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Elsa Crescimento
de Mattos, et al. Desenvolv Hum. 2006;16(3):66-75 PESQUISA
Rev Bras Crescimento Desenvolv ORIGINAL
Hum. 2006;16(3):66-75
RESEARCH ORIGINAL
Mattos Ed, Chaves AM. As representações sociais do trabalho entre adolescentes aprendizes –
um estudo piloto. Rev Bras Crescimento Desenvolv Hum 2006; 16(3):66-75.
*
Programa de Pós-Graduação em Psicologia (UFBA). Rua Aristides Novis, 105, ap.1001B – Federação, CEP: 40.210-
730 Salvador (BA). Email: elmattos@atarde.com.br
**
Professor do Programa de Pós-Graduação em Psicologia (UFBA). Endereço para correspondência: Av. Otávio
Mangabeira, 11.881, M-406, CEP: 41.650-000 Salvador (BA). Email: amchaves@ufba.br.
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entrada no mercado de trabalho a partir dos 16 atores sociais constroem sobre a atividade labo-
anos. A Lei da Aprendizagem, instituída em ral. Em estudo realizado com alunos trabalhado-
2000, complementa o ECA, assegurando que res de uma escola pública, Alves-Mazzotti4 rela-
adolescentes e jovens com idade entre 14 e 24 tou que os jovens, em geral, percebem o traba-
anos podem exercer atividade produtiva em lho de maneira positiva, como uma atividade que
horário determinado, com continuidade dos lhes possibilita ajudar à família, ao tempo em que
estudos e também com todas as garantias os prepara para o futuro. Nessa linha, a autora
trabalhistas e previdenciárias dos demais tra- defende que a atividade laboral pode contribuir
balhadores empregados (tais como férias, aviso para que o adolescente desenvolva sentimentos
prévio, 13º salário, FGTS, etc), desde que rece- de independência, auto-valorização e respeito, ou
bam capacitação específica para essa atividade. seja, que ela permite a formação de uma auto-
A criação de condições para inserção qua- imagem positiva. Oliveira, Fischer, Amaral, Tei-
lificada de adolescentes e jovens no mundo do xeira & Sá5 também destacam o predomínio de
trabalho, especialmente daqueles em situação de elementos positivos nas representações do tra-
vulnerabilidade social, é essencial para a cons- balho entre adolescentes do ensino médio de uma
trução de um país mais justo e igualitário. Estu- escola pública de São Paulo. No entanto, em
dos recentes realizados no Brasil trazem dife- pesquisa feita com adolescentes trabalhadores e
rentes enfoques e concepções sobre o trabalho não trabalhadores de duas cidades de São Pau-
infanto-juvenil. Enquanto algumas pesquisas en- lo, os autores afirmam que, quando associado ao
fatizam os aspectos negativos desse tipo de tra- estudo, o trabalho é representado de forma con-
balho, outras mostram o lado positivo da inser- traditória, refletindo um campo de possibilidades
ção laboral precoce. e de impossibilidades, mas que, ainda assim é
Conseqüências negativas foram aponta- legitimado pelos jovens5.
das por Oliveira, Fisher, Martins, Teixeira & Sá3, O conjunto das pesquisas demonstra que,
Fischer, Martins, Oliveira, Teixeira, Latorre, & embora o trabalho apresente riscos para a saúde
Cooper4 e Martins, Fischer, Oliveira, Teixeira, bio-psico-social dos adolescentes, essa ativida-
Costa, Marinho, Perestrelo & Latorre5. Martins de não pode ser tratada de forma homogênea,
e colaboradores3, que registram débitos de sono, considerando somente suas conseqüências ne-
alterações no estado de ânimo, sobrecarga de gativas. Em alguns casos, o trabalho pode repre-
tarefas e o afastamento da escola entre os ado- sentar uma experiência positiva e relevante para
lescentes que trabalham. Essas pesquisas des- adolescentes e jovens, desde que sejam assegu-
tacam os riscos bio-psico-sociais que o trabalho radas condições que possibilitem o exercício la-
precoce acarreta, argumentando que crianças e boral sem prejuízo à saúde, escolaridade e lazer.
adolescentes que trabalham deixam de vivenciar A maioria das pesquisas realizadas até o momento,
experiências que são essenciais nesse momento no entanto, focou adolescentes que exercem ati-
da vida. Outros estudos, entretanto, indicam que vidades precárias, sem respaldo legal e atuando
o trabalho é importante para o adolescente, pois no mercado informal. Outros estudos, realizados
além de ampliar os rendimentos da família, favo- com jovens que exercem atividades mais bem
rece o desenvolvimento cognitivo e emocional estruturadas podem trazer novas contribuições
nessa fase da vida, possibilitando a aquisição de sobre o tema.
novas habilidades, o desenvolvimento da auto- É necessário aprofundar a compreensão
nomia e da responsabilidade. Os pesquisadores sobre as representações sociais dos adolescen-
também destacam que o trabalho atua como tes que trabalham em condições mais favorá-
forma complementar de socialização entre ado- veis, como é o caso daqueles que contam com o
lescentes e jovens, ao lado da escola, da família repaldo da Lei da Aprendizagem. Esses estudos
e do grupo de pares6. podem informar políticas públicas voltadas para
Recentemente, alguns estudos têm bus- inserção social de adolescentes e jovens em situa-
cado compreender as representações que esses ção de vulnerabilidade social. Além disso, a ques-
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tão do trabalho precoce, em espacial o trabalho sificar, sem ambigüidade, os vários aspectos de
de adolescentes e jovens, precisa ser tratada de seu mundo e da sua história individual e social
forma específica pelos pesquisadores, já que essa (Moscovici, , 2004 p.21)9.
época da vida está associada à redefinição dos As representações sociais podem ser con-
papéis sociais, à construção da identidade pessoal sideradas como o conteúdo mental estruturado –
e social à socialização para o trabalho 6-8. isto é, cognitivo, avaliativo, afetivo e simbóli-
A situação dos adolescentes que traba- co – sobre um determinado fenômeno social re-
lham como aprendizes parece ser um campo levante, ou sobre um assunto do seu cotidiano,
fértil de estudo para aprofundar a compreensão que toma a forma de metáforas, e que é consci-
sobre as representações do trabalho entre jovens entemente compartilhado com outros membros
e contribuir com a formulação de programas e do grupo social12. Nas palavras de Jodelet10, as
políticas de inseção laboral de jovens. Além das representações sociais consistem num saber prá-
garantias trabalhistas, os aprendizes recebem tico, cuja função é tornar o que não é familiar
trainamento específico para o exercício de suas em algo familiar e próximo.
funções. Algumas dessas experiências vêm As representações sociais são indispen-
sendo desenvolvidas no âmbito de organizações sáveis para a compreensão do conhecimento
não-governamentais (ONGs), entidades sem social que orienta as práticas de uma determi-
fins lucrativos e que prestam serviço à po- nada população, ou seja, o conhecimento que
pulação, que oferecem programas de apren- ela utiliza para atuar no cotidiano e interpretar
dizagem para adolescentes e jovens de co- a realidade e para encontrar seu lugar no mun-
munidades populares. No entanto, até o presente do. Conforme destaca Abric13, as representa-
momento não se conhece mais profundamente ções sociais atuam como um sistema de inte-
as formas como vem ocorrendo a inserção pretação de realidade que organiza as relações
laboral dos adolescentes participantes desses do indivíduo com seu contexto, determinando
programas, bem como as representações que seus comportamentos e práticas, servindo de
desenvolvem sobre o trabalho a partir das guia para a ação.
práticas que exercem. De que forma os adolesentes aprendizes
Este estudo explora as representações concebem o trabalho? Como eles vivenciam a
do trabalho entre jovens que participam de um relação entre trabalho e estudo? Qual a pre-
programa de aprendizagem desenvolvido por cepção que têm sobre o adolescente trabalha-
uma ONG localizada em Salvador (BA), bus- dor? O presente trabalho busca examinar es-
cando estabelecer uma compreensão incial so- sas percepções, recuperando os elementos que
bre a forma através da qual os adolescentes as caracterizam. Pelo fato das representações
que participam de contextos formais e estru- sociais situarem o indivíduo dentro de um cam-
turados de trabalho, contando com garantias po social, facilitando a elaboração de uma iden-
legais e treinamento específico para o exercício tidade pessoal e social, a compreensão de como
de suas funções, interpretam e significam a ati- o adolescente constrói representações de si
vidade laboral. mesmo e do trabalho é especialmente valiosa,
O estudo foi realizado a partir do referen- pois a construção da identidade e a transição
cial teórico da Teoria das Representações Soci- para o mundo do trabalho ganham grande des-
ais9-11. A noção de representação social diz res- taque nesse momento da vida14. Por tratar-se
peito ao sistema de valores, idéias e práticas, com de um referencial importante na construção da
dupla função: primeiro, estabelecer uma ordem identidade de parcela significativa da popula-
que possibilitará às pessoas oreintar-se em seu ção jovem, em especial aqueles de baixa renda,
mundo material e social e controlá-lo; e, em se- residentes nos grandes centros urbanos, o pa-
gundo lugar, possibilitar que a comunicação seja pel de “adolescente trabalhador” necessita ser
possível entre os membros de uma comunidade, mais detalhadamente investigado pelos pesqui-
fornecendo-lhes um código para nomear e clas- sadores da área da Psicologia.
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revela o ss # 19 “o trabalho é um meio de adqui- rar as coisas e ter sempre certeza do que você
rir experiência e maturidade”. está fazendo”. A ss # 50 revela que “ser adoles-
cente e trabalhar significa [ter] reponsabilidade.
O que significa ser adolescente e trabalhar? E é bom, pois [a pessoa] já vai crescendo res-
ponsável, se preparando logo para o futuro”. Ou
Em suas respostas a essa questão, os ado- ainda, como revela o ss # 37 ser adolescente e
lescentes puderam se distanciar um pouco mais trabalhar significa”ter [mais] responsabilidade do
e refletir sobre o sentido do trabalho em suas que antes e poder mostrar para nossos pais que
vidas. As respostas reafirmam a centralidade dos temos capacidade de fazer o que eles menos
elementos responsabilidade (30) e possibilida- esperam”.
de de aprender coisas novas (26) nas repre- O aprendizado aparece também como um
sentações dos jovens. aspecto central da representasção do trabalho
Em relação à responsabilidade, aparecem entre os adolescentes aprendizes. Conforme in-
aspectos positivos e negativos. Os jovens reve- dica o ss # 10 “ser adolescente e trabalhar é
lam que o adolescente que trabalha precisa sa- legal porque eu conheço muitas coisas e tiro mi-
ber dividir o tempo entre estudo, trabalho e lazer, nha conclusão de como vou trabalhar e me for-
buscando conciliar essas diferentes atividades. mar no futuro”. Ou como revela o ss # 15 “é
Precisa ser organizado, saber administrar o tem- muito bom, pois você aprende desde cedo sobre
po, ter força de vontade. Conforme relata o ss # o mundo do trabalho e sabe como enfrentar o
52 “ser adolescente e trabalhar significa um au- trabalho no futuro”. O depoimento da ss # 41
mento da responsabilidade [pois] o adolescente também revela muito bem esse aspecto do tra-
tem que conciliar escola, lazer e trabalho”. Ou balho associado à oportunidade de aprender: “a
como indica o ss # 39 “significa ter muita res- adolescência é uma fase da nossa vida em que
ponsabilidade, saber que a hora da brincadeira começamos a conhecer o mundo, tudo de bom e
acabou e assumir seus compromissos”. de ruim que ele tem a nos oferecer. E o trabalho
Os aspectos negativos da responsabilida- é o [lado] bom do mundo, onde temos a oportu-
de parecem estar associados com o cumprimen- nidade de crescer e aprender. Quanto mais cedo
to de obrigações que não são próprias da adoles- melhor, pois temos ajuda dos nossos pais, dos
cência. Isso se confirma, por exemplo, no depo- nossos amigos e isso nos faz crescer”.
imento do ss # 62, que revela: “ser adolescente é
uma fase que queremos ter tudo, mas às vezes Como é estar trabalhando e estudando ao
as condições dos pais não são muito boas e, en- mesmo tempo?
tão, o adolescente fica irritado, rebelde, mas não
procura reconhecer o quanto a situação não está Em suas respostas a essa questão, a mai-
boa. [...] Ser adolescente pra mim é uma grande oria dos jovens revelou que trabalhar e estudar
barra e ainda mais, [é preciso] saber dividir os simultaneamente é difícil, pois exige o esforço
horários de estudar e trabalhar. É muita respon- de conciliação de diferentes atividades: estudo,
sabilidade que o adolescente carrega nas cos- trabalho e lazer. Dentre os adolescentes pesqui-
tas”. Ou conforme revela o ss # 22: “ser ado- sados, 33 revelam ter conseguido superar o de-
lescente é muito bom, é a fase de se divertir, sair, safio, organizando os horários, equilibrando o tra-
brincar e a maioria [é] irresponsável. Mas quan- balho e a vida pessoal. Eles acreditam que esse
do entra o trabalho, tudo muda”. esforço foi válido. O depoimento da ss # 66 re-
Outros depoimentos, no entanto, ressaltam vela muito bem esse aspecto. Ela diz: “no início,
o aspecto positivo da responsabilidade. A ss # 58 achei que ia ser um pouco difícil, mas percebi
indica que ser adolescente e trabalhar “significa que era uma questão de saber dividir o tempo.
ter muita responsabilidade, organizar a vida, não Deixo tudo em ordem nos finais de semana, para
deixar as coisas de lado e sempre tentar resol- não sentir nenhum aperto durante a semana”.
ver tudo no seu tempo determinado, saber sepa- Essa perspectiva é confirmada pelo ss # 24, que
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indica: “no começo, foi muito difícil de estudar e representada de forma intrinsecamente positiva
trabalhar ao mesmo tempo, mas com o passar ou negativa pelos jovens. As representações va-
dos dias eu fui conciliando os dois e agora eu riam de acordo com as interpretações que eles
tenho mais tempo para fazer as coisas do que elaboram das suas experiências enqunto adoles-
antigamente”. centes trabalhadores.
Outros jovens (31) indicam que é bom De acordo com as informações analisa-
estar trabalhando e estudando. Embora reconhe- das, a representação acerca de trabalho entre
çam a dificuldade de conciliar as duas ativida- os adolescentes pesquisados apresenta-se den-
des, encaram o processo de maneira positiva, tro de três grandes categorias: os resultados do
como uma oportunidade de desenvolver a flexi- trabalho, as atitudes frente ao trabalho e o
bilidade, de se organizar melhor, de planejar o desenvolvimento pessoal. Conforme indicam
dia-a-dia. Alguns jovens indicam, também, que o Sá10 e Abric13, as representações sociais se or-
trabalho os estimulou a estudar e aprender mais. ganizam em torno de um núcleo central, que lhes
O depoimento do ss # 40 expressa o que pen- dá significado, e de elementos periféricos. As
sam e sentem esses adolescentes: “Estar traba- respostas dadas pelos jovens revelam que o nú-
lhando e estudando ao mesmo tempo é [bom], cleo central da representação que têm do traba-
pois desenvolve o senso criativo, social e a flexi- lho é composto por elementos que identificam
bilidade para lidar com a rotina do dia-a-dia”. essa atividade com o cumprimento de tarefas e
Conforme indica o ss # 8, “foi ótimo trabalhar e com a possibilidade de obter uma remuneração
estudar; gostei bastante desse tempo corrido e capaz de contribuir para a sobrevivência e o sus-
não me atrapalhou em nada, porque antes eu fazia tento de si mesmos e suas famílias. Além disso,
meu planejamento”. Ou ainda, como relata o ss os jovens ressaltam que o trabalho acarreta, por
# 16 “não tive dificuldade em trabalhar e estu- um lado, um aumento considerável nas respon-
dar. Depois que comecei a trabalhar, me deu mais sabilidades assumidas no dia-a-dia, mas também
vontade de estudar. Isso me mostrou que traba- possibilita o desenvolvimento e o aprendizado de
lhar não atrapalha o estudo se a pessoa tem von- conheicmentos novos. Esse resultado indica que
tade de trabalhar”. os adolescentes aprendizes tendem a adotar uma
Alguns jovens (11), no entanto, revelam representação objetiva e prática do trabalho, que
que conciliar trabalho e estudo é muito difícil e nasce do contexto sócio-histórico em que vivem
cansativo. Para eles falta tempo para estudar, e os adolescentes das periferias brasileiras. Ali suas
além disso, não conseguem chegar na escola no necessidades de sobrevivência se apresentam de
horário, ou se alimentar direito. Conforme reve- maneira contundente, levando os jovens a
la a ss # 35, “é muito difícil tarabalhar e estudar buscarem obter renda para ajudar o sustento de
porque acho que tenho pouco tempo para os es- suas famílias.
tudos, além de estudar longe de casa”. Ou como Estudos anteriores sugerem que alguns
indica o ss # 10: “é muito difícil [conciliar as duas elementos associados ao trabalho precoce tra-
atividades], porque eu não tenho muito tempo zem conseqüências negativas para a vida dos
para estudar em casa [...] é muito cansativo”. adolescentes1,5. Um dos elementos apontados
nesses estudos é o aumento da responsabilida-
CONSIDERAÇÕES FINAIS de. No entanto, os resultados aqui relatados su-
gerem que o aumento da responsabilidade pode
Esse estudo aborda as representações ser vivenciado pelos adolescentes tanto sob o lado
sociais que 71 adolescentes aprendizes partici- positivo quanto negativo, a depender de como
pantes de um programa de aprendizegem desen- interpretam suas experiências. Por exemplo, al-
volvido por uma ONG de Salvador têm sobre o guns aprendizes indicam que o aumento da res-
trabalho. Os resultados indicam a complexidade ponsabilidade contribui para que se tornem mais
da compreensão do trabalho por parte dos ado- organizados, mais ativos, planejem melhor suas
lescentes e revelam que essa atividade não é atividades. Revelam que estão estudando e
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aprendendo mais. Outros adolescentes apontam vante o aspecto da aprendizagem que acontece
que o aumento da responsabilidade os torna mais na ONG e também na empresa, aparecendo de
cansados e dificulta seus estudos. Nesse senti- forma marcante nos depoimentos dos jovens.
do, é possível afirmar que os resultados desse Talvez outros jovens, submetidos a outro tipo de
estudo corroboram com as pesquisas de Alves- programa de inserção laboral que não seja ne-
Mazotti4 e apontam para a diversidade das re- cessariamente um programa de aprendizagem,
presentações do trabalho entre os adolescentes. ou que se insiram no mundo do trabalho por con-
Ao lado dos elementos centrais acima re- ta própria, desenvolvam uma representação do
feridos, encontram-se elementos periféricos como trabalho na qual a aprendizagem não seja um
a possibilidade de alcançar objetivos e metas, o aspecto tão relevante. Pesquisas futuras, com-
aumento da competência, da pontualidade, o es- parando as representações sociais de adoles-
forço e dedicação, a satisfação e o prazer de centes aprendizes com as dos adolescentes que
trabalhar, a oportunidade de ter mais experiên- não se encontram em programas desse tipo, po-
cia, mas também o aumento do estresse. Esses dem esclarecer melhor esse ponto.
elementos indicam o que é particular na vivência Por fim, quando perguntados sobre a re-
de cada jovem em relação ao trabalho. lação entre trabalhar e estudar ao mesmo tem-
Quando refletem sobre a relação entre ser po, a maioria dos jovens revela ter consciência
adolescente e trabalhar, a maioria dos jovens das dificuldades em conciliar as duas atividades,
aponta a responsabilidade e a possibilidade de mas acredita que esse esforço é válido e tem
aprender e de se desenvolver como aspectos caráter positivo. Essas respostas corroboram
relevantes. Essas respostas refoçam a centrali- estudos anteriores que apontam para a existên-
dade desses elementos na representação social cia de contradições nas representações dos jovens
do trabalho entre os adolescentes pesquisados. em situações envolvendo trabalho e estudo. Mas
É provável que o forte impacto da resposabilida- que, ainda assim, predomina o valor afirmativo
de esteja associado ao momento em que essa do trabalho para o futuro1.
experiência é vivenciada pelos participantes da Tomados em seu conjunto, os resultados
pesquisa, ou seja, a adolescência. Alguns dos desse estudo piloto revelam que o trabalho na
participantes apresentaram uma concepção da adolescência, desde que realizado em situação de
adolescência mais próxima da infância, como um aprendizagem, com todas as garantias legais, pode
momento de querer tudo, ou seja, de ter muitas ter efeitos positivos e promover o desenvolvimen-
expectativas, de experimentar coisas novas, mas to e o amadurecimento dos jovens. Entretanto, é
também asssociado com brincadeiras, com “cur- preciso ter cautela no desenho dos programas de
tir a vida”. Nesses casos, a entrada no mundo inserção laboral para essa faixa etária. O acom-
do trabalho parece representar uma ruptura, uma panhamento e o apoio dado aos jovens, em todas
mudança radical na vida do jovem. A maioria dos as etapas, por profissionais qualificados é essencial
participantes, no entanto, apresenta uma visão para que eles possam fazer uma transição saudável
da adolescência mais próxima da vida adulta. para o mundo do trabalho, sem comprometer
Aqui, a responsabilidade parece justamente es- outros aspectos importantes do seu desenvol-
tar associada ao processo de amadurecimento vimento, como a escolaridade e o lazer.
pelo qual o adolescente está passando e no qual A conciliação entre trabalho e estudo apa-
a experiência de trabalho tende a atuar como rece como um aspecto delicado. Embora alguns
catalizadora. autores apontem os aspectos negativos que o tra-
Ainda no que se refere à relação entre balho acarreta para a vida escolar dos jovens3,7
ser adolescente e trabalhar, a ênfase dada pelos é possível criar condições favoráveis para o exer-
jovens à aprendizagem e ao desenvolvimento cício do trabalho concomitante ao estudo. Por
parece decorrer do fato deles estarem partici- um lado, os próprios jovens apontam para a ne-
pando de um Programa de Aprendizagem. Esse cessidade de saber organizar-se, de aprender a
contexto favorece a aprendizagem e torna rele- conciliar as atividades, de ter determinação. Es-
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ses aspectos devem ser estimulados e desenvol- Esse estudo aponta para a necessidade de
vidos de forma explícita nos programas de apren- aprofundar as pesquisas nesse campo como for-
dizaegm, através de atividades especialmente ma de favorecer o desenvolvimento dos jovens
direcionadas para essa finalidade. Por outro lado, que necessitam trabalhar e estudar ao mesmo
ao desenhar programas dessa natureza, é preci- tempo. Além disso, ele possibilita compreender
so pensar em criar melhores condições de estu- a relevância do trabalho para o desenvolvimento
do, para os jovens que trabalham. No âmbito das e a socialização dos jovens de classes popula-
políticas educacionais, podem ser criados meca- res. O estudo amplia a idéia de Alves-Mazzotti4
nismos e programas que atendam as necessida- de que o trabalho pode contribuir para que o ado-
des específicas dos jovens que trabalham, ofe- lescente desenvolva sentimentos de independên-
recendo, por exemplo, atividades complementa- cia e auto-valorização, desde que seja exercido
res de apoio pedagógico nas escolas, possibili- em condições favoráveis ao desenvolvimento
tando a aquisição de créditos extras, possibili- humano, sem o prejuízo de outras atividades fun-
tando ao jovem exercer as duas atividades. damentais à vida saudável.
Abstract: The present study investigated adolescent apprentices’ social representations of work
and its relationship to study. Seventy adolescents, with ages raging from 15 to 18 years old,
participating in an apprenticeship program developed by a NGO in Salvador (Bahia), answered an
open-ended questionnaire that contained the following questions: What does work mean to
you? What does it mean to be a working adolescent? How do you feel about studying and
working at the same time? The answers were submitted to a content analysis for the main themes.
Findings point to 3 types of social representation of work among apprentice adolescents: work
outcomes, work attitudes, and personal development. Aspects such as financial earnings (i.e.
wage) and task performance emerged as work outcomes. Among the work attitudes, the most
significant were responsibility and competence development. In the domain of personal
development, aspects such as learning and acquisition of experience were relevant. The relationship
between working and studying appears to be a complex one, demanding conciliation efforts on
the part of adolescents, but it does not necessarily have a negative connotation.
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8. Sarriera JC, Silva MA, Kabbas CP, Lopes VB. 12. Wagner W. Descrição, exploração e método em
Formação ocupacional em adolescentes. Estud representações sociais. In: Guareschi P,
Psicol (Natal). 2001;6(1):27-32. Jovchelovitch S, editores. Textos em
9. Moscovici S. Representações sociais: representações sociais. Rio de Janeiro: Vozes;
investigações em psicologia social. Rio de 1995. p. 149-86.
Janeiro: Vozes; 2004. 13. Abric JC. O estudo experimental das
10. Sá CP. Núcleo central das representações representações sociais. In: Jodelet D, editor. As
sociais. Rio de Janeiro: Vozes; 1996. representações sociais. Rio de Janeiro:
11. Jodelet D. Representações sociais: um domínio EdUERJ; 2001. p. 155-7.
em expansão. In: Jodelet D, editor. As 14. Arnett JJ. Adolescents’ uses of media for self-
representações sociais. Rio de Janeiro: socialization. J Youth Adolesc. 1995;24(5):519-34.
EdUERJ; 2001. p. 17-44.
Recebido em: 23/06/2006
Aprovado em: 11/09/2006
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