migração, “o prazo de residência fixado no inciso II


do caput do art. 65 será reduzido para, no mínimo, 1 (um) ano se o naturalizando preencher
quaisquer das seguintes condições: [...] II - ter filho brasileiro; III - ter cônjuge ou companheiro
brasileiro e não estar dele separado legalmente ou de fato no momento de concessão da
naturalização; [...] V - haver prestado ou poder prestar serviço relevante ao Brasil; ou VI -
recomendar-se por sua capacidade profissional, científica ou artística. Parágrafo único. O
preenchimento das condições previstas nos incisos V e VI do caput será avaliado na forma
disposta em regulamento”.

b) Estrangeiro de qualquer nacionalidade, residente na República Federativa do Brasil há


mais de quinze anos ininterruptos e sem condenação penal, desde que requeira a
nacionalidade brasileira.

Essa modalidade é conhecida como naturalização extraordinária.

7
Existem, porém, outras modalidades de naturalização especificadas na nova Lei de
Migração, que serão vistas a seguir:

c) Especial: nos exatos termos do art. 68 da Lei de Migração, é aquela concedida ao


estrangeiro que se encontre em uma das seguintes situações: a) seja cônjuge ou
companheiro, há mais de 5 (cinco) anos, de integrante do Serviço Exterior Brasileiro em
atividade ou de pessoa a serviço do Estado brasileiro no exterior; ou b) seja ou tenha
sido empregado em missão diplomática ou em repartição consular do Brasil por mais
de 10 (dez) anos ininterruptos.

Requisitos para a concessão de naturalização especial: possuir capacidade civil, segundo


a lei brasileira; comunicar-se em língua portuguesa, consideradas as condições do
naturalizando; e não possuir condenação penal ou estiver reabilitado, nos termos da lei.

d) Provisória: segundo o art. 70 da Lei de Migração – “[...] poderá ser concedida ao


migrante criança ou adolescente que tenha fixado residência em território nacional
antes de completar 10 (dez) anos de idade e deverá ser requerida por intermédio de
seu representante legal. Parágrafo único. A naturalização prevista no caput será
convertida em definitiva se o naturalizando expressamente assim o requerer no prazo
de 2 (dois) anos após atingir a maioridade”.

Assim, criança estrangeira adotada por brasileiros só será nacional por naturalização.

Cumpre, por fim, salientar que uma vez naturalizada brasileira, a pessoa possui todos os
deveres e direitos concedidos ao brasileiro nato, exceto o exercício de algumas funções
públicas, conforme previsão do art. 12, § 3º, da Constituição Federal: Presidente e Vice-
Presidente da República; Presidente da Câmara dos Deputados; Presidente do Senado Federal;
Ministro do Supremo Tribunal Federal; carreira diplomática; oficial das Forças Armadas;
Ministro de Estado da Defesa.

1.4. Perda da nacionalidade


A perda da nacionalidade pode atingir tanto o brasileiro nato quanto o naturalizado,
estando prevista no art. 12, § 4º, da Constituição Federal.

8
A hipótese de perda de nacionalidade de brasileiro nato decorre do fato do brasileiro
adquirir outra nacionalidade através de uma naturalização voluntária. No entanto, existem
duas exceções para o caso do brasileiro adquirir outra nacionalidade e permanecer com a
nacionalidade brasileira:

a) Reconhecimento de nacionalidade originária pela lei estrangeira (reconhecimento


também da polipatridia).
b) Imposição de naturalização, pela norma estrangeira, ao brasileiro que reside em estado
estrangeiro, como condição para permanecer no território ou para o exercício de
direitos civis.5

A hipótese de perda de nacionalidade do brasileiro naturalizado decorre do


cancelamento da naturalização, por sentença judicial, em virtude de atividade nociva ao
interesse nacional. Podem ser consideradas atividades nocivas ao interesse nacional: subversão
por meios violentos, atentar contra as instituições democráticas, deslealdade ao Brasil e
pressuposto criminal.

A perda de nacionalidade decorre de Decreto do Presidente da República, ou por


delegação, do Ministro da Justiça, sendo ato meramente declaratório, tendo efeito apenas de
dar publicidade ao fato.

O indivíduo que teve sua naturalização cancelada não poderá reaver seu status de
nacional brasileiro, a não ser que haja a revogação ou o cancelamento da perda da
nacionalidade através de ação rescisória. Já aquele que perdeu a nacionalidade brasileira por
naturalização voluntária poderá reavê-la através de Decreto do Presidente, se domiciliar no
Brasil, na forma do art. 36 da Lei nº 818/1949. A reaquisição terá a mesma natureza de uma
naturalização ordinária.

1.5. Conflitos de nacionalidade: polipatridia e apatridia


Em decorrência da soberania estatal em definir os critérios de concessão de
nacionalidade, podem existir casos de conflitos de nacionalidade: um positivo (polipátrida) e
um negativo (apátrida).

5
Vide questão 5.
9
a) Polipatridia: o indivíduo tem duas ou mais nacionalidades, sendo decorrência da
coincidência de critérios de atribuição de nacionalidades diferentes para a mesma
pessoa (por exemplo, a combinação do critério jus solis em um país e o jus sanguini em
outro).

A Convenção de Haia Concernente a Certas Questões Relativas aos Conflitos de Leis


sobre a Nacionalidade (1930) determina que um Estado não pode exercer a sua proteção
diplomática em proveito de seu nacional contra outro Estado de que o mesmo também
seja nacional.

b) Apatridia: o indivíduo não possui nenhuma nacionalidade, em decorrência da não


incidência de nenhum critério de atribuição de nacionalidade sobre uma pessoa.
Esse caso é intolerável pelo art. XV da Declaração Universal dos Direitos Humanos
(1948), pois a nacionalidade é um direito humano. Ademais, o apátrida tem direito a
mesma proteção devida a qualquer ser humano.

1.6. Estatuto da Igualdade entre brasileiros e portugueses


O Estatuto da Igualdade Brasil-Portugal foi decorrência da assinatura da Convenção
sobre Igualdade de Direitos e Deveres entre Brasileiros e Portugueses, do ano de 1971,
vigorando até 2001, quando foi substituída pelo Tratado de Amizade, Cooperação e Consulta
entre os dois países, promulgado pelo Decreto nº 3.927/2001. O Estatuto da Igualdade é
regulamentado dentre os artigos 12 a 22 desse Decreto.

O objetivo principal do Estatuto é, tendo em vista as afinidades históricas e culturais


entre os dois países, possibilitar que um brasileiro em Portugal ou um português no Brasil
possam exercer direitos relacionados à qualidade de cidadão: os estrangeiros gozarão dos
mesmos direitos e se submeterão aos mesmos deveres dos nacionais desses Estados, de
acordo com as normas fixadas no Estatuto. No entanto, esses benefícios não implicarão na
perda das respectivas nacionalidades.

Ressalta-se que os benefícios estabelecidos no Estatuto só são obtidos mediante


requerimento dos portugueses ou brasileiros civilmente capazes, com residência habitual no
outro país, após decisão do Ministério competente (da Justiça no Brasil, da Administração

10
Interna em Portugal), devendo a aquisição (e também a perda) do benefício ser comunicada
ao país de origem.

No âmbito da Constituição Federal, o art. 12, § 1º, estabelece que aos portugueses
com residência permanente no País, se houver reciprocidade em favor de brasileiros, serão
atribuídos os direitos inerentes ao brasileiro, salvo os casos previstos nesta Constituição. Para
essas hipóteses, o Estatuto não é aplicado.

11
2. Condição jurídica do estrangeiro: a Lei de Migração

2.1. Noções gerais


Importante destacar que a Lei nº 6.815/80, também denominada Estatuto do
Estrangeiro (regulamentadora dos institutos da admissão e entrada do estrangeiro em
território nacional, além das questões referentes a visto e sua respectiva transformação,
deportação, expulsão, extradição, dentre outros) foi integralmente revogada pela Lei da
Migração (Lei nº 13.445/2017).

O estatuto do estrangeiro considerava o estrangeiro como uma ameaça, seguindo a


filosofia protecionista. Agora, o Brasil está em um contexto atual de globalização, procurando
atrair os estrangeiros, e não dificultar sua vinda, por isso, reforça a proteção constitucional a
eles, como sujeitos de direitos.

No atual ordenamento jurídico constitucional brasileiro, a regra geral é que os


estrangeiros têm os mesmos direitos e deveres básicos dos brasileiros, pois “todos são iguais
perante a lei”, conforme previsão do art. 5º, caput, da Constituição Federal. A Constituição
também prevê direitos específicos para estrangeiros, no art. 5º, incisos XXXI e LII.

Existem, porém, direitos que só se aplicam aos nacionais (sejam natos ou naturalizados),
como os direitos políticos (art. 14, § 2º, da Constituição Federal), além de outras previsões
constitucionais.

A Lei de Migração fixa alguns conceitos, logo no seu art. 1º, § 1º, que são:

 Imigrante: animus de ficar no país de forma temporária ou definitiva, sendo nacional


de outro país ou apátrida.
 Emigrante: brasileiro que se estabelece de forma temporária ou definitiva no
exterior.
 Residente fronteiriço: pessoa nacional ou apátrida residente de município
fronteiriço.

12
 Visitante: pessoa nacional de outro país ou apátrida no país para estadia de curta
duração, sem pretensão de se estabelecer temporária ou definitivamente no Brasil.
 Apátrida: pessoa que não é nacional para nenhum Estado (estatuto dos apátridas)
ou assim reconhecida pelo Estado brasileiro.

Já o art. 3º fixa um rol de princípios e diretrizes da política migratória brasileira, dos


quais se pode destacar: universalidade, indivisibilidade e interdependência dos direitos
humanos, repúdio a discriminações, igualdade de tratamento e oportunidade, cooperação
internacional, proteção do brasileiro no exterior e repúdio a práticas de expulsão ou de
deportação coletivas.

Percebe-se que, apesar do direito de ir e vir, os Estados exercem certo controle com
relação à entrada e permanência de estrangeiros em seus territórios, com fulcro no interesse
estatal (ato discricionário). Assim, dentre as condições jurídicas do estrangeiro, veremos:
deportação, expulsão, extradição (saída involuntária), vistos, asilo e refúgio.

2.2. Admissão de entrada e permanência no território nacional: vistos


O visto é documento concedido por embaixadas, consulados-gerais, consulados, vice-
consulados e, quando habilitados pelo órgão competente do Poder Executivo, por escritórios
comerciais e de representação do Brasil no exterior, tratando-se de documento que confere a
seu titular expectativa de ingresso em território nacional, observando as disposições contidas
no art. 6º e seguintes da Lei nº 13.445/2017, bem como no respectivo regulamento.

Os tipos de vistos estão previstos no art. 12 da Lei de Migração, conforme segue:

a) Visto de visita: estada de curta duração, sem estabelecer residência, para turismo,
negócios, trânsito, atividades artísticas ou desportivas etc. É vedado ao estrangeiro com
esse visto exercer atividade remunerada no Brasil.
b) Visto temporário: imigrante no Brasil para estabelecer residência por tempo
determinado, como nos casos de pesquisa, ensino ou extensão acadêmica, tratamento
de saúde, acolhida humanitária, férias, atividade religiosa, serviço voluntário etc.
c) Vistos diplomáticos e oficiais: concedidos a autoridades e funcionários estrangeiros
que viajem ao Brasil em missão oficial de caráter transitório ou permanente,

13
representando Estado ou organismo internacional. Poderão ser transformados em
autorização de residência.
d) Visto de cortesia: o particular que o tenha só poderá exercer atividade remunerada
para o titular de visto diplomático ou oficial (de cortesia ao qual esteja vinculado).

Regra geral, excluídas as hipóteses legais de proibição de visto, o Ministério das


Relações Exteriores tem discricionariedade para conceder vistos. Ter visto é uma expectativa
de direito; ou seja, o país pode recusá-la.

Não há limite de tempo para ser migrante, desde que o visto seja renovado. Após certo

lapso temporal, pode-se requerer a nacionalidade, variando o tempo para cada país.

2.3. Saída do estrangeiro: deportação, expulsão e extradição


 Deportação

É o ato pelo qual o Estado retira compulsoriamente de seu território um estrangeiro


que entrou ou permanece irregularmente, configurando uma situação de irregularidade. A
deportação é oriunda de irregularidade migratória em território nacional, seja na entrada do
estrangeiro no território brasileiro (EX: escondido no navio), seja em sua estadia no Brasil (EX:
esgotou-se o prazo de permanência e o estrangeiro continua no país). Está prevista do art. 50
ao art. 53 da Lei de Migração.

O deportado só poderá reingressar no território nacional se ressarcir o Tesouro


Nacional, com correção monetária, das despesas com a sua deportação e efetuar, se for o
caso, o pagamento da multa devida à época, também corrigida.

A deportação sempre pressupõe irregularidade, seja na entrada ou na estadia, mas não


pressupõe crime. Decorre de procedimento administrativo a retirada compulsória de pessoa

14
que se encontra em situação irregular. A Defensoria Pública da União prestará assistência ao
deportado, porém a ausência de manifestação da Defensoria não impedirá a deportação, nos
casos em que ela foi notificada.

É precedida de notificação pessoal ao indivíduo com as irregularidades verificadas e


prazo para regularização não inferior a 60 dias (pode ser prorrogado por mais 60 dias e
também pode ser reduzido se o indivíduo praticar ato contrário à constituição), antes de ser
deportado. Isso não impedirá a livre circulação em território nacional, mas deve informar seu
domicilio e suas atividades. Vencido o prazo sem regularização da situação ocorrerá a
deportação. Se o indivíduo sair voluntariamente, ocorrerá o cumprimento da notificação.

 Expulsão

Outra medida administrativa de retirada compulsória de estrangeiro do território


nacional é a expulsão, que é conjugada com o impedimento de reingresso por prazo
determinado, sendo a sua causa a condenação com sentença transitada em julgado relativa à
prática de: crime de genocídio, crime contra a humanidade, crime de guerra ou crime de
agressão, nos termos do Estatuto de Roma do Tribunal Penal Internacional (Decreto nº
4.388/2002), ou crime comum doloso passível de pena privativa de liberdade, consideradas a
gravidade e as possibilidades de ressocialização em território nacional. Esta modalidade está
prevista do art. 54 ao art. 60 da Lei de Migração.

Na forma da referida Lei, caberá à autoridade competente resolver sobre a expulsão, a


duração do impedimento de reingresso e a suspensão ou a revogação dos efeitos da
expulsão. Ademais, o prazo de vigência da medida de impedimento vinculada aos efeitos da
expulsão será proporcional ao prazo total da pena aplicada, mas nunca será superior ao dobro
de seu tempo.

O Poder Judiciário pode avaliar se a expulsão ocorreu conforme a lei, mas não pode
analisar sua conveniência e oportunidade, que configura controle de mérito, sendo
competência privativa do Poder Executivo, bem como um ato discricionário.

Assim, a expulsão é a medida administrativa de retirada compulsória de migrante ou


visitante do território nacional, conjugada com o impedimento de reingresso por prazo

15
determinado, haja vista a pressuposição de que houve crime cometido pelo estrangeiro,
mesmo que sua situação como estrangeiro seja de legalidade no país.

 Extradição

A extradição decorre da entrega, por um Estado a outro, a pedido desse, do indivíduo


que deve cumprir pena ou responder a processo penal em seu território. Em regra, o
fundamento jurídico de todo pedido de extradição é um tratado entre os dois Estados; na
falta desse, poderá ser atendido mediante reciprocidade. Esta modalidade está prevista do art.
81 ao art. 99 da Lei de Migração.

Segundo entendimento do STF, o indivíduo que, extraditado, foge do país a que foi
entregue e retorna ao Brasil, deverá ser preso e entregue novamente, após emissão de ordem
judicial nesse sentido (não é necessário novo processo de extradição, bastando nova decisão
determinando a prisão e viabilizando a entrega). “Em caso de reingresso de extraditando
foragido, não é necessária nova decisão jurisdicional acerca da entrega, basta a emissão de
ordem judicial” (STF Ext 1225/DF, Info 885).

A extradição pressupõe a cooperação entre Estados, podendo ser ativa (solicitar a


extradição) ou passiva (concedê-la). Consiste em ato de império do Estado negar pedido de
extradição; porém, há defensores da teoria que, se o Brasil tiver algum tratado de cooperação,
será obrigado a extraditar para aquele país.

Ademais, importante ressaltar que, de acordo com o art. 96 da Lei de Migração, o país
que solicita a extradição deve se comprometer com o Brasil a não realizar um rol de atos
atentatórios aos direitos humanos contra o indivíduo, bem como respeitar o devido processo
legal e o estado de direito, sob pena de a extradição não ser efetivada. Ou seja, tanto a
extradição quanto a expulsão e a deportação não ocorrerão se poderá vir a colocar em risco a
vida ou a integridade da pessoa.

O processo da extradição funciona, resumidamente, da seguinte maneira:

Pedido estrangeiro  STF (analisa os requisitos de admissibilidade, podendo autorizar


ou não a extradição)  se permitir  encaminhamento ao Poder Executivo, que decidirá pela
extradição ou não (constitui ato de império).

16
Ademais, ressalta-se que, segundo o art. 5º, LI, da Constituição Federal, nenhum
brasileiro será extraditado, salvo o naturalizado, em caso de crime comum, praticado antes da
naturalização, ou de comprovado envolvimento em tráfico ilícito de entorpecentes e drogas
afins, na forma da lei.6

É relevante fazer algumas importantes observações.

A deportação e a expulsão serão feitas para o país de nacionalidade ou de procedência


do migrante, ou para outro que o aceite. O chefe da unidade da Policia Federal poderá
representar perante o Juízo Federal.

É proibida a repatriação, a deportação e a expulsão coletivas (não individualizadas).

Deportação e expulsão são atos de vontade do país, enquanto extradição configura um


pedido de país estrangeiro.

De acordo com as Súmulas nº 1 e nº 421, do STF, ter filho brasileiro ou ser casado
com brasileiro impede a expulsão, mas não impede a extradição.

Para que seja possível a expulsão de estrangeiro refugiado, antes, ele deve perder a

condição de refugiado.

2.4. Asilo e refúgio


Nos casos em que o direito à vida e à integridade de uma pessoa estão sendo
ameaçados, em decorrência de questões políticas, religiosas, ideológicas, conflitos armados,
dentre outras hipóteses, é prerrogativa desse indivíduo solicitar a proteção de outro Estado.

6
Vide questões 2, 3 e 10.
17
Esse direito é inclusive garantido no art. XIV da Declaração Universal dos Direitos Humanos.
Para isso, o Direito Internacional conta com dois instrumentos: o asilo e o refúgio

O asilo é a proteção dada por um Estado a uma pessoa que tenha sua vida, liberdade
ou dignidade ameaçadas por autoridades estatais; independe a pessoa ser nacional desse
Estado ou não. Como essa perseguição geralmente tem viés político, também pode ser
denominado de “asilo político”. Seu objeto é justamente a perseguição além da adequada em
um estado democrático de direito, então, o asilo não pode se basear em crimes comuns.

O asilo tem previsão no art. 27 ao art. 29 da Lei de Migração, onde há a previsão de


que a concessão do asilo é ato discricionário do Estado, não existindo um direito ao asilo
(somente o direito a solicitá-lo). Sua concessão também é tida como um dos princípios das
relações internacionais do Brasil, no art. 4º, X, da Constituição Federal.

Não obstante, não será concedido asilo se o indivíduo tiver cometido crime de
genocídio, crime contra a humanidade, crime de guerra ou crime de agressão, nos termos do
Estatuto de Roma do Tribunal Penal Internacional (Decreto nº 4.388/2002).

Existem dois tipos de asilo: o territorial e o diplomático. No asilo territorial, o indivíduo


é acolhido no território de um Estado, implicando em sua permanência nesse Estado. Já o
asilo diplomático pressupõe um estado de urgência, consistindo na acolhido da pessoa em
missões diplomáticas, embarcações ou aeronaves oficiais e acampamentos militares, sendo
uma etapa anterior ao asilo definitivo (territorial). O asilo diplomático só é reconhecido nos
países latino-americanos, não pode ser concedido em consulados e também não assegura a
eventual concessão do asilo territorial, que ocorre através de salvo-conduto para sair do local
onde esteja abrigado.7

Por sua vez, o refúgio, apesar de ser um instituto muito parecido com o do asilo,
possui certas peculiaridades que permitem que a doutrina os distinga. Os mecanismos para a
implementação do Estatuto dos Refugiados de 1951 e para o processo de refúgio estão
previstos na Lei nº 9474/1997.

7
Vide questão 7.
18
Enquanto a concessão de asilo é ato discricionário, a concessão de refúgio será
obrigatória para o Estado para atender as exigências definidas em eventuais tratados. A
concessão do refúgio pode se fundamentar em perseguições por motivo de raça, religião,
grupo social e penúria (asilo é só política). Para o refúgio, não importa se o ato que levou à
perseguição tem natureza política ou comum (no asilo, importa).

O controle da aplicação das normas sobre refúgio está disciplinado em órgãos


internacionais, como o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados – ACNUR (o
que não existe para o asilo). Ademais, o refúgio é um instrumento de caráter universal e
apolítico, sendo mais aplicado nos casos em que a necessidade de proteção atinge um
número maior de pessoas, pois a perseguição possui um aspecto mais generalizado (quando
comparado com os casos de asilo).

19
QUADRO SINÓTICO

NACIONALIDADE BRASILEIRA
BRASILEIROS NATOS BRASILEIROS NATURALIZADOS
Nascidos no Brasil, mesmo que de pais Naturalização ordinária: aos originários de
estrangeiros, se estes não estiverem a serviço países de língua portuguesa se exige
de seu país (critério solo) residência por um ano ininterrupto e
idoneidade moral
Nascidos no exterior de pai OU mãe Naturalização extraordinária: para estrangeiro
brasileira, estando qualquer deles a serviço de qualquer nacionalidade, residente no Brasil
do Brasil (critério sangue) há mais de 15 anos ininterruptos e sem
condenação penal
Nascidos no estrangeiro de pai OU mãe Hipóteses de naturalização previstas na Lei de
brasileira, se registrados em repartição Migração: especial e provisória
brasileira competente ou vir a residir no
Brasil e optem, na maioridade, pela
nacionalidade brasileira (critério sangue)

20
DEPORTAÇÃO EXPULSÃO EXTRADIÇÃO
Retirada compulsória de Retirada compulsória de Retirada de estrangeiro para
estrangeiro irregular estrangeiro que cometeu um outro Estado, onde tenha
crime cometido um crime
Ato discricionário, de ofício, Ato discricionário, de ofício, Ato que depende de pedido
não praticado contra nacionais não aplicado contra nacionais de Estado estrangeiro, não
(vedação ao banimento) cabível contra brasileiro nato

Retirada do estrangeiro para Retirada do estrangeiro para para


Possibilidade de extraditar
qualquer Estado, sendo qualquer Estado, sendo brasileiro naturalizado nos
permitido o retorno com proibido o retorno, salvo em casos de crime comum
a situação regularizada caso de revogação do decreto anterior à naturalização ou
de tráfico ilícito de
entorpecentes

ASILO REFÚGIO
Concessão: ato discricionário e soberano Concessão: dever do Estado no caso de
(sem regulação por tratados) tratado ou promessa de reciprocidade
Fundamento: perseguições de caráter Fundamento: perseguições de caráter político,
político racial, religioso, social, sexual etc.

Os motivos da perseguição importam Os motivos da perseguição não importam


Perseguição mais individualizada Perseguição mais generalizada

21
QUESTÕES COMENTADAS

Questão 1

Banca: FGV - Órgão: OAB - 2016

Carlos, brasileiro naturalizado, tendo renunciado à sua anterior nacionalidade, casou-se com
Tatiana, de nacionalidade alemã. Em razão do trabalho na iniciativa privada, Carlos foi
transferido para o Chile, indo residir lá com sua mulher. Em 15/07/2011, em território chileno,
nasceu a primeira filha do casal, Cláudia, que foi registrada na Repartição Consular do Brasil.

A teor das regras contidas na Constituição Brasileira de 1988, assinale qual a situação de
Cláudia quanto à sua nacionalidade.

A) Cláudia não pode ser considerada brasileira nata, em virtude de a nacionalidade brasileira
de seu pai ter sido adquirida de modo derivado e pelo fato de sua mãe ser estrangeira.

B) Cláudia é brasileira nata, pelo simples fato de o seu pai, brasileiro, ter se mudado por
motivo de trabalho.

C) Cláudia somente será brasileira nata se vier a residir no Brasil e fizer a opção pela
nacionalidade brasileira após atingir a maioridade.

D) Cláudia é brasileira nata, não constituindo óbice o fato de o seu pai ser brasileiro
naturalizado e sua mãe, estrangeira.

Comentário:

A alternativa A está incorreta, pois caso um dos pais seja brasileiro (nato ou
naturalizado), o seu descendente poderá ser brasileiro nato. A alternativa B está incorreta, pois

22
seu pai foi transferido por empresa privada, ou seja, ele não está a serviço da República
Federativa do Brasil. A alternativa C está incorreta, pois esses requisitos não são necessários;
ela já pode ser considerada brasileira nata. A alternativa D está correta, pois, neste caso, não
há óbice.

Questão 2

Banca: FGV - Órgão: OAB - 2018 - Exame de Ordem Unificado – XXV

Jean Oliver, nascido em Paris, na França, naturalizou-se brasileiro no ano de 2003. Entretanto,
no ano de 2016, foi condenado, na França, por comprovado envolvimento com tráfico ilícito
de drogas (cocaína), no território francês, entre os anos de 2010 e 2014. Antes da condenação,
em 2015, Jean passou a residir no Brasil. A França, com quem o Brasil possui tratado de
extradição, requer a imediata extradição de Jean, a fim de que cumpra, naquele país, a pena
de oito anos à qual foi condenado. Apreensivo, Jean procura um advogado e o questiona
acerca da possibilidade de o Brasil extraditá-lo. O advogado, então, responde que, segundo o
sistema jurídico-constitucional brasileiro, a extradição:

A) não é possível, já que, a Constituição Federal, por não fazer distinção entre o brasileiro nato
e o brasileiro naturalizado, não pode autorizar tal procedimento.

B) não é possível, pois o Brasil não extradita seus cidadãos nacionais naturalizados, por crime
comum praticado após a oficialização do processo de naturalização.

C) é possível, pois a Constituição Federal prevê a possibilidade de extradição em caso de


comprovado envolvimento com tráfico ilícito de drogas, ainda que praticado após a
naturalização.

D) é possível, pois a Constituição Federal autoriza que o Brasil extradite qualquer brasileiro
quando comprovado o seu envolvimento na prática de crime hediondo em outro país.

Comentário:

23
A alternativa A está incorreta, pois, em relação à extradição, a Constituição Federal confere
tratamento distinto a brasileiros natos e naturalizados, de modo que os primeiros não serão
extraditados, enquanto os últimos podem ser extraditados nas hipóteses previstas no seu art.
5º, inciso LI. A alternativa B está incorreta, pois, em se tratando de crime comum, a
Constituição Federal autoriza a extradição de brasileiros naturalizados apenas se o crime
houver sido praticado ANTES da naturalização. A alternativa C está correta, estando essa
hipótese prevista no art. 5º, LI, da Constituição Federal, sendo aplicável aos brasileiros
naturalizados. A alternativa D está incorreta, pois não se admite a extradição de brasileiro
nato, em qualquer hipótese.

Questão 3

TRF 4ª Região – Juiz – 2008 (adaptada)


A extradição do brasileiro nato só é possível nos casos de crimes de tráfico internacional de
entorpecentes e de terrorismo, em razão dos respectivos tratados de repressão a que aderiu a
República Federativa do Brasil.

Comentário:

A assertiva está incorreta, pois, na forma do art. 5º, inciso LI, da Constituição Federal,
brasileiros natos não podem ser extraditados em nenhuma hipótese.

Questão 4

OAB São Paulo – Exame 135 – 2008


São brasileiros natos:
A) os nascidos na República Federativa do Brasil, ainda que de pais estrangeiros que estejam a
serviço de seu país.
B) os nascidos, no estrangeiro, de pai brasileiro ou de mãe brasileira, desde que sejam
registrados em repartição brasileira competente.

24
C) os nascidos, no estrangeiro, de pai e mãe brasileiros, desde que ambos estejam a serviço
da República Federativa do Brasil.
D) os nascidos, no estrangeiro, de pai brasileiro ou de mãe brasileira, desde que venham a
residir na República Federativa do Brasil e optem, em qualquer tempo, antes de atingida a
maioridade, pela nacionalidade brasileira.

Comentário:

A alternativa A está incorreta, pois, de acordo com o art. 12, I, “a”, da Constituição
Federal, eles não serão brasileiros. A alternativa B está correta, pois de acordo com o preceito
do art. 12, I, “c”, da Constituição Federal. A alternativa C está incorreta, pois, de acordo com o
art. 12, I, “b”, da Constituição Federal, basta que um dos pais esteja a serviço do Brasil. A
alternativa D está incorreta, pois, de acordo com o art. 12, I, “c”, da Constituição Federal, a
opção só pode ser feita após atingida a maioridade, não antes.

Questão 5

OAB São Paulo – Exame 134 – 2008


O brasileiro que adquirir outra nacionalidade:
A) passará a ter dupla nacionalidade, pois a Constituição Federal não prevê hipóteses de perda
de nacionalidade.
B) perderá a nacionalidade brasileira, exceto se for brasileiro nato.
C) perderá a nacionalidade brasileira, exceto se permanecer residindo em território brasileiro.
D) perderá a nacionalidade brasileira, exceto se a lei estrangeira impuser a naturalização ao
brasileiro residente no território do respectivo estado estrangeiro como condição para sua
permanência.

Comentário:

Toda a fundamentação das alternativas dessa questão será feita de acordo com o art.
12, § 4º, da Constituição Federal. A alternativa A está incorreta, pois há previsão da perda da

25
nacionalidade. A alternativa B está incorreta, pois tanto o nato quanto o naturalizado podem
perder a nacionalidade brasileira. A alternativa C está incorreta, pois a residência não influi na
perda da nacionalidade. A alternativa D está correta, por expressa previsão legal no art. 12, §
4º, II, “b”, da Constituição Federal.

Questão 6

Ano: 2009 Banca: CESPE Órgão: BACEN Prova: CESPE - 2009 - BACEN - Procurador
Com relação aos princípios gerais da nacionalidade no direito internacional, assinale a opção
correta:
A) É discricionário dos Estados privar alguém de sua nacionalidade.
B) A nacionalidade rege-se pelo princípio da efetividade.
C) A nacionalidade dá-se apenas pelo jus soli.
D) É permitido aplicar o banimento a indivíduo com comprovado envolvimento no tráfico de
drogas ilícitas.
E) Nacionalidade originária é aquela que se adquire por naturalização.

Comentário:

A alternativa A está incorreta, pois a nacionalidade é um direito humano, conforme


previsão da Declaração Universal dos Direitos Humanos; sua perda está condicionada ao
previsto em lei, não sendo um ato discricionário. A alternativa B está correta, de acordo com o
art. 5º da Convenção de Haia de 1930 sobre nacionalidade. A alternativa C está incorreta, pois
há também o jus sanguinis e o critério misto para a nacionalidade originária. A alternativa D
está incorreta, pois o banimento (expulsão de nacional) não é permitido em nenhuma
hipótese. A alternativa E está incorreta, pois a nacionalidade secundária é adquirida por
naturalização, enquanto a originária se adquire por nascimento.

Questão 7

26
Ano: 2018 Banca: FGV Órgão: OAB Prova: FGV - 2018 - OAB - Exame de Ordem Unificado
- XXVI - Primeira Fase
Um ex-funcionário de uma agência de inteligência israelense está de passagem pelo Brasil e
toma conhecimento de que chegou ao Supremo Tribunal Federal um pedido de extradição
solicitado pelo governo de Israel, país com o qual o Brasil não possui tratado de extradição.
Receoso de ser preso, por estar respondendo em Israel por crime de extorsão, ele pula o
muro do consulado da Venezuela no Rio de Janeiro e solicita proteção diplomática a esse
país. Nesse caso,
A) pode pedir asilo diplomático e terá direito a salvo-conduto para o país que o acolheu.
B) é cabível o asilo territorial, porque o consulado é território do Estado estrangeiro.
C) não se pode pedir asilo, e o STF não autorizará a extradição, por ausência de tratado.
D) o asilo diplomático não pode ser concedido, pois não é cabível em consulado.

Comentário:

A assertiva A está incorreta; primeiro porque o asilo diplomático não pode ser
concedido, segundo porque não há direito ao salvo-conduto: o asilo diplomático não
pressupõe que o indivíduo receberá o territorial. A assertiva B está incorreta, pois não é
cabível o asilo territorial (ele não está na Venezuela). A assertiva C está incorreta, pois o STF
pode autorizar a extradição, independente da ausência de tratado, havendo apenas “promessa
de reciprocidade”. A assertiva D está correta, pois o asilo diplomático só é cabível em missões
diplomáticas, embarcações ou aeronaves oficiais e acampamentos militares.

Questão 8

Ano: 2007 Banca: CESPE Órgão: OAB Prova: CESPE - 2007 - OAB - Exame de Ordem - 2 -
Primeira Fase
Acerca do direito internacional atinente a nacionalidade e a extradição, assinale a opção
correta.
A) Nacionalidade é o vínculo entre o indivíduo e a nação.

27
B) Considere que, durante uma viagem de navio, um casal de argentinos, que deixara seu país
rumo a um passeio pelo Caribe, tenha uma criança no momento em que o navio transite no
mar territorial brasileiro. Nessa situação, a criança terá nacionalidade brasileira.
C) A perda da nacionalidade brasileira somente poderá ocorrer caso haja aquisição de outra
nacionalidade por naturalização voluntária.
D) A extradição é um ato estatal que obriga o estrangeiro a sair do território nacional, ao qual
não poderá mais retornar.

Comentário:

A assertiva A está incorreta, pois a nacionalidade é o vínculo entre o indivíduo e o


Estado. A assertiva B está correta, sendo o caso previsto no art. 12, I, “a”, da Constituição
Federal. A assertiva C está incorreta, pois, segundo o art. 12, § 4º, da Constituição Federal,
também há a possibilidade de perda da naturalização, por sentença judicial, em virtude de
atividade nociva ao interesse nacional. A alternativa D está incorreta, pois não há previsão de
que o extraditado não poderá retornar ao Estado em que estava.

Questão 9

Ano: 2010 Banca: CESPE Órgão: OAB Prova: CESPE - 2010 - OAB - Exame de Ordem
Unificado - I - Primeira Fase
Acerca da condição jurídica dos estrangeiros e dos nacionais no direito brasileiro, assinale a
opção correta.
A) A CF dispõe expressamente sobre a possibilidade de expulsão do estrangeiro que praticar
atividade nociva à ordem pública e ao interesse nacional, salvo se estiverem presentes,
simultaneamente, os seguintes requisitos: cônjuge brasileiro e filho brasileiro dependente da
economia paterna.
B) O Brasil, por ter ratificado integralmente o Estatuto de Roma, que criou o Tribunal Penal
Internacional, tem o compromisso de entregar ao tribunal os indivíduos contra os quais
tenham sido expedidos pedidos de detenção e entrega, mesmo que eles possuam,
originariamente, nacionalidade brasileira.

28
C) Os estrangeiros de qualquer nacionalidade residentes na República Federativa do Brasil há
mais de quinze anos ininterruptos são automaticamente considerados brasileiros naturalizados,
independentemente de qualquer outra condição ou exigência.
D) É vedada a extradição de nacionais, salvo em caso de comprovado envolvimento em tráfico
ilícito de entorpecentes, em terrorismo ou em crimes definidos, em lei, como hediondos.

Comentário:

A assertiva A está incorreta, pois não são requisitos simultâneos: basta um ou outro
para ser proibida a expulsão. A alternativa B está correta por exclusão, mas se destaca que é
uma polêmica doutrinária: apesar de ter ratificado o Estatuto, e de que entrega é diferente de
extradição, há previsão constitucional de que o brasileiro nato não seria extraditado em
nenhuma hipótese. A assertiva C está incorreta, pois a naturalização não é automática,
devendo ser requerida. A assertiva D está incorreta, pois o art. 5º, LI, da Constituição Federal
só fala em tráfico de entorpecentes; os demais crimes só poderiam ser objeto de extradição se
fossem cometidos antes da naturalização.

Questão 10

Ano: 2011 Banca: FGV Órgão: OAB Prova: FGV - 2011 - OAB - Exame de Ordem Unificado
- III - Primeira Fase
Pierre de Oliveira nasceu na França, filho de pai brasileiro (que à época se encontrava em
viagem privada de estudos) e mãe francesa. Viveu até os 25 anos em Paris, onde se formou
em análise de sistemas e se pós-graduou em segurança de rede. Em 2007, Pierre foi
convidado por uma universidade brasileira para fazer parte de um projeto de pesquisa
destinado a desenvolver um sistema de segurança para uso de instituições financeiras. Embora
viajasse com frequência para a França, Pierre passou a residir no Brasil, optando, em 2008,
pela nacionalidade brasileira. No início de 2010, uma investigação conjunta entre as polícias
brasileira e francesa descobriu que Pierre fez parte, no passado, de uma quadrilha
internacional de hackers. Detido em São Paulo, ele confessou que, entre 2004 e 2005, quando

29
ainda vivia em Paris, invadiu mais de uma vez a rede de um grande banco francês, desviando
recursos para contas localizadas em paraísos fiscais.
Com relação ao caso hipotético acima, é correto afirmar que
A) se a França assim requerer, Pierre poderá ser extraditado, pois cometeu crime comum
sujeito à jurisdição francesa antes de optar pela nacionalidade brasileira.
B) a critério do Ministério da Justiça, Pierre poderá ser expulso do território nacional pelo
crime cometido no exterior antes do processo de aquisição da nacionalidade, a menos que
tenha filho brasileiro que, comprovadamente, esteja sob sua guarda e dele dependa
economicamente.
C) Pierre poderá ser deportado para a França, a menos que peça asilo político.
D) Pierre não poderá ser extraditado, expulso ou deportado em qualquer hipótese.

Comentário:

A alternativa correta é a letra D. Pierre tinha nacionalidade francesa, pois nasceu na França e
nenhum de seus pais estava a serviço do Brasil (art. 12, I, "b", da Constituição Federal), mas
optou pela nacionalidade originária brasileira, quando atingida a maioridade (art. 12, I, "b", da
Constituição Federal). Portanto, sendo brasileiro originário, não poderá ser extraditado, expulso
ou deportado em qualquer hipótese (art. 5º, LI, da Constituição Federal). As demais
alternativas estão incorretas, por exclusão.

30
GABARITO

Questão 1 - D

Questão 2 - C

Questão 3 - Errada

Questão 4 - B

Questão 5 - D

Questão 6 - B

Questão 7 - D

Questão 8 - B

Questão 9 - B

Questão 10 - D

31
LEGISLAÇÃO COMPILADA

Nesta matéria, faz-se de extrema importância a leitura de:

Constituição Federal

 Art. 4º, X
 Art. 5º, caput, XXXI, LI, LII
 Art. 12

Lei de Migração (Lei nº 13.445/2017)

 Art. 1º, § 1º
 Art. 3º
 Art. 6º
 Art. 12
 Art. 27 a 29
 Art. 50 a 53
 Art. 54 a 60
 Art. 65 a 70
 Art. 81 a 99

Estatuto da Igualdade (Decreto nº 3.927/2001)

 Art. 12 a 22

Lei nº 818/1949

 Art. 36

32
Súmulas do Supremo Tribunal Federal

 Nº 1: é vedada a expulsão de estrangeiro casado com brasileira, ou que tenha filho


brasileiro, dependente da economia paterna.
 Nº 421: não impede a extradição, pois, a circunstância de ser o extraditado casado
com brasileiro ou ter filho brasileiro.

Declaração Universal dos Direitos Humanos

 Art. XIV
 Art. XV, § 1º e 2º

33
JURISPRUDÊNCIA

Jurisprudência do STJ sobre tratados e costumes internacionais:


 AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL Nº 1.074.507 - SP (parte da ementa):

DECISÃO 1. Cuida-se de agravo interposto por NORDIC TRUSTEE ASA contra decisão
que negou seguimento ao seu recurso especial, por sua vez manejado em face de
acórdão do eg. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, assim ementado: HIPOTECA
MARÍTIMA Embarcação destinada à exploração de petróleo na costa brasileira Bandeira
liberiana, com hipoteca em favor da agravante, registrada sob a lei liberiana Bem que é
penhorado em execução movida por terceiro Credora hipotecária que pretende a
preferência sobre o produto da arrematação Reconhecimento da hipoteca estrangeira
no Brasil Impossibilidade Estado da Libéria que não é signatário de tratados e
convenções internacionais a esse respeito, a que o Brasil tenha aderido Costume
internacional nesse sentido não verificado: Inviável o reconhecimento da validade no
Brasil de hipoteca registrada sob as leis liberianas, incidente sobre embarcação de
bandeira liberiana, para o fim de garantir ao credor hipotecário a preferência sobre o
produto da alienação da embarcação, penhorada em execução ajuizada por outro
credor, uma vez que a Libéria não é signatária de tratados e convenções internacionais
a esse respeito a que o Brasil tenha aderido, e que não se verifica a existência de
costume internacional nesse sentido. (...) (STJ - AREsp: 1074507 SP 2017/0065899-5,
Relator: Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, Data de Publicação: DJ 27/09/2017).

Jurisprudência do STF sobre extradição de estrangeiro


 Ext 1244 - Info 834:

34
É possível conceder extradição para brasileiro naturalizado envolvido em tráfico de
droga (art. 5º, LI, da CF/88). STF. 1a Turma. Ext 1244 / República Francesa, Rel. Min. Rosa
Weber, julgado em 9/8/2016 (Info 834).

 Ext 1428/DF - Info 939

Brasil deve negar a extradição se houver possibilidade concreta de o Estado requerente


condenar o extraditando a prisão perpétua ou a pena de morte. Brasil deve negar a
extradição se houver possibilidade concreta de o Estado requerente condenar o
extraditando a prisão perpétua ou a pena de morte, sanções que são expressamente
proibidas pela Constituição brasileira (art. 5º, XLVII). Além disso, é possível negar a
extradição se houver uma excessiva abertura dos tipos penais no Estado requerente, o
que viola o princípio da legalidade (art. 5º, XXXIX, da CF/88). As hipóteses previstas na
lei nas quais a extradição é proibida podem ser expandidas pela jurisprudência para
atender ao respeito a outros direitos fundamentais do extraditando. STF. 2a Turma. Ext
1428/DF, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 7/5/2019 (Info 939).

Jurisprudência do STF sobre naturalização de estrangeiro


 RMS 27840/DF - Info 694

Segundo o art. 12, § 4º, I, da CF/88, após ter sido deferida a naturalização, seu
desfazimento só pode ocorrer mediante processo judicial, mesmo que o ato de
concessão da naturalização tenha sido embasado em premissas falsas (erro de fato). O
STF entendeu que os §§ 2º e 3º do art. 112 da Lei n. 6.815/80 (Estatuto do Estrangeiro)
não foram recepcionados pela CF/88. Plenário. RMS 27840/DF, rel. orig. Min. Ricardo
Lewandowski, red. p/ o acórdão Min. Marco Aurélio, 7/2/2013.

Jurisprudência do STJ sobre expulsão de estrangeiro


 HC 324.231/SP e AgRg no HC 321.157/SP

35
A situação irregular do estrangeiro no País não é circunstância, por si só, capaz de
afastar o princípio da igualdade entre nacionais e estrangeiros, razão pela qual a
existência de processo ou mesmo decreto de expulsão em desfavor do estrangeiro não
impede a concessão dos benefícios da progressão de regime ou do livramento
condicional, tendo em vista que a expulsão poderá ocorrer, conforme o interesse
nacional, após o cumprimento da pena, ou mesmo antes disto. HC 324.231/SP, Rei.
Ministro Reynaldo Soares da Fonseca. Quinta turma, julgado em 03/09/2015, DJe
10/09/2015. 2. Agravo regimental improvido. AgRg no HC 321.157/SP, Rel. Ministro Nefi
Cordeiro, Sexta Turma, julgado em 05/04/2016, DJe 18/04/2016.

Jurisprudência do STJ sobre a condição de refugiado


 HC 333902-DF – Info 571

A expulsão de estrangeiro que ostente a condição de refugiado não pode ocorrer sem a
regular perda dessa condição. Assim, mesmo que o refugiado seja condenado com
trânsito em julgado pela prática de crime grave, antes de ele ser expulso deverá ser
instaurado devido processo legal, com contraditório e ampla defesa, para se decretar a
perda da condição de refugiado, nos termos do art. 39, III, da Lei no 9.474/97. Somente
após essa providência, ele poderá ser expulso. STJ. 1a Seção. HC 333902-DF, Rel. Min.
Humberto Martins, julgado em 14/10/2015 (Info 571).

36
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

AMARAL JÚNIOR, Alberto do. Introdução ao direito internacional público. São Paulo: Atlas,
2008.

CANÇADO, Trindade, Antônio Augusto. Princípios do direito internacional contemporâneo


– 2. ed. rev. atual. – Brasília: FUNAG, 2017.

CASELLA, Paulo Borba; Hildebrando Accioly e G. E. do Nascimento e Silva. Manual de


direito internacional público.— 20. ed. — São Paulo: Saraiva, 2012.

MAZZUOLI, Valerio de Oliveira. Curso de direito internacional público. 9. ed. rev., atual. e
ampl. -- São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2015.

PORTELA, Paulo Henrique Gonçalves. Direito Internacional Público e Privado. 9ª ed.


Salvador: Juspodivm, 2017.

REZEK, Francisco. Direito internacional público – Curso Elementar. 17ª ed. São Paulo:
Saraiva, 2018.

SOARES, Guido Fernando Silva. Curso de direito internacional público. São Paulo: Atlas,
2002.

37
Capítulo 6
SUMÁRIO

DIREITO INTERNACIONAL, Capítulo 6 .......................................................................................... 3

1. Responsabilidade internacional e solução pacífica de controversas ............................. 3

1.1. Responsabilidade internacional .............................................................................................................. 3

1.1.1. Introdução ........................................................................................................................................... 3

1.2. Elementos constitutivos ............................................................................................................................. 6

1.3. Excludente de responsabilidade internacional ................................................................................. 6

1.4. Proteção diplomática .................................................................................................................................. 8

2. Solução pacífica de controvérsias .......................................................................................... 9

2.1. Introdução........................................................................................................................................................ 9

2.2. Meios de solução de controvérsias ................................................................................................... 10

2.2.1. Meios diplomáticos e políticos ............................................................................................... 10

2.2.2. Meios semijudiciais: arbitragem.............................................................................................. 12

2.2.3. Meios judiciais ................................................................................................................................ 12

2.2.4. Meios coercitivos: sanções ........................................................................................................ 13

QUADRO SINÓTICO ......................................................................................................................... 14

QUESTÕES COMENTADAS ............................................................................................................. 16

GABARITO .......................................................................................................................................... 23

LEGISLAÇÃO COMPILADA .............................................................................................................. 24

JURISPRUDÊNCIA ............................................................................................................................... 25

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ........................................................................................................ 26

2
DIREITO INTERNACIONAL

Capítulo 6

1. Responsabilidade internacional e solução pacífica de


controversas

1.1. Responsabilidade internacional

1.1.1. Introdução

É de extrema importância tratar sobre o tema responsabilidade internacional, pois,

muitas vezes, as normas internacionais têm dificuldade em serem eficazmente aplicadas, em


virtude da falta de um poder mundial central ou da limitação dos mecanismos de solução de

controvérsias internacionais.

Então, o Direito Internacional necessita de instrumentos aptos a permitir que aqueles


que violaram as normas internacionais sejam responsabilizados por seus ilícitos. Assim, a

responsabilidade internacional é o instituto vinculado à aplicação de sanções pelo qual o


Estado ou organização internacional que tenha descumprido norma internacional (um ato
atentatório ao Direito Internacional é um ato ilícito), causando danos a outrens, tem a

obrigação de reparar o prejuízo eventualmente causado.

3
A responsabilidade internacional pode ser decorrência também de atos inicialmente

lícitos, mas que sejam condutas perigosas, ou seja, tenham potencial de causar danos a outros

sujeitos internacionais. 1

A responsabilidade internacional tem tanto caráter patrimonial (reparação do dano)


quanto moral (reprimenda internacional), porém, como regra geral, não possui aspecto penal.
Por isso, o instituto não é aplicável a todo e qualquer tipo de violação do Direito
Internacional. Pode-se concluir que se trata de mera responsabilidade civil no âmbito

internacional, não se confundindo com a responsabilidade penal internacional (esta é pessoal,


enquanto aquela é institucional, ou seja, os Estados e as organizações assumem a

responsabilidade pelos atos de seus funcionários e de particulares para os quais tenham


concorrido).

Existem três teorias sobre a natureza jurídica da responsabilidade internacional:

a) Teoria subjetivista (teoria da culpa): para que se configure a responsabilidade


internacional, não basta apenas a configuração do ilícito, mas também a existência de
dolo ou culpa no ato ilícito (ação ou omissão) do sujeito internacional.
b) Teoria objetivista (teoria do risco): a responsabilidade internacional não considera o
dolo, a culpa ou qualquer outro motivo pelo qual o sujeito interacional violou a norma,
bastando que se configure o nexo causal entre o ato ilícito e a lesão decorrente. Essa
teoria é empregada nos atos ilícitos relacionados à exploração espacial, proteção do
meio ambiente e emprego de energia nuclear.2

1
Vide questão 1.
2
Vide questão 3.
4
c) Teoria mista: quando for o caso de omissão, deve-se verificar a existência de culpa, na
modalidade negligência, para que a responsabilidade internacional seja configurada. Já
no caso de uma ação comissiva, basta haver um nexo causal entre a conduta e o dano.

Um dos instrumentos aptos a requerer a responsabilidade internacional são, justamente,


os mecanismos de solução de controvérsias internacionais, que podem apurar a ilegalidade do

ato e determinar os meios de reparação dos prejuízos. Ademais, os Judiciários nacionais


também podem ser empregados nos casos cabíveis.

Apesar de a responsabilidade internacional só ser, em geral, aplicável para os Estados e

as organizações internacionais, está em desenvolvimento a possibilidade de uma pessoa


natural responsabilizar diretamente o sujeito internacional na ordem internacional, e também a

pessoa natural ser responsabilizada diretamente por desrespeitar norma internacional, tanto

no âmbito penal quanto no civil, especialmente acerca dos direitos humanos.

A responsabilidade pode ser convencional (resultante da violação de um tratado) ou


delituosa (resultante da violação de um costume). Pode ser também direta (consequência de

ato realizado por Estado, seus órgãos, seus funcionários ou particulares que realizem
atividades imputáveis ao ente) ou indireta (ato cometido por entes que o Estado represente

internacionalmente, como estados-membros ou municípios)3. Pode haver direito de regresso


do Estado contra o agente causador do dano.4

Não obstante, importante ressaltar que a natureza da responsabilidade internacional é

de civil, de finalidade reparatória, não objetivando punir um Estado ou organização

3
Vide questão 5.
4
Vide questão 2.
5
internacional, mas apenas reparar um prejuízo. Além disso, a maioria das regras acerca da
responsabilidade internacional tem natureza costumeira, ou seja, não codificada em tratados.

1.2. Elementos constitutivos


Existem três elementos essenciais para constituir uma responsabilidade internacional,

que são cumulativos:

a) Ato ilícito: é a conduta que viola a norma de Direito Internacional, seja ela comissiva ou
omissiva. O mero dano a um interesse não configura a responsabilidade internacional,
devendo necessariamente haver a infração de norma internacional. Ademais, o fato de o
ato ser lícito no âmbito interno estatal não o exime de ter praticado um ato ilícito no
âmbito internacional, em conformidade com a Convenção de Viena sobre Direito dos
Tratados (art. 27).5
b) Imputabilidade: necessidade de que o ato ilícito possa ser atribuído ao ente
responsável, ou seja, deve existir um vínculo entre a violação da norma e seu
responsável. Pode ser direta (consequência de ato realizado por Estado, seus órgãos,
seus funcionários ou particulares que realizem atividades imputáveis ao ente) ou
indireta (ato cometido por entes que o Estado represente internacionalmente, como
estados-membros ou municípios).
c) Dano: consiste no prejuízo decorrente do ato ilícito causado a outro sujeito de Direito
Internacional (Estado, organização internacional, indivíduo etc.). Ademais, a natureza do
dano pode ser material ou moral, mesmo que não tenha expressão econômica: pode
atingir a honra e a dignidade, um território, bens, dentre outros.

1.3. Excludente de responsabilidade internacional


Mesmo nos casos em que se fazem presentes os três elementos constitutivos da

responsabilidade internacional, é possível que haja alguma hipótese de exclusão ou atenuação


da mesma. Desse modo, a reparação de danos se torna desnecessária ou, ao menos, mitigada.
A seguir, serão vistos alguns tipos de excludentes ou mitigadores da responsabilidade

internacional.

5
Vide questão 4.
6
O primeiro excludente de responsabilidade é a legítima defesa, ou seja, a reação a um
ataque armado, seja ele real ou iminente. Em condições normais, o uso da força nas relações

internacionais configuraria um ato ilícito, porém, já que objetiva manter a integridade e a


soberania estatal, que são direitos fundamentais, e tem natureza protetiva, punitiva e

reparadora, é uma hipótese de exclusão da responsabilidade, inclusive prevista no art. 51 da


Carta da ONU. Ressalta-se que para que haja a exclusão, os atos de legítima defesa devem
ser proporcionais à agressão, só podendo ser praticados até que o Conselho de Segurança da

ONU tome as medidas cabíveis na manutenção ou restauração da paz.

O segundo excludente de responsabilidade é o estado de necessidade, que está


relacionado à lesão a bem jurídico de outrem, com objetivo de salvar bem jurídico próprio. Só

excluirá a responsabilidade se o ato que, a priori, seria ilícito seja a única maneira de
salvaguardar esses interesses essenciais, contra um perigo grave e iminente.

O terceiro excludente de responsabilidade é a prescrição, que consiste na perda do

direito do sujeito internacional reclamar a reparação de um prejuízo decorrente do ato ilícito


de outro sujeito internacional; ou seja, a inércia do prejudicado exclui a responsabilidade. Deve

ser regulada por meio de tratado.

O quarto excludente de responsabilidade é a represália, a retaliação a um ato ilícito de


outro Estado, sendo admissível quando: há violação do outro Estado de normas internacionais,

exista um dano e a represália seja proporcional ao prejuízo sofrido.

O quinto excludente de responsabilidade é a contribuição do Estado prejudicado pelo


resultado do ato ilícito para a ocorrência do dano.

Existem também as hipóteses de força maior, caso fortuito e perigo extremo (ou seja,

o perigo de vida de pessoas sob a guarda estatal), que também podem excluir ou atenuar a
responsabilidade.

Por fim, se o Estado tomar as medidas cabíveis na tentativa de evitar o dano, ele
pode ter sua responsabilidade excluída ou, ao menos, mitigada.

7
1.4. Proteção diplomática
A priori, importante ressaltar que a proteção diplomática não tem relação com o
instituto dos privilégios e imunidades diplomáticos.

O instituto da proteção diplomática consiste nos casos em que o sujeito prejudicado é

uma pessoa natural, por um Estado de que não é nacional, havendo a possibilidade de o
Estado de que é nacional acolher a reclamação do indivíduo, pleiteando reparação para o

Estado infrator (ato chamado de endosso). A partir desse ponto, o Estado assume a demanda
do indivíduo como se fosse dele própria.

Assim, existem três requisitos para que seja concedida a proteção diplomática: a

nacionalidade (efetiva e contínua) da vítima, o esgotamento dos recursos internos


(administrativos e judiciais) e a conduta correta do prejudicado (não pode ser uma das

hipóteses de excludente de responsabilidade).

O benefício da proteção diplomática não é um direito da pessoa natural que sofreu


dano, mas sim um ato discricionário do Estado, podendo ela, inclusive, ser oferecida pelo ente

estatal independente da solicitação do indivíduo.

Com relação às organizações internacionais, estas não oferecem proteção diplomática,


mas sim proteção funcional, para salvaguardar as pessoas sob seu serviço, podendo, inclusive,

ser oferecida contra o Estado do qual o indivíduo é nacional.

8
2. Solução pacífica de controvérsias

2.1. Introdução
A controvérsia internacional consiste no litígio entre sujeitos internacionais (Estados

e/ou organizações internacionais), sobre determinado ponto de fato ou de direito, seja de


natureza econômica, política, jurídica, dentre outras, variando, no caso a caso, em sua

gravidade. Já que as controvérsias internacionais não podem ser solucionadas da mesma


maneira que ocorre com os litígios internos ou nacionais, foi preciso que o Direito
Internacional concebesse meios de solução pacífica dessas controvérsias, considerando as

particularidades da sociedade internacional.

Importante destacar que as normas estabelecidas estão direcionadas às buscas da


manutenção e/ou restauração da paz. Os meios pacíficos de soluções de controvérsias são os

mecanismos que visam promover a composição dos litígios internacionais. São: voluntários
(em regra, só podem ser acionados com o consentimento das partes), preventivos e

impeditivos (quando possível) e de ofício ou por impulso de outras entidades (como o


Conselho de Segurança da ONU).

Os mecanismos de solução de controvérsias internacionais devem ser pacíficos, não se


admitindo o uso da força nas relações internacionais; a guerra não é um meio lícito de

solução de controvérsias, salvo nos casos de legítima defesa, no interesse da comunidade

internacional e no objetivo de manter ou restaurar a paz.

9
2.2. Meios de solução de controvérsias
A obrigação de solucionar as controvérsias pela via pacífica é um dos princípios
fundamentais do Direito Internacional Público, na condição de norma imperativa.

O art. 33 da Carta da ONU prevê um rol não exaustivo dos meios de solução de

controvérsias, quais sejam: negociação, inquérito, mediação, conciliação, arbitragem, solução


judicial, recurso a entidades ou acordos regionais ou qualquer outro meio pacífico à escolha

das partes envolvidas. Assim, outros mecanismos não são excluídos, desde que pacíficos,
como os bons ofícios (previsto pela OEA). Ressalta-se que não existe hierarquia entre os

meios, podendo ser livremente escolhidos pelas partes interessadas, podendo ser definidos
antes dos conflitos (em tratados) ou após. Inclusive, admite-se o emprego de mecanismos que

não recorram ao direito como critério de solução de litigio.

Os meios de solução de controvérsia podem ser, quanto à compulsoriedade de suas


decisões: facultativos (a decisão não é juridicamente vinculante para as partes; EX: meios

diplomáticos e políticos) ou obrigatórios (a decisão vincula as partes; EX: meios judiciais e


arbitragem). Já quanto à fundamentação da decisão: diplomáticos/políticos (meios não
jurisdicionais) ou jurídicos (semi-judiciais ou judiciais). Cada um será visto a seguir.

2.2.1. Meios diplomáticos e políticos

Os meios diplomáticos e políticos são os não jurisdicionais, porque a fundamentação da


decisão nem sempre ocorre com base no Direito. Podem emitir recomendações e resoluções
que devem ser cumpridas. Não configura violação ao principio da não-intervenção em

assuntos internos, principalmente se relativo a direitos humanos, proteção do meio ambiente e


do trabalho, perigo à paz e à segurança.

Os meios diplomáticos são aqueles que mantêm um diálogo entre as partes, em busca

de um denominador comum, a fim de satisfazer a maior parte possível de interesses dos


envolvidos no litígio. Os meios políticos são iguais aos diplomáticos, mas ocorrem no âmbito

das organizações internacionais, podendo ocorrer sem o consentimento de uma das partes
envolvidas, nos casos de controvérsias graves e de difícil solução.

São eles: negociações, bons ofícios, consultas, mediação, conciliação e inquérito.


10
a) Negociações: meio mais direito, simples e comum. Entendimento direto entre os
Estados dentro ou fora de uma organização internacional. Comunicação diplomática
oral ou por escrito. Possíveis resultados: transação (concessões mútuas), renúncia
(abdicação de interesses) ou reconhecimento (admissão) das pretensões. Pode ser
bilateral ou multilateral; geralmente ocorre antes do emprego de outros meios, mas
pode ocorrer em qualquer momento. Processualística fixada casuisticamente, no geral.
b) Bons ofícios: oferta espontânea de um terceiro (moderador) para colaborar na solução
do problema. Ele pode ser um ou mais de um Estado, instituição internacional ou um
alto funcionário, que aproxima as partes, mas não se intromete, interfere nem toma
partido, ou seja, é neutro. É vedada a apresentação de propostas para solucionar o
impasse, não decidindo pelas partes.6
c) Consultas: mecanismo através do qual os sujeitos internacionais podem manter
contatos preliminares entre si, para identificar e estabelecer os assuntos controversos
entre eles, a fim de se preparar para eventuais negociações.
d) Mediação: mecanismo com o envolvimento de um terceiro (pessoa natural, Estado,
organização internacional) que aproxima as partes, sendo mais extensa e solene que os
bons ofícios. O terceiro não só toma conhecimento do problema, mas se envolve e
propõe uma solução pacifica para o conflito; é parte ativa, mas não significa que sua
decisão será acatada. A mediação pode ser facultativa ou obrigatória (prevista no
tratado), oferecida ou solicitada, aceita ou rejeitada. Será encerrada quando as partes
chegam a um bom termo ou decidem não aceitar as propostas do mediador.
e) Conciliação: método mais formal, mas parecido com a mediação. É a atuação de uma
comissão de conciliação, formada por representantes dos Estados envolvidos e por
pessoas neutras (número total ímpar). A comissão emite parecer propondo a solução
dos conflitos, decidindo-se pela maioria dos votos, mas não tem força vinculante.
f) Inquérito ou investigação: esclarece fatos conflituosos para uma futura solução, sendo
sempre prévio à via de soluções de conflito escolhida, podendo inclusive sugerir
condutas. Tem natureza preliminar e facultativa. Podem ser conduzidos por um só
investigador ou uma equipe, normalmente de especialistas, que não precisam ser
imparciais, mas devem obedecer a eventuais normas internacionais.

6
Vide questões 8 e 9.
11
2.2.2. Meios semijudiciais: arbitragem

O meio semijudicial tem seu resultado fundamentado no Direito, sendo juridicamente


vinculante entre as partes, mas não há participação de um órgão jurisdicional permanente: é a

arbitragem. É um instituto cada vez mais usado em âmbito internacional, em vistas da sua
celeridade e maior atenção aos aspectos técnicos da controvérsia.

Sua jurisdição tem formação específica para o caso concreto (ad hoc), sendo composta

por árbitros de países diversos, escolhidos pelos litigantes, com parâmetro de atuação jurídico,
conhecimento técnico na matéria e poderes predeterminados na cláusula compromissória ou

no compromisso arbitral. A cláusula compromissória é parte de tratados que preveem a


arbitragem como meio de solução de conflitos. Já o compromisso arbitral é posterior ao

surgimento da lide, também feito por meio de tratado que estipula suas condições.

Assim, os Estados não estão obrigados a se submeterem à arbitragem, mas iniciada, sua
decisão vinculará às partes, devendo ser cumprida de boa-fé, segundo o princípio pacta sunt

servanda. O documento que formaliza a decisão é o laudo arbitral, contra o qual não é cabível
recursos, em regra: é definitivo, mas não é executório. Exceção: o Mercosul permite o reexame
de laudo arbitral pelo Tribunal Permanente de Revisão.7

2.2.3. Meios judiciais

Os meios judiciais funcionam através de tribunais internacionais de caráter e jurisdição


permanentes. São normalmente criados por tratados, que disciplinam seu funcionamento e
atuação. Exemplos: Corte Internacional de Justiça, Tribunal Penal Internacional, Cortes Europeia

e Interamericana de Direitos Humanos, Tribunal Permanente de Revisão (Mercosul), Tribunal


Internacional do Direito do Mar, dentre outros.

A maioria dessas cortes só pode atuar com o consentimento expresso dos Estados, que

pode ocorrer no momento da criação desses órgãos por tratados (onde se concorda em
submeter-se à jurisdição da corte) ou com atos internacionais quando do surgimento de

7
Vide questão 6 e 10.
12
conflitos específicos, com a aceitação da competência contenciosa da corte. Assim, as partes
têm a obrigação de cumprir o que for decidido na sentença.

O Brasil, de acordo com o art. 5º, § 4º, da Constituição Federal, submete-se à

jurisdição de Tribunal Penal Internacional, mas ainda não se manifestou acerca da cláusula
facultativa de jurisdição obrigatória da Corte Internacional de Justiça.8

Ressalta-se que a Corte Internacional de Justiça tem competência consultiva (para

organizações internacionais), emitindo pareceres, e contenciosa (apenas para os Estados), para


conhecer de conflitos relativos a qualquer matéria de Direito Internacional.

2.2.4. Meios coercitivos: sanções

Os meios coercitivos têm cada vez menos prestígio no âmbito do Direito Internacional,

pois se prioriza a composição pacífica dos litígios. Eles visam, inicialmente, solucionar os
conflitos quando fracassam os demais meios, mas, na prática, ele é usado de acordo com os

interesses particulares de cada Estado. Os principais meios são:

a) Retorsão: reação de um Estado, de modo equivalente, a ato de outro Estado.


b) Represálias: ação ilícita e proibida, de um Estado contra outro, que violou seus direitos.
c) Embargo: sequestro de navios ou cargas de um Estado que estejam no mar territorial
de outro Estado; não é permitido em tempos de paz.
d) Bloqueio: ato em que o Estado emprega forças armadas para impedir que um Estado
mantenha relações comerciais com outros; é proibido.
e) Boicote: interrupção das relações econômico-comerciais com outro Estado.
f) Rompimento de relações diplomáticas: fim do direito de legação, saída de diplomatas.
g) Interrupção (parcial ou total) das relações econômicas e das operações dos meios
de comunicação e de transportes e emprego de forças militares: meios previstos nos
art. 41 e 42 da Carta da ONU, sendo de competência do Conselho de Segurança.

8
Vide questão 7.
13
QUADRO SINÓTICO

TEORIA SUBJETIVISTA TEORIA OBJETIVISTA TEORIA MISTA


Teoria da culpa Teoria do risco Sistema misto

Responsabilidade = Responsabilidade = Responsabilidade por


Configuração do ilícito + Nexo causal entre o ato ilícito omissão = culpa na
Dolo ou culpa e a lesão decorrente modalidade negligência

Leva em consideração os Empregada nos atos ilícitos Responsabilidade por


eventuais motivos que acerca de: meio ambiente, comissão = nexo causal entre
levaram à violação da norma energia nuclear, exploração o ato ilícito e a lesão
espacial decorrente

14
MEIOS DE SOLUÇÃO DE CONTROVÉRSIAS INTERNACIONAIS

Meio diplomático e político de solução de controvérsias


NEGOCIAÇÕES
Entendimento entre os Estados litigantes por contato direto

Meio diplomático e político de solução de controvérsias


INQUÉRITOS
Mecanismo para esclarecer fatos conflituosos, prévio a outros meios

Meio diplomático e político de solução de controvérsias


CONSULTAS
Sujeitos internacionais mantêm contatos prévios para identificar litígios

Meio diplomático e político de solução de controvérsias


BONS OFÍCIOS
Terceiro colabora na solução do problema sem interferir (neutro)

Meio diplomático e político de solução de controvérsias


MEDIAÇÃO
Terceiro colabora na solução do problema propondo soluções

Meio diplomático e político de solução de controvérsias


CONCILIAÇÃO
Comissão de conciliação emite parecer/relatório propondo soluções

Meio semijudicial de solução de controvérsias


ARBITRAGEM
Corte/tribunal arbitral (ad hoc) profere uma decisão que vincula as partes

Órgãos jurisdicionais pré-existentes e permanentes


MEIOS JUDICIAIS
Devem ter sua competência contenciosa reconhecida pelos Estados

Estão em declínio: usa-se mais os meios pacíficos


MEIOS
COERCITIVOS Visam solucionar os conflitos quando os meios pacíficos falham

15
QUESTÕES COMENTADAS

Questão 1

TRF – 5ª Região – Juiz – 2007 – ADAPTADA

A responsabilidade de um sujeito de direito internacional decorre, necessariamente, de


atos ilícitos.

Comentário:

A assertiva está incorreta, pois, como visto, é possível que a responsabilidade


internacional decorra também de atos que, a priori, seriam considerados lícitos, mas que, por

conta de condutas perigosas, têm potencial de causar danos a outros sujeitos internacionais,
podendo deles decorrer a responsabilidade internacional.

Questão 2

TRF – 5ª Região – Juiz – 2007 – ADAPTADA

A responsabilidade internacional enseja a reparação de danos tanto da parte do agente

causador quanto da parte do Estado do qual esse agente se origine.

Comentário:

A assertiva está incorreta, pois, como visto, a obrigação de reparar o dano ou indenizar
o prejuízo é do Estado. Por sua vez, o ente estatal pode (tem a faculdade, não é obrigação

nem regra) exercer o direito de regresso contra o agente causador do dano.

Questão 3

16
AGU – 2004
O regime jurídico preponderante no sistema internacional de responsabilidade por

danos ambientais, previsto nas principais convenções internacionais relativas ao tema, é o da


responsabilidade objetiva.

Comentário:

A assertiva está correta. Conhecida como “teoria do risco”, a responsabilidade

internacional objetiva não considera o dolo, a culpa ou qualquer outro motivo pelo qual o
sujeito interacional violou a norma. Para ela, basta que se configure o nexo causal entre o ato

ilícito e a lesão decorrente, para se configurar a responsabilidade e o dever de indenizar.

Questão 4

AGU – 2004
O Estado não pode eximir-se de sua responsabilidade internacional pela violação de
obrigações relacionadas com a proteção do direito à vida e à pessoal por motivos de ordem

interna, como federativa do Estado e a consequente divisão de competências materiais e

legislativas próprias à União e aos Estados-Membros.

Comentário:

A assertiva está correta, pois, de acordo com o art. 27 da Convenção de Viena sobre

Direito dos Tratados, “uma parte não pode invocar as disposições de seu direito interno para
justificar o inadimplemento de um tratado”. Ou seja, o fato de o ato ser lícito no âmbito

interno estatal não o exime se, praticado no âmbito internacional ele for ilícito, de
responsabilidade internacional.

Questão 5

Ano: 2007 - Banca: ESAF Órgão: PGFN Prova: ESAF - 2007 - PGFN - Procurador da
Fazenda Nacional

17
A respeito de responsabilidade internacional, considere as asserções abaixo e, em seguida,
assinale a opção correta.

I. Uma decisão do Poder Judiciário brasileiro pode levar à responsabilidade internacional do


Brasil, caso a decisão viole compromissos jurídico-internacionais assumidos pelo país.

II. Uma lei de um dos Estados da federação não pode dar ensejo à responsabilidade
internacional do Brasil porque, no âmbito nacional, os compromissos são assumidos pela
União Federal.

III. A responsabilidade internacional do Estado deve ter sempre por base uma ação. Uma
omissão não pode dar ensejo à responsabilização do Estado no plano internacional.

IV. A responsabilidade internacional do Estado apenas existe se há a violação de um tratado


internacional. O desrespeito a um costume internacional, por exemplo, não é suficiente para

dar ensejo à responsabilidade do Estado.


V. A despeito de terem personalidade jurídica internacional, as organizações internacionais não

podem ser responsabilizadas juridicamente na ordem internacional.


A) Apenas a asserção I está correta.
B) Apenas as asserções I e II estão corretas

C) Apenas as asserções I, II e III estão corretas


D) Apenas a asserção V está incorreta.

E) Todas as asserções estão incorretas.

Comentário:

A assertiva I está correta, pois configura hipótese de responsabilidade indireta (ato

cometido por entes que o Estado represente internacionalmente, inclusive seus Poderes). A
assertiva II está incorreta, pois quem assume os compromissos internacionais é a República
Federativa do Brasil (representada pela União), e esta não pode invocar normas internas para

se isentar de responsabilidades por obrigações assumidas. A assertiva III está incorreta, pois
pode haver responsabilização tanto por ação quanto por omissão. A assertiva IV está incorreta,

pois a forma de responsabilidade internacional pode ser por violação de tratado


(convencional) ou de costume internacional (delituosa). A assertiva V está incorreta, pois as

organizações internacionais podem ser responsabilizadas internacionalmente. Gabarito: letra A.

18
Questão 6

TRF 3ª Região – Juiz – 8º Concurso – ADAPTADA

Acerca da arbitragem, é correto afirmar-se que:


A) a arbitragem internacional pode ser definida como a via judiciária mais adequada, através

da Corte Permanente de Arbitragem em Haia, para a solução pacífica de litígios internacionais.


B) o árbitro internacional é membro permanente do foro arbitral, e sua escolha há de
considerar os Estados litigantes envolvidos na disputa, e a existência de um tratado geral de

arbitragem.
C) proferida a sentença arbitral, esta tem efeito “erga omnes”, e é sempre definitiva, e sua

execução, após julgamento dos recursos, deverá ser processada perante a Corte Permanente
de Arbitragem.

D) a sentença arbitral é, em regra, definitiva, nos termos do tratado geral de arbitragem,


cabendo às partes envolvidas o cumprimento da decisão, sob pena de incidirem em ato ilícito,

observando o princípio do “pactum sunt servanda”.

Comentário:

A alternativa A está incorreta, pois não há hierarquia entre os meios de solução de

controvérsias, e a arbitragem não precisa ocorrer dentro da citada Corte. A alternativa B está
incorreta, pois nem sempre o árbitro é membro permanente do foro, nem sempre a

arbitragem será fundada em tratado. A alternativa C está incorreta, pois a citada Corte não é
órgão executor de sentenças. A alternativa D está correta, ressaltando-se que há exceções

para essa regra (possibilidade de recurso no âmbito do Mercosul).

Questão 7

Ano: 2006 Banca: FCC Órgão: BACEN Prova: FCC - 2006 - BACEN - Procurador - Prova 1

No âmbito da Corte Internacional de Justiça, é cláusula facultativa de jurisdição obrigatória a


que:

A) permite ao Estado membro da ONU decidir se adere ou não ao Estatuto da Corte.

19
B) uma vez aceita pelo Estado-parte no Estatuto, garante a jurisdição da Corte em todos os
conflitos internacionais que envolvam aquele Estado, verificada a reciprocidade.

C) uma vez aceita pelo Estado-parte no Estatuto, garante a jurisdição da Corte em todos os
conflitos internacionais que envolvam aquele Estado, independentemente de reciprocidade.

D) possibilita aos Estados membros da ONU a opção, no caso concreto, de se submeter à


jurisdição da Corte.
E) garante ao Estado-parte no Estatuto ampla imunidade de jurisdição ratione materiae.

Comentário:

A alternativa correta é a letra C, pois a cláusula facultativa de jurisdição obrigatória


pode ou não depender de reciprocidade; além disso, sua aceitação implica que o Estado deve

se submeter à jurisdição da Corte Internacional de Justiça, ainda que contra sua vontade.
Ademais, todos os Estados-membros da Corte são parte de seu Estatuto.

Questão 8

TRF – 2ª Região – Juiz - 2009


O fato de um Estado oferecer ajuda a outros dois Estados para resolver certa controvérsia,
sem, contudo, interferir nas negociações, configura o meio de solução de controvérsias

denominado:
A) mediação.

B) conciliação.
C) bons ofícios.

D) inquérito.

E) troca de notas.

Comentário:

A assertiva correta é a C: bons ofícios. A mediação e a conciliação incluem interferência


nas negociações; o inquérito visa apurar fatos conflituosos; a troca de notas é uma

modalidade de tratado.

20
Questão 9

Ano: 2015 Banca: FGV Órgão: OAB Prova: FGV - 2015 - OAB - Exame de Ordem Unificado

- XVI - Primeira Fase


O litígio que envolve Estados e organizações internacionais, podendo ser de natureza

econômica, política ou meramente jurídica, é conceituado como controvérsia internacional.


Acerca dos meios diplomáticos para soluções pacíficas de controvérsias internacionais, assinale
a afirmativa correta.

A) A negociação é um mecanismo que conta com o envolvimento de um terceiro, cuja função


é propor uma solução pacífica para o conflito entre as partes.

B) Os bons ofícios caracterizam-se pela oferta espontânea de um terceiro que colabora com a
solução de controvérsias podendo ser um Estado, um organismo internacional ou uma

autoridade.
C) A mediação caracteriza-se pelo envolvimento de um terceiro, que somente pode ser pessoa

natural.
D) A conciliação é muito semelhante à mediação. Entretanto, caracteriza-se pela possibilidade
de atuar como mediador pessoa natural, Estado ou organismo internacional.

Comentário:

A assertiva A está incorreta, pois a negociação consiste no entendimento direto entre os


Estados, sem o envolvimento de terceiros. A alternativa B está correta. A assertiva C está

incorreta, pois o terceiro na mediação não precisa ser apenas uma pessoa natural, podendo
também ser um Estado ou uma organização internacional. A assertiva D está incorreta, pois
descreve a mediação, enquanto a conciliação é realizada por um órgão conciliador que

emitem opiniões valorativas e formularem sugestões aos sujeitos litigantes, embora não sejam
obrigados a aceitarem a solução proposta.

Questão 10

21
Ano: 2013 Banca: FGV Órgão: OAB Prova: FGV - 2013 - OAB - Exame de Ordem Unificado
- XI - Primeira Fase

A respeito dos mecanismos de solução pacífica de controvérsias no sistema internacional,


assinale a afirmativa correta.

A) O Tribunal Permanente de Revisão do MERCOSUL tem como base jurídica o Protocolo de


Olivos e tem como competência resolver litígios dentro do sistema regional de integração,
proferir pareceres consultivos e editar medidas excepcionais e de urgência.

B) Os Estados possuem capacidade postulatória para solicitar pareceres consultivos perante a


Corte Internacional de Justiça (CIJ).

C) A Organização Mundial do Comércio (OMC) não abre a possibilidade de participação de


atores privados no contencioso, como amici curiae.

D) Apenas os Estados que fazem parte da ONU e ratificaram o Estatuto da Corte Internacional
de Justiça (CIJ) podem apresentar seus contenciosos à mesma.

Comentário:

A assertiva A está correta, pois o Tribunal Permanente de Revisão julga, em grau de

recurso, as decisões proferidas pelos tribunais arbitrais ad hoc (duplo grau de jurisdição para
solução de controvérsias no Mercosul), estando o recurso limitado a questões de direito

tratadas na controvérsia e às interpretações jurídicas do tribunal (1º grau). A alternativa B está


incorreta, pois somente a Assembleia Geral, o Conselho de Segurança e outros órgãos e

entidades especializadas poderão requerer pareceres da Corte Internacional de Justiça. A


assertiva C está incorreta, pois é possível a intervenção de “amicus curiae” nos procedimentos

de competência da Organização Mundial do Comércio. A assertiva D está incorreta, pois não


basta que o Estado tenha ratificado o Estatuto da Corte para que seja vinculado à sua
jurisdição, devendo também assinar a declaração de aceitação da cláusula facultativa de

jurisdição obrigatória.

22
GABARITO

Questão 1 - Errada

Questão 2 - Errada

Questão 3 - Correta

Questão 4 - Correta

Questão 5 - A

Questão 6 - D

Questão 7 - C

Questão 8 - C

Questão 9 - B

Questão 10 - A

23
LEGISLAÇÃO COMPILADA

Nesta matéria, faz-se de extrema importância a leitura de:

Constituição Federal

 Art. 5º, § 4º

Convenção de Viena sobre Direito dos Tratados

 Art. 27

Carta da ONU

 Art. 33
 Art. 41 e 42
 Art. 51
 Art. 96

24
JURISPRUDÊNCIA

Jurisprudência do STF sobre responsabilidade internacional e


aplicação de meio semijudicial de solução pacífica de controvérsias
internacionais
 RECURSO ESPECIAL Nº 607211 - DF (parte da ementa):

RECURSO EXTRAORDINÁRIO. DIREITO CONSTITUCIONAL. ORGANISMO


INTERNACIONAL ONU/PNUD. IMUNIDADE DE JURISDIÇÃO. DECRETO 27.784/1950

APLICAÇÃO. PROVIMENTO DO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. 1. O organismo


internacional ONU/PNUD possui imunidade de jurisdição, inclusive, em relação às

causas trabalhistas, conforme afirmado pelo Plenário desta Corte no julgamento dos
RREE 578.543/MT e 597.368/MT, redator para o acórdão Ministro Teori Zavasck. [...].

Cumpre ressaltar que, no voto proferido nos autos dos precedentes supra mencionados,
consignei que os organismos internacionais são criados mediante tratados. A imunidade
de jurisdição e de execução não é atributo inerente a essas pessoas jurídicas de direito

internacional. No caso específico, os Decretos 27.784 e 52.288 regulam os privilégios e


imunidades de que o organismo é titular. Entre os privilégios e imunidades outorgados

pelo Brasil à ONU, encontra-se a imunidade de jurisdição. Ou seja, o Estado brasileiro,


expressamente, renunciou a sua jurisdição sobre organismo internacional. Salientei,

também, que a violação dos privilégios e garantias da ONU importam em


responsabilidade internacional, podendo acarretar inclusive, a exclusão do Brasil do

quadro das Nações Unidas. Anotei, por fim, que os contratados pela ONU/PNUD
firmam contrato de prestação de serviço de natureza especial, regulado pelo
Decreto nº 27.584, onde há previsão de que eventuais conflitos sejam solucionados
por arbitragem. [...]. (STF – RE: 607211 DF, Relator: Min. LUIZ FUX, Data de Julgamento:
15/05/2014, Data de Publicação: DJe-095 DIVULG 19/05/2014 PUBLIC 20/05/2014).

25
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

AMARAL JÚNIOR, Alberto do. Introdução ao direito internacional público. São Paulo: Atlas,
2008.

CANÇADO, Trindade, Antônio Augusto. Princípios do direito internacional contemporâneo


– 2. ed. rev. atual. – Brasília: FUNAG, 2017.

CASELLA, Paulo Borba; Hildebrando Accioly e G. E. do Nascimento e Silva. Manual de


direito internacional público.— 20. ed. — São Paulo: Saraiva, 2012.

MAZZUOLI, Valerio de Oliveira. Curso de direito internacional público. 9. ed. rev., atual. e
ampl. -- São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2015.

PORTELA, Paulo Henrique Gonçalves. Direito Internacional Público e Privado. 9ª ed.


Salvador: Juspodivm, 2017.

REZEK, Francisco. Direito internacional público – Curso Elementar. 17ª ed. São Paulo:
Saraiva, 2018.

SOARES, Guido Fernando Silva. Curso de direito internacional público. São Paulo: Atlas,
2002.

26
Capítulo 7
SUMÁRIO

DIREITO INTERNACIONAL, Capítulo 7 .......................................................................................... 3

1. Domínio Público Internacional ............................................................................................... 3

1.1 Zonas Polares ............................................................................................................................. 3

2. Direito do Mar, rios internacionais e águas interiores...................................................... 5

2.1. Águas Interiores, Mar Territorial e Zona Contígua ........................................................................ 6

2.2. Zona Econômica Exclusiva ........................................................................................................................ 6

2.3. Plataforma Continental e Fundos Marinhos ..................................................................................... 7

2.4. Rios Internacionais ....................................................................................................................................... 7

2.5. Alto-mar ............................................................................................................................................................ 7

3. Espaço aéreo e extra-atmosférico ......................................................................................... 9

3.1. Situação jurídica das aeronaves e das embarcações ................................................................. 10

QUADRO SINÓTICO ......................................................................................................................... 12

QUESTÕES COMENTADAS ............................................................................................................. 13

GABARITO .......................................................................................................................................... 21

LEGISLAÇÃO COMPILADA .............................................................................................................. 22

JURISPRUDÊNCIA ............................................................................................................................... 23

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ........................................................................................................ 24

2
DIREITO INTERNACIONAL

Capítulo 7

1. Domínio Público Internacional

Existem espaços geográficos que possuem grande importância para todos os Estados e

para a humanidade como um todo. Esses espaços são chamados de domínio público
internacional, pois incluem lugares que não estão sob a soberania de nenhum Estado ou que

são objeto de interesse internacional, mesmo que pertençam a um país específico. São esses
espaços: o mar (incluindo-se águas internas e rios internacionais), o espaço aéreo e extra-

atmosférico e as zonas polares.

Assim, qualquer espaço internacional pode ser usado por todos, desde que para fins
pacíficos. A utilização desses locais exige a cooperação internacional, sendo objeto de

regulamentação do Direito Internacional. O tema será estudado a seguir.

1.1 Zonas Polares

As Zonas Polares são o Ártico (Polo Norte) e a Antártida (Polo Sul). O Polo Norte é um
grande oceano congelado, utilizado como corredor aéreo alternativo, uma área de livre
trânsito (alto mar). Não há regulamentação específica para a região, seguindo as normas

relativas à navegação aérea e marítima, à exploração de recursos e à proteção do meio


ambiente. Há pouco interesse econômico na área; não possui terra, nem compõe nenhuma

região continental.1

1
Vide questão 10.
3
Por sua vez, a Antártida é um continente congelado, usada para exploração científica
com fins pacíficos, sendo o único espaço terrestre internacionalizado. A necessidade de

regulamentação específica sobre a área (para impedir disputas pela região) levou à formulação
do Tratado da Antártida (1959), aderido pelo Brasil através do Decreto nº 75.963/1975, o

qual estipula que a área seja utilizada sempre para fins pacíficos e a importância das pesquisas
científicas, com a preservação dos recursos naturais, para o progresso da humanidade.

Assim, existe interesse científico e econômico na região, é usada para transporte

marítimo e aéreo, caça e pesca, recursos minerais, aspecto estratégico, dentre outros
interesses. Por isso, o referido Tratado só permite o estabelecimento de pessoal e
equipamento militar na área se for para fins pacíficos ou de pesquisa científica. Ademais, são

proibidas na área explosões nucleares e lançamento de lixo ou resíduos radioativos.

Canadá, Rússia e Dinamarca exercem soberania unilateral em algumas áreas no Polo


Norte. Isso ainda não foi contestado por nenhum outro país.

Muitos Estados mantêm reivindicações territoriais quanto ao Polo Sul, mas, enquanto o
Tratado da Antártida estiver em vigor, são proibidas novas reivindicações ou ampliações de

reivindicações existentes.

4
2. Direito do Mar, rios internacionais e águas interiores

O dispositivo que rege sobre o direito do mar é a Convenção das Nações Unidas
sobre o Direito do Mar de Montego Bay em 1982 (Decreto nº 1.530/1995), com o Tribunal
Internacional Marítimo em Hamburgo. Ademais, o Brasil também tem a Lei nº 8.617/1993

para regular a matéria.

Dentre outros temas, a Convenção tem o intuito de estabelecer um regime legal


abrangente para os mares e oceanos e, quanto às questões ambientais, fixar normas práticas

relativas aos padrões ambientais, assim como o cumprimento dos dispositivos que
regulamentam a poluição do meio ambiente marinho, promovendo a utilização equitativa e
eficiente dos recursos naturais, bem como sua proteção, preservação e fiscalização.

A mencionada Convenção reduziu o mar territorial brasileiro de 200 (entendimento


anterior ao da Lei 8.617/1993) para 12 milhas marítimas (22 km).2 Em contrapartida, garantiu

aos Estados costeiros a exploração econômica exclusiva numa aérea de 200 milhas marítimas.

O domínio estatal é exercido nas águas interiores (rios, lagos, baías, canais, mares
interiores), no mar territorial e na zona contígua. A partir das 12 milhas náuticas, há uma

relativização da soberania estatal; não se admite direito de passagem inocente (sem objetivos
além de navegar, sem escalas) dentro das águas interiores, só após da linha de base. No mar

territorial, mesmo que seja navio de guerra, não precisa de autorização estatal. Nas águas
interiores, precisa de autorização estatal.

Entre 12 e 24 milhas náuticas: soberania relativa estatal (fiscalizar); após as 24 milhas,

basicamente o poder estatal é de explorar economicamente, conservando e zelando os


recursos naturais; após 200 milhas náuticas são águas internacionais. Ou seja, quanto mais

distante da costa, menos soberania estatal.

2
Vide questão 3.
5
2.1. Águas Interiores, Mar Territorial e Zona Contígua

As águas interiores estão situadas no interior da linha de base do mar territorial. Nelas,
o Estado costeiro exerce sua soberania de forma plena, sem estar sujeito a qualquer limitação

da ordem jurídica internacional. Nesse sentido, elas abrangem também as águas doces dos
rios, lagos e poços existentes no território do país. Não se reconhece o direito de passagem

inocente de navegação estrangeira, precisando de autorização (soberania absoluta).

O mar territorial compreende a faixa de água de 12 milhas marítimas desde a linha de


base. Segurança, conservação, defesa, motivos econômicos, politica aduaneira e fiscal.

Soberania relativa: admite-se o direito de passagem inocente a navios mercantes estrangeiros,


desde que de modo contínuo e breve, não ferindo a soberania, a segurança, a ordem pública

e os interesses econômicos nacionais. Em regra, a jurisdição penal do Estado costeiro não será
exercida a bordo do navio estrangeiro.

A zona contígua está após o mar territorial, com 12 milhas marítimas de extensão a

partir dele (24 milhas da linha de base). O Estado costeiro pode fiscalizar, defender, prevenir
ou punir infrações, conservar e explorar. Pertence ao alto mar. Seu regime é essencialmente o
de liberdade em alto mar, permitindo ao Estado alguns poderes de mera jurisdição.

2.2. Zona Econômica Exclusiva

A Zona Econômica Exclusiva tem extensão de 200 milhas marítimas contadas da linha
de base do mar territorial. Abrange a produção de energia da água, das correntes e dos
ventos, além de abranger jurisdição para o estabelecimento e a utilização de ilhas artificiais,

para investigação cientifica marinha e preservação do meio ambiente marinho, além de


explorar, conservar e administrar os recursos naturais vivos e não vivos da área. O Estado

pode exercer jurisdição (direitos de soberania taxativos), mas é permitida a liberdade de


navegação para Estados sem litoral e outros interessados, bem como de outros usos do mar

internacionalmente permitidos.3

3
Vide questão 5, 6 e 9.
6
2.3. Plataforma Continental e Fundos Marinhos

De acordo com a Convenção das Nações Unidas sobre Direito do Mar, a Plataforma
Continental engloba o leito e o subsolo das áreas submarinas para além do mar territorial do

Estado, pela extensão do prolongamento natural do território terrestre estatal, até ao bordo
exterior da margem continental, ou até uma distância de 200 milhas marítimas das linhas de

base a partir das quais se mede a largura do mar territorial, nos casos em que o bordo
exterior da margem continental não atinja essa distância.4

Nessa área, o Estado exerce direitos de soberania quanto à exploração e

aproveitamento dos recursos naturais; outros Estados também podem fazê-lo, mas desde que
com o consentimento explícito do Estado costeiro, pois seus direitos à Plataforma Continental

são implícitos e independentes de qualquer ocupação.

Já os Fundos Marinhos são áreas que não pertencem a nenhum Estado (são patrimônio
comum da humanidade), pois compreendem as áreas subaquáticas, o leito e o subsolo das

águas internacionais. Sua exploração deve ser realizada considerando o benefício geral.

2.4. Rios Internacionais

Os Rios Internacionais são aqueles que banham mais de um Estado, podendo ser
sucessivos (passam consecutivamente por Estados) ou contíguos (são limítrofes, separando

territórios). Não existe um tratado geral sobre a matéria, por isso, a regulamentação é feita
caso a caso. O Brasil faz parte dos seguintes tratados sobre a matéria: Tratado da Bacia do
Prata de 1969 (Decreto nº 67.084/1970) e Tratado de Cooperação Amazônica de 1978

(Decreto nº 85.050/1980).5

2.5. Alto-mar

O conceito de Alto-mar é residual: compreende todas as áreas não inclusas na Zona


Econômica Exclusiva, Mar Territorial, Águas Interiores ou até águas de um arquipélago. É a

parte do mar sobre a qual não existe nenhum poder soberano estatal, estando aberto a todos

4
Vide questão 1.
5
Vide questão 8.
7
os Estados, sempre com fins pacíficos, para navegar, realizar pesquisa científica e exercer
outras atividades lícitas. Existem também deveres: prestar assistência, impedir e punir o

transporte de escravos, combater a pirataria e reprimir o tráfico ilícito de entorpecentes.

8
3. Espaço aéreo e extra-atmosférico

O espaço aéreo compreende o espaço acima da área terrestre e do mar territorial (até
12 milhas náuticas) do Estado, bem como o espaço acima de áreas em que ele exerce sua

soberania, jurisdição, proteção ou mandato, independente de altura, até o fim da atmosfera6.


Nele, é proibida a passagem inocente, ou seja, todo avião deve pedir autorização para

ultrapassar o espaço aéreo do país, informando de onde está vindo, para onde vai e o que
está sendo transportado, ainda que sobre o mar territorial.

O Estado exerce soberania sobre seu espaço aéreo de modo exclusivo e absoluto,
possuindo todos os direitos de soberania sobre o espaço aéreo acima de seu território
especifico e de seu mar territorial. Os Estados devem considerar a segurança de voo como um

dos princípios mais valiosos. No espaço aéreo internacional (acima das águas internacionais e
das zonas polares), é livre a navegação aérea, não incidindo nenhuma soberania. Liberdades

do ar: de sobrevoo, de fazer escalas, de embarcar, de desembarcar, de embarcar passageiros,


mercadorias e malas postais.

O espaço extra-atmosférico tem grande interesse para a humanidade: corrida


aeroespacial, comunicação, pesquisa científica, segurança, estabilidade, dentre outros temas. É

de uso comum para fins pacíficos, com cooperação internacional, revertendo benefícios para
toda a humanidade. A matéria é regulamentada pelo Tratado sobre Princípios Reguladores
das Atividades dos Estados na Exploração e Uso do Espaço Cósmico, Inclusive a Lua e

Demais Corpos Celestes, de 1967 (Decreto nº 64.362/1969).

São proibidos: a apropriação do espaço e de corpos celestes por qualquer Estado e a

realização de manobras ou a disposição de equipamentos militares. Um dos problemas é que


a exploração espacial deve evitar danos ao meio ambiente terrestre, existindo também a

questão do lixo aeroespacial (o satélite é lançado, mas não se consegue trazê-lo de volta).

6
Vide questão 7.
9
3.1. Situação jurídica das aeronaves e das embarcações

Em decorrência da similaridade dos temas, a situação jurídica tanto das aeronaves


quanto das embarcações será vista em conjunto, pois o que se aplica para uma, no geral,

também se aplica para outra. Particularidades serão ressaltadas.

Toda embarcação ou aeronave deve ter uma nacionalidade, implicando a


responsabilidade estatal e a possibilidade de proteção no exterior. Nenhum navio ou aeronave

pode ter mais de uma bandeira.

Veremos a seguir as hipóteses acerca de embarcações e aeronaves:

a) Brasileiras públicas (ou a serviço oficial do Brasil): aplica-se lei brasileira é aplicada
independente de onde esteja; princípio da extraterritorialidade.
b) Brasileiras privadas (ou pública com fins comerciais): aplica-se lei brasileira se estiver
em território brasileiro ou em águas ou espaço aéreo internacionais; estando em águas
estrangeiras, em regra, aplica-se a lei do respectivo Estado costeiro.
c) Estrangeiras públicas (ou a serviço oficial do governo estrangeiro): a lei estrangeira é
aplicada independente de onde esteja (princípio da intraterritorialidade), não lhes sendo
aplicada a lei brasileira mesmo se em águas nacionais (costume internacional).
d) Estrangeiras privadas: se estiverem no território brasileiro, aplica-se a lei brasileira; se
estiverem em seu espaço ou em espaço internacional, aplica-se a lei de origem do
país.7

Destaca-se que o espaço internacional é neutro, por isso, aplica-se a lei da bandeira da
embarcação ou aeronave.

Ademais, importante ressaltar que, de acordo com o art. 109, IX, da Constituição

Federal, compete ao Juízo Federal processar e julgar os crimes cometidos a bordo de navios
ou aeronaves, ressalvada a competência da Justiça Militar. 8

Segundo o art. 5º, do Código Penal, consideram-se como extensão do território


nacional as embarcações e aeronaves brasileiras, de natureza pública ou a serviço do governo

7
Vide questão 4.
8
Vide questão 2.
10
brasileiro onde quer que se encontrem, bem como as aeronaves e as embarcações brasileiras,
mercantes ou de propriedade privada, que se achem, respectivamente, no espaço aéreo

correspondente ou em alto-mar, aplicando-se, assim, a lei brasileira no caso de crimes. É


também aplicável a lei brasileira aos crimes praticados a bordo de aeronaves ou embarcações

estrangeiras de propriedade privada, achando-se aquelas em pouso no território nacional ou


em voo no espaço aéreo correspondente, e estas em porto ou mar territorial do Brasil.

Ficam também sujeitos à aplicação da lei brasileira os crimes cometidos em aeronaves

ou embarcações brasileiras privadas no exterior, mas que não são julgados nesse outro país,
na forma do art. 7º, II, “c”, do Código Penal.

11
QUADRO SINÓTICO

DOMÍNIO INTERNACIONAL PÚBLICO

ESPAÇOS CARACTERÍSTICAS DESTAQUES

Ártico (Polo Norte): oceano congelado Tratado da Antártida:


exploração científica com fins
ZONAS POLARES Antártida (Polo Sul): continente
pacíficos
congelado

Águas Interiores, Mar Territorial, Zona O domínio estatal é exercido


Contígua, Zona Econômica Exclusiva, nas águas interiores, no mar
Plataforma Continental, Alto-mar, Rios territorial e na zona contígua.
MAR E ÁGUAS
internacionais Quanto mais distante da
costa, menor incidência da
soberania estatal

Espaço acima da área terrestre e do mar Soberania absoluta: proibida


territorial, o espaço acima de áreas em a passagem inocente
ESPAÇO AÉREO que se exerce soberania, jurisdição,
proteção ou mandato, até o fim da
atmosfera

Espaço após do espaço aéreo É proibida a apropriação do


espaço e de corpos celestes
ESPAÇO EXTRA- De uso comum para fins pacíficos, com
pelos Estados e a realização
ATMOSFÉRICO cooperação internacional, revertendo
de manobras ou a disposição
benefícios para toda a humanidade
de equipamentos militares

12
QUESTÕES COMENTADAS

Questão 1

CESGRANRIO – 2011 – Petrobrás - Advogado

Segundo a Convenção das Nações Unidas sobre Direito do Mar, o Brasil pode explorar os

recursos minerais da plataforma continental, observados os seguintes limites:

A) do mar territorial, de 12 milhas marítimas.

B) do mar territorial, de 200 milhas marítimas.

C) o bordo exterior da plataforma continental ou 200 milhas marítimas.

D) o bordo exterior da plataforma continental.

E) da Zona Econômica Exclusiva de 188 milhas marítimas.

Comentário:

A alternativa correta é a letra C. Segundo o art. 76, § 1º, da Convenção das Nações

Unidas sobre Direito do Mar, a plataforma continental de um Estado costeiro compreende o


leito e o subsolo das áreas submarinas que se estendem além do seu mar territorial, passando

por toda a extensão do prolongamento natural do território terrestre estatal, até ao bordo
exterior da margem continental, ou até uma distância de 200 milhas marítimas das linhas de

base a partir das quais se mede a largura do mar territorial, nos casos em que o bordo
exterior da margem continental não atinja essa distância. Por isso, as demais estão erradas.

Questão 2

Procurador Federal – 2004


13
Todo crime praticado a bordo de uma aeronave comercial civil brasileira, ainda que fora do
espaço aéreo brasileiro, será da competência da justiça federal.

Comentário:

Como visto, se o ato ocorrido na aeronave for de competência da Justiça Militar, a

competência não será do Juízo Federal, de acordo com o art. 109, IX, da Constituição Federal.

Assertiva errada.

Questão 3

Ano: 2008 Banca: CESPE Órgão: OAB Prova: CESPE - 2008 - OAB - Exame de Ordem - 3 -
Primeira Fase

A respeito do direito internacional do mar e sua recepção no direito brasileiro, assinale a

opção incorreta.

A) A zona contígua brasileira compreende uma faixa que se estende de 12 a 24 milhas


marítimas, contadas a partir das linhas de base que servem para medir a largura do mar

territorial.

B) Em sua zona econômica exclusiva, o Brasil tem o direito exclusivo de regular a investigação
científica marinha.

C) É reconhecido aos navios de todas as nacionalidades o direito de passagem inocente no


mar territorial brasileiro.

D) O mar territorial brasileiro compreende uma faixa de duzentas milhas marítimas de largura,

medidas a partir da linha de base.

Comentário:

As alternativas A, B e C estão corretas, todas em conformidade com a Convenção das

Nações Unidas sobre Direito do Mar. No entanto, a alternativa D está incorreta, sendo o
gabarito, pois está em desconformidade com a referida Convenção e também com a Lei

14
8.617/1993, que revogou o antigo entendimento, reduzindo o mar territorial brasileiro de 200
para 12 milhas marítimas.

Questão 4

TRF 3ª Região – Juiz - 2006

Delito ocorrido a bordo de navio de bandeira estrangeira, no mar territorial do Brasil,


envolvendo dois estrangeiros de nacionalidade diversa, a competência para o processo
criminal é:

A) do juiz brasileiro;

B) do juiz da nacionalidade da vítima;

C) do juiz da nacionalidade do autor do delito;

D) da nacionalidade do navio.

Comentário:

A alternativa correta é a letra A, pois a Convenção das Nações Unidas sobre Direito do
Mar faculta ao Estado estabelecer sua jurisdição penal em hipóteses específicas. No caso,

tratando-se de embarcação estrangeira particular, tendo o crime ocorrido no território


brasileiro, aplica-se a lei brasileira.

Questão 5

Ano: 2017 Banca: PGR Órgão: PGR Prova: PGR - 2017 - PGR - Procurador da República

DENTRE OS ENUNCIADOS ABAIXO, SOMENTE ESTÃO CORRETOS:

I - A Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar reconhece, na zona econômica
exclusiva, os direitos do estado costeiro para exploração e aproveitamento, conservação e
gestão dos recursos naturais, vivos ou não vivos das águas sobrejacentes ao leito do mar, do
15
leito do mar e seu subsolo, bem como sua jurisdição no tocante à colocação e utilização de
ilhas artificiais.

II - O Estado costeiro, de acordo com a Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do

Mar, possui o direito de perseguição que só poderá ter início de execução quando o navio
infrator estiver nas águas internas, no mar territorial ou na zona contígua, podendo continuar

e terminar no mar territorial de terceiro estado desde que a perseguição tenha sido contínua
e não tiver sido interrompida.

III - De acordo com a Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar, em caso de

abalroamento entre navios mercantes em alto mar, a jurisdição penal pode ser exercida pelo
Estado da bandeira de qualquer um dos navios envolvidos ou ainda por Estado terceiro em

cujo porto os navios buscaram abrigo após o incidente.

IV - De acordo com a Convenção sobre infrações e certos outros atos praticados a bordo de
aeronaves, o Estado contratante que não for o da matrícula da aeronave pode exercer sua

jurisdição penal em relação a infração cometida a bordo, caso tal exercício de jurisdição seja
necessário para cumprir obrigações internacionais multilaterais.

A) I e IV

B) I, III e IV

C) todos estão corretos

D) II e III

Comentário:

A assertiva I está correta, em conformidade com a Convenção de Montego Bay. A

assertiva II está incorreta, pois a perseguição não pode continuar no mar territorial do seu
próprio Estado ou de Estado terceiro, devendo ser cessada. A assertiva III está incorreta, pois

os procedimentos penais e disciplinares contra essas pessoas só podem ser iniciados perante
as autoridades judiciais ou administrativas do Estado de bandeira ou perante as do Estado do
qual essas pessoas sejam nacionais. A assertiva IV está correta, em conformidade com a

Convenção de Montego Bay. Gabarito: letra A.


16
Questão 6

Ano: 2016 Banca: FGV Órgão: CODEBA Prova: FGV - 2016 - CODEBA - Técnico Portuário -
Manutenção e Obras

De acordo com a Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar, os países costeiros

têm direito a declarar uma Zona Econômica Exclusiva (ZEE), é delimitada por uma linha
imaginária situada a

A) 50 milhas marítimas da costa.

B) 150 milhas marítimas da costa.

C) 200 milhas marítimas da costa.

D) 500 milhas marítimas da costa.

E) 1.000 milhas marítimas da costa.

Comentário:

A alternativa incorreta é a letra C, pois, de acordo com a Convenção das Nações Unidas

sobre o Direito do Mar de Montego Bay e a Lei nº 8.617/1993, a Zona Econômica Exclusiva
tem extensão de 200 milhas marítimas contadas da linha de base do mar territorial brasileira.

Incorretas, portanto, as demais assertivas.

Questão 7

Ano: 2011 Banca: CESPE Órgão: TRF - 1ª REGIÃO Prova: CESPE - 2011 - TRF - 1ª REGIÃO -
Juiz Federal

No que se refere ao domínio público marítimo internacional, assinale a opção correta.

A) Nos termos da Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar, os Estados sem
litoral devem ter direito reconhecido de participar do aproveitamento do excedente dos

17
recursos vivos das zonas econômicas exclusivas dos Estados costeiros da mesma região,
independentemente de acordos.

B) O Estado costeiro tem o direito de aplicar as suas leis e regulamentos aduaneiros, fiscais, de

imigração e sanitários na zona econômica exclusiva.

C) Conforme a Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar, a soberania do Estado
costeiro sobre o mar territorial estende-se ao espaço aéreo sobrejacente a este, bem como ao

leito e ao subsolo desse mar.

D) Os Estados exercem soberania sobre suas águas interiores, ainda que estejam obrigados a
assegurar o direito de passagem inocente em favor dos navios mercantes, mas não dos navios

de guerra.

E) Na plataforma continental, os Estados possuem direitos de soberania no tocante à


exploração e aproveitamento dos seus recursos naturais, mas a falta de utilização e exploração

desses direitos em qualquer de suas formas autoriza outros Estados ao seu exercício, ainda
que sem consentimento expresso.

Comentário:

A alternativa A está incorreta, pois essa exploração depende de acordos prévios,

dependendo do consentimento explícito do Estado costeiro. A alternativa B está incorreta, pois


se refere à Zona Contígua, e não à Zona Econômica Exclusiva. A alternativa C está correta, de
acordo com o art. 2º da referida Convenção. A alternativa D está incorreta, pois a passagem

inocente é a navegação pelo mar territorial com o fim de atravessá-lo, mas sem penetrar nas
águas interiores. A alternativa E está incorreta, pois, mesmo que não haja a exploração pelo

Estado costeiro, ainda deve haver seu consentimento expresso.

Questão 8

Ano: 2011 Banca: CESPE Órgão: TRF - 5ª REGIÃO Prova: CESPE - 2011 - TRF - 5ª REGIÃO -
Juiz Federal

18
O domínio público internacional refere-se a espaços de interesse geral pertencentes a todas as
nações. A respeito desse assunto, assinale a opção correta com base nos tratados e

convenções pertinentes.

A) O espaço aéreo não é considerado domínio público internacional.

B) A Antártica é considerada domínio público internacional cujo uso deve destinar-se a fins
científicos e militares.

C) Os espaços territoriais de domínio público internacional não se sujeitam à soberania de

nenhum país.

D) É juridicamente possível o domínio privado dos corpos celestes.

E) Os rios internacionais, como, por exemplo, o Danúbio, na Europa, podem ser considerados
de domínio público internacional.

Comentário:

A alternativa A está incorreta, pois, como visto, o espaço aéreo é sim um domínio

público internacional. A alternativa B está incorreta, pois os fins da Antártica devem ser
sempre pacíficos, só sendo permitidas bases militares com o objetivo de pesquisa científica. A

alternativa C está incorreta, pois o domínio público internacional é o conjunto dos espaços
cujo uso interessa à sociedade internacional como um todo, mesmo que tais espaços estejam

sujeitos à soberania de um Estado. A alternativa D está incorreta, pois isso é expressamente


proibido pelo Tratado sobre Princípios Reguladores das Atividades dos Estados na Exploração

e Uso do Espaço Cósmico, Inclusive a Lua e Demais Corpos Celestes. A alternativa E está
correta, pois o princípio que regula os rios internacionais é o da soberania dos Estados sobre
os trechos que correm dentro de seus respectivos limites.

Questão 9

TRF 1ª Região – Juiz - 2015

19
Ao realizar um cruzeiro turístico, uma embarcação de pavilhão do Estado A parou em área
situada na zona econômica exclusiva do Estado B e lá permaneceu. Após dez dias, autoridades

do Estado B apreenderam a embarcação sob a alegação de que esta deveria ter informado
que permaneceria parada naquela área, sendo a ausência de informação motivo para suspeitar

de seu engajamento em atividade ilícita. Nessa situação hipotética, a atitude do Estado B


violou:

A) o direito de passagem em trânsito da embarcação.

B) a liberdade de navegação da embarcação.

C) a liberdade de exploração econômica da embarcação.

D) a liberdade do estatuto de bandeira da embarcação.

E) o direito de passagem inocente da embarcação.

Comentário:

Na sua Zona Econômica Exclusiva, o Estado pode exercer jurisdição, tendo soberania,

mas, segundo a Convenção de Montego Bay, é permitida a liberdade de navegação da


embarcação para Estados sem litoral e outros interessados, bem como de outros usos do mar

internacionalmente permitidos. Por isso, o gabarito é a letra B, excluindo-se as demais.

Questão 10

Senado Federal – 2002 - Cargo: Consultor Legislativo - Área Relações Internacionais e


Defesa Nacional - Banca: CESPE/CEBRASPE - Nível: Superior

O espaço aéreo situado sobre o Polo Norte é de livre trânsito, independentemente de

qualquer tratado, posto que sua superfície hídrica subjacente é alto-mar.

Comentário:

A assertiva está correta, pois o Polo Norte é um grande oceano congelado, utilizado

como corredor aéreo alternativo e área de livre trânsito, consistindo em alto-mar.

20
GABARITO

Questão 1 - C

Questão 2 - Errada

Questão 3 - D

Questão 4 - A

Questão 5 - A

Questão 6 - C

Questão 7 - C

Questão 8 - E

Questão 9 - B

Questão 10 - Correta

21
LEGISLAÇÃO COMPILADA

Nesta matéria, faz-se de extrema importância a leitura de:

Constituição Federal

 Art. 109, IX

Código Penal

 Art. 5º
 Art. 7º, II, “c”

Convenção das Nações Unidas sobre Direito do Mar (Montego Bay)

 Art. 76, § 1º

22
JURISPRUDÊNCIA

Jurisprudência do TRF – 2ª Região sobre Direito do Mar:


 RECURSO EM SENTIDO ESTRITO Nº 201251030008505:

RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. CRIME AMBIENTAL. LEI Nº 9.605/98. COMPETÊNCIA


TERRITORIAL. COMPETÊNCIA RELATIVA. DECLINATÓRIA DE COMPETÊNCIA EX OFFICIO.

NÃO OCORRÊNCIA. I – Não ocorrência de declínio de competência ex officio. II – O


declínio de competência ocorreu após provocação dos acusados, não existindo
nenhuma razão de ordem processual, material ou prática que os impeça de veicular a

matéria antes do juízo de admissibilidade sobre a acusação. III – Regras de fixação de


competência. IV – O Estado só exerce soberania plena dentro dos limites de seu mar

territorial, do qual a Plataforma Continental e a Zona Econômica Exclusiva não


fazem parte, consoante definições trazidas nos artigos 6º e 11 da Lei n. 8.617/93.

Dentro dessas duas faixas de mar o Brasil exerce poderes sob limitações impostas
pela Convenção de Montego Bay. V – Pautado na convenção, na Lei n. 8.617/93, e

nos incisos III, IV, e V do art. 109 da CRFB/88, o crime ambiental cometido na zona
econômica exclusiva atrai a competência da Justiça Federal. Porém, essa atração
não altera a natureza jurídica da zona econômica exclusiva nem da plataforma

continental, que não são mar territorial ou território nacional propriamente e,


portanto, não permitem uso do regramento convencional de definição de competência

territorial pautado nos artigos 5º, § 2º do CP e 70 do CPP, reclamando então recurso às


noções de extraterritorialidade que, na hipótese, encontrarão enquadramento no art. 7º,

II do CP. [...]. (TRF-2 - RSE: 201251030008505, Relator: Desembargador Federal ABEL


GOMES, Data de Julgamento: 17/10/2012, PRIMEIRA TURMA ESPECIALIZADA, Data de
Publicação: 26/10/2012).

23
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

AMARAL JÚNIOR, Alberto do. Introdução ao direito internacional público. São Paulo: Atlas,
2008.

CANÇADO, Trindade, Antônio Augusto. Princípios do direito internacional contemporâneo


– 2. ed. rev. atual. – Brasília: FUNAG, 2017.

CASELLA, Paulo Borba; Hildebrando Accioly e G. E. do Nascimento e Silva. Manual de


direito internacional público.— 20. ed. — São Paulo: Saraiva, 2012.

MAZZUOLI, Valerio de Oliveira. Curso de direito internacional público. 9. ed. rev., atual. e
ampl. -- São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2015.

PORTELA, Paulo Henrique Gonçalves. Direito Internacional Público e Privado. 9ª ed.


Salvador: Juspodivm, 2017.

REZEK, Francisco. Direito internacional público – Curso Elementar. 17ª ed. São Paulo:
Saraiva, 2018.

SOARES, Guido Fernando Silva. Curso de direito internacional público. São Paulo: Atlas,
2002.

24
CARREIRA JURÍDICA

Direito Internacional
Capítulo 8
CAPÍTULOS

Capítulo 1 – Introdução ao Direito Internacional Público

Capítulo 2 – Fontes do Direito Internacional Público

Capítulo 3 – Direito dos Tratados

Capítulo 4 – Sujeitos do Direito Internacional Público

Capítulo 5 – Nacionalidade e condição jurídica do estrangeiro

Capítulo 6 – Responsabilidade internacional e solução pacífica de controvérsias

Capítulo 7 – Domínio público internacional

Capítulo 8 – Introdução ao Direito Internacional Privado e aplicação da lei no espaço

Capítulo 9 – Direito Processual Internacional

Capítulo 10 – Outros ramos do Direito Internacional

1
SUMÁRIO

DIREITO INTERNACIONAL, Capítulo 8 ........................................................................................................... 3

1. Introdução ao Direito Internacional Privado e aplicação da lei no espaço ..................... 3

1.1. Introdução ao Direito Internacional Privado..................................................................................... 3

1.2. Diferenças entre o Direito Internacional Privado do Público .................................................... 4

1.3. Objetos do Direito Internacional Privado .......................................................................................... 5

1.4. Fontes do Direito Internacional Privado ............................................................................................. 5

2. Aplicação da lei no espaço ...................................................................................................... 7

2.1. Norma no Direito Internacional Privado e sua estrutura ............................................................ 7

2.2. Objetos e elementos de conexão.......................................................................................................... 8

2.3. Institutos básicos do Direito Internacional Privado ....................................................................... 9

2.4. Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (LINDB) ................................................... 10

QUADRO SINÓTICO ............................................................................................................................................... 13

QUESTÕES COMENTADAS.................................................................................................................................. 15

GABARITO ................................................................................................................................................................... 22

LEGISLAÇÃO COMPILADA .................................................................................................................................. 23

JURISPRUDÊNCIA....................................................................................................................................................... 24

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS............................................................................................................................ 26

2
DIREITO INTERNACIONAL

Capítulo 8

1. Introdução ao Direito Internacional Privado e

aplicação da lei no espaço

1.1. Introdução ao Direito Internacional Privado


Existem relações privadas, entre pessoas naturais e jurídicas, que vão além dos limites
de cada Estado, possuindo uma “conexão internacional”, seja com relação a transações
comerciais, casamentos ou divórcios entre pessoas de nacionalidades distintas, negócios

jurídicos entre pessoas que domiciliam em Estados diferentes, dentre outras hipóteses.

A regra geral é que o Direito interno de cada Estado regule as relações que ocorrem no
âmbito de seu território, e resolvam eventuais conflitos delas decorrentes. Os Estados possuem

normas jurídicas específicas para regular essas situações de conflito, conferindo segurança
jurídica ao desenvolvimento das relações internacionais privadas. Contudo, quando tais

relações privadas tem contexto internacional, pode existir conflito acerca de qual norma
aplicar, de qual ordenamento jurídico interno.

Desse modo, surge o Direito Internacional Privado (Conflict of laws, para o direito

anglo-saxão), o ramo do Direito que regula os conflitos de leis no espaço quanto as relações
de caráter privado com conexão internacional, indicando qual norma jurídica nacional deverá

ser aplicada àquele caso concreto. Por esse motivo, as normas de Direito Internacional Privado
são meramente indicativas (normas de sobredireito), pois só apontam qual o preceito jurídico

que deve ser aplicado ao caso concreto, seja ele estrangeiro, nacional ou internacional.

3
O Direito Internacional Privado pode ser considerado uma exceção ao princípio da
territorialidade, pelo qual, dentro do território de um Estado, aplicam-se suas leis, decorrência

direta da soberania estatal. Assim, o legislador, no exercício do poder soberano estatal, dispõe

de situações em que podem ser aplicadas normas estrangeiras dentro do território pátrio.

Ademais, a norma a ser aplicada no caso concreto deve vir da ordem jurídica do país
com a qual a relação privada internacional tenha maior conexão. É preciso avaliar, justamente,

os chamados “elementos de conexão”, que devem ser pertinentes ao ponto de se aplicar


norma estrangeira em detrimento da norma nacional, indicando o vínculo da pessoa (física ou

jurídica) ou de uma situação com outro Estado ou ordem jurídica. Assim, cada Estado
determina seus “elementos de conexão” a serem aplicados em seu território, ou seja, cada

Estado possui normas próprias de Direito Internacional Privado.

1.2. Diferenças entre o Direito Internacional Privado do Público


Importante destacar que o Direito Internacional Privado não é ramo do Direito

Internacional Público. Enquanto o Público regula as relações internacionais e os temas de


interesse da sociedade internacional (como a paz e os direitos humanos), o Privado regula as

relações privadas com contexto internacional, sobre as quais incidiria mais de uma ordem
jurídica, disciplinando os conflitos de leis no espaço.

No entanto, ressalta-se que existem matérias que podem ser reguladas tanto pelo

Direito Internacional Privado quanto pelo Público, como aquelas relacionadas ao comércio
internacional.

As normas de Direito Internacional Privado, apesar de poderem se originar das fontes

do Direito Internacional Público, geralmente decorrem das próprias normas dos direitos
4
internos, fixadas pelos Estados e estabelecendo quais normas serão aplicadas em caso de
conflito. Desse modo, o controle de legalidade no Direito Internacional Privado ocorre não no

âmbito internacional, mas no Poder Judiciário de cada país envolvido.

Ademais, enquanto as normas de Direito Internacional Público são de aplicação direta,


ou seja, aplicam-se diretamente às relações cabíveis, sendo vinculantes, as normas de Direito

Internacional Privado são indicativas, ou seja, indicam que normas devem ser aplicadas no
caso concreto de um conflito de leis no espaço, seja interna, estrangeira ou internacional.

1.3. Objetos do Direito Internacional Privado


O Direito Internacional Privado tem como objeto de seu estudo, pela doutrina mais
ampla: a nacionalidade, a condição jurídica do estrangeiro e o reconhecimento de direitos

adquiridos no exterior.

Mais especificamente, é o ramo do Direito que tem como objeto disciplinar as soluções
para conflitos de leis no espaço, estabelecendo que ordenamento jurídico deve ser aplicado

no caso concreto que envolva relações privadas com conexão internacional. Seu objeto não é
regular o conflito, mas indicar qual norma deve ser aplicada.

1.4. Fontes do Direito Internacional Privado


As fontes do Direito Internacional Privado podem ser divididas em internas e
internacionais, com relação a sua origem. As fontes internas são as emanadas dos processos

legislativos nacionais, fazendo-se presentes no ordenamento jurídico interno de cada Estado.


No entanto, os Estados podem concordar em definir que normas de Direito Internacional

Privado serão aplicadas em seus territórios, geralmente por meio de tratados. É assim que as
fontes do Direito Internacional Público passam a poder regular relações de Direito

Internacional Privado.

Desse modo, são consideradas fontes: leis, tratados, costumes, jurisprudência, doutrina,
princípios gerais do Direito, princípios gerais do Direito Internacional Privado, atos de

organizações internacionais e soft law.

5
Assim, o que foi disposto sobre esse tema no capítulo acerca das fontes do Direito
Internacional Público também se aplica ao Direito Internacional Privado. Importante ressaltar,

contudo, duas fontes em particular: as leis e os tratados.

a) Leis: são consideradas a fonte primária do Direito Internacional Privado, devendo ser
aplicada anteriormente às demais fontes. No Brasil, a principal lei sobre a matéria é a
Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro – LINDB (Lei nº 4.657/1942, com
redação dada pela Lei nº 12.376/2010), além do Código de Processo Civil.
b) Tratados: que sejam referentes a temas de Direito Internacional Privado, a fim de
uniformizar o tratamento de questões e conferir maior segurança jurídica às relações
privadas internacionais. Sobre a matéria, apesar de não ser muito aplicado e de ter
alguns preceitos derrogados por tratados ou leis mais novos, está em vigor no Brasil o
Código Bustamante de 1928 (Decreto nº 18.871/1929).

6
2. Aplicação da lei no espaço

O conflito de leis no espaço provém de dois fatores: a diversidade legislativa (cada

sistema jurídico, autônomo e soberano, dá tratamento diferente a aspectos sociais) e a


existência de uma sociedade transnacional (relações entre indivíduos vinculados a sistemas

jurídicos diferentes). Se existisse um direito absolutamente uniforme ou sociedades herméticas,


não existiria o “fato anormal” (fato jurídico vinculado, por qualquer de seus elementos, a mais
de um ordenamento), que gera o conflito de leis.

Em regra, o Direito de um Estado é aplicado dentro de seu território, incidindo sobre as


pessoas, bens e relações que estejam sob seu poder soberano. No entanto, nem sempre é
fácil solucionar os conflitos de aplicação de leis no espaço. Desse modo, no caso de conflito

de leis no espaço, segundo as disposições da Lei de Introdução às Normas do Direito


Brasileiro (LINDB), aplica-se a regra do direito pátrio, já o direito estrangeiro é aplicado por

exceção, quando for determinado expressamente pela legislação interna.

Os conflitos de leis no espaço são as situações em que mais de um ordenamento


jurídico nacional pode incidir sobre uma relação privada com conexão internacional. É esse,

como visto, o objeto do Direito Internacional Privado: indicar a norma que corretamente deve
ser aplicada para solucionar o conflito, de acordo com os “elementos de conexão”. Isso ocorre

mesmo que haja a aplicação da norma de um Estado estrangeiro no ordenamento jurídico


interno de outro país.

2.1. Norma no Direito Internacional Privado e sua estrutura


Como visto, a norma de Direito Internacional Privado é a que indica qual norma, seja
ela nacional ou estrangeira, é aplicável para solucionar um conflito de leis no espaço. Já que é

uma norma meramente indicativa, não apresenta a conduta a ser seguida, apenas o
dispositivo, pois este indicará a conduta.

A norma de Direito Internacional Privado divide-se em duas partes: o elemento e o

objeto de conexão. O elemento de conexão é responsável por determinar o Direito aplicável à

7
matéria; são exemplos de elementos: domicílio, nacionalidade, autonomia da vontade, dentre
outros que serão posteriormente estudados. Já o objeto de conexão consiste na descrição da

matéria à qual se refere a norma, ou seja, se se trata de personalidade, capacidade,


contratados, dentre outras hipóteses.

As normas de Direito Internacional Privado podem ter também caráter conceitual ou

qualificador, informando o modo como a norma deve ser interpretada e aplicada, além de
preceitos que podem proibir sua execução.

2.2. Objetos e elementos de conexão


Agora, serão estudadas as duas partes da estrutura da norma de Direito Internacional
Privado. Como visto, o elemento de conexão é o fator que determina qual a norma aplicável

para solucionar o conflito de lei no espaço que envolva um determinado objeto de conexão,
que é um tema de interesse jurídico.

Os elementos de conexão são, em regra, fixados pela lex fori, ou seja, pela lei do

Estado, mas podem também ser definidos pela autonomia da vontade e por tratados, quando
a lex fori permitir. Ressalta-se que pode haver mais de um elemento de conexão para o

mesmo objeto de conexão, seja de forma alternada ou de forma subsidiária.

Os principais elementos de conexão são:

a) Nacionalidade (elemento lex patriae): aplicada a norma do Estado do qual a pessoa é


nacional, nos casos de conflito de leis no espaço. EX: art. 7º, § 2º, e art. 18 da LINDB.
b) Domicílio (elemento lex domicilii): é o principal elemento de conexão adotado pelo
Brasil, onde se aplica a norma do domicílio de uma das partes do conflito. EX: art. 7º,
art. 8º, § 1º e 2º, art. 10º, art. 12, todos da LINDB.
c) Residência: o centro de vida e ocupação de uma pessoa pode ser elemento de
conexão, se a pessoa não tiver domicílio, considerar-se-á domiciliada no lugar de sua
residência. EX: art. 7º, § 8º, da LINDB.
d) Localização do bem (elemento lex rei sitae): incide a norma do lugar onde está situada
a coisa, aplicável para os bens imóveis e para os bens móveis de situação permanente,
sendo regido pelo princípio da territorialidade. EX: art. 8º, caput, art. 10, § 2º, art. 12,
§ 1º, da LINDB. Exceções: casos de extraterritorialidade e quando prevalece o domicílio.

8
e) Lex fori: é aplicável a lei do lugar do foro, a norma do lugar onde ocorre a relação
jurídica, em vigor na legislação interna do Estado. É a regra referente à aplicação do
Direito Internacional Privado e também quando o direito estrangeiro não for aplicado.
f) Local onde o ato ilícito foi cometido (elemento lex loci delicti comissi): aplicável em
questões relativas a poluição ambiental, concorrência desleal, dentre outras.
g) Local de celebração e/ou de execução de contrato ou obrigação (elemento lex loci
executionis/lex loci solutionis): prevista no art. 12 da LINDB.
h) Local de constituição da obrigação (elemento locus regit actum/lex loci contractus ):
diferentemente do anterior, consiste na aplicação da norma do local onde a obrigação
foi constituída, não onde ela deve ser executada. EX: art. 9º, caput, e art. 11 da
LINDB.1
i) Autonomia da vontade das partes (elemento lex voluntatis): se permitido pela lei do
Estado ou pelas normas de um tratado vigente, as partes podem escolher o direito
nacional aplicável a uma determinada relação privada com conexão internacional, desde
que também não viole a ordem pública ou os compromissos internacionais do Estado.

2.3. Institutos básicos do Direito Internacional Privado


Como regra geral do Direito Internacional Privado, sabe-se que o juiz deve aplicar a

norma indicada pela lex fori, seja ela uma norma nacional ou estrangeira. No entanto, existem
outros institutos que devem ser estudados, pois eles podem determinar a forma pela qual a

norma indicativa incidirá sobre um conflito de leis no espaço.

São alguns dos institutos básicos de Direito Internacional Privado:

a) Qualificação: ato pelo qual se delimita o objeto de conexão, sendo a conceituação e


classificação de um instituto jurídico, para identificar o tratamento adequado à matéria.
No geral, adota-se a lex fori, mas também pode-se aplicar a lei estrangeira (EX: art. 8º e
art. 9º da LINDB).
b) Ordem pública: a incompatibilidade da norma estrangeira que seria aplicável ao
conflito com a ordem pública impede sua incidência.

1
Vide questão 4 e 10.
9
c) Reenvio: ocorre quando as normas de Direito Internacional Privado de um Estado
remetem às normas jurídicas de um terceiro Estado. Não é permitido no Brasil (art. 16
da LINDB).2
d) Direito adquirido: o direito adquirido no âmbito de um Estado acompanha a pessoa
em outro Estado, devendo ser reconhecido. Porém, não será permitido se ofender a
ordem pública do outro Estado.

2.4. Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (LINDB)


A seguir, será realizado o estudo do art. 7º ao art. 19º da Lei de Introdução às Normas

de Direito Brasileiro (LINDB), de extrema importância para o entendimento da matéria de


Direito internacional Privado no âmbito brasileiro e, especialmente, da aplicação da lei no

espaço, decidindo eventuais conflitos.

A legislação brasileira que regula o direito internacional privado, a Lei de Introdução às


Normas de Direito Brasileiro (LINDB), adota o critério do domicílio como principal elemento

de conexão do Direito Internacional Privado brasileiro, respeitando-se a ordem interna. Ou


seja, como regra geral, na necessidade de aplicação de norma estrangeira, aplicar-se-á a lei do
país em que era domiciliado o de cujus para regular a sucessão por morte.

Tendo o Brasil recebido um grande fluxo de imigrantes, permitir a aplicação da lei de


nacionalidade impediria essa integração dos estrangeiros com o sistema brasileiro. Assim, para
efeitos de Direito Internacional Privado, o domicílio, neste caso, deve ser analisado, sobre o

prisma do direito interno, residência com animus definitivo. Entretanto, nos casos em que a
pessoa não tenha domicílio ou este seja desconhecido, deve-se aplicar a lei do país onde o

indivíduo tenha residência ou, por fim, do local onde a pessoa se encontre.

Contudo, caso a lei nacional do de cujus seja mais favorável, o inventário será feito no
exterior e a sentença deverá ser homologada no Brasil para que produza efeitos. Por esta

razão, no caso do inventário processado no Brasil, a regra traz consigo uma exceção, a qual
dispõe que deve prevalecer lei mais benéfica ao cônjuge e aos descendentes de nacionalidade

Brasileira (§ 1º do art. 10 da LINDB).

2
Vide questão 3.
10
Outra norma importante dispõe que “a lei do país em que domiciliada a pessoa
determina as regras sobre o começo e o fim da personalidade, o nome, a capacidade e os

direitos de família” (art. 7º, caput, da LINDB), enquanto que “para qualificar os bens e regular
as relações a eles concernentes, aplicar-se-á a lei do país em que estiverem situados” (art. 8º,

caput, da LINDB). Já em relação à qualificação e regência das obrigações, aplicar-se-á a lei do


país em que se constituírem (art. 9º, caput, da LINDB).

Ademais, quanto às organizações destinadas a fins de interesse coletivo, como as

sociedades e as fundações, elas deverão obedecer à lei do Estado em que se constituírem,


mas não poderão ter filiais, agências ou estabelecimentos no Brasil antes de serem os atos
constitutivos aprovados pelo Governo brasileiro, ficando sujeitas à lei brasileira (art. 11º, caput

e § 1º, da LINDB). No entanto, ressalta-se que governos estrangeiros, bem como suas
organizações, não poderão adquirir no Brasil bens imóveis ou susceptíveis de desapropriação,

somente podendo adquirir a propriedade dos prédios necessários à sede dos representantes
diplomáticos ou dos agentes consulares (art. 11º, § 2º e 3º, da LINDB).

Com relação à competência da autoridade judiciária brasileira, o art. 12 da LINDB

estabelece que ela será competente: quando for o réu domiciliado no Brasil ou aqui tiver de
ser cumprida a obrigação (caput), para conhecer das ações relativas a imóveis situados no

Brasil (§ 1º) e para cumprir as diligências deprecadas por autoridade estrangeira competente,
observando a lei desta, quanto ao objeto das diligências, concedido o exequatur (§ 2º).

Preceitua o art. 13 da LINDB que a prova dos fatos ocorridos em país estrangeiro rege-

se pela lei que nele vigorar, quanto ao ônus e aos meios de produzir-se, não admitindo os
tribunais brasileiros provas que a lei brasileira desconheça; ou seja, o ônus da prova e sua

produção são regidos pela norma do local onde ocorreu o fato que se deseja provar. No
entanto, no caso de não conhecer a lei estrangeira, poderá o juiz exigir de quem a invoca

prova do texto e da vigência (art. 14 da LINDB).

Quanto à possibilidade de execução no Brasil de sentença proferida no estrangeiro, é


necessária a presença dos requisitos estabelecidos no art. 15 da LINDB:

a) haver sido proferida por juiz competente;

11
b) terem sido os partes citadas ou haver-se legalmente verificado à revelia;

c) ter passado em julgado e estar revestida das formalidades necessárias para a


execução no lugar em que foi proferida;

d) estar traduzida por intérprete autorizado;

e) ter sido homologada pelo Supremo Tribunal Federal. (Vide art. 105, I, “i” da
Constituição Federal).

O art. 16 da LINDB confirma que a regra geral no Direito Internacional Privado é a


aplicação da norma nacional, mas quando, nos termos dos artigos precedentes, se houver de

aplicar a lei estrangeira, ter-se-á em vista a disposição desta, sem considerar-se qualquer
remissão por ela feita a outra lei.

Já o art. 17 da LINDB demonstra que a incompatibilidade da norma estrangeira que


seria aplicável ao conflito com a ordem pública impede sua incidência, pois as leis, atos e
sentenças de outro país, além de declarações de vontade, não terão eficácia no Brasil quando
ofenderem a soberania nacional, a ordem pública e os bons costumes.

Por sua vez, o art. 18 da LINDB trata da competência das autoridades consulares
brasileiras para celebrar o casamento e os demais atos de Registro Civil e de tabelionato para
brasileiros, inclusive o registro de nascimento e de óbito dos filhos de brasileiro nascidos no

país da sede do Consulado, separação consensual e o divórcio consensual de brasileiros


(observados os requisitos legais e os prazos), sendo, porém, indispensável a assistência de

advogado.

Por fim, o art. 19 da LINDB dá validade a todos os atos indicados no artigo anterior e
celebrados pelos cônsules brasileiros na vigência do Decreto-lei nº 4.657, de 1942, desde que

satisfaçam todos os requisitos legais.

12
QUADRO SINÓTICO

DIREITO INTERNACIONAL PÚBLICO DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO


Regulamentação da sociedade internacional Regulamentação das relações privadas no
e de temas de seu interesse âmbito internacional
Regras fixadas em normas internacionais Regras fixadas em normas geralmente internas
Normas de aplicação direta Normas indicativas do Direito aplicável

ELEMENTOS DE CONEXÃO
NACIONALIDADE Em caso de conflito, aplica-se a norma do Estado da nacionalidade
de uma das partes
DOMICÍLIO Em caso de conflito, aplica-se a norma do domicílio de uma das
partes
RESIDÊNCIA Se a pessoa não tiver domicílio, considerar-se-á domiciliada no lugar
de sua residência
LEX FORI Em caso de conflito, aplica-se a norma do Estado onde ocorre a
relação jurídica
LOCALIZAÇÃO DO Em caso de conflito, aplica-se a norma do lugar onde está situada a
BEM coisa (princípio da territorialidade)
LOCAL DO ATO Em caso de conflito, aplica-se a norma do lugar onde o ilícito foi
ILÍCITO cometido

LOCAL DA Em caso de conflito, aplica-se a norma do lugar de execução de um


CELEBRAÇÃO DO contrato ou de uma obrigação
CONTRATO

13
LOCAL DE Em caso de conflito, aplica-se a norma do lugar onde a obrigação foi
CONSTITUIÇÃO DA constituída ou contraída
OBRIGAÇÃO
AUTONOMIA DA As próprias partes definem o Direito aplicável a uma determinada
VONTADE relação privada com contexto internacional, dependente da permissão
do ordenamento jurídico do Estado e de eventuais tratados
realizados

14
QUESTÕES COMENTADAS

Questão 1

TRF 5ª Região – Juiz – 2005

O juiz brasileiro pode, diante de um caso concreto, aplicar, de ofício, a lei estrangeira.

Comentário:

A assertiva está correta, pois, uma vez permitido pelo legislador pátrio em exercício do
poder soberano estatal, todas as autoridades competentes (inclusive juízes) podem aplicar, até

de ofício, a norma estrangeira. Ademais, caso não conheça a lei estrangeira, o juiz pode exigir
de quem a invoca prova do texto e da vigência, de acordo com o art. 14 da LINDB.

Questão 2

OAB – PE – 2002

São considerados pelas correntes doutrinárias como objeto do Direito Internacional Privado
todos os indicados nas alternativas, com exceção de:

a) reconhecimento de direitos adquiridos no estrangeiro;


b) conflitos de leis no espaço;

c) situação jurídica do estrangeiro;

d) criação de um direito internacional.

Comentário:

Estão corretas as alternativas A, B e C, pois todas essas hipóteses podem constituir


possíveis objetos do Direito Internacional Privado, de acordo com a doutrina. No entanto, o
Direito Internacional Privado não objetiva criar um direito internacional, até porque ele já

existe, estando incorreta. Gabarito: letra D.

15
Questão 3

TRF 4ª Região – Juiz – 2008


Dadas as assertivas abaixo, assinalar a alternativa correta:

I. Dá-se reenvio de 3º grau no caso de conflito de regras de Direito Internacional que envolva
quatro países.

II. Hipótese comum de conflito de regras de Direito Internacional ocorre quanto ao foro
competente para os inventários e partilhas de bens situados no Brasil, pertencentes a
estrangeiro.
III. São exemplos de regras de conexão ou elementos de conexão a lex patriæ (da
nacionalidade), a lex loci actus (do local da realização do ato jurídico), a lex voluntatis

(escolhida pelos contratantes), a lex loci celebrationis (do local da celebração do matrimônio).
IV. Para regular as relações concernentes aos bens, segundo as normas brasileiras de Direito

Internacional, aplicar-se-á a lei do país em que estiverem situados.


A) Está correta apenas a assertiva II.

B) Estão corretas apenas as assertivas I e III.


C) Estão corretas apenas as assertivas II e IV.
D) Estão corretas apenas as assertivas I, III e IV.

Comentário:

A assertiva I está correta, pois o reenvio nasce do conflito de leis no espaço, originando
um choque entre sistemas legais e buscando solução no ordenamento jurídico de outro país.
O reenvio tem três graus de complexidade de conflitos: o reenvio de 1º grau envolve dois

países, o de 2º grau três países e o de 3º grau quatro países. A assertiva II está incorreta, pois,
de acordo com o art. 12, § 1º, da LINDB, só a autoridade judiciária brasileira tem competência

para conhecer das ações relativas a imóveis situados no Brasil. A assertiva III está correta,
apesar de o local da celebração do matrimônio não ser mais um elemento de conexão muito
empregado. A assertiva IV está correta, pois defini o elemento de conexão lex rei sitae,

presente no art. 8º, caput, da LINDB. Portanto, o gabarito é a letra D.

16
Questão 4

TRF – 3ª Região – Juiz – 2006

Em controvérsia submetida ao juiz brasileiro sobre contrato firmado no exterior por brasileiro
domiciliado no exterior e estrangeiro domiciliado no Brasil, aplica-se ao mérito:

A) a lei do local da celebração do contrato;


B) a lei do local da execução do contrato;

C) a lei da nacionalidade das partes;


D) a lei do domicílio da parte autora.

Comentário:

A alternativa correta é a letra A, seguindo o elemento de conexão de acordo com o

local de constituição da obrigação (elemento locus regit actum), na forma do art. 9º da LINDB:
para qualificar e reger as obrigações, aplicar-se-á a lei do país em que se constituírem. As

demais estão incorretas, por exclusão.

Questão 5

TRF – 3ª Região – Juiz – 10º Concurso (adaptada)


A capacidade para suceder, em se tratando de fatos anormais, nos termos da Lei de

Introdução às Normas do Direito Brasileiro atualmente em vigor, será regulada por:


a) a lei do último domicílio do de cujus;
b) a lei do local do falecimento do de cujus;

c) a lei do domicílio do herdeiro;


d) a lei escolhida pelo de cujus, de acordo com o princípio da autonomia da vontade, no

testamento.

Comentário:

17
A alternativa correta é a letra C, pois, de acordo com o art. 10, § 2º, da LINDB, a lei do
domicílio do herdeiro ou legatário regula a capacidade para suceder. A alternativa A está

incorreta, pois obedece a lei do país em que era domiciliado o de cujus, tendo relevância com
relação à sucessão, mas não quanto a capacidade de suceder. A alternativa B está incorreta,

pois a LINDB não faz referência ao local de falecimento. A alternativa D está incorreta, pois
não é caso onde a lex fori permita a autonomia da vontade.

Questão 6

Ano: 2019 Banca: CESPE Órgão: TJ-AM Prova: CESPE - 2019 - TJ-AM - Analista Judiciário -
Direito
No que concerne à Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro, à pessoa natural, aos
direitos da personalidade e à desconsideração de pessoa jurídica, julgue o item a seguir.

Em se tratando de indivíduo de nacionalidade estrangeira domiciliado no Brasil, as regras


sobre o começo e o fim da sua personalidade, seu nome, sua capacidade civil e seus direitos

de família são aquelas da legislação vigente no seu país de origem.

Comentário:

A assertiva está incorreta, pois, na forma do art. 7º da LINDB, “a lei do país em que
domiciliada a pessoa determina as regras sobre o começo e o fim da personalidade, o nome,
a capacidade e os direitos de família”. Assim, são as leis do local de domicílio da pessoa que

definirão as regras quanto a esses conteúdos.

Questão 7

Ano: 2019 Banca: CONSULPLAN Órgão: TJ-MG Prova: CONSULPLAN - 2019 - TJ-MG -
Titular de Serviços de Notas e de Registros - Provimento

Considerando a disciplina saída da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro, assinale


a alternativa correta.

A) A lei do último domicílio do falecido regula a capacidade para suceder.

18
B) A sucessão de bens de estrangeiros, situados no país, será regulada pela lei brasileira em
benefício do cônjuge ou dos filhos brasileiros, mesmo nas hipóteses em que a lei pessoal do

falecido lhes seja mais favorável.


C) As organizações destinadas a fins de interesse coletivo, como as sociedades e as fundações,

obedecem à lei do Estado em que se constituírem, mas só poderão ter filiais no Brasil depois
que os seus atos constitutivos forem aprovados pelo Governo brasileiro, ficando sujeitas à lei
brasileira.

D) Os governos estrangeiros, bem como as organizações de qualquer natureza, que eles


tenham constituído, dirijam ou hajam investido de funções públicas, poderão adquirir no Brasil

bens imóveis além daqueles destinados à sede de sua representação, desde que essa

aquisição seja precedida de autorização do Senado Federal.

Comentário:

A alternativa A está incorreta, pois, de acordo com o art. 10, § 2º, da LINDB, a lei do

domicílio do herdeiro ou legatário é que regula a capacidade para suceder. A alternativa B


está incorreta, pois só será regulada pela lei brasileira quando não lhes seja mais favorável a
lei pessoal do de cujus, na forma do art. 10, § 1º, da LINDB. A alternativa C está correta, pois é

hipótese prevista no art. 11, § 1º, da LINDB. A alternativa D está incorreta, pois, segundo o art.
11, § 2º, da LINDB, Governos estrangeiros não poderão adquirir no Brasil bens imóveis ou

susceptíveis de desapropriação em nenhuma hipótese.

Questão 8

Banca: FGV - Órgão: OAB - 2012

José, de nacionalidade brasileira, era casado com Maria, de nacionalidade sueca, encontrando-
se o casal domiciliado no Brasil. Durante a viagem de “lua de mel”, na França, Maria, após o

jantar, veio a falecer, em razão de uma intoxicação alimentar. Maria, quando ainda era noiva
de José, havia realizado testamento em Londres, dispondo sobre os seus bens, entre eles dois

imóveis situados no Rio de Janeiro. À luz das regras de Direito Internacional Privado, assinale a
afirmativa correta.

19
A) Se houver discussão acerca da validade do testamento, no que diz respeito à observância
das formalidades, deverá ser aplicada a legislação brasileira, pois Maria encontrava- se

domiciliada no Brasil.
B) Se houver discussão acerca da validade do testamento, no que diz respeito à observância

das formalidades, deverá ser aplicada a legislação inglesa, local em que foi realizado o ato de
disposição de última vontade de Maria.
C) A autoridade judiciária brasileira não é competente para proceder ao inventário e à partilha

de bens, porquanto Maria faleceu na França, e não no Brasil.


D) Se houver discussão acerca do regime sucessório, deverá ser aplicada a legislação sueca,

em razão da nacionalidade do de cujus.

Comentário:

A alternativa A está incorreta, pois deverá ser aplicada a legislação inglesa, não a
brasileira, pois as obrigações convencionais e as decorrentes de atos unilaterais serão regidas,

quanto à forma, pela lei do local onde se originaram. A alternativa B está correta, pois, já que
o testamento foi realizado em Londres, a legislação inglesa será aplicável no que concerne às
formalidades do ato, em conformidade com o art. 9º, caput, da LINDB. A alternativa C está

incorreta, pois a autoridade será competente para proceder ao inventário e à partilha dos
bens situados no Brasil, já que o ordenamento jurídico pátrio prevê a competência absoluta

em relação aos bens, na forma do art. 23, II, do CPC. A alternativa D está incorreta, pois se
refere à regra geral da sucessão internacional prevista no caput do art. 10 da LINDB, segundo

a qual o regime sucessório será o da lei do país do último domicílio do falecido. Deste modo,
não importa qual a nacionalidade do de cujos, nem a natureza ou situação dos bens.

Questão 9

Banca: FGV - Órgão: OAB - 2018 - Exame de Ordem Unificado – XXV


Paulo, brasileiro, celebra no Brasil um contrato de prestação de serviços de consultoria no

Brasil a uma empresa pertencente a François, francês residente em Paris, para a realização de
investimentos no mercado imobiliário brasileiro. O contrato possui uma cláusula indicando a

20
aplicação da lei francesa. Em ação proposta por Paulo no Brasil, surge uma questão
envolvendo a capacidade de François para assumir e cumprir as obrigações previstas no

contrato. Com relação a essa questão, a Justiça brasileira deverá aplicar:


A) a lei brasileira, porque o contrato foi celebrado no Brasil.

B) a lei francesa, porque François é residente da França.


C) a lei brasileira, país onde os serviços serão prestados.

D) a lei francesa, escolhida pelas partes mediante cláusula contratual expressa.

Comentário:

O art. 7º da LINDB estabelece que a lei do país em que domiciliada a pessoa determina

as regras sobre o começo e o fim da personalidade, o nome, a capacidade e os direitos de


família. Assim, a lei que deve ser observada no caso é a do domicílio de François, ou seja, a lei

francesa, estando correta a alternativa B e incorretas as demais, por exclusão.

Questão 10

Ano: 2006 Banca: ND Órgão: OAB-DF Prova: ND - 2006 - OAB-DF - Exame de Ordem - 1 -
Primeira Fase

Considerando hipotético conflito de normas no espaço, determina a lei brasileira que as


sociedades e as fundações obedeçam a lei:
A) do Estado onde tiverem sua sede;

B) do Estado da nacionalidade da maioria de seus acionistas;


C) do Estado que for indicado em seus atos constitutivos;

D) do Estado em que se constituírem.

Comentário:

Questão de letra de lei. De acordo com o art. 11 da LINDB, as organizações destinadas


a fins de interesse coletivo, como as sociedades e as fundações, obedecem à lei do Estado em
que se constituírem. Por isso, o gabarito é a letra D, excluindo-se as demais alternativas.

21
GABARITO

Questão 1 - Correta

Questão 2 - D

Questão 3 - D

Questão 4 - A

Questão 5 - C

Questão 6 - Errada

Questão 7 - C

Questão 8 - B

Questão 9 - B

Questão 10 - D

22
LEGISLAÇÃO COMPILADA

Nesta matéria, faz-se de extrema importância a leitura de:

Constituição Federal de 1988

 Art. 5º, XXXI


 Art. 105, I, “i”

Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (Lei nº 4.657/1942, com


redação dada pela Lei nº 12.376/2010)

 Art. 7º - art. 19º

23
JURISPRUDÊNCIA

Jurisprudência do STJ sobre pedido de homologação de sentença


arbitral
 STJ – SEC: 15977 EX 2016/0210574-9

DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO E PROCESSUAL CIVIL. ARBITRAGEM. COMPRA E


VENDA INTERNACIONAL. INADIMPLEMENTO. SENTENÇA ARBITRAL. ALEGAÇÕES DE
DESCONFORMIDADE DE PROCURAÇÃO E DE PODERES DOS DIRIGENTES PARA
OUTORGA. INSUBSISTENTES. DOCUMENTAÇÃO REGULAR. DEMAIS REQUISITOS LEGAIS
ATENDIDOS. HOMOLOGAÇÃO DEFERIDA. 1. Pedido de homologação de sentença
arbitral condenou a parte requerida por inadimplemento de pagamento em
transação de compra de produtos para produção agrícola; a parte requerida alega que
não poderia haver homologação, em razão da ausência de poderes dos gestores para
outorgar poderes de representação judicial aos advogados brasileiros, bem como da
inexistência de tradução juramentada da procuração. 2. Os documentos dos autos
informam que a parte requerente juntou a tradução juramentada da procuração (...). 3.
Foram atendidos os demais requisitos, previstos na Lei de Introdução às Normas do
Direito Brasileiro (LINDB), na Lei de Arbitragem (Lei n. 9.307/1995), no Código de
Processo Civil e no RISTJ. Pedido de homologação deferido. (STJ – SEC: 15977 EX
2016/0210574-9, Relator: Ministro HUMBERTO MARTINS, Data de Julgamento:
06/09/2017, CE – CORTE ESPECIAL, Data de Publicação: DJe 15/09/2017).

Jurisprudência do STJ sobre pedido de homologação de sentença


estrangeira sobre divórcio consensual
 STJ – SEC: 7804 EX 2014/0213753-6

24
DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO. PROCESSUAL CIVIL. HOMOLOGAÇÃO DE
SENTENÇA ESTRANGEIRA. DIVÓRCIO CONSENSUAL. PRELIMINAR DE NULIDADE.

CITAÇÃO. TENTATIVA POR MEIO DE CARTA ROGATÓRIA. CITAÇÃO POR EDITAL.


LICITUDE. PRECEDENTES. REQUISITOS ATENDIDOS. DEFERIMENTO. 1. Pedido de

homologação de sentença estrangeira de divórcio consensual. É trazida preliminar de


nulidade pela curadoria especial em relação à citação por edital, pois argumenta que
deveria ter havido mais comprovação de tentativas da parte requerente. 2. Está

devidamente comprovada, no caso, a tentativa infrutífera de citação por carta rogatória


(fls. 134-368), que deu ensejo à citação por edital. A jurisprudência do STJ tem se

firmado no sentido se (sic) rejeitar tal preliminar de nulidade se for evidenciada ativa
tentativa de localização da parte contrária, sendo lícita a citação por edital, prevista nos

art. 231 e 232 do Código de Processo Civil. Precedentes: SEX 9.386/EX, Rel. Ministro
Raul Araújo, Corte Especial, DJe 18.2.2015; SEC 2.845/EX, Rel. Ministro Gilson Dipp, Corte

Especial, DJe 26.6.2013. 3. Estando atendidos os requisitos da Resolução STJ n.


9/2005, bem como nos arts. 15 e 16 da LINDB (Decreto-Lei n. 4.657/1942), deve ser
deferida a homologação. Pedido de homologação deferido. (STJ – SEC: 7804 EX

2014/0213753-6, Relator: Ministro HUMBERTO MARTINS, Data de Julgamento:


06/05/2015, CE – CORTE ESPECIAL, Data de Publicação: DJe 25/05/2015).

25
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

AMARAL JÚNIOR, Alberto do. Introdução ao direito internacional público. São Paulo: Atlas,
2008.

CANÇADO, Trindade, Antônio Augusto. Princípios do direito internacional contemporâneo


– 2. ed. rev. atual. – Brasília: FUNAG, 2017.

CASELLA, Paulo Borba; Hildebrando Accioly e G. E. do Nascimento e Silva. Manual de


direito internacional público.— 20. ed. — São Paulo: Saraiva, 2012.

MAZZUOLI, Valerio de Oliveira. Curso de direito internacional público. 9. ed. rev., atual. e
ampl. -- São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2015.

PORTELA, Paulo Henrique Gonçalves. Direito Internacional Público e Privado. 9ª ed.


Salvador: Juspodivm, 2017.

REZEK, Francisco. Direito internacional público – Curso Elementar. 17ª ed. São Paulo:
Saraiva, 2018.

SOARES, Guido Fernando Silva. Curso de direito internacional público. São Paulo: Atlas,
2002.

26
CARREIRA JURÍDICA

Direito Internacional
Capítulo 9
CAPÍTULOS

Capítulo 1 – Introdução ao Direito Internacional Público

Capítulo 2 – Fontes do Direito Internacional Público

Capítulo 3 – Direito dos Tratados

Capítulo 4 – Sujeitos do Direito Internacional Público

Capítulo 5 – Nacionalidade e condição jurídica do estrangeiro

Capítulo 6 – Responsabilidade internacional e solução pacífica de controvérsias

Capítulo 7 – Domínio público internacional

Capítulo 8 – Introdução ao Direito Internacional Privado e aplicação da lei no espaço

Capítulo 9 – Direito Processual Internacional

Capítulo 10 – Outros ramos do Direito Internacional

1
SUMÁRIO

DIREITO INTERNACIONAL, Capítulo 9 ........................................................................................................... 3

1. Direito Processual Internacional ................................................................................................................. 3

1.1. Introdução........................................................................................................................................................ 3

2. Competência internacional do Brasil ........................................................................................................ 5

3. Cooperação jurídica internacional ............................................................................................................. 7

4. Cartas Rogatórias .............................................................................................................................................. 9

5. Homologação de sentença estrangeira ................................................................................................ 12

6. Litispendência internacional ....................................................................................................................... 15

7. Cláusula de eleição de foro estrangeiro ............................................................................................... 17

QUADRO SINÓTICO ............................................................................................................................................... 19

QUESTÕES COMENTADAS.................................................................................................................................. 21

GABARITO ................................................................................................................................................................... 31

LEGISLAÇÃO COMPILADA .................................................................................................................................. 32

JURISPRUDÊNCIA....................................................................................................................................................... 34

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS............................................................................................................................ 38

2
DIREITO INTERNACIONAL

Capítulo 9

1. Direito Processual Internacional

1.1. Introdução
O conjunto de preceitos que regulam a aplicação das normas de Direito Internacional
Privado é denominado Direito Processual Internacional, que se relacionará tanto com o

Direito Internacional Privado quanto com o Direito Processual Civil.

Assim, pode-se dizer que as normas de processo civil que se aplicam no âmbito do
Direito Internacional Privado são as da lex fori, apesar de que existe uma tendência de

uniformização dessas normas a nível internacional, geralmente através de tratados.

Como visto, o ordenamento jurídico interno é que indica qual a norma, seja ela nacional
ou estrangeira, que deve ser aplicada para solucionar um conflito de leis no espaço.

A seguir, veremos como funciona o processo de aplicação do Direito estrangeiro no

âmbito interno brasileiro.

 Verificação e prova
A verificação e a prova do Direito estrangeiro são regidas pela lex fori. Segundo o art.

14 da LINDB, o juiz brasileiro pode aplicar a lei estrangeira mesmo que de ofício, mas
caso não a conheça, ou seja, quando existir a necessidade de comprovar a norma

estrangeira em um processo, o juiz pode verificar seu conteúdo ou determinar que a


parte o faça. A prova do conteúdo da norma pode ocorrer por meio do direito

comparado, doutrina, publicações oficiais, cartas rogatórias, dentre outros.

3
O Brasil é signatário do Protocolo de Cooperação e Assistência Jurisdicional em
Matéria Civil, Comercial, Trabalhista e Administrativa (Protocolo de Las Leñas,

Decreto nº 2.067/1996), que regulamenta a verificação e a prova do Direito estrangeiro


entre os Estados que fazem parte do Mercosul.

 Interpretação e incidência
Verificada e provada a lei estrangeira, pode existir dúvidas acerca de sua interpretação e
de sua incidência sobre as relações jurídicas que tutela. Na forma do art. 376 do

Código de Processo Civil, “a parte que alegar direito municipal, estadual, estrangeiro
ou consuetudinário provar-lhe-á o teor e a vigência, se assim o juiz determinar”. Assim,

o juiz pode aplicar a norma estrangeira de ofício, podendo requerer também a


colaboração das partes. Porém, caso decidido que a norma estrangeira não pode ou

não deve ser aplicada, poder-se-á aplicar o Direito brasileiro. A interpretação da norma
estrangeira deve ser da forma mais completa, de acordo com os preceitos da doutrina e

jurisprudência estrangeiras, aplicando a norma em conformidade com o sentido que ela


tem no seu ordenamento pátrio.
 Exceções à aplicação

Existem situações em que a norma estrangeira não pode ser aplicada no âmbito
interno, mesmo que norma indicativa de Direito Internacional Privado determine sua
incidência. Em regra, o art. 17 da LINDB estabelece que o Direito estrangeiro não

poderá ser aplicado se ferir a ordem pública (violar princípios fundamentais da ordem
jurídica brasileira), a soberania nacional (autoridade suprema do Estado em seu território

e sua independência) ou os bons costumes (preceitos de ordem moral). Além disso,


podem impedir a aplicação de norma estrangeira: a fraude a lei (ação deliberada para

evitar aplicação de uma norma no caso concreto), a instituição desconhecida (quando a


matéria não é objeto de previsão na ordem jurídica interna, apesar de ser regulada no

Direito estrangeiro; essa situação pode ser resolvida pela adaptação do instituto por
outro semelhante, reconhecido no âmbito interno) e a lei imperfeita (aquela que prevê

tanto a aplicação do Direito interno quanto do Direito estrangeiro; EX: art. 10, § 1º, da
LINDB).

4
2. Competência internacional do Brasil

Assim como podem surgir dúvidas acerca de qual norma aplicar em um conflito de leis

no espaço, pode haver dúvidas também a respeito de qual autoridade é competente para
conhecer o litígio resultante de uma relação privada com conexão internacional, se um juiz

nacional ou estrangeiro.

Desse modo, a competência internacional está relacionada ao poder de um Estado em


examinar processos resultantes de conflitos que envolvam conexão internacional. Importante

ressaltar que, já que cada Estado fixa suas normas a respeito do Direito Internacional Privado,
a competência internacional é definida e se fundamenta no Direito interno. Ou seja, cada
Estado pode fixar os poderes de seus órgãos jurisdicionais quanto ao tema.

Os conflitos de competência podem ser:

a) Positivo: quando dois ou mais Estados estabeleceram que seus Poderes Judiciários são
internacionalmente competentes.
b) Negativo: quando nenhum Poder Judiciário for tido como competente.

Ademais, a competência internacional obedece a duas regras básicas: o princípio


segundo o qual, depois de determinada, a competência é firmada permanentemente

(perpetuatio fori) e a regra geral segundo a qual o réu submete-se à competência do Poder
Judiciário do Estado onde ele tem domicílio ou se encontre, independente da nacionalidade.

Ressalta-se também que existe a possibilidade de as partes em uma relação jurídica

privada com conexão internacional, com base no princípio da autonomia da vontade,


elegerem um foro competente para conhecer de eventuais litígios acerca dessa relação, desde
que permitido pela lex fori e de acordo com as condições por ela estabelecidas.

Desse modo, inicialmente, deve-se analisar qual o juiz competente para julgar o caso,
pois, na competência internacional, deve-se observar primeiramente o Direito processual
nacional. Tal competência está elencada nos artigos 21, 22 e 23 do Código de Processo

Civil; os dois primeiros dispõem sobre a competência concorrente (com foros estrangeiros), já

5
o último dispõe sobre a competência exclusiva (do foro brasileiro). Após analisar o caso e
verificar a competência do juiz brasileiro, deve-se avaliar qual a legislação a ser aplicada, ou

seja, se utilizará a lei brasileira ou a lei estrangeira. 1

A competência concorrente também está prevista no art. 12, caput, da LINDB, e a


exclusiva no art. 12, § 1º, da LINDB.

Para saber qual é a localização da sede jurídica, deve-se analisar o caso sob três

situações jurídicas:

a) Questão pessoal: a sede jurídica deverá ser o domicílio da pessoa.


b) Questão real: a sede jurídica deverá ser o local do objeto.
c) Questão formal: a sede jurídica deverá ser a que foi constituída a obrigação.2

Para facilitar o entendimento, um exemplo: o Brasil e a Argentina firmam um contrato


no México, mas o sócio argentino não é competente para realizar um acordo (cláusula formal);

neste caso, o juiz brasileiro é competente para julgar o caso, entretanto, como o acordo foi
firmado no México, utiliza-se o quesito formal (onde a obrigação foi constituída), logo, o juiz

brasileiro tomará a decisão baseada na lei mexicana.

1
Vide questão 10.
2
Vide questões 1 e 2.
6
3. Cooperação jurídica internacional

Eventualmente, pode existir a necessidade de que, no exercício da função jurisdicional,

alguns atos (por exemplo, atos de comunicação, oitiva de testemunhas, execução de


sentenças, coleta de provas, dentre outros) sejam praticados em outro Estado soberano.

Porém, o Estado não pode realizar esses atos fora de seu território sem configurar uma
violação à soberania estatal de outro Estado. Desse modo, surge a necessidade de um
instituto que possibilite uma colaboração entre os Estados soberanos para solucionar

processos judiciais.

Assim, a cooperação jurídica internacional pode ser entendida como um modo formal
de solicitar a outro Estado alguma medida judicial, investigativa ou administrativa, necessária

para um caso concreto em andamento. A priori, a possibilidade de cooperação jurídica


internacional aplica-se a todos os ramos do Direito interno, seja a regulamentação por leis ou

por tratados internacionais.

Percebe-se que a cooperação jurídica internacional é tema relevante para o Direito


Internacional, pois possibilita um apoio na solução de problemas internacionais, além de

ajudar a promover relações amistosas entre os Estados.

Além de tratados bilaterais sobre o tema, o Brasil é signatário de diversas Convenções


que visam regulamentar a cooperação jurídica internacional no âmbito de várias temáticas. A

título de exemplo, pode-se citar a Convenção Interamericana sobre Prova e Informação


acerca do Direito Estrangeiro, de 1979 (Convenção de Montevidéu, Decreto nº 1.925/1996),

que regulamenta a cooperação entre os Estados americanos, e a Convenção para Repressão


do Tráfico de Pessoas e do Lenocínio e seu Protocolo Final, de 1950 (Decreto nº

46.981/1959), dentre muitas outras.

Em regra, a cooperação jurídica internacional pode ocorrer de três maneiras: 3

3
Vide questão 4.
7
 Carta rogatória: são pedidos feitos pelo juiz de um Estado ao Poder Judiciário
de outro ente estatal, com o objetivo de buscar colaboração para prática de atos
processuais. Será mais estudada a seguir.
 Auxílio direto: cabível quando a medida não decorrer diretamente de decisão
de autoridade jurisdicional estrangeira a ser submetida a juízo de delibação no
Brasil. A solicitação de auxílio direto será encaminhada pelo órgão estrangeiro
interessado à autoridade central, cabendo ao Estado requerente assegurar a
autenticidade e a clareza do pedido. Compete ao juízo federal, do lugar em que
deva ser executada a medida, apreciar o pedido de auxílio direto passivo que
demande prestação de atividade jurisdicional.4
 Autoridade central: trata-se de um ponto unificado de contato para a
tramitação dos pedidos de cooperação jurídica internacional, com vistas à
efetividade e à celeridade desses pedidos. No Brasil, o Ministério da Justiça
exerce essa função para a maioria dos acordos internacionais em vigor.

4
Vide questão 3.
8
4. Cartas Rogatórias

Como visto, as cartas rogatórias são o principal instrumento de cooperação judiciária

internacional. Consistem em uma solicitação de auxílio, através do Poder Judiciário de um ente


estatal para outro, a fim de realizar neste um ato processual ou diligências acerca de um

processo em trâmite no primeiro Estado.

A carta rogatória é regulamentada pelos Direitos internos de cada Estado, existindo


tratados internacionais em vista a uniformizar seu tratamento. Seu encaminhamento

geralmente é feito por via diplomática, ou por algum outro modo especificado em eventual
tratado entre as partes.

No geral, o ente estatal não é obrigado a atender à rogatória, exceto se atendidos os

requisitos fixados em seu ordenamento jurídico ou em tratados do qual seja signatário tanto o
Estado rogante (que solicita a cooperação) quanto o Estado rogado (o que é solicitado).
Ademais, se o pedido da rogatória for atendido, seu conteúdo será subordinado à norma do

Estado rogante, mas sua forma de execução, à norma do Estado rogado.

O Brasil é signatário da Convenção Interamericana sobre Cartas Rogatórias, de 1975


(Decreto nº 1.899/1996), e seu Protocolo Adicional, de 1979 (Decreto nº 2.022/1996), acerca
da cooperação jurídica internacional às rogatórias em matéria civil e comercial. Abrangem
apenas os atos de mera tramitação, não se aplicando outros tipos de atos, como os

executórios.

No Brasil, a carta rogatória tem previsão em vários instrumentos: na Constituição


Federal, nos art. 105, I, “i”, e art. 109, X; no Código de Processo Civil, nos arts. 36, 237, II,

260 ao 263, 377; no Regimento Interno do Superior Tribunal de Justiça (STJ), no art. 21, XI;
na Resolução nº 9 do STJ, de 2005, que dispõe sobre a matéria, em caráter transitório, sobre

a competência do STJ quanto às cartas rogatórias. Para a doutrina brasileira, existem dois tipos
de rogatórias:

9
a) Rogatórias ativas
São aquelas expedidas por autoridade judiciária brasileira, recebidas por Estado
estrangeiro. Seus requisitos, no âmbito interno brasileiro, são aqueles previstos nos
supramencionados artigos do Código de Processo Civil. Seu subscritor deve ser
vinculado ao Poder Judiciário. Além disso, seu objeto deve ser lícito à luz da legislação
brasileira. A expedição de carta rogatória suspende o processo quando a sentença não
puder ser proferida senão depois de verificado certo fato ou de produzida certa prova,
e quando, tendo sido requeridos antes da decisão de saneamento, a prova neles
solicitada for imprescindível. O prazo processual começa a correr a partir da data da
juntada da carta devidamente cumprida aos autos (art. 231, VI, do CPC); a carta
rogatória não devolvida no prazo ou concedida sem efeito suspensivo poderão ser
juntadas aos autos a qualquer momento (art. 377, parágrafo único, do CPC). Ademais,
lembra-se que o cumprimento da carta rogatória em Estado estrangeiro obedecerá às
normas processuais deste.
b) Rogatórias passivas
São aquelas expedidas por autoridade judiciária estrangeira, recebidas pelo Brasil. Para
serem cumpridas no Brasil, a rogatória dependerá do exequatur concedido pelo
Presidente do STJ, ou por sua Corte Especial, no caso da impugnação às rogatórias
decisórias (art. 105, I, “i”, da Constituição Federal, e art. 12, § 2º, da LINDB),
pendente o cumprimento dos requisitos estabelecidos pela Resolução nº 9 do STJ e
também por eventuais tratados. O exame da rogatória pelo STJ é meramente de
delibação (avaliar as condições de sua execução), não tratando do mérito nem das
razões da carta, sob pena de violar a soberania do Estado rogante.
São requisitos para a rogatória ser concedida: ser autêntica, não ofender a soberania
nacional ou a ordem pública brasileiras, não ser referente a processo de competência
exclusiva da autoridade judiciária brasileira (poderá ser cumprida se a competência for
concorrente), não implicar em atos executórios ou que dependa da homologação da
sentença que os determina.5
O art. 7º, parágrafo único, da Resolução nº 9 do STJ, estabelece que os pedidos de
cooperação jurídica internacional que tiverem como objeto atos que não ensejam juízo
de delibação pelo STJ, mesmo que sob o nome de “carta rogatória”, podem ser

5
Vide questão 5.
10
encaminhados para o Ministério da Justiça, para que seja cumprido o ato por meio do
auxílio direto. Porém, esse não é o entendimento jurisprudencial, que aplica no sentido
da obrigatoriedade da execução de diligências estrangeiras pelo processo da rogatória.
A parte interessada pode ser citada para, no prazo de 15 dias, impugnar a rogatória. O
Ministério Público também terá vista dos autos, pelo prazo de 10 dias, podendo
impugna-la também. Havendo impugnação, o processo poderá ser distribuído para
julgamento pela Corte Especial do STJ. A execução das rogatórias após o exequatur é
competência do Juízo Federal de 1º grau. Cumprida a rogatória, ela será devolvida ao
Presidente do STJ no prazo de 10 dias após sua execução, sendo remetida, também em
10 dias, através do Ministério da Justiça ou do Ministério das Relações Exteriores, para o
Estado rogante.

11
5. Homologação de sentença estrangeira

Uma das prerrogativas dos Estados é decidir sobre os conflitos de interesses,

judicializados através de processos, pelas competências do Poder Judiciário no âmbito da


soberania estatal. No entanto, é possível que uma decisão judicial estrangeira gere efeitos em

outros Estados que não o seu, porém, sua eficácia está condicionada ao consentimento do
outro Estado, onde a sentença deverá ser executada, geralmente através do instituto da
homologação de sentença estrangeira.

Assim, a homologação de sentença estrangeira é o ato pelo qual uma decisão,


proferida em um ente estatal, possa ser executada no território de outro Estado, viabilizando e
estendendo sua eficácia jurídica em um território onde seu Estado não exerce soberania.

“Homologar a sentença estrangeira” pode ser traduzida por tornar tal sentença semelhante,
quanto aos seus efeitos, àquelas que são proferidas em âmbito nacional. Ou seja, uma vez

homologada, a sentença estrangeira produzirá os mesmos efeitos de uma sentença nacional.

A decisão judicial de outro Estado só poderá ser homologada se não violar as restrições
referentes à aplicação de normas estrangeiras, como já visto. Não obstante, a homologação

visa facilitar as relações internacionais, evitando a necessidade de ter que iniciar um outro
processo judicial para o mesmo direito ser reconhecido, mas em Estados diferentes.

Ademais, ressalta-se que a homologação não é automática, sendo necessário o

cumprimento dos requisitos determinados pelo ordenamento jurídico do Estado ao qual é


solicitado a homologação. No Brasil, é realizado mero juízo de delibação, não adentrando no

mérito da decisão a ser homologada, mas apenas examinando os pressupostos formais, salvo
nos casos de afronta à ordem pública, à soberania nacional e aos bons costumes.

No Brasil, a homologação de sentença estrangeira tem previsão em vários instrumentos:

na Constituição Federal, nos art. 105, I, “i”, e art. 109, X; no Código de Processo Civil, no
art. 960 ao art. 965; na LINDB, no art. 15 ao art. 17; na Resolução nº 9 do STJ, de 2005,
que dispõe sobre a matéria, em caráter transitório. Além disso, a matéria também pode ser

12
regulamentada através de tratados internacionais; além dos tratados bilaterais, também,
destacam-se, dentre outros: o Código de Bustamante (Decreto nº 18.871/1929), entre os

artigos 423 e 433, e o Protocolo de Cooperação e Assistência Jurisdicional em Matéria


Civil, Comercial, Trabalhista e Administrativa (Protocolo de Las Leñas, Decreto nº

2.067/1996), entre os artigos 18 e 24.

Na forma da Constituição Federal, o STJ é o órgão competente para homologar a


sentença estrangeira; já a execução da sentença estrangeira homologada é competência do

Juízo Federal de 1º grau, na forma estabelecida pelo Código de Processo Civil.

As decisões interlocutórias e os despachos de mero expediente não são homologáveis,


já que não têm natureza de sentença, mas sim de meros atos processuais. Para serem
cumpridos no Brasil, o instrumento correto é o da carta rogatória.

Não obstante, os atos que têm as mesmas características e os mesmos efeitos de uma
sentença judicial, ainda que não sejam tecnicamente sentenças, que não tenham essa
nomenclatura ou que não tenham sido proferidas por juízes, são passíveis de homologação.

Como principal exemplo, tem-se os laudos arbitrais estrangeiros.

Além de ser homologada pelo STJ, no geral, como requisitos para a homologação da
sentença estrangeira, ela deve ter sido proferida por juiz competente, respeitado o devido

processo legal (especialmente quanto à citação das partes), ter transitado em julgado e ser
passível de execução, estar traduzida por intérprete autorizado (tradutor oficial e juramentado)
e autenticada pela autoridade consular brasileira.6

6
Vide questão 7.
13
Ademais, ressalta-se que, além das sentenças estrangeiras que violam a soberania
nacional, a ordem pública e os bons costumes, também não serão homologadas as sentenças

relativas às hipóteses previstas no art. 23, do CPC, por ser de competência exclusiva do Brasil.

As regras para homologação da sentença estrangeira, como normas de natureza


processual, são estabelecidas pela lex fori. Assim, compete ao Presidente do STJ realizar a

homologação, a partir do requerimento da parte interessada; a outra parte tem 15 dias para
contestar o pedido de homologação, e o Ministério Público tem 10 dias de vista dos autos,

podendo impugnar a homologação.7 Caso haja contestação ou impugnação, haverá


julgamento pela Corte Especial. Uma vez homologada, a sentença será considerada título
executivo judicial (art. 515, VIII, do CPC). Com base no art. 102, III, da Constituição Federal,

é cabível recurso extraordinário ao STF da decisão do STJ.

Apesar da polêmica sobre o tema, importante ressaltar que o entendimento majoritário


é que não há necessidade de homologar as sentenças proferidas por tribunais internacionais,

pois decidem com base no Direito Internacional e não estão sob a soberania de nenhum
Estado.

7
Vide questão 9.
14
6. Litispendência internacional

A litispendência ocorre quando há, pelo menos, dois processos iguais (mesmas partes,

mesmo pedido e mesma causa de pedir) tramitando perante juízos distintos. Na


litispendência internacional, esses juízos distintos estão em órgãos jurisdicionais de Estados
diferentes.

Em regra, a litispendência interna pressupõe a extinção, sem julgamento de mérito, dos


processos idênticos, de modo que apenas um seja conhecido pela justiça, podendo ser
reconhecida a qualquer tempo e em qualquer grau de jurisdição.8

Os ordenamentos jurídicos internos dos Estados (lex fori) disciplinam as regras relativas
à litispendência internacional. Porém, o ordenamento jurídico brasileiro prevê que apenas a
litispendência no âmbito interno é que pressupõe a extinção do processo sem o exame de

mérito. Nesse sentido, dispõe o art. 24 do Código de Processo Civil:

Art. 24. A ação proposta perante tribunal estrangeiro não induz litispendência e não
obsta a que a autoridade judiciária brasileira conheça da mesma causa e das que lhe são
conexas, ressalvadas as disposições em contrário de tratados internacionais e acordos
bilaterais em vigor no Brasil.

Parágrafo único. A pendência de causa perante a jurisdição brasileira não impede a


homologação de sentença judicial estrangeira quando exigida para produzir efeitos no
Brasil.

Assim, o mesmo processo pode ser objeto de exame pelo Judiciário brasileiro e

também por Poder Judiciário estrangeiro, podendo a sentença estrangeira, inclusive, vir a
produzir efeitos no âmbito interno brasileiro, não havendo a extinção do processo.9

8
Vide questão 8.
9
Vide questão 6.
15
Se for o caso de competência exclusiva da autoridade brasileira, não haverá

reconhecimento pelo Brasil de um processo igual que esteja tramitando no estrangeiro. Só

haverá reconhecimento quando a competência for concorrente.

Há discussão na doutrina e na jurisprudência a respeito da execução das decisões


decorrentes de processos litispendentes. Uma corrente acredita que a decisão que deve

prevalecer é a que transite em julgado primeiro: se a decisão estrangeira for homologada pelo
Superior Tribunal de Justiça (STJ) antes de transitada em julgada a decisão brasileira, aquela

valerá, sendo o processo brasileiro extinto. No entanto, outra corrente acredita que a
sentença estrangeira não pode se sobrepor à nacional quando aquela puder modificar esta,

sob pena de ofensa à soberania nacional.

Contudo, independente da corrente, tem-se que a sentença estrangeira não


homologada pelo STJ não repercute sobre o processo em trâmite interno brasileiro. Nesse

sentido, se a sentença brasileira transitar em julgado, a sentença estrangeira não poderá ser
homologada, e eventual processo de homologação deverá ser extinto sem julgamento de
mérito.

16
7. Cláusula de eleição de foro estrangeiro

A cláusula de eleição de foro estrangeiro é a norma de negócio jurídico responsável

por determinar qual o foro competente para conhecer eventuais causas relativas ao
compromisso fixado no exterior.

Essa cláusula pode ser expressa (quando se faz presente em tratados internacionais) ou

tácita (ocorre quando o réu não arguiu, na forma da lei, a exceção declinatória de foro em
processo que já tenha iniciado). No entanto, importante ressaltar que a cláusula, em qualquer

um dos casos, deve resultar de alguma expressão inequívoca da vontade das partes, por
menor que seja, tendo resultado de um consentimento consciente e específico.

A cláusula de eleição de foro estrangeiro é permitida no âmbito do Direito Internacional

na forma do Protocolo de Buenos Aires sobre Jurisdição Internacional em Matéria


Contratual, de 1994 (Decreto nº 2.095/1996).

Em razão da alta frequência do uso da cláusula de eleição de foro estrangeiro, o art. 25

do Código de Processo Civil de 2015 previu que:

Art. 25. Não compete à autoridade judiciária brasileira o processamento e o julgamento


da ação quando houver cláusula de eleição de foro exclusivo estrangeiro em contrato
internacional, arguida pelo réu na contestação.

§ 1º Não se aplica o disposto no caput às hipóteses de competência internacional


exclusiva previstas neste Capítulo.

§ 2º Aplica-se à hipótese do caput o art. 63, §§ 1º a 4º.

Há também a previsão de que:

Art. 63. As partes podem modificar a competência em razão do valor e do território,


elegendo foro onde será proposta ação oriunda de direitos e obrigações.

§ 1º A eleição de foro só produz efeito quando constar de instrumento escrito e aludir


expressamente a determinado negócio jurídico.

§ 2º O foro contratual obriga os herdeiros e sucessores das partes.

17
§ 3º Antes da citação, a cláusula de eleição de foro, se abusiva, pode ser reputada
ineficaz de ofício pelo juiz, que determinará a remessa dos autos ao juízo do foro de
domicílio do réu.

§ 4º Citado, incumbe ao réu alegar a abusividade da cláusula de eleição de foro na


contestação, sob pena de preclusão.

Assim, se a cláusula de eleição de foro estrangeiro for válida, o réu domiciliado no Brasil

terá que se submeter à jurisdição estrangeira. Além disso, a eventual sentença condenatória
pode ser homologada para gerar efeitos no âmbito interno do Brasil.

Importante ressaltar que, na forma do art. 62 do Código de Processo Civil, a


competência determinada em razão da matéria, da pessoa ou da função é inderrogável por
convenção das partes. Porém, como visto, o art. 63 permite a modificação da competência em

razão do valor e do território, quando constar de instrumento escrito e específico.

18
QUADRO SINÓTICO

INSTITUTOS DO DIREITO PROCESSUAL INTERNACIONAL


COMPETÊNCIA Poder de um Estado em examinar processos resultantes de
INTERNACIONAL conflitos que envolvam relações privadas com conexão
internacional
COOPERAÇÃO JURÍDICA Modo formal de solicitar a outro Estado alguma medida
INTERNACIONAL judicial, investigativa ou administrativa, necessária para um
processo em andamento
CARTAS ROGATÓRIAS Principal instrumento de cooperação judiciária internacional;
solicitação de auxílio, através do Judiciário de um ente estatal
para outro, para realizar neste ato processual ou diligências
acerca de um processo em trâmite no primeiro Estado
HOMOLOGAÇÃO DE Ato pelo qual uma decisão, proferida em um ente estatal,
SENTENÇA ESTRANGEIRA pode ser executada no território de outro Estado, viabilizando
e estendendo sua eficácia jurídica em um território onde seu
Estado não exerce soberania
LITISPENDÊNCIA A litispendência internacional ocorre quando há dois
INTERNACIONAL processos iguais (mesmas partes, mesmo pedido e mesma
causa de pedir) tramitando perante juízos em Estados
distintos
CLÁUSULA DE ELEIÇÃO DE Norma de negócio jurídico responsável por determinar qual o
FORO ESTRANGEIRO foro competente para conhecer eventuais causas relativas ao
compromisso fixado no exterior

19
CARTAS ROGATÓRIAS
ATIVAS PASSIVAS
Devem obedecer ao disposto em tratados; Requerem exequatur do STJ
na falta deles, devem ser enviados por via
diplomática ou pelas autoridades centrais
Só podem emanar de órgãos do Poder Juízo de delibação: não há exame de mérito
Judiciário
Seu objeto deve ser lícito à luz da legislação Devem ser autênticas, sem violar a soberania e
brasileira a ordem públicas, não sendo cumpridas se
implicarem em atos executórios
Seu cumprimento no Estado estrangeiro Seu cumprimento no Brasil obedecerá à
obedecerá à norma processual deste norma processual deste

20
QUESTÕES COMENTADAS

Questão 1

TRF 3ª Região – Juiz - 2006


Em ação promovida por Estado estrangeiro contra pessoa domiciliada no Brasil para cobrança

de dívidas fiscais deve o juiz brasileiro:


A) conhecer da ação e mandar processa-Ia;

B) indeferir a inicial por falta de competência absoluta da Justiça brasileira;


C) julgar-se incompetente e enviar a ação ao Tribunal Superior;
D) enviar o pedido do Estado estrangeiro ao MRE.

Comentário:

De acordo com o art. 21, inciso II, do Código de Processo Civil, compete à autoridade
judiciária brasileira processar e julgar as ações em que no Brasil tiver de ser cumprida a

obrigação. Por isso, o juiz brasileiro deve indeferir a inicial por falta de competência da Justiça
brasileira, pois ela não tem competência no caso de dívida fiscal com Estado estrangeiro.

Ademais, ressalta-se que tribunal superior também não possui competência, e o Ministério das
Relações Exteriores não é órgão jurisdicional. Gabarito: letra B.

Questão 2

Ano: 2013 Banca: FGV Órgão: OAB Prova: FGV - 2013 - OAB - Exame de Ordem Unificado

- XII - Primeira Fase


A sociedade empresária Airplane Ltda., fabricante de aeronaves, sediada na China, celebrou

contrato internacional de compra e venda com a sociedade empresária Voe Rápido Ltda, com
sede na Argentina. O contrato foi celebrado no Japão, em razão de uma feira promocional

21
que ali se realizava. Conforme estipulado no contrato, as aeronaves deveriam ser entregues
pela Airplane Ltda., na cidade do Rio de Janeiro, no dia 1º de abril de 2011, onde a sociedade

Voe Rápido Ltda. possui uma filial e realiza a atividade empresarial de transporte de
passageiros.

Diante da situação exposta, à luz das regras de Direito Internacional Privado veiculadas na Lei
de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (LINDB) e no estatuto processual civil brasileiro
(Código de Processo Civil – CPC), assinale a afirmativa INCORRETA.

A) Não sendo as aeronaves entregues no prazo avençado, o Poder Judiciário brasileiro é


competente para julgar eventual demanda em que a credora postule o cumprimento do

contrato.
B) No tocante à regência das obrigações, aplica-se, no caso vertente, a legislação japonesa.

C) O Poder Judiciário Brasileiro não é competente para julgar eventual ação por
inadimplemento contratual, pois o contrato não foi constituído no Brasil.

D) O juiz, não conhecendo a lei estrangeira, poderá exigir de quem a invoca prova do texto e

da vigência.

Comentário:

O gabarito é a letra C, que está incorreta. De acordo tanto com o art. 21, inciso II, do
CPC, e o art. 12 da LINDB, compete à autoridade judiciária brasileira processar e julgar as

ações em que no Brasil tiver de ser cumprida a obrigação. Portanto, apesar de o contrato ter
sido celebrado no Japão, sua execução (ou seja, a obrigação) deveria ter sido cumprida no

Brasil, na cidade do Rio de Janeiro. A letra A está correta, pois a autoridade brasileira é
competente nesta ação. A letra B está correta, na forma do art. 9º da LINDB. A letra D está

correta, conforme o art. 14 da LINDB.

22
Questão 3

Ano: 2019 Banca: VUNESP Órgão: TJ-AC Prova: VUNESP - 2019 - TJ-AC - Juiz de Direito

Substituto

A cooperação jurídica internacional pode ser entendida como um modo formal de solicitar a
outro país alguma medida judicial, investigativa ou administrativa, necessária para um caso

concreto em andamento. Uma das inovações trazidas pelo Código de Processo Civil de 2015
foi regular a cooperação internacional em seu texto, nos seguinte termos:

A) a carta rogatória oriunda de autoridade brasileira competente, a fim de viabilizar o seu


cumprimento, via de regra, será encaminhada ao Ministério das Relações Exteriores,
acompanhada de tradução para a língua oficial do Estado requerido.

B) compete ao juízo federal do lugar em que deva ser executada a medida apreciar pedido de
auxílio direto passivo que demande prestação de atividade jurisdicional.

C) realizar-se-á, como regra, com base em reciprocidade, manifestada por via diplomática.

D) é incabível o auxílio direto quando a medida não decorrer diretamente de decisão de

autoridade jurisdicional estrangeira a ser submetida a juízo de delibação no Brasil.

Comentário:

A alternativa A está incorreta, pois o art. 37 do CPC estabelece que o pedido de


cooperação jurídica internacional será encaminhado à autoridade central para posterior envio
ao Estado requerido para lhe dar andamento, e, segundo o art. 26, § 4º, do CPC, as funções
de autoridade central, na ausência de designação específica, serão exercidas pelo Ministério da

Justiça. A alternativa B está correta, pois em consonância com o art. 34 do CPC. A alternativa C
está incorreta, pois a regra é que a cooperação jurídica internacional será regida por tratado

de que o Brasil faz parte (art. 26 do CPC), sendo a reciprocidade a exceção (§ 1º). A alternativa

D está correta, pois, de acordo com o art. 28 do CPC.

23
Questão 4

Ano: 2019 Banca: FGV Órgão: OAB Prova: FGV - 2019 - OAB - Exame de Ordem Unificado

- XXVIII - Primeira Fase


Uma das funções da cooperação jurídica internacional diz respeito à obtenção de provas em

outra jurisdição, nos termos das disposições dos tratados em vigor e das normas processuais
brasileiras.

Para instruir processo a ser iniciado ou já em curso, no Brasil ou no exterior, não é admitida,
no entanto, a solicitação de colheita de provas:

A) por carta rogatória ativa.


B) por carta rogatória passiva.

C) a representantes diplomáticos ou agentes consulares.


D) pela via do auxílio direto.

Comentário:

A alternativa incorreta, ou seja, o gabarito, é a letra C. As alternativas A e B estão


corretas, pois a carta rogatória, pedido feito pelo juiz de um Estado para o Judiciário de outro

Estado, solicitando a colaboração deste para a prática de algum ato processual, que pode ser
ativa (o juízo do Brasil para o juízo estrangeiro) ou passiva (o estrangeiro pede para o

brasileiro) são instrumentos adequados para a colheita de provas (art. 36, CPC). A alternativa D
também está correta, pois o auxílio direto é cabível quando a medida não decorrer
diretamente de decisão de autoridade jurisdicional estrangeira a ser submetida a juízo de

delibação no Brasil (art. 28, CPC).

Questão 5

OAB – RJ – 30º Exame de Ordem

O Superior Tribunal de Justiça não dará o exequatur à carta rogatória que:


a) Sendo citatória, for dirigida a um brasileiro que figure como réu em uma ação de outro

país;
b) Seja oriunda de país que não tenha tratado para cumprimento de rogatória com o nosso

país;

24
c) Que ofenda a soberania nacional ou a ordem pública;

d) Não esteja ratificado pelo Presidente da República.

Comentário:

A alternativa A está incorreta, pois o STJ determina o cumprimento, através do

exequatur, de cartas rogatórias passivas, não ativas. A alternativa B está incorreta, pois não
necessariamente a concessão de exequatur dependerá de tratados, podendo ser concedida
pela mera promessa de reciprocidade. A alternativa C está correta, pois em conformidade com

o art. 17 da LINDB e art. 6º da Resolução nº 9 do STJ. A alternativa D está incorreta, pois a


rogatória é ato de cooperação jurídica internacional, ou seja, entre Poderes Judiciários, não

havendo a necessidade de ratificação do Presidente da República.

Questão 6

Ano: 2017 Banca: TRF - 2ª Região Órgão: TRF - 2ª REGIÃO Prova: TRF - 2ª Região - 2017 -

TRF - 2ª REGIÃO - Juiz Federal Substituto


Na hipótese de idêntica ação ser proposta no Brasil e no exterior, e inexistindo Tratado com o

país estrangeiro, marque a opção correta:


A) A litispendência internacional não pode ser conhecida de ofício e deve ser arguida. Arguida,

ela impede que o juiz brasileiro dê curso à ação intentada no Brasil se a questão já tiver sido
submetida a juiz estrangeiro.
B) A litispendência internacional pode ser conhecida de ofício e impede que o juiz brasileiro

dê curso à ação intentada no Brasil se a questão já está submetida a juiz estrangeiro.


C) Em tema afeto à soberania, os Estados estrangeiros estão impedidos de conhecer
demandas que versem sobre causas situadas no território de outras soberanias, sob pena de
responsabilização internacional.

D) Se uma sentença brasileira decidir determinada questão que também tenha sido decidida
por sentença estrangeira, será sempre a sentença brasileira a que produzirá efeitos no Brasil.

E) A ação intentada no estrangeiro não impede que a mesma questão seja submetida a juiz

brasileiro, nem produz litispendência.

25
Comentário:

As alternativas A e B estão incorretas, pois, de acordo com o art. 24, do CPC, a ação
proposta perante tribunal estrangeiro não induz litispendência e não obsta a que a autoridade

judiciária brasileira conheça da mesma causa e das que lhe são conexas, ressalvadas as
disposições em contrário de tratados internacionais e acordos bilaterais em vigor no Brasil.

Desse modo, a alternativa E está correta. A alternativa C está incorreta, pois existem exceções,
já que a soberania de um Estado não é absoluta, podendo haver casos em que um Estado

estrangeiro conheça demandas situadas no território brasileiro e vice-versa. A alternativa D


está incorreta, pois, segundo o parágrafo único do art. 24, do CPC, a pendência de causa
perante a jurisdição brasileira não impede a homologação de sentença judicial estrangeira

quando exigida para produzir efeitos no Brasil.

Questão 7

Ano: 2015 Banca: CESGRANRIO Órgão: Petrobras Prova: CESGRANRIO - 2015 - Petrobras -

Advogado Júnior
A homologação de uma sentença estrangeira no Brasil tem, como requisito indispensável,

A) haver sido proferida por autoridade competente.


B) estar autenticada pelo Ministro da Justiça brasileiro.

C) estar acompanhada de tradução, podendo ser juramentada ou não.


D) ser decisão proferida por órgão colegiado ou tribunal.

E) terem sido as partes citadas adequadamente, não se admitindo a figura da revelia.

Comentário:

Os requisitos para a homologação da sentença estrangeira estão previstos no art. 15 da

LINDB e no art. 5º da Resolução nº 9 do STJ. Dentre eles, está que a sentença deve ter sido
proferida por autoridade competente, portanto, o gabarito é a letra A. Assim, as demais

alternativas estão erradas, por exclusão.

26
Questão 8

Ano: 2010 Banca: TRF - 4ª REGIÃO Órgão: TRF - 4ª REGIÃO Prova: TRF - 4ª REGIÃO - 2010

- TRF - 4ª REGIÃO - Juiz Federal


Dadas as assertivas abaixo, assinale a alternativa correta.

I. A delibação é um sistema jurídico de homologação de sentença estrangeira que tem


fundamento na cortesia internacional pela qual a sentença estrangeira é reapreciada e

examinada quanto ao mérito e à sua forma.


II. O procedimento a ser seguido para a homologação de sentença estrangeira é, segundo a

norma do Código de Processo Civil, o do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal.


III. Segundo o entendimento majoritário do tribunal competente para a homologação de

sentença estrangeira, contra essa é passível de arguição como defesa apenas a questão
relativa à observância dos requisitos para a homologação, sendo vedado à arguição versar
sobre outras questões.

IV. Havendo tramitação de duas ações idênticas paralelamente (competência concorrente) na


jurisdição estrangeira e jurisdição nacional e ocorrendo o trânsito em julgado da sentença

estrangeira e sua homologação no Brasil, deverá ser extinto o processo no Brasil pela
ocorrência de coisa julgada estrangeira.

V. Poderá ser homologada pelo tribunal competente do Brasil a sentença estrangeira já


transitada em julgado relativa a sucessão mortis causa que dispõe sobre bem imóvel situado

no Brasil.
A) Está correta apenas a assertiva III.
B) Está correta apenas a assertiva IV.

C) Estão corretas apenas as assertivas I e II.


D) Estão corretas apenas as assertivas I e IV.

E) Estão corretas apenas as assertivas II e III.

Comentário:

A assertiva I está incorreta, pois a delibação consiste no exame, apenas, de certos


pressupostos formais, não adentrando no mérito da decisão a ser homologada. A assertiva II
está incorreta, pois o regramento se faz presente: na Constituição Federal, na LINDB, no CPD e

27
na Resolução nº 09 do STJ. A assertiva III está incorreta, pois a parte interessada poderá versar
sobre a autenticidade dos documentos, a inteligência da decisão, bem como a eventual

observância dos requisitos estabelecidos pela Resolução nº 09 do STJ. A assertiva IV está


correta, pois A assertiva V está incorreta, pois apesar de a sentença estrangeira não induzir

litispendência, quando esta é homologada, passa a ter eficácia no Brasil. não é passível de
homologação, já que é competência exclusiva da autoridade judiciária brasileira conhecer de

ações relativas a imóveis situados no Brasil. Portanto, gabarito B.

Questão 9

Ano: 2015 Banca: NC-UFPR Órgão: ITAIPU BINACIONAL Prova: NC-UFPR - 2015 - ITAIPU
BINACIONAL – Direito (ADAPTADA)
A respeito da cooperação jurídica internacional, assinale a alternativa correta.
A) Segundo o entendimento do Superior Tribunal de Justiça, incabível a concessão de cartas

rogatórias com conteúdo decisório.


B) De acordo com o regimento interno do Superior Tribunal de Justiça, inadmite-se a

homologação parcial de sentença estrangeira.


C) O Ministério Público Federal terá vista do processo de homologação de sentença

estrangeira, podendo impugná-lo se assim o entender.


D) A cooperação jurídica, mediante auxílio direto, depende de juízo de deliberação via
Superior Tribunal de Justiça.

Comentário:

A alternativa A está incorreta, pois o art. 7º da Resolução nº 9 do STJ estabelece que as


cartas rogatórias podem ter por objeto atos decisórios ou não decisórios. A alternativa B está
incorreta, pois o art. 4º, § 2º, admite homologação parcial de sentença estrangeira. A

alternativa C está correta, pois, de acordo com o art. 10, o Ministério Público terá vista dos
autos nas cartas rogatórias e homologações de sentenças estrangeiras, pelo prazo de dez dias,

podendo impugná-las. A alternativa D está incorreta, pois, de acordo com o parágrafo único

do art. 7º, nesse caso, não há necessidade.

28
Questão 10

Ano: 2011 Banca: CESPE Órgão: TRF - 1ª REGIÃO Prova: CESPE - 2011 - TRF - 1ª REGIÃO -

Juiz Federal
Considerando a legislação brasileira relativa à competência jurisdicional nas relações jurídicas

com elemento estrangeiro, as cartas rogatórias e a homologação de sentenças estrangeiras,


assinale a opção correta.

A) Tanto a autoridade judiciária brasileira quanto a autoridade do país de origem do autor da


herança, se este for estrangeiro, têm competência para proceder a inventário e partilha de

bens situados no Brasil.


B) A homologação de sentença estrangeira no Brasil, cuja natureza é jurisdicional, pode ser

concedida a sentença de qualquer natureza, com exceção das que sejam meramente
declaratórias do estado das pessoas.
C) A carta rogatória obedecerá, quanto à admissibilidade e ao modo de cumprimento, ao

disposto na legislação brasileira, devendo necessariamente ser remetida aos juízes ou tribunais
estrangeiros por contato direto entre as autoridades judiciárias dos Estados envolvidos.

D) Não conhecendo a lei estrangeira, o juiz brasileiro não pode exigir da parte que a invoque
o fornecimento de prova do seu texto e vigência, mas, sim, solicitar às autoridades de outro

Estado os elementos de prova ou informação sobre o texto, sentido e alcance legal de seu
direito.

E) A competência jurisdicional brasileira é territorial-relativa e incide sobre o estrangeiro


domiciliado no país, sendo competente também o juiz brasileiro quando a obrigação tiver de
ser cumprida no Brasil e quando a ação se originar de fato ocorrido ou de ato praticado no

território nacional.

Comentário:

A alternativa A está incorreta, pois é competência exclusiva da autoridade judiciária


brasileira, na forma do art. 23, II, do CPC. A alternativa B está incorreta, pois a previsão de que

não dependem de homologação as sentenças meramente declaratórias do estado das


pessoas, no parágrafo único do art. 15 da LINDB, foi revogado pela Lei nº 12.036, de 2009. A
alternativa C está incorreta, pois o contato não é direto, mas sim através do Ministério da

29
Justiça ou do Ministério das Relações Exteriores, para o Estado rogante. A alternativa D está
incorreta, pois, de acordo com o art. 14 da LINDB, não conhecendo a lei estrangeira, poderá o

juiz exigir de quem a invoca prova do texto e da vigência. A alternativa E está correta, em
conformidade com o art. 21, II, do CPC.

30
GABARITO

Questão 1 - B

Questão 2 - C

Questão 3 - B

Questão 4 - C

Questão 5 - C

Questão 6 - E

Questão 7 - A

Questão 8 - B

Questão 9 - C

Questão 10 - E

31
LEGISLAÇÃO COMPILADA

Nesta matéria, faz-se de extrema importância a leitura de:

Constituição Federal de 1988

 Art. 102, III


 Art. art. 105, I, “i”
 Art. 109, X

Código de Processo Civil (Lei nº 13.105/2015)

 Art. 23
 Art. 26 – art. 41
 Art. 63
 Art. 237, II
 Art. 260 – art. 263
 Art. 376
 Art. 377
 Art. 515, VIII
 Art. 960 – art. 965

Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (Lei nº 4.657/1942, com

redação dada pela Lei nº 12.376/2010)

 Art. 12
 Art. 14 – art. 17

32
Súmulas do Supremo Tribunal Federal (STF)
 Súmula 259: Para produzir efeito em juízo não é necessária a inscrição, no
Registro Público, de documentos de procedência estrangeira, autenticados por via
consular.

Regimento Interno do Superior Tribunal de Justiça (STJ)


 Art. 21, XI

Resolução nº 9 do Superior Tribunal de Justiça (STJ)


 Art. 1º - art. 15

33
JURISPRUDÊNCIA

Jurisprudência do STJ sobre cooperação internacional


 STJ: AgInt no HC: 369350/SP

AGRAVO INTERNO NO HABEAS CORPUS. PRISÃO CIVIL. DECRETAÇÃO. DEVEDOR


RESIDENTE NO EXTERIOR. POSSIBILIDADE. JUSTIÇA COMUM ESTADUAL. COMPETÊNCIA.

COOPERAÇÃO JURÍDICA INTERNACIONAL. 1. Compete à Justiça Comum estadual


processar e julgar ação de alimentos contra devedor domiciliado no exterior. 2. A
situação do paciente submetido à jurisdição nacional se subsume inclui-se na regra

ordinária, segundo a qual as ações de alimentos e as respectivas execuções devem ser


processadas e cumpridas no foro do domicílio do alimentando. 3. O habeas corpus não

é admitido como sucedâneo ou substitutivo do recurso ordinário. 4. Agravo interno não


provido (STJ - AgInt: 369350 SP 2016/0228691-8, Relator: Ministro RICARDO VILLAS

BÔAS CUEVA, Data de Julgamento: 14/02/2017, T3 – TERCEIRA TURMA, Data de


Publicação: DJe 20/02/2017).

 STJ: AgInt no AgRg no HC: 449017/PR (parte da ementa):

PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL DA DECISÃO QUE NÃO CONHECEU DO


HABEAS CORPUS. EVASÃO DE DIVISAS. COOPERAÇÃO JURÍDICA INTERNACIONAL.

NULIDADES. PROCEDIMENTO. AUSÊNCIA. CONSTRANGIMENTO ILEGAL. NÃO


CONSTATADO. QUESTÃO DE FATO NÃO APRECIADA NO ACÓRDÃO DE ORIGEM.

SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. I – O agravo


regimental deve trazer novos argumentos capazes de alterar o entendimento
anteriormente firmado, sob pena de ser mantida a r. decisão vergastada tal qual
lançada. II – A transferência de investigação criminal inicialmente aberta na Suíça para o

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Brasil, com concordância das autoridades respectivas de ambos os Países, sem ressalvas,
encontra respaldo em convenções internacionais de cooperação jurídica das quais o

Brasil é signatário, pois há previsão de ampla cooperação entre os países. III – Não
obstante as alegações de nulidade deduzidas do presente writ, verifica-se que o e.

Tribunal Regional Federal da 4ª Região entendeu pela inexistência de ilegalidade na


transferência/remessa das investigações da Suíça para o Brasil, seja porque não há
vedação (havendo, ao contrário, previsão de ampla cooperação), seja porque a Suíça

não faz restrições quanto ao uso das provas constantes de tal investigação, quando da
referida remessa. IV – Nos limites afetos ao âmbito de cognição do writ, afigura-se

legítima a providência da autoridade brasileira de, com base em material probatório


obtido da Confederação Suíça, por sistema de cooperação jurídica internacional,

investigar e processar o paciente pelo delito de evasão de divisas, já que se trata de


fato delituoso diretamente vinculado à persecução penal objeto da cooperação, que

teve como foto central delitos de corrupção e lavagem de capitais, valendo registrar
que não se impôs qualquer limitação ao alcance das informações e aos meios de prova
compartilhados. (...). Agravo Regimental desprovido. (STJ – AgInt no AgRg no HC:

449017 PR 2018/0107139-8, Relator: Ministro FELIX FISCHER, Data de Julgamento:


18/10/2018, T5 – QUINTA TURMA, Data de Publicação: DJe 23/10/2018).

Jurisprudência do STJ sobre carta rogatória e exequatur


 STJ: AgInt na CR: 11165

COMPETÊNCIA DA PRESIDÊNCIA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA PARA


MANIFESTAÇÃO QUANTO À PRESCINDIBILIDADE OU NÃO DO EXEQUATUR EM

PEDIDOS DE COOPERAÇÃO JURÍDICA INTERNACIONAL. ATRIBUIÇÃO EXCLUSIVA DESTA


CORTE SUPERIOR DE JUSTIÇA PELA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. CARTA ROGATÓRIA

E AUXÍLIO DIRETO. DEFINIÇÃO. CASO CONCRETO. INEXISTÊNCIA DE DECISÃO JUDICIAL


ESTADUNIDENSE PARA A CONCESSÃO DO EXEQUATUR. PEDIDO ESTRANGEIRO
BASEADO EM ACORDO DE ASSISTÊNCIA EM MATÉRIA PENAL CELEBRADO ENTRE
BRASIL E OS ESTADOS UNIDOS DA AMÉRICA. EFICÁCIA. AGRAVO DESPROVIDO. 1.

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Compete ao Superior Tribunal de Justiça, exclusivamente, como antes competia ao
Supremo Tribunal Federal, a análise dos requisitos para a concessão de exequatur às

cartas rogatórias, nos termos do art. 105 da Constituição da República e do art. 216-O
do Regimento Interno do Superior Tribunal de Justiça. 2. A carta rogatória e o auxílio

direto convivem no ordenamento jurídico como sistemas de cooperação internacional


em matéria penal, entretanto são institutos com ritos e procedimentos diversos,
mormente em razão das normas aplicáveis e da origem da decisão que ensejou o

pedido estrangeiro. 3. O pedido de assistência direta dos Estados Unidos da América


(mutual legal assistance) firmou-se no Acordo de Assistência Judiciária em Matéria

Penal, celebrado entre Brasil e Estados Unidos, devidamente integrado ao nosso


ordenamento jurídico. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal e do Superior

Tribunal de Justiça é no sentido de que os tratados e convenções internacionais de


caráter normativo incorporados ao sistema jurídico brasileiro têm eficácia de lei

ordinária e força normativa. 4. Na carta rogatória passiva, existe decisão judicial oriunda
de juízos ou tribunais estrangeiros que, para serem executados em território nacional,
precisam do juízo de delibação do Superior Tribunal de Justiça, sem, contudo, adentrar-

se no mérito da decisão proveniente do país alienígena. No auxílio direto, há um


pedido de assistência do Estado estrangeiro diretamente ao Estado rogado, no exercício

de atividade investigatória, para que este preste as informações solicitadas ou, havendo
necessidade legal, submeta o pedido à Justiça Federal competente para julgar a

providência requerida (medidas acautelatórias), conforme o caso concreto. A assistência


direta decorre de acordo ou tratado internacional de cooperação em que o Brasil é,

necessariamente, signatário. 5. No caso em apreço, não há decisão judicial norte-


americana a ser submetida ao juízo delibatório do Superior Tribunal de Justiça. O que

se tem é pedido de assistência direta formulado por autoridade estrangeira no exercício


de atividade investigatória, dirigido à autoridade congênere no Brasil, qual seja, o
Ministério Público Federal, que, no intuito de cooperação internacional, submeteu o

pedido estrangeiro ao crivo da Justiça Federal do Estado do Rio de Janeiro. 6.


Prescindibilidade da concessão do exequatur, uma vez que o pedido estrangeiro não se
amolda na definição de carta rogatória, podendo, dessa forma, prosseguir o feito como
auxílio direto. Precedentes. 7. Agravo interno desprovido. (STJ - AgInt na CR: 11165 EX
36
2016/0247898-2, Relator: Ministra LAURITA VAZ, Data de Julgamento: 06/09/2017, CE -
CORTE ESPECIAL, Data de Publicação: DJe 15/09/2017)

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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

AMARAL JÚNIOR, Alberto do. Introdução ao direito internacional público. São Paulo: Atlas,
2008.

CANÇADO, Trindade, Antônio Augusto. Princípios do direito internacional contemporâneo


– 2. ed. rev. atual. – Brasília: FUNAG, 2017.

CASELLA, Paulo Borba; Hildebrando Accioly e G. E. do Nascimento e Silva. Manual de


direito internacional público.— 20. ed. — São Paulo: Saraiva, 2012.

MAZZUOLI, Valerio de Oliveira. Curso de direito internacional público. 9. ed. rev., atual. e
ampl. -- São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2015.

PORTELA, Paulo Henrique Gonçalves. Direito Internacional Público e Privado. 9ª ed.


Salvador: Juspodivm, 2017.

REZEK, Francisco. Direito internacional público – Curso Elementar. 17ª ed. São Paulo:
Saraiva, 2018.

SOARES, Guido Fernando Silva. Curso de direito internacional público. São Paulo: Atlas,
2002.

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