Você está na página 1de 862

J.V.

Stalin
Obras Escolhidas

Organizadores:

João Carvalho
Marcelo Bamonte
Otávio Losada
Klaus Scarmeloto
Copyright ©2021 – Todos os direitos reservados a Editora Raízes da América.

EDIÇÕES CIÊNCIAS REVOLUCIONÁRIAS – www.cienciasrevolucionarias.info

Diagramação: Gabriel Felipe Silva


Organização e tradução: João Carvalho
Marcelo Bamonte
Otávio Losada
Klaus Scarmeloto
Revisão: Gabriel Felipe Silva
Capa: Raíssa Oliveira

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)


Tuxped Serviços Editoriais (São Paulo, SP)
Ficha catalográfica elaborada pelo bibliotecário Pedro Anizio Gomes - CRB-8 8846

S782o Stalin, Josef.

Obras Escolhidas de J. V. Stalin (1901-1952) Josef Stalin; Organização e tradução


de João Carvalho, Otávio Losada, Marcelo Bamonte e Klaus Scarmeloto; Prefácio
de João Carvalho.– 1. ed.– São Paulo: Editora Raízes da América, 2021.
864 p.; tabs.; fotografias; 23x16 cm.

Inclui bibliografia.
ISBN 978-65-994637-1-6.

1. Marxismo. 2. Revolução. 3. Stalin. 4. União Soviética. I. Título. II. Assunto.


III. Stalin, Josef. IV. Organizadores.

CDD 320.531
CDU 316.323.72

ÍNDICE PARA CATÁLOGO SISTEMÁTICO


1. Socialismo e sistemas relacionados: Comunismo, Marxismo, Leninismo; ideologias políticas.
2. Ciência política: Socialismo, Comunismo e Marxismo; Ideologias.

1ª edição: maio de 2021

Todos os direitos reservados. Nenhuma parte do conteúdo deste livro poderá ser utilizada
ou reproduzida em qualquer meio ou forma, seja ele impresso, digital, áudio ou visual
sem a expressa autorização por escrito da Raízes da América; Otávio Losada; Marcelo
Bamonte e João Carvalho sob penas criminais e ações civis.
Sumário

Apresentação| 13

Prefácio| 19

I A construção do revolucionário| 51

O Partido Social-Democrata da Rússia e suas tarefas imediatas | 53


Como a Social-Democracia considera a questão nacional? | 64
A Duma de Estado e a tática da social-democracia | 76
A questão agrária | 80
A contrarrevolução internacional | 88
O proletariado de vanguarda e o V Congresso do Partido | 90
A dissolução da Duma e as tarefas do proletariado | 92
O Congresso de Londres do Partido Operário Social-democrata da
Rússia (apontamentos de um delegado) | 95
O terrorismo econômico e o movimento operário | 112
A imprensa | 114
A crise no Partido e as nossas tarefas | 117
Resoluções aprovadas pelo Comitê de Baku | 124
Pelo Partido! | 126

7
8 Obras Escolhidas

Os extravagantes apartidários | 129


Os hipócritas liberais | 131
A vontade dos delegados | 132
A todos os trabalhadores e trabalhadoras da Rússia | 134
No caminho do nacionalismo | 137
Os Sovietes dos Deputados Operários e Soldados | 140
As condições da vitória da Revolução Russa | 142
A abolição das restrições dos direitos das nacionalidades | 145
Terras aos camponeses! | 148
Superados Pela Revolução | 150
O triunfo da contrarrevolução | 153
O novo governo | 155
A contrarrevolução e os povos da Rússia | 156
Todo o poder aos sovietes! | 159
O poder dos sovietes | 161
A Rada ucraniana | 164
A independência da Finlândia | 166
Intervenção na reunião do Comitê Central sobre a paz com os alemães | 167
A organização da República Federativa da Rússia | 168
A lógica dos fatos (as ''Teses'' do CC Menchevique) | 172
A Revolução de Outubro e a questão nacional | 178
Nossas tarefas no Leste | 184
O fuzilamento dos vinte e seis camaradas de Baku, obra dos agentes do
imperialismo britânico | 186
Discurso de abertura do II Congresso das Organizações Comunistas
dos Povos Orientais da Rússia | 189
Lenin, organizador e líder do Partido Comunista da Rússia | 191
A política do poder soviético e a questão nacional na Rússia | 197
O Congresso dos Povos do Daguestão | 204

II A consolidação do dirigente| 209

As tarefas imediatas do Partido em relação à questão nacional | 211


Saudação ao Primeiro Congressos das Mulheres das Terras Altas | 219
Da estratégia política e das táticas dos comunistas russos | 220
O décimo aniversário do Pravda | 234
J. V. Stalin 9

A Formação da União das Repúblicas Soviéticas | 237


A Imprensa como Organizador Coletivo | 239
Lenin | 242
Sobre a morte de Lenin | 249
Trotskismo ou Leninismo? | 253
A Revolução de Outubro e as táticas dos comunistas russos | 271
Dia Internacional da Mulher | 294
As tarefas políticas da Universidade dos Povos do Leste | 295
Sobre as questões do leninismo | 305
A possibilidade de construir o socialismo em nosso país | 344
A luta contra os desvios de direita e ''ultraesquerdistas'' | 346
As perspectivas da revolução na China | 351
Os três slogans fundamentais do partido na questão camponesa | 360
Questões sobre a Revolução Chinesa | 368
A oposição trotskista antes e agora | 374
O Partido e a Oposição | 392
Aquisições de grãos e as perspectivas para o desenvolvimento da
agricultura | 401
Lenin e a questão da aliança com o camponês médio | 407
Contra a vulgarização do slogan da autocrítica | 415
Industrialização do país e o desvio à direita no PCUS (B) | 421
Sobre questões de política agrária na URSS | 445
Sobre a política de eliminação dos kulaks como classe | 462
Sobre questões do movimento das fazendas coletivas | 466
Antissemitismo | 471
Novas Condições – Novas Tarefas na construção econômica | 472
A importância e as tarefas dos Bureaus de Reclamações | 488
Os resultados do primeiro Plano Quinquenal | 489

III Triunfo e ocaso do homem de aço| 521

Marxismo versus Liberalismo – Uma Entrevista com H. G. Wells | 523


A morte de Kirov | 535
Discurso à Comissão do 2º Congresso Sindical de Kolkhozianos | 537
Discurso na 1ª Conferência Sindical de Stakhanovitas | 538
Sobre o projeto de Constituição da URSS | 549
10 Obras Escolhidas

Sobre a vitória final do socialismo na União Soviética | 571


Relatório sobre o trabalho do Comitê Central ao XVIII Congresso do
PCUS | 577
Transmissão de rádio | 616
Discurso na reunião de comemoração do Soviete de Deputados do
povo trabalhador e do Partido de Moscou e organizações públicas de
Moscou | 621
A dissolução da Internacional Comunista - resposta ao
correspondente da Reuters | 631
Discurso na reunião de celebração do Soviete de Deputados do Povo
Trabalhador e do Partido e Organizações Públicas de Moscou | 633
Ordem do Supremo Comandante-em-Chefe nº 309 | 643
Ordem do Supremo Comandante-em-Chefe nº 220 | 646
Discurso sobre o Tratado com a Polônia | 649
Discurso da Vitória | 651
Ao Primeiro-Ministro da Mongólia | 653
Discurso de Stalin ao povo | 654
Ordem do Dia do Comissário da Defesa da URSS, nº 8 | 656
Entrevista com o correspondente do Pravda | 659
Coexistência, cooperação américo-soviética, energia atômica, Europa | 664
Mensagem de saudações para Moscou | 667
Paz na Coréia | 669
Carta de resposta ao Presidente do Gabinete de Ministros da República
Democrática Popular da Coréia, Kim Il-Sung | 670
Proibição de Armas Atômicas | 671
Problemas econômicos do socialismo na URSS | 673
Discurso no 19º Congresso do PCUS | 725

IV Anexos| 731

ANEXO 1 – Telegramas de Guerra | 733

ANEXO 2 – CONFERÊNCIAS DE GUERRA | 753

ANEXO 3 – LEGISLAÇÃO E DECLARAÇÕES CONCERNENTES À QUESTÃO


NACIONAL | 805

ANEXO 4 – MARXISMO E PROBLEMAS DE LINGUÍSTICA | 809

ANEXO 5 – CORRESPONDÊNCIAS COM MOLOTOV | 836


J. V. Stalin 11
12 Obras Escolhidas
J. V. Stalin 13

Apresentação
J. V. Stalin 15

Apresentação
O projeto Obras Escolhidas de J.V. Stalin tem como proposta compilar, den-
tro do amplo recorte temporal escolhido, os principais escritos inéditos de Josef
Stalin (1878-1953), englobando sua formação como fervoroso revolucionário bol-
chevique, passando por seu período de liderança da URSS até seu ocaso, com a
vitória sobre o nazismo e acontecimentos posteriores. Foram deixadas de fora
da presente seleção, por escolha editorial, obras de Stalin outrora publicadas no
país, que formam o corpo de livros propriamente escritos pelo revolucionário:
Anarquismo ou Socialismo (1906-7), Marxismo e a Questão Nacional (1913), Os
Fundamentos do Leninismo (1924), Materialismo Histórico e Dialético (1938).
Destas obras de maior fôlego, apenas o escrito Problemas Econômicos do Socia-
lismo na URSS (1951) figura o corpo do volume.
Todos os nomes em russo foram mantidos em concordância com o tipo de
transliteração BGN/PCGN, preservando ao máximo o corpo original do texto,
com raras adequações em casos específicos. Durante os esforços de tradução,
também foi priorizada a máxima fidelidade à estilística literária de Stalin, que
contava, por vezes, com períodos longos, mas de fácil entendimento. As tra-
duções foram realizadas com base nos materiais de Obras Completas do autor,
compilados em inglês, espanhol, italiano, francês e russo.
Para a organização dos Anexos, foi priorizada a escolha de correspondência
que o corpo editorial julgou de maior importância, destacando a questão his-
tórica e conjuntural de cada telegrama e correspondência de guerra. Também
contempla a seção trechos inéditos das conferências do pós-guerra, com ênfase
na atuação de Stalin enquanto estadista após o maior conflito bélico da história.
A terceira parte dos anexos concerne às contribuições práticas de Stalin quanto à
questão nacional. O escrito sobre filosofia da linguagem, Sobre o Marxismo na
Linguística (1950), foi deixado na quarta parte dos anexos para melhor organi-
zação da obra. Por fim, a seção conta com as correspondências entre Josef Stalin
e Molotov.
18 Obras Escolhidas
J. V. Stalin 19

Prefácio
J. V. Stalin 21

O Homem entre a lenda e o monstro


Introdução

É mister do trabalho do Historiador tornar cognoscível não somente uma


dada fonte, mas sim todo o imbricado campo político e mental que permite a ur-
didura da mesma. É cônscio desse dever que pretendemos, nesse breve prefácio,
retraçar os nortes da vida e das lutas de Josef Vissarianovich Dzhugashvili para
que possamos, assim, abrir uma janela privilegiada para seu mundo.
Neste intuito, começaremos por retraçar um breve escopo biográfico e polí-
tico de Stalin mostrando os principais acontecimentos de sua vida vis a vis suas
intervenções e lutas, de forma a construir um quadro de suas pugnas inseridas
no tempo histórico em que as mesmas aconteceram.
Vencido este primeiro momento, traçaremos em nossa conclusão breves consi-
derações historiográficas sobre o estado da arte dos estudos do período de Stalin
em nosso campo político, a esquerda revolucionária, bem como em relação aos
estudos de sovietologia no Brasil, demarcando assim nossa postura bem como os
nortes de nossa contribuição para o campo.
Ao remate, optamos por não tratar nessa introdução de alguns dos mitos que
constituem o norte dos ataques anticomunistas a sua figura em profundidade, vez
que os mesmos são debatidos pormenorizadamente no ensaio historiográfico de
Klaus Scarmeloto que acompanha esse volume.

Stalin: Uma vida de lutas

Josef Vissarianovich Dzhugashvili nasceu de uma família de baixa renda na


cidade de Gori, província de Tiflis, na Geórgia, a 6 de dezembro de 1878, tendo
sido batizado somente em 29 de dezembro de 1878, o que gerou uma série de
controvérsias entre seus biógrafos sobre a sua data de nascimento.1
Filho de Vissarion Ivanovich Dzhugashvili (1850-1909), sapateiro por profis-
são, e Ekaterina Georgievna (1858-1937), diarista, Josef, terceiro filho do casal,
passou por uma infância de privações e extrema pobreza. Seu rosto foi marcado
pela varíola, atropelado por uma carruagem seus movimentos do braço seriam
prejudicados por toda sua vida. Ambos seus irmãos mais velhos pereceram ainda
na infância em meio à miséria que os cercava.
A piora da situação econômica da família levou Vissarion ao alcoolismo e ele
eventualmente abandonaria Ekaterina, que passaria a cuidar do filho sozinha.
Vissarion morreria poucos anos depois, as versões sobre sua morte destoam en-
tre um desentendimento entre alcoólatras2 e complicações derivadas de colite,
1 Sobre o assunto ver INSTITUTO MARX-ENGELS-LENIN. Stalin: Uma breve biografia. São
Paulo: Nova Cultura, 2019; KOTKIN, Stephen. Stalin: Volume I: Paradoxes of Power, 1878–1928.
Londres: Penguin Press, 2014. SERVICE, Robert. Stalin: A Biography. Londres: Picador, 2008.
2 A versão “sangrenta” é contada pela filha de Stalin, que fugiu para os Estados Unidos em suas
22 Obras Escolhidas

tuberculose e pneumonia3 , sendo esta última a documentalmente mais verossí-


mil.
Desde o momento que se encontra com sua exclusiva tutela, Ekaterina traba-
lharia dia e noite para prover ao pequeno Josef e garantir ao mesmo um futuro.
De acordo com os relatos de seus amigos de infância4 , Ekaterina era uma mãe
severa, mas ao mesmo tempo carinhosa e abnegada, e dizem que ela gostaria que
o futuro líder da URSS tivesse seguido o caminho do seminário.
Em 1886, Ekaterina tentou, pela primeira vez, que seu filho Soso – apelido ca-
rinhoso de Josef na infância – entrasse no Seminário de Gori (Escola Teológica
Ortodoxa de Gori), porém, seu desconhecimento da língua russa foi uma bar-
reira para a entrada. Entre 1886-88, Soso estuda com amigos do ciclo religioso
de sua mãe, e em 1888 ele entra direto na segunda turma preparatório (espécie
de segundo ciclo à época). Em setembro do ano seguinte, ele avança para a pri-
meira turma da escola (espécie de ciclo fundamental superior da época) onde se
formará em junho de 1894.
Em setembro de 1894, Josef passou no exame de admissão e foi matriculado
no Seminário Teológico Ortodoxo de Tiflis. Lá ele conheceria o marxismo e,
já no início de 1895, entraria em contato com grupos clandestinos de marxis-
tas revolucionários expulsos pelo governo para a Transcaucásia. Posteriormente,
o próprio Stalin recordou: ”Entrei no movimento revolucionário aos 15 anos,
quando entrei em contato com grupos clandestinos de marxistas russos que vi-
viam então na Transcaucásia. Esses grupos tiveram uma grande influência sobre
mim e me incutiram o gosto pela literatura marxista ilegal”5 .
De acordo com o jornalista Simon Sebag-Montefiore6 , Stalin era um aluno
extremamente talentoso que recebeu notas altas em todas as disciplinas: mate-
mática, teologia, grego e russo; Stalin também apreciava a poesia tendo em sua
juventude, ele próprio escrito em sua língua natal.7
Em 1931, em uma entrevista com o escritor alemão Emil Ludwig8 , Stalin nos
conta de sua radicalização, ele diz: ”Meus pais não possuíam educação, mas me
trataram muito bem. Outra coisa era o seminário teológico ortodoxo onde es-
tudava então. Em protesto contra o regime humilhante e os métodos jesuítas
presentes no seminário, eu estava pronto para me tornar e realmente me tor-
nei um revolucionário, um apoiador do marxismo enquanto um ensinamento

memórias. Ver ALLILUYEVNA, Svetlana. Twenty Letters to a Friend. Nova York: Harper, 2016.
3 Tal versão encontra vasto fulcro documental e provavelmente é a correta. Ver: SERVICE, Robert.

Stalin: A Biography. Londres: Picador, 2008; ; KOTKIN, Stephen. Stalin: Volume I: Paradoxes of
Power, 1878–1928. Londres: Penguin Press, 2014.
4 Sobre o assunto ver DAVRICHEWY, Joseph. Ah! Ce qu’on rigolait bien avec mon copain Staline.

Paris: J. C. Simoën, 1979.


5 STALIN, J.V. An Interview with the german author Emil Ludwig. Disponível em:
https://www.marxists.org/reference/archive/stalin/works/1931/dec/13a.htm. Acessada em 05 de
Abril de 2021.
6 Ver SEBAG-MONTEFIORE, Simon. Stalin: A corte do Czar Vermelho. São Paulo: Cia das
Letras, 2006.
7 Uma das poesias pode ser encontrada em KOTKIN, Stephen. Stalin: Volume I: Paradoxes of

Power, 1878–1928. Londres: Penguin Press, 2014.


8 Vide nota 6.
J. V. Stalin 23

revolucionário.”9
Em 1898, Dzhugashvili começa sua experiência de propagandista em uma
reunião com trabalhadores no apartamento do revolucionário Vano Sturua e logo
começou a liderar um círculo operário de jovens ferroviários. Passou a lecionar
em vários círculos operários e até elaborou um currículo marxista para eles. Em
agosto do mesmo ano, Josef ingressou na organização social-democrata georgi-
ana “Mesamedasi” (“O terceiro grupo”). Juntamente com V. Z. Ketskhoveli e A.
G. Tsulukidze, Dzhugashvili forma o núcleo da minoria revolucionária desta or-
ganização, contra uma maioria que apoiava as posições do “marxismo legal” e
tendia ao nacionalismo10 .
Em 29 de maio de 1899, em seu quinto ano de estudos, foi expulso do seminá-
rio “por não comparecimento aos exames por motivo desconhecido”11 Depois do
ocorrido, Dzhugashvili se dedicou por algum tempo às aulas particulares. Entre
seus alunos, em particular, estava seu amigo de infância mais próximo, Simon
Ter Petrosyan (o futuro revolucionário Kamo).
Em abril de 1900, Josef Dzhugashvili, Vano Sturua e Zakro Chodrishvili orga-
nizaram os trabalhadores da fábrica Mayovka, reunindo 400-500 trabalhadores.
Na reunião o próprio Josef falou. Esse discurso foi a primeira aparição de Stalin
diante de um grande grupo de pessoas. Em agosto do mesmo ano, Dzhugashvili
participou da preparação e condução de uma grande manifestação dos trabalha-
dores de Tiflis – uma greve nas Oficinas Ferroviárias Principais. Na organização
dos protestos dos trabalhadores participaram: M. I. Kalinin (expulso de São Pe-
tersburgo para o Cáucaso), S. Y. Alliluev entre outros. De 1º a 15 de agosto, até
quatro mil pessoas participaram da greve. Como resultado, mais de quinhentos
grevistas foram presos.
Em março de 1901, a polícia vasculhou o observatório de física onde Dzhu-
gashvili vivia e trabalhava. Ele mesmo, no entanto, escapou da prisão e se escon-
deu, tornando-se revolucionário clandestino12 .
Em setembro de 1901, o jornal ilegal Brdzola (A Luta) começa a ser publicado
em Baku. O editorial da primeira edição pertencia a Josef Dzhugashvili, de 22
anos. Este artigo é a primeira obra política conhecida de Stalin13 .
Em novembro de 1901, foi empossado no Comitê de Tiflis do POSDR14 e
enviado a Batum no mesmo mês, onde participou da criação de uma organização
local. Seria ali que, pela primeira vez, usaria a alcunha de Koba. Após a divisão
dos sociais-democratas russos em bolcheviques e mencheviques em 1903, Stalin

9 Idem.
10 Sobre o assunto ver SIMASHVILI, Tengliz. Gigla Berbichashvili’s and Iliko Imerlishvili’s relati-
onship with Stalin. Archival Bulletin. Nº14, 2013, pgs. 72-99.
11 Provavelmente o verdadeiro motivo da exclusão foram as atividades de Joseph Dzhugashvili para

promover o marxismo entre os seminaristas e trabalhadores em oficinas ferroviárias. Ver SCARME-


LOTO, Klaus (org). Em defesa de Stalin: Textos Biográficos. São Paulo: Ciências Revolucionárias,
2020.
12 Um trabalho seminal em russo pode ser encontrado em SEMANOV, Sergey; Kardashov, Vla-

dislav. Иосиф Сталин: жизнь и наследие disponível em http://stalin-irk.narod.ru/index.files/STA-


LIN_1/Stalin_5/I_Stalin/stalin.html. Acessado em 29 de Março de 2021.
13 STALIN, J. V. From the Editors disponível em https://www.marxists.org/reference/archive/sta-

lin/works/1901/09/x01.htm. Acessado em 29 de março de 2021.


14 Partido Operário Social Democrata Russo.
24 Obras Escolhidas

juntou-se aos bolcheviques.


Em 1904, ele participou da organização da greve dos trabalhadores do pe-
tróleo em Baku, que terminou com a conclusão de um acordo coletivo entre os
grevistas e os industriais. Em dezembro de 1905, foi enviado como delegado
da União do Cáucaso do POSDR na 1ª conferência do POSDR em Tammerfors
(Finlândia), onde se encontra pela primeira vez pessoalmente com V. I. Lenin.
Em 1906, foi um dos delegados de Tiflis ao IV Congresso do POSDR em
Estocolmo, esta foi sua primeira viagem ao exterior. Em julho do mesmo ano
casou-se com Ekaterina Svanidze. Desse casamento em 1907, nasceu o primeiro
filho de Stalin, Yakov. No final do mesmo ano, a esposa de Stalin morreu de tifo.
Em 1907, Stalin foi delegado ao V Congresso do POSDR em Londres. De
acordo com vários autores, Stalin estaria envolvido na chamada “expropriação
de Tiflis” do verão de 1907, cujos fundos destinavam-se às necessidades do par-
tido15 .
Entre 1909-1911, Stalin esteve duas vezes no exílio na cidade de Solvyche-
godsk, província de Vologda. Tendo escapado do exílio em 1909, em março de
1910, Stalin foi preso e, após seis meses encarcerado em Baku, foi novamente
escoltado a Solvychegodsk. No final do período de exílio, Stalin vai para São
Petersburgo. Novamente preso, denunciado por um traidor do Partido, é mais
uma vez exilado em Vologda, de onde fugiria em fevereiro de 1912. Desde 1910,
Stalin é o representante autorizado do Comitê Central do partido para o Cáucaso.
Em janeiro de 1912, na plenária do Comitê Central do POSDR, realizada
após a VI Conferência Pan-Russa do POSDR, por sugestão de Lenin, Stalin foi
eleito à revelia para o Bureau Russo do Comitê Central do POSDR16 . Alguns
sovietólogos observam esta eleição de Stalin como sua emergência enquanto uma
figura política17 . Seria ainda em 1912 que Josef Dzhugashvili finalmente adotou
o pseudônimo de “Stalin”18 .
Em abril, Stalin é preso novamente e enviado para o exílio na Sibéria. Desta
vez, o local de exílio foi a cidade de Narym, na província de Tomsk. Lá já estavam
Smirnov, Sverdlov e alguns outros bolcheviques famosos. Após 41 dias ele fugiu
mais uma vez, tendo conseguido chegar a Tomsk de vapor, onde embarcou em
um trem com um passaporte falsificado para a parte europeia da Rússia e, de lá,
imediatamente para a Suíça, onde se encontraria com Lenin.
Após o encontro, Stalin vai a São Petersburgo onde foi um dos principais or-
ganizadores do primeiro jornal bolchevique de massa, o Pravda (A Verdade). Em
março de 1913, Stalin foi novamente detido, encarcerado e enviado ao Território
Turukhansk da província de Yenisei, onde permaneceria até o final do outono
de 1916. No exílio, ele se correspondia com Lenin. Stalin somente retornaria a
Petrogrado em 12 de março de 1917.

15 LUDWIG, Emil. Stalin. Rio de Janeiro: Editorial Calvino, 1943.


16 STALIN, J.V. History of the communist party of the Soviet Union (Bolsheviks). Nova York: In-
ternational Publishers, 1939
17 DELYAGIN, Mikhail; RYBAS, STANISLAV; WELLER, Mikhail. К 60-летию со дня смерти:

значение И. В. Сталина для современного общества. Свободную мысль. Nº3/4, Junho de 2012, dis-
ponível em http://svom.info/events/. Acessado em 02 de Abril de 2021.
18 POKHLEBKIN, William. Великий псевдоним. Moscou: Ozon, 1996.
J. V. Stalin 25

Tendo recebido sua liberdade como resultado da Revolução de fevereiro, Sta-


lin voltou a Petrogrado. Ele era um dos líderes do Comitê Central do POSDR e
do Comitê do Partido Bolchevique de Petersburgo, e membro do conselho edi-
torial do jornal Pravda. Inicialmente, Stalin apoiou o Governo Provisório, na
Conferência Pan-Russa dos Bolcheviques em 28 de março, em Petrogrado. Du-
rante uma discussão sobre a iniciativa dos mencheviques sobre a possibilidade de
se reunirem em um único partido, Stalin observou que “a unificação é possível
ao longo da linha Zimmerwald-Kinthal”. No entanto, após o retorno de Lenin
à Rússia, Stalin apoiaria seu slogan de transformar a revolução “democrático-
burguesa” de fevereiro em uma revolução socialista proletária.
De 14 a 22 de abril, foi delegado à I Conferência dos Bolcheviques da Cidade
de Petrogrado. Em 24-29 de abril, na VII Conferência Pan-Russa do POSDR,
apoiou os pontos de vista de Lenin e fez uma apresentação sobre a questão naci-
onal; foi eleito membro do Comitê Central do POSDR.
Entre maio e junho, ele participou de propaganda antiguerra; foi um dos or-
ganizadores das eleições dos sovietes e participou da campanha municipal em Pe-
trogrado. De 3 a 24 de junho, participou como delegado do Primeiro Congresso
Pan-Russo de Sovietes de deputados operários e soldados; foi eleito membro do
Comitê Executivo Central de Toda a Rússia e membro do Bureau do Comitê Exe-
cutivo Central de Toda a Rússia da facção bolchevique. Publicou uma série de
artigos de agitação e propaganda no Pravda 19 e em outros jornais.
Em 5 de agosto, foi eleito membro da composição restrita do Comitê Central.
Em agosto e setembro, ele realizou principalmente trabalhos organizacionais e
jornalísticos. Em 10 de outubro, em uma reunião do Comitê Central do POSDR,
ele votou a favor de uma resolução sobre um levante armado e foi eleito membro
do Bureau Político, criado “para a liderança política no futuro próximo”.20
Na noite de 16 de outubro, em uma reunião ampliada do Comitê Central,
ele se manifestou contra as posições de Kamenev e Zinoviev, que votaram contra
a decisão sobre o levante, foi eleito então membro do Exército Central Revolu-
cionário, que passou a fazer parte do Comitê Revolucionário Militar de Petro-
grado21 .
Em 24 de outubro, depois que os cadetes destruíram a gráfica do jornal
Pravda, Stalin conseguiu publicar clandestinamente o artigo editorial “De que
precisamos?”22 com um apelo à derrubada do Governo Provisório e à sua subs-
tituição pelo Governo dos Sovietes com a imediata eleição de representantes dos
trabalhadores, soldados e camponeses. No mesmo dia, Stalin e Trotsky reali-
zaram uma conferência dos bolcheviques. Na noite de 25 de outubro, ele par-
ticipou de uma reunião do Comitê Central do POSDR (B), que determinou a
estrutura e o nome do novo governo soviético. Nas eleições para a Assembleia

19 STALIN, J.V. Works. Vol 3. Moscou: Foreign Languages Publishing House, 1954.
20 INSTITUTO MARX-ENGELS-LENIN. Stalin: Uma breve biografia. São Paulo: Nova Cultura,
2019.
21 NENAROKOVA, D. P. Реввоенсовет Республики in: Энциклопедия Гражданская война и военная

интервенция в СССР. Moscou: S. S. Khromov e Kol; 1987.


22 STALIN, J.V. Works. Vol 3. Moscou: Foreign Languages Publishing House, 1954. Disponível

em https://www.marxists.org/reference/archive/stalin/works/1917/10/24.htm. Acessado em 4 de
Abril de 2021.
26 Obras Escolhidas

Constituinte Pan-Russa no distrito da capital de Petrogrado, foi eleito deputado


pelo POSDR.
Após a vitória da Revolução de Outubro, Stalin ingressou no Conselho de
Comissários do Povo como Comissário do Povo para as Nacionalidades23 . Em 29
de novembro, Stalin entrou no Bureau do Comitê Central do POSDR, junto com
Lenin, Trotsky e Sverdlov.
De outubro de 1918 a julho de 1919 e de maio de 1920 a abril de 1922,
Stalin foi membro do Conselho Militar Revolucionário do Exército Vermelho.
Stalin também foi membro dos Conselhos Militares Revolucionários das Frentes
Oeste, Sul e Sudoeste. Durante a Guerra Civil, Stalin ganhou vasta experiência
na liderança político-militar de grandes massas de tropas em múltiplas frentes:
a defesa de Tsaritsyn, Petrogrado, nas frentes contra Denikin, Wrangel, contra
os Poloneses Brancos, dentre outras. Especialmente na defesa de Tsaritsyn, após
renomeada Stalingrado, Stalin demonstrou seu gênio militar e garantiu a ma-
nutenção das linhas de suporte e transmissão de víveres e armas para as frentes
mais importantes da Guerra Civil, feito que o colocaria ao fim da guerra, junto
a Trotsky, como os dois mais condecorados membros do Exército Vermelho.24
No Plenário do Comitê Central de abril de 1922, Stalin foi eleito para o Po-
litburo e para o Bureau Organizador do Comitê Central, bem como a Secretário
Geral do Comitê Central do Partido. Tal posição significava a liderança do apa-
relho do partido, sendo Lenin, o presidente do Conselho dos Comissários do
Povo, visto por todos como o líder do partido e do governo.
Desde 1922, devido à sua doença, Lenin foi forçado a se afastar da ativi-
dade política. Dentro do Politburo, Stalin, Zinoviev e Kamenev organizaram
uma “troika”. Os três líderes partidários da época combinavam vários cargos im-
portantes. Zinoviev chefiava a influente organização do Partido de Petrogrado
e, ao mesmo tempo, era presidente do Comitê Executivo do Comintern. Kame-
nev chefiava a organização do Partido de Moscou e, ao mesmo tempo, também
chefiava o Conselho de Trabalho e Defesa, que reunia vários comissariados po-
pulares. Stalin, por outro lado, uniu a liderança do Secretariado e do Bureau
Organizador do Comitê Central. Em contraste com a “troika”, Trotsky chefiava
o Exército Vermelho e mantinha posições-chave no Comissariado do Povo para
os Assuntos Militares e no Conselho Militar Revolucionário.
Em setembro de 1922, Stalin, como Comissário do Povo para as Nacionalida-
des, preparou suas propostas para o acordo das relações entre Moscou e a perife-
ria nacional soviética do antigo Império Russo. A periferia passou a fazer parte
da federação soviética com direitos de república com todos os atributos de um
Estado. A palavra “russo” foi removida do nome da própria federação, que passa
a adotar seu renomado nome de União das Repúblicas Socialistas Soviéticas.
No final de 1922, início de 1923, Lenin ditou uma “Carta ao Congresso”,
23 Desde a publicação de seu Marxismo e A Questão Nacional, Stalin já era reconhecido entre seus
pares como uma especialidade sobre as questões das distintas nacionalidades russas, fruto não so-
mente de suas pesquisas sobre o assunto, mas mormente de sua profunda vivência em meio a es-
magadora maioria dos povos que compõem a sociedade russa. Ver STALIN, J.V. O Marxismo e a
Questão Nacional. São Paulo: Nova Cultura, 2019.
24 CARR, Edward Hallet. The Russian Revolution: From Lenin to Stalin. (1917-1929). Londres:

Macmillan, 1979.
J. V. Stalin 27

na qual deu características críticas de seus associados mais próximos no partido,


incluindo Stalin e Trotsky. A carta foi lida entre os membros do Comitê Cen-
tral na véspera do XIII Congresso em maio de 1924. Stalin renunciou, mas sua
renúncia não foi aceita, sendo reconduzido ao seu posto por unanimidade.
Após o XIII Congresso (1924), no qual o grupo de Trotsky sofreu uma derrota
esmagadora, a troika começou a se desfazer. O XIV Congresso faria a crítica
da chamada “oposição de Leningrado”, também conhecida como a “plataforma
dos quatro”, composta por Zinoviev, Kamenev, Sokolnikov e Krupskaya, a qual
abandonaria sua posição oposicionista um ano mais tarde. A oposição teórica
e política a este grupo foi formulada por Stalin, Bukharin, Rykov e Tomsky. O
congresso ocorreu em uma atmosfera de grande tensão, com acusações de desvios
de lado a lado25 .
Stalin tornou-se vitorioso nessa contenda especialmente pelo “apelo leninista”
de 1924 e o subsequente recrutamento em massa de trabalhadores para o par-
tido. Em sua obra “Sobre os fundamentos do leninismo”26 , Stalin escreveu: “Eu
me dedico ao chamado de Lenin”.
Trotsky, que não compartilhava da teoria da vitória do socialismo em um país
apresentada por Stalin, juntou-se a Zinoviev e Kamenev em abril de 1926. Foi
criada a chamada “Oposição Unida”, que propunha o slogan “movamos o fogo
para a direita – contra o Nepman, o kulak e o burocrata”27 .
Na luta interna do partido dos anos 1920, Stalin buscou o papel de um “paci-
ficador”. No final de 1924, chegou a defender Trotsky dos ataques de Zinoviev,
que exigiu sua expulsão do partido sob a acusação de preparar um golpe militar.
Seu método, que aliava duras críticas às posições consideradas de desvio à justeza
no tratamento de seus adversários políticos, pode ser visto em seu cartulário com
Molotov, que trazemos como anexo dessa edição. Exemplo disso têm-se nas dis-
cussões de 1927, onde, Stalin continuou a se comportar como um “pacificador”
enquanto seus aliados, Rykov e Tomsky, faziam declarações muito mais duras.
Em seu discurso no 15º Congresso (1927), Rykov claramente sugeriu que a
Oposição de Esquerda deveria ser enviada para a prisão, e Tomsky, na Confe-
rência Regional de Leningrado do Partido Comunista dos Bolcheviques em no-
vembro de 1927, declarou que “em uma atmosfera de ditadura do proletariado,
pode haver dois ou quatro partidos, mas apenas com uma condição: um partido
estará no poder e todos os outros na prisão”28 .
Entre 1926 e 1927, as relações internas do partido tornaram-se especialmente
tensas. Para publicar literatura de propaganda, a oposição criou uma gráfica
ilegal. No aniversário da Revolução de Outubro em 7 de novembro de 1927, eles
realizaram uma manifestação paralela à do governo central. Essas ações foram o
motivo da expulsão de Zinoviev e Trotsky do partido (16 de novembro de 1927).
Sob a influência da crise de compra de grãos e do escalonamento das con-

25 CARR, E.H. El Socialismo en uno solo país. 2 Vols. Madri: Alianza Editorial, 1974.
26 STALIN, J.V. Sobre os Fundamentos do Leninismo. São Paulo: Nova Cultura, 2018.
27 Ver nota 24.
28 As observações são do historiador trotskista russo Vadim Rogovin, tiradas do capítulo XXXVI

do primeiro volume de seu Была ли альтернатива? Disponível em http://trst.narod.ru/rogo-


vin/t1/xxxvi.htm#ftnref_03. Acessado em 05 de Abril de 2021.
28 Obras Escolhidas

tradições interimperialistas, em 1927, Stalin acusou Bukharin e seus aliados de


“desvio à direita” por suas posições filokulakianas, e começa a implementar o
programa para restringir a NEP, bem como avança nos ousados planos de in-
dustrialização. Stalin declarou 1929 como o ano da “grande virada”. Já cônscio
da inevitabilidade futura de uma outra guerra interimperialista ele declara a in-
dustrialização, a coletivização e uma profunda revolução cultural do partido e
do proletariado como objetivos estratégicos do Estado.
A consolidação da justa linha revolucionária foi feita por Stalin a partir de
mecanismos que já existiam antes dele, e que eram fulcrais para a manutenção
do centralismo democrático dentro do partido, sobretudo a resolução histórica
“Sobre a Unidade do Partido” do 10º Congresso29 , adotada sob pressão pessoal
de Lenin30 .
No XV Congresso do PCUS, realizado em dezembro de 1927, foi decidida a
coletivização da produção agrícola na URSS – a liquidação das fazendas campone-
sas individuais e sua unificação em fazendas coletivas (kolkhozes). A coletivização
foi realizada entre 1928 e 193331 .
O pano de fundo da transição para a coletivização foi a crise da compra de
grãos de 1927, agravada pela necessidade de compra massiva de bens essenciais
para a população. Os camponeses ricos (kulaks) estavam retendo seus grãos em
um esforço para inflar seus preços (a chamada “greve de grãos kulak”). De 15 de
janeiro a 6 de fevereiro de 1928, Stalin pessoalmente fez uma viagem à Sibéria,
durante a qual exigiu colocar a pressão máxima sobre “kulaks e especuladores”32 .
A escala de apreensão dos grãos aumentou significativamente e recaiu com
peso sobre os camponeses ricos e médios, até 25% dos grãos apreendidos fo-
ram revertidos aos pobres rurais. A coletivização foi acompanhada pela chamada
“expropriação” (deskulakização), o extermínio dos Kulaks enquanto classe, que
visava terminar com os privilégios artificiais desse grupo em detrimento da soci-
edade. Tal campanha fora aplicada pelas autoridades locais com base no decreto
do Politburo do Comitê Central datado de 30 de janeiro de 1930 “Sobre as me-
didas para liquidar as fazendas kulak em áreas de coletivização completa ”33 .
No total, entre 1930 e 1931 foram encaminhadas para reassentamentos espe-
ciais 381.026 famílias com um total de 1.803.392 pessoas. Entre 1932 e 1940,
outras 489.822 pessoas chegaram aos assentamentos especiais. Boa parte desses
29 A resolução pode ser acessada em https://www.marxists.org/history/ussr/government/party-
congress/10th/16.htm.
30 É precisamente sob a égide da concepção leninista de partido e a imperiosidade de seu centralismo

que Mariategui aprovará a resolução de expulsão de Trotsky. Ver MARIATEGUI, Jose Carlos. Sobre
o Exílio de Trotsky. In: MARIATEGUI, José Carlos. Textos Escolhidos: Marxismo, Política e
Questão Indígena. Porto Alegre: Cio da Terra, 2021.
31 Nas regiões ocidentais da Ucrânia e Bielorrússia, bem como na Moldávia, Estônia, Letônia e

Lituânia, anexadas à URSS em 1939-1940, a coletivização se deu após a grande guerra patriótica
entre 1949 e 1950. Sobre o assunto ver MARTENS, Ludo. Stalin: Um Novo Olhar. Rio de Janeiro:
Revan, 2003. Especialmente o capítulo IV.
32 Sobre o assunto ver SHISHKIN, V. I. Проблемы истории аграрного и демографического развития

Сибири в XX — начале XXI в.: материалы всероссийской научной конференции. Novosibirsk: Ed. V.
A. Ilynykh, 2009. Especialmente o capítulo 4 sobre a viagem de Stalin à Sibéria no início de 1928.
33 Sobre o assunto ver SHISHKIN, V. I. Проблемы истории аграрного и демографического развития

Сибири в XX — начале XXI в.: материалы всероссийской научной конференции. Novosibirsk: Ed. V.
A. Ilynykh, 2009. Especialmente o capítulo 4 sobre a viagem de Stalin à Sibéria no início de 1928.
J. V. Stalin 29

realocados acabaria por voltar às suas terras ou ocupar novas terras em locais
diferentes nos anos vindouros.
As medidas tomadas pelas autoridades para realizar a coletivização geraram
uma resistência massiva entre os camponeses médios e ricos. Somente em março
de 1930, a OGPU contabilizou 6.500 tumultos, oitocentos dos quais foram su-
primidos com o uso de armas. Em geral, durante 1930, cerca de 2,5 milhões de
camponeses participaram de 14 mil protestos contra a coletivização.
Em 2 de março de 1930, Stalin publicou um artigo no Pravda intitulado “Dizzy
with Success. Concerning Questions of the Collective-Farm Movement”34 , no
qual fazia um balanço dos avanços e retrocessos da implementação das políticas
de coletivização.
Durante o período de deskulakização, entre 1932 e 1933, uma profunda fome
atingiu a região da Ucrânia, do Volga e do Cáucaso, se espalhando desde a Galícia
no território ucraniano até o Azerbaijão. Tal fome foi piorada pela concomitân-
cia de uma epidemia, pelas lutas intestinas pela coletivização e pela má colheita
de grãos dos anos anteriores, causadas em conjunto pela seca e pela má alocação
dos recursos pelos Kulaks, que tentavam sabotar as colheitas. Tal fome, que dei-
xou cerca de um milhão de mortos, seria usada à época e posteriormente como
instrumento político de teses anticomunistas. Voltaremos a esse assunto mais
tarde.
O renomado escritor Sholokhov escreveu várias cartas a Stalin, nas quais fa-
lou diretamente sobre a catástrofe que eclodiu no distrito de Vyoshensky, no
território do Norte do Cáucaso. Em resposta à carta de Sholokhov de 4 de abril
de 1933, Stalin enviou um telegrama em 16 de abril: “Recebi sua carta no dia
quinze. Obrigado pela mensagem. Eu farei o que for preciso. Forneça infor-
mações sobre a quantidade de assistência necessária. Me diga o número”, após
o que ele instruiu Molotov “para satisfazer inteiramente o pedido de Sholokhov,
fornecendo 120 mil puds de ajuda alimentar para o distrito de Vyoshensky e 40
mil para o Verkhnedonsky.
A partir de 1934, a situação do setor agrícola havia se estabilizado. A produ-
ção agrícola começou a crescer de forma constante. A produtividade do trabalho
aumentou graças à eletrificação e mecanização (por exemplo, em 1940, 182 mil
colheitadeiras de grãos trabalhavam na URSS. Na década de 20, o número não
chegava a três digitos35 ). O crescimento da produtividade do trabalho na agricul-
tura libertou 18,5 milhões de pessoas que se tornaram trabalhadores da indústria
e da construção. O historiador russo Nefodov observa que a política de coleti-
vização predeterminou amplamente o sucesso do desenvolvimento industrial do
país e, consequentemente, a vitória da URSS na Grande Guerra Patriótica36 .
Falemos sobre a Industrialização. O plano de cinco anos para a construção
de 1.500 fábricas, aprovado por Stalin em 1928, exigia enormes despesas para a
compra de tecnologias e equipamentos estrangeiros. Para financiar as compras
34 Publicado no Pravda nº60 de 2 de Março de 1930. Disponível em https://www.marxists.org/refe-
rence/archive/stalin/works/1930/03/02.htm. Acessado em 05 de abril de 2021.
35 Sobre o assunto ver MARTENS, Ludo. Stalin: Um Novo Olhar. Rio de Janeiro: Revan, 2003.

Especialmente o capítulo III.


36 Sobre o assunto ver NEFODOV, Sergei Alexandrovich. История России. Факторный анализ. 2

Vols. Moscou: Территория будущего, 2011.


30 Obras Escolhidas

no Ocidente, Stalin decidiu aumentar a exportação de matérias-primas. O Par-


tido acreditava que as fazendas coletivas poderiam ser um meio para restaurar a
exportação de grãos, com a qual o Estado ia retirar da aldeia os produtos agríco-
las necessários ao financiamento das necessidades militares de industrialização.
A industrialização e a coletivização trouxeram uma tremenda mudança social.
Milhões de pessoas mudaram de fazendas coletivas para as cidades. A URSS foi
engolfada por uma migração grandiosa. O número de trabalhadores e empre-
gados passou de 9 milhões de pessoas, em 1928 para 23 milhões em 1940. A
população das cidades, em particular, Moscou aumentou de 2 milhões para 5
milhões, Sverdlovsk de 150 mil para 50037 .
No plenário de janeiro de 1933 do Comitê Central, Stalin anunciou que o
primeiro plano de cinco anos fora concluído em 4 anos e 3 meses. Durante os
anos do primeiro plano, até 1.500 empresas foram construídas, novos ramos in-
dustriais surgiram (construção de tratores, indústria de aviação, etc.)
A propaganda oficial glorificava os esforços abnegados das massas trabalha-
doras sob os nomes do líder de produção Stakhanov, do piloto Chkalov e de
canteiros de obras como os de Magnitka, Dneproges e Uralmash, exemplos de
produtividade das indústrias do Cáucaso38 .
Durante o período do segundo plano quinquenal da URSS, houve um au-
mento da construção de moradias e, no marco da revolução cultural, de teatros,
cinemas, clubes e casas de repouso. A elevação no padrão de vida do trabalhador
e do camponês se tornaram nítidas em comparação aos conturbados momentos
da Guerra Civil, onde 14 nações capitalistas tentaram a obliteração do povo russo
e a razia de seus recursos.
O modelo planificado de economia garantiu altas taxas de crescimento econô-
mico. Assim, nos anos do primeiro e segundo planos quinquenais, o PIB da
URSS cresceu 14-15% ao ano39 . As importações caíram acentuadamente, sinal
da conquista da independência econômica do país. O desemprego foi elimi-
nado. Ao final do segundo plano quinquenal, a URSS ocupava o segundo lugar
no mundo em termos de produção industrial, perdendo apenas para os Estados
Unidos. Até 1941, cerca de 9 mil novas fábricas foram construídas. A União
Soviética, em apenas 13 anos, conseguiu eliminar o atraso que existia antes da
industrialização de Stalin40 .
A revolução cultural foi declarada um dos objetivos estratégicos do Estado.
Nesse contexto, foram realizadas campanhas educativas (iniciadas em 1920), am-
pliada a rede de escolas, escolas técnicas e universidades. Desde 1930, o país
37 Sobre o assunto ver PRIEB, Sérgio. Do socialismo da URSS ao capitalismo da Rússia. Curitiba:
Editora CRV, 2019.
38 Sobre a evolução econômica da Rússia no período em tela um resumo pode ser encontrado em

POMERANZ, Lenina. Do socialismo Soviético ao capitalismo Russo. São Paulo: Ateliê Editorial,
2018.
39 Sobre a evolução econômica da Rússia no período em tela um resumo pode ser encontrado em

POMERANZ, Lenina. Do socialismo Soviético ao capitalismo Russo. São Paulo: Ateliê Editorial,
2018.
40 O melhor livro em língua russa sobre a Industrialização é o de KATASONOV, Valentin.

Экономика сталина. Moscou: Институт русской цивилизации, 2014. Disponível em http://web.ar-


chive.org/web/20180130202257/http://www.rusinst.ru/docs/books/v.yu.katasonov-economika_sta-
lina.pdf. Acessado em 05 de abril de 2021.
J. V. Stalin 31

introduziu a educação primária universal pela primeira vez. No final da década


de 1930, foram alcançados sucessos significativos na luta contra o analfabetismo:
de acordo com o censo de 1939, a percentagem da população alfabetizada era de
87,4%41 .
A inevitabilidade de uma nova grande guerra era bastante óbvia para o Par-
tido Bolchevique. Assim exortava Kamenev já em 1921, a esperar o início de
uma nova “guerra ainda mais monstruosa, ainda mais desastrosa” em seu relató-
rio “Sobre o cerco capitalista” no 10º Congresso42 . No XIV Congresso (dezembro
de 1925), Stalin expressou confiança de que a Alemanha não toleraria os termos
da Paz de Versalhes.
Ao mesmo tempo, Stalin sabia manobrar entre as duas principais alianças das
potências ocidentais. Aproveitando o confronto da Alemanha com a Inglaterra e
a França em 1939, a URSS ocupou os territórios da Bielorrússia Ocidental e da
Ucrânia Ocidental, e desencadeou uma guerra com a Finlândia. Tal manobra
tática permitiu avançar as linhas de defesa e evitar uma possível aliança entre
Franceses, Ingleses e Alemães além de adiar o começo da guerra o que permitiu
uma melhor organização das forças internas.
Ao selar o acordo Molotov-Ribbentrop, a URSS garantiu o tempo necessário
para a preparação para a guerra inevitável. Muitas vezes visto por liberais e
anticomunistas, à direita e à esquerda, como um pacto espúrio, o acordo de não-
agressão, que por sinal existia nos mesmos moldes entre as potências capitalistas e
a Alemanha, permitiu a organização das linhas de defesa, a produção de material
bélico, a consecução de importantes exercícios militares e quase um ano e meio
de paz armada antes da invasão.43
Já às 5 horas e 45 minutos do dia 22 de junho, Stalin recebeu em seu escri-
tório no Kremlin o Comissário do Povo para Relações Exteriores da URSS V.M.
Molotov, o Comissário do Povo para Assuntos Internos L.P. Beria, o Comissário
do Povo para a Defesa S.K. Timoshenko, o Vice-Presidente do Conselho de Co-
missários do Povo da URSS L.Z. Mekhlis e Chefe do Estado-Maior do Exército
Vermelho G.K. Zhukov44 .
No dia seguinte ao início da guerra, 23 de junho de 1941, o Conselho dos Co-
missários do Povo da URSS e o Comitê Central do Partido Comunista da União
Soviética, por uma resolução conjunta, formaram a Sede do Comando Principal
das Forças Armadas da URSS, que incluía Stalin e cujo presidente foi nomeado o
41 Sobre os dados da educação na URSS, ver ANGLO-SOVIET YOUTH FRIENDSHIP ALLIANCE.
Education in the USSR. Disponível em https://www.revolutionarydemocracy.org/archive/anglo-
sov.htm#: :text=Compulsory%20education%20from%208%2D15,and%2016%2C000%20in%20ru-
ral%20places. Acessado em 05 de abril de 2021.
42 O discurso foi proferido no encontro noturno do dia 8 de março, as atas podem ser encontradas

em http://publ.lib.ru/ARCHIVES/K/KPSS/10_s’ezd_RKP(b).(1933).[djv-fax].zip. Acessado em 05
de abril de 2021.
43 Sobre o assunto ver RAMOS, Vinicius da Silva. De Sosso a Stalin: A Construção de uma figura

lendária. Disponível em https://www.cienciasrevolucionarias.com/post/de-sosso-a-st%C3%A1lin-a-


constru%C3%A7%C3%A3o-de-uma-figura-legend%C3%A1ria. Acessado em 03 de Abril de 2021.
44 O próprio marechal Zhukov narra em suas memórias os primeiros dias da Grande Guerra Pa-

triótica e joga por terra a versão anticomunista sobre a suposta paralisia de Stalin diante do ataque
alemão. Ver ZHUKOV, Georgy K. G. Zhukov, Marshal of Soviet Union: Reminiscences and Reflec-
tions. 2 Vols. Moscou: Progress Publishers, 1985. Também sobre o assunto. V.A. La grande guerre
nationale de l’Union Soviétique. Moscou: Éditions du Progrès, 1974.
32 Obras Escolhidas

Comissário da Defesa do Povo, Marechal da União Soviética C. K. Timoshenko.


Em 24 de junho, Stalin assinou um decreto do Comitê Central do Partido Comu-
nista dos Bolcheviques e do Conselho de Comissários do Povo da URSS sobre a
criação de um Conselho de Evacuação sob o Conselho de Comissários do Povo da
URSS, destinado a organizar a evacuação da “população, instituições, bens mi-
litares e outros, equipamentos de empresas e outros valores” da parte ocidental
da URSS45 .
Quando Minsk caiu em 28 de junho, por consecutivos erros do General Pa-
vlov, que já havia sido admoestado por Stalin em 1940 quando de um exercício
junto a Zhukov sobre os possíveis ataques alemães46 , Stalin se retirou para sua
datcha em Kuntsevo. Em 29 de junho, Stalin não foi ao Kremlin, o que causou
grande preocupação entre sua comitiva. Na tarde de 30 de junho, seus colegas
do Politburo vieram vê-lo em Kuntsevo e decidiram criar um gabinete conjunto
de comando. Durante toda a Grande Guerra Patriótica, esse período de um dia
foi o maior afastamento de Stalin dos assuntos do país, conforme assevera o histo-
riador liberal Roy Medvedev47 . Ou seja, o mito de um Stalin vacilante e distante
no princípio da agressão nazista é uma farsa.
À medida que a guerra se desenvolvia, ela se tornou uma escola não só para
Stalin, mas igualmente para o Exército Vermelho. A violência inaudita desenca-
deada pelo terror nazista não perdoava sequer crianças e idosos. Era uma guerra
de aniquilação, muito distinta daquela que era luta na fronte ocidental.48
Ao mesmo tempo, na opinião do Marechal Zhukov, a partir da Batalha de
Stalingrado, Stalin começou a se mostrar como uma pessoa “de grande capaci-
dade estratégica”, além de ser capaz de ”encontrar o principal elo no ambiente
estratégico.” Em geral, o Marechal Zhukov avalia Stalin como “um Comandante
Supremo digno da Chefatura”. Zhukov vai além, e considera necessário prestar
homenagem a Stalin, como um organizador de destaque em “Garantir as ope-
rações, criando reservas estratégicas, organizando a produção de equipamentos
militares e, em geral, criando tudo o que é necessário para fazer uma guerra”49 .
Uma semana após o início da guerra, Stalin foi nomeado presidente do recém-
formado Comitê de Defesa do Estado. Em 3 de julho, foi veiculado por rádio
para toda a Rússia o discurso de Stalin exortando o povo ao combate contra a
ameaça Hitlerista, o discurso havia sido gravado no dia 28 do mês anterior. Nele
Stalin disse:

45 Sobre o assunto ver DEBORINE, Grigori. Les secrets de la seconde guerre mondiale. Moscou:
Editions de Moscou, 1972.
46 O marechal Zhukov descreve o Exercício de guerra de 1940 em suas memórias. Ver ZHUKOV,

Georgy K. G. Zhukov, Marshal of Soviet Union: Reminiscences and Reflections. 2 Vols. Moscou:
Progress Publishers, 1985.
47 MEDVEDEV, Roy; MEDVEDEV, Zhoures. Um Stalin desconhecido. Rio de Janeiro: Editora

Record, 2006.
48 Sobre o assunto ver CHUIKOV, V. I.; RIABOV, V. S. A Grande Guerra Patriótica da URSS (1941-

1945). São Paulo: Nova Cultura, 2018.


49 Zhukov escreve suas memórias após o período Krushchev e usa a oportunidade como um acerto

de contas histórico. Zhukov havia sido um dos que apoiaram o grupo de Krushchev visando garantir
maiores privilégios aos militares. Ver ZHUKOV, Georgy K. G. Zhukov, Marshal of Soviet Union:
Reminiscences and Reflections. 2 Vols. Moscou: Progress Publishers, 1985.
J. V. Stalin 33

“A guerra com a Alemanha fascista não pode ser considerada uma guerra comum. Não
é apenas uma guerra entre dois exércitos, é também uma grande guerra de todo o povo
soviético contra os exércitos fascistas alemães. O objetivo desta guerra nacional patriótica
em defesa de nosso país contra os opressores fascistas não é apenas eliminar o perigo que
paira sobre nosso país, mas também ajudar todos os povos europeus que sofrem sob o jugo
do fascismo alemão... Camaradas, nossas forças são inúmeras. O inimigo arrogante logo
aprenderá isso à sua própria custa. Lado a lado com o Exército Vermelho, muitos milhares
de trabalhadores, fazendeiros coletivos e intelectuais estão se levantando para lutar contra o
agressor inimigo. As massas de nosso povo se levantarão aos milhões. Os trabalhadores de
Moscou e Leningrado já começaram a formar enormes Guardas do Povo em apoio ao Exército
Vermelho. Essas Guardas do Povo devem ser criadas em todas as cidades que correm o risco
de invasão inimiga; todos os trabalhadores devem ser despertados para defender com suas
vidas sua liberdade, sua honra e seu país nesta guerra patriótica contra o fascismo alemão.”50

Em 10 de julho de 1941, o Quartel-General do Alto Comando foi transfor-


mado no Quartel-General do Comando Supremo (SVK), e Stalin foi nomeado
presidente em substituição a Timoshenko. Em 19 de julho de 1941, Stalin substi-
tuiu Timoshenko como Comissário de Defesa do Povo, por decisão colegiada do
SVK. Em 8 de agosto de 1941, por decreto do Presidium do Soviete Supremo da
URSS, Stalin foi nomeado Comandante Supremo das Forças Armadas da URSS,
e o Quartel-General do Comando Supremo foi renomeado para Quartel-General
do Alto Comando Supremo (SVGK). Tal estrutura que contava não só com a pre-
sença de todo o alto-oficialato das forças de defesa da URSS, mas também com
os responsáveis pelas questões internas, de indústria e comércio, de relações ex-
teriores e de logística se manteria durante o restante da Guerra Patriótica51 .
Desde julho de 1941, Stalin já avançava na rumo à confecção de protocolos
militares-diplomáticos com as potências no enfrentamento ao nazifascismo. Na
realidade, essas negociações já ocorriam desde 1937 em idas e vindas52 . Ainda
em julho daquele ano, Stalin encontrou-se com o representante pessoal e conse-
lheiro mais próximo do presidente dos Estados Unidos Franklin D. Roosevelt –
Harry Hopkins53 . De 16 a 20 de dezembro, em Moscou, Stalin negociou com
o ministro das Relações Exteriores britânico E. Eden sobre a questão da conclu-
são de um acordo entre a URSS e a Grã-Bretanha, sobre uma aliança na guerra
contra a Alemanha e sobre a cooperação no pós-guerra54 .
Durante a batalha por Moscou em 1941, depois que o estado de sítio foi decla-
rado, Stalin permaneceu na capital, o que foi visto pelo povo como uma declara-
ção de total compromisso com a causa soviética e elevou o moral das tropas55 . No
dia 7 de novembro de 1941, sob a direção de Stalin, o tradicional desfile militar
50 Reminiscences and Reflections. 2 Vols. Moscou: Progress Publishers, 1985.
51 Sobre o assunto ver sobre o assunto. V.A. La grande guerre nationale de l’Union Soviétique.
Moscou: Éditions du Progrès, 1974; CHUIKOV, V. I.; RIABOV, V. S. A Grande Guerra Patriótica da
URSS (1941-1945). São Paulo: Nova Cultura, 2018.
52 Sobre o assunto ver MINISTÉRIO DAS RELAÇÕES EXTERIORES DA URSS, Documents et

matériaux se rapportant à la veille de la Deuxième Guerre Mondiale Tome I: Novembre 1937 – 1938.
Moscou: Editions em Langues Etrangères, 1948; MINISTÉRIO DAS RELAÇÕES EXTERIORES DA
URSS, Documents et matériaux se rapportant à la veille de la Deuxième Guerre Mondiale Tome II:
1938-1939. Moscou: Editions em Langues Etrangères, 1948.
53 Os cadernos de registro de visitas de Stalin estão disponíveis em russo e podem ser acessados em

http://istmat.info/node/165. Acessado em 05 de abril de 2021.


54 Idem.
55 Sobre o assunto ver MARTENS, Ludo. Stalin: Um Novo Olhar. Rio de Janeiro: Revan, 2003.

Especialmente o capítulo IX.


34 Obras Escolhidas

foi realizado na Praça Vermelha, e de lá os soldados partiram direto para a fronte,


o que mostra a altivez do povo soviético mesmo diante das maiores adversidades.
O início de uma virada radical na guerra, iniciada na Batalha de Stalingrado56 ,
continuou durante a ofensiva de inverno do Exército Vermelho em 1943. Na Ba-
talha de Kursk, o que começou em Stalingrado foi concluído57 . Cônscio por
meio de sua rede de espiões dos desenvolvimentos de seus “aliados” que já se
preparavam para o pós-guerra, sedentos em verem alemães e soviéticos minarem
uns as forças dos outros, em 11 de fevereiro de 1943, Stalin assinou um decreto
sobre o início dos trabalhos para a criação de uma bomba atômica.
É imperioso lembrar aqui que, desde o início da Guerra, Stalin já admoestava
as potências ocidentais sobre a necessidade da abertura da fronte ocidental para
mitigar os esforços e o morticínio do povo russo. A vasta documentação diplo-
mática e os cartulário pessoais que trazemos em anexo comprovam tais fatos. O
que fica como lição indelével é que os aliados optaram por não o fazer até o úl-
timo momento possível, obviamente de forma estratégica, pensando em minar as
forças da URSS com medo da eclosão de uma nova onda revolucionária em solo
europeu. Entre a vida das pessoas e o lucro o capitalismo, jamais se preocupou
com uma única vida humana58 .
Em 25 de novembro de 1943, Stalin, acompanhado pelo Comissário do Povo
para Relações Exteriores da URSS, Molotov, do Vice-Presidente dos Comissários
dos Povos da URSS Voroshilov voa para Teerã. De 28 de novembro a 1º de de-
zembro de 1943, participa da Conferência de Teerã – a primeira conferência dos
“Três Grandes” da Segunda Guerra Mundial.59
O terceiro período da guerra foi caracterizado por um crescimento quanti-
tativo significativo das forças armadas alemãs. O número de tanques e canhões
autopropelidos na Wehrmacht em 1º de janeiro de 1945 era de 12 990 unidades,
enquanto em 1º de janeiro de 1944 era de 9149 e em 1º de janeiro de 1943 apenas
7927 unidades60 . Este foi o resultado das atividades no âmbito do programa de
mobilização militar indústria alemã, que começou em janeiro de 1942, porém
produziria resultados vultosos apenas em 1943 e 1944.
Não obstante, o crescimento quantitativo, devido às enormes perdas na Frente
Oriental e à falta de combustível, foi acompanhado por uma queda na qualidade
das Forças Armadas alemãs. Assim, a iniciativa estratégica permaneceu com a
URSS e seus aliados, e as perdas da Alemanha aumentaram significativamente
durante esse período. Aliado a isso está o próprio desenrolar da Guerra, que
ensinou ao Exército Vermelho as melhores formas de abordagem estratégica
do conflito. Ressalta-se a importância das longas batalhas como Stalingrado e
Leningrado para a depuração técnica do alto comando das forças armadas da
56 Uma descrição impressionante da batalha vista por dentro pode ser encontrada no livro do Ma-
rechal TCHUIKOV. Ver TCHUIKOV, Vasili I. A Batalha de Stalingrado. Rio de Janeiro: Editora
Civilização Brasileira, 1966.
57 Sobre os desenvolvimentos das frentes durante a Grande Guerra Patriótica ver: V.A. La grande

guerre nationale de l’Union Soviétique. Moscou: Éditions du Progrès, 1974.


58 Sobre o assunto ver, KULKOV, E; RJECHEVSKI, O e TCHELICHEV, I. A verdade e a mentira

sobre a segunda guerra mundial. Lisboa: Avante, 1985.


59 Parte das atas das reuniões de Teerã se encontram nesse livro em forma de anexo.
60 Para números da Wehrmacht alemã recomendamos o seguinte estudo: ROLF-DIETER, Müller.

Hitler’s Wehrmacht, 1935–1945. Lexington: University Press of Kentucky, 2016.


J. V. Stalin 35

URSS.61
O Exército Vermelho começou a campanha de inverno de 1943-1944 com
uma ofensiva grandiosa na margem direita da Ucrânia. Como resultado da ofen-
siva de quatro meses, as tropas soviéticas libertaram a margem direita da Ucrâ-
nia, suas regiões ocidentais e alcançaram a fronteira no sul da URSS, no sopé
dos Cárpatos. Como resultado da ofensiva, a frente foi empurrada para trás
de suas posições originais no final de dezembro de 1943 entre 250 e 450 km.
Simultaneamente com a liberação da margem direita da Ucrânia, a operação
Leningrado-Novgorod começou. Um dos principais objetivos era levantar o blo-
queio de Leningrado62 .
Como resultado da ofensiva, as tropas soviéticas derrotaram o Grupo de Exér-
citos do Norte da Wehrmacht. Além disso, o bloqueio de quase 900 dias de Le-
ningrado foi levantado e quase todo o território das regiões de Leningrado e
Novgorod, bem como a maior parte da região de Kalinin, foi libertada, e as tro-
pas soviéticas entraram no território da Estônia. Essa ofensiva das tropas soviéti-
cas privou o comando alemão da oportunidade de transferir as forças do Grupo
de Exércitos Norte para a margem direita da Ucrânia, onde as tropas soviéticas
desfeririam o golpe principal no inverno de 194463 .
Como resultado da operação Leningrado-Novgorod, as tropas avançaram de
220 a 280 km. Os meses de abril a maio foram marcados pela operação ofensiva
da Crimeia. As tropas soviéticas libertaram a Crimeia e derrotaram o 17º exército
de campanha dos alemães. A Frota do Mar Negro recuperou a sua base principal
– Sebastopol, o que melhorou significativamente as condições para a flotilha mi-
litar de Azov. A ameaça à retaguarda das frentes foi eliminada pela libertação da
margem direita da Ucrânia. As tropas soviéticas libertaram a Crimeia em pouco
mais de um mês, enquanto os alemães demoraram quase 10 meses apenas para
capturar Sebastopol64 .
Em junho de 1944, os Aliados abriram uma segunda frente, o que piorou sig-
nificativamente a situação militar na Alemanha. Durante as campanhas de verão
e outono, o Exército Vermelho realizou várias operações importantes, comple-
tou a libertação da Bielorrússia, da Ucrânia e dos estados bálticos (exceto para
algumas regiões da Letônia), bem como a libertação parcial da Tchecoslováquia;
libertou as regiões árticas setentrionais e do norte da Noruega, forçou a rendição
e a entrada na guerra contra a Alemanha da Romênia e Bulgária.65
No verão, as tropas soviéticas entraram na Polônia. Ainda antes haviam pe-
netrado no território ocidental da Ucrânia e da Bielorrússia, bem como no da
Lituânia. As tropas soviéticas se reuniram, em um primeiro momento, com as
formações do Exército da Pátria polonês, que estava subordinado ao governo

61 Sobre a batalha de Leningrado ver PAVLOV, Dmitri V. Leningrad. Paris: Presses de la cité, 1967.
62 Idem.
63 Sobre o assunto ver STALIN, J. V. Sobre a Grande Guerra Patriótica da União Soviética. São

Paulo: Raízes da América, 2016.


64 Algumas destas batalhas e movimentos podem ser vistas em DA SILVA, Francisco C. T.; PITILLO,

João Claudio Platenik; VINHAS, Ricardo Quiroga. A Grande Guerra Patriótica dos Soviéticos. Rio
de Janeiro: Multifoco, 2019.
65 Idem; ver também CHUIKOV, V. I.; RIABOV, V. S. A Grande Guerra Patriótica da URSS (1941-

1945). São Paulo: Nova Cultura, 2018.


36 Obras Escolhidas

polonês emigrado sitiado em Londres. O governo émigré polonês era formado


por membros da burguesia e setores do grande capital, e tinha um caráter aber-
tamente antipopular, sendo protegido pela Inglaterra de Churchill. Os liberta-
dores soviéticos foram recebidos com enorme alívio pela população polonesa, e
rapidamente se conformou um novo exército e um novo governo popular daque-
les poloneses que ficaram e lutaram a guerra66 .
Em agosto, quando as forças avançadas do Exército Vermelho se aproximavam
da capital polonesa, Varsóvia, o Exército da Pátria se revoltou. Os insurgentes lu-
taram por dois meses, mas em 2 de outubro foram forçados a se render. Ainda no
mês de agosto, o levante nacional eslovaco começou contra o regime pró-alemão
liderado por Joseph Tissot. Em outubro, as tropas soviéticas realizaram com su-
cesso a operação Debrecen e iniciaram a operação Budapeste, com o objetivo de
derrotar as tropas alemãs em território húngaro e retirá-las da guerra. No en-
tanto, as tropas alemãs em Budapeste se renderam apenas em 13 de fevereiro de
1945. Em 28 de dezembro, foi criado o governo provisório da Hungria, que em
20 de janeiro concluiu um armistício com a URSS.67
As operações ofensivas das tropas soviéticas na direção oeste foram retomadas
apenas em janeiro de 1945. Como resultado dos combates, as tropas soviéticas
ocuparam parte da Prússia Oriental, libertaram o território do Norte da Polônia
e, bloqueando o agrupamento Prussiano Oriental do inimigo criaram condições
favoráveis para sua derrota subsequente68 .
Na direção de Kaliningrado, eles começaram uma operação que teve como
resultado o avanço das tropas da 3ª Frente Bielorrussa a uma profundidade de
130 km, criando condições para a conclusão da operação Prussiana Oriental.
Na outra direção, na Polônia, o território foi limpo das tropas alemãs e uma
cabeça de ponte foi capturada na margem esquerda do Oder, que mais tarde
seria usado na ofensiva em Berlim. No sul da Polônia e na Tchecoslováquia, as
tropas venceram e em 18 de fevereiro alcançaram a área do curso superior do
Vístula.69
Viena foi tomada em 13 de abril. De 10 de fevereiro a 4 de abril, foi realizada
com sucesso a operação da Pomerânia Leste (nordeste de Berlim). Ao mesmo
tempo, as batalhas por Königsberg começaram na Prússia Oriental. Como resul-
tado da operação de Königsberg, as principais forças alemãs da Prússia Oriental
foram derrotadas70 .
Na direção polonesa, em março de 1945, as tropas alcançaram a linha dos
rios Oder e Neisse, uma ponte de 60km até Berlim. As tropas anglo-americanas
concluíram a liquidação do agrupamento Ruhr e, em meados de abril, unidades
avançadas chegaram ao Elba. A perda das regiões de matérias-primas mais im-
portantes levou a um declínio na produção industrial na Alemanha. No entanto,
as forças armadas alemãs ainda eram uma força impressionante. De acordo com
66 Sobre a questão polonesa na Grande Guerra Patriótica ver ERICKSON, John. The Road to Ber-

lim. Londres: Cassel, 2007.


67 Sobre os desenvolvimentos das campanhas na fronte húngara ver, também, ERICKSON, John.

The Road to Berlim. Londres: Cassel, 2007.


68 Idem.
69 Ibidem.
70 Ibidem.
J. V. Stalin 37

o departamento de inteligência do Estado-Maior do Exército Vermelho, em me-


ados de abril havia 223 divisões e brigadas em sua composição71 .
Em 16 de abril de 1945, a operação ofensiva de Berlim das tropas soviéticas
começou. Em 25 de abril, as tropas soviéticas cercaram Berlim completamente.
Em 25 de abril de 1945, as tropas soviéticas no rio Elba se encontraram pela pri-
meira vez com tropas americanas avançando do oeste. Em 30 de abril, enquanto
cercava Berlim, o Führer suicidou-se. Em 2 de maio de 1945, a guarnição de
Berlim se rendeu72 .
Quando o exército soviético iniciou a operação em Berlim, em 16 de abril
de 1945, Churchill percebeu que as tropas anglo-americanas naquela época não
podiam entrar fisicamente em Berlim, e se concentrou na ocupação de Lübeck
para impedir a ocupação soviética da Dinamarca.
Após o fim da Grande Guerra Patriótica, o preço em vidas humanas do triunfo
contra o hitlerismo mostrou seu peso. Faltava mão de obra, gado e equipamen-
tos no país. Isso obrigou o governo a aumentar o investimento na agricultura,
expandir o trabalho de mecanização e eletrificação do campo73 .
Em dezembro de 1947, a reforma monetária foi realizada e eliminou as con-
sequências da guerra na circulação econômica. Entre 1948 a 1953, houve um
declínio anual nos preços de varejo de bens de consumo74 . A redução dos pre-
ços melhorou o padrão de vida do povo soviético. Em 1952, o custo do pão era
de 39% do preço do final de 1947, o do leite 72%, o da carne 42%, o do açúcar
49% e o da manteiga 37%. Conforme observado no 19º Congresso do PCUS, ao
mesmo tempo o preço do pão aumentou 28% nos EUA, 90% na Inglaterra e na
França mais que dobrara; o custo da carne nos Estados Unidos aumentou 26%,
na Inglaterra 35% e na França – 88%. Se em 1948 os salários reais eram em mé-
dia 20% mais baixos do que o nível pré-guerra, então em 1952 eles já excediam
o nível pré-guerra em 25%, e quase alcançaram o nível de 192875 .
A URSS atingiu o nível anterior à guerra para a maioria dos indicadores
econômicos já em 1948, após o qual o rápido crescimento do PIB continuou.
No final dos anos 1940 – 1950, a economia soviética já estava se desenvolvendo
predominantemente ao longo de um caminho intensivo. De 1939 a 1956, um
método de aumento da eficiência do trabalho estava em vigor, que era uma com-
binação de incentivos morais e materiais para os trabalhadores e racionalização
da produção, além introdução das conquistas mais recentes da ciência e tecnolo-
gia76 .
Apesar das dificuldades dos anos do pós-guerra, o governo aumentou o fi-
71 STALIN, J. V. Sobre a Grande Guerra Patriótica da União Soviética. São Paulo: Raízes da América,
2016.
72 Sobre a tomada de Berlim ver TCHUIKOV, Vassily. A Conquista de Berlim. 1945 – A Derrota dos

Nazistas. São Paulo: Contexto, 2019.


73 Sobre o assunto ver POMERANZ, Lenina. Do socialismo Soviético ao capitalismo Russo. São

Paulo: Ateliê Editorial, 2018. PRIEB, Sérgio. Do socialismo da URSS ao capitalismo da Rússia.
Curitiba: Editora CRV, 2019.
74 Idem, Ibidem.
75 STALIN, J.V. Speech of the 19th Congress of the Communist Party of the Soviet Union. In:

STALIN, J.V Works. Vol XVI. Londres: Red Star Press, 1986.
76 Vide nota 72.
38 Obras Escolhidas

nanciamento do orçamento do Estado para a educação e a ciência. Durante os


anos do quarto plano quinquenal, o número de institutos de pesquisa aumentou
em quase um terço, academias de ciências foram criadas no Cazaquistão, Letônia
e Estônia. Desde 1951, a educação escolar de sete anos tornou-se obrigatória77 .
Em 24 de julho de 1945, em Potsdam, Truman informou a Stalin que os Esta-
dos Unidos “agora têm armas de extraordinário poder destrutivo”78 . Segundo as
lembranças de Churchill, Stalin sorriu, mas não se interessou pelos detalhes. A
partir disso, Churchill concluiu que Stalin não entendia nada e não estava ciente
dos eventos79 . Naquela mesma noite, Stalin ordenou a Molotov que conversasse
com Kurchatov sobre acelerar o trabalho no projeto atômico80 .
Em 20 de agosto de 1945, para administrar o projeto atômico, foi criado um
Comitê Especial com poderes extraordinários, chefiado por Lavrenti Beria. A
diretriz de Stalin visava garantir a criação de bombas atômicas de urânio e plutô-
nio até 1948. Em janeiro de 1946, Stalin se encontrou pela primeira vez com o
desenvolvedor da bomba atômica, o acadêmico I. V. Kurchatov. Em 1946, Stalin
assinou cerca de sessenta documentos que determinaram o desenvolvimento da
ciência e tecnologia atômica, cujo resultado foi o teste bem-sucedido da primeira
bomba atômica soviética em 29 de agosto de 1949, na região de testes de Semi-
palatinsk, no Cazaquistão, e a construção da primeira usina nuclear do mundo
em Obninsk, em 195481 .
Apesar do rápido desenvolvimento de seu arsenal atômico, Stalin capitaneou
uma campanha internacional pela sua proscrição e banimento82 . Os Estados
Unidos não somente planejavam como usaram a bomba atômica como instru-
mento de força contra a população civil de um Japão já às beiras da rendição in-
condicional, e usariam sua potência nuclear como arma de intimidação durante
todo o período da Guerra Fria.83
Com o declínio militar e político da Grã-Bretanha no pós guerra frente aos Es-
tados Unidos e a URSS e, tendo em vista suas ideologias diametralmente opostas,
a conflagração da guerra fria seria uma questão de tempo. De um lado o campo
da URSS em sua luta pela emancipação da humanidade e a transposição de sua
pré-história, e do outro os países capitalistas capitaneados pelos Estados Unidos,
buscando a manutenção do colonialismo e do neocolonialismo, da exploração do
homem pelo homem e a centralidade do capital em detrimento da vida humana.
Os Estados Unidos rapidamente avançaram suas frentes militares em todos os
continentes adquirindo bases em países geograficamente estratégicos para a con-
77 Vide nota 40.
78 Para a documentação de Potsdam ver V.A. The Tehran, Yalta and Potsdam Conferences. Docu-
ments. Moscou: Progress Publishers, 1969.
79 CHURCHILL, Winston. Memórias da Segunda Guerra Mundial. Rio de Janeiro, 1995.
80 Os russos já trabalhavam em seu próprio projeto atômico desde 1943. Sobre o assunto ver BAG-

GOTT, Jim. The First War of Physics: The Secret History of the Atom Bomb, 1939-1949. Nova York:
Pegasus Books, 2010.
81 Idem.
82 A entrevista de Stalin ao Pravda sobre o assunto em 1951 expõe as linhas mestras de seu pensa-

mento e pode ser vista em STALIN, J. V. Prohibition of Atomic Weapons. In: STALIN, J. V. For
Peaceful Coexistence: Post War Interviews. Nova York: International Publishers, 1951.
83 Sobre o assunto ver LOSURDO, Domenico. A linguagem do Império. São Paulo: Boitempo,

2010.
J. V. Stalin 39

tenção das ondas revolucionárias, instaurando regimes títeres por todo o terceiro
mundo.84 Apesar das tensões da crise iraniana de 1946, Molotov, em 1949, con-
segue, nas negociações multilaterais para a criação da ONU, garantir o assento
da URSS no Conselho de Segurança. Não obstante, já começava a demoniza-
ção da figura de Stalin em todo o Ocidente e as esdrúxulas comparações entre
aquele que tentou escravizar a humanidade, Hitler, e o responsável direto por
sua extinção.85
No novo teatro de guerra, a URSS procurou manter e expandir sua área de
influência buscando a um só tempo proteger e consolidar suas fronteiras, bem
como auxiliar o proletariado de todo mundo na boa consecução de suas lutas
intestinas contra o capitalismo e/ou o colonialismo86 . Para tanto, reconheceu
a independência dos Estados Bálticos e auxiliou na construção das democracias
populares do Leste.
Em setembro de 1947, uma reunião de líderes comunistas do Leste Euro-
peu, além de representantes dos partidos comunistas da Itália e França e Andrei
Zhdanov como representante da URSS foi realizada na Polônia. A partir dessa
reunião seria formado o Bureau Comunista de Informação87 .
No que tange à Alemanha, houve a sugestão de um estado unificado e desmi-
litarizado, a negativa das potências capitalistas levou à crise de Berlim de 1948,
com a posterior formação, em 1949, da República Federal da Alemanha, em sua
porção ocidental e capitalista e a República Democrática Alemã, em sua porção
oriental88 .
Na Polônia, Hungria e Checoslováquia, os partidos populares, com suporte
da URSS, acabaram por se sagrar vitoriosos nas eleições da segunda metade da
década de 50. A monarquia foi finalmente abolida na Bulgária e na Romênia, o
que permitiu a formação do bloco do Leste89 .
No tabuleiro geopolítico asiático, o mundo veria a triunfal vitória do Partido
Comunista da China e a subida do grande timoneiro Mao Zedong ao poder em
outubro de 1949. Mao visita Stalin em dezembro de 1949, e em 1950 um novo
acordo é fechado entre os dois países em substituição ao Tratado Sino-Soviético
de 1945.90

84 Sobre o assunto ver PRASHAD, Vijay. Balas de Washington. São Paulo: Expressão Popular,
2020. Do mesmo autor também ver PRASHAD, Vijay. Estrela Vermelha sobre o Terceiro Mundo.
São Paulo: Expressão Popular, 2019; PRASHAD, Vijay. The Poorer Nations: A possible history of
the Global South. Londres: Verso, 2013 e PRASHAD, Vijay. The Darker Nations: A People’s
History of the Third World. Nova York: The New Press, 2007.
85 Sobre o assunto ver SAUNDERS, Frances S. Quem Pagou a conta? A CIA na guerra fria da

cultura. Rio de Janeiro: Record, 2008.


86 Sobre o assunto ver SHISHKIN, V. A. Становление внешней политики послереволюционной

России (1917—1930 годы) и капиталистический мир: от революционного «западничества» к


«национал-большевизму». Очерк истории. São Petersburgo: Dmitriy Bulanin, 2002.
87 Sobre o Cominfor ver: PROCACCI, G. The Cominform. Minutes of the Three Conferences
(1947-1949). Milão: Feltrinelli, 1994.
88 Sobre o assunto ver MURPHY, Austin. Triumph of Evil: The reality of the USA’s Cold War

Victory. Florença: European Press Academic Publishing, 2002.


89 Interessantes apontamentos históricos sobre o desenvolvimento do Bloco Oriental podem ser vis-

tos em MARTENS, Ludo. A URSS, A Contrarrevolução de Veludo e Outros Escritos. São Paulo:
Ciências Revolucionárias, 2020.
90 Um importante e compreensivo rol de fontes em língua portuguesa pode ser encontrado em
40 Obras Escolhidas

Ao fim da Segunda Guerra Mundial, a Coréia, que estava anteriormente sob


o julgo do fascismo nipônico, era ocupada pela União Soviética e pelos Estados
Unidos acima e abaixo do paralelo 38. A intestina luta revolucionária do povo
coreano já durava várias décadas desde seu início, sendo a guerra de guerrilha
antinipônica capitaneada por Kim Il Sung e auxiliada tanto pelos Chineses atra-
vés da Manchúria, bem como pelos Russos por suas fronteiras, a mais avançada
força de unificação verdadeiramente coreana no tabuleiro geopolítico. Se os Rus-
sos deixaram a Coreia paulatinamente durante a segunda metade da década de
40, o mesmo não pode ser dito dos Estadunidenses, que militarizavam a Penín-
sula e buscavam de toda forma a instauração artificial de um governo títere pró
Ocidente. Cônscio da inevitabilidade do conflito vindouro devido às constantes
provocações do Sul ao longo do Paralelo, bem como à recusa de uma reunificação
feita aos moldes da vontade popular, Kim Il Sung visitou Moscou em março de
1949 e novamente em março de 1950. A sangrenta guerra, que até hoje formal-
mente não acabou, opôs a União Soviética e a China, que prestaram auxílios de
toda sorte à Coreia do Norte, aos Estados Unidos e seus títeres, que defenderam
com unhas e dentes seus protetorados no Sul pensando exclusivamente no lucro,
mas que não se furtaram a uma política de terra arrasada contra os próprios ci-
dadãos coreanos, com vistas a ganhar a guerra. O “empate” foi o primeiro sinal
internacional patente que o predador do norte não era imbatível91 .
Em 1950, Stalin publica Marxismo e Problemas de Linguística92 , onde po-
lemiza com escolas idealistas da linguística soviética e demonstra seu profundo
domínio das questões étnicas nacionais. Em 1952, Stalin publicaria o seu último
livro, Problemas Econômicos do Socialismo na URSS. Ambos os escritos estão
presentes neste volume.
A década de 1950 seria marcada na URSS por movimentações constantes de
grupos reformistas em sua luta pelo poder, perpassada por acusações de parte a
parte, escândalos internos e uma crescente escalada do poder do Exército Ver-
melho dentro da política que não foi balanceada com a correção ideológica dos
setores militarizados. Stalin era cônscio dessa realidade e organizava com Molo-
tov e Kaganovich um novo movimento de combate aos desvios internos do PCUS,
porém ele não viveria o bastante para as batalhas desse novo desafio93 .
No primeiro dia de março de 1953, um de seus guardas o encontra caído no
chão de sua Dacha. Assim como Lenin, um aneurisma havia paralisado metade
de seu corpo. Aos 5 de março, o Pai dos Povos termina sua caminhada. A morte
de Stalin seria a vida dos golpistas e reformistas russos, primeiro Beria e depois
Krushchev94 , mas o exemplo de Stalin e sua vida de lutas, este viverá para sempre

SCARMELOTO, Klaus; LIVRAMENTO, Igor. Coleção Mundo Socialista: China 1839-1949. São
Paulo: Ciências Revolucionárias, 2020.
91 Sobre o assunto ver JONG HO, HO; SOK HUI, KANG; THAE HO, PAK. Os Imperialistas dos

Estados Unidos Iniciaram a Guerra da Coreia. São Paulo: Nova Cultura, 2020; V.A. História da
Revolução Coreana. São Paulo: Nova Cultura, 2019; CHA, Victor. The Impossible State. North
Korea, Past and Future. Nova York: Harper Collins, 2012.
92 Tradução inédita para o português está nos Anexos deste volume.
93 Sobre o assunto ver MARTENS, Ludo. Stalin: Um Novo Olhar. Rio de Janeiro: Revan, 2003.
94 Sobre o assunto ver FURR, Grover. Khrushchev Lied. The Evidence that Every Revelation of

Stalin’s (and Beria’s) Crimes in Nikita Khrushchev’s Infamous Secret Speech to the 20th Party Con-
gress of the Communist Party of the Soviet Union on February 25, 1956, Is Provably False. Kettering:
J. V. Stalin 41

como tesouro do povo trabalhador.

Conclusão

Conforme asseverava o filósofo e militante comunista italiano Domenico Lo-


surdo em entrevista ao site Opera Mundi:
“...hoje as coisas mudaram porque com a televisão e as novas mídias, a classe dominante não
tem somente esse monopólio de produção de ideias, mas também, o que é muito importante, o
monopólio da produção das emoções. Transmitem-se imagens horríveis que podem ter sido
escolhidas em uma série de outras imagens propositalmente ou que podem até ser falsas.
[Através desse artifício] se consegue provocar uma indignação geral [na opinião pública] e
esse monopólio de produção de emoções que é muito importante para o início das guerras....
Devemos tomar consciência dessa nova situação: das ideias e emoções, com uma tecnologia e
psicologia muito refinadas e sofisticadas. Nesse sentido, o aparelho militar do imperialismo
ficou mais forte não só no domínio militar clássico, mas no plano multimidiático. Armas
midiáticas provocam a opinião pública a ser favorável ao início de uma guerra.95

Destarte, nos encontramos sobre a égide daquilo que Losurdo chama de um


processo e um projeto de desemancipação humana96 , ou seja, um combate sis-
temático por parte do capitalismo vitorioso após o colapso da URSS e do bloco
oriental contra todas as conquistas angariadas pela luta dos povos, usando, para
tanto, todos os aparatos ideológicos multimidiáticos estatais e paraestatais para
impingir, via controle das emoções e sentimentos, a autofobia97 e os desvios der-
rotistas nas camadas populares em geral e nas esquerdas especificamente.
Ora, tal projeto deve necessariamente ser um combate pela memória, um ata-
que e uma desconstrução das experiências objetivas por meio do véu da ideologia
e das mentiras, verossímeis ou não, abalizadas pelo aparato acadêmico do poder
simbólico coadunado ao aparato repressivo do poder político. Lembremo-nos
das lições de Walter Benjamin:
“Cabe ao materialismo histórico fixar uma imagem do passado, como ela se apresenta, no
momento do perigo, ao sujeito histórico, sem que ele tenha consciência disso. O perigo
ameaça tanto a existência da tradição como os que a recebem. Para ambos, o perigo é o
mesmo: entregar-se às classes dominantes, como seu instrumento. Em cada época, é preciso
arrancar a tradição ao conformismo, que quer apoderar-se dela. Pois o Messias não vem
apenas como salvador; ele vem também como o vencedor do Anticristo. O dom de despertar
no passado as centelhas da esperança é privilégio exclusivo do historiador convencido de que
também os mortos não estarão em segurança se o inimigo vencer. E esse inimigo não tem
cessado de vencer.”98

Tal ataque deve ser, necessariamente, um ataque àquilo que melhor repre-
senta para o hegemon a experiência libertadora a ser combatida. No século XIX,
Erythros Press and Media, 2011.
95 LOSURDO, D. A produção das emoções é o novo Estágio de Controle da Classe dominante.

Disponível em https://operamundi.uol.com.br/politica-eeconomia/31615/losurdo-producao-das-
emocoes-e-novo-estagio-do-controle-da-classedominante”. Acessado em 16 de março de 2021.
96 Sobre o conceito de desemancipação humana ver LOSURDO, Domenico. Democracia ou Bona-

partismo. São Paulo: Editora Unesp, 1993.


97 Sobre o conceito de autofobia em Losurdo ver LOSURDO, Domenico. Fuga Da História? A

Revolução Russa E Chinesa Vistas De Hoje. Rio de Janeiro: Revan, 2004.


98 BENJAMIN, Walter. Obras Escolhidas. Vol. 1. Magia e Técnica, Arte e Política. Ensaios sobre

literatura e História da Cultura. São Paulo: Brasiliense, 1987, pgs.223-234.


42 Obras Escolhidas

esses ataques eram voltados a Marx e Engels, no final da década de 10 do século


passado ao bolchevismo, na década de 20 a Lenin, e desde o final da segunda
guerra mundial tais ataques se voltam a Stalin, a Mao e a todas as figuras que
lutaram pela superação da exploração99 , pela libertação da humanidade de suas
correntes e pelo desenvolvimento de uma democracia verdadeira.
Stalin foi, desde a infância, salvo por sua própria inteligência, que o permitiu
alcançar um ciclo de estudos que era vetado à esmagadora maioria daqueles pro-
vindos das massas de subalternos, que na Geórgia da época, viviam em condições
análogas aos servos100 e lavravam seus campos como no século XIV. Tornou-se
professor em Tiflis, publicou uma obra de quase 20.000 páginas, capitaneou sua
nação em duas guerras, uma civil e uma global, deixou escritos sobre linguística,
política, economia, estratégia militar, questão agrária, teoria marxista, dentre
outros. Considerar este homem como uma pessoa rude e bruta, incapaz de qual-
quer pensamento, é um acinte contra a verdade dos fatos e um papel indigno de
qualquer pessoa que se diga marxista.
Sua obra em vida foi tão perseguida por seus inimigos quanto seria o seu
legado em morte, sinal do medo que o marxismo-leninismo instila no coração
de qualquer estirpe de reacionário.
É tarefa revolucionária de cada militante comunista combater a virulência e
as farsas anticomunistas, quer elas se apresentem pela direita, quer pela esquerda
mascaradas por palavreado ultra esquerdista e ideologia social-democrata capitu-
lacionista, munidos da arma da teoria. É visando essa tarefa que nós nos propuse-
mos o esforço gargantuano de organizar os trabalhos do homem que industriali-
zou, em duas décadas, um país semifeudal e campesino, derrotou o nazifascismo
e preveniu, com seus esforços, a eclosão de uma terceira guerra interimperialistas
de tipo mundial.
Ao fazê-lo, não somente deixamos um legado bibliográfico às gerações pre-
sentes e futuras de militantes e pesquisadores brasileiros, mas, sobremaneira,
ensejamos uma disputa franca e justa pelo discurso, pela nossa história e pela
autocrítica eivada da autofobia pequeno-burguesa.
Em combate àquele que estrebucha contra os fatos, os desconhece ou quer
mudá-los com dolo.
Nossa pugna por uma sovietologia brasileira, livre de preconceitos rasteiros
filocidentais e mitologias quixotescas, visa à construção de uma esquerda revo-
lucionária que conheça sua história pelo que ela de fato foi, e não pelo chorume
que seus vendilhões e detratores oferecem a partir da lixeira da ideologia.
A hagiografia pertence aos estudos de História Antiga e Medieval, a autofagia
aos lisossomos e a demonização aos cultos de vertente neopentecostal. O mar-
xismo, desde que se erigiu enquanto método científico, renega qualquer apre-
ensão idealista de homens, ideias ou temporalidades.
Levantemos, portanto, o estandarte de Marx, Engels, Lenin e Stalin. Que
nossa história nos encha de profundo orgulho e faça tremer aos inimigos da
99 Sobre o assunto ver PARENTI, Michael. A Cruzada Anticomunista. Rio de Janeiro: Civilização

Brasileira, 1970.
100 A servidão na Rússia, formalmente, fora abolida em 1861, em Tiflis, apenas em 1864, na prática,

ela continua a existir sob diversas formas até o triunfo da revolução de Outubro.
J. V. Stalin 43

classe trabalhadora. Que sejamos justos em nossa autocrítica sem cairmos no


desvio da autofagia.
Que o estudo de Stalin nos sirva não como âncora que imobiliza rumo ao
passado, mas como farol luminoso que clareia o presente de lutas e o futuro da
superação da pré-história da humanidade.
Paz entre nós, guerra aos senhores.
João Carvalho, abril de 2021.
Recomendação de Bibliografia introdutória ao
estudo de Stalin e seu período
Ao remate de nossa breve introdução deixo, abaixo, uma lista tentativa de lei-
turas introdutórias mínimas, nas línguas ocidentais e em russo, para se compre-
ender os nortes da produção de Stalin, sua vida, suas lutas e os desdobramentos
políticos e geográficos que perpassam seu caminhar. Busquei, na lista, trazer to-
dos aqueles aportes fundamentais para se conhecer o que há de mais hodierno
na historiografia pós abertura dos arquivos, bem como os clássicos ineludíveis e
aqueles escritores burgueses que possuem um limiar mínimo de honestidade e
verossimilhança em suas obras.
Que um estudo revigorado de Stalin e seu período possa nascer na esquerda
brasileira e no campo historiográfico de nossa sovietologia, livre de dogmatismos,
transposições mecânicas, demonizações rasteiras e preconceitos atávicos.
A, KAHN; M, SAYERS. A Grande Conspiração: A Guerra Secreta Contra União
Soviética. São Paulo: Brasiliense. 1957.
BRAR, Harpal. Trotskismo x Leninismo. Lições da História. São Paulo: Cara-
vansari, 2009.
BUTLER, Susan. My Dear Mr. Stalin. The complete correspondence of Franklin
Delano Roosevelt and Josef V. Stalin. Londres: Yale University Press, 2005.
CARR, E.H. El Socialismo en uno solo país. 2 vols. Madrid: Alianza Editorial,
1974
CHISTY, Mikhail. Julgamentos de Moscou 1936-1938: a derrota dos dissidentes
ou da quinta coluna? Disponível em: https://www.cienciasrevolucionarias.com/-
post/julgamentos-de-moscou-de-1936-1938-a-derrota-dos-dissidentes-ou-a-quin-
ta-coluna. Acessado em 20 de março de 2021.
CHISTY, Mikhail. Sobre o conluio dos contrarrevolucionários de Trotsky e Bukha-
rin com os Hitleristas. Disponível em: https://www.cienciasrevolucionarias.com/-
post/sobre-o-conluio-dos-contrarrevolucion%C3%A1rios-de-trotsky-e-bukharin-c-
om-os-hitleritas. Acessado em 26 de Março de 2021.
CHISTYI, Mikhail. Os Grandes Expurgos: a tentativa de golpe militar em 1937 a
luz de novos fatos. Disponível em: https://www.cienciasrevolucionarias.com/post-
/os-grandes-expurgos-a-tentativa-de-golpe-militar-em-1937-a-luz-de-novos-fatos.
Acesso em 02 de Abril de 2021.
DA SILVA, Francisco C. T.; PITILLO, João Claudio Platenik; VINHAS, Ricardo
Quiroga et SANTOS, Roberto Santa. A Segunda Guerra Mundial e seus mo-
mentos decisivos. São Paulo: Raízes da América, 2017.
DA SILVA, Francisco C. T.; PITILLO, João Claudio Platenik; VINHAS, Ricardo
44 Obras Escolhidas

Quiroga. A Grande Guerra Patriótica dos Soviéticos. Rio de Janeiro: Multifoco,


2019
DAVIES, Sarah; HARRIS, James. Stalin: A new History. Cambridge: Cambridge
University Press, 2005.
EMELYANOV, Yuri. Os grandes expurgos: houve uma conspiração militar? Dis-
ponível em: https://www.cienciasrevolucionarias.com/post/houve-uma-conspira-
%C3%A7%C3%A3o-militar. Acessado em 15 de Fevereiro de 2021
FURR, Grover. Yezhov vs. Stalin: The Truth About Mass Repressions and the
So-Called Great Terror in the USSR. Kettering: Erythros Press and Media, 2016.
FURR, Grover. Blood Lies: The Evidence that Every Accusation against Josef
Stalin and the Soviet Union in Timothy Snyder’s Bloodlands Is False. Plus: What
Really Happened in the Famine of 1932–33; the Polish Operation; the Great
Terror; the Molotov-Ribbentrop Pact; the Soviet Invasion of Poland; the Katyn
Massacre; the Warsaw Uprising; and Stalin’s Anti-Semitism. Nova York: Red
Star Publishers, 2014
FURR, Grover. Khrushchev Lied. The Evidence that Every Revelation of Stalin’s
(and Beria’s) Crimes in Nikita Khrushchev’s Infamous Secret Speech to the 20th
Party Congress of the Communist Party of the Soviet Union on February 25,
1956, Is Provably False. Kettering: Erythros Press and Media, 2011.
FURR, Grover. Leon Trotsky and the Barcelona “May Days” of 1937. Journal of
Labor and Society, nº20, Setembro/2017, pp 325-347
FURR, Grover. Leon Trotsky’s Collaboration with Germany and Japan. Trotsky’s
Conspiracies of the 1930s, Volume Two. Kettering: Erythros Press and Media,
2017.
FURR, Grover. New Evidence of Trotsky’s Conspiracy. Kettering: Erythros
Press and Media, 2020.
FURR, Grover. Stalin: Waiting for ... the Truth! Exposing the Falsehoods in
Stephen Kotkin’s Stalin: Waiting for Hitler, 1929–1941. Nova York: Red Star
Publishers. 2019.
FURR, Grover. The Fraud of the Dewey Commission. Nova York: Red Star
Publishers, 2018.
FURR, Grover. The Moscow Trials as Evidence. Nova York: Red Star Publishers,
2018.
FURR, Grover. The Murder of Sergei Kirov: History, Scholarship and the Anti-
Stalin Paradigm. Kettering: Erythros Press and Media, 2013.
FURR, Grover. The Mystery of the Katyn Massacre: The Evidence, The Solution.
Kettering: Erythros Press and Media, 2018.
FURR, Grover. Trotsky’s Amalgams. Trotsky’s Lies, The Moscow Trials as Evi-
dence, The Dewey Commission. Trotsky’s Conspiracies of the 1930s, Volume
One. Kettering: Erythros Press and Media, 2015.
FURR, Grover. Trotsky’s Lies. Kettering: Erythros Press and Media, 2019.
GETTY, J. A.; NAUMOV, Oleg V. The Road to Terror: Stalin and the Self-
Destruction of the Bolsheviks, 1932-1939. Londres: Yale University Press, 1999.
GETTY, John A.; MANNING, Roberta T. Stalinist Terror: New Perspectives,
J. V. Stalin 45

Nova York: Cambridge University Press, 1993.


GETTY, John A.; Origins of the Great Purges: The Soviet Communist Party
Reconsidered, 1933-1938, New York, Cambridge University Press, 1985. Ninth
printing, 1996
GUSEV, Mateus Pereira Jorge. União Soviética, uma poderosa potência Indus-
trial. Disponível em: https://ojcrb.wordpress.com/2020/09/04/urss-a-poderosa-
potencia-industrial/. Acessado em 02 de março de 2021. Tradução do capí-
tulo РОСТ МАТЕРИАЛЬНОГО БЛАГОСОСТОЯНИЯ ГРАЖ ДАН СССР do li-
vro 20 лет Советской власти. Статистический сборник (цифровой материал для
пропагандистов, publicado pela ПАРТИЗДАТ ЦК ВКП(б) em 1937
IAKOVLEV, Nikolay. A Cia contra a URSS. Disponível em: http://www.hist-
socialismo.com/docs/CIA_contra_URSS.pdf. Acessado em 12 fevereiro de 2021.
INSTITUTO MARX-ENGELS-LENIN. Stalin: Uma breve biografia. São Paulo:
Nova Cultura, 2019.
KHABAROVA, Tatiana. O Bolchevismo hoje: lições, perspectivas e problemas.
Disponível em https:/hist-socialismo.com/docs/Khabarova_Bolchevismo_hoje_-
II.pdf. Acessado em 16 de março de 2021.
KOTKIN, Stephen. Stalin: Paradoxos do poder 1879-1928. Companhia das Le-
tras. São Paulo, 2015.
KOTKIN, Stephen. Stalin: Volume I: Paradoxes of Power, 1878–1928. Londres:
Penguin Press, 2014.
KOTKIN, Stephen. Stalin: Volume II: Waiting for Hitler, 1929-1941. Londres:
Penguin Press, 2017
KOZINKIN, Oleg. Были ли секретные протоколы к Пакту Молотова - Риббентро-
па? Disponível em: https://stalinism.ru/stalin-i-gosudarstvo/byili-li-sekretnyie-
protokolyi-k-paktu-molotova-ribbentropa.html. Acessado em 16 de março de 2021.
KUROMIYA, Hiroaki. Stalin’s Industrial Revolution. Cambridge: Cambridge
University Press, 1988.
LITTLEPAGE, John; BESS, Demaree. In search of Soviet Gold. Nova York:
Harcourt, Brace and Company, 1938.
LOSURDO, D. Stalin: História Crítica de Uma lenda Negra. Rio de Janeiro:
Revan, 2010
LOSURDO, Domenico. Fuga Da História? A Revolução Russa E Chinesa Vistas
De Hoje. Rio de Janeiro: Revan, 2004.
LOSURDO, Domenico. Guerra e Revolução. O mundo um século após outubro
de 1917. São Paulo: Boitempo, 2017
MARCOU, LILLY. A Vida Privada de Stalin. Rio de Janeiro: Zahar, 2013
MARTENS, Ludo. Stalin: Um Novo Olhar. Rio de Janeiro: Revan, 2003.
MARTENS. L. A URSS, a contrarrevolução de veludo e outros escritos. São
Paulo: Edições Ciências Revolucionárias, 2020.
NOREN, James. Watching the Bear: Essay’s on CIA’s Analysis of the Soviet
Union. Disponível em https://www.cia.gov/static/b0d215187dbd27053be822db-
279d6d4d/Watching-the-Bear-Essays-on-CIAs-Analysis-of-the-Soviet-Union.pdf.
Acessado em 18 de fevereiro de 2021
46 Obras Escolhidas

POMERANZ, Lenina. Do socialismo Soviético ao capitalismo Russo. São Paulo:


Ateliê Editorial, 2018
PRIEB, Sérgio. Do socialismo da URSS ao capitalismo da Rússia. Curitiba: Edi-
tora CRV, 2019.
PRITT, Dennis Nowell. The Zinoviev Trial. Londres: Gollancz, 1936.
RAPOSO, Manoel Coelho. Stalinismo. O leninismo da época da construção do
socialismo. Fortaleza: Forgrel, 2004.
RIESS, Curt. The Nazis go underground. Nova York: Doubleday, Doran and
Company, 1944.
SAKHAROV, V.A et alli. The Lie of the Lenin Testament. Toronto: Northern
Star Publishers, 1977.
SCARMELOTTO, Klaus (org). Em defesa de Stalin: Textos Biográficos. São
Paulo: Ciências Revolucionárias, 2020
SCARMELOTTO, Klaus. A Atualidade de Stalin. São Paulo: Ciências Revoluci-
onárias, 2021.
SCOTT, John. Au-delà de 1’Oural, Pantin: Ed. Les Bons Caractères, 2010
SERVICE, Robert. Stalin: A Biography. Londres: Picador, 2008.
SHISHKIN, V. A. Становление внешней политики послереволюционной России
(1917—1930 годы) и капиталистический мир: от революционного «западничества»
к «национал-большевизму». Очерк истории. São Petersburgo: Dmitriy Bulanin,
2002.
SHVED, Vladislav N. Катынь. Современная история вопроса. Moscou: Algoritm,
2012.
SHVED, Vladislav N. Тайна Катыни. Moscou: Algoritm, 2007.
SIDOLI, Roberto. Il volo de Pjatakov. Disponível em: https://www.robertosi-
doli.net/pubblicazioni/trotskij-tradito-da-trotskij. acessado em 20 de fevereiro
de 2021.
STRONG, Anna Louise. The Stalin Era . Nova York: Mainstream Publishers,
1956.
STRYGIN, Sergey. “Волынская Катынь” оказалась делом рук гитлеровцев. Dis-
ponível em http://katyn.ru/index.php?go=News&in=view&id=253. Acessado em
17 de março de 2021.
TAUBMAN, W. Khrushchev: the man and his era. Nova Iorque: W. W. Norton
& Company, 2003.
TAUGER, Mark B. The 1932 Harvest and the Famine of 1933. Slavic Review,
50(1), 70–89. doi:10.2307/2500600. Acessado em 22 fevereiro de 2021
TAUGER, Mark B. Arguing from errors: On certain issues in Robert Davies’ and
Stephen Wheatcroft’s analysis of the 1932 Soviet grain harvest and the Great
Soviet famine of 1931 – 1933. Europe-Asia Studies, 58(6), 973 -84
TAUGER, Mark. B. Stalin, Soviet Agriculture and Collectivization . Apud TRENT-
MANN, F; JUST, F. Food and Conflict in Europe in the Age of the Two World
Wars
THURSTON, Robert W. Life and Terror in Stalin’s Russia 1934-1941. Londres:
Yale University Press, 1996.
J. V. Stalin 47

TOTTLE, Douglas. Fraud, Famine and Fascism. The Ukrainian Genocide Myth
from Hitler to Harvard. Toronto: Progress Books, 1987
ULIANOVA, Maria. On the relations between Lenin and Stalin. Disponível
em: https://revolutionarydemocracy.org/rdv8n1/lenstal.htm. Acessado em 12
de Março de 2021.
URRUTIA, LUIS. Os processos de Moscou. Disponível em https://www.cienci-
asrevolucionarias.com/post/os-processos-de-moscou. Acessado em 18 de Março
de 2021.
ZHUKOV, Yuri N. Сталин: тайны власти. Moscou: Vagrius, 2008.
ZHUKOV, Yuri N. Иной Сталин. Политические реформы в СССР в 1933-1937 гг.
Moscou: Vagrius, 2003
ZHUKOV, Yuri N. Настольная книга сталиниста. Moscou: Eksmo, 2010.
ZHUKOV, Yuri N. Гордиться, а не каяться! Правда о сталинской эпохе (сборник
статей и интервью). Moscou: Eksmo, 2011
50 Obras Escolhidas
J. V. Stalin 51

PARTE I

A construção do
revolucionário
J. V. Stalin 53

O Partido Social-Democrata da
Rússia e suas tarefas imediatas
novembro e dezembro de 1901

O pensamento humano teve de suportar muitas provações, muitas penalida-


des e transformações antes de atingir o socialismo elaborado e erguido sobre ba-
ses científicas. Os socialistas da Europa Ocidental tiveram de tatear longamente
no escuro, no deserto do socialismo utópico (irrealizável, impossível), antes de
abrir o caminho, antes de pesquisar e demonstrar as leis da vida social, e, por con-
seguinte, a necessidade do socialismo para o gênero humano. Desde o início do
século passado, a Europa produziu muitos estudiosos honestos, corajosos, cheios
de abnegação, que se dedicaram a descobrir o meio de livrar a humanidade dos
males, cada vez mais graves e agudos, que acompanham o desenvolvimento do
comércio e da indústria. Muitas tempestades, muitos rios de sangue, passaram
pela Europa Ocidental, assinalaram as tentativas de destruir a opressão da mino-
ria sobre a maioria, mas, não obstante, o mal continuava o mesmo, as feridas se
tornavam ainda mais agudas e os sofrimentos iam ficando cada dia mais intole-
ráveis. Uma das principais causas desse fato pode ser encontrada no seguinte:
o socialismo utópico não explicava as leis da vida social, mas considerava a vida
de cima, perdia-se nas nuvens, quando era necessária uma estreita ligação com a
realidade. Os utopistas estabeleciam, como tarefa imediata, a realização do socia-
lismo, quando na vida não existia qualquer base para a sua realização; esperavam
– o que tinha consequências ainda mais dolorosas – a construção do socialismo
pelos poderosos deste mundo, os quais, na sua opinião, se deixariam facilmente
persuadir da excelência dos ideais socialistas (Robert Owen, Louis Blanc, Fou-
rier, etc.). Essa concepção sufocava completamente o movimento operário real e
a massa operária, que é a única portadora natural do ideal socialista. Os utopistas
não podiam compreendê-lo. Queriam criar a felicidade sobre a terra com as leis,
com as declarações, sem o auxílio do próprio povo (dos operários). Não dedica-
vam uma atenção particular ao movimento operário e negavam frequentemente
até mesmo a sua importância. Como consequência, suas teorias eram apenas
teorias que não penetravam na massa operária, cujo seio amadurecia, de modo
inteiramente independente dessa teoria, uma grande ideia, anunciada em mea-
dos do século passado pela voz do genial Karl Marx: “a emancipação da classe
operária deve ser obra da própria classe operária... Proletários de todos os países,
unam-se!”
Dessas palavras surgia claramente aquela verdade que hoje é evidente até para
os “cegos”, isto é, que para realizar o ideal socialista é indispensável a atividade
dos operários e sua união numa força organizada, independentemente da nacio-
nalidade e do país. Era necessário demonstrar essa verdade – e foi o que fizeram,
54 Obras Escolhidas

magnificamente, Marx e seu parceiro Engels – para lançar as bases indestrutíveis


de um forte partido social-democrático, que hoje, como destino inexorável, se
acha suspenso sobre a ordem burguesa europeia, ameaçando destruí-la e edi-
ficar sobre suas ruínas a sociedade socialista. O desenvolvimento da ideia do
socialismo seguiu na Rússia quase o mesmo caminho que na Europa Ocidental.
Também na Rússia os socialistas tatearam longamente no escuro antes de atin-
gir a consciência social-democrática, o socialismo científico. Também entre nós
existiam os socialistas e existia um movimento operário, mas ambos caminhavam
independentemente um do outro, cada qual por sua própria conta: os socialistas
com os sonhos utópicos (“Terra e liberdade”, “Vontade do Povo”101 ) e o movi-
mento operário com as revoltas espontâneas.
Ambos agiam no mesmo período de tempo (de 1870 a 1890) sem nada saber
um do outro. Os socialistas não tinham uma base na população trabalhadora,
portanto, sua atividade era abstrata, suspensa no ar. Os operários não tinham
dirigentes, organizadores e, assim, seu movimento resultava em revoltas desor-
denadas. Por esse motivo, principalmente a luta heroica dos socialistas perma-
necia infrutífera, e seu heroísmo lendário despedaçava-se contra a muralha gra-
nítica da autocracia. Os socialistas russos só se aproximaram da massa operária
após 1890. Compreenderam que somente na classe operária estava a salvação, e
que somente esta classe poderia realizar o socialismo. Então a social-democracia
russa concentrou todos os seus esforços e sua atenção no movimento que, naquela
época, surgira entre os operários russos. O operário russo, ainda não bastante
consciente, não preparado para a luta, esforçava-se por sair gradualmente de sua
situação desesperada e por melhorar de qualquer modo a própria sorte. É óbvio
que naquele movimento não havia ainda um trabalho sistemático de organização;
era um movimento espontâneo.
E a social-democracia intervém nesse movimento inconsciente, espontâneo e
desorganizado. Esforçou-se por desenvolver a consciência dos operários, esforçou-
se por unificar a luta dispersa e fracionada de grupos isolados de operários con-
tra patrões isolados, fundindo-a numa luta de classe geral, a fim de que esta se
transformasse na luta da classe operária russa contra a classe dos opressores da
Rússia, e esforçando-se por dar a essa luta um caráter organizado.
Nos primeiros tempos, a social-democracia não podia ampliar a própria ati-
vidade nas fileiras da massa operária e, por isso, contentava-se com o trabalho
nos círculos de agitação e propaganda. As atividades dos círculos eram, então, a
única forma de seu trabalho. O objetivo de tais círculos era constituir, entre os
próprios operários, um grupo que posteriormente dirigisse o movimento. Por
isso, os círculos eram constituídos de operários avançados: somente os operários
selecionados tinham a possibilidade de trabalhar nos círculos. Mas o período
dos círculos foi rapidamente superado. A social-democracia depressa sentiu a
necessidade de sair dos restritos limites do círculo e de estender sua influência
à grande massa operária. Para isso, também contribuíam as condições exterio-
res. Era na época em que o movimento espontâneo se intensificava de modo
particular entre os operários.
Quem dentre vocês não se recorda do ano em que Tiflis, quase toda, era presa

101 Zemlya i Volya (Terra e liberdade); Narodnaya Volya – (Vontade do Povo).


J. V. Stalin 55

desses movimentos espontâneos? Greves não organizadas sucediam-se umas às


outras nas manufaturas de fumo e nas oficinas ferroviárias. Isso acontecia entre
nós nos anos de 1897 e 1898, e acontecera na Rússia um pouco antes. Era neces-
sário ir oportunamente em seu auxílio, e a social-democracia apressou-se em dar
sua ajuda. Começou a luta pela redução da jornada de trabalho, pela abolição
das multas, pelo aumento do salário, etc. A social-democracia sabia muito bem
que o desenvolvimento do movimento operário não se limitava a essas pequenas
reivindicações, que essas reivindicações não eram a finalidade do movimento,
que eram apenas um meio para atingir o fim. Embora essas reivindicações sejam
pequenas, embora os próprios operários de determinada cidade e região lutem
hoje isolados, essa mesma luta ensina aos operários que a vitória completa só
poderá ser atingida quando toda a classe operária desfechar, como uma força
organizada, poderosa e unida, o assalto contra o seu inimigo. Essa mesma luta
mostrará aos operários, que, além de seu inimigo direto, o capitalista, têm outro
inimigo ainda mais infatigável, que é a força organizada de toda a classe bur-
guesa, o Estado capitalista moderno, com suas tropas, os tribunais, a polícia, os
cárceres, os gendarmes. Se até na Europa Ocidental a mínima tentativa do operá-
rio no sentido de melhorar sua situação se choca de encontro ao poder burguês
e se na Europa Ocidental, onde já foram conquistados os direitos humanos, o
operário é forçado a travar uma luta direta com o poder constituído, com maior
razão o operário russo se choca necessariamente, em sua luta, contra o poder
da autocracia, que é inimigo vigilante de todo e qualquer movimento operário,
não só porque defende os capitalistas, mas ainda porque, como poder autocrá-
tico, não pode admitir a atividade autônoma das classes sociais e especialmente a
atividade autônoma de uma classe como a classe operária, mais oprimida e ofen-
dida do que as outras classes. Assim concebia a social-democracia russa o curso
do movimento e todos os seus esforços eram dirigidos no sentido de divulgar tais
ideias entre os operários. Esta era a sua força e assim se explica seu grande e vito-
rioso desenvolvimento desde o primeiro dia, conforme o demonstrou a grandiosa
greve das fábricas têxteis de Petersburgo, em 1896.
Mas as primeiras vitórias fizeram com que alguns elementos débeis perdes-
sem o rumo e virassem a cabeça. Seguindo o mesmo caminho dos socialistas
utópicos de outrora, que só tomavam em consideração o objetivo final e, obceca-
dos por isso, não acompanhavam ou mesmo negavam a luta real dos operários,
que se travava sob seus próprios olhos, alguns social-democratas russos tomaram
em consideração, ao contrário, apenas o movimento espontâneo dos operários,
suas exigências cotidianas. Naquele período (há cinco anos), a consciência de
classe dos operários russos encontrava-se em nível muito baixo. O operário russo
mal despertava de um sono secular e seus olhos habituados à escuridão não con-
seguiam, por certo, distinguir claramente tudo quanto acontecia num mundo
que se lhe revelava pela primeira vez. Suas exigências não eram muitas e suas
reivindicações não eram grandes. O operário russo ainda não ia além de um
mísero aumento de salário ou de uma redução das horas de trabalho. A massa
operária russa não tinha nem sequer ideia da necessidade de transformar a or-
dem existente, de destruir a propriedade privada, de organizar a sociedade soci-
alista. Hesitava até mesmo em pensar na destruição daquela escravidão em que
definha todo o povo russo sob o domínio da autocracia, na liberdade do povo,
56 Obras Escolhidas

na participação do povo na direção do Estado. E então, enquanto uma parte da


social-democracia da Rússia considerava seu dever introduzir suas próprias ideias
socialistas no movimento operário, uma outra parte, atraída pela luta econômica,
pela luta por uma melhoria parcial da situação dos operários (como a redução
das horas de trabalho e o aumento do salário), estava pronta a esquecer por com-
pleto o seu grande dever e os seus grandes ideais. Esses, como seus amigos da
Europa Ocidental (os chamados bernsteinianos), diziam: “Para nós, o movimento
é tudo, o fim não é nada”.
Não lhes interessava de modo algum o fim pelo qual lutasse a classe ope-
rária; só importava a própria luta. Desenvolveu-se a chamada política dos dois
vinténs. Chegou-se ao ponto de um belo dia o jornal de Petersburgo Rabótchaia
Mysl proclamar: “Nosso programa político é a jornada de trabalho de 10 horas,
o restabelecimento dos feriados abolidos com a lei de 2 de junho”.102
Em vez de dirigir o movimento espontâneo, de infundir nas massas os ide-
ais social-democráticos e de orientá-las para o nosso objetivo final, essa parte da
social-democracia russa transformara-se num instrumento cego do próprio mo-
vimento; pusera-se cegamente a reboque da parte menos evoluída dos operários,
limitando-se a exprimir as necessidades e as exigências sentidas pela massa ope-
rária naquele determinado momento. Numa palavra, ela ficava a bater numa
porta aberta, sem ousar entrar na própria casa. Era impotente para explicar à
massa operária que o objetivo final é o socialismo, ou ao menos que o objetivo
imediato é a derrubada da autocracia e – coisa ainda mais triste – julgava essa
explicação inútil e até mesmo prejudicial. Considerava o operário russo uma cri-
ança e temia assustá-lo com essas ideias audaciosas. Além disso, uma certa parte
da social-democracia pensava mesmo que, para atingir o socialismo, não é ne-
cessária nenhuma luta revolucionária; somente a luta econômica – as greves e os
sindicatos, as cooperativas de consumo e de produção – é necessária para que o
socialismo seja um fato. Julgavam errada a doutrina da velha social-democracia
internacional, a qual demonstrava que, até a passagem do poder político para
as mãos do proletariado (ditadura do proletariado), é impossível a transforma-
ção da ordem social existente, é impossível a libertação completa dos operários.
Segundo eles, o socialismo não representa, por si mesmo, nada de novo e não
se distingue, propriamente falando, do atual sistema capitalista; diziam que o
socialismo pode facilmente existir mesmo na ordem atual e cada sindicato, e até
mesmo cada armazém de consumo ou cooperativa de produção, já constitui uma
“parte do socialismo”. Com esses miseráveis trapos de uma vestimenta esfar-
rapada, queriam fazer uma roupa nova para a humanidade sofredora! Mas a
coisa mais triste e incompreensível para os revolucionários era que essa parte dos
social-democratas russos seguia a mesma doutrina de seus mestres da Europa Oci-
dental (Bernstein e companhia) até o ponto de afirmar, de forma despudorada:
a liberdade política (liberdade de greve, de organização sindical, de palavra, etc.)
é compatível com o tsarismo, e, portanto, uma luta propriamente política, uma

102A Lei de 2 de junho de 1897 fixou a jornada de trabalho dos trabalhadores das empresas in-
dustriais e das oficinas ferroviárias em 111/2 horas, e também reduziu o número de férias dos tra-
balhadores. Por conta disso, Stalin pontua: “É preciso dizer que ultimamente a Liga de Luta de
São Petersburgo e o corpo editorial de seu jornal renunciaram à tendência anterior, exclusivamente
econômica, e agora buscam introduzir a ideia da luta política em suas atividades”.
J. V. Stalin 57

luta pela derrubada da autocracia, é totalmente supérflua, já que, para se atingir


ao objetivo, a luta econômica, por si só, se revela suficiente; basta que as greves
sejam mais frequentes, apesar das proibições do governo, para que a autoridade
desista de punir os grevistas e a liberdade de greve e de reunião sobrevenha por
si mesma.
Assim, esses falsos “social-democratas” sustentavam que o operário russo de-
via consagrar todos os seus esforços e sua energia somente à luta econômica e não
devia seguir outros “grandes ideais”. Na prática, sua atividade se expressava em
considerarem como único dever o trabalho local nesta ou naquela cidade. Para
eles, a organização do Partido Operário Social-democrata da Rússia não apre-
sentava nenhum interesse; ao contrário, consideravam a organização do Partido
um ridículo e ocioso passatempo, que impedia o cumprimento de seu “dever”
imediato: a luta econômica. Greves e mais greves e coleta de dinheiro para os
fundos de resistência, eis o alfa e o ômega de seu trabalho.
Em vista de limitarem a tal ponto sua atividade, em vista de abandonarem as
concepções social-democráticas, pensarão certamente que esses adoradores do
“movimento” espontâneo ao menos fizessem muito por esse movimento. Mas
essa também é uma ilusão. A história do movimento em Petersburgo o con-
firma. Seu brilhante desenvolvimento e o ardoroso avanço dos primeiros tempos
(1895-1897) transformaram-se sucessivamente num cego tatear e, por fim, o mo-
vimento parou por completo. Isso não é de causar espanto; todos os esforços
dos “economistas” no sentido de criar uma organização sólida que guiasse a luta
econômica chocavam-se invariavelmente de encontro à muralha de granito do po-
der, e sempre se esboroavam. As terríveis perseguições policiais destruíam toda
possibilidade de existência para qualquer organização econômica. Também as
greves não traziam nenhum proveito, porque, de 100 greves, 99 eram sufocadas
pela repressão policial; os operários eram expulsos desapiedadamente de Peters-
burgo e sua energia revolucionária era implacavelmente sufocada nas paredes do
cárcere e nos gelos da Sibéria. Nossa convicção profunda é de que essa interrup-
ção (por certa relativa) do movimento não era imputável a condições externas,
tais como o regime policial; não eram menos responsáveis o atraso no desenvol-
vimento das ideias, da consciência de classe, e a consequente queda da energia
revolucionária dos operários.
Já que, enquanto o movimento se desenvolvia, os operários não podiam com-
preender plenamente o significado e os altos fins da luta, já que a bandeira sob
a qual devia bater-se o operário russo se reduzia a um velho trapo desbotado
com o mísero lema da luta econômica, os operários deviam levar para a luta me-
nor energia, menor decisão e aspirações revolucionárias, pois as grandes ener-
gias nascem somente de um grande ideal. Mas o perigo ameaçador provocado
por esse movimento teria sido maior se as condições da nossa vida não tivessem
impelido cada vez mais decididamente os operários russos para a luta política
aberta. Uma simples greve de resistência, mesmo pequena, colocava diante dos
operários a questão da inexistência dos direitos políticos, levava-os a chocar-se
com o governo e com as forças armadas, e demonstrava claramente a insuficiên-
cia da luta exclusivamente econômica. Por isso, não obstante as intenções desses
“social-democratas”, a luta assumia cada vez mais, de dia para dia, um claro cará-
ter político. Cada tentativa dos operários que tinham despertado, no sentido de
58 Obras Escolhidas

exprimir abertamente seu descontentamento contra a situação econômica e po-


lítica existente que oprime os operários russos, cada tentativa de libertar-se dessa
opressão, os impelia a demonstrações em que ia desaparecendo, cada vez mais,
o tom da luta econômica. Os festejos de 1º de maio na Rússia abriam caminho
à luta política e às demonstrações políticas. E o operário russo unia, agora, ao
que fora seu único e velho instrumento de luta – a greve – um novo e poderoso
instrumento – a manifestação política, realizada pela primeira vez em Kharkov
durante a grandiosa celebração de 1º de maio de 1900. Assim, o movimento ope-
rário russo, graças ao seu desenvolvimento interno, passava da propaganda dos
círculos e da luta econômica, conduzida por meio de greves, à luta política e à
agitação. Essa passagem foi sensivelmente acelerada quando a classe operária viu
no campo da luta elementos de outras classes sociais da Rússia, animados pela
firme decisão de conquistar a liberdade política

II
A classe operária não é a única a gemer sob o jugo do regime tsarista. Também
outras classes sociais são sufocadas pelo pesado calçado da autocracia. Lamentam
os camponeses russos, vítimas da fome permanente, reduzidos à miséria pela in-
suportável pressão fiscal, presas dos comerciantes burgueses e dos “nobres” pro-
prietários fundiários. Geme o povo miúdo das cidades, os pequenos empregados
do Estado e das sociedades privadas, os pequenos funcionários e, em geral, a nu-
merosa população humilde das cidades, que, como a classe operária, não tem sua
existência assegurada, e que tem motivos para se sentir descontente com sua con-
dição social. Geme uma parte da pequena e até da média burguesia, que não se
pode adaptar ao chicote, à chibata do tsar, particularmente a parte culta da bur-
guesia, os chamados representantes das profissões liberais (professores, médicos,
advogados, estudantes e, de modo geral, os intelectuais). Agonizam as naciona-
lidades e as confissões religiosas oprimidas na Rússia, inclusive os poloneses e
os finlandeses, perseguidos na própria pátria, ofendidos em seus mais sagrados
sentimentos, e que veem insolentemente feridos pela autocracia os direitos e as
liberdades legadas pela história. Agonizam os judeus, continuamente persegui-
dos e ofendidos, privados até mesmo desses miseráveis direitos de que gozam os
outros súditos russos: o direito de livre domicílio, o direito de frequentar as es-
colas, o direito de ocupar empregos, etc. Agonizam os georgianos, os armênios
e as outras nacionalidades, privadas do direito de possuir escolas próprias, de
poder trabalhar nas instituições do Estado, constrangidos a submeter-se a essa
infame política de russificação, aplicada com tanto ardor pela autocracia. Agoni-
zam muitos milhões de russos pertencentes a seitas religiosas, que querem crer e
celebrar os ritos de acordo com a própria consciência e não segundo a vontade
dos padres ortodoxos. Agonizam, mas é impossível enumerar todos aqueles que
são oprimidos, perseguidos pela autocracia da Rússia. São tantos que, se fossem
todos conscientes e compreendessem quem é seu inimigo comum, o poder despó-
tico na Rússia não poderia sobreviver um só dia. Ainda mais: os camponeses na
Rússia estão ainda prostrados por uma escravidão secular, pela miséria e a igno-
rância; começam apenas a despertar e ainda não compreenderam onde está seu
inimigo. As nacionalidades oprimidas da Rússia não podem nem sequer pensar
J. V. Stalin 59

em conquistar a liberdade somente com suas próprias forças, enquanto estiver


contra elas não só o governo russo, mas também o povo russo, que ainda não
compreendeu que a autocracia é o inimigo comum. Restam a classe operária, a
população humilde das cidades e a parte culta da burguesia.
Mas a burguesia de cada país e nacionalidade sabe perfeitamente apropriar-se
dos frutos do suor alheio, sabe perfeitamente tirar as castanhas do fogo com as
mãos alheias. Não deseja arriscar sua posição relativamente privilegiada numa
luta com um inimigo forte, numa luta que, por ora, não é fácil de vencer. Embora
insatisfeita, não passa privações e, por isso, cede de bom grado à classe operária
e em geral ao povo simples o direito de oferecer as próprias costas às chicotadas
dos cossacos e às balas dos soldados, o de combater nas barricadas, etc. Limita-
se, por sua parte, a “simpatizar” com a luta e, no melhor dos casos, “insurge-
se” (intimamente) contra a crueldade com que o inimigo enfurecido reprime o
movimento popular. Teme as ações revolucionárias e, só nos últimos instantes
da luta, quando vê claramente que o inimigo está extenuado, passa às medidas
revolucionárias; é o que nos ensina a experiência da história...
Só a classe operária e em geral o povo, que nada tem a perder na luta, senão
as próprias correntes, só eles são as forças revolucionárias efetivas. A experiência
da Rússia, embora ainda limitada, confirma esta velha verdade, ensinada pela
história de todos os movimentos revolucionários.
Entre os representantes das camadas privilegiadas, só uma parte dos estudan-
tes revelou decisão de lutar intensamente pelas próprias reivindicações. Não de-
vemos esquecer, entretanto, que também essa parte dos estudantes é constituída
precisamente pelos filhos dos cidadãos oprimidos, e além disso, os estudantes,
na sua qualidade de juventude estudiosa, antes de mergulhar no mar da vida e
de ocupar uma posição social determinada, tendem, mais do que todos, para as
aspirações ideais que impelem à luta pela liberdade.
De qualquer forma, hoje os estudantes participam do movimento da “soci-
edade” quase como dirigentes, – como destacamento de vanguarda. Em torno
deles agrupam-se, hoje, as camadas descontentes das diversas classes sociais. No
início, os estudantes tentaram bater-se empregando um instrumento de luta to-
mado de empréstimo aos operários: a greve. Mas quando o governo respondeu
às suas greves com leis ferozes (as “normas provisórias”103 ) pelas quais os es-
tudantes grevistas eram incorporados no exército, aos estudantes só restou um
instrumento de luta: pedir o auxílio da sociedade russa e passar das greves às
demonstrações de rua. E foi isso o que fizeram os estudantes. Não depuseram
as armas; ao contrário, começaram a combater de modo ainda mais corajoso e
decidido. Em torno deles reuniram-se os cidadãos oprimidos; a classe operá-
ria estendeu-lhes, em ajuda, a própria mão, e o movimento tornou-se poderoso
e ameaçador para o governo. Há dois anos que o governo russo vem travando
uma luta tão feroz quanto inútil contra os cidadãos rebeldes, com o emprego de
ilimitadas forças militares, da polícia e dos gendarmes.
103Stalin refere-se ao “Regulamento Provisório sobre o Serviço Militar para Alunos em Estabeleci-
mentos de Ensino Superior”, introduzido pelo governo em 29 de julho de 1899. Com base nesse
regulamento, os alunos que participaram de manifestações coletivas contra o regime policial, insti-
tuídas em estabelecimentos de ensino superior, foram expulsos e recrutados como soldados rasos no
exército tsarista, por um período que variava de um a três anos.
60 Obras Escolhidas

Os acontecimentos dos últimos dias mostram que é impossível esmagar as de-


monstrações políticas. Os acontecimentos dos primeiros dias de dezembro em
Kharkov, Moscou, Nijni-Novgorod, Riga, etc., demonstram que o descontenta-
mento público já se manifesta de forma consciente e que esta sociedade des-
contente está pronta a passar do protesto tácito à ação revolucionária. Mas as
reivindicações apresentadas pelos estudantes – liberdade dos estudos, liberdade
da vida interna universitária – são demasiadamente restritas para um grande
movimento social. Para unir todos quantos participam deste movimento, é indis-
pensável uma bandeira, uma bandeira que todos compreendam e sintam como
sua, capaz de unificar todas as reivindicações. Essa bandeira é a da derrubada
da autocracia. Somente sobre as ruínas da autocracia pode ser edificada uma
ordem social que se apoie sobre a participação do povo na direção do Estado e
que assegure a liberdade, seja a liberdade de estudo, de greve, de palavra, de
religião, de nacionalidade, etc. Esta ordem social é a única que dará ao povo o
meio de se defender de todos os opressores, dos comerciantes e dos capitalistas,
do clero e dos nobres; esta ordem social é a única que abrirá o caminho para um
futuro melhor, para uma luta aberta pela instauração da sociedade socialista. Os
estudantes não podem, por certo, travar essa grandiosa luta apenas com suas pró-
prias forças; seus débeis braços não podem sustentar essa pesada bandeira. Para
empunhá-la são necessários braços mais robustos, e, nas condições atuais, essa
força é unicamente a força unida do povo trabalhador. A classe operária deve,
portanto, apanhar das débeis mãos dos estudantes a bandeira de toda a Rússia,
escrever nessa bandeira “Abaixo a autocracia! Viva a constituição democrática!”
E guiar o povo russo para a liberdade. Devemos ser gratos aos estudantes pelo en-
sinamento que nos deram; foram eles que demonstraram a grande importância
que representa, na luta revolucionária, a demonstração política.
A demonstração de rua é importante porque permite pôr em movimento, ra-
pidamente, uma grande massa da população, informá-la instantaneamente de
nossas reivindicações, e cria esse vasto terreno favorável no qual poderemos lan-
çar com audácia a semente das ideias socialistas e da liberdade política. A de-
monstração de rua cria a agitação de rua, cuja influência não se pode furtar
nem mesmo a parte mais hesitante e menos adiantada da sociedade104 . Basta
sair à rua durante uma demonstração para ver combatentes corajosos, para com-
preender qual é a causa pela qual se batem, para ouvir discursos livres que con-
clamam todos à luta e canções combativas que desmascaram a ordem existente e
denunciam nossas chagas sociais. Eis porque o governo teme, acima de tudo, a
demonstração de rua. Eis porque ameaça de punição severa não só os manifes-
tantes, mas também os “curiosos”. Essa curiosidade do povo encerra um grave
perigo para o governo: o “curioso” de hoje reunirá amanhã, em seu redor, como
manifestantes, novos grupos de “curiosos”. E esses “curiosos” contam-se hoje,
em cada grande cidade, por dezenas de milhares. O cidadão russo já não mais
se esconde como outrora, quando é informado de que se verificam desordens
em qualquer lugar (“parece-me que o melhor será não me meter, ficar de parte”,
dizia outrora); hoje, ao contrário, dirige-se apressadamente para o lugar das de-
104 Nas condições que prevalecem atualmente na Rússia, livros impressos ilegalmente e folhetos de
agitação chegam a cada habitante com enorme dificuldade. Embora os efeitos da distribuição dessa
literatura sejam consideráveis, na maioria dos casos ela cobre apenas uma minoria da população.
J. V. Stalin 61

sordens e vai satisfazer sua “curiosidade”: por que se verificam essas desordens,
como é que tanta gente se expõe aos chicotes dos cossacos?
Nesta situação, os “curiosos” já não permanecem indiferentes quando ouvem
o sibilar dos chicotes e dos sabres. Os “curiosos” verificam que os manifestantes
se reuniram na rua para exprimir suas próprias aspirações e suas próprias reivin-
dicações, enquanto o governo lhes responde com massacres e repressões bestiais.
O “curioso” já não foge ao sibilar dos chicotes, mas, ao contrário, aproxima-se e
o chicote já não consegue mais distinguir onde acaba o simples “curioso” e onde
começa o “revoltoso”. Desde então, o chicote, observando uma “plena igualdade
democrática”, sem distinção de sexo, de idade e até de condição social, acari-
cia as costas de uns e de outros. O chicote nos presta, assim, um grande ser-
viço, porque apressa a passagem dos “curiosos” para as posições revolucionárias.
Transformando-se em instrumento de despertar, o que era arma de repressão.
Dessa maneira, embora as demonstrações de rua não nos deem resultados
diretos, e a força dos manifestantes seja hoje ainda insuficiente para constran-
ger o governo a fazer concessões às reivindicações populares, os sacrifícios que
hoje enfrentamos nas demonstrações de rua nos serão cem vezes recompensados.
Para cada combatente tombado na luta ou arrancado de nossas fileiras, surgem
centenas de novos combatentes. Mais de uma vez seremos ainda derrotados nas
ruas, e mais de uma vez o governo sairá vitorioso nas lutas de rua. Será, porém,
uma “vitória de Pirro”. Mais algumas vitórias desse gênero, e o absolutismo cairá
fatalmente. Com a vitória de hoje, prepara sua própria derrocada. Firmemente
convencidos de que chegará esse dia, de que esse dia não está longe, enfrenta-
mos as chicotadas para lançar a semente da agitação política e do socialismo. O
governo não está menos convencido do que nós de que as agitações de rua são
para ele uma sentença de morte, e de que bastam dois ou três anos para que
surja à sua frente o fantasma da revolução popular. O governo declarou um
destes dias, pela boca do governador de Iekaterinoslav, que “não recuará nem
mesmo diante de medidas extremas para sufocar a menor tentativa de demons-
tração de rua”. Como se vê, essa declaração cheira a fuzilaria e talvez mesmo
a canhoneio; mas somos de opinião que, tanto quanto as chicotadas, os projé-
teis atiçam o descontentamento. Não acreditamos que, mesmo com essas “medi-
das extremas”, o governo consiga refrear por muito tempo a agitação política e
impedir-lhe o desenvolvimento. Esperamos que a social-democracia revolucioná-
ria saberá adaptar a agitação às novas condições criadas pelo governo com essas
“medidas extremas”. Em todo o caso, a social-democracia deve acompanhar os
acontecimentos com vigilância, deve tirar rapidamente proveito das lições desses
acontecimentos e adaptar sua atividade às condições que se modificam.
Entretanto, para alcançar tudo isso, é necessária à social-democracia uma or-
ganização forte e coesa, e precisamente uma organização de partido, unida não
apenas pelo nome, mas pelos princípios fundamentais, pela orientação tática.
Nossa tarefa é trabalhar na criação desse partido forte, que será armado de prin-
cípios sólidos e de uma indestrutível capacidade conspirativa. O Partido Social-
democrata deve utilizar o movimento de rua recentemente iniciado, deve tomar
nas mãos a bandeira da democracia da Rússia e levá-la à vitória por todos alme-
jada.
62 Obras Escolhidas

Abre-se, diante de nós, um período de luta predominantemente, política.


Essa luta é para nós inevitável, porque, na situação política atual, a luta econô-
mica (greves) não pode produzir nenhum resultado substancial. As greves são
uma arma de dois gumes, mesmo nos Estados livres; nesses Estados, apesar de
possuírem os operários meios de luta – a liberdade política, fortes organizações
sindicais operárias, caixas bem providas – as greves terminam frequentemente
pela derrota dos operários. E entre nós, onde a greve é um delito punido com
prisão, reprimido pela força armada, onde é proibido qualquer sindicato operá-
rio, as greves assumem o caráter de simples protesto. Mas, como ação de protesto,
as demonstrações são um instrumento mais poderoso. Nas greves, as forças dos
operários são divididas; delas participam apenas os operários de um ou de al-
guns estabelecimentos e, no melhor dos casos, de uma categoria; a organização
da greve geral é muito difícil até mesmo na Europa Ocidental e aqui, entre nós,
é absolutamente impossível; nas demonstrações de rua, entretanto, os operários
unem de imediato suas forças.
Daí se depreende o quanto é estreita a visão de certos “social-democratas”
que querem restringir o movimento operário aos limites da luta econômica e das
organizações econômicas, deixando a luta política aos “intelectuais”, aos estu-
dantes, à “sociedade”, atribuindo aos operários simplesmente a função de força
auxiliar. A história ensina que, em semelhantes condições, os operários seriam
forçados a tirar as castanhas do fogo exclusivamente para a burguesia. A bur-
guesia, via de regra, fica muito satisfeita de explorar os braços musculosos dos
operários na luta contra o poder autocrático, e, quando a vitória é conquistada,
ela se apropria dos frutos e deixa os operários de mãos vazias. Se também entre
nós as coisas corressem desse modo, os operários nada obteriam dessa luta. No
que se refere aos estudantes e aos outros elementos da “sociedade” que protes-
tam, cumpre dizer que também eles são burguesia. Basta dar-lhes um “farrapo
de constituição”, absolutamente inofensivo, que conceda direitos insignificantes
ao povo, para que todos esses descontentes passem a cantar em outro tom; co-
meçarão logo a exaltar o “novo” regime. A burguesia está em estado de alarme
contínuo diante do “fantasma vermelho” do comunismo e em todas as revoluções
esforça-se para pôr termo à ação apenas começada. Obtida, em benefício pró-
prio, uma concessão insignificante, logo, apavorada pelos operários, estende a
mão ao governo para a reconciliação e vende a causa da liberdade105 . Só a classe
operária é um baluarte seguro da verdadeira democracia. Só ela não pode entrar
em conchavos com a autocracia em troca de uma concessão qualquer, e não se
deixará adormecer quando começarem a lhe cantar doces canções ao som da lira
constitucional.
Assume, portanto, uma importância extraordinária para a causa da democra-
cia na Rússia, verificar se a classe operária saberá colocar-se à frente do movi-
mento democrático geral ou se deixará arrastar-se a reboque desse movimento,
como força auxiliar dos “intelectuais”, isto é, da burguesia. Na primeira hipótese,
o resultado da derrubada da autocracia será uma ampla constituição democrá-
tica, que dará direitos iguais aos operários, aos camponeses e aos capitalistas. Na
105Aqui, é claro, não queremos dizer aquele setor da intelectualidade que já renuncia à sua classe e
luta nas fileiras dos social-democratas. Mas esses intelectuais são apenas exceções, eles são “corvos
brancos”.
J. V. Stalin 63

segunda hipótese, teremos como resultado aquele “farrapo de constituição” que,


tanto quanto o absolutismo, conseguirá golpear as reivindicações dos operários e
dará ao povo apenas uma aparência de liberdade. Mas, para exercer essa função
dirigente, a classe operária deve organizar-se em partido político independente.
Então, já não serão de temer, na luta contra o absolutismo, nem as defecções nem
as traições do seu aliado temporário: a “sociedade”. Desde o momento em que
essa “sociedade” trair a causa da democracia, a classe operária levará essa causa
para diante, com suas próprias forças; o partido político independente lhe dará
a força necessária para atingir essa meta.
Brdzola (A Luta), nº 23.
Novembro/dezembro de 1901
64 Obras Escolhidas

Como a Social-Democracia
considera a questão nacional?
9 de março de 1906

Tudo se transforma... Transforma-se a vida social e com ela também se trans-


forma a “questão nacional”. Em tempos diversos, classes diferentes entram no
campo da luta, e cada classe tem uma concepção particular da “questão nacio-
nal”. Por conseguinte, a “questão nacional, em tempos diversos, serve interesses
diversos, toma aspectos diversos”, segundo a classe que a apresenta e quando a
apresenta.
Entre nós existia a chamada “questão nacional” da nobreza no período em
que, após a “anexação da Geórgia à Rússia”, os nobres georgianos compreen-
deram o prejuízo que representava para eles a perda do poderio antigo e dos
antigos privilégios de que gozavam sob os monarcas georgianos, e, considerando
a “simples situação de súditos” uma diminuição de sua dignidade, aspiravam à
“libertação da Geórgia”. Com isso queriam colocar o rei e os nobres georgianos
à frente da “Geórgia” e confiar-lhes, desse modo, o destino do povo georgiano!
Isto era “nacionalismo” monárquico feudal. Esse “movimento” não deixou ne-
nhum traço notável na vida dos georgianos e não conquistou glória por qualquer
feito, se omitirmos algumas conjurações de nobres georgianos contra os governa-
dores russos do Cáucaso. Bastou que os acontecimentos da vida social tocassem
de leve nesse “movimento” já assaz débil por si mesmo, para destruí-lo em seus
fundamentos. E, de fato, o desenvolvimento da economia mercantil, a abolição
da servidão da gleba, a fundação do banco da nobreza, o fortalecimento dos
antagonismos de classe na cidade e no campo, o movimento, cada vez mais po-
deroso, dos camponeses pobres, etc., desfecharam um golpe mortal na nobreza
georgiana e, simultaneamente, no “nacionalismo monárquico feudal”.
A nobreza georgiana dividiu-se em dois grupos. Um repudiou qualquer “na-
cionalismo” e estendeu a mão à autocracia russa para receber, em troca, boas
posições, créditos fáceis e aparelhamento agrícola, e para que o governo o defen-
desse dos “revoltosos” do campo, etc. O outro grupo de nobres georgianos, mais
débil, aliou-se aos bispos e aos arquimandritas georgianos e cobriu dessa forma,
sob a asa do clericalismo, o “nacionalismo” expulso da vida. Esse grupo dedica-
se com grande interesse à restauração das igrejas georgianas destruídas (este é o
ponto principal de seu “programa”!), “dos monumentos da grandeza passada” e
espera piamente o milagre que satisfará a suas “aspirações” monárquico feudais.
Assim, o nacionalismo monárquico feudal assumiu, nos seus últimos instantes de
vida, uma forma clerical.
Nesse meio tempo, a vida social moderna pôs na ordem do dia, entre nós, a
questão nacional da burguesia. Assim que compreendeu como lhe era difícil a
J. V. Stalin 65

livre concorrência com os capitalistas “estrangeiros”, começou a jovem burgue-


sia georgiana, pela boca dos seus nacional-democratas, a balbuciar sobre uma
Geórgia independente. A burguesia georgiana queria proteger o mercado geor-
giano com uma barreira alfandegária, expulsar à força do mercado a burguesia
“estrangeira”, fazer subir artificialmente os preços das mercadorias e assegurar,
de imediato, seu enriquecimento com essas manobras “patrióticas”. Era e conti-
nua sendo este o objetivo do nacionalismo da burguesia georgiana. É óbvio dizer
que, para cumprir essa tarefa, era necessária a força, e a força estava no Proleta-
riado. Só o proletariado podia dar vida ao castrado “patriotismo” da burguesia.
Era necessário atrair para seu lado o proletariado e assim apareceram em cena
os “nacional-democratas”.
Gastavam eles muito fôlego para refutar o socialismo científico, censuravam
muito os social democratas e aconselhavam os proletários georgianos a afastarem-
se destes últimos, cobriam de lama o proletariado georgiano e exortavam-no, “no
interesse dos próprios operários”, a fortalecer por todos os meios a burguesia ge-
orgiana. Suplicavam, insistentemente, aos proletários georgianos: não arruínem
a “Geórgia” (ou a burguesia georgiana?), esqueçam as “divergências internas”,
unam-se com a burguesia georgiana, etc., mas em vão!
As fábulas adocicadas dos publicistas burgueses não conseguiram adorme-
cer o proletariado georgiano! Os ataques impiedosos dos marxistas georgianos,
e principalmente as poderosas manifestações de classe, fundindo num exército
socialista único os proletários russos, armênios, georgianos, etc., assestaram um
golpe esmagador nos nossos nacionalistas burgueses, escorraçando-os do terreno
da luta. “Para reabilitar o próprio nome coberto de vergonha”, era necessário
aos nossos patriotas em retirada “trocar ao menos o verniz”, mascarar-se de so-
cialistas, já que não podiam fazer suas as ideias socialistas. E entrou em cena,
efetivamente, o Sakartvelo106 , órgão nacionalista; burguês ilegal... e, respeitosa-
mente falando, “socialista”! Queriam, desse modo, seduzir os operários georgi-
anos! Mas já era tarde!
Os operários georgianos tinham aprendido a distinguir o preto do branco e
percebiam facilmente que os nacionalistas burgueses “tinham trocado apenas o
verniz” e não a substância de seus princípios, e que o Sakartvelo, de socialista, só
tinha o nome. Os operários compreendiam-no e riam na cara dos “salvadores”
da Geórgia! As esperanças dos Dom Quixote do Sakartvelo não se realizaram!
Por outro lado, nosso desenvolvimento econômico lança gradualmente uma
ponte entre os grupos adiantados da burguesia georgiana e a “Rússia”, liga econô-
mica e politicamente esses grupos à “Rússia” e, precisamente com isso, solapa os
alicerces já periclitantes do nacionalismo burguês. Isto constitui um segundo
golpe para o nacionalismo burguês!

106 Sakartvelo (Geórgia) — era um jornal publicado por um grupo de nacionalistas georgianos no
exterior, que se tornou o núcleo do partido nacionalista burguês dos Social-Federalistas. O jornal
foi publicado em Paris nas línguas georgiana e francesa, e funcionou de 1903 a 1905. O partido
dos federalistas georgianos (formado em Genebra em abril de 1904), consistia no grupo Sakartvelo,
bem como englobava frações de anarquistas, socialistas-revolucionários e nacional-democratas. A
principal exigência dos federalistas era a autonomia nacional da Geórgia dentro do estado burguês
de latifundiários russos. Durante o período de reação, eles se tornaram inimigos declarados da
revolução.
66 Obras Escolhidas

Uma nova classe, o proletariado, surgiu no campo da luta e com ela nasceu
a nova “questão nacional”, a “questão nacional” do proletariado. Assim como o
operariado se distingue da nobreza e da burguesia, da mesma forma a “questão
nacional” levantada pelo proletariado se distingue da “questão nacional” da no-
breza e da burguesia. Falaremos agora desse “nacionalismo”. Como concebe a
social-democracia a “questão nacional”?
Há muito tempo, o proletariado da Rússia falava em luta. Como é sabido, o es-
copo de cada luta é a vitória. Mas, para a vitória do proletariado, é indispensável
a união de todos os operários sem distinção de nacionalidade. É claro que a condição
essencial para a vitória do proletariado é a derrubada das barreiras nacionais e
a união estreita dos proletários russos, georgianos, armênios, poloneses, judeus,
etc. São esses os interesses do proletariado da Rússia.
No entanto, a autocracia da Rússia, que é o pior inimigo do proletariado da
Rússia, opõe-se de maneira constante à causa da unificação dos proletários. A
autocracia persegue criminosamente a cultura nacional, a língua, os costumes e
as instituições das nacionalidades “estrangeiras” da Rússia; priva-as dos direitos
civis indispensáveis, oprime-as de todos os modos, farisaicamente semeia entre
elas a desconfiança e a inimizade, impele-as a encontros sangrentos mostrando,
assim, que o único objetivo da autocracia russa é dividir as nacionalidades que
habitam a Rússia, atiçar entre elas a discórdia nacional, fortalecer as barreiras
nacionais, para assim dividir os proletários com melhores resultados, fragmentar
todo o Proletariado da Rússia em pequenos grupos nacionais, cavando, por esse
meio, a sepultura para a consciência de classe dos operários e para sua união de
classe.
São estes os interesses da reação russa, é esta a política da autocracia russa.
É evidente que os interesses do proletariado da Rússia deveriam inevitavelmente
chocar-se, cedo ou tarde, com a política reacionária da autocracia tsarista. As-
sim aconteceu, e justamente nessa situação é que nasceu na social-democracia a
“Questão Nacional”.
Como derrubar as barreiras nacionais erguidas entre as nações, como des-
truir o isolamento nacional, a fim de melhor aproximar uns dos outros os pro-
letários da Rússia, a fim de uni-los mais estreitamente? Tal é o conteúdo da
“questão nacional” na social-democracia. Pela divisão em partidos nacionais se-
parados e a criação entre eles de uma “aliança livre”: eis como respondem os
social-democratas federalistas.
O mesmo sustenta a “Organização Operária Social-democrata Armênia”107 .
Como se verifica, não nos aconselham a unir-nos em um partido único para toda
a Rússia, guiado por um centro único, mas sim a dividir-nos em alguns partidos
com certo número de centros diretores, e tudo isso para fortalecer a unidade de
classe! Queremos aproximar uns dos outros os proletários das diversas nacionali-
dades. Como devemos proceder? – Afastem os proletários uns dos outros e terão
107 A Organização Social-Democrata Trabalhista Armênia foi formada por elementos Nacional-
Federalistas Armênios logo após o Segundo Congresso do Partido Trabalhista Social-Democrata
Russo. V. I. Lenin observou a estreita conexão entre esta organização e o Bund. Numa carta aos
membros do Comitê Central do Partido, datada de 7 de setembro de 1905, ele escreveu: “Esta é uma
criatura do Bund, nada mais, inventada especialmente com o propósito de fomentar o Bundismo
caucasiano. Os camaradas caucasianos se opõem a essa gangue de disruptores de canetas”.
J. V. Stalin 67

alcançado seu objetivo! – Respondem os social-democratas federalistas.


Queremos unir os proletários em um partido único. Como devemos proce-
der? – Dispersem o proletariado da Rússia em partidos separados e atingirão o
objetivo! – Respondem os social-democratas federalistas. Queremos derrubar as
barreiras nacionais. Que medidas devem ser tomadas? – Fortaleçam as barreiras
nacionais com barreiras orgânicas e atingiram o objetivo! – Respondem eles.
E todos esses conselhos são dados a nós, proletários da Rússia, que travamos a
luta nas mesmas condições políticas e temos um só e mesmo inimigo comum! Eis,
em poucas palavras, o que nos dizem: trabalhem para a alegria dos inimigos e
sepultem com suas próprias mãos o seu fim comum! Ponhamo-nos de acordo por
um instante com os social-democratas federalistas e acompanhemo-los; veremos
onde nos levarão!
Costuma-se dizer: persegue o mentiroso até a fonte da mentira. Suponhamos
que tivéssemos dado ouvidos aos nossos federalistas e tivéssemos criado partidos
nacionais separados. A que resultados chegaríamos? É fácil compreender. Se
até agora, enquanto éramos centralistas, tínhamos voltado, principalmente, nossa
atenção para as condições comuns da situação dos proletários, para a unidade de
seus interesses, e tínhamos falado de suas “diferenças nacionais” somente na me-
dida em que isso não estava em contradição com seus interesses comuns; se até
agora a questão essencial, para nós, foi a do acordo recíproco entre os proletários
das nacionalidades da Rússia, e daquilo que é comum entre eles – para construir
à base destes interesses comuns um partido único centralizado dos operários de
toda a Rússia – hoje que “nós” nos tornamos federalistas, devemos voltar nossa
atenção para um outro problema, que é o essencial: em que se distinguem uns
dos outros os proletários das nacionalidades da Rússia, que diferença existe entre
eles, para construir, à base das “diversidades nacionais”, partidos nacionais dis-
tintos. Assim, as “diferenças nacionais”, secundárias para o centralista, tornam-se
para o federalista os fundamentos dos partidos nacionais.
Seguindo ainda por esse caminho, seremos forçados, mais cedo ou mais tarde,
a concluir que as “diferenças” nacionais, ou qualquer outra, por exemplo, do pro-
letariado armênio, são da mesma natureza que as da burguesia armênia, que são
idênticos os costumes e o caráter do proletário armênio e do burguês armênio,
que ambos constituem um único povo, uma só “Nação” indivisível. A “Organi-
zação Operária Social-democrata Armênia” acaba de dar esse notável passo. No
seu “Manifesto”, afirma resolutamente que “não é possível separar o proletari-
ado (armênio) da sociedade (armênia); o proletariado unificado (armênio) deve
ser o órgão mais inteligente e mais forte do povo armênio”, que “o proletariado
armênio, unificado no Partido socialista, deve cuidar de definir o pensamento
social armênio, que o proletariado armênio será o filho amado de sua própria
gente”, etc. (vide o art. 3º do Manifesto da “Organização Operária Social-democrata
Armênia” ).
Não se compreende, em primeiro lugar, porque “não é necessário separar o
proletariado armênio da sociedade armênia, se essa “separação” se verifica a cada
passo. Será que o proletariado armênio unificado não se “separou” da sociedade
armênia quando, em 1900 (em Tiflis), declarou guerra à burguesia armênia e
aos armênios que pensavam como a burguesia? E que representa a “Organização
68 Obras Escolhidas

Operária Social-democrata Armênia”, senão uma organização de classe dos pro-


letários armênios que se “separaram” das outras classes da sociedade armênia?
Ou será, talvez, a “Organização Operária Social-democrata Armênia” uma orga-
nização de todas as classes?! Poderá, por acaso, o proletariado armênio em luta
limitar-se a “definir o pensamento social armênio”, ou deve ele marchar para
a frente, declarar guerra a esse “pensamento social”, burguês até à medula, e
infundir-lhe espírito revolucionário? Dizem os fatos que esse é o seu dever. Mas,
do modo como estão as coisas, é evidente que o “Manifesto” deveria ter chamado
a atenção dos leitores não para a “definição do pensamento social”, mas sim para
a luta contra esse pensamento, para a necessidade da sua transformação revoluci-
onária; desse modo teria caracterizado melhor os deveres do “proletariado soci-
alista”. E, finalmente, poderá o proletariado armênio ser o “filho amado de sua
própria gente”, quando uma parte dessa gente – a burguesia armênia – suga o seu
sangue como um morcego, e uma outra parte – o clero armênio – além de sugar
o sangue dos operários, corrompe sistematicamente sua consciência? Todas essas
perguntas são simples e inevitáveis, se se considera a questão do ponto de vista
da luta de classes. Mas os autores do “Manifesto” não reparam nessas questões,
porque consideram as coisas do ponto de vista federalista-nacionalista, tomado
de empréstimo ao Bund (União Operária Judaica). E, em geral, parece que os
autores do “Manifesto” se esforçam por imitar em tudo o Bund. Em seu “Mani-
festo” introduziram também o artigo 2º da resolução do V Congresso do Bund
“Sobre a situação do Bund no Partido”. Chamam eles a “Organização Operária
Social-democrata Armênia” de única defensora dos interesses do proletariado
armênio (vide o artigo 3º do citado “Manifesto”). Os autores do “Manifesto” es-
queceram que os comitês caucasianos do nosso Partido já são considera dos, há
vários anos, os representantes dos proletários armênios (assim como dos outros)
no Cáucaso, que desenvolvem nos proletários a consciência de classe através da
agitação e da propaganda oral e escrita em língua armênia, que os guiam em
suas lutas, etc., enquanto a “Organização Operária Social-democrata Armênia”
só nasceu ontem. De tudo isso se esqueceram, é de se esperar que se esqueçam
de muitas outras coisas ainda, já que imitam exatamente os princípios orgânicos
e políticos do Bund.
Não estamos, aqui, muito longe do “único terreno de ação unida”, no qual
tanto burgueses como proletários devem pôr-se de acordo e estreitar amistosa-
mente as mãos, como membros de uma mesma “nação”. Por outro lado, a po-
lítica farisaica do Tsar autocrático pode servir como nova prova dessa amizade,
e as discussões sobre o antagonismo de classe parecerão um “doutrinarismo ex-
temporâneo”. E também aí qualquer mão poética tocará “mais ousadamente” as
cordas estreitamente nacionais, que em caráter provisório ainda vibram entre os
proletários das várias nacionalidades da Rússia, e as fará ressoar no tom conveni-
ente. Será dado crédito ao charlatanismo dos chauvinistas, os amigos parecerão
inimigos e os inimigos parecerão amigos, nascerá a confusão, se desagregará a
consciência de classe do proletariado da Rússia. Assim, em vez de destruir as
barreiras nacionais, nós, graças aos federalistas, iremos fortalecê-las ainda mais
com barreiras orgânicas; em vez de fazer progredir a consciência de classe do
proletariado, nós a faremos retrogradar e a submeteremos a provas perigosas.
E “alegra-se o coração” do Tsar autocrático, pois jamais teria conseguido obter
J. V. Stalin 69

auxiliares gratuitos iguais a nós. Acaso era isso o que queríamos!


Finalmente, num momento em que temos necessidade de um partido único,
centralizado e flexível, com um Comitê Central capaz de levantar, em um ins-
tante, os operários de toda a Rússia, e de conduzi-los ao ataque contra a autocracia
e a burguesia, atiram em nossas mãos uma “união federalista” monstruosa, esfa-
celada em partidos separados! Em vez de uma arma afiada, dão-nos uma arma
enferrujada e nos asseguram: com esta – dizem eles – liquidarão mais depressa
os seus mortais inimigos! Eis para onde nos conduzem os social-democratas fe-
deralistas! Mas, já que não tencionamos “fortalecer as barreiras nacionais”, e sim
destruí-las, já que, para extirpar pelas raízes a injustiça atual, é necessária uma
arma afiada e não uma arma enferrujada, já que não queremos proporcionar a
nossos inimigos alegria, porém aflição, e queremos eliminá-los da face da terra, é
claro que nosso dever é desfazer-nos dos federalistas e encontrar melhor solução
para a “questão nacional”.

II

Até o momento falamos de como não se deve resolver a “questão nacional”.


Diremos, agora, como é preciso resolvê-la, isto é, como a resolveu o Partido Ope-
rário Social-democrata108 . É necessário recordar, inicialmente, que o Partido
Social-democrata que exerce atividades na Rússia se chamou da Rossiiskaya (e
não Russkaya)109 .
É evidente que, desse modo quis demonstrar-nos que acolherá sob sua ban-
deira não apenas os proletários russos, mas os proletários de todas as nacionali-
dades da Rússia e que tomará, por conseguinte, todas as medidas para destruir
as barreiras nacionais erguidas entre eles.
Nosso Partido libertou a “questão nacional” das névoas que a envolviam, dando-
lhe um aspecto misterioso, decompôs a questão em seus vários elementos, deu
a cada um deles o caráter de reivindicação de classe e os dispôs no programa
em diversos artigos. Desse modo, o Partido demonstrou claramente que, por si
mesmos, os chamados “interesses nacionais” e as “reivindicações nacionais” não
têm um valor particular, que esses “interesses” e essas “reivindicações” só mere-
cem atenção na medida em que fazem ou podem fazer progredir a consciência
de classe do proletariado, seu desenvolvimento de classe. Assim, o Partido Ope-
rário Social-democrata da Rússia apontou o caminho em que se encontrava e as
posições que assumira na solução da “questão nacional”. Que reivindicam os
senhores social-democratas federalistas?
1) “Igualdade Civil Para As Nacionalidades Da Rússia”?
Perturba-os a desigualdade civil reinante na Rússia? Querem restituir às na-
cionalidades da Rússia os direitos civis que lhes foram arrancados pelo governo
e para isso exigem a igualdade civil para essas nacionalidades? Mas somos nós
108 Não faltará assinalar que se segue um comentário sobre as cláusulas do programa do nosso Partido
que tratam da questão nacional.
109 À época, foi utilizado o adjetivo “Rossiiskaya”, aplicado a toda a Rússia com todas as suas diferentes

nacionalidades. Russkaya se aplica mais especificamente ao povo russo em si. Em português, ambos
são traduzidos pela palavra russo (N.T)
70 Obras Escolhidas

contrários, por acaso, a esta reivindicação? Compreendemos perfeitamente a


grande importância que têm os direitos civis para os proletários. Os direitos ci-
vis são uma arma de luta; tirar esses direitos significa tirar uma arma; e quem
ignora que, sem armas, os proletários não podem combater bem? Para o prole-
tariado da Rússia, é necessário que os proletários de todas as nacionalidades da
Rússia combatam bem, pois, quanto melhor se baterem esses proletários, tanto
mais desenvolvida será sua consciência de classe, e quanto mais desenvolvida for
sua consciência de classe tanto mais consolidada será a unidade de classe do pro-
letariado da Rússia. Sim, sabemos tudo isso e, por isso, lutamos e lutaremos com
todas as nossas forças pela igualdade civil das nacionalidades da Rússia! Leiam
o art. 7º do programa de nosso Partido, no qual o Partido fala da “plena igual-
dade dos direitos de todos os cidadãos, independentemente de sexo, religião,
raça e nacionalidade”, e verificarão que o Partido Operário Social-democrata da
Rússia chama a si a realização dessas reivindicações. Que mais reivindicam os
social-democratas federalistas?
2) “Liberdade de idioma para as nacionalidades da Rússia”?
Comovem-se com o fato de ser quase proibido, aos proletários das nacionali-
dades “estrangeiras” da Rússia, estudar no idioma materno, servir-se do idioma
materno nas instituições sociais, estatais e outras? Em verdade, o fato é de como-
ver! O idioma é uma arma de desenvolvimento e de luta. As diferentes nações
têm línguas diferentes. O interesse do proletariado da Rússia exige que os pro-
letários das várias nacionalidades da Rússia tenham o pleno direito de usar a
língua em que possam, com maior facilidade, receber uma educação, língua com
a qual possam lutar melhor contra seus inimigos nas assembleias, nas institui-
ções estatais, sociais, etc. E essa língua é a língua materna. Os proletários das
nacionalidades “estrangeiras” veem-se privados da língua materna. Podemos,
porventura, calar-nos? – Perguntam eles. Pois bem, como responde ao proletari-
ado da Rússia o programa de nosso Partido? Leiam o artigo 8º do programa do
nosso Partido que exige:
Direito de a população receber a instrução na língua materna, assegurado pela criação das
escolas necessárias a tal fim, por conta do Estado e das administrações locais; direito de cada
cidadão exprimir-se em reuniões na língua materna; introdução da língua materna, em pé
de igualdade com a língua oficial, em todas as instituições sociais e estatais, do lugar.

Leiam tudo isso e se convençam de que o Partido Operário Social-Democrata


Russo toma a seu cargo a execução dessas reivindicações. Que mais reivindicam
ainda os social-democratas federalistas?
3)“Autonomia para as nacionalidades da Rússia?”
Com essa expressão, querem dizer que é impossível aplicar de maneira idên-
tica as mesmas leis às diversas regiões do Estado, que diferem umas das outras
pela composição da população e pelas condições de vida características? Querem
que seja conferido às citadas localidades o direito de adaptar às suas condições
peculiares as leis gerais do Estado? Se assim estão as coisas, se é esse o significado
de sua exigência, é necessário dar-lhe uma forma adequada, cumpre desfazer as
névoas nacionalistas, as confusões, e dar às coisas seu verdadeiro nome.
E se seguirem este conselho, convencerei-os de que nada temos contra essa rei-
vindicação. Não há dúvida, para nós, de que as várias regiões do Estado russo,
J. V. Stalin 71

que se distinguem umas das outras pelas condições originais de vida e pela com-
posição da população, não podem aplicar de maneira idêntica à constituição do
Estado; de que é necessário dar a essas regiões o direito de aplicar a constituição
geral do Estado na forma sob a qual possam tirar maiores vantagens e em que
as forças políticas existentes no povo tenham o mais completo desenvolvimento.
Isso é o que exige o interesse do proletariado da Rússia. E se reexaminarem o
artigo 3º do programa de nosso Partido, no qual nosso Partido reclama “uma
ampla autonomia local; a autonomia regional para as regiões que se distinguem
por condições particulares de vida e pela composição da população”, verão que o
Partido Operário Social-democrata da Rússia libertou essa reivindicação, desde
o início, das névoas nacionalistas e traçou a si mesmo, em seguida, a tarefa de
realizá-la.
4) Cultura Estrangeira
Vocês nos apontam a autocracia russa, que persegue ferozmente a “cultura
nacional” das nacionalidades “estrangeiras” da Rússia, intervém de maneira cri-
minosa em sua vida interna e as oprime por todos os lados, que destruiu barba-
ramente (e continua a destruir) as instituições culturais dos finlandeses e que se
apossou criminosamente do patrimônio nacional armênio, etc.? Exigem garan-
tias contra as criminosas agressões da autocracia? E nós, por acaso, não estamos
vendo as agressões da autocracia tsarista e não temos lutado, permanentemente,
contra essas agressões? Todo mundo vê, hoje, como o atual governo russo oprime
e sufoca as nacionalidades “estrangeiras” da Rússia. Não se pode nem sequer
pôr dúvida que semelhante política do governo corrompe dia a dia e submete a
uma dura provação a consciência de classe do proletariado da Rússia. Por conse-
guinte, lutamos, sempre, e em toda parte, contra a política corruptora do governo
tsarista. Por conseguinte, defenderemos sempre e em toda parte, contra as vio-
lências policiais da autocracia, não só as instituições úteis dessas nacionalidades,
mas também as inúteis, já que o interesse do proletariado da Rússia nos diz que
somente as próprias nacionalidades têm o direito de destruir ou de desenvolver
este ou aquele aspecto de sua cultura nacional. Leiam, porém, o artigo 9º de
nosso programa. Acaso, não se trata disso, no artigo 9º do programa de nosso
Partido que, cumpre dizer, tanto deu que falar aos nossos inimigos, quanto aos
nossos amigos?
Mas neste ponto nos interrompem e nos aconselham a silenciar sobre o artigo
9º. Por quê? – Perguntamos. “Porque” – respondem-nos – esse artigo de nosso
programa “contradiz radicalmente” os artigos 3º, 7º e 8º. do mesmo programa,
já que, se se concede às nacionalidades o direito de organizar a seu modo to-
dos os seus assuntos nacionais (vede o artigo 9º), não deveriam caber, no mesmo
programa, os artigos 3º, 7º e 8º, e vice-versa, se esses artigos permanecem no
programa, o artigo 9º, deve, sem dúvida, ser excluído. É mais ou menos isso,
por certo, o que diz o Sakartvelo 110 quando, com a leviandade que lhe é peculiar,
indaga: “Que lógica há em dizer a uma nação: concedo-te a autonomia regio-
nal, e, ao mesmo tempo, recordar-lhe que tem o direito de regular, de acordo
com o próprio critério, todos os seus assuntos nacionais?” (vide Sakartvelo, nº
110Referimo-nos aqui a Sakartvelo com o único propósito de melhor explicar o conteúdo da cláusula
9. O objetivo do presente artigo é criticar os social-democratas federalistas, e não os sakartvelistas,
que diferem radicalmente dos primeiros (veja o Capítulo I do escrito.)
72 Obras Escolhidas

9). “Evidentemente”, se uma contradição lógica se insinuou no programa, “evi-


dentemente”, para eliminar essa contradição, é necessário excluir do programa
um ou alguns artigos! Sim, é necessário excluir “incondicionalmente”, mas nesse
caso, como vereis, a própria lógica protesta pela boca do ilógico Sakartvelo.
Recordemos uma antiga lenda. Era uma vez um “sábio anatomista”. Tinha,
à sua disposição, “tudo quanto é necessário” a um “verdadeiro” anatomista. O
diploma, o local, os instrumentos, a pretensão desmedida. Faltava-lhe apenas
uma bagatela: o conhecimento da anatomia. Um belo dia, pediram-lhe para
explicar as ligações existentes entre as partes de um esqueleto, que havia espa-
lhado na mesa de anatomia. Apresentava-se, assim, ao nosso “famoso sábio” a
oportunidade de se distinguir. O “sábio”, com grande pompa e solenidade, pôs
mãos à “obra”! Mas que desgraça! O “sábio” não compreendia coisa alguma de
anatomia, e não sabia quais os pedaços a serem reunidos para formar o esque-
leto inteiro! O infeliz fez o que pôde, suou muito, mas em vão! Finalmente,
quando já estava inteiramente confuso sem nada conseguir, agarrou alguns pe-
daços do esqueleto, lançou-os longe, e passou a injuriar filosoficamente os “mal-
intencionados” que, na sua opinião, tinham posto sobre sua mesa falsos pedaços
de esqueleto. Os espectadores, como era de esperar, cobriram de ridículo o “sá-
bio anatomista”.
Aventura semelhante foi a que aconteceu ao Sakartvelo, que teve a ideia de
analisar o programa de nosso Partido. Mas, ao que parece, não sabia o que re-
presenta nosso programa e como deve ser examinado, não compreendia quais as
ligações existentes entre os diversos artigos, o que significa cada artigo tomado
isoladamente do programa, e, por isso, dá-nos “filosoficamente” este conselho:
não pude compreender este e aquele artigo do seu programa, portanto, é neces-
sário eliminá-los do programa.
Mas não quero zombar do já assaz ridículo Sakartvelo. Dizem que não se es-
pezinha quem já está no chão! Ao contrário, sinto-me até disposto a ajudá-lo a
explicar nosso programa, desde que ele: 1) reconheça por sua própria boca sua
ignorância; 2) ouça-me com atenção; 3) Passe a agir segundo a lógica.
Eis em que consiste a questão. Os artigos 3º, 7º e 8º de nosso programa nas-
ceram no terreno do centralismo político. Quando o Partido Operário Social-
democrata da Rússia introduziu esses artigos em seu programa, foi guiado pela
consideração de que a chamada solução “final” da “questão nacional”, isto é, a
“libertação” das nacionalidades “estrangeiras” da Rússia, falando em termos ge-
rais, é impossível enquanto o poder político se encontrar nas mãos da burguesia.
E por um duplo motivo: em primeiro lugar, o atual desenvolvimento econômico
lança gradualmente uma ponte entre as “nacionalidades estrangeiras” e a “Rús-
sia”, estabelece entre umas e outra um laço recíproco cada vez mais estreito e,
por isso mesmo, gera sentimentos amistosos nos círculos dirigentes da burguesia
dessas nacionalidades, o que priva de fundamento sua aspiração à “libertação na-
cional”; e, em segundo lugar, falando em termos gerais, o proletariado não apoi-
ará o movimento chamado de “libertação nacional”, já que até o presente todos
os movimentos desse gênero levaram água ao moinho da burguesia, mutilaram e
corromperam a consciência de classe do proletariado. Essas considerações fize-
ram nascer a ideia do centralismo político, à qual obedecem aos artigos 3º, 7º e
J. V. Stalin 73

8º do programa de nosso Partido. Mas, como foi dito acima, esta é uma opinião
geral.
Tal opinião, porém, não exclui a possibilidade da criação de condições econô-
micas e políticas tais que façam os grupos adiantados da burguesia das naciona-
lidades “estrangeiras” desejar a “libertação nacional”.
Pode ainda acontecer que esse movimento se mostre útil ao desenvolvimento
da consciência de classe do proletariado. Como deverá então agir nosso Partido?
Justamente para atender à eventualidade de semelhantes casos é que foi incluído
em nosso programa o artigo 9º; e justamente na previsão da possibilidade de se-
melhantes circunstâncias é que se confere às nacionalidades um direito à base do
qual se esforçarão por solucionar seus assuntos nacionais, segundo suas aspira-
ções (por exemplo “libertar-se” por completo, separar-se).
Nosso Partido, que se propõe a dirigir a luta do proletariado de toda a Rús-
sia, deve estar preparado para semelhantes casos, que são possíveis na vida do
proletariado, e, justamente por isso, teve de introduzir tal artigo em seu pro-
grama. Assim deve proceder todo partido previdente e de visão ampla. Parece,
entretanto, que esse significado do artigo 9º não satisfaz aos “sábios” do Sakart-
velo, nem tampouco a alguns social-democratas federalistas. Pedem estes uma
resposta “decisiva”, “categórica” à pergunta: é vantajosa ou prejudicial ao prole-
tariado a “independência nacional”?
Recordo os metafísicos russos de meados do século passado, que importuna-
vam os dialéticos de então com a pergunta sobre se a chuva era útil ou prejudicial
à colheita, pergunta para a qual exigiam uma resposta “decisiva”. Não era difí-
cil aos dialéticos demonstrar que esse modo de apresentar a questão nada tinha
de científico, que, mudando o tempo, se deve responder de modo diverso a essa
pergunta, que a chuva é útil durante a seca, enquanto é inútil e mesmo prejudi-
cial com o tempo chuvoso, que, por conseguinte, exigir uma resposta “decisiva”
a essa pergunta é uma rematada tolice.
Mas o jornal Sakartvelo não tirou proveito desses exemplos.
Uma resposta “decisiva” do mesmo gênero exigiam aos marxistas os adep-
tos de Bernstein, fazendo a pergunta: são úteis ou prejudiciais ao proletariado
as cooperativas? Não era difícil aos marxistas demonstrar a inconsistência de se-
melhante modo de colocar a questão. Explicavam, muito simplesmente, que tudo
depende do tempo e do lugar, que onde a consciência de classe do proletariado
atingiu o devido nível de desenvolvimento; onde os proletários estão unidos num
único e forte partido político, aí as cooperativas podem prestar grande auxílio ao
proletariado, se é o próprio Partido quem se empenha em criá-las e dirigi-las, ao
passo que, onde não existam essas condições, as cooperativas são prejudiciais ao
proletariado, pois que geram entre os operários tendências de pequenos comer-
ciantes e isolamento corporativo, desnaturando, assim, a consciência de classe.
Entretanto, também esse exemplo não foi proveitoso aos “sakartvelistas”. Per-
guntam eles, com insistência! Ainda maior: é útil ou prejudicial ao proletariado
a independência nacional? Dai-nos uma resposta decisiva!
Estamos, porém, vendo que as circunstâncias capazes de gerar e desenvolver
o movimento de “libertação nacional” entre a burguesia das nacionalidades “es-
trangeiras”, não existem ainda nem são inevitáveis no futuro, e, sendo assim, nós
74 Obras Escolhidas

as consideramos apenas como circunstâncias possíveis. Além disso, é impossível


saber, por enquanto, o grau de desenvolvimento em que se encontrará então a
consciência de classe do proletariado e quanto poderá esse movimento ser útil ou
prejudicial ao proletariado! Perguntam-nos: em que base se pode formular111
uma resposta “decisiva” a tal pergunta, do que podemos inferi-la? Não é uma
tolice, pedir uma resposta “decisiva” em tal situação?
É claro que a solução deste problema deve ser confiada às próprias nacionali-
dades “estrangeiras”, para as quais devemos conquistar o direito de resolver esse
problema. Que as próprias nacionalidades o decidam, quando se lhes perguntar:
é-lhes útil ou prejudicial, a “independência nacional”, e, se é útil, sob que forma
deve ser realizada? Somente elas podem resolver semelhante questão!
Assim, por força do artigo 9º é conferido às nacionalidades “estrangeiras” o
direito de solucionar seus próprios negócios nacionais de acordo com suas pró-
prias aspirações. E nós, por força desse mesmo artigo, devemos conseguir que as
aspirações dessas nacionalidades sejam autênticas aspirações social-democráticas
que derivem dos interesses de classe do proletariado, para o que é necessário
educar os proletários dessas nacionalidades no espírito social-democrático, sub-
meter a uma rigorosa crítica social-democrática alguns usos, costumes e institui-
ções “nacionais” reacionárias, o que não nos impedirá, entretanto, de defender
esses usos, costumes e instituições contra as violências policiais. Este é o sentido
fundamental do artigo 9º.
É fácil perceber a profunda ligação lógica que tem esse artigo de nosso pro-
grama com os princípios da luta de classe do proletariado. E já que todo o nosso
programa é fundado sobre esse princípio, é por si mesma evidente a conexão do
artigo 9º com todos os artigos restantes do programa de nosso Partido. O ob-
tuso Sakartvelo é chamado de “sábio” órgão da imprensa, justamente porque não
digere ideias tão simples. Que resta ainda da “Questão Nacional”?
5) “A defesa do espírito nacional e de suas características”?
Mas que vêm a ser o “espírito nacional e suas características”? A ciência,
por meio do materialismo dialético, demonstrou há muito tempo que não existe
nem pode existir nenhum “espírito nacional”. Alguém já terá, por acaso, refu-
tado essa tese do materialismo dialético? A história nos diz que ninguém fez essa
refutação. Por conseguinte, devemos concordar com o citado parecer da ciên-
cia, devemos repetir com a ciência que não existe e nem pode existir nenhum
“espírito nacional”. Assim sendo, se não existe nenhum “espírito nacional”, é
evidente que toda defesa daquilo que não existe é uma estupidez lógica, que
inevitavelmente arrasta atrás de si as correspondentes consequências históricas
(indesejáveis). Falar dessas tolices “filosóficas” condiz só, talvez, com o Sakartvelo,
“órgão do Partido Revolucionário dos Social-Federalistas Georgianos” (Vide Sa-
kartvelo, nº 9).112 Assim estão as coisas no que diz respeito à questão nacional.

111 Os sakartvelistas sempre constroem suas demandas na areia e não podem conceber pessoas que
sejam capazes de encontrar um terreno mais firme para as mesmas!
112 O que é esse “partido” que tem um nome tão estranho? O Sakartvelo nos informa (ver Suplemento

nº 1 de Sakartvelo, nº 10) que “na primavera deste ano, revolucionários georgianos: Anarquistas ge-
orgianos, apoiadores de Sakartvelo, social-revolucionários georgianos, reuniram-se no exterior e...
unidos... um “partido” de Social-Federalistas da Geórgia. “... Sim, anarquistas, que desprezam
toda política de coração e alma, social-revolucionários que adoram a política e os sakartvelistas, que
J. V. Stalin 75

Como é evidente, nosso Partido dividiu-a em partes separadas, extraiu-lhe o


suco vital, introduziu-o nas veias de seu programa e mostrou, assim, como deve
ser resolvida a “questão nacional” na social-democracia, para destruir pela base as
barreiras nacionais, sem se afastar um só instante de nossos princípios. Para que
servem – perguntamos – os partidos nacionais separados? Ou antes, onde está
a “base” social-democrática sobre a qual devem apoiar-se as concessões políticas
e orgânicas dos social-democratas federalistas? Não se vê essa “base”; ela não
existe. Os social-democratas federalistas estão suspensos no ar.
Eles têm dois caminhos para sair dessa incômoda posição. Ou devem aban-
donar definitivamente o ponto de vista do proletariado revolucionário e adotar
o princípio do fortalecimento das barreiras nacionais (oportunismo na forma
federativa); ou devem abandonar qualquer federalismo na organização do par-
tido, empunhar ousadamente a bandeira da destruição das barreiras nacionais e
cerrar fileiras no campo único do Partido Operário Social-democrata da Rússia.
Proletariatis Brdzola (A Luta do Proletariado), nº. 7.
1º de setembro de 1904

repudiam todas as medidas terroristas e anarquistas – e acontece que essa multidão heterogênea e
mutuamente negativa se uniu para se formar... um partido”! Uma colcha de retalhos tão ideal quanto
qualquer um poderia imaginar! Este é um lugar onde ninguém o achará enfadonho! Os organiza-
dores que afirmam que as pessoas devem ter princípios comuns para se unir em um partido estão
enganados! Não são princípios comuns, mas a ausência de princípios é a base sobre a qual um “par-
tido” deve ser construído, diz essa multidão heterogênea. Abaixo a “teoria” e os princípios – eles são
apenas grilhões de escravos! Quanto mais cedo nos libertarmos deles, melhor – filosofa essa mul-
tidão heterogênea. E, de fato, no momento em que essas pessoas se libertaram dos princípios, elas
imediatamente construíram... um castelo de cartas – peço perdão – o “partido dos social-federalistas
georgianos”. Acontece que “sete homens e um menino” podem formar um “partido” a qualquer mo-
mento, sempre que estiverem juntos. Pode-se deixar de rir quando esses ignorantes, esses “oficiais”
sem exército, filosofam assim: o Partido Trabalhista Social-Democrata Russo “é antissocialista, rea-
cionário” etc.; os sociais-democratas russos são “chauvinistas”; a União do Cáucaso do nosso partido
submete-se “servilmente” ao Comitê Central do Partido, etc. (ver as resoluções da Primeira Confe-
rência dos Revolucionários da Geórgia). Nada melhor se poderia esperar dos fósseis arqueológicos
da era Bakunin: o fruto é típico da árvore que o gerou, os bens são típicos da fábrica que os produziu.
76 Obras Escolhidas

A Duma de Estado e a tática da


social-democracia
Certamente ouvistes falar da libertação dos camponeses. Era o momento em
que o governo recebia um duplo golpe: a derrota na Criméia, no exterior; o mo-
vimento camponês, no interior. Por isso, o governo, golpeado pelos dois lados,
foi obrigado a ceder e começou a falar na libertação dos camponeses: “Somos
nós que devemos libertar, de cima, os camponeses, pois de outro modo o povo se
insurgirá, e conquistará, de baixo, a liberdade com as próprias mãos.” Sabemos
o que foi essa “libertação de cima”.
E se então o povo se deixou ludibriar, se o governo se saiu bem de seus planos
astuciosos, se, graças às reformas, reforçou sua posição e dessa maneira retardou
a vitória do povo, isso significa, entre outras coisas, que então o povo ainda não
estava preparado e que se podia enganá-lo facilmente. A mesma história repete-
se ainda hoje na vida da Rússia. Também hoje, como é sabido, o governo recebeu
o mesmo duplo golpe: no exterior, a derrota na Manchúria; no interior, a revo-
lução popular. Como é sabido, o governo, golpeado dos dois lados, é obrigado,
mais uma vez, a ceder, e fala, como então, de “reformas de cima”: “Devemos
dar, de cima, ao povo, à Duma de Estado, senão o povo se insurgirá e ele próprio
convocará, de baixo, a Assembleia-Constituinte”.
Desse modo, com a convocação da Duma, deseja-se aplacar a revolução popu-
lar, justamente como, já uma vez, com a “libertação dos camponeses”, foi apla-
cado o grande movimento camponês. Portanto, nossa tarefa é desfazer, com a
máxima decisão, os planos da reação, arredar da estrada a Duma de Estado e,
dessa maneira, desimpedir o caminho para a revolução popular. Mas o que é a
Duma, por que quem é composta? A Duma é um parlamento híbrido: só em
palavras terá voto deliberativo, mas, na realidade, terá somente voto consultivo,
uma vez que a Câmara alta e o governo, armado até os dentes, pesarão sobre
ela na qualidade de censores. No manifesto, se diz abertamente que a nenhuma
decisão da Duma pode dar-se execução sem a aprovação da Câmara alta e do tsar.
A Duma não é um parlamento popular, é um parlamento de inimigos do povo,
uma vez que as eleições para a Duma não serão nem universais, nem iguais, nem
diretas, nem secretas. Os insignificantes direitos eleitorais concedidos aos operá-
rios existem só no papel. Dentre 98 eleitores de segundo grau, que devem eleger
os deputados do governo de Tiflis à Duma, somente dois podem ser operários,
os restantes 96 eleitores devem pertencer a outras classes: assim declara o mani-
festo. Dos 32 eleitores de segundo grau que devem enviar à Duma os deputados
dos colégios de Batum e de Sukhum, somente um pode ser operário, devendo
os restantes 31 pertencer a outras classes; assim declara o manifesto. O mesmo é
preciso dizer-se ainda com relação aos outros governos.
É supérfluo dizer que conseguirão ser deputados somente os representan-
tes de outras classes. Nem sequer um deputado dos operários, nem sequer um
voto aos operários: eis em que princípios se funda a Duma. Se a tudo isso se
J. V. Stalin 77

acrescentar ainda o estado de sítio, se se levar em conta que não há liberdade


de imprensa, de palavra, de reunião e de associação, se verá logo que espécie de
gente se reunirá na Duma tsarista.
É evidente que devemos esforçar-nos, com maior decisão ainda, para tirar do
caminho essa Duma e içar a bandeira da revolução. Como podemos tirar do ca-
minho a Duma? Com a participação nas eleições ou com o boicote das eleições?
Eis agora o problema. Uns dizem: devemos, sem falta, participar das eleições,
para colher a reação nas redes que ela própria estendeu e, assim, fazer desmo-
ronar definitivamente a Duma de Estado. Outros respondem: se participarem
das eleições, ajudarão involuntariamente a reação a lançar os alicerces da Duma
e cairão assim em cheio na rede estendida pela reação. Em outros termos, pri-
meiro, unidos com a reação, criarão a Duma tsarista e depois, sob a pressão da
vida, procurarão destruir a Duma que vocês mesmos criaram, o que é incompa-
tível com as exigências de nossa política fiel aos princípios. Das duas uma: ou se
recusam a participar das eleições e agem no sentido de sabotar a Duma, ou então
se recusam a sabotar a Duma e participem das eleições, sabendo, porém, que não
devem depois destruir o que vocês mesmos criaram.
É claro que o único caminho justo é o boicote ativo, mediante o qual isola-
remos do povo a reação, organizaremos a sabotagem da Duma, privando assim
esse parlamento híbrido de qualquer base. Assim raciocinam os partidários do
boicote. Quem tem razão? Duas condições são necessárias a uma boa tática social-
democrata: a primeira é que não deve estar em contradição com o curso da vida
social, e a segunda é que deve elevar cada vez mais o espírito revolucionário das
massas. A tática da participação nas eleições está em contradição com o curso da
vida social, uma vez que a vida mina os alicerces da Duma e a participação nas
eleições a reforça e, portanto, se contrapõe à vida. A tática do boicote emana
naturalmente do curso da revolução, uma vez que, de acordo com a revolução,
desacredita e mina, desde o princípio, os alicerces da Duma policialesca. A tática
da participação nas eleições debilita o espírito revolucionário do povo, uma vez
que os partidários da participação convidam o povo a eleições policialescas e não
a ações revolucionárias, veem a salvação nas cédulas eleitorais e não na ação do
povo.
Mas as eleições policialescas farão nascer no povo uma concepção enganadora
da Duma de Estado, suscitarão nele esperanças enganosas e o levarão involunta-
riamente a pensar: evidentemente a Duma não é assim tão ruim, senão os social-
democratas não nos haveriam aconselhado a participar dela; talvez a sorte nos
sorria e a Duma nos traga vantagens. A tática do boicote não semeia nenhuma
falsa esperança na Duma, porém diz abertamente e sem equívocos que a única
salvação está na ação vitoriosa do povo, que a libertação do povo pode ser re-
alizada somente pelas mãos do próprio povo, e uma vez que a Duma constitui
obstáculo a isso, é necessário preparar-se desde já para eliminá-la. Aqui, o povo
só conta consigo mesmo, e, desde o princípio, toma uma posição hostil à Duma
como cidadela da reação; e isso eleva cada vez mais o seu espírito revolucionário,
preparando o terreno para a vitoriosa ofensiva geral. A tática revolucionária deve
ser clara, precisa e nítida, e a tática do boicote tem precisamente essas qualida-
des. Diz-se: a agitação verbal apenas não basta; é preciso convencer a massa da
inutilidade da Duma com os fatos e, assim, favorecer o fracasso desta, mas tudo
78 Obras Escolhidas

isso requer a participação nas eleições e não o boicote ativo.


Eis o que diremos nós a esse respeito. É evidente que a agitação com fatos tem
uma importância muito maior que o esclarecimento oral. Justamente por isso,
comparecemos às assembleias eleitorais populares, onde, em luta com os outros
partidos, nos choques com estes, poderemos demonstrar de maneira palmar ao
povo a perfídia da reação e da burguesia e assim “agitar com fatos” os eleitores.
E se os companheiros não estiverem satisfeitos com isso, se a tudo isso acrescen-
tarem ainda a participação nas eleições, será preciso observar que as eleições em
si mesmas – a distribuição ou a não distribuição das cédulas – não acrescentam
coisa alguma nem à agitação “com fatos”, nem à “oral”. O prejuízo que daí deriva
é grande, porque com essa “agitação com fatos”, os partidários da participação
aprovam involuntariamente a existência da Duma e assim lhe reforçam as bases.
Como desejam refazer-se os companheiros desse enorme prejuízo? Colocando
as cédulas na urna? Nem vale a pena falar nisso.
Por outro lado, a “agitação com fatos” deve ter os seus limites. Também Ga-
pon, quando com a cruz e os ícones marchava à frente dos operários de Peters-
burgo, afirmava: o povo, dizem, acreditar na bondade do tsar, não se persuadiu
ainda do caráter criminoso do aparelho governamental e devemos levá-lo ao pa-
lácio do tsar. Gapon, compreende-se, estava errado; sua tática era prejudicial,
como o 9 de janeiro confirmou. E isso significa que devemos ficar longe da tática
de Gapon. A tática do boicote é a única tática que elimina e os subterfúgios de
Gapon. Dizem: o boicote causará a ruptura entre a massa e o seu destacamento
de vanguarda, uma vez que somente o destacamento de vanguarda os seguirá
no boicote, enquanto a massa ficará com os reacionários e com os liberais, que a
arrastarão para o seu lado.
Respondemos que, onde se produzir tal fenômeno, isto significa que a massa
simpatiza com outros partidos e, em todo o caso, não escolherá como seus dele-
gados os social-democratas, mesmo que participemos das eleições. Admitamos
que as eleições, por si só, não podem tornar revolucionária a massa! No que se
refere à agitação pré-eleitoral, esta é promovida por ambas as partes, com a dife-
rença que os partidários do boicote promovem uma agitação contra a Duma mais
decidida e implacável do que os defensores da participação nas eleições, porque
uma crítica áspera da Duma pode impelir a massa a abster-se das eleições. E isso
não entra nos planos dos defensores da participação nas eleições. Se essa agita-
ção tiver êxito, o povo irá se unir em torno dos social-democratas e, quando estes
o convidarem para o boicote da Duma, o povo irá segui-lo imediatamente, e os
reacionários ficarão sozinhos com seus aristocratas delinquentes. Se a agitação
“não tiver êxito”, as eleições só trarão prejuízo, uma vez que nós, com a tática
da participação na Duma, seremos obrigados a aprovar a atividade dos reacioná-
rios. Como pode ser observado, o boicote é o melhor meio de unir o povo em
torno da social-democracia, onde, está claro, tal união for possível; e onde ela for
impossível, as eleições só trarão prejuízo.
Ademais, a tática da participação na Duma turva a consciência revolucioná-
ria do povo. O fato é que todos os partidos reacionários e liberais tomam parte
nas eleições. Que diferença existe entre eles e os revolucionários? A essa per-
gunta a tática da participação não dá à massa uma resposta direta. A massa pode
J. V. Stalin 79

facilmente confundir os cadetes não revolucionários com os social-democratas


revolucionários. A tática do boicote, pelo contrário, traça uma fronteira nítida
entre os revolucionários e os não revolucionários que desejam salvar, com o au-
xílio da Duma, as bases do velho regime. E traçar essa fronteira tem uma grande
importância para a educação revolucionária do povo. Dizem-nos, enfim, que nós,
mediante as eleições, criaremos os sovietes de deputados operários e, portanto,
unificaremos e organizaremos as massas revolucionárias.
Respondemos que, nas condições atuais, em que se procede a prisões até nas
reuniões mais inofensivas, a atividade dos sovietes de deputados operários é ab-
solutamente impossível e, por conseguinte, propor-se a essa tarefa é uma ilusão.
Assim, a tática da participação serve involuntariamente para reforçar a Duma
tsarista, debilita o espírito revolucionário das massas, turva a consciência revolu-
cionária do povo, não está em condições de criar nenhuma organização revolucio-
nária, vai contra o desenvolvimento da vida social e por isso deve ser repelida pela
social-democracia. A tática do boicote, eis o rumo que agora toma o desenvolvi-
mento da revolução. Nesse rumo deve prosseguir também a social-democracia.
I. Besochvili
Gantiadi (A Aurora), nº 3.
9 de março de 1906
80 Obras Escolhidas

A questão agrária
março de 1906

Prossegue a demolição da antiga ordem social; o campo agitou-se. Os cam-


poneses, ainda ontem oprimidos e humilhados, hoje se põem de pé e erguem
a cabeça. O movimento camponês, ainda ontem impotente, hoje irrompe como
caudal impetuosa contra a velha ordem: afasta-te do caminho ou serás varrida!
“Os camponeses querem receber as terras da nobreza fundiária” “os campone-
ses querem destruir os restos do feudalismo”: eis as vozes que hoje ressoam nas
aldeias insurretas e nos campos da Rússia. Enganam-se aqueles que acreditam
forçar, à bala, os camponeses ao silêncio, a vida demonstrou-nos que isso incita e
exacerba ainda mais o movimento revolucionário dos camponeses. Enganam-se
também aqueles que, através de míseras promessas e dos “bancos camponeses”,
procuram pacificar os camponeses: os camponeses querem a terra; essa terra
eles a veem até em sonho e, naturalmente, não se acalmarão enquanto não se
apoderarem das terras da nobreza fundiária. Que podem dar aos camponeses as
promessas vazias e alguns “bancos camponeses”? Os camponeses querem ocupar
as terras da nobreza fundiária. Dessa maneira, esforçam-se por destruir os restos
do feudalismo, e quem não atraiçoa os camponeses deve envidar esforços no sen-
tido de resolver, justamente nessa base, a questão agrária. Mas de que maneira
receberão os camponeses, em suas mãos, as terras da nobreza fundiária?
Diz-se que a única saída é o “resgate” das terras “em condições favoráveis”. O
governo e os proprietários possuem muitas terras livres, dizem-nos esses senho-
res: se os camponeses resgatarem essas terras, tudo se arranjará naturalmente
e assim se salvarão a cabra e a couve. Mas por que não se pergunta como os
camponeses poderão resgatar essas terras, desde que já lhes arrancaram não só
o dinheiro, como também a pele? E não pensem que, com o resgate, impingi-
rão aos camponeses só as terras ruins, guardando para si as terras boas, assim
como conseguiram fazer por ocasião da “emancipação dos servos da gleba”! E
afinal, por que devem os camponeses resgatar as terras que lhes pertencem desde
tempos imemoriais? Por acaso não estarão empapadas de suor camponês quer
as terras dominiais, quer as dos nobres? Por acaso não pertenciam aos campo-
neses essas terras? Por acaso não foi tirado dos camponeses esse patrimônio de
seus pais e antepassados? E onde está a justiça, quando se pede aos camponeses
que resgatem as terras que foram tiradas deles próprios? Por acaso a questão do
movimento camponês será uma questão de compra e venda? Por acaso o movi-
mento camponês não é dirigido no sentido da libertação dos camponeses? Mas,
quem libertará os camponeses do jugo do feudalismo senão eles próprios? E
esses senhores asseguram-nos que a nobreza fundiária libertará os camponeses
desde que a ela se atirem alguns trocados. E como poderiam pensar nisso! Essa
“libertação”, ao que parece, deve ser posta em prática sob a direção da burocra-
J. V. Stalin 81

cia tsarista, a mesma burocracia que mais de uma vez recebeu os camponeses
esfomeados com canhões e metralhadoras!
Não! O resgate das terras não salvará os camponeses. Os que aconselham aos
camponeses o “resgate em condições favoráveis” são traidores, porque procuram
colher os camponeses nas redes dos agenciadores e não querem que a libertação
dos camponeses se efetue pelas mãos dos próprios camponeses. Se os camponeses
querem ocupar as terras da nobreza, se devem por esse meio destruir os restos do
feudalismo, se o “resgate em condições favoráveis” não os salvará, se a libertação
dos camponeses deve efetuar-se pelas mãos dos próprios camponeses, então é
fora de qualquer dúvida que a única saída está em tomar as terras dos nobres,
isto é, no confisco dessas terras. Essa é a saída. Pergunta-se: até que ponto deve
chegar esse confisco, terá ele limites, devem os camponeses tomar só uma parte,
ou todas as terras?
Alguns dizem que tomar todas as terras é demasiado, que basta tomar só uma
parte das terras para satisfazer aos camponeses. Admitamos, porém como pro-
ceder se os camponeses pedirem mais? Não seremos nós que nos atravessaremos
no caminho deles dizendo: parem, não passem adiante! É claro que isso se-
ria reacionário! E os acontecimentos na Rússia acaso não demonstraram que os
camponeses reivindicam efetivamente o confisco de todas as terras da nobreza?
Além disso, que significa “tomar uma parte”? Que parte deve ser tomada dos
nobres: a metade ou um terço? Quem deve decidir essa questão: os nobres so-
zinhos ou os nobres e os camponeses juntos? Como pode ser observado, ainda
há muito lugar para os agenciadores, ainda é possível mercadejar entre nobres e
camponeses e isso contraria radicalmente a causa da libertação dos camponeses.
Os camponeses devem convencer-se de uma vez por todas de que com a nobreza
fundiária não se deve mercadejar, mas lutar. Não se deve remendar o jugo do
feudalismo, mas despedaçá-lo, a fim de destruir lhe para sempre os restos. “To-
mar só uma parte” significa pôr-se a remendar os restos do feudalismo, e isso é
incompatível com a causa da libertação dos camponeses.
É claro que o único caminho é tomar da nobreza fundiária todas as terras.
Somente assim se pode levar até fim o movimento camponês, somente isso pode
intensificar a energia do povo, pode varrer os restos decrépitos do feudalismo.
O atual movimento no campo é, portanto, um movimento democrático dos cam-
poneses. O objetivo desse movimento é a destruição dos restos do feudalismo.
Para destruir esses restos é necessário confiscar todas as terras da nobreza e do go-
verno. Alguns senhores levantam-nos uma acusação: por que a social-democracia
não exigiu até agora o confisco de todas as terras, por que ela falou até agora so-
mente em confisco dos “otrezki”?113
Porque, senhores, em 1903, quando o Partido falava dos “otrezki”, os campo-
neses da Rússia não tinham sido ainda atraídos para o movimento. Era dever do
Partido lançar no campo uma palavra de ordem que inflamasse os corações dos
camponeses e levantasse as massas camponesas contra os restos do feudalismo.
Uma palavra de ordem desse gênero eram justamente os “otrezki”, que recor-
davam vivamente aos camponeses da Rússia a injustiça dos restos feudais. Mas

113Em tradução literal, “cortes”. Lotes de terra que os latifundiários tomaram dos camponeses
quando a servidão foi abolida na Rússia em 1861 (N.T.)
82 Obras Escolhidas

depois, os tempos mudaram. O movimento camponês desenvolveu-se. Agora


não é mais necessário lançar lhe apelos, ele se desencadeia por si só. Hoje não se
trata de saber como devem ser postos em movimento os camponeses, mas o que
devem reivindicar os camponeses que se puseram em movimento. É claro que são
necessárias reivindicações precisas, e por isso o Partido diz aos camponeses que
eles devem reivindicar o confisco de todas as terras dos nobres e do governo. Mas
isso significa que todas as coisas têm seu tempo e seu lugar: não só os “otrezki”,
como também o confisco de todas as terras.

II

Vimos que o atual movimento no campo é um movimento de libertação dos


camponeses, vimos também que, para a libertação dos camponeses, é necessário
destruir os restos do feudalismo, e que para a destruição desses restos é necessário
tomar todas as terras da nobreza e do governo, para desimpedir o caminho para
uma nova vida, para o livre desenvolvimento do capitalismo. Suponhamos que
tudo isso tenha sido feito. Como devem, pois, ser repartidas essas terras, a quem
devem ser dadas em propriedade? Dizem uns que as terras tomadas devem ser
entregues em propriedade comum à aldeia, e imediatamente deve ser destruída a
propriedade privada da terra, que, dessa maneira, a aldeia deve ser proprietária
integral das terras e que em seguida a própria aldeia distribuirá aos camponeses
“lotes” iguais, realizando assim imediatamente o socialismo no campo; ao invés
do trabalho assalariado instaurar-se-á a utilização igualitária da terra. Isso se
chama “socialização da terra”, dizem-nos os social-revolucionários.
É aceitável para nós essa saída? Entremos no âmago da questão. Comecemos
pelo fato de que os social-revolucionários querem iniciar pelo campo a realização
do socialismo. É isso possível? Todos sabem que a cidade é mais desenvolvida que
o campo, que a cidade é o guia do campo e que, por conseguinte, qualquer reali-
zação socialista deve começar pela cidade. Ao contrário, os social-revolucionários
querem transformar o campo em dirigente da cidade e obrigá-lo a iniciar a reali-
zação do socialismo, o que, compreende-se é impossível, dado o atraso do campo.
É, portanto, evidente que o “socialismo” dos social-revolucionários será um soci-
alismo natimorto.
Passemos agora ao fato de que estes querem realizar, desde já, o socialismo
no campo. A realização do socialismo é a eliminação da produção mercantil, a
abolição da economia monetária, a destruição do capitalismo pela base e a so-
cialização de todos os meios de produção. Os social-revolucionários, ao invés,
querem deixar intacto tudo isso e socializar unicamente a terra, o que é abso-
lutamente impossível. Se a produção mercantil permanecer intacta, também a
terra se tornará mercadoria, e, hoje ou amanhã, aparecerá no mercado, e o “so-
cialismo” dos social-revolucionários voará pelos ares. É claro que eles querem
pôr em prática o socialismo no âmbito do capitalismo, o que, compreende-se, é
inconcebível. Por isso, diz também que o “socialismo” dos social-revolucionários
é socialismo burguês.
No que diz respeito à utilização igualitária da terra, é preciso observar que es-
sas são somente palavras vazias. A utilização igualitária da terra exige igualdade
J. V. Stalin 83

na propriedade, mas entre os camponeses existe a desigualdade na propriedade,


que a atual revolução democrática não tem força para destruir. Pode-se conceber
que o dono de oito juntas de bois usufrua a terra na mesma medida do lavrador
que não possui um boi sequer? Entretanto, os social-revolucionários pensam que
a “utilização igualitária da terra” destruirá o trabalho assalariado, e assinalará o
fim do desenvolvimento do capital, o que obviamente é um absurdo. Evidente-
mente os social-revolucionários querem lutar contra o ulterior desenvolvimento
do capitalismo e fazer girar para trás a roda da história; nisso veem eles a salvação.
Mas, a ciência nos diz que a vitória do socialismo depende do desenvolvimento do
capitalismo, e, quem luta contra esse desenvolvimento, luta contra o socialismo.
Por isso os social-revolucionários são também chamados social-reacionários.
Nada diremos do fato de que os camponeses querem lutar pela abolição da
propriedade feudal, não contra a propriedade burguesa, mas nos limites da pro-
priedade burguesa: desejam repartir entre si, como propriedade privada, as ter-
ras tomadas, e não se contentam com a “socialização da terra”.
Como se vê, a “socialização da terra” é inaceitável. Outros dizem que as terras
tomadas devem ser dadas ao Estado democrático: os camponeses serão somente
arrendatários da terra do Estado. Chama-se a isso “nacionalização da terra”. É
aceitável a nacionalização da terra? Se considerarmos que o Estado futuro, por
mais democrático que possa ser, será todavia burguês, que em seguida à transfe-
rência das terras a um tal Estado teremos um fortalecimento político da burgue-
sia, o que é extremamente desvantajoso para o proletariado urbano e rural; se
considerarmos, além disso, que os próprios camponeses serão contra a “naciona-
lização da terra” e não ficarão satisfeitos com o simples papel de arrendatários,
se tornará evidente que a “nacionalização da terra” não corresponde aos interes-
ses do movimento atual. Consequentemente a “nacionalização da terra” também
é inaceitável. Dizem ainda outros que a terra deve ser dada em propriedade às
administrações locais e que os camponeses serão arrendatários da terra das ad-
ministrações locais. Chama-se a isso “municipalização da terra”. É aceitável a
municipalização da terra? Que significa “municipalização da terra”? Significa,
em primeiro lugar, que os camponeses não receberão, em propriedade, as terras
por eles arrancadas, no curso da luta aos nobres e ao governo.
Como verão os camponeses essa solução? Os camponeses querem repartir as
terras tomadas, até em sonho veem essas terras como sua propriedade e quando
se disser que as terras devem ser transferidas não a eles, mas à administração
local, os camponeses sem dúvida não estarão de acordo com os partidários da
“municipalização”. Não devemos esquercer de tal questão.
Além disso, como proceder se os camponeses, arrastados pela revolução, apro-
priarem-se de todas as terras tomadas e não deixarem nada para a administração
local? Não seremos nós que lhes barraremos o caminho dizendo: alto lá, estas
terras devem ser transferidas à administração local e não a vocês, para vocês basta
o arrendamento! Em segundo lugar, se aceitamos a palavra de ordem da “mu-
nicipalização”, por isso mesmo devemos desde já lançar essa palavra de ordem
ao povo e devemos imediatamente explicar aos camponeses que as terras pelas
quais eles lutam e que desejam tomar em suas mãos, serão dadas em propriedade
à administração local e não aos camponeses. Certo, se o Partido tem uma grande
84 Obras Escolhidas

influência sobre os camponeses, existe a possibilidade de que eles o apoiem, mas


é supérfluo dizer que os camponeses não lutarão mais com o primitivo ardor, o
que será extremamente prejudicial à revolução atual. Se, ao invés, o Partido não
tem uma grande influência sobre os camponeses, então os camponeses irão lhe
abandonar e virarão as costas, o que provocará um conflito entre os camponeses
e o Partido e debilitará consideravelmente as forças da revolução.
Nos dirão: frequentemente as aspirações dos camponeses estão em contradi-
ção com o curso do desenvolvimento e não podemos ignorar o curso da história e
seguir sempre as aspirações dos camponeses; o Partido deve possuir os seus prin-
cípios. É a pura verdade! O Partido deve orientar-se segundo os seus princípios.
Mas trairia os seus princípios um Partido que repelisse todas aquelas aspirações
dos camponeses. Se a tendência dos camponeses a ocupar as terras dos nobres e a
dividi-las não está em contradição com o curso da história, se, pelo contrário, essa
tendência emana inteiramente da revolução democrática atual, se a verdadeira
luta contra a propriedade feudal é possível somente nos limites da propriedade
burguesa, se as aspirações dos camponeses exprimem precisamente essa tendên-
cia, então é óbvio que o Partido não pode repelir essas reivindicações dos campo-
neses, uma vez que negar-se a apoiar essas reivindicações significaria recusar-se
a desenvolver a revolução. Por outro lado, se o Partido possui princípios, se não
quer transformar-se em freio da revolução, deve favorecer a realização dessas as-
pirações dos camponeses. Mas essas aspirações estão radicalmente em contradi-
ção com a “municipalização da terra”! Como se vê, a “municipalização da terra”
também é inaceitável.

III

Vimos que nenhuma das três soluções – nem a “socialização”, nem a “nacio-
nalização”, nem a “municipalização” – pode satisfazer devidamente aos interesses
da revolução atual. Como devem ser repartidas as terras tomadas, a quem devem
ser dadas em propriedade? É claro que as terras arrebatadas pelos camponeses
devem ser transferidas aos próprios camponeses para dar-lhes a possibilidade de
repartir essas terras entre si. Assim deve ser resolvida a questão acima levan-
tada. A divisão da terra provocará um revolucionamento da propriedade. Os
menos abastados venderão as terras e enveredarão pelo caminho da proletariza-
ção, os endinheirados adquirirão novas terras e se lançarão a melhorar a técnica
das culturas, o campo será dividido em classes, se intensificará a luta de clas-
ses, e dessa maneira serão lançadas as bases para o ulterior desenvolvimento do
capitalismo. Como se vê, a divisão da terra é a consequência natural do atual
desenvolvimento econômico. Por outro lado, a palavra de ordem: “a terra aos
camponeses, somente aos camponeses e a ninguém mais”, encorajará os campo-
neses, irão preenchê-los de nova energia e contribuirá para levar até ao fim o
movimento revolucionário já iniciado no campo. Como se vê, também o curso
da revolução atual nos indica a necessidade da repartição das terras. Os adversá-
rios acusam-nos de fazer renascer, por meio de tudo isso, a pequena burguesia,
o que está em contradição radical com a doutrina de Marx. Eis o que escreve a
J. V. Stalin 85

Revoliutsiónnaia Rossíia 114 :


Ajudando os camponeses a expropriarem a nobreza fundiária, favorecerão inconsciente-
mente a formação de uma economia pequeno-burguesa sobre as ruínas das formas já mais ou
menos desenvolvidas da economia agrícola capitalista. Não é isso um “passo atrás” do ponto
de vista do marxismo ortodoxo? (vide Revoliutsiónnaia Rossíia, nº 75).

Devo dizer que os senhores “críticos” confundiram os fatos. Esqueceram-se


de que a economia da nobreza fundiária não é uma economia capitalista, que
ela é uma sobrevivência da economia feudal e, por conseguinte, com a expro-
priação da nobreza fundiária, destroem-se os restos da economia feudal e não a
economia capitalista. Esqueceram-se também de que, do ponto de vista do mar-
xismo, à economia feudal nunca se seguiu e não pode seguir-se imediatamente
a economia capitalista: entre uma e outra está a economia pequeno-burguesa,
que substitui a economia feudal, e transforma-se em seguida em economia capi-
talista. Já no terceiro volume do O Capital, Karl Marx dizia que, na história, à
economia feudal seguiu-se primeiro a economia agrícola pequeno-burguesa, e só
depois desenvolveu-se a grande economia capitalista; não houve e não poderia
haver um salto direto de uma à outra. E, todavia, esses estranhes “críticos” dizem-
nos que tomar as terras dos nobres e dividi-las é um retrocesso do ponto de vista
do marxismo! Dentro em pouco passarão a acusar-nos considerando também
a “supressão da servidão” como um retrocesso do ponto de vista do marxismo,
porque então algumas terras foram tomadas dos nobres e transferidas aos cam-
poneses pequenos lavradores! Indivíduos ridículos! Não compreendem que o
marxismo considera todas as coisas do ponto de vista histórico, que, do ponto
de vista do marxismo, a economia pequeno-burguesa camponesa é progressista
em relação à economia feudal, que a destruição da economia feudal e a introdu-
ção da pequeno-burguesa são uma condição necessária do desenvolvimento do
capitalismo, o qual, em seguida, suplantará essa economia pequeno-burguesa...
Mas deixemos em paz os “críticos”. O fato é que a transferência das terras aos
camponeses e depois sua repartição minam as bases dos restos feudais, prepa-
ram o terreno para o desenvolvimento da economia capitalista, reforçam consi-
deravelmente o ímpeto revolucionário e justamente por isso são aceitáveis para o
Partido Social-democrata. Portanto, para destruir os restos feudais, é necessário
o confisco de todas as terras dos nobres; e os camponeses devem tomar em pro-
priedade essas terras e reparti-las entre si de acordo com seus interesses. Nessa
base deve ser elaborado o programa agrário do Partido.
Nos dirão: tudo isso diz respeito aos camponeses, porém o que pretendem
fazer com os proletários agrícolas? Respondemos que, se para os camponeses é
necessário um programa agrário democrático, para os proletários urbanos e ru-
rais há o programa socialista, em que se exprimem seus interesses de classe, ao
passo que seus interesses imediatos são tomados em consideração nos dezesseis
pontos do programa mínimo, em que se fala no melhoramento das condições de
trabalho (vide o Programa do Partido, aprovado pelo segundo Congresso). Por
ora, o trabalho socialista imediato do Partido exprime-se na propaganda socia-
lista que ele promove entre os proletários agrícolas, unindo-os em organizações
114Revolutsionnaya Rossiya (Rússia Revolucionária) foi o órgão dos Socialistas-Revolucionários, publi-
cado do final de 1900 a 1905. No início foi publicado pela Liga dos Socialistas-Revolucionários, mas
em janeiro de 1902 tornou-se o órgão central do Partido Socialista Revolucionário.
86 Obras Escolhidas

socialistas próprias e fundindo-os com os proletários urbanos em um partido


político distinto.
O Partido ocupa-se continuamente com essa parte dos camponeses e lhes diz:
na mesma medida em que realizam a revolução democrática, mantenham-se uni-
dos com os camponeses que lutam, e lutem contra a nobreza fundiária; na mesma
medida em que marcham para o socialismo, unam-se decididamente aos prole-
tários urbanos e lutem implacavelmente contra todos os burgueses, sejam cam-
poneses ou nobres. Juntamente com os camponeses pela república democrática!
Juntamente com os operários pelo socialismo! Eis o que diz o Partido aos proletá-
rios agrícolas. Se o movimento dos proletários e seu programa socialista reavivam
a chama da luta de classes, para destruir para sempre, com esta luta, todo tipo
de classismo, por sua vez o movimento camponês e o seu programa agrário de-
mocrático reavivam no campo a chama da luta de camadas sociais para destruir
com isso mesmo pelas raízes todas as divisões em camadas.
P. S. – No fim deste artigo, não se pode deixar de responder à carta de um
leitor, que nos escreve o seguinte: “Contudo, seu primeiro artigo não me satisfez.
Acaso não era o Partido contra o confisco de todas as terras? E se é assim, por
que não falou sobre isso?”
Não, caro leitor, o Partido nunca esteve contra esse confisco. Já no segundo
Congresso, isto é, no Congresso em que foi aprovado o ponto sobre os “otrezki”, já
naquele Congresso (1903), o Partido pela palavra, de Plekhanov e de Lenin, disse
que teríamos apoiado os camponeses, se estes houvessem reivindicado o confisco
de todas as terras. Dois anos depois (em 1905), ambas as frações do Partido, os
“bolcheviques” no terceiro Congresso e os “mencheviques” na primeira Confe-
rência, declaram por unanimidade que teriam sustentado por todas as formas os
camponeses na questão do confisco de todas as terras. Em seguida, nos jornais
de ambas as tendências do Partido, seja na Iskra e no Proletari, seja na Novaia
Jizn115 e no Natchalo116 , os camponeses foram repetidamente chamados a confis-
car todas as terras... Como pode ser visto, o Partido era desde o princípio pelo
confisco de todas as terras então, você não deve ter, por isso, nenhuma razão ao
pensar que o Partido se haja deixado levar a reboque do movimento camponês.
O movimento camponês ainda não havia começado seriamente, os camponeses
ainda não reivindicavam sequer os “otrezki”, e o Partido já falava no confisco de
todas as terras em seu segundo Congresso.
E se, não obstante, nos perguntaram por que não introduzimos no programa a
reivindicação do confisco de todas as terras naquele mesmo ano de 1903, respon-
deremos com uma pergunta: por que os social-revolucionários não introduziram
em seu programa, desde 1900, a reivindicação da república democrática? Acaso
eram contra essa reivindicação? Por que então falavam somente em nacionali-
zação e hoje romperam-nos os tímpanos com a socialização? E se nós hoje no

115 Novaya Zhizn (Vida Nova) – o primeiro jornal bolchevique legal, publicado em São Petersburgo
de 27 de outubro a 3 de dezembro de 1905. Quando V. I. Lenin chegou do exterior, o Novaya Zhizn
começou a funcionar sob sua direção pessoal. Parte ativa na publicação do jornal foi assumida por
Maxim Gorky. Com a aparição do nº 27 de Novaya Zhizn, o artigo foi suprimido pelas autoridades.
O nº 28, último número a ser publicado, saiu ilegalmente.
116 Nachalo (O Começo) —um jornal diário legal publicado em São Petersburgo pelos mencheviques

de 13 de novembro a 2 de dezembro de 1905.


J. V. Stalin 87

programa mínimo não dizemos nada sobre a jornada de trabalho de sete horas,
isso, por acaso, quer dizer que somos contra ela? Então, de que se trata? Somente
do fato de que em 1903, quando o movimento ainda não havia tomado consistên-
cia, o confisco de todas as terras teria ficado no papel; o movimento, ainda não
consistente, não teria conseguido essa reivindicação, e por isso a reivindicação
dos “otrezki” era mais adequada àquele período. Mas, em seguida, quando o mo-
vimento se desenvolveu e pôs em discussão as questões práticas, então o Partido
devia mostrar que o movimento não pode e não deve parar nos “otrezki”, que é
indispensável o confisco de todas as terras. Estes são os fatos. Enfim, algumas
palavras sobre o Tsnobis Purtseli117 – esse jornal diz certas tolices a propósito do
“costume” e do “princípio” e assevera que o Partido, não sei quando, teria trans-
formado em princípio os “otrezki”. O leitor pode ver também acima que isso é
mentira, que o Partido reconheceu publicamente como um princípio, desde o
início, o confisco de todas as terras. No que se refere ao fato de que o Tsnobis
Purtseli não distingue das questões práticas os princípios, nada de mau há nisso:
ele crescerá e aprenderá a distingui-los.118
I. Besochvili
Elva (O Relâmpago), nº 5, 9 e 10.
17, 22 e 23 de março de 1906

117 Tsnobis Purtseli (Boletim de Notícias) — um jornal diário georgiano publicado em Tiflis de 1896
a 1906. No final de 1900, tornou-se o porta-voz dos nacionalistas georgianos e, em 1904, tornou-se
o órgão dos social-federalistas georgianos.
118 Stalin completa: Tsnobis Purtseli “ouviu” em algum lugar que os “sociais-democratas russos... ado-

taram um novo programa agrário em virtude do qual... eles apoiam a municipalização da terra”.
Devo dizer que os sociais-democratas russos não adoptaram esse programa. A adoção de um pro-
grama é função de um congresso, mas nenhum congresso foi realizado ainda. Claramente, Tsnobis
Purtseli foi enganado por alguém ou algo. Tsnobis Purtseli se sairia bem se parasse de encher seus
leitores de rumores.
88 Obras Escolhidas

A contrarrevolução internacional
14 de julho de 1906

A Rússia contemporânea lembra, sob muitos aspectos, a França dos tempos


da grande revolução. Essa analogia exprime-se, entre outras coisas, no fato de
que também entre nós, como na França, a contrarrevolução se estende e, em vez
de permanecer nas próprias fronteiras, entra em aliança com a contrarrevolu-
ção dos outros Estados, adquire gradativamente um caráter internacional. Na
França, o velho governo havia-se aliado ao imperador austríaco e ao rei da Prús-
sia, havia chamado em seu auxílio os exércitos deles, e tomara a ofensiva contra
a revolução popular. Na Rússia o velho governo alia-se aos imperadores alemão
e austríaco, quer chamar em auxílio os exércitos deles e afogar em sangue a re-
volução popular.
Já há um mês, circulavam rumores precisos, segundo os quais “a Rússia” e
“a Alemanha” estavam em negociações secretas (vide Séviernaia Zviezda nº 3119 ).
Em seguida, os rumores tornaram-se ainda mais insistentes. E agora, chegou-se
ao ponto de o jornal das Centenas Negras, Rossíia120 afirmar abertamente que
os culpados da atual situação difícil da “Rússia” (isto é, da contrarrevolução) são
os elementos revolucionários. “O governo imperial alemão – diz o jornal dá-
se plenamente conta de tal situação e, por isso, tomou uma série de medidas
adequadas, que não deixarão de levar aos resultados desejados”. Ao que parece,
essas medidas consistem no propósito de a “Áustria” e a “Alemanha” enviarem
tropas em auxílio da Rússia”, no caso de que a revolução russa alcançasse êxitos.
Além disso, elas já se puseram de acordo a esse respeito e decidiram que, “nas
condições conhecidas, a intervenção ativa nos assuntos internos da Rússia, com o
fim de esmagar ou limitar o movimento revolucionário, poderia demonstrar-se
desejável e útil...”.
Assim fala o Rossíia. Como pode ser visto, a contrarrevolução internacional
efetua de há muito grandes preparativos. É sabido que há muito ela ajuda finan-
ceiramente a Rússia contrarrevolucionária em luta contra a revolução. Contudo,
não se limitou a essa ajuda. Ao que parece, já decidiu enviar, também, tropas
em seu auxílio. Depois disso, até um menino compreenderá facilmente o verda-
deiro significado da dissolução da Duma, como também o significado das “novas”
disposições de Stolypin121 e dos “velhos” pogroms de Trepov.122 É preciso supor
que, depois disso, se desvanecerão as ilusórias esperanças dos vários liberais e
dos outros ingênuos que se persuadirão finalmente de que, entre nós, não há
119 Severnaya Zemlya (Terra ao Norte) – um jornal diário bolchevique legal publicado em São Peters-
burgo de 23 a 28 de junho de 1906.
120 Rossiya (Rússia) – um jornal diário que expressava as opiniões da polícia e das Centenas Negras,

publicado de novembro de 1905 a abril de 1914. Órgão do Ministério do Interior.


121 Em junho e julho de 1906, P. A. Stolypin, o Ministro do Interior, emitiu uma ordem às autorida-

des locais exigindo a supressão implacável, pelas forças armadas, do movimento revolucionário dos
trabalhadores e camponeses e das organizações revolucionárias (N.T.)
122 D. Trepov foi o Governador-Geral de São Petersburgo, que dirigiu a supressão da Revolução de

1905 (N.T.)
J. V. Stalin 89

“constituição”, existe a guerra civil, e a luta deve ser conduzida militarmente...


Mas a Rússia contemporânea assemelha-se à França daquele tempo também
sob outro aspecto. Então a contrarrevolução internacional provocava a exten-
são da revolução; a revolução atravessava as fronteiras da França, e como uma
torrente impetuosa, derramava-se pela Europa. Se os “coroados” da Europa se
haviam unido numa aliança geral, por outro lado também os povos da Europa se
estenderam as mãos uns aos outros. O mesmo fenômeno observamos na Rússia.
“A toupeira cava muito bem”. A contrarrevolução russa, unindo-se à contrarrevo-
lução europeia, estende incessantemente a revolução, une entre si os proletários
de todos os países e lança os alicerces da revolução internacional. O proletariado
da Rússia marcha à frente da revolução democrática, estende a sua mão fraterna
e une-se ao proletariado europeu, que iniciará a revolução socialista. Como é
sabido, em seguida aos fatos de 9 de janeiro, começou-se a realizar grandes co-
mícios em toda a Europa. A ação de dezembro deu origem a demonstrações na
Alemanha e na França. Não há dúvida de que a iminente ofensiva da revolução
russa impelirá ainda mais decididamente à luta o proletariado europeu. A con-
trarrevo1ução internacional não fara nada senão consolidar, aprofundar, refor-
çar e colocar num terreno sólido a revolução internacional. A palavra de ordem:
“Proletários de todos os países, unam-se” encontrará sua verdadeira expressão.
Trabalhemos, portanto, senhores, trabalhemos! À revolução russa que se es-
tende, irá seguir a revolução europeia, e nesse momento... soará a hora não só
para os restos feudais, como também para o seu predileto capitalismo. Sim, vocês
“cavam muito bem”, senhores contrarrevolucionários.
Koba
Akhali Tskhovreba (Vida Nova), nº 20.
14 de julho de 1906
90 Obras Escolhidas

O proletariado de vanguarda e o V
Congresso do Partido
A preparação do Congresso aproxima-se do fim123 . Pouco a pouco delineiam-
se as correlações de força das frações. É evidente que a maior parte dos distritos
industriais apoia os bolcheviques. Petersburgo, Moscou, zona central industrial,
Polônia, região báltica, Urais: eis onde se tem confiança na tática dos bolchevi-
ques. O Cáucaso, a zona além do Cáspio, a Rússia meridional, algumas cidades
das regiões influenciadas pelo Bund124 , organizações camponesas Spilka125 : eis
onde os mencheviques obtêm suas forças. A Rússia meridional é a única região
industrial onde se tem confiança nos mencheviques. Os outros pontos de apoio
do menchevismo são na sua maioria centros de pequena produção.
Torna-se claro que a tática dos mencheviques é sobretudo a tática das cida-
des atrasadas, onde se vê com maus olhos o desenvolvimento da revolução e da
consciência de classe. Torna-se claro que a tática dos bolcheviques é sobretudo
a tática das cidades adiantadas, dos centros industriais, onde a atenção volta-se
principalmente para o aprofundamento da revolução e para o desenvolvimento
da consciência de classe.
Houve uma época em que a social-democracia russa não possuía senão um
grupinho de adeptos. Tinha ela então um caráter intelectual e não estava em
condições de dar seu próprio cunho à luta do proletariado. A política do Partido
era então dirigida por poucas pessoas; a voz da massa proletária do Partido era
sufocada.... Muito diferentes são as coisas, hoje. Hoje temos em nossa frente
um partido imponente, o Partido Operário Social-Democrata da Rússia, que tem
em suas fileiras cerca de 200 mil membros, imprime seu próprio cunho à luta
do proletariado, reúne em torno de si a democracia revolucionária de toda a
Rússia e incute medo nos “poderosos do mundo”. E esse partido imponente é
tanto mais imponente e maravilhoso quanto o leme que o dirige está nas mãos
da massa do Partido e não nas de poucos “homens cultos”. Isso foi evidenciado
da melhor maneira possível por ocasião das eleições à Duma, quando a massa
do Partido, repelindo a proposta do “autorizado” Plekhanov, não quis ter uma
“plataforma comum” com os cadetes. É verdade que os mencheviques chamam
igualmente nosso Partido de um partido de intelectuais, mas provavelmente o
fazem porque não é ele em sua maioria menchevique. Mas se o Partido Social-
Democrata alemão, dentre 18 milhões de proletários, conta em suas fileiras com
400 mil membros, se esse partido tem o direito de chamar-se partido proletário,
o mesmo direito tem também o Partido Operário Social-Democrata da Rússia,
123 O Quinto Congresso foi realizado em Londres de 30 de abril a 19 de maio de 1907. Em todas as
questões principais, o congresso adotou resoluções bolcheviques. Stalin esteve presente no congresso
como delegado da organização de Tiflis .
124 Sindicato Geral dos Trabalhadores Judeus da Polônia, Lituânia e Rússia – foi formado em outubro

de 1897.
125 Liga Social-Democrática Ucraniana, que esteve perto dos mencheviques, foi formada no final de

1904 como resultado de uma ruptura com o Partido Revolucionário Ucraniano (RUP) nacionalista
pequeno-burguês. Deixou de existir durante a reação de Stolypin.
J. V. Stalin 91

que possui 200 mil membros, num total de 9 milhões de proletários. O Partido
Operário Social-Democrata da Rússia é, portanto, imponente também porque é
um partido verdadeiramente proletário, que segue o seu caminho, em direção ao
porvir, criticando ao mesmo tempo os murmúrios de seus velhos “chefes”. A esse
respeito são significativas as últimas conferências de Petersburgo e de Moscou.
Em ambas as conferências eram os operários que davam o tom. Os nove déci-
mos do total dos delegados eram constituídos, tanto numa como a outra confe-
rência, por operários. Ambas as conferências repeliram as “diretrizes” superadas
e inoportunas dos “velhos líderes” do gênero de Plekhanov. Ambas as confe-
rências reconheceram ardorosamente a necessidade do bolchevismo. Com isso,
Moscou e Petersburgo expressaram a sua desconfiança da tática menchevique,
reconheceram a necessidade da hegemonia do proletariado na atual revolução.
Pela boca de Petersburgo e de Moscou fala todo o proletariado consciente.
Moscou e Petersburgo arrastam atrás de si as outras cidades. De Moscou e de
Petersburgo partiram as diretivas por ocasião das ações de dezembro e outubro;
foram elas que dirigiram o movimento e as gloriosas jornadas de dezembro. Não
há dúvida de que serão elas a dar o sinal para o iminente ataque revolucioná-
rio. Tanto Petersburgo como Moscou se atêm à tática do bolchevismo. A tática
do bolchevismo é a única tática proletária: eis o que dizem os operários dessas
cidades ao proletariado da Rússia.
Dro (O Tempo), nº 25.
8 de abril de 1907
92 Obras Escolhidas

A dissolução da Duma e as tarefas


do proletariado
20 de junho de 1907

A II Duma foi dissolvida126 . E não foi dissolvida simplesmente, porém com


estrépito, exatamente como a I Duma. Também desta vez não falta o “manifesto
de dissolução”, com o “sincero pesar” do Tsar fariseu pela dissolução. Também
desta vez não falta a “nova lei eleitoral”, que reduz a zero os direitos eleitorais
dos operários e dos camponeses. Não falta até a promessa de “renovar” a Rússia,
naturalmente, por meio de violências e da III Duma. Em suma, nesta dissolu-
ção, repete-se o que sucedeu, em tempos ainda não tão recuados, quando foi
dissolvida a I Duma. Em suma, o Tsar repetiu a dissolução da I Duma...
E dissolveu a II Duma não sem nisso refletir, e o fez não sem razão. Que-
ria servir-se da Duma para ligar a si os camponeses, fazê-los converterem-se, de
aliados do proletariado em aliados do governo, deixando, assim, o proletariado
sozinho, isolando-o; queria fazer fracassar a causa da revolução, tornar-lhe im-
possível a vitória. Para fazer tudo isso, o governo valeu-se da ajuda da burguesia
liberal, que goza ainda de uma certa influência entre a massa ignorante dos cam-
poneses, e, através dessa burguesia, queria ligar a si milhões de camponeses. Para
isso queria o governo servir-se da Duma.
Mas, aconteceu justamente o contrário. Desde as primeiras sessões da II
Duma, evidenciou-se que os deputados camponeses não só não tinham confiança
no governo, como também não a tinham nem sequer nos deputados burgueses
liberais. Essa desconfiança cresceu no curso de toda uma série de votações e, por
fim, chegou a tal ponto que se transformou em inimizade aberta em relação aos
deputados da burguesia liberal. O governo não conseguiu, portanto, aglutinar
os deputados camponeses em torno dos liberais e – através destes últimos – em
torno do velho poder. O desejo do governo de ligar a si – através da Duma – os
camponeses e de isolar o proletariado, não se verificou. Pelo contrário, os de-
putados camponeses uniram-se ainda mais solidamente em torno dos deputados
proletários, em torno dos social-democratas. E quanto mais se afastavam dos libe-
rais, tanto mais decididamente se avizinhavam dos deputados social-democratas.
Tornou-se, pois, mais fácil unir os camponeses em torno do proletariado fora da
Duma. Resultou, então, que não o proletariado, mas a burguesia liberal e o go-
verno, é que ficaram isolados do campesinato. O proletariado assegurou para si
o consenso de milhões de camponeses; e não foi a causa da revolução que sofreu
com isso, como queria o governo, mas a da contrarrevolução. A existência da
Duma tornava-se, por isso, cada vez mais “perigosa” para o governo, o qual en-
tão a “dissolveu”. Para impedir com maior êxito a aproximação do campesinato
126A Segunda Duma de Estado foi dispersada pelo governo tsarista em 3 de junho de 1907. O
grupo social-democrata na Duma, composto por 65 deputados, foi falsamente acusado de conspiração
armada. A maioria dos deputados social-democratas foi condenada à servidão penal e ao exílio
permanente (N.T.)
J. V. Stalin 93

ao proletariado, para semear nas massas camponesas ignorantes o ódio contra os


social-democratas e agrupá-las em torno de si, o governo recorreu então a duas
medidas.
Antes que tudo, atacou a fração social-democrata na Duma, lançou contra
os seus membros a falsa acusação de haverem apelado para a insurreição imedi-
ata e fez, assim, aparecerem como os principais responsáveis pela dissolução da
Duma. Não teríamos dissolvido a “amada Duma”, caros camponeses, diz o go-
verno, mas os social-democratas ameaçavam desencadear a insurreição e fomos
compelidos a “dissolvê-la”. Em segundo lugar, o governo promulgou uma “nova
lei”, na base da qual o número dos eleitores diretos camponeses foi cortado pela
metade, ao passo que na mesmo proporção foi aumentado o dos latifundiários,
e a estes últimos foi conferida a faculdade de eleger, nas assembleias gerais, os
deputados camponeses; o número dos eleitores diretos dos operários foi também
quase reduzido à metade (124 em vez de 237); o governo reservou-se o direito
de redistribuir os eleitores “por localidade, pela renda e pela nacionalidade”;
eliminou-se qualquer possibilidade de livre agitação eleitoral, etc., etc. O go-
verno fez tudo isso para não permitir que entrassem na III Duma, os represen-
tantes revolucionários dos operários e dos camponeses; para enche-la de liberais
e de representantes reacionários dos latifundiários e dos fabricantes; para alte-
rar a representação dos camponeses conseguindo, contra a vontade deles, fazer
eleger os camponeses conservadores, impedindo de tal modo ao proletariado
reunir em torno de si as grandes massas camponesas, assegurando-se, portanto,
a possibilidade de aproximar-se delas abertamente.
Esse é o significado da dissolução da II Duma de Estado.
A burguesia liberal, ao que parece, compreendeu tudo isso e, na pessoa dos
seus cadetes, vai ao encontro do governo. Já na II Duma ela havia concluído uma
transação com o velho poder e, piscando os olhos para os deputados camponeses,
tinha tentado isolar o proletariado. Na véspera da dissolução, o chefe dos cade-
tes, Miliukov, havia convidado o seu partido a agrupar tudo e todos em torno do
“governo de Stolypin”, a concluir com ele um acordo e a declarar guerra à revo-
lução, e precisamente ao proletariado. E um segundo dirigente cadete, Struve,
já depois da dissolução, defendeu a “ideia de entregar” ao governo os deputados
social-democratas, convidou os cadetes a porem-se abertamente no caminho da
luta contra a revolução, a fazerem fusão com os outubristas contrarrevolucioná-
rios e a conduzirem a luta contra o proletariado irrequieto. O partido cadete
cala-se: quer dizer que está de acordo com os seus líderes.
É evidente que a burguesia liberal compreende toda a importância do mo-
mento que atravessamos. Tanto mais nitidamente surge perante o proletariado a
tarefa de derrubar o poder tsarista. Pensem um pouco. Houve a I Duma. Houve
a II. Mas, nem uma nem outra “resolveram” – nem podiam “resolver” – nenhum
dos problemas da revolução. Como antes, camponeses permaneceram sem terra,
operários sem a jornada de trabalho de 8 horas, todos os cidadãos sem liberda-
des políticas. Por quê? Porque o poder tsarista ainda não está morto, continua
a subsistir, dissolvendo, depois da I, a II Duma. Ele organiza a contrarrevolução
e procura levar a desordem às forças da revolução, arrancar ao proletariado os
milhões de camponeses.
94 Obras Escolhidas

Nesse ínterim, as forças subterrâneas da revolução – a crise nas cidades e a


penúria nos campos – continuam a sua obra, movimentando massas cada vez
maiores de operários e de camponeses, exigindo sempre com maior insistência a
solução dos problemas fundamentais da nossa revolução. Os esforços do poder
tsaristas não fazem nada, senão exasperar a crise. As tentativas da burguesia
liberal no sentido de separar os camponeses dos proletários não fazem nada,
senão reforçar a revolução. É claro que sem a derrubada do poder tsarista e
a convocação da Assembleia-Constituinte popular não é possível dar satisfação
às grandes massas de operários e de camponeses. Não menos claro, também, é
que somente em aliança com os camponeses, contra o poder tsarista e a burguesia
liberal, será possível resolver os problemas fundamentais da revolução Derrubada
do poder tsarista e a convocação de uma Constituinte popular: eis a que nos leva
a dissolução da II Duma.
Guerra à burguesia liberal traidora, estreita aliança com os camponeses: eis
o que nos impõe a dissolução da II Duma. A tarefa do proletariado é a de pôr-se
nesse caminho e de cumprir dignamente a função de cabeça da revolução.
Bakinski Proletari (O Proletário de Baku), nº 1.
20 de junho de 1907
J. V. Stalin 95

O Congresso de Londres do
Partido Operário Social-democrata
da Rússia (apontamentos de um
delegado)
junho e julho de 1907
O Congresso de Londres terminou. A despeito das expectativas dos escrevi-
nhadores liberais – os diversos Vergezhsky e as diversas Kúskova127 – o Congresso
não nos acarretou a cisão, mas sim maior coesão do Partido, maior união dos
operários avançados de toda a Rússia num partido bem coeso. O Congresso foi
verdadeiramente um Congresso de unificação para toda a Rússia, pois que nele
estavam representados, pela primeira vez, do modo completo, os companheiros
poloneses, membros do Bund e letões; pela primeira vez eles tomaram parte ativa
nos trabalhos de um Congresso do Partido e, portanto, pela primeira vez liga-
ram de modo mais imediato a sorte de suas organizações aos destinos de todo o
Partido. Sob esse aspecto, graças ao Congresso de Londres o trabalho para refor-
çar e tornar mais coeso o Partido Operário Social-Democrata da Rússia deu um
notável passo à frente.
Esse é o primeiro resultado importante do Congresso de Londres. Mas a im-
portância do Congresso de Londres não está toda aí. O fato é que, a despeito dos
sobreditos escrevinhadores liberais, o Congresso terminou com a vitória do “bol-
chevismo”, com a vitória da social-democracia revolucionária sobre a ala oportu-
nista do nosso Partido, sobre o “menchevismo”.
Ninguém, decerto, ignora as nossas divergências acerca da função das diver-
sas classes dos diversos partidos em nossa revolução e acerca de nossa atitude para
com eles. Ninguém ignora tampouco que o centro oficial do Partido, composto
de mencheviques, em toda uma série de intervenções, colocou-se em contrapo-
sição ao Partido no seu conjunto. Lembrem-se também somente da história da
palavra de ordem do Comitê Central a respeito do ministério responsável ca-
dete, repelida pelo Partido durante a I Duma; a história da palavra de ordem
do mesmo CC sobre a “reabertura da sessão da Duma” após a dissolução da I
Duma, também repelida pelo Partido; a história do conhecido apelo do CC à
greve geral pela dissolução da I Duma, também esse repelido pelo Partido... Era
necessário por um paradeiro a essa situação anormal. E por sua vez, para fazer
isso, era necessário tirar as conclusões das vitórias alcançadas de fato pelo Partido
sobre o CC oportunista, vitórias de que está cheia a história do desenvolvimento
interno do nosso Partido em todo o ano recém-transcorrido. E foi o Congresso
de Londres que tirou as conclusões de todas essas vitórias da social-democracia
revolucionária, em assegurando a esta última a vitória, aceitou-lhe a tática.
127Vergezhsky é pseudônimo de A. V. Tyrkova; ela era uma colaboradora do jornal Cadete Rech. Em
1906-7, ela colaborou com jornais e periódicos semicadetes e semimencheviques. E. D. Kuskova, por
sua vez, foi um dos autores do programa dos Economistas conhecido como “Credo”.
96 Obras Escolhidas

Doravante, então, o Partido aplicará rigorosamente a política de classe do pro-


letariado socialista. A bandeira vermelha do proletariado não será mais arriada
diante dos retóricos do liberalismo. As hesitações próprias de intelectuais, não
de proletários, receberam um golpe mortal.
Esse é o segundo resultado, não menos importante, do Congresso de Londres
do nosso Partido. Efetiva união dos operários avançados de toda a Rússia em
um partido único, sob a bandeira da social-democracia revolucionária: tal é o
significado do Congresso de Londres, tal é o seu caráter geral. Passemos agora
a uma análise mais particularizada do Congresso.

A composição do Congresso

Ao todo, estavam presentes ao Congresso cerca de 330 delegados: 302 com


voto deliberativo, representando mais de 150 mil membros do Partido; os outros
com voto consultivo. Pela fração a qual pertenciam, os delegados dividiam-se
aproximadamente assim (com voto deliberativo): 92 bolcheviques, 85 menchevi-
ques, 54 membros do Bund, 45 poloneses e 26 letões.
Quanto à condição social dos participantes do Congresso (operários e não
operários), o Congresso apresentava o seguinte quadro: operários ocupados em
trabalho manual, ao todo 116; empregados e comerciários, 24; os outros não
eram operários. Além disso, os operários ocupados em trabalhos manuais esta-
vam divididos por frações do seguinte modo: na fração bolchevique, 38 (36% );
na menchevique, 30 (31% ); entre poloneses, 27 (61% ) entre letões, 12 (40% );
entre os membros do Bund, 9 (15% ); ao passo que os revolucionários profissio-
nais estavam assim divididos: na fração bolchevique, 18 (17% ); na menchevique,
22 (22% ); entre os poloneses, 5 (11% ); entre os letões, 2 (6% ); entre membros
do Bund, 9 (15% ).
Estávamos todos “surpresos” com tal estatística. Como? Mencheviques ha-
viam gritado tanto contra a composição intelectual do nosso Partido, dia e noite,
haviam censurado os intelectuais bolcheviques, haviam ameaçado de expulsar
todos os intelectuais do Partido, haviam continuamente, insultado os revoluci-
onários profissionais, e de repente verificou-se que em sua fração havia muito
menos operários que entre os bolcheviques “intelectuais”! Verificou-se que entre
eles havia muito mais revolucionários profissionais que entre os bolcheviques!
Contudo, achamos a explicação dos uivos mencheviques: “a língua bate onde o
dente dói”.
Ainda mais interessantes são as cifras sobre a composição do Congresso do
ponto de vista da “repartição territorial” dos delegados. Verificou-se que os gru-
pos mais numerosos de delegados mencheviques foram enviados sobretudo pelas
zonas agrícolas e artesãs: Guria (9 delegados), Tiflis (10 delegados), organização
camponesa Spüka, da Pequena Rússia (12 delegados, parece-me), Bund (enorme
maioria menchevique) e, como exceção, bacia do Donetz (7 pessoas). Ao passo
que os grupos mais numerosos de delegados bolcheviques foram enviados exclu-
sivamente pelas zonas da grande indústria: Petersburgo (12 delegados), Moscou
(13 ou 14 delegados), Urais (21 delegados), Ivanovo-Voznessensk (11 delegados),
Polônia (45 delegados). É evidente que a tática dos bolcheviques é a tática dos
J. V. Stalin 97

proletários da grande indústria, a tática das zonas onde as contradições de classe


são particularmente claras e a luta de classes particularmente árduas. O bolche-
vismo é a tática dos verdadeiros proletários.
Por outro lado, não é menos evidente que a tática dos mencheviques é prepon-
derantemente a tática dos operários artesãos e dos camponeses semiproletários,
a tática das zonas onde as contradições de classe não são de todo claras e a luta
de classes é mascarada. A tática do menchevismo é a tática dos elementos semi-
burgueses do proletariado. As cifras falam claro. E não é difícil empreendê-lo:
não se pode falar a sério com os operários de Lodz, de Moscou ou de Ivanovo-
Voznessensk sobre um bloco com aquela mesma burguesia liberal cujos membros
dirigem contra estes uma luta encarniçada, e que frequentemente os “punem”
com despedidas parciais e lockouts em massa. Ali, os mencheviques não encon-
tram simpatias, é necessário o bolchevismo, a tática da luta de classes proletária,
intransigente. E vice-versa, é extremamente difícil inculcar a ideia da luta de
classes nos camponeses da Guria ou em algum artesão de Chklov, que não expe-
rimentam sistematicamente os pesados golpes da luta de classes e estão prontos
a concluir qualquer acordo contra o “inimigo comum”. Aí, por ora, não é neces-
sário bolchevismo; é preciso o menchevismo, pois tudo está ainda impregnado
da atmosfera dos acordos e dos compromissos.
Não menos interessante é a composição do Congresso do ponto de vista das
nacionalidades. A estatística mostrou que a maioria da fração menchevique
é constituída de judeus (naturalmente, sem se levar em conta os membros do
Bund); depois vem georgianos e depois ainda russos. A enorme maioria da fração
bolchevique é, ao contrário, constituída de russos, depois vem os judeus (natu-
ralmente, não se levando em conta poloneses e letões), depois ainda georgianos,
etc. A esse respeito, alguém entre os bolcheviques (Alexinski128 , parece-me) no-
tou pilheriando que os mencheviques são uma fração judaica, os bolcheviques
uma fração russa pura e, portanto, não teria sido mau para nós, bolcheviques,
organizar uma “depuração” no Partido.
E não é difícil explicar tal composição das frações: são focos do bolchevismo
sobretudo as zonas da grande indústria que são puramente russas, com exclusão
da Polônia, ao passo que as zonas mencheviques são as da pequena produção,
que são ao mesmo tempo zonas habitadas por judeus, georgianos etc. No con-
cernente às tendências que se delinearam no Congresso, é preciso notar que a
divisão formal do Congresso em 5 frações (bolcheviques, mencheviques, polone-
ses etc.), manteve uma certa força – pouco apreciável, é verdade – somente até
quando não foram discutidas as questões de princípio (questão dos partidos não
proletários do congresso operários etc.). Desde o momento em que se iniciou
a discussão das questões de princípio, o agrupamento formal foi posto de lado
e nas votações o Congresso dividiu-se habitualmente em duas partes: bolchevi-
ques e mencheviques. O Congresso não tinha o chamado centro ou pântano.
Trotsky apareceu como uma “bela inutilidade”. Além disso, todos os poloneses
enfileiraram-se ao lado dos bolcheviques. A imensa maioria dos letões apoiou
nitidamente os bolcheviques. O Bund, cujos delegados, em sua enorme maioria,
128
J. A. Alexinski, deputado à II Duma de Estado, pertencia à fração bolchevique da fração parla-
mentar social-democrática. Após o Congresso de Londres apoiou o boicote da III Duma. Afastou-se
em seguida do partido bolchevique e após a Revolução de Outubro emigrou para o estrangeiro.
98 Obras Escolhidas

apoiaram sempre, de fato, os mencheviques, conduziu formalmente uma política


em extremo ambígua, que rusticou sorrisos de uma parte e irritação da outra.
A camarada Rosa Luxemburgo definiu com perfeição essa política do Bund, di-
zendo que não era a política de uma organização politicamente madura, que
influência as massas, mas uma política de mercadores eternamente em confi-
ante expectativa: amanhã talvez o açúcar diminuirá de preço. Entre os membros
do Bund, somente 8 a 10 delegados, nem sempre, apoiaram os bolcheviques.
Em geral, a maioria, e maioria bastante apreciável, estavam do lado dos bol-
cheviques.
O Congresso era, pois, bolchevique, ainda que não nitidamente. Das reso-
luções mencheviques, passou somente a relativa às operações de guerrilhas, e
ainda de modo absolutamente casual: os bolcheviques dessa vez não aceitaram
a batalha ou, melhor, não quiseram empenhar-se nela a fundo, simplesmente
para “dar ensejo aos camaradas mencheviques de se alegrarem pelo menos uma
vez”...

A ordem do dia: Relatório do Comitê Central.


Relatório da fração parlamentar

Do ponto de vista das tendências políticas, os trabalhos do Congresso pode-


riam ser divididos em duas partes.
Primeira parte: discussão das questões formais, como a ordem do dia do Con-
gresso, os relatórios do CC e o relatório da fração parlamentar; questões com um
significado político profundo, mas vinculadas e subordinadas à “honra” desta ou
daquela fração – “só para não ofender” esta ou aquela fração, “só para não provo-
car a cisão” – e por isso chamadas questões formais. Essa parte do Congresso foi
mais tempestuosa e absorveu a maior parte do tempo. E isso aconteceu porque
as considerações de princípio foram relegadas a segundo plano por considera-
ções “morais” (“só para não ofender”); portanto, não se criou um agrupamento
nitidamente determinado, não era possível adivinhar logo “quem teria levado a
melhor”, e as frações, na esperança de atrair para seu lado os “corretos-neutros”,
abandonaram-se a uma luta furiosa para obter a supremacia.
Segunda parte: debates sobre questões de princípio, como a questão dos par-
tidos não proletários, do congresso operário, etc. Aqui já estavam assentes as
considerações de “moral”; os grupos tinham fisionomia mais precisa, segundo
tendências de princípio rigorosamente determinadas; a correlação de forças en-
tre as frações revelou-se logo, e, portanto, esta parte do Congresso foi mais calma
e frutífera, testemunho evidente em favor do fato de que nos debates de um con-
gresso as posições de princípios são a melhor garantia do rendimento e da calma
dos seus trabalhos.
Passemos a uma breve análise da primeira parte dos trabalhos do Congresso.
Após o discurso do camarada Plekhanov – o qual abriu o Congresso e ob-
servou no seu discurso a necessidade de chegar a acordos “caso por caso” com
“elementos progressistas” da sociedade burguesa – o Congresso elegeu a presi-
dência, composta de cinco pessoas (uma por tração), e a comissão dos delegados,
J. V. Stalin 99

e passou à elaboração da ordem do dia. É característico o fato de que neste Con-


gresso, precisamente como no de unificação do ano passado, os mencheviques
opuseram-se da maneira mais violenta à proposta dos bolcheviques no sentido
de incluir na ordem do dia a questão do exame da situação atual e das tarefas
de classe do proletariado em nossa revolução. A revolução vai em direção a um
ascenso ou está em sua fase descendente? E, por conseguinte, é preciso “liquidá-
la” ou dirigi-la a fundo? Quais são as tarefas de classe do proletariado em nossa
revolução, tarefas que determinam uma nítida separação entre o proletariado e
as outras classes da sociedade russa? Eis as perguntas que os camaradas men-
cheviques temem. Fogem a elas como a sombra foge ao sol, não querem que se
faça luz sobre as raízes das nossas divergências. Por quê? Porque na própria fra-
ção menchevique existem profundas divergências sobre essas questões, porque
o menchevismo não é uma tendência homogênea, é uma mistura de tendên-
cias, que não se notam durante a luta fracionista contra os bolcheviques, porém
afloram assim que se colocam do ponto de vista dos princípios as questões do
momento e da nossa tática. Os mencheviques não querem revelar essa debili-
dade interna da sua fração. Os bolcheviques sabiam-no e, para conseguirem que
os debates tivessem um caráter de princípio mais acentuado, insistiram em que
fossem postas na ordem do dia as questões lembradas acima. Os mencheviques,
vendo que as questões de princípio os aniquilavam, começaram a fazer finca-pé,
deram a entender aos “camaradas corretos” que se “ofenderiam”, e o Congresso
não colocou na ordem do dia a questão do exame da situação, etc. Por fim, foi
aprovada a seguinte ordem do dia: relatório do Comitê Central, relatório da fra-
ção parlamentar, atitude para com os partidos não proletários. Duma, congresso
operário, sindicatos, operações de guerrilhas, crise, lockouts e desemprego, Con-
gresso internacional de Stuttgart129 , questões de organização.

∗ ∗ ∗

Quanto ao relatório do CC, os relatores principais foram o camarada Martov


(pelos mencheviques) e o camarada Riadovoi130 (pelos bolcheviques). O informe
de Martov não foi devidamente colocado visando à ilustração séria dos fatos, foi
antes um relatório comovente de como, segundo o orador, o inocente CC se havia
posto a dirigir o Partido e depois a fração parlamentar, de como os “horríveis”
bolcheviques o impediram de agir, não lhe dando paz com o seu apego aos prin-
cípios. Uma vez que em seguida o Partido não havia aprovado as palavras de
ordem do CC sobre o ministério cadete responsável, sobre a “reabertura da ses-
são da Duma”, etc., Martov disse como justificativa que o momento era incerto
e que nos períodos de calma não era possível lançar outras palavras de ordem.
O insucesso do apelo do CC no sentido de uma greve geral, e depois no sentido
129 A questão do Congresso Socialista Internacional de Stuttgart (o Sétimo Congresso da Segunda
Internacional) foi originalmente incluída na agenda do Congresso de Londres, mas foi posterior-
mente retirado pelo congresso. O Congresso de Stuttgart realizou-se de 5 a 11 de agosto (18 a 24)
de 1907. Os bolcheviques foram representados por V. I. Lenin, A. V. Lunacharsky, M. M. Litvinov e
outros (N.T.)
130 Riadovoi, pseudônimo de A. A. Malinvski, mais conhecido como Bogdanov (seu outro pseudô-

nimo era Maximov). Em 1903, aderiu aos bolcheviques. Dois anos após o congresso de Londres saiu
do Partido Bolchevique. Morreu em 1928.
100 Obras Escolhidas

de ações parciais logo após a dissolução da I Duma, Martov justificou-o, indi-


cando aquela mesma situação incerta e a impossibilidade de se determinar de
maneira precisa o estado de animo das massas. Muito pouco falou sobre o papel
desempenhado pelo CC na cisão do organismo de Petersburgo131 .
Em compensação, alongou-se demasiado sobre a conferência das organiza-
ções militares e de combate, formadas por iniciativa de um conhecido grupo de
bolcheviques, que levavam, segundo Martov, a desorganização e a anarquia aos
órgãos do Partido. No final do relatório, Martov convidou o Congresso a levar
em conta as condições difíceis em que se desenvolvia o trabalho de direção do
Partido, dado que o momento era particularmente complicado e confuso, e a
não ser demasiado severo ao defrontar-se com o CC É evidente que o próprio
Martov reconhecia que o CC havia cometido graves pecados.
O relatório do camarada Riadovoi teve um caráter absolutamente diverso. Se-
gundo ele, o CC do Partido tem o dever: 1º) de apoiar e aplicar o programa do
Partido; 2º) de por em prática as diretivas táticas dadas a ele pelo Congresso do
Partido; 3º) de salvaguardar a integridade do Partido; 4º) de unificar o trabalho
positivo do Partido. O CC, contudo, não havia assumido nem um desses deveres
sequer. Ao invés de apoiar e aplicar o programa do Partido, tinha proposto à
fração parlamentar social-democrata, no interesse da unidade da oposição e com
o fim de atrair para o nosso lado os cadetes, não incluir, de acordo com o conhe-
cido critério da I Duma sobre a questão agrária 132 , o conhecido ponto do nosso
programa sobre o confisco de todas as terras (dos latifundiários) e limitar-se à
alienação das terras, sem a cláusula: com ou sem indenização.
Vejam só: o CC havia proposto omitir ponto principal do programa do Par-
tido, o ponto sobre o confisco das terras. O CC havia proposto omitir o ponto
principal do programa do Partido, o ponto sobre o confisco das terras. O CC não
havia levado em conta o programa do Partido! Um CC que não leva em conta o
programa: podem imaginar essa inaudita vergonha?
Há mais. Ao invés de aplicar pelo menos as diretivas do Congresso de unifi-
cação; ao invés de aprofundar sistematicamente a luta dos partidos no interior
da Duma para tornar mais consciente a luta de classes fora da Duma; ao invés
de fazer uma política estritamente de classe, independente, do proletariado, o
CC havia lançado as palavras de ordem: ministério cadete responsável, “reiní-
cio da sessão da Duma”, “pela Duma contra a camarilha”, etc., etc., palavras de
ordem que ofuscam a luta dos partidos na Duma, amortecem as contradições
de classes fora da Duma, anulam qualquer delimitação entre a política comba-
tiva do proletariado e a política conciliadora da burguesia liberal, adaptando a
primeira à segunda. E, quando um dos redatores do órgão central e, portanto,
membro também do CC, o camarada Plekhanov, fora ainda mais longe no cami-
nho do acordo com os cadetes e propusera ao Partido formar um bloco com a

131 Sobre a cisão do organismo de Petersburgo, vide o escrito A luta eleitoral em Petersburgo e os
Mencheviques.
132 O projeto da moção sobre a questão agrária. Em nome da Duma. Foi elaborado pelos cadetes e pu-

blicado a 5 de julho de 1906, em resposta ao comunicado governamental concernente à propriedade


territorial camponesa. Os cadetes queriam convencer os camponeses a esperar que a Duma elabo-
rasse a lei agrária. O CC do POSDR, dirigido pelos mencheviques, ordenou a fração parlamentar
social-democrata que votasse no projeto dos cadetes. A fração votou contra.
J. V. Stalin 101

burguesia liberal, renunciando à palavra de ordem da Assembleia-Constituinte


e lançando a da “Duma soberana”, aceitável pela burguesia liberal, o CC não só
não havia protestado contra o achado de Plekhanov, que cobria de vergonha o
Partido, mas até ficara de acordo com essa proposta, sem ter a coragem, aliás, de
exprimir oficialmente o seu assentimento.
Eis como o Comitê Central do Partido dessegurou as mais elementares exi-
gências da política de classe independente do proletariado e as decisões do Con-
gresso de unificação! Um CC que ofusca a consciência de classe do proletariado;
um CC que subordina a política do proletariado à política da burguesia liberal;
um CC que arria a bandeira do proletariado perante os charlatões do liberalismo
cadete: eis a que ponto nos levaram os oportunistas do menchevismo!
Sem falar, ainda, no modo pelo qual o CC não só não preservou a unidade e a
disciplina do Partido, como descurou-as sistematicamente, tomando a iniciativa
da cisão no organismo de Petersburgo.
Não queremos tampouco alongar-nos sobre o fato de o CC não haver dado
um critério único ao trabalho do Partido: isso é evidente por si mesmo. Por
que tudo isso, por que todos esses erros do CC? Não certamente porque no CC
estavam reunidas pessoas “muito malvadas”, mas porque o menchevismo, que
contaminava então o CC, não está em condições de dirigir o Partido e faliu de-
finitivamente como tendência política. Deste ponto de vista, toda a história do
CC é história da ruína do menchevismo. E quando os camaradas mencheviques
repreendem-nos dizendo que nós “obstaculizávamos” o CC, não os “deixávamos
em paz”, etc., etc., a esses camaradas que nos pregam moral não podemos deixar
de responder: sim camaradas, nós “impedimos” e continuaremos a impedi-lo de
adaptar a tática do proletariado ao gosto da burguesia liberal, porque esse é o
nosso sacrossanto dever...
Isso é o que aproximadamente disse o camarada Riadovoi.
No decorrer dos debates verificou-se que a maior parte dos camaradas – até
alguns membros do Bund – apoiava o ponto de vista do camarada Riadovoi. E se,
todavia, não foi aprovada a resolução dos bolcheviques que punha em relevo os
erros do CC, isso aconteceu porque entre os camaradas prevaleceu a considera-
ção: “só para não provocar a cisão”. Não foi tampouco aprovada, naturalmente,
a moção menchevique de confiança ao CC Foi aprovada a simples passagem à
ordem do dia, sem se emitir um juízo sobre a atividade do CC...

∗ ∗ ∗

Os debates sobre o relatório da fração parlamentar foram em geral uma repe-


tição dos debates sobre a questão precedente. E é compreensível: a fração parla-
mentar havia agido sob a direção imediata do CC eram ao mesmo tempo a crítica
e a defesa da fração parlamentar. Interessante a observação do segundo relator,
o camarada Alexinski (o primeiro tinha sido o camarada Tsereteli), o qual disse
que a palavra de ordem da fração parlamentar, menchevique na maioria, sobre
a unidade da oposição na Duma, contra o fracionamento da oposição e sobre a
necessidade de marchar junto com os cadetes, essa palavra de ordem menchevi-
que, segundo expressão do camarada Alexinski sofreu na Duma um xeque-mate,
porque na questões mais importantes, como a do orçamento, do exército, etc.,
102 Obras Escolhidas

os cadetes haviam marchado junto com o Stolypin, e os social-democratas men-


cheviques tiveram de lutar ombro a ombro com os deputados camponeses contra
o governo e os cadetes. Os mencheviques foram obrigados a constatar à luz dos
fatos a falência de sua posição para aplicar na Duma a palavra de ordem dos
bolcheviques, que sustentavam a necessidade de arrastar a reboque os deputados
camponeses na luta contra as direitas e os cadetes.
Não menos interessante a observação dos camaradas poloneses, segundo os
quais não é admissível que a fração parlamentar mantenha reuniões comuns com
os nacional-democratas133 , aquelas Centenas Negras da Polônia que organizaram
várias vezes e continuam a organizar hoje os massacres de socialistas poloneses.
Dois dirigentes dos mencheviques caucasianos134 replicaram, um após o outro,
que para a fração parlamentar não é importante o que os partidos fazem em
sua casa, mas a sua conduta na Duma, e os nacional-democratas poloneses ali se
comportam de modo mais ou menos liberal. Daí se verificava que não se devem
definir os partidos pelo que fazem fora da Duma, no entanto, pelo que dizem na
Duma. Com oportunistas desse tipo é que se morre.
A maioria dos oradores compartilhou o ponto de vista do camarada Alexinski,
mas também sobre essa questão não foi, todavia, aprovada nenhuma resolução,
mais uma vez pela mesma consideração: “não ofender”, adiando a questão da
resolução, o Congresso passou diretamente à questão seguinte.

Os partidos não proletários

Das questões formais passemos às de princípio, às questões que determinaram


as nossas divergências. As questões que determinaram as nossas divergências tá-
ticas são as dos destinos prováveis da nossa revolução e da função das diversas
classes e dos diversos partidos da sociedade russa nessa revolução. Que a nossa
revolução é burguesa, que ela deverá encerrar-se com a derrota não da ordem
capitalista, mas da feudal, que pode ser coroada somente pela república demo-
crática, sobre isto, parece, em nosso Partido todos estão de acordo. Ainda, que
a nossa revolução se encaminhou em geral para um ascenso e não para uma fase
descendente, e que nossa tarefa não é “liquidá-la”, mas levá-la a termo, sobre
isto também, pelo menos formalmente, todos estão de acordo, uma vez que os
mencheviques, como fração, ainda não declaravam em nenhum lugar o contrá-
rio. Mas, como levar a termo a nossa revolução? Qual é a função do proletariado,
do campesinato, da burguesia liberal nessa revolução? Com qual combinação das
forças combatentes se poderia conduzir ao término a revolução atual? Com quem
marchar, combater quem, etc., etc.? Eis onde começam as nossas divergências.
Opinião dos mencheviques. Já que a nossa revolução é burguesa, só a bur-
guesia pode ser a cabeça da revolução. A burguesia esteve à frente da Grande
Revolução na França, esteve à frente das revoluções em outros estados europeus;
133 Partido Nacionalista contrarrevolucionário da burguesia polonesa, fundado em 1897. No período
da revolução de 1905-1907, tornou-se o principal partido da contrarrevolução polonesa, o partido
das Centenas Negras polonesas (N.T.)
134 Trata-se dos deputados mencheviques à II Duma, A. L. Japaridze e I. J. Tscreteli (vide Atas do V

Congresso do POSDR, Moscou, 1935. Páginas 250 e 534-535).


J. V. Stalin 103

ela deve estar também à frente da nossa revolução russa. O proletariado é o prin-
cipal combatente na revolução, mas deve marchar atrás da burguesia e impeli-la
para a frente. Também o campesinato é uma força revolucionária, mas nele há
muito de reacionário, e assim o proletariado deve empreender ações comuns com
os camponeses muito mais raramente que com a burguesia democrático-liberal.
A burguesia é um aliado mais seguro do proletariado do que o campesinato. To-
das as forças combatentes devem agrupar-se em torno da burguesia democrático-
liberal, como em torno de um chefe. Não se deve, pois, determinar nossa atitude
para com os partidos burgueses baseada no princípio: junto com os camponeses
contra o governo e a burguesia liberal, com o proletariado à frente, mas com
base no princípio oportunista: junto com toda oposição contra o governo, com a
burguesia liberal à frente. Daí a tática do acordo com os liberais. Tal é a opinião
dos mencheviques.
Opinião dos bolcheviques. A nossa revolução é na realidade burguesa, mas
isso não significa ainda que à frente dela deva estar a nossa burguesia liberal. No
século XVIII a burguesia francesa esteve à frente da Revolução francesa. Mas por
quê? Porque o proletariado francês era débil, não agia de modo independente,
não lançava as suas reinvindicações de classe, não tinha nem consciência de classe
nem organização, marchava então a reboque da burguesia, e a burguesia servia-se
dele como instrumento para os seus fins burgueses. Como pode ser observado,
a burguesia não tinha necessidade então de um aliado, representado pelo poder
tsarista, contra o proletariado – o próprio proletariado era o seu aliado servidor
– e assim podia ser revolucionária, pôr-se até à frente da revolução. Coisa ab-
solutamente diversa observa-se entre nós, na Rússia. Não se pode em absoluto
dizer que o proletariado russo seja débil: já faz alguns anos que age de modo
plenamente autônomo, lançando suas reinvindicações de classe; está suficien-
temente armado de consciência de classe para compreender os seus interesses;
está agrupado em seu partido; possui o partido mais forte existente na Rússia,
um partido com seu programa próprio e seus princípios táticos-orgânicos pró-
prios; com este partido à frente, já alcançou muitas vitórias brilhantes sobre a
burguesia. Dadas essas condições, pode o nosso proletariado contentar-se com a
função de apêndice da burguesia liberal, com a função mísero instrumento nas
mãos dessa burguesia? Pode, deve seguir a essa burguesia, dela fazendo a pró-
pria cabeça? Pode não ser a cabeça da revolução? Mas observem o que acontece
no campo de nossa burguesia liberal: a nossa burguesia, amedrontada com o es-
pírito revolucionário do proletariado, em vez de colocar-se à frente da revolução,
joga-se nos braços da contrarrevolução, alia-se com ela contra o proletariado. E
o seu partido, o partido dos cadetes, entra em acordo abertamente, na frente
de todo o mundo, com Stolypin, vota a favor do orçamento e do exército, com
toda a vantagem para o tsarismo e contra a revolução popular. Não é claro que a
burguesia liberal russa representa uma força antirrevolucionária, contra o qual
é preciso mover a luta mais implacável? E não tinha razão o camarada Kautsky
quando dizia que, onde o proletariado age de modo independente, a burguesia
cessa de ser revolucionária?
Então a burguesia liberal russa é antirrevolucionária; não pode ser nem a
força motriz nem, muito menos, a cabeça da revolução; é o inimigo jurado da
revolução e contra ela é preciso mover uma luta obstinada. A única cabeça da
104 Obras Escolhidas

nossa revolução, que tem o interesse e a possibilidade de conduzir atrás de si


as forças revolucionárias da Rússia no assalto contra a autocracia tsarista, é o
proletariado. Somente o proletariado pode reunir em torno de si os elementos
revolucionários do país, só ele pode levar a termo a nossa revolução. A tarefa
da social-democracia é fazer todo o possível para preparar o proletariado para
a função de cabeça de cabeça da revolução. Aí está o núcleo do ponto de vista
bolchevique.
A pergunta: quem então pode ser um aliado seguro do proletariado para le-
var até o fim a nossa revolução? – os bolcheviques respondem: os únicos aliados
do proletariado mais ou menos seguros e fortes, são os camponeses revolucioná-
rios. Não a burguesia liberal traidora, mas sim os camponeses revolucionários se
unirão junto ao proletariado contra todos os sustentáculos da ordem feudal.
A nossa atitude para com os partidos burgueses deverá, pois, ser determinada
pelo princípio: junto com os camponeses revolucionários contra o tsarismo e a
burguesia liberal, com o proletariado à frente. Daí a necessidade da luta contra a
hegemonia (direção) da burguesia cadete e, por conseguinte, a inadmissibilidade
de um acordo com os cadetes. Esta é a opinião dos bolcheviques.
Os discursos dos relatores, Lenin e Martinov, e de todos os outros oradores
giraram nos limites destas duas posições. O camarada Marlitov “aprofundou”
definitivamente o ponto de vista dos mencheviques negando categoricamente a
admissibilidade da hegemonia do proletariado e defendendo não menos catego-
ricamente a ideia de um bloco com os cadetes.
Os outros oradores – em sua imensa maioria – declararam-se de acordo com
a posição bolchevique. Particularmente interessantes foram os discursos da ca-
marada Rosa Luxemburgo, que levou ao Congresso uma saudação em nome dos
social-democratas alemães e expôs a opinião dos nossos camaradas alemães sobre
as nossas divergências. (Unimos aqui os dois discursos de R. L., pronunciados em
dias diversos). Declarando-se plenamente de acordo com os bolcheviques sobre a
questão do papel do proletariado, como cabeça da revolução, e sobre a do papel
da burguesia liberal, como força antirrevolucionária, etc., etc., R. Luxemburgo
criticou os chefes do menchevismo, Plekhanov e Axelrod, chamando-os de opor-
tunistas e equiparando a sua posição à dos partidários de Jaurês, na França. Eu
sei, disse Rosa Luxemburgo, que também os bolcheviques possuem vários defei-
tos, estranheza são excessivamente rígidos, porém, compreendo-os e justifico-os
plenamente: não se pode deixar de ser rígido frente à massa amorfa, gelatinosa
do oportunismo menchevique. A mesma rigidez excessiva notou-se nos guesdis-
tas135 na França, o chefe dos quais, o camarada Guesde, declarou num manifesto
eleitora: “Nem sequer um burguês ouse votar em mim, uma vez que eu sustenta-
rei no parlamento unicamente os interesses do proletariado contra todos os bur-
gueses”. E, não obstante isso, não obstante essa aspereza, nós social-democratas
alemães, sempre estivemos do lado dos partidários de Guesde em sua luta contra

135Sequazes de Jules Guesde, que constituíam a corrente marxista no Partido Socialista Francês. Em
1901, os guesdistas constituíram o Partido Socialista da França e lutaram contra os oportunistas no
movimento operário francês, contra a política de colaboração com a burguesia contra a participação
dos socialistas nos ministérios burgueses. No início da guerra imperialista mundial, Guesde assu-
miu uma posição “defensista” e entrou para o governo burguês. Uma parte dos guesdistas fiéis ao
marxismo revolucionário entrou mais tarde para o Partido Comunista (N.T.)
J. V. Stalin 105

os traidores do marxismo, contra os adeptos de Jau-rés. A mesma coisa é pre-


ciso dizer-se dos bolcheviques, que nós, social-democratas alemães, apoiaremos
em sua luta contra os mencheviques oportunistas. Isto aproximadamente disse a
camarada Rosa Luxemburgo.
Ainda mais interessante é a célebre carta enviada ao Congresso pelo Comitê
Central do Partido Social-Democrata alemão e lida pela camarada Rosa Luxem-
burgo. Interessante porque, aconselhando o Partido a lutar contra o liberalismo
e reconhecendo o papel particular do proletariado russo, como cabeça da revolu-
ção russa, reconhece implicitamente todas as teses fundamentais do bolchevismo.
Tornou-se assim evidente que a social-democracia alemã, a mais experimen-
tada e a mais revolucionária da Europa, apoia aberta e nitidamente os bolchevi-
ques – considerando-os verdadeiros marxistas – em sua luta contra os traidores
do marxismo, contra os mencheviques. Foram igualmente interessantes alguns
pontos do discurso do camarada Tyszko136 , o representante da delegação polo-
nesa na presidência. Ambas as frações, disse o camarada Tyzko, asseguram-nos
que se atem firmemente ao ponto de vista do marxismo. E não é fácil para todos
compreender: quem pois, afinal, se atem a esse ponto de vista, os bolcheviques
ou os mencheviques? “Nós nos atemos ao ponto de vista do marxismo”, inter-
rompem “da esquerda” alguns mencheviques. “Não, camaradas – responde-lhes
Tyszko –não partam desse ponto de vista, porem repousem sobre ele, porque
toda a sua inépcia no trabalho de direção da luta de classe do proletariado, o
fato de que sabem decorar as grandes palavras do grande Marx, porém não sa-
beis aplicá-las, tudo isso nos diz que não partem do ponto de vista do marxismo,
mas repousam sobre ele”. Focalizado magistralmente!
De fato, considerem apenas o fato seguinte. Os mencheviques dizem frequen-
tes vezes que constitui tarefa da social-democracia, sempre e onde quer que seja,
transformar o proletariado numa força política independente. É justo isso? In-
dubitavelmente! São grandes palavras de Marx, que todo marxista deve sempre
recordar. Como as aplicam, porém, os camaradas mencheviques? Ajudarão tal-
vez, de fato, o proletariado a destacar-se da massa dos elementos burgueses que
o circundam para constituir-se em classe autônima, independente? Agruparão
talvez os elementos revolucionários em torno do proletariado e prepararão este
último para o papel de cabeça da revolução? Os fatos demonstram que os men-
cheviques não fazem nada de semelhante. Pelo contrário, aconselham o proleta-
riado a concluir mais frequentemente acordos com a burguesia liberal e, desse
modo, não ajudam o proletariado a destacar-se como classe autônoma, mas a
confundir-se com a burguesia. Os mencheviques aconselham o proletariado a
renunciar ao papel de cabeça da revolução, a deixar este papel à burguesia, a se-
guir a burguesia, e desse modo favorecem não a transformação do proletariado
em uma força política independente, mas a sua transformação em apêndice da
burguesia. Os mencheviques, vale dizer, partindo de uma tese marxista justa,
fazem exatamente o contrário daquilo que deveriam fazer.
Sim, tinha razão o camarada Tyszko quando disse que os mencheviques não

136Tysko (pseudônimo de Leo Jogisches, 1867-1919), fundador do partido Social-democrata polo-


nês. Lutou ao lado de Rosa Luxemburgo contra o centro kautskista. Foi assassinado em março de
1919 pelos sicários do governo após o malogro dos movimentos espartaquistas.
106 Obras Escolhidas

partem do ponto de vista do marxismo, mas repousam sobre. No final dos de-
bates foram apresentados dois projetos de resolução: o menchevique e o bolche-
vique. Foi aprovado, como base, o projeto bolchevique, por esmagadora maioria
de votos.
Seguiram-se as emendas. Foram propostas cerca de oitenta, que se referiam,
sobretudo, a dois pontos do projeto: ao primeiro ponto, o proletariado com o ca-
beça da revolução; e ao outro ponto, os cadetes como força antirrevolucionária.
Foi a parte mais interessante dos debates porque, nestes, revelou-se de maneira
particularmente nítida a fisionomia das frações. A primeira emenda importante
foi proposta pelo camarada Martov. Queria ele substituir as palavras: “o prole-
tariado, como cabeça da revolução”, pelas palavras: “o proletariado, como van-
guarda”. Fundamentou ele esta sua proposta dizendo que a palavra “vanguarda”
exprime com maior precisão a ideia. O camarada Alexinski objetou-lhe que não
se tratava de precisão, mas de dois modos de ver opostos, expressos nesse ponto,
uma vez que “vanguarda” e “cabeça” são dois conceitos completamente diversos.
Ser a vanguarda (destacamento avançado) significa bater-se nas primeiras filei-
ras, ocupar os pontos mais expostos, derramar o próprio sangue, mas ao mesmo
tempo ser dirigido por outros, no caso presente pela burguesia democrática: a
vanguarda não dirige nunca a luta geral. É sempre dirigida. Pelo contrário,
ser a cabeça significa não só bater-se nas primeiras filas, como também dirigir a
luta geral, dirigi-la no sentido do seu próprio objetivo. Nós, bolcheviques, não
queremos que o proletariado seja dirigido por democratas burgueses; queremos
que ele mesmo dirija a luta de todo o povo e a dirija no sentido da república
democrática.
O resultado foi que a emenda de Martov não passou. Todas as outras emendas
do mesmo tipo foram também rejeitadas.
O outro grupo de emendas visava modificar o ponto relativo aos cadetes. Os
mencheviques propunham reconhecer que os cadetes não se haviam ainda posto
a caminho da contrarrevolução. Mas o Congresso não aprovou essa proposta e
todas as emendas desse tipo foram repelidas. Em seguida, os mencheviques pro-
puseram que fosse admitido em certos casos um acordo técnico com os cadetes.
Nem mesmo essa proposta foi aprovada pelo Congresso, que rejeitou as emendas
correspondentes.
Afinal, votou-se a resolução em seu conjunto e verificou-se que 159 haviam
votado pela resolução bolchevique, 104 contra e os outros se abstiveram. O Con-
gresso aprovou a resolução dos bolcheviques por esmagadora maioria de votos.
Desde esse momento, o ponto de vista dos bolcheviques tornou-se o ponto de
vista do Partido.
Ademais, essa votação deu dois resultados importantes.
Antes de mais nada, pôs fim à divisão formal, artificiosa, do Congresso em
cinco frações (bolcheviques, mencheviques, poloneses, letões, membros do Bund)
e deu origem a uma nova divisão de princípios: bolcheviques (compreendidos to-
dos os poloneses e a maioria dos letões) e mencheviques (compreendidos quase
todos os membros do Bund). Em segundo lugar, com essa votação se teve uma es-
tatística mais precisa da distribuição dos delegados operários por fração: resultou
que na fração bolchevique havia não 38, mas 77 operários (38 mais 27 poloneses
J. V. Stalin 107

e 12 letões) e na menchevique não 30, mas 39 operários (30 mais 9 membros do


Bund). Verificou-se que a fração menchevique é uma fração de intelectuais.

O congresso operário
Antes de passar à análise dos debates sobre a questão do congresso operário,
é necessário conhecer a história da questão137 .
O fato é que tal questão permaneceu extremamente confusa e nebulosa. Ao
passo que para os outros pontos que suscitaram as nossas divergências no Par-
tido já existem duas correntes definidas: a bolchevique e a menchevique, para a
questão do congresso operário não temos duas, mas um amontoado de correntes,
extremamente confusas e contraditórias. É verdade que os bolcheviques decla-
ram em bloco e de maneira precisa serem contrários ao congresso operário. Mas
entre os mencheviques reina, ao invés, o caos mais completo, a máxima confu-
são: dividiram-se em numerosos grupos e cada um desses grupos canta por conta
própria, sem ouvir os outros. Ao passo que os mencheviques de Petersburgo, che-
fiados por Axelrod, propõem a convocação de um congresso operário para criar
o Partido, os mencheviques de Moscou, com EL na chefia, propõem convocá-
lo não para favorecer a criação do Partido, mas com o fim de criar uma “união
operária de toda a Rússia”, apartidista. Os mencheviques do Sul vão ainda mais
longe e, com Larin138 à frente, propõem a convocação do congresso operário não
para criar o Partido, e nem tampouco uma “união operária”, mas uma “união do
trabalho” mais ampla, que possa abarcar, além de todos elementos proletários,
também elementos social-revolucionários, semiburgueses, elementos “que vivem
do próprio trabalho”. Sem falar ainda dos outros grupos e de pessoas menos in-
fluentes, do gênero dos grupos de Odessa e dos do Transcáspio e dos “autores”
de um folheto ridículo, os chamados “vagabundos” e “Chura”.139
Essa é a confusão que reina nas fileiras dos mencheviques.
Porém, como convocar o congresso operário, como organizá-lo, quem con-
vidar ao congresso, a quem confiar o encargo da convocação, quem deve tomar
a iniciativa disso? Sobre todos esses problemas, existe entre os mencheviques a
mesma confusão que existe em torno do problema das finalidades do congresso.
Enquanto uns propõem que se faça coincidir as eleições para o congresso com as
eleições para a Duma e que se organize “de surpresa” o congresso operário, ou-
tros propõem que se tenha confiança na “condescendência” do governo, ao qual
em caso extremo se pode pedir a “autorização”, e outros ainda aconselham o en-
vio de delegados ao estrangeiro, nem que sejam três ou quatro mil e lá realizar
ilegalmente o congresso operário.
Enquanto, entre os mencheviques, uns propõem que somente às organiza-
ções operárias realmente constituídas se permita que sejam representadas no
137 Trata-se do artigo do Iuri Pereiaslavski (J. Khrustaliov), publicado no Bakinski Dién (O dia de
Baku), diário liberal que se publicou de junho de 1907 a janeiro de 1908.
138 I. Larin, I. A. Rin (M. A. Lurie), menchevique liquidacionista. Em 1917, entrou para o partido

bolchevique. El (C. I. Luzin), menchevique liquidacionista.


139 Trata-se do Folheto “O Congresso Operário de Toda Rússia e os Bolcheviques”, publicado em ge-

orgiano, em Tiflis , no ano de 1907. “O vagabundo” era o menchevique Gucórgui Eradze: “Chura”,
sua mulher, a menchevique Piehkina.
108 Obras Escolhidas

congresso, outros propõem que dele participem os representantes de todo o pro-


letariado em geral, organizado e não organizado, que conta com não menos de
10 mil pessoas.
Enquanto, entre os mencheviques, uns sustentam que a iniciativa da convoca-
ção do congresso operário cabe ao Partido social-democrata, com a participação
dos intelectuais, outros aconselham que se deixe de lado tanto o Partido como os
intelectuais, e que a iniciativa caiba unicamente aos próprios operários, sem ne-
nhuma participação dos intelectuais. Enquanto, entre os mencheviques, alguns
insistem em que o congresso operário seja convocado imediatamente outros pro-
põem que se lhe adie a convocação para data indeterminada, limitando-se por
ora a promover uma agitação em favor da convocação do próprio congresso.
Porém, que fazer do Partido Operário Social-Democrata, que existe e que
já faz muito anos dirige a luta do proletariado, reúne em suas fileiras 150 mil
aderentes e já realizou cinco congressos, etc. etc.? “mandá-lo ao diabo”, ou o
que, então?
A estas perguntas, todos os mencheviques, desde Axelrod até Larin, respon-
dem unanimemente que entre nós não existe um partido proletário. “O pro-
blema está todo aqui, entre nós não existe o Partido – diziam-nos os menche-
viques no Congresso – entre nós não existe somente uma organização de inte-
lectuais pequeno-burgueses”, que é preciso substituir por um partido através do
Congresso operário. Isso declarou ao Congresso do Partido o relator dos men-
cheviques, o camarada Axelrod. Mas, permite-me que o indague, como é pos-
sível? Então, todos esses Congressos do nosso Partido, do primeiro (1898) ao
último (1907), em cuja organização os camaradas mencheviques tomaram parte
com a maior energia; todo o dispêndio de dinheiro e de energias proletárias, dis-
pêndio necessário para a organização de congressos pelos quais são responsáveis
tanto os mencheviques como os bolcheviques, tudo isso então era somente ilusão
e farisaísmo?!
Todos os apelos à luta que o Partido dirigiu ao proletariado, apelos assinados
também pelos mencheviques; todas as greves e as insurreições de 1905-1906-
1907, desencadeadas sob a direção do Partido e muitas vezes por iniciativa do
Partido; todas as vitórias alcançadas pelo proletariado, guiado pelo nosso Par-
tido; todos os milhares de vítimas proletárias, tombadas nas ruas de Petersburgo,
Moscou, etc., deportadas para a Sibéria, arruinadas nas prisões em nome do Par-
tido, sob a bandeira do Partido, tudo isso então não é senão comédia e ilusão?
Entre nós, então, não existe o Partido? Entre nós existe somente uma “organiza-
ção de intelectuais pequeno-burgueses”?
Tratava-se, naturalmente, de uma mentira aberta, de uma mentira revoltante,
descarada.
Essas, na verdade, são provavelmente as condições que podem explicar o ili-
mitado desdém suscitado entre os delegados operários de Petersburgo e de Mos-
cou pelas supramencionadas declarações de Axelrod. Pondo-se, imediatamente,
de pé, responderam com energia ao relator Axelrod: “fala por ti, burguês, que
andas pelo estrangeiro, e não por nós; somos operários, temos o nosso Partido
Social-Democrata em ao permitiremos que seja vilipendiado...”.
Mas, admitamos que se realize o Congresso Operário, imaginemos que isso
J. V. Stalin 109

já tenha ocorrido. O Partido Social-Democrata existente foi então arquivado, de


um modo ou de outro o Congresso Operário foi convocado e nele desejamos or-
ganizar algo que esteja entre uma união “operária” e uma união “do trabalho”.
E depois? Que programa adotara esse Congresso? Qual será sua fisionomia?
Entre os mencheviques, alguns respondem que o Congresso Operário poderia
adotar o programa da Social-Democracia, naturalmente com algumas omissões,
mas apressam-se a acrescentar que poderia também não adotar o programa dos
social-democratas, o que, segundo eles, não é para o proletariado um grande mal.
Outros respondem de modo mais decidido: uma vez que nosso proletariado está
fortemente embebido de aspirações pequeno-burguesas, com toda probabilidade
o Congresso Operário não adotará o programa Social-Democrata, mas um pro-
grama democrático pequeno-burguês. No Congresso Operário, o proletariado
perderá o programa social-democrata, mas, em compensação, adquirirá uma or-
ganização operária que unirá todos os operários. É o que diz, por exemplo, o
líder dos mencheviques moscovitas, N. Tcherevanin (vide Problemas de tática).
Portanto, “organização dos operários sem o programa social-democrata”: tal
seria provavelmente o resultado do congresso operário. Assim, pelo menos, pen-
sam os próprios mencheviques.
É evidente que estes últimos, em desacordo entre si, sobre várias questões
concernentes às finalidades do congresso operário e aos meios para convocá-lo,
concordam em declarar que “entre nós não existe o Partido, mas somente uma
organização de intelectuais pequeno-burgueses, própria para ser arquivada”. O
informe de Axelrod manteve-se nesse plano. Do seu informe resultou que na
prática, a agitação para a convocação do congresso operário se reduziria inevita-
velmente à agitação contra o Partido, à guerra contra este. E o trabalho prático
para convocação do congresso reduziria também, inevitavelmente, ao trabalho
prático no sentido de organizar e desagregar o nosso Partido atual. Entremen-
tes, os mencheviques – pela boca do seu relator, como também no seu projeto
de resolução – pediram ao congresso que proibisse a agitação contra as tentativas
tendentes a organizar o congresso operário, contra as tentativas, vale dizer, que
levam à desorganização do Partido.
E é interessante: nos discursos dos oradores mencheviques (exceto Plekha-
nov que, na verdade, do congresso operário nada disse) eram sempre repetidas
as palavras de ordem: abaixo o partido, abaixo a social-democracia, viva o apar-
tidismo, viva o “congresso operário” não social-democratas. Essas palavras de
ordem não eram lançadas abertamente pelos oradores, mas transpareciam dos
seus discursos.
Não é gratuitamente que todos os escritores burgueses, desde os sindicalis-
tas e social-revolucionários até os cadetes e outubristas, se declaram favoráveis
ao congresso operário: não serão talvez todos eles inimigos do nosso Partido?
E o trabalho prático para convocação do congresso operário poderia debilitar
e desorganizar acentuadamente o nosso partido. Por que não deveriam então
dispensar boa acolhida à “ideia do congresso operário”?
De maneira absolutamente diversa falaram os oradores bolcheviques. O re-
lator dos bolcheviques, o camarada Lindov, após haver emitido um juízo sobre
as correntes principais existentes entre os próprios mencheviques, passou a ilus-
110 Obras Escolhidas

trar as condições em que nascera a ideia do congresso operário. A agitação no


sentido do congresso operário começou em 1905, antes das jornadas de outubro,
no momento da repressão. Cessou durante as jornadas de outubro e novembro.
Acentuou-se novamente nos meses seguintes, em que houve novas repressões.
Por ocasião da I Duma, nos dias de relativa liberdade, a agitação cessou. Em
seguida, após a dissolução da Duma, cresceu novamente, etc. A conclusão é evi-
dente: nos dias de relativa liberdade, em que o Partido tenha a possibilidade de
desenvolver-se livremente, a agitação do sentido do congresso operário com o fim
de criar um “amplo partido apartidista” perde naturalmente terreno; e, pelo con-
trário, nos dias da repressão, quando ao invés do afluxo dos membros verifica-se
um refluxo, a agitação em torno do congresso operário medida artificiosa no
sentido do desenvolvimento do Partido ou da substituição do partido restrito
por um outro partido “amplo e apartidista”, encontra terreno favorável. Mas é
óbvio que nenhuma medida artificiosa serviria, porque para um verdadeiro de-
senvolvimento do Partido é necessária a liberdade política e não um congresso
operário, o qual necessita ele próprio, de tal liberdade.
Há mais. A ideia do congresso operário, considerada em seu aspecto con-
creto, é radicalmente errônea, não se baseia nos fatos, mas sobre um princípio
errado: “nós não temos o Partido”. O fato é que nós possuímos um partido prole-
tário que afirma em voz alta a própria existência e se faz sentir muito seriamente
aos inimigos do proletariado – os próprios mencheviques sabem-no muito bem
– e justamente porque já temos um partido assim, justamente, por isso, a ideia
do congresso operário é radicalmente errônea. Naturalmente, se não tivéssemos
um partido que conta com mais de 150 mil proletários avançados e arrasta a seu
reboque centenas de milhares de combatentes; se fôssemos um pequenos grupo
de indivíduos com escassa influência, como social-democratas alemães de 1860 à
1879 ou socialistas franceses do período de 1870 à 1889, procuraríamos também
a convocação de um congresso operário, com o fim de, dali, extrair um partido
verdadeiramente proletário, o qual goza de enorme influência junto as massas,
e para convocar o congresso operário, para criar um fantástico “partido apar-
tidista” deveríamos inevitavelmente antes de mais nada “dar cabo” do partido
existente, antes de mais nada destruí-lo.
Eis por que, na prática, o trabalho no sentido da convocação do congresso ope-
rário se reduziria inevitavelmente a um trabalho para desorganização do Partido.
E ainda está por se ver se se conseguiria, de um dia para o outro, criar, em seu
lugar, um “amplo partido apartidista”, e se é preciso criar um partido assim.
Eis porque os inimigos do nosso Partido, os vários cadetes e outubristas lou-
varam com tanto zelo os mencheviques pela sua agitação em favor do congresso
operário. Eis porque os bolcheviques pensam que o trabalho no sentido da con-
vocação do congresso operário é perigoso, nocivo: este desacredita o Partido aos
olhos das massas e submete estas últimas à influência da democracia burguesia.
Eis, pouco mais ou menos, o que disse o camarada Lindov. Pelo congresso
operário contra o Partido Social-Democrata ou pelo Partido contra o congresso
operário? Assim se colocava a questão do congresso.
Os delegados bolcheviques compreenderam-no logo e intervieram energica-
mente “em defesa do partido”. “Somos patriotas do Partido – diziam estes –
J. V. Stalin 111

amamos nosso Partido e não permitiremos aos intelectuais desfibrados que o de-
sacreditem”. É interessante o fato de que a representante da social-democracia
alemã, a camarada Rosa Luxemburgo, esteve de pleno acordo com os bolchevi-
ques. “Nós, social-democratas alemães – disse ela – não conseguimos entender
a ridícula desorientação dos camaradas mencheviques, sempre tateantes procu-
ram as massas, enquanto as próprias massas buscam o Partido e a este se apegam
irresistivelmente”.
Dos debatedoresm resultou que a esmagadora maioria dos oradores apoiava
os bolcheviques. No final da discussão foram postos em votação dois projetos de
resolução, respectivamente dos bolcheviques e dos mencheviques. Foi aprovado,
com base, o projeto dos bolcheviques. Quase todas as emendas que tinham um
caráter de princípio foram rejeitadas delas só foi aprovada uma, mais ou me-
nos séria, a que era contra a limitação da liberdade de se discutir a questão do
congresso operário. A resolução em suma, afirmava que a “ideia do congresso
operário leva à desorganização do Partido”, “coloca amplas massas operárias so-
bre influência da democracia burguesa”, e por isso é prejudicial ao proletariado.
A resolução além disso, estabelecia nítida distinção entre o congresso operário e
os sovietes de deputados operários e seus congressos, que não só desorganizam
o Partido, não só não lhe fazem concorrência, mas pelo contrário, reforçam-no,
seguindo atrás dele e ajudando-o a resolver as questões práticas dos momentos
de ascenso revolucionário.
Enfim, a resolução foi aprovada em seu conjunto por uma maioria de 165
votos contra 94. Os demais abstiveram-se. O congresso repeliu também a ideia
do congresso operário porque era contrária aos interesses do Partido.
A votação revelou algo importante: dos 114 delegados operários que nele
tinham participado, somente 25 haviam votado pelo congresso operário. Os de-
mais tinham votado contra. Vale dizer: 22% dos delegados operários tinham
votado a favor do congresso operário e 72% contra. E, o que mais é, dos 94 de-
legados que haviam votado a favor do congresso operário, somente 26% eram
operários e 74% intelectuais. Contudo, os mencheviques gritavam aos quatro
ventos que a ideia do congresso operário era uma ideia operária, que somente
os bolcheviques “intelectuais” opunham-se à convocação do congresso. A julgar
por essa votação, deveriam antes reconhecer que a ideia do congresso operário é
uma fantasmagoria de intelectuais. Até mesmo os operários mencheviques, pelo
que se verifica, não votaram a favor do congresso operário: dentre 39 delegados
operários (30 mencheviques mais 9 membros do Bund), somente 24 votaram a
favor do congresso operário.
Koba Ivanovitch
Baku, 1907
Bakinski Proletari (O proletário de Baku) nº 1 e 2.
20 de junho e 10 de julho de 1907
112 Obras Escolhidas

O terrorismo econômico e o
movimento operário
30 de março de 1908
A luta dos operários não teve sempre, e por toda a parte, a mesma forma.
Houve tempo em que os operários, lutando contra os patrões, quebravam as má-
quinas, incendiavam as oficinas. A máquina: eis a origem da miséria! A oficina:
eis o lugar da opressão! Quebremo-las, pois, incendiemo-las! – diziam então os
operários. Era a época dos conflitos espontâneos, anárquicos, da revolta cega.
Conhecemos, também, outros casos em que os operários, perdida a confiança
na eficácia dos incêndios e das destruições, passaram a “forma de luta mais vi-
olentas”, ao assassinato dos diretores, administradores, dirigentes, etc. Não se
podem destruir todas as máquinas e oficinas, diziam então os operários, e além
do mais isso não é vantajoso para nós, mas se pode sempre cortar os dedos dos
administradores, incutindo-lhes terror: batamo-los, pois, assustemo-los!
Era a época dos conflitos terroristas individuais, nascidos da luta econômica.
O movimento operário condenou francamente ambas as formas de luta, re-
legando-as ao passado.
E é compreensível. Não há dúvida de que, na realidade, a oficina é o lugar se
exploram os operários, e a máquina dá mão forte à burguesia para ampliar essa
exploração, mas isso ainda não significa que a máquina e a oficina sejam a origem
da miséria. Pelo contrário, justamente a oficina e a máquina dão ao proletariado
a possibilidade de romper as cadeias da escravidão, de destruir a miséria, de
dar cabo de qualquer opressão; é necessário somente que se transformem, de
propriedade privada de capitalistas isolados, em propriedade social do povo.
Por outro lado, que seria da vida, se nos metêssemos realmente a destruir e
incendiar as máquinas, as oficinas, as ferrovias? A vida se tornaria um deserto
pavoroso, e os operários seriam os primeiros a privarem-se de um pedaço de
pão! É claro que não devemos destruir as máquinas e as oficinas, mas apoderar-
nos delas, quando for possível, se verdadeiramente aspirarmos à supressão da
miséria.
Eis por que o movimento operário não aprova os conflitos anárquicos, a re-
volta cega.
Não há dúvida de que também o terrorismo econômico tem uma certa “justi-
ficação” evidente, desde que seja aplicado para incutir medo na burguesia. Mas
de que vale esse medo, se é passageiro, fugaz? E que só possa ser passageiro
torna-se claro também pelo único fato de que é impossível praticar o terrorismo
econômico sempre e onde quer que seja. Isso em primeiro lugar. Em segundo
lugar, que nos pode proporcionar o medo passageiro da burguesia e a concessão
que dele deriva, se não tivermos às nossas costas uma forte organização de massa
dos operários, sempre pronta a lutar pelas reivindicações operárias e em condi-
ções de não permitir que lhe tirem a concessão conquistada? De resto, os fatos
mostram com evidência que o terrorismo econômico torna inútil tal organização,
J. V. Stalin 113

tira aos operários a vontade de unir-se, de agir de maneira autônoma, desde que
dispõem de heróis terroristas, os quais podem agir por eles. Não devemos nós de-
senvolver nos operários o espírito de iniciativa? Não devemos desenvolver neles
o desejo de ser unidos? Naturalmente que sim! Mas poderemos talvez praticar o
terrorismo econômico, se este inculca nos operários outra coisa?
Não, companheiros! Não compete a nós meter medo na burguesia atacando
os indivíduos imprevistamente: deixemos que certos bandidos se ocupem des-
ses “assuntos”. Devemos agir abertamente contra a burguesia, devemos mantê-la
sempre, até a vitória definitiva, sob o pesadelo do medo! E para fazê-lo, não
é necessário o terrorismo econômico, mas uma forte organização de massa, ca-
paz de guiar os operários na luta. Eis por que o movimento operário repele o
terrorismo econômico. Depois de tudo quanto se disse, a última resolução dos
grevistas da Mirzoiev, dirigida contra os incêndios e os assassinatos “econômi-
cos”, adquire um interesse especial. Nessa resolução, a comissão unificada dos
1.500 operários da Mirzoiev, pondo em relevo certos fatos, como o incêndio da
seção de caldeiras (em Balakhani) e o assassinato do diretor, devidos a razões
econômicas (Surakhani), declara que “protesta contra métodos de luta tais como
o assassinato e o incêndio” (Gudok, nº 24).
Os operários da Mirzoiev rompem, assim, definitivamente com as antigas ten-
dências terroristas, com a revolta cega.
Põem-se eles, assim, decididamente no caminho de um verdadeiro movimento
operário.
Aplaudimos os companheiros da Mirzoiev e convidamos todos os operários a
adentrarem, de maneira igualmente decidida, no caminho do movimento prole-
tário.
Gudok (A Sirena), nº 25.
30 de março de 1908
114 Obras Escolhidas

A imprensa
20 de julho de 1908

Os ''socialistas'' servis

Ao lado dos outros jornais publicados em Tiflis, existe também um jornal ge-
orgiano chamado Napertskali140 . É um jornal novo, mas ao mesmo tempo dema-
siado velho, porque é a continuação de todos os jornais mencheviques que houve
até agora em Tiflis, a começar pelo Skhivi de 1905. O Napertskali é redigido por
um velho grupo de oportunistas mencheviques. Mas não se trata naturalmente
só disso. Trata-se sobretudo do fato de que o oportunismo desse grupo tem qual-
quer coisa de particular, de fabuloso. Oportunismo é falta de princípios, falta de
caráter político; e nós afirmamos que em nenhum dos grupos mencheviques se
pôde observar uma tão descarada falta de caráter como no de Tiflis. Em 1905,
este grupo reconhecia a função do proletariado como cabeça da revolução (vide
Skhivi). Em 1906, trocou de “posição”, declarando que “não se pode esperar
coisa nenhuma dos operários... a iniciativa pode partir somente dos campone-
ses” (vide Skhivi). Em 1907, modificou mais uma vez a sua “posição”, dizendo
que “na revolução a hegemonia cabe à burguesia liberal” (vide Azri141 ), etc.
Mas jamais a falta de caráter do grupo supradito havia atingido a desfaçatez a
que chegou hoje, no verão de 1908. Pretendemos falar sobre o juízo expresso nas
colunas do Napertskali acerca do assassinato do opressor espiritual dos deserda-
dos, o chamado exarca. A história desse homicídio é conhecida de todos. Alguns
indivíduos, após haverem matado o exarca, mataram também o brigadeiro dos
gendarmes que voltava com a ata do “local do crime” e atacaram depois a pro-
cissão de malandros que acompanhava o cadáver do exarca. Aqueles indivíduos
não constituíam evidentemente um grupo de malandros, mas nem tampouco um
grupo revolucionário, porque nenhum grupo revolucionário teria decidido, num
momento como este, enquanto se reúnem as forças revolucionárias, a cometer
semelhante ato, arriscando-se a fazer malograr o trabalho da união do proleta-
riado. A posição da social-democracia nos choques desses grupos é conhecida
de todos: ela explica as condições que dão origem a esses grupos e os combatem
e, ao mesmo tempo, luta ideologicamente e de maneira organizada contra esses
grupos, desacreditando-os aos olhos do proletariado, do qual os distingue niti-
damente. Mas o Napertskali não procede assim. Sem nenhuma explicação, sem
nenhuma argumentação, vomita algumas banais frases liberais contra o terro-
rismo em geral e dá então conselhos aos leitores sobre o modo de denunciar tais
grupos à polícia, de entregá-los à polícia (e não dá só conselhos, mas exige nem
mais nem menos que uma obrigação)! É uma vergonha, mas desgraçadamente
é um fato. Ouçam o Napertskali: “arrastar à barra do tribunal os assassinos do
140 Diário georgiano menchevique que se publicou em Tiflis de 29 de janeiro a 2 de março de 1908.
141 Azri (O Pensamento), jornal georgiano menchevique que se publicou em Tiflis de 29 de janeiro
a 2 de março de 1908.
J. V. Stalin 115

exarca: este é o único meio de nos lavarmos para sempre dessa mancha... Tal é
o dever dos elementos avançados” (vide Napertskali, nº 5).
Os social-democratas no papel de delatores voluntários: eis a que nos reduzi-
ram os oportunistas mencheviques de Tiflis!
A falta de caráter político dos oportunistas não cai do céu. Deriva da irrefreá-
vel aspiração de adaptar-se às preferências da burguesia, ao gosto dos “senhores”,
de arrancar-lhes um elogio. Essa é a base psicológica da tática oportunista da
adaptação. E eis que, para fazerem-se belos perante os “senhores”, agradá-los e
evitarem ao menos sua cólera provocada pela morte do exarca, os nossos opor-
tunistas mencheviques entregam-se a mesuras servis diante deles, assumindo o
papel de investigadores da polícia! A tática da adaptação atingiu os limites ex-
tremos!

Os zubatovistas fariseus

Baku forma, ao lado das outras, cidades do Cáucaso que fornecem variantes
originais do oportunismo. Também em Baku existe um grupo mais à direita –
e por isso com uma falta de princípios ainda mais destacada – que o grupo de
Tiflis. Não aludimos ao Promislovi Viestnik que está flertando com o burguês Se-
vodnia: sobre isso se escreveu bastante em nossa imprensa. Pretendemos falar do
grupo Chendrikov do Pravoie Dielo142 , progenitor dos mencheviques de Baku. É
verdade que esse grupo há muito tempo não reside mais em Baku: perseguido
pelos operários dessa cidade e pelas suas organizações, foi forçado a transferir-se
para Petersburgo. Mas continua a enviar seus escritos a Baku, escreve unicamente
sobre os assuntos de Baku, busca apoio justamente em Baku, tenta “conquistar”
o proletariado de Baku. Não seria, pois, supérfluo falar dele. Então, temos di-
ante de nós o Pravoie Dielo, nº 2-3. Folheamo-lo, e diante de nós revela-se um
velho quadro: a velha e inseparável companhia dos Chendrikov. Eis Ilia Chen-
drikov, mestre na arte das intrigas de corredor, conhecido pelos seus “apertos de
mão” ao senhor D. Junkovski. E eis Gleb Chendrikov, ex-social-revolucionário,
ex-menchevique, ex-zubatovista e agora aposentado. E eis a famosa tagarela, a
“imaculada” Claudia Chendrikova, senhora amável sob todos os pontos de vista.
E não faltam nem sequer os vários “sequazes”, como os Grochev e os Kalinin,
que durante algum tempo desempenharam um papel no movimento e que hoje
ficaram para trás com relação à vida e vivem unicamente de recordações. Até a
sombra do falecido Liova ergue-se à nossa frente... em uma palavra, o quadro
142 Os Irmãos Chendrikov (Leon, Elias, Gleb) criaram em 1904, em Baku, uma organização zuba-
tovista chamada “Organização dos operários de Balakhani e de “Bibi-Eibat” (mais tarde rebatizada
de “União dos Operários de Baku”). Os Chendrikov e seus agentes moviam uma campanha na base
de calúnias contra os bolcheviques. Com sua agitação em prol da criação de “Juntas de conciliação”,
de cooperativas artesãs, etc. e suas palavras de ordem econômicas estritamente corporativas, visa-
vam desorganizar as greves e a sabotar a preparação da insurreição armada. Embora fosse notório
que os Chendríkov recebiam subvenções dos industriais do petróleo e das autoridades tsaristas, os
mencheviques reconheceram oficialmente a organização deles com uma organização do POSDR. Os
bolcheviques de Baku os desmascararam e os liquidaram, demonstrando que eram agentes da Okh-
ranka. A revista Pravoie Dielo (A Justa Causa) era publicada em Petersburgo pelos Chendrikov. O
nº 1 saiu em novembro de 1905 o nº 2-3 em maio de 1908. Grochev e Kalínin, mencionados mais
adiante, eram dois mencheviques apoiadores dos Chendrikov.
116 Obras Escolhidas

está completo!
Mas, quem tem necessidade disso, por que se impõem aos operários as som-
bras de um passado obscuro? São talvez os operários convidados a pôr fogo nos
poços de petróleo? Ou a insultar o Partido e a arrastá-lo na lama? Para compare-
cer à conferência sem os operários e depois fazer os próprios negócios imundos
com o senhor Junkovski?
Não! Os Chendrikov querem “salvar” os operários de Baku! Eles “veem” que
depois de 1905, isto é, depois que os operários expulsaram os Chendrikov, os
“operários encontraram-se à beira do abismo” (vide Pravoie Dielo); e eis que os
Chendrikov escreveram o Pravoie Dielo para “salvar” os operários, para fazê-los
sair do “beco sem saída”. E para fazer isso, propõem voltar ao passado, renun-
ciar às conquistas dos últimos três anos, virar as costas ao Gudok e ao Promis-
lovi Viestnik, desinteressar-se dos sindicatos existentes, mandar ao diabo a social-
democracia e, após ter expulsado das comissões operárias todos aqueles que não
seguem os Chendrikov, reunir-se e torno da junta de conciliação. Não é preciso
mais greves, não é preciso nem sequer as organizações ilegais: aos operários é ne-
cessária uma só coisa, a junta de conciliação onde os Chendrikov e os Gukassov
“resolverão os problemas” com a permissão do senhor Junkovski...
Assim, eles querem fazer sair do “beco sem saída” o movimento operário de
Baku. Exatamente como o camaleão do Nieftianoie Dielo, o senhor K-za (vide
Nieftianoie Dielo, nº 11). Mas não é talvez dessa maneira que Zubatov em Mos-
cou, Gaspon em Petersburgo, Chiaievitch em Odessa “salvaram” os operários? E
não resultou talvez que esses senhores estavam todos entre os mais encarniçados
inimigos dos operários?
Quem desejam então enganar à luz do dia esses “salvadores” fariseus? Não,
senhores Chendrikov, se bem que afirmei, juntamente com K-za, que o proleta-
riado de Baku ainda “não está maduro”, que ele deve ainda “passar no exame
(perante quem?) para o certificado de maturidade” (vide Pravoie Dielo), não con-
seguira, todavia, enganá-lo!
O proletariado de Baku é bastante consciente para arrancar-lhes a máscara
e colocar no devido lugar! Quem somos, de onde vem? Vocês não são social-
democratas, porque crescentes na luta contra a social-democracia e viveis dessa
luta, da luta contra o espírito do partido! E não sois sindicalistas, porque arrastais
na lama os sindicatos, por sua natureza compenetrados do espírito da social-
democracia!
São justamente os sequazes de Gapon e de Zubatov ocultos sob a máscara de
“amigos do povo”! Inimigos no seio do proletariado e, portanto, os mais peri-
gosos! Abaixo os sequazes dos Chendrikov! Voltemos as costas aos Chendrikov!
Eis como respondemos ao seu Pravoie Dielo, senhores Chendrikov! Eis como res-
ponde o proletariado de Baku aos seus namoros farisaicos!
Ko...
Bakinski Proletari (O proletário de Baku), nº 5. 20 de julho de 1908
J. V. Stalin 117

A crise no Partido e as nossas


tarefas
agosto de 1909

Não é segredo para ninguém que o nosso Partido atravessa uma grave crise. A
saída de membros do Partido, o menor número e a debilidade das organizações,
o fato de que estas estão separadas umas das outras, a ausência de um trabalho
partidário unificado: tudo isso demonstra que o Partido está doente, que está
atravessando uma séria crise.
Em primeiro lugar, o que pesa particularmente sobre o Partido é a separação
entre as suas organizações e as amplas massas. Houve tempo em que nossos ór-
gãos tinham em suas fileiras milhares de homens, e arrastavam sob a sua direção
a dezenas de milhares. O Partido possuía, então, raízes sólidas nas massas. Hoje
não é a mesma coisa. Em vez dos milhares de homens, não vale a pena sequer
falar a respeito. É verdade que nosso Partido exerce uma grande influência ide-
ológica sobre as massas, que as massas o conhecem e o respeitam. Justamente e
sobretudo por isso, o Partido de “depois da revolução” distingue-se do Partido
de “antes da revolução”. Mas a influência do Partido está toda aí. E, entretanto,
a influência ideológica do Partido só por si ainda está longe de ser suficiente.
O fato é que a amplitude da influência ideológica se choca contra a limitação
da consolidação orgânica: aí está a origem da separação entre nossos órgãos e as
amplas massas. É suficiente o exemplo de Petersburgo – onde em 1907 existiam
8 mil membros e hoje apenas se podem juntar uns 300 a 400 – para se compre-
ender toda a gravidade da crise. Nem falemos sequer de Moscou, dos Urais, da
Polônia, da bacia do Don, etc.; que estão na mesma situação.
Mas ainda não é tudo. O Partido sofre não só por sua separação das massas,
mas também pelo fato de que seus órgãos não estão de maneira alguma ligados
uns aos outros, não vivem uma vida partidária única, estão separados uns dos
outros. Petersburgo não sabe o que se faz no Cáucaso, o Cáucaso não sabe o
que se faz nos Urais, etc. Cada setor vive uma vida à parte. Rigorosamente fa-
lando, não existe mais de fato aquele Partido único que vivia uma vida comum,
o Partido do qual falávamos com altivez nos anos de 1905, 1906 e 1907. Estamos
num período de trabalho artesão dos mais vergonhosos. Os jornais existentes
no exterior, o Proletari, o Golos,143 por um lado, e o Sotzial-Demokrat 144 por outro,
143 Proletari, jornal ilegal fundado pelos bolcheviques após o IV Congresso do POSDR; publicou-
se de 21 de agosto (3 de setembro) de 1906 a 28 de novembro (11 de dezembro) de 1909. Saíram
50 números. Os primeiros 20 foram impressos na Finlândia, outros em Genebra e em Paris. O
Proletari era de fato o órgão central dos bolcheviques e era dirigido por Lenin. Nos anos da reação de
Stolypin teve função importante para a manutenção e consolidação da organização bolchevique. Golos
Sotzial-Demokrata (A Voz do Social-Democrata), órgão dos mencheviques liquidacionistas, publicado
no estrangeiro de fevereiro de 1908 a dezembro de 1911. Em dezembro de 1908, dada a orientação
nitidamente liquidacionista do jornal, Plekhanov, que era um dos redatores, cessou sua colaboração
em seguida saiu oficialmente da redação. Não obstante a reunião plenária do CC do POSDR haver
decidido que o Golos Sotzial-Demokrata devia cessar a sua publicação, os mencheviques continuaram o
jornal e a pregar abertamente em suas colunas as ideias do liquidacionismo.
118 Obras Escolhidas

não ligam e não podem ligar intimamente entre si as organizações esparsas pela
Rússia, não podem dar-lhes uma vida partidária única. E seria também estra-
nho pensar-se que os órgãos publicados no exterior, longe da realidade russa,
possam unir, num todo único, o trabalho de um Partido que há muito tempo
superou o estágio do trabalho nos círculos. É verdade que entre as organizações
separadas umas das outras há muito de comum, que se liga ideologicamente; que
elas têm um programa comum, o qual resistiu à crítica da revolução, princípios
práticos confirmados pela revolução, gloriosas tradições revolucionárias. Exata-
mente nisso está a segunda diferença importante entre o Partido de “depois da
revolução” e o Partido de “antes da revolução”. Mas isso ainda não basta. O fato
é que a unidade ideológica de suas organizações ainda está bem longe de sal-
var o Partido do fracionamento orgânico, da separação criada entre seus órgãos.
Basta indicar o fato de que até mesmo a simples formação escrita não é levada
na devida consideração dentro do Partido. Nem falemos sequer na união efetiva
do Partido num único organismo.
Portanto: 1º) separação entre o Partido e as amplas massas e 2º) separação
entre os seus órgãos: essa é a essência da crise que o Partido atravessa. Não é di-
fícil de se compreender que a causa de tudo isso é a crise da própria revolução, o
triunfo temporário da contrarrevolução, a calma após a ação, a perda, enfim, de
todas aquelas semiliberdades de que o Partido gozava durante os anos de 1905 e
1906. O Partido desenvolveu-se, ampliou-se e reforçou-se até e enquanto a revo-
lução marchou para a frente, até e enquanto existiram liberdades. A revolução
retrocedeu, as liberdades cessaram de existir, e o Partido começou a perder as
forças, começou a fuga, do Partido, dos intelectuais e depois dos operários mais
vacilantes. A fuga dos intelectuais foi em parte apressada pelo desenvolvimento
do Partido, e mais precisamente pela ação dos operários avançados, que com as
suas complexas exigências haviam superado a limitada bagagem intelectual dos
“intelectuais de 1905”.
Disso ainda não se infere absolutamente que o Partido, até o advento das
futuras liberdades, deva vegetar na crise, como sem razão pensam alguns. Em
primeiro lugar, o advento das próprias liberdades depende em grande parte da
capacidade do Partido de sair são e renovado da crise: as liberdades não caem do
céu; conquistam-se, entre outras coisas, por meio de um partido operário bem
organizado. Em segundo lugar, as leis da luta de classes conhecidas de todos
dizem-nos que a organização da burguesia, que vai se reforçando cada vez mais,
deve infalivelmente levar consigo uma correspondente organização do proletari-
ado. E é conhecido de todos que o desenvolvimento orgânico do nosso proletari-
ado na sua qualidade de classe pressupõe, como condição necessária, a renovação
de nosso Partido, como único partido operário.

144Sotzial-Demokrat (O Social-Democrata), órgão central do POSDR que se publicou de fevereiro de


1908 a janeiro de 1917. O primeiro número saiu na Rússia, os demais no estrangeiro, primeiramente,
em Paris e depois em Genebra. O corpo de redação era composto, de acordo com a decisão do CC do
POSDR, de representantes dos bolcheviques, dos mencheviques e dos social-democratas poloneses.
No seio do corpo de redação e colunas do jornal, Lenin dirigiu a luta por uma linha bolchevique
consequente, contra Kamenev e Zinoviev, que tinham uma atitude conciliatória para com os liqui-
dacionistas, contra os mencheviques Martov e Dan, que defendiam abertamente o liquidacionismo
pelas colunas do Golos Sotzial-Demokrata eram sistematicamente publicados artigos sobre o trabalho
das organizações locais, inclusive as da Transcaucásia.
J. V. Stalin 119

Portanto, não só é possível curar de novo o Partido, libertá-lo da crise antes


do advento das liberdades, mas é também indispensável. Tudo está em se achar
o meio de saná-lo de novo, de abrir as estradas através das quais o Partido: 1º)
ligar-se-á às massas e 2º) unirá em um único organismo as organizações separadas
umas das outras.
Como pode então o nosso Partido sair da crise? Que é preciso fazer? Trans-
formar o Partido em um partido o mais possível legal e reuni-lo em torno da
fração parlamentar legal, dizem uns. Porém como transformá-lo em um partido
o mais legal possível, se as mais inofensivas instituições legais, como as sociedades
de cultura, etc., são objetivo das mais ferozes perseguições? Renunciando talvez
às suas reivindicações revolucionárias? Mas significaria enterrar o Partido e não
o renovar! Além disso, como pode a fração parlamentar ligar o Partido às massas,
quando ela própria está desligada não só das massas, mas dos órgãos do Partido?
É claro que resolver dessa maneira a questão quer dizer embrulhá-la mais ainda,
tornando mais difícil para o Partido superar a crise.
Transferir para os próprios operários o maior número possível de funções no
Partido e libertar, desse modo, o Partido dos elementos intelectuais inconstan-
tes, dizem-nos outros. Não há dúvida de que libertando o Partido dos hóspedes
inúteis, e centralizando as funções nas mãos dos próprios operários, a obra de re-
novação do Partido seria bastante facilitada. Mas não é menos claro que a simples
“transferência das funções”, permanecendo intatos o velho sistema de organiza-
ção, os velhos métodos de trabalho do Partido, a “direção” do exterior, não pode
ligar o Partido à massa e fundi-lo em um todo único.
É evidente que, com meias medidas, não se pode fazer nada: é necessário
encontrar meios radicais para curar radicalmente o Partido doente. O Partido
sofre, primeiro, com seu desligamento das massas: é preciso a todo custo ligá-lo a
essas massas. Mas, nas nossas condições isso é possível, primeiro e acima de tudo,
no terreno das questões que agitam particularmente as amplas massas. Tomemos
também só o fato do empobrecimento das massas e da ofensiva do capital. Sobre
as cabeças dos operários, as grandes greves passaram como um furacão, enquanto
a redução da produção, as despedidas arbitrárias, a diminuição do pagamento, o
prolongamento da jornada de trabalho, e, em geral, a ofensiva do capital, conti-
nuam sempre. É difícil imaginar que sofrimentos, que tensão de ânimo ocasiona
tudo isso entre os operários, que massa de mal-entendidos e de conflitos surgem
entre operários e patrões, que massa de problemas interessantes nascem a esse
respeito no cérebro dos operários. Que os nossos órgãos, portanto, continuando
o trabalho política em geral, intervenham incansavelmente em todos esses pe-
quenos conflitos, liguem esses conflitos à grande luta das classes e, apoiando as
massas em seus protestos e exigências de todos os dias, façam conhecer através
dos fatos reais os grandes princípios do nosso Partido. Não deveria ser claro para
todos que somente nesse terreno é possível redimir as massas “esmagadas contra
o muro”, somente nesse terreno é possível “deslocá-las” daquele maldito ponto
morto? E “deslocá-las” do ponto morto significa justamente agrupá-las em torno
de nossos órgãos.
Os comitês de fábricas e de oficina do Partido: eis os nossos órgãos que pode-
riam com maior êxito desempenhar esse trabalho junto às massas. Os operários
120 Obras Escolhidas

avançados que fazem parte desses comitês: eis os homens vivos que poderiam
agrupar em torno do Partido as massas que os circundam. É preciso somente
que os comitês de fábrica e de oficina intervenham incansavelmente em tudo
quanto se refere à luta dos operários, defendam seus interesses cotidianos e li-
guem esses interesses aos interesses fundamentais da classe operária. Fazer dos
comitês de fábrica e de oficina os bastiões fundamentais do Partido: essa é a
tarefa.
Há mais. No interesse da própria aproximação das massas, é necessário que
também os outros órgãos do Partido, os órgãos superiores, sejam construídos de
modo a servir à defesa dos interesses não só políticos, mas também econômicos
das massas. É necessário que nem sequer um dos ramos mais ou menos impor-
tantes da produção escape à atenção dos órgãos. E para isso é preciso que ao
serem construídos os órgãos o princípio territorial seja integrado pelo princípio
da produção, isto é, que, por exemplo, os comitês de fábricas e de oficina dos
diferentes ramos da produção se agrupem em diversos subdistritos, segundo o
ramo de produção, para fazerem com que esses subdistritos se unam territori-
almente em distritos, etc. Pouco importa que o número dos subdistritos cresça
demais, em compensação o organismo ganhará com isso em solidez e estabilidade
dos seus alicerces, se conectará mais estreitamente às massas. Uma importância
ainda maior para a solução da crise tem a composição dos órgãos do Partido.
É necessário que em todos os órgãos locais haja operários avançados mais ex-
perimentados e mais influentes, que o organismo se centralize em suas mãos
fortes, que estes operários, e justamente estes, ocupem os postos mais importan-
tes, desde os relativos à atividade prática e de organização até aos referentes à
atividade publicitária. Pouco importa que os operários que tiverem ocupado os
postos mais importantes não se revelem suficientemente experimentados e pre-
parados; e mesmo que claudiquem nos primeiros tempos: a prática e os conselhos
dos camaradas mais experientes ampliarão seus horizontes e, por fim, farão deles
verdadeiros escritores e chefes do movimento. Não se deve esquecer de que os
Bebel não caem do céu, mas se formam somente no curso do trabalho, na prá-
tica; e nosso movimento necessita, hoje como jamais, de Bebel russos, de chefes
experientes e firmes, egressos do ambiente operário.
Eis por que nossa palavra de ordem orgânica deve ser “mãos livres aos ope-
rários esclarecidos em todas as esferas do trabalho do Partido”, “dai-lhes mais
espaço”!
É óbvio que, além do desejo de “dirigir” e do espírito de iniciativa, aos operá-
rios avançados são também necessários sólidos conhecimentos. Mas é justamente
aqui que pesa a ajuda dos intelectuais experientes e ativos. É necessário criar cír-
culos de estudo superiores, “seminários” de operários esclarecidos, pelo menos
um por distrito, e “estudar” a teoria e a prática do marxismo: tudo isso preenche-
ria notavelmente as lacunas dos operários esclarecidos, fazendo-os tornarem-se
futuros educadores e dirigentes ideológicos. Concomitantemente, os operários
esclarecidos devem fazer relações mais frequentes em suas oficinas e fábricas, “fa-
zer plenamente o seu tirocínio”, sem estacar diante do perigo de “fazer fiasco”
diante dos ouvintes. É preciso libertar-se de uma vez por todas da modéstia inútil
e do medo dos ouvintes, armar-se de audácia e de confiança nas próprias forças:
pouco importa se nos primeiros tempos se fizer má figura; tropeçará uma vez ou
J. V. Stalin 121

dias, mas com isso nos habituaremos a caminhar sozinhos, como “Cristo sobre as
águas”.
Em resumo: 1º) intensificar a agitação alicerçando-a sobre as necessidades
cotidianas, colocadas em relação com as necessidades gerais de classe do pro-
letariado; 2º) organizar e reforçar os comitês de fábrica e de oficina de modo
a torná-los os centros distritais mais importantes do Partido; 3º) “transferir” as
funções principais do Partido aos operários esclarecidos; 4º) organizar “seminá-
rios” de operários esclarecidos: por esses meios nossos órgãos poderão agrupar
em torno de si amplas massas.
Não se pode deixar de destacar que a própria vida indica os meios mencio-
nados acima para resolver a crise do Partido. A zona central e os Urais há muito
tempo abstêm-se dos intelectuais; aí os próprios operários dirigem as atividades
de organização. Em Sormov, em Lugasnk (bacia do Don), em Nikolaiev, os ope-
rários imprimiam em 1908 boletins, e em Nikolaiev, além dos boletins, um jornal
ilegal. E em Baku, o organismo interveio e intervém sistematicamente em tudo
quanto se refere à luta dos operários, não deixou e não deixa passar sem a sua in-
tervenção quase nenhum conflito dos operários com os industriais do petróleo,
dirigindo, compreende-se, ao mesmo tempo, uma agitação política geral. Isso
explica, entre outras coisas, por que a organização de Baku manteve até agora as
ligações com as massas.
Assim estão as coisas no que se refere aos métodos para ligar o Partido às
amplas massas operárias. Mas o Partido não sofre somente por estar desligado
das massas. Sofre também pelo desligamento existente entre os seus órgãos.
Passemos a este último problema.
∗ ∗ ∗
Como, então, ligar intimamente entre si os órgãos locais que estão desligados
uns dos outros, como reuni-los em um Partido coeso, que viva uma única vida?
Poderia se pensar que as conferências gerais do Partido, que são realizadas
de tempos a tempos, possam resolver o problema da união dos órgãos. Ou que o
Proletari, o Golos e o Sotzial-Demokrat, que se publicam no estrangeiro, consigam
afinal de contas reunir, tornar coeso o Partido. Não há dúvida de que ambas
essas formas têm não pouca importância para ligar os órgãos entre si. Até hoje,
pelo menos, as conferências e jornais editados no estrangeiro eram os únicos
meios para unir os órgãos separados. Mas, em primeiro lugar, as conferências,
que se realizam de resto muito raramente, podem reunir só temporariamente os
órgãos, e, portanto, de modo não tão sólido como seria necessário em geral: no
intervalo entre as conferências os laços se despedaçam, e, de fato, o método de
trabalho artesanal permanece como antes. Em segundo lugar, os jornais edita-
dos no estrangeiro, sem contar que chegam à Rússia em número muito limitado,
são naturalmente atrasados com relação ao curso da vida do Partido na Rússia,
não estão em condições de levantar-se e tocar oportunamente nos problemas que
agitam os operários e não podem, pois, reunir, com laços sólidos num todo único,
os nossos órgãos locais. Os fatos mostram que, desde a época do Congresso de
Londres, o Partido pôde realizar duas conferências145 e publicar no exterior de-
145 A terceira Conferência do POSDR (“segunda de toda Rússia”) de 5 a 12 de novembro de 1907.
122 Obras Escolhidas

zenas de números de jornais; contudo, a obra de unificação de nossos órgãos


em um verdadeiro Partido e de solução da crise, deu pouquíssimos passos para
a frente.
Por conseguinte, as conferências e os jornais editados no exterior – muito im-
portantes para tornar coeso o Partido – não são, todavia, suficientes para resolver
a crise, para unir solidamente os órgãos locais. É evidente que se torna necessária
uma providência radical.
E essa providência poderia ser uma só: um jornal para toda a Rússia, jornal
que esteja no centro do trabalho do Partido e seja editado na Rússia. É possível
unir os órgãos esparsos pela Rússia unicamente na base de um trabalho comum
do Partido. E um trabalho em comum não é possível se a experiência dos ór-
gãos locais não for canalizada para um único centro geral, de onde a experiência
generalizada do Partido se difunda por todos os órgãos locais. Um jornal para
toda a Rússia poderia ser justamente esse centro, um centro que dirija o trabalho
do Partido, unifique-o e oriente-o. Mas, para que esse jornal possa verdadeira-
mente dirigir o trabalho é necessário que das várias localidades afluam sistema-
ticamente pedidos de informações, declarações, cartas, correspondências, recla-
mações, protestos, planos de trabalho, problemas que agitam as massas, etc.; que
entre o jornal e as várias localidades existam os laços mais estreitos, as ligações
mais sólidas; que o jornal, dispondo assim de quantidade suficiente de material,
possa oportunamente levantar, abordar e ilustrar, quando isso for necessário, de-
terminados problemas, extrair dos materiais as indicações e as palavras de ordem
indispensáveis e fazê-las tornarem-se patrimônio de todo o Partido, de todos seus
órgãos...
Sem essas condições, não se pode dirigir o trabalho do Partido; e se não se
dirige o trabalho, não pode existir um laço que funda os órgãos em um todo
único! Eis por que destacamos a necessidade justamente de um jornal para toda
a Rússia (e não editado no exterior) e justamente de um jornal dirigente (e não
simplesmente popular).
Não é necessário dizer que o único organismo que possa encarregar-se da
organização e da direção de tal jornal é o Comitê Central do Partido. A tarefa
de dirigir o trabalho do Partido é, de resto, dever do Comitê Central. Mas no
momento atual esse dever é mal executado, e como resultado temos o isolamento
quase completo dos órgãos locais. Ao passo que um jornal para toda a Rússia,
com uma boa localização, poderia ser, nas mãos do CC, o instrumento mais eficaz
para uma união efetiva do Partido e para a direção do trabalho partidário. E não
é tudo. Afirmamos que somente por esse meio o CC pode transformar-se de
centro fictício em centro efetivo, em um centro de todo o Partido, que torne de
fato o Partido coeso e dê, de fato, o tom ao trabalho partidário. Por essas razões
a organização e a direção de um jornal para toda a Rússia constituem a tarefa
imediata do Comitê Central.
Um jornal para toda a Rússia, como órgão que uma e consolide o Partido em
torno do Comitê Central: esta é pois a tarefa, este é o meio para resolver a crise
que o Partido está atravessando.

∗ ∗ ∗
J. V. Stalin 123

Em resumo de tudo quanto foi dito. Em consequência da crise da revolução,


também no Partido sobreveio uma crise: os órgãos perderam os sólidos laços que
os prendiam às massas, o Partido fracionou-se em órgãos isolados.
É necessário ligar nossos órgãos às amplas massas. Essa é uma tarefa local. É
necessário ligar entre si os órgãos citados acima, reuni-los em torno do Comitê
Central do Partido. Essa é uma tarefa do centro. Para executar a tarefa local é ne-
cessária, paralelamente à agitação política em geral, uma agitação econômica no
terreno das necessidades cotidianas mais agudas, são necessárias uma interven-
ção sistemática na luta dos operários, a criação e o reforço dos comitês do Partido
de fábrica e de oficina, a centralização nas mãos dos operários esclarecidos do
maior número possível das funções partidárias, a organização de “seminários”
dos operários esclarecidos para formar dirigentes operários firmes e armados de
conhecimentos.
Para executar a tarefa do centro, é necessário um jornal para toda a Rússia,
que ligue os órgãos locais ao CC do Partido e os una num todo único. Somente
ao executar essas tarefas o Partido poderá sair da crise são e renovado, somente
se tais condições se tornarem realidade, o Partido poderá tomar para si a alta
função de digna vanguarda do heroico proletariado russo. Esses são os meios
para resolver a crise do Partido.
Não é necessário dizer que quanto mais plenamente o Partido utilizar as possi-
bilidades legais que tem sob suas mãos – desde a tribuna da Duma até aos sindica-
tos, às cooperativas, às caixas para despesas de funerais – tanto mais rapidamente
será executada a tarefa de renovar e sanar o Partido Operário Social-Democrata
da Rússia.
Bakinski Proletari (O Proletário de Baku) nº 6 e 7.
1º e 27 de agosto de 1909
124 Obras Escolhidas

Resoluções aprovadas pelo Comitê


de Baku
Para a próxima Conferência Geral do Partido

A agitação política e o efetivo agrupamento do


Partido
O abatimento e o torpor, em que haviam caído durante algum tempo as forças
motrizes da Revolução Russa, começam a desaparecer.
O fracasso da política do poder tsarista nos Balcãs, na Pérsia, no Extremo Ori-
ente; os ridículos esforços do governo para acalmar os camponeses mediante a lei
de 9 de novembro146 , que tira a terra dos pobres e enriquece os ricos; a absoluta
inaceitabilidade da “política operária” do governo, que priva os operários das
liberdades elementares e sacrifica-os aos piratas do capital; as crescentes obriga-
ções contraídas pelo Tesouro e a venda parcial da Rússia ao capital estrangeiro; o
arruinamento completo da máquina administrativa, que manifesta-se na rapina
dos diretores dos magnatas das estradas de ferro, no suborno dos investigadores
policiais, nas chantagens da Okhranka, etc.; tudo isto, tornando evidente para as
massas que a contrarrevolução é incapaz de triunfar sobre as forças adormecidas
da revolução, contribui para a recuperação que se nota entre os operários nestes
últimos meses, desperta neles o interesse pela vida política do país, faz nascer as
perguntas: que fazer, aonde ir, etc.?
Diante do Partido surge o problema urgente da necessidade de ampla agita-
ção política do partido. A tentativa, pois, dos contrarrevolucionários liberalóides,
que gozam de liberdade de imprensa, no sentido de domesticar as massas me-
diante “congressos” e “sociedades” legais e de minar a influência de que gozam
os social-democratas entre essas massas, transforma a questão da necessidade de
uma agitação política de partido em uma questão de vida ou morte para o pró-
prio Partido.
Por outro lado, a separação que existe entre nossos órgãos e a falta de um
centro prático (dirigente), que funcione regularmente na Rússia e una de fato
os órgãos locais em um único partido, excluem a possibilidade de promover efe-
tivamente uma agitação política de partido (e não de grupo, artesã), colocam o
Partido na impossibilidade de opor algo de sério à sistemática difamação dos
“liberais”, diminuem-lhe o prestígio aos olhos dos operários.
Nem falamos sequer do fato de que tal estado de coisas, ao invés de levar à uti-
lização das “possibilidades legais”, pode fazer com que as “possibilidades legais”
venham efetivamente a utilizar os dispersos, e, por isto, débeis órgãos ilegais, em
detrimento, naturalmente, dos interesses da social-democracia. Por todas estas
considerações, o Comitê de Baku julga que a elaboração das medidas no sentido
146Trata-se da lei agrária promulgada pelo ministro tsarista Stolipin a 9 de novembro de 1906 (vide
História do Partido Comunista (bolchevique) da URSS).
J. V. Stalin 125

de tornar efetivamente sólido o Partido, como também, por conseguinte, no sen-


tido de promover agitação político-partidário, é um problema atual e inadiável.
O Comitê de Baku julga que, entre as medidas necessárias, devem ocupar o pri-
meiro lugar as seguintes: 1) transferência para a Rússia, do centro para o trabalho
prático (dirigente); 2) organização de um jornal para toda a Rússia, intimamente
ligado aos órgãos locais, editado na Rússia e redigido pelo centro prático acima
citado; 3) organização de órgãos de imprensa locais nos principais centros do
movimento operário (Urais, bacia do Don, Petersburgo, Moscou, Baku, etc.).
O Comitê de Baku está firmemente convencido de que a aplicação das medi-
das acima poderia agrupar, dentro do Partido Social-democrata, todos os elemen-
tos verdadeiramente de partido, sem distinções de fração, criaria a possibilidade
de uma ampla agitação política e facilitaria substancialmente uma ampla utiliza-
ção das “possibilidades legais”, dirigida no sentido da ampliação e do reforço do
nosso Partido. O Comitê de Baku propõe ao Comitê Central que, portanto, con-
voque imediatamente uma conferência do Partido, à qual deverão ser submetidos
os problemas indicados acima.

A representação na próxima conferência geral do


Partido
O Comitê de Baku, após haver examinado o plano organizado (Proletários, A
tarefa imediata, nº 50) para a convocação da conferência geral do Partido, julga
que nela devem tomar parte (além da representação estabelecida) representantes
de órgãos ilegais que funcionam e realmente existem, e que, ademais, a atenção
maior deve ser dispensada aos grandes centros, onde estão concentradas enormes
massas proletárias.
É inútil fundamentar a necessidade de tal gênero de representação (vide re-
solução especial sobre a ordem do dia da conferência). Embora reconhecendo
a necessidade de ampliar a composição da conferência, o Comitê de Baku é,
todavia, resolutamente contrário a uma especial representação dos grupos que
operam nos “órgãos” legais.
Julga que uma representação especial desses grupos não traz nada de subs-
tancial aos trabalhos, seja no caso de o grupo fazer parte do organismo local
do Partido e se submeter a sua direção, seja no caso de que o grupo se julga
social-democrata, mas não reconhece de fato a direção do organismo local. No
primeiro caso, a representação do organismo do Partido elimina a necessidade
de qualquer outra representação especial. No segundo caso, a representação es-
pecial está em contradição com o próprio caráter da conferência, a qual deve ser
absolutamente partidária.
126 Obras Escolhidas

Pelo Partido!
março de 1912

Desperta novamente no país o interesse pela vida política e, com este des-
pertar, a crise do nosso Partido chega ao fim. O Partido está por superar o
ponto morto, para sair do torpor. A recente Conferência Geral147 foi um indício
manifesto do renascimento do Partido. O Partido, reforçado com o desenvolvi-
mento da revolução russa e esmagado com a sua queda, devia inevitavelmente
recuperar-se com o despertar político do país. A ascensão nos ramos principais
da indústria e o aumento dos lucros dos capitalistas, paralelamente à queda do
salário real dos operários; o livre desenvolvimento das organizações econômicas
e políticas da burguesia, paralelamente à supressão violenta dos órgãos legais e
ilegais do proletariado; a alta dos preços dos gêneros de primeira necessidade e
o aumento dos lucros dos grande latifundiários, paralelamente à ruína da eco-
nomia camponesa; a penúria que se estendeu a uma nova população de mais
de 25 milhões de pessoas, demonstrando a importância do “renovado” regime
contrarrevolucionário: tudo isto não podia deixar de repercutir nas camadas tra-
balhadoras, principalmente, na proletária, despertando nestas o interesse pela
vida política. A conferência do Partido Operário Social-Democrata da Rússia,
realizada em janeiro deste ano, é uma das provas evidentes desse despertar.
Mas o despertar dos intelectuais e dos corações não pode esgotar-se em si
mesmo, nas atuais condições, deve levar infalivelmente a uma ação aberta de
massas. É necessário melhorar o nível de vida dos operários, é preciso elevar
seus salários, diminuir a jornada de trabalho, é preciso mudar radicalmente a
situação dos operários nas oficinas, nas fábricas, nas minas. Porém, como fazer
tudo isso, senão mediante ações econômicas parciais e gerais, ainda proibidas?
É preciso conquistar o direito de lutar livremente contra os patrões, o direito
de greve, de associação, de reunião, de palavra, de imprensa, etc. Sem isto, a luta
dos operários para melhorar seu padrão de vida será dificultada extremamente.
Contudo, como fazer tudo isso, senão mediante ações econômicas parciais e ge-
rais, ainda proibidas?
É preciso curar o país, doente de fome crônica, é preciso por fim ao atual
estado de coisas, no qual dezenas de milhões de trabalhadores da terra são obri-
gados a ver-se periodicamente golpeados pela penúria, com todos seus horrores;
é insensato ficar olhando sem fazer nada os pais e as mães famintos que, com
lágrimas nos olhos, “vendem por preço irrisório” seus filhos e suas filhas! É
preciso destruir pela raiz a rapace política financeira atual, que arruína a pobre
economia camponesa e, em cada ano mau, joga inevitavelmente milhões de cam-
poneses nos braços da penúria devastadora! É preciso salvar o país da miséria
e da desmoralização! Mas pode-se, talvez, fazê-lo sem derrubar de alto a baixo
todo o edifício do tsarismo? E como derrubar o governo tsarista, com todas suas
sobrevivências feudais, senão por meio de um amplo movimento revolucionário
147 Trata-se da Conferência de Praga (vide História do PCUS (B) da URSS).
J. V. Stalin 127

popular, sob a direção, que a história reconhece, do proletariado socialista?


Mas a fim de que as ações iminentes não sejam dispersivas e desordenadas,
que o proletariado possa executar com honra a alta função de coordenar e diri-
gir as futuras ações, para tudo isso, além da consciência revolucionária das am-
plas camadas populares e da consciência de classe do proletariado, é necessária
à existência de um partido proletário forte a maleável, capaz de coordenar es-
forços dos isolados órgãos locais em um único esforço comum e orientar assim o
movimento revolucionário de massas contra as principais fortalezas dos inimigos.
Tornar eficiente o partido do proletariado, o Partido Operário Social-Democrata
da Rússia: eis o que é particularmente necessário para que o proletariado possa
ir ao encontro das próximas ações revolucionárias.
A premente necessidade da solidez do Partido torna-se mais evidente com
a aproximação das eleições para a IV Duma do Estado. Porém, como tornar
eficiente o Partido?
É necessário, primeiro de tudo, reforçar seus órgãos locais. Fracionados em
pequenos e pequeníssimos grupos, por um mar de desespero e desconfiança na
causa, privados de forças intelectuais e, muitas vezes, desagregados pelos pro-
vocadores: quem não conhece este quadro pouco edificante dos nossos órgãos
locais?
Deve-se e pode-se por um parceiro nesta dispersão das nossas forças! O in-
cipiente despertar das massas operárias, por um lado, e a conferência realizada
recentemente, que é a manifestação desse despertar, por outro, tornam bem mais
fácil liquidar essa dispersão. Façamos, pois, tudo quanto estiver ao nosso alcance
para liquidar a dispersão orgânica! Que em todas as cidades e em todas as loca-
lidades industriais se unam todos os operários social-democratas, sem distinções
de fração; se unam todos aqueles que acreditam na necessidade da existência
do Partido Operário Social-Democrata ilegal da Rússia, se agrupem todos os
órgãos locais do Partido! Que as máquinas, as quais reúnem os operários em
um único exército de explorados, que essas mesmas máquinas os unam em um
único partido, formado por aqueles que se batem contra a exploração e a vio-
lência! Não há, porém, necessidade de se cuidar unicamente do número dos
membros: nas atuais condições de trabalho isso pode também resultar perigoso.
Tudo está na qualidade dos camaradas; é importante que os companheiros uni-
dos nos órgãos locais tenham influência, sejam conscientes da importância da
causa a que servem e desenvolvam firmemente seu trabalho segundo a linha da
social-democracia revolucionária.
E que esses órgãos locais, formados dessa maneira, não se fechem sobre si
mesmos, intervenham assiduamente em todas as questões referentes à luta do
proletariado, das mais “pequenas” e comuns até as maiores e “incomuns”, não
deixem escapar a sua influência nem sequer um dos conflitos entre o trabalho
e o capital, nem sequer um protesto das massas operárias contra as crueldades
do governo tsarista: não se deve jamais esquecer que só por esse meio se poderá
obter o reforço e a cura dos órgãos locais. Eis porque, entre outras coisas, es-
tes devem possuir os laços mais vitais com os órgãos operários legais de massa,
com os sindicatos e com os círculos, e cooperar de todas as maneiras para seu
desenvolvimento.
128 Obras Escolhidas

E não se preocupem os operários com a dificuldade e a complexidade das


tarefas que, dada a falta de forças intelectuais, recaem totalmente sobre eles; é
preciso desembaraçar-se de uma vez por todas da modéstia inútil e do inútil te-
mor diante de um trabalho “incomum”; é preciso ter a coragem de preparar-se
para complexos trabalhos partidários! Não será um grande mal se se cometa al-
guns erros: tropeça-se uma vez ou duas, e depois se toma o hábito de caminhar
com desembaraço. Os Bebel não caem do céu, eles crescem somente de baixo,
no curso do trabalho partidário em todos os seus campos...
Mas os órgãos partidários, embora fortes e influentes, afastaram-se uns dos
outros, não constituem ainda o Partido. Para que constituam, é preciso uni-
los, soldá-los em um todo único, que viva uma só vida comum. Órgãos locais
separados, não apenas não ligados uns aos outros, mas ignorando a existência
recíproca, órgãos entregues completamente a si mesmos, que agem por sua conta
e risco e muitas vezes aplicam no trabalho duas linhas opostas: tudo isso constitui
o conhecido quadro do método artesão no Partido. Ligar intimamente entre
si os órgãos locais e estreitá-los em torno do Comitê Central do Partido: isto
precisamente significa romper com métodos artesanais e abrir caminho para a
organização de um partido proletário. Um Comitê Central influente, que crie
raízes vivas nos órgãos locais, que informe sistematicamente estes últimos e os
ligue intimamente entre si, um Comitê Central que intervenha sistematicamente
em todas as ações gerais do proletariado, um Comitê Central que disponha, para
uma ampla agitação política, de um jornal ilegal editado na Rússia: eis em que
a direção deve orientar-se a obra de renovação e de reagrupamento do Partido.
Não é necessário dizer que o Comitê Central por si, só não está em condi-
ções de executar essa tarefa difícil; os camaradas dos órgãos locais não devem
esquecer-se de que sem seu apoio sistemático das diversas localidades, o Comitê
Central se transformará inevitavelmente em algo inútil e o Partido em uma fic-
ção. Portanto, trabalho harmônico do centro e dos órgãos locais: eis a condição
necessária para renovar o Partido, eis o convite que dirigimos aos camaradas.
Então, camaradas, pelo Partido, pelo ilegal e ressurgido Partido Operário
Social-Democrata da Rússia!
Viva o Partido Operário Social-Democrata Unido da Rússia!
Comitê Central do POSDR.
Março de 1912
J. V. Stalin 129

Os extravagantes apartidários
15 de abril de 1912

O progressismo apartidário virou moda. Nada se pode fazer, tal é a natureza


do intelectual russo: tem necessidade de uma moda. Sentiu-se atraído pelo sa-
nismo148 , ocupou-se com decadentismo; hoje chegou a vez do apartidarismo. O
que é apartidarismo?
Na Rússia existem latifundiários e camponeses, cujos interesses são opostos;
a luta entre eles é um fenômeno inevitável. Mas o apartidarismo transcura esse
fato, propende a silenciar sobre o antagonismo de interesses. Na Rússia existem
burgueses e proletários; a vitória de uma dessas duas classes significa a derrota
da outra. Mas o apartidarismo dissimula a oposição dos interesses, fecha os olhos
diante da luta de classes.
Toda classe tem seu partido com um programa particular e uma fisionomia
particular. Os partidos dirigem a luta de classes: sem os partidos não haveria
luta, apenas, caos, falta de clareza, mistura dos interesses. Mas, o apartidarismo
não ama a clareza e a precisão, prefere a nebulosidade e ausência de programa.
A dissimulação das contradições de classe, o silêncio sobre a luta de classes, a au-
sência da fisionomia, a luta contra os programas, a tendência ao caos e a mistura
dos interesses: tal é o apartidarismo. A que visa o apartidarismo? A união do
que não se pode unir, a realização do irrealizável.
Unir em uma aliança burgueses e proletários, lançar uma ponte entre lati-
fundiários e camponeses, por em movimento um cargueiro com o auxílio de um
cisne, de uma lagosta e de um lúcio: eis a que tende o apartidarismo. O aparti-
darismo sente que é importante unir o que não se pode unir, e por isso suspira:
“Ah! se... se... se... cogumelos na minha boca brotassem!”
Mas os cogumelos não brotam na boca, e todas as vezes o apartidarismo fica
com um punhado de moscas, de boca aberta. Um homem sem cabeça ou, mais
precisamente, com um nabo sobre os ombros no lugar da cabeça: eis o aparti-
darismo. Justamente é essa a posição da revista progressista Zaproci Jizni149 . “Os
partidos tomam sua decisão – diz esta revista – e unem-se em uma só massa reaci-
onária para lutar contra toda oposição progressista... Ao bloco das direitas deve,
portanto, ser contraposto o bloco das esquerdas” (vide Zaproci Jizni, nº 6). Mas,
quem são esses “elementos progressistas”?
São os renovadores pacíficos150 , os cadetes, os “progressistas”, latifundiários
e liberalóides, os camponeses que têm fome das terras dos grandes proprietá-
rios, os proletários que lutam contra os burgueses. E a Zaproci Jizni esforçam-se
para obter a união desses “elementos”! Muito original e... pouco inteligente,
148 Do nome de Sánin, personagem amoral, protagonista do romance homônimo de Artsibachev
(N.T.)
149 Zaproci Jizni (Exigências da Vida), revista de tendências variadas publicada em Petersburgo nos

anos 1909-1912.
150 Membros de um partido de grande burguesia industrial e comercial e dos latifundiários, fundado

em 1906, que Lenin chamava “o partido da rapina pacífica”.


130 Obras Escolhidas

não é verdade? E este periódico de homens sem princípios prepara-se para dar
lições aos social-democratas sobre tática a seguir nas eleições para a IV Duma?
Extravagantes!
K. St.
Zviezda (A Estrela), jornal de Petersburgo, nº 30.
15 de abril de 1912
J. V. Stalin 131

Os hipócritas liberais
15 de abril de 1912

O Rech “enganou-se” mais uma vez! Ao que parece, “não esperava” do “go-
verno” explicações “destituídas de tato” sobre o massacre do Lena. “Esperava”
ele, vejam só, que o ministro Makarov tivesse chamado “para responder em tri-
bunal” o senhor Trechtchenko. E de repente, eis a declaração de Makarov, a qual
afirma que Trechtchenko tem razão, e que continuará a atirar sobre os operários!
“Enganamo-nos”, observa com fingido pesar o liberal Rech a esse respeito
(vide Rech, 12 de abril). Pobres cadetes, quantas vezes “se enganam” em seus
cálculos sobre o governo! Ainda há pouco tempo, eles “pensavam” que na Rús-
sia existisse uma Constituição e juravam em todas as línguas, perante a Europa,
que nosso “governo unificado” é “plenamente constitucional”. Isto acontecia
em Londres, longe da Rússia. Mas, bastou voltarem à pátria, ao país dos “ar-
bítrios” e das “repressões”, para reconhecerem seu “erro” e “permanecem ilu-
didos”. Ainda há pouco tempo, “acreditavam” que Stolypin conseguiria levar o
país pelo caminho da “renovação” parlamentar. Mas bastou que Stolypin surgisse
com o seu famoso artigo 87151 , para que os cadetes dessem mais uma vez o sinal
de partida para o refrão dos “erros” e dos “mal-entendidos”.
Será que já se passou muito tempo desde quando os cadetes estabeleciam um
paralelo entre o governo russo (lembrem-se da greve dos portuários) e o inglês,
acerca de sua atitude com relação as greves? Mas bastou o drama do Lena para
que os cadetes repetissem mais uma vez o seu farisaico refrão: “enganamo-nos”.
E é significativo: aumentam os “erros” as “ilusões”, mas a tática cadete de namo-
rar com o governo não muda!
Pobres cadetes! É evidente que “contam” com leitores ingênuos que acredi-
tam na sua sinceridade. Eles “pensam” que a população não nota as suas mesuras
servis diante dos inimigos da libertação da Rússia. Eles não sabem, ainda, que,
se até agora frequentes vezes “enganaram-se” em suas opiniões sobre o governo,
agora estarão “iludidos” com as massas da população, que por fim compreende-
rão o seu caráter contrarrevolucionário e virar-lhes as costas. Quem enganará
então os senhores cadetes? Servilismo diante do governo, farisaísmo diante do
país: por que então são chamados “partido da liberdade do povo”?
S.
Zviezda (A Estrela), jornal de Petersburgo, nº 30.
15 de abril de 1912

151 O Art. 87 da Lei fundamental do Estado atribuía ao governo a faculdade de apresentar, durante
as férias da Duma, projetos de lei diretamente ao Tsar a fim de que os sancionasse. Valendo-se dessa
faculdade, o ministro Stolipin promulgou, sem apresentá-las à Duma, várias leis, particularmente em
matéria agrária.
132 Obras Escolhidas

A vontade dos delegados


19 de outubro de 1912

Os resultados das eleições para a cúria operária já são claros152 . Dos seis
eleitores diretos, três são liquidacionistas e três apoiam o Pravda. Qual deles de-
signar como deputado? Quem, precisamente, seria necessário designar? Deu
alguma indicação a esse respeito a assembleia dos delegados? Os liquidacionis-
tas conseguiram eleger seus partidários ocultando dos delegados suas opiniões,
velaram as divergências jogando na “unidade”. Os delegados sem partido que
acreditaram neles sem outro argumento e que não gostam das divergências, os
apoiaram. Mas, embora os liquidacionistas tenham se esforçado para virar as
águas, sobre uma coisa a vontade dos delegados exprimiu-se igualmente: a ques-
tão do mandato. A assembleia dos delegados aprovou por maioria um mandato
circunstanciado ao deputado, o mandato dos que apoiam o Pravda.
No seu relatório sobre as eleições, o Lutch153 não fala nisso, porém não con-
segue ocultar a verdade, conhecida de todos os delegados.
O mandato é a diretiva dada ao deputado. O mandato faz o deputado. Tal
mandato, tal deputado. Que diz, portanto, o mandato apresentado pelas gran-
des oficinas de Petersburgo e aprovado na assembleia dos delegados? Fala dos
problemas de 1905, do fato de ficarem sem solução e que a situação econômica
e política do país torna inevitável sua solução. Segundo o mandato, a liberta-
ção do país pode ser obtida com a luta em duas frentes: contra as sobrevivências
burocrático-feudais e contra a burguesia liberal traidora. Ademais, somente as
massas camponesas podem ser seguras aliadas dos operários. Mas a luta pode ser
vitoriosa unicamente sob a condição de que o proletariado nela exerça a função
de hegemonia dirigente. Quanto mais os operários estiverem conscientes e orga-
nizados, melhor desempenharão as funções dirigentes. E uma vez que a tribuna
da Duma é um dos melhores meios para organizar e educar as massas, os ope-
rários mandam precisamente seu deputado à Duma para que ele e toda a fração
social-democrata na IV Duma se batam pelos objetivos fundamentais do proleta-
riado, pelas reivindicações, integrais e não truncadas, do país. Tal é o conteúdo
do mandato.
152 As eleições dos eleitores diretos pela cúria operária do governo de Petersburgo ocorreram pela
primeira vez no Congresso dos delegados realizado em 5 de outubro de 1912. Apesar dos operários
de 21 de grandes empresas ter sido privados do direito de voto, dentre os seis eleitores diretos,
eleitos pelo congresso, quatro eram bolcheviques. A pressão exercida pelas massas operárias obrigou
a ser reintegrados em seus direitos os operários das empresas “interpretadas”. Em 14 de outubro,
realizaram-se nessas empresas novas eleições e em 17 de outubro ocorreu o segundo congresso, onde
se procedeu, pela segunda vez, à eleição dos eleitores diretos. Cinco candidatos tiveram maioria
absoluta, dois bolcheviques e três mencheviques. No dia seguinte, fez-se uma eleição complementar
na qual foi eleito um bolchevique. As fases da luta eleitoral são minuciosamente descritas por Stalin
no artigo “As eleições em Petersburgo”.
153 Lutch (O Raio), diário legal dos Mencheviques liquidacionistas que se publicou em Petersburgo,

Diário legal dos mencheviques liquidacionistas que se publicou em Petersburgo de setembro de 1912
a julho de 1913. Pelas colunas do Lutch os liquidacionistas declaravam-se nitidamente contrários ao
partido ilegal. O jornal devia sua existência aos financiamentos da burguesia.
J. V. Stalin 133

Não é difícil compreender que esse mandato difere da “plataforma” dos li-
quidacionistas; que ele é antiliquidacionista. Surge uma pergunta: se os liquida-
cionistas ousarem apresentar igualmente o seu candidato, o que será do mandato
que o deputado é obrigado a cumprir, dado que, a este respeito, há uma decisão
precisa do congresso dos delegados?
Um mandato antiliquidacionista apoiado por um liquidacionista: vão se ex-
por a tal vergonha os nossos liquidacionistas? Sentem que jogando na “unidade”
lançaram-se um beco sem saída? Ou talvez tencionem transgredir o mandato,
atirá-lo a um canto? Porém, que farão da vontade dos delegados, em defesa da
qual se levantarão operários de Petersburgo? Ousarão os liquidacionistas tri-
pudiar a vontade expressa dos delegados? Falam eles ainda em vitória, mas o
mandato lhes lançou uma derrota mortal, pois só o deputado pode ser um anti-
liquidacionista.
K. St.
Pravda (A Verdade), nº 147.
19 de outubro de 1912
134 Obras Escolhidas

A todos os trabalhadores e
trabalhadoras da Rússia
Camaradas! Mais uma vez celebramos o 9 de janeiro, dia marcado com o san-
gue dos nossos irmãos operários, daqueles que, em 9 de janeiro de 1905, foram
golpeados pelas balas de Nicolau Romanov, por serem culpados de se haverem
dirigido a ele, pacíficos e inermes, para implorar por uma vida melhor. Desde
então transcorreram oito anos. Oito longos anos, durante os quais, exceto o breve
momento em que lampejou a liberdade, foi o país sempre atazanado e torturado
pelo Tsar e pela nobreza fundiária!
Sim, hoje ainda, como antes, na Rússia se atira contra os operários, por causa
de uma greve pacífica, como se fez no Lena. E hoje, como antes, reduzem-se mi-
lhões e milhões de camponeses à fome, como aconteceu em 1911. E hoje, como
antes, nas prisões tsaristas tornaram-se a escarnecem-se os melhores filhos do
povo, impelidos aos suicídios em massa, como aconteceu recentemente em Ku-
tomar, em Algatchi154 , etc. E hoje, como antes, o tribunal tsarista manda fuzilar
os camponeses e a liberdade para todo o povo, como se fez recentemente com os
dezessete marinheiros da frota do Mar Negro155 , Nicolau Romanov, autocrata de
toda a Rússia por graça da nobreza fundiária, exerce seu poder, conferido a ele
“por Deus” e abençoado pelos delinquentes de batina do sínodo e das Centenas
Negras, os Purichkevitch e os Khvostov.
Como antes, a monarquia dos Romanov, que se prepara este ano para feste-
jar o 300º aniversário do seu sanguinário domínio sobre o nosso país, sufoca a
Rússia no seu torniquete. Mas, a Rússia não é mais aquela Rússia aviltada e com-
placente que agonizou muda por longos anos sob o jugo dos Romanov. E não
o é assim, tampouco, nossa classe operária, a qual marcha à frente de todos os
combatentes pela liberdade. E nós celebramos o 9 de janeiro de 1913, não como
escravos curvados, humilhados, mas de cabeça erguida, como um exército coeso
de combatente que sentem, sabem que a Rússia popular mais uma vez desperta,
que o gelo da contrarrevolução está despedaçado, que o rio espraiado do movi-
mento popular de novo moveu-se, que “atrás de nós marcham fileiras de novos
recrutas”.
Oito anos! Quantos acontecimentos vividos em tão breve tempo! Neste pe-
ríodo vimos três Dumas de Estado. As duas primeiras, com maioria de liberais,
mas ecoando com as vozes potentes dos operários e dos camponeses, foram dissol-

154 Em agosto-outubro de 1912, os presos políticos das penitenciárias de Kutomar e de Algatchi


(local de trabalhos forçados de Nertechinsk, na Transbaikalia), para protestar contra as violências da
administração das prisões, fizeram em massa a greve de fome; houve também quem se matasse. Esses
acontecimentos suscitaram greves de protesto dos operários e comícios de estudantes em Petersburgo,
Moscou e Varsóvia.
155 Em outubro de 1912, foram processados pelo tribunal da Marinha de guerra de Sebastopol 142

marinheiros acusados de haver preparado uma insurreição na frota do Mar Negro. 17 acusados foram
condenados à morte, 106 aos trabalhos forçados e 19 foram absolvidos. Em resposta à condenação,
em Moscou, Petersburgo, Kharkov, Nikolaiev, Riga e outras cidades da Rússia efetuaram-se greves de
massas e demonstrações de protesto.
J. V. Stalin 135

vidas pelo Tsar que executava a vontade dos latifundiários das Centenas Negras.
A III Duma era também dominada pelas Centenas Negras e durante anos tra-
balhou junto com a camarilha do Tsar para subjugar e oprimir ainda mais os
camponeses, os operários, toda a Rússia popular.
Nos anos da negra contrarrevolução, a classe operária teve que beber até no
fundo o amaríssimo cálice. Desde 1907, ano em que as forças da velha ordem
conseguiram esmagar temporariamente o movimento revolucionário das mas-
sas, os operários agonizam sob um duplo jugo. O bando tsarista exerce sua
vingança sobre eles mais do que sobre os outros. Os fabricantes e os industri-
ais, aproveitando-se da reação política, tiram pouco a pouco tudo quanto estes
haviam conquistado com tanta fadiga, com tantos sacrifícios. Por meio dos loc-
kouts, protegidos pelos policiais e gendarmes, os patrões prolongam a jornada
de trabalho, reduzem os salários, põem em vigor a velha ordem nas fábricas e
nas oficinas.
Os operários calam-se, cerrando os dentes. Sobretudo nos anos de 1908 e
1909, as Centenas Negras abandonam-se à euforia do triunfo e o movimento
operário alcança o ponto mais baixo. Contudo, já no verão de 1910, recomeçam
as greves operárias, sendo que em fins de 1911 dezenas de milhares de operários
protestam ativamente porque os deputados social-democratas à II Duma, conde-
nados em consequência de uma provocação, estão ainda nos trabalhos forçados.
O movimento de massas dos operários foi concluído com a greve de 22 de no-
vembro de 1907 contra a condenação a trabalhos forçados dos deputados social-
democratas à II Duma. E o movimento de massa dos operários ressurge no final
de 1911, novamente ligado à sorte destes deputados, combatentes de vanguarda,
heróis da classe operária, cuja obra é agora continuada pelos deputados operários
à IV Duma.
A ascensão da luta política traz consigo a ascensão da luta econômica dos
operários. A greve política alimenta a greve econômica e vice-versa. Uma onda
segue a outra; o movimento operário, como torrente impetuosa, irrompe contra
cidadela do tsarismo e contra o poder absoluto do capital. Sempre novas cama-
das de operários despertam para uma nova vida. Massas cada vez mais amplas
participam da nova luta. Das greves pela fuzilaria do Lena, das do 1º de Maio, do
protesto contra a tentativa de privar os operários dos direitos eleitorais, contra
o fuzilamento dos marinheiros do mar negro, participam cerca de um milhão
de pessoas. Eram greves revolucionárias, greves que haviam escrito sobre sua
bandeira: “abaixo a monarquia dos Romanov, abaixo todo o regime dos latifun-
diários nobres, o velho putrefato regime que sufoca a Rússia”.
O movimento revolucionário dos operários se estendeu e desenvolveu. A
classe operária começa a despertar, para a nova luta, também outras camadas da
população. Tudo quanto há de honesto, tudo quanto tende com todo o ânimo
a uma vida melhor, começa a protestar contra as violências de matilha tsarista.
Até a burguesia murmura: também está descontente com o domínio absoluto e
indiviso dos Purichkevitch.
O regime de 3 de julho não pacificou nada e ninguém. Todos os anos da
contrarrevolução mostraram que não pode existir uma vida livre na Rússia en-
quanto a monarquia dos Romanov permanecer intacta, intangível o domínio dos
136 Obras Escolhidas

grandes latifundiários. Uma nova revolução está em ascensão, uma revolução na


qual a classe operária terá novamente alta função de direção de todo o exército
de libertação. Na bandeira da classe operária estão escritas, como antes, as três
reivindicações, pelas quais houve tantos mártires, na qual sangue foi derramado:
Jornada de Trabalho de Oito horas para operários! Todas as terras dos grandes
latifundiários, do Tsar e dos mosteiros, sem indenização, para os camponeses!
República democrática para todo o povo!
Em torno destas reivindicações foi dirigida e se dirige a luta na Rússia con-
temporânea. Estas reivindicações foram apresentadas pelos operários nos dias
das recentes greves do Lena. A classe operária as apresentava também em 9 de
janeiro.
Os operários de Petersburgo, de Riga, de Nicolaiev tentaram, a partir do 9 de
janeiro de 1912, celebrar aquele dia com greves e demonstrações. Em 9 de janeiro
de 1913, celebraremos por toda parte, em toda a Rússia. A primeira revolução
russa nasceu em 9 de janeiro de 1905, no sangue dos operários. Que o início
de 1913 seja o prólogo da segunda revolução na Rússia, A casa dos Romanov,
preparando-se para celebrar, em 1913, seu tricentésimo aniversário, demonstra
querer pesar ainda por muito tempo sobre os ombros da Rússia. Digamos, pois,
esse bando, a 9 de janeiro de 1913: “Basta! Abaixo a monarquia dos Romanov!
Viva a República Democrática!”
Camaradas, que a data de 9 de janeiro não passe inobservada em nenhum
lugar onde vive e luta o operário russo. Com reuniões, resoluções, comícios e,
onde for possível, com uma greve de 24 horas e com demonstrações. Celebremos
por toda a parte esse dia! Recordaremos nesse dia os heróis tombados na luta!
O melhor modo de honrar sua memória será fazendo ecoar nesse dia, por toda
a Rússia, nossas velhas reivindicações:
República democrática!
Confisco das terras latifundiários!
Jornada de trabalho de oito horas!
Comitê Central do Partido Operário Social-Democrata da Rússia.
J. V. Stalin 137

No caminho do nacionalismo
12 de janeiro de 1913

Dentre as resoluções que eternizam a glória da conferência dos liquidacio-


nistas, ocupa um dos primeiros lugares aquela referente à “autonomia cultural
nacional”. Vamos a ela: “ouvida a comunicação da delegação caucasiana sobre o
fato de que, seja na última conferência dos órgãos caucasianos do POSDR, seja
nos órgãos de imprensa destes órgãos, resultou que os camaradas julgam neces-
sário lançar a reivindicação da autonomia cultural nacional, a conferência, sem
entrar no mérito desta reivindicação, constata que tal interpretação do ponto do
programa do Partido que reconhece para todas as nacionalidades o direito de
autodeterminação, não está em contraste com o sentido preciso desse programa,
e exprime o indício de que a questão nacional seja inclusa na ordem do dia do
próximo congresso do POSDR”.
Esta resolução é importante não somente porque reflete as tergiversações
oportunistas dos liquidacionistas diante do levantamento de uma onda naciona-
lista. É também importante porque, nela, cada frase é uma pérola. Quanto vale,
por exemplo a declaração de que a conferência, “sem entrar no mérito dessa rei-
vindicação”, apesar disso “constata” e decide? Somente nas operetas “decide-se”
desta maneira!
Ou, a frase que diz como “tal interpretação do ponto do programa do partido,
que reconhece para todas as nacionalidades o direito de autodeterminação, não
está em contraste com o sentido preciso desse programa”. Pensem um pouco!
Um ponto do programa acima (ponto nº 9) fala da liberdade das nacionalida-
des, de seu direito de desenvolver-se livremente, da obrigação que tem o partido
de lutar contra qualquer violência exercida em detrimento delas. De modo ge-
ral, segundo o sentido deste ponto, o direito das nacionalidades não deve sofrer
limitação alguma, pode chegar tanto à autonomia ou à federação, quanto à sepa-
ração. Porém significará isto talvez que o Partido seja indiferente e igualmente
vantajoso que uma dada nacionalidade decida dos seus destinos precisamente a
favor do centralismo ou do separatismo?
Significará talvez que, unicamente com base em um direito abstrato das na-
cionalidades, “sem entrar no mérito dessa reivindicação”, se possa recomendar,
ainda que indiretamente, a umas a autonomia, a outras a federação, a outras
ainda a separação? A nacionalidade decide dos seus destinos: mas isto signifi-
cará talvez que o Partido não deve exercer uma influência sobre a vontade da
nacionalidade, a fim de que a decisão corresponda o mais possível aos interesses
do proletariado? O Partido é pela liberdade de crença, pelo direito de professar
qualquer religião. Mas, pode-se deduzir disso que o Partido seja na Polônia pelo
catolicismo, pela religião ortodoxa na Geórgia, pela gregoriana na Armênia e na
lute, ao invés, contra essas formas de concepção do mundo? E não é evidente por
si mesmo que o ponto 9 do programa do Partido e a autonomia cultural nacio-
nal são duas coisas absolutamente diversas, que podem “estar em contraste” uma
com a outra na mesma medida, digamos, em que o estão a pirâmide de Checops
138 Obras Escolhidas

e a famosa conferência dos liquidacionistas?


É justamente com esses malabarismos que a conferência “resolve” a questão.
Na citada resolução dos liquidacionistas, a coisa mais importante é a defecção
ideológica dos liquidacionistas caucasianos, que traíram no Cáucaso a velha ban-
deira do internacionalismo e conseguiram obter da conferência essa resolução.
O desvio dos liquidacionistas caucasianos no sentido do nacionalismo não é ca-
sual. Eles começaram há muito a liquidar as tradições do Partido. A supressão
da “parte social” do programa mínimo, a renúncia à “hegemonia do proletari-
ado” (Vide Diskussionni Listok, nº 2156 ), a declaração segundo a qual o Partido
ilegal seria um organismo auxiliar dos órgãos legais (vide Diskussioni Listok, nº
9157 ): todas estas coisas são conhecidas de todos. Agora chegou a vez da questão
nacional.
Desde seu aparecimento (nos primeiros anos do decênio 1890-1900), o orga-
nismo tivera no Cáucaso um caráter nitidamente internacional. Organismo único
para os operários georgianos, russos, armênios e muçulmanos, que lutavam todos
unidos e em harmonia contra seus inimigos: tal era o quadro da vida partidária.
Em 1903, no primeiro congresso constitutivo dos órgãos social-democratas cau-
casianos (mais precisamente, transcaucasianos), que fundou a União Caucásica,
tinha sido de novo proclamado, como o único justo, o princípio internacional
na edificação do organismo. A partir de então, a social-democracia do Cáucaso
crescera na luta contra o nacionalismo. Os social-democratas georgianos tinham
lutado contra “seus” nacionalistas, os nacional-democratas e os federalistas; os
social-democratas armênios contra “seus” dachnaktsakani; os muçulmanos contra
os pan-islamistas.158 E a social-democracia do Cáucaso havia estendido e refor-
çado suas organizações, independentemente das frações. Em 1906, na confe-
rência regional do Cáucaso, aflorou pela primeira vez a questão da autonomia
cultural nacional. Foi o grupo de Kutais que a formulou e pretendeu a solução
da mesma em sentido positivo. A questão foi “rejeitada ruidosamente”, como o
respeito se falou então, entre outras coisas porque contra ela intervieram, com
igual firmeza, as duas frações, nas pessoas de Kostrov e de quem escreve estas
linhas. Foi decidido que o denominado “autogoverno regional do Cáucaso” era
a melhor solução da questão nacional, a que melhor correspondia aos interesses
do próprio proletariado caucásico, unido na luta. Sim, assim era em 1906. E esta
decisão foi repetida nas conferências que se seguiram, foi sustentada e populari-
zada tanto pela imprensa caucasiana menchevique como pela bolchevique, legal
e ilegal.
Mas, como estamos em 1912, e “resultou” que “nos” é “necessária” a auto-
nomia cultural nacional, naturalmente (naturalmente!) no interesse do proleta-
riado! Do que se trata? Que mudou? Talvez que o proletariado caucasiano se

156 Vide o escrito Cartas do Cáucaso.


157 No n◦ 9 do Dniévnik Sotzial-Demokrata (Diário do Social-Democrata), Plekhanov havia criticado o
escrito do menchevique liquidacionista S. Jibladze, publicado no Golos Sotzial-Demokrata.
158 O pan-islamismo, ideologia político-religiosa reacionária, surgiu na segunda metade do século

XIX na Turquia, entre os latifundiários, a burguesia, o clero, e difundiu-se depois pelas classes abas-
tadas dos outros povos muçulmanos. O pan-islamismo desejava reunir em um todo único os povos
muçulmanos. As classes dominantes dele se serviram para tentar reforçar suas posições e sufocar o
movimento revolucionário dos povos do Oriente (N.T.)
J. V. Stalin 139

tornou menos socialista? Mas, então é mais do que nunca descabido elevar entre
operários barreiras nacionais orgânicas e “culturais”! Talvez se tornou mais soci-
alista? Mas, neste caso como chamar aqueles – falando em termos – “socialistas”
que elevam e reforçam artificialmente barreiras perigosas e perfeitamente inú-
teis? Kutais camponesa arrastou a reboque os “outubristas social-democratas”
de Tiflis. Doravante, quem decidirá os destinos da causa dos liquidacionistas do
Cáucaso será o camponês de Kutais, atemorizado com o nacionalismo militante.
Os liquidacionistas caucasianos não puderam resistir “nas ondas” do naciona-
lismo, jogando ao Marx a última riqueza: “para que serve esse vão objeto”.
Mas quem deu o primeiro passo deve também dar segundo: todas as coisas
têm sua lógica! Atrás da autonomia cultural nacional georgiana, armênia, mu-
çulmana (e russa?) dos liquidacionistas caucasianos, alinham-se os partidos dos
liquidacionistas georgianos, armênios, muçulmanos, etc. Em lugar do organismo
único vem os órgãos isolados por nacionalidade, os “Bund”, por assim dizer, ge-
orgianos, armênios, etc.
Não buscarão talvez esse objetivo os senhores liquidacionistas caucasianos,
com sua “solução” do problema nacional? Bem, podemos lhes formular votos de
que tenham coragem. Façam o que quiserem! Em todo caso, podemos assegurar-
lhes que a outra parte das organizações caucasianas, os social-democratas dos ór-
gãos partidários georgianos, russos, armênios e muçulmanos, romperá com os
senhores nacional-liquidacionistas, com estes traidores da gloriosa bandeira do
internacionalismo no Cáucaso.
K. St.
Sotzial-Demokrat, nº 30.
25 de janeiro de 1913
140 Obras Escolhidas

Os Sovietes dos Deputados


Operários e Soldados
Veloz como o relâmpago avança o carro da revolução Russa. As fileiras dos
combatentes revolucionários crescem e se alargam por toda a parte. Estreme-
cem e desmoronam os fundamentos do velho regime. Petrogrado, hoje como
sempre, marcha na vanguarda. E a imensa província a acompanha, embora às
vezes vacilando. As forças do velho regime estão em declínio, mas não foram
vencidas. Estão apenas entocadas e esperam a ocasião propícia para de novo er-
guerem a cabeça e atirarem-se contra a livre Rússia. Olhem em torno e verão
que a sombria atividade das forças retrógradas prossegue ininterrupta. . . manter
os direitos conquistados para golpear definitivamente as velhas forças e, com a
província, fazer progredir a revolução russa: essa que deve ser a tarefa imediata
do proletariado da capital.
Mas, como fazer isso? Que é indispensável para fazer isso?
Para derrubar o velho regime foi suficiente uma aliança provisória dos operá-
rios e dos soldados insurretos. De fato, não há dúvida de que a força da revolu-
ção russa está na aliança dos operários e camponeses que envergam o uniforme
militar. Mas, para conservar os direitos conquistados e para levar adiante a revo-
lução, é indubitável que não basta uma simples aliança provisória dos operários e
dos soldados. Para obter esse resultado é necessário tornar consciente e estável
essa aliança, torná-la duradoura e sólida, tão sólida que possa resistir aos golpes
provocadores da contrarrevolução. Na verdade, torna-se claro para todos que a
garantia da vitória definitiva da revolução russa está na consolidação da aliança
entre os operários e os soldados revolucionários.
Os Sovietes dos Deputados Operários e Soldados são justamente os órgãos
dessa aliança. E quanto mais coesos são esses sovietes, quanto mais sólida é a sua
organização, tanto mais efetivo é o poder revolucionário do povo revolucionário
que neles se exprime, tanto mais concretas são as garantias contra as tentativas
contrarrevolucionárias. Reforçar esses sovietes, criá-los por toda a parte, ligá-los
uns aos outros e colocar à sua frente o Soviete Central dos Deputados Operários
e Soldados, como órgão do poder revolucionário do povo: nessa direção devem
trabalhar os social-democratas revolucionários.
Operários! Cerrem fileiras de modo mais coeso e unam-se em torno do Par-
tido Operário Social-democrata da Rússia! Camponeses! Organizem-se em asso-
ciações camponesas e agrupem-se em torno do proletariado revolucionário, líder
da revolução russa! Soldados! Organizem-se em suas associações e reúnam-se em
torno do povo russo, único aliado fiel do exército revolucionário russo. Operá-
rios, camponeses, soldados! Unam-se por toda parte nos Sovietes dos Deputados
Operários e Soldados, órgãos de aliança e de poder das forças revolucionárias
da Rússia! Essa é a garantia da vitória completa sobre as forças reacionárias da
velha Rússia.
J. V. Stalin 141

Essa é a garantia de que as reivindicações essenciais do povo russo – a terra


aos camponeses, a defesa do trabalho para os operários, a república democrática
para todos os cidadãos da Rússia – serão realizadas!
K. Stalin
Pravda (A Verdade), nº 8.
142 Obras Escolhidas

As condições da vitória da
Revolução Russa
18 de março de 1917
A revolução caminha. Deflagrada em Petrogrado, estende-se pela província,
ganhando pouco a pouco toda a imensa Rússia. Não basta. A revolução passa
inevitavelmente das questões políticas às sociais, às questões que dizem respeito
à organização da vida dos operários, dos camponeses, tornando mais profunda
a crise em curso.
Tudo isso suscita alarme em determinados círculos da Rússia dos ricos. A
reação dos latifundiários e do tsarismo levanta a cabeça. A camarilha imperialista
repica os sinos. A burguesia financeira estende a mão à decrépita aristocracia
feudal para que juntas organizem a contrarrevolução. Hoje essas forças ainda
são débeis e vacilantes, mas amanhã podem reforçar-se e mobilizar-se contra a
revolução. Sem descanso, elas, de qualquer maneira, desenvolvem sua atividade
reacionária, reunindo forças em todas as camadas da população, inclusive no
exército. . .
Como esmagar a contrarrevolução no início?
Quais as condições indispensáveis para a vitória da revolução russa? Uma
das particularidades da nossa revolução está no fato de que até agora tem tido
como base Petrogrado. Os conflitos e os tiroteios, as barricadas e as vítimas, a
luta e a vitória surgiram principalmente em Petrogrado e em suas imediações
(Kronstadt, etc.). Limitou-se a província a colher frutos da vitória e a exprimir
sua confiança no governo provisório.
A dualidade do poder, a divisão do poder que de fato se operou entre o go-
verno provisório e o Soviete dos Deputados Operários e Soldados de Petrogrado,
e que não dá trégua aos mercenários da contrarrevolução, reflete esse fato. Eis
o quadro: o Soviete dos Deputados Operários e Soldados de Petrogrado, como
órgão da luta revolucionária dos operários e soldados, e o governo provisório,
como órgão da burguesia moderada, aterrorizada com os “excessos” da revolu-
ção e que encontrou um ponto de apoio na inércia da província. Aqui está o
ponto fraco da revolução, uma vez que uma situação dessas acentua a separação
entre a província e a capital, a falta de contato entre uma e outra.
Mas a revolução, à medida que se aprofunda, conquista também a província.
Organizam-se os sovietes locais de deputados operários. Os camponeses entram
para o movimento e se organizam em suas associações. O exército se democratiza
e se organizam associações locais de soldados. A inércia da província transforma-
se numa recordação do passado. Em vista disso o governo provisório sente que
o terreno lhe foge sob os pés. Ao mesmo tempo, diante da nova situação, já não
basta mais o Soviete dos Deputados Operários de Petrogrado.
Torna-se necessário um órgão para todo o país que dirija a luta revolucio-
nária de todos os democratas da Rússia, que tenha autoridade suficiente para
fundir num todo único as forças democráticas da capital e da província e para
J. V. Stalin 143

transformar-se, no momento necessário, de órgão da luta revolucionária do povo,


em órgão do poder revolucionário, que mobilize todas as forças revolucionárias,
que mobilize todas as forças vivas do povo para combater a contrarrevolução.
Somente o Soviete dos Deputados Operários, Soldados e Camponeses de Toda
a Rússia pode ser esse órgão. Essa é a primeira condição da vitória da revolução
russa. Prossigamos. A guerra, como tudo na vida, tem, além dos lados nega-
tivos, também um lado positivo. Foi este o de ter dado ao exército, através da
mobilização de quase toda a população adulta na Rússia, um espírito popular,
facilitando por isso a união dos soldados com os operários insurretos. Assim
se explica justamente a relativa facilidade com que a revolução deflagrou e saiu
vitoriosa.
Mas o exército é móvel, e não estável, sobretudo porque se transfere conti-
nuamente de um lugar para outro, de acordo com as exigências da guerra. O
exército não pode permanecer eternamente no mesmo lugar para defender a re-
volução da contrarrevolução. É necessário, portanto, uma outra força armada, o
exército dos operários armados, ligados naturalmente aos centros do movimento
revolucionário. E se é justo sustentar que uma revolução não pode vencer sem
uma força armada, sempre pronta a servi-la, nossa revolução não poderá dispen-
sar sua guarda operária, indissoluvelmente ligada à causa da revolução.
Armar imediatamente os operários, formar a guarda operária: essa é a se-
gunda condição para a vitória da revolução. Na França, por exemplo, o traço
característico dos movimentos revolucionários era constituído pelo fato incon-
testável de que os governos provisórios sempre nasciam nas barricadas, e por isso
eram revolucionários, mais revolucionários, aliás, do que as assembleias consti-
tuintes que convocavam em seguida e que normalmente se reuniam depois da
“pacificação” do país. Assim se explica exatamente por que os revolucionários
mais hábeis da época se esforçavam para realizar seus programas antes que o
governo convocasse a Assembleia-Constituinte, atrasando sua convocação. Que-
riam assim colocar a Assembleia-Constituinte em face do fato consumado das
reformas já realizadas.
Entre nós as coisas passam-se de outro modo. O governo provisório não es-
teve nas barricadas, mas ao lado das barricadas. Esse é o motivo por que não é
revolucionário e não faz senão arrastar-se a reboque da revolução, recalcitrando
e tropeçando. E a julgar pelo fato de que, à medida que se aprofunda, a revolu-
ção põe em primeiro plano os problemas sociais da jornada de trabalho de oito
horas e da confiscação de terra e faz a província participar do movimento revolu-
cionário, pode-se afirmar com segurança que a futura Assembleia-Constituinte
de todo o povo será muito mais democrática do que o atual governo, eleito pela
Duma de 3 junho.
É de temer, além disso, que o governo provisório, espantado com o desen-
volvimento que toma a revolução e imbuído de tendências imperialistas, possa
servir, numa determinada situação política, de escudo “legal” e de máscara à
contrarrevolução que se organiza. Por isso não se deve em nenhuma hipótese
protelar a convocação da Assembleia-Constituinte. Com esse objetivo é indispen-
sável convocar o mais breve possível a Assembleia-Constituinte, única instituição
representativa de todas as camadas sociais, que pode coroar a obra da revolução
144 Obras Escolhidas

e aparar as asas da contrarrevolução que levanta a cabeça.


Convocação imediata da Assembleia-Constituinte: essa é a terceira condição
para a vitória da revolução. Tudo isso se deve fazer sob a condição geral de que
as negociações de paz se iniciem o mais breve possível e de que esta guerra desu-
mana termine, pois, uma guerra prolongada, com a crise financeira, econômica
e alimentar dela proveniente, constitui o escolho que pode despedaçar a nave da
revolução.
K. Stalin
Pravda (A Verdade), nº 12.
18 de março de 1917
J. V. Stalin 145

A abolição das restrições dos


direitos das nacionalidades
25 de março de 1917

Uma das chagas que cobriram de vergonha a velha Rússia foi a da opressão
nacional.
As perseguições religiosas e nacionais, a russificação forçada dos “estrangei-
ros”, os vexames impostos às instituições culturais e nacionais, a privação dos
direitos eleitorais e da liberdade de locomoção de um lugar para outro, o inci-
tamento ao ódio recíproco entre as nacionalidades, os pogroms e os massacres:
essa é a opressão nacional de triste memória.
Que fazer para liquidar a opressão nacional? a base social da opressão naci-
onal, a força que a alimenta, é a decrépita aristocracia fundiária. Quanto mais
próxima está essa aristocracia do poder, quanto mais solidamente o tem em suas
mãos, mais forte é a opressão nacional, mais monstruosas são as suas formas.
Quando na velha Rússia a velha aristocracia fundiária feudal estava no poder, a
opressão nacional enfurecia-se com todo o seu vigor acabando muitas vezes nos
pogroms (pogroms contra judeus) e nos massacres (massacres dos tártaros e dos
armênios).
Na Inglaterra, onde a aristocracia fundiária (latifundiários) divide o poder com
a burguesia, onde já há muito tempo não existe o domínio absoluto da aristocra-
cia, a opressão nacional é menos pesada, menos desumana, se, naturalmente,
não se levar em conta que durante a guerra, quando o poder passou às mãos dos
latifundiários, a opressão nacional se acentuou consideravelmente (perseguições
aos irlandeses e hindus).
Por outro lado, na Suíça e na América do Norte, onde não existe e jamais
existiu uma aristocracia fundiária e o poder está por completo nas mãos da bur-
guesia, as nacionalidades se desenvolvem mais ou menos livremente, e, em geral,
quase não há opressão nacional.
Tudo isso se explica principalmente devido ao fato de que a aristocracia fun-
diária é (e não pode deixar de ser assim!), por sua própria posição, o adversário
mais resoluto e inconciliável de qualquer espécie de liberdade, inclusive a liber-
dade nacional, e que a liberdade em geral, e a liberdade nacional em particular,
solapam (e não podem deixar de solapar!) os próprios fundamentos do domínio
político da aristocracia fundiária.
Varrer da cena política a aristocracia feudal, arrancar-lhe das mãos o poder,
significa exatamente liquidar a opressão nacional, criar as condições reais indis-
pensáveis para instaurar a liberdade nacional. Com sua vitória a revolução russa
já criou essas condições reais, derrubando o poder feudal e ultrarreacionário e
instaurando a liberdade.
Agora é indispensável:
1º) elaborar os direitos das nacionalidades libertas da opressão;
146 Obras Escolhidas

2º) sancionar tais direitos na legislação.


Sobre esse terreno é que nasceu o decreto do governo provisório relativo à
abolição das restrições religiosas e nacionais. Premido pela revolução sem de-
senvolvimento, o governo provisório devia dar esse primeiro passo no caminho
da libertação dos povos da Rússia, e o fez.
O dispositivo do decreto limita-se, de um modo geral, a abolir as restrições
dos direitos dos cidadãos de nacionalidade não russa e de religião não ortodoxa
no concernente a: 1º) – residência, habitação e locomoção de uma localidade
para outra; 2º) – aquisição do direito de propriedade, etc.; 3º) – atividades artesãs
e comerciais de qualquer espécie; 4º) – participação nas sociedades por ações e
de outro tipo; 5º) – acesso aos empregos públicos, etc.; 6º) – acesso aos estabele-
cimentos de ensino; 7º) – uso das línguas e dos dialetos diferentes do russo na
correspondência das sociedades privadas, no ensino dos institutos de educação
particular de todo o gênero e na escrituração dos livros comerciais.
Esse é o decreto do governo provisório. Os povos da Rússia, que foram manti-
dos até agora sob vigilância, podem hoje respirar livremente e sentir-se cidadãos
da Rússia. Muito bem. Mas seria um erro imperdoável pensar que esse decreto
baste para garantir a liberdade nacional e que a libertação da opressão nacional
tenha sido finalmente levada a cabo. Antes de mais nada, o decreto não estabe-
lece a igualdade de direitos entre as nacionalidades no que se refere à língua.
O último artigo do decreto fala no direito de empregar línguas diferentes do
russo na correspondência entre as sociedades privadas, no ensino dos institutos
de educação particulares. Que fazer nas regiões onde a maioria absoluta não é de
cidadãos russos, mas de cidadãos que não falam russo (Transcaucásia, Turques-
tão, Ucrânia, Lituânia, etc.)?
Não há dúvida de que existirão (devem existir!) Parlamentos locais e, por-
tanto, também uma “correspondência” (não em absoluto “privada”!), e “ensino”
nos institutos de educação (não só nos “particulares”!), e tudo isso, naturalmente,
não só em língua russa, como também nas línguas locais. Pretende o governo
provisório declarar o russo língua oficial, privando as regiões mencionadas do direito
de empregar a língua materna, quer para a “correspondência” quer no “ensino”, nos pró-
prios órgãos e institutos que não são em absoluto “privados”? Sim, evidentemente. Mas
quem, senão ingênuos, pode acreditar que seja essa a igualdade completa de di-
reitos entre as nações, como deblateram e gritam de todos os cantos as comadres
burguesas do Rietch e do Dien159 ? Quem não compreenderá que isso significa
sancionar a desigualdade das nacionalidades no que se refere à língua?
Prossigamos. Quem deseja instaurar a igualdade efetiva de direitos entre as
nações não pode contentar-se com uma medida negativa como é a abolição das
restrições, mas deve passar da abolição das restrições a um projeto positivo que
assegure a destruição do jugo nacional. Deve-se, portanto, proclamar:
1º – a autonomia política (não a federação!) das regiões que constituem uma
unidade econômica territorial com composição étnica e costumes particulares,
com “correspondência” e “ensino” na própria língua;

159Dien (O Dia), jornal financiado pelos bancos e dirigido pelos mencheviques liquidacionistas. Ini-
ciou sua publicação em Petersburgo, em 1912, e foi suprimido por atividade contrarrevolucionária a
26 de outubro de 1917.
J. V. Stalin 147

2º – o direito de autodeterminação as nações que por qualquer motivo que


seja não podem permanecer dentro das fronteiras do Estado.
Esse é o caminho que leva à efetiva destruição da opressão nacional e assegura
às nacionalidades a máxima liberdade possível no regime capitalista.
K. Stalin
Pravda (A Verdade), nº 17.
25 de março de 1917
148 Obras Escolhidas

Terras aos camponeses!


14 de abril de 1917

Os camponeses da governadoria de Riazan declararam ao ministro Chinga-


riov que lavrarão as terras deixadas sem cultivo pelos latifundiários, mesmo que
estes não estejam de acordo. Os camponeses afirmam que a recusa dos latifun-
diários no sentido de efetuar as semeaduras leva à ruína, que o cultivo imediato
das terras improdutivas é o único meio para assegurar o pão não só à população
na retaguarda, como também ao exército no front.
Como única resposta, o ministro Chingariov (vide seu telegrama160 ) proíbe
categoricamente o cultivo não autorizado, chamando-o de “arbitrário” e propõe
aos camponeses que aguardem até a convocação da Assembleia-Constituinte: esta
decidirá tudo.
Mas uma vez que não se conhece a data da convocação da Assembleia Naci-
onal Constituinte, visto como essa convocação é adiada pelo governo provisório
de que o senhor Chigariov é membro, segue-se daí que, de fato, a terra deve
permanecer inculta, que os latifundiários fiquem com a terra, os camponeses
permanecem sem a terra, e a Rússia, os operários, os camponeses e os soldados
não têm bastante pão. Tudo isso para não ofender os latifundiários, mesmo que
a Rússia venha a ser presa da fome.
Essa é a resposta do governo provisório de que o ministro Chingariov é mem-
bro. Essa resposta não nos causa admiração. Um governo de industriais e de
latifundiários não pode agir de maneira diferente com os camponeses: que lhes
importam os camponeses, contanto que vivam e prosperem os latifundiários! Por
isso convidamos os camponeses, todos os camponeses pobres de toda a Rússia, a
tomar a nas próprias mãos sua causa e levá-la avante. Dirigimos-lhes um apelo
para que se organizem em comitês camponeses revolucionários (comunais, dis-
tritais, etc.), apoderem-se através desses comitês das terras dos latifundiários e
cultivem-nas por iniciativa própria, de maneira organizada.
Conclamamo-los a fazer isso imediatamente, sem aguardar a Assembleia-Constituinte
e sem dar importância às proibições reacionárias do ministro, que colocavam tra-
vas entre as rodas da revolução. Dizem-nos que a ocupação imediata das terras
dos latifundiários quebraria a “unidade” da revolução, desligando desta as “ca-
madas progressistas” da sociedade. Mas seria ingênuo pensar-se em poder fazer
progredir a revolução sem romper com os industriais e com os latifundiários.
Os operários, com a introdução da jornada de trabalho de oito horas, não
terão talvez “afastado” da revolução os industriais e os que estão do lado des-
tes? Quem ousará sustentar que a revolução perdeu ao melhorar a situação dos
operários, reduzindo a jornada de trabalho?
Sem dúvida, o cultivo não autorizado das terras dos latifundiários e sua ocu-
160 O texto do telegrama de Chingariov é reproduzido no artigo de Lenin: “Acordo voluntário” entre
latifundiários e camponeses? publicado na Pravda, nº 33, 15 de abril de 1917 (vide V.I. Lenin, Obras
Completas em língua russa, IV edição, vol. 24, pág. 108)
J. V. Stalin 149

pação por parte dos camponeses “afastam” da revolução os latifundiários e quem


está do seu lado. Mas quem ousará dizer que, unindo em torno da revolução mi-
lhões e milhões de camponeses pobres, enfraquecemos as forças da revolução?
Os que desejam influir no curso da revolução devem compreender de uma
vez por todas:
1º – que as forças da nossa revolução são os operários e os camponeses pobres
que a guerra obrigou a envergar o uniforme militar;
2º – que na medida em que a revolução se aprofunda e estende-se, “afastar-
se-ão” inevitavelmente dela os chamados “elementos progressistas”, progressistas
em palavras, reacionários nos fatos.
Seria uma utopia reacionária dificultar esse processo benéfico através do qual
a revolução purifica-se dos “elementos” inúteis. A política da expectativa e do adi-
amento até a Assembleia-Constituinte, a política da proibição “temporária” dos
confiscos, favorecida pelos populistas, pelos Trudoviks 161 e pelos mencheviques,
a política que consiste em manobrar com destreza entre as classes (só para não
ofender ninguém!) e em marcar passo, não é a política do proletariado revoluci-
onário.
A marcha vitoriosa da revolução russa varrerá essa política como ferro velho,
útil e vantajoso somente para os inimigos da revolução.
K. Stalin
Pravda (A verdade), nº 32.
14 de abril de 1917

161 Trudoviks (Grupo do Trabalho): grupo de democratas pequeno-burgueses, constituído em abril


de 1906 pelos deputados camponeses da I Duma de Estado. Os trudoviks reivindicavam a abolição de
todas as limitações nacionais e de camadas sociais, a democratização das administrações autônomas
locais, urbanas e rurais, o sufrágio universal para as eleições à Duma de Estado e antes de mais nada
a solução da questão agrária. Em 1917 os trudoviks fundiram-se com o partido dos social-populistas
(N.T.)
150 Obras Escolhidas

Superados Pela Revolução


4 de maio de 1917

A revolução caminha. Aprofundando-se e estendendo-se, passa de um campo


para outro, revolucionando radicalmente toda a vida econômica e social do país.
A revolução, irrompendo na indústria, estabelece o problema do controle e da
direção da produção por parte dos operários (bacia do Donetz).
A revolução, estendendo-se à agricultura, impele os camponeses a lavrar co-
letivamente as terras improdutivas e a munir-se de instrumentos de trabalho e de
animais de tração (distrito de Schlüsselburg)162 . Expondo as pragas da guerra
e o esfacelamento econômico agravado durante a guerra, a revolução irrompe
no campo da distribuição, criando, de um lado, o problema do abastecimento
alimentar da cidade (crise alimentar) e, do outro, o problema do abastecimento
do campo com produtos industriais (crise comercial).
Para resolver todos estes problemas e outros semelhantes, já chegados à ma-
turação, é necessário que as massas revolucionárias deem prova da máxima inici-
ativa, que os Sovietes dos Deputados Operários intervenham ativamente na obra
de edificação de uma nova vida, que, enfim, todo o poder passe para as mãos de
uma nova classe capaz de conduzir o país na ampla estrada da revolução.
As massas revolucionárias da província já se colocam nessa estrada. Em alguns
lugares os órgãos revolucionários já tomaram nas mãos o poder (Urais Schlüssel-
burg), pondo de lado os chamados “comitês de salvação pública”. Entremen-
tes, o Comitê Executivo do Soviete dos Deputados de Petrogrado, ao qual com-
pete a tarefa de dirigir a revolução, marca-passo, impotente, ficando para trás e
desligando-se das massas, e substitui a questão fundamental da tomada de todo o
poder pela fútil questão das “candidaturas” ao governo provisório. Ficando para
trás em relação às massas, o Comitê Executivo mantém-se, ao mesmo tempo, em
atraso relativamente à revolução e dificulta-lhe o avanço.
Temos diante de nós dois documentos do Comitê Executivo: o Memorial para
os delegados dos operários, que foram levar presentes aos soldados na frente, e
o Apelo aos soldados na frente. Pois bem, que nos dizem esses documentos? Preci-
samente que o Comitê Executivo ficou para trás, uma vez que ele, nesses docu-
mentos, dá as mais antirrevolucionárias e mais revoltantes respostas as principais
questões do momento.

162 O Comitê Popular Revolucionário do distrito de Schlüsselburg, eleito para o Congresso dos re-
presentantes das comunas e dos burgos agrícolas, para resolver a questão agrária decidiu: 1º – mandar
lavrar pelas comunidades camponesas as terras livres pertencentes às igrejas, aos conventos, à família
do tsar e aos proprietários privados; 2º – apoderar-se, mediante compensação mínima, dos animais
de tração e instrumentos agrícolas necessários, pertencentes aos grandes proprietários, etc. De con-
formidade com essa deliberação, os comitês das comunas agrícolas tomaram sob seu controle todas as
terras dos respectivos territórios, fizeram o recenseamento de todos os animais, utensílios agrícolas,
providenciaram no sentido da proteção e preservação dos bosques, organizaram o lavramento das
terras improdutivas, etc.
J. V. Stalin 151

A questão da guerra

Enquanto Comitê Executivo disputa com o governo provisório a respeito das


anexações e das indenizações, enquanto o governo provisório fabrica “notas” e
o Comitê Executivo se compraz em fazer o papel do “vencedor”, enquanto a
guerra de agressão contínua como antes, a vida das trincheiras, a verdadeira vida
dos soldados, criou um novo instrumento de luta: a confraternização em massa.
Não há dúvida de que a confraternização não é outra coisa, em si mesma, senão
uma forma espontânea de aspiração a paz. Isso não obstante, a confraternização,
posta em prática de maneira organizada e consciente, pode tornar-se um instru-
mento poderoso, nas mãos da classe operária para atear a revolução nos países
beligerantes.
Qual é a atitude de Comitê Executivo relativamente à confraternização? Ou-
çam: “Camaradas soldados! Com a confraternização não conseguirão a paz...
Aqueles que os asseguram que a confraternização é o caminho para atingir a
paz, levam à ruína a liberdade da Rússia e a vocês próprios. Não acreditem ne-
les” (vide Apelo).
Ao invés da confraternização, o Comitê Executivo propõe aos soldados que
“não se recusem a efetuar as operações ofensivas que a situação militar pode
exigir” (vide Apelo). Segundo parece, a questão é que a defensiva, “a defesa
no sentido político, não exclui em nada as ofensivas estratégicas, a ocupação de
novos territórios, etc. No interesse da defesa. . . é indispensável passar à ofensiva,
ocupar novas posições” (vide Memorial). Em suma: para obter a paz é preciso
atacar e conquistar “territórios” estrangeiros.
Assim raciocina o Comitê Executivo. Mas em que distinguem esses reacio-
nários imperialistas do Comitê Executivo da “ordem” contrarrevolucionária do
general Alexeiev, na qual a confraternização na frente é declarada “traição” e
se ordena aos soldados que “travem uma luta desapiedada contra o inimigo”?
Ou ainda mais: em que se distinguissem esses raciocínios no discurso contrar-
revolucionário com o qual Miliukov, na conferência do Palácio Mariinski, exigia
que os soldados “efetuassem operações ofensivas” e observassem a disciplina no
interesse da “unidade da frente”?. . .

A questão da terra

Todos conhecem o conflito surgido entre os camponeses e o governo provisó-


rio. Os camponeses querem cultivar as terras abandonadas pelos latifundiários,
julgando que esse passo é o único meio de se assegurar o pão não só à popula-
ção na retaguarda, como também ao exército na frente. Em resposta, o governo
provisório declarou resolutamente guerra aos camponeses, pondo fora da “lei” o
movimento agrário, e além disso enviou para o local comissários com a tarefa de
defender os interesses dos latifundiários, dos “atentados” dos camponeses “que
cometem arbitrariedades”. O governo provisório convidou os camponeses a se
absterem de confiscar a terra até à convocação da Assembleia-Constituinte: esta
decidirá tudo.
Que atitude assume o Comitê Executivo sobre esta questão? Apoia os campo-
152 Obras Escolhidas

neses ou o governo provisório? Ouçam:


A democracia revolucionária sustentará do modo mais resoluto na próxima Assembleia-Constituinte. . .
a expropriação sem indenização. . . das terras dos latifundiários. Hoje, considerando que o
confisco imediato das terras dos latifundiários poderia gerar. . . no país uma séria com como-
ção econômica. . . a democracia revolucionária previne os camponeses de qualquer solução
arbitrária da questão da terra, uma vez que as desordens agrárias serão vantajosas não para
os camponeses, mas para a contrarrevolução”, pelo que se propõe “que não se apossem ar-
bitrariamente dos bens dos latifundiários até as decisões da Assembleia-Constituinte” (vide
Memorial).

Estas são as declarações do Comitê Executivo.


Evidentemente o Comitê não apoia os camponeses, mas o governo provisório.
Não será talvez evidente que o Comitê Executivo, assumindo essa posição acabou
aceitando a palavra de ordem contrarrevolucionária de Chingariov: “Reprimir
os camponeses!”.
De um modo geral, desde quando os movimentos agrários se tornaram “de-
sordens agrárias”, e é inadmissível “a solução arbitrária” das questões? Que são
os sovietes, inclusive, o Soviete de Petrogrado, senão um organismo surgido “ar-
bitrariamente”? Talvez pense o Comitê Executivo que passou o tempo dos órgãos
e das decisões “arbitrários”?
O Comitê Executivo agita o espantalho da “crise alimentar” como consequên-
cia do cultivo arbitrário das terras dos latifundiários. Mas, eis que o Comitê re-
volucionário distrital de Schlüsselberg, surgido “arbitrariamente”, decidiu, com
o objetivo de melhorar o abastecimento da população, que, para obter maior
quantidade de produtos cerealíferos, cuja falta se faz sentir grandemente, as co-
munidades camponesas devem cultivar as terras improdutivas pertencentes às
igrejas, aos mosteiros, as que já constituem apanágio e as dos proprietários pro-
vados. “Que tem para dizer o Comitê Executivo contra essa decisão arbitrária?”
Que pode contrapor a esta sábia decisão senão expressões vazias sobre as “arbi-
trariedades”, sobre as “desordens agrárias”, sobre as “soluções arbitrárias”, etc.,
tomadas por empréstimo aos decretos do senhor Chingariov?
Não será talvez evidente que o Comitê Executivo ficou para trás em relação ao
movimento revolucionário da província e, tendo permanecido para trás, assumiu
uma posição em contraste com o próprio movimento?. . . Assim, um quadro novo
abre-se diante de nós. A revolução desenvolve-se em amplitude e profundidade,
abarca novos campos, penetrando na indústria na agricultura, no campo da dis-
tribuição, formulando a questão da tomada de todo o poder. A província marcha
à frente do movimento. Petrogrado, que marchava a frente durante os primeiros
dias da revolução, agora começa a ficar para trás. Tem-se por isso a impressão de
que o Comitê Executivo de Petrogrado tende a ficar parado na posição já atingida.
Mas, em um período revolucionário é impossível ficar-se parado no mesmo
lugar; só o movimento é possível: para a frente ou para trás. Por isso, quem ten-
der a permanecer parado durante a revolução ficará inevitavelmente para trás e
quem fica para trás não é poupado: a revolução o impelirá para o campo con-
trarrevolucionário.
K. Stalin
Pravda (A Verdade), nº 48.
4 de maio de 1917
J. V. Stalin 153

O triunfo da contrarrevolução
julho de 1917

A contrarrevolução se organizou. Ela está se espalhando e atacando ao longo


da linha. Seus dirigentes, a pequena nobreza cadete, que ontem boicotavam o
governo, hoje se preparam para voltar aos seus cargos, para atuar como senhores
do país.
Os partidos “governantes”, os Socialistas-Revolucionários e os Mencheviques,
e seu governo de “salvação da revolução”, estão se retirando em total desordem.
Eles estão prontos para fazer qualquer concessão, consentir com tudo - basta
apenas dar a ordem.
Entregar os bolcheviques e os seus seguidores? Por favor, senhores cadetes,
tomem os bolcheviques. Entregar a delegação do Báltico e os bolcheviques de
Kronstadt? Às suas ordens, senhores “esbirros da polícia secreta”, tomem a de-
legação. Suprimir os jornais bolcheviques dos operários dos soldados e dos sol-
dados, que aborrecem os cadetes? Empenharemos nossos melhores esforços, se-
nhores cadetes, suprimiremos esses jornais. Desarmar a revolução, desarmar os
operários e os soldados? Com grande prazer, senhores latifundiários e capita-
listas. Desarmaremos não só os operários de Petrogrado, como também os de
Sestroretsk, se bem não tenham participação dos acontecimentos de 3 e 4 de ju-
lho.
Restringir a liberdade de palavra e de reunião, a inviolabilidade da pessoa e
do domicílio, instituir a censura e a polícia secreta? Tudo será feito, senhores rea-
cionários, tudo e até o fim. Restabelecer a pena de morte na frente? Com grande
prazer, insaciáveis senhores. Dissolver a Dieta finlandesa que apoia o programa
aprovado pelo Soviete? Será feito, senhores latifundiários e capitalistas. Modifi-
car o programa do governo? Empenharemos nossos melhores esforços, senhores
cadetes. E os mencheviques com os sociais revolucionários estão dispostos a ce-
der ainda, só para ficarem de acordo com os cadetes, só para concordarem de
qualquer maneira com o preço...
E a contrarrevolução torna-se cada vez mais insolente, exigindo novas vítimas
e induzindo o governo provisório e o Comitê Executivo a vergonhas renúncias.
Propõe-se, para agradar aos cadetes, a convocar em Moscou uma “assembleia ex-
traordinária” dos membros da dissolvida Duma de Estado e de outros expoentes
das cestas abastadas, em cujas fileiras o Comitê Executivo Central ficará em mi-
noria absoluta. Os ministros perdendo a cabeça, depõem as pastas aos pés de
Kerensky. Os cadetes ditam a lista dos membros do governo.
Com o auxílio da Duma Tsarista e dos traidores cadetes enterra-se a liberdade
conquistada com sangue: eis a que vergonha nos reduzem os atuais dirigentes de
nossa vida política. E a guerra continua, e agravam-se os reveses na frente, en-
quanto se acredita em melhorar a situação restabelecendo a pena de morte. Ce-
gos! Não veem que a ofensiva só pode contar com a simpatia das massas quando
os objetivos da guerra forem claros e sentidos pelo exército, quando o exército
154 Obras Escolhidas

estiver consciente de derramar o sangue pela própria causa; não veem que na
Rússia democrática, na qual se realizam comícios e livres assembleias de solda-
dos, não se pode pensar em uma grande ofensiva se não existir essa consciência.
E o esfacelamento continua, a fome, o desemprego e a ruína geral ameaçam-
nos, enquanto se acredita em resolver a crise econômica recorrendo a medidas
policiais contra a revolução. Essa é a vontade da contrarrevolução. Cegos! Não
veem que sem tomar medidas revolucionárias contra a burguesia é impossível
salvar o país do desastre.
As perseguições aos operários, a destruição das organizações, o engodo dos
camponeses, a prisão dos soldados e dos marinheiros, as mentiras, as calúnias
contra os líderes do partido proletário, e ao lado disso a vitória dos contrarrevolu-
cionários que caluniam e tornam-se insolentes, tudo sob a bandeira da “salvação”
da revolução: eis a que ponto nos reduziram o partido social-revolucionário e o
menchevique. Ainda há no mundo indivíduos (vide Novaia Jizn) que depois de
tudo isso, nos propõem a unidade com esses “senhores” que salvam a revolução
sufocando-a!
Por quem nos tomam? Não, senhores, não temos nada em comum com os
traidores da revolução!
Os operários não se esquecerão nunca de que durante as horas graves das jor-
nadas de julho, quando a contrarrevolução desencadeada disparava contra a revo-
lução, o Partido Bolchevique foi o único que não abandonou os blocos operários.
Os operários não se esquecerão nunca de que naqueles graves instantes o partido
social-revolucionário e menchevique, partidos “no governo”, encontravam-se no
campo dos que golpeavam e desarmavam os operários, os soldados e os mari-
nheiros. Os operários recordarão tudo isso e daí tirarão as devidas conclusões.
K. St.
Rabotchi i Soldat (O Operário e o Soldado), nº 123.
Julho de 1917
J. V. Stalin 155

O novo governo
26 de julho de 1917

O vai e vem dos ministros terminou. Foi formado o novo governo. O novo
governo é constituído de cadetes, de elementos de tendências cadetes, de sociais
revolucionários e de mencheviques.
O partido dos cadetes está satisfeito. As reivindicações fundamentais dos
cadetes são acolhidas. Essas reivindicações são colocadas na base da atividade
do novo governo. Os cadetes queriam obter o fortalecimento do governo às ex-
pensas dos sovietes e tornar o governo independente dos sovietes. Os sovietes,
guiados pelos “maus pastores” sociais revolucionários e mencheviques, cederam
nesse ponto firmando a própria condenação à morte. O governo provisório como
único poder: eis o que obtiveram os cadetes. Os cadetes reivindicam o “sanea-
mento do exército”, isto é, a introdução de uma “disciplina de ferro” no exército,
a subordinação do exército unicamente aos comandantes diretos, por sua vez su-
bordinados somente ao governo. Os sovietes, dirigidos pelos sociais revolucioná-
rios e pelos mencheviques, cederam também nesse ponto e desarmaram-se. Os
sovietes ficam sem exército e o exército está subordinado somente ao formado
por elementos de tendências cadetes: eis o que obtiveram os cadetes. Os cade-
tes reivindicavam a unidade incondicional com os aliados. Os sovietes tomaram
“decididamente esse caminho no interesse. . . da defesa do país, esquecendo-se
de suas declarações internacionais”. O chamado programa de 8 de julho ficou
assim suspenso no ar. A “impiedosa” guerra, a “guerra até ao fim”: eis o que
obtiveram os cadetes. Escutem os próprios cadetes:
As reivindicações dos cadetes constituem indubitavelmente a base da atividade de todo o
governo... Justamente por isso, uma vez que as reivindicações fundamentais dos cadetes
foram acolhidas, o partido julgou que não era mais possível continuar a disputa sobre as
dissensões especificamente partidárias”. De fato, os cadetes sabem que na situação de hoje
“para por em prática os elementos democráticos contidos no famoso programa de 8 de julho
restam muito pouco tempo e possibilidades escassas (vide “Rech”).

É claro, ao que parece. Houve tempo em que os sovietes edificavam uma


nova vida, introduzindo transformações revolucionárias e obrigando o governo
provisório a sancionar essas transformações com leis e decretos. Isso acontecia
nos meses de março-abril. Então o governo provisório era rebocado pelos sovietes
com a sua bandeira não revolucionária. Depois iniciou-se o período em que o go-
verno provisório se pôs a marchar em sentido oposto, introduzindo transforma-
ções contrarrevolucionárias, e os sovietes são “obrigados” a aprovar tacitamente
essas transformações com suas resoluções moderadas.
O comitê Executivo Central, esse representante de todos os sovietes, é agora
rebocado pelo governo provisório e vela a fisionomia contrarrevolucionária deste
com uma fraseologia revolucionária. Evidentemente inverteram-se os papéis e
não a favor dos sovietes. Sim, os cadetes têm razão para estar “satisfeitos”. Se o
estarão por muito tempo, dir-lhes-ão o futuro próximo.
Rabotchi i Soldat (O Operário e o Soldado), nº3.
26 de julho de 1917
156 Obras Escolhidas

A contrarrevolução e os povos da
Rússia
13 de agosto de 1917

Durante as jornadas da revolução e das transformações democráticas, o movi-


mento marchava sob a bandeira da emancipação. Os camponeses emancipavam-
se do poder absoluto dos latifundiários. Os operários emancipavam-se das im-
posições das administrações de fábrica. Os soldados emancipavam-se do arbítrio
dos generais... Esses processos de emancipação não podiam deixar de atingir
também os povos da Rússia que o tsarismo oprimia há séculos.
O decreto sobre a “igualdade de direitos” dos povos e a destruição de fato das
restrições nacionais, os congressos dos ucranianos, dos finlandeses, dos bielor-
russos e a questão da república federativa, a proclamação solene do direito das
nações à autodeterminação e as promessas oficiais no sentido de “não interpor
obstáculos”: todos esses fatos atestavam a existência de um grande movimento
de libertação dos povos da Rússia.
Isso acontecia durante as jornadas da revolução, quando os latifundiários ha-
viam desaparecido da cena e a burguesia imperialista era apertada no torniquete
da democracia. Com o retorno ao poder dos latifundiários (os generais!) e com a
vitória da burguesia contrarrevolucionária, modificou-se completamente o qua-
dro da situação. “Os grandes discursos” sobre a autodeterminação e as solenes
promessas no sentido de “não interpor obstáculos” são esquecidos. Interpõem-se
os obstáculos mais inverossímeis e chega-se até à ingerência direta na vida interna
dos povos. Dissolve-se a Dieta finlandesa163 e ameaça-se “por a Finlândia em es-
tado de sítio, se for necessário” (Vietcherneie Vremia, 9 de agosto). Abre-se uma
campanha contra a Rada ucraniana e contra a sua Secretaria164 com a intenção
evidente de decapitar o regime autônomo da Ucrânia. Simultaneamente voltam
à baila os infames velhos métodos de provocar conflitos entre as nacionalidades
e de semear criminosas suspeitas de “traição” com o fim de uma vez desencadea-
das as forças chauvinistas contrarrevolucionárias, afogar em torrentes de sangue

163 A Dieta finlandesa, convocada em fins de março de 1917, reivindicou a autonomia da Finlândia. A
5 de julho de 1917, após negociações prolongadas com o governo provisório, negociações quo deram
em nada, a Dieta aprovou a “lei sobre o poder supremo”, segundo a qual o seu poder estendia-se
a todos os campos da vida da Finlândia, exclusive as questões de política externa, de legislação e
administração militar, as quais permaneciam da alçada dos órgãos centrais de toda a Rússia. A 18
de julho de 1917 o governo provisório declarou que a lei aprovada pela Dieta se substituía à vontade
da Assembleia-Constituinte e dissolveu a Dieta.
164 A Rada central ucraniana foi constituída em abri de 1917 por grupos e partidos burgueses e

pequeno-burgueses. Na véspera das jornadas de julho foi organizada a Secretaria geral da Rada,
como órgão administrativo supremo na Ucrânia. Reprimida a demonstração de julho em Petrogrado,
o governo provisório, pondo em prática uma política de opressão nacional, tirou da Ucrânia a bacia
do Donetz, a região de Iekaterinoslav e alguns outros distritos. O poder supremo passou então para
um comissário especial designado pelo governo provisório. Não obstante, os chefes da Rada, diante
da ameaça da revolução proletária, conciliaram-se bem depressa com o governo provisório e Rada
tornou-se o baluarte da contrarrevolução nacionalista burguesa na Ucrânia.
J. V. Stalin 157

a própria ideia da libertação nacional, de cavar um abismo entre os povos da Rús-


sia e de semear entre eles o ódio, para que se alegrem os inimigos da revolução.
Graças a isso é infligido um golpe de morte à causa da unificação desses povos
em uma única família harmônica. De fato, é óbvio que a política dos “litígios”
nacionais não une, mas divide os povos, reforçando entre eles as tendências “se-
paratistas”. De fato, é óbvio que a política da opressão nacional posta em prática
pela burguesia contrarrevolucionária ameaça “desagregar” a Rússia, coisa contra
a qual investe com tanta falsidade e hipocrisia a imprensa burguesa. De fato, é
óbvio que a política que tem por fim incitar as nacionalidades umas contra as
outras é a mesma política infame que, reforçando a desconfiança recíproca e o
ódio entre os povos, divide as forças do proletariado de toda a Rússia, minando
as próprias bases da revolução.
Justamente por isso todas as nossas simpatias, vão para os povos oprimidos
e menosprezados em seus direitos, que naturalmente lutam contra essa política.
Justamente por isso apontamos nossas armas contra aqueles que, pretextando a
“autodeterminação” do povo, põem em prática a política das anexações imperi-
alistas e da “união” forçada. Não somos absolutamente contrários à união dos
povos em um Estado único. Não queremos absolutamente o despedaçamento dos
grande Estados em pequenos. De fato, é óbvio que a união dos pequenos Estados
em grandes Estados é uma das condições que facilitam a causa da aplicação do
socialismo.
Mas queremos em tudo e por tudo que essa união seja voluntária, uma vez
que somente uma união desse tipo é efetiva e duradoura. Mas para obter isso é
indispensável antes de mais nada o reconhecimento pleno e sem reservas do di-
reito dos povos da Rússia à autodeterminação, que pode levar até à sua separação
da Rússia.
É indispensável, além disso, confirmar com fatos esse reconhecimento verbal,
deixando logo aos povos a liberdade de definir seu território e as formas de
sua organização política, mediante Assembleias Constituintes próprias. Essa é a
única política que pode reforçar a confiança e a amizade entre os povos. Essa é a
única política que pode desimpedir o caminho para a união efetiva dos povos. É
certo que os povos da Rússia não são falíveis e podem cometer determinados erros
ao organizar sua vida. O dever dos marxistas russos é indicar-lhes esses erros,
antes de mais nada aos proletários, para conseguirem que os corrijam através
da crítica, através da persuasão. Mas ninguém tem o direito de intrometer-se à
força na vida interna das nações e de “corrigir” à força seus erros. As nações são
soberanas nos assuntos que dizem respeito à sua vida interna e tem o direito de
organizar-se segundo sua vontade.
Essa são as reivindicações fundamentais dos povos da Rússia, proclamadas
pela revolução e tripudiadas agora pela contrarrevolução. Não se pode pensar
em realizar essas reivindicações enquanto a contrarrevolução estiver no poder.
O único caminho de libertação dos povos da Rússia da Opressão nacional é a
vitória da revolução. A conclusão é uma só: a questão da libertação da opressão
nacional é a questão do poder. As raízes da opressão nacional escondem-se no
domínio dos latifundiários e da burguesia imperialista. Transferir o poder para
as mãos do proletariado e do campesinato revolucionário significa justamente
158 Obras Escolhidas

obter a libertação completa dos povos da Rússia da opressão nacional.


Ou os povos da Rússia apoiam a luta revolucionária dos operários pelo poder,
e então obterão a libertação, ou não apoiam essa luta, e então é matematicamente
certo que não verão a libertação.
Proletari (O Proletário), nº 1.
13 de agosto de 1917
J. V. Stalin 159

Todo o poder aos sovietes!


17 de setembro de 1917
A revolução está a caminho. Atacada com fuzilarias durante as jornadas de
julho e “enterrada” na Conferência de Moscou, reergue a cabeça transpondo os
velhos obstáculos e criando um novo poder. A primeira linha das trincheiras da
contrarrevolução está expugnada. Após Kornilov, Kaledin está em retirada. No
fogo da luta reanimam-se os sovietes que estavam a ponto de sucumbir. Os sovi-
etes tomaram de novo o leme em suas mãos, guiando as massas revolucionárias.
Todo o poder aos sovietes! Essa é a palavra de ordem do novo movimento.
O governo de Kerensky intervém na luta contra o novo movimento. Desde
os primeiros dias da revolta de Kornilov, havia ameaçado dissolver os comitês
revolucionários, chamando de “arbitrária” a luta contra a camarilha de Korni-
lov. A partir de então a luta contra os comitês intensificou-se continuamente,
transformando-se nos últimos tempos em guerra aberta. O Soviete de Simfero-
pol prende o conhecido Riabuchinski como partícipe do complô de Kornilov. E
o governo de Kerensky, como única resposta, ordena que “sejam tomadas medi-
das no sentido da libertação de Riabuchinski e da incriminação das pessoas que
o submeteram a essa prisão ilegal” (Rech).
Em Tachkent todo o poder passa ao Soviete e as antigas autoridades são des-
tituídas. E o governo de Kerensky, como única resposta, “toma uma série de
medidas que são mantidas por ora em segredo, porém que deverão fazer voltar
à razão da maneira mais segura os expoentes do Soviete dos Deputados Ope-
rários e Soldados de Tachkent que perderam o senso das proporções” (Rússkie
Viédomosti). Os sovietes exigem um inquérito severo e completo sobre as ações
de Kornilov e dos seus adeptos. E o governo de Kerensky, com única resposta,
“limita o inquérito a uma busca insignificante de pessoas, deixando inutiliza-
das algumas fontes muito importantes que dariam a possibilidade de qualificar
o delito de Kornilov como traição à pátria e não só como rebelião (Novaia Jizn,
Relatório de Chubnikov).
Os sovietes exigem o rompimento com a burguesia e em primeiro lugar com
os cadetes. E o governo de Kerensky, como única resposta, trata com os Kichkin e
os Konovalov, convidando-os a entrar para o governo, proclamando a “indepen-
dência” do governo, em relação aos sovietes. Todo o poder à burguesia imperialista!
Essa é a palavra de ordem do governo de Kerensky. Nenhuma dúvida é possível:
encontramo-nos diante de dois poderes: o poder de Kerensky e do seu governo
e o poder dos sovietes e dos comitês.
O momento que atravessamos é caracterizado pela luta que se trava entre esses
dois poderes. Ou o poder de Kerensky, e então tem-se a hegemonia dos latifun-
diários e dos capitalistas, tem-se a guerra e o esfacelamento. Ou o poder dos
sovietes e então tem-se a hegemonia dos operários e dos camponeses, a paz e a
cessação do esfacelamento. A própria vida coloca a questão nesses termos e não
de outra maneira.
Durante todas as crises do poder a revolução apresentou essa questão. Todas
160 Obras Escolhidas

as vezes os senhores conciliadores evitaram dar uma resposta direta e, agindo as-
sim, entregaram o poder nas mãos dos inimigos. Os conciliadores, convocando
a Conferência em vez do Congresso dos Sovietes, queriam mais uma vez bater
em retirada cedendo o poder a burguesia, mas enganaram-se nos cálculos. Che-
gou o tempo em que não é mais possível bater em retirada. A questão colocada
diretamente pela vida deve dar-se uma resposta clara e precisa.
Com os sovietes ou contra eles! Escolham os senhores conciliadores.
Rabotchi Put (O Caminho Operário), nº 13.
17 de setembro de 1917
J. V. Stalin 161

O poder dos sovietes


13 de outubro de 1917

Nos primeiros tempos da revolução a palavra de ordem “Todo o poder aos


sovietes!” era uma novidade. Em abril o “poder dos sovietes!” contrapõe-se pela
primeira vez ao poder do governo provisório. Na capital a maioria é ainda favorá-
vel ao governo provisório, mas sem Miliukov e Gutchkov. Em junho essa palavra
de ordem é aprovada pela enorme maioria dos operários e dos soldados durante
a demonstração. Na capital o governo provisório já está isolado. Em julho, em
torno da palavra de ordem “Todo o poder aos sovietes!”, estoura a luta entre a
maioria revolucionária da capital e o governo Lvov-Kerensky. O Comitê executivo
Central conciliador, que se apoia no atraso da província, passa para o lado do go-
verno. A luta decide-se a favor do governo. Os partidários do poder dos sovietes
são declarados fora da lei. Segue-se o negro período das repressões “socialistas” e
das prisões “republicanas”, das instigas bonapartistas e das coempções militares,
dos fuzilamentos na frente e das conferências no interior. Esse período dura até
fins de agosto. Em fins de agosto a situação muda repentinamente. A revolta
de Kornilov provoca a tensão de todas as forças revolucionárias. Os sovietes no
interior e os comitês na frente, que estavam a ponto de sucumbir no período de
julho-agosto, agora reanimam-se “de golpe”. E reanimando-se tomam o poder
nas suas mãos na Sibéria e no Cáucaso, na Finlândia e nos Urais, em Odessa e
em Kharkov. Sem isso, sem a tomada do poder, a revolução teria sido derrotada.
Assim o “poder dos sovietes”, proclamado em abril por um “pequeno grupo” de
bolcheviques em Petrogrado, em fins de agosto recebe um reconhecimento quase
universal por parte das classes revolucionárias da Rússia.
Agora é evidente para todos que o “poder dos sovietes” não somente é uma
palavra de ordem popular, mas é o único verdadeiro instrumento de luta para
conseguir a vitória da revolução, a única saída da situação que se criou. Chegou
o momento em que a palavra de ordem “Todo o poder aos sovietes!” deve ser
finalmente realizada. Mas o que é o “poder dos sovietes”, em que ele se distingue
de qualquer outro poder?
Diz-se que transmitir o poder aos sovietes significa constituir um governo de-
mocrático “homogêneo”, organizar um novo “gabinete” formado por ministros
“socialistas” e, de um modo geral, pôr em prática uma “séria mudança” das pes-
soas que compõem o governo provisório. Mas isto é falso. Aqui não se trata
absolutamente de substituir algumas pessoas no governo provisório. Trata-se de
fazer que novas classes revolucionárias se tornem as classes dominantes no país.
Trata-se de fazer que o poder passe para as mãos do proletariado e do campe-
sinato revolucionário. Mas para se obter isso não é de modo algum suficiente
mudar apenas o governo. Para realizar isso é necessário antes de mais nada por
em prática uma depuração radical em todos os ministérios e em todas as insti-
tuições do governo, expulsando de todos esses postos os kornilovistas, colocando
por toda a parte homens devotados a classe operária e aos camponeses. Somente
então e somente nesse caso será possível falar em passagem do poder para os
162 Obras Escolhidas

sovietes “no centro e na periferia”.


Como explicar a impotência universalmente conhecida dos ministros “socia-
listas” do governo provisório? Como explicar o fato de que esses ministros foram
míseros joguetes nas mãos de homens que estavam fora do governo provisório
(recordam-se dos “informes” de Tchernov e de Skobelev, de Zarudni e de Pe-
chekhonov na “Conferência Democrática”)? Explica-se antes de mais nada pelo
fato de que eles não dirigiam seus ministérios, mas eram por estes dirigidos. E,
entre outras coisas, pelo fato de que cada ministério constitui uma fortaleza na
qual se encontram ainda e sempre os burocratas do período tsarista que transfor-
mam as boas intenções dos ministros em “palavras destituídas de significado”, e
estão prontos para sabotar qualquer providência revolucionária do governo. Para
que o poder passe aos sovietes não somente nas palavras como nos fatos, é neces-
sário tomar essas fortalezas e, expulsos delas os servos do regime cadete-tsarista,
colocar em seu lugar funcionários eletivos e demissíveis, devotados à causa da
revolução.
O poder aos sovietes significa a depuração radical de todas as instituições do
governo, sem exceção, no interior e na frente, de alto a baixo. O poder aos sovie-
tes significa a eletividade e a demissibilidade de todos os “comandantes” no inte-
rior e na frente. O poder aos sovietes significa eletividade e demissibilidade dos
“representantes do poder” na cidade e no campo, no exército e na frota, nos “mi-
nistérios” e nas “instituições”, nas ferrovias e nos correios e telégrafos. O poder
aos sovietes significa a ditadura do proletariado e do campesinato revolucionário.
Essa ditadura distingue-se radicalmente da ditadura da burguesia imperialista,
daquela ditadura que não faz muito tempo Kornilov e Miliukov, esforçaram-se
por instaurar, com o benévolo consentimento de Kerensky e Terechtchenko.
A ditadura do proletariado e do campesinato revolucionário significa a di-
tadura da maioria trabalhadora sobre a minoria exploradora, sobre os latifun-
diários e sobre os capitalistas, sobre os especuladores e sobre os banqueiros, em
nome da paz democrática, em nome do controle operário sobre a produção e
sobre a distribuição, em nome da terra aos camponeses, em nome do pão para o
povo.
A ditadura do proletariado e do campesinato revolucionário significa uma
ditadura aberta, de massa, exercida à vista de todos, sem complôs e sem intrigas
atrás dos bastidores. De fato, essa ditadura não precisa esconder que não terá pi-
edade dos capitalistas que recorrem aos “lockouts”, que agravam o desemprego
mediante formas diversas de “exonerações”, e dos banqueiros especuladores que
fazem aumentar os preços dos produtos e criam a fome. A ditadura do proleta-
riado e do campesinato significa uma ditadura que não exerce violência sobre as
massas, uma ditadura por vontade das massas, uma ditadura para garrotear os
inimigos dessas massas.
Tal a essência de classe da palavra de ordem “Todo o poder aos sovietes!”. Os
acontecimentos da política interna e externa, a guerra prolongada e a sede de paz,
as detoras na frente e a questão da “transferência” para Moscou, o esfacelamento
e a fome, o desemprego e a exaustão: todos esses fatos impelem irresistivelmente
para o poder as classes revolucionárias da Rússia. Isso significa que o país já está
maduro para a ditadura do proletariado e do campesinato revolucionário.
J. V. Stalin 163

Chegou o momento em que a palavra de ordem revolucionária “Todo o poder


aos sovietes!” deve ser finalmente realizada.
Rabotchi Put (O Caminho Operário), nº 35.
13 de outubro de 1917
164 Obras Escolhidas

A Rada ucraniana
15 de dezembro de 1917

Mais adiante, encontrará o leitor um telegrama cifrado, interceptado pelo


governo soviético, que mostra a verdadeira natureza da Rada e as verdadeiras
intenções das missões militares dos “nossos aliados” em relação à paz. Verifica-
se, através o telegrama, que já se concluiu uma aliança entre a missão francesa e
a Rada e que os “membros da missão francesa trabalham em contato direto com
a Rada.” Verifica-se, outrossim, através o telegrama, que tal aliança visa “manter
um simulacro de frente russa até fevereiro ou março e adiar a conclusão definitiva
do armistício para a primavera.” Finalmente, através do telegrama, verifica-se
que a missão francesa concluiu “um acordo com as autoridades militares” (isto é,
com o “governo” de Kaledin) sobre o “abastecimento de carvão e viveres para as
frentes romena e sul-ocidental” (que segundo o plano teria de ser mantido pela
Rada). Em resumo: existe, como se vê, uma aliança entre a Rada, Kaledin e a
missão militar francesa, tendo o objetivo de comprometer a paz e “adiá-la” “até a
primavera”. A missão militar francesa não age assim por iniciativa própria, mas
segundo as “instruções urgentes do governo francês.” Não queremos ocupar-
nos aqui com o comportamento das missões militares dos “nossos aliados”. A
sua função foi suficientemente esclarecida: em agosto ajudaram Kornilov, em
novembro a Rada e Kaledin, em dezembro abasteceram de automóveis blindados
os rebeldes. Tudo isto serve à guerra “à outrance”. Não duvidamos de que a
luta dos povos da Rússia por uma paz democrática fará com que fracassem os
planos agressivos dos “aliados”, cujas missões portam-se como se estivessem na
África Central. Bem depressa, porém, os “aliados” deverão convencer-se de que
a Rússia não é a África Central. A nós, entretanto, interessa, principalmente, a
miserável função assumida pela Rada.
Agora sabemos por que motivo a Rada concentra as unidades ucranianas na
frente romeno-sul-ocidental: sob a palavra de ordem da “nacionalização” do
exército, a Rada tenta ocultar seu acordo com a missão francesa sobre o adia-
mento do armistício para a primavera. Agora sabemos por que a Rada não deixa
passarem os exércitos soviéticos enviados contra Kaledin: sob a palavra de or-
dem da “neutralidade” no que se refere a este, ela procura esconder a aliança
que concluiu com Kaledin para combater os sovietes. Agora sabemos por que
a Rada protesta contra a “ingerência” do Conselho dos Comissários do Povo na
vida interna da Ucrânia: com as tagarelices em torno da não intervenção, a Rada
procura ocultar a ingerência efetiva do governo francês na vida da Ucrânia e de
toda a Rússia para liquidar as conquistas da revolução.
Os camaradas ucranianos muito frequentemente fazem-me a pergunta: o que
é a Rada? Eis a minha resposta. A Rada, ou, mais precisamente, a sua Secreta-
ria Geral, é o governo dos traidores do socialismo, que se dizem socialistas para
enganar as massas. Exatamente como faziam os governos de Kerensky e de Sa-
vinkov, os quais também se diziam socialistas. A Rada, ou, mais precisamente, a
sua Secretaria Geral, é um governo burguês aliado a Kaledin, que luta contra os
J. V. Stalin 165

sovietes. Antes era o governo de Kerensky, que, aliado a Kornilov, desarmava os


sovietes da Rússia. Agora é o governo da Rada que, aliado a Kaledin, desarma
os sovietes da Ucrânia.
A Rada, ou, mais precisamente, a sua Secretaria Geral, é um governo burguês
que, aliado aos capitalistas anglo-franceses, luta contra a paz. Antes era o governo
de Kerensky que protelava a conclusão da paz, condenando milhões de soldados
a serem carne de canhão. Agora é o governo da Rada que tenta comprometer a
causa da paz “protelando a conclusão do armistício para a primavera”. O governo
de Kerensky por isso foi derrubado, graças aos esforços comuns dos soldados da
Rússia. Nós não duvidamos de que também o governo da Rada será derrubado
graças aos esforços dos operários e dos soldados da Ucrânia.
Só uma nova Rada, a Rada dos sovietes dos operários, soldados e campone-
ses da Ucrânia, pode salvaguardar os interesses nacionais da Ucrânia contra os
Kaledin e os Kornilov, contra os latifundiários e os capitalistas.
J. V Stalin
15 de dezembro de 1917
166 Obras Escolhidas

A independência da Finlândia
22 de dezembro de 1917
Informe apresentado na reunião do Comitê Executivo Central da Rússia
Os representantes da Finlândia dirigem-se a nós pedindo a independência da
Finlândia, separando-a da Rússia. Em resposta, o Conselho dos Comissários do
Povo acolheu o pedido com um decreto sobre a independência da Finlândia, que
já foi publicado nos jornais. Eis o texto da resolução do Conselho dos Comissários
do Povo: “O Conselho dos Comissários do Povo, em conformidade com o direito
das nações à autodeterminação, decide apresentar ao Comitê Executivo Central
as seguintes propostas:
a) reconhecer a independência da República Finlandesa, e b) constituir, com
o governo finlandês, a comissão (com representantes) para elaborar as providên-
cias que a separação requer”.
O Conselho dos Comissários do Povo não pode agir diferente quando um
povo pede a independência. Baseado na autodeterminação deve consentir. A
imprensa burguesa assevera que levamos o país à ruína, que perdemos países,
entre os quais a Finlândia. Camaradas, nós não podíamos perdê-la, porque ela
nunca foi nossa. Se tivéssemos retido a Finlândia pela violência, isto não signi-
ficaria que ela seria nossa. Sabemos como Guilherme, por meio da violência,
“adquire” Estados inteiros e sobre que terreno se baseiam, devido a isso, as rela-
ções recíprocas do povo e os seus opressores. Os princípios da social-democracia
consistem na criação de uma atmosfera de mútua confiança entre os povos, há
tanto tempo desejada. E só nessa base levaremos à pratica a palavra de ordem:
“Proletários de todos os países, unam-se!” Tudo isto é conhecido por todos. Se
examinarmos o modo como a Finlândia obteve sua independência, veremos que
de fato o Conselho dos Comissários do Povo, a contragosto, deu a liberdade não
ao povo, aos representantes do proletariado finlandês, mas à burguesia finlan-
desa, a qual se apoderou do poder e recebeu a independência das mãos dos socia-
listas da Rússia. Os operários e os social-democratas finlandeses se encontraram
na situação de dever receber a liberdade não das mãos dos socialistas russos,
mas da burguesia finlandesa. Embora reconhecendo uma tragédia para o pro-
letariado finlandês, não podemos deixar de salientar que os social-democratas
finlandeses, somente por causa de sua irresolução e de sua incompreensível co-
vardia, não deram com decisão os passos necessários para tomarem o poder das
mãos da burguesia. Pode-se reprovar o Conselho dos Comissários do Povo, ou
criticá-lo, mas não afirmar que o Conselho dos Comissários do Povo carece com
as promessas feitas, visto que não existe no mundo uma força que possa obri-
gar o Conselho dos Comissários do Povo a não manter seus compromissos. Já
o demonstramos quando, imparcialmente, levamos em consideração os pedidos
apresentados pela burguesia finlandesa acerca da concessão da independência à
Finlândia e imediatamente procedemos à promulgação do decreto que sanciona
essa independência. Possa a independência da Finlândia facilitar a causa da li-
bertação dos operários e dos camponeses daquele país e criar uma sólida base
para a amizade entre os nossos povos!
J. V. Stalin
22 de dezembro de 1917
J. V. Stalin 167

Intervenção na reunião do Comitê


Central sobre a paz com os alemães
11 de janeiro de 1918

(Breve nota extraída da ata)

O camarada Stalin entende o adotar da palavra de ordem “guerra revoluci-


onária” como fazer o jogo do imperialismo. A posição de Trotsky não pode ser
chamada de posição. Não há no Ocidente um movimento revolucionário, não
há fatos que provem tal existência revolucionária; ele existe em potencial, mas
nós não podemos confiar só nisso. Se os alemães começarem a ofensiva, isto
conduzirá a um fortalecimento da contrarrevolução em nosso país.
A Alemanha está em condições de atacar, tem suas tropas kornilovitas, a
“guarda”. Em outubro falamos numa guerra contra o imperialismo porque en-
tão se dissera que a palavra “paz” seria suficiente para fazer rebentar a revolução
no Ocidente. Isto não aconteceu. O fato de entre nós se estar realizando o soci-
alismo agita o Ocidente, mas ao construí-lo necessitamos de tempo. Se aceita a
política de Trotsky criaríamos péssimas condições ao movimento revolucionário
no Ocidente. Por isso Stalin propõe o aceite da proposta do camarada Lenin de
paz com os alemães. Os jornais burgueses insistem em difundir rumores sobre
um pretenso “início de negociações entre a Rada e o Conselho dos Comissários
do Povo.”
Os círculos ligados aos contrarrevolucionários ampliam esses rumores, acen-
tuando o seu “particular” significado. Muitos camaradas não estão longe de crer
na fábula das negociações com a Rada de Kiev e muitos se dirigiram a mim por
escrito, pedindo dizer-lhes até que ponto merece fé essa fábula. Declaro que: o
Conselho dos Comissários do Povo não efetua negociações com a Rada de Kiev,
que se ligou a Kaledin e que trata com os imperialistas austro-alemães da Rús-
sia; com uma Rada de tal espécie o Conselho dos Comissários do Povo julga que
só será possível conduzir uma luta até à vitória dos sovietes e da Ucrânia; só
a liquidação da Rada burguesa de Kiev e sua substituição por uma nova Rada
socialista, poderão trazer a paz e a tranquilidade à Ucrânia. Partindo dessas con-
siderações, o Conselho dos Comissários do Povo decidiu promulgar um decreto
especial sobre a livre autodeterminação da “Armênia turca”. Isto é necessário
especialmente agora, quando os governos alemão e turco, fiéis à sua natureza
imperialista, não escondem o desejo que têm de manter pela violência seu do-
mínio sobre os territórios ocupados. Saibam os povos da Rússia que à revolução
russa e ao seu governo são estranhos os objetivos de conquista. Saibam todos que
à política imperialista de opressão nacional o Conselho dos Comissários do Povo
contrapõe a política da completa libertação dos povos oprimidos.
168 Obras Escolhidas

A organização da República
Federativa da Rússia
4 de abril de 1918

(Entrevista com um correspondente do Pravda)

Em consequência da discussão surgida nestes dias, na imprensa soviética, dos


princípios da edificação da Federação Russa, um correspondente nosso dirigiu-
se ao camarada Stalin, Comissário do Povo para as Nacionalidades, pedindo-lhe
exprimir seu pensamento sobre a questão. A uma série de perguntas formuladas
pelo nosso correspondente, o camarada Stalin deu as seguintes respostas:

As federações democráticas burguesas


Das uniões federativas existentes, as mais características, quanto ao regime
democrático burguês, são as federações americana e suíça. Historicamente, for-
maram-se de Estados independentes, passando da confederação à federação; ade-
mais, transformaram-se praticamente em Estados unitários, que da federação só
conservaram a forma. Todo esse desenvolvimento, da independência ao regime
unitário, verificou-se através de uma série de violências, de repressões e de guer-
ras nacionais. A guerra dos Estados americanos do Sul contra os do Norte165 e a
guerra do Sonderbund 166 contra os outros cantões da Suíça. Não se pode deixar
de salientar que os cantões da Suíça e os Estados da América não se formaram
segundo um critério nacional e nem sequer segundo um critério econômico, mas
de um modo todo fortuito, devido à ocupação casual destes ou daqueles territó-
rios por emigrantes colonizadores ou comunidades agrícolas.

Em que se distingue dessas federações a Federação


da Rússia que se encontra em seu processo de
formação
A Federação que se está formando na Rússia apresenta, e deve apresentar, um
quadro diverso. Em primeiro lugar, na Rússia as diferentes regiões são unidades
determinadas no que se refere aos costumes e à composição étnica. A Ucrânia,
165 A Guerra de Secessão americana (1861-1865) estourou quando sete estados dissidentes do Sul
se separaram da União e proclamaram-se “Estados Confederados da América”. A vitória do Norte
assinalou o início da unificação nacional de todos os estados americanos sob um governo federal
central.
166 O Sonderbund, união reacionária dos sete cantões católicos da Suíça fundada em 1845, apoiava

o fracionamento político do país. Em 1847, estalou um conflito armado entre o Sonderbund e os


outros cantões da Suíça que eram favoráveis a uma centralização do Poder. A guerra terminou pela
derrota do Sonderbund e a transformação da Suíça, de federação de Estados, num único Estado
federal.
J. V. Stalin 169

a Criméia, a Polônia, a Transcaucásia, o Turquestão, a região do curso médio


do Volga, a região quirguiz, distinguem-se do centro não só por sua posição
geográfica (regiões periféricas), mas como territórios economicamente coesos,
com determinados costumes e com uma população nacional homogênea. Em se-
gundo lugar, essas regiões não constituem territórios livres e independentes, mas
unidades mantidas pela violência no organismo político do Estado russo e que
hoje visam obter a necessária liberdade de ação sob a forma de relações federati-
vas ou de completa independência. A história da “unificação” desses territórios
apresenta um quadro de violências e repressões das velhas autoridades russas. A
instauração na Rússia do regime federativo significará a libertação desses terri-
tórios, e dos povos que os habitam, do jugo imperialista. Do regime unitário à
federação! Em terceiro lugar, nas federações Ocidentais a edificação da vida es-
tatal é dirigida pela burguesia imperialista. Não é de admirar que a “unificação”
não se tenha podido realizar sem violências. Aqui na Rússia, ao contrário, a edi-
ficação política é dirigida pelo proletariado, inimigo do imperialismo. Por esse
motivo, na Rússia se pode e se deve instaurar o regime federativo, na base da livre
união dos povos. Essa é a diferença entre a federação na Rússia e as federações
no Ocidente.

Os princípios da edificação da Federação da Rússia


Disso resulta – continua o camarada Stalin – que a Federação da Rússia não é
a união de cidades independentes (como acreditam os caricaturistas da imprensa
burguesa), ou, de um modo geral, de regiões (como imaginam alguns camaradas
nossos), mas a união de determinados territórios historicamente distintos, que
se diferenciam tanto por seus costumes particulares quanto por sua composição
nacional. Não é a posição geográfica desta ou daquela região o que pesa, nem
tampouco que algumas regiões sejam separadas do centro por extensões d’água
(Turquestão), cadeias de montanhas (Sibéria) ou estepes (ainda o Turquestão).
Esse federalismo geográfico propagado por Latsis nada tem de comum com o fe-
deralismo anunciado pelo Congresso dos Sovietes. A Polônia e a Ucrânia não es-
tão separadas do centro por nenhuma cadeia de montanhas ou extensão d’água,
mas a ocorre sustentar que a falta de tais elementos geográficos exclua aquelas
regiões do direito à livre autodeterminação. Por outro lado, é fora de dúvida –
diz o camarada Stalin – que tampouco o federalismo original dos regionalistas de
Moscou, os quais se esforçam para unificar artificialmente em torno de Moscou
quatorze províncias, nada tem de comum com a conhecida resolução do III Con-
gresso dos Sovietes sobre a federação. Não há dúvida de que a zona têxtil central,
compreendendo apenas algumas províncias, é uma unidade econômica coesa e
que, como tal, terá um organismo administrativo regional, na qualidade de seção
autônoma do Conselho Supremo da Economia Nacional. Mas, o que possa ha-
ver de comum entre a atrasada Kaluga e a industrial Ivanovo-Voznessensk e qual
o critério que segue o atual Conselho Regional dos Comissários do Povo para
“unificá-las” é coisa que não se consegue compreender.
170 Obras Escolhidas

Composição da República Federativa da Rússia


Não é qualquer fração ou unidade, território geográfico, que deve e pode
fazer parte de uma federação, mas somente determinadas regiões, que reúnam
particularidades de costumes, uma composição étnica própria e um mínimo de
coesão econômica em seus territórios. Assim a Polônia, a Ucrânia, a Finlândia,
a Criméia, a Transcaucásia (não se exclui, além disso, a possibilidade de que a
Transcaucásia se divida numa série de determinadas unidades territoriais nacio-
nais, como a georgiana, a armênia, a azeri-tártara, etc.), o Turquestão, a região
quirguiz, o território tártaro-bachkírio, a Sibéria, etc.

Direitos das regiões federadas. Direitos das


minorias nacionais
Os limites dos direitos dessas regiões federadas serão elaborados na edificação
da Federação Soviética; todavia, é possível estabelecer esses direitos. O exército
e a marinha de guerra, os negócios estrangeiros, as estradas de ferro, os correios
e telégrafos, o sistema monetário, os tratados comerciais, a política geral econô-
mica, financeira e bancária, tudo isto necessariamente deverá ser da competência
do Conselho Central dos Comissários do Povo. Todas as outras questões, e, antes
de mais nada, as formas de aplicação dos decretos gerais, a escola, o processo judi-
ciário, a administração, etc., serão da competência dos Conselhos Regionais dos
Comissários do Povo. Nenhuma língua “oficial” obrigatória, nem no processo
judiciário, nem na escola! Cada região escolherá a língua ou as línguas corres-
pondentes à composição de sua população; além disso, respeitará a completa
igualdade de direitos no uso das línguas, tanto das minorias como das maiorias,
em todas as disposições administrativas e políticas.

Estrutura do poder central


A estrutura do poder, sua constituição, são determinadas pelas peculiarida-
des da Federação da Rússia. Na América e na Suíça o federalismo levou à um
sistema bicameral: de um lado, um parlamento eleito segundo o princípio do
sufrágio universal, de outro lado um conselho federal constituído dos estados
ou dos cantões. Esse é o sistema bicameral que na realidade conduz ao burocra-
tismo legislativo burguês. As massas da Rússia não aceitariam esse sistema. Nem
falemos sequer da incompatibilidade desse sistema com as exigências elementa-
res do socialismo. Parece-nos que o órgão supremo do poder da Federação da
Rússia deve ser o Congresso dos Sovietes, eleito por trabalhadores da Rússia, ou
o Comitê Executivo Central que o substitui. Será preciso abandonar o precon-
ceito burguês da infalibilidade do “princípio” do sufrágio universal. O direito
de voto será, ou deverá ser concedido só àquelas camadas da população que são
exploradas ou que não exploram o trabalho alheio. Este é o resultado natural da
situação criada pela ditadura do proletariado e das massas camponesas pobres.
J. V. Stalin 171

O órgão executivo do poder


No que se refere ao órgão executivo do poder da Federação da Rússia, isto é, o
Conselho Central dos Comissários do Povo, este será eleito pelos congressos dos
sovietes entre os candidatos apresentados, pelo centro e regiões federadas. Entre
o Comitê Executivo Central e o Conselho dos Comissários do Povo não haverá a
segunda câmara. Sem dúvida, a prática poderá e deverá elaborar outras formas
mais elásticas e adequadas ao objetiva de harmonizar os interesses das regiões e
do centro na obra de edificação do poder. Mas uma coisa é certa: a saber, que
quaisquer formas que possam ser desenvolvidas na prática, elas não ressuscitarão
o obsoleto sistema de duas câmaras que foi enterrado por nossa revolução.

Função transitória do federalismo


Tais são, a meu ver, os traços gerais da Federação da Rússia, que se vai for-
mando sob os nossos olhos. Muitos são inclinados a considerar o regime federa-
tivo como o mais estável e sem dúvida como o ideal, e em confirmação dessa tese
citam frequentemente o exemplo da América, do Canadá e da Suíça. Todavia, o
entusiasmo exagerado pelo federalismo não é justificado pela história. Em pri-
meiro lugar, tanto a América, como a Suíça, não são mais federações, foram-no
entre 1860 e 1870; na realidade transformaram-se em Estados unitários desde o
fim do século passado, quando os estados e cantões transferiram todo o poder
ao governo federativo central. A história mostrou que o federalismo da América
e da Suíça não constituiu senão uma fase transitória que preparou a passagem
da independência dos estados e cantões para a sua completa unificação. O fe-
deralismo mostrou ser uma forma plenamente adequada ao objetivo. Uma fase
transitória que preparava a passagem da independência ao unitarismo imperia-
lista, mas foi superado e abandonado logo que atingiram a maturidade as con-
dições necessárias para a unificação dos estados e dos cantões num único Estado
unitário.

O processo de edificação política da Federação da


Rússia. O federalismo na Rússia, Fase transitória
que prepara o regime unitário socialista
Na Rússia a edificação política segue um processo inverso. Aqui, o unitarismo
forçado tsarista é substituído por um federalismo voluntário, para que, com o
correr do tempo, o federalismo ceda lugar a uma voluntária e fraternal união das
massas trabalhadoras de todas as nações e de todas as comunidades da Rússia. O
federalismo na Rússia – disse o camarada Stalin terminando a sua entrevista –
está destinado a ter, como na América e na Suíça, uma função transitória, a qual
prepara o futuro regime unitário socialista.
172 Obras Escolhidas

A lógica dos fatos (as ''Teses'' do CC


Menchevique)
29 de outubro de 1918

Chegou-nos às mãos um documento intitulado Teses e Resoluções do Comitê Cen-


tral do Partido Menchevique (17-21 de outubro de 1918). Esse documento realiza
um balanço das atividades do Poder Soviético a partir de outubro de 1917 e abre
uma certa perspectiva que, segundo parece, tem uma grande importância para
o desenvolvimento do partido menchevique. Mas o que no documento tem mais
valor são as conclusões que, depois de um ano de revolução, subvertem toda
a prática do menchevismo. Adiando o exame de Teses e resolução para outra
ocasião, julgamos desde já necessário comunicar ao leitor algumas impressões
nossas.

A Revolução de Outubro

Foi exatamente há um ano. O país enfraquecia-se sob o peso da guerra impe-


rialista e do caos econômico. O exército, debilitado pelos graves golpes sofridos,
não tinha mais força para combater. Enquanto isso, os imperialistas ingleses (Bu-
chanan!) envolviam cada vez mais o país em suas redes, tentando por todos os
meios fazer com que ficasse no âmbito da guerra imperialista. Haviam cedido
Riga167 , preparavam-se para ceder Petrogrado, unicamente para demonstrarem
a necessidade da guerra e da ditadura militar. A burguesia compreendia tudo
isso e visava abertamente à ditadura militar e à derrota da revolução.
Que fizeram então os bolcheviques? Os bolcheviques prepararam-se para a
revolução. Compreendiam que a tomada do poder pelo proletariado era a única
solução para o beco sem saída da guerra e do caos econômico; compreendiam
que, sem a revolução aberta, a ruptura com o imperialismo e a libertação da Rús-
sia das garras deste seriam absolutamente impossíveis, e convocaram o Congresso
dos Sovietes, único organismo no país que poderia receber a herança do poder.
Primeiro a revolução, depois a paz! Que fizeram então os mencheviques? De-
clararam a “empresa” dos bolcheviques uma “aventura contrarrevolucionária”.
Consideraram supérfluo o Congresso dos Sovietes e o dificultaram, chamando
os próprios sovietes “barracas antiquadas”, condenadas à demolição. Ao invés
dos sovietes “barracas”, ofereceram-nos um “sólido edifício” de tipo “europeu”,
o Pré-Parlamento168 , no qual os mencheviques, juntamente com Miliukov, ela-
boraram planos de “reformas agrárias e econômicas radicais”.
167Riga foi entregue aos alemães pelo general Kornilov em 21 de agosto de 1917.
168O Pré-Parlamento, ou Conselho Provisório da República, órgão consultivo existente na época do
governo provisório burguês, foi constituído na Conferência Democrática que se realizou em Petro-
grado de 14 a 22 de setembro de 1917. A criação do Pré-Parlamento constituiu uma tentativa dos
social-revolucionários e dos mencheviques no sentido de refrear a marcha da revolução e de voltar
ao parlamentarismo burguês.
J. V. Stalin 173

Em lugar da ruptura com o imperialismo, propuseram uma conferência dos


aliados em Paris, como possível saída para a situação de guerra. Viam uma “con-
sequente política de paz” na participação, nessa conferência, do menchevique
Skobelev e nas atividades dúbias do menchevique Axelrod pela convocação do
congresso dos Scheidemann, dos Renaudel e dos Hyndman... Desde então trans-
correu um ano. A “revolução bolchevique” soube destruir a engenhosa máquina
dos imperialistas internos e externos. A velha guerra imperialista, para a Rús-
sia, não é já senão uma recordação. A Rússia libertou-se do jugo do imperia-
lismo. Conduz e espera continuar conduzindo uma política externa indepen-
dente. Hoje está claro para todos que sem a Revolução de Outubro a Rússia não
teria deixado o beco sem saída da guerra imperialista, os camponeses não teriam
recebido a terra, os operários não teriam assumido a administração das oficinas
e fábricas. Que vêm dizer-nos agora os mencheviques, o seu Comitê Central?
Ouvi:
A revolução efetuada pelos bolcheviques em outubro de 1917 foi uma necessidade histórica
porquanto, rompendo as ligações entre as massas trabalhadoras e as classes capitalistas, ex-
primiu a aspiração das massas trabalhadoras de subordinar a diretriz da revolução aos seus
interesses, sem o que não teria sido sequer possível pensar em libertar a Rússia do jugo do
imperialismo dos aliados, em conduzir uma consequente política de paz, em aplicar radical-
mente a reforma agrária e fazer com que o Estado regule toda a vida econômica no interesse
das massas populares; porquanto essa etapa da revolução também teve a tendência de ampliar
ainda mais a influência que a revolução russa havia exercido no curso dos acontecimentos
mundiais (vide Teses e Resolução).

Assim se exprime agora o Comitê Central menchevique. É incrível, mas é um


fato. “A revolução bolchevique foi”, ao que parece, “uma necessidade histórica”,
“sem o que não teria sido sequer possível pensar em libertar a Rússia do jugo do
imperialismo dos aliados”, “em conduzir uma consequente política de paz”, “em
aplicar radicalmente a reforma agrária” e “fazer com que o Estado regule toda a
vida econômica no interesse das massas populares.” Mas isto é justamente o que
há um ano sustentavam os bolcheviques, e contra isto é que se batia com tanto
furor o Comitê Central menchevique! Sim, é exatamente a mesma coisa. Não
é verdade que a vida instrui e corrige os mais incorrigíveis? Onipotente, ela se
assenhoreia sempre, a todo custo, daquilo que lhe compete...

A ditadura do proletariado

Isto aconteceu há dez meses. A Assembleia-Constituinte estava para reunir-


se. Os contrarrevolucionários burgueses, já plenamente batidos, reagrupavam
novamente as forças e, esfregando as mãos, antegozavam a “ruína” do Poder
Soviético. A imprensa imperialista estrangeira (aliada) saudava a Assembleia-
Constituinte. Os mencheviques e social-revolucionários organizavam reuniões
“privadas” e elaboravam o plano de transferir o Poder dos Sovietes à Assembleia-
Constituinte, “senhora da terra russa”. Pairava no ar a sombra da renascente
“coalizão honesta” que visava eliminar os “erros” bolcheviques. Que fizeram en-
tão os bolcheviques?
Continuaram o trabalho já empreendido para reforçar o poder do proletari-
ado. Julgavam que a “coalizão honesta” e o seu órgão, a Assembleia-Constituinte,
174 Obras Escolhidas

seriam condenados à morte pela história, pois sabiam que no mundo nascera uma
nova força, o poder do proletariado, e uma nova forma de governo, a república
dos sovietes. No começo de 1917 a palavra de ordem de Assembleia-Constituinte
era progressista e os bolcheviques eram favoráveis a ela. Em fins de 1917, de-
pois da Revolução de Outubro, a palavra de ordem de Assembleia-Constituinte
tornara-se reacionária porque não correspondia mais às correlações existentes
entre as forças políticas em luta no país. Os bolcheviques julgavam que, na situ-
ação determinada pela guerra imperialista na Europa e pela vitoriosa revolução
proletária na Rússia, fossem concebíveis somente dois tipos de poder: a ditadura
do proletariado, sob a forma da república dos sovietes, ou a ditadura da burgue-
sia, sob a forma da ditadura militar; qualquer tentativa de encontrar um meio
termo e de fazer renascer a Assembleia-Constituinte inevitavelmente haveria pro-
vocado uma volta ao passado, à reação, à liquidação das conquistas de Outubro.
Os bolcheviques estavam certos de que o parlamentarismo burguês e a república
democrática burguesa representavam uma etapa já superada da revolução...
Desde então transcorreram dez meses. A Assembleia-Constituinte, que havia
tentado derrubar o Poder Soviético, foi dissolvida. No país, os camponeses nem
deram por isso e os operários acolheram esse ato com júbilo. Um grupo dos
partidários da Assembleia foi-se para a Ucrânia e pediu ajuda aos imperialistas
alemães para combater os sovietes. Outro grupo dos partidários da Assembleia
foi-se para o Cáucaso, consolando-se nos braços dos imperialistas turco-alemães.
Um terceiro grupo dos partidários da Assembleia foi-se para Samara e, junta-
mente com os imperialistas anglo-franceses, empreendeu a guerra contra os ope-
rários e camponeses da Rússia. A palavra de ordem da Assembleia-Constituinte,
desse modo, transformou-se num meio de envolver os políticos simplórios e numa
insígnia para mascarar os contrarrevolucionários internos e externos em sua luta
contra os sovietes. Como se portaram naquele período os mencheviques? Com-
bateram contra o Poder Soviético, sustentando sempre a palavra de ordem da
Assembleia-Constituinte, lançada pelos contrarrevolucionários. Que dizem agora
os mencheviques, que diz o seu Comitê Central?
Ouvi: Ele “repele qualquer colaboração política com as classes hostis à demo-
cracia e recusa-se a participar em todas as combinações governativas que, embora
mascaradas com a insígnia da democracia, baseiam-se nas coalizões “nacionais”
da democracia com a burguesia capitalista ou então na dependência do imperia-
lismo e do militarismo estrangeiro” (vide Teses). E ainda: “todas as tentativas da
democracia revolucionária que se apoia nas massas não proletárias das cidades
e nas massas trabalhadoras do campo, tentativas com a intenção de restaurar a
república democrática mediante a luta armada contra o governo soviético e con-
tra as massas que o sustentam, foram e continuam sendo acompanhadas, dado o
caráter da situação internacional e a imaturidade política da pequena burguesia
democrática russa, por um agrupamento de forças sociais capaz de tirar à luta
para restaurar um regime democrático o seu próprio significado revolucionário,
e de ameaçar diretamente as conquistas socialistas fundamentais da revolução.
A tendência para entrar em acordo a qualquer preço com as classes capitalistas
e utilizar as armas estrangeiras na luta pelo poder, priva de qualquer indepen-
dência a política da democracia revolucionária, transformando-a em instrumento
daquelas classes e das coalizões imperialistas” (vide Teses e resolução). Em re-
J. V. Stalin 175

sumo: a coalizão “é repelida” decididamente e sem reservas, a luta pela república


democrática e pela Assembleia-Constituinte é reconhecida como contrarrevolu-
cionária, uma vez que é capaz de “ameaçar diretamente as conquistas socialistas
fundamentais da revolução”. A conclusão é só uma: o Poder dos Sovietes, a dita-
dura do proletariado, é o único poder revolucionário concebível na Rússia. Mas
isto é justamente o que há tanto tempo vêm afirmando os bolcheviques e contra
o que até ontem se bateram os mencheviques! Sim, é exatamente a mesma coisa.
Não é verdade que a lógica das coisas é mais forte que qualquer outra lógica, sem
exclusão da lógica menchevique.

Confusão pequeno-burguesa

Portanto: é fato que depois de um ano de luta contra o “espírito aventu-


reiro” dos bolcheviques, o CC menchevique é constrangido a admitir a “neces-
sidade histórica” da “revolução bolchevique”, efetuada em outubro de 1917. É
fato que depois de uma longa luta pela Assembleia-Constituinte e por uma “co-
alizão honesta”, o CC menchevique, embora a contragosto e com relutância, é
constrangido a reconhecer que a coalizão “nacional” é inadequada e que a luta
para “restaurar o regime democrático” e a Assembleia-Constituinte reveste-se
de um caráter contrarrevolucionário. É verdade que esse reconhecimento veio
com um ano de atraso, depois que o caráter contrarrevolucionário da palavra
de ordem da Assembleia-Constituinte e a necessidade histórica da Revolução de
Outubro tornaram-se um lugar-comum repisado; é verdade que esse atraso não
engrandece o CC menchevique, o qual tem a pretensão de exercer uma função
dirigente na revolução. Mas esta já vem sendo a sorte dos mencheviques: não é
a primeira vez que ficam para trás com relação à marcha dos acontecimentos, e,
acreditamos, esta não será a última vez que procuram embelezar-se à custa dos
bolcheviques... Seria lícito supor que depois de tal reconhecimento dá parte do
CC menchevique não deveria mais haver lugar para sérias divergências.
E assim teria acontecido se tivéssemos que lidar não com o CC menchevique
e sim com revolucionários consequentes, capazes de levar até ao fim seus raci-
ocínios, deles tirando as necessárias conclusões. A desgraça é que neste caso
lidamos com um partido de intelectuais pequeno-burgueses, eternamente hesi-
tantes entre o proletariado e a burguesia, entre a revolução e a contrarrevolução.
Daí as inevitáveis contradições entre as palavras e os atos, a eterna incerteza e a
instabilidade de suas ideias. Pasmem todos. O CC menchevique:
considera como antes que a soberania popular, a democracia absolutamente ilimitada, seja a
única forma política que permite não só preparar, como também efetivar a libertação social
do proletariado. Na república democrática, organizada por uma Assembleia-Constituinte
soberana e livremente eleita no sufrágio universal, etc., o CC vê não só instrumentos abso-
lutamente insubstituíveis de educação política das massas e de reagrupamento de classe do
proletariado sob a bandeira dos seus próprios interesses, mas também o único terreno so-
bre o qual o proletariado socialista pode desenvolver sua força social criadora (vide Teses e
resolução).

É incrível, mas é fato. De um lado, “a luta para restaurar um regime demo-


crático” é, ao que parece, “capaz de ameaçar diretamente as conquistas socialistas
fundamentais da revolução”, e é então chamada contrarrevolucionária; por ou-
176 Obras Escolhidas

tro lado, o CC menchevique, “como antes”, declara-se favorável à “Assembleia-


Constituinte soberana”, já agora sepultada! Ou será que o CC menchevique
pensa chegar a obter a “Constituinte” sem “luta armada”? Que fim levaria,
nesse caso, a “necessidade histórica da revolução bolchevique”, que deu, cabo
da “Assembleia-Constituinte soberana”? Há mais. O CC menchevique pede,
nem mais nem menos, “a abolição dos órgãos excepcionais de repressão policial
e dos tribunais extraordinários” e “a cessação do terrorismo político e econômico”
(vide Teses e resolução).
Por um lado, se reconhece a “necessidade histórica” da ditadura do proleta-
riado, que tem a função de destruir a resistência da burguesia, por outro se pede
a abolição de alguns importantes instrumentos do poder, sem os quais essa des-
truição é inconcebível! Que fim levarão em tal caso as conquistas da Revolução
de Outubro, contra a qual a burguesia luta com todas as forças, chegando até a
organizar ações terroristas e complôs de banditismo? Como se pode reconhecer
a “necessidade histórica” da Revolução de Outubro, se não se reconhecem os re-
sultados e as consequências que dela derivam? Conseguirá o CC menchevique
sair de uma vez por todas dessa incrível confusão pequeno-burguesa?

Que virá depois?

De resto, ele tenta sair dela. Ouvi:


Apoiando o objetivo de restabelecer apenas com as forças da democracia a unidade e a inde-
pendência da Rússia na base das conquistas da revolução e repelindo por esse mesmo motivo
qualquer ingerência dos capitalistas estrangeiros nos assuntos internos da Rússia”, o partido
menchevique ”está politicamente solidário com o governo soviético, porquanto este defende
particularmente a libertação do território da Rússia contra a ocupação estrangeira, e luta
contra as tentativas da democracia não proletária de ampliar ou de conservar essa ocupação.
Mas essa solidariedade política, no que concerne à ingerência imperialista, poderia levar a
um apoio direto às operações militares do governo soviético, que visam a libertar os territórios
da Rússia ocupados, apenas no caso de que esse governo se declarasse efetivamente disposto
a fundamentar suas relações com a democracia não bolchevique das regiões periféricas sobre
um acordo recíproco e não sobre a repressão e o terrorismo (vide Teses e Resolução).

Então, da luta contra o Poder Soviético ao “acordo” com ele. “Solidariedade


política com o governo soviético”. Não sabemos até que ponto essa solidariedade
é completa, mas será talvez necessário dizer que os bolcheviques não se oporão
à solidariedade do CC menchevique com o Poder Soviético? Compreendemos
muito bem a diferença que existe entre a solidariedade com o governo soviético
e a solidariedade, digamos, com os membros da Assembleia-Constituinte de Sa-
mara. “Apoio direto às operações militares do governo soviético”...
Não sabemos quantas tropas o CC menchevique poderia pôr à disposição do
Poder Soviético, nem as forças militares com as quais poderia enriquecer o exér-
cito soviético, mas será talvez preciso demonstrar que os bolcheviques não pode-
rão senão desejar o apoio militar ao Poder Soviético? Compreendemos muito
bem quanto é profunda a diferença entre apoio militar ao governo soviético e
a participação dos mencheviques, digamos, na “conferência de defesa”169 , no
169A Conferência para a Defesa foi convocada em Petrogrado a 7 de agosto de 1917 pelo Comitê
Executivo Central dos Sovietes, composto então de social-revolucionários e mencheviques, como fim
J. V. Stalin 177

tempo da guerra imperialista, sob o governo de Kerensky. Eis tudo. Mas a expe-
riência ensinou-nos a não acreditar nos homens através de palavras; habituamo-
nos a julgar os partidos e os grupos não só por suas resoluções, mas sobretudo
por seus atos.
E como agem os mencheviques? Na Ucrânia os mencheviques até agora não
romperam com o governo contrarrevolucionário de Skoropadski, que luta com
todas as suas forças contra os elementos soviéticos locais e que, assim fazendo, fa-
vorece a dominação dos imperialistas internos e estrangeiros no sul. No Cáucaso
os mencheviques já há muito tempo aliaram-se aos latifundiários e aos capita-
listas e, declarada a guerra santa contra os homens da Revolução de Outubro,
pediram ajuda aos imperialistas alemães.
Nos Urais e na Sibéria, os mencheviques, solidarizando-se com os imperi-
alistas anglo-franceses, de fato contribuíram e continuam contribuindo para a
supressão das conquistas da Revolução de Outubro. Em Krasnovodsk os men-
cheviques abriram aos imperialistas ingleses as portas da região transcaspiana,
facilitando-lhes a tarefa de derrotar o Poder Soviético no Turquestão. Enfim,
uma parte dos mencheviques da Rússia Europeia proclama a necessidade da luta
“ativa” contra o Poder Soviético, organiza greves contrarrevolucionárias na re-
taguarda do nosso Exército, que está derramando o seu sangue na guerra pela
libertação da Rússia e desse modo inexequível presta o “apoio às operações mi-
litares do governo soviético” apregoado pelo CC menchevique. Todos esses ele-
mentos mencheviques, antissocialistas e contrarrevolucionários, na zona central
e nas regiões periféricas da Rússia continuam, contudo, a considerar-se mem-
bros do partido menchevique, partido cujo CC anuncia agora, de forma solene,
“solidariedade política” ao Poder Soviético.
Perguntamos: 1º) Qual a atitude do CC do partido menchevique a respeito
dos elementos contrarrevolucionários mencheviques acima citados? 2º) Pensa
romper com eles de maneira decidida e sem hesitações! 3º) Ao menos deu um
primeiro passo em tal direção?
Todas estas são perguntas para as quais não encontramos resposta nem na
“resolução” do CC menchevique, nem na atividade prática dos mencheviques.
Entretanto é que só uma decidida ruptura com os elementos mencheviques con-
trarrevolucionários poderia fazer avançar alguns passos o problema do “acordo
recíproco”, proclamado agora pelo CC menchevique.

de mobilizar as forças e os meios da população para o prosseguimento da guerra imperialista.


178 Obras Escolhidas

A Revolução de Outubro e a
questão nacional
19 de novembro de 1918

A questão nacional não pode ser considerada como um problema fixo, pro-
posto de uma vez para sempre. Sendo uma parte da questão geral da transfor-
mação da ordem existente, a questão nacional é determinada pelas condições
do ambiente social, pelo caráter do poder no país e por todo o processo de de-
senvolvimento da sociedade. Isto se apresenta de maneira evidente no período
da revolução na Rússia, quando a questão nacional e o movimento nacional nas
regiões periféricas da Rússia mudam rápida o seu conteúdo em relação com a
marcha e o êxito da revolução.

I. A Revolução de Fevereiro e a questão nacional


Na época da revolução burguesa na Rússia (fevereiro de 1917), o movimento
nacional nas regiões periféricas tinha um caráter de movimento de libertação
burguês. As nacionalidades da Rússia, durante séculos oprimidas e exploradas
pelo “antigo regime”, pela primeira vez tiveram a sensação de sua força e se
lançaram à luta contra os opressores. “Liquidação da opressão nacional” era a
palavra de ordem do movimento. Com a rapidez de um relâmpago nas regiões
periféricas da Rússia multiplicaram-se as instituições “nacionais”. À frente do
movimento puseram-se os intelectuais democráticos burgueses das várias nações.
Os “sovietes nacionais” na Letônia, na região estoniana, na Lituânia, na Geórgia,
na Armênia, no Azerbaijão, no Cáucaso Setentrional, na Quirguízia e no médio
Volga; a “Rada” na Ucrânia e na Bielorrússia; o “Statulzarii” na Bessarábia; o
“Kurultai” na Criméia e na Bachkíria; o “governo autônomo” no Turquestão,
estas eram as instituições “nacionais” em torno das quais a burguesia nacional
reunia suas forças. Tratava-se de libertar-se do tsarismo, “causa fundamental” da
opressão nacional, e de formar Estados nacionais burgueses. O direito das na-
ções à autodeterminação era interpretado como o direito da burguesia nacional
das regiões periféricas a tomar o poder em suas mãos e a utilizar a Revolução
de Fevereiro para formar um Estado nacional “próprio”. O desenvolvimento
ulterior da revolução não entrava, não podia entrar nos cálculos das institui-
ções burguesas supracitadas. Perdia-se de vista, além disso, que o tsarismo estava
sendo substituído pelo imperialismo nu e cru, sem máscara, e que exatamente
esse imperialismo era o mais forte e mais perigoso inimigo das nacionalidades,
e constituía a base de uma nova opressão nacional.
A derrubada do tsarismo e a subida da burguesia ao poder não levaram, to-
davia, à destruição da opressão nacional. A velha e brutal forma de opressão
nacional transformou-se em forma nova, mais requintada, mas não menos peri-
gosa. O governo de Lvov Miliukov e Kerensky não só não abandonou a política
de opressão nacional, mas organizou novos ataques contra a Finlândia (dissolu-
J. V. Stalin 179

ção da Dieta no verão de 1917) e contra a Ucrânia (dissolução das instituições


culturais). Além disso, esse governo, por sua natureza imperialista, convidou a
população a prosseguir na guerra, visando a conquista de novos territórios, de
novas colônias e nacionalidades. A isso o impulsionava não só a natureza íntima
do imperialismo, como também a presença no Ocidente de velhos Estados im-
perialistas, que tendiam irresistivelmente a submeter novos territórios e novas
nacionalidades, e ameaçavam restringir sua esfera de influência. A luta dos Es-
tados imperialistas pela submissão das pequenas nacionalidades, condição para
a existência desses Estados: esse foi o quadro que apareceu no curso da guerra
imperialista.
A derrubada do tsarismo e a entrada em cena do governo de Miliukov-Kerens-
ky não trouxeram absolutamente nenhuma modificação a esse feio quadro. Na-
turalmente, na medida em que as instituições “nacionais” das regiões periféricas
mostravam tendências à autonomia estatal, chocavam-se com a insuperável re-
sistência do governo imperialista da Rússia. Ao invés, na medida em que essas
instituições, sancionando o poder da burguesia nacional, permaneceram surdas
aos interesses fundamentais de “seus” operários e camponeses, suscitaram nestes
últimos lamentos e descontentamento. Os chamados “regimentos nacionais” não
fizeram outra coisa senão deitar azeite no fogo: contra a ameaça que vinha de
cima, eram impotentes, enquanto não faziam senão acentuar e agravar a ameaça
que vinha de baixo. As instituições “nacionais” permaneceram sem defesa, seja
contra os golpes do exterior, seja contra as explosões internas. Os Estados bur-
gueses nacionais então surgidos, não conseguindo consolidar-se, começaram a
dissolver-se. Assim, a velha interpretação democrático-burguesa do princípio de
autodeterminação se transformou numa simulação e perdeu seu sentido revolu-
cionário. Era evidente que nessas condições não se podia nem sequer pensar em
destruir a opressão nacional e instituir a autonomia para os pequenos Estados
nacionais. Evidentemente, a libertação das massas trabalhadoras das nacionali-
dades oprimidas e a destruição das opressões nacionais não podiam ser concebi-
das sem a ruptura com o imperialismo, sem a derrubada da “própria” burguesia
nacional e a subida ao poder dessas mesmas massas trabalhadoras! Depois da
Revolução de Outubro isso tornou-se claro.

II. A Revolução de Outubro e a questão nacional

A revolução de fevereiro ocultava em seu seio contradições internas inconci-


liáveis. A revolução consumara-se graças aos esforços dos operários e dos cam-
poneses (soldados), entretanto, em consequência da revolução, o poder passara
não aos operários e camponeses, mas à burguesia. Fazendo a revolução, os ope-
rários e camponeses queriam acabar com a guerra e obter a paz. Ao contrário, a
burguesia, depois de subir ao poder, tentava explorar o fervor revolucionário das
massas para prolongar a guerra, contra a paz. A desordem econômica existente
no país e a crise alimentar impunham a expropriação do capital e das empresas
industriais em benefício dos operários, o confisco das terras dos grandes proprie-
tários em benefício dos camponeses, ao passo que o governo burguês de Miliukov
e de Kerensky defendia os interesses dos latifundiários e dos capitalistas, pro-
180 Obras Escolhidas

tegendo decididamente estes últimos dos ataques dos operários e camponeses.


Essa, portanto, foi uma revolução burguesa, feita pelos operários e camponeses
em benefício dos exploradores. Enquanto isso, o país continuava gemendo sob o
peso da guerra imperialista, do desastre econômico e da anarquia nos aprovisio-
namentos. A frente desmoronava e dissolvia-se. As fábricas e oficinas cessavam
toda atividade. No país aumentava a fome. A revolução de fevereiro, com suas
contradições internas, mostrava-se sem dúvida insuficiente para a “salvação do
país”. O governo Miliukov-Kerensky mostrava-se evidentemente incapaz de re-
solver as questões fundamentais da revolução. Tornava-se necessária uma nova
revolução, socialista, que tirasse o país do beco sem saída da guerra imperialista
e do caos econômico. Essa revolução foi a Revolução de Outubro.
Derrubando o poder dos grandes proprietários de terras e da burguesia e co-
locando em seu lugar os operários e camponeses, a Revolução de Outubro, de
um só golpe, resolveu as contradições da de fevereiro. O aniquilamento da oni-
potência dos grandes proprietários de terras e dos kulaks e a entrega da terra em
usufruto às massas trabalhadoras do campo; a expropriação das fábricas e das
oficinas, que foram confiadas à direção dos operários; o rompimento com o im-
perialismo e a liquidação da guerra de rapina; a publicação dos acordos secretos e
o desmascaramento da política de conquista de territórios alheios; enfim, a pro-
clamação da autodeterminação das massas trabalhadoras dos povos subjugados e
o reconhecimento da independência da Finlândia; tais foram as medidas funda-
mentais adotadas pelo Poder Soviético no início da revolução soviética. Esta foi
uma revolução efetivamente socialista. A revolução, iniciada no centro, não podia
continuar por muito tempo limitada ao âmbito de seu restrito território. Tendo
vencido no centro, precisava inevitavelmente difundir-se nas zonas periféricas. E
efetivamente a vaga revolucionária que vinha do Norte, desde os primeiros dias
da revolução, alastrou-se por toda a Rússia, invadindo uma região após outra.
Mas aí esbarrou de encontro a um dique representado pelos “sovietes nacionais”
e pelos “governos” regionais formados antes de Outubro (Don, Kuban, Sibéria).
Esses “governos nacionais” não queriam nem sequer ouvir falar em revolução
socialista. Burgueses por natureza, não desejavam em absoluto destruir o velho
regime burguês; ao contrário, consideravam seu dever conservá-lo e consolidá-lo
com todas as suas forças. Imperialistas em sua essência, não queriam romper em
absoluto com o imperialismo; ao contrário, jamais foram estranhos às invasões
e sujeições de grandes e pequenos trechos de territórios “estrangeiros” toda vez
que se apresentavam possibilidades para isso.
Não há nada de estranho no fato de que os “governos nacionais” das regiões
periféricas declarassem guerra ao governo socialista do centro. Uma vez decla-
rada a guerra tornaram-se focos da reação, reunindo todas as forças contrarrevo-
lucionárias da Rússia. Não é segredo que, naqueles focos, refugiaram-se todos os
contrarrevolucionários fugidos da Rússia, que lá, em torno daqueles focos, cons-
tituíram os regimentos “nacionais” dos guardas brancos. Entretanto, além dos
governos “nacionais”, nas regiões periféricas há também operários e camponeses.
Organizados em seus sovietes de deputados revolucionários segundo o mo-
delo dos sovietes dos deputados do centro da Rússia desde antes da Revolução de
Outubro, eles jamais romperam os laços com seus irmãos do Norte. Também eles
lutaram para vencer a burguesia, também se bateram pela vitória do socialismo.
J. V. Stalin 181

Não é de admirar se o seu conflito com os “seus” governos nacionais se aguçasse


dia a dia. A Revolução de Outubro não faz outra coisa senão consolidar a união
dos operários e camponeses das zonas periféricas com os operários e camponeses
da Rússia, incutindo-lhes a fé na vitória do socialismo. A guerra dos “governos
nacionais” contra o Poder Soviético provocou um conflito das massas nacionais
com esses “governos”, conflito que chegou até à completa ruptura com eles, até
à revolta aberta. Assim se formou a união socialista dos operários e dos cam-
poneses de toda a Rússia contra a união contrarrevolucionária dos “governos”
nacionais burgueses das regiões periféricas da Rússia.
Algumas pessoas apresentam a luta dos “governos” periféricos como uma luta
pela libertação nacional contra o“impiedoso centralismo” do Poder Soviético.
Mas isso não é em absoluto uma verdade. Nenhum poder no mundo jamais
admitiu uma descentralização tão ampla, nenhum governo no mundo jamais
concedeu aos povos uma liberdade nacional tão plena como o Poder Soviético
na Rússia. A luta dos “governos” periféricos foi e continua sendo uma luta dos
contrarrevolucionários burgueses contra o socialismo. Apenas para induzir em
erro as massas se utiliza a bandeira nacional como bandeira do povo, destinada
a encobrir os propósitos contrarrevolucionários da burguesia nacional.
Mas a luta dos “governos nacionais” e regionais revelou-se uma luta desigual.
Atacados por dois lados, de fora pelo Poder Soviético da Rússia, e de dentro
por ”seus” operários e camponeses, os “governos nacionais” foram obrigados a
retirar-se desde os primeiros combates. A revolta dos operários e dos torparis170
finlandeses e a fuga do “Senado” burguês; a revolta dos operários e dos cam-
poneses ucranianos e a fuga da “Rada” burguesa ; a revolta dos operários e dos
camponeses no Don, no Kuban, na Sibéria e a derrocada de Kaledin, de Kor-
nilov e do “governo” siberiano; a revolta dos pobres do Turquestão e a fuga do
“governo autônomo”; a revolta agrária no Cáucaso e a completa impotência dos
“sovietes nacionais” da Geórgia, da Armênia e do Azerbaijão, são fatos conhe-
cidos por todos, que demonstraram a absoluta falta de ligação dos “governos”
regionais com as “suas” massas trabalhadoras. Os ”governos nacionais”, desba-
ratados, foram “constrangidos” a pedir ajuda contra os “seus” operários e cam-
poneses aos imperialistas do Ocidente, aos seculares opressores e exploradores
das nacionalidades de todo o mundo. Teve assim início o período da intervenção
estrangeira e da ocupação das regiões periféricas, que mais uma vez demonstrou
o caráter contrarrevolucionário dos “governos” “nacionais” e regionais. Só então
se tornou evidente para todos que a burguesia nacional não aspira a libertar o
“seu povo” do jugo nacional, mas pretende tirar disso lucros, conservar os pró-
prios privilégios e os próprios capitais. Só então se tornou claro que a libertação
nacional das nacionalidades oprimidas não é concebível sem o rompimento com
o imperialismo, sem a derrubada da burguesia das nacionalidades subjugadas,
sem a passagem do poder para as mãos das massas trabalhadoras dessas naciona-
lidades. Assim, a velha concepção burguesa do princípio de autodeterminação,
juntamente com a palavra de ordem “Todo o poder à burguesia nacional”, foi
desmascarada e eliminada pelo próprio curso da revolução. A concepção soci-

170Camponeses finlandeses sem terra, que tomavam de aluguel as terras dos latifundiários em con-
dições semifeudais (N.T.).
182 Obras Escolhidas

alista do princípio de autodeterminação, segundo a palavra de ordem “Todo o


poder às massas trabalhadoras das nacionalidades oprimidas”, obteve todos os
direitos e possibilidades de ser aplicada. Assim, a Revolução de Outubro, pondo
fim ao antigo movimento de libertação nacional burguês, iniciou a era do novo
movimento socialista dos operários e camponeses das nacionalidades oprimidas,
dirigido contra qualquer opressão, mesmo contra a nacional, contra o poder da
burguesia “patrícia” e outras, contra o imperialismo em geral.

III. O significado mundial da Revolução de


Outubro

Tendo vencido, a Revolução de Outubro não podia permanecer entre os li-


mites territoriais da Rússia. Na atmosfera da guerra imperialista mundial e do
descontentamento geral das camadas inferiores, ela não podia senão difundir-se
nos países vizinhos. O rompimento com o imperialismo e a libertação da Rús-
sia da guerra de rapina; a publicação dos acordos secretos e a solene renúncia
à política de conquista dos territórios estrangeiros; a proclamação da liberdade
nacional e o reconhecimento da independência da Finlândia; a proclamação da
Rússia como ”Federação das Repúblicas Nacionais Soviéticas” e o apelo lançado
pelo Poder Soviético ao mundo por uma luta decidida contra o imperialismo;
tudo isso não podia deixar de exercer uma notável influência sobre o Oriente
subjugado e o Ocidente ensanguentado.
Efetivamente, a Revolução de Outubro foi a primeira revolução no mundo
que rompeu a secular letargia das massas trabalhadoras dos povos oprimidos do
Oriente, impelindo-as à luta contra o imperialismo mundial. A formação dos
sovietes dos operários e dos camponeses na Pérsia, na China e na Índia sob o
modelo dos da Rússia é prova bastante convincente. A Revolução de Outubro é a
primeira revolução no mundo que serviu de vivo exemplo de salvação aos operá-
rios e soldados do Ocidente, mostrando-lhes o caminho da efetiva libertação do
jugo da guerra e do imperialismo. A insurreição dos operários e dos soldados
na Áustria-Hungria e na Alemanha, a formação dos conselhos dos deputados
operários e soldados, a luta revolucionária contra a opressão nacional levada a
efeito pelos povos, privados de plenos direitos, da Áustria-Hungria, provam-no
de maneira bastante evidente. Não tem nenhuma importância o fato de que a
luta no Oriente e também no Ocidente ainda não se tenha conseguido libertar
de algumas características burguesas nacionalistas, pois o fato é que a luta con-
tra o imperialismo se iniciou, continua e necessariamente atingirá sua conclusão
lógica. A intervenção estrangeira e a política de ocupação dos imperialistas “es-
trangeiros” não fazem senão aguçar a crise revolucionária, incitando à luta novos
povos e ampliando a esfera das lutas revolucionárias contra o imperialismo. As-
sim, a Revolução de Outubro, estabelecendo a ligação entre os povos do Oriente
atrasado e os do Ocidente adiantado, atira esses povos no campo comum da luta
contra o imperialismo. Assim, a questão nacional, de questão particular da luta
contra a opressão nacional, desenvolve-se até se tornar a questão geral da liber-
tação das nações, das colônias e das semicolônias, do imperialismo.
O pecado mortal da II Internacional e de seu chefe, Kautsky, consiste, no fato
J. V. Stalin 183

de que escorregaram sempre na concepção burguesa do problema da autodeter-


minação nacional e, não compreendendo o seu significado revolucionário, não
souberam ou não quiseram colocar a questão nacional no terreno revolucioná-
rio da luta aberta contra o imperialismo, nem viram a ligação entre o problema
nacional e o da libertação das colônias. A obtusidade dos social-democratas aus-
tríacos do tipo de Bauer e de Renner consiste substancialmente no fato de que
não compreenderam a união indissolúvel da questão nacional com a questão do
poder e tentaram separar a questão nacional da política, relegando-a ao âmbito
dos problemas culturais, esquecendo a existência de “bagatelas” como o imperi-
alismo e as colônias a ele subordinadas.
Dizem que os princípios da autodeterminação e da “defesa da pátria” foram
anulados pelo curso dos acontecimentos, pela marcha da revolução socialista.
Não se anularam os princípios da autodeterminação e da “defesa da pátria”, mas
foram anuladas suas interpretações burguesas. Basta considerar as regiões ocu-
padas que agonizam sob a opressão do imperialismo e desejam a libertação, basta
considerar a Rússia, que conduz uma guerra revolucionária pela defesa da pátria
socialista e contra os saqueadores do imperialismo; basta refletir sobre os acon-
tecimentos que se verificam na Áustria-Hungria; basta considerar as colônias e
semicolônias subjugadas que já organizaram sovietes (Índia, Pérsia, China), basta
considerar tudo isso para compreender o valor revolucionário do princípio de
autodeterminação na interpretação que lhe dá o socialismo.
O grande significado mundial da Revolução de Outubro consiste principal-
mente no fato de que ela: 1º) ampliou os limites da questão nacional, transfor-
mando-a de questão da luta contra a opressão nacional na Europa em questão
geral da libertação dos povos das colônias e das semicolônias, oprimidos pelo
imperialismo; 2º) abriu amplas possibilidades e caminhos eficazes para atingir
essa libertação, tornando consideravelmente mais fácil aos povos oprimidos do
Ocidente e do Oriente sua libertação, conduzindo-os pela estrada geral da luta
vitoriosa contra o imperialismo; 3º) por esse mesmo motivo lançou uma ponte en-
tre o Ocidente socialista e o Oriente oprimido, constituindo uma nova frente da
revolução, que através da revolução russa une os proletários do Ocidente aos po-
vos oprimidos do Oriente contra o imperialismo mundial. Assim que se explica
o entusiasmo com que hoje se voltam para o proletariado da Rússia as massas
trabalhadoras exploradas do Oriente e do Ocidente.
Desse modo, sobretudo, explica-se o furor com que investem contra a Rússia
Soviética os saqueadores imperialistas de todo o mundo.
184 Obras Escolhidas

Nossas tarefas no Leste


2 de março de 1919

Com o avanço do Exército Vermelho para o leste e a abertura da estrada para


o Turquestão, uma série de novas tarefas nos confronta.
A população da parte oriental da Rússia não se caracteriza nem pela homo-
geneidade das gubernias centrais, o que facilita a construção socialista, nem pela
maturidade cultural das regiões fronteiriças oeste e sul, que possibilitaram re-
vestir o poder soviético com rapidez e sem dificuldades em fórmulas nacionais
apropriadas. Em contraste com essas regiões fronteiriças e o centro da Rússia,
as regiões orientais – tártaros, bashkirs, kirghiz, uzbeques, turcomanos, tadji-
ques e um grande número de outros grupos étnicos (um total de cerca de trinta
milhões de habitantes) – apresentam uma grande diversidade de povos cultu-
ralmente atrasados que ainda não emergiram do medievalismo ou que apenas
recentemente entraram na fase de desenvolvimento capitalista.
Esta circunstância, sem dúvida, complica e dificulta um pouco as tarefas do
poder soviético no Oriente.
Além das complicações de caráter puramente interno ligadas ao modo de
vida, há complicações de caráter “histórico”, introduzidas, por assim dizer, de
fora. Estamos nos referindo à política imperialista do governo tsarista voltada
para esmagar os povos do Oriente, à ganância insaciável dos mercadores russos
que atuavam como senhores nas regiões orientais e, também, à política jesuítica
dos padres russos, que se esforçavam por meios justos – ou não a arrastar os povos
muçulmanos para o seio da Igreja Ortodoxa – circunstâncias que despertaram
nos povos orientais um sentimento de desconfiança e ódio de tudo o que é russo.
É verdade que o triunfo da revolução proletária na Rússia e a política do
governo soviético de emancipação dos povos oprimidos sem dúvida ajudaram a
eliminar o clima de inimizade nacional e conquistaram para o proletariado russo
a confiança e o respeito dos povos do Oriente. E mais, há todos os motivos para
afirmar que os povos do Oriente, seus representantes mais esclarecidos, estão co-
meçando a considerar a Rússia como o baluarte e a bandeira de sua libertação das
cadeias do imperialismo. No entanto, a cultura restrita e o modo de vida retró-
grado não podem ser eliminados de uma só vez e eles ainda fazem (e continuarão
a fazer) sua influência sentida na construção do poder soviético no Oriente.
São essas desvantagens que a Comissão de Redação do Programa do Partido
Comunista Russo171 tem em mente quando afirma em seu projeto que, no que
diz respeito à questão da liberdade nacional “o Partido Comunista Russo defende
o ponto de vista histórico e de classe, levando em consideração o estágio de de-
senvolvimento histórico em que a dada nação se encontra – seja no caminho do
medievalismo para a democracia burguesa, ou da democracia burguesa para a
171A comissão para redigir o programa do Partido Comunista Russo, do qual V. I Lenin e J. V Stalin
eram membros, foi criada pelo Sétimo Congresso do Partido, em 8 de março de 1918. O projeto da
comissão foi tomado como base do programa aprovado pelo Oitavo Congresso.
J. V. Stalin 185

democracia soviética”, e que “o proletariado das nações que eram nações opres-
soras deve ter cuidado especial e estar particularmente atentos às sobrevivências
do sentimento nacional entre as massas trabalhadoras das nações oprimidas ou
desiguais”. Nossa tarefa é:
1) Elevar em todos os sentidos o nível cultural dos povos atrasados, para cons-
truir um amplo sistema de escolas e instituições educacionais, e para conduzir
nossa agitação soviética, oral e impressa, na língua que é nativa e entendida pela
população trabalhadora circundante.
2) Alistar as massas trabalhadoras do Oriente na construção do estado sovié-
tico e prestar-lhes a maior assistência na formação de seus volost, uyezd e outros
sovietes compostos de pessoas que apoiam o poder soviético e estão intimamente
ligados à população local.
3) Acabar com todas as deficiências, formais e reais, herdadas do antigo re-
gime ou surgidas em clima de guerra civil, que impeçam os povos do Oriente de
exercerem a máxima atividade independente para se emanciparem dos vestígios
do medievalismo e da opressão nacional que já foi destruída.
Só assim o poder soviético pode se tornar próximo e caro aos povos escra-
vizados do Oriente sem limites. Só assim pode ser erguida uma ponte entre a
revolução proletária do Ocidente e o movimento anti-imperialista do Oriente,
formando assim um círculo abrangente em torno do imperialismo moribundo.
A tarefa é construir uma cidadela do poder soviético no Oriente, plantar um
farol socialista em Kazan e Ufa, em Samarcanda e Tashkent, que iluminará o
caminho de emancipação dos povos atormentados do Oriente.
Não temos dúvidas de que o nosso devoto Partido e os funcionários soviéticos,
que suportaram todo o peso da revolução proletária e da guerra contra o impe-
rialismo, cumprirão com crédito este dever adicional que a história lhes impõe.
Pravda, nº 48.
2 de março de 1919
186 Obras Escolhidas

O fuzilamento dos vinte e seis


camaradas de Baku, obra dos
agentes do imperialismo britânico
23 de abril de 1919

Chamamos a atenção dos leitores para dois documentos172 sobre a feroz re-
presália exercida no outono do ano passado pelos imperialistas ingleses contra
dirigentes do Poder Soviético de Baku, que ocupavam cargos responsabilidade.
As fontes desses documentos são o jornal social-revolucionário Znamia Truda 173 e
a Edinaia Rossiia174 de Baku, isto é, os mesmos círculos que até ontem, traindo os
bolcheviques, pediram o auxílio dos ingleses e hoje são obrigados pelo curso dos
acontecimentos a desmascarar seus aliados de ontem. O primeiro documento dá
notícia do bárbaro fuzilamento de vinte e seis dirigentes soviéticos da cidade de
Baku (Chaumian, Djaparidze, Fioletov, Malyguin e outros) efetuado pelo capitão
inglês Teague-Jones, sem processo e sem instrução, na noite de 20 de setembro
de 1918, na estrada de Krasnovodsk a Askhabad, cidade para a qual deviam ser
conduzidos por Teague-Jones na qualidade de prisioneiros de guerra.
Teague-Jones e os seus companheiros social-revolucionários e mencheviques
esperavam abafar o assunto, propondo-se fazer circular falsos testemunhos sobre
a morte “natural” dos bolcheviques de Baku na prisão ou no hospital; mas esse
plano pereceu porque, segundo parece, ficaram testemunhas que não querem
calar e estão prontas a desmascarar até ao fim os bárbaros ingleses. Esse docu-
mento é assinado pelo social-revolucionário Tchaikin. O segundo documento
cita uma conversação do general inglês Thomson com o autor do primeiro do-
cumento, Tchaikin, havida em fins de março de 1919. O general Thomson pede
a Tchaikin que nomeie as testemunhas da feroz execução dos vinte e seis bolche-
viques de Baku efetuada pelo capitão inglês Teague-Jones. Tchaikin declara-se
pronto a apresentar os documentos e a nomear as testemunhas, sob a condição
de que seja constituída uma comissão de inquérito composta de representantes
do comando inglês, da população de Baku e dos bolcheviques do Turquestão;
pede ele, garantias de que as testemunhas turquestanas não sejam mortas por
agentes dos ingleses. Uma vez que Thomson não aceita a proposta da comissão
de inquérito e não dá garantias acerca da incolumidade pessoal das testemunhas,
a conversação é interrompida e Tchaikin se afasta.
O documento é interessante deste ponto de vista: confirmando a barbárie dos
imperialistas ingleses, ele não só revela, mas expõe de maneira gritante a fero-
172 Os dois documentos (“A execução dos 26 comissários” e “O encontro do general Thomson com
o senhor Tchaikin em 23 de março de 1919”) foram publicados com o presente artigo no Izvestia de
23 de abril de 1919.
173 Znamia Truda (A Bandeira do Trabalho), órgão do comitê dos social-revolucionários de Baku.

Circulou de janeiro de 1918 a novembro de 1919.


174 Edinaia Rossiia (A Rússia Unida), jornal e tendência cadete, publicado pelo chamado “Comitê

Nacional Russo de Baku”, de dezembro de 1918 a julho de 1919.


J. V. Stalin 187

cidade selvagem dos agentes ingleses, que, protegidos pela impunidade, se com-
portam com os “nativos” de Baku e das regiões transcáspias como se estes fossem
negros da África Central. Eis a história dos vinte e seis bolcheviques de Baku. Em
agosto de 1918, quando as tropas turcas estavam às portas de Baku e os membros
social-revolucionários e mencheviques do soviete de Baku, não obstante os bol-
cheviques, arrastaram a reboque a maioria do Soviete e pediram auxílio aos impe-
rialistas ingleses, os bolcheviques de Baku, com Chaumian e Djaparidze à frente,
em minoria, renunciaram ao seu poder, deixaram aos seus adversários políticos e
decidiram, consensualmente ao poder inglês social-revolucionário-menchevique
a constituição em Baku, refugiar-se em Petrovsk lugar mais próximo do Poder
Soviético. Mas, quando se dirigia para Petrovsk, o vapor, que levava os bolche-
viques de Baku e suas famílias, foi bombardeado pelos navios ingleses que os
seguiam e conduzido a Krasnovodsk. Isso aconteceu em agosto.
Depois disso, o governo soviético da Rússia dirigiu-se ao comando inglês, ofe-
recendo prisioneiros ingleses em troca dos camaradas de Baku e de suas famílias;
mas o comando inglês nunca respondeu. Desde o mês de outubro começaram
a chegar notícias provenientes de particulares e de organizações sobre o fuzila-
mento dos camaradas de Baku. A 5 de março de 1919, Astracã interceptou uma
notícia difundida pelo rádio de Tiflis, a qual dizia que “Djaparidze e Chaumian
não estavam nas mãos do comando inglês, e que, segundo notícias colhidas no
local, foram mortos em setembro por um grupo de operários nas vizinhanças
de Kizyl-Arvat”. Essa era a 1ª tentativa dos assassinos ingleses de fazer recair a
culpa de sua ferocidade sobre os operários que nutriam um grande afeto tanto
por Chaumian como por Djaparidze. Agora, após a publicação dos documentos
supracitados, deve-se julgar como provado que os nossos camaradas de Baku, os
quais se haviam retirado da arena política e dirigiam-se a Petrovsk como fugiti-
vos, foram fuzilados sem processo e sem instrução pelos canibais da “civilizada” e
“humana” Inglaterra. Nos países “civilizados” costuma-se falar dos atos terroris-
tas e dos horrores cometidos pelos bolcheviques. Os imperialistas anglo-franceses
são, ao contrário, pintados como inimigos do terrorismo e dos fuzilamentos. Mas
acaso não é nítido que nunca o Poder Soviético se vingou dos seus adversários,
baixa e vilmente como fizeram os “civilizados” e “humanos” ingleses, e que só os
imperialistas podem ter necessidade de assassinatos sob a proteção da noite e de
ataques contra inimigos políticos inermes?
Se existem homens que duvidam disso, que leiam os documentos acima re-
feridos e chamem as coisas pelo seu nome. Chamando os ingleses a Baku e
traindo os bolcheviques, os mencheviques e os social-revolucionários daquela ci-
dade pensavam “servir-se” dos “hóspedes” ingleses como de uma força, mas pen-
savam que permaneceriam eles como donos do país, ao passo que os “hóspedes”
iriam embora para casa. Na realidade, aconteceu o contrário: os “hóspedes”
tornaram-se donos de poder ilimitado, os social-revolucionários e os menchevi-
ques transformaram-se em cúmplices necessários do criminoso e vil assassinato
dos vinte e seis comissários bolcheviques; além disso, os social-revolucionários
foram obrigados a passar para a oposição, desmascarando os novos donos, e os
mencheviques no seu jornal de Baku, a Iskra175 , foram obrigados a pregar a ali-

175 Iskra (Centelha), órgão do comitê menchevique de Baku. Saiu de novembro de 1918 a abril de
188 Obras Escolhidas

ança com os bolcheviques contra os “hóspedes agradáveis” de ontem. Não é acaso


claro que a aliança dos social-revolucionários e dos mencheviques com os agentes
do imperialismo é uma “aliança” de escravos e de lacaios com os seus amos?

1920.
J. V. Stalin 189

Discurso de abertura do II
Congresso das Organizações
Comunistas dos Povos Orientais da
Rússia
22 de novembro de 1919

Camaradas! Recebi do CC do Partido Comunista a tarefa de abrir o II Con-


gresso dos representantes das organizações comunistas muçulmanas do Oriente.176
Um ano transcorreu desde o I Congresso. Durante o período, na história
do socialismo deram-se dois acontecimentos importantes. Primeiro: na Europa
Ocidental e na América penetrou o espírito revolucionário e surgiram partidos
comunistas; segundo: os povos do Oriente despertaram para revolução. No Oci-
dente, os proletários ameaçam destruir a vanguarda das potências imperialistas
e tomar o poder. Aqui os proletários ameaçam destruir a retaguarda do impe-
rialismo, o Oriente, fonte de riquezas, a base sobre a qual se apoiam as riquezas
do imperialismo, de onde ele tira forças e onde pretende refugiar-se se for der-
rotado na Europa Ocidental. Há um ano, o imperialismo mundial ameaçava
apertar num estreito círculo de aço a Rússia Soviética. Agora, ele está cercado
porque recebe golpes pelos flancos e pela retaguarda. Há um ano, os delega-
dos ao I Congresso Muçulmano dos Povos do Oriente, ao se separarem, juraram
fazer tudo quanto estivesse ao seu alcance para despertar do torpor os povos do
Oriente, lançar uma ponte entre a revolução do Ocidente e os povos oprimidos
do Oriente. Agora, passando em revista essa atividade, pode-se com satisfação
verificar que esse trabalho revolucionário não foi executado em vão, que a ponte
contra os estranguladores da liberdade de todos os povos oprimidos foi erigida.
Afinal, se os nossos exércitos vermelhos avançaram e em direção ao Oriente,
nesse avanço, seu trabalho teve uma função de importância. Se hoje o caminho
para o Oriente está aberto, a revolução deve-o mais uma vez ao intensíssimo tra-
balho que os nossos camaradas delegados executaram nos últimos tempos. Só à
coesão das organizações comunistas muçulmanas dos povos do Oriente, e antes
de mais nada das dos tártaros, bachkírios, quirguizes, dos povos do Turquestão,
só à sua coesão se pode atribuir o rápido desenvolvimento dos acontecimentos
que observamos agora no Oriente. Não duvido, camaradas, de que este con-
gresso, o II Congresso, mais rico que o I, quer do ponto de vista quantitativo
quer do qualitativo, saberá continuar o trabalho iniciado para o despertar dos
176O II Congresso das organizações comunistas dos povos orientais de toda a Rússia realizou-se em
Moscou de 22 de novembro a 3 de dezembro de 1919. Estavam presentes ao Congresso cerca de 80
delegados, representantes das organizações comunistas muçulmanas do Turquestão, do Azerbaijão,
de Khiva, de Bukhara, da Quirguízia, da Tartária, da Tchuvachia da Bachkiria, do Cáucaso e de cida-
des isoladas (Perm, Viatka, Oronburg e outras). O informe sobre a situação política foi apresentado
por Lenin. No Congresso foi dado um balanço no trabalho efetuado pelo Bureau Central das orga-
nizações muçulmanas do P.C.(b) da Rússia, discutiu-se a questão oriental e foram fixados os objetivos
que o Partido e os sovietes se propunham atingir no Oriente.
190 Obras Escolhidas

povos do Oriente, para o fortalecimento da ponte lançada entre o Ocidente e o


Oriente, o trabalho pela libertação das massas trabalhadoras do jugo secular do
imperialismo. Esperamos que a bandeira levantada pelo I Congresso, a bandeira
da libertação das massas trabalhadoras do Oriente, a bandeira da derrota do im-
perialismo, será levada até o fim com honra pelos militantes das organizações
comunistas muçulmanas. (Aplausos).
J. V. Stalin 191

Lenin, organizador e líder do


Partido Comunista da Rússia
23 de abril de 1920

Existem dois grupos de marxistas. Ambos trabalham sob a bandeira do mar-


xismo e consideram-se “verdadeiros” marxistas. Contudo, estão bem longe de
ser idênticos. Pelo contrário, um abismo os separa, uma vez que seus métodos de
trabalho são diametralmente opostos.
O primeiro grupo limita-se ao reconhecimento exterior do marxismo, à sua
solene proclamação. Não sabendo ou não querendo penetrar a substância do
marxismo, não sabendo ou não querendo aplicá-lo na prática, esse grupo trans-
forma as teses vivas e revolucionárias do marxismo em fórmulas mortas que não
dizem nada. Esse grupo não baseia sua atividade na experiência, nos ensina-
mentos do trabalho prático, mas nas citações tomadas de Marx. Tira indicações
e diretivas, não da análise da realidade viva, mas das analogias e dos paralelos
históricos. A discordância entre as palavras e os atos: eis a doença principal desse
grupo. Daí as desilusões e a perpétua insatisfação com o destino, que contínua e
regularmente o trai, e zomba dele. O nome desse grupo é menchevismo (na Rús-
sia), e oportunismo (na Europa). No Congresso de Londres o camarada Tyszko
deu uma definição bastante precisa desse grupo, dizendo que ele não parte do
ponto de vista do marxismo, mas repousa sobre este.
O segundo grupo, pelo contrário, transfere o centro de gravidade da ques-
tão, do reconhecimento exterior do marxismo para a sua realização, para a sua
aplicação prática. A indicação, de conformidade com a situação. dos caminhos
e meios para a realização do marxismo, a modificação desses caminhos e desses
meios quando a situação muda: eis os pontos para os quais esse grupo volta sua
atenção. Ele extrai diretivas e ensinamentos, não das analogias e dos paralelos
históricos, mas do estudo das circunstâncias. Em sua atividade, não se baseia nas
citações e nas sentenças, mas na experiência prática; verifica todos os seus passos
com a experiência; extrai ensinamentos dos próprios erros e ensina aos outros
a construção de uma nova vida. Isso precisamente explica por que na atividade
desse grupo a palavra não diverge da ação e a doutrina de Marx conserva intei-
ramente a sua viva força revolucionária. A esse grupo se aplicam plenamente as
palavras de Marx, segundo as quais os marxistas não podem limitar-se a explicar
o mundo, mas devem seguir além, a fim de transformá-lo. O nome desse grupo
é bolchevismo, comunismo. O organizador e líder desse grupo é V. I. Lenin.

Lenin, organizador do Partido Comunista da


Rússia

A formação do partido proletário na Rússia deu-se em condições particula-


res, diferentes das existentes no Ocidente no momento em que lá se organizava o
192 Obras Escolhidas

partido operário. Ao passo que no Ocidente, na França, na Alemanha, o partido


operário surgiu dos sindicatos; quando estes e os partidos existiam legalmente,
na situação criada após a revolução burguesa, quando existia o parlamento bur-
guês; e a burguesia tendo chegado ao poder se encontrava frente a frente com o
proletariado. Na Rússia, pelo contrário, a formação do partido proletário deu-se
sob o mais feroz absolutismo, na expectativa da revolução democrático-burguesa,
quando por um lado as organizações partidárias regurgitavam de elementos bur-
gueses “marxistas legais”, ávidos por utilizar a classe operária para os fins da re-
volução burguesa e, por outro, os gendarmes tsaristas arrancavam das fileiras do
partido os seus melhores militantes, no momento em que o desenvolvimento do
movimento revolucionário espontâneo exigia a presença de um núcleo combativo
de revolucionários, sólido, coeso e suficientemente clandestino, capaz de dirigir
o movimento no sentido de abater o absolutismo.
A tarefa consistia em separar o trigo do joio, em nos afastarmos dos elemen-
tos estranhos, em organizar na base quadros de revolucionários experimentados,
em dar-lhes um programa claro e uma tática firme e, enfim, em reunir esses
quadros numa única organização combativa de revolucionários profissionais su-
ficientemente clandestina para resistir aos golpes dos gendarmes, mas ao mesmo
tempo ligada às massas para conduzi-las à luta quando chegasse o momento.
Os mencheviques, aqueles mesmos que “repousam” sobre o ponto de vista do
marxismo, resolviam a questão de maneira muito simples: como no Ocidente o
partido operário surgira dos sindicatos sem partido, que lutavam pela melhoria
das condições econômicas da classe operária, também na Rússia se devia, na me-
dida do possível, proceder da mesma maneira, isto é, limitar-se, por enquanto, às
“lutas econômicas dos operários contra os patrões e o governo” em escala local,
sem criar uma organização de luta em escala nacional, e depois... depois, se nesse
ínterim não surgissem sindicatos, convocar um congresso operário apartidista e
proclamar partido o próprio congresso.
Que esse “plano marxista” dos mencheviques, utópico dadas as condições da
Rússia, pressupusesse não obstante um amplo trabalho de agitação no sentido
de aviltar o conceito de partido, de destruir os quadros do partido, de deixar o
proletariado sem o seu partido e de abandonar a classe operária nas mãos dos
liberais, então os mencheviques, e talvez também muitos bolcheviques, provavel-
mente não o imaginavam sequer. O maior mérito de Lenin diante do proleta-
riado russo e do seu partido é o de haver revelado todo o perigo do “plano”
organizativo dos mencheviques, desde o momento em que o “plano” mal tinha
sido concebido e os seus próprios autores lhe entreviam com dificuldades os con-
tornos. E denunciando esse perigo, Lenin iniciou um violento ataque contra a
frouxidão organizativa dos mencheviques, concentrando toda a atenção dos ati-
vistas nesse problema. Tratava-se, de fato, da existência do Partido, da sua vida
e da sua morte.
Criar um jornal político para toda a Rússia, como centro de agrupamento das
forças do partido, organizar na base sólidos quadros partidários como “forma-
ções regulares” do partido, cimentar esses quadros através do jornal e fundi-los
todos num partido de luta para toda a Rússia, com limites nitidamente deter-
minados, um programa claro, uma tática firme, uma vontade única: eis o plano
J. V. Stalin 193

que Lenin desenvolveu, nos seus célebres livros: Que Fazer? e Um Passo Adiante,
Dois Passos Atrás. Esse plano tinha o mérito de corresponder plenamente à reali-
dade russa e de generalizar de maneira magistral a experiência organizativa dos
melhores ativistas. Na luta por esse plano a maioria dos ativistas russos seguiu
decididamente Lenin, sem se deter diante da cisão. A vitória desse plano lançou
as bases daquele Partido Comunista, coeso e temperado, que não tem igual no
mundo.
Não poucas vezes os nossos camaradas (e não só os mencheviques!) acusavam
Lenin de ser demasiado propenso à polêmica e à cisão, de combater com intran-
sigência os conciliadores, etc. Indubitavelmente, uma e outra coisa tiveram lugar
a seu tempo. Mas não é difícil de compreender que o nosso partido não teria po-
dido nem se desembaraçar da debilidade interna e do amorfismo, nem atingir a
força e a solidez que lhe são próprias, se não houvesse expulsado do seu seio os
elementos não proletários e oportunistas. Na época da dominação burguesa, o
partido proletário pode desenvolver-se e reforçar-se só na medida em que luta,
no próprio seio e na classe operária, contra os elementos oportunistas, hostis à
revolução, ao Partido. Lassalle tinha razão quando dizia: “Depurando-se, um
partido se fortalece.”177
Os acusadores reportavam-se de costume ao partido alemão, no qual flores-
cia então a “unidade”. Mas, em primeiro lugar, nem toda unidade é indício de
força, e, em segundo lugar, basta olhar hoje o velho partido alemão, dividido
em três partidos178 , para compreender quão falsa e ilusória é a “unidade” de
Scheidemann e de Noske com Liebknecht e Luxemburgo. E como saber se não
teria sido melhor para o proletariado alemão que os elementos revolucionários
do partido alemão tivessem se separado a tempo dos elementos antirrevolucio-
nários?... Sim, Lenin tinha mil vezes razão quando guiava o Partido no caminho
da luta intransigente contra os elementos hostis ao Partido e à revolução. Gra-
ças somente a essa política organizativa, pôde nosso partido atingir efetivamente
aquela unidade interna e aquela extraordinária coesão que lhe permitiram sair
incólume da crise de julho sob Kerensky, sustentar a insurreição de Outubro,
atravessar sem abalos a crise do período de Brest-Litovsk, organizar a vitória so-
bre a Entente e, enfim, atingir aquela incomparável ductilidade, graças à qual
consegue em qualquer momento reorganizar suas fileiras e concentrar centenas
de milhares dos seus membros para qualquer grande trabalho que seja, sem pro-
duzir perturbação no próprio conjunto.

Lenin, líder do Partido Comunista da Rússia

Mas as qualidades organizativas do Partido Comunista da Rússia não são se-


não um aspecto daquela questão. O Partido não teria podido desenvolver-se e
reforçar-se tão rapidamente se o conteúdo político do seu trabalho, se o seu pro-
grama e a sua tática não correspondessem à realidade russa, se as suas palavras
177 Essas palavras de Lassalle, contidas na carta a Marx, de 24 de junho de 1852, são citadas por
Lenin.
178 Da desagregação do velho Partido Social-Democrata alemão surgiram três partidos: o Partido

Social-Democrata, o Partido Social-Democrata Independente e o Partido Comunista.


194 Obras Escolhidas

de ordem não tivessem inflamado as massas operárias e não tivessem impelido


para a frente o movimento revolucionário. Passaremos agora a esse aspecto da
questão. A revolução democrático-burguesa russa (de 1905) desenvolveu-se em
condições diferentes das existentes no Ocidente, durante as comoções revoluci-
onárias na França e na Alemanha, por exemplo. Ao passo que a revolução no
Ocidente se desenvolveu no período da manufatura, quando a luta de classes
ainda não estava desenvolvida e o proletariado, débil e pouco numeroso, não
possuía um partido próprio que pudesse formular suas reivindicações, e a bur-
guesia era bastante revolucionária para inspirar confiança aos operários e aos
camponeses e conduzi-los à luta contra a aristocracia; na Rússia, pelo contrário,
a revolução começou (em 1905) no período do capitalismo industrial, quando a
luta de classes já estava desenvolvida, quando o proletariado russo, relativamente
numeroso e tornado coeso pelo capitalismo, já havia sustentado uma série de lu-
tas contra a burguesia, possuía o seu partido, mais coeso que o partido burguês,
possuía as suas reivindicações de classe, e a burguesia russa, que, de resto, vivia
dos pedidos de mercadorias feitos pelo governo, estava tão amedrontada com o
espírito revolucionário do proletariado que procurava aliar-se com o governo e
os latifundiários contra os operários e os camponeses. O fato de que a revolu-
ção russa estalou em seguida às derrotas militares nos campos da Manchúria,
esse fato somente forçou os acontecimentos, mas não lhes mudou em absoluto a
substância.
A situação exigia que o proletariado se colocasse à frente da revolução, reu-
nisse em torno de si os camponeses revolucionários e conduzisse uma luta decisiva
simultaneamente contra o tsarismo e contra a burguesia em nome da completa
democratização do país e da salvaguarda dos próprios interesses de classe. Mas os
mencheviques, aqueles mesmos que “repousam” sobre o ponto de vista do mar-
xismo, decidiram a questão a seu modo: uma vez que a revolução russa é uma
revolução burguesa, e as revoluções burguesas são dirigidas pelos representantes
da burguesia (vide a “história” das revoluções francesa e alemã), o proletariado
não pode ter a hegemonia na revolução russa, a direção deve ser confiada à bur-
guesia russa (aquela mesma que trai a revolução); os camponeses também devem
ser confiados à tutela da burguesia, e o proletariado deve manter-se na oposi-
ção de extrema esquerda. E esses banais refrães próprios de liberais de fancaria
eram apresentados pelos mencheviques como a última palavra do “verdadeiro”
marxismo!
O maior mérito de Lenin com relação à revolução russa é o de ter posto a
mostra, até às raízes, a inconsistência dos paralelos históricos dos mencheviques
e todo o perigo do “esquema da revolução” menchevique, que abandonava a causa
operária à mercê da burguesia. A ditadura democrático-revolucionária do prole-
tariado e do campesinato, ao invés da ditadura da burguesia; o boicote da Duma
de Buliguin179 e a insurreição armada, em vez da participação na Duma e do tra-

179 Em 1905, Buliguin, então ministro do interior, elaborou um projeto de lei para a convocação de
um organismo representativo com funções consultivas, chamada Duma de Buliguin. Os bolcheviques
boicotaram o projeto, e os acontecimentos revolucionários daquele ano obrigaram o governo tsarista
a renunciar à sua realização na prática e a promulgar uma nova lei eleitoral “... a Duma de Buliguin
nunca foi convocada. O furacão revolucionário varreu-a antes que fosse convocada” (vide informe
sobre a Revolução de 1905, em Lenin, La Revoluzione del 1905, Edições Rinascita, Roma, 1949, vol.
J. V. Stalin 195

balho orgânico no seio dela; a ideia do “bloco de esquerda” depois que a Duma,
apesar de tudo, se reunira e a utilização da tribuna da Duma para a luta fora da
Duma, ao invés do ministério cadete e da “salvaguarda” reacionária da Duma;
a luta contra o partido dos cadetes, como força contrarrevolucionária, ao invés
do bloco com ele: eis o plano tático desenvolvido por Lenin nos seus célebres
folhetos: “Duas Táticas da Social-Democracia na Revolução Democrática” e “A Vitória
dos Cadetes e as Tarefas do Partido Operário”.
O mérito desse plano consistia no fato de que ele, formulando decidida e
claramente as reivindicações de classe do proletariado no período da revolução
democrático-burguesa na Rússia, facilitava a passagem para a revolução socia-
lista, trazia consigo em embrião a ideia da ditadura do proletariado. Na luta por
esse plano tático, a maioria dos ativistas russos seguiu decidida e resolutamente
Lenin. A vitória desse plano lançou as bases da tática revolucionária, graças à
qual hoje o nosso partido abala os alicerces do imperialismo mundial.
O desenvolvimento ulterior dos acontecimentos, os quatro anos da guerra
imperialista e o fato de que toda a economia nacional se achava em desordem;
a revolução de fevereiro e a famosa dualidade do poder: de um lado o governo
provisório como foco da contrarrevolução burguesa, do outro lado o soviete de
Petrogrado como forma embrionária da ditadura proletária; a Revolução de Ou-
tubro e a dissolução da Constituinte; a abolição do parlamentarismo burguês e a
proclamação da República dos Sovietes; a transformação da guerra imperialista
em guerra civil; a intervenção do imperialismo mundial, de cambulhada com os
“marxistas” de boca, contra a revolução proletária; e, enfim, a situação lamen-
tável dos mencheviques, agarrados à Assembleia-Constituinte, jogados no mar
pelo proletariado e tangidos pelas vagas da revolução para as praias do capita-
lismo, tudo isso confirmou plenamente que os princípios da tática revolucionária
formulada por Lenin nas Duas Táticas eram justos. O partido que possuía tal he-
rança podia navegar ousadamente, sem temer os escolhos submarinos.
Em nossa época, que é a época da revolução proletária, em que toda pala-
vra de ordem do Partido e toda frase do chefe é submetida à prova dos fatos, o
proletariado exige que os seus dirigentes tenham capacidade especial. A história
conhece chefes proletários, chefes dos tempos de borrasca, chefes práticos, de
grande coragem e de grande abnegação, mas fracos em teoria. As massas não
se esquecem tão cedo dos nomes de semelhantes chefes. Tais são, por exemplo,
Lassalle na Alemanha, Blanqui na França. Mas o movimento no seu conjunto
não pode viver só de recordações: ele precisa de um objetivo claro (programa) e
de uma linha firme (tática).
Existem também chefes de outro gênero, chefes dos tempos de paz, fortes em
teoria, mas fracos em organização e no trabalho prático. Tais chefes são popu-
lares só entre as camadas superiores do proletariado e só até um determinado
momento; quando tem início uma época revolucionária, quando se exigem dos
chefes palavras de ordem práticas revolucionárias, os teóricos abandonam a cena,
cedendo o lugar a gente nova. Chefes desse tipo são, por exemplo, Plekhanov na
Rússia e Kautsky na Alemanha. Para manter-se no posto de chefe da revolução
proletária e do partido proletário é necessário unir em si a força da teoria e a ex-

I, p. 22).
196 Obras Escolhidas

periência prática organizativa do movimento proletário. P. Axelrod, quando era


marxista, escrevia acerca de Lenin que este “reunia felizmente em si a experiên-
cia de um bom prático ao preparo teórico e a um vasto horizonte político” (veja-se
o prefácio de P. Axelrod ao folheto de Lenin: Às Tarefas dos Social-Democratas Rus-
sos180 ). Não é difícil adivinhar o que diria Lenin o senhor Axelrod, ideólogo
do capitalismo “civilizado”. Mas para nós que conhecemos Lenin de perto e po-
demos examinar objetivamente a coisa, é indubitável que esses velhos dotes se
conservaram totalmente em Lenin. E aqui, entre outras coisas, é preciso pro-
curar a explicação do fato de que Lenin, e precisamente ele, é hoje o líder do
partido proletário mais forte e mais inflamado do mundo.

180O folheto As Tarefas dos Social-Democratas Russos foi escrito por Lenin no exílio, em fins de
1897. A primeira edição do folheto, com um prefácio de P. Axelrod, foi publicada em 1898, em
Genebra, pela “União dos Social-Democratas Russos” (vide Lenin, em dois volumes, Edições em
línguas estrangeiras, Moscou, 1949, vol. I, págs. 123-137).
J. V. Stalin 197

A política do poder soviético e a


questão nacional na Rússia
10 de outubro de 1920

Três anos de revolução e de guerra civil na Rússia mostraram que sem o apoio
mútuo da Rússia Central e de suas regiões periféricas a vitória da revolução é
impossível, e é impossível a libertação da Rússia das garras do imperialismo.
A Rússia Central, este foco da revolução mundial, não pode manter-se por
muito tempo sem o auxílio das regiões periféricas, ricas em matérias-primas, em
combustíveis e em gêneros alimentícios. As regiões periféricas da Rússia, por
sua vez, se lhes faltar o auxílio político, militar e organizativo da Rússia Cen-
tral, que é mais desenvolvida, estão condenadas inevitavelmente a suportar o
jugo imperialista. Se é verdadeira a tese de que o Ocidente proletário mais bem
desenvolvido não pode bater definitivamente a burguesia mundial sem o apoio
do Oriente camponês menos desenvolvido, porém rico em matérias-primas e em
combustíveis, é igualmente verdadeira a outra tese de que a Rússia Central, mais
bem desenvolvida, não pode levar a termo a revolução sem o apoio das regiões
periféricas da Rússia, menos desenvolvidas, porém ricas dos recursos necessários.
Indubitavelmente a Entente levou em conta essa circunstância desde os pri-
meiros dias de existência do governo soviético, quando pôs em prática o plano de
cerco econômico da Rússia Central, arrancando-lhe as regiões periféricas mais
importantes. Em seguida, o plano de cerco econômico da Rússia continuou a
figurar na base de todos os ataques da Entente contra a Rússia, de 1918 a 1920,
não se excluindo suas atuais maquinações na Ucrânia, no Azerbaijão e no Tur-
questão. Tanto maior é a importância de que se reveste a garantia de uma sólida
união entre o Centro e as regiões periféricas da Rússia. Daí a necessidade de es-
tabelecer determinadas relações, determinados laços entre o Centro e as regiões
periféricas da Rússia, de modo a garantir uma união estreita e indissolúvel en-
tre elas. De que espécie devem ser essas relações e que formas devem assumir?
Em outras palavras: em que consiste a política do Poder Soviético com respeito
à questão nacional na Rússia?
A separação da Rússia, reivindicada pelas regiões periféricas como forma de
relações entre o Centro e a periferia, deve ser excluída não só porque está em
contradição com a própria apresentação do problema no concernente à união
entre o Centro e as regiões periféricas, mas porque está em absoluto contraste
com os interesses das massas nacionais, quer do Centro quer das regiões periféri-
cas. Se se prescindir do fato de que a separação das regiões periféricas minaria o
poderio revolucionário da Rússia Central, a qual estimula o movimento de liber-
tação do Ocidente e do Oriente, as próprias regiões, após se separarem, cairiam
necessariamente debaixo do jugo do imperialismo internacional. Basta lançar
um olhar sobre a Geórgia, sobre a Armênia, sobre a Polônia, sobre a Finlândia e
sobre as outras regiões que se separaram da Rússia, que conservaram só a forma
exterior da independência, e, de fato, se transformaram em Estados vassalos,
198 Obras Escolhidas

submetidos ao poder incondicional da Entente; basta, enfim, recordar a recente


história da Ucrânia e do Azerbaijão, a primeira saqueada pelo capital alemão e
o segundo pela Entente, para se compreender todo o caráter contrarrevolucio-
nário de que, nas atuais condições internacionais, se reveste essa reivindicação
de separação das regiões periféricas. Enquanto lavra uma luta de morte entre a
Rússia proletária e a Entente imperialista, apresentam-se diante das regiões pe-
riféricas apenas duas saídas: ou junto com a Rússia, e se tem então a libertação
das massas trabalhadoras das regiões periféricas do jugo imperialista; ou junto
com a Entente, e se tem então o inevitável jugo imperialista.
Uma terceira saída não existe. A chamada independência das consideradas
independentes Geórgia, Armênia, Polônia, Finlândia, etc., não é senão uma falaz
aparência, que esconde a completa dependência desses, digamos assim, Estados,
deste ou daquele grupo de imperialistas. Naturalmente, as regiões periféricas
da Rússia, as nações e as raças que povoam essas regiões, como, de um modo ge-
ral, todas as outras nações, têm o imprescritível direito de separar-se da Rússia,
e se qualquer uma dessas nações decidisse em sua maioria separar-se da Rússia,
como fez a Finlândia em 1917, a Rússia provavelmente tomaria nota do fato e
sancionaria a separação. Mas não se trata aqui dos direitos das nações, que são
incontestáveis, e sim dos interesses das massas populares quer do Centro quer
das regiões periféricas, trata-se do caráter, determinado, por esses interesses, da
agitação que o nosso partido deve promover se não quiser renegar a si mesmo,
se quiser exercer influência sobre a vontade das massas trabalhadoras das várias
nacionalidades para dar a essa vontade uma determinada orientação. Pois bem,
os interesses das massas populares indicam que a reivindicação de separação das
regiões periféricas, na etapa atual da revolução, é profundamente contrarrevo-
lucionária.
Do mesmo modo deve ser excluída a chamada autonomia cultural nacional
como forma de união entre o Centro e as regiões periféricas da Rússia. A expe-
riência da Áustria-Hungria (pátria da autonomia cultural nacional) nos últimos
dez anos mostrou o quanto esse tipo de autonomia, como forma de união en-
tre as massas trabalhadoras de várias nacionalidades num Estado multinacional,
é efêmero e privado de vitalidade. Springer e Bauer, esses descobridores da
autonomia cultural nacional, os quais agora, com todo o seu astuto programa
nacional, ficaram a ver navios, são uma prova evidente disso. Enfim, o arauto
da autonomia cultural nacional da Rússia, o Bund, outrora famoso, foi obrigado
não faz muito tempo a reconhecer oficialmente a inutilidade dessa autonomia,
declarando abertamente que: “A exigência da autonomia cultural nacional no
quadro do regime capitalista perde seu significado nas condições da revolução
socialista” (vide XII Conferência do Bund, 1920, pág. 21). Resta a autonomia
regional das zonas periféricas que se distinguem por particularidades de cos-
tumes e por composição étnica, como a única forma racional de união entre o
Centro e as regiões periféricas, autonomia que deve unir as regiões periféricas
da Rússia ao centro com os laços da união federativa. Isto é, justamente aquela
autonomia soviética que o Poder Soviético proclamou desde os primeiros dias de
sua existência e que é posta agora em prática nas regiões periféricas sob formas
de comunas administrativas e de repúblicas soviéticas autônomas. A autonomia
soviética não é algo de cristalizado e de fixado de uma vez por todas; ela admite
J. V. Stalin 199

as mais variadas formas e os mais variados graus de desenvolvimento.


Da estrita autonomia administrativa (alemães do Volga, tchuvachos, carélios)
ela passa a uma autonomia mais ampla, política (bachkírios, tártaros do Volga,
quirguizes); da autonomia ampla, política, a uma forma ainda mais ampla (Ucrâ-
nia, Turquestão) e, enfim; do tipo de autonomia ucraniano à forma suprema de
autonomia, às relações estabelecidas por um tratado (Azerbaijão).
Essa maleabilidade de autonomia soviética constitui um dos seus méritos prin-
cipais, porque lhe permite abranger todas as características heterogêneas das re-
giões periféricas da Rússia, que se encontram nos mais vários graus de desenvol-
vimento cultural e econômico. Três anos de política soviética dirigida no sentido
de resolver a questão nacional na Rússia mostraram que, realizando a autono-
mia soviética nas suas variadas formas, o Poder Soviético se encontra no caminho
certo, porque só graças a essa política conseguiu penetrar nos mais remotos rin-
cões das regiões periféricas da Rússia, elevar a uma vida política as massas mais
atrasadas e diferentes pela nacionalidade, ligar essas massas ao Centro por meio
dos mais variados canais, tarefa que nenhum governo no mundo não só não re-
solveu, mas nem sequer se propôs resolver (pois havia medo de fazê-lo!).
A subdivisão administrativa da Rússia, fundada sobre a autonomia soviética,
ainda não está ultimada: os caucasianos do norte, os calmucos, os tcheremissos,
os votiacos, os buriatas, etc., ainda esperam que a questão seja resolvida; mas
qualquer que seja o aspecto que assuma o mapa administrativo da Rússia fu-
tura e quaisquer que sejam os erros que possam ser cometidos nesse terreno, e
alguns erros foram de fato cometidos, é preciso reconhecer que, pondo em prá-
tica a subdivisão administrativa baseada na autonomia regional, a Rússia deu um
passo enorme para a frente no caminho do agrupamento das regiões periféricas
em torno do Centro proletário, no caminho da aproximação do governo às am-
plas massas populares dessas regiões. Mas a proclamação desta ou daquela forma
de autonomia soviética, a publicação dos decretos e das disposições correspon-
dentes, e até mesmo a criação de governos regionais sob a forma de conselhos
regionais dos comissários do povo das repúblicas autônomas estão longe de ser
suficientes para robustecer a união entre as regiões periféricas e o Centro.
Para reforçar essa união é necessário liquidar aquele particularismo e aquele
espírito de campanário das regiões, aquele caráter patriarcal e aquela falta de
cultura, aquela desconfiança contra o centro, que permaneceram nas regiões pe-
riféricas, como herança da feroz política do tsarismo.
O tsarismo cultivava de propósito nas regiões periféricas o jugo patriarcal feu-
dal, a fim de manter as massas na escravidão e na ignorância. O tsarismo povoava
de propósito com colonizadores as mais belas localidades das regiões periféricas
para expulsar as massas nacionais locais para as piores zonas e acirrar as inimi-
zades nacionais. O tsarismo punha empecilhos à escola, ao teatro, às instituições
culturais locais, ou as suprimia, com o fim de manter as massas na ignorância;
reprimia qualquer iniciativa dos melhores homens da população das regiões peri-
féricas. Enfim, destruiu qualquer atividade das massas populares dessas regiões.
Agindo dessa maneira, fez nascer no seio das massas nacionais locais a mais pro-
funda desconfiança, que talvez se haja transformado em hostilidade contra tudo
quanto era russo.
200 Obras Escolhidas

Para consolidar a união entre a Rússia Central e as regiões periféricas é pre-


ciso que essa desconfiança desapareça, é preciso criar uma atmosfera de compre-
ensão mútua e de confiança fraternal. Mas para fazer desaparecer a desconfiança
é preciso antes de mais nada ajudar as massas populares das regiões periféricas
a libertarem-se dos restos do jugo patriarcal feudal, é preciso eliminar, eliminar
de fato e não só em palavras, todos os privilégios dos colonizadores, é preciso que
as massas populares sintam os benefícios materiais da revolução.
Em suma: é preciso demonstrar às massas que a Rússia Central proletária de-
fende os interesses delas, e somente delas, e demonstrá-lo não só por meio de
medidas repressivas contra os colonizadores e os nacionalistas burgueses, medi-
das que muitas vezes as massas não compreendem em absoluto, mas, antes de
mais nada, por meio de uma política econômica consequente e ponderada. É do
conhecimento de todos que os liberais sempre exigiram a instrução geral obriga-
tória. Os comunistas das regiões periféricas não podem mostrar-se menos adian-
tados que os liberais; devem instituir nessas regiões a instrução geral, se quiserem
liquidar a ignorância do povo, se quiserem aproximar espiritualmente o Centro
e as regiões periféricas da Rússia. Mas para fazer isso é necessário desenvolver
uma escola nacional local, um teatro nacional, instituições culturais nacionais,
elevar o nível cultural das massas populares das regiões periféricas, porque não
é necessário demonstrar que a ignorância e a falta de cultura são o inimigo mais
perigoso do Poder Soviético. De um modo geral, não sabemos se prossegue com
o êxito ou não o trabalho por nós desenvolvido nesse sentido, mas, ao que nos
comunicam, numa das regiões periféricas mais importantes o Comissariado do
Povo para a Instrução Pública local emprega nas escolas locais apenas 10% das
verbas do seu orçamento. Se isso for verdade, é preciso reconhecer que nesse
campo, infelizmente, fomos bem pouco para a frente, em confronto com o “ve-
lho regime”.
O Poder Soviético não pode ser considerado como um poder desligado do
povo; pelo contrário, ele é um poder único no seu gênero, expresso pelas mas-
sas populares russas e familiar, próximo delas. Justamente isso é que explica a
força inaudita e a maleabilidade que de costume o Poder Soviético manifesta nos
momentos críticos. É preciso que o Poder Soviético se torne igualmente fami-
liar e próximo das massas populares das regiões periféricas da Rússia. Mas para
tornar-se familiar, o Poder Soviético deve antes de mais nada tornar-se compre-
ensível a essas massas. É necessário, por isso, que todos os órgãos soviéticos nas
regiões periféricas, os tribunais, os órgãos administrativos, os econômicos, os ór-
gãos imediatos do Poder (e também os órgãos partidários), sejam compostos, na
medida do possível, de pessoas do lugar, que conheçam os usos e costumes, o ca-
ráter, a língua da população local; que nessas instituições se proceda de modo que
ingressem todos os melhores homens pertencentes às massas populares do lugar;
que se faça com que as massas trabalhadoras participem, em todos os campos, do
trabalho de direção do país, inclusive do trabalho das formações militares; que as
massas vejam que o Poder Soviético e seus órgãos são obra dos próprios esforços
delas, personificação das esperanças delas. Só dessa maneira se pode estabelecer
um indissolúvel laço espiritual entre as massas e o poder, só assim pode-se tornar
o Poder Soviético compreensível e próximo às massas trabalhadoras das regiões
periféricas.
J. V. Stalin 201

Alguns camaradas veem nas repúblicas autônomas da Rússia e, de um modo


geral, na autonomia soviética, um mal temporário, mas necessário, que não podia
ser evitado por causa de certas circunstâncias, mas contra o qual é preciso lutar
de maneira que com o tempo possa ser eliminado. Não é necessário demonstrar
que essa opinião é absolutamente errada e, em todo o caso, não tem nada que ver
com a política do Poder Soviético em relação à questão nacional. A autonomia
soviética não pode ser considerada como algo de abstrato e de artificioso, e muito
menos como uma simples promessa, uma simples declaração. A autonomia sovié-
tica é a forma mais real. mais concreta, de união das repúblicas periféricas com
a Rússia Central. Não ocorrerá a ninguém dizer que a Ucrânia, o Azerbaijão, o
Turquestão, a Quirguízia, a Bachkíria, a Tartária e as outras regiões periféricas,
ao aspirarem ao desenvolvimento cultural e material das massas populares, não
necessitarão de uma escola nacional, de tribunais, de órgãos administrativos e
de um governo todos eles compostos principalmente por elementos locais. Além
disso, a sovietização efetiva dessas regiões, sua transformação em países soviéticos,
estreitamente ligados à Rússia Central num único Estado, são inconcebíveis sem
a organização, em vasta escala, de escolas locais, sem a criação de tribunais, de
órgãos administrativos e de um poder, etc., compostos de homens que conheçam
os costumes e a língua da população. Mas fundar escolas, tribunais, órgãos ad-
ministrativos e do poder que se sirvam da língua nacional, significa justamente
realizar com fatos a autonomia soviética, uma vez que a autonomia soviética não
é senão a soma de todas essas instituições, revestidas das formas ucraniana, tur-
questana, quirguiz, etc.
Após isso, como é que se pode falar seriamente do caráter efêmero da autono-
mia soviética, da necessidade de lutar contra ela, etc.? De duas uma: ou as línguas
ucraniana, azerbaijana, quirguiz, uzbeque, bachkíria e outras são uma realidade
efetiva, e, portanto, é absolutamente necessário desenvolver nessas regiões uma
escola nacional, tribunais, órgãos administrativos e do poder com pessoas do lu-
gar, e então a autonomia soviética deve ser posta em prática nessas regiões até ao
fim, sem reservas; ou as línguas ucraniana, azerbaijana e outras não passam de
vãs invenções, e as escolas e as outras instituições na língua nacional não são ne-
cessárias, portanto, e então a autonomia soviética deve ser rejeitada, como inútil
traste velho. A procura de um terceiro caminho é o resultado da ignorância do
problema ou de uma lamentável falta de reflexão.
Um dos mais sérios obstáculos que se opõem à realização da autonomia so-
viética é a grande deficiência de intelectuais locais nas regiões periféricas, a falta
de instrutores para todos, absolutamente todos, os setores do trabalho soviético
e partidário. Essa falta não pode deixar de dificultar quer o trabalho educativo
quer o trabalho revolucionário construtivo nas regiões periféricas. Mas justa-
mente por isso seria insensato, prejudicial, afastar os grupos, já pouco numero-
sos, de intelectuais do lugar, os quais provavelmente desejariam pôr-se a serviço
das massas populares, mas não podem fazê-lo porque, não sendo comunistas,
sentem-se rodeados por uma atmosfera de desconfiança e temem possíveis re-
pressões. Com relação a esses grupos, pode ser aplicada com êxito uma política
que vise a fazê-los participar do trabalho soviético, uma política tendente a incluí-
los no trabalho da indústria, da agricultura, do aprovisionamento e de outra espé-
cie, para obter sua sovietização gradual. É de fato difícil afirmar que esses grupos
202 Obras Escolhidas

de intelectuais sejam menos seguros que, digamos, aqueles especialistas militares


contrarrevolucionários, os quais, apesar de sua natureza contrarrevolucionária,
foram postos a trabalhar e depois sovietizados quando já ocupavam postos im-
portantíssimos. Mas mesmo que se utilizem os grupos de intelectuais do lugar,
ainda se está bem longe de poder satisfazer a necessidade que se tem de instruto-
res. Ao mesmo tempo é necessário desenvolver uma extensa rede de cursos e de
escolas nas regiões periféricas, para todos os ramos da administração, com o fim
de criar, com a gente do lugar, quadros de instrutores. Isso porque é claro que
se não houver tais quadros, a organização. da escola, dos tribunais, dos órgãos
administrativos e das outras instituições, em que seja adotada a língua nacional,
se tornará extremamente difícil. Um obstáculo não menos sério para a realização
da autonomia soviética é a pressa, que muitas vezes se transforma em grosseira
falta de tato, demonstrada por alguns camaradas na sovietização das regiões peri-
féricas. Quando esses camaradas, em regiões que permaneceram atrasadas por
um período histórico inteiro com relação à Rússia Central, em regiões nas quais
ainda não foi liquidada de todo a ordem medieval, decidem encarregar-se do
“heroico esforço” de pôr em prática o “comunismo puro”, pode-se dizer com
certeza que dessa empresa cavalheiresca, desse “comunismo” não sairá nada de
bom. Desejaríamos lembrar a esses camaradas um conhecido ponto do nosso
programa, segundo o qual:
O Partido Comunista da Rússia se atem ao ponto de vista histórico e de classe, e leva em conta
o grau de desenvolvimento histórico atingido por uma determinada nação; se se encontra no
caminho da idade média para a democracia burguesa ou no da democracia burguesa para a
democracia soviética ou proletária, etc.

E mais ainda:
Em qualquer caso, o proletariado das nações outrora dominantes deve mostrar-se particu-
larmente cauteloso e particularmente respeitoso com os restos de sentimentos nacionais das
massas trabalhadoras das nações oprimidas ou que não gozam de plenos direitos (vide Pro-
grama do PC da Rússia).

Isto é, se, por exemplo, no Azerbaijão, a requisição de alguns espaços vagos


em residências demasiado grandes para a família que as ocupa, com o objetivo
de ali se instalarem novos inquilinos, afasta de nós as massas que consideram a
habitação, o lar doméstico, como uma coisa inviolável, sagrada, é claro que a re-
quisição deve ser substituída por um sistema indireto que permita, contornando
as dificuldades, alcançar o mesmo objetivo. Ou ainda: se por exemplo as massas
do Daguestão, fortemente imbuídas de preconceitos religiosos, seguem os co-
munistas “na base da Sharya”181 , é claro que o caminho da luta direta contra os
preconceitos religiosos, nesse país, deve ser substituído por sistemas indiretos,
mais cautelosos, etc., etc. Em suma: das empresas cavalheirescas pela “imediata
comunistização” das massas populares atrasadas é preciso passar a uma política
cautelosa e ponderada que canalize gradativamente essas massas para o álveo
geral do desenvolvimento soviético. Tais são, de um modo geral, as condições
181 Sharya (do árabe chariá = o caminho justo): o conjunto das normas que regulam as relações
religiosas, civis e jurídicas entre muçulmanos e entre os muçulmanos e os outros povos, em caso
de guerra, etc. Esse código, cujas origens remontam ao século VII, formou-se lentamente através
dos séculos e serviu ao poder teocrático-militar e às classes dirigentes para manter na escravidão
econômica e política as massas muçulmanas.
J. V. Stalin 203

práticas para realizar a autonomia soviética, cuja aplicação assegurará a aproxi-


mação espiritual e uma sólida união revolucionária do Centro com as regiões
periféricas da Rússia. A Rússia Soviética está levando a efeito uma experiência
nunca vista até agora no mundo, qual seja a de organizar a colaboração entre
uma série inteira de nações e de raças no âmbito de um Estado proletário uni-
tário, colaboração baseada nos princípios da confiança recíproca, nos princípios
do entendimento voluntário, fraternal. Três anos de revolução mostraram que
essa tentativa tem todas as possibilidades de êxito. Mas só se pode contar com o
triunfo pleno no caso de que nossa política prática em relação à questão nacional
nas regiões periféricas não esteja em contraste com as exigências da autonomia
soviética – que já expusemos – nas suas diversas formas e nos seus diversos graus,
no caso de que todas as nossas medidas nos vários lugares favoreçam o objetivo
de fazer com que as massas populares das regiões periféricas se aproximem da
superior cultura espiritual e material proletária nas formas correspondentes aos
costumes e à fisionomia nacional dessas massas. Isso é garantia do fortalecimento
da união revolucionária entre a Rússia Central e as suas regiões periféricas, di-
ante da qual se desfarão todas as maquinações da Entente.
204 Obras Escolhidas

O Congresso dos Povos do


Daguestão
13 de novembro de 1920

Declaração sobre a autonomia soviética do


Daguestão

Camaradas!
O governo soviético da República Federativa Socialista da Rússia, empenhado
nos últimos tempos na guerra contra os inimigos externos no Sul e no Oeste,
contra a Polônia e Wrangel, não teve nem possibilidade nem tempo de dedicar-
se à solução do problema que agita o povo do Daguestão.
Agora que o exército de Wrangel foi derrotado, que os seus míseros restos
fogem para a Criméia, que foi concluída a paz com a Polônia, o governo so-
viético tem a possibilidade de ocupar-se do problema da autonomia do povo do
Daguestão. No passado, o poder na Rússia estava nas mãos do tsar, dos latifun-
diários, dos fabricantes e dos industriais. No passado, a Rússia era a Rússia dos
tsares e dos carrascos. Vivia mantendo oprimidos os povos que formavam o im-
pério russo. Seu governo vivia sugando o sangue dos povos por ela oprimidos,
inclusive o povo russo. Era o tempo em que todos os povos maldiziam a Rússia.
Mas essa época já pertence ao passado. Foi sepultada e não poderá nunca mais
ressurgir.
Das ruínas dessa Rússia tsarista opressora nasceu uma nova Rússia, a Rús-
sia dos operários e dos camponeses. Para os povos que fazem parte da Rússia
começou uma nova vida. Começou o período da emancipação desses povos que
sofreram sob o jugo dos tsares e dos senhores, dos latifundiários e dos industriais.
O novo período, iniciado após a Revolução de Outubro, quando o poder pas-
sou para as mãos dos operários e dos camponeses e tornou-se comunista, já é
famoso não só por haver libertado os povos da Rússia. Ele também se propôs a
tarefa da libertação de todos os povos que sofrem sob o jugo dos imperialistas
ocidentais, inclusive os povos do Oriente.
A Rússia tornou-se a alavanca do movimento de libertação, que impele para
a frente não só os povos do nosso país, como também os do mundo inteiro. A
Rússia Soviética tornou-se o archote que ilumina o caminho da libertação para
todos os povos oprimidos. No momento presente, o governo da Rússia, que,
graças à vitória alcançada sobre os inimigos, teve a possibilidade de ocupar-se dos
problemas inerentes ao seu desenvolvimento interno, julgou necessário declará-
los que o Daguestão deve ser autônomo, e que, embora mantendo laços fraternais
com os povos da Rússia, poderá ter, no interior, um autogoverno.
O Daguestão deverá administrar-se de conformidade com as suas particulari-
dades, seus costumes, seus usos. Foi-nos dito que entre os povos do Daguestão a
J. V. Stalin 205

Sharya tem uma grande importância. Também tivemos conhecimento de que os


inimigos do Poder Soviético espalham boatos segundo os quais o Poder Soviético
proíbe a Sharya.
Estou autorizado a declarar aqui, em nome do governo da República Soci-
alista Federativa Soviética da Rússia, que esses boatos são falsos. O governo da
Rússia oferece a cada povo o pleno direito de governar-se baseado nas suas leis
e nos seus costumes. Ele considera a Sharya um direito incontestável, normal,
que têm também outros povos que habitam a Rússia. Se o povo daguestano de-
seja conservar suas leis e seus costumes, tanto aquelas quanto estes devem ser
conservados.
Ao mesmo tempo, julgo necessário declarar que a autonomia do Daguestão
não significa e não pode significar a sua separação da Rússia Soviética. A autono-
mia não é a independência. A Rússia e o Daguestão devem conservar-se ligados,
porque só nesse caso o Daguestão poderá conservar sua liberdade. Concedendo
a autonomia ao Daguestão, o governo soviético tem o objetivo preciso de confiar
todos os órgãos de direção do Daguestão, quer econômicos quer administrativos,
a homens honestos e devotados, que amem seu povo, a homens que provenham
das fileiras dos trabalhadores locais. Só assim, só dessa maneira, se pode aproxi-
mar, no Daguestão, o Poder Soviético do povo.
O Poder Soviético não tem nenhum outro objetivo a não ser o de elevar o
Daguestão a um nível cultural mais alto, fazendo participarem do trabalho de
direção homens do lugar. O Poder Soviético sabe que a ignorância é o primeiro
inimigo do povo. Por isso é necessário criar mais escolas e órgãos administrativos
que se sirvam das línguas locais. Dessa maneira o Poder Soviético espera tirar os
povos do Daguestão do pântano, das trevas e da ignorância em que a velha Rússia
os havia atirado.
O governo soviético acredita que seja necessário instituir no Daguestão uma
autonomia semelhante à de que gozam o Turquestão e as repúblicas quirguiz e
tártara. O Poder Soviético propõe a vós, representantes dos povos do Daguestão,
confiar ao seu Comitê Revolucionário o encargo de eleger os representantes a
serem enviados a Moscou para elaborarem lá, juntamente com os representantes
do Poder Soviético Supremo, o projeto de autonomia para o Daguestão.
Os últimos acontecimentos sucedidos no Daguestão Meridional, onde o trai-
dor Gotsinski – executor da vontade do general Wrangel, do mesmo Wrangel
que no tempo de Denikin combateu contra os insurretos e destruiu os aúis dos
montanheses do Cáucaso Setentrional – atenta contra a liberdade do Dagues-
tão. Esses acontecimentos dizem muitas coisas. Devo salientar que na luta contra
Gotsinski para defender o seu Poder Soviético, o povo do Daguestão mostrou sua
fidelidade à bandeira vermelha.
Se expulsarem Gotsinski, inimigo dos trabalhadores do Daguestão, darão uma
prova de que é justificada a confiança que o Poder Soviético Supremo os demons-
tra dando ao Daguestão a autonomia. O governo soviético é o primeiro governo
que voluntariamente dá ao Daguestão a autonomia. Estamos certos de que os
povos do Daguestão mostrar-se-ão dignos da confiança que o governo soviético
deposita neles.
Viva a união dos povos do Daguestão com os povos da Rússia! Viva a autono-
206 Obras Escolhidas

mia soviética do Daguestão!

Discurso de encerramento
Camaradas! Agora que o último inimigo do Poder Soviético foi derrotado, o
significado político da autonomia que o governo soviético deu, voluntariamente
ao Daguestão, torna-se evidente. É preciso voltar a atenção para uma circunstân-
cia. Ao passo que o governo tsarista e em geral os governos burgueses do mundo
habitualmente fazem concessões ao povo e concedem estas ou aquelas reformas
só no caso de que circunstâncias difíceis os obriguem a fazê-lo, o governo sovié-
tico, pelo contrário, quando se encontra no apogeu dos seus êxitos concede a
autonomia ao Daguestão de maneira totalmente espontânea.
Isso significa que a autonomia do Daguestão entrará na vida da sua Repú-
blica como base duradoura e intangível. De fato, é duradouro só aquilo que se
dá espontaneamente. Concluindo, desejava frisar o fato de que essa grande con-
fiança, que o Poder Soviético mostrou ter em vós, será justificada pelos povos do
Daguestão na luta que eles travarão de futuro contra os nossos inimigos comuns.
Viva o Daguestão autônomo soviético!
208 Obras Escolhidas
J. V. Stalin 209

PARTE II

A consolidação do
dirigente
J. V. Stalin 211

As tarefas imediatas do Partido em


relação à questão nacional
10 de fevereiro de 1921

Teses para o X Congresso do PC Russo (B)

Endossado pelo Comitê Central do Partido182

O sistema capitalista e a opressão nacional


1. As nações modernas são o produto de uma época definida – a época do
capitalismo em ascensão. O processo de eliminação do feudalismo e desenvolvi-
mento do capitalismo é ao mesmo tempo um processo de constituição de pessoas
em nações. Os britânicos, franceses, alemães e italianos foram formados em na-
ções na época do desenvolvimento vitorioso do capitalismo e seu triunfo sobre a
desunião feudal.
2. Onde a formação das nações como um todo coincidiu ao tempo de for-
mação de Estados centralizados, as nações naturalmente assumiram formas de
Estado, desenvolveram-se em Estados nacionais burgueses independentes. Foi o
que aconteceu na Grã-Bretanha (excluindo a Irlanda), na França e na Itália. Na
Europa Oriental, ao contrário, a formação de Estados centralizados, acelerados
pelas necessidades de autodefesa (invasão de turcos, mongóis, etc.), ocorreu an-
tes da liquidação do feudalismo; portanto, antes da formação das nações. Como
consequência, as nações aqui não se desenvolveram e não puderam se transfor-
mar em Estados; em vez disso, vários Estados burgueses multinacionais e mistos
foram formados, geralmente consistindo em uma nação forte e dominante e de
várias nações subjugadas e fracas. Exemplos: Áustria, Hungria, Rússia.
3. Em Estados nacionais como a França e a Itália, que a princípio depen-
diam principalmente de suas próprias forças nacionais, não havia, de modo ge-
ral, opressão nacional. Em contraste com isso, os Estados multinacionais que se
baseiam no domínio de uma nação – mais exatamente, da classe dominante dessa
nação – sobre as outras nações são o lar original e a arena principal da opressão
nacional e de movimentos nacionais em si. As contradições entre os interesses
da nação dominante e os das nações subjugadas são contradições que, a menos
que sejam resolvidas, tornam impossível a existência estável de um Estado mul-
tinacional. A tragédia do Estado burguês multinacional reside em que ele não
182As teses “As tarefas imediatas do partido à questão nacional” foram discutidas em uma reunião
do Bureau Político do Comitê Central do PC Russo (B) no dia 5 de fevereiro de 1921, e uma co-
missão chefiada por V. I. Lenin e J. V. Stalin foi indicada para fazer o esboço final. As teses foram
publicadas no Pravda, nº 29, de 10 de fevereiro de 1921; eles também foram publicados como um
panfleto separado no mesmo ano.
212 Obras Escolhidas

pode resolver essas contradições, que cada tentativa de sua parte para “igualar”
as nações e “proteger” as minorias nacionais, preservando a propriedade privada
e a desigualdade de classe, geralmente termina em outro fracasso, em um agra-
vamento dos conflitos nacionais.
4. O maior crescimento do capitalismo na Europa, a necessidade de novos
mercados, a busca por matérias-primas e combustível, – e, finalmente, o desen-
volvimento do imperialismo – a exportação de capital e a necessidade de assegu-
rar rotas marítimas e ferroviárias importantes, levaram, por um lado, à apreensão
de novos territórios pelos antigos Estados nacionais e à transformação destes em
Estados multinacionais (coloniais), com sua opressão nacional inerente e confli-
tos nacionais (Grã-Bretanha, França, Alemanha, Itália); por outro lado, entre as
nações dominantes nos antigos Estados multinacionais, eles intensificaram a luta
não apenas para reter as antigas fronteiras estaduais, mas também para as expan-
dir, para subjugar nacionalidades novas e consideradas fracas às custas dos Esta-
dos vizinhos. Isso ampliou a questão nacional e, finalmente, pelo próprio curso
dos desenvolvimentos, fundiu-a com a questão geral das colônias; e a opressão
nacional foi transformada, de uma questão intraestatal, em uma questão interes-
tatal, uma questão da luta (e da guerra) entre os “grandes” poderes imperialistas
pela subjugação de nacionalidades fracas e desiguais.
5. A guerra imperialista, que escancarou até as raízes as contradições naci-
onais irreconciliáveis e a falência interna dos Estados multinacionais burgueses,
intensificou extremamente os conflitos nacionais dentro dos Estados coloniais
vencedores (Grã-Bretanha, França, Itália), causou a desintegração máxima dos
antigos Estados multinacionais vencidos (Áustria, Hungria, Rússia em 1917) e,
finalmente, como a solução burguesa mais “radical” à questão nacional, levou à
formação de novos Estados nacionais burgueses (Polônia, Tchecoslováquia, Iu-
goslávia, Finlândia, Geórgia, Armênia, etc.). Mas a formação dos novos Estados
nacionais independentes não trouxe – e não poderia – englobar uma forma de
coexistência pacífica das nacionalidades; não eliminou e não pôde eliminar a
desigualdade nacional ou a opressão nacional, pois os novos Estados nacionais,
sendo baseados na propriedade privada e na desigualdade de classe, não podem
existir:
a) sem oprimir suas minorias nacionais (Polônia, que oprime bielorussos,
judeus, lituanos e ucranianos; Geórgia, que oprime ossetianos, abkhazianos e
armênios; Iugoslávia, que oprime croatas, bósnios etc.);
b) sem expandir os seus territórios à custa dos seus vizinhos, o que dá
origem a conflitos e guerras (Polônia contra a Lituânia, Ucrânia e Rússia;
Iugoslávia contra Bulgária; Geórgia contra Armênia, Turquia, etc.);
c) sem se submeter ao domínio financeiro, econômico e militar das “gran-
des” potências imperialistas.
6. Assim, o período pós-guerra revela um quadro sombrio de inimizade na-
cional, desigualdade, opressão, conflitos, guerra e brutalidade imperialista por
parte das nações dos países civilizados, tanto entre si como para com as nações
desiguais. Por um lado, existem alguns “grandes” poderes, que oprimem e ex-
ploram todos os Estados nacionais dependentes e “independentes” (na verdade,
totalmente dependentes), e há uma luta desses poderes entre si para monopo-
J. V. Stalin 213

lizar os exploração dos Estados nacionais. Por outro lado, há uma luta dos Es-
tados nacionais dependentes e “independentes” contra a opressão insuportável
das “grandes” potências; há uma luta dos Estados nacionais entre si para am-
pliar seus territórios nacionais; há uma luta de cada Estado nacional contra as
minorias nacionais que oprime. Por fim, há uma intensificação do movimento de
libertação nas colônias contra as “grandes” potências e um agravamento dos con-
flitos nacionais tanto dentro dessas potências como também dentro dos Estados
nacionais que, como regra, contém uma série de minorias nacionais.
Essa é o “quadro de paz” legado pela guerra imperialista. A sociedade bur-
guesa provou ser totalmente incapaz de resolver a questão nacional.

II

O sistema soviético e a liberdade nacional

1. Considerando que a propriedade privada e o capital inevitavelmente desu-


nem as pessoas, fomentam a luta nacional e intensificam a opressão nacional, a
propriedade coletiva e o trabalho tão inevitavelmente unem as pessoas, atacam as
raízes das lutas nacionais e abolem a opressão nacional. A existência de capita-
lismo sem opressão nacional é tão inconcebível quanto a existência de socialismo
sem a libertação das nações oprimidas, sem liberdade nacional. O chauvinismo e
a luta nacional são inevitáveis, inevitáveis, enquanto o campesinato (e a pequena
burguesia em geral), cheio de preconceitos nacionalistas, seguir a burguesia; pelo
contrário, a paz e a liberdade nacionais podem ser consideradas garantidas se o
campesinato seguir o proletariado, ou seja, se a ditadura do proletariado for as-
segurada. Assim, a vitória dos sovietes e o estabelecimento da ditadura do prole-
tariado são condições fundamentais para abolir a opressão nacional, estabelecer
a igualdade nacional e garantir os direitos das minorias nacionais.
2. A experiência da revolução soviética confirmou plenamente esta tese. O
estabelecimento do sistema soviético na Rússia e a proclamação do direito das
nações de se separarem mudou completamente as relações entre as massas traba-
lhadoras das diferentes nacionalidades na Rússia, golpeou na raiz a velha inimi-
zade nacional, removeu o terreno para opressão e conquistou para os trabalhado-
res russos a confiança de seus irmãos de outras nacionalidades não só na Rússia,
mas também na Europa e Ásia, transformando essa confiança em entusiasmo, em
prontidão para lutar pela causa comum. O estabelecimento das repúblicas sovié-
ticas no Azerbaijão e na Armênia levou aos mesmos resultados, pois eliminou
os conflitos nacionais e solucionou a “antiquíssima” inimizade entre os turcos e
os armênios, e entre os armênios e azerbaijanos, ambos pertencentes às massas
trabalhadoras. O mesmo deve ser dito sobre a vitória temporária dos soviéticos
na Hungria, Baviera e Letônia. Por outro lado, pode-se afirmar com segurança
que os trabalhadores russos não poderiam ter derrotado Kolchak e Denikin, e as
repúblicas do Azerbaijão e da Armênia não poderiam ter se sublevado com fir-
meza se não tivessem eliminado a inimizade nacional e a opressão nacional em
seu próprio solo, se não tivesse conquistado a confiança e despertado o entusi-
asmo das massas trabalhadoras das nacionalidades do Ocidente e do Oriente. O
fortalecimento das repúblicas soviéticas e a abolição da opressão nacional são os
214 Obras Escolhidas

dois lados de um mesmo processo de libertação dos trabalhadores da escravidão


imperialista.
3. Mas a existência de repúblicas soviéticas, mesmo nas menores dimensões, é
uma ameaça mortal para o imperialismo. A ameaça reside não apenas no fato de
que, ao romper com o imperialismo, as repúblicas soviéticas foram transformadas
de colônias e semicolônias em Estados realmente independentes, privando assim
os imperialistas de algum território extra e renda extra, mas também, e principal-
mente, na própria existência das repúblicas soviéticas. Cada passo que dão para
suprimir a burguesia e fortalecer a ditadura do proletariado constitui uma tre-
menda agitação contra o capitalismo e o imperialismo, a agitação pela libertação
dos países dependentes de escravidão imperialista, e é um elemento insuperável
na desintegração e desorganização do capitalismo em todas as suas formas. Daí a
luta inevitável das “grandes” potências imperialistas contra as repúblicas soviéti-
cas, o empenho das “grandes” potências para destruir essas repúblicas. A história
da luta das “grandes” potências contra a Rússia Soviética, levantando-se contra
o governo burguês de um país fronteiriço após o outro, um grupo de generais
contrarrevolucionários após o outro, bloqueando de perto a Rússia Soviética e,
em geral, tentando isolá-la economicamente, testemunha eloquentemente que
no estado atual das relações internacionais, nas condições do cerco capitalista,
nem uma única república soviética, sozinha, pode se considerar garantida contra
o esgotamento econômico e a derrota militar pelo mundo imperialismo.
4. Portanto, a existência isolada de repúblicas soviéticas individuais é instável
e precária devido à ameaça dos Estados capitalistas à sua existência. Os interesses
comuns de defesa das repúblicas soviéticas constam: em primeiro lugar, na ta-
refa de restaurar as forças produtivas destruídas pela guerra; em segundo lugar,
na assistência necessária que as repúblicas soviéticas produtoras de grãos devem
prestar às que não plantam; em terceiro lugar, que todas ditam imperativamente
a necessidade de uma união de estado das repúblicas soviéticas individuais como
o único meio de salvação da escravidão imperialista e da opressão nacional. Ape-
nas as repúblicas soviéticas nacionais que se libertaram da burguesia “própria” e
da burguesia “estrangeira” podem manter sua existência e derrotar a união de
forças do imperialismo, com uma unidade estadual estreita. Sem isso, eles não
serão derrotados em absoluto.
5. Uma federação das repúblicas soviéticas baseada em interesses militares e
econômicos comuns é a forma geral de união estadual que tornará possível:
a) assegurar a integridade e o desenvolvimento econômico de cada repú-
blica individualmente e da federação como um todo;
b) abarcar toda a diversidade de modos de vida, cultura e condições econô-
micas das várias nações e nacionalidades, que se encontram atualmente em
diferentes estágios de desenvolvimento, e aplicar as correspondentes formas
de federação;
c) providenciar a coexistência pacífica e a cooperação fraterna das nações
e nacionalidades que, de uma forma ou de outra, ligaram o seu destino ao da
federação.
A experiência da Rússia em empregar diferentes formas de federação, desde
federações baseadas na autonomia soviética (Kirghizia, Bashkiria, Tataria, Da-
J. V. Stalin 215

guestão) até federações baseadas em relações de tratado com repúblicas soviéti-


cas independentes (Ucrânia, Azerbaijão), e permitindo estágios intermediários
(Turquestão, Bielorrússia), provou plenamente a conveniência e flexibilidade da
federação como a forma geral de união estadual das repúblicas soviéticas.
6. Mas a federação só pode ser estável e os resultados da federação só podem
ser eficazes apenas se a mesma for baseada na confiança mútua e no consenti-
mento voluntário dos países federados. Se a RSFSR é o único país do mundo
onde a experiência de coexistência pacífica e cooperação fraterna de uma série
de nações e nacionalidades tem sido bem-sucedida, é porque aqui não existem
nações dominantes ou subjugadas, nem metrópoles, nem colônias, nem imperia-
lismo, nem opressão nacional; a federação aqui se apoia na confiança mútua e na
luta voluntária das massas trabalhadoras das diferentes nações pela união. Este
caráter voluntário da federação deve ser preservado sem falta, pois apenas tal
federação pode servir como o estágio de transição para aquela unidade superior
dos trabalhadores de todos os países em um único sistema econômico mundial,
cuja necessidade está se tornando cada vez mais aparente.

III

As tarefas imediatas do Partido Comunista Russo


1. A RSFSR e as repúblicas soviéticas associadas a ela têm uma população de
cerca de 140 milhões de habitantes. Destes, os não grã-russos somam cerca de
65.000.000. A política do tsarismo, a dos latifundiários e da burguesia para com
estes povos, era matar quaisquer que fossem os germes nacionais ou de Estado
existente entre eles, mutilar sua cultura, restringir suas línguas para mantê-los
na ignorância e, por último, na medida do possível, para russificá-los. O resultado
dessa política foi o subdesenvolvimento e o atraso político desses povos.
Agora que os latifundiários e a burguesia foram derrubados e o poder so-
viético foi proclamado pelas massas populares também nesses países, a tarefa do
Partido é ajudar as massas trabalhadoras dos povos não-grã-russos a alcançar a
Rússia central, que avançou. Para ajudá-los, devemos:
a) desenvolver e fortalecer sua condição de Estado soviético nas formas
correspondentes à compleição nacional desses povos;
b) estabelecer seus tribunais, administração, organizações econômicas e
órgãos de poder, funcionando nas línguas nativas e dotados de gente local
familiarizada com o modo de vida e a mentalidade da população local;
c) desenvolver sua imprensa, escolas, teatros, clubes recreativos e institui-
ções culturais e educacionais em geral, funcionando nas línguas nativas.
2. Se excluímos a Ucrânia, Bielorrússia, uma pequena parte do Azerbaijão e
Armênia – que em algum grau já passaram pelo período do capitalismo indus-
trial – dos 65 milhões de habitantes não russos, resta uma população de cerca
de 25 milhões (principalmente Tyurks) que não passaram por nenhum desen-
volvimento capitalista, que têm pouco ou nenhum proletariado industrial e na
maioria casos mantiveram sua economia pastoral e modo de vida patriarcal-tribal
(Kirghizia, Bashkiria, Cáucaso do Norte), ou que não foram além das formas
216 Obras Escolhidas

primitivas de um estilo de vida semipatriarcal e semifeudal (Azerbaijão, Crimeia,


etc.), mas já foram atraídos para o canal comum do desenvolvimento soviético.
A tarefa do Partido em relação às massas trabalhadoras desses povos (além
da tarefa indicada no ponto 1 é ajudá-los a eliminar os vestígios das relações
patriarca-feudais e atraí-los para o trabalho de construção de uma economia so-
viética no base de sovietes de camponeses trabalhadores, criando entre esses po-
vos fortes organizações comunistas capazes de aproveitar a experiência dos operá-
rios e camponeses russos na construção econômica soviética e, ao mesmo tempo,
capazes de levar em conta em suas obras todas as especificidades características
da situação econômica, a estrutura de classes, cultura e modo de vida de cada na-
cionalidade em questão, enquanto se abstém de transplantar mecanicamente da
Rússia central medidas econômicas que são adequadas apenas para um estágio
diferente e superior de desenvolvimento econômico.
3. Se da população de 25 milhões, principalmente Tyurk, excluirmos o Azer-
baijão, a maior parte do Turquestão, os tártaros (Volga e Criméia), Bucara, Khiva,
Daguestão, parte dos “Highlanders” (cabardinianos, cherkesses e balcarianos) e
várias outras nacionalidades nômades que já se estabeleceram firmemente em
um determinado território, restam cerca de seis milhões de quirguizes, bashkirs,
chechenos, ossetianos e inguches, cujas terras serviram até recentemente como
objeto de colonização por colonos russos, que têm conseguido manejar a situação
para tirar deles as melhores terras aráveis e estão constantemente empurrando-os
para o deserto árido.
A política do tsarismo, dos latifundiários e da burguesia, era colonizar esses
distritos tanto quanto possível com kulaks de camponeses russos e cossacos, con-
vertendo estes últimos em um apoio confiável para as lutas da nação dominante.
O resultado dessa política foi a extinção gradual da população nativa, que foi
empurrada ao estágio de vida selvagem.
A tarefa do Partido em relação às massas trabalhadoras dessas nacionalidades
(além das tarefas mencionadas nos pontos 1 e 2) é unir seus esforços aos das
massas trabalhadoras da população russa local na luta pela libertação das garras
dos kulaks em geral, e contra os vorazes kulaks da Grã-Rússia em particular, para
ajudá-los por todos os meios possíveis a se livrar do jugo dos colonizadores e,
dessa forma, fornecer-lhes terras aráveis necessárias para a existência humana.
4. Além das nações e nacionalidades mencionadas acima, que têm uma es-
trutura de classes definida e ocupam um território definido, ainda existem na
RSFSR grupos nacionais flutuantes, minorias nacionais, intercalados entre mai-
orias compactas de outras nacionalidades e, na maioria dos casos, não tendo uma
estrutura de classes definida nem um território definido (letões, estonianos, po-
lacos, judeus e outras minorias nacionais). A política do tsarismo era a de oblite-
rar essas minorias por todos os meios possíveis, mesmo por pogroms (os pogroms
antijudaicos, por exemplo).
Agora que os privilégios nacionais foram abolidos, a igualdade de direitos
para as nações foi posta em prática, e que o direito das minorias nacionais ao livre
desenvolvimento nacional é garantido pelo próprio caráter do sistema soviético, a
tarefa do Partido em relação às massas trabalhadoras desses grupos nacionais é de
ajudá-las a fazer o máximo uso de seu direito garantido ao livre desenvolvimento.
J. V. Stalin 217

5. As organizações comunistas nas regiões fronteiriças desenvolvem-se em


condições peculiares que retardam o crescimento normal do Partido. Por um
lado, os comunistas grã-russos que trabalham nas regiões de fronteira e que cres-
ceram durante a existência de uma nação “dominante” e não sofreram opressão
nacional, muitas vezes subestimam a importância de características nacionais es-
pecíficas em suas tarefas partidárias ou as ignoram completamente; eles não le-
vam em consideração, em suas tarefas, as características específicas da estrutura
de classe, cultura, modo de vida e história da nacionalidade em questão, e assim
vulgarizam e distorcem a política do Partido na questão nacional. Isso leva a
um desvio do comunismo para uma nação dominante e perspectiva colonialista,
para o chauvinismo da Grande Rússia. Por outro lado, os comunistas da popu-
lação nativa local que vivenciaram o duro período de opressão nacional, e que
ainda não se libertaram totalmente das memórias assombrosas daquele período,
muitas vezes exageram a importância de características nacionais específicas em
suas tarefas, ocultando os interesses de classe dos trabalhadores, ou simplesmente
confundindo os interesses dos trabalhadores da nação, estando mais preocupa-
dos com os interesses “nacionais” dessa nação; eles são incapazes de separar os
primeiros dos últimos e basear suas tarefas partidárias à questão. Isso, por sua
vez, leva a um desvio do comunismo ao nacionalismo democrático-burguês, que
às vezes assume a forma de pan-islamismo e panturquismo183 (no Oriente).
Este congresso, condenando enfaticamente estes dois desvios como nocivos
e perigosos para a causa do comunismo, considera necessário assinalar o perigo
especial e a nocividade do primeiro desvio mencionado, o desvio para uma na-
ção dominante, uma visão colonialista. O congresso lembra ao Partido que, a
menos que os sobreviventes colonialistas e nacionalistas em suas fileiras sejam
superados, será impossível construir nas regiões de fronteira organizações for-
tes, genuinamente comunistas que estão ligadas às massas e que unem em suas
fileiras os proletários das populações nativas locais e russas com base no inter-
nacionalismo. O congresso considera, portanto, que a eliminação das vacilações
nacionalistas e, principalmente, colonialistas, é uma das tarefas mais importantes
do Partido nas regiões fronteiriças.
6. Como resultado dos sucessos alcançados nas frentes de guerra, particular-
mente após a liquidação de Wrangel, em algumas das regiões fronteiriças atrasa-
das onde há pouco ou nenhum proletariado industrial tem havido um aumento
do influxo de elementos nacionalistas pequeno-burgueses dentro do Partido à

183 Pan-islamismo é uma ideologia religiosa e política reacionária que surgiu na segunda metade do
século XIX no Sultão da Turquia entre os proprietários de terras, a burguesia e o clero turcos. Mais
tarde, ele se espalhou entre as classes proprietárias de outros povos muçulmanos. O pan-islamismo
professou a unificação em um todo de todos os povos que adoram o Islã (religião muçulmana). Com
a ajuda do pan-islamismo, as classes dominantes dos povos muçulmanos estavam se esforçando para
fortalecer suas posições e sufocar o movimento revolucionário dos povos trabalhadores do Oriente.
O objetivo do panturquismo é submeter todos os povos turcos ao domínio turco. Surgiu durante
as guerras dos Bálcãs de 1912-13. Durante a guerra de 1914-18, ela se desenvolveu em uma ideo-
logia extremamente agressiva e chauvinista. Na Rússia, após a Revolução Socialista de Outubro, o
pan-islamismo e o panturquismo foram utilizados por elementos contrarrevolucionários com o pro-
pósito de combater o poder soviético. Posteriormente, os imperialistas anglo-americanos utilizaram
o pan-islamismo e o panturquismo como sua base na preparação para uma guerra imperialista contra
os EUA e contra as democracias populares, com o objetivo de suprimir o movimento de libertação
nacional (N.T.)
218 Obras Escolhidas

busca de aspirações pessoais. Levando em consideração a posição do Partido


como a força governante real, esses elementos geralmente se disfarçam com as
cores comunistas e muitas vezes se espalham no Partido em grupos inteiros, car-
regando consigo um espírito de chauvinismo e desintegração, enquanto os órgão
do Partido nas regiões de fronteira nem sempre são capazes de resistir à tentação
de “expandir” o Partido aceitando novos membros.
Apelando a uma luta decidida contra todos os elementos pseudo-comunistas
que se ligam ao Partido do proletariado, o congresso adverte o Partido con-
tra a “expansão” através da aceitação de elementos nacionalistas intelectuais e
pequeno-burgueses. O congresso considera que as fileiras do Partido nas regiões
fronteiriças devem ser reforçadas principalmente entre os proletários, os pobres e
os camponeses operários dessas regiões, e que ao mesmo tempo deve-se trabalhar
para fortalecer as organizações do Partido na região das fronteiras, melhorando
a qualidade de seus membros.
Pravda, nº 29.
10 de fevereiro de 1921
J. V. Stalin 219

Saudação ao Primeiro Congressos


das Mulheres das Terras Altas
17 de junho 1921

Transmito minha saudação fraterna ao Primeiro Congresso de Mulheres Tra-


balhadoras da República das Terras Altas184 . Lamento profundamente não po-
der estar presente no congresso devido a problemas de saúde.
Camaradas Mulheres das Terras Altas, não houve um único movimento im-
portante pela emancipação na história da humanidade em que as mulheres não
tenham participado de perto, pois cada passo dado por uma classe oprimida ao
longo do caminho para a emancipação traz consigo uma melhoria na posição
das mulheres. O movimento pela emancipação dos escravos na antiguidade, as-
sim como o movimento pela emancipação dos servos nos tempos modernos, teve
em suas fileiras não só homens, mas também mulheres – lutadoras e mártires,
que com seu sangue selaram sua devoção para a causa dos trabalhadores. Por
último, o atual movimento pela emancipação do proletariado – o mais profundo
e poderoso de todos os movimentos de emancipação da humanidade – trouxe à
tona não apenas heroínas e mulheres mártires, mas também um movimento soci-
alista de massa de milhões de mulheres trabalhadoras, que lutam vitoriosamente
sob a bandeira proletária comum.
Comparado com este poderoso movimento das mulheres trabalhadoras, o mo-
vimento liberal das mulheres intelectuais burguesas é um jogo infantil, inventado
como passatempo.
Estou convencido de que o Congresso das Mulheres das Terras Altas condu-
zirá seus trabalhos sob a Bandeira Vermelha.
Stalin
17 de junho 1921

184A República Socialista Socialista Autônoma das Terras Altas foi formada com base em um Decreto
do Comitê Executivo Central de Toda a Rússia em 20 de janeiro de 1921. Originalmente, a região
consistia nos territórios da Chechênia, Nazran, Vladikavkaz, Cabardiniano, Balkarian e Karachayev.
No período de 1921-24, várias Regiões Nacionais Autônomas foram formadas a partir das Terras
Altas Por decreto do Comitê Executivo Central de toda a Rússia em 7 de julho de 1924, a antiga
região e comitês das Terras Altas foi dissolvido.
220 Obras Escolhidas

Da estratégia política e das táticas


dos comunistas russos
julho de 1921

(Sinopse de um panfleto)

Definição de termos e assunto de investigação


1) Os limites de operação da estratégia e tática política, seu campo de aplicação. Se for
garantido que o movimento proletário tem dois lados, objetivo e subjetivo, então
o campo de operação da estratégia e da tática é, sem dúvida, limitado ao lado
subjetivo do movimento. O lado objetivo compreende os processos de desenvol-
vimento que ocorrem fora e em torno do proletariado, independentemente de
sua vontade e da vontade de seu partido, processos que, em última análise, de-
terminam o desenvolvimento de toda a sociedade. O lado subjetivo compreende
os processos que ocorrem dentro do proletariado como o reflexo na consciência
do proletariado dos processos objetivos, acelerando ou retardando estes últimos,
mas não os determinando.
2) A teoria marxista, que estuda principalmente os processos objetivos em seu
desenvolvimento e declínio, define a tendência do desenvolvimento e aponta para
a classe ou classes que estão inevitavelmente subindo ao poder, ou estão inevita-
velmente caindo, que devem cair.
3) O programa marxista, baseado em deduções da teoria, define o objetivo do
movimento da classe ascendente, no caso presente o proletariado, durante um
determinado período do desenvolvimento do capitalismo, ou durante todo o pe-
ríodo capitalista (o programa mínimo e o programa máximo).
4) A estratégia, orientada pelo programa e baseada no cálculo das forças em
conflito, internas (nacionais) e internacionais, define o percurso geral, a direção
geral, na qual o movimento proletário revolucionário deve ser guiado com vistas
a alcançar os maiores resultados sob a incipiente e crescente relação de forças.
Em conformidade com isso, ele traça um plano de disposição das forças do pro-
letariado e de seus aliados na frente social (disposição geral). “Traçar um plano
de disposição de forças” não deve ser confundido com a operação real (concreta
e prática) de dispor, alocar as forças, que é realizada conjuntamente por tática e
estratégia. Isso não significa que a estratégia se limite a definir a rota e traçar um
plano de distribuição das forças combatentes no campo proletário; ao contrário,
dirige a luta e introduz correções nas táticas correntes durante todo o período de
uma volta, fazendo uso habilidoso das reservas disponíveis e manobrando com o
objetivo de apoiar as táticas.
5) A tática, orientada pela estratégia e pela experiência do movimento revo-
lucionário em nosso solo e nos países vizinhos, levando em consideração a cada
J. V. Stalin 221

momento o balanço de forças dentro do proletariado e seus aliados (nível supe-


rior ou inferior de cultura, superior ou inferior grau de organização e consciência
política, tradições existentes, formas de movimento, formas de organização, prin-
cipal e auxiliar), e também no campo do inimigo, aproveitando-se da desarmonia
ou de qualquer confusão no campo do inimigo – indicam essas formas definidas
de vencer o amplas massas ao lado do proletariado revolucionário e de colocá-los
em suas posições de luta na frente social (em cumprimento do plano de distri-
buição das forças delineado no plano estratégico), como certamente preparará
o sucesso da estratégia. Em conformidade com isso, eles emitem ou alteram os
slogans e diretrizes do Partido.
6) A estratégia se altera em turnos, mudanças radicais, na história; abrange o
período de uma virada (mudança radical) a outra. Por isso, dirige o movimento
para o objetivo geral que abrange os interesses do proletariado durante todo este
período. Seu objetivo é vencer a guerra de classes que se trava durante todo esse
período e, portanto, permanece inalterada durante esse período.
As táticas, por outro lado, são determinadas pelos fluxos e refluxos com base
no turno dado, o período estratégico dado, pela relação das forças em conflito,
pelas formas de luta (movimento), pelo ritmo do movimento, pela arena da luta
em cada momento dado, em cada distrito determinado. E uma vez que esses fa-
tores mudam de acordo com as condições do lugar e do tempo durante o período
de uma virada para outra, as táticas, que não cobrem toda a guerra, mas apenas
as batalhas individuais, que levam à vitória ou perda da guerra, mudam (podem
mudar) várias vezes no decorrer do período estratégico. Um período estratégico
é mais longo do que um período tático. As táticas estão subordinadas aos inte-
resses da estratégia. Em termos gerais, os sucessos táticos se preparam para os
sucessos estratégicos. A função da tática é conduzir as massas à luta de tal forma,
emitir tais slogans, conduzir as massas a novas posições de tal forma que a luta
deva, em suma, resultar na vitória da guerra, ou seja, no sucesso estratégico. Mas
os casos ocorrem quando um sucesso tático frustra ou adia o sucesso estratégico.
Diante disso, é necessário, nesses casos, perdoar os sucessos táticos.
Exemplo. A agitação contra a guerra que conduzimos entre os trabalhadores
e soldados no início de 1917, sob Kerensky, sem dúvida resultou em um revés
tático, pois as massas arrastaram nossos porta-vozes para fora das plataformas,
espancaram-nos e as vezes os espancaram membro por membro; em vez de as
massas serem atraídas para o Partido, eles se afastaram dele. Mas apesar do re-
vés tático, esta agitação trouxe mais perto um grande sucesso estratégico, pois as
massas logo perceberam que estávamos certos em agitar contra a guerra, e mais
tarde isso apressou e facilitou sua passagem para o lado do Partido. Ou de novo.
A demanda do Comintern por uma dissociação dos Reformistas e Centristas em
conformidade com as 21 condições185 , sem dúvida envolve um certo revés tático,
pois reduz deliberadamente o número de “apoiadores” do Comintern e tempora-
riamente enfraquece o último; mas leva a um grande ganho estratégico ao livrar
o Comintern de elementos não confiáveis, o que sem dúvida fortalecerá o Co-
mintern, unirá suas fileiras mais estreitamente, ou seja, aumentará seu poder em

185Isso se refere às vinte e uma condições de filiação à Internacional Comunista estabelecidas pelo
Segundo Congresso do Comintern em 6 de agosto de 1920.
222 Obras Escolhidas

geral.
7) Slogan de agitação e slogan de ação. Isso não deve ser confundido. É perigoso
fazer isso. No período de abril a outubro de 1917, o slogan “Todo o poder aos
sovietes” era um slogan de agitação; em outubro, tornou-se um slogan de ação –
depois que o Comitê Central do Partido, no início de outubro (10 de outubro),
adotou a decisão sobre a “tomada do poder”. Em sua ação em Petrogrado, em
abril, o grupo Bagdatyev foi culpado de tal confusão de slogans.
8) Diretiva (geral) é um apelo direto à ação, em um determinado momento e
em um determinado local, vinculando a Parte. O slogan “Todo o poder aos so-
vietes” foi um slogan de propaganda no início de abril (as “teses”186 ); em junho,
tornou-se um slogan de agitação; em outubro (10 de outubro) tornou-se um slo-
gan de ação; mas no final de outubro tornou-se uma diretiva imediata. Falo de
uma diretiva geral para todo o partido, tendo em mente que também deve haver
diretivas locais que detalhem a diretiva geral.
9) Vacilação da pequena burguesia especialmente durante a intensificação das
crises políticas (na Alemanha durante as eleições do Reichstag, na Rússia sob
Kerensky em abril, em junho e em agosto, e novamente na Rússia durante os
eventos de Kronstadt, 1921187 ); isto deve ser estudado cuidadosamente, aprovei-
tado, levado em consideração, mas ceder a ele seria perigoso, fatal para a causa
do proletariado. Os slogans de agitação não devem ser mudados por causa de
tal vacilação, mas é permissível, e às vezes necessário, mudar ou adiar uma de-
terminada diretiva e, talvez, também um slogan (de ação). Mudar de tática “da
noite para o dia” significa precisamente mudar uma diretiva, ou mesmo um slo-
gan de ação, mas não um slogan de agitação. (por exemplo, o cancelamento da
manifestação em 9 de junho de 1917 e fatos semelhantes.)
10) A arte do estrategista e do tático consiste em transformar com habilidade
e oportunidade um slogan de agitação em um slogan de ação, e em moldar,
também oportuna e habilmente, um slogan de ação em diretrizes definidas e
concretas.

II

Mudanças históricas no desenvolvimento da Rússia


1) A virada em 1904-05 (a guerra russo-japonesa revelou a total instabilidade
da autocracia, por um lado, e o poder do movimento proletário e camponês, por
outro) e o livro de Lenin “Duas Táticas” como plano estratégico dos marxistas cor-
respondente a esta virada. Uma virada para a revolução democrático-burguesa
(esta foi a essência da virada). Não um tratado liberal-burguês com o tsarismo
sob a hegemonia dos cadetes, mas uma revolução democrático-burguesa sob a he-
gemonia do proletariado. (Essa era a essência do plano estratégico.) Este plano
partia de que a revolução democrático-burguesa na Rússia daria um ímpeto ao
movimento socialista no Ocidente, desencadearia a revolução ali e ajudaria a Rús-
186 Refere-se às Teses de abril de V. I. Lenin, sobre o escrito “As Tarefas do Proletariado na Revolução
Atual”.
187 Referência ao motim contrarrevolucionário em Kronstadt em março de 1921.
J. V. Stalin 223

sia a passar da burguesia à revolução socialista (ver também as Atas do Terceiro


Congresso, os discursos de Lenin no congresso e também sua análise do conceito
de ditadura tanto no Congresso quanto no folheto “A Vitória dos Cadetes” ). Um
cálculo das forças em conflito, internas e internacionais, e, em geral, uma aná-
lise da economia e da política do período da virada são essenciais. A Revolução
de fevereiro marcou o ponto culminante deste período, executando pelo menos
dois terços do plano estratégico delineado em “Duas Táticas”.
2) A virada em fevereiro-março de 1917 para a revolução soviética (a guerra
imperialista, que varreu o regime autocrático, revelou a falência absoluta do ca-
pitalismo e mostrou que uma revolução socialista era absolutamente inevitável
como a única saída da crise).
Diferença entre a “gloriosa” Revolução de Fevereiro provocada pelo povo, pela
burguesia e pela capital anglo-francesa (esta revolução, pois transferiu o poder
para os cadetes, não causaram mudanças de qualquer importância na situação
internacional, pois foi uma continuação da política da capital anglo-francesa), e
a Revolução de Outubro, que tudo mudou.
As “Teses” de Lenin – como o plano estratégico correspondente à nova virada.
A ditadura do proletariado como saída. Este plano teve como ponto de partida
que “começaremos a revolução socialista na Rússia, derrubaremos nossa própria
burguesia e assim desencadearemos a revolução no Ocidente, e então os cama-
radas ocidentais nos ajudarão a completar nossa revolução”. É essencial analisar
a economia e a política interna e internacional deste período de virada (o pe-
ríodo do poder dual, combinações de coalizões, a revolta de Kornilov como um
sintoma da morte do regime de Kerensky, agitação nos países ocidentais devido
a descontentamento com a guerra).
3) A virada em outubro de 1917 (uma virada não só na Rússia, mas na histó-
ria mundial), estabelecimento da ditadura do proletariado na Rússia (outubro-
novembro-dezembro de 1917, e primeira metade de 1918), como uma violação
do front da política social internacional, contra o imperialismo mundial, que cau-
sou uma virada para a liquidação do capitalismo e o estabelecimento da ordem
socialista em escala mundial, e como abrindo a era da guerra civil no lugar da
guerra imperialista (o Decreto de Paz, o Decreto sobre Terra, o decreto sobre as naci-
onalidades, publicação dos tratados secretos, programa de construção, discursos
de Lenin no Segundo Congresso dos Sovietes, panfleto de Lenin “As tarefas do
poder soviético”, construção econômica).
Faça uma análise abrangente da diferença entre a estratégia e táticas do co-
munismo quando não está no poder, quando está na oposição e a estratégia e
táticas do comunismo quando está no poder.
Situação internacional: continuação da guerra entre as duas facções imperia-
listas como condição favorável (após a conclusão da Paz de Brest) para a existência
e o desenvolvimento do poder soviético na Rússia.
4) O rumo das operações militares contra os intervencionistas (verão de 1918
ao final de 1920), iniciadas após o breve período de construção pacífica, ou seja,
após a Paz de Brest. Este curso começou após a Paz de Brest, que refletiu a fra-
queza militar da Rússia Soviética e enfatizou a necessidade de criar um Exército
Vermelho na Rússia para servir como o principal baluarte da revolução sovié-
224 Obras Escolhidas

tica. A ação hostil dos tchecoslovacos, a ocupação de Murmansk, Archangel,


Vladivostok e Baku pelas tropas da Entente e a declaração de guerra da Entente
contra a Rússia Soviética – tudo isso marcou definitivamente a passagem de uma
construção pacífica incipiente para operações militares, para a defesa do centro
da revolução mundial de ataques de inimigos internos e externos. (Discursos de
Lenin sobre a Paz de Brest, etc.) Como a revolução social demorou a chegar e
fomos deixados por conta própria, especialmente após a ocupação dos distritos
acima mencionados, que não encontraram nenhum protesto sério por parte de
os proletários do Ocidente, fomos obrigados a concluir a indecente Paz de Brest,
a fim de obter uma trégua durante a qual construir nosso Exército Vermelho e
defender a República Soviética com nossos próprios esforços.
“Tudo pela frente, tudo pela defesa da República”. Daí a criação do Conselho de
Defesa, etc. Foi o período da guerra que deixou sua marca em toda a vida interna
e externa da Rússia.
5) O caminho para a construção pacífica desde o início de 1921, após a derrota
de Wrangel, a paz com vários Estados burgueses, o tratado com a Grã-Bretanha,
etc.
A guerra acabou, mas como os socialistas ocidentais ainda não são capazes
de nos ajudar a restaurar nossa economia, nós, sendo economicamente cercados
por Estados burgueses industrialmente mais desenvolvidos, somos obrigados a
fazer concessões, a concluir acordos comerciais com Estados burgueses indivi-
duais e concessões acordos com grupos capitalistas individuais; também nesta
esfera (econômica) somos deixados aos nossos próprios recursos, somos obriga-
dos a manobrar. Tudo para o restabelecimento da economia nacional. (Ver os
famosos discursos e panfletos de Lenin.) O Conselho de Defesa é transformado
no Conselho de Trabalho e Defesa.
6) As etapas do desenvolvimento do Partido até 1917:
a) Soldagem do núcleo principal, especialmente o grupo Iskra, e assim por
diante. Luta contra o Economist. O Credo188 .
b) Formação de quadros do Partido como base do futuro partido operário
em escala totalmente russa. O Segundo Congresso do Partido.
c) A expansão dos quadros em partido operário e o seu reforço com novos
operários partidários recrutados durante o movimento proletário (1903-04).
O Congresso do Terceiro Partido.
d) A luta dos mencheviques contra os quadros do Partido com o objetivo
de dissolver estes entre as massas apartidárias (o “Congresso do Trabalho”) e
a luta dos bolcheviques para conservar os quadros do Partido como base do
Partido. O Congresso de Londres e a derrota dos defensores de um Congresso
Trabalhista.
e) Liquidantes e apoiadores do partido. Derrota dos liquidacionistas (1908-
10).
f) 1908-16 inclusive. O período de combinação das formas ilegais e legais
de atividade e de crescimento das organizações do Partido em todos os âmbitos
de atividade.

188 O “Credo” foi um o manifesto publicado pelo grupo “Economist”.


J. V. Stalin 225

7) O Partido Comunista como uma espécie de Ordem dos Cavaleiros da Es-


pada dentro do Estado soviético, dirigindo os órgãos deste último e inspirando
suas atividades.
A importância da velha guarda nesta poderosa Ordem. Reforço da velha
guarda com novas forças que foram reforçadas durante os últimos três ou quatro
anos.
Lenin estava certo ao travar uma luta intransigente contra os conciliadores?
Sim, pois se não o fizesse, o Partido teria se diluído e não seria um organismo,
mas um conglomerado de elementos heterogêneos; não teria sido tão soldado
e unido internamente; não teria possuído aquela disciplina sem precedentes e
flexibilidade sem precedentes sem as quais, e o Estado soviético que guia, não
poderiam ter resistido ao imperialismo mundial. “O Partido se fortalece ao se
purificar”, disse Lassalle com razão. Qualidade primeiro e depois quantidade.
8) A questão da necessidade ou não de um partido proletário e do papel deste
último. O Partido constitui o corpo de oficiais e o estado-maior do proletariado,
que dirige a luta deste em todas as suas formas e em todas as esferas sem exceção,
e reúne as diversas formas de luta em um todo. Dizer que não é necessário um
Partido Comunista equivale a dizer que o proletariado deve lutar sem um estado-
maior, sem um núcleo dirigente, que faça um estudo especial das condições da
luta e trabalhe os métodos de luta; equivale a dizer que é melhor lutar sem estado-
maior do que com estado-maior, o que é estúpido.

III

Questões

1) O papel da autocracia antes e depois da guerra russo-japonesa. A guerra


Russo-Japonesa expôs a podridão e fraqueza absolutas da autocracia russa. A
greve política geral bem-sucedida em outubro de 1905 deixou essa fraqueza ab-
solutamente clara (um colosso com pés de barro). Além disso, 1905 não só expôs
a fraqueza da autocracia, a fragilidade da burguesia liberal e o poder do pro-
letariado russo, mas também refutou a opinião anteriormente corrente de que
a autocracia russa era o gendarme da Europa, que era forte o suficiente para
ser o gendarme da Europa. Os fatos mostraram que a autocracia russa foi inca-
paz de lidar nem mesmo com sua própria classe trabalhadora, sem a ajuda do
capital europeu. A autocracia russa foi, de fato, capaz de ser o gendarme da
Europa enquanto a classe trabalhadora da Rússia estava adormecida e enquanto
o campesinato russo estava quiescente, continuando a ter fé no Pequeno Padre,
o Tsar; mas 1905, e acima de tudo o tiroteio em 9 de janeiro de 1905, desper-
tou o proletariado russo; e o movimento agrário no mesmo ano minou a fé dos
mujiques no tsar. O centro de gravidade da contrarrevolução europeia mudou
dos proprietários russos para os banqueiros e imperialistas anglo-franceses. Os
sociais-democratas alemães que tentaram justificar sua traição ao proletariado
em 1914 com o argumento de que a guerra era uma guerra progressiva contra a
autocracia russa, já que o gendarme da Europa estava na verdade brincando com
a sombra do passado e jogando desonestamente, é claro que os verdadeiros gen-
226 Obras Escolhidas

darmes da Europa, que tinham forças e fundos suficientes sob seu comando para
serem gendarmes, não estavam em Petrogrado, mas em Berlim, Paris e Londres.
Agora ficava claro para todos que a Europa estava introduzindo na Rússia não
apenas o socialismo, mas também a contrarrevolução na forma de empréstimos
ao tsar, etc., enquanto, além dos emigrantes políticos, a Rússia estava introdu-
zindo a revolução na Europa. (De qualquer forma, em 1905 a Rússia introduziu
a greve geral na Europa como uma arma na luta proletária.)
2) “O amadurecimento dos frutos”. Como é possível determinar quando chegou
o momento das convulsões revolucionárias? Quando é possível dizer que o “fruto
está maduro”, que o período de preparação terminou e que a ação pode começar?
a) Quando o temperamento revolucionário das massas está transbordando
e nossos slogans de ação e diretivas ficam para trás do movimento das massas
(ver “Para entrar na Duma” de Lenin, o período antes de outubro de 1905),
quando restringimos as massas com dificuldade e nem sempre sucesso, por
exemplo, os trabalhadores de Putilov e portadores de metralhadoras na época
das manifestações de julho de 1917 (ver o livro de Lenin “Esquerdismo, Doença
infantil do Comunismo” );
b) Quando a incerteza e a confusão, a decadência e a desintegração no
campo do inimigo atingem o clímax; quando o número de desertores e rene-
gados do acampamento do inimigo aumenta aos trancos e barrancos; quando
os chamados elementos neutros, a vasta massa da pequena burguesia urbana
e rural, começam definitivamente a se afastar do inimigo (da autocracia ou
da burguesia) e procuram uma aliança com o proletariado; quando, em con-
sequência de tudo isso, os órgãos de administração do inimigo, junto com os
órgãos de supressão, deixem de funcionar, se tornem paralisados e inúteis,
etc., deixando assim o caminho aberto para o proletariado exercer seu direito
de tomar o poder;
c) Quando ambos os fatores (pontos a e b) coincidem no tempo, o que, na
verdade, é o que geralmente acontece. Há quem pense que basta observar o
processo objetivo de extinção da classe no poder para lançar o ataque. Mas isso
está errado. Além disso, as condições subjetivas necessárias para um ataque
bem-sucedido devem ter sido preparadas. É precisamente tarefa da estraté-
gia e da tática com habilidade e oportunidade fazer com que a preparação
das condições subjetivas para os ataques se encaixe nos processos objetivos de
extinção do poder da classe dominante.
3) Escolha do momento. A escolha correta do momento, na medida em que
o momento da greve é realmente escolhido pelo Partido e não imposto pelos
acontecimentos, pressupõe a existência de duas condições:
a) “amadurecimento do fruto” e;
b) algum evento flagrante, ação pelo governo ou por alguma explosão es-
pontânea de caráter local que possa servir de motivo adequado, óbvio para
as grandes massas, para desferir o primeiro golpe, para iniciar o ataque. A
falha em observar essas duas condições pode significar que o golpe não só
deixará de servir como ponto de partida para ataques gerais de escala e inten-
sidade crescentes sobre o inimigo, não só deixará de crescer para um golpe
trovejante e esmagador (e isso é precisamente o significado e o propósito da
J. V. Stalin 227

escolha adequada do momento), mas, ao contrário, pode degenerar em um


golpe ridículo, que o governo, e o inimigo em geral, acolherão e explorarão
para aumentar seu prestígio, e que pode se tornar um pretexto e ponto de
partida para destruir o Partido, ou em todo caso, para desmoralizá-lo. Por
exemplo, a proposta feita por uma seção do Comitê Central para prender a
Conferência Democrática 189 mas rejeitada pelo Comitê Central porque não
cumpriu (falhou totalmente) com o segundo requisito (Ver acima), era inade-
quada do ponto de vista de escolha do momento.
Em geral, deve-se ter cuidado para que o primeiro golpe (escolha do mo-
mento) não se transforme em golpe. Para evitar isso, é essencial que as duas
condições indicadas acima sejam estritamente observadas.
4) “Prova de força”. Às vezes, o Partido, tendo feito preparativos para ações de-
cisivas e tendo acumulado, como pensa, reservas suficientes, considera oportuno
empreender uma ação de teste, para testar a força do inimigo e verificar se suas
próprias forças estão prontas para a ação. Tal prova de força pode ser empre-
endida pelo Partido deliberadamente, por sua própria escolha (a demonstração
que foi proposta em 10 de junho de 1917, mas foi posteriormente cancelada e
substituída pela demonstração em 18 de junho), ou pode ser forçada pelas cir-
cunstâncias, pela ação prematura do lado oposto ou, em geral, por algum acon-
tecimento imprevisto (a revolta de Kornilov em agosto de 1917 e o contra-ataque
do Partido Comunista que serviu como uma esplêndida prova de força). Uma
“prova de força” não deve ser considerada meramente como uma demonstração,
como uma demonstração do Primeiro de Maio; portanto, não deve ser descrito
meramente como um cálculo de forças; quanto à sua importância e resultados
possíveis, é sem dúvida mais do que uma manifestação comum, embora menos
do que uma revolta – é algo entre uma manifestação e uma revolta ou uma greve
geral. Em circunstâncias favoráveis, pode evoluir para o primeiro golpe (escolha
do momento), para uma insurreição (ação do nosso Partido no final de outubro);
em circunstâncias desfavoráveis, pode colocar o Partido em perigo imediato de
naufrágio (a manifestação de 3 a 4 de julho de 1917). Portanto, é mais conve-
niente empreender uma prova de força quando o “fruto está maduro”, quando
o campo do inimigo está suficientemente desmoralizado, quando o Partido acu-
mulou certo número de reservas; resumidamente: quando o Partido está pronto
para uma ofensiva, quando o Partido não se intimida com a possibilidade de
que as circunstâncias possam fazer com que a prova de força se torne o primeiro
golpe e depois se torne uma ofensiva geral contra o inimigo. Ao empreender
uma prova de força, o Partido deve estar pronto para todas as contingências.
5) “Balanço de forças”. O balanço das forças é simplesmente uma demonstração
que pode ser realizada em quase todas as situações (por exemplo, uma demons-
189 A Conferência Democrática foi realizada em Petrogrado, de 14 a 22 de setembro de 1917. Foi con-
vocada pelos líderes mencheviques e socialistas-revolucionários do Comitê Executivo Central de toda
a Rússia dos Sovietes de Deputados de Trabalhadores e Soldados e do Executivo Comitê dos Sovie-
tes de deputados camponeses, com a presença de representantes dos partidos socialistas, soviéticos
comprometedores, sindicatos, Zemstvos, círculos comerciais e industriais e unidades militares. A
conferência criou um pré-parlamento (Conselho Provisório da República) como órgão consultivo do
Governo Provisório. Com a ajuda do pré-parlamento, os conciliadores esperavam deter a revolução e
desviar o país do caminho da revolução soviética para o caminho do desenvolvimento constitucional
burguês.
228 Obras Escolhidas

tração do Primeiro de Maio, com ou sem greve). Se um balanço de forças não for
realizado na véspera de uma revolta aberta, mas em um momento mais ou menos
“pacífico”, pode terminar no máximo em uma contenda com a polícia ou tropas
do governo, sem envolver pesadas baixas para o Partido ou para o inimigo. Se,
no entanto, for realizado na atmosfera incandescente de convulsões iminentes,
pode envolver o Partido em uma colisão decisiva prematura com o inimigo, e se
o Partido ainda estiver fraco e irreal por causa dessas colisões, o inimigo pode
tirar vantagem de tal “balanço de forças” para esmagar as forças proletárias (daí
os repetidos apelos do Partido em setembro de 1917: “não se deixem provocar”).
Portanto, ao aplicar o método de balanço de forças na atmosfera de uma crise
revolucionária já madura, é necessário ter muito cuidado, e se deve ter em mente
que se o Partido for fraco, o inimigo pode converter tal cálculo em uma arma
para derrotar o proletariado, ou pelo menos, para enfraquecê-lo seriamente. E,
por outro lado, se o Partido está pronto para a ação, e as fileiras do inimigo estão
obviamente desmoralizadas, então, tendo iniciado um “balanço de forças”, não
deve ser perdida a oportunidade de passar para uma “prova de força” (assumindo
que as condições para isso são favoráveis – frutos maduros”, etc.) e então lançar
o ataque geral.
6) Táticas ofensivas (táticas de guerras de libertação, quando o proletariado já
tomou o poder).
7) Táticas de retirada ordenada. Com que habilidade recuar para o interior,
diante de forças inimigas obviamente superiores, a fim de salvar, se não a maior
parte do exército, pelo menos seus quadros (ver o livro de Lenin “Comunismo de
Esquerda”...). Como fomos os últimos a recuar, por exemplo, durante o boicote
à Duma Witte-Dubasov. A diferença entre táticas de recuo e “táticas” de fuga
(compare os mencheviques).
8) Táticas de defesa, como meio necessário para preservar quadros e acumular
forças em antecipação aos combates futuros. Eles impõem ao Partido o dever de
assumir posições em todos os campos da luta, sem exceção, de ordenar todos os
tipos de armas, ou seja, todas as formas de organização, sem descuidar de ne-
nhuma delas, mesmo as aparentemente mais insignificante, pois ninguém pode
dizer de antemão qual campo será a primeira arena de batalha, ou qual forma de
movimento, ou forma de organização, será o ponto de partida e a arma tangível
do proletariado quando as batalhas decisivas se abrirem. Ou seja: no período
de defesa e acumulação de forças, o Partido deve preparar-se plenamente para
as batalhas decisivas. Em antecipação às batalhas, mas isso não significa que o
Partido deva esperar de braços cruzados e se tornar um espectador ocioso, dege-
nerando de um partido revolucionário (se estiver na oposição) em um partido do
tipo “esperar para ver”. Não, em tal período deve evitar batalhas, não aceitar ba-
talhas, se ainda não acumulou a quantidade necessária de forças ou se a situação
lhe é desfavorável, mas não deve perder uma única oportunidade, em condições
favoráveis, é claro, forçar uma batalha sobre o inimigo quando isso for prejudi-
cial para o inimigo, para mantê-lo em constante estado de tensão, passo a passo
para desorganizar e desmoralizar suas forças, passo a passo para exercitar as for-
ças proletárias em batalhas que afetem os interesses cotidianos do proletariado,
e desta forma aumentar suas próprias forças.
J. V. Stalin 229

Só assim a defesa pode ser uma defesa realmente ativa e o Partido preserva
todos os atributos de um verdadeiro partido de ação e não de um contempla-
tivo, que espera para ver; só então o Partido evitará perder, esquecer o momento
da ação decisiva, evitar ser pego de surpresa pelos acontecimentos. O caso de
Kautsky e companhia negligenciando o momento da revolução proletária no Oci-
dente devido às suas táticas de espera contemplativas “sábias” e passividade ainda
mais “sábia” é um aviso direto. Ou ainda: o caso dos mencheviques e socialistas-
revolucionários que perderam a oportunidade de tomar o poder devido à sua
tática de espera sem fim pelas questões da paz e da terra deveria servir também
de alerta. Por outro lado, também é óbvio que as táticas de defesa ativa, as tá-
ticas de ação, não devem ser abusadas, pois isso criaria o perigo de as táticas de
ação revolucionária do Partido Comunista se converterem em táticas de ginástica
“revolucionária”, isto é, em táticas que conduzam não à acumulação das forças
do proletariado e à sua maior prontidão para a ação, portanto, não à acelera-
ção da revolução, mas à dissipação das forças proletárias, à deterioração de sua
prontidão para a ação e, portanto, para retardar a causa da revolução.
9) Os princípios gerais da estratégia e tática comunistas. Existem três princípios:
a) A adoção, como base, da conclusão, alcançada pela teoria marxista e
confirmada pela prática revolucionária, de que nos países capitalistas o pro-
letariado é a única classe completamente revolucionária que está interessada
na emancipação total da humanidade do capitalismo e de quem missão é,
portanto, ser o líder de todas as massas oprimidas e exploradas na luta pela
derrubada do capitalismo. Consequentemente, todo trabalho deve ser direci-
onado para o estabelecimento da ditadura do proletariado.
b) A adoção, como base, da conclusão a que chega a teoria marxista e
confirmado pela prática revolucionária, que a estratégia e a tática do Par-
tido Comunista de qualquer país só podem ser corretas se não se limitarem
aos interesses de “seu” país, “sua própria pátria”, “seu próprio” proletariado,
mas, pelo contrário, se, tendo em conta as condições e a situação do seu pró-
prio país, fazem dos interesses do proletariado internacional, dos interesses
da revolução nos outros países, a pedra angular, ou seja, se, em essência, em
espírito, são internacionalistas, se fizerem “o máximo possível em um (seu
próprio) país pelo desenvolvimento, apoio e despertar da revolução em todos
os países” (ver o livro de Lenin “A Revolução Proletária e o Renegado Kautsky”).
c) A adoção, como ponto de partida, do repúdio a todo doutrinarismo (di-
reita e esquerda) na mudança de estratégia e tática, na elaboração de novos
planos estratégicos e linhas táticas (Kautsky, Axelrod, Bogdanov, Bukharin),
repúdio ao contemplativo método e o método de citar textos e traçar para-
lelos históricos, planos artificiais e fórmulas sem vida (Axelrod, Plekhanov);
reconhecimento de que é necessário manter o ponto de vista do marxismo,
não “deitar sobre ele”, que é necessário “mudar” o mundo, não “meramente
interpretá-lo”, que é necessário liderar o proletariado e ser a expressão cons-
ciente do processo inconsciente, e não “contemplar a retaguarda do proleta-
riado” e arrastar-se na cauda dos acontecimentos (ver “Espontaneidade e Cons-
ciência” de Lenin e a conhecida passagem do Manifesto Comunista de Marx
no sentido de que os comunistas são a seção mais previdente e avançada do
230 Obras Escolhidas

proletariado).
Ilustre cada um desses princípios com fatos do movimento revolucionário na
Rússia e no Ocidente, especialmente o segundo princípio e o terceiro.
10) Tarefas:
a) Ganhar a vanguarda do proletariado ao lado do comunismo (ou seja,
construir quadros, criar um Partido Comunista, elaborar o programa, os prin-
cípios da tática). Propaganda como principal forma de atividade.
b) Ganhar as grandes massas dos trabalhadores e dos trabalhadores geral-
mente para o lado da vanguarda (para levar as massas às posições de luta).
Principal forma de atividade – ação prática pelas massas como um prelúdio
para batalhas decisivas.
11) Regras:
a) Domine todas as formas de organização do proletariado sem exceção
e todas as formas (campos) do movimento, da luta. (Formas de movimento:
parlamentar e extraparlamentar, legal e ilegal.)
b) Aprender a adaptar-se a mudanças rápidas de algumas formas de movi-
mento para outras, ou complementar algumas formas com outras; aprender
a combinar formas legais com formas ilegais, parlamentares e extraparlamen-
tares (exemplo: a rápida transição dos bolcheviques das formas legais para as
ilegais em julho de 1917; combinação do movimento extraparlamentar com
ação na Duma durante os eventos de Lena).
12)Estratégia e táticas do Partido Comunista antes e depois de assumir o poder. Qua-
tro recursos específicos.
a) A característica mais importante da situação que surgiu na Europa em
geral, e na Rússia em particular, após a Revolução de Outubro, foi a ruptura
da frente social internacional (como resultado da vitória sobre a burguesia
russa) na região da Rússia levada a cabo pelo proletariado russo (ruptura com
o imperialismo, publicação dos tratados secretos, guerra civil em vez de guerra
imperialista, apelo à confraternização das tropas, apelo aos operários para
que se levantem contra os seus governos). Essa ruptura marcou uma virada
na história mundial, pois ameaçou diretamente todo o edifício do imperia-
lismo internacional e mudou radicalmente a relação das forças em conflito
no Ocidente em favor da classe trabalhadora da Europa. Isso significou que
o proletariado russo e seu Partido passaram de uma força nacional para uma
força internacional, e sua tarefa anterior de derrubar sua própria burguesia
nacional foi substituída pela nova tarefa de derrubar a burguesia internaci-
onal. Visto que a burguesia internacional, pressentindo o perigo mortal, se
impôs a tarefa imediata de encerrar a brecha russa e concentrou suas forças
não engajadas (reservas) contra a Rússia Soviética, esta última não pôde, por
sua vez, deixar de concentrar todas as suas forças para a defesa, e foi obrigada
a atrair sobre si o golpe principal da burguesia internacional. Tudo isso fa-
cilitou enormemente a luta que os proletários ocidentais travavam contra sua
própria burguesia e aumentou em dez vezes sua simpatia pelo proletariado
russo como lutador de vanguarda do proletariado internacional.
Assim, o cumprimento da tarefa de derrubar a burguesia em um país levou
J. V. Stalin 231

à nova tarefa de lutar em escala internacional, de lutar em um plano diferente


– a uma luta travada pelo Estado proletário contra Estados capitalistas hostis;
e o proletariado russo, que até então havia sido um dos destacamentos do
proletariado internacional, tornou-se o destacamento avançado, a vanguarda
do proletariado internacional.
Assim, a tarefa de desencadear a revolução no Ocidente para tornar mais
fácil para ela, ou seja, a Rússia, para completar sua revolução, foi transfor-
mada de um desejo em uma tarefa puramente prática do dia. Esta mudança
nas relações (especialmente nas relações internacionais) provocada por outu-
bro deve-se inteiramente a outubro. A Revolução de Fevereiro não afetou em
nada as relações internacionais.
b) A segunda característica importante da situação que surgiu na Rússia
depois de outubro foi a mudança na posição tanto do proletariado quanto de
seu Partido dentro da Rússia. Anteriormente, antes de outubro, a principal
preocupação do proletariado era organizar todas as forças de luta para der-
rubar a burguesia, ou seja, sua tarefa era principalmente de caráter crítico e
destrutivo. Agora, depois de outubro, quando a burguesia não está mais no
poder e o Estado se tornou proletário, a velha tarefa caiu fora; seu lugar foi
ocupado pela nova tarefa de organizar todos os trabalhadores da Rússia (os
camponeses, artesãos, artesãos, intelectuais, as nacionalidades atrasadas na
RSFSR) para construir a nova Rússia Soviética, suas organizações econômicas
e militares, em um por outro lado, e para esmagar a resistência da burguesia
derrubada, mas ainda não completamente esmagada, por outro lado190 .
c) Correspondendo à mudança na posição do proletariado na Rússia, e em
conformidade com a nova tarefa, uma mudança ocorreu na política do pro-
letariado em relação aos grupos burgueses e pequeno-burgueses e estratos da
população da Rússia. Anteriormente (às vésperas da derrubada da burgue-
sia), o proletariado se recusava a fazer acordos individuais com grupos burgue-
ses, pois tal política teria fortalecido a burguesia que estava no poder. Agora,
porém, o proletariado é a favor dos acordos individuais, pois eles fortalecem
seu poder, causam a desintegração entre a burguesia, ajudam o proletariado a
domar, a assimilar grupos individuais da burguesia. A diferença entre “refor-
mismo” e a política de acordos individuais (o primeiro rejeita absolutamente
o método de ação revolucionária, o último não, e quando os revolucionários
o empregam, baseiam-se no método revolucionário; o primeiro é mais res-
trito, o último tem um escopo mais amplo). (Ver “reformismo” e “política de
acordos”.)
d) Correspondendo ao crescimento colossal da força e dos recursos do pro-
letariado e do Partido Comunista, o alcance das atividades estratégicas do Par-
tido Comunista aumentou. Antigamente a estratégia do Partido Comunista
limitava-se à elaboração do plano estratégico, à manobra entre as diferentes
formas do movimento e das organizações proletárias, e também entre as dife-
rentes demandas do movimento (slogans), avançando uns, mudando outros,
190Correspondentemente, algumas das velhas formas do movimento foram abandonadas, como gre-
ves, revoltas, etc., e, da mesma maneira, o caráter e as formas (funções) das organizações da classe
trabalhadora (o Partido, Sovietes, sindicatos, cooperativas, instituições culturais e educacionais) tam-
bém mudaram.
232 Obras Escolhidas

empregando as escassas reservas na forma das contradições entre as diferen-


tes classes. Em regra, o âmbito e a possibilidade de utilização dessas reservas
restringiam-se a limites estreitos devido à fraqueza do Partido. Agora, porém,
depois de outubro, em primeiro lugar, as reservas cresceram (contradições en-
tre os grupos sociais na Rússia, contradições entre classes e nacionalidades nos
Estados vizinhos, contradições entre os Estados vizinhos, a crescente revolu-
ção socialista no Ocidente, o crescente movimento revolucionário no Oriente
e nas colônias em geral, etc.); em segundo lugar, os meios e as possibilidades
de manobra aumentaram (os meios antigos foram complementados por novos
na forma, por exemplo, de atividade diplomática, estabelecimento de cone-
xões mais eficazes tanto com o movimento socialista ocidental quanto com o
movimento revolucionário oriental); em terceiro lugar, surgiram novas e mais
amplas possibilidades de utilização das reservas devido ao aumento da força
e dos recursos do proletariado que, na Rússia, se tornou a força política do-
minante, possuindo suas próprias forças armadas, e no campo internacional
se tornou a vanguarda do movimento revolucionário mundial.
13) Especial:
a) a questão do ritmo do movimento e seu papel na determinação da es-
tratégia e tática;
b) a questão do reformismo, da política de acordos e da relação entre eles.
14) “Reformismo” (“compromisso”), “política de acordos” e “acordos indivi-
duais” são três coisas diferentes (escreva sobre cada um separadamente). Os
acordos concluídos pelos mencheviques são inaceitáveis porque se baseiam no
reformismo, ou seja, no repúdio à ação revolucionária, ao passo que os acordos
celebrados pelos bolcheviques se baseiam nas exigências da ação revolucionária.
Por isso mesmo os acordos celebrados pelos mencheviques se convertem em um
sistema, em uma política de acordos, enquanto os bolcheviques são apenas para
acordos individuais e concretos, e não os transformam em uma política especial
de acordos.
15) Três períodos no desenvolvimento do Partido Comunista da Rússia:
a) o período de formação da vanguarda (isto é, o partido) do proletariado,
o período de mobilização dos quadros do Partido (neste período o Partido era
fraco; tinha um programa e princípios gerais de tática, mas como um partido
de ação de massa era fraco);
b) o período da luta revolucionária de massas sob a liderança do Partido
Comunista. Nesse período, o Partido deixou de ser uma organização de agita-
ção de massa em uma organização de ação de massa; o período de preparação
foi substituído pelo período de ação revolucionária;
c) o período após a tomada do poder, após a transformação do Partido
Comunista em partido do governo.
16) A força política da revolução proletária russa reside no fato de que a revo-
lução agrária camponesa (derrubada do feudalismo) ocorreu aqui sob a direção
do proletariado (e não da burguesia), e, como consequência disso, a revolução
democrático-burguesa serviu como prólogo da revolução proletária; em que a
conexão entre os elementos trabalhadores do campesinato e do proletariado, e
o apoio que este prestava aos primeiros, não eram apenas assegurados politica-
J. V. Stalin 233

mente, mas consolidados organizacionalmente nos sovietes, e isso despertou no


proletariado a simpatia da vasta maioria dos a população (e por isso não importa
se o próprio proletariado não constitui a maioria no país).
A fraqueza das revoluções proletárias na Europa (o continente) reside no fato
de que ali o proletariado carece dessa conexão e desse apoio ao campo; lá os
camponeses foram emancipados do feudalismo sob a direção da burguesia e não
do proletariado, que era fraco na época), e isso, combinado com a indiferença
da social-democracia pelos interesses do campo, por muito tempo assegurada a
burguesia a simpatia da maioria dos camponeses.191

191Essa sinopse foi usada pelo autor em seu panfleto “Os Fundamentos do Leninismo”, publicado
em 1924. A parte I da sinopse foi usada para o artigo “Sobre a Questão da Estratégia e Táticas dos
Comunistas Russos”, publicado em 1923. Algumas das teses da sinopse foram usadas pelo autor para
o artigo “O partido antes e depois de tomar o poder”, publicado em agosto de 1921.
234 Obras Escolhidas

O décimo aniversário do Pravda


5 de maio de 1922

1. Os eventos do Lena

Os eventos de Lena foram o resultado do regime de Stolypin de “pacificação”.


Os membros mais jovens do Partido, é claro, não experimentaram e não se lem-
bram dos encantos deste regime. Quanto aos mais velhos, eles, sem dúvida, se
lembram das expedições punitivas de memória maldita, das incursões violentas
às organizações da classe trabalhadora, do açoitamento em massa de campone-
ses e, como tela de tudo isso, a Duma dos Centenas Negras. Opinião pública
em frangalhos, lassidão e apatia generalizadas, carência e desespero entre os tra-
balhadores, o campesinato oprimido e aterrorizado, com gangues de policiais,
proprietários de terras e capitalistas desenfreados por toda parte – essas eram as
características típicas da “pacificação” de Stolypin.
Para o observador superficial, pode ter parecido que a época da revolução
havia passado para sempre e que um período de desenvolvimento “constitucio-
nal” da Rússia nas linhas da Prússia havia se estabelecido. Os liquidacionistas
mencheviques gritavam abertamente que assim era e pregavam a necessidade de
organizar um partido legal dos trabalhadores sob Stolypin. E certos velhos “bol-
cheviques”, que em seus corações simpatizavam com esta pregação, se apressaram
em abandonar as fileiras de nosso Partido. O triunfo do knout192 e dos poderes
das trevas foi completo. Naquela época, a vida política da Rússia era descrita
como uma “abominação da desolação”.
Os eventos de Lena explodiram nessa “abominação da desolação” como um
furacão e revelaram uma nova imagem para todos. Descobriu-se que o regime de
Stolypin não era tão estável afinal, que a Duma estava despertando o desprezo
das massas e que a classe trabalhadora havia acumulado energia suficiente para se
lançar à batalha por uma nova revolução. O abate de trabalhadores nas remotas
profundezas da Sibéria (Bodaibo no Lena) bastou para provocar greves em toda a
Rússia, e os trabalhadores de São Petersburgo saíram às ruas e de uma só tacada
varreram do caminho o orgulhoso Ministro Makarov e seu slogan insolente “As-
sim foi, assim será”. Esses foram os primeiros arautos do poderoso movimento que
então estava começando. O Zvezda193 tinha razão quando exclamou na época:
192 Espécie de chicote feito com diversas camadas de cordas grossas, todas conectadas a um cabo
espesso manuseado pelo torturador. Às vezes, eram usados diversos tipos de metal e ganchos incor-
porados nas cordas, a fim de punir mais o torturado em questão (N.T.)
193 Zvezda (A Estrela) era um jornal bolchevique legal publicado em São Petersburgo de 16 de dezem-

bro de 1910 a 22 de abril de 1912, primeiro semanalmente e depois duas ou três vezes por semana.
Estava sob a orientação ideológica de V. I. Lenin, que regularmente enviava artigos para ele do exte-
rior. Teve como olaboradores regulares nomes como V. M. Molotov; M. S. Olminsky, N. G. Poletayev,
N. N. Baturin, K. S. Yeremeyev e outros. Contribuições também foram recebidas de Maxim Gorky.
Na primavera de 1912, quando Stalin estava em São Petersburgo, o jornal saiu sob sua direção e ele
escreveu uma série de artigos para ele. A circulação de edições individuais do jornal atingiu 50.000
a 60.000. O Zvezda abriu caminho para a publicação do diário bolchevique Pravda. Em 22 de abril
J. V. Stalin 235

“Nós vivemos! Nosso sangue escarlate ferve com o fogo da força não gasta...”. O
surgimento de um novo movimento revolucionário era evidente. Foi nas ondas
desse movimento que nasceu o jornal popular Pravda.

2. A fundação do Pravda

Foi em meados de abril de 1912, em uma noite na casa do camarada Pole-


tayev, onde dois membros da Duma (Pokrovsky e Poletayev), dois escritores (Ol-
minsky e Baturin) e eu, um membro do Comitê Central (eu, estando escondido,
encontrei na casa de Poletayev um “santuário”, já que ele gozava de imunidade
parlamentar) chegou a um acordo sobre a plataforma do Pravda e compilou o
primeiro número do jornal. Não me lembro se Demyan Byedny e Danilov, dois
colaboradores muito próximos do Pravda, estiveram presentes nesta conferência.
Os pré-requisitos técnicos e financeiros do jornal já haviam sido atendidos
graças à agitação do Zvezda, à simpatia das amplas massas operárias e à arreca-
dação massiva de fundos para o Pravda nas fábricas e nas fábricas. Na verdade,
o Pravda nasceu como resultado dos esforços da classe trabalhadora da Rússia e,
acima de tudo, de São Petersburgo. Não fosse por esses esforços, o jornal não
poderia ter existido.
A aparência do Pravda era clara: sua missão era popularizar o programa do
Zvezda entre as massas. Em sua primeira edição, o Pravda escreveu: “Quem lê o
Zvezda e conhece seus colaboradores, que também são colaboradores do Pravda,
não terá dificuldade em entender a linha que o Pravda seguirá”. A única dife-
rença entre o Zvezda e o Pravda era que este, ao contrário do primeiro, não se
dirigia aos trabalhadores avançados, mas às amplas massas da classe trabalhadora.
A função do Pravda era ajudar os trabalhadores avançados a reunir em torno da
bandeira do Partido as amplas camadas da classe trabalhadora russa que haviam
despertado para uma nova luta, mas ainda estavam politicamente atrasados. Jus-
tamente por isso, um dos objetivos que o Pravda se propôs na época era formar
escritores dentre os trabalhadores e atraí-los para a direção do jornal.
Em seu primeiro número, o Pravda escreveu: “Gostaríamos que os trabalha-
dores não se limitassem apenas à simpatia, mas que participassem ativamente da
condução de nosso jornal. Não digam os trabalhadores que ’não estão acostuma-
dos’ a escrever. Os escritores da classe trabalhadora não caem do céu já prontos,
eles só podem ser treinados gradualmente, no decorrer da atividade literária.
Tudo o que é necessário é começar o trabalho com ousadia: você pode tropeçar
uma ou duas vezes, mas no final, você aprenderá a escrever...”.

3. O significado organizacional do Pravda

O Pravda surgiu naquele período de desenvolvimento do nosso Partido quando


a organização clandestina estava inteiramente nas mãos dos bolcheviques (os
mencheviques tinham fugido dele), mas as formas legais de organização – o

de 1912, o governo tsarista suprimiu o Zvezda. Foi sucedido por Nevskaya Zvezda, cuja publicação
continuou até outubro de 1912.
236 Obras Escolhidas

grupo na Duma, a imprensa, sociedades de auxílio-doença, sociedades de se-


guros, organizações sindicais – ainda não haviam sido totalmente conquistadas
dos mencheviques. Foi um período em que os bolcheviques travaram uma luta
determinada para expulsar os liquidacionistas (mencheviques) das organizações
legais da classe trabalhadora. O slogan “Demitir os mencheviques de seus car-
gos” era então o slogan mais popular do movimento da classe trabalhadora. As
colunas do Pravda fervilhavam de relatos de expulsão das sociedades de seguros,
sociedades de auxílio-doença e organizações sindicais dos liquidacionistas que
outrora se haviam entrincheirado nelas. Todos os seis assentos de deputados na
cúria operária foram conquistados pelos mencheviques. A imprensa menchevi-
que também estava na mesma, ou quase na mesma, posição desesperadora. Foi
verdadeiramente uma luta heroica que os trabalhadores de mentalidade bolche-
vique travaram pelo Partido, pois os agentes do tsarismo estavam bem acordados,
caçando e expulsando os bolcheviques, e o Partido, conduzido profundamente
na clandestinidade, não poderia se desenvolver mais a menos que tivesse um dis-
farce. Mais do que isso: nas condições políticas vigentes na época, o Partido
não poderia lançar mão das grandes massas e arregimentá-las em torno de sua
bandeira, a menos que ganhasse as organizações jurídicas; teria se separado das
massas e se transformado em um grupo isolado, cozinhando seu próprio suco.
O Pravda foi o centro desta luta pelo princípio do Partido, pela criação de um
partido operário de massas. Não foi apenas um jornal que resumiu o sucesso dos
bolcheviques na conquista das organizações legais de trabalhadores; foi também
o centro organizador que uniu essas organizações em torno dos centros clandesti-
nos do Partido e dirigiu o movimento da classe trabalhadora para um único obje-
tivo definido. Já em seu livro O Que Fazer (1902), o camarada Lenin escreveu que
um jornal militante russo bem organizado deve ser não apenas um agitador co-
letivo, mas também um organizador coletivo. Esse é exatamente o tipo de jornal
que o Pravda se tornou no período da luta contra os liquidacionistas pela preser-
vação da organização clandestina e pela conquista das organizações jurídicas dos
trabalhadores. Se é verdade que, se não tivéssemos derrotado os liquidacionistas,
não teríamos tido o Partido que, forte na unidade e invencível pela devoção ao
proletariado, organizou em outubro de 1917, então é igualmente verdade que a
luta perseverante e devotada do velho Pravda, em um grau considerável, preparou
e apressou essa vitória sobre os liquidacionistas. Nesse sentido, o velho Pravda
foi sem dúvida o arauto das futuras gloriosas vitórias do proletariado russo.
Pravda, nº 98.
5 de maio de 1922
J. V. Stalin 237

A Formação da União das Repúblicas


Soviéticas
31 de dezembro de 1922

Relatório emitido ao Primeiro Congresso dos Sovietes da União das Repúblicas Socialis-
tas Soviéticas194

Camaradas, este dia marca uma virada na história do poder soviético. É um


marco entre o antigo período, agora passado, quando as repúblicas soviéticas,
embora agissem em comum, cada uma seguia seu próprio caminho e se preocu-
pava principalmente com sua própria preservação, e o novo período, já iniciado,
quando o fim é sendo colocado na existência isolada das repúblicas soviéticas,
quando as repúblicas estão sendo unidas em um único estado de união para uma
luta bem-sucedida contra a ruína econômica, e quando o poder soviético está pre-
ocupado não apenas com sua preservação, mas também com o desenvolvimento
de uma importante comunidade internacional força, capaz de influenciar a situ-
ação internacional e de modificá-la no interesse dos trabalhadores.
O que era o Estado soviético há cinco anos? Uma entidade pequena, quase
imperceptível, que evocou o escárnio de todos os seus inimigos e a pena de muitos
dos seus amigos. Esse foi o período da ruína do tempo de guerra, quando o
poder soviético não confiava tanto em sua própria força quanto na impotência
de seus oponentes; quando os inimigos do poder soviético, divididos em duas
coalizões, a coalizão austro-alemã e a coalizão anglo-francesa, estavam engajados
em uma guerra mútua e não estavam em posição de virar suas armas contra o
poder soviético. Na história do poder soviético, esse foi o período da ruína da
guerra. Na luta contra Kolchak e Denikin, entretanto, o poder soviético criou
o Exército Vermelho e emergiu com sucesso do período de ruína do tempo de
guerra.
Posteriormente, teve início o segundo período da história do poder soviético,
o período de luta contra a ruína econômica. Este período ainda não terminou,
mas já deu frutos, pois durante este período o poder soviético conseguiu lidar
com a fome que afligiu o país no ano passado. Durante este período, testemu-
nhamos um avanço considerável na agricultura e um renascimento considerável
das indústrias leves. Quadros de dirigentes industriais já se destacaram e são
objeto de nossa esperança e confiança. Mas isso está longe de ser suficiente para
superar a ruína econômica. Para vencer e eliminar essa ruína, as forças de todas
as repúblicas soviéticas devem ser reunidas; todas as potencialidades financeiras
e econômicas das repúblicas devem ser concentradas na tarefa de restaurar nos-
sas indústrias básicas. Daí a necessidade de unir as repúblicas soviéticas em um
194 O Primeiro Congresso dos Sovietes da URSS dos ocorreu em Moscou em 30 de dezembro de
1922. Estavam presentes 1.727 delegados da RSFSR, 364 da RSS Ucraniana, 91 da Federação
Transcaucasiana e 33 da RSS Bielorrussa. O congresso discutiu o relatório de J. V. Stalin sobre
a formação da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas, ratificou a Declaração e o Tratado da
União sobre a Formação da URSS e elegeu o Comitê Executivo Central da URSS.
238 Obras Escolhidas

único estado de união. Hoje é o dia da união de nossas repúblicas em um único


Estado com o objetivo de reunir todas as nossas forças para a restauração de nossa
economia.
O período de combate à ruína da guerra nos deu o Exército Vermelho, um dos
alicerces da existência do poder soviético. O próximo período, o período de luta
contra a ruína econômica, está nos dando uma nova estrutura de existência do
Estado – a União das Repúblicas Socialistas Soviéticas, que sem dúvida promoverá
o trabalho de restauração da economia soviética.
Qual é o poder soviético agora? Um grande Estado da classe trabalhadora que
evoca entre nossos inimigos não uma zombaria, mas o ranger de dentes. Esses
são os resultados do desenvolvimento do poder soviético durante os cinco anos
de sua existência.
Mas, camaradas, hoje não é só um dia para resumir, é ao mesmo tempo o dia
do triunfo da nova Rússia sobre a velha Rússia, a Rússia que era o gendarme da
Europa, a Rússia que era o carrasco da Ásia. Hoje é o dia do triunfo da nova Rús-
sia, que quebrou as correntes da opressão nacional, organizou a vitória sobre o
capital, criou a ditadura do proletariado, despertou os povos do Oriente, inspira
os trabalhadores do Ocidente, transformou a Bandeira Vermelha de uma ban-
deira do Partido em uma bandeira do Estado, e reuniu em torno dessa bandeira
os povos das repúblicas soviéticas a fim de uni-los em um único Estado, a União
das Repúblicas Socialistas Soviéticas, o protótipo da futura República Socialista
Soviética Mundial.
Nós, comunistas, frequentemente somos insultados e acusados de não poder
construir. Que a história do poder soviético durante esses cinco anos de exis-
tência sirva como prova de que os comunistas também são capazes de construir.
Que o Congresso dos Sovietes de hoje, cuja função é ratificar a Declaração e o
Tratado de União das Repúblicas que foram aprovados ontem na Conferência
das Delegações de Plenipotenciários, que este Congresso da União demonstre
a todos aqueles que ainda não perderam a capacidade de compreender que os
Comunistas são tão capazes de construir o novo quanto de destruir o antigo.
Aqui, camaradas, está a Declaração que foi aprovada ontem, na Conferência
das Delegações de Plenipotenciários195 . E aqui está o texto do Tratado que foi
aprovado na mesma conferência.
Camaradas, por instruções da Conferência das Delegações de Plenipotenciá-
rios das Repúblicas Soviéticas, proponho que ratifiquem os textos que acabo de
ler sobre a Declaração e o Tratado sobre a Constituição da União das Repúblicas
Socialistas Soviéticas. Camaradas, proponho que os adotem com a unanimidade
característica dos Comunistas e, assim, adicionar um novo capítulo à história da
humanidade. (Aplausos)
Pravda, nº 298.
31 de dezembro de 1922
195A Conferência das Delegações Plenipotenciárias da RSFSR., da RSS da Ucrânia, da RSS da Bielor-
rússia e da RFSS Transcaucasiana aconteceu em 29 de dezembro de 1922. A conferência examinou
e adotou a Declaração e o Tratado sobre a Formação da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas.
Stalin fez um relatório à conferência sobre a ordem dos procedimentos do Primeiro Congresso dos
Sovietes da URSS. A conferência instruiu Stalin a entregar no congresso o relatório sobre a formação
da URSS. Na manhã de 30 de dezembro, o as delegações plenipotenciárias assinaram a Declaração e
o Tratado de Constituição da URSS.
J. V. Stalin 239

A Imprensa como Organizador


Coletivo
6 de maio de 1923

Em seu artigo “Às Raízes” (Pravda, nº 98), Ingulov abordou a importante ques-
tão da importância da imprensa para o Estado e o Partido. Evidentemente, para
reforçar o seu ponto de vista, referiu-se ao relatório de organização do Comitê
Central, onde diz que a imprensa “estabelece um vínculo imperceptível entre o
Partido e a classe operária, vínculo tão forte como qualquer aparelho de trans-
missão de massa”, que “a imprensa é a arma mais poderosa por meio da qual o
Partido fala diariamente, de hora em hora, à classe trabalhadora”. Mas em sua
tentativa de resolver o problema, Ingulov cometeu dois erros: primeiro, ele dis-
torceu o significado da passagem do relatório do Comitê Central; em segundo
lugar, perdeu de vista o papel muito importante que a imprensa desempenha
como organizadora. Penso que, dada a importância da pergunta, devemos dizer
uma ou duas palavras sobre estes erros.
1. O significado do relatório não é que o papel do Partido se limite a falar
à classe operária, ao passo que o Partido deve conversar e não apenas falar com
ela.
Esse contraste da fórmula “falar com” com a fórmula “conversar com” nada
mais é do que mero malabarismo. Na prática, os dois constituem um todo indis-
solúvel, expresso na interação contínua entre o leitor e o escritor, entre o Partido
e a classe trabalhadora, entre o Estado e as massas trabalhadoras. Isso tem acon-
tecido desde o início do partido proletário de massas, desde a época do velho
Iskra. Ingulov está errado ao pensar que essa interação começou apenas alguns
anos depois que a classe trabalhadora assumiu o poder na Rússia. O ponto cen-
tral da passagem citada do relatório do Comitê Central não está em “falar”, mas
no fato de que a imprensa “estabelece um elo entre o Partido e a classe traba-
lhadora”, um elo “tão forte quanto qualquer transmissão de massa. aparelho”.
O ponto principal da passagem está na importância organizacional da imprensa.
É precisamente por isso que a imprensa, como uma das correias de transmissão
entre o Partido e a classe operária, foi incluída no relatório de organização do Co-
mitê Central. Ingulov não conseguiu entender a passagem e involuntariamente
distorceu seu significado.
2. Ingulov enfatiza o papel da imprensa na agitação e na denúncia de abusos,
acreditando que a função da imprensa periódica se limita a isso. Ele se refere
a uma série de abusos em nosso país e argumenta que a exposição na imprensa,
a agitação por meio dela, é a “raiz” do problema. É claro, no entanto, que por
mais importante que seja o papel agitador da imprensa, no momento atual seu
papel organizativo é o fator mais vital em nosso trabalho de construção. A ques-
tão não é só que um jornal deve agitar e expor, mas principalmente que deve ter
uma ampla rede de colaboradores, agentes e correspondentes em todo o país, em
todos os centros industriais e agrícolas, para que os assuntos corram do Partido
240 Obras Escolhidas

ao jornal, a todos os bairros operários e camponeses sem exceção, de modo que


a interação entre o Partido e o Estado, por um lado, e os distritos industriais
e camponeses, por outro, seja completa. Se um jornal popular como, digamos,
Bednota196 , fosse, de vez em quando, convocar conferências de seus principais
agentes em diferentes partes de nosso país com o objetivo de trocar opiniões e
somar experiências, e se cada um deles os agentes, por sua vez, deveriam convo-
car conferências de seus correspondentes em seus bairros, centros e volosts para
o mesmo fim, que seria um primeiro passo importante não apenas para estabe-
lecer a conexão organizacional entre o Partido e a classe trabalhadora, entre o
Estado e as partes mais remotas do nosso país, mas também no aperfeiçoamento e
dinamização da própria imprensa, no aperfeiçoamento e dinamização de todos
os quadros da nossa imprensa periódica. Na minha opinião, tais conferências
são de muito mais importância real do que “todos os russos” e outros congres-
sos de jornalistas. Transformar os jornais em organizadores coletivos em nome
do Partido e do regime soviético, um meio de estabelecer conexão com as mas-
sas trabalhadoras de nosso país e de reuni-las em torno do Partido e do regime
soviético – essa é agora a tarefa imediata de a imprensa.
Não será supérfluo lembrar ao leitor algumas linhas do artigo “Por onde come-
çar” do camarada Lenin (escrito em 1901) sobre o papel organizador da imprensa
periódica na vida do nosso Partido:
O papel do jornal não se limita, porém, apenas à difusão de ideias, apenas à formação política
e à captação de aliados políticos. Um jornal não é apenas um propagandista coletivo e agi-
tador coletivo, mas também um organizador coletivo. Podem ser comparados aos andaimes
erguidos em torno de um edifício em construção, que marcam os contornos da estrutura,
facilitam a comunicação entre as construtoras e lhes permite distribuir a obra e visualizar os
resultados comuns alcançados pela sua mão de obra organizada. Em relação a um jornal,
desenvolverá automaticamente uma organização permanente que se envolverá não apenas
em atividades locais, mas também em atividades gerais regulares, treinando seus membros
cuidadosamente para assistir a eventos políticos, para avaliar sua importância e a influência
que exercem sobre vários estratos da população, e conceber meios adequados pelos quais
o Partido revolucionário pudesse influenciar esses eventos. A tarefa técnica – de garantir o
abastecimento regular de exemplares para o jornal e sua correta distribuição – tornará neces-
sária a criação de uma rede de agentes locais do Partido unido, agentes que terão contato vivo
entre si, que conhecerão o estado geral de coisas, que se acostumem a realizar regularmente
as funções detalhadas do trabalho totalmente russo e teste sua força na organização de várias
ações revolucionárias. Essa rede de agentes formará o esqueleto exatamente da organização
de que precisamos, a saber, uma que seja grande o suficiente para abranger todo o país; sufi-
cientemente amplo e multifacetado para efetuar uma divisão de trabalho estrita e detalhada;
suficientemente experimentado e temperado para ser capaz de realizar seu próprio trabalho
inabalavelmente em todas as circunstâncias, em todas as ’voltas’ e em todas as contingências;
suficientemente flexível para ser capaz de evitar a batalha aberta contra um inimigo de força
esmagadora, quando ele concentrar todas as suas forças em um ponto, e ainda é capaz de
tirar vantagem da dificuldade de manejo desse inimigo e atacá-lo quando e onde menos se
espera.

Naquela época, o camarada Lenin falava do jornal como instrumento de cons-


trução do nosso Partido. Mas não há motivos para duvidar de que o que disse
o camarada Lenin é totalmente aplicável às atuais condições do nosso Partido e
dos negócios de Estado. Em seu artigo, Ingulov perdeu de vista esse importante
papel organizador da imprensa periódica. Esse é o seu principal erro.
196Bednota (O Pobre) – um jornal diário, órgão do Comitê Central do PCUS (B), Publicado de março
de 1918 a janeiro de 1931.
J. V. Stalin 241

Como é que um dos nossos principais jornalistas perdeu de vista esta impor-
tante função? Ontem, um camarada disse-me que, aparentemente, para além
do objetivo de resolver o problema da imprensa, Ingulov tinha outro objetivo,
ulterior, nomeadamente, “bater em alguém e fazer bem a outrem”. Eu mesmo
não me comprometo a dizer que assim seja, e estou longe de negar a quem quer
que seja o direito de se propor objetivos ulteriores além dos imediatos. Mas não
se deve permitir que objetivos ulteriores obscureçam por um momento a tarefa
imediata de revelar o papel organizador da imprensa em nosso Partido e nos
assuntos de Estado.
Pravda, nº 99.
6 de maio de 1923
242 Obras Escolhidas

Lenin
28 de janeiro de 1924

Discurso proferido em reunião comemorativa da Escola Militar do Kremlin

Camaradas, soube que vocês organizaram uma reunião em memória de Le-


nin aqui esta noite e que fui convidado como um dos oradores. Não creio que
haja necessidade de fazer um discurso definido sobre as atividades de Lenin. Se-
ria melhor, eu acho, me limitar a alguns fatos para trazer à tona algumas das
características de Lenin como homem e líder. Pode não haver, talvez, nenhuma
conexão inerente entre esses fatos, mas isso não é de importância vital no que diz
respeito a obter uma ideia geral de Lenin. De qualquer forma, não posso, nesta
ocasião, fazer mais do que o que acabei de prometer.

A águia da montanha

Conheci Lenin pela primeira vez em 1903. É verdade que não foi um encon-
tro pessoal, mas por correspondência. Deixou-me uma impressão indelével, que
nunca me abandonou ao longo de todo o meu trabalho no Partido. Eu estava
exilado na Sibéria na época. Meu conhecimento das atividades revolucionárias
de Lenin desde o final dos anos 90, e especialmente depois de 1901, após o sur-
gimento do Iskra197 , me convencera de que em Lenin tínhamos um homem de
extraordinário calibre. Naquela época, eu não o via apenas como um líder do
Partido, mas como seu verdadeiro fundador, pois só ele compreendia a essência
interna e as necessidades urgentes de nosso Partido. Quando o comparei com
os outros líderes de nosso Partido, sempre me pareceu que ele estava cabeça e
ombros acima de seus colegas – Plekhanov, Martov, Axelrod e os outros; que, em
comparação com eles, Lenin não era apenas um dos líderes, mas um líder do mais
alto escalão, uma águia da montanha, que não conheceu o medo da luta e que
corajosamente conduziu o Partido pelos caminhos inexplorados do revolucioná-
rio russo movimento. Essa impressão tomou conta de mim tão profundamente
que me senti impelido a escrever sobre isso a um amigo meu que vivia como exi-
lado político no exterior, pedindo-lhe que me fornecesse sua opinião. Algum
tempo depois, quando já estava no exílio na Sibéria – isso foi no final de 1903
-, recebi uma resposta entusiasmada de meu amigo e uma carta simples, mas
profundamente expressiva de Lenin, a quem, descobri, meu amigo tinha mos-
trado minha carta. A nota de Lenin era comparativamente curta, mas continha
uma crítica ousada e destemida do trabalho prático de nosso Partido e um relato
notavelmente claro e conciso de todo o plano de trabalho do Partido no futuro
imediato. Só Lenin poderia escrever sobre as coisas mais complexas de forma tão
simples e clara, tão concisa e ousada, que cada frase não falava, mas soava como
197
O Iskra (Centelha) foi o primeiro jornal marxista ilegal totalmente russo, fundado por V.I Lenin
em dezembro de 1900. Era publicado no exterior e trazido secretamente para a Rússia.
J. V. Stalin 243

um tiro de rifle. Esta carta simples e ousada fortaleceu-me ainda mais em minha
opinião de que Lenin era a águia da montanha de nosso Partido. Não posso me
perdoar por ter, por hábito de um velho trabalhador da clandestinidade, envi-
ado às chamas esta carta de Lenin, como muitas outras. Meu conhecimento com
Lenin data dessa época.

Modéstia
Encontrei Lenin pela primeira vez em dezembro de 1905 na conferência bol-
chevique em Tammerfors (Finlândia). Eu esperava ver a águia da montanha do
nosso Partido, o grande homem, grande não só politicamente, mas, se quiserem,
fisicamente, porque na minha imaginação eu havia retratado Lenin como um
gigante, imponente e imponente. Qual foi, então, minha decepção ao ver um
homem de aparência mais comum, altura abaixo da média, de maneira alguma,
literalmente de forma alguma, distinguível dos mortais comuns.
É considerado comum que um “grande homem” chegue tarde às reuniões
para que a assembleia espere seu aparecimento com a respiração suspensa; e en-
tão, pouco antes de o “grande homem” entrar, o sussurro de advertência sobe:
“Cala-te!... Silêncio! ele está vindo”. Este ritual não me parece supérfluo, por-
que impressiona, inspira respeito. O que, então, foi minha decepção ao saber
que Lenin havia chegado à conferência antes dos delegados, acomodado em al-
gum lugar em um canto e estava mantendo uma conversa despretensiosa, uma
conversa muito comum com os delegados mais simples da conferência. Não vou
esconder de você que, naquela época, isso me parecia uma espécie de violação de
certas regras essenciais.
Só mais tarde é que percebi que essa simplicidade e modéstia, esse esforço
para não ser observado, ou, pelo menos, para não se destacar e não enfatizar sua
alta posição, essa característica era um dos pontos fortes de Lenin como o novo
líder dos novos. massas, das massas simples e comuns da “base” da humanidade.

Força da Lógica
Os dois discursos que Lenin proferiu nesta conferência foram notáveis: um
sobre a situação atual e o outro sobre a questão agrária. Infelizmente, eles não
foram preservados. Eles foram inspiradores e levaram toda a conferência a um
nível de entusiasmo tempestuoso. O extraordinário poder de convicção, a simpli-
cidade e clareza de argumentação, as frases breves e facilmente compreendidas,
a ausência de afetação, de gestos vertiginosos e frases teatrais visando o efeito –
tudo isso fazia dos discursos de Lenin um contraste favorável com os discursos
dos oradores usualmente “parlamentares”.
Mas o que me cativou na época não foi esse aspecto dos discursos de Lenin.
Fui cativado por aquela força irresistível de lógica neles que, embora um tanto
concisa, ganhou um controle firme sobre o público, aos poucos eletrificou-o e
então, como se poderia dizer, o subjugou completamente. Lembro-me de que
muitos dos delegados disseram: “A lógica dos discursos de Lenin é como um
tentáculo poderoso que te enrosca e te segura como um vício e de cujas garras
244 Obras Escolhidas

você é impotente para se desvencilhar: você deve se render ou renunciar você


mesmo para a derrota total”.
Acho que essa característica dos discursos de Lenin foi a mais forte de sua
arte como orador.

Nada de choro

A segunda vez que encontrei Lenin foi em 1906, no Congresso de Estocolmo


do nosso Partido198 . Você sabe que os bolcheviques estavam em minoria neste
congresso e sofreram uma derrota. Esta foi a primeira vez que vi Lenin no papel
do derrotado. Mas ele não era nem um pouco parecido com aqueles líderes que
reclamam e perdem o ânimo após uma derrota. Ao contrário, a derrota transfor-
mou Lenin em uma fonte de energia comprimida que inspirou seus partidários
para novas batalhas e vitórias futuras. Eu disse que Lenin foi derrotado. Mas
que tipo de derrota foi essa? Bastava olhar para seus oponentes, os vencedores
do Congresso de Estocolmo – Plekhanov, Axelrod, Martov e o resto. Eles tinham
pouco da aparência de verdadeiros vencedores, pois a crítica implacável de Lenin
ao menchevismo não havia deixado um osso inteiro em seus corpos, por assim
dizer. Lembro-me que nós, os delegados bolcheviques, nos amontoamos em um
grupo, olhando para Lenin e pedindo seus conselhos. Os discursos de alguns dos
delegados traíram uma nota de cansaço e desânimo. Lembro que a esses discur-
sos Lenin respondeu mordazmente com os dentes cerrados: “Não se lamentem,
camaradas, estamos fadados a vencer, pois estamos certos”. Ódio ao intelectual
reclamão, fé em nossa própria força, confiança na vitória – foi isso que Lenin
nos impressionou. Sentia-se que a derrota dos bolcheviques era temporária, que
eles estavam fadados a vencer em um futuro muito próximo.
“Sem reclamar da derrota” – esta foi a característica das atividades de Lenin
que o ajudou a reunir em torno de si um exército fiel até o fim e confiante em
sua força.

Sem ostentação

No congresso seguinte, realizado em 1907 em Londres199 , os bolcheviques


venceram. Esta foi a primeira vez que vi Lenin no papel de vencedor. A vitória
transforma a cabeça de alguns líderes e os torna altivos e orgulhosos. Na maioria
dos casos, eles começam a triunfar, a descansar sobre os louros. Mas Lenin não
se parecia em nada com esses líderes. Pelo contrário, foi precisamente depois
de uma vitória que ele se tornou especialmente vigilante e cauteloso. Recordo
que Lenin insiste aos delegados: “A primeira coisa é não se embriagar pela vi-
tória e não se gabar; a segunda coisa é consolidar a vitória; o terceiro é dar ao
inimigo o golpe final, pois ele foi derrotado, mas de forma alguma esmagado”.
198 O Congresso do Partido de Estocolmo – o Quarto Congresso do POSDR – ocorreu de 10 a 25 de
abril (23 de abril a 8 de maio) de 1906.
199 O Quinto Congresso (Londres) ocorreu de 30 de abril a 19 de maio (13 de maio a 1º de junho)

de 1907.
J. V. Stalin 245

Ele despejou um desprezo fulminante sobre os delegados que afirmavam frivo-


lamente: “Agora está tudo acabado com os mencheviques”. Não teve dificuldade
em mostrar que os mencheviques ainda tinham raízes no movimento operário,
que deviam ser combatidos com habilidade, e que toda superestimação da pró-
pria força e, principalmente, toda subestimação da força do inimigo tinha que
ser evitada. “Sem ostentação na vitória” – esta foi a característica do caráter de
Lenin que o ajudou sobriamente a pesar a força do inimigo e a segurar o Partido
contra possíveis surpresas.

Fidelidade ao Princípio

Os líderes partidários não podem deixar de valorizar a opinião da maioria de


seu partido. A maioria é um poder com o qual um líder não pode deixar de con-
tar. Lenin entendeu isso não menos do que qualquer outro líder do partido. Mas
Lenin nunca se tornou cativo da maioria, especialmente quando essa maioria não
tinha base de princípio. Houve momentos na história do nosso Partido em que a
opinião da maioria ou os interesses momentâneos do Partido conflitavam com os
interesses fundamentais do proletariado. Nessas ocasiões, Lenin nunca hesitou
e assumiu resolutamente sua posição de apoio aos princípios contra a maioria
do Partido. Além disso, ele não temia, em tais ocasiões, ficar literalmente sozi-
nho contra todos, considerando – como ele costumava dizer – que “uma política
baseada em princípios é a única política correta”.
Particularmente característicos a esse respeito são os dois fatos a seguir.
Primeiro fato. Foi no período 1909-11, quando o Partido, esmagado pela
contrarrevolução, estava em processo de desintegração total. Foi um período
de descrença no Partido, de abandono total do Partido, não só por parte dos
intelectuais, mas em parte até dos trabalhadores; um período em que a necessi-
dade de organização ilegal estava sendo negada, um período de liquidacionismo
e colapso. Não apenas os mencheviques, mas até os bolcheviques consistiam en-
tão em várias facções e tendências, em sua maioria separadas do movimento da
classe trabalhadora. Você sabe que foi nessa época que surgiu a ideia de liquidar
completamente a organização ilegal e organizar os trabalhadores em um par-
tido Stolypin legal e liberal. Lenin, naquela época, foi o único a não sucumbir à
epidemia generalizada e a erguer bem alto a bandeira do princípio do Partido,
reunindo as forças dispersas e despedaçadas do Partido com surpreendente paci-
ência e extraordinária persistência, combatendo todas as tendências antipartido
dentro da classe trabalhadora e defendendo o princípio do Partido com coragem
incomum e perseverança incomparável.
Sabemos que, nesta luta pelo princípio do Partido, Lenin mais tarde provou
ser o vencedor.
Segundo fato. Foi no período 1914-17, quando a guerra imperialista estava
a todo vapor, e quando todos, ou quase todos, os partidos Social-Democrata e
Socialista sucumbiram ao frenesi patriótico geral e se colocaram a serviço do im-
perialismo de seus respectivos países. Foi um período em que a Segunda Interna-
cional trouxe suas cores ao capitalismo, quando mesmo pessoas como Plekhanov,
Kautsky, Guesde e o resto foram incapazes de resistir à maré do chauvinismo.
246 Obras Escolhidas

Lenin naquela época era o único, ou quase o único, a travar uma luta determi-
nada contra o social-chauvinismo e o social-pacifismo, a denunciar a traição dos
Guesdes e Kautskys e a estigmatizar a indiferença entre “revolucionários”. Le-
nin sabia que era apoiado apenas por uma minoria insignificante, mas para ele
este não era um momento decisivo, pois sabia que a única política correta com
futuro era a política de internacionalismo consistente, que uma política baseada
em princípios é a apenas política correta.
Sabemos que também nesta luta por uma nova Internacional, Lenin foi o
vencedor.
“Uma política baseada em princípios é a única política correta” – esta foi a fór-
mula por meio da qual Lenin assumiu novas posições “inexpugnáveis” de assalto
e conquistou os melhores elementos do proletariado para o marxismo revoluci-
onário.

Fé nas Massas
Teóricos e líderes de partidos, homens que conhecem a história das nações e
estudaram a história das revoluções do começo ao fim, às vezes são atingidos por
uma doença vergonhosa. Esta doença é chamada de medo das massas, descrença
no poder criativo das massas. Isso às vezes faz surgir nos líderes uma espécie
de atitude aristocrática para com as massas, que, embora não sejam versadas na
história das revoluções, estão destinadas a destruir a velha ordem e construir a
nova. Esse tipo de atitude aristocrática se deve ao medo de que os elementos se
soltem, que as massas “destruam demais”; é devido ao desejo de desempenhar o
papel de um mentor que tenta ensinar as massas com os livros, mas que é avesso
a aprender com as massas.
Lenin era a própria antítese de tais líderes. Não conheço nenhum outro re-
volucionário que tivesse uma fé tão profunda no poder criativo do proletariado e
na eficácia revolucionária de seu instinto de classe como Lenin. Não conheço ne-
nhum outro revolucionário que pudesse açoitar os críticos presunçosos do “caos
da revolução” e do “motim de ações não autorizadas das massas” tão implacavel-
mente como Lenin. Lembro-me de que quando, no decorrer de uma conversa,
um camarada disse que “a revolução deve ser seguida pela ordem normal das
coisas”, disse Lenin sarcasticamente: “É uma pena que as pessoas que querem
ser revolucionárias esqueçam que a ordem mais normal das coisas na história é a
ordem revolucionária das coisas”.
Daí o desprezo de Lenin por todos que desprezavam as massas e tentavam
ensiná-las pelos livros. E, portanto, o preceito constante de Lenin: aprender com
as massas, tentar compreender suas ações, estudar cuidadosamente a experiência
prática da luta das massas.
Fé no poder criativo das massas – esta foi a característica das atividades de
Lenin que lhe permitiu compreender o processo espontâneo e dirigir seu movi-
mento para o canal da revolução proletária.
J. V. Stalin 247

O gênio da revolução

Lenin nasceu para a revolução. Ele foi, na verdade, o gênio dos despontares
revolucionários e o maior mestre da arte da liderança revolucionária. Nunca se
sentiu tão livre e feliz como em uma época de convulsões revolucionárias. Não
quero dizer com isso que Lenin aprovasse igualmente todas as convulsões revolu-
cionárias, ou que fosse a favor de surtos revolucionários em todos os momentos
e sob todas as circunstâncias. De modo nenhum. O que quero dizer é que nunca
o gênio do pensamento de Lenin foi exibido de forma tão completa e distinta
como em uma época de surtos revolucionários. Em tempos de revolução, ele li-
teralmente floresceu, tornou-se um vidente, adivinhou o movimento das classes
e os prováveis ziguezagues da revolução, vendo-os como se estivessem na palma
da sua mão. Era com razão que se costumava dizer nos círculos do nosso Partido:
“Lenin nada na maré da revolução como um peixe na água”.
Daí a clareza “surpreendente” dos slogans táticos de Lenin e a ousadia “de
tirar o fôlego” de seus planos revolucionários.
Recordo dois fatos que são particularmente característicos desse traço de Le-
nin.
Primeiro fato. Foi no período imediatamente anterior à Revolução de Outu-
bro, quando milhões de operários, camponeses e soldados, impulsionados pela
crise na retaguarda e na frente, exigiam paz e liberdade; quando os generais e a
burguesia trabalhavam por uma ditadura militar em prol da “guerra até o fim”;
quando toda a chamada “opinião pública” e todos os chamados “partidos socialis-
tas” eram hostis aos bolcheviques e os rotulavam como “espiões alemães”; quando
Kerensky estava tentando – já com algum sucesso – levar o Partido Bolchevique
para a clandestinidade; e quando os exércitos ainda poderosos e disciplinados da
coalizão austro-alemã confrontaram nossos exércitos cansados e em desintegra-
ção, enquanto os “socialistas” da Europa Ocidental viviam em feliz aliança com
seus governos em prol da “guerra para a vitória completa”.
O que significava começar um levante em tal momento? Começar um levante
em tal situação significava apostar tudo. Mas Lenin não temia o risco, pois sabia,
ele viu com seu olho profético, que uma revolta era inevitável, que iria vencer;
que um levante na Rússia abriria caminho para o fim da guerra imperialista,
que despertaria as massas do Ocidente cansadas da guerra, que transformaria a
guerra imperialista em uma guerra civil; que o levante daria início a uma Re-
pública dos sovietes e que a República dos sovietes serviria de baluarte para o
movimento revolucionário em todo o mundo.
Sabemos que a visão revolucionária de Lenin foi posteriormente confirmada
com exatidão incomparável.
Segundo fato. Foi nos primeiros dias da Revolução de Outubro, quando o
Conselho dos Comissários do Povo estava tentando obrigar o General Dukho-
nin, o rebelde Comandante-em-Chefe, a encerrar as hostilidades e abrir negoci-
ações para um armistício com os alemães. Lembro-me de que Lenin, Krylenko
(o futuro comandante-chefe) e eu fomos ao quartel-general do Estado-Maior em
Petrogrado para negociar com Dukhonin por fio direto. Foi um momento horrí-
vel. Dukhonin e o Quartel General recusaram-se categoricamente a obedecer à
248 Obras Escolhidas

ordem do Conselho de Comissários do Povo. Os oficiais do exército estavam com-


pletamente sob o domínio do Quartel-General de Campo. Quanto aos soldados,
ninguém sabia dizer o que diria este exército de catorze milhões, subordinado
que estava às chamadas organizações militares, que eram hostis ao poder sovié-
tico. Em Petrogrado, como sabemos, um motim dos cadetes militares estava se
formando. Além disso, Kerensky estava marchando sobre Petrogrado. Lembro-
me que, após uma pausa na linha direta, o rosto de Lenin brilhou de repente com
uma luz extraordinária. Claramente ele havia chegado a uma decisão. “Vamos
para a estação sem fio”, disse ele, “ela nos ajudará muito. Iremos emitir uma
ordem especial demitindo o General Dukhonin, nomear o Camarada Krylenko
Comandante-em-Chefe em seu lugar e apelar aos soldados acima das cabeças dos
oficiais, convocando-os a cercar os generais, a cessar as hostilidades, a estabelecer
contato com os Soldados austro-alemães e tomem a causa da paz em suas próprias
mãos”.
Esse foi “um tiro no escuro”. Mas Lenin não se esquivou desse “tiro”; pelo
contrário, ele o deu ansiosamente, pois sabia que o exército queria a paz e iria
conquistá-la, varrendo todos os obstáculos de seu caminho; ele sabia que esse
método de estabelecer a paz estava fadado a surtir efeito nos soldados austro-
alemães e daria rédea solta ao anseio pela paz em todas as frentes, sem exceção.
Sabemos que também aqui a visão revolucionária de Lenin foi posteriormente
confirmada com a maior exatidão. A percepção do gênio, a capacidade de captar
e adivinhar rapidamente o significado interno dos eventos iminentes, esta foi a
qualidade de Lenin que lhe permitiu estabelecer a estratégia correta e uma linha
de conduta clara nos pontos de inflexão do movimento revolucionário.
J. V. Stalin 249

Sobre a morte de Lenin


30 de janeiro de 1924

Discurso proferido no Segundo Congresso Sindical dos Soviéticos200

Camaradas, nós, comunistas, somos pessoas de um molde especial. Somos


feitos de um algo especial. Somos nós que formamos o exército do grande estra-
tegista proletário, o exército do camarada Lenin. Não há nada maior do que a
honra de pertencer a este exército. Nada mais elevado do que o título de mem-
bro do Partido cujo fundador e dirigente foi o camarada Lenin. Não é dado a
todos ser membro de tal partido. São os filhos da classe trabalhadora, os filhos
da miséria e da luta, os filhos da incrível privação e do esforço heroico que an-
tes de tudo deveriam ser membros de tal partido. É por isso que o Partido dos
Leninistas, o Partido dos Comunistas, também é chamado de Partido da classe
trabalhadora.
Nos deixando, o camarada Lenin nos confiou a tarefa de segurar ao alto e
proteger a pureza do grande título de sermos membros do Partido. Nós o reve-
renciamos, camarada Lenin. Que seu pedido, também, cumpramos com honra!
Por vinte e cinco anos, o camarada Lenin cuidou de nosso partido e o trans-
formou no partido operário mais forte e altamente endurecido do mundo. Os
golpes do tsarismo e seus capangas, a fúria da burguesia e dos latifundiários, os
ataques armados de Kolchak e Denikin, a intervenção armada da Grã-Bretanha
e da França, as mentiras e calúnias da imprensa burguesa de cem bocas – to-
dos esses escorpiões constantemente castigaram nosso Partido por um quarto de
século. Mas nosso Partido permaneceu firme como uma rocha, repelindo os inú-
meros golpes de seus inimigos e conduzindo a classe trabalhadora para a vitória.
Em batalhas ferozes, nosso Partido forjou a unidade e a solidariedade de suas
fileiras. E por unidade e solidariedade alcançou a vitória sobre os inimigos da
classe trabalhadora.
Nos deixando, o camarada Lenin nos confiou a tarefa de resguardar a uni-
dade de nosso Partido como se fosse a pupila de nossos olhos. Nos o reverencia-
mos, camarada Lenin. Que seu pedido, também, cumpramos com honra!
Pesado e intolerável tem sido o destino da classe trabalhadora. Doloroso e
penoso tem sido o sofrimento do povo trabalhador. Escravos e proprietários de
escravos, servos e proprietários de servos, camponeses e senhores de terras, traba-
lhadores e capitalistas, oprimidos e opressores – o mundo foi construído desde
tempos imemoriais e assim permanece até hoje na grande maioria dos países.
200O Segundo Congresso foi realizado em Moscou de 26 de janeiro a 2 de fevereiro de 1924. Na
primeira sessão, que foi dedicada à memória de Lenin, Stalin proferiu um discurso no qual, em
nome do Partido Bolchevique, fez um voto solene de considerá-lo sagrado e cumprir as ordens de
Lenin. Em conexão com a morte de Lenin, o congresso aprovou o apelo “À Humanidade Traba-
lhadora”. Para perpetuar a memória de Lenin, o congresso adotou a decisão de publicar as Obras
de Lenin, de mudar o nome de Petrogrado para Leningrado, de estabelecer um Dia de Luto e de
erguer um mausoléu para Lenin na Praça Vermelha de Moscou e monumentos para ele nas capitais
das Repúblicas da União e também nas cidades de Leningrado e Tashkent.
250 Obras Escolhidas

Dezenas e, na verdade, centenas de vezes no curso dos séculos, o povo trabalha-


dor tem se esforçado para se livrar dos opressores e se tornar o senhor de seu
próprio destino. Mas a cada vez, derrotados e desgraçados, eles foram forçados
a recuar, abrigando em seus seios ressentimento e humilhação, raiva e desespero,
erguendo seus olhos para um céu inescrutável onde esperavam encontrar liber-
tação. As correntes da escravidão permaneceram intactas, ou as velhas correntes
foram substituídas por novas, igualmente pesadas e degradantes. Nosso país é o
único onde as massas trabalhadoras oprimidas e humilhadas conseguiram der-
rubar o domínio dos latifundiários e capitalistas e substituí-lo pelo domínio dos
trabalhadores e camponeses. Vocês sabem, camaradas, e o mundo inteiro agora o
admite, que esta luta gigantesca foi liderada pelo camarada Lenin e seu partido.
A grandeza de Lenin reside acima de tudo nisso, que ao criar a República dos
sovietes ele deu uma demonstração prática às massas oprimidas de todo o mundo
que a esperança de libertação não está perdida, que o governo dos latifundiários
e capitalistas tem vida curta., que o reino do trabalho pode ser criado pelos es-
forços das próprias pessoas trabalhadoras, e que o reino do trabalho não deve ser
criado no céu, mas na terra. Ele, assim, incendiou os corações dos trabalhadores
e camponeses de todo o mundo com a esperança da libertação. Isso explica por
que o nome de Lenin se tornou o nome mais querido das massas trabalhadoras
e exploradas.
Nos deixando, o camarada Lenin nos confiou a tarefa de fortalecer e proteger
a ditadura do proletariado. Nós o reverenciamos, camarada Lenin. Que não
poupemos esforços para completar este pedido, também, com honra!
A ditadura do proletariado foi estabelecida em nosso país com base na aliança
entre operários e camponeses. Esta é a primeira e fundamental base da Repú-
blica dos sovietes. Os trabalhadores e camponeses não poderiam ter vencido os
capitalistas e latifundiários sem tal aliança. Os trabalhadores não poderiam ter
derrotado os capitalistas sem o apoio dos camponeses. Os camponeses não po-
deriam ter derrotado os latifundiários sem a liderança dos trabalhadores. Isso
é confirmado por toda a história da guerra civil em nosso país. Mas a luta pela
consolidação da República dos sovietes não está de modo algum no fim – apenas
assumiu uma nova forma. Antes, a aliança de operários e camponeses assumia a
forma de aliança militar, pois era dirigida contra Kolchak e Denikin. Agora, a
aliança dos operários e camponeses deve assumir a forma de cooperação econô-
mica entre a cidade e o campo, entre operários e camponeses, porque se dirige
contra os comerciantes e os kulaks, e tem como objetivo o abastecimento mútuo
por camponeses e operários de tudo que eles exigem. Você sabe que ninguém
trabalhou por isso com mais persistência do que o camarada Lenin.
Nos deixando, o camarada Lenin nos confiou a tarefa de fortalecer com toda
nossa ambição a aliança dos operários e camponeses. Nós o reverenciamos, ca-
marada Lenin. Que seu pedido, também, cumpramos com honra!
A segunda base da República dos sovietes é a união dos trabalhadores das di-
ferentes nacionalidades do nosso país. Russos e ucranianos, bashkirs e bielorrus-
sos georgianos e azeris, armênios e daguestanos, tártaros e quirguizes, uzbeques
e turcomenos são todos igualmente interessados em fortalecer a ditadura do pro-
letariado. A ditadura do proletariado não só livra esses povos dos grilhões e da
J. V. Stalin 251

opressão, mas esses povos, por sua vez, libertam a nossa República dos sovietes
das intrigas e dos ataques dos inimigos da classe trabalhadora por sua devoção
suprema à República dos sovietes e seus prontidão para fazer sacrifícios por ela.
É por isso que o camarada Lenin nos exortou incansavelmente à necessidade da
união voluntária dos povos de nosso país, à necessidade de sua cooperação fra-
terna no âmbito da União das Repúblicas.
Nos deixando, o camarada Lenin nos confiou a tarefa de fortalecer e expandir
a União das Repúblicas. Nós o reverenciamos, camarada Lenin. Que este pedido,
também, cumpramos com honra!
A terceira base da ditadura do proletariado é o nosso Exército Vermelho e a
nossa Marinha Vermelha. Mais de uma vez, Lenin nos evidenciou que a trégua
que tínhamos conquistado dos Estados capitalistas poderia ser curta. Mais de
uma vez Lenin nos mostrou que o fortalecimento do Exército Vermelho e a me-
lhoria de sua condição é uma das tarefas mais importantes do nosso Partido. Os
eventos relacionados com o ultimato de Curzon e a crise na Alemanha201 mais
uma vez confirmaram que, como sempre, Lenin estava certo. Juremos então, ca-
maradas, que não pouparemos esforços para fortalecer nosso Exército Vermelho
e nossa Marinha Vermelha.
Como uma grande rocha, nosso país se destaca em meio a um oceano de
Estados burgueses. Onda após onda se choca contra ele, ameaçando submer-
gir e levar embora. Mas a rocha permanece inabalável. Onde está sua força?
Não apenas no fato de que nosso país repousa sobre uma aliança de operários e
camponeses, que encarna uma união de nacionalidades livres, que é protegido
pelo poderoso braço do Exército Vermelho e da Marinha Vermelha. A força, a
firmeza, a solidez do nosso país devem-se à profunda simpatia e ao apoio infalí-
vel que encontra no coração dos trabalhadores e camponeses de todo o mundo.
Os trabalhadores e camponeses de todo o mundo querem preservar a República
dos sovietes como uma flecha disparada pela mão segura do camarada Lenin no
campo do inimigo, como o pilar de suas esperanças de libertação da opressão e
da exploração, como um farol confiável apontando o caminho para sua emanci-
pação. Eles querem preservá-lo e não permitirão que os proprietários de terras
e capitalistas o destruam. É aí que reside a nossa força. É aí que reside a força
dos trabalhadores de todos os países. E é aí que reside a fraqueza da burguesia
em todo o mundo.
Lenin nunca considerou a República dos sovietes um fim em si mesma. Sem-
pre o considerou um elo essencial para o fortalecimento do movimento revolu-
cionário nos países do Ocidente e do Oriente, um elo essencial para facilitar a
vitória dos trabalhadores de todo o mundo sobre o capitalismo. Lenin sabia que
essa era a única concepção correta, tanto do ponto de vista internacional quanto
do ponto de vista da preservação da própria República dos sovietes. Lenin sabia
que só isso poderia incendiar os corações dos trabalhadores de todo o mundo com
a determinação de travar as batalhas decisivas por sua emancipação. É por isso
201 Se refere à crise econômica e política na Alemanha em 1923. Um movimento revolucionário de
massa espalhou-se pelo país, com governos operários sendo estabelecidos na Saxônia e na Turíngia,
assim como um levante armado em Hamburgo. Após a supressão do movimento revolucionário na
Alemanha, a reação burguesa se intensificou em toda a Europa, assim como o perigo de uma nova
intervenção contra a República Soviética.
252 Obras Escolhidas

que, logo no dia seguinte ao estabelecimento da ditadura do proletariado, ele, o


maior dos gênios que dirigiram o proletariado, lançou as bases da Internacional
dos trabalhadores. É por isso que ele nunca se cansou de estender e fortalecer a
união de: os trabalhadores de todo o mundo – a Internacional Comunista.
Você viu durante os últimos dias a peregrinação de dezenas e centenas de
milhares de trabalhadores ao caixão do camarada Lenin. Em pouco tempo você
verá a peregrinação de representantes de milhões de trabalhadores ao túmulo
do camarada Lenin. Você não precisa duvidar que os representantes de milhões
serão seguidos por representantes de dezenas e centenas de milhões de todas as
partes da terra, que virão testemunhar que Lenin era o líder não só do proleta-
riado russo, não só dos trabalhadores europeus, não apenas do Oriente colonial,
mas de todos os trabalhadores do mundo.
Nos deixando, o camarada Lenin nos confiou que seguíssemos fiéis aos prin-
cípios da Internacional Comunista. Nós o reverenciamos, camarada Lenin. Que
não poupemos nossas vidas para expandir e fortalecer a união de todos os pro-
letários do mundo – a Internacional Comunista!
J. V. Stalin 253

Trotskismo ou Leninismo?
26 de novembro de 1924

Camaradas, depois do relatório abrangente de Kamenev, pouco me resta a


dizer. Devo, portanto, limitar-me a expor certas lendas que estão sendo espa-
lhadas por Trotsky e seus partidários sobre o levante de outubro, sobre o papel
de Trotsky no levante, sobre o Partido e a preparação para outubro, e assim por
diante. Também mencionarei o trotskismo como uma ideologia peculiar que é
incompatível com o leninismo, e as tarefas do Partido em conexão com os últimos
pronunciamentos literários de Trotsky.

I. Os fatos sobre a insurreição de outubro

Em primeiro lugar, sobre o levante de outubro. Correm vigorosamente ru-


mores entre os membros do Partido de que o Comitê Central como um todo se
opunha a uma revolta em outubro de 1917. A história usual é que em 10 de outu-
bro, quando o Comitê Central adotou a decisão de organizar a revolta, a maioria
do Comitê Central a princípio falou contra um levante, mas, segundo a história,
naquele momento um operário irrompeu na reunião do Comitê Central e disse:
“Você está se decidindo contra um levante, mas eu lhe digo que haverá um
levante mesmo assim, apesar de tudo”. E assim, depois dessa ameaça, continua a
história, o Comitê Central, que supostamente ficou assustado, levantou a questão
de um levante novamente e adotou a decisão de organizá-lo.
Isso não é apenas um boato, camaradas. É relatado pelo conhecido John
Reed em seu livro Dez Dias202 . Reed estava distante do nosso Partido e, claro,
não poderia saber a história de nosso encontro secreto em 10 de outubro e, con-
sequentemente, foi enganado pela fofoca espalhada por gente como Sukhanov.
Essa história foi mais tarde divulgada e repetida em vários panfletos escritos por
trotskistas, incluindo um dos últimos panfletos de outubro escrito por Syrkin.
Esses rumores foram fortemente apoiados nos últimos pronunciamentos literá-
rios de Trotsky.
Nem é preciso provar que todos esses e outros contos de fadas das semelhan-
tes não estão de acordo com a verdade, que na verdade nada disso aconteceu,
nem poderia ter acontecido, na reunião do Comitê Central. Consequentemente,
poderíamos ignorar esses rumores absurdos; afinal, muitos rumores são fabri-
cados nas salas dos opositores ou daqueles que estão distantes do Partido. Na
verdade, nós os ignoramos até agora; por exemplo, não prestamos atenção aos
erros de John Reed e não nos demos ao trabalho de corrigi-los. Após os últimos
pronunciamentos de Trotsky, entretanto, não é mais possível ignorar tais lendas,
pois agora estão sendo feitas tentativas de educar nossos jovens sobre elas e, infe-
202 Stalin se refere à obra do jornalista norte-americano John Reed (1887-1920), “Dez dias que aba-
laram o mundo”, que narra os acontecimentos na cidade de Petrogrado durante a Revolução Russa.
O trabalho foi considerando um dos melhores escritos jornalísticos de todos os tempos (N.T.)
254 Obras Escolhidas

lizmente, alguns resultados já foram alcançados a esse respeito. Em vista disso,


devo contrariar esses rumores absurdos com os fatos reais.
Eu lhes mostro o registro da ata da reunião do Comitê Central de nosso Par-
tido em 10 (23) de outubro de 1917. Presentes: Lenin, Zinoviev, Kamenev, Stalin,
Trotsky, Sverdlov, Uritsky, Dzerzhinsky, Kollontai, Bubnov, Sokolnikov, Lomov. A
questão da situação atual e do levante foi discutida. Após a discussão, a resolução
do camarada Lenin sobre o levante foi posta à votação. A resolução foi aprovada
por uma maioria de 10 contra 2. Claro, pode-se pensar: por uma maioria de
10 contra 2, o Comitê Central decidiu prosseguir com o trabalho prático imedi-
ato de organizar o levante. Nessa mesma reunião, o Comitê Central elegeu um
centro político para dirigir o levante; este centro, denominado Bureau Político,
consistia em Lenin, Zinoviev, Stalin, Kamenev, Trotsky, Sokolnikov e Bubnov.
Esses são os fatos.
Esses poucos minutos de uma só vez destroem várias lendas. Eles destroem a
lenda de que a maioria do Comitê Central se opunha a um levante. Eles também
destroem a lenda de que, na questão do levante, o Comitê Central estava à beira
de uma cisão. Resulta da ata que os opositores de uma revolta imediata – Kame-
nev e Zinoviev – foram eleitos para o órgão que deveria exercer a direção política
da revolta em pé de igualdade com aqueles que eram a favor de uma revolta. Não
havia dúvida de uma divisão, nem poderia haver.
Trotsky afirma que em outubro nosso Partido tinha uma ala à direita nas
pessoas de Kamenev e Zinoviev, que, diz ele, eram quase social-democratas. O
que não se pode compreender então é como, nessas circunstâncias, pode aconte-
cer que o Partido evite uma cisão; como pode acontecer que as desavenças com
Kamenev e Zinoviev durassem apenas alguns dias; como pode acontecer que,
apesar dessas divergências, o Partido nomeou esses camaradas para cargos de
grande importância, elegeu-os para o centro político do levante, e assim por di-
ante. A atitude implacável de Lenin para com os social-democratas é suficien-
temente conhecida no Partido; o Partido sabe que Lenin não concordaria por
um só momento em ter camaradas de mentalidade social-democrata no Partido,
muito menos em cargos de grande importância. Como, então, explicar o fato
de que o Partido evitou uma cisão? A explicação é que, apesar das divergências,
esses camaradas eram velhos bolcheviques que defendiam o terreno comum do
bolchevismo. Qual era esse terreno comum? Unidade de pontos de vista sobre
as questões fundamentais: o caráter da revolução russa, as forças motrizes da
revolução, o papel do campesinato, os princípios da direção do partido e assim
por diante. Se não houvesse esse terreno comum, uma divisão teria sido inevitá-
vel. Não houve divisão e as divergências duraram apenas alguns dias, porque, e
apenas porque, Kamenev e Zinoviev eram leninistas, bolcheviques.
Passemos agora à lenda sobre o papel especial de Trotsky no levante de ou-
tubro. Os trotskistas estão espalhando vigorosamente os rumores de que Trotsky
inspirou e foi o único líder do levante de outubro. Esses rumores estão sendo es-
palhados com zelo excepcional pelo chamado editor das obras de Trotsky, Lents-
ner. O próprio Trotsky, ao evitar sistematicamente a menção ao Partido, ao Co-
mitê Central e ao Comitê de Petrogrado do Partido, nada tem a dizer sobre o
papel dirigente dessas organizações no levante e, impelindo-se com vigor como a
J. V. Stalin 255

figura central no levante de outubro, voluntária ou involuntariamente ajuda a es-


palhar os rumores sobre o papel especial que ele supostamente desempenhou no
levante. Estou longe de negar o papel indubitavelmente importante de Trotsky
no levante. Devo dizer, porém, que Trotsky não desempenhou nenhum papel
especial na insurreição de outubro, nem poderia fazê-lo; sendo presidente do
Soviete de Petrogrado, ele meramente cumpriu a vontade dos órgãos apropria-
dos do Partido, que dirigiram cada passo que Trotsky deu. Para filisteus como
Sukhanov, tudo isso pode parecer estranho, mas os fatos, os fatos verdadeiros,
confirmam total e completamente o que digo.
Examinemos a ata da próxima reunião do Comitê Central, a realizada em 16
(29) de outubro de 1917. Presentes: os membros do Comitê Central, mais repre-
sentantes do Comitê de Petrogrado, mais representantes da organização militar,
fábrica comitês, sindicatos e ferroviários. Entre os presentes, além dos membros
do Comitê Central, estavam: Krylenko, Shotman, Kalinin, Volodarsky, Shlyap-
nikov, Lacis e outros, vinte e cinco ao todo. A questão da revolta foi discutida do
ponto de vista puramente prático-organizacional. A resolução de Lenin sobre a
revolta foi aprovada por uma maioria de 20 votos contra 2, três abstenções. Um
centro prático foi eleito para a liderança organizacional do levante. Quem foi
eleito para este centro? Os cinco seguintes: Sverdlov, Stalin, Dzerzhinsky, Bub-
nov, Uritsky. As funções do centro prático: dirigir todos os órgãos práticos da
insurreição em conformidade com as diretivas do Comitê Central. Assim, como
você vê, algo “terrível” aconteceu nesta reunião do Comitê Central, ou seja, “es-
tranho de se relacionar”, o “inspirador”, a “figura principal”, o “único líder” do
levante, Trotsky, não foi eleito para o centro prático, que foi chamado para dirigir
o levante. Como reconciliar isso com a opinião atual sobre o papel especial de
Trotsky? Não é tudo isso um tanto “estranho”, como diriam Sukhanov ou os trots-
kistas? E, no entanto, estritamente falando, não há nada de estranho nisso, pois
nem no Partido, nem na insurreição de outubro, Trotsky desempenhou qualquer
papel especial, nem poderia fazê-lo, pois era um homem relativamente novo em
nosso Partido no período de outubro. Ele, como todos os trabalhadores respon-
sáveis, apenas cumpriu a vontade do Comitê Central e de seus órgãos. Quem
conhece a mecânica da direção do Partido Bolchevique não terá dificuldade em
compreender que não poderia ser de outra forma: bastaria Trotsky ter ido con-
tra a vontade do Comitê Central para ter sido privado de influência no curso de
eventos. Essa conversa sobre o papel especial de Trotsky é uma lenda que está
sendo espalhada por fofocas do “Partido”.
Isso, é claro, não significa que a insurreição de outubro não teve seu inspi-
rador. Teve o seu inspirador e líder, mas este foi Lenin, e ninguém menos que
Lenin, o mesmo Lenin cujas resoluções o Comitê Central adotou ao decidir a
questão do levante, o mesmo Lenin que, apesar do que diz Trotsky, não foi im-
pedido por estar escondido de ser o verdadeiro inspirador do levante. É tolice e
ridículo tentar agora, por meio de boatos sobre Lenin ter estado escondido, obs-
curecer o fato indubitável de que o inspirador do levante foi o líder do Partido,
V. I. Lenin.
Esses são os fatos.
Certo, somos informados, mas não se pode negar que Trotsky lutou bem no
256 Obras Escolhidas

período de outubro. Sim, é verdade, Trotsky, de fato, lutou bem em outubro; mas
Trotsky não foi o único que lutou bem no período de outubro. Mesmo pessoas
como os socialistas-revolucionários de esquerda, que então estavam ao lado dos
bolcheviques, também lutaram bem. Em geral, devo dizer que no período de
uma revolta vitoriosa, quando o inimigo está isolado e a revolta está crescendo,
não é difícil lutar bem. Nesses momentos, até as pessoas atrasadas se tornam
heróis.
A luta proletária não é, entretanto, um avanço ininterrupto, uma cadeia inin-
terrupta de vitórias. A luta proletária também tem suas provações, suas derrotas.
O genuíno revolucionário não é aquele que mostra coragem no período de uma
revolta vitoriosa, mas aquele que, enquanto luta bem durante o avanço vitori-
oso da revolução, também mostra coragem quando a revolução está em retirada,
quando o proletariado sofre a derrota; que não perde a cabeça e não titubeia
quando a revolução sofre reveses, quando o inimigo alcança o sucesso; que não
entra em pânico nem se desespera quando a revolução está em um período de
retrocesso. Os socialistas-revolucionários de esquerda não lutaram mal no pe-
ríodo de outubro e apoiaram os bolcheviques. Mas quem não sabe que aqueles
“bravos” lutadores entraram em pânico no período de Brest, quando o avanço
do imperialismo alemão os levou ao desespero e à histeria? É um fato muito
triste, mas indubitável que Trotsky, que lutou bem no período de outubro, não
teve, no período de Brest, no período em que a revolução sofreu reveses tem-
porários, a coragem de mostrar firmeza suficiente naquele momento difícil e
abster-se de seguir os passos dos socialistas-revolucionários de esquerda. Sem
dúvida, aquele momento foi difícil; era preciso mostrar uma coragem excepcio-
nal e uma frieza imperturbável para não desanimar, para recuar a tempo, para
aceitar a paz a tempo, para retirar o exército proletário do alcance dos golpes do
imperialismo alemão, para preservar as reservas camponesas e, depois obtendo
uma trégua dessa maneira, para atacar o inimigo com força renovada. Infeliz-
mente, descobriu-se que Trotsky não tinha essa coragem e firmeza revolucionária
naquele momento difícil.
Na opinião de Trotsky, a principal lição da revolução proletária é “não se
desesperar” durante o mês de outubro. Isso está errado, pois a afirmação de
Trotsky contém apenas uma partícula da verdade sobre as lições da revolução.
Toda a verdade sobre as lições da revolução proletária é “não se desesperar”, não
só quando a revolução está avançando, mas também quando está em retirada,
quando o inimigo está ganhando o controle e a revolução está sofrendo reveses.
A revolução não terminou em outubro. Outubro foi apenas o início da revolu-
ção proletária. É ruim ter medo quando a maré da insurreição está subindo;
mas é pior quando a revolução está passando por severas provações depois que o
poder foi conquistado. Manter o poder no dia seguinte da revolução não é me-
nos importante do que capturá-lo. Se Trotsky se assustou durante o período de
Brest, quando nossa revolução passava por severas provações, quando era quase
uma questão de “entregar” o poder, ele deveria saber que os erros cometidos por
Kamenev e Zinoviev em outubro são irrelevantes aqui.
É assim que as coisas estão com as lendas sobre o levante de outubro.
J. V. Stalin 257

II. O Partido e a preparação para outubro


Passemos agora à questão da preparação para outubro.
Ouvindo Trotsky, pode-se pensar que durante todo o período de preparação,
de março a outubro, o Partido Bolchevique não fez nada além de marcar o tempo;
que estava sendo corroído por contradições internas e prejudicava Lenin em to-
dos os sentidos; que, não fosse por Trotsky, ninguém sabe como teria terminado
a Revolução de Outubro. É bastante divertido ouvir esta estranha conversa so-
bre o Partido de Trotsky, que declara que “o principal instrumento da revolução
proletária é o Partido”, que “sem o Partido, separado do Partido, contornando
o Partido, com um substituto para o Partido, a revolução proletária não pode
ser vitoriosa”. O próprio Alá não entenderia como nossa revolução poderia ter
sido bem-sucedida se “seu principal instrumento” se mostrasse inútil, enquanto
o sucesso era impossível, ao que parece, “contornando o Partido”. Mas esta não é
a primeira vez que Trotsky nos trata de estranhezas. Deve-se supor que essa con-
versa divertida sobre nosso Partido seja uma das esquisitices usuais de Trotsky.
Vamos revisar brevemente a história da preparação para outubro de acordo
com os períodos.

1) O período da nova orientação do Partido (março-abril). Os principais fatos


deste período:

a) a derrubada do tsarismo;
b) a formação do Governo Provisório (ditadura da burguesia);
c) o surgimento de sovietes de deputados operários e soldados (ditadura
do proletariado e do campesinato);
d) dupla potência;
e) a manifestação de abril;
f) a primeira crise de poder.
O traço característico deste período é o fato de existirem juntas, lado a lado
e simultaneamente, a ditadura da burguesia e a ditadura do proletariado e do
campesinato; este confia no primeiro, acredita que luta pela paz, cede voluntari-
amente o poder à burguesia e, assim, torna-se um apêndice da burguesia. Ainda
não há conflitos graves entre as duas ditaduras. Por outro lado, existe o “Comitê
de Contato”203 .
Este foi o maior ponto de virada na história da Rússia e um ponto de vi-
rada sem precedentes na história do nosso Partido. A velha plataforma pré-
revolucionária de derrubada direta do governo era clara e definitiva, mas não
mais adequada às novas condições de luta. Agora não era mais possível ir direto
203 O “Comitê de Contato”, consistindo de Chkheidze, Steklov, Sukhanov, Filippovsky e Skobelev (e
posteriormente Chernov e Tsereteli), foi criado pelo Comitê Executivo Revolucionário Menchevique
e Socialista do Soviete de Deputados dos Trabalhadores e Soldados de Petrogrado em 7 de março,
1917, com o objetivo de estabelecer contato com o Governo Provisório, de “influenciá-lo” e “contro-
lar” suas atividades. Na verdade, o “Comitê de Contato” ajudou a levar a cabo a política burguesa
do Governo Provisório e impediu as massas dos trabalhadores de travar uma luta revolucionária ativa
para transferir todo o poder aos Sovietes. O “Comitê de Contato” existiu até maio de 1917, quando
representantes dos Mencheviques e Socialistas-Revolucionários ingressaram no governo provisório.
258 Obras Escolhidas

para a derrubada do governo, pois este estava ligado aos sovietes, então sob a in-
fluência dos defensores, e o Partido teria que fazer guerra tanto contra o governo
quanto contra os sovietes, uma guerra que estaria além de suas forças. Nem foi
possível seguir uma política de apoio ao Governo Provisório, pois era o governo
do imperialismo. Nas novas condições de luta, o Partido teve que adotar uma
nova orientação. O Partido (sua maioria) tateou seu caminho em direção a essa
nova orientação. Adotou a política de pressão sobre o Governo Provisório através
dos sovietes sobre a questão da paz e não se aventurou a avançar imediatamente
da velha palavra de ordem da ditadura do proletariado e do campesinato para
a nova palavra de ordem de poder para os sovietes. O objetivo dessa política
intermediária era permitir aos sovietes discernir a real natureza imperialista do
governo provisório com base nas questões concretas da paz e, dessa forma, arran-
car os sovietes do governo provisório. Mas essa foi uma posição profundamente
errada, pois deu origem a ilusões pacifistas, fomentou o defensor e atrapalhou
a educação revolucionária das massas. Naquela época, compartilhei esta posição
equivocada com outros camaradas do Partido e a abandonei totalmente só em
meados de abril, quando me associei às teses de Lenin. Uma nova orientação era
necessária. Esta nova orientação foi dada ao Partido por Lenin, nas suas célebres
Teses de Abril. Não tratarei dessas teses, pois são conhecidas por todos. Houve
alguma divergência entre o Partido e Lenin naquela época? Sim foram. Quanto
tempo duraram essas desavenças? Não mais de duas semanas. A Conferência
Municipal da organização de Petrogrado204 (na segunda quinzena de abril), que
adotou as teses de Lenin, marcou um ponto de inflexão no desenvolvimento do
nosso Partido. A Conferência Pan-Russa de abril205 (no final de abril) mera-
mente completou em uma escala totalmente russa o trabalho da Conferência de
Petrogrado, reunindo nove décimos do Partido em torno desta posição partidária
unida.
Agora, sete anos depois, Trotsky se regozija maliciosamente com as desaven-
ças passadas entre os bolcheviques e as descreve como uma luta travada como se
houvesse quase dois partidos dentro do bolchevismo. Mas, em primeiro lugar,
Trotsky vergonhosamente exagera e infla a questão, pois o Partido Bolchevique
viveu essas divergências sem o menor choque. Em segundo lugar, nosso Partido
seria uma casta e não um partido revolucionário se não permitisse diferentes
matizes de opinião em suas fileiras. Além disso, é sabido que já existiram di-
vergências entre nós ainda antes, por exemplo, no período da Terceira Duma,
mas não abalaram a unidade do nosso Partido. Em terceiro lugar, não será im-
próprio perguntar qual era então a posição do próprio Trotsky, que agora se
vangloria com tanto entusiasmo dos desentendimentos anteriores entre os bol-
cheviques. Lentsner, o chamado editor das obras de Trotsky, nos assegura que as
cartas de Trotsky da América (março) “anteciparam totalmente” as Cartas de Le-
nin de longe (março), que serviram de base para as teses de abril de Lenin. Isso
é o que ele diz: “totalmente antecipado”. Trotsky não se opõe a essa analogia;

204 A Conferência da Cidade de Petrogrado aconteceu de 27 de abril a 5 de maio (14 a 22 de abril) de


1917, com 57 delegados presentes. Lenin e Stalin participaram do processo. V. I. Lenin apresentou
um relatório sobre a situação atual com base em suas teses de abril. Stalin foi eleito para a comissão
para redigir a resolução sobre o relatório de V. I. Lenin.
205 A respeito da Sétima Conferência Pan-russa dos Bolcheviques de abril.
J. V. Stalin 259

aparentemente, ele aceita com agradecimento. Mas, em primeiro lugar, as cartas


de Trotsky “não se assemelham em nada” às cartas de Lenin, nem em espírito,
nem em conclusões, pois refletem total e inteiramente o slogan antibolchevique
de Trotsky de “não há tsar, mas um governo dos trabalhadores”, um slogan que
implica uma revolução sem campesinato. Basta dar uma olhada nessas duas sé-
ries de cartas para se convencer disso. Em segundo lugar, se o que Lentener diz
é verdade, como explicar o fato de que Lenin, no dia seguinte à sua chegada
do exterior, considerou necessário dissociar-se de Trotsky? Quem não sabe das
repetidas declarações de Lenin de que o slogan de Trotsky: “não um tsar, mas
um governo operário” era uma tentativa “de pular o movimento camponês ainda
não exaurido”, que esse slogan significava “brincar com a tomada do poder por
um governo operário?”.
O que pode haver em comum entre as teses bolcheviques de Lenin e o es-
quema antibolchevique de Trotsky com seu “jogo de tomada do poder”? E o que
leva a essa paixão que algumas pessoas demonstram por comparar um barraco
miserável com o Mont Blanc? Com que propósito Lentsner achou necessário fa-
zer esse arriscado acréscimo de mais outra lenda ao amontoado de velhas lendas
sobre nossa revolução, sobre as cartas de Trotsky da América “antecipando” as
conhecidas Cartas de longe de Lenin? 206 Não é de admirar que se diga que um
tolo obediente é mais perigoso do que um inimigo.

206 Nota original de Stalin: Entre essas lendas deve ser incluída também a história muito difundida
de que Trotsky foi o “único” ou “principal organizador” das vitórias nas frentes da guerra civil.
Devo declarar, camaradas, no interesse da verdade, que esta versão está totalmente em desacordo
com os fatos. Estou longe de negar que Trotsky desempenhou um papel importante na guerra civil.
Mas devo declarar enfaticamente que a grande honra de ser o organizador de nossas vitórias não
pertence a indivíduos, mas ao grande corpo coletivo de trabalhadores avançados em nosso país, o
Partido Comunista Russo. Talvez não seja impróprio citar alguns exemplos. Você sabe que Kolchak
e Denikin eram considerados os principais inimigos da República Soviética. Você sabe que nosso país
respirava livremente somente depois que esses inimigos foram derrotados. Bem, a história mostra
que ambos os inimigos, ou seja, Kolchak e Denikin, foram derrotados por nossas tropas, apesar dos
planos de Trotsky. Julguem por si mesmos. 1) Kolchak. Estamos no verão de 1919. Nossas tropas
avançam contra Kolchak e operam perto de Ufa. Uma reunião do Comitê Central é realizada. Trotsky
propõe que o avanço seja interrompido ao longo da linha do rio Belaya (perto de Ufa), deixando os
Urais nas mãos de Kolchak, e que parte das tropas seja retirada da Frente Oriental e transferida para
a Frente Sul. Um acalorado debate ocorre. O Comitê Central discorda de Trotsky, sendo de opinião
que os Urais, com suas fábricas e rede ferroviária, não devem ser deixados nas mãos de Kolchak,
pois este poderia facilmente se recuperar ali organizar uma força forte e chegar novamente ao Volga;
Kolchak deve primeiro ser conduzido para além da cordilheira dos Urais para as estepes siberianas,
e somente depois que isso for feito as forças devem ser transferidas para o Sul. O Comitê Central
rejeita o plano de Trotsky. Trotsky entrega sua renúncia. O Comitê Central se recusa a aceitá-lo.
O comandante-chefe Vatsetis, que apoiava o plano de Trotsky, renuncia. Seu lugar é ocupado por
um novo comandante em chefe, Kamenev. A partir desse momento, Trotsky deixa de tomar parte
direta nos assuntos da Frente Oriental. 2) Denikin. Isso foi no outono de 1919. A ofensiva contra
Denikin não está progredindo com sucesso. O “anel de aço” em torno de Mamontov (o ataque de
Mamontov) está obviamente desmoronando. Denikin captura Kursk. Denikin está se aproximando
de Orel. Trotsky é convocado da Frente Sul para participar de uma reunião do Comitê Central. O
Comitê Central considera a situação alarmante e decide enviar novos chefes militares à Frente Sul e
retirar Trotsky. Os novos líderes militares exigem “nenhuma intervenção” de Trotsky nos assuntos da
Frente Sul. Trotsky deixa de tomar parte direta nos assuntos da Frente Sul. As operações na Frente
Sul, até a captura de Rostov-o-Don e Odessa por nossas tropas, prosseguem sem Trotsky. Que alguém
tente refutar esses fatos.
260 Obras Escolhidas

2) O período da mobilização revolucionária das massas (maio-agosto). Os prin-


cipais fatos deste período:

a) a manifestação de abril em Petrogrado e a formação do governo de co-


alizão com a participação dos “socialistas”;
b) as manifestações do Primeiro de Maio nos principais centros da Rússia
com o lema de “uma paz democrática”;
c) a manifestação de junho em Petrogrado com o lema principal: “Abaixo
os ministros capitalistas!”;
d) a ofensiva de junho na frente e na reversão do exército russo;
e) a manifestação armada de julho em Petrogrado; os ministros cadetes
renunciam ao governo;
f) as tropas contrarrevolucionárias são convocadas da frente; a redação do
Pravda está destruída; a contrarrevolução lança uma luta contra os sovietes e
um novo governo de coalizão é formado, chefiado por Kerensky;
g) o VI Congresso do nosso Partido, que edita a consigna de preparação
para uma insurreição armada;
h) a Conferência de Estado contrarrevolucionária e a greve geral em Mos-
cou;
i) a marcha fracassada de Kornilov sobre Petrogrado, a revitalização dos
sovietes; os cadetes renunciam e forma-se um “Diretório”.
O traço característico deste período é a intensificação da crise e o rompimento
do equilíbrio instável entre os sovietes e o Governo Provisório que, para o bem ou
para o mal, existia no período anterior. O poder duplo tornou-se insuportável
para ambos os lados. O frágil edifício do “Comitê de Contato” está cambaleando.
“Crise de poder” e “reorganização ministerial” são os slogans mais na moda da
época. A crise na frente e a desorganização na retaguarda estão fazendo seu tra-
balho, fortalecendo os flancos extremos e comprimindo os defensores de ambos
os lados. A revolução está se mobilizando, causando a mobilização da contrarre-
volução. A contrarrevolução, por sua vez, está estimulando a revolução, agitando
novas ondas da maré revolucionária. A questão de transferir o poder para a nova
classe torna-se a questão imediata do dia.
Houve divergências em nosso partido então? Sim foram. Tiveram, no en-
tanto, um caráter puramente prático, apesar das afirmações de Trotsky, que tenta
descobrir uma ala de “direita” e uma “esquerda” no Partido. Quer dizer, eram
divergências tão inevitáveis onde existe uma vida partidária vigorosa e uma ati-
vidade partidária real.
Trotsky está errado ao afirmar que a manifestação de abril em Petrogrado
deu origem a desacordos no Comitê Central. O Comitê Central estava absoluta-
mente unido nesta questão e condenou a tentativa de um grupo de camaradas de
prender o Governo Provisório numa época em que os bolcheviques estavam em
minoria tanto nos sovietes quanto no exército. Se Trotsky tivesse escrito a “histó-
ria” de outubro não de acordo com Sukhanov, mas de acordo com documentos
autênticos, ele facilmente teria se convencido do erro de sua afirmação.
Trotsky está absolutamente errado ao afirmar que a tentativa, “por iniciativa
J. V. Stalin 261

de Lenin” de organizar uma manifestação em 10 de junho, foi descrita como


“aventureirismo” pelos membros de “direita” do Comitê Central. Se Trotsky não
tivesse escrito de acordo com Sukhanov, ele certamente saberia que a manifesta-
ção de 10 de junho foi adiada com o total acordo de Lenin, e que ele insistiu na
necessidade de adiá-la em um grande discurso que proferiu na conhecida reu-
nião de Petrogrado Comitê (ver ata do Comitê de Petrogrado).
Trotsky está absolutamente errado ao falar sobre desacordos “trágicos” no
Comitê Central em relação à manifestação armada de julho. Trotsky está sim-
plesmente inventando ao afirmar que alguns membros do grupo dirigente da
Central. O Comitê “não podia deixar de considerar o episódio de julho como
uma aventura prejudicial”. Trotsky, que então ainda não era membro de nosso
Comitê Central e era apenas nosso parlamentar soviético, poderia, é claro, não
saber que o Comitê Central considerava a manifestação de julho apenas como um
meio de sondar o inimigo, que o Comitê Central (e Lenin) não queria converter,
nem mesmo pensava em converter, a manifestação em levante numa época em
que os sovietes nas capitais ainda apoiavam os defensores. É bem possível que
alguns bolcheviques tenham chorado com a derrota de julho. Sei, por exemplo,
que alguns dos bolcheviques que foram presos na época estavam até dispostos a
abandonar nossas fileiras. Mas tirar inferências disso contra certos supostos “di-
reitos”, supostamente membros do Comitê Central, é uma vergonhosa distorção
da história.
Trotsky erra ao declarar que durante os dias Kornilov uma parte dos dirigen-
tes do Partido tendia a formar um bloco com os defensores, a apoiar o Governo
Provisório. Ele, é claro, está se referindo aos mesmos supostos “direitos” que o
mantêm acordado à noite. Trotsky se engana, pois existem documentos, como
o Órgão Central do Partido da época, que refutam suas afirmações. Trotsky
se refere à carta de Lenin ao Comitê Central advertindo contra o apoio a Ke-
rensky; mas Trotsky não consegue entender as cartas de Lenin, seu significado,
seu propósito. Em suas cartas, Lenin às vezes avançava deliberadamente, colo-
cando em primeiro plano os erros que porventura se cometessem e criticando-os
de antemão com o objetivo de alertar o Partido e salvaguardá-lo dos erros. Às
vezes, ele até mesmo aumentava uma “ninharia” e “fazia uma montanha de um
pequeno morro” com o mesmo propósito pedagógico. O líder do partido, espe-
cialmente se estiver escondido, não pode agir de outra forma, pois deve ver além
de seus companheiros de armas, deve soar o alarme sobre todos os erros possí-
veis, mesmo sobre “ninharias”. Mas inferir de tais cartas de Lenin (e ele escreveu
um bom número de tais cartas) a existência de desentendimentos “trágicos” e
proclamá-los significa não entender as cartas de Lenin, significa não conhecer
Lenin. Isso, provavelmente, explica por que Trotsky às vezes se engana. Resu-
mindo: não houve desacordos no Comitê Central durante a revolta de Kornilov,
absolutamente nenhum.
Depois da derrota de julho, o desacordo realmente surgiu entre o Comitê
Central e Lenin sobre a questão do futuro dos sovietes. É sabido que Lenin,
desejando concentrar a atenção do Partido na tarefa de preparar o levante fora
dos sovietes, advertia contra qualquer paixão por estes, pois era de opinião que,
profanados pelos defensores, eles haviam se tornado inúteis. O Comitê Central
e o Sexto Congresso do Partido adotaram uma linha mais cautelosa e decidiram
262 Obras Escolhidas

que não havia motivos para excluir a possibilidade de os sovietes ressuscitarem.


A revolta Kornilov mostrou que essa decisão foi correta. Essa discordância, en-
tretanto, não teve grandes consequências para o Partido. Mais tarde, Lenin ad-
mitiu que a linha seguida pelo Sexto Congresso estava correta. É interessante
que Trotsky não tenha se agarrado a essa discordância e não a tenha ampliado a
proporções “monstruosas”.
Partido unido e sólido, centro da mobilização revolucionária das massas – tal
era o quadro apresentado pelo nosso Partido naquele período.

3) O período de organização do assalto (setembro-outubro). Os principais fatos


deste período:

a) a convocação da Conferência Democrática e o colapso da ideia de bloco


com os cadetes;
b) os sovietes de Moscou e Petrogrado passam para o lado dos bolcheviques;
c) o Congresso dos Sovietes da Região Norte207 ; o Soviete de Petrogrado
decide contra a retirada das tropas;
d) a decisão do Comitê Central sobre o levante e a formação do Comitê
Militar Revolucionário do Soviete de Petrogrado;
e) a guarnição de Petrogrado decide render o apoio armado soviético de
Petrogrado; é organizada uma rede de comissários do Comitê Militar Revolu-
cionário;
f) as forças armadas bolcheviques entram em ação; os membros do Governo
Provisório são presos;
g) tomada de poder o Comitê Militar Revolucionário do Soviete de Petro-
grado; o Segundo Congresso dos Sovietes cria o Conselho dos Comissários do
Povo.
O traço característico deste período é o rápido crescimento da crise, a cons-
ternação absoluta reinando entre os círculos dirigentes, o isolamento dos socia-
listas revolucionários e mencheviques e a fuga em massa dos elementos vacilantes
para o lado dos bolcheviques. Uma característica peculiar das táticas da revolu-
ção neste período deve ser notada, a saber, que a revolução se esforçou para dar
todos, ou quase todos, os passos em seu ataque sob o pretexto de defesa. Sem
dúvida, a recusa em permitir a retirada das tropas de Petrogrado foi um passo
importante no ataque da revolução; no entanto, esse ataque foi realizado sob o
lema de proteger Petrogrado de um possível ataque do inimigo externo. Sem
dúvida, a formação do Comitê Militar Revolucionário foi um passo ainda mais
207O Congresso dos Sovietes de deputados operários e soldados da Região Norte realizou-se em
Petrogrado de 24 a 26 de outubro (11 a 13) de 1917, sob a direção dos bolcheviques. Estiveram
presentes representantes de Petrogrado, Moscou, Kronstadt, Novgorod, Reval, Helsingfors, Vyborg
e outras cidades. Ao todo, havia 94 delegados, dos quais 51 eram bolcheviques. O congresso aprovou
uma resolução sobre a necessidade de transferência imediata de todo o poder aos sovietes, centrais e
locais. Convocou os camponeses a apoiar a luta pela transferência do poder aos sovietes e instou os
próprios sovietes a iniciar operações ativas e a criar Comitês Militares Revolucionários para organizar
a defesa militar da revolução. O congresso criou um Comitê Regional do Norte e encarregou-o de
preparar a convocação do Segundo Congresso Pan-Russo dos Sovietes e coordenar as atividades de
todos os Sovietes regionais.
J. V. Stalin 263

importante no ataque ao Governo Provisório; no entanto, foi realizada sob o lema


de organizar o controle soviético sobre as ações do Quartel-General da Área Mi-
litar. Sem dúvida, a passagem aberta da guarnição para o lado do Comitê Militar
Revolucionário e a organização de uma rede de comissários soviéticos marcou o
início do levante; no entanto, a revolução deu esses passos sob o lema de proteger
o Soviete de Petrogrado de uma possível ação da contrarrevolução. A revolução,
por assim dizer, mascarou suas ações no ataque sob o manto da defesa, a fim de
atrair mais facilmente os elementos indecisos e vacilantes para sua órbita. Isso,
sem dúvida, explica o caráter exteriormente defensivo dos discursos, artigos e
slogans daquele período, cujo conteúdo interno, não obstante, era de natureza
profundamente ofensiva.
Houve divergências no Comitê Central nesse período? Sim, havia, e bastante
importantes. Já falei sobre as divergências sobre o levante. Elas estão plenamente
refletidas nas atas das reuniões do Comitê Central de 10 e 16 de outubro. Não
repetirei, portanto, o que já disse. Três questões devem agora ser tratadas: a
participação no Pré-parlamento, o papel dos sovietes na revolta e a data da revolta.
Isso é tanto mais necessário porque Trotsky, em seu zelo por se colocar em um
lugar de destaque, “inadvertidamente” deturpou a posição que Lenin assumiu
nas duas últimas questões.
Sem dúvida, as divergências sobre a questão do Pré-parlamento eram de natu-
reza grave. Qual era, por assim dizer, o objetivo do Pré-parlamento? Era: ajudar
a burguesia a colocar os sovietes em segundo plano e a lançar as bases do parla-
mentarismo burguês. Se o Pré-parlamento poderia ter cumprido essa tarefa na
situação revolucionária que surgiu, é outra questão. Os acontecimentos mostra-
ram que esse objetivo não poderia ser realizado, e o próprio Pré-parlamento foi
um aborto kornilovista. Não pode haver dúvida, porém, de que foi precisamente
este objetivo que os mencheviques e socialistas-revolucionários perseguiram ao
constituir o Pré-parlamento. O que poderia significar a participação dos bol-
cheviques no Pré-parlamento nessas circunstâncias? Nada além de enganar as
massas proletárias sobre a verdadeira natureza do Pré-parlamento. Esta é a prin-
cipal explicação para a paixão com que Lenin, em suas cartas, açoitou aqueles
que eram a favor da participação no Pré-parlamento. Não há dúvida de que foi
um grave erro ter participado do Pré-parlamento.
Seria um erro, no entanto, pensar, como faz Trotsky, que aqueles que eram a
favor da participação no Pré-parlamento entraram nele com o propósito de um
trabalho construtivo, com o propósito de “dirigir o movimento operário no canal
da Social-Democracia”. Não é esse o caso. Não é verdade. Se fosse esse o caso,
o Partido não teria sido capaz de retificar esse erro “em dois cliques”, saindo de
forma demonstrativa do Pré-parlamento. Aliás, a rápida retificação desse erro
foi uma expressão da vitalidade e do poder revolucionário de nosso Partido.
E agora, permita-me corrigir uma ligeira imprecisão que se infiltrou no re-
latório de Lentsner, o “editor” das obras de Trotsky, sobre a reunião do grupo
bolchevique em que foi tomada uma decisão sobre a questão do Pré-parlamento.
Lentsner diz que havia dois relatores nesta reunião, Kamenev e Trotsky. Isso
não é verdade. Na verdade, eram quatro relatores: dois a favor do boicote ao
Pré-parlamento (Trotsky e Stalin) e dois a favor da participação (Kamenev e No-
264 Obras Escolhidas

gin).
Trotsky está em uma posição ainda pior ao lidar com a posição que Lenin as-
sumiu sobre a questão da forma do levante. De acordo com Trotsky, parece que
a visão de Lenin era que o Partido deveria tomar o poder em outubro “indepen-
dentemente e pelas costas do Soviete”. Mais tarde, criticando esse absurdo, que
ele atribui a Lenin, Trotsky “corta travessuras” e finalmente profere a seguinte
declaração condescendente:
“Isso teria sido um erro”. Trotsky está aqui proferindo uma falsidade sobre
Lenin, ele está deturpando as opiniões de Lenin sobre o papel dos sovietes na
revolta. Uma pilha de documentos pode ser citada, mostrando que Lenin propôs
que o poder fosse tomado por meio dos sovietes, seja Petrogrado ou Soviete de
Moscou, e não pelas costas dos mesmos. Por que Trotsky teve que inventar essa
lenda mais do que estranha sobre Lenin? Nem Trotsky está em melhor posição
quando “analisa” a posição assumida pelo Comitê Central e por Lenin sobre a
questão da data do levante. Relatando a famosa reunião do Comitê Central de
10 de outubro, Trotsky afirma que naquela reunião “foi aprovada uma resolução
no sentido de que o levante ocorresse o mais tardar em 15 de outubro”. Disto,
parece que o Comitê Central fixou 15 de outubro como a data do levante e então
ele mesmo violou essa decisão ao adiar a data do levante para 25 de outubro.
Isso é verdade? Não, não é. Durante esse período, o Comitê Central aprovou
apenas duas resoluções sobre o levante – uma em 10 de outubro e outra em 16
de outubro. Leiamos essas resoluções.
A resolução do Comitê Central de 10 de outubro:
O Comitê Central reconhece que a posição internacional da revolução russa (o motim na
marinha alemã, que é uma manifestação extrema do crescimento em toda a Europa da re-
volução socialista mundial, e a ameaça de paz208 entre os imperialistas com os objeto de
estrangulamento da revolução na Rússia), bem como a situação militar (a decisão indubitá-
vel da burguesia russa e Kerensky e companhia de render Petrogrado aos alemães), e o fato
de que o partido proletário ganhou a maioria nos sovietes. Tudo isso, levado em conjunto
com a revolta camponesa e a virada da confiança popular em relação ao nosso Partido (as
eleições em Moscou), e, finalmente, os óbvios preparativos para um segundo caso Kornilov
(a retirada das tropas de Petrogrado, o envio de cossacos a Petrogrado, os arredores de Minsk
por cossacos, etc.) – tudo isso coloca um levante armado na ordem do dia (...) Considerando,
portanto, que um levante armado é inevitável, e que o tempo para isso é totalmente opor-
tuno, o Comitê Central instrui todas as organizações do Partido a se orientarem de acordo e
a discutir e decidir todas as questões práticas (o Congresso dos Sovietes do Norte Região, a
retirada das tropas de Petrogrado, as ações das pessoas em Moscou e Minsk, etc.) deste ponto
de vista.

A resolução adotada pela conferência do Comitê Central com os trabalhado-


res responsáveis em 16 de outubro:
Esta reunião dá as boas-vindas e apoia totalmente a resolução do Comitê Central, apela a
todas as organizações e todos os trabalhadores e soldados para fazerem preparativos comple-
tos e intensos para um levante armado e para apoiar o centro criado pelo Comitê Central
para este fim, e expressa total confiança de que o Comitê Central e o Soviete irão em tempo
oportuno indicar o momento favorável e os meios adequados para lançar o ataque.

Vocês veem que a memória de Trotsky o traiu sobre a data do levante e a


resolução do Comitê Central sobre o levante.
208 Stalin acrescenta: “Obviamente, isso deve ser “uma paz separada”.
J. V. Stalin 265

Trotsky está absolutamente errado ao afirmar que Lenin subestimou a lega-


lidade soviética, que Lenin falhou em avaliar a grande importância da tomada
do poder pelo Congresso Pan-Russo dos sovietes em 25 de outubro, e que esta
foi a razão pela qual ele insistiu que o poder fosse assumido antes de 25 de ou-
tubro. Isso não é verdade. Lenin propôs que o poder fosse tomado antes de 25
de outubro por duas razões. Em primeiro lugar, porque os contrarrevolucioná-
rios poderiam ter rendido Petrogrado a qualquer momento, o que teria drenado
o sangue do levante em desenvolvimento, e por isso cada dia era precioso. Em
segundo lugar, porque o erro cometido pelo Soviete de Petrogrado ao fixar e
anunciar abertamente o dia do levante (25 de outubro) não poderia ser retifi-
cado de outra forma que não lançando realmente o levante antes da data legal
para ele fixada. O fato é que Lenin considerava a insurreição uma arte e não
podia deixar de saber que o inimigo, informado da data da revolta (devido ao
descuido do Soviete de Petrogrado), certamente tentaria se preparar para aquele
dia. Consequentemente, era necessário prevenir o inimigo, ou seja, sem deixar
de lançar o levante antes da data legal. Esta é a principal explicação para a paixão
com que Lenin em suas cartas açoitou aqueles que fizeram da data um fetiche,
a data de 25 de outubro. Os acontecimentos mostraram que Lenin estava ab-
solutamente certo. É bem sabido que o levante foi lançado antes do Congresso
dos Sovietes de toda a Rússia. É bem sabido que o poder foi realmente tomado
antes da abertura do Congresso Pan-Russo dos Sovietes, e foi tomado não pelo
Congresso dos Sovietes, mas pelo Soviete de Petrogrado, pelo Comitê Militar Re-
volucionário. O Congresso dos Sovietes apenas assumiu o poder do Soviete de
Petrogrado. É por isso que os longos argumentos de Trotsky sobre a importância
da legalidade soviética estão completamente fora de questão.
Um partido viril e poderoso à frente das massas revolucionárias que atacavam
e derrubavam o domínio burguês – tal era o estado do nosso Partido naquele
período.
Assim ficam as lendas sobre a preparação para outubro.

III. Trotskismo ou Leninismo?

Abordamos acima as lendas dirigidas contra o Partido e aquelas sobre Lenin


espalhadas por Trotsky e seus partidários em relação a outubro e a preparação
para ele. Expusemos e refutamos essas lendas. Mas surge a pergunta: para que
propósito Trotsky precisava de todas essas lendas sobre outubro e a preparação
para outubro, sobre Lenin e o Partido de Lenin? Qual é o propósito dos novos
pronunciamentos literários de Trotsky contra o Partido? Qual é o sentido, a fi-
nalidade, o objetivo desses pronunciamentos agora, quando o Partido não quer
uma discussão, quando o Partido está ocupado com uma série de tarefas urgen-
tes, quando o Partido precisa de esforços unidos para restaurar nossa economia
e não uma nova luta em torno de velhas questões? Com que propósito Trotsky
precisa arrastar o Partido de volta para novas discussões?
Trotsky afirma que tudo isso é necessário para o propósito de “estudar” outu-
bro. Mas não é possível estudar outubro sem dar outro chute no Partido e em seu
líder Lenin? Que espécie de “história” de outubro é essa que começa e termina
266 Obras Escolhidas

com tentativas de tirar o mérito do chefe da insurreição de outubro, de desacre-


ditar o Partido, que organizou e levou a cabo a insurreição? Não, não se trata
aqui de estudar outubro. Essa não é a maneira de estudar outubro. Não é assim
que se escreve a história de outubro. Obviamente, há um “desenho” diferente
aqui, e tudo indica que esse “desenho” é que Trotsky, com seus pronunciamentos
literários, está fazendo outra (mais uma!) tentativa de criar as condições para
substituir o leninismo pelo trotskismo. Trotsky precisa “desesperadamente” de-
sacreditar o Partido, e seus quadros que realizaram a revolta, para, depois de
desacreditar o Partido, proceder ao descrédito do leninismo. E é preciso que
ele desacredite o leninismo para arrastar o trotskismo como a “única” ideologia
“proletária” (não ria!). Tudo isso, claro (ah, claro!) Sob a bandeira do leninismo,
para que a operação de arrasto seja realizada “da forma mais indolor possível”.
Essa é a essência dos últimos pronunciamentos literários de Trotsky. É por isso
que esses pronunciamentos literários de Trotsky levantam agudamente a questão
do trotskismo. E então, o que é trotskismo?
O trotskismo possui três características específicas que o colocam em contra-
dição irreconciliável com o leninismo. Quais são esses recursos?
Primeiramente. O trotskismo é a teoria da revolução “permanente” (ininter-
rupta). Mas o que é revolução permanente em sua interpretação trotskista? É
uma revolução que não leva em conta o campesinato pobre como força revolu-
cionária. A revolução “permanente” de Trotsky é, como disse Lenin, “pular” o
movimento camponês, “brincar com a tomada do poder”. Por que é perigoso?
Porque tal revolução, se fosse feita uma tentativa de realizá-la, teria inevitavel-
mente terminado em fracasso, pois teria se divorciado do proletariado russo, seu
aliado, o campesinato pobre. Isso explica a luta que o leninismo vem travando
contra o trotskismo desde 1905.
Como Trotsky avalia o leninismo do ponto de vista dessa luta? Ele a considera
uma teoria que possui “características antirrevolucionárias”. Em que se baseia
esta opinião indignada sobre o leninismo? Sobre o fato de que, no momento
oportuno, o leninismo advogou e sustentou a ideia da ditadura do proletariado
e do campesinato.
Mas Trotsky não se limita a esta opinião indignada. Ele vai mais longe e
afirma: “Todo o edifício do leninismo na atualidade é construído sobre mentiras
e falsificações e traz em si os elementos venenosos de sua própria decadência”
(ver carta de Trotsky a Chkheidze, 1913). Como você vê, temos diante de nós
duas linhas opostas.
Em segundo lugar. O trotskismo é a desconfiança do princípio do Partido
Bolchevique, do caráter monolítico do Partido, de sua hostilidade para com os
elementos oportunistas. Na esfera da organização, o trotskismo é a teoria de que
revolucionários e oportunistas podem coexistir e formar grupos e círculos dentro
de um único partido. Você, sem dúvida, conhece a história do bloco de agosto
de Trotsky, no qual os martovistas e otzovistas, os liquidacionistas e os trotskis-
tas cooperaram alegremente, fingindo que eram um partido “de verdade”. É
sabido que este “partido” de retalhos perseguia o objetivo de destruir o Partido
Bolchevique. Qual era a natureza de “nossos desacordos” naquela época? É que
o leninismo considerava a destruição do bloco de agosto uma garantia do desen-
J. V. Stalin 267

volvimento do partido proletário, enquanto o trotskismo considerava esse bloco


a base para a construção de um partido “real”.
Novamente, como você pode ver, temos duas linhas opostas.
Em terceiro lugar. O trotskismo é a desconfiança dos dirigentes do bolche-
vismo, uma tentativa de desacreditá-los, de difama-los. Não conheço nenhuma
tendência do Partido que se compare ao trotskismo na questão de desacreditar
os dirigentes do leninismo ou as instituições centrais do partido. Por exemplo,
o que dizer da opinião “polida” de Trotsky sobre Lenin, a quem ele descreveu
como “um explorador profissional de todo tipo de atraso no movimento operário
russo”? (ibid.) E esta está longe de ser a mais “polida” das opiniões que Trotsky
expressou.
Como pôde acontecer que Trotsky, que carregava nas costas um estoque tão
desagradável, se encontrasse, afinal, nas fileiras dos bolcheviques durante o mo-
vimento de outubro? Aconteceu porque, naquela época, Trotsky abandonou (e
realmente abandonou) esse estoque-em-comércio; ele o escondeu no armário.
Se ele não tivesse realizado essa “operação”, a cooperação real com ele teria sido
impossível. A teoria do bloco de agosto, ou seja, a teoria da unidade com os men-
cheviques, já havia sido destruída e atirada ao mar pela revolução, pois como se
poderia falar em unidade quando uma luta armada se travava entre bolcheviques
e mencheviques? Trotsky não teve alternativa senão admitir que essa teoria era
inútil.
O mesmo infortúnio “aconteceu” com a teoria da revolução permanente, pois
nem um único bolchevique contemplava a tomada imediata do poder no dia se-
guinte da Revolução de Fevereiro, e Trotsky não pôde deixar de saber que os bol-
cheviques não o permitiriam, nas palavras de Lenin, “para jogar na tomada do
poder”. Trotsky não teve alternativa senão reconhecer a política dos bolcheviques
de lutar por influência nos sovietes, de lutar para conquistar o campesinato. No
que diz respeito à terceira característica específica do trotskismo (desconfiança
dos líderes bolcheviques), ele naturalmente teve que se retirar para um segundo
plano devido ao óbvio fracasso das duas primeiras características.
Nessas circunstâncias, Trotsky poderia fazer outra coisa senão esconder seu
estoque no armário e seguir os bolcheviques, considerando que ele não tinha
nenhum grupo próprio de qualquer importância, e que ele veio aos bolcheviques
como um indivíduo político, sem exército? Claro, ele não podia!
Qual é a lição a ser aprendida com isso? Apenas uma: essa colaboração pro-
longada entre os leninistas e Trotsky só é possível se este último abandona com-
pletamente seu antigo estoque no comércio, apenas se ele aceita completamente
o leninismo. Trotsky escreve sobre as lições de outubro, mas esquece que, além
de todas as outras lições, há mais uma lição de outubro, a que acabo de menci-
onar, que é de primordial importância para o trotskismo. O trotskismo também
deve aprender essa lição de outubro.
É evidente, entretanto, que o trotskismo não aprendeu essa lição. O fato é
que o velho estoque de trotskismo que estava escondido no armário no período
do movimento de outubro agora está sendo arrastado para a luz novamente na
esperança de que um mercado seja encontrado para ele, vendo que o mercado
em nosso país está se expandindo. Sem dúvida, os novos pronunciamentos lite-
268 Obras Escolhidas

rários de Trotsky são uma tentativa de voltar ao trotskismo, de “superar” o leni-


nismo, de arrastar e implantar todas as características específicas do trotskismo.
O novo trotskismo não é uma mera repetição do antigo trotskismo; suas penas
foram arrancadas e está bastante sujo; é incomparavelmente mais brando em es-
pírito e mais moderado em forma do que o antigo trotskismo; mas, em essência,
sem dúvida retém todas as características específicas do antigo trotskismo. O
novo trotskismo não se atreve a se apresentar como uma força militante contra
o leninismo; prefere operar sob a bandeira comum do leninismo, sob o lema de
interpretar, melhorar o leninismo. Isso porque é fraco. Não pode ser conside-
rado um acidente que o surgimento do novo trotskismo coincidiu com a partida
de Lenin. Durante a vida de Lenin, não teria ousado dar esse passo arriscado.
Quais são os traços característicos do novo trotskismo?
1) Sobre a questão da revolução “permanente”. O novo trotskismo não consi-
dera necessário defender abertamente a teoria da revolução “permanente”. Ele
afirma “simplesmente” que a Revolução de Outubro confirmou totalmente a
ideia de uma revolução “permanente”. Disto tira a seguinte conclusão: a parte
importante e aceitável do leninismo é a parte que veio depois da guerra, no pe-
ríodo da Revolução de Outubro; por outro lado, a parte do leninismo que existia
antes da guerra, antes da Revolução de Outubro, é errada e inaceitável. Daí a
teoria trotskista da divisão do leninismo em duas partes: leninismo pré-guerra,
o “velho” e “inútil” leninismo com sua ideia da ditadura do proletariado e do
campesinato, e o novo leninismo pós-guerra, outubro Leninismo, que contam
adaptar às exigências do trotskismo. O trotskismo precisa desta teoria da divisão
do leninismo como um primeiro passo, mais ou menos “aceitável”, que é neces-
sário para facilitar os próximos passos em sua luta contra o leninismo.
Mas o leninismo não é uma teoria eclética reunida a partir de diversos ele-
mentos e capaz de ser dividida em partes. O leninismo é uma teoria integral,
que surgiu em 1903, passou no teste de três revoluções e agora está sendo levada
adiante como a bandeira de batalha do proletariado mundial.
“O bolchevismo”, disse Lenin, “como tendência do pensamento político e
como partido político, existe desde 1903. Somente a história do bolchevismo
durante todo o período de sua existência pode explicar satisfatoriamente por
que foi capaz de construir e manter sob as condições mais difíceis a disciplina de
ferro necessária para a vitória do proletariado”.
Bolchevismo e leninismo são um só. São dois nomes para uma e a mesma
coisa. Portanto, a teoria da divisão do leninismo em duas partes é uma teoria
destinada a destruir o leninismo, para substituir o leninismo pelo trotskismo.
Desnecessário dizer que o Partido não consegue se reconciliar com essa teoria
grotesca.
2) Sobre a questão do princípio do Partido. O antigo trotskismo tentou minar
o princípio do partido bolchevique por meio da teoria (e prática) da unidade com
os mencheviques. Mas essa teoria sofreu tal fracasso que ninguém agora quer se-
quer mencioná-la. Para minar o princípio do Partido, o trotskismo atual inventou
a nova, menos odiosa e quase “democrática” teoria de contrastar os antigos qua-
dros com o elemento mais jovem do Partido. Segundo o trotskismo, nosso Partido
não tem uma história única e integral. O trotskismo divide a história do nosso
J. V. Stalin 269

Partido em duas partes de importância desigual: pré-Outubro e pós-Outubro.


A parte anterior a outubro da história do nosso Partido, propriamente falando,
não é história, mas “pré-história”, o período preparatório sem importância ou,
pelo menos, pouco importante do nosso Partido. A parte pós-outubro da história
de nosso Partido, entretanto, é uma história real, genuína. No primeiro, estão
os quadros “antigos”, “pré-históricos” sem importância do nosso Partido. Neste
último, está o novo, real, “histórico” Partido. Nem é preciso provar que este es-
quema singular da história do Partido é um esquema para romper a unidade
entre os antigos e os novos quadros do nosso Partido, um esquema para destruir
o princípio do Partido Bolchevique.
Nem é preciso dizer que o Partido não consegue se conformar com esse es-
quema grotesco.
3) Sobre a questão dos dirigentes do bolchevismo. O velho trotskismo tentou
desacreditar Lenin mais ou menos abertamente, sem temer as consequências. O
novo trotskismo é mais cauteloso. Tenta alcançar o objetivo do velho trotskismo
fingindo elogiar, exaltar Lenin. Acho que vale a pena citar alguns exemplos.
O Partido sabe que Lenin foi um revolucionário implacável; mas sabe também
que ele era cauteloso, que não gostava de pessoas imprudentes e muitas vezes,
com mão firme, continha aqueles que estavam apaixonados pelo terrorismo, in-
cluindo o próprio Trotsky. Trotsky toca nesse assunto em seu livro sobre Lenin,
mas a partir de sua descrição de Lenin, pode-se pensar que tudo o que Lenin
fez foi “em todas as oportunidades para enfiar na mente das pessoas a ideia de
que o terrorismo era inevitável”. Cria-se a impressão de que Lenin era o mais
sanguinário de todos os bolcheviques sanguinários.
Com que propósito Trotsky precisava desse exagero desnecessário e total-
mente injustificado?
O Partido sabe que Lenin foi um homem exemplar do Partido, que não gos-
tava de resolver questões sozinho, sem o corpo coletivo dirigente, no impulso do
momento, sem investigação e verificação cuidadosas. Trotsky também aborda
esse aspecto em seu livro. Mas o retrato que ele pinta não é o de Lenin, mas de
uma espécie de mandarim chinês, que resolve questões importantes no silêncio
de seu escritório, por intuição.
Quer saber como o nosso Partido resolveu a questão da dispersão da Assem-
bleia Constituinte? Ouça Trotsky:
“Claro, a Assembleia Constituinte terá de ser dispersa”, disse Lenin, “mas e
os socialistas-revolucionários de esquerda?”
“Mas nossas apreensões foram bastante dissipadas pelo velho Natanson. Ele
veio para ‘aconselhar-se’ conosco e, após as primeiras palavras, disse: Provavel-
mente teremos de dispersar a Assembleia Constituinte pela força”. “Bravo!” ex-
clamou Lenin. “O que é verdade é verdade! Mas será que o seu povo concordará
com isso?”. “Alguns de nosso povo estão vacilando, mas acho que no final eles
concordarão”, respondeu Natanson.
É assim que a história é escrita. Quer saber como o Partido resolveu a questão
do Conselho Militar Supremo? Ouça Trotsky:
“A menos que tenhamos especialistas militares sérios e experientes, nunca
270 Obras Escolhidas

nos livraremos deste caos’, disse eu a Vladimir Ilitch após cada visita ao Estado-
Maior. “Isso é evidentemente verdade, mas eles podem nos trair...”. “Vamos co-
locar um comissário para cada um deles”. “Dois seria melhor”, exclamou Lenin,
“E os mais fortes. Certamente deve haver comunistas fortes em nossas fileiras”.
“Foi assim que surgiu a estrutura do Conselho Militar Supremo”.
É assim que Trotsky escreve a história.
Por que Trotsky precisava dessas histórias farsantes e depreciativas a Lenin?
Era para exaltar V. I. Lenin, o líder do Partido? Não parece.
O Partido sabe que Lenin foi o maior marxista de nossos tempos, um pro-
fundo teórico e um revolucionário muito experiente, a quem qualquer traço de
blanquismo era estranho. Trotsky também aborda esse aspecto em seu livro. Mas
o retrato que ele pinta não é o do gigante Lenin, mas de um anão blanquista que,
nos dias de outubro, aconselha o Partido “a tomar o poder por suas próprias
mãos, independentemente e pelas costas do Soviete”. Já disse, porém, que não
há um traço de verdade nessa descrição.
Por que Trotsky precisava dessa imensa e gritante imprecisão? Não é uma
tentativa de desacreditar Lenin “só um pouco?”. Esses são os traços característicos
do novo trotskismo.
Qual é o perigo deste novo trotskismo? É que o trotskismo, devido a todo o
seu conteúdo interior, tem todas as chances de se tornar o centro e o ponto de
convergência dos elementos não proletários que se esforçam para enfraquecer,
para desintegrar a ditadura do proletariado.
Você vai perguntar: o que deve ser feito agora? Quais são as tarefas imedi-
atas do Partido em relação aos novos pronunciamentos literários de Trotsky? O
trotskismo está agindo agora para desacreditar o bolchevismo e minar seus fun-
damentos. É dever do Partido enterrar o trotskismo como tendência ideológica.
Fala-se de medidas repressivas contra a oposição e da possibilidade de cisão.
Isso é um absurdo, camaradas. Nosso partido é forte e poderoso. Não permitirá
nenhuma divisão. No que diz respeito às medidas repressivas, oponho-me vee-
mentemente a elas. O que precisamos agora não é de medidas repressivas, mas
de uma extensa luta ideológica contra o trotskismo renascente.
Não queríamos e não nos esforçávamos por essa discussão literária. O trots-
kismo está forçando isso sobre nós com seus pronunciamentos antileninistas.
Bem, estamos prontos, camaradas.
J. V. Stalin 271

A Revolução de Outubro e as táticas


dos comunistas russos
17 de dezembro de 1924

I. O cenário externo e interno para a revolução de


outubro

Três circunstâncias de natureza externa determinaram a relativa facilidade


com que a revolução proletária na Rússia conseguiu quebrar as cadeias do impe-
rialismo e, assim, derrubar o domínio da burguesia.
Em primeiro lugar, a circunstância de que a Revolução de Outubro começou
em um período de luta desesperada entre os dois principais grupos imperialis-
tas, o anglo-francês e o austro-alemão; numa época em que, engajados em uma
luta mortal entre si, esses dois grupos não tinham tempo nem meios para de-
dicar atenção séria à luta contra a Revolução de Outubro. Essa circunstância
foi de grande importância para a Revolução de Outubro, pois lhe permitiu tirar
vantagem dos ferozes conflitos dentro do mundo imperialista para fortalecer e
organizar suas próprias forças.
Em segundo lugar, a circunstância de a Revolução de Outubro ter come-
çado durante a guerra imperialista, numa época em que as massas trabalhadoras,
exaustas por conta da guerra e sedentas por paz, pela própria lógica dos fatos
conduzidas à revolução proletária como única saída para a guerra. Essa circuns-
tância foi de extrema importância para a Revolução de Outubro, pois colocou
em suas mãos a poderosa arma da paz, tornou mais fácil vincular a revolução
soviética ao fim da odiada guerra e, assim, criou simpatia em massa por ela tanto
no Ocidente, entre os trabalhadores e no Oriente, entre os povos oprimidos.
Em terceiro lugar, a existência de um poderoso movimento da classe trabalha-
dora na Europa e o fato de que uma crise revolucionária estava amadurecendo
no Ocidente e no Oriente, provocada pela prolongada guerra imperialista. Essa
circunstância foi de importância inestimável para a revolução na Rússia, pois as-
segurou à revolução aliados fiéis fora da Rússia em sua luta contra o imperialismo
mundial.
Mas, além de circunstâncias de natureza externa, havia também uma série de
condições internas favoráveis que facilitaram a vitória da Revolução de Outubro.
Destas condições, as seguintes devem ser consideradas as principais:
Em primeiro lugar, a Revolução de Outubro teve o apoio mais ativo da es-
magadora maioria da classe trabalhadora na Rússia. Em segundo lugar, contou
com o apoio indubitável dos camponeses pobres e da maioria dos soldados, que
tinham sede de paz e de terra. Em terceiro lugar, tinha à sua frente, como força
motriz, um partido experiente e já muitas vezes testado, como o Partido Bolche-
vique, forte não só pela experiência e disciplina adquiridas ao longo dos anos,
mas também por causa das suas vastas ligações com os trabalhadores massas.
272 Obras Escolhidas

Em quarto lugar, a Revolução de Outubro foi confrontada por inimigos com-


parativamente fáceis de superar, como a bastante fraca burguesia russa, uma
classe de proprietários de terras totalmente desmoralizada por “revoltas” campo-
nesas e os partidos comprometedores (os mencheviques e socialistas-revolucio-
nários), que tinha falido completamente durante a guerra. Em quinto lugar,
tinha à sua disposição as vastas extensões do jovem Estado, no qual era capaz
de manobrar livremente, retirar-se quando as circunstâncias o exigissem, des-
frutar de uma trégua, reunir forças, etc. Por último e sexto lugar, em sua luta
contra a contrarrevolução, a Revolução de Outubro poderia contar com recursos
suficientes de alimentos, combustível e matérias-primas dentro do país. A com-
binação dessas circunstâncias externas e internas criou aquela situação peculiar
que determinou a relativa facilidade com que a Revolução de Outubro obteve sua
vitória.
Isso não significa, é claro, que não houvesse características desfavoráveis no
cenário externo e interno da Revolução de Outubro. Pense em uma característica
tão desfavorável como, por exemplo, o isolamento, até certo ponto, da Revolução
de Outubro. A ausência perto dela, ou na fronteira com ela, de um país soviético
no qual pudesse contar para obter apoio. Sem dúvida, a futura revolução, por
exemplo, na Alemanha, estará em uma situação mais favorável a esse respeito,
pois tem nas proximidades um poderoso país soviético como a nossa União So-
viética. Não preciso mencionar uma característica tão desfavorável da Revolução
de Outubro como a ausência de uma maioria proletária no país.
Mas essas características desfavoráveis apenas enfatizam a tremenda impor-
tância das condições peculiares internas e externas da Revolução de Outubro, da
qual falei acima. Essas condições peculiares não devem ser perdidas de vista por
um único momento. Devem ser levadas em conta principalmente ao se analisar
os acontecimentos do outono de 1923 na Alemanha. Acima de tudo, devem ser
lembradas por Trotsky, que traça uma analogia infundada entre a Revolução de
Outubro e a revolução na Alemanha e ataca violentamente o Partido Comunista
Alemão por seus erros reais e alegados.
“Foi fácil para a Rússia”, diz Lenin, “na situação específica e historicamente
muito especial de 1917, começar a revolução socialista, mas será mais difícil para
a Rússia do que para os países europeus continuar a revolução e levá-la adiante.
Tive a oportunidade de assinalar isso já no início de 1918, e nossa experiência
dos últimos dois anos confirmou inteiramente o acerto dessa visão. Condições
tão específicas, como 1) a possibilidade de vincular a revolução soviética com o
fim, como consequência desta revolução, da guerra imperialista, que havia exau-
rido os trabalhadores e camponeses a um grau incrível; 2) a possibilidade de
aproveitar por um certo tempo o conflito mortal entre dois poderosos grupos de
ladrões imperialistas mundiais, que não conseguiram se unir contra seu inimigo
soviético; 5) a possibilidade de resistir a uma guerra civil relativamente longa,
em parte devido ao enorme tamanho do país e aos pobres meios de comunica-
ção; 4) a existência de um movimento revolucionário democrático-burguês tão
profundo entre o campesinato que o partido do proletariado foi capaz de assu-
mir as reivindicações revolucionárias do partido camponês (o Partido Socialista-
Revolucionário, cuja maioria de seus membros eram definitivamente hostis ao
bolchevismo) e realizá-los imediatamente, graças à conquista do poder político
J. V. Stalin 273

pelo proletariado – tais condições específicas não existem na Europa Ocidental


atualmente; e a repetição de tais condições ou semelhantes não virá tão facil-
mente. Isso, aliás, além de uma série de outras causas, é o motivo pelo qual será
mais difícil para a Europa Ocidental iniciar uma revolução socialista do que foi
para nós. (Ver “Esquerdismo, doença infantil do Comunismo” ).
Estas palavras de Lenin não devem ser esquecidas.

II. Duas características específicas da revolução de


outubro – ou outubro e a teoria da revolução
''permanente'' de Trotsky

Existem duas características específicas da Revolução de Outubro que devem


ser compreendidas antes de tudo se quisermos compreender o significado in-
terno e o significado histórico dessa revolução. Quais são essas características?
Em primeiro lugar, o fato de que a ditadura do proletariado nasceu em nosso
país como um poder que surgiu a partir de uma aliança entre o proletariado e as
massas trabalhadoras do campesinato, estas últimas lideradas pelo proletariado.
Em segundo lugar, o fato de que a ditadura do proletariado se estabeleceu em
nosso país como resultado da vitória do socialismo em um país – um país em que
o capitalismo era pouco desenvolvido – enquanto o capitalismo foi preservado
em outros países onde o capitalismo era mais desenvolvido. Isso não significa, é
claro, que a Revolução de Outubro não tenha outras características específicas.
Mas são precisamente essas duas características específicas que são importantes
para nós no momento presente, não apenas porque expressam distintamente a
essência da Revolução de Outubro, mas também porque revelam brilhantemente
a natureza oportunista da teoria da “revolução permanente”.
Vamos examinar brevemente esses recursos.
A questão das massas trabalhadoras da pequena burguesia, tanto urbana como
rural. É muito importante para a revolução proletária a questão de ganhar essas
massas para o lado do proletariado. A questão de quem a população trabalhadora
da cidade e do campo apoiará na luta pelo poder, a burguesia ou o proletariado;
de quem eles se tornarão a base, da burguesia ou do proletariado – disso depende
o destino da revolução e a estabilidade da ditadura do proletariado. As revolu-
ções na França em 1848 e 1871 foram prejudicadas principalmente porque as
bases camponesas mostraram-se do lado da burguesia. A Revolução de Outu-
bro foi vitoriosa porque conseguiu privar a burguesia das suas bases camponesas,
porque conseguiu ganhar essas bases para o lado do proletariado e porque nesta
revolução o proletariado se revelou a única força motriz para as vastas massas do
povo trabalhador da cidade e do campo.
Quem não o compreendeu, jamais compreenderá nem o caráter da Revolução
de Outubro, nem a natureza da ditadura do proletariado, nem as características
específicas da política interna de nosso poder proletário.
A ditadura do proletariado não é simplesmente um estrato superior de um
governo “habilmente” “selecionado” pela mão cuidadosa de um “estrategista ex-
periente” e “judiciosamente contando” com o apoio de um ou outro setor da
274 Obras Escolhidas

população. A ditadura do proletariado é a aliança de classe entre o proletariado


e as massas trabalhadoras do campesinato com o objetivo de derrubar o capital,
para alcançar a vitória final do socialismo, com a condição de que a força motriz
dessa aliança seja o proletariado.
Assim, não se trata de subestimar “ligeiramente” ou superestimar “ligeira-
mente” as potencialidades revolucionárias do movimento camponês, como agora
gostam de exprimir certos advogados diplomáticos da “revolução permanente”.
É uma questão da natureza do novo Estado proletário que surgiu como resultado
da Revolução de Outubro. É uma questão do caráter do poder proletário, dos
fundamentos da própria ditadura do proletariado. “A ditadura do proletariado”,
diz Lenin, “é uma forma especial de aliança de classe entre o proletariado, a van-
guarda do povo trabalhador e as numerosas camadas não proletárias da classe
trabalhadora (a pequena burguesia, os pequenos proprietários, os campesinato,
intelectualidade, etc.), ou a maioria destes; é uma aliança contra o capital, uma
aliança que visa a derrubada completa do capital, a supressão total da resistên-
cia da burguesia e de qualquer tentativa de sua parte. restauração, uma aliança
que visa o estabelecimento final e consolidação do socialismo” (Ver o prefácio do
discurso publicado ‘Sobre enganar as pessoas com slogans sobre liberdade e igualdade’ ).
E mais adiante:
“A ditadura do proletariado, se traduzirmos este termo latino, científico,
histórico-filosófico para uma linguagem mais simples, significa o seguinte: Só
uma classe definida, a saber, os trabalhadores urbanos e de fábrica, os trabalha-
dores industriais em geral, é capaz de liderar toda a massa dos trabalhadores e
explorados na luta pela derrubada do jugo do capital, no processo de derrubada
em si, na luta para manter e consolidar a vitória, no trabalho de criação do novo
sistema social socialista, em toda a luta pela abolição total das classes” (Ver o texto
de Lenin “Um ótimo começo”).
Essa é a teoria da ditadura do proletariado apresentada por Lenin.
Uma das características específicas da Revolução de Outubro é o fato de que
essa revolução representa uma aplicação clássica da teoria de Lenin da ditadura
do proletariado.
Alguns camaradas acreditam que esta teoria é uma teoria puramente “russa”,
aplicável apenas às condições russas. Isso está errado. Isso está absolutamente
errado. Ao falar das massas trabalhadoras das classes não proletárias dirigidas
pelo proletariado, Lenin tem em mente não apenas os camponeses russos, mas
também os trabalhadores das regiões fronteiriças da União Soviética, que até re-
centemente eram colônias da Rússia. Lenin reiterou constantemente que sem
uma aliança com essas massas de outras nacionalidades, o proletariado da Rús-
sia não poderia alcançar a vitória. Em seus artigos sobre a questão nacional e
em seus discursos nos congressos do Comintern, Lenin disse repetidamente que
a vitória da revolução mundial era impossível sem uma aliança revolucionária,
um bloco revolucionário, entre o proletariado dos países avançados e os povos
oprimidos das colônias escravizadas. Mas o que são as colônias senão as massas
trabalhadoras oprimidas e, principalmente, as massas trabalhadoras do campesi-
nato? Quem não sabe que a questão da libertação das colônias é essencialmente
uma questão da libertação das massas trabalhadoras das classes não proletárias
J. V. Stalin 275

da opressão e da exploração do capital financeiro?


Mas daí se segue que a teoria de Lenin sobre a ditadura do proletariado não
é uma teoria puramente “russa”, mas uma teoria que se aplica necessariamente
a todos os países. O bolchevismo não é apenas um fenômeno russo. “Bolche-
vismo”, diz Lenin, é “um modelo de tática para todos” (Ver A Revolução Proletária
e o Renegado Kautsky).
Essas são as características da primeira particularidade da Revolução de Ou-
tubro. Como estão as coisas em relação à teoria da “revolução permanente” de
Trotsky à luz dessa característica específica da Revolução de Outubro?
Não devemos nos alongar muito sobre a posição de Trotsky em 1905, quando
ele “simplesmente” esqueceu tudo sobre o campesinato como força revolucio-
nária e propôs o slogan de “Sem tsar, mas governo dos trabalhadores”, isto é, o
slogan da revolução sem o campesinato. Até Radek, aquele defensor diplomático
da “revolução permanente”, é agora obrigado a admitir que a “revolução perma-
nente” em 1905 significava um “salto no ar” para longe da realidade. Agora,
aparentemente todo mundo admite que não vale mais a pena se preocupar com
esse “salto para o ar”.
Nem devemos nos alongar sobre a posição de Trotsky no período da guerra,
digamos, em 1915, quando, em seu artigo A luta pelo poder, partindo do fato de
que “estamos vivendo na era do imperialismo”, que o imperialismo “não coloca
a nação burguesa em oposição ao antigo regime, mas o proletariado em oposi-
ção à nação burguesa”, ele chegou à conclusão de que o papel revolucionário
do campesinato estava fadado a ceder, que a palavra de ordem do confisco de a
terra não tinha mais a mesma importância de antes. É bem sabido que, naquela
época, Lenin, examinando este artigo de Trotsky, acusou-o de “negar o papel do
campesinato” e disse que “Trotsky está de fato ajudando os políticos trabalhistas
liberais na Rússia que entendem que a “negação do papel do campesinato signi-
fica a recusa em despertar os camponeses para a revolução!” (Ver Duas Linhas da
Revolução).
Em vez disso, passemos às obras posteriores de Trotsky sobre este assunto, às
obras do período em que a ditadura do proletariado já havia se estabelecido e
quando Trotsky teve a oportunidade de testar sua teoria da “revolução perma-
nente” à luz da realidade de eventos concretos e para corrigir seus erros. Tome-
mos o “Prefácio” de Trotsky a seu livro O ano de 1905, escrito em 1922. Aqui está
o que Trotsky diz neste “Prefácio” a respeito da “revolução permanente”:
Foi precisamente durante o intervalo entre 9 de janeiro e a greve de outubro de 1905 que as
ideias sobre o caráter do desenvolvimento revolucionário da Rússia, que veio a ser conhecido
como a teoria da ’revolução permanente’ se cristalizaram na mente do autor. Este termo obs-
curo representava a ideia de que a revolução russa, cujos objetivos imediatos eram burgueses
por natureza, não poderia, no entanto, parar quando esses objetivos foram alcançados. A
revolução não seria capaz de resolver seus problemas burgueses imediatos, exceto colocando
o proletariado no poder. E este último, ao assumir o poder, não poderia se privar aos limites
burgueses da revolução. Pelo contrário, precisamente para garantir sua vitória, a vanguarda
proletária seria forçada, nos estágios iniciais de seu domínio, a fazer incursões profundas
não apenas na propriedade feudal, mas também na propriedade burguesa. Nisto entraria
em colisão hostil não só com todos os agrupamentos burgueses que apoiaram o proletariado
durante as primeiras etapas de sua luta revolucionária, mas também com as amplas massas do
campesinato com cuja assistência chegou ao poder. As contradições na posição de um governo
dos trabalhadores em um país atrasado com uma população predominantemente camponesa
276 Obras Escolhidas

só poderiam ser resolvidas em escala internacional, na arena da revolução proletária mundial.


(itálicos meus. – J. Stalin)

É o que Trotsky diz sobre sua “revolução permanente”.


Basta comparar esta citação com as citações acima das obras de Lenin sobre
a ditadura do proletariado para perceber o grande abismo que separa a teoria
da ditadura do proletariado de Lenin da teoria da “revolução permanente” de
Trotsky. Lenin fala da aliança entre o proletariado e as camadas trabalhadoras do
campesinato como a base da ditadura do proletariado. Trotsky vê uma “colisão
hostil” entre “a vanguarda proletária” e “as grandes massas do campesinato”.
Lenin fala da direção das massas trabalhadoras e exploradas pelo proletari-
ado. Trotsky vê “contradições na posição de um governo operário em um país
atrasado com uma população predominantemente camponesa”.
De acordo com Lenin, a revolução tira sua força principalmente dos trabalha-
dores e camponeses da própria Rússia. De acordo com Trotsky, a força necessária
pode ser encontrada apenas “na arena da revolução proletária mundial”.
Mas e se a revolução mundial estiver destinada a chegar com algum atraso?
Existe algum raio de esperança para nossa revolução? Trotsky não oferece ne-
nhum raio de esperança; pois “as contradições na posição de um governo dos
trabalhadores... só poderiam ser resolvidas... na arena da revolução proletária
mundial”. De acordo com esse plano, resta apenas uma perspectiva para nossa
revolução: vegetar em suas próprias contradições e apodrecer enquanto espera
pela revolução mundial.
Qual é a ditadura do proletariado segundo Lenin?
A ditadura do proletariado é um poder que repousa sobre uma aliança entre
o proletariado e as massas trabalhadoras do campesinato para “a derrubada com-
pleta do capital” e para “o estabelecimento final e consolidação do socialismo”.
Qual é a ditadura do proletariado segundo Trotsky?
A ditadura do proletariado é um poder que entra “em colisão hostil” com “as
grandes massas do campesinato” e busca a solução de suas “contradições” apenas
“na arena da revolução proletária mundial”. Que diferença há entre esta “teoria
da revolução permanente” e a conhecida teoria do menchevismo que repudia o
conceito de ditadura do proletariado? Essencialmente, não há diferença.
Não pode haver dúvida alguma. A “revolução permanente” não é uma mera
subestimação das potencialidades revolucionárias do movimento camponês. A
“revolução permanente” é uma subestimação do movimento camponês que leva
ao repúdio da teoria de Lenin sobre a ditadura do proletariado. A “revolução
permanente” de Trotsky é uma variedade do menchevismo. É assim que as coisas
estão em relação ao primeiro aspecto específico da Revolução de Outubro.
Quais são as características da segunda característica específica da Revolução
de Outubro?
Em seu estudo do imperialismo, especialmente no período da guerra, Lenin
chegou à lei do desenvolvimento desigual, espasmódico, econômico e político
dos países capitalistas. De acordo com esta lei, o desenvolvimento de empresas,
trustes, ramos da indústria e países individuais não ocorre de maneira uniforme
– não de acordo com uma sequência estabelecida, não de forma que um truste,
J. V. Stalin 277

um ramo da indústria ou um país esteja sempre à frente de os outros, enquanto


outros trustes ou países se mantêm consistentemente um atrás do outro – mas
espasmodicamente, com interrupções no desenvolvimento de alguns países e sal-
tos no desenvolvimento de outros. Nessas circunstâncias, o empenho “bastante
legítimo” dos países que desaceleraram para manter suas antigas posições, e o
empenho igualmente “legítimo” dos países que saltaram à frente para tomar no-
vas posições, levam a uma situação em que confrontos armados entre os países
imperialistas tornam-se uma necessidade inescapável. Foi o caso, por exemplo,
da Alemanha, que há meio século era um país atrasado em comparação com a
França e a Grã-Bretanha. O mesmo deve ser dito do Japão em comparação com a
Rússia. É bem sabido, porém, que no início do século XX a Alemanha e o Japão
saltaram tanto à frente que a Alemanha conseguiu ultrapassar a França e come-
çou a pressionar fortemente a Grã-Bretanha no mercado mundial, enquanto o
Japão pressionava a Rússia. Como se sabe, foi dessas contradições que surgiu a
recente guerra imperialista.
Esta lei procede do seguinte:
1) “O capitalismo se tornou um sistema mundial de opressão colonial e de
estrangulamento financeiro da vasta maioria da população do mundo por um
punhado de países avançados’“ (ver Prefácio à edição francesa do Imperialismo de
Lenin);
2) “Este ‘espólio’ é dividido entre dois ou três ladrões mundiais poderosos
armados até os dentes (América, Grã-Bretanha, Japão), que envolvem o mundo
inteiro em sua guerra pela partilha de seu espólio” (Ibid.);
3) O crescimento das contradições dentro do sistema mundial de opressão
financeira e a inevitabilidade dos confrontos armados levam a frente mundial
do imperialismo se tornando facilmente vulnerável à revolução, e a uma brecha
nesta frente em países individuais se tornando provável;
4) Esta ruptura é mais provável de ocorrer naqueles pontos, e naqueles países,
onde a cadeia da frente imperialista é mais fraca, isto é, onde o imperialismo está
menos consolidado e onde é mais fácil para uma revolução se expandir;
5) Em vista disso, a vitória do socialismo em um país, mesmo que esse país seja
menos desenvolvido no sentido capitalista, enquanto o capitalismo permanece
em outros países, mesmo que esses países sejam mais desenvolvidos no sentido
capitalista, é bem possível e provável.
Tais são, resumidamente, os fundamentos da teoria da revolução proletária
de Lenin.
Qual é a segunda característica específica da Revolução de Outubro?
A segunda característica específica da Revolução de Outubro reside no fato
de que esta revolução representa um modelo da aplicação prática da teoria de
Lenin da revolução proletária. Quem não entendeu essa característica específica
da Revolução de Outubro, jamais compreenderá a natureza internacional dessa
revolução, ou seu colossal poder internacional, ou as características específicas
de sua política externa.
“O desenvolvimento econômico e político desigual”, diz Lenin, “é uma lei ab-
soluta do capitalismo. Portanto, a vitória do socialismo é possível primeiro em
278 Obras Escolhidas

vários ou mesmo em um país capitalista tomado separadamente. O proletariado


vitorioso daquele país, tendo expropriado os capitalistas e organizado sua pró-
pria produção socialista, se levantaria contra o resto do mundo, o mundo capi-
talista, atraindo para sua causa as classes oprimidas de outros países, levantando
revoltas nesses países contra os capitalistas, e em caso de necessidade saindo até
com força armada contra as classes exploradoras e seus Estados”. Pois “a união
livre das nações no socialismo é impossível sem uma luta mais ou menos prolon-
gada e obstinada das repúblicas socialistas contra os Estados atrasados (Ver Sobre
o slogan por um Estados Unidos da Europa).
Os oportunistas de todos os países afirmam que a revolução proletária pode
começar – se é que deve começar em qualquer lugar, de acordo com sua teoria
– apenas nos países industrialmente desenvolvidos, e que quanto mais desenvol-
vidos esses países são industrialmente, mais chances existem para a vitória do
socialismo. Além disso, segundo eles, a possibilidade de vitória do socialismo
em um país, e em que o capitalismo é pouco desenvolvido, é excluída como algo
absolutamente improvável. Já no período da guerra, Lenin, tomando por base
a lei do desenvolvimento desigual dos Estados imperialistas, opôs aos oportunis-
tas sua teoria da revolução proletária sobre a vitória do socialismo em um país,
mesmo que esse país é aquele em que o capitalismo é menos desenvolvido.
É bem sabido que a Revolução de Outubro confirmou plenamente a correção
da teoria de Lenin sobre a revolução proletária. Como estão as coisas com a
“revolução permanente” de Trotsky à luz da teoria de Lenin sobre a vitória da
revolução proletária em um país?
Tomemos o panfleto de Trotsky Nossa Revolução (1906). Trotsky escreve:
“Sem o apoio estatal direto do proletariado europeu, a classe trabalhadora da
Rússia não será capaz de se manter no poder e transformar seu governo tempo-
rário em uma ditadura socialista duradoura. Não podemos duvidar disso por
um instante”.
O que essa citação significa? Isso significa que a vitória do socialismo em um
país, neste caso a Rússia, é impossível “sem o apoio estatal direto do proletariado
europeu”, isto é, antes que o proletariado europeu tenha conquistado o poder.
O que há de comum entre essa “teoria” e a tese de Lenin sobre a possibilidade
da vitória do socialismo “em um país capitalista separadamente”?
Claramente, não há nada em comum.
Mas vamos supor que o panfleto de Trotsky, que foi publicado em 1906, numa
época em que era difícil determinar o caráter de nossa revolução, contenha erros
inadvertidos e não corresponda totalmente às visões de Trotsky em um período
posterior. Vamos examinar outro panfleto escrito por Trotsky, seu Programa de
Paz, que apareceu antes da Revolução de Outubro de 1917 e agora (1924) foi re-
publicado em seu livro O ano de 1917. Nesse panfleto, Trotsky critica a teoria de
Lenin da revolução proletária sobre a vitória do socialismo em um país e opõe-se
a ele a palavra de ordem dos Estados Unidos da Europa. Ele afirma que a vitória
do socialismo em um país é impossível, que a vitória do socialismo só é possível
como a vitória de vários dos principais países da Europa (Grã-Bretanha, Rússia,
Alemanha), que se combinam em um Estados Unidos da Europa; caso contrário,
não é possível. Ele diz claramente que “uma revolução vitoriosa na Rússia ou
J. V. Stalin 279

na Grã-Bretanha é inconcebível sem uma revolução na Alemanha e vice-versa”.


“O único argumento histórico mais ou menos concreto”, diz Trotsky, “que avan-
çou contra a palavra de ordem dos Estados Unidos da Europa foi formulado no
Sotsial-Demokrat suíço (na época o órgão central dos bolcheviques) em a seguinte
frase: ‘O desenvolvimento econômico e político desigual é uma lei absoluta do
capitalismo’. Disto o Sotsial-Demokrat chega à conclusão de que a vitória do socia-
lismo é possível em um país e que, portanto, não há razão para tornar a ditadura
do proletariado em cada país dependente do estabelecimento dos Estados Uni-
dos da Europa. O argumento de que o desenvolvimento capitalista em diferentes
países é desigual é absolutamente incontestável. Mas essa desigualdade é em si
extremamente desigual. O nível capitalista da Grã-Bretanha, Áustria, Alemanha
ou França não é idêntico. Mas em comparação com a África e a Ásia, todos es-
ses países representam a Europa capitalista, que está madura para a revolução
social. Que nenhum país em sua luta deve “esperar” pelos outros, é um pensa-
mento elementar que é útil e necessário reiterar, a fim de que a ideia de uma
ação internacional simultânea não seja substituída pela ideia de contemporizar a
inação internacional. Sem esperar pelos outros, iniciamos e continuamos a luta
nacional, em plena luta confiança de que nossa iniciativa impulsionará a luta em
outros países; mas se isso não acontecesse, seria inútil pensar – como a experiên-
cia histórica e as considerações teóricas testemunham – que, por exemplo, uma
Rússia revolucionária poderia resistir a uma Europa conservadora, ou que uma
Alemanha socialista poderia existir isoladamente em um mundo capitalista”.
Como vê, temos diante de nós a mesma teoria da vitória simultânea do so-
cialismo nos principais países da Europa que, via de regra, exclui a teoria da
revolução de Lenin sobre a vitória do socialismo em um país.
Nem é preciso dizer que para a vitória total do socialismo, para uma garantia
total contra a restauração da velha ordem, são necessários os esforços conjuntos
dos proletários de vários países. Escusado será dizer que, sem o apoio dado à
nossa revolução pelo proletariado da Europa, o proletariado da Rússia não po-
deria ter resistido à investida geral, assim como sem o apoio dado pela revolução
na Rússia ao movimento revolucionário no Oeste, este último não poderia ter se
desenvolvido no ritmo em que começou a se desenvolver desde o estabelecimento
da ditadura do proletariado na Rússia. Nem é preciso dizer que precisamos de
apoio. Mas o que significa o apoio à nossa revolução pelo proletariado da Europa
Ocidental? Não é a simpatia dos trabalhadores europeus pela nossa revolução,
a sua disponibilidade para frustrar os planos de intervenção dos imperialistas –
não é todo este apoio, uma ajuda real? Inquestionavelmente, é. Sem esse apoio,
sem essa ajuda, não só dos trabalhadores europeus, mas também dos países colo-
niais e dependentes, a ditadura do proletariado na Rússia teria sido duramente
pressionada. Até agora, essa simpatia e essa assistência, juntamente com o poder
de nosso Exército Vermelho e a prontidão dos trabalhadores e camponeses da
Rússia para defender sua pátria socialista até o fim, tudo isso tem sido suficiente
para repelir os ataques do imperialistas e para nos ganhar as condições necessá-
rias para o trabalho sério de construção? Sim, foi suficiente. Essa simpatia está
ficando mais forte ou está diminuindo? Inquestionavelmente, está ficando mais
forte. Temos, pois, condições favoráveis, não só para avançar na organização da
economia socialista, mas também, por nossa vez, para apoiar os trabalhadores
280 Obras Escolhidas

da Europa Ocidental e os povos oprimidos do Oriente? Sim, nós temos. Isso é


eloquentemente provado pelos sete anos de história da ditadura do proletariado
na Rússia. Pode-se negar que uma poderosa onda de entusiasmo trabalhista já
surgiu em nosso país? Não, não pode ser negado.
Depois de tudo isso, o que significa a afirmação de Trotsky de que uma Rússia
revolucionária não poderia resistir em face de uma Europa conservadora?
Só pode significar isso: em primeiro lugar, que Trotsky não aprecia a força
inerente de nossa revolução; em segundo lugar, que Trotsky não compreende
a importância inestimável do apoio moral que é dado à nossa revolução pelos
trabalhadores do Ocidente e pelos camponeses do Oriente; terceiro, que Trotsky
não percebe a enfermidade interna que está consumindo o imperialismo hoje.
Levado pela crítica à teoria de Lenin sobre a revolução proletária, Trotsky,
sem querer, desferiu um golpe violento em seu panfleto Programa de Paz, publi-
cado em 1917 e republicado em 1924. Mas talvez este panfleto também tenha
ficado desatualizado e tenha deixado, por uma razão ou outra, de corresponder
às visões atuais de Trotsky? Tomemos suas últimas obras, escritas após a vitória
da revolução proletária em um país, na Rússia. Tomemos, por exemplo, o “Pós-
escrito” de Trotsky, de 1922, para a nova edição de seu panfleto Programa pela
Paz. Aqui está o que ele diz:
A afirmação reiterada várias vezes no Programa de Paz de que uma revolução proletária não
pode culminar vitoriosamente dentro dos limites nacionais pode talvez parecer a alguns leito-
res ter sido refutada pela experiência de quase cinco anos de nossa República Soviética. Mas
tal conclusão seria injustificada. O fato de o Estado operário ter resistido contra o mundo
inteiro em um país, e um país atrasado testemunha o poder colossal do proletariado, mais do
que em outros países mais avançados e mais civilizados. Mas, embora tenhamos nos mantido
firme como um Estado política e militarmente, não chegamos, nem mesmo começamos a
chegar, à criação de uma sociedade socialista... Enquanto a burguesia permanecer no po-
der nos outros países europeus países seremos obrigados, em nossa luta contra o isolamento
econômico, a buscar acordos com o mundo capitalista; ao mesmo tempo, pode-se dizer com
certeza que estes acordos podem, na melhor das hipóteses, nos ajudar a mitigar alguns de
nossos males econômicos, a dar um ou outro passo à frente, mas o progresso real de uma
economia socialista na Rússia só será possível após a vitória do proletariado nos principais
países europeus (meus itálicos – J. Stalin).

Assim fala Trotsky, claramente pecando contra a realidade e tentando obsti-


nadamente salvar sua “revolução permanente” do naufrágio final.
Parece, então, que, dando quantas voltas quiser, não apenas “não chegamos”,
mas “nem mesmo começamos a chegar” à criação de uma sociedade socialista. Pa-
rece que algumas pessoas têm esperado por “acordos com o mundo capitalista”,
mas também parece que nada sairá desses acordos; pois, dando quantas voltas
quiser, “o verdadeiro progresso de uma economia socialista” não será possível
até que o proletariado tenha sido vitorioso nos “principais países europeus”.
Pois bem, como ainda não há vitória no Ocidente, a única “escolha” que resta
para a revolução na Rússia é: apodrecer ou degenerar em um Estado burguês.
Não é por acaso que Trotsky fala há dois anos sobre a “degeneração” do nosso
Partido.
Não é por acaso que no ano passado Trotsky profetizou a “desgraça” de nosso
país. Como esta estranha “teoria” pode ser reconciliada com a teoria de Lenin
da “vitória do socialismo em um país”? Como esta estranha “perspectiva” pode
J. V. Stalin 281

ser reconciliada com a visão de Lenin de que a NEP nos permitirá “construir as
bases da economia socialista”? Como conciliar essa desesperança “permanente”,
por exemplo, com as seguintes palavras de Lenin:
O socialismo não é mais uma questão de futuro distante, ou uma imagem abstrata, ou um
ícone. Ainda mantemos nossa velha má opinião sobre os ícones. Arrastamos o socialismo
para a vida cotidiana e aqui devemos encontrar nosso caminho. Este é a tarefa de nossos
dias, tarefa de nossa época. Permitam-me concluir expressando a convicção de que, por mais
difícil que seja esta tarefa, por mais nova que seja em comparação com a anterior, e por mais
dificuldades que possa acarretar, nós devemos todos – não em um dia, mas no curso de vários
anos – todos nós juntos cumprir o que quer que aconteça para que a NEP Rússia se torne a
Rússia socialista. (Ver o Discurso em uma sessão plenária do Soviete de Moscou).

Como essa melancolia “permanente” de Trotsky pode ser reconciliada, por


exemplo, com as seguintes palavras de Lenin:
Na verdade, o poder do Estado sobre todos os meios de produção de grande escala, o poder
do Estado nas mãos do proletariado, a aliança deste proletariado com os muitos milhões de
pequenos e muito pequenos camponeses, a direção assegurada do campesinato por o prole-
tariado, etc. – não é tudo o que é necessário para a construção de uma sociedade socialista
completa a partir das cooperativas, apenas das cooperativas, que antes considerávamos vi-
garistas e que, de certo modo, temos direito desprezar como tal agora, sob a NEP? Não é
tudo o que é necessário para construir uma sociedade socialista completa? Isso ainda não
é a construção da sociedade socialista, mas é tudo o que é necessário e suficiente para essa
construção. (Ver Sobre a Cooperação).

É claro que essas duas visões são incompatíveis e não podem ser reconciliadas
de forma alguma. A “revolução permanente” de Trotsky é o repúdio à teoria da
revolução proletária de Lenin e, inversamente, a teoria da revolução proletária
de Lenin é o repúdio da teoria da “revolução permanente”.
Falta de fé na força e nas capacidades de nossa revolução, falta de fé na força
e capacidade do proletariado russo – é isso que está na raiz da teoria da “revolu-
ção permanente”. Até agora, apenas um aspecto da teoria da “revolução perma-
nente” foi geralmente observado, a falta de fé nas potencialidades revolucionárias
do movimento camponês. Agora, para ser justo, isso deve ser complementado
por outro aspecto – a falta de fé na força e na capacidade do proletariado na
Rússia.
Que diferença há entre a teoria de Trotsky e a teoria menchevique comum de
que a vitória do socialismo em um país, e ainda em um país atrasado, é impossível
sem a vitória preliminar da revolução proletária “nos principais países da Europa
Ocidental”? Essencialmente, não há diferença.
Não pode haver dúvida alguma. A teoria da “revolução permanente” de
Trotsky é uma variedade do menchevismo.
Recentemente, diplomatas podres têm aparecido em nossa imprensa para ten-
tar difundir a teoria da “revolução permanente” como algo compatível com o le-
ninismo. Claro, dizem eles, essa teoria provou ser inútil em 1905; mas o erro que
Trotsky cometeu foi que ele correu muito à frente naquela época, na tentativa
de aplicar à situação de 1905 o que não poderia ser aplicado. Mas mais tarde,
dizem eles, em outubro de 1917, por exemplo, quando a revolução teve tempo de
amadurecer completamente, a teoria de Trotsky mostrou-se bastante apropriada.
Não é difícil adivinhar que o chefe desses diplomatas é Radek. Aqui, por favor,
está o que ele diz:
282 Obras Escolhidas

A guerra criou um abismo entre o campesinato, que lutava por conquistar a terra e a paz,
e os partidos pequeno-burgueses; a guerra colocou o campesinato sob a liderança da classe
trabalhadora e de sua vanguarda, o Partido Bolchevique. Isso tornou possível, não a ditadura
da classe trabalhadora e do campesinato, mas a ditadura da classe trabalhadora baseada no
campesinato. O que Rosa Luxemburgo e Trotsky avançaram contra Lenin em 1905 (ou seja,
“revolução permanente” – J. Stalin) provou, por um lado, na verdade, para ser a segunda fase
do desenvolvimento histórico.

Aqui, cada afirmação é uma distorção.


Não é verdade que a guerra “tornou possível não a ditadura da classe traba-
lhadora e do campesinato, mas a ditadura da classe trabalhadora contando com o
campesinato”. Na verdade, a Revolução de fevereiro de 1917 foi a materialização
da ditadura do proletariado e do campesinato, entrelaçada de maneira peculiar
com a ditadura da burguesia.
Não é verdade que a teoria da “revolução permanente”, que Radek timida-
mente se abstém de mencionar, tenha sido proposta em 1905 por Rosa Luxem-
burgo e Trotsky. Na verdade, essa teoria foi avançada por Parvus e Trotsky.
Agora, dez meses depois, Radek se corrige e considera necessário castigar Parvus
pela teoria da “revolução permanente”. Mas com toda a justiça, Radek também
deveria castigar Trotsky, o parceiro de Parvus.
Não é verdade que a teoria da “revolução permanente”, deixada de lado pela
Revolução de 1905, tenha se mostrado correta na “segunda etapa do desenvolvi-
mento histórico”, isto é, durante a Revolução de Outubro. Todo o curso da Revo-
lução de Outubro, todo o seu desenvolvimento, demonstrou e provou a falência
total da teoria da “revolução permanente” e sua incompatibilidade absoluta com
os fundamentos do leninismo. Discursos melosos e diplomacia podre não podem
esconder o enorme abismo que existe entre a teoria da “revolução permanente”
e o leninismo.

III. Certas características específicas das táticas


dos bolcheviques durante o período de preparação
para outubro

A fim de compreender as táticas seguidas pelos bolcheviques durante o pe-


ríodo de preparação para outubro, devemos ter uma ideia clara de pelo menos
algumas das características particularmente importantes dessas táticas. Isso é
necessário já que em numerosos panfletos sobre a tática dos bolcheviques esses
aspectos, precisamente, são frequentemente esquecidos.
Quais são esses recursos?
Primeira característica específica. Se alguém ouvisse Trotsky, pensaria que houve
apenas dois períodos na história da preparação para outubro: o período do re-
conhecimento e o período da revolta, e que tudo o mais vem do maligno. Qual
foi a demonstração de abril de 1917? “A manifestação de abril, que foi mais para
a ’esquerda’ do que deveria, foi uma surtida de reconhecimento com o propó-
sito de sondar a disposição das massas e as relações entre elas e a maioria nos
sovietes”. E qual foi a demonstração de julho de 1917? Na opinião de Trotsky,
“este também foi de fato outro – mais amplo – reconhecimento de uma fase nova
J. V. Stalin 283

e superior do movimento”. Desnecessário dizer que a manifestação de junho de


1917, organizada a pedido de nosso Partido, deveria, segundo a ideia de Trotsky,
ser ainda mais chamada de “reconhecimento”.
Isso parece implicar que já em março de 1917 os bolcheviques tinham um
exército político de operários e camponeses pronto e que, se não acionassem
esse exército para um levante em abril, ou em junho, ou em julho, mas engajados
meramente no “reconhecimento”, foi porque, e apenas porque, “as informações
obtidas no reconhecimento” na altura eram desfavoráveis.
É desnecessário dizer que essa noção simplificada da tática política de nosso
Partido nada mais é do que uma confusão das táticas militares comuns com as
táticas revolucionárias dos bolcheviques. Na verdade, todas essas manifestações
foram principalmente o resultado da pressão espontânea das massas, o resultado
do fato de que a indignação das massas contra a guerra havia transbordado e
procurado uma saída nas ruas. A tarefa do Partido naquela época era moldar
e guiar as manifestações espontâneas das massas ao longo da linha dos slogans
revolucionários dos bolcheviques.
Os bolcheviques não tinham um exército político pronto em março de 1917,
nem poderiam ter. Os bolcheviques construíram esse exército (e finalmente o
formaram em outubro de 1917) apenas no decorrer da luta e dos conflitos de
classes entre abril e outubro de 1917, através da manifestação de abril, as ma-
nifestações de junho e julho, as eleições para o distrito e a cidade de Dumas, a
luta contra a revolta Kornilov e a conquista dos sovietes. Um exército político
não é como um exército militar. Um comando militar começa uma guerra com
um exército pronto, ao passo que o Partido deve criar seu exército no curso da
própria luta, no curso dos conflitos de classe, à medida que as próprias massas
se convencem, por sua própria experiência, da correção de os slogans e a política
do Partido.
Claro, cada demonstração ao mesmo tempo lançava uma certa quantidade
de luz sobre as inter-relações ocultas das forças envolvidas, fornecia certas infor-
mações de reconhecimento, mas esse reconhecimento não era o motivo para a
demonstração, mas seu resultado natural.
Ao analisar os acontecimentos que antecederam o levante de outubro e compará-
los com os acontecimentos que marcaram o período de abril a julho, Lenin
afirma:
A situação agora não é mais o que era antes de 20-21 de abril, 9 de junho, 3 de julho; pois
então havia uma excitação espontânea que nós, como um partido, ou não percebemos (20 de
abril) ou tentamos conter e formamos uma manifestação pacífica (9 de junho e 3 de julho).
Pois naquela época tínhamos plena consciência de que os sovietes ainda não eram nossos, que
os camponeses ainda confiavam no curso Lieber-Dan-Chernov e não no curso bolchevique
(levante), e que, consequentemente, não poderíamos ter a maioria do povo atrás de nós e,
portanto, um levante foi prematuro (Ver Carta aos Camaradas).

É claro que o “reconhecimento” por si só não leva muito longe. Obviamente,


não se tratava de “reconhecimento”, mas do seguinte:
1) durante todo o período de preparação para outubro, o Partido invariavel-
mente confiou em sua luta no surgimento espontâneo do movimento revolucio-
nário de massas;
2) enquanto confiava no surgimento espontâneo, manteve sua própria lide-
284 Obras Escolhidas

rança indivisa do movimento;


3) essa liderança do movimento ajudou a formar o exército político de massas
para o levante de outubro;
4) essa política estava fadada a resultar em toda a preparação para outubro
sob a liderança de um partido, o Partido Bolchevique;
5) essa preparação para outubro, por sua vez, fez com que, como resultado da
revolta de outubro, o poder se concentrasse nas mãos de um partido, o Partido
Bolchevique.
Assim, a direção indivisa de um partido, o Partido Comunista, como principal
fator de preparação para outubro – tal é o traço característico da Revolução de
Outubro, tal é o primeiro traço específico da tática dos bolcheviques no período
de preparação para outubro. Nem é preciso provar que, sem essa característica
da tática bolchevique, a vitória da ditadura do proletariado nas condições do
imperialismo teria sido impossível.
Nisso, a Revolução de Outubro difere favoravelmente da revolução de 1871
na França, onde a direção foi dividida entre dois partidos, nenhum dos quais
poderia ser chamado de Partido Comunista.
Segunda característica específica. A preparação para outubro procedeu assim
sob a liderança de um partido, o Partido Bolchevique. Mas como o Partido exer-
ceu essa liderança, em que linha foi esta última? Essa direção procedeu na linha
de isolar os partidos comprometedores, como os grupos mais perigosos no pe-
ríodo da eclosão da revolução, a linha de isolar os socialistas-revolucionários e os
mencheviques.
Qual é a regra estratégica fundamental do leninismo?
É o reconhecimento do seguinte:
1) os partidos comprometedores são o apoio social mais perigoso dos inimi-
gos da revolução no período da eclosão revolucionária que se aproxima; 2) é
impossível derrubar o inimigo (tsarismo ou burguesia) a menos que esses par-
tidos estejam isolados; 3) as principais armas no período de preparação para a
revolução devem, portanto, ser dirigidas para isolar esses partidos, para afastar
deles as amplas massas trabalhadoras.
No período da luta contra o tsarismo, no período de preparação para a revolu-
ção democrático-burguesa (1905-1916), o apoio social mais perigoso do tsarismo
era o partido monarquista liberal, o Partido dos Cadetes. Por quê? Porque foi o
partido comprometedor, o partido do compromisso entre o tsarismo e a maioria
do povo, ou seja, o campesinato como um todo. Naturalmente, o Partido naquela
época dirigiu seus principais golpes contra os cadetes, pois, a menos que os ca-
detes estivessem isolados, não haveria esperança de ruptura entre o campesinato
e o tsarismo e, a menos que essa ruptura fosse garantida, não haveria esperança
de vitória do a revolução. Muitas pessoas naquela época não entenderam esta
característica específica da estratégia bolchevique e acusaram os bolcheviques de
excessiva “cadetofobia”; eles afirmaram que com os bolcheviques a luta contra os
cadetes “obscureceu” a luta contra o principal inimigo – o tsarismo. Mas essas
acusações, para as quais não havia justificativa, revelavam um fracasso total na
compreensão da estratégia bolchevique, que clamava pelo isolamento do partido
J. V. Stalin 285

comprometedor para facilitar e apressar a vitória sobre o principal inimigo.


Nem é preciso provar que sem essa estratégia a hegemonia do proletariado na
revolução democrático-burguesa teria sido impossível.
No período de preparação para outubro, o centro de gravidade das forças
conflitantes mudou para outro plano. O tsar se foi. O Partido Cadete havia se
transformado de uma força comprometedora em uma força governante, na força
dominante do imperialismo. Agora a luta não era mais entre o tsarismo e o povo,
mas entre a burguesia e o proletariado. Neste período, os partidos democráticos
pequeno-burgueses, os partidos dos Socialistas-Revolucionários e dos Menchevi-
ques, eram o apoio social mais perigoso do imperialismo. Por quê? Porque esses
partidos eram então os partidos comprometedores, os partidos de compromisso
entre o imperialismo e as massas trabalhadoras. Naturalmente, os bolcheviques
da época dirigiram seus principais golpes contra esses partidos; pois, a menos
que esses partidos estivessem isolados, não poderia haver esperança de uma rup-
tura entre as massas trabalhadoras e o imperialismo, e a menos que essa rup-
tura fosse assegurada, não haveria esperança de vitória da revolução soviética.
Muitas pessoas naquela época não entenderam esta característica específica das
táticas bolcheviques e acusaram os bolcheviques de mostrar “ódio excessivo” aos
socialistas-revolucionários e mencheviques e de “esquecerem” o objetivo princi-
pal. Mas todo o período de preparação para outubro atesta com eloquência o
fato de que somente perseguindo essas táticas os bolcheviques poderiam garantir
a vitória da Revolução de Outubro.
O traço característico deste período foi a continuação da revolução das massas
trabalhadoras do campesinato, sua desilusão com os socialistas-revolucionários e
mencheviques, sua deserção desses partidos, sua virada para se unir diretamente
ao proletariado como a única força revolucionária consistente, capaz de liderar o
país para a paz. A história deste período é a história da luta entre os socialistas-
revolucionários e os mencheviques, de um lado, e os bolcheviques, de outro, pelas
massas trabalhadoras do campesinato, pela conquista dessas massas. O resultado
desta luta foi decidido pelo período da coalizão, o período Kerensky. Pela re-
cusa dos socialistas-revolucionários e mencheviques em confiscar as terras dos
latifundiários, a luta dos socialistas-revolucionários e mencheviques para conti-
nuar a guerra, a ofensiva de junho em na frente, a introdução da pena capital
para os soldados, a revolta Kornilov. E eles decidiram a questão desta luta intei-
ramente a favor da estratégia bolchevique; pois se os socialistas-revolucionários
e os mencheviques não tivessem sido isolados, teria sido impossível derrubar o
governo dos imperialistas, e se este governo não tivesse sido derrubado, teria sido
impossível escapar da guerra. A política de isolar os socialistas-revolucionários e
os mencheviques revelou-se a única correta.
Assim, o isolamento dos partidos menchevique e socialista-revolucionário como
a linha principal na direção dos preparativos para outubro – tal foi a segunda ca-
racterística específica da tática dos bolcheviques.
Nem é preciso provar que, sem essa característica da tática dos bolcheviques,
a aliança da classe trabalhadora e das massas trabalhadoras do campesinato teria
ficado no ar. É característico que, em suas Lições de Outubro, Trotsky nada diga,
ou quase nada, sobre essa característica específica da tática bolchevique.
286 Obras Escolhidas

Terceiro recurso específico. Assim, o Partido, ao dirigir os preparativos para ou-


tubro, perseguiu a linha de isolar os partidos Socialista-Revolucionário e Men-
chevique, de afastar deles as amplas massas operárias e camponesas. Mas como,
concretamente, este isolamento foi efetuado pelo Partido – de que forma, sob
que slogan? Foi efetivada na forma de movimento revolucionário de massas pelo
poder dos sovietes, sob o lema “Todo poder aos sovietes!”, por meio da luta para
converter os sovietes de órgãos de mobilização das massas em órgãos do levante,
em órgãos de poder, no aparato de um novo poder estatal proletário.
Por que foram precisamente os sovietes que os bolcheviques tomaram como a
principal alavanca organizacional que poderia facilitar a tarefa de isolar os men-
cheviques e socialistas-revolucionários, que era capaz de fazer avançar a causa da
revolução proletária, e que estava destinada a liderar milhões das massas traba-
lhadoras à vitória da ditadura do proletariado? O que são os sovietes? Lenin nos
responde em setembro de 1917:
Os sovietes são um novo aparato de Estado, que, em primeiro lugar, fornece uma força ar-
mada de trabalhadores e camponeses; e essa força não está divorciada do povo, como era o
antigo exército permanente, mas está mais intimamente ligado ao povo. Do ponto de vista
militar, esta força é incomparavelmente mais poderosa do que as forças anteriores; do ponto
de vista revolucionário, não pode ser substituída por outra coisa. Em segundo lugar, este
aparelho fornece um vínculo com as massas, com a maioria do povo, tão íntimas, tão indis-
solúveis, tão prontamente controláveis e renováveis, que não havia nada nem remotamente
parecido no aparelho de Estado anterior. Em terceiro lugar, este aparelho, em virtude do
fato de seu pessoal ser eleito e sujeito a relocação à vontade do povo sem quaisquer formali-
dades burocráticas, é muito mais democrático do que qualquer aparelho anterior. Em quarto
lugar, permite um contato estreito com as mais diversas profissões, facilitando assim o anún-
cio opção das mais variadas e profundas reformas sem burocracia. Em quinto lugar, fornece
uma forma de organização da vanguarda, ou seja, da seção mais politicamente consciente,
mais enérgica e mais progressista das classes oprimidas, os trabalhadores e camponeses, e
constitui assim um aparelho por meio do qual a vanguarda dos oprimidos as classes podem
elevar, treinar, educar e conduzir toda a vasta massa dessas classes, que até agora estiveram
bem distantes da vida política, da história. Em sexto lugar, permite conjugar as vantagens
do parlamentarismo com as vantagens da democracia imediata e direta, ou seja, unir nas pes-
soas dos representantes eleitos do povo as funções legislativa e executiva. Comparado com
o parlamentarismo burguês, isso representa um avanço no desenvolvimento da democracia
que tem um significado histórico mundial. Não tivesse o espírito criativo das classes revolu-
cionárias do povo dado origem aos sovietes, a revolução proletária na Rússia seria um caso
perdido; pois o proletariado, sem dúvida, não poderia manter o poder com o velho aparelho
de Estado, e é impossível criar um novo aparelho imediatamente.

É por isso que os bolcheviques se apoderaram dos sovietes como o principal


elo organizacional que poderia facilitar a tarefa de organizar a Revolução de Ou-
tubro e a criação de um novo e poderoso aparato do poder do Estado proletário.
Do ponto de vista de seu desenvolvimento interno, o slogan “Todo poder aos
sovietes!” passou por duas etapas: a primeira (até a derrota dos bolcheviques em
julho, durante o período de dualidade do poder), e a segunda (após a derrota da
revolta Kornilov).
Durante a primeira fase, este slogan significava quebrar o bloco dos menche-
viques e socialistas-revolucionários com os cadetes, a formação de um governo so-
viético constituído por mencheviques e socialistas-revolucionários (pois naquela
época os sovietes eram socialistas-revolucionários e mencheviques), o direito de
livre agitação para a oposição (isto é, para os bolcheviques), e a livre luta dos
partidos dentro dos sovietes, na expectativa de que por meio de tal luta os bol-
J. V. Stalin 287

cheviques conseguiriam capturar os sovietes e mudar a composição do Governo


Soviético no curso de um desenvolvimento pacífico da revolução. Este plano, é
claro, não significava a ditadura do proletariado. Mas sem dúvida facilitou a pre-
paração das condições necessárias para garantir a ditadura; pois, ao colocar os
mencheviques e socialistas-revolucionários no poder e obrigá-los a pôr em prática
sua plataforma antirrevolucionária, apressou a exposição da verdadeira natureza
desses partidos, acelerou seu isolamento, seu divórcio das massas. A derrota dos
bolcheviques em julho, no entanto, interrompeu esse desenvolvimento, pois deu
preponderância à contrarrevolução de generais e cadetes e atirou os socialistas-
revolucionários e os mencheviques nos braços dessa contrarrevolução. Isso obri-
gou o Partido a retirar temporariamente o slogan “Todo o poder aos sovietes!”,
apenas para apresentá-lo novamente nas condições de um novo surto revolucio-
nário.
A derrota da revolta Kornilov deu início à segunda fase. O slogan “Todo o
poder aos sovietes!” tornou-se novamente o slogan imediato. Mas agora esse slo-
gan tinha um significado diferente daquele do primeiro estágio. Seu conteúdo
mudou radicalmente. Agora, esse slogan significava uma ruptura completa com
o imperialismo e a passagem do poder aos bolcheviques, pois a maioria dos so-
viéticos já era bolchevique. Ora, esta palavra de ordem significa a abordagem
direta da revolução à ditadura do proletariado por meio de uma revolta. Mais
do que isso, esta palavra de ordem passou a significar a organização da ditadura
do proletariado e dar-lhe uma forma de Estado.
O significado inestimável das táticas de transformar os sovietes em órgãos do
poder do Estado reside no fato de que eles fizeram com que milhões de traba-
lhadores rompessem com o imperialismo, expuseram os partidos menchevique
e socialista-revolucionários como ferramentas do imperialismo e trouxeram as
massas por um caminho direto, por assim dizer, para a ditadura do proletariado.
Assim, a política de transformação dos sovietes em órgãos do poder do Estado,
como condição mais importante para isolar os partidos comprometedores e para
a vitória da ditadura do proletariado – tal é a terceira especificidade da tática dos
bolcheviques no período de preparação para outubro.
Quarta característica específica. O quadro não estaria completo se não abor-
dássemos a questão de como e por que os bolcheviques foram capazes de trans-
formar seus slogans do Partido em slogans para as grandes massas, em slogans
que impulsionaram a revolução; como e por que eles conseguiram convencer não
apenas a vanguarda, e não apenas a maioria da classe trabalhadora, mas também
a maioria do povo, da correção de sua política.
A questão é que para a vitória da revolução, se é realmente uma revolução
popular que abraça as massas aos milhões, só os slogans corretos do partido não
são suficientes. Para a vitória da revolução é necessária mais uma condição ne-
cessária, a saber, que as próprias massas sejam convencidas, por sua própria ex-
periência, da correção desses slogans. Só então os slogans do Partido se tornam
os slogans das próprias massas. Só então a revolução se torna realmente uma re-
volução popular. Uma das características específicas da tática dos bolcheviques
no período de preparação para outubro foi que eles determinaram corretamente
os caminhos e as voltas que conduziriam naturalmente as massas aos slogans do
288 Obras Escolhidas

Partido – ao próprio limiar da revolução, por assim dizer – ajudando-os assim a


sentir, a testar, a perceber por sua própria experiência a correção desses slogans.
Em outras palavras, uma das características específicas da tática dos bolcheviques
é que eles não confundem a direção do Partido com a direção das massas; que
eles veem claramente a diferença entre o primeiro tipo de liderança e o segundo;
que eles, portanto, representam a ciência, não só da direção do Partido, mas da
direção das vastas massas da classe trabalhadora.
Um exemplo da manifestação dessa característica da tática bolchevique foi
fornecido pela experiência de convocar e dispersar a Assembleia Constituinte.
É bem sabido que os bolcheviques propunham a palavra de ordem de uma
República dos sovietes já em abril de 1917. É sabido que a Assembleia Consti-
tuinte era um parlamento burguês, fundamentalmente oposto aos princípios de
uma República dos sovietes. Como é que os bolcheviques, que avançavam para a
República dos sovietes, exigiam ao mesmo tempo que o Governo Provisório con-
vocasse imediatamente a Assembleia Constituinte? Como é que os bolcheviques
não só participaram nas eleições, mas eles próprios convocaram a Assembleia
Constituinte? Como pôde acontecer que um mês antes do levante, na transição
do antigo para o novo, os bolcheviques considerassem possível uma combina-
ção temporária da República dos sovietes com a Assembleia Constituinte? Isso
“aconteceu” porque:
1) a ideia de uma Assembleia Constituinte era uma das ideias mais populares
entre as amplas massas da população;
2) o slogan da convocação imediata da Assembleia Constituinte ajudou a ex-
por o caráter contrarrevolucionário do Governo Provisório;
3) para desacreditar a ideia de uma Assembleia Constituinte aos olhos das
massas, era necessário conduzir as massas às paredes da Assembleia Constituinte
com suas reivindicações de terra, de paz, de poder dos sovietes, assim colocá-los
frente a frente com a atual Assembleia Constituinte ao vivo;
4) só isso poderia ajudar as massas a se convencerem, por meio de sua própria
experiência, da natureza contrarrevolucionária da Assembleia Constituinte e da
necessidade de dispersá-la;
5) tudo isto pressupunha naturalmente a possibilidade de uma combinação
temporária da República dos sovietes com a Assembleia Constituinte, como um
dos meios para a eliminação da Assembleia Constituinte;
6) tal combinação, se realizada sob a condição de que todo o poder fosse
transferido para os sovietes, só poderia significar a subordinação da Assembleia
Constituinte aos sovietes, sua conversão em apêndice dos sovietes, sua extinção
indolor.
Nem é preciso provar que, se os bolcheviques não tivessem adotado tal política,
a dispersão da Assembleia Constituinte não teria ocorrido tão suavemente e as
ações subsequentes dos socialistas-revolucionários e dos mencheviques sob o lema
“Todo o poder à Assembleia Constituinte!” não teria falhado tão notavelmente.
“Participamos”, diz Lenin, “das eleições para o parlamento burguês russo,
a Assembleia Constituinte, em setembro-novembro de 1917. Nossas táticas fo-
ram corretas ou não? Nós, os bolcheviques russos, não tínhamos mais razão?
J. V. Stalin 289

em setembro-novembro de 1917 do que qualquer comunista ocidental a consi-


derar que o parlamentarismo era politicamente obsoleto na Rússia? Claro que
tínhamos; pois a questão não é se os parlamentos burgueses existiram por um
longo ou curto período de tempo, mas até que ponto as grandes massas do os
trabalhadores estão preparados (ideológica, política e praticamente) para acei-
tar o sistema soviético e para dispersar o parlamento democrático-burguês (ou
permitir que seja disperso). Que, devido a uma série de condições especiais, a
classe trabalhadora das cidades e os soldados e camponeses da Rússia estavam,
em setembro-novembro de 1917, excepcionalmente bem preparados para aceitar
o sistema soviético e para dispersar o mais democrático dos parlamentos burgue-
ses, é uma lei absolutamente incontestável e plenamente estabelecida fato his-
tórico. No entanto, os bolcheviques não boicotaram a Assembleia Constituinte,
mas participaram das eleições antes e depois da conquista do poder político pelo
proletariado” (ver Esquerdismo, doença infantil do Comunismo).
Por que então não boicotaram a Assembleia Constituinte?
Porque, diz Lenin, “a participação em um parlamento democrático-burguês,
mesmo algumas semanas antes da vitória da República Soviética, e mesmo depois
de tal vitória, não só não prejudica o proletariado revolucionário, mas na verdade
o ajuda a provar às massas atrasadas porque esses parlamentos merecem ser dis-
persos; ajuda a sua dispersão bem-sucedida e ajuda a tornar o parlamentarismo
burguês ’politicamente obsoleto”. É característico que Trotsky não entenda essa
característica da tática bolchevique e bufe com a “teoria” de combinar a Assem-
bleia Constituinte com os sovietes, qualificando-a como hilferdingismo.
Não entende que permitir tal combinação, acompanhada da palavra de or-
dem de um levante e da provável vitória dos sovietes, em conexão com a convoca-
ção da Assembleia Constituinte, foi a única tática revolucionária, que nada tinha
em comum com as táticas de Hilferding de conversão dos sovietes em apêndice
da Assembleia Constituinte; ele não entende que o erro cometido por alguns
camaradas nesta questão não lhe dá fundamento para menosprezar a posição
absolutamente correta assumida por Lenin e o Partido sobre o “tipo combinado
de poder estatal” sob certas condições.
Não compreende que, se os bolcheviques não tivessem adotado essa política
especial em relação à Constituinte, não teriam conseguido conquistar para o seu
lado as grandes massas populares; e se eles não tivessem conquistado essas massas,
não poderiam ter transformado o levante de outubro em uma profunda revolu-
ção popular. É interessante notar que Trotsky até zomba das palavras “povo”,
“democracia revolucionária”, etc., que aparecem em artigos de bolcheviques, e
as considera impróprias para um marxista usar.
Trotsky evidentemente esqueceu que mesmo em setembro de 1917, um mês
antes da vitória da ditadura do proletariado, Lenin, o marxista inquestionável,
escreveu sobre “a necessidade de transferência imediata de todo o poder para
a democracia revolucionária encabeçada pelo proletariado revolucionário” (Ver
Marxismo e Insurreição). Evidentemente, Trotsky se esqueceu de que Lenin, esse
marxista inquestionável, citando a conhecida carta de Marx a Kugelmann (abril
de 1871) de que o esmagamento da máquina de Estado burocrático-militar é a
condição preliminar para toda revolução popular real no continente, escreve em
290 Obras Escolhidas

preto e branco as seguintes linhas:


Particular atenção deve ser dada à observação extremamente profunda de Marx de que a
destruição da máquina burocrática-militar do Estado é ‘a condição preliminar para toda re-
volução popular real’. Este conceito de uma revolução “popular” parece estranho vindo de
Marx, e os plekhanovitas e mencheviques russos, aqueles seguidores de Struve que desejam
ser considerados marxistas, podem possivelmente declarar tal expressão como um “lapso de
escrita” no de Marx. Eles reduziram o marxismo a um estado de distorção lamentavelmente
liberal que nada existe para eles além da antítese entre a revolução burguesa e a revolução
proletária – e mesmo essa antítese eles interpretam de uma forma extremamente sem vida
(...) Na Europa, em 1871, não havia um único país no continente em que o proletariado
constituísse a maioria do povo. Uma revolução ‘popular’, que realmente colocasse a maioria
em movimento, só poderia sê-lo se abrangesse ambos o proletariado e o campesinato. Essas
duas classes constituíam então o “povo”. Essas duas classes estão unidas pelo fato de que
a ’máquina do Estado burocrático-militar’ oprime, esmaga, explora. Para quebrar essa má-
quina, para esmagá-la – isso é realmente do interesse do ’povo’, da maioria, dos trabalhadores
e da maioria dos camponeses, esta é ’a condição preliminar’ para uma aliança livre entre os
camponeses pobres e os proletários, ao passo que sem tal aliança a democracia é instável e a
transformação socialista é impossível” (Ver O Estado e a Revolução).

Estas palavras de Lenin não devem ser esquecidas.


Assim, a capacidade de convencer as massas da justeza das palavras de ordem
do Partido com base na sua própria experiência, levando-as às posições revo-
lucionárias, como a condição mais importante para a conquista de milhões de
trabalhadores para o lado do Partido, essa é a quarta especificidade da tática dos
bolcheviques no período de preparação para outubro. Acho que o que eu disse
é suficiente para se ter uma ideia clara dos traços característicos dessas táticas.

IV. A Revolução de Outubro como o início e a


pré-condição para a Revolução Mundial
Não pode haver dúvida de que a teoria universal de uma vitória simultânea
da revolução nos principais países da Europa, a teoria de que a vitória do socia-
lismo em um país é impossível, provou ser uma teoria artificial e insustentável.
Os sete anos de história da revolução proletária na Rússia falam não a favor, mas
contra esta teoria. Esta teoria é inaceitável não apenas como um esquema de de-
senvolvimento da revolução mundial, pois contradiz fatos óbvios. É ainda menos
aceitável como slogan; pois ela restringe, ao invés de incentivar, a iniciativa de
países individuais que, em razão de certas condições históricas, obtêm a oportu-
nidade de romper a frente do capital de forma independente; pois não estimula
um ataque ativo ao capital em países individuais, mas encoraja a espera passiva
pelo momento do “desenlace universal”. Pois cultiva entre os proletários dos di-
ferentes países não o espírito de determinação revolucionária, mas o sentimento
de dúvida do tipo Hamlet sobre a questão: “E se os outros não nos apoiarem?”.
Lenin estava absolutamente certo ao dizer que a vitória do proletariado em um
país é o “caso típico”, que “uma revolução simultânea em vários países” só pode
ser uma “rara exceção” (Ver A Revolução Proletária e o Renegado Kautsky).
Mas, como é sabido, a teoria da revolução de Lenin não se limita apenas
a este lado da questão. É também a teoria do desenvolvimento da revolução
mundial (ver Os fundamentos do Leninismo – J. Stalin). A vitória do socialismo em
um país não é uma tarefa autossuficiente. A revolução que saiu vitoriosa em
J. V. Stalin 291

um país deve considerar-se não como uma entidade autossuficiente, mas como
uma ajuda, como um meio para apressar a vitória do proletariado em todos os
países. Pois a vitória da revolução em um país, no caso presente a Rússia, não é
apenas o produto do desenvolvimento desigual e da decadência progressiva do
imperialismo, é ao mesmo tempo o início e a condição prévia para a revolução
mundial.
Sem dúvida, os caminhos de desenvolvimento da revolução mundial não são
tão claros como podem ter parecido anteriormente, antes da vitória da revolução
em um país, antes do surgimento do imperialismo desenvolvido, que é “a véspera
da revolução socialista”. Pois um novo fator surgiu: a lei do desenvolvimento de-
sigual dos países capitalistas, que opera sob as condições do imperialismo desen-
volvido, e que implica a inevitabilidade das colisões armadas, o enfraquecimento
geral da frente mundial do capital e a possibilidade de a vitória do socialismo em
cada país. Pois um novo fator surgiu: o vasto país soviético, situado entre o Oci-
dente e o Oriente, entre o centro da exploração financeira do mundo e a arena
da opressão colonial, um país que por sua própria existência está revolucionando
o mundo inteiro.
Todos esses são fatores (para não mencionar outros menos importantes) não
podem ser deixados de lado no estudo dos caminhos do desenvolvimento da revo-
lução mundial. Antigamente, era comum pensar que a revolução se desenvolveria
por meio do mesmo “amadurecimento” dos elementos do socialismo, principal-
mente nos países mais desenvolvidos, os “avançados”. Agora, esta visão deve ser
consideravelmente modificada.
“O sistema de relações internacionais”, disse Lenin, “agora assumiu a forma
em que um dos Estados da Europa, a saber, a Alemanha, foi escravizado pelos
países vencedores. Além disso, vários Estados, que são, aliás, os mais antigos
Estados do Ocidente, encontram-se em posição, como resultado de sua vitória,
de utilizar esta vitória para fazer uma série de concessões insignificantes às suas
classes oprimidas – concessões que, no entanto, retardam o movimento revoluci-
onário nesses países e criam alguns aparência de ‘paz social’. Ao mesmo tempo,
precisamente como resultado da última guerra imperialista, uma série de países
– Oriente, Índia, China, etc. – foram completamente desalojados. Seu desen-
volvimento mudou definitivamente para as linhas capitalistas europeias gerais.
O fermento geral europeu começou a afetá-los, e agora está claro para todo o
mundo que eles foram arrastados para um processo de desenvolvimento que não
pode deixar de levar a uma crise em todo o capitalismo mundial”.
Em vista deste fato, e em conexão com ele, “os países capitalistas da Europa
Ocidental consumarão seu desenvolvimento em direção ao socialismo. Não como
esperávamos anteriormente. Eles estão consumando-o nem mesmo pelo ‘amadu-
recimento’ do socialismo neles, mas pela exploração de alguns países por outros,
pela exploração do primeiro dos países a ser vencido na guerra imperialista com-
binada com a exploração de todo o Oriente. Por outro lado, precisamente como
resultado da primeira guerra imperialista, o Oriente definitivamente entrou no
movimento revolucionário, foi definitivamente atraído para o turbilhão geral do
movimento revolucionário mundial”.
Se adicionarmos a isso o fato de que não apenas os países e colônias derro-
292 Obras Escolhidas

tados estão sendo explorados pelos países vitoriosos, mas que alguns dos países
vitoriosos estão caindo na órbita da exploração financeira nas mãos do mais po-
derosos dos países vitoriosos, América e Grã-Bretanha. Que as contradições en-
tre todos esses países são um fator extremamente importante na desintegração do
imperialismo mundial, que, além dessas contradições, existem e se desenvolvem
contradições muito profundas em cada um desses países. Que todas essas contra-
dições se tornam mais profundas e agudas pela existência, ao lado desses países,
da grande República dos Soviéticos – se tudo isso for levado em consideração,
então o quadro do caráter especial da situação internacional se tornará mais ou
menos completo.
Muito provavelmente, a revolução mundial se desenvolverá com o rompimento
de vários novos países do sistema dos Estados imperialistas, como resultado da re-
volução, enquanto os proletários desses países serão apoiados pelo proletariado
dos Estados imperialistas. Vemos que o primeiro país a se separar, o primeiro
país vitorioso, já está sendo apoiado pelos trabalhadores e pelas massas traba-
lhadoras de outros países. Sem esse suporte, não poderia resistir. Sem dúvida,
esse apoio vai aumentar e crescer. Mas também não pode haver dúvida de que o
próprio desenvolvimento da revolução mundial, o próprio processo de ruptura
com o imperialismo de uma série de novos países será tanto mais rápido e com-
pleto, quanto mais profundamente o socialismo se consolidar no primeiro país
vitorioso, mais rapidamente este país se transforma em uma base para o futuro
desenrolar da revolução mundial, em uma alavanca para uma maior desintegra-
ção do imperialismo.
Embora seja verdade que a vitória final do socialismo no primeiro país a se
emancipar seja impossível sem os esforços conjuntos dos proletários de vários
países, é igualmente verdade que o desenrolar da revolução mundial será o mais
rápido e completo, o mais eficaz a assistência prestada pelo primeiro país socia-
lista aos trabalhadores e às massas trabalhadoras de todos os outros países.
Em que essa assistência deve ser expressa?
Deve ser expresso, em primeiro lugar, no país vitorioso alcançar “o máximo
possível em um país para o desenvolvimento, apoio e despertar da revolução em
todos os países” (ver A Revolução Proletária e o Renegado Kautsky). Deve ser ex-
presso, em segundo lugar, em que o “proletariado vitorioso” de um país, “tendo
expropriado os capitalistas e organizado sua própria produção socialista, se le-
vantaria... contra o resto do mundo, o mundo capitalista, atraindo para o seu
causar as classes oprimidas de outros países, levantando revoltas nesses países
contra os capitalistas e, em caso de necessidade, sair até com força armada con-
tra as classes exploradoras e seus Estados” (Ver Sobre o Slogan dos Estados Unidos
da Europa).
A característica da ajuda prestada pelo país vitorioso não é apenas que ace-
lera a vitória dos proletários de outros países, mas também que, ao facilitar essa
vitória, garante a vitória final do socialismo no primeiro país vitorioso.
Muito provavelmente, no curso do desenvolvimento da revolução mundial,
lado a lado com os centros do imperialismo em países capitalistas individuais e
com o sistema desses países em todo o mundo, centros de socialismo serão criados
em países soviéticos individuais e um sistema de esses centros em todo o mundo, e
J. V. Stalin 293

a luta entre esses dois sistemas preencherá a história do desenrolar da revolução


mundial.
Pois, diz Lenin, “a união livre das nações no socialismo é impossível sem uma
luta mais ou menos prolongada e obstinada das repúblicas socialistas contra os
Estados atrasados”. (ver Sobre o Slogan dos Estados Unidos da Europa.)
O significado mundial da Revolução de Outubro reside não só no fato de que
ela constitui um grande começo feito por um país ao causar uma ruptura no
sistema do imperialismo e que é o primeiro centro do socialismo no oceano dos
países imperialistas, mas também no sentido de que constitui o primeiro estágio
da revolução mundial e uma base poderosa para seu desenvolvimento posterior.
Portanto, erram não só aqueles que se esquecem do caráter internacional da
Revolução de Outubro e declaram que a vitória do socialismo em um país é um
fenômeno puramente nacional – e apenas nacional – mas também aqueles que,
embora tenham em mente o caráter internacional da Revolução de Outubro, es-
tão inclinados a considerar essa revolução como algo passivo, meramente desti-
nado a aceitar ajuda de fora. Na verdade, não só a Revolução de Outubro precisa
do apoio da revolução em outros países, mas a revolução nesses países precisa do
apoio da Revolução de Outubro, a fim de acelerar e fazer avançar a causa da
derrubada do imperialismo mundial.
J. V. Stalin
17 de dezembro de 1924
294 Obras Escolhidas

Dia Internacional da Mulher


8 de março de 1925

Não houve na história da humanidade um único grande movimento dos opri-


midos do qual não tenham participado as mulheres trabalhadoras. As mulheres
trabalhadoras, as mais oprimidas de todos os oprimidos, nunca se afastaram do
caminho principal do movimento de emancipação, e nunca poderiam ter feito
isso. Como se sabe, o movimento pela emancipação dos escravos trouxe para a
frente centenas de milhares de grandes mulheres mártires e heroínas. Nas fi-
leiras dos lutadores pela emancipação dos servos, havia dezenas de milhares de
mulheres trabalhadoras. Não é surpreendente que o movimento revolucionário
da classe trabalhadora, o mais poderoso de todos os movimentos de emancipação
das massas oprimidas, tenha reunido milhões de mulheres trabalhadoras para
sua bandeira.
O Dia Internacional da Mulher é um símbolo da invencibilidade do movi-
mento da classe trabalhadora pela emancipação e um prenúncio de seu grande
futuro.
As mulheres trabalhadoras – trabalhadoras e camponesas – constituem uma
vasta reserva da classe trabalhadora. Esta reserva constitui uma boa metade da
população. O lado que tomar – a favor ou contra a classe trabalhadora – determi-
nará o destino do movimento proletário, a vitória ou derrota da revolução pro-
letária, a vitória ou derrota do poder proletário. Consequentemente, a primeira
tarefa do proletariado, e de seu destacamento avançado – o Partido Comunista,
é travar uma luta decidida pelas mulheres livres, trabalhadoras e camponesas,
da influência da burguesia, para esclarecê-las politicamente e organizá-las sob a
bandeira do proletariado.
O Dia Internacional da Mulher é um meio de ganhar a base de mulheres
trabalhadoras para o lado do proletariado.
Mas as mulheres trabalhadoras não são apenas uma base. Se a classe traba-
lhadora segue uma política correta, ela pode e deve se tornar um verdadeiro
exército da classe trabalhadora, operando contra a burguesia. Forjar desta base
de mulheres trabalhadoras um exército de mulheres trabalhadoras e camponesas,
operando lado a lado com o grande exército do proletariado – esta é a segunda
e decisiva tarefa da classe trabalhadora.
O Dia Internacional da Mulher deve se tornar um meio de transformar as
mulheres trabalhadoras e camponesas de uma reserva da classe trabalhadora em
um exército ativo do movimento de emancipação do proletariado.
Viva o Dia Internacional da Mulher!
J. Stalin
Pravda, nº 56
8 de março de 1925
J. V. Stalin 295

As tarefas políticas da Universidade


dos Povos do Leste
18 de maio de 1925

Discurso proferido à reunião de estudantes da Universidade Comunista dos trabalhadores


do Leste

Camaradas, permitam-me, em primeiro lugar, saudá-los por ocasião do quarto


aniversário da existência da Universidade Comunista dos Trabalhadores do Leste.
Escusado será dizer que desejo à sua Universidade todo o sucesso no difícil ca-
minho da formação de quadros comunistas para o Oriente. E agora passemos ao
assunto em questão.
Analisando a composição do corpo discente da Universidade dos Trabalha-
dores do Leste, não se pode deixar de notar uma certa dualidade nela. Esta
universidade reúne representantes de não menos de cinquenta nações e grupos
nacionais do Oriente. Todos os alunos desta universidade são filhos do Oriente.
Mas essa definição não dá uma imagem clara ou completa. O fato é que existem
dois grupos principais entre os alunos da Universidade, representando dois con-
juntos de condições de desenvolvimento totalmente diferentes. O primeiro grupo
é formado por pessoas que vieram do Leste soviético, de países onde o domínio
da burguesia não existe mais, onde a opressão imperialista foi derrubada e onde
os trabalhadores estão no poder. O segundo grupo de estudantes é formado por
pessoas que vieram de países coloniais e dependentes, de países onde o capita-
lismo ainda reina, onde a opressão imperialista ainda está em pleno vigor e onde
a independência ainda está para ser conquistada expulsando os imperialistas.
Assim, temos dois Lestes, vivendo vidas diferentes e desenvolvendo-se em
condições diferentes. Desnecessário dizer que essa dualidade na composição do
corpo discente não pode deixar de deixar sua marca no trabalho da Universidade
dos Trabalhadores do Leste. Isso explica o fato de esta Universidade estar com
um pé em solo soviético e o outro em solo de colônias e países dependentes. Daí
as duas linhas de atividade da Universidade: uma linha com o objetivo de criar
quadros capazes de atender às necessidades das repúblicas soviéticas do Oriente,
e a outra linha com o objetivo de criar quadros capazes de servir às necessidades
revolucionárias das massas trabalhadoras nos países coloniais e dependentes do
Oriente.
Daí, também, os dois tipos de tarefas enfrentadas pela Universidade dos Tra-
balhadores do Leste. Vamos examinar essas tarefas da Universidade Comunista
dos Trabalhadores do Leste separadamente.
296 Obras Escolhidas

I
As tarefas da Universidade Comunista dos
trabalhadores do Leste em relação às Repúblicas
Soviéticas do Oriente

Quais são os traços característicos da vida e do desenvolvimento desses países,


dessas repúblicas, que os distinguem dos países coloniais e dependentes?
Em primeiro lugar, essas repúblicas estão livres da opressão imperialista. Em
segundo lugar, eles estão se desenvolvendo e se consolidando como nações não
sob a égide da ordem burguesa, mas sob a égide do poder soviético. Esse é um fato
sem precedentes na história, mas é um fato mesmo assim. Em terceiro lugar, na
medida em que são industrialmente subdesenvolvidos, em seu desenvolvimento
podem contar total e inteiramente com o apoio do proletariado industrial da
União Soviética. Em quarto lugar, estando livres da opressão colonial, gozando
da proteção da ditadura do proletariado e sendo membros da União Soviética,
essas repúblicas podem e devem ser atraídas para a obra de construção do socia-
lismo em nosso país.
A principal tarefa é facilitar a inserção dos operários e camponeses dessas
repúblicas na obra da construção do socialismo em nosso país, para criar e de-
senvolver os pré-requisitos, aplicáveis nas condições específicas de vida dessas
repúblicas, que possam impulsionar e acelerar este processo.
Portanto, as tarefas imediatas que enfrentam os quadros dirigentes no Oriente
Soviético são:
1) Criar centros industriais nas repúblicas soviéticas do Leste para servir de
base para reunir os camponeses em torno da classe trabalhadora. Vocês sabem
que este trabalho já começou e avançará junto com o crescimento econômico da
União Soviética. O fato de essas repúblicas possuírem todo tipo de matéria-prima
é garantia de que com o tempo esse trabalho estará concluído.
2) Elevar o nível da agricultura, sobretudo da irrigação. Vocês sabem que esse
trabalho também foi levado adiante, pelo menos na Transcaucásia e no Turques-
tão.
3) Iniciar e promover ainda mais a organização de cooperativas para as gran-
des massas de camponeses e artesãos como o meio mais seguro de atrair as repú-
blicas soviéticas do Oriente para o sistema geral de construção econômica sovié-
tica. 4) Aproximar os sovietes das massas, torná-los nacionais em sua composição
e, assim, implantar um Estado nacional-soviético, próximo e compreensível para
as massas trabalhadoras.
5) Desenvolver a cultura nacional, estabelecer uma ampla rede de cursos e
escolas tanto para o ensino geral como para a formação técnico-profissional, a
serem ministrados nas línguas nativas, com o propósito de formar quadros sovié-
ticos, partidários, técnicos e empresariais de a população local.
É precisamente o cumprimento dessas tarefas que facilitará o trabalho de
construção do socialismo nas repúblicas soviéticas do Oriente.
Fala-se sobre repúblicas-modelo no Leste soviético. Mas o que é uma repú-
blica modelo? Uma república modelo é aquela que realiza todas essas tarefas
J. V. Stalin 297

com honestidade e consciência, atraindo assim para o movimento de libertação


os trabalhadores e camponeses dos países coloniais e dependentes vizinhos.
Falei acima sobre aproximar os soviéticos das massas trabalhadoras das dife-
rentes nacionalidades – sobre tornar os soviéticos em caráter nacional. Mas o que
isso significa e como se manifesta na prática? Penso que a delimitação nacional
recentemente concluída no Turquestão209 pode servir de modelo de como os so-
vietes devem ser aproximados das massas. A imprensa burguesa considera esta
delimitação como “astúcia bolchevique”. É óbvio, no entanto, que esta foi uma
manifestação não de “astúcia”, mas da aspiração profundamente enraizada das
massas do povo do Turcomenistão e do Uzbequistão de ter seu próprio órgãos
de poder, próximos e compreensíveis para eles. Na época pré-revolucionária, es-
ses dois países foram despedaçados e distribuídos entre vários canatos e Estados,
proporcionando assim um campo conveniente para as maquinações explorado-
ras dos “poderes constituídos”. Chegou o momento em que se tornou possível
que essas peças dispersas se reunissem em Estados independentes, de modo que
as massas trabalhadoras do Uzbequistão e do Turcomenistão possam ser apro-
ximadas dos órgãos do poder e firmemente ligadas a eles. A delimitação do
Turquestão é, acima de tudo, a reunião das partes dispersas desses países em
Estados independentes. Que esses Estados mais tarde expressaram o desejo de
aderir à União Soviética como membros iguais dela, apenas mostra que os bol-
cheviques encontraram a chave para as aspirações arraigadas das massas do povo
do Oriente, e que a União Soviética é uma união voluntária das massas trabalha-
doras de diferentes nacionalidades, a única no mundo. Para reunir a Polônia, a
burguesia precisava de toda uma série de guerras. Para reunir o Turcomenistão
e o Uzbequistão, entretanto, os comunistas precisaram de apenas alguns meses
de propaganda explicativa.
É assim que aproximamos os órgãos do governo, no caso os sovietes, das gran-
des massas de trabalhadores de diferentes nacionalidades. Essa é a prova de que
a política nacional bolchevique é a única política correta.
Falei, ainda, sobre elevar o nível da cultura nacional nas repúblicas soviéti-
cas do Oriente. Mas o que é cultura nacional? Como reconciliar com a cultura
proletária? Lenin não disse, já antes da guerra, que existem duas culturas – bur-
guesa e socialista? Que o slogan da cultura nacional é um slogan reacionário da
burguesia, que tenta envenenar as mentes dos trabalhadores com o veneno do
nacionalismo?210 Como é a construção da cultura nacional, o desenvolvimento
de escolas e cursos no nativo línguas, e a formação de quadros da população
209 Isso se refere à delimitação nacional-estatal das repúblicas soviéticas na Ásia Central (as repúblicas
do Turquestão, Bukhara e Khoresm) realizada em 1924. Como resultado dessa delimitação nacio-
nal foram formadas: a República Socialista Soviética Turcomeniana, o Socialista Soviético Uzbeque
República, a República Socialista Soviética Autônoma do Tadjique como parte do SSH do Uzbeque,
a Região Autônoma de Kara-Kirghiz da RSFSR (posteriormente tornou-se a República Socialista
Soviética Quirguiz) e a Região Autônoma Kara-Kalpak da República Socialista Soviética Autônoma
do Quirguiz (mais tarde, República Socialista Soviética do Cazaquistão). O Terceiro Congresso dos
Soviéticos da URSS, realizado em maio de 1925, aceitou as Repúblicas Socialistas Soviéticas do Uz-
beque e do Turcomenistão na URSS e emendou a Constituição da URSS de acordo. A delimitação
nacional-obsoleta das repúblicas soviéticas na Ásia Central foi realizada sob a direção imediata de
Stalin.
210 Ver o artigo de Lenin intitulado “Apontamentos críticos sobre a questão nacional”, disponível em

seu vigésimo volume de Obras Completas, quarta edição russa, pp. 1-34.
298 Obras Escolhidas

local, para se reconciliar com a construção do socialismo, com a construção da


cultura proletária? Não há uma contradição irreconciliável aqui? Claro que não!
Estamos construindo a cultura proletária. Isso é absolutamente verdade. Mas
também é verdade que a cultura proletária, de conteúdo socialista, assume dife-
rentes formas e modos de expressão entre os diferentes povos que são atraídos
para a construção do socialismo, dependendo das diferenças de idioma, modo
de vida e assim por diante. Proletário em conteúdo, nacional em forma – tal é a
cultura universal para a qual o socialismo está avançando. A cultura proletária
não abole a cultura nacional, mas lhe dá conteúdo. Por outro lado, a cultura
nacional não abole a cultura proletária, mas dá-lhe forma. O slogan da cultura
nacional foi um slogan burguês enquanto a burguesia esteve no poder e a conso-
lidação das nações ocorreu sob a égide da ordem burguesa. A palavra de ordem
da cultura nacional tornou-se uma palavra de ordem proletária quando o pro-
letariado chegou ao poder e quando a consolidação das nações começou sob a
égide do poder soviético. Quem não consegue compreender a diferença funda-
mental entre estas duas situações, nunca compreenderá nem o leninismo nem a
essência da questão nacional.
Algumas pessoas (Kautsky, por exemplo) falam da criação de uma única lín-
gua universal e do desaparecimento de todas as outras línguas no período do
socialismo. Tenho pouca fé nesta teoria de uma linguagem única e abrangente.
A experiência, de qualquer forma, fala mais contra do que a favor de tal teo-
ria. Até agora, o que aconteceu foi que a revolução socialista não diminuiu, mas
aumentou o número de línguas; pois, ao despertar as camadas mais baixas da
humanidade e empurrá-las para a arena política, desperta para uma nova vida
um número de nacionalidades até então desconhecidas ou pouco conhecidas.
Quem poderia imaginar que a velha Rússia tsarista consistia em não menos de
cinquenta nações e grupos nacionais? A Revolução de Outubro, entretanto, ao
quebrar as velhas correntes e trazer à cena uma série de povos e nacionalidades
esquecidos, deu-lhes uma nova vida e um novo desenvolvimento. Hoje, fala-se
da Índia como um todo. Mas não pode haver dúvida de que, no caso de um
levante revolucionário na Índia, muitas nacionalidades até então desconhecidas,
com suas próprias línguas e culturas separadas, aparecerão em cena. E no que
diz respeito à implantação da cultura proletária entre as várias nacionalidades,
dificilmente pode haver dúvida de que isso ocorrerá nas formas correspondentes
às línguas e modos de vida dessas nacionalidades.
Não faz muito tempo, recebi uma carta de alguns camaradas de Buryat pedin-
do-me que explicasse questões sérias e difíceis sobre as relações entre a cultura
universal e a cultura nacional. Aqui está:
Pedimos sinceramente que nos expliquem as seguintes questões muito sérias e difíceis. O ob-
jetivo último do Partido Comunista é alcançar uma única cultura universal. Como conceber a
transição para uma única cultura universal através das culturas nacionais que estão se desen-
volvendo dentro dos limites de nossas repúblicas autônomas individuais? Como deve ocorrer
a assimilação das características específicas das culturas nacionais individuais (idioma, etc.)?

Creio que o que acabamos de dizer pode servir de resposta à ansiosa pergunta
desses camaradas de Buryat. Eles levantam a questão da assimilação das naciona-
lidades individuais no processo de construção de uma cultura proletária univer-
sal. Sem dúvida, algumas nacionalidades podem, e talvez certamente passarão,
J. V. Stalin 299

por um processo de assimilação. Esses processos já ocorreram antes. A questão é,


entretanto, que o processo de assimilação de algumas nacionalidades não exclui,
mas pressupõe o processo oposto de fortalecimento e desenvolvimento adicio-
nal de um grande número de nações existentes e em desenvolvimento; pois o
processo parcial de assimilação de nacionalidades individuais é o resultado do
processo geral de desenvolvimento das nações. É precisamente por isso que a
possível assimilação de algumas nacionalidades individuais não enfraquece, mas
confirma a tese inteiramente correta de que a cultura proletária universal não ex-
clui, mas pressupõe e fomenta a cultura nacional dos povos, assim como a cultura
nacional dos povos não anula, mas complementa e enriquece a cultura proletária
universal.
Tais são, em geral, as tarefas imediatas que enfrentam os dirigentes das repú-
blicas soviéticas do Oriente. Tal é o caráter e o conteúdo dessas tarefas.
É preciso aproveitar o período que se iniciou de intensa construção econômica
e de novas concessões ao campesinato para promover o cumprimento dessas ta-
refas e, assim, facilitar a aproximação das repúblicas soviéticas do Oriente, que
são principalmente países camponeses, no trabalho de construção do socialismo
na União Soviética.
Diz-se que a nova política do Partido em relação ao campesinato, ao fazer uma
série de novas concessões (terra arrendada, permissão para empregar mão de
obra contratada), contém certos elementos de recuo. Isso é verdade? Sim, é. Mas
esses são elementos de recuo que permitimos juntamente com a manutenção de
uma esmagadora superioridade de forças ao lado do Partido e do poder soviético.
Moeda estável, indústria em desenvolvimento, transporte em desenvolvimento,
sistema de crédito cada vez mais forte e por meio do qual é possível, por meio de
créditos preferenciais, arruinar ou elevar a um nível superior qualquer estrato da
população sem causar a menor perturbação. Todos eles são reservas ao comando
da ditadura do proletariado, por meio das quais certos elementos de retirada de
um setor da frente só podem facilitar a preparação de uma ofensiva em toda a
frente. Precisamente por isso, as poucas novas concessões que o Partido fez ao
campesinato deveriam, na atualidade, tornar mais fácil do que difícil atrair o
campesinato para a construção do socialismo.
O que essa circunstância pode significar para as repúblicas soviéticas no Ori-
ente? Só pode significar que coloca nas mãos dos quadros dirigentes dessas repú-
blicas uma nova arma que permite a esses países se ligar mais fácil e rapidamente
ao sistema geral de desenvolvimento econômico soviético. Essa é a conexão en-
tre a política do Partido no campo e as tarefas nacionais imediatas com que se
defrontam os dirigentes do Oriente soviético.
A este respeito, a tarefa da Universidade dos Povos do Leste em relação às
repúblicas soviéticas do Oriente é formar quadros para essas repúblicas em linhas
que assegurem o cumprimento das tarefas imediatas que enumerei acima.
A Universidade dos Povos do Leste não deve se isolar da vida. Não é, nem
pode ser, uma instituição acima da vida. Deve estar conectado com a vida real por
meio de cada fibra de seu ser. Consequentemente, não pode ignorar as tarefas
imediatas que as repúblicas soviéticas enfrentam no Oriente. É por isso que a
tarefa da Universidade dos Povos do Leste é levar em consideração as tarefas
300 Obras Escolhidas

imediatas que enfrentam essas repúblicas, na formação de quadros adequados


para elas.
A este respeito, é necessário ter presente a existência de dois desvios na prá-
tica dos quadros dirigentes do Oriente soviético, desvios que devem ser combati-
dos dentro do recinto desta Universidade se se pretende formar quadros reais e
verdadeiros revolucionários para o Oriente soviético.
O primeiro desvio está na simplificação, uma simplificação das tarefas de que
falei acima, uma tentativa de transplantar mecanicamente modelos de constru-
ção econômica bastante compreensíveis e aplicáveis no centro da União Sovié-
tica, mas totalmente inadequados às condições desenvolvimento nas chamadas
regiões fronteiriças. Os camaradas culpados desse desvio não conseguem enten-
der duas coisas. Eles não compreendem que as condições no centro e nas “regiões
fronteiriças” não são iguais e estão longe de ser idênticas. Além disso, não con-
seguem compreender que as próprias repúblicas soviéticas no Oriente não são
semelhantes, que algumas delas, Geórgia e Armênia, por exemplo, estão em um
estágio superior de formação nacional, enquanto outras, Chechênia e Kabarda,
por exemplo, estão em um estágio inferior da formação nacional, e outras nova-
mente, Kirghizia, por exemplo, ocupam uma posição intermediária entre esses
dois extremos. Esses camaradas não compreendem que, se a obra não for adap-
tada às condições locais, se não se levarem em conta todas as especificidades de
cada país, nada de importante pode ser construído. O resultado desse desvio é
que eles se divorciaram das massas e degeneram em criadores de frases esquer-
distas. A tarefa da Universidade dos Povos do Leste é formar quadros no espírito
de uma luta intransigente contra esta simplificação.
O segundo desvio, por outro lado, reside no exagero das especificidades lo-
cais, no esquecimento do comum e principal que liga as repúblicas soviéticas do
Leste às áreas industriais da União Soviética, o ocultamento das tarefas socialis-
tas, adaptação às tarefas de um nacionalismo estreito e restrito. Os camaradas
culpados deste desvio pouco se importam com o desenvolvimento interno de seus
países e preferem deixar esse desenvolvimento ao curso natural das coisas. Para
eles, o principal não é o desenvolvimento interno, mas a política “externa”, a
expansão das fronteiras de suas repúblicas, o litígio com as repúblicas vizinhas,
o desejo de arrebatar um pedaço extra de território de seus vizinhos e, assim,
entrar no bem graças dos nacionalistas burgueses em seus respectivos países. O
resultado desse desvio é que eles se divorciaram do socialismo e degeneraram em
nacionalistas burgueses comuns. A tarefa da Universidade dos Povos do Leste é
formar quadros no espírito de uma luta intransigente contra este nacionalismo
oculto.
Essas são as tarefas da Universidade dos Povos do Oriente em relação às re-
públicas soviéticas do Oriente.
J. V. Stalin 301

II
As tarefas da Universidade Comunista dos
trabalhadores do Leste em relação aos Países
Coloniais e Dependentes do Oriente
Passemos à segunda questão, a questão das tarefas da Universidade Comu-
nista dos trabalhadores do Leste em relação aos países coloniais e dependentes
do Oriente. Quais são os traços característicos da vida e do desenvolvimento des-
ses países, que os distinguem das repúblicas soviéticas do Oriente?
Em primeiro lugar, esses países vivem e se desenvolvem sob a opressão do
imperialismo. Em segundo lugar, a existência de uma opressão dupla, opressão
interna (pela burguesia nativa) e opressão externa (pela burguesia imperialista
estrangeira), está intensificando e aprofundando a crise revolucionária nesses
países. Em terceiro lugar, em alguns desses países, na Índia, por exemplo, o
capitalismo está crescendo a uma taxa rápida, dando origem e moldando uma
classe mais ou menos numerosa de proletários locais. Em quarto lugar, com
o crescimento do movimento revolucionário, a burguesia nacional nesses países
está se dividindo em duas partes, uma parte revolucionária (a pequena burgue-
sia) e uma parte comprometedora (a grande burguesia), da qual a primeira é
continuar a luta revolucionária, enquanto o segundo está entrando em um bloco
com o imperialismo. Em quinto lugar, paralelamente ao bloco imperialista, ou-
tro bloco está se formando nesses países, um bloco entre os trabalhadores e a
pequena burguesia revolucionária, um bloco anti-imperialista, cujo objetivo é a
libertação total do imperialismo.
Em sexto lugar, a questão da hegemonia do proletariado nesses países e de
libertar as massas do povo da influência da burguesia nacional comprometedora
torna-se cada vez mais urgente. Em sétimo lugar, essa circunstância torna muito
mais fácil vincular o movimento de libertação nacional em tais países ao movi-
mento proletário nos países avançados do Ocidente.
Disto seguem pelo menos três conclusões: 1) A libertação dos países coloniais
e dependentes do imperialismo não pode ser alcançada sem uma revolução vi-
toriosa: você não obterá independência gratuitamente. 2) A revolução não pode
ser avançada e a completa independência das colônias desenvolvidas no modelo
capitalista e dos países dependentes não pode ser conquistada, a menos que a
burguesia nacional comprometida seja isolada, a menos que as massas revolu-
cionárias pequeno-burguesas sejam libertadas da influência dessa burguesia, a
menos que a política de a hegemonia do proletariado é efetivada, a menos que
os elementos avançados da classe trabalhadora sejam organizados em um Partido
Comunista independente. 3) Uma vitória duradoura não pode ser alcançada nos
países coloniais e dependentes sem uma ligação real entre o movimento de liber-
tação nesses países e o movimento proletário nos países avançados do Ocidente.
A principal tarefa dos comunistas nos países coloniais e dependentes é basear
suas atividades revolucionárias nessas conclusões. Quais são as tarefas imediatas
do movimento revolucionário nas colônias e países dependentes em vista dessas
circunstâncias?
A característica distintiva das colônias e dos países dependentes atualmente é
302 Obras Escolhidas

que não existe mais um Leste colonial único e abrangente. Anteriormente, o Ori-
ente colonial era retratado como um todo homogêneo. Hoje, essa imagem não
corresponde mais à verdade. Temos agora pelo menos três categorias de países
coloniais e dependentes. Em primeiro lugar, países como o Marrocos, que têm
pouco ou nenhum proletariado e são industrialmente pouco desenvolvidos. Em
segundo lugar, países como China e Egito, que são subdesenvolvidos industrial-
mente e têm um proletariado relativamente pequeno. Em terceiro lugar, países
como a Índia, que são mais ou menos desenvolvidos dentro do modelo capitalista
e têm um proletariado nacional mais ou menos numeroso.
Obviamente, todos esses países não podem ser colocados em pé de igualdade.
Em países como Marrocos, onde a burguesia nacional ainda não tem moti-
vos para se dividir em partido revolucionário e partido transigente, a tarefa dos
elementos comunistas é tomar todas as medidas para criar uma frente nacional
única contra o imperialismo. Em tais países, os elementos comunistas podem ser
agrupados em um único partido apenas no curso da luta contra o imperialismo,
particularmente depois de uma luta revolucionária vitoriosa contra o imperia-
lismo.
Em países como Egito e China, onde a burguesia nacional já se dividiu em
partido revolucionário e partido transigente, mas onde o setor conciliador da
burguesia ainda não é capaz de se unir ao imperialismo, os comunistas não po-
dem mais se estabelecer no objetivo de formar uma frente nacional única contra
o imperialismo. Em tais países, os comunistas devem passar da política de uma
frente nacional única à política de um bloco revolucionário dos trabalhadores e
da pequena burguesia. Em tais países, esse bloco pode assumir a forma de um
partido único, um partido de trabalhadores e camponeses, desde que, no en-
tanto, esse partido distintivo represente realmente um bloco de duas forças – o
Partido Comunista e o partido da pequena burguesia revolucionária. As tarefas
deste bloco são expor a indiferença e inconsistência da burguesia nacional e tra-
var uma luta decidida contra o imperialismo. Esse partido dual é necessário e
conveniente, desde que não amarre as mãos e os pés do Partido Comunista, desde
que não restrinja a liberdade do Partido Comunista de conduzir o trabalho de
agitação e propaganda, desde que não impeça a mobilização dos proletários em
torno do Partido Comunista, e desde que facilite a liderança real do movimento
revolucionário pelo Partido Comunista. Um tal partido dual é desnecessário e
inconveniente se não se conforma com todas essas condições, pois só pode le-
var à dissolução dos elementos comunistas nas fileiras da burguesia, à perda do
Partido Comunista do exército proletário.
A situação é um pouco diferente em países como a Índia. A característica fun-
damental e nova das condições de vida de colônias como a Índia não é apenas que
a burguesia nacional se dividiu em um partido revolucionário e um partido com-
prometedor, mas principalmente que o setor comprometedor dessa burguesia já
conseguiu, no geral, fazer um acordo com o imperialismo. Temendo a revolu-
ção mais do que o imperialismo, e mais preocupada com suas bolsas de dinheiro
do que com os interesses de seu próprio país, esta seção da burguesia, a seção
mais rica e influente, está indo inteiramente para o campo dos inimigos irre-
conciliáveis da a revolução, está formando um bloco com o imperialismo contra
J. V. Stalin 303

os trabalhadores e camponeses de seu próprio país. A vitória da revolução não


pode ser alcançada a menos que este bloco seja destruído. Mas, para esmagar
este bloco, o fogo deve ser concentrado na burguesia nacional comprometida,
deve-se expor a sua traição, libertar as massas trabalhadoras de sua influência e
criar as condições necessárias para a hegemonia do proletariado. Em outras pala-
vras, em colônias como a Índia, trata-se de preparar o proletariado para o papel
de líder do movimento de libertação, desalojando passo a passo a burguesia e
seus porta-vozes deste honroso posto. A tarefa é criar um bloco anti-imperialista
revolucionário e assegurar a hegemonia do proletariado neste bloco. Este bloco
pode assumir, embora nem sempre necessariamente o faça, a forma de um único
partido operário e camponês, formalmente vinculado a uma única plataforma.
Em tais países, a independência do Partido Comunista deve ser o principal slogan
dos elementos comunistas avançados, pois a hegemonia do proletariado só pode
ser preparada e realizada pelo Partido Comunista. Mas o Partido Comunista
pode e deve entrar em bloco aberto com a ala revolucionária da burguesia para,
depois de isolar a burguesia nacional comprometida, liderar as grandes massas
da pequena burguesia urbana e rural na luta contra o imperialismo.
Portanto, as tarefas imediatas do movimento revolucionário nas colônias de-
senvolvidas dentro do modo capitalista e nos países dependentes são: 1) Ganhar
os melhores elementos da classe trabalhadora para o lado do comunismo e criar
partidos comunistas independentes. 2) Formar um bloco nacional-revolucionário
dos trabalhadores, camponeses e intelectualidade revolucionária contra o bloco
da burguesia nacional comprometedora e do imperialismo. 3) Assegurar a hege-
monia do proletariado naquele bloco. 4) Lutar para libertar a pequena burguesia
urbana e rural da influência da burguesia nacional comprometida. 5) Assegu-
rar que o movimento de libertação esteja vinculado ao movimento proletário dos
países avançados.
Tais são os três grupos de tarefas imediatas que confrontam os dirigentes dos
países coloniais e dependentes do Oriente.
Essas tarefas assumem um caráter particularmente importante e de grande
importância quando examinadas à luz da atual situação internacional. O traço
característico da atual situação internacional é que o movimento revolucionário
entrou em um período de calmaria temporária. Mas o que é uma calmaria, o
que significa no momento? Só pode significar uma intensificação da pressão so-
bre os trabalhadores do Ocidente, sobre as colônias do Oriente e principalmente
sobre a União Soviética como porta-estandarte do movimento revolucionário em
todos os países. Não há dúvida de que a preparação para essa pressão sobre a
União Soviética já começou nas fileiras dos imperialistas. A campanha de calú-
nias lançada em conexão com a insurreição na Estônia211 , o infame incitamento
contra a União Soviética em conexão com a explosão em Sofia e a cruzada geral
que a imprensa burguesa está conduzindo contra nosso país, todos marcam a fase

211Refere-se ao levante armado dos trabalhadores em Revel (Tallinn) em 1 de dezembro de 1924,


provocado pela sentença proferida por um tribunal estoniano no final de novembro de 1924 contra
149 criminosos políticos acusados de conduzir propaganda comunista. A maioria dos acusados foi
condenada a longas penas de servidão penal, trinta e nove foram condenados à prisão perpétua e
Tomp, o líder dos trabalhadores estonianos, foi morto. O levante foi cruelmente reprimido pelo
reacionário governo da Estônia (N.T.)
304 Obras Escolhidas

preparatória de uma ofensiva. É a preparação de artilharia da opinião pública


destinada a acostumar o público em geral aos ataques contra a União Soviética e
a criar os pré-requisitos morais para a intervenção. Qual será o resultado desta
campanha de mentiras e calúnias, se os imperialistas correrão o risco de empre-
ender uma ofensiva séria, resta saber e aguardar; mas dificilmente pode haver
qualquer dúvida de que esses ataques não auguram nada de bom para as colônias.
Portanto, a questão de preparar um contragolpe das forças unidas da revolução
ao golpe que provavelmente será dado pelo imperialismo é uma questão inevi-
tável do dia. É por isso que o cumprimento inabalável das tarefas imediatas do
movimento revolucionário nas colônias e países dependentes adquire particular
importância na atualidade. Qual é a missão da Universidade dos Povos do Leste
em relação aos países coloniais e dependentes em todas essas circunstâncias? A
sua missão é ter em consideração todas as especificidades do desenvolvimento
revolucionário destes países e formar os quadros que deles emanam de modo a
assegurar o cumprimento das várias tarefas imediatas que enumerei.
Na Universidade dos Povos do Leste, há cerca de dez grupos diferentes de
estudantes vindos de países coloniais e dependentes. Todos nós sabemos que
esses camaradas têm sede de luz e conhecimento. A tarefa da Universidade dos
Povos do Leste é transformá-los em verdadeiros revolucionários, armados com a
teoria do leninismo, dotados da experiência prática do leninismo e capazes de
realizar as tarefas imediatas do movimento de libertação nas colônias e países
dependentes com todo o seu coração e alma.
A este respeito, é necessário ter presentes dois desvios da prática dos quadros
dirigentes no Oriente colonial, dois desvios que devem ser combatidos para se
formar verdadeiros quadros revolucionários.
O primeiro desvio reside em uma subestimação das potencialidades revoluci-
onárias do movimento de libertação e em uma superestimação da ideia de uma
frente nacional unida e abrangente nas colônias e países dependentes, indepen-
dentemente do estado e do grau de desenvolvimento desses países. Isso é um
desvio para a direita, e está carregado com o perigo de o movimento revolucio-
nário ser aviltado e as vozes dos elementos comunistas se afogarem no coro geral
dos nacionalistas burgueses. É dever direto da Universidade dos Povos do Leste
travar uma luta decidida contra esse desvio.
O segundo desvio está em uma superestimação das potencialidades revoluci-
onárias do movimento de libertação e em uma subestimação do papel de uma
aliança entre a classe trabalhadora e a burguesia revolucionária contra o imperi-
alismo. Parece-me que os comunistas de Java, que não há muito tempo propu-
seram erroneamente a palavra de ordem do poder soviético para seu país, estão
sofrendo com esse desvio. Isso é um desvio para a esquerda e está repleto do pe-
rigo de o Partido Comunista se divorciar das massas e se converter em uma seita.
Uma luta determinada contra esse desvio é condição essencial para a formação
de verdadeiros quadros revolucionários para as colônias e países dependentes do
Oriente.
Tais são, em geral, as tarefas políticas da Universidade dos Povos do Leste em
relação aos povos do Oriente soviético e do Oriente colonial. Esperamos que a
Universidade consiga cumprir com honra estas tarefas.
J. V. Stalin 305

Sobre as questões do leninismo


25 de janeiro de 1926

Dedicado à organização de Leningrado do Partido Comunista da União Soviética (B)

A definição de leninismo
O folheto “Os Fundamentos do Leninismo” contém uma definição do leninismo
que parece ter recebido reconhecimento geral. Funciona da seguinte forma: “Le-
ninismo é o marxismo da era do imperialismo e da revolução proletária. Para ser mais
exato, o leninismo é a teoria e a tática da revolução proletária em geral, a teoria e a tática
da ditadura do proletariado em particular”.
Esta definição está correta?
Eu acho que está correto. É correto, em primeiro lugar, porque indica cor-
retamente as raízes históricas do leninismo, caracterizando-o como o marxismo
da era do imperialismo, em oposição a certos críticos de Lenin que pensam er-
roneamente que o leninismo se originou depois da guerra imperialista. Em se-
gundo lugar, é correto porque assinala corretamente o carácter internacional do
leninismo, em oposição à social-democracia, que considera que o leninismo só se
aplica às condições nacionais russas. É correto, em terceiro lugar, porque observa
corretamente a conexão orgânica entre o leninismo e os ensinamentos de Marx,
caracterizando o leninismo como o marxismo da era do imperialismo, em opo-
sição a certos críticos do leninismo que o consideram não um desenvolvimento
posterior do marxismo, mas apenas a restauração do marxismo e sua aplicação
às condições russas.
Tudo isso, poderíamos pensar, não precisa de comentários especiais. No en-
tanto, parece que há pessoas no nosso partido que consideram necessário definir
o leninismo de uma forma diferente. Zinoviev, por exemplo, pensa que: “Leni-
nismo é o marxismo da era das guerras imperialistas e da revolução mundial que
começou diretamente em um país onde o campesinato predomina”.
Qual pode ser o significado das palavras sublinhadas por Zinoviev? O que
significa introduzir o atraso da Rússia, seu caráter camponês, na definição do
leninismo?
Significa transformar o leninismo de uma doutrina proletária internacional
em um produto das condições especificamente russas. Significa fazer o jogo de
Bauer e Kautsky, que negam que o leninismo seja adequado para outros países,
para países em que o capitalismo está mais desenvolvido.
Nem é preciso dizer que a questão camponesa é de grande importância para
a Rússia, que nosso país é um país camponês. Mas que significado esse fato pode
ter na caracterização dos fundamentos do leninismo? O leninismo foi elaborado
apenas em solo russo, apenas para a Rússia, e não no solo do imperialismo, e para
306 Obras Escolhidas

os países imperialistas em geral? Os trabalhos de Lenin como “Imperialismo, o


Estágio Superior do Capitalismo”, “O Estado e a Revolução”, “A Revolução Proletária e o
Renegado Kautsky”, “Esquerdismo, Doença Infantil do Comunismo” aplicam-se apenas
à Rússia, e não para todos os países imperialistas em geral? O leninismo não é
a generalização da experiência do movimento revolucionário de todos os países?
Os fundamentos da teoria e da tática do leninismo não são adequados, não são
obrigatórios, para os partidos proletários de todos os países? Lenin não estava
certo quando disse que “o bolchevismo pode servir de modelo de tática para
todos”? (Ver Vol. 23, p. 386.). Lenin não estava certo quando falou sobre o
“significado internacional do poder soviético e dos fundamentos da teoria e tática
bolchevique”? (Ver Vol. 25, pp. 171-72.) Não são, por exemplo, as seguintes
palavras de Lenin corretas?
“Na Rússia, a ditadura do proletariado deve inevitavelmente diferir em cer-
tas particularidades da dos países avançados, devido ao grande atraso e caráter
pequeno-burguês de nosso país. Mas as forças básicas – e as formas básicas de
economia social – são as mesmas na Rússia e em qualquer país capitalista, de
modo que essas características específicas podem se relacionar apenas com o que
não é mais importante” (ver Vol. 24, p. 508).
Mas se tudo isso é verdade, não se segue que a definição de leninismo de Zino-
viev não pode ser considerada correta? Como pode esta definição nacionalmente
restrita do leninismo ser reconciliada com o internacionalismo?

II

O principal no Leninismo

O panfleto “Os Fundamentos do Leninismo”, afirma:


Alguns pensam que o fundamental no leninismo é a questão camponesa, que o ponto de
partida do leninismo é a questão do campesinato, de seu papel, de sua importância relativa.
Isso está absolutamente errado. A questão fundamental do leninismo, seu ponto de partida,
não é a questão camponesa, mas a questão da ditadura do proletariado, das condições em
que pode ser alcançada, das condições em que pode ser consolidada. A questão camponesa,
como questão do aliado do proletariado na luta pelo poder, é uma questão derivada.

Esta tese está correta? Eu acho que está. Esta tese decorre inteiramente da
definição de leninismo. Na verdade, se o leninismo é a teoria e a tática da re-
volução proletária, e o conteúdo básico da revolução proletária é a ditadura do
proletariado, então é claro que o principal no leninismo é a questão da ditadura
do proletariado, a elaboração desta questão, a fundamentação e concretização
desta questão. No entanto, Zinoviev evidentemente não concorda com essa tese.
Em seu artigo “Em memória de Lenin”, ele diz: “Como já disse, a questão do papel
do campesinato é a questão fundamental do bolchevismo, do leninismo”.
Como você pode ver, a tese de Zinoviev decorre inteiramente de sua definição
errada do leninismo. É, portanto, tão errado quanto sua definição de leninismo
está errada.
A tese de Lenin de que a ditadura do proletariado é a “raiz do conteúdo da
revolução proletária” está correta? (ver Vol. 23, p. 337.) É inquestionavelmente
J. V. Stalin 307

correto. A tese de que o leninismo é a teoria e a tática da revolução proletária está


correta? Eu acho que está correto. Mas o que se segue disso? Disto se segue que
a questão fundamental do leninismo, seu ponto de partida, seu fundamento, é
a questão da ditadura do proletariado.
Não é verdade que a questão do imperialismo, a questão do caráter espas-
módico do desenvolvimento do imperialismo, a questão da vitória do socialismo
em um país, a questão do Estado proletário, a questão da forma soviética deste
Estado, a questão do papel do Partido no sistema da ditadura do proletariado,
a questão dos caminhos da construção do socialismo – que todas essas questões
foram elaboradas precisamente por Lenin? Não é verdade que são precisamente
estas questões que constituem a base, o fundamento da ideia da ditadura do
proletariado? Não é verdade que sem a elaboração dessas questões fundamen-
tais seria inconcebível a elaboração da questão camponesa do ponto de vista da
ditadura do proletariado?
Nem é preciso dizer que Lenin era um especialista na questão camponesa.
Escusado será dizer que a questão camponesa, como questão do aliado do prole-
tariado, é da maior importância para o proletariado e constitui uma parte cons-
tituinte da questão fundamental da ditadura do proletariado. Mas não é claro
que, se o leninismo não tivesse enfrentado a questão fundamental da ditadura
do proletariado, a questão derivada do aliado do proletariado, a questão do cam-
pesinato, também não teria surgido? Não é claro que, se o leninismo não tivesse
enfrentado a questão prática da conquista do poder pelo proletariado, também
não teria surgido a questão da aliança com o campesinato?
Lenin não teria sido o grande líder ideológico do proletariado que ele é in-
questionavelmente – ele teria sido um simples “filósofo camponês”, como os filis-
teus literários estrangeiros frequentemente o descrevem – se ele tivesse elaborado
a questão camponesa, não com base na teoria e táticas da ditadura do proletari-
ado, mas independentemente desta base, à parte desta base.
Um ou outro: Ou a questão camponesa é o principal no leninismo, e nesse
caso o leninismo não é adequado – nem obrigatório – para os países desenvol-
vidos no modelo capitalista, para aqueles que não são países camponeses, ou o
principal no leninismo é a ditadura do proletariado e, nesse caso, o leninismo é a
doutrina internacional dos proletários de todas as terras, adequada e obrigatória
para todos os países, sem exceção, incluindo os países desenvolvidos no modelo
capitalista.
Aqui deve-se escolher.

III

A questão da revolução ''permanente''


No panfleto “Os Fundamentos do Leninismo,” a “teoria da revolução perma-
nente” é avaliada como uma “teoria” que subestima o papel do campesinato. Lá
está declarado:
Consequentemente, Lenin lutou contra os adeptos da revolução ’permanente’, não pela ques-
tão da ininterrupção, pois o próprio Lenin manteve o ponto de vista da revolução ininter-
308 Obras Escolhidas

rupta, mas porque eles subestimaram o papel do campesinato, que é uma enorme base do
proletariado.

Essa caracterização dos “permanentes” russos foi considerada geralmente acei-


ta até recentemente. No entanto, embora em geral correto, não pode ser consi-
derado exaustivo. A discussão de 1924, por um lado, e uma análise cuidadosa
das obras de Lenin, por outro, mostraram que o erro dos “permanentes” russos
não estava apenas em sua subestimação do papel do campesinato, mas também
em sua subestimação da força do proletariado e sua capacidade de liderar o cam-
pesinato, em sua descrença na ideia da hegemonia do proletariado.
É por isso que, em meu panfleto “A Revolução de Outubro e as Táticas dos Comu-
nistas Russos” (dezembro de 1924), ampliei essa caracterização e a substituí por
outra mais completa. Aqui está o que está declarado naquele panfleto:
Até agora, apenas um aspecto da teoria da ’revolução permanente’ tem sido geralmente ob-
servado – falta de fé nas potencialidades revolucionárias do movimento camponês. Agora,
para ser justo, isso deve ser complementado por outro aspecto – falta de fé na força e na
capacidade do proletariado na Rússia.

Isso não significa, é claro, que o leninismo tenha sido ou se oponha à ideia de
revolução permanente, sem aspas, que foi proclamada por Marx nos anos 40 do
século passado212 . Pelo contrário, Lenin foi o único marxista que compreendeu
e desenvolveu corretamente a ideia de revolução permanente. O que distingue
Lenin dos “permanentes” nesta questão, é que os “permanentes” distorceram a
ideia de Marx de revolução permanente e a transformaram em uma sabedoria
livresca, sem vida, enquanto Lenin a tomou em sua forma pura e a tornou um
de seus fundamentos teoria da revolução. Deve-se ter em mente que a ideia de
evolução da revolução democrático-burguesa para a revolução socialista, proposta
por Lenin já em 1905, é uma das formas de concretização da teoria da revolução
permanente de Marx. Aqui está o que Lenin escreveu sobre isso já em 1905:
Da revolução democrática devemos imediatamente, e apenas na medida de nossa força, a força
do proletariado organizado e com consciência de classe, começar a passar para a revolução
socialista. Defendemos uma revolução ininterrupta. Não devemos parar na metade. Sem
sucumbir ao aventureirismo ou ir contra a nossa consciência científica, sem lutar por uma
popularidade barata, podemos e dizemos apenas uma coisa: devemos nos esforçar para ajudar
todo o campesinato a realizar a revolução democrática a fim de torná-la mais fácil para nós,
o partido do proletariado, passarmos, o mais rapidamente possível, à nova e mais alta tarefa
– a revolução socialista. (ver Vol. 8, pp. 186-87).

E aqui está o que Lenin escreveu sobre o assunto dezesseis anos depois, após
a conquista do poder pelo proletariado:
Os Kautskys, Hilferdings, Martovs, Chernovs, Hillquits, Longuets, MacDonalds, Turatis e
outros heróis do marxismo ‘Dois e Meio’eram incapazes de entender (...) a relação entre a
revolução democrático-burguesa e a revolução socialista proletária. O primeiro se transforma
no segundo. O segundo, de passagem, resolve as questões do primeiro. O segundo consolida
o trabalho do primeiro. Lutar, e lutar sozinho, decide até que ponto o segundo consegue
superar o primeiro” (ver Vol. 27, p. 26).

Chamo atenção especial para a primeira das citações acima, extraída do artigo
de Lenin intitulado “A atitude da social-democracia em relação ao movimento campo-
nês”, publicado em 1º de setembro de 1905. Destaco isto para informação daque-
les que ainda continuam a afirmar que Lenin chegou à ideia de transformar a
212 Ver Karl Marx e Friedrich Engels, “O Primeiro Discurso do Comitê Central à Liga Comunista”.
J. V. Stalin 309

revolução democrático-burguesa em revolução socialista, isto é, a ideia de revolu-


ção permanente, depois da guerra imperialista. Essa citação não deixa dúvidas
de que essas pessoas estão profundamente enganadas.

IV

A revolução proletária e a ditadura do


proletariado

Quais são os traços característicos da revolução proletária distinta da revolu-


ção burguesa? A distinção entre a revolução proletária e a revolução burguesa
pode ser reduzida a cinco pontos principais.
1) A revolução burguesa geralmente começa quando já existem formatos mais
ou menos prontos pertencentes à ordem capitalista, que cresceram e amadurece-
ram no seio da sociedade feudal antes da revolução aberta, enquanto a revolução
proletária começa quando formatos prontos pertencentes à ordem socialista es-
tão ausentes ou quase ausentes.
2) A principal tarefa da revolução burguesa consiste em tomar o poder e torná-
lo adequado à economia burguesa já existente, enquanto a principal tarefa da
revolução proletária consiste, depois de tomar o poder, em construir uma nova
economia socialista.
3) A revolução burguesa é geralmente consumada com a tomada do poder,
enquanto na revolução proletária a tomada do poder é apenas o começo, e o
poder é usado como uma alavanca para transformar a velha economia e organizar
a nova.
4) A revolução burguesa limita-se a substituir um grupo de exploradores no
poder por outro grupo de exploradores, em vista do qual não precisa destruir
a velha máquina do Estado; ao passo que a revolução proletária tira do poder
todos os grupos exploradores e coloca no poder o líder de todos os trabalhadores
e explorados, a classe dos proletários, em vista da qual não pode administrar sem
destruir a velha máquina do Estado e substituí-la por uma agora.
5) A revolução burguesa não pode reunir os milhões de massas trabalhado-
ras e exploradas em torno da burguesia por muito tempo, pela própria razão de
que são trabalhadores e explorados; ao passo que a revolução proletária pode e
deve ligá-los, precisamente como trabalhadores e explorados, numa aliança du-
radoura com o proletariado, se deseja cumprir sua tarefa principal de consolidar
o poder do proletariado e construir uma nova economia socialista.
Aqui estão algumas das principais teses de Lenin sobre este assunto:
Uma das diferenças fundamentais entre a revolução burguesa e a revolução socialista é que
para a revolução burguesa, que surge do feudalismo, as novas organizações econômicas são
gradualmente criadas no seio da velha ordem, mudando gradualmente os aspectos da socie-
dade feudal. A revolução burguesa enfrentava apenas uma tarefa – varrer, jogar fora, destruir
todos os grilhões da sociedade precedente. Cumprindo esta tarefa, toda revolução burguesa
cumpre tudo o que dela é exigido: acelera o crescimento do capitalismo. A revolução socia-
lista está em uma posição totalmente diferente. Quanto mais atrasado for o país que, pelos
ziguezagues da história, se revelou o que deu início à revolução socialista, tanto mais difícil
é passar das velhas relações capitalistas às relações socialistas. Às tarefas de destruição são
310 Obras Escolhidas

adicionadas novas tarefas de dificuldade sem precedentes – tarefas organizacionais (ver Vol.
22, p. 315).

Assim como:
Se não fosse o espírito popular criativo da revolução russa, que havia passado pela grande
experiência do ano de 1905, dando origem aos sovietes já em fevereiro de 1917, eles não
poderiam, em hipótese alguma, tomar o poder em outubro. Porque o sucesso dependia in-
teiramente da existência de formas organizacionais prontas para um movimento que abrangia
milhões. Essas formas prontas foram os sovietes, e é por isso que nos esperavam na esfera
política aqueles brilhantes sucessos, a marcha triunfante contínua que experimentamos; pois
a nova forma de poder político estava pronta e tudo o que tínhamos a fazer era, por meio
de alguns decretos, transformar o poder dos sovietes do Estado embrionário em que existia
nos primeiros meses da revolução, em um forma legalmente reconhecida que se estabeleceu
no Estado russo – isto é, na República Soviética da Rússia. Mas ainda restavam dois pro-
blemas de enorme dificuldade cuja solução não poderia ser a marcha triunfante que nossa
revolução experimentou nos primeiros meses (...) em primeiro lugar, havia os problemas de
organização interna, que confrontam toda revolução socialista. A diferença entre a revolu-
ção socialista e a revolução burguesa reside precisamente no fato de que esta última encontra
formas pré-fabricadas de relações capitalistas, enquanto o poder soviético – o poder prole-
tário – não herda essas relações pré-fabricadas, se deixarmos de fora as mais desenvolvidas
formas de capitalismo, que, estritamente falando, se estendiam a apenas uma pequena ca-
mada superior da indústria e mal tocavam a agricultura. A organização da contabilidade, o
controle de grandes empresas, a transformação de todo o mecanismo econômico do Estado
em uma única grande máquina, em um organismo econômico que funciona de tal forma que
centenas de milhões de pessoas são guiadas por um único plano – tal era o enorme problema
organizacional que repousava sobre nossos ombros. Nas atuais condições de trabalho, este
problema não poderia ser resolvido pelos métodos de guerra pelos quais fomos capazes de
resolver os problemas da Guerra Civil (ver Vol. 22, p. p 315-318).

Lenin, então, completa:


A segunda dificuldade enorme era a questão internacional. A razão pela qual fomos capazes
de lidar tão facilmente com as gangues de Kerensky, pela qual estabelecemos nosso poder tão
facilmente e sem a menor dificuldade, aprovamos os decretos sobre a socialização da terra e o
controle dos trabalhadores, a razão pela qual conseguimos tudo isso tão facilmente foi apenas
que uma feliz combinação de circunstâncias nos protegeu por um curto período do imperia-
lismo internacional. O imperialismo internacional, com todo o poder de sua capital, com sua
técnica militar altamente organizada – que é uma verdadeira força, uma verdadeira fortaleza
do capital internacional – não poderia em caso algum, em hipótese alguma, viver lado a lado
com a República Soviética, ambos por causa de sua posição objetiva e por causa dos interesses
econômicos da classe capitalista que está incorporada nela. Não poderia fazê-lo por causa de
conexões comerciais, de relações financeiras internacionais. Nesta esfera, um conflito é ine-
vitável. É aí que reside a maior dificuldade da revolução russa, seu maior problema histórico:
a necessidade de resolver as tarefas internacionais, a necessidade de convocar uma revolução
internacional (ver Vol. 22, p. 317).

Esse é o caráter intrínseco e o significado básico da revolução proletária. Pode


uma transformação tão radical da velha ordem burguesa ser realizada sem uma
revolução violenta, sem a ditadura do proletariado? Obviamente não. Pensar
que tal revolução pode ser realizada pacificamente, dentro da estrutura da de-
mocracia burguesa, que é adaptada ao domínio da burguesia, significa que ou
se perdeu o juízo e perdeu a compreensão humana normal. No pior dos casos,
significa um repudiou aberto e grosseiro à revolução proletária.
Esta tese deve ser enfatizada de forma ainda mais forte e categórica porque
se trata de uma revolução proletária que por enquanto só triunfou em um país,
um país cercado por países capitalistas hostis e cuja burguesia não pode falhar
para receber o apoio do capital internacional.
J. V. Stalin 311

É por isso que Lenin diz que: “A emancipação da classe oprimida é impossível
não só sem uma revolução violenta, mas também sem a destruição do aparelho
de poder do Estado criado pela classe dominante” (ver Vol. 21, p. 373). Além
disso, ele complementa:
Primeiro, que a maioria da população, enquanto a propriedade privada ainda existe, ou seja,
enquanto o domínio e o jugo do capital ainda existe, se expresse em favor do partido do
proletariado, e só então pode e deve o partido tomar o poder – então dizem os democratas
pequeno-burgueses que se autodenominam ‘Socialistas’, mas que são na realidade os ser-
vidores da burguesia (...) Dizemos: Que o proletariado revolucionário derrube primeiro a
burguesia, quebre o jugo do capital e quebre o aparelho de Estado burguês, então o pro-
letariado vitorioso poderá ganhar rapidamente a simpatia e o apoio da maioria das massas
não-proletárias, satisfazendo suas necessidades às custas dos exploradores (...) Para ganhar
a maioria da população para o seu lado, o proletariado deve, em primeiro lugar, derrubar a
burguesia e tomar o poder do Estado; em segundo lugar, deve introduzir o poder soviético
e despedaçar o velho aparato do Estado, o que imediatamente mina o domínio, o prestígio
e a influência da burguesia e dos pequenos burgueses em conciliação sobre as massas tra-
balhadoras não-proletárias. Em terceiro lugar, deve destruir inteiramente a influência da
burguesia e dos pequenos burgueses conciliadores sobre a maioria das massas trabalhadoras
não proletárias, satisfazendo suas necessidades econômicas de forma revolucionária às custas
dos exploradores (ver Vol. 24, pp. 641- 647).

Essas são as características da revolução proletária.


Quais são, neste contexto, as características principais da ditadura do pro-
letariado, uma vez que se admite que a ditadura do proletariado é o conteúdo
básico da revolução proletária? Aqui está a definição mais geral de ditadura do
proletariado dada por Lenin:
A ditadura do proletariado não é o fim da luta de classes, mas sua continuação em novas
formas. A ditadura do proletariado é a luta de classes do proletariado, que venceu e se
apoderou do poder político, contra a burguesia que, embora vencida, não foi aniquilada,
não desapareceu, não cessou sua resistência, mas aumentou sua resistência (ver Vol. 24, p.
311).

Argumentando contra confundir a ditadura do proletariado com governo


“popular”, “eleito por todos”, com governo “sem classe”, Lenin diz:
A classe que tomou o poder político o fez sabendo que tomou o poder sozinha. Isso faz parte
do conceito de ditadura do proletariado. Este conceito só tem sentido quando esta classe
sabe que sozinha está tomando o poder político em suas mãos, e não se engana ou a outros
falando sobre governo ‘popular’, ‘eleito por todos, santificado por todo o povo’ (ver Vol. 26,
p. 286).

Isso não significa, entretanto, que o poder de uma classe, a classe dos prole-
tários, que não compartilha e não pode compartilhar o poder com outras classes,
não precise do auxílio e de uma aliança com as massas trabalhadoras e exploradas
de outras classes para a realização de seus objetivos. Pelo contrário. O poder de
uma classe só pode ser firmemente estabelecido e exercido ao máximo por meio
de uma forma especial de aliança entre a classe dos proletários e as massas traba-
lhadoras das classes pequeno-burguesas, principalmente as massas trabalhadoras
do campesinato.
Qual é esta forma especial de aliança? Em que consiste? Esta aliança com
as massas trabalhadoras de outras classes não proletárias contradiz totalmente a
ideia da ditadura de uma classe?
Esta forma especial de aliança consiste no fato de que a força motriz do pro-
cesso é o proletariado. Esta forma especial de aliança consiste em que o líder
312 Obras Escolhidas

do Estado, o líder no sistema da ditadura do proletariado é um partido, o par-


tido do proletariado, o Partido dos Comunistas, que não compartilha e não pode
compartilhar a liderança com outros partidos.
Como vocês veem, a contradição é apenas aparente.
A ditadura do proletariado é uma forma especial de aliança de classes entre o proletariado,
a vanguarda da classe trabalhadora e as numerosas camadas não proletárias da classe traba-
lhadora (a pequena burguesia, os pequenos proprietários, o campesinato, a intelectualidade,
etc.), ou a maioria destes; é uma aliança contra o capital, uma aliança que visa a derrubada
total do capital, a supressão total da resistência da burguesia e de qualquer tentativa de res-
tauração de sua parte, uma aliança que visa o estabelecimento final e a consolidação do soci-
alismo. É um tipo especial de aliança, que está sendo construída em circunstâncias especiais,
ou seja, em circunstâncias de uma guerra civil feroz; é uma aliança dos firmes defensores
do socialismo com os aliados vacilantes deste último e às vezes com os “neutros” (então, em
vez de um acordo de luta, a aliança se torna um acordo de neutralidade), uma aliança entre
classes que diferem econômica, política, socialmente e ideologicamente (ver Vol. 24, p. 311).

Em um de seus relatórios de instrução, Kamenev, contestando essa concepção


da ditadura do proletariado, afirma: “A ditadura não é uma aliança de uma classe
com outra”. Eu acredito que Kamenev aqui tem em vista, principalmente, uma
passagem em meu panfleto “A Revolução de Outubro e as Táticas dos Comunistas
Russos”, onde é afirmado:
A ditadura do proletariado não é simplesmente um estrato superior do governo ‘habilmente
selecionado pela mão cuidadosa de um estrategista experiente’ e ‘contando judiciosamente’
com o apoio de um setor ou outro da população. A ditadura do proletariado é a aliança
de classe entre o proletariado e as massas trabalhadoras do campesinato com o propósito de
derrubar o capital, para alcançar a vitória final do socialismo, com a condição de que a força
motriz dessa aliança seja o proletariado.

Apoio totalmente esta formulação da ditadura do proletariado, pois penso


que coincide total e inteiramente com a formulação de Lenin, que acabei de citar.
Afirmo que a declaração de Kamenev de que “a ditadura não é uma aliança de
uma classe com outra”, na forma categórica em que é feita, não tem nada em
comum com a teoria de Lenin da ditadura do proletariado.
Afirmo que tais afirmações só podem ser feitas por pessoas que não compre-
enderam o significado da ideia de vínculo, a ideia da aliança do proletariado e
do campesinato, a ideia da hegemonia do proletariado dentro desta aliança.
Essas declarações podem ser feitas apenas por pessoas que não conseguiram
entender a tese de Lenin: “Somente um acordo com o campesinato pode salvar a re-
volução socialista na Rússia enquanto a revolução em outros países não ocorrer”
(ver Vol. 26, p. 238). Também não conseguiram entender que: “O princípio su-
premo da ditadura é a manutenção da aliança do proletariado e do campesinato
para que o proletariado mantenha o seu papel dirigente e o poder do Estado”
(ibid., p. 460).
Apontando um dos objetivos mais importantes da ditadura, o objetivo de su-
primir os exploradores, Lenin diz: “O conceito científico de ditadura significa
nada mais, nada menos, do que poder totalmente irrestrito, absolutamente de-
simpedido por leis ou regulamentos e apoiado diretamente no uso da força” (ver
Vol. 25, p. 441). Também complementa que: “Ditadura significa – notem de
uma vez por todas, Srs. Cadetes – poder irrestrito, baseado na força e não na
lei. Em tempo de guerra civil, qualquer potência vitoriosa pode ser apenas uma
J. V. Stalin 313

ditadura” (ver Vol. 25, p. 436).


Mas é claro que a ditadura do proletariado não significa apenas o uso da força,
embora não haja ditadura sem tal aspecto. “Ditadura”, diz Lenin, “não significa
apenas o uso da força, embora seja impossível sem sua utilização; também sig-
nifica a organização do trabalho em um nível mais alto do que a organização
anterior” (ver Vol. 24, p. 305).
Como o próprio Lenin observa:

A ditadura do proletariado... não é só o uso da força contra os exploradores, e nem mesmo


principalmente o uso da força. O fundamento econômico deste uso revolucionário da força,
a garantia de sua eficácia e sucesso é o fato de que o proletariado representa e cria um tipo
superior de organização social do trabalho em comparação com o capitalismo. Essa é a essên-
cia. Esta é a fonte da força e a garantia do inevitável triunfo completo do comunismo (...) Sua
quintessência (isto é, da ditadura —J. Stalin) é a organização e disciplina do destacamento
avançado dos trabalhadores, de sua vanguarda. De seu único líder, o proletariado, cujo ob-
jetivo é construir o socialismo, abolir a divisão da sociedade em classes, para fazer todos os
membros da sociedade trabalharem, para remover a base de qualquer exploração do homem
pelo homem. Este objetivo não pode ser alcançado de uma só vez. Requer um período bas-
tante longo de transição do capitalismo ao socialismo, porque a reorganização da produção é
uma questão difícil, porque mudanças radicais em todas as esferas da vida precisam de tempo
e porque a enorme força do hábito da conduta da economia pequeno-burguesa e burguesa só
pode ser superado por uma luta longa e teimosa. É por isso que Marx falou de todo um pe-
ríodo de ditadura do proletariado, como o período de transição do capitalismo ao socialismo
(ver Vol. 24, pp. 314; 335-36).

Tais são os traços característicos da ditadura do proletariado. Daí os três as-


pectos principais da ditadura do proletariado:
1) A utilização do domínio do proletariado para a supressão dos exploradores,
para a defesa do país, para a consolidação dos laços com os proletários de outras
terras, e para o desenvolvimento e vitória da revolução em todos os países.
2) A utilização do domínio do proletariado para separar as massas trabalha-
doras e exploradas de uma vez por todas da burguesia, para consolidar a aliança
do proletariado com essas massas, para atrair essas massas para o trabalho de
construção socialista, e para assegurar a liderança estatal dessas massas pelo pro-
letariado.
3) A utilização do domínio do proletariado para a organização do socialismo,
para a abolição das classes, para a transição para uma sociedade sem classes, para
uma sociedade socialista.
A ditadura do proletariado é uma combinação de todos esses três aspectos.
Nenhum desses aspectos pode ser apresentado como a única característica da di-
tadura do proletariado. Por outro lado, nas circunstâncias do cerco capitalista,
a ausência de pelo menos uma dessas características é suficiente para que a dita-
dura do proletariado deixe de ser uma ditadura. Portanto, nenhum destes três
aspectos pode ser omitido sem correr o risco de distorcer o conceito de ditadura
do proletariado. Somente todos esses três aspectos tomados em conjunto nos dão
o conceito completo e finalizado de ditadura do proletariado.
A ditadura do proletariado tem seus períodos, suas formas especiais, diversos
métodos de trabalho. Durante o período de guerra civil, é o aspecto da força
da ditadura que mais se destaca. Mas não se segue de forma alguma que ne-
nhum trabalho construtivo seja realizado durante o período de guerra civil. Sem
314 Obras Escolhidas

trabalho construtivo, é impossível travar uma guerra civil. Durante o período


de construção socialista, por outro lado, é o trabalho pacífico, organizacional e
cultural da ditadura, do direito revolucionário, etc., que se destaca. Mas, nova-
mente, não se segue de forma alguma que o aspecto forçoso da ditadura tenha
deixado de existir ou pode deixar de existir no período de construção. Os ór-
gãos de repressão, o exército e outras organizações, são tão necessários agora, no
momento da construção, quanto no período da guerra civil. Sem esses órgãos, o
trabalho construtivo da ditadura com qualquer grau de segurança seria impos-
sível. Não se deve esquecer que, por enquanto, a revolução venceu em apenas
um país. Não se deve esquecer que enquanto existir o cerco capitalista também
existirá o perigo de intervenção, com todas as consequências daí decorrentes.

O Partido e a classe trabalhadora no sistema da


ditadura do proletariado
Eu tratei acima da ditadura do proletariado do ponto de vista de sua inevitabi-
lidade histórica, de seu conteúdo de classe, de sua natureza estatal e, finalmente,
do ponto de vista das tarefas destrutivas e criativas que realiza ao longo de todo o
período histórico que é denominado como período de transição do capitalismo
para o socialismo.
Agora devemos dizer algo sobre a ditadura do proletariado do ponto de vista
de sua estrutura, do ponto de vista de seu “mecanismo”, do ponto de vista do
papel e do significado das “correias de transmissão”, suas “alavancas”, e a “força
dirigente” que em sua totalidade constituem “o sistema da ditadura do proleta-
riado” (Lenin), e com a ajuda da qual se realiza o trabalho diário da ditadura do
proletariado.
O que são essas “correntes de transmissão” ou “alavancas” no sistema da di-
tadura do proletariado? O que é essa “força dirigente”? Por que eles são neces-
sários?
As alavancas ou correntes de transmissão são as próprias organizações de mas-
sas do proletariado sem a ajuda das quais a ditadura não pode ser realizada. A
força dirigente é o destacamento avançado do proletariado, sua vanguarda, que
é a principal força motriz da ditadura do proletariado.
O proletariado precisa destas correntes de transmissão, destas alavancas e
desta força dirigente, porque sem elas, na sua luta pela vitória, seria um exército
sem armas face ao capital organizado e armado. O proletariado precisa dessas
organizações porque sem elas sofreria uma derrota inevitável em sua luta pela
derrubada da burguesia, em sua batalha pela consolidação de seu domínio, em
sua guerra pela construção do socialismo. A ajuda sistemática dessas organiza-
ções e a força dirigente da vanguarda são necessárias porque, na ausência dessas
condições, é impossível que a ditadura do proletariado seja duradoura e firme.
O que são essas organizações?
Em primeiro lugar, existem os sindicatos de trabalhadores, com suas rami-
ficações centrais e locais na forma de toda uma série de organizações voltadas
J. V. Stalin 315

para a produção, cultura, educação, etc. Estes unem os trabalhadores de todas as


profissões. Eles são organizações não-partidárias. Os sindicatos podem ser de-
nominados a organização abrangente da classe trabalhadora, que está no poder
em nosso país. Eles são uma escola de comunismo. Eles promovem as melhores
pessoas de seu meio para o trabalho de liderança em todos os ramos da adminis-
tração. Eles formam o elo entre os elementos avançados e atrasados nas fileiras da
classe trabalhadora. Eles conectam as massas dos trabalhadores com a vanguarda
da classe trabalhadora.
Em segundo lugar, estão os sovietes, com suas numerosas ramificações cen-
trais e locais na forma de organizações administrativas, econômicas, militares,
culturais e outras organizações estatais, além das inúmeras associações de massas
dos trabalhadores que surgiram por conta própria e que abrangem essas organi-
zações e as conectam com a população. Os sovietes são uma organização de massa
de todos os trabalhadores da cidade e do campo. Eles são uma organização apar-
tidária. Os sovietes são a expressão direta da ditadura do proletariado. É por
meio dos sovietes que são realizadas todas as medidas para o fortalecimento da
ditadura e para a construção do socialismo. É através dos sovietes que se exerce
a direção estatal do campesinato pelo proletariado. Eles ligam as grandes massas
trabalhadoras à vanguarda do proletariado.
Em terceiro lugar, existem as cooperativas de todos os tipos, com todas as
suas ramificações. Trata-se de uma organização de massas dos trabalhadores,
uma organização sem partido, que os une principalmente como consumidores e
também, com o passar do tempo, como produtores (cooperativas agrícolas). As
cooperativas adquirem especial significado após a consolidação da ditadura do
proletariado, durante o período de extensas construções. Eles facilitam o contato
entre a vanguarda do proletariado e a massa do campesinato e permitem arrastar
a massa para o canal da construção socialista.
Em quarto lugar, existe a Liga Juvenil. Esta é uma organização de massa de
jovens trabalhadores e camponeses; é uma organização sem partido, mas está li-
gada ao Partido. A sua missão é ajudar o Partido a educar as jovens gerações no
espírito do socialismo. Fornece uma base de jovens para todas as outras orga-
nizações de massa do proletariado em todos os ramos da administração. A Liga
da Juventude adquiriu um significado especial desde a consolidação da ditadura
do proletariado, no período de extenso trabalho cultural e educacional realizado
pelo proletariado.
Por último, está o Partido do proletariado, sua vanguarda. A sua força reside
no fato de atrair para as suas fileiras todos os melhores elementos do proletariado
de todas as organizações de massa deste último. Sua função é combinar o tra-
balho de todas as organizações de massas do proletariado, sem exceção, e dirigir
suas atividades para um único objetivo, o objetivo da emancipação do proletari-
ado. E é absolutamente necessário combiná-los e direcioná-los para um único
objetivo. Caso contrário, a unidade na luta do proletariado é impossível. Não há
outra forma de orientação das massas proletárias em sua luta pelo poder, em sua
luta pela construção do socialismo. É impossível. Apenas a vanguarda do prole-
tariado, seu Partido, é capaz de combinar e dirigir o trabalho das organizações
de massas do proletariado. Só o Partido do proletariado, só o Partido Comunista,
316 Obras Escolhidas

é capaz de cumprir este papel de dirigente principal do sistema da ditadura do


proletariado.
Por quê?
Porque, em primeiro lugar, é o centro de concentração dos melhores elementos da classe ope-
rária, que têm ligações diretas com as organizações não partidárias do proletariado e muitas
vezes as dirigem; porque, em segundo lugar, o Partido, como centro de reunião dos melhores
membros da classe operária, é a melhor escola para a formação de dirigentes da classe operá-
ria, capaz de dirigir todas as formas de organização de sua classe; porque, em terceiro lugar,
o Partido, como a melhor escola para a formação de dirigentes da classe operária, é, pela sua
experiência e prestígio, a única organização capaz de centralizar a direção da luta do prole-
tariado, transformando assim todo e qualquer organização apartidária da classe operária em
um órgão auxiliar e correia de transmissão que liga o Partido à classe (ver “Fundamentos do
Leninismo”).

O Partido é o principal motor do sistema da ditadura do proletariado. “O


Partido é a forma mais elevada de organização de classe do proletariado” (Lenin).
Resumindo: os sindicatos, como organização de massas do proletariado, li-
gando o Partido à classe principalmente na esfera da produção; os sovietes, como
organização de massas dos trabalhadores, ligando o Partido a este principalmente
na esfera da administração estatal; as cooperativas, como organização de massas
principalmente do campesinato, ligando o Partido às massas camponesas prin-
cipalmente na esfera econômica, na esfera de atrair o campesinato ao trabalho
de construção socialista; a Liga da Juventude, como organização de massas de
jovens operários e camponeses, cuja missão é ajudar a vanguarda do proletari-
ado na educação socialista da nova geração e na formação de jovens reservas; e,
finalmente, o Partido, como principal força dirigente do sistema da ditadura do
proletariado, cuja missão é liderar todas essas organizações de massa – tal, em ge-
ral, é o retrato do “mecanismo” da ditadura, a imagem do “sistema da ditadura
do proletariado”.
Sem o Partido como principal força motriz, é impossível que a ditadura do
proletariado seja durável e firme.
Assim, nas palavras de Lenin:
No seu conjunto, temos um aparelho proletário formalmente não comunista, flexível e rela-
tivamente amplo e muito poderoso, através do qual o Partido está intimamente ligado à classe
e às massas, e por meio da qual, sob a direção do Partido, se exerce a ditadura de classe (ver
vol. 25, p. 192).

Claro, isso não deve ser entendido no sentido de que o Partido pode ou deve
tomar o lugar dos sindicatos, dos sovietes e das outras organizações de massa. O
Partido exerce a ditadura do proletariado. No entanto, não o exerce diretamente,
mas com a ajuda dos sindicatos e através dos sovietes e suas ramificações. Sem
essas “correntes de transmissão”, seria impossível que a ditadura se firmasse.
O Partido, por assim dizer, arrasta para as suas fileiras a vanguarda do proletariado, e esta
vanguarda exerce a ditadura do proletariado. Sem uma fundação como a dos sindicatos, a
ditadura não pode ser exercida, as funções do Estado não podem ser cumpridas. E essas
funções devem ser exercidas por meio de várias instituições especiais também de um novo
tipo; a saber, através do aparato soviético (...)É impossível exercer a ditadura sem uma série
de ‘correntes de transmissão’ da vanguarda à massa da classe avançada e desta última à massa
do povo trabalhador (ver vol. XXVI, pp. 64-65).

A expressão máxima do papel de liderança do Partido, aqui, na União Sovié-


J. V. Stalin 317

tica, na terra da ditadura do proletariado, por exemplo, é o fato de que nenhuma


questão política ou organizacional importante é decidida por nosso Soviete e ou-
tras organizações de massa sem diretrizes orientadoras do Partido. Nesse sentido,
pode-se dizer que a ditadura do proletariado é, em essência, a “ditadura” de sua
vanguarda, a “ditadura” de seu Partido, como principal força motriz do proleta-
riado. Aqui está o que Lenin disse sobre este assunto no Segundo Congresso do
Comintern213 :
Tanner diz que representa a ditadura do proletariado, mas a ditadura do proletariado não é
concebida da mesma forma que nós a concebemos. Ele diz que por ditadura do proletariado
queremos dizer, em essência, a ditadura de sua minoria organizada e com consciência de
classe (...) E, de fato, na era do capitalismo, quando as massas dos trabalhadores estão conti-
nuamente submetidas à exploração e não podem desenvolver suas potencialidades humanas,
a característica mais notável dos partidos políticos da classe trabalhadora é que eles podem
abraçar apenas uma minoria de sua classe. Um partido político pode compreender apenas
uma minoria da classe, da mesma forma que os trabalhadores com consciência de classe em
toda sociedade capitalista constituem apenas uma minoria de todos os trabalhadores. É por
isso que devemos admitir que somente esta minoria com consciência de classe pode guiar as
grandes massas dos trabalhadores e liderá-las. E se o camarada Tanner diz que se opõe aos
partidos, mas ao mesmo tempo é a favor da minoria constituída pelos operários mais bem
organizados e mais revolucionários que mostram o caminho a todo o proletariado, então digo
que realmente não há diferença entre nós (ver Vol. 25, p. 347).

Mas isso, no entanto, não deve ser entendido no sentido de que um sinal de
igualdade pode ser colocado entre a ditadura do proletariado e o papel dirigente
do Partido (a “ditadura” do Partido), com o qual a primeira pode ser identifi-
cada como o último, e que o último pode ser substituído pelo primeiro. Sorin,
por exemplo, diz que “a ditadura do proletariado é a ditadura do nosso Partido”.
Esta tese, como vê, identifica a “ditadura do Partido” com a ditadura do proleta-
riado. Podemos considerar esta identificação correta e ainda assim permanecer
no terreno do leninismo? Não, nós não podemos. E pelos seguintes motivos:
Primeiramente. No trecho de seu discurso, no Segundo Congresso do Co-
mintern citado acima, Lenin não identifica de forma alguma o papel dirigente
do Partido com a ditadura do proletariado. Ele diz que “apenas esta minoria com
consciência de classe (isto é, o Partido – J. Stalin) pode guiar as grandes massas
dos trabalhadores e liderá-las”, que é precisamente neste sentido que “pela di-
tadura do proletariado queremos dizer, em essência, a ditadura de sua minoria
organizada e com consciência de classe”.
Dizer “em essência” não significa “totalmente”. Costumamos dizer que a
questão nacional é, em essência, uma questão camponesa. E isso é verdade. Mas
isso não significa que a questão nacional seja abrangida pela questão camponesa,
que a questão camponesa seja igual em âmbito à questão nacional, que a questão
camponesa e a questão nacional sejam idênticas. Não há necessidade de provar
que a questão nacional é mais ampla e rica em seu alcance do que a questão cam-
ponesa. O mesmo deve ser dito por analogia a respeito do papel dirigente do
Partido e da ditadura do proletariado. Embora o Partido exerça a ditadura do
proletariado, e neste sentido a ditadura do proletariado seja, em essência, a “di-
tadura” do seu Partido, isso não significa que a “ditadura do Partido” (seu papel
213O Segundo Congresso da Internacional Comunista foi realizado de 19 de julho a 7 de agosto de
1920. Stalin está citando aqui o discurso de Lenin sobre “O Papel da Política Comunista”.
318 Obras Escolhidas

dirigente) é idêntica à ditadura do proletariado, que a primeira é igual em es-


copo à segunda. Não há necessidade de provar que a ditadura do proletariado é
mais ampla e rica em seu alcance do que o papel dirigente do Partido. O Partido
realiza a ditadura do proletariado, e não qualquer outro tipo de ditadura. Quem
identifica o papel dirigente do Partido com a ditadura do proletariado substitui
a ditadura do proletariado por “ditadura” do Partido.
Em segundo lugar. Nenhuma decisão importante é alcançada pelas organi-
zações de massas do proletariado sem as diretrizes orientadoras do Partido. Isso
é perfeitamente verdade. Mas isso significa que a ditadura do proletariado con-
siste inteiramente nas diretrizes orientadoras dadas pelo Partido? Isso significa
que, em vista disso, as diretrizes orientadoras do Partido podem ser identifica-
das com a ditadura do proletariado? Claro que não. A ditadura do proletariado
consiste nas diretrizes orientadoras do Partido mais a execução dessas diretrizes
pelas organizações de massas do proletariado, mais o seu cumprimento pela po-
pulação. Aqui, como você vê, temos que lidar com toda uma série de transições
e etapas intermediárias que não são de forma alguma elementos sem importân-
cia da ditadura do proletariado. Portanto, entre as diretrizes orientadoras do
Partido e seu cumprimento estão a vontade e as ações daqueles que são lidera-
dos, a vontade e as ações da classe, sua disposição (ou relutância) em apoiar tais
diretrizes, sua capacidade (ou incapacidade) de cumprir de acordo com essas di-
retrizes, sua capacidade (ou incapacidade) de cumpri-las estritamente de acordo
com as demandas da situação. Quase não é preciso provar que o Partido, tendo
assumido a liderança em suas mãos, não pode deixar de contar com a vontade,
a condição, o nível de consciência política daqueles que são liderados, não pode
deixar de levar em conta a vontade, a condição e o nível da consciência política de
sua classe. Portanto, quem identifica o protagonismo do Partido com a ditadura
do proletariado substitui as diretrizes do Partido pela vontade e pelas ações da
classe.
Em terceiro lugar. “A ditadura do proletariado”, diz Lenin, “é a luta de clas-
ses do proletariado, que conquistou a vitória e tomou o poder político” (ver Vol.
24, p. 311). Como essa luta de classes pode encontrar expressão? Pode encon-
trar expressão em uma série de ações armadas do proletariado contra as inves-
tidas da burguesia derrubada ou contra a intervenção da burguesia estrangeira.
Pode encontrar expressão na guerra civil, se o poder do proletariado ainda não
estiver consolidado. Pode encontrar expressão, depois que o poder já foi con-
solidado, no extenso trabalho organizativo e construtivo do proletariado, com o
alistamento das grandes massas nesta obra. Em todos esses casos, a força atuante
é o proletariado como classe. Nunca aconteceu que o Partido, apenas o Partido,
empreendeu todas essas ações apenas com suas próprias forças, sem o apoio da
classe. Normalmente, ele apenas direciona essas ações, e pode direcioná-las ape-
nas na medida em que tem o apoio da classe. Pois o Partido não pode cobrir, não
pode substituir a classe. Pois, apesar de todo o seu importante papel de liderança,
o Partido ainda faz parte da classe. Portanto, quem identifica o protagonismo do
Partido com a ditadura do proletariado, substitui a classe pelo Partido.
Em quarto lugar. O Partido exerce a ditadura do proletariado. “O Partido é
a vanguarda direta do proletariado; é o líder” (Lenin). Nesse sentido, o Partido
toma o poder, o Partido governa o país. Mas isso não deve ser entendido no sen-
J. V. Stalin 319

tido de que o Partido exerce a ditadura do proletariado separadamente do poder


do Estado, sem o poder do Estado; que o Partido governa o país separadamente
dos sovietes, não por meio dos sovietes. Isso não significa que o Partido se iden-
tifique com os sovietes, com o poder do Estado. O Partido é o cerne desse poder,
mas não é e não pode ser identificado com o poder estatal.
“Como partido governante”, diz Lenin, “não podíamos deixar de fundir a
‘liderança’ soviética com a ‘liderança’ do Partido – em nosso país eles se fundiram
e assim permanecerão” (ver Vol. 26, p. 208). Isso é verdade. Mas com isso Lenin
de forma alguma quer sugerir que nossas instituições soviéticas como um todo,
por exemplo nosso exército, nossos transportes, nossas instituições econômicas,
etc., são instituições do Partido, que o Partido pode substituir os sovietes e suas
ramificações, que o Partido pode ser identificado com o poder do Estado. Lenin
disse repetidamente que “o sistema dos sovietes é a ditadura do proletariado” e
que “o poder soviético é a ditadura do proletariado” (ver Vol. 24, pp. 14-15); mas
nunca disse que o Partido é o poder do Estado, que os sovietes e o Partido são uma
só e mesma coisa. O Partido, com várias centenas de milhares de membros, guia
os sovietes e suas ramificações centrais e locais, que abrangem dezenas de milhões
de pessoas, partidárias e não-partidárias, mas não pode e não deve suplantá-los.
É por isso que Lenin diz que “a ditadura é exercida pelo proletariado organizado
nos sovietes, o proletariado dirigido pelo Partido Comunista dos Bolcheviques”;
que “todo o trabalho do Partido é realizado através dos sovietes, que abraçam as
massas trabalhadoras independentemente da ocupação” (ver Vol. 25, pp. 192-
193); e que a ditadura “tem que ser exercida... através do aparato soviético” (ver
Vol. 26, p. 64). Portanto, quem identifica o papel dirigente do Partido com a
ditadura do proletariado, substitui o Partido pelos sovietes, ou seja, pelo poder
do Estado.
Em quinto lugar. O conceito de ditadura do proletariado é um conceito de
Estado. A ditadura do proletariado inclui necessariamente o conceito de força.
Não há ditadura sem uso da força, se ditadura for entendida no sentido estrito
da palavra. Lenin define a ditadura do proletariado como “o poder baseado di-
retamente no uso da força” (ver Vol. 19, p. 315). Portanto, falar de ditadura do
Partido em relação à classe proletária e identificá-la com a ditadura do proleta-
riado equivale a dizer que em relação à sua classe o Partido não deve ser apenas
um guia – não apenas um líder e professor – mas também uma espécie de dita-
dor que emprega força contra ele, o que, claro, é totalmente incorreto. Portanto,
quem identifica “ditadura do Partido” com a ditadura do proletariado parte ta-
citamente do pressuposto de que o prestígio do Partido pode ser construído com
a força empregada contra a classe trabalhadora, o que é absurdo e totalmente in-
compatível com o leninismo. O prestígio do Partido é sustentado pela confiança
da classe trabalhadora. E a confiança da classe trabalhadora não é conquistada
pela força – a força só a destrói – mas pela teoria correta do Partido, pela polí-
tica correta do Partido, pela devoção do Partido à classe trabalhadora, por sua
conexão com as massas da classe trabalhadora, por sua prontidão e capacidade
de convencer as massas da correção de seus slogans.
O que, então, decorre de tudo isso?
Disto se segue que:
320 Obras Escolhidas

1) Lenin usa a palavra ditadura do Partido não no sentido estrito da palavra


(“poder baseado no uso da força”), mas no sentido figurado, no sentido de sua
liderança indivisa.
2) Quem identifica a direção do Partido com a ditadura do proletariado dis-
torce Lenin, atribuindo erroneamente ao Partido a função de usar a força contra
a classe operária como um todo.
3) Quem atribui ao Partido a função, que não possui, de usar a força contra
a classe operária no seu conjunto, viola os requisitos elementares de corretas
relações mútuas entre a vanguarda e a classe, entre o Partido e o proletariado.
Assim, chegamos à questão das relações mútuas entre o Partido e a classe,
entre o Partido e os não partidários da classe operária. Lenin define essas rela-
ções mútuas como “confiança mútua entre a vanguarda da classe trabalhadora e
a massa dos trabalhadores” (ver Vol. 26, p. 235).
O que isto significa?
Significa, em primeiro lugar, que o Partido deve ouvir de perto os anseios
das massas; que deve prestar atenção cuidadosa ao instinto revolucionário das
massas; que deve estudar a prática da luta das massas e, com base nisso, testar a
correção de sua própria política; que, consequentemente, não deve apenas ensi-
nar as massas, mas também aprender com elas. Significa, em segundo lugar, que
o Partido deve ganhar dia a dia a confiança das massas proletárias; que deve por
sua política e trabalho garantir o apoio das massas; que não deve comandar, mas
principalmente convencer as massas, ajudando-as a perceber por sua própria ex-
periência a linha correta da política do Partido que, consequentemente, deve ser
o guia, o líder e o professor de sua classe.
Violar essas condições significa desestabilizar as relações mútuas e corretas
entre a vanguarda e a classe, minar a “confiança mútua”, quebrar a disciplina de
classe e do Partido. Como pontuava Lenin:
Certamente quase todo mundo agora percebe que os bolcheviques não poderiam ter se man-
tido no poder por dois meses e meio, muito menos dois anos e meio, sem a mais rígida e
verdadeiramente férrea disciplina em nosso Partido, e sem o apoio total ao Partido por toda
a massa da classe trabalhadora, isto é, por todo o seu pensamento, elementos honestos, ab-
negados e influentes, capazes de liderar ou levar consigo os estratos atrasados (...) a ditadura
do proletariado é uma luta obstinada – sangrenta e sem sangue, violenta e pacífica, militar
e econômica, educacional e administrativa – contra as forças e tradições da velha sociedade.
A força do hábito de milhões e dezenas de milhões é uma força terrível. Sem um partido
de ferro temperado na luta, sem um partido que goze da confiança de tudo o que é honesto
na classe, sem um partido capaz de vigiar e influenciar o ânimo das massas, é impossível
conduzir tal luta com sucesso (ver Vol. 25, pp. 173-190).

Mas como o Partido adquire essa confiança e apoio da classe? Como é a


disciplina de ferro necessária para a ditadura do proletariado construída dentro
da classe trabalhadora? Em que solo cresce? Aqui está o que Lenin disse sobre
este assunto:
Como é mantida a disciplina do partido revolucionário do proletariado? Como é testado?
Como é reforçado? Em primeiro lugar, pela consciência de classe da vanguarda proletária e
pela sua devoção à revolução, pelo seu vigor, auto sacrifício e heroísmo. Em segundo lugar,
por sua capacidade de se vincular, de se manter em contato próximo e, em certa medida, se
quiser, de se fundir com as mais amplas massas trabalhadoras- principalmente com o proletá-
rio, mas também com os não-proletários. Em terceiro lugar, pela correção da direção política
J. V. Stalin 321

exercida por esta vanguarda, pela correção de sua estratégia e tática política, desde que as
massas mais amplas tenham sido convencidas por sua própria experiência dessa correção.
Sem essas condições, a disciplina em um partido revolucionário que é realmente capaz de
ser o partido da classe avançada, cuja missão é derrubar a burguesia e transformar toda a
sociedade, não pode ser alcançada. Sem essas condições, as tentativas de estabelecer disci-
plina tornam-se inevitavelmente uma cifra, uma frase vazia, mera afetação. Por outro lado,
essas condições não podem surgir todas de uma vez. Elas são criadas apenas por esforço pro-
longado e experiência arduamente conquistada. Sua criação é facilitada apenas pela teoria
revolucionária correta, que, por sua vez, não é um dogma, mas assume forma final apenas
em conexão próxima com a atividade prática de um movimento verdadeiramente de massa e
verdadeiramente revolucionário (ver Vol. 25, p. 174).

E mais:
A vitória sobre o capitalismo requer a correlação correta entre os dirigentes, comunistas,
partidários, a classe revolucionária – o proletariado – e as massas, ou seja, os trabalhadores
e os explorados como um todo. Somente o Partido Comunista, se é realmente a vanguarda
da classe revolucionária, se contém todos os melhores representantes dessa classe, se consiste
de comunistas totalmente conscientes e devotados que foram educados e fortalecidos pela
experiência de revolucionários obstinados luta, se este Partido conseguiu ligar-se insepara-
velmente com toda a vida da sua classe e, através dela, com toda a massa dos explorados, e
se conseguiu inspirar a confiança total desta classe e desta massa- apenas tal partido é capaz
de liderar o proletariado na luta mais implacável, decidida e final contra todas as forças do
capitalismo. Por outro lado, somente sob a liderança de tal partido o proletariado pode de-
senvolver todo o poder de seu ataque revolucionário e anular a inevitável apatia e, em parte, a
resistência da pequena minoria da aristocracia operária corrompida pelo capitalismo, e dos
antigos dirigentes sindicais e cooperativos, etc. Só então poderá mostrar toda a sua força,
que, devido à própria estrutura econômica da sociedade capitalista, é incomensuravelmente
maior do que a proporção da população que constitui (ver vol. 25, p. 315).

Destas citações segue-se que:


1) O prestígio do Partido e a disciplina de ferro dentro da classe trabalhadora
que são necessários para a ditadura do proletariado não são construídos sobre
o medo ou sobre os direitos “irrestritos” do Partido, mas sobre a confiança da
classe trabalhadora no Partido, no apoio que o Partido recebe da classe operária.
2) A confiança da classe operária no Partido não se adquire de um só golpe,
e não por meio da força contra a classe operária, mas pelo trabalho prolongado
do Partido entre as massas, pela política correta do Partido, pela capacidade do
Partido para convencer as massas por sua própria experiência da correção de sua
política, pela capacidade do Partido de garantir o apoio da classe trabalhadora e
de liderar as massas da classe trabalhadora.
3) Sem uma correta política do Partido, reforçada pela experiência da luta
das massas e sem a confiança da classe trabalhadora, não há e não pode haver
uma verdadeira liderança do Partido.
4) O Partido e sua direção, se o Partido goza da confiança da classe, e se essa
direção é uma direção real, não pode ser contraposta à ditadura do proletariado,
porque sem a direção do Partido (a “ditadura” do Partido), gozando da confiança
da classe operária, é impossível que a ditadura do proletariado seja de todo firme.
Sem essas condições, o prestígio do Partido e a disciplina férrea da classe
trabalhadora são frases vazias ou fanfarronice e aventureirismo.
É impossível opor a ditadura do proletariado à direção (a “ditadura”) do Par-
tido. Impossível porque a direção do Partido é a coisa principal na ditadura do
proletariado, se tivermos em mente uma ditadura que seja firme e completa, e
322 Obras Escolhidas

não uma como a Comuna de Paris, por exemplo, que não foi nem um completa
nem uma ditadura firme. É impossível porque a ditadura do proletariado e a
direção do Partido estão, por assim dizer, na mesma linha de atividade, operam
na mesma direção.
A mera apresentação da questão ‘ditadura do Partido’ ou ‘ditadura de classe’? ‘ditadura
(Partido) dos líderes ou ditadura (Partido) das massas’? atesta a mais incrível e desesperada
confusão de pensamento. Todo mundo sabe que as massas se dividem em classes. Que nor-
malmente, e na maioria dos casos, pelo menos nos países civilizados modernos, as classes são
lideradas por partidos políticos; que os partidos políticos, como regra geral, são dirigidos
por grupos mais ou menos estáveis compostos pelos membros mais autorizados, influentes
e experientes, que são eleitos para os cargos de maior responsabilidade e são chamados de
líderes. Ir tão longe como opor, em geral, a ditadura das massas à ditadura dos líderes, é
ridiculamente absurdo e estúpido (ver Vol. 25, pp. 187-188).

Isso é absolutamente correto. Mas essa afirmação correta parte da premissa


de que existem relações mútuas corretas entre a vanguarda e as massas operárias,
entre o Partido e a classe. Parte do pressuposto de que as relações mútuas entre a
vanguarda e a classe permanecem, por assim dizer, normais, permanecem dentro
dos limites da “confiança mútua”.
Mas e se as relações mútuas corretas entre a vanguarda e a classe, as relações
de “confiança mútua” entre o Partido e a classe forem perturbadas? E se o pró-
prio Partido começar, de uma forma ou de outra, a se opor à classe, perturbando
assim os fundamentos de suas corretas relações mútuas com a classe, perturbando
assim os fundamentos da “confiança mútua”? Esses casos são possíveis? Sim, eles
são.
Eles são possíveis:
1) se o Partido começa a construir seu prestígio entre as massas, não por seu
trabalho e pela confiança das massas, mas por seus direitos “irrestritos”;
2) se a política do Partido estiver obviamente errada e o Partido não estiver
disposto a reconsiderar e retificar seu erro;
3) se a política do Partido é correta em geral, mas as massas ainda não estão
prontas para torná-la sua, e o Partido não quer ou não pode esperar para dar às
massas a oportunidade de se convencerem por meio de seus própria experiência
que a política do Partido é correta e procura impô-la às massas.
A história do nosso Partido fornece vários desses casos. Vários grupos e fac-
ções em nosso Partido sofreram e desapareceram porque violaram uma dessas
três condições, e às vezes todas essas condições em conjunto. Mas daí decorre
que opor a ditadura do proletariado à “ditadura” (direção) do Partido só pode
ser considerado incorreto:
1) se por ditadura do Partido em relação à classe trabalhadora entendemos
não uma ditadura no sentido próprio da palavra (“poder com base no uso da
força”), mas sim a direção do Partido, o que impede o uso de força contra a
classe trabalhadora como um todo, contra sua maioria, exatamente como Lenin
queria dizer;
2) se o Partido tiver as qualificações para ser o verdadeiro líder da classe, ou
seja, se a política do Partido estiver correta, se essa política estiver de acordo com
os interesses da classe;
3) se a classe (sua maioria da classe) aceita essa política, faz essa política sua,
J. V. Stalin 323

torna-se convencida, como resultado do trabalho do Partido, que essa política é


correta, tem confiança no Partido e o apoia.
A violação destas condições dá origem inevitavelmente a um conflito entre o
Partido e a classe, a uma cisão entre eles, a uma contraposição.
A liderança do Partido pode ser imposta à classe pela força? Não, não pode.
De qualquer forma, tal liderança não pode ser durável. Se o Partido quer per-
manecer o Partido do proletariado, deve saber que é, antes de mais nada, o guia,
o dirigente, o professor da classe operária. Não devemos esquecer o que Lenin
disse sobre o assunto em seu livro “O Estado e a Revolução” :
Educando o partido operário, o marxismo educa a vanguarda do proletariado, que é capaz
de tomar o poder e conduzir todo o povo ao socialismo, de dirigir e organizar a nova ordem,
de ser o mestre, o guia, o dirigente do todos os trabalhadores e explorados na construção de
sua vida social sem a burguesia e contra a burguesia.

Pode-se considerar o Partido como o verdadeiro líder da classe se sua polí-


tica estiver errada, se sua política colidir com os interesses da classe? Claro que
não. Em tais casos, o Partido, se quiser permanecer líder, deve reconsiderar sua
política, deve corrigir sua política, deve reconhecer seu erro e corrigi-lo. Para
confirmar esta tese, pode-se citar, por exemplo, um fato da história de nosso Par-
tido como o período da abolição do sistema de apropriação excedente, quando
as massas operárias e camponesas estavam obviamente descontentes com nossa
política e quando o Partido decidiu, aberta e honestamente, reconsiderar esta
política. Eis o que Lenin disse na época, no Décimo Congresso do Partido, sobre
a questão da abolição do sistema de apropriação de excedentes e da introdução
da Nova Política Econômica:
Não devemos tentar ocultar nada, mas devemos dizer francamente que o campesinato não
se contenta com a forma de relações que com ele se estabelece, que não quer essa forma de
relações e não continuará a viver assim. Isso é indiscutível. Definitivamente, expressou essa
vontade. Esta é a vontade da vasta massa da população trabalhadora. Devemos contar com
isso; e somos políticos suficientemente sóbrios para dizer francamente: vamos reconsiderar
nossa política para com o campesinato (ver Vol. 26, p. 238).

Pode-se considerar que o Partido deve tomar a iniciativa e a liderança na or-


ganização de ações decisivas das massas apenas com o fundamento de que sua
política é correta em geral, se essa política ainda não conta com a confiança e o
apoio da classe porque, digamos, do atraso político deste último? Se o Partido
ainda não conseguiu convencer a classe da correção de sua política porque, di-
gamos, os eventos ainda não amadureceram? Não, não pode. Em tais casos, o
Partido, se quer ser um verdadeiro líder, deve saber esperar o momento, deve
convencer as massas de que sua política é correta, deve ajudar as massas a se
convencerem por meio de sua própria experiência de que esta política é correta.
“Se o partido revolucionário”, diz Lenin, “não tem maioria nos destacamentos
avançados das classes revolucionárias e no país, um levante está fora de questão”
(ver Vol. 21, p. 282). “A revolução é impossível sem uma mudança nas visões
da maioria da classe trabalhadora, e essa mudança é provocada pela experiência
política das massas” (ver Vol. 25, p. 221).
Além disso, Lenin complementa:
A vanguarda proletária foi conquistada ideologicamente. Isso é a questão principal. Sem
isso, nem mesmo o primeiro passo para a vitória pode ser dado. Mas ainda está um longo
324 Obras Escolhidas

caminho até a vitória. A vitória não pode ser conquistada apenas com a vanguarda. Para
lançar a vanguarda sozinha na batalha decisiva, antes de toda a classe, antes que as grandes
massas tenham assumido uma posição de apoio direto da vanguarda, ou pelo menos de neu-
tralidade benevolente em relação a ela, e uma na qual eles não podem apoiar o inimigo, seria
não apenas uma tolice, mas um crime. E para que de fato toda a classe, que de fato as gran-
des massas operárias e oprimidas pelo capital tomem tal posição, não bastam propaganda e
agitação por si só. Para isso, as massas devem ter sua própria experiência política (ibid., p.
228).

Sabemos que foi precisamente assim que o nosso Partido agiu durante o pe-
ríodo que vai das teses de abril de Lenin à insurreição de outubro de 1917. E
teve sucesso no levante precisamente porque agiu de acordo com essas diretrizes
de Lenin.
Tais são, basicamente, as condições para relações mútuas corretas entre a van-
guarda e a classe. O que significa, então, uma liderança quando a política do
Partido é correta e as relações corretas entre a vanguarda e a classe não são per-
turbadas?
Liderança, nestas circunstâncias, significa a capacidade de convencer as mas-
sas da correção da política do Partido; a capacidade de propor e executar slogans
como trazer as massas para as posições do Partido e ajudá-los a perceber por sua
própria experiência a correção da política do Partido; a capacidade de elevar as
massas ao nível de consciência política do Partido e, assim, garantir o apoio das
massas e sua prontidão para a luta decisiva. Portanto, o método de persuasão é
o principal método de liderança do Partido da classe trabalhadora. Lenin dizia:
Se nós, na Rússia de hoje, depois de dois anos e meio de vitórias sem precedentes sobre a
burguesia e sobre a Entente, fizéssemos do ‘reconhecimento da ditadura’ uma condição para
a filiação sindical, estaríamos cometendo uma loucura, prejudicando nossa influência sobre
as massas, ajudando os mencheviques. Toda a tarefa dos comunistas é ser capaz de convencer
os elementos atrasados, ser capaz de trabalhar entre eles, e não se isolar deles com slogans
artificiais e infantis de ‘esquerda’ (ver Vol. 25, p. 197).

Isso, é claro, não deve ser entendido no sentido de que o Partido deve conven-
cer todos os trabalhadores, até o último homem, e que só depois disso é possível
proceder à ação, que só depois disso é possível iniciar as operações. De modo
nenhum! Significa apenas que, antes de iniciar ações políticas decisivas, o Par-
tido deve, por meio de um trabalho revolucionário prolongado, assegurar para si
o apoio da maioria das massas operárias, ou pelo menos a neutralidade benevo-
lente da maioria da classe. Caso contrário, a tese de Lenin, de que uma condição
necessária para a revolução vitoriosa é que o Partido conquiste a maioria da classe
trabalhadora, seria desprovida de qualquer significado.
Pois bem, e o que se deve fazer com a minoria, se ela não quiser, se ela não
concordar em submeter-se voluntariamente à vontade da maioria? O Partido
pode e deve, gozando da confiança da maioria, obrigar a minoria a se submeter
à vontade da maioria? Sim, pode e deve. A liderança é assegurada pelo método
de persuadir as massas, como principal método pelo qual o Partido influencia
as massas. Isso, entretanto, não impede, mas pressupõe, o uso da coerção, se tal
coerção se basear na confiança no Partido e no apoio a ele por parte da maioria
da classe trabalhadora, se for aplicada à minoria após o partido convenceu a
maioria.
Convém relembrar as controvérsias em torno deste tema que ocorreram em
J. V. Stalin 325

nosso Partido durante a discussão da questão sindical. Qual foi o erro da opo-
sição, o erro do Tsektran214 naquela época? Será que a oposição considerou
recorrer à coerção? Não! Foi, não foi isso. O erro da oposição na altura foi
que, não conseguindo convencer a maioria da justeza da sua posição, tendo per-
dido a confiança da maioria, passou, no entanto, a aplicar coerção, passando a
insistir em “sacudir” que desfrutavam da confiança da maioria. Eis o que Lenin
disse naquela época, no Décimo Congresso do Partido, em seu discurso sobre os
sindicatos:
Para estabelecer relações mútuas e confiança mútua entre a vanguarda da classe operária
e as massas operárias, era necessário, se o Tsektran tivesse cometido um erro, corrigir esse
erro. Mas quando as pessoas começam a defender esse erro, ele se torna uma fonte de perigo
político. Se não tivéssemos feito o máximo possível no sentido da democracia em atender
aos Estados de espírito aqui expressos por Kutuzov, teríamos nos deparado com a falência
política. Primeiro devemos convencer e depois coagir. Devemos a todo custo primeiro con-
vencer, e depois coagir. Não fomos capazes de convencer as grandes massas e perturbamos
as relações corretas entre a vanguarda e as massas (ver Vol. 26, p. 235).

Lenin diz a mesma coisa em seu panfleto Sobre os Sindicatos: “Aplicamos a


coerção de maneira correta e com sucesso apenas quando fomos capazes de criar
de antemão uma base de convicção para ela” (ibid., P. 74). E isso é bem verdade,
pois sem essas condições nenhuma liderança é possível. Pois só assim podemos
assegurar a unidade de ação do Partido, se falamos do Partido, ou a unidade de
ação da classe, se falamos da classe como um todo. Sem isso, há divisão, confusão
e desmoralização nas fileiras da classe trabalhadora.
Tais são, em geral, os fundamentos de uma direção correta da classe traba-
lhadora pelo Partido. Qualquer outra concepção de liderança é sindicalismo,
anarquismo, burocracia – o que você quiser, mas não o bolchevismo, nem o leni-
nismo.
A ditadura do proletariado não pode ser contraposta à direção (“ditadura”)
do Partido se existirem relações recíprocas e corretas entre o Partido e a classe
operária, entre a vanguarda e as massas operárias. Mas daí decorre que é ainda
mais inadmissível identificar o Partido com a classe trabalhadora, a direção (“di-
tadura”) do Partido com a ditadura da classe trabalhadora. Com o fundamento
de que a “ditadura” do Partido não pode ser contraposta à ditadura do proleta-
riado, Sorin chegou à conclusão errada de que “a ditadura do proletariado é a
ditadura do nosso Partido”.
Mas Lenin não só fala da inadmissibilidade de tal contraposição, ele também
fala da inadmissibilidade de contrapor “a ditadura das massas à ditadura dos lí-
deres”. Quereria, com base nisso, que identificássemos a ditadura dos dirigentes
com a ditadura do proletariado? Se adotássemos essa linha, teríamos que dizer
que “a ditadura do proletariado é a ditadura de nossos líderes”. Mas é precisa-
mente a este absurdo que somos conduzidos, propriamente falando, pela política
de identificar a “ditadura” do Partido com a ditadura do proletariado.
214 Tsektran era o Comitê Central da União Conjunta de Trabalhadores em Transporte Ferroviário
e Aquático, formado em setembro de 1920. Em 1920 e no início de 1921, a liderança do Tsektran
estava nas mãos de trotskistas, que usavam métodos de pura compulsão e ditados na condução das
atividades sindicais. Em março de 1921, o Primeiro Congresso Conjunto Pan-Russo de Trabalhadores
em Transporte Ferroviário e Aquático expulsou os trotskistas da liderança do Tsektran, elegeu um
novo Comitê Central e esboçou novos métodos de trabalho sindical.
326 Obras Escolhidas

Qual é a posição de Zinoviev sobre esse assunto?


Em essência, Zinoviev compartilha do ponto de vista de Sorin de identificar
a “ditadura” do Partido com a ditadura do proletariado – com a diferença, no
entanto, de que Sorin se expressa de forma mais aberta e clara, enquanto Zino-
viev “se contorce”. Basta tomar, por exemplo, a seguinte passagem do livro de
Zinoviev, “Leninismo”, para nos convencermos disso:
Qual é o sistema existente na URSS do ponto de vista do conteúdo das classes? É a ditadura
do proletariado. Qual é a fonte de alimentação direta de poder na URSS? Quem exerce o
poder da classe trabalhadora? O Partido Comunista! Nesse sentido, temos a ditadura do
Partido. Qual é a forma jurídica de poder na URSS? Qual é o novo tipo de sistema de Estado
que foi criado pela Revolução de Outubro? O sistema soviético. Um não contradiz o outro
em nada”

Que uma não contradiga a outra é, evidentemente, correto se se entende a di-


reção do Partido por ditadura do Partido em relação à classe trabalhadora como
um todo. Mas, como é possível, neste terreno, colocar um sinal de igualdade
entre a ditadura do proletariado e a “ditadura” do Partido, entre o sistema so-
viético e a “ditadura” do Partido? Lenin identificou o sistema dos sovietes com
a ditadura do proletariado, e tinha razão, pois os sovietes, os nossos sovietes, são
organizações que reúnem as massas trabalhadoras em torno do proletariado sob
a manifestação do Partido. Mas quando, onde e em qual de seus escritos Le-
nin colocou um sinal de igualdade entre a “ditadura” do Partido e a ditadura
do proletariado, entre a “ditadura” do Partido e o sistema dos sovietes, como
Zinoviev faz agora? Nem a direção (“ditadura”) do Partido nem a direção (“dita-
dura”) dos dirigentes contradizem a ditadura do proletariado. Queres, com base
nisso, que proclamemos que o nosso país é o país da ditadura do proletariado,
isto é, o país da ditadura do Partido, isto é, o país da ditadura dos dirigentes? E,
no entanto, o “princípio” de identificar a “ditadura” do Partido com a ditadura
do proletariado, que Zinoviev enuncia sub-repticiamente e sem coragem, conduz
precisamente a este absurdo.
Nas numerosas obras de Lenin, pude constatar apenas cinco casos em que ele
toca, de passagem, na questão da ditadura do Partido. O primeiro caso é em sua
polêmica com os Socialistas-Revolucionários e os Mencheviques, onde diz:
Quando somos acusados de ditadura de um partido, e quando, como vocês ouviram, é feita
uma proposta para estabelecer uma frente socialista unida, respondemos: Sim, a ditadura de
um partido! Nós a defendemos e não podemos afastá-la, pois é aquele Partido que, ao longo
das décadas, conquistou a posição de vanguarda de todo o proletariado industrial (ver Vol.
24, p. 423).

O segundo caso está em sua “Carta aos Trabalhadores e Camponeses em Relação à


Vitória sobre Kolchak”, na qual afirma: “Algumas pessoas (especialmente os men-
cheviques e os socialistas-revolucionários – todos eles, até mesmo os ‘esquerdis-
tas’) estão tentando assustar os camponeses com o fantasma da ‘ditadura de um
partido’, o partido dos bolcheviques”. Os camponeses aprenderam com a instân-
cia de Kolchak a não ter medo deste bicho-papão. “Ou a ditadura (isto é, governo
de ferro) dos latifundiários e capitalistas, ou a ditadura da classe trabalhadora”
(ver Vol. 24, p. 436).
O terceiro caso é o discurso de Lenin no Segundo Congresso do Comintern
em sua controvérsia com Tanner. Eu a citei mais acima no escrito. O quarto caso
J. V. Stalin 327

são algumas linhas do panfleto “Esquerdismo, Doença Infantil do Comunismo”. As


passagens em questão já foram citadas acima igualmente. E o quinto caso está
em seu esboço da ditadura do proletariado, publicado na “Miscelânea de Lenin”,
Volume III, onde há um subtítulo “Ditadura de um único Partido” (ver Vol. III, p.
497).
Deve ser notado que, em dois dos cinco casos, o último e o segundo, Lenin
coloca as palavras “ditadura de um partido” entre aspas, evidenciando assim o
sentido inexato e figurativo desta fórmula. Deve-se notar também que em cada
um desses casos, por “ditadura do Partido” Lenin quis dizer ditadura (“governo
de ferro”) sobre os “latifundiários e capitalistas”, e não sobre a classe trabalha-
dora, ao contrário das calúnias de Kautsky e companhia.
É característico que em nenhuma das suas obras, principais ou secundárias,
em que Lenin discuta ou apenas faz alusão à ditadura do proletariado e ao papel
do Partido no sistema da ditadura do proletariado, haja qualquer indício de que
“a ditadura do proletariado é a ditadura do nosso Partido”. Ao contrário, cada
página, cada linha dessas obras clama contra essa fórmula.
Ainda mais característico é o fato de que nas teses do Segundo Congresso do
Comintern215 sobre o papel de um partido político, que foram elaboradas sob a
orientação direta de Lenin, e às quais Lenin repetidamente se referiu nos seus
discursos como modelo da formulação correta do papel e das tarefas do Partido,
não encontramos nenhuma palavra, literalmente nenhuma palavra sobre a dita-
dura do Partido. O que tudo isso indica?
a) Lenin não considerava a fórmula “ditadura do Partido” irrepreensível
e exata, razão pela qual é muito raramente usada em suas obras, e às vezes é
colocada entre aspas;
b) nas poucas ocasiões em que Lenin foi obrigado, em polêmica com os
adversários, a falar da ditadura do Partido, costumava referir-se à “ditadura
de um partido”, ou seja, ao fato de o nosso Partido deter o poder sozinho,
que não compartilha o poder com outras partes. Além disso, sempre deixou
claro que a ditadura do Partido em relação à classe trabalhadora significava a
direção do Partido, seu papel dirigente;
c) em todos os casos em que Lenin considerou necessário dar uma defi-
nição científica do papel do Partido no sistema da ditadura do proletariado,
falou exclusivamente do papel dirigente do Partido em relação à classe ope-
rária (e existem milhares de tais casos);
d) é por isso que nunca “ocorreu” a Lenin incluir a fórmula “ditadura
do Partido” na resolução fundamental sobre o papel do Partido – tenho em
mente a resolução aprovada no Segundo Congresso do Comintern;
e) os camaradas que identificam, ou tentam identificar, a “ditadura” do
Partido e, portanto, a “ditadura dos dirigentes” com a ditadura do proleta-
riado erram do ponto de vista do leninismo e são politicamente limitados,
pois violam as condições para corretas relações mútuas entre a vanguarda e a
classe.

215As teses do Segundo Congresso do Comintern sobre “O Papel do Partido Comunista na Revolução
Proletária” foram adotadas como resolução do Congresso.
328 Obras Escolhidas

Além do fato de que a fórmula “ditadura do Partido”, quando tomada sem


as ressalvas acima mencionadas, pode dar origem a uma série de perigos e retro-
cessos políticos em nosso trabalho prático. Esta fórmula, tomada sem reservas,
diz, por assim dizer:
a) às massas não-partidárias: não se atrevam a contradizer, não se atrevam a
discutir, porque o Partido pode fazer tudo, pois temos a ditadura do Partido;
b) aos quadros do Partido: atuem com mais ousadia, apertem o parafuso, não
há necessidade de dar atenção ao que dizem as massas não-partidárias, temos
a ditadura do Partido;
c) à alta direção do Partido: você pode se dar ao luxo de uma certa compla-
cência, pode até se tornar vaidoso pois temos a ditadura do Partido e, “con-
sequentemente”, a ditadura dos líderes.
É oportuno chamar a atenção para estes perigos precisamente no momento
presente, em um período em que a atividade política das massas está em ascen-
são, quando a prontidão do Partido para ouvir a voz das massas é de particular
valor para nós, quando a atenção às exigências das massas é um preceito funda-
mental do nosso Partido, quando incumbe ao Partido mostrar particular cautela
e particular flexibilidade na sua política, quando o perigo de se tornar vaidoso
é um dos mais graves perigos que o Partido enfrenta no seu tarefa de liderar
corretamente as massas.
Não se pode deixar de lembrar as palavras de ouro de Lenin no Décimo Pri-
meiro Congresso do nosso Partido:
Entre a massa do povo, nós (os comunistas – J. Stalin) somos, afinal, apenas uma gota no
oceano, e só podemos administrar quando expressamos adequadamente o que o povo está
consciente. A menos que façamos isso, o Partido Comunista não liderará o proletariado, o
proletariado não liderará as massas e todo o sistema entrará em colapso (ver Vol. 27, p. 256).

“Exprimir de forma apropriada aquilo de que o povo está consciente” – esta é preci-
samente a condição necessária que assegura ao Partido o honroso papel de prin-
cipal forca motriz do sistema da ditadura do proletariado.

VI

A questão da vitória do socialismo em um só país


O panfleto “Os Fundamentos do Leninismo” contém duas formulações sobre a
questão da vitória do socialismo em um país. O primeiro deles diz:
Antigamente, a vitória da revolução em um país era considerada impossível, supondo que
seria necessária a ação conjunta dos proletários de todos os países avançados ou pelo menos
de uma grande maioria para, assim, obter a vitória sobre a burguesia. Agora, esse ponto de
vista não se ajusta mais aos fatos. Devemos partir da possibilidade de tal vitória, pelo caráter
desigual e espasmódico do desenvolvimento dos vários países capitalistas sob as condições
do imperialismo, o desenvolvimento dentro do imperialismo de contradições catastróficas
levando a guerras inevitáveis, o crescimento do movimento revolucionário em todos os países
do mundo – tudo isso leva, não apenas à possibilidade, mas também à necessidade da vitória
do proletariado em cada país.

Esta tese está totalmente correta e dispensa comentários. É dirigida contra


a teoria dos social-democratas, que consideram utópica a tomada do poder pelo
J. V. Stalin 329

proletariado num país, sem a vitória simultânea da revolução nos outros países.
Mas o panfleto contém uma segunda formulação, que diz:
Mas a derrubada do poder da burguesia e o estabelecimento do poder do proletariado em um
país ainda não significa que a vitória completa do socialismo esteja assegurada. A principal
tarefa do socialismo – a organização da produção socialista – ainda não foi cumprida. Esta
tarefa pode ser cumprida, a vitória final do socialismo pode ser alcançada em um país, sem os
esforços conjuntos dos proletários em vários países avançados? Não, não pode. Para derrubar
a burguesia, os esforços de um país são suficientes; isso é provado pela história de nossa
revolução. Para a vitória final do socialismo, para a organização da produção socialista, os
esforços de um país, particularmente de um país camponês como a Rússia, são insuficientes;
para isso, são necessários os esforços dos proletários de vários países avançados.

Esta segunda formulação foi dirigida contra as afirmações dos críticos do le-
ninismo, contra os trotskistas, que declararam que a ditadura do proletariado em
um país, na ausência de vitória em outros países, não poderia “resistir diante de
uma Europa conservadora”.
Nessa medida – mas apenas nessa medida – essa formulação era então (em
maio de 1924) adequada e, sem dúvida, de alguma utilidade. Posteriormente,
porém, quando a crítica ao leninismo nesta esfera já havia sido superada no Par-
tido, quando uma nova questão se colocou em primeiro plano – a questão da
possibilidade de construir uma sociedade socialista completa pelos esforços de
nosso país, sem ajuda do exterior – a segunda formulação tornou-se obviamente
inadequada e, portanto, incorreta.
Qual é o defeito desta formulação?
Seu defeito é que junta duas questões diferentes em uma: junta a questão
da possibilidade de construir o socialismo pelos esforços de um país – que deve
ser respondida afirmativamente – com a questão de saber se um país em que a
ditadura do proletariado existe pode considerar-se totalmente protegido contra
a intervenção e, consequentemente, contra a restauração da velha ordem, sem
uma revolução vitoriosa em vários outros países – que deve ser respondida nega-
tivamente. Isso está além do fato de que essa formulação pode dar oportunidade
para pensar que a organização de uma sociedade socialista pelos esforços de um
país é impossível – o que, é claro, está incorreto.
Com base nisso, modifiquei e corrigi essa formulação em meu panfleto “A
Revolução de Outubro e as Táticas dos Comunistas Russos” de dezembro de 1924; eu
dividi a questão em duas – a questão da garantia total contra a restauração da ordem
burguesa e a questão da possibilidade de construir uma sociedade socialista completa
em um país. Isso foi feito, em primeiro lugar, tratando a “vitória total do socia-
lismo” como uma “garantia total contra a restauração da velha ordem”, o que só
é possível através “do esforço conjunto dos proletários de vários países”; e, em se-
gundo lugar, ao proclamar, com base no panfleto de Lenin “Sobre a Cooperação”,
a verdade indiscutível de que temos tudo o que é necessário para construir uma
sociedade socialista completa.
Foi esta nova formulação da questão que formou a base para a conhecida
resolução da 14ª Conferência do Partido “As Tarefas do Comintern e do PC Russo
(B)”, que examina a questão da vitória do socialismo em um país em conexão
com a estabilização do capitalismo (abril de 1925), e considera que a construção
do socialismo pelos esforços de nosso país é possível e necessária.
330 Obras Escolhidas

Essa nova formulação também serviu de base para meu panfleto “Os Resultados
do Trabalho da Décima Quarta Conferência do PC Russo (B)”, publicado em maio de
1925, imediatamente após a Décima Quarta Conferência do Partido.
Com relação à apresentação da questão da vitória do socialismo em um país,
este panfleto afirma:
Nosso país apresenta dois grupos de contradições. Um grupo consiste nas contradições inter-
nas que existem entre o proletariado e o campesinato (isso se refere à construção do socialismo
em um país – J. Stalin). O outro grupo consiste nas contradições externas que existem entre
nosso país, como a pátria do socialismo, e todos os outros países, como pátrias do capitalismo
(isto se refere à vitória final do socialismo – J. Stalin). Quem confunde o primeiro grupo
de contradições, que podem ser superadas inteiramente pelos esforços de um país, com o se-
gundo grupo de contradições, cuja solução exige os esforços dos proletários de vários países,
comete um grave erro contra o leninismo. A pessoa que confunde ou tem a cabeça confusa,
ou é um oportunista incorrigível.

Sobre a questão da vitória do socialismo em nosso país, o folheto afirma:


Podemos construir o socialismo, e vamos construí-lo junto com o campesinato sob a liderança
da classe trabalhadora (...) pois sob a ditadura do proletariado que possuímos tudo o que é
necessário para construir uma sociedade socialista completa, superando todas as dificuldades
internas, pois podemos e devemos superá-las com o nosso próprio esforço.

Sobre a questão da vitória final do socialismo, meu escrito afirma:


A vitória final do socialismo é a garantia total contra as tentativas de intervenção e, portanto,
contra a restauração, pois qualquer tentativa séria de restauração só pode acontecer com o
apoio sério de fora, apenas com o apoio do capital internacional. Portanto, o apoio à nossa
revolução pelos trabalhadores de todos os países, e ainda mais a vitória dos trabalhadores em
pelo menos vários países, é uma condição necessária para garantir plenamente o primeiro
país vitorioso contra as tentativas de intervenção e restauração, condição necessária para a
vitória final do socialismo.

Claro, alguém poderia pensar. É bem sabido que esta questão foi tratada
com o mesmo espírito em meu panfleto “Perguntas e Respostas” (junho de 1925)
e no relatório político do Comitê Central ao XIV Congresso do PCUS (B) (24 de
dezembro de 1925). Esses são os fatos. Esses fatos, creio eu, são do conhecimento
de todos os camaradas, incluindo Zinoviev.
Se agora, quase dois anos depois da luta ideológica no Partido e depois da
resolução que foi adotada na XIV Conferência do Partido (abril de 1925), Zi-
noviev acha possível em sua resposta à discussão no XIV Congresso do Partido
(dezembro de 1925) desenterrar a velha e bastante inadequada fórmula contida
no meu panfleto escrito em abril de 1924 e torná-la a base para decidir a questão
já decidida da vitória do socialismo em um país – então, esse truque peculiar só
mostra que ele ficou completamente confuso nesta questão. Arrastar o Partido
depois de ter avançado, fugir da resolução da Décima Quarta Conferência do
Partido depois de confirmada por um Plenária do Comitê Central216 , significa
tornar-se irremediavelmente emaranhado em contradições, não ter fé na causa
de construir o socialismo, abandonar o caminho de Lenin e reconhecer a própria
derrota.
216Refere-se à plenária do Comitê Central do PC Russo (B) que se realizou de 23 a 30 de abril de
1925. A plenária endossou as resoluções adotadas pela Décima Quarta Conferência do PC Russo
(B), incluindo a resolução sobre “As tarefas do Comintern e do PC Russo (B) em relação à plenária
ampliado do CEIC” que definiu a posição do Partido sobre a questão da vitória do socialismo na
URSS.
J. V. Stalin 331

O que significa a possibilidade de vitória do socialismo em um país?


Significa a possibilidade de resolver as contradições entre o proletariado e o
campesinato por meio das forças internas do nosso país, a possibilidade do prole-
tariado tomar o poder e usar esse poder para construir uma sociedade socialista
completa em nosso país, com a simpatia e a apoio dos proletários de outros países,
mas sem a vitória preliminar da revolução proletária em outros países.
Sem essa possibilidade, construir o socialismo é construir sem perspectivas,
construir sem ter certeza de que o socialismo será totalmente consolidado. Não
adianta empenhar-se na construção do socialismo sem ter a certeza de que pode-
mos construí-lo integralmente, sem a convicção de que o atraso técnico de nosso
país não é um obstáculo insuperável à construção de uma sociedade socialista
completa. Negar tal possibilidade significa descrença na causa da construção do
socialismo, um afastamento do leninismo.
O que significa quando mencionamos a impossibilidade da vitória completa e
final do socialismo em um país sem a vitória da revolução em outros países?
Significa a impossibilidade de ter uma garantia total contra a intervenção e,
consequentemente, contra a restauração da ordem burguesa, sem a vitória da
revolução em pelo menos alguns países. Negar esta tese indiscutível significa
afastamento do internacionalismo, afastamento do leninismo. Já dizia Lenin:
Estamos vivendo não apenas em um Estado, mas em um sistema de Estados, e a existência da
República Soviética lado a lado com Estados imperialistas por um longo tempo é impensável.
Um ou outro deve triunfar no final. E antes que esse fim chegue, uma série de colisões
terríveis entre a República Soviética e os Estados burgueses será inevitável. Isso significa que
se a classe dominante, o proletariado, quer ter o controle, deve prová-lo também por meio de
sua organização militar (ver Vol. 24, p. 122).

E ainda reafirmava:
Temos diante de nós um certo equilíbrio, que é instável no mais alto grau, mas um equilíbrio
inquestionável, indiscutível, no entanto. Vai durar muito? Não sei e acho que é impossível
saber. E, portanto, devemos ter muito cuidado. E o primeiro preceito de nossa política, a
primeira lição a ser aprendida em nossas atividades governamentais durante o ano passado, a
lição que todos os trabalhadores e camponeses devem aprender, é que devemos estar alertas,
devemos lembrar que estamos cercados por pessoas, classes e governos que expressam aber-
tamente seu intenso ódio por nós. Devemos lembrar que estamos sempre a um fio de cabelo
de qualquer tipo de invasão (ver Vol. 27, p. 117).

Claro, alguém poderia pensar.


Agora, qual é a posição de Zinoviev quanto à questão da vitória do socialismo
em um país? Leiam:
Por vitória final do socialismo entende-se, pelo menos: 1) a abolição das classes e, portanto, 2)
a abolição da ditadura de uma classe, neste caso a ditadura do proletariado (...) Para ter uma
ideia mais clara de como a questão se encontra aqui, na URSS, no ano de 1925, devemos
distinguir entre duas coisas: 1) a possibilidade garantida de se engajar na construção do
socialismo – tal possibilidade, é lógico, é perfeitamente concebível dentro dos limites de um
país; e 2) a construção e consolidação final do socialismo, ou seja, a conquista de um sistema
socialista, de uma sociedade socialista.

O que tudo isso pode significar?


Isso significa que pela vitória final do socialismo em um país, Zinoviev en-
tende não uma garantia contra a intervenção e restauração, mas a possibilidade
332 Obras Escolhidas

de construir completamente a sociedade socialista. E pela vitória do socialismo


em um país, Zinoviev entende o tipo de construção do socialismo que não pode
e não deve levar à construção completa do socialismo. Construir ao acaso, sem
perspectivas, construir o socialismo sem construir uma sociedade socialista é im-
possível, e essa é a posição de Zinoviev. Engajar-se na construção do socialismo
sem a possibilidade de construí-lo completamente, sabendo que ele não pode ser
totalmente construído – tais são os absurdos em que Zinoviev se envolveu.
Isso é uma zombaria da questão, não uma solução para ela!
Aqui está outro trecho da resposta de Zinoviev à discussão no XIV Congresso
do Partido:
Dê uma olhada, por exemplo, no que o camarada Yakovlev chegou a dizer na última Con-
ferência do Partido Kursk Gubernia. Ele pergunta: “É possível para nós, cercados como estamos
por todos os lados por inimigos capitalistas, construir completamente o socialismo em um país sob tais
condições?” E ele responde: “Com base em tudo o que foi dito, temos o direito de dizer não só que estamos
construindo o socialismo, mas que apesar de por enquanto estarmos sozinhos, por enquanto somos o único
país soviético, o único Estado soviético no mundo, iremos completamente construir o socialismo” (Kurs-
kaya Pravda, No. 279, 8 de dezembro de 1925). É este o método leninista de apresentar a questão?
isto não cheira a estreiteza nacional?

Assim, segundo Zinoviev, reconhecer a possibilidade de construir totalmente


o socialismo em um país significa adotar o ponto de vista da estreiteza nacional,
enquanto negar tal possibilidade significa adotar o ponto de vista do internacio-
nalismo. Mas se isso for verdade, vale a pena lutar pela vitória sobre os elementos
capitalistas em nossa economia?
Não se segue daí que tal vitória é impossível?
Capitulação para os elementos capitalistas em nossa economia – é a isso que
a lógica inerente da linha de argumento de Zinoviev nos leva. E este absurdo,
que nada tem em comum com o leninismo, nos é apresentado por Zinoviev como
“internacionalismo”, como “leninismo legítimo”!
Afirmo que, nesta questão mais importante da construção do socialismo,
Zinoviev está abandonando o leninismo e caindo na posição do menchevique
Sukhanov. Vamos nos voltar para Lenin. Aqui está o que ele disse sobre a vitória
do socialismo em um país antes mesmo da Revolução de Outubro, em agosto de
1915:
O desenvolvimento econômico e político desigual é uma lei absoluta do capitalismo. Conse-
quentemente, a vitória do socialismo é possível primeiro em vários ou até mesmo em um país
capitalista separadamente. O proletariado vitorioso daquele país, tendo expropriado os capi-
talistas e organizado a produção socialista, se levantaria contra o resto do mundo – o mundo
capitalista – atraindo para sua causa as classes oprimidas de outros países, levantando revoltas
nesses países contra o capitalistas e, em caso de necessidade, sair até com força armada contra
as classes exploradoras e seus Estados (ver Vol. 18, pp. 232-33).

O que significa a frase de Lenin “organizado a produção socialista” que subli-


nhei? Isso significa que o proletariado do país vitorioso, tendo tomado o poder,
pode e deve organizar a produção socialista. E o que significa “organizar a pro-
dução socialista”? Significa construir completamente uma sociedade socialista.
Quase não é preciso provar que esta declaração clara e definitiva de Lenin não
requer mais comentários. Caso contrário, o apelo de Lenin para a tomada do
poder pelo proletariado em outubro de 1917 seria incompreensível.
J. V. Stalin 333

Veem que esta tese clara de Lenin, em comparação com a “tese” confusa e
anti-leninista de Zinoviev, de que podemos nos engajar na construção do socia-
lismo “dentro dos limites de um país”, embora seja impossível construí-lo comple-
tamente, são tão diferentes quanto o céu é diferente da terra.
A afirmação acima citada foi feita por Lenin em 1915, antes do proletariado
assumir o poder. Mas talvez ele tenha modificado seus pontos de vista após a
experiência de tomar o poder, depois de 1917? Voltemos ao panfleto de Lenin
“Sobre a Cooperação”, escrito em 1923.
De fato o poder do Estado sobre todos os meios de produção em grande escala, o poder
do Estado nas mãos do proletariado, a aliança deste proletariado com os muitos milhões de
pequenos camponeses, a direção assegurada do campesinato pelo proletariado, etc. – não é
isso tudo o que é necessário para construir uma sociedade socialista completa a partir das
cooperativas, apenas das cooperativas, que antes olhávamos como vendedores ambulantes e
que de certo ponto temos o direito de desprezar em como tal agora, sob NEP? Isso não é
tudo o que é necessário para construir uma sociedade socialista completa? Esta ainda não
é a construção da sociedade socialista, mas é tudo o que é necessário e suficiente para essa
construção (ver Vol. 27, p. 392).

Em outras palavras, podemos e devemos construir uma sociedade socialista


completa, pois temos à nossa disposição tudo o que é necessário e suficiente para
essa construção. Acho que seria difícil se expressar com mais clareza.
Compare esta tese clássica de Lenin com a repreensão anti-Leninista que Zi-
noviev direcionou a Yakovlev, e você perceberá que Yakovlev estava apenas re-
petindo as palavras de Lenin sobre a possibilidade de construir completamente
o socialismo em um país, enquanto Zinoviev, por atacar esta tese e castigar Ya-
kovlev, abandonou Lenin e adotou o ponto de vista do menchevique Sukhanov,
o ponto de vista de que é impossível construir o socialismo completamente em
nosso país devido ao seu atraso técnico.
Só podemos nos perguntar por que tomamos o poder em outubro de 1917 se
não contávamos com a construção total do socialismo. Não deveríamos ter assumido
o poder em outubro de 1917 – esta é a conclusão a que a lógica inerente da linha de
argumento de Zinoviev nos leva.
Afirmo ainda que na importantíssima questão da vitória do socialismo, Zino-
viev foi contra as decisões definitivas de nosso Partido, conforme registrado na
conhecida resolução da XIV Conferência do Partido “As Tarefas do Comintern e do
PC Russo (B) em conexão com a plenária Alargado do Comitê Executivo da Internacional
Comunista”. Voltemos a esta resolução. Aqui está o que diz sobre a vitória do
socialismo em um país:
A existência de dois sistemas sociais diretamente opostos dá origem à ameaça constante de
bloqueio capitalista, de outras formas de pressão econômica, de intervenção armada, de res-
tauração. Consequentemente, a única garantia da vitória final do socialismo, ou seja, a garan-
tia contra a restauração, é uma revolução socialista vitoriosa em vários países (...) O leninismo
ensina que a vitória final do socialismo, no sentido de uma garantia total contra a restauração
das relações burguesas, só é possível em escala internacional (...) Mas não decorre disso que é
impossível construir uma sociedade socialista completa em um país atrasado como a Rússia,
sem a ‘ajuda estatal’ (Trotsky) de países mais desenvolvidos técnica e economicamente (ver a
resolução).

Como você pode ver, a resolução interpreta a vitória final do socialismo como
uma garantia contra a intervenção e a restauração, em total contraste com a in-
terpretação de Zinoviev em seu livro “Leninismo”.
334 Obras Escolhidas

A resolução reconhece a possibilidade de construir uma sociedade socialista


completa em um país atrasado como a Rússia sem a “ajuda estatal” de países
mais desenvolvidos técnica e economicamente, em total contraste com o que Zi-
noviev disse quando repreendeu Yakovlev em sua resposta ao a discussão no XIV
Congresso do Partido.
De que outra forma isso pode ser descrito, senão como uma luta da parte de
Zinoviev contra a resolução da 14ª Conferência do Partido?
Claro, as resoluções do partido não estão isentas de erros. Às vezes elas con-
têm erros. Falando de forma geral, pode-se supor que a resolução da Conferência
do Décimo Quarto Partido também contém certos erros. Talvez Zinoviev pense
que esta resolução está errada. Mas então ele deveria dizer isso clara e aberta-
mente, como convém a um bolchevique. Por uma razão ou outra, no entanto,
Zinoviev não o faz. Ele preferiu escolher outro caminho, o de atacar a resolução
da XIV Conferência do Partido pela retaguarda, mantendo silêncio sobre esta
resolução e abstendo-se de qualquer crítica aberta à resolução. Evidentemente,
Zinoviev pensa que esta será a melhor maneira de alcançar seu propósito. E ele
tem apenas um propósito, a saber – “melhorar” a resolução e emendar Lenin
“apenas um pouco”. Nem é preciso provar que Zinoviev cometeu um erro de
cálculo.
A que se deve o erro de Zinoviev? Qual é a raiz desse erro?
A raiz desse erro, em minha opinião, está na convicção de Zinoviev de que
o atraso técnico de nosso país é um obstáculo insuperável à construção de uma
sociedade socialista completa; que o proletariado não pode construir completa-
mente o socialismo devido ao atraso técnico de nosso país. Zinoviev e Kamenev
certa vez tentaram levantar esse argumento em uma reunião do Comitê Central
do Partido antes da Conferência do Partido em abril217 . Mas eles receberam uma
rejeição e foram obrigados a recuar, e formalmente se submeteram ao ponto de
vista oposto, o ponto de vista da maioria do Comitê Central. Mas embora tenha
se submetido formalmente, Zinoviev continuou a travar uma luta contra a mai-
oria o tempo todo. Aqui está o que o Comitê de Moscou de nosso Partido diz
sobre este “incidente” no Comitê Central do PC Russo (B) em sua “Resposta” à
carta da Conferência do Partido de Leningrado em Gubernia218 :
Recentemente, no Bureau Político, Kamenev e Zinoviev defenderam o ponto de vista de que
não podemos enfrentar as dificuldades internas devido ao nosso atraso técnico e econômico,
a menos que uma revolução internacional venha em nosso socorro. Nós, porém, como a
maioria dos membros do Comitê Central, pensamos que podemos construir o socialismo, o
estamos construindo, e o faremos por completo, apesar de nosso atraso técnico. Achamos
que a obra de construção será muito mais lenta, é claro, do que nas condições de uma vitória
mundial; no entanto, estamos progredindo e continuaremos avançando. Também acredita-
mos que a opinião de Kamenev e Zinoviev expressa descrença nas forças internas de nossa
classe trabalhadora e das massas camponesas que seguem sua liderança. Acreditamos que é
um afastamento da posição leninista.

Este documento apareceu na imprensa durante as primeiras sessões do XIV


217 Isso se refere à Décima Quarta Conferência do PC Russo (B), realizada de 27 a 29 de abril de
1925.
218 A resposta do Comitê de Moscou do PC Russo (B) à carta da Vigésima Segunda Conferência

do Partido em Leningrado-Gubernia, carta esta que foi um ataque dos seguidores de Zinoviev e
Kamenev, foi publicada no Pravda, nº 291, 20 de dezembro de 1925.
J. V. Stalin 335

Congresso do Partido. Zinoviev, é claro, teve a oportunidade de atacar esse do-


cumento no Congresso. É característico que Zinoviev e Kamenev não tenham
encontrado argumentos contra essa grave acusação dirigida contra eles pelo Co-
mitê de Moscou de nosso Partido. Isso foi acidental? Eu acho que não. A acusa-
ção, aparentemente, acertou o alvo. Zinoviev e Kamenev “responderam” a essa
acusação em silêncio, porque não tinham “repertório para vencê-la”.
A “Nova Oposição” está ofendida porque Zinoviev é acusado de descrença na
vitória da construção socialista em nosso país. Mas se depois de um ano inteiro
de discussão sobre a questão da vitória do socialismo em um país; após o ponto
de vista de Zinoviev ter sido rejeitado pelo Bureau Político do Comitê Central
(abril de 1925); depois de o Partido chegar a uma opinião definitiva sobre esta
questão, registrada na conhecida resolução da XIV Conferência do Partido (abril
de 1925) – se, depois de tudo isso, Zinoviev se aventurar a se opor ao ponto de
vista do Partido em seu livro “Leninismo” (setembro de 1925), se ele então repe-
tir essa oposição no XIV Congresso do Partido – como tudo isso, essa teimosia,
essa persistência em seu erro, podem ser explicados senão pelo fato de que Zi-
noviev está infectado, irremediavelmente afetado, com descrença na vitória da
construção socialista em nosso país?
Agrada a Zinoviev considerar essa descrença como internacionalismo. Mas
desde quando passamos a considerar o afastamento do leninismo em uma ques-
tão fundamental do leninismo como internacionalismo?
Não seria mais correto dizer que não é o Partido, mas Zinoviev, que está pe-
cando contra o internacionalismo e a revolução internacional? Pois o que é o
nosso país, o país “que está construindo o socialismo”, senão a base da revolução
mundial? Mas pode ser uma base real da revolução mundial se for incapaz de
construir completamente uma sociedade socialista? Pode continuar a ser o pode-
roso centro de atração para os trabalhadores de todos os países que sem dúvida
é agora, se é incapaz de alcançar a vitória em casa sobre os elementos capita-
listas de nossa economia, a vitória da construção socialista? Eu acho que não.
Mas não se segue daí que a descrença na vitória da construção socialista, a dis-
seminação dessa descrença, levará nosso país a ser desacreditado como base da
revolução mundial? E se nosso país for desacreditado, o movimento revolucio-
nário mundial ficará enfraquecido. Como é que os senhores social-democratas
tentaram afastar os trabalhadores de nós? Pregando que “os russos não chega-
rão a lugar nenhum”. Com que derrotamos os social-democratas agora, quando
atraímos para o nosso país toda uma série de delegações operárias e, com isso,
fortalecemos a posição do comunismo em todo o mundo? Por nossos sucessos
na construção do socialismo. Não é óbvio, então, que quem dissemina a des-
crença em nossos sucessos na construção do socialismo ajuda indiretamente os
social-democratas, reduz o alcance do movimento revolucionário internacional e
inevitavelmente se afasta do internacionalismo?
Você vê que Zinoviev não está em melhor posição em relação ao seu “interna-
cionalismo” do que em relação ao seu “leninismo legítimo” na questão da cons-
trução do socialismo em um país. É por isso que o XIV Congresso do Partido
corretamente definiu as visões da “Nova Oposição” como “descrença na causa da
construção socialista”, como “uma distorção do leninismo”.
336 Obras Escolhidas

VII

A luta pela vitória da construção do socialismo


Acho que a descrença na vitória da construção socialista é o principal erro
da “Nova Oposição”. Em minha opinião, é o principal erro porque dele sur-
gem todos os outros erros dessa mesma ala. Os erros nas questões da NEP, do
capitalismo de Estado, a natureza da nossa indústria socialista, o papel das coo-
perativas sob a ditadura do proletariado, os métodos de luta contra os kulaks, o
papel e a importância do campesinato médio – todos esses erros devem ser atri-
buídos ao principal erro da oposição, à descrença na possibilidade de construir
completamente uma sociedade socialista pelos esforços de nosso país.
O que é a descrença na vitória da construção socialista em nosso país?
É, antes de mais nada, falta de confiança de que, devido a certas condições
de desenvolvimento de nosso país, a massa principal do campesinato possa ser
arrastada para a tarefa da construção socialista.
Em segundo lugar, é falta de confiança que o proletariado do nosso país, que
detém as posições-chave da nossa economia nacional, seja capaz de atrair a massa
principal do campesinato para a obra da construção socialista. É a partir dessas
teses que a oposição procede tacitamente em seus argumentos sobre os caminhos
de nosso desenvolvimento – não importa se o faz consciente ou inconsciente-
mente.
A massa principal do campesinato soviético pode ser arrastada para o trabalho
de construção socialista? No panfleto “Os Fundamentos do Leninismo”, há duas
teses principais sobre o assunto:
1) O campesinato da União Soviética não deve ser confundido com o campe-
sinato do Ocidente. Um campesinato que foi educado em três revoluções, que
lutou contra o tsar e o poder da burguesia lado a lado com o proletariado e sob
a direção do proletariado, um campesinato que recebeu terras e paz nas mãos
da revolução proletária e por isso tornou-se a base do proletariado – tal campe-
sinato não pode deixar de ser diferente de um campesinato que durante a re-
volução burguesa lutou sob a liderança da burguesia liberal, que recebeu terras
nas mãos dessa burguesia, e em vista disso tornou-se a base da burguesia. Quase
não é necessário provar que o campesinato soviético, que aprendeu a apreciar sua
amizade política e colaboração política com o proletariado e que deve sua liber-
dade a essa amizade e colaboração, não pode deixar de representar um material
excepcionalmente favorável para a colaboração econômica com o proletariado.
2) Agricultura na Rússia não deve ser confundida com agricultura no Oci-
dente. Lá, a agricultura se desenvolve ao longo das linhas normais do capita-
lismo, em condições de profunda diferenciação entre o campesinato, com gran-
des propriedades e latifúndios capitalistas privados em um extremo e paupe-
rismo, miséria e escravidão assalariada no outro. Devido a isso, a desintegração
e a deterioração são bastante naturais lá. Não é assim na Rússia. Aqui, a agri-
cultura não pode se desenvolver por esse caminho, a não ser pelo fato de que
a existência do poder soviético e a nacionalização dos principais instrumentos
e meios de produção impedem tal desenvolvimento. Na Rússia, o desenvolvi-
J. V. Stalin 337

mento da agricultura deve prosseguir por um caminho diferente, ao longo do


caminho de organizar milhões de pequenos e médios camponeses em cooperati-
vas, ao longo do caminho de desenvolver no campo um movimento cooperativo
de massa apoiado pelo Estado por meio de créditos preferenciais. Lenin assina-
lou acertadamente em seus artigos sobre a cooperação, que o desenvolvimento da
agricultura em nosso país deve seguir um novo caminho e, ao longo do caminho,
atrair a maioria dos camponeses para a construção socialista através das coopera-
tivas, introduzir na agricultura os princípios do coletivismo, primeiro na esfera da
comercialização e depois na esfera da produção de produtos agrícolas (...) Nem
é preciso provar que a grande maioria do campesinato seguirá avidamente esse
novo caminho de desenvolvimento, rejeitando o caminho do latifúndio capita-
lista privado e da escravidão assalariada, o caminho da destituição e da ruína”.
Essas teses estão corretas? Acho que ambas as teses são corretas e incontestá-
veis para todo o nosso período de construção nas condições da NEP.
São apenas a expressão das conhecidas teses de Lenin sobre o vínculo entre
o proletariado e o campesinato, sobre a inclusão das fazendas camponesas no
sistema de desenvolvimento socialista do nosso país; de suas teses de que o prole-
tariado deve marchar para o socialismo junto com a massa principal do campe-
sinato, que a organização das grandes massas do campesinato em cooperativas é
o caminho principal da construção socialista no campo, que com o crescimento
do nosso indústria socialista, “para nós, quanto mais crescimento da cooperação
é idêntico (...) ao crescimento do socialismo” (ver Vol. 27, p. 396).
De fato, por qual caminho pode e deve prosseguir o desenvolvimento da eco-
nomia camponesa em nosso país? A economia camponesa não é uma economia
capitalista. A economia camponesa, se considerarmos a esmagadora maioria das
fazendas camponesas, é uma pequena economia mercantil. E o que é a pequena
economia mercantil camponesa? É a economia que se encontra na encruzilhada
entre o capitalismo e o socialismo. Pode se desenvolver na direção do capita-
lismo, como está agora nos países capitalistas, ou na direção do socialismo, como
deve fazer aqui, em nosso país, sob a ditadura do proletariado.
De onde vem essa instabilidade, essa falta de independência da economia
camponesa? Como isso deve ser explicado?
Isso se explica pelo caráter disperso das fazendas camponesas, sua desorga-
nização, sua dependência das cidades, da indústria, do sistema de crédito, do
caráter do poder do Estado no país e, por último, do fato notório de que o campo
segue, e necessariamente deve seguir, a cidade tanto em matéria material quanto
cultural.
O rumo capitalista de desenvolvimento da economia camponesa significa de-
senvolvimento por meio da desigualdade profunda entre o campesinato, com
grandes latifúndios em um extremo e empobrecimento em massa no outro. Esse
caminho de desenvolvimento é inevitável nos países capitalistas porque o campo,
a economia camponesa, depende das cidades, da indústria, do crédito concen-
trado nas cidades, do caráter do poder do Estado – e nas cidades é a burguesia,
a indústria capitalista, o sistema de crédito capitalista e o poder do Estado capi-
talista que dominam.
É esta via de desenvolvimento da agricultura camponesa obrigatória para o
338 Obras Escolhidas

nosso país? Onde as cidades têm um aspecto bastante diferente, onde a indústria
está nas mãos do proletariado, onde se concentram os transportes, o sistema de
crédito, o poder do Estado, onde a nacionalização da terra é uma lei universal do
país? Claro que não. Pelo contrário. Precisamente porque as cidades conduzem
o campo, enquanto nós temos nas cidades o domínio do proletariado, que detém
todas as posições-chave da economia nacional – precisamente por isso as fazen-
das camponesas em seu desenvolvimento devem seguir um caminho diferente, o
caminho de construção socialista.
Qual é esse caminho?
É o caminho da organização em massa de milhões de fazendas camponesas em
cooperativas em todas as esferas de cooperação, o caminho de unir as fazendas
camponesas espalhadas em torno da indústria socialista, o caminho de implantar
os elementos do coletivismo entre o campesinato, em primeiro lugar no domínio
da comercialização dos produtos agrícolas e no abastecimento das explorações
camponesas com os produtos da indústria urbana e, mais tarde, no domínio da
produção agrícola.
E quanto mais avançamos, mais este caminho se torna inevitável nas condi-
ções da ditadura do proletariado, porque o comércio cooperativo, o fornecimento
cooperativo e, finalmente, o crédito e a produção cooperativa (cooperativas agrí-
colas) são as únicas maneiras de promover o bem-estar do campo, a única maneira
de salvar as amplas massas do campesinato da pobreza e da ruína.
Diz-se que nosso campesinato, por sua posição, não é socialista e, portanto,
incapaz de desenvolvimento socialista. É verdade, claro, que o campesinato, por
sua posição, não é socialista. Mas isso não é argumento contra o desenvolvimento
das fazendas camponesas ao longo do caminho do socialismo, uma vez que está
provado que o campo segue a cidade, e nas cidades é a indústria socialista que
domina. O campesinato, por sua posição, também não era socialista na época
da Revolução de Outubro, e de modo algum queria estabelecer o socialismo em
nosso país. Naquela época, lutava principalmente pela abolição do poder dos
latifundiários e pelo fim da guerra, pelo estabelecimento da paz. No entanto,
ele seguiu o exemplo do proletariado socialista. Por quê? Porque a derrubada
da burguesia e a tomada do poder pelo proletariado socialista era então a única
forma de sair da guerra imperialista, a única forma de estabelecer a paz. Porque
não havia outro caminho naquela época, nem poderia haver. Porque o nosso
Partido foi capaz de atingir aquele grau de combinação dos interesses específicos
do campesinato (a derrubada dos latifundiários, a paz) e a sua subordinação aos
interesses gerais do país (a ditadura do proletariado) que provou ser aceitável e
vantajoso para o campesinato. E assim o campesinato, apesar de seu caráter não
socialista, na época seguia a liderança do proletariado.
O mesmo deve ser dito sobre a construção socialista em nosso país, sobre pu-
xar o campesinato para o canal dessa construção. O campesinato não é socialista
por sua posição. Mas deve, e certamente irá seguir o caminho do desenvolvi-
mento socialista, pois não há – e não pode haver – nenhuma outra maneira de
salvar o campesinato da pobreza e da ruína, exceto o vínculo com o proletari-
ado, exceto o vínculo com a indústria socialista, exceto a inclusão da economia
camponesa no canal comum de desenvolvimento socialista pela organização de
J. V. Stalin 339

massas do campesinato em cooperativas.


Mas por que precisamente pela organização de massa do campesinato em
cooperativas?
Porque na organização de massas em cooperativas “encontramos aquele grau
de combinação de interesse privado, interesse comercial privado, com supervi-
são e controle estatal desse interesse, aquele grau de subordinação aos interesses
gerais” (Lenin), que é aceitável e vantajosa para o campesinato e que garante ao
proletariado a possibilidade de atrair a massa principal do campesinato para o
trabalho de construção socialista. Justamente porque é vantajoso para o cam-
pesinato organizar a venda de seus produtos e a compra de máquinas para suas
fazendas por meio de cooperativas, é justamente por isso que ele deve e continu-
ará pelo caminho da organização em massas nas cooperativas.
O que significa a organização em massa das fazendas camponesas em coope-
rativas quando temos a supremacia da indústria socialista?
Significa que a pequena economia mercantil camponesa abandona o velho
caminho capitalista, que está repleto de ruína em massa para o campesinato, e
passa para o novo caminho do desenvolvimento, o caminho da construção socia-
lista. É por isso que a luta pelo novo caminho de desenvolvimento da economia
camponesa, a luta para atrair a massa principal do campesinato para a obra da
construção socialista, é a tarefa imediata do nosso Partido.
O Décimo Quarto Congresso do PCUS (B), Portanto, acertou ao declarar:
O principal caminho para a construção do socialismo no campo consiste em usar a liderança
econômica crescente da indústria estatal socialista, das instituições de crédito estatais e de
outras posições-chave nas mãos do proletariado para atrair a massa principal do campesi-
nato à organização cooperativa e assegurar a esta organização um desenvolvimento socialista,
aproveitando, superando e derrubando seus elementos capitalistas.

O erro profundo da “Nova Oposição” reside no fato de não acreditar neste


novo caminho de desenvolvimento do campesinato, de não ver, ou não compre-
ender, a absoluta inevitabilidade deste caminho nas condições da ditadura do
proletariado. E não entende isso porque não acredita na vitória da construção
socialista em nosso país, não acredita na capacidade do nosso proletariado de
conduzir o campesinato no caminho do socialismo.
Daí a falta de compreensão do caráter dual da NEP, o exagero dos aspectos
negativos da NEP e o tratamento da NEP como sendo principalmente um recuo.
Daí o exagero do papel dos elementos capitalistas na nossa economia e a de-
preciação do papel das alavancas do nosso desenvolvimento socialista (indústria
socialista, sistema de crédito, cooperativas, governo do proletariado, etc.). Daí a
falta de compreensão da natureza socialista de nossa indústria estatal, e as dúvi-
das sobre a correção do plano cooperativo de Lenin. Daí os relatos inflacionados
de diferenciação no campo, o pânico em face do kulak, a depreciação do papel
do camponês médio, as tentativas de frustrar a política do Partido de assegurar
uma aliança firme com o camponês médio e, em geral, a oscilação de um lado
para o outro sobre a questão da política do Partido no campo.
Daí a falta de compreensão do tremendo trabalho do Partido em atrair as
grandes massas de trabalhadores e camponeses para a construção da indústria e
da agricultura, revitalizar as cooperativas e os sovietes, administrar o país, com-
340 Obras Escolhidas

bater a burocracia, melhorar e remodelar nosso aparelho de Estado – obra que


marca uma nova etapa de desenvolvimento e sem a qual nenhuma construção
socialista é concebível.
Daí a desesperança e consternação face às dificuldades da nossa obra de cons-
trução, as dúvidas sobre a possibilidade de industrializar o nosso país, a tagarelice
pessimista sobre a degeneração do Partido, etc.
Lá, entre a burguesia, tudo vai muito bem, mas aqui, entre os proletários, as
coisas vão muito mal; a menos que a revolução no Ocidente aconteça logo, nossa
causa está perdida – esse é o tom geral da “Nova Oposição” que, em minha opi-
nião, é um tom liquidacionista, mas que, por uma razão ou outra (provavelmente
em tom de brincadeira), a oposição tenta se passar por “internacionalismo”.
NEP é capitalismo, diz a oposição. NEP é principalmente um recuo, diz Zino-
viev. Tudo isso, é claro, não é verdade. Na verdade, a NEP é a política do Partido,
permitindo uma luta entre os elementos socialistas e capitalistas e visando a vitó-
ria dos elementos socialistas sobre os elementos capitalistas. Na verdade, a NEP
começou apenas como uma retirada, mas visava reagrupar nossas forças durante
a retirada e lançar uma ofensiva. Na verdade, estamos na ofensiva há vários anos
e estamos atacando com sucesso, desenvolvendo nossa indústria, desenvolvendo
o comércio soviético e expulsando o capital privado.
Mas qual é o significado da tese de que a NEP é capitalismo, de que a NEP é
principalmente um recuo? De que provém esta tese?
Parte da suposição errada de que o que agora está acontecendo em nosso país
é simplesmente a restauração do capitalismo, simplesmente um “retorno” ao ca-
pitalismo. Esta suposição por si só pode explicar as dúvidas da oposição quanto
à natureza socialista de nossa indústria. Essa suposição por si só pode explicar
o pânico da oposição em face do kulak. Só essa suposição pode explicar a pressa
com que a oposição se apoderou das estatísticas imprecisas sobre a diferenciação
no campesinato. Esta suposição por si só pode explicar o esquecimento especial
da oposição do fato de que o camponês médio é a figura central em nossa agri-
cultura. Esta suposição por si só pode explicar a subestimação da importância do
camponês médio e as dúvidas sobre o plano cooperativo de Lenin. Este pressu-
posto por si só pode servir para “substanciar” a descrença da “Nova Oposição” no
novo caminho de desenvolvimento do campo, o caminho de inseri-lo no trabalho
de construção socialista.
Na verdade, o que está acontecendo em nosso país agora não é um processo
unilateral de restauração do capitalismo, mas um duplo processo de desenvolvi-
mento do capitalismo e desenvolvimento do socialismo – um processo contradi-
tório de luta entre o socialismo e o os elementos capitalistas, um processo em que
os elementos socialistas estão superando os elementos capitalistas. Isso é igual-
mente incontestável no que diz respeito às cidades, onde a indústria estatal é a
base do socialismo, e no que diz respeito ao campo, aqui o principal ponto de
apoio do desenvolvimento socialista é a cooperação de massa ligada à indústria
socialista.
A simples restauração do capitalismo é impossível, nem que seja pela razão
de que o proletariado está no poder, que a grande indústria está nas mãos do
proletariado e que o transporte e o crédito estão nas mãos do Estado proletário.
J. V. Stalin 341

A diferenciação no campo não pode assumir as suas dimensões anteriores, os


camponeses médios ainda constituem a massa principal do campesinato, e o kulak
não pode recuperar a sua força anterior, pelo menos porque a terra foi naciona-
lizada, que foi retirada de circulação, ao passo que a nossa política comercial,
creditícia, tributária e cooperativa visa restringir as tendências exploradoras dos
kulaks, promover o bem-estar da grande massa camponesa e nivelar os extremos
no campo. Isso está totalmente à parte do fato de que a luta contra os kulaks
agora prossegue não apenas ao longo da velha linha de organizar os campone-
ses pobres contra os kulaks, mas também ao longo da nova linha de fortalecer a
aliança do proletariado e dos camponeses pobres com os massa dos camponeses
médios contra os kulaks. O fato de a oposição não compreender o significado e o
significado da luta contra os kulaks ao longo desta segunda linha confirma mais
uma vez que a oposição está se desviando para o antigo caminho de desenvolvi-
mento no campo – o caminho do desenvolvimento capitalista, quando os kulaks
e os camponeses pobres constituíam as forças principais no campo, enquanto os
camponeses médios estavam “derretendo”.
A cooperação é uma variedade do capitalismo de Estado, diz a oposição, ci-
tando, a este respeito, o panfleto de Lenin, “O imposto em espécie” ; e, consequen-
temente, não acredita que seja possível utilizar as cooperativas como o principal
ponto de apoio do desenvolvimento socialista. Também aqui a oposição comete
um erro grosseiro. Tal interpretação da cooperação era adequada e satisfatória
em 1921, quando o panfleto foi escrito, quando não tínhamos uma indústria
socialista desenvolvida, quando Lenin concebeu o capitalismo de Estado como
a possível forma básica de conduzir nossa economia, e quando ele considerou
cooperação em conjunto com o capitalismo de Estado. Mas esta interpretação
tornou-se inadequada e obsoleta pela história, pois os tempos mudaram desde
então: nossa indústria socialista se desenvolveu, o capitalismo de Estado nunca
atingiu o grau esperado, enquanto as cooperativas, que agora têm mais de dez
milhões membros, começaram a se conectar com a indústria socialista.
De que outra forma podemos explicar o fato de que já em 1923, dois anos
depois do panfleto ter sido escrito, Lenin começou a ver a cooperação sob uma
ótica diferente, e considerou que “a cooperação, nas nossas condições, muitas
vezes inteiramente coincide com o socialismo” (ver Vol. 27, p. 396).
De que outra maneira isso pode ser explicado, exceto pelo fato de que durante
aqueles dois anos a indústria socialista cresceu, enquanto o capitalismo de Estado
não conseguiu se firmar na medida necessária, em vista da qual Lenin começou
a considerar a cooperação, não em conjunto com o capitalismo de Estado, mas
em conjunto com a indústria socialista? As condições de desenvolvimento da
cooperação mudaram. E assim a abordagem da questão da cooperação também
teve que ser mudada.
Aqui, por exemplo, está uma passagem notável do panfleto de Lenin “Sobre
a cooperação” (1923), que lança o holofote sobre este assunto:

No capitalismo de Estado, as empresas cooperativas diferem das empresas capitalistas de


Estado, em primeiro lugar, por serem empresas privadas e, em segundo lugar, por serem
empresas coletivas. Sob nosso sistema atual, as empresas cooperativas diferem das empresas
capitalistas privadas porque são empresas coletivas, mas não diferem das empresas socialistas
se a terra em que estão situadas e os meios de produção pertencem ao Estado, isto é, a classe
342 Obras Escolhidas

trabalhadora (ver Vol. 27, p. 396).

Nesta curta passagem, duas grandes questões são resolvidas. Em primeiro lu-
gar, que “nosso sistema atual” não é capitalismo de Estado. Em segundo lugar, as
empresas cooperativas tomadas em conjunto com “nosso sistema” “não diferem”
das empresas socialistas. Acho que seria difícil se expressar com mais clareza.
Aqui está outra passagem do mesmo panfleto de Lenin: “para nós, o mero
crescimento da cooperação (com a ‘pequena’ exceção mencionada acima) é idên-
tico ao crescimento do socialismo e, ao mesmo tempo, devemos admitir que uma
mudança radical ocorreu em toda a nossa visão do socialismo”.
Obviamente, o panfleto dá uma nova avaliação das cooperativas, algo que a
“Nova Oposição” não quer admitir e que está cuidadosamente silenciando, de-
safiando os fatos, desafiando as verdades óbvias e desafiando, enfim, o próprio
leninismo. A cooperação em conjunto com o capitalismo de Estado é uma coisa,
e a cooperação em conjunto com a indústria socialista é outra.
Disto, porém, não se deve concluir que existe um abismo entre “O imposto em
espécie” e “Sobre a cooperação”. Isso, é claro, estaria errado. Basta, por exemplo,
referir-se à seguinte passagem de do primeiro texto que cito acima para discernir
imediatamente a conexão inseparável entre ele e o panfleto “Sobre a cooperação”,
no que diz respeito à avaliação das cooperativas. Aqui está:
A transição das concessões ao socialismo é a transição de uma forma de produção em grande
escala para outra forma de produção em grande escala. A transição das cooperativas de
pequenos proprietários para o socialismo é uma transição da pequena produção para a pro-
dução em grande escala, ou seja, é uma transição mais complicada, mas, se bem sucedida,
é capaz de abarcar massas mais amplas da população, é capaz de arrancando as raízes mais
profundas e tenazes das velhas relações pré-socialistas e mesmo pré-capitalistas, que resistem
obstinadamente a todas as ‘inovações’ (ver Vol. 26, p. 337).

A partir desta citação, é evidente que mesmo durante a época de “O imposto em


espécie”, quando ainda não tínhamos uma indústria socialista desenvolvida, Lenin
era da opinião de que, se bem-sucedida, a cooperação poderia se transformar
em uma arma poderosa na luta contra o “pré-socialismo” e, portanto, contra as
relações capitalistas. Acho que foi precisamente essa ideia que posteriormente
serviu de ponto de partida para seu panfleto “Sobre a cooperação”.
Mas o que se segue de tudo isso?
De tudo isso segue-se que a “Nova Oposição” aborda a questão da cooperação,
não de uma forma marxista, mas metafisicamente. Entende a cooperação não
como um fenômeno histórico tomado em conjunto com outros fenômenos, em
conjunção, digamos, com o capitalismo de Estado (em 1921) ou com a indústria
socialista (em 1923), mas como algo constante e imutável, como uma “coisa em
si”.
Daí os erros da oposição na questão da cooperação, daí a sua descrença no
desenvolvimento do campo para o socialismo através da cooperação, daí o seu re-
gresso ao antigo caminho, o caminho do desenvolvimento capitalista no campo.
Tal é, em geral, a posição da “Nova Oposição” sobre as questões práticas da cons-
trução socialista.
A conclusão é uma só: a linha da oposição, na medida em que tem linha, sua
hesitação e vacilação, sua descrença em nossa causa e sua consternação diante das
J. V. Stalin 343

dificuldades, levam à capitulação aos elementos capitalistas de nossa economia.


Pois, se a NEP é principalmente um recuo, se a natureza socialista da indús-
tria estatal for posta em dúvida, se o kulak for quase onipotente, se houver pouca
esperança nas cooperativas, se o papel do camponês médio estiver em declínio
progressivo, se o novo caminho de desenvolvimento no campo está aberto à dú-
vida, se o Partido está quase degenerando, enquanto a revolução no Ocidente
não está muito próxima – então o que resta no arsenal da oposição, com que
pode contar em a luta contra os elementos capitalistas em nossa economia? Você
não pode ir para a batalha armado apenas com “A Filosofia da Época”219 .
É claro que o arsenal da “Nova Oposição”, se é que pode ser chamado de arse-
nal, é pouco invejável. Não é um arsenal de batalha. Ainda menos é direcionado
para a vitória.
É claro que o Partido estaria condenado “de pronto” se entrasse na luta equi-
pado com tal arsenal; simplesmente teria que capitular aos elementos capitalistas
de nossa economia.
É por isso que o XIV Congresso do Partido teve toda a razão ao decidir que “a
luta pela vitória da construção socialista na URSS é a principal tarefa do nosso
Partido”; que uma das condições necessárias para o cumprimento desta tarefa
é “combater a descrença na causa da construção do socialismo no nosso país e
as tentativas de representação das nossas empresas, que são de ‘tipo consisten-
temente socialista’ (Lenin), como empresas capitalistas estatais”; que “tais ten-
dências ideológicas, que impedem as massas de adotar uma atitude consciente
em relação à construção do socialismo em geral e de uma indústria socialista em
particular, só podem servir para impedir o crescimento dos elementos socialistas
em nossa economia e para facilitar a luta dos capital privado contra eles”; que
“o Congresso considera, portanto, que um amplo trabalho educativo deve ser re-
alizado com o objetivo de superar essas distorções do leninismo” (ver “Resolução
sobre o Relatório do Comitê Central do PCUS (B)” ).
O significado histórico do XIV Congresso do PCUS (B) reside no fato de que
ele foi capaz de expor radicalmente os erros da “Nova Oposição”, que rejeitou sua
descrença e reclamação, que indicou de forma clara e precisa o caminho da nova
luta pelo socialismo, abriu perante o Partido a perspectiva da vitória e, assim,
armou o proletariado com uma fé invencível na vitória da construção socialista.

219“A Filosofia da Época” era o título de um artigo contra o Partido escrito por Zinoviev em 1925.
Stalin criticaria posteriormente de maneira pública apontando a fragilidade de seu argumento.
344 Obras Escolhidas

A possibilidade de construir o
socialismo em nosso país
10 de fevereiro de 1926

Uma resposta ao camarada Pokoyev

Camarada Pokoyev,
Estou atrasado para responder, pelo que peço desculpa a você e aos seus ca-
maradas.
Infelizmente, você não entendeu nossas divergências no Décimo Quarto Con-
gresso. A questão não é que a oposição afirmava que ainda não tínhamos chegado
ao socialismo, enquanto o congresso sustentava que já tínhamos chegado ao so-
cialismo. Isso não é verdade. Você não encontrará um único membro em nosso
Partido que diga que já alcançamos o socialismo.
Isso não foi de forma alguma o assunto da disputa no congresso. O assunto da
disputa era este. O congresso sustentou que a classe operária, em aliança com o
campesinato operário, pode desferir o golpe final nos capitalistas de nosso país e
construir uma sociedade socialista, mesmo que não haja uma revolução vitoriosa
no Ocidente para vir em seu auxílio. A oposição, pelo contrário, sustentou que
não podemos dar o golpe final em nossos capitalistas e construir uma sociedade
socialista até que os trabalhadores sejam vitoriosos no Ocidente. Bem, como a
vitória da revolução no Ocidente está muito atrasada, nada nos resta a fazer,
aparentemente, a não ser vagar. O congresso considerou, e disse isso em sua
resolução sobre o relatório do Comitê Central220 , que essas opiniões da oposição
implicavam descrença na vitória sobre nossos capitalistas.
Esse era o ponto em questão, queridos camaradas.
É claro que isso não significa que não precisemos da ajuda dos trabalhadores
da Europa Ocidental. Suponha que os trabalhadores da Europa Ocidental não
simpatizassem conosco e não nos dessem apoio moral. Suponha que os trabalha-
dores da Europa Ocidental não impedissem seus capitalistas de lançar um ataque
à nossa República. Qual seria o resultado? O resultado seria que os capitalistas
marchariam contra nós e interromperiam radicalmente nosso trabalho constru-
tivo, se não nos destruiriam por completo. Se os capitalistas não estão tentando
isso, é porque temem que, se atacassem nossa República, os trabalhadores os
atingiriam pela retaguarda. É isso que queremos dizer quando afirmamos que
os trabalhadores da Europa Ocidental apoiam a nossa revolução.
Mas do apoio dos trabalhadores do Ocidente à vitória da revolução no Oci-
dente é um longo, longo caminho. Sem o apoio dos trabalhadores do Ocidente,
dificilmente poderíamos resistir aos inimigos que nos cercam. Se esse apoio evo-
luir posteriormente para uma revolução vitoriosa no Ocidente, tudo bem. Então
220Ver “Resoluções e Decisões do PCUS. Congressos, Conferências e Plenárias do Comitê Central”,
Parte II, 1953 pp. 73-82.
J. V. Stalin 345

a vitória do socialismo em nosso país será definitiva. Mas e se esse apoio não se
transformar em uma vitória da revolução no Ocidente? Se não houver tal vitória
no Ocidente, podemos construir uma sociedade socialista e concluir a construção
dela? O congresso respondeu que podemos. Do contrário, não haveria sentido
em tomarmos o poder em outubro de 1917. Se não tivéssemos contado dar o
golpe final em nossos capitalistas, todos diriam que não tínhamos nada a ver
com tomar o poder em outubro de 1917. A oposição, porém, afirma que não
podemos acabar com nossos capitalistas por nossos próprios esforços.
Essa é a diferença entre nós.
Também se falou no congresso sobre a vitória final do socialismo. O que
isso significa? Significa uma garantia total contra a intervenção de capitalistas
estrangeiros e a restauração da velha ordem em nosso país como resultado de
uma luta armada desses capitalistas contra nosso país. Podemos, pelos nossos
próprios esforços, assegurar essa garantia, ou seja, impossibilitar a intervenção
armada do capital internacional? Não, nós não podemos. Isso deve ser feito em
conjunto por nós e pelos proletários de todo o Ocidente. O capital internacional
pode ser finalmente restringido apenas pelos esforços da classe trabalhadora de
todos os países, ou pelo menos dos principais países europeus. Para isso, a vitória
da revolução em vários países europeus é indispensável – sem ela a vitória final
do socialismo é impossível.
O que se segue então na conclusão?
Segue que somos capazes de construir completamente uma sociedade soci-
alista por nossos próprios esforços e sem a vitória da revolução no Ocidente,
mas que, por si só, nosso país não pode garantir-se contra a invasão do capital
internacional – para isso a vitória de a revolução em vários países ocidentais é
necessária. A possibilidade de construir completamente o socialismo em nosso
país é uma coisa, a possibilidade de garantir nosso país contra as usurpações do
capital internacional é outra.
Na minha opinião, o seu erro e o dos seus camaradas é que vocês ainda não
encontraram sua posição sobre este tópico e confundiram estas duas questões.
Saudações camaradas,
J. Stalin
P.S: Você deve realizar a leitura do Bolchevique221 (de Moscou), nº 3, e ler meu
artigo nele. Isso tornaria as coisas mais fáceis para você.

221Foi uma revista teórica e política, órgão do Comitê Central do PCUS (B) que começou a ser
publicada em abril de 1924. Stalin se refere à edição que continha o seu escrito “Sobre as questões
do Leninismo”. Desde novembro de 1952 a revista continua em circulação, e é publicada sob o título
de “Kommunist”.
346 Obras Escolhidas

A luta contra os desvios de direita


e ''ultraesquerdistas''
18 de fevereiro de 1926

Acho que a atitude de Hansen e Ruth Fischer está errada. Exigem que a luta
contra os direitistas e os “ultraesquerdistas” seja travada sempre e em toda parte,
em todas as condições, com igual intensidade, no princípio, por assim dizer, da
equidade. Essa ideia de equidade, de golpear os direitistas e os “ultraesquerdis-
tas” com igual intensidade em todas as condições e circunstâncias, é infantil. É
algo que nenhum político pode entreter. A questão da luta contra os direitistas e
os “ultra esquerdistas” deve ser encarada não do ponto de vista da equidade, mas
do ponto de vista das demandas da situação política, das exigências políticas do
Partido em cada momento. Por que, no Partido francês, a luta contra os direitos
é a tarefa urgente e imediata no momento, enquanto no Partido Comunista ale-
mão a tarefa imediata é a luta contra os “ultraesquerdistas”? Porque as situações
nos partidos comunistas francês e alemão não são idênticas. Porque os requisitos
políticos dessas duas partes no momento são diferentes.
A Alemanha só recentemente emergiu de uma profunda crise revolucioná-
ria, quando o Partido conduzia sua luta pelo método de ataque direto. Agora
o Partido Comunista Alemão está passando por um período de concentração de
forças e preparação das massas para as batalhas decisivas que estão por vir. Nesta
nova situação, o método de ataque direto não servirá mais para a realização dos
antigos objetivos. O que o Partido Comunista Alemão deve fazer agora é passar
ao método dos movimentos de flanco, com o objetivo de conquistar a maioria
da classe trabalhadora na Alemanha. É natural nestas circunstâncias que encon-
tremos na Alemanha um grupo de “ultraesquerdistas” que continua a repetir os
velhos slogans à moda dos colegiais e não pode ou não quer adaptar-se às novas
condições da luta, que exigem novos métodos de trabalho. Temos, portanto, os
“ultraesquerdistas” que, com a sua política, impedem o Partido de se adaptar às
novas condições da luta e de encontrar o seu caminho para as grandes massas do
proletariado alemão. Ou o Partido Comunista Alemão quebra a resistência dos
“ultraesquerdistas”, e então estará no caminho certo para conquistar a maioria
da classe trabalhadora; ou não, e então tornará a crise atual crônica e desastrosa
para o Partido. Portanto, a luta contra os “ultraesquerdistas” no Partido Comu-
nista Alemão é a tarefa imediata deste último.
Na França, a situação é diferente. Naquele país, não houve nenhuma crise
revolucionária profunda até agora. A luta lá prosseguiu dentro dos limites da
legalidade e os métodos de luta foram exclusivas, ou quase exclusivamente, de
caráter jurídico. Mas agora uma crise começou a se desenvolver na França. Tenho
em mente as guerras do Marrocos e da Síria e as dificuldades financeiras da
J. V. Stalin 347

França. Quão profunda é essa crise, é difícil dizer no momento, mas é uma crise,
no entanto, e que exige do Partido uma combinação de formas legais e ilegais
de luta e a máxima bolchevização do Partido. É natural nestas circunstâncias
que encontremos no Partido Francês um grupo – refiro-me aos de direita – que
não consegue ou não quer adaptar-se às novas condições da luta e que continua
por inércia a insistir nos velhos métodos de luta como os únicos corretos. Esta
circunstância, é claro, não pode deixar de impedir a bolchevização do Partido
Comunista Francês. Portanto, o perigo certo no Partido Comunista Francês é o
perigo imediato. Portanto, a tarefa de lutar contra o perigo de direita é a tarefa
urgente do Partido Comunista Francês.
Algumas ilustrações da história do PCUS (B). Depois da Revolução de 1905,
surgiu também em nosso Partido um grupo “ultraesquerdista”, conhecido como
“otzovistas”, que não pôde ou não quis se adaptar às novas condições da luta e
se recusou a reconhecer o método de utilização de oportunidades legais (Duma,
clubes de trabalhadores, fundos de seguro, etc.). Como sabem, Lenin lutou reso-
lutamente contra aquele grupo e foi depois de o Partido ter conseguido vencê-lo
que pôde seguir o caminho certo. Tivemos a mesma coisa depois da Revolução
de 1917, quando um grupo “ultra esquerdista” se opôs à Paz de Brest. Como
sabem, o nosso Partido, sob a liderança de Lenin, também destruiu este grupo.
O que esses fatos mostram? Eles mostram que a questão da luta contra os
direitistas e os “ultraesquerdistas” deve ser colocada não de maneira abstrata,
mas concreta, dependendo da situação política.
É acidental que os franceses tenham chegado ao Presidium do Comitê Exe-
cutivo da Internacional Comunista com uma resolução contra os elementos de
direita em seu partido, e os alemães com uma resolução contra os “ultra esquer-
distas”? Claro que não. A língua sempre se volta para o dente dolorido.
Portanto, a ideia de equidade, de golpear as direitas e as “ultraesquerdistas”
com igual intensidade, é insustentável.
Por isso mesmo, sugiro suprimir do projeto de resolução sobre os “ultraes-
querdistas” na Alemanha a frase que diz que no Partido Comunista Alemão é
necessário concentrar-se em igual medida na luta contra os Direitos e os “ultra-
esquerdistas”. Proponho que esta frase seja eliminada pela mesma razão que a
frase sobre a concentração na luta contra os “ultraesquerdistas” foi eliminada da
resolução sobre os direitos no Partido Comunista Francês. Que os de direta e os
“ultraesquerdistas” devem ser combatidos sempre e em todos os lugares é perfei-
tamente verdade. Mas não é esse o ponto agora; a questão é em que nos concen-
trar no momento presente na França, por um lado, e na Alemanha, por outro.
Acho que no Partido Comunista Francês é necessário concentrar-se na luta contra
os elementos de direita, pois isso é exigido por necessidade política no momento
atual, enquanto no Partido Comunista Alemão é necessário concentrar-se na luta
contra os “ultraesquerdistas”, já que isso é exigido pelas exigências políticas do
Partido Comunista Alemão no momento atual.
Qual é a posição do grupo intermediário no Partido Comunista Alemão –
o grupo Ruth Fischer-Maslow – olhando para a questão do ponto de vista que
acabamos de expor? Este grupo, em minha opinião, está examinando diplomati-
camente o grupo “ultraesquerdista” de Scholem. O grupo Ruth Fischer-Maslow
348 Obras Escolhidas

não está do lado do grupo Scholem abertamente, mas está fazendo tudo ao seu
alcance para enfraquecer a força do golpe do Partido contra o grupo Scholem. O
grupo Ruth Fischer-Maslow está, portanto, atrapalhando os esforços do Comitê
Central do Partido Comunista Alemão para superar e eliminar os preconceitos
“ultraesquerdistas” do Partido Comunista Alemão. O Partido Comunista Ale-
mão deve, portanto, travar uma luta determinada contra este grupo, o grupo
Ruth Fischer-Maslow. Ou o grupo Ruth Fischer-Maslow é esmagado, e então o
Partido estará em posição de superar a crise atual na luta contra o grupo Scho-
lem; ou o Partido Comunista Alemão é enganado pelas artimanhas diplomáticas
do grupo Ruth Fischer-Maslow, e então a luta estará perdida, em benefício de
Scholem.

II

Parece-me que, na questão da luta ideológica interna do partido, Hansen está


pregando uma espécie de moralidade de pároco, totalmente inadequada para um
Partido Comunista. Aparentemente, ele não se opõe a uma luta ideológica. Mas
ele gostaria de conduzi-la de forma a não desacreditar nenhum dos líderes da
oposição. Devo dizer que essa luta nunca acontece. Devo dizer que quem está
preparado para tolerar uma luta apenas desde que nenhum dos dirigentes esteja
de forma alguma comprometido, praticamente nega a possibilidade de travar
qualquer tipo de luta ideológica dentro do Partido. Devemos divulgar os erros
cometidos pelos líderes partidários? Devemos trazer à luz esses erros, para educar
as massas do partido com base nos erros dos dirigentes? Acho que devemos fazer
isso. Acho que não há outra forma de corrigir erros. Acho que o método de
falar mal dos erros não é o nosso método. Mas segue-se daí que não pode haver
luta interna do partido e correção de erros sem que algum líder ou outro esteja
de alguma forma comprometido. Isso pode ser triste, mas nada pode ser feito a
respeito, porque somos impotentes contra o inevitável.
Devemos lutar contra os “ultraesquerdistas” e contra os elementos de direita?
Hansen pergunta. Claro, devemos. Resolvemos essa questão há muito tempo. A
disputa não é sobre isso. A disputa é sobre qual perigo devemos nos concentrar
na luta neste momento nas duas partes diferentes, a francesa e a alemã, cujas
situações são atualmente diferentes. É acidental que os franceses tenham vindo
ao Presidium do Comitê Executivo da Internacional Comunista com uma reso-
lução contra os elementos de direita, e os alemães com uma resolução contra os
“ultraesquerdistas”? Será que os franceses estão errados ao se concentrar na luta
contra os direitistas? Por que, nesse caso, Hansen não tentou chegar ao Presi-
dium com uma resolução contrária sobre a luta contra os “ultraesquerdistas” na
França? Será que os alemães se enganam ao se concentrarem na luta contra os
“ultraesquerdistas”? Por que, nesse caso, Hansen e Ruth Fischer não tentaram
vir ao Presidium com uma proposta contrária centrada na luta contra os direi-
tistas? Qual é o ponto aqui? A questão é que nos deparamos não com a questão
abstrata de combater os elementos de direita e os “ultraesquerdistas” em geral,
mas com a questão concreta das tarefas imediatas do Partido alemão no momento
presente. E a tarefa imediata do Partido Comunista Alemão é superar o perigo
J. V. Stalin 349

“ultraesquerdista”, assim como a tarefa imediata do Partido Comunista Francês


é superar o perigo da direita.
Como, por exemplo, devemos explicar o fato geralmente conhecido de que
os Partidos Comunistas da Grã-Bretanha, França e Tchecoslováquia já obtiveram
importantes pontos de apoio nos movimentos sindicais de seus países, encontra-
ram seu caminho para as grandes massas da classe trabalhadora, e estão come-
çando a ganhar a confiança – senão da maioria – pelo menos de uma parte consi-
derável da classe trabalhadora, enquanto na Alemanha a posição a esse respeito
ainda é fraca? Deve ser explicado, sobretudo, pelo fato de que os “ultraesquerdis-
tas” ainda são fortes no Partido Comunista Alemão e ainda olham com ceticismo
para os sindicatos, para a palavra de ordem de uma frente única, para a palavra
de ordem da vitória sobre os sindicatos. Todos sabem que até recentemente os
“ultraesquerdistas” defendiam o slogan “Saia dos sindicatos”. Todos sabem que
os vestígios deste slogan antiproletário ainda não foram completamente erradi-
cados entre os “ultraesquerdistas”. Uma coisa ou outra: ou o Partido Comunista
Alemão consegue livrar-se rápida e decisivamente dos preconceitos dos “ultra-
esquerdistas” em relação aos métodos de trabalho das massas, depois de ter es-
magado totalmente – ideologicamente também – o grupo Scholem; ou não tem
sucesso, caso em que a crise no Partido Comunista Alemão pode tomar um rumo
muito perigoso.
Diz-se que há operários revolucionários honestos entre os “ultraesquerdistas”
e que não devemos repeli-los. Isso é bem verdade, e não estamos sugerindo que
eles devam ser repelidos. Por esse motivo, não estamos introduzindo em nosso
projeto de resolução nenhuma proposta de que qualquer um dos “ultraesquer-
distas”, e muito menos os trabalhadores, sejam repelidos ou expulsos do Partido.
Mas como esses trabalhadores podem ser elevados ao nível de compreensão polí-
tica de um partido leninista? Como eles podem ser resgatados dos equívocos sob
os quais estão agora trabalhando devido aos erros e preconceitos de seus líderes
“ultraesquerdistas”? Só existe um método para o sucesso: o método de repudiar
politicamente os dirigentes “ultraesquerdistas”, o método de expor os erros “ul-
traesquerdistas” que estão a enganar os trabalhadores revolucionários honestos
e os impedem de pôr os pés na ampla rodovia. Podemos tolerar uma diploma-
cia pútrida, a preguiça de erros, nas questões da luta ideológica do Partido e da
educação política das massas? Não, nós não podemos. Estaríamos enganando
os trabalhadores se o fizéssemos. Qual é, então, a solução? Só existe uma solu-
ção, que é expor os erros dos líderes “ultraesquerdistas” e, dessa forma, ajudar
os trabalhadores revolucionários honestos a tomar o caminho certo.
Diz-se que um golpe nos “ultraesquerdistas” pode levar à acusação de que o
Partido Comunista Alemão se voltou para a direita. Isso é um absurdo, camara-
das. Na Conferência do Partido Pan-Russo de 1908, quando Lenin lutou contra
os “ultraesquerdistas” russos e os derrotou totalmente, também entre nós havia
pessoas que acusavam Lenin de direitismo, de ter se voltado para a direita. Mas
agora todo o mundo sabe que a posição de Lenin naquela época era correta, que
seu ponto de vista era o único revolucionário e que os “ultraesquerdistas” rus-
sos, que então faziam um show de frases “revolucionárias”, eram, na realidade,
oportunistas.
350 Obras Escolhidas

Não se deve esquecer que os elementos de direita e “ultraesquerdistas” são, na


verdade, gêmeos. Que, consequentemente, ambos assumem uma posição oportu-
nista. A diferença entre eles é que enquanto os de direita nem sempre ocultam
seu oportunismo, os de esquerda invariavelmente camuflam seu oportunismo
com frases “revolucionárias”. Não podemos permitir que nossa política seja de-
terminada pelo que os traficantes de escândalos e filisteus podem dizer sobre
nós. Devemos seguir nosso caminho com firmeza e confiança, sem prestar aten-
ção às histórias que mentes ociosas podem inventar sobre nós. Os russos têm
um ditado adequado: “os cães ladram, a caravana passa”. Devemos ter isso em
mente; pode nos ajudar em mais de uma ocasião.
Ruth Fischer diz que mais tarde o perigo de direita pode vir a ser a ques-
tão imediata para o Partido Comunista Alemão. Isso é perfeitamente possível
e até provável. Mas o que se segue disso? Ruth Fischer tira a estranha con-
clusão de que o golpe contra os “ultraesquerdistas” na Alemanha, que já neste
momento constituem um perigo real, deve ser enfraquecido, e o golpe contra
os direitistas, que pode se tornar um sério perigo no futuro, deve ser fortalecido
imediatamente. Será facilmente visto que esta é uma maneira um tanto ridícula e
fundamentalmente incorreta de colocar a questão. Somente um grupo diplomá-
tico intermediário como o grupo Ruth Fischer-Maslow poderia pousar em uma
posição tão ridícula em seu esforço para enfraquecer a luta do Partido contra os
“ultraesquerdistas” e, assim, salvar o grupo Scholem, retirando-o de o golpe. Pois
esse é todo o propósito da proposta de Ruth Fischer. Acho que deve haver um
grupo diplomático intermediário semelhante na França, que está tentando, com
discursos melosos, proteger os elementos de direita do Partido Comunista Fran-
cês. É, portanto, uma tarefa imediata do dia lutar contra os grupos diplomáticos
intermediários, tanto no partido alemão quanto no francês.
Ruth Fischer afirma que se uma resolução contra os “ultraesquerdistas” for
adotada na Alemanha, isso só agravaria a situação no Partido. Parece-me que
Ruth Fischer está ansiosa para prolongar a crise do Partido Comunista Alemão,
para torná-la prolongada e crônica. Não podemos, portanto, seguir o caminho
de Ruth Fischer, apesar de toda a sua diplomacia e conversa doce sobre a paz no
Partido.
Acho, camaradas, que importantes elementos marxistas já se cristalizaram no
Partido Alemão. Eu acho que o atual núcleo da classe trabalhadora do Partido
Comunista Alemão constitui aquele núcleo marxista de que o Partido Comunista
Alemão precisa. A tarefa do Presidium do CEIC é apoiar esse núcleo e assisti-lo
na sua luta contra todos os desvios, sobretudo contra o desvio “ultraesquerdistas”.
Devemos, portanto, adotar uma resolução dirigida contra os “ultraesquerdistas”
na Alemanha.
A situação econômica da União Soviética e a Política do Partido
J. V. Stalin 351

As perspectivas da revolução na
China
30 de novembro de 1926

Discurso proferido na Comissão Chinesa do CEIC

Camaradas, antes de passar ao assunto em discussão, julgo necessário dizer


que não estou de posse do material exaustivo sobre a questão chinesa, necessário
para dar um quadro completo da revolução na China. Portanto, sou obrigado
a me limitar a algumas observações gerais de caráter fundamental que têm uma
relação direta com a tendência básica da revolução chinesa.
Tenho as teses de Petrov, as teses de Mif, dois relatórios de Tang Ping-shan e
as observações de Rafes sobre a questão chinesa. Em minha opinião, todos esses
documentos, apesar de seus méritos, sofrem do grave defeito de ignorar uma
série de questões cardeais da revolução na China. Creio que é necessário, antes
de tudo, chamar a atenção para essas lacunas. Por esta razão, minhas observações
serão ao mesmo tempo de natureza crítica.

I. Caráter da revolução na China


Lenin disse que os chineses logo teriam seu ano de 1905. Alguns camaradas
entenderam que isso significava que teria de haver uma repetição entre os chi-
neses, exatamente do mesmo que aconteceu aqui na Rússia em 1905. Isso não é
verdade, camaradas. Lenin de forma alguma disse que a revolução chinesa seria
uma réplica da Revolução de 1905 na Rússia. Tudo o que ele disse foi que os
chineses teriam seu 1905. Isso significa que, além das características gerais da
Revolução de 1905, a revolução chinesa teria suas próprias características especí-
ficas, que estariam fadadas a deixar sua marca especial na revolução na China.
Quais são essas características específicas?
A primeira característica específica é que, embora a revolução chinesa seja
uma revolução democrático-burguesa, é ao mesmo tempo uma revolução de li-
bertação nacional dirigida contra a dominação do imperialismo estrangeiro na
China. É nisso, sobretudo, que se diferencia da Revolução de 1905 na Rússia. A
questão é que o domínio do imperialismo na China se manifesta não apenas em
seu poderio militar, mas principalmente no fato de que os principais segmentos
da indústria na China, as ferrovias, usinas e fábricas, minas, bancos, etc., são pro-
priedade ou controlados por imperialistas estrangeiros. Mas daí decorre que as
questões da luta contra o imperialismo estrangeiro e seus agentes chineses não
podem deixar de desempenhar um papel importante na revolução chinesa. Este
fato vincula diretamente a revolução chinesa com as revoluções dos proletários
de todos os países contra o imperialismo.
A segunda característica específica da revolução chinesa é que a grande bur-
guesia nacional na China é extremamente fraca, incomparavelmente mais fraca
352 Obras Escolhidas

do que a burguesia russa era no período de 1905. Isso é compreensível. Uma


vez que os principais fios da indústria estão concentrados nas mãos de imperia-
listas estrangeiros, a grande burguesia nacional na China não pode deixar de ser
fraca e atrasada. A esse respeito, Mif tem toda a razão em sua observação sobre
a fraqueza da burguesia nacional na China como um dos fatos característicos da
revolução chinesa. Mas daí decorre que o papel de dianteira e guia da revolu-
ção chinesa, o papel de líder do campesinato chinês, deve inevitavelmente recair
sobre o proletariado chinês e seu partido.
Tampouco se deve ignorar uma terceira característica específica da revolução
chinesa. A saber, que, lado a lado com a China, a União Soviética existe e está se
desenvolvendo, e sua experiência e ajuda revolucionárias não podem deixar de
facilitar a luta do proletariado chinês contra o imperialismo e contra o imperia-
lismo medieval e sobrevivências feudais na China.
Essas são as principais características específicas da revolução chinesa, que
determinam seu caráter e tendência.

II. O imperialismo e intervenção imperialista na


China

O primeiro defeito das teses apresentadas é que ignoram ou subestimam a


questão da intervenção imperialista na China. O estudo das teses pode levar a
pensar que no momento presente não há, propriamente falando, nenhuma in-
tervenção imperialista na China, que existe apenas uma luta entre nortistas e
sulistas, ou entre um grupo de generais e outro grupo de generais. Além disso,
tende-se a compreender por intervenção um estado de coisas marcado pela en-
trada de tropas estrangeiras em território chinês e que, se assim não for, não há
intervenção.
Isso é um erro profundo, camaradas. A intervenção não se limita de forma
alguma à incursão de tropas, e a incursão de tropas de forma alguma constitui a
característica principal da intervenção. Nas condições atuais do movimento revo-
lucionário nos países capitalistas, quando a incursão direta de tropas estrangeiras
pode gerar protestos e conflitos, a intervenção assume formas mais flexíveis e ca-
mufladas. Nas condições que prevalecem hoje, o imperialismo prefere intervir
em um país dependente organizando a guerra civil, financiando as forças con-
trarrevolucionárias contra a revolução, dando apoio moral e financeiro aos seus
agentes chineses contra a revolução. Os imperialistas tendiam a descrever a luta
de Denikin e Kolchak, Yudenich e Wrangel contra a revolução na Rússia, como
uma luta exclusivamente interna. Mas todos nós sabemos – e não apenas nós,
mas o mundo inteiro – que por trás desses generais contrarrevolucionários rus-
sos estavam os imperialistas da Grã-Bretanha e da América, França e Japão, sem
cujo apoio uma guerra civil séria na Rússia teria sido completamente impossí-
vel. O mesmo deve ser dito da China. A luta de Wu Pei-fu, Sun Chuan-fang,
Chang Tsolin e Chang Tsung-chang contra a revolução na China seria simples-
mente impossível se esses generais contrarrevolucionários não fossem instigados
pelos imperialistas de todos os países, se estes não os fornecessem com dinheiro,
armas, instrutores, “conselheiros” etc.
J. V. Stalin 353

Onde está a força das tropas de Cantão? No fato de se inspirarem num ideal,
no entusiasmo, na luta pela libertação do imperialismo; no fato de que estão
trazendo a libertação da China. Onde está a força dos generais contrarrevolu-
cionários na China? No fato de serem apoiados pelos imperialistas de todos os
países, pelos donos de todas as ferrovias, concessões, moinhos e fábricas, bancos
e casas comerciais na China.
Portanto, não se trata apenas, ou nem tanto, da incursão de tropas estran-
geiras, mas do apoio que os imperialistas de todos os países estão prestando aos
contrarrevolucionários na China. Intervenção pelas mãos de outros – é aí que
reside a raiz da intervenção imperialista.
Portanto, a intervenção imperialista na China é um fato indubitável, e é con-
tra ela que se dirige a revolução chinesa.
Portanto, quem ignora ou subestima o fato da intervenção imperialista na
China, ignora ou subestima o que há de principal e fundamental na China.
Diz-se que os imperialistas japoneses mostram alguns sintomas de “boa von-
tade” para com os cantoneses e a revolução chinesa em geral. Diz-se que os im-
perialistas americanos não estão atrás dos japoneses nesse aspecto. Isso é auto-
engano, camaradas. É preciso saber distinguir entre a essência da política dos
imperialistas, incluindo a dos imperialistas japoneses e americanos, e seus dis-
farces. Lenin costumava dizer que é difícil impor os revolucionários com a clava
ou com o punho, mas às vezes é muito fácil aceitá-los com lisonjas. Essa verdade
de Lenin nunca deve ser esquecida, camaradas. Em todo caso, está claro que
os imperialistas japoneses e americanos perceberam muito bem seu valor. É ne-
cessário, portanto, fazer uma distinção estrita entre agrados e elogios feitos aos
cantoneses e o fato de que os imperialistas que são mais generosos com os agra-
dos são aqueles que se apegam mais firmemente às “suas” concessões e ferrovias
na China, e que não o farão consentir em abandoná-las a qualquer preço.

III. O exército revolucionário na China

Minha segunda observação sobre as teses apresentadas diz respeito à ques-


tão do exército revolucionário na China. O fato é que a questão do exército é
ignorada ou subestimada nas teses. Esse é o segundo defeito. O avanço dos
cantoneses para o norte é geralmente considerado não como uma expansão da
revolução chinesa, mas como uma luta dos generais de Cantão contra Wu Pei-fu
e Sun Chuan-fang, como uma luta pela supremacia de alguns generais contra
outros. Isso é um erro profundo, camaradas. Os exércitos revolucionários na
China são o fator mais importante na luta dos trabalhadores e camponeses chi-
neses pela sua emancipação. Foi acidental que, até maio ou junho deste ano, a
situação na China era considerada como a regra da reação, que se instalou após
a derrota dos exércitos de Fen Yuhsiang, mas que mais tarde, no verão deste ano,
as tropas vitoriosas de Cantão tiveram apenas avançar para o norte e ocupar Hu-
peh para que todo o quadro mude radicalmente a favor da revolução? Não, não é
acidental. Pois o avanço dos cantoneses significa um golpe no imperialismo, um
golpe nos seus agentes na China; significa liberdade de assembleia, liberdade de
greve, liberdade de imprensa e liberdade de organização para todos os elemen-
354 Obras Escolhidas

tos revolucionários na China em geral, e para os trabalhadores em particular. É


isso que constitui a característica específica e a importância suprema do exército
revolucionário na China.
Antigamente, nos séculos XVIII e XIX, as revoluções costumavam começar
com uma revolta do povo em sua maioria desarmado ou mal armado, que entrava
em choque com o exército do antigo regime, que tentava desmoralizar ou pelo
menos vencer parte para o seu próprio lado. Essa foi a forma típica dos surtos
revolucionários no passado. Foi o que aconteceu aqui na Rússia em 1905. Na
China, as coisas seguiram um curso diferente. Na China, as tropas do antigo go-
verno são confrontadas não por um povo desarmado, mas por um povo armado
na forma de seu exército revolucionário. Na China, a revolução armada está
lutando contra a contrarrevolução armada. Essa é uma das características espe-
cíficas e uma das vantagens da revolução chinesa. E é aí que reside o significado
especial do exército revolucionário na China.
É por isso que é uma lacuna inadmissível das teses apresentadas que subesti-
mam o exército revolucionário.
Mas daí decorre que os comunistas na China devem dedicar atenção especial
ao trabalho no exército.
Em primeiro lugar, os comunistas na China devem intensificar, em todos os
sentidos, o trabalho político no exército, e garantir que o exército se torne um
veículo real e exemplar das ideias da revolução chinesa. Isso é particularmente
necessário porque todos os tipos de generais que nada têm em comum com o
Kuomintang estão agora se ligando aos cantoneses, como uma força que está
derrotando os inimigos do povo chinês; e, ao se apegar aos cantoneses, estão in-
troduzindo a desmoralização no exército. A única maneira de neutralizar esses
“aliados” ou torná-los genuínos ‘kuomintanguistas’ é intensificar o trabalho po-
lítico e estabelecer o controle revolucionário sobre eles. A menos que isso seja
feito, o exército pode se encontrar em uma situação muito difícil.
Em segundo lugar, os revolucionários chineses, inclusive os comunistas, de-
vem realizar um estudo aprofundado da arte da guerra. Eles não devem considerá-
lo algo secundário, porque hoje é um fator cardeal na revolução chinesa. Os re-
volucionários chineses e, portanto, também os comunistas, devem estudar a arte
da guerra, a fim de gradualmente se tornarem importantes e ocuparem vários
postos de liderança no exército revolucionário. Essa é a garantia de que o exér-
cito revolucionário na China avançará no caminho certo, direto para seu objetivo.
A menos que isso seja feito, hesitação e vacilação podem se tornar inevitáveis.

IV. O caráter do futuro governo na China

Minha terceira observação diz respeito ao fato de que as teses nada dizem,
ou não dizem o suficiente, sobre o caráter do futuro governo revolucionário
na China. Mif, em suas teses, chega perto do assunto, e isso tem o seu cré-
dito. Mas, chegando perto disso, por algum motivo ele ficou assustado e não se
aventurou a levar o assunto a uma conclusão. Mif pensa que o futuro governo
revolucionário na China será um governo da pequena burguesia revolucioná-
ria, sob a direção do proletariado. O que isso significa? Na época da revolu-
J. V. Stalin 355

ção de fevereiro de 1917, os mencheviques e socialistas-revolucionários também


eram partidos pequeno-burgueses e, em certa medida, revolucionários. Isso sig-
nifica que o futuro governo revolucionário na China será um governo Socialista-
Revolucionário-Menchevique? Não, não significa. Por quê? Porque o governo
socialista-revolucionário-menchevique foi, na verdade um governo imperialista,
enquanto o futuro governo revolucionário na China não pode deixar de ser um
governo anti-imperialista. A diferença aqui é fundamental.
O governo MacDonald era até um governo “trabalhista”, mas era um governo
imperialista mesmo assim, porque se baseava na preservação do domínio impe-
rialista britânico, na Índia e no Egito, por exemplo. Em comparação com o
governo MacDonald, o futuro governo revolucionário na China terá a vantagem
de ser um governo anti-imperialista.
A questão reside não apenas no caráter democrático-burguês do governo de
Cantão, que é o embrião do futuro governo revolucionário de toda a China; a
questão, acima de tudo, é a de que este governo é, e não pode deixar de ser,
um governo anti-imperialista, que cada avanço que faz é um golpe no imperi-
alismo mundial – e, consequentemente, um golpe que beneficia o movimento
revolucionário mundial.
Lenin estava certo quando disse que, enquanto antigamente, antes do advento
da era da revolução mundial, o movimento de libertação nacional fazia parte
do movimento democrático geral, agora, após a vitória da revolução soviética
na Rússia e o advento do era da revolução mundial, o movimento de libertação
nacional faz parte da revolução proletária mundial.
Mif não levou em consideração este recurso específico.
Acho que o futuro governo revolucionário na China terá, em geral, um caráter
semelhante ao governo de que falávamos em nosso país em 1905, ou seja, algo na
natureza de uma ditadura democrática do proletariado e do campesinato, com a
diferença, no entanto, que será, antes de tudo, um governo anti-imperialista.
Será um governo de transição para um não capitalista, ou, mais exatamente,
para um desenvolvimento socialista da China.
Essa é a direção que a revolução na China deve tomar.
Este curso de desenvolvimento da revolução é facilitado por três circunstân-
cias: em primeiro lugar, pelo fato de que a revolução na China, sendo uma revo-
lução de libertação nacional, será lançada contra o imperialismo e seus agentes
na China; em segundo lugar, pelo fato de que a grande burguesia nacional na
China é fraca, mais fraca do que a burguesia nacional era na Rússia no período
de 1905, o que facilita a hegemonia do proletariado e a direção do campesinato
chinês pelo partido proletário; em terceiro lugar, pelo fato de que a revolução na
China se desenvolverá em circunstâncias que permitirão contar com a experiên-
cia e a ajuda da revolução vitoriosa na União Soviética.
Se este curso terminará em vitória absoluta, dependerá de muitas circuns-
tâncias. Mas uma coisa, de qualquer modo, é clara: a luta precisamente por
esse curso da revolução chinesa é a tarefa básica dos comunistas chineses. Daí
decorre a tarefa dos comunistas chineses no que diz respeito à sua atitude para
com o Kuomintang e para com o futuro governo revolucionário na China. Diz-se
que os comunistas chineses deveriam se retirar do Kuomintang. Isso seria errado,
356 Obras Escolhidas

camaradas. A retirada dos comunistas chineses do Kuomintang na atualidade se-


ria um erro profundo. Todo o curso, caráter e perspectivas da revolução chinesa
sem dúvida testemunham a favor da permanência dos comunistas chineses no
Kuomintang e da intensificação de seu trabalho nele.
Mas pode o Partido Comunista Chinês participar no futuro governo revolu-
cionário? Não só pode, mas deve fazê-lo. O curso, o caráter e as perspectivas
da revolução na China são testemunhos eloquentes a favor da participação do
Partido Comunista Chinês no futuro governo revolucionário da China.
É aí que reside uma das garantias essenciais do estabelecimento de fato da
hegemonia do proletariado chinês.

V. A questão do camponês na China

Minha quarta observação diz respeito à questão do campesinato na China.


Mif acha que o slogan para formar os sovietes – ou seja, sovietes camponeses no
interior da China – deveria ser divulgado imediatamente. Na minha opinião,
isso seria um erro. Mif está indo longe demais. Não se pode construir sovietes
no campo e evitar os centros industriais da China. Mas o estabelecimento de
sovietes nos centros industriais da China não está na ordem do dia. Além disso,
deve-se ter em mente que os sovietes não podem ser considerados alheios à situ-
ação circundante. Os sovietes – neste caso os sovietes camponeses – só poderiam
ser organizados se a China estivesse no auge de um movimento camponês que
estava destruindo a velha ordem das coisas e construindo um novo poder, com
base no cálculo de que os centros industriais da China já haviam estourado a bar-
ragem e entrado na fase de estabelecimento do poder dos sovietes. Pode-se dizer
que o campesinato chinês e a revolução chinesa em geral já entraram nesta fase?
Não, não se pode. Consequentemente, falar dos sovietes agora seria correr muito
à frente. Consequentemente, a questão que deve ser levantada agora não é a dos
sovietes, mas da formação de comitês camponeses. Tenho em mente comitês
camponeses eleitos pelos camponeses, comitês capazes de formular as deman-
das básicas do campesinato e que tomariam todas as medidas para assegurar a
realização dessas demandas de forma revolucionária. Esses comitês camponeses
deveriam servir de eixo em torno do qual se desenvolve a revolução no campo.
Sei que há ‘kuomintanguistas’ e até comunistas chineses que não conside-
ram possível desencadear a revolução no campo, pois temem que, se o campe-
sinato fosse atraído para a revolução, isso desestruturaria a frente única anti-
imperialista. Isso é um erro profundo, camaradas. Quanto mais rápida e com-
pletamente o campesinato chinês for atraído para a revolução, mais forte e pode-
rosa será a frente anti-imperialista na China. Os autores das teses, especialmente
Tang Ping-shan e Rafes, têm toda a razão em sustentar que a satisfação imedi-
ata de uma série das demandas mais urgentes dos camponeses é uma condição
essencial para a vitória da revolução chinesa. Acho que já é tempo de quebrar
essa inércia e essa “neutralidade” em relação ao campesinato que se observam
nas ações de certos elementos do Kuomintang. Acho que tanto o Partido Comu-
nista Chinês quanto o Kuomintang, e, portanto, o governo de Cantão, deveriam
passar das palavras aos atos sem demora e levantar a questão de satisfazer de uma
J. V. Stalin 357

vez as demandas mais vitais do campesinato.


Quais devem ser as perspectivas a esse respeito, e até onde é possível e neces-
sário ir, depende do curso da revolução. Eu acho que no longo prazo, as coisas
deveriam ir tão longe quanto a nacionalização da terra. Em todo o caso, não
podemos repudiar um slogan como o da nacionalização da terra.
Quais são as formas e os meios que os revolucionários chineses devem adotar
para despertar as vastas massas camponesas da China para a revolução?
Acho que, nas condições dadas, só podemos falar de três maneiras.
A primeira forma é pela formação de comitês de camponeses e pela entrada
dos revolucionários chineses nesses comitês para influenciar o campesinato. (Uma
voz da plateia: “E as associações de camponeses?”). Eu acho que as associações de cam-
poneses se agruparão em torno dos comitês de camponeses, ou serão convertidas
em comitês de camponeses, investidos da medida necessária de autoridade para
a realização do reivindicações dos camponeses. Já falei sobre esse caminho. Mas
assim não basta. Seria ridículo pensar que existem revolucionários suficientes
na China para esta tarefa. A China tem cerca de 400 milhões de habitantes.
Destes, cerca de 350 milhões são chineses. E deles, mais de nove décimos são
camponeses. Qualquer um que pensa que algumas dezenas de milhares de re-
volucionários chineses podem cobrir este oceano de camponeses está cometendo
um erro. Consequentemente, caminhos adicionais são necessários.
A segunda maneira é influenciando o campesinato por meio do aparato do
governo revolucionário do novo povo. Não há dúvida de que nas províncias
recém-libertadas será estabelecido um novo governo do tipo do governo de Can-
tão. Não há dúvida de que esta autoridade e seu aparato terão que se empenhar
em satisfazer as demandas mais urgentes do campesinato se realmente desejam
fazer avançar a revolução. Pois bem, a tarefa dos comunistas e dos revolucioná-
rios chineses em geral é penetrar no aparato do novo governo, aproximar esse
aparato das massas camponesas e, por meio dele, ajudar as massas camponesas
a garantir a satisfação das suas demandas urgentes, seja pela expropriação das
terras dos proprietários, seja pela redução de impostos e aluguéis – de acordo
com as circunstâncias.
A terceira forma é influenciando o campesinato por meio do exército revolu-
cionário. Já falei da grande importância do exército revolucionário na revolução
chinesa. O exército revolucionário da China é a força que primeiro penetra nas
novas províncias, que passa primeiro por áreas camponesas densamente povoa-
das, e pela qual o camponês forma seu julgamento do novo governo, de suas boas
ou más qualidades. Depende principalmente do comportamento do exército re-
volucionário, de sua atitude para com o campesinato e para com os latifundiários,
de sua prontidão para ajudar os camponeses, e também qual será a atitude do
campesinato para com o novo governo, o Kuomintang e a revolução chinesa em
geral. Se tivermos em mente que um grande número de elementos duvidosos se
uniu ao exército revolucionário da China, e que podem mudar a compleição do
exército para pior, será entendido quão grande é a importância da compleição
política do exército e sua, por assim dizer, política camponesa aos olhos do cam-
pesinato. Os comunistas chineses e os revolucionários chineses em geral devem,
portanto, tomar todas as medidas para neutralizar os elementos anti-camponeses
358 Obras Escolhidas

no exército, para preservar o espírito revolucionário do exército e para garantir


que o exército ajude os camponeses e os incite à revolução.
Dizem que o exército revolucionário é recebido de braços abertos na China,
mas que depois, quando se instala, instala-se uma certa desilusão. O mesmo
aconteceu aqui na União Soviética durante a Guerra Civil. A explicação é que,
quando o exército libera novas províncias e nelas se instala, tem de se alimen-
tar de uma forma ou de outra à custa da população local. Nós, revolucioná-
rios soviéticos, geralmente tínhamos sucesso em contrabalançar essas desvanta-
gens, esforçando-nos por meio do exército para ajudar os camponeses contra
os elementos latifundiários. Os revolucionários chineses também devem apren-
der como contrabalançar essas desvantagens conduzindo uma política camponesa
correta por meio do exército.

VI. O proletariado e a hegemonia do proletariado


na China
A minha quinta observação diz respeito à questão do proletariado chinês. Em
minha opinião, as teses não enfatizam suficientemente o papel e a importância
da classe trabalhadora na China. Rafes pergunta em quem os comunistas chine-
ses deveriam se orientar – nas esquerdas ou no centro do Kuomintang? Essa é
uma pergunta estranha. Penso que os comunistas chineses devem orientar-se em
primeiro lugar ao proletariado, e orientar os dirigentes do movimento de liberta-
ção chinês para a revolução. Essa é a única maneira correta de fazer a pergunta.
Eu sei que entre os comunistas chineses há camaradas que não aprovam que os
trabalhadores façam greve para melhorar suas condições materiais e legais, e que
tentam dissuadir os trabalhadores de fazerem greve. (Uma voz: “Isso aconteceu em
Cantão e Xangai”). Isso é um grande erro, camaradas. É uma subestimação muito
séria do papel e da importância do proletariado chinês. Esse fato deve ser no-
tado nas teses como algo decididamente questionável. Seria um grande erro se os
comunistas chineses deixassem de aproveitar a atual situação favorável para aju-
dar os trabalhadores a melhorar suas condições materiais e jurídicas, mesmo por
meio de greves. Caso contrário, a que propósito serve a revolução na China? O
proletariado não pode ser uma força dirigente se, durante as greves, seus filhos
são açoitados e torturados por agentes do imperialismo. Esses ultrajes medie-
vais devem ser interrompidos a todo custo, a fim de aumentar o senso de poder
e dignidade entre os proletários chineses e torná-los capazes de liderar o movi-
mento revolucionário. Sem isso, a vitória da revolução na China é inconcebível.
Portanto, deve-se dar o devido lugar nas teses às demandas econômicas e jurídi-
cas da classe trabalhadora chinesa no sentido de melhorar substancialmente suas
condições. (Mif: “É mencionado nas teses” ). Sim, é mencionado nas teses, mas,
infelizmente, não é dado destaque suficiente a essas exigências.

VII. A questão da juventude na China

Minha sexta observação diz respeito à questão da juventude na China. É es-


tranho que essa questão não tenha sido levada em consideração nas teses. No en-
J. V. Stalin 359

tanto, agora é de extrema importância na China. Os relatórios de Tang Ping-shan


tocam nesta questão, mas, infelizmente, não dão destaque suficiente. A questão
da juventude é de importância primordial na China hoje. A juventude estudan-
til (os estudantes revolucionários), a juventude operária, a juventude camponesa
– tudo isso constitui uma força que poderia fazer a revolução avançar a passos
largos, se ela estivesse subordinada à influência ideológica e política do Kuomin-
tang222 . Devemos ter em mente que ninguém sofre com a opressão imperialista
tão profunda e agudamente – ou está tão aguda e dolorosamente ciente da ne-
cessidade de lutar contra ela – como a juventude chinesa. O Partido Comunista
Chinês e os revolucionários chineses deveriam levar esta circunstância totalmente
em consideração e intensificar seu trabalho entre os jovens ao máximo. A juven-
tude deve ter seu lugar nas teses sobre a questão chinesa.

VIII. Algumas conclusões


Gostaria de mencionar algumas conclusões – a respeito da luta contra o im-
perialismo na China e a respeito da questão camponesa.
Não há dúvida de que o Partido Comunista Chinês não pode agora se limitar a
exigir a abolição dos tratados desiguais. Essa é uma exigência que agora é susten-
tada até por um contrarrevolucionário como Chang Hsueh-liang. Obviamente,
o Partido Comunista Chinês deve ir além disso.
É necessário, ainda, considerar – como perspectiva – a nacionalização das fer-
rovias. Isso é necessário e deve ser trabalhado.
É preciso, ainda, ter em mente a perspectiva de nacionalizar as usinas e fábri-
cas mais importantes. A este respeito, coloca-se, em primeiro lugar, a questão de
nacionalizar as empresas cujos proprietários apresentam particular hostilidade
e particular agressividade para com o povo chinês. É preciso também dar des-
taque à questão camponesa, relacionando-a com as perspectivas da revolução na
China. Acho que o que deve ser trabalhado a longo prazo é o confisco das terras
dos proprietários para o benefício dos camponeses e a nacionalização da terra.
O resto é evidente.
Essas, camaradas, são todas as observações que desejo fazer.

222 Tal política era correta nas condições prevalecentes na época, visto que o Kuomintang represen-
tava, então, um bloco de comunistas e kuomintanguistas mais ou menos de esquerda, que conduziam
uma política revolucionária anti-imperialista. Posteriormente, essa política foi abandonada por não
estar mais em conformidade com os interesses da revolução chinesa, uma vez que o Kuomintang ha-
via desertado da revolução e depois se tornado o centro da luta contra ela, enquanto os comunistas
se retiraram do Kuomintang e romperam relações com ele.
360 Obras Escolhidas

Os três slogans fundamentais do


partido na questão camponesa
15 de abril de 1927

Resposta a Yansky

Obviamente, recebi sua carta. Estou respondendo com alguma demora, pelo
que, por favor, me perdoe.
1) Lenin diz que “a questão principal de toda revolução é a questão do poder
do Estado” (ver Vol. 21, p. 142). Nas mãos de que classe, ou de quais classes,
está o poder concentrado; qual classe, ou quais classes, devem ser derrubadas;
qual classe, ou quais classes, devem assumir o poder – essa é “a questão principal
de toda revolução”.
Os slogans estratégicos fundamentais do Partido, que mantêm a sua validade
durante todo o período de qualquer fase específica da revolução, não podem ser
chamados de slogans fundamentais se não forem total e inteiramente baseados
nesta tese cardinal de Lenin.
Os slogans fundamentais só podem ser corretos se forem baseados em uma
análise marxista das forças de classe, se indicarem o plano correto de disposição
das forças revolucionárias na frente da luta de classes, se ajudarem a trazer as
massas para a frente da luta pela vitória da revolução, à frente da luta pela tomada
do poder pela nova classe, se ajudarem o Partido a formar das amplas massas
populares o grande e poderoso exército político que é essencial para a realização
desta tarefa.
Durante qualquer estágio particular da revolução podem ocorrer derrotas e
recuos, fracassos e erros táticos, mas isso não significa que o slogan estratégico
fundamental esteja errado. Assim, por exemplo, o slogan fundamental na pri-
meira fase da nossa revolução – “junto com todo o campesinato, contra o tsar e os
latifundiários, neutralizando a burguesia, pela vitória da revolução democrático-
burguesa” foi absolutamente um slogan correto, apesar da derrota da Revolução
de 1905.
Consequentemente, a questão da palavra de ordem fundamental do Partido
não deve ser confundida com a questão dos sucessos ou fracassos da revolução
em qualquer estágio particular de seu desenvolvimento.
Pode acontecer que, no curso da revolução, a palavra de ordem fundamental
do Partido já tenha levado à derrubada do poder das velhas classes, ou da velha
classe, mas uma série de demandas vitais da revolução, decorrentes deste slogan,
não foram alcançadas, ou sua realização se espalhou por um período de tempo
inteiro, ou uma nova revolução pode ser necessária para sua realização; mas isso
não significa que o slogan fundamental estivesse errado. Assim, por exemplo, a
Revolução de fevereiro de 1917 derrubou o tsarismo e os proprietários de terras,
mas não levou ao confisco das terras dos proprietários, etc.; mas isso não significa
que nosso slogan fundamental no primeiro estágio da revolução estivesse errado.
J. V. Stalin 361

Ou outro exemplo: a Revolução de Outubro derrubou a burguesia e transfe-


riu o poder ao proletariado, mas não levou imediatamente a: a) a conclusão da
revolução burguesa, em geral; b) o isolamento dos kulaks no campo, em particular
— estavam espalhados por um determinado período de tempo. Apesar de tudo,
isso não significa que nosso slogan fundamental na segunda fase da revolução
– “junto com o campesinato pobre, contra o capitalismo na cidade e no campo,
enquanto neutraliza o campesinato médio, pelo poder do proletariado” – estava
errado.
Consequentemente, a questão da palavra de ordem fundamental do Partido
não deve ser confundida com a questão do tempo e das formas de atender às
demandas particulares decorrentes dessa palavra de ordem.
É por isso que as palavras de ordem estratégicas do nosso Partido não devem
ser avaliadas do ponto de vista dos sucessos de episódios ou derrotas do movi-
mento revolucionário em qualquer período particular; ainda menos podem ser
avaliadas do ponto de vista da época ou das formas de realização de quaisquer
demandas particulares que surjam desses slogans. Os slogans estratégicos do Par-
tido só podem ser avaliados do ponto de vista de uma análise marxista das forças
de classe e da correta disposição das forças revolucionárias na frente da luta pela
vitória da revolução, pela concentração do poder nas mãos da nova classe.
Seu erro consiste em deixar de lado essa questão metodológica extremamente
importante, ou não a entender.
2) Você escreve em sua carta:
É correto afirmar que estivemos em aliança com todo o campesinato apenas até outubro?
Não, não é. O slogan ‘aliança com todo o campesinato’ era válido antes de outubro, durante
outubro e no primeiro período após outubro, visto que todo o campesinato estava interessado
em completar a revolução burguesa.

Assim, desta citação decorre que a palavra de ordem estratégica do Partido


na primeira fase da revolução (1905 a fevereiro de 1917), quando a tarefa era
derrubar o poder do tsar e dos latifundiários e estabelecer a ditadura do prole-
tariado e o campesinato, não diferia da palavra de ordem estratégica da segunda
etapa da revolução (fevereiro de 1917 a outubro de 1917), quando a tarefa era
derrubar o poder da burguesia e estabelecer a ditadura do proletariado.
Consequentemente, o senhor nega a diferença fundamental entre a revolução
democrático-burguesa e a revolução socialista proletária. Você comete este erro
porque, evidentemente, você se recusa a entender uma questão tão simples: como
que o tema fundamental de um slogan estratégico é a questão do poder em uma
determinada etapa da revolução, a questão de qual classe está sendo derrubada
e em as mãos das quais o poder de classe está sendo transferido. Nem é preciso
provar que, nesse ponto, você está radicalmente errado.
Você diz que na época de outubro e no primeiro período depois de outubro
aplicamos o slogan, “aliança com todo o campesinato”, na medida em que todo
o campesinato estava interessado em completar a revolução burguesa. Mas quem
lhe disse que a insurreição de outubro e a revolução de outubro se limitavam
ou tinham como tarefa principal a conclusão da revolução burguesa? Onde você
conseguiu essa informação? É possível que a derrubada do poder da burguesia
e a instauração da ditadura do proletariado se efetuem no âmbito da revolução
362 Obras Escolhidas

burguesa? A conquista da ditadura do proletariado não significa ir além do


marco da revolução burguesa?
Como se pode afirmar que os kulaks (que, naturalmente, também são cam-
poneses) poderiam apoiar a derrubada da burguesia e a transferência do poder
para o proletariado?
Como se pode negar que o decreto sobre a nacionalização da terra, a abolição
da propriedade privada da terra, a proibição da compra e venda de terras, etc.,
apesar de não poder ser considerado um decreto socialista, foi posto em prática
por nós na luta contra os kulaks, e não em aliança com eles?
Como se pode afirmar que os kulaks (que também são camponeses) poderiam
apoiar os decretos do governo soviético sobre a expropriação de engenhos, fábri-
cas, ferrovias, bancos, etc., ou a palavra de ordem do proletariado de transformar
a guerra imperialista em uma guerra civil?
Como se pode afirmar que o fundamental em outubro não foram estes e ou-
tros atos semelhantes, não a derrubada da burguesia e a instauração da ditadura
do proletariado, mas a conclusão da revolução burguesa?
Ninguém nega que uma das principais tarefas da Revolução de Outubro era
completar a revolução burguesa, que sem a Revolução de Outubro ela não pode-
ria ter sido completada, assim como a própria Revolução de Outubro não poderia
ter se consolidado sem completar a revolução burguesa; e como a Revolução de
Outubro completou a revolução burguesa, ela estava fadada a receber a simpatia
de todos os camponeses. Tudo isso é inegável. Mas pode-se afirmar, com base
nisso, que a conclusão da revolução burguesa não foi um fenômeno derivado no
curso da Revolução de Outubro, mas sua essência ou seu objetivo principal? O
que então, segundo você, se tornou o objetivo principal da Revolução de Outu-
bro, ou seja, a derrubada do poder da burguesia, o estabelecimento da ditadura
do proletariado, a transformação da guerra imperialista em uma guerra civil, a
expropriação dos capitalistas, etc.?
E se o tema principal de um slogan estratégico é a questão fundamental de
toda revolução, ou seja, a questão da transferência do poder de uma classe para
outra classe, não fica claro disso que a questão da conclusão da revolução bur-
guesa pelo poder proletário não deve ser confundido com a questão da derrubada
da burguesia e da conquista desse poder proletário, isto é, com a questão que é
o tema central da palavra de ordem estratégica da segunda etapa da revolução?
Uma das maiores conquistas da ditadura do proletariado é que ela comple-
tou a revolução burguesa e varreu toda a sujeira do medievalismo. Para o campo,
isso era de importância suprema e, na verdade, decisiva. Sem ela, a combinação
das guerras camponesas com a revolução proletária, da qual Marx falou na se-
gunda metade do século passado, eu não poderia ter ocorrido. Sem ela, a própria
revolução proletária não poderia ter se consolidado.
Além disso, a seguinte e importante circunstância deve ser levada em con-
sideração. A conclusão da revolução burguesa não pôde ser realizada de um só
golpe. Na verdade, ela se espalhou por todo um período abrangendo não apenas
partes de 1918, como você afirma em sua carta, mas também partes de 1919 (a
região do Volga e os Urais) e de 1919 a 1929 (a Ucrânia). Refiro-me ao avanço de
Kolchak e Denikin, quando o campesinato como um todo enfrentou o perigo da
J. V. Stalin 363

restauração do poder dos latifundiários e quando o campesinato, precisamente


como um todo, foi compelido a se unir em torno do poder soviético, a fim de as-
segurar a conclusão da revolução burguesa e reter os frutos dessa revolução. Essa
complexidade e diversidade dos processos de viver a realidade, esse “estranho”
entrelaçamento das tarefas diretamente socialistas da ditadura do proletariado
com a tarefa de completar a revolução burguesa, devem ser sempre mantidos em
mente para entender corretamente as passagens que você cita as obras de Lenin
e a mecânica de aplicação dos slogans do Partido.
Pode-se dizer que este entrelaçamento indica que o slogan do Partido na se-
gunda fase da revolução estava errado, e que este slogan não diferia do slogan
da primeira fase da revolução? Não, não se pode. Pelo contrário, este entrelaça-
mento apenas confirma o acerto da palavra de ordem do Partido na segunda fase
da revolução: “junto com o campesinato pobre, contra a burguesia capitalista na
cidade e no campo, pelo poder do proletariado”, etc. Por quê? Porque para
completar a revolução burguesa foi necessário primeiro, em outubro, derrubar o
poder da burguesia e erguer o poder do proletariado, pois só esse poder é capaz
de completar a revolução burguesa. Mas, para erguer o poder do proletariado
em outubro, era essencial preparar e organizar para outubro o exército político
apropriado, um exército capaz de derrubar a burguesia e estabelecer o poder do
proletariado; e não há necessidade de provar que tal exército político só poderia
ser preparado e organizado por nós sob o lema: “aliança do proletariado com o
campesinato pobre contra a burguesia, pela ditadura do proletariado”.
É claro que sem esse slogan estratégico, que realizamos de abril de 1917 a ou-
tubro de 1917, não poderíamos ter tido tal exército político, e que, portanto, não
poderíamos ter triunfado em outubro, não teríamos derrubado o poder da bur-
guesia e, consequentemente, não teríamos sido capazes de completar a revolução
burguesa.
É por isso que a conclusão da revolução burguesa não deve ser contraposta
à palavra de ordem estratégica da segunda fase da revolução, uma palavra de
ordem que tinha por missão assegurar a tomada do poder pelo proletariado.
Só há uma maneira de evitar todas essas “contradições”, a saber, reconhecer
a diferença fundamental entre o slogan estratégico da primeira fase da revolu-
ção (a revolução democrático-burguesa) e o slogan estratégico da segunda fase
da revolução ( a revolução proletária), para sintetizar que, durante a primeira
etapa da revolução, marchamos junto com todo o campesinato pela revolução
democrático-burguesa, ao passo que, durante a segunda etapa da revolução, mar-
chamos junto com o campesinato pobre contra o poder do capital e para a revo-
lução proletária.
E isso deve ser reconhecido porque uma análise das forças de classe no pri-
meiro e segundo estágios da revolução nos obriga a isso. Caso contrário, seria
impossível explicar o fato de que até fevereiro de 1917 continuamos nosso tra-
balho sob o slogan de uma ditadura democrática revolucionária do proletariado
e do campesinato, enquanto que, a partir de fevereiro de 1917, este slogan foi
substituído pelo slogan da ditadura socialista do proletariado e campesinato po-
bre.
Você concordará que esta substituição de um slogan por outro em março-abril
364 Obras Escolhidas

de 1917 não pode ser explicada em seu esquema.


Essa diferença fundamental entre os dois slogans estratégicos do Partido já
foi apontada por Lenin em seu panfleto “Duas Táticas da Social-Democracia na
Revolução Democrática”. Ele formulou o slogan do Partido na preparação para a
revolução democrático-burguesa da seguinte forma: “O proletariado deve levar a
cabo a revolução democrática, aliando a si a massa do campesinato para esmagar,
pela força, a resistência da autocracia, e paralisar a instabilidade da burguesia”
(ver Vol. 8, p. 96).
Em outras palavras: com todo o campesinato contra a autocracia, neutrali-
zando a burguesia, por uma revolução democrática.
Quanto ao slogan do Partido no período de preparação para a revolução so-
cialista, ele formulou da seguinte forma:
O proletariado deve realizar a revolução socialista, aliando a si mesmo a massa dos elementos
semiproletários da população para esmagar, pela força, a resistência da burguesia, e paralisar
a instabilidade do campesinato e da pequena burguesia. (Ibid.).

Em outras palavras: junto com o campesinato pobre e as camadas semiprole-


tárias da população em geral, contra a burguesia, ao mesmo tempo que neutraliza
a pequena burguesia na cidade e no campo, pela revolução socialista.
Isso foi em 1905.
Em abril de 1917, Lenin, caracterizando a situação política da época como
o entrelaçamento da ditadura democrática revolucionária do proletariado e do
campesinato com o poder real da burguesia, disse:
A característica específica da situação atual na Rússia consiste na passagem do primeiro es-
tágio da revolução – que, devido à insuficiente consciência de classe e organização do prole-
tariado, colocou o poder nas mãos da burguesia – para a segunda etapa, que deve colocar o
poder nas mãos do proletariado e das camadas pobres do campesinato. (ver “Teses de Abril” de
Lenin-Vol. 20, p. 88).

No final de agosto de 1917, quando os preparativos para a Revolução de Ou-


tubro estavam em pleno andamento, Lenin, em um artigo especial intitulado
“Camponeses e Trabalhadores”, escreveu o seguinte:
Somente o proletariado e o campesinato podem derrubar a monarquia – tal era a definição funda-
mental de nossa política de classe para aquela época (refere-se a 1905 — J. Stalin). E essa
definição era correta. Fevereiro e março de 1917 confirmaram isso mais uma vez. Só o pro-
letariado, liderando o campesinato pobre (os semiproletários, como diz nosso programa), pode
acabar com a guerra por uma paz democrática, curar as feridas que ela causou e começar a
dar passos rumo ao socialismo, que se tornaram absolutamente essenciais e urgentes – tal é a
definição de nossa política de classe agora. (ver Vol. 21, p. 111).

Isso não deve ser entendido como significando que agora temos uma dita-
dura do proletariado e do campesinato pobre. É claro que não é assim. Marcha-
mos em direção a outubro sob o lema da ditadura do proletariado e do cam-
pesinato pobre, e em outubro a efetivamos formalmente, na medida em que
tínhamos um bloco com os socialistas-revolucionários de esquerda e com eles
dividíamos a direção, embora, na verdade, a ditadura de o proletariado já exis-
tisse, pois nós, bolcheviques, constituímos a maioria. A ditadura do proletariado
e do campesinato pobre deixou de existir formalmente, porém, após o “golpe”
J. V. Stalin 365

dos socialistas-revolucionários de esquerda223 , após a ruptura do bloco com os


socialistas-revolucionários de esquerda, quando a direção passou total e inteira-
mente nas mãos de um partido, nas mãos do nosso Partido, que não divide e não
pode dividir a liderança do Estado com outro partido. Isso é o que chamamos
de ditadura do proletariado.
Finalmente, em novembro de 1918, Lenin, lançando um olhar retrospectivo
sobre o caminho percorrido pela revolução, escreveu:
Sim, nossa revolução é uma revolução burguesa, enquanto marcharmos com o campesinato
como um todo. Isso foi tão claro quanto pode ser para nós; dissemos isso centenas e milhares
de vezes desde 1905 e nunca tentamos pular essa etapa necessária do processo histórico ou
aboli-la por decretos. Mas em 1917, começando em abril, muito antes da Revolução de Outu-
bro, antes de tomarmos o poder, declaramos publicamente e explicamos ao povo: a revolução
não pode parar agora, pois o país avançou, o capitalismo avançou, a ruína atingiu dimensões
sem precedentes, que (gostemos ou não) exigirão avanços, rumo ao socialismo; pois não há
outra maneira de avançar, de salvar o país, que está arrasado pela guerra, e de aliviar o so-
frimento dos trabalhadores e explorados. As coisas aconteceram exatamente como dissemos
que aconteceriam. O curso da revolução confirmou a firmeza e acerto do nosso raciocínio.
Primeiro, com o “todo” do campesinato contra a autocracia, contra os latifundiários, contra
o regime medieval (e nessa medida a revolução continua burguesa, burguesa-democrática).
Depois, com o campesinato pobre, com os semiproletários, com todos os explorados, contra o
capitalismo, inclusive os ricos rurais, os kulaks, os aproveitadores, e nessa medida a revolução
se torna socialista. (ver Vol. 23, pp. 390-91).

Como você vê, Lenin enfatizou repetidamente a profunda diferença entre o


primeiro slogan estratégico, no período de preparação para a revolução democrático-
burguesa, e o segundo slogan estratégico, no período de preparação para outu-
bro. O primeiro slogan foi: “com todo o campesinato contra a autocracia”; a
segunda: “com o campesinato pobre contra a burguesia”.
O fato de que a conclusão da revolução burguesa se estendeu por todo um
período após outubro e que, na medida em que estávamos completando a re-
volução burguesa, o “todo”“ do campesinato não poderia deixar de simpatizar
conosco – este fato, como eu disse acima, não abala em nada a tese fundamental
de que marchamos em direção a outubro e conquistamos a vitória em outubro
junto com o campesinato pobre, de que derrubamos o poder da burguesia e es-
tabelecemos a ditadura do proletariado (uma das tarefas da qual era completar
a revolução burguesa) junto com o campesinato pobre, contra a resistência dos
kulaks (também camponeses) e com o campesinato médio vacilante.
Isso é claro, eu acho.
3) Você escreve mais em sua carta:
É verdade a afirmação de que ‘chegamos em outubro sob o lema da aliança com os pobres
rurais, neutralizando o camponês médio’? Não, não é verdade. Pelas razões mencionadas
acima, e a partir das citações de Lenin, verá que esse slogan só poderia surgir quando ‘a
divisão de classes entre os camponeses tivesse amadurecido’ (Lenin), ou seja, ’no verão e no
outono de 1918’.

Desta citação segue-se que o Partido adotou a política de neutralizar o cam-


ponês médio, não no período de preparação para outubro e durante outubro,
mas depois de outubro e, particularmente, a partir de 1918, após os Comitês de
Camponeses Pobres. Isso está totalmente errado.
223
A referência é à revolta contrarrevolucionária dos Socialistas-Revolucionários de “esquerda” em
Moscou, de 6 a 7 de julho de 1918, que foi reprimida em poucas horas.
366 Obras Escolhidas

Ao contrário, a política de neutralização do camponês médio não começou,


mas terminou depois dos Comitês de Camponeses Pobres, após 1918. A política
de neutralização do camponês médio foi abolida (e não introduzida) em nosso
trabalho prático depois de 1918. Foi a partir de 1918, em março de 1919, que
Lenin, abrindo o Oitavo Congresso do nosso Partido, afirmou:

Os melhores representantes do socialismo de antigamente – quando ainda acreditavam na


revolução e a serviam teórica e ideologicamente – falavam em neutralizar o campesinato, ou
seja, em transformar o campesinato médio em um estrato social que, se não ajudasse ativa-
mente o a revolução do proletariado, pelo menos não a impediria, seria neutra e não tomaria
partido dos nossos inimigos. Esta apresentação teórica e abstrata do problema é perfeita-
mente clara para nós. Mas não é suficiente. Entramos em uma fase de construção socialista na qual
devemos traçar regras e instruções básicas concretas e detalhadas que foram testadas pela experiência de
nosso trabalho no campo e pelas quais devemos ser guiados a fim de alcançar uma aliança estável com
o campesinato médio. (ver Vol. 24, p. 114).

Como você vê, isso equivale exatamente ao oposto do que você diz em sua
carta; você vira nossa prática real do Partido de cabeça para baixo ao confundir
o início da neutralização com seu fim.
O camponês médio choramingava e oscilava entre a revolução e a contrarre-
volução enquanto a burguesia era derrubada e o poder dos sovietes não se con-
solidava; portanto, era necessário neutralizá-lo. O camponês médio começou a
se voltar para nós quando começou a se convencer de que a burguesia havia sido
derrubada “para sempre”, que o poder dos soviéticos estava se consolidando,
que o kulak estava sendo vencido e que o Exército Vermelho estava começando a
conquistar vitória nas frentes da Guerra Civil. E foi precisamente depois dessa
virada que o terceiro slogan estratégico do Partido, emitido por Lenin no Oitavo
Congresso do Partido, se tornou possível, a saber: “contando com os camponeses
pobres e estabelecendo uma aliança estável com os camponeses médios – à frente
da construção socialista”!
Como você pôde esquecer esse fato tão conhecido?
Da sua carta resulta também que a política de neutralizar o camponês mé-
dio durante a transição para a revolução proletária, e nos primeiros dias após a
vitória dessa revolução, é errada, inadequada e, portanto, inaceitável. Isso está
totalmente errado. No caso, é o oposto. É precisamente enquanto o poder da
burguesia está sendo derrubado e antes que o poder do proletariado se conso-
lide que o camponês médio vacila e resiste acima de tudo. É precisamente neste
período que se faz necessária a aliança com o camponês pobre e a neutralização
do camponês médio.
Persistindo no seu erro, o senhor afirma que a questão do campesinato é
muito importante, não só para o nosso país, mas também para outros países “que
mais ou menos se assemelham ao sistema econômico da Rússia anterior a ou-
tubro”. Esta última afirmação é, obviamente, verdadeira. Mas aqui está o que
Lenin disse em suas teses sobre a questão agrária no II Congresso do Comin-
tern, sobre a política dos partidos proletários em relação ao camponês médio no
período em que o proletariado está tomando o poder. Depois de definir o cam-
pesinato pobre, ou mais precisamente, “as massas trabalhadoras e exploradas no
campo”, como um grupo separado consistindo em trabalhadores agrícolas, se-
miproletários ou titulares de quotas e pequenos camponeses, passando então à
J. V. Stalin 367

questão do meio o campesinato como um grupo separado no campo, Lenin diz:


Por ‘camponeses médios’, no sentido econômico, entendem-se pequenos agricultores que
também possuem, seja como proprietários ou arrendatários, pequenas parcelas de terra, mas,
em primeiro lugar, como, sob o capitalismo, fornecem-lhes como regra geral não apenas com
um parco o sustento das suas famílias e agregados familiares, mas também com a possibilidade
de assegurar um certo excedente, que, pelo menos nos melhores anos, pode ser convertido em
capital; e, em segundo lugar, com bastante frequência (por exemplo, uma fazenda em cada
duas ou três) recorrem ao aluguel de mão de obra externa. O proletariado revolucionário
não pode assumir a tarefa – pelo menos no futuro imediato e no período inicial da ditadura
do proletariado – de conquistar este estrato, mas deve limitar-se à tarefa de neutralizá-lo, ou
seja, de deixá-lo neutro em a luta entre o proletariado e a burguesia. (ver Vol. 25, pp. 271-72).

Como, depois disso, se pode afirmar que a política de neutralização do cam-


ponês médio “surgiu” em nosso país “apenas” “no verão e no outono de 1918”,
ou seja, após os sucessos decisivos na consolidação do poder soviético, o poder
do proletariado?
Como pode ver, a questão da palavra de ordem estratégica dos partidos pro-
letários no momento da transição para a revolução socialista e a consolidação do
poder do proletariado – como também a questão da neutralização do camponês
médio – não é tão simples como você imagina.
4) De tudo o que foi dito acima, é evidente que as passagens das obras de
Lenin que você cita não podem de forma alguma ser contrapostas à palavra de
ordem fundamental do Partido na segunda fase da revolução, uma vez que estas
citações:
a) não lidam com o slogan fundamental do Partido antes de outubro, mas
com a conclusão da revolução burguesa depois de outubro; b) não refutam,
mas confirmam a correção desse slogan.
Já disse acima, e devo repetir, que a palavra de ordem estratégica do Partido
na segunda fase da revolução, no período anterior à tomada do poder pelo prole-
tariado, cujo tema principal é a questão do poder, deve não se contrapor à tarefa
de completar a revolução burguesa que se efetua no período posterior à tomada
do poder pelo proletariado.
5) O senhor fala, sobre o artigo do camarada Molotov no Pravda intitulado
“A revolução burguesa em nosso país” (12 de março de 1927), que, ao que parece,
te “induziu” a solicitar uma explicação a mim por meio de sua carta. Eu não sei
como você lê artigos. Eu também li o artigo do camarada Molotov e penso que
não contradiz de forma alguma o que disse no meu relatório no XIV Congresso
do nosso Partido sobre os slogans do nosso Partido em relação ao campesinato.
Em seu artigo, o camarada Molotov não trata da palavra de ordem fundamen-
tal do Partido no período de outubro, mas do fato de que, desde que o Partido
depois de outubro completou a revolução burguesa, gozou da simpatia de todos
os camponeses. Mas já disse acima que a afirmação deste fato não refuta, mas,
pelo contrário, confirma a justeza da tese fundamental de que derrubamos o po-
der da burguesia e estabelecemos a ditadura do proletariado junto com o cam-
pesinato pobre, ao mesmo tempo em que neutraliza o camponês médio, contra
a burguesia da cidade e do campo; que sem isso não poderíamos ter concluído a
revolução burguesa.
368 Obras Escolhidas

Questões sobre a Revolução


Chinesa
21 de abril de 1927

Teses para propagandistas, aprovadas pelo CC do PCUS (B)

I. Perspectivas da revolução chinesa

Fatores básicos que determinam o caráter da revolução chinesa:


a) a condição semicolonial da China e a dominação financeira e econômica
do imperialismo;
b) a opressão das sobrevivências feudais, agravada pela opressão do milita-
rismo e da burocracia;
c) a crescente luta revolucionária das grandes massas operárias e camponesas
contra a opressão feudal e burocrática, contra o militarismo e contra o imperia-
lismo;
d) a fraqueza política da burguesia nacional, sua dependência do imperia-
lismo, seu medo do movimento revolucionário;
e) a crescente atividade revolucionária do proletariado, seu crescente prestígio
entre as vastas massas da classe trabalhadora;
f) a existência de uma ditadura do proletariado na vizinhança da China.
Daí, dois caminhos para o desenvolvimento de eventos na China: ou a burgue-
sia nacional esmaga o proletariado, faz um acordo com o imperialismo e junto
com ele lança uma campanha contra a revolução para acabar com esta, estabele-
cendo o domínio do capitalismo; ou o proletariado afasta a burguesia nacional,
consolida a sua hegemonia e assume a liderança das grandes massas trabalha-
doras na cidade e no campo, para vencer a resistência da burguesia nacional,
garantir a vitória completa da revolução democrático-burguesa e, então, gradu-
almente convertê-la em uma revolução socialista, com todas as consequências daí
decorrentes.
Um ou outro.
A crise do capitalismo mundial e a existência na URSS de uma ditadura do
proletariado, cuja experiência pode ser utilizada com sucesso pelo proletariado
chinês, aumenta consideravelmente a possibilidade de a revolução chinesa seguir
o segundo caminho.
Por outro lado, o fato do imperialismo estar atacando a revolução chinesa,
principalmente com uma frente única, que não há atualmente aquela divisão e
guerra entre os imperialistas que, por exemplo, existiam no campo imperialista
antes de a Revolução de Outubro, e que tendia a enfraquecer o imperialismo –
este fato indica que em seu caminho para a vitória, a revolução chinesa encon-
trará dificuldades muito maiores do que a revolução na Rússia, e que as deserções
J. V. Stalin 369

e traições no curso desta revolução serão incomparavelmente mais numerosos do


que durante a Guerra Civil na URSS.
Portanto, a luta entre estes dois caminhos da revolução constitui o traço ca-
racterístico da revolução chinesa. Justamente por isso, a tarefa fundamental dos
comunistas é lutar pela vitória da segunda via de desenvolvimento da revolução
chinesa.

II. A primeira fase da revolução chinesa

No primeiro período da revolução chinesa, na época da primeira marcha para


o Norte – quando o exército nacional se aproximava do Yang-tsé e colecionava
vitória após vitória, mas um poderoso movimento dos trabalhadores e campone-
ses ainda não havia se desenrolado – a burguesia nacional (não a compradora224 )
ficou do lado da revolução. Foi a revolução de uma frente nacional unida.
Isso não significa que não houvesse contradições entre a revolução e a burgue-
sia nacional. Significa apenas que a burguesia nacional, ao apoiar a revolução,
tentou utilizá-la para seus próprios fins e, orientando-a principalmente na linha
da conquista territorial, restringir seu alcance. A luta entre direitas e esquer-
distas no Kuomintang naquele período era um reflexo dessas contradições. A
tentativa de Chiang Kai-shek, em março de 1926, de expulsar os comunistas do
Kuomintang, foi a primeira tentativa séria da burguesia nacional de conter a re-
volução. Como se sabe, já naquela época o CC do PCUS (B) considerava que “a
linha deve ser manter o Partido Comunista dentro do Kuomintang” e que era
necessário “trabalhar pela renúncia ou expulsão dos Direitos do o Kuomintang”
(abril de 1926).
Esta linha foi direcionada para um maior desenvolvimento da revolução, es-
treita cooperação entre as esquerdas e os comunistas dentro do Kuomintang e
dentro do governo nacional, fortalecendo a unidade do Kuomintang e, ao mesmo
tempo, expondo e isolando os elementos de direita do Kuomintang, obrigando-
os a submeter-se à disciplina do Kuomintang. Utilizando os direitistas, as suas
ligações e a sua experiência, para que se submetessem à disciplina do Kuomin-
tang, ou expulsando-os do Kuomintang se violassem essa disciplina e traíssem os
interesses da revolução.
Os eventos subsequentes confirmaram totalmente o acerto desta linha. O
poderoso desenvolvimento do movimento camponês e a organização de associa-
ções e comitês camponeses no campo, a poderosa onda de greves nas cidades e
a formação de conselhos sindicais, o avanço vitorioso do exército nacional sobre
Xangai, sitiada por navios de guerra e tropas imperialistas. Todos esses fatos e
outros semelhantes indicam que a linha adotada foi a única correta.
Esta circunstância por si só pode explicar o fato de que a tentativa feita pelos
direitistas em fevereiro de 1927 de dividir o Kuomintang e estabelecer um novo
centro em Nanchang fracassou diante da resistência unânime do Kuomintang
224O setor de compradores era parte da grande burguesia mercantil nativa nas colônias e países
dependentes, que atuam como intermediários entre o capital estrangeiro e o mercado local. Na
China, a burguesia compradora mostrou-se uma agência do imperialismo estrangeiro e uma inimiga
feroz da revolução chinesa de 1925-27.
370 Obras Escolhidas

revolucionário em Wuhan.
Mas esta tentativa foi um sinal de que um reagrupamento das forças de classe
estava ocorrendo no país, que os direitistas e a burguesia nacional não desisti-
riam, que eles intensificariam seu trabalho contra a revolução.
O CC do PCUS (B) estava certo, portanto, quando disse em março de 1927
que: a) “na atualidade, em conexão com o reagrupamento das forças de classe
e concentração dos exércitos imperialistas, a revolução chinesa atravessa um pe-
ríodo crítico, e que só pode alcançar novas vitórias adotando resolutamente o
curso de desenvolvimento das massas movimento”; b) “é necessário adotar o curso
de armar os operários e camponeses e converter os comitês camponeses das lo-
calidades em verdadeiros órgãos de poder governamental dotados de legítima
defesa armada”; c) “o Partido Comunista não deve encobrir a política traiçoeira
e reacionária dos Direitos do Kuomintang, e deve mobilizar as massas em torno
do Kuomintang e do Partido Comunista Chinês com vistas a expor os Direitos”
(3 de março de 1927).
Portanto, será facilmente compreendido que o subsequente poderoso golpe
da revolução, por um lado, e o ataque imperialista em Xangai, por outro lado,
estavam fadados a lançar a burguesia nacional chinesa no campo da contrarre-
volução, assim como a ocupação de Xangai pelas tropas nacionais e as greves dos
trabalhadores de Xangai foram destinadas a unir os imperialistas para estrangu-
lar a revolução.
E foi isso que aconteceu. O massacre de Nanquim serviu, a este respeito,
como um sinal para uma nova demarcação das forças em conflito na China. Ao
bombardear a região e apresentar um ultimato, os imperialistas queriam deixar
claro que buscavam o apoio da burguesia nacional para uma luta conjunta contra
a revolução chinesa.
Chiang Kai-shek, por outro lado, ao disparar contra as reuniões de trabalha-
dores e engendrar um golpe, estava, por assim dizer, respondendo ao apelo dos
imperialistas e dizendo que estava pronto para fazer um acordo com eles junta-
mente com os a burguesia contra os trabalhadores e camponeses chineses.

III. A segunda fase da revolução chinesa


O golpe de Chiang Kai-shek marca a deserção da burguesia nacional da re-
volução, o surgimento de um centro de contrarrevolução nacional e a conclusão
de um acordo entre os direitos do Kuomintang e os imperialistas contra a revo-
lução chinesa. O golpe de Chiang Kai-shek significa que no sul da China haverá
agora dois campos, dois governos, dois exércitos, dois centros – o centro revo-
lucionário em Wuhan e o centro contrarrevolucionário em Nanquim. O golpe
de Chiang Kai-shek significa que a revolução entrou no segundo estágio de seu
desenvolvimento, que uma virada começou a partir da revolução de uma frente
única nacional e em direção a uma revolução das vastas massas dos trabalhadores
e camponeses, em direção a uma revolução agrária, que fortalecerá e ampliará a
luta contra o imperialismo, contra a pequena nobreza e os latifundiários feudais,
e contra os militaristas e o grupo contrarrevolucionário de Chiang Kai-shek.
Isso significa que a luta entre os dois caminhos da revolução, entre aqueles
J. V. Stalin 371

que são a favor de seu posterior desenvolvimento e aqueles que são a favor de sua
liquidação, se tornará mais aguda a cada dia e preencherá todo o período atual
da revolução.
Significa que, travando uma luta decidida contra o militarismo e o imperi-
alismo, o Kuomintang revolucionário em Wuhan se tornará de fato o órgão de
uma ditadura democrática revolucionária do proletariado e do campesinato, en-
quanto o grupo contrarrevolucionário de Chiang Kai-shek em Nanquim, por
separar-se dos trabalhadores e camponeses e aproximar-se do imperialismo, aca-
bará por partilhar o destino dos militaristas.
Mas daí decorre que a política de preservação da unidade do Kuomintang,
a política de isolar os Direitos dentro do Kuomintang e de os utilizar para os
fins da revolução, não está mais de acordo com as novas tarefas da revolução. A
política deve ser substituída por uma política de expulsar resolutamente os ele-
mentos de direita do Kuomintang, uma política de lutar resolutamente contra os
direitistas até que sejam completamente eliminados politicamente. Uma política
de concentrar todo o poder do país nas mãos de um Kuomintang revolucionário,
um Kuomintang sem seus elementos de direita, um Kuomintang que é um bloco
entre as esquerdas do Kuomintang e os comunistas.
Segue-se, além disso, que a política de estreita cooperação entre as esquerdas
e os comunistas dentro do Kuomintang adquire um valor e significado particu-
lares nesta fase, que esta cooperação reflete a aliança entre os trabalhadores e
camponeses que está se formando fora do Kuomintang, e que sem essa coopera-
ção a vitória da revolução será impossível.
Segue-se, além disso, que a principal fonte de força do Kuomintang revolu-
cionário está no desenvolvimento do movimento revolucionário dos trabalhado-
res e camponeses e no fortalecimento de suas organizações de massas – comitês
camponeses revolucionários, sindicatos de trabalhadores e outras organizações
revolucionárias de massa – Como os elementos preparatórios dos futuros sovie-
tes, e que o principal penhor da vitória da revolução é o crescimento da atividade
revolucionária das vastas massas do povo trabalhador, e o principal antídoto para
a contrarrevolução é o armamento do trabalhadores e camponeses.
Segue-se, por último, que enquanto luta nas mesmas fileiras dos kuomintan-
guistas revolucionários, o Partido Comunista deve mais do que nunca preservar a
sua independência, como condição essencial para garantir a hegemonia do pro-
letariado na revolução democrático-burguesa.

IV. Erros da oposição

O erro básico da oposição (Radek e companhia) é que ela não entende o ca-
ráter da revolução na China, o estágio que está passando e seu atual cenário
internacional.
A oposição exige que a revolução chinesa se desenvolva aproximadamente no
mesmo ritmo que a Revolução de Outubro. A oposição está insatisfeita porque
os trabalhadores de Xangai não travaram uma batalha decisiva aos imperialistas
e seus subalternos.
372 Obras Escolhidas

Mas não se percebe que a revolução na China não pode se desenvolver em um


ritmo acelerado. Uma das razões para isso é que a situação internacional hoje é
menos favorável do que era em 1917 (os imperialistas não estão em guerra entre
si).
Não se dá conta de que a batalha decisiva não deve ser travada em condições
desfavoráveis, quando as bases ainda não foram formadas – assim como os bol-
cheviques, por exemplo, não deram batalha decisiva nem em abril nem em julho
de 1917.
A oposição não percebe que não evitar o combate decisivo em condições des-
favoráveis (quando pode ser evitado) significa facilitar as coisas para os inimigos
da revolução.
A oposição exige a formação imediata de sovietes de deputados operários,
camponeses e soldados na China. Mas o que significaria formar sovietes agora?
Em primeiro lugar, eles não podem ser formados em qualquer momento de-
sejado – eles são formados apenas quando a maré da revolução está particular-
mente alta.
Em segundo lugar, os sovietes não são formados para falas e conversas. Eles
são formados principalmente como órgãos de luta contra o poder existente, como
órgãos de luta pelo poder. Foi esse o caso em 1905. Foi também o caso em 1917.
Mas o que significaria a formação de sovietes no momento atual na área de
ação, digamos, do governo de Wuhan? Significaria lançar o slogan de uma luta
contra o poder existente naquela área. Seria um hino a emissão de um slogan
para a formação de novos órgãos de poder, um slogan de luta contra o poder
do Kuomintang revolucionário, que inclui comunistas trabalhando em um bloco
com as esquerdas do Kuomintang, pois nenhum outro poder existe agora nessa
área, exceto o poder do Kuomintang revolucionário.
Significaria, ainda, confundir a tarefa de criar e fortalecer organizações de
massas dos trabalhadores e camponeses – na forma de comitês de greve, associ-
ações e comitês de camponeses, conselhos sindicais, comitês de fábrica, etc. –
em que o Kuomintang revolucionário já depende, com a tarefa de estabelecer
um sistema soviético, como um novo tipo de poder estatal, no lugar do poder do
Kuomintang revolucionário.
Significaria, por fim, não entender qual estágio está passando a revolução
na China. Significaria colocar nas mãos dos inimigos do povo chinês uma nova
arma contra a revolução, permitindo-lhes espalhar novas lendas de que o que
está acontecendo na China não é uma revolução nacional, mas um transplante
artificial da “sovietização de Moscou”.
Portanto, ao avançar a palavra de ordem da formação dos sovietes no mo-
mento atual, a oposição está fazendo o jogo dos inimigos da revolução chinesa.
A oposição considera inconveniente a participação do Partido Comunista no
Kuomintang. A oposição, consequentemente, considera conveniente a retirada
do Partido Comunista do Kuomintang. Mas o que significaria a retirada do Ku-
omintang agora, quando toda a gangue imperialista, com todos os seus subor-
dinados, está exigindo a expulsão dos comunistas do Kuomintang? Significaria
abandonar o campo de batalha e abandonar seus aliados no Kuomintang, para
J. V. Stalin 373

alegria dos inimigos da revolução. Significaria enfraquecer o Partido Comunista,


minar o Kuomintang revolucionário, facilitar o trabalho dos Cavaignacs de Xan-
gai e entregar a bandeira do Kuomintang, a mais popular de todas as bandeiras
na China, aos direitistas do Kuomintang.
É precisamente isso que os imperialistas, os militaristas e os elementos de
direita do Kuomintang exigem agora. Segue-se, portanto, que ao declarar a re-
tirada do Partido Comunista do Kuomintang no momento atual, a oposição está
jogando a favor dos inimigos da revolução chinesa.
O recente plenária do Comitê Central de nosso Partido agiu, portanto, com
toda a razão, ao rejeitar categoricamente a plataforma da oposição225 .

225Refere-se à plenária do CC do PCUS (B) realizado de 13 a 16 de abril de 1927. A plenária discutiu


uma série de questões relacionadas com os congressos dos soviéticos da URSS e RSFSR, e fixou a data
para a convocação do XV Congresso do PCUS (B). Em 13 de abril, Stalin falou sobre a questão da
agenda da plenária e na discussão sobre o relatório de I. Kalinin sobre “Questões dos Congressos
dos Sovietes da URSS e da RSFSR”. Depois de discutir uma comunicação do Bureau Político do
CC do PCUS (B) sobre as decisões por ele adotadas em relação aos acontecimentos internacionais
(acontecimentos na China, etc.), a plenária aprovou a política do Bureau Político para os assuntos
internacionais e rejeitou enfaticamente a plataforma antipartido da oposição Trotsky-Zinoviev.
374 Obras Escolhidas

A oposição trotskista antes e agora


2 de novembro de 1927

Discurso proferido em uma reunião da plenária Conjunto do Comitê Central e Comissão


Central de Controle do PCUS (B)226

I. Algumas questões menores


Camaradas, não tenho muito tempo; tratarei, portanto, de questões distintas.
Em primeiro lugar, sobre o fator pessoal. Vocês ouviram aqui com que assidui-
dade os oposicionistas me insultam e abusam de minha pessoa com todas as suas
forças. Isso não me surpreende, camaradas. A razão pela qual os principais
ataques foram dirigidos contra mim é porque eu conheço todos os truques da
oposição melhor, talvez, do que alguns de nossos camaradas, e não é tão fácil,
ouso dizer, me enganar. Portanto, eles desferem seus golpes principalmente em
mim. Bem, deixe-os lançar o abuso para o conteúdo de seu coração.
E o que é Stalin? Stalin é apenas uma figura secundária. Vejam Lenin. Quem
não sabe que na época do bloco de agosto, a oposição, chefiada por Trotsky, em-
preendeu uma campanha ainda mais grosseira de calúnias contra Lenin? Ouça
Trotsky, por exemplo: “Me parece uma obsessão sem sentido a disputa miserável,
sistematicamente provocada por Lenin, aquele veterano no jogo, aquele explora-
dor profissional de tudo o que está atrasado no movimento operário russo” (ver
“Carta de Trotsky a Chkheidze”, abril de 1913).
Observem a linguagem, camaradas! Observem o idioma! É uma escrita de
Trotsky. E escrevendo sobre Lenin.
É surpreendente, então, que Trotsky, que escreveu de maneira tão mal-educada
sobre o grande Lenin, cujos cadarços ele não era digno de amarrar, agora insista
226 A plenária conjunta do Comitê Central e da Comissão Central de Controle do PCUS (B) foi re-
alizada de 21 a 23 de outubro de 1927. Ela discutiu e aprovou os projetos de teses apresentados
pelo Bureau Político do Comitê Central do PCUS (B) sobre as questões da agenda do Décimo Quinto
Congresso do Partido. A saber: as diretrizes para a elaboração do plano quinquenal da economia
nacional; trabalho no campo. A plenária aprovou a nomeação de repórteres, resolveu abrir a discus-
são no Partido e decidiu publicar as teses do Décimo Quinto Congresso para discussão nas reuniões
do Partido e na imprensa. Tendo em vista o ataque dos líderes da oposição Trotsky-Zinoviev ao Ma-
nifesto emitido pelo Comitê Executivo Central da URSS em comemoração ao décimo aniversário da
Grande Revolução Socialista de Outubro, particularmente contra o ponto de passar para sete horas
úteis, a plenária discutiu esta questão e, em decisão especial, declarou que o Bureau Político do Co-
mitê Central agiu corretamente em sua iniciativa na publicação do Manifesto do Comitê Executivo
Central da URSS e aprovou o próprio Manifesto. A plenária ouviu um relatório do Presidium da
Comissão de Controle Central sobre as atividades faccionais de Trotsky e Zinoviev após a plenária
de agosto (1927) do Comitê Central e da Comissão de Controle Central do PCUS (B). Durante a
discussão deste assunto na reunião da plenária realizada em 23 de outubro, Stalin fez o discurso:
“A oposição trotskista antes e agora”. Por enganar o Partido e travar uma luta fracional contra ele,
a plenária expulsou Trotsky e Zinoviev do Comitê Central e decidiu submeter ao Décimo Quinto
Congresso do Partido todos os documentos relativos às atividades de divisão dos líderes da oposição
Trotsky-Zinoviev. Para as resoluções e decisões da plenária, consultar Resoluções e decisões do PCUS,
Conferências e Plenárias do Comitê Central, Parte II, 1953, pp.275-311.
J. V. Stalin 375

em um dos numerosos alunos de Lenin – o camarada Stalin?


Mais que isso. Acho que a oposição me honra ao expressar todo o seu ódio
contra mim. Isso é como deveria ser. Acho que seria estranho e ofensivo se a
oposição, que está tentando destruir o Partido, elogiasse Stalin, que defende os
fundamentos do princípio do Partido Leninista.
Agora, sobre o “testamento” de Lenin. Os oposicionistas gritaram aqui –
vocês os ouviram – que o Comitê Central do Partido “ocultou” a “vontade” de
Lenin. Já discutimos essa questão várias vezes na plenária do Comitê Central e
da Comissão Central de Controle, vocês sabem disso (uma voz: “Muitas vezes” ).
Foi provado e provado novamente que ninguém escondeu nada, que a “vontade”
de Lenin foi dirigida ao XIII Congresso do Partido, que esta “vontade” foi lida
no congresso (vozes: “É isso mesmo!” ), que o congresso decidiu por unanimidade
não a publicar porque, entre outras coisas, o próprio Lenin não queria que fosse
publicada e não pediu que fosse publicado. A oposição sabe de tudo isso tão bem
quanto nós. No entanto, tem a audácia de declarar que o Comitê Central está
“ocultando” o “testamento”.
A questão da “vontade” de Lenin foi levantada, se não me engano, já em 1924.
Há um certo Eastman, um ex-comunista americano que mais tarde foi expulso
do Partido. Este senhor, que se misturou com os trotskistas em Moscou, ouviu
alguns rumores e fofocas sobre o “testamento” de Lenin, foi para o exterior e
publicou um livro intitulado “Depois da morte de Lenin”, no qual ele fez o possível
para difamar o Partido, o Comitê Central e o regime soviético, e a essência disso
era que o Comitê Central de nosso Partido estava “ocultando” a “vontade” de Le-
nin. Em vista do fato de que este elemento uma vez esteve ligado a Trotsky, nós,
os membros do Bureau Político, pedimos a Trotsky que se dissociasse desse ele-
mento que, agarrando-se a Trotsky e referindo-se à oposição, o responsabilizou
Trotsky por as declarações caluniosas contra o nosso Partido sobre a “vontade”
de Lenin. Como a questão era tão óbvia, Trotsky, de fato, se dissociou publica-
mente deste homem em uma declaração que fez à imprensa. Foi publicado em
setembro de 1925, no nº 16 do “Bolchevique”.
Permitam-me ler a passagem do artigo de Trotsky em que ele trata da questão
de se o Partido e seu Comitê Central estavam ocultando a “vontade” de Lenin ou
não. Cito o artigo de Trotsky:
Em várias partes de seu livro, Eastman diz que o Comitê Central ‘escondeu’ do Partido uma
série de documentos excepcionalmente importantes escritos por Lenin no último período
de sua vida (é uma questão de cartas sobre a questão nacional, chamado de ‘vontade’ e ou-
tros); não pode haver outro nome para isso do que calúnia contra o Comitê Central do nosso
Partido. Do que ele diz, pode-se inferir que Vladimir pretendia essas cartas, que tinham o
caráter de conselho interno organização, para a imprensa. Na verdade, isso é absolutamente
falso. Durante sua doença, Vladimir frequentemente enviava propostas, cartas e assim por
diante, às instituições dirigentes do Partido e ao seu congresso. Escusado será dizer que todas
essas cartas e propostas eram sempre entregues àqueles a quem se destinavam, eram levados
ao conhecimento dos delegados no XII e no XIII Congressos e sempre, é claro, exerciam
a devida influência nas decisões do Partido; e se nem todas essas cartas foram publicadas,
foi porque o autor não as pretendia para a imprensa. Vladimir não deixou nenhum ‘testa-
mento’, e o próprio caráter de sua atitude para com o Partido, bem como o caráter do próprio
Partido, excluíam a possibilidade de tal ‘testamento’. O que geralmente é referido como um
“testamento” na imprensa burguesa e menchevique emigrada e estrangeira (de uma maneira
distorcida e irreconhecível) é uma das cartas de Vladimir contendo conselhos sobre questões
organizacionais. O XIII Congresso do Partido prestou a maior atenção a esta carta, como
376 Obras Escolhidas

a todas as outras, e dela tirou conclusões adequadas às condições e circunstâncias da época.


Toda conversa sobre esconder ou violar uma ‘vontade’ é uma invenção maliciosa e é inteira-
mente dirigida contra a vontade real de Vladimir e contra os interesses do Partido que ele
criou. (ver o artigo de Trotsky “Sobre o livro de Eastman após a morte de Lenin”, “Bolchevique”,
nº. 16, 1º de setembro de 1925, p. 68).

Claro, alguém poderia pensar. Isso foi escrito por ninguém menos que Trotsky.
Com que base, então, Trotsky, Zinoviev e Kamenev estão agora contando uma his-
tória sobre o Partido e seu Comitê Central “ocultando” a “vontade” de Lenin? É
“permitido” esmiuçar os fios, mas é preciso saber onde parar.
Diz-se que nesse “testamento”, o camarada Lenin sugeriu ao congresso que,
em vista da “grosseria” de Stalin, deveria considerar a questão de colocar outro
camarada no lugar de Stalin como secretário-geral. Isso é verdade. Sim, camara-
das, sou rude com aqueles que, de forma grosseira e pérfida, destroem e dividem
o Partido. Eu nunca escondi isso e não escondo agora. Talvez seja necessário um
pouco de suavidade no tratamento de divisores, mas sou péssimo nisso. Logo na
primeira reunião da plenária do Comitê Central após o Décimo Terceiro Con-
gresso, pedi à plenária do Comitê Central que me liberasse de minhas funções
como Secretário Geral. O próprio congresso discutiu esta questão. O assunto
foi discutido por cada delegação separadamente, e todas as delegações por una-
nimidade, incluindo Trotsky, Kamenev e Zinoviev, me obrigaram a permanecer
em meu posto.
O que eu poderia fazer? Largar meu posto? Isso não é da minha natureza;
nunca abandonei nenhum posto e não tenho o direito de fazê-lo, pois isso seria
deserção. Como já disse antes, não sou um agente livre e, quando o Partido me
impõe uma obrigação, devo obedecer.
Um ano depois, apresentei novamente à plenária um pedido de libertação,
mas fui novamente obrigado a permanecer no meu posto. O que mais posso
fazer?
Quanto à publicação do “testamento”, o congresso decidiu por não o publicar,
uma vez que era dirigido ao congresso e não se destinava à publicação.
Temos a decisão de um plenária do Comitê Central e da Comissão Central
de Controle em 1926 de pedir permissão ao Décimo Quinto Congresso para pu-
blicar este documento. Temos a decisão do mesma plenária do Comitê Central
e da Comissão Central de Controle de publicar outras cartas de Lenin, nas quais
apontava os erros de Kamenev e Zinoviev pouco antes da insurreição de outubro
e exigia sua expulsão do Partido227 .
Obviamente, falar sobre o Partido ocultar esses documentos é uma calúnia
infame. Entre esses documentos estão cartas de Lenin exortando a necessidade
de expulsar Zinoviev e Kamenev do Partido. O Partido Bolchevique, o Comitê
Central do Partido Bolchevique, nunca temeu a verdade. A força do Partido
Bolchevique reside precisamente no fato de que ele não teme a verdade e a encara
nos olhos.
A oposição está tentando usar a “vontade” de Lenin como um trunfo; mas
é suficiente ler este “testamento” para ver que não é um trunfo para eles. Ao
227V. I. Lenin, “Uma Carta aos Membros do Partido Bolchevique” e “Uma Carta ao Comitê Central
do POSDR”.
J. V. Stalin 377

contrário, a “vontade” de Lenin é fatal para os atuais líderes da oposição.


De fato, é certo que em seu “testamento” Lenin acusa Trotsky de ser culpado
de “não-bolchevismo” e, a respeito do erro que Kamenev e Zinoviev cometeram
em outubro, ele diz que esse erro não foi “acidental”. O que isso significa? Isso
significa que Trotsky, que sofre com um afastamento do bolchevismo, e Kame-
nev e Zinoviev, cujos erros não são “acidentais” – que podem e certamente serão
repetidos – não podem ser politicamente confiáveis.
É característico que não haja uma palavra, nenhuma sugestão na “vontade” de
que eu tenha cometido erros. Refere-se apenas à minha grosseria. Mas a grosseria
não é e não pode ser considerada um defeito de minha linha ou posição política.
Aqui está a passagem relevante no “testamento”:
Não vou continuar a caracterizar as qualidades pessoais dos outros membros do Comitê Cen-
tral. Devo apenas lembrar que o episódio de outubro com Zinoviev e Kamenev não foi aci-
dental, é claro, mas eles podem ser responsabilizados pessoalmente por isso tão pouco quanto
Trotsky pode ser culpado por seu não-bolchevismo.

Claro, alguém poderia pensar.

II. A ''plataforma'' da oposição


Próxima questão. Por que o Comitê Central não publicou a “plataforma” da
oposição? Zinoviev e Trotsky dizem que foi porque o Comitê Central e o Par-
tido “temem” a verdade. Isso é verdade? Claro que não. Mais que isso. É um
absurdo dizer que o Partido ou o Comitê Central temem a verdade. Temos os re-
latos literais das plenárias do Comitê Central e da Comissão Central de Controle.
Esses relatórios foram impressos em vários milhares de exemplares e distribuí-
dos entre os membros do Partido. Eles contêm os discursos dos oposicionistas e
também dos representantes da linha do Partido. Eles estão sendo lidos por de-
zenas e centenas de milhares de membros do Partido. (Vozes: “Isso é verdade!”) Se
temêssemos a verdade, não teríamos divulgado esses documentos. O bom desses
documentos é que permitem precisamente aos membros do Partido comparar
a posição do Comitê Central com as da oposição e tomar suas decisões. Isso é
medo da verdade?
Em outubro de 1926, os líderes da oposição se pavonearam e afirmaram,
como afirmam agora, que o Comitê Central temia a verdade, que estava ocul-
tando sua “plataforma”, ocultando-a do Partido, e assim por diante. É por isso
que eles foram bisbilhotar entre as unidades do Partido em Moscou (lembre-se
da Fábrica Aviapribor), em Leningrado (lembre-se das tarefas de Putilov) e em
outros lugares. Bem, o que aconteceu? Os operários comunistas deram uma boa
surra em nossos oposicionistas, tamanha surra que os líderes da oposição foram
obrigados a fugir do campo de batalha. Por que não ousaram então ir mais longe,
em todas as unidades do Partido, para averiguar quem de nós teme a verdade –
a oposição ou o Comitê Central? Foi porque ficaram com medo, assustados com
a verdade real (e não imaginária).
E agora? Falando honestamente, não está havendo uma discussão agora nas
unidades do Partido? Aponte para pelo menos uma unidade, contendo pelo
menos um oposicionista e onde pelo menos uma reunião tenha se realizado nos
378 Obras Escolhidas

últimos três ou quatro meses, na qual representantes da oposição não tenham


falado, na qual não tenha havido discussão. Não é verdade que nos últimos três
ou quatro meses a oposição avançou sempre que podia nas unidades do Partido
com as suas resoluções contrárias? (Vozes: “É verdade!”) Por que, então, Trotsky
e Zinoviev não tentam ir às unidades do Partido e expor seus pontos de vista?
Um fato característico. Em agosto deste ano, após a plenária do Comitê Cen-
tral e da Comissão de Controle Central, Trotsky e Zinoviev enviaram uma decla-
ração de que gostariam de falar em uma reunião da ativa de Moscou se o Comitê
Central não tivesse objeções. A isso o Comitê Central respondeu (e a resposta
foi distribuída entre as organizações locais) que não tinha objeções a Trotsky e
Zinoviev falando em tal reunião, desde que, no entanto, eles, como membros
do Comitê Central, não falassem contra as decisões do Comitê Central. O que
aconteceu? Eles abandonaram o pedido (Gargalhadas).
Sim, camaradas, alguém entre nós teme a verdade, mas não é o Comitê Cen-
tral e muito menos o Partido; são os líderes de nossa oposição.
Sendo assim, por que o Comitê Central não publicou a “plataforma” da opo-
sição?
Em primeiro lugar, porque o Comitê Central não queria e não tinha o direito
de legalizar a facção de Trotsky, ou qualquer grupo operacional. Na resolução do
Décimo Congresso “Sobre a unidade”, Lenin disse que a existência de uma “pla-
taforma” é um dos principais sinais do partidarismo. Apesar disso, a oposição
elaborou uma “plataforma” e exigiu sua publicação, violando a decisão do Dé-
cimo Congresso. Supondo que o Comitê Central tivesse publicado a “plataforma”
da oposição, o que isso significaria? Isso significaria que o Comitê Central estava
disposto a participar dos esforços das facções da oposição para violar as decisões
do Décimo Congresso. O Comitê Central e a Comissão Central de Controle con-
cordariam em fazer isso? Obviamente, nenhum Comitê Central que se preze
poderia dar esse passo operacional. (Vozes: “É verdade!”).
Ainda em frente. Nesta mesma resolução do Décimo Congresso “Sobre a uni-
dade”, escrita por Lenin, é dito: “O congresso ordena a dissolução imediata de
todos os grupos, sem exceção, que se formaram com base em uma plataforma
ou outra”, que “a não observância desta decisão do congresso envolverá a expul-
são certa e imediata do Partido”. A diretriz é clara e definitiva. Supondo que o
Comitê Central e a Comissão Central de Controle tivessem publicado a “plata-
forma” da oposição, isso poderia ser chamado de dissolução de todos os grupos,
sem exceção, formados em uma “plataforma” ou outra? Obviamente não. Pelo
contrário, significaria que o Comitê Central e a Comissão Central de Controle
não pretendiam se dissolver, mas ajudar a organizar grupos e facções com base na
“plataforma” da oposição. O Comitê Central e a Comissão Central de Controle
poderiam dar esse passo para dividir o Partido? Obviamente que não.
Finalmente, a “plataforma” da oposição contém calúnias contra o Partido que,
se publicadas, fariam ao Partido e ao nosso Estado um dano irreparável.
De fato, consta na “plataforma” da oposição que nosso Partido está disposto
a abolir o monopólio do comércio exterior e a pagar todas as dívidas e, portanto,
também as dívidas de guerra. Todos sabem que esta é uma calúnia asquerosa
contra o nosso Partido, contra a nossa classe trabalhadora, contra o nosso Es-
J. V. Stalin 379

tado. Supondo que tivéssemos publicado a “plataforma” contendo essa calúnia


contra o Partido e o Estado, o que teria acontecido? O único resultado teria sido
que a burguesia internacional teria começado a exercer maior pressão sobre nós,
teria exigido concessões com as quais não poderíamos concordar (por exemplo,
a abolição do monopólio do comércio exterior, pagamentos à dívida de guerra,
e assim por diante) e teria nos ameaçado com a própria guerra.
Quando membros do Comitê Central como Trotsky e Zinoviev fornecem rela-
tórios falsos sobre nosso Partido aos imperialistas de todos os países, garantindo-
lhes que estamos prontos para fazer as concessões máximas, incluindo a aboli-
ção do monopólio do comércio exterior, ele só pode ter um significado: senho-
res burgueses, pressionem com mais força o Partido Bolchevique, ameacem ir à
guerra contra eles; os bolcheviques concordarão com todas as concessões se você
pressionar com força suficiente.
Falsos relatos sobre o nosso Partido apresentados aos senhores imperialistas
por Zinoviev e Trotsky para agravar as nossas dificuldades na esfera da política
externa: é a isso que se resume a “plataforma” da oposição.
A quem isso prejudica? Obviamente, isso prejudica o proletariado da URSS,
o Partido Comunista da URSS, todo o nosso Estado.
A quem isso beneficia? Beneficia os imperialistas de todos os países.
Agora eu pergunto: o Comitê Central poderia concordar em publicar tal
imundície em nossa imprensa? Obviamente, não poderia.
Essas são as considerações que obrigaram o Comitê Central a se recusar a
publicar a “plataforma” da oposição.

III. Lenin sobre discussões e oposições em geral


A próxima pergunta. Zinoviev tentou veementemente provar que Lenin era a
favor da discussão sempre e em todos os momentos. Ele se referiu à discussão de
várias plataformas que teve lugar antes do Décimo Congresso e no próprio con-
gresso, mas “esqueceu” de mencionar que Lenin considerou a discussão que teve
lugar antes do Décimo Congresso como um erro. Ele “esqueceu” de dizer que a
resolução do Décimo Congresso “Sobre a unidade do Partido”, que foi escrita por
Lenin e era uma diretriz para o desenvolvimento do nosso Partido, ordenava não
a discussão de “plataformas”, mas a dissolução de todos os grupos formados com
base em uma “plataforma” ou outra. Ele “esqueceu” que no Décimo Congresso,
Lenin falou a favor da “proibição”, no futuro, de todas as oposições no Partido.
Ele “esqueceu” de dizer que Lenin considerava a conversão de nosso Partido em
uma “sociedade de debates” absolutamente inadmissível.
Aqui, por exemplo, está a avaliação de Lenin da discussão que ocorreu antes
do Décimo Congresso:
Já tive oportunidade de falar sobre isso hoje e, claro, só pude observar com cautela que
dificilmente haverá muitos entre vocês que não considerem esta discussão um luxo excessivo.
Não posso deixar de acrescentar isso, falando por mim. Acho que esse luxo era de fato
absolutamente inadmissível e que, ao permitir tal discussão, indubitavelmente cometemos
um erro. (ver Atas do Décimo Congresso, p. 16).228
228 Ver “Relatório sobre as Atividades Políticas do Comitê Central do PC Russo (B)”, 8 de março de
380 Obras Escolhidas

E aqui está o que Lenin disse no Décimo Congresso sobre qualquer possível
oposição após o Décimo Congresso:
Consolidação do Partido, proibição de oposição no Partido – essa é a conclusão política a
ser tirada da situação atual (...) não queremos oposição agora, camaradas. E acho que o
congresso do partido terá que tirar essa conclusão, tirar a conclusão de que agora devemos
acabar com a oposição, acabar com ela, já estamos fartos de oposições agora! (Ibid., p. p 61
e 63)

É assim que Lenin via a questão da discussão e da oposição em geral.

IV. A oposição e a ''Terceira Força''


A próxima pergunta. Qual era a necessidade da declaração do camarada
Menzhinsky sobre os guardas brancos com os quais alguns dos “trabalhadores”
da imprensa ilegal antipartido dos trotskistas estão ligados?
Em primeiro lugar, para dissipar a mentira e a calúnia que a oposição está a
difundir em relação a esta questão em seus escritos contra o Partido. A oposição
garante a todos que a reportagem sobre guardas brancos, que estão ligados de
uma forma ou de outra a aliados da oposição como Shcherbakov e Tverskoy, é fic-
ção, uma invenção posta em circulação com o objetivo de desacreditar a oposição.
A declaração do camarada Menzhinsky, com os depoimentos das pessoas presas,
não deixa dúvidas de que uma seção dos “trabalhadores” da imprensa ilegal dos
trotskistas está ligada, indubitavelmente ligada, à ala contrarrevolucionária da
guarda branca. Que a oposição tente refutar esses fatos e documentos.
Em segundo lugar, para expor as mentiras que agora estão sendo dissemi-
nadas pelo órgão de Maslow em Berlim (“Die Fahne des Kommunismus”, ou seja,
“O Banner do Comunismo”). Acabamos de receber a última edição deste trapo
imundo, publicado por este renegado Maslow, que está ocupado em caluniar a
URSS e em trair os segredos de Estado da URSS para a burguesia. Esse órgão da
imprensa imprime para informação pública, de forma distorcida, é claro, os de-
poimentos feitos pelos guardas brancos presos e seus aliados na imprensa ilegal
antipartido. (Vozes: “Escandaloso!”). De onde Maslow poderia obter essas infor-
mações? Esta informação é secreta, pois nem todos os membros do bando de
guardas brancos, que estão envolvidos no negócio de organizar uma conspira-
ção nos moldes da conspiração de Pilsudski, ainda foram localizados e presos.
Esta informação foi revelada na Comissão de Controle Central a Trotsky, Zino-
viev, Smilga e outros membros da oposição. Eles estavam proibidos de fazer uma
cópia desses depoimentos por enquanto. Mas, evidentemente, eles fizeram uma
cópia e se apressaram em enviá-la a Maslow. Mas o que significa enviar essas
informações para Maslow para publicação? Significa alertar os guardas brancos
que ainda não foram localizados e presos, alertando-os de que os bolcheviques
pretendem prendê-los.
É adequado, é permitido aos comunistas fazerem uma coisa dessas? Obvia-
mente não.
O artigo no órgão de Maslow traz um título picante: “Stalin está dividindo o
PCUS. Uma conspiração de um guarda branco, uma carta da URSS”. (Vozes: “Cana-
1921.
J. V. Stalin 381

lhas!” ). Será que poderíamos, depois de tudo isso, depois de Maslow, com a ajuda
de Trotsky e Zinoviev, ter imprimido para informação pública depoimentos trun-
cados de pessoas presas, poderíamos, afinal, abster-nos de fazer um relatório à
plenária do Comitê Central e da Comissão Central de Controle e de contrastar
as histórias mentirosas com os fatos reais e os depoimentos reais?
Por isso, o Comitê Central e a Comissão Central de Controle consideraram
necessário pedir ao camarada Menzhinsky que se pronunciasse sobre os fatos.
O que se segue desses depoimentos, da declaração do camarada Menzhinsky?
Já acusamos ou agora estamos acusando a oposição de organizar uma conspira-
ção militar? Claro que não. Alguma vez acusamos ou estamos agora acusando a
oposição de tomar parte nesta conspiração? Claro que não. (Muralov: “Você fez
a acusação no última plenária” ). Isso não é verdade, Muralov. Temos duas decla-
rações do Comitê Central e da Comissão Central de Controle sobre a tipografia
ilegal e antipartido e sobre os intelectuais não-partidários ligados a essa tipogra-
fia. Você não encontrará uma única frase, nenhuma palavra, nesses documentos,
para mostrar que estamos acusando a oposição de participar de uma conspiração
militar. Nesses documentos, o Comitê Central e a Comissão Central de Controle
apenas afirmam que, ao organizar sua gráfica ilegal, a oposição entrou em con-
tato com intelectuais burgueses, e que alguns desses intelectuais, por sua vez,
foram encontrados em contato com guardas brancos que estavam tramando uma
conspiração militar. Peço a Muralov que destaque a passagem relevante nos do-
cumentos publicados pelo Bureau Político do Comitê Central e pelo Presidium
da Comissão Central de Controle em relação a esta questão. Muralov não pode
apontar tal passagem porque ela não existe.
Sendo esse o caso, quais são as acusações que fizemos e ainda fazemos contra
a oposição?
Em primeiro lugar, que a oposição, ao seguir uma política de divisão, orga-
nizou uma gráfica ilegal antipartido. Em segundo lugar, que a oposição, com
o propósito de organizar esta tipografia, formou um bloco com os intelectuais
burgueses, parte dos quais acabou em contato direto com conspiradores con-
trarrevolucionários. Em terceiro lugar, que, ao alistar os serviços de intelectuais
burgueses e conspirar com eles contra o Partido, a oposição, independentemente
de sua vontade ou desejo, se viu cercada pela chamada “terceira força”.
A oposição provou ter muito mais confiança nesses intelectuais burgueses do
que no seu próprio partido. Caso contrário, não teria exigido a libertação de
“todos os presos” em conexão com a imprensa ilegal, incluindo Shcherbakov,
Tverskoy, Bolshakov e outros, que foram encontrados em contato com elementos
contrarrevolucionários.
A oposição queria ter uma impressora ilegal antipartido; para tanto, recorreu
à ajuda de intelectuais burgueses, mas alguns desses intelectuais mostraram estar
em contato com os contrarrevolucionários francos – tal é a cadeia que resultou,
camaradas. Independentemente da vontade ou desejo da oposição, elementos
antissoviéticos se aglomeraram em torno dela e se esforçaram para utilizar suas
atividades de divisão para seus próprios fins.
Assim, o que Lenin previu já no Décimo Congresso do nosso Partido, onde
disse que a “terceira força”, que é a burguesia, certamente tentaria agarrar o
382 Obras Escolhidas

conflito dentro de nosso Partido para utilizar as atividades da oposição para seus
próprios fins de classe, tornou-se realidade.
Diz-se que elementos contrarrevolucionários às vezes também penetram em
nossos corpos soviéticos, nas frentes, por exemplo, sem ter qualquer ligação com
a oposição. Isso é verdade. Em tais casos, entretanto, as autoridades soviéticas
prendem esses elementos e os matam. Mas o que a oposição fez? Exigia a liber-
tação dos intelectuais burgueses que foram presos em conexão com a imprensa
ilegal e foram encontrados em contato com elementos contrarrevolucionários.
Esse é o problema, camaradas. É a isso que conduzem as atividades de divisão da
oposição. Em vez de pensar em todos esses perigos, em vez de pensar no buraco
que se abre diante deles, nossos oposicionistas lançam calúnias sobre o Partido e
tentam com todas as suas forças desorganizar e dividir nosso Partido.
Fala-se sobre um ex-oficial de Wrangel que está ajudando a OGPU a des-
mascarar organizações contrarrevolucionárias. A oposição pula, dança e faz um
grande estardalhaço sobre o fato de que o ex-oficial Wrangel a quem os aliados da
oposição, todos esses Shcher-bakovs e Tverskoys, pediram ajuda, provou ser um
agente da OGPU. Mas há algo de errado neste ex-oficial de Wrangel ajudando as
autoridades soviéticas a desmascarar conspirações contrarrevolucionárias? Quem
pode negar às autoridades soviéticas o direito de atrair ex-oficiais para o seu lado
a fim de empregá-los com o propósito de desmascarar as organizações contrar-
revolucionárias?
Shcherbakov e Tverskoy dirigiram-se a este ex-oficial Wrangel não porque
ele fosse um agente da OGPU, mas porque ele era um ex-oficial Wrangel, e eles
o fizeram para empregá-lo contra o Partido e contra o governo soviético. Esse
é o ponto, e esse é o infortúnio de nossa oposição. E quando, seguindo essas
pistas, a OGPU inesperadamente se deparou com a imprensa ilegal antipartido
dos trotskistas, descobriu que, enquanto organizava um bloco com a oposição, os
senhores Shcherbakovs, Tverskoys e Bolchekovs já estavam em um bloco com con-
trarrevolucionários, com ex-oficiais de Kolchak como Kostrov e Novikov, como o
camarada Menzhinsky informou a você hoje.
Esse é o ponto, camaradas, e esse é o problema com nossa oposição.
As atividades de cisão da oposição levam-na a se conectar com os intelectuais
burgueses, e a ligação com os intelectuais burgueses torna mais fácil para todos os
tipos de elementos contrarrevolucionários envolvê-la – esta é a amarga verdade.

V. Como a oposição está se ''preparando'' para o


Congresso
A próxima pergunta: sobre os preparativos para o congresso. Zinoviev e
Trotsky afirmaram com veemência, aqui, que nos preparamos para o congresso
por meio da repressão. É estranho que eles não vejam nada além de “repressão”.
Mas e quanto à decisão de abrir uma discussão tomada em plenária do Comitê
Central e da Comissão Central de Controle mais de um mês antes do congresso
– isso na sua opinião é uma preparação para o congresso, ou não? E a discussão
nas unidades do Partido e em outras organizações do Partido que já dura três
ou quatro meses sem parar? E a discussão dos relatos literais e das decisões da
J. V. Stalin 383

plenária que vem acontecendo nos últimos seis meses, particularmente nos úl-
timos três ou quatro meses, sobre todas as questões relativas à política interna
e externa? O que mais pode ser chamado tudo isso senão estimular a atividade
dos membros do Partido arrastando-os para a discussão das grandes questões de
nossa política, preparando os membros do Partido para o congresso?
De quem é a culpa se, em tudo isso, as organizações do Partido não apoiam a
oposição? Obviamente, a culpa é da oposição, pois sua linha é de falência total,
sua política é a de um bloco com todos os elementos antipartidários, inclusive os
renegados Maslow e Souvarine, contra o Partido e o Comintern.
Evidentemente, Zinoviev e Trotsky pensam que os preparativos para o con-
gresso devem ser feitos organizando prensas ilegais antipartido, organizando
reuniões ilegais antipartido, fornecendo relatórios falsos sobre o nosso Partido
aos imperialistas de todos os países, desorganizando e dividindo nosso partido.
Você concordará que esta é uma ideia bastante estranha do que significam os
preparativos para o congresso do Partido. E quando o Partido toma medidas re-
solutas, incluindo a expulsão, contra os desorganizadores e divisores, a oposição
levanta um grito de repressão.
Sim, o Partido recorre e recorrerá à repressão contra os desorganizadores e
divisores, pois o Partido não deve ser cindido em hipótese alguma, seja antes
do congresso, seja durante o congresso. Seria suicídio para o Partido permitir
que divisores absolutos, aliados de todos os tipos de Shcherbakovs, destruíssem
o Partido só porque falta apenas um mês para o congresso.
O camarada Lenin via as coisas sob uma luz diferente. Você sabe que, em
1921, Lenin propôs que Shlyapnikov fosse expulso do Comitê Central e do Par-
tido, mas não por organizar uma tipografia antipartido, e não por se aliar a
intelectuais burgueses, mas simplesmente porque, em uma reunião de uma uni-
dade do Partido, Shlyapnikov ousou criticar as decisões do Conselho Supremo
de Economia Nacional. Se você comparar esta atitude de Lenin com o que o
Partido está fazendo agora com a oposição, você perceberá a licença que demos
aos desorganizadores e divisores.
Você certamente deve saber que em 1917, pouco antes do levante de outubro,
Lenin várias vezes propôs que Kamenev e Zinoviev fossem expulsos do Partido
simplesmente porque haviam criticado decisões do partido não publicadas no
jornal semiburguês Novaya Zhizn229 . Mas quantas decisões secretas do Comitê
Central e da Comissão de Controle Central estão agora sendo publicadas pela
nossa oposição nas colunas do jornal de Maslow em Berlim, que é um jornal
burguês, antissoviético e contrarrevolucionário! No entanto, toleramos tudo isso,
toleramos sem fim e, assim, damos aos divisores da oposição a oportunidade de
destruir nosso Partido. Essa é a desgraça que a oposição nos trouxe! Mas não
podemos tolerar isso para sempre, camaradas.
Diz-se que os desorganizadores que foram expulsos do Partido e realizam
atividades antissoviéticas estão sendo presos. Sim, nós os prendemos e faremos
isso no futuro, se eles não pararem de minar o Partido e o regime soviético.
Diz-se que tais coisas não têm precedentes na história do nosso Partido. Isso
229Novaya Zhizn (Nova Vida) foi um jornal menchevique publicado em Petrogrado em abril de 1917;
fechou em julho de 1918.
384 Obras Escolhidas

não é verdade. E o grupo Myasnikov230 ? E o grupo “Verdade dos Trabalhado-


res”? Quem não sabe que os membros desses grupos foram presos com o pleno
consentimento de Zinoviev, Trotsky e Kamenev? Por que era permitido, três
ou quatro anos atrás, prender desorganizadores que haviam sido expulsos do
Partido, mas é inadmissível agora, quando alguns dos ex-membros da oposição
trotskista chegam ao ponto de se ligar diretamente aos contrarrevolucionários?
Você ouviu a declaração do camarada Menzhinsky. Nessa declaração, é dito
que um certo Stepanov (um homem do exército), um membro do Partido, um
apoiador da oposição, está em contato direto com os contrarrevolucionários, com
Novikov, Kostrov e outros, o que o próprio Stepanov não tem como negar em
seus depoimentos. O que você quer que façamos com este sujeito, que está na
oposição até hoje? Beijá-lo ou prendê-lo? É surpreendente que a OGPU prenda
tais companheiros?
Lenin disse que o Partido pode ser completamente destruído se a indulgência
for mostrada aos desorganizadores e divisores. Isso é verdade. Justamente por
isso, penso que já é tempo de deixar de mostrar indulgência aos dirigentes da
oposição e de chegar à conclusão de que Trotsky e Zinoviev devem ser expulsos do
Comitê Central do nosso Partido. (Vozes: “Com toda a razão!” ). Essa é a conclusão
elementar e a medida elementar mínima que deve ser tomada para proteger o
Partido das atividades de cisão dos desorganizadores.
No última plenária do Comitê Central e da Comissão Central de Controle,
realizado em agosto deste ano, alguns membros da plenária me censuraram por
ser muito brando com Trotsky e Zinoviev, por aconselhar a plenária contra a
expulsão imediata de Trotsky e Zinoviev do Centro Comitê. Talvez eu tenha sido
muito gentil e cometido um erro ao propor que uma linha mais branda fosse
adotada em relação a Trotsky e Zinoviev. Mas agora, camaradas, depois do que
passamos nesses três meses, depois da oposição quebrar a promessa de dissolver
sua facção, que fez em sua “declaração” especial de 8 de agosto, enganando assim
o Partido mais uma vez, depois de tudo isso, não pode haver mais espaço para
brandura. Devemos agora dar um passo à frente com aqueles camaradas que
exigem que Trotsky e Zinoviev sejam expulsos do Comitê Central. (Tempestuosos
aplausos. Vozes: “Muito bem! Muito bem!”. Uma voz da audiência: “Trotsky deve ser
expulso do Partido” ). Que o congresso decida isso, camaradas.
Ao expulsar Trotsky e Zinoviev do Comitê Central, devemos submeter à con-
sideração do Décimo Quinto Congresso todos os documentos que se acumularam
sobre as atividades de cisão da oposição e, com base nesses documentos, o con-
gresso poderá adotar uma decisão apropriada.

VI. Do leninismo ao trotskismo

A próxima pergunta. Em seu discurso, Zinoviev abordou a interessante ques-


tão dos “erros” na linha do Partido durante os últimos dois anos e do “acerto”
da linha da oposição. Gostaria de responder brevemente esclarecendo a questão
230Grupo clandestino contrarrevolucionário que se autodenominava “grupo dos trabalhadores”. Foi
formado em Moscou em 1923 por G. Myasnikov e outros que haviam sido expulsos do Partido Co-
munista Russo (B) e tinha poucos membros. Foi dissolvido no mesmo ano (N.T.)
J. V. Stalin 385

da falência da linha da oposição e da correção da linha do nosso Partido nos úl-


timos dois anos. Mas estou ocupando muito de sua atenção, camaradas. (Vozes:
“Continue!” O presidente: “Alguém contra?” Vozes: “Continue!” ).
Qual é o principal pecado da oposição, que determinou a falência de sua po-
lítica? Seu principal pecado é que tentou, está tentando e continuará tentando
embelezar o leninismo com o trotskismo e substituir o leninismo pelo trotskismo.
Houve um tempo em que Kamenev e Zinoviev defenderam o leninismo dos ata-
ques de Trotsky. Naquela época, o próprio Trotsky não era tão ousado. Essa
foi uma linha. Mais tarde, porém, Zinoviev e Kamenev, amedrontados por novas
dificuldades, desertaram para o lado de Trotsky, formaram com ele algo na natu-
reza de um Bloco de Agosto inferior, e assim tornaram-se cativos do trotskismo.
Essa foi mais uma confirmação da declaração anterior de Lenin, de que o erro
que Zinoviev e Kamenev cometeram em outubro não foi “acidental”. Da luta
pelo leninismo, Zinoviev e Kamenev passaram para a linha da luta pelo trots-
kismo. Essa é uma linha totalmente diferente. E isso de fato explica por que
Trotsky agora se tornou mais ousado.
Qual é o objetivo principal do atual bloco único liderado por Trotsky? É,
pouco a pouco, mudar o Partido da via leninista para a do trotskismo. Esse é o
principal pecado da oposição. Mas o Partido quer continuar sendo um partido
leninista. Naturalmente, o Partido deu as costas à oposição e ergueu a bandeira
do leninismo cada vez mais alto. É por isso que os líderes do Partido de ontem
agora se tornaram renegados.
A oposição pensa que sua derrota pode ser “explicada” pelo fator pessoal,
pela grosseria de Stalin, pela obstinação de Bukharin e Rykov, e assim por diante.
Essa é uma explicação muito barata! É um encantamento, não uma explicação.
Trotsky luta contra o leninismo desde 1904. De 1904 até a Revolução de fevereiro
de 1917, ele conviveu com os mencheviques, lutando desesperadamente contra o
partido de Lenin o tempo todo. Durante esse período, Trotsky sofreu uma série
de derrotas nas mãos do Partido de Lenin. Por quê? Talvez a grosseria de Stalin
fosse a culpada? Mas eu ainda não era secretário do Comitê Central naquela
época; eu não estava no exterior, mas na Rússia, lutando clandestinamente contra
o tsarismo, enquanto a luta entre Trotsky e Lenin se alastrava no exterior. Então,
o que a grosseria de Stalin tem a ver com isso?
Durante o período da Revolução de Outubro de 1922, Trotsky, já membro
do Partido Bolchevique, conseguiu fazer duas “grandes” surtidas contra Lenin
e seu Partido: em 1918 – sobre a questão da Paz de Brest; e em 1921 – sobre a
questão sindical. Ambas as surtidas terminaram com a derrota de Trotsky. Por
quê? Talvez a grosseria de Stalin fosse a culpada aqui? Mas, naquela época, eu
ainda não era secretário do Comitê Central. Os cargos de secretariado foram
então ocupados por trotskistas notórios. Então, o que a grosseria de Stalin tem a
ver com isso?
Mais tarde, Trotsky fez uma série de novas surtidas contra o Partido (1923,
1924, 1926, 1927) e cada surtida terminou com Trotsky sofrendo uma nova der-
rota.
Não é óbvio por tudo isso que a luta de Trotsky contra o Partido Leninista
tem raízes históricas profundas e de longo alcance? Não é óbvio que a luta que o
386 Obras Escolhidas

Partido trava agora contra o trotskismo é uma continuação da luta que o Partido,
dirigido por Lenin, travou de 1904 em diante?
Não é óbvio por tudo isso que as tentativas dos trotskistas de substituir o le-
ninismo pelo trotskismo são a causa principal do fracasso e da falência de toda a
linha da oposição?
Nosso Partido nasceu e cresceu na tempestade das batalhas revolucionárias.
Não é um partido que cresceu em um período de desenvolvimento pacífico. Por
isso mesmo é rico em tradições revolucionárias e não faz de seus líderes um feti-
che. Houve uma época em que Plekhanov era o homem mais popular do Partido.
Mais do que isso, ele foi o fundador do Partido, e sua popularidade era incom-
paravelmente maior do que a de Trotsky ou Zinoviev. No entanto, apesar disso, o
Partido se afastou de Plekhanov assim que ele começou a se afastar do marxismo
e se encaminhar para o oportunismo. É surpreendente, então, que pessoas que
não são tão “ótimas” gostem dele.
Mas a indicação mais marcante da degeneração oportunista da oposição, o
sinal mais marcante da falência e queda da oposição, foi seu voto contra o Ma-
nifesto do Comitê Executivo Central da URSS. A oposição é contra a introdução
de uma jornada de trabalho de sete horas! A oposição é contra o Manifesto do
Comitê Executivo Central da URSS! Toda a classe operária da URSS, toda a seção
avançada dos proletários em todos os países, acolhe com entusiasmo o Manifesto,
aplaude unanimemente a ideia de introduzir uma jornada de trabalho de sete ho-
ras – mas a oposição vota contra o Manifesto e acrescenta sua voz ao coro geral
de “críticos” burgueses e mencheviques, acrescenta sua voz à dos caluniadores da
equipe de Vorwarts231 .
Não pensei que a oposição pudesse cair em tal desgraça.

VII. Alguns dos resultados mais importantes da


política do Partido durante os últimos anos

Passemos agora à questão da linha do nosso Partido nos últimos dois anos;
vamos examiná-la e avaliá-la.
Zinoviev e Trotsky disseram que a linha de nosso Partido se revelou inade-
quada. Voltemos aos fatos. Tomemos quatro questões principais de nossa política
e examinemos a linha de nosso Partido nos últimos dois anos a partir dessas ques-
tões. Tenho em mente questões decisivas como a do campesinato, a da indústria
e seu reaparelhamento, a da paz e, por último, a do crescimento dos elementos
comunistas no mundo.
A questão do campesinato. Qual era a situação em nosso país há dois ou três
anos? Você sabe que a situação no campo era grave. Nossos presidentes do Co-
mitê Executivo da Volost, e funcionários do interior em geral, nem sempre eram
reconhecidos e frequentemente eram vítimas de terrorismo. Correspondentes
da aldeia foram recebidos com rifles serrados. Aqui e ali, especialmente nas re-
231Vorwarts (Avante) foi o órgão central do Partido Social-Democrata da Alemanha, publicado de
1876 a 1933. Após a Grande Revolução Socialista de Outubro, tornou-se um centro de propaganda
antissoviética.
J. V. Stalin 387

giões de fronteira, havia atividades de bandidos; e em um país como a Geórgia


houve até revoltas232 . Naturalmente, em tal situação, os kulaks ganharam força,
os camponeses médios se reuniram em torno dos kulaks e os camponeses pobres
ficaram desunidos. A situação no país era agravada particularmente pelo fato de
que as forças produtivas no campo cresciam muito lentamente, parte da terra ará-
vel permanecia sem cultivo e a área de cultivo era de cerca de 70% a 75% da área
pré-guerra. Isso foi no período anterior à XIV Conferência do nosso Partido.
Na Décima Quarta Conferência, o Partido adotou uma série de medidas na
forma de certas concessões aos camponeses médios destinadas a acelerar o pro-
gresso da economia camponesa, aumentar a produção dos produtos agrícolas –
alimentos e matérias-primas, estabelecer uma aliança estável com os camponeses
médios, e apressar o isolamento dos kulaks. No XIV Congresso do nosso Partido,
a oposição, encabeçada por Zinoviev e Kamenev, tentou perturbar esta política
do Partido e propôs que adotássemos em seu lugar o que era, em essência, a
política de ‘deskulakização’, uma política de restauração dos Comitês de Cam-
poneses Pobres. Em essência, essa foi uma política de retorno à guerra civil no
campo. O Partido repeliu este ataque da oposição; endossou as decisões da XIV
Conferência, aprovou a política de revitalização dos sovietes no campo e avançou
com a palavra de ordem da industrialização, como principal palavra de ordem
da construção socialista. O Partido manteve firmemente a linha de estabelecer
uma aliança estável com os camponeses médios e de isolar os kulaks.
O que o Partido conseguiu com isso?
O que conseguiu foi que a paz foi estabelecida no campo, as relações com a
massa principal do campesinato foram melhoradas, as condições foram criadas
para organizar os camponeses pobres em uma força política independente, os
kulaks ficaram ainda mais isolados e o Estado e as cooperativas os órgãos gradu-
almente estenderam suas atividades às fazendas individuais de milhões de cam-
poneses.
O que significa paz no campo? É uma das condições fundamentais para a
construção do socialismo. Não podemos construir o socialismo se tivermos ativi-
dades de bandidos e revoltas camponesas. A área de cultivo atingiu as dimensões
anteriores à guerra (95% ), temos paz no campo, uma aliança com os campone-
ses médios, um campesinato pobre mais ou menos organizado, sovietes rurais
fortalecidos e o prestígio grande do proletariado e do Partido no campo.
Criamos assim as condições que nos permitem avançar na ofensiva contra
os elementos capitalistas no campo e assegurar mais sucesso na construção do
socialismo em nosso país. Esses são os resultados da política do nosso Partido no
campo durante os dois anos.
Conclui-se, portanto, que a política do nosso Partido sobre a grande questão
das relações entre o proletariado e o campesinato se revelou correta.
A questão da indústria. A história nos diz que até agora nenhum jovem Es-
232Refere-se às revoltas contrarrevolucionárias que eclodiram na Geórgia em 28 de agosto de 1924.
Elas foram organizadas pelos remanescentes dos partidos nacionalistas burgueses derrotados e pelo
“governo” menchevique emigrado da Jordânia do Norte sob instruções, e com a ajuda financeira,
dos Estados imperialistas e dos dirigentes da Segunda Internacional. As revoltas foram sufocadas em
29 de agosto, um dia após seu início, com a ajuda ativa dos trabalhadores e camponeses trabalhadores
georgianos (N.T.)
388 Obras Escolhidas

tado do mundo desenvolveu sua indústria – e sua indústria pesada em particular


– sem ajuda externa, sem empréstimos estrangeiros ou sem saquear outros países,
colônias e assim por diante. Esse é o caminho normal da industrialização capi-
talista. A Grã-Bretanha desenvolveu sua indústria no passado drenando a seiva
vital de todos os países, de todas as colônias, por centenas de anos e investindo
o saque em sua indústria. A Alemanha começou a subir recentemente porque
recebeu empréstimos da América no valor de vários bilhões de rublos.
Nós, no entanto, não podemos prosseguir por nenhum desses caminhos. A
pilhagem colonial é impedida por toda a nossa política. E não recebemos em-
préstimos. Só nos resta um caminho, o caminho indicado por Lenin, a saber:
elevar a nossa indústria, reequipar a nossa indústria com base nas acumulações
internas. A oposição reclama o tempo todo sobre os acúmulos internos não se-
rem suficientes para o reequipamento de nossa indústria. Já em abril de 1926, a
oposição afirmava em plenária do Comitê Central que nossas acumulações inter-
nas não bastariam para avançar no reequipamento de nossa indústria. Naquela
época, a oposição previu que sofreríamos fracasso após fracasso. No entanto,
ao fazer uma verificação, constatou-se que havíamos conseguido avançar no ree-
quipamento de nossa indústria durante esses dois anos. É um fato que durante
os dois anos conseguimos investir mais de dois bilhões de rublos em nossa in-
dústria. É fato que esses investimentos têm se mostrado suficientes para avançar
ainda mais no reequipamento de nossa indústria e na industrialização do país.
Alcançamos o que nenhum outro Estado do mundo conseguiu ainda: elevamos
nossa indústria, começamos a reequipá-la, avançamos neste assunto com base em
nossas próprias acumulações.
Aí estão os resultados da nossa política sobre a questão do reequipamento da
nossa indústria. Só os cegos podem negar que a política do nosso Partido nesta
matéria se revelou correta.
A questão da política externa. O objetivo de nossa política externa, se tiver-
mos em mente as relações diplomáticas com os Estados burgueses, é manter a
paz. O que alcançamos nesta esfera? O que conquistamos é que defendemos –
bem ou mal, mas temos mantido – a paz. O que conseguimos é que, apesar do
cerco capitalista, apesar das atividades hostis dos governos capitalistas, apesar
das surtidas provocativas em Pequim233 , Londres234 , e Paris235 , apesar de tudo
isso, não nos deixamos provocar e conseguimos defender a causa da paz.
Não estamos em guerra, apesar das repetidas profecias de Zinoviev e outros
– este é o fato fundamental diante do qual todos os histéricos de nossa oposição
são inúteis. E isso é importante para nós, porque somente em condições de paz
podemos promover a construção do socialismo em nosso país no ritmo que dese-
233 Refere-se ao ataque armado por um destacamento de soldados e policiais chineses à Embaixada
Soviética em Pequim em 6 de abril de 1927. O ataque foi instigado por imperialistas estrangeiros
com o objetivo de provocar um conflito armado entre a China e a URSS.
234 Refere-se à batida policial à Delegação de Comércio Soviética e à Arcos (Sociedade Cooperativa

Anglo-Russa) em Londres, realizada em 12 de maio de 1927, por ordem do governo conservador


britânico.
235 Refere-se à campanha antissoviética na França no outono de 1927. Foi inspirada pelo governo

francês, que apoiou todos os tipos de atividades antissoviéticas, conduziu uma campanha de calúnias
contra os representantes e instituições soviéticas oficiais em Paris, e viu com bons olhos a ruptura das
relações diplomáticas da Grã-Bretanha com a URSS.
J. V. Stalin 389

jamos. No entanto, quantas profecias de guerra apareceram! Zinoviev profetizou


que deveríamos estar em guerra na primavera deste ano. Mais tarde, ele profeti-
zou que, com toda a probabilidade, a guerra eclodiria no outono deste ano. No
entanto, já estamos enfrentando o inverno, mas ainda não há guerra.
Esses são os resultados da nossa política de paz.
Apenas os cegos podem deixar de ver esses resultados.
Por último, a quarta questão, a do estado das forças comunistas em todo o
mundo. Só os cegos podem negar que os partidos comunistas estão crescendo
em todo o mundo, da China à América, da Grã-Bretanha à Alemanha. Só os
cegos podem negar que os elementos da crise do capitalismo estão crescendo,
e não diminuindo. Só os cegos podem negar que o progresso na construção do
socialismo em nosso país, os sucessos de nossa política dentro do país, são uma das
principais razões para o crescimento do movimento comunista em todo o mundo.
Só os cegos podem negar o aumento progressivo da influência e prestígio da
Internacional Comunista em todos os países do mundo.
Tais são os resultados da linha de nosso Partido nas quatro principais questões
de política interna e externa durante os últimos dois anos. O que significa o
acerto da política do nosso Partido? Além de tudo mais, pode significar apenas
uma coisa: a falência total da política de nossa oposição.

VIII. Voltando para Axelrod

Isso está muito bem, podemos dizer. A linha da oposição está errada, é uma
linha antipartido. Sua tática não pode ser chamada de outra coisa senão de tática
de divisão. A expulsão de Zinoviev e Trotsky é, portanto, a saída natural para a
situação que surgiu. Tudo isso é verdade.
Mas houve um tempo em que todos dizíamos que os líderes da oposição de-
viam ser mantidos no Comitê Central, que não deviam ser expulsos. Por que essa
mudança agora? Como explicar essa virada? E existe alguma mudança?
Sim existe. Como isso deve ser explicado? É devido à mudança radical que
ocorreu na política fundamental e no “esquema” organizacional dos líderes da
oposição. Os líderes da oposição, e principalmente Trotsky, mudaram para pior.
Naturalmente, isso causaria uma mudança na política do Partido em relação a
esses oposicionistas.
Tomemos, por exemplo, uma questão de princípio tão importante como a da
degeneração do nosso Partido. O que se entende por degeneração do nosso Par-
tido? Significa negar a existência da ditadura do proletariado na URSS. Qual
era a posição de Trotsky neste assunto, digamos, cerca de três anos atrás? Você
sabe que naquela época os liberais e os mencheviques, os smena-vekhistas236 e todo
tipo de renegados repetiam que a degeneração do nosso partido era inevitável.
236 Smena-vekhistas eram os representantes de uma tendência política burguesa que surgiu em 1921

entre a intelectualidade militar russa que vivia no exterior. Eram liderados por um grupo formado
por N. Ustryalov, Y. Kluchnikov e outros, que publicaram a revista Smena Vekh (Mudança de Marcos).
Os smena-vekhistas expressaram as opiniões da nova burguesia e da intelectualidade burguesa na
Rússia Soviética, que acreditava que, devido à introdução da NEP, o sistema soviético degeneraria
gradualmente em democracia burguesa.
390 Obras Escolhidas

Você sabe que naquela época eles citaram exemplos da Revolução Francesa e afir-
maram que os bolcheviques estavam fadados a sofrer o mesmo colapso que os
jacobinos sofreram em seus dias na França. Você sabe que as analogias históricas
com a Revolução Francesa (a queda dos jacobinos) foram e são hoje o principal
argumento avançado por todos os vários mencheviques e smena-vekhistas contra a
manutenção da ditadura do proletariado e a possibilidade de construir o socia-
lismo em nosso país.
Qual foi a atitude de Trotsky em relação a isso há três anos? Ele certamente se
opôs ao desenho de tais analogias. Aqui está o que ele escreveu na época em seu
panfleto “O novo curso” (1924): “As analogias históricas com a Grande Revolução
Francesa (a queda dos jacobinos!), que o liberalismo e o menchevismo utilizam e
se consolam, são superficiais e doentias”.
Claro e definitivo! Seria difícil, eu acho, se expressar de forma mais enfática
e definitiva. Trotsky estava certo no que então disse sobre as analogias históricas
com a revolução francesa que estavam sendo zelosamente avançadas por todos os
tipos de smena-vekhistas e mencheviques? Absolutamente certo.
Mas agora? Trotsky ainda adota essa posição? Infelizmente, ele não o faz.
Pelo contrário. Durante esses três anos, Trotsky conseguiu evoluir na direção do
“menchevismo” e do “liberalismo”. Agora ele mesmo afirma que fazer analogias
históricas com a Revolução Francesa é um sinal não do menchevismo, mas do
“real”, “genuíno” “leninismo”. Os senhores leram o relato integral da reunião
do Presidium da Comissão Central de Controle realizada em julho deste ano? Se
o fizeram, compreenderão facilmente que, em sua luta contra o Partido, Trotsky
agora se baseia nas teorias mencheviques sobre a degeneração de nosso Partido
nas linhas da queda dos jacobinos no período da Revolução Francesa. Hoje,
Trotsky acha que tagarelar sobre o “Termidor”237 é sinal de bom gosto.
Do trotskismo ao “menchevismo” e ao “liberalismo” na questão fundamental
da degeneração: tal é o caminho que os trotskistas percorreram nos últimos três
anos.
Os trotskistas mudaram. A política do Partido para com os trotskistas também
teve que mudar.
Tomemos agora uma questão não menos importante, como a da organização,
da disciplina do Partido, da submissão da minoria à maioria, do papel desempe-
nhado pela disciplina de ferro do Partido no fortalecimento da ditadura do pro-
letariado. Todos sabem que a disciplina de ferro no nosso Partido é uma das con-
dições fundamentais para manter a ditadura do proletariado e para ter sucesso
na construção do socialismo no nosso país. Todos sabem que a primeira coisa
que os mencheviques em todos os países tentam fazer é minar a disciplina férrea
do nosso Partido. Houve um tempo em que Trotsky compreendeu e apreciou a
importância da disciplina de ferro em nosso Partido. Falando propriamente, as
237O 9 de Termidor do ano II da Revolução Francesa, segundo o calendário revolucionário, corres-
ponde a 27 de julho de 1794 e marca o ápice de uma série de eventos que marca o fim do chamado
Terror, com a queda de Robespierre e seus seguidores. Por votação, o Comitê de Salvação Pública
condenou à morte Robespierre, Saint-Just e vários outros membros da liderança do regime. O 9 de
Termidor marca, assim, o fim da segunda fase (1792-1794) – a mais radical – da Revolução Francesa.
Entre 30.000 e 40.000 pessoas de todas as classes foram vítimas do Terror. A essa fase, seguiu-se o
governo dos girondinos (N.T.)
J. V. Stalin 391

divergências entre nosso Partido e Trotsky nunca cessaram, mas Trotsky e os trots-
kistas foram espertos o suficiente para se submeter às decisões de nosso Partido.
Todos estão cientes das repetidas declarações de Trotsky de que, não importa o
que nosso Partido possa ser, ele estava pronto para “ficar em posição de sentido”
sempre que o Partido ordenasse. E deve ser dito que muitas vezes os trotskistas
conseguiram permanecer leais ao Partido e aos seus órgãos dirigentes.
Mas agora? Pode-se dizer que os trotskistas, a atual oposição, estão dispostos
a se submeter às decisões do Partido, a ficar em posição de sentido e assim por
diante? Não. Isso não pode ser dito mais. Depois de terem quebrado duas vezes
sua promessa de se submeterem às decisões do Partido, depois de terem enga-
nado o Partido duas vezes, depois de terem organizado impressoras ilegais em
conjunto com intelectuais burgueses, depois das repetidas declarações de Zino-
viev e Trotsky feitas nesta mesma tribuna que eles estavam violando a disciplina
de nosso Partido e continuariam a fazê-lo – afinal de contas, é duvidoso que haja
uma única pessoa em nosso Partido que ouse acreditar que os líderes da oposição
estão prontos para ficar em posição de alerta perante o Partido. A oposição agora
mudou para uma nova linha, a linha de divisão do Partido, a linha de criação de
um novo partido. O panfleto mais popular entre os oposicionistas atualmente
não é o panfleto bolchevique de Lenin “Um passo adiante, dois passos atrás”, mas
o antigo panfleto menchevique de Trotsky “Nossa tarefa política” (publicado em
1904), escrito em oposição aos princípios organizacionais do leninismo, em opo-
sição ao panfleto de Lenin.
Você sabe que a essência daquele velho panfleto de Trotsky é o repúdio à con-
cepção leninista do Partido e da disciplina do Partido. Nesse panfleto, Trotsky
nunca chama Lenin de nada além de “Maximillien Lenin”, dando a entender
que Lenin era outro Maximillien Robespierre, lutando, como este, pela ditadura
pessoal. Nesse panfleto, Trotsky diz claramente que a disciplina do Partido deve
ser submetida apenas na medida em que as decisões do Partido não contradigam
os desejos e visões daqueles que são chamados a se submeter ao Partido. Esse
é um princípio de organização puramente menchevique. Aliás, esse panfleto é
interessante porque Trotsky o dedica ao menchevique P. Axelrod. É o que ele
diz: “Ao meu querido professor Pavel Borisovich Axelrod”. (Risos. Vozes: “Um
verdadeiro menchevique!”)
Da lealdade ao Partido à política de divisão do Partido, do panfleto de Lenin
de volta ao panfleto de Trotsky, de Lenin a Axelrod – tal é o caminho organiza-
cional que nossa oposição percorreu. Os trotskistas mudaram. A política orga-
nizacional do Partido em relação à oposição trotskista também teve que mudar.
Bem, uma boa viagem! Vá até o seu “querido professor Pavel Borisovich Axel-
rod”! Uma boa viagem! Apresse-se, meritíssimo Trotsky, pois, em vista de sua
senilidade, “Pavel Borisovich” pode morrer logo, e você pode não chegar a seu
“mestre” a tempo. (Salva de palmas).
Pravda, nº 251.
2 de novembro de 1927
392 Obras Escolhidas

O Partido e a Oposição
24 de novembro de 1927

Discurso proferido na décima sexta Conferência do Partido Gubernia em Moscou238

Camaradas, permitam-me fazer um breve resumo da luta entre o Partido e a


oposição, para resumir a discussão que se desenvolveu nas últimas três ou quatro
semanas dentro do Partido e – é preciso dizer com franqueza – fora dele.

I. Breves resultados da discussão

Estão disponíveis os seguintes resultados estatísticos: até o tempo presente,


algo mais de 572.000 camaradas declararam para o Partido, para seu Comitê
Central; para a oposição – algo mais de 3.000.
A oposição geralmente gosta de exibir números, porcentagens, alegando que
tem o apoio de 99% e assim por diante. Todos veem agora que mais de 99% se
declararam contra a oposição e a favor do Comitê Central do Partido.
Quem é o “culpado” por isso? A própria oposição! De vez em quando, a opo-
sição tenta nos empurrar para uma discussão. Por dois anos, dificilmente passava
um dia sem que ela fizesse uma nova demanda para uma discussão. Resistimos a
essa pressão; nós, membros do Comitê Central, resistimos a essa pressão, sabendo
que o nosso Partido não é uma sociedade de debates, como bem disse Lenin, mas
sabendo que o nosso Partido é o partido militante do proletariado, rodeado de
inimigos, empenhado na construção do socialismo, face a um enorme número
de tarefas práticas de atividade criativa e, portanto, incapaz de concentrar toda a
sua atenção, tantas vezes, nas divergências dentro do Partido.
Mas o tempo passou como o avanço da discussão e um mês e por mais de um
mês – antes do Décimo Quinto Congresso, o Partido, em conformidade com as
Regras do Partido, disse à oposição: “Muito bem, você quer uma discussão, você
quer uma luta – vamos em frente, então!”. E aqui está o resultado: mais de 99%
para o Partido, para seu Comitê Central; menos de 1% para a oposição.
O blefe da oposição foi considerado 100%, por assim dizer.
Pode-se dizer que esse resultado não é decisivo. Pode-se dizer que ao lado
do Partido também estão a classe operária e as massas do campesinato operário.
238 A Décima Sexta Conferência Gubernia de Moscou do PCUS (B) foi realizada de 20 a 28 de no-
vembro de 1927. A conferência ouviu os relatórios do Comitê Central e da Comissão de Controle
Central do PCUS (B), discutindo as perspectivas do trabalho de construção econômica na Gubernia
de Moscou em conexão com o plano geral para o desenvolvimento da economia nacional da URSS,
relatórios do Comitê de Moscou e da Comissão de Controle de Moscou do PCUS (B), um relatório
sobre o trabalho no campo e outras questões. Stalin fez um discurso em 23 de novembro, na ses-
são matinal da conferência. Em sua resolução sobre o relatório do Comitê Central do PCUS (B),
a conferência aprovou as atividades políticas e organizacionais do Comitê Central e também suas
decisões sobre a oposição trotskista. A conferência elegeu J. V. Stalin como delegado ao Décimo
Quinto Congresso do PCUS (B).
J. V. Stalin 393

Pode-se dizer que aqui, nesta esfera, os resultados ainda não foram resumidos.
Isso não é verdade, camaradas! Os resultados foram resumidos também nesta
esfera.
Quais foram as manifestações do sétimo de novembro em todas as cidades
e vilas de nosso vasto país? Não foram todas uma tremenda demonstração da
classe operária, dos setores operários do campesinato, do Exército Vermelho e
da Marinha Vermelha, pelo nosso Partido, pelo governo e contra a oposição,
contra o trotskismo?
Não é a ignomínia que a oposição invocou sobre a sua própria cabeça no
Décimo Aniversário de Outubro, não é a unanimidade com que os milhões de
trabalhadores saudaram o Partido e o governo naquele dia, prova de que não só
o Partido, mas também a classe trabalhadora, não apenas a classe trabalhadora,
mas também os setores operários do campesinato, não apenas os setores operários
do campesinato, mas também todo o Exército e toda a Marinha, permanecem
como uma rocha para o Partido, para o governo e contra a oposição, contra os
desorganizadores? (Aplausos prolongados.)
Que mais resultados você precisa?
Eis aqui, camaradas, um breve resumo da luta entre o Partido e a oposição,
entre os bolcheviques e a oposição, a luta que se desenvolveu dentro do Partido e
mais tarde, por culpa da própria oposição, ultrapassou as fronteiras do mesmo.
Como explicar essa derrota vergonhosa da oposição? É um fato que nenhuma
outra oposição na história do nosso Partido, desde a tomada do poder pelos
bolcheviques, sofreu uma derrota tão vergonhosa.
Sabemos da oposição dos trotskistas no período da paz de Brest. Na época,
contava com o apoio de cerca de um quarto do Partido.
Sabemos da oposição dos trotskistas em 1921, durante a discussão sindical.
Naquela época, tinha o apoio de cerca de um oitavo do Partido.
Sabemos da chamada “Nova Oposição”, a oposição Zinoviev-Kamenev, no
XIV Congresso. Em seguida, teve o apoio de toda a delegação de Leningrado.
Mas agora? Agora, a oposição está mais isolada do que nunca. É duvidoso
agora se haverá pelo menos um delegado no Décimo Quinto Congresso.
O fracasso da oposição se deve ao fato de estar completamente divorciada
do Partido, da classe trabalhadora, da revolução. A oposição acabou sendo um
punhado de intelectuais divorciados da vida, divorciados da revolução. É aí que
está a raiz do fracasso vergonhoso da oposição.
Façamos, a título de prova, duas ou três das questões que separam a oposição
do Partido.

II. A classe trabalhadora e o campesinato


A questão das relações entre a classe operária e o campesinato.
Lenin disse que a questão das relações entre a classe operária e o campesi-
nato em nosso país é uma questão fundamental da ditadura do proletariado, a
questão fundamental de nossa revolução. Ele disse: “Dez ou vinte anos de rela-
ções corretas com o campesinato, e a vitória em escala mundial está assegurada
394 Obras Escolhidas

(mesmo que as revoluções proletárias, que estão crescendo, sejam atrasadas)”239 .


Quais são as relações corretas com o campesinato? Por relações corretas com
o campesinato, Lenin queria dizer o estabelecimento de uma “aliança estável”
com os camponeses médios, enquanto contava com os camponeses pobres.
Mas qual é a visão da oposição sobre esta questão? Não só não atribui ne-
nhum valor à aliança entre a classe trabalhadora e o campesinato, não só deixa
de apreciar a imensa importância de tal aliança para o desenvolvimento de nossa
revolução, mas vai “mais longe”, propondo uma política que inevitavelmente con-
duz à ruptura da aliança entre a classe operária e o campesinato, à ruptura do
vínculo entre a classe operária e o campesinato.
Não é necessário ir tão longe para provar isso. Eu poderia me referir a Preo-
brazhensky, o economista-chefe da oposição, que considera o campesinato uma
“colônia” de nossa indústria, um objeto a ser explorado ao máximo.
Eu também poderia me referir a uma série de documentos da oposição a favor
do aumento dos preços dos produtos manufaturados, o que inevitavelmente faria
nossa indústria murchar, fortaleceria os kulaks, arruinaria os camponeses médios
e obrigaria os camponeses pobres a serem escravos dos kulaks.
Todos esses e outros documentos de oposição são parte integrante da política
da oposição, calculada para causar uma ruptura com o campesinato, uma ruptura
com as massas do campesinato médio.
Há algo dito de forma clara e aberta sobre isso na “plataforma” da oposição
ou em suas teses contrárias ao Partido? Não, não há. Na “plataforma” e nas
proposições da oposição, tudo isso é cuidadosamente escondido e velado. Pelo
contrário, na “plataforma” e nas ideias da oposição, encontram-se dezenas de
elogios dirigidos aos camponeses médios e aos camponeses pobres. Eles também
contêm ataques ao suposto desvio kulak do Partido. Mas eles não dizem nada,
absolutamente nada, clara e abertamente, sobre a linha fatal de sua ação, que
conduz, e está fadada a conduzir, a uma ruptura entre a classe trabalhadora e o
campesinato.
Mas o que os líderes da oposição estão escondendo com tanto cuidado dos
trabalhadores e camponeses, tentarei agora trazer à luz do dia e colocar na mesa
para ensinar a oposição a não enganar o Partido no futuro. Tenho em mente
o discurso proferido recentemente por Ivan Nikitich Smirnov na Conferência
do Partido do Distrito de Rogozhsko-Simonovsky. Smirnov, um dos líderes da
oposição, provou ser um dos poucos homens honestos entre eles que tiveram a
coragem de dizer a verdade sobre a linha da oposição. Quer saber qual é a verda-
deira “plataforma” da oposição sobre a questão das relações entre o proletariado
e o campesinato? Leia o discurso de Smirnov e estude-o, pois é um daqueles raros
documentos de oposição que contam toda a verdade sobre a posição realmente
tomada por eles. Aqui está o que Smirnov disse em seu discurso: “Dizemos que
o nosso orçamento do Estado deve ser revisto, de forma que a maior parte deste
orçamento de cinco milhões vá para a indústria, pois seria melhor tolerarmos a
discórdia com os camponeses médios do que convidar a uma condenação certa”.
Isso é o fundamental de tudo o que os líderes da oposição têm escondido em
239V. I. Lenin, “Esboço do Panfleto O Imposto em Espécie” (vide Obras Completas, 4ª edição Russa,
Vol. 32, pp. 302-03).
J. V. Stalin 395

sua “plataforma” e teses contrárias, e o que Smirnov, também líder da oposição,


conscienciosamente arrastou para a luz do dia.
Consequentemente, não uma aliança estável com os camponeses médios, mas
discórdia com os camponeses médios – esse, ao que parece, é o meio de “salvar”
a revolução.
Lenin disse que “o princípio supremo da ditadura é a manutenção da aliança
do proletariado e do campesinato para que o proletariado possa manter seu papel
de liderança e poder do Estado”.240
Mas a oposição discorda disso e afirma que o importante para a ditadura do
proletariado não é a aliança com o campesinato, com a massa principal do cam-
pesinato, mas a discórdia com ele. Lenin disse, e não apenas disse, mas constan-
temente reiterou, a partir do Oitavo Congresso do Partido, que será impossível
construir o socialismo com sucesso em nosso país a menos que tenhamos “uma
aliança estável com os camponeses médios”241
Mas a oposição discorda disso e afirma que a política de aliança estável com
os camponeses médios pode ser substituída por uma política de discórdia com
eles.
Essa é a principal divergência entre o Partido e a oposição na questão cardinal
das relações entre a classe trabalhadora e o campesinato.
Em sua “plataforma”, a oposição tentou esconder sua verdadeira fisionomia
dirigindo elogios ao campesinato e fazendo investidas hipócritas ao alegado des-
vio kulak do Partido. Mas Smirnov introduziu uma emenda radical à “plata-
forma” da oposição, rasgando a máscara dos líderes da oposição e dizendo ao
Partido a verdade sobre a oposição, a verdade sobre a plataforma real de sua
ação.
O que se segue disso? Daqui decorre que a “plataforma” e as teses contrárias
da oposição são meros pedaços de papel, concebidos para enganar o Partido e a
classe operária.
O que significa uma política de discórdia com os camponeses médios? A po-
lítica de discórdia com os camponeses médios é uma política de discórdia com
a maioria dos camponeses, pois os camponeses médios constituem não menos
do que 60% de todo o campesinato. É precisamente por isso que a política de
discórdia com os camponeses médios leva a maioria dos camponeses a ser lan-
çada nos braços dos kulaks. E uma política de colocar a maioria dos camponeses
nos braços dos kulaks significa fortalecer os kulaks, isolar os camponeses pobres,
enfraquecer o domínio soviético no campo e ajudar os kulaks a estrangular os
camponeses pobres.
Mas o assunto não termina aqui. Seguir uma política de desacordo com a mai-
oria dos camponeses significa iniciar uma guerra civil no campo, dificultando o
abastecimento de nossa indústria com as matérias-primas produzidas pelos cam-
poneses (algodão, beterraba, linho, peles, lã, etc. etc.), desorganizando a oferta
240 V. I. Lenin, “Relatório sobre as Táticas do PC Russo (B)”, entregue no Terceiro Congresso da
Internacional Comunista, 5 de julho de 1921 (vide Obras Completas, 4ª edição Russa, Vol. 32, p.
466).
241 V. I. Lenin, “Discurso de abertura no Oitavo Congresso do PC Russo (B)”, 18 de março de 1919

(vide Obras Completas, 4ª edição Russa, Vol. 29, p. 125).


396 Obras Escolhidas

de produtos agrícolas para a classe trabalhadora, estilhaçando os próprios alicer-


ces de nossa indústria leve, atrapalhando todo o nosso trabalho de construção,
atrapalhando todo o nosso plano de industrialização do país.
É esse o rumo que o assunto toma, camaradas, se tivermos em mente não
as declarações simples que a oposição faz em sua “plataforma” e suas teses con-
trárias, mas a própria política da oposição, como explicada com autoridade por
Smirnov.
Estou longe de acusar a oposição de lutar deliberadamente por todos esses
infortúnios. Não é, porém, uma questão do que a oposição deseja e luta, mas
dos resultados que devem inevitavelmente resultar da política de discórdia da
oposição com o campesinato médio.
A mesma coisa está acontecendo com a oposição aqui como aconteceu com o
urso na fábula de Krylov “O Eremita e o Urso”. (Risos.) Nem é preciso dizer que a
intenção do urso ao esmagar a cabeça de seu amigo, o eremita, com um pedaço de
pedra, era livrá-lo da mosca que o atazanava. O urso foi motivado pelos motivos
mais amigáveis. No entanto, as intenções amigáveis do urso levaram a uma ação
que estava longe de ser amigável, e pela qual o eremita pagou com a vida. Claro,
a oposição deseja à revolução apenas o bem. Mas, para isso, propõe meios que
resultariam na derrota total da revolução, na derrota total da classe trabalhadora
e do campesinato, na destruição de todo o nosso trabalho de construção.
A “plataforma” da oposição é uma plataforma para a ruptura da aliança en-
tre a classe trabalhadora e o campesinato, uma plataforma para a ruptura de
todas as nossas obras de construção, uma plataforma para a ruptura da obra de
industrialização.

III. O Partido e a Ditadura do Proletariado

A questão do partido.
Lenin afirma que a unidade e a disciplina de ferro do Partido são a base da
ditadura do proletariado. A oposição, de fato, sustenta a visão oposta. Pensa que,
para a ditadura do proletariado, não necessitamos da unidade e da disciplina de
ferro do Partido, mas da destruição da unidade e da disciplina do Partido, da
divisão do Partido e da formação de um segundo partido. É verdade que a opo-
sição fala e escreve, escreve e fala, e não tanto fala, mas uiva sobre a unidade do
Partido. Mas a conversa da oposição sobre a unidade do Partido é uma tagarelice
hipócrita, calculada para enganar o Partido. (Aplausos)
Pois, enquanto fala e grita sobre unidade, a oposição está construindo um
novo partido antileninista. E não está apenas empenhada em construí-lo, ela já
o construiu, como mostram documentos autênticos, como os discursos de Kuzov-
nikov, Zof e Reno, ex-oposicionistas.
Estamos, agora, com posse de provas documentais exaustivas de que já há mais
de um ano a oposição tem seu próprio partido antileninista, com seu Comitê
Central, escritórios regionais, gabinetes governamentais e assim por diante. O
que a oposição pode opor a esses fatos, exceto tagarelice hipócrita sobre unidade?
A oposição grita que o Comitê Central do Partido não conseguirá empurrá-lo
J. V. Stalin 397

para a posição de “segundo partido”. Estranho! O Comitê Central alguma vez


tentou empurrar a oposição para tal posição? Não é verdade que o Comitê Cen-
tral sempre evitou que a oposição escorregasse à linha de organizar um segundo
partido?
Toda a história de nossas divergências durante os últimos dois anos é uma
história dos esforços do Comitê Central de nosso Partido para impedir a oposição
de se dividir e manter os elementos da oposição dentro do Partido.
Tomemos o caso da conhecida “declaração” da oposição de 16 de outubro de
1926. Não foi uma tentativa do Comitê Central de manter a oposição nas fileiras
do Partido?
Ver a segunda “declaração” da oposição de 8 de agosto de 1927. O que isso
mostra senão que o Comitê Central do Partido sempre esteve disposto para man-
ter a oposição nas fileiras de um único partido?
Mas o que houve? A oposição fez declarações sobre a unidade, fez promessas
de mantê-la, deu garantias de que abandonaria o partidarismo; mas na verdade
continuou a construir um segundo partido.
O que tudo isso mostra? Mostra que não podemos aceitar a palavra da oposi-
ção; que a oposição deve ser testada não por suas “plataformas” e teses, mas por
seus atos.
Lenin disse: aprenda a testar grupos, tendências e partidos não por suas pro-
messas e “plataformas”, mas por seus atos. Consideramos nosso dever seguir os
passos de Lenin e testar a oposição não pelos papéis e “plataformas” que ela cria,
mas por seus atos.
Quando a oposição grita pela unidade do Partido, está enganando o Partido,
é hipocrisia, meras palavras vazias. Mas quando a oposição constrói um novo
partido, estabelece seu próprio comitê central, organiza escritórios regionais, e
assim por diante, perturbando assim a unidade e a disciplina proletária de nosso
Partido, esses são os feitos da oposição, seus atos nefastos.
Isso não significa, é claro, que a oposição já tenha conseguido criar algo pare-
cido com um verdadeiro partido. Não. Ele não teve sucesso nisso, e nunca terá.
Não terá sucesso porque a classe trabalhadora é contra a oposição. Ao tentar criar
um novo partido, um segundo partido, a oposição está, na realidade, envolvida
em um jogo infantil, brincando de ser um partido, um comitê central, escritórios
regionais e assim por diante. Perdidos e desgraçados, eles encontram consolo em
se divertirem brincando de ser um partido, um comitê central, escritórios regio-
nais e assim por diante. (Risos. Aplausos.)
Mas, camaradas, existem jogos e jogos. Quando a oposição brinca de ser
partidária, só dá gargalhadas, porque, para o Partido, essa brincadeira não passa
de uma fantasia divertida.
Temos, no entanto, não apenas o Partido a considerar. Ainda temos classes,
ainda temos elementos antissoviéticos em nosso país. E esses elementos antisso-
viéticos estão assistindo ao jogo da oposição, aprendendo com ela como lutar
contra o Partido, como lutar contra o regime soviético, como lutar contra nossa
revolução. Para esses elementos, o jogo de ser partido da oposição, as investidas
da oposição no Partido, as surtidas antissoviéticas da oposição, servem como uma
398 Obras Escolhidas

espécie de escola, uma escola preparatória para aprender a lutar contra o regime
soviético, a desencadear as forças da contrarrevolução.
Não é surpreendente que todos os tipos de elementos antissoviéticos se reú-
nam em torno da oposição. É aqui que reside o perigo do jogo da oposição ser
partido. E precisamente porque um grave perigo se esconde aqui, o Partido não
pode olhar com indiferença para os exercícios antissoviéticos da oposição; preci-
samente por esta razão, deve acabar com eles de uma vez.
Quanto à classe operária, não pode deixar de ver o quão perigoso é o jogo
antipartido que a oposição está jogando. Para a oposição, o Partido é um tabu-
leiro de xadrez. Ao lutar contra o Partido, ela faz vários movimentos. Um dia,
ele apresenta uma declaração prometendo acabar com o partidarismo. No dia
seguinte, ele repudia sua própria declaração. Um dia depois, ele apresenta uma
nova declaração, apenas para repudiar sua própria declaração novamente alguns
dias depois. Estes são movimentos de xadrez para a oposição. Eles são jogadores
e nada mais.
Mas não é assim que a classe trabalhadora encara o seu Partido. Para a classe
operária, o Partido não é um tabuleiro de xadrez, mas o instrumento de sua
emancipação. Para a classe operária, o Partido não é um tabuleiro de xadrez, mas
um meio vital de vencer seus inimigos, de organizar novas vitórias, de alcançar
a vitória final do socialismo. Portanto, a classe trabalhadora só pode desprezar
aqueles que transformam seu Partido em um tabuleiro de xadrez para os jogos
desonestos dos elementos da oposição. Pois a classe operária não pode deixar
de saber que os esforços da oposição para romper a disciplina de ferro do nosso
Partido, os seus esforços para dividir o nosso Partido, são, em essência, esforços
para quebrar a ditadura do proletariado em nosso país.
A “plataforma” da oposição é uma plataforma para destruir o nosso Partido,
uma plataforma para desarmar a classe trabalhadora, uma plataforma para li-
bertar as forças antissoviéticas, uma plataforma para desmantelar a ditadura do
proletariado.

IV. As perspectivas de nossa revolução


Passemos à terceira questão, a questão das perspectivas de nossa revolução.
O traço característico de toda a linha da oposição é a descrença na força de
nossa revolução, descrença na força do proletariado e na capacidade de liderar o
campesinato, descrença na força e capacidade da classe trabalhadora para cons-
truir o socialismo.
Já citei a passagem do discurso de Smirnov sobre a inevitável “desgraça” de
nossa revolução se não estabelecermos discórdia com o campesinato médio. Esta
não é a primeira vez que ouvimos as canções da oposição sobre a “ruína” da re-
volução. Não é a primeira vez que, nas declarações da oposição, encontramos
queixas e consternação contínua diante das dificuldades, das previsões do cre-
púsculo e do colapso de nossa revolução. Desde o momento em que a política
das facções da oposição começou a sofrer derrota após derrota, a oposição não
parou de gritar sobre a “condenação” de nossa revolução, fazendo com que a con-
denação de seu próprio grupo fosse a “condenação” da revolução. A oposição
J. V. Stalin 399

só tem que se encontrar em minoria, para receber uma surra do Partido, para
correr para a rua e começar a gritar sobre a “ruína” da revolução e para utilizar
todas as dificuldades possíveis contra o Partido.
Já no período da Paz de Brest, em 1918, quando a revolução passava por certas
dificuldades, Trotsky, depois de ser derrotado pelo Partido no Sétimo Congresso,
começou a espernear sobre a “ruína” de nossa revolução. Mas a revolução não
morreu, e as profecias de Trotsky permaneceram como profecias vazias.
Em 1921, no período da discussão sindical, quando nos deparamos com novas
dificuldades advindas da abolição do sistema de apropriação de sobras, Trotsky
sofreu mais uma derrota, no Décimo Congresso do Partido, voltou a gritar sobre
a “desgraça” da revolução. Lembro-me bem de Trotsky afirmar em uma reunião
do Birô Político, na presença de Lenin, que o regime soviético havia “cantado o
canto do cisne”, que seus dias e horas estavam contados. (Risos.) Mas a revolu-
ção não morreu, as dificuldades foram superadas e a confusão histérica sobre a
“ruína” da revolução permaneceu mera confusão.
Não sei se os dias e as horas estavam contados naquele momento ou não;
mas se fossem, tudo o que posso dizer é que foram numerados incorretamente.
(Aplausos, risos.)
Em 1923, em um período de novas dificuldades, desta vez oriundas da NEP,
no período de crise de mercado, Trotsky voltou a cantar o canto do cisne sobre
a “desgraça” da revolução, denunciando que a derrota de seu próprio grupo na
Décima Terceira Conferência do nosso Partido era a derrota da revolução. A
revolução, porém, ignorou esse canto do cisne e superou as dificuldades que o
enfrentavam naquele momento.
Em 1925-26, em um período de novas dificuldades decorrentes do progresso
de nossa indústria, Trotsky, desta vez em coro com Kamenev e Zinoviev, voltou a
cantar o canto do cisne sobre a “ruína” da revolução, decretando a derrota de seu
próprio grupo no XIV Congresso e que, depois do XIV Congresso, veríamos a
derrota da revolução. A revolução, no entanto, não tinha intenção de morrer. Os
autoproclamados profetas foram colocados em segundo plano e as dificuldades
foram superadas, como sempre, como no passado, pois os bolcheviques veem as
dificuldades não como algo para lamentar, mas como algo a ser superado. (Vivos
aplausos.)
Agora, no final de 1927, devido às novas dificuldades no período de recons-
trução de toda a nossa economia sobre uma nova base técnica, eles começaram no-
vamente um canto de cisne sobre a “ruína” da revolução, tentando, desta forma,
encobrir a destruição real de seu próprio grupo. Mas, camaradas, todos vocês
veem que a revolução está viva e prosperando, enquanto outros estão morrendo.
E então eles cantaram e cantaram seu canto do cisne até que finalmente se
encontraram em uma posição desesperadora. (Risada.)
A “plataforma” da oposição é uma plataforma para a “ruína” de nossa revo-
lução.
400 Obras Escolhidas

V. O que vem a seguir?


Esta é a verdadeira plataforma da oposição nas três questões principais das
quais discordamos: a questão da classe operária e do campesinato, a questão do
Partido e da ditadura do proletariado e, finalmente, a questão das perspectivas
da nossa revolução.
Você vê que esta plataforma esquisita testemunha o divórcio completo da opo-
sição do Partido, da classe trabalhadora, de nossa revolução. É a plataforma de
intelectuais que romperam com o leninismo e estão divorciados da vida.
É surpreendente, depois de tudo isso, que o Partido e a classe trabalhadora
tenham se afastado completamente da oposição?
Por isso a oposição sofreu uma derrota vergonhosa em sua luta contra o Par-
tido durante a última discussão.
O que vem a seguir?
A oposição reclama que outro dia apresentou uma declaração de unidade, as-
sinada por trinta e um trotskistas, mas ainda não obteve uma resposta satisfatória.
Mas, de fato, que resposta pode ser dada à declaração hipócrita dos trinta e um
trotskistas quando as falsas declarações da oposição são refutadas repetidamente
por suas atividades de divisão? A história do nosso Partido registra uma declara-
ção semelhante feita, creio eu em 1907, por trinta e um mencheviques. (Vozes da
plateia: “Isso mesmo!” ). Lenin, na época, chamou essa declaração de “a hipocrisia
dos trinta e um mencheviques”242 (Risos.) Acho que a hipocrisia dos trinta e um
trotskistas atual é bastante análoga à hipocrisia dos trinta e um mencheviques do
passado. (Vozes da audiência: “Verdade!” ). A oposição enganou duas vezes o Par-
tido. Agora quer enganar o Partido uma terceira vez. Não, camaradas, já chega
de engano, chega de jogos. (Aplausos.)
O que vem a seguir?
O limite foi atingido, camaradas, porque a oposição ultrapassou todos os li-
mites do que é permitido no Partido. Não pode continuar oscilando de um lado
para o outro em dois partidos ao mesmo tempo, no velho Partido Leninista, o
único Partido, e no novo Partido Trotskista. Deve escolher entre essas duas par-
tes.
Ou a própria oposição elimina este segundo partido trotskista, abandonando
suas visões antileninistas e condenando francamente seus próprios erros perante
todo o partido; ou a oposição deixa de fazer isso – nesse caso, nós mesmos aca-
baremos com o partido trotskista. (Aplausos.)
Uma coisa ou outra.
Ou os oposicionistas dão o passo necessário, ou não o fazem, e nesse caso
serão expulsos voando para fora do Partido. (Aplausos tempestuosos e prolongados.
Uma ovação de todo o salão. A “Internacional” é cantada.)
Pravda, nº 269.
24 de novembro de 1927

242
V. I. Lenin “As Eleições em São Petersburgo e a Hipocrisia dos Trinta e Um Mencheviques” (ver
Obras Completas, 4ª edição Russa, Vol. 12, pp. 17-27).
J. V. Stalin 401

Aquisições de grãos e as
perspectivas para o
desenvolvimento da agricultura
De declarações feitas em várias partes da Sibéria, janeiro de 1928243

(breve registro)

Fui enviado aqui à Sibéria para uma curta visita. Fui instruído a ajudá-los a
cumprir o plano de compras de grãos. Também fui instruído a discutir com vocês
as perspectivas de desenvolvimento da agricultura, o plano de desenvolvimento
da formação de fazendas coletivas e fazendas estatais em seus territórios.
Você certamente sabe que este ano as contas de grãos de nosso país mostram
uma escassez, um déficit de mais de 100 milhões de puds. Por causa disso, o
Governo e o Comitê Central tiveram que restringir as compras de grãos em todas
as regiões e territórios para cobrir esse déficit em nossas contas de grãos. O
déficit terá que ser suprido principalmente pelas regiões e territórios com boas
safras, que terão não só que cumprir, mas seguir estritamente o plano de compras
de grãos.
Vocês sabem, é claro, qual pode ser o efeito do déficit se ele não for compen-
sado. O efeito será que nossas cidades e centros industriais, assim como nosso
Exército Vermelho, estarão em graves dificuldades; serão mal abastecidos e ame-
açados de fome. Obviamente, não podemos permitir isso.
O que vocês acham disso? Que medidas pensam tomar para cumprir o seu
dever para com o país? Fiz um tour pelos distritos de seus territórios e tive a
oportunidade de ver por mim mesmo que o povo não está seriamente preocu-
pado em ajudar nosso país a sair da crise dos grãos. Vocês tiveram uma colheita
abundante, pode-se dizer que foi recorde. Seus excedentes de grãos neste ano
são maiores do que nunca. Mesmo assim, o plano de compras de grãos não está
sendo cumprido. Por quê? Qual é a razão?
Vocês dizem que o plano de aquisição de grãos é pesado e não pode ser cum-
prido. Por que não pode ser cumprido? De onde vocês tiraram essa ideia? Não
é verdade que a suas colheitas deste ano são realmente recordes? Não é verdade
que o plano de compra de grãos da Sibéria este ano é quase o mesmo do ano
passado? Por que, então, vocês consideram que o plano não pode ser cumprido?
Olhe para as fazendas kulak: seus celeiros e galpões estão abarrotados de grãos;
os grãos estão expostos sob os telhados por falta de espaço de armazenamento;
243 Durante sua viagem na Sibéria, que durou de 15 de janeiro a 6 de fevereiro de 1928, Stalin
visitou as principais regiões produtoras de grãos. Ele participou de uma reunião do Bureau do
Comitê Territorial Siberiano do PCUS (B) em Novosibirsk, reuniões dos bureaus dos comitês de
okrug do PCUS (B) e conferências dos ativos de Barnaul, Biisk, organizações do Partido Rubtsovsk
e okrug de Omsk, juntamente com representantes dos sovietes e dos órgãos de aquisição. Graças às
medidas políticas e organizacionais realizadas por J. V. Stalin, as organizações do Partido Siberiano
puderam garantir o cumprimento do plano de aquisição de grãos.
402 Obras Escolhidas

os kulaks têm de 50.000 a 60.000 puds de grãos excedentes por fazenda, sem con-
tar os estoques de sementes, alimentos e forragem. No entanto, vocês dizem que
o plano de aquisição de grãos não pode ser cumprido. Por que vocês estão tão
pessimistas?
Vocês dizem que os kulaks não querem entregar grãos, que estão esperando
que os preços subam e preferem se envolver em especulações desenfreadas. Isso é
verdade. Mas os kulaks não estão simplesmente esperando que os preços subam;
eles estão exigindo um aumento de preços três vezes maior que os fixados pelo
governo. Vocês acham que é permitido satisfazer os kulaks? Os camponeses po-
bres e uma parte considerável dos camponeses médios já entregaram seus grãos
ao Estado a preços de governo. É permitido ao governo pagar aos kulaks três
vezes mais pelos grãos do que paga aos camponeses pobres e médios? Basta fazer
essa pergunta para perceber como seria inadmissível satisfazer as demandas dos
kulaks.
Se os kulaks estão se envolvendo em especulações desenfreadas sobre os preços
dos grãos, por que vocês não os processam por especulação? Vocês não sabem
que existe uma lei contra a especulação? Artigo 107 do Código Penal da RSFSR,
segundo qual as pessoas culpadas de especulação podem ser processadas e, seus
bens, confiscados em favor do Estado? Por que vocês não aplicam essa lei contra
os especuladores de grãos? Será que vocês têm medo de perturbar a tranquili-
dade da pequena nobreza kulak?!
Os senhores dizem que a aplicação do artigo 107 contra os kulaks seria uma
medida de emergência, que não produziria bons resultados, que agravaria a situ-
ação no campo. O camarada Zagumenny insiste especialmente nisso. Supondo
que fosse uma medida de emergência – e daí? Por que é que em outros territórios
e regiões a aplicação do Artigo 107 produziu resultados esplêndidos, reuniu o
campesinato trabalhador em torno do Governo Soviético e melhorou a situação
no campo, enquanto entre vocês, na Sibéria, afirma-se que é obrigado a produzir
resultados ruins e piorar a situação? Por quê, com base em quê?
Vocês dizem que as suas autoridades judiciárias e de acusação não estão pre-
paradas para tal. Mas por que é que em outros territórios e regiões as autoridades
judiciárias e de acusação estavam preparadas para isso e estão agindo com bas-
tante eficácia, mas aqui não estão preparadas para aplicar o artigo 107 contra
os especuladores? Quem é o culpado por isso? Obviamente, a culpa é das orga-
nizações de seu Partido; eles estão evidentemente trabalhando mal e não estão
cuidando para que as leis de nosso país sejam observadas com atenção. Eu vi
várias dezenas de seus promotores e funcionários judiciais. Quase todos eles
moram em casas de kulaks, alojam-se com eles e, claro, estão ansiosos para viver
em paz com os kulaks. Em resposta à minha pergunta, eles disseram que as casas
dos kulaks são mais limpas e a comida lá é melhor. Claramente, nada de efetivo
ou útil para o Estado Soviético deve ser esperado de tais oficiais de acusação e
justiça. A única coisa que não está clara é porque esses nobres ainda não foram
removidos e substituídos por outros funcionários honestos. Eu proponho: que
os kulaks recebam ordem de entregar todos os seus excedentes de grãos imedia-
tamente a preços do governo; que se os kulaks se recusarem a obedecer à lei, eles
devem ser processados nos termos do artigo 107 do Código Penal da RSFSR, e
J. V. Stalin 403

seus excedentes de grãos confiscados em favor do Estado, 25% dos grãos confis-
cados para serem distribuídos entre os camponeses pobres e camponeses médios
economicamente mais fracos, a preços baixos do governo ou na forma de em-
préstimos de longo prazo.
Quanto aos seus promotores e funcionários judiciais, todos os que são inade-
quados para seus cargos devem ser demitidos e substituídos por pessoas honestas
e conscientes de mentalidade soviética.
Vocês verão, em breve, que essas medidas produzirão resultados esplêndidos,
e vocês poderão não apenas cumprir, mas até mesmo superar o plano de compras
de grãos.
Mas isso não esgota o problema. Essas medidas serão suficientes para corrigir
a situação neste ano.
Não há garantia de que os kulaks não sabotarão novamente as compras de
grãos no ano que vem. Mais, pode-se dizer, com certeza, que enquanto houver
kulaks, haverá sabotagem nas compras de grãos. Para colocar as compras de grãos
em uma base mais ou menos satisfatória, outras medidas são necessárias. Quais
medidas, exatamente? Tenho em mente desenvolver a formação de fazendas
coletivas e fazendas estatais.
As fazendas coletivas e estatais são, como você sabe, fazendas em grande es-
cala, capazes de empregar tratores e máquinas. Eles produzem excedentes co-
mercializáveis maiores do que os proprietários ou as fazendas kulak. Deve-se ter
em mente que nossas cidades e nossa indústria estão crescendo e continuarão a
crescer ano após ano. Isso é necessário para a industrialização do país. Conse-
quentemente, a demanda por grãos aumentará de ano para ano, o que significa
que os planos de compra de grãos também aumentarão. Não podemos permitir
que nossa indústria dependa do capricho dos kulaks. Devemos, portanto, cuidar
para que, no decorrer dos próximos três ou quatro anos, as fazendas coletivas e
fazendas estatais, como distribuidores de grãos, estejam em condições de forne-
cer ao Estado pelo menos um terço dos grãos necessários. Isso relegaria os kulaks
para segundo plano e estabeleceria as bases para o suprimento mais ou menos
adequado de grãos para os trabalhadores e o Exército Vermelho. Mas, para isso,
devemos desenvolver ao máximo a formação de fazendas coletivas e estatais, sem
poupar energia nem recursos. Isso pode ser feito e devemos fazê-lo.
Mas mesmo isso não é tudo. Nosso país não pode viver de olho apenas nas
necessidades de hoje. Devemos também pensar no amanhã, nas perspectivas de
desenvolvimento de nossa agricultura e, por último, no destino do socialismo em
nosso país. O problema dos grãos é parte do problema agrícola, e o problema
agrícola é parte integrante do problema da construção do socialismo em nosso
país. A coletivização parcial da agricultura de que acabei de falar será suficiente
para manter a classe trabalhadora e o Exército Vermelho mais ou menos, tolera-
velmente, abastecidos de grãos, mas será totalmente insuficiente para fornecer
uma base firme de um abastecimento totalmente adequado de alimentos para
todo o país, garantindo as reservas de alimentos necessárias nas mãos do Estado
e garantindo a vitória da construção socialista no campo, na agricultura.
Hoje, o sistema soviético se apoia em dois fundamentos heterogêneos: na
indústria socializada unida e na economia individual de pequenos camponeses
404 Obras Escolhidas

baseada na propriedade privada dos meios de produção. O sistema soviético pode


persistir por muito tempo nessas fundações heterogêneas? Não, não pode.
Lenin diz que enquanto a economia camponesa individual, que engendra
os capitalistas e o capitalismo, predominar no país, existirá o perigo de uma
restauração do capitalismo. Obviamente, enquanto este perigo existir, não se
pode falar sério sobre a vitória da construção socialista em nosso país.
Portanto, para a consolidação do sistema soviético e para a vitória da constru-
ção socialista em nosso país, a socialização da indústria por si só é insuficiente.
Para isso, é preciso passar da socialização da indústria à socialização de toda a
agricultura.
E o que isso significa?
Implica, em primeiro lugar, que devemos gradualmente, mas inabalavelmente,
unir as fazendas camponesas individuais, que produzem os menores excedentes
comercializáveis, em fazendas coletivas, kolkhozes, que produzem os maiores ex-
cedentes comercializáveis.
Implica, em segundo lugar, que todas as áreas de nosso país, sem exceção, de-
vem ser cobertas por fazendas coletivas (e fazendas estatais) capazes de substituir
não só os kulaks, mas também os camponeses individuais, como fornecedores de
grãos ao Estado.
Implica, em terceiro lugar, acabar com todas as fontes que engendram os
capitalistas e o capitalismo e acabar com a possibilidade de restauração do capi-
talismo.
Implica, em quarto lugar, criar uma base sólida para o abastecimento sistemá-
tico e abundante de todo o país não só de cereais, mas também de outros produtos
alimentares, garantindo ao mesmo tempo as reservas necessárias ao Estado.
Implica, em quinto lugar, a criação de uma base socialista única e firme para
o sistema soviético, para o poder soviético.
Implica, por fim, assegurar a vitória da construção socialista em nosso país.
Essas são as perspectivas de desenvolvimento da nossa agricultura. Essa é a
tarefa de construir vitoriosamente o socialismo em nosso país.
É uma tarefa complexa e difícil, mas perfeitamente possível de cumprir; pois
as dificuldades existem para serem superadas e vencidas.
Devemos perceber que não podemos mais progredir com base na pequena
economia camponesa individual. Que o que precisamos na agricultura são gran-
des fazendas capazes de empregar máquinas e produzir o máximo de excedentes
comercializáveis. Existem duas maneiras de criar grandes fazendas na agricul-
tura: a maneira capitalista: por meio da ruína total dos camponeses e da orga-
nização das grandes propriedades capitalistas que exploram o trabalho; e a via
socialista: através da união das pequenas fazendas camponesas em grandes fazen-
das coletivas, sem arruinar os camponeses e sem exploração do trabalho. Nosso
Partido escolheu a forma socialista de criar grandes fazendas na agricultura.
Mesmo antes da vitória da Revolução de Outubro, e então, imediatamente
após essa vitória, Lenin atribuiu ao Partido a tarefa de unir as pequenas fazen-
das camponesas em grandes fazendas coletivas como perspectiva para o desen-
volvimento de nossa agricultura e como meio decisivo de assegurar a vitória do
J. V. Stalin 405

socialismo no campo, na agricultura. Lenin apontou que: “O sistema de pe-


quena agricultura sob a produção de mercadorias não pode salvar a humanidade
da pobreza e da opressão das massas” (Vol. XX, p. 122). E também afirmou: “Se
continuarmos como antigamente em nossas pequenas fazendas, mesmo como ci-
dadãos livres em terras livres, ainda seremos confrontados com a ruína inevitável”
(Vol. XX, p. 417).
Mais adiante, Lenin explica: “Somente com a ajuda do trabalho comum e
cooperativo que podemos escapar do impasse em que a guerra imperialista nos
lançou” (Vol. XXIV, p. 537). Lenin ressalta ainda:
Só se conseguirmos, na prática, mostrar aos camponeses as vantagens do cultivo comum, co-
letivo, cooperativo e artel 244 do solo. Só se conseguirmos ajudar o camponês por meio da
agricultura cooperativa e artel, a classe trabalhadora, que detém o poder do Estado em suas
mãos, comprovará efetivamente ao camponês o acerto de sua política e assegurar de fato o
seguimento real e duradouro das vastas massas do campesinato. Daí a importância de todo
tipo de medida de promoção cooperativa, artel, etc. A agricultura dificilmente pode ser supe-
restimada. Temos milhões de fazendas individuais em nosso país, espalhadas e dispersas nas
profundezas do campo. Só quando for comprovado na prática, por experiência facilmente
compreendida pelos camponeses, que a transição para a forma cooperativa – a forma artel de
agricultura – é essencial e possível, só então teremos o direito de dizer que neste vasto país
camponês, a Rússia, um importante passo em direção à agricultura socialista foi dado. (ver
Vol. XXIV, pp. 579-80).

Essas são as diretrizes de Lenin.


No seguimento destas diretivas, o Décimo Quinto Congresso do nosso Par-
tido245 afirmou na sua resolução sobre o “Trabalho no Campo”: “No período atual,
244 Um artel era qualquer uma das várias associações cooperativas que existiram no Império Russo
e na União Soviética. Foram especialmente prevalentes desde a época da emancipação dos servos
russos (1861) até a década de 1950. No período soviético posterior (1960-1980), o termo foi quase
totalmente extinto com a monopolização completa da economia soviética pelo Estado (N.T.)
245 O Décimo Quinto Congresso do PCUS (B) aconteceu em Moscou, de 2 a 19 de dezembro de 1927.

O congresso discutiu os relatórios políticos e organizacionais do Comitê Central, os relatórios da Co-


missão Central de Auditoria da Comissão Central de Controle e dos Trabalhadores e Inspeção dos
Camponeses, e da delegação do PCUS (B) no Comitê Executivo do Comintern; discutiu também as
diretrizes para a elaboração de um plano quinquenal de desenvolvimento da economia nacional e um
relatório sobre o trabalho no campo; ouviu o relatório da comissão do congresso sobre a questão da
oposição e elegeu os órgãos centrais do Partido. Em 3 de dezembro, J. V. Stalin entregou o relatório
político do Comitê Central do PCUS (B) e, em 7 de dezembro, respondeu à discussão. Em 12 de
dezembro, o congresso elegeu J. V. Stalin membro da comissão para redigir a resolução sobre o rela-
tório sobre o trabalho da delegação do PCUS (B) no Comitê Executivo do Comintern. O congresso
aprovou a linha política e organizacional do Comitê Central do Partido e instruiu-o a continuar a
perseguir uma política de paz e de fortalecimento da capacidade de defesa da URSS, a continuar a
um ritmo ininterrupto a industrialização socialista do país, a ampliar e fortalecer o setor socialista
na cidade e no campo e para orientar a eliminação dos elementos capitalistas da economia nacional.
O congresso deu instruções para a elaboração do Primeiro Plano Quinquenal de Desenvolvimento
da Economia Nacional da URSS. O Congresso aprovou, também, uma resolução apelando ao pleno
desenvolvimento da coletivização da agricultura, traçou um plano para a extensão das fazendas co-
letivas e fazendas estatais e indicavam os métodos de luta pela coletivização da agricultura. O XV
Congresso entrou na história do Partido como Congresso da Coletivização da Agricultura. Em suas
decisões sobre a oposição, voltadas para a liquidação do bloco Trotsky-Zinoviev, o congresso observou
que as divergências entre o Partido e a oposição se transformaram em divergências programáticas,
que a oposição trotskista havia trilhado o caminho da luta antissoviética, e declarou que a adesão à
oposição trotskista e a propagação de seus pontos de vista eram incompatíveis com a adesão ao Partido
Bolchevique. O congresso aprovou a decisão da reunião conjunta do Comitê Central e da Comissão
de Controle Central do PCUS (B) de novembro de 1927 para expulsar Trotsky e Zinoviev do Partido
e decidiu expulsar do Partido todos os membros ativos do bloco Trotsky-Zinoviev.
406 Obras Escolhidas

a tarefa de unir e transformar as pequenas fazendas camponesas individuais em


grandes fazendas coletivas deve ser considerada a principal tarefa do Partido no
campo”.
É assim, camaradas, que se posicionam as coisas em relação à socialização da
agricultura em nosso país. Nosso dever é cumprir essas diretrizes.
J. V. Stalin 407

Lenin e a questão da aliança com o


camponês médio
12 de junho de 1928

Resposta ao Camarada S.

Camarada S.,
Não é verdade que o slogan de Lenin: “Chegar a um acordo com o campo-
nês médio, embora nunca por um momento renunciar à luta contra os kulak, e
confiar firmemente apenas no camponês pobre”, que ele apresentou em seu co-
nhecido artigo sobre Pitirim Sorokin é, como se alega, um slogan do “período
dos Comitês de Camponeses Pobres”, um slogan do “fim do período da chamada
neutralização do campesinato médio”. Isso é absolutamente falso.
Os Comitês de Camponeses Pobres foram formados em junho de 1918. No
final de outubro de 1918, nossas forças no campo já haviam vencido os kulaks
e os camponeses médios haviam se voltado para o lado do poder soviético. Foi
com base nessa mudança, que a decisão do Comitê Central foi tomada de abolir o
duplo poder dos sovietes e dos Comitês de Camponeses Pobres, de realizar novas
eleições para os volost e sovietes de aldeia, para fundir os Comitês de Campone-
ses Pobres com os sovietes recém-eleitos e, consequentemente, para dissolver os
Comitês de Camponeses Pobres. Essa decisão foi formalmente aprovada, como
se sabe, em 9 de novembro de 1918, pelo VI Congresso dos Sovietes. Tenho em
mente a decisão do Sexto Congresso dos Sovietes de 9 de novembro de 1918, so-
bre as eleições da aldeia e do volost soviético e a fusão dos Comitês de Camponeses
Pobres com os sovietes.
Mas, quando apareceu o artigo de Lenin, “As valiosas admissões de Pitirim So-
rokin”, o artigo em que ele proclamava a palavra de ordem do acordo com o
camponês médio, no lugar da palavra de ordem de neutralizar o camponês mé-
dio? Surgiu em 21 de novembro de 1918, ou seja, quase duas semanas após a
decisão do Sexto Congresso dos Sovietes. Neste artigo, Lenin afirma claramente
que a política de acordo com o camponês médio é ditada pela sua virada para o
nosso lado.
Aqui está o que Lenin disse:
Nossa tarefa no campo é destruir o senhorio e esmagar a resistência do explorador e do
especulador kulak. Para isso, podemos confiar firmemente apenas nos semiproletários, os ‘camponeses
pobres’. Mas o camponês médio não é nosso inimigo. Ele vacilou, está vacilando e continuará a vacilar.
A tarefa de influenciar os vacilantes não é idêntica à tarefa de derrubar o explorador e derrotar o inimigo
ativo. A tarefa, neste momento, é chegar a um acordo com o camponês médio, embora nunca por um
momento renunciar à luta contra os kulaks, e confiar firmemente apenas no pobre camponês, pois é
precisamente agora que uma mudança em nossa direção por parte do campesinato médio é inevitável,
devido às causas acima enumeradas. (Vol. 23, p. 294).

O que se segue disso?


Segue-se, daí, que a palavra de ordem de Lenin não se refere ao antigo pe-
ríodo, ao período dos Comitês de Camponeses Pobres e à neutralização do cam-
408 Obras Escolhidas

ponês médio, mas ao novo período, o período de acordo com o camponês médio.
Assim, reflete não o fim do antigo período, mas o início de um novo período.
Mas, sua afirmação sobre o slogan de Lenin não está apenas errada do ponto
de vista formal, não apenas, por assim dizer, cronologicamente; está errada em
substância.
Sabemos que a palavra de ordem de Lenin sobre o acordo com o camponês
médio foi proclamada como uma nova palavra de ordem por todo o Partido no
Oitavo Congresso do Partido (março de 1919). Sabemos que o Oitavo Congresso
do Partido foi o congresso que lançou as bases da nossa política de aliança estável
com o camponês médio. É sabido que o nosso programa, o programa do PCUS
(B), foi aprovado também no Oitavo Congresso do Partido. Sabemos que esse
programa contém pontos especiais que tratam da atitude do Partido para com
os vários grupos do campo: os camponeses pobres, os camponeses médios e os
kulaks. O que dizem estes pontos do programa do PCUS (B) sobre os grupos
sociais do campo e sobre a atitude do nosso Partido para com eles? É o que
segue:
Em todo o seu trabalho no campo, o PC Russo, como até agora, conta com as camadas proletá-
rias e semiproletárias da população rural; em primeiro lugar, ele organiza essas camadas em
uma força independente, estabelecendo unidades do Partido nas aldeias, formando organi-
zações de camponeses pobres, um tipo especial de sindicatos de proletários e semiproletários
do campo, e assim por diante, aproximando-os em todos os sentidos do proletariado urbano
e arrancando-os da influência da burguesia rural e dos interesses dos pequenos proprietá-
rios. No que diz respeito aos kulaks, à burguesia rural, a política do PC Russo é resolutamente
combater suas tendências exploradoras, suprimir sua resistência à política soviética. No que diz respeito
aos camponeses médios, a política do PC Russo é, de forma gradual e sistemática, atraí-los para a obra
da construção socialista. O Partido se propõe a separá-los dos kulaks, de ganhá-los para o lado da classe
operária atendendo atentamente às suas necessidades, combatendo o seu atraso com medidas de influên-
cia ideológica e de forma alguma com medidas de repressão, e empenhando-se em todos os casos em que
estejam em causa os seus interesses vitais para chegar a acordos práticos com eles, fazendo-lhes concessões
ao determinarmos os métodos de realização das mudanças socialistas. (Oitavo Congresso do PC Russo
(B), relatório integral, p. 351).

Tente encontrar a menor diferença, mesmo em palavras, entre esses pontos


do programa e o slogan de Lenin! Você não encontrará nenhuma diferença,
pois não há nenhuma. Mais que isso. Não pode haver dúvida de que a palavra
de ordem de Lenin não só não contradiz as decisões do Oitavo Congresso sobre
o camponês médio, mas, pelo contrário, é a formulação mais adequada e exata
dessas decisões. E é um fato que o programa do PCUS (B) foi aprovado em março
de 1919, no Oitavo Congresso do Partido, que discutia especialmente a questão
do camponês médio, enquanto o artigo de Lenin contra Pitirim Sorokin, que
proclamava o slogan de estabelecer acordos com o camponês médio, apareceu
na imprensa em novembro de 1918, quatro meses antes do Oitavo Congresso do
Partido.
Não é claro que o Oitavo Congresso do Partido confirmou plena e integral-
mente a palavra de ordem de Lenin, por ele proclamada em seu artigo contra
Pitirim Sorokin, como uma palavra de ordem pela qual o Partido deve se orien-
tar em seu trabalho no campo durante todo o presente período de construção
socialista?
Qual é o ponto essencial do slogan de Lenin?
O ponto essencial do slogan de Lenin é que ele abraça com notável precisão
J. V. Stalin 409

a tarefa trina do trabalho do Partido no campo, expressa em uma única fórmula


condensada: a) confiar no camponês pobre; b) estabelecer acordo com o cam-
ponês médio; c) nunca, por um momento, pare de lutar contra os kulaks. Tente
tirar desta fórmula qualquer uma de suas partes como base para o trabalho no
campo na atualidade e esqueça as outras partes, e você inevitavelmente se verá
em um beco sem saída.
É possível, na fase atual da construção socialista, chegar a um acordo real e
estável com o camponês médio sem contar com o camponês pobre e sem lutar
contra os kulak? Não é possível.
É possível, nas atuais condições de desenvolvimento, travar uma luta bem-
sucedida contra os kulak sem contar com o camponês pobre, e sem chegar a um
acordo com o camponês médio? Não é possível.
Como essa tarefa tríplice do trabalho do Partido no campo pode ser expressa
da maneira mais apropriada em um slogan abrangente? Acho que o slogan de
Lenin é a expressão mais adequada dessa tarefa. É preciso admitir que você não
pode expressá-lo de maneira mais adequada do que Lenin.
Por que é necessário enfatizar a conveniência do slogan de Lenin agora, pre-
cisamente nas atuais condições de trabalho no campo?
Porque agora vemos uma tendência, entre certos camaradas, de dividir em
partes esta tarefa trina do Partido no campo, e separar essas partes umas das
outras. Isso é totalmente comprovado pela experiência de nossa campanha de
compra de grãos em janeiro e fevereiro deste ano.
Todo bolchevique sabe que se deve chegar a um acordo com o camponês mé-
dio. Mas nem todo mundo entende como esse acordo deve ser alcançado. Alguns
pensam que o acordo com o camponês médio pode ser conseguido abandonando
a luta contra o kulak ou abrandando essa luta; porque, dizem eles, a luta contra
os kulak pode assustar uma parte do campesinato médio, sua parte abastada.
Outros pensam que o acordo com o camponês médio pode ser alcançado
abandonando o trabalho de organização dos camponeses pobres, ou abrandando
este trabalho; porque, dizem eles, a organização dos camponeses pobres significa
separar os camponeses pobres, e isso pode afugentar os camponeses médios de
nós.
O resultado desses desvios da linha correta, é que tais pessoas esquecem a tese
marxista de que o campesinato médio é uma classe vacilante, de que o acordo
com os camponeses médios só pode ser estabilizado se uma luta determinada for
travada contra os kulaks e se o trabalho entre os camponeses pobres é intensifi-
cado. Lembre-se do que Lenin disse no Oitavo Congresso do Partido:

Temos que determinar nossa atitude para com uma classe que não tem uma posição definida
e estável. O proletariado, em sua massa, é a favor do socialismo, a burguesia, em sua massa,
se opõe ao socialismo; determinar a relação entre essas duas classes é fácil. Mas, quando
passamos para um estrato como o campesinato médio, descobrimos que é uma classe que
vacila. O camponês médio é em parte proprietário, em parte trabalhador. Ele não explora
outros representantes dos trabalhadores. Por décadas ele teve que fazer isso, defender a sua
posição sob as maiores dificuldades; sofreu a exploração dos latifundiários e dos capitalistas;
suportou tudo e, ao mesmo tempo, é dono de uma propriedade. A nossa atitude para com
esta classe vacilante apresenta, portanto, enormes dificuldades. (Oitavo Congresso do PC
Russo (B), Relatório integral, p. 300).
410 Obras Escolhidas

Mas existem outros desvios da linha correta, não menos perigosos do que os
já mencionados. Em alguns casos, a luta contra o kulak é de fato prosseguida,
mas de maneira tão desajeitada e sem sentido, que os golpes recaem sobre os
camponeses médios e pobres. Como resultado, o kulak escapa ileso, abre-se um
rompimento na aliança com o camponês médio e uma parte dos camponeses
pobres cai temporariamente nas garras do kulak, que luta para minar a política
soviética.
Em outros casos, tenta-se transformar a luta contra os kulaks em “deskulaki-
zação”, e o trabalho de colheita de grãos em apropriação de excedentes, esque-
cendo que, nas condições atuais, a “deskulakização” é uma loucura, e o sistema
de apropriação de excedentes significa não uma aliança, mas uma luta contra o
camponês médio.
Qual é a origem desses desvios da linha do Partido?
A fonte reside em não compreender que a tripla tarefa do trabalho do Partido
no campo é uma tarefa única e indivisível; por não compreender que a tarefa de
lutar contra o kulak não pode ser separada da tarefa de chegar a um acordo com
o camponês médio, e que essas duas tarefas não podem ser separadas da tarefa
de converter o camponês pobre em baluarte do Partido no campo246 .
O que deve ser feito para garantir que essas tarefas não sejam separadas umas
das outras no decorrer do nosso trabalho atual no campo?
Devemos, pelo menos, emitir um slogan orientador, que reúna todas essas
tarefas em uma fórmula geral e, consequentemente, evite que essas tarefas sejam
separadas umas das outras. Existe tal fórmula, tal slogan em nosso arsenal do
Partido?
Sim, existe. Essa fórmula é o lema de Lenin: “Chegar a um acordo com o
camponês médio, embora nunca por um momento renunciar à luta contra os

246 Disto se segue que os desvios da linha correta criam um duplo perigo para a aliança dos trabalha-
dores e camponeses: um perigo do lado daqueles que querem, por exemplo, transformar as medidas
de emergência temporárias para a colheita de grãos em uma política de longo prazo, ou permanente;
e um perigo por parte daqueles que querem aproveitar a suspensão das medidas de emergência para
dar liberdade ao kulak, para proclamar total liberdade de comércio, sem qualquer regulamentação
do comércio por parte dos órgãos do Estado. Portanto, para garantir que a linha correta seja per-
seguida, a luta deve ser travada em duas frentes. Aproveito para observar que nossa imprensa nem
sempre segue essa regra e às vezes exibe uma certa unilateralidade. Em alguns casos, por exemplo, a
imprensa denuncia aqueles que querem transformar as medidas emergenciais de compra de grãos,
de caráter temporário, em uma linha permanente de nossa política e que assim põem em risco o
vínculo com os camponeses. Isso é muito bom. Mas é mau e errado se, ao mesmo tempo, a nossa
imprensa deixa de prestar atenção suficiente e expor adequadamente aqueles que põem em perigo
o vínculo do outro lado, que sucumbem às forças elementais pequeno-burguesas, exigem um abran-
damento da luta contra os elementos capitalistas no campo e o estabelecimento de total liberdade de
comércio, o comércio não regulado pelo Estado, e, portanto, minar o vínculo com os camponeses
do outro lado. Isso é mau. Isso é unilateral. Acontece também que a imprensa denuncia aqueles
que, por exemplo, negam a possibilidade e a conveniência de melhorar as pequenas e médias propri-
edades camponesas individuais, que atualmente são a base da agricultura. Isso é muito bom. Mas é
ruim e errado se, ao mesmo, tempo a imprensa não expõe aqueles que menosprezam a importância
das fazendas coletivas e das fazendas estatais e que não conseguem ver que a tarefa de melhorar as
fazendas individuais de pequenos e médios camponeses deve ser complementada na prática, pela
tarefa de ampliar a construção de fazendas coletivas e estatais. Isso é unilateral. Para garantir que
a linha correta seja perseguida, a luta deve ser travada em duas frentes, e toda unilateralidade deve
ser rejeitada (J. Stalin).
J. V. Stalin 411

kulak e confiar firmemente apenas no camponês pobre”.


É por isso que penso que este slogan é o slogan mais oportuno e abrangente,
que deve ser posto em primeiro plano neste momento, precisamente nas atuais
condições do nosso trabalho no campo.
O senhor considera o slogan de Lenin um slogan “oposicionista”, e em sua
carta pergunta: “Como é que este slogan oposicionista foi impresso no Pravda
em 1º de maio de 1928? como se explica o fato de que esse slogan apareceu
nas páginas do Pravda, o órgão do Comitê Central do PCUS? trata-se apenas de
um esquecimento técnico ou é um compromisso com a oposição na questão do
camponês médio?”
Isso é colocado de forma muito forte – não há como negar! Mas “cuidado
onde pisa”, camarada S; caso contrário, podeis, no vosso zelo, chegar à conclu-
são de que devemos proibir a impressão do nosso programa, o que confirma
plenamente o slogan de Lenin (isto é um fato!), e que no essencial foi redigido
por Lenin (que certamente não foi um oposicionista!), e que foi aprovado pelo
Oitavo Congresso do Partido (também não oposicionista!). Tenha mais respeito
pelos pontos conhecidos do nosso programa sobre os grupos sociais no campo!
Tenha mais respeito pelas decisões do Oitavo Congresso do Partido sobre o cam-
pesinato médio!
Quanto à sua frase “um compromisso com a oposição na questão do camponês
médio”, não acho que valha a pena refutá-la; sem dúvida você escreveu no calor
do momento.
Você parece estar incomodado com o fato de que tanto o slogan de Lenin,
quanto o Programa do PCUS (B) adotado pelo Oitavo Congresso do Partido, fa-
lam de acordo com o camponês médio, enquanto em seu discurso de abertura
do Oitavo Congresso Lenin falou de uma aliança estável com o camponês mé-
dio. Evidentemente, você acha que há algo semelhante a uma contradição nisso.
Talvez, você até esteja inclinado a acreditar que a política de acordo com o cam-
ponês médio é algo como um afastamento da política de aliança com o camponês
médio. Isso está errado, camarada S. Isso é um sério equívoco. Só pode pensar
assim quem consegue ler a mensagem de um slogan, mas não consegue captar o
seu significado. Só quem desconhece a história da palavra de ordem da aliança,
do acordo com o camponês médio, pode pensar assim. Só podem pensar assim,
aqueles que são capazes de acreditar que Lenin, que em seu discurso de abertura
no Oitavo Congresso, falou sobre a política de uma “aliança estável” com o cam-
ponês médio, se afastou de sua própria posição ao dizer em outro discurso no
mesmo congresso, e no programa do Partido aprovado pelo Oitavo Congresso,
que agora precisamos de uma política de “acordo” com o camponês médio.
Qual é o ponto então? A questão é que Lenin e o Partido, na forma do Oitavo
Congresso, não fazem distinção alguma entre o conceito de “acordo” e o conceito
de “aliança”. A questão é que por toda parte, em todos os seus discursos no
Oitavo Congresso, Lenin dá um sinal de igualdade entre o conceito de “aliança”
e o conceito de “acordo”. O mesmo deve ser dito sobre a resolução do Oitavo
Congresso, “A atitude para com o campesinato médio”, em que um sinal de igualdade
é colocado entre o conceito de “acordo” e o conceito de “aliança”. E, uma vez
que Lenin e o Partido consideram a política de acordo com o camponês médio
412 Obras Escolhidas

não como uma política casual e transitória, mas como uma política de longo
prazo, eles tinham, e têm, todos os motivos para chamar a política de acordo com
o camponês médio de uma política de aliança estável com ele e, inversamente,
chamar a política de aliança estável com o camponês médio de política de acordo
com ele. Basta ler o relato integral do Oitavo Congresso do Partido e a resolução
desse congresso sobre o camponês médio para se convencer disso. Aqui está um
trecho do discurso de Lenin no Oitavo Congresso:
“Devido à inexperiência dos funcionários soviéticos e às dificuldades do problema, os golpes
que eram dirigidos aos kulaks caíram com muita frequência sobre o campesinato médio. Aqui
pecamos excessivamente. A experiência que adquirimos a esse respeito nos permitirá fazer
de tudo para evitar que isso aconteça no futuro. Essa é a tarefa que agora enfrentamos,
não teoricamente, mas praticamente. Você sabe muito bem que essa tarefa é difícil. Não
temos vantagens materiais para oferecer ao camponês médio; e ele é um materialista, um
homem prático que exige vantagens materiais definidas, que não estamos agora em posição
de oferecer e das quais o país terá de prescindir, talvez, por vários meses ainda de luta severa –
uma luta que agora promete terminar em vitória completa. Mas há muito que podemos fazer
em nosso trabalho administrativo: podemos melhorar nosso aparato administrativo e corrigir
uma série de abusos. A linha do nosso Partido, que não tem feito o suficiente para chegar
a um bloco, uma aliança, um acordo com o campesinato médio, pode e deve ser endireitado e
corrigido” (Oitavo Congresso do PC Russo (B), relatório integral, p. 20).

Como você vê, Lenin não faz distinção entre “acordo” e “aliança”.
E aqui estão alguns trechos da resolução do Oitavo Congresso, “A atitude para
com o campesinato médio”:
“Confundir os camponeses médios com os kulaks, estender a eles, em qualquer grau, as me-
didas que são dirigidas contra os kulaks, significa violar grosseiramente, não apenas todos os
decretos soviéticos e toda a política soviética, mas também todos os princípios fundamentais
do comunismo, que apontam para o acordo entre o proletariado e o campesinato médio du-
rante o período de luta decidida do proletariado pela derrubada da burguesia, como uma
das condições para a transição indolor para a abolição de todas as formas de exploração.
O campesinato médio, que possui raízes econômicas relativamente fortes devido ao atraso
da técnica agrícola, em comparação com a técnica industrial, mesmo nos países capitalistas
avançados, sem falar na Rússia, continuará a existir por um tempo bastante longo após o
início da revolução do proletariado. É por isso que a tática dos funcionários soviéticos no
campo, bem como dos trabalhadores ativos do Partido, deve basear-se no pressuposto de um
longo período de colaboração com o campesinato médio. Uma política absolutamente cor-
reta seguida pelo governo soviético no campo garante, assim, a aliança e o acordo entre o
proletariado vitorioso e o campesinato médio. A política do governo operário e camponês e
do Partido Comunista deve continuar a ser conduzida neste espírito de acordo entre o pro-
letariado, juntamente com o campesinato pobre e o campesinato médio” (Oitavo Congresso
do PC Russo (B), relatório integral, pp. 370-72).

Como você vê, a resolução também não faz distinção entre “acordo” e “ali-
ança”.
Não será supérfluo observar que não há uma única palavra nesta resolução
do Oitavo Congresso sobre uma “aliança estável” com o camponês médio. Isso
significa, porém, que a resolução, portanto, se afasta da política de uma “aliança
estável” com o camponês médio? Não, não significa. Significa apenas que a reso-
lução coloca um sinal de igualdade entre o conceito de “acordo”, “colaboração”
e o conceito de “aliança estável”. Pois é claro: não pode haver uma “aliança”
com o camponês médio sem um “acordo” com ele, e a aliança com o camponês
médio não pode ser “estável” a menos que haja “um longo período” de acordo e
colaboração com ele.
J. V. Stalin 413

Esses são os fatos.


Um ou outro: ou Lenin e o Oitavo Congresso do Partido se afastaram da
declaração de Lenin sobre uma “aliança estável” com o camponês médio, ou essa
suposição frívola deve ser abandonada e deve-se admitir que Lenin e o Oitavo
Congresso do Partido não fez qualquer distinção entre os conceitos.
Assim, quem se recusa a ser vítima do pedantismo ocioso, quem deseja apre-
ender o verdadeiro sentido da palavra de ordem de Lenin, que fala de confiar no
campesinato pobre, de acordo com o campesinato médio e de lutar contra os ku-
laks, não pode deixar de compreender que a política de acordo com o camponês
médio é uma política de aliança estável com ele.
Seu erro é que você não entendeu o truque fraudulento da oposição, e caiu
como vítima de sua provocação; você caiu na armadilha que o inimigo preparou
para você. Os vigaristas oposicionistas nos asseguram ruidosamente que são a
favor da palavra de ordem de Lenin de acordo com o camponês médio, mas,
ao mesmo tempo, deixam cair a insinuação provocadora de que “acordo” com o
camponês médio é uma coisa, e uma “aliança estável” com ele é algo diferente.
Querem, assim, matar dois coelhos com uma cajadada só: em primeiro lugar,
para ocultar a sua verdadeira atitude para com o campesinato médio, que não é
de acordo com o camponês médio, mas de “dissensão com o camponês médio”
(ver bem conhecido discurso do oposicionista Smirnov, que citei na Décima Sexta
Conferência do Partido Gubernia247 em Moscou ); e, em segundo lugar, pegar
os simplórios entre os bolcheviques com a alegada diferença entre “acordo” e
“aliança”, e confundi-los completamente, afastando-os de Lenin.
E como alguns de nossos camaradas reagem a isso? Em vez de arrancar a más-
cara dos malandros oposicionistas, em vez de condená-los por enganar o Partido
sobre sua verdadeira posição, eles engolem a isca, caem na armadilha e se dei-
xam afastar de Lenin. A oposição está fazendo muito barulho sobre o slogan de
Lenin; os oposicionistas se fazem passar por adeptos do slogan de Lenin; por-
tanto, devo dissociar-me deste slogan, caso contrário posso ser confundido com
a oposição, caso contrário posso ser acusado de “transigir com a oposição” – tal
é a lógica destes camaradas!
E este não é o único exemplo dos truques fraudulentos da oposição. Consi-
dere, por exemplo, o slogan da autocrítica. Os bolcheviques não podem deixar
de saber que a palavra de ordem da autocrítica é uma das bases da atividade do
nosso Partido: é um meio de fortalecer a ditadura do proletariado, a alma do
método bolchevique de formação de quadros. A oposição faz muito barulho,
afirmando que ela, a oposição, inventou o slogan da autocrítica, que o Partido
lhe roubou esse slogan e, assim, capitulou perante a oposição. Agindo desta
forma, a oposição está tentando obter pelo menos dois fins: em primeiro lugar,
enganar a classe operária e esconder dela que um abismo separa a “autocrítica”
da oposição, cujo objetivo é destruir o espírito do Partido, da autocrítica bolche-
vique, cujo objetivo é fortalecer o espírito partidário; em segundo lugar, apanhar
certos elementos simplórios e induzi-los a se dissociarem da palavra de ordem do
partido da autocrítica.

247A Décima Sexta Conferência Gubernia de Moscou do PCUS (B) foi realizada de 20 a 28 de novem-
bro de 1927. Na sessão da manhã de 23 de novembro, Stalin falou sobre “O Partido e a Oposição”.
414 Obras Escolhidas

E como alguns de nossos camaradas reagem a isso? Em vez de arrancar a


máscara dos malandros oposicionistas e defender o slogan da autocrítica bolche-
vique, eles caem na armadilha, se dissociam do slogan da autocrítica, dançam ao
som da oposição e se aliam com a mesma, na crença equivocada de que estão, na
verdade, se dissociando da oposição.
Muitos desses exemplos poderiam ser citados, mas em nosso trabalho não po-
demos dançar ao som de ninguém. Ainda menos podemos ser guiados em nosso
trabalho pelo que os oposicionistas dizem sobre nós. Devemos seguir o nosso
próprio caminho, pondo de lado os truques fraudulentos da oposição e os erros
de alguns dos nossos bolcheviques que são vítimas da provocação dos oposicio-
nistas. Lembre-se das palavras citadas por Marx: “Siga seu próprio caminho e
deixe as pessoas falarem!”.248
J. Stalin Pravda, nº 152.
3 de julho de 1928

248 Essas palavras da “Divina Comédia” de Dante Alighieri foram citadas por Marx como um lema no
prefácio da primeira edição alemã de “O Capital” (ver K. Marx e F. Engels, Obras Escolhidas, Vol.
I, Moscou, 1951, p. 410)
J. V. Stalin 415

Contra a vulgarização do slogan


da autocrítica
26 de junho de 1928

O slogan da autocrítica não deve ser considerado algo temporário e passa-


geiro. A autocrítica é um método específico, um método bolchevique, de treinar
as forças do Partido e da classe trabalhadora em geral no espírito do desenvol-
vimento revolucionário. O próprio Marx falou da autocrítica como um método
de fortalecer a revolução proletária249 . Quanto à autocrítica em nosso Partido,
seus primórdios remontam ao aparecimento do bolchevismo em nosso país, ao
seu próprio início como uma tendência revolucionária específica no movimento
operário.
Sabemos que, já na primavera de 1904, quando o bolchevismo ainda não era
um partido político independente, mas trabalhava junto com os mencheviques
dentro de um único partido social-democrata, sabemos que Lenin já pedia ao
partido que fizesse “autocrítica e exposição implacável de suas próprias defici-
ências”. Aqui está o que Lenin escreveu em seu panfleto “Um passo à frente, dois
passos atrás”:
Eles (ou seja, os oponentes dos marxistas – J. Stalin) se gabam e nos caçoam por nossas contro-
vérsias; e, é claro, tentarão pegar passagens isoladas de meu panfleto, que trata dos defeitos e
deficiências de nosso Partido, e usá-los para seus próprios fins. Os sociais-democratas russos
já estão suficientemente preparados na batalha para não se perturbarem com essas alfinetadas
e para continuar, apesar delas, seu trabalho de autocrítica e exposição implacável por conta própria
deficiências, que serão inquestionavelmente e inevitavelmente superadas com o crescimento
do movimento operário. Quanto a esses senhores, nossos adversários, que tentem nos dar
um panorama da verdadeira situação em seus próprios “partidos”, mesmo que remotamente
se aproxime disso pelas atas de nosso Segundo Congresso! (Vol. VI, p. 161)

Portanto, estão absolutamente errados aqueles camaradas que pensam que


a autocrítica é um fenômeno passageiro, uma moda que está fadada a desapa-
recer rapidamente como toda moda costuma fazer. Na verdade, a autocrítica
é uma arma indispensável e permanente no arsenal do bolchevismo, que está
intimamente ligada à própria natureza do bolchevismo, com seu espírito revolu-
cionário.
Costuma-se dizer que a autocrítica é algo bom para um partido que ainda não
chegou ao poder e “não tem nada a perder”, mas que é perigosa e prejudicial
para um partido que já chegou ao poder, que é cercado por forças hostis, e contra
o qual uma exposição de suas fraquezas pode ser explorada por seus inimigos.
Isso não é verdade. É totalmente falso! Pelo contrário, só porque o bolche-
vismo chegou ao poder, só porque os bolcheviques podem ficar presunçosos de-
vido ao sucesso de nossa obra de construção, só porque os bolcheviques podem
deixar de observar suas fraquezas e, assim, tornar as coisas mais fáceis para seus
inimigos – por essas mesmas razões a autocrítica é particularmente necessária
agora, após a tomada do poder.
249 MARX, Karl. O 18 de brumário de Luís Bonaparte. São Paulo: Boitempo, 2011 (N.T.)
416 Obras Escolhidas

Com o propósito da autocrítica de revelar e eliminar nossos erros e fraquezas,


não é claro que, nas condições da ditadura do proletariado, ela só pode facilitar
a luta do bolchevismo contra os inimigos da classe trabalhadora? Lenin levou
em consideração essas características específicas da situação surgida depois que
os bolcheviques tomaram o poder, quando, em abril-maio de 1920, escreveu em
seu panfleto “Esquerdismo, Doença Infantil do Comunismo” :
A atitude de um partido político para com seus próprios erros é uma das formas mais im-
portantes e mais seguras de julgar a seriedade do partido e como ele na prática cumpre suas
obrigações para com sua classe e as massas trabalhadoras. Admitindo francamente um erro, averi-
guando as razões para isso, analisando as circunstâncias que lhe deram origem, e discutindo
minuciosamente os meios de corrigi-lo – essa é a marca de uma parte séria; essa é a forma
como deve cumprir suas funções, é a forma como deve educar e treinar a classe e depois as
massas. (Vol. XXV, p. 200).

Lenin estava mil vezes certo quando disse no Décimo Primeiro Congresso do
Partido em março de 1922:
O proletariado não teme admitir que esta ou aquela coisa teve um êxito esplêndido na sua
revolução, e isto ou aquilo não o teve. Todos os partidos revolucionários que até agora pere-
ceram, o fizeram porque se tornaram vaidosos, não conseguiram ver onde estava a sua força,
e temiam falar de suas fraquezas. Mas não pereceremos, pois não temos medo de falar de nossas
fraquezas e aprenderemos a superá-las. (Vol. XXVII, pp. 260-61).

Há apenas uma conclusão: sem autocrítica, não pode haver educação ade-
quada do Partido, da classe e das massas; e que sem a educação adequada do
Partido, da classe e das massas, não pode haver bolchevismo.
Por que o slogan da autocrítica adquiriu especial importância agora, neste
momento particular da história, em 1928?
Porque a crescente acuidade das relações de classe, tanto nas esfera interna
como externa, é mais evidente, agora, do que há um ou dois anos. Porque as
atividades subversivas dos inimigos de classe do governo soviético, que estão uti-
lizando nossas fraquezas, nossos erros, contra a classe trabalhadora de nosso país,
são mais evidentes agora do que eram há um ou dois anos.
Porque não podemos e não devemos permitir que as lições do caso Shakhty
e as “manobras de aquisição” dos elementos capitalistas no campo, juntamente
com nossos erros de planejamento, passem despercebidos. Se quisermos forta-
lecer a revolução e enfrentar nossos inimigos plenamente preparados, devemos
nos livrar o mais rápido possível de nossos erros e fraquezas, como revelou o caso
Shakhty e as dificuldades de colheita de grãos.
Se não quisermos ser apanhados por todo tipo de “surpresas” e “acidentes”,
para alegria dos inimigos da classe trabalhadora, devemos revelar o mais rápido
possível as nossas fraquezas e erros que ainda não foram divulgados, mas que
indubitavelmente existem.
Se demorarmos nisso, estaremos facilitando o trabalho de nossos inimigos e
agravando nossas fraquezas e erros. Mas tudo isso será impossível se a autocrítica
não for desenvolvida e estimulada, se as vastas massas da classe trabalhadora e
do campesinato não forem levadas ao trabalho de trazer à luz e eliminar nossas
fraquezas e erros.
A plenária de abril do CC e CCC estava, portanto, bastante certa quando
disse em sua resolução sobre o caso Shakhty: “A principal condição para o bom
J. V. Stalin 417

cumprimento de todas as medidas indicadas é a efetiva implementação da palavra


de ordem da autocrítica emitida pelo Décimo Quinto Congresso”.
Mas, para desenvolver a autocrítica, devemos primeiro superar uma série de
obstáculos que se colocam no caminho do Partido. Isso inclui o atraso cultu-
ral das massas, as forças culturais inadequadas da vanguarda proletária, nosso
conservadorismo, nossa “vanglória comunista” e assim por diante. Mas um dos
obstáculos mais sérios, senão o mais sério de todos, é a burocracia do nosso apare-
lho. Refiro-me aos elementos burocráticos que podem ser encontrados em nosso
Partido, governo, sindicatos, cooperativas e todas as outras organizações. Refiro-
me aos elementos burocráticos que atacam nossas fraquezas e erros, que temem
como uma praga toda crítica das massas, todo controle das massas, e que nos im-
pedem de desenvolver a autocrítica e nos livrarmos de nossas fraquezas e erros.
A burocracia em nossas organizações não deve ser vista apenas como rotina. A
burocracia é uma manifestação da influência burguesa em nossas organizações.
Lenin estava certo quando disse:

Devemos compreender que a luta contra a burocracia é absolutamente essencial, e tão com-
plicada quanto a luta contra as forças elementais pequeno-burguesas. A burocracia em nosso
sistema de Estado tornou-se uma doença de tal gravidade que é falado no programa do nosso
Partido, e isso porque está conectado com essas forças elementais pequeno-burguesas e sua
ampla dispersão. (Vol. XXVI, p. 220).

Com toda a persistência, portanto, deve ser travada a luta contra a burocracia
em nossas organizações, se realmente queremos desenvolver a autocrítica e nos
livrar das mazelas em nosso trabalho construtivo. Com persistência ainda maior,
devemos despertar as grandes massas de trabalhadores e camponeses para a ta-
refa da crítica de baixo, do controle de baixo, como o principal antídoto para a
burocracia.
Lenin estava certo quando disse: “Se quisermos combater a burocracia, de-
vemos contar com a cooperação da base. Que outra maneira há de acabar com a
burocracia do que alistando a cooperação dos trabalhadores e camponeses!” (Vol. XXV,
pp. 496 e 495.)
Mas, para “conseguir a cooperação” das vastas massas, devemos desenvolver a
democracia proletária em todas as organizações de massas da classe trabalhadora,
e principalmente dentro do próprio Partido. Caso contrário, a autocrítica não
será nada, uma coisa vazia, uma mera palavra. Não é qualquer tipo de autocrítica
que precisamos. Precisamos de uma autocrítica que eleve o nível cultural da classe
trabalhadora, aprimore seu espírito de luta, fortaleça sua fé na vitória, aumente
sua força e a ajude a se tornar o verdadeiro senhor do país.
Alguns dizem que, uma vez que haja autocrítica, não precisamos de disciplina
de trabalho, podemos deixar de trabalhar e nos entregar a tagarelice de tudo.
Isso não seria autocrítica, mas um insulto à classe trabalhadora. A autocrítica é
necessária não para quebrar a disciplina do trabalho, mas para fortalecê-la, para
que a disciplina do trabalho se torne uma disciplina consciente, capaz de resistir
à negligência pequeno-burguesa.
Outros dizem que, uma vez que haja autocrítica, não precisamos mais de lide-
rança, podemos abandonar o leme e deixar as coisas “seguirem seu curso natu-
ral”. Isso não seria autocrítica, mas uma desgraça. A autocrítica é necessária não
418 Obras Escolhidas

para relaxar a liderança, mas para fortalecê-la, a fim de convertê-la de uma lide-
rança no papel e com pouca autoridade em uma liderança vigorosa e realmente
autoritária.
Mas há outro tipo de “autocrítica”, que tende a destruir o espírito do Partido,
a desacreditar o regime soviético, a enfraquecer nosso trabalho de construção,
a corromper nossos quadros econômicos, a desarmar a classe trabalhadora e a
fomentar o diálogo de degeneração. Foi exatamente esse tipo de “autocrítica”
que a oposição de Trotsky estava insistindo conosco recentemente. Nem é preciso
dizer que o Partido nada tem em comum com essa “autocrítica”. Nem é preciso
dizer que o Partido combaterá essa “autocrítica” com força e direção.
Deve-se fazer uma distinção estrita entre esta “autocrítica”, que nos é alheia,
destrutiva e antibolchevique, e a nossa autocrítica bolchevique, cujo objetivo é
promover o espírito do Partido, para consolidar o regime soviético, para melho-
rar nosso trabalho construtivo, para fortalecer nossos quadros econômicos, para
armar a classe trabalhadora.
Nossa campanha para intensificar a autocrítica começou há apenas alguns
meses. Ainda não temos os dados necessários para uma revisão dos primeiros
resultados da campanha. Mas já se pode dizer que a campanha começa a dar
frutos benéficos.
Não se pode negar que a onda de autocrítica está começando a aumentar
e se espalhar, estendendo-se a setores cada vez maiores da classe trabalhadora e
atraindo-os para o trabalho de construção socialista. Isso é confirmado, pelo me-
nos, por fatos, como o renascimento das conferências de produção e as comissões
de controle temporário.
É verdade que ainda há tentativas de sabotar recomendações bem fundamen-
tadas e verificadas das conferências de produção e comissões de controle tempo-
rário. Tais tentativas devem ser combatidas com a maior determinação, pois seu
propósito é desencorajar os trabalhadores da autocrítica. Mas, quase não há ra-
zão para duvidar de que tais tentativas burocráticas serão varridas completamente
pela crescente onda de autocrítica.
Também não se pode negar que, como resultado da autocrítica, nossos execu-
tivos estão começando a ficar mais espertos, a se tornar mais vigilantes, a abordar
questões de liderança econômica com mais seriedade, enquanto nosso Partido,
soviético, sindical e todos os outros o pessoal está se tornando mais sensível e
responsivo aos requisitos das massas.
É verdade que não se pode dizer que a democracia interna do Partido e a
democracia operária em geral já estejam plenamente estabelecidas nas organi-
zações de massa da classe operária. Mas não há razão para duvidar de que mais
avanços serão feitos neste campo à medida que a campanha se desenrolar.
Também não se pode negar que, como resultado da autocrítica, nossa im-
prensa se tornou mais viva e vigorosa, enquanto destacamentos de nossos traba-
lhadores da imprensa, como organizações de correspondentes de trabalhadores
e aldeias, já estão se tornando uma força política de peso.
É verdade que nossa imprensa, às vezes, continua patinando na superfície;
ainda não aprendeu a passar dos comentários críticos individuais para a crítica
mais profunda, e da crítica profunda para tirar conclusões gerais dos resultados
J. V. Stalin 419

da crítica, e tornar claro quais realizações foram alcançadas em nosso trabalho


construtivo como resultado da crítica. Mas não se pode duvidar de que avanços
serão feitos neste campo, à medida que a campanha prossegue.
Porém, junto com esses aspectos positivos de nossa campanha, é necessário
observar alguns aspectos negativos. Refiro-me àquelas distorções da palavra de
ordem da autocrítica, que já estão ocorrendo no início da campanha e que, se
não forem corrigidas de uma vez, podem dar lugar ao perigo de a autocrítica ser
vulgarizada.
1) Deve-se observar, em primeiro lugar, que vários jornais estão traindo a
tendência de transplantar a campanha do campo das críticas empresariais às de-
ficiências de nossa construção socialista para o campo dos protestos ostensivos
contra os excessos da vida privada. Isso pode parecer incrível. Mas, infelizmente,
é um fato.
Ver o jornal Vlast Truda, por exemplo, órgão do Comitê do Partido Irkutsk
Okrug e do Comitê Executivo Soviético do Okrug (nº 128). Lá você encontrará
uma página inteira, salpicada de “slogans” ostentosos, como: “Promiscuidade
sexual – um vício burguês”; “Uma taça leva a outra”; “Chamadas de casa própria
para vacas”; “Bandidos de cama de casal”; “Um tiro que saiu pela culatra”, e
assim por diante. O que pode haver em comum, você pode se perguntar, entre
esses gritos “críticos”, dignos de Birzhovka250 , e a autocrítica bolchevique, cujo
objetivo é melhorar nossa construção socialista? É bem possível que o autor dessas
peças ostentosas seja um comunista. É possível que ele esteja ardendo de ódio
pelos “inimigos de classe” do regime soviético. Mas, que ele está se desviando do
caminho certo, que está vulgarizando a palavra de ordem da autocrítica, e que
sua voz não é a de nossa classe, disso não pode haver dúvida.
2) Ressalte-se, ainda, que mesmo os órgãos de imprensa que, de modo geral,
não são destituídos da capacidade de criticar corretamente, às vezes se inclinam
a criticar pela crítica, transformando a crítica em esporte, em sensacionalismo.
Ver o Komsomolskaya Pravda, por exemplo. Todos conhecem os serviços prestados
pelo Komsomolskaya Pravda no estímulo à autocrítica. Mas, pegue as últimas edi-
ções deste documento e veja suas “críticas” aos líderes do Conselho Central de
Sindicatos de Todos os Sindicatos – toda uma série de caricaturas inadmissíveis
sobre o assunto. Quem, pergunta-se, precisa de “crítica” desse tipo, e que efeito
ela pode ter, exceto desacreditar o slogan da autocrítica? Qual é a utilidade de
tal “crítica”, vista, é claro, do ponto de vista dos interesses de nossa construção
socialista, e não da promoção de sensações baratas, destinadas a dar ao filisteu
algo para rir? Claro, todas as formas de armas são necessárias para a autocrí-
tica, incluindo a “cavalaria leve”. Mas isso significa que a cavalaria leve deve ser
transformada em cavalaria leviana?
3) Deve-se observar, por fim, que existe uma tendência definida por parte
de várias de nossas organizações, de transformar a crítica em uma caça às bruxas
contra nossos executivos, em uma tentativa de desacreditá-los aos olhos dos classe
operária. É um fato que, certas organizações locais na Ucrânia e na Rússia Cen-

250Birzhovka foi um jornal burguês fundado em São Petersburgo em 1880. Sua falta de escrúpulos e
venalidade tornaram seu nome um palavrão. No final de outubro de 1917, foi fechado pelo Comitê
Militar Revolucionário do Soviete de Petrogrado.
420 Obras Escolhidas

tral, começaram uma caça às bruxas regular contra alguns de nossos melhores
executivos, cuja única falha é que eles não são 100% imunes a erros. De que ou-
tra forma devemos entender as decisões das organizações locais de destituir esses
executivos de seus cargos, decisões que não têm qualquer força vinculante e que
obviamente visam desacreditá-los? De que outra forma devemos entender o fato
de que esses executivos são criticados, mas não têm oportunidade de responder
às críticas? Quando começamos a passar por uma “corte de Shemyaka”251 como
autocrítica?
Claro, não podemos exigir que as críticas sejam 100% corretas. Se a crítica
vier de baixo, não devemos ignorá-la, mesmo que seja apenas 5% ou 10% correta.
Tudo isso é verdade. Mas isso significa que devemos exigir que os executivos se-
jam 100% imunes a erros? Existe alguém na criação que está 100% imune ao
erro? É tão difícil compreender que a formação dos nossos quadros econômi-
cos leva anos e anos, e que a nossa atitude para com eles deve ser de extrema
consideração e solicitude? É tão difícil entender que necessitamos de uma auto-
crítica não para uma caça às bruxas contra nossos quadros econômicos, mas para
melhorá-los e aperfeiçoá-los?
Critique as deficiências de nosso trabalho construtivo, mas não vulgarize o
slogan da autocrítica e não o transforme em um meio para exercícios ostentosos
sobre temas como “Bandidos de cama de casal”, “Um tiro que saiu pela culatra”
e assim por diante.
Critique as lacunas do nosso trabalho construtivo, mas não desacredite a pala-
vra de ordem da autocrítica e não a transforme em meio de engendrar sensações
baratas.
Critique as lacunas de nosso trabalho construtivo, mas não perverta o slogan
da autocrítica e não o transforme em uma arma de caça às bruxas contra nosso
negócio ou quaisquer outros executivos.
E o principal: não substitua a crítica de massa vinda de baixo com fogos de
artifício “críticos” de cima; deixemos que as massas da classe trabalhadora parti-
cipem e exibam sua iniciativa criativa em corrigir nossas deficiências e melhorar
nosso trabalho construtivo.
J. Stalin
Pravda, nº 146.
26 de junho de 1928

251 Stalin, aqui, se refere à expressão “Tribunal de Shemyaka”, ou seja, um tribunal injusto. A
expressão é proveniente de uma antiga história russa sobre um juiz chamado Shemyaka (N.T.)
J. V. Stalin 421

Industrialização do país e o desvio


à direita no PCUS (B)
24 de novembro de 1928

Discurso proferido na plenária do PCUS (B)252

Tratarei, camaradas, de três questões principais suscitadas nas teses do Bureau


Político.
Em primeiro lugar, a industrialização do país e o fato de o fator chave da
industrialização ser o desenvolvimento da produção dos meios de produção, ga-
rantindo, ao mesmo tempo, a maior velocidade possível desse desenvolvimento.
Em seguida, o fato de a taxa de desenvolvimento de nossa agricultura ficar
extremamente aquém da taxa de desenvolvimento de nossa indústria, e, por isso,
a questão mais candente de nossa política interna hoje é a da agricultura, e prin-
cipalmente o problema dos grãos. A questão de como melhorar para reconstruir
a agricultura em uma nova base técnica.
E, em terceiro e último lugar, os desvios da linha do Partido, a luta em duas
frentes, e o fato de que nosso maior perigo no momento atual é o perigo da
direita, o desvio à direita.

I. A taxa de desenvolvimento da indústria


Nossas teses partem da premissa de que o rápido desenvolvimento da indús-
tria em geral, e da produção dos meios de produção em particular, é o princípio
subjacente e a chave da industrialização do país. É o seu princípio básico, e a
chave para a transformação de toda a nossa economia nacional nas linhas do
desenvolvimento socialista.
Mas o que envolve uma rápida taxa de desenvolvimento da indústria? En-
volve o máximo de investimento de capital na indústria. E isso leva a um estado
de tensão em todos os nossos planos, orçamentais e não orçamentais. E, de fato,
o traço característico de nossos números de controle nos últimos três anos, no pe-
ríodo de reconstrução, é que eles foram compilados e executados em alta tensão.
Pegue nossos números de controle, examine nossas estimativas de orçamento,
converse com nossos camaradas do Partido – tanto aqueles que trabalham nas
252 A plenária do Comitê Central do PCUS (B), juntamente com os membros da Comissão Central
de Controle e da Comissão Central de Auditoria, foi realizada de 16 a 24 de novembro de 1928.
Examinou os números de controle da economia nacional para 1928-29, e também as seguintes
questões: os primeiros resultados e o uso mais amplo da jornada de trabalho de sete horas; o re-
crutamento de trabalhadores para o Partido e a regulamentação do crescimento do Partido; um
relatório do Comitê Territorial do Cáucaso do Norte do PCUS (B) sobre o trabalho no campo;
e medidas para o progresso da agricultura. O discurso de J. V. Stalin foi proferido em 19 de no-
vembro em conexão com o primeiro item da agenda. Em 20 de novembro, Stalin foi eleito para a
comissão criada pela plenária para redigir a resolução sobre os números de controle da economia
nacional para 1928-1929.
422 Obras Escolhidas

organizações do Partido quanto aqueles que dirigem nossos assuntos soviéticos,


econômicos e cooperativos. Você invariavelmente encontrará este único aspecto
característico em todos os lugares, a saber, o estado de tensão em nossos planos.
Surge a pergunta: esse estado de tensão em nossos planos é realmente necessário
para nós? Não podemos viver sem ele? Não é possível conduzir o trabalho em um
ritmo mais lento, em um ambiente mais “repousante”? Não é o ritmo acelerado
de desenvolvimento industrial que temos adotado devido ao caráter inquieto dos
membros do Bureau Político e do Conselho dos Comissários do Povo?
Claro que não! Os membros do Bureau Político e do Conselho dos Comis-
sários do Povo são pessoas calmas e sóbrias. Ou seja, abstratamente falando,
se desconsiderássemos a situação externa e interna, poderíamos, naturalmente,
conduzir o trabalho em uma velocidade mais lenta. Mas a questão é que, em
primeiro lugar, não podemos desconsiderar a situação externa e interna, e, em
segundo lugar, se tomarmos a situação circundante como nosso ponto de par-
tida, devemos admitir que é precisamente esta situação que dita uma taxa rápida
de desenvolvimento da nossa indústria.
Permitam-me que passe a um exame desta situação, destas condições de uma
ordem externa e interna que ditam um ritmo acelerado de desenvolvimento in-
dustrial.
Condições externas. Assumimos o poder em um país cujo aparato técnico é
terrivelmente atrasado. Junto com algumas grandes unidades industriais mais ou
menos baseadas em tecnologia moderna, temos centenas e milhares de moinhos
e fábricas cujo equipamento técnico está sob qualquer crítica do ponto de vista
das conquistas modernas. Ao mesmo tempo, temos à nossa volta vários países
capitalistas cuja técnica industrial é muito mais desenvolvida e atualizada do que
a do nosso país. Olhe para os países capitalistas e você verá que sua tecnologia
não está apenas avançando, mas avançando aos trancos e barrancos, superando
as velhas formas de técnica industrial. E assim descobrimos que, por um lado,
nós em nosso país temos o sistema mais avançado, o sistema soviético, e o tipo de
poder estatal mais avançado do mundo, o poder soviético, enquanto, por outro
lado, nossa indústria, que deveria ser a base do socialismo e do poder soviético, é
extremamente atrasada tecnicamente. Você acha que podemos alcançar a vitória
final do socialismo em nosso país enquanto essa contradição existir?
O que deve ser feito para acabar com essa contradição? Para acabar com isso,
devemos ultrapassar e superar a tecnologia avançada dos países capitalistas de-
senvolvidos. Nós já ultrapassamos e superamos os países capitalistas avançados no
sentido de estabelecer um novo sistema político, o sistema soviético. Isso é bom.
Mas não é suficiente. Para garantir a vitória final do socialismo em nosso país,
devemos também ultrapassar e superar esses países técnica e economicamente.
Ou fazemos isso ou seremos forçados a ficar contra a parede.
Isso se aplica não apenas à construção do socialismo. Aplica-se também à
defesa da independência de nosso país nas circunstâncias do cerco capitalista. A
independência de nosso país não pode ser mantida a menos que tenhamos uma
base industrial adequada para a defesa. E essa base industrial não pode ser criada
se a nossa indústria não for mais desenvolvida tecnicamente.
É por isso que um ritmo rápido de desenvolvimento de nossa indústria é ne-
J. V. Stalin 423

cessário e imperativo.
O atraso técnico e econômico de nosso país não foi inventado por nós. Esse
atraso é antigo e nos foi legado por toda a história do nosso país. Esse atraso
foi considerado um mal tanto antes da revolução, quanto mais tarde, depois da
revolução. Quando Pedro, o Grande, tendo que lidar com os países mais desen-
volvidos do Ocidente, construiu febrilmente moinhos e fábricas para abastecer o
exército e fortalecer as defesas do país, isso foi, em seu caminho, uma tentativa de
escapar das garras desse atraso. É perfeitamente compreensível, porém, que ne-
nhuma das velhas classes, nem a aristocracia feudal, nem a burguesia, pudessem
resolver o problema de acabar com o atraso de nosso país. Mais do que isso, essas
classes não só foram incapazes de resolver esse problema, como também não con-
seguiram formular a tarefa de forma satisfatória. O antigo atraso de nosso país
só pode acabar nas linhas de uma construção socialista bem-sucedida. E só pode
acabar com a tarefa nas mãos do proletariado, que estabeleceu a sua ditadura e
dirige o país.
Seria tolice nos consolarmos com a ideia de que, uma vez que o atraso de nosso
país não foi inventado por nós e nos foi legado por toda a história de nosso país,
não podemos ser, e não devemos ser, responsáveis por ele. Isso não é verdade, ca-
maradas. Uma vez que chegamos ao poder e assumimos a tarefa de transformar o
país com base no socialismo, somos responsáveis e devemos ser responsáveis por
tudo, tanto o mal como o bem. E só porque somos responsáveis por tudo, de-
vemos acabar com nosso atraso técnico e econômico. Devemos fazê-lo sem falha
se realmente quisermos ultrapassar e superar os países capitalistas avançados. E
só nós, bolcheviques, podemos fazer isso. Mas, precisamente para cumprir essa
tarefa, devemos sistematicamente atingir um ritmo rápido de desenvolvimento
de nossa indústria. E que já estamos atingindo um ritmo acelerado de desenvol-
vimento industrial, é agora claro para todos.
A questão de ultrapassar e superar os países capitalistas avançados técnica e
economicamente não é para nós, bolcheviques, uma questão nova, nem inespe-
rada. A situação foi criada em nosso país já em 1917, antes da Revolução de
Outubro. Foi levantada por Lenin já em setembro de 1917, na véspera da Re-
volução de Outubro, durante a guerra imperialista, em seu panfleto “A catástrofe
iminente e como combatê-la”. Aqui está o que Lenin disse sobre este assunto:
O resultado da revolução foi que o sistema político da Rússia alcançou, em poucos meses,
o nível dos países avançados. Mas isso não é suficiente. A guerra é inexorável; ela coloca a
alternativa com severidade implacável: ou perecer, ou ultrapassar e superar economicamente
os países avançados também. Perecer ou seguir em frente a todo vapor. Essa é a alternativa
com a qual a história nos confrontou. (Vol. 21, p. 191).

Você vê com que clareza Lenin colocou a questão de acabar com nosso atraso
técnico e econômico.
Lenin escreveu tudo isso às vésperas da Revolução de Outubro, no período
anterior à tomada do poder pelo proletariado, quando os bolcheviques ainda
não tinham poder estatal, nem indústria socializada, nem uma rede cooperativa
amplamente ramificada que abrangia milhões de camponeses, nem fazendas co-
letivas, nem fazendas estatais. Hoje, quando já temos algo substancial com o qual
acabar completamente com nosso atraso técnico e econômico, podemos parafra-
sear as palavras de Lenin mais ou menos assim: “Nós ultrapassamos e superamos
424 Obras Escolhidas

os países capitalistas avançados politicamente ao estabelecer a ditadura do prole-


tariado. Mas isso não é suficiente. Devemos utilizar a ditadura do proletariado,
nossa indústria socializada, transporte, sistema de crédito, etc., as cooperativas,
fazendas coletivas, fazendas estatais, etc., a fim de ultrapassar e superar econo-
micamente os países capitalistas avançados também”.
A questão de uma taxa rápida de desenvolvimento da indústria não nos afli-
giria tão agudamente como o faz agora se tivéssemos uma indústria altamente
desenvolvida e uma tecnologia tão desenvolvida como a Alemanha, digamos, e se
a importância relativa da indústria em todo o país a economia estivesse tão alta em
nosso país quanto na Alemanha, por exemplo. Se fosse esse o caso, poderíamos
desenvolver nossa indústria em um ritmo mais lento, sem temer ficar para trás
em relação aos países capitalistas e sabendo que poderíamos superá-los de um
só golpe. Mas então não deveríamos ser tão atrasados técnica e economicamente
como estamos agora. A questão toda é que estamos atrás da Alemanha nesse
aspecto e ainda estamos longe de tê-la ultrapassado técnica e economicamente.
A questão de um rápido desenvolvimento da indústria não nos afligiria de
forma tão aguda se não fôssemos o único país, mas um dos países da ditadura
do proletariado, se houvesse uma ditadura do proletariado não apenas em nosso
país, mas em outro, países mais avançados também, Alemanha e França, digamos.
Se fosse esse o caso, o cerco capitalista não poderia ser um perigo tão grave
como é agora, a questão da independência econômica de nosso país iria natu-
ralmente recuar para um segundo plano, poderíamos nos integrar no sistema de
Estados proletários mais desenvolvidos, deles poderíamos receber máquinas para
tornar mais produtiva a nossa indústria e agricultura, abastecendo-os por sua vez
com matérias-primas e produtos alimentares, e poderíamos, consequentemente,
expandir a nossa indústria a um ritmo mais lento. Mas, sabemos muito bem que
ainda não é o caso e que continuamos a ser o único país da ditadura do proleta-
riado, e estamos rodeados de países capitalistas, muitos dos quais estão muito à
frente de nós técnica e economicamente.
É por isso que Lenin levantou a questão de ultrapassar e superar os países
economicamente avançados como uma questão de vida ou morte para o nosso
desenvolvimento.
Essas são as condições externas que ditam um rápido ritmo de desenvolvi-
mento de nossa indústria.
Condições internas. Mas, além das condições externas, existem também as con-
dições internas que ditam um ritmo acelerado de desenvolvimento de nossa in-
dústria como base principal de toda a economia nacional. Refiro-me ao extremo
atraso da nossa agricultura, do seu nível técnico e cultural. Refiro-me à existência
em nosso país de uma preponderância avassaladora de pequenos produtores de
commodities, com sua produção dispersa e totalmente atrasada, em comparação
com a qual nossa grande indústria socialista é como uma ilha no meio do mar,
uma ilha cuja base está se expandindo a cada dia, mas que não deixa de ser uma
ilha no meio do mar.
Costumamos dizer que a indústria é o principal alicerce de toda a nossa eco-
nomia nacional, incluindo a agricultura, que é a chave para a reconstrução coleti-
vista de nosso atrasado e disperso sistema agrícola. Isso é perfeitamente verdade.
J. V. Stalin 425

Dessa posição, não devemos recuar um só momento. Mas é preciso lembrar tam-
bém que, enquanto a indústria é a base principal, a agricultura constitui a base
do desenvolvimento industrial, tanto como mercado que absorve os produtos da
indústria, quanto como fornecedor de matérias-primas e alimentos, bem como
fonte de exportar reservas essenciais para importar maquinários para as neces-
sidades de nossa economia nacional. Podemos avançar a indústria deixando a
agricultura em estado de completo atraso técnico, sem fornecer uma base agrícola
para a indústria, sem reconstruir a agricultura e elevá-la ao nível da indústria?
Não, nós não podemos.
Daí a tarefa de dotar a agricultura do máximo de instrumentos e meios de
produção indispensáveis para acelerar e promover sua reconstrução sobre novas
bases técnicas. Mas para o cumprimento desta tarefa é necessário um rápido
desenvolvimento da nossa indústria. Claro, a reconstrução de uma agricultura
desunida e dispersa é uma questão incomparavelmente mais difícil do que a re-
construção de uma indústria socialista unida e centralizada. Mas essa é a tarefa
que nos confronta e devemos cumpri-la. E isso não pode ser realizado exceto por
uma taxa rápida de desenvolvimento industrial.
Não podemos continuar indefinidamente, isto é, por um período muito longo,
baseando o regime soviético e a construção socialista em duas bases diferentes, a
base da indústria socialista mais ampla e unida e a base da mais dispersa e atra-
sada, pequena economia mercantil dos camponeses. Devemos gradualmente,
mas de forma sistemática e persistente, colocar nossa agricultura em uma nova
base técnica, a base da produção em larga escala, e elevá-la ao nível da indústria
socialista. Ou cumprimos essa tarefa – caso em que a vitória final do socialismo
em nosso país estará assegurada, ou nos afastamos dela e não a cumprimos –
nesse caso, um retorno ao capitalismo pode se tornar inevitável.
Aqui está o que Lenin disse sobre este assunto:

Enquanto vivermos em um pequeno país camponês, há uma base econômica mais segura para
o capitalismo na Rússia do que para o comunismo. Isso deve ser levado em consideração.
Qualquer pessoa que tenha observado cuidadosamente a vida no campo, em comparação
com a vida no cidades, sabe que não arrancamos as raízes do capitalismo e não destruímos
os alicerces, a base do inimigo interno, que depende da produção em pequena escala, e só há
uma maneira de miná-la, a saber, colocando a economia do país, incluindo a agricultura, em
uma nova base técnica, a base técnica da produção em grande escala moderna. E é apenas a
eletricidade que é essa base. O comunismo é o poder soviético mais a eletrificação de todo o
país. (Vol. 26, p. 46).

Como você vê, quando Lenin fala da eletrificação do país, ele se refere não
à construção isolada de usinas individuais, mas à gradual “colocação da econo-
mia do país, incluindo a agricultura, em uma nova base técnica, a base técnica de
produção moderna em grande escala”, que de uma forma ou de outra, direta ou
indiretamente, está ligada à eletrificação.
Lenin fez esse discurso no Oitavo Congresso dos Sovietes em dezembro de
1920, na véspera da introdução da NEP, quando estava fundamentando o cha-
mado plano de eletrificação, ou seja, o plano GOELRO. Alguns camaradas ar-
gumentam com base nisso que as opiniões expressas nesta citação se tornaram
inaplicáveis nas condições atuais. Por que, nós perguntamos? Porque, dizem
eles, muita água passou por baixo das pontes desde então. É verdade, claro, que
426 Obras Escolhidas

muita água passou por baixo das pontes desde então. Agora temos uma indústria
socialista desenvolvida, temos fazendas coletivas em grande escala, temos velhas e
novas fazendas estatais, temos uma ampla rede de organizações cooperativas bem
desenvolvidas, temos estações de aluguel de máquinas a serviço dos camponeses.
Agora, praticamos o sistema de contrato como uma nova forma de vínculo, e
podemos colocar em operação todas essas e uma série de outras alavancas para
colocar gradativamente a agricultura em uma nova base técnica. Tudo isso é ver-
dade. Mas também é verdade que, apesar de tudo isso, ainda somos um pequeno
país camponês onde predomina a pequena produção. E isso é o fundamental. E
enquanto continuar a ser o fundamental, a tese de Lenin permanece válida de
que “enquanto vivermos em um pequeno país camponês, haverá uma base econô-
mica mais segura para o capitalismo na Rússia do que para o comunismo”, e que,
consequentemente, o perigo da restauração do capitalismo não é uma frase vazia.
Lenin diz a mesma coisa, mas de forma mais nítida, no plano de seu panfleto,
“O imposto em espécie”, que foi escrito após a introdução da NEP (março-abril de
1921): “Se tivermos eletrificação em 10-20 anos, então o individualismo do pe-
queno lavrador e a liberdade para ele negociar localmente não serão nada ter-
ríveis. Se não tivermos eletrificação, o retorno ao capitalismo será inevitável de
qualquer maneira”.
E mais adiante ele diz: ‘Dez ou vinte anos de relações corretas com o campe-
sinato, e a vitória em escala mundial está assegurada (mesmo que as revoluções
proletárias, que estão crescendo, sejam atrasadas); caso contrário, 20-40 anos de
tormentos do terrorismo de guardas brancos” (Vol. 26, p. 313).
Você vê como Lenin coloca a questão de maneira abrupta: ou a eletrificação,
isto é, a “colocação da economia do país, incluindo a agricultura, em uma nova
base técnica, a base técnica da moderna produção em grande escala”, ou um
retorno ao capitalismo. Foi assim que Lenin entendeu a questão das “relações
corretas com o campesinato”.
Não se trata de mimar o camponês e considerar isso como estabelecer relações
corretas com ele, pois mimar não o levará muito longe. Trata-se de ajudar o
camponês a colocar sua lavoura “sobre uma nova base técnica, a base técnica da
moderna produção em grande escala”; pois esta é a principal maneira de livrar
o camponês de sua pobreza.
E é impossível colocar a economia do país sobre uma nova base técnica, a
menos que a nossa indústria e, em primeiro lugar, a produção dos meios de
produção, se desenvolvam em ritmo acelerado.
Essas são as condições internas que ditam o rápido desenvolvimento de nossa
indústria.
São essas condições externas e internas que estão na origem de os números
de controle de nossa economia nacional estarem sob tal tensão.
Isso explica, também, por que nossos planos econômicos, orçamentários e
não orçamentários, são marcados por um estado de tensão, por substanciais in-
vestimentos em desenvolvimento de capital, cujo objetivo é manter um ritmo
acelerado de desenvolvimento industrial.
Pode-se perguntar onde isso é dito nas teses, em que trecho das teses. A evi-
dência disso nas teses é a soma total dos investimentos de capital na indústria
J. V. Stalin 427

em 1928-29. Afinal, nossas teses são chamadas de teses nas figuras de controle.
É verdade, não é, camaradas? Bem, as teses afirmam que entre 1928-29 estare-
mos investindo 1.650.000.000 de rublos na construção da indústria. Em outros
termos, esse ano investiremos na indústria 330.000.000 rublos a mais que ano
passado
Segue-se, portanto, que não estamos apenas mantendo o ritmo de desenvol-
vimento industrial, mas dando um passo além, investindo mais na indústria do
que no ano passado, ou seja, expandindo a construção de capital na indústria de
forma absoluta e relativa.
Esse é o ponto crucial das teses sobre os dados de controle da economia nacio-
nal. No entanto, certos camaradas não conseguiram observar esse fato marcante.
Eles criticaram as teses sobre as figuras de controle à direita e à esquerda no que
diz respeito a detalhes mesquinhos, mas o mais importante eles não observaram.

II. O problema dos grãos

Falei até agora da primeira questão principal das teses, a taxa de desenvolvi-
mento da indústria. Agora, consideremos a segunda questão principal, o pro-
blema dos grãos. Uma característica das teses é que elas enfatizam o problema
do desenvolvimento da agricultura em geral e da cultura de grãos em particular.
As teses estão certas em fazer isso? Eu acho que estão. Já na sessão plenária de
julho, foi dito que o ponto mais fraco do desenvolvimento da nossa economia
nacional é o excessivo atraso da agricultura em geral e da cultura de cereais em
particular.
Quando, ao falar de nossa agricultura atrasada em relação à indústria, as pes-
soas reclamam disso, é claro que não estão falando sério. A agricultura sempre
ficou para trás e sempre ficará para trás da indústria. Isso é particularmente
verdadeiro em nossas condições, onde a indústria está concentrada ao máximo,
enquanto a agricultura está espalhada ao máximo. Naturalmente, uma indústria
unida se desenvolverá mais rápido do que uma agricultura dispersa. Isso, aliás,
dá origem à posição de liderança da indústria em relação à agricultura. Conse-
quentemente, a defasagem costumeira da agricultura em relação à indústria não
dá motivos suficientes para levantar o problema dos grãos.
O problema da agricultura, e do cultivo de grãos em particular, só aparece
quando o atraso habitual da agricultura em relação à indústria se transforma
em um atraso excessivo no ritmo de seu desenvolvimento. A característica do es-
tado atual de nossa economia nacional é que nos deparamos com o fato de uma
defasagem excessiva na taxa de desenvolvimento da agricultura de grãos em re-
lação à taxa de desenvolvimento da indústria, ao mesmo tempo que a demanda
por grãos comercializáveis em a parte das cidades e áreas industriais em cresci-
mento está aumentando aos trancos e barrancos. A tarefa, então, não é reduzir a
taxa de desenvolvimento da indústria ao nível do desenvolvimento da agricultura
de grãos (o que perturbaria tudo e inverteria o curso do desenvolvimento), mas
harmonizar a taxa de desenvolvimento da agricultura de grãos com a taxa de de-
senvolvimento da indústria, para elevar a taxa de desenvolvimento da agricultura
de grãos a um nível que garanta o rápido progresso de toda a economia nacional,
428 Obras Escolhidas

tanto a indústria como a agricultura.


Ou cumprimos essa tarefa e, com isso, resolvemos o problema dos grãos, ou
não a fazemos, e então será inevitável uma ruptura entre a cidade socialista e o
pequeno campo camponês.
É assim que está a questão, camaradas. Essa é a essência do problema dos
grãos.
Isso não significa que o que temos agora é “estagnação” no desenvolvimento
da agricultura ou mesmo seu “retrocesso”? Isso é o que Frumkin realmente
afirma em sua segunda carta, que, a seu pedido, distribuímos hoje aos mem-
bros do CC e CCC. Ele diz explicitamente nesta carta que há “estagnação” em
nossa agricultura. “Não podemos e não devemos falar na imprensa sobre retro-
cesso na imprensa, mas dentro do Partido não devemos esconder o fato de que
esse atraso é equivalente a retrocesso”.
Esta afirmação de Frumkin é correta? É claro que está incorreta! Nós, mem-
bros do Bureau Político, discordamos totalmente desta afirmação, e as teses do
Bureau Político estão em total desacordo com tal opinião sobre o estado da cul-
tura de cereais.
Na verdade, o que é retrocesso e como ele se manifestaria na agricultura?
Obviamente, ele estaria fadado a se manifestar em um movimento para trás e
para baixo da agricultura, um movimento que se afastaria das novas formas de
agricultura para as velhas formas medievais. Estaria fadado a se manifestar pelos
camponeses, abandonando, por exemplo, o sistema de três campos para o sistema
de longo pousio. O arado de aço e as máquinas para o arado de madeira, semen-
tes limpas e selecionadas para sementes não colhidas e de baixo grau, métodos
modernos de cultivo para métodos inferiores, e assim por diante. Mas observa-
mos algo desse tipo? Nem todo mundo sabe que dezenas e centenas de milhares
de fazendas camponesas estão abandonando anualmente o campo de três fai-
xas para o sistema de campos com quatro faixas e múltiplos campos, sementes
de baixo grau para sementes selecionadas, o arado de madeira para o arado de
aço e máquinas, métodos inferiores de cultivo para métodos superiores? Isso é
retrocesso?
Frumkin tem o hábito de se pendurar nas pontas do casaco de um ou ou-
tro membro do Bureau Político para fundamentar seu próprio ponto de vista. É
bem provável que, também neste caso, ele pegue as pontas do casaco de Bukharin
para mostrar que Bukharin em seu artigo, “Notas de um economista”, diz “a mesma
coisa”. Mas o que Bukharin diz está muito longe de ser “a mesma coisa”. Bukha-
rin, em seu artigo, levantou a questão teórica e abstrata da possibilidade ou do
perigo de retrocesso. Em abstrato, tal formulação da questão é perfeitamente
possível e legítima. Mas o que Frumkin faz? Ele transforma a questão abstrata
da possibilidade de retrocesso da agricultura em um fato. E isso ele chama de
análise do estado da plantação de grãos! Não é ridículo, camaradas?
De fato, seria um bom governo soviético se, no décimo primeiro ano de sua
existência, tivesse levado a agricultura a um estado de retrocesso! Ora, um go-
verno como aquele não merece ser apoiado, mas sim mandado embora. E os
trabalhadores teriam despachado tal governo há muito tempo, se ele tivesse redu-
zido a agricultura a um estado de retrocesso. Retrocesso é uma música que todos
J. V. Stalin 429

os tipos de especialistas burgueses estão repetindo; sonham com nossa agricul-


tura retrocedendo. Trotsky uma vez insistiu no tema do retrocesso. Não esperava
ver Frumkin seguir essa linha duvidosa.
Em que Frumkin baseia sua afirmação sobre o retrocesso? Em primeiro lugar,
no fato da área de safra de grãos este ano ser menor do que no ano passado. A
que se deve esse fato? À política do governo soviético, talvez? Claro que não. É
devido ao desaparecimento das colheitas de inverno na área de estepe da Ucrânia
e parcialmente no Norte do Cáucaso, e à seca no verão deste ano na mesma área
da Ucrânia. Não fosse por essas condições climáticas desfavoráveis, das quais a
agricultura é total e inteiramente dependente, nossa área de safra de grãos neste
ano teria sido pelo menos 1.000.000 dessiatins253 maior do que no ano passado.
Ele baseia sua afirmação, ainda, no fato de que nossa produção bruta de grãos
este ano é apenas ligeiramente (70 milhões de puds) maior e, a de trigo e centeio,
200 milhões de puds menor do que no ano passado. E a que tudo isso se deve? De
novo, à seca e às geadas que mataram as colheitas de inverno. Não fosse por essas
condições climáticas desfavoráveis, nossa produção bruta de grãos neste ano teria
excedido a do ano passado em 300 milhões de puds. Como ignorar fatores como
seca, geada, etc., que são de importância decisiva para a safra desta ou daquela
região?
Agora estamos assumindo a tarefa de aumentar a área de cultivo em 7%, au-
mentar a safra em 3% e aumentar a produção bruta de grãos em, acredito, 10%.
Não há necessidade de haver dúvidas de que faremos tudo ao nosso alcance para
realizar essas tarefas. Mas, apesar de todas as nossas medidas, não está fora de
questão que possamos nos deparar novamente com uma quebra parcial de safra,
geadas ou seca nesta ou naquela região, caso em que é possível que essas circuns-
tâncias possam causar graves a produção de grãos ficará aquém de nossos planos
ou mesmo da produção bruta deste ano. Isso significa que a agricultura está
“retrocedendo”, que a política do governo soviético é a culpada por esse “retro-
cesso”, que “roubamos” o incentivo econômico do camponês, que o “privamos”
de suas perspectivas econômicas?
Vários anos atrás, Trotsky cometeu o mesmo erro, declarando que “um pouco
de chuva” não tinha importância para a agricultura. Rykov o rebateu e teve o
apoio da esmagadora maioria dos membros do CC. Agora, Frumkin está come-
tendo o mesmo erro, ignorando as condições meteorológicas, que são de impor-
tância decisiva para a agricultura, e tentando responsabilizar por tudo a política
do nosso Partido.
Que formas e meios são necessários para acelerar o ritmo de desenvolvimento
da agricultura em geral e da cultura de grãos em particular?
Existem três formas:
a) aumentando os rendimentos das colheitas e ampliando a área semeada
pelos camponeses pobres e médios;
b) pelo maior desenvolvimento das fazendas coletivas;
c) estabelecendo novas fazendas estaduais e ampliando as antigas.

253Um dessiatin é igual a 2.400 sazhens quadrados. Aproximadamente equivalente a 2.702 acres in-
gleses ou 10.926.512 metros quadrados (N.T.)
430 Obras Escolhidas

Tudo isso já foi mencionado na resolução da plenária de julho. As teses re-


petem o que foi dito, mas colocam a questão de forma mais concreta, e afirmam
em termos de números na forma de investimentos definitivos. Aqui, também,
Frumkin encontra algo para contestar. Ele pensa que, posto que a agricultura
individual está em primeiro lugar e as fazendas coletivas e as fazendas estatais,
em segundo e terceiro, isso só pode significar que seu ponto de vista triunfou.
Isso é ridículo, camaradas.
É claro que, se abordarmos o assunto do ponto de vista da importância re-
lativa de cada forma de agricultura, a agricultura individual deve ser colocada
em primeiro lugar, pois fornece quase seis vezes mais grãos comerciáveis que as
fazendas coletivas e fazendas estatais. Mas se abordarmos o assunto do ponto de
vista do tipo de agricultura, cuja forma de economia mais se assemelha ao nosso
propósito, o primeiro lugar deve ser dado às fazendas coletivas e fazendas es-
tatais, que representam um tipo de agricultura superior agricultura camponesa
individual. É realmente necessário mostrar que ambos os pontos de vista são
igualmente aceitáveis para nós?
O que é necessário para que nosso trabalho prossiga ao longo desses três ca-
nais, para que a taxa de desenvolvimento da agricultura, e principalmente da
cultura de grãos, seja aumentada na prática?
É necessário, antes de tudo, dirigir a atenção dos quadros do nosso Partido
para a agricultura e focalizá-la nos aspectos concretos do problema dos grãos.
Devemos deixar de lado as frases abstratas e as conversas sobre a agricultura em
geral e começar, finalmente, a trabalhar nas medidas práticas para o fomento da
cultura de grãos, adaptada às diversas condições dos diferentes territórios. É hora
de passar das palavras aos atos e abordar, finalmente, a questão concreta de como
aumentar a produtividade das safras e aumentar as áreas de cultivo das fazendas
individuais de camponeses pobres e médios, como melhorar e desenvolver ainda
mais as fazendas coletivas e o fazendas estatais, como organizar a prestação de
assistência pelas fazendas coletivas e fazendas estatais aos camponeses por meio
do fornecimento de melhores sementes e melhores raças de gado, como organizar
a assistência aos camponeses em forma de máquinas e outros implementos por
máquina – locação de postos, como estender e melhorar o sistema de contrato e
cooperação agrícola em geral, e assim por diante (Uma voz: “Isso é empirismo” ).
Esse empirismo é absolutamente essencial, pois, do contrário, corremos o risco
de afogar a séria questão de resolver o problema dos grãos em conversas vazias
sobre a agricultura em geral.
O Comitê Central se comprometeu a conseguir relatórios concretos sobre o
desenvolvimento agrícola dos principais trabalhadores do Conselho dos Comissá-
rios do Povo e do Bureau Político, responsáveis pelas principais regiões de grãos.
Vão ouvir nesta sessão plenária um relatório do camarada Andreiev sobre as for-
mas de resolver o problema dos cereais no Norte do Cáucaso. Acho que teremos
de ouvir relatos semelhantes sucessivamente da Ucrânia, da região da Terra Ne-
gra Central, da região do Volga, da Sibéria, etc. Isso é absolutamente necessário
para voltar a atenção do Partido para o problema dos grãos e para obter uma
formulação concreta às questões relacionadas com o problema dos grãos, vinda
de nossos trabalhadores do Partido.
J. V. Stalin 431

É necessário, em segundo lugar, fazer com que os trabalhadores do nosso


Partido no campo façam uma distinção estrita no seu trabalho prático entre o
camponês médio e o kulak, não os amontoem e não atinjam o camponês médio
quando é o kulak que deve ser atingido. É mais que hora de acabar com esses er-
ros, se é que podem ser chamados assim. Tomemos, por exemplo, a questão do
imposto individual. Temos a decisão do Bureau Político e da lei correspondente
sobre a cobrança de um imposto individual sobre não mais de 2% a 3% das fa-
mílias, ou seja, sobre a parte mais rica dos kulaks. Mas o que realmente acontece?
Existem vários distritos onde 10, 12 e até mais (em porcentagem) dos agregados
familiares são tributados, o que faz com que a seção média do campesinato seja
afetada. Não é hora de acabar com este crime?
No entanto, em vez de indicar medidas concretas para acabar com esses e
outros ultrajes, nossos queridos “críticos” se entregam ao jogo de palavras, pro-
pondo que as palavras “a seção mais rica dos kulaks” sejam substituídas pelas
palavras “a seção mais poderosa dos kulaks” ou “a seção superior dos kulaks”.
Como se não fosse a mesma coisa! Foi demonstrado que os kulaks constituem
cerca de 5% do campesinato. Foi demonstrado que a lei exige que o imposto
individual seja cobrado de apenas 2% a 3% das famílias, ou seja, sobre a seção
mais rica dos kulaks. Foi demonstrado que, na prática, esta lei está sendo violada
em várias áreas. No entanto, em vez de indicar medidas concretas para impedir
isso, os “críticos” se entregam à crítica verbal e se recusam a entender que isso
não altera as coisas nem um pouco. Divisores absolutos! (Uma voz: “Eles propõem
que o imposto individual seja cobrado de todos os kulaks” ). Bem, então eles deveriam
exigir a revogação da lei que impõe um imposto individual de 2-3%. No entanto,
não ouvi dizer que alguém exigiu a revogação da lei tributária individual. Diz-
se que a tributação individual é arbitrariamente estendida para complementar
o orçamento local. Mas você não deve complementar o orçamento local infrin-
gindo a lei, infringindo as diretivas do Partido. Nosso Partido existe, ainda não
foi liquidado. O governo soviético existe, ainda não foi liquidado. E se você não
tiver fundos suficientes para o seu orçamento local, então você deve pedir para
ter seu orçamento local reconsiderado, e não infringir a lei ou desrespeitar as
instruções do Partido.
É necessário, a seguir, dar mais incentivos à agricultura individual de campo-
neses pobres e médios. Sem dúvida, o aumento dos preços dos grãos já introdu-
zido, a aplicação prática da lei revolucionária, a assistência prática às fazendas de
camponeses pobres e médios na forma do sistema de contrato, e assim por diante,
aumentará consideravelmente o incentivo econômico do camponês. Frumkin
pensa que matamos ou quase liquidamos o incentivo do camponês roubando-lhe
as perspectivas econômicas. Isso, é claro, é um absurdo. Se fosse verdade, seria
incompreensível entender em que realmente repousa o vínculo, a aliança entre
a classe trabalhadora e a massa principal do campesinato. Não se pode pensar,
com certeza, que essa aliança se baseia no sentimentalismo. Deve-se perceber,
afinal, que a aliança entre a classe trabalhadora e o campesinato é uma aliança
na base de negócios, uma aliança dos interesses de duas classes, uma aliança de
classe dos trabalhadores e a massa principal do campesinato visando vantagem
mútua. É óbvio que se tivéssemos matado ou quase liquidado o incentivo econô-
mico do camponês, privando-o de perspectivas econômicas, não haveria vínculo
432 Obras Escolhidas

nem aliança entre a classe trabalhadora e o campesinato. Claramente, o que está


em questão aqui não é a “criação” ou “liberação” do incentivo econômico das
massas camponesas pobres e médias, mas o fortalecimento e posterior desen-
volvimento desse incentivo, para o benefício mútuo da classe trabalhadora e a
principal massa do campesinato. E é exatamente isso que indicam as teses sobre
os dados de controle da economia nacional.
É necessário, por último, aumentar a oferta de bens para o campo. Penso em
bens de consumo e, principalmente, em bens de produção (máquinas, fertilizan-
tes, etc.) capazes de aumentar a produção agrícola. Não se pode dizer que tudo
a este respeito é como deveria ser. Você sabe que os sintomas de escassez de mer-
cadorias ainda estão longe de terem sido eliminados e provavelmente não serão
eliminados tão cedo. Em certos círculos do Partido, existe a ilusão de que pode-
mos acabar imediatamente com a escassez de produtos. Isso, infelizmente, não
é verdade. Deve-se ter em mente que os sintomas de escassez de bens estão rela-
cionados, em primeiro lugar, com a crescente prosperidade dos trabalhadores e
camponeses e o aumento gigantesco da demanda efetiva por bens, cuja produção
cresce a cada ano, mas que não são suficientes para satisfazer toda a demanda e,
em segundo lugar, com o período atual de reconstrução da indústria.
A reconstrução da indústria envolve a transferência de fundos da esfera dos
meios de produção de consumo para a esfera da produção dos meios de pro-
dução. Sem isso, não pode haver uma reconstrução séria da indústria, especial-
mente em nossas condições soviéticas. Mas o que isso significa? Isso significa que
o dinheiro está sendo investido na construção de novas fábricas e que o número
de cidades e novos consumidores está crescendo, enquanto as novas fábricas po-
dem produzir mercadorias adicionais em quantidade somente depois de três ou
quatro anos. É fácil perceber que isso não contribui para acabar com a escassez
de mercadorias.
Isso significa que devemos cruzar os braços e reconhecer que somos impoten-
tes para lidar com os sintomas de uma escassez de bens? Não, não significa. O
fato é que podemos e devemos adotar medidas concretas para mitigar, moderar
a escassez de mercadorias. Isso é algo que podemos e devemos fazer imediata-
mente. Para isso, devemos acelerar a expansão dos ramos da indústria que con-
tribuem diretamente para a promoção da produção agrícola (a Fábrica de Trator
de Stalingrado, a Fábrica de Máquinas Agrícolas de Rostov, a Fábrica de Seleção
de Sementes de Voronezh, etc., etc.). Para isso e além, devemos expandir, na
medida do possível, os ramos da indústria que contribuem para o aumento da
produção de bens escassos (tecidos, vidros, pregos, etc.). E assim por diante.
Kubyak disse que os números do controle da economia nacional propõem
destinar menos recursos, este ano, à agricultura camponesa individual do que
no ano passado. Isso, eu acho, não é verdade. Kubyak aparentemente perde de
vista o fato de que este ano estamos dando aos camponeses um crédito de cerca
de 300 milhões de rublos sob o sistema de contrato (quase 100 milhões a mais
que no ano passado). Se isso for levado em conta, e deve ser levado em conta,
verá que este ano estamos destinando mais para o desenvolvimento da agricultura
camponesa individual do que no ano passado. Quanto às fazendas do antigo e
novo estado e fazendas coletivas, estamos investindo nelas este ano cerca de 300
J. V. Stalin 433

milhões de rublos (cerca de 150 milhões a mais que no ano passado).


Atenção especial deve ser dada às fazendas coletivas, às fazendas estatais e ao
sistema de contratos. Essas coisas não devem ser consideradas apenas como meio
de aumentar nossos estoques de grãos comerciáveis. São, ao mesmo tempo, uma
nova forma de vínculo entre a classe operária e a massa principal do campesinato.
Já foi dito o suficiente sobre o sistema de contrato e não vou me alongar mais
nele. Todos percebem que a aplicação deste sistema em grande escala torna mais
fácil unir os esforços das fazendas camponesas individuais, introduz um elemento
de permanência nas relações entre o Estado e o campesinato e, assim, fortalece
o vínculo entre a cidade e o campo.
Gostaria de chamar a atenção para as fazendas coletivas, e especialmente as
fazendas estatais, como alavancas que facilitam a reconstrução da agricultura em
uma nova base técnica, causando uma revolução nas mentes dos camponeses e
ajudando-os a se livrar do conservadorismo, rotina. O surgimento de tratores,
grandes máquinas agrícolas e colunas de trator em nossas regiões de grãos não
pode deixar de afetar as fazendas camponesas vizinhas. A assistência prestada
aos camponeses vizinhos na forma de sementes, máquinas e tratores será, sem
dúvida, apreciada pelos camponeses e tida como um sinal do poder e da força
do Estado soviético, que está tentando conduzi-los para a estrada principal de
um substancial melhoria da agricultura. Não levamos em conta essa circunstân-
cia até agora e, talvez, ainda não a tenhamos levado em conta suficientemente.
Mas acho que isso é o principal que as fazendas coletivas e as fazendas estatais
estão contribuindo, e podem contribuir, no momento presente para a solução do
problema dos grãos e o fortalecimento do vínculo em suas novas formas.
Essas, em geral, são as formas e meios que devemos adotar em nosso trabalho
de resolver o problema dos grãos.

III. Combate a desvios e conciliações

Passemos agora à terceira questão central de nossas teses, a dos desvios da


linha leninista.
A base social dos desvios é o fato da produção em pequena escala predominar
no nosso país, o fato de a produção em pequena escala dar origem a elementos
capitalistas, o fato de nosso Partido estar rodeado de forças elementares pequeno-
burguesas e, por último, o fato de que certas organizações do nosso Partido foram
infectadas por essas forças elementares.
É aí que reside, em grande medida, a base social dos desvios.
Todos esses desvios são de caráter pequeno-burguês.
Qual é o desvio à direita, que é o principal em questão aqui? Em que direção
ele tende a ir? Tende à adaptação à ideologia burguesa, à adaptação de nossa
política aos gostos e exigências da burguesia “soviética”.
Que ameaça representa o desvio à direita, se triunfar em nosso Partido? Sig-
nificaria a derrota ideológica de nosso Partido, uma rédea nas mãos dos elemen-
tos capitalistas, o aumento das chances de restauração do capitalismo ou, como
Lenin o chamou, de um “retorno ao capitalismo”.
434 Obras Escolhidas

Onde está principalmente alojada a tendência para um desvio de direita? Em


nossos aparelhos soviéticos, econômicos, cooperativos e sindicais, e também no
aparelho do Partido, especialmente em seus elos inferiores no campo.
Existem porta-vozes do desvio à direita entre os membros do nosso Partido?
Certamente existem. Rykov citou o exemplo de Shatunovsky, que se declarou
contra a construção da Central Hidrelétrica de Dnieper. Não pode haver dúvida
de que Shatunovsky foi culpado de um desvio de direita, um desvio para o opor-
tunismo aberto. Mesmo assim, acho que Shatunovsky não é uma ilustração típica
do desvio de direita, de sua fisionomia. Acho que nesse aspecto a palma deveria
ir para Frumkin (Risos). Refiro-me à sua primeira carta (junho de 1928) e depois
à sua segunda carta, que foi distribuída aqui aos membros do CC e CCC (no-
vembro de 1928). Vamos examinar essas duas cartas. Tomemos as “proposições
básicas” da primeira carta.
1) “O sentimento no campo, com exceção de um pequeno grupo de camponeses pobres,
se opõe a nós”. Isso é verdade? É obviamente falso. Se fosse verdade, o vínculo
nem seria uma memória. Mas desde junho (a carta foi escrita em junho) quase
seis meses se passaram, mas qualquer um, a menos que seja cego, pode ver que o
vínculo entre a classe trabalhadora e a massa principal do campesinato continua
e está se fortalecendo. Por que Frumkin escreve tanta bobagem? Para assustar o
Partido e fazê-lo ceder ao desvio de direita.
2) “A linha adotada ultimamente tem levado a massa principal dos camponeses médios a
ficarem sem esperança, sem perspectivas”. Isso é verdade? É totalmente falso. É óbvio
que se na primavera deste ano a massa principal dos camponeses médios não
tivesse esperança ou perspectivas econômicas, eles não teriam aumentado a área
de cultivo da primavera como fizeram em todas as principais regiões produtoras
de grãos. A semeadura da primavera ocorre em abril-maio. Bem, a carta de
Frumkin foi escrita em junho. Em nosso país, sob o regime soviético, quem é o
principal comprador de cereais? O Estado e as cooperativas, que estão ligadas ao
Estado. É óbvio que se a massa de camponeses médios não tivesse perspectivas
econômicas, se estivessem em um estado de “estranhamento” para com o governo
soviético, não teriam aumentado a área de cultivo da primavera para o benefício
do Estado, como principal comprador de grãos. Frumkin está falando bobagem
óbvia. Aqui, mais uma vez, ele está tentando assustar o Partido com os “horrores”
de perspectivas sem esperança, a fim de fazê-lo ceder à sua visão.
3) “Devemos retornar ao Décimo Quarto e Décimo Quinto Congressos”. Que o Dé-
cimo Quinto Congresso foi simplesmente acrescentado aqui, sem rima ou razão,
disso não pode haver dúvida. O ponto crucial aqui não está no Décimo Quinto
Congresso, mas no slogan: De volta ao Décimo Quarto Congresso. E o que isso
significa? Significa renunciar à “intensificação da ofensiva contra os kulak” (ver
resolução do Décimo Quinto Congresso). Não digo isso para depreciar o XIV
Congresso. Digo isso porque, ao pedir um retorno ao XIV Congresso, Frum-
kin está rejeitando o passo em frente que o Partido deu entre o XIV e o XV
Congressos e, ao rejeitá-lo, ele está tentando puxar o Partido para trás. A ple-
nária de julho do Comitê Central se pronunciou sobre esta questão. Afirmava
claramente em sua resolução que as pessoas que tentam se esquivar da decisão
do XV Congresso – “para desenvolver ainda mais a ofensiva contra os kulaks” –
J. V. Stalin 435

são “uma expressão das tendências burguesas em nosso país”. Devo dizer clara-
mente a Frumkin que, quando o Bureau Político formulou este item da resolução
da plenária de julho, tinha ele e sua primeira carta em mente.
4) “Assistência máxima aos camponeses pobres que entram em fazendas coletivas”.
Sempre, com o melhor de nossas capacidades e recursos, prestamos a máxima
assistência aos camponeses pobres que entram, ou mesmo não entram, nas fa-
zendas coletivas. Não tem nada novo nisso. O que há de novo nas decisões do
Décimo Quinto Congresso em comparação com as do Décimo Quarto Congresso
não é isso, mas que o Décimo Quinto Congresso fez do desenvolvimento máximo
do movimento da fazenda coletiva uma das tarefas cardeais da época. Quando
Frumkin fala de assistência máxima aos camponeses pobres que entram nesses es-
paços, ele está, na verdade, se afastando, fugindo, da tarefa atribuída ao Partido
pelo Décimo Quinto Congresso de desenvolver o movimento da fazenda cole-
tiva ao máximo. Na verdade, Frumkin é contra o desenvolvimento do trabalho
de fortalecimento do setor socialista no campo ao longo da linha de fazendas
coletivas.
5) “As fazendas estatais não devem ser expandidas por táticas de choque ou super-
choque”. Frumkin não pode deixar de saber que estamos apenas começando a
trabalhar seriamente para expandir as antigas fazendas estatais e criar novas.
Frumkin não pode deixar de saber que estamos alocando para esse fim muito
menos dinheiro do que deveríamos se tivéssemos reservas para ele. As palavras
“por choque ou táticas de super-choque” foram colocadas aqui para atingir as
pessoas com “horror” e para esconder sua própria aversão a qualquer expan-
são séria das fazendas estatais. Frumkin, na verdade, está expressando aqui sua
oposição ao fortalecimento do setor socialista no campo ao longo da linha das
fazendas estatais.
Agora, reúna todas essas proposições de Frumkin, e você obterá um buquê
característico do desvio à direita.
Passemos à segunda carta de Frumkin. De que forma a segunda carta difere
da primeira? Na forma em que agrava os erros do primeiro escrito. O primeiro
dizia que a agricultura camponesa média não tinha perspectivas. O segundo
fala do “retrocesso” da agricultura. A primeira carta dizia que devemos retornar
ao XIV Congresso, no sentido de relaxar a ofensiva contra os kulak. A segunda
carta, porém, diz que “não devemos prejudicar a produção nas fazendas kulak”. A
primeira carta não dizia nada sobre a indústria. Mas, a segunda carta desenvolve
uma “nova” teoria, no sentido de que menos deve ser atribuído à construção
industrial. Aliás, há dois pontos em que as duas cartas coincidem: no que diz
respeito às fazendas coletivas e no que diz respeito às fazendas estatais. Em ambas
as cartas, Frumkin se pronuncia contra o desenvolvimento de fazendas coletivas
e fazendas estatais. É claro que a segunda carta agrava os erros da primeira.
Já falei sobre a teoria do “retrocesso”. Não pode haver dúvida de que esta
teoria é invenção de especialistas burgueses, que estão sempre prontos para gritar
que o regime soviético está condenado. Frumkin se deixou amedrontar pelos
espertos burgueses que têm seu poleiro ao redor do Comissariado do Povo para
as Finanças, e agora ele mesmo tenta assustar o Partido para fazê-lo ceder ao
desvio de direita. Também já se disse o suficiente sobre as fazendas coletivas e as
436 Obras Escolhidas

fazendas estatais. Portanto, não há necessidade de repetir. Vamos examinar os


dois pontos restantes: sobre a agricultura kulak e sobre o investimento de capital
na indústria.
Agricultura Kulak. Frumkin diz que “não devemos prejudicar a produção nas
fazendas kulak”. O que isso significa? Significa não impedir os kulaks de desen-
volver sua economia exploradora. Mas o que não significa impedir os kulaks de
desenvolver sua economia exploradora? Significa dar rédea solta ao capitalismo
no campo, permitindo-lhe liberdade de ação. Pegamos o velho slogan dos libe-
rais franceses: “laissez faire, laissez passer”, isto é, não impeça a burguesia de fazer
seus negócios, não impeça a burguesia de se mover livremente.
Essa palavra de ordem foi defendida pelos antigos liberais franceses na época
da revolução burguesa francesa, na época da luta contra o regime feudal, que
acorrentava a burguesia e não a deixava se desenvolver. Segue-se, então, que de-
vemos agora ir do slogan socialista – “restrições cada vez maiores aos elementos
capitalistas” (Ver as teses sobre as figuras de controle) – ao slogan burguês liberal:
não impeça o desenvolvimento do capitalismo no interior. Por que estamos real-
mente pensando em passar dos bolcheviques para os liberais burgueses? O que
pode haver em comum entre esse slogan burguês de Frumkin e a linha do Par-
tido? (Frumkin: “Camarada Stalin, leia os outros pontos também” ). Devo ler todo o
ponto: “Também não devemos impedir a produção nas fazendas kulak, ao mesmo
tempo que combatemos sua exploração escravizante”.
Meu caro Frumkin, você realmente acha que a segunda parte da frase me-
lhora as coisas e não as torna piores? O que significa combater a exploração
escravizante? Ora, a palavra de ordem do combate à exploração escravizante é
uma palavra de ordem da revolução burguesa, dirigida contra os métodos de
exploração do servo feudal ou semifeudal. De fato, propusemos essa palavra
de ordem quando avançávamos para a revolução burguesa, diferenciando entre
a forma escravizadora de exploração, que lutávamos por abolir, e a forma não
escravizadora, dita “progressiva” de exploração, que poderíamos não naquela
época restringir ou abolir, na medida em que o sistema burguês permaneceu em
vigor. Mas naquela época estávamos avançando para uma república democrático-
burguesa. Agora, porém, se não me engano, temos uma revolução socialista, que
se dirige para a abolição de todas as formas de exploração, incluindo as formas
“progressistas”. Realmente, você quer que saiamos da revolução socialista, que
estamos desenvolvendo e promovendo, e voltemos aos slogans da revolução bur-
guesa? Como alguém pode se obrigar a falar essas bobagens?
Além disso, o que não significa impedir a economia kulak? Significa dar li-
berdade ao kulak. E o que significa dar carta branca ao kulak? Significa dar-lhe
poder. Quando os liberais burgueses franceses exigiram que o governo feudal
não impedisse o desenvolvimento da burguesia, expressaram-no concretamente
na exigência de que se desse o poder à burguesia. E eles estavam certos. Para
poder se desenvolver adequadamente, a burguesia deve ter poder. consequente-
mente, para ser consistente, você deve dizer: forneça poder ao kulak. Pois deve
ser entendido, afinal, que você não pode deixar de restringir o desenvolvimento
da economia kulaks se tirar o poder dos kulaks e concentrá-lo nas mãos da classe
trabalhadora. Essas são as conclusões que se sugerem ao ler a segunda carta de
J. V. Stalin 437

Frumkin.
Construção de capital na indústria. Quando discutimos os números de controle,
tínhamos três números diante de nós: o Conselho Supremo de Economia Naci-
onal pediu 825 milhões de rublos; a Comissão de Planejamento Estadual estava
disposta a dar 750 milhões de rublos; o Comissariado do Povo das Finanças daria
apenas 650 milhões de rublos. Que decisão adotou o Comitê Central de nosso
Partido? Fixou o número em 800 milhões de rublos, ou seja, exatamente 150
milhões de rublos a mais do que o proposto pelo Comissariado do Povo das Fi-
nanças. O fato de o Comissariado do Povo das Finanças ter oferecido menos, é
claro, não é surpreendente: a mesquinhez do Comissariado do Povo é geralmente
conhecida; tem que ser mesquinho. Mas não é esse o ponto agora. A questão é
que Frumkin defende a cifra de 650 milhões de rublos não por mesquinhez, mas
por causa de sua nova teoria de “viabilidade”, afirmando em sua segunda carta
e em um artigo especial no periódico do Comissariado do Povo que, certamente
será prejudicial para nossa economia se atribuirmos ao Conselho Supremo de
Economia Nacional mais de 650 milhões de rublos para construção de capital.
E o que isso significa? Significa que Frumkin é contra a manutenção do atual
ritmo de desenvolvimento da indústria, evidentemente sem perceber que, se fosse
abrandado, isso realmente prejudicaria toda a economia nacional.
Agora, combine esses dois pontos na segunda carta de Frumkin, o ponto sobre
a agricultura kulak e o ponto sobre a construção de capital na indústria, acres-
cente a teoria do “retrocesso” e você terá a fisionomia do desvio à direita. Você
quer saber qual é o desvio e como ele se parece? Leia as duas cartas de Frumkin,
estude-as e você entenderá.
É o suficiente para explicitar a fisionomia do desvio de direita.
Mas as teses não falam apenas do desvio. Eles falam também do chamado des-
vio de “esquerda”. Qual é o desvio “à esquerda”? Existe realmente no Partido?
Existem em nosso Partido, como dizem nossas teses, tendências anticamponesas
médias, tendências de superindustrialização e assim por diante? Sim, existem.
O que elas representam? Elas equivalem a um desvio para o trotskismo. Isso já
foi dito na plenária de julho. Refiro-me à resolução da plenária de julho sobre
a política de compras de grãos, que fala de uma luta em duas frentes: contra
aqueles que querem voltar do Décimo Quinto Congresso – os de direita – e con-
tra aqueles que querem converter as medidas de emergência em permanentes
política do Partido – as “esquerdas”, a tendência ao trotskismo.
Claramente, existem elementos do trotskismo e uma tendência para a ideolo-
gia trotskista dentro do nosso partido. Cerca de quatro mil pessoas, creio, vota-
ram contra nossa plataforma durante a discussão que precedeu o XV Congresso
do Partido (Uma voz: “Dez mil” ). Acho que se dez mil votaram contra, então duas
vezes dez mil membros do Partido que simpatizavam com o trotskismo não vota-
ram em absoluto, porque não compareceram às reuniões. Estes são os elementos
trotskistas que não deixaram o Partido e que, deve-se supor, ainda não se livra-
ram da ideologia trotskista. Além disso, acho que uma seção dos trotskistas que
mais tarde se separou da organização trotskista e retornou ao Partido ainda não
conseguiu se livrar da ideologia trotskista e também, presumivelmente, não tem
aversão a disseminar suas opiniões entre os membros do partido. Por último, há
438 Obras Escolhidas

o fato de termos um certo recrudescimento da ideologia trotskista em algumas


organizações do nosso Partido. Combine tudo isso e você terá todos os elementos
necessários para um desvio ao trotskismo no Partido.
E isso é compreensível: com a existência de forças elementais pequeno-burguesas
e a pressão que essas forças exercem sobre o nosso Partido, não pode deixar de
haver tendências trotskistas. Uma coisa é prender quadros trotskistas ou expulsá-
los do Partido. Outra coisa é acabar com a ideologia trotskista. Isso será mais
difícil. E dizemos que sempre que houver um desvio à direita, também haverá
um desvio “à esquerda”. O desvio “esquerdista” é a sombra do desvio de di-
reita. Lenin costumava dizer, referindo-se aos otzovistas, que os “esquerdistas”
são mencheviques, só que do avesso. Isso é verdade. A mesma coisa deve ser
dita dos atuais “esquerdistas”. Pessoas que se desviam para o trotskismo são, de
fato, também de direita, só que virados do avesso, elementos de direita que se
disfarçam com frases de “esquerda”.
Daí a luta em duas frentes – tanto contra o desvio à direita quanto contra o
desvio “à esquerda”.
Pode-se dizer: se o desvio de “esquerda” é, em essência, a mesma coisa que
o desvio oportunista de direita, então qual é a diferença entre eles e onde você
realmente consegue duas frentes? Na verdade, se uma vitória dos elementos de
direita significa aumentar as chances de restauração do capitalismo, e uma vitória
dos “esquerdistas” levaria ao mesmo resultado, que diferença há entre eles, e
por que alguns são chamados de elementos de direita e outros de elementos de
esquerda? E se houver uma diferença entre eles, qual é? Não é verdade que
os dois desvios têm as mesmas raízes sociais, que são ambos desvios pequeno-
burgueses? Não é verdade que ambos os desvios, se triunfassem, conduziriam ao
mesmo resultado? Qual é, então, a diferença entre eles?
A diferença está em suas plataformas, suas demandas, sua abordagem e seus
métodos.
Se, por exemplo, os de direita dizem: “Foi um erro construir a Central Hidrelétrica
Dnieper”, e os esquerdistas, pelo contrário, declaram: “Para que serve uma Central
Hidroelétrica em Dnieper, vamos ter uma Central Hidroelétrica Dnieper todos os anos”,
devemos admitir que obviamente há uma diferença.
Se os de direita dizem: “Deixe o kulak em paz, permita que ele se desenvolva livre-
mente”, e os esquerdistas, pelo contrário, declaram: “Golpeie não apenas o kulak,
mas também o camponês médio, porque ele é igualmente um proprietário privado quanto
o kulak”, deve-se admitir que obviamente há uma diferença.
Se os de direita dizem: “Surgiram dificuldades, não é hora de desistir?” e os
esquerdistas, ao contrário, declaram: “O que são as dificuldades para nós? um figo
por suas dificuldades – avante com toda velocidade!”, deve-se admitir que obviamente
há uma diferença.
Aí você tem uma imagem da plataforma específica e os métodos específicos
dos esquerdistas. Isso, de fato, explica por que os “esquerdistas” às vezes conse-
guem atrair uma parte dos trabalhadores para o seu lado com a ajuda de frases
pomposas de “esquerda” e se apresentando como os oponentes mais determina-
dos dos elementos de direita, embora todo mundo saiba que eles, os “esquerdis-
tas”, têm as mesmas raízes sociais dos elementos de direita, e que não raro se
J. V. Stalin 439

unem a um acordo, um bloco, com os direitistas para lutar contra a linha leni-
nista.
É por isso que é obrigatório para nós, leninistas, travar uma luta em duas
frentes – tanto contra o desvio de direita como contra o desvio de esquerda.
Mas, se a tendência trotskista representa um desvio de “esquerda”, isso não
significa que os esquerdistas estão mais à esquerda do que o leninismo? Não,
não significa. O leninismo é a tendência mais à esquerda no movimento operário
mundial. Nós, leninistas, pertencemos à Segunda Internacional até a eclosão da
guerra imperialista, como o grupo de extrema esquerda dos social-democratas.
Não ficamos na II Internacional e defendemos uma cisão na II Internacional
precisamente porque, sendo o grupo de extrema esquerda, não queríamos estar
no mesmo partido que os pequeno-burgueses traidores do marxismo, os social-
pacifistas e social-chauvinistas.
Foram essas táticas e essa ideologia que posteriormente se tornaram a base
de todos os partidos bolcheviques do mundo. Em nosso Partido, nós, leninistas,
somos os únicos esquerdistas sem aspas. Consequentemente, nós, leninistas, não
somos nem “esquerdistas” nem direitistas em nosso próprio Partido. Somos um
partido de marxista-leninistas. E, dentro do nosso Partido, combatemos não só
aqueles a quem chamamos de desviantes abertamente oportunistas, mas também
aqueles que pretendem ser mais “esquerdistas” do que o marxismo, mais “esquer-
distas” do que o leninismo, e que camuflam seu direitismo oportunista com uma
pomposa pose de esquerda.
Todo mundo percebe que, quando as pessoas que ainda não se livraram das
tendências trotskistas são chamadas de “esquerdistas”, isso tem um tom de ironia.
Lenin se referiu aos “comunistas de esquerda” como esquerdistas, às vezes com e
às vezes sem aspas. Mas todos percebem que Lenin os chamava ironicamente de
esquerdistas, enfatizando, assim, que eram esquerdistas apenas nas palavras, na
aparência, mas que, na realidade, representavam tendências de direita pequeno-
burguesa.
Em que sentido os elementos trotskistas podem ser chamados de esquerdis-
tas (sem aspas), se ontem eles se uniram em um bloco antileninista unido com
elementos abertamente oportunistas e se ligaram direta e imediatamente com
as camadas antissoviéticas do país? Não é verdade que ontem tivemos um bloco
aberto das “esquerdas” e das direitas contra o Partido Leninista, e que esse bloco,
sem dúvida, teve o apoio dos elementos burgueses? E isso não mostra que eles, as
“esquerdas” e os direitistas, não poderiam ter se unido em um bloco único se não
tivessem raízes sociais comuns, se não fossem de natureza oportunista comum?
O bloco trotskista caiu em pedaços há um ano. Alguns dos direitistas, como Sha-
tunovsky, deixaram o bloco. Consequentemente, os membros de direita do bloco
agora se apresentarão como direitistas, enquanto os “esquerdistas” camuflarão
seu direitismo com frases de “esquerda”. Mas que garantia há de que as “esquer-
das” e as direitas não se reencontrarão? (Risos). Obviamente, não há, e não pode
haver, qualquer garantia disso. Mas se defendemos a palavra de ordem de uma
luta em duas frentes, isso significa que estamos proclamando a necessidade do
centrismo em nosso Partido? O que significa uma luta em duas frentes? Isso não
é centrismo? Você sabe que é exatamente assim que os trotskistas descrevem as
440 Obras Escolhidas

coisas: existem os “esquerdistas”, isto é, “nós”, e os trotskistas, os “verdadeiros


leninistas”; existem os “direitistas”, isto é, todo o resto; e, por último, estão os
“centristas”, que vacilam entre as “esquerdas” e as direitas. Isso pode ser conside-
rado uma visão correta do nosso Partido? Obviamente que não. Somente pessoas
que se confundiram em todos os seus conceitos e que há muito romperam com o
marxismo podem dizer isso. Só pode ser dito por quem não consegue ver e com-
preender a diferença de princípio entre o partido social-democrata do período
pré-guerra, que era o partido de um bloco de interesses proletários e pequeno-
burgueses, e o Partido Comunista, que é o partido monolítico do proletariado
revolucionário.
O centrismo não deve ser considerado um conceito espacial: os direitistas,
digamos, sentados de um lado, os “esquerdistas” do outro e os centristas no meio.
Centrismo é um conceito político. Sua ideologia é de adaptação, de subordinação
dos interesses do proletariado aos interesses da pequena burguesia dentro de um
partido comum. Esta ideologia é estranha e repulsiva para o leninismo.
O centrismo foi um fenômeno natural na II Internacional do período anterior
à guerra. Havia direitas (a maioria), esquerdistas (sem aspas) e centristas, cuja
política toda consistia em embelezar o oportunismo dos setores de direita com
frases de esquerda e subordinar os esquerdistas a esses setores.
Qual era, então, a política das esquerdas, das quais os bolcheviques consti-
tuíam o núcleo? Tratava-se de lutar decididamente contra os centristas, de lutar
por uma cisão com os direitistas (especialmente após a eclosão da guerra im-
perialista) e de organizar uma nova Internacional revolucionária composta por
elementos genuinamente de esquerda e proletários.
Por que foi possível que pudesse surgir, naquele momento, tal alinhamento
de forças dentro da Segunda Internacional e tal política dos bolcheviques dentro
dela? Porque a Segunda Internacional era, então, o partido de um bloco de inte-
resses proletários e pequeno-burgueses ao serviço dos social-pacifistas pequeno-
burgueses, social-chauvinistas. Porque os bolcheviques não podiam deixar de
concentrar o seu fogo nos centristas, que procuravam subordinar os elementos
proletários aos interesses da pequena burguesia. Porque os bolcheviques eram,
então, obrigados a defender a ideia de uma divisão. Caso contrário, os proletá-
rios não poderiam ter organizado o seu próprio partido marxista revolucionário
monolítico.
Pode-se afirmar que existe um alinhamento de forças semelhante em nosso
Partido Comunista, e que nele deve ser praticada a mesma política que foi prati-
cada pelos bolcheviques nos partidos da Segunda Internacional do período an-
terior à guerra? Obviamente não. Não deve, porque significaria um fracasso
na compreensão da diferença de princípio entre a social-democracia, como par-
tido de um bloco de elementos proletários e pequeno-burgueses, e o Partido Co-
munista monolítico do proletariado revolucionário. Eles (os sociais-democratas)
tinham uma base de classe subjacente ao partido. Nós (os comunistas) temos
uma base subjacente totalmente diferente. Com eles (os social-democratas), o
centrismo era um fenômeno natural, porque o partido de um bloco de interesses
heterogêneos não pode viver sem os centristas, e os bolcheviques foram obrigados
a trabalhar pela divisão. Conosco (os comunistas), o centrismo não tem sentido, e
J. V. Stalin 441

é incompatível com o princípio do Partido Leninista, pois o Partido Comunista é


o partido monolítico do proletariado, e não o partido de um bloco de elementos
heterogêneos de classe.
E, uma vez que a força dominante no nosso Partido é a mais à esquerda das
tendências do movimento operário mundial (os leninistas), uma política de di-
visão no nosso Partido não tem e não pode ter qualquer justificação do ponto
de vista do leninismo (Uma voz: “A divisão é possível em nosso Partido ou não?”). A
questão não é se a divisão é possível; a questão é que uma política de divisão em
nosso monolítico Partido Leninista não pode ser justificada do ponto de vista do
leninismo.
Quem não consegue compreender esta diferença de princípio está indo contra
o leninismo e está rompendo com o leninismo.
É por isso que penso que só quem perdeu o juízo e perdeu todo vestígio de
marxismo pode afirmar seriamente que a política do nosso Partido, a política de
lutar em duas frentes, é uma política centrista.
Lenin sempre lutou em duas frentes em nosso Partido – tanto contra as “es-
querdas” quanto contra os desvios mencheviques. Estude o panfleto de Lenin,
“Esquerdismo, Doença Infantil do Comunismo”, estude a história de nosso Partido, e
você perceberá que nosso Partido cresceu e ganhou força na luta contra ambos
os desvios – à direita e à “esquerda”. A luta contra os otzovistas e os comunistas
de “esquerda”, por um lado, e a luta contra o desvio abertamente oportunista,
antes, durante e depois da Revolução de Outubro, por outro. Foram essas as fases
pelas quais o nosso Partido passou no seu desenvolvimento. Todos conhecem as
palavras de Lenin, de que devemos travar uma luta tanto contra os oportunistas
declarados quanto contra os doutrinários de “esquerda”.
Isso significa que Lenin era um centrista, que seguia uma política centrista?
Obviamente que não. Sendo esse o caso, o que representam os nossos desviantes
de direita e de “esquerda”?
Quanto ao desvio de direita, não é, evidentemente, o oportunismo dos sociais-
democratas do pré-guerra. O desvio para o oportunismo ainda não é oportu-
nismo. Estamos familiarizados com a explicação que Lenin deu sobre o conceito
de desvio. O desvio à direita é algo que ainda não assumiu a forma de opor-
tunismo e que pode ser corrigido. Consequentemente, um desvio à direita não
deve ser identificado com oportunismo absoluto.
Quanto ao desvio de “esquerda”, é algo diametralmente oposto ao que re-
presentavam as esquerdas extremas da Segunda Internacional do pré-guerra, ou
seja, os bolcheviques. Não são apenas os desviantes de “esquerda” não esquer-
distas sem aspas, eles são essencialmente desviadores de direita, com a diferença,
entretanto, que eles inconscientemente camuflam sua verdadeira natureza por
meio de frases de “esquerda”. Seria um crime contra o Partido não perceber a
grande diferença entre os desviantes de “esquerda” e os genuínos leninistas, que
são os únicos esquerdistas (sem aspas) no nosso Partido. (Uma voz: “E a legaliza-
ção dos desvios?”) Se travar uma luta aberta contra os desvios é legalização, então
deve-se confessar que Lenin os “legalizou” há muito tempo.
Esses desviadores, tanto de direita como de “esquerda”, são recrutados entre
os mais diversos elementos das camadas não proletárias, elementos que refletem
442 Obras Escolhidas

a pressão das forças elementais pequeno-burguesas sobre o Partido e a dege-


neração de certos setores do Partido. Ex-membros de outros partidos; pessoas
no Partido com tendências trotskistas; resquícios de antigos grupos do Partido;
Membros do partido nos aparatos estatal, econômico, cooperativo e sindical que
estão se tornando (ou se tornaram) burocratizados e se vinculam aos elementos
burgueses definitivos desses aparatos; Membros abastados do Partido em nossas
organizações rurais que estão se fundindo com os kulaks, e assim por diante. Esse
é o meio nutritivo para desvios da linha leninista. É óbvio que esses elementos
são incapazes de absorver qualquer coisa genuinamente de esquerda e leninista.
Só são capazes de alimentar o desvio abertamente oportunista, ou o chamado
desvio de “esquerda”, que mascara o seu oportunismo.
Por isso, uma luta em duas frentes é a única política correta para o Partido.
Adicional. As teses estão corretas ao dizer que nosso método principal de
lutar contra o desvio de direita deveria ser o de uma luta ideológica em grande
escala? Eu acho que estão. Seria bom relembrar a experiência da luta contra o
trotskismo. Com o que começamos a luta contra o trotskismo? Foi, talvez, com
penalidades organizacionais? Claro que não! Começamos com uma luta ideoló-
gica. Nós a travamos de 1918 a 1925. Já em 1924, nosso Partido e o Quinto Con-
gresso do Comintern aprovaram uma resolução sobre o trotskismo, definindo-o
como um desvio pequeno-burguês. Não obstante, Trotsky continuou a ser mem-
bro de nosso Comitê Central e Bureau Político. Isso é verdade ou não? É um fato.
consequentemente, “toleramos” Trotsky e os trotskistas no Comitê Central. Por
que permitimos que permanecessem em órgãos dirigentes do Partido? Porque,
naquela época, os trotskistas, apesar de suas divergências com o Partido, obede-
ciam às decisões do Comitê Central e permaneciam leais. Quando começamos a
aplicar penalidades organizacionais extensivamente? Só depois que os trotskistas
se organizaram em uma facção, estabeleceram seu centro operacional, transfor-
maram sua facção em um novo partido e começaram a convocar as pessoas para
manifestações antissoviéticas.
Acho que devemos seguir o mesmo rumo na luta contra o desvio de direita.
O desvio de direita ainda não pode ser considerado como algo que tomou forma
definida e se cristalizou, embora esteja ganhando terreno no Partido. Está ape-
nas em processo de tomar forma e cristalizar. Os desviantes de direita têm uma
facção? Eu penso que não. Pode-se dizer que não se submetem às decisões do
nosso Partido? Acho que ainda não temos motivos para acusá-los disso. Pode-se
afirmar que os desviantes de direita certamente se organizarão em facção? Eu
duvido. Daí, a conclusão de que nosso principal método de lutar contra o desvio
de direita, neste estágio, deveria ser o de uma luta ideológica em grande escala.
Isto é o mais correto, já que existe uma tendência oposta entre alguns dos mem-
bros do nosso Partido: uma tendência para começar a luta contra o desvio de
direita não com uma luta ideológica, mas com sanções organizacionais. Eles di-
zem sem rodeios: dê-nos dez ou vinte desses direitos e faremos picadinho deles
em um instante e, assim, acabaremos com o desvio de direita. Acho, camaradas,
que tais sentimentos são errados e perigosos. Precisamente para evitar ser levado
por tais sentimentos, e para colocar a luta contra o desvio de direita em linhas
corretas, deve ser dito clara e resolutamente que nosso principal método de lutar
contra o desvio de direita nesta fase é uma luta ideológica.
J. V. Stalin 443

Isso significa que descartamos todas as penalidades organizacionais? Não,


não significa. Mas, sem dúvida, significa que as penalidades organizacionais
devem desempenhar um papel subordinado, e se não houver casos de violação
das decisões do Partido por desviantes de direita, não devemos expulsá-los de
organizações ou instituições líderes. (Uma voz: “E a experiência de Moscou?” )
Não creio que houvesse elementos de direita entre os principais camaradas
de Moscou. Havia, em Moscou, uma atitude incorreta em relação aos segmentos
direitistas. Mais precisamente, pode-se dizer que houve uma tendência conci-
liatória aí. Mas não posso dizer que houve um desvio de direita no Comitê de
Moscou. (Uma voz: “Mas houve uma luta organizacional?” )
Houve uma luta organizacional, embora tenha desempenhado um papel me-
nor. Houve tal luta porque novas eleições estão sendo realizadas em Moscou com
base na autocrítica, e as reuniões distritais de ativistas têm o direito de substituir
seus secretários (Uma voz: “Foram anunciadas novas eleições de nossos secretários?” ).
Ninguém proibiu novas eleições de secretários. Há o apelo de junho do Comitê
Central, que diz expressamente que o desenvolvimento da autocrítica pode se tor-
nar uma frase vazia se as organizações inferiores não tiverem garantido o direito
de substituir qualquer secretário, ou qualquer comitê. Que objeção você pode
fazer a tal recurso? (Uma voz: “Antes da Conferência em Parte?” ). Sim, mesmo antes
da Conferência em Parte.
Vejo um sorriso incrédulo no rosto de alguns camaradas. Isso não vai funcio-
nar, camaradas. Vejo que alguns de vocês têm um desejo irreprimível de remover
certos porta-vozes do desvio de direita de seus postos o mais rápido possível. Mas
isso, queridos camaradas, não é solução para o problema. Claro, é mais fácil re-
mover pessoas de seus cargos do que conduzir uma campanha ampla e inteligente
explicando o desvio, o perigo e como combatê-lo. Mas o que é mais fácil não deve
ser considerado o melhor. Seja o melhor em organizar uma ampla campanha ex-
plicativa contra o perigo de direita – e não percamos tempo em organizar isso – e
então você verá que, quanto mais ampla e profunda a campanha, pior será para
o desvio de direita. É por isso que acho que o ponto central de nossa luta contra
o desvio de direita deve ser uma luta ideológica.
Quanto ao Comitê de Moscou, não sei se algo pode ser adicionado ao que
Uglanov disse em sua resposta à discussão na plenária do Comitê de Moscou e
da Comissão de Controle de Moscou do PCUS (B). Ele disse claramente: “Se
nos lembrarmos um pouco da história, se nos lembrarmos de como lutei contra
Zinoviev em Leningrado em 1921, verá que naquela época a ‘confusão’ foi um
pouco mais violenta. Fomos os vencedores porque tínhamos a razão. Temos sido
derrotados agora porque estamos errados. Vai ser uma boa lição”.
Conclui-se que Uglanov está travando uma luta agora, da mesma forma que
uma vez travou uma luta contra Zinoviev. Contra quem, pode-se perguntar, ele
tem travado sua luta atual? Evidentemente, contra a política do CC. Contra quem
mais ele poderia ter travado isso? Com base em que ele poderia ter travado essa
luta? Obviamente, com base na conciliação para o desvio de direita.
As teses, portanto, muito acertadamente sublinham, como uma das tarefas
imediatas do nosso Partido, a necessidade de travar uma luta contra a concilia-
ção para os desvios da linha leninista, especialmente contra a conciliação para o
444 Obras Escolhidas

desvio de direita.
Finalmente, um último ponto. As teses dizem que devemos enfatizar particu-
larmente a necessidade, neste momento, de combater o desvio de direita. O que
isso significa? Significa que, neste momento, o perigo certo é o principal perigo
do nosso Partido. Uma luta contra as tendências trotskistas, e uma luta concen-
trada nisso, já se arrasta há cerca de dez anos. Esta luta resultou na derrota dos
principais quadros trotskistas. Não se pode dizer que a luta contra a tendência
abertamente oportunista tem sido travada ultimamente com igual intensidade.
Não foi travada com especial intensidade, porque o desvio à direita ainda está em
um período de formação e cristalização, crescendo e ganhando força devido ao
fortalecimento das forças elementais pequeno-burguesas, que foram alimentadas
por nossas dificuldades de colheita de grãos. O golpe principal deve, portanto,
ser dirigido ao desvio de direita.
Para terminar, gostaria, camaradas, de referir mais um fato, que não foi aqui
referido e que, a meu ver, não é de pouca importância. Nós, membros do Bu-
reau Político, expusemos nossas teses sobre os números de controle. Em meu
discurso, considerei essas teses inquestionavelmente corretas. Não digo que cer-
tas correções não possam ser feitas nas teses. Mas que estão no essencial corretas
e asseguram o bom andamento da linha leninista, disso não pode haver nenhuma
dúvida. Bem, devo dizer-lhes que nós, no Bureau Político, aprovamos estas teses
por unanimidade. Penso que este fato tem alguma importância face aos rumores
que de vez em quando se espalham nas nossas fileiras por diversos malfeitores,
opositores e inimigos do nosso Partido. Tenho em mente os rumores de que no
Bureau Político temos um desvio de direita, um desvio de “esquerda”, concili-
ação e diabo sabe o que mais. Que essas teses sirvam como mais uma prova, a
centésima ou centésima primeira, de que nós, no Bureau Político, estamos todos
unidos.
Gostaria que este plenária aprovasse estas teses, em princípio, com igual una-
nimidade. (Aplausos.)
Pravda, nº 273.
24 de novembro de 1928
J. V. Stalin 445

Sobre questões de política agrária


na URSS
27 de dezembro de 1929

Discurso proferido em uma conferência de estudantes marxistas das questões agrárias.254

Camaradas, o principal fato de nossa vida social e econômica na atualidade,


fato que está atraindo a atenção universal, é o tremendo crescimento do movi-
mento das fazendas coletivas.
O traço característico do atual movimento das fazendas coletivas é que não
apenas as fazendas coletivas estão sendo aderidas por grupos individuais de cam-
poneses pobres, como tem sido o caso até agora, mas que estão sendo aderidas
pela massa dos camponeses médios também. Isso significa que o movimento das
fazendas coletivas se transformou de um movimento de grupos individuais e se-
tores de camponeses trabalhadores em um movimento de milhões e milhões da
massa principal do campesinato. Isso, aliás, explica o fato tremendamente im-
portante de que o movimento das fazendas coletivas, que assumiu o caráter de
uma avalanche poderosa e crescente anti-kulak, está varrendo a resistência do ku-
lak de seu caminho, está despedaçando essa classe e pavimentando o caminho
para extensas construções socialistas no campo.
Mas, embora tenhamos motivos para nos orgulhar dos sucessos práticos al-
cançados na construção socialista, o mesmo não se pode dizer de nosso trabalho
teórico no campo econômico em geral e no da agricultura em particular. Mais do
que isso, é preciso admitir que o pensamento teórico não acompanha os nossos
sucessos práticos, que existe uma certa lacuna entre os nossos sucessos práticos e
o desenvolvimento do pensamento teórico. No entanto, é essencial que o traba-
lho teórico não só acompanhe o trabalho prático, mas se mantenha à frente dele
e sustente nossos trabalhadores em sua luta pela vitória do socialismo.
Não vou me alongar aqui sobre a importância da teoria. Vocês estão bem ci-
entes de sua importância. Vocês sabem que a teoria, se for uma teoria genuína, dá
aos trabalhadores práticos o poder de orientação, clareza de perspectiva, confi-
ança em seu trabalho, fé na vitória de nossa causa. Tudo isso é, e necessariamente
deve ser, imensamente importante em nosso trabalho de construção socialista. O
que é lamentável é que precisamente nesta esfera, na esfera do tratamento teórico
das questões da nossa economia, começamos a ficar para trás.
De que outra forma podemos explicar o fato de que em nosso país, em nossa
vida social e política, várias teorias burguesas e pequeno-burguesas sobre ques-
tões de nossa economia ainda são atuais? Como podemos explicar o fato de que
essas teorias ainda não estão encontrando uma rejeição adequada? Como pode-
254A Conferência Sindical de Estudantes Marxistas de Questões Agrárias, convocada pela Academia
Comunista do CEC da URSS, foi realizada de 20 a 27 de dezembro de 1929. Os 302 delegados que
compareceram representaram instituições de pesquisa científica, escolas agrícolas e econômicas e
jornais e revistas. Stalin fez este discurso na reunião plenária de encerramento em 27 de dezembro.
446 Obras Escolhidas

mos explicar o fato de que uma série de teses fundamentais da economia polí-
tica marxista-leninista, que são o antídoto mais eficaz para as teorias burguesas
e pequeno-burguesas, estão começando a ser esquecidas, não são popularizadas
em nossa imprensa, por algum motivo não colocado em primeiro plano? É difícil
entender que, a menos que uma luta implacável contra as teorias burguesas seja
travada com base na teoria marxista-leninista, será impossível alcançar a vitória
completa sobre nossos inimigos de classe?
Uma nova experiência prática está dando origem a uma nova abordagem aos
problemas da economia do período de transição. As questões da NEP, das classes,
do ritmo de construção, do vínculo com o campesinato, da política do Partido,
passam a ser apresentadas de uma nova forma. Se não quisermos ficar para trás
na prática, devemos começar imediatamente a trabalhar em todos esses proble-
mas à luz da nova situação. A menos que o façamos, será impossível superar
as teorias burguesas que estão enchendo de lixo as cabeças de nossos operários
práticos. A menos que façamos isso, será impossível erradicar essas teorias que
estão adquirindo a tenacidade de preconceitos. Pois somente combatendo os
preconceitos burgueses no campo da teoria é possível consolidar a posição do
marxismo-leninismo.
Permitam-me agora caracterizar pelo menos alguns desses preconceitos bur-
gueses que são chamados de teorias, e demonstrar sua falta de fundamento à luz
de certos problemas-chave de nosso trabalho de construção.

I. A teoria do ''equilíbrio''

Vocês sabem, é claro, que a chamada teoria do “equilíbrio” entre os setores


de nossa economia nacional ainda é corrente entre os comunistas. Essa teoria, é
claro, nada tem em comum com o marxismo. No entanto, é uma teoria que está
sendo difundida por várias pessoas no campo dos sabotadores de direita.
Essa teoria pressupõe que temos, em primeiro lugar, um setor socialista –
que é um compartimento, por assim dizer – e que, além disso, temos um setor
não socialista ou, se você preferir, capitalista – que é outro compartimento. Esses
dois “compartimentos” estão em trilhos diferentes e deslizam pacificamente para
a frente, sem se tocarem. A geometria ensina que as linhas paralelas não se en-
contram. Mas os autores dessa teoria notável acreditam que essas linhas paralelas
acabarão por se encontrar e que, quando isso acontecer, teremos socialismo. Esta
teoria ignora o fato de que, por trás desses chamados “compartimentos”, existem
classes, e que o movimento desses compartimentos ocorre por meio de uma luta
de classes feroz, uma luta de vida ou morte, uma luta com o princípio de “quem
vai vencer quem?”.
Não é difícil perceber que essa teoria nada tem em comum com o leninismo.
Não é difícil perceber que, objetivamente, o propósito dessa teoria é defender
a posição da agricultura camponesa individual, armar os elementos kulak com
uma “nova” arma teórica em sua luta contra as fazendas coletivas e desacreditar
as mesmas.
No entanto, essa teoria ainda é corrente em nossa imprensa. E não se pode
dizer que encontrou uma rejeição séria, muito menos uma rejeição esmagadora,
J. V. Stalin 447

por parte de nossos teóricos. Como essa incongruência pode ser explicada senão
pelo atraso de nosso pensamento teórico? E, no entanto, basta tirar do tesouro
do marxismo a teoria da reprodução e contrapô-la à teoria do equilíbrio dos se-
tores para que esta última teoria seja apagada sem deixar vestígios. Na verdade,
a teoria marxista da reprodução ensina que a sociedade moderna não pode se
desenvolver sem acumular ano a ano, e a acumulação é impossível a menos que
haja reprodução expandida de ano a ano. Isso é claro e compreensível. Nossa in-
dústria socialista centralizada em grande escala está se desenvolvendo de acordo
com a teoria marxista da reprodução expandida, pois está crescendo em volume
a cada ano, tem seus acúmulos e avança a passos gigantes.
Mas nossa grande indústria não constitui toda a economia nacional. Ao con-
trário, a economia do pequeno camponês ainda predomina nela. Podemos dizer
que nossa economia camponesa está se desenvolvendo de acordo com o princípio
da reprodução ampliada? Não, nós não podemos. Não apenas não há reprodu-
ção anual expandida no grosso de nossa economia de pequenos camponeses, mas,
ao contrário, raramente ele é capaz de alcançar até mesmo uma reprodução sim-
ples. Podemos desenvolver nossa indústria socializada em um ritmo acelerado
enquanto temos uma base agrícola como a economia de pequenos camponeses,
que é incapaz de reprodução expandida e que, além disso, é a força predomi-
nante em nossa economia nacional? Não, nós não podemos. O poder soviético
e o trabalho de construção socialista podem repousar por algum tempo em duas
bases diferentes: na indústria socialista mais concentrada e em grande escala, e
na economia camponesa mais desunida e atrasada, de pequenas mercadorias?
Não, eles não podem. Mais cedo ou mais tarde, isso acabaria no colapso total de
toda a economia nacional.
Qual é, então, a saída? A saída está em tornar a agricultura em uma agricul-
tura de grande escala, em torná-la capaz de acumulação, de reprodução ampliada
e, assim, transformar a base agrícola da economia nacional.
Mas como isso pode ser feito em grande escala?
Há duas maneiras de fazer isso. Existe o caminho capitalista, que consiste em
tornar a agricultura em grande escala implantando o capitalismo na agricultura –
um caminho que leva ao empobrecimento do campesinato e ao desenvolvimento
de empresas capitalistas na agricultura. Rejeitamos esse caminho por ser incom-
patível com a economia soviética.
Há outro caminho: o caminho socialista, que é introduzir fazendas coleti-
vas e fazendas estatais na agricultura, o caminho que leva à união das pequenas
fazendas camponesas em grandes fazendas coletivas, empregando máquinas e
métodos científicos de agricultura, e capazes de se desenvolver ainda mais, pois
essas fazendas podem alcançar uma reprodução ampliada.
E assim, a questão é a seguinte: de um jeito ou de outro. Ou de volta ao
capitalismo, ou à frente ao socialismo. Não existe e não pode haver nenhuma
terceira via.
A teoria do “equilíbrio” é uma tentativa de indicar uma terceira via. E preci-
samente porque se baseia em uma terceira via (inexistente), é utópica e antimar-
xista.
Você vê, portanto, que tudo o que era necessário era contrapor a teoria da
448 Obras Escolhidas

reprodução de Marx a esta teoria do “equilíbrio” dos setores para que esta última
teoria fosse eliminada sem deixar vestígios.
Por que, então, nossos estudantes marxistas de questões agrárias não fazem
isso? De quem é o interesse que a ridícula teoria do “equilíbrio” seja difundida
em nossa imprensa enquanto a teoria marxista da reprodução é mantida oculta?

II. A teoria da ''espontaneidade'' na construção


socialista

Tomemos agora o segundo preconceito da economia política, o segundo tipo


de teoria burguesa. Tenho em mente a teoria da “espontaneidade” na construção
socialista – uma teoria que nada tem em comum com o marxismo, mas que está
sendo zelosamente defendida por nossos camaradas de direita.
Os autores desta teoria afirmam aproximadamente o seguinte. Houve um
tempo em que existia o capitalismo em nosso país, a indústria se desenvolvia em
bases capitalistas, e o campo seguia a cidade capitalista espontaneamente, auto-
maticamente, transformando-se à imagem da cidade capitalista. Já que foi isso o
que aconteceu no capitalismo, por que o mesmo não deveria acontecer no sistema
econômico soviético? Por que não deveria o campo, a pequena agricultura cam-
ponesa, seguir automaticamente a cidade socialista, transformando-se esponta-
neamente à imagem da cidade socialista? Com base nisso, os autores dessa teoria
afirmam que o campo pode seguir automaticamente a cidade socialista. Assim,
surge a pergunta: vale a pena nos preocuparmos em organizar fazendas estatais
e fazendas coletivas; vale a pena quebrar lanças por causa disso, se o campo pode,
em qualquer caso, seguir a cidade socialista?
Aqui você tem outra teoria que, objetivamente, busca fornecer aos elementos
capitalistas do campo uma nova arma para sua luta contra as fazendas coletivas.
A natureza antimarxista desta teoria está além de qualquer dúvida.
Não é estranho que nossos teóricos ainda não tenham se dado ao trabalho
de extirpar essa teoria esquisita que está enchendo de lixo as cabeças de nossos
trabalhadores da fazenda coletiva?
Não há dúvida de que o protagonismo da cidade socialista em relação ao
campo individualista e camponês é grande e de valor inestimável. É precisamente
nisso que se baseia o papel da indústria na transformação da agricultura. Mas
esse fator é suficiente para fazer com que o camponês siga automaticamente a
cidade nas obras de construção socialista? Não, não é suficiente.
No capitalismo, o campo seguia automaticamente a cidade porque a econo-
mia capitalista da cidade e a economia de pequenas mercadorias do camponês
são, basicamente, economias do mesmo tipo. É claro que a economia mercantil do
pequeno camponês ainda não é uma economia capitalista. Mas é, basicamente,
o mesmo tipo de economia que a economia capitalista, uma vez que se baseia
na propriedade privada dos meios de produção. Lenin estava mil vezes certo
quando, em suas notas sobre a “Economia do Período de Transição” de Bukharin,
referiu-se à “tendência capitalista do campesinato” em contraste com a “tendên-
cia socialista do proletariado”. É isso que explica por que “a pequena produção
J. V. Stalin 449

engendra o capitalismo e a burguesia continuamente, diariamente, a cada hora,


espontaneamente e em escala de massa”.
É possível dizer que a economia camponesa, composta basicamente de pe-
quenas mercadorias, é o mesmo tipo de economia que a produção socialista nas
cidades? Obviamente, é impossível dizer isso sem romper com o marxismo. Caso
contrário, Lenin não teria dito que “enquanto vivermos em um país de peque-
nos camponeses, haverá uma base econômica mais segura para o capitalismo na
Rússia do que para o comunismo”.
Consequentemente, a teoria da “espontaneidade” na construção socialista é
uma teoria podre e antileninista.
Para que o campesinato camponês acompanhe a cidade socialista, é necessá-
rio, além de tudo, introduzir no campo grandes fazendas socialistas sob a forma
de fazendas estatais e fazendas coletivas, como base do socialismo, que— encabe-
çado pela cidade socialista – poderá assumir a liderança da massa principal do
campesinato.
A teoria da “espontaneidade” na construção socialista é uma teoria antimar-
xista. A cidade socialista pode liderar o campo de pequenos camponeses, intro-
duzindo fazendas coletivas e fazendas estatais e transformando o campo segundo
um novo padrão socialista.
É estranho que a teoria antimarxista da “espontaneidade” na construção soci-
alista não tenha, até agora, encontrado uma rejeição adequada de nossos teóricos
agrários.

III. A teoria da ''estabilidade'' da agricultura do


pequeno camponês

Tomemos, agora, o terceiro preconceito da economia política, a teoria da “es-


tabilidade” da pequena agricultura camponesa. Todos estão familiarizados com
o argumento da economia política burguesa, de que a conhecida tese marxista
sobre as vantagens da produção em grande escala sobre a pequena produção se
aplica apenas à indústria, e não à agricultura. Teóricos social-democratas como
David e Hertz, que defendem esta teoria, tentaram “basear-se” no fato de que o
pequeno camponês é resistente e paciente, que está pronto para suportar qual-
quer privação, se ao menos puder manter o seu pequeno lote de terra, e que,
como consequência, a economia camponesa apresenta estabilidade na luta con-
tra a economia de grande escala na agricultura.
Não é difícil entender que tal “estabilidade” é pior do que qualquer instabili-
dade. Não é difícil entender que esta teoria antimarxista tem apenas um objetivo:
elogiar e fortalecer o sistema capitalista que arruína as grandes massas de peque-
nos camponeses. E é precisamente porque essa teoria persegue esse objetivo, que
tem sido tão fácil para os marxistas destruí-la.
Mas não é esse o ponto agora. A questão é que nossa prática, nossa reali-
dade, está fornecendo novos argumentos contra essa teoria, mas nossos teóricos,
estranhamente, não querem – ou não podem – fazer uso dessa nova arma contra
os inimigos da classe trabalhadora. Tenho em mente nossa prática de abolir a
450 Obras Escolhidas

propriedade privada da terra, nossa prática de nacionalizar a terra, nossa prá-


tica que liberta o pequeno camponês de seu apego servil ao seu pequeno pedaço
de terra e, assim, ajuda na mudança da pequena agricultura camponesa para a
agricultura coletiva em grande escala.
Na verdade, o que é que amarrou, ainda está amarrando e continuará a amar-
rar o pequeno camponês da Europa Ocidental à sua agricultura de pequenas mer-
cadorias? Principalmente o fato de ele ser proprietário de seu pequeno pedaço
de terra, a existência de propriedade privada de terras. Durante anos, ele eco-
nomizou dinheiro para comprar um pequeno pedaço de terra; ele o comprou,
e é claro que não quer se desfazer dele, preferindo suportar qualquer privação,
preferindo afundar na barbárie e na pobreza abjeta, se ao menos puder manter
seu pequeno pedaço de terra, base de sua economia individual.
Pode-se dizer que esse fator, nesta forma, continua operando em nosso país,
sob o sistema soviético? Não, não pode ser dito. Isso não pode ser dito por um
motivo: não existe propriedade privada de terras em nosso país. E precisamente
porque não há propriedade privada da terra em nosso país, nossos camponeses
não exibem aquele apego servil a um lote de terra que se vê no Ocidente. E esta
circunstância só pode facilitar a transição da agricultura familiar para a agricul-
tura coletiva.
Essa é uma das razões pelas quais as grandes fazendas, as fazendas coletivas do
nosso campo, conseguem em nosso país, onde a terra é nacionalizada, demons-
trar tão facilmente sua superioridade sobre as pequenas fazendas camponesas.
Esse é o grande significado revolucionário das leis agrárias soviéticas que abo-
liram a renda absoluta, aboliram a propriedade privada da terra e levaram a cabo
a nacionalização da terra.
Mas daí decorre que agora temos sob nosso comando um novo argumento
contra os economistas burgueses que proclamam a estabilidade da pequena agri-
cultura camponesa em sua luta contra a grande agricultura.
Por que, então, este novo argumento não é suficientemente utilizado por nos-
sos teóricos agrários em sua luta contra todas as várias teorias burguesas? Quando
nacionalizamos a terra, nosso ponto de partida foi, entre outras coisas, as pre-
missas teóricas estabelecidas no terceiro volume de “O Capital”, conhecido livro
de Marx, teorias da mais-valia, e nas obras de Lenin sobre questões agrárias, que
representam um tesouro extremamente rico de pensamento teórico. Refiro-me
à teoria da renda fundiária em geral e à teoria da renda fundiária absoluta em
particular. Agora está claro que os princípios teóricos estabelecidos nessas obras
foram brilhantemente confirmados pela experiência prática de nosso trabalho
de construção socialista na cidade e no campo.
A única coisa incompreensível é porque as teorias anticientíficas de econo-
mistas “soviéticos”, como Chayanov, deveriam ser livremente correntes em nossa
imprensa, enquanto as obras geniais de Marx, Engels e Lenin, lidando com a
teoria da renda fundiária e da renda absoluta, não são popularizadas e trazidas
para o primeiro plano, sendo ocultadas.
Vocês, sem dúvida, se lembram do conhecido panfleto de Engels, “A Questão
do Camponês”. Evidentemente, vocês se lembram com que circunspecção Engels
aborda a questão da transição dos pequenos camponeses ao caminho da agricul-
J. V. Stalin 451

tura cooperativa, ao caminho da agricultura coletiva. Permita-me citar a passa-


gem em questão de Engels255 :
Estamos decididamente do lado do pequeno camponês; faremos tudo o que for permitido
para tornar sua sorte mais suportável, para facilitar sua transição para a cooperativa caso ele
decida fazê-lo, e até mesmo para tornar possível que ele permaneça em seu pequeno pedaço
de terra por um longo período de tempo para pensar sobre o assunto, caso ele ainda seja
incapaz de tomar essa decisão.

Você vê com que circunspecção Engels aborda a questão da transição da agri-


cultura camponesa individual para linhas coletivistas. Como explicar esta cir-
cunspecção de Engels, que à primeira vista parece exagerada? De onde ele pro-
cedeu? Obviamente, ele partiu da existência da propriedade privada da terra,
do fato de o camponês ter “seu pequeno pedaço de terra”, do qual terá dificul-
dade em se desfazer. Assim é o campesinato do Ocidente. Esse é o campesinato
nos países capitalistas, onde existe propriedade privada da terra. Naturalmente,
grande cautela é necessária aqui.
Pode-se dizer que tal situação existe em nosso país, na URSS? Não, eu não
posso. Isso não pode ser dito porque aqui não temos propriedade privada da
terra que acorrenta o camponês à sua fazenda individual. Não se pode dizer
porque, em nosso país, a terra está nacionalizada, o que facilita a passagem do
camponês individual para as linhas coletivistas.
Essa é uma das razões da relativa facilidade e rapidez com que ultimamente
se desenvolve o movimento da fazenda coletiva em nosso país.
É de se lamentar que nossos teóricos agrários ainda não tenham procurado
evidenciar com a devida clareza essa diferença entre a situação do campesinato
em nosso país e a do Ocidente. E, no entanto, isso seria de grande valor, não
apenas para nós, que trabalhamos na União Soviética, mas para os comunistas
em todos os países. Pois não é indiferente para a revolução proletária nos países
capitalistas se, desde o primeiro dia da tomada do poder pelo proletariado, o
socialismo terá de ser construído com base na nacionalização da terra ou sem
essa base.
Em meu artigo recente (“Um ano de grandes mudanças”), apresentei alguns ar-
gumentos para provar a superioridade da agricultura em grande escala sobre a
pequena; nisso, eu tinha em mente grandes fazendas estatais. É evidente que
todos esses argumentos se aplicam plena e inteiramente também às fazendas co-
letivas, como grandes unidades econômicas. Não estou falando apenas de fazen-
das coletivas desenvolvidas, que dispõem de máquinas e tratores, mas também
de fazendas coletivas em seu estágio primário, que representam, por assim dizer,
o período de manufatura do desenvolvimento da fazenda coletiva e se baseiam
nos implementos das fazendas menores. Refiro-me às fazendas coletivas em seu
estágio primário, que agora estão sendo formadas nas áreas de coletivização com-
pleta e que se baseiam na simples combinação dos instrumentos de produção dos
camponeses.
Tomemos, por exemplo, as fazendas coletivas da área de Khoper, na antiga
região do Don. Externamente, do ponto de vista do equipamento técnico, essas
fazendas coletivas dificilmente se diferenciam das pequenas fazendas campone-
255 Refere-se a F. Engels, “A questão do camponês na França e Alemanha”, 1922, p. 66
452 Obras Escolhidas

sas (poucas máquinas, poucos tratores). E, no entanto, a simples combinação dos


implementos de produção dos camponeses dentro das fazendas coletivas pro-
duziu resultados com os quais nossos trabalhadores práticos nunca sonharam.
Quais são esses resultados? O fato de que a transição para a agricultura coletiva
ocasionou um aumento da área de cultivo em 30%, 40% e 50%. Como esses resul-
tados “estonteantes” podem ser explicados? Pelo fato de que os camponeses, que
eram impotentes sob as condições do trabalho individual, foram transformados
em uma força poderosa, uma vez que juntaram seus implementos e se uniram em
fazendas coletivas. Pelo fato de que se tornou possível aos camponeses cultivar
terras abandonadas e solo virgem, que é difícil de cultivar com trabalho indi-
vidual. Pelo fato de que os camponeses puderam aproveitar-se do solo virgem.
Pelo fato de que terras devastadas, lotes isolados, limites de campo, etc., agora
podiam ser cultivados.
A questão do cultivo de terras abandonadas e solo virgem é de enorme im-
portância para nossa agricultura. Vocês sabem que o pivô do movimento revo-
lucionário na Rússia nos velhos tempos era a questão agrária. Vocês sabem que
um dos objetivos do movimento agrário era acabar com a escassez de terras. Na-
quela época, muitos pensavam que essa escassez de terras era absoluta, ou seja,
que não havia mais na Rússia terras livres adequadas para cultivo. E o que real-
mente provou ser a situação? Agora, está bastante claro que dezenas de milhões
de hectares de terra livre estavam e ainda estão disponíveis na URSS. Mas os cam-
poneses eram incapazes de cultivar essa terra com seus miseráveis implementos.
E precisamente porque não podiam cultivar terras abandonadas e solo virgem,
ansiavam por “solo macio”, pelo solo que pertencia aos proprietários, por solo
que pudesse ser lavrado com a ajuda de ferramentas camponesas por trabalho
individual. Isso foi o motivo da “escassez de terras”. Não é surpreendente, por-
tanto, que nosso truste de grãos, equipado com tratores, seja agora capaz de
cultivar cerca de vinte milhões de hectares de terras livres, terras não ocupadas
pelos camponeses e impróprias para o cultivo de mão-de-obra individual com a
ajuda de pequenos implementos camponeses.
O significado do movimento da fazenda coletiva em todas as suas fases – tanto
em sua fase primária quanto em sua fase mais desenvolvida, quando é equipado
com tratores – reside, por um lado, no fato de que agora é possível para os cam-
poneses cultivarem materiais em terras negligenciadas e de solo virgem. Esse é
o segredo da tremenda expansão da área de cultivo que acompanha a transição
dos camponeses para o trabalho coletivo. Essa é uma das razões da superioridade
das fazendas coletivas sobre as fazendas camponesas individuais.
Nem é preciso dizer que a superioridade das fazendas coletivas sobre as fazen-
das camponesas individuais se tornará ainda mais incontestável quando nossas
estações de máquinas, tratores, e colunas de trator vierem em auxílio das fazen-
das coletivas recém-formadas nas áreas de coletivização completa, e quando as
fazendas coletivas terão condições de possuir tratores e colheitadeiras.
J. V. Stalin 453

IV. Cidade e o campo

Em relação às chamadas “tesouras”, existe um preconceito, fomentado pelos


economistas burgueses, contra o qual se deve declarar uma guerra implacável,
como contra todas as outras teorias burguesas que, infelizmente, circulam na im-
prensa soviética. Tenho em mente a teoria que alega que a Revolução de Outubro
trouxe menos benefícios ao campesinato do que a Revolução de Fevereiro, que,
de fato, a Revolução de Outubro não trouxe benefícios ao campesinato.
Em certa época, esse preconceito foi ampliado em nossa imprensa por um
economista “soviético”. Este economista “soviético”, é verdade, mais tarde re-
nunciou à sua teoria. (Uma voz: “Quem era?” ). Era Groman. Mas essa teoria foi
aproveitada pela oposição Trotsky-Zinoviev e usada contra o Partido. Além disso,
não há fundamentos para alegar que não seja atual mesmo agora nos círculos pú-
blicos “soviéticos”.
Esta é uma questão muito importante, camaradas. Aborda o problema das
relações entre a cidade e o campo. Ele aborda o problema de eliminar a antítese
entre a cidade e o campo. Ele toca na questão muito urgente da “tesoura”. Acho,
portanto, que vale a pena examinar essa estranha teoria.
É verdade que a Revolução de Outubro não trouxe benefícios aos campone-
ses? Voltemos aos fatos.
Tenho diante de mim a tabela elaborada pelo camarada Nemchinov, o conhe-
cido estatístico, que foi publicada em meu artigo “No front dos grãos”. A partir
dessa tabela, pode-se ver que, em tempos pré-revolucionários, os proprietários
“não produziam” menos de 600 milhões de puds de grãos. Consequentemente,
os latifundiários eram, então, proprietários de 600 milhões de puds de grãos.
Os kulaks, conforme mostrado nesta tabela, na época “produziram” 1.900.000.
000 de puds de grãos. Isso representa o grande poder que os kulaks exerciam
naquela época.
Os camponeses pobres e médios, conforme mostrado na mesma tabela, pro-
duziram 2.500.000.000 de puds de grãos.
Essa era a situação no velho campo, antes da Revolução de Outubro.
Que mudanças ocorreram no campo desde outubro? Cito os números da
mesma tabela. Veja, por exemplo, o ano de 1927. Quanto os proprietários de ter-
ras produziram naquele ano? Obviamente, eles não produziram nada e não pu-
deram produzir nada porque foram abolidos pela Revolução de Outubro. Você
perceberá que isso deve ter sido um grande alívio para o campesinato; pois os
camponeses foram libertados do jugo dos latifundiários. Isso, é claro, foi um
grande ganho para o campesinato, obtido com a Revolução de Outubro.
Quanto os kulaks produziram em 1927? Seiscentos milhões de puds de grãos
em vez de 1.900.000.000. Assim, durante o período que se seguiu à Revolução de
Outubro, os kulaks perderam mais de dois terços de seu poder. Vocês perceberão
que isso iria aliviar a situação dos camponeses pobres e médios.
E quanto os camponeses pobres e médios produziram em 1927? Quatro bilhões
de puds, em vez de 2.500.000.000. Assim, após a Revolução de Outubro, os cam-
poneses pobres e médios começaram a produzir 1.500.000.000 de puds a mais do
454 Obras Escolhidas

que nos tempos pré-revolucionários.


Aí, vocês tem fatos que mostram que a Revolução de Outubro trouxe ganhos
colossais para os camponeses pobres e médios.
Isso é o que a Revolução de Outubro trouxe aos camponeses pobres e médios.
Como, depois disso, se pode afirmar que a Revolução de Outubro não trouxe
benefícios para os camponeses?
Mas isso não é tudo, camaradas. A Revolução de Outubro aboliu a proprie-
dade privada da terra, acabou com a compra e venda de terras, levou a cabo a
nacionalização da terra. O que isto significa? Isso significa que agora o cam-
ponês não precisa mais comprar terras para produzir grãos. Anteriormente, ele
economizava anos para adquirir terras; ele se endividou, ficou preso, se ao me-
nos comprasse um pedaço de terra. O gasto que a compra de terras envolvia,
naturalmente aumentava o custo de produção dos grãos. Agora, o camponês
não tem que fazer isso. Ele pode produzir grãos, agora, sem comprar terras.
Consequentemente, as centenas de milhões de rublos que antes eram gastos pe-
los camponeses na compra de terras agora permanecem em seus bolsos. Isso
ameniza a situação dos camponeses ou não? Obviamente, sim.
Adicional. Até recentemente, o camponês era obrigado a cavar o solo com
implementos antiquados pelo trabalho individual. Todos sabem que o trabalho
individual, equipado com instrumentos de produção antiquados, agora inade-
quados, não traz os ganhos necessários para permitir uma existência tolerável,
melhorar sistematicamente sua posição material, desenvolver sua cultura e emer-
gir no caminho de alta construção socialista. Hoje, após o desenvolvimento ace-
lerado do movimento da fazenda coletiva, os camponeses podem combinar seu
trabalho com o de seus vizinhos, se unir em fazendas coletivas, arar solo virgem,
utilizar terras abandonadas, obter máquinas e tratores e, assim, dobrar ou mesmo
triplicar a produtividade do trabalho. E o que isto significa? Isso significa que
hoje o camponês, ao ingressar na fazenda coletiva, pode produzir muito mais do
que antes com o mesmo dispêndio de trabalho. Isso significa, portanto, que os
grãos serão produzidos muito mais barato do que era o caso até recentemente.
Significa, enfim, que, com preços estáveis, o camponês pode obter muito mais
por seus grãos do que obteve até agora.
Como, depois de tudo isso, se pode afirmar que a Revolução de Outubro não
trouxe ganhos para o campesinato?
Não está claro que aqueles que proferem tais ficções obviamente caluniam o
Partido e o poder soviético?
Mas o que se segue de tudo isso?
Segue-se que a questão da “tesoura”, a questão de acabar com a “tesoura”,
deve agora ser abordada de uma nova maneira. Segue-se que, se o movimento
das fazendas coletivas crescer no ritmo atual, a “tesoura” será abolida em um
futuro próximo. Segue-se que a questão das relações entre a cidade e o campo
passa a ter uma nova base, que a antítese entre a cidade e o campo vai desaparecer
a um ritmo acelerado.
Esta circunstância, camaradas, é de grande importância para todo o nosso
trabalho de construção. Transforma a mentalidade do camponês e o direciona
J. V. Stalin 455

para a cidade. Ele cria a base para eliminar a antítese entre cidade e campo.
Cria a base para que a palavra de ordem do Partido – “face para o campo” – seja
complementada pela palavra de ordem dos camponeses coletivos: “face para a
cidade”.

V. A natureza das fazendas coletivas


A fazenda coletiva, como forma de economia, é uma das formas de economia
socialista. Não pode haver nenhuma dúvida sobre isso.
Um dos palestrantes aqui tentou desacreditar as fazendas coletivas. Ele afir-
mou que as fazendas coletivas, como organizações econômicas, nada têm em co-
mum com a forma socialista de economia. Devo dizer, camaradas, que tal ca-
racterização das fazendas coletivas está absolutamente errada. Não pode haver
dúvida de que nada tem em comum com o verdadeiro estado de coisas.
O que determina o tipo de economia? Obviamente, as relações entre as pes-
soas no processo de produção. De que outra forma o tipo de economia pode ser
determinado? Mas existe nas fazendas coletivas uma classe de pessoas que possui
os meios de produção e uma classe de pessoas que são privadas desses meios de
produção? Existe uma classe exploradora e uma classe explorada nas fazendas
coletivas? A fazenda coletiva não representa a socialização dos principais ins-
trumentos de produção nas terras do Estado? Quais são os fundamentos para
afirmar que as fazendas coletivas, como forma de economia, não representam
uma das formas de economia socialista?
Claro, existem contradições nas fazendas coletivas. É claro que existem sobre-
vivências individualistas e até mesmo kulaks nas fazendas coletivas, que ainda não
desapareceram, mas que estão fadados a desaparecer com o passar do tempo, à
medida que as fazendas coletivas se fortalecem, à medida que recebem mais má-
quinas. Mas pode-se negar que as fazendas coletivas como um todo, com todas
as suas contradições e carências, as fazendas coletivas como fato econômico, re-
presentam, no essencial, uma nova via de desenvolvimento do campo, a via de
desenvolvimento socialista do o campo em contraste com o kulak, o caminho ca-
pitalista de desenvolvimento? Pode-se negar que as fazendas coletivas (estou fa-
lando de fazendas coletivas reais, não falsas) representam, em nossas condições,
uma base e um centro da construção socialista no campo – uma base e um centro
que cresceram em confrontos desesperados com os elementos capitalistas?
Não é claro que as tentativas de alguns camaradas para desacreditar as fazen-
das coletivas e declará-las uma forma burguesa de economia carecem de qualquer
fundamento?
Em 1923, ainda não tínhamos um movimento de fazendas coletivas em massa.
Lenin, em seu panfleto “Sobre a cooperação”, tinha em mente todas as formas de
cooperação, tanto suas formas inferiores (cooperativas de abastecimento e comer-
cialização) quanto suas formas superiores (fazendas coletivas). O que ele disse
naquela época sobre cooperação, sobre empresas cooperativas? Aqui está uma
citação:
Sob nosso sistema atual, as empresas cooperativas diferem das empresas capitalistas privadas
porque são empresas coletivas, mas não diferem das empresas socialistas se a terra em que estão
456 Obras Escolhidas

situadas e os meios de produção pertencerem ao Estado, ou seja, a classe trabalhadora. (Vol.


27, p. 396).

Assim, Lenin toma as empresas cooperativas não por si mesmas, mas em co-
nexão com nosso sistema atual, em conexão com o fato de que funcionam em
terras pertencentes ao Estado, em um país onde os meios de produção perten-
cem ao Estado; e, considerando-os sob esta luz, Lenin declara que as empresas
cooperativas não diferem das empresas socialistas.
Isso é o que Lenin diz sobre as empresas cooperativas em geral.
Não está claro que há ainda mais motivos para dizer o mesmo sobre as fazen-
das coletivas em nosso período?
Isso, aliás, explica por que Lenin considerava o “mero crescimento da coope-
ração” em nossas condições como “idêntico ao crescimento do socialismo”.
Como vocês podem ver, o orador a que me referi acima, ao tentar desacreditar
as fazendas coletivas, cometeu um grave erro contra o leninismo.
Tampouco há nada de surpreendente nisso, pois o camponês passou a re-
ceber, da cidade, máquinas, tratores, agrônomos, organizadores e, finalmente,
ajuda direta no combate e na superação dos kulaks. O velho camponês, com
sua selvagem desconfiança da cidade, que a considerava um saqueador, está pas-
sando para segundo plano. Seu lugar está sendo ocupado pelo novo camponês,
pelo camponês coletivo, que olha para a cidade com a esperança de receber uma
ajuda real na produção. O lugar do velho tipo de camponês que temia afun-
dar ao nível dos camponeses pobres e apenas furtivamente (pois ele poderia ser
privado da franquia!) ascendeu à posição de um kulak, está sendo tomado pelo
novo camponês, com uma nova perspectiva diante dele – a de ingressar em uma
fazenda coletiva e sair da pobreza e da ignorância para o caminho do progresso
econômico e cultural.
Essa é a direção que as coisas estão tomando, camaradas.
É ainda mais lamentável, camaradas, que nossos teóricos agrários não tenham
tomado todas as medidas para explodir e erradicar todas as teorias burguesas
que buscam desacreditar as conquistas da Revolução de Outubro e do crescente
movimento das fazendas coletivas.
Esse erro o levou a outro erro – sobre a luta de classes nas fazendas coletivas.
O palestrante retratou a luta de classes nas fazendas coletivas em cores tão vivas
que se poderia pensar que a luta de classes nas fazendas coletivas não difere da
luta de classes na ausência de fazendas coletivas. Na verdade, pode-se pensar
que nas fazendas coletivas se torna ainda mais violento. A propósito, o orador
mencionado não é o único que errou neste assunto. Conversas fúteis sobre a
luta de classes, que gritam e esperneiam sobre a luta de classes nas fazendas
coletivas, agora são características de todas as nossas ruidosas “esquerdas”. O
mais cômico sobre esses guinchos é que os gritadores “veem” a luta de classes
onde ela não existe, ou quase não existe, mas não conseguem vê-la onde ela
existe e é flagrantemente manifesta.
Existem elementos da luta de classes nas fazendas coletivas? Sim, existem. É
provável que haja elementos da luta de classes nas fazendas coletivas enquanto
houver reminiscências da mentalidade individualista, ou mesmo kulak. Enquanto
J. V. Stalin 457

houver um certo grau de desigualdade material. Pode-se dizer que a luta de clas-
ses nas fazendas coletivas equivale à luta de classes na ausência das fazendas cole-
tivas? Não, não se pode. O erro que nossos formuladores de frases “esquerdistas”
cometem reside precisamente em não ver a diferença.
O que significa a luta de classes na ausência de fazendas coletivas, antes do
estabelecimento das fazendas coletivas? Implica uma luta contra o kulak que
possui os instrumentos e meios de produção e que mantém os camponeses pobres
em cativeiro com a ajuda desses instrumentos e meios de produção. É uma luta
de vida ou morte.
Mas o que a luta de classes implica com as fazendas coletivas existentes? Im-
plica, em primeiro lugar, que o kulak foi derrotado e privado dos instrumentos
e meios de produção. Implica, em segundo lugar, que os camponeses pobres e
médios estejam unidos em fazendas coletivas com base na socialização dos prin-
cipais instrumentos e meios de produção. Isso implica, finalmente, que é uma
luta entre membros de fazendas coletivas, alguns dos quais ainda não se livraram
das sobrevivências individualistas e kulak e estão se esforçando para transformar
a desigualdade, que existe até certo ponto nas fazendas coletivas em seu próprio
benefício, enquanto os outros querem eliminar esses sobreviventes e essa desi-
gualdade. Não está claro que apenas os cegos podem deixar de ver a diferença
entre a luta de classes com as fazendas coletivas existentes e a luta de classes na
ausência das fazendas coletivas?
Seria um erro acreditar que, uma vez que existam as fazendas coletivas, te-
mos tudo o que é necessário para construir o socialismo. Seria ainda mais um
erro acreditar que os membros das fazendas coletivas já se tornaram socialistas.
Não, muito trabalho ainda precisa ser feito para remodelar o camponês coletivo
agricultor, para corrigir sua mentalidade individualista e para transformá-lo em
um verdadeiro membro trabalhador de uma sociedade socialista. E quanto mais
rapidamente as fazendas coletivas são abastecidas com máquinas, quanto mais ra-
pidamente elas são munidas com tratores, mais rapidamente isso será alcançado.
Mas isso não menospreza a grande importância das fazendas coletivas como uma
alavanca para a transformação socialista do campo. A grande importância das
fazendas coletivas reside precisamente no fato de representarem a base principal
do emprego de máquinas e tratores na agricultura, de constituir a base principal
para remodelar o camponês, para mudar sua mentalidade no espírito do socia-
lismo. Lenin estava certo quando disse:
A reconstrução do pequeno leme, a remodelação de toda a sua mentalidade e hábitos, é obra
de gerações. No que diz respeito ao pequeno leme, este problema pode ser resolvido, toda
a sua mentalidade pode ser posta em linhas saudáveis, por assim dizer, apenas pela base
material, pelos meios técnicos, pela introdução de tratores e máquinas na agricultura em
escala massiva, pela eletrificação em escala de massa. (Vol. 26, p. 239).

Quem pode negar que as fazendas coletivas são, de fato, aquela forma de eco-
nomia socialista que sozinha pode atrair as grandes massas dos pequenos cam-
poneses individuais para a agricultura em grande escala, com suas máquinas e
tratores como as alavancas do progresso econômico, as alavancas do desenvolvi-
mento socialista da agricultura?
Nossos criadores de frases da “esquerda” se esqueceram de tudo isso. E nosso
palestrante também se esqueceu disso.
458 Obras Escolhidas

VI. As mudanças de classe e o giro na política do


Partido

Por fim, a questão das mudanças de classe em nosso país e a ofensiva do soci-
alismo contra os elementos capitalistas do campo.
O traço característico do trabalho do nosso Partido durante o ano passado é
que nós, como Partido, como potência soviética: a) desenvolvemos uma ofensiva
em toda a frente contra os elementos capitalistas do campo; b) que esta ofensiva,
como sabem, rendeu e continua a render resultados muito apreciáveis e positivos.
O que isto significa? Significa que passamos da política de restringir as ten-
dências exploratórias dos kulaks para a política de eliminar os kulaks como classe.
Significa que realizamos, e continuamos realizando, uma das viradas decisivas
em toda a nossa política.
Até recentemente, o Partido aderiu à política de restringir as tendências ex-
ploratórias dos kulaks. Como você sabe, essa política foi proclamada já no Oitavo
Congresso do Partido. Foi novamente anunciada na altura da introdução da NEP
e no XI Congresso do nosso Partido. Todos nos lembramos da conhecida carta
de Lenin sobre as teses de Preobrazhensky (1922), na qual Lenin mais uma vez
voltou à necessidade de seguir esta política. Finalmente, esta política foi confir-
mada pelo Décimo Quinto Congresso do nosso Partido. E era essa política que
seguíamos até recentemente.
Esta política estava correta? Sim, estava absolutamente correta na época. Po-
deríamos ter empreendido tal ofensiva contra os kulaks há uns cinco ou três anos?
Poderíamos então ter contado com sucesso em tal ofensiva? Não, não podería-
mos. Esse teria sido o aventureirismo mais perigoso. Teria sido uma jogada
muito perigosa na ofensiva. Pois certamente teríamos falhado, e nosso fracasso
teria fortalecido a posição dos kulaks. Por quê? Porque ainda não tínhamos, no
campo, pontos fortes na forma de uma ampla rede de fazendas estatais e fazendas
coletivas que pudessem ser a base de uma ofensiva determinada contra os kulaks.
Porque, naquela época, ainda não podíamos substituir a produção capitalista dos
kulaks pela produção socialista das fazendas coletivas e fazendas estatais.
Em 1926-1927, a oposição Zinoviev-Trotsky fez o máximo para impor ao Par-
tido a política de uma ofensiva imediata contra os kulaks. O Partido não embarcou
nessa perigosa aventura, pois sabia que gente séria não pode se dar ao luxo de
apostar na ofensiva. Uma ofensiva contra os kulaks é um assunto sério. Não deve
ser confundido com declamações contra os kulaks. Nem deve ser confundido com
uma política de alfinetadas contra os kulaks, que a oposição Zinoviev-Trotsky fez
o máximo para impor ao Partido. Lançar uma ofensiva contra os kulaks signi-
fica que devemos esmagar os kulaks, eliminá-los como uma classe. A menos que
nos proponhamos esses objetivos, uma ofensiva seria mera declamação, alfine-
tadas, troca de frases, qualquer coisa, menos uma verdadeira ofensiva bolchevi-
que. Lançar uma ofensiva contra os kulaks significa que devemos nos preparar
para isso e depois atacar os kulaks, atacar com força para evitar que se levantem
novamente. Isso é o que nós, bolcheviques, chamamos de verdadeira ofensiva.
Poderíamos ter empreendido tal ofensiva há uns cinco ou três anos, com alguma
perspectiva de sucesso? Não, não poderíamos.
J. V. Stalin 459

De fato, em 1927 os kulaks produziram mais de 600 milhões de puds de grãos,


cerca de 130 milhões de puds dos quais comercializavam fora dos distritos rurais.
Esse era um poder bastante sério, que tinha que ser considerado. Quanto nos-
sas fazendas coletivas e fazendas estatais produziam naquela época? Cerca de 80
milhões de puds, dos quais cerca de 35 milhões deles foram enviados ao mercado
(grãos comerciáveis). Julguem vocês mesmos. Poderíamos, naquela época, ter
substituído a produção do kulak e os grãos comercializáveis do kulak pela produ-
ção e os grãos comercializáveis de nossas fazendas coletivas e fazendas estatais?
Obviamente, não poderíamos.
O que significaria lançar uma ofensiva determinada contra os kulaks sob tais
condições? Isso significaria certo fracasso, fortalecer a posição dos kulaks e ficar
sem grãos. É por isso que não podíamos e não deveríamos ter empreendido
uma ofensiva decidida contra os kulaks naquela época, apesar das declamações
aventureiras da oposição Zinoviev-Trotsky.
Mas hoje? Qual é a posição agora? Hoje, temos uma base material adequada
para atacarmos os kulaks, quebrar sua resistência, eliminá-los como classe e subs-
tituir sua produção pela produção das fazendas coletivas e fazendas do Estado.
Vocês sabem que, em 1929, o grão produzido nas fazendas coletivas e fazendas
estatais totalizou não menos do que 400 milhões de puds (200 milhões de puds
a menos do que a produção bruta das fazendas kulak em 1927). Vocês também
sabem que, em 1929, as fazendas coletivas e as fazendas estatais forneceram mais
de 130 milhões de puds de grãos comercializáveis (ou seja, mais do que os kulaks
em 1927). Por último, vocês sabem que, em 1930, a produção bruta das fazendas
coletivas e fazendas estatais será de não menos de 900 milhões de puds de grãos
(ou seja, mais que a produção bruta dos kulaks em 1927), e sua produção de grãos
comercializáveis não menos de 400 milhões de puds (ou seja, incomparavelmente
mais do que os kulaks em 1927).
É assim que as coisas estão conosco agora, camaradas.
Aí está a mudança que ocorreu na economia do nosso país.
Agora, como vocês podem notar, temos a base material que nos permite subs-
tituir a produção do kulak pela produção das fazendas coletivas e fazendas esta-
tais. É por isso mesmo que nossa determinada ofensiva contra os kulaks agora
está tendo um sucesso inegável.
É assim que deve ser feita uma ofensiva contra os kulaks, se queremos uma
ofensiva genuína e determinada e não mais declamações fúteis contra os kulaks.
É por isso que passamos recentemente da política de restringir as tendências
exploradoras dos kulaks para a política de eliminar os kulaks como classe.
Bem, e quanto à política de deskulakização? Podemos permitir a deskulakização
nas áreas de coletivização completa? Esta pergunta é feita em vários quadrantes.
Uma pergunta ridícula! Não podíamos permitir a deskulakização enquanto pros-
seguíssemos com a política de restringir as tendências exploratórias dos kulaks,
enquanto não pudéssemos passar a uma ofensiva determinada contra os kulaks,
enquanto não pudéssemos substituir a produção de kulaks pela produção das fa-
zendas coletivas e fazendas estatais. Naquela época, a política de não permitir
a deskulakização era necessária e correta. Mas agora? Agora as coisas são di-
ferentes. Agora, podemos realizar uma determinada ofensiva contra os kulaks,
460 Obras Escolhidas

quebrar sua resistência, eliminá-los como classe e substituir sua produção pela
produção das fazendas coletivas e fazendas do Estado. Agora, a deskulakização
está sendo realizada pelas próprias massas de camponeses pobres e médios, que
estão colocando em prática a coletivização completa. Agora, a deskulakização nas
áreas de coletivização completa não é mais apenas uma medida administrativa.
Agora, é parte integrante da formação e do desenvolvimento das fazendas cole-
tivas. Consequentemente, agora é ridículo e tolo discorrer longamente sobre a
deskulakização. Quando a cabeça está fora, não se lamenta pelo cabelo. Há outra
questão que não parece menos ridícula: se os kulaks deveriam ser autorizados a
ingressar nas fazendas coletivas. Claro que não, pois eles são inimigos declarados
do movimento das fazendas coletivas.

VII. Conclusões
Acima, camaradas, dissertei sobre seis questões-chave que o trabalho teórico
de nossos estudantes marxistas de questões agrárias não pode ignorar.
A importância dessas questões reside, acima de tudo, no fato de que uma aná-
lise marxista delas torna possível erradicar todas as várias teorias burguesas que
às vezes – para nossa vergonha – são divulgadas por nossos próprios camaradas,
por comunistas, e que enchem a cabeças de nossos trabalhadores práticos com
lixo. E essas teorias deveriam ter sido erradicadas e descartadas há muito tempo.
Pois somente em uma luta implacável contra essas teorias e outras semelhantes
que o pensamento teórico entre os estudantes marxistas das questões agrárias
pode se desenvolver e se fortalecer.
A importância dessas questões reside, por fim, no fato de darem um novo
aspecto aos velhos problemas da economia do período de transição.
As questões da NEP, das classes, das fazendas coletivas, da economia do pe-
ríodo de transição, passam a ser apresentadas de uma nova forma.
O erro de quem interpreta a NEP como um recuo, e apenas como um recuo,
deve ser exposto. Na verdade, mesmo quando a Nova Política Econômica estava
sendo introduzida, Lenin disse que não era apenas um recuo, mas também a pre-
paração para uma nova e determinada ofensiva contra os elementos capitalistas
na cidade e no campo.
Deve ser exposto o erro de quem pensa que a NEP é necessária apenas como
elo entre a cidade e o campo. Não precisamos de qualquer tipo de ligação entre
a cidade e o campo. O que precisamos é de um elo que garanta a vitória do soci-
alismo. E se aderimos à NEP é porque ela serve à causa do socialismo. Quando
ele deixar de servir à causa do socialismo, nós nos livraremos dela. Lenin disse
que a NEP foi introduzida a sério e por muito tempo. Mas ele nunca disse que
foi introduzida para sempre.
Devemos também levantar a questão da popularização da teoria marxista da
reprodução. Devemos examinar a questão da estrutura do balanço de nossa eco-
nomia nacional. O que o a Central Estatística publicou em 1926 como o balanço
da economia nacional não é um balanço, mas um malabarismo com números.
Tampouco é adequada a maneira como Bazarov e Groman tratam o problema
do balanço patrimonial da economia nacional. A estrutura do balanço da eco-
J. V. Stalin 461

nomia nacional da URSS deve ser elaborada pelos marxistas revolucionários, se


eles desejam se dedicar às questões da economia do período de transição.
Seria bom se nossos economistas marxistas designassem um grupo especial
para examinar os problemas da economia do período de transição, na nova forma
como se apresentam, no estágio atual de desenvolvimento.
462 Obras Escolhidas

Sobre a política de eliminação dos


kulaks como classe
21 de janeiro de 1930

O artigo “A eliminação dos Kulaks como classe”, no nº 16 do Krasnaya Zvezda256


está inegavelmente correto em sua essência, mas contém duas imprecisões de
formulação. Parece-me que essas imprecisões devem ser corrigidas.
1. O artigo diz: “No período da restauração, fizemos uma política de restrição
aos elementos capitalistas da cidade e do campo. Com a inauguração do período
de reconstrução, passamos da política de restrição à política de expulsão”.
Esta afirmação está incorreta. A política de restringir os elementos capita-
listas e a política de expulsá-los não são duas políticas diferentes. Eles são uma
única e mesma política. Banir os elementos capitalistas no campo é um resultado
inevitável e parte integrante da política de restrição dos elementos capitalistas, da
política de restrição das tendências exploratórias dos kulaks. Expulsar os elemen-
tos capitalistas no campo não deve ser considerado equivalente a acabar os kulaks
como uma classe. Abandonar os elementos capitalistas no campo significa ex-
pulsar e superar setores individuais dos kulaks, aqueles que são incapazes de arcar
com o peso dos impostos e do sistema de medidas restritivas do governo soviético.
Naturalmente, a política de restringir as tendências exploratórias dos kulaks,
a política de restringir os elementos capitalistas no campo, não pode deixar de
levar à expulsão de setores individuais dos kulaks. Consequentemente, a expulsão
de elementos individuais dos kulaks não pode ser considerada senão como um
resultado inevitável e uma parte integrante da política de restrição dos elementos
capitalistas no campo.
Seguimos essa política não só no período de restauração, mas também no
período de reconstrução, no período após o XV Congresso (dezembro de 1927),
e no período da Décima Sexta Conferência do nosso Partido (abril de 1929),
também como depois daquela conferência até o verão de 1929, quando a fase da
coletivização completa se instalou e quando começou a mudança para a política
de eliminação dos kulaks como classe.
Se alguém examinar os documentos mais importantes de nosso Partido, desde,
digamos, o XIV Congresso em dezembro de 1925 (ver a resolução sobre o relató-
rio do Comitê Central257 ) até a Décima Sexta Conferência em abril de 1929 (ver
a resolução sobre “Modos e meios de promover a agricultura”258 ), não se pode deixar
de notar que a tese de “restringir as tendências exploradoras dos kulaks” ou de
256 Krasnaya Zvezda (Estrela Vermelha) foi um jornal diário militar e político fundado em janeiro de
1924. Em março de 1953, tornou-se o órgão central do Ministério da Defesa da URSS.
257 Ver “Resoluções e Decisões de PCUS. Congressos, Conferências e Plenárias do Comitê Central”,

Parte II, 1953, pp. 73-82.


258 Para a resolução da Décima Sexta Conferência do Partido sobre “Formas e meios de promover a

agricultura e a redução de impostos para o camponês médio”, ver “Resoluções e decisões do PCUS.
Congressos, Conferências e Plenárias do Comitê Central”, Parte II, 1953, pp. 455-69.
J. V. Stalin 463

“restringir o crescimento do capitalismo no campo” anda sempre lado a lado da


tese de “expulsar os elementos capitalistas no campo”, sobre a “superação dos
elementos capitalistas no campo”.
O que isso significa?
Isso significa que o Partido não separa a expulsão dos elementos capitalistas do
campo da política de restrição das tendências exploradoras dos kulaks, da política
de restrição dos elementos capitalistas do campo.
Tanto o Décimo Quinto Congresso do Partido como a Décima Sexta Con-
ferência defenderam de todo o coração a política de “restringir as tendências
exploradoras da burguesia agrícola” (resolução do Décimo Quinto Congresso
sobre “Trabalho no Campo”259 ), pela política de “adoção de novas medidas para
restringir o desenvolvimento do capitalismo no campo”, pela política de “res-
tringir resolutamente as tendências exploradoras dos kulaks” (ver resolução do
Décimo Quinto Congresso sobre o plano quinquenal260 ), pela política de “uma
ofensiva contra os kulaks” no sentido de “passar a uma restrição posterior, mais
sistemática e persistente do kulak e do comerciante privado” (ibid.), para a polí-
tica de “expulsão econômica ainda mais resoluta” dos “elementos da economia
capitalista privada” na cidade e país (ver resolução do Décimo Quinto Congresso
sobre o relatório do Comitê Central261 ).
Consequentemente: a) o autor do artigo citado se equivoca ao descrever a
política de restrição dos elementos capitalistas e a política de expulsão deles como
duas políticas distintas. Os fatos mostram que, o que temos aqui, é uma política
geral de restrição do capitalismo, uma parte componente e resultado da qual é a
expulsão de seções individuais dos kulaks.
Consequentemente: b) o autor do referido artigo erra ao afirmar que a ex-
pulsão dos elementos capitalistas do campo começou apenas no período da re-
construção, no período do XV Congresso. Na verdade, a expulsão ocorreu antes
do Décimo Quinto Congresso, no período de restauração, e depois do Décimo
Quinto Congresso, no período de reconstrução. No período do Décimo Quinto
Congresso, a política de restringir as tendências exploratórias dos kulaks só foi in-
tensificada por medidas novas e adicionais, como resultado das quais a expulsão
de seções individuais dos kulaks também deveria ser intensificada.
2. O artigo diz: “A política de eliminação dos kulaks como classe decorre
inteiramente da política de expulsão dos elementos capitalistas, sendo uma con-
tinuação desta política em uma nova etapa”.
Esta afirmação é imprecisa e, portanto, falsa. Naturalmente, a política de
eliminação dos kulaks como classe não poderia ter caído dos céus. O caminho
para isso foi preparado por todo o período anterior de restrição e, portanto, de
expulsão dos elementos capitalistas no campo. Mas isso não significa que não
difira radicalmente da política de restrição (e expulsão) dos elementos capitalis-
259 Ver “Resoluções e Decisões do PCUS. Congressos, Conferências e Plenárias do Comitê Central”,
Parte II, 1953, pp. 350-68.
260 Para a resolução do Décimo Quinto Congresso do Partido sobre “Diretrizes para a Compilação de

um Plano Econômico Quinquenal”, Ver “Resoluções e Decisões de PCUS. Congressos, Conferências


e Plenárias do Comitê Central”, Parte II, 1953, pp. 330-49.
261 Ver “Resoluções e Decisões do PCUS. Congressos, Conferências e Plenárias do Comitê Central”,

Parte II, 1953, pp. 313-21.


464 Obras Escolhidas

tas no campo, que é uma continuação da política de restrição. Repetir o discurso


do nosso autor é negar que tenha havido uma mudança no desenvolvimento do
campo desde o verão de 1929. Repetir seu argumento é negar que durante esse
período tenhamos executado uma virada na política de nosso Partido em o inte-
rior. Dizer o que ele diz é criar um certo refúgio ideológico para os elementos
da direita em nosso Partido, que agora se apegam às decisões do XV Congresso
em oposição à nova política do partido, assim como uma vez Frumkin se agarrou
às decisões do XIV Congresso, em oposição à política de fomento às fazendas
coletivas e às fazendas do Estado.
Qual foi o ponto de partida do Décimo Quinto Congresso ao proclamar uma
intensificação da política de restrição (e expulsão) dos elementos capitalistas no
campo? Seu ponto de partida foi que, apesar dessa restrição dos kulaks, eles,
como uma classe, deveriam permanecer por enquanto. Com base nisso, o Décimo
Quinto Congresso deixou em vigor a lei do aluguel de terras, embora soubesse
muito bem que eram principalmente kulaks que alugavam terras. Com base nisso, o
Décimo Quinto Congresso deixou em vigor a lei de contratação de mão de obra
no campo e exigiu que ela fosse estritamente observada. Com base nisso, foi no-
vamente proclamado que a deskulakização era inadmissível. Essas leis e decisões
contradizem a política de restrição (e expulsão) dos elementos capitalistas no
campo? Certamente não. Essas leis e decisões contradizem a política de elimina-
ção dos kulaks como classe? Certamente! Consequentemente, essas leis e decisões
devem agora ser postas de lado nas áreas de coletivização completa, que está se
espalhando aos trancos e barrancos. Aliás, elas já foram deixadas de lado pelo
próprio avanço do movimento dos kolkhoses nas áreas da coletivização completa.
Pode-se, então, afirmar que a política de eliminação dos kulaks como classe é
uma continuação da política de restrição (e expulsão) dos elementos capitalistas
no campo? Obviamente, não se pode.
O autor do artigo acima mencionado esquece que a classe kulak, como uma
classe, não pode ser eliminada por medidas tributárias ou quaisquer outras res-
trições, se esta classe for autorizada a reter instrumentos de produção e o direito
de uso livre da terra, e se na nossa atividade prática preservamos, no campo, a
lei da contratação de mão-de-obra, a lei do arrendamento de terras e a proibi-
ção da deskulakização. A forma de restringir (e expulsar) os elementos capitalistas
no campo? Seu ponto de partida foi que, apesar dessa restrição dos kulaks, eles,
como uma classe, deveriam permanecer existindo momentaneamente. Com base
nisso, o Décimo Quinto Congresso deixou em vigor a lei do aluguel de terras, em-
bora soubesse muito bem que eram principalmente kulaks que alugavam terras.
Com base nisso, o Décimo Quinto Congresso deixou em vigor a lei de contratação
de mão de obra no campo e exigiu que ela fosse estritamente observada. Com base
nisso, foi novamente proclamado que a deskulakização era inadmissível. Essas leis
e decisões contradizem a política de restrição (e expulsão) dos elementos capi-
talistas no campo? Certamente não. Essas leis e decisões contradizem a política
de eliminação dos kulaks como classe? Certamente! Consequentemente, essas leis
e decisões devem agora ser postas de lado nas áreas de coletivização completa,
que está se espalhando aos trancos e barrancos. Aliás, elas já foram deixadas de
lado pelo próprio avanço do movimento dos kolkhoses nas áreas da coletivização
completa.
J. V. Stalin 465

Pode-se, então, afirmar que a política de eliminação dos kulaks como classe é
uma continuação da política de restrição (e expulsão) dos elementos capitalistas
no campo? Obviamente, não se pode.
O autor do artigo acima mencionado esquece que a classe kulak, como uma
classe, não pode ser eliminada por medidas tributárias ou quaisquer outras res-
trições, se esta classe for autorizada a reter instrumentos de produção e o direito
de uso livre da terra, e se na nossa atividade prática preservamos no campo a
lei da contratação de mão-de-obra, a lei do arrendamento de terras e a proibi-
ção da deskulakização. O autor esquece que a política de restringir as tendências
exploradoras dos kulaks permite contar apenas com a expulsão de seções indi-
viduais dos kulaks, o que não contradiz, mas, ao contrário, pressupõe a preser-
vação, por enquanto, dos kulaks como classe. Como meio de expulsar os kulaks
como uma classe, a política de restringir e expulsar seções individuais dos ku-
laks é inadequada. Para derrubar os kulaks como classe, a resistência desta classe
deve ser esmagada em batalha aberta e deve ser privada das fontes produtivas de
sua existência e desenvolvimento (uso livre da terra, instrumentos de produção,
arrendamento de terras, direito para contratar mão de obra, etc.).
É uma virada para a política de eliminação dos kulaks como classe. Sem isso,
falar sobre expulsar os kulaks como uma classe é uma tagarelice vazia, aceitável
e lucrativa apenas para os que desviam à direita. Sem ela, nenhuma coletiviza-
ção substancial – muito menos completa – do campo é concebível. Isso é bem
compreendido por nossos camponeses pobres e médios, que estão esmagando os
kulaks e introduzindo a coletivização completa. Isso, evidentemente, ainda não é
compreendido por alguns de nossos camaradas.
Portanto, a atual política do Partido no campo não é uma continuação da
velha política, mas um afastamento da velha política de restringir (e expulsar) os
elementos capitalistas no campo, para a nova política de eliminação dos kulaks
como classe.
J. Stalin
21 de janeiro de 1930
466 Obras Escolhidas

Sobre questões do movimento das


fazendas coletivas
2 de março de 1930

Os sucessos do governo soviético na esfera do movimento das fazendas cole-


tivas, agora, estão sendo comentados por todos. Até mesmo nossos inimigos são
forçados a admitir que os sucessos são substanciais. E eles realmente são ótimos.
É um fato que, em 20 de fevereiro deste ano, 50% das fazendas camponesas
em toda a URSS haviam sido coletivizadas. Isso significa que, em 20 de fevereiro
de 1930, havíamos superado o plano de cinco anos de coletivização em mais de
100%.
É fato que em 28 de fevereiro deste ano, as fazendas coletivas já haviam conse-
guido estocar mais de 36 milhões de centners262 , ou seja, cerca de 220 milhões de
puds de sementes para a semeadura da primavera, que é mais de 90% do plano.
Deve-se admitir que o acúmulo de 220 milhões de puds de sementes somente pe-
las fazendas coletivas – após o cumprimento bem-sucedido do plano de aquisição
de grãos – é uma conquista tremenda.
O que tudo isso mostra? Que uma virada radical do campo para o socialismo pode
ser considerada como já alcançada.
Não há necessidade de provar que esses sucessos são de suprema importância
para o destino de nosso país, para toda a classe trabalhadora, que é a força motriz
de nosso país, e, por último, para o próprio Partido. Para não falar dos resul-
tados práticos diretos, estes sucessos têm um valor imenso para a vida interna
do próprio Partido, para a educação do nosso Partido. Eles impregnam o nosso
Partido um espírito de alegria e confiança na sua força. Eles armam a classe
trabalhadora com confiança na vitória de nossa causa. Eles trazem milhões de
reservas adicionais para o nosso Partido.
Portanto, a tarefa do partido é consolidar os sucessos alcançados e utilizá-los
sistematicamente para o nosso avanço futuro.
Mas os sucessos têm seu lado desagradável, especialmente quando são obti-
dos com relativa “facilidade” – “inesperadamente”, por assim dizer. Esses suces-
sos, às vezes, induzem um espírito de vaidade e presunção: “Podemos alcançar
qualquer coisa!”, “Não há nada que não possamos fazer!”. As pessoas, não ra-
ramente, ficam intoxicadas por tais sucessos; ficam tontos com o sucesso, per-
dem todo o senso de proporção e a capacidade de compreender a realidade; eles
mostram uma tendência a superestimar sua própria força e a subestimar a força
do inimigo; tentativas aventureiras são feitas para resolver todas as questões da
construção socialista “em um instante”. Nesse caso, não há espaço para a preocu-
pação de consolidar os sucessos alcançados e de utilizá-los sistematicamente para
um maior avanço. Porque devemos consolidar os sucessos alcançados quando, do
262
Uma unidade métrica não padronizada de peso igual a 100 quilogramas, comumente usada como
medida agrícola nos países do Bloco Oriental (N.T.)
J. V. Stalin 467

jeito que está, podemos correr para a vitória total do socialismo “de uma só vez”:
“Podemos alcançar qualquer coisa!”, “Não há nada que não possamos fazer!’.
Portanto, a tarefa do Partido é travar uma luta determinada contra esses sen-
timentos, que são perigosos e prejudiciais para a nossa causa, e expulsá-los do
Partido.
Não se pode dizer que esses sentimentos perigosos e nocivos estão dissemi-
nados nas fileiras do nosso Partido. Mas eles existem, e não há motivos para
afirmar que não se tornarão mais fortes. E se eles deveriam ter liberdade de
ação, não pode haver dúvida de que o movimento das fazendas coletivas ficará
consideravelmente enfraquecido e o perigo de sua quebra pode se tornar uma
realidade.
Portanto, a tarefa de nossa imprensa é: denunciar sistematicamente esses e
outros sentimentos anti-leninistas semelhantes.
Alguns fatos.
1. Os sucessos de nossa política de fazendas coletivas se devem, entre outras
coisas, ao fato de que ela se apoia no caráter voluntário do movimento de fazendas
coletivas e na consideração da diversidade de condições nas várias regiões da
URSS. As fazendas coletivas não devem ser estabelecidas à força. Isso seria tolice
e reacionário. O movimento da fazenda coletiva deve apoiar-se no apoio ativo
da massa principal do campesinato. Exemplos de formação de fazendas coletivas
em áreas desenvolvidas não devem ser transplantados mecanicamente para áreas
subdesenvolvidas. Isso seria tolice e reacionário. Tal “política” desacreditaria a
ideia de coletivização de uma só vez. Ao determinar a velocidade e os métodos
de desenvolvimento de fazendas coletivas, deve-se considerar cuidadosamente a
diversidade de condições nas várias regiões da URSS.
Nossas áreas de cultivo de grãos estão à frente de todas as outras no movi-
mento das fazendas coletivas. Por que isso?
Em primeiro lugar, porque nestas áreas temos o maior número de fazendas
estatais e fazendas coletivas já consolidadas, graças às quais os camponeses tive-
ram a oportunidade de se convencer da força e da importância dos novos equi-
pamentos técnicos, do poder e da importância da nova organização coletiva da
agricultura.
Em segundo lugar, porque essas áreas tiveram dois anos de formação na luta
contra os kulaks durante as campanhas de colheita de grãos, o que não poderia
deixar de facilitar o desenvolvimento do movimento das fazendas coletivas.
Por último, porque estas áreas, nos últimos anos foram amplamente abaste-
cidas com os melhores quadros dos centros industriais.
Pode-se dizer que essas condições especialmente favoráveis também existem
em outras áreas, as áreas de consumo, por exemplo, como nossas regiões do
norte, ou em áreas onde ainda existem nacionalidades atrasadas, como o Tur-
questão, por exemplo?
Não, não pode ser dito.
Claramente, o princípio de levar em consideração a diversidade de condições
nas várias regiões da URSS é, juntamente com o princípio voluntário, um dos
pré-requisitos mais importantes para um movimento de fazenda coletiva sólido.
468 Obras Escolhidas

Mas o que realmente acontece às vezes? Pode-se dizer que o princípio volun-
tário e o princípio de levar em conta as peculiaridades locais não são violadas em
várias áreas? Não, isso não pode ser dito, infelizmente. Sabemos, por exemplo,
que em várias áreas do norte da zona de consumo, onde as condições para a orga-
nização imediata das fazendas coletivas são comparativamente menos favoráveis
do que nas áreas de cultivo de grãos, não raramente são feitas tentativas de subs-
tituir os trabalhos preparatórios para a organização das fazendas coletivas por
decreto burocrático do movimento dos fazendeiros coletivos, resoluções em pa-
pel sobre o crescimento das fazendas coletivas, organização das fazendas coletivas
no papel – fazendas coletivas que ainda não têm realidade, mas cuja “existência”
é proclamada em um pilha de resoluções arrogantes.
Ou considere certas áreas do Turquestão, onde as condições para a organiza-
ção imediata de fazendas coletivas são ainda menos favoráveis do que nas regiões
do norte da zona de consumo. Sabemos que, em várias áreas do Turquestão, já
houve tentativas de “ultrapassar e superar” as áreas avançadas da URSS, amea-
çando usar a força armada, ameaçando que os camponeses que ainda não estão
prontos para ingressar nas fazendas coletivas serão privados de água de irrigação
e produtos manufaturados.
O que pode haver em comum entre esta “política” do Sargento Prishibeyev e
a política do Partido de confiar no princípio voluntário e de levar em conta as
peculiaridades locais no desenvolvimento da fazenda coletiva? Obviamente, não
há e não pode haver nada em comum.
Quem se beneficia dessas distorções, dessa decretação burocrática do movi-
mento da fazenda coletiva, dessas ameaças indignas contra os camponeses? Nin-
guém, exceto nossos inimigos!
A que podem levar essas distorções? Ao fortalecimento de nossos inimigos e
descrédito da ideia do movimento da fazenda coletiva.
Não está claro que os autores dessas distorções, que se imaginam “esquer-
distas”, estão, na realidade, trazendo grãos para o moinho do oportunismo de
direita?
2. Um dos maiores méritos da estratégia política do nosso Partido é que ele
pode, a qualquer momento, apontar o principal elo do movimento, compreen-
dendo que o Partido atrai toda a cadeia para um objetivo comum para chegar
à solução do problema. Pode-se dizer que o Partido já identificou o principal
elo do movimento da fazenda coletiva no sistema de desenvolvimento da fazenda
coletiva? Sim, isso pode e deve ser dito.
Qual é este elo principal?
É, talvez, associação para cultivo conjunto da terra? Não, não é isso. As associ-
ações de cultivo conjunto da terra, em que os meios de produção ainda não estão
socializados, já são uma etapa do movimento da fazenda coletiva.
É, talvez, a comuna agrícola? Não, não é isso, as comunas ainda são de ocorrên-
cia isolada no movimento das fazendas coletivas. As condições ainda não estão
maduras para que as comunas agrícolas – nas quais não só a produção, mas tam-
bém a distribuição é socializada – sejam as comunidades predominantes.
O principal elo do movimento da fazenda coletiva, sua forma predominante
J. V. Stalin 469

no momento presente, o elo que deve ser apreendido agora, é o artel agrícola.
No artel agrícola, socializam-se os meios básicos de produção, principalmente
para a cultura de grãos – mão de obra, uso da terra, máquinas e outros imple-
mentos, animais de tração e prédios agrícolas. No artel, as parcelas domésticas
(pequenas hortas, pequenos pomares), as casas de habitação, uma parte do gado
leiteiro, pequenos rebanhos, aves, etc., não são socializadas.
O artel é o principal elo do movimento da fazenda coletiva porque é a forma mais
bem adaptada para resolver o problema dos grãos. E o problema dos grãos é o
principal elo de todo o sistema de agricultura porque, se não for resolvido, será
impossível resolver o problema da pecuária (pequena e grande), o problema das
culturas industriais e especiais que fornecem as principais matérias-primas para
a indústria. Por isso, o artel agrícola é o principal elo do sistema de movimento
da fazenda coletiva na atualidade.
Esse é o ponto de partida das “Regras Modelo” para fazendas coletivas, cujo
texto final foi publicado hoje.
E esse deve ser o ponto de partida de nosso Partido e dos trabalhadores sovié-
ticos, um de seus deveres é fazer um estudo aprofundado dessas regras e cumpri-
las até o último detalhe.
Essa é a linha do Partido no momento atual.
Pode-se dizer que esta linha do Partido está sendo conduzida sem violação
ou distorção? Não, não se pode, infelizmente. Sabemos que em várias áreas da
URSS, onde a luta pela existência dos kolkhoses ainda está longe de terminar, e
onde os artel ainda não estão consolidados, se tentam pular o arcabouço artel e
saltar imediatamente para a comuna agrícola. Os artel ainda não estão consoli-
dados, mas já estão “socializando” moradias, pequenos rebanhos e aves; ademais,
essa “socialização” está degenerando em decretos burocráticos no papel, porque
ainda não existem as condições que tornariam essa socialização necessária. Pode-
se pensar que o problema dos grãos já está resolvido nas fazendas coletivas, que já
é uma etapa passada, que a principal tarefa no momento presente não é a solução
do problema dos grãos, mas a solução do problema da pecuária e da avicultura.
Quem, podemos nos perguntar, se beneficia desse “trabalho” estúpido de juntar
diferentes formas de movimento da fazenda coletiva? Quem se beneficia com
essa corrida afobada, que é estúpida e prejudicial à nossa causa? Irritar o cam-
ponês da fazenda coletiva ao “socializar” as moradias, todo gado leiteiro, toda
pecuária e aves, quando o problema dos grãos ainda não foi resolvido, quando a
forma artel de agricultura coletiva ainda não está consolidada – não é óbvio que
tal “política” pode ser aprazível apenas para a satisfação e vantagem apenas de
nossos inimigos jurados?
Um tal “socializador” excessivamente zeloso chega ao ponto de emitir uma
ordem a um artel contendo as seguintes instruções: “dentro de três dias, registre
todas as aves de cada família”, estabeleça postos de “comandantes” especiais para
registro e supervisão; “Ocupar as posições-chave na artel”, “comandar a batalha
socialista sem abandonar seus cargos” e – é claro – controlar com firmeza toda a
vida da artel.
O que é isso – uma política de direcionamento das fazendas coletivas, ou uma
política de desorganizá-las e desacreditá-las?
470 Obras Escolhidas

Não digo nada desses “revolucionários” – Pelo amor! – que iniciam o trabalho
de organização de artel retirando os sinos das igrejas. Imaginando remover os
sinos da igreja – que r-r-revolucionário!
Como poderiam ter surgido em nosso meio tais exercícios estúpidos de “soci-
alização”, tais tentativas ridículas de se sobrepor, tentativas que visam contornar
as classes e a luta de classes, e que de fato trazem grãos para o moinho de nossos
inimigos de classe?
Eles só poderiam ter surgido na atmosfera de nossos sucessos “fáceis” e “ines-
perados” na frente do desenvolvimento da fazenda coletiva.
Eles poderiam ter surgido apenas como resultado da crença estúpida de uma
seção de nosso Partido: “Podemos alcançar qualquer coisa!”, “Não há nada que
possamos fazer!”.
Eles só poderiam ter surgido porque alguns de nossos camaradas ficaram ton-
tos com o sucesso e, no momento, perderam a clareza da mente e a sobriedade
de visão.
Para corrigir a linha do nosso trabalho na esfera do desenvolvimento da fa-
zenda coletiva, devemos acabar com esses sentimentos.
Essa é agora uma das tarefas imediatas do Partido.
A arte da liderança é um assunto sério. Não se deve ficar para trás no mo-
vimento, porque fazer isso é perder o contato com as massas. Mas também não
se deve correr muito à frente, porque correr muito à frente é perder as massas
e isolar-se. Quem quer liderar um movimento e ao mesmo tempo manter con-
tato com as grandes massas deve travar uma luta em duas frentes – contra os que
ficam para trás e contra os que correm muito.
Nosso Partido é forte e invencível porque, ao liderar um movimento, é ca-
paz de preservar e multiplicar seus contatos com as grandes massas operárias e
camponesas.
J. Stalin
2 de março de 1930
J. V. Stalin 471

Antissemitismo
12 de janeiro de 1931

Resposta à Agência de Notícias Judaica nos Estados Unidos

Em resposta à sua pergunta:


O chauvinismo nacional e racial é um vestígio dos costumes misantrópicos ca-
racterísticos do período do canibalismo. O antissemitismo, como forma extrema
de chauvinismo racial, é o mais perigoso vestígio de canibalismo.
O antissemitismo é uma vantagem para os exploradores como um para-raios
que desvia os golpes dos trabalhadores contra o capitalismo. O antissemitismo
é perigoso para os trabalhadores, pois é um caminho falso que os leva para fora
da trilha correta e os conduz para a selva. Consequentemente, os comunistas,
como internacionalistas consistentes, não podem deixar de ser irreconciliáveis,
inimigos jurados do antissemitismo.
Na URSS, o antissemitismo é punível com a maior severidade da lei como um
fenômeno profundamente hostil ao sistema soviético. De acordo com a lei da
URSS, os antissemitas ativos estão sujeitos à pena de morte.
J. Stalin
12 de janeiro de 1931
472 Obras Escolhidas

Novas Condições – Novas Tarefas na


construção econômica
5 de julho de 1931

Discurso proferido em uma conferência de executivos de negócios263

Camaradas, os materiais apresentados nesta conferência mostram que, no que


diz respeito ao cumprimento do plano, a nossa indústria apresenta um quadro
bastante heterogêneo. Há ramos da indústria que aumentaram sua produção nos
últimos cinco meses em 40% a 50% em comparação com o ano passado. Outros
ramos aumentaram sua produção não mais do que 20% a 30%. Por último, exis-
tem algumas sucursais que apresentam um acréscimo muito pequeno, cerca de
6% a 10% e por vezes até menos. Entre estes últimos, devemos incluir a mineração
de carvão e a indústria de ferro e aço. O cenário, como você vê, é heterogênea.
Como explicar essa diversidade? Por que certos ramos da indústria estão
ficando para trás? Por que certos ramos da indústria mostram um aumento de
apenas 20% a 25%, enquanto a mineração de carvão e a indústria de ferro e aço
mostram um aumento ainda menor e estão atrás de outros ramos?
A razão é que, ultimamente, as condições de desenvolvimento da indústria
mudaram radicalmente; surgiram novas condições que exigiam novos métodos
de gestão; mas alguns de nossos executivos econômicos, em vez de mudar seus
métodos de trabalho, estão continuando à maneira antiga. A questão, portanto,
é que as novas condições de desenvolvimento da indústria exigem novos métodos
de trabalho; mas alguns de nossos executivos econômicos não entendem isso e
não veem que agora devem adotar novos métodos de gestão.
Essa é a razão pela qual certos ramos de nossa indústria estão ficando para
trás.
Quais são essas novas condições de desenvolvimento da nossa indústria? Como
eles surgiram?
Existem, pelo menos, seis dessas novas condições.
Vamos examiná-las.

I. Mão de obra
Em primeiro lugar, há a questão do fornecimento de mão de obra para nossas
fábricas. Anteriormente, os trabalhadores geralmente iam por conta própria às
263 Uma Conferência de Executivos de Negócios foi realizada sob os auspícios do CC do PCUS (B),
de 22 a 23 de junho de 1931. Estiveram presentes representantes das organizações econômicas
unidas sob o Conselho Supremo de Economia Nacional da URSS e por representantes do Comis-
sariado do Povo de Abastecimento da URSS. Stalin compareceu à conferência nos dias 22 e 23 de
junho e, na última data, proferiu seu discurso. V. M. Molotov, K. Y. Voroshilov, A. A. Andreyev, L.
M. Kaganovich, A. I. Mikoyan, N. M. Shvernik, M. I. Kalinin, G. K. Orjonikidze e V. V. Kuibyshev
participaram do trabalho da conferência.
J. V. Stalin 473

fábricas e moinhos – em certa medida, portanto, as coisas aconteciam automati-


camente nesta esfera. E isso acontecia porque havia desemprego, havia diferenci-
ação no campo, havia pobreza e o medo da fome, que levava as pessoas do campo
para a cidade. Você se lembra da fórmula: “A fuga do camponês do campo para
a cidade”? O que levou o camponês a fugir do campo para a cidade? O medo da
fome, do desemprego, do fato de que a aldeia era como uma madrasta para ele,
e ele estava pronto para fugir de sua aldeia para o próprio diabo, se ao menos
pudesse encontrar algum tipo de trabalho.
Tal, ou quase tal, era a situação no passado recente.
Pode-se dizer que as mesmas condições prevalecem agora? Não, não se pode.
Pelo contrário, as condições mudaram radicalmente. E porque as condições mu-
daram, não temos mais um influxo automático de mão de obra.
O que, de fato, mudou durante esse período? Em primeiro lugar, eliminamos
o desemprego – consequentemente, eliminamos a força que pressionava o “mer-
cado de trabalho”. Em segundo lugar, minamos radicalmente a diferenciação no
campo – consequentemente, superamos a pobreza em massa ali, que levou o cam-
ponês do campo para a cidade. Por último, abastecemos o campo com dezenas
de milhares de tratores e máquinas agrícolas, destruímos os kulak, organizamos
fazendas coletivas e demos aos camponeses a oportunidade de viver e trabalhar
como seres humanos. Agora o campo não pode mais ser denominado como a
madrasta do camponês. E precisamente porque não pode mais ser chamada de
madrasta, a camponesa começou a se estabelecer no campo; não temos mais “a
fuga do camponês do campo para a cidade”, nem um influxo automático de mão
de obra.
Como você pode ver, agora temos uma situação inteiramente nova e inéditas
condições com relação ao fornecimento de mão de obra para nossas fábricas.
O que se segue disso?
Segue-se, em primeiro lugar, que não devemos mais contar com um influxo
automático de mão de obra. Isso significa que devemos passar da “política” de
deixar as coisas seguirem automaticamente para a política de recrutamento orga-
nizado de trabalhadores para a indústria. Mas só há uma maneira de conseguir
isso: contratos de organizações econômicas com fazendas e agricultores coletivos.
Como você sabe, certas organizações econômicas e fazendas coletivas já adotaram
esse método; e a experiência tem mostrado que esta prática traz vantagens im-
portantes tanto para as fazendas coletivas quanto para as empresas industriais.
Segue-se, em segundo lugar, que devemos passar imediatamente à mecaniza-
ção dos processos de trabalho mais pesados e desenvolvê-la ao máximo (indústria
madeireira, construção civil, mineração de carvão, carga e descarga, transporte,
siderurgia, etc.). Isso, é claro, não significa que devemos abandonar o trabalho
manual. Ao contrário, o trabalho manual continuará a desempenhar um papel
muito importante na produção por muito tempo. Mas significa que a mecaniza-
ção dos processos de trabalho é, para nós, a nova e decisiva força, sem a qual nem
o nosso ritmo nem a nova escala de produção podem ser mantidos.
Ainda há um grande número de nossos executivos econômicos que “não acre-
ditam” nem na mecanização, nem nos contratos com fazendas coletivas. São esses
mesmos executivos que não entendem a nova situação, que não querem trabalhar
474 Obras Escolhidas

da nova maneira e anseiam pelos “bons velhos tempos” quando a mão de obra
“vinha por si mesma” para as empresas. Desnecessário dizer que tais executivos
econômicos estão tão distantes das novas tarefas da construção econômica, que
são impostas pelas novas condições, quanto o céu está da terra. Aparentemente,
eles pensam que as dificuldades em relação à mão de obra são acidentais e que a
escassez de mão de obra desaparecerá automaticamente, por assim dizer. Isso é
uma ilusão, camaradas.
As dificuldades em relação à mão de obra não podem desaparecer por si mes-
mas. Eles podem desaparecer apenas como resultado de nossos próprios esfor-
ços.
Daí a tarefa de recrutar mão de obra de forma organizada, por meio de contratos com
as fazendas coletivas, e mecanizar a mão de obra.
É assim que se colocam as questões em relação à primeira nova condição de
desenvolvimento da nossa indústria.
Passemos à segunda condição.

II. Salários

Acabei de falar sobre o recrutamento organizado de trabalhadores para nos-


sas fábricas. Mas recrutar trabalhadores não é tudo o que precisa ser feito. A
fim de garantir mão de obra para nossas empresas, devemos cuidar para que os
trabalhadores estejam conectados de forma estável com suas fábricas e tornem a
composição da força de trabalho nas fábricas mais ou menos constante. Nem é
preciso provar que, sem uma força de trabalho constante que tenha mais ou me-
nos dominado a técnica de produção e se acostumado com as novas máquinas,
será impossível fazer algum progresso, impossível cumprir os planos de produ-
ção. A menos que isso seja alcançado, teremos que continuar treinando novos
trabalhadores e gastar metade do tempo treinando-os, em vez de aproveitar esse
tempo para a produção. Mas o que realmente está acontecendo agora? Pode-se
dizer que a composição da força de trabalho em nossas fábricas é mais ou menos
constante? Infelizmente, isso não pode ser dito. Ao contrário, ainda temos uma
chamada “fluidez” de mão de obra em nossas fábricas. Mais do que isso, em vá-
rias fábricas a fluidez da mão de obra, longe de desaparecer, está aumentando e
se tornando mais acentuada. De qualquer forma, você encontrará poucas fábri-
cas em que o pessoal não mude pelo menos de 30% a 40% do total no decorrer
de meio ano, ou mesmo em um trimestre.
Antigamente, durante o período de restauração de nossa indústria, quando
seu equipamento técnico não era muito complexo e a escala de produção não
muito grande, era mais ou menos possível “tolerar” essa fluidez de mão de obra.
Agora é outro assunto. Agora a situação é radicalmente diferente. Agora, no
período de reconstrução intensiva, quando a escala de produção se tornou gi-
gantesca e os equipamentos técnicos extremamente complexos, a fluidez da mão
de obra tornou-se um flagelo da produção e está desorganizando nossas fábricas.
“Tolerar” a fluidez da mão de obra, agora, significaria desintegrar nossa indús-
tria, destruindo a possibilidade de cumprir os planos de produção e arruinando
qualquer chance de melhorar a qualidade do produto.
J. V. Stalin 475

Qual é a causa da fluidez da mão de obra?


A causa é a estrutura incorreta de salários, as escalas salariais erradas, a prática
“esquerdista” de equalização salarial. Em várias fábricas, as tabelas de salários
são estabelecidas de forma a eliminar praticamente a diferença entre trabalho
qualificado e não qualificado, entre trabalho pesado e leve. A consequência da
equalização de salários é que o trabalhador não qualificado não tem incentivo
para se tornar um trabalhador qualificado e, portanto, fica privado da perspec-
tiva de progresso; como resultado, ele se sente um “visitante” da fábrica, traba-
lhando apenas temporariamente para “ganhar um pouco de dinheiro” e depois
ir “tentar a sorte” em algum outro lugar. A consequência da equalização de sa-
lários é que o trabalhador qualificado é obrigado a ir de fábrica em fábrica até
encontrar uma em que sua habilidade seja devidamente avaliada.
Consequentemente, o deslocamento “geral” de fábrica em fábrica; daí a flui-
dez da mão de obra.
Para acabar com este mal, devemos abolir a equalização de salários e descartar
as antigas tabelas de salários. Para acabar com este mal, devemos traçar escalas
salariais que levem em conta a diferença entre trabalho qualificado e não espe-
cializado, entre trabalho pesado e leve. Não podemos tolerar uma situação em
que um trabalhador de laminação na indústria de ferro e aço não ganhe mais
do que um varredor. Não podemos tolerar uma situação em que um motorista
de locomotiva ganha apenas o mesmo que um copiador. Marx e Lenin disseram
que a diferença entre trabalho qualificado e não qualificado existiria mesmo sob
o socialismo, mesmo depois que as classes tivessem sido abolidas; que somente
no comunismo essa diferença desapareceria e que, consequentemente, mesmo
no socialismo, os “salários” devem ser pagos de acordo com o trabalho realizado
e não de acordo com as necessidades. Mas os igualitários entre nossos executivos
econômicos e dirigentes sindicais não concordam com isso, e acreditam que sob
nosso sistema soviético essa diferença já desapareceu. Quem está certo, Marx e
Lenin ou os igualitários? Deve-se presumir que Marx e Lenin é que estão certos.
Mas daí decorre que quem estabelece escalas salariais segundo o “princípio” da
equalização de salários, sem levar em conta a diferença entre trabalho qualificado
e não qualificado, rompe com o marxismo, rompe com o leninismo.
Em cada ramo da indústria, em cada fábrica, em cada loja, existe um grupo
dirigente de trabalhadores mais ou menos qualificados que, antes de mais nada,
devem ser retidos se queremos realmente assegurar uma força de trabalho cons-
tante nas fábricas. Esses grupos dirigentes de trabalhadores são o principal elo
da produção. Ao retê-los na fábrica, na oficina, podemos reter toda a força de
trabalho e impedir radicalmente a fluidez da mão de obra. Mas como podemos
retê-los nas fábricas? Só podemos retê-los promovendo-os a cargos mais eleva-
dos, aumentando o nível de seus salários, introduzindo um sistema de salários
que dará ao trabalhador o que é devido de acordo com a qualificação.
E o que significa promovê-los a cargos mais altos e elevar o nível de seus salá-
rios, o que isso pode levar no que diz respeito aos trabalhadores não qualificados?
Significa, além de tudo, abrir perspectivas para o trabalhador não qualificado e
dar-lhe um incentivo para ascender, para ser promovido à categoria de trabalha-
dor qualificado. Você sabe que agora precisamos de centenas de milhares e até
476 Obras Escolhidas

milhões de trabalhadores qualificados. Mas, para formar quadros de trabalhado-


res qualificados, devemos dar um incentivo aos trabalhadores não qualificados,
dar-lhes uma perspectiva de progresso, de ascensão a uma posição superior. E
quanto mais ousadamente adotarmos esse rumo, melhor, pois esse é o principal
meio de acabar com a fluidez da mão de obra. Economizar neste assunto seria
criminoso, seria ir contra os interesses de nossa indústria socialista.
Mas isso não é tudo.
Para reter os trabalhadores nas fábricas, devemos melhorar ainda mais a oferta
de bens e as condições de moradia dos trabalhadores. Não se pode negar que
muito se fez nos últimos anos no domínio da construção de moradias e do abas-
tecimento dos trabalhadores. Mas o que foi feito é totalmente inadequado em
comparação com as crescentes necessidades dos trabalhadores. Não adianta ale-
gar que antes havia menos casas do que agora e que, portanto, podemos nos con-
tentar com os resultados alcançados. Nem adiantará alegar que os suprimentos
dos trabalhadores eram muito piores antes do que são agora e, portanto, pode-
mos estar satisfeitos com a situação atual. Somente aqueles que estão podres até
o âmago podem se contentar com referências ao passado. Devemos proceder,
não do passado, mas das crescentes necessidades dos trabalhadores no tempo
presente. Devemos perceber que as condições de vida dos trabalhadores muda-
ram radicalmente em nosso país. O trabalhador hoje não é o que era antes. O
operário de hoje, nosso operário soviético, deseja que todas as suas necessidades
materiais e culturais sejam satisfeitas: em matéria de alimentação, condições de
moradia, culturais e todos os outros requisitos. Ele tem direito a isso e é nosso
dever assegurar-lhe essas condições. É verdade que nosso trabalhador não sofre
de desemprego; ele está livre do jugo do capitalismo; ele não é mais um escravo,
mas o mestre de seu trabalho. Mas isto não é o suficiente. Ele exige que todas as
suas necessidades materiais e culturais sejam satisfeitas, e é nosso dever atender
a essa sua exigência. Não se esqueça de que agora fazemos certas exigências ao
trabalhador – exigimos dele disciplina de trabalho, esforço intenso, emulação,
trabalho de brigada de choque. Não se esqueça de que a grande maioria dos tra-
balhadores aceitou com grande entusiasmo essas demandas do governo soviético
e as está cumprindo com heroísmo. Não se surpreenda, portanto, se, ao cumprir
as exigências do governo soviético, os trabalhadores, por sua vez, exigirem que o
governo soviético cumpra suas obrigações no que diz respeito a melhorar ainda
mais sua condição material e cultural.
A tarefa, portanto, é acabar com a fluidez da mão-de-obra, acabar com a equali-
zação salarial, organizar adequadamente os salários e melhorar as condições de vida dos
trabalhadores.
É assim que se colocam as questões em relação à segunda nova condição de
desenvolvimento da nossa indústria. Passemos à terceira condição.

III. A organização do trabalho

Eu disse que é preciso acabar com a fluidez da mão-de-obra, para reter os


trabalhadores nas fábricas. Mas reter os trabalhadores nas fábricas não é tudo; o
assunto não termina aí. Não basta acabar com a fluidez da mão de obra. Devemos
J. V. Stalin 477

proporcionar aos trabalhadores condições de trabalho que lhes permitam traba-


lhar com eficiência, aumentar a produtividade e melhorar a qualidade dos pro-
dutos. Consequentemente, devemos organizar o trabalho nas fábricas de modo
a aumentar a produtividade do trabalho mês a mês, trimestre a trimestre.
Pode-se dizer que a atual organização do trabalho em nossas fábricas atende
às modernas exigências de produção? Infelizmente, isso não pode ser dito. Em
todo o caso, ainda temos várias fábricas onde o trabalho é abominavelmente or-
ganizado. Onde, em vez de ordem e coordenação de trabalho, há desordem e
confusão. Onde, em vez de responsabilidade pelo trabalho, há absoluta irres-
ponsabilidade, falta de responsabilidade pessoal.
O que significa falta de responsabilidade pessoal? É a ausência de qualquer
responsabilidade pelo trabalho que é confiado a alguém, a ausência de responsa-
bilidade por máquinas e ferramentas. Naturalmente, quando não há responsabi-
lidade pessoal, não se põe em causa nenhum aumento importante da produtivi-
dade do trabalho, nenhuma melhoria na qualidade da produção, ou cuidado no
manejo de máquinas e ferramentas. Você sabe o que a falta de responsabilidade
pessoal causou às ferrovias. Está levando ao mesmo resultado na indústria. Eli-
minamos o sistema de falta de responsabilidade pessoal nos caminhos-de-ferro
e, assim, melhoramos o seu trabalho. Devemos fazer o mesmo na indústria para
elevar o seu trabalho a um nível superior.
Antigamente, podíamos “administrar”, de uma forma ou de outra, a má or-
ganização do trabalho que ocorre naturalmente com a falta de responsabilidade
pessoal, sem que nenhum trabalhador fosse responsável por um determinado
trabalho concreto. Agora é outro assunto. Agora a situação é completamente
diferente. Com a vasta escala de produção atual e a existência de empresas gi-
gantescas, a falta de responsabilidade pessoal tornou-se um flagelo da indústria
que está comprometendo todas as nossas conquistas nas fábricas na esfera da
produção e da organização.
O que permitiu que a falta de responsabilidade pessoal se tornasse a regra em
várias de nossas fábricas? Ela se infiltrou nas fábricas como companheira ilegí-
tima da semana de trabalho ininterrupta. Seria errado afirmar que a semana de
trabalho ininterrupta leva necessariamente à falta de responsabilidade pessoal na
produção. Se o trabalho for adequadamente organizado, se cada pessoa for res-
ponsabilizada por um trabalho definido, se grupos definidos de trabalhadores
forem atribuídos às máquinas, se os turnos forem devidamente organizados de
modo que sejam iguais em qualidade e habilidade – dadas tais condições, o tra-
balho ininterrupto – leva a um aumento tremendo na produtividade do trabalho,
a uma melhoria na qualidade do trabalho e à eliminação da falta de responsa-
bilidade pessoal. É o caso dos caminhos-de-ferro, por exemplo, onde já está em
vigor a semana de trabalho ininterrupta, mas onde já não existe falta de respon-
sabilidade pessoal. Pode-se dizer que a posição em relação à semana de trabalho
ininterrupta é igualmente satisfatória nas empresas industriais? Infelizmente,
isso não pode ser dito. O fato é que várias de nossas fábricas adotaram a semana
ininterrupta de trabalho com muita pressa, sem preparar as condições adequadas
para isso, sem organizar devidamente os turnos mais ou menos iguais em qua-
lidade e habilidade, sem responsabilizar cada trabalhador por um determinado
478 Obras Escolhidas

trabalho concreto. O resultado é que a jornada de trabalho ininterrupta, entre-


gue a si mesma, deu origem à falta de responsabilidade pessoal. O resultado é
que, em várias fábricas, temos a semana de trabalho ininterrupta no papel, em
palavras, e a falta de responsabilidade pessoal não no papel, mas na operação real.
O resultado é que não há senso de responsabilidade pelo trabalho, o maquinário
é manuseado de maneira descuidada, um grande número de máquinas quebra
e não há incentivo para aumentar a produtividade do trabalho. Não é à toa que
os trabalhadores dizem: “Poderíamos aumentar a produtividade do trabalho e
melhorar as coisas; mas quem vai valorizar quando ninguém é responsável por
nada?”.
Daí decorre que, alguns dos nossos camaradas, se precipitaram um pouco na
introdução da semana de trabalho ininterrupta e, com a pressa, a distorceram e
transformaram em um sistema de isenção de responsabilidade pessoal.
Existem duas formas de pôr fim a esta situação e de acabar com a falta de
responsabilidade pessoal. Mude a forma de realização da semana de trabalho
ininterrupta para que não resulte em falta de responsabilidade pessoal, como
acontecia nas ferrovias. Ou, onde as condições não o favorecem, abandone a
semana nominal de trabalho ininterrupto, adote temporariamente a semana in-
terrompida de seis dias, como foi feito recentemente nas obras de trator de Sta-
lingrado, e prepare as condições para retornar, caso haja necessidade, a uma
semana de trabalho ininterrupta real, não nominal; voltar eventualmente à se-
mana ininterrupta de trabalho, mas não à falta de responsabilidade pessoal.
Não há outro caminho.
Não há dúvida de que nossos executivos econômicos entendem tudo isso muito
bem. Mas eles ficam em silêncio. Por quê? Porque, evidentemente, eles temem
a verdade. Mas desde quando os bolcheviques começaram a temer a verdade?
Não é verdade que, em várias fábricas, a semana de trabalho ininterrupta resul-
tou em falta de responsabilidade pessoal e, portanto, foi distorcida ao extremo?
A questão é: quem quer uma semana de trabalho ininterrupta? Quem se atreve a
afirmar que a preservação desta semana de trabalho ininterrupta nominal e dis-
torcida é mais importante do que a organização adequada do trabalho, do que o
aumento da produtividade do trabalho, do que uma semana de trabalho genuína
e ininterrupta, do que os interesses de nossa indústria socialista? Não está claro
que, quanto mais cedo enterrarmos a semana de trabalho nominal ininterrupta,
mais cedo conseguiremos uma organização adequada do trabalho?
Alguns camaradas pensam que podemos acabar com a falta de responsabili-
dade pessoal por meio de encantamentos e discursos pomposos. De qualquer
forma, conheço vários executivos econômicos que, em sua luta contra a falta de
responsabilidade pessoal, se limitam a falar em reuniões, de vez em quando,
amaldiçoando a falta de responsabilidade pessoal, aparentemente acreditando
que, depois de tais discursos, a falta de responsabilidade pessoal é fadada a desa-
parecer automaticamente, por assim dizer. Eles estão gravemente enganados se
pensam que a falta de responsabilidade pessoal pode ser eliminada por meio de
discursos e encantamentos. Não, camaradas, a falta de responsabilidade pessoal
nunca desaparecerá por si mesma. Só nós podemos e devemos acabar com isso;
porque somos você e eu que estamos no comando, e somos você e eu que somos
J. V. Stalin 479

responsáveis por tudo, incluindo a falta de responsabilidade pessoal. Acho que


seria muito melhor se nossos executivos econômicos, em vez de fazer discursos
e encantamentos, passassem um ou dois meses em alguma mina ou fábrica, es-
tudassem todos os detalhes e “ninharias” relativas à organização do trabalho, se
realmente colocassem um ponto final à falta de responsabilidade pessoal e, de-
pois, aplicassem a experiência adquirida nesta empresa a outras empresas. Isso
seria muito melhor. Isso seria realmente lutar contra a falta de responsabilidade
pessoal, lutar pela organização bolchevique adequada do trabalho, pela distri-
buição adequada das forças em nossas empresas.
Por isso, a tarefa é acabar com a falta de responsabilidade pessoal, melhorar a organi-
zação do trabalho e assegurar uma distribuição adequada das forças nas nossas empresas.
É assim que se colocam as questões em relação à terceira nova condição de
desenvolvimento da nossa indústria. Passemos à quarta condição.

IV. Uma intelligentsia técnica e da classe operária


industrial

A situação também mudou no que diz respeito ao pessoal administrativo da


indústria em geral, e no que diz respeito ao pessoal de engenharia e técnico em
particular.
Anteriormente, a situação era que a principal fonte de abastecimento para
toda a nossa indústria era o carvão e a base metalúrgica na Ucrânia. A Ucrâ-
nia fornecia metal a todas as nossas regiões industriais: tanto ao sul quanto a
Moscou e Leningrado. Também fornecia carvão para as principais empresas da
URSS. Excluo os Urais porque a importância relativa de todos os Urais era muito
pequena em comparação com a Bacia de Donetz. Assim, tínhamos três centros
principais de formação de quadros administrativos para a indústria: o Sul, o dis-
trito de Moscou e o distrito de Leningrado. Naturalmente, nessas condições,
poderíamos de alguma forma nos virar com as pequeníssimas forças de enge-
nharia e técnicas, que eram tudo o que nosso país tinha à sua disposição naquela
época.
Essa era a posição no passado recente.
Mas a situação agora é bem diferente. Agora é óbvio, penso eu, que com o
atual ritmo de desenvolvimento e a gigantesca escala de produção, já não somos
capazes de nos contentar apenas com o carvão ucraniano e a base metalúrgica.
Como sabem, o abastecimento de carvão e metal ucraniano é adequado, apesar
do aumento da produção. Como vocês sabem, fomos obrigados, como resultado
disso, a criar uma nova base de carvão e metalúrgica no Leste – a Bacia dos
Urais-Kuznetsk. Nosso trabalho para criar essa base foi um sucesso. Mas isso
não é suficiente. Devemos, além disso, criar uma indústria metalúrgica na pró-
pria Sibéria para satisfazer suas próprias necessidades crescentes. E já estamos
criando. Além disso, devemos criar uma nova base para metais não ferrosos no
Cazaquistão e no Turquestão. Finalmente, devemos desenvolver a construção
ferroviária extensiva. Isso é ditado pelos interesses da URSS como um todo –
pelos interesses das repúblicas fronteiriças, bem como do centro.
480 Obras Escolhidas

Mas daí decorre que não podemos mais nos contentar com as pequeníssimas
forças de engenharia, técnicas e administrativas da indústria com que adminis-
trávamos anteriormente. Segue-se que os velhos centros de treinamento de forças
técnicas e de engenharia não são mais adequados, que devemos criar toda uma
rede de novos centros – nos Urais, na Sibéria e na Ásia Central. Devemos, agora,
garantir o abastecimento de três vezes, cinco vezes o número de forças de en-
genharia, técnicas e administrativas para a indústria se realmente pretendemos
realizar o programa de industrialização socialista da URSS.
Mas não precisamos de qualquer tipo de força administrativa, de engenharia
e técnica. Precisamos de forças administrativas, engenheiras e técnicas capazes de
compreender a política da classe trabalhadora de nosso país, capazes de assimilar
essa política e prontas para executá-la com consciência. E o que isto significa?
Significa que nosso país entrou em uma fase de desenvolvimento em que a classe
trabalhadora deve criar sua própria intelectualidade industrial e técnica, capaz
de defender os interesses da classe trabalhadora na produção como os interesses
da classe dominante.
Nenhuma classe dominante conseguiu sem sua própria intelectualidade. Não
há motivos para acreditar que a classe trabalhadora da URSS possa administrar
sem sua própria intelectualidade industrial e técnica.
O governo soviético levou em consideração essa circunstância, e abriu ampla-
mente as portas de todas as instituições de ensino superior em todos os ramos da
economia nacional aos membros da classe trabalhadora e do campesinato traba-
lhador. Vocês sabem que dezenas de milhares de jovens da classe trabalhadora e
camponesa estão agora estudando em instituições de ensino superior. Enquanto
anteriormente, sob o capitalismo, as instituições de ensino superior eram mono-
pólio dos descendentes dos ricos – hoje, sob o sistema soviético, a classe trabalha-
dora e a juventude camponesa predominam ali. Não há dúvida de que, em breve,
nossas instituições de ensino formarão milhares de novos técnicos e engenheiros,
novos líderes para nossas indústrias.
Mas esse é apenas um aspecto da questão. O outro aspecto é que a intelec-
tualidade industrial e técnica da classe trabalhadora será recrutada não apenas
entre aqueles que tiveram educação superior, mas também entre os trabalhadores
práticos em nossas fábricas, os trabalhadores qualificados, as forças culturais da
classe trabalhadora nos moinhos, fábricas e minas. Os iniciadores da emulação,
os líderes das brigadas de choque, aqueles que, na prática, inspiram o entusiasmo
trabalhista, os organizadores das operações nos vários setores de nosso trabalho
de construção. Tal é o novo estrato da classe trabalhadora que, junto com os
camaradas que têm ensino superior, deve formar o núcleo da intelectualidade
da classe trabalhadora, o núcleo do corpo administrativo de nossa indústria. A
tarefa é fazer com que esses camaradas “de base”, que mostram iniciativa, não
sejam deixados de lado, para promovê-los com ousadia a posições de responsa-
bilidade, para dar-lhes a oportunidade de mostrar suas habilidades de organiza-
ção e a oportunidade de complementar seus conhecimentos, para criar condições
adequadas para o seu trabalho, sem poupar dinheiro para esse fim.
Entre esses camaradas, não são poucos os que não são do Partido. Mas isso
não deve impedir-nos de promovê-los com ousadia a posições de liderança. Pelo
J. V. Stalin 481

contrário, são sobretudo estes camaradas não partidários que devem receber a
nossa atenção especial, que devem ser promovidos a cargos de responsabilidade,
para que vejam por si próprios que o Partido valoriza os trabalhadores capazes e
talentosos.
Alguns camaradas acham que apenas os membros do Partido podem ocupar
cargos de chefia nas fábricas e moinhos. Essa é a razão pela qual eles frequen-
temente colocam de lado os camaradas não-partidários, que possuem habilidade
e iniciativa, e colocam os membros do Partido no topo, embora eles sejam inca-
pazes e não mostrem nenhuma iniciativa. Desnecessário dizer que não há nada
mais estúpido e reacionário do que tal “política”, se podemos chamá-la assim.
Nem é preciso provar que tal “política” só pode deixar o Partido em descrédito e
repelir os trabalhadores não partidários dele. Nossa política, de forma alguma,
consiste em converter o Partido em uma casta exclusiva. Nossa política é garan-
tir que haja uma atmosfera de “confiança mútua”, de “controle mútuo” (Lenin),
entre os trabalhadores do Partido e não-partidários. Uma das razões pelas quais
nosso Partido é forte entre a classe trabalhadora, é que segue essa política.
Portanto, a tarefa é fazer com que a classe trabalhadora da URSS tenha sua própria
intelectualidade industrial e técnica.
É assim que se colocam as questões em relação à quarta nova condição de
desenvolvimento da nossa indústria. Passemos à quinta condição.

V. Sinais de mudança de atitude entre a antiga


intelligentsia industrial e técnica

A questão da nossa atitude para com a velha intelectualidade industrial e


técnica burguesa também é apresentada sob uma nova luz.
Cerca de dois anos atrás, a situação era que a seção mais altamente qualificada
da antiga intelectualidade técnica estava infectada com a doença da destruição.
Mais do que isso, naquela época, a sabotagem era uma espécie de atividade da
moda. Alguns se engajaram na destruição, outros protegeram os destruidores,
outros novamente lavaram as mãos sobre o que estava acontecendo e permane-
ceram neutros, enquanto outros ainda vacilaram entre o regime soviético e os
destruidores. Claro, a maioria da velha intelectualidade técnica continuou a tra-
balhar mais ou menos lealmente. Mas não estamos falando aqui da maioria, mas
da seção mais altamente qualificada da intelectualidade técnica.
O que deu origem ao movimento de demolição? O que o fomentou? A inten-
sificação da luta de classes na URSS, a política de ofensiva do Governo Soviético
contra os elementos capitalistas na cidade e no campo, a resistência desses ele-
mentos à política do Governo Soviético, a complexidade da situação internacional
e as dificuldades do desenvolvimento das fazendas coletivas e estatais. Enquanto
as atividades da seção militante dos destruidores eram aumentadas, boa parte
pelas intrigas intervencionistas dos imperialistas nos países capitalistas, e pelas
dificuldades de grãos em nosso país, as vacilações da outra seção da velha in-
telectualidade técnica em relação aos destruidores ativos eram encorajadas por
declarações que estavam na moda entre os fanfarrões trotskistas-mencheviques,
482 Obras Escolhidas

no sentido de que “nada virá das fazendas coletivas e fazendas estatais”, que “o
poder soviético está degenerando de qualquer maneira e está fadado ao colapso
muito em breve”, que “os bolcheviques, por sua política, estão eles próprios facili-
tando a intervenção”, etc., etc. Além disso, se mesmo alguns velhos bolcheviques
entre os desviantes de direita não puderam resistir à “epidemia” e se afastaram
do Partido naquele momento, não é surpreendente que uma certa seção da velha
intelectualidade técnica, que nunca tivera a menor ideia do bolchevismo, deveria,
com a ajuda de Deus, também vacilar.
Naturalmente, sob tais circunstâncias, o governo soviético poderia seguir ape-
nas uma política em relação à velha intelectualidade técnica: a política de esma-
gar os destruidores ativos, diferenciar os neutros e alistar aqueles que eram leais.
Isso foi há um ou dois anos.
Podemos dizer que a situação é exatamente a mesma agora? Não, nós não
podemos. Pelo contrário, surgiu uma situação inteiramente nova. Para começar,
há o fato de termos derrotado e vencido com sucesso os elementos capitalistas
na cidade e no campo. Claro, isso não pode evocar alegria entre a velha intelec-
tualidade. Muito provavelmente, eles ainda expressam simpatia por seus amigos
derrotados. Mas os simpatizantes, ainda menos os neutros ou vacilantes, não
têm o hábito de concordar voluntariamente em compartilhar o destino de seus
amigos mais ativos quando estes sofreram uma derrota severa e irreparável.
Além disso, superamos as dificuldades dos grãos, e não apenas as superamos,
mas agora exportamos uma quantidade de grãos maior do que jamais foi expor-
tada desde a existência do poder soviético. Consequentemente, este “argumento”
dos vacilantes também cai por terra.
Além disso, até os cegos podem ver agora que, no que diz respeito ao de-
senvolvimento da fazenda coletiva e da fazenda estatal, obtivemos uma vitória
definitiva e alcançamos um sucesso tremendo.
Consequentemente, a principal arma do “arsenal” da antiga intelectualidade
desapareceu. Quanto às esperanças de intervenção da intelectualidade burguesa,
há que admitir que, pelo menos por enquanto, se revelaram uma casa construída
sobre a areia; de fato, durante seis anos a intervenção foi prometida, mas ne-
nhuma tentativa de intervenção foi feita. Chegou a hora de reconhecer que nossa
sapiente intelectualidade burguesa foi simplesmente levada pelo nariz. Isso sem
contar o fato de que a conduta dos destruidores ativos no famoso julgamento de
Moscou estava fadada a desacreditar, e de fato desacreditou, a ideia da destrui-
ção.
Naturalmente, essas novas circunstâncias não podiam deixar de influenciar
nossa velha intelectualidade técnica. A nova situação estava fadada a dar ori-
gem, e realmente deu origem, a novos sentimentos entre a velha intelectualidade
técnica. Isso, de fato, explica por que há sinais definitivos de uma mudança de
atitude em favor do regime soviético por parte de uma certa seção dessa intelec-
tualidade, que antes simpatizava com os destruidores. O fato de que não apenas
este estrato da antiga intelectualidade, mas mesmo destruidores definitivos de
ontem, um número considerável deles, estão começando a trabalhar lado a lado
com a classe trabalhadora em muitas fábricas e moinhos, este fato mostra, sem
dúvida, que uma mudança de atitude entre a velha intelectualidade técnica já co-
J. V. Stalin 483

meçou. Isso, é claro, não significa que não haja mais sabotadores no país. Não,
não significa isso. Destruidores existem e continuarão a existir enquanto tiver-
mos classes e enquanto existir o cerco capitalista. Mas isso significa que, uma vez
que uma grande parte da velha intelectualidade técnica que antes simpatizava,
de uma forma ou de outra, com os destruidores, agora deu uma guinada para o
lado do regime soviético, os destruidores ativos tornaram-se poucos em número,
estão isolados e terão de se aprofundar no subsolo por enquanto.
Mas segue-se disso que devemos mudar nossa política em relação à velha in-
telectualidade técnica de acordo com a situação. Enquanto no auge das ativi-
dades de demolição nossa atitude para com a velha intelectualidade técnica era
expressa principalmente pela política de derrotá-la, agora, quando esses intelec-
tuais se voltam para o lado do regime soviético, nossa atitude em relação a eles
deve ser expressa principalmente pela política de alistá-los e mostrar solicitude
por eles. Seria errado e anti-dialético continuar nossa política anterior nas novas
e alteradas condições. Seria estúpido e insensato considerar praticamente todo
especialista e engenheiro da velha escola como um criminoso e sabotador não
descoberto. Sempre consideramos, e ainda consideramos, a “isca de especialis-
tas” um fenômeno nocivo e vergonhoso.
Portanto, a tarefa é mudar nossa atitude em relação aos engenheiros e técnicos da
velha escola, para mostrar-lhes maior atenção e solicitude, para obter sua cooperação com
mais ousadia.
Assim se colocam as questões em relação à quinta nova condição de desenvol-
vimento de nossa indústria.
Passemos à última condição.

VI. Contabilidade de negócios


O quadro ficaria incompleto se eu não tratasse de mais uma nova condição.
Refiro-me às fontes de acumulação de capital para a indústria, para a economia
nacional; refiro-me à necessidade de aumentar a taxa de acumulação.
Qual é a característica nova e especial do desenvolvimento de nossa indústria
do ponto de vista da acumulação? É que as velhas fontes de acumulação já co-
meçam a ser inadequadas para a expansão futura da indústria; que é necessário,
portanto, buscar novas fontes de acumulação e reforçar as velhas fontes se real-
mente quisermos manter e desenvolver o ritmo bolchevique de industrialização.
Sabemos, pela história dos países capitalistas, que nem um único Estado jo-
vem que desejasse elevar sua indústria a um patamar superior foi capaz de dis-
pensar a ajuda externa, na forma de créditos ou empréstimos de longo prazo.
Por isso, os capitalistas dos países ocidentais recusaram categoricamente créditos
ou empréstimos ao nosso país, por acreditarem que a falta de créditos e emprés-
timos impediria certamente a industrialização do nosso país. Mas os capitalistas
estavam enganados. Não levaram em conta o fato de que nosso país, ao contrário
dos países capitalistas, possui certas fontes especiais de acumulação suficientes
para restaurar e desenvolver ainda mais nossa indústria. E, de fato, não apenas
restauramos nossa indústria, não apenas restauramos nossa agricultura e trans-
porte, mas já conseguimos iniciar o tremendo trabalho de reconstrução da in-
484 Obras Escolhidas

dústria pesada, da agricultura e dos transportes. Claro, este trabalho nos custou
muitos bilhões de rublos. De onde tiramos essa quantia? Da indústria leve, da
agricultura e das acumulações orçamentárias. É assim que administramos até
recentemente.
Mas a situação é totalmente diferente agora. Se, antes, as velhas fontes de
acumulação de capital eram suficientes para a reconstrução da indústria e dos
transportes, agora estão obviamente se tornando inadequadas. Agora não é uma
questão de reconstruir nossas velhas indústrias. É uma questão de criar novas
indústrias tecnicamente bem equipadas nos Urais, na Sibéria, no Cazaquistão.
É uma questão de criar uma nova agricultura em grande escala nas regiões de
grãos, gado e matérias-primas da URSS. É uma questão de criar uma nova rede
de ferrovias ligando o leste e o oeste da URSS. Naturalmente, as velhas fontes de
acumulação não podem aguentar o suficiente para esta tarefa gigantesca.
Mas isso não é tudo. A isso deve ser adicionado o fato de que, devido à gestão
ineficiente, os princípios da contabilidade empresarial são grosseiramente viola-
dos em um grande número de nossas fábricas e organizações empresariais. É um
fato que várias empresas e organizações empresariais, há muito, deixaram de ter
contas adequadas, de calcular, de estabelecer balanços sólidos de receitas e des-
pesas. É um fato que, em várias empresas e organizações empresariais, conceitos
como “regime de economia”, “redução de gastos improdutivos”, “racionalização
da produção” há muito saíram de moda. Evidentemente, eles presumem que o
Banco do Estado “adiantará o dinheiro necessário de qualquer maneira”. É um
fato que os custos de produção em várias empresas começaram recentemente a
aumentar. Eles receberam a tarefa de reduzir os custos em 10% ou mais, mas, em
vez disso, eles os estão aumentando. No entanto, o que significa uma redução no
custo de produção? Você sabe que reduzir o custo de produção em um por cento
significa um acúmulo na indústria de 150 milhões a 200 milhões de rublos. Ob-
viamente, aumentar o custo de produção sob tais circunstâncias significa privar
a indústria e toda a economia nacional de centenas de milhões de rublos.
De tudo isso, não é mais possível contar apenas com a indústria leve, com as
acumulações orçamentárias e com as receitas da agricultura. A indústria leve é
uma fonte abundante de acumulação e há todas as perspectivas de sua contínua
expansão; mas não é uma fonte ilimitada. A agricultura é uma fonte não menos
abundante de acumulação, mas agora, durante o período de sua reconstrução, a
própria agricultura requer ajuda financeira do Estado. Quanto às acumulações
orçamentárias, vocês mesmos sabem que não podem e não devem ser ilimitadas.
O que resta então? Resta a indústria pesada. Consequentemente, devemos cui-
dar para que a indústria pesada – e principalmente sua seção de construção de
máquinas – também forneça acúmulos. Consequentemente, ao mesmo tempo
em que reforçamos e expandimos as velhas fontes de acumulação, devemos cui-
dar para que a indústria pesada – e acima de tudo a construção de máquinas –
também forneça acumulações. Essa é a saída.
E o que é necessário para isso? Devemos acabar com a ineficiência, mobilizar
os recursos internos da indústria, introduzir e reforçar a contabilidade empresa-
rial em todas as nossas empresas, reduzir sistematicamente os custos de produção
e aumentar as acumulações internas em todos os ramos da indústria, sem exce-
J. V. Stalin 485

ção.
Essa é a saída.
Portanto, a tarefa é introduzir e reforçar a contabilidade empresarial, para aumentar
a acumulação na indústria.

VII. Novos métodos de trabalho, novos métodos de


gestão

Tais são, camaradas, as novas condições de desenvolvimento da nossa indús-


tria.
O significado dessas novas condições é que elas estão criando uma nova situ-
ação para a indústria, que exige novos métodos de trabalho e novos métodos de
gestão.
Consequentemente:
a) Segue-se, portanto, que não podemos mais contar, como antigamente,
com um influxo automático de mão de obra. Para garantir mão de obra para
nossas indústrias, ela deve ser recrutada de maneira organizada e a mão de
obra deve ser mecanizada. Acreditar que podemos prescindir da mecaniza-
ção, tendo em vista o nosso ritmo de trabalho e escala de produção, é como
acreditar que o mar pode ser esvaziado com uma colher.
b) Segue-se, ainda, que não podemos mais tolerar a fluidez da mão de obra
na indústria. Para acabar com esse mal, devemos organizar os salários de uma
nova forma e fazer com que a composição da força de trabalho nas fábricas
seja mais ou menos constante.
c) Segue-se, além disso, que não podemos mais tolerar a falta de respon-
sabilidade pessoal na indústria. Para acabar com este mal, o trabalho deve
ser organizado de uma nova maneira, e as forças devem ser distribuídas de
forma que cada grupo de trabalhadores seja responsável por seu trabalho,
pelo maquinário e pela qualidade do trabalho.
d) Segue-se, além disso, que não podemos mais lidar, como antigamente,
com a pequena força de velhos engenheiros e técnicos que herdamos da Rússia
burguesa. Para aumentar a atual taxa e escala de produção, devemos garan-
tir que a classe trabalhadora tenha sua própria intelectualidade industrial e
técnica.
e) Segue-se, ainda, que não podemos mais, como antigamente, agrupar to-
dos os especialistas, engenheiros e técnicos da velha escola. Para ter em conta
a evolução da situação, devemos mudar a nossa política e mostrar a máxima
solicitude para com os especialistas, engenheiros e técnicos da velha escola
que estão definitivamente se voltando para o lado da classe trabalhadora.
f) Segue-se, por último, que não podemos mais, como antigamente, admi-
nistrar com as velhas fontes de acumulação. A fim de assegurar uma maior
expansão da indústria e da agricultura, devemos explorar novas fontes de
acumulação; devemos acabar com a ineficiência, introduzir a contabilidade
empresarial, reduzir os custos de produção e aumentar a acumulação na in-
dústria.
486 Obras Escolhidas

Tais são as novas condições de desenvolvimento da indústria, que exigem no-


vos métodos de trabalho e novos métodos de gestão na construção econômica.
O que é necessário para garantir a gestão em novas linhas?
Em primeiro lugar, nossos executivos econômicos devem compreender a nova
situação; devem estudar concretamente as novas condições de desenvolvimento
da indústria e reformar seus métodos de trabalho para atender às necessidades
da nova situação.
Além disso, nossos executivos econômicos devem dirigir seus empreendimen-
tos não “em geral”, não “no abstrato”, mas concretamente, especificamente; eles
devem abordar todas as questões não do ponto de vista de frases gerais, mas de
uma maneira estritamente profissional; eles não devem se limitar a instruções
escritas formais ou frases e slogans gerais, mas estudar a técnica do negócio e
entrar em detalhes, em “ninharias”, pois é a partir de “ninharias” que grandes
coisas estão sendo construídas agora.
Além disso, nossas atuais colheitadeiras pesadas, que às vezes consistem em
até 100 a 200 empresas, devem ser divididas imediatamente em várias colheita-
deiras. Obviamente, o presidente de uma colheitadeira que tem que lidar com
cem ou mais fábricas não pode realmente conhecer essas fábricas, suas poten-
cialidades e seu trabalho. Obviamente, se ele não conhece essas fábricas, não
está em posição de dirigi-las. Consequentemente, para capacitar o presidente
de uma colheitadeira a estudar completamente as fábricas e dirigi-las, ele deve
ser dispensado de algumas das fábricas; a colheitadeira deve ser dividida em vá-
rias outras menores e a sede da colheitadeira deve ser colocada em contato mais
próximo com as fábricas.
Além disso, nossas colheitadeiras devem substituir a administração de um ho-
mem pela administração do conselho. A posição atual é que há de 10 a 15 pes-
soas no conselho de uma colheitadeira, redigindo documentos e conduzindo as
discussões. Não podemos continuar administrando assim, camaradas. Devemos
acabar com a “administração” no papel e mudar para um trabalho genuíno bol-
chevique. Deixe um presidente e vários vice-presidentes permanecerem à frente
de uma combinação. Isso será o bastante para sua gestão. Os demais membros
do conselho devem ser encaminhados para as fábricas e usinas. Isso será muito
mais útil, tanto para o trabalho quanto para eles próprios.
Além disso, os presidentes e vice-presidentes das colheitadeiras devem fazer
visitas mais frequentes às fábricas, permanecer e trabalhar nelas por períodos
mais longos, familiarizar-se mais de perto com o pessoal nas fábricas e não ape-
nas ensinar a população local, mas também aprender com eles. Pensar que agora
você pode dirigir sentado em um escritório, longe das fábricas, é uma ilusão.
Para dirigir as fábricas, você deve entrar em contato mais frequente com os fun-
cionários dessas fábricas, manter contato ao vivo com eles.
Finalmente, uma ou duas palavras sobre nosso plano de produção para 1931.
Há certos filisteus próximos ao Partido que afirmam que nosso programa de pro-
dução é irreal, que não pode ser cumprido. Eles são um pouco como os “gobiões
sapientes” de Shchedrin, que estão sempre prontos para espalhar “um vácuo de
inaptidão” em torno de si. Nosso programa de produção é realista ou não? Cer-
tamente, é. É realista apenas porque todas as condições necessárias para o seu
J. V. Stalin 487

cumprimento estão disponíveis. É realista até porque o seu cumprimento agora


depende apenas de nós, da nossa capacidade e disponibilidade para aproveitar
as vastas oportunidades à nossa disposição. De que outra forma podemos expli-
car o fato de um grande número de empresas e setores já terem superado seus
planos? Isso significa que outras empresas e setores também podem cumprir e
superar seus planos.
Seria tolice pensar que o plano de produção é uma mera enumeração de nú-
meros e atribuições. Na verdade, o plano de produção é a atividade vivencial e
prática de milhões de pessoas. A realidade do nosso plano de produção reside
nos milhões de trabalhadores que estão criando uma nova vida. A realidade do
nosso programa reside nas pessoas vivas, você e eu, nossa vontade de trabalhar,
nossa prontidão para trabalhar da nova maneira, nossa determinação em cumprir
o plano. Temos essa determinação? Sim, nós temos. Pois bem, nosso programa
de produção pode e deve ser cumprido.
Pravda, nº 183.
5 de julho de 1931
488 Obras Escolhidas

A importância e as tarefas dos


Bureaus de Reclamações
7 de abril de 1932

O trabalho dos Bureaus de Reclamações264 é de enorme importância na luta


para eliminar as deficiências dos aparelhos do nosso Partido, sovietes, econômi-
cos, sindicais e Komsomol, para melhorar o nosso aparelho administrativo.
Lenin disse que, sem um aparelho, teríamos morrido há muito tempo e que,
sem uma luta sistemática e obstinada para melhorar o aparelho, certamente mor-
reríamos. Isso significa que a luta resoluta e sistemática contra o conservado-
rismo e a burocracia em nosso aparelho é uma tarefa essencial do Partido, da
classe trabalhadora e de todos os trabalhadores de nosso país.
A tremenda importância dos Bureaus de Reclamações consiste no fato de se-
rem um meio sério de cumprir o pedido de Lenin, no que diz respeito à luta
para melhorar o aparelho.
É indiscutível que os Bureaus de Reclamações têm realizações consideráveis
neste domínio.
A tarefa é consolidar os resultados alcançados e alcançar sucessos decisivos
nesta questão. Não pode haver dúvida de que, se os Bureaus de Reclamações reu-
nirem em torno deles todos os setores mais ativos dos trabalhadores e agricultores
coletivos, atraindo-os para o trabalho de administração do Estado e atendendo
atentamente à voz dos trabalhadores dentro e fora do Partido, esses sucessos de-
cisivos serão conquistados.
Esperamos que a revisão de cinco dias do trabalho dos Bureaus de Reclama-
ções sirva de estímulo para uma maior expansão do seu trabalho ao longo da
linha indicada pelo nosso professor Lenin.

264 O Bureau de Reclamações foi criado em abril de 1919, sob a alçada do Comissariado do Povo para
o Controle do Estado, que em 1920 foi mudado para o Comissariado do Povo para a Inspeção dos
Trabalhadores e Camponeses. As tarefas e o escopo do trabalho do Bureau Central de Reclamações
e Solicitações foram definidos por um regulamento datado de 4 de maio de 1919, e as dos departa-
mentos locais do Bureau Central por um regulamento datado de 24 de maio de 1919, publicado sob
a assinatura de Stalin, Comissário do Povo para o Controle do Estado. Desde o dia em que foram
formados, os escritórios centrais e locais trabalharam muito na investigação e verificação de recla-
mações e depoimentos dos trabalhadores, alistando neste trabalho uma extensa ativa de operários e
camponeses. A partir de fevereiro de 1934, o Bureau de Reclamações e Solicitações foi incluído no
sistema da Comissão de Controle Soviética sob o Conselho dos Comissariados do Povo e, a partir de
setembro de 1940, formou um departamento do Comissariado do Povo (posteriormente Ministério)
de Controle do Estado da URSS. O artigo de Stalin, “A importância dos Bureaus de Reclamações da
URSS”, foi escrito em conexão com a revisão de cinco dias de toda a União e a verificação do trabalho
dos órgãos, realizada em 9 a 14 de abril de 1932, por uma decisão do Presidium da Comissão Central
de Controle do PCUS (B) e do Colégio do Comissariado do Povo da URSS.
J. V. Stalin 489

Os resultados do primeiro Plano


Quinquenal
I. O significado internacional do plano
quinquenal

Camaradas, quando o plano quinquenal foi publicado, as pessoas dificilmente


previram que ele poderia ter um enorme significado internacional. Pelo contrá-
rio, muitos pensaram que o plano era um assunto privado da União Soviética –
um assunto importante e sério, mas ainda assim um assunto privado nacional da
União Soviética.
A história mostra, no entanto, que o significado internacional do plano quin-
quenal é incomensurável. A história mostra que o plano não é assunto privado
da União Soviética, mas diz respeito a todo o proletariado internacional.
Muito antes do plano quinquenal entrar em cena, no período em que terminá-
vamos nossa luta contra os intervencionistas e passávamos para a obra de cons-
trução econômica – ainda naquele período, Lenin dizia que nossa construção
econômica tinha um profundo significado internacional; que cada passo dado
pelo governo soviético ao longo do caminho da construção econômica estava en-
contrando uma resposta poderosa entre as mais variadas camadas dos países ca-
pitalistas, e dividindo as pessoas em dois campos – o campo dos apoiadores da
revolução proletária e o campo de seus oponentes. Lenin disse na época:
No momento, estamos exercendo nossa principal influência na revolução internacional por
meio de nossa política econômica. Todos os olhos estão voltados para a República Soviética
da Rússia, os olhos de todos os trabalhadores em todos os países do mundo, sem exceção
e sem exagero. Isso nós temos alcançado. Esse é o campo para o qual a luta se transferiu
em escala mundial. Se resolvermos este problema, teremos vencido em escala internacional
de forma segura e definitiva. É por isso que as questões de construção econômica assumem
absolutamente significado excepcional para nós. Nesta frente, devemos obter a vitória por
meio de um progresso lento, gradual – não pode ser rápido – mas constante, para cima, e
para frente. (ver Vol. 26, pp. 410-11).

Isso foi dito no momento em que encerrávamos a guerra contra os interven-


cionistas, quando passávamos da luta militar contra o capitalismo para a luta na
frente econômica, para o período do desenvolvimento econômico.
Muitos anos se passaram desde então, e cada passo dado pelo Governo Sovié-
tico na esfera do desenvolvimento econômico, a cada ano, a cada trimestre, vem
confirmar de forma brilhante as palavras do camarada Lenin.
Mas a confirmação mais brilhante do acerto das colocações de Lenin foi forne-
cida por nosso plano de construção de cinco anos, pelo surgimento desse plano,
seu desenvolvimento e sua realização. Na verdade, parece que nenhum passo
dado no caminho do desenvolvimento econômico de nosso país encontrou uma
resposta tão grande entre os mais diversos estratos dos países capitalistas da Eu-
ropa, América e Ásia quanto a questão do plano quinquenal, seu desenvolvi-
mento e seu cumprimento
490 Obras Escolhidas

No início, a burguesia e sua imprensa saudaram o plano de cinco anos com


um tom difamatório. “Fantasia”, “delírio”, “utopia”. Foi assim que apelidaram
nosso plano de cinco anos na época.
Mais tarde, quando começou a ficar evidente que o cumprimento do plano
quinquenal estava dando resultados reais, começaram a soar o alarme, afirmando
que o plano quinquenal ameaçava a existência dos países capitalistas, que seu
cumprimento conduziria à inundação de mercadorias nos mercados europeus, à
intensificação de descartes e ao aumento do desemprego.
Ainda mais tarde, quando este truque usado contra o regime soviético tam-
bém não produziu os resultados esperados, uma série de viagens à URSS foi
realizada por representantes de todos os tipos de firmas, órgãos de imprensa,
sociedades de vários tipos, etc., para o propósito de ver com os próprios olhos o
que realmente se passava na URSS Não me refiro aqui às delegações operárias,
que, desde a primeira apresentação do plano quinquenal, expressaram sua ad-
miração pelos empreendimentos e sucessos do regime soviético e manifestaram
sua prontidão para apoiar a classe trabalhadora da URSS
A partir dessa época, iniciou-se uma divisão na chamada opinião pública, na
imprensa burguesa, em todos os tipos de sociedades burguesas, etc. Alguns sus-
tentavam que o plano quinquenal havia fracassado totalmente e que os bolchevi-
ques estavam à beira do colapso. Outros, ao contrário, declararam que, embora
os bolcheviques fossem pessoas más, seu plano de cinco anos estava indo bem e
com toda probabilidade eles alcançariam seu objetivo.
Não será supérfluo, talvez, citar as opiniões de vários órgãos de imprensa
burgueses.
Veja, por exemplo, um jornal americano, The New York Times265 . No final de
novembro de 1932, este jornal escreveu: “Um plano industrial de cinco anos que
se propõe a desafiar o senso de proporção, que leva a um objetivo ‘independen-
temente do custo’, como Moscou frequentemente se gabou com orgulho, não é
realmente um plano. É uma aposta”.
Portanto, parece que o plano de cinco anos não é nem mesmo um plano, mas
uma aposta absoluta.
E aqui está a opinião de um jornal burguês britânico, The Daily Telegraph266 ,
expressa no final de novembro de 1932: “Como um teste prático de ‘economia
planejada’, o esquema claramente falhou’.
A opinião do The New York Times em novembro de 1932: “A campanha de
coletivização é, obviamente, um terrível fracasso. Ela levou a Rússia à beira da
fome”.
A opinião de um jornal burguês da Polônia, Gazeta Polska267 , no verão de
1932: “A situação parece mostrar que em sua política de coletivização do campo,
265 The New York Times é um jornal diário burguês, órgão de imprensa influente dos monopólios
capitalistas americanos; associada ao chamado Partido Democrático; publicado em Nova York desde
1851. p. 166
266 The Daily Telegraph é um jornal diário reacionário britânico próximo à liderança do Partido

Conservador, publicado em Londres desde 1855. Em 1937, ele se fundiu com o Morning Post e
desde então tem sido publicado em Londres e Manchester sob o nome de The Daily Telegraph.
267 Gazeta Polska (Gazeta Polonesa) foi um jornal burguês polonês, porta-voz do grupo fascista de

Pilsudski. Foi emitido em Varsóvia de 1929 a 1939.


J. V. Stalin 491

o governo soviético chegou a um impasse”.


A opinião de um jornal burguês britânico, The Financial Times268 , em novem-
bro de 1932: “Stalin e seu partido, como resultado de sua política, enfrentam
o colapso do sistema de plano quinquenal e a frustração dos objetivos que se
esperava que ele atingisse”.
A opinião da revista italiana Politica269 :
Seria absurdo pensar que nada foi criado em quatro anos de trabalho de uma nação de cento
e sessenta milhões de habitantes, em quatro anos de esforço econômico e político sobre-
humano por parte de um regime tão forte como o regime bolchevique representa. Ao con-
trário, muito foi feito. No entanto, a catástrofe é evidente – é um fato óbvio para todos.
Amigos e inimigos, bolcheviques e antibolcheviques, oposicionistas de direita e da esquerda
estão convencidos disso.

Por fim, a opinião da revista burguesa americana Current History 270 :

Um levantamento da postura existente dos negócios na Rússia, portanto, leva à conclusão de


que o programa de cinco anos falhou, tanto em termos de seus objetivos estatísticos anunci-
ados, e mais, fundamentalmente em termos de alguns de seus princípios sociais subjacentes.

Essas são as opiniões de um setor da imprensa burguesa.


Não vale a pena criticar aqueles que expressaram essas opiniões. Acho que
não vale a pena. Não vale a pena porque esses “obstinados” pertencem à espécie
de fósseis medievais para os quais os fatos nada significam e que persistirão em
sua opinião, não importa como nosso plano de cinco anos seja cumprido.
Voltemos às opiniões de outros órgãos de imprensa pertencentes ao mesmo
campo burguês.
Aqui está a opinião de um conhecido jornal burguês da França, Le Temps271 ,
expressa em janeiro de 1932: “A URSS ganhou o primeiro turno, industrializando-
se sem a ajuda do capital estrangeiro”.
A opinião de Le Temps novamente, expressa no verão de 1932:
O comunismo está completando o processo de reconstrução com enorme rapidez, enquanto
o sistema capitalista só permite o progresso em um ritmo lento... Na França, onde a terra é
infinitamente dividida entre os proprietários individuais, é impossível mecanizar a agricul-
tura; os soviéticos, entretanto, pela industrialização da agricultura, resolveram o problema...
Na disputa conosco, os bolcheviques foram os vencedores.

A opinião de uma revista burguesa britânica, The Round Table272 :


O desenvolvimento alcançado sob o plano de cinco anos é surpreendente. As fábricas de
tratores de Kharkov e Stalingrado, a fábrica de automóveis em Moscou, a fábrica de auto-
móveis em Nizhnij-Novgorod, o projeto hidroelétrico Dnieprostroi, as gigantescas fábricas
268 The Financial Times é um jornal diário burguês britânico, órgão dos círculos industriais e finan-
ceiros, publicado em Londres desde 1888
269 Politica foi uma revista social e política italiana que refletia as opiniões da grande burguesia do

país. A publicação começou em Roma em 1918.


270 Current History é uma revista que propaga as opiniões de historiadores burgueses americanos e

ideólogos da política externa agressiva do Departamento de Estado dos EUA. É publicada em Nova
York desde 1914.
271 Le Temps foi um jornal diário burguês francês, que desde 1931 era propriedade do Comité des

Forges (a Associação da Indústria Pesada). Foi publicado em Paris de 1861 a 1942.


272 The Round Table é uma revista burguesa britânica que trata das questões da política colonial do

Império Britânico e de suas relações internacionais. Publicado em Londres desde 1910, expressava
as opiniões dos círculos conservadores da burguesia britânica.
492 Obras Escolhidas

de aço em Magnitogorsk e Kuznetsk, a rede de oficinas mecânicas e fábricas de produtos


químicos nos Urais – que ofereceu uma feira para se tornar o Ruhr da Rússia. Essas e outras
conquistas industriais em todo o país mostram que, sejam quais forem as deficiências e difi-
culdades, a indústria russa, como uma fábrica bem regada, continua ganhando cor, tamanho
e força... Ela lançou as bases para o desenvolvimento futuro e fortaleceu prodigiosamente
sua capacidade de luta.

A opinião do jornal burguês britânico The Financial Times:


Não se pode duvidar do progresso feito na construção de máquinas, e as comemorações
disso na imprensa e na plataforma, brilhando como são, não são injustificadas. É preciso
lembrar que a Rússia, é claro, produzia máquinas e ferramentas, mas apenas do tipo mais
simples. É verdade que a importação de máquinas e ferramentas está realmente aumentando
em números absolutos; mas a proporção de máquinas importadas em relação às de produção
nativa está diminuindo constantemente. A Rússia está produzindo, hoje, todas as máquinas
essenciais para suas indústrias metalúrgica e elétrica; conseguiu criar sua própria indústria
automobilística; estabeleceu sua própria indústria de fabricação de ferramentas de pequenos
instrumentos de precisão às prensas mais pesadas; e, em matéria de maquinário agrícola,
é independente de importações estrangeiras. Ao mesmo tempo, o governo soviético está
tomando medidas para evitar o retardo da produção na confecção de indústrias básicas, como
ferro e carvão, colocando em risco o cumprimento do plano em quatro anos. A única coisa
certa é que as enormes fábricas, que agora estão sendo instaladas, garantem um aumento
muito considerável na produção das indústrias pesadas.

A opinião de um jornal burguês austríaco, Die Neue Freie Presse273 , expressa


no início de 1932: “Podemos amaldiçoar o bolchevismo, mas devemos entendê-
lo. O plano quinquenal é uma nova e enorme quantidade de produção que deve ser levada
em conta em todos os cálculos econômicos”.
A opinião de um capitalista britânico, Gibson Jarvie, presidente do United
Dominion Trust, expressa em outubro de 1932:
Agora quero que fique bem claro que não sou comunista nem bolchevique, sou definitiva-
mente um capitalista e individualista. A Rússia está avançando enquanto muitas de nossas
fábricas e estaleiros estão ociosas, e cerca de 3.000.000 de pessoas de nosso povo procuram
desesperadamente trabalho. Piadas foram feitas sobre o plano de cinco anos, e seu fracasso
foi previsto. Você pode levar isso como fora de dúvida, que sob o plano de cinco anos muito
mais foi realizado do que jamais foi realmente previsto. Em todos esses locais industriais que
visitei, uma nova cidade está crescendo, uma cidade com um plano definido, com ruas lar-
gas em processo de embelezamento, com árvores e gramados. Casas do tipo mais moderno,
escolas, hospitais, clubes de trabalhadores e a inevitável creche ou berçário, onde os filhos
de mães trabalhadoras são cuidados. Não subestime os russos ou seus planos e não cometa
o erro de acreditar que o governo soviético deve quebrar. A Rússia hoje é um país com uma
alma e um ideal. A Rússia é um país de atividades incríveis. Eu acredito que o objetivo russo é
correto. E talvez o mais importante de tudo, todos esses jovens e esses trabalhadores na Rússia
têm uma coisa que infelizmente está faltando nos países capitalistas hoje, que é a esperança!

A opinião da revista burguesa americana The Nation274 , expressa em novem-


bro de 1932:
Os quatro anos do plano de cinco anos testemunharam desenvolvimentos verdadeiramente
notáveis. A Rússia está trabalhando com intensidade durante a guerra na tarefa positiva
de construir os moldes físicos e sociais de uma nova vida. A face do país está mudando
literalmente e além do reconhecível. (...) Isso é verdade para Moscou, com centenas de ruas
e praças pavimentadas, com novos subúrbios, novos edifícios e um cordão de novas fábricas
273 Die Neue Freie Presse foi um jornal burguês austríaco que refletia as opiniões da burguesia comercial

e industrial, e dos círculos bancários; foi publicado em Viena de 1864 a 1939.


274 The Nation é revista social-política e literária americana de tendência liberal, refletindo a opinião

pequeno-burguesa. É publicada em Nova York desde 1865.


J. V. Stalin 493

em seus arredores, e é verdade para cidades menores e menos importantes. Novas cidades
surgiram da estepe, da selva e do deserto – não apenas algumas cidades, mas pelo menos
50 delas com populações de 50.000 a 250.000 habitantes – tudo em apenas quatro anos,
cada uma construída em torno de um empreendimento para o desenvolvimento de algum
recurso natural (...) Centenas de novas centrais elétricas distritais e um punhado de ‘gigantes’
como Dnieprostroi estão gradualmente concretizando a fórmula de Lenin: ‘Eletricidade mais
Sovietes é igual a Socialismo’. A União Soviética, agora, se dedica à fabricação em grande
escala de uma variedade infinita de artigos que a Rússia nunca antes produziu – tratores,
colheitadeiras, aços de alta qualidade, borracha sintética, rolamentos de esferas, motores
a diesel de alta potência, turbinas de 50.000 quilowatts, telefone, equipamentos de troca,
máquinas elétricas de mineração, aviões, automóveis, caminhões, bicicletas e várias centenas
de tipos de novas máquinas. Pela primeira vez, a Rússia está extraindo alumínio, magnésio,
apatita, iodo, potássio e muitos outros minerais valiosos. O ponto de referência na zona
rural soviética não é mais a cúpula de uma igreja, mas o elevador de grãos e o silo. Coletivos
estão construindo cercas para porquinhos, celeiros e casas. A eletricidade está penetrando
na aldeia, e o rádio e os jornais a conquistaram. Os trabalhadores estão aprendendo operar
as máquinas mais modernas do mundo; os meninos camponeses fazem e usam máquinas
agrícolas maiores e mais complicadas do que nunca. A Rússia está se tornando “voltada para
as máquinas”, a Rússia passa rapidamente da idade da madeira para a era do ferro, aço,
concreto e motores.

A opinião de uma revista reformista de “esquerda” britânica, Forward275 , ex-


pressa em setembro de 1932:
Ninguém pode deixar de notar a enorme quantidade de obras em andamento. Novas fábri-
cas, novos cinemas, novas escolas, novos clubes, novos grandes blocos de cortiços, por toda
parte novos edifícios, muitos concluídos, outros com andaimes. É difícil transmitir à mente
do leitor britânico exatamente o que foi feito e o que está sendo feito. É preciso ver para
crer. Nossos próprios esforços durante a guerra são pequenas picadas de pulga para o que
foi feito na Rússia. Os americanos admitem que mesmo nos dias de maior pressa no Oci-
dente, não poderia haver nada como a febril atividade de construção que está acontecendo
na Rússia hoje. Vemos tantas mudanças no cenário russo depois de dois anos que desistimos
de tentar imaginar o que a Rússia será como em mais 10 anos. Portanto, descarte de suas
cabeças as fantásticas histórias assustadoras da imprensa britânica que mentem tão persis-
tentemente, de forma tão desprezível sobre a Rússia, e todas as meias verdades e equívocos
que circulam pelos diletantes intelectuais, que olham para a Rússia de maneira paternalista
através dos óculos da classe média, sem ter a menor compreensão do que está acontecendo.
A Rússia está construindo uma nova sociedade no que são, de um modo geral, linhas funda-
mentalmente sólidas. Para isso é preciso correr riscos, é preciso trabalhar com entusiasmo,
com uma energia nunca antes vista no mundo. Existem enormes dificuldades inseparáveis
desta tentativa de construir o socialismo num vasto país subdesenvolvido e isolado do resto
do mundo. Mas, a impressão que tenho, depois de vê-lo novamente depois de dois anos, é
a de uma nação fazendo progresso sólido, planejando, criando, construindo de uma forma
que é um desafio marcante para o mundo capitalista hostil.

Tais são as vozes discordantes e a clivagem no campo dos círculos burgueses,


dos quais alguns defendem a aniquilação da URSS com seu plano quinquenal
alegadamente falido, enquanto outros, aparentemente, defendem a cooperação
comercial com a URSS, obviamente calculando que eles podem obter alguma
vantagem para si próprios com o sucesso do plano de cinco anos.
A questão da atitude da classe trabalhadora nos países capitalistas em relação
ao plano quinquenal, aos sucessos da construção socialista na URSS, é uma cate-
goria à parte. Pode ser suficiente citar aqui a opinião de apenas uma das nume-
rosas delegações de trabalhadores que vêm à URSS todos os anos, por exemplo,
275
Forward é um semanário sindicalista da marca reformista de esquerda; começou a ser publicado
em Glasgow (Escócia) em 1906.
494 Obras Escolhidas

a de uma delegação de trabalhadores belga. A opinião desta delegação é típica


de todas as delegações de trabalhadores sem exceção, sejam elas britânicas ou
francesas, alemãs ou americanas, ou delegações de outros países. Aqui está:

Estamos impressionados com a enorme quantidade de construção que testemunhamos du-


rante nossas viagens. Em Moscou, bem como em Makeyevka, Gorlovka, Kharkov e Lenin-
grado, pudemos ver por nós mesmos com que entusiasmo as obras são realizadas lá. Todas
as máquinas são dos modelos mais modernos. As fábricas são limpas, bem ventiladas e bem
iluminadas. Vimos como é prestada assistência médica e condições de higiene aos trabalha-
dores na URSS. As casas dos trabalhadores são construídas perto das fábricas. As escolas e
creches são organizadas nas cidades operárias, e as crianças são observadas com todo o cui-
dado. Pudemos ver a diferença entre as fábricas antigas e as recém-construídas, entre as casas
novas e antigas. Tudo o que vimos deu temos uma ideia clara da tremenda força dos traba-
lhadores que estão construindo uma nova sociedade sob a liderança do Partido Comunista.
Na URSS, observamos um grande renascimento cultural, enquanto em outros países temos a
decadência em todas as esferas, e o desemprego reina. Pudemos ver as terríveis dificuldades
que os trabalhadores da União Soviética encontram em seu caminho. Podemos, portanto,
apreciar ainda mais o orgulho com que apontam para as suas vitórias. Estamos convencidos
de que eles vão superar todos os obstáculos.

Aí você tem o significado internacional do plano de cinco anos. Bastou-nos


levar a cabo os trabalhos de construção por dois ou três anos, bastou-nos mostrar
os primeiros sucessos do plano quinquenal, para que o mundo inteiro se dividisse
em dois campos – o campo de aqueles que nunca se cansam de rosnar para nós, e
o campo daqueles que estão maravilhados com os sucessos do plano quinquenal,
além do fato de que temos em todo o mundo nosso próprio campo, que está se
tornando mais forte – o campo da classe operária dos países capitalistas, que se
alegra com os sucessos da classe operária na URSS e está disposta a apoiá-la, para
alarme da burguesia de todo o mundo.
O que isto significa?
Isso significa que não pode haver dúvida sobre a importância internacional
do plano de cinco anos, sobre a importância internacional de seus sucessos e
realizações.
Significa que os países capitalistas estão grávidos da revolução proletária e
que, precisamente porque estão grávidos da revolução proletária, a burguesia
gostaria de encontrar no fracasso do plano de cinco anos um novo argumento
contra a revolução; enquanto o proletariado, por outro lado, está se esforçando
para encontrar, e de fato encontra, nos sucessos do plano quinquenal, um novo
argumento a favor da revolução e contra a burguesia de todo o mundo.
Os sucessos do plano quinquenal estão mobilizando as forças revolucionárias
da classe trabalhadora de todos os países contra o capitalismo – tal é o fato indis-
cutível.
Não pode haver dúvida de que o significado revolucionário internacional do
plano de cinco anos é realmente incomensurável.
Devemos, portanto, dedicar ainda mais atenção à questão do plano de cinco
anos, do conteúdo do plano, das tarefas fundamentais do plano.
Com maior cuidado, portanto, devemos analisar os resultados do plano quin-
quenal, os resultados da execução e cumprimento do plano quinquenal.
J. V. Stalin 495

II. A tarefa fundamental do plano quinquenal e o


caminho para seu cumprimento

Passamos à questão da essência do plano quinquenal. Qual é o plano de cinco


anos? Qual foi a tarefa fundamental do plano de cinco anos?
A tarefa fundamental do plano quinquenal era transferir nosso país, com sua
tecnologia atrasada e em parte medieval, para as linhas de uma tecnologia nova
e moderna.
A tarefa fundamental do plano de cinco anos era converter a URSS de um
país agrário e fraco, dependente dos caprichos dos países capitalistas, em um país
industrial e poderoso, totalmente autossuficiente e independente dos caprichos
do capitalismo mundial.
A tarefa fundamental do plano de cinco anos era, ao converter a URSS em
um país industrial, derrubar completamente os elementos capitalistas, alargar a
frente das formas socialistas de economia e criar a base econômica para a abolição
das classes na URSS, para a construção de uma sociedade socialista.
A tarefa fundamental do plano quinquenal era criar em nosso país uma in-
dústria que fosse capaz de se reequipar e reorganizar, não só a indústria como
um todo, mas também os transportes e a agricultura – com base no socialismo.
A tarefa fundamental do plano quinquenal era transferir a pequena e dispersa
agricultura para as linhas da grande agricultura coletiva, de modo a garantir a
base econômica do socialismo no campo e, assim, eliminar a possibilidade de
restauração do capitalismo na URSS
Finalmente, a tarefa do plano quinquenal era criar todos os pré-requisitos téc-
nicos e econômicos necessários para aumentar ao máximo a capacidade de defesa
do país, permitindo-lhe organizar uma resistência determinada a qualquer ten-
tativa de intervenção militar do exterior, a qualquer tentativa no ataque militar
do exterior.
O que ditou esta tarefa fundamental do plano de cinco anos; quais foram os
motivos para isso?
A necessidade de acabar com o atraso técnico e econômico da União Soviética,
que a condenava a uma existência nada invejável; a necessidade de criar no país
os pré-requisitos que lhe permitissem não só ultrapassar, mas, a tempo, superar,
técnica e economicamente, os países capitalistas avançados.
Considerando o fato de que o regime soviético não poderia se manter por
muito tempo com base em uma indústria atrasada; que apenas uma indústria
moderna em grande escala, não apenas não inferior, mas capaz de ultrapassar
as indústrias dos países capitalistas, pode servir de base real e confiável para o
regime soviético.
Considerando o fato de que o regime soviético não poderia repousar por
muito tempo sobre dois fundamentos opostos: na grande indústria socialista,
que destrói os elementos capitalistas, e na pequena agricultura camponesa indi-
vidual, que engendra os elementos capitalistas.
Considerando o fato de que até que a agricultura fosse colocada na base da
produção em larga escala, até que as pequenas fazendas camponesas fossem uni-
496 Obras Escolhidas

das em grandes fazendas coletivas, o perigo da restauração do capitalismo na


URSS era o mais real de todos os perigos possíveis. Lenin disse: “O resultado
da revolução foi que o sistema político da Rússia alcançou, em poucos meses, o
dos países avançados”. Ele ainda completa: “Mas isso não é suficiente. A guerra
é inexorável; ela coloca a alternativa com severidade implacável: ou perecer, ou
ultrapassar e superar economicamente os países avançados também. Perecer ou
seguir em frente a todo vapor. Essa é a alternativa com a qual a história nos
confrontou” (ver Vol. XXI, p. 191 14).
Lenin disse:
Enquanto vivermos em um pequeno país camponês, há uma base econômica mais segura para
o capitalismo na Rússia do que para o comunismo. Isso deve ser levado em consideração.
Qualquer pessoa que tenha observado cuidadosamente a vida no campo, em comparação
com a vida no cidades, sabe que não arrancamos as raízes do capitalismo e não destruímos
os alicerces, a base do inimigo interno, que depende da produção em pequena escala, e só
há uma maneira de miná-la, a saber, colocando a economia do país, incluindo a agricultura,
sobre uma nova base técnica, a base técnica da moderna produção em grande escala. Somente
quando o país tiver sido eletrificado, somente quando nossa indústria, nossa agricultura,
nosso sistema de transporte forem colocados sobre a base técnica da indústria moderna de
grande escala, alcançaremos a vitória final. (ver Vol. XXVI, pp. 46-47 15)

Essas proposições formaram a base das considerações do Partido que levaram


à elaboração do plano quinquenal e à determinação de sua tarefa fundamental.
É assim que as coisas estão em relação à tarefa fundamental do plano de cinco
anos.
Mas a execução de um plano tão gigantesco não pode ser iniciada ao acaso, de
qualquer maneira. Para realizar tal plano, é necessário, antes de tudo, encontrar
seu elo principal; pois somente depois de encontrar e apreender esse elo principal
poderia uma atração ser exercida sobre todos os outros elos do plano.
Qual era o principal elo no plano de cinco anos?
O principal elo no plano quinquenal era a indústria pesada, com a constru-
ção de máquinas como seu núcleo. Pois somente a indústria pesada é capaz de
reconstruir a indústria como um todo, transporte e agricultura, e colocá-los em
pé. Era necessário iniciar o cumprimento do plano quinquenal com a indústria
pesada. Consequentemente, a restauração da indústria pesada teve que ser feita
a base do cumprimento do plano de cinco anos.
Também temos as diretrizes de Lenin sobre este assunto:
“A salvação da Rússia não reside apenas em uma boa colheita nas fazendas
camponesas – isso não é suficiente; e não apenas nas boas condições da indústria
leve, que fornece ao campesinato bens de consumo – isso também não é sufi-
ciente; nós também precisamos da indústria pesada. A menos que salvemos a
indústria pesada, a menos que a restauremos, não seremos capazes de construir
nenhuma indústria; e sem ela estaremos condenados totalmente como um país
independente. A indústria pesada precisa do Estado. Se não os fornecermos, es-
taremos condenados como um Estado civilizado – quanto mais como um Estado
socialista” (ver Vol. XXVII, p. 349).
Mas a restauração e o desenvolvimento da indústria pesada, especialmente em
um país tão atrasado e pobre como o nosso, era, no início do período do plano
de cinco anos, uma tarefa extremamente difícil; pois, como se sabe, a indústria
J. V. Stalin 497

pesada exige enormes despesas financeiras e a existência de um certo mínimo


de forças técnicas experientes, sem as quais, em geral, a restauração da indústria
pesada é impossível. O Partido sabia disso e levou isso em consideração? Sim, é
verdade. Não apenas o Partido sabia disso, mas também o anunciou para que to-
dos ouvissem. O Partido sabia como a indústria pesada havia sido construída na
Grã-Bretanha, Alemanha e América. Sabia que, nesses países, a indústria pesada
havia sido construída ou com a ajuda de grandes empréstimos, ou pelo saque
de outros países, ou pelos dois métodos simultaneamente. O Partido sabia que
esses caminhos estavam fechados para o nosso país. Com que, então, contava?
Contou com recursos próprios do nosso país. Contava com o fato de que, com
um governo soviético no leme, na terra, na indústria, nos transportes, nos ban-
cos e no comércio nacionalizado, poderíamos perseguir um regime da economia
mais estrita a fim de acumular recursos suficientes para a restauração e desenvol-
vimento da indústria pesada. O Partido declarou francamente que isso exigiria
sacrifícios sérios, e que era nosso dever, aberta e conscientemente, fazer esses
sacrifícios se quiséssemos alcançar nosso objetivo. O Partido contava em levar a
cabo essa tarefa com a ajuda dos recursos internos de nosso país – sem escravizar.
Aqui está o que Lenin disse sobre este assunto:
Devemos nos esforçar para construir um Estado em que os trabalhadores mantenham sua li-
derança sobre os camponeses, em que mantenham a confiança dos camponeses e, exercendo
a maior economia, removam todo traço de extravagância de nossas relações sociais (...) Deve-
mos levar nosso aparato estatal ao grau máximo de economia. Devemos remover dele todos
os vestígios de extravagância, de que tanto sobrou da Rússia tsarista, de seu aparato burocrá-
tico e capitalista. Não será este um reinado de estreiteza camponesa? Não. Se cuidarmos
para que a classe trabalhadora mantenha a liderança do campesinato, poderemos, exercendo
a maior economia possível na vida econômica de nosso Estado, usar todo copeque que eco-
nomizamos para desenvolver nossa grande escala indústria de máquinas, para desenvolver a
eletrificação, a extração hidráulica de turfa, para terminar a construção de Volkhovstroi, etc.
(...) Nisto, e apenas nisto, reside a nossa esperança. Só quando o fizermos é que, falando
figurativamente, seremos capazes de mudar os cavalos, mudar do cavalo do camponês, mu-
jique, pobre, para o cavalo da economia adaptado a uma terra camponesa, ao cavalo que o
proletariado está buscando e não pode deixar de buscar – o cavalo da indústria de máquinas
em grande escala, da eletrificação, de Volkhovstroi, etc. (ver Vol. XXVII, p. 417 17)

Mudar do cavalo mujique da pobreza para o cavalo da indústria de máquinas


em grande escala – tal era o objetivo do Partido ao traçar o plano quinquenal e
se esforçar por seu cumprimento.
Estabelecer um regime de economia do mais estrito e acumular os recursos
necessários ao financiamento da industrialização do nosso país – foi esse o cami-
nho que teve de ser percorrido para ter sucesso na criação da indústria pesada e
na execução do plano quinquenal.
Tarefa ousada? Um caminho difícil? Mas o nosso Partido é chamado de
partido leninista precisamente porque não tem o direito de temer as dificuldades.
Mais que isso. A confiança do Partido na viabilidade do plano quinquenal
e sua fé nas forças da classe trabalhadora eram tão fortes que o Partido achou
possível realizar o cumprimento desta difícil tarefa não em cinco anos, como
estava previsto no plano quinquenal, mas em quatro anos, ou, a rigor, em quatro
anos e três meses, se somar o trimestre especial.
Foi isso que deu origem ao famoso slogan, “O Plano Quinquenal em Quatro
Anos”.
498 Obras Escolhidas

E o que aconteceu?
Os fatos subsequentes mostraram que o Partido estava certo.
Os fatos demonstraram que sem esta ousadia e confiança nas forças da classe
operária, o Partido não poderia ter alcançado a vitória de que agora nos orgu-
lhamos com razão.

III. Os resultados do plano quinquenal em quatro


anos na esfera da indústria

Passemos agora aos resultados do cumprimento do plano quinquenal.


Quais são os resultados do plano quinquenal em quatro anos na esfera da
indústria? Alcançamos vitórias nesta esfera?
Sim, nós alcançamos. E não só isso, mas realizamos mais do que esperávamos,
mais do que as mentes ardentes do nosso Partido poderiam ter esperado. Isso não
é negado agora, nem mesmo por nossos inimigos, e certamente nossos amigos
não podem negar.
Não tínhamos uma indústria siderúrgica, base da industrialização do país.
Agora temos. Não tínhamos uma indústria de tratores. Agora temos. Não tí-
nhamos indústria automobilística. Agora temos. Não tínhamos uma indústria de
máquinas-ferramenta. Agora temos um. Não tínhamos uma grande e moderna
indústria química. Agora temos. Não tínhamos uma indústria real e grande
para a produção de máquinas agrícolas modernas. Agora temos. Não tínhamos
indústria aeronáutica. Agora temos.
Em produção de energia elétrica éramos os últimos da lista. Agora estamos
entre os primeiros.
Na produção de derivados de petróleo e carvão, ficamos em último lugar na
lista. Agora estamos entre os primeiros.
Tínhamos apenas uma base carbonífera e metalúrgica – na Ucrânia – e foi
com dificuldade que nos contentamos com isso. Não só conseguimos melhorar
esta base, mas também criamos uma nova base carbonífera e metalúrgica – no
Oriente – que é o orgulho do nosso país.
Tínhamos apenas um centro da indústria têxtil – no Norte do nosso país.
Como resultado de nossos esforços, teremos em um futuro muito próximo dois
novos centros da indústria têxtil – na Ásia Central e na Sibéria Ocidental.
E não apenas criamos estas novas grandes indústrias, mas também as criamos
numa escala e em dimensões que eclipsam a escala e as dimensões da indústria
europeia.
E como resultado de tudo isso, os elementos capitalistas foram, de forma com-
pleta e irrevogável, expulsos da indústria, e a indústria socialista se tornou a única
forma de indústria na URSS.
E como resultado de tudo isso, nosso país foi convertido de um país agrário
em um país industrial; para a proporção da produção industrial, em comparação
com a produção agrícola, aumentou de 48% do total no início do período do
plano de cinco anos (1928) para 70% no final do quarto ano do período do plano
J. V. Stalin 499

quinquenal (1932).
E como resultado de tudo isso, conseguimos, ao final do quarto ano do pe-
ríodo do plano de cinco anos, cumprir o programa total da produção industrial,
que foi elaborado para cinco anos, na medida de 93,7%, portanto, aumentando
o volume da produção industrial para mais de três vezes a produção anterior à
guerra e para mais do dobro do nível de 1928. Quanto ao programa de produção
para a indústria pesada, cumprimos o plano de cinco anos em 108%.
É verdade que faltam 6% para cumprir o programa total do plano de cinco
anos. Mas isso se deve ao fato de que, diante da recusa dos países vizinhos
em firmar pactos de não agressão conosco, e das complicações que surgiram no
Extremo Oriente276 , fomos obrigados, a fim de fortalecer nossa defesa, mudar
apressadamente uma série de fábricas para a produção de modernos meios de de-
fesa. E devido à necessidade de passar por um certo período de preparação, essa
mudança resultou na suspensão da produção dessas fábricas por quatro meses, o
que não poderia deixar de afetar o cumprimento do programa total de produção
para 1932, conforme fixado no plano quinquenal. Como resultado desta ope-
ração, preenchemos totalmente as lacunas no que diz respeito à capacidade de
defesa do país. Mas isso estava fadado a afetar adversamente o cumprimento do
programa de produção previsto no plano de cinco anos. Está fora de qualquer
dúvida que, se não fosse por esta circunstância incidental, quase certamente não
apenas teríamos cumprido, mas até mesmo excedido os números de produção
total do plano de cinco anos.
Finalmente, como resultado de tudo isso, a União Soviética foi convertida
de um país fraco, despreparado para a defesa, em um país poderoso na defesa,
um país preparado para todas as contingências, um país capaz de produzir, em
grande escala, todos os meios modernos de defesa e equipar seu exército com
eles em caso de um ataque do exterior.
Esses são, em linhas gerais, os resultados do plano quinquenal em quatro anos
no âmbito da indústria.
Agora, depois de tudo isso, julguem por si mesmos o que vale a pena falar na
imprensa burguesa sobre o “fracasso” do plano quinquenal na esfera da indús-
tria.
E qual é a posição em relação ao crescimento da produção industrial nos
países capitalistas, que agora passam por uma grave crise?
Aqui estão os números oficiais geralmente conhecidos.
Enquanto no final de 1932 o volume da produção industrial na URSS au-
mentou para 334% da produção antes da guerra, o volume da produção industrial
nos EUA caiu durante o mesmo período para 84% do nível anterior à guerra, na
Grã-Bretanha para 75%, na Alemanha para 62%.
Enquanto no final de 1932 o volume da produção industrial na URSS aumen-

276No final de 1931, o Japão imperialista, que se esforçava por estabelecer o seu domínio na China e
no Extremo Oriente, invadiu a Manchúria sem declaração de guerra. A ocupação deste território foi
acompanhada por uma concentração de tropas japonesas na fronteira da URSS e pela mobilização de
espiões, guardas-brancos e bandidos destinados à guerra contra a União Soviética. Os imperialistas
japoneses preparavam posições adequadas para atacar a URSS, visando a tomada do Extremo Oriente
Soviético e da Sibéria.
500 Obras Escolhidas

tou para 219% da produção de 1928, o volume da produção industrial nos EUA
caiu durante este mesmo período para 56%, na Grã-Bretanha para 80%, em Ale-
manha para 55%, na Polônia para 54%.
O que esses números mostram senão que o sistema capitalista de indústria
falhou em resistir ao teste em competição com o sistema soviético, que o sistema
soviético de indústria tem todas as vantagens sobre o sistema capitalista.
Dizem-nos: tudo está muito bem; muitas novas fábricas foram construídas
e as bases para a industrialização foram lançadas; mas teria sido muito melhor
renunciar à política de industrialização, à política de expansão da produção dos
meios de produção, ou pelo menos relegá-la a um segundo plano, para produzir
mais tecidos de algodão, calçados, roupas e outros bens para consumo de massa.
É verdade que a produção de bens para consumo de massa era menor do que
a necessária, e isso cria certas dificuldades. Mas, então, devemos perceber e levar
em conta onde nos teria levado tal política de relegar a tarefa da industrialização
para segundo plano. Claro, dos 1.500.000.000 de rublos em moeda estrangeira
que gastamos durante este período em equipamentos para nossas indústrias pe-
sadas, poderíamos ter reservado metade para a importação de algodão, peles, lã,
borracha, etc. Então agora teríamos mais tecidos, sapatos e roupas de algodão.
Mas não teríamos uma indústria de tratores ou uma indústria automobilística;
não teríamos nada como uma grande indústria siderúrgica; não teríamos me-
tal para a manufatura de máquinas – e permaneceríamos desarmados enquanto
rodeados por países capitalistas armados com técnicas modernas.
Teríamos nos privado da possibilidade de abastecer a agricultura com tratores
e máquinas agrícolas – consequentemente, ficaríamos sem pão.
Teríamos comprometido a possibilidade de alcançar a vitória sobre os ele-
mentos capitalistas em nosso país. Consequentemente, teríamos aumentado in-
comensuravelmente as chances de restauração do capitalismo.
Não teríamos todos os meios modernos de defesa sem os quais é impossível
um país ser politicamente independente, sem os quais um país se torna alvo de
ataques militares de inimigos estrangeiros. Nossa posição seria mais ou menos
análoga à posição atual da China, que não tem indústria pesada nem indústria
de guerra própria e que está sendo molestada por qualquer um que se importe
com isso.
Em suma, nesse caso teríamos intervenção militar; não pactos de não agres-
são, mas guerra, uma guerra perigosa e fatal, sangrenta e desigual; pois em tal
guerra estaríamos quase desarmados diante de um inimigo com todos os meios
modernos de ataque à sua disposição.
É assim que funciona, camaradas.
É óbvio que nenhum governo que se preze e nenhum partido que se preze
poderia adotar um ponto de vista tão fatal.
E é precisamente porque o Partido rejeitou esta linha antirrevolucionária –
foi precisamente por isso que alcançou uma vitória decisiva no cumprimento do
plano quinquenal no domínio da indústria.
Ao levar a cabo o plano de cinco anos e organizar a vitória na esfera do de-
senvolvimento industrial, o Partido perseguiu a política de acelerar o desenvol-
J. V. Stalin 501

vimento da indústria ao máximo. O Partido, por assim dizer, estimulou o país e


acelerou seu progresso.
O Partido estava certo em seguir a política de acelerar o desenvolvimento ao
máximo? Sim, estava absolutamente certo.
Era necessário impulsionar um país que estava cem anos atrasado e que en-
frentava um perigo mortal por causa de seu atraso. Só assim foi possível capacitar
o país a se reequipar rapidamente com base na técnica moderna e a emergir fi-
nalmente no caminho certo.
Além disso, não podíamos saber exatamente quando os imperialistas ataca-
riam a URSS e interromperiam nosso trabalho de construção; mas que eles po-
dem nos atacar a qualquer momento, tirando proveito da fragilidade técnica e
econômica de nosso país – disso não havia dúvida. Por isso o Partido se viu obri-
gado a impulsionar o país, para não perder tempo, para aproveitar ao máximo a
trégua e criar, na URSS, a base da industrialização que é um dos pilares de seu
poder. O Partido não podia esperar e manobrar; tinha que seguir a política de
acelerar o desenvolvimento ao máximo.
Por último, o Partido devia pôr fim, no mais curto espaço de tempo possí-
vel, à fragilidade do país na esfera da defesa. As condições vigentes na época,
o crescimento dos armamentos nos países capitalistas, o colapso da ideia do de-
sarmamento, o ódio da burguesia internacional pela URSS – tudo isso impeliu o
Partido a acelerar o trabalho de fortalecimento da capacidade de defesa do país,
a base da sua independência.
Mas teria o Partido uma possibilidade real de levar a cabo ao máximo a política
de aceleração do desenvolvimento? Sim, teria. Teve essa possibilidade, não só
porque conseguiu em tempo útil despertar o país para um rápido progresso,
mas sobretudo porque nas obras de novas construções extensas podia contar com
as fábricas novas e fábricas antigas, renovadas, que os operários, engenheiros e
pessoal técnico já dominava, o que, portanto, nos permitiu alcançar a máxima
aceleração de desenvolvimento.
Essa foi a base para o rápido avanço das novas construções, para o entusiasmo
demonstrado nas extensas obras de construção, para o surgimento de heróis e bri-
gadistas de choque nas obras, para os tempestuosos índices de desenvolvimento
em nosso país no período dos primeiros planos quinquenais.
Pode-se dizer que exatamente a mesma política de acelerar o desenvolvimento
ao máximo deve ser perseguida no período do Segundo Plano Quinquenal?
Não, não se pode.
Em primeiro lugar, como resultado do cumprimento bem-sucedido do plano
de cinco anos, já alcançamos, no essencial, seu objetivo principal – colocar a in-
dústria, o transporte e a agricultura em uma nova e moderna base técnica. Existe
realmente alguma necessidade, depois disso, de estimular o país e fazê-lo avan-
çar? Obviamente, isso não é mais necessário.
Em segundo lugar, como resultado do cumprimento bem-sucedido do plano
de cinco anos, já conseguimos elevar a capacidade de defesa do país ao nível
adequado. Existe realmente alguma necessidade, depois disso, de estimular o
país e fazê-lo avançar? Obviamente, isso não é mais necessário.
502 Obras Escolhidas

Finalmente, como resultado do cumprimento bem-sucedido do plano de cinco


anos, fomos capazes de construir dezenas e centenas de novas fábricas e obras,
equipadas com equipamentos técnicos novos e complexos. Isso significa que no
período do Segundo Plano Quinquenal, o grosso da produção industrial será
fornecido não pelas fábricas antigas, cujos equipamentos já foram dominados,
como era o caso durante o período do Primeiro Plano Quinquenal, mas pelas
novas fábricas, cujo equipamento ainda não foi dominado, mas será. Mas o do-
mínio dos novos empreendimentos e novos equipamentos apresenta dificuldades
muito maiores do que a utilização de fábricas e plantas antigas ou renovadas cujo
equipamento já foi dominado. Requer mais tempo, necessário para a qualifica-
ção dos operários, do pessoal de engenharia e técnica, e para a aquisição de novos
hábitos para o aproveitamento pleno dos novos equipamentos. Não fica claro de-
pois de tudo isso que, mesmo que o desejássemos, não poderíamos no período
do Segundo Plano Quinquenal, particularmente durante os primeiros dois ou
três anos, seguir uma política de aceleração do desenvolvimento ao máximo?
Por isso, acho que no segundo período do plano quinquenal teremos que
adotar taxas de crescimento menos rápidas da produção industrial. No período
do Primeiro Plano Quinquenal, o aumento médio anual da produção industrial
foi de 22%. Acho que, no Segundo Plano Quinquenal, teremos de adotar, no
mínimo, um aumento médio anual de 13% a 14% na produção industrial. Para
os países capitalistas, essa taxa de aumento da produção industrial é um ideal
inatingível. E não apenas essa taxa de aumento na produção industrial – mesmo
um aumento médio anual de 5% na produção industrial é, agora, um ideal ina-
tingível para eles. Mas, então, eles são países capitalistas. O país soviético, com o
sistema soviético de economia, é totalmente diferente. Sob nosso sistema econô-
mico, somos plenamente capazes de obter, e devemos obter, um aumento anual
de 13-14% da produção, no mínimo.
No período do Primeiro Plano Quinquenal, conseguimos organizar o entu-
siasmo e o zelo pelas novas construções e alcançamos sucessos decisivos. Isso é
muito bom. Mas agora isso não é suficiente. Agora devemos complementá-lo
com entusiasmo e zelo pelo domínio das novas fábricas e do novo equipamento
técnico, com um aumento substancial da produtividade do trabalho, com uma
redução substancial dos custos de produção.
Isso é o principal no momento.
Pois somente com base nisso seremos capazes, digamos, na última metade do
período do Segundo Plano Quinquenal, de dar um novo impulso poderoso tanto
no trabalho de construção quanto no aumento da produção industrial.
Finalmente, algumas palavras sobre as taxas de desenvolvimento e as porcen-
tagens de aumento anual da produção. Nossos executivos da indústria prestam
pouca atenção a essa questão. E, no entanto, é muito interessante. Qual é a
natureza dos aumentos percentuais da produção, o que está oculto por trás de
cada por cento de aumento? Tomemos, por exemplo, o ano de 1925, o período
da restauração. O aumento anual da produção foi então de 66%. A produção
industrial bruta atingiu 7.700.000.000 de rublos. O aumento de 66% na época
representava, em números absolutos, um pouco mais de 3.000.000.000 de rublos.
Portanto, cada por cento de aumento era igual a 45 milhões de rublos. Agora,
J. V. Stalin 503

consideremos o ano de 1928. Naquele ano, o aumento foi de 26%, ou seja, cerca
de um terço daquele em 1925 no que diz respeito às percentagens. A produção
industrial bruta em 1928 foi de 15.500.000.000 de rublos. O aumento total no
ano foi, em números absolutos, de 3.280.000.000 de rublos. Portanto, cada por
cento de aumento era igual a 126 milhões de rublos, ou seja, era quase três vezes
mais do que em 1925, quando tivemos um aumento de 66%. Finalmente, consi-
deremos 1931. Naquele ano, o aumento foi de 22%, ou seja, um terço daquele
de 1925. A produção industrial bruta em 1931 foi de 30.800.000.000 de rublos.
O aumento total, em números absolutos, foi de pouco mais de 5.600.000.000
milhões de rublos. Portanto, cada por cento de aumento representou mais de
250 milhões de rublos, ou seja, seis vezes mais do que em 1925, quando tivemos
um aumento de 66%, e duas vezes mais do que em 1928, quando tivemos um
aumento de pouco mais de 26%.
O que tudo isso mostra? Mostra que, ao estudar a taxa de aumento da produ-
ção, não devemos limitar nosso exame à porcentagem total de aumento – devemos
também levar em conta o que está por trás de cada por cento de aumento e qual é
o montante total do aumento anual da produção. Para 1933, por exemplo, esta-
mos prevendo um aumento de 16%, ou seja, um quarto do de 1925. Mas isso não
significa que o aumento real da produção em 1933 também será um quarto do
de 1925. Em 1925 o aumento da produção em números absolutos foi de pouco
mais de 3.000.000.000 de rublos e cada por cento foi igual a 45.000.000 de ru-
blos. Não há razão para duvidar que um aumento de 16% da produção em 1933
equivalerá, em números absolutos, a não menos de 5.000.000.000 de rublos, ou
seja, quase o dobro de 1925, e cada por cento de aumento será igual a pelo me-
nos 320.000.000-340.000.000 rublos, ou seja, representará pelo menos sete vezes
mais do que cada por cento de aumento representado em 1925.
É assim que funciona, camaradas, se examinarmos a questão das taxas e per-
centagens de aumento em termos concretos.
É assim que fica a questão em relação aos resultados do plano quinquenal em
quatro anos no âmbito da indústria.

IV. Os resultados do plano quinquenal em quatro


anos na esfera da agricultura

Passemos à questão dos resultados do plano quinquenal em quatro anos na


esfera da agricultura.
O plano de cinco anos na esfera da agricultura era um plano de coletivização
de cinco anos. De que procedeu o Partido na realização da coletivização?
O Partido partiu do fato de que, para consolidar a ditadura do proletariado
e construir uma sociedade socialista, era necessário, além da industrialização,
passar da pequena agricultura camponesa individual para a grande agricultura
coletiva equipada com tratores e agricultura máquinas modernas, como a única
base firme para o regime soviético no campo.
O Partido partiu do fato de que sem a coletivização seria impossível conduzir
nosso país ao caminho da construção das bases econômicas do socialismo, im-
504 Obras Escolhidas

possível libertar da pobreza e da ignorância as grandes massas do campesinato


operário.
Lenin disse: “A agricultura em pequena escala não oferece escapatória da
pobreza” (ver Vol. XXIV, p. 540). Lenin disse: “Se continuarmos como anti-
gamente em nossas pequenas fazendas, mesmo como cidadãos livres em terras
livres, ainda seremos confrontados com a ruína inevitável” (ver Vol. XX, p. 417).
Lenin disse: “Somente com a ajuda do trabalho comum, artel e cooperativo po-
demos escapar do impasse em que a guerra imperialista nos lançou” (ver Vol.
XXIV, p. 537). Lenin disse: “Devemos passar ao cultivo comum em grandes
fazendas-modelo. Do contrário, não haverá como escapar do deslocamento, da
situação verdadeiramente desesperadora em que a Rússia se encontra” (ver Vol.
XX, p. 418).
Partindo disso, Lenin chegou à seguinte conclusão fundamental:
Só se conseguirmos, na prática, mostrar aos camponeses as vantagens do cultivo comum, co-
letivo, cooperativo e artel do solo, só se conseguirmos ajudar o camponês por meio da agricultura
cooperativa, artel, a classe trabalhadora, que detém o poder do Estado em suas mãos, realmente prova-
remos ao camponês o acerto de nossa política e realmente asseguraremos o seguimento real e duradouro
das vastas massas do campesinato. (ver Vol. XXIV, p. 579).

Foi a partir dessas proposições de Lenin que o Partido prosseguiu na execução


do programa da agricultura coletivizadora, o programa do plano quinquenal no
domínio da agricultura.
A este respeito, a tarefa do plano quinquenal na esfera da agricultura consistia
em unir as dispersas e pequenas fazendas camponesas individuais, que careciam
da possibilidade de utilizar tratores e maquinaria agrícola moderna, em grandes
fazendas coletivas equipadas com todos os implementos modernos de agricultura
altamente desenvolvidos, e para cobrir terras não ocupadas com o modelo de
fazendas estatais.
A tarefa do plano de cinco anos na esfera da agricultura era converter a URSS
de um atrasado e pequeno país camponês, em um país de agricultura em grande
escala organizada com base no trabalho coletivo, fornecendo o máximo de pro-
dução para o mercado.
O que conseguiu o Partido na execução do programa do plano quinquenal
em quatro anos na esfera da agricultura? Cumpriu este programa ou falhou?
O Partido conseguiu, ao longo de cerca de três anos, organizar mais de 200.000
fazendas coletivas e cerca de 5.000 fazendas estatais dedicadas à cultura de grãos
e pecuária, e ao mesmo tempo conseguiu, durante quatro anos, expandir a área
de cultivo em 21 milhões de hectares.
O Partido conseguiu que mais de 60% das fazendas camponesas se unissem
em fazendas coletivas, abrangendo mais de 70% de todas as terras cultivadas pelos
camponeses; isso significa que cumprimos três vezes o plano de cinco anos.
O Partido conseguiu tornar possível sua aquisição de 1.200.000.000 a 1.400.
000.000 de puds de grãos comercializáveis anualmente, em vez dos 500.000.000-
600.000.000 de puds que foram adquiridos no período em que predominava a
agricultura camponesa individual.
O Partido conseguiu derrotar os kulaks como uma classe, embora eles ainda
não tenham recebido o golpe final; os camponeses trabalhadores foram eman-
J. V. Stalin 505

cipados da escravidão e da exploração kulak, e o regime soviético recebeu uma


sólida base econômica no campo, a base da agricultura coletiva.
O Partido conseguiu converter a URSS de um país de pequena agricultura
camponesa em um país com a maior agricultura em escala do mundo.
Em geral, são esses os resultados do plano quinquenal em quatro anos no
domínio da agricultura.
Agora, depois de tudo isso, julguem por si mesmos o que vale a pena falar
na imprensa burguesa sobre o “colapso” da coletivização, sobre o “fracasso” do
plano quinquenal no domínio da agricultura.
E qual é a posição da agricultura nos países capitalistas, que agora passam por
uma grave crise agrícola?
Aqui estão os dados oficiais geralmente conhecidos.
Nos principais países produtores de grãos, a área de cultivo foi reduzida em
8-10%. A área sob o algodão nos Estados Unidos foi reduzida em 15%; a área
cultivada com beterraba açucareira na Alemanha e na Tchecoslováquia foi redu-
zida em 22-30%; a área cultivada com linho na Lituânia e na Letônia foi reduzida
em 25-30%.
De acordo com os números do Departamento de Agricultura dos Estados Uni-
dos, o valor da produção bruta da agricultura nos EUA caiu de 11.000.000.000
de dólares em 1929 para 5.000.000.000 de dólares em 1932. O valor da produ-
ção bruta de grãos naquele país caiu de 1.288.000.000 de dólares em 1929 para
391.000.000 de dólares em 1932. O valor da safra de algodão naquele país caiu
de 1.389.000.000 de dólares em 1929 para 397.000.000 em 1932.
Todos esses fatos não atestam a superioridade do sistema soviético de agricul-
tura sobre o sistema capitalista? Esses fatos não mostram que as fazendas coleti-
vas são uma forma mais eficiente de agricultura do que as fazendas individuais
e capitalistas?
Diz-se que as fazendas coletivas e as fazendas estatais nem sempre dão lu-
cro, que consomem uma enorme quantidade de recursos, que não há sentido
em manter tais empreendimentos, que seria mais conveniente dissolvê-los, res-
tando apenas aqueles que geram lucro. Mas apenas pessoas que não entendem
nada de economia nacional, de economia em si, podem dizer essas coisas. Há
alguns anos, mais da metade de nossas fábricas têxteis não dava lucro. Alguns de
nossos camaradas sugeriram na época que deveríamos fechar essas fábricas. O
que teria acontecido se tivéssemos seguido seus conselhos? Teríamos cometido
um enorme crime contra o país, contra a classe trabalhadora; pois, ao fazer isso,
teríamos arruinado nossa indústria em ascensão. O que fizemos naquela hora?
Perseveramos por pouco mais de um ano e, finalmente, conseguimos fazer com
que toda a nossa indústria têxtil desse lucro. E a nossa fábrica de automóveis em
Gorky? Também não dão lucro. Você poderia, talvez, nos pedir para encerrá-la?
Ou nossa siderurgia, que também não dá lucro? Devemos encerrar isso também,
camaradas? Se olharmos sob esse viés voltado para lucratividade, então devemos
desenvolver ao máximo apenas algumas indústrias, aquelas que são as mais lucra-
tivas, como, por exemplo, confeitaria, moagem de farinha, perfumaria, artigos
de malha, fabricação de brinquedos, etc. Claro, não me oponho ao desenvolvi-
mento dessas indústrias. Ao contrário, devem ser desenvolvidas, pois também são
506 Obras Escolhidas

necessários para a população. Mas, em primeiro lugar, eles não podem ser de-
senvolvidos sem equipamentos e combustível, que são fornecidos pela indústria
pesada. Em segundo lugar, é impossível fazer deles a base da industrialização.
Esse é o ponto, camaradas.
Não podemos olhar para a lucratividade do ponto de vista do vendedor am-
bulante, do ponto de vista do presente imediato. Devemos abordá-la do ponto
de vista da economia nacional como um todo, ao longo de vários anos. Somente
tal ponto de vista pode ser chamado de verdadeiramente leninista, verdadeira-
mente marxista. E esse ponto de vista é imperativo não só no que diz respeito à
indústria, mas também, e em maior medida, no que diz respeito às fazendas cole-
tivas e às fazendas estatais. Basta pensar: em questão de três anos, criamos mais
de 200.000 fazendas coletivas e cerca de 5.000 fazendas estatais, ou seja, criamos
grandes empreendimentos totalmente novos que têm a mesma importância para
a agricultura que grandes usinas e fábricas para a indústria. Cite outro país que
conseguiu criar, no decorrer de três anos, não 205.000 novos grandes empreen-
dimentos, mas até 25.000. Você não será capaz de fazer isso; pois esse país não
existe e nunca existiu. Mas criamos 205.000 novos empreendimentos na agricul-
tura. Parece, no entanto, que há pessoas que exigem que tais empreendimentos
se tornem imediatamente lucrativos e, se não o fizerem imediatamente, devem
ser destruídos e dissolvidos. Não está claro que essas pessoas muito estranhas
têm inVer dos louros de Herostratus277 ?
Ao dizer que as fazendas coletivas e as fazendas estatais não geram lucro, de
forma alguma quero sugerir que nenhuma delas dê lucro. Nada desse gênero!
Todos sabem que ainda hoje temos várias fazendas coletivas e fazendas estatais
altamente lucrativas. Temos milhares de fazendas coletivas e dezenas de fazen-
das estatais que são totalmente lucrativas mesmo agora. Essas fazendas coletivas e
fazendas estatais são o orgulho do nosso Partido, o orgulho do regime soviético.
Claro, nem todas as fazendas coletivas e fazendas estatais são iguais. Algumas
fazendas coletivas e fazendas estatais são antigas, algumas são novas e algumas
são muito, mas muito novas. Estes últimos são organismos econômicos ainda fra-
cos, que ainda não se formaram totalmente. Eles estão passando por aproxima-
damente o mesmo período de desenvolvimento organizacional pelo qual nossas
fábricas e fábricas passaram em 1920-21. Naturalmente, a maioria deles ainda
não pode gerar lucro. Mas não pode haver a menor dúvida de que começarão a
dar lucro nos próximos dois ou três anos, assim como nossas fábricas e moinhos
começaram a fazê-lo depois de 1921. Recusar-lhes assistência e apoio com base
no fato de que, no momento presente, nem todos eles dão lucro, seria cometer
um grave crime contra a classe trabalhadora e o campesinato. Somente os inimi-
gos do povo e os contrarrevolucionários podem levantar a questão das fazendas
coletivas e as fazendas estatais serem desnecessárias.
No cumprimento do plano quinquenal para a agricultura, o Partido realizou

277 Herostratus foi um incendiário grego do século 4 a. C, que buscou notoriedade ao destruir o
segundo templo de Artemis em Éfeso (nos arredores da atual Selçuk). Seus atos levaram à criação
de uma lei damnatio memoriae proibindo qualquer pessoa de mencionar seu nome, oralmente ou
por escrito. A lei acabou sendo ineficaz, como evidenciado por menções de sua existência em obras
e linguagem moderna. Assim, Herostratus se tornou um epônimo para alguém que comete um ato
criminoso para se tornar famoso (N.T.)
J. V. Stalin 507

a coletivização em ritmo acelerado. O Partido estava certo em seguir a política


de um ritmo acelerado de coletivização? Sim, estava absolutamente correto, em-
bora certos excessos tenham sido cometidos no processo. Ao seguir a política
de eliminar os kulaks como classe e destruir os ninhos dos kulaks, o Partido não
poderia parar no meio do caminho. Ele teve que concluir sua tarefa.
Esse é o primeiro ponto.
Em segundo lugar, tendo à sua disposição tratores e máquinas agrícolas, por
um lado, e aproveitando a ausência da propriedade privada da terra (a naciona-
lização da terra!), por outro, o Partido teve todas as oportunidades de acelerar a
coletivização dos agricultura. E, de fato, alcançou sucessos tremendos nesta es-
fera; pois cumpriu três vezes o programa do plano quinquenal de coletivização.
Isso significa que devemos seguir a política de um ritmo acelerado de coleti-
vização também no período do Segundo Plano Quinquenal? Não, não significa
isso. A questão é que, no essencial, já concluímos a coletivização das principais
regiões da URSS. Portanto, fizemos mais nesta esfera do que se poderia esperar.
E não completamos apenas, no geral, a coletivização. Conseguimos fazer com
que a esmagadora maioria do campesinato considerasse a agricultura coletiva a
forma mais aceitável de agricultura. Esta é uma tremenda vitória, camaradas.
Vale a pena, depois disso, ter pressa em acelerar o ritmo da coletivização? Clara-
mente, não vale.
Agora não é mais uma questão de acelerar o ritmo da coletivização. Muito
menos é uma questão de saber se as fazendas coletivas deveriam existir ou não
– essa questão já foi respondida afirmativamente. As fazendas coletivas vieram
para ficar, e o caminho de volta à velha agricultura individual está fechado para
sempre. A tarefa agora é fortalecer as fazendas coletivas em termos de organiza-
ção, expulsar deles elementos sabotadores, recrutar quadros bolcheviques reais e
comprovados para as fazendas coletivas e torná-las realmente fazendas coletivas
bolcheviques.
Isso agora é o principal.
Assim está a questão do plano quinquenal em quatro anos na esfera da agri-
cultura.

V. Os resultados do plano de cinco anos em quatro


anos no que diz respeito à melhoria das condições
materiais dos trabalhadores e camponeses

Falei de nossos sucessos na indústria e da agricultura, do progresso da indús-


tria e da agricultura na URSS. Quais são os resultados desses sucessos do ponto
de vista da melhoria das condições materiais dos trabalhadores e camponeses?
Quais são os principais resultados de nossos sucessos na esfera da indústria e da
agricultura, no que diz respeito à melhoria radical das condições materiais dos
trabalhadores?
Em primeiro lugar, a abolição do desemprego e a eliminação das incertezas
quanto ao futuro entre os trabalhadores.
Em segundo lugar, o fato de que quase todos os camponeses pobres foram
508 Obras Escolhidas

atraídos para o desenvolvimento da fazenda coletiva; que, com base nisso, a di-
ferenciação do campesinato em kulaks e camponeses pobres foi interrompida; e
que, como resultado, o empobrecimento e o pauperismo no campo foram eliminados.
São conquistas tremendas, camaradas, conquistas com que nenhum Estado
burguês, mesmo o mais “democrático” pode sonhar.
Em nosso país, na URSS, os trabalhadores estiveram muito tempo desempre-
gados. Há cerca de três anos, tínhamos cerca de 1.500.000 desempregados. Já se
passaram dois anos desde que o desemprego foi completamente abolido. E nestes
dois anos, os trabalhadores já se esqueceram do desemprego, de seu fardo e de
seus horrores. Ver os países capitalistas: que horrores resultam do desemprego!
Existem, agora, nada menos que 30 milhões a 40 milhões de desempregados nes-
ses países. Quem são essas pessoas? Normalmente, diz-se deles que estão “por
baixo e por fora”.
Todos os dias conseguem mínimos trabalhos, procuram trabalho, estão pre-
parados para aceitar quase todas as condições de trabalho, mas não lhes dão
trabalho, porque são “supérfluos”. E isso está ocorrendo em uma época em que
grandes quantidades de bens e produtos estão sendo desperdiçadas para satis-
fazer os caprichos dos favoritos da fortuna, os descendentes dos capitalistas e
proprietários de terras.
Aos desempregados é recusada comida porque não têm dinheiro para pagá-la;
eles não têm abrigo porque não têm dinheiro para pagar o aluguel. Como e onde
eles moram? Eles vivem com as migalhas miseráveis da mesa do homem rico;
varrendo latas de lixo, onde encontram restos de comida em decomposição; eles
vivem nas favelas das grandes cidades e, mais frequentemente, em casebres fora
das cidades, erguidos às pressas pelos desempregados em caixas de embalagem
e cascas de árvores. Mas isto não é tudo. Não são apenas os desempregados que
sofrem com o desemprego. Os trabalhadores empregados também sofrem com
isso. Sofrem porque a presença de um grande número de desempregados torna
insegura a sua posição na indústria, torna-os incertos sobre o seu futuro. Hoje
eles estão empregados, mas não têm certeza de que, quando acordarem amanhã,
não se encontrarão desligados de suas funções.
Uma das principais conquistas do plano de cinco anos em quatro anos é que
abolimos o desemprego e salvamos os trabalhadores da URSS de seus horrores.
O mesmo deve ser dito dos camponeses. Eles também se esqueceram da di-
ferenciação dos camponeses em kulaks e camponeses pobres, da exploração dos
camponeses pobres pelos kulaks, da ruína que todos os anos fazia centenas de
milhares e milhões de camponeses pobres ficarem destituídos. Há três ou qua-
tro anos, os camponeses pobres constituíam não menos de 30% da população
camponesa total em nosso país. Eles eram cerca de 20 milhões. E ainda antes,
no período anterior à Revolução de Outubro, os camponeses pobres constituíam
não menos de 60% da população camponesa. Quem eram os pobres camponeses?
Eram pessoas que geralmente careciam de sementes, ou cavalos, ou implementos,
ou tudo isso, para continuar sua agricultura. Os camponeses pobres eram pessoas
que viviam em um estado de semi-inanição e, via de regra, estavam escravizados
pelos kulaks – e nos velhos tempos, tanto pelos kulaks quanto pelos proprietários.
Não faz muito tempo, mais de 2.000.000 de camponeses pobres costumavam ir
J. V. Stalin 509

para o sul – para o Norte do Cáucaso e a Ucrânia – todos os anos para se aluga-
rem aos kulaks – e ainda antes, aos kulaks e proprietários de terras. Um número
ainda maior costumava vir todos os anos aos portões das fábricas e engrossar as
fileiras dos desempregados. E não foram apenas os camponeses pobres que se
encontraram nesta posição nada invejável. Boa metade dos camponeses médios
vivia no mesmo estado de pobreza e miséria.
O quê o plano de cinco anos em quatro anos deu aos camponeses pobres e
aos estratos mais baixos dos camponeses médios? Ele minou e esmagou os ku-
laks como classe, libertando os camponeses pobres e boa metade dos camponeses
médios da escravidão. Ele os trouxe para as fazendas coletivas e os colocou em
uma posição segura. Eliminou, assim, a possibilidade de diferenciação do cam-
pesinato em exploradores – kulaks – e explorados – camponeses pobres, e aboliu
a miséria no campo. Elevou os camponeses pobres e as camadas inferiores dos
camponeses médios a uma posição de segurança nas fazendas coletivas, e aí pôs
um fim ao processo de ruína e empobrecimento do campesinato. Agora não
acontece mais em nosso país que milhões de camponeses deixam suas casas to-
dos os anos em busca de trabalho em áreas distantes. Para atrair um camponês
para trabalhar fora de sua própria fazenda coletiva, agora é necessário assinar um
contrato com a fazenda coletiva e, além disso, pagar ao agricultor coletivo a pas-
sagem de trem. Agora não acontece mais em nosso país que centenas de milhares
e milhões de camponeses estão arruinados e rondando os portões de fábricas e
moinhos. Isso é o que costumava acontecer; mas isso foi há muito tempo. Agora
o camponês está em posição de segurança, membro de uma fazenda coletiva que
tem à sua disposição tratores, máquinas agrícolas, fundos de sementes, fundos
de reserva, etc., etc.
Isso é o que o plano quinquenal deu aos camponeses pobres e às camadas
inferiores dos camponeses médios.
Essa é a essência das principais conquistas do plano quinquenal em relação à
melhoria das condições materiais dos trabalhadores e camponeses.
Como resultado dessas principais conquistas na melhoria das condições mate-
riais dos trabalhadores e camponeses, realizamos durante o período do Primeiro
Plano Quinquenal:
a) uma duplicação do número de trabalhadores e outros empregados na
indústria de grande escala em comparação com 1928, o que representa um
cumprimento excessivo do plano de cinco anos em 57%;
b) um aumento na renda nacional – portanto, um aumento na renda dos
trabalhadores e camponeses – para 45.100.000.000 de rublos em 1932, o que
representa um aumento de 85% em relação a 1928;
c) um aumento nos salários médios anuais dos trabalhadores e outros em-
pregados na indústria de grande escala em 67% em comparação com 1928, o
que representa um cumprimento excessivo do plano de cinco anos em 18%;
d) um aumento no fundo de seguro social em 292% em comparação com
1928 (4.120.000.000 de rublos em 1932, contra 1.050.000.000 de rublos em
1928), o que representa um cumprimento excessivo do plano de cinco anos
em 111%;
e) um aumento da restauração pública, agora cobrindo mais de 70% dos
510 Obras Escolhidas

trabalhadores empregados nas indústrias decisivas, o que representa uma su-


peração do plano quinquenal em 500%.
É claro que ainda não alcançamos o ponto em que possamos satisfazer plena-
mente as necessidades materiais dos operários e camponeses, e é pouco provável
que o alcancemos nos próximos anos. Mas, sem dúvida, alcançamos uma posição
em que as condições materiais dos trabalhadores e camponeses melhoram ano a
ano. Os únicos que podem ter dúvidas a este respeito são os inimigos jurados
do regime soviético, ou, talvez, certos representantes da imprensa burguesa, in-
cluindo alguns dos correspondentes de Moscou dessa imprensa, que quase não
sabem mais sobre a economia de nações e a condição dos trabalhadores do que,
digamos, o imperador da Abissínia sabe sobre matemática superior.
E qual é a posição em relação às condições materiais dos trabalhadores e cam-
poneses nos países capitalistas?
Aqui estão os números oficiais.
O número de desempregados nos países capitalistas aumentou catastrofica-
mente. Nos Estados Unidos, de acordo com dados oficiais, o número de traba-
lhadores empregados nas indústrias de manufatura caiu de 8.500.000 em 1928
para 5.500.000 em 1932; e de acordo com os números da American Federation of
Labor, o número de desempregados nos Estados Unidos, em todas as indústrias,
no final de 1932, era de 11 milhões. Na Grã-Bretanha, segundo dados oficiais, o
número de desempregados aumentou de 1.290.000 em 1928 para 2.800.000 em
1932. Na Alemanha, de acordo com números oficiais, o número de desempre-
gados aumentou de 1.376.000 em 1928 para 5.500.000 em 1932. Este é o quadro
que é observado em todos os países capitalistas. Além disso, as estatísticas ofici-
ais geralmente minimizam o número de desempregados, cujo número total nos
países capitalistas varia de 35 milhões a 40 milhões.
Os salários dos trabalhadores estão sendo sistematicamente reduzidos. De
acordo com números oficiais, os salários médios mensais nos Estados Unidos fo-
ram reduzidos em 35% em comparação com 1928. Na Grã-Bretanha, os salários
foram reduzidos em 15% no mesmo período e na Alemanha em até 50%. De
acordo com as estimativas da American Federation of Labor, os trabalhadores ame-
ricanos perderam mais de 35.000.000.000 de dólares como resultado dos cortes
salariais em 1930-31.
Os fundos de seguro dos trabalhadores na Grã-Bretanha e na Alemanha,
por menores que fossem, diminuíram consideravelmente. Nos Estados Unidos
e na França, o seguro-desemprego não existe, ou quase não existe, e, como con-
sequência, o número de trabalhadores sem-teto e abandonados está crescendo
enormemente, especialmente nos Estados Unidos.
A situação não é melhor no que diz respeito à condição das massas campo-
nesas nos países capitalistas, onde a crise agrícola está minando completamente
a agricultura camponesa e está obrigando milhões de camponeses e camponeses
arruinados a mendigar.
Tais são os resultados do plano de cinco anos em quatro anos no que diz
respeito à melhoria das condições materiais da classe trabalhadora da URSS.
J. V. Stalin 511

VI. Os resultados do plano de cinco anos em


quatro anos, no que diz respeito ao volume de
negócios entre a cidade e o campo

Passemos agora à questão dos resultados do plano quinquenal em quatro anos


no que se refere ao crescimento do volume de negócios entre a cidade e o campo.
O tremendo crescimento da produção da indústria e da agricultura, o cres-
cimento do excedente comercializável tanto na indústria quanto na agricultura
e, finalmente, o crescimento das necessidades dos trabalhadores e camponeses –
tudo isso não poderia deixar de conduzir, e de fato conduziu, para um renasci-
mento e expansão do volume de negócios entre a cidade e o campo.
O vínculo baseado na produção é a forma fundamental de vínculo entre ci-
dade e campo. Mas o vínculo baseado na produção não basta por si só. Deve
ser complementado pelo vínculo baseado no comércio, para que os laços entre a
cidade e o campo sejam duráveis e invioláveis. Isso só pode ser alcançado desen-
volvendo o comércio soviético. Seria errado pensar que o comércio soviético só
pode ser desenvolvido ao longo de um canal, por exemplo, as sociedades coope-
rativas. Para desenvolver o comércio soviético, todos os canais devem ser usados:
a rede de cooperativas, a rede de comércio estatal e o comércio de fazendas co-
letivas.
Alguns camaradas pensam que o desenvolvimento do comércio soviético, e
particularmente o desenvolvimento do comércio de fazendas coletivas, é uma
reversão ao primeiro estágio da NEP. Isso está absolutamente errado.
Há uma diferença fundamental entre o comércio soviético, incluindo o co-
mércio de fazendas coletivas, e o comércio realizado no primeiro estágio da NEP.
No primeiro estágio da NEP, permitimos um renascimento do capitalismo,
permitimos o comércio privado, permitimos as “atividades” de comerciantes pri-
vados, capitalistas, especuladores.
Isso era mais ou menos livre comércio, restringido apenas pelo papel regu-
lador do Estado. Naquela época, o setor capitalista privado ocupava um lugar
bastante amplo no volume de negócios do país. Afora isso, não tínhamos então a
indústria desenvolvida que temos agora, nem fazendas coletivas e fazendas esta-
tais funcionando de acordo com o planejado e colocando à disposição do Estado
enormes reservas de produtos agrícolas e manufaturas urbanas.
Pode-se dizer que esta é a posição agora? Claro que não.
Em primeiro lugar, o comércio soviético não pode ser equiparado ao comér-
cio do primeiro estágio da NEP, embora este último fosse regulado pelo Estado.
Enquanto o comércio no primeiro estágio da NEP permitiu um renascimento do
capitalismo e o funcionamento do setor capitalista privado no volume de negó-
cios, o comércio soviético procede da negação, da ausência, de um e de outro. O
que é o comércio soviético? O comércio soviético é um comércio sem capitalistas,
grandes ou pequenos; é um comércio sem especuladores, grandes ou pequenos.
É um tipo especial de comércio, que nunca existiu antes na história, e que é
praticado apenas por nós, os bolcheviques, nas condições do desenvolvimento
soviético.
512 Obras Escolhidas

Em segundo lugar, agora temos uma indústria estatal bastante desenvolvida e


todo um sistema de fazendas coletivas e fazendas estatais, que fornecem ao Estado
enormes reservas de produtos agrícolas e manufaturados para o desenvolvimento
do comércio soviético. Isso não existia, e não poderia ter existido, nas condições
da primeira fase da NEP.
Em terceiro lugar, conseguimos, no período recente, expulsar completamente
da esfera do comércio os comerciantes, mercadores e intermediários privados
de todos os tipos. É claro que isso não significa que os comerciantes privados e
aproveitadores não possam, de acordo com a lei do atavismo, reaparecer na esfera
do comércio e aproveitar o campo mais favorável para eles neste aspecto, a saber,
o comércio da fazenda coletiva. Além disso, os próprios agricultores coletivos às
vezes não são avessos a se envolver em especulação, o que não os honra, é claro.
Mas, para combater essas atividades insalubres, temos a lei soviética recentemente
emitida sobre medidas para prevenir a especulação e punir especuladores278 .
Você sabe, é claro, que esta lei não erra do lado da clemência. Você entenderá, é
claro, que tal lei não existia, e não poderia ter existido, nas condições da primeira
fase da NEP.
Assim, você vê que quem, apesar desses fatos, fala de uma reversão ao comér-
cio da primeira fase da NEP, mostra que não entende nada, absolutamente nada,
sobre nossa economia soviética.
Dizem que é impossível desenvolver o comércio, mesmo que seja o comércio
soviético, sem um sistema monetário sólido e uma moeda sólida; que devemos
antes de tudo conseguir a recuperação do nosso sistema monetário e da nossa
moeda soviética, que, alegadamente, não vale nada. Isso é o que nos dizem os
economistas dos países capitalistas. Acho que aqueles economistas dignos não
entendem mais sobre economia política do que, digamos, o Arcebispo de Canter-
bury entende sobre propaganda antirreligiosa. Como se pode afirmar que nossa
moeda soviética não vale nada? Não é verdade que com essa moeda construímos
Magnitostroi, Dnieprostroi, Kuznetskstroi, as fábricas de tratores de Stalingrado
e Kharkov, as fábricas de automóveis Gorky e Moscou, centenas de milhares de
fazendas coletivas e milhares de fazendas estatais? Será que esses senhores pen-
sam que todos estes empreendimentos foram construídos com palha ou barro, e
não com materiais reais, tendo um valor definido? O que é que garante a estabili-
dade da moeda soviética – se tivermos em mente, é claro, o mercado organizado,
que é de importância decisiva em nosso volume de negócios, e não o mercado
desorganizado, que é apenas de importância secundária? Claro, não é apenas a
reserva de ouro. A estabilidade da moeda soviética é assegurada, em primeiro
lugar, pela vasta quantidade de bens mantidos pelo Estado e colocados em cir-
culação de mercadorias a preços estáveis. Qual economista pode negar que tal
garantia, que existe apenas na URSS, é uma garantia mais real de estabilidade
da moeda do que qualquer reserva de ouro? Será que os economistas dos paí-
ses capitalistas algum dia compreenderão que estão irremediavelmente confusos
em sua teoria de uma reserva de ouro como a “única” garantia da estabilidade

278Isso se refere à decisão do Comitê Executivo Central e do Conselho de Comissários do Povo da


URSS, datado de 22 de agosto de 1932, sobre “A luta contra a especulação”. A decisão foi publicada
no Pravda, nº 233, de 23 de agosto de 1932.
J. V. Stalin 513

da moeda?
Essa é a posição em relação às questões relativas ao crescimento do comércio
soviético.
O que alcançamos com a execução do plano quinquenal de expansão do co-
mércio soviético?
Como resultado do plano de cinco anos, temos:
a) um aumento na produção da indústria leve para 187% da produção em
1928;
b) um aumento no volume de negócios da cooperativa varejista e do comér-
cio estadual, que, calculado a preços de 1932, agora chega a 39.600.000.000
de rublos, ou seja, um aumento no volume de mercadorias no comércio vare-
jista para 175% do valor de 1928;
c) um aumento da rede estatal e cooperativa em 158.000 lojas e lojas em
relação ao número de 1929;
d) o desenvolvimento contínuo e crescente do comércio de fazendas cole-
tivas e compras de produtos agrícolas por vários Estados e organizações coo-
perativas.
Esses são os fatos.
Um quadro totalmente diferente é apresentado pela condição do comércio
interno nos países capitalistas, onde a crise resultou em uma queda catastrófica
do comércio, no fechamento em massa de empresas e na ruína de pequenos e
médios lojistas, na falência de grandes firmas comerciais, e o excesso de esto-
ques das empresas comerciais enquanto o poder de compra das massas da classe
trabalhadora continua a diminuir.
Esses são os resultados do plano quinquenal em quatro anos no que se refere
à evolução do volume de negócios.

VII. Os resultados do plano de cinco anos em


quatro anos na esfera da luta contra os resquícios
das classes hostis

Como resultado do cumprimento do plano quinquenal de indústria, agricul-


tura e comércio, estabelecemos o princípio do socialismo em todas as esferas da
economia nacional e delas expulsamos os elementos capitalistas.
O que isso deveria ter levado em relação aos elementos capitalistas; e a que
isso realmente levou?
Levou a isso: os últimos remanescentes das classes moribundas – os fabricantes
privados e seus servidores, os comerciantes privados e seus capangas, os ex-nobres
e padres, os kulaks e agentes kulak, os antigos guardas brancos e oficiais da polícia,
policiais e gendarmes, todos os tipos de intelectuais burgueses de tipo chauvinista
e todos os outros elementos antissoviéticos – foram expulsos de sua rotina.
Jogados fora de sua rotina e espalhados por toda a face da URSS, esses “que já
foram” se infiltraram em nossas fábricas e fábricas, em nossos escritórios gover-
namentais e organizações comerciais, em nossas empresas de transporte ferroviá-
514 Obras Escolhidas

rio e marítimo e, principalmente nas fazendas coletivas e nas fazendas estatais.


Eles se esgueiraram para esses lugares e se abrigaram lá, vestindo a máscara de
“trabalhadores” e “camponeses”, e alguns deles até conseguiram se infiltrar no
Partido.
O que eles carregaram com eles para esses lugares? Claro, eles carregavam
consigo um sentimento de ódio em relação ao regime soviético, um sentimento
de inimizade ardente em relação às novas formas de economia, vida e cultura.
Esses senhores não podem mais lançar um ataque frontal contra o regime
soviético. Eles e suas classes fizeram esses ataques várias vezes, mas foram der-
rotados e dispersos. Portanto, a única coisa que lhes resta é fazer mal e mal aos
trabalhadores, aos agricultores coletivos, ao regime soviético e ao Partido. E eles
estão fazendo o máximo de mal que podem, agindo às escondidas. Eles atearam
fogo em armazéns e destroem máquinas. Eles organizam sabotagem. Eles orga-
nizam atividades de demolição nas fazendas coletivas e fazendas estatais, e alguns
deles, inclusive alguns professores, chegam a tal ponto em sua paixão pela des-
truição que injetam germes da peste e do antraz no gado das fazendas coletivas
e fazendas estaduais, ajudam a espalhar meningite entre cavalos, etc.
Mas isso não é o principal. O principal no “trabalho” desses “que já foram” é
que eles organizam o roubo em massa e a pilhagem de propriedades do Estado,
propriedades cooperativas e propriedades agrícolas coletivas. Roubo e saque nas
fábricas, roubo e saque de frete ferroviário, roubo e pilhagem em armazéns e
empresas comerciais – especialmente roubo e pilhagem nas fazendas estatais e
fazendas coletivas – essa é a principal forma de “trabalho” destes elementos. Seu
instinto de classe, por assim dizer, diz a eles que a base da economia soviética é
propriedade pública e que é precisamente essa base que deve ser abalada a fim
de prejudicar o regime soviético – e eles realmente tentam abalar as fundações
da propriedade pública, organizando roubos e pilhagens em massa.
Para organizar a pilhagem, jogam com os hábitos da propriedade privada e
com a sobrevivência dos coletivos, os camponeses de ontem que hoje fazem parte
das fazendas coletivas. Vocês, como marxistas, devem saber que, em seu desen-
volvimento, a consciência do homem está atrasada em relação à sua posição real.
A posição dos membros das fazendas coletivas é que eles não são mais agricul-
tores individuais, mas coletivistas; mas sua consciência ainda é a velha – a dos
proprietários privados. E assim, os “que passaram” das fileiras das classes explo-
radoras jogam com os hábitos de propriedade privada dos fazendeiros coletivos
a fim de organizar a pilhagem da riqueza pública e, assim, abalar os alicerces do
sistema soviético.
Muitos de nossos camaradas olham com complacência para tais fenômenos e
não conseguem entender o significado desse roubo e pilhagem em massa. Eles
permanecem cegos para esses fatos e consideram que “não há nada de particular
nisso”. Mas esses camaradas estão profundamente enganados. A base do nosso
sistema é a propriedade pública, assim como a propriedade privada é a base do
capitalismo. Se os capitalistas proclamaram a propriedade privada sagrada e invi-
olável quando estavam consolidando o sistema capitalista, eis ainda mais a razão
por que nós, comunistas, deveríamos proclamar a propriedade pública sagrada e
violável a fim de consolidar as novas formas socialistas de economia em todas as
J. V. Stalin 515

esferas da produção e do comércio. Permitir o roubo e pilhagem de propriedade


pública – não importa se é propriedade do Estado, cooperativa ou fazenda cole-
tiva – e ignorar esses ultrajes contrarrevolucionários significa ajudar e estimular
o enfraquecimento do sistema soviético, que depende da propriedade pública
como sua base. Foi com base nisso que nosso governo soviético aprovou a recente
lei de proteção da propriedade pública279 . Esta promulgação é a base da lei re-
volucionária na atualidade. E é o dever principal de todo comunista, de todo
trabalhador e de todo agricultor coletivo cumprir estritamente esta lei.
Diz-se que o direito revolucionário na atualidade não difere em nada do di-
reito revolucionário do primeiro período da NEP, que o direito revolucionário
atualmente é uma reversão ao direito revolucionário do primeiro período da
NEP. Isso está absolutamente errado. A ponta afiada da lei revolucionária no
primeiro período da NEP foi dirigida principalmente contra os excessos do co-
munismo de guerra, contra o confisco “ilegal” e os impostos. Garantia a se-
gurança da propriedade do proprietário privado, do camponês individual e do
capitalista, desde que observassem estritamente as leis soviéticas. A posição em
relação ao direito revolucionário atualmente é totalmente diferente. O gume
afiado da lei revolucionária no momento atual é dirigido, não contra os excessos
do comunismo de guerra, que há muito deixou de existir, mas contra ladrões e
destruidores da economia pública, contra desordeiros e furtadores de proprie-
dade pública. A principal preocupação do direito revolucionário na atualidade
é, consequentemente, à proteção da propriedade pública, e não outra coisa.
É por isso que uma das tarefas fundamentais do Partido é lutar pela proteção
do patrimônio público, lutar com todas as medidas e todos os meios colocados
ao nosso dispor pelas nossas leis soviéticas.
Uma forte e poderosa ditadura do proletariado – é disso que precisamos agora
para espalhar ao vento os últimos vestígios das classes moribundas e frustrar seus
desígnios ladrões.
Alguns camaradas interpretaram a tese sobre a abolição das classes, a cria-
ção de uma sociedade sem classes e o enfraquecimento do Estado, como uma
justificativa da preguiça e complacência, uma justificativa da teoria contrarre-
volucionária da extinção da luta de classes e o enfraquecimento do poder do
Estado. Nem é preciso dizer que essas pessoas não podem ter nada em comum
com o nosso Partido. Eles são degenerados ou traficantes de ideias e devem ser
expulsos do Partido. A abolição das classes não é alcançada pela extinção da
luta de classes, mas pela sua intensificação. O Estado irá definhar, não como
resultado do enfraquecimento do poder do Estado, mas como resultado do seu
fortalecimento ao máximo, o que é necessário para finalmente esmagar os restos
das classes moribundas e para organizar a defesa contra o cerco capitalista que
279 Refere-se à decisão do Comitê Executivo Central e do Conselho de Comissários do Povo da URSS
sobre “Proteção da propriedade das Empresas Estatais, Fazendas Coletivas e Cooperativas e conso-
lidação da Propriedade Pública (socialista)”, adotada em 7 de agosto de 1932. Esta decisão, escrita
por Stalin, declara: “O Comitê Executivo Central e o Conselho de Comissários do Povo da URSS
consideram que a propriedade pública (estatal, fazenda coletiva e propriedade cooperativa) é a base
do sistema soviético; é sagrado e inviolável, e as pessoas que cometem ofensas contra a propriedade
pública devem ser consideradas inimigas do povo. Em vista disso, é um dever primordial dos órgãos
do poder soviético travar uma luta decidida contra aqueles que roubam a propriedade pública”. A
decisão foi publicada no Pravda, nº 218, de 8 de agosto de 1932.
516 Obras Escolhidas

está longe de ter sido eliminado ainda, e não será logo eliminado.
Como resultado do cumprimento do plano de cinco anos, conseguimos fi-
nalmente expulsar os últimos remanescentes das classes hostis de suas posições
na produção; derrotamos os kulaks e preparamos o terreno para sua eliminação.
Tais são os resultados do plano quinquenal no âmbito da luta contra os últimos
destacamentos da burguesia. Mas isso não é suficiente. A tarefa é expulsar esses
“que já existiram” de nossas próprias empresas e instituições e torná-los inofen-
sivos para o bem e para todos.
Não se pode dizer que esses “já foram” podem alterar qualquer coisa na posi-
ção atual da URSS por suas maquinações de destruição e roubo. Eles são muito
fracos e impotentes para resistir às medidas adotadas pelo governo soviético. Mas,
se nossos camaradas não se armarem com a vigilância revolucionária e não puse-
rem fim à atitude presunçosa e filisteia em relação aos casos de furto e pilhagem
de propriedade pública, esses “que já foram” podem causar danos consideráveis.
Devemos ter em mente que o crescimento do poder do Estado soviético in-
tensificará a resistência dos últimos remanescentes das classes moribundas. É
precisamente porque estão a morrer e os seus dias estão contados que irão passar
de uma forma de ataque a outra, de forma mais contundente, apelando às ca-
madas atrasadas da população e mobilizando-as contra o regime soviético. Não
há maldade e calúnia a que esses “pretensos” não recorrerão contra o regime
soviético e em torno da qual não tentarão reunir os elementos atrasados. Isso
pode fornecer o solo para um renascimento das atividades dos grupos derro-
tados dos velhos partidos contrarrevolucionários: os socialistas-revolucionários,
os mencheviques e os nacionalistas burgueses das regiões centrais e fronteiriças,
pode também fornecer o solo para uma reativação das atividades dos fragmentos
de elementos contrarrevolucionários entre os trotskistas e os desviantes de di-
reita. Claro, não há nada de terrível nisso. Mas devemos ter tudo isso em mente
se quisermos acabar com esses elementos rapidamente e sem sacrifício especial.
É por isso que a vigilância revolucionária é a qualidade de que os bolcheviques
precisam especialmente no momento.

VIII. Conclusões Gerais


Estes são os principais resultados da implementação do plano quinquenal no
que diz respeito à indústria e à agricultura, no que diz respeito à melhoria das
condições de vida dos trabalhadores e ao desenvolvimento do volume de negó-
cios, no que diz respeito à consolidação do regime soviético e ao desenvolvimento
da luta de classes contra os remanescentes das classes moribundas.
Esses são os sucessos e ganhos do regime soviético durante os últimos quatro
anos.
Seria um erro pensar que, uma vez que esses sucessos foram alcançados, tudo
está como deveria ser. Claro, nem tudo conosco ainda é como deveria ser. Exis-
tem muitas falhas e erros em nosso trabalho. Ainda devemos enfrentar a inefi-
ciência e a confusão em nosso trabalho prático. Infelizmente, não posso agora
parar para tratar de lacunas e erros, pois os limites do relatório que fui instruído
a fazer não me dão espaço suficiente para isso. Mas não é esse o ponto agora.
J. V. Stalin 517

A questão é que, apesar das falhas e erros, cuja existência nenhum de nós nega,
alcançamos sucessos tão importantes que suscitam admiração na classe trabalha-
dora de todo o mundo, alcançamos uma vitória que é verdadeiramente mundial
e tem significado histórico.
O que poderia e realmente desempenhou o papel principal para que o Par-
tido, apesar dos erros e falhas, tenha alcançado sucessos decisivos na execução do
plano quinquenal em quatro anos?
Quais são as principais forças que nos garantiram esta vitória histórica apesar
de tudo?
São, antes de mais nada, a atividade e a devoção, o entusiasmo e a iniciativa
das grandes massas de operários e camponeses coletivos que, junto com as forças
engenheiras e técnicas, mostraram uma energia colossal no desenvolvimento da
emulação socialista e do trabalho de brigada de choque. Não há dúvida de que
sem isso não poderíamos ter alcançado nosso objetivo, não poderíamos ter dado
um único passo.
Em segundo lugar, a direção firme do Partido e do Governo, que instou as
massas a avançar e superou todas as dificuldades no caminho para a meta.
E, por último, os méritos e vantagens especiais do sistema soviético de eco-
nomia, que traz em si as colossais potencialidades necessárias para superar as
dificuldades.
Essas são as três principais forças que determinaram a vitória histórica das
conclusões gerais da URSS:
1. Os resultados do plano de cinco anos refutaram a afirmação dos dirigen-
tes burgueses e sociais-democratas de que o plano quinquenal era uma fantasia,
um delírio, um sonho irrealizável. Os resultados mostram que o plano já foi
cumprido.
2. Os resultados do plano quinquenal abalaram o conhecido “artigo de fé”
burguês de que a classe operária é incapaz de construir algo novo, de que só é
capaz de destruir o antigo. Os resultados do plano de cinco anos mostraram que
a classe trabalhadora é tão capaz de construir o novo quanto de destruir o antigo.
3. Os resultados do plano quinquenal abalaram a tese dos sociais-democratas
de que é impossível construir o socialismo num só país considerado separada-
mente. Os resultados do plano de cinco anos mostraram que é perfeitamente
possível construir uma sociedade socialista em um país; pois as bases econômicas
de tal sociedade já foram estabelecidas na URSS.
4. Os resultados do plano de cinco anos refutaram a afirmação dos econo-
mistas burgueses de que o sistema capitalista de economia é o melhor de todos os
sistemas, que qualquer outro sistema de economia é instável e incapaz de resistir
ao teste das dificuldades do desenvolvimento econômico. Os resultados do plano
quinquenal mostraram que o sistema capitalista de economia está falido e instá-
vel; que sobreviveu a seus dias e deve dar lugar a outro, um sistema de economia
socialista mais elevado, soviético; que o único sistema de economia que não teme
as crises e é capaz de superar as dificuldades que o capitalismo não pode resolver
é o sistema soviético de economia.
518 Obras Escolhidas

5. Finalmente, os resultados do plano quinquenal mostraram que o Partido


Comunista é invencível, se conhece o seu objetivo e se não tem medo das dificul-
dades.
Pravda, nº 10 e nº 17.
10 e 17 de janeiro de 1933
520 Obras Escolhidas
J. V. Stalin 521

PARTE III

Triunfo e ocaso do
homem de aço
J. V. Stalin 523

Marxismo versus Liberalismo – Uma


Entrevista com H. G. Wells
23 de julho de 1934

Wells: Estou muito grato ao senhor, Sr. Stalin, por concordar em me rece-
ber. Estive recentemente nos Estados Unidos. Tive uma longa conversa com o
presidente Roosevelt e tentei averiguar quais eram suas ideias principais. Agora
eu vim perguntar o que você está fazendo para mudar o mundo...
Stalin: Não muito.
Wells: Eu vagueio pelo mundo como um homem comum e, como um homem
comum, observo o que está acontecendo ao meu redor.
Stalin: Homens públicos importantes como você não são “homens comuns”.
Claro, só a história pode mostrar o quão importante esse ou aquele homem pú-
blico foi; em todo caso, você não vê o mundo como um “homem comum”.
Wells: Não estou fingindo humildade. O que quero dizer é que procuro ver o
mundo pelos olhos do homem comum, e não como um político partidário ou um
administrador responsável. Minha visita aos Estados Unidos entusiasmou minha
mente. O velho mundo financeiro está entrando em colapso; a vida econômica
do país está sendo reorganizada em novas linhas. Lenin disse: “Devemos apren-
der a fazer negócios, aprender isso com os capitalistas.”
Hoje os capitalistas têm que aprender com você, para compreender o espí-
rito do socialismo. Parece-me que o que está ocorrendo nos Estados Unidos é
uma profunda reorganização, a criação de uma economia planejada, isto é, so-
cialista. Você e Roosevelt partem de dois pontos de partida diferentes. Mas não
há uma relação de ideias, um parentesco de ideias, entre Moscou e Washington?
Em Washington, fiquei impressionado com a mesma coisa que vejo acontecendo
aqui; eles estão construindo escritórios, estão criando uma série de órgãos regu-
ladores do Estado, estão organizando uma função pública há muito necessária.
A necessidade deles, como a sua, é habilidade diretiva.
Stalin: Os Estados Unidos perseguem um objetivo diferente daquele que per-
seguimos na URSS. O objetivo que os americanos perseguem surgiu dos pro-
blemas econômicos, da crise econômica. Os americanos querem se livrar da
crise com base na atividade capitalista privada, sem mudar a base econômica.
Eles estão tentando reduzir ao mínimo a ruína, as perdas causadas pelo sistema
econômico existente. Aqui, porém, como vocês sabem, no lugar da velha e des-
truída base econômica, foi criada uma base econômica inteiramente diferente,
uma nova. Mesmo se os americanos que você mencionou atingirem parcialmente
seu objetivo, ou seja, reduzir essas perdas ao mínimo, eles não destruirão as raí-
zes da anarquia que é inerente ao sistema capitalista existente. Eles estão preser-
vando o sistema econômico que deve inevitavelmente levar, e não pode deixar
de levar, à anarquia na produção. Assim, na melhor das hipóteses, se tratará não
de reorganizar a sociedade, não de abolir o antigo sistema social que dá origem
524 Obras Escolhidas

à anarquia e às crises, mas de restringir alguns de seus excessos. Subjetivamente,


talvez, esses americanos pensem que estão reorganizando a sociedade; objetiva-
mente, entretanto, eles estão preservando a base atual da sociedade. Por isso,
objetivamente, não haverá reorganização da sociedade.
Nem haverá economia planejada. O que é economia planejada? Quais são
alguns de seus atributos? A economia planejada tenta abolir o desemprego. Su-
ponhamos que seja possível, preservando o sistema capitalista, reduzir o desem-
prego a um certo mínimo. Mas, certamente, nenhum capitalista jamais concor-
daria com a abolição completa do desemprego, com a abolição do exército de
reserva de desempregados, cujo objetivo é exercer pressão sobre o mercado de
trabalho, para garantir uma oferta de mão de obra barata. Aqui você tem uma das
rendas da “economia planejada” da sociedade burguesa. Além disso, a economia
planejada pressupõe um aumento da produção nos ramos da indústria que pro-
duzem bens de que as massas populares precisam. Mas você sabe que a expansão
da produção sob o capitalismo ocorre por motivos inteiramente diferentes, que o
capital flui para os ramos da economia em que a taxa de lucro é mais alta. Você
nunca obrigará um capitalista a incorrer em perdas para si mesmo e concordar
com uma taxa de lucro mais baixa com o objetivo de satisfazer as necessidades
do povo. Sem se livrar dos capitalistas, sem abolir o princípio da propriedade
privada dos meios de produção, é impossível criar uma economia planejada.
Wells: Concordo com muito do que você disse. Mas eu gostaria de enfatizar
que se um país como um todo adotar o princípio da economia planejada, se o
governo, gradualmente, passo a passo, começar a aplicar consistentemente esse
princípio, a oligarquia financeira será finalmente abolida e o socialismo, no sig-
nificado anglo-saxão da palavra, acontecerá. O efeito das ideias do “New Deal” de
Roosevelt é mais poderoso e, em minha opinião, são ideias socialistas. Parece-me
que, em vez de enfatizar o antagonismo entre os dois mundos, devemos, nas atu-
ais circunstâncias, nos esforçar para estabelecer uma língua comum para todas
as forças construtivas.
Stalin: Ao falar da impossibilidade de realizar os princípios da economia pla-
nejada preservando a base econômica do capitalismo, não desejo minimamente
menosprezar as notáveis qualidades pessoais de Roosevelt, sua iniciativa, cora-
gem e determinação. Sem dúvida, Roosevelt se destaca como uma das figuras
mais fortes entre todos os capitães do mundo capitalista contemporâneo. Por
isso, gostaria, mais uma vez, de sublinhar que a minha convicção de que a eco-
nomia planificada é impossível nas condições do capitalismo não significa que
tenha dúvidas sobre as capacidades pessoais, o talento e a coragem do Presidente
Roosevelt. Mas se as circunstâncias forem desfavoráveis, o capitão mais talentoso
não pode atingir o gol que você mencionou. Teoricamente, é claro, a possibili-
dade de marchar gradualmente, passo a passo, nas condições do capitalismo, em
direção ao objetivo que você chama de socialismo no significado anglo-saxão da
palavra, não está excluída.
Mas o que será esse “socialismo”? Na melhor das hipóteses, freando até certo
ponto o mais desenfreado dos representantes individuais do lucro capitalista,
algum aumento na aplicação do princípio da regulação na economia nacional.
Está tudo muito bem. Mas assim que Roosevelt, ou qualquer outro capitão do
J. V. Stalin 525

mundo burguês contemporâneo, começar a empreender algo sério contra a fun-


dação do capitalismo, ele inevitavelmente sofrerá uma derrota total. Os bancos,
as indústrias, as grandes empresas, as grandes fazendas não estão nas mãos de
Roosevelt. Todos esses são propriedade privada. As ferrovias, a frota mercantil,
tudo isso pertence a proprietários privados. E, finalmente, o exército de traba-
lhadores qualificados, os engenheiros, os técnicos, esses também não estão sob
o comando de Roosevelt, estão sob o comando dos proprietários privados; todos
eles trabalham para os proprietários privados. Não devemos esquecer as funções
do Estado no mundo burguês.
O Estado é uma instituição que organiza a defesa do país, organiza a manu-
tenção da “ordem”; é um aparelho de cobrança de impostos. O Estado capitalista
não lida muito com economia no sentido estrito da palavra; esse último não está
nas mãos do Estado. Ao contrário, o Estado está nas mãos da economia capita-
lista. É por isso que temo que, apesar de todas as suas energias e habilidades,
Roosevelt não atingirá a meta que você mencionou, se de fato for essa a meta.
Talvez, no decorrer de várias gerações, seja possível nos aproximar um pouco
dessa meta; mas eu pessoalmente acho que mesmo isso não é muito provável.
Wells: Talvez eu acredite mais fortemente na interpretação econômica da po-
lítica do que você. Enormes forças que conduzem a uma melhor organização,
para o melhor funcionamento da comunidade, ou seja, para o socialismo, fo-
ram postas em ação pela invenção e pela ciência moderna. A organização e a
regulação da ação individual tornaram-se necessidades mecânicas, independen-
temente das teorias sociais. Se começarmos com o controle estatal dos bancos e
depois seguirmos com o controle dos transportes, das indústrias pesadas da in-
dústria em geral, do comércio, etc., tal controle abrangente será equivalente à
propriedade estatal de todos os ramos da economia nacional. Esse será o pro-
cesso de socialização. Socialismo e individualismo não são opostos como preto
e branco. Existem muitos estágios intermediários entre eles. Há individualismo
que beira o banditismo, e há disciplina e organização que equivalem ao socia-
lismo. A introdução da economia planejada depende, em grande medida, dos
organizadores da economia, da habilidosa intelectualidade técnica, que, passo a
passo, pode ser convertida aos princípios socialistas de organização. E isso é o
mais importante. Porque a organização vem antes do socialismo. É o fato mais
importante. Sem organização, a ideia socialista é uma mera ideia.
Stalin: Não há, nem deveria haver, contraste irreconciliável entre o indivi-
dual e o coletivo, entre os interesses da pessoa individual e os interesses do co-
letivo. Não deveria haver tal contraste, porque o coletivismo, o socialismo, não
nega, mas combina os interesses individuais com os interesses do coletivo. O so-
cialismo não pode se abstrair dos interesses individuais. Somente a sociedade
socialista pode satisfazer plenamente esses interesses pessoais. Mais que isso; a
sociedade socialista sozinha pode salvaguardar firmemente os interesses do in-
divíduo. Nesse sentido, não há contraste irreconciliável entre “individualismo”
e socialismo. Mas podemos negar o contraste entre as classes, entre a classe pro-
prietária, a classe capitalista, e a classe trabalhadora, a classe proletária? Por um
lado, temos a classe proprietária que possui os bancos, as fábricas, as minas, os
transportes, as plantações nas colônias. Essas pessoas não veem nada além de
seus próprios interesses, sua busca por lucros. Eles não se submetem à vontade
526 Obras Escolhidas

do coletivo; eles se esforçam para subordinar cada coletivo à sua vontade. Por ou-
tro lado, temos a classe dos pobres, a classe explorada, que não possui fábricas,
nem obras, nem bancos, que é obrigada a viver vendendo sua força de trabalho
aos capitalistas que não têm a oportunidade de satisfazer suas necessidades mais
elementares. Como esses interesses e esforços opostos podem ser reconciliados?
Tanto quanto sei, Roosevelt não conseguiu encontrar o caminho da conciliação
entre estes interesses. E é impossível, como a experiência mostra. A propósito,
você conhece a situação nos Estados Unidos melhor do que eu, pois nunca es-
tive lá e vejo os assuntos americanos principalmente pela literatura. Mas tenho
alguma experiência na luta pelo socialismo, e essa experiência me diz que se Ro-
osevelt fizer uma tentativa real de satisfazer os interesses da classe proletária às
custas da classe capitalista, esta colocará outro presidente em seu lugar. Os ca-
pitalistas dirão: presidentes vêm e presidentes vão, mas nós continuamos para
sempre; se este ou aquele presidente não proteger nossos interesses, encontrare-
mos outro. O que o presidente pode opor à vontade da classe capitalista?
Wells: Oponho-me a esta classificação simplificada da humanidade em po-
bres e ricos. Claro que existe uma categoria de pessoas que se esforça apenas
para obter lucro. Mas essas pessoas não são consideradas um incômodo no Oci-
dente tanto quanto aqui? Não existem muitas pessoas no Ocidente para as quais
o lucro não é um fim, que possuem uma certa quantidade de riqueza, que dese-
jam investir e obter lucro com esse investimento, mas que não consideram isso
como o objetivo principal? Eles consideram o investimento uma necessidade in-
conveniente. Não há muitos engenheiros capazes e dedicados, organizadores da
economia, cujas atividades são estimuladas por algo diferente do lucro? Em mi-
nha opinião, há uma numerosa classe de pessoas capazes que admitem que o
sistema atual é insatisfatório e que estão destinadas a desempenhar um grande
papel na futura sociedade socialista. Durante os últimos anos, estive muito en-
gajado e pensei na necessidade de conduzir propaganda em favor do socialismo
e do cosmopolitismo entre amplos círculos de engenheiros, aviadores, técnicos
militares, etc. É inútil abordar esses círculos com dois - propaganda de guerra
de classe de trilha. Essas pessoas entendem a condição do mundo. Eles enten-
dem que é uma confusão sangrenta, mas consideram seu antagonismo simples
da guerra de classes um absurdo.
Stalin: Você se opõe à classificação simplificada da humanidade em rica e
pobre. Claro que existe um estrato médio, existe a intelectualidade técnica que
você mencionou e entre a qual há pessoas muito boas e muito honestas. Entre eles
também há pessoas desonestas e más, há todos os tipos de pessoas entre eles. Mas,
antes de tudo, a humanidade está dividida em ricos e pobres, em proprietários
e explorados; e abstrair-se dessa divisão fundamental e do antagonismo entre
pobres e ricos significa abstrair-se do fato fundamental. Não nego a existência
de estratos intermediários, que ou tomam partido de uma ou de outra dessas
duas classes em conflito, ou então assumem uma posição neutra ou semineutra
nessa luta. Mas, repito, abstrair-se dessa divisão fundamental da sociedade e da
luta fundamental entre as duas classes principais significa ignorar os fatos. A
luta continua e continuará. O resultado será determinado pela classe proletária,
a classe trabalhadora.
Wells: Mas não existem muitas pessoas que não são pobres, mas que traba-
J. V. Stalin 527

lham e trabalham produtivamente?


Stalin: Claro, existem pequenos proprietários de terras, artesãos, pequenos
comerciantes, mas não são essas pessoas que decidem o destino de um país, mas
as massas trabalhadoras, que produzem tudo o que a sociedade exige.
Wells: Mas existem tipos muito diferentes de capitalistas. Existem capitalistas
que só pensam em lucro, em ficar rico; mas também há aqueles que estão prepa-
rados para fazer sacrifícios. Veja o velho Morgan, por exemplo. Ele só pensava
em lucro; ele era um parasita da sociedade, simplesmente, ele apenas acumulava
riquezas. Mas veja Rockefeller. Ele é um organizador brilhante; ele deu o exem-
plo de como organizar o fornecimento de petróleo digno de emulação. Ou veja
Ford. Claro que a Ford é egoísta. Mas ele não é um organizador apaixonado
da produção racionalizada de quem você aprende? Gostaria de enfatizar o fato
de que recentemente ocorreu uma importante mudança de opinião em relação
a URSS em países de língua inglesa. A razão para isso, em primeiro lugar, é a
posição do Japão e os acontecimentos na Alemanha. Mas há outras razões além
das decorrentes da política internacional. Há uma razão mais profunda, a saber,
o reconhecimento por muitas pessoas do fato de que o sistema baseado no lucro
privado está falindo. Nessas circunstâncias, parece-me, não devemos colocar em
primeiro plano o antagonismo entre os dois mundos, mas devemos nos esforçar
para combinar, tanto quanto possível, todos os movimentos construtivos, todas
as forças construtivas em uma linha. Parece-me que sou mais à esquerda do que
você, Sr. Stalin; Acho que o antigo sistema está mais perto do fim do que você
pensa.
Stalin: Ao falar dos capitalistas que lutam apenas pelo lucro, apenas para en-
riquecer, não quero dizer que são as pessoas mais inúteis, capazes de nada mais.
Muitos deles, sem dúvida, possuem grande talento organizador, que não sonho
em negar. Nós, soviéticos, aprendemos muito com os capitalistas. E Morgan,
a quem você caracteriza de forma tão desfavorável, foi sem dúvida um organi-
zador bom e capaz. Mas se você se refere a pessoas que estão preparadas para
reconstruir o mundo, é claro, você não será capaz de encontrá-las nas fileiras
daqueles que servem fielmente à causa do lucro. Nós e eles estamos em polos
opostos. Você mencionou Ford. Claro, ele é um organizador de produção ca-
paz. Mas você não conhece a atitude dele para com a classe trabalhadora? Você
não sabe quantos trabalhadores ele joga na rua? O capitalista está voltado para
o lucro; e nenhum poder na terra pode afastá-lo disso. O capitalismo será abo-
lido, não pelos “organizadores” da produção, não pela intelectualidade técnica,
mas pela classe trabalhadora, porque os estratos mencionados não desempenham
um papel independente. O engenheiro, organizador da produção, não traba-
lha como gostaria, mas como lhe é ordenado, de forma a servir os interesses de
seus patrões. Claro, há exceções; há pessoas neste estrato que despertaram da
embriaguez do capitalismo. A intelectualidade técnica pode, sob certas condi-
ções, realizar milagres e beneficiar enormemente a humanidade. Mas também
pode causar grandes danos. Nós, o povo soviético, não temos pouca experiên-
cia da intelectualidade técnica. Depois da Revolução de Outubro, certo setor
da intelectualidade técnica recusou-se a participar do trabalho de construção da
nova sociedade; opuseram-se a esta obra de construção e sabotaram-na. Fizemos
tudo o que pudemos para trazer a intelectualidade técnica para este trabalho
528 Obras Escolhidas

de construção; tentamos desta forma e daquela. Não demorou muito para que
nossa intelectualidade técnica concordasse ativamente em ajudar o novo sistema.
Hoje, a melhor seção dessa intelectualidade técnica está na linha de frente dos
construtores da sociedade socialista. Com essa experiência, estamos longe de su-
bestimar o lado bom e o lado ruim da intelectualidade técnica e sabemos que por
um lado ela pode fazer mal e, por outro, pode fazer “milagres”. Claro, as coisas
seriam diferentes se fosse possível, de um só golpe, afastar espiritualmente a in-
telectualidade técnica do mundo capitalista. Mas isso é utopia. Existem muitos
intelectuais técnicos que ousariam romper com o mundo burguês e começar a
trabalhar na reconstrução da sociedade? Você acha que existem muitas pessoas
desse tipo, digamos, na Inglaterra ou na França? Não, poucos estão dispostos a
romper com seus empregadores e começar a reconstruir o mundo.
Além disso, podemos perder de vista que para transformar o mundo é preciso
ter poder político? Parece-me, Sr. Wells, que você subestima enormemente a
questão do poder político, que ela foge inteiramente de sua concepção.
O que podem aqueles, mesmo com as melhores intenções do mundo, fazer
se não conseguem levantar a questão da tomada do poder e não o possuem? Na
melhor das hipóteses, eles podem ajudar a classe que assume o poder, mas não
podem mudar o mundo por si próprios. Isso só pode ser feito por uma grande
classe que tomará o lugar da classe capitalista e se tornará o senhor soberano
como essa foi antes. Esta classe é a classe trabalhadora. Claro, a assistência da
intelectualidade técnica deve ser aceita; e este por sua vez, deve ser assistido. Mas
não se deve pensar que a intelectualidade técnica pode desempenhar um papel
histórico independente. A transformação do mundo é um processo grande, com-
plicado e doloroso. Para esta tarefa é necessária uma grande aula. Os grandes
navios fazem longas viagens.
Wells: Sim, mas para viagens longas são necessários um capitão e um navega-
dor.
Stalin: Isso é verdade; mas o que primeiro é necessário para uma longa viagem
é um grande navio. O que é um navegador sem navio? Um homem preguiçoso,
Wells: O grande navio é a humanidade, não uma classe.
Você, senhor Wells, evidentemente começa com a suposição de que todos os
homens são bons. Eu, porém, não me esqueço de que existem muitos homens
perversos. Não acredito na bondade da burguesia.
Wells: Lembro-me da situação com relação à intelectualidade técnica há vá-
rias décadas. Naquela época a intelectualidade técnica era numericamente pe-
quena, mas havia muito o que fazer e cada engenheiro, técnico e intelectual en-
controu sua oportunidade. É por isso que a intelectualidade técnica foi a classe
menos revolucionária. Agora, porém, há uma superabundância de intelectuais
técnicos e sua mentalidade mudou muito. O homem habilidoso, que antes nunca
ouvia falar de revolucionário, agora está muito interessado nisso. Recentemente,
estava jantando com a Royal Society, nossa grande sociedade científica inglesa.
O discurso do presidente foi um discurso de planejamento social e controle ci-
entífico. Trinta anos atrás, eles não teriam ouvido o que eu digo a eles agora.
Hoje, o homem à frente da Royal Society tem visões revolucionárias e insiste na
reorganização científica da sociedade humana. Mudanças de mentalidade. Sua
J. V. Stalin 529

propaganda de guerra de classes não acompanhou esses fatos.


Stalin: Sim, eu sei disso, e isso pode ser explicado pelo fato de que a sociedade
capitalista está agora em um beco sem saída. Os capitalistas procuram, mas não
conseguem encontrar uma saída deste beco sem saída que seja compatível com a
dignidade desta classe, compatível com os interesses desta classe. Eles poderiam,
em certa medida, sair da crise de joelhos, mas não conseguem encontrar uma
saída que lhes permita sair dela de cabeça erguida, uma saída que não perturbe
fundamentalmente os interesses do capitalismo. Isso, é claro, é conhecido por
amplos círculos da intelectualidade técnica. Uma grande parte dela está come-
çando a perceber a comunidade de seus interesses com os da classe que é capaz
de apontar o caminho para fora do beco sem saída.
Wells: Você, entre todas as pessoas, sabe alguma coisa sobre revoluções, Sr.
Stalin, do lado prático. As massas crescem? Não é uma verdade estabelecida que
todas as revoluções são feitas por uma minoria?
Stalin: Para provocar uma revolução, a orientação de uma minoria revoluci-
onária é necessária; mas a minoria mais talentosa, devotada e enérgica estaria
desamparada se não contasse com o apoio, pelo menos passivo, de milhões.
Wells: Pelo menos passivo? Talvez subconsciente?
Stalin: Em parte também os semi-instintivos e semiconscientes, mas sem o
apoio de milhões, a melhor minoria é impotente.
Wells: Eu vejo a propaganda comunista no Ocidente e me parece que nas con-
dições modernas essa propaganda soa muito antiquada, porque é propaganda
insurrecional. A propaganda a favor da derrubada violenta do sistema social ia
muito bem quando era dirigida contra a tirania. Mas nas condições modernas,
quando o sistema está entrando em colapso de qualquer maneira, a ênfase deve
ser colocada na eficiência, na competência, na produtividade, e não na insurrei-
ção. Parece-me que a nota insurrecional está obsoleta. A propaganda comunista
no Ocidente é um incômodo para as pessoas de mentalidade construtiva.
Stalin: É claro que o antigo sistema está quebrando e decaindo. Isso é ver-
dade. Mas também é verdade que novos esforços estão sendo feitos por outros
métodos, por todos os meios, para proteger, para salvar este sistema moribundo.
Você tira uma conclusão errada de um postulado correto. Você afirma corre-
tamente que o velho mundo está se desintegrando. Mas você está errado em
pensar que ele está se quebrando por conta própria. Não, a substituição de um
sistema social por outro é um processo revolucionário longo e complicado. Não
é simplesmente um processo espontâneo, mas uma luta, é um processo ligado ao
confronto de classes. O capitalismo está decaindo, mas não deve ser comparado
simplesmente a uma árvore que se decompôs a tal ponto que deve cair no chão
por conta própria. Não, a revolução, a substituição de um sistema social por ou-
tro, sempre foi uma luta, uma luta dolorosa e cruel, uma luta de vida ou morte.
E cada vez que as pessoas do novo mundo chegavam ao poder, elas tinham que se
defender contra as tentativas do velho mundo de restaurar o antigo poder pela
força; essas pessoas do novo mundo sempre tiveram que estar em alerta, sem-
pre tiveram que estar prontas para repelir os ataques do velho mundo ao novo
sistema.
Sim, você está certo quando diz que o antigo sistema social está falindo; mas
530 Obras Escolhidas

não está se quebrando por conta própria. Veja o fascismo, por exemplo. O fas-
cismo é uma força reacionária que tenta preservar o antigo sistema por meio da
violência. O que você fará com os fascistas? Discutir com eles? Tentar convencê-
los? Mas isso não terá nenhum efeito sobre eles. Os comunistas não idealizam
absolutamente os métodos de violência. Mas eles, os comunistas, não querem ser
pegos de surpresa, não podem contar com que o velho mundo saia voluntaria-
mente do palco, veem que o antigo sistema se defende violentamente, e é por
isso que os comunistas dizem à classe trabalhadora: Responder à violência com
violência; faça todo o possível para evitar que a velha ordem moribunda o esma-
gue, não permita que ela coloque algemas em suas mãos, nas mãos com as quais
você destruirá o antigo sistema. Como você vê, os comunistas consideram a subs-
tituição de um sistema social por outro, não simplesmente como um processo
espontâneo e pacífico, mas como um processo complicado, longo e violento. Os
comunistas não podem ignorar os fatos.
Wells: Mas veja o que está acontecendo agora no mundo capitalista. O co-
lapso não é simples; é a eclosão da violência reacionária que está degenerando
em gangsterismo. E me parece que quando se trata de um conflito com vio-
lência reacionária e pouco inteligente, os socialistas podem apelar para a lei e,
em vez de considerar a polícia como inimiga, deveriam apoiá-la na luta contra
os reacionários. Acho que é inútil operar com os métodos do antigo socialismo
insurrecional.
Stalin: Os comunistas se baseiam em uma rica experiência histórica que en-
sina que classes obsoletas não abandonam voluntariamente o palco da história.
Lembre-se da história da Inglaterra no século XVII. Muitos não disseram que o
antigo sistema social se deteriorou? Mas não era necessário que um Cromwell o
esmagasse à força?
Wells: Cromwell agiu com base na constituição e em nome da ordem consti-
tucional.
Stalin: Em nome da constituição, ele recorreu à violência, decapitou o rei,
dispersou o Parlamento, prendeu alguns e decapitou outros!
Ou dê um exemplo de nossa história. Não ficou claro por muito tempo que o
sistema tsarista estava decaindo, estava rompendo? Mas quanto sangue teve que
ser derramado para derrubá-lo?
E a Revolução de Outubro? Não havia muita gente que sabia que só nós, os
bolcheviques, estávamos indicando a única saída correta? Não estava claro que
o capitalismo russo havia decaído? Mas você sabe como foi grande a resistência,
quanto sangue teve que ser derramado para defender a Revolução de Outubro
de todos os seus inimigos, internos e externos.
Ou vejamos a França do final do século XVIII. Muito antes de 1789, era claro
para muitos o quão podre era o poder real, o sistema feudal. Mas uma insurrei-
ção popular, um choque de classes não foi, não poderia ser evitado. Por quê?
Porque as classes que devem abandonar o palco da história são as últimas a se
convencer de que seu papel acabou. É impossível convencê-los disso. Eles pen-
sam que as fissuras no edifício decadente da velha ordem podem ser reparadas e
salvas. É por isso que as classes moribundas pegam nas armas e recorrem a todos
os meios para salvar sua existência como classe dominante.
J. V. Stalin 531

Wells: Mas não foram poucos os advogados à frente da Grande Revolução


Francesa.
Stalin: Você nega o papel da intelectualidade nos movimentos revolucioná-
rios? A Grande Revolução Francesa foi uma revolução de advogados e não uma
revolução popular, que alcançou a vitória levantando grandes massas do povo
contra o feudalismo e defendendo os interesses do Terceiro Estado? E os advo-
gados entre os líderes da Grande Revolução Francesa agiram de acordo com as
leis da velha ordem? Não introduziram novas leis revolucionárias burguesas?
A rica experiência da história ensina que até agora nem uma única aula abriu
voluntariamente lugar para outra. Não existe tal precedente na história mundial.
Os comunistas aprenderam essa lição da história. Os comunistas acolheriam com
agrado a saída voluntária da burguesia. Mas tal mudança é improvável; isso é o
que a experiência ensina. É por isso que os comunistas querem estar preparados
para o pior e apelam à classe trabalhadora para estar vigilante, para estar pre-
parada para a batalha. Quem quer um capitão que embala a vigilância de seu
exército, um capitão que não entende que o inimigo não se renderá, que deve
ser esmagado? Ser tal capitão significa enganar, trair a classe trabalhadora. É
por isso que eu acho que o que parece para você ser antiquado é na verdade uma
medida de conveniência revolucionária para a classe trabalhadora.
Wells: Não nego que seja necessário usar a força, mas acho que as formas de
luta devem se adequar o mais possível às oportunidades apresentadas pelas leis
existentes, que devem ser defendidas contra ataques reacionários. Não há neces-
sidade de desorganizar o antigo sistema porque ele já está se desorganizando o
suficiente do jeito que está. É por isso que me parece que a insurreição contra
a velha ordem, contra a lei, é obsoleta; antiquado. A propósito, eu exagero deli-
beradamente para trazer a verdade mais claramente. Posso formular meu ponto
de vista da seguinte maneira: primeiro, sou a favor da ordem; em segundo lu-
gar, ataco o sistema atual na medida em que ele não pode assegurar a ordem;
terceiro, acho que a propaganda da guerra de classes pode separar do socialismo
apenas aquelas pessoas instruídas de que o socialismo precisa.
Stalin: Para alcançar um grande objetivo, um objetivo social importante, deve
haver uma força principal, um baluarte, uma classe revolucionária. Em seguida,
é necessário organizar a assistência de uma força auxiliar para esta força prin-
cipal; neste caso, essa força auxiliar é o Partido, ao qual pertencem as melhores
forças da intelectualidade. Agora mesmo você falou sobre “pessoas educadas”.
Mas que pessoas instruídas você tem em mente? Não havia muitas pessoas ins-
truídas ao lado da velha ordem na Inglaterra no século XVII, na França no final
do século XVIII e na Rússia na época da Revolução de Outubro? A velha ordem
tinha a seu serviço muitas pessoas altamente educadas que defendiam a velha
ordem, que se opunham à nova ordem. A educação é uma arma cujo efeito é
determinado pelas mãos que a empunham, por quem será abatido. Claro, o pro-
letariado, o socialismo, precisa de pessoas altamente educadas. Obviamente, os
simplórios não podem ajudar o proletariado a lutar pelo socialismo, a construir
uma nova sociedade. Não subestimo o papel da intelligentsia; pelo contrário, eu
o enfatizo. A questão é, no entanto, que intelectualidade estamos discutindo?
Porque existem diferentes tipos de intelectuais.
532 Obras Escolhidas

Wells: Não pode haver revolução sem uma mudança radical no sistema edu-
cacional. Basta citar dois exemplos: O exemplo da República Alemã, que não
tocou o antigo sistema educacional e, portanto, nunca se tornou uma república;
e o exemplo do Partido Trabalhista britânico, que carece de determinação para
insistir em uma mudança radical no sistema educacional.
Stalin: Essa é uma observação correta.
Permitam-me agora responder aos seus três pontos.
Em primeiro lugar, o principal para a revolução é a existência de um baluarte
social. Este baluarte da revolução é a classe trabalhadora.
Em segundo lugar, é necessária uma força auxiliar, aquela que os comunis-
tas chamam de partido. Ao Partido pertencem os trabalhadores inteligentes e
os elementos da intelectualidade técnica que estão intimamente ligados à classe
trabalhadora. A intelectualidade só pode ser forte se se combinar com a classe
trabalhadora. Se se opõe à classe trabalhadora, torna-se uma cifra.
Terceiro, o poder político é necessário como uma alavanca para a mudança. O
novo poder político cria as novas leis, a nova ordem, que é a ordem revolucionária.
Eu não defendo nenhum tipo de ordem. Eu defendo uma ordem que corres-
ponda aos interesses da classe trabalhadora. Se, entretanto, qualquer uma das
leis da velha ordem puder ser utilizada no interesse da luta pela nova ordem, as
antigas leis devem ser utilizadas. Não posso objetar ao seu postulado de que o
sistema atual deve ser atacado na medida em que não garante a ordem necessária
para o povo.
E, finalmente, você se engana se pensa que os comunistas são apaixonados
pela violência. Eles ficariam muito satisfeitos em abandonar os métodos violen-
tos se a classe dominante concordasse em ceder à classe trabalhadora. Mas a
experiência da história fala contra tal suposição.
Wells: Houve um caso na história da Inglaterra, no entanto, de uma classe que
entregou voluntariamente o poder a outra classe. No período entre 1830 e 1870,
a aristocracia, cuja influência ainda era muito considerável no final do século
XVIII, voluntariamente, sem uma luta severa, cedeu o poder à burguesia, que
serve de apoio sentimental da monarquia. Posteriormente, essa transferência de
poder levou ao estabelecimento do domínio da oligarquia financeira.
Stalin: Mas você passou imperceptivelmente das questões da revolução às
questões da reforma. Isto não é a mesma coisa. Você não acha que o movi-
mento cartista desempenhou um grande papel nas reformas na Inglaterra no
século XIX?
Wells: Os cartistas fizeram pouco e desapareceram sem deixar vestígios.
Stalin: Não concordo com você. Os cartistas e o movimento grevista que or-
ganizaram desempenharam um grande papel; obrigaram a classe dominante a
fazer várias concessões em relação à franquia, em relação à abolição dos cha-
mados “bairros podres” e em relação a alguns pontos da “Carta”. O cartismo
desempenhou um papel histórico importante e obrigou uma parte das classes
dominantes a fazer certas concessões, reformas, a fim de evitar grandes choques.
De modo geral, deve-se dizer que de todas as classes dominantes, as classes do-
minantes da Inglaterra, tanto a aristocracia quanto a burguesia, mostraram-se as
J. V. Stalin 533

mais inteligentes, mais flexíveis do ponto de vista de seus interesses de classe,


do ponto de vista de manter seu poder. Tomemos como exemplo, digamos, da
história moderna, a greve geral na Inglaterra em 1926.
A primeira coisa que qualquer outra burguesia teria feito em face de tal
evento, quando o Conselho Geral dos Sindicatos convocasse uma greve, teria foi
prender os líderes sindicais. A burguesia britânica não fez isso e agiu habilmente
do ponto de vista de seus próprios interesses. Não consigo conceber uma estraté-
gia tão flexível sendo empregada pela burguesia nos Estados Unidos, Alemanha
ou França. Para manter seu domínio, as classes dominantes da Grã-Bretanha
nunca renunciaram a pequenas concessões, reformas. Mas seria um erro pensar
que essas reformas foram revolucionárias.
Wells: Você tem uma opinião mais elevada sobre as classes dominantes do meu
país do que eu. Mas existe uma grande diferença entre uma pequena revolução
e uma grande reforma? A reforma não é uma pequena revolução?
Stalin: Devido à pressão de baixo, à pressão das massas, a burguesia pode,
às vezes, conceder certas reformas parciais, embora permanecendo com base no
sistema socioeconômico existente. Agindo dessa forma, calcula que essas con-
cessões são necessárias para preservar seu domínio de classe. Essa é a essência
da reforma. Revolução, no entanto, significa a transferência de poder de uma
classe para outra. É por isso que é impossível descrever qualquer reforma como
revolução. É por isso que não podemos contar com a mudança dos sistemas so-
ciais como uma transição imperceptível de um sistema para outro por meio de
reformas, por parte da classe dominante fazendo concessões.
Wells: Estou muito grato a você por esta palestra, que significou muito para
mim. Ao me explicar as coisas, você provavelmente se lembrou de como deveria
explicar os fundamentos do socialismo nos círculos ilegais antes da revolução.
No momento, existem apenas duas pessoas cuja opinião, a cada palavra, milhões
estão ouvindo: você e Roosevelt. Outros podem pregar o quanto quiserem; o
que eles dizem nunca será impresso ou atendido. Ainda não posso avaliar o que
foi feito em seu país; Eu só cheguei ontem. Mas já vi os rostos felizes de homens
e mulheres saudáveis e sei que algo muito considerável está sendo feito aqui. O
contraste com 1920 é surpreendente.
Stalin: Muito mais poderia ter sido feito se nós, bolcheviques, tivéssemos sido
mais inteligentes.
Wells: Não, se os seres humanos fossem mais espertos. Seria bom inventar
um plano de cinco anos para a reconstrução do cérebro humano que obviamente
carece de muitas coisas necessárias para uma ordem social perfeita. (Riso.)
Stalin: Você não pretende ficar para o Congresso da União dos Escritores
Soviéticos?
Wells: Infelizmente, tenho vários compromissos a cumprir e posso ficar na
URSS apenas por uma semana. Vim ver você e estou muito satisfeito com nossa
conversa. Mas pretendo discutir com esses escritores soviéticos, pois posso en-
contrar a possibilidade de sua afiliação ao clube PEN. Esta é uma organização
internacional de escritores fundada por Galsworthy; após sua morte, tornei-me
presidente. A organização ainda é fraca, mas tem filiais em vários países e, o
que é mais importante, os discursos dos associados são amplamente divulgados
534 Obras Escolhidas

na imprensa. Insiste nessa expressão livre de opinião - até mesmo da opinião da


oposição. Espero discutir esse ponto com Gorky. Não sei se você já está prepa-
rado para tanta liberdade aqui.
Stalin: Nós, bolcheviques, chamamos isso de “autocrítica”. É amplamente
utilizado na URSS. Se houver algo que eu possa fazer para ajudá-lo, ficarei feliz
em fazê-lo.
Wells: (Agradece.)
Stalin: (Agradece a visita.)
J. V. Stalin 535

A morte de Kirov
01 de dezembro de 1934

Uma grande tristeza se abateu sobre o nosso Partido. Em 1º de dezembro, o


camarada Kirov foi vítima das mãos de um assassino, vieira enviada pelos inimi-
gos da classe.
A morte de Kirov é uma perda irreparável, não só para nós, seus amigos ínti-
mos e camaradas, mas também para todos aqueles que o conheceram em sua obra
revolucionária, e o conheceram como lutador, camarada e amigo. Um homem
que deu toda a sua vida brilhante pela causa da classe trabalhadora, pela causa
do comunismo, pela causa da libertação da humanidade, está morto, vítima do
inimigo.
O camarada Kirov foi um exemplo de bolchevismo, não reconhecendo medo
nem dificuldades na concretização do grande objetivo fixado pelo Partido. A sua
integridade, a sua vontade de ferro, as suas espantosas qualidades de orador, ins-
pirado na Revolução, combinavam-se nele com tanta cordialidade e tanta ternura
nas relações com os camaradas e amigos pessoais, com tanto calor e modéstia, to-
dos eles traços do verdadeiro leninista.
O camarada Kirov trabalhou em diferentes partes da URSS no período de
ilegalidade e após a Revolução de Outubro - em Tomsk e Astrakhan, em Vla-
dicaucase e Baku - e em todos os lugares ele manteve o alto padrão do Partido;
Ele conquistou para o Partido milhões de trabalhadores, devido ao seu trabalho
revolucionário, infatigável, enérgico e fecundo.
Durante os últimos nove anos, o camarada Kirov dirigiu a organização do
nosso Partido na cidade de Lenin e na região de Leningrado. Não há possibili-
dade, por meio de uma carta curta e triste, de fazer um balanço de suas atividades
entre os operários de Leningrado. Teria sido difícil encontrar em nosso Partido
um diretor que pudesse estar mais bem-sucedido em sintonia com a classe traba-
lhadora de Leningrado, que pudesse tão habilmente unir todos os membros do
Partido e toda a classe trabalhadora em torno do Partido. Ele criou em toda a
organização de Leningrado, esta mesma atmosfera de organização, de disciplina,
de amor e de devoção bolchevique à Revolução, que caracterizou o próprio ca-
marada Kirov.
Estavas perto de nós, camarada Kirov, como amigo de confiança, como ca-
marada querido, como fiel companheiro de armas. Lembraremos de você, caro
amigo, até o fim de nossa vida e de nossa luta e sentimos amargura por nossa
perda. Esteve sempre conosco nos anos difíceis da luta pela vitória do Socialismo
no nosso país, esteve sempre conosco nos anos de incerteza e dificuldades inter-
nas do nosso Partido, viveu conosco todas as dificuldades destes últimos anos ,
e perdemo-lo no momento em que o nosso país conseguiu grandes vitórias. Em
todas essas lutas, em todas as nossas conquistas, há muitas evidências de você, de
sua energia, de sua força e de seu ardente amor pela causa comunista.
536 Obras Escolhidas

Adeus, Sergei, nosso querido amigo e camarada.


J. Stalin, S. Ordjonikidze, V. Molotov, M. Kalinin, K. Voroshilov, L. Kagano-
vich, A. Mikoyan, A. Andreyev, V. Tchoubar, A. Idanov, V. Kuibyshev, Ia. Roud-
zoutak, S. Kossior, P. Postychev, G. Petrovsky, A. Ienoukidze, M. Chkiriatov,
Em. Iaroslavski, N. Ejov.
J. V. Stalin 537

Discurso à Comissão do 2º
Congresso Sindical de
Kolkhozianos
15 de fevereiro de 1935

Se você deseja consolidar o artel, se você deseja ter um movimento de Kolkho-


zianos em massa, que abrangerá milhões de famílias e não apenas unidades e
grupos ímpares, se você deseja atingir esse objetivo, é obrigado a levar em consi-
deração nas atuais condições, não apenas os interesses comuns do povo Kolkhozi-
ano, mas também seus interesses privados.
Você não leva em consideração os interesses privados dos Kolkhozianos quando
diz que não é necessário dar aos Kolkhozianos mais do que um décimo de hectare
como sua porção individual de terra. Algumas pessoas acham que não é neces-
sário que o Kolkhoziano tenha uma vaca, outras acham que não é necessário ter
uma porca capaz de procriar. E, em geral, você deseja sufocar o Kolkhoziano. Este
status quo não pode continuar. Isso está incorreto. Vocês são pessoas avançadas.
Eu entendo que você está muito preocupado com o sistema de Kolkhoziano e com
a economia de Kolkhoziano. Mas todos os Kolkhozianos são como você? Você é,
portanto, uma minoria nos Kolkhoz.
A maioria pensa de forma bastante diferente. É necessário levar isso em con-
sideração ou não? Acho que é preciso levar isso em consideração.
Se em seu artel, seus produtos ainda não estão em abundância e você não
pode dar à família Kolkhoziano isolada tudo o que ela precisa, então a Kolkhoz não
pode reivindicar a satisfação das necessidades sociais e privadas das pessoas. Seria
melhor admitir francamente que um aspecto do seu trabalho é social e o outro
é privado. Seria melhor admitir abertamente, abertamente e francamente que
na casa de Kolkhoziano, há uma exploração inevitavelmente menor, mas muito
definida do indivíduo. Não basta preocupar-se apenas com a exploração em
grande escala que é reconhecidamente grande, decisiva e importante e o manejo
dela é indispensável para que as necessidades sociais do povo sejam satisfeitas,
mas de igual importância com esta, se o privado. necessidades das pessoas devem
ser satisfeitas, é o manejo da pequena exploração individual. Se alguém tem
família, filhos, necessidades e gostos individuais, - com o seu método, essas coisas
não são levadas em consideração.
E você não tem o direito de não levar em consideração esses interesses atuais
dos Kolkhozianos. Sem isso, a consolidação do Kolkhoz não é possível.
É a combinação dos interesses privados dos Kolkhozianos com seus interesses
sociais que levará à consolidação. Aqui está a chave!
Pravda
13 de março de 1935
538 Obras Escolhidas

Discurso na 1ª Conferência
Sindical de Stakhanovitas
17 de novembro de 1935

I. A importância do movimento Stakhanov


Camaradas, tanto foi dito nesta conferência sobre os Stakhanovitas, e isso foi
dito tão bem, que na verdade muito pouco me resta a dizer. Mas, como fui
chamado para falar, terei de dizer algumas palavras.
O movimento Stakhanov não pode ser considerado um movimento comum
de homens e mulheres trabalhadoras.
O movimento Stakhanov é um movimento de trabalhadores e trabalhadoras
que ficará na história de nossa construção socialista como uma de suas páginas
mais gloriosas.
Onde está o significado do movimento Stakhanov?
Primeiramente, no fato de que é a expressão de uma nova onda de emulação
socialista, um novo e mais alto estágio de emulação socialista. Por que novo e por
que mais alto? Porque o movimento Stakhanov, como expressão da emulação
socialista, contrasta favoravelmente com o antigo estágio da emulação socialista.
No passado, há cerca de três anos, no período da primeira fase da emulação
socialista, a emulação socialista não estava necessariamente associada à técnica
moderna.
Naquela época, de fato, não tínhamos quase nenhuma técnica moderna. O
estágio atual da emulação socialista, o movimento Stakhanov, por outro lado,
está necessariamente associado à técnica moderna. O movimento Stakhanov se-
ria inconcebível sem uma técnica nova e superior. Temos diante de nós pessoas
como os camaradas Stakhanov, Busygin, Smetanin, Krivonoss, Pronin, os Vino-
gradovas e muitos outros, novas pessoas, homens e mulheres trabalhadores, que
dominaram completamente a técnica de seu trabalho, a dominaram e seguiram
em frente. Não existiam essas pessoas, ou quase nenhuma dessas pessoas, cerca
de três anos atrás. São pessoas novas, pessoas de um tipo especial.
Além disso, o movimento Stakhanov é um movimento de trabalhadores e tra-
balhadoras que se propõe a superar os padrões técnicos atuais, superar as capaci-
dades projetadas existentes, superar os planos e estimativas de produção existen-
tes. Superá-los – porque esses padrões já se tornaram antiquados para os nossos
dias, para o nosso novo povo.
Esse movimento está quebrando as velhas visões da técnica, está quebrando
os antigos padrões técnicos, as antigas capacidades projetadas e os velhos planos
de produção, e exige a criação de novos e mais elevados padrões técnicos, capa-
cidades projetadas e planos de produção. Ele está destinado a produzir uma re-
volução em nossa indústria. É por isso que o movimento Stakhanov é, no fundo,
um movimento profundamente revolucionário.
J. V. Stalin 539

Já foi dito aqui que o movimento Stakhanov, como uma expressão de novos
e mais elevados padrões técnicos, é um modelo daquela alta produtividade do
trabalho que só o socialismo pode dar, e que o capitalismo não pode dar. Isso
é absolutamente verdade. Por que foi que o capitalismo esmagou e derrotou o
feudalismo?
Por criar padrões mais elevados de produtividade do trabalho, permitiu que
a sociedade obtivesse uma quantidade incomparavelmente maior de produtos
do que poderia ser adquirida no sistema feudal; porque tornou a sociedade mais
rica. Por que o socialismo pode, deve e certamente derrotará o sistema capitalista
de economia? Porque pode fornecer modelos de trabalho mais elevados, uma
produtividade de trabalho mais elevada do que o sistema de economia capitalista;
porque pode fornecer à sociedade mais produtos e pode torná-la mais rica do que
o sistema de economia capitalista.
Algumas pessoas pensam que o socialismo pode ser consolidado por uma
certa equalização das condições materiais das pessoas, a partir do padrão de vida
dos pobres.
Isso não é verdade. Essa é uma concepção pequeno-burguesa do socialismo.
Na verdade, o socialismo só pode ter sucesso com base em uma alta produtivi-
dade do trabalho, maior do que sob o capitalismo, com base na abundância de
produtos e artigos de consumo de todos os tipos, com base em uma vida prós-
pera e culta para todos os membros da sociedade. Mas se o socialismo pretende
atingir este objetivo e tornar nossa sociedade soviética a mais próspera de todas
as sociedades, nosso país deve ter uma produtividade do trabalho que supere a
dos principais países capitalistas. Sem isso, não podemos nem mesmo pensar em
garantir uma abundância de produtos e artigos de consumo de todos os tipos. O
significado do movimento Stakhanov reside no fato de que é um movimento que
está quebrando os antigos padrões técnicos, porque eles são inadequados, que
em vários casos está ultrapassando a produtividade do trabalho dos principais
países capitalistas, e assim criando a possibilidade prática de consolidar ainda
mais o socialismo em nosso país, a possibilidade de converter nosso país no mais
próspero de todos os países.
Mas a importância do movimento Stakhanov não termina aí. O seu signifi-
cado reside também no fato de preparar as condições para a passagem do socia-
lismo ao comunismo.
O princípio do socialismo é que em uma sociedade socialista cada um trabalha
de acordo com suas habilidades e recebe artigos de consumo, não de acordo com
suas necessidades, mas de acordo com o trabalho que realiza para a sociedade.
Isso significa que o nível cultural e técnico da classe trabalhadora ainda não é alto,
que a distinção entre trabalho mental e manual ainda existe, que a produtividade
do trabalho ainda não é alta o suficiente para garantir uma abundância de artigos
de consumo, e, como resultado, a sociedade é obrigada a distribuir artigos de
consumo não de acordo com as necessidades de seus membros, mas de acordo
com o trabalho que eles realizam para a sociedade.
O comunismo representa um estágio superior de desenvolvimento.
O princípio do comunismo é que em uma sociedade comunista cada um traba-
lha de acordo com suas habilidades e recebe artigos de consumo, não de acordo
540 Obras Escolhidas

com o trabalho que realiza, mas de acordo com suas necessidades como indiví-
duo culturalmente desenvolvido. Isso significa que o nível cultural e técnico da
classe trabalhadora se tornou alto o suficiente para minar a base da distinção
entre trabalho mental e trabalho manual, que a distinção entre trabalho mental
e trabalho manual já desapareceu e que a produtividade do trabalho atingiu um
nível tão alto que pode fornecer uma abundância absoluta de artigos de consumo
e, como resultado, a sociedade é capaz de distribuir esses artigos de acordo com
as necessidades de seus membros.
Algumas pessoas pensam que a eliminação da distinção entre trabalho mental
e trabalho manual pode ser alcançada por meio de uma certa equalização cultural
e técnica dos trabalhadores mentais e manuais, baixando o nível cultural e técnico
dos engenheiros e técnicos, dos trabalhadores mentais, para o nível médio de
trabalhadores qualificados. Isso é absolutamente incorreto. Só os fanfarrões
pequeno-burgueses podem conceber o comunismo dessa maneira. Na realidade,
a eliminação da distinção entre trabalho mental e trabalho manual só pode ser
conseguida elevando o nível cultural e técnico da classe trabalhadora ao nível
de engenheiros e trabalhadores técnicos. Seria um absurdo pensar que isso é
inviável. É totalmente viável sob o sistema soviético, onde as forças produtivas do
país foram libertadas dos grilhões do capitalismo, onde o trabalho foi libertado
do jugo da exploração, onde a classe trabalhadora está no poder e onde a geração
mais jovem de a classe trabalhadora tem todas as oportunidades de obter uma
educação técnica adequada. Não há razão para duvidar que somente tal elevação
no nível cultural e técnico da classe trabalhadora pode minar a base da distinção
entre trabalho mental e trabalho manual, que somente isto pode assegurar o alto
nível de produtividade do trabalho e a abundância. de artigos de consumo que
são necessários para iniciar a transição do socialismo para o comunismo.
Nesse sentido, o movimento Stakhanov é significativo pelo fato de conter os
primeiros inícios – ainda débeis, é verdade, mas, no entanto, os inícios – de tal
ascensão do nível cultural e técnico da classe trabalhadora de nosso país.
E, de fato, olhe para nossos camaradas, os Stakhanovitas, mais de perto. Que
tipo de pessoas são?
São na sua maioria trabalhadores e trabalhadoras jovens e de meia-idade, pes-
soas com cultura e conhecimentos técnicos, que dão exemplos de precisão e rigor
no trabalho, que são capazes de valorizar o fator tempo no trabalho e que apren-
deram a contar não só o minutos, mas também os segundos. A maioria deles
fez os cursos técnicos mínimos e está continuando a formação técnica. Eles es-
tão livres do conservadorismo e da estagnação de certos engenheiros, técnicos
e executivos de negócios; eles estão marchando corajosamente para frente, que-
brando os padrões técnicos antiquados e criando padrões novos e mais elevados;
estão introduzindo alterações nas capacidades projetadas e nos planos econômi-
cos elaborados pelos líderes de nossa indústria; muitas vezes complementam e
corrigem o que os engenheiros e técnicos têm a dizer, muitas vezes os ensinam e
impulsionam, pois são pessoas que dominaram completamente a técnica de seu
trabalho e são capazes de extrair da técnica o máximo que podem ser espremido
para fora dele. Hoje os stakhanovitas ainda são poucos, mas quem pode duvidar
que amanhã haverá dez vezes mais deles? Não está claro que os Stakhanovitas são
J. V. Stalin 541

inovadores em nossa indústria, que o movimento Stakhanov representa o futuro


de nossa indústria, que contém a semente do futuro aumento da cultura e do
nível técnico da classe trabalhadora, que nos abre a caminho pelo qual somente
podem ser alcançados aqueles altos índices de produtividade do trabalho que são
essenciais para a transição do socialismo para o comunismo e para a eliminação
da distinção entre trabalho mental e trabalho manual.
Tal é, camaradas, a importância do movimento Stakhanov para a nossa cons-
trução socialista.
Stakhanov e Busygin pensaram na grande importância do movimento Stakha-
nov quando começaram a quebrar os antigos padrões técnicos? Claro que não.
Eles tinham suas próprias preocupações - eles estavam tentando tirar sua empresa
das dificuldades e cumprir o plano econômico em excesso. Mas, ao buscar atingir
esse objetivo, eles tiveram que quebrar os velhos padrões técnicos e desenvolver
uma alta produtividade do trabalho, superando a dos principais países capita-
listas. Seria ridículo, entretanto, pensar que essa circunstância pode de alguma
forma diminuir o grande significado histórico do movimento dos stakhanovitas.
O mesmo pode ser dito dos trabalhadores que primeiro organizaram os So-
vietes de Deputados Operários em nosso país em 1905. Eles nunca pensaram,
é claro, que os Sovietes de Deputados Operários se tornariam a base do sistema
socialista. Eles estavam apenas se defendendo contra o tsarismo, contra a burgue-
sia, quando criaram os Sovietes de deputados operários. Mas esta circunstância
de forma alguma contradiz o fato inquestionável de que o movimento pelos Sovi-
etes de deputados operários iniciado em 1905 pelos trabalhadores de Leningrado
e Moscou, conduziu, no final, à derrota do capitalismo e à vitória do socialismo
em um sexto do globo.

II. As raízes do movimento Stakhanov

Agora estamos no berço do movimento Stakhanov, em sua origem.


Certos traços característicos do movimento Stakhanov devem ser observados.
O que mais chama a atenção é o fato de que esse movimento começou de al-
guma forma, por si mesmo, quase que espontaneamente, de baixo, sem qualquer
pressão dos administradores de nossas empresas.
Mais do que isso - esse movimento de certa forma, surgiu e começou a se de-
senvolver a despeito dos administradores de nossos empreendimentos, mesmo
em oposição a eles. O camarada Molotov já lhes disse quais os problemas que
o camarada Mussinsky, o operário da serraria Archangelsk, teve que enfrentar
quando elaborou novos e mais elevados padrões técnicos, em segredo da admi-
nistração, em segredo dos inspetores.
A sorte do próprio Stakhanov não era melhor, pois em seu progresso ele teve
que se defender não apenas contra certos funcionários da administração, mas
também contra certos trabalhadores que o perseguiam por causa de suas “ideias
inovadoras”. Quanto a Busygin, sabemos que quase pagou por suas “ideias ino-
vadoras” perdendo o emprego na fábrica, e foi apenas a intervenção do superin-
tendente da loja, o camarada Sokolinsky, que o ajudou a permanecer na fábrica.
542 Obras Escolhidas

Portanto, se houve algum tipo de ação por parte dos administradores de nos-
sas empresas, não foi para ajudar o movimento Stakhanov, mas para impedi-lo.
Consequentemente, o movimento Stakhanov surgiu e se desenvolveu como um
movimento vindo de baixo.
E só porque surgiu por si mesmo, só porque vem de baixo, é o movimento
mais vital e irresistível da atualidade.
Além disso, deve ser feita menção a outro aspecto característico do movimento
Stakhanov. Essa característica é que o movimento Stakhanov se espalhou por toda
a nossa União Soviética não gradualmente, mas a uma velocidade sem paralelo,
como um furacão.
Como isso começou? Stakhanov elevou o padrão técnico de produção de car-
vão cinco ou seis vezes, se não mais. Busygin e Smetanin fizeram o mesmo –
um na esfera da construção de máquinas e o outro na indústria de calçados. Os
jornais noticiaram esses fatos. E de repente, as chamas do movimento Stakhanov
envolveram todo o país. Qual foi a razão? Como é que o movimento Stakhanov se
espalhou tão rapidamente? Será porque Stakhanov e Busygin são grandes orga-
nizadores, com amplos contatos nas regiões e distritos da URSS, e eles próprios
organizaram esse movimento? Não, claro que não! É talvez porque Stakhanov
e Busygin têm ambições de se tornarem grandes figuras em nosso país, e eles
próprios carregaram as centelhas do movimento Stakhanov por todo o país? Isso
também não é verdade. Vocês viram Stakhanov e Busygin aqui.
Eles falaram nesta conferência. São pessoas simples, modestas, sem a menor
ambição de conquistar os louros das figuras nacionais. Até me parece que estão
um tanto constrangidos com a abrangência que o movimento adquiriu, além de
todas as suas expectativas.
E se, apesar disso, o fósforo lançado por Stakhanov e Busygin foi suficiente
para iniciar uma conflagração, isso significa que o movimento Stakhanov está
absolutamente maduro. Apenas um movimento que está absolutamente maduro
e está esperando apenas um solavanco para se libertar – apenas tal movimento
pode se espalhar com tal rapidez e crescer como uma bola de neve rolando.
Como se pode explicar que o movimento Stakhanov provou estar absoluta-
mente maduro? Quais são as causas de sua rápida disseminação? Quais são as
raízes do movimento Stakhanov?
Existem pelo menos quatro dessas causas.
1. A base para o movimento Stakhanov foi antes de mais nada a melhoria
radical no bem-estar material dos trabalhadores. A vida melhorou, camaradas.
A vida se tornou mais alegre. E quando a vida é alegre, o trabalho vai bem. Daí
as altas taxas de produção. Daí os heróis e heroínas do trabalho.
Essa é, principalmente, a raiz do movimento Stakhanov.
Se houvesse crise em nosso país, se houvesse desemprego - esse flagelo da
classe trabalhadora - se as pessoas em nosso país vivessem mal, tristemente, sem
alegria, não teríamos nada como o movimento Stakhanov. (Aplausos.) Nossa re-
volução proletária é a única revolução no mundo que teve a oportunidade de
mostrar ao povo não só resultados políticos, mas também resultados materiais.
De todas as revoluções operárias, conhecemos apenas uma que conseguiu che-
J. V. Stalin 543

gar ao poder. Essa foi a Comuna de Paris. Mas não durou muito. É verdade
que se esforçou para quebrar os grilhões do capitalismo; mas não teve tempo de
esmagá-los e menos ainda de mostrar ao povo os resultados materiais benéficos
da revolução. Nossa revolução é a única que não só quebrou os grilhões do ca-
pitalismo e trouxe liberdade ao povo, mas também conseguiu criar as condições
materiais de uma vida próspera para o povo. É aí que reside a força e invencibi-
lidade da nossa revolução.
É uma coisa boa, naturalmente, expulsar os capitalistas, expulsar os latifun-
diários, expulsar os capangas tsaristas, tomar o poder e alcançar a liberdade.
Isso é muito bom. Mas, infelizmente, a liberdade por si só não é suficiente, de
longe. Se houver falta de pão, falta de manteiga e gorduras, falta de têxteis e se as
condições de moradia forem ruins, a liberdade não o levará muito longe. É muito
difícil, camaradas, viver só de liberdade. (Gritos de aprovação. Aplausos.) Para viver
bem e com alegria, os benefícios da liberdade política devem ser complementados
por benefícios materiais. É uma característica distintiva de nossa revolução que
ela trouxe ao povo não apenas liberdade, mas também benefícios materiais e a
possibilidade de uma vida próspera e culta. É por isso que a vida se tornou alegre
em nosso país, e é aí que surgiu o movimento Stakhanov.
2. A segunda fonte do movimento Stakhanov é o fato de não haver exploração
em nosso país. As pessoas em nosso país não trabalham para exploradores, para o
enriquecimento dos parasitas, mas para si mesmas, para sua própria classe, para
sua própria sociedade soviética, onde o poder é exercido pelos melhores mem-
bros da classe trabalhadora. É por isso que o trabalho em nosso país tem impor-
tância social e é uma questão de honra e glória. Sob o capitalismo, o trabalho
tem um caráter privado e pessoal. Vocês produziram mais – bem, então, recebam
mais e vivam o melhor que puderem. Ninguém os conhece ou quer os conhe-
cer. Vocês trabalham para os capitalistas, vocês os enriquecem? Bem, o que você
esperava? Por isso te contrataram, para que enriquecessem os exploradores. Se
vocês não concordam com isso, juntem-se às fileiras dos desempregados e deem
o melhor que puderem – “encontraremos outros que sejam mais tratáveis”. É por
isso que o trabalho das pessoas não é muito valorizado no capitalismo. Sob tais
condições, é claro, não pode haver espaço para um movimento Stakhanov. Mas as
coisas são diferentes no sistema soviético. Aqui, o trabalhador é estimado. Aqui,
ele trabalha, não para os exploradores, mas para si mesmo, para sua classe, para
a sociedade.
Aqui, o trabalhador não pode se sentir abandonado e sozinho.
Pelo contrário, o homem que trabalha, sente-se um cidadão livre de seu país,
uma figura pública de certa forma. E se ele trabalha bem e dá o seu melhor à
sociedade - ele é um herói do trabalho e está coberto de glória. Obviamente, o
movimento Stakhanov só poderia ter surgido sob tais condições.
3. Devemos considerar, como a terceira fonte do movimento Stakhanov, o
fato de termos uma técnica moderna. O movimento Stakhanov está ligado orga-
nicamente à técnica moderna. Sem a técnica moderna, sem os modernos moi-
nhos e fábricas, sem a maquinaria moderna, o movimento Stakhanov não pode-
ria ter surgido. Sem a técnica moderna, os padrões técnicos poderiam ter sido
duplicados ou triplicados, mas não mais. E se os stakhanovitas elevaram os pa-
544 Obras Escolhidas

drões técnicos cinco ou seis vezes, isso significa que eles confiam inteiramente
na técnica moderna. Segue-se, portanto, que a industrialização do nosso país, a
reconstrução das nossas fábricas e fábricas, a introdução da técnica moderna e
da maquinaria moderna, foi uma das causas que deram origem ao movimento
Stakhanov.
4. Mas a técnica moderna sozinha não o levará muito longe. Você pode ter
uma técnica de primeira classe, moinhos e fábricas de primeira classe, mas se
você não tiver as pessoas capazes de controlar essa técnica, descobrirá que sua
técnica é apenas técnica nua. Para que a técnica moderna produza resultados,
são necessárias pessoas, quadros de homens e mulheres trabalhadoras, capazes
de assumir o comando da técnica e promovê-la. O nascimento e o crescimento
do movimento Stakhanov significam que tais quadros já apareceram entre os tra-
balhadores. do nosso país. Há cerca de dois anos, o Partido declarou que, na
construção de novos moinhos e fábricas e no fornecimento de maquinários mo-
dernos às nossas empresas, havíamos realizado apenas metade do trabalho. O
Partido declarou então que o entusiasmo pela construção de novas fábricas deve
ser complementado pelo entusiasmo por dominar essas novas fábricas, que só as-
sim o trabalho poderia ser concluído. É claro que o domínio desta nova técnica
e o crescimento de novos quadros têm prosseguido nestes dois anos. Agora está
claro que já temos esses quadros. É óbvio que sem esses quadros, sem essas novas
pessoas, nunca teríamos um movimento Stakhanov. Consequentemente, as no-
vas pessoas, homens e mulheres trabalhadores, que dominaram a nova técnica,
constituem a força que moldou e avançou o movimento Stakhanov.
Essas são as condições que deram origem e avançaram o movimento Stakha-
nov.

III. Novas pessoas – novos padrões técnicos

Eu disse que o movimento Stakhanov não se desenvolveu gradualmente, mas


como uma explosão, como se tivesse rompido algum tipo de barragem. É óbvio
que teve que superar certas barreiras. Alguém o estava impedindo, alguém o es-
tava impedindo; e então, tendo reunido forças, o movimento Stakhanov rompeu
essas barreiras e varreu o país.
O que estava errado? Quem exatamente estava atrapalhando?
Eram os antigos padrões técnicos e as pessoas por trás desses padrões que o
impediam. Vários anos atrás, nossos engenheiros, operários técnicos e geren-
tes de negócios elaboraram certas normas técnicas, adaptadas ao atraso técnico
de nossos trabalhadores e trabalhadoras. Vários anos se passaram desde então.
Nesse período, as pessoas cresceram e adquiriram conhecimentos técnicos. Mas
os padrões técnicos permaneceram inalterados. Claro, esses padrões agora se
mostraram desatualizados para nosso novo pessoal. Todo mundo agora abusa
dos padrões técnicos existentes. Mas, afinal, eles não caíram dos céus. E a ques-
tão não é que esses padrões técnicos tenham sido definidos muito baixo na época
em que foram elaborados. A questão é, principalmente, que agora, quando es-
ses padrões já se tornaram antiquados, são feitas tentativas de defendê-los como
padrões modernos.
J. V. Stalin 545

As pessoas se apegam ao atraso técnico de nossos operários, orientando-se por


esse atraso, baseando-se nesse atraso, e as coisas finalmente chegam ao ponto,
quando as pessoas começam a fingir atraso. Mas o que fazer se esse atraso está se
tornando coisa do passado? Vamos mesmo adorar nosso atraso e transformá-lo
em um ícone, um fetiche? O que fazer se os trabalhadores já conseguiram crescer
e adquirir conhecimentos técnicos?
O que fazer se as antigas normas técnicas já não correspondem à realidade
e os nossos trabalhadores e trabalhadoras já conseguiram na prática ultrapassá-
las cinco ou dez vezes? Já fizemos um juramento de lealdade ao nosso atraso?
Parece-me que não, não é, camaradas? (Risos.)
Alguma vez presumimos que nossos homens e mulheres trabalhadores per-
maneceriam atrasados para sempre? Nós nunca fizemos, não é? (Risos.) Então
qual é o problema?
Será que realmente nos faltará a coragem de esmagar o conservadorismo de
alguns de nossos engenheiros e técnicos, de destruir as velhas tradições e padrões
e dar liberdade de ação às novas forças da classe trabalhadora?
As pessoas falam sobre ciência. Eles dizem que os dados da ciência, os dados
contidos em manuais e instruções técnicas, contradizem as demandas dos stakha-
novistas por novos e mais elevados padrões técnicos. Mas de que tipo de ciência
eles estão falando? Os dados da ciência sempre foram testados pela prática, pela
experiência. Ciência que cortou o contato com a prática, com a experiência -
que espécie de ciência é essa? Se a ciência fosse o que é representado por alguns
de nossos camaradas conservadores, ela teria perecido para a humanidade há
muito tempo. A ciência é chamada de ciência só porque não reconhece fetiches,
só porque não teme erguer a mão contra o obsoleto e antiquado, e porque dá
ouvidos atentos à voz da experiência, da prática. Se fosse de outra forma, não
teríamos ciência alguma; não teríamos astronomia, digamos, e ainda teríamos
de conviver com o sistema obsoleto de Ptolomeu; não teríamos biologia e ainda
estaríamos nos confortando com a lenda da criação do homem; não teríamos
química e ainda teríamos de conviver com os augúrios dos alquimistas.
É por isso que acho que nossos engenheiros, trabalhadores técnicos e geren-
tes de negócios, que já conseguiram ficar muito atrás do movimento Stakhanov,
fariam bem se parassem de se apegar aos antigos padrões técnicos e reajustassem
seu trabalho em um maneira científica real para a nova maneira, a maneira de
Stakhanov.
Muito bem, dirão, mas e as normas técnicas em geral? A indústria precisa
deles ou podemos continuar sem nenhum padrão?
Alguns dizem que não precisamos mais de padrões técnicos. Isso não é ver-
dade, camaradas. Mais, é estúpido. Sem padrões técnicos, a economia planejada
é impossível. Além disso, as normas técnicas são necessárias para ajudar as massas
que ficaram para trás a alcançar as mais avançadas. Os padrões técnicos são uma
grande força reguladora que organiza as massas dos trabalhadores nas fábricas
em torno dos elementos avançados da classe trabalhadora. Portanto, precisamos
de padrões técnicos; não aqueles, entretanto, que agora existem, mas os superio-
res.
Outros dizem que precisamos de padrões técnicos, mas que eles devem ser
546 Obras Escolhidas

imediatamente elevados ao nível das realizações de pessoas como Stakhanov,


Busygin, os Vinogradovas e outros. Isso também não é verdade. Tais padrões
seriam irreais no momento atual, uma vez que homens e mulheres trabalhado-
ras com menos conhecimento técnico do que Stakhanov e Busygin não poderiam
cumprir esses padrões. Precisamos de padrões técnicos em algum lugar entre
os padrões técnicos atuais e aqueles alcançados por pessoas como Stakhanov e
Busygin. Tomemos, por exemplo, Maria Demchenko, o conhecido “quinhentos”
em beterraba sacarina. Ela alcançou uma colheita de mais de 500 centners de
beterraba sacarina por hectare. Essa conquista pode se tornar o rendimento pa-
drão para toda a produção de beterraba sacarina, digamos, na Ucrânia? Não, eu
não posso. É muito cedo para falar nisso. Maria Demchenko garantiu mais de
500 centners de um hectare, enquanto a colheita média de beterraba sacarina este
ano na Ucrânia, por exemplo, é de 130 ou 132 centners por hectare. A diferença,
como vocês veem, não é pequena. Podemos definir o padrão de rendimento da
beterraba sacarina em 400 ou 300 centners? Todo especialista nesta área diz que
isso ainda não pode ser feito. Evidentemente, o rendimento padrão por hectare
para a Ucrânia em 1936 deve ser fixado em 200 ou 250 centners. E esse não é um
padrão baixo, pois, se fosse cumprido, poderia nos dar o dobro de açúcar que
obtínhamos em 1935. O mesmo deve ser dito da indústria. Stakhanov excedeu
o padrão existente de produção dez vezes, ou até mais, acredito.
Declarar essa conquista, o novo padrão técnico para todos os operadores de
perfuratrizes pneumáticas seria imprudente. Obviamente, um padrão deve ser
estabelecido em algum lugar entre o padrão técnico existente e aquele alcançado
pelo camarada Stakhanov.
De qualquer modo, uma coisa é clara: os padrões técnicos atuais não cor-
respondem mais à realidade; ficaram para trás e tornaram-se um freio à nossa
indústria; e para que não haja freios em nossa indústria, eles devem ser substi-
tuídos por novos e mais elevados padrões técnicos. Novas pessoas, novos tempos
- novos padrões técnicos.

IV. Tarefas imediatas

Quais são nossas tarefas imediatas do ponto de vista dos interesses do mo-
vimento Stakhanov? Para não ser difuso, reduzamos o assunto a duas tarefas
imediatas.
Primeiro. A tarefa é ajudar os stakhanovitas a desenvolver ainda mais o mo-
vimento Stakhanov e a divulgá-lo em todas as direções, por todas as regiões e
distritos da URSS. Isso, por um lado.
E, por outro lado, a tarefa é coibir todos aqueles elementos entre os gerentes
de negócios, engenheiros e operários técnicos que se apegam obstinadamente ao
antigo, não querem avançar e atrapalham sistematicamente o desenvolvimento
do movimento Stakhanov.
Os stakhanovitas sozinhos, é claro, não podem espalhar o movimento Stakha-
nov em toda a sua extensão por toda a face de nosso país. As organizações do
nosso partido devem intervir neste assunto e ajudar os stakhanovitas a consumar
o movimento. A este respeito, a organização regional de Donetz mostrou, sem
J. V. Stalin 547

dúvida, uma grande iniciativa. Bom trabalho está sendo feito nesse sentido pelas
organizações regionais de Moscou e Leningrado. Mas e as outras regiões? Eles,
aparentemente, ainda estão “começando”.
Por exemplo, não ouvimos nada, ou muito pouco, dos Urais, embora, como
vocês sabem, os Urais sejam um vasto centro industrial. O mesmo deve ser dito da
Sibéria Ocidental e dos kuzbas, onde, ao que parece, eles ainda não conseguiram
“começar”. No entanto, não precisamos ter dúvidas de que as organizações do
nosso Partido irão intervir neste assunto e ajudar os stakhanovitas a superar suas
dificuldades.
Quanto ao outro aspecto da questão - a contenção dos conservadores obsti-
nados entre os empresários, engenheiros e operários técnicos - as coisas serão
um pouco mais complicadas. Teremos, em primeiro lugar, que persuadir esses
elementos conservadores da indústria, persuadi-los de maneira paciente e cama-
rada, da natureza progressista do movimento Stakhanov e da necessidade de se
reajustar ao estilo Stakhanov. E se a persuasão não ajudar, medidas mais vigoro-
sas terão que ser adotadas. Veja, por exemplo, o Comissariado do Povo das Fer-
rovias. No aparato central daquele Comissariado, havia, até recentemente, um
grupo de professores, engenheiros e outros especialistas - entre eles comunistas
- que garantiam a todos que uma velocidade comercial de 13 ou 14 quilômetros
por hora era um limite que não podia ser ultrapassado sem contradizer “a ci-
ência da operação ferroviária.” Tratava-se de um grupo de bastante autoridade,
que pregava seus pontos de vista de forma verbal e impressa, dava instruções
aos diversos departamentos do Comissariado do Povo das Ferrovias e, em geral,
eram os “ditadores de opinião” nos departamentos de trânsito. Nós, que não
somos especialistas nesta área, baseando-nos nas sugestões de vários operários
da ferrovia, de nossa parte asseguramos a esses professores de autoridade que
13 ou 14 quilômetros não poderiam ser o limite, e que se as coisas fossem or-
ganizadas em de certa forma, esse limite poderia ser estendido. Em resposta,
este grupo, em vez de dar ouvidos à voz da experiência e da prática, e rever sua
atitude sobre o assunto, lançou-se a uma luta contra os elementos progressistas
nas ferrovias e ainda intensificou a propaganda de suas visões conservadoras. É
claro que tivemos que dar um leve tapinha no queixo desses indivíduos estimados
e, muito educadamente, removê-los do aparato central do Comissariado do Povo
das Ferrovias. (Aplausos)
E qual é o resultado? Agora temos uma velocidade comercial de 18 e 19
quilômetros por hora. (Aplausos.)
Parece-me, camaradas, que, na pior das hipóteses, teremos de recorrer a este
método também em outros ramos da nossa economia nacional – isto é, claro, se
os conservadores teimosos não deixarem de interferir e de colocar raios nas rodas
do movimento Stakhanov.
Segundo. No caso daqueles empresários, engenheiros e técnicos que não que-
rem atrapalhar o movimento Stakhanov, que simpatizam com este movimento,
mas ainda não conseguiram se reajustar e assumir a liderança do movimento
Stakhanov, a tarefa é ajudar eles se reajustam e assumem a liderança do movi-
mento Stakhanov.
Devo dizer, camaradas, que temos alguns desses executivos, engenheiros e
548 Obras Escolhidas

técnicos.
E se ajudarmos esses camaradas, haverá, sem dúvida, ainda mais deles.
Acho que, se cumprirmos essas tarefas, o movimento Stakhanov se desenvol-
verá em todo o seu alcance, abrangerá todas as regiões e distritos de nosso país e
nos mostrará milagres de novas conquistas.

V. Mais algumas palavras


Algumas palavras sobre a presente conferência, sobre seu significado. Lenin
nos ensinou que somente esses líderes podem ser verdadeiros líderes bolchevi-
ques, pois sabem não apenas como ensinar os trabalhadores e camponeses, mas
também como aprender com eles. Certos bolcheviques não gostaram dessas pala-
vras de Lenin. Mas a história mostra que Lenin estava 100% certo também neste
campo. E, de fato, milhões de trabalhadores, operários e camponeses, trabalham,
vivem e lutam.
Quem pode duvidar que essas pessoas não vivem em vão, que, vivendo e lu-
tando, essas pessoas acumulam vasta experiência prática? Pode-se duvidar que
os líderes que desprezam essa experiência não podem ser considerados líderes
reais? Por isso, nós, dirigentes do Partido e do governo, devemos não só ensinar
os trabalhadores, mas também aprender com eles. Não devo negar que vocês,
membros da presente conferência, aprenderam algo aqui nesta conferência com
os líderes de nosso governo. Mas também não se pode negar que nós, os líderes
do governo, aprendemos muito com vocês, os stakhanovitas, os membros desta
conferência. Bem, camaradas, obrigado pela lição, muito obrigado! (Vibrantes
aplausos.)
Por fim, duas palavras sobre como seria adequado assinalar esta conferência.
Nós aqui no presidium conferenciamos e decidimos que esta conferência entre os
líderes do governo e os líderes do movimento Stakhanov deve ser marcada de
alguma forma. Bem, chegamos à decisão de que cento ou cento e vinte de vocês
terão que ser recomendados para a mais alta distinção.
Vozes: Certo. (Vivos aplausos.)
Stalin: Se vocês aprovarem, camaradas, é o que faremos.
(A conferência dá uma ovação tempestuosa ao camarada Stalin. Vivas e aplausos es-
trondosos. Saudações são gritadas ao camarada Stalin, o líder do Partido, de todas as
partes do salão. Os três mil membros da conferência cantam o hino proletário, a “Interna-
tionale”.)
Pravda
22 de novembro de 1935
J. V. Stalin 549

Sobre o projeto de Constituição da


URSS
Relatório entregue no Oitavo Congresso Extraordinário dos Sovietes da URSS

25 de novembro de 1936

Formação da Comissão Constitucional e suas


tarefas
Camaradas, a Comissão de Constituição, cujo projeto foi submetido à con-
sideração do presente Congresso, foi formada, como vocês sabem, por decisão
especial do Sétimo Congresso dos Sovietes da URSS. Esta decisão foi adotada em
6 de fevereiro de 1935. Diz:
“1. Para alterar a Constituição das Repúblicas Socialistas Soviéticas da União no sentido de:

a) democratizar ainda mais o sistema eleitoral, substituindo o sufrágio não totalmente igual
por sufrágio igual, as eleições indiretas por eleições diretas e o voto aberto por voto secreto;

b) dar uma definição mais precisa da base social e econômica da Constituição, colocando a
Constituição em conformidade com a atual relação de forças de classe na URSS (a criação
de uma nova indústria socialista, a demolição da classe kulak, a vitória do sistema de fazendas
coletivas, a consolidação da propriedade socialista como base da sociedade soviética, e assim por diante).

2. Incumbir o Comitê Executivo Central da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas de


eleger uma Comissão de Constituição, que será instruída a redigir um texto emendado da
Constituição de acordo com os princípios indicados na Cláusula 1, e submetê-la à aprovação
a uma Sessão do Comitê Executivo Central da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas.

3. Conduzir as próximas eleições ordinárias dos órgãos do governo soviético na União das
Repúblicas Socialistas Soviéticas com base no novo sistema eleitoral.”

Isso foi em 6 de fevereiro de 1935. No dia seguinte à adoção dessa decisão, isto
é, 7 de fevereiro de 1935, a Primeira Sessão do Comitê Executivo Central da URSS
se reuniu, e em cumprimento à decisão do Sétimo Congresso dos Sovietes da
URSS, estabeleceu uma Comissão de Constituição composta por 31 pessoas. Ele
instruiu a Comissão de Constituição a preparar um projeto de uma Constituição
emendada da URSS.
Esses eram os fundamentos e instruções formais do órgão supremo da URSS
com base nos quais o trabalho da Comissão de Constituição deveria prosseguir.
Assim, a Comissão de Constituição deveria introduzir modificações na Cons-
tituição ora em vigor, que foi adotada em 1924, levando em consideração as mu-
danças de rumo do socialismo que se produziram na vida da URSS no período
de 1924 até hoje.
550 Obras Escolhidas

II

Mudanças na vida na URSS no período de 1924 a 1936

Quais são as mudanças na vida da URSS que ocorreram no período de 1924 a


1936 e que a Comissão de Constituição deveria refletir em seu Projeto de Cons-
tituição?
Qual é a essência dessas mudanças?
Qual era a situação em 1924?
Esse foi o primeiro período da Nova Política Econômica, quando o governo
soviético permitiu um certo renascimento do capitalismo enquanto tomava todas
as medidas para desenvolver o socialismo; quando calculava em assegurar, no
curso da competição entre os dois sistemas de economia – o sistema capitalista
e o sistema socialista - a preponderância do sistema socialista sobre o sistema
capitalista. A tarefa era consolidar a posição do socialismo no curso dessa com-
petição, conseguir a eliminação dos elementos capitalistas e consumar a vitória
do sistema socialista como sistema fundamental da economia nacional.
Nossa indústria, principalmente a pesada, apresentava um quadro nada inve-
jável na época. É verdade que estava sendo restaurado gradualmente, mas ainda
não havia aumentado sua produção para nem perto do nível anterior à guerra.
Foi baseado na técnica antiga, atrasada e insuficiente. Claro, estava se desenvol-
vendo na direção do socialismo. O setor socialista de nossa indústria na época
respondia por cerca de 80% do total. Mas o setor capitalista ainda controlava
nada menos que 20% da indústria.
Nossa agricultura apresentou um quadro ainda mais desagradável. É ver-
dade que a classe dos latifundiários já havia sido eliminada, mas, por outro lado,
a classe capitalista agrícola, a classe kulak, ainda representava uma força bastante
considerável. De modo geral, a agricultura daquela época parecia um oceano
ilimitado de pequenas fazendas camponesas individuais com equipamentos téc-
nicos medievais atrasados. Nesse oceano existiam, sob a forma de pontinhos e
ilhotas isoladas, fazendas coletivas e fazendas do Estado que, a rigor, ainda não
tinham uma importância considerável em nossa economia nacional. As fazen-
das coletivas e as fazendas estatais eram fracas, enquanto o kulak ainda era forte.
Naquela época, não falávamos em eliminar os kulaks, mas em restringi-los.
O mesmo deve ser dito sobre o comércio de nosso país. O setor socialista no
comércio representava cerca de 50 ou 60%, não mais, enquanto todo o resto do
campo era ocupado por mercadores, exploradores e outros comerciantes priva-
dos.
Essa era a imagem da vida econômica em nosso país em 1924.
Qual é a situação atual, em 1936?
Naquela época estávamos no primeiro período da Nova Política Econômica, o
início da NEP, o período de um certo renascimento do capitalismo; agora, porém,
estamos no último período da NEP, o fim da NEP, o período da liquidação total
do capitalismo em todas as esferas da economia nacional.
Considere o fato, para começar, que durante esse período nossa indústria
J. V. Stalin 551

cresceu e se tornou uma força gigantesca. Agora ele não pode mais ser descrito
como fraco e tecnicamente mal equipado. Pelo contrário, agora se baseia em
equipamentos técnicos novos, ricos e modernos, com uma indústria pesada de-
senvolvida de forma poderosa e uma indústria de construção de máquinas ainda
mais desenvolvida. Mas o mais importante é que o capitalismo foi inteiramente
banido da esfera de nossa indústria, enquanto a forma socialista de produção
agora detém controle total na esfera de nossa indústria. O fato de que, em vo-
lume de produção, nossa atual indústria socialista excede a indústria pré-guerra
em mais de sete vezes não pode ser considerado um pequeno detalhe.
Quanto à agricultura, em vez do oceano de pequenas fazendas camponesas in-
dividuais, com seu pobre equipamento técnico e forte influência kulak, passamos
a ter uma produção mecanizada, realizada em escala maior do que em qualquer
outro lugar do mundo, com até - equipamento técnico de data, na forma de um
sistema abrangente de fazendas coletivas e fazendas estatais. Todo mundo sabe
que a classe kulak na agricultura foi eliminada, enquanto o setor das pequenas
fazendas camponesas individuais, com seu equipamento técnico medieval atra-
sado, ocupa agora um lugar insignificante; sua participação na agricultura em
termos de área de cultivo não chega a mais de 2 ou 3%. Não devemos esquecer
que as fazendas coletivas têm agora à disposição 316.000 tratores com um total
de 5.700.000 cavalos de potência e, junto com as fazendas do Estado, mais de
400.000 tratores, com um total de 7.580.000 cavalos de potência.
Quanto ao comércio do país, os mercadores e aproveitadores foram total-
mente banidos desta esfera. Todo o comércio está agora nas mãos do Estado, das
sociedades cooperativas e das fazendas coletivas. Um novo comércio soviético –
comércio sem aproveitadores, comércio sem capitalistas – surgiu e se desenvol-
veu.
Assim, a vitória completa do sistema socialista em todas as esferas da econo-
mia nacional é agora um fato.
E o que isto significa?
Significa que a exploração do homem pelo homem foi abolida, eliminada,
enquanto a propriedade socialista dos implementos e meios de produção foi es-
tabelecida como o fundamento inabalável de nossa sociedade soviética. (Aplausos
prolongados.)
Como resultado de todas essas mudanças na esfera da economia nacional da
URSS, temos agora uma nova economia socialista, que não conhece crises nem
desemprego, que não conhece pobreza nem ruína, e que oferece aos nossos ci-
dadãos todas as oportunidades para leve uma vida próspera e culta.
Tais são, em geral, as mudanças ocorridas na esfera de nossa economia du-
rante o período de 1924 a 1936.
Em conformidade com essas mudanças na vida econômica da URSS, a estru-
tura de classes de nossa sociedade também mudou.
A classe do senhorio, como vocês sabem, já havia sido eliminada com a con-
clusão vitoriosa da guerra civil. Quanto às outras classes exploradoras, elas com-
partilharam o destino da classe dos proprietários. A classe capitalista na esfera
da indústria deixou de existir. A classe kulak na esfera da agricultura deixou de
existir. E os mercadores e aproveitadores na esfera do comércio deixaram de
552 Obras Escolhidas

existir. Assim, todas as classes exploradoras foram eliminadas.


Resta a classe trabalhadora.
Resta a classe camponesa.
Resta a intelectualidade.
Mas seria um erro pensar que esses grupos sociais não sofreram nenhuma
mudança durante este período, que eles permaneceram os mesmos que eram,
digamos, no período do capitalismo.
Tomemos, por exemplo, a classe trabalhadora da URSS. Por força do hábito,
ela é frequentemente chamada de proletariado. Mas o que é o proletariado?
O proletariado é uma classe desprovida de instrumentos e meios de produção,
sob um sistema econômico em que os meios e instrumentos de produção per-
tencem aos capitalistas e no qual a classe capitalista explora o proletariado. O
proletariado é uma classe explorada pelos capitalistas. Mas em nosso país, como
vocês sabem, a classe capitalista já foi eliminada e os instrumentos e meios de
produção foram tirados dos capitalistas e transferidos para o Estado, do qual a
força dirigente é a classe trabalhadora. Consequentemente, nossa classe operá-
ria, longe de ser privada dos instrumentos e meios de produção, pelo contrário,
os possui junto com todo o povo. E uma vez que os possui, e a classe capitalista
foi eliminada, toda possibilidade de a classe trabalhadora ser explorada está ex-
cluída. Sendo assim, nossa classe operária pode ser chamada de proletariado?
Claramente, não pode. Marx disse que se o proletariado deve se emancipar, ele
deve esmagar a classe capitalista, tomar os instrumentos e meios de produção
dos capitalistas e abolir as condições de produção que dão origem ao proletari-
ado. Pode-se dizer que a classe trabalhadora da URSS já trouxe essas condições
para sua emancipação? Inquestionavelmente, isso pode e deve ser dito. E o que
isto significa? Isso significa que o proletariado da URSS se transformou em uma
classe inteiramente nova, na classe trabalhadora da URSS, que aboliu o sistema
econômico capitalista, que estabeleceu a propriedade socialista dos instrumentos
e meios de produção e está dirigindo o Soviete sociedade ao longo do caminho
para o comunismo.
Como vocês veem, a classe trabalhadora da URSS é uma classe trabalhadora
inteiramente nova, uma classe trabalhadora emancipada da exploração, como a
história da humanidade nunca conheceu antes.
Passemos à questão do campesinato. Costuma-se dizer que o campesinato é
uma classe de pequenos produtores, com seus membros atomizados, espalhados
pela face da terra, mergulhando isolados em suas pequenas propriedades com
seu equipamento técnico retrógrado; que são escravos da propriedade privada
e são explorados impunemente por proprietários de terras, kulaks, mercadores,
exploradores, usurários e semelhantes. E, de fato, nos países capitalistas, o cam-
pesinato, se o considerarmos em massa, é precisamente essa classe. Pode-se dizer
que nosso campesinato atual, o campesinato soviético, tomado em massa, se asse-
melha a esse tipo de campesinato? Não, isso não pode ser dito. Já não existe tal
campesinato em nosso país. Nosso campesinato soviético é um campesinato intei-
ramente novo. Em nosso país já não existem latifundiários e kulaks, mercadores e
usurários que explorem os camponeses. Consequentemente, nosso campesinato
é um campesinato emancipado da exploração. Além disso, Nosso campesinato
J. V. Stalin 553

soviético, sua esmagadora maioria, é um campesinato de fazendas coletivas, ou


seja, baseia seu trabalho e riqueza não no trabalho individual e em equipamentos
técnicos atrasados, mas no trabalho coletivo e em equipamentos técnicos atualiza-
dos. Finalmente, a economia de nossos camponeses não se baseia na propriedade
privada, mas na propriedade coletiva, que cresceu com base no trabalho coletivo.
Como podem ver, o campesinato soviético é um campesinato inteiramente
novo, como a história da humanidade nunca conheceu antes.
Por fim, passemos à questão da intelligentsia, à questão dos engenheiros e téc-
nicos, dos trabalhadores da frente cultural, dos empregados em geral, e assim
por diante. A intelectualidade também sofreu grandes mudanças durante este
período. Já não é a velha intelectualidade tacanha que tentava colocar-se acima
das classes, mas que na verdade, na sua maior parte, servia os latifundiários e
os capitalistas. Nossa intelligentsia soviética é uma intelectualidade inteiramente
nova, ligada pelas próprias raízes à classe trabalhadora e ao campesinato. Em
primeiro lugar, a composição da intelligentsia mudou. Pessoas que vêm da aris-
tocracia e da burguesia constituem apenas uma pequena porcentagem de nossa
intelectualidade soviética; 80 a 90% da intelectualidade soviética são pessoas que
vieram da classe trabalhadora, do campesinato ou de algum outro estrato da
população trabalhadora. Finalmente, a própria natureza das atividades da intel-
ligentsia mudou. Anteriormente, tinha de servir às classes ricas, pois não tinha
alternativa. Hoje deve servir ao povo, pois não existem mais classes exploradoras.
E é exatamente por isso que agora é um membro igual da sociedade soviética, na
qual, lado a lado com os trabalhadores e camponeses, unindo-se com eles, está
empenhada na construção de uma nova sociedade socialista sem classes.
Como notam, esta é uma intelligentsia inteiramente nova e ativa, como você
não encontrará em nenhum outro país do mundo.
Tais são as mudanças ocorridas durante este período no que diz respeito à
estrutura de classes da sociedade soviética.
O que essas mudanças significam?
Em primeiro lugar, eles significam que as linhas divisórias entre a classe tra-
balhadora e o campesinato, e entre essas classes e a intelectualidade, estão sendo
obliteradas e que a velha exclusividade de classe está desaparecendo. Isso signi-
fica que a distância entre esses grupos sociais está diminuindo constantemente.
Em segundo lugar, eles significam que as contradições econômicas entre esses
grupos sociais estão diminuindo e estão se tornando obliteradas.
E, por último, significam que as contradições políticas entre eles também es-
tão diminuindo e se apagando.
Essa é a posição em relação às mudanças na estrutura de classes da URSS.
O quadro das mudanças na vida social da URSS ficaria incompleto se algumas
palavras não fossem ditas sobre as mudanças em mais uma esfera. Tenho em
mente a esfera das relações nacionais na URSS. Como vocês sabem, na União
Soviética existem cerca de sessenta nações, grupos nacionais e nacionalidades. O
Estado soviético é um Estado multinacional. Claramente, a questão das relações
entre os povos da URSS não pode deixar de ser de primordial importância para
nós.
554 Obras Escolhidas

A União das Repúblicas Socialistas Soviéticas, como sabem, foi formada em


1922, no Primeiro Congresso dos Sovietes da URSS. Foi constituída com base
nos princípios da igualdade e da filiação voluntária dos povos da URSS. A Cons-
tituição em vigor, aprovada em 1924, foi a primeira Constituição da URSS. Foi
o período em que as relações entre os povos ainda não estavam devidamente
ajustadas, em que ainda não haviam desaparecido os restos de desconfiança em
relação aos grã-russos e em que as forças centrífugas continuavam a operar. Nes-
sas condições, era necessário estabelecer a cooperação fraterna entre os povos
na base da ajuda mútua econômica, política e militar, unindo-os em um único
Estado federado e multinacional. O governo soviético não podia deixar de ver
as dificuldades dessa tarefa. Ela tinha diante de si as experiências malsucedidas
de Estados multinacionais em países burgueses. Teve diante de si a experiência
da velha Áustria-Hungria, que terminou em fracasso. No entanto, resolveu fa-
zer a experiência de criar um Estado multinacional, pois sabia que um Estado
multinacional que surgiu com base no socialismo está fadado a passar por todo
e qualquer teste.
Desde então, catorze anos se passaram. Um período longo o suficiente para
testar o experimento. E o que encontramos? Este período mostrou, sem sombra
de dúvida, que a experiência de formar um Estado multinacional com base no
socialismo foi totalmente bem-sucedida. Esta é a vitória indubitável da política
nacional leninista. (Aplausos prolongados.)
Como essa vitória pode ser explicada?
A ausência de classes exploradoras, que são as principais organizadoras das
lutas entre as nações; a ausência de exploração, que cultiva a desconfiança mútua
e desperta paixões nacionalistas; o fato de que o poder está nas mãos da classe
trabalhadora, que é a inimiga de toda escravidão e o verdadeiro veículo das ideias
do internacionalismo; a prática efetiva da ajuda mútua entre os povos em todas as
esferas da vida econômica e social; e, finalmente, a florescente cultura nacional
dos povos da URSS, cultura que é nacional na forma e socialista no conteúdo
- todos esses e outros fatores semelhantes trouxeram uma mudança radical no
aspecto dos povos da URSS; seu sentimento de desconfiança mútua desapareceu,
um sentimento de mútua amizade se desenvolveu entre eles e, assim, estabeleceu-
se uma verdadeira cooperação fraterna entre os povos dentro do sistema de um
único Estado federado.
Como resultado, agora temos um Estado socialista multinacional plenamente
formado, que passou por todos os testes e cuja estabilidade pode ser invejada por
qualquer Estado nacional em qualquer parte do mundo. (Vivos aplausos.)
Tais são as mudanças que ocorreram durante este período no âmbito das re-
lações nacionais na URSS.
Esse é o quadro geral das mudanças ocorridas na esfera da vida econômica e
sócio-política da URSS no período de 1924 a 1936.
J. V. Stalin 555

III

As principais características específicas do projeto


de constituição

Como todas essas mudanças na vida da URSS se refletem no projeto da nova


Constituição?
Em outras palavras: quais são as principais especificidades do Projeto de
Constituição submetido à consideração do presente Congresso?
A Comissão de Constituição foi instruída a alterar o texto da Constituição
de 1924. O trabalho da Comissão de Constituição resultou em um novo texto da
Constituição, um projeto de uma nova Constituição da URSS Na redação da nova
Constituição, a Comissão de Constituição procedeu da proposição de que uma
constituição não deve ser confundida com um programa. Isso significa que há
uma diferença essencial entre um programa e uma constituição. Enquanto um
programa fala daquilo que ainda não existe, daquilo que ainda não foi alcançado
e conquistado no futuro, uma constituição, pelo contrário, deve falar daquilo
que já existe, daquilo que já foi alcançado e conquistado agora, no tempo pre-
sente. Um programa lida principalmente com o futuro, uma constituição com o
presente.
Dois exemplos a título de ilustração.
Nossa sociedade soviética já conseguiu, no geral, alcançar o socialismo; criou
um sistema socialista, ou seja, trouxe o que os marxistas, em outras palavras,
chamam de a primeira, ou inferior, fase do comunismo. Portanto, em geral, já
alcançamos a primeira fase do comunismo. Socialismo. (Prolongados aplausos.) O
princípio fundamental desta fase do comunismo é, como sabem, a fórmula: “De
cada um segundo as suas capacidades, a cada um segundo seu trabalho”. Deve
nossa Constituição refletir este fato, o fato de que o Socialismo foi alcançado?
Deve ser baseado nesta conquista? Inquestionavelmente, deveria. Deveria, por-
que para a URSS o socialismo é algo já alcançado e conquistado.
Mas a sociedade soviética ainda não atingiu a fase superior do comunismo,
na qual o princípio dominante será a fórmula: “De cada um de acordo com suas
habilidades, a cada um de acordo com suas necessidades”, embora se defina o
objetivo de alcançar a fase superior do comunismo no futuro. A nossa Constitui-
ção pode basear-se na fase superior do comunismo, que ainda não existe e que
ainda não foi conquistada? Não, não pode, porque para a URSS a fase superior
do comunismo é algo que ainda não foi realizado e que deve ser realizado no
futuro. Não pode, se não for convertido em um programa ou uma declaração de
conquistas futuras.
Esses são os limites de nossa Constituição no momento histórico atual.
Assim, o projeto da nova Constituição é uma síntese do caminho percorrido,
uma síntese dos ganhos já alcançados. Em outras palavras, é o registro e a ma-
terialização legislativa do que já foi conquistado e conquistado de fato. (Vivos
aplausos.)
Essa é a primeira particularidade do projeto da nova Constituição da URSS.
556 Obras Escolhidas

Prossigo. As constituições dos países burgueses geralmente partem da con-


vicção de que o sistema capitalista é imutável. O principal fundamento dessas
constituições consiste nos princípios do capitalismo, de seus principais pilares:
a propriedade privada da terra, florestas, fábricas, obras e demais implemen-
tos e meios de produção; a exploração do homem pelo homem e a existência
de exploradores e explorados; insegurança para a maioria trabalhadora em um
polo da sociedade, e luxo para a minoria não trabalhadora, mas segura, no outro
polo, etc., etc. Eles se apoiam nestes e em outros pilares do capitalismo. Eles os
refletem, eles os incorporam na lei.
Ao contrário destes, o projeto da nova Constituição da URSS procede do fato
de o sistema capitalista ter sido liquidado e o sistema socialista ter triunfado
na URSS. O principal fundamento do projeto da nova Constituição da URSS
são os princípios do Socialismo, cujos pilares principais são coisas que já foram
conquistadas e realizadas: a propriedade socialista da terra, florestas, fábricas,
obras e outros instrumentos e meios de produção; a abolição da exploração e
das classes exploradoras; a abolição da pobreza para a maioria e do luxo para a
minoria; a abolição do desemprego; o trabalho como obrigação e dever honroso
de todo cidadão apto, de acordo com a fórmula: “Quem não trabalha, também
não come”; o direito ao trabalho, ou seja, o direito de todo cidadão a receber
garantia de emprego; o direito ao descanso e lazer; o direito à educação, etc., etc.
O projeto da nova Constituição baseia-se nestes e em outros pilares do socialismo.
Isso os reflete, os incorpora na lei.
Essa é a segunda característica específica do projeto da nova Constituição.
Prossigo. As constituições burguesas partem tacitamente da premissa de que
a sociedade consiste em classes antagônicas, em classes que possuem riqueza e
classes que não possuem riqueza; que não importa qual partido chegue ao poder,
a direção da sociedade pelo Estado (a ditadura) deve estar nas mãos da burguesia;
que uma constituição é necessária com o propósito de consolidar uma ordem
social desejada e benéfica para as classes proprietárias.
Ao contrário das constituições burguesas, o esboço da nova Constituição da
URSS parte do fato de que não há mais classes antagônicas na sociedade; que a
sociedade consiste em duas classes amigas, de operários e camponeses; que são
essas classes, as classes trabalhadoras, que estão no poder; que a direção da socie-
dade pelo Estado (a ditadura) está nas mãos da classe trabalhadora, a classe mais
avançada da sociedade, que uma constituição é necessária com o propósito de
consolidar uma ordem social desejada e benéfica para os trabalhadores pessoas.
Essa é a terceira especificidade do projeto da nova Constituição.
Prossigo. As constituições burguesas partem tacitamente da premissa de que
nações e raças não podem ter direitos iguais, que existem nações com plenos
direitos e nações sem plenos direitos, e que, além disso, existe uma terceira cate-
goria de nações ou raças, por exemplo as colônias, que têm ainda menos direitos
do que as nações sem direitos plenos. Isso significa que, no fundo, todas essas
constituições são nacionalistas, ou seja, constituições de nações governantes.
Ao contrário dessas constituições, o projeto da nova Constituição da URSS
é, ao contrário, profundamente internacionalista. Ele parte da proposição de
que todas as nações e raças têm direitos iguais. Parte do fato de que nenhuma
J. V. Stalin 557

diferença de cor ou língua, nível cultural ou nível de desenvolvimento político,


nem qualquer outra diferença entre nações e raças pode servir de base para jus-
tificar a desigualdade nacional de direitos. Parte da proposição de que todas as
nações e raças, independentemente de sua posição passada e presente, indepen-
dentemente de sua força ou fraqueza, devem gozar de direitos iguais em todas
as esferas da vida econômica, social, política e cultural da sociedade.
Essa é a quarta particularidade do projeto da nova Constituição.
A quinta característica específica do projeto da nova Constituição é o seu
democratismo consistente e completo. Do ponto de vista do democratismo, as
constituições burguesas podem ser divididas em dois grupos: Um grupo de cons-
tituições nega abertamente, ou na verdade anula, a igualdade de direitos dos
cidadãos e as liberdades democráticas. O outro grupo de constituições aceita
prontamente e até mesmo anuncia os princípios democráticos, mas ao mesmo
tempo faz reservas e prevê restrições que mutilam totalmente esses direitos e li-
berdades democráticas. Eles falam de sufrágio igual para todos os cidadãos, mas
ao mesmo tempo o limitam por qualificações residenciais, educacionais e mesmo
de propriedade. Eles falam de direitos iguais para os cidadãos, mas ao mesmo
tempo fazem a reserva de que isso não se aplica às mulheres, ou se aplica a elas
apenas em parte. E assim por diante.
O que distingue a minuta da nova Constituição da URSS é o fato de estar
livre de tais reservas e restrições. Para isso, não existe divisão de cidadãos em
ativos e passivos; para isso, todos os cidadãos são ativos. Não reconhece nenhuma
diferença de direitos entre homens e mulheres, “residentes” e “não residentes”,
possuidores e sem propriedade, educados e não educados. Para isso, todos os
cidadãos têm direitos iguais. Não é o status de propriedade, nem a origem na-
cional, nem o sexo, nem o cargo, mas a capacidade pessoal e o trabalho pessoal
que determinam a posição de cada cidadão na sociedade.
Por fim, há ainda mais uma especificidade do projeto da nova Constituição.
As constituições burguesas costumam se limitar a declarar os direitos formais dos
cidadãos, sem se preocupar com as condições de exercício desses direitos, com a
oportunidade de exercê-los, com os meios pelos quais podem ser exercidos. Fa-
lam da igualdade dos cidadãos, mas esquecem que não pode haver igualdade real
entre patrão e trabalhador, entre senhorio e camponês, se o primeiro possui ri-
queza e peso político na sociedade, enquanto o segundo está privado de ambos –
se os primeiros são exploradores enquanto os últimos são explorados. Ou ainda:
falam de liberdade de expressão, de reunião e de imprensa, mas esquecem que
todas essas liberdades podem ser apenas um som vazio para a classe trabalha-
dora, se esta não tiver acesso a locais adequados para reuniões, boas gráficas, um
quantidade suficiente de papel de impressão, etc.
O que distingue o projeto da nova Constituição é o fato de não se limitar a
enunciar os direitos formais dos cidadãos, mas sim de salientar a garantia desses
direitos, os meios através dos quais esses direitos podem ser exercidos. Não se
limita a proclamar a igualdade de direitos para os cidadãos, mas a garante ao dar
corpo legislativo ao fato de o regime de exploração ter sido abolido, ao fato de os
cidadãos terem sido emancipados de toda a exploração. Não se limita a procla-
mar o direito ao trabalho, mas garante-o ao dar corpo legislativo ao fato de que
558 Obras Escolhidas

não há crises na sociedade soviética e de que o desemprego foi abolido. Não se


limita a proclamar as liberdades democráticas, mas as garante legislativamente ao
fornecer recursos materiais definidos. É claro, portanto, que o democratismo do
esboço da nova Constituição não é o democratismo “comum” e “universalmente
reconhecido” em abstrato, mas o democratismo socialista.
Estas são as principais características específicas do projeto da nova Consti-
tuição da URSS.
É assim que o rascunho da nova Constituição reflete o progresso e as mudan-
ças que ocorreram na vida econômica e sócio-política da URSS no período de
1924 a 1936.

IV

Críticas burguesas ao projeto de Constituição

Algumas palavras sobre a crítica burguesa ao Projeto de Constituição.


A questão da atitude da imprensa burguesa estrangeira em relação ao Pro-
jeto de Constituição é, sem dúvida, de algum interesse. Na medida em que a
imprensa estrangeira reflete a opinião pública dos diversos segmentos da po-
pulação dos países burgueses, não podemos ignorar suas críticas ao Projeto de
Constituição.
A primeira reação da imprensa estrangeira ao Projeto de Constituição foi
expressa em uma tendência definida – para abafar o Projeto de Constituição,
estou me referindo aqui à imprensa mais reacionária, a imprensa fascista. Este
grupo de críticos achou melhor simplesmente abafar o Projeto de Constituição
e fingir que não existe tal Projeto, e nunca existiu. Pode-se dizer que o silêncio
não é crítica. Mas isso não é verdade. O método de guardar silêncio, como
método especial de ignorar as coisas, é também uma forma de crítica – uma forma
estúpida e ridícula, é verdade, mas uma forma de crítica, apesar de tudo. (Risos
e aplausos.) Mas o silêncio deles foi inútil. No final, foram obrigados a abrir
a válvula e informar ao mundo que, por mais triste que seja, existe um Projeto
de Constituição da URSS, e não só existe, mas começa a exercer uma influência
perniciosa na mente das pessoas . Nem poderia ser de outra forma; pois, afinal,
existe uma opinião pública no mundo, existe o público leitor, pessoas vivas, que
desejam conhecer os fatos e mantê-los no torno do engano por muito tempo é
totalmente impossível. A decepção não leva longe.
O segundo grupo de críticos admite que existe realmente um Projeto de
Constituição, mas considera que o projeto não interessa muito, porque não é
realmente um Projeto de Constituição, mas um pedaço de papel, uma promessa
vazia, com a ideia de realizar certa manobra para enganar as pessoas. E acres-
centam que a URSS não poderia produzir um esboço melhor, porque a própria
URSS não é um Estado, mas apenas um conceito geográfico (riso geral), e como
não é um Estado, sua Constituição não pode ser uma constituição real. Um re-
presentante típico desse grupo de críticos é, por estranho que pareça, o órgão
semioficial alemão: “Deutsche Diplomatisch-Politische Korrespondenz”. Este jornal
declara sem rodeios que o Projeto de Constituição da URSS é uma promessa va-
J. V. Stalin 559

zia, uma fraude, uma “aldeia Potemkin”. Declara, sem hesitar, que a URSS não
é um Estado, que a URSS “nada mais é do que um conceito geográfico estrita-
mente definido” (riso geral), e que, em vista disso, a Constituição da URSS não
pode ser considerada uma constituição real.
O que se pode dizer sobre essas chamadas críticas?
Em um de seus contos, o grande escritor russo Shchedrin retrata um oficial
cabeça-dura, muito tacanho e obtuso, mas autoconfiante e zeloso ao extremo.
Depois que esse burocrata estabeleceu “ordem e tranquilidade” na região “sob
seu comando”, tendo exterminado milhares de seus habitantes e queimado deze-
nas de cidades no processo, ele olhou ao redor e no horizonte avistou a América
- um pequeno país conhecido, é claro, onde, ao que parece, existem liberdades
de algum tipo ou outro que servem para agitar o povo, e onde o Estado é ad-
ministrado de uma maneira diferente. O burocrata avistou a América e ficou
indignado:
Que país é esse, como chegou lá, com que direito existe? (risos e aplausos.)
Claro, ele foi descoberto acidentalmente há vários séculos, mas não poderia ser
fechado novamente para que nem um fantasma permanecesse? (risos.) Em se-
guida, ele escreveu uma ordem: “Cale a boca da América de novo!” (risos gerais)
Parece-me que os senhores do “Deutsche Diplomatisch - Politische Korrespondenz”
e o burocrata de Shchedrin são como duas ervilhas. (risos e aplausos.) A URSS há
muito tempo é uma monstruosidade para esses senhores. Por dezenove anos a
URSS permaneceu como um farol, espalhando o espírito de emancipação entre
a classe trabalhadora em todo o mundo e despertando a fúria dos inimigos da
classe trabalhadora. E acontece que essa URSS não apenas existe, mas até está
crescendo; não está apenas crescendo, mas até mesmo florescendo; e não só está
florescendo, mas até mesmo redigindo um esboço de uma nova Constituição, um
esboço que está mexendo com as mentes e inspirando as classes oprimidas com
uma nova esperança. (aplausos.) Como podem os cavalheiros do órgão semioficial
alemão ficarem indignados depois disso? Que tipo de país é esse? - eles uivam;
com que direito existe? (risos.) E se foi descoberto em outubro de 1917, por
que não pode ser fechado de novo para que nem um fantasma permaneça? Em
seguida, eles resolveram: Calar a URSS novamente; proclama publicamente que
a URSS, como um Estado, não existe, que a URSS nada mais é do que um mero
conceito geográfico. (risos gerais)
Ao escrever sua ordem para calar a América novamente, o burocrata de Shche-
drin, apesar de toda sua obtusidade, evidenciou alguma realidade ao acrescentar
a si mesmo: “No entanto, parece que isso não está em meu poder.” (gargalhadas e
aplausos.) Não sei se os senhores do órgão semioficial alemão são dotados de in-
teligência suficiente para suspeitar que – embora, é claro, possam “calar a boca”
este ou aquele país no papel – falando sério, no entanto, “o mesmo não está em
seu poder...” (Gargalhadas e aplausos.)
Quanto à Constituição da URSS ser uma promessa vazia, uma “aldeia Potem-
kin”, etc., gostaria de me referir a uma série de fatos estabelecidos que falam por
si.
Em 1917, os povos da URSS derrubaram a burguesia e estabeleceram a dita-
dura do proletariado, estabeleceram um governo soviético. Isso é um fato, não
560 Obras Escolhidas

uma promessa.
Ademais, o governo soviético eliminou a classe dos latifundiários e transferiu
aos camponeses mais de 150 milhões de hectares de antigos senhorios, governos
e terras monasteriais, além das terras que já estavam em posse dos camponeses.
Isso é um fato, não uma promessa.
Além disso, o governo soviético expropriou a classe capitalista, tirou seus ban-
cos, fábricas, ferrovias e outros implementos e meios de produção, declarou que
eram propriedade socialista e colocou à frente dessas empresas os melhores mem-
bros da classe trabalhadora. Isso é um fato, não uma promessa. (aplausos prolon-
gados.)
Ademais, tendo organizado a indústria e a agricultura em novas linhas socia-
listas, com uma nova base técnica, o governo soviético atingiu hoje uma posição
em que a agricultura na URSS está produzindo uma vez e meia mais do que era
produzida em tempos pré-guerra, onde a indústria está produzindo sete vezes
mais do que era antes da guerra, e onde a renda nacional quadruplicou em com-
paração com os tempos anteriores à guerra. Todos esses são fatos, não promessas.
(aplausos prolongados.)
Além disso, o governo soviético aboliu o desemprego, introduziu o direito ao
trabalho, o direito ao descanso e ao lazer, o direito à educação, proporcionou
melhores condições materiais e culturais para os trabalhadores, camponeses e
intelectuais e assegurou a introdução da , sufrágio direto e igual com voto secreto
para seus cidadãos. Todos esses são fatos, não promessas. (aplausos prolongados.)
Finalmente, a URSS produziram o projeto de uma nova Constituição que não
é uma promessa, mas o registro e a incorporação legislativa desses fatos geral-
mente conhecidos, o registro e a incorporação legislativa do que já foi alcançado
e conquistado.
Pode-se perguntar: em vista de tudo isso, o que pode toda a conversa dos
senhores do órgão semioficial alemão sobre as “aldeias Potemkin” não ser se-
não uma tentativa de sua parte esconder do povo a verdade sobre a URSS, para
enganar o povo, para enganá-lo.
Esses são os fatos. E os fatos, dizem, são coisas teimosas. Os senhores do
órgão semioficial alemão podem dizer: Tanto pior para os fatos. (risos.) Mas
então, podemos respondê-los com as palavras do conhecido provérbio russo: “As
leis não são feitas para os tolos.” (risos e aplausos prolongados.)
O terceiro grupo de críticos não se opõe a reconhecer certos méritos no Pro-
jeto de Constituição; eles consideram isso uma coisa boa; mas, veja, eles duvidam
muito que vários de seus princípios possam ser aplicados na prática, porque es-
tão convencidos de que esses princípios são geralmente impraticáveis e devem
permanecer letra morta. Esses, para dizer o mínimo, são céticos. Esses céticos
podem ser encontrados em todos os países.
É preciso dizer que esta não é a primeira vez que os encontramos. Quando
os bolcheviques tomaram o poder em 1917, os céticos disseram: Os bolcheviques
não são maus companheiros, talvez, mas nada sairá de seu governo; eles irão
falhar. Na verdade, no entanto, não foram os bolcheviques que falharam, mas os
céticos.
J. V. Stalin 561

Durante a guerra civil e a intervenção estrangeira, este grupo de céticos disse:


O governo soviético não é uma coisa ruim, é claro, mas Denikin e Kolchak, mais
os estrangeiros, irão, arriscamos dizer, sair por cima. Na verdade, descobriu-se,
porém, que os céticos estavam novamente errados em seus cálculos.
Quando o governo soviético publicou o Primeiro Plano Quinquenal, os céticos
voltaram a aparecer dizendo: O Plano Quinquenal é uma coisa boa, claro, mas
dificilmente viável; o Plano Quinquenal dos Bolcheviques provavelmente não
terá sucesso. Os fatos provaram, porém, que mais uma vez os céticos tiveram
azar: o Plano Quinquenal foi executado em quatro anos.
O mesmo deve ser dito sobre o projeto da nova Constituição e as críticas di-
rigidas contra ele pelos céticos. Assim que o projeto foi publicado, este grupo
de críticos voltou a aparecer em cena com seu ceticismo sombrio e suas dúvidas
quanto à praticabilidade de certos princípios da Constituição. Não há o menor
fundamento para dúvida de que, também neste caso, os céticos falharão, que eles
falharão hoje como falharam mais de uma vez no passado.
O quarto grupo de críticos, ao atacar o projeto da nova Constituição, carac-
teriza-o como uma “virada para a direita”, como o “abandono da ditadura do
proletariado”, como a “liquidação do regime bolchevique”. “Os bolcheviques
se voltaram para a direita, isso é um fato”, declaram em um coro de diferen-
tes vozes. Particularmente zelosos a esse respeito são alguns jornais poloneses e
também alguns jornais americanos.
O que se pode dizer sobre essas chamadas críticas?
Se a ampliação das bases da ditadura da classe trabalhadora e a transformação
da ditadura em uma mais flexível e, consequentemente, um sistema mais pode-
roso de orientação da sociedade pelo Estado é interpretada por eles não como o
fortalecimento da ditadura do proletariado, mas como seu enfraquecimento, ou
mesmo abandono, então é legítimo perguntar: Será que esses senhores sabem
realmente o que significa a ditadura da classe trabalhadora?
Se a incorporação legislativa dada às vitórias do socialismo, a incorporação
legislativa dada aos sucessos da industrialização, coletivização e democratização
é representada por eles como uma “virada para a direita”, então é legítimo per-
guntar: Será que esses senhores realmente sabem a diferença entre esquerda e
direita? (Risos e aplausos.)
Não pode haver dúvida de que esses senhores se perderam totalmente nas
críticas ao Projeto de Constituição e, perdidos, confundem direita com esquerda.
Não se pode deixar de lembrar, neste contexto, a “moça” Pelageya em “Almas
Mortas” de Gogol. Gogol relata que Pelageya se ofereceu para servir de guia para
o cocheiro de Chichikov, Seliphan; mas não sabendo o lado direito da estrada da
esquerda, ela se perdeu e entrou em uma situação embaraçosa. É preciso admi-
tir que, apesar de todas as suas pretensões, a inteligência dos nossos críticos dos
jornais poloneses não é muito superior à da “moça” Pelageya em “Almas Mortas”.
(Aplausos.) Se você se lembra, o cocheiro Seliphan achou adequado repreender
Pelageya por confundir direito com esquerdo e disse a ela: “Oh, suas pernas sujas
... você não sabe o que é direita e o que é esquerda.” Parece-me que nossos críti-
cos infelizes deveriam ser repreendidos da mesma maneira: “Oh, desculpem-se
críticos... vocês não sabem o que é direita e o que é esquerda.” (aplausos prolonga-
562 Obras Escolhidas

dos.)
Finalmente, há mais um grupo de críticos. Enquanto o último grupo acusa
o Projeto de Constituição de abandonar a ditadura da classe trabalhadora, este
grupo, ao contrário, acusa-o de não mudar nada na posição existente na URSS,
de deixar intacta a ditadura da classe trabalhadora, de não conceder liberdade
aos partidos políticos e de preservar a atual posição de liderança do Partido Co-
munista na URSS. E esse grupo de críticos afirma que a ausência de liberdade
dos partidos na URSS é um sintoma da violação dos princípios do democratismo.
Devo admitir que o esboço da nova Constituição preserva o regime da di-
tadura da classe trabalhadora, assim como também preserva inalterada a atual
posição de liderança do Partido Comunista da URSS. (Aplausos.) Se os estimados
críticos a respeito disso como uma falha no Projeto de Constituição, que é apenas
para ser lamentado. Nós, bolcheviques, consideramos isso um mérito do Projeto
de Constituição. (Estrondosos aplausos.)
Quanto à liberdade de vários partidos políticos, aderimos a pontos de vista
um tanto diferentes. Uma festa faz parte de uma classe, sua parte mais avan-
çada. Vários partidos e, consequentemente, a liberdade dos partidos, só podem
existir em uma sociedade em que existam classes antagônicas cujos interesses
são mutuamente hostis e irreconciliáveis - na qual existem, digamos, capitalistas
e trabalhadores, latifundiários e camponeses, kulaks e camponeses pobres, etc.
Mas na URSS não existem mais classes como os capitalistas, os latifundiários, os
kulaks, etc. Na URSS existem apenas duas classes, trabalhadores e camponeses,
cujos interesses - longe de serem mutuamente hostis - são, pelo contrário, ami-
gável. Assim, não há fundamento na URSS para a existência de várias partes e,
consequentemente, para a liberdade dessas partes. Na URSS, só há fundamento
para um partido, o Partido Comunista. Na URSS só pode existir um partido, o
Partido Comunista, que defende com coragem os interesses dos trabalhadores e
camponeses até o fim. E que não defende mal os interesses dessas classes, disso
quase não há dúvida. (vivos aplausos.)
Eles falam de democracia. Mas o que é democracia? A democracia nos países
capitalistas, onde existem classes antagônicas, é, em última análise, democracia
para os fortes, democracia para a minoria proprietária. Na URSS, ao contrário,
democracia é democracia para os trabalhadores, ou seja, democracia para todos.
Mas daí decorre que os princípios do democratismo são violados, não pelo pro-
jeto da nova Constituição da URSS, mas pelas constituições burguesas. É por
isso que acho que a Constituição da URSS é a única Constituição totalmente
democrática do mundo.
Essa é a posição em relação à crítica burguesa ao projeto da nova Constituição
da URSS.
J. V. Stalin 563

Emendas e adendos ao projeto de constituição

Passemos às emendas e adendas ao projeto de Constituição propostas pelos


cidadãos durante a discussão nacional do projeto.
A discussão nacional do Projeto de Constituição, como vocês sabem, produziu
um número bastante grande de emendas e adendos. Todos eles foram publicados
na imprensa soviética. Tendo em conta a grande variedade de alterações e o fato
de nem todas terem o mesmo valor, deveriam, em minha opinião, ser divididas
em três categorias.
A característica distintiva das alterações da primeira categoria é que não tra-
tam de questões constitucionais, mas de questões que se inserem no âmbito dos
trabalhos legislativos em curso dos futuros órgãos legislativos. Algumas questões
relativas aos seguros, algumas questões relativas ao desenvolvimento da agricul-
tura coletiva, algumas questões relativas ao desenvolvimento industrial, questões
financeiras – tais são os assuntos de que tratam estas alterações. Evidentemente,
os autores dessas emendas não eram claros quanto à diferença entre as questões
constitucionais e as questões da legislação vigente. É por isso que eles se esfor-
çam para espremer o máximo de leis possível na Constituição, tendendo assim
a convertê-la em algo na natureza de um código de leis. Mas uma constituição
não é um código de leis. Uma constituição é a lei fundamental e apenas a lei
fundamental. Uma constituição não exclui, mas pressupõe trabalho legislativo
atual por parte dos futuros corpos legislativos. Uma constituição fornece a base
jurídica para as futuras atividades legislativas desses órgãos. Por conseguinte, as
alterações e adendas deste tipo, que não têm incidência direta na Constituição,
deveriam, em minha opinião, ser remetidas aos futuros órgãos legislativos do
país.
À segunda categoria devem ser atribuídas as emendas e adendos que visam
introduzir na Constituição elementos de referências históricas, ou elementos de
declarações a respeito do que o governo soviético ainda não alcançou e do que
deverá alcançar no futuro. Descrever na Constituição as dificuldades que o Par-
tido, a classe operária e todos os trabalhadores venceram durante os longos anos
de luta pela vitória do Socialismo; indicar na Constituição o objetivo último do
movimento soviético, ou seja, a construção de uma sociedade comunista completa
- tais são os assuntos de que tratam essas emendas, em diferentes variações. Penso
que essas alterações e adendas também deveriam ser deixadas de lado por não
terem qualquer relação direta com a Constituição. A Constituição é o registro e
a materialização legislativa dos ganhos já alcançados e assegurados. A menos que
queiramos distorcer este caráter fundamental da Constituição, devemos abster-
nos de enchê-la de referências históricas ao passado, ou de declarações sobre as
realizações futuras dos trabalhadores da URSS. Para isso temos outros meios e
outros documentos.
Finalmente, à terceira categoria devem ser atribuídas emendas e adendos que
tenham uma relação direta com o Projeto de Constituição.
Um grande número de alterações nesta categoria são simplesmente uma ques-
564 Obras Escolhidas

tão de redação. Eles poderiam, portanto, ser encaminhados para a Comissão de


Redação do atual Congresso que eu acho que o Congresso vai criar, com instru-
ções para decidir sobre o texto final da nova Constituição.
Quanto às restantes alterações da terceira categoria, são de maior significado
material e, na minha opinião, algumas palavras devem ser ditas sobre elas.
1. Em primeiro lugar, sobre as alterações ao artigo 1.º do Projeto de Consti-
tuição. Existem quatro alterações. Alguns propõem que substituamos as palavras
“Estado dos trabalhadores e camponeses” pelas palavras “Estado dos trabalhado-
res”. Outros propõem que adicionemos as palavras “e intelectualidade operária”
às palavras “Estado dos trabalhadores e camponeses”. Um terceiro grupo pro-
põe que substituamos as palavras “Estado dos trabalhadores e camponeses” pelas
palavras “Estado de todas as raças e nacionalidades que habitam o território da
URSS”. Um quarto grupo propõe que substituamos a palavra “camponeses” pelas
palavras “agricultores coletivos” ou “trabalhadores da agricultura socialista”.
Essas emendas devem ser adotadas? Eu acho que eles não deveriam.
Do que fala o Artigo 1º do Projeto de Constituição? Fala da composição de
classes da sociedade soviética. Podemos nós, marxistas, ignorar a questão da
composição de classes de nossa sociedade na Constituição? Não nós não pode-
mos. Como sabemos, a sociedade soviética consiste em duas classes, operários
e camponeses. E é disso que fala o Artigo 1º do Projeto de Constituição. Con-
sequentemente, o Artigo 1º do Projeto de Constituição reflete adequadamente
a composição de classes de nossa sociedade. Pode-se perguntar: E quanto à in-
telectualidade operária? A intelectualidade nunca foi uma classe e nunca pode
ser uma classe – foi e continua sendo um estrato, que recruta seus membros em
todas as classes da sociedade. Antigamente, a intelligentsia recrutava seus mem-
bros nas fileiras da nobreza, da burguesia, em parte nas fileiras do campesinato
e apenas em grau muito insignificante nas fileiras dos trabalhadores. Em nossos
dias, sob os sovietes, a intelectualidade recruta seus membros principalmente nas
fileiras dos operários e camponeses. Mas não importa onde possa recrutar seus
membros e que caráter possa ter, a intelectualidade é, no entanto, um estrato e
não uma classe.
Essa circunstância infringe os direitos da intelectualidade do trabalho? Nem
um pouco! O Artigo 1º do Projeto de Constituição não trata dos direitos dos
vários estratos da sociedade soviética, mas da composição de classes dessa socie-
dade. Os direitos das várias camadas da sociedade soviética, incluindo os direitos
da intelectualidade operária, são tratados principalmente nos Capítulos X e XI
do Projeto de Constituição. É evidente a partir desses capítulos que os traba-
lhadores, os camponeses e a intelectualidade operária gozam de direitos inteira-
mente iguais em todas as esferas da vida econômica, política, social e cultural do
país. Consequentemente, não pode haver violação dos direitos da intelectuali-
dade operária.
O mesmo deve ser dito das nações e raças que compõem a URSS. No Capítulo
II do Projeto de Constituição, afirma-se que a URSS é uma união livre de nações
com direitos iguais. Vale a pena repetir essa fórmula no Artigo 1 do Projeto de
Constituição, que trata não da composição nacional da sociedade soviética, mas
de sua composição de classes? Claramente, não vale a pena. Quanto aos direitos
J. V. Stalin 565

das nações e raças que compõem a URSS, são tratados nos Capítulos II, X e XI
do Projeto de Constituição. A partir desses capítulos, fica evidente que as nações
e raças da URSS gozam de direitos iguais em todas as esferas da vida econômica,
política, social e cultural do país. Consequentemente, não pode haver violação
dos direitos nacionais.
Também seria errado substituir a palavra “camponês” pelas palavras “agri-
cultor coletivo” ou “trabalhador da agricultura socialista”. Em primeiro lugar,
além dos agricultores coletivos, ainda existem mais de um milhão de famílias de
agricultores não coletivos no campesinato. O que deve ser feito sobre eles? Os
autores desta emenda propõem eliminá-los dos livros? Isso seria imprudente.
Em segundo lugar, o fato de a maioria dos camponeses ter iniciado a agricultura
coletiva não significa que já tenham deixado de ser camponeses, que não tenham
mais sua economia pessoal, suas próprias famílias, etc. Em terceiro lugar, para a
palavra “trabalhador” nós teríamos então que substituir as palavras “trabalhador
da indústria socialista”, que, no entanto, os autores da emenda por uma razão
ou outra não propõem. Enfim, a classe trabalhadora e a classe camponesa já
desapareceram em nosso país? E se não desapareceram, vale a pena apagar do
nosso vocabulário os nomes estabelecidos para eles? Evidentemente, o que os
autores da emenda têm em mente não é a sociedade atual, mas a sociedade fu-
tura, quando as classes não existirão mais e os operários e camponeses terão se
transformado em trabalhadores de uma homogênea sociedade comunista. Con-
sequentemente, eles estão obviamente correndo na frente. Mas, na elaboração
de uma constituição, não se deve partir do futuro, mas do presente, do que já
existe. Uma constituição não pode e não deve progredir.
2. Em seguida, segue-se uma emenda ao Artigo 17 do Projeto de Constitui-
ção. A emenda propõe a supressão total do artigo 17 da Constituição, que reserva
às Repúblicas da União o direito de livre secessão da URSS. Acho que essa pro-
posta é errada e, portanto, não deve ser adotada pelo Congresso. A URSS é
uma união voluntária de União das Repúblicas com direitos iguais. Eliminar da
Constituição o artigo que prevê o direito de livre secessão da URSS seria violar
o caráter voluntário desta união. Podemos concordar com esta etapa? Acho que
não podemos e não devemos concordar com isso. Diz-se que não há uma única
república na URSS que queira se separar da URSS e que, portanto, o artigo 17
não tem importância prática. É claro que não existe uma única república que
queira se separar da URSS. Mas isso não significa de forma alguma que não de-
vamos fixar na Constituição o direito das Repúblicas da União de se separarem
livremente da URSS. Na URSS, não há uma única República da União que queira
subjugar outra República da União. Mas isso não significa de forma alguma que
devamos suprimir da Constituição da URSS o artigo que trata da igualdade de
direitos das Repúblicas da União.
3. Em seguida, há uma proposta de adicionarmos um novo artigo ao Capítulo
II do Projeto de Constituição, com o seguinte efeito: que, ao atingir o nível ade-
quado de desenvolvimento econômico e cultural, as Repúblicas Socialistas Sovié-
ticas autônomas possam ser elevadas ao status de União Soviética Repúblicas So-
cialistas. Esta proposta pode ser aprovada? Eu acho que não deveria ser adotado.
É uma proposta errada, não só pelo seu conteúdo, mas também pela condição
que estabelece. A maturidade económica e cultural não pode ser invocada como
566 Obras Escolhidas

fundamento para a transferência das Repúblicas Autónomas para a categoria de


Repúblicas da União do que o atraso económico ou cultural. ser instado como
motivo para deixar qualquer república particular na lista de Repúblicas autôno-
mas. Esta não seria uma abordagem marxista nem leninista. A República Tatar,
por exemplo, continua sendo uma República Autônoma, enquanto a República
do Cazaquistão se tornará uma República da União; mas isso não significa que,
do ponto de vista do desenvolvimento cultural e econômico, a República do Ca-
zaquistão está em um nível mais alto do que a República do Tártaro. O oposto é
o caso. O mesmo se pode dizer, por exemplo, da República Autônoma Alemã do
Volga e da República da União Quirguiz, das quais a primeira se encontra em
um nível cultural e econômico mais elevado que a segunda, embora permaneça
uma República Autônoma.
Quais são os motivos para a transferência das Repúblicas autônomas para a
categoria de Repúblicas da União?
Existem três motivos.
Em primeiro lugar, a república em questão deve ser uma república de fron-
teira, não cercada por todos os lados pelo território da URSS. Por quê? Porque
uma vez que as Repúblicas da União têm o direito de se separar da URSS, uma
república, ao se tornar uma República da União, deve estar em uma posição ló-
gica e efetiva para levantar a questão da secessão da URSS. E essa questão só pode
ser levantada por uma república que, digamos, faz fronteira com algum Estado
estrangeiro e, consequentemente, não é cercada por todos os lados por território
da URSS. Claro, nenhuma de nossas repúblicas levantaria realmente a questão
da separação da URSS. Mas, uma vez que o direito de se separar da URSS é re-
servado às Repúblicas da União, deve ser organizado de forma que esse direito
não se torne um pedaço de papel sem sentido. Tomemos, por exemplo, a Repú-
blica Bashkir ou a República Tatar. Suponhamos que essas repúblicas autônomas
sejam transferidas para a categoria de repúblicas sindicais. Eles poderiam logi-
camente e realmente levantar a questão da separação da URSS? Não, eles não
podiam. Por quê? Porque estão cercados por todos os lados por repúblicas e
regiões soviéticas e, estritamente falando, não têm para onde ir se se separarem
da URSS. (Risos e aplausos.) Portanto, seria errado transferir tais repúblicas para
a categoria de Repúblicas da União.
Em segundo lugar, a nacionalidade que dá nome a uma dada república sovié-
tica deve constituir uma maioria mais ou menos compacta dentro dessa república.
Veja a República Autônoma da Criméia, por exemplo. É uma república frontei-
riça, mas os tártaros da Crimeia não constituem a maioria nessa república; pelo
contrário, eles são uma minoria. Consequentemente, seria errado transferir a
República da Crimeia para a categoria das Repúblicas da União.
Em terceiro lugar, a república não deve ter uma população muito pequena;
deve ter uma população de, digamos, não menos, mas mais de um milhão, pelo
menos. Por quê? Porque seria errado supor que uma pequena república so-
viética com uma população muito pequena e um pequeno exército pudesse ter
esperança de manter sua existência como um Estado independente. Não pode
haver dúvida de que as feras imperialistas logo poriam as mãos nele.
Penso que, a menos que existam estas três razões objetivas, seria errado, no
J. V. Stalin 567

momento histórico atual, levantar a questão de transferir uma determinada Re-


pública Autônoma para a categoria de Repúblicas da União.
4. Em seguida, propõe-se suprimir dos artigos 22º, 23º, 24º, 25º, 26º, 27º,
28º e 29º a enumeração pormenorizada da divisão territorial administrativa das
repúblicas da União em territórios e regiões. Acho que esta proposta também
é inaceitável. Há pessoas na URSS que estão sempre prontas e ansiosas para
recarregar incansavelmente os territórios e regiões e, assim, causar confusão e
incerteza em nosso trabalho. O projeto de Constituição coloca um freio a es-
sas pessoas. E isso é muito bom, porque aqui, como em muitas outras coisas,
precisamos de uma atmosfera de certeza, precisamos de estabilidade e clareza.
5. A quinta emenda diz respeito ao artigo 33. A criação de duas câmaras é
considerada inadequada e propõe-se a abolição do Soviete das Nacionalidades.
Acho que esta alteração também está errada. Um sistema de câmara única seria
melhor do que um sistema de câmara dupla se a URSS fosse um Estado de câmara
única. Mas a URSS não é um Estado de nação única. A URSS, como sabemos, é
um Estado multinacional. Temos um órgão supremo no qual são representados
os interesses comuns de todos os trabalhadores da URSS, independentemente da
nacionalidade. Este é o Soviete da União. Mas, além dos interesses comuns, as
nacionalidades da URSS têm seus interesses particulares e específicos, vinculados
às suas especificidades nacionais. Esses interesses específicos podem ser ignora-
dos? Não, eles não podem. Precisamos de um órgão supremo especial para re-
fletir precisamente esses interesses específicos? Inquestionavelmente, sim. Não
pode haver dúvida de que, sem esse órgão, seria impossível administrar um Es-
tado multinacional como a URSS. Tal corpo é a segunda câmara, o Soviete das
Nacionalidades da URSS.
É feita referência à história parlamentar dos Estados europeus e americanos;
assinala-se que o sistema de câmara dupla nesses países produziu apenas resul-
tados negativos – que a segunda câmara geralmente degenera em um centro de
reação e um freio ao progresso. Tudo isso é verdade. Mas isso se deve ao fato
de que nesses países não há igualdade entre as duas câmaras. Como sabemos,
não é raro que a segunda câmara receba mais direitos do que a primeira e, além
disso, como regra, a segunda câmara é constituída de forma não democrática,
não raro os seus membros sendo nomeados de cima. Sem dúvida, esses defeitos
serão eliminados se for estabelecida a igualdade entre as câmaras e se a segunda
câmara for constituída tão democraticamente quanto a primeira.
6. Além disso, um adendo ao Projeto de Constituição é proposto, convocando
um número igual de membros em ambas as câmaras. Acho que essa proposta
pode ser aprovada. Na minha opinião, tem vantagens políticas óbvias, pois enfa-
tiza a igualdade das câmaras.
7. Em seguida, vem um adendo ao Projeto de Constituição que propõe que
os membros do Soviete das Nacionalidades sejam eleitos por voto direto, como
no caso dos membros do Soviete da União. Acho que essa proposta também pode
ser aprovada. É verdade que pode criar certos inconvenientes técnicos durante as
eleições; mas, por outro lado, seria de grande vantagem política, pois aumentaria
o prestígio do Soviete de Nacionalidades.
8. Em seguida, segue-se um adendo ao Artigo 40, propondo que seja conce-
568 Obras Escolhidas

dido ao Presidium do Soviete Supremo o direito de aprovar leis provisórias. Acho


que esse adendo está errado e não deve ser aprovado pelo Congresso. É tempo
de acabarmos com uma situação em que não apenas um, mas vários órgãos le-
gislam. Tal situação vai contra o princípio de que as leis devem ser estáveis. E
precisamos de estabilidade das leis agora mais do que nunca. O poder legislativo
na URSS deve ser exercido apenas por um corpo, o Soviete Supremo da URSS.
9. Além disso, é proposto um adendo ao Artigo 48 do Projeto de Consti-
tuição, exigindo que o Presidente do Soviete Supremo da URSS seja eleito não
pelo Soviete Supremo da URSS, mas por toda a população do país. Acho que
este adendo está errado, porque vai contra o espírito de nossa Constituição. De
acordo com o sistema de nossa Constituição, não deve haver um presidente indi-
vidual na URSS, eleito por toda a população em pé de igualdade com o Soviete
Supremo e capaz de se opor ao Soviete Supremo. O presidente da URSS é um co-
légio, é o Presidium do Soviete Supremo, incluindo o Presidente do Presidium do
Soviete Supremo, eleito, não por toda a população, mas pelo Soviete Supremo,
e responsável perante o Soviete Supremo. A experiência histórica mostra que
tal estrutura de órgãos supremos é a mais democrática e protege o país contra
contingências indesejáveis.
10. Em seguida, segue-se outra emenda ao artigo 48. Diz o seguinte: que
o número de Vice-Presidentes do Presidium do Soviete Supremo da URSS seja
aumentado para onze, um de cada República da União. Acho que essa emenda
poderia ser adotada, pois seria uma melhoria e apenas aumentaria o prestígio do
Presidium do Soviete Supremo da URSS.
11. Segue-se então uma emenda ao Artigo 77. Ele apela à organização de
um novo Comissariado do Povo da União – o Comissariado do Povo da Indústria
de Defesa. Penso que esta alteração também deve ser aceita (aplausos), porque é
chegado o momento de separar a nossa indústria de defesa e de ter um Comissa-
riado do Povo para a mesma. Parece-me que isso só melhoraria a defesa do nosso
país.
12. Em seguida, segue uma emenda ao Artigo do Projeto de Constituição,
exigindo que o artigo seja alterado para prever a proibição de ritos religiosos.
Penso que esta alteração deve ser rejeitada por contrariar o espírito da nossa
Constituição.
13. Finalmente, há uma outra emenda de caráter mais ou menos material.
Refiro-me a uma emenda ao artigo 135 do Projeto de Constituição. Propõe que
ministros da religião, ex-guardas-brancos, todos os ex-ricos e pessoas não envol-
vidas em ocupações socialmente úteis sejam privados de direitos, ou, em todos
os eventos, que a franquia de pessoas nesta categoria seja restrita ao direito de
eleger, mas não para ser eleito. Penso que esta alteração também deve ser re-
jeitada. O governo soviético privou de direitos os elementos não-trabalhadores e
exploradores, não para sempre, mas temporariamente, até certo período. Houve
um tempo em que esses elementos travaram uma guerra aberta contra o povo e
resistiram ativamente às leis soviéticas. A lei soviética que os privou da franquia
foi a resposta do governo soviético a essa resistência. Muito tempo se passou
desde então. Durante esse período, conseguimos abolir as classes exploradoras
e o governo soviético se tornou uma força invencível. Não chegou a hora de
J. V. Stalin 569

revisarmos esta lei? Acho que chegou a hora. Diz-se que isso é perigoso, pois
elementos hostis ao governo soviético, alguns dos ex-guardas-brancos, kulaks, pa-
dres, etc., podem se infiltrar nos órgãos de governo supremos do país. Mas do
que ter medo? Se você tem medo de lobos, fique longe da floresta. (risos e aplau-
sos.) Em primeiro lugar, nem todos os ex-kulaks, guardas-brancos e padres são
hostis ao governo soviético. Em segundo lugar, se as pessoas em algum lugar ou
outro elegerem pessoas hostis, isso mostrará que nosso trabalho de propaganda
foi muito mal organizado, e nós mereceremos tal desgraça; se, no entanto, nosso
trabalho de propaganda é conduzido de uma forma bolchevique, o povo não
deixará pessoas hostis deslizarem para os órgãos de governo supremos. Isso sig-
nifica que devemos trabalhar e não reclamar (aplausos), devemos trabalhar e não
esperar que tudo seja posto diante de nós pronto por ordem oficial. Já em 1919,
Lenin disse que não estava muito distante o tempo em que o governo soviético
consideraria conveniente introduzir o sufrágio universal sem quaisquer restri-
ções. Atenção: sem quaisquer restrições. Ele disse isso em um momento em que
a intervenção militar estrangeira ainda não havia sido superada e quando nossa
indústria e agricultura estavam em condições desesperadoras. Desde então, de-
zessete anos se passaram. Camaradas, não é hora de cumprirmos a ordem de
Lenin? Eu acho que é.
Aqui está o que Lenin disse em 1919 em seu “Projeto de Programa do Partido
Comunista da Rússia”. Permita-me ler.
“O Partido Comunista Russo deve explicar às massas trabalhadoras, a fim de evitar uma
generalização errada das necessidades históricas transitórias, que a privação de direitos de
uma parte dos cidadãos não afeta na República Soviética, como foi o caso na maioria das
repúblicas democrático-burguesas, uma categoria definida de cidadãos privados de direitos
para toda a vida, mas se aplica apenas aos exploradores, apenas àqueles que, em violação das
leis fundamentais da República Socialista Soviética, persistem em defender sua posição de
exploradores, na preservação do capitalismo Consequentemente, na República Soviética, por
um lado, cada dia de força acrescida para o Socialismo e diminuição do número daqueles que
têm possibilidades objetivas de permanecer exploradores ou de preservar as relações capita-
listas, reduz automaticamente a percentagem de pessoas privadas de direitos. Na Rússia, no
momento, essa porcentagem é pouco mais do que 2 ou 3%. Num futuro distante, a cessação
da invasão estrangeira e a conclusão da expropriação dos expropriadores podem, sob certas
condições, criar uma situação em que o poder estatal proletário escolherá outros métodos
de suprimir a resistência dos exploradores e introduzirá o sufrágio universal sem qualquer
restrições.” (Lenin: Obras Escolhidas, edição russa, Vol. XXIV, p. 94.)

Isso é claro, eu acho.


Essa é a posição em relação às emendas e adendos ao Projeto de Constituição
da URSS.
570 Obras Escolhidas

VI

O significado da nova constituição da URSS


A julgar pelos resultados da discussão nacional, que durou quase cinco me-
ses, pode-se presumir que o Projeto de Constituição será aprovado pelo atual
Congresso. (aplausos. Todos se levantam.)
Em poucos dias, a União Soviética terá uma nova Constituição Socialista, cons-
truída sobre os princípios do democratismo socialista plenamente desenvolvido.
Será um documento histórico que tratará em termos simples e concisos, quase
em forma de ata, dos fatos da vitória do Socialismo na URSS, dos fatos da eman-
cipação dos trabalhadores da URSS da escravidão capitalista, com os fatos da
vitória na URSS de uma democracia plena e totalmente consistente.
Será um documento que atesta que aquilo com que sonharam e ainda sonham
milhões de pessoas honestas nos países capitalistas já se realizou na URSS. (Vivos
aplausos.)
Será um documento que atesta o fato de que o que foi realizado na URSS é
plenamente possível de ser realizado também em outros países. (Aplausos.)
Mas daí decorre que o significado internacional da nova Constituição da
URSS dificilmente pode ser exagerado.
Hoje, quando a turva onda de fascismo está manchando o movimento soci-
alista da classe trabalhadora e manchando as lutas democráticas das melhores
pessoas do mundo civilizado, a nova Constituição da URSS será uma acusação
contra o fascismo, declarando que o socialismo e a democracia são invencível.
(aplausos.) A nova Constituição da URSS dará assistência moral e verdadeiro
apoio a todos aqueles que hoje lutam contra a barbárie fascista. (aplausos.)
Ainda maior é o significado da nova Constituição da URSS para os povos
da URSS. Enquanto para os povos dos países capitalistas a Constituição da URSS
terá o significado de um programa de ação, é significativa para os povos da URSS
como a síntese de suas lutas, um resumo de suas vitórias na luta pela emancipação
da humanidade. Depois do caminho de luta e privação que percorreu, é agradá-
vel e alegre ter a nossa Constituição, que trata dos frutos das nossas vitórias. É
uma alegria e uma alegria saber por que lutou nosso povo e como conquistou esta
vitória de importância histórica mundial. É agradável e alegre saber que o san-
gue que nosso povo derramou tão abundantemente não foi derramado em vão,
que produziu resultados. (Aplausos prolongados.) Isso arma nossa classe operá-
ria, nosso campesinato, nossa intelectualidade operária espiritualmente. Isso os
impulsiona e desperta um sentimento de orgulho legítimo. Aumenta a confiança
em nossa força e nos mobiliza para novas lutas pela conquista de novas vitórias
do comunismo. (Aplausos estrondosos. Todos se levantam. Gritos de todas as partes do
salão: “Viva o camarada Stalin.” Todos se levantam e cantam a “Internacional”, após a
qual a ovação é retomada. Gritos de “Viva nosso líder, camarada Stalin, viva.” )
Pravda,
26 de novembro de 1936
J. V. Stalin 571

Sobre a vitória final do socialismo


na União Soviética
18 de janeiro de 1938 - 12 de fevereiro de 1938

Ivan Philipovich Ivanov, propagandista da equipe do distrito de Manturovsk


da Liga dos Jovens Comunistas na região de Kursk da URSS, dirigiu uma carta
ao camarada Stalin solicitando sua opinião sobre a questão da vitória final do
socialismo na União Soviética.

Ivanov para Stalin

Caro camarada Stalin,


Peço-lhe sinceramente que explique a seguinte questão: Nos distritos locais
daqui e até mesmo no Comitê Regional da Liga Jovem Comunista, prevalece
uma dupla concepção sobre a vitória final do socialismo em nosso país, ou seja,
o primeiro grupo de contradições é confundido com o segundo.
Em seus trabalhos sobre o destino do Socialismo na URSS, você fala de dois
grupos de contradições – internas e externas.
Quanto ao primeiro grupo de contradições, nós, é claro, resolvemos – dentro
do país o socialismo vence.
Gostaria de saber sua resposta sobre o segundo grupo de contradições, ou
seja, aquelas entre a terra do socialismo e do capitalismo.
Assinala que a vitória final do socialismo implica a solução das contradições
externas, que devemos estar totalmente garantidos contra a intervenção e, por
conseguinte, contra a restauração do capitalismo.
Mas este conjunto de contradições só pode ser resolvido com o esforço dos
trabalhadores de todos os países.
Além disso, o camarada Lenin nos ensinou que “só podemos alcançar a vitória
final em escala mundial, somente com o esforço conjunto dos trabalhadores de
todos os países”.
Enquanto assistia às aulas de propagandistas do quadro de pessoal do Comitê
Regional da LJC, eu, baseando-me nos seus trabalhos, disse que a vitória final
do Socialismo só é possível à escala mundial. Mas os principais trabalhadores do
comitê regional – Urozhenko, Primeiro Secretário do Comitê Regional, e Kazel-
kov, instrutor de propaganda – descreveram minha declaração como uma surtida
trotskista.
Comecei a ler para eles trechos de seus trabalhos sobre esta questão, mas
Urozhenko ordenou-me que fechasse o livro e disse: “O camarada Stalin disse
isso em 1926, mas agora estamos em 1938. Naquela época não tínhamos a vi-
tória final , mas agora o temos e não há necessidade de nos preocuparmos com
intervenção e restauração.”
572 Obras Escolhidas

Em seguida, ele disse: “Temos agora a vitória final do socialismo e uma ga-
rantia total contra a intervenção e a restauração do capitalismo.”
E assim fui considerado um cúmplice do trotskismo e removido do trabalho
de propaganda e foi levantada a questão de saber se eu estava apto a permanecer
na LJC.
Por favor, camarada Stalin, explique se ainda temos ou não a vitória final
do socialismo. Talvez haja material contemporâneo adicional sobre esta questão
conectado com mudanças recentes que ainda não descobri. Também acho que
a afirmação de Urozhenko de que os trabalhos do camarada Stalin sobre esta
questão estão um tanto desatualizados é antibolchevique.
Os dirigentes do Comitê Regional estão certos em me considerar trotskista?
Sinto-me muito magoado e ofendido com isso.
Espero, camarada Stalin, que conceda meu pedido e responda ao distrito de
Manturovsk, região de Kursk, primeiro soviete da vila de Zasemsky, Ivan Phili-
povich Ivanov.
(Assinado) I. Ivanov. 18 de janeiro de 1938.

Stalin para Ivanov

Claro que você está certo, camarada Ivanov, e seus oponentes ideológicos,
ou seja, os camaradas Urozhenko e Kazelkov, estão errados. E pelos seguintes
motivos:
Sem dúvida, a questão da vitória do socialismo em um país, neste caso o nosso
país, tem dois lados diferentes.
O primeiro lado da questão da vitória do socialismo em nosso país abrange o
problema das relações mútuas entre as classes em nosso país. Isso diz respeito à
esfera das relações internas.
A classe operária de nosso país pode superar as contradições com nosso cam-
pesinato e estabelecer uma aliança, uma colaboração com eles?
Pode a classe operária de nosso país, em aliança com nosso campesinato, es-
magar a burguesia de nosso país, privá-la das terras, das fábricas, das minas, etc.,
e por seus próprios esforços construir uma nova sociedade sem classes, uma so-
ciedade socialista completa?
Tais são os problemas que se relacionam com o primeiro lado da questão da
vitória do socialismo em nosso país.
O leninismo responde afirmativamente a esses problemas.
Lenin nos ensina que “temos tudo o que é necessário para a construção de
uma sociedade socialista completa”.
Portanto, podemos e devemos, por nossos próprios esforços, superar nossa
burguesia e construir a sociedade socialista.
Trotsky, Zinoviev, Kamenev e outros senhores que mais tarde se tornaram es-
piões e agentes do fascismo, negaram que fosse possível construir o socialismo em
nosso país, a menos que a vitória da revolução socialista fosse alcançada primeiro
em outros países, em países capitalistas. Na verdade, estes senhores queriam
J. V. Stalin 573

voltar o nosso país ao caminho do desenvolvimento burguês e esconderam a sua


apostasia falando hipocritamente da “vitória da revolução” noutros países.
Este foi precisamente o ponto de controvérsia entre o nosso Partido e estes
senhores.
O curso posterior do desenvolvimento de nosso país provou que o Partido
estava certo e que Trotsky e companhia estavam errados.
Pois, durante este período, conseguimos liquidar a nossa burguesia, estabele-
cer uma colaboração fraterna com o nosso campesinato e construir, no essencial,
a sociedade socialista, embora a revolução socialista ainda não tenha vencido em
outros países.
Esta é a posição em relação ao primeiro lado da questão da vitória do socia-
lismo em nosso país.
Creio, camarada Ivanov, que este não é o lado da questão que está na origem
da controvérsia entre você e os camaradas Urozhenko e Kazelkov.
O segundo lado da questão da vitória do socialismo em nosso país abrange
o problema das relações mútuas entre nosso país e outros países, países capita-
listas; o problema das relações mútuas entre a classe operária de nosso país e
a burguesia de outros países. Isso diz respeito à esfera das relações externas e
internacionais. Pode o socialismo vitorioso de um país, que está rodeado por
muitos países capitalistas fortes, considerar-se totalmente garantido contra o pe-
rigo de invasão militar e, portanto, contra as tentativas de restaurar o capitalismo
em nosso país?
Pode nossa classe operária e nosso campesinato, por seus próprios esforços,
sem a ajuda séria da classe operária nos países capitalistas, superar a burguesia
de outros países da mesma forma que vencemos nossa própria burguesia? Em
outras palavras: podemos considerar a vitória do socialismo em nosso país como
definitiva, ou seja, como estando livre dos perigos do ataque militar e das tenta-
tivas de restaurar o capitalismo, supondo que o socialismo vence apenas em um
país e que o cerco capitalista continua existir?
Tais são os problemas que se relacionam com a segunda face da questão da
vitória do socialismo em nosso país.
O leninismo responde a esses problemas negativamente. O leninismo ensina
que “a vitória final do socialismo, no sentido de garantia total contra o restabe-
lecimento das relações burguesas, só é possível em escala internacional” (como a
resolução da Décima Quarta Conferência do Partido Comunista da União Sovié-
tica).
Isso significa que a ajuda séria do proletariado internacional é uma força
sem a qual o problema da vitória final do socialismo em um país não pode ser
resolvido.
Isso, é claro, não significa que devemos sentar de braços cruzados e esperar
pela ajuda de fora. Pelo contrário, esta ajuda do proletariado internacional deve
ser combinada com o nosso trabalho para fortalecer a defesa do nosso país, para
fortalecer o Exército Vermelho e a Marinha Vermelha, para mobilizar todo o país
com o propósito de resistir aos ataques militares e às tentativas de restauração.
relações burguesas.
574 Obras Escolhidas

Isso é o que Lenin diz sobre o assunto:


“Vivemos não apenas em um Estado, mas em um sistema de Estados, e é inconcebível que a
República Soviética continue a coexistir por um longo período ao lado dos Estados imperi-
alistas. Em última análise, um ou outro deve conquistar. Enquanto isso, alguns de terríveis
confrontos entre a República Soviética e os Estados burgueses é inevitável. Isso significa que
se o proletariado, como classe dominante, quer e vai governar, deve prová-lo também pela
organização militar.” (Obras Escolhidas, Vol. 24. p. 122.)

E mais:
“Estamos cercados por pessoas, classes e governos que expressam abertamente seu ódio por
nós. Devemos lembrar que estamos sempre a um fio de cabelo da invasão.” (Obras Escolhidas,
Vol. 27, p. 117.)

Isso é dito de forma nítida e forte, mas honesta e verdadeiramente sem em-
belezamento, como Lenin foi capaz de falar.
Com base nessas premissas, Stalin afirmou em “Em Torno dos Problemas do Le-
ninismo” que:
“A vitória final do socialismo é a garantia total contra as tentativas de intervenção, e isso
significa contra a restauração, pois qualquer tentativa séria de restauração só pode acontecer
com o apoio sério de fora, apenas com o apoio do capital internacional.

Daí o apoio à nossa revolução pelos trabalhadores de todos os países, e ainda mais, a vitória
dos trabalhadores em pelo menos vários países, é uma condição necessária para garantir ple-
namente o primeiro país vitorioso contra as tentativas de intervenção e restauração, condição
necessária para a vitória final do Socialismo” (Em Torno dos Problemas do Leninismo. 1937, p.
134.)

Na verdade, seria ridículo e estúpido fechar os olhos ao cerco capitalista e


pensar que os nossos inimigos externos, os fascistas, por exemplo, não farão, se
surgir a oportunidade, uma tentativa de ataque militar à URSS. Os fanfarrões
ou inimigos mascarados que desejam acalmar a vigilância de nosso povo podem
pensar assim.
Não menos ridículo seria negar que, no caso de o menor sucesso de uma
intervenção militar, os intervencionistas tentariam destruir o sistema soviético
nos distritos que ocuparam e restaurar o sistema burguês.
Denikin e Kolchak não restauraram o sistema burguês nos distritos que ocu-
param? Os fascistas são melhores do que Denikin ou Kolchak?
Só estúpidos ou inimigos mascarados que com sua arrogância querem escon-
der sua hostilidade e se esforçam para desmobilizar o povo, podem negar o perigo
da intervenção militar e das tentativas de restauração enquanto o cerco capitalista
existir.
A vitória do socialismo em um país pode ser considerada final se este país
está rodeado pelo capitalismo e não está totalmente garantido contra o perigo
de intervenção e restauração?
Claramente, não pode.
Esta é a posição em relação à questão da vitória do socialismo em um país.
Conclui-se que esta questão contém dois problemas diferentes:
1. O problema das relações internas em nosso país, ou seja, o problema de
superar nossa própria burguesia e construir o socialismo completo; e
J. V. Stalin 575

2. O problema das relações externas do nosso país, ou seja, o problema de


garantir totalmente o nosso país contra os perigos da intervenção militar e da
restauração.
Já resolvemos o primeiro problema, pois nossa burguesia já foi liquidada e o
socialismo já está construído na sua maioria. Isso é o que chamamos de vitória
do socialismo, ou, para ser mais exato, a vitória da construção socialista em um
país.
Poderíamos dizer que esta vitória é definitiva se o nosso país estivesse situado
numa ilha e não estivesse rodeado por numerosos países capitalistas.
Mas como não vivemos em uma ilha, mas “em um sistema de Estados”, um
número considerável dos quais são hostis à terra do socialismo e criam o perigo
de intervenção e restauração, dizemos aberta e honestamente que a vitória do
socialismo em nosso país ainda não é final.
Mas daí segue-se que o segundo problema ainda não foi resolvido e que ainda
não foi resolvido. Mais do que isso: o segundo problema não pode ser resolvido
da mesma forma que resolvemos o primeiro, ou seja, unicamente com o esforço
do nosso país.
O segundo problema só pode ser resolvido combinando os esforços sérios do
proletariado internacional com os esforços ainda mais sérios de todo o nosso povo
soviético.
Os laços proletários internacionais entre a classe trabalhadora da URSS e a
classe trabalhadora nos países burgueses devem ser aumentados e fortalecidos; a
ajuda política da classe operária nos países burgueses à classe operária de nosso
país deve ser organizada em caso de um ataque militar ao nosso país; e também
toda ajuda da classe operária de nosso país para a classe operária nos países bur-
gueses deve ser organizada; nosso Exército Vermelho, Marinha Vermelha, Frota
Aérea Vermelha e a Sociedade de Defesa Química e Aérea devem ser aumentados
e fortalecidos ao máximo.
Todo o nosso povo deve ser mantido em status de mobilização e preparação
perante o perigo de um ataque militar, para que nenhum “acidente” e nenhum
truque da parte dos nossos inimigos externos nos apanhe de surpresa...
De sua carta fica evidente que o camarada Urozhenko adere a opiniões dife-
rentes e não exatamente leninistas. Ele, ao que parece, afirma que “agora temos
a vitória final do socialismo e plena garantia contra a intervenção e a restauração
do capitalismo”.
Não pode haver a menor dúvida de que o camarada Urozhenko está funda-
mentalmente errado.
A afirmação do camarada Urozhenko só pode ser explicada por sua incapaci-
dade de compreender a realidade circundante e sua ignorância das proposições
elementares do leninismo, ou pela vaidade vazia de um jovem burocrata vaidoso.
Se é verdade que “temos total garantia contra a intervenção e restauração do
capitalismo”, então por que precisamos de um Exército Vermelho forte, Marinha
Vermelha, Frota Aérea Vermelha, uma Sociedade Química e de Defesa Aérea
forte, mais e mais fortes laços com o internacional proletariado?
Não seria melhor gastar os bilhões que agora vão com o propósito de forta-
576 Obras Escolhidas

lecer o Exército Vermelho em outras necessidades e reduzi-lo ao máximo, ou


mesmo dissolvê-lo por completo?
Pessoas como o camarada Urozhenko, mesmo que subjetivamente sejam leais
à nossa causa, são objetivamente perigosas para ela porque com sua arrogância
eles - de boa ou má vontade (não faz diferença!) – acalmam a vigilância de nosso
povo, desmobilizam os trabalhadores e camponeses e ajudam os inimigos a nos
pegar de surpresa em caso de complicações internacionais.
Quanto ao fato de que, ao que parece, você, camarada Ivanov, foi “afastado do
trabalho de propaganda e foi levantada a questão de sua aptidão para permanecer
na LJC”, você não tem nada a temer.
Se as pessoas do Comitê Regional da LJC realmente querem imitar o sargento
Prishibeyev de Chekov, você pode ter certeza de que eles perderão neste jogo.
Os Prishibeyev não são apreciados em nosso país.
Agora você pode julgar se a passagem do livro “Problemas do Leninismo”
sobre a vitória do Socialismo em um país está desatualizada ou não.
Eu mesmo gostaria que estivesse desatualizado, gostaria que coisas desagradá-
veis como o cerco capitalista, o perigo de um ataque militar, o perigo da restau-
ração do capitalismo, etc., fossem coisas do passado. Infelizmente, porém, essas
coisas desagradáveis ainda existem.
J. Stalin
12 de fevereiro de 1938.
Pravda,
14 de fevereiro de 1938
J. V. Stalin 577

Relatório sobre o trabalho do


Comitê Central ao XVIII Congresso
do PCUS
10 de março de 1939

A União Soviética em campo internacional

Camaradas, cinco anos se passaram desde o XVII Congresso do Partido. Não


é um período pequeno, como notam.
Durante esse período, o mundo passou por mudanças consideráveis. Esta-
dos e países, e suas relações mútuas, estão agora em muitos aspectos totalmente
alterados.
Que mudanças exatamente ocorreram na situação internacional neste pe-
ríodo? De que maneira exatamente mudaram os assuntos externos e internos
de nosso país?
Para os países capitalistas, esse período foi de profundas perturbações tanto
na esfera econômica quanto na política. Na esfera econômica foram anos de
depressão, seguidos, desde o início da segunda metade de 1937, por um período
de nova crise econômica, de um novo declínio da indústria nos Estados Unidos,
Grã-Bretanha e França; consequentemente, foram anos de novas complicações
econômicas. Na esfera política foram anos de graves conflitos e perturbações
políticas. Uma nova guerra imperialista já está em seu segundo ano, uma guerra
travada por um enorme território que se estende de Xangai a Gibraltar e envolve
mais de quinhentos milhões de pessoas. Os mapas da Europa, África e Ásia estão
sendo redesenhados à força.
Todo o sistema pós-guerra, o chamado regime de paz, foi abalado em seus
alicerces.
Para a União Soviética, ao contrário, foram anos de crescimento e prosperi-
dade, de maior progresso econômico e cultural, de maior desenvolvimento do
poder político e militar, de luta pela preservação da paz em todo o mundo.
Essa é a situação geral.
Examinemos agora os dados concretos que ilustram as mudanças na situação
internacional.
578 Obras Escolhidas

1. Nova crise econômica nos países capitalistas,


intensificação das disputas por mercados e fontes de
matéria-prima e por uma nova redivisão do mundo

A crise econômica que eclodiu nos países capitalistas na segunda metade de


1929 durou até o final de 1933. Depois disso, a crise passou para uma depressão,
seguida por um certo renascimento, uma certa tendência ascendente da indús-
tria. Mas essa tendência ascendente da indústria não evoluiu para um boom, como
geralmente é o caso em um período de renascimento. Pelo contrário, na segunda
metade de 1937 começou uma nova crise econômica que atingiu primeiro os Es-
tados Unidos, e depois a Inglaterra, a França, e vários outros países.
Os países capitalistas viram-se então confrontados com uma nova crise econó-
mica antes mesmo de se recuperarem das devastações da recente.
Essa circunstância levou naturalmente a um aumento do desemprego. O nú-
mero de desempregados nos países capitalistas, que havia caído de trinta milhões
em 1933 para quatorze milhões em 1937, agora aumentou novamente para de-
zoito milhões como resultado da nova crise econômica.
Uma característica peculiar da nova crise é que ela difere em muitos aspectos
da anterior e, além disso, difere para pior e não para melhor.
Em primeiro lugar, a nova crise não começou depois de um boom industrial,
como foi o caso em 1929, mas depois de uma depressão e um certo renascimento,
que, no entanto, não evoluiu para um boom. Isso significa que a crise atual será
mais grave e mais difícil de enfrentar do que a crise anterior.
Além disso, a crise atual estourou não em tempos de paz, mas em um mo-
mento em que uma segunda guerra imperialista já começou; numa época em
que o Japão, já no segundo ano de sua guerra com a China, está desorganizando
o imenso mercado chinês e o tornando quase inacessível aos produtos de outros
países; quando a Itália e a Alemanha já colocaram sua economia nacional em pé
de guerra, desperdiçando suas reservas de matéria-prima e moeda estrangeira
para esse fim; e quando todas as outras grandes potências capitalistas estão co-
meçando a se reorganizar em pé de guerra. Isso significa que o capitalismo terá
muito menos recursos à sua disposição para uma saída normal da crise atual do
que durante a crise anterior.
Por último, distinta da crise anterior, a crise atual não é geral, mas envolve
principalmente os países economicamente poderosos que ainda não se coloca-
ram em uma base de economia de guerra. Quanto aos países agressores, como
Japão, Alemanha e Itália, que já reorganizaram sua economia em pé de guerra,
eles, devido ao intenso desenvolvimento de sua indústria bélica, ainda não estão
passando por uma crise de superprodução, embora estejam se aproximando isto.
Isso significa que, no momento em que os países economicamente poderosos e
não agressores começam a sair da fase de crise, os países agressores, tendo esgo-
tado suas reservas de ouro e matéria-prima durante a agitação da guerra, estão
fadados a entrar em uma fase de crise muito severa.
Isso é claramente ilustrado, por exemplo, pelos números das reservas visíveis
de ouro dos países capitalistas (tabela 1).
Esta tabela mostra que as reservas de ouro combinadas da Alemanha, Itália e
J. V. Stalin 579

Tabela 1:
RESERVAS DE OURO VISÍVEIS DOS PAÍSES CAPITALISTAS
(Em milhões de dólares de ouro)
fim de 1936 setembro de 1938
Total 12.980 14.301
EUA 6.499 8.126
Grã-Bretanha 2.029 2.396
França 1.769 1.435
Holanda 289 595
Bélgica 373 318
Suíça 387 407
Alemanha 16 17
Itália 123 124
Japão 273 97

Japão somam menos do que as reservas da Suíça sozinha.


Na tabela 2 estão alguns números que ilustram a situação de crise da indústria
nos países capitalistas durante os últimos cinco anos e a tendência do progresso
industrial na URSS.

Tabela 2:
VOLUME DE SAÍDA INDUSTRIAL
EM COMPARAÇÃO COM 1929 (1929 = 100)
1934 1935 1936 1937 1938
EUA 66,4 75,6 88,1 92,2 72,0
Grã-Bretanha 98,8 105,8 115,9 123,7 112,0
França 71,0 67,4 79,3 82,8 70,0
Itália 80,0 93,8 87,5 99,6 96,0
Alemanha 79,8 94,0 106,3 117,2 125,0
Japão 128,7 141,8 151,1 170,8 165,0
URSS 283,3 293,4 382,3 424,0 477,0

Esta tabela mostra que a União Soviética é o único país do mundo onde as
crises são desconhecidas e onde a indústria está em constante atualização.
Este quadro também mostra que uma grave crise econômica já começou e está
se desenvolvendo nos Estados Unidos, Grã-Bretanha e França.
Além disso, esta tabela mostra que na Itália e no Japão, que colocaram sua
economia nacional em pé de guerra antes da Alemanha, o curso descendente da
indústria já começou em 1938.
Por último, esta tabela mostra que na Alemanha, que reorganizou sua econo-
mia em pé de guerra depois da Itália e do Japão, a indústria ainda experimenta
uma certa tendência de alta – embora pequena, é verdade – correspondente à
que ocorreu no Japão e Itália até recentemente.
Não pode haver dúvida de que, a menos que ocorra algo imprevisto, a in-
580 Obras Escolhidas

dústria alemã deve seguir o mesmo caminho de queda que o Japão e a Itália
já percorreram. Pois o que significa colocar a economia de um país em pé de
guerra? Significa dar à indústria uma direção de guerra unilateral; desenvolver
ao máximo a produção de bens necessários à guerra e não ao consumo da popu-
lação; restringindo ao máximo a produção e, principalmente, a venda de artigos
de consumo geral – e, consequentemente, reduzindo o consumo da população e
confrontando o país com uma crise econômica.
Este é o quadro concreto da tendência da nova crise econômica nos países
capitalistas.
Naturalmente, tal virada desfavorável nos assuntos econômicos não poderia
deixar de agravar as relações entre as potências. A crise anterior já havia mistu-
rado as cartas e intensificado a luta por mercados e fontes de matérias-primas.
A tomada da Manchúria e do Norte da China pelo Japão, a tomada da Abissínia
pela Itália – tudo isso refletia a acuidade da luta entre as potências. A nova crise
econômica deve levar, e na verdade está levando, a um maior acirramento da luta
imperialista. Já não se trata de concorrência nos mercados, de guerra comercial,
de dumping. Esses métodos de luta há muito são reconhecidos como inadequa-
dos. Trata-se agora de uma nova redivisão do mundo, das esferas de influência
e das colônias, pela ação militar.
O Japão tentou justificar suas agressões com o argumento de que ela foi en-
ganada quando o Tratado das Nove Potências foi concluído e não teve permissão
para estender seu território às custas da China, enquanto a Grã-Bretanha e a
França possuem vastas colônias. A Itália lembrou que foi enganada durante a di-
visão dos espólios após a primeira guerra imperialista e que deve se recompensar
às custas das esferas de influência da Grã-Bretanha e da França. A Alemanha,
que havia sofrido gravemente como resultado da primeira guerra imperialista
e da Paz de Versalhes, juntou forças com o Japão e a Itália e exigiu a extensão
de seu território na Europa e o retorno das colônias das quais os vencedores no
primeiro imperialismo a guerra a privou.
Assim se formou o bloco dos três Estados agressores.
Uma nova redivisão do mundo por meio da guerra tornou-se iminente.

2. Agravamento da situação política internacional

Colapso do sistema de tratados de paz do pós-guerra.


Início de uma nova guerra imperialista.
Aqui está uma lista dos eventos mais importantes durante o período em aná-
lise que marcam o início da nova guerra imperialista. Em 1935, a Itália atacou
e apreendeu a Abissínia. No verão de 1936, a Alemanha e a Itália organizaram
uma intervenção militar na Espanha, a Alemanha se entrincheirou no norte da
Espanha e no Marrocos espanhol, e a Itália no sul da Espanha e nas Ilhas Bale-
ares. Tendo tomado a Manchúria, o Japão em 1937 invadiu o Norte e o Centro
da China, ocupou Pequim, Tientsin e Xangai e começou a expulsar seus concor-
rentes estrangeiros da zona ocupada. No início de 1938, a Alemanha conquistou
a Áustria e, no outono de 1938, a região dos Sudetos da Tchecoslováquia. No
final de 1938, o Japão conquistou Cantão e no início de 1939 a Ilha de Hainan.
J. V. Stalin 581

Assim, a guerra, que atingiu as nações de forma tão imperceptível, atraiu


mais de 500 milhões de pessoas para sua órbita e estendeu sua esfera de ação por
um vasto território, que se alastra de Tientsin, Xangai e Cantão, passando pela
Abissínia e até Gibraltar.
Depois da primeira guerra imperialista, os Estados vencedores, principal-
mente a Grã-Bretanha, a França e os Estados Unidos, estabeleceram um novo
regime nas relações entre os países, o regime de paz do pós-guerra. Os princi-
pais pilares desse regime foram o Tratado das Nove Potências no extremo oriente,
o Tratado de Versalhes, e vários outros tratados na Europa. A Liga das Nações foi
criada para regular as relações entre os países no âmbito deste regime, na base
de uma frente única dos Estados, de defesa coletiva da segurança dos Estados.
No entanto, três Estados agressores e a nova guerra imperialista por eles lançada
perturbaram todo o sistema deste regime de paz do pós-guerra.
O Japão rasgou o Tratado das Nove Potências, e a Alemanha e a Itália o Tra-
tado de Versalhes. Para ter as mãos livres, esses três Estados se retiraram da Liga
das Nações.
A nova guerra imperialista tornou-se um fato.
Não é tão fácil em nossos dias se libertar repentinamente e mergulhar direto
na guerra sem levar em conta tratados de qualquer tipo ou a opinião pública.
Os políticos burgueses sabem disso muito bem. O mesmo acontece com os go-
vernantes fascistas. É por isso que os governantes fascistas decidiram, antes de
mergulhar na guerra, enquadrar a opinião pública para se adequar aos seus fins,
isto é, persuadi-la, enganá-la.
Um bloco militar da Alemanha e da Itália contra os interesses da Inglaterra e
da França na Europa? Abençoe-nos, você chama isso de bloco? “Nós” não temos
bloco militar.
Tudo o que “nós” temos é um “eixo Berlim-Roma” inofensivo; isto é, apenas
uma equação geométrica para um eixo. (Risos.)
Um bloco militar da Alemanha, Itália e Japão contra os interesses dos Estados
Unidos, Grã-Bretanha e França no Extremo Oriente? Nada desse gênero.
“Nós” não temos bloco militar. Tudo o que “nós” temos é um “triângulo
Berlim-Roma-Tóquio” inofensivo; isto é, uma leve inclinação para a geometria.
(Mais risos.)
Uma guerra contra os interesses da Inglaterra, França, Estados Unidos? Ab-
surdo! “Nós” estamos travando uma guerra contra o Comintern, não contra esses
Estados. Se você não acredita, leia o “pacto anti-Comintern” concluído entre a
Itália, a Alemanha e o Japão.
Era assim, messieurs, que os agressores pensavam em enquadrar a opinião pú-
blica, embora não fosse difícil perceber o quão absurdo era todo aquele jogo de-
sajeitado de camuflagem; pois é ridículo procurar “viveiros” do Comintern nos
desertos da Mongólia, nas montanhas da Abissínia ou nos confins do Marrocos
espanhol. (Risos.)
Mas a guerra é inexorável. Não pode ser escondido sob nenhum pretexto.
Pois nenhum “eixo”, “triângulo” ou “pacto anti-Comintern” pode esconder o fato
de que neste período o Japão se apoderou de uma vasta extensão de território
582 Obras Escolhidas

na China, que a Itália se apoderou da Abissínia, que a Alemanha se apoderou


da Áustria e da região dos Sudetos, que a Alemanha e a Itália juntas tomaram a
Espanha – e tudo isso em desafio aos interesses dos Estados não-agressores.
A guerra continua uma guerra; o bloco militar de agressores continua sendo
um bloco militar; e os agressores continuam agressores.
É uma característica distintiva da nova guerra imperialista que ainda não se
tornou universal, uma guerra mundial. A guerra está sendo travada por Esta-
dos agressores, que em todos os sentidos infringem os interesses dos Estados não
agressivos, principalmente Inglaterra, França e EUA, enquanto estes últimos re-
cuam e recuam, fazendo concessão após concessão aos agressores.
Assistimos, assim, a uma redivisão aberta do mundo e das esferas de influên-
cia à custa dos Estados não-agressores, sem a menor tentativa de resistência, e
mesmo com alguma conivência, por parte destes.
Incrível, mas é verdade.
A que devemos atribuir esse caráter unilateral e estranho da nova guerra im-
perialista?
Como é que os países não-agressores, que possuem tantas oportunidades, tão
facilmente, e sem resistência, abandonaram suas posições e suas obrigações de
agradar aos agressores?
Deve ser atribuído à fraqueza dos Estados não-agressores? Claro que não.
Combinados, os Estados não-agressores e democráticos são inquestionavelmente
mais fortes do que os Estados fascistas, tanto economicamente quanto no sentido
militar.
A que então devemos atribuir as concessões sistemáticas feitas por esses Esta-
dos aos agressores?
Pode ser atribuído, por exemplo, ao medo de que uma revolução possa eclodir
se os Estados não agressivos forem à guerra e a guerra assumir proporções mun-
diais. Os políticos burgueses sabem, é claro, que a primeira guerra imperialista
mundial levou à vitória da revolução em um dos maiores países. Eles temem que
a segunda guerra mundial imperialista possa também levar à vitória da revolução
em um ou vários países.
Mas, no momento, essa não é a única nem a principal razão. A principal
razão é que a maioria dos países não-agressores, particularmente Inglaterra e
França, rejeitaram a política de segurança coletiva, a política de resistência cole-
tiva aos agressores, e assumiram uma posição de não-intervenção, uma posição
de “neutralidade”.
Formalmente falando, a política de não intervenção pode ser definida da se-
guinte forma: “Que cada país se defenda dos agressores como quiser e da melhor
maneira que puder. Isso não é problema nosso. Trataremos tanto com os agres-
sores como com suas vítimas.” Mas, na verdade, a política de não-intervenção sig-
nifica conivência com a agressão, dar rédea solta à guerra e, consequentemente,
transformar a guerra em guerra mundial. A política de não-intervenção revela
uma ânsia, um desejo de não impedir os agressores em seu trabalho nefasto: não
impedir o Japão, digamos, de se envolver em uma guerra com a China, ou, me-
lhor ainda, com a União Soviética: permitir que todos os beligerantes afundem
J. V. Stalin 583

profundamente no lodo da guerra, para encorajá-los sorrateiramente nisso, para


permitir que eles enfraqueçam e esgotem uns aos outros; e então, quando eles
se tornaram fracos o suficiente, para aparecer em cena com força renovada, para
aparecer, é claro, “no interesse da paz”, e para ditar condições aos beligerantes
enfraquecidos.
Barato e fácil!
Veja o Japão, por exemplo. É característico que, antes de o Japão invadir o
norte da China, todos os jornais franceses e britânicos influentes gritaram sobre a
fraqueza da China e sua incapacidade de oferecer resistência, e declararam que o
Japão com seu exército poderia subjugar a China em dois ou três meses. Então,
os políticos europeus e americanos começaram a observar e esperar. E então,
quando o Japão iniciou as operações militares, eles deixaram que ela ficasse com
Xangai, o centro vital do capital estrangeiro na China; eles a deixaram ficar com
Cantão, um centro de influência monopolista da Grã-Bretanha no sul da China;
eles a deixaram ficar com Hainan e permitiram que ela cercasse Hong Kong.
Isso não se parece muito com encorajar o agressor? É como se dissessem:
“Envolva-se ainda mais na guerra; então veremos.”
Ou veja a Alemanha, por exemplo. Eles a deixaram ficar com a Áustria, ape-
sar do compromisso de defender sua independência; eles a deixaram ficar com
a região dos Sudetos; eles abandonaram a Tchecoslováquia ao seu destino, vio-
lando assim todas as suas obrigações; e então começou a mentir veementemente
na imprensa sobre “a fraqueza do exército russo”, “a desmoralização da força
aérea russa” e “distúrbios” na União Soviética, incitando os alemães a marchar
mais para o leste, prometendo-lhes saques fáceis, e induzindo-os: “Basta come-
çar a guerra contra os bolcheviques, e tudo ficará bem.” É preciso admitir que
isso também se parece muito com incitar e encorajar o agressor.
O alvoroço levantado pela imprensa britânica, francesa e americana sobre a
Ucrânia soviética é característico.
Os senhores da imprensa gritaram até ficarem roucos que os alemães estavam
marchando sobre a Ucrânia soviética, que agora tinham o que é chamado de
Ucrânia dos Cárpatos, com uma população de cerca de 700 mil habitantes, e
que não depois desta primavera os alemães iriam anexar a Ucrânia soviética,
que tem uma população de mais de 30 milhões, a essa chamada Ucrânia dos
Cárpatos. Parece que o objetivo desse alvoroço suspeito era incensar a União
Soviética contra a Alemanha, envenenar a atmosfera e provocar um conflito com
a Alemanha sem qualquer fundamento visível.
É bem possível, claro, que existam loucos na Alemanha que sonhem em ane-
xar o elefante, isto é, a Ucrânia soviética, ao mosquito, ou seja, a chamada Ucrâ-
nia dos Cárpatos. Se realmente existem tais lunáticos na Alemanha, tenha cer-
teza de que encontraremos camisas de força suficientes para eles em nosso país.
(Aplausos estrondosos.) Mas se ignorarmos os loucos e nos voltarmos para as pessoas
normais, não é claramente absurdo e tolo falar seriamente em anexar a Ucrânia
soviética a esta chamada Ucrânia dos Cárpatos? Imagine: o mosquito vem até o
elefante e diz alegremente: “Ah, irmão, como sinto muito por você... Aqui está
você, sem nenhum senhorio, sem nenhum capitalista, sem opressão nacional,
sem nenhum patrão fascista. Isso é um maneira de viver? Olhando para você,
584 Obras Escolhidas

não consigo deixar de pensar que não há esperança para você, a menos que se
anexe a mim... (Gargalhadas.) Bem, que assim seja: Eu permito que você anexe
seu minúsculo domínio aos meus vastos territórios.” (Risos e aplausos.)
Ainda mais característico é o fato de que certos políticos e jornalistas euro-
peus e americanos, perdendo a paciência à espera pela “marcha sobre a Ucrânia
soviética”, começam eles próprios a revelar o que está realmente por trás da polí-
tica de não-intervenção. Eles estão dizendo abertamente, colocando em preto no
branco, que os alemães os “desapontaram” cruelmente, pois em vez de marchar
mais para o leste, contra a União Soviética, eles se viraram, você vê, para o oeste
e estão exigindo colônias. Pode-se pensar que os distritos da Tchecoslováquia
foram cedidos à Alemanha como o preço de um compromisso de guerra contra
a União Soviética, mas agora os alemães se recusam a cumprir suas contas e os
enviam para o Hades.
Longe de mim moralizar o que concerne a política de não-intervenção, falar
de traição, trapaça e assim por diante. Seria ingênuo pregar a moral a pessoas
que não reconhecem a moralidade humana. Política é política, como dizem os
velhos diplomatas burgueses obstinados.
É preciso ressaltar, porém, que o grande e perigoso jogo político iniciado pe-
los partidários da política de não-intervenção pode terminar em um grave fiasco
para eles.
Essa é a verdadeira face da política de não-intervenção vigente.
Essa é a situação política nos países capitalistas.

3. A União Soviética e os países capitalistas

A guerra criou uma nova situação no que diz respeito às relações entre os
países. Isso os envolveu em uma atmosfera de alarme e incerteza. Ao minar o
regime de paz do pós-guerra e anular os princípios elementares do direito inter-
nacional, lançou dúvidas sobre o valor dos tratados e obrigações internacionais.
Os esquemas de pacifismo e desarmamento estão mortos e enterrados. O arma-
mento acalorado tomou seu lugar.
Todos estão se armando, pequenos e grandes Estados, principalmente aqueles
que praticam a política de não-intervenção. Ninguém acredita mais nos discursos
sicofantas que afirmam que as concessões de Munique aos agressores e o acordo
de Munique abriram uma nova era de “apaziguamento”. Eles são desacreditados
até pelos signatários do acordo de Munique, Grã-Bretanha e França, que estão
aumentando seus armamentos não menos do que outros países.
Naturalmente, a URSS não poderia ignorar esses eventos ameaçadores. Não
há dúvida de que qualquer guerra, por menor que seja, iniciada pelos agressores
em qualquer canto remoto do mundo, constitui um perigo para os países pací-
ficos. Tanto mais grave é o perigo que surge da nova guerra imperialista, que
já atraiu para a sua órbita mais de 500 milhões de pessoas na Ásia, África e Eu-
ropa. Em vista disso, enquanto nosso país segue inabalavelmente uma política
de preservação da paz, ao mesmo tempo está fazendo muito para aumentar a
preparação de nosso Exército Vermelho e de nossa Marinha Vermelha.
Ao mesmo tempo, a fim de fortalecer sua posição internacional, a União So-
J. V. Stalin 585

viética decidiu tomar outras medidas. No final de 1934 nosso país aderiu à Liga
das Nações, considerando que, apesar de sua fragilidade, a Liga pode, no en-
tanto, servir como um lugar onde os agressores podem ser expostos e como um
certo instrumento de paz, por mais fraco que seja, que pode impedir o início
da guerra. A União Soviética considera que em tempos alarmantes como estes,
mesmo uma organização internacional tão fraca como a Liga das Nações, não
deve ser ignorada. Em maio de 1935, um tratado de assistência mútua contra
possíveis ataques de agressores foi assinado entre a França e a União Soviética.
Um tratado semelhante foi aderido simultaneamente com a Tchecoslováquia. Em
março de 1936, a União Soviética firmou um tratado de assistência mútua com a
República Popular da Mongólia. Em agosto de 1937, a União Soviética assinou
um pacto de não agressão com a República Chinesa.
Foi em condições internacionais tão difíceis que a União Soviética seguiu sua
política externa de defesa da causa da paz.
A política externa da União Soviética é clara e explícita.
1. Defendemos a paz e o fortalecimento das relações comerciais com todos
os países. Essa é a nossa posição; e devemos aderir a esta posição enquanto esses
países mantiverem relações semelhantes com a União Soviética, e enquanto não
fizerem qualquer tentativa de invadir os interesses de nosso país.
2. Defendemos relações pacíficas, próximas e amistosas com todos os países
vizinhos que têm fronteiras comuns com a URSS. Essa é a nossa posição; e ade-
riremos a esta posição enquanto esses países mantiverem relações semelhantes
com a União Soviética e enquanto não fizerem qualquer tentativa de ultrapassar,
direta ou indiretamente, a integridade e inviolabilidade das fronteiras do Estado
soviético.
3. Defendemos o apoio às nações que são vítimas de agressões e lutam pela
independência do seu país.
4. Não temos medo das ameaças dos agressores e estamos prontos para desfe-
rir dois golpes por cada golpe desferido pelos instigadores de guerra que tentam
violar as fronteiras soviéticas.
Essa é a política externa da União Soviética. (Aplausos altos e prolongados.)
Em sua política externa, a União Soviética conta com:
1. Seu crescente poder econômico, político e cultural;
2. A unidade moral e política de nossa sociedade soviética;
3. A amizade mútua das nações de nosso país;
4. Seu Exército Vermelho e Marinha Vermelha;
5. Sua política de paz;
6. O apoio moral dos trabalhadores de todos os países, que estão vitalmente
preocupados com a preservação da paz;
7. O bom senso dos países que por uma razão ou outra não têm interesse na
violação da paz.

∗ ∗ ∗

As tarefas do Partido na esfera da política externa são:


586 Obras Escolhidas

1. Continuar a política de paz e de fortalecimento das relações comerciais


com todos os países;
2. Ser cauteloso e não permitir que nosso país seja arrastado para confli-
tos por fomentadores de guerra que estão acostumados a ter outros arrancando
castanhas do fogo por eles;
3. Para fortalecer o poder de nosso Exército Vermelho e Marinha Vermelha
ao máximo;
4. Fortalecer os laços internacionais de amizade com os trabalhadores de
todos os países, interessados na paz e na amizade entre as nações.

II

Assuntos internos da União Soviética

Passemos agora aos assuntos internos de nosso país.


Do ponto de vista de sua situação interna, a União Soviética, durante o pe-
ríodo em análise, apresentou um quadro de novos avanços em toda a sua vida
econômica, um aumento da cultura e o fortalecimento do poder político do país.
Quanto ao desenvolvimento econômico, devemos considerar que o resultado
mais importante durante o período em análise foi o fato de que a reconstrução
da indústria e da agricultura com base em uma técnica nova e moderna foi con-
cluída. Já não existem, ou quase não existem, em nosso país fábricas velhas, com
a sua técnica antiga, e quase não há antigas fazendas camponesas, com os seus
equipamentos antediluvianos. Nossa indústria e agricultura agora são baseadas
em técnicas novas e atualizadas. Pode-se dizer sem exagero que do ponto de vista
da técnica de produção, do ponto de vista do grau de saturação da indústria e
da agricultura com máquinas novas, nosso país está mais avançado que qualquer
outro, onde as máquinas antigas funcionam como um obstáculo na produção e
dificulta a introdução da técnica moderna.
No que concerne o desenvolvimento social e político do país, devemos con-
siderar a conquista mais importante do período em análise, o fato de que os
remanescentes das classes exploradoras foram completamente eliminados, que
os trabalhadores, camponeses e intelectuais foram. soldada em uma frente co-
mum dos trabalhadores, que a unidade moral e política da sociedade soviética foi
fortalecida, que a amizade entre as nações de nosso país se tornou mais estreita
e, como resultado, que a vida política de nosso país se tornou completamente de-
mocratizado e criada uma nova Constituição. Ninguém ousará negar que nossa
Constituição é a mais democrática do mundo, e que os resultados das eleições
para o Soviete Supremo da URSS, bem como para os Sovietes Supremos das Re-
públicas da União, foram os mais exemplares.
O resultado de tudo isso é uma situação interna completamente estável e uma
estabilidade de governo que qualquer outro governo no mundo poderia invejar.
Vejamos os dados concretos que ilustram a situação econômica e política de
nosso país.
J. V. Stalin 587

1. Adiante no progresso da indústria e da agricultura

a) Indústria: Durante o período em análise, nossa indústria apresentou um


quadro de progresso ininterrupto. Este progresso se refletiu não apenas em um
aumento da produção em geral, mas, principalmente, na florescente situação da
indústria socialista, por um lado, e o destino da indústria privada, por outro.
A tabela 3 ilustra isso.

Tabela 3:
PROGRESSO INDUSTRIAL DA URSS EM 1934-38
1933 1934 1935 1936 1937 1938
Total 42.030 50.477 62.137 80.929 90.166 100.375
Em milhões
Indústria
de rublos 42.002 50.443 62.114 80.898 90.138 100.349
socialista
aos preços
Indústria
de 1936-27 28 34 23 31 28 26
privada
Total 100, 00 100, 00 100, 00 100, 00 100, 00 100, 00
Indústria
99, 93 99, 93 99, 93 99, 96 99, 97 99, 97
Porcentagem socialista
Indústria
0, 07 0, 07 0, 04 0, 04 0, 03 0, 03
privada
1938
1934 1935 1936 1937 1938 comparado
Porcentagem em
a 1933 [%]
relação ao ano
Total 120, 1 123, 1 130, 2 111, 4 111, 3 238, 8
anterior
Indústria
120, 1 123, 1 130, 2 111, 4 111, 3 238, 9
socialista
Indústria
121, 1 67, 6 134, 8 90, 3 92, 9 92, 9
privada

Este quadro mostra que, durante o período em análise, a produção da nossa


indústria mais do que duplicou e que, além disso, todo o aumento da produção
foi explicado pela indústria socialista.
Além disso, esta tabela mostra que o único sistema de indústria na URSS é o
sistema socialista.
Por último, esta tabela mostra que a ruína completa da indústria privada é
um fato que até um cego agora não pode negar.
A ruína da indústria privada não deve ser considerada um acaso. A indústria
privada pereceu, em primeiro lugar, porque o sistema econômico socialista é
superior ao sistema capitalista; e, em segundo lugar, porque o sistema econômico
socialista nos permitiu reequipar em poucos anos toda a nossa indústria socialista
em linhas novas e atualizadas. Esta é uma possibilidade que o sistema econômico
capitalista não oferece e não pode oferecer. É fato que, do ponto de vista da
técnica de produção e do ponto de vista do grau de saturação da indústria com
máquinas modernas, nossa indústria ocupa o primeiro lugar no mundo.
Se tomarmos a taxa de crescimento da nossa indústria, expressa em percen-
tagens do nível anterior à guerra, e a compararmos com a taxa de crescimento
da indústria dos principais países capitalistas, obtemos quadro na tabela 4.
588 Obras Escolhidas

Tabela 4:
CRESCIMENTO INDUSTRIAL NA URSS E NOS PRINCIPAIS
PAÍSES CAPITALISTAS ENTRE 1913-1938
1913 1933 1934 1935 1936 1937 1938
URSS 100, 0 380, 5 457, 0 562, 6 732, 7 816, 4 908, 8
EUA 100, 0 108, 7 112, 9 128, 6 149, 8 156, 9 120, 0
G.B 100, 0 87, 0 97, 1 104, 0 114, 2 121, 9 113, 3
Alemanha 100, 0 75, 4 90, 4 105, 9 118, 1 129, 3 131, 6
França 100, 0 107, 0 99, 0 94, 0 98, 0 101, 0 93, 2

Esta tabela mostra que nossa indústria cresceu mais de nove vezes em compa-
ração com o pré-guerra, enquanto a indústria dos principais países capitalistas
continua marcando o tempo em torno do nível pré-guerra, superando este último
em apenas 20 ou 30%.
Isso significa que, em termos de taxa de crescimento, nossa indústria socialista
ocupa o primeiro lugar no mundo.
Assim, constatamos que, em termos de técnica de produção e taxa de cresci-
mento de nossa indústria, já ultrapassamos e ultrapassamos os principais países
capitalistas.
Em que aspecto estamos atrasados? Ainda estamos defasados economica-
mente, ou seja, no que diz respeito ao volume de nossa produção industrial per
capita. Em 1938, produzimos cerca de 15 milhões de toneladas de ferro-gusa; A
Grã-Bretanha produziu 7.000.000 de toneladas. Pode parecer que estamos em
melhor situação do que a Grã-Bretanha. Mas se dividirmos este número de tone-
ladas pelo número da população, descobriremos que a produção de ferro-gusa
per capita da população em 1938 era de 145 quilos na Grã-Bretanha e apenas
87 quilos na URSS. Ou ainda: em 1938 na Grã-Bretanha produziu 10.800.000
toneladas de aço e cerca de 29.000.000.000 quilowatts-hora de eletricidade, en-
quanto a URSS produziu 18.000.000 toneladas de aço e mais de 39.000.000.000
quilowatts-hora de eletricidade. Pode parecer que estamos em melhor situação
do que a Grã-Bretanha. Mas se dividirmos este número de toneladas e quilowatt-
hora pelo número da população, descobriremos que em 1938 na Grã-Bretanha
a produção de aço per capita da população era de 226 quilogramas e de ele-
tricidade 620 quilowatt-hora, enquanto na URSS a produção de aço per capita
da população era de apenas 107 quilogramas e de eletricidade de apenas 233
quilowatts-hora.
Qual é a razão para isto? A razão é que nossa população é várias vezes maior
do que a da Grã-Bretanha e, portanto, nossas necessidades são maiores: a União
Soviética tem uma população de 170 milhões, enquanto a Grã-Bretanha tem uma
população de não mais de 46 milhões. O poder econômico da indústria de um
país não é expresso pelo volume da produção industrial em geral, independen-
temente do tamanho da população, mas pelo volume da produção industrial
tomada em referência direta ao montante consumido per capita da população.
Quanto maior a produção industrial per capita de um país, maior é o seu poder
econômico; e, inversamente, quanto menor a produção per capita da popula-
J. V. Stalin 589

ção, menor é o poder econômico do país e de sua indústria. Consequentemente,


quanto maior a população de um país, maior é a necessidade de artigos de con-
sumo e, portanto, maior deve ser a produção industrial do país.
Considere, por exemplo, a produção de ferro-gusa. Para ultrapassar econo-
micamente a Grã-Bretanha em relação à produção de ferro-gusa, que em 1938 to-
talizava 7.000.000 de toneladas naquele país, devemos aumentar nossa produção
anual de ferro-gusa para 25.000.000 toneladas. Para superar economicamente
a Alemanha, que em 1938 produzia 18 milhões de toneladas de ferro-gusa ao
todo, devemos aumentar nossa produção anual para 40 milhões ou 45 milhões
de toneladas. E para ultrapassar economicamente os EUA – não no que diz res-
peito ao nível de 1938, que foi um ano de crise, e em que os EUA produziram
apenas 18.800.000 toneladas de ferro-gusa, mas no que diz respeito ao nível de
1929, quando os EUA viviam um boom industrial e quando produziu cerca de
43.000.000 toneladas de ferro-gusa – devemos aumentar nossa produção anual
de ferro-gusa para 50.000.000 ou 60.000.000 toneladas.
O mesmo deve ser dito da produção de aço e aço laminado, da indústria
de construção de máquinas, e assim por diante, visto que todos esses ramos da
indústria, como os outros ramos, dependem no longo prazo da produção de
ferro-gusa.
Ultrapassamos os principais países capitalistas no que diz respeito à técnica
de produção e ao ritmo de desenvolvimento industrial. Isso é muito bom, mas
não é suficiente. Devemos superá-los economicamente também. Podemos fazer
isso e devemos fazer. Só se ultrapassarmos economicamente os principais países
capitalistas, poderemos contar com nosso país totalmente saturado de bens de
consumo, com abundância de produtos e capaz de fazer a transição da primeira
fase do comunismo para a segunda fase.
O que precisamos para superar economicamente os principais países capita-
listas? Em primeiro lugar, exigimos o desejo sincero e indomável de seguir em
frente e a prontidão para fazer sacrifícios e investir quantias consideráveis de
capital para a expansão máxima de nossa indústria socialista. Temos esses requi-
sitos?
Sem dúvida, sim! Além disso, exigimos uma alta técnica de produção e uma
alta taxa de desenvolvimento industrial. Temos esses requisitos?
Sem dúvida, sim! Por último, precisamos de tempo. Sim, camaradas, tempo.
Devemos construir novas fábricas. Devemos formar novos quadros para a indús-
tria. Mas isso requer tempo, e não é pouco tempo. Não podemos ultrapassar
economicamente os principais países capitalistas em dois ou três anos. Exigirá
bem mais do que isso.
Veja, por exemplo, o ferro-gusa e sua produção. Quanto tempo precisamos
para superar economicamente os principais países capitalistas na produção de
ferro-gusa? Quando o 2º Plano Quinquenal estava sendo elaborado, certos mem-
bros do antigo pessoal da Comissão de Planejamento do Estado propuseram que
a produção anual de ferro-gusa no final do 2º Plano Quinquenal fosse fixada
em sessenta milhões toneladas. Isso significa que eles assumiram a possibilidade
de um aumento médio anual na produção de ferro-gusa de dez milhões de to-
neladas. Isso, é claro, era pura fantasia, se não pior. Aliás, não era apenas em
590 Obras Escolhidas

relação à produção de ferro-gusa que esses camaradas se entregavam à fantasia.


Eles consideraram, por exemplo, que durante o período do 2º Plano Quinquenal,
o aumento anual da população na URSS deve chegar a três ou quatro milhões
de pessoas, ou até mais. Isso também era fantasia, se não pior. Mas se ignorar-
mos esses fantásticos sonhadores e voltarmos à realidade, podemos considerar
bastante viável um aumento médio anual da produção de ferro-gusa de dois ou
dois milhões e meio de toneladas, tendo em vista a situação atual da técnica de
fundição do ferro. A história industrial dos principais países capitalistas, assim
como de nosso país, mostra que tal taxa anual de crescimento envolve uma grande
tensão, mas é bastante exequível.
Portanto, necessitamos de tempo, e não pouco tempo ainda, para superar eco-
nomicamente os principais países capitalistas. E quanto mais alta se torna nossa
produtividade de trabalho e quanto mais nossa técnica de produção é aperfeiço-
ada, mais rapidamente podemos realizar essa tarefa econômica fundamental e
mais podemos reduzir o período de sua realização.
b) Agricultura: Tal como o desenvolvimento da indústria, o desenvolvimento
da agricultura durante o período em análise seguiu uma tendência ascendente.
Essa tendência ascendente se expressa não apenas no aumento da produção agrí-
cola, mas, principalmente, no crescimento e na consolidação da agricultura soci-
alista, por um lado, e no declínio total da agricultura camponesa individual, por
outro. Enquanto a área de cereais das fazendas coletivas aumentou de 75 milhões
de hectares em 1933 para 92 milhões em 1938, a área de cereais dos camponeses
individuais caiu neste período de 15.700.000 hectares para 600.000 hectares, ou
0,6% da área total de cereais. Não vou mencionar a área de cultivo industrial, um
ramo onde a agricultura camponesa individual foi reduzida a zero. Além disso, é
bem conhecido que as fazendas coletivas agora reúnem 18.800.000 famílias cam-
ponesas, ou 93,5% de todas as famílias camponesas, além da pesca coletiva e da
pesca coletiva e das indústrias de artesanato.
Isso significa que as fazendas coletivas foram firmemente estabelecidas e con-
solidadas, e que o sistema socialista de agricultura é agora nossa única forma de
agricultura.
Se compararmos as áreas de todas as culturas durante o período em análise
com as áreas de culturas no período pré-revolucionário, na tabela 5 observamos
o seguinte quadro de crescimento:

Tabela 5:
ÁREAS SOB TODAS AS CULTURAS NA URSS
(em milhões de hectares)
1938
Áreas de
1913 1934 1935 1936 1937 1938 comparado
cultivos
a 1913 [%]
a) Cereais 94,4 104,4 103,4 102,4 104,4 102,4 108,5
b) Industrial 4,5 10,7 10,6 10,8 11,2 11,0 244,4
c) Vegetais 3,8 8,8 9,9 9,8 9,0 9,4 247,4
d) Forragem 2,1 7,1 8,6 10,6 10,6 14,1 671,4
Total 105,0 131,5 132,8 133,8 135,3 136,9 130,4
J. V. Stalin 591

A tabela mostra que temos um aumento de área para todas as culturas e,


sobretudo, para forragens, culturas industriais e vegetais.
Isso significa que nossa agricultura está se tornando mais produtiva e de alto
nível, e que uma base sólida está sendo fornecida para a aplicação cada vez maior
da rotação adequada de culturas.
A forma como nossas fazendas coletivas e fazendas estatais têm sido cada vez
mais abastecidas com tratores, colheitadeiras e outras máquinas durante o pe-
ríodo em análise é mostrada nas tabelas a seguir.
Se além desses números tivermos em mente que no período em análise o nú-
mero de estações de máquinas e tratores aumentou de 2.900 em 1934 para 6.350
em 1938, pode-se dizer com segurança que a reconstrução de nossa agricultura
a partir de técnicas e máquinas novas e atualizadas já foi, em geral, concluída.
Nossa agricultura, consequentemente, não é apenas executada em maior es-
cala, e é a mais mecanizada do mundo e, portanto, produz o maior excedente
para o mercado, mas também está mais equipada com maquinários modernos
do que a agricultura de qualquer outro país.
(Veja as tabelas 6 e 7.)

Tabela 6:
TRATORES EMPREGADOS NA AGRICULTURA
NA URSS
1938
1933 1934 1935 1936 1937 1938 comparado
a 1933 [%]
I. Número de tratores
(milhares)
a) em máquinas e estações
123,2 177,3 254,7 328,5 365,8 394,0 319,8
de trator
b) em fazendas estatais e
empreendimentos agrícolas 83,2 95,5 102,1 88,5 84,5 85,0 102,2
auxiliares
Total 210,9 276,4 360,3 422,7 454,5 483,5 229,3
II. Capacidade
(milhares. h.p.)
a) em máquinas e estações
1.758,1 2.753,9 4.281,6 5.856,0 6.679,2 7.437,0 423,0
de trator
b) em fazendas estatais e
empreendimentos agrícolas 1.401,7 1.669,5 1.861,4 1.730,7 1.647,5 1.751,8 125,0
auxiliares
Total 3.209,2 4.465,8 6.184,0 7.672,4 8.385,0 9.256,2 288,4
592 Obras Escolhidas

Tabela 7:
TOTAL DE COLHEITADEIRAS E OUTRAS MÁQUINAS
EMPREGADAS NA AGRICULTURA NA URSS
(em milhares; ao final do ano)
1938
1933 1934 1935 1936 1937 1938 comparado
a 1933 [%]
Colheitadeiras 24,5 32,3 50,3 87,8 128,8 153,5 604,3
Motores de combustão
48,0 60,9 69,1 72,4 77,9 83,7 174,6
interna e a vapor
Peneiras de grãos complexas
120,3 121,9 120,1 123,7 126,1 130,8 108,7
e semicomplexas
Motores de caminhão 26,6 40,3 63,7 76,2 144,5 195,8 736,1
Automóveis (unidades) 3.991 5.533 7.333 7.630 8.156 9.594 240,4

Se compararmos as safras de cereais e culturas industriais durante o período


em análise com o período pré-revolucionário, na tabela 8 temos o quadro de
crescimento.

Tabela 8:
PRODUÇÃO BRUTA DE GRÃOS E SAFRAS INDUSTRIAIS NA URSS
(em centenas de milhões de kilogramas [centners])
1938
1913 1934 1935 1936 1937 1938 comparado
a 1933 [%]
Grãos 801,0 894,0 901,0 827,3 1.202,9 949,9 118,36
Algodão cru 7,4 11,8 17,2 23,9 25,8 26,9 363,5
Fibra de linho 3,3 5,3 5,5 5,8 5,7 5,46 165,5
Beterraba sacarina 109,0 113,6 162,1 168,3 218,6 166,8 153,0
Semente oleaginosa 21,5 35,9 42,7 42,3 51,1 46,3 216,7

Nesta tabela, pode-se ver que, apesar da seca nos distritos leste e sudeste em
1936 e 1938, e apesar da colheita sem precedentes em 1913, a produção bruta
de cereais e safras industriais durante o período em análise aumentou constan-
temente em comparação com 1913.
De particular interesse é a questão da quantidade de cereais comercializados
pelas fazendas coletivas e fazendas estatais em comparação com suas colheitas
brutas. O camarada Nemchinov, conhecido estatístico, calculou que de uma co-
lheita bruta de cereais de 5.000.000.000 de puds em tempos anteriores à guerra,
apenas cerca de 1.300.000.000 puds foram comercializados. Assim, a propor-
ção da produção comercializada da agricultura de cereais naquela época era de
26%. O camarada Nemchinov calcula que a proporção da produção comerciali-
zada para a colheita bruta nos anos 1926-27, por exemplo, foi de cerca de 47%
no caso da agricultura coletiva e estatal, que é a agricultura em grande escala,
e cerca de 12% no caso da agricultura camponesa individual. Se abordarmos o
assunto com mais cautela e assumirmos que a quantidade de produtos comerci-
alizados no caso da agricultura coletiva e estatal em 1938 seja de 40% da safra
bruta, descobriremos que no ano nossa agricultura socialista de cereais foi capaz
J. V. Stalin 593

de liberar, e na verdade, lançou cerca de 2.300.000.000 de puds de cereais para o


mercado, ou 1.000.000.000 de puds a mais do que era comercializado nos tempos
anteriores à guerra.
Consequentemente, a elevada proporção de produtos comercializados consti-
tui uma característica importante da agricultura estatal e coletiva, e é de impor-
tância fundamental para o abastecimento alimentar de nosso país.
É esta característica das fazendas coletivas e das fazendas do Estado que ex-
plica o segredo por que nosso país conseguiu tão fácil e rapidamente resolver
o problema dos cereais, o problema de produzir um suprimento adequado de
cereais de mercado para este vasto país.
Deve-se notar que, durante os últimos três anos, as entregas anuais de cereais
para o Estado não caíram abaixo de 1.600.000.000 puds, embora às vezes, como
por exemplo em 1937, tenham chegado a 1.800.000.000 puds. Se adicionarmos a
isso cerca de 200 milhões de puds ou mais de cereais comprados anualmente pelo
Estado, bem como várias centenas de milhões de puds vendidos por fazendas co-
letivas e fazendeiros diretamente no mercado, teremos em todo o total de cereais
comercializados pelas fazendas coletivas e fazendas estatais já mencionadas.
Além disso, é interessante notar que durante os últimos três anos a base de
cereais de mercado mudou da Ucrânia, que antes era considerada o celeiro do
nosso país, para o norte e para o leste, ou seja, para o RSFSR Sabemos que du-
rante os últimos dois ou três anos as entregas de cereais na Ucrânia totalizaram
cerca de 400 milhões de puds por ano, enquanto na RSFSR as entregas de cereais
durante esses anos totalizaram 1.100.000.000 ou 1.200.000.000 de puds anual-
mente.
É assim que as coisas estão em relação ao cultivo de cereais.
No que diz respeito à pecuária, houve um progresso considerável nos últimos
anos nesse ramo, o mais atrasado da agricultura. É verdade que em número de
cavalos e de criação de ovelhas ainda estamos abaixo do nível pré-revolucionário;
mas, no que diz respeito à criação de gado e suínos, já ultrapassamos o nível
pré-revolucionário.
Os números estão na tabela 9.

Tabela 9:
TOTAL DE CABEÇAS DA PECUÁRIA NA URSS
(em MILHÕES)
Julho Julho Julho Julho Julho Julho 1938 comparado
1916
1933 1934 1935 1936 1937 1938 1916 1933
Cavalos 35,8 16,6 15,7 15,9 16,6 16,7 17,5 48,9 105,4
Gado 60,6 38,4 42,4 49,2 56,7 57,0 63,2 104,3 164,6
Ovelhas e bodes 121,2 50,2 51,9 61,1 73,7 81,3 102,5 84,6 204,2
Porcos 20,9 12,1 17,4 22,5 30,5 22,8 30,6 146,4 252,9

Não pode haver dúvida de que o atraso na criação de cavalos e ovelhas será
resolvido em um período bem curto.
c) Comércio e transporte: O progresso da indústria e da agricultura foi acom-
panhado pelo aumento do comércio do país. Durante o período em análise, o
número de lojas de varejo estatais e cooperativas aumentou 25%. O comércio
594 Obras Escolhidas

varejista estatal e cooperativo aumentou em 178%. O comércio nos mercados de


fazendas coletivas aumentou 112%. Siga na tabela 10

Tabela 10:
Comércio
1938
1933 1934 1935 1936 1937 1938 comparado
a 1933 [%]
Lojas de varejo estatais
e cooperativas e estandes 285.355 286.236 268.713 298.47 327.361 356.930 125,1
ao final do ano
Lojas de varejo estatais
e cooperativas, incluindo
49.789,2 61.814,7 81.712,1 106.760,9 125.943,2 138.574,3 278,3
alimentação pública
(em milhões de rublos)
Comércio em mercados
de fazendas coletivas 11.500,0 14.000,0 14.500,0 15.607,2 17.799,7 24.399,2 212,2
(em milhões de rublos)
Departamentos regionais
de atacado das Comissões
de Gente da Indústria
Alimentícia, Indústria
718 836 1.141 1.798 1.912 1.994 277,7
Leve, Indústria Pesada
e Indústria Local
da União das Repúblicas
ao final do ano

É óbvio que o comércio no país não poderia ter se desenvolvido dessa forma
sem um certo aumento na circulação de mercadorias. E, de fato, durante o pe-
ríodo em análise, o tráfego de carga aumentou em todos os ramos do transporte,
especialmente ferroviário e aéreo. Houve um aumento no frete marítimo tam-
bém, mas com flutuações consideráveis, e em 1938, é lamentável, houve até uma
queda no frete marítimo em comparação com o ano anterior.
A tabela 11 é a correspondente.

Tabela 11:
Tráfego de mercadorias
1938
1933 1934 1935 1936 1937 1938 comparado
a 1933 [%]
Ferrovias (em milhões
169.500 205.700 258.100 323.400 354.800 369.100 217,7
de ton-kilometros)
Transporte marítimo
e por rios(em milhões 50.200 56.500 68.300 72.300 70.100 66.000 131,5
de ton-kilometros)
Frota aérea cívil(em
3.100 6.400 9.800 21.900 24.900 31.700 1.055,6
milhões de ton-kilometros

Não pode haver dúvida de que o atraso no transporte marítimo será resolvido
até 1939.

2. Adiante no aumento no padrão material e cultural das


pessoas

O progresso constante da indústria e da agricultura não poderia deixar de


levar, e realmente levou, a um novo aumento no padrão material e cultural do
J. V. Stalin 595

povo.
A abolição da exploração e a consolidação do sistema econômico socialista,
a ausência de desemprego, com a pobreza que o acompanha, na cidade e no
campo, a enorme expansão da indústria e o crescimento constante do número
de trabalhadores, o aumento da produtividade do trabalho dos trabalhadores e
fazendeiros coletivos, a segurança da terra para fazendas coletivas em perpetui-
dade, e o grande número de tratores de primeira classe e máquinas agrícolas
fornecidas às fazendas coletivas – tudo isso criou condições efetivas para um novo
aumento no padrão de vida dos trabalhadores e camponeses.
Por sua vez, a melhoria do nível de vida dos operários e camponeses levou
naturalmente a uma melhoria do nível de vida da intelligentsia, que representa
uma força considerável em nosso país e serve aos interesses dos trabalhadores e
camponeses.
Agora não é mais uma questão de encontrar espaço na indústria para cam-
poneses desempregados e sem-teto que foram deixados à deriva de suas aldeias
e vivem com medo da fome – de lhes dar empregos por caridade.
Foi-se o tempo em que havia camponeses assim em nosso país. E isso é uma
coisa boa, claro, pois testemunha a prosperidade de nosso campo. Na verdade,
agora é uma questão de pedir às fazendas coletivas que atendam ao nosso pedido
e liberem, digamos, um milhão e meio de jovens fazendeiros anualmente para as
necessidades de nossa indústria em expansão.
As fazendas coletivas, que já se tornaram prósperas, devem ter em mente que,
se não conseguirmos essa ajuda deles, será muito difícil continuar a expansão de
nossa indústria, e se não expandirmos nossa indústria não seremos capaz de sa-
tisfazer a crescente demanda dos camponeses por bens de consumo. As fazendas
coletivas estão bastante capacitadas para atender a essa nossa demanda, pois a
abundância de maquinários nas fazendas coletivas libera uma parcela dos tra-
balhadores rurais, que, se transferidos para a indústria, poderiam prestar um
imenso serviço a toda a economia nacional.
Como resultado, temos os seguintes indícios de melhoria no padrão de vida
dos trabalhadores e camponeses durante o período em análise:
1. A renda nacional aumentou de 48.500.000.000 de rublos em 1933 para
105.000.000.000 de rublos em 1938;
2. O número de trabalhadores e outros empregados aumentou de pouco mais
de 22 milhões em 1933 para 28 milhões em 1938;
3. A folha de pagamento anual total dos trabalhadores e outros empregados
aumentou de 34.953.000.000 de rublos para 96.425.000.000 de rublos;
4. O salário médio anual dos trabalhadores industriais, que chegava a 1.513
rublos em 1933, aumentou para 3.447 rublos em 1938;
5. A renda monetária total das fazendas coletivas aumentou de 5.661.900.000
rublos em 1933 para 14.180.100.000 rublos em 1937;
6. A quantidade média de cereais recebidos por família de fazendeiros cole-
tivos nas regiões de cultivo de cereais aumentou de 61 puds em 1933 para 144
puds em 1937, excluindo sementes, estoques de sementes de emergência, forra-
gem para o gado de propriedade coletiva, entregas de cereais e pagamentos em
596 Obras Escolhidas

espécie pelo trabalho executado nas estações de máquinas e tratores;


7. A verba do orçamento estatal para serviços sociais e culturais aumentou de
5.839.900.000 rublos em 1933 para 35.202.500.000 rublos em 1938.
No que diz respeito ao padrão cultural do povo, o período em análise foi
marcado por uma verdadeira revolução cultural. A introdução do ensino funda-
mental obrigatório universal nas línguas das várias nações da URSS, um número
crescente de escolas e acadêmicos de todos os graus, um número crescente de
especialistas com formação universitária e a criação e crescimento de uma nova
intelectualidade, um soviético intelectualidade – tal é o quadro geral do avanço
cultural de nosso povo.
Nas Tabelas 12 e 13 estão os números.

Tabela 12:
INCREMENTO NO NÍVEL CULTURAL
DO POVO
1933-34
1933-34 1938-39 comprado
a 1938-39 [%]
Número de aprendizes e estudantes
23.814 33.965,4 142,6
de todos os níveis (Milhares):
em escolas elementares (Milhares) 17.873,3 21.288,4 119,1
em escolas intermediárias (geral e especial)(Milhares) 5.482,2 12,076,0 220,3
em intituição de ensino superior (Milhares) 458,3 601,0 131,1
Numero de pessoas engajadas em todos
- 47.442,1 -
as formas de estudo na URSS (Milhares)
Número de bibliotecas públicas (Milhares) 40,3 70,7 173,7
Número de livros em bibliotecas públicas (Milhões) 86,0 126,6 147,2
Número de clubes (Milhares) 61,1 95,6 156,5
Número de teatros (unidades) 587 790 134,6
Número de instalações de cinemas(unidades): 27.467 30,461 110,9
com equipamento de som(unidades) 498 15.202 3.052,6
Número de instalações de cinema
17.470 18.991 108,7
nos distritos rurais (unidades):
com equipamento de som (unidades) 24 6.670 27.791,7
Circulação anual de jornais (milhões) 4.44984,6 7.092,4 142,3

Tabela 13:
NÚMEROS DE ESCOLAS CONSTRUÍDAS NA URSS ENTRE 1933-38
Em cidades e Em localidades
Total
aldeias rurais
1933 326 3.261 3.587
1934 577 3.488 4.065
1935 533 2.829 3.362
1936 1.505 4.206 5.711
1937 790 1.246 2.053
1938 583 1.246 1.829
Total(1933-38) 4.254 16.353 20.607
J. V. Stalin 597

Como resultado deste imenso trabalho cultural, uma numerosa nova intelec-
tualidade soviética surgiu em nosso país, uma intelectualidade que emergiu das
fileiras da classe trabalhadora, camponeses e empregados soviéticos, que é da
carne e do sangue de nosso povo, que nunca passou pelo jugo da exploração,
que odeia os exploradores e que está pronta a servir aos povos da URSS com
fidelidade e devoção.
Eu acho que a ascensão desta nova intelectualidade socialista do povo é um
dos resultados mais importantes da revolução cultural em nosso país.[Veja tabela
14 - Nota do Tradutor]

Tabela 14:
JOVENS ESPECIALISTAS GRADUADOS EM
INTITUIÇÃO DE ENSINO SUPERIOR EM 1933-1938
(em milhares)
1933 1934 1935 1936 1937 1938
Engenheiros para a indústria
6,1 14,9 29,6 29,2 27,6 25,2
e construção
Engenheiros para transportes
1,8 4,0 7,6 6,6 7,0 6,1
e comunicações
Engenheiros agrícolas, agrônomos,
4,8 6,3 8,8 10,4 11,3 10,6
veterinários e zootecnistas
Economistas e juristas 2,5 2,5 5,0 6,4 5,0 5,7
Professores de educação
intermediária, escolas técnicas
10,5 7,9 12,5 21,6 31,7 35,7
e outros tabaradores educacionais
incluindo trabalhadores da arte
Médicos, farmacêuticos e instrutores
4,6 2,5 7,5 9,2 12,3 18,6
de educação física
Outros especialistas 4,3 11,1 12,7 14,2 9,9 9,8
Total da URSS (excluindo especialistas
34,6 49,2 83,7 97,6 104,8 106,7
militares)

3. Adiante na consolidação do Sistema Soviético

Um dos resultados mais importantes do período em análise é que levou a


uma maior consolidação interna do país, a uma maior consolidação do sistema
soviético.
Nem poderia ser de outra forma. O firme estabelecimento do sistema soci-
alista em todos os ramos da economia nacional, o progresso da indústria e da
agricultura, o crescente padrão material do povo, o crescente padrão cultural do
povo e sua crescente atividade política – tudo isso, realizado sob a orientação de o
poder soviético não poderia deixar de levar a uma maior consolidação do sistema
soviético.
A característica que distingue a sociedade soviética hoje de qualquer socie-
dade capitalista é que ela não contém mais classes antagônicas e hostis; que as
classes exploradoras foram eliminadas, enquanto os operários, camponeses e in-
telectuais, que constituem a sociedade soviética, vivem e trabalham em colabora-
598 Obras Escolhidas

ção amigável. Enquanto a sociedade capitalista está dilacerada por contradições


irreconciliáveis entre trabalhadores e capitalistas e entre camponeses e latifun-
diários – resultando em sua instabilidade interna – a sociedade soviética, libertada
do jugo da exploração, não conhece tais contradições, está livre de conflitos de
classe e apresenta um quadro de colaboração amigável entre operários, campo-
neses e intelectuais. É essa comunidade de interesses que formou a base para o
desenvolvimento de forças motivadoras como a unidade moral e política da soci-
edade soviética, a amizade mútua das nações da URSS e o patriotismo soviético.
Também tem sido a base para a Constituição da URSS, adotada em novembro de
1936, e para a democratização completa das eleições para os órgãos supremos do
país.
Quanto às próprias eleições, foram uma magnífica demonstração daquela
unidade da sociedade soviética e daquela amizade entre as nações da URSS que
constituem o traço característico da situação interna do nosso país. Como sabe-
mos, nas eleições para o Soviete Supremo da URSS em dezembro de 1937, quase
noventa milhões de votos, ou 98,6% do total dos votos, foram lançados para o
bloco comunista e não partidário, enquanto nas eleições para o Soviete Supremo
das Repúblicas da União em junho de 1938, noventa e dois milhões de votos, ou
99,4% do total dos votos, foram lançados para o bloco comunista e não partidário.
Aí está a base da estabilidade do sistema soviético e a fonte da força inesgotável
do poder soviético.
Isso significa, aliás, que em caso de guerra, a retaguarda e a frente de nosso
exército, em razão de sua homogeneidade e unidade inerente, serão mais fortes
do que as de qualquer outro país, fato que quem gosta de fora de nossas fronteiras
conflitos militares fariam bem em lembrar.
Certos assessores de imprensa estrangeiros têm falado bobagens no sentido
de que o expurgo de organizações soviéticas de espiões, assassinos e destruidores
como Trotsky, Zinoviev, Kamenev, Yakir, Tukhachevsky, Rosengoltz, Bukharin e
outros demônios “abalou” o sistema soviético e causou sua “desmoralização”. Só
podemos rir dessas baboseiras baratas. Como a remoção de elementos nocivos
e hostis das organizações soviéticas pode abalar e desmoralizar o sistema sovié-
tico? Esse bando de espiões, assassinos e destruidores de Trotsky-Bukharin, que
foram rebocados para o mundo estrangeiro, que eram possuídos por um instinto
servil de rastejar diante de todo figurão estrangeiro e que estavam prontos para
entrar em seu emprego como espião – este punhado de pessoas que não entende-
ram que o mais humilde cidadão soviético, estando livre dos grilhões do capital,
fica cabeça e ombros acima de qualquer figurão estrangeiro de alto escalão cujo
pescoço carregue o jugo da escravidão capitalista - que precisa desse bando mi-
serável de escravos mercenários, que valor eles podem ter para o povo, e quem
eles podem “desmoralizar”? Em 1937, Tukhachevsky, Yakir, Uborevich e outros
demônios foram condenados a serem fuzilados. Depois disso, foram realizadas
as eleições para o Soviete Supremo da URSS. Nessas eleições, 98,6% dos votos
totais foram lançados para o poder soviético. No início de 1938, Rosengoltz,
Rykov, Bukharin e outros demônios foram condenados a fuzilamentos. Depois
disso, foram realizadas as eleições para os Sovietes Supremos das Repúblicas da
União. Nessas eleições, 99,4% dos votos totais foram lançados para o poder sovié-
J. V. Stalin 599

tico. Onde estão os sintomas de “desmoralização”, gostaríamos de saber, e por


que essa “desmoralização” não se refletiu nos resultados das eleições?
Ao ouvir esses patetas estrangeiros, alguém poderia pensar que se os espiões,
assassinos e destruidores tivessem sido deixados em liberdade para destruir, as-
sassinar e espionar sem deixar ou impedir, as organizações soviéticas teriam sido
muito mais sólidas e mais fortes. (Risos.) Esses cavalheiros não estão se entre-
gando cedo demais por defender tão insolentemente a causa de espiões, assassi-
nos e destruidores?
Não seria mais verdadeiro dizer que a eliminação de espiões, assassinos e des-
truidores de nossas organizações soviéticas estava fadada a liderar, e levou, a um
maior fortalecimento dessas organizações?
O que, por exemplo, os eventos no Lago Hassan mostram, senão que a eli-
minação de espiões e destruidores é o meio mais seguro de fortalecer nossas
organizações soviéticas.

∗ ∗ ∗

As tarefas do Partido na esfera da política industrial são:


1. Aumentar o progresso de nossa indústria, o aumento da produtividade do
trabalho e o aperfeiçoamento da técnica de produção, a fim de, já tendo ultra-
passado os principais países capitalistas em técnica de produção e taxa de desen-
volvimento industrial, ultrapassá-los economicamente também nos próximos dez
ou quinze anos.
2. Aumentar o progresso de nossa agricultura e pecuária de modo a alcançar
nos próximos três ou quatro anos uma colheita anual de cereais de 8.000.000.000
de puds, com um rendimento médio de 12-13 centenas de quilogramas (centners)
por hectare; um aumento médio na colheita de safras industriais de 30-35%; e
um aumento no número de ovelhas e porcos em 100%, de gado em cerca de 40%
e de cavalos em cerca de 35%.
3. Continuar a melhorar os padrões materiais e culturais dos trabalhadores,
camponeses e intelectuais.
4. Para levar a efeito a nossa Constituição Socialista com firmeza; para com-
pletar a democratização da vida política do país; fortalecer a unidade moral e
política da sociedade soviética e a colaboração fraterna entre nossos operários,
camponeses e intelectuais; para promover a amizade dos povos da URSS ao má-
ximo e para desenvolver e cultivar o patriotismo soviético.
5. Nunca esquecer que estamos rodeados por um mundo capitalista; lembrar
que os serviços de espionagem estrangeiros contrabandearão espiões, assassinos e
destruidores para o nosso país; e, lembrando disso, para fortalecer nosso serviço
de inteligência socialista e ajudá-lo sistematicamente a derrotar e erradicar os
inimigos do povo.
600 Obras Escolhidas

III

Fortalecimento do PCUS(B) adiante


Do ponto de vista da linha política e do trabalho prático do dia a dia, o pe-
ríodo em análise foi de total vitória da linha geral do nosso Partido. (Aplausos
acalorados.)
As principais conquistas que demonstram a correção da política de nosso Par-
tido e a correção de sua liderança são o firme estabelecimento do sistema soci-
alista em toda a economia nacional, a conclusão da reconstrução da indústria
e da agricultura com base em uma nova técnica, a cumprimento antecipado do
Segundo Plano Quinquenal na indústria, o aumento da safra anual de cereais a
um nível de 7.000.000.000 de puds, a abolição da pobreza e do desemprego e a
elevação do padrão material e cultural do povo.
Diante dessas conquistas imponentes, os oponentes da linha geral de nosso
Partido, todas as várias tendências de “esquerda” e “direita”, todos os degene-
rados de Trotsky-Pyatakov e Bukharin-Rykov foram forçados a se enfiar em suas
conchas, para enfiar afastar suas “plataformas” banais e se esconder. Não tendo
masculinidade para se submeter à vontade do povo, preferiram fundir-se com
os mencheviques, socialistas-revolucionários e fascistas, para se tornarem instru-
mentos dos serviços de espionagem estrangeira, para se alistarem como espiões
e para se obrigarem a ajudar os inimigos da União Soviética para desmembrar
nosso país e restaurar a escravidão capitalista nele.
Tal foi o fim inglório dos adversários da linha do nosso Partido, que acabaram
como inimigos do povo.
Depois de esmagar os inimigos do povo e expurgar os degenerados do Partido
e das organizações soviéticas, o Partido tornou-se ainda mais unido em seu tra-
balho político e organizacional e se reuniu ainda mais solidamente em torno de
seu Comitê Central (Calorosos aplausos. Todos os delegados se levantam e aplaudem.)
Examinemos os fatos concretos que ilustram o desenvolvimento da vida in-
terna do Partido e seu trabalho de organização e propaganda durante o período
em análise.

1. Medidas para melhorar a divisão partidária das


organizações para um contato mais próximo entre os órgãos
de liderança dos partidos e o trabalho dos órgãos inferiores

O fortalecimento do Partido e dos seus órgãos dirigentes durante o período


em questão decorreu principalmente em duas vertentes: na linha de regular a
composição do Partido, na expulsão de elementos não confiáveis e na seleção
dos melhores, e na linha da divisão das organizações, reduzindo seu tamanho e
aproximando os órgãos dirigentes do trabalho concreto e cotidiano dos órgãos
inferiores.
Havia 1.874.488 membros do Partido representados no XVII Congresso do
Partido. Comparando este número com o número de membros do Partido repre-
sentados no congresso anterior, o XVI Congresso do Partido, verificamos que no
J. V. Stalin 601

intervalo entre estes dois congressos 600.000 novos membros aderiram ao Par-
tido.
O Partido não podia deixar de sentir que, nas condições prevalecentes em
1930-33, tal influxo em massa em suas fileiras era uma expansão doentia e in-
desejável de seus membros. O Partido sabia que suas fileiras estavam sendo uni-
das não só por pessoas honestas e leais, mas também por elementos do acaso e
carreiristas, que buscavam utilizar a insígnia do Partido para seus próprios fins
pessoais. O Partido não podia deixar de saber que sua força residia não apenas
no tamanho de seus membros, mas, acima de tudo, na qualidade de seus mem-
bros. Isso levantou a questão de regular a composição do Partido. Decidiu-se
continuar o expurgo de membros do Partido e membros candidatos iniciado em
1933; e os expurgos na verdade continuaram até maio de 1935. Foi ainda deci-
dido suspender a admissão de novos membros no Partido; e a admissão de novos
membros na verdade foi suspensa até setembro de 1936, a admissão de novos
membros foi retomada apenas em 1 de novembro de 1936. Além disso, em co-
nexão com o assassinato covarde do camarada Kirov, que mostrou que havia um
grande número de elementos suspeitos no Partido, decidiu-se proceder à veri-
ficação dos cadastros dos membros do Partido e à troca dos antigos cartões do
Partido por novos, ambas as medidas concluídas apenas em setembro de 1936.
Só depois disso foi retomada a admissão de novos membros e candidatos para o
Partido. Como resultado de todas essas medidas, o Partido conseguiu eliminar
de vez os elementos passivos, carreiristas e diretamente hostis, e selecionar as pes-
soas mais firmes e leais. Não se pode dizer que o expurgo não foi acompanhado
de graves erros. Infelizmente, ocorreram mais erros do que se poderia esperar.
Sem dúvida, não teremos mais necessidade de recorrer ao método de expurgos
em massa. No entanto, o expurgo de 1933-36 foi inevitável e seus resultados, no
geral, foram benéficos. O número de membros do Partido representados neste,
o XVIII Congresso, é de cerca de 1.600.000, ou seja, 270.000 a menos do que os
representados no XVII Congresso. Mas não há nada de ruim nisso. Pelo con-
trário, é muito bom, pois o Partido se fortalece livrando suas fileiras da escória.
Nosso Partido agora é um pouco menor em membros, mas, por outro lado, é
melhor em qualidade.
Essa é uma grande conquista.
No que diz respeito à melhoria da direção cotidiana do Partido, aproximando-
a do trabalho dos órgãos inferiores e tornando-o mais concreto, o Partido chegou
à conclusão de que a melhor maneira de facilitar aos órgãos do Partido a orien-
tação das organizações e de manter concreta, viva e prática a própria direção era
dividir as organizações, para diminuir seu tamanho. Tanto os Comissariados do
Povo como as organizações administrativas dos diversos divisões territoriais, ou
seja, as repúblicas da União, territórios, regiões, distritos, etc., foram divididos.
O resultado das medidas adotadas é que em vez de 7 Repúblicas da União, pas-
samos a ter 11; em vez de 14 Comissariados do Povo da URSS, agora temos 34;
em vez de 70 territórios e regiões, agora temos 110; em vez de 2.559 distritos
urbanos e rurais, agora temos 3.815. Correspondentemente, dentro do sistema
de órgãos dirigentes do Partido, temos agora 11 comitês centrais, chefiados pelo
Comitê Central do PCUS (B), 6 comitês territoriais, 104 comitês regionais, 30
comitês de área, 212 comitês municipais, 336 comitês distritais, 3.479 comitês
602 Obras Escolhidas

distritais rurais e 113.060 organizações primárias do Partido.


Não se pode dizer que a divisão das organizações já acabou. Muito provavel-
mente, será levada adiante.
Mas, seja como for, já dá bons resultados tanto no aprimoramento da lide-
rança do dia a dia da obra, quanto na aproximação da própria liderança com o
trabalho concreto dos órgãos inferiores.
Não preciso mencionar que a divisão das organizações tornou possível pro-
mover centenas e milhares de novas pessoas a cargos de liderança.
Isso também é uma grande conquista.

2. Seleção, promoção e alocação de quadros

A regulamentação da composição do Partido e a aproximação dos órgãos di-


rigentes ao trabalho concreto dos órgãos inferiores não era, nem poderia ser, o
único meio de fortalecer ainda mais o Partido e sua direção. Outro meio adotado
no período em análise foi uma melhoria radical na formação de quadros, uma
melhoria no trabalho de seleção, promoção e atribuição de quadros e de os testar
no processo de trabalho.
Os quadros do Partido constituem o quadro de comando do Partido; e como
nosso Partido está no poder, eles também constituem o comando dos principais
órgãos do Estado. Depois de elaborada e testada na prática uma linha política
correta, os quadros do Partido tornam-se a força decisiva na direção do Partido
e do Estado. Uma linha política correta é, naturalmente, o principal e mais
importante.
Mas isso por si só não é suficiente. Uma linha política correta não é necessária
como declaração, mas como algo a ser efetivo. Mas para ser efetiva uma linha
política correta, devemos ter quadros, pessoas que entendam a linha política do
Partido, que a aceitem como sua própria linha, que estejam preparados para
efetiva-la, que sejam capazes de colocá-la em prática e são capazes de responder
por ela, defendê-la e lutar por ela. Caso contrário, uma linha política correta
corre o risco de ser puramente nominal.
E aqui se coloca a questão da correta seleção de quadros, da formação de
quadros, da promoção de novas pessoas, da correta alocação de quadros e da
prova dos quadros pelo trabalho realizado.
O que se entende por seleção correta de quadros?
A correta seleção de quadros não significa apenas reunir um monte de assis-
tentes e subalternos, montar um escritório e emitir ordens após ordens. (Risos.)
Nem significa abusar dos próprios poderes, trocar dezenas e centenas de pes-
soas de um emprego para outro sem rima ou razão e conduzir “reorganizações”
sem fim. (Risos.)
A seleção adequada de quadros significa:
Em primeiro lugar, valorizar os quadros como reserva de ouro do Partido e
do Estado, valorizá-los, respeitá-los.
Em segundo lugar, conhecer os quadros, estudar cuidadosamente os seus mé-
ritos e debilidades individuais, saber em que posto as capacidades de um deter-
J. V. Stalin 603

minado trabalhador têm maior probabilidade de se desenvolver.


Em terceiro lugar, promover quadros cuidadosamente, ajudando cada traba-
lhador promissor a avançar, não perdendo tempo em pacientemente “incomo-
dar” tais trabalhadores e acelerar seu desenvolvimento.
Em quarto lugar, promover corajosamente novos e jovens quadros no tempo,
de modo a não permitir que envelheçam estagnados nos cargos anteriores.
Em quinto lugar, alocar trabalhadores em cargos de forma que cada um se
sinta no lugar certo, que cada um contribua para a nossa causa comum o máximo
que suas capacidades pessoais lhe permitam contribuir, e que a tendência geral
do trabalho de alocação de quadros possa responder cabalmente às demandas da
linha política para a qual esta alocação de quadros está desenhada.
Particularmente importante a este respeito é a promoção ousada e oportuna
de quadros novos e jovens. Parece-me que nosso povo ainda não está muito claro
sobre esse ponto. Alguns pensam que ao selecionar pessoas devemos confiar
principalmente nos antigos quadros. Outros, ao contrário, pensam que devemos
confiar principalmente nos quadros jovens. Parece-me que ambos se enganam.
Os quadros antigos, claro, representam um bem valioso para o Partido e para
o Estado. Eles possuem o que falta aos jovens quadros, a saber, uma tremenda
experiência de liderança, uma escolaridade nos princípios marxista-leninistas,
conhecimento da situação e capacidade de orientação.
Mas, primeiramente, nunca há quadros antigos suficientes, são muito menos
do que o necessário e já estão parcialmente fora de serviço devido ao funciona-
mento das leis da natureza. Em segundo lugar, parte dos antigos quadros às vezes
tende a manter um olhar muito persistente no passado, a se apegar ao passado,
a permanecer na velha rotina e deixar de observar o novo na vida. Isso se chama
perder o sentido do novo. É uma deficiência muito séria e perigosa. Quanto
aos quadros jovens, eles, evidentemente, não têm a experiência, a escolaridade,
o conhecimento da vida e a capacidade de orientação dos quadros antigos. Mas,
em primeiro lugar, os jovens quadros constituem a grande maioria; em segundo
lugar, são jovens e, por enquanto, não correm o risco de ficar fora de serviço; em
terceiro lugar, eles possuem em abundância o sentido do novo, que é uma quali-
dade valiosa em todo trabalhador bolchevique; e, em quarto lugar, eles desenvol-
vem e adquirem conhecimento tão rapidamente, eles avançam tão avidamente,
que não está longe o tempo em que alcançarão os velhos companheiros, tomarão
sua posição lado a lado com eles e se tornarão dignos de substituí-los. Conse-
quentemente, a questão não é confiar nos quadros antigos ou nos novos, mas
orientar para uma combinação, uma união dos quadros antigos e jovens numa
sinfonia comum de direção do Partido e do Estado. (Prolongado aplausos.)
É por isso que devemos corajosamente e em tempo útil promover jovens qua-
dros a cargos de direção.
Uma das conquistas importantes do Partido durante o período em análise
no que se refere ao fortalecimento da direção do Partido é que, ao selecionar os
quadros, tem prosseguido com sucesso, de cima a baixo, exatamente este caminho
de combinar velhos e jovens trabalhadores.
Dados em poder do Comitê Central do Partido mostram que durante o pe-
ríodo em análise o Partido conseguiu promover a cargos dirigentes do Estado e
604 Obras Escolhidas

do Partido mais de quinhentos mil jovens bolcheviques, membros do Partido e


pessoas próximas ao Partido, mais vinte por cento dos quais eram mulheres.
Qual é a nossa tarefa agora?
Nossa tarefa agora é concentrar o trabalho de selecionar quadros de alto a
baixo, nas mãos de um corpo e elevá-lo a um nível bolchevique adequado e cien-
tífico.
Isto implica acabar com a divisão do trabalho de estudo, promoção e sele-
ção de quadros entre os vários departamentos e sectores, e concentrá-lo num só
órgão.
Este órgão deve ser a Administração de Quadros do Comité Central do PCUS
(B) e um departamento de quadros correspondente em cada uma das organiza-
ções republicanas, territoriais e regionais do Partido.

3. Propaganda do Partido. Formação marxista-leninista de


membros e quadros do partido

Existe, ainda, uma outro campo de trabalho do Partido, um campo muito im-
portante e muito respeitável, na qual o trabalho de fortalecimento do Partido e de
seus órgãos dirigentes se desenvolveu durante o período em análise. Refiro-me à
agitação e propaganda do Partido, oral e impressa, ao trabalho de formação dos
membros e quadros do Partido no espírito do marxismo-leninismo, ao trabalho
de elevação do nível político e teórico do Partido e dos seus trabalhadores.
Não é preciso insistir na importância fundamental da propaganda do Par-
tido, da formação marxista-leninista de nosso povo. Não me refiro apenas aos
funcionários do Partido. Refiro-me também aos trabalhadores da Liga dos Jo-
vens Comunistas, organizações sindicais, comerciais, cooperativas, econômicas,
estatais, educacionais, militares e outras. A tarefa de regular a composição do
Partido e de aproximar os órgãos dirigentes das atividades dos órgãos inferiores
pode ser organizada de maneira satisfatória; o trabalho de promoção, seleção e
alocação de quadros pode ser organizado de forma satisfatória; mas, com tudo
isso, se a propaganda do nosso Partido por um motivo ou outro fracassar, se a
formação marxista-leninista de nossos quadros começar a enfraquecer, se nosso
trabalho de elevação do nível político e teórico desses quadros se embandeirar
e os próprios quadros deixem por conta disso de mostrar interesse na perspec-
tiva de nosso progresso futuro, deixem de entender a verdade de nossa causa e
se transformem em vagabundos e sem perspectiva, cega e mecanicamente exe-
cutando instruções de cima – então todo o nosso Estado e trabalho do Partido
deve inevitavelmente definhar. Deve-se aceitar como axioma que quanto mais
alto o nível político e o conhecimento marxista-leninista dos trabalhadores em
qualquer ramo do trabalho estatal do Partido, melhor e mais fecundo será o tra-
balho em si, e mais eficazes serão os resultados do trabalho; e, vice-versa, quanto
mais baixo for o nível político dos trabalhadores, e quanto menos eles estiverem
imbuídos do conhecimento do marxismo-leninismo, maior será a probabilidade
de interrupção e fracasso no trabalho, de os próprios trabalhadores se tornarem
rasos e deteriorados em mesquinhos preguiçosos. Pode-se afirmar com segu-
rança que, se conseguíssemos formar ideologicamente os quadros de todos os
J. V. Stalin 605

ramos do nosso trabalho e educá-los politicamente, de maneira que lhes permi-


tisse orientar-se facilmente na situação interna e internacional; se conseguísse-
mos torná-los marxistas-leninistas bem maduros, capazes de resolver os proble-
mas que envolvem a direção do país sem erros graves, teríamos todos os motivos
para considerar nove décimos de nossos problemas já resolvidos.
E certamente podemos conseguir isso, pois temos todos os meios e oportuni-
dades para fazê-lo.
O treinamento e a formação de nossos jovens quadros geralmente procede
em algum ramo particular da ciência ou tecnologia, ao longo da linha de especi-
alização. Isso é necessário e desejável. Não há razão para que um homem que se
especializou em medicina deva ao mesmo tempo se especializar em física ou bo-
tânica, ou vice-versa. Mas há um ramo da ciência que os bolcheviques em todos
os ramos da ciência têm o dever de conhecer, e é o da ciência marxista-leninista
da sociedade, das leis de desenvolvimento social, das leis de desenvolvimento
da revolução proletária, das leis de desenvolvimento da construção socialista e
da vitória do comunismo. Pois um homem que se diz leninista não pode ser
considerado um verdadeiro leninista se se fecha na sua especialidade, digamos,
matemática, botânica ou química, e não vê nada além dessa especialidade. Um
leninista não pode ser apenas um especialista em sua ciência favorita; deve ser
também um assistente político e social, profundamente interessado nos destinos
de seu país, conhecedor das leis de desenvolvimento social, capaz de aplicá-las e
empenhar-se em ser um participante ativo na orientação política do país. É claro,
será um fardo adicional para os especialistas bolcheviques. Mas será um fardo
mais do que compensado por seus resultados.
A tarefa de propaganda do Partido, a tarefa de formação marxista-leninista
de quadros, é ajudar nossos quadros em todos os ramos de trabalho a se tornarem
versados na ciência marxista-leninista das leis do desenvolvimento social.
Medidas para melhorar o trabalho de propaganda e de formação marxista-
leninista de quadros foram muitas vezes discutidas pelo Comitê Central do PCUS
(B) em conjunto com propagandistas de várias organizações regionais do Partido.
A publicação, em setembro de 1938, do “História do PCUS (B) – Minicurso” foi
levada em consideração neste contexto.
Verificou-se que a publicação da “História do PCUS (B)” deu um novo im-
pulso à propaganda marxista-leninista em nosso país.
Os resultados dos trabalhos do Comitê Central do PCUS (B) foram publicados
na sua decisão, “Sobre a Organização da Propaganda Partidária em Relação à
Publicação da História do PCUS (B) – Minicurso”.
Com base nesta decisão e com a devida referência às decisões do Plenário do
Comitê Central do PCUS (B) de março de 1937, “Sobre Defeitos no Trabalho do
Partido”, o Comitê Central do PCUS (B) delineou as seguintes medidas impor-
tantes para eliminar os defeitos na propaganda do Partido e melhorar o trabalho
da formação marxista-leninista de membros e quadros do Partido:
1. Concentrar o trabalho de propaganda e agitação do Partido em um só
corpo e fundir os departamentos de propaganda e agitação e os departamentos
de imprensa em uma única Administração de Propaganda e Agitação do Comitê
Central do PCUS (B), E organizar a propaganda correspondente e departamen-
606 Obras Escolhidas

tos de agitação em cada organização republicana, territorial e regional do Par-


tido;
2. Reconhecendo como incorreta a paixão pelo sistema de propaganda atra-
vés dos círculos de estudo, e considerando o método de estudo individual dos
princípios do marxismo-leninismo por membros do Partido como mais conveni-
ente, para centrar a atenção do Partido na propaganda através da imprensa e na
organização de um sistema de propaganda por meio de palestras;
3. Organizar Cursos de Instrução de um ano para nossos quadros inferiores
em cada centro regional;
4. Organizar Escolas Lenin de dois anos para os nossos quadros médios em
vários centros do país;
5. Organizar uma Escola Superior de Marxismo-Leninismo sob os auspícios
do Comitê Central do PCUS (B) Com um curso de três anos para a formação de
teóricos do Partido altamente qualificados;
6. Estabelecer Cursos de Instrução de um ano para propagandistas e jorna-
listas em diversos centros do país;
7. Estabelecer, em conexão com a Escola Superior de Marxismo-Leninismo,
Cursos de Instrução de seis meses para professores de Marxismo-Leninismo nos
estabelecimentos de ensino superior.
Não há dúvida de que a concretização dessas medidas, que já estão sendo
realizadas, embora ainda não suficientemente, em breve trarão resultados bené-
ficos.

4. Algumas questões de teoria

Outro dos defeitos de nosso trabalho propagandista e ideológico é a ausência


de total clareza entre nossos camaradas sobre certas questões teóricas de impor-
tância prática vital, a existência de certa confusão sobre essas questões. Refiro-
me à questão do Estado em geral, e de nosso Estado socialista em particular, e à
questão de nossa intelectualidade soviética.
Às vezes é perguntado “Nós abolimos as classes exploradoras; não há mais
classes hostis no país; não há ninguém para suprimir; portanto, não há mais
necessidade do Estado; ele deve morrer. – Por que então não fazemos ajudar
nosso Estado socialista a morrer? Por que não nos esforçamos para acabar com
isso? Não é hora de jogar fora todo esse lixo de Estado?”
Ou ainda: “As classes exploradoras já foram abolidas em nosso país; o socia-
lismo se construiu em sua maioria; estamos avançando para o comunismo.
Agora, a doutrina marxista do Estado diz que não deve haver nenhum Es-
tado sob o comunismo. – Por que então não ajudamos nosso Estado socialista a
morrer?
Não é hora de relegar o Estado ao museu de antiguidades?”
Essas perguntas mostram que aqueles que as fazem memorizam consciencio-
samente certas proposições contidas na doutrina de Marx e Engels sobre o Es-
tado. Mas também mostram que esses camaradas não conseguiram compreender
o significado essencial desta doutrina; que eles falharam em perceber em que
J. V. Stalin 607

condições históricas as várias proposições desta doutrina foram elaboradas; e,


além disso, que não entendem as condições internacionais atuais, têm esquecido
o cerco capitalista e os perigos que isso acarreta para o país socialista.
Essas questões não apenas denunciam uma subestimação do cerco capitalista,
mas também uma subestimação do papel e da importância dos Estados burgue-
ses e seus órgãos, que enviam espiões, assassinos e destruidores ao nosso país e
aguardam uma oportunidade favorável para atacá-lo por força armada.
Da mesma forma, denunciam uma subestimação do papel e da importância
do nosso Estado socialista e dos seus órgãos militares, punitivos e de inteligência,
essenciais para a defesa da terra socialista de ataques estrangeiros. É preciso
confessar que os companheiros mencionados não são os únicos a pecar nessa
subestimação. Todos os bolcheviques, todos nós, sem exceção, pecamos até certo
ponto a esse respeito.
Não é de surpreender que tenhamos aprendido sobre a espionagem e as ativi-
dades conspiratórias dos líderes trotskistas e bukharinistas apenas recentemente,
em 1937 e 1938, embora, como mostram as evidências, esses nobres estivessem
a serviço de organizações de espionagem estrangeiras e realizassem atividades
conspiratórias desde os primeiros dias da Revolução de Outubro? Como pude-
mos deixar de notar um assunto tão grave? Como vamos explicar esse erro? A
resposta usual a essa pergunta é que não poderíamos presumir que essas pessoas
pudessem ter caído tanto. Mas isso não é explicação, muito menos é uma jus-
tificativa: pois o erro foi um erro crasso. Como esse erro pode ser explicado?
Isso se explica por uma subestimação da força e consequência do mecanismo dos
Estados burgueses que nos cercam e de seus órgãos de espionagem, que se esfor-
çam por aproveitar as fraquezas das pessoas, sua vaidade, sua negligência, para
enredá-las em seus redes de espionagem e usá-las para cercar os órgãos do Estado
soviético. Deve ser explicado por uma subestimação do papel e da importância
do mecanismo de nosso Estado socialista e de seu serviço de inteligência, por
uma subestimação deste serviço de inteligência, pelo boato de que um serviço
de inteligência em um Estado soviético é uma ninharia sem importância, e que
o serviço de inteligência soviético e o próprio Estado soviético logo terão que ser
relegados ao museu de antiguidades.
O que poderia ter dado origem a essa subestimação?
Surgiu devido ao fato de que algumas das proposições gerais da doutrina
marxista do Estado foram incompletamente elaboradas e inadequadas.
Recebeu aceitação devido à nossa atitude imperdoavelmente descuidada para
assuntos relativos à teoria do Estado, apesar do fato de termos vinte anos de ex-
periência prática em assuntos de Estado, o que fornece rico material para ge-
neralizações teóricas, e apesar do fato de que, dado o desejo, temos todas as
oportunidades de preencher com sucesso essa lacuna na teoria. Esquecemos a
recomendação altamente importante de Lenin sobre os deveres teóricos dos mar-
xistas russos, de que é sua missão desenvolver ainda mais a teoria marxista. Aqui
está o que Lenin disse a este respeito:
“Não consideramos a teoria marxista algo completo e inviolável; pelo contrário, estamos con-
vencidos de que ela apenas lançou a pedra angular da ciência que os socialistas devem avançar
em todas as direções se desejam acompanhar o ritmo da vida. Nós acho que uma elaboração
independente da teoria marxista é especialmente essencial para os socialistas russos, pois esta
608 Obras Escolhidas

teoria fornece apenas princípios gerais de orientação, que, em particular, são aplicados na
Inglaterra de forma diferente da França, na França de forma diferente da Alemanha e na
Alemanha de forma diferente da Rússia.” (Lenin, Obras Escolhidas, Edição Russa, Vol. II,
p. 492.)

Considere, por exemplo, a formulação clássica da teoria do desenvolvimento


do Estado Socialista dada por Engels:
“Tão logo não haja mais nenhuma classe da sociedade a ser submetida; tão logo, junto com
a dominação de classes e a luta pela existência individual baseada na antiga anarquia da
produção, as colisões e excessos daí decorrentes também foram abolido, nada mais há a ser
reprimido que tornasse necessária uma força repressiva especial, um Estado. O primeiro ato
em que o Estado realmente se apresenta como representante da sociedade como um todo – a
apropriação dos meios de produção em o nome da sociedade – é ao mesmo tempo seu último
ato independente como Estado. A interferência do poder estatal nas relações sociais torna-se
supérflua em uma esfera após a outra, e então cessa por si mesma. O governo das pessoas
é substituído pela administração das coisas e da direção do processo de produção. O Estado
não é ‘abolido’, ele definha.” (Revolução na ciência de Herr Eugen Dühring (Anti-Dühring),
pp. 308-09.)

Essa proposição de Engels está correta?


Sim, está correto, mas apenas em uma das duas condições:
(1) se estudarmos o Estado socialista apenas sob o ângulo do desenvolvimento
interno do país, abstraindo-nos antecipadamente do fator internacional, isolando,
para a conveniência da investigação, o país e o Estado da situação internacional;
ou (2) se assumirmos que o socialismo já é vitorioso em todos os países, ou na
maioria dos países, que existe um cerco socialista em vez de um cerco capitalista,
que não há mais perigo de ataque estrangeiro e que não há mais necessidade de
fortalecer o exército e o Estado.
Bem, mas e se o socialismo tiver vencido apenas em um país, considerado
isoladamente, e se, em vista disso, for absolutamente impossível se abstrair das
condições internacionais – e daí? A fórmula de Engels não fornece uma resposta
a essa pergunta. Na verdade, Engels não se fez essa pergunta e, portanto, não
poderia ter dado uma resposta a ela. Engels parte do pressuposto de que o so-
cialismo já foi vitorioso em todos os países, ou na maioria deles, mais ou menos
simultaneamente.
Consequentemente, Engels não está aqui investigando qualquer Estado socia-
lista específico de qualquer país em particular, mas o desenvolvimento do Estado
socialista em geral, no pressuposto de que o socialismo venceu na maioria dos
países – de acordo com a fórmula: “Assumindo que o socialismo é vitorioso na
maioria dos países, que mudanças deve sofrer o Estado proletário socialista?”. So-
mente esse caráter geral e abstrato do problema pode explicar por que, em sua
investigação da questão do Estado socialista, Engels se abstraiu completamente
de um fator como as condições internacionais, a situação internacional.
Mas decorre disso que a fórmula geral de Engels sobre o destino do Estado
socialista em geral não pode ser estendida ao caso parcial e específico da vitória
do socialismo em um único país, um país que é cercado por um mundo capi-
talista, está sujeito à ameaça de ataque militar estrangeiro, não pode, portanto,
abstrair-se da situação internacional, e deve ter à sua disposição um exército bem
treinado, órgãos punitivos bem organizados e um forte serviço de inteligência,
consequentemente, deve ter seu próprio Estado, forte o suficiente para defender
J. V. Stalin 609

as conquistas do socialismo do ataque estrangeiro.


Não temos o direito de esperar dos escritores marxistas clássicos, separados
como estavam desde nossos dias por um período de quarenta e cinco ou cin-
quenta e cinco anos, que eles deveriam ter previsto cada um dos ziguezagues da
história no futuro distante em cada país. Seria ridículo esperar que os escritores
marxistas clássicos elaborassem para nosso benefício soluções prontas para todo
e qualquer problema teórico que pudesse surgir em qualquer país em particular
cinquenta ou cem anos depois, de modo que nós, os descendentes dos escritores
marxistas clássicos, podermos cochilar calmamente ao lado da lareira e mastigar
soluções prontas. (Gargalhadas.)
Mas podemos e devemos esperar dos marxistas-leninistas de nossos dias que
eles não se limitem a aprender de cor alguns princípios gerais do marxismo; que
mergulham profundamente na essência do marxismo; que aprendam a ter em
conta a experiência adquirida nos vinte anos de existência do Estado socialista
no nosso país; que, por fim, aprendam, com o uso dessa experiência e com o
conhecimento da essência do marxismo, a aplicar concretamente as várias teses
gerais do marxismo, a dar-lhes maior precisão e a aperfeiçoá-las.
Lenin escreveu seu famoso livro, O Estado e a Revolução, em agosto de 1917,
ou seja, poucos meses antes da Revolução de Outubro e do estabelecimento do
Estado soviético. Lenin considerava a principal tarefa deste livro defender a dou-
trina de Marx e Engels do Estado das distorções e vulgarizações dos oportunistas.
Lenin se preparava para escrever um segundo volume de O Estado e a Revolução,
no qual pretendia resumir as principais lições da experiência das revoluções rus-
sas de 1905 e 1917. Não pode haver dúvida de que Lenin pretendia no segundo
volume de seu livro para elaborar e desenvolver a teoria do Estado com base na
experiência adquirida durante a existência do poder soviético em nosso país. A
morte, no entanto, o impediu de levar essa tarefa à execução. Mas o que Lenin
não conseguiu fazer deve ser feito por seus discípulos. (Vivos aplausos.)
O Estado surgiu porque a sociedade se dividiu em classes antagônicas; surgiu
para conter a maioria explorada no interesse da minoria exploradora. Os instru-
mentos da autoridade do Estado concentraram-se principalmente no exército,
nos órgãos punitivos, no serviço de espionagem, nas prisões.
Duas funções básicas caracterizam a atividade do Estado: a doméstica (a fun-
ção principal), manter sob controle a maioria explorada; a internacional (não a
função principal), para estender o território de sua classe, a classe dominante, às
custas do território de outros Estados, ou para defender o território de seu pró-
prio Estado do ataque de outros Estados. Esse foi o caso na sociedade escravista
e a feudal. Esse é o mesmo caso no capitalismo.
Para derrubar o capitalismo, não era apenas necessário tirar a burguesia do
poder, era necessário não apenas expropriar os capitalistas, mas também esmagar
inteiramente a máquina estatal burguesa e seu antigo exército, seu oficialismo
burocrático e sua força policial, e para substituí-lo por uma nova forma proletária
de Estado, um novo Estado socialista.
E isso, como sabemos, é exatamente o que os bolcheviques fizeram. Mas isso
não significa que o novo Estado proletário não pode preservar certas funções
do antigo Estado, alteradas para se adequar às necessidades do Estado prole-
610 Obras Escolhidas

tário. Ainda menos se segue que as formas de nosso Estado socialista devem
permanecer inalteradas, que todas as funções originais de nosso Estado devem
ser totalmente preservadas no futuro. De fato, as formas de nosso Estado estão
mudando e continuarão mudando de acordo com o desenvolvimento de nosso
país e com as mudanças na situação internacional.
Lenin estava absolutamente certo quando disse:
“As formas dos Estados burgueses são extremamente variadas, mas em essência são todas
iguais: de uma forma ou de outra, em última análise, todos esses Estados são inevitavelmente
a ditadura da burguesia. A transição do capitalismo para o comunismo certamente criará uma
grande variedade e abundância de formas políticas, mas sua essência será inevitavelmente a
mesma: a ditadura do proletariado”. (Lenin, Obras Escolhidas, Vol. VII, p. 34.)

Desde a Revolução de Outubro, nosso Estado socialista passou por duas fases
principais em seu desenvolvimento.
A primeira fase foi o período da Revolução de Outubro a eliminação das clas-
ses exploradoras.
A principal tarefa naquele período era suprimir a resistência das classes der-
rubadas, organizar a defesa do país contra os ataques dos intervencionistas, res-
taurar a indústria e a agricultura e preparar as condições para a eliminação dos
elementos capitalistas. Consequentemente, neste período nosso Estado desem-
penhou duas funções principais.
A primeira função era suprimir as classes derrubadas dentro do país. Nesse
aspecto, nosso Estado tinha uma semelhança superficial com os Estados anterio-
res cujas funções também tinham sido suprimir os recalcitrantes, com a diferença
fundamental, entretanto, que nosso Estado suprimiu a minoria exploradora no
interesse da maioria trabalhadora, enquanto os Estados anteriores suprimiram
os explorados maioria no interesse da minoria exploradora. A segunda função
era defender o país de ataques estrangeiros. Nesse aspecto, também tinha uma
semelhança superficial com os Estados anteriores, que também empreenderam
a defesa armada de seus países, com a diferença fundamental, porém, que nosso
Estado defendeu do ataque estrangeiro os ganhos da maioria operária, enquanto
os Estados anteriores nesses casos defendeu a riqueza e os privilégios da minoria
exploradora. Nosso Estado tinha ainda uma terceira função: era o trabalho de
organização econômica e educação cultural realizado por nossos órgãos do Es-
tado com o propósito de desenvolver os pueris impulsos do novo sistema econô-
mico socialista e reeducar o povo no espírito do socialismo. Mas esta nova função
não alcançou nenhum desenvolvimento considerável naquele período.
A segunda fase foi o período desde a eliminação dos elementos capitalistas na
cidade e no campo até a vitória total do sistema econômico socialista e a adoção
da nova Constituição.
A principal tarefa nesse período era estabelecer o sistema econômico socia-
lista em todo o país e eliminar os últimos resquícios dos elementos capitalistas,
realizar uma revolução cultural e formar um exército totalmente moderno para
a defesa do país. E as funções do nosso Estado socialista mudaram de acordo.
A função de repressão militar dentro do país cessou, morreu; pois a exploração
havia sido abolida, não havia mais exploradores e, portanto, não havia ninguém
para suprimir.
J. V. Stalin 611

Em lugar desta função de supressão, o Estado adquiriu a função de proteger


a propriedade socialista de ladrões e furtos de propriedade do povo.
A função de defender o país de ataques estrangeiros permaneceu totalmente;
consequentemente, o Exército Vermelho e a Marinha também permaneceram
plenamente, assim como os órgãos punitivos e o serviço de inteligência, indispen-
sáveis para a detecção e punição dos espiões, assassinos e destruidores enviados
a nosso país pelos serviços de espionagem estrangeira. A função de organiza-
ção econômica e educação cultural pelos órgãos do Estado também permaneceu
e foi desenvolvida ao máximo. Agora, a principal tarefa de nosso Estado den-
tro do país é o trabalho de organização econômica pacífica e educação cultural.
Quanto ao nosso exército, órgãos punitivos e serviço de inteligência, sua vanta-
gem não está mais voltada para o interior do país, mas para o exterior, contra os
inimigos externos.
Como vocês veem, agora temos um Estado socialista inteiramente novo, sem
precedentes na história e que difere consideravelmente em forma e funções do
Estado socialista da primeira fase.
Mas o desenvolvimento não pode parar por aí. Vamos em frente, em direção
ao comunismo. Nosso Estado permanecerá no período do comunismo também?
Sim, será, a menos que o cerco capitalista seja liquidado e a menos que o
perigo de um ataque militar estrangeiro tenha desaparecido. Naturalmente, é
claro, as formas de nosso Estado mudarão novamente de acordo com a mudança
na situação interna e externa.
Não, não vai permanecer e vai atrofiar se o cerco capitalista for liquidado e
um cerco socialista tomar o seu lugar.
É assim que se coloca a questão em relação ao Estado socialista.
A segunda questão é a da intelligentsia soviética.
Também nesta questão, como na questão do Estado, existe uma certa obscu-
ridade e confusão entre os membros do Partido.
Apesar de a posição do Partido sobre a questão da intelligentsia soviética ser
perfeitamente clara, ainda existem em nosso Partido visões hostis à intelectua-
lidade soviética e incompatíveis com a posição do partido. Como vocês sabem,
aqueles que defendem essas opiniões praticam uma atitude desdenhosa e desde-
nhosa para com a intelectualidade soviética e a consideram uma força estranha,
até mesmo como uma força hostil à classe trabalhadora e ao campesinato. É
verdade que, durante o período de desenvolvimento soviético, a intelectualidade
passou por uma mudança radical tanto em sua composição quanto em seu status.
Aproximou-se do povo e está colaborando honestamente com o povo, no qual se
diferencia fundamentalmente da velha intelectualidade burguesa. Mas isso apa-
rentemente não significa nada para esses camaradas. Eles continuam repetindo
as velhas melodias e aplicam erroneamente à intelectualidade soviética pontos de
vista e atitudes que eram justificados nos velhos tempos, quando a intelectuali-
dade estava a serviço dos latifundiários e dos capitalistas.
Nos velhos tempos, sob o capitalismo, antes da revolução, a intelectualidade
consistia principalmente de membros das classes proprietárias – nobres, fabrican-
tes, comerciantes, kulaks e assim por diante. Alguns membros da intelectualidade
612 Obras Escolhidas

eram filhos de pequenos comerciantes, funcionários mesquinhos e até mesmo de


camponeses e trabalhadores, mas eles não tinham e não podiam desempenhar
um papel decisivo.
A intelligentsia como um todo dependia para sua subsistência das classes pro-
prietárias e ministrava às classes proprietárias. Daí é fácil compreender a descon-
fiança, muitas vezes beirando o ódio, com que os elementos revolucionários de
nosso país e sobretudo os trabalhadores olhavam para os intelectuais. É verdade
que a velha intelectualidade produziu alguns indivíduos corajosos, punhados de
revolucionários que adotaram o ponto de vista da classe trabalhadora e se alia-
ram completamente à classe trabalhadora. Mas essas pessoas eram muito poucas
entre a intelectualidade e não podiam mudar o aspecto da intelectualidade como
um todo.
As questões relativas à intelligentsia sofreram uma mudança fundamental, po-
rém, desde a Revolução de Outubro, desde a derrota da intervenção armada es-
trangeira, e especialmente desde a vitória da industrialização e da coletivização,
quando a abolição da exploração e o firme estabelecimento do sistema econô-
mico socialista tornou realmente possível dar ao país uma nova Constituição e
colocá-la em vigor. O setor mais influente e qualificado da antiga intelectuali-
dade se separou do corpo principal nos primeiros dias da Revolução de Outubro,
proclamou guerra ao governo soviético e juntou-se às fileiras dos sabotadores.
Eles encontraram uma punição bem merecida por isso; foram esmagados e dis-
persos pelos órgãos do poder soviético. Posteriormente, a maioria dos que sobre-
viveram foi recrutada pelos inimigos de nosso país como destruidores e espiões e,
portanto, foram expurgados por seus próprios atos das fileiras dos intelectuais.
Outro setor da velha intelectualidade, menos qualificado, mas mais numeroso,
por muito tempo continuou a marcar o tempo, esperando por “dias melhores”;
mas então, aparentemente sem esperança, decidiu ir servir e viver em harmonia
com o governo soviético.
A maior parte desse grupo da antiga intelectualidade está bem avançada e
está começando a sair da comissão. Uma terceira seção da velha intelectualidade,
composta principalmente de sua base, e ainda menos qualificada do que a seção
que acabamos de mencionar, juntou forças com o povo e apoiou o governo sovié-
tico. Precisava aperfeiçoar sua educação e começou a fazê-lo em nossas universi-
dades. Mas paralelamente a este doloroso processo de diferenciação e dissolução
da velha intelectualidade, deu-se um rápido processo de formação, mobilização e
reunião de forças de uma nova intelectualidade. Centenas de milhares de jovens
vindos das fileiras da classe operária, do campesinato e da intelectualidade ope-
rária ingressaram nas universidades e colégios técnicos, de onde surgiram para
reforçar as fileiras atenuadas da intelectualidade. Eles infundiram sangue novo
nele e o reanimaram em um novo espírito soviético. Eles mudaram radicalmente
todo o aspecto da intelligentsia, moldando-a em sua própria forma e imagem. Os
remanescentes da velha intelectualidade foram dissolvidos na nova intelectuali-
dade soviética, a intelectualidade do povo.
Surgiu assim uma nova intelectualidade soviética, intimamente ligada ao povo
e, na maior parte, pronta para servi-lo com fidelidade e lealdade.
Como resultado, temos agora uma numerosa, nova e popular intelectualidade
J. V. Stalin 613

socialista, fundamentalmente diferente da velha intelectualidade burguesa, tanto


na composição como no caráter social e político.
A velha teoria sobre a intelectualidade, que ensinava que ela deveria ser tra-
tada com desconfiança e combatida, era plenamente aplicada à velha intelectua-
lidade pré-revolucionária, que servia aos latifundiários e capitalistas.
Essa teoria agora está desatualizada e não se encaixa em nossa nova intelectu-
alidade soviética. Nossa nova intelectualidade exige uma nova teoria, uma teoria
que ensine a necessidade de uma atitude cordial em relação a ela, solicitude e
respeito por ela e cooperação com ela no interesse da classe trabalhadora e do
campesinato.
Isso é claro, eu acho.
É, portanto, ainda mais surpreendente e estranho que, depois de todas essas
mudanças fundamentais no status da intelectualidade, se encontrem em nosso
Partido pessoas que tentam aplicar a velha teoria, que era dirigida contra a in-
telectualidade burguesa, à nossa nova intelectualidade soviética, que é basica-
mente uma intelectualidade socialista. Essas pessoas, ao que parece, afirmam
que os trabalhadores e camponeses que até recentemente trabalhavam à moda
de Stakhanov nas fábricas e fazendas coletivas e que depois eram enviados às
universidades para serem educados, assim deixaram de ser pessoas reais e se tor-
naram pessoas de segunda categoria. Portanto, devemos concluir que a educação
é algo pernicioso e perigoso. (Risos.) Queremos que todos os nossos trabalhado-
res e camponeses sejam cultos e educados, e vamos conseguir isso a tempo. Mas,
na opinião desses camaradas estranhos, esse propósito acarreta um grave perigo;
pois depois que os trabalhadores e camponeses se tornarem cultos e educados,
podem correr o perigo de serem classificados como pessoas de segunda classe.
(Gargalhadas.) Não está excluída a possibilidade de que esses camaradas estra-
nhos possam, com o tempo, cair na posição de exaltar o atraso, a ignorância, a
ignorância e o obscurantismo. Seria bem da natureza das coisas. Os caprichos
teóricos nunca levaram, e nunca podem levar, a qualquer bem.
Essa é a posição em relação à nossa nova intelectualidade socialista.

∗ ∗ ∗

Nossas tarefas quanto ao fortalecimento do Partido são:


1. Melhorar sistematicamente a composição do Partido, elevando o nível de
conhecimento dos seus membros e admitindo nas suas fileiras, por um processo
de seleção individual, apenas camaradas experimentados e testados que sejam
leais à causa do comunismo.
2. Estabelecer um contacto mais estreito entre os órgãos dirigentes e os tra-
balhos dos órgãos inferiores, de forma a tornar o seu trabalho de chefia mais
prático e específico e menos confinado a reuniões e ofícios.
3. Centralizar o trabalho de seleção de quadros, formá-los cuidadosamente
e promovê-los, estudar a fundo os méritos e deméritos dos trabalhadores, pro-
mover com coragem os jovens trabalhadores e adaptar a seleção dos quadros às
exigências da linha política do Partido.
4. Centralizar a propaganda e a agitação do Partido, estender a propaganda
614 Obras Escolhidas

das ideias do marxismo-leninismo, elevar o nível teórico e melhorar a escolari-


dade política dos nossos quadros.

∗ ∗ ∗

Camaradas, estou prestes a concluir meu relatório.


Esbocei em linhas gerais o caminho percorrido por nosso Partido durante
o período em análise. São conhecidos os resultados dos trabalhos do Partido
e de seu Comitê Central durante esse período. Houve erros e falhas em nosso
trabalho.
O Partido e o Comitê Central não os ocultaram e se esforçaram por corrigi-
los. Também houve sucessos importantes e grandes conquistas, que não devemos
permitir que nos voltem a cabeça.
A principal conclusão a ser tirada é que a classe trabalhadora de nosso país,
tendo abolido a exploração do homem pelo homem e estabelecido firmemente
o sistema socialista, provou ao mundo a verdade de sua causa. Essa é a conclusão
principal, pois fortalece nossa fé no poder da classe trabalhadora e na inevitabi-
lidade de sua vitória final.
A burguesia de todos os países afirma que o povo não pode viver sem capita-
listas e latifundiários, sem mercadores e kulaks. A classe operária do nosso país
provou na prática que o povo pode viver perfeitamente bem sem exploradores.
A burguesia de todos os países afirma que, tendo destruído o velho sistema
burguês, a classe trabalhadora é incapaz de construir algo novo para substituir
o antigo. A classe operária do nosso país provou na prática que é perfeitamente
capaz não só de destruir o antigo sistema, mas de construir um novo e melhor
sistema, um sistema socialista, um sistema, aliás, ao qual as crises e o desemprego
são desconhecidos. A burguesia de todos os países afirmam que o campesinato
é incapaz de seguir o caminho do socialismo.
Os camponeses coletivos de nosso país provaram na prática que podem fazê-lo
com bastante sucesso.
O esforço principal da burguesia de todos os países e de seus seguidores refor-
mistas é matar na classe trabalhadora a fé em sua própria força, a fé na possibili-
dade e inevitabilidade de sua vitória, e assim perpetuar a escravidão capitalista.
Pois a burguesia sabe que se o capitalismo ainda não foi derrubado e continua
existindo, isso não se deve aos seus próprios méritos, mas ao fato de que o prole-
tariado ainda não tem fé suficiente na possibilidade de sua vitória. Não se pode
dizer que os esforços da burguesia a esse respeito tenham sido totalmente infrutí-
feros. Deve-se confessar que a burguesia e seus agentes entre a classe trabalhadora
conseguiram, até certo ponto, envenenar as mentes da classe trabalhadora com
o veneno da dúvida e do ceticismo.
Se os sucessos da classe operária de nosso país, se sua luta e vitória servem para
despertar o espírito da classe operária nos países capitalistas e para fortalecer sua
fé em seu próprio poder e em sua vitória, então nosso Partido pode dizer que
é o trabalho não foi em vão. E não há dúvida de que esse será o caso. (Aplausos
prolongados.)
Viva nossa classe operária vitoriosa! (Aplausos.)
J. V. Stalin 615

Viva nosso campesinato vitorioso da fazenda coletiva! (Aplausos.)


Viva a nossa intelectualidade socialista! (Aplausos.)
Viva a grande amizade das nações do nosso país! (Aplausos.)
Viva o Partido Comunista da União Soviética! (Aplausos.)
616 Obras Escolhidas

Transmissão de rádio
03 de julho de 1941

Camaradas! Cidadãos!
Irmãos e irmãs!
Combatentes de nosso exército e da nossa marinha!
É a vós que me dirijo, meus amigos!
A pérfida invasão da Alemanha hitlerista contra a nossa Pátria, iniciada em
22 de junho, prossegue. A despeito dos esforços e da defesa heroica de Exér-
cito Vermelho e não obstante as melhores divisões e forças aéreas alemãs terem
sido destruídas e terem encontrado seu túmulo no campo de batalha, os alemães
continuam avançando e enviando novas unidades para a linha de frente.
O exército hitlerista conseguiu apossar-se da Lituânia, de grande parte da
Letônia, da Bielorrússia Ocidental e de setores da Ucrânia Ocidental. A aviação
fascista estende a área de ação de seus bombardeiros, tendo atingido Murmansk,
Orsha, Mohilev, Smolensk, Kiev, Odessa e Sebastópol. Grande ameaça paira
sobre o nosso país.
Como pôde acontecer que nosso famoso Exército Vermelho tenha perdido
para as tropas fascistas várias cidades e regiões? É possível que as tropas inimigas
sejam realmente invencíveis, como o trombeteiam sem descanso os propagandis-
tas fanfarrões fascistas?
É claro que não! A história mostra que exércitos invencíveis não existem e
nunca existiram. O exército de Napoleão dizia-se invencível, mas foi destruído
sucessivamente pelos exércitos russo, inglês e alemão. O exército alemão de Gui-
lherme no período da primeira guerra imperialista também se dizia invencível,
mas ele foi derrotado várias vezes pelos exércitos russo e anglo-francês e, final-
mente, destruído por este último. O mesmo deve-se dizer do atual exército fas-
cista de Hitler. Este exército ainda não encontrou uma oposição séria no resto
da Europa e somente se deparou com tal resistência em nosso território.
E se em meio a essa resistência, o nosso Exército Vermelho mostrou que as
melhores divisões do exército hitlerista podiam ser derrotadas, isso significa que
elas podem e serão destruídas, como o foram os exércitos de Napoleão e Gui-
lherme. O fato de que parte de nosso território, apesar disso, tenha sido tomada
pelas tropas fascistas alemãs, é explicado principalmente por a guerra da Alema-
nha fascista contra a União Soviética ter começado em condições vantajosas para
o exército alemão e desvantagens para o Exército Soviético.
É verdade que as tropas alemãs, tal como os países que conduzem a guerra,
já estavam totalmente mobilizadas e 170 divisões enviadas pela Alemanha con-
tra a União Soviética, que se aproximavam das nossas fronteiras, encontravam-se
em prontidão, à espera do sinal para a invasão, enquanto que os exércitos so-
viéticos ainda tinham de ser mobilizados e trazidos para as fronteiras. Não é de
menor importância o fato de que a Alemanha fascista tenha rompido, inesperada
e traiçoeiramente, o pacto de não-agressão assinado em 1939 entre ela e a União
J. V. Stalin 617

Soviética, sem contar que ela será considerada por todo o mundo como o país
agressor. Compreensivelmente do pacto, não pôde permanecer no caminho da
traição.
Pode-se perguntar como o Governo Soviético assinou um pacto de não-agressão
com pessoas tão traiçoeiras e monstruosas como Hitler e Ribbentrop. Não seria
o caso aqui de um erro cometido por parte do Governo Soviético? É claro que
não! O pacto de não-agressão é um acordo de paz entre dois Estados. Justamente
esse tipo de pacto nos foi oferecido pela Alemanha em 1939. Poderia o Governo
Soviético recusar tal oferta? Eu penso que nenhum Estado do mundo pode re-
cusar um acordo de paz com uma potência vizinha, se no comando da mesma
estão tiranos e canibais como Hitler e Ribbentrop. E isto, é claro, com a condi-
ção sine qua non de que o acordo de paz não esbarre direta ou indiretamente na
integridade territorial e a honra de um Estado pacífico. Como é sabido, o pacto
de não-agressão entre a Alemanha e a União soviética realizou-se nestes termos.
O que nós ganhamos assinando o pacto com a Alemanha? Nós garantimos
a paz para o nosso país por um ano e meio e a possibilidade de preparar nossas
forças para o revide, se a Alemanha fascista se arriscasse a nos atacar, apesar do
pacto. Isto foi uma vitória determinante para nós e uma derrota para a Alemanha
fascista.
O que ganhou e o que perdeu a Alemanha fascista ao romper traiçoeiramente
o pacto e invadir a União Soviética.
Ela conseguiu com isso algumas vitórias para os seus exércitos num curto
prazo, mas perdeu do ponto de vista político, sendo desmascarada aos olhos de
todo o mundo como um agressor sanguinário. Não pode haver dúvida de que
esta vitória militar momentânea da Alemanha consiste em apenas um episódio,
enquanto que o conjunto das vitórias políticas da União Soviética é um fator sério
e duradouro, na base do qual deverão se desdobrar os êxitos militares decisivos
do Exército Vermelho na luta contra a Alemanha fascista.
Eis porque todo o nosso heroico exército, toda a nossa destemida frota naval,
todos os nossos ases da aviação, todos os povos do nosso país, todas as pessoas
de bem da Europa, América e Ásia e, finalmente, todas as pessoas de bem da
Alemanha deploram as ações traiçoeiras dos fascistas alemães e dão seu apoio ao
Governo Soviético e se apercebem de que nossa causa é justa, que o inimigo será
destruído e que nós temos que vencer.
Com a força que nos é imposta pela guerra, nosso país entrou em confronto
mortal com seu inimigo mais perverso – o fascismo alemão. Nosso exército com-
bate heroicamente o inimigo armado até os dentes com tanques e aviões. O Exér-
cito Vermelho e a Marinha Vermelha superam as inúmeras dificuldades e batem-
se com determinação por cada milímetro da terra soviética. Entram em combate
as principais forças do Exército Vermelho, armadas com milhares de tanques e
aviões. A coragem dos soldados do Exército Vermelho é sem precedentes. Nossa
resistência ao inimigo endurece e se torna cada vez mais forte. Junto com o Exér-
cito Vermelho na defesa da nossa Pátria, levanta-se todo o povo soviético. O que
é necessário para que seja eliminado o perigo que ameaça a nossa Pátria e que
medidas devem ser tomadas para derrotar o inimigo?
Antes de mais nada, é necessário que o nosso povo, o povo soviético, compre-
618 Obras Escolhidas

enda a extensão do perigo que ameaça o nosso país e deixe de lado a indiferença,
o espírito de construção da paz, plenamente aceitáveis no período pré-guerra,
mas nocivos na época atual, quando a guerra mudou radicalmente a situação.
O inimigo é cruel e não perdoa. Ele leva adiante seu objetivo de ocupar nossas
terras regadas com nosso suor, de roubar nosso pão e nosso petróleo, conquis-
tados com nosso trabalho. Ele leva adiante a sua meta de restaurar o poder dos
latifundiários, de ressuscitar o tsarismo, de destruir a cultura nacional e os Es-
tados nacionais dos russos, ucranianos, bielorrussos, lituanos, letões, estonianos,
uzbeques, tártaros, moldávios, georgianos, armênios, azeris e outros povos livres
da União Soviética, de germanizá-las e transformá-las em escravos dos príncipes
e barões. Trata-se, como se vê, da vida ou morte do Estado Soviético, da vida ou
morte das nações da União Soviética, enfim, de continuarem sendo povos livres
deste país ou se tornar escravos. É necessário que o povo soviético compreenda,
deixe de ser passivo, se mobilize e oriente o seu trabalho para o esforço de guerra,
sem ficar à mercê do inimigo.
É indispensável, também, que nas nossas fileiras não haja lugar para quei-
xosos e covardes, para alarmistas e desertores, que o nosso povo não conheça o
medo em combate e vá para a nossa Guerra Patriótica de libertação contra os
escravizadores fascistas. O grande Lenin, que criou o nosso Estado, dizia que
as qualidades fundamentais dos soviéticos devem ser a coragem, a intrepidez, o
desconhecimento do medo em combate, o preparo para lutar junto com o povo
contra os inimigos da nossa Pátria. É necessário que esta qualidade magnífica do
bolchevique se torne patrimônio de milhões e milhões de indivíduos do Exército
Vermelho, da nossa Marinha Vermelha e de todos os povos da URSS.
Nós devemos rapidamente reorganizar todo nosso trabalho para o esforço
de guerra, tudo em função dos interesses do front e objetivando a derrota do
inimigo. Os povos da União Soviética percebem agora que não eliminaremos do
fascismo germânico a sua raiva e ódio contra a nossa Pátria que garante a todos
os trabalhadores emprego livre e bem-estar.
Os povos da União Soviética devem erguer-se na defesa dos seus direitos, da
sua terra contra o inimigo.
O Exército Vermelho, a Marinha Vermelha e todos os cidadãos da União
Soviética devem defender cada pedaço da terra soviética, lutar até a última gota
de sangue pelas nossas cidades e aldeias, mostrar coragem, iniciativa e ousadia,
próprios do nosso povo.
Nós devemos organizar toda a nação para ajudar o Exército Vermelho, garan-
tir o reforço de suas fileiras, garantir o seu abastecimento com o indispensável,
organizar um rápido sistema de transporte de tropas e carregamentos militares,
e uma ajuda ampla aos feridos.
Nós devemos fortalecer a retaguarda do Exército Vermelho, submetendo todo
o nosso trabalho nesse sentido, garantir o reforço do trabalho de todas as empre-
sas, produzir mais rifles, metralhadoras, canhões, cartuchos, projéteis, aviões,
organizar a proteção das fábricas, centrais elétricas, telefônicas e telegráficas, or-
ganizar a defesa antiaérea local. Nós devemos organizar uma luta implacável
contra todos desorganizadores da retaguarda, desertores, alarmistas, espalhado-
res de boatos, liquidar espiões, diversionistas, paraquedistas inimigos, prestando
J. V. Stalin 619

sempre um auxílio rápido aos nossos batalhões de extermínio. É necessário ter


em mente que o inimigo é pérfido, astuto e experiente na fabricação de fraudes
e difusão de boatos mentirosos. É necessário levar-se em conta tudo isso e não
ceder às provocações. É necessário entregar rapidamente ao Tribunal Militar
para julgamento todos aqueles que com o seu alarmismo e covardia atrapalham
o trabalho da defesa, sem distinção.
Durante a retirada forçada de parte do Exército Vermelho, é necessário quei-
mar todos os veículos ferroviários, não deixando ao inimigo nenhuma locomo-
tiva, nenhum vagão, não deixando sequer um quilograma de pão e nenhum litro
de combustível. Os kolkhozianos devem destruir todo o gado e deixar o pão sob a
guarda dos órgãos governamentais para ser levado para as regiões na retaguarda.
Todos os materiais de valor, incluindo-se os metais não-ferrosos, pão e combus-
tível, que não possam ser levados, devem ser destruídos. Nas regiões ocupadas
pelo inimigo é necessário criar destacamentos de guerrilheiros, a cavalo ou a pé,
criar grupos diversionistas para a luta com o exército inimigo, para fomentar a
guerra de guerrilhas em todas as partes, para a destruição de pontes, estradas,
para interromper ligações telefônicas e telegráficas, queimar florestas, depósitos
e veículos.
Nas regiões ocupadas deve-se criar condições insuportáveis para o inimigo e
todos os seus simpatizantes e eliminá-los a cada passo, frustrando todos os seus
empreendimentos.
A guerra com a Alemanha fascista não deve ser considerada uma guerra co-
mum. Ela baseia-se não somente num enfrentamento entre dois exércitos. Ela
constitui-se numa grande guerra de todo o povo soviético contra os exércitos fas-
cistas alemães. Toda essa Guerra Patriótica de todos os povos contra os opressores
fascistas não é só uma destruição da ameaça que pesa sobre nosso país, mas tam-
bém é uma ajuda a todos os povos da Europa, que estão sob o jugo do fascismo
alemão. Nesta guerra de libertação, nós não estaremos sós.
Nesta grande guerra, nós teremos aliados fiéis no seio dos povos da Europa
e América, contando-se entre estes o povo alemão, escravizado pelos ditames de
Hitler. A guerra pela liberdade da nossa Pátria soma-se à guerra dos povos da
Europa e América pela sua independência, pelas liberdades democráticas.
Será uma única frente dos povos que defendem a liberdade contra os terrores
da escravidão, representados pelos exércitos fascistas de Hitler. Nessa união his-
tórica, o discurso do Primeiro-Ministro da Grã-Bretanha, Sr. Churchill, acerca
da ajuda à União Soviética e a declaração do governo dos Estados Unidos sobre
os preparativos para organizar a ajuda ao nosso país, que causam sentimento de
gratidão nos corações dos povos soviéticos, são claros para nós.
Camaradas! Nossas forças são imensuráveis. O inimigo presunçoso deve se
aperceber logo disto. Junto com o Exército Vermelho, levantam-se milhares de
operários, kolkhozianos e intelectuais para a guerra com o inimigo. Levantam-se
milhões de pessoas do nosso povo.
Os trabalhadores de Moscou e Leningrado já começaram a criação de bata-
lhões populares com milhares de componentes para auxiliar o Exército Verme-
lho. Em cada cidade ameaçada pela invasão do inimigo, nós devemos criar tais
batalhões e convocar para o combate todos os trabalhadores, a fim de que de-
620 Obras Escolhidas

fendam a sua liberdade, a sua honra e a seu País na Guerra Patriótica contra o
fascismo alemão.
Para a mobilização rápida de todas as forças dos povos da URSS e a resistência
ao inimigo, que atacou traiçoeiramente a nossa Pátria, foi criado o Comitê Estatal
de Defesa, em cujas mãos está concentrado todo o poder governamental.
O Comitê Estatal de Defesa começou o seu trabalho e conclama a todo o
povo para cerrar fileiras em torno do partido de Lenin e Stalin, em torno do
Governo Soviético, a fim de se garantir o abnegado auxílio ao Exército Vermelho
e à Marinha para a derrota do inimigo e rumo à vitória.
Todas as nossas forças devem ser direcionadas para auxiliar os nossos heroicos
Exército e Marinha Vermelha!
Todas as nossas forças devem ser dispendidas para a derrota do inimigo!
Avante, pela nossa vitória!
J. V. Stalin 621

Discurso na reunião de
comemoração do Soviete de
Deputados do povo trabalhador e
do Partido de Moscou e
organizações públicas de Moscou
06 de novembro de 1941

Camaradas, já se passaram vinte e quatro anos desde a vitória da Revolução


Socialista de Outubro e o estabelecimento do sistema soviético em nosso país.
Estamos agora no limiar do próximo, o vigésimo quinto ano de existência do
sistema soviético.
Normalmente, nas reuniões que celebram os aniversários da Revolução de
Outubro, são resumidos os resultados de nossos sucessos no domínio da cons-
trução pacífica no ano passado. Temos realmente a possibilidade de somar esses
resultados, pois os nossos sucessos no domínio da construção pacífica estão a
crescer não só de ano para ano, mas de mês para mês. Quais são esses sucessos e
quão grandes eles são, é do conhecimento de todos, amigos e inimigos.
Mas o ano passado não foi apenas um ano de construção pacífica. É também
um ano de guerra com os invasores alemães que perfidamente atacaram nosso
país amante da paz. Somente durante os primeiros seis meses do ano passado
pudemos continuar nosso trabalho pacífico e construtivo. Na segunda metade
do ano, mais de quatro meses foram passados em condições de uma guerra feroz
com os imperialistas alemães. A guerra tornou-se assim um ponto de inflexão
no desenvolvimento do nosso país no último ano. A guerra reduziu conside-
ravelmente e, em alguns ramos, parou completamente nosso pacífico trabalho
construtivo. Obrigou-nos a reorganizar todo o nosso trabalho em pé de guerra.
Converteu nosso país em uma retaguarda unida e abrangente, servindo à frente,
nosso Exército Vermelho e nossa Marinha.
O período de construção pacífica terminou. O período da guerra de liberta-
ção dos invasores alemães começou.
É, portanto, bastante apropriado resumir os resultados da guerra para a se-
gunda metade do ano passado, ou melhor, para o período de mais de quatro
meses da segunda metade do ano, bem como as tarefas que enfrentamos nesta
guerra. de libertação.

O curso da guerra por quatro meses


Já disse em meu discurso no início da guerra que a guerra havia criado uma
perigosa ameaça ao nosso país, que um sério perigo pairava sobre nosso país, que
devemos entender e perceber esse perigo e remodelar nosso trabalho em uma
622 Obras Escolhidas

guerra -por tempo. Agora, depois de quatro meses de guerra, devo enfatizar que
esse perigo não só não diminuiu, mas, ao contrário, até aumentou. O inimigo
tomou grande parte da Ucrânia, Bielorrússia, Moldávia, Lituânia, Letônia, Estô-
nia e uma série de outras regiões, abriu caminho para a Bacia de Donetz, paira
como uma nuvem negra sobre Leningrado e ameaça nossa gloriosa capital, Mos-
cou. Os invasores fascistas alemães estão saqueando nosso país, destruindo as
cidades e vilas criadas pelo trabalho dos trabalhadores, camponeses e intelectu-
ais. As hordas hitleristas estão assassinando e ultrajando os pacíficos habitantes
de nosso país, sem piedade das mulheres, crianças ou idosos. Nossos irmãos nas
regiões de nosso país conquistadas pelos alemães estão gemendo sob o jugo dos
opressores alemães.
Correntes de sangue inimigo foram derramadas pelos homens de nosso Exér-
cito e Marinha, que defendem a honra e a liberdade de nossa Pátria, vencendo
com coragem os ataques do inimigo bestial e exibindo exemplos de bravura e
heroísmo. Mas o inimigo para sem sacrifício, ele não se importa nem um pouco
com o sangue de seus soldados, ele lança em ação cada vez mais destacamentos
para substituir aqueles que foram destruídos, e está envidando todos os seus es-
forços para capturar Leningrado e Moscou antes do advento do inverno, pois ele
sabe que o inverno não é bom para ele.
Em quatro meses de guerra, perdemos 350.000 mortos, 378.000 desapare-
cidos e 1.020.000 feridos. No mesmo período, o inimigo já matou, feridos e
prisioneiros perderam mais de quatro milhões e meio de homens.
Não pode haver dúvida de que, como resultado de quatro meses de guerra, a
Alemanha, cujas reservas de força de trabalho já estão se esgotando, foi conside-
ravelmente mais enfraquecida do que a União Soviética, cujas reservas só agora
estão sendo totalmente mobilizadas.

Falha da ''Blitzkrieg''
Ao lançar seu ataque ao nosso país, os invasores fascistas alemães pensaram
que certamente seriam capazes de “acabar” com a União Soviética em um mês
e meio ou dois meses, e neste curto período conseguiriam chegar aos Urais. É
preciso dizer que os alemães não esconderam esse plano de vitória “relâmpago”.
Pelo contrário, eles anunciaram de todas as maneiras possíveis. Os fatos, entre-
tanto, demonstraram a absoluta irresponsabilidade e falta de fundamento desse
plano “relâmpago”. Agora, este plano louco deve ser considerado como tendo
finalmente falhado. (Aplausos.)
Como se pode explicar que a “blitzkrieg” que teve sucesso na Europa Ocidental
falhou e ruiu no Leste?
Com o que os estrategistas fascistas alemães contaram quando afirmaram que
acabariam com a União Soviética em dois meses e atingiriam os Urais neste curto
período?
Eles calcularam seriamente, em primeiro lugar, a criação de uma coalizão ge-
ral contra a URSS, o alistamento da Grã-Bretanha e dos Estados Unidos nesta
coalizão, primeiro tendo assustado os círculos dirigentes desses países com o es-
pectro da revolução, e assim isolando completamente nosso país da outros po-
J. V. Stalin 623

deres. Os alemães sabiam que sua política de jogar com as contradições entre
as classes de Estados individuais, e entre esses Estados e o país soviético, já havia
produzido resultados na França, cujos governantes, tendo se deixado amedrontar
pelo espectro da revolução, em seu pavor, colocaram seu país aos pés de Hitler e
renunciaram a toda resistência. Os estrategistas fascistas alemães pensaram que
o mesmo ocorreria na Grã-Bretanha e nos Estados Unidos. O notório Hess foi de
fato enviado à Inglaterra pelos fascistas alemães precisamente para persuadir os
políticos ingleses a se juntarem à cruzada geral contra a URSS. Mas os alemães er-
raram gravemente nos cálculos. (Aplausos.) A Grã-Bretanha e os Estados Unidos,
apesar dos esforços de Hess, não apenas não aderiram à campanha dos invaso-
res fascistas alemães contra a URSS, mas, pelo contrário, mostraram-se unidos
à URSS contra a Alemanha hitlerista. A URSS não só não ficou isolada, mas,
ao contrário, conquistou novos aliados na forma da Grã-Bretanha, dos Estados
Unidos e de outros países ocupados pelos alemães. Acontece que a política alemã
de jogar com as contradições e intimidar por meio do espectro da revolução se
exauriu e não é mais adequada à nova situação. E não só é inadequado, mas tam-
bém representa um grande perigo para os invasores alemães, porque nas novas
condições da guerra leva a resultados diametralmente opostos.
Os alemães contavam, em segundo lugar, com a instabilidade do sistema so-
viético e a falta de confiabilidade da retaguarda soviética, calculando que após
o primeiro golpe sério e os primeiros reveses do Exército Vermelho estourariam
conflitos entre trabalhadores e camponeses, a dissensão Começando entre os
povos da URSS, iriam ocorrer revoltas e o país se desintegraria em suas partes
componentes – o que facilitaria o avanço dos invasores alemães até os Urais. Mas
aqui, também, os alemães calcularam gravemente mal. Os reveses do Exército
Vermelho não só não enfraqueceram como, pelo contrário, fortaleceram ainda
mais a aliança dos operários e camponeses, bem como a amizade dos povos da
URSS (Aplausos.) Além disso, converteram a família de povos da URSS em um
campo único e inabalável, apoiando abnegadamente seu Exército Vermelho e
sua Marinha Vermelha. Nunca antes a retaguarda soviética foi tão firme como
é hoje. (Vivos aplausos.) É bastante provável que qualquer outro Estado, tendo
sofrido perdas territoriais como as que temos agora, não tivesse resistido ao teste
e entrado em declínio. Se o sistema soviético passou por essa prova com tanto
sucesso e até fortaleceu sua retaguarda, isso significa que o sistema soviético é
agora o mais estável. (Intensos aplausos.)
Finalmente, os invasores alemães contaram com a fraqueza do Exército Ver-
melho e da Marinha Vermelha, acreditando que o exército alemão e a marinha
alemã teriam sucesso no primeiro golpe em esmagar e dispersar nosso exército
e marinha e abrindo caminho para um avanço sem oposição para o profundezas
do nosso país. Mas aqui também os alemães erraram gravemente os cálculos, su-
perestimando sua própria força e subestimando nosso exército e marinha. Claro,
nosso exército e nossa marinha ainda são jovens, estão lutando há quatro meses
ao todo, ainda não conseguiram se tornar totalmente experientes, ao passo que
são confrontados pelo experiente exército e marinha dos alemães, que já estão
travando guerra por dois anos. Mas, em primeiro lugar, o moral do nosso exér-
cito é mais alto do que o dos alemães, porque está defendendo sua terra natal de
invasores estrangeiros e acredita na justiça de sua causa, enquanto o exército ale-
624 Obras Escolhidas

mão está travando uma guerra agressiva e saqueando um país estrangeiro, sem
possibilidade de acreditar nem por um momento na justiça de sua vil causa. Não
pode haver dúvida de que a ideia de defender a própria terra natal – e é em nome
disso que nosso povo está lutando – está fadada a criar, e na verdade está criando
em nosso exército, heróis que estão cimentando o Exército Vermelho; ao passo
que a ideia de tomar e saquear um país estrangeiro – e é em nome disso que os
alemães estão de fato travando a guerra – está fadada a se reproduzir, e na ver-
dade está criando no exército alemão, saqueadores profissionais, desprovidos de
todos os princípios morais e corromper o exército alemão. Em segundo lugar,
avançando nas profundezas de nosso país, o exército alemão está se movendo
cada vez mais longe de sua própria retaguarda alemã, é forçado a operar em um
ambiente hostil, é forçado a criar uma nova retaguarda em um país estrangeiro,
uma retaguarda que está em ao mesmo tempo sendo interrompido por nossas
guerrilhas – tudo o que está desorganizando radicalmente o abastecimento do
exército alemão, forçando-o a temer sua própria retaguarda, e destruindo sua
fé na estabilidade de sua própria posição; Considerando que nosso exército está
operando em seu próprio ambiente nativo, desfruta do apoio constante de sua
própria retaguarda, garantiu suprimentos de homens, munições e alimentos e
tem uma fé profunda em sua retaguarda. É por isso que nosso exército provou
ser mais forte do que os alemães esperavam e o exército alemão mais fraco do
que se poderia esperar, a julgar pela autopropaganda orgulhosa dos invasores
alemães. A defesa de Leningrado e Moscou, onde nossas divisões recentemente
eliminaram cerca de vinte e cinco divisões alemãs experientes, mostra que no
fogo de nossa guerra patriótica estão sendo forjados, e já foram forjados, novos
combatentes e comandantes soviéticos, aviadores, artilheiros, equipes de mortei-
ros, tanques, soldados de infantaria e marinheiros, que amanhã se tornarão uma
ameaça mortal para o exército alemão. (Vivos aplausos.)
Não há dúvida de que todas essas circunstâncias, tomadas em conjunto, pre-
determinaram o inevitável fracasso da “blitzkrieg” no Oriente.

Razões para as reversões temporárias de nosso


exército

Tudo isso, claro, é verdade. Mas também é verdade que, ao lado desses fatores
favoráveis, há uma série de fatores desfavoráveis ao Exército Vermelho, como
resultado dos quais nosso exército está sofrendo reveses temporários, é obrigado
a recuar e a entregar uma série de regiões de nosso país ao inimigo.
Quais são esses fatores desfavoráveis? Quais são as razões para os reveses
militares temporários do Exército Vermelho?
Uma das razões para os reveses do Exército Vermelho é a ausência de uma se-
gunda frente na Europa contra as tropas fascistas alemãs. O fato é que atualmente
ainda não há exércitos da Grã-Bretanha ou dos Estados Unidos da América no
continente europeu para fazer guerra contra as tropas fascistas alemãs, com o
resultado que os alemães não são obrigados a se dissipar suas forças e para travar
a guerra em duas frentes, no Ocidente e no Oriente. Bem, o efeito disso é que
os alemães, considerando sua retaguarda no Oeste segura, podem mover todas
J. V. Stalin 625

as suas tropas e as tropas de seus aliados na Europa contra nosso país. A situação
atual é tal que o nosso país está a travar a guerra de libertação sozinho, sem qual-
quer assistência militar, contra as forças combinadas de alemães, finlandeses,
romenos, italianos e húngaros. Os alemães se orgulham de seus sucessos tempo-
rários e são pródigos nos elogios de seu exército, alegando que ele sempre pode
derrotar o Exército Vermelho em um único combate. Mas as reivindicações dos
alemães são vãs, pois é incompreensível por que, naquele caso, os alemães recor-
reram à ajuda dos finlandeses, romenos, italianos e húngaros contra o Exército
Vermelho, que está lutando absolutamente sozinho, sem qualquer ajuda militar
de fora. Não há dúvida de que a ausência de uma segunda frente na Europa
contra os alemães facilita consideravelmente a posição do exército alemão. Mas
também não pode haver dúvida de que o surgimento de uma segunda frente
no continente europeu - e isso deve aparecer inquestionavelmente em um fu-
turo próximo (Fortes aplausos.) – irá essencialmente amenizar a situação do nosso
exército em detrimento do exército alemão.
A outra razão para a reversão temporária de nosso exército é a falta de um
número adequado de tanques e, em parte, de aeronaves. Na guerra moderna, é
muito difícil para a infantaria lutar sem tanques e sem proteção adequada para
aeronaves. Nossa aviação é superior em qualidade à dos alemães, e nossos valen-
tes aviadores se cobriram de glória como lutadores destemidos. (Aplausos.) Mas
ainda temos menos aeronaves do que os alemães. Nossos tanques são superiores
em qualidade aos tanques alemães, e nossos gloriosos homens-tanque e artilhei-
ros mais de uma vez colocaram em fuga as alardeadas tropas alemãs, com seus
numerosos tanques. (Aplausos.) Mas ainda temos várias vezes menos tanques do
que os alemães. É aí que reside o segredo dos sucessos temporários do exército
alemão. Não se pode dizer que nossa indústria de construção de tanques está
funcionando mal e abastecendo nossa frente com poucos tanques. Não, ela está
funcionando muito bem e produzindo vários tanques excelentes. Mas os alemães
estão produzindo consideravelmente mais tanques, pois agora têm à sua dispo-
sição não apenas sua própria indústria de construção de tanques, mas também
a indústria da Tchecoslováquia, Bélgica, Holanda e França. Não fosse por esta
circunstância, o Exército Vermelho teria há muito esmagado o exército alemão,
que não vai para a batalha sem tanques e não pode resistir aos golpes de nossas
tropas se não tiver superioridade nos tanques. (Aplausos.)
Só há uma maneira de anular a superioridade dos alemães em tanques e, as-
sim, melhorar radicalmente a posição de nosso exército. Desta forma, não só
aumentar várias vezes a produção de tanques em nosso país, mas também au-
mentar drasticamente a produção de aeronaves antitanque, rifles e canhões anti-
tanque, granadas e morteiros antitanque e construir mais trincheiras antitanque
e qualquer outro tipo de obstáculo antitanque.
Aqui está nossa tarefa atual.
Podemos cumprir essa tarefa e devemos cumpri-la a todo custo!
626 Obras Escolhidas

Quem são os ''nacional-socialistas''?

Em nosso país, os invasores alemães, ou seja, os hitleristas, são geralmente


chamados de fascistas. Os hitleristas, ao que parece, consideram isso errado e
obstinadamente continuam a se chamar de “nacional-socialistas”. Por isso os
alemães querem assegurar-nos que o partido hitlerista, o partido dos invasores
alemães, que saqueia a Europa e organizou o vilanesco ataque ao nosso Estado
socialista, é um partido socialista. Isso é possível? O que pode haver em co-
mum entre o socialismo e os invasores hitleristas bestiais que estão pilhando e
oprimindo as nações da Europa?
Os hitleristas podem ser considerados nacionalistas? Não, eles não podem.
Na verdade, os hitleristas agora não são nacionalistas, mas imperialistas. En-
quanto os hitleristas estiveram empenhados em reunir as terras alemãs e reunir
o distrito do Reno, a Áustria, etc., era possível, com certa base, chamá-los de na-
cionalistas. Mas depois que eles tomaram territórios estrangeiros e escravizaram
nações europeias – tchecos, eslovacos, poloneses, noruegueses, dinamarqueses,
holandeses, belgas, franceses, sérvios, gregos, ucranianos, bielorrussos, os habi-
tantes dos países bálticos, etc. – e começaram a alcançar em busca do domínio
mundial, o partido hitlerista deixou de ser um partido nacionalista, porque a par-
tir daquele momento se tornou um partido imperialista, um partido de anexação
e opressão.
O partido hitlerista é um partido de imperialistas, e dos imperialistas mais
vorazes e predadores entre todos os imperialistas do mundo.
Os hitleristas podem ser considerados socialistas? Não, eles não podem. Na
verdade, os hitleristas são os inimigos jurados do socialismo, reacionários con-
sagrados, como os Centenas Negras, que roubaram da classe trabalhadora e dos
povos da Europa as mais elementares liberdades democráticas. A fim de encobrir
sua essência reacionária, de Centenas Negras, os hitleristas denunciam os regi-
mes internos da Grã-Bretanha e da América como regimes plutocráticos. Mas
na Grã-Bretanha e nos Estados Unidos existem liberdades democráticas elemen-
tares, existem sindicatos de trabalhadores e trabalhadores, existem partidos de
trabalhadores, existem parlamentos; enquanto na Alemanha, sob o regime de
Hitler, todas essas instituições foram destruídas. Basta comparar esses dois con-
juntos de fatos para perceber a natureza reacionária do regime de Hitler e a
hipocrisia absoluta das conversas fascistas alemãs sobre um regime plutocrático
na Grã-Bretanha e na América. Na verdade, o regime de Hitler é uma cópia do
regime reacionário que existiu na Rússia sob o tsarismo. É bem sabido que os hi-
tleristas suprimem os direitos dos trabalhadores, os direitos dos intelectuais e os
direitos das nações tão prontamente quanto o regime tsarista os suprimiu, e que
eles organizam os pogroms judeus medievais tão prontamente quanto o regime
tsarista os organizou.
O partido hitlerista é um partido dos inimigos das liberdades democráticas,
um partido da reação medieval e dos pogroms das Centenas Negras.
E se esses descarados imperialistas e reacionários arrogantes ainda continuam
a se disfarçar nas togas de “nacionalistas” e “socialistas”, eles o fazem para enga-
nar o povo, enganar os simplórios e se esconder sob a bandeira do “nacionalismo”
J. V. Stalin 627

e “ socialismo” sua natureza saqueadora e imperialista.


Corvos enfeitados com penas de pavão. Mas não importa o quanto os corvos
possam se enfeitar com penas de pavão, eles não deixarão de ser corvos.
“Devemos a todo custo”, diz Hitler, “nos empenhar para alcançar a conquista
alemã do mundo. Se quisermos criar nosso grande império alemão, devemos
antes de tudo expulsar e exterminar os povos eslavos - russos, poloneses, tchecos,
eslovacos, búlgaros, ucranianos, bielorrussos. Não há razões para que isso não
seja feito.”
“O homem”, diz Hitler, “é pecador desde o nascimento e só pode ser gover-
nado com a ajuda da força. Ao lidar com ele, todos os métodos são permitidos.
Quando a política exige, é preciso mentir, trair e até matar”.
“Mate todos os que estão contra nós”, diz Göring. “Mate, mate! - Não é você
quem será responsabilizado, mas eu. Portanto, mate!”
“Eu emancipei o homem”, diz Hitler, “da quimera humilhante que se chama
consciência. A consciência, como a educação, mutila o homem. Tenho a vanta-
gem de não ser restringido por quaisquer considerações de natureza teórica ou
moral.”
Em uma das ordens do comando alemão, datada de 25 de setembro, ao 489º
regimento de infantaria, e encontrada sobre um suboficial alemão morto, afirma-
se:
“Ordeno que abram fogo contra cada russo assim que ele aparecer a 600 me-
tros de distância. O russo deve aprender que se depara com um adversário deci-
dido de quem não pode esperar misericórdia”.
Em uma das declarações do comando alemão aos soldados, encontrada sobre
o cadáver do Tenente Gustav Ziegel, natural de Frankfurt, afirma-se:
“Você não tem coração ou nervos; eles não são necessários na guerra. Elimine
todo traço de pena e simpatia de seu coração – mata cada russo, cada pessoa so-
viética. Não pare, mesmo que antes de você se levantar um velho ou uma mulher,
uma menina ou um menino, mate! Com isso, você se salvará da destruição, ga-
rantirá o futuro de sua família e ganhará a glória eterna”.
Aí você tem o programa e as instruções dos líderes do partido hitlerista e do
comando hitlerista, o programa e as instruções de homens que perderam toda a
aparência de seres humanos e caíram ao nível de feras.
E esses homens, despojados de consciência e honra, esses homens com moral
de feras, têm a insolência de pedir o extermínio da grande nação russa, a nação
de Plekhanov e Lenin, Bielínski e Chernyshevsky, Pushkin e Tolstoi, Glinka e
Chaikovsky, Gorky e Chekhov, Sechenov e Pavlov, Repin e Surikov, Suvorov e
Kutuzov!
Os invasores alemães querem uma guerra de extermínio com os povos da
URSS. Bem, se os alemães querem uma guerra de extermínio, eles a conseguirão.
(Aplausos altos e prolongados.)
De agora em diante nossa tarefa, a tarefa dos povos da URSS, a tarefa dos
lutadores, comandantes e trabalhadores políticos de nosso Exército e de nossa
Marinha será exterminar todo alemão que colocou seu pé invasor no território
de nosso Pátria. (Vivos aplausos.)
628 Obras Escolhidas

Sem piedade para os invasores alemães!


Morte aos invasores alemães! (Vivos aplausos.)

A derrota dos imperialistas alemães e seus exércitos


é inevitável

Já a própria degradação moral dos invasores alemães, que perderam toda a


aparência humana, e há muito tempo caíram ao nível das feras, esta circunstância
já é uma evidência do fato de que eles se condenaram à destruição inevitável.
Mas a destruição inevitável dos invasores hitleristas e seus exércitos não é
determinada apenas por fatores morais.
Existem três outros fatores básicos, que estão operando com mais força a cada
dia que passa, e que estão fadados a levar em um futuro próximo à derrota ine-
vitável do imperialismo bandido de Hitler. (Aplausos.)
Primeiro, há a instabilidade da retaguarda europeia da Alemanha imperia-
lista, a instabilidade da “Nova Ordem” na Europa. Os invasores alemães escravi-
zaram os povos do continente europeu - da França ao Báltico Soviético, da Noru-
ega, Dinamarca, Bélgica, Holanda e Bielorrússia Soviética aos Bálcãs e à Ucrânia
Soviética; eles os roubaram de suas liberdades democráticas elementares; eles os
privaram do direito de dispor de seus próprios destinos; tiraram seu pão, carne e
matérias-primas; eles os transformaram em seus escravos; eles crucificaram os po-
loneses, tchecos, sérvios e decidiram que, tendo alcançado o domínio na Europa,
agora podem usá-lo como base para construir o domínio mundial da Alemanha.
Isso é o que eles chamam de “Nova Ordem na Europa”. Mas o que é essa “base”,
o que é essa “Nova Ordem”? Só os presunçosos idiotas hitleristas deixam de ver
que a “Nova Ordem” na Europa e a infame “base” dessa ordem representam um
vulcão que está prestes a explodir a qualquer momento e dominar o castelo de
cartas imperialista alemão. Eles se referem a Napoleão, garantindo-nos que Hi-
tler está agindo como Napoleão e que ele se assemelha a Napoleão em tudo. Em
primeiro lugar, no entanto, não se deve esquecer o destino de Napoleão. E, em
segundo lugar, Hitler se parece com Napoleão da mesma forma que um gatinho
se parece com um leão. (Risos, aplausos) Pois Napoleão lutou contra as forças da
reação e confiou nas forças progressistas, enquanto Hitler, ao contrário, confia
nas forças da reação e está lutando contra as forças progressistas. Apenas os idi-
otas hitleristas em Berlim não conseguem perceber que os povos escravizados da
Europa lutarão e se revoltarão contra a tirania de Hitler. Quem pode duvidar
que a URSS, a Grã-Bretanha e os EUA darão total apoio aos povos da Europa em
sua luta pela libertação contra a tirania de Hitler? (Aplausos.)
Em segundo lugar, há a instabilidade da retaguarda alemã dos invasores hitle-
ristas. Enquanto os hitleristas estivessem engajados na montagem da Alemanha,
que havia sido dividida pelo Tratado de Versalhes, eles poderiam contar com o
apoio do povo alemão, que foi inspirado pelo ideal da restauração da Alemanha.
Mas depois que esse objetivo foi alcançado e os hitleristas entraram no caminho
do imperialismo, da tomada de terras estrangeiras e da subjugação de nações
estrangeiras, convertendo os povos da Europa e os povos da URSS em inimigos
J. V. Stalin 629

jurados da atual Alemanha. Uma profunda mudança de sentimento ocorreu no


povo alemão – contra a continuação da guerra, a favor do fim da guerra. Mais
de dois anos de guerra sanguinária, cujo fim ainda não está à vista; os milhões
de vidas humanas sacrificadas; inanição; empobrecimento; epidemias; uma at-
mosfera de hostilidade aos alemães ao seu redor; A política estúpida de Hitler,
que transformou os povos da URSS em inimigos jurados da atual Alemanha –
tudo isso não poderia deixar de colocar o povo alemão contra a guerra desne-
cessária e ruinosa. Apenas os tolos hitleristas não conseguem entender que não
apenas a retaguarda europeia, mas também a retaguarda alemã das tropas ale-
mãs representa um vulcão que está pronto para entrar em erupção e subjugar os
aventureiros hitleristas.
Existe, finalmente, a coalizão da URSS, Grã-Bretanha e Estados Unidos da
América contra os imperialistas fascistas alemães. É um fato que a Grã-Bretanha,
os Estados Unidos da América e a União Soviética se uniram em um único campo,
que se propôs a esmagar os imperialistas hitleristas e seus exércitos predatórios.
A guerra atual é uma guerra de motores. A guerra será vencida pelo lado que
tem uma preponderância avassaladora na produção de motores. Se somarmos a
produção de motores nos EUA, Grã-Bretanha e na URSS, obtemos uma superi-
oridade de pelo menos três vezes em comparação com a Alemanha. Esse é um
dos motivos para a inevitável condenação do imperialismo ladrão de Hitler.
A recente conferência de três potências em Moscou, com a presença de Lord
Beaverbrook como representante da Grã-Bretanha e do Sr. Harriman como re-
presentante dos Estados Unidos, decidiu sistematicamente ajudar nosso país com
tanques e aeronaves. Como é sabido, já começamos a receber tanques e aviões
com base nessa decisão. Mesmo antes disso, a Inglaterra providenciou o forne-
cimento ao nosso país de materiais escassos como alumínio, chumbo, estanho,
níquel e borracha. Se a isso acrescentarmos o fato de que há poucos dias os Es-
tados Unidos da América decidiram conceder à União Soviética um empréstimo
de 1.000.000.000 de dólares, podemos dizer com certeza que a coalizão dos Esta-
dos Unidos da América, Grã-Bretanha e URSS é uma realidade (Fortes aplausos),
que está crescendo e continuará crescendo em benefício de nossa causa comum
de libertação.
Esses são os fatores que determinam o destino inevitável do imperialismo
alemão-fascista.

Nossas tarefas

Lenin distinguiu entre dois tipos de guerras – guerras predatórias e, portanto,


guerras injustas, e guerras de libertação – guerras justas.
Os alemães agora estão travando uma guerra predatória, uma guerra injusta,
com o propósito de tomar território estrangeiro e subjugar povos estrangeiros.
É por isso que todas as pessoas honestas devem se levantar contra os invasores
alemães como seus inimigos.
Em contraste com a Alemanha hitlerista, a União Soviética e seus aliados estão
travando uma guerra de libertação, uma guerra justa, com o objetivo de libertar
os povos escravizados da Europa e os povos da tirania de Hitler. É por isso que
630 Obras Escolhidas

todas as pessoas honestas devem apoiar os exércitos da URSS, da Grã-Bretanha


e dos outros aliados, como exércitos de libertação.
Não temos, e não podemos ter, objetivos de guerra como a tomada de terri-
tórios estrangeiros e a subjugação de povos estrangeiros – sejam os povos e ter-
ritórios da Europa ou os povos e territórios da Ásia, até o Irã. Nosso primeiro
objetivo é libertar nossos territórios e nossos povos do jugo fascista alemão.
Não temos e não podemos ter objetivos de guerra como o de impor nossa
vontade e nosso regime aos eslavos ou outras nações escravizadas da Europa, que
esperam nossa ajuda. Nosso objetivo é ajudar essas nações em sua luta pela li-
bertação contra a tirania de Hitler e, em seguida, deixar que elas organizem
livremente suas vidas em suas terras como acharem adequado. Nenhuma inter-
ferência nos assuntos internos de outras nações!
Mas, para que esses objetivos sejam alcançados, devemos esmagar o poderio
militar dos invasores alemães, devemos destruir, até o último homem, as forças
de ocupação alemãs que invadiram nosso país com o objetivo de escravizá-lo.
(Aplausos altos e prolongados.)
Mas para isso é necessário que nosso Exército e Marinha recebam apoio ativo
e efetivo de todo o nosso país, que todos os nossos operários e empregados de
escritório, homens e mulheres, trabalhem incansavelmente nas fábricas e forne-
çam à frente quantidades cada vez maiores de tanques, rifles e armas antitanque,
aeronaves, artilharia, morteiros de trincheira, metralhadoras, rifles e munições;
que nossos camponeses, homens e mulheres, trabalhem incansavelmente em seus
campos e forneçam à frente e ao país quantidades cada vez maiores de pão, carne,
matéria-prima para a indústria; que todo o nosso país e todos os povos da URSS
se organizem em um único campo de luta, travando, junto com nosso Exército e
Marinha, a grande guerra de libertação pela honra e liberdade de nossa Pátria,
pela derrota dos exércitos alemães. (Vivos aplausos.)
Esta agora é nossa tarefa.
Podemos e devemos cumprir essa tarefa.
Somente quando tivermos cumprido essa tarefa e derrotado os invasores ale-
mães, poderemos alcançar uma paz duradoura e justa.
Pela derrota completa dos invasores alemães! (Vivos aplausos.) Pela libertação
de todos os povos oprimidos que gemem sob o jugo da tirania de Hitler! (Vivos
aplausos.)
Viva a amizade inabalável dos povos da União Soviética! (Vivos aplausos.)
Viva nosso Exército Vermelho e nossa Marinha Vermelha! (Vivos aplausos.)
Viva nossa gloriosa Pátria! (Vivos aplausos.)
Nossa causa é justa – a vitória será nossa! (Vivos aplausos. Todos se levantam.
Gritam: “Viva o grande Stalin!” Aplausos prolongados. A Internacional é cantada.)
J. V. Stalin 631

A dissolução da Internacional
Comunista - resposta ao
correspondente da Reuters
28 de maio de 1943

O correspondente em Moscou da agência inglesa Reuters, Sr. King, dirigiu-


se ao Presidente do Soviete de Comissários do Povo da URSS, Camarada J. V.
Stalin, com uma carta, na qual solicitava resposta a uma pergunta que interessava
à opinião pública inglesa. O Camarada Stalin respondeu ao Sr. King com a
seguinte carta:
Sr. King!
Recebi o seu pedido para responder à pergunta que trata da dissolução da
Internacional Comunista. Envio a minha resposta;
“Os comentários britânicos foram amplamente favoráveis à decisão de acabar com a
Komintern. Qual é o ponto de vista da União Soviética em relação a essa questão e a sua
influência nas futuras relações internacionais?”
RESPOSTA: A dissolução da Internacional comunista mostra-se correta e
oportuna e contribui para a luta comum de todas as nações amantes da liber-
dade contra o mesmo inimigo, o hitlerismo.
A dissolução da Internacional Comunista é correta porque:
Ela desmascara a mentira dos hitleristas de que “Moscou” pretende se intro-
meter na vida de outros Estados e “bolchevizá-los” A partir de agora, coloca-se
um ponto final nessa mentira.
Ela desmascara a calúnia dos anticomunistas, que afirmam que os partidos
comunistas de diferentes países agem de acordo com ordens externas e não em
prol dos interesses de seu povo. Pois a partir deste momento, põe-se um ponto
final também nessa mentira.
Ela facilita o trabalho dos patriotas dos países amantes da paz, no sentido
de unificar as forças progressistas de suas pátrias, independentemente de suas
convicções políticas e religiosas, em um único campo nacional pela libertação,
ampliando, assim, a luta contra o fascismo.
Ela contribui para o trabalho dos patriotas de todos os países, no sentido de
unificar todos os povos amantes da liberdade em um campo internacional de
luta contra a ameaça de dominação mundial do hitlerismo, abrindo, assim, o
caminho para o estabelecimento de uma futura amizade entre os povos baseada
na igualdade de direitos.
Penso que todas essas circunstâncias levarão ao fortalecimento de uma única
frente de aliados e outras nações partícipes de sua luta, pela vitória sobre a tirania
hitlerista.
Considero que a dissolução da Internacional Comunista é totalmente opor-
tuna, pois, justamente agora, quando as feras fascistas envidam seus últimos es-
632 Obras Escolhidas

forços, torna-se indispensável organizar uma ação conjunta de todos os países


amantes da liberdade para destruí-las e livrar os povos da opressão hitlerista.
Respeitosamente,
J. Stalin
28 de maio de 1943
J. V. Stalin 633

Discurso na reunião de celebração


do Soviete de Deputados do Povo
Trabalhador e do Partido e
Organizações Públicas de Moscou
06 de novembro de 1943

Camaradas: Hoje o povo da União Soviética celebra o 26º aniversário da


grande Revolução Socialista de Outubro.
Pela terceira vez, nosso país comemora o aniversário da revolução de seu povo
nas condições da Guerra Patriótica.
Em outubro de 1941, nossa Pátria viveu dias difíceis. O inimigo estava se
aproximando da capital e ele cercou Leningrado da terra. Nossas tropas foram
obrigadas a recuar. Exigiu enormes esforços por parte do exército e o empenho
de todas as forças do povo para conter o inimigo e desferir-lhe um sério golpe
diante de Moscou.
Em outubro de 1942, o perigo para a nossa pátria tornou-se ainda maior. O
inimigo estava então a apenas 120 km de Moscou, havia invadido Stalingrado e
entrado na beirada do Cáucaso. Mas mesmo naqueles dias graves, o exército e
o povo não desanimaram, mas suportaram firmemente todas as provações. Eles
encontraram em si mesmos a força para controlar o inimigo e desferir um golpe
em resposta. Fiel às ordens do grande Lenin, eles defenderam as conquistas da
Revolução de Outubro sem poupar suas forças ou suas vidas. Como é bem sabido,
esses esforços do exército e do povo não foram em vão.
Logo após os dias de outubro do ano passado, nossas tropas passaram à ofen-
siva e infligiram novos e poderosos golpes nos alemães, primeiro em Stalingrado,
no Cáucaso e na área do curso médio do Don, e então, no início de 1943, em Ve-
likie Luki, antes de Leningrado e na área de Rzhev e Vyazma. Desde então, o
Exército Vermelho nunca mais deixou a iniciativa fora de suas mãos. Ao longo
do verão deste ano, seus golpes se tornaram cada vez mais fortes, seu domínio
militar crescia a cada mês. Desde então, nossas tropas conquistaram grandes vi-
tórias, e os alemães sofreram uma derrota após a outra. Por mais que o inimigo
tentasse, ele ainda não conseguiu obter nenhum sucesso da menor importância
na frente soviético-alemã.

I. Um ano marcando uma virada radical no curso


da guerra

O ano passado, do 25º ao 26º ano da Revolução de Outubro, marcou uma


virada na Guerra Patriótica.
Foi um ponto de inflexão acima de tudo porque neste ano o Exército Verme-
634 Obras Escolhidas

lho pela primeira vez na guerra conseguiu realizar uma grande ofensiva de verão
contra as tropas alemãs, e sob os golpes de nossas forças as tropas fascistas ale-
mãs foram forçadas apressadamente desistir do território por eles apreendido,
salvando-se não raro do cerco pela fuga e abandonando no campo de batalha
enormes quantidades de material de guerra, estoques de armamentos e muni-
ções e grande número de oficiais e soldados feridos.
Assim, os sucessos da nossa campanha de verão no segundo semestre deste
ano continuaram e coroaram os sucessos alcançados na nossa campanha de in-
verno no início deste ano.
Agora, quando o Exército Vermelho, desenvolvendo os sucessos da campanha
de inverno, infligiu um golpe poderoso nas tropas alemãs no verão, é possível
considerar como finalmente morto e enterrado o conto de fadas de que o Exér-
cito Vermelho é incapaz de conduzir um ofensiva bem-sucedida no verão. O ano
passado mostrou que o Exército Vermelho pode avançar tanto no verão quanto
no inverno.
No decorrer do ano passado, como resultado dessas operações ofensivas, nos-
sas tropas conseguiram abrir caminho a partir de 500 km na parte central da
frente e até 1.300 km no sul (Aplausos), liberando quase 1.000.000 km² de terri-
tório, ou seja, quase dois terços do solo soviético temporariamente tomado pelo
inimigo, enquanto as tropas inimigas eram rechaçadas de Vladikavkaz a Kher-
son, de Elista a Krivoi Rog, de Stalingrado a Kiev, de Voronezh a Gomel, de
Vyazma e Rzhev aos acessos de Orsha e Vitebsk.
Sem acreditar na estabilidade de seus sucessos anteriores na frente soviético-
alemã, os alemães já, por um longo período, construíram poderosas zonas de
defesa, especialmente ao longo dos grandes rios. Mas nas batalhas deste ano, nem
rios nem fortificações poderosas salvaram os alemães. Nossas tropas destruíram
as defesas alemãs e, em apenas três meses do verão de 1943, forçaram habilmente
quatro barreiras de água importantes – Donets do Norte, Desna, Sozh e Dnieper.
Nem mesmo menciono barreiras como as defesas alemãs na área do rio Mius, a
oeste de Rostov, e as defesas na área do rio Molochnaya, perto de Melitopol. No
momento, o Exército Vermelho está vencendo com sucesso o inimigo do outro
lado do Dnieper.
Este ano marcou um ponto de inflexão também porque o Exército Vermelho
foi capaz, em um tempo comparativamente curto, de esmagar os mais experien-
tes quadros veteranos das tropas fascistas alemãs e, ao mesmo tempo, fortalecer
e multiplicar seus próprios quadros em batalhas ofensivas bem-sucedidas no de-
correr do ano. Nas batalhas na frente soviético-alemã durante o ano passado, o
exército fascista alemão perdeu mais de 4.000.000 oficiais e soldados, incluindo
não menos de 1.800.000 mortos. Além disso, durante este ano os alemães per-
deram mais de 14.000 aviões, mais de 25.000 tanques e não menos de 40.000
armas.
O exército fascista alemão hoje não é o que era no início da guerra. Enquanto
na eclosão da guerra ele tinha um número suficiente de quadros experientes,
agora foi diluído com oficiais recém formados, jovens e inexperientes que os
alemães estão atirando às pressas para a frente, já que eles não têm nem a reserva
necessária de oficiais, nem a hora de treiná-los.
J. V. Stalin 635

Completamente diferente é o quadro apresentado hoje pelo Exército Ver-


melho. Seus quadros cresceram e se fortaleceram em batalhas ofensivas bem-
sucedidas durante o ano passado. O número dos seus quadros de combate está a
crescer e continuará a aumentar, pois a existência da necessária reserva de oficiais
dá-lhe tempo e oportunidade para formar jovens quadros de oficiais e promovê-
los a cargos de responsabilidade.
É característico que em vez das 240 divisões que enfrentaram nossa frente no
ano passado, das quais 179 divisões eram alemãs, este ano a frente do Exército
Vermelho seja enfrentada por 257 divisões, das quais 207 divisões são alemãs.
Os alemães, evidentemente, esperam compensar a baixa qualidade de suas di-
visões aumentando seu número. No entanto, a derrota dos alemães durante o
ano passado mostra que é impossível compensar a deterioração na qualidade das
divisões aumentando seu número.
Do ponto de vista puramente militar, a derrota das tropas alemãs em nossa
frente no final deste ano foi predeterminada por dois grandes eventos: a batalha
de Stalingrado e a batalha de Kursk.
A batalha de Stalingrado terminou com o cerco de um exército alemão de
300.000 homens, sua derrota e a captura de cerca de um terço das tropas cer-
cadas. Para se ter uma ideia da escala do massacre, sem paralelo na história,
que ocorreu nos campos de batalha de Stalingrado, é preciso perceber que, após
o fim da batalha de Stalingrado, 147.200 corpos de oficiais alemães e homens
mortos e 46.700 corpos de soviéticos mortos oficiais e homens foram encontra-
dos e enterrados. Stalingrado significou o declínio do exército fascista alemão.
Após o massacre de Stalingrado, como se sabe, os alemães não conseguiram se
recuperar.
Quanto à batalha de Kursk, terminou com a derrota dos dois grupos princi-
pais das tropas fascistas alemãs de ataque e com a passagem de nossas tropas para
uma contraofensiva, que posteriormente se transformou na poderosa ofensiva de
verão do Exército Vermelho. A batalha de Kursk começou com a ofensiva alemã
contra Kursk do norte e do sul. Esta foi a última tentativa dos alemães de reali-
zar uma grande ofensiva de verão e, em caso de sucesso, recuperar suas perdas.
Como é bem sabido, a ofensiva terminou em fracasso, o Exército Vermelho não
só repeliu a ofensiva alemã, mas ele próprio passou à ofensiva e, por uma série de
golpes consecutivos, no decorrer do período de verão lançou as tropas fascistas
alemãs de volta além do Dnieper.
Enquanto a batalha de Stalingrado anunciava o declínio do exército fascista
alemão, a batalha de Kursk o confrontava com um desastre. Finalmente, este ano
marcou uma virada porque a bem-sucedida ofensiva do Exército Vermelho agra-
vou radicalmente a situação política econômica e militar da Alemanha fascista e
a confrontou com uma crise profunda.
Os alemães contavam com a realização, no verão deste ano, de uma ofensiva
exitosa no front soviético-alemão, para resgatar suas perdas e aumentar seu aba-
lado prestígio na Europa. Mas o Exército Vermelho perturbou os cálculos dos
alemães, repeliu sua ofensiva, lançou ele próprio uma ofensiva e passou a em-
purrar os alemães para o oeste, quebrando assim o prestígio das armas alemãs.
Os alemães contaram com o prolongamento da guerra, começaram a cons-
636 Obras Escolhidas

truir linhas de defesa e “muros” e proclamaram para que todos ouvissem que suas
novas posições eram inexpugnáveis. Mas aqui novamente o Exército Vermelho
perturbou os cálculos dos alemães, rompeu suas linhas de defesa e “paredes” e
continuou avançando com sucesso, não lhes dando tempo para arrastar a guerra.
Os alemães contavam com a retificação da situação na frente por meio de uma
mobilização “total”. Mas aqui, também, os eventos perturbaram os cálculos dos
alemães. A campanha de verão já consumiu dois terços dos mobilizados “total-
mente”. No entanto, não parece que esta circunstância tenha trazido qualquer
melhoria na posição do exército fascista alemão. Pode ser necessário proclamar
mais uma mobilização “total”, e não há razão para que a repetição de tal medida
não resulte no colapso “total” de um determinado Estado. (Vivos aplausos.)
Os alemães contavam com a manutenção de um domínio firme sobre a Ucrâ-
nia, a fim de se beneficiarem da produção agrícola ucraniana para seu exército
e população, e do carvão de Donbass para as fábricas e ferrovias que serviam
ao exército alemão. Mas aqui também eles calcularam mal. Como resultado da
bem-sucedida ofensiva do Exército Vermelho, os alemães perderam não apenas
o carvão de Donbass, mas também as regiões produtoras de cereais mais ricas
da Ucrânia, e não há razão para supor que eles não perderão também o resto
da Ucrânia futuro muito próximo. (Vivos aplausos.) Naturalmente, todos esses
erros de cálculo não podiam deixar de piorar, e de fato pioraram radicalmente,
a posição econômica e político-militar da Alemanha fascista.
A Alemanha fascista está passando por uma crise profunda. Ela está enfren-
tando um desastre.

II. Assistência ao front em toda a nação

Os sucessos do Exército Vermelho teriam sido impossíveis sem o apoio do


povo, sem o trabalho abnegado do povo soviético nas fábricas e oficinas, carvo-
arias e minas, transporte e agricultura. Nas duras condições da guerra, o povo
soviético provou ser capaz de garantir ao seu Exército tudo o que fosse neces-
sário e aperfeiçoou incessantemente seu equipamento de combate. Nunca, du-
rante todo o curso da guerra, o inimigo conseguiu superar nosso Exército em
qualidade de armamentos. Ao mesmo tempo, nossa indústria forneceu à frente
quantidades cada vez maiores de equipamentos de guerra.
O ano passado marcou uma virada não apenas na tendência das operações
militares, mas também no trabalho de nossa frente interna. Não éramos mais
confrontados com tarefas como a evacuação de empresas para o leste e a mudança
da indústria para a produção de armamentos. O Estado soviético agora tem uma
economia de guerra eficiente e em rápida expansão. Assim, todos os esforços do
povo poderiam ser concentrados no aumento da produção e no aperfeiçoamento
dos armamentos, particularmente tanques, aviões, canhões e artilharia autopro-
pelida. Aqui alcançamos grandes sucessos. O Exército Vermelho, apoiado por
todo o povo, recebeu suprimentos ininterruptos de equipamento de combate, fez
chover milhões de bombas, minas e granadas sobre o inimigo e trouxe milhares
de tanques e aviões para a batalha. Temos todos os motivos para dizer que o tra-
balho abnegado do povo soviético na retaguarda entrará para a história, lado a
J. V. Stalin 637

lado com a luta heroica do Exército Vermelho e o feito sem paralelo do povo em
defesa de sua pátria. (Longos aplausos.)
Os trabalhadores da União Soviética, que nos anos de construção pacífica
construíram nossa poderosa indústria socialista altamente desenvolvida, durante
a Guerra Patriótica trabalharam com intenso zelo e energia para ajudar a frente,
exibindo verdadeiro heroísmo trabalhador.
Todos sabem que na guerra contra a URSS os hitleristas tiveram à sua disposi-
ção não apenas a indústria altamente desenvolvida da Alemanha, mas também as
indústrias bastante poderosas dos países vassalos e ocupados. No entanto, os hi-
tleristas não conseguiram manter a superioridade quantitativa em equipamento
militar que possuíam no início da guerra contra a União Soviética. Se a antiga
superioridade do inimigo em relação ao número de tanques, aviões, morteiros
e rifles automáticos já foi liquidada, se nosso exército hoje não passa por gra-
ves faltas de armas, munições e equipamentos, o crédito por isso é devido, no
primeiro lugar, à nossa classe trabalhadora. (Salva de palmas.)
Os camponeses da União Soviética, que nos anos de construção pacífica com
base no sistema de fazendas coletivas transformaram uma agricultura atrasada
em uma agricultura avançada, demonstraram durante a Guerra Patriótica um
alto grau de consciência do interesse nacional comum sem paralelo no história
do campo. Com trabalho abnegado para ajudar a frente, eles mostraram que
o campesinato soviético considera a guerra atual contra os alemães como sua
própria causa, uma guerra por sua própria vida e liberdade.
É bem sabido que, como resultado da invasão das hordas fascistas, nosso país
foi temporariamente privado dos importantes distritos agrícolas da Ucrânia, o
Don e o Kuban. Mesmo assim, nossas fazendas coletivas e estatais abasteciam o
exército e o país com alimentos sem nenhuma interrupção séria. É claro que, sem
o sistema de fazendas coletivas, sem o trabalho abnegado dos homens e mulheres
nas fazendas coletivas, não poderíamos ter superado essa tarefa tão difícil. Se no
terceiro ano de guerra o nosso exército não passa por falta de alimentos, e se a
população se abastece de alimentos e da indústria com matérias-primas, isso é
uma prova da força e vitalidade do sistema de fazendas coletivas, do patriotismo
de o campesinato da fazenda coletiva. (Aplausos prolongados.)
Uma grande parte da ajuda à frente tem sido desempenhada pelo nosso trans-
porte, principalmente por transporte ferroviário, e também por transporte flu-
vial, marítimo e automóvel. Como é sabido, o transporte é o meio vital de co-
nectar a parte traseira e a dianteira. Pode-se produzir grandes quantidades de
armas e munições, mas se o transporte não os entregar no front a tempo, eles
podem permanecer como carga inútil no que diz respeito ao front. Deve-se dizer
que o transporte desempenha um papel decisivo na entrega oportuna de armas
e munições, alimentos, roupas e assim por diante. Se apesar das dificuldades dos
tempos de guerra e da escassez de combustível, temos podido abastecer a frente
com tudo o que é necessário, o crédito vai primeiro para os nossos trabalhadores
dos transportes e logística. (Aplausos prolongados.)
Nem nossa intelectualidade fica atrás da classe trabalhadora e do campesinato
em sua ajuda à frente. A intelligentsia soviética está trabalhando com devoção pela
defesa de nosso país, melhorando continuamente os armamentos do Exército
638 Obras Escolhidas

Vermelho e a tecnologia e organização da produção. Ajuda os trabalhadores


e os agricultores coletivos a melhorar a indústria e a agricultura, faz avançar a
ciência e a cultura soviética nas condições de guerra.
Isso é uma honra para nossa intelectualidade. (Aplausos.)
Todos os povos da União Soviética se levantaram como um só em defesa de sua
Pátria, considerando acertadamente a presente Guerra Patriótica como a causa
comum de todos os trabalhadores, independentemente de sua nacionalidade ou
religião. A esta altura, os próprios políticos hitleristas veem como eram irreme-
diavelmente estúpidos seus cálculos sobre a discórdia e o conflito entre os povos
da União Soviética. A amizade dos povos de nosso país resistiu a todas as adver-
sidades e provações da guerra e se temperou ainda mais na luta comum de todo
o povo soviético contra os invasores fascistas.
Aqui está a fonte da força da União Soviética. (Salva de palmas.)
Como nos anos de construção pacífica, também nos dias de guerra, a força
dirigente e orientadora do povo soviético tem sido o Partido de Lenin, o Par-
tido dos Bolcheviques. Nenhum outro partido jamais gozou, ou goza, de tanto
prestígio entre as massas do povo como o nosso Partido Bolchevique. E isso é
natural. Sob a liderança do Partido Bolchevique, os trabalhadores, camponeses
e intelectuais de nosso país conquistaram sua liberdade e construíram uma soci-
edade socialista. Na Guerra Patriótica, o Partido se colocou diante de nós como
o inspirador e organizador da luta nacional contra os invasores fascistas. O tra-
balho organizativo do Partido uniu e dirigiu todos os esforços do povo soviético
para o objetivo comum, subordinando todas as nossas forças e meios à causa da
derrota do inimigo. Durante a guerra, o Partido aumentou sua relação com o
povo, estabeleceu laços ainda mais estreitos com as amplas massas trabalhadoras.
Aqui está a fonte da força do nosso Estado. (Aplausos altos e prolongados.)
A guerra atual confirmou com força a conhecida declaração de Lenin de que
a guerra é um teste completo das forças materiais e espirituais de uma nação. A
história da guerra ensina que só os Estados resistiram a esta prova que se revelou
mais forte do que os seus adversários no que diz respeito ao desenvolvimento
e organização da sua economia, no que diz respeito à experiência, habilidade
e espírito de luta das suas tropas, no que diz respeito à fortaleza e unidade do
povo. ao longo de todo o curso da guerra. Temos exatamente esse Estado.
O Estado soviético nunca foi tão estável e inabalável como agora, no terceiro
ano da Guerra Patriótica. As lições da guerra mostram que o sistema soviético não
é apenas a melhor forma de organizar o desenvolvimento econômico e cultural do
país nos anos de construção pacífica, mas também a melhor forma de mobilizar
todas as forças do povo para a resistência ao inimigo em tempo de guerra. O
poder soviético, estabelecido há 26 anos, transformou nosso país em um curto
período histórico em uma fortaleza inexpugnável. O Exército Vermelho tem a
retaguarda mais estável e confiável de todos os exércitos do mundo.
Aqui está a fonte da força da União Soviética. (Aplausos.)
Não há dúvida de que o Estado Soviético sairá da guerra ainda mais forte e
consolidado. Os invasores alemães estão arruinando e devastando nossas terras
em uma tentativa de minar o poder de nosso Estado. Em uma extensão ainda
maior do que antes, a ofensiva do Exército Vermelho expôs o caráter bárbaro e
J. V. Stalin 639

saqueador do exército hitlerista. Nos distritos apreendidos por eles, os alemães


exterminaram centenas de milhares de nossos pacíficos civis. Como os bárbaros
medievais das hordas de Átila, os demônios alemães pisoteiam nossos campos,
queimam nossas cidades e vilas, destroem nossas empresas industriais e insti-
tuições culturais. Os crimes dos alemães são a prova da fraqueza dos invasores
fascistas, pois apenas usurpadores como eles próprios, que não acreditam em sua
vitória, atuariam dessa forma. E quanto mais desesperançada se torna a posição
dos hitleristas, mais cruelmente eles se enfurecem em suas atrocidades e saques.
Nosso povo não perdoará os demônios alemães por esses crimes. Faremos os
criminosos alemães responder por todos os seus delitos. (Aplausos.)
Nas áreas onde os golpes fascistas temporariamente dominaram, teremos que
restaurar cidades e vilas demolidas, indústrias, transporte, instituições agrícolas
e culturais, e criar condições de vida normais para o povo soviético libertado da
escravidão fascista. O trabalho já está a todo vapor para a restauração da econo-
mia e da cultura em áreas libertadas do inimigo. Mas este é apenas o começo.
Devemos eliminar completamente as consequências do domínio dos alemães nas
áreas libertadas da ocupação alemã. Esta é uma grande tarefa nacional. Podemos
e devemos enfrentar esta difícil tarefa em pouco tempo.

III. Consolidação da coalizão anti-hitlerista e


desintegração do bloco fascista

O ano passado marcou uma virada não só na Guerra Patriótica da União


Soviética, mas também em toda a guerra mundial.
As mudanças ocorridas durante este ano na situação militar e internacional
foram vantajosas para a URSS e os países aliados, amigos dele, e prejudiciais para
a Alemanha e seus cúmplices na pilhagem da Europa.
As vitórias do Exército Vermelho tiveram resultados e consequências muito
além dos limites da frente soviético-alemã. Eles mudaram todo o curso posterior
da guerra mundial e adquiriram grande importância internacional. Aproxima-se
a vitória dos países Aliados sobre o inimigo comum, enquanto as relações entre
os Aliados e a parceria de luta de seus exércitos, longe de enfraquecerem, ao
contrário das expectativas do inimigo, se fortalecem e se consolidam. As deci-
sões históricas da Conferência de Moscou de representantes da União Soviética,
Grã-Bretanha e dos Estados Unidos da América, publicadas recentemente na im-
prensa, são um testemunho eloquente disso. Agora, os países unidos estão cheios
de determinação para desferir golpes conjuntos contra o inimigo que resultarão
na vitória final sobre ele.
Este ano, os golpes do Exército Vermelho contra as tropas fascistas alemãs fo-
ram apoiados pelas operações militares dos nossos Aliados no Norte da África, na
Bacia do Mediterrâneo e no Sul da Itália. Ao mesmo tempo, os Aliados subme-
teram e ainda estão submetendo importantes centros industriais da Alemanha a
pesados bombardeios aéreos, enfraquecendo consideravelmente o poder militar
do inimigo. Se acrescentarmos a tudo isto o fato de os Aliados nos fornecerem
regularmente vários armamentos e matérias primas, pode-se dizer sem exagero
que, com tudo isto, facilitaram consideravelmente o sucesso da nossa campanha
640 Obras Escolhidas

de verão. É claro que as operações atuais dos exércitos aliados no sul da Europa
ainda não podem ser consideradas uma segunda frente. Mas ainda é algo na na-
tureza de uma segunda frente. Obviamente, a abertura de uma segunda frente
real na Europa, que não está longe, apressaria consideravelmente a vitória sobre
a Alemanha hitlerista e consolidaria ainda mais a camaradagem de armas dos
países aliados.
Assim, os acontecimentos do ano passado mostram que a coalizão anti-hitlerista
é uma união firme dos povos e assenta em bases sólidas. A essa altura, é óbvio
para todos que, ao desencadear a guerra atual, a camarilha hitlerista levou a Ale-
manha e seus satélites a um impasse sem esperança. As derrotas das tropas fascis-
tas na frente soviético-alemã e os golpes de nossos Aliados nas tropas ítalo-alemãs
abalaram todo o edifício do bloco fascista, que agora está desmoronando diante
de nossos olhos. A Itália abandonou irrevogavelmente a coalizão hitlerista. Mus-
solini nada pode mudar, pois na verdade ele é um prisioneiro dos alemães. Em
seguida, vem a vez dos demais participantes da coalizão. Finlândia, Hungria,
Romênia e outros vassalos de Hitler, desencorajados pelas derrotas militares da
Alemanha, agora finalmente perderam a fé de que o resultado da guerra será
favorável a eles e estão ansiosos para encontrar uma saída do atoleiro em que
Hitler arrastou-os. Agora que chegou a hora de responder por seu saque, os
cúmplices de Hitler e da Alemanha no saque, mas recentemente tão obedientes
ao seu mestre, estão agora em busca de um momento favorável para se afastar
despercebido do bando de ladrões. (Risos.)
Ao entrarem na guerra, os sócios do bloco hitlerista contavam com uma vitória
rápida. Já haviam decidido quem receberia o quê – quem ficaria com os pudins
e as tortas, quem ficaria com os hematomas e os olhos roxos. É claro que eles
pretendiam os hematomas e os olhos roxos para seus adversários e os pudins e
tortas para eles próprios. Mas agora está claro que a Alemanha e seus lacaios não
receberão pudins e tortas, mas terão que compartilhar os hematomas e os olhos
roxos. (Risos e aplausos.)
Prevendo essa perspectiva nada atraente, os cúmplices de Hitler agora estão
quebrando a cabeça para encontrar uma saída da guerra com o mínimo de he-
matomas e olhos roxos possíveis. (Risos.)
O exemplo da Itália mostra aos vassalos de Hitler que quanto mais eles adiam
sua ruptura inevitável com os alemães e permitem que eles sejam o senhor em
seus Estados, quanto maior a devastação reservada para seus países, maiores os
sofrimentos que seus povos terão de suportar. O exemplo da Itália também mos-
tra que a Alemanha hitlerista não tem a menor intenção de defender seus países
vassalos, mas pretende convertê-los em um cenário de guerra devastadora, se
apenas ela puder adiar a hora de sua própria derrota.
A causa do fascismo alemão está perdida, e a sanguinária “Nova Ordem” que
ele estabeleceu está se aproximando do colapso. Nos países ocupados da Europa,
uma explosão de ira do povo contra os escravos fascistas está se desenvolvendo. O
antigo prestígio da Alemanha nos países de seus aliados e nos países neutros está
perdido além da recuperação; e seus laços econômicos e políticos com Estados
neutros foram minados.
Já se foi o tempo em que a camarilha hitlerista fez um grande barulho sobre
J. V. Stalin 641

os alemães conquistando o domínio mundial. Agora, como se sabe, os alemães


têm outros assuntos além da dominação mundial com que se preocupar. Eles
têm que pensar em manter corpo e alma juntos. (Risos e aplausos.)
Assim, o curso da guerra mostrou que a aliança dos Estados fascistas não se
apoiava e não se apoia em uma base confiável. A coalizão hitlerista foi formada
com base nas ambições predatórias e vorazes de seus membros. Enquanto os
hitleristas estavam obtendo sucessos militares, a coalizão fascista parecia ser uma
associação estável. Mas as primeiras derrotas das tropas fascistas resultaram na
própria desintegração do bloco de bandidos.
A Alemanha hitlerista e seus vassalos estão à beira da catástrofe. A vitória
dos países aliados sobre a Alemanha hitlerista colocará em pauta as importantes
questões de organização e reconstrução do Estado, da vida econômica e cultural
dos povos europeus. A política do nosso governo sobre essas questões permanece
constante. Junto com nossos Aliados, devemos:
(1) Libertar os povos da Europa dos invasores fascistas e ajudar a recons-
truir seus Estados nacionais, desmembrados pelos escravos fascistas – os povos
da França, Bélgica, Iugoslávia, Tchecoslováquia, Polônia, Grécia e outros Esta-
dos agora sob o jugo alemão, devem mais uma vez torne-se livre e independente;
(2) conceder aos povos libertados da Europa o pleno direito e a liberdade de
determinar sua própria forma de governo;
(3) adotar medidas para assegurar que todos os criminosos fascistas respon-
sáveis pela presente guerra e pelo sofrimento do povo suportem severa punição
e retribuição por todos os crimes perpetrados por eles, não importa em que país
eles possam se esconder;
(4) estabelecer uma ordem na Europa que exclua completamente a possibili-
dade de novas agressões por parte da Alemanha;
(5) estabelecer uma colaboração econômica, política e cultural duradoura en-
tre os povos da Europa, baseada na confiança mútua e na assistência mútua, com
o objetivo de restaurar a vida econômica e cultural destruída pelos alemães.

∗ ∗ ∗

O Exército Vermelho e o povo soviético durante o ano passado obtiveram


grande sucesso na luta contra os invasores alemães. Alcançamos um ponto de
inflexão radical na guerra em favor de nosso país, e a guerra agora está avan-
çando para seu clímax. Mas não é hábito do povo soviético ficar satisfeito com
suas realizações, exultar com seus sucessos. A vitória pode nos escapar se a com-
placência aparecer em nossas fileiras. A vitória não pode ser conquistada sem
luta e esforço. É conseguida na luta. A vitória está agora próxima, mas para
conquistá-la deve haver um novo esforço extenuante, trabalho abnegado em toda
a retaguarda e ações hábeis e resolutas do Exército Vermelho na frente. Seria
um crime contra a Pátria, contra o povo soviético que caiu temporariamente sob
o jugo fascista, contra os povos da Europa que padecem sob a opressão alemã, se
não aproveitássemos todas as oportunidades para apressar a derrota do inimigo.
O inimigo não deve ter trégua. É por isso que devemos exercer todas as nossas
forças para acabar com o inimigo.
642 Obras Escolhidas

O povo soviético e o Exército Vermelho veem claramente as dificuldades da


luta que se aproxima. Mas hoje já está claro que o dia da nossa vitória se apro-
xima. A guerra entrou na fase em que se trata de expulsar completamente os
invasores do solo soviético e liquidar a fascista “Nova Ordem na Europa”. Não
está longe o tempo em que expulsaremos completamente o inimigo da Ucrânia
e da Bielorrússia, das regiões de Leningrado e Kalinin, e libertaremos dos in-
vasores alemães os povos da Crimeia, Lituânia, Letônia, Estônia, Moldávia e do
Karelo-Finlandês República.
Camaradas!
Pela vitória da aliança de combate anglo-soviético-americana! (Aplausos.)
Pela libertação dos povos da Europa do jugo fascista! (Aplausos.)
Pela expulsão completa dos demônios alemães de nosso solo! (Aplausos.)
Viva nosso Exército Vermelho! (Aplausos.)
Viva nossa marinha! (Aplausos.)
Viva nossos galantes homens e mulheres guerrilheiros! (Aplausos.)
Viva nossa grande Pátria! (Aplausos.)
Morte aos invasores alemães! (Aplausos prolongados. Todos se levantam.)
J. V. Stalin 643

Ordem do Supremo
Comandante-em-Chefe nº 309
07 de novembro de 1943

Camaradas do Exército e da Marinha Vermelha, sargentos, oficiais e generais,


guerrilheiros e guerrilheiras! Trabalhadores da URSS!
Saúdo-os, em nome do Governo Soviético e do nosso partido bolchevique,
pelo 26º aniversário da Revolução Socialista de Outubro.
Estamos comemorando o 26º aniversário da nossa Grande Revolução socia-
lista em meio às gloriosas vitórias do Exército Vermelho sobre os inimigos da
nossa Pátria.
Já faz mais de dois anos que o nosso povo conduz uma guerra de libertação
contra os usurpadores fascistas alemães. A nossa Pátria enfrentou momentos di-
fíceis há um ano atrás. O inimigo, naquele momento, tinha invadido uma grande
parte do nosso território. Milhões de soviéticos sofriam sob o jugo alemão. As
hordas inimigas avançaram até o Volga para cercar Moscou a partir do Leste e
assediar os acessos ao Cáucaso. Mas o Exército Vermelho barrou o caminho dos
alemães. Nossos exércitos detiveram as hordas de bandidos e, em seguida, as
destruíram em Stalingrado, expulsando-as para o oeste. Desde então, o Exército
Vermelho tomou definitivamente em suas mãos a iniciativa das ações militares.
No inverno de 1942-1943, as nossas tropas destemidas destruíram as forças
de elite alemãs, italianas, romenas e húngaras e matarem mais de um milhão de
soldados e oficiais inimigos, libertando uma parte do território de, aproximada-
mente, meio milho de quilômetros quadrados.
No verão de 1943, o Exército Vermelho desfechou novos golpes poderosos
contra o inimigo. Nossos exércitos, no decorrer de alguns dias, detiveram o
avanço de verão dos alemães, sepultando, assim, os planos de Hitler de derrotar
as forças as forças fundamentais do Exército Vermelho e cercar Moscou a partir
de Orel e Kursk. Mais do que isso, o Exército Vermelho passou a avançar decidi-
damente, rompeu várias zonas de defesa do inimigo e, no decorrer de três meses,
empurrou-o, em alguns lugares, cerca de 400 a 500 quilômetros em direção ao
oeste. Durante a campanha de verão, os nossos exércitos expulsaram o inimigo
da região oriental da Ucrânia, da bacia do Don, de Taman, Orlovchina e Smo-
lenchina e avançaram rumo a região ocidental da Ucrânia, apoderaram-se da
capital, Kiev, entraram na Bielorússia, tomaram os acessos à Criméia, libertaram
mais de 160 cidades e mais de 38 mil povoados.
O Exército Vermelho reconquistou das mãos dos alemães, no ano passado,
quase dois terços do nosso território e libertou do jugo hitlerista dezenas de mi-
lhões de soviéticos. Só no ano passado, os alemães perderam, na frente soviético-
alemã, mais de quatro milhões de soldados e oficiais, dos quais foram mortos
cerca de 1,8 milhões. Na frente soviético-alemã encontraram um fim inglório
quadros seletos das divisões fascistas alemãs. Junto com eles, foram definitiva-
mente sepultados os planos dos alemães de conquistar o mundo e escravizar os
644 Obras Escolhidas

povos.
É verdade que o Exército alemão, mesmo agora, defende-se com afinco, agar-
rando-se a cada palmo de chão. Mas as derrotas que os alemães sofreram, desde
a destruição de suas unidades em Stalingrado, quebraram o espírito de luta de
seu exército. Agora, ante a ameaça de serem cercados por nossos exércitos, os
alemães fogem, deixando para trás, no campo de batalha, seus equipamentos e
soldados feridos.
As vitórias do Exército Vermelho fortaleceram ainda mais a posição inter-
nacional da União Soviética. O nosso exército foi auxiliado, em suas ofensivas,
pelas ações militares dos exércitos aliados no Norte da África, no sul da Itália e
em suas ilhas. A aviação dos nossos aliados realizou uma série de bombardeios
sobre os centros industriais da Alemanha. Não há dúvida de que os golpes des-
feridos pelo Exército Vermelho contra as tropas alemãs a partir do Leste, com o
apoio das principais forças dos aliados a partir do Oeste, levarão à aniquilação
da Alemanha hitlerista e à vitória total da coalizão anti-hitlerista.
O Exército Vermelho não conquistaria grandes vitórias este ano sem a ajuda
do nosso povo no front. O povo soviético dedicou todas as suas forças à ajuda
ao seu exército, enviando ao front uma torrente interminável de armamentos,
munições, víveres e equipamentos. Os Urais e a bacia de Kuznets, Moscou e a
região do Volga, Leningrado e Baku, Cazaquistão e Uzbequistão, Geórgia e Ar-
mênia, todas as nossas repúblicas e regiões tornaram-se um arsenal possante do
Exército Vermelho. O povo soviético reconstrói, com habilidade, as indústrias
e regiões agrícolas reconquistadas aos alemães, põe para funcionar fábricas, mi-
nas e ferrovias, restabelece sovkhozes e Kolkhozes e coloca os recursos das regiões
libertadas a serviço do front.
Nossos êxitos são realmente grandes. Mas, seria ingenuidade contentar-se
com o que foi alcançado. Agora que o Exército Vermelho combate o inimigo
pelo Dnieper e avança para as fronteiras ocidentais do nosso país, seria parti-
cularmente perigoso rejubilar-se e subestimar as sérias dificuldades do combate
que ainda está por vir. O inimigo lutará agora, furiosamente, por cada pedaço
do território que conquistou, pois a cada avanço do nosso exército, aproxima-se
o momento da vingança contra os alemães pelos crimes praticados por eles em
nossa terra.
A luta pela vitória final sobre os invasores fascistas alemães exige do exército
e do povo esforços ainda maiores e novas proezas.
Camaradas soldados e marinheiros vermelhos, sargentos, oficiais e generais,
guerrilheiros e guerrilheiras!
Nas grandes batalhas com o inimigo, vocês conquistaram significativas vitó-
rias, cobrindo a bandeira de combate do Exército Vermelho e da Marinha de
guerra de glória eterna. O Exército Vermelho e a Marinha de Guerra têm agora
toda possibilidade de, em breve, libertar totalmente a terra soviética dos inva-
sores alemães. Em nome da vitória de nossa Pátria sobre os tiranos fascistas,
ORDENO:
A todos os soldados e sargentos, aperfeiçoar, sem descanso, sua habilidade
combativa, cumprindo rigorosamente os regulamentos, conselhos e ordens dos
superiores, manter continuamente e em todas as partes uma ordem exemplar,
J. V. Stalin 645

uma disciplina férrea e um alto grau de organização.


Aos oficiais e generais, aperfeiçoar o comando dos exércitos no campo de
batalha e a cooperação entre eles, consolidar os êxitos das ofensivas, perseguir,
implacavelmente, as tropas inimigas, reforçar mais rapidamente as retaguardas e
utilizar, com audácia, as reservas em novas investidas.
A todo o Exército Vermelho, romper, com coragem e determinação, a defesa
do inimigo, persegui-lo dia e noite, impedir que descanse, romper habilmente e
com coragem suas linhas de comunicação, cercar e dizimar seus exércitos, der-
rotar e capturar todo material humano e equipamentos do adversário.
Aos guerrilheiros e guerrilheiras, conclamar o povo soviético para a luta ar-
mada contra os alemães, reforçar, de todas as maneiras, a ajuda ao Exército Ver-
melho em seu avanço, destruir a retaguarda e o Estado-Maior do inimigo, salvar
os cidadãos soviéticos do extermínio e da deportação para trabalhos forçados na
Alemanha, aniquilar sem piedade os patifes fascistas alemães!
Soldados do Exército Vermelho, guerrilheiros e guerrilheiras! Avante, pela
derrota total dos invasores fascistas alemães!
Viva o 26º aniversário da Revolução Socialista de Outubro! Viva o nosso vi-
torioso Exército Vermelho! Viva a nossa vitoriosa Marinha de Guerra! Viva os
nossos corajosos guerrilheiros e guerrilheiras! Viva a nossa grande Pátria! Morte
aos invasores fascistas alemães!
Supremo Comandante-em-Chefe
Marechal da União Soviética
J. Stalin
646 Obras Escolhidas

Ordem do Supremo
Comandante-em-Chefe nº 220
07 de novembro de 1944

Camaradas soldados e marinheiros vermelhos, sargentos, oficiais e generais!


Trabalhadores da União Soviética! Irmãos e irmãs, obrigados a ir para a Alema-
nha para trabalhos forçados!
Em nome do Governo Soviético e do nosso partido bolchevique, saúdo-os pelo
27◦ aniversário da Revolução Socialista de Outubro.
Estamos comemorando o 27◦ aniversário da Revolução de Outubro, em meio
a vitórias decisivas do Exército Vermelho sobre os inimigos da nossa Pátria. Gra-
ças aos esforços heroicos do Exército Vermelho e do povo soviético a nossa terra
livrou-se dos invasores fascistas alemães.
Neste ano, os exércitos soviéticos desfecharam golpes ininterruptamente so-
bre o inimigo. No inverno de 1944, o Exército Vermelho alcançou vitórias no-
táveis na Ucrânia Oriental e derrotou os alemães em Leningrado. Na prima-
vera deste ano, libertou a Criméia. No verão de 1944, nossos exércitos causaram
grandes derrotas aos hitleristas, o que trouxe uma mudança radical da situa-
ção na frente de combate. O Exército Vermelho rompeu as poderosas defesas
do inimigo no istmo da Karélia, e também entre os lagos Ládoga e Onêguin, e
obrigou a Finlândia a sair do bloco hitlerista. No combate histórico em terras
bielorrussas, as unidades do Exército Vermelho destruíram completamente, o
grupamento central das tropas alemãs, composto de três exércitos, matando e
aprisionando 540 mil soldados oficiais germânicos. Na batalha ao Sul, o Exér-
cito Vermelho cercou e aniquilou, completamente, um agrupamento de tropas
alemãs em um total de 2 exércitos. Nessa operação, os exércitos soviéticos elimi-
naram e aprisionaram mais de 250 mil soldados e oficiais alemães. O Exército
Vermelho derrotou os alemães na Romênia, expulsou-os da Bulgária e os en-
frenta no território da Hungria. Os nossos exércitos cercaram o agrupamento
Báltico dos exércitos alemães. Após a campanha de verão de 1944, o Exército
Vermelho em meio a combatentes avançou de Kishinev até Belgrado mais de
900 quilômetros, de Zhlobin até Varsóvia mais de 600 quilômetros e de Vitebsk
até Tilsit, 550 quilômetros. A guerra está sendo conduzida agora no território
da Alemanha fascista.
No andamento dos combates, o Exército Vermelho expulsou os invasores fas-
cistas alemães de todo o território da Ucrânia Soviética, da Bielorrússia e das Re-
públicas Soviéticas da Karélia, Moldávia, Estônia, Letônia e Lituânia. O Exército
Vermelho devolveu a liberdade a dezenas de milhões de soviéticos. A fronteira
soviética, violada traiçoeiramente pelos bandidos hitleristas em 22 de junho de
1941, foi restaurada em toda a sua extensão do Mar Negro ao Mar de Barents.
Deste modo, 1944 tornou-se o ano da libertação total da terra soviética dos
invasores fascistas alemães.
Concluída a libertação da terra natal da podridão hitlerista, o Exército Ver-
J. V. Stalin 647

melho agora ajuda os povos da Polônia, Iugoslávia e Tchecoslováquia a romper as


cadeias da escravidão hitlerista e a restabelecer a sua liberdade e independência.
Nos combates de inverno e verão deste ano, o Exército Vermelho mostrou
uma crescente habilidade militar. Os soldados do exército Vermelho romperam
magistralmente as linhas reforçadas do inimigo, perseguindo-o, cercando-o e
aniquilando-o. Nas ofensivas revelou-se uma nítida cooperação entre todas as
unidades dos exércitos soviéticos e uma grande maestria em suas manobras. Os
soldados soviéticos foram forjados nos combates, aprenderam a destruir e vencer
o inimigo. O Exército Vermelho tornou-se uma força terrível e superou o inimigo
com a sua habilidade militar e sua técnica de combatente. As forças do Exército
Vermelho multiplicam-se graças ao trabalho realizado pela retaguarda soviética.
Operários, kolkhozianos e os intelectuais cumprem honrosamente o seu dever
perante a Pátria, superam heroicamente os difíceis tempos de guerra, abastecem
ininterruptamente o Exército Vermelho com armamento, munições e víveres. A
economia soviética aglutina forças e presta uma ajuda crescente ao front.
O Exército Vermelho e o povo soviético estão prontos para assestar novos gol-
pes destruidores contra o inimigo. Os dias do regime sanguinário de Hitler estão
contados. Sob os golpes do Exército Vermelho o bloco fascista se fez, definiti-
vamente, em pedaços a Alemanha hitlerista perdeu a maioria dos seus aliados.
As magistrais operações conduzidas pelos nossos aliados na Europa Ocidental
causaram a derrota das tropas alemãs na França e Bélgica e libertaram estes paí-
ses da ocupação fascista. Os exércitos aliados atravessaram a fronteira ocidental
da Alemanha. Os ataques conjuntos do Exército Vermelho e das tropas anglo-
americanas contra a Alemanha hitlerista antecipam o momento do final vitorioso
da guerra. Está se concluindo o cerco a Alemanha hitlerista. O covil das bestas
fascistas está cercado de todos os lados e nenhum artifício do inimigo o salvará
da inevitável derrota total.
O Exército Vermelho e as tropas dos nossos aliados tomaram posições para
iniciar a ofensiva decisiva aos centros habitados da Alemanha. A tarefa agora
consiste em destruir a Alemanha hitlerista com um ataque violento dos exércitos
das nações aliadas em um curto espaço de tempo.
Camaradas soldados e marinheiros vermelhos, sargentos, oficiais e generais!
Trabalhadores da União Soviética! Na Grande Guerra Patriótica nós defende-
mos a nossa Pátria contra os invasores, liquidamos definitivamente a ameaça de
escravização dos povos da URSS pelos tiranos fascistas e nos encontramos agora
às vésperas da vitória total.
Em comemorações às vitórias históricas do Exército Vermelho no front e aos
grandes êxitos dos operários, camponeses e intelectuais na retaguarda, em home-
nagem à libertação da terra soviética dos invasores fascistas alemães, ORDENO:
Que hoje, às 20 horas, o dia do 27◦ aniversário da Grande Revolução Socialista
de Outubro seja saudado com 20 salvas de artilharia em Moscou, Leningrado,
Kiev, Minsk, Petrozavodsk, Tallin, Riga, Vilnius, Tbilissi, Sebastopol e Lvov.
Viva o 27◦ aniversário da Revolução Socialista de Outubro!
Viva a nossa Pátria Soviética livre!
Viva o nosso Exército Vermelho e a nossa Marinha de Guerra!
648 Obras Escolhidas

Viva o grande povo soviético!


Gloria eterna aos heróis que caíram na luta pela liberdade e independência
da nossa Pátria!
Morte aos invasores alemães!
O Supremo Comandante-em-Chefe
Marechal da União Soviética
J. Stalin
J. V. Stalin 649

Discurso sobre o Tratado com a


Polônia
(Por ocasião da assinatura do tratado de amizade, assistência mútua e colaboração pós-
guerra entre a URSS e a República da Polônia)

21 de abril de 1945

Senhor Presidente, Senhor Primeiro Ministro, Senhores!


Creio que o Tratado de Amizade, Assistência Mútua e Colaboração Pós-guerra
entre a União Soviética e a Polônia, que acabamos de assinar, tem uma impor-
tância histórica e de grande importância.
A importância deste tratado consiste, em primeiro lugar, no fato de que ele
significa a virada radical das relações entre a União Soviética e a Polônia para a
aliança e a amizade, uma virada que tomou forma no curso da presente luta de
libertação contra a Alemanha e que agora está sendo formalmente consumado
neste Tratado.
É sabido que as relações entre nossos países ao longo dos últimos cinco séculos
foram abundantes em elementos de distanciamento mútuo, hostilidade e, não
raramente, em conflitos militares abertos. Essas relações enfraqueceram nossos
países e fortaleceram o imperialismo alemão.
A importância do presente Tratado consiste em pôr termo a estas velhas re-
lações entre os nossos países, cravar a tampa do caixão sobre elas e criar uma
base real para a substituição das antigas relações hostis por relações de aliança e
amizade entre a União Soviética e a Polônia.
No decurso das duas últimas guerras mundiais, os alemães conseguiram uti-
lizar o território da Polônia como corredor para a invasão do Leste e como tram-
polim para o ataque à União Soviética. Isso se tornou possível porque naquela
época não havia relações aliadas amistosas entre nossos países. Os ex-governantes
da Polônia não queriam ter relações de aliança com a União Soviética. Eles pre-
feriam uma política de jogo entre a Alemanha e a União Soviética. E, é claro, eles
se meteram em problemas... A Polônia foi ocupada, sua independência abolida
e, como resultado de toda essa política ruinosa, tropas alemãs puderam aparecer
às portas de Moscou.
A importância do presente Tratado consiste em pôr fim à velha e ruinosa
política de brincadeiras entre a Alemanha e a União Soviética e substituí-la por
uma política de aliança e amizade entre a Polônia e o seu vizinho oriental.
Tal é a importância histórica do Tratado entre a Polônia e a União Soviética
sobre Amizade, Assistência Mútua e Colaboração Pós-Guerra, que acabamos de
assinar.
Não admira, pois, que os povos dos nossos países aguardem com impaciência
a assinatura deste Tratado. Eles acham que este Tratado é uma promessa de
independência da nova e democrática Polônia, uma promessa de seu poder e
prosperidade.
650 Obras Escolhidas

Mas as coisas não se limitam a isso. O presente Tratado também tem grande
importância internacional. Enquanto não houvesse aliança entre nossos países,
a Alemanha foi capaz de aproveitar a ausência de uma frente unida entre nós,
ela poderia opor a Polônia à União Soviética e vice-versa, e assim derrotá-los
um de cada vez. As coisas mudaram radicalmente depois que a aliança entre
nossos países tomou forma. Agora não é mais possível opor nossos países uns
aos outros. Agora existe uma frente única entre nossos países, do Báltico aos
Cárpatos, contra o inimigo comum, contra o imperialismo alemão. Agora, pode-
se dizer com segurança que a agressão alemã é cercada pelo Oriente. Sem dúvida,
se esta barreira no Oriente for complementada por uma barreira no Ocidente,
ou seja, pela aliança entre nossos países e nossos Aliados no Ocidente, pode-se
dizer com segurança que a agressão alemã será contida, e que não será fácil para
correr solto.
Não admira, portanto, que as nações amantes da liberdade, e em primeiro lu-
gar as nações eslavas, aguardem com impaciência a conclusão deste Tratado, pois
veem que este Tratado significa um fortalecimento da frente única das Nações
Unidas contra o inimigo comum na Europa.
Portanto, não tenho dúvidas de que nossos Aliados no Ocidente darão as
boas-vindas a este Tratado.
Que a Polônia livre, independente e democrática viva e prospere!
Que seu vizinho oriental – nossa União Soviética – viva e prospere!
Viva a aliança e a amizade entre nossos países!
J. V. Stalin 651

Discurso da Vitória
Transmissão de Moscou às 20h (horário de Moscou)

9 de maio de 1945

Camaradas! Homens e mulheres compatriotas!


O grande dia da vitória sobre a Alemanha chegou. A Alemanha fascista, for-
çada a se ajoelhar ao Exército Vermelho e às tropas de nossos Aliados, reconheceu-
se derrotada e declarou rendição incondicional.
Em 7 de maio, o protocolo preliminar de rendição foi assinado na cidade de
Rheims. No dia 8 de maio representantes do Alto Comando Alemão, na presença
de representantes do Comando Supremo das tropas Aliadas e do Comando Su-
premo das Tropas Soviéticas, assinaram em Berlim o ato final de rendição, cuja
execução teve início em 8 de maio às 24h.
Cientes dos hábitos predatórios dos líderes alemães, que consideram tratados
e acordos como pedaços de papel vazios, não temos razão para confiar em suas
palavras. No entanto, esta manhã, em busca do ato de rendição, as tropas alemãs
começaram a dispor das armas e a render-se às nossas tropas em massa. Este não
é mais um pedaço de papel vazio. Esta é a rendição real das forças armadas da
Alemanha. É verdade que um grupo de soldados alemães na área da Tchecos-
lováquia ainda está evitando a rendição. Mas acredito que o Exército Vermelho
será capaz de trazê-lo à razão.
Agora podemos afirmar com toda a justificação que chegou o dia histórico
da derrota final da Alemanha, o dia da grande vitória do nosso povo sobre o
imperialismo alemão.
Os grandes sacrifícios que fizemos em nome da liberdade e independência de
nossa Pátria, as incalculáveis privações e sofrimentos vividos por nosso povo no
decorrer da guerra, o intenso trabalho na retaguarda e na frente, colocados no
altar do Pátria, não foram em vão e foram coroados pela vitória completa sobre
o inimigo. A luta milenar dos povos eslavos por sua existência e independência
terminou com a vitória sobre os invasores alemães e a tirania alemã.
Doravante, a grande bandeira da liberdade dos povos e da paz entre os povos
pairará sobre a Europa.
Há três anos, Hitler declarou para que todos soubessem que seus objetivos
incluíam o desmembramento da União Soviética e a arrancada dela do Cáucaso,
da Ucrânia, da Bielo-Rússia, das terras do Báltico e de outras áreas. Ele declarou
sem rodeios: “Destruiremos a Rússia para que ela nunca seja capaz de se levantar
novamente.” Isso foi há três anos. No entanto, as ideias malucas de Hitler não
estavam fadadas a se tornar realidade – o progresso da guerra as espalhou ao
vento. Na verdade, ocorreu o oposto direto dos delírios dos hitleristas. A Ale-
manha está totalmente derrotada. As tropas alemãs estão se rendendo. A União
Soviética festeja a Vitória, embora não pretenda desmembrar nem destruir a Ale-
manha.
652 Obras Escolhidas

Camaradas! A Grande Guerra Patriótica terminou com nossa vitória com-


pleta. O período de guerra na Europa acabou. O período de desenvolvimento
pacífico já começou.
Felicito-vos pela vitória, meus caros compatriotas!
Glória ao nosso heroico Exército Vermelho, que defendeu a independência
de nossa pátria e conquistou a vitória sobre o inimigo!
Glória ao nosso grande povo, o povo vitorioso!
Glória eterna aos heróis que caíram na luta contra o inimigo e deram suas
vidas pela liberdade e felicidade de nosso povo!
J. V. Stalin 653

Ao Primeiro-Ministro da Mongólia
29 de agosto de 1945

Agradeço de todo o coração os seus parabéns pela vitória total sobre os agres-
sores japoneses e por sua vez, os parabenizo pela vitória.
O Governo Soviético reconhece com gratidão que o Exército Revolucionário
do Povo da Mongólia, lutando lado a lado com o Exército Vermelho, deu uma
contribuição inestimável para a causa comunal da derrota do imperialismo japo-
nês.
Estou certo de que no futuro a União Soviética e o Exército Revolucionário
do Povo da Mongólia independente também caminharão de mãos dadas na luta
contra os inimigos de nossos países, pelo bem-estar de nossos povos.
J. Stalin
Comandante-em-Chefe Supremo
Marechal da União Soviética
Pravda,
29 de agosto de 1945
654 Obras Escolhidas

Discurso de Stalin ao povo


02 de setembro de 1945

Camaradas! Companheiros e compatriotas!


Hoje, 2 de setembro, representantes políticos e militares do Japão assinaram
um ato de rendição incondicional. Totalmente derrotado no mar e em terra, e
completamente cercado pelas forças armadas das Nações Unidas, o Japão admi-
tiu a derrota e depôs as armas.
Dois focos de fascismo mundial e agressão mundial foram formados na vés-
pera da presente Guerra Mundial: a Alemanha no Ocidente e o Japão no Ori-
ente. Foram eles que desencadearam a Segunda Guerra Mundial. Foram eles
que trouxeram a humanidade e a civilização à beira da ruína. O foco da agressão
mundial no Ocidente foi destruído há quatro meses e, como resultado, a Alema-
nha foi forçada a capitular. Quatro meses depois, o foco da agressão no Leste foi
destruído e, como resgate, o Japão, o principal aliado da Alemanha, também foi
obrigado a assinar um ato de capitulação.
Isso significa o fim da Segunda Guerra Mundial.
Agora podemos dizer que as condições necessárias para a paz em todo o
mundo foram conquistadas.
Deve-se observar que os agressores japoneses infligiram danos não apenas
aos nossos Aliados – China, EUA e Grã-Bretanha. Eles também infligiram danos
extremamente graves ao nosso país. É por isso que temos uma conta separada
para acertar com o Japão.
O Japão começou sua agressão contra nosso país já em 1904, durante a Guerra
Russo-Japonesa. Como sabemos, em fevereiro de 1904, quando as negociações
entre o Japão e a Rússia ainda estavam em andamento, o Japão, aproveitando-
se da fragilidade do governo tsarista, repentina e traiçoeiramente, sem declarar
guerra, caiu sobre nosso país e atacou a frota russa na região de Port Arthur, com
o objetivo de colocar vários navios de guerra russos fora de ação e, assim, criar
uma posição vantajosa para sua frota. De fato, ela pôs fora de ação três navios
de guerra russos de primeira classe. É característico que 37 anos depois o Japão
tenha praticado exatamente a mesma trapaça pérfida contra os Estados Unidos
quando, em 1941, atacou a base naval dos Estados Unidos em Pearl Harbor e
colocou vários navios de guerra americanos fora de ação. Como sabemos, na
guerra contra o Japão, a Rússia foi derrotada. O Japão aproveitou a derrota da
Rússia tsarista para tomar da Rússia a parte sul de Sacalina e se estabelecer nas
Ilhas Curilas, fechando assim todas as saídas de nosso país para o oceano no leste,
o que significava também todas as saídas para os portos de Sovfet Kamchatka e
Soviética Chukotka. Era óbvio que o Japão pretendia privar a Rússia de todo o
seu Extremo Oriente.
Mas isso não esgota a lista de operações agressivas do Japão contra nosso país.
Em 1918, após a implantação do sistema soviético em nosso país, o Japão, aprovei-
tando a hostilidade então manifestada à Terra dos Soviéticos pela Grã-Bretanha,
J. V. Stalin 655

França e Estados Unidos, e apoiado neles, voltou a atacar nosso país, ocupou o
Extremo Oriente e por quatro anos atormentou nosso povo e saqueou o Extremo
Oriente soviético.
E isso não é tudo. Em 1938, o Japão voltou a atacar o nosso país, na região
do Lago Hasan, perto de Vladivostok, com o objetivo de cercar Vladivostok; e no
ano seguinte o Japão repetiu seu ataque em outro lugar, na região da República
Popular da Mongólia, perto de Khalkin-gol, com o objetivo de invadir o território
soviético, cortando nossa Ferrovia Siberiana e separando o Extremo Oriente da
Rússia.
É verdade que os ataques do Japão nas regiões de Hasan e Khalkin-gol foram
liquidados pelas tropas soviéticas, para extrema humilhação dos japoneses. A
intervenção militar japonesa em 1918-1922 foi liquidada com igual sucesso e os
invasores japoneses foram expulsos de nossas regiões do Extremo Oriente. Mas a
derrota das tropas russas em 1904 durante a Guerra Russo-Japonesa deixou me-
mórias amargas nas mentes de nosso povo. Parecia uma mancha negra em nosso
país. Nosso povo acreditou e esperou pelo dia em que o Japão seria derrotado
e a mancha apagada. Nós, da geração mais velha, esperamos por este dia por
quarenta anos e agora este dia chegou. Hoje o Japão admitiu a derrota e assinou
um ato de rendição incondicional.
Isso significa que a parte sul de Sakhalin e as Ilhas Curilas reverteram para
a União Soviética e, doravante, servirão não como uma barreira entre a União
Soviética e o oceano e como uma base para o ataque japonês ao nosso Extremo
Oriente, mas como um meio direto de comunicação entre a União Soviética e o
oceano e uma base de defesa do nosso país contra a agressão japonesa.
Nosso povo soviético não poupou forças nem trabalho em nome da vitória.
Passamos por anos extremamente difíceis. Mas agora cada um de nós pode dizer:
Vencemos. Doravante, podemos considerar nosso país livre da ameaça da invasão
alemã no oeste e da invasão japonesa no leste. A tão esperada paz para os povos
de todo o mundo chegou.
Parabenizo vocês, meus queridos compatriotas e camponesas, por esta grande
vitória, pelo término bem-sucedido da guerra e pela instauração da paz em todo
o mundo!
Glória às Forças Armadas da União Soviética, Estados Unidos da América,
China e Grã-Bretanha que conquistaram a vitória sobre o Japão!
Glória às nossas tropas do Extremo Oriente e à nossa Frota do Pacífico, que
defendeu a honra e dignidade do nosso país!
Glória ao nosso grande povo, o povo vitorioso!
Glória eterna aos heróis que caíram lutando pela honra e vitória de nosso
país! Que nosso país floresça e prospere!
656 Obras Escolhidas

Ordem do Dia do Comissário da


Defesa da URSS, nº 8
23 de fevereiro de 1946

Camaradas, soldados e marinheiros do Exército Vermelho e da Marinha Ver-


melha, suboficiais, oficiais e generais!
Hoje celebramos o 28º aniversário da existência do Exército Vermelho. O
Exército Vermelho comemora seu 28º aniversário com o brilho da gloriosa vitória
sobre os imperialistas alemão e japonês. Envolvido em uma guerra prolongada e
árdua, o Exército Fugido emergiu como um exército de primeira classe do mais
alto moral e força de combate, equipado com armamentos modernos e quadros
de grande experiência, temperados pela batalha. Na guerra contra os invasores
fascistas, o Exército Vermelho mostrou sua alta qualidade e mostrou que é capaz
de defender os interesses do Estado soviético de maneira eficaz, fiel e firme.
Nossos soldados, oficiais e generais justificaram a confiança do povo e mos-
traram sua grande devoção à nossa Pátria. O Exército Vermelho provou ao povo
soviético que eles podem confiar nele. O povo de nosso país tem grande confi-
ança em seu exército e suas vitórias, e manterá a sagrada memória de seus heróis
que morreram nas batalhas pela Pátria.
As notáveis vitórias do Exército Vermelho são explicadas, acima de tudo, pelo
fato de ser um exército verdadeiramente popular que defende os interesses de seu
povo. O povo soviético ama seu exército ardentemente e é uma fonte constante
de seu reforço e de sua força. Isso foi demonstrado especialmente na época
da Grande Guerra Patriótica. Todo o nosso povo trabalhou sem hesitação, dia
e noite, pela vitória. Sem este trabalho, sem este sacrifício dos trabalhadores,
camponeses e intelectuais, sem o seu apoio material e moral, o Exército Vermelho
não teria derrotado o inimigo.
As vitórias do Exército Vermelho também são explicadas pelo fato de ser lide-
rado e educado pelo Partido Comunista. Além disso, as ordens do grande Lenin
ajudaram o povo soviético, sob a orientação do Partido Comunista, a transformar
nosso país de uma terra atrasada em uma terra de progresso, de um país agrário
a um industrial. Sobre esta base foram fundadas todas as possibilidades mate-
riais para a luta vitoriosa do Exército Vermelho contra seus inimigos. Durante
a Grande Guerra Patriótica, o Partido Comunista uniu todos os países da União
Soviética em um único campo militar e orientou todos os esforços do povo e do
exército para um único objetivo – a destruição do inimigo. O Partido Comunista
educou o soldado soviético no sentido e nos objetivos da guerra, cultivou o amor
pela pátria, reforçou constantemente seu espírito de luta e inspirou sua firmeza
e disciplina. Tudo isso criou as condições para nossa vitória.
Depois da vitória sobre os inimigos, a União Soviética entrou em um novo
período, em um período pacífico de desenvolvimento econômico. A tarefa atual
do povo soviético é assegurar as posições conquistadas e avançar em um novo
esforço econômico. Não podemos apenas assegurar nossa posição, pois isso sig-
J. V. Stalin 657

nificaria estagnação; temos que ir em frente e criar as condições para um novo e


poderoso esforço da economia nacional. Resumindo, temos de curar as feridas
infligidas ao nosso país pelo inimigo e atingir o nível pré-guerra da economia na-
cional antes de podermos fazer um progresso considerável; temos que aumentar
o bem-estar material de nosso povo e temos que aumentar a capacidade econô-
mica e militar do Estado soviético.
Sob essas novas condições, o Exército Vermelho deve proteger vigilantemente
o trabalho criativo do povo soviético, deve garantir solidamente os interesses da
União Soviética e proteger as fronteiras de nossa pátria e torná-las inacessíveis a
qualquer inimigo.
Durante a guerra, a principal tarefa dos soldados, oficiais e generais do Exér-
cito Vermelho consistia em alcançar a vitória, para concentrar todos os seus co-
nhecimentos e esforços no aniquilamento total do inimigo. Nestes tempos de paz,
a principal tarefa de nossos soldados, oficiais e generais, sem exceção, consiste
em aperfeiçoar suas habilidades militares e políticas. Todos os nossos soldados e
suboficiais do Exército Vermelho precisam estudar intensamente a arte militar,
precisam conhecer bem suas armas e cumprir seu dever de maneira irrepreen-
sível. Agora, mais do que nunca, os oficiais precisam ser capazes de educar e
instruir seus subordinados.
Durante a guerra, os oficiais e generais do Exército Vermelho sabiam bem
como liderar suas tropas na batalha. Agora, esses oficiais e generais devem se
tornar mestres perfeitos na educação e instrução de suas tropas nos tempos atu-
ais.
A Grande Guerra Patriótica introduziu muitas novidades na arte militar. A
experiência de combate representa um rico tesouro para a instrução e educa-
ção das tropas. É por isso que toda a instrução do exército deve ser baseada na
aplicação inteligente das experiências da guerra. Também é necessário utilizar
esta experiência em todos os campos para a instrução teórica dos quadros e ofi-
ciais, para o enriquecimento da ciência militar soviética. É preciso garantir que a
arte militar se desenvolva constante e rapidamente. O Exército Vermelho é obri-
gado não apenas a acompanhar o desenvolvimento da arte militar, mas também a
progredir mais. O Exército Vermelho está equipado com material militar de pri-
meira classe que constitui a base de sua habilidade em combate. Sabe manusear
este equipamento perfeitamente e o trata como a menina dos seus olhos.
Qualquer sucesso na instrução e educação de suas tropas é impossível sem
disciplina e uma ordem militar estrita, porque a eficácia de um exército depende
disso. Isso se aplica especialmente aos ajudantes e sargentos que são os superiores
imediatos e professores diretos dos soldados do Exército Vermelho. Os soldados,
oficiais e generais do Exército Vermelho têm grande mérito junto ao povo e à
Pátria. Mas eles não devem se tornar complacentes e vaidosos com isso, eles não
devem descansar sobre os louros, mas devem cumprir conscienciosamente seus
deveres e devem dedicar toda a sua força e conhecimento ao serviço do Exército
Vermelho. É isso que se exige de todos os soldados soviéticos.
Camaradas, soldados e marinheiros do Exército Vermelho e da Marinha Ver-
melha, suboficiais, oficiais e generais! Em nome do governo soviético e do nosso
Partido Comunista, saúdo e felicito-o por ocasião do vigésimo oitavo aniversário
658 Obras Escolhidas

do Exército Vermelho. Para celebrar o dia do Exército Vermelho, hoje, 23 de


fevereiro, ORDENO:
Uma saudação a vinte salvas de artilharia na capital de nossa Pátria, Moscou,
nas capitais das repúblicas federativas e nas heroicas cidades de Leningrado, Sta-
lingrado, Sebastopol e Odessa.
Viva nosso vitorioso Exército Vermelho!
Viva nossos vitoriosos marinheiros da guerra!
Viva nosso glorioso Partido Comunista!
Viva o grande povo soviético!
Viva nossa poderosa Pátria!
J. Stalin
Comissário da Defesa do Povo da URSS,
Generalíssimo da União Soviética
J. V. Stalin 659

Entrevista com o correspondente


do Pravda
(Sobre o discurso de Churchill em Fulton)

13 de março de 1946

Outro dia, um correspondente do Pravda pediu ao camarada Stalin que escla-


recesse uma série de questões relacionadas com o discurso de Churchill. Seguem
abaixo as respostas do camarada Stalin às perguntas do correspondente.
Pravda: Como você avalia o último discurso do Sr. Churchill proferido nos
Estados Unidos da América?
Stalin: Eu considero isso um ato perigoso calculado para semear as sementes
da discórdia entre os Estados Aliados e dificultar sua cooperação.
Pravda: O discurso do Sr. Churchill pode ser considerado prejudicial à causa
da paz e segurança?
Stalin: Inquestionavelmente, sim. Na verdade, a posição de Churchill agora
é a dos incendiários da guerra. E o Sr. Churchill não está sozinho nisso – ele tem
amigos não apenas na Inglaterra, mas também nos Estados Unidos da América.
Deve-se notar que, a esse respeito, o Sr. Churchill e seus amigos se parecem
muito com Hitler e seus amigos. Hitler decidiu desencadear a guerra procla-
mando a teoria racial, declarando que o povo de língua alemã constituía uma
nação superior. O Sr. Churchill se propõe a desencadear a guerra também com
uma teoria racial, ao afirmar que as nações de língua inglesa são nações superi-
ores chamadas a decidir os destinos do mundo inteiro. A teoria da raça alemã
levou Hitler e seus amigos à conclusão de que os alemães, como a única nação su-
perior, deveriam dominar outras nações. A teoria da raça inglesa leva Churchill
e seus amigos à conclusão de que as nações de língua inglesa, como as únicas
nações superiores, devem dominar as outras nações do mundo.
Na verdade, o Sr. Churchill e seus amigos na Inglaterra e nos Estados Unidos
estão apresentando algo da natureza de um ultimato às nações que não falam
inglês: reconheçam nossa dominação voluntariamente, e então tudo estará em
ordem – do contrário, a guerra será inevitável.
Mas as nações derramaram seu sangue durante cinco anos de guerra feroz
em prol da liberdade e independência de seus países, e não para substituir o
domínio dos Hitlers pelo domínio dos Churchills. Portanto, é bem provável que
as nações que não falam inglês e ao mesmo tempo constituem a grande maioria
da população mundial, não concordem em se submeter à nova escravidão.
A tragédia do Sr. Churchill é que ele, como um Tory antiquado, não entende
esta verdade simples e óbvia.
Sem dúvida, a linha do Sr. Churchill é a da guerra, um apelo à guerra contra
a URSS. Também é claro que esta linha do Sr. Churchill é incompatível com
o tratado de aliança existente entre a Grã-Bretanha e a URSS. Verdade, para
660 Obras Escolhidas

confundir os leitores O Sr. Churchill declara de passagem que o prazo do tratado


soviético-britânico de assistência mútua e cooperação poderia perfeitamente ser
estendido para cinquenta anos. Mas como pode tal declaração do Sr. Churchill
ser reconciliada com sua linha de guerra contra a URSS, com sua pregação de
guerra contra a URSS? É claro que essas coisas não podem ser reconciliadas de
forma alguma. E se o Sr. Churchill, que está convocando a guerra contra a União
Soviética, ao mesmo tempo acredita ser possível estender a vigência do tratado
Anglo-Soviético para cinquenta anos, isso significa que ele considera este tratado
como um mero pedaço de papel que ele precisa apenas para encobrir e camuflar
sua linha antissoviética. Portanto, não podemos tratar seriamente a declaração
hipócrita dos amigos do Sr. Churchill na Inglaterra sobre a extensão do prazo
do tratado soviético-britânico para cinquenta anos ou mais. A extensão do prazo
do tratado não tem sentido se uma das partes violar o tratado e transformá-lo em
uma mera confusão de papel.
Pravda: Como você avalia aquela parte do discurso do Sr. Churchill em que
ele ataca os sistemas democráticos nos Estados europeus vizinhos a nós e em que
critica as relações de boa vizinhança estabelecidas entre esses Estados e a União
Soviética?
Stalin: Esta parte do discurso do Sr. Churchill representa uma mistura de
elementos de calúnia e com elementos de grosseria e falta de tato.
O Sr. Churchill afirma que “Varsóvia, Berlim, Praga, Viena, Budapeste, Bel-
grado, Bucareste, Sofia – todas essas cidades e populações famosas ao seu redor
estão dentro da esfera soviética e todas estão sujeitas de uma forma ou de outra
não apenas à influência soviética, mas a uma medida de controle muito elevada
e crescente de Moscou.” O Sr. Churchill descreve tudo isso como “tendências
expansionistas” ilimitadas da União Soviética.
Nenhum esforço especial é necessário para provar que, neste caso, o Sr. Chur-
chill está caluniando rude e descaradamente tanto Moscou quanto os menciona-
dos Estados vizinhos da URSS.
Em primeiro lugar, é totalmente absurdo falar de controle exclusivo da URSS
em Viena e Berlim, onde existem Conselhos de Controle Aliados compostos por
representantes dos quatro Estados e onde a URSS tem apenas um quarto dos
votos. Acontece que algumas pessoas não conseguem evitar a calúnia, mas mesmo
assim deveria haver um limite.
Em segundo lugar, não se deve esquecer o seguinte fato. Os alemães invadi-
ram a URSS pela Finlândia, Polônia, Romênia, Bulgária, Hungria. Os alemães
conseguiram efetuar sua invasão por meio desses países porque naquela época
existiam nesses países governos hostis à União Soviética. Devido à invasão alemã,
a União Soviética perdeu irrevogavelmente nas batalhas com os alemães e tam-
bém como resultado da ocupação alemã e da expulsão do povo soviético para a
servidão penal alemã, cerca de sete milhões de pessoas. Em outras palavras, a
União Soviética perdeu muito mais pessoas do que a Grã-Bretanha e os Estados
Unidos da América juntos. Possivelmente alguns quadrantes estão inclinados a
consignar ao esquecimento esses sacrifícios colossais do povo soviético que asse-
guraram a libertação da Europa do jugo hitlerista. Mas a União Soviética não
pode esquecê-los. Surge a pergunta: o que pode haver de surpreendente no
J. V. Stalin 661

fato de que a União Soviética, desejando garantir sua segurança no futuro, pro-
cura alcançar uma situação em que esses países tenham governos mantendo uma
atitude amigável para com a União Soviética? Como pode alguém que não enlou-
queceu descrever essas aspirações pacíficas da União Soviética como tendências
expansionistas de nosso Estado?
O Sr. Churchill afirma ainda que “o governo polonês de domínio russo foi
encorajado a fazer enormes incursões injustas sobre a Alemanha”.
Aqui, cada palavra é uma calúnia rude e ofensiva. A atual Polônia demo-
crática é guiada por homens notáveis. Eles provaram por atos que são capazes
de defender os interesses e a dignidade de sua pátria de uma maneira que seus
predecessores não eram capazes. Que fundamentos tem o Sr. Churchill para
afirmar que os líderes da atual Polônia podem permitir a “dominação” de re-
presentantes de quaisquer Estados estrangeiros em seu país? Não é porque o Sr.
Churchill pretende semear as sementes da discórdia nas relações entre a Polônia
e a União Soviética que ele calunia “os russos” aqui?
O Sr. Churchill está descontente com o fato de que a Polônia mudou sua
política de amizade e aliança com a URSS. Houve um tempo em que elementos
de conflito e contradição prevaleciam nas relações entre a Polônia e a URSS que
forneciam aos estadistas do tipo de Churchill a oportunidade de jogar com essas
contradições, de colocar as mãos na Polônia sob o pretexto de protegê-la dos
russos, para intimidar a Rússia com o espectro da guerra entre ela e a Polônia,
e para reservar para eles a posição de árbitros. Mas esse tempo já passou, pois a
inimizade entre a Polônia e a Rússia cedeu lugar à amizade entre elas, enquanto
a Polônia, a atual Polônia democrática, não quer mais ser jogada como uma bola
por estrangeiros. Parece-me que é exatamente essa circunstância que irrita o Sr.
Churchill e o leva a ataques rudes e sem tato contra a Polônia. Não é brincadeira:
ele não tem permissão para jogar às custas de outra pessoa.
No que diz respeito ao ataque do Sr. Churchill à União Soviética em conexão
com a extensão da fronteira ocidental da Polônia em territórios poloneses toma-
dos pelos alemães no passado, aqui, parece-me, ele está obviamente agindo. É
bem sabido que a decisão sobre a fronteira ocidental da Polônia foi adotada na
Conferência de Berlim das Três Potências com base nas demandas da Polônia. A
União Soviética afirmou repetidamente que considera as exigências da Polônia
corretas e justas. É bem provável que o Sr. Churchill não goste dessa decisão.
Mas por que o Sr. Churchill, embora sem poupar flechas contra a posição dos
russos neste assunto, esconde de seus leitores o fato de que a decisão foi adotada
na Conferência de Berlim por unanimidade, que não apenas os russos, mas tam-
bém os britânicos e os americanos votou nesta decisão? Por que o Sr. Churchill
precisava enganar as pessoas?
O Sr. Churchill afirma ainda que “os partidos comunistas, que antes eram
muito pequenos em todos esses Estados do leste da Europa, foram elevados à
proeminência e ao poder muito além de seu número e buscam em todos os luga-
res obter o controle totalitário. Governos policiais prevalecem em quase todos os
casos, e até agora, exceto na Tchecoslováquia, não existe uma verdadeira demo-
cracia.”
É bem sabido que na Grã-Bretanha o Estado é agora governado por um par-
662 Obras Escolhidas

tido, o Partido Trabalhista, enquanto os partidos de oposição não têm o direito


de participar do governo da Grã-Bretanha. Isso é o que o Sr. Churchill chama
de verdadeira democracia. Polônia, Romênia, Iugoslávia, Bulgária e Hungria são
governados por blocos de vários partidos – de quatro a seis partidos – enquanto a
oposição, se for mais ou menos leal, tem garantido o direito de participar do go-
verno. Isso é o que Churchill chama de totalitarismo, tirania, governo policial.
Por que, e com que fundamento? Não espere uma resposta do Sr. Churchill.
Churchill não entende em que posição ridícula ele se coloca com seus discursos
vociferantes sobre totalitarismo, tirania, governo policial.
O Sr. Churchill gostaria que a Polônia fosse governada por Sosnkowski e
Anders; Iugoslávia por Mikhailovic e Pavelic; Romênia, do príncipe Stirbei e
Radescu; Hungria e Áustria por algum rei da casa de Habsburgo e assim por
diante. O Sr. Churchill quer nos convencer de que esses cavalheiros do quintal
fascista são capazes de garantir a “verdadeira democracia”. Essa é a “democracia”
do Sr. Churchill.
O Sr. Churchill está divagando sobre a verdade quando fala do crescimento
da influência dos partidos comunistas na Europa Oriental. Deve-se notar, entre-
tanto, que ele não é muito preciso. A influência dos partidos comunistas cres-
ceu não apenas na Europa Oriental, mas em quase todos os países da Europa
onde o fascismo governou antes (Itália, Alemanha, Hungria, Bulgária, Romênia
e Finlândia), ou onde ocorreu a ocupação alemã, italiana ou húngara (França,
Bélgica, Holanda, Noruega, Dinamarca, Polônia, Tchecoslováquia, Iugoslávia,
Grécia, União Soviética e assim por diante).
O crescimento da influência dos comunistas não pode ser considerado for-
tuito. É um fenômeno perfeitamente legítimo. A influência dos comunistas
cresceu porque nos anos difíceis de dominação fascista na Europa, os comunis-
tas provaram ser lutadores confiáveis, corajosos e abnegados contra o regime
fascista, pela liberdade dos povos. O Sr. Churchill às vezes menciona em seus
discursos “o povo simples dos chalés”, dando tapinhas nas costas deles de ma-
neira senhorial e se passando por amigo. Mas essas pessoas não são tão simples
como podem parecer à primeira vista. Eles, essas “pessoas simples”, têm seus
próprios pontos de vista, sua própria política e são capazes de se defender. Fo-
ram eles, os milhões dessas “pessoas simples”, que votaram contra o sr. Churchill
e seu partido na Inglaterra, votando a favor dos trabalhistas. São eles, os milhões
de “gente simples”, que isolam os reacionários da Europa, adeptos da colabora-
ção com o fascismo, e dão preferência aos partidos democráticos de esquerda.
Foram eles, os milhões dessas “pessoas simples”, que testaram os comunistas no
fogo da luta e resistência ao fascismo e decidiram que os comunistas mereciam
totalmente a confiança do povo. É assim que a influência dos comunistas cresceu
na Europa. Essa é a lei do desenvolvimento histórico.
Naturalmente, o Sr. Churchill não gosta de tal curso de desenvolvimento e
ele soa o alarme, apelando para a força. Mas ele também não gostou do nasci-
mento do regime soviético na Rússia após a Primeira Guerra Mundial. Então ele
também deu o alarme e organizou a campanha militar de “14 Estados” contra a
Rússia, estabelecendo para si mesmo o objetivo de virar a roda da história para
trás. Mas a história se mostrou mais forte do que a intervenção de Churchill,
J. V. Stalin 663

e os modos quixotescos de Churchill trouxeram sua derrota total. Não sei se o


Sr. Churchill e seus amigos terão sucesso em organizar, após a Segunda Guerra
Mundial, uma nova campanha militar contra a “Europa Oriental”. Mas se eles
tiverem sucesso – o que é pouco provável, já que milhões de “pessoas simples”
estão defendendo a causa da paz – pode-se dizer com segurança que eles serão
espancados assim como foram espancados no passado, vinte e seis anos atrás.
664 Obras Escolhidas

Coexistência, cooperação
américo-soviética, energia atômica,
Europa
(Trecho da entrevista com Harold Stassen)

09 de abril de 1947

Stassen: Generalíssimo Stalin, nesta viagem à Europa estou particularmente


interessado em estudar as condições de natureza econômica. A este respeito,
é claro, as relações da URSS e dos EUA são muito importantes. Sei que temos
dois sistemas econômicos muito diferentes. A URSS com o Partido Comunista
e sua economia planejada e Estado coletivo socializado, e os Estados Unidos da
América com sua economia livre e capitalismo privado regulado são muito dife-
rentes. Gostaria de saber se você acha que esses dois sistemas econômicos podem
coexistir no mesmo mundo moderno em harmonia um com o outro?
Stalin: Claro que podem. A diferença entre eles não é importante no que
diz respeito à cooperação. Os sistemas na Alemanha e nos Estados Unidos são
os mesmos, mas estourou uma guerra entre eles. Os sistemas dos EUA e da
URSS são diferentes, mas não travamos guerra uns contra os outros e a URSS
não pretendem fazer isso. Se durante a guerra eles puderam cooperar, por que
não podem hoje em paz, dado o desejo de cooperar? Claro, se não houver desejo
de cooperar, mesmo com o mesmo sistema econômico, eles podem cair como foi
o caso da Alemanha.
Stassen: Eu acredito, é claro, que eles podem cooperar se ambos desejarem,
mas tem havido muitas declarações sobre não serem capazes de cooperar. Al-
gumas delas foram feitas pelo próprio Generalíssimo antes da guerra. Mas é
possível, agora que o eixo fascista foi derrotado, que a situação mudou?
Stalin: Não é possível que eu tenha dito que os dois sistemas econômicos
não poderiam cooperar. Ideias de cooperação foram expressas por Lenin. Eu
poderia ter dito que um sistema relutava em cooperar, mas isso dizia respeito
apenas a um lado. Mas quanto à possibilidade de cooperação, concordo com
Lenin, que expressou a possibilidade e o desejo de cooperação. Quanto ao desejo
do povo de cooperar por parte da URSS e do Partido, é possível – e os dois países
só poderiam se beneficiar com essa cooperação.
Stassen: Essa última parte é clara. As declarações a que me referi são aquelas
feitas por você no 18º Congresso do Partido Comunista em 1939 e na sessão
plenária em 1937 – declarações sobre o cerco capitalista e o monopólio. Presumo
pela sua declaração agora que a derrota da Alemanha e do Japão fascistas não
carregou essa situação.
Stalin: Não houve um único congresso do partido ou sessão plenária do Co-
mitê Central do Partido Comunista em que eu disse ou poderia ter dito que a
cooperação entre os dois sistemas era impossível. Eu disse que existia cerco ca-
J. V. Stalin 665

pitalista e perigo de ataque a URSS. Se uma das partes não deseja cooperar, isso
significa que existe uma ameaça de ataque. E, na verdade, a Alemanha, não de-
sejando cooperar com a URSS, atacou a URSS. A URSS poderia ter cooperado
com a Alemanha? Sim, a URSS poderia ter cooperado com a Alemanha, mas os
alemães não queriam cooperar. Caso contrário, a URSS poderia ter cooperado
com a Alemanha como com qualquer outro país. Como você vê, isso diz respeito
à esfera do desejo e não à possibilidade de cooperação. É necessário fazer uma
distinção entre a possibilidade; de cooperar e o desejo de cooperar. A possi-
bilidade de cooperação sempre existe, mas nem sempre está presente o desejo
de cooperar. Se uma das partes não deseja cooperar, o resultado será conflito,
guerra.
Stassen: Deve ser mútuo.
Stalin: Sim. Quero prestar testemunho de que a Rússia deseja cooperar.
Stassen: Gostaria de apontar, com referência à sua declaração anterior, que
havia uma grande diferença entre a Alemanha e os Estados Unidos na época em
que a Alemanha começou a guerra.
Stalin: Havia uma diferença no governo, mas nenhuma diferença nos sistemas
econômicos. O governo foi um fator temporário.
Stassen: Não concordo. Sim, havia uma diferença de sistemas econômicos
também. O imperialismo, o desenvolvimento do monopólio estatal e a opressão
dos trabalhadores são os males do capitalismo praticado pelos nazistas. Parece-
me que tivemos sucesso na América em evitar o monopólio do capitalismo e a
tendência imperialista, e que os trabalhadores fizeram mais progresso com o uso
da força de seu voto e de sua liberdade do que Karl Marx ou Friedrich Engels
pensaram que poderiam fazer. E esta regulamentação do capital livre e a pre-
venção do monopólio e da liberdade dos trabalhadores na América tornam a
situação econômica bastante diferente daquela que existia na Alemanha.
Stalin: Não vamos criticar mutuamente nossos sistemas. Todos têm o direito
de seguir o sistema que desejam manter. Qual é o melhor será dito pela história.
Devemos respeitar os sistemas escolhidos pelo povo, e se o sistema é bom ou
ruim é assunto do povo americano. Para cooperar, não são necessários os mesmos
sistemas. Deve-se respeitar o outro sistema quando aprovado pelo povo. Somente
nesta base podemos garantir a cooperação. Só que, se criticarmos, isso nos levará
longe demais.
Quanto a Marx e Engels, eles foram incapazes de prever o que aconteceria
quarenta anos após sua morte. Mas devemos aderir ao respeito mútuo pelas
pessoas. Algumas pessoas chamam o sistema soviético de totalitário. Nosso povo
chama o sistema americano de capitalismo monopolista. Se começarmos a xingar
uns aos outros com as palavras monopolista e totalitário, não haverá cooperação.
Devemos partir do fato histórico de que existem dois sistemas aprovados pelo
povo. Somente nessa base a cooperação é possível. Se nos distrairmos com críti-
cas, isso é propaganda.
Quanto à propaganda, não sou um propagandista, mas um homem de negó-
cios. Não devemos ser sectários. Quando as pessoas desejam mudar os sistemas,
elas o farão. Quando nos encontramos com Roosevelt para discutir as questões
da guerra, não xingávamos uns aos outros. Estabelecemos cooperação e conse-
666 Obras Escolhidas

guimos derrotar o inimigo.


Stassen: Esse tipo de crítica tem sido causa de mal-entendidos após a guerra.
Você espera no futuro uma maior troca de ideias e novidades, de alunos e pro-
fessores, de artistas, de turistas, se houver cooperação?
Stalin: Isso acontecerá inevitavelmente se a cooperação for estabelecida. Pois
uma troca de mercadorias levará a uma troca de pessoas.
Stassen: A meu ver, então, você pensa que é possível que haja cooperação,
desde que haja vontade e desejo de cooperar.
Stalin: Isso é correto.
Stassen: No desenvolvimento dos padrões de vida das pessoas, a mecaniza-
ção e a eletrificação foram de grande importância. O novo desenvolvimento da
energia atômica é de grande importância para todos os povos do mundo. Eu
sinto que a questão da inspeção internacional, controles eficazes e proibição do
uso da energia atômica para a guerra são de suprema importância para todos os
povos do mundo. Você acha que há uma perspectiva razoável de se chegar a acor-
dos para um futuro de longo prazo para o desenvolvimento pacífico da energia
atômica?
Stalin: Espero por isso. Existem grandes diferenças de pontos de vista entre
nós, mas no longo prazo espero que cheguemos a um entendimento. O controle
e a fiscalização internacionais serão estabelecidos, em qualquer ponto de vista, e
será de grande importância. O uso pacífico da energia atômica trará grandes
mudanças tecnológicas. É um assunto muito importante. Quanto ao uso de
energia atômica para fins de guerra, com toda probabilidade será proibido. Será
um problema a longo prazo que será enfrentado pela consciência do povo e será
proibido.
Stassen: Sim, esse é um dos nossos problemas importantes e, se resolvido,
pode ser uma grande dádiva – e se não, uma grande maldição para as pessoas do
mundo.
Stalin: Acho que conseguiremos estabelecer a inspeção e o controle interna-
cionais. As coisas estão levando a isso.
Stassen: Agradeço a oportunidade de conversar com você.
(A entrevista já durava quarenta minutos e Stassen se preparava para se despedir. No
entanto, Stalin indicou a disposição de continuar a discussão. O restante da conversa
tratou das condições econômicas prevalecentes na Europa e nos Estados Unidos)
J. V. Stalin 667

Mensagem de saudações para


Moscou
08 de setembro de 1947

Saudações a Moscou, capital do nosso país, em seu 800º aniversário.


O país inteiro comemora hoje este dia significativo. É celebrar não formal-
mente, mas com sentimentos de amor e reverência, por quê? Os grandes serviços
que Moscou prestou ao nosso país.
Os serviços prestados por Moscou não são apenas que, por três vezes no curso
da história do nosso país, libertou da opressão estrangeira – do jugo mongol, da
invasão polonesa-lituana e da incursão francesa. O serviço prestado por Moscou
é basicamente tornar-se a base para a união da Rússia desunida em um único
Estado, com um único governo e uma única liderança. Nenhum país do mundo
pode contar com a preservação da sua independência, com um verdadeiro cres-
cimento económico e cultural, se não tiver conseguido libertar-se da desunião
feudal e das contendas entre os príncipes. Só um país unido num só Estado cen-
tralizado pode contar com a possibilidade de um verdadeiro crescimento cultural
e económico, com a possibilidade de estabelecer com firmeza a sua independên-
cia. O serviço histórico prestado por Moscou é que ela foi e continua sendo a
base e o iniciador na criação de um Estado centralizado na Rússia.
Mas este não é o único serviço que Moscou prestou ao nosso país. Depois
que Moscou, pela vontade de nosso grande Lênin, foi novamente proclamada a
capital de nosso país, tornou-se o porta-estandarte da nova época soviética.
Moscou hoje não é apenas a inspiradora da construção da nova ordem so-
cial e econômica soviética, que substituiu o domínio do capital pelo domínio do
Trabalho e rejeitou a exploração do homem pelo homem. Moscou também é o
arauto do movimento pela libertação da humanidade trabalhadora da escravidão
capitalista.
Moscou hoje não é apenas a inspiradora da construção da nova democracia
soviética, que rejeita todas as desigualdades, diretas ou indiretas, de cidadãos,
sexos, raças e nações, e garante o direito ao trabalho e o direito a salário igual por
trabalho igual . Moscou é também a bandeira da luta que todos os trabalhadores
do mundo, todas as raças e nações oprimidas, estão travando para se libertar
do domínio da plutocracia e do imperialismo. Não pode haver dúvida de que
sem esta política Moscou não poderia ter se tornado o centro da organização da
amizade das nações e de sua cooperação fraterna em nosso Estado multinacional.
Moscou não é hoje apenas o iniciador na construção da nova forma de vida
dos trabalhadores da capital, uma vida livre de miséria e miséria sofrida por
milhões de pobres e desempregados. Moscou também é um modelo para todas
as capitais do mundo nesse aspecto. Uma das feridas mais graves das grandes
capitais de países da Europa, Ásia e América são as favelas em que milhões de
trabalhadores empobrecidos estão condenados à miséria e a uma morte lenta
e dolorosa. O serviço que Moscou prestou é que aboliu completamente essas
668 Obras Escolhidas

favelas e deu aos trabalhadores a oportunidade de se mudarem de seus porões


e choupanas para os apartamentos e casas da burguesia e para as novas casas
confortáveis que foram construídas pelas autoridades soviéticas.
Por fim, o serviço que Moscou presta é ser o arauto da luta por uma paz
duradoura e a amizade entre as nações, o arauto da luta contra os incendiários
de uma nova guerra. Para os imperialistas, a guerra é o empreendimento mais
lucrativo. Não é surpreendente que os agentes do imperialismo estejam tentando,
de “uma forma ou de outra, provocar uma nova guerra”. O serviço que Moscou
presta é expor incessantemente os incendiários de uma nova guerra e reunir em
torno da bandeira da paz todas as nações amantes da paz. É do conhecimento
geral que as nações amantes da paz olham com esperança para Moscou como a
capital do grande poder amante da paz e como um poderoso baluarte da paz.
É por causa desses serviços que nosso país celebra hoje os 800 anos de Moscou
com tanto amor e reverência por sua capital.
Viva nossa poderosa, amada, soviética e socialista Moscou!
J. Stalin
J. V. Stalin 669

Paz na Coréia
(Resposta ao Primeiro Ministro da Índia, Pandit Jawaharlal Nehru, em cone-
xão com suas propostas para assentar os representantes do Governo Popular da
China no Conselho de Segurança da ONU e a “cessação do conflito” na Coreia)

15 de julho de 1950

Congratulo-me com sua iniciativa pacífica. Compartilho inteiramente seu


ponto de vista quanto à conveniência de uma regulamentação pacífica da ques-
tão coreana por meio do Conselho de Segurança, com a participação obrigatória
de representantes das cinco grandes potências, incluindo o Governo Popular da
China. Acredito que, para uma solução rápida da questão coreana, seria conve-
niente ouvir representantes do povo coreano no Conselho de Segurança.
670 Obras Escolhidas

Carta de resposta ao Presidente do


Gabinete de Ministros da República
Democrática Popular da Coréia,
Kim Il-Sung
(Sobre a questão do estabelecimento de relações diplomáticas e econômicas entre a URSS
e a República Democrática do Povo da Coreia)

12 de outubro de 1948

Ao Sr. Kim Il-Sung, Presidente do Gabinete de Ministros da República De-


mocrática Popular da Coreia.
Confirmo que recebi a sua carta de 8 de outubro, na qual nos informa que
o Governo da República Democrática do Povo Coreano se empenha no cumpri-
mento do seu dever e se propõe a estabelecer relações diplomáticas com a URSS
para a troca de embaixadores que também cumpram o estabelecimento de rela-
ções econômicas entre os dois estados.
O governo soviético, que defende o direito do povo coreano de iniciar a cons-
trução de um Estado unido e independente, saúda o estabelecimento do governo
coreano e deseja-lhes sucesso em seu trabalho pelo renascimento nacional e pelo
desenvolvimento democrático da Coreia. O governo soviético declara-se disposto
a estabelecer relações diplomáticas entre a URSS e a República Democrática do
Povo Coreano, a trocar embaixadores e a estabelecer imediatamente relações
econômicas complementares.
J. Stalin
Pravda,
13 de outubro de 1948
J. V. Stalin 671

Proibição de Armas Atômicas


Entrevista com o correspondente do Pravda

06 de outubro de 1951

Pravda: Qual é sua opinião sobre o rebuliço levantado recentemente na im-


prensa estrangeira em conexão com o teste de uma bomba atômica na União
Soviética?
Stalin: Na verdade, um dos tipos de bombas atômicas foi testado recente-
mente em nosso país. Futuramente também serão realizados testes de bombas
atômicas de diferentes calibres, de acordo com o plano de defesa de nosso país
dos ataques do bloco agressivo anglo-americano.
Pravda: Em conexão com o teste da bomba atômica, vários indivíduos nos Es-
tados Unidos estão alertando e gritando sobre a ameaça à segurança dos Estados
Unidos. Existe algum motivo para tal alarme?
Stalin: Não há motivos para tal alarme. Os indivíduos dos Estados Unidos
não podem deixar de saber que a União Soviética não só se opõe ao emprego da
arma atômica, mas também defende sua proibição e o fim de sua produção. É
sabido que a União Soviética várias vezes exigiu a proibição da arma atômica, mas
todas as vezes isso foi recusado pelas potências do bloco atlântico. Isso significa
que, em caso de ataque dos Estados Unidos a nosso país, os círculos dirigentes
dos Estados Unidos usarão a bomba atômica. É esta circunstância que obrigou
a União Soviética a dispor da arma atômica para enfrentar os agressores total-
mente preparada. É claro que os agressores querem que a União Soviética fique
desarmada no caso de um ataque contra ela. A União Soviética, porém, não con-
corda com isso e pensa que deveria estar totalmente preparada para enfrentar o
agressor. Consequentemente, se os Estados Unidos não têm a intenção de atacar
a União Soviética, o alarme dos indivíduos nos Estados Unidos deve ser consi-
derado inútil e falso, porque a União Soviética não pensa em atacar os Estados
Unidos ou qualquer outro país.
Indivíduos nos Estados Unidos estão aborrecidos porque o segredo da bomba
atômica não é possuído apenas pelos Estados Unidos, mas também por outros
países, principalmente a União Soviética. Eles gostariam que os Estados Unidos
fossem o monopolista da produção da bomba atômica. Eles gostariam que os
Estados Unidos tivessem poder ilimitado para intimidar e chantagear outros paí-
ses. Mas com base em que eles pensam assim? Com que direito os interesses de
preservar a paz exigem tal monopólio? Não seria mais correto dizer que as coisas
são exatamente o oposto, que são os interesses de preservar a paz que requerem
antes de tudo a liquidação de tal monopólio e depois a proibição incondicional
da arma atômica também? Acho que os proponentes da bomba atômica podem
concordar com a proibição da arma atômica apenas se virem que não são mais
monopolistas.
Pravda: Qual a sua opinião sobre o controle internacional das armas atômi-
cas?
672 Obras Escolhidas

Stalin: A União Soviética defende a proibição da arma atômica e o fim da


produção da arma atômica. A União Soviética defende o estabelecimento de
controle internacional sobre a implementação totalmente exata e cuidadosa da
decisão de proibir a arma atômica, de encerrar a produção da arma atômica e
de utilizar as bombas atômicas já produzidas exclusivamente para fins civis. A
União Soviética representa exatamente esse tipo de controle internacional. Os
indivíduos americanos também falam em controle, mas seu controle pressupõe
não o término da produção da arma atômica, mas a continuação dessa produção
em quantidades conforme as quantidades de matéria-prima à disposição dos di-
ferentes países. Consequentemente, o controle americano pressupõe não proibir
a arma atômica, mas torná-la legal e lícita. Desse modo, o direito dos fomentado-
res da guerra de aniquilar dezenas e centenas de milhares de habitantes pacíficos
com a ajuda da arma atômica torna-se legítimo. Não é difícil compreender que
isso não é controle, mas uma zombaria do controle e um engano das aspirações
pacíficas dos povos. É claro que tal controle não pode satisfazer os povos amantes
da paz que exigem a proibição da arma atômica e o fim de sua produção.
J. V. Stalin 673

Problemas econômicos do
socialismo na URSS
(Aos participantes da discussão econômica)

28 de setembro de 1952

Comentários sobre questões econômicas


relacionadas à discussão de novembro de 1951
Recebi todo o material sobre a discussão econômica preparada para avaliar o
rascunho do livro didático sobre economia política. O material recebido inclui
as “Propostas para o Aperfeiçoamento do Projeto de Livro Didático de Economia
Política”, “Propostas para a Eliminação de Erros e Imprecisões” no anteprojeto
e o “Memorando sobre Assuntos Disputados”.
Sobre todos esses materiais, bem como sobre a minuta do livro didático, con-
sidero necessário fazer as seguintes observações.

I. O caráter das leis econômicas no socialismo

Alguns camaradas negam o caráter objetivo das leis da ciência, e das leis da
economia política em particular, sob o socialismo. Eles negam que as leis da
economia política refletem processos governados por leis que operam indepen-
dentemente da vontade do homem. Eles acreditam que, em vista do papel espe-
cífico atribuído ao Estado soviético pela história, o Estado soviético e seus líderes
podem abolir as leis existentes de economia política e podem “formar”, “criar”
novas leis.
Esses camaradas estão profundamente enganados. É evidente que eles con-
fundem as leis da ciência, que refletem processos objetivos na natureza ou na
sociedade, processos que ocorrem independentemente da vontade do homem,
com as leis que são emitidas pelos governos, que são feitas pela vontade do ho-
mem, e que têm apenas validade jurídica. Mas eles não devem ser confundidos.
O marxismo considera as leis da ciência – sejam elas leis da ciência natural
ou da economia política – como o reflexo de processos objetivos que ocorrem
independentemente da vontade do homem. O homem pode descobrir essas leis,
conhecê-las, estudá-las, considerá-las em suas atividades e utilizá-las no interesse
da sociedade, mas não pode mudá-las ou aboli-las. Muito menos pode ele formar
ou criar novas leis da ciência.
Isso significa, por exemplo, que os resultados da ação das leis da natureza,
os resultados da ação das forças da natureza, são geralmente inevitáveis, que a
ação destrutiva das forças da natureza sempre e em toda parte prossegue com um
elemental e poder inexorável que não cede à influência do homem? Não, não
tem. Deixando de lado processos astronômicos, geológicos e outros semelhantes,
674 Obras Escolhidas

que o homem realmente não tem poder de influenciar, mesmo que tenha conhe-
cido as leis de seu desenvolvimento, em muitos outros casos o homem está muito
longe de ser impotente, no sentido de poder influenciar os processos da natureza.
Em todos esses casos, tendo vindo a conhecer as leis da natureza, contando com
elas e contando com elas, e aplicando-as e utilizando-as de forma inteligente, o
homem pode restringir sua esfera de ação e pode dar uma direção diferente às
forças destrutivas da natureza e converter para o uso da sociedade.
Para dar um dos vários exemplos. Antigamente, o transbordamento de gran-
des rios, enchentes e a consequente destruição de casas e plantações eram consi-
derados uma calamidade inevitável, contra a qual o homem era impotente. Mas
com o passar do tempo e o desenvolvimento do conhecimento humano, quando o
homem aprendeu a construir represas e usinas hidroelétricas, tornou-se possível
proteger a sociedade da calamidade das enchentes que antes pareciam inevitável.
Mais, o homem aprendeu a conter as forças destrutivas da natureza, a aproveitá-
las, por assim dizer, a converter a força da água para o uso da sociedade e a
utilizá-la para a irrigação dos campos e a geração de energia.
Isso significa que o homem, com isso, aboliu as leis da natureza, as leis da
ciência, e criou novas leis da natureza, novas leis da ciência? Não, não tem. O
fato é que todo esse procedimento de afastar a ação das forças destrutivas da
água e de utilizá-las no interesse da sociedade ocorre sem qualquer violação,
alteração ou abolição das leis científicas ou a criação de novas leis científicas. Ao
contrário, todo esse procedimento é efetuado em conformidade precisa com as
leis da natureza e as leis da ciência, uma vez que qualquer violação, mesmo a
mais leve, das leis da natureza só perturbaria as coisas e tornaria o procedimento
fútil.
O mesmo deve ser dito das leis do desenvolvimento econômico, as leis da eco-
nomia política - seja no período do capitalismo ou no período do socialismo.
Aqui, também, as leis do desenvolvimento econômico, como no caso das ciências
naturais, são leis objetivas, refletindo processos de desenvolvimento econômico
que ocorrem independentemente da vontade do homem. O homem pode desco-
brir essas leis, conhecê-las e, com base nelas, utilizá-las no interesse da sociedade,
dar uma direção diferente à ação destrutiva de algumas das leis, restringir sua
esfera de ação e permitir um escopo mais amplo a outras leis que estão forçando
seu caminho para a frente; mas ele não pode destruí-los ou criar novas leis econô-
micas.
Uma das características distintivas da economia política é que suas leis, ao
contrário das ciências naturais, são impermanentes, que elas, ou pelo menos a
maioria delas, operam por um período histórico definido, após o qual dão lugar
a novas leis. No entanto, essas leis não são abolidas, mas perdem sua validade
devido às novas condições econômicas e saem de cena para dar lugar a novas
leis, leis que não são criadas pela vontade do homem, mas que surgem das novas
condições econômicas.
Faz-se referência ao Anti-Dühring de Engels, à sua fórmula que diz que, com
a abolição do capitalismo e a socialização dos meios de produção, o homem ob-
terá o controle de seus meios de produção, que será libertado do jugo das relações
sociais e econômicas e se tornar o “senhor” de sua vida social. Engels chama essa
J. V. Stalin 675

liberdade de “apreciação da necessidade”. E o que pode significar esta “apreci-


ação da necessidade”280 ? Significa que, conhecendo as leis objetivas (“necessi-
dade”), o homem as aplicará com plena consciência no interesse da sociedade. É
por isso que Engels diz no mesmo livro:
“As leis de sua própria ação social, até agora estando face a face com
o homem como leis da natureza estranhas e dominando-o, serão então
usadas com plena compreensão, e assim dominadas por ele.” 281
Como vemos, a fórmula de Engels não fala absolutamente a favor daqueles
que pensam que sob o socialismo as leis econômicas existentes podem ser abolidas
e novas criadas. Ao contrário, exige não a abolição, mas a compreensão das leis
econômicas e sua aplicação inteligente.
Diz-se que as leis econômicas têm um caráter elementar, que sua ação é ine-
vitáveis e que a sociedade é impotente contra elas. Isso não é verdade. É fazer
das leis um fetiche e tornar-se escravo das leis. Foi demonstrado que a sociedade
não é impotente contra as leis, que, conhecendo as leis econômicas e contando
com elas, a sociedade pode restringir sua esfera de ação, utilizá-las no interesse
da sociedade e “aproveitá-las”, assim como no caso das forças da natureza e suas
leis, assim como no caso do transbordamento de grandes rios citado na ilustração
acima.
É feita referência ao papel específico do governo soviético na construção do
socialismo, que supostamente lhe permite abolir as leis existentes de desenvolvi-
mento econômico e “formar” novas. Isso também não é verdade.
O papel específico do governo soviético era devido a duas circunstâncias: pri-
meiro, o que o governo soviético tinha que fazer não era substituir uma forma
de exploração por outra, como era o caso nas revoluções anteriores, mas abolir
totalmente a exploração; segundo, que em vista da ausência no país de quaisquer
rudimentos pré-fabricados de uma economia socialista, ela teve que criar novas
formas de economia socialista, “começando do zero”, por assim dizer.
Essa foi, sem dúvida, uma tarefa difícil, complexa e sem precedentes. No
entanto, o governo soviético cumpriu essa tarefa com crédito. Mas o fez não por-
que supostamente destruiu as leis econômicas existentes e “formou” novas, mas
apenas porque se baseou na lei econômica de que as relações de produção devem
necessariamente conformar-se com o caráter das forças produtivas. As forças
produtivas do nosso país, especialmente na indústria, eram de caráter social, a
forma de propriedade, por outro lado, era privada, capitalista. Baseando-se na
lei econômica de que as relações de produção devem necessariamente estar em
conformidade com o caráter das forças produtivas, o governo soviético socializou
os meios de produção, tornou-os propriedade de todo o povo e, assim, aboliu
o sistema de exploração e criou formas socialistas de economia. Se não fosse
por essa lei, e se o governo soviético não tivesse confiado nela, não poderia ter
cumprido sua missão.
A lei econômica de que as relações de produção devem necessariamente estar
de acordo com o caráter das forças produtivas há muito vem forçando seu ca-
280 Friedrich Engels, Anti-Dühring, ed. em inglês, Editora de Línguas Estrangeiras, Moscou, 1954,
p. 158.
281 Ibid., pp. 392-93.
676 Obras Escolhidas

minho para a vanguarda nos países capitalistas. Se até agora ele não conseguiu
abrir caminho à força, é porque está encontrando uma forte resistência por parte
de forças obsoletas da sociedade. Aqui temos outra característica distintiva das
leis econômicas. Ao contrário das leis das ciências naturais, onde a descoberta
e aplicação de uma nova lei ocorre mais ou menos suavemente, a descoberta e
aplicação de uma nova lei no campo econômico, afetando os interesses de for-
ças obsoletas da sociedade, encontra-se com o a mais poderosa resistência de sua
parte. Uma força, uma força social, capaz de superar essa resistência, é necessá-
ria. Em nosso país, tal força era a aliança da classe operária e do campesinato,
que representava a esmagadora maioria da sociedade. Não existe tal força ainda
em outros países capitalistas. Isso explica o segredo por que o governo soviético
foi capaz de esmagar as velhas forças da sociedade, e por que em nosso país a lei
econômica de que as relações de produção devem necessariamente conformar-se
com o caráter das forças produtivas recebeu todo o alcance.
Diz-se que a necessidade de um desenvolvimento equilibrado (proporcional)
da economia nacional em nosso país permite ao governo soviético abolir as leis
econômicas existentes e criar novas. Isso é absolutamente falso. Nossos planos
anuais e quinquenais não devem ser confundidos com a lei econômica objetiva
do desenvolvimento equilibrado e proporcional da economia nacional. A lei do
desenvolvimento equilibrado da economia nacional surgiu em oposição à lei da
competição e da anarquia da produção sob o capitalismo. Surgiu da socializa-
ção dos meios de produção, depois que a lei da concorrência e a anarquia da
produção perderam sua validade. Tornou-se operacional porque uma economia
socialista só pode ser conduzida com base na lei econômica do desenvolvimento
equilibrado da economia nacional. Isso significa que a lei do desenvolvimento
equilibrado da economia nacional permite que nossos órgãos de planejamento
planejem corretamente a produção social. Mas a possibilidade não deve ser con-
fundida com a realidade. São duas coisas diferentes. Para transformar a possibili-
dade em realidade, é necessário estudar esta lei econômica, dominá-la, aprender
a aplicá-la com plena compreensão e a compilar planos que reflitam plenamente
os requisitos desta lei. Não se pode dizer que os requisitos desta lei econômica
estão plenamente refletidos em nossos planos anuais e quinquenais.
Diz-se que algumas das leis econômicas que operam em nosso país sob o socia-
lismo, incluindo a lei do valor, foram “transformadas”, ou mesmo “radicalmente
transformadas”, com base na economia planejada. Isso também não é verdade.
As leis não podem ser “transformadas”, ainda menos “radicalmente” transfor-
madas. Se eles podem ser transformados, eles podem ser abolidos e substituídos
por outras leis. A tese de que as leis podem ser “transformadas” é uma relíquia
da fórmula incorreta de que as leis podem ser “abolidas” ou “formadas”. Em-
bora a fórmula de que as leis econômicas podem ser transformadas já exista em
nosso país há muito tempo, ela deve ser abandonada por uma questão de preci-
são. A esfera de ação desta ou daquela lei econômica pode ser restringida, sua
ação destrutiva – isto é, se é passível de ser destrutiva - pode ser evitada, mas não
pode ser “transformada” ou “abolida”.
Dessa forma, quando falamos em “subjugar” as forças naturais ou econômicas,
em “dominá-las”, etc., isso não significa que o homem possa “abolir” ou “formar”
leis científicas. Pelo contrário, significa apenas que o homem pode descobrir as
J. V. Stalin 677

leis, conhecê-las e dominá-las, aprender a aplicá-las com plena compreensão,


utilizá-las no interesse da sociedade e, assim, subjugá-las, assegurar o domínio
sobre elas.
Consequentemente, as leis da economia política sob o socialismo são leis obje-
tivas, que refletem o fato de que os processos da vida econômica são governados
por leis e operam independentemente de nossa vontade. Quem nega esse pos-
tulado está, na verdade, negando a ciência e, ao negar a ciência, está negando
toda possibilidade de prognóstico – e, assim, está negando a possibilidade de
direcionar a atividade econômica.
Pode ser que ele diga que tudo isso é correto e geralmente conhecido; mas que
não há nada de novo nisso, e que, portanto, não vale a pena perder tempo reite-
rando verdades geralmente conhecidas. Claro, não há realmente nada de novo
nisso; mas seria um erro pensar que não vale a pena perder tempo reiterando
certas verdades que conhecemos bem. O fato é que nós, o núcleo dirigente, nos
juntamos a cada ano milhares de novas e jovens forças que estão ardentemente de-
sejosas de nos ajudar e ardentemente desejosas de provar seu valor, mas que não
possuem uma educação marxista adequada, não estão familiarizados com mui-
tos verdades que são bem conhecidas por nós e, portanto, compelidas a tatear na
escuridão. Eles ficam pasmos com as conquistas colossais do governo soviético,
ficam deslumbrados com os sucessos extraordinários do sistema soviético e come-
çam a imaginar que o governo soviético pode “fazer qualquer coisa”, que “nada
está além disso”, que pode abolir a ciência leis e formar novas. O que devemos
fazer com esses camaradas? Como devemos educá-los no marxismo-leninismo?
Acho que a reiteração sistemática e a explicação paciente das chamadas verdades
“geralmente conhecidas” é um dos melhores métodos de educar esses camaradas
no marxismo.

II. A produção mercantil no socialismo

Certos camaradas afirmam que o Partido agiu erradamente ao preservar a


produção mercantil depois de ter assumido o poder e nacionalizado os meios
de produção em nosso país. Eles consideram que o Partido deveria ter banido a
produção de mercadorias naquele momento. A este respeito, citam Engels, que
afirma:
“Com a apreensão dos meios de produção pela sociedade, cessa-se a produção
de mercadorias e, simultaneamente, o domínio do produto sobre o produtor”.
282

Esses camaradas estão profundamente enganados.


Vamos examinar a fórmula de Engels. A fórmula de Engels não pode ser
considerada totalmente clara e precisa, pois não indica se refere-se à apreensão
pela sociedade de todos ou apenas parte dos meios de produção, ou seja, se todos
ou apenas parte dos meios de produção são convertidos em propriedade pública.
Portanto, esta fórmula de Engels pode ser entendida de qualquer maneira.
Em outra parte do Anti-Dühring, Engels fala em dominar “todos os meios de
produção”, em tomar posse de “todos os meios de produção”. Portanto, nesta
282 Ibid., pp. 392.
678 Obras Escolhidas

fórmula Engels tem em mente a nacionalização não de parte, mas de todos os


meios de produção, ou seja, a conversão em propriedade pública dos meios de
produção não só da indústria, mas também da agricultura.
Daí decorre que Engels tem em mente países onde o capitalismo e a concentra-
ção da produção avançaram o suficiente tanto na indústria quanto na agricultura
para permitir a expropriação de todos os meios de produção do país e sua con-
versão em propriedade pública. Engels, portanto, considera que, nesses países,
paralelamente à socialização de todos os meios de produção, deve-se acabar com
a produção mercantil. E isso, é claro, está correto.
Havia apenas um país assim no final do século passado, quando o Anti-Dühring
foi publicado – a Grã-Bretanha. Nela o desenvolvimento do capitalismo e a con-
centração da produção tanto na indústria como na agricultura chegaram a tal
ponto que teria sido possível, em caso de tomada do poder pelo proletariado,
converter todos os meios de produção do país em propriedade pública e acabar
com a produção de mercadorias.
Deixo de lado, neste caso, a questão da importância do comércio exterior para
a Grã-Bretanha e o vasto papel que ele desempenha em sua economia nacional.
Penso que só depois de uma investigação desta questão pode ser finalmente de-
cidido qual seria o futuro da produção de mercadorias na Grã-Bretanha depois
que o proletariado assumisse o poder e todos os meios de produção tivessem sido
nacionalizados.
No entanto, não apenas no final do século passado, mas também hoje, ne-
nhum país atingiu tal grau de desenvolvimento do capitalismo e concentração da
produção na agricultura como se observa na Grã-Bretanha. Quanto aos outros
países, apesar do desenvolvimento do capitalismo no campo, ainda contam com
uma classe bastante numerosa de pequenos e médios produtores-proprietários
rurais, cujo futuro teria que ser decidido se o proletariado chegasse ao poder.
Mas aqui está uma questão: o que o proletariado e seu partido devem fazer
nos países, sendo o nosso caso, que as condições são favoráveis para a tomada
do poder pelo proletariado e a derrubada do capitalismo, onde o capitalismo
tanto concentrou o meios de produção na indústria que possam ser expropria-
dos e tornados propriedade da sociedade, mas onde a agricultura, não obstante
o crescimento do capitalismo, é dividida entre numerosos pequenos e médios
produtores-proprietários a tal ponto que torna impossível considerar o desapro-
priação desses produtores?
A fórmula de Engels não fornece uma resposta a esta questão. Aliás, não
deveria fornecer uma resposta, uma vez que a fórmula surgiu de outra questão,
a saber, qual deveria ser o destino da produção de mercadorias depois de todos
os meios de produção terem sido socializados.
E assim, o que deve ser feito se não todos, mas apenas parte dos meios de
produção foram socializados, mas as condições são favoráveis para a tomada do
poder pelo proletariado – deveria o proletariado assumir o poder e a produção
de mercadorias ser abolida imediatamente depois disso?
Não podemos, é claro, considerar como uma resposta a opinião de certos
marxistas mal-acabados que acreditam que, sob tais condições, a coisa a fazer é
deixar de tomar o poder e esperar até que o capitalismo consiga arruinar os mi-
J. V. Stalin 679

lhões de pequenos e médios produtores, convertendo-os em trabalhadores rurais


e concentrando os meios de produção na agricultura, e que só depois disso seria
possível considerar a tomada do poder pelo proletariado e a socialização de todos
os meios de produção. Naturalmente, essa é uma “solução” que os marxistas não
podem aceitar, a menos que queiram se envergonhar completamente.
Tampouco podemos considerar como resposta a opinião de outros marxis-
tas mal-acabados, que pensam que o que se deve fazer seria assumir o poder e
expropriar os pequenos e médios produtores rurais e socializar seus meios de
produção. Os marxistas também não podem adotar essa linha criminosa e sem
sentido, porque isso destruiria todas as chances de vitória da revolução proletária
e por muito tempo lançaria o campesinato no campo dos inimigos do proletari-
ado.
A resposta a esta pergunta foi dada por Lenin em seus escritos sobre o “im-
posto em espécie” e em seu célebre “plano cooperativo”.
A resposta de Lenin pode ser resumida da seguinte forma:
a) As condições favoráveis para a assunção do poder não devem ser perdidas
– o proletariado deve assumir o poder sem esperar até que o capitalismo consiga
arruinar os milhões de pequenos e médios produtores individuais;
b) Os meios de produção da indústria devem ser desapropriados e convertidos
em propriedade pública;
c) Quanto aos pequenos e médios produtores individuais, devem ser grada-
tivamente reunidos em cooperativas de produtores, ou seja, em grandes empre-
endimentos agrícolas, fazendas coletivas;
d) A indústria deve desenvolver-se ao máximo e os kolkhozes assentam na mo-
derna base técnica da grande produção, não expropriando-os, mas, pelo con-
trário, abastecendo-os generosamente com tratores de primeira classe e outras
máquinas;
e) Para garantir o vínculo econômico entre cidade e campo, entre indústria
e agricultura, a produção mercantil (troca pela compra e venda) deve ser preser-
vada por um certo período, sendo a forma de vínculo econômico com a cidade
que é a única aceitável para os camponeses, e o comércio soviético – estatal, coo-
perativo e de fazendas coletivas – deveria ser desenvolvido ao máximo e os capita-
listas de todos os tipos e descrições deveriam ser expulsos da atividade comercial.
A história da construção socialista em nosso país mostrou que esse caminho
de desenvolvimento traçado por Lenin se justificou plenamente.
Não pode haver dúvida de que no caso de todos os países capitalistas com uma
classe mais ou menos numerosa de pequenos e médios produtores, este caminho
de desenvolvimento é o único possível e conveniente para a vitória do socialismo.
É dito que a produção de mercadorias deve levar, está fadada a levar, ao ca-
pitalismo da mesma forma, em todas as condições. Isso não é verdade. Nem
sempre e nem em todas as condições! A produção de mercadorias não deve ser
identificada com a produção capitalista. São duas coisas diferentes. A produção
capitalista é a forma mais elevada de produção de mercadorias. A produção de
mercadorias leva ao capitalismo apenas se houver propriedade privada dos meios
de produção, se a força de trabalho aparecer no mercado como uma mercadoria
680 Obras Escolhidas

que pode ser comprada pelo capitalista e explorada no processo de produção,


e se, consequentemente, o sistema de exploração de trabalhadores assalariados
pelos capitalistas existe no país. A produção capitalista começa quando os meios
de produção estão concentrados nas mãos privadas e quando os trabalhadores
ficam sem meios de produção e são obrigados a vender sua força de trabalho
como mercadoria. Sem isso, não existe produção capitalista.
Bem, e o que fazer se as condições para a conversão da produção mercantil
em produção capitalista não existirem, se os meios de produção não forem mais
privados, mas sim propriedade socialista, se o sistema de trabalho assalariado
não existir mais e a força de trabalho for deixou de ser uma mercadoria, e se
o sistema de exploração há muito foi abolido - pode-se considerar então que a
produção de mercadorias levará ao capitalismo da mesma forma? Não, eu não
posso. No entanto, a nossa é precisamente essa sociedade, uma sociedade onde
a propriedade privada dos meios de produção, o sistema de trabalho assalariado
e o sistema de exploração há muito deixaram de existir.
A produção mercantil não deve ser considerada como algo suficiente em si
mesma, algo independente das condições econômicas circundantes. A produção
mercantil é mais antiga do que a produção capitalista. Existiu em uma sociedade
escravista e serviu a ela, mas não levou ao capitalismo. Existiu na sociedade feu-
dal e serviu-a; no entanto, embora tenha preparado algumas das condições para
a produção capitalista, não conduziu ao capitalismo. Por que então, pergunta-
se, a produção de mercadorias não pode servir à nossa sociedade socialista por
um certo período sem levar ao capitalismo, tendo em mente que em nosso país a
produção de mercadorias não é tão ilimitada e abrangente como sob as condições
capitalistas, estando confinada dentro limites estritos graças a condições econô-
micas decisivas como a propriedade social dos meios de produção, a abolição do
sistema de trabalho assalariado e a eliminação do sistema de exploração?
Diz-se que, desde que se estabeleceu em nosso país o domínio da propriedade
social dos meios de produção e se aboliu o sistema de trabalho assalariado e de
exploração, a produção mercantil perdeu todo o sentido e deve, portanto, ser
abolida.
Isso também não é verdade. Hoje existem duas formas básicas de produção
socialista em nosso país: a produção estatal, ou propriedade pública, e a pro-
dução de fazendas coletivas, que não pode ser considerada propriedade pública.
Nas empresas estatais, os meios de produção e o produto da produção são pro-
priedade nacional. Na fazenda coletiva, embora os meios de produção (terra,
máquinas) pertençam ao Estado, o produto da produção é propriedade das di-
ferentes fazendas coletivas, uma vez que a mão de obra, assim como a semente, é
sua, enquanto a as terras, que foram entregues às fazendas coletivas em regime de
posse perpétua, são por elas utilizadas praticamente como propriedade própria,
apesar de não poderem vender, comprar, arrendar ou hipotecar.
O efeito disso é que o Estado dispõe apenas do produto das empresas esta-
tais, enquanto o produto das fazendas coletivas, sendo sua propriedade, está a
disposição apenas para elas. Mas as fazendas coletivas não estão dispostas a alie-
nar seus produtos, exceto na forma de mercadorias, em troca das quais desejam
receber as mercadorias de que precisam. Atualmente as fazendas coletivas não
J. V. Stalin 681

reconhecerão nenhuma outra relação econômica com a cidade, exceto a relação


mercantil – troca por meio de compra e venda. Por causa disso, a produção e o
comércio de mercadorias são tão necessários para nós hoje quanto o eram, di-
gamos, trinta anos atrás, quando Lenin falou da necessidade de desenvolver o
comércio ao máximo.
É claro que quando, em vez dos dois setores básicos de produção, o setor es-
tatal e o setor da fazenda coletiva, houver um único setor produtivo abrangente,
com direito a dispor de todos os bens de consumo produzidos no país, a circu-
lação de mercadorias, com a sua “economia monetária”, irá desaparecer, por ser
um elemento desnecessário na economia nacional. Mas enquanto este não for
o caso, enquanto os dois setores básicos de produção permanecerem, a produ-
ção de mercadorias e a circulação de mercadorias devem permanecer em vigor,
como um elemento necessário e muito útil em nosso sistema de economia nacio-
nal. Como se dará a formação de um setor único e unido, seja simplesmente pela
incorporação do setor da fazenda coletiva pelo setor estatal – o que dificilmente
será (porque isso seria visto como a desapropriação das fazendas coletivas) – ou
pela constituição de um único órgão econômico nacional (composto por repre-
sentantes da indústria estadual e das fazendas coletivas), com o direito de, ini-
cialmente, contabilizar todos os produtos de consumo do país, e eventualmente
também distribuí-los, por via, digamos, de troca de produtos – é uma questão
especial que requer discussão separada.
Consequentemente, nossa produção de mercadorias não é do tipo comum,
mas é um tipo especial de produção de mercadorias, produção de mercadorias
sem capitalistas, que se preocupa principalmente com os bens dos produtores
socialistas associados (o Estado, as fazendas coletivas, as cooperativas), cuja es-
fera de atuação está confinada a itens de consumo pessoal, que obviamente não
podem se desenvolver em produção capitalista, e que, juntamente com sua “eco-
nomia monetária”, é projetada para servir ao desenvolvimento e consolidação da
produção socialista.
Totalmente enganados, portanto, estão aqueles camaradas que alegam que,
uma vez que a sociedade socialista não aboliu as formas mercantis de produção,
estamos fadados a ter o reaparecimento de todas as categorias econômicas carac-
terísticas do capitalismo: a força de trabalho como mercadoria, a mais-valia, o
capital, o lucro capitalista, a taxa média de lucro, etc. Esses camaradas confun-
dem a produção de mercadorias com a produção capitalista e acreditam que, uma
vez que haja produção de mercadorias, também deve haver produção capitalista.
Eles não percebem que nossa produção de mercadorias difere radicalmente da
produção de mercadorias sob o capitalismo.
Além disso, acho que devemos também descartar alguns outros conceitos reti-
rados do Capital de Marx – onde Marx se preocupava com uma análise do capita-
lismo – que artificialmente são aplicados às nossas relações socialistas. Refiro-me
a tais conceitos, entre outros, como trabalho “necessário” e “excedente”, produto
“necessário” e “excedente”, tempo “necessário” e “excedente”. Marx analisou o
capitalismo a fim de elucidar a fonte de exploração da classe trabalhadora – a
mais-valia – e entregar à classe trabalhadora, que não tinha os meios de produ-
ção, uma arma intelectual para a derrubada do capitalismo. É natural que Marx
682 Obras Escolhidas

usasse conceitos (categorias) que correspondiam totalmente às relações capitalis-


tas. Mas é estranho, para dizer o mínimo, usar esses conceitos agora, quando
a classe trabalhadora não só não está privada de poder e meios de produção,
mas, pelo contrário, está na posse do poder e controla os meios de produção.
Sob nosso sistema, falar sobre a força de trabalho ser uma mercadoria e sobre
a “contratação” de trabalhadores parece um tanto absurdo agora: como se a
classe trabalhadora, que possui meios de produção, compre e venda sua força
de trabalho para si mesma. É tão estranho falar agora de trabalho “necessário”
e “excedente”: como se, em nossas condições, o trabalho aportado pelos traba-
lhadores à sociedade para a extensão da produção, a promoção da educação e
da saúde pública, a organização do defesa, e além, não é tão necessário para a
classe trabalhadora, agora no poder, quanto o trabalho despendido para suprir
as necessidades pessoais do trabalhador e de sua família.
Deve-se notar que em seu Crítica do Programa de Gotha, onde não é mais o capi-
talismo que ele investiga, mas, entre outras coisas, a primeira fase da sociedade
comunista, Marx reconhece que o trabalho contribuiu com a sociedade para a
extensão da produção, para a educação e saúde pública, para despesas adminis-
trativas, formação de reservas, e além, para ser tão necessária quanto a mão de
obra empregada para suprir as necessidades de consumo da classe trabalhadora.
Penso que os nossos economistas deveriam pôr fim a esta incongruência en-
tre os antigos conceitos e o novo estado de coisas no nosso país socialista, substi-
tuindo os antigos conceitos por novos que correspondam à nova situação.
Poderíamos tolerar essa incongruência por um certo período, mas chegou a
hora de acabar com isso.

III. A lei do valor no socialismo

Às vezes é perguntado se a lei do valor existe e opera em nosso país, sob o


sistema socialista.
Sim, existe e funciona. Onde quer que existam mercadorias e produção de
mercadorias, aí também existirá a lei do valor.
Em nosso país, a esfera de atuação da lei do valor se estende, em primeiro
lugar, à circulação de mercadorias, à troca de mercadorias por meio da compra
e venda, a troca, principalmente, de artigos de consumo pessoal. Aqui, nesta
esfera, a lei do valor preserva, dentro de certos limites, é claro, a função de um
regulador.
Mas a aplicação da lei do valor não está confinada à esfera da circulação de
mercadorias. Também se estende à produção. É verdade que na nossa produção
socialista a lei do valor não tem função reguladora, mas influencia a produção,
e esse fato não pode ser ignorado ao dirigir a produção. Na realidade, os bens
de consumo, necessários para compensar a força de trabalho despendida no pro-
cesso de produção, são produzidos e realizados em nosso país como mercadorias
submetidas à aplicação da lei do valor. É precisamente aqui que a lei do va-
lor exerce sua influência na produção. Nesse sentido, aspectos como o cálculo
econômico e a lucratividade, os custos de produção, preços, e mais, são de real
importância em nossas empresas. Consequentemente, nossas empresas não po-
J. V. Stalin 683

dem, e não devem, funcionar sem levar em conta a lei do valor.


Isto é bom? Não é ruim. Nas condições atuais, realmente não é ruim, já que
treina nossos camaradas que trabalham com o domínio da economia para con-
duzir a produção de forma racional e os disciplina. Não é ruim porque ensina
nossos dirigentes a calcular as magnitudes da produção, calculá-las com preci-
são e também ter em conta as coisas reais na produção com precisão, e não falar
bobagens sobre “números aproximados”, frutos de sua imaginação. Não é ruim
porque ensina nossos dirigentes a procurar, encontrar e utilizar as reservas ocul-
tas latentes na produção, e não passar por cima delas. Não é ruim porque ensina
nossos dirigentes a melhorar sistematicamente os métodos de produção, a redu-
zir seus custos, a praticar a contabilidade de custos e a manter suas empresas
rentáveis. É uma boa escola prática, que acelera o desenvolvimento de nossos
quadros da economia e seu crescimento em verdadeiros dirigentes da produção
socialista no estágio atual de desenvolvimento.
O problema não é que a produção em nosso país seja influenciada pela lei
do valor. O problema é que os dirigentes de nossa economia e os responsáveis
por sua planificação, com poucas exceções, estão mal familiarizados com as ope-
rações da lei do valor, não as estudam e são incapazes de considerá-las em seus
cálculos. Isso, de fato, explica a confusão que ainda reina na esfera da política
de preços. Trago um de muitos exemplos. Há algum tempo, decidiu-se ajustar
os preços do algodão e dos cereais no interesse da cultura algodoeira, estabele-
cer preços mais precisos para os cereais vendidos aos plantadores de algodão e
aumentar os preços do algodão entregue ao Estado. Nossos dirigentes e planeja-
dores apresentaram uma proposta nesse sentido que não deixou de surpreender
os membros do Comitê Central, pois sugeria fixar o preço de uma tonelada de
cereais praticamente no mesmo nível de uma tonelada de algodão e, ainda, o
preço de uma tonelada de cereais era considerado equivalente ao de uma tone-
lada de pão. Quando os membros do Comitê Central indicaram que o preço de
uma tonelada de pão deve ser superior ao de uma tonelada de cereais, devido
às despesas adicionais de moagem e cozimento, e que o algodão era geralmente
muito mais caro do que os cereais, como também foi confirmado por seus pre-
ços no mercado mundial, os autores da proposta não encontraram nada coerente
para dizer. O Comitê Central foi, portanto, obrigado a resolver o assunto com
suas próprias mãos, abaixar os preços dos cereais e aumentar os preços do algo-
dão. O que teria acontecido se a proposta desses camaradas tivesse entrado em
vigor? Teríamos arruinado os produtores de algodão e estaríamos sem algodão.
Mas isso quer dizer que a atuação da lei do valor tem tanto alcance em nosso
país quanto sob o capitalismo, e que é o regulador da nossa produção também?
Não, não quer dizer isso. Na verdade, a esfera de atuação da lei do valor em nosso
sistema econômico é estritamente circunscrita e enquadrada dentro de limites
definidos. Já foi dito que a esfera de produção de mercadorias é restringida e
colocada dentro de limites definidos por nosso sistema. O mesmo deve ser dito da
esfera de atuação da lei do valor. Sem dúvida, o fato de não existir propriedade
privada dos meios de produção e de os meios de produção na cidade e no campo
serem socializados não pode deixar de restringir a esfera de atuação da lei do
valor e a extensão de sua influência na produção.
684 Obras Escolhidas

Nessa mesma toada opera a lei do desenvolvimento harmônico (proporcio-


nal) da economia nacional, que superou a lei da competição e da anarquia da
produção.
Também nesse sentido operam os nossos planos anuais e quinquenais e toda
a nossa política económica no geral, que se baseiam nos requisitos da lei do de-
senvolvimento harmônico da economia nacional.
Tudo isso, considerado em conjunto, faz com que a esfera de atuação da lei
do valor em nosso país seja estritamente limitada e que a lei do valor não possa,
em nosso sistema, funcionar como reguladora da produção.
Isso, de fato, explica o fato “assombroso” de que enquanto em nosso país a lei
do valor, apesar da expansão ininterrupta e acelerada de nossa produção socia-
lista, não conduz a crises de superprodução, nos países capitalistas essa mesma
lei, cuja esfera de atuação é muito ampla, conduz, apesar da baixa taxa de ex-
pansão da produção, a crises periódicas de superprodução.
Diz-se que a lei do valor é uma lei constante, obrigatória a todos os períodos
do desenvolvimento histórico, e que, se perde a sua função de regulador das
relações de troca na segunda fase da sociedade comunista, mantém nesta fase
do desenvolvimento a sua função de regulador das relações entre os diversos
ramos de produção, como regulador da distribuição do trabalho entre os ramos
da produção.
Isso é totalmente falso. O valor, como a lei do valor, é uma categoria histórica
conectada à existência da produção de mercadorias. Com o desaparecimento da
produção de mercadorias, o valor e suas formas e a lei do valor também desapa-
recem.
Na segunda fase da sociedade comunista, a quantidade de trabalho empe-
nhado na produção de bens será medida não de forma indireta, através do valor
e suas formas, como é o caso na produção de mercadorias, mas direta e imedia-
tamente – pela quantidade de tempo, o número de horas, investido na produção
de bens. Quanto à distribuição do trabalho, sua distribuição entre os ramos de
produção não será regulada pela lei do valor, que nessa época terá deixado de
atuar, mas pelo crescimento da necessidade de bens da sociedade. Essa será uma
sociedade em que a produção será regulada pelas necessidades da sociedade, e
o cálculo dessas necessidades terá importância primordial para os órgãos de pla-
nificação.
Totalmente incorreta, também, é a afirmação de que sob nosso sistema econô-
mico atual, na primeira fase de desenvolvimento da sociedade comunista, a lei
do valor regula as “proporções” do trabalho distribuído entre os vários ramos de
produção.
Se isso fosse verdade, seria incompreensível por que nossas indústrias leves,
que são as mais lucrativas, não estão sendo desenvolvidas ao máximo, e por que
a preferência é dada às nossas indústrias pesadas, que muitas vezes são menos
lucrativas, e às vezes totalmente inúteis.
Se isso fosse verdade, seria incompreensível a razão pela qual uma série de
nossas fábricas de indústria pesada, que ainda não são lucrativas e onde o tra-
balho do trabalhador não dá os “devidos resultados”, não foram fechadas, e por
que novas fábricas de indústria leve, que certamente seriam lucrativas e onde o
J. V. Stalin 685

trabalho dos trabalhadores pudesse render “maiores resultados”, não são abertas.
Se fosse assim, seria incompreensível que os trabalhadores não sejam trans-
feridos de fábricas menos lucrativas, mas muito necessárias à nossa economia
nacional, para fábricas mais lucrativas – de acordo com a lei do valor, que su-
postamente regula as “proporções” do trabalho distribuído entre os ramos de
produção.
Obviamente, se fôssemos seguir o exemplo desses camaradas, deveríamos dei-
xar de dar primazia à produção de meios de produção em favor da produção de
artigos de consumo. E qual seria o efeito de deixar de dar primazia à produção
dos meios de produção? O efeito seria destruir a possibilidade de expansão contí-
nua de nossa economia nacional, pois a economia nacional não pode se expandir
continuamente sem dar primazia à produção dos meios de produção.
Esses camaradas esquecem que a lei do valor pode ser um regulador da pro-
dução apenas no capitalismo, com propriedade privada dos meios de produção
e competição, anarquia de produção e crises de superprodução. Esquecem-se de
que em nosso país a esfera de atuação da lei do valor é limitada pela proprie-
dade social dos meios de produção e pela lei do desenvolvimento equilibrado da
economia nacional, e, consequentemente, também é limitada por nossas planos
anuais, que são um reflexo aproximado dos requisitos desta lei.
Alguns camaradas concluem daí que a lei do desenvolvimento harmônico da
economia nacional e a planificação econômica anulam o princípio da rentabi-
lidade da produção. Isso é totalmente falso. É justamente o contrário. Se a
rentabilidade for considerada não do ponto de vista de fábricas ou indústrias in-
dividuais, e não ao longo de um período de um ano, mas do ponto de vista de toda
a economia nacional e ao longo de um período de, digamos, dez ou quinze anos,
que é a única abordagem correta dessa questão, então a rentabilidade temporária
e instável de algumas fábricas ou indústrias está abaixo de qualquer comparação
com aquela forma superior de lucratividade estável e permanente que obtemos
da operação da lei de desenvolvimento harmônico da economia nacional e da
planificação econômica, que nos salvam de crises econômicas periódicas que per-
turbam a economia nacional e causam tremendos danos materiais à sociedade,
e que garantem um contínuo e elevado ritmo de expansão de nossa economia
nacional.
Em poucas palavras: não pode haver dúvida de que, nas atuais condições so-
cialistas de produção, a lei do valor não pode ser um “regulador das proporções”
da distribuição do trabalho entre os vários ramos da produção.

IV. A supressão da antítese entre a cidade e o campo, entre o


trabalho intelectual e manual e a abolição das diferenças
entre eles

Esse título se refere a uma série de problemas essencialmente diferentes uns


dos outros. Eu os combino em uma seção, não para agrupá-los, apenas para
tornar a exposição mais breve.
A abolição da antítese entre cidade e campo, entre indústria e agricultura, é
um problema conhecido e discutido há muito tempo por Marx e Engels. A base
686 Obras Escolhidas

econômica desta antítese é a exploração do campo pela cidade, a expropriação


do campesinato e a ruína da maioria da população rural por todo o curso de
desenvolvimento da indústria, do comércio e do sistema de créditos sob o capita-
lismo. Portanto, a antítese entre cidade e campo sob o capitalismo deve ser vista
como um antagonismo de interesses. Foi isso que deu origem à atitude hostil do
país em relação à cidade e aos “cidadãos” em geral.
Sem dúvida, com a abolição do capitalismo e do sistema de exploração, e com
a consolidação do sistema socialista em nosso país, o antagonismo de interesses
entre cidade e campo, entre indústria e agricultura, também estava fadado a de-
saparecer. E foi isso que aconteceu. A imensa assistência prestada pela cidade
socialista, por nossa classe trabalhadora, ao nosso campesinato na eliminação
dos latifundiários e kulaks fortaleceu as bases para a aliança entre a classe tra-
balhadora e o campesinato, enquanto o fornecimento sistemático de tratores de
primeira classe e outras máquinas para o campesinato e suas fazendas coletivas
converteram a aliança entre a classe trabalhadora e o campesinato em amizade
entre eles. É claro que os trabalhadores e o campesinato da fazenda coletiva re-
presentam duas classes que diferem uma da outra em status. Mas essa diferença
não enfraquece sua amizade de forma alguma. Ao contrário, seus interesses es-
tão em uma linha comum: fortalecer o sistema socialista e alcançar a vitória do
comunismo. Não é de estranhar, portanto, que não resta um traço da antiga
desconfiança, para não falar do antigo ódio, do campo pela cidade.
Tudo isso significa que o terreno para a antítese entre cidade e campo, entre
indústria e agricultura, já foi eliminado por nosso atual sistema socialista.
Isso, é claro, não significa que o efeito da abolição da antítese entre cidade
e campo será que “as grandes cidades perecerão”283 . Não apenas as grandes
cidades não perecerão, mas as novas grandes cidades aparecerão como centros
de máximo desenvolvimento da cultura, e como centros não apenas de grande
indústria, mas também de processamento de produtos agrícolas e de grandioso
desenvolvimento de todos os ramos da indústria de alimentos. Isso facilitará o
progresso cultural da nação e tenderá a equilibrar as condições de vida na cidade
e no campo.
Temos uma situação análoga no que diz respeito ao problema da abolição da
antítese entre trabalho intelectual e físico. Esse também é um problema bem co-
nhecido que foi discutido por Marx e Engels há muito tempo. A base econômica
da antítese entre trabalho intelectual e físico é a exploração dos trabalhadores fí-
sicos pelos trabalhadores intelectuais. Todos estão familiarizados com o abismo
que sob o capitalismo separava os trabalhadores físicos dos quadros dirigentes.
Sabemos que esse abismo deu origem a uma atitude hostil por parte dos traba-
lhadores para com os diretores, supervisores, engenheiros e outros membros do
corpo técnico, que os trabalhadores consideravam seus inimigos. Naturalmente,
com a abolição do capitalismo e do sistema de exploração, o antagonismo de in-
teresses entre trabalho físico e intelectual também estava fadado a desaparecer.
E realmente desapareceu em nosso sistema socialista atual. Hoje, os trabalha-
dores físicos e os quadros dirigentes não são inimigos, mas camaradas e amigos,
membros de um único corpo coletivo de produtores, vitalmente interessados no

283 Ibid., pp. 412.


J. V. Stalin 687

progresso e na melhoria da produção. Não resta um rastro da antiga inimizade


entre eles.
De caráter bastante diferente é o problema do desaparecimento das distin-
ções entre a cidade (indústria) e o campo (agricultura) e entre o trabalho físico
e o intelectual. Esse problema não foi discutido nos clássicos marxistas. É um
problema novo, que foi levantado praticamente por nossa construção socialista.
Este problema é imaginário? Tem alguma importância prática ou teórica para
nós? Não, esse problema não pode ser considerado imaginário. Pelo contrário,
é para nós um problema da maior importância.
Veja, por exemplo, a distinção entre agricultura e indústria. Em nosso país,
não apenas as condições de trabalho na agricultura diferem das da indústria,
mas, antes de tudo e principalmente, enquanto na indústria temos propriedade
pública dos meios de produção e do produto da indústria, na agricultura não
temos propriedade pública, mas coletiva, de seus produtores. Já foi dito que esse
fato leva à preservação da circulação de mercadorias, e que somente quando essa
distinção entre indústria e agricultura desaparecer, a produção de mercadorias
com todas as suas consequências também poderá desaparecer. Portanto, não se
pode negar que o desaparecimento desta distinção essencial entre agricultura e
indústria deve ser uma questão de suma importância para nós.
O mesmo deve ser dito do problema da abolição da distinção essencial entre
trabalho intelectual e trabalho físico. Também é um problema de extrema impor-
tância para nós. Antes que o caráter da emulação socialista assumisse proporções
massivas, o crescimento de nossa indústria ocorria de forma muito hesitante, e
muitos camaradas até sugeriram que a taxa de desenvolvimento industrial deve-
ria ser atrasada. Isso se devia principalmente ao fato de que o nível cultural e
técnico dos trabalhadores era muito baixo, muito aquém do pessoal técnico. Mas
a situação mudou radicalmente quando o movimento de emulação socialista as-
sumiu um caráter de massa. Foi a partir desse momento que a indústria começou
a avançar em velocidade acelerada. Por que a emulação socialista assumiu o ca-
ráter de um caráter de massa? Porque entre os trabalhadores surgiram grupos
inteiros de camaradas que não só dominaram os requisitos mínimos do conhe-
cimento técnico, mas foram além e ascenderam ao nível do pessoal técnico; eles
começaram a corrigir os técnicos e engenheiros, a quebrar as normas existentes
como antiquadas, a introduzir normas novas e mais atualizadas, e assim por di-
ante. O que teria ocorrido caso a maioria desses trabalhadores tivesse elevado
seu nível cultural e técnico ao nível do pessoal técnico, ao invés de alguns gru-
pos de trabalhadores apenas? Nossa indústria teria alcançado graus inatingíveis
pela indústria de outros países. Portanto, não se pode negar que a abolição da
distinção essencial entre trabalho intelectual e físico, elevando o nível cultural e
técnico dos trabalhadores ao do pessoal técnico, não pode deixar de ser de suma
importância para nós.
Alguns camaradas afirmam que, com o tempo, não apenas desaparecerá a
distinção essencial entre a indústria e a agricultura, e entre o trabalho físico e
o intelectual, mas também toda a distinção entre eles. Isso não é verdade. A
abolição da distinção essencial entre a indústria e a agricultura não pode levar à
abolição de todas as distinções entre elas. Certamente restará alguma distinção,
688 Obras Escolhidas

ainda que não essencial, devido à diferença entre as condições de trabalho na


indústria e na agricultura. Mesmo na indústria, as condições de trabalho não
são iguais em todos os seus ramos: as condições de trabalho, por exemplo, nas
minas de carvão diferem daquelas dos trabalhadores de uma fábrica mecanizada
de calçados; as condições de trabalho dos mineiros diferem daquelas dos enge-
nheiros da produção de máquinas. Se assim for, então deve permanecer uma
certa distinção entre a indústria e a agricultura.
O mesmo deve ser dito sobre a distinção entre trabalho intelectual e físico. A
distinção essencial entre eles, a diferença em seus níveis culturais e técnicos, cer-
tamente desaparecerá. Mas alguma distinção, mesmo que não essencial, perma-
necerá, pelo menos porque as condições de trabalho dos quadros administrativos
e dos trabalhadores não são idênticas.
Os camaradas que afirmam o contrário o fazem presumivelmente com base
na formulação dada em algumas das minhas declarações, que fala da abolição
da distinção entre indústria e agricultura, e entre trabalho intelectual e físico,
sem qualquer reserva de que o que significa a abolição da distinção essencial,
não de toda distinção. É exatamente assim que os camaradas entenderam minha
formulação, supondo que ela implicava a abolição de toda distinção. Mas isso
indica que a formulação era imprecisa, insatisfatória. Deve ser descartada e subs-
tituída por outra formulação, uma que fale da abolição de distinções essenciais e
da persistência de distinções não essenciais entre indústria e agricultura, e entre
trabalho intelectual e físico.

V. A desintegração do mercado mundial único e o


aprofundamento da crise no sistema capitalista global

A desintegração de um mercado mundial único e abrangente deve ser con-


siderada a sequência econômica mais importante da Segunda Guerra Mundial
e de suas consequências econômicas. Ela determinou o aprofundamento ainda
maior da crise geral do sistema capitalista mundial.
A Segunda Guerra Mundial foi ela própria engendrada por essa crise. Cada
uma das duas coalizões capitalistas que se acertaram na guerra premeditou a der-
rota de seu adversário e a conquista da supremacia mundial. Foi nisso que bus-
caram uma saída para a crise. Os Estados Unidos da América esperavam colocar
seus competidores mais perigosos, Alemanha e Japão, fora de ação, apoderar-se
dos mercados estrangeiros e dos recursos mundiais de matéria-prima e estabele-
cer sua supremacia mundial.
Mas a guerra não justificou essas esperanças. É verdade que Alemanha e Ja-
pão foram postos fora de combate como concorrentes dos três principais países
capitalistas: EUA, Grã-Bretanha e França. Mas, ao mesmo tempo, a China e
outras democracias populares europeias romperam com o sistema capitalista e,
junto com a União Soviética, formaram um campo socialista unido e poderoso
que confronta o campo do capitalismo. A consequência econômica da existên-
cia de dois campos opostos foi que o mercado mundial único e abrangente se
desintegrou, de modo que agora temos dois mercados mundiais paralelos, que
também se opõem.
J. V. Stalin 689

Deve-se observar que os próprios EUA, Grã-Bretanha e França contribuíram


– sem que eles mesmos o desejassem, é claro – para a formação e consolidação do
novo mercado mundial paralelo. Impuseram um bloqueio econômico à URSS,
à China e às democracias populares europeias, que não aderiram ao sistema do
“plano Marshall”, pensando assim que os estrangulariam com seu bloqueio. Na
verdade, o novo mercado mundial em vez de se enfraquecer, se fortaleceu.
Mas o fundamental, claro, não é o bloqueio econômico, mas o fato de que,
desde a guerra, esses países se uniram economicamente e estabeleceram relações
de cooperação econômica e assistência mútua. A experiência dessa cooperação
mostra que nenhum país capitalista poderia ter prestado assistência tão eficaz e
tecnicamente competente às democracias populares como a União Soviética está
prestando. A questão não é apenas que essa assistência seja a mais barata possível
e tecnicamente excelente. O ponto principal é que na base desta cooperação está
um desejo sincero de ajudar uns aos outros e de promover o progresso econômico
de todos. O resultado é um ritmo acelerado de desenvolvimento industrial nes-
ses países. Pode-se dizer com segurança que, com esse ritmo de desenvolvimento
industrial, logo acontecerá que esses países não só não precisarão da importa-
ções dos países capitalistas, mas também sentirão a necessidade de encontrar um
mercado externo para seus produtos excedentes.
Mas daí se percebe que a esfera de exploração dos recursos mundiais pelos
principais países capitalistas (EUA, Grã-Bretanha, França) não se expandirá, mas
se contrairá; que suas oportunidades de venda no mercado mundial se deteriora-
rão e que suas indústrias estarão operando cada vez mais abaixo da capacidade.
Isso, de fato, é o que se entende por aprofundamento da crise geral do sistema
capitalista mundial em conexão com a desintegração do mercado mundial.
Isso é sentido pelos próprios capitalistas, pois seria difícil para eles não sentir
a perda de mercados como a URSS e a China. Eles estão tentando compensar
essas dificuldades com o “plano Marshall”, a guerra na Coréia, o rearmamento
frenético e a militarização industrial. Mas isso é muito parecido com um homem
se afogando agarrado a uma palha em chamas.
Este estado de coisas confrontou os economistas com duas questões:
a) Pode-se afirmar que a tese exposta por Stalin antes da Segunda Guerra
Mundial sobre a relativa estabilidade dos mercados no período de crise geral do
capitalismo ainda é válida?
b) Pode-se afirmar que a tese exposta por Lenin na primavera de 1916 – a
saber, que, apesar da decadência do capitalismo, “no geral, o capitalismo está
crescendo muito mais rapidamente do que antes”284 – ainda está válido?
Eu acho que não pode. Dadas as novas condições a que deu origem a Segunda
Guerra Mundial, deve-se considerar que ambas as teses perderam a validade.

VI. A inevitabilidade das guerras entre os países capitalistas

Alguns camaradas afirmam que, devido ao desenvolvimento de novas condi-


ções internacionais desde a Segunda Guerra Mundial, as guerras entre os países
284V. I. Lenin. Imperialismo, Etapa Superior do Capitalismo, ed. ing., Foreign Languages Press,
Peking, 1969, p. 151.
690 Obras Escolhidas

capitalistas deixaram de ser inevitáveis. Eles consideram que as contradições


entre o campo socialista e o campo capitalista são mais agudas do que as contra-
dições entre os países capitalistas; que os EUA trouxeram os outros países capita-
listas suficientemente sob seu domínio para ser capaz de impedi-los de entrar em
guerra entre si e enfraquecer uns aos outros; que as primeiras mentes capitalis-
tas foram suficientemente ensinadas pelas duas guerras mundiais e pelos graves
danos que causaram a todo o mundo capitalista a não se aventurar a envolver os
países capitalistas em guerra entre si novamente – e que, por causa de tudo isso,
guerras entre países capitalistas não são mais inevitáveis.
Esses camaradas estão enganados. Eles veem os fenômenos externos que se
manifestam na superfície, mas não veem aquelas forças profundas que, embora
operem até agora de forma imperceptível, serão, ao fim do dia, o que determi-
nará o curso dos fatos.
Exteriormente, tudo pareceria “indo bem”: os EUA têm ração na Europa
Ocidental, no Japão e em outros países capitalistas; Alemanha (Ocidental), Grã-
Bretanha, França, Itália e Japão caíram nas garras dos EUA e estão obedecendo
submissos aos seus comandos. Mas seria um erro pensar que as coisas podem con-
tinuar a “ir bem” por “toda a eternidade”, que esses países tolerarão a dominação
e opressão dos Estados Unidos indeterminadamente, que não se empenharão em
se libertar da escravidão americana e tomar o caminho do desenvolvimento in-
dependente.
Considere, em primeiro lugar, a Grã-Bretanha e a França. Sem dúvida, são
países imperialistas. Sem dúvida, matérias primas baratas e mercados assegura-
dos são de extrema importância para eles. Pode-se presumir que eles vão tolerar
indefinidamente a situação atual, na qual, sob o pretexto do “plano Marshall”,
os americanos estão penetrando nas economias da Grã-Bretanha e da França e
tentando convertê-las em adjuntos da economia e do capital americano? Está
explorando matérias primas das colônias britânicas e francesas e, portanto, pla-
nejando um desastre para os altos lucros dos capitalistas britânicos e franceses?
Não seria mais verdadeiro dizer que a Grã-Bretanha capitalista e, depois dela, a
França capitalista, serão obrigadas ao final a romper laços com os EUA e entrar
em conflito com eles a fim de garantir uma posição independente e, claro , altos
lucros?
Passemos aos principais países vencidos, Alemanha (Ocidental) e Japão. Esses
países estão agora definhando na miséria sob a bota do imperialismo americano.
Sua indústria e agricultura, seu comércio, suas políticas interna e externa e toda
a sua vida estão acorrentados pelo “regime” americano de ocupação. Ainda on-
tem, esses países eram grandes potências imperialistas e abalavam os alicerces do
domínio da Grã-Bretanha, dos EUA e da França na Europa e na Ásia. Pensar que
esses países não tentarão se levantar novamente, não tentarão esmagar o “regime”
dos EUA e forçar seu caminho para o desenvolvimento independente é acreditar
em milagres.
É dito que as contradições entre capitalismo e socialismo são mais fortes do
que as contradições entre os países capitalistas. Teoricamente, é claro, isso é ver-
dade. Não é apenas verdade agora, hoje; era verdade antes da Segunda Guerra
Mundial. E isso foi mais ou menos compreendido pelos dirigentes dos países
J. V. Stalin 691

capitalistas. No entanto, a Segunda Guerra Mundial começou não como uma


guerra contra a URSS, mas como uma guerra entre países capitalistas. Porque?
Em primeiro lugar, porque a guerra contra a URSS, como uma terra socialista,
é mais perigosa para o capitalismo do que a guerra entre países capitalistas; pois
enquanto a guerra entre países capitalistas põe em questão apenas a suprema-
cia de certos países capitalistas sobre outros, a guerra com a URSS certamente
deve colocar em questão a existência do próprio capitalismo. Em segundo lugar,
porque os capitalistas, embora clamem, por “propaganda”, sobre a agressividade
da União Soviética, não acreditam que ela seja agressiva, porque estão cientes da
política pacífica da União Soviética e sabem que ela não atacará países capitalis-
tas.
Após a Primeira Guerra Mundial, acreditava-se da mesma forma que a Alema-
nha havia sido definitivamente colocada fora de ação, assim como certos camara-
das agora acreditam que o Japão e a Alemanha foram definitivamente colocados
fora de ação. Então, também, foi dito e clamado na imprensa que os Estados
Unidos haviam fornecido rações à Europa; que a Alemanha nunca mais se levan-
taria e que não haveria mais guerras entre os países capitalistas. Apesar disso, a
Alemanha se ergueu novamente como uma grande potência no espaço de cerca
de quinze ou vinte anos após sua derrota, tendo se libertado da escravidão e se-
guido o caminho do desenvolvimento independente. E é significativo que não
tenham sido outros senão a Grã-Bretanha e os Estados Unidos que ajudaram a
Alemanha a se recuperar economicamente e a aumentar seu potencial de guerra
econômica. É claro que, quando os Estados Unidos e a Grã-Bretanha ajudaram
na recuperação econômica da Alemanha, eles o fizeram com o objetivo de colo-
car uma Alemanha recuperada contra a União Soviética, para utilizá-la contra a
terra do socialismo. Mas a Alemanha dirigiu suas forças em primeiro lugar con-
tra o bloco anglo-franco-americano. E quando a Alemanha de Hitler declarou
guerra à União Soviética, o bloco anglo-franco-americano, longe de se juntar à
Alemanha de Hitler, foi compelido a entrar em uma coalizão com a URSS contra
a Alemanha de Hitler.
Consequentemente, a luta dos países capitalistas por mercados e seu desejo de
esmagar seus concorrentes provou ser na prática mais forte do que as contradições
entre o campo capitalista e o campo socialista.
Que garantia existe, então, de que a Alemanha e o Japão não se levantarão
novamente, não tentarão se libertar da escravidão americana e viver suas próprias
vidas independentes? Acho que não existe essa garantia.
Mas decorre disso que a inevitabilidade das guerras entre países capitalistas
continua em vigor.
Diz-se que a tese de Lenin de que o imperialismo inevitavelmente gera a
guerra deve agora ser considerada obsoleta, uma vez que poderosas forças po-
pulares se apresentaram hoje em defesa da paz e contra outra guerra mundial.
Isso não é verdade.
O objetivo do movimento atual pela paz é despertar as massas populares para
a luta pela preservação da paz e pela prevenção de outra guerra mundial. Conse-
quentemente, o objetivo desse movimento não é derrubar o capitalismo e estabe-
lecer o socialismo - ele se limita ao objetivo democrático de preservar a paz. Nesse
692 Obras Escolhidas

aspecto, o movimento pacifista atual difere do movimento da época da Primeira


Guerra Mundial pela conversão da guerra imperialista em guerra civil, uma vez
que o último movimento foi mais longe e perseguiu objetivos socialistas.
É possível que em uma determinada conjuntura de circunstâncias a luta pela
paz se transforme aqui ou ali em uma luta pelo socialismo. Mas então não será
mais o movimento atual pela paz; será um movimento pela derrubada do capita-
lismo.
O mais provável é que o atual movimento pela paz, como um movimento pela
preservação da paz, irá, se for bem-sucedido, resultar na prevenção de uma de-
terminada guerra, em seu adiamento temporário, na preservação temporária de
uma determinada paz, em a renúncia de um governo belicoso e sua substituição
por outro que se prepara temporariamente para manter a paz. Isso, é claro, será
bom. Mesmo muito bom. Mas, ao mesmo tempo, não será suficiente para eli-
minar a inevitabilidade das guerras entre países capitalistas em geral. Não será
suficiente, porque, apesar de todos os sucessos do movimento pacifista, o impe-
rialismo continuará, continuará em vigor – e, por conseguinte, a inevitabilidade
das guerras também continuará em vigor.
Para eliminar a inevitabilidade da guerra, é necessário abolir o imperialismo.

VII. As leis econômicas fundamentais do capitalismo moderno


e do socialismo

Como você sabe, a questão das leis econômicas básicas do capitalismo e do


socialismo surgiu várias vezes no decorrer da discussão. Várias opiniões foram
expressas sobre este assunto, mesmo as mais fantásticas. É verdade que a maioria
dos participantes na discussão reagiu debilmente ao assunto e nenhuma decisão
sobre o assunto foi indicada. No entanto, nenhum dos participantes negou a
existência de tais leis.
Existe uma lei econômica básica do capitalismo? Sim existe. O que é essa
lei e quais são seus traços característicos? A lei econômica básica do capitalismo
é aquela que determina não algum aspecto particular ou processos particulares
do desenvolvimento da produção capitalista, mas todos os aspectos principais e
todos os processos principais de seu desenvolvimento – um, consequentemente,
que determina a essência do capitalismo produção, sua natureza essencial.
A lei do valor é a lei econômica básica do capitalismo? Não. A lei do valor
é principalmente uma lei da produção de mercadorias. Existia antes do capita-
lismo e, como a produção de mercadorias, continuará a existir após a derrubada
do capitalismo, como ocorre, por exemplo, em nosso país, embora, é verdade,
com uma esfera de atuação restrita. Tendo uma ampla esfera de operação nas
condições capitalistas, a lei do valor, é claro, desempenha um grande papel no
desenvolvimento da produção capitalista. Mas não apenas não determina a es-
sência da produção capitalista e os princípios do lucro capitalista; nem mesmo
apresenta esses problemas. Portanto, não pode ser a lei econômica básica do
capitalismo moderno.
Pelas mesmas razões, a lei da competição e da anarquia da produção, ou a lei
do desenvolvimento desigual do capitalismo nos vários países, também não pode
J. V. Stalin 693

ser a lei econômica básica do capitalismo.


Diz-se que a lei da taxa média de lucro é a lei econômica básica do capitalismo
moderno. Isso não é verdade. O capitalismo moderno, o capitalismo monopo-
lista, não pode se contentar com o lucro médio, que aliás tende a declinar, em
vista da crescente composição orgânica do capital. Não é o lucro médio, mas o
lucro máximo que o capitalismo monopolista moderno exige, de que necessita
para uma reprodução ampliada mais ou menos regular.
O mais apropriado para o conceito de uma lei econômica básica do capita-
lismo é a lei da mais-valia, a lei da origem e do crescimento do lucro capitalista.
Ele realmente determina as características básicas da produção capitalista. Mas
a lei da mais-valia é uma lei muito geral; não cobre o problema da maior taxa de
lucro, cuja garantia é uma condição para o desenvolvimento do capitalismo mo-
nopolista. Para preencher este hiato, a lei da mais-valia deve ser concretizada e
desenvolvida ainda mais na adaptação às condições do capitalismo monopolista,
ao mesmo tempo tendo em mente que o capitalismo monopolista exige não qual-
quer tipo de lucro, mas precisamente o máximo lucro. Essa será a lei econômica
básica do capitalismo moderno.
As principais características e requisitos da lei econômica básica do capita-
lismo moderno podem ser formuladas grosseiramente, desta forma: a garantia
do máximo lucro capitalista por meio da exploração, ruína e empobrecimento da
maioria da população de um determinado país, por meio da escravidão e o roubo
sistemático de povos de outros países, especialmente os atrasados, e, por último,
por meio de guerras e militarização da economia nacional, que são utilizadas
para a obtenção dos maiores lucros.
Diz-se que o lucro médio pode, entretanto, ser considerado bastante suficiente
para o desenvolvimento capitalista nas condições modernas. Isso não é verdade.
O lucro médio é o ponto mais baixo de lucratividade, abaixo do qual a produção
capitalista se torna impossível. Mas seria absurdo pensar que, ao tomar colônias,
subjugar povos e arquitetar guerras, os magnatas do capitalismo monopolista
moderno estão se esforçando para garantir apenas o lucro médio. Não, não é o
lucro médio, nem tampouco o superlucro – que, via de regra, representa apenas
um ligeiro acréscimo ao lucro médio – mas precisamente o lucro máximo que é
o motor do capitalismo monopolista. É precisamente a necessidade de garan-
tir o máximo de lucros que leva o capitalismo monopolista a empreendimentos
arriscados como a escravidão e saque sistemático de colônias e outros países atra-
sados, a conversão de uma série de países independentes em países dependentes,
a organização de novas guerras - que para os magnatas do capitalismo moderno
é o “negócio” mais bem adaptado à extração do máximo lucro – e, por último,
tenta conquistar a supremacia econômica mundial.
A importância da lei econômica básica do capitalismo consiste, entre outras
coisas, na circunstância de que, uma vez que determina todos os principais fenô-
menos no desenvolvimento do modo de produção capitalista, seus booms e crises,
suas vitórias e derrotas, seus méritos e deméritos - todo o processo de seu desen-
volvimento contraditório - permite-nos compreendê-los e explicá-los.
Aqui está um dos muitos exemplos “impressionantes”.
Todos nós conhecemos fatos da história e prática do capitalismo ilustrativos
694 Obras Escolhidas

do rápido desenvolvimento da tecnologia sob o capitalismo, quando os capita-


listas aparecem como os porta-estandartes das técnicas mais avançadas, como
revolucionários no desenvolvimento da técnica de produção. Mas também esta-
mos familiarizados com fatos de um tipo diferente, ilustrativos de uma parada
no desenvolvimento técnico sob o capitalismo, quando os capitalistas aparecem
como reacionários no desenvolvimento de novas técnicas e não raro recorrem ao
trabalho manual.
Como essa contradição latente pode ser explicada? Isso só pode ser explicado
pela lei econômica básica do capitalismo moderno, ou seja, pela necessidade de
obter o lucro máximo. O capitalismo é a favor de novas técnicas quando elas
prometem o maior lucro. O capitalismo é contra as novas técnicas e por recorrer
ao trabalho manual, quando as novas técnicas não prometem o maior lucro.
É assim que as coisas estão com a lei econômica básica do capitalismo mo-
derno.
Existe uma lei econômica básica do socialismo? Sim existe. Quais são as ca-
racterísticas e requisitos essenciais desta lei? As características e requisitos essen-
ciais da lei básica do socialismo podem ser formulados aproximadamente desta
forma: a garantia da satisfação máxima das necessidades materiais e culturais em
constante crescimento de toda a sociedade por meio da expansão contínua e do
aperfeiçoamento da produção socialista com base de técnicas superiores.
Consequentemente: em vez de lucros máximos – satisfação máxima das ne-
cessidades materiais e culturais da sociedade; em vez de desenvolvimento da pro-
dução com interrupções na continuidade do boom à crise e da crise ao boom –
expansão ininterrupta da produção; em vez de interrupções periódicas no de-
senvolvimento técnico, acompanhadas pela destruição das forças produtivas da
sociedade - um processo ininterrupto de aperfeiçoamento da produção com base
em técnicas superiores.
Diz-se que a lei do desenvolvimento equilibrado e proporcional da economia
nacional é a lei econômica básica do socialismo. Isso não é verdade. O desenvol-
vimento equilibrado da economia nacional e, portanto, o planejamento econô-
mico, que é um reflexo mais ou menos fiel desta lei, nada pode render por si
só, se não se sabe para que propósito o desenvolvimento econômico é planejado,
ou se esse propósito é não está claro. A lei do desenvolvimento equilibrado da
economia nacional só pode produzir o resultado desejado se houver um propó-
sito pelo qual o desenvolvimento econômico seja planejado. Este propósito, a lei
do desenvolvimento equilibrado da economia nacional não pode prover por si
mesma. Muito menos o planejamento econômico pode fornecê-lo. Esse propó-
sito é inerente à lei econômica básica do socialismo, na forma de suas exigências,
conforme exposto acima. Consequentemente, a lei do desenvolvimento equi-
librado da economia nacional pode operar em seu alcance total apenas se sua
operação se basear na lei econômica básica do socialismo.
Quanto ao planejamento econômico, ele só pode obter resultados positivos se
duas condições forem observadas: a) se corrigir e refletir os requisitos da lei de
desenvolvimento equilibrado da economia nacional, e b) se atender em todos os
aspectos aos requisitos do lei econômica básica do socialismo.
J. V. Stalin 695

VIII. Outras questões

1) Coerção extraeconômica sob o feudalismo: É claro que a coerção extraeconô-


mica teve um papel importante no fortalecimento do poder econômico dos pro-
prietários feudais; no entanto, não, mas a propriedade feudal da terra era a base
do feudalismo.

2) Bens pessoais da família da fazenda coletiva: Seria errado dizer, como faz
o rascunho do livro, que “cada família em uma fazenda coletiva tem para uso
pessoal uma vaca, pequenos rebanhos e aves”. Na verdade, como sabemos, não
é para uso pessoal, mas como propriedade pessoal que o agregado familiar da
fazenda coletiva tem sua vaca, pequenos animais, aves, etc. A expressão “para
uso pessoal” foi evidentemente retirada das Regras Modelo do Artel Agrícola. Mas
um erro foi cometido nas Regras Modelo do Artel Agrícola. A Constituição da URSS,
que foi redigida com mais cuidado, coloca isso de forma diferente, diz:
“Cada família em uma fazenda coletiva ... tem como sua propriedade pessoal uma lavoura
subsidiária no terreno, uma casa de habitação, gado, aves e pequenos implementos agrícolas.”

Isso, é claro, está correto.


Seria bom, além disso, afirmar mais especificamente que todo agricultor co-
letivo tem como propriedade pessoal de uma a tantas vacas, dependendo das
condições locais, tantas ovelhas, cabras, porcos (o número também depende das
condições locais), e uma quantidade ilimitada de aves (patos, gansos, galinhas,
perus).
Tais detalhes detalhados são de grande importância para nossos camaradas
no exterior, que querem saber o que exatamente permaneceu como propriedade
pessoal da família da fazenda coletiva agora que a agricultura em nosso país foi
coletivizada.

3) Renda total paga pelos camponeses aos proprietários; também as despesas to-
tais com a compra de terras: O rascunho do livro texto diz que, como resultado
da nacionalização da terra, “o campesinato foi liberado do pagamento de aluguel
aos proprietários de um total de cerca de 500 milhões de rublos anualmente” (de-
veria ser rublos de “ouro”). Este valor deve ser verificado, porque me parece que
não inclui o aluguel pago em toda a Rússia, mas apenas na maioria das gubernias
russas. Deve-se ter em mente que em algumas das regiões fronteiriças da Rússia
o aluguel era pago em espécie, fato que os autores do projeto de livro eviden-
temente negligenciaram. Além disso, deve-se lembrar que os camponeses foram
liberados não apenas do pagamento do aluguel, mas também das despesas anuais
com a compra de terras. Isso foi levado em consideração no rascunho do livro
didático? Parece-me que não; mas deveria ter sido.

4) Coalescência dos monopólios com a máquina estatal: A palavra “coalescên-


cia” não é apropriada. Nota superficial e descritivamente o processo de fusão
dos monopólios com o Estado, mas não revela a importância econômica desse
processo. O fato é que o processo de fusão não é simplesmente um processo de
coalescência, mas a subjugação da máquina estatal aos monopólios. A palavra
696 Obras Escolhidas

“coalescência” deve, portanto, ser descartada e substituída pelo trecho “subjuga-


ção da máquina estatal aos monopólios”.

5) Uso de maquinário na URSS: O rascunho do livro texto diz que “na URSS as
máquinas são usadas em todos os casos, quando economizam o trabalho da soci-
edade”. Isso não é de forma alguma o que deve ser dito. Em primeiro lugar, as
máquinas na URSS sempre economizam o trabalho da sociedade e, portanto, não
sabemos de nenhum caso na URSS em que não tenham economizado o trabalho
da sociedade. Em segundo lugar, as máquinas não apenas economizam trabalho;
eles também aliviam o trabalho do trabalhador e, consequentemente, em nossas
condições, em contraposição às condições do capitalismo, os trabalhadores usam
as máquinas nos processos de trabalho com a maior avidez.
Deve-se dizer, portanto, que em nenhum lugar as máquinas são utilizadas com
tanta boa vontade como na URSS, porque economizam o trabalho da sociedade
e aliviam o trabalho do trabalhador, e, como não há desemprego na URSS, os
trabalhadores usam as máquinas no país. economia com a maior ansiedade.

6) Padrões de vida da classe trabalhadora nos países capitalistas: Normalmente,


quando se fala dos padrões de vida da classe trabalhadora, o que se quer dizer
são apenas os padrões dos trabalhadores empregados, e não do que é conhecido
como exército de reserva de desempregados. Essa atitude em relação à ques-
tão dos padrões de vida da classe trabalhadora é correta? Eu acho que não. Se
existe um exército de reserva de desempregados, cujos membros não podem viver
exceto pela venda de sua força de trabalho, então os desempregados devem ne-
cessariamente fazer parte da classe trabalhadora; e se eles fazem parte da classe
trabalhadora, então sua condição miserável não pode deixar de influenciar os
padrões de vida dos trabalhadores engajados na produção. Portanto, penso que
ao descrever os padrões de vida da classe trabalhadora nos países capitalistas, a
condição do exército de reserva de trabalhadores desempregados também deve
ser levada em consideração.

7) Renda nacional: Acho absolutamente necessário adicionar um capítulo sobre


renda nacional ao projeto de livro didático.

8) Deve haver um capítulo especial no livro didático sobre Lenin e Stalin como
os fundadores da economia política do socialismo? Eu acho que o capítulo, “A
Teoria Marxista do Socialismo. Fundação da Economia Política do Socialismo
por V. I. Lenin e J. V. Stalin” deveria ser excluído do livro. É totalmente desne-
cessário, uma vez que não acrescenta nada e apenas reitera sem cor o que já foi
dito com mais detalhes nos capítulos anteriores do livro.
Quanto às outras questões, não tenho comentários a fazer sobre as “propostas”
dos camaradas Ostrovityanov, Leontyev, Shepilov, Gatovsky, e demais.
J. V. Stalin 697

IX. Importância internacional de um livro marxista de


economia política

Acho que os camaradas não apreciam a importância de um livro marxista de


economia política tão plenamente quanto deveriam. É necessário não apenas
para nossa juventude soviética. É particularmente necessário para comunistas
e simpatizantes comunistas em todos os países. Nossos camaradas no exterior
querem saber como escapamos da escravidão capitalista; como reconstruímos a
economia de nosso país em linhas socialistas; como garantimos a amizade do cam-
pesinato; como conseguimos converter um país que só recentemente foi atingido
pela pobreza e fraco em um país rico e poderoso; quais são as fazendas coletivas;
por que, embora os meios de produção sejam socializados, não abolimos a pro-
dução mercantil, o dinheiro, o comércio etc. Eles querem saber tudo isso e muito
mais, não por mera curiosidade, mas para aprender conosco e utilizar nossa ex-
periência em seus próprios países. Consequentemente, o surgimento de um bom
livro marxista de economia política não é apenas de importância política interna,
mas também de grande importância internacional.
O que é necessário, portanto, é um livro que possa servir como um livro de
referência para a juventude revolucionária não só em casa, mas também no exte-
rior. Não deve ser muito volumoso, porque um livro muito volumoso não pode
ser um livro de referência e é difícil de assimilar, de dominar. Mas deve conter
tudo o que é fundamental relativo à economia do nosso país e à economia do
capitalismo e do sistema colonial.
Durante a discussão, alguns camaradas propuseram a inclusão no livro didá-
tico de uma série de capítulos adicionais: os historiadores – na história, os cien-
tistas políticos – na política, os filósofos – na filosofia, os economistas – na eco-
nomia. Mas o efeito disso seria engrossar um livro didático a dimensões pesadas.
Isso, é claro, não deve ser feito. O livro emprega o método histórico para ilustrar
problemas de economia política, mas isso não significa que devamos transformar
um livro didático de economia política em uma história das relações econômicas.
O que precisamos é de um livro didático de 500 páginas, 600 no máximo, não
mais. Este seria um livro de referência sobre economia política marxista – e um
excelente presente para os jovens comunistas de todos os países.
A propósito, em vista do nível inadequado de desenvolvimento marxista da
maioria dos partidos comunistas no exterior, tal livro poderia ser de grande uti-
lidade para quadros comunistas no exterior que não são mais jovens.

X. Maneiras de melhorar o projeto de livro didático de


economia política

Durante a discussão, alguns camaradas “elaboraram” o rascunho do livro di-


dático com demasiada assiduidade, repreenderam seus autores por erros e omis-
sões e alegaram que o rascunho foi um fracasso. Isso é injusto. Claro, existem
erros e omissões no livro - eles podem ser encontrados em praticamente todos os
grandes empreendimentos. Seja como for, a esmagadora maioria dos participan-
tes na discussão era de opinião que o projeto poderia servir de base para o futuro
livro didático e só precisava de algumas correções e acréscimos. Na verdade, basta
698 Obras Escolhidas

comparar o rascunho com os livros de economia política já em circulação para


ver que o rascunho está acima deles. Por isso, os autores do rascunho merecem
grande crédito.
Acho que, a fim de melhorar o rascunho do livro didático, seria bom nomear
um pequeno comitê que incluiria não apenas os autores do livro, e não apenas os
apoiadores, mas também os oponentes da maioria dos participantes na discussão
– e os críticos do esboço do livro didático.
Também seria bom incluir na comissão um estatístico competente para ve-
rificar os números e fornecer material estatístico adicional para o projeto, bem
como um jurista competente para verificar a exatidão das formulações.
Os membros da comissão devem ser temporariamente dispensados de todo o
outro trabalho e bem providos, de modo que possam se dedicar inteiramente ao
livro didático.
Além disso, seria bom nomear um comitê editorial, de digamos três pessoas,
para cuidar da edição final do livro didático. Isso é necessário também para
alcançar a unidade de estilo, que, infelizmente, falta no projeto de livro.
Prazo para apresentação do livro acabado ao Comitê Central – um ano.
J. Stalin
1 de fevereiro de 1952

Resposta ao camarada Alexander Ilyich Notkin

Camarada Notkin,
Não tive pressa em responder, porque não vi urgência nas questões que le-
vantou. Ainda mais porque há outras questões urgentes e que naturalmente
desviaram a atenção de sua carta.
Vou responder ponto por ponto.
O primeiro ponto.
Há uma declaração nas “observações” no sentido de que a sociedade não é
impotente contra as leis da ciência, que o homem, conhecendo as leis econômi-
cas, pode utilizá-las no interesse da sociedade. Você afirma que este postulado
não pode ser estendido a outras formações sociais, que é válido apenas sob o
socialismo e comunismo, que o caráter elementar dos processos econômicos sob
o capitalismo, por exemplo, torna impossível para a sociedade utilizar as leis
econômicas no interesse de sociedade.
Isso não é verdade. Na época da revolução burguesa na França, por exemplo,
a burguesia utilizou contra o feudalismo a lei de que as relações de produção
devem necessariamente estar de acordo com o caráter das forças produtivas, der-
rubou as relações feudais de produção, criou novas relações burguesas de pro-
dução, e os colocou em conformidade com o caráter das forças produtivas que
haviam surgido no seio do sistema feudal. A burguesia fez isso não por causa
de quaisquer habilidades particulares que possuía, mas porque estava vitalmente
interessada em fazê-lo. Os senhores feudais resistiram a isso não por estupidez,
mas porque estavam vitalmente interessados em impedir que essa lei se tornasse
efetiva.
O mesmo deve ser dito da revolução socialista em nosso país. A classe tra-
J. V. Stalin 699

balhadora utilizou a lei de que as relações de produção devem necessariamente


estar em conformidade com o caráter das forças produtivas, derrubou as relações
de produção burguesas, criou novas relações de produção socialistas e as colocou
em conformidade com o caráter das forças produtivas. Ele foi capaz de fazer isso
não por causa de qualquer habilidade particular que possuía, mas porque estava
vitalmente interessado em fazê-lo. A burguesia, que desde uma força avançada
no alvorecer da revolução burguesa já havia se tornado uma força contrarrevolu-
cionária, ofereceu todas as resistências à implementação desta lei - e não o fez por
falta de organização, e não porque a natureza elementar dos processos econômi-
cos levou-o a resistir, mas principalmente porque era de seu interesse vital que a
lei não se tornasse operativa.
Consequentemente:
1. Os processos econômicos, as leis econômicas são, em um grau ou outro,
utilizados no interesse da sociedade não apenas sob o socialismo e o comunismo,
mas também sob outras formações;
2. A utilização das leis econômicas na sociedade de classes sempre e em toda
parte tem um pano de fundo de classe e, além disso, sempre e em todos os lugares
o campeão da utilização das leis econômicas no interesse da sociedade é a classe
avançada, enquanto as classes obsoletas resistem a ela.
A diferença nesta matéria entre o proletariado e as outras classes que em qual-
quer momento da história revolucionaram as relações de produção consiste no
fato de que os interesses de classe do proletariado se fundem com os interesses da
esmagadora maioria da sociedade, porque proletária revolução implica a abolição
não de uma ou outra forma de exploração, mas de toda exploração, enquanto as
revoluções de outras classes, que aboliram apenas uma ou outra forma de explo-
ração, foram confinadas dentro dos limites de seus estreitos interesses de classe,
que conflitavam com o interesses da maioria da sociedade.
As “observações” falam do contexto de classe da utilização das leis econômi-
cas no interesse da sociedade. Afirma-se aí que “ao contrário das leis das ciên-
cias naturais, onde a descoberta e aplicação de uma nova lei procede de forma
mais ou menos tranquila, a descoberta e aplicação de uma nova lei no domínio
económico, afetando como o faz os interesses das forças obsoletas da sociedade,
encontra a resistência mais poderosa de sua parte”. Este ponto você perdeu.
O segundo ponto.
O senhor afirma que a conformidade total das relações de produção com o
caráter das forças produtivas só pode ser alcançada sob o socialismo e o comu-
nismo, e que sob outras formações a conformidade só pode ser parcial.
Isso não é verdade. Na época que se seguiu à revolução burguesa, quando a
burguesia destruiu as relações feudais de produção e estabeleceu as relações bur-
guesas de produção, houve, sem dúvida, períodos em que as relações de produ-
ção burguesas se conformaram plenamente com o caráter das forças produtivas.
Caso contrário, o capitalismo não poderia ter se desenvolvido tão rapidamente
como depois da revolução burguesa.
Além disso, as palavras “conformidade total” não devem ser entendidas no
sentido absoluto. Não devem ser entendidos como significando que não há ne-
nhum atraso nas relações de produção por trás do crescimento das forças produ-
700 Obras Escolhidas

tivas sob o socialismo. As forças produtivas são as forças de produção mais móveis
e revolucionárias. Eles inegavelmente avançam nas relações de produção, mesmo
no socialismo. Só depois de um certo lapso de tempo as relações de produção
mudam de acordo com o caráter das forças produtivas.
Como, então, as palavras “conformidade total” devem ser entendidas? Devem
ser entendidos como significando que sob o socialismo as coisas geralmente não
chegam a um conflito entre as relações de produção e as forças produtivas, que
a sociedade está em posição de tomar medidas oportunas para trazer as relações
de produção atrasadas em conformidade com o caráter das forças produtivas.
A sociedade socialista está em condições de fazê-lo porque não inclui as classes
obsoletas que podem organizar a resistência. É claro que mesmo sob o socialismo
haverá forças retrógradas e inertes que não percebem a necessidade de mudar as
relações de produção; mas eles, é claro, não serão difíceis de superar sem trazer
o assunto para um conflito.
O terceiro ponto.
Resulta do seu argumento que você considera os meios de produção e, em
primeiro lugar, os implementos de produção produzidos por nossas empresas
nacionalizadas, como mercadorias.
Os meios de produção podem ser considerados mercadorias em nosso sistema
socialista? Na minha opinião, certamente não podem.
Uma mercadoria é um produto que pode ser vendido a qualquer comprador
e, quando o seu proprietário o vende, perde a propriedade e o comprador passa
a ser o proprietário da mercadoria, que pode revender, penhorar ou deixar apo-
drecer. Os meios de produção entram nesta categoria? Obviamente, não. Em
primeiro lugar, os meios de produção não são “vendidos” a nenhum comprador,
não são “vendidos” nem mesmo a fazendas coletivas; eles só são alocados pelo Es-
tado às suas empresas. Em segundo lugar, ao transferir meios de produção para
qualquer empresa, o seu proprietário – o Estado – não perde de forma alguma
a propriedade deles; pelo contrário, ele o retém totalmente. Em terceiro lugar,
os dirigentes das empresas que recebem meios de produção do Estado soviético,
longe de se tornarem seus proprietários, são considerados agentes do Estado na
utilização dos meios de produção de acordo com os planos por ele estabelecidos.
Ver-se-á, então, que em nosso sistema os meios de produção certamente não
podem ser classificados na categoria de mercadorias.
Por que, nesse caso, falamos de valor dos meios de produção, seu custo de
produção, seu preço, etc.?
Por duas razões.
Em primeiro lugar, é necessário para efeitos de cálculo e liquidação, para de-
terminar se as empresas estão a pagar ou com prejuízo, para verificar e controlar
as empresas. Mas esse é apenas o aspecto formal da questão.
Em segundo lugar, é necessário para, no interesse de nosso comércio exte-
rior, realizar vendas de meios de produção a países estrangeiros. Aqui, na esfera
do comércio exterior, mas apenas nesta esfera, nossos meios de produção são
realmente mercadorias, e realmente são vendidos (no sentido direto do termo).
Segue-se, portanto, que na esfera do comércio exterior os meios de produção
J. V. Stalin 701

produzidos por nossas empresas retêm as propriedades das mercadorias tanto


essencialmente quanto formalmente, mas que na esfera da circulação econômica
doméstica, os meios de produção perdem as propriedades das mercadorias, dei-
xam de ser. mercadorias e passam para fora da esfera de operação da lei do valor,
retendo apenas o tegumento externo das mercadorias (cálculo, etc.).
Como explicar essa peculiaridade?
O fato é que em nossas condições socialistas o desenvolvimento econômico
prossegue não por meio de convulsões, mas por meio de mudanças graduais, o
antigo não simplesmente sendo abolido de imediato, mas mudando sua natureza
em adaptação ao novo, e retendo apenas sua forma; enquanto o novo não destrói
simplesmente o antigo, mas se infiltra nele, muda sua natureza e suas funções,
sem destruir sua forma, mas utilizando-a para o desenvolvimento do novo. Isso,
em nossa circulação econômica, vale não só para as mercadorias, mas também
para o dinheiro, como também para os bancos, que, ao perderem suas antigas
funções e adquirirem novas, preservam sua forma antiga, que é utilizada pelo
sistema socialista.
Se o assunto for abordado do ângulo formal, do ângulo dos processos que
ocorrem na superfície dos fenômenos, pode-se chegar à conclusão incorreta de
que as categorias do capitalismo mantêm sua validade em nossa economia. Se,
no entanto, o assunto for abordado do ponto de vista da análise marxista, que
distingue estritamente entre a substância de um processo econômico e sua forma,
entre os processos profundos de desenvolvimento e os fenômenos de superfície,
chega-se à única conclusão correta, a saber, que é principalmente a forma, a
aparência exterior das velhas categorias de capitalismo que permaneceram em
nosso país, mas que sua essência mudou radicalmente em adaptação às exigências
do desenvolvimento da economia socialista.
O quarto ponto.
O senhor afirma que a lei do valor exerce uma influência reguladora sobre
os preços dos “meios de produção” produzidos pela agricultura e entregues ao
Estado aos preços de aquisição. Você se refere a esses “meios de produção” como
matérias-primas – algodão, por exemplo. Você pode ter adicionado linho, lã e
outras matérias-primas agrícolas.
Em primeiro lugar, deve-se observar que, neste caso, não é “um meio de pro-
dução” que a agricultura produz, mas apenas um dos meios de produção – a
matéria-prima. As palavras “meios de produção” não devem ser manipuladas.
Quando os marxistas falam de produção de meios de produção, o que eles têm
em mente principalmente é a produção de instrumentos de produção, o que
Marx chama de “os instrumentos de trabalho, os de natureza mecânica, que,
no seu conjunto, podemos chamar os ossos e músculos de produção”, que consti-
tuem as “características de uma determinada época de produção”285 . Equacionar
uma parte dos meios de produção (matérias-primas) com os meios de produção,
incluindo os implementos de produção, é pecar contra o marxismo, porque o
marxismo considera que os implementos de produção desempenham um papel
decisivo em comparação com todos os outros. meios de produção. Todos sabem
que, por si só, as matérias-primas não podem produzir implementos de produ-
285 Karl Marx, O Capital, ed. ing., Vol. I, Capítulo 5, Seção I, p. 55.
702 Obras Escolhidas

ção, embora certos tipos de matéria-prima sejam necessários para a produção de


implementos de produção, enquanto nenhuma matéria-prima pode ser produ-
zida sem implementos de produção.
Além disso: a influência da lei do valor sobre o preço das matérias-primas
produzidas pela agricultura é uma influência reguladora, como você, camarada
Notkin, afirma? Seria regulador, se os preços das matérias-primas agrícolas tives-
sem “jogo livre” em nosso país, se prevalecesse a lei da concorrência e a anarquia
da produção, se não tivéssemos uma economia planificada e se a produção das
matérias-primas fosse não regulado pelo plano. Mas como todos esses “se” estão
faltando em nosso sistema econômico, a influência da lei do valor sobre o preço
das matérias-primas agrícolas não pode ser reguladora. Em primeiro lugar, no
nosso país os preços das matérias-primas agrícolas são fixos, fixados em plano, e
não são “gratuitos”. Em segundo lugar, as quantidades de matérias-primas agrí-
colas produzidas não são determinadas espontaneamente ou por elementos do
acaso, mas por plano. Em terceiro lugar, os implementos de produção necessá-
rios à produção de matérias-primas agrícolas estão concentrados não nas mãos
de indivíduos, ou grupos de indivíduos, mas nas mãos do Estado. O que resta
então da função reguladora da lei do valor? Parece que a própria lei do valor é
regulada pelos fatores acima mencionados característicos da produção socialista.
Consequentemente, não se pode negar que a lei do valor influencia a forma-
ção dos preços das matérias-primas agrícolas, que é um dos fatores desse pro-
cesso. Mas ainda menos se pode negar que sua influência não é, e não pode ser,
reguladora.
O quinto ponto.
Ao falar, nas minhas “observações”, da rentabilidade da economia nacio-
nal socialista, estava a contestar certos camaradas que alegam que, por não dar
grande preferência a empresas lucrativas, e por tolerar a existência lado a lado
com elas de empresas não lucrativas, nossa economia planejada está matando o
próprio princípio da lucratividade dos empreendimentos econômicos. As “ob-
servações” dizem que a lucratividade considerada do ponto de vista de fábricas
ou indústrias individuais está abaixo de qualquer comparação com aquela forma
superior de lucratividade que obtemos de nosso modo de produção socialista,
que nos salva de crises de superprodução e nos garante uma expansão contínua
de produção.
Mas seria um erro concluir disso que a lucratividade de fábricas e indústrias
individuais não tem nenhum valor particular e não merece atenção séria. Isso,
claro, não é verdade. A lucratividade de fábricas e indústrias individuais é de
grande valor para o desenvolvimento de nossa indústria. Deve ser levado em
consideração ao planejar a construção e ao planejar a produção. É uma exigência
elementar de nossa atividade econômica no atual estágio de desenvolvimento.
O sexto ponto.
Não está claro como suas palavras “produção estendida em um disfarce forte-
mente deformado” em referência ao capitalismo devem ser entendidas. É preciso
dizer que essa produção, e ainda mais produção estendida, não ocorre na natu-
reza.
É evidente que, depois que o mercado mundial se dividiu, e a esfera de ex-
J. V. Stalin 703

ploração dos recursos mundiais pelos principais países capitalistas (EUA, Grã-
Bretanha, França) começou a se contrair, o caráter cíclico do desenvolvimento
do capitalismo – expansão e contração de produção – deve continuar a operar.
No entanto, a expansão da produção nesses países continuará em bases mais es-
treitas, uma vez que o volume de produção nesses países diminuirá.
O sétimo ponto.
A crise geral do sistema capitalista mundial começou no período da Primeira
Guerra Mundial, principalmente devido ao afastamento da União Soviética do
sistema capitalista. Essa foi a primeira etapa da crise geral. Uma segunda etapa
da crise geral se desenvolveu no período da Segunda Guerra Mundial, especial-
mente depois que as democracias populares europeia e asiática se afastaram do
sistema capitalista. A primeira crise, no período da Primeira Guerra Mundial, e
a segunda crise, no período da Segunda Guerra Mundial, não devem ser consi-
deradas como crises separadas, desconexas e independentes, mas como estágios
do desenvolvimento da crise geral de o sistema capitalista mundial.
A crise geral do capitalismo mundial é apenas política ou apenas econômica?
Nem um, nem o outro. É uma crise geral, ou seja, global do sistema capitalista
mundial, abrangendo tanto a esfera econômica quanto a política. E é claro que no
fundo está a decadência cada vez maior do sistema econômico capitalista mun-
dial, por um lado, e o poder econômico crescente dos países que se afastaram do
capitalismo – a URSS, a China e outras democracias populares – por outro.
J. Stalin
21 de abril de 1952
Quanto aos erros do camarada L. D. Yaroshenko
Há algum tempo, os membros do Bureau Político do CC do PCUS (B) rece-
beram uma carta do camarada Yaroshenko, de 20 de março de 1952, sobre uma
série de questões econômicas que foram debatidas na discussão de novembro. O
autor da carta reclama que os documentos básicos que resumem a discussão e
as “observações” do camarada Stalin “não contêm qualquer reflexo da opinião”
do camarada Yaroshenko. O camarada Yaroshenko também sugere em sua nota
que lhe seja permitido escrever uma “Economia Política do Socialismo”, a ser
concluída em um ano ou um ano e meio, e que lhe sejam dados dois assistentes
para ajudá-lo no trabalho.
Penso que tanto a reclamação do camarada Yaroshenko como a sua proposta
devem ser examinadas quanto ao mérito.
Vamos começar com a queixa.
Pois bem, qual é a “opinião” do camarada Yaroshenko que não recebeu qual-
quer reflexão nos documentos acima mencionados?

I. O principal erro do camarada Yaroshenko

Para descrever a opinião do camarada Yaroshenko em algumas palavras, deve-


se dizer que ela não é marxista - e, portanto, profundamente errônea.
O principal erro do camarada Yaroshenko é que ele abandona a posição mar-
xista sobre a questão do papel das forças produtivas e das relações de produção
704 Obras Escolhidas

no desenvolvimento da sociedade, que ele superestima desordenadamente o pa-


pel das forças produtivas, e da mesma forma que subestima desordenadamente o
papel das relações de produção e acaba por declarar que no socialismo as relações
de produção são parte integrante das forças produtivas.
O camarada Yaroshenko está disposto a conceder às relações de produção um
certo papel nas condições das “contradições de classe antagônicas”, na medida
em que as relações de produção “vão contra o desenvolvimento das forças pro-
dutivas”. Mas ele o limita a um papel puramente negativo, o papel de um fator
que retarda o desenvolvimento das forças produtivas, que impede seu desenvolvi-
mento. Quaisquer outras funções, funções positivas, das relações de produção,
o camarada Yaroshenko não consegue ver.
Quanto ao sistema socialista, onde não existem mais “contradições de classe
antagônicas” e onde as relações de produção “já não são contrárias ao desenvol-
vimento das forças produtivas”, aqui, segundo o camarada Yaroshenko, as rela-
ções de produção perdem todos os vestígios de caráter independente, deixam de
ser um fator sério de desenvolvimento, e são absorvidos pelas forças produtivas,
passando a fazer parte delas. No socialismo, afirma o camarada Yaroshenko,
“as relações de produção dos homens tornam-se parte da organização das forças
produtivas, como um meio, um elemento de sua organização”.286
Nesse caso, qual é a principal tarefa da “Economia Política do Socialismo”?
O camarada Yaroshenko responde: “O principal problema da Economia Política
do Socialismo, portanto, não é investigar as relações de produção dos membros
da sociedade socialista; é elaborar e desenvolver uma teoria científica da organi-
zação das forças produtivas no social produção, uma teoria do planejamento do
desenvolvimento econômico”.287
Isso, de fato, explica por que o camarada Yaroshenko não está interessado em
questões econômicas do sistema socialista como a existência de diferentes formas
de propriedade em nossa economia, a circulação de mercadorias, a lei do valor
etc., que ele acredita serem questões menores. que só dão origem a disputas es-
colares. Ele declara claramente que em sua Economia Política do Socialismo “as
disputas quanto ao papel de qualquer categoria particular da economia política
socialista – valor, mercadoria, dinheiro, crédito, etc. – que muitas vezes conosco
são de caráter escolástico, são substituídas por uma discussão saudável da organi-
zação racional das forças produtivas na produção social, por uma demonstração
científica da validade de tal organização.”288
Em suma, economia política sem problemas econômicos.
O camarada Yaroshenko pensa que basta organizar uma “organização racio-
nal das forças produtivas” e a passagem do socialismo ao comunismo ocorrerá
sem qualquer dificuldade particular. Ele considera que isso é suficiente para a
transição para o comunismo. Ele declara sem mais nem menos que “sob o socia-
lismo, a luta básica pela construção de uma sociedade comunista se reduz a uma
luta pela organização adequada das forças produtivas e sua utilização racional
na produção social”. O camarada Yaroshenko proclama solenemente que “o co-
286 Carta do camarada Yaroshenko ao Bureau Político do Comitê Central.
287 Discurso do camarada Yaroshenko na discussão plenária.
288 Discurso do camarada Yaroshenko no Painel de Discussão.
J. V. Stalin 705

munismo é a mais alta organização científica das forças produtivas na produção


social”.289
Parece, então, que a essência do sistema comunista começa e termina com a
“organização racional das forças produtivas”.
De tudo isso, o camarada Yaroshenko conclui que não pode haver uma econo-
mia política única para todas as formações sociais, que deve haver duas economias
políticas: uma para as formações sociais pré-socialistas, cujo objeto de investiga-
ção são as relações de produção dos homens, e o outro para o sistema socialista,
cujo objeto de investigação não deve ser a produção, ou seja, as relações econô-
micas, mas a organização racional das forças produtivas.
Essa é a opinião do camarada Yaroshenko.
O que pode ser dito dessa opinião?
Não é verdade, em primeiro lugar, que o papel das relações de produção na
história da sociedade se tenha limitado ao de freio, de obstáculo ao desenvolvi-
mento das forças produtivas. Quando os marxistas falam do papel retardador
das relações de produção, não são todas as relações de produção que eles têm
em mente, mas apenas as antigas relações de produção, que não se conformam
mais com o crescimento das forças produtivas e, consequentemente, retardam
suas desenvolvimento. Mas, como sabemos, além das antigas, existem também
novas relações de produção, que se sobrepõem às antigas. Pode-se dizer que o
papel das novas relações de produção é o de freio às forças produtivas? Não, eu
não posso. Pelo contrário, as novas relações de produção são a força principal e
decisiva, aquela que de fato determina o desenvolvimento ulterior e, além disso,
poderoso, das forças produtivas, e sem as quais estas últimas estariam condenadas
à estagnação, como está o caso hoje nos países capitalistas.
Ninguém pode negar que o desenvolvimento das forças produtivas de nossa
indústria soviética fez grandes avanços no período dos planos quinquenais. Mas
esse desenvolvimento não teria ocorrido se não tivéssemos, em outubro de 1917,
substituído as velhas relações de produção capitalistas por novas relações de pro-
dução socialistas. Sem esta revolução na produção, nas relações econômicas de
nosso país, nossas forças produtivas teriam estagnado, assim como estagnam hoje
nos países capitalistas.
Ninguém pode negar que o desenvolvimento das forças produtivas de nossa
agricultura deu grandes passos nos últimos vinte ou vinte e cinco anos. Mas este
desenvolvimento não teria ocorrido se não tivéssemos na década de 1930 subs-
tituído as velhas relações de produção capitalistas no campo por novas relações
de produção coletivistas. Sem esta revolução na produção, as forças produtivas
de nossa agricultura teriam estagnado, da mesma forma que estagnam hoje nos
países capitalistas.
É claro que as novas relações de produção não podem e não permanecem
novas para sempre; começam a envelhecer e a contrariar o desenvolvimento ulte-
rior das forças produtivas; começam a perder o seu papel de principal motor das
forças produtivas e passam a ser um travão para elas. Nesse ponto, no lugar des-
sas relações de produção que se tornaram antiquadas, surgem novas relações de

289 Discurso do camarada Yaroshenko na discussão plenária.


706 Obras Escolhidas

produção, cujo papel é o de ser o principal impulsionador do desenvolvimento


ulterior das forças produtivas.
Este desenvolvimento peculiar das relações de produção, desde o papel de
freio das forças produtivas até o da mola principal que as impulsiona, e do papel
de principal motor ao de freio às forças produtivas, constitui um dos principais
elementos da dialética materialista marxista. Todo novato no marxismo sabe
disso hoje em dia. Mas o camarada Yaroshenko, ao que parece, não sabe disso.
Não é verdade, em segundo lugar, que as relações de produção, isto é, as
econômicas, perdem seu papel autônomo no socialismo, que são absorvidas pelas
forças produtivas, que a produção social no socialismo se reduz à organização
das forças produtivas. O marxismo considera a produção social como um todo
integral que tem dois lados inseparáveis: as forças produtivas da sociedade (a
relação da sociedade com as forças da natureza, em disputa com a qual assegura
os valores materiais de que necessita) e as relações de produção (as relações dos
homens uns com os outros no processo de produção). São dois lados diferentes
da produção social, embora estejam inseparavelmente ligados um ao outro. E só
porque eles constituem lados diferentes da produção social, eles são capazes de
influenciar um ao outro. Afirmar que um desses lados pode ser absorvido pelo
outro e ser convertido em sua parte integrante é cometer um pecado gravíssimo
contra o marxismo.
Marx disse:
Na produção, os homens não apenas agem sobre a natureza, mas também uns sobre os outros.
Eles produzem apenas cooperando de uma certa maneira e trocando mutuamente suas ativi-
dades. Para produzir, eles entram em conexões e relações definidas entre si e somente dentro
dessas conexões e relações sociais é que sua ação sobre a natureza, sua produção, ocorre.290

Consequentemente, a produção social consiste em dois lados, que, embora es-


tejam inseparavelmente ligados, refletem duas categorias diferentes de relações:
as relações dos homens com a natureza (forças produtivas), e as relações dos ho-
mens entre si no processo de produção (produção relações). Somente quando os
dois lados da produção estão presentes é que temos produção social, seja sob o
sistema socialista ou sob qualquer outra formação social.
O camarada Yaroshenko, evidentemente, não concorda totalmente com Marx.
Ele considera que este postulado de Marx não é aplicável ao sistema socialista.
Justamente por isso, ele reduz o problema da Economia Política do Socialismo
à organização racional das forças produtivas, descartando a produção, o econô-
mico, as relações e separando-os das forças produtivas.
Se seguirmos o camarada Yaroshenko, portanto, o que obteremos é, em vez
de uma economia política marxista, algo na natureza da “Ciência Organizadora
Universal” de Bogdanov.
Assim, partindo da ideia certa de que as forças produtivas são as forças de
produção mais móveis e revolucionárias, o camarada Yaroshenko reduz a ideia
ao absurdo, a ponto de negar o papel da produção, do econômico, das relações
no socialismo; e, em vez de uma produção social vigorosa, o que ele obtém é
uma tecnologia de produção desequilibrada e desalinhada - algo na natureza da
290Karl Marx, “Trabalho Assalariado e Capital”, Obras Escolhidas de Karl Marx e Friedrich Engels,
ed. ing., Moscou, 1951, Vol. I, p. 83.
J. V. Stalin 707

“técnica de organização social” de Bukharin.


Marx diz:
Na produção social de sua vida [isto é, na produção dos valores materiais necessários à vida
dos homens – J. Stalin], os homens entram em relações definidas que são indispensáveis e
independentes de sua vontade, relações de produção que correspondem a um estágio defi-
nido de desenvolvimento de suas forças produtivas materiais. A soma total dessas relações de
produção constitui a estrutura econômica da sociedade, o fundamento real, sobre o qual se
ergue uma superestrutura jurídica e política e à qual correspondem determinadas formas de
consciência social.291

Isso significa que toda formação social, sociedade socialista não excluída, tem
seu fundamento econômico, consistindo na soma total das relações de produção
dos homens. O que, pergunta-se, acontece à base econômica do sistema socialista
com o camarada Yaroshenko? Como sabemos, o camarada Yaroshenko já acabou
com as relações de produção no socialismo como uma esfera mais ou menos inde-
pendente, e incluiu o pouco que resta delas na organização das forças produtivas.
O sistema socialista, pergunta-se, tem sua própria base econômica? Obviamente,
visto que as relações de produção desapareceram como um fator mais ou me-
nos independente sob o socialismo, o sistema socialista ficou sem fundamento
econômico.
Em suma, um sistema socialista sem fundamento econômico. Uma situação
bastante engraçada...
É possível um sistema social sem base econômica? O camarada Yaroshenko
evidentemente acredita que sim. O marxismo, porém, acredita que tais sistemas
sociais não ocorrem na natureza.
Não é verdade, por fim, que o comunismo significa a organização racional
das forças produtivas, que a organização racional das forças produtivas é o iní-
cio e o fim do sistema comunista, que basta organizar racionalmente as forças
produtivas, e o a transição para o comunismo ocorrerá sem dificuldade particu-
lar. Há em nossa literatura outra definição, outra fórmula do comunismo – a
fórmula de Lenin: “O comunismo é o domínio soviético mais a eletrificação de
todo o país”.292 A fórmula de Lenin evidentemente não agrada ao camarada
Yaroshenko, e ele a substitui por sua própria fórmula caseira: “O comunismo é
a mais alta organização científica das forças produtivas na produção social”.
Em primeiro lugar, ninguém sabe o que representa esta organização “cien-
tífica superior” ou “racional” das forças produtivas que o camarada Yaroshenko
anuncia, qual é o seu significado concreto. Em seus discursos no Plenário e
nos painéis de trabalho da discussão, e em sua carta aos membros do Bureau
Político, o camarada Yaroshenko reitera essa fórmula mítica dezenas de vezes,
mas em nenhum lugar ele diz uma única palavra para explicar como o “deve ser
compreendida a organização racional” das forças produtivas, que supostamente
constitui o início e o fim da essência do sistema comunista.
Em segundo lugar, se se deve fazer uma escolha entre as duas fórmulas, então
não é a fórmula de Lenin, que é a única correta, que deve ser descartada, mas
291 Karl Marx, Prefácio a Uma contribuição para a crítica da economia política, Obras escolhidas de
Karl Marx e Friedrich Engels, ed. ing., Moscou, 1951, Vol. I, pp. 328-29.
292 V. I. Lenin, “Nosso posicionamento estrangeiro e doméstico e as tarefas do partido”, Obras Com-

pletas, ed. rus., Vol. 31.


708 Obras Escolhidas

a pseudo fórmula do camarada Yaroshenko, tão obviamente quimérica e não


marxista , e é emprestado do arsenal de Bogdanov, de sua “Ciência Organizadora
Universal”.
O camarada Yaroshenko pensa que só temos que assegurar uma organização
racional das forças produtivas, e poderemos obter uma abundância de produtos
e passar ao comunismo, passar da fórmula “a cada um segundo a sua obra” para
a fórmula “a cada um segundo suas necessidades”. Esse é um erro profundo e
revela uma total falta de compreensão das leis de desenvolvimento econômico do
socialismo. A concepção do camarada Yaroshenko das condições para a transição
do socialismo para o comunismo é muito rudimentar e pueril. Ele não entende
que nem uma abundância de produtos, capaz de cobrir todas as necessidades da
sociedade, nem a transição para a fórmula, “a cada um de acordo com suas ne-
cessidades”, pode ocorrer se fatores econômicos como a fazenda coletiva, grupo,
propriedade, circulação de mercadorias, etc., permanecem em vigor. O cama-
rada Yaroshenko não compreende que antes de passarmos à fórmula “a cada um
segundo as suas necessidades”, teremos de passar por várias etapas de reedu-
cação económica e cultural da sociedade, ao longo das quais o trabalho irá ser
transformado aos olhos da sociedade de apenas um meio de sustentar a vida em
necessidade primordial da vida, e propriedade social na base sagrada e inviolável
da existência da sociedade.
A fim de preparar o caminho para uma transição real, e não declaratória,
para o comunismo, pelo menos três condições preliminares principais devem ser
satisfeitas.
1. É necessário, em primeiro lugar, garantir não uma “organização racional”
mítica das forças produtivas, mas uma expansão contínua de toda a produção
social, com uma taxa de expansão relativamente mais elevada da produção dos
meios de produção. A taxa relativamente mais alta de expansão da produção
dos meios de produção é necessária não apenas porque tem que fornecer o equi-
pamento para suas próprias fábricas e para todos os outros ramos da economia
nacional, mas também porque a reprodução em uma escala estendida torna-se
totalmente impossível sem ele.
2.. É preciso, em segundo lugar, por meio de transições graduais realizadas
em proveito dos kolkhozes e, portanto, de toda a sociedade, elevar a propriedade
kolkhoziana ao nível de propriedade pública, e, também, por meio de transições
graduais, para substituir a circulação de mercadorias por um sistema de troca de
produtos, sob o qual o governo central, ou algum outro centro socioeconômico,
poderia controlar todo o produto da produção social no interesse da sociedade.
O camarada Yaroshenko se engana quando afirma que não há contradição en-
tre as relações de produção e as forças produtivas da sociedade sob o socialismo.
É claro que nossas atuais relações de produção estão em um período em que se
ajustam totalmente ao crescimento das forças produtivas e ajudam a avançá-las a
passadas de sete léguas. Mas seria errado ficar tranquilo com isso e pensar que
não há contradições entre nossas forças produtivas e as relações de produção.
Certamente há, e haverá, contradições, visto que o desenvolvimento das relações
de produção está atrasado, e ficará para trás, em relação ao desenvolvimento das
forças produtivas. Dada uma política correta por parte dos órgãos dirigentes,
J. V. Stalin 709

essas contradições não podem se transformar em antagonismos, e não há chance


de que a situação entre em conflito entre as relações de produção e as forças pro-
dutivas da sociedade. Seria diferente se tivéssemos uma política errada, como a
que o camarada Yaroshenko recomenda. Nesse caso, o conflito seria inevitável,
e nossas relações de produção poderiam se tornar um sério freio ao desenvolvi-
mento ulterior das forças produtivas.
A tarefa dos órgãos dirigentes consiste, portanto, em discernir prontamente
as contradições incipientes e em tomar medidas oportunas para as resolver, adap-
tando as relações de produção ao crescimento das forças produtivas. Isso, acima
de tudo, diz respeito a fatores econômicos como o grupo ou a fazenda coletiva,
a propriedade e a circulação de mercadorias. Atualmente, é claro, esses fatores
estão sendo utilizados com sucesso por nós para a promoção da economia so-
cialista e são de inegável benefício para nossa sociedade. É inegável, também,
que eles serão úteis também no futuro próximo. Mas seria uma cegueira im-
perdoável não ver ao mesmo tempo que esses fatores já começam a dificultar o
poderoso desenvolvimento de nossas forças produtivas, pois criam obstáculos à
plena extensão do planejamento governamental a toda a economia nacional, es-
pecialmente a agricultura. . Não há dúvida de que esses fatores dificultarão cada
vez mais a continuidade do crescimento das forças produtivas de nosso país com o
passar do tempo. A tarefa, portanto, é eliminar essas contradições, convertendo
gradualmente a propriedade da fazenda coletiva em propriedade pública e in-
troduzindo – também gradualmente – a troca de produtos no lugar da circulação
de mercadorias.
3. É necessário, em terceiro lugar, assegurar tal avanço cultural da sociedade
que assegure a todos os membros da sociedade o desenvolvimento integral de
suas habilidades físicas e mentais, de modo que os membros da sociedade pos-
sam estar em uma posição receber uma educação suficiente para capacitá-los a
ser agentes ativos do desenvolvimento social, e em posição de escolher livremente
suas ocupações e não estar amarrados por toda a vida, devido à divisão de traba-
lho existente, a uma ocupação.
O que é necessário para isso?
Seria errado pensar que tal avanço substancial no padrão cultural dos mem-
bros da sociedade pode ser realizado sem mudanças substanciais na condição
atual do trabalho. Para isso, é necessário, em primeiro lugar, encurtar a jornada
de trabalho para, no mínimo, seis e, posteriormente, para cinco horas. Isso é
necessário para que os membros da sociedade possam ter o tempo livre neces-
sário para receber uma educação completa. É necessário, além disso, introduzir
a educação politécnica obrigatória universal, que é exigida para que os mem-
bros da sociedade possam escolher livremente suas ocupações e não ficar presos
a uma ocupação por toda a vida. É igualmente necessário que as condições de
habitação sejam radicalmente melhoradas e que os salários reais dos trabalha-
dores e empregados sejam pelo menos duplicados, senão mais, tanto por meio
de aumentos diretos de ordenados e salários, e, mais especialmente, por novas
reduções sistemáticas dos preços dos bens de consumo.
Estas são as condições básicas necessárias para preparar o caminho para a
transição para o comunismo.
710 Obras Escolhidas

Somente depois que todas essas condições preliminares forem satisfeitas em


sua totalidade, pode-se esperar que o trabalho seja convertido, aos olhos dos
membros da sociedade, de um incômodo para “a principal necessidade da vida”
(Marx)293 , que “o trabalho se tornará um prazer em vez de ser um fardo” (En-
gels)294 , e que a propriedade social será considerada por todos os membros da
sociedade como a base sagrada e inviolável da existência da sociedade.
Só depois de satisfeitas todas estas condições preliminares na sua totalidade
será possível passar da fórmula socialista, “de cada um segundo a sua capacidade,
a cada um segundo a sua obra”, para a fórmula comunista, “de cada um segundo
a sua capacidade, a cada um de acordo com suas necessidades”.
Esta será uma transição radical de uma forma de economia, a economia do
socialismo, para outra forma superior de economia, a economia do comunismo.
Como vemos, a transição do socialismo para o comunismo não é uma questão
tão simples como o camarada Yaroshenko imagina.
Tentar reduzir esse processo complexo e multiforme, que exige mudanças
econômicas profundas, à “organização racional das forças produtivas”, como faz
o camarada Yaroshenko, é substituir o marxismo pelo bogdanovismo.

II. Outros erros do camarada Yaroshenko

1. De sua opinião incorreta, o camarada Yaroshenko tira conclusões incorre-


tas em relação ao caráter e à província da economia política.
O camarada Yaroshenko nega a necessidade de uma economia política única
para todas as formações sociais, alegando que toda formação social tem suas leis
econômicas específicas. Mas ele está absolutamente errado aí, e está em desa-
cordo com marxistas como Engels e Lenin.
Engels diz que a economia política é “a ciência das condições e formas sob
as quais as várias sociedades humanas produziram e trocaram e, com base nisso,
distribuíram seus produtos”.295 Portanto, a economia política investiga as leis
do desenvolvimento econômico e não as de ninguém. formação social, mas das
várias formações sociais.
Com isso, como sabemos, Lenin concordou plenamente. Em seus comentá-
rios críticos sobre a Economia do Período de Transição de Bukharin, ele disse
que Bukharin estava errado ao restringir a esfera da economia política à produ-
ção de commodities e, acima de tudo, à produção capitalista, observando que, ao
fazer isso, Bukharin estava dando “um passo para trás em relação a Engels”.296
Em plena conformidade com isso está a definição de economia política dada
no anteprojeto de livro didático, quando diz que economia política é a ciência
que estuda “as leis da produção social e da distribuição dos valores materiais nas
várias fases do desenvolvimento da sociedade humana”.
293 Karl Marx, “Crítica ao Programa de Gotha”, Obras Escolhidas de Karl Marx e Friedrich Engels,
ed. ing., Moscou, 1951, Vol. 2, p.23.
294 Friedrich Engels, “Anti-Dühring”, ed. ing., Moscou, 1954, p. 408.
295 Ibid, p. 208.
296 V. I. Lenin, Comentários Críticos sobre a “Economia do Período de Transição” de Bukharin, ed.

rus.
J. V. Stalin 711

Isso é compreensível. As várias formações sociais são regidas em seu desen-


volvimento econômico não apenas por suas próprias leis econômicas específicas,
mas também pelas leis econômicas que são comuns a todas as formações, como,
por exemplo, a lei que as forças produtivas e as relações de produção são. uni-
dos em uma produção social integral, e a lei que rege as relações entre as forças
produtivas e as relações de produção no processo de desenvolvimento de todas
as formações sociais. Consequentemente, as formações sociais não estão apenas
separadas umas das outras por suas próprias leis específicas, mas também conec-
tadas umas às outras pelas leis econômicas comuns a todas as formações.
Engels estava certo quando disse:
Para levar a cabo esta crítica da economia burguesa, não bastava um conhecimento da forma
capitalista de produção, troca e distribuição. As formas que a precederam ou que ainda
existem a seu lado nos países menos desenvolvidos também tiveram, pelo menos em suas
características principais, que ser examinadas e comparadas.297

É óbvio que aqui, nesta questão, o camarada Yaroshenko está em sintonia com
Bukharin.
Além disso, o camarada Yaroshenko declara que em sua “Economia Política
do Socialismo”, “as categorias da economia política - valor, mercadoria, dinheiro,
crédito, etc., - são substituídas por uma discussão saudável da organização racio-
nal das forças produtivas no social produção”, que, consequentemente, o objeto
de investigação desta economia política não serão as relações de produção do
socialismo, mas “a elaboração e desenvolvimento de uma teoria científica da or-
ganização das forças produtivas, teoria do planejamento econômico, etc., “e que,
sob o socialismo, as relações de produção perdem seu significado independente
e são absorvidas pelas forças produtivas como parte integrante delas.
Deve-se dizer que nunca antes nenhum “marxista” retrógrado se livrou de
uma baboseira tão profana. Imagine uma economia política do socialismo sem
problemas econômicos de produção! Essa economia política existe em algum
lugar da criação? Qual é o efeito, em uma economia política do socialismo, de
substituir os problemas econômicos por problemas de organização das forças pro-
dutivas? O efeito é abolir a economia política do socialismo. E isso é exatamente
o que o camarada Yaroshenko faz – ele abole a economia política do socialismo.
Nesse sentido, sua posição zomba totalmente da de Bukharin. Bukharin disse que
com a eliminação do capitalismo, a economia política também seria eliminada.
O camarada Yaroshenko não diz isso, mas o faz; ele abole a economia política
do socialismo. É verdade que ele finge não concordar totalmente com Bukharin;
mas isso é apenas um truque, e um truque barato. Na verdade, ele está fazendo
o que Bukharin pregou e contra o que Lenin se levantou em armas. O camarada
Yaroshenko está seguindo os passos de Bukharin.
Além disso, o camarada Yaroshenko reduz os problemas da economia política
do socialismo a problemas de organização racional das forças produtivas, a pro-
blemas de planejamento econômico etc. Mas ele está profundamente errado. A
organização racional das forças produtivas, o planejamento econômico, etc., não
são problemas de economia política, mas problemas de política econômica dos
órgãos dirigentes. São duas províncias diferentes, que não devem ser confundi-
297 Friedrich Engels, “Anti-Dühring”, ed. ing., Moscou, 1954, p. 209.
712 Obras Escolhidas

das. O camarada Yaroshenko confundiu essas duas coisas diferentes e fez uma
bagunça terrível. A economia política investiga as leis de desenvolvimento das
relações de produção dos homens. A política econômica tira conclusões práticas
disso, dá-lhes uma forma concreta e constrói seu trabalho diário com base nelas.
Impor à economia política problemas de política econômica é eliminá-la como
ciência.
A província da economia política é a produção, as relações econômicas dos
homens. Inclui: a) as formas de propriedade dos meios de produção; b) a situ-
ação dos vários grupos sociais em produção e suas inter-relações que decorrem
dessas formas, ou o que Marx chama de: “eles trocam suas atividades”;298 as for-
mas de distribuição dos produtos, que são inteiramente determinadas por eles.
Todos esses juntos constituem o domínio da economia política.
Esta definição não contém a palavra “troca”, que figura na definição de En-
gels. É omitido porque “troca” é geralmente entendida por muitos como a troca
de mercadorias, o que é característico não de todas, mas apenas de algumas for-
mações sociais, e isso às vezes dá origem a mal-entendidos, embora a palavra
“troca” com Engels tenha não significa apenas troca de mercadorias. Como se
verá, entretanto, o que Engels quis dizer com a palavra “troca” foi incluído, como
parte integrante, na definição acima. Consequentemente, essa definição da pro-
víncia da economia política coincide totalmente em conteúdo com a definição de
Engels.
2. Quando se fala da lei econômica básica de alguma formação social particu-
lar, geralmente presume-se que esta última não pode ter várias leis econômicas
básicas, que pode ter apenas uma lei econômica básica, que precisamente por
isso é a lei básica. Do contrário, teríamos várias leis econômicas básicas para cada
formação social, o que seria contrário ao próprio conceito de lei básica. Mas o
camarada Yaroshenko não concorda com isso. Ele pensa que é possível ter não
uma, mas várias leis econômicas básicas do socialismo. É incrível, mas é um fato.
Na Discussão Plenária, ele disse:
As magnitudes e correlações dos fundos materiais de produção e reprodução social são deter-
minadas pela força de trabalho disponível engajada na produção social e seu aumento futuro.
Esta é a lei econômica básica da sociedade socialista e determina a estrutura da produção e
reprodução socialista.

Essa é uma lei econômica básica do socialismo. Nesse mesmo discurso, o ca-
marada Yaroshenko declarou:
Na sociedade socialista, as correlações entre os Departamentos I e II são determinadas pelo
fato de que a produção deve ter meios de produção em quantidades suficientes para alistar
todos os membros aptos da população na produção social. Esta é a lei econômica básica do
socialismo e, ao mesmo tempo, uma exigência de nossa Constituição, decorrente do direito
ao trabalho dos cidadãos soviéticos.

Essa, por assim dizer, é a segunda lei econômica básica do socialismo.


Por fim, em sua carta aos membros do Bureau Político, o camarada Yaroshen-
ko declara:
298Karl Marx, “Trabalho Assalariado e Capital”, Obras Escolhidas de Karl Marx e Friedrich Engels,
ed. ing., Moscou, 1951, Vol. I, p. 83.
J. V. Stalin 713

Consequentemente, as características e requisitos essenciais da lei econômica básica do soci-


alismo podem, parece-me, ser formulados aproximadamente da seguinte forma: a expansão
contínua e o aperfeiçoamento da produção das condições materiais e culturais de vida da
sociedade.

Aqui temos uma terceira lei econômica básica do socialismo.


Se todas essas leis são leis econômicas básicas do socialismo, ou apenas uma
delas, e se apenas uma delas, que exatamente – a essas questões o camarada Yaro-
shenko não responde em sua última carta dirigida aos membros do Bureau Polí-
tico. Ao formular a lei econômica básica do socialismo em sua carta aos membros
do Bureau Político, ele “esqueceu”, deve-se presumir que em seu discurso na Dis-
cussão Plenária três meses antes ele já havia formulado duas outras leis econômi-
cas básicas do socialismo, evidentemente acreditando que ninguém notaria essa
manobra duvidosa, para dizer o mínimo. Mas, como vemos, ele calculou mal.
Suponhamos que as duas primeiras leis econômicas básicas do socialismo for-
muladas pelo camarada Yaroshenko não existam mais, e que a partir de agora ele
considere como lei econômica básica do socialismo a terceira, que formulou em
sua carta aos membros do Partido Político Escritório. Voltemos a esta carta.
O camarada Yaroshenko diz nesta carta que não concorda com a definição da
lei econômica básica do socialismo que o camarada Stalin deu em suas “observa-
ções”. Ele diz:
O principal nesta definição é “assegurar a satisfação máxima de (...) os requisitos de toda a
sociedade.” A produção é apresentada aqui como o meio para atingir este objetivo principal
- a satisfação das necessidades. Tal definição fornece bases para supor que a lei econômica
básica do socialismo formulada por você se baseia não na primazia da produção, mas na
primazia do consumo.

É evidente que o camarada Yaroshenko falhou completamente em compreen-


der a essência do problema e não vê que falar sobre o primado do consumo ou
da produção não tem absolutamente nada a ver com o caso. Quando se fala da
primazia de qualquer processo social sobre outro, geralmente presume-se que os
dois processos são mais ou menos homogêneos em caráter. Pode-se e deve-se fa-
lar da primazia da produção dos meios de produção sobre a produção dos meios
de consumo, porque a produção está envolvida em ambos os casos e, portanto,
são mais ou menos homogêneos. Mas não se pode falar, e seria errado falar,
da primazia do consumo sobre a produção, ou da produção sobre o consumo,
porque produção e consumo são duas esferas inteiramente diferentes, as quais,
é verdade, estão conectadas uma com a outra, mas que são esferas diferentes da
mesma forma. O camarada Yaroshenko obviamente falha em perceber que o
que estamos falando aqui não é a primazia do consumo ou da produção, mas
de que objetivo a sociedade fixa a produção social, a que propósito ela subor-
dina a produção social, digamos sob o socialismo. Portanto, quando o camarada
Yaroshenko diz que “a base da vida da sociedade socialista, como de todas as ou-
tras sociedades, é a produção”, isso não vem ao caso. O camarada Yaroshenko
esquece que os homens não produzem para produzir, mas para satisfazer suas ne-
cessidades. Ele esquece que a produção divorciada da satisfação das necessidades
da sociedade murcha e morre.
Podemos falar em geral dos objetivos da produção capitalista ou socialista, dos
objetivos aos quais a produção capitalista ou socialista está subordinada? Acho
714 Obras Escolhidas

que podemos e devemos.


Marx diz:
O objetivo direto da produção capitalista não é a produção de bens, mas a produção de mais-
valia, ou do lucro em sua forma desenvolvida; não o produto, mas o produto excedente.
Desse ponto de vista, o próprio trabalho é produtivo apenas na medida em que cria lucro ou
produto excedente para o capital. Na medida em que o trabalhador não o cria, seu trabalho
é improdutivo. Consequentemente, a soma total do trabalho produtivo aplicado interessa
ao capital apenas na medida em que por meio dele – ou em relação a ele – a soma total do
trabalho excedente aumenta. Somente nessa medida o que é chamado de tempo de trabalho
necessário é necessário. Na medida em que não produz esse resultado, é supérfluo e deve
ser interrompido.

É objetivo constante da produção capitalista produzir o máximo de mais-valia ou mais-produto


com o mínimo de capital adiantado; na medida em que esse resultado não é alcançado sobre-
carregando o trabalhador, é uma tendência de o capital procurar produzir um dado produto
com o mínimo de despesas – economizando força de trabalho e custos. (...)

Os próprios trabalhadores figuram nesta concepção como o que eles realmente são na pro-
dução capitalista – apenas meios de produção; não um objetivo em si e não o objetivo da
produção.299

Essas palavras de Marx são notáveis não apenas porque definem o objetivo da
produção capitalista de forma concisa e precisa, mas também porque indicam o
objetivo básico, o objetivo principal, que deve ser estabelecido para a produção
socialista.
Consequentemente, o objetivo da produção capitalista é a obtenção de lucros.
Quanto ao consumo, o capitalismo só precisa dele na medida em que garanta a
obtenção de lucro. Fora disso, o consumo não significa nada para o capitalismo.
O homem e suas necessidades desaparecem de seu campo de visão.
Qual é o objetivo da produção socialista? Qual é o propósito principal ao qual
a produção social deve ser subordinada sob o socialismo?
O objetivo da produção socialista não é o lucro, mas o homem e suas neces-
sidades, ou seja, a satisfação de suas necessidades materiais e culturais. Como
se afirma nas “observações” do camarada Stalin, o objetivo da produção socia-
lista é “assegurar a satisfação máxima das necessidades materiais e culturais em
constante crescimento de toda a sociedade”.
O camarada Yaroshenko pensa que o que o confronta aqui é a “primazia” do
consumo sobre a produção. Isso, é claro, é um equívoco. Na verdade, o que
temos aqui não é a primazia do consumo, mas a subordinação da produção soci-
alista ao seu objetivo principal de assegurar a satisfação máxima das necessidades
materiais e culturais em constante crescimento de toda a sociedade.
Consequentemente, a satisfação máxima das necessidades materiais e cultu-
rais em constante crescimento de toda a sociedade é o objetivo da produção so-
cialista; a expansão e o aperfeiçoamento contínuos da produção socialista com
base em técnicas superiores são os meios para atingir o objetivo.
Essa é a lei econômica básica do socialismo.
Desejando preservar o que ele chama de “primazia” da produção sobre o con-
sumo, o camarada Yaroshenko afirma que a “lei econômica básica do socialismo”
299 Karl Marx e Friedrich Engels, “Teoria da Mais-Valia”, Werke, ed. ale., Vol. 26, Parte 2, Capítulo
18.
J. V. Stalin 715

consiste na “expansão contínua e no aperfeiçoamento da produção das condições


materiais e culturais da sociedade”. Isso está absolutamente errado. O camarada
Yaroshenko distorce grosseiramente e corrompe a fórmula dada nas “observa-
ções” do camarada Stalin. Com ele, a produção é convertida de meio em fim, e
a satisfação máxima das necessidades materiais e culturais em constante cresci-
mento da sociedade é descartada. O que obtemos é a expansão da produção pelo
bem da expansão da produção, a produção como um objetivo em si; o homem e
suas necessidades desaparecem do campo de visão do camarada Yaroshenko.
Portanto, não é surpreendente que, com o desaparecimento do homem como
objetivo da produção socialista, todos os vestígios do marxismo desapareçam da
“concepção” do camarada Yaroshenko.
E assim, o que o camarada Yaroshenko chega não é à “primazia” da produção
sobre o consumo, mas algo como a “primazia” da ideologia burguesa sobre a
ideologia marxista.
3. Uma questão em si é a teoria da reprodução de Marx.
O camarada Yaroshenko afirma que a teoria marxista da reprodução é uma
teoria da reprodução capitalista apenas, que não contém nada que possa ter va-
lidade para outras formações sociais, a formação social socialista em particular.
Ele diz:
A extensão do esquema de reprodução de Marx, que ele elaborou para a economia capitalista,
à produção social socialista é fruto de uma compreensão dogmática da teoria de Marx e vai
contra a essência de sua teoria.300

Ele afirma ainda:


O esquema de reprodução de Marx não corresponde às leis econômicas da sociedade socia-
lista e não pode servir de base para a investigação da reprodução socialista.301

A respeito da teoria da reprodução simples de Marx, que estabelece uma


correlação definitiva entre a produção dos meios de produção (Departamento I)
e a produção dos meios de consumo (Departamento II), o camarada Yaroshenko?
diz:
Na sociedade socialista, a correlação entre os Departamentos I e II não é determinada pela
fórmula de Marx v + m do Departamento I e do Departamento II.302 Não deveria haver tal
interconexão no desenvolvimento entre os Departamentos I e H sob condições socialistas.303

Ele afirma:
A teoria da correlação entre os departamentos I e II elaborada por Marx não é aplicável em
nossas condições socialistas, uma vez que a teoria de Marx é baseada na economia capitalista
e suas leis.304

É assim que o camarada Yaroshenko faz picadinho da teoria da reprodução


de Marx.
300 Discurso do camarada Yaroshenko na discussão plenária.
301 Ibid.
302 Aqui, “V” significa capital variado, “M” significa mais-valia e “C” significa capital constante. Para

a fórmula, ver Karl Marx, “O Capital”, ed. ing., Vol. 2, Capítulo 20.
303 Discurso do camarada Yaroshenko na discussão plenária.
304 Carta do camarada Yaroshenko aos membros do Bureau Político do Comitê Central.
716 Obras Escolhidas

É claro que a teoria da reprodução de Marx, que foi fruto de uma investigação
das leis do modo de produção capitalista, reflete o caráter específico deste último
e, naturalmente, está revestida da forma de relações capitalista-valor mercado-
ria. Não poderia ser diferente. Mas quem vê na teoria da reprodução de Marx
apenas sua forma, e não observa seus fundamentos, sua substância essencial, que
vale não apenas para a formação social capitalista, não tem compreensão alguma
dessa teoria. Se o camarada Yaroshenko tivesse qualquer compreensão do as-
sunto, ele teria percebido a verdade evidente de que o esquema de reprodução
de Marx não começa e termina com uma reflexão do caráter específico do modo
de produção capitalista, que ao mesmo tempo O tempo contém um grande nú-
mero de princípios fundamentais sobre o tema da reprodução, que valem para
todas as formações sociais, particularmente e especialmente para a formação so-
cialista. Esses princípios fundamentais da teoria marxista da reprodução, como
a divisão da produção social em produção de meios de produção e produção de
meios de consumo; o aumento relativamente maior da produção dos meios de
produção em reprodução em escala ampliada; a correlação entre os Departa-
mentos I e II; produto excedente como única fonte de acumulação; a formação e
designação dos fundos sociais; acumulação como a única fonte de reprodução em
uma escala estendida – todos esses princípios fundamentais da teoria marxista
da reprodução são, ao mesmo tempo, princípios que valem não apenas para a
formação capitalista, e dos quais nenhuma sociedade socialista pode prescindir
no planejamento de sua economia nacional. É significativo que o próprio ca-
marada Yaroshenko, que bufa com tanta altivez dos “esquemas de reprodução”
de Marx, seja obrigado de vez em quando a pedir ajuda a esses “esquemas” ao
discutir problemas de reprodução socialista.
E como Lenin e Marx viam o assunto?
Todos estão familiarizados com os Comentários Críticos de Lenin sobre a “Eco-
nomia do Período de Transição” de Bukharin. Nessas observações, como sabemos,
Lenin reconheceu que a fórmula de Marx da correlação entre os Departamentos
I e II, contra a qual o camarada Yaroshenko se levanta em armas, é válida tanto
para o socialismo quanto para o “comunismo puro”, isto é, para a segunda fase
do comunismo.
Quanto a Marx, ele, como sabemos, não gostou de se desviar de sua investi-
gação das leis da produção capitalista e não discutiu, em seu Capital, a aplicabi-
lidade de seus esquemas de reprodução ao socialismo. No entanto, no Capítulo
XX, Vol. II do Capital, na seção “O Capital Constante do Departamento I”, onde
examina a troca de produtos do Departamento I dentro desse departamento,
Marx, como que de passagem, observa que no socialismo a troca de produtos
dentro desse departamento ocorreria com a mesma regularidade do modo de
produção capitalista. Ele diz:
Se a produção fosse socializada, ao invés de capitalista, é evidente que esses produtos do
Departamento I seriam redistribuídos com a mesma regularidade como meios de produção
para as várias linhas de produção deste departamento, para fins de reprodução, uma parte
permanecendo diretamente nessa esfera de produção que o criou, passando outra para ou-
tras linhas de produção do mesmo departamento, mantendo assim um intercâmbio mútuo
constante entre as várias linhas de produção deste departamento.305

305 Karl Marx, “O Capital”, ed. ing., Vol. 2, Capítulo 20, Seção 6.
J. V. Stalin 717

Consequentemente, Marx de forma alguma considerou que sua teoria da re-


produção fosse válida apenas para o modo de produção capitalista, embora fos-
sem as leis do modo de produção capitalista que ele estava investigando. Vemos,
ao contrário, que ele sustentava que sua teoria da reprodução poderia ser válida
também para o modo de produção socialista.
Deve-se observar que, ao analisar a economia do socialismo e do período de
transição ao comunismo em sua Crítica do Programa de Gotha, Marx parte dos
princípios fundamentais de sua teoria da reprodução, evidentemente considerando-
os obrigatórios para o sistema comunista.
Também deve ser observado que quando Engels, em seu Anti-Dühring, critica
o “sistema socialitário” de Dühring e discute a economia do sistema socialista,
ele também parte dos princípios fundamentais da teoria da reprodução de Marx,
considerando-os obrigatórios para o comunista sistema.
Esses são os fatos.
Parece, então, que também aqui, na questão da reprodução, o camarada Ya-
roshenko, apesar de sua atitude zombeteira para com os “esquemas” de Marx,
voltou a cair no banco de areia.
4. O camarada Yaroshenko conclui a sua carta aos membros do Bureau Polí-
tico com a proposta de que lhe seja confiada a compilação da “Economia Política
do Socialismo”. Ele escreve: “Com base na definição da província da ciência
político-econômica do socialismo delineada por mim na reunião plenária, no
painel de trabalho e na presente carta, e utilizando o método dialético marxista,
eu poderia, com a ajuda de dois assistentes, trabalhar no espaço de um ano, ou
um ano e meio no máximo, a solução teórica dos problemas básicos da economia
política do socialismo, isto é, expor o marxista, o leninista. Teoria stalinista da
economia política do socialismo, uma teoria que converteria esta ciência em uma
arma eficaz da luta do povo pelo comunismo”.
Devemos confessar que a modéstia não é uma das falhas do camarada Yaro-
shenko – “até o contrário”, pode-se dizer, tomando emprestado o estilo de alguns
de nossos escritores.
Já foi assinalado acima que o camarada Yaroshenko confunde a economia
política do socialismo com a política econômica dos órgãos dirigentes. Aquilo
que ele considera o domínio da economia política do socialismo – organização
racional das forças produtivas, planejamento econômico, formação de fundos
sociais, etc. – é o domínio da política econômica dos órgãos dirigentes, e não da
economia política dos socialismo.
Não digo nada sobre o fato de que os graves erros cometidos pelo camarada
Yaroshenko e sua “opinião” não marxista não levam ninguém a confiar-lhe tal
tarefa.
Conclusões:
i) A reclamação que o camarada Yaroshenko faz aos dirigentes da discussão
é insustentável, uma vez que eles, sendo marxistas, não podiam em seus docu-
mentos resumidos refletir sua “opinião” não marxista;
ii) O pedido do camarada Yaroshenko para que lhe confiem a redação da
economia política do socialismo não pode ser levado a sério, pelo menos porque
718 Obras Escolhidas

cheira a Khlestakovismo.306
J. Stalin
22 de maio de 1952
Resposta aos camaradas A. V. Sanina e V. G. Venzher
Recebi suas cartas. Pode-se ver por eles que seus autores estão fazendo um
estudo profundo e sério dos problemas econômicos de nosso país. Há um grande
número de formulações corretas e argumentos interessantes nas cartas. Mas ao
lado disso, existem alguns erros teóricos graves. É sobre esses erros que proponho
me alongar nesta resposta.

1. Caráter das Leis Econômicas do Socialismo

Os camaradas Sanina e Venzher afirmam que “somente por causa da ação


consciente dos cidadãos soviéticos engajados na produção material é que as leis
econômicas do socialismo surgem”. Esta opinião está absolutamente incorreta.
As leis do desenvolvimento econômico existem objetivamente, fora de nós,
independentemente da vontade e da consciência do homem? O marxismo res-
ponde a essa pergunta afirmativamente. O marxismo afirma que as leis da eco-
nomia política do socialismo são um reflexo, nas mentes dos homens, de leis ob-
jetivas que existem fora de nós. Mas a fórmula dos camaradas Sanina e Venzher
responde a esta pergunta negativamente. Isso significa que esses camaradas estão
adotando a posição de uma teoria incorreta que afirma que, sob o socialismo, as
leis do desenvolvimento econômico são “criadas”, “transformadas” pelos órgãos
dirigentes da sociedade. Em outras palavras, eles estão rompendo com o mar-
xismo e assumindo uma posição de idealismo subjetivo.
É claro que os homens podem descobrir essas leis objetivas, conhecê-las e,
contando com elas, utilizá-las no interesse da sociedade. Mas eles não podem
“criá-los”, nem podem “transformá-los”. Suponha por um momento que acei-
temos essa teoria incorreta que nega a existência de leis objetivas da atividade
econômica sob o socialismo e que proclama a possibilidade de “criar” e “trans-
formar” as leis econômicas. Para onde isso nos levaria? Isso nos levaria ao reino
do caos e do acaso, deveríamos nos encontrar na dependência escrava das chan-
ces, e deveríamos perder a possibilidade não apenas de compreender, mas de
simplesmente encontrar nosso caminho neste caos de chances.
O efeito seria que estaríamos destruindo a economia política como ciência,
porque a ciência não pode existir e se desenvolver a menos que reconheça a exis-
tência de leis objetivas e as estude. E ao destruir a ciência, estaríamos perdendo
a possibilidade de prever o curso da evolução da vida econômica do país, ou seja,
deveríamos estar perdendo a possibilidade de fornecer até mesmo a liderança
econômica mais elementar.
No final, devemos nos encontrar à mercê de aventureiros “econômicos” que
estão prontos para “destruir” as leis do desenvolvimento econômico e “criar” no-
vas leis sem qualquer compreensão ou consideração pela lei objetiva.
306Refere-se à Khlestakov, figura central na peça “O Inspetor Geral” de Nikolai Gogol. Significa um
impostor, um fanfarrão.
J. V. Stalin 719

Todos estão familiarizados com a formulação clássica da posição marxista so-


bre esta questão dada por Engels em seu Anti-Dühring:
As forças sociais ativas funcionam exatamente como as forças naturais: cegamente, forço-
samente, destrutivamente, desde que não as compreendamos e não as consideremos. Mas
quando os compreendemos, quando apreendemos sua ação, sua direção, seus efeitos, de-
pende apenas de nós mesmos sujeitá-los cada vez mais à nossa própria vontade e, por meio
deles, alcançar nossos próprios fins. E isso vale muito especialmente para as poderosas forças
produtivas de hoje. Enquanto nos recusarmos obstinadamente a compreender a natureza e o
caráter dessas forças produtivas – e esse entendimento vai contra a natureza do modo de pro-
dução capitalista e seus defensores – enquanto essas forças estão trabalhando apesar de nós,
em oposição a nós, enquanto eles nos dominam, como mostramos acima em detalhes. Mas
quando uma vez que sua natureza é compreendida, eles podem, nas mãos dos produtores tra-
balhando juntos, ser transformados de demônios mestres em servos dispostos. A diferença é
aquela entre a força destrutiva da eletricidade no relâmpago da tempestade e a eletricidade
sob comando do telégrafo e do arco voltaico; a diferença entre uma conflagração e o fogo
trabalhando a serviço do homem. Com esse reconhecimento, enfim, da real natureza das
forças produtivas de hoje, a anarquia social da produção dá lugar a uma regulação social da
produção sobre um plano definido, de acordo com as necessidades da comunidade e de cada
indivíduo. Então, o modo de apropriação capitalista, em que o produto escraviza primeiro o
produtor e depois o apropriador, é substituído pelo modo de apropriação dos produtos que
se baseia na natureza dos meios de produção modernos; de um lado, a apropriação social di-
reta, como meio de manutenção e extensão da produção; de outro, a apropriação individual
direta, como meio de subsistência e de fruição.307

2. Medidas para elevar a propriedade da fazenda coletiva ao


nível de propriedade pública

Que medidas são necessárias para elevar a propriedade da fazenda coletiva,


que, obviamente, não é propriedade pública, ao nível de propriedade pública
(“nacional”)?
Alguns camaradas pensam que o que se deve fazer é simplesmente naciona-
lizar a propriedade da fazenda coletiva, para proclamá-la propriedade pública,
como se fazia no passado no caso da propriedade capitalista. Tal proposta seria
absolutamente errada e totalmente inaceitável. A propriedade da fazenda co-
letiva é propriedade socialista e simplesmente não podemos tratá-la da mesma
forma que a propriedade capitalista. Do fato de que a propriedade da fazenda
coletiva não é propriedade pública, de modo algum se segue que não seja pro-
priedade socialista.
Esses camaradas acreditam que a conversão da propriedade de indivíduos ou
grupos de indivíduos em propriedade do Estado é a única, ou pelo menos a me-
lhor forma de nacionalização. Isso não é verdade. O fato é que a conversão em
propriedade estatal não é a única, nem mesmo a melhor, forma de nacionaliza-
ção, mas a forma inicial de nacionalização, como Engels muito acertadamente
diz no Anti-Dühring. Inquestionavelmente, enquanto o Estado existir, a conver-
são em propriedade estatal é a forma inicial mais natural de nacionalização. Mas
o Estado não existirá para sempre. Com a ampliação da esfera de atuação do
socialismo na maioria dos países do mundo, o Estado morrerá e, é claro, a con-
versão da propriedade de indivíduos ou grupos de indivíduos em propriedade
estatal perderá consequentemente seu significado. O Estado terá morrido, mas
307 Friedrich Engels, “Anti-Dühring”, ed. ing., Moscou, 1954, pp. 387-88.
720 Obras Escolhidas

a sociedade permanecerá. Portanto, o herdeiro da propriedade pública não será


então o Estado, que terá morrido, mas a própria sociedade, na forma de um
corpo econômico central e dirigente.
Sendo assim, o que deve ser feito para elevar a propriedade da fazenda coletiva
ao nível de propriedade pública?
A proposta dos camaradas Sanina e Venzher como principal meio de conse-
guir tal elevação da propriedade da fazenda coletiva é vender os implementos
básicos de produção concentrados nas estações de máquinas e tratores para as
fazendas coletivas como sua propriedade, liberando assim o Estado da a neces-
sidade de fazer investimentos de capital na agricultura, e de responsabilizar as
próprias fazendas coletivas pela manutenção e desenvolvimento das estações de
máquinas e tratores. Eles dizem:
É errado acreditar que os investimentos em fazendas coletivas devam ser usados principal-
mente para as necessidades culturais da aldeia de fazendas coletivas, enquanto a maior parte
dos investimentos para as necessidades da produção agrícola devem continuar como até então
a cargo do Estado. Não seria mais correto aliviar o Estado desse fardo, visto que as fazendas
coletivas são capazes de tomá-lo inteiramente sobre si? O Estado terá muitos empreendimen-
tos nos quais aplicar seus recursos com vistas à criação de fartura de artigos de consumo no
país.

Os autores apresentam vários argumentos em apoio à sua proposta.


Primeiro. Referindo-se à declaração de Stalin de que os meios de produção
não são vendidos nem mesmo para fazendas coletivas, os autores da proposta
lançam dúvidas sobre essa declaração de Stalin ao declarar que o Estado, afinal,
vende meios de produção para fazendas coletivas, como implementos menores,
como foices e foices, pequenos motores elétricos, etc. Eles consideram que se o
Estado pode vender esses meios de produção às fazendas coletivas, também pode
vender-lhes outros meios de produção, como as máquinas da máquina e do trator
estações.
Este argumento é insustentável. O Estado, claro, vende implementos meno-
res para as fazendas coletivas, como, aliás, tem que fazer de acordo com as Regras
da Artel Agrícola e a Constituição. Mas podemos agrupar em uma categoria im-
plementos menores e meios de produção agrícolas básicos como as máquinas das
estações de máquinas e tratores, ou, digamos, a terra, que, afinal, é também um
dos meios básicos de produção em agricultura? Obviamente não. Eles não po-
dem ser agrupados em uma categoria porque implementos menores não decidem
em nenhum grau o destino da produção da fazenda coletiva, enquanto meios de
produção como as máquinas da máquina e estações de trator e a terra decidem
inteiramente o destino da agricultura em nosso presente condições do dia.
Não deve ser difícil compreender que quando Stalin dizia que os meios de
produção não se vendem às fazendas coletivas, não eram os implementos menores
que tinha em mente, mas os meios básicos de produção agrícola: as máquinas
das máquinas e as estações de trator, a terra. Os autores brincam com as palavras
“meios de produção” e confundem duas coisas diferentes, sem perceber que estão
se metendo numa confusão.
Segundo. Os camaradas Sanina e Venzher referem-se ainda ao fato de que
no período inicial do movimento das fazendas coletivas em massa – final de 1929
e início de 1930 – o próprio CC do PCUS (B) era a favor da transferência das
J. V. Stalin 721

estações de máquinas e tratores para as fazendas coletivas como sua propriedade,


obrigando-os a pagar o custo da máquina e das estações de trator por um período
de três anos. Consideram que embora nada disso tenha acontecido na altura,
“face à pobreza” dos kolkhozes, agora que enriqueceram, convém regressar a esta
política, nomeadamente, a venda da máquina e das estações de trator. às fazendas
coletivas.
Este argumento é igualmente insustentável. Uma decisão realmente foi ado-
tada pelo CC do PCUS (B) no início de 1930 de vender as estações de máquinas
e tratores para fazendas coletivas. Foi adotado por sugestão de um grupo de
trabalhadores de choque da fazenda coletiva como um experimento, como uma
tentativa, com a ideia de voltar à questão em uma data anterior e reexaminá-
la. Mas o primeiro julgamento demonstrou a inadmissibilidade desta decisão, e
poucos meses depois, ou seja, no final de 1930, foi rescindida.
A subsequente disseminação do movimento da fazenda coletiva e o desenvol-
vimento da construção da fazenda coletiva convenceu definitivamente tanto os
coletivos quanto os dirigentes de que a concentração dos implementos básicos
da produção agrícola nas mãos do Estado, nas mãos da máquina e estações de
trator, era a única forma de garantir um alto índice de expansão da produção da
fazenda coletiva.
Estamos todos satisfeitos com os enormes avanços que a produção agrícola de
nosso país está obtendo, com o aumento da produção de grãos, algodão, linho,
beterraba, etc. Qual é a origem desse aumento? É o acréscimo de equipamentos
técnicos de última geração, as inúmeras máquinas de última geração que aten-
dem a todos os ramos de produção. Não é uma questão de maquinaria em geral;
a questão é que as máquinas não podem ficar paradas, devem ser aperfeiçoadas
o tempo todo, máquinas velhas sendo descartadas e substituídas por novas, e as
novas por mais novas ainda. Sem isso, a marcha de nossa agricultura socialista
seria impossível; grandes colheitas e abundância de produtos agrícolas estariam
fora de questão. Mas o que está envolvido em demolir centenas de milhares de
tratores de rodas e substituí-los por tratores de lagarta, em substituir dezenas de
milhares de colheitadeiras obsoletas por outras mais modernas, em criar novas
máquinas, digamos, para colheitas industriais? Envolve um gasto de bilhões de
rublos, que só podem ser recuperados depois de decorridos seis ou oito anos.
Nossas fazendas coletivas são capazes de suportar tal despesa, mesmo que sua
renda chegue à casa dos milhões? Não, não o são, visto que não estão em condi-
ções de arcar com as despesas de bilhões de rublos, que só podem ser recuperadas
após um período de seis ou oito anos. Tais despesas podem ser suportadas ape-
nas pelo Estado, pois ele, e somente ele, está em posição de arcar com as perdas
decorrentes do sucateamento de máquinas velhas e sua substituição por novas;
porque ela, e só ela, está em condições de suportar essas perdas durante seis ou
oito anos e só então recuperar os gastos.
Diante disso, qual seria o efeito da venda das máquinas e das estações de
tratores às fazendas coletivas como sua propriedade? O efeito seria envolver as
fazendas coletivas em grandes perdas e arruiná-las, minar a mecanização da agri-
cultura e retardar o desenvolvimento da produção das fazendas coletivas.
Conclui-se, pois, que, ao propor que as máquinas e as estações de trator se-
722 Obras Escolhidas

jam vendidas às fazendas coletivas como sua propriedade, os camaradas Sanina e


Venzher estão sugerindo um passo na reversão do velho atraso e tentando fazer
voltar a roda da história.
Assumindo por um momento que aceitássemos a proposta dos camaradas Sa-
nina e Venzher e começássemos a vender os implementos básicos de produção, as
estações de máquinas e tratores, para as fazendas coletivas como sua propriedade.
Qual seria o resultado?
O resultado seria, primeiro, que as fazendas coletivas se tornariam as proprie-
tárias dos instrumentos básicos de produção; isto é, seu status seria excepcional,
como não é compartilhado por nenhuma outra empresa em nosso país, pois,
como sabemos, mesmo as empresas nacionalizadas não possuem seus instrumen-
tos de produção. Como, por quais considerações de progresso e avanço, esse
status excepcional das fazendas coletivas pode ser justificado? Pode-se dizer que
tal status facilitaria a elevação da propriedade da fazenda coletiva ao nível de
propriedade pública, que aceleraria a transição de nossa sociedade do socialismo
ao comunismo? Não seria mais verdadeiro dizer que tal status poderia apenas
cavar um abismo mais profundo entre a propriedade da fazenda coletiva e a pro-
priedade pública, e não nos aproximará mais do comunismo, mas, ao contrário,
nos afastaria dele?
O resultado seria, em segundo lugar, uma extensão da esfera de operação da
circulação de mercadorias, porque uma quantidade gigantesca de instrumentos
de produção agrícola entraria em sua órbita. O que pensam os camaradas Sanina
e Venzher – é a extensão da esfera da circulação de mercadorias calculada para
promover nosso avanço em direção ao comunismo? Não seria mais verdadeiro
dizer que nosso avanço em direção ao comunismo só seria retardado por ele?
O erro básico dos camaradas Sanina e Venzher reside no fato de que eles não
entendem o papel e o significado da circulação de mercadorias sob o socialismo;
que eles não entendem que a circulação de mercadorias é incompatível com a
transição prospectiva do socialismo para o comunismo. Eles evidentemente pen-
sam que a transição do socialismo para o comunismo é possível mesmo com a
circulação de mercadorias, que a circulação de mercadorias não pode ser obs-
táculo para isso. Esse é um erro profundo, decorrente de uma compreensão
inadequada do marxismo.
Criticando a “comuna econômica” de Dühring, que funciona nas condições
de circulação de mercadorias, Engels, em seu Anti-Dühring, mostra de maneira
convincente que a existência da circulação de mercadorias estava inevitavelmente
fadada a levar as chamadas “comunas econômicas” de Dühring à regeneração do
capitalismo. Os camaradas Sanina e Venzher evidentemente não concordam com
isso. Pior para eles. Mas nós, marxistas, aderimos à visão marxista de que a tran-
sição do socialismo para o comunismo e o princípio comunista de distribuição de
produtos de acordo com as necessidades excluem todas as trocas de mercadorias
e, portanto, impedem a conversão de produtos em mercadorias e, com isso, sua
conversão em valor.
Tanto para a proposta e os argumentos dos camaradas Sanina e Venzher.
Mas o que, então, deve ser feito para elevar a propriedade da fazenda coletiva
ao nível de propriedade pública?
J. V. Stalin 723

A fazenda coletiva é um tipo de empreendimento incomum. Opera em ter-


ras e cultiva terras que há muito são públicas, e não propriedade de fazendas
coletivas. Consequentemente, a fazenda coletiva não é dona da terra que cultiva.
Além disso, a fazenda coletiva opera com implementos básicos de produção
que são públicos, não propriedade da fazenda coletiva. Consequentemente, a
fazenda coletiva não é proprietária de seus implementos básicos de produção.
Além disso, a fazenda coletiva é uma empresa cooperativa: ela utiliza o tra-
balho de seus membros e distribui sua renda entre eles com base em unidades
de jornada de trabalho; possui sua semente, que se renova a cada ano e entra em
produção.
O que, então, a fazenda coletiva possui? Onde está a propriedade da fazenda
coletiva de que ela dispõe livremente, a seu critério? Essa propriedade da fa-
zenda coletiva é o seu produto, o produto da agricultura coletiva: grãos, carne,
manteiga, vegetais, algodão, beterraba, linho, etc., sem contar as construções e
a lavoura pessoal dos agricultores coletivos em seus lotes familiares. O fato é
que parte considerável desse produto, o excedente da produção da fazenda co-
letiva, vai para o mercado e, portanto, é incluído no sistema de circulação das
mercadorias. É precisamente esta circunstância que agora impede a elevação
da propriedade coletiva à categoria de propriedade pública. É, pois, justamente
com esse fim que se deve enfrentar a obra de elevação da propriedade coletiva à
categoria de propriedade pública.
Para elevar a propriedade da fazenda coletiva ao nível de propriedade pública,
o excedente da produção da fazenda coletiva deve ser excluído do sistema de
circulação de mercadorias e incluído no sistema de troca de produtos entre a
indústria estatal e as fazendas coletivas. Esse é o ponto.
Ainda não temos um sistema desenvolvido de troca de produtos, mas os rudi-
mentos de tal sistema existem na forma de “comercialização” de produtos agrí-
colas. Já há bastante tempo, como sabemos, os produtos da cultura do algodão,
do linho, da beterraba e de outras fazendas coletivas são “comercializados”. Eles
não são “comercializados” por completo, é verdade, mas apenas parcialmente,
ainda assim são “comercializados”. Diga-se de passagem que “comercialização”
não é uma palavra feliz e deve ser substituída por “troca de produtos”. A tarefa é
estender esses rudimentos de troca de produtos a todos os ramos da agricultura
e desenvolvê-los em um amplo sistema, pelo qual as fazendas coletivas recebe-
riam por seus produtos não apenas dinheiro, mas também e principalmente as
manufaturas de que precisam. Tal sistema exigiria um imenso aumento nos bens
alocados pela cidade ao campo e, portanto, teria de ser introduzido sem qual-
quer pressa especial, e apenas quando os produtos da cidade se multiplicassem.
Mas deve ser introduzido de forma inabalável e sem hesitação, contraindo passo
a passo a esfera de operação da circulação de mercadorias e ampliando a esfera
de operação da troca de produtos.
Tal sistema, ao contrair a esfera de operação da circulação de mercadorias,
facilitará a transição do socialismo para o comunismo. Além disso, possibilitará
a inclusão da propriedade básica das fazendas coletivas, produto da agricultura
coletiva, no sistema geral de planejamento nacional.
Esse será um meio real e eficaz de elevar a propriedade da fazenda coletiva
724 Obras Escolhidas

ao nível de propriedade pública nas nossas condições atuais.


Esse sistema será vantajoso para o campesinato da fazenda coletiva? Sem dú-
vida, sim. Sim, porque o campesinato da fazenda coletiva receberá muito mais
produtos do Estado do que sob a circulação de mercadorias, e a preços muito
mais baratos. Todos sabem que as fazendas coletivas que têm contratos de troca
de produtos (“merchandising”) com o governo recebem vantagens incompara-
velmente maiores do que as fazendas que não têm esses contratos. Se o sistema
de troca de produtos for estendido a todos os kolkhoses do país, essas vantagens
estarão à disposição de todo o nosso campesinato kolkhoziano.
J. Stalin
28 de setembro de 1952
J. V. Stalin 725

Discurso no 19º Congresso do PCUS


14 de outubro de 1952

Camaradas!
Permitam-me, em nome de nosso Congresso do Partido, expressar nossos
agradecimentos a todos os partidos e organizações irmãos cujos representantes
honraram nosso Congresso do Partido com sua presença, ou que enviaram ao
nosso Congresso do Partido saudações de amizade, por seus votos de nosso maior
sucesso e por sua confiança. (Aplausos prolongados.)
Para nós, esta confiança é especialmente valiosa porque significa a sua dispo-
nibilidade para apoiar o nosso Partido na sua luta por um futuro melhor para o
povo, na sua luta contra a guerra, na sua luta pela manutenção da paz. (Aplausos
prolongados.)
Seria um erro acreditar que nosso Partido, que se tornou uma grande po-
tência, não precisa de mais apoio. Isso estaria errado. Nosso Partido e nosso
país precisam da confiança, simpatia e apoio contínuos dos povos irmãos fora de
nossas fronteiras e sempre precisarão.
A qualidade especial deste apoio reside no fato de que todo apoio aos esforços
de paz de nosso Partido por parte de cada partido fraterno, significa simultane-
amente o apoio de seu próprio povo em sua luta para manter a paz. Como os
trabalhadores ingleses nos anos 1918-1919, durante o ataque armado da burgue-
sia inglesa à União Soviética, organizaram sua luta contra a guerra sob o lema
“Tirem as mãos da Rússia!”, Era um apoio, era acima de tudo um apoio da luta
de seu próprio povo pela paz, e então, também, um apoio da União Soviética.
Se o camarada Thorez ou o camarada Togliatti declaram que seu povo não quer
ser conduzido a uma guerra contra o povo da União Soviética (Aplausos), isso é
um apoio, acima de tudo, um apoio aos trabalhadores e camponeses franceses e
italianos que lutam pela paz, e então, também, um apoio aos esforços de paz da
União Soviética. Explica-se assim a qualidade especial do apoio atual, que os in-
teresses do nosso Partido não só não vão contra os interesses dos pacifistas, mas,
pelo contrário, fundem-se com eles. (Aplausos.) No que diz respeito à União So-
viética, seu interesse na questão da paz mundial não pode ser separado da causa
da paz no mundo inteiro.
Entende-se que nosso Partido deve cumprir seu dever para com seus partidos
irmãos e apoiá-los e a seus povos na luta pela libertação e pela manutenção da
paz. Isso é o que o Partido faz. (Tempestuosos aplausos.) Depois da tomada do po-
der por nosso Partido em 1917, e depois que nosso Partido tomou medidas reais
para eliminar o jugo dos capitalistas e latifundiários, os representantes dos ‘par-
tidos irmãos’, inspirados por nossa ousadia e sucesso de nosso Partido, deu-lhe
o nome de “Brigada de Choque” do movimento revolucionário e do movimento
operário mundial. Assim, expressaram a esperança de que o sucesso da “Brigada
de Choque” aliviasse o sofrimento do povo por estar sob o jugo capitalista. Acho
que nosso Partido cumpriu essas esperanças, especialmente no tempo da segunda
726 Obras Escolhidas

guerra mundial, quando a União Soviética esmagou a tirania fascista alemã e ja-
ponesa e libertou os povos europeus e asiáticos do perigo da escravidão fascista.
(Aplausos.)
É claro que era muito difícil cumprir essa honrosa tarefa enquanto houvesse
apenas uma “Brigada de Choque”, contanto que permanecesse sozinha, a van-
guarda no cumprimento dessa tarefa. Mas isso é passado. Agora é completa-
mente diferente. Agora, da China e Coréia à Tchecoslováquia e Hungria, novas
“Brigadas de choque” apareceram no mapa, na forma de democracias populares;
agora a luta foi facilitada para o nosso Partido e também o trabalho prossegue
melhor. (Aplausos prolongados.)
Uma atenção especial deve ser dada aos partidos comunistas, democráticos ou
operários e camponeses que ainda não estão no poder e que devem realizar o seu
trabalho sob o jugo de um regime burguês estrito. Claro que seu trabalho é mais
difícil. Mas o trabalho deles não é tão difícil como o era para nós, comunistas
russos, na época do tsar, pois o menor passo em frente foi declarado um crime
grave. Os comunistas russos, no entanto, mantiveram-se firmes, não recuaram
das dificuldades e chegaram à vitória. O mesmo acontecerá com essas partes.
Por que esses partidos não têm um trabalho tão difícil como os comunistas
russos tiveram na época do tsarismo?
Porque, antes de tudo, eles têm o exemplo da luta e do sucesso, como na União
Soviética e nos países democráticos populares, antes deles. Consequentemente,
eles podem aprender com os erros e acertos desses países e, assim, facilitar seu
trabalho.
Porque, em segundo lugar, a própria burguesia, a arqui-inimiga do movi-
mento pela liberdade, se tornou diferente, mudou essencialmente, se tornou
mais reacionária, perdeu a cooperação do povo e, portanto, se enfraqueceu.
Entende-se que essas circunstâncias devem também facilitar o trabalho dos par-
tidos revolucionários e democráticos. (Aplausos.)
Antes, a burguesia se apresentava como liberal, ela era a favor da liberdade
democrática burguesa e assim ganhou popularidade junto ao povo. Agora não
há um vestígio remanescente de liberalismo. Já não existe “liberdade de perso-
nalidade” – os direitos pessoais são agora apenas reconhecidos por eles, os donos
do capital, - todos os outros cidadãos são considerados matérias-primas, que são
apenas para exploração. O princípio da igualdade de direitos para pessoas e na-
ções é pisado na poeira e é substituído pelo princípio de plenos direitos para a
minoria exploradora e a falta de direitos da maioria explorada dos cidadãos. A
bandeira da liberdade democrática burguesa foi lançada ao mar. Acho que vo-
cês, os representantes dos partidos comunistas e democráticos, devem pegar esta
bandeira e carregá-la se quiserem conquistar a maioria do povo. Não há mais
ninguém para aumentá-lo. (Aplausos.)
Antes, a burguesia, como cabeça das nações, defendia os direitos e a indepen-
dência das nações e colocava isso “acima de tudo”. Agora não há mais vestígio
desse “princípio nacional”. Agora a burguesia vende os direitos e a indepen-
dência de suas nações por dólares. A bandeira da independência nacional e
da soberania nacional foi jogada ao mar. Sem dúvida, vocês, os representantes
dos partidos comunistas e democráticos, devem erguer esta bandeira e carregá-la
J. V. Stalin 727

adiante se quiserem ser patriotas de seus países, se quiserem ser as potências di-
rigentes das nações. Não há mais ninguém para aumentá-lo. (Aplausos calorosos.)
É assim que estão as coisas no momento.
Entende-se que todas essas circunstâncias devem facilitar o trabalho dos par-
tidos comunistas e democráticos que ainda não estão no poder.
Consequentemente, há todas as bases para o sucesso e a vitória dos partidos
irmãos nas terras do domínio capitalista. (Aplausos.)
Viva nossas festas fraternas! (Aplausos.)
Vida longa e saúde aos dirigentes dos partidos irmãos! (Aplausos.)
Viva a paz entre os povos! (Aplausos.)
Abaixo os incendiários de guerra!
730 Obras Escolhidas
J. V. Stalin 731

PARTE IV

Anexos
J. V. Stalin 733

ANEXO 1 – Telegramas de Guerra


Mensagem Pessoal de Stalin ao Sr. Churchill
Enviado em 18 de julho de 1941

Permita-me agradecê-lo por suas duas mensagens pessoais.


Suas mensagens iniciaram um acordo entre nossos dois governos. Agora,
como você colocou, com todas as justificativas, a União Soviética e a Grã-Bretanha
tornaram-se aliados na luta contra a Alemanha hitlerista. Não tenho dúvidas de
que nossos dois países são fortes o suficiente para derrotar nosso inimigo comum
diante de todas as dificuldades.
Pode não ser inoportuno informá-lo que a posição das tropas soviéticas na
frente permanece tensa. Os resultados da inesperada violação de Hitler do Pacto
de Não-Agressão e o ataque repentino à União Soviética, que colocaram as tropas
alemãs em vantagem, ainda estão afetando a posição dos exércitos soviéticos.
É bastante óbvio que as forças alemãs teriam sido muito mais vantajosamente
colocadas se as tropas soviéticas tivessem que conter o golpe, não ao longo da linha
Kishinev-Lvov-Brest-Bialystok-Kaunas e Vyborg, mas ao longo da linha Odessa-
Kamenets, Podolsk-Minsk e nas proximidades de Leningrado.
Parece-me, além disso, que a posição militar da União Soviética, e pelo mesmo
motivo da Grã-Bretanha, melhoraria substancialmente se uma frente fosse esta-
belecida contra Hitler no Ocidente (norte da França) e no Norte (Ártico).
Uma frente no norte da França, além de desviar as forças de Hitler do Ori-
ente, tornaria impossível a invasão da Grã-Bretanha por Hitler. O estabeleci-
mento desta frente seria popular tanto com o Exército Britânico quanto com a
população do sul da Inglaterra. Estou ciente da dificuldade de estabelecer tal
frente, mas parece-me que, apesar das dificuldades, deve ser feito, não apenas
por nossa causa comum, mas também no próprio interesse da Grã-Bretanha. O
melhor momento para abrir esta frente é agora, vendo que as forças de Hitler
foram trocadas para o Oriente e que ele ainda não foi capaz de consolidar as
posições que tomou no Oriente.
Seria mais fácil ainda abrir uma frente no Norte. Isso exigiria ação apenas
das forças navais e aéreas britânicas, sem tropas de pouso ou artilharia. Forças
terrestres, navais e aéreas soviéticas poderiam participar da operação. Ficaríamos
felizes se a Grã-Bretanha pudesse enviar para lá, digamos, uma divisão leve ou
mais de voluntários noruegueses, que poderiam ser transferidos para o norte da
Noruega para operações insurgentes contra os alemães.
734 Obras Escolhidas

Mensagem pessoal do Primeiro-Ministro Stalin ao


Primeiro-Ministro, Sr. Churchill
Enviado em 3 de setembro de 1941

Por favor, aceite meus agradecimentos pela promessa de vender à União So-
viética mais 200 aviões de caça, além dos 200 caças prometidos anteriormente.
Não tenho dúvidas de que os pilotos soviéticos terão sucesso em dominá-los e
colocá-los em uso.
Devo dizer, no entanto, que estas aeronaves, que parece que não poderemos
usar em breve e nem todas de uma vez, mas em intervalos e em grupos, não
podem mudar seriamente a situação na Frente Oriental. Elas não podem fazê-
lo não apenas por causa da escala da guerra, que requer o contínuo despacho
de um grande número de aeronaves, mas também, e principalmente, porque,
durante as últimas três semanas, a posição das tropas soviéticas se deteriorou
consideravelmente em áreas vitais como a Ucrânia e Leningrado.
O fato é que a relativa estabilização da frente, alcançada há cerca de três se-
manas atrás, foi perturbada nas últimas semanas com a chegada de 30 a 34 novas
divisões de infantaria alemã e um enorme número de tanques e aeronaves na
Frente Oriental, e também pela ativação de 20 divisões finlandesas e 26 rome-
nas. Os alemães olham para a ameaça no Ocidente como um blefe, então eles
estão movendo todas as suas forças do Ocidente para o Oriente com impunidade,
sabendo que não há uma segunda frente no Ocidente nem é provável que haja
uma. Eles acham perfeitamente possível que eles sejam capazes de derrotar seus
inimigos um de cada vez – primeiro os russos e depois os britânicos.
Como resultado, perdemos mais da metade da Ucrânia e, além disso, o ini-
migo está agora nos portões de Leningrado.
Estas circunstâncias levaram à perda da área de minério de ferro Krivoi Rog
e a uma série de fábricas de ferro e aço na Ucrânia, à evacuação por nós de uma
fábrica de alumínio no Dnieper e outra em Tikhvin, uma fábrica de motores e
duas fábricas de aeronaves na Ucrânia e duas fábricas de motores e duas aero-
naves em Leningrado, que não podem começar a produzir em seus novos locais
antes de sete ou oito meses.
Isso resultou em uma diminuição da nossa capacidade de defesa e confrontou
a União Soviética com perigo mortal.
Aqui é pertinente perguntar – qual é a saída para esta situação mais do que
desfavorável.
Acho que a única maneira é abrir uma segunda frente este ano em algum lu-
gar nos Balcãs ou na França, uma que desviasse 30-40 divisões alemãs da Frente
Oriental, e simultaneamente fornecer à União Soviética 30.000 toneladas de alu-
mínio até o início de outubro e uma ajuda mensal mínima de 400 aviões e 500
tanques (de pequeno ou médio porte).
Sem esses dois tipos de ajuda, a União Soviética será derrotada ou enfraque-
cida, na medida em que perderá, por muito tempo, a capacidade de ajudar seus
Aliados através de operações ativas na frente contra o hitlerismo.
Sei que esta mensagem causará alguma vexação à Vossa Excelência. Mas isso
J. V. Stalin 735

não pode ser evitado. A experiência me ensinou a encarar a realidade, não im-
porta o quão desagradável possa ser, e não encolher em dizer a verdade, não
importa o quão desagradável.
A questão do Irã saiu bem, de fato. Operações conjuntas das tropas britânicas
e soviéticas resolveram a questão. E assim será no futuro, enquanto nossas forças
operarem em conjunto. Mas o Irã é apenas um episódio. Não é no Irã, é claro,
que o resultado da guerra será decidido.
A União Soviética, como a Grã-Bretanha, não quer guerra com o Japão. A
União Soviética não considera possível violar tratados, incluindo o tratado de
neutralidade com o Japão. Mas, se o Japão violar esse tratado e atacar a União
Soviética, ele será devidamente rejeitado pelas tropas soviéticas.
Em conclusão, permita-me agradecê-lo pela admiração que expressou pelas
operações das tropas soviéticas, que estão travando uma guerra sangrenta contra
as hordas de ladrões de Hitler por nossa causa de libertação comum.

J. V. Stalin para F. Roosevelt


Enviado em 20 de abril de 1942

Obrigado pela mensagem que recebi em Moscou há alguns dias.


O Governo soviético concorda que é essencial organizar uma reunião en-
tre V. M. Molotov e você para uma troca de opiniões sobre a organização de
uma segunda frente na Europa em um futuro próximo. Molotov pode chegar
a Washington até 10 e 15 de maio, acompanhado por um representante militar
apropriado.
Não é preciso dizer que Molotov também irá a Londres para trocar opiniões
com o Governo britânico.
Não tenho dúvidas de que poderei ter uma reunião pessoal com vocês, a que
atribuo grande importância, especialmente tendo em vista os grandes problemas
de organização da derrota do hitlerismo que confrontam nossos dois países.
Por favor, aceite meus sinceros cumprimentos e desejos de sucesso na luta
contra os inimigos dos Estados Unidos da América.
J. Stalin

J. V. Stalin para W. Churchill


Enviado em 13 de agosto de 1942

Memorando

Como resultado da troca de opiniões em Moscou, em 12 de agosto, estabeleci


que o senhor Churchill, o primeiro-ministro britânico, considera impossível abrir
uma segunda frente na Europa em 1942.
Recorda-se que a decisão de abrir uma segunda frente na Europa em 1942
havia sido alcançada na época da visita de Molotov a Londres, e encontrou ex-
736 Obras Escolhidas

pressão no acordado Comunicado anglo-soviético lançado em 12 de junho pas-


sado.
Recorda-se, ainda, que a abertura de uma segunda frente na Europa foi pro-
jetada para desviar as forças alemãs da Frente Oriental para o Ocidente, para
estabelecer no Ocidente um grande centro de resistência às forças fascistas ale-
mãs e, assim, facilitar a posição das tropas soviéticas na frente soviético-alemã em
1942.
Desnecessário dizer que o Alto Comando Soviético, no planejamento de suas
operações de verão e outono, contava com uma segunda frente sendo aberta na
Europa em 1942.
Será facilmente compreendido que a recusa do Governo britânico em abrir
uma segunda frente na Europa em 1942 dá um golpe moral à opinião pública
soviética, que esperava que a segunda frente fosse aberta, complica a posição do
Exército Vermelho na frente e fere os planos do Alto Comando Soviético.
Não digo nada do fato de que as dificuldades em que o Exército Vermelho
está envolvido, devido à recusa em abrir uma segunda frente em 1942, complicará
as posições da Grã-Bretanha e de outros aliados.
Eu e meus colegas acreditamos que o ano de 1942 oferece as condições mais
favoráveis para uma segunda frente na Europa, vendo que quase todas as forças
alemãs — e suas tropas de elite, também — estão amarradas na Frente Oriental,
enquanto apenas forças insignificantes, e as mais pobres, também, são deixadas
na Europa. É difícil dizer se 1943 oferecerá condições favoráveis para abrir uma
segunda frente como 1942. Por essa razão, achamos que é possível e necessá-
rio abrir uma segunda frente na Europa em 1942. Infelizmente, não consegui
convencer o primeiro-ministro britânico a isso, enquanto o senhor Harriman,
representante do presidente dos EUA nas negociações de Moscou, apoiou plena-
mente o primeiro-ministro.
J. Stalin
13 de agosto de 1942

Mensagem do Primeiro-Ministro Stalin ao


Presidente, Sr. Roosevelt
Enviado em 16 de fevereiro de 1943

[MENSAGEM PESSOAL E SECRETA]

Em 12 de fevereiro, recebi do senhor Churchill uma mensagem dando infor-


mações adicionais sobre as decisões tomadas por vocês dois em Casablanca. Uma
vez que, de acordo com o senhor Churchill, a sua mensagem é uma resposta co-
mum, dando a sua opinião também, gostaria de fazer algumas observações, que
transmiti ao senhor Churchill.
Parece que a data — fevereiro — fixada anteriormente para concluir as ope-
rações na Tunísia está agora prevista para abril. Não há necessidade de demons-
trar, finalmente, a indesejabilidade deste atraso nas operações contra os alemães
e italianos. É agora, quando as tropas soviéticas ainda estão mantendo sua ampla
J. V. Stalin 737

ofensiva, que essa ação das tropas anglo-americanas no norte da África é impe-
rativa. A pressão simultânea sobre Hitler de nossa frente, e da sua na Tunísia,
seria de grande significado positivo para nossa causa comum e criaria dificulda-
des mais sérias para Hitler e Mussolini. Também aceleraria as operações que está
planejando na Sicília e no Mediterrâneo Oriental.
Quanto à abertura de uma segunda frente na Europa, em particular na França,
está prevista, a julgar pela sua comunicação, para agosto ou setembro. Na minha
opinião, porém, a situação exige a redução desses prazos ao máximo e a abertura
de uma segunda frente no Ocidente em uma data muito mais próxima do que
a mencionada. Para que o inimigo não tenha a chance de se recuperar, é muito
importante, ao que me parece, que o golpe vindo do Ocidente, em vez de ser
adiado até a segunda metade do ano, seja dado na primavera ou início do verão.
De acordo com informações confiáveis à nossa disposição, desde o final de de-
zembro, quando, por alguma razão, as operações anglo-americanas na Tunísia
foram suspensas, os alemães movimentaram 27 divisões, incluindo cinco divisões
blindadas, para a frente soviético-alemã da França, dos Países Baixos e da Alema-
nha. Em outras palavras, em vez de a União Soviética ser ajudada desviando as
forças alemãs da frente soviético-alemã, o que temos é um alívio para Hitler, que,
por causa da diminuição nas operações anglo-americanas na Tunísia, foi capaz
de mover tropas adicionais contra os russos.
O precedente indica que quanto mais cedo fizermos uso conjunto das difi-
culdades de campo de Hitler na frente, mais motivos teremos para antecipar a
sua derrota. A menos que levemos isso em conta e aproveitemos o momento pre-
sente para promover nossos interesses comuns, pode muito bem ser que, tendo
ganhado uma trégua e reunido suas forças, os alemães possam se recuperar. Está
claro para você e para nós que tal erro é indesejável e não deve ser cometido.

Do Primeiro-Ministro J. V. Stalin ao Presidente, Sr.


Franklin D. Roosevelt
Enviado em 11 de Junho de 1943

[MENSAGEM PESSOAL E SECRETA]

Sua mensagem me informando de certas decisões sobre assuntos estratégicos


adotados por você e pelo Sr. Churchill chegou a mim em 4 de junho. Obrigado
pela informação.
Parece, pela sua comunicação, que as decisões vão contra as tomadas por você
e pelo senhor Churchill no início deste ano, sobre a data de uma segunda frente
na Europa Ocidental.
O senhor, sem dúvida, recordará que a mensagem conjunta de 26 de janeiro,
enviada por você e pelo senhor Churchill, anunciou a decisão adotada na época
de desviar as consideráveis forças terrestres e aéreas alemãs da frente russa, e
colocar a Alemanha de joelhos em 1943.
Então, em 12 de fevereiro, o senhor Churchill comunicou, em seu nome e
por ele mesmo, o tempo especificado da operação anglo-americana na Tunísia
738 Obras Escolhidas

e no Mediterrâneo, bem como na costa oeste da Europa. A comunicação dizia


que a Grã-Bretanha e os Estados Unidos estavam vigorosamente se preparando
para atravessar o Canal da Mancha em agosto de 1943 e que, se a operação fosse
prejudicada pelo clima ou outras causas, então seria preparada com o objetivo
de ser realizada em maior força em setembro de 1943.
Agora, em maio de 1943, você e o Sr. Churchill decidiram adiar a invasão
anglo-americana da Europa Ocidental até a primavera de 1944. Em outras pala-
vras, a abertura da segunda frente na Europa Ocidental, anteriormente adiada
de 1942 para 1943, está sendo adiada novamente, desta vez até a primavera de
1944.
Sua decisão cria dificuldades excepcionais para a União Soviética, que, for-
çando todos os seus recursos, nos últimos dois anos, está engajada contra as prin-
cipais forças da Alemanha e seus satélites, e deixa o Exército Soviético, que está
lutando não só por seu país, mas também por seus Aliados, a fazer o trabalho so-
zinho, quase solitário, contra um inimigo que ainda é formidável e muito forte.
Preciso falar da desanimadora impressão negativa de que este novo adiamento
da segunda frente e a retenção do nosso Exército, que sacrificou tanto, do apoio
substancial antecipado dos exércitos anglo-americanos, produzirá na União So-
viética — tanto entre o povo quanto no Exército?
Quanto ao Governo soviético, não pode alinhar-se a esta decisão, que, aliás,
foi adotada sem a sua participação e sem qualquer tentativa de uma discussão
conjunta sobre este assunto altamente importante e que pode afetar gravemente
o curso subsequente da guerra.

Do Primeiro-Ministro J. V. Stalin ao
Primeiro-Ministro, Sr. W. Churchill
Enviado em 24 de junho de 1943

[MENSAGEM PESSOAL E SECRETA]

Sua mensagem de 19 de junho foi recebida.


Eu percebo completamente a dificuldade de organizar uma invasão anglo-
americana da Europa Ocidental, em particular, de transferir tropas através do
Canal. A dificuldade também pode ser discernida em suas comunicações.
A partir de suas mensagens do ano passado eu conquistei a convicção de que
você e o Presidente estavam plenamente cientes das dificuldades de organizar
tal operação, e estavam preparando a invasão em conformidade, com o devido
respeito às dificuldades e ao esforço necessário de forças e meios. Mesmo no
ano passado você me disse que uma invasão em larga escala da Europa por tropas
anglo-americanas seria efetuada em 1943. No Aide-mémoire entregue a V. M.
Molotov, em 10 de junho de 1942, você escreveu:
“Finalmente, e o mais importante de tudo, estamos concentrando nosso es-
forço máximo na organização e preparação de uma invasão em larga escala do
continente europeu pelas forças britânicas e americanas em 1943. Não estabele-
cemos limite para o escopo e objetivos desta campanha, que será realizada, em
J. V. Stalin 739

primeira instância, por mais de um milhão de homens, britânicos e americanos,


com forças aéreas de força apropriada.”
No início deste ano, você me informou duas vezes, em seu próprio nome e
em nome do Presidente, de decisões relativas a uma invasão anglo-americana da
Europa Ocidental destinada a “desviar fortes forças terrestres e aéreas alemãs da
frente russa”. Você tinha estabelecido a tarefa de colocar a Alemanha de joelhos
já em 1943, e nomeou setembro como a última data para a invasão.
Na sua mensagem de 26 de janeiro você escreveu:
“Estivemos em conferência com nossos conselheiros militares e decidimos so-
bre as operações que serão realizadas pelas forças americanas e britânicas nos
primeiros nove meses de 1943. Queremos informá-lo de nossas intenções ime-
diatamente. Acreditamos que essas operações, juntamente com sua poderosa
ofensiva, podem muito bem colocar a Alemanha de joelhos em 1943”.
Na sua próxima mensagem, que recebi em 12 de fevereiro, você escreveu,
especificando a data da invasão da Europa Ocidental, decidida por você e pelo
Presidente:
“Também estamos levando os preparativos ao limite de nossos recursos para
uma operação transversal em agosto, na qual unidades britânicas e americanas
participariam. Aqui novamente, embarcações de transporte e de pouso de as-
salto serão os fatores limitantes. Se a operação for adiada pelo tempo ou outros
motivos, ela estará preparada com forças ainda maiores para setembro.”
Em fevereiro passado, quando me escreveu sobre esses planos e a data para
invadir a Europa Ocidental, as dificuldades dessa operação eram maiores do que
são agora. Desde então, os alemães sofreram mais de uma derrota: foram empur-
rados para trás por nossas tropas no Sul, onde sofreram perdas apreciáveis; eles
foram derrotados no norte da África e expulsos pelas tropas anglo-americanas;
na guerra submarina, também, os alemães se viram em uma situação pior do que
nunca, enquanto a superioridade anglo-americana aumentou substancialmente;
também é sabido que os americanos e britânicos ganharam superioridade aérea
na Europa e que suas marinhas e fuzileiros mercantes cresceram em poder.
Segue-se que as condições para abrir uma segunda frente na Europa Ocidental
durante 1943, longe de se deteriorar, melhoraram muito.
Sendo assim, o Governo soviético não poderia imaginar que os governos britâ-
nico e americano revisariam a decisão de invadir a Europa Ocidental, que haviam
adotado no início deste ano. Na verdade, o Governo soviético tinha pleno direito
de esperar que a decisão anglo-americana fosse executada, que os preparativos
apropriados estivessem em curso e que a segunda frente na Europa Ocidental
finalmente seria aberta em 1943.
É por isso que, quando você escreve agora que “não seria de ajuda para a Rús-
sia se jogássemos fora cem mil homens em um desastroso ataque entre canais”,
tudo o que posso fazer é lembrá-lo do seguinte:
Primeiro, seu próprio Aide-mémoire de junho de 1942, no qual você declarou
que os preparativos estavam em andamento para uma invasão, não por cem mil,
mas por uma força anglo-americana que excedeu um milhão de homens no início
da operação.
740 Obras Escolhidas

Segundo, sua mensagem de fevereiro, que mencionava extensas medidas pre-


paratórias para a invasão da Europa Ocidental em agosto ou setembro de 1943,
que, aparentemente, previa uma operação, não por cem mil homens, mas por
uma força adequada.
Então, quando você agora declara: “Eu não posso ver como uma grande der-
rota e morticínio britânico ajudaria os exércitos soviéticos”, não está claro que
uma declaração deste tipo em relação à União Soviética é totalmente infundada e
contradiz diretamente suas decisões responsabilizáveis anteriores, listadas acima,
sobre medidas extensas e vigorosas dos britânicos e americanos para organizar a
invasão este ano, medidas sobre as quais o sucesso total da operação deve depen-
der?
Não vou ampliar o fato de que esta decisão responsabilizável, revogando suas
decisões anteriores sobre a invasão da Europa Ocidental, foi alcançada por você e
pelo Presidente sem a participação soviética e sem convidar seus representantes
para a conferência de Washington, embora não possa deixar de estar ciente de
que o papel da União Soviética na guerra contra a Alemanha e seu interesse nos
problemas da segunda frente são suficientemente grandes.
Você diz que “entende” minha decepção. Devo dizer-lhe que o ponto aqui não
é apenas a decepção do Governo soviético, mas a preservação de sua confiança
em seus Aliados, uma confiança que está sendo submetida a um estresse severo.
Não se deve esquecer que é uma questão de salvar milhões de vidas nas áreas
ocupadas da Europa Ocidental e da Rússia, e de reduzir os enormes sacrifícios
dos exércitos soviéticos, em comparação com os quais os sacrifícios dos exércitos
anglo-americanos são insignificantes.

Do Primeiro-Ministro J. V. Stalin ao Presidente


Roosevelt
Enviado em 16 de fevereiro de 1944

[MENSAGEM PESSOAL E SECRETA]

Sua mensagem sobre a questão polonesa está em mãos. Não é preciso dizer
que uma solução correta deste problema é de grande importância tanto para a
URSS quanto para a nossa causa comum.
Há dois pontos importantes a serem considerados: primeiro, a fronteira soviético-
polonesa e, segundo, a composição do Governo polonês. O ponto de vista do Go-
verno soviético é familiar para você a partir de suas declarações recém-publicadas
e da carta de V. M. Molotov em resposta à Nota do Sr. Hull, recebida em Moscou
através do Embaixador soviético, Gromyko, em 22 de janeiro.
Em primeiro lugar, sobre a fronteira soviético-polonesa. Como sabem, o Go-
verno soviético declarou oficialmente que não considera final a fronteira de 1939
e concordou com a Linha Curzon. Ao afirmar isso, fizemos concessões muito
importantes aos poloneses na questão da fronteira. Tínhamos motivos para an-
tecipar uma declaração apropriada por parte do Governo polonês. Deveria ter
declarado oficialmente que a fronteira estabelecida pelo Tratado de Riga seria
J. V. Stalin 741

revista, e que seria aceita a Linha Curzon como a nova linha fronteiriça entre a
URSS e a Polônia. Deveria ter feito uma declaração oficial sobre o reconheci-
mento da Linha Curzon, assim como o Governo soviético o fez. Mas o governo
polonês em Londres recusou-se a ceder, e continuou a insistir em declarações
oficiais de que a fronteira imposta a nós sob o Tratado de Riga, em um momento
difícil, deveria ser deixada inalterada. Portanto, não há base para um acordo,
em vista ao ponto de vista do atual Governo polonês, que como vemos, impede
o acordo.
Diante desta circunstância, a questão da composição do Governo polonês
tornou-se igualmente mais aguda. É evidente que o Governo polonês, no qual o
papel principal é desempenhado por elementos pró-fascistas, imperialistas hos-
tis à União Soviética, como Sosnkowski, e no qual quase não há elementos de-
mocráticos, não pode ter bases populares na Polônia, nem, como a experiência
mostrou, pode estabelecer relações amigáveis com países democráticos vizinhos.
Claramente, tal Governo polonês é incapaz de estabelecer relações amistosas com
a União Soviética e não se pode prever que não semeará discórdia entre os países
democráticos que, pelo contrário, gostariam de fortalecer a sua unidade. Segue-
se que uma melhoria radical na composição do Governo polonês é uma questão
urgente.
Tive que adiar a resposta, estando ocupado na frente.

Do Primeiro-Ministro J. V. Stalin ao
Primeiro-Ministro, Sr. W. Churchill
Enviado em 23 de março de 1944

[MENSAGEM PESSOAL E SECRETA]

Recentemente recebi duas mensagens suas sobre a questão polonesa e li a


declaração do senhor Kerr sobre a pergunta a V. M. Molotov sobre instruções
suas. Eu não fui capaz de responder anteriormente como assuntos de frente
muitas vezes me mantem longe de assuntos não militares.
Agora responderei ponto a ponto.
Fiquei impressionado com o fato de que tanto a sua mensagem quanto par-
ticularmente a declaração de Kerr conterem ameaças contra a União Soviética.
Gostaria de chamar sua atenção para esta circunstância porque as ameaças como
método não só estão fora de lugar nas relações entre aliados, mas também são
prejudiciais, pois podem levar a resultados opostos.
Os esforços da União Soviética para manter e implementar a Linha Curzon
são referidos em uma de suas mensagens como uma política de força. Isso implica
que agora você está tentando descrever a Linha Curzon como ilegal e a luta por
ela como injusta. Eu discordo totalmente de você. Devo salientar que em Teerã,
o Presidente e eu concordamos que a Linha Curzon era legal.
Naquela época, você considerou correta a posição do Governo soviético sobre
a questão e disse que seria loucura que os representantes do governo polonês
rejeitassem a Linha Curzon. Mas agora você mantém o contrário.
742 Obras Escolhidas

Isso significa que você não reconhece mais o que concordamos em Teerã e está
pronto para violar o acordo de Teerã? Não tenho dúvidas de que se você tivesse
perseverado em sua posição quando do Acordo de Teerã, o conflito com o go-
verno polonês poderia ter sido resolvido. Quanto a mim e ao Governo Soviético,
ainda aderimos ao ponto de vista de Teerã, e não temos intenção de voltar atrás,
pois acreditamos que a implementação da Linha Curzon seja evidência, não de
uma política de força, mas de uma política de restabelecer o direito legítimo da
União Soviética a esses territórios, que até Curzon e o Conselho Supremo das
Potências Aliadas reconheceram como não-poloneses em 1919.
Você diz na sua mensagem de 7 de março que o problema da fronteira soviético-
polonesa terá que ser adiado até que a conferência de armistício seja convocada.
Acho que há um mal-entendido aqui. A União Soviética não está travando nem
pretende travar uma guerra contra a Polônia. Não há conflito com o povo polo-
nês e consideramo-nos um aliado da Polônia e do povo polonês. É por isso que
está derramando seu sangue para libertar a Polônia da opressão alemã. Seria es-
tranho, portanto, falar de um armistício entre a URSS e a Polônia. Mas a União
Soviética está em conflito com o governo polonês de emigrados, que não repre-
senta os interesses do povo polonês nem expressa suas aspirações. Seria estranho
ainda identificar a Polônia com o governo polonês em Londres, um governo iso-
lado da Polônia. Até acho difícil dizer a diferença entre o Governo de emigrados
da Polônia e o Governo de emigrados iugoslavo, que é semelhante a ele, ou entre
certos generais do governo polonês e o general sérvio Mihajlovic.
Em sua mensagem de 21 de março, você me diz de sua intenção de fazer
uma declaração na Câmara dos Comuns no sentido de que todas as questões
territoriais devem aguardar o armistício ou as conferências de paz dos Poderes
vitoriosos e que, entretanto, você não pode reconhecer quaisquer transferências
forçadas de território. Pelo que vejo, você faz a União Soviética parecer hostil
à Polônia, e praticamente nega a natureza de libertação da guerra travada pela
União Soviética contra a agressão alemã. Isso equivale a atribuir à União Soviética
algo que é inexistente e, assim, desacreditá-la. Não tenho dúvidas de que os povos
da União Soviética e da opinião pública mundial avaliarão sua declaração como
um insulto gratuito à União Soviética.
Obviamente, você está livre para fazer qualquer declaração que você quiser
na Câmara dos Comuns — esse problema é seu. Mas se você fizer uma declaração
desta natureza, considerarei que cometeu um ato injusto e hostil em relação à
União Soviética.
Em sua mensagem, você expressa a esperança de que a quebra sobre a questão
polonesa não afete nossa cooperação em outras esferas. No que me diz respeito,
fui, e ainda sou, em prol da cooperação. Mas temo que o método de intimidação
e difamação, se continuado, não beneficiará nossa cooperação.
J. V. Stalin 743

Do Primeiro-Ministro J. V. Stalin ao Presidente, Sr.


F. Roosevelt
Enviado em 14 de setembro de 1944

[MENSAGEM SECRETA E PESSOAL]

Estou recebendo sua mensagem sobre as discussões de Dumbarton Oaks.


É meu desejo, também, que essas discussões importantes sejam encerradas
de forma exitosa. Isso pode desempenhar um papel proeminente na promoção
da cooperação entre nossos países e na promoção da paz e da segurança futuras
como um todo.
O processo de votação no Conselho será, penso, de suma importância para o
sucesso da Organização Internacional de Segurança, pois é essencial que o Con-
selho baseie seu trabalho no princípio do acordo e na unanimidade entre os qua-
tro principais Poderes em todas as questões, incluindo aquelas que interessem
diretamente um desses Poderes. A proposta americana original para estabele-
cer um procedimento especial de votação no caso de uma disputa envolvendo
diretamente um ou vários membros do Conselho que têm o status de membros
permanentes é, penso eu, sólida. Caso contrário, o acordo que alcançamos na
Conferência de Teerã, onde fomos guiados pelo desejo de garantir, acima de
tudo, a unidade de ação das quatro potências tão vital para prevenir futuras
agressões, será reduzido a nada.
Essa unidade implica, naturalmente, que não deve haver suspeitas entre os
Poderes. Quanto à União Soviética, não pode muito bem ignorar a existência de
certos preconceitos absurdos que muitas vezes dificultam uma atitude genuina-
mente objetiva para com a URSS. Além disso, outros países também devem pesar
as prováveis consequências da falta de unidade entre as principais Potências.
Espero que apreciem a importância dessas considerações e que cheguemos a
uma decisão acordada sobre este assunto.

Do Primeiro-Ministro J. V. Stalin ao Presidente, Sr.


F. Roosevelt
Enviado em 26 de dezembro de 1944

[MENSAGEM SECRETA E PESSOAL]

Sua mensagem chegou a mim por meio do Sr. Harriman em 14 de dezembro.


Compartilho plenamente a sua opinião de que, antes da conferência geral
das Nações Unidas se reunir para discutir a fundação de uma Organização In-
ternacional, seria aconselhável chegarmos a um acordo sobre os problemas mais
importantes que não encontraram solução em Dumbarton Oaks, principalmente
sobre o processo de votação no Conselho de Segurança. Considero necessário
lembrar que o projeto original americano ressaltou a necessidade de elaborar re-
gras especiais no que diz respeito ao procedimento de votação, no caso de uma
744 Obras Escolhidas

disputa que afete diretamente um ou vários membros permanentes do Conselho.


O projeto britânico, também, apontou que o procedimento geral de resolução de
disputas entre as Grandes Potências, caso surjam disputas, pode ser inviável.
Neste sentido, os parágrafos 1º e 2 da sua proposta não dão origem a quais-
quer objeções e podem ser aceitos, sendo entendido que o parágrafo 2º está re-
lacionado a questões de procedimento mencionadas no Capítulo VI, Seção D.
79
Quanto ao parágrafo 3 da sua proposta, lamento dizer que não posso aceitá-la
como redigida por você. Como você mesmo reconheceu, o princípio da unani-
midade dos membros permanentes é indispensável em todas as decisões do Con-
selho que determinam uma ameaça à paz, bem como naqueles que pedem ação
para remover a ameaça ou combater a agressão ou outras violações da paz. Ao
adotar decisões sobre essas questões, deve haver, sem dúvida, um acordo com-
pleto entre os Poderes que são membros permanentes do Conselho e que assu-
mem a responsabilidade principal pela manutenção da paz e da segurança. Não
é preciso dizer que qualquer tentativa de barrar em qualquer fase um ou vá-
rios membros permanentes do Conselho de votar sobre as questões mencionadas
acima, e isso, teoricamente falando, é possível, e pode até ser que a maioria dos
membros permanentes se encontre excluída da participação na resolução de uma
questão — pode ter consequências terríveis para a preservação da segurança in-
ternacional. Isso vai contra o princípio do acordo e da unanimidade nas decisões
dos quatro principais Poderes, e pode resultar em alguns dos Grandes Poderes
sendo jogados contra outros — um desenvolvimento que provavelmente prejudi-
caria a segurança global. Os pequenos países estão interessados em evitar que,
tanto quanto as Grandes Potências, uma divisão entre as Grandes Potências que
se uniram para salvaguardar a paz e a segurança de todas as nações amantes da
liberdade que estaria repleta das consequências mais perigosas para todos esses
Estados.
É por isso que devo insistir na nossa antiga posição quanto à votação no Conse-
lho de Segurança. Na minha opinião, esta atitude garantirá a unidade de quatro
poderes para a nova Organização Internacional e ajudará a evitar tentativas de
jogar algumas das Grandes Potências contra as outras, o que é vital para a sua
luta conjunta contra futuras agressões. Tal situação, naturalmente, salvaguarda-
ria os interesses das pequenas nações na manutenção de sua segurança e estaria
de acordo com os interesses da paz universal.
Espero que aprecie plenamente a importância das considerações acima apre-
sentadas em apoio ao princípio da unanimidade dos quatro principais Poderes e
que cheguemos a decisões acordadas sobre este ponto, bem como em alguns ou-
tros pontos ainda pendentes. Com base em uma decisão acordada, nossos repre-
sentantes poderiam elaborar um rascunho final e discutir as medidas necessárias
para a convocação antecipada de uma conferência geral das Nações Unidas.
J. V. Stalin 745

Do Premier J. V. Stalin para o Presidente, Sr. F.


Roosevelt
Enviado em 26 de Dezembro de 1944

[MENSAGEM SECRETA E PESSOAL]

Sua mensagem sobre assuntos poloneses chegou a mim em 20 de dezembro.


Quanto à declaração do senhor Stettinius de 18 de dezembro, prefiro comen-
tar sobre isso quando nos encontrarmos. De qualquer forma, os eventos na Polô-
nia já foram muito além do que se reflete na referida declaração.
Uma série de coisas que ocorreram desde a última visita do senhor Miko-
lajczyk a Moscou, em particular a correspondência sem fio com o Governo Mi-
kolajczyk, que descobrimos sobre terroristas presos na Polônia — agentes ilegais
do Governo de emigrados — demonstram, sem qualquer dúvida, que as conver-
sações do senhor Mikolajczyk com o Comitê Nacional Polonês serviram para en-
cobrir os elementos que, pelas costas do senhor Mikolajczyk, tinham participado
em atos de terror contra oficiais soviéticos e soldados na Polônia. Não podemos
tolerar uma situação em que terroristas, instigados por emigrados poloneses, as-
sassinem soldados e oficiais do Exército Vermelho na Polônia, travem uma luta
criminosa contra as forças soviéticas envolvidas na libertação da Polônia e aju-
dem diretamente nossos inimigos, com quem estão virtualmente em coligação.
A substituição de Arciszewski por Mikolajczyk e as mudanças ministeriais no Go-
verno emigrado em geral agravaram a situação e resultaram em um profundo
racha entre a Polônia e o Governo emigrado.
Enquanto isso, o Comitê Nacional fez progressos notáveis na consolidação
do Estado polonês e na máquina do poder estatal em solo polonês, na expansão
e fortalecimento do Exército polonês, na implementação de uma série de me-
didas importantes do governo, principalmente a reforma agrária em favor dos
camponeses. Esses desenvolvimentos resultaram na consolidação das forças de-
mocráticas na Polônia e em um aumento considerável do prestígio do Comitê
Nacional entre o povo polonês e grandes seções dos poloneses no exterior.
Na minha opinião, devemos, agora, estar interessados em apoiar o Comitê
Nacional e todos os que estão dispostos a cooperar e que são capazes de cooperar
com ele, o que é de especialmente tempestivo para os Aliados e para o cumpri-
mento de nossa tarefa comum: acelerar a derrota da Alemanha de Hitler. Para
a União Soviética, que está carregando todo o fardo da luta pela libertação da
Polônia dos invasores alemães, o problema das relações com a Polônia é, nas
circunstâncias atuais, uma questão de relações cotidianas, próximas e amigáveis
com uma autoridade trazida ao ser pelo povo polonês em seu próprio solo, uma
autoridade que já se fortaleceu e tem forças armadas próprias, que, juntamente
com o Exército Vermelho, estão lutando contra os alemães.
Devo dizer francamente que, no caso de o Comitê Polonês de Libertação Na-
cional se tornar um Governo Polonês Provisório, o Governo soviético, tendo em
vista o anterior, não terá razões sérias para adiar o seu reconhecimento. Deve-
se ter em mente que a União Soviética, mais do que qualquer outro Poder, tem
uma participação no fortalecimento de uma Polônia pró-Aliada e democrática,
746 Obras Escolhidas

não apenas porque está suportando o peso da luta pela libertação da Polônia,
mas também porque a Polônia faz fronteira com a União Soviética e porque o
problema polonês é inseparável do da segurança da União Soviética. Devo acres-
centar que o sucesso do Exército Vermelho na luta contra os alemães na Polônia
depende, em grande parte, de uma retaguarda tranquila e confiável na Polô-
nia, e o Comitê Nacional Polonês está plenamente ciente desta circunstância,
enquanto o Governo emigrado e seus agentes subterrâneos por seus atos de ter-
ror ameaçam a guerra civil na retaguarda do Exército Vermelho e contra seus
sucessos.
Por outro lado, nas condições que agora prevalecem na Polônia, não há mo-
tivos para continuar a apoiar o Governo emigrado, que perdeu completamente
a confiança da população dentro do país e que, além disso, ameaça a guerra ci-
vil na retaguarda do Exército Vermelho, ferindo assim nosso interesse comum
no sucesso da luta que estamos travando contra os alemães. Penso que seria na-
tural, justo e benéfico para a nossa causa comum, se os Governos dos Poderes
Aliados concordassem como um primeiro passo para trocar representantes neste
momento com o Comitê Nacional, tendo em vista o seu reconhecimento poste-
rior como o governo legal da Polônia, depois de se ter proclamado o Governo
Provisório da Polônia. A menos que isso seja feito, temo que a confiança do povo
polonês no Poder Aliado possa diminuir. Penso que não devemos contempori-
zar uma situação em que os poloneses possam dizer que estamos sacrificando os
interesses da Polônia aos de um punhado de emigrados em Londres.

De J. V. Stalin ao Presidente, Sr. F. Roosevelt


Enviado em 29 de março de 1945

[MENSAGEM SECRETA E PESSOAL]

Analisei o assunto levantado na sua carta de 25 de março, e descobri que o


Governo soviético não poderia ter dado qualquer outra resposta depois que seus
representantes foram barrados das negociações de Berna com os alemães para
uma rendição alemã e abrindo a frente para as tropas anglo-americanas no norte
da Itália.
Longe de ser contra, sou a favor de lucrar com casos de desintegração nos
exércitos alemães para apressar sua rendição em um ou outro setor, e incentivá-
los a abrir a frente para as forças aliadas.
Mas, concordo com tais conversas com o inimigo apenas nos casos em que elas
não levam a uma flexibilização da posição do inimigo, se a oportunidade para os
alemães manobrarem e usarem as conversações para mudar tropas para outros
setores, sobretudo para a frente soviética, for impedida.
E foi unicamente com o objetivo de fornecer esta garantia de que o Governo
soviético achou necessário que representantes de seu Comando Militar partici-
passem de tais negociações com o inimigo onde quer que pudessem ocorrer – seja
em Berna ou em Caserta. Não consigo entender por que os representantes do
Comando Soviético foram excluídos das conversações e de que forma poderiam
ter prejudicado os representantes do Comando Aliado.
J. V. Stalin 747

Devo lhe dizer, por suas informações, que os alemães já aproveitaram as con-
versações com o Comando Aliado para mover três divisões do norte da Itália para
a frente soviética. A tarefa de operações coordenadas envolvendo um golpe nos
alemães do Oeste, Sul e Leste, proclamado na Conferência da Crimeia, é manter
o inimigo no local e impedi-lo de manobrar, de mover suas forças para os pontos
onde ele mais precisa deles. O Comando Soviético está fazendo isso. Mas o Ma-
rechal Alexander não está. Esta circunstância irrita o Comando Soviético e gera
desconfiança.
“Como militar”, você me escreve, “você vai entender a necessidade de uma
ação rápida para evitar perder uma oportunidade. O envio de uma bandeira de
trégua ao seu General em Königsberg ou Danzig estaria na mesma categoria”.
Receio que a analogia não se encaixe no caso. As tropas alemãs em Danzig e
em Königsberg estão cercadas. Se eles se renderem, o farão para escapar do
extermínio, mas não podem abrir a frente para as tropas soviéticas, porque a
frente se moveu tão a oeste quanto o Oder. As tropas alemãs no norte da Itália
estão em uma posição totalmente diferente. Eles não estão cercados e não são
confrontados com um possível extermínio. Se, no entanto, os alemães no norte
da Itália buscam negociações para se render e abrir a frente para as tropas aliadas,
então eles devem ter outros objetivos mais abrangentes que afetam o destino da
Alemanha.
Devo dizer-lhe que, se uma situação semelhante ocorresse na Frente Orien-
tal, em algum lugar do Oder, fornecendo uma oportunidade para uma rendição
alemã e para a abertura da frente às tropas soviéticas, eu deveria ter imediata-
mente notificado o Comando Militar Anglo-Americano e requisitado que envi-
asse seus representantes para participar das conversações, pois em uma situação
deste tipo aliados não devem ter nada a esconder uns dos outros.

De J. V. Stalin ao Presidente, Sr. F. Roosevelt


Enviado em 7 de abril de 1945

[MENSAGEM SECRETA E PESSOAL]

Recebi sua mensagem de 5 de abril.


Na minha mensagem de 3 de abril, o ponto não era sobre integridade ou con-
fiabilidade. Nunca duvidei de sua integridade ou confiabilidade, assim como
nunca questionei a integridade ou confiabilidade do Sr. Churchill. O que quero
dizer é que, no curso de nossa correspondência, surgiu uma diferença de opi-
niões sobre o que um Aliado pode permitir a si mesmo em relação a outro e o
que ele não pode. Nós, russos, acreditamos que, tendo em vista a situação atual
nas frentes, uma situação em que o inimigo se depara com uma rendição inevitá-
vel, sempre que os representantes de um dos Aliados se reúnem com os alemães
para discutir os termos de rendição, os representantes do outro Aliado devem ser
habilitados a participar da reunião. Isso é absolutamente necessário, pelo menos
quando o outro Aliado busca participação na reunião. Os americanos e os britâ-
nicos, no entanto, têm uma opinião diferente — eles sustentam que o ponto de
vista russo está errado. Por essa razão, negaram aos russos o direito de estarem
748 Obras Escolhidas

presentes na reunião com os alemães na Suíça. Eu já escrevi para você, e não vejo
nenhum mal em repetir que, dada uma situação semelhante, os russos nunca te-
riam negado aos americanos e britânicos o direito de participar de tal reunião.
Eu ainda considero o ponto de vista russo como o único correto, porque exclui
suspeitas mútuas e não dá ao inimigo nenhuma chance de semear desconfiança
entre nós.
2. É difícil concordar que a ausência de resistência alemã na Frente Ocidental
deve-se unicamente ao fato de terem sido derrotados. Os alemães têm 147 divi-
sões na Frente Oriental. Eles poderiam mover, com segurança, de 15 a 20 divisões
da Frente Oriental para ajudar suas forças na Frente Ocidental. No entanto, eles
não fizeram isso, nem estão fazendo isso. Eles estão lutando desesperadamente
contra os russos por Zemlenice, uma estação obscura na Tchecoslováquia, que
eles precisam tanto quanto um homem morto precisa de cataplasma, mas eles
rendem sem qualquer resistência cidades tão importantes no coração da Alema-
nha como Osnabruck, Mannheim e Kassel. Você admitirá que este comporta-
mento por parte dos alemães é mais do que estranho e inexplicável.
3. No que diz respeito àqueles que fornecem minhas informações, posso
assegurar-lhe que são pessoas honestas e despretensiosas que cumprem seus de-
veres conscientemente e que não têm intenção de afrontar ninguém. Eles foram
testados em ação em várias ocasiões. Julgue você mesmo. Em fevereiro, o General
Marshall disponibilizou ao Estado-Maior das tropas soviéticas uma série de rela-
tórios importantes nos quais ele, citando dados em sua posse, alertou os russos
que em março os alemães estavam planejando dois graves contragolpes na Frente
Oriental, um da Pomerânia em direção a Thorn, o outro da área de Moravska
Ostrava em direção a L6 dz. Descobriu-se, no entanto, que o principal golpe
alemão tinha sido preparado, e feito, não nas áreas mencionadas acima, mas em
uma área totalmente diferente, ou seja, na área do Lago Balaton, sudoeste de
Budapeste. Os alemães, como sabemos agora, concentraram 35 divisões na área,
11 delas blindadas. Estas, com sua grande concentração de armadura protetiva,
foi um dos golpes mais pesados da guerra. O Marechal Tolbukhin conseguiu
primeiro evitar o desastre e depois esmagar os alemães, e foi capaz de fazê-lo
também porque meus informantes tinham revelado – verdade, com algum atraso
– o plano para o principal golpe alemão e imediatamente informaram o Mare-
chal Tolbukhin. Assim, tive mais uma oportunidade de me satisfazer quanto à
confiabilidade e solidez das minhas fontes de informação.
Para sua orientação neste assunto, incluo uma carta enviada pelo General An-
tonov, Chefe do Estado-Maior do Exército Vermelho, ao Major-General Deane.

De J. V. Stalin ao Presidente, Sr. F. Roosevelt


Enviado em 7 de abril de 1945

[MENSAGEM SECRETA E PESSOAL]

Em relação à sua mensagem de 1º de abril, acho que devo fazer os seguintes


comentários sobre a questão polonesa. A questão polonesa chegou de fato a um
impasse. Qual é o motivo?
J. V. Stalin 749

A razão é que os embaixadores dos EUA e da Inglaterra em Moscou — mem-


bros da Comissão de Moscou — se afastaram das instruções da Conferência da
Crimeia, introduzindo novos elementos não previstos naquela Conferência.
A saber:
(a) Na Conferência da Crimeia, nós três consideramos o Governo Provisório
polonês como o governo que agora opera na Polônia e sujeito à reconstrução,
como o governo que deveria ser o núcleo de um novo Governo de Unidade Na-
cional. Os embaixadores americanos e britânicos em Moscou, no entanto, parti-
ram dessa tese; eles ignoram o Governo Provisório polonês, não prestam atenção
a ele e, na melhor das hipóteses, os indivíduos na Polônia e Londres estão em
pé de igualdade perante o Governo Provisório. Além disso, eles sustentam que a
reconstrução do Governo Provisório deve ser entendida em termos de sua aboli-
ção e do estabelecimento de um governo inteiramente novo. As coisas foram tão
longe, que o senhor Harriman declarou na Comissão de Moscou que talvez não
fosse um único membro do Governo Provisório incluído no Governo polonês de
Unidade Nacional.
Obviamente, esta tese dos embaixadores americanos e britânicos não pode
deixar de ser fortemente ressentida pelo Governo Provisório polonês. No que diz
respeito à União Soviética, certamente não pode aceitar uma tese que equivale a
uma violação direta das decisões da Conferência da Crimeia.
(b) Na Conferência da Crimeia, nós três defendemos que cinco pessoas deve-
riam ser convidadas para consulta da Polônia e três de Londres, não mais. Mas
os EUA e os embaixadores britânicos abandonaram essa posição e insistem que
cada membro da Comissão de Moscou tenha o direito de convidar um número
ilimitado da Polônia e de Londres.
É evidente que o Governo soviético não poderia concordar com isso, porque,
de acordo com a decisão da Crimeia, os convites não deveriam ser enviados por
membros individuais da Comissão, mas pela Comissão como um todo, como um
órgão. A exigência de não haver limite para o número de convidados para con-
sulta vai contra o que estava previsto na Conferência da Crimeia.
(c) O Governo soviético prossegue a partir do pressuposto de que, em virtude
das decisões da Crimeia, aqueles convidados para a consulta devem ser, em pri-
meira instância, líderes poloneses que reconhecem as decisões da Conferência da
Crimeia, incluindo a da Linha Curzon, e, em segundo lugar, que realmente que-
rem relações amistosas entre a Polônia e a União Soviética. O Governo soviético
insiste nisso porque o sangue dos soldados soviéticos, tão livremente derramado
na libertação da Polônia, e o fato de que nos últimos 30 anos o território da
Polônia tem sido usado duas vezes por um inimigo para invadir a Rússia, obriga
o Governo soviético a garantir relações amistosas entre a União Soviética e a Polô-
nia.
Os embaixadores americanos e britânicos em Moscou, no entanto, ignoram
isso e querem convidar os líderes poloneses para consulta, independentemente
de suas atitudes para com as decisões da Crimeia e para com a União Soviética.
Tais, na minha opinião, são os fatores que dificultam a resolução do problema
polonês através de um acordo mútuo.
A fim de quebrar o impasse e chegar a uma decisão acordada, os seguintes
750 Obras Escolhidas

passos devem, penso eu, ser tomados:


1) Afirmar que a reconstrução do Governo Provisório polonês implica, não
a sua abolição, mas a sua reconstrução, ampliando-o, entendendo-se que o Go-
verno Provisório deve formar o núcleo do futuro Governo Polonês de Unidade
Nacional.
(2) Retornar às disposições da Conferência da Crimeia e restringir o número
de líderes poloneses a serem convidados a oito pessoas, das quais cinco devem
ser da Polônia e três de Londres.
(3) Afirmar que os representantes do Governo Provisório polonês serão con-
sultados em todas as circunstâncias, que serão consultados em primeiro lugar,
uma vez que o Governo Provisório é muito mais forte na Polônia em comparação
com os indivíduos a serem convidados de Londres e da Polônia, cuja influên-
cia entre a população de forma alguma se compara ao tremendo prestígio do
Governo Provisório.
Eu trago sua atenção a isso porque, na minha opinião, qualquer outra decisão
sobre o ponto pode ser considerada na Polônia como uma afronta ao povo e
como uma tentativa de impor um governo sem levar em conta a opinião pública
polonesa.
(4) Apenas aqueles líderes que reconheçam as decisões da Conferência da
Crimeia sobre a Polônia e que, na prática, querem relações amistosas entre a
Polônia e a União Soviética, devem ser convocados para consulta da Polônia e de
Londres.
(5) A reconstrução do Governo Provisório será efetuada substituindo vários
ministros do Governo Provisório por indicados entre os líderes poloneses que
não são membros do Governo Provisório.
Quanto à proporção de antigos e novos ministros no Governo da Unidade
Nacional, pode ser estabelecido mais ou menos nas mesmas linhas que foi feito
no caso do Governo Iugoslavo.
Penso que, se estes comentários forem levados em consideração, a questão
polonesa pode ser resolvida em pouco tempo.
J. V. Stalin 751

De J. V. Stalin ao Presidente, Sr. H. Truman


Enviado em 16 de junho de 1945

[MENSAGEM SECRETA E PESSOAL]

Sua mensagem sobre a retirada das tropas aliadas na Alemanha e na Áustria


em suas respectivas zonas foi recebida.
Infelizmente, devo dizer-lhe que sua proposta de iniciar a retirada das tropas
americanas em sua zona e mover tropas americanas para Berlim em 21 de junho
está encontrando dificuldades, pois o Marechal Zhukov e outros comandantes
militares foram convocados para a sessão do Soviete Supremo, que começa em
Moscou em 19 de junho, e também para organizar e participar de um desfile em
24 de junho. Além disso, alguns dos distritos de Berlim ainda não foram limpos
das minas, nem as operações de limpeza de minas podem ser concluídas até o fi-
nal de junho. Uma vez que o Marechal Zhukov e os outros comandantes militares
soviéticos não poderão retornar à Alemanha antes de 28-30 de junho, gostaria
que o início da retirada fosse adiado até 1º de julho, quando os comandantes
voltarão aos seus postos e a limpeza das minas terá terminado.
No que diz respeito à Áustria, o que eu disse sobre a convocação dos coman-
dantes soviéticos para Moscou e o tempo de seu retorno aos seus postos também
se aplica a esse país. É essencial, além disso, que nos próximos dias a Comissão
Consultiva Europeia conclua seu trabalho na criação das zonas de ocupação na
Áustria e em Viena. Em vista do exposto, o funcionamento das respectivas forças
nas zonas atribuídas a eles na Áustria também deve ser adiado para 1º de julho.
Além disso, tanto em relação à Alemanha como à Áustria, devemos estabele-
cer zonas de ocupação imediatamente para as tropas francesas.
Nós, de nossa parte, tomaremos as medidas adequadas na Alemanha e na
Áustria de acordo com o plano acima estabelecido.
752 Obras Escolhidas

J. V. Stalin para H. Truman


Enviado em 23 de dezembro de 1945

[MENSAGEM SECRETA E PESSOAL]

Meu caro Sr. Presidente,


Fiquei feliz em receber sua mensagem, transmitida a mim pelo senhor Byrnes,
na qual você se debruça sobre os assuntos muito importantes que estamos discu-
tindo agora. Concordo com você sobre o fato de que os povos da União Soviética
e dos Estados Unidos devem se esforçar para trabalhar juntos na restauração e
manutenção da paz, e que devemos proceder do fato de que os interesses comuns
dos nossos dois países superam, em muito, certas diferenças entre nós.
A conferência dos Ministros, agora em sessão em Moscou, já rendeu bons
resultados. As medidas tomadas por você e pelo senhor Byrnes no que diz res-
peito ao Japão e aos tratados de paz ajudaram em grande medida. Podemos
aceitar que o acordo sobre esses pontos importantes tenha sido alcançado e que
a conferência tenha feito um trabalho proeminente no estabelecimento de um
entendimento mútuo adequado entre nossos países neste período de transição
da guerra para a paz.
O tema da energia atômica ainda está em discussão. Espero que, também
neste assunto, estabeleçamos a unidade de pontos de vista e que, por esforço
conjunto, seja tomada uma decisão que seja satisfatória para ambos os países e
para as outras nações.
Suponho que tenha sido informado da minha primeira conversa com o Sr.
Byrnes. Nos reuniremos para mais conversações. Mas mesmo agora sinto que
posso dizer que, em geral, estou otimista quanto aos resultados da troca de opi-
niões que estão agora em vigor entre nós sobre problemas internacionais urgen-
tes, e isso, espero, proporcionará mais oportunidades para coordenar as políticas
de nossos países em outras questões.
Aproveito para responder a carta que recebi recentemente de você sobre a
chegada do artista Chandor em Moscou. Estive longe de Moscou por muito
tempo e lamento dizer que, no futuro imediato, eu ache difícil, tendo em vista
os meus numerosos deveres, dar qualquer tempo ao senhor Chandor. Estou,
claro, pronto para enviar a ele meu retrato se você acha que seria adequado neste
caso.
J. Stalin
J. V. Stalin 753

ANEXO 2 – CONFERÊNCIAS DE
GUERRA
Introdução

As conferências de Teerã (28 de novembro a 1º de dezembro de 1943), Criméia


(Yalta, 4 a 11 de fevereiro de 1945) e Potsdam dos líderes da União Soviética, Es-
tados Unidos da América e Grã-Bretanha ocupam um lugar especial na história
da Segunda Guerra Mundial. Nestas Conferências, os líderes das três Grandes
Potências debateram e adotaram decisões conjuntas sobre as questões militares e
políticas básicas relacionadas à guerra contra a Alemanha de Hitler e os acordos
do pós-guerra. Estas Conferências e suas decisões concretas foram vitais para a
formação de uma coalizão antinazista, a coordenação dos esforços militares e a
mobilização de todos os povos para a derrota da Alemanha nazista.
A Segunda Guerra Mundial e as Conferências de Teerã, Yalta e Potsdam pro-
varam vividamente a possibilidade de cooperação entre países com diferentes sis-
temas socioeconômicos na luta contra um agressor comum e a possibilidade de
uma decisão mutuamente aceitável sobre questões tópicas. Aqui fazemos justiça
aos líderes dos países ocidentais que durante a guerra entraram em cooperação
militar e política com a União Soviética contra o inimigo comum, a Alemanha
nazista.
As decisões dos “três grandes” nestas Conferências têm um significado atual
hoje e estão intimamente relacionadas com os problemas que estão sendo lutados
na Europa moderna. Entre essas decisões, particularmente importantes são os
Acordos de Potsdam que visam esmagar o militarismo e o revanchismo na Alema-
nha e evitar a ameaça de uma nova guerra para os povos da Europa e do mundo
inteiro. Os países socialistas bem como todas as forças amantes da paz da Europa
estão pressionando pela implementação das decisões de Potsdam, pois apenas a
observância escrupulosa destas pode evitar o perigo que paira sobre a Europa e
o mundo inteiro como resultado do renascimento na Alemanha Ocidental, com
o apoio e conivência dos Estados Unidos da América e outras potências ociden-
tais, das forças que já haviam mergulhado o mundo no abismo da guerra mais
devastadora da história da humanidade.
Apresentamos aqui o texto dos registros soviéticos feitos durante as sessões
das três Conferências (nenhum registro acordado foi feito nas Conferências; cada
delegação fez seus próprios registros de forma independente). Eles são o estan-
darte da lealdade da União Soviética às ideias de paz, democracia e progresso e
sua incansável campanha por uma justa resolução dos problemas do pós-guerra
no interesse dos povos, para alcançar a segurança europeia, criando condições
que impossibilitassem o renascimento das forças militaristas na Alemanha e uma
repetição da agressão e para o desenvolvimento da cooperação internacional e
garantia do direito de cada povo a determinar seu destino independentemente.
Tais documentos foram publicados na revista International Affairs durante o
754 Obras Escolhidas

período 1961-1966.

CONFERÊNCIA DE TEERÃ

(28 de novembro a 1º de dezembro de 1943)

A Primeira Sessão da Conferência dos Chefes de Governo da


URSS, dos Estados Unidos e da Grã-Bretanha

Teerã, 28 de novembro de 1943

Aberto: 16h; Fechado: 19h30


Roosevelt: Como o mais jovem chefe de governo presente aqui, gostaria de
tomar a liberdade de falar primeiro. Gostaria de assegurar aos membros da nova
família – os membros da presente conferência reunidos em torno desta mesa –
que estamos reunidos aqui com um propósito, o propósito de vencer a guerra o
mais rápido possível.
Gostaria também de dizer algumas palavras sobre a condução da conferência.
Não pretendemos tornar público nada do que será dito aqui, mas falaremos uns
com os outros como amigos, aberta e francamente. Penso que esta conferência
será um sucesso, e que nossas três nações, que se uniram no curso da atual guerra,
fortalecerão seus laços e criarão os pré-requisitos para a estreita cooperação das
gerações futuras. Nossos funcionários podem discutir assuntos militares, e nos-
sas delegações, embora não tenhamos nenhuma agenda fixa, também podem
discutir outros problemas, como, por exemplo, os problemas das resoluções pós-
guerra. Se, no entanto, vocês não quiserem discutir tais problemas, eles podem
ser deixados de lado.
Antes de começar nosso trabalho, gostaria de saber se o Sr. Churchill deseja
dizer algumas palavras gerais sobre a importância desta reunião e o que esta
reunião significa para a humanidade.
Churchill: Esta é a maior concentração de forças mundiais que já existiu na
história da humanidade. Nós possuímos a solução do problema de reduzir a
duração da guerra, a vitória, o futuro da humanidade. Rezo para que possamos
ser dignos desta notável oportunidade concedida a nós por Deus, a oportunidade
de servir a humanidade.
Roosevelt: O Marechal Stalin gostaria de dizer alguma coisa?
Stalin: Ao saudar esta conferência dos representantes dos três governos, gos-
taria de fazer algumas observações. Acho que estamos sendo mimados pela his-
tória. Ela nos deu a posse de forças colossais e grandes oportunidades. Espero
que façamos tudo nesta conferência para fazer o devido uso, no âmbito da nossa
cooperação, do poder e autoridade que nossos povos imbuíram em nós. Vamos
agora começar nosso trabalho.
Roosevelt: Posso começar com uma revisão geral da guerra e dos requisitos
da guerra no momento. Claro, falarei disso do ponto de vista dos EUA. Nós,
como o Império Britânico e a União Soviética, esperamos uma vitória antecipada.
J. V. Stalin 755

Gostaria de começar com uma revisão dessa parte da guerra que diz respeito
aos Estados Unidos e não à União Soviética e à Grã-Bretanha. Quero dizer, a
guerra no Oceano Pacífico, onde os Estados Unidos suportam o peso da guerra,
recebendo ajuda das forças australianas e neozelandesas...308
Retomando a questão mais importante, que é de maior interesse para a União
Soviética – a operação em todo o Canal – gostaria de dizer que estamos elabo-
rando nossos planos pelo último ano e meio, mas devido à escassez da tonelagem
não conseguimos decidir uma data para esta operação. Queremos não só atra-
vessar o Canal, mas perseguir o inimigo até o coração do território. O Canal da
Mancha é aquela desagradável faixa de água que exclui a possibilidade de ini-
ciar a expedição através do Canal antes de 1º de maio, é por isso que o plano
elaborado em Quebec foi baseado na premissa de que a expedição através do
Canal seria feita aproximadamente em 1 de maio de 1944. Todas as operações
de aterragem envolvem embarcações especiais. Se realizarmos operações de ater-
ragem em larga escala no Mediterrâneo, a expedição através do Canal terá que
ser adiada por dois ou três meses. É por isso que gostaríamos de ter o conselho
de nossos colegas soviéticos sobre o assunto, e também conselhos sobre a melhor
maneira de usar as forças agora na área do Mediterrâneo, considerando que há
poucos navios lá também. Mas não queremos adiar a data da invasão do Canal
além de maio ou junho. Ao mesmo tempo, há muitos lugares onde as forças
anglo-americanas poderiam ser usadas. Elas poderiam ser usadas na Itália, na
área adriática, na área do Egeu, e finalmente, para ajudar a Turquia se ela en-
trar na guerra. Tudo isso temos que decidir aqui. Gostaríamos muito de ajudar
a União Soviética e retirar uma parte das forças alemãs da frente soviética. Gos-
taríamos de ter o conselho de nossos amigos soviéticos sobre como poderíamos
melhor facilitar sua posição.
Churchill gostaria de acrescentar alguma coisa?
Churchill: Posso falar e expressar minha opinião depois que o Marechal Sta-
lin expressar as suas. Ao mesmo tempo, gostaria de dizer que concordo, em
princípio, com o que foi dito pelo Presidente Roosevelt.
Stalin: Quanto à primeira parte do discurso do Sr. Presidente sobre a guerra
na área do Pacífico, podemos dizer o seguinte: nós, russos, saudamos os sucessos
que foram e estão sendo alcançados pelas forças anglo-americanas no Pacífico.
Quanto à segunda parte do discurso do Senhor Presidente sobre a guerra na
Europa, também tenho várias observações a fazer.
Em primeiro lugar, algumas palavras na forma de um relatório sobre a forma
como conduzimos e estamos conduzindo operações desde a ofensiva de julho dos
alemães. Se eu entrar em muitos detalhes eu posso encurtar a minha declaração.
Churchill: Estamos preparados para ouvir tudo o que você deseja dizer.
Stalin: Devo dizer, de passagem, que nós mesmos temos ultimamente nos
preparados para uma ofensiva. Os alemães estavam à nossa frente, mas como
estávamos nos preparando para uma ofensiva e tínhamos uma grande força, de-
pois de vencermos a ofensiva alemã, foi relativamente fácil para nós irmos para a
ofensiva. Devo dizer que, embora a opinião sobre nós seja que planejamos tudo
308As lacunas do texto foram propositadamente deixadas pela delegação soviética cujas notas aqui
apresentamos (N.T)
756 Obras Escolhidas

de antemão, não esperávamos os sucessos que tivemos em agosto e setembro. Ao


contrário das nossas expectativas, os alemães provaram ser mais fracos do que
esperávamos. No momento, de acordo com nossa inteligência, os alemães têm
210 divisões em nosso front e outras seis divisões a caminho de lá. Além disso,
há 50 divisões não alemãs, incluindo os finlandeses. Assim, ao todo os alemães
têm 260 divisões, incluindo até 10 divisões húngaras, até 20 finlandesas e até 16
ou 18 romenas.
Roosevelt: Qual é a força numérica de uma divisão alemã?
Stalin: A divisão alemã consiste em cerca de 8.000 a 9.000 homens, excluindo
forças auxiliares. Com as forças auxiliares, a divisão possui de 12.000 para 13.000
homens. No ano passado havia 240 divisões em nossa frente, 179 delas alemãs.
Este ano há 260 divisões em nossa frente, 210 delas alemãs, com seis divisões ale-
mãs a caminho da frente. De 300 a 330 divisões estão operando no lado russo.
Assim, temos mais divisões do que os alemães junto com seus satélites. Este exce-
dente de forças está sendo usado para operações ofensivas. Caso contrário, não
teria havido ofensiva. Mas, com o passar do tempo, a diferença entre o número
de divisões russas e alemãs torna-se menor. Outra grande dificuldade é que os
alemães estão arrasando tudo enquanto se retiram. Isso dificulta o fornecimento
de munição. Essa é a razão pela qual nossa ofensiva diminuiu seu ritmo. Nas úl-
timas três semanas, os alemães lançaram operações ofensivas na Ucrânia, a sul
e oeste de Kiev. Eles recapturaram Zhitomir, uma importante junção ferroviá-
ria. Isso foi anunciado. Parece que um dia eles tomarão Korosten, também uma
importante junção ferroviária. Nessa área, os alemães têm cinco novas divisões
de tanques e três antigas, ao todo 8 divisões de tanques, e também 22 ou 23 di-
visões de infantaria e motorizadas. O objetivo deles é recapturar Kiev. Assim,
enfrentaremos algumas dificuldades no futuro.
Essa é a parte do relatório sobre nossas operações no verão. Agora, algumas
palavras sobre o lugar onde as operações das forças anglo-americanas na Europa
seriam desejáveis para aliviar a situação em nossa frente. Posso estar enganado,
mas nós, russos, pensamos que o teatro italiano era importante apenas na me-
dida em que garantia a livre navegação do transporte marítimo aliado no Mar
Mediterrâneo. Só nesse sentido o teatro italiano de operações é importante. Isso
é o que pensávamos e é isso que continuamos a pensar. Quanto à ideia de lançar
uma ofensiva da Itália diretamente contra a Alemanha, nós russos achamos que
o teatro italiano não é adequado para tais fins. Consequentemente, o fato é que
o teatro italiano é importante para a livre navegação no Mediterrâneo, mas não
tem importância no sentido de novas operações contra a Alemanha, porque os Al-
pes bloqueiam o caminho e dificultam qualquer avanço em direção à Alemanha.
Nós, russos, acreditamos que o melhor resultado seria dado por um golpe no
inimigo no norte ou noroeste da França. Mesmo as operações no sul da França
seriam melhores do que as operações na Itália. Seria bom se a Turquia estivesse
preparada para abrir caminho para os Aliados. Afinal, seria mais perto dos Bal-
cãs até o coração da Alemanha. Lá, o caminho não está bloqueado nem pelos
Alpes nem pelo Canal. Mas o ponto mais fraco da Alemanha é a França. É claro
que esta é uma operação difícil, e os alemães na França se defenderão desespe-
radamente; não obstante essa é a melhor solução. Essas são todas as observações
que eu tenho.
J. V. Stalin 757

Churchill: Há muito tempo concordamos com os Estados Unidos em atacar


a Alemanha via Norte ou Noroeste da França e extensas preparações para isso
estão em andamento. Seria necessário dar muitos fatos e números para mostrar
por que não pudemos realizar essas operações em 1943. Mas decidimos atacar a
Alemanha em 1944. O local para o ataque contra a Alemanha foi escolhido em
1943. Estamos agora diante da tarefa de criar condições para a possibilidade de
transferir um exército para a França através do Canal no final da primavera de
1944. As forças que poderemos acumular para esse fim em maio ou junho consis-
tirão de 16 divisões britânicas e 19 americanas. Mas essas divisões são mais fortes
numericamente do que as divisões alemãs das quais o Marechal Stalin falou. Essas
forças seriam seguidas pela força principal e está previsto que toda a Operação
Overlord309 envolverá a transferência de cerca de um milhão de homens através
do Canal em maio, junho e julho. Juntamente com os exércitos no Mediterrâ-
neo e no Oceano Índico é tudo o que nós britânicos podemos dar, considerando
nossa população de 46 milhões e a força numérica de nossa força aérea. O rema-
nejamento das divisões acima mencionadas depende dos Estados Unidos. Mas a
data que mencionei ainda está longe. Chegará dentro de seis meses. Nas con-
versações entre o Presidente e eu, perguntamos um ao outro a melhor forma de
usar nossas forças no Mediterrâneo para ajudar os russos, sem qualquer prejuízo
à Operação Overlord, para que esta operação pudesse ser realizada a tempo ou,
possivelmente, com pouco atraso. Nós já enviamos sete divisões de batalha da
área do Mediterrâneo, e também uma parte dos navios de desembarque para a
Overlord. Levando isso em conta, e o mau tempo na Itália, apesar disso, devo di-
zer que estamos um pouco desapontados por ainda não ter tomado Roma. Nossa
primeira tarefa é tomar Roma e esperamos travar a batalha decisiva em janeiro
e ganhá-la. O General Alexander, comandante do 15º Grupo do Exército que
está sob as ordens do General Eisenhower, acredita que é bem possível vencer a
batalha por Roma. Além disso, pode ser possível capturar e destruir mais de 11
ou 12 divisões inimigas. Não planejamos seguir para a Lombardia ou atravessar
os Alpes para a Alemanha. Nós apenas planejamos seguir um pouco ao norte de
Roma até a linha Pisa-Rimini, depois da qual poderíamos fazer a aterragem no
sul da França e por meio do Canal.
A próxima questão importante é convencer a Turquia a entrar na guerra. Isso
permitiria a abertura de comunicações através dos Dardanelos e do Bósforo, e po-
deríamos enviar suprimentos para a Rússia através do Mar Negro. Além disso,
poderíamos usar os aeródromos turcos para combater o inimigo. Seria preciso
apenas uma pequena força para ocupar Rhodes e outras ilhas. Poderíamos en-
tão estabelecer contato direto com os russos e enviar-lhes suprimentos continua-
mente. Conseguimos até agora enviar apenas quatro comboios para os portos do
norte da Rússia, devido à escassez de escoltas, mas se uma rota for aberta através
do Mar Negro, poderíamos enviar regularmente suprimentos para os portos do
sul da Rússia.
Stalin: Deve-se dizer que esses comboios chegaram sem perdas, sem ter en-
contrado o inimigo no caminho.
Churchill: Como podemos fazer a Turquia entrar na guerra? O que ela vai

309 Codinome da operação de travessia forçada do Canal da Mancha (N.T)


758 Obras Escolhidas

ter que fazer? Ela terá que atacar a Bulgária e declarar guerra à Alemanha?
Ela terá que começar operações ofensivas ou deve abster-se de avançar para a
Trácia? Qual seria a atitude russa para os búlgaros que ainda se lembram que a
Rússia os libertou dos turcos? Que efeito isso teria sobre os romenos que já estão
procurando saídas para a guerra? Como isso afetaria a Hungria? Não seria o
resultado disso grandes mudanças políticas entre muitos países? Todas essas são
perguntas sobre as quais nossos amigos russos, naturalmente, têm suas próprias
opiniões.
Nossas operações na parte oriental do Mediterrâneo, o que poderia causar
algum atraso na operação através do Canal, de algum interesse para o governo
soviético?
Ainda não temos uma decisão definitiva sobre esta questão, e viemos aqui
para resolver isso.
Roosevelt: Há outra possibilidade. Pode ser conveniente fazer um pouso
na parte norte do Adriático quando os exércitos soviéticos se aproximarem de
Odessa.
Churchill: Se tomarmos Roma e bloquearmos a Alemanha a partir do sul,
começaríamos as operações no oeste ou sul da França, e também estenderíamos
a assistência aos exércitos da guerrilha. Essas operações ainda não foram deta-
lhadas. Uma comissão poderia ser criada para estudar a questão e elaborar um
documento em detalhes.
Stalin: Tenho algumas perguntas: entendo que há 35 divisões para operações
de invasão no norte da França.
Churchill: Sim, isso é correto.
Stalin: Antes das operações para invadir o norte da França, planeja-se realizar
a operação no teatro italiano para tomar Roma, depois da qual está prevista a
defensiva na Itália.
Churchill: Sim. Já estamos retirando sete divisões da Itália.
Stalin: Também entendo que três outras operações estão planejadas, uma das
quais consistirá em um desembarque na área adriática.
Churchill: A realização dessas operações pode ser útil para os russos. Depois
que as sete divisões forem enviadas da área do Mediterrâneo, teremos até 35
divisões para a invasão do norte da França. Além disso, teremos 20 ou 23 divisões
no norte da Itália.
Gostaria de acrescentar que o maior problema é a transferência das forças
necessárias. Como já apontei, a Operação Overlord será iniciada por 35 divisões.
A partir daí, o número de tropas será aumentado por divisões transferidas dos
EUA; seu número subirá para 50 ou 60. Quero acrescentar que nos próximos seis
meses a força aérea britânica e americana agora na Grã-Bretanha será duplicada e
triplicada. Além disso, o trabalho está sendo continuamente feito para acumular
forças na Grã-Bretanha.
Stalin: Outra pergunta. Entendi corretamente que, além das operações para
tomar Roma, planeja-se realizar outra operação no Adriático e também uma ope-
ração no sul da França?
Churchill: O plano é realizar um ataque no sul da França no momento em
J. V. Stalin 759

que a Operação Overlord for lançada. Tropas que podem ser liberadas da Itália
serão usadas para isso. Mas esta operação ainda não foi decidida em detalhes.
Stalin: Outra pergunta: se a Turquia entra na guerra o que deve ser feito
nesse caso?
Churchill: Posso dizer que não seria preciso mais do que duas ou três divisões
para tomar as ilhas ao longo da costa oeste da Turquia, de modo a permitir que os
navios de abastecimento fossem para a Turquia e também para abrir a rota para o
Mar Negro. Mas a primeira coisa que faremos é enviar aos turcos 20 esquadrões
aéreos e vários regimentos de defesa aérea, o que pode ser feito sem prejuízo de
outras operações.
Stalin: Na minha opinião, seria melhor fazer da Operação Overlord a base de
todas as operações em 1944. Se um desembarque fosse feito no sul da França ao
mesmo tempo que essa operação, ambos os grupos de forças poderiam se juntar
na França. É por isso que seria bom ter duas operações: a Operação Overlord
e o desembarque no sul da França como uma operação de apoio. Ao mesmo
tempo, a operação na área de Roma seria uma operação de desvio. Ao realizar
o desembarque na França no Norte e no Sul pode haver um acúmulo de forças
quando essas forças se unirem. A França é o ponto fraco da Alemanha. Quanto
à Turquia, duvido que a Turquia entre na guerra. Ela não se juntará à guerra,
não importa a pressão que exerçamos. Essa é a minha opinião.
Churchill: Entendemos que o governo soviético está altamente interessado
em fazer a Turquia entrar na guerra. É claro que podemos falhar em fazer a
Turquia entrar na guerra, mas devemos tentar fazer tudo a este respeito.
Stalin: Sim, temos que tentar fazer com que a Turquia entre na guerra.
Churchill: Concordo com as considerações do Marechal Stalin sobre a inde-
sejabilidade de dispersar as forças, mas se temos 25 divisões na área do Medi-
terrâneo, três ou quatro divisões e 20 esquadrões aéreos podem muito bem ser
reservados para a Turquia, particularmente porque eles estão atualmente sendo
usados para proteger o Egito, e eles poderiam ser movidos de lá para o norte.
Stalin: Essa é uma grande força, esses 20 esquadrões aéreos. Claro, seria bom
se a Turquia entrasse na guerra.
Churchill: Receio que neste período de seis meses, durante o qual podería-
mos tomar Roma e nos preparar para grandes operações na Europa, nosso exér-
cito permanecerá inativo e não exercerá pressão sobre o inimigo. Temo que,
nesse caso, o Parlamento me censuraria por não dar qualquer assistência aos rus-
sos.
Stalin: Acho que Overlord é uma grande operação. Seria consideravelmente
facilitada e teria certamente um grande efeito se fosse apoiada pelo sul da França.
Eu pessoalmente iria a esse extremo. Eu iria para a defensiva na Itália, abando-
nando a captura de Roma, e começaria uma operação no sul da França, retirando
as forças alemãs do norte da França. Em cerca de dois ou três meses eu começa-
ria a operação no norte da França. Este plano garantiria o sucesso da Operação
Overlord; os dois exércitos poderiam se encontrar, e isso resultaria em um acú-
mulo de forças.
Churchill: Eu poderia produzir ainda mais argumentos, mas gostaria de dizer
760 Obras Escolhidas

apenas que seríamos mais fracos se não tomássemos Roma. Além disso, para
realizar uma ofensiva aérea contra a Alemanha é necessário chegar à linha Pisa-
Rimini. Gostaria que os especialistas militares discutissem essa questão. A luta
por Roma já está em andamento e esperamos tomar Roma em janeiro. Recusar-
se a tomar Roma significaria a nossa derrota e eu não poderia explicar isso à
Assembleia.
Roosevelt: Poderíamos realizar Overlord a tempo se não houvesse operações
no Mediterrâneo. Se houver operações no Mediterrâneo, isso adiará a data da
Operação Overlord. Eu não gostaria de atrasar Overlord.
Stalin: Pela experiência de nossas operações, sabemos que o sucesso é obtido
onde o golpe é dado de dois lados, e que as operações realizadas de um só lado
não produzem efeito suficiente. É por isso que tentamos atacar o inimigo de dois
lados para fazê-lo transportar suas forças de um lado para o outro. Eu acho que,
neste caso, também seria bom realizar a operação a partir do sul e do norte da
França.
Churchill: Eu pessoalmente concordo plenamente com isso, mas acho que po-
demos realizar atos de distração na Iugoslávia, e também fazer com que a Turquia
se junte à guerra, independentemente da invasão do sul ou norte da França. Eu
pessoalmente considero a ociosidade do nosso exército no Mediterrâneo como
um fato altamente negativo. É por isso que não podemos garantir que a data de
1º de maio seja cumprida com precisão. Seria um grande erro marcar essa data.
Não posso sacrificar as operações no Mediterrâneo só para manter a data de 1º
de maio. Claro que devemos chegar a um acordo definitivo sobre o assunto. Esta
questão poderia ser discutida por nossos especialistas militares.
Stalin: Muito bem. Não esperávamos uma discussão sobre assuntos pura-
mente militares, por isso não convidamos representantes do Estado-Maior para
vir junto, mas acho que o Marechal Voroshilov e eu podemos organizar algo.
Churchill: O que devemos fazer com a questão da Turquia? Devemos também
encaminhá-lo aos especialistas militares?
Stalin: É uma questão política e militar. A Turquia é aliada da Grã-Bretanha
e tem relações amistosas com a URSS e os Estados Unidos. A Turquia não deve
mais jogar entre nós e a Alemanha.
Churchill: Eu posso possivelmente ter seis ou sete perguntas sobre a Turquia.
Mas primeiro gostaria de pensar sobre elas.
Stalin: Muito bem.
Roosevelt: Claro, sou a favor de fazer a Turquia entrar na guerra, mas se eu
estivesse no lugar do Presidente turco, pediria um preço que só poderia ser pago
infligindo danos à Operação Overlord.
Stalin: Deve haver um esforço para fazer a Turquia lutar. Ela tem muitas
divisões ociosas.
Churchill: Todos temos sentimentos de amizade um pelo outro, mas natural-
mente temos nossas diferenças. Precisamos de tempo e paciência.
Stalin: Isso mesmo.
Roosevelt: Destarte, os peritos militares se reunirão amanhã de manhã, e às
quatro horas haverá uma sessão da conferência.
J. V. Stalin 761

Comunicado: Sobre a Conferência dos Chefes de Governo


dos Países Aliados – URSS, Estados Unidos e Grã-Bretanha –
realizada em Teerã

A Conferência dos Chefes de Governo dos três Poderes Aliados foi realizada
em Teerã de 28 de novembro a 1º de dezembro. J. V. Stalin, Presidente do Con-
selho de Comissários do Povo da URSS, F. D. Roosevelt, Presidente dos Estados
Unidos da América e W. Churchill, primeiro-ministro da Grã-Bretanha, partici-
param de seus trabalhos.
A Conferência aprovou a Declaração sobre a ação conjunta na guerra contra
a Alemanha e a cooperação pós-guerra das três Potências e também a Declaração
relativa ao Irã. Os textos estão publicados abaixo.

Declaração dos Três Poderes

Nós – o presidente dos Estados Unidos, o primeiro-ministro da Grã-Bretanha


e o Presidente do Conselho de Ministros da União Soviética, nos reunimos nestes
quatro dias passados, nesta capital do nosso Aliado, o Irã, e moldamos e confir-
mamos nossa política comum.
Expressamos nossa determinação de que nossas nações trabalharão juntas na
guerra e na paz que se seguirá.
Quanto à guerra – nossos adidos militares se juntaram às nossas mesas re-
dondas, e nós concatenamos nossos planos para a destruição das forças alemãs.
Chegamos a um acordo completo quanto ao escopo e tempo das operações a
serem realizadas a partir do leste, oeste e sul.
O entendimento comum a que chegamos aqui garante que a vitória será nossa.
E quanto à paz – temos certeza de que nossa concordância renderá uma paz
duradoura. Reconhecemos plenamente a suprema responsabilidade repousando
sobre nós e todas as Nações Unidas para fazer uma paz que comandará a boa
vontade da massa esmagadora dos povos do mundo e banirá o flagelo e o terror
da guerra por muitas gerações.
Com nossos conselheiros diplomáticos, examinamos os problemas do futuro.
Buscaremos a cooperação e a participação ativa de todas as nações, grandes e pe-
quenas, cujos povos de coração e mente se dedicam, assim como nossos próprios
povos, à eliminação da tirania e da escravidão, opressão e intolerância. Vamos
recebê-los, caso eles escolham vir, em uma família mundial de nações democrá-
ticas.
Nenhum poder na Terra pode impedir que destruamos os exércitos alemães
por terra, seus submarinos por mar, e suas indústrias de guerra pelo ar.
Nosso ataque será implacável e crescente.
Emergindo dessas conferências cordiais, olhamos com confiança para o dia
em que todos os povos do mundo poderão viver vidas livres, intocadas pela tirania
e de acordo com seus desejos variados e suas próprias consciências.
Viemos aqui com esperança e determinação. Saímos daqui amigos de fato,
em espírito e de propósito.
762 Obras Escolhidas

Assinado em Teerã em 1 de dezembro de 1943


Roosevelt, Stalin, Churchill

Declaração sobre o Irã

O Presidente dos Estados Unidos da América, o Presidente do Conselho de


Ministros da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas e o Primeiro-Ministro
do Reino Unido, tendo consultado uns aos outros e com o primeiro-ministro do
Irã, desejam declarar o acordo mútuo de seus três governos em relação às suas
relações com o Irã.
Os governos dos Estados Unidos da América, da União das Repúblicas So-
cialistas Soviéticas e do Reino Unido reconhecem a assistência que o Irã deu
no processo de guerra contra o inimigo comum, particularmente facilitando o
transporte de suprimentos do exterior para a União Soviética.
Os três governos percebem que a guerra causou dificuldades econômicas es-
peciais para o Irã e eles estão acordados que eles continuarão a disponibilizar ao
Governo do Irã assistência econômica como possível, tendo em conta as pesadas
demandas que jazem sobre eles por suas operações militares em todo o mundo
e pela escassez mundial de transporte, matérias-primas e suprimentos para con-
sumo civil.
Com relação ao período pós-guerra, os governos dos Estados Unidos da Amé-
rica, a União das Repúblicas Socialistas Soviéticas e o Reino Unido estão de
acordo com o Governo do Irã de que qualquer problema econômico que enfrente
o Irã no encerramento das hostilidades deve receber total consideração junto com
os dos outros membros das Nações Unidas por conferências ou agências interna-
cionais realizadas ou criadas para lidar com questões econômicas internacionais.
Os governos dos Estados Unidos da América, da União das Repúblicas Socia-
listas Soviéticas e do Reino Unido estão em um acordo com o Governo do Irã em
seu desejo de manutenção da independência, soberania e integridade territorial
do Irã. Eles contam com a participação do Irã juntamente com todas as outras
nações amantes da paz no estabelecimento da paz internacional, segurança e
prosperidade após a guerra, de acordo com os princípios da Carta do Atlântico
da qual todos os quatro governos são signatários.
1 de dezembro de 1943
Churchill, Stalin, Roosevelt
J. V. Stalin 763

CONFERÊNCIA DA CRIMEIA

(4 a 11 de fevereiro de 1945)

Primeira sessão no Palácio Livadia

4 de fevereiro de 1945

Stalin pede a Roosevelt que ele abra a sessão.


Roosevelt disse que nem a lei nem a história previam que ele Roosevelt deveria
abrir conferências. Era pura sorte ele ter aberto a Conferência em Teerã. Ele,
Roosevelt, considerou uma grande honra abrir a presente Conferência e gostaria
de começar expressando sua gratidão pela hospitalidade concedida a ele.
Os líderes dos três Poderes, disse Roosevelt, já se entendiam bem e seu en-
tendimento mútuo estava crescendo. Todos queriam o fim precoce da guerra e
a paz estável. Foi por isso que os participantes da Conferência puderam iniciar
suas conversações não oficiais. Ele, Roosevelt, acreditava que as conversas deve-
riam ser francas. A experiência mostrou que a franqueza nas conversas conduzia
à realização precoce de boas decisões. Os participantes da Conferência tinham os
mapas da Europa, Ásia e África de frente a eles. A sessão do dia, no entanto, era
para ser dedicada à situação na frente oriental, onde as tropas do Exército Ver-
melho estavam avançando com grande sucesso. Ele, Roosevelt, pediu a alguém
que relatasse a situação na frente soviético-alemã.
Stalin respondeu que poderia oferecer um relatório de Antonov, General do
Exército e vice-chefe do Estado-Maior do Exército Vermelho.
Antonov: “Nos dias 12 a 15 de janeiro, as forças soviéticas foram para a ofensiva
em uma frente de 700 quilômetros entre o rio Niemen e os Cárpatos.”
As tropas do General Chernyakhovsky avançavam sobre Königsberg310 . “As
tropas do Marechal Rokossovsky estavam avançando ao longo da margem norte
do Vístula, cortando a Prússia Oriental das áreas centrais da Alemanha. As tro-
pas do Marechal Zhukov avançavam ao sul do Vístula em direção a Poznan. As
tropas do Marechal Konev avançavam sobre Czestochowa e Breslau. As tropas
do General Petrov avançavam sobre Nowy Targ na área dos Cárpatos. O golpe
principal foi impingido pelas forças sob Rokossovsky, Zhukov e Konev em uma
frente de 300 quilômetros entre Ostroleka e Cracóvia.
2. Devido às condições climáticas desfavoráveis, a operação estava prevista
para o final de janeiro, quando se esperava uma melhora no tempo. Como a
operação foi considerada e preparada como uma com objetivos decisivos, a in-
tenção era conduzi-la em condições mais favoráveis.
No entanto, tendo em vista a situação alarmante que se desenvolveu na frente
ocidental, em conexão com a ofensiva alemã nas Ardenas, o Alto Comando das
forças soviéticas ordenou que a ofensiva fosse iniciada até meados de janeiro, sem
esperar que o tempo melhorasse.
310A partir de 1946 a cidade seria rebatizada para Kaliningrado, hoje é um exclave russo do oblast
de Kaliningrado. (N.T)
764 Obras Escolhidas

3. Quando as forças soviéticas chegaram ao Narew e ao Vístula, o agrupa-


mento inimigo era mais sólido no setor central da frente, posto que um ataque
àquele setor levaria nossas tropas aos centros vitais da Alemanha ao longo da rota
mais curta.
A fim de criar as condições mais vantajosas para a ofensiva, o Alto Comando
Soviético decidiu diminuir esse agrupamento central do inimigo. Com esse fim
em vista, conduziu uma operação de apoio contra a Prússia Oriental e continuou
a ofensiva na Hungria em direção a Budapeste.
Ambas as direções eram altamente sensíveis para os alemães que rapidamente
reagiram à nossa ofensiva movendo algumas forças do setor central da frente para
os flancos; assim, das 24 divisões de tanques em nossa frente, que constituíram
a principal força de ataque dos alemães, 11 divisões de tanques foram movidas
para a direção de Budapeste e 6 divisões de tanques para a Prússia Oriental (3
divisões de tanques já estavam em Kurland), deixando assim apenas 4 divisões de
tanques no setor central da frente. O objetivo estabelecido pelo Alto Comando
foi alcançado.
4. O equilíbrio de forças na direção do ataque principal:
Na frente entre Ostroleka e Cracóvia, ou seja, a direção do nosso ataque prin-
cipal, o inimigo tinha até 80 divisões; criamos um agrupamento com o objetivo
de obter a seguinte superioridade sobre o inimigo:
Infantaria – mais que o dobro (até 180 divisões); Artilharia, tanques e aviação
– avassalador. Nos setores de rompimento da frente, a densidade de artilharia
criada foi de 220-230 peças (de 76 mm e maiores) por quilômetro de frente.
5. A ofensiva foi iniciada em condições climáticas altamente desfavoráveis
(nuvens baixas e neblina), o que excluiu absolutamente as operações da Força
Aérea e limitou o campo de observação de artilharia a cem metros.
Graças ao bom reconhecimento preliminar e à poderosa ofensiva de artilharia,
o sistema de fogo do inimigo foi suprimido e suas fortificações destruídas. Isso
permitiu que nossas tropas avançassem de 10 a 15 quilômetros no primeiro dia
da ofensiva, ou seja, romper toda a profundidade tática das defesas inimigas.
6. Resultados da ofensiva:
(A) Em 1º de fevereiro, ou seja, em 18 dias de ofensiva, as forças soviéticas
avançaram até 500 quilômetros na direção do ataque principal, com uma média
de 25-30 quilômetros por dia.
(B) As forças soviéticas atingiram o Oder no setor de Küstrin (norte de Frank-
furt) e ao sul e ocuparam a área industrial da Silésia.
(C) As principais rotas que ligam o agrupamento prussiano oriental do ini-
migo com as áreas centrais da Alemanha foram cortadas.
Assim, além do agrupamento Kurland (26 divisões), o agrupamento do ini-
migo na Prússia Oriental foi isolado (até 27 divisões); um número de agrupamen-
tos isolados de alemães (na área de Lodz, Thorn, Poznan, Schneidemühl, etc...
um total de até 15 divisões) foram cercados e estão sendo destruídos.
(D) Posições de defesa permanentes dos alemães na Prússia Oriental – nas
direções de Königsberg e Letzen – foram rompidas.
(E) Quarenta e cinco divisões alemãs foram eliminadas, com o inimigo so-
J. V. Stalin 765

frendo as seguintes perdas: cerca de 100.000 prisioneiros cerca de 300.000 mor-


tos, um total de até 400.000 homens.
7. As prováveis operações do inimigo:
(A) Os alemães defenderão Berlim, para tal propósito tentarão conter o avanço
das forças soviéticas na linha Oder, organizando a defesa lá com a ajuda de tropas
em retirada e reservas transferidas da Alemanha, Europa Ocidental e Itália. O
inimigo tentará usar seu agrupamento em Kurland para a defesa da Pomerânia,
transportando-o por mar além do Vístula.
(B) Os alemães cobrirão a direção de Viena da forma mais sólida possível,
reforçando-a com tropas que operam na Itália.
8. Movimento das tropas inimigas:
(A) As seguintes divisões já apareceram em nossa frente: 9 divisões das áreas
centrais da Alemanha, 6 divisões da Frente Oeste Europeia, 1 divisão da Itália,
somando 16 divisões.
(B) No caminho: 4 divisões de tanques, 1 divisão motorizada, total 5 divisões
(C) Até 30-35 divisões ou provavelmente ainda mais serão movidas (da frente da
Europa Ocidental, Noruega e Itália, e reservas na Alemanha). Assim, mais 35-40
divisões podem aparecer em nossa frente.
9. Nossos desejos:
(A) Acelerar a ofensiva das forças aliadas na frente ocidental, para a qual a
situação agora é muito favorável, ou seja:
(1) Derrota dos alemães na frente oriental;
(2) Derrota do agrupamento alemão que havia atacado nas Ardenas;
(3) Enfraquecimento das forças alemãs no Ocidente, tendo em vista a trans-
ferência de suas reservas para o Oriente.
É desejável que uma ofensiva seja iniciada na primeira quinzena de fevereiro.
(B) Impedir que o inimigo transfira suas forças para o Oriente a partir da
frente ocidental, Noruega e Itália por ataques aéreos contra suas comunicações;
em particular, paralisar as junções de Berlim e Leipzig.
(C) Impedir que o inimigo retire suas forças da Itália.

[O texto escrito do relatório de Antonov foi entregue a Roosevelt e Churchill.]

Stalin questiona se havia alguma pergunta.


Roosevelt disse que gostaria de saber o que o governo soviético pretendia fazer
com as locomotivas alemãs, material circulante e ferrovias. Ele perguntou se o
governo soviético pretendia ampliar o calibre das ferrovias alemãs.
Antonov respondeu que, uma vez que as locomotivas e o material circulante
abandonado pelos alemães eram de pouca utilidade, o calibre das ferrovias ale-
mãs teria que ser alterado em várias direções-chave.
Roosevelt afirmou que, em sua opinião, seria bom que as delegações aliadas
discutissem em conjunto esta questão, pois as forças aliadas estavam se aproxi-
mando rapidamente.
Antonov disse que o comando soviético estava alterando o calibre em um nú-
mero mínimo de direções necessárias para garantir o fornecimento das forças
766 Obras Escolhidas

soviéticas.
Stalin disse que a maior parte das ferrovias permaneceu sem alterações. O
comando soviético estava mudando o calibre das ferrovias com parcimônia.
Churchill declarou que tinha várias perguntas a fazer. Ele acreditava que havia
uma série de perguntas que seria conveniente para as três delegações discutirem.
Por exemplo, a questão do tempo. Deve-se determinar quanto tempo os alemães
precisariam para transferir oito divisões da Itália para a frente soviética. O que
deve ser feito para evitar tal transferência? Não deveria parte das forças aliadas
ser transferida pelo corredor de Liubliana para se juntar ao Exército Vermelho?
Também seria necessário determinar o tempo que isto levaria e se talvez não fosse
tarde demais para fazê-lo.
Ele, Churchill, havia indicado apenas uma das perguntas que poderiam ser
discutidas pelas delegações. Ele propôs que o General Marshall fizesse um re-
latório sobre as operações na frente ocidental cuja condução seria de assistência
aos exércitos soviéticos.
Roosevelt concordou com o Primeiro-Ministro. Ele disse que os Aliados esta-
vam lutando a uma grande distância um do outro. A Alemanha tinha encolhido,
e foi por isso que o contato mais próximo entre as delegações dos três países foi
de especial importância.
Stalin disse que isto era correto.
O General Marshall declarou que as consequências da ofensiva alemã nas Ar-
denas foram eliminadas. Nas semanas anteriores, o General Eisenhower reagru-
pou suas divisões. Ao mesmo tempo, o General Eisenhower continuou a exercer
pressão sobre o inimigo na área da contraofensiva alemã. Como resultado das
operações que havia conduzido, o General Eisenhower descobriu que os alemães
tinham grandes forças nas Ardenas. Foi por isso que o General Eisenhower co-
meçou a concentrar suas forças no norte.
No setor sul da frente, ou seja, ao norte da Suíça, o objetivo da operação
planejada era jogar de volta os alemães na área de Mühlhausen e Colmar. O
objetivo das operações que estão sendo conduzidas ao norte de Estrasburgo era
liquidar a ponte na margem esquerda do Reno. À época, o 25º Grupo do Exército
e o 9º Exército dos EUA, que estavam sob o comando de Montgomery, estavam
se preparando para uma ofensiva no setor norte. O 9º Exército dos EUA atacaria
na direção nordeste.
O comando aliado esperava iniciar a primeira dessas operações em 8 de feve-
reiro. A segunda operação era para começar em uma semana ou possivelmente
um pouco mais cedo. Os aliados esperavam que os alemães se retirassem para
Düsseldorf, depois do que as tropas aliadas se mudariam para Berlim. Como mui-
tas forças deveriam ser movidas para esta ofensiva devido às instalações de abas-
tecimento. Paraquedistas seriam usados. Esperava-se que a travessia do Reno, no
norte, fosse possível no início de março. No norte, havia três lugares adequados
para forçar a passagem do Reno.
Por um certo tempo, as operações na frente ocidental se desenvolveram len-
tamente por causa da falta de tonelagem. Então, após a abertura da Antuérpia,
as coisas estavam se animando, e os Aliados foram capazes de trazer de 70.000
a 80.000 toneladas de carga seca por dia, e 12.000 toneladas de combustível lí-
J. V. Stalin 767

quido. Os alemães estavam tentando dificultar o abastecimento dos Aliados e


continuavam a bombardear a Antuérpia com bombas aéreas. Informações rece-
bidas naquele dia mostravam que 60 bombas aéreas e 6 foguetes haviam caído na
área da Antuérpia nas últimas 24 horas.
Stalin disse que bombas e foguetes raramente atingem o alvo.
Marshall comentou que sempre havia a possibilidade de bombas atingirem
navios no porto.
Ele afirmou que a força aérea aliada sempre esteve ativa quando o tempo per-
mitiu. Grande destruição foi infligida por caças e bombardeiros leves e pesados.
Informações recebidas naquele dia indicavam que os trens das tropas a cami-
nho da frente soviético-alemã tinham sido atacados pelo ar. Grande destruição
foi feita nas ferrovias ao norte de Estrasburgo. Bombardeiros pesados atacaram
principalmente indústrias que produzem combustível para privar a Alemanha da
possibilidade de fornecer combustível a seus tanques. A produção de combustí-
vel na Alemanha caiu 60% . A Força Aérea também estava atacando linhas de
comunicação. As fábricas de tanques foram fortemente bombardeadas.
Quanto à situação na Itália e ao sul da Suíça, ele, Marshall, teve o seguinte a
relatar. Ao sul da Suíça, a Alemanha tinha uma ou duas divisões e na Itália, 27
divisões. Na Itália, os Aliados tinham uma força igual à dos alemães. Além disso,
os Aliados tinham uma força aérea na Itália que estava destruindo o material
circulante dos alemães, ferrovias e pontes.
Os alemães, declarou Marshall, provavelmente logo retomariam sua ofensiva
submarina porque tinham produzido um submarino melhorado. Os alemães ti-
nham na época cerca de 30 submarinos à sua disposição. Apesar do pequeno nú-
mero de submarinos, eles poderiam apresentar uma séria ameaça ao transporte
marítimo aliado porque os dispositivos desenvolvidos pelos Aliados não eram ca-
pazes de detectar submarinos do tipo melhorado. Foi por isso que as operações
de bombardeiros pesados foram dirigidas contra os estaleiros onde os subma-
rinos estavam sendo construídos. As operações dos bombardeiros não tinham
depreciado os ataques da Força Aérea contra a indústria alemã, em particular, as
usinas que fabricavam combustível.
Churchill disse que gostaria de ouvir o Marechal de Campo Brooke e o Al-
mirante Cunningham. A velocidade do avanço soviético era na época altamente
importante, porque Danzig era um dos lugares onde muitos submarinos estavam
concentrados.
Stalin perguntou onde mais os submarinos estavam concentrados.
Churchill respondeu que era em Kiel e Hamburgo.
Brooke afirmou que, em sua opinião, os planos e operações aliados na frente
ocidental tinham sido expostas de forma completa.
Churchill disse que antes dos participantes do Conferência passassem para ou-
tras perguntas, não militares, ele gostaria de mencionar uma questão relacionada
com a passagem dos rios. Os Aliados tinham um centro especial para o estudo
das travessias forçadas de rios. O oficial no comando daquele centro estava então
em Yalta. Churchill disse que ficaria grato se o oficial pudesse contatar os milita-
res soviéticos com o propósito de obter informações sobre a travessia forçada de
768 Obras Escolhidas

rios. Os russos eram conhecidos por terem grande experiência, especialmente


na travessia forçada de rios em locais congelados.
Stalin disse que tinha várias perguntas para fazer. Ele gostaria de saber o
comprimento da frente em que o avanço deveria ser feito.
Marshall respondeu que o avanço seria feito em uma frente entre 50 e 60
milhas de comprimento.
Stalin perguntou se os alemães tinham alguma fortificação na frente onde o
avanço estava sendo planejado.
Marshall respondeu que os alemães tinham construído fortificações pesadas
naquele setor da frente.
Stalin perguntou se os Aliados teriam reservas para explorar os possíveis su-
cessos.
Marshall respondeu afirmativamente.
Stalin disse que tinha feito a pergunta porque o comando soviético estava ci-
ente da grande importância das reservas. Isso ficou especialmente claro durante
a campanha de inverno. Ele gostaria de perguntar quantas divisões de tanques
os Aliados concentraram no setor do avanço planejado. Durante o avanço do
inverno, o comando soviético concentrou cerca de 9.000 tanques no setor central
da frente.
Marshall respondeu que não sabia disso, mas haveria uma divisão de tanques
para três divisões de infantaria, ou seja, cerca de 10-12 divisões de tanques para
35 divisões.
Stalin perguntou quantos tanques havia em uma divisão aliada.
Marshall respondeu: 300 tanques.
Churchill observou que em todo o teatro da Europa Ocidental os Aliados ti-
nham 10.000 tanques.
Stalin disse que era muito. Na frente do ataque principal, o comando sovié-
tico concentrou-se entre 8.000 e 9.000 aviões. Ele perguntou quantos aviões os
Aliados tinham.
Portal respondeu que os Aliados tinham quase tantos aviões, incluindo 4.000
bombardeiros, cada um dos quais era capaz de transportar uma carga de bomba
de 3 a 5 toneladas.
Stalin perguntou que superioridade os Aliados tinham na infantaria. Na
frente do ataque principal, o comando soviético tinha uma superioridade na in-
fantaria de 100 divisões contra 80 alemãs.
Churchill declarou que os Aliados nunca tiveram grande superioridade na in-
fantaria, mas os Aliados tinham, por vezes, uma grande superioridade no ar.
Stalin disse que o comando soviético tinha grande superioridade na artilha-
ria. Ele perguntou se os Aliados estavam interessados em saber como a artilharia
soviética operava. Stalin disse que o povo soviético, sendo os camaradas de armas
dos Aliados, poderia trocar experiências com eles. Um ano antes, o comando
soviético tinha estabelecido uma força de artilharia especial. Esta tinha produ-
zido bons resultados. Uma divisão de artilharia tinha de 300 a 400 armas. Por
exemplo, em uma frente de 35-40 quilômetros, o Marechal Konev tinha seis di-
J. V. Stalin 769

visões de artilharia complementadas com divisões de escaramuçadores. Como


resultado, havia quase 230 armas por quilômetro do avanço. Depois de uma bar-
ragem de artilharia, muitos alemães foram mortos, outros ficaram atordoados
e não puderam voltar por muito tempo. Isso abriu os portões para o Exército
Vermelho. A partir daí, o avanço não tinha sido difícil.
Ele, Stalin, lamentou ter tomado tempo ao relatar o anterior. Stalin disse ter
expressado a forma em relação a como os exércitos aliados poderiam ajudar as
forças soviéticas. Ele gostaria de saber que desejos os Aliados tinham em relação
às forças soviéticas.
Churchill afirmou que gostaria de aproveitar a oportunidade para expressar
sua profunda admiração pelo poder que o Exército Vermelho havia demonstrado
em sua ofensiva.
Stalin disse que aquilo não era um desejo.
Churchill declarou que os Aliados estavam cientes da dificuldade de sua tarefa
e não a minimizaram. Mas os Aliados estavam confiantes de que lidariam com sua
própria tarefa. Todos os comandantes aliados estavam confiantes nisso. Embora
o ataque fosse feito contra o ponto mais forte dos alemães, os Aliados tinham
certeza de que seria um sucesso e seria benéfico para as operações das forças
soviéticas. Quanto aos desejos, os Aliados queriam que a ofensiva dos exércitos
soviéticos continuasse com o mesmo sucesso.
Roosevelt declarou que estava de acordo com Churchill.
Stalin disse que a ofensiva do Exército Vermelho, pela qual Churchill expres-
sou sua gratidão, estava cumprindo um dever camarada. De acordo com as deci-
sões adotadas na Conferência de Teerã, o Governo soviético não tinha obrigação
de lançar uma ofensiva de inverno.
O Presidente lhe perguntou se ele, Stalin, poderia receber um representante
do General Eisenhower. Ele, Stalin, tinha naturalmente dado o seu consenti-
mento. Churchill lhe enviara uma mensagem, perguntando-lhe se ele, Stalin,
planejava iniciar uma ofensiva em janeiro. Ele, Stalin, tinha percebido que nem
Churchill nem Roosevelt estavam pedindo-lhe abertamente uma ofensiva; ele ti-
nha apreciado este tato por parte dos Aliados, mas tinha visto que tal ofensiva
era necessária para os Aliados. O comando soviético tinha começado sua ofen-
siva antes mesmo da data planejada. O Governo soviético considerou que esse era
seu dever, o dever de um aliado, embora não estivesse sob nenhuma obrigação
formal nesta situação. Ele, Stalin, gostaria que os líderes dos Poderes Aliados le-
vassem em conta que os líderes soviéticos não apenas cumpriam suas obrigações,
mas também estavam preparados para cumprir seu dever moral na medida do
possível.
Quanto aos desejos, ele perguntou sobre eles porque Tedder311 havia expres-
sado o desejo de que as forças soviéticas não parassem sua ofensiva até o final de
março. Ele, Stalin, entendeu que este era possivelmente o desejo não só de Ted-
der, mas também de outros líderes militares aliados. Stalin disse que as forças
soviéticas continuariam sua ofensiva, se o tempo permitisse e as estradas fossem
transitáveis.
311
Arthur Tedder, um dos altos comandantes da aeronáutica britânica durante a segunda guerra
mundial (N.T)
770 Obras Escolhidas

Roosevelt afirmou que estava de acordo com a opinião do Marechal Stalin. Na


conferência em Teerã, era impossível elaborar um plano comum de operações.
Ele, Roosevelt, achou que cada Aliado estava moralmente obrigado a avançar com
a maior velocidade possível. Na época da Conferência de Teerã havia uma grande
distância entre as forças aliadas movendo-se do Leste e do Oeste. Mas chegou
a hora em que era necessário coordenar mais detalhadamente as operações das
forças aliadas.
Churchill declarou que saudou as palavras do Marechal Stalin. Ele, Churchill,
acreditava que poderia dizer o seguinte em nome do Presidente e de si mesmo. A
razão pela qual os Aliados não tinham concluído em Teerã qualquer acordo com
a União Soviética sobre futuras operações, era sua confiança no povo soviético e
seus militares.
Roosevelt respondeu que a Conferência de Teerã havia sido realizada antes
de sua reeleição. Ainda não se sabia se o povo americano estaria ou não do seu
lado... foi por isso que tinha sido difícil elaborar qualquer plano militar comum...
Churchill disse que a questão levantada por Tedder em sua conversa com o
Marechal Stalin poderia ser posteriormente discutida pelas delegações aliadas.
Churchill disse que os três líderes poderiam, naturalmente, ser criticados por não
coordenar as ofensivas aliadas. Se o tempo dificultasse as operações das forças
soviéticas, talvez os Aliados atacassem em sua frente. Mas essa questão deve ser
decidida pelas delegações.
Stalin disse que faltava coordenação. As forças soviéticas tinham parado sua
ofensiva no outono. Só então os Aliados começaram sua ofensiva. Na época, era o
contrário. No futuro, isso deve ser evitado. Stalin perguntou se era conveniente
para os militares aliados discutir planos para operações de verão.
Churchill disse que isso poderia ter que ser feito. Os militares aliados pode-
riam lidar com as questões militares enquanto os líderes lidavam com as políticas.
Stalin respondeu que isto estava correto.
Cunningham disse que gostaria de complementar o relatório do General Marshall.
A ameaça de um novo surto de guerra submarina por parte dos alemães era po-
tencial e não factual. Os alemães conseguiram grande sucesso na melhoria de
seus submarinos. Mas isso não era tão importante. O importante era que os
alemães já estavam construindo submarinos novos. Os submarinos seriam equi-
pados com os mais recentes dispositivos técnicos e teriam uma grande velocidade
sob a água. As forças navais, portanto, achariam muito difícil combatê-los. Os
submarinos alemães estavam sendo construídos em Bremen, Hamburgo e Dan-
zig. Se ele, Cunningham, pudesse expressar um desejo, era que, como represen-
tante do departamento naval, ele gostaria de pedir às forças soviéticas para tomar
Danzig o mais rápido possível, porque 30% da construção de submarinos estava
concentrada lá.
Roosevelt perguntou se Danzig estava ao alcance da artilharia soviética.
Stalin respondeu que Danzig ainda não estava ao alcance da artilharia sovié-
tica. O comando soviético esperava em breve aproximar Danzig do alcance do
fogo de artilharia.
Churchill disse que os militares podem se encontrar na manhã seguinte.
J. V. Stalin 771

Stalin disse que concordava com isso. Ele propôs que a reunião fosse marcada
para as 12 horas.
Churchill declarou que na reunião os militares devem discutir não apenas a
situação nas frentes oriental e ocidental, mas também na frente italiana, bem
como também a questão da melhor maneira de usar as forças disponíveis. Ele,
Churchill, também propôs que uma reunião fosse marcada para o dia seguinte
para discutir questões políticas, nomeadamente, o futuro da Alemanha, se ela
tiver algum.
Stalin respondeu que a Alemanha teria um futuro.

Comunicado da Conferência da Crimeia dos Chefes de


Governo da União Soviética, dos Estados Unidos e da
Grã-Bretanha

Nos últimos oito dias, Winston S. Churchill, primeiro-ministro da Grã-Bretanha,


Franklin D. Roosevelt, Presidente dos Estados Unidos da América, e o Marechal
J. V. Stalin, presidente do Conselho de Comissários do Povo da União das Repú-
blicas Socialistas Soviéticas se reuniram com os Secretários de Relações Exterio-
res, Chefes de Estado-Maior e outros conselheiros na Crimeia.
A seguinte declaração é feita pelo primeiro-ministro da Grã-Bretanha, o Pre-
sidente dos Estados Unidos da América e o Presidente do Conselho de Comissá-
rios Do Povo da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas sobre os resultados
da Conferência da Crimeia:

I – A Derrota da Alemanha

Consideramos e determinamos os planos militares dos Três Poderes Aliados


para a derrota final do inimigo comum. Os Estados-Maiores das três Nações
Aliadas se reuniram em reuniões diárias durante toda a Conferência. Essas reu-
niões têm sido satisfatórias em todos os pontos de vista e resultaram em uma
coordenação mais estreita do que nunca do esforço militar dos Três Aliados. As
informações mais completas foram trocadas. O tempo, o escopo e a coordenação
de novos e ainda mais poderosos golpes a serem lançados por nossos exércitos e
forças aéreas no coração da Alemanha a partir do leste, oeste, norte e sul foram
totalmente acordados e planejados em detalhes.
Nossos planos militares combinados serão conhecidos apenas quando os exe-
cutarmos, mas acreditamos que a estreita parceria de trabalho entre as três dele-
gações alcançados nesta Conferência resultará no encurtamento da guerra. Reu-
niões das três delegações serão continuadas no futuro sempre que a necessidade
surgir.
A Alemanha nazista está condenada. O povo alemão só vai tornar o custo
de sua derrota mais pesado para si mesmos, tentando continuar uma resistência
desesperada.
772 Obras Escolhidas

II – A Ocupação e Controle da Alemanha

Concordamos com políticas comuns e planos para impor os termos de rendi-


ção incondicional à Alemanha nazista assim que a resistência armada alemã for
finalmente esmagada. Estes termos não serão divulgados até que a derrota final
da Alemanha tenha sido alcançada. Sob o plano acordado, as forças dos Três
Poderes ocuparão, cada uma, uma zona separada da Alemanha. A administra-
ção e o controle coordenados foram previstos no plano através de uma Comissão
Central de Controle, composta pelos comandantes supremos dos Três Poderes,
com sede em Berlim. Foi acordado que a França deveria ser convidada pelos
Três Poderes, se assim desejar, a assumir uma zona de ocupação e a participar
como quarto membro da Comissão de Controle. Os limites da zona francesa se-
rão acordados pelos quatro Governos envolvidos através de seus representantes
na Comissão Consultiva Europeia.
É nosso propósito inflexível destruir o militarismo alemão e o nazismo e ga-
rantir que a Alemanha nunca mais será capaz de perturbar a paz do mundo. Esta-
mos determinados a desarmar e dissolver todas as forças armadas alemãs; romper
para sempre o Estado-Maior Alemão, que tem repetidamente contribuído para o
ressurgimento do militarismo alemão; remover ou destruir todos os equipamen-
tos militares alemães; eliminar ou controlar toda a indústria alemã que poderia
ser usada para a produção militar; levar todos os criminosos de guerra a pu-
nição justa e rápida e reparar de forma exata a destruição feita pelos alemães;
aniquilar o Partido Nazista, as leis nazistas, organizações e instituições, remover
todas as influências nazistas e militaristas de cargos públicos e da vida cultural
e econômica do povo alemão; e assumir quaisquer outras medidas na Alemanha
como pode vir a ser necessário para a paz e segurança futura do mundo. Não é
nosso propósito destruir o povo da Alemanha, mas somente quando o nazismo
e o militarismo foram extirpados haverá esperança de uma vida decente para os
alemães, bem como um lugar para eles na comunidade das nações.

III – Reparação pela Alemanha

Consideramos a questão dos danos causados pela Alemanha às Nações Ali-


adas nesta guerra e reconhecemos como justo que a Alemanha seja obrigada a
compensar este dano na medida do possível.
Uma comissão para a compensação dos danos será estabelecida. A comissão
será instruída a considerar a questão da extensão e dos métodos para compensar
os danos causados pela Alemanha aos países aliados. A comissão trabalhará em
Moscou.

IV – Conferência das Nações Unidas

Estamos resolvidos sobre o mais pronto estabelecimento possível com nossos


aliados de uma organização internacional geral para manter a paz e a segurança.
Acreditamos que isso é essencial, tanto para prevenir a agressão como para re-
mover as causas políticas, econômicas e sociais da guerra através da colaboração
próxima e contínua de todos os povos amantes da paz.
J. V. Stalin 773

As fundações foram colocadas em Dumbarton Oaks. No entanto, sobre a


importante questão do processo de votação, não houve acordo. A presente Con-
ferência foi capaz de resolver essa dificuldade.
Concordamos que uma Conferência das Nações Unidas deveria ser convocada
para se reunir em São Francisco, nos Estados Unidos, em 25 de abril de 1945,
para preparar a Carta de tal organização, nos moldes propostos nas conversas
informais em Dumbarton Oaks.
O Governo da China e o Governo Provisório da França serão imediatamente
consultados e convidados a patrocinar convites para a Conferência em conjunto
com os governos dos Estados Unidos, Grã-Bretanha e União das Repúblicas So-
cialistas Soviéticas. Assim que a consulta à China e à França estiver concluída, o
texto das propostas sobre o processo de votação será tornado público.

V – Declaração sobre a Europa Liberada

Elaboramos e subscrevemos uma Declaração sobre a Europa Libertada. Esta


Declaração prevê políticas de concertação para uma ação conjunta dos Três Po-
deres no cumprimento dos problemas políticos e econômicos de uma Europa
liberada de acordo com os princípios democráticos. O texto da Declaração é o
seguinte:
“O Presidente do Conselho de Comissários do Povo da União das Repúbli-
cas Socialistas Soviéticas, o Primeiro-Ministro do Reino Unido e o Presidente
dos Estados Unidos da América consultaram-se uns com os outros nos interesses
comuns dos povos de seus países e dos da Europa libertada. Eles declaram con-
juntamente seu acordo mútuo para concerto das políticas de seus Três Governos,
durante o período temporário de instabilidade na Europa liberada, no sentido de
ajudar os povos libertados do domínio da Alemanha nazista e dos povos dos an-
tigos estados satélites do Eixo a resolver por meios democráticos seus problemas
políticos e econômicos urgentes.
O estabelecimento da ordem na Europa e a reconstrução da vida econômica
nacional devem ser alcançados por processos que permitam aos povos libertados
destruir os últimos vestígios do nazismo e do fascismo e criar instituições demo-
cráticas de sua própria escolha. Este é um princípio da Carta atlântica – o direito
de todos os povos de escolher a forma de governo sob a qual viverão – a restau-
ração dos direitos soberanos e do autogoverno aos povos que foram privados à
força deles pelas nações agressoras.
Para promover as condições em que os povos libertados possam exercer esses
direitos, os Três Governos ajudarão conjuntamente as pessoas em qualquer es-
tado europeu libertado ou antigo Estado satélite do Eixo na Europa, onde em
suas condições de julgamento se exigir: (a) estabelecer condições de paz interna;
(b) Realizar medidas emergenciais para o alívio de pessoas afligidas; (c) Formar
autoridades governamentais interinas amplamente representativas de todos os
elementos democráticos da população e que se comprometam com o estabeleci-
mento através de eleições livres, o mais cedo possível, de governos responsáveis
pela vontade do povo; e (d) facilitar, quando necessário, a realização dessas elei-
ções.
774 Obras Escolhidas

Os Três Governos consultarão as outras Nações Unidas e autoridades provisó-


rias ou outros governos europeus quando questões de interesse direto para eles
estiverem em análise.
Quando, na opinião dos Três Governos, as condições em qualquer estado
europeu liberado ou em qualquer estado satélite do Antigo Eixo na Europa fize-
rem tal ação necessária, eles consultarão imediatamente juntos sobre as medidas
necessárias para quitar as responsabilidades conjuntas estabelecidas nesta decla-
ração.
Por esta Declaração reafirmamos nossa fé nos princípios da Carta atlântica,
nossa promessa na Declaração das Nações Unidas e nossa determinação de cons-
truir em cooperação com outras nações amantes da paz a ordem mundial sob a
lei, dedicada à paz, segurança, liberdade e bem-estar geral de toda a humani-
dade.
Ao emitir esta Declaração, os Três Poderes expressam a esperança de que o
Governo Provisório da República Francesa possa estar associado a eles no proce-
dimento sugerido.”

VI – Polônia

Viemos à Conferência da Crimeia resolver nossas diferenças sobre a Polônia.


Discutimos plenamente todos os aspectos da questão. Reafirmamos nosso desejo
comum de ver uma Polônia forte, livre, independente e democrática. Como re-
sultado de nossas discussões, concordamos com as condições em que um novo
Governo Provisório polonês de Unidade Nacional pode ser formado de forma a
receber o reconhecimento pelas três grandes Potências.
O acordo alcançado é o seguinte:
“Uma nova situação foi criada na Polônia, como resultado de sua completa
libertação pelo Exército Vermelho. Isso exige o estabelecimento de um Governo
Provisório polonês, que pode ser mais amplamente baseado do que era possí-
vel antes da recente libertação da Polônia Ocidental. O Governo Provisório que
agora funciona na Polônia deve, portanto, ser reorganizado em uma base demo-
crática mais ampla com a inclusão de líderes democráticos da própria Polônia e
dos poloneses no exterior. Este novo Governo deve então ser chamado de Go-
verno Provisório polonês de Unidade Nacional.
O Sr. Molotov, o Sr. Harriman e Lorde A. Clark Kerr estão autorizados, como
uma comissão, a consultar em primeira instância em Moscou com membros do
atual Governo Provisório e com outros líderes democráticos poloneses de dentro
da Polônia e do exterior, com vistas à reorganização do atual Governo de acordo
com as linhas acima. Este Governo Provisório polonês de Unidade Nacional deve
ser comprometido à realização de eleições livres e irrestritas o mais rapidamente
possível, com base no sufrágio universal e na votação secreta. Nestas eleições,
todos os partidos democráticos e antinazistas terão o direito de participar e apre-
sentar candidatos.
Quando um Governo Provisório polonês de Unidade Nacional tiver sido de-
vidamente formado em conformidade com o acima, o Governo da União das
Repúblicas Socialistas Soviéticas, que agora mantém relações diplomáticas com
J. V. Stalin 775

o atual Governo Provisório da Polônia, e o Governo do Reino Unido bem como


o Governo dos Estados Unidos da América, estabelecerão relações diplomáticas
com o novo Governo Provisório polonês de Unidade Nacional e trocarão embai-
xadores cujos relatórios os respectivos governos usarão para serem informados
sobre a situação na Polônia.
Os Três Chefes de Governo consideram que a fronteira oriental da Polônia
deve seguir a linha Curzon com digressões dela em algumas regiões de 5 a 8
quilômetros a favor da Polônia. Eles reconheceram que a Polônia deve receber
adesões substanciais de território no norte e oeste. Eles acham que a opinião do
novo Governo Provisório polonês de Unidade Nacional deve ser buscada no de-
vido tempo sobre a extensão dessas adesões e que a delimitação final da fronteira
ocidental da Polônia deve, posteriormente, aguardar a conferência de paz.”

VII – Iugoslávia

Concordamos em recomendar ao Marechal Tito e ao Dr. Subasi� que o


Acordo entre eles seja imediatamente colocado em vigor e que um novo Governo
seja formado com base nesse Acordo.
Também recomendamos que, assim que o novo Governo for formado, deve
declarar que: 1) a Assembleia Antifascista de Libertação Nacional (Avnoj) deve
ser estendida para incluir membros do último Parlamento Iugoslavo (Skupština)
que não se comprometeram por colaboração com o inimigo, formando assim um
órgão a ser conhecido como parlamento temporário; e
2) os atos legislativos aprovados pela Assembleia Antifascista de Libertação
Nacional estarão sujeitos à posterior ratificação por uma Assembleia Consti-
tuinte.
Houve também uma revisão geral de outras questões dos Balcãs.

VIII – Conferências de Chanceleres

Ao longo da Conferência, além das reuniões diárias dos Chefes de Governo e


dos Secretários de Relações Exteriores, reuniões separadas dos três Chanceleres
e seus conselheiros também foram mantidas diariamente.
Estas reuniões provaram ser de maior valor e a Conferência concorda que
instituições permanentes devem ser criadas para consulta regular entre os três
Chanceleres. Eles, portanto, se reunirão quantas vezes for necessário, provavel-
mente a cada 3 ou 4 meses. Essas reuniões serão realizadas em rotação nas três
capitais, sendo a primeira reunião realizada em Londres, após a Conferência das
Nações Unidas sobre a Organização Mundial.

IX – Unidade para a paz como para a guerra

Nosso encontro aqui na Criméia reafirmou nossa determinação comum de


manter e fortalecer na paz a seguir essa unidade de propósito e de ação que tem
feito a vitória possível e certa para as Nações Unidas nesta guerra. Acreditamos
que esta é uma obrigação sagrada que nossos governos devem aos nossos povos e
776 Obras Escolhidas

a todos os povos do mundo.


Somente com a contínua e crescente cooperação e compreensão entre nossos
três países e entre todas as nações amantes da paz pode ser realizada a maior
aspiração da humanidade – uma paz segura e duradoura que, nas palavras da
Carta Atlântica, “dará segurança, de que todos os homens em todas as terras
possam viver suas vidas libertos do medo e do desejo”.
A vitória nesta guerra e o estabelecimento da organização internacional pro-
posta proporcionará a maior oportunidade de toda a história para criar, nos anos
que virão, as condições essenciais de tal paz.

11 de fevereiro de 1945

Winston S. Churchill
Franklin D. Roosevelt
J. V. Stalin

Protocolo de Procedimentos da Conferência da Crimeia

A Conferência da Crimeia dos Chefes de Governo dos Estados Unidos da


América, do Reino Unido e da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas, que
ocorreu de 4 a 11 de fevereiro, chegou às seguintes conclusões.
Organização Mundial Foi decidido:
(1) que uma Conferência das Nações Unidas sobre a Proposta da Organização
Mundial deve ser convocada para quarta-feira, 25 de abril de 1945, e deve ser
realizada nos Estados Unidos da América;
(2) as nações a serem convidadas para esta Conferência devem ser:
(a) As Nações Unidas como eles existiam em 8 de fevereiro de 1945 e
(b) As Nações Associadas que declararam guerra ao inimigo comum até 1º de
março de 1945. (Para este fim, o termo “Nações Associadas” significa as oito
Nações Associadas e a Turquia.) Quando a Conferência sobre a Organização
Mundial for realizada, os delegados do Reino Unido e dos Estados Unidos da
América apoiarão uma proposta de admissão da adesão original de duas Repú-
blicas Socialistas Soviéticas, por exemplo, a Ucrânia e a Rússia Branca;
(3) que o Governo dos Estados Unidos, em nome das Três Potências, consulte
o Governo da China e o Governo Provisório francês em relação às decisões toma-
das na presente Conferência relativas à Proposta de uma Organização Mundial;
(4) que o texto do convite a ser emitido a todas as nações que participariam
da Conferência das Nações Unidas deve ser o seguinte:
Convite
“O Governo dos Estados Unidos da América, em nome de si mesmo e dos
governos do Reino Unido, da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas, da
República da China e do Governo Provisório da República Francesa, convida o
Governo de .... para enviar representantes a uma Conferência das Nações Unidas
a ser realizada em 25 de abril de 1945, ou logo depois, em São Francisco, nos
Estados Unidos da América, para preparar uma Carta para uma Organização
Internacional Geral para a manutenção da paz e segurança internacional.
J. V. Stalin 777

Os governos acima nomeados sugerem que a Conferência considere como


uma base para tal Carta as Propostas para o Estabelecimento de uma Organização
Internacional Geral, que foi tornada pública em outubro passado como resultado
da Conferência de Dumbarton Oaks, e que agora foram complementadas pelas
seguintes disposições para a Seção C do Capítulo VI:
C – Votação
1. Cada membro do Conselho de Segurança deve ter um voto.
2. As decisões do Conselho de Segurança sobre questões processuais devem
ser tomadas por um voto afirmativo de sete membros.
3. As decisões do Conselho de Segurança sobre todas as outras matérias de-
vem ser tomadas por um voto afirmativo de sete membros, incluindo os votos
concursais dos membros permanentes; desde que, em decisões sob o Capítulo
VIII, Seção A e sob a segunda sentença do parágrafo 1º da Seção C, Capítulo
VIII, uma parte de uma disputa deve abster-se de votar.
Mais informações sobre os arranjos serão transmitidas posteriormente.
No caso de o Governo de ... desejar antes da Conferência apresentar opiniões
ou comentários sobre as propostas, o Governo dos Estados Unidos da América
terá o prazer de transmitir tais opiniões e comentários aos outros governos par-
ticipantes.”
Tutela Territorial
Ficou acordado que as cinco Nações que terão assentos permanentes no Con-
selho de Segurança devem consultar-se antes da Conferência das Nações Unidas
sobre a questão da tutela territorial.
A aceitação desta recomendação está sujeita ao esclarecimento de que a tutela
territorial só se aplicará a (a) mandatos existentes da Liga das Nações; (b) Terri-
tórios separados do inimigo como resultado da guerra atual; (c) Qualquer outro
território que possa ser voluntariamente colocado sob tutela; e (d) nenhuma dis-
cussão sobre territórios fatuais será contemplada na próxima Conferência das
Nações Unidas ou nas consultas preliminares, e será uma questão para o acordo
subsequente que os territórios dentro das categorias acima poderão ser colocados
sob tutela.
Zona de Ocupação para os franceses e Conselho de Controle da Alemanha
Ficou acordado que uma zona na Alemanha, a ser ocupada pelas Forças Fran-
cesas, deveria ser alocada à França. Esta zona seria formada a partir das zonas
britânica e americana e sua extensão seria estabelecida pelos britânicos e ameri-
canos em consulta com o Governo Provisório francês.
Também foi acordado que o Governo Provisório francês deveria ser convidado
a se tornar membro do Conselho de Controle Aliado para a Alemanha.
Reparações
O seguinte protocolo foi aprovado.
Protocolo sobre as negociações entre os três chefes de governo na Conferência
da Crimeia sobre as Reparações Alemãs em Espécie.
Os chefes dos três governos concordaram da seguinte forma:
1. A Alemanha deve pagar em espécie pelas perdas que ela causou às nações
778 Obras Escolhidas

aliadas durante a guerra.


As reparações devem ser recebidas em primeira instância pelos países que
suportaram o principal fardo da guerra, sofreram as perdas mais pesadas e or-
ganizaram a vitória sobre o inimigo.
2. A reparação em espécie deve ser exigida da Alemanha nas três seguintes
formas:
a) Remoções dentro de 2 anos da rendição da Alemanha ou da cessação da
resistência organizada da riqueza nacional da Alemanha localizada no territó-
rio da própria Alemanha, bem como fora de seu território, de equipamentos,
máquinas-ferramentas, navios, material circulante, investimentos alemães no ex-
terior, participação industrial, de transporte e outras empresas na Alemanha, etc.
Essas remoções a serem realizadas principalmente com o propósito de destruir o
potencial de guerra da Alemanha:
b) Entregas anuais de mercadorias da produção atual por um período a ser
fixado.
c) Uso do trabalho alemão.
3. Para o trabalho sobre os princípios acima de um plano detalhado para a re-
paração da Alemanha, uma Comissão aliada de reparação será criada em Moscou.
Será composta por três representantes – um da União das Repúblicas Socialistas
Soviéticas, um do Reino Unido e outro dos Estados Unidos da América.
4. No que diz respeito à fixação da soma total da reparação, bem como a dis-
tribuição dela entre os países que sofreram com a agressão alemã, as delegações
soviéticas e americanas concordaram da seguinte forma:
“A Comissão de Reparação de Moscou deve tomar em seus estudos iniciais
como base para discussão a sugestão do Governo soviético de que a soma total
da reparação, de acordo com os pontos (a) e (b) do segundo parágrafo, deve ser
de 20 bilhões de dólares e que 50% dela deve ir para a União das Repúblicas
Socialistas Soviéticas.”
A delegação britânica considerou que, enquanto aguarda a consideração da
questão da reparação pela Comissão de Reparação de Moscou, não devem ser
mencionados valores de reparação.
A proposta soviético-americana acima foi passada à Comissão de Reparação
de Moscou como uma das propostas a serem consideradas pela Comissão.
Grandes Criminosos de Guerra
A Conferência concordou que a questão dos principais criminosos de guerra
deveria ser objeto de inquérito pelos três Chanceleres para relatório no devido
tempo após o encerramento da Conferência.
Acordo entre os Estados Aliados relativos aos Prisioneiros de Guerra e Civis
destes Três Estados
As negociações ocorreram na Conferência da Crimeia entre as delegações bri-
tânica, americana e soviética sobre a conclusão de um acordo abrangente sobre
medidas de proteção, manutenção e repatriação de prisioneiros de guerra e civis
da Grã-Bretanha, da União Soviética e dos Estados Unidos da América liberta-
dos pelas forças aliadas que agora invadem a Alemanha. Os textos dos Acordos
assinados em 11 de fevereiro entre a URSS e a Grã-Bretanha e entre a URSS e
J. V. Stalin 779

os Estados Unidos da América são idênticos. O Acordo entre a União Soviética


e a Grã-Bretanha foi assinado por V. M. Molotov e o Sr. Eden. O acordo entre
a União Soviética e os Estados Unidos da América foi assinado pelo Tenente-
General Gryzlov e o General Deane.
Nos termos desses Acordos, cada aliado deve fornecer alimentos, roupas, cui-
dados médicos e outras necessidades para os nacionais dos demais estados até que
o transporte esteja disponível para sua repatriação. Oficiais soviéticos devem aju-
dar as autoridades britânicas e americanas em sua tarefa de cuidar dos cidadãos
soviéticos libertados pelas forças britânicas e americanas durante o tempo em que
estavam no continente europeu ou no Reino Unido, aguardando transporte para
levá-los para casa.
Oficiais britânicos e americanos deveriam ajudar o governo soviético em sua
tarefa de cuidar de súditos britânicos e cidadãos americanos.
Com a concretização do acordo, os Três Governos se comprometeram a dar
toda assistência consistente com os requisitos operacionais para ajudar a garantir
que todos esses prisioneiros de guerra e civis fossem rapidamente repatriados.
Acordo entre as Três Grandes Potências sobre Questões do Extremo Oriente
Os líderes das Três Grandes Potências – a União Soviética, os Estados Unidos
da América e a Grã-Bretanha – concordaram que em dois ou três meses após a
rendição da Alemanha e a guerra na Europa ter terminado, a União Soviética
entrará na guerra contra o Japão do lado dos Aliados, na condição de que:
1. O status quo na Mongólia Exterior (República Popular da Mongólia) deve
ser preservado;
2. Os antigos direitos da Rússia violados pelo ataque traiçoeiro do Japão em
1904 serão restaurados:
a) a parte sul de Sacalina, bem como todas as ilhas adjacentes a ela serão
devolvidas à União Soviética;
b) o porto comercial de Dairen será internacionalizado, os interesses preemi-
nentes da União Soviética neste porto sendo salvaguardados e o arrendamento
de Port Arthur como base naval da URSS restaurado;
c) a Ferrovia China-Oriental e a Ferrovia Sul-Manchuriana que fornecem uma
saída para Dairen serão operadas conjuntamente pelo estabelecimento de uma
companhia sino-soviética conjunta, entendendo-se que os interesses preeminen-
tes da União Soviética devem ser salvaguardados e que a China manterá plena
soberania na Manchúria;
3. As Ilhas Kuril serão entregues à União Soviética.
Entende-se que o acordo relativo à Mongólia Exterior e os portos e ferrovias
referidos acima requerem concordância do Generalíssimo Chiang. Kai-Shek. O
Presidente tomará medidas para obter esta concordância por conselho do Mare-
chal Stalin. Os Chefes das Três Grandes Potências concordaram que estas reivin-
dicações da União Soviética serão inquestionavelmente cumpridas após a derrota
do Japão.
Por sua vez, a União Soviética expressou sua prontidão para concluir com
o Governo Nacional da China um pacto de amizade e aliança entre a URSS e
a China, a fim de prestar assistência à China com suas forças armadas com o
780 Obras Escolhidas

propósito de libertar a China do jugo japonês.

11 de fevereiro de 1945

J. V. Stalin
Franklin D. Roosevelt
Winston S. Churchill

CONFERÊNCIA DE POTSDAM

(17 de julho a 2 de agosto de 1945)

Primeira Sessão

17 de julho de 1945

Churchill: Quem será o presidente da nossa Conferência?


Stalin: Proponho o Presidente Truman dos Estados Unidos.
Churchill: A delegação britânica apoia esta proposta.
Truman: Aceito a presidência desta Conferência. Deixe-me colocar diante de
vocês algumas das perguntas que se acumularam até o momento da nossa reunião
e que requerem um exame urgente. Podemos então discutir o procedimento da
Conferência.
Churchill: Teremos o direito de adicionar à agenda.
Truman: Um dos problemas mais agudos no momento é criar algum tipo
de mecanismo para organizar negociações de paz. Sem ele, o desenvolvimento
econômico da Europa continuará em detrimento da causa dos Aliados e de todo
o mundo.
A experiência da Conferência de Versalhes após a Primeira Guerra Mundial
mostrou que uma conferência de paz pode ter muitas falhas, a menos que seja
preparada antecipadamente pelos poderes vitoriosos. Uma conferência de paz
sem preparações preliminares ocorre em um clima tenso de lados em disputa o
que inevitavelmente atrasa a consecução de suas decisões.
É por isso que proponho, considerando a experiência da Conferência de Ver-
salhes, que devemos aqui e agora criar um Conselho especial de Ministros das
Relações Exteriores, composto pelos Ministros da Grã-Bretanha, da URSS, dos
Estados Unidos, da França e da China, ou seja, dos membros permanentes do
Conselho de Segurança das Nações Unidas, estabelecido na Conferência de São
Francisco. Este Conselho de Ministros das Relações Exteriores, para a prepara-
ção de uma conferência de paz, deve se reunir assim que possível depois de nossa
reunião. É neste espírito e nestas linhas que eu elaborei um rascunho para a cri-
ação de um Conselho de Ministros das Relações Exteriores para a preparação de
uma conferência de paz que eu agora coloquei diante de vocês.
Churchill: Proponho que encaminhemos o assunto para consideração dos
nossos Ministros das Relações Exteriores, que nos reportarão na próxima sessão.
J. V. Stalin 781

Stalin: Concordo, mas não estou muito certo quanto à participação do Minis-
tro das Relações Exteriores da China no Conselho. Afinal, esta é uma questão de
problemas europeus, não é? Quão apropriada é a participação do representante
da China?
Truman: Podemos discutir esta questão depois que os Ministros das Relações
Exteriores nos apresentarem seus relatórios.
Stalin: Muito bem.
Truman: Sobre um Conselho de Controle da Alemanha. Este Conselho deve
iniciar o seu trabalho o mais rápido possível, de acordo com o acordo alcançado.
Com esse fim em vista, submeto para vossa consideração um rascunho contendo
os princípios que, em nossa opinião, devem reger o trabalho deste Conselho de
Controle.
Churchill: Não tive oportunidade de ler este documento, mas o lerei com
total atenção e respeito e então isso poderá ser discutido. Esta questão é tão
ampla que não deve ser encaminhada aos Ministros das Relações Exteriores, mas
devemos estudá-la e discuti-la nós mesmos, e então, se necessário, encaminhá-la
aos Ministros.
Truman: Podemos discutir este assunto amanhã.
Stalin: De fato, podemos discutir a questão amanhã. Os ministros poderiam
familiarizar-se com ela de antemão; isso seria aconselhável, porque nós mesmos
estaremos estudando a questão ao mesmo tempo.
Churchill: Nossos ministros já têm o suficiente para fazer no primeiro docu-
mento. Amanhã podemos encaminhar esta segunda pergunta para eles também,
não podemos? Stalin: Bom, vamos fazer isso amanhã.
Truman lê o conteúdo de um memorando que diz que, sob as decisões da
Declaração de Yalta sobre a Europa Libertada, as três Potências assumiram cer-
tas obrigações em relação aos povos libertados da Europa e dos antigos satélites
da Alemanha. Essas decisões previam uma política acordada dos três Poderes e
sua ação conjunta na solução dos problemas políticos e econômicos da Europa
libertada de acordo com os princípios democráticos.
Desde a Conferência de Yalta, as obrigações assumidas por nós na Declara-
ção sobre a Europa Libertada permanecem sem cumprimento. Na opinião do
Governo dos EUA, o fracasso contínuo no cumprimento dessas obrigações será
considerado em todo o mundo como indicativo da falta de unidade entre as três
Grandes Potências e minará a confiança na sinceridade e unidade de propó-
sito entre as Nações Unidas. É por isso que o Governo dos EUA propõe que o
cumprimento das obrigações desta Declaração seja totalmente coordenado nesta
Conferência.
Os três grandes Estados aliados devem concordar com a necessidade de uma
reorganização imediata dos atuais Governos da Romênia e da Bulgária em es-
trita conformidade com o parágrafo 3, ponto “c” da Declaração sobre a Europa
Libertada. As consultas devem ser realizadas imediatamente para elaborar o pro-
cedimento necessário para a reorganização desses Governos para que incluam
representantes de todos os importantes grupos democráticos. Depois que esses
Governos forem reorganizados, pode haver reconhecimento diplomático deles
782 Obras Escolhidas

por parte dos Poderes Aliados e conclusão de tratados correspondentes.


Em conformidade com as obrigações dos três Poderes, estabelecidas no pa-
rágrafo 3, ponto “d” da Declaração sobre a Europa Libertada, os Governos dos
três Poderes devem discutir a melhor forma de ajudar o trabalho dos Governos
provisórios na realização de eleições livres e justas. Tal ajuda será necessária na
Romênia, Bulgária, e, possivelmente, em outros países também.
Uma das tarefas mais importantes que enfrentamos é determinar nossa ati-
tude em relação à Itália. Tendo em vista que a Itália declarou recentemente
guerra ao Japão, espero que a Conferência considere possível concordar em
apoiar a candidatura da Itália para se tornar membro das Nações Unidas. Os
Ministros das Relações Exteriores poderiam elaborar uma declaração apropri-
ada sobre este assunto em nome dos Governos das Nações Unidas.
É necessário ler todo este documento? Temos tempo?
Churchill: Sr. Presidente, estes são problemas muito importantes e temos de
ter tempo para discuti-los. A questão é que nossas posições sobre essas questões
diferem. Fomos atacados pela Itália no momento mais crítico, quando ela esfa-
queou a França pelas costas. Nós lutamos contra a Itália na África por dois anos,
antes da América entrar na guerra, e nós sofremos grandes perdas. Tivemos até
que arriscar as forças do Reino Unido, e reduzir nossas defesas no Reino Unido,
a fim de enviar tropas para a África. Tivemos grandes batalhas navais no Me-
diterrâneo. Temos as melhores intenções em relação à Itália, e provamos isso
deixando-a manter seus navios.
Stalin: Isso é muito bom, mas hoje devemos nos limitar a elaborar uma
agenda com os pontos adicionais. Quando a agenda for elaborada, qualquer
questão pode ser discutida em seus méritos.
Truman: Concordo plenamente.
Churchill: Sou muito grato ao Presidente por ter aberto esta discussão, con-
tribuindo muito para o nosso trabalho, mas acho que devemos ter tempo para
discutir essas questões. É a primeira vez que as vejo. Não estou dizendo que
não posso concordar com essas propostas, mas deve haver tempo para discuti-las.
Proponho que o Presidente concluísse as suas propostas, se tiver mais, para que
depois possamos elaborar a agenda.
Stalin: Perfeito.
Truman: O objetivo dos três governos em relação à Itália é promover sua
independência política e reabilitação econômica e garantir ao povo italiano o
direito de escolher sua forma de governo.
A posição atual da Itália, como cobeligerante e como um Poder que se rendeu
incondicionalmente, é anômala e dificulta todas as tentativas tanto dos Aliados
quanto da própria Itália para melhorar sua posição econômica e política. Esta
anomalia só pode ser eliminada através da conclusão de um tratado de paz com
a Itália. A elaboração desse tratado deve ser uma das primeiras tarefas estabele-
cidas perante o Conselho de Ministros das Relações Exteriores.
Ao mesmo tempo, uma melhoria da situação interna da Itália pode ser al-
cançada criando uma atmosfera na qual a contribuição da Itália para a derrota
da Alemanha seja reconhecida. É por isso que se recomenda que os breves ter-
J. V. Stalin 783

mos da rendição da Itália e os termos abrangentes da rendição da Itália sejam


anulados e substituídos pelas obrigações do Governo italiano que fluem da nova
situação na Itália.
Essas obrigações devem estipular que o Governo italiano se abstenha de ações
hostis contra qualquer membro das Nações Unidas; o governo italiano não deve
ter quaisquer forças e equipamentos navais ou aéreos, exceto aqueles que serão es-
tabelecidos pelos Aliados, e observarão todas as instruções dos Aliados; enquanto
se aguarda a conclusão de um tratado de paz, o controle sobre a Itália deve ser
exercido à medida que a necessidade surgir; simultaneamente, deve haver uma
decisão sobre quanto tempo as forças armadas aliadas devem permanecer no ter-
ritório da Itália; finalmente, deve ser assegurado um acordo justo de disputas
territoriais.
Como fui inesperadamente eleito presidente desta Conferência, não pude
expressar meus sentimentos. Estou muito feliz em conhecê-lo, Generalíssimo,
e você, Sr. Primeiro-Ministro. Estou bem ciente de que estou substituindo um
homem a quem é impossível substituir, o falecido Presidente Roosevelt. Fico
feliz em servir, mesmo que parcialmente, a memória que vocês preservam do
Presidente Roosevelt. Quero consolidar a amizade que existia entre vocês.
Os assuntos que coloquei diante de vocês são, é claro, altamente importantes.
Mas isso não exclui a colocação de questões adicionais na ordem do dia.
Churchill: Você tem algo a dizer, Generalíssimo, em resposta ao Sr. Presi-
dente, ou você vai me permitir fazê-lo?
Stalin: Por favor, o faça.
Churchill: Em nome da delegação britânica, gostaria de expressar nossa sin-
cera gratidão ao Presidente dos Estados Unidos por ter aceitado a presidência
desta Conferência, e agradeço-lhe por ter expressado as opiniões da grande re-
pública que ele representa e da qual ele é o cabeça, e desejo dizer-lhe: Tenho
certeza que o Generalíssimo concordará comigo que o recebemos com muita sin-
ceridade e é nosso desejo dizer-lhe neste momento importante que teremos os
mesmos sentimentos calorosos por ele que tínhamos pelo Presidente Roosevelt.
Ele veio em um momento histórico, e é nosso desejo que as tarefas atuais e os
objetivos pelos quais lutamos sejam alcançados agora, em tempos de paz. Temos
respeito não só pelo povo americano, mas também pelo seu presidente pesso-
almente, e espero que esse sentimento de respeito cresça e sirva para melhorar
nossas relações.
Stalin: Deixe-me dizer em nome da delegação russa que compartilhamos ple-
namente os sentimentos expressos pelo Sr. Churchill.
Churchill: Eu acho que, agora, devemos passar para os itens comuns da
agenda e elaborar algum tipo de programa para o nosso trabalho, para ver se
somos capazes de lidar com essa agenda nós mesmos ou se devemos encaminhar
uma parte dos itens aos Ministros das Relações Exteriores. Não acho que de-
vemos estabelecer toda a agenda de uma vez, mas podemos nos limitar a uma
agenda para cada dia. Por exemplo, gostaríamos de acrescentar a questão polo-
nesa.
Stalin: Ainda assim, seria bom para todas as três delegações apresentar todas
as questões que consideram necessárias a serem adicionadas à pauta. Os russos
784 Obras Escolhidas

têm perguntas sobre a divisão da marinha alemã e outras. Sobre a questão da


marinha, o Presidente e eu tivemos uma troca de cartas e chegamos a um acordo.
A segunda questão é a das indenizações.
Então devemos discutir a questão dos territórios de confiança.
Churchill: Você quer dizer os territórios na Europa ou em todo o mundo?
Stalin: Discutiremos isso. Não sei exatamente quais são esses territórios, mas
os russos gostariam de participar na administração de territórios de confiança.
Gostaríamos de levantar como uma questão separada a retomada das relações
diplomáticas com os antigos satélites da Alemanha.
Também é necessário examinar a questão do regime na Espanha. Nós, russos,
consideramos que o atual regime Franco na Espanha foi imposto ao povo espa-
nhol pela Alemanha e pela Itália. Está repleto de grave perigo para as Nações
Unidas que amam a liberdade. Achamos que seria bom criar condições para o
povo espanhol estabelecer um regime de sua escolha.
Churchill: Ainda estamos discutindo os itens a serem colocados na agenda.
Concordo que a questão da Espanha deve ser colocada em pauta.
Stalin: Eu estava apenas explicando a ideia por trás da pergunta. Então de-
vemos também levantar a questão de Tânger.
Churchill: O Sr. Eden me disse que se chegássemos à questão de Tânger, só
poderíamos chegar a um acordo temporário por causa da ausência dos franceses.
Stalin: Ainda assim é interessante saber a opinião das três Grandes Potências
sobre este assunto.
Em seguida, deve haver uma discussão sobre a questão da Síria e do Líbano.
Também é necessário discutir a questão polonesa com o objetivo de resolver as
questões que surgem a partir do fato de que o Governo da Unidade Nacional foi
formado na Polônia e a consequente necessidade de dissolver o governo polonês
dos emigrados.
Churchill: Considero necessário discutir a questão polonesa. A discussão
desta questão que ocorreu após a Conferência da Crimeia resultou, sem dúvida,
em uma solução satisfatória da questão polonesa. Concordo plenamente em exa-
minar a questão como também a questão corolária da dissolução do Governo
Polonês em Londres.
Stalin: Isso mesmo, isso mesmo.
Churchill: Espero que o Generalíssimo e o Presidente entendam que temos o
Governo polonês de Londres que tinha sido a base para a manutenção do Exér-
cito polonês que lutou contra a Alemanha. Isso produz uma série de questões se-
cundárias relacionadas com a dissolução do governo polonês em Londres. Penso
que nossos objetivos são semelhantes, mas certamente temos uma tarefa mais di-
fícil do que os outros dois Poderes. Em conexão com a dissolução do Governo
polonês, não podemos deixar de prover os soldados. Mas devemos resolver essas
questões no espírito e à luz da Conferência de Yalta. Em relação à questão polo-
nesa, damos uma importância muito grande, no interesse da Polônia, à questão
das eleições, que devem ser uma expressão do desejo sincero do povo polonês.
Stalin: Por enquanto, a delegação russa não tem mais perguntas para a agenda.
J. V. Stalin 785

Churchill: Já apresentamos nossa agenda a vocês. Se me permitir, Sr. Pre-


sidente, gostaria de fazer uma proposta sobre o procedimento a ser seguido na
Conferência. Proponho que os três Ministros das Relações Exteriores se reúnam
hoje ou amanhã de manhã para selecionar as questões que poderiam ser melhor
discutidas por nós aqui amanhã. Poderíamos seguir o mesmo procedimento para
os dias seguintes da Conferência. Os Ministros poderiam elaborar uma agenda
melhor selecionando três, quatro ou cinco itens. Eles podem se encontrar ama-
nhã de manhã e elaborar uma agenda para nós.
Stalin: Não tenho objeções.
Truman: Concordo.
Churchill: Eu acho que temos um esboço geral de nossa tarefa e uma ideia do
volume do nosso trabalho. Acho que os Ministros das Relações Exteriores devem,
agora, fazer a sua escolha e colocá-la diante de nós, e então podemos começar a
trabalhar.
Stalin: Concordo. O que faremos hoje? Devemos continuar nossa sessão até
que os Ministros nos deixem ter cinco ou seis questões? Penso que podemos
discutir a criação do Conselho de Ministros das Relações Exteriores como uma
instituição preparatória para a próxima conferência de paz.
Truman: Tudo bem.
Churchill: Tudo bem.
Stalin: Devemos discutir a questão da participação do representante da China
no Conselho de Ministros das Relações Exteriores, se a ideia é que o Conselho
lidará com questões europeias.
Truman: A China será um dos membros permanentes do Conselho de Segu-
rança criado em São Francisco.
Stalin: A decisão da Conferência da Crimeia, sob a qual os Ministros das Re-
lações Exteriores devem se reunir periodicamente para examinar várias questões,
deve ser retirada?
Truman: Propomos criar o Conselho de Ministros das Relações Exteriores
com um propósito definido, qual seja: trabalhar os termos de um tratado de paz
e preparar uma conferência de paz.
Stalin: Foi estabelecido, na Conferência da Crimeia, que os Ministros das Re-
lações Exteriores se reuniriam a cada três ou quatro meses para discutir questões
separadas. Isso parece não ser mais necessário, não é? Nesse caso, a Comissão
Consultiva Europeia parece não ser mais necessária também? É assim que eu vejo
e eu gostaria de saber se estou ou não tendo a visão correta.
Truman: O Conselho de Ministros das Relações Exteriores está sendo criado
apenas com um propósito definitivo para trabalhar os termos do tratado de paz.
Stalin: Eu não tenho objeção à criação do Conselho de Ministros das Relações
Exteriores, mas as reuniões de ministros estabelecidas pela decisão da Conferên-
cia da Crimeia estão aparentemente canceladas e deve-se pensar que a Comissão
Consultiva Europeia também não é mais necessária. Ambas as instituições serão
substituídas pelo Conselho de Ministros das Relações Exteriores.
Churchill: Os três Ministros das Relações Exteriores, como foi estabelecido
na Conferência da Crimeia, se reuniriam a cada três ou quatro meses para nos dar
786 Obras Escolhidas

conselhos sobre uma série de questões importantes relacionadas com a Europa.


Penso que se adicionarmos o representante da China ao Conselho de Ministros
das Relações Exteriores das três Grandes Potências, isso só complicará as coisas,
porque o Conselho deve discutir questões relativas a países da Europa. Quando
discutirmos o tratado de paz relativo ao mundo inteiro e não apenas à Europa, o
representante da China pode ser convidado. Nossos três ministros serão capazes
de fazer seu trabalho de forma mais frutífera e com maior facilidade. A partici-
pação do representante da China no dia-a-dia do Conselho apenas complicaria
seu trabalho. É muito fácil criar organizações no papel, mas se elas não produ-
zem nada na realidade, acho que são supérfluas. Na verdade, não somos capazes
de resolver a questão da futura administração da Alemanha sem a participação
da China? Vamos nos limitar aos três Ministros do Conselho de Ministros das
Relações Exteriores.
Truman: Proponho que adiemos a discussão da questão de encerrar as reu-
niões periódicas dos Ministros, conforme estabelecido pela decisão da Conferên-
cia de Yalta. Estamos agora a discutir a criação de um Conselho de Ministros para
elaborar um tratado de paz, e este é um assunto bem diferente. Gostaria de sub-
meter a vocês o rascunho dos EUA sobre o Conselho de Ministros das Relações
Exteriores que estabelece os princípios de sua organização.
Este projeto conclama um Conselho de Ministros das Relações Exteriores
composto pelos Ministros das Relações Exteriores da URSS, Estados Unidos,
Grã-Bretanha, China e França. O Conselho deve se reunir periodicamente, e
sua primeira reunião será em tal e tal data.
Cada um dos Ministros das Relações Exteriores deve ser acompanhado por
um assessor de alto escalão devidamente autorizado e capaz de trabalhar de forma
independente na ausência do Ministro das Relações Exteriores. Ele também deve
ser acompanhado por uma equipe limitada de assessores técnicos. Uma secreta-
ria conjunta também deve ser montada.
O Conselho deve ser habilitado a elaborar, com o objetivo de submeter aos
Governos das Nações Unidas, tratados de paz com Itália, Romênia, Bulgária e
Hungria. O Conselho também deve propor formas de resolver questões territo-
riais que permanecem abertas desde o fim da guerra na Europa. O Conselho
deve preparar termos abrangentes para um tratado de paz com a Alemanha que
deve ser aceito pelo futuro Governo da Alemanha, quando um Governo alemão
adequado para esse fim for criado.
Quando o Conselho de Ministros das Relações Exteriores lida com assuntos
que têm influência direta sobre um Estado não representado no Conselho, esse
Estado deve ser convidado a participar das reuniões do Conselho para participar
da discussão da questão dada.
Isso não significa que regras invariáveis estejam sendo estabelecidas para o
trabalho do Conselho. O Conselho estabelecerá um procedimento em confor-
midade com um determinado problema. Em alguns casos, o Conselho pode ser
convocado para discussão preliminar com a participação de outros estados in-
teressados; em outros casos, pode ser desejável convocar o Conselho antes de
convidar os lados interessados.
Stalin: Será um Conselho preparando questões para a futura conferência
J. V. Stalin 787

internacional de paz?
Truman: Sim.
Churchill: A conferência de paz que acabará com a guerra.
Stalin: Na Europa, a guerra acabou. O Conselho determinará e sugerirá a
data para a convocação de uma conferência de paz.
Truman: Me parece que a conferência não deve ser convocada antes de estar-
mos devidamente preparados para isso.
Churchill: Parece-me que não há dificuldade em concertar o objetivo pelo
qual estamos lutando. Devemos criar um Conselho de Ministros das Relações
Exteriores para elaborar um tratado de paz. Mas este Conselho não deve subs-
tituir as organizações que já existem e lidam com assuntos cotidianos – as reu-
niões regulares dos três Ministros e da Comissão Consultiva Europeia, nas quais
a França também participa. O Conselho de Ministros das Relações Exteriores é
uma organização mais ampla. Lá poderá se estabelecer até que ponto a Comis-
são Consultiva Europeia e as reuniões ordinárias dos Ministros podem tratar das
questões do tratado de paz.
Stalin: Quem nesse caso deve ser subordinado a quem?
Churchill: O Conselho de Ministros das Relações Exteriores deve existir pa-
ralelamente ao Conselho de Segurança, do qual a China também participa, e
paralelamente às reuniões ordinárias dos Ministros das Relações Exteriores e da
Comissão Consultiva Europeia. Até a vitória sobre o Japão, a China terá dificul-
dade em participar na discussão de questões europeias. Não podemos nos be-
neficiar de forma alguma com a participação da China na discussão de questões
europeias no momento. A Europa sempre foi um grande vulcão e seus proble-
mas devem ser considerados altamente importantes. É possível que, no momento
em que a conferência de paz será convocada, tenhamos melhores notícias do Ex-
tremo Oriente e possamos convidar a China também. Proponho que, em princí-
pio, o tratado de paz seja elaborado pelas cinco principais potências, mas quanto
à Europa, seus problemas devem ser discutidos apenas pelos quatro Poderes que
têm interesse direto nessas questões. Desta forma, não interromperemos o tra-
balho da Comissão Consultiva Europeia e as reuniões ordinárias dos Ministros
das Relações Exteriores. Ambas as organizações poderão continuar seu trabalho
simultaneamente.
Stalin: Talvez devêssemos encaminhar esta questão aos Ministros para discus-
são?
Truman: Concordo e não me oponho à exclusão da China do Conselho de
Ministros das Relações Exteriores.
Churchill: Eu acho que seria possível organizar as coisas de tal forma que
alguns membros não participariam de todas as sessões, embora usufruíssem de
direitos plenos, como todos os outros membros, mas só compareceriam às sessões
quando houvesse um exame das questões que os interessassem.
Truman: Como eu vejo, esta questão deve ser encaminhada aos Ministros das
Relações Exteriores para discussão.
Stalin: Sim, isso mesmo.
Truman: Podemos discutir mais alguma coisa hoje?
788 Obras Escolhidas

Stalin: Já que todas as questões devem ser discutidas pelos Ministros das Re-
lações Exteriores, não temos mais nada para discutir hoje.
Churchill: Proponho que os Ministros das Relações Exteriores examinem a
questão de se deve haver quatro ou cinco membros. Mas que este Conselho deve
tratar exclusivamente dos preparativos para o tratado de paz primeiro para a Eu-
ropa e depois para o mundo inteiro.
Stalin: Um tratado de paz ou uma conferência de paz?
Churchill: O Conselho preparará um plano que colocará perante os Chefes
de Governo para exame.
Stalin: Que os Ministros das Relações Exteriores discutam o quanto é ne-
cessário manter viva a Comissão Consultiva Europeia na Europa e o quanto é
necessário para que as reuniões ordinárias dos três Ministros, estabelecidas de
acordo com a decisão de Yalta, continuem suas funções. Que os Ministros tam-
bém discutam essas questões.
Churchill: Isso depende da situação na Europa e do progresso que essas orga-
nizações fizerem em seu trabalho. Proponho que os três Ministros das Relações
Exteriores continuem as reuniões regulares e que a Comissão Consultiva Euro-
peia também continue seu trabalho.
Truman: Temos que especificar as questões concretas para discussão na sessão
de amanhã.
Churchill: Devemos querer ter algo definitivo na bolsa todas as noites quando
voltarmos para casa.
Truman: Gostaria que os Ministros das Relações Exteriores nos dessem algo
definitivo para discussão todos os dias.
Stalin: Concordo.
Truman: Também proponho que comecemos nossas sessões às quatro horas
em vez de cinco.
Stalin: Quatro? Tudo bem.
Churchill: Nós nos submetemos ao Presidente.
Truman: Se isso for aceito, vamos adiar o exame das perguntas para as 16
horas de amanhã.
Stalin: Sim, vamos fazer isso. Há apenas uma outra pergunta: por que o Sr.
Churchill nega aos russos sua parte da marinha alemã?
Churchill: Não tenho objeções. Mas já que você me fez esta pergunta, aqui
está minha resposta: esta marinha deve ser afundada ou dividida.
Stalin: Você quer que ela seja afundada ou dividida?
Churchill: Todos os meios de guerra são coisas terríveis.
Stalin: A marinha deve ser dividida. Se o Sr. Churchill prefere afundar
a marinha, ele está livre para afundar sua parte dela; Não tenho intenção de
afundar a minha.
Churchill: No momento, quase toda a marinha alemã está em nossas mãos.
Stalin: Essa é a questão. Essa é a questão. É por isso que precisamos decidir
a questão.
Truman: Amanhã a sessão é às 4 horas.
J. V. Stalin 789

Comunicado sobre a Conferência Tripartite de Berlim

Em 17 de julho de 1945, o Presidente dos Estados Unidos da América, Harry


S. Truman, o Presidente do Conselho de Comissários Do Povo da União das
Repúblicas Socialistas Soviéticas, generalíssimo J. V. Stalin, e o Primeiro-Ministro
da Grã-Bretanha, Winston S. Churchill, juntamente com o Sr. Clement R. Attlee,
reuniram-se na Conferência Tripartite de Berlim. Eles foram acompanhados
pelos Chanceleres dos Três Governos, Sr. James F. Byrnes, Sr. V. M. Molotov, e
Sr. Anthony Eden, chefes de gabinete e outros conselheiros.
Ocorreram nove reuniões entre 17 e 25 de julho. A Conferência foi então
interrompida por dois dias enquanto os resultados das eleições gerais britânicas
estavam sendo declarados.
Em 28 de julho, o Sr. Attlee retornou à Conferência como Primeiro-Ministro,
acompanhado pelo novo Secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros, Sr. Er-
nest Bevin. Mais quatro sessões, então, aconteceram. Durante o curso da Confe-
rência, houve reuniões regulares dos Chefes dos Três Governos acompanhados
apenas pelos Chanceleres bem como também dos Chanceleres em separado. Co-
mitês nomeados pelos Chanceleres para apreciação preliminar das questões antes
da Conferência também se reuniram diariamente.
As reuniões da Conferência foram realizadas no Cecilienhof312 perto de Pots-
dam. A Conferência terminou em 2 de agosto de 1945.
Decisões e acordos importantes foram alcançados. Opiniões foram trocadas
em uma série de outras questões e a consideração desses problemas será con-
tinuada pelo Conselho de Ministros das Relações Exteriores estabelecido pela
Conferência.
O Presidente Truman, o Generalíssimo Stalin e o primeiro-ministro Attlee
deixam a Conferência, que fortaleceu os laços entre os Três Governos e ampliou
o escopo de sua colaboração e compreensão, com confiança renovada de que seus
governos e povos, juntamente com as outras Nações Unidas, garantirão a criação
de uma paz justa e duradoura.
II- Estabelecimento de um Conselho de Ministros das Relações Exteriores
A. A Conferência chegou a um acordo para a criação de um Conselho de Mi-
nistros das Relações Exteriores representando os cinco principais Poderes para
continuar o trabalho preparatório necessário para os acordos de paz e para as-
sumir outras questões que, de tempos em tempos, podem ser encaminhadas ao
Conselho por acordo dos Governos participantes do mesmo.
O texto do acordo para a criação do Conselho de Ministros das Relações Ex-
teriores é o seguinte:
(1) Será estabelecido um Conselho composto pelos Ministros das Relações
Exteriores do Reino Unido, da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas, da
China, da França e dos Estados Unidos.
(2) (i) O Conselho se reunirá normalmente em Londres, que será a sede per-
manente do Secretariado conjunto que o Conselho formará. Cada um dos Minis-
tros das Relações Exteriores será acompanhado por um suplente de alto escalão,

312 O palácio Cecilienhof fica na cidade de Potsdam em Brandemburgo, próximo à Berlim (N.T)
790 Obras Escolhidas

devidamente autorizado a continuar o trabalho do Conselho na ausência de seu


Ministro das Relações Exteriores e por uma pequena equipe de assessores técni-
cos.
(ii) A primeira reunião do Conselho será realizada em Londres até 1º de se-
tembro de 1945. As reuniões podem ser realizadas por acordo comum em outras
capitais, o que pode ser acordado de tempos em tempos.
(3) (i) Como sua tarefa importante imediata, o Conselho estará autorizado a
elaborar, a fim de apresentar às Nações Unidas, tratados de paz com a Itália, a
Romênia, a Bulgária, a Hungria e a Finlândia, e a propor acordos de questões
territoriais pendentes sobre o término da guerra na Europa. Esse Conselho será
utilizado para a preparação de um acordo de paz para a Alemanha a ser aceito
pelo Governo da Alemanha quando um governo adequado para o propósito for
estabelecido.
(ii) Para a quitação de cada uma dessas tarefas, o Conselho será composto
pelos membros que representam os Estados signatários dos termos de rendição
impostos ao Estado inimigo em causa. Para efeitos do acordo de paz para a Itália,
a França será considerada signatária dos termos de rendição para a Itália. Outros
membros serão convidados a participar quando questões diretamente relativas a
eles estiverem em discussão.
(iii) Outras questões podem, de tempos em tempos, ser encaminhadas ao Con-
selho por acordo entre os Governos-Membros.
(4) (i) Sempre que o Conselho considerar uma questão de interesse direto
para um Estado não representado nele, tal Estado deve ser convidado a enviar
representantes para participar da discussão e estudo dessa questão.
(ii) O Conselho pode adaptar o seu procedimento ao problema particular em
questão. Em alguns casos, pode realizar suas próprias discussões preliminares
antes da participação de outros Estados interessados. Em outros casos, o Conse-
lho pode convocar uma conferência formal dos Estados interessados em buscar
uma solução para o problema específico.
B. De acordo com a decisão da Conferência, os Três Governos enviaram, cada
um, um convite idêntico aos governos da China e da França para aprovar este
texto e aderir à criação do Conselho.
C. A criação do Conselho de Ministros das Relações Exteriores para fins es-
pecíficos nomeados neste texto ocorrerá sem prejuízo do acordo da Conferência
da Crimeia, de que deve haver consulta periódica entre os Ministros de Relações
Exteriores dos Estados Unidos, a União das Repúblicas Socialistas Soviéticas e o
Reino Unido.
D. A Conferência também considerou a posição da Comissão Consultiva Eu-
ropeia à luz do acordo para estabelecer o Conselho de Ministros das Relações
Exteriores. Observou-se com satisfação que a Comissão tinha exonerado as suas
principais tarefas pelas recomendações que havia fornecido para os termos da
rendição incondicional da Alemanha, para as zonas de ocupação na Alemanha e
na Áustria e para os mecanismos de controle interaliadas nesses países. Sentiu-se
que um trabalho mais detalhado para a coordenação da política aliada para o
controle da Alemanha e da Áustria, no futuro, ficariam sob a competência do
Conselho de Controle Aliado em Berlim e da Comissão Aliada de Viena. Nesse
J. V. Stalin 791

sentido foi acordado recomendar que a Comissão Consultiva Europeia fosse dis-
solvida.
III – Alemanha
Os exércitos aliados estão em ocupação de toda a Alemanha e o povo alemão
começou a expiar os terríveis crimes cometidos sob a liderança daqueles que, na
hora de seu sucesso, eles aprovaram abertamente e obedeceram cegamente.
Chegou-se a um acordo nesta Conferência sobre os princípios políticos e
econômicos de uma política aliada coordenada em relação à Alemanha derro-
tada durante o período de controle aliado.
O objetivo deste acordo é executar a declaração da Crimeia sobre a Alemanha.
O militarismo alemão e o nazismo serão extirpados e os Aliados tomarão juntos,
agora e no futuro, as outras medidas necessárias para garantir que a Alemanha
nunca mais ameace seus vizinhos ou a paz do mundo.
Não é a intenção dos Aliados destruir ou escravizar o povo alemão. É a in-
tenção dos Aliados que o povo alemão tenha a oportunidade de se preparar para
a eventual reconstrução de suas vidas de forma democrática e pacífica. Se seus
próprios esforços forem constantemente direcionados para este fim, será possí-
vel que eles, no devido tempo, tomem seu lugar entre os povos livres e pacíficos
do mundo.
O texto do acordo é o seguinte:

Os Princípios Políticos e Econômicos para governar o


tratamento da Alemanha no Período de Controle Inicial

Princípios Políticos
1. De acordo com o Acordo sobre Mecanismos de Controle na Alemanha,
a autoridade suprema na Alemanha é exercida por instruções de seus respecti-
vos Governos, pelos comandantes-em-chefe das Forças Armadas da União das
Repúblicas Socialistas Soviéticas, os Estados Unidos da América, o Reino Unido
e a República Francesa, cada um em sua própria zona de ocupação, e também
conjuntamente, em assuntos que afetam a Alemanha como um todo, em sua ca-
pacidade como membros do Conselho de Controle.
2. Na medida em que for possível, haverá uniformidade de tratamento da
população alemã em toda a Alemanha.
3. Os propósitos da ocupação da Alemanha pela qual o Conselho de Controle
será orientado são:
(I) O completo desarmamento e desmilitarização da Alemanha e a eliminação
ou controle de toda a indústria alemã que poderia ser usada para a produção
militar. Para estes fins:
(a) Todas as forças terrestres, navais e aéreas alemãs, as S.S., S.A., S.D. e Ges-
tapo, com todas as suas organizações, funcionários e instituições, incluindo o
Estado-Maior, o Corpo de Oficiais, Corpo de Reserva, escolas militares, organi-
zações de veteranos de guerra e todas as outras organizações militares e quase
militares, juntamente com todos os clubes e associações que servem para manter
viva a tradição militar na Alemanha, serão completamente e finalmente abolidas
792 Obras Escolhidas

de forma permanente para impedir o reavivamento ou reorganização do milita-


rismo alemão e o nazismo;
(b) Todas as armas, munições e implementos de guerra e todas as instalações
especializadas para sua produção serão mantidas à disposição dos Aliados ou
destruídas. A manutenção e produção de todas as aeronaves e todas as armas,
munições e implementos de guerra devem ser impedidas.
(II) Convencer o povo alemão de que eles sofreram uma derrota militar total
e que eles não podem escapar da responsabilidade pelo que eles mesmos fize-
ram, uma vez que sua própria guerra implacável e a fanática resistência nazista
destruíram a economia alemã e tornaram o caos e o sofrimento inevitáveis.
(III) Destruir o Partido Nacional Socialista e suas organizações afiliadas e
supervisionadas, dissolver todas as instituições nazistas, garantir que elas não
sejam revividas de qualquer forma, e impedir toda a atividade ou propaganda
nazista e militarista.
(IV) Preparar-se para a eventual reconstrução da vida política alemã de forma
democrática e para uma eventual cooperação pacífica na vida internacional pela
Alemanha.
4. Todas as leis nazistas que forneceram a base do regime de Hitler ou es-
tabeleceram discriminação por motivos de raça, credo ou opinião política serão
abolidas. Tais discriminações, sejam legais ou administrativas não serão tolera-
das.
5. Criminosos de guerra e aqueles que participaram no planejamento ou exe-
cução de empreendimentos nazistas envolvendo ou resultando em atrocidades
ou crimes de guerra serão presos e levados a julgamento. Líderes nazistas, in-
fluentes partidários nazistas e altos funcionários de organizações e instituições
nazistas e quaisquer outras pessoas perigosas à ocupação ou seus objetivos serão
presos e internados.
6. Todos os membros do Partido Nazista que tenham participado mais do que
nominalmente em suas atividades e todas as outras pessoas hostis aos propósitos
aliados serão removidas de cargos públicos e semipúblicos, bem como de cargos
de responsabilidade em importantes empresas privadas. Tais pessoas serão subs-
tituídas por pessoas que, por suas qualidades políticas e morais, são consideradas
capazes de ajudar no desenvolvimento de instituições genuinamente democráti-
cas na Alemanha.
7. A educação alemã será controlada completamente para eliminar doutrinas
nazistas e militaristas e para viabilizar o desenvolvimento bem-sucedido das ideias
democráticas.
8. O sistema judicial será reorganizado de acordo com os princípios da de-
mocracia, da justiça sob a lei e dos direitos iguais para todos os cidadãos sem
distinção de raça, nacionalidade ou religião.
9. A administração dos assuntos na Alemanha deve ser dirigida para a des-
centralização da estrutura política e o desenvolvimento da responsabilidade local.
Para este fim:
(I) O autogoverno local deve ser restaurado em toda a Alemanha sobre princí-
pios democráticos e, em particular, através de conselhos eletivos tão rapidamente
J. V. Stalin 793

quanto é consistente com a segurança militar e os propósitos da ocupação militar;


(II) todos os partidos políticos democráticos com direitos de reunião e de
discussão pública serão permitidos e incentivados em toda a Alemanha;
(III) os princípios representativos e eleitorais devem ser introduzidos na admi-
nistração regional, provincial e estadual (Land) tão rapidamente quanto possível
pela aplicação bem-sucedida desses princípios no autogoverno local;
(IV) por enquanto não será estabelecido governo central alemão. Não obs-
tante, alguns departamentos administrativos centrais essenciais da Alemanha,
chefiados por secretários de Estado, serão estabelecidos, particularmente nas
áreas de finanças, transporte, comunicações, comércio exterior e indústria. Tais
departamentos atuarão sob a direção do Conselho de Controle.
10. Sujeito à necessidade de manter a segurança militar, a liberdade de ex-
pressão, de imprensa e de religião serão respeitadas e as instituições religiosas
serão respeitadas. Sujeito da mesma forma à manutenção da segurança militar,
será permitida a formação de sindicatos livres.
B. Princípios Econômicos
11. A fim de eliminar o potencial de guerra da Alemanha, a produção de
armas, munições e implementos de guerra, bem como todos os tipos de aerona-
ves e navios marítimos, deve ser proibida e impedida. A produção de metais,
produtos químicos, máquinas e outros itens diretamente necessários para uma
economia de guerra será rigidamente controlada e restrita às necessidades apro-
vadas para a Alemanha no pós-guerra para cumprir os objetivos estabelecidos no
parágrafo 15. A capacidade produtiva não necessária para a produção permitida
será removida de acordo com o plano de reparação recomendado pela Comissão
de Reparações Aliada e aprovado pelos Governos em causa ou se não removidos
serão destruídos.
12. Na data mais rápida e viável, a economia alemã será descentralizada com
o propósito de eliminar a atual concentração excessiva do poder econômico, con-
forme exemplificado em particular por cartéis, sindicatos, trustes e outros arran-
jos monopolistas.
13. Na organização da economia alemã, deve-se dar ênfase primária ao de-
senvolvimento da agricultura e das indústrias domésticas pacíficas.
14. Durante o período de ocupação, a Alemanha será tratada como uma única
unidade econômica. Para este fim, devem ser estabelecidas políticas comuns em
relação a:
(a) Mineração e produção industrial e alocações; (b) Agricultura, silvicultura e
pesca; (c) Salários, preços e racionamento; (d) Programas de importação e expor-
tação para a Alemanha como um todo; (e) Moeda e bancos, tributação central e
aduaneira; (f) Reparação e remoção do potencial industrial de guerra; (g) Trans-
porte e comunicações.
Na aplicação dessas políticas, deve-se tomar conta, quando for o caso, dife-
rentes condições locais.
15. Os controles aliados serão impostos à economia alemã, mas apenas na
medida necessária:
(a) Para realizar programas de desarmamento industrial e desmilitarização,
794 Obras Escolhidas

de reparação e de exportações e importações aprovadas;


(b) Para assegurar a produção e manutenção de bens e serviços necessários
para atender às necessidades das forças ocupantes e pessoas deslocadas na Ale-
manha, essenciais para manter na Alemanha padrões médios de vida não superi-
ores à média dos padrões de vida dos países europeus (países europeus significam
todos os países europeus, excluindo o Reino Unido e a União das Repúblicas So-
cialistas Soviéticas);
(c) Para assegurar, da forma determinada pelo Conselho de Controle, a dis-
tribuição equitativa de mercadorias essenciais entre as diversas zonas, a ponto de
produzir uma economia equilibrada em toda a Alemanha e reduzir a necessidade
de importações;
(d) Para controlar a indústria alemã e todas as transações internacionais econô-
micas e financeiras, incluindo exportações e importações, com o objetivo de im-
pedir que a Alemanha desenvolva um potencial de guerra e de alcançar os outros
objetivos aqui nomeados;
(e) Para controlar todos os órgãos científicos públicos ou privados alemães,
instituições de pesquisa e experiências, laboratórios, etc., ligados às atividades
econômicas.
16. Na imposição e manutenção dos controles econômicos estabelecidos pelo
Conselho de Controle, serão criados mecanismos administrativos alemães e as
autoridades alemãs serão obrigadas ao máximo a proclamar e assumir a adminis-
tração de tais mecanismos. Assim, deve ser claro ao povo alemão que a responsa-
bilidade pela administração de tais mecanismos e qualquer quebra nos mesmos
repousa sobre eles próprios. Quaisquer mecanismos alemães que possam ir con-
tra os objetivos da ocupação serão proibidos.
17. Medidas devem ser prontamente tomadas:
(a) Para efetuar o reparo essencial do transporte; (b) Ampliar a produção de
carvão; (c) Maximizar a produção agrícola; e (d) Para efetivar a reparação emer-
gencial de habitações e utilidades essenciais.
18. Medidas apropriadas devem ser tomadas pelo Conselho de Controle para
exercer o controle e o poder de disposição sobre os ativos externos de propriedade
alemã que ainda não estão sob o controle das Nações Unidas que participaram
da guerra contra a Alemanha.
19. O pagamento de indenizações deve deixar recursos suficientes para per-
mitir que o povo alemão subsista sem assistência externa. Para trabalhar o equi-
líbrio econômico da Alemanha, os meios necessários devem ser fornecidos para
pagar as importações aprovadas pelo Conselho de Controle na Alemanha. Os
rendimentos das exportações provenientes da produção atual e dos estoques dis-
poníveis serão utilizados, em primeiro lugar, para o pagamento dessas importa-
ções.
A cláusula acima não se aplicará aos equipamentos e produtos referidos nos
parágrafos 4(a) e 4(b) do Acordo de Reparações.
IV – Reparações pela Alemanha
De acordo com a decisão de Crimeia de que a Alemanha seja obrigada a com-
pensar a maior extensão possível pela perda e sofrimento que ela causou às Na-
J. V. Stalin 795

ções Unidas e pela qual o povo alemão não pode escapar da responsabilidade,
chegou-se ao seguinte acordo sobre as indenizações:
1. As reivindicações de reparação da URSS serão atendidas por remoções da
zona da Alemanha ocupada pela URSS e dos ativos externos alemães apropriados.
2. A URSS compromete-se a resolver as reivindicações de reparação da Polô-
nia de sua própria parcela de indenizações.
3. As reivindicações de reparação dos Estados Unidos, do Reino Unido e de
outros países com direito a indenizações serão atendidas das zonas ocidentais e
dos ativos externos alemães apropriados.
4. Além das reparações a serem tomadas pela URSS de sua própria zona de
ocupação, a URSS receberá adicionalmente das zonas ocidentais:
(a) 15% desses equipamentos de capital industrial utilizáveis e completos, em
primeiro lugar das indústrias metalúrgica, química e de fabricação de máquinas,
por serem desnecessárias para a economia de paz alemã e devem ser removidas
das zonas ocidentais da Alemanha, em troca de um valor equivalente de alimen-
tos, carvão, potássio, zinco, madeira, produtos de argila, produtos petrolíferos e
outras commodities como pode ser acordado.
(b) 10% desses equipamentos de capital industrial, por serem desnecessários
para a economia de paz alemã e devem ser removidos das zonas ocidentais, para
serem transferidos ao Governo soviético por conta de reparação sem pagamento
ou troca de qualquer tipo em retorno.
As remoções dos equipamentos conforme previsto em (a) e (b) acima devem
ser feitas simultaneamente.
5. A quantidade de equipamento a ser removido das zonas ocidentais por
conta de indenizações deve ser determinada dentro de seis meses, no máximo.
6. As remoções dos equipamentos de capital industrial devem começar o mais
breve possível e devem ser concluídas dentro de dois anos a partir da determina-
ção especificada no parágrafo 5. A entrega dos produtos cobertos por 4(a) acima
começará o mais rápido possível e deve ser feita pela URSS em parcelas acordadas
dentro de cinco anos a partir da data deste documento. A determinação do mon-
tante e do caráter dos equipamentos de capital industrial desnecessários para a
economia alemã de paz e, portanto, disponível para indenizações, será feita pelo
Conselho de Controle sob políticas fixadas pela Comissão de Reparações Aliadas
com a participação da França, sujeita à aprovação final do Comandante da zona
de onde o equipamento deve ser removido.
7. Antes da fixação da quantidade total de equipamentos sujeitos à remoção,
as entregas antecipadas serão feitas em relação a tais equipamentos, conforme
determinadas elegíveis para entrega de acordo com o procedimento estabelecido
na última sentença do parágrafo 6.
8. O Governo soviético renuncia a todas as reivindicações em relação às inde-
nizações em ações de empresas alemãs que estão localizadas nas zonas ocidentais
de ocupação na Alemanha, bem como aos ativos estrangeiros alemães em todos
os países, exceto aqueles especificadas no parágrafo 9 abaixo.
9. Os governos do Reino Unido e dos EUA renunciam às suas reivindica-
ções em relação a reparações em ações alemãs de empresas que estão localizadas
796 Obras Escolhidas

na zona oriental de ocupação na Alemanha, bem como para ativos estrangeiros


alemães na Bulgária, Finlândia, Hungria, Romênia e Leste da Áustria.
10. O governo soviético não faz reivindicações ao ouro capturado pelas tropas
aliadas na Alemanha.
V- Disposição da Marinha e Marinha Mercante Alemã
A Conferência concordou, em princípio, com os arranjos para o uso e eli-
minação da frota alemã e dos navios mercantes rendidos. Foi decidido que os
Três Governos nomeariam especialistas para elaborar planos detalhados para dar
efeito aos princípios acordados. Uma nova declaração conjunta será publicada
simultaneamente pelos Três Governos oportunamente.
VI- Cidade de Königsberg e a Área Adjacente
A Conferência analisou uma proposta do Governo soviético de que, enquanto
aguarda a determinação final de questões territoriais no acordo de paz, a seção
da fronteira ocidental da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas, adjacente
ao Mar Báltico, deve passar de um ponto na costa leste da Baía de Danzig a leste,
ao norte de Braunsberg-Goldap, ao ponto de encontro das fronteiras da Lituânia,
da República Polonesa e da Prússia Oriental.
A Conferência concordou, em princípio, com a proposta do Governo soviético
sobre a transferência para a União Soviética da Cidade de Königsberg e a área
adjacente a ela, conforme descrito acima, sujeito a exame pericial da fronteira
real.
O Presidente dos Estados Unidos e o Primeiro-Ministro britânico declararam
que apoiarão a proposta da Conferência no próximo acordo de paz.
VII – Criminosos de Guerra
Os Três Governos tomaram nota das discussões que têm procedido nas últi-
mas semanas em Londres entre representantes britânicos, dos Estados Unidos,
soviéticos e franceses, com o objetivo de chegar a um acordo sobre os métodos
de julgamento daqueles grandes criminosos de guerra cujos crimes sob a Decla-
ração de Moscou de outubro de 1943 não têm localização geográfica particular.
Os Três governos reafirmam sua intenção de levar esses criminosos a uma justiça
rápida e segura. Eles esperam que as negociações em Londres resultem em um
acordo rápido para este fim e consideram uma questão de grande importância
que o julgamento desses grandes criminosos deva começar o mais cedo possível.
A primeira lista de réus será publicada antes de 1º de setembro.
VIII – Áustria
A Conferência analisou uma proposta do Governo soviético sobre a extensão
da autoridade do Governo Provisório austríaco para toda a Áustria.
Os Três Governos concordaram que estavam preparados para examinar esta
questão após a entrada das forças britânicas e americanas na cidade de Viena.
IX – Polônia
A Conferência considerou questões relativas ao Governo Provisório polonês e
à fronteira ocidental da Polônia.
Sobre o Governo Provisório polonês de Unidade Nacional eles definiram sua
atitude na seguinte declaração:
J. V. Stalin 797

A. Tomamos nota com prazer do acordo alcançado entre os poloneses da Polô-


nia e do exterior que possibilitou a formação, de acordo com as decisões toma-
das na Conferência da Crimeia, de um Governo Provisório Polonês de Unidade
Nacional reconhecido pelos Três Poderes. O estabelecimento pelos governos bri-
tânico e dos Estados Unidos de relações diplomáticas com o Governo Provisório
polonês resultou na retirada de seu reconhecimento do antigo governo polonês
em Londres, que não mais existe.
Os governos britânico e dos Estados Unidos tomaram medidas para prote-
ger os interesses do Governo Provisório polonês como o Governo reconhecido
do Estado polonês quanto às propriedades pertencentes ao Estado polonês loca-
lizadas em seus territórios e sob seu controle, qualquer que seja a forma desta
propriedade.
Eles tomaram ainda medidas para evitar a alienação a terceiros de tais pro-
priedades. Todas as facilidades adequadas serão dadas ao Governo Provisório
polonês para o exercício dos recursos legais cabíveis para a recuperação de qual-
quer propriedade pertencente ao Estado polonês que possa ter sido injustamente
alienada.
Os Três Poderes estão ansiosos para ajudar o Governo Provisório polonês a
facilitar o retorno à Polônia assim que possível de todos os poloneses no exte-
rior que desejam voltar, incluindo membros das Forças Armadas polonesas e da
Marinha Mercante. Eles esperam que a tais poloneses que voltarem para casa
sejam concedidos direitos pessoais e de propriedade na mesma base que todos os
cidadãos poloneses.
Os Três Poderes observam que o Governo Provisório polonês de acordo com as
decisões da Conferência da Crimeia concordou com a realização de eleições livres
e irrestritas o mais breve possível com base no sufrágio universal e na votação
secreta na qual todos os partidos democráticos e antinazistas terão o direito de
participar e apresentar candidatos, e que os representantes da imprensa aliada
desfrutarão de total liberdade para reportar ao mundo sobre os desenvolvimentos
na Polônia antes e durante as eleições.
B. O seguinte acordo foi alcançado na fronteira ocidental da Polônia:
Em conformidade com o acordo sobre a Polônia alcançado na Conferência
da Crimeia, os três chefes de Governo buscaram a opinião do Governo Provisó-
rio polonês de Unidade Nacional no que diz respeito ao acréscimo de território
no norte e oeste que a Polônia deve receber. O Presidente do Conselho Nacio-
nal da Polônia e membros do Governo Provisório Polonês de Unidade Nacional
foram recebidos na Conferência e apresentaram plenamente suas opiniões. Os
três chefes de governo reafirmaram sua opinião de que a determinação final da
fronteira ocidental da Polônia deve aguardar o acordo de paz.
Os três chefes de governo concordam que, até a determinação final da fron-
teira ocidental da Polônia, os antigos territórios alemães a leste de uma linha que
vai do Mar Báltico imediatamente a oeste de Swinemünde, e daí ao longo do rio
Oder até a confluência do rio Neisse ocidental e ao longo do Neisse ocidental
até a fronteira da Tchecoslováquia, incluindo aquela porção da Prússia Oriental
não colocada sob a administração da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas
em conformidade com o entendimento desta Conferência e incluindo a área da
798 Obras Escolhidas

antiga cidade livre de Danzig, estará sob a administração do Estado polonês e


para tais fins não deve ser considerada como parte da zona de ocupação soviética
na Alemanha.
X – Conclusão dos Tratados de Paz e Admissão à Organização das Nações
Unidas
A Conferência concordou com a seguinte declaração de política comum para
estabelecer, o mais rapidamente possível, as condições de paz duradoura após a
vitória na Europa:
Os Três Governos consideram desejável que a atual posição anômala da Itá-
lia, Bulgária, Finlândia, Hungria e Romênia seja encerrada com a conclusão dos
Tratados de Paz. Eles confiam que os outros governos aliados interessados com-
partilharão essas opiniões.
Por sua vez, os Três Governos incluíram a elaboração de um Tratado de Paz
para a Itália como a primeiro entre as tarefas imediatas a serem realizadas pelo
novo Conselho de Ministros das Relações Exteriores. A Itália foi a primeira das
Potências do Eixo a romper com a Alemanha, para cuja derrota ela fez uma con-
tribuição material, e agora se juntou aos Aliados na luta contra o Japão. A Itália
libertou-se do regime fascista e está fazendo um bom progresso para reestabe-
lecer um governo e instituições democráticas. A conclusão de tal Tratado de
Paz com um governo italiano reconhecido e democrático tornará possível para
os Três Governos realizarem seu desejo de apoiar um pedido da Itália para sua
adesão às Nações Unidas.
Os Três Governos também atribuíram ao Conselho de Ministros das Relações
Exteriores a preparação de tratados de paz para a Bulgária, Finlândia, Hungria
e Romênia. A conclusão dos Tratados de Paz com governos democráticos re-
conhecidos destes Estados também permitirá que os Três Governos apoiem os
pedidos deles para a adesão às Nações Unidas. Os Três Governos concordam em
examinar cada um separadamente em um futuro próximo, à luz das condições
que prevalecem, o estabelecimento de relações diplomáticas com a Finlândia, a
Romênia, a Bulgária e a Hungria na medida do possível antes da conclusão dos
tratados de paz com esses países.
Os Três Governos não têm dúvidas de que, em vista das mudanças pelas con-
dições resultantes do fim da guerra na Europa, os representantes da imprensa
aliada desfrutarão de total liberdade para reportar ao mundo sobre os desenvol-
vimentos na Romênia, Bulgária, Hungria e Finlândia.
Quanto à admissão de outros Estados na Organização das Nações Unidas, o
artigo 4º da Carta das Nações Unidas declara que:
“1. A adesão às Nações Unidas está aberta a todos os outros Estados amantes
da paz que aceitem as obrigações contidas na presente Carta e, no julgamento da
organização, estejam aptos e dispostos a cumprir essas obrigações;
2. A admissão da adesão de qualquer Estado às Nações Unidas será efetuada
por decisão da Assembleia Geral por recomendação do Conselho de Segurança.”
Os Três Governos, ao que consta, apoiarão os pedidos de adesão daqueles
Estados que permaneceram neutros durante a guerra e que cumprem as qualifi-
cações acima estabelecidas.
J. V. Stalin 799

Os Três Governos sentem-se obrigados, no entanto, a deixar claro que, por


sua vez, não favoreceriam qualquer pedido de adesão apresentado pelo atual
Governo espanhol, que, tendo sido fundado com o apoio dos Poderes do Eixo,
não possui, tendo em vista suas origens, sua natureza, sua história e sua estreita
associação com os Estados agressores, não possui as qualificações necessárias para
justificar tal adesão.
XI – Tutela Territorial
A Conferência analisou uma proposta do Governo soviético sobre tutela de
territórios, conforme definido na decisão da Conferência da Crimeia e na Carta
da Organização das Nações Unidas.
Após uma troca de opiniões sobre esta questão, decidiu-se que a disposição de
quaisquer antigos territórios coloniais italianos deveria ser decidida em conexão
com a elaboração de um tratado de paz para a Itália e que a questão dos territórios
coloniais italianos seria considerada pela reunião do Conselho de Ministros das
Relações Exteriores de setembro.
XII – Procedimento Revisado da Comissão Aliada de Controle na Romênia,
Bulgária e Hungria
Os Três Governos tomaram nota que os representantes soviéticos nas Comis-
sões de Controle Aliados na Romênia, Bulgária e Hungria, comunicaram aos seus
colegas do Reino Unido e dos Estados Unidos propostas para melhorar o traba-
lho das Comissões de Controle, agora que as hostilidades na Europa cessaram.
Os Três Governos concordaram que a revisão dos procedimentos das Comis-
sões de Controle Aliadas nesses países seria agora realizada, tendo em conta os
interesses e responsabilidades dos Três Governos que, juntos, apresentaram os
termos do armistício aos respectivos países, e aceitando como base as propostas
acordadas.
XIII- Transferências Ordenadas de Populações Alemãs
A Conferência chegou ao seguinte acordo sobre a remoção dos alemães da
Polônia, Tchecoslováquia e Hungria:
Os Três Governos, tendo considerado a questão em todos os seus aspectos, re-
conhecem que a transferência para a Alemanha das populações alemãs, ou seus
elementos, remanescentes na Polônia, Tchecoslováquia e Hungria, terão de ser
empreendidas. Eles concordam que quaisquer transferências que ocorram de-
vem ser efetuadas de forma ordenada e humana. Uma vez que o fluxo de um
grande número de alemães para a Alemanha aumentaria a carga já experienci-
ada sobre as autoridades ocupantes, eles consideram que o Conselho de Controle
Aliado na Alemanha deve, em primeira instância, examinar o problema com es-
pecial consideração à questão da distribuição equitativa desses alemães entre as
várias zonas de ocupação. Por conseguinte, instruem seus respectivos represen-
tantes no Conselho de Controle a informar aos seus Governos o mais rapidamente
possível o quanto essas pessoas já entraram na Alemanha da Polônia, da Tchecos-
lováquia e da Hungria e apresentarem uma estimativa do tempo e da taxa em que
novas transferências poderiam ser realizadas, tendo em conta a situação atual na
Alemanha.
O Governo da Tchecoslováquia, o Governo Provisório polonês e o Conselho
800 Obras Escolhidas

de Controle na Hungria estão ao mesmo tempo sendo informados sobre o acima


e estão sendo solicitados, entretanto, a suspender novas expulsões até o exame
pelos governos interessados no relatório de seus representantes no Conselho de
Controle.
XIV – Conversas Militares
Durante a Conferência houve reuniões entre os Chefes de Estado-Maior dos
Três Governos sobre assuntos militares de interesse comum.
XV – [Aqui é dada uma lista dos delegados da U.S.S.R., dos EUA e do Reino Unido
para a Conferência.]
J.V. Stalin
Harry S. Truman
C. R. Attlee

Protocolo de Procedimentos da Conferência de Berlim

A Conferência de Berlim dos Três Chefes de Governo da URSS, EUA e Reino


Unido, que ocorreu de 17 de julho a 2 de agosto de 1945, chegou às seguintes
conclusões:
I – Estabelecimento de um Conselho de Ministros das Relações Exteriores
A. A Conferência chegou ao seguinte acordo para a criação de um Conselho
de Ministros das Relações Exteriores para fazer o trabalho preparatório necessá-
rio para os acordos de paz:
(1) Será estabelecido um Conselho composto pelos Ministros das Relações
Exteriores do Reino Unido, da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas, da
China, da França e dos Estados Unidos.
(2) (i) O Conselho se reunirá normalmente em Londres, que será a sede per-
manente do Secretariado conjunto que o Conselho formará. Cada um dos Minis-
tros das Relações Exteriores será acompanhado por um suplente de alto escalão,
devidamente autorizado a continuar o trabalho do Conselho na ausência de seu
Ministro das Relações Exteriores, e por uma pequena equipe de assessores técni-
cos.
(ii) A primeira reunião do Conselho será realizada em Londres até 1º de se-
tembro de 1945. As reuniões podem ser realizadas por acordo comum em outras
capitais, como pode ser acordado de tempos em tempos.
(3) (i) Como sua tarefa importante imediata, o Conselho estará autorizado a
elaborar, com vistas à sua submissão às Nações Unidas, os tratados de paz com
a Itália, à Romênia, à Bulgária, à Hungria e à Finlândia, e a propor acordos de
questões territoriais pendentes sobre o término da guerra na Europa. O Con-
selho será utilizado para a elaboração de um acordo de paz para a Alemanha
a ser aceito pelo Governo da Alemanha quando um governo adequado para o
propósito for estabelecido.
(ii) Para a quitação de cada uma dessas tarefas, o Conselho será composto
pelos membros que representam os Estados signatários dos termos de rendição
impostos sobre o Estado inimigo em causa. Para efeitos do acordo de paz para a
Itália, a França será considerada signatária dos termos de rendição para a Itália.
J. V. Stalin 801

Outros deputados serão convidados a participar quando questões diretamente


relativas a eles estiverem em discussão.
(iii) Outras questões podem, de tempos em tempos, ser encaminhadas ao Con-
selho por acordo entre os Governos-Membros.
(4) (i) Sempre que o Conselho estiver considerando uma questão de interesse
direto para um Estado não representado nela, esse Estado deve ser convidado a
enviar representantes para participar da discussão e estudo dessa questão.
(ii) O Conselho pode adaptar o seu procedimento ao problema particular em
questão. Em alguns casos, pode realizar suas próprias discussões preliminares an-
tes da participação de outros Estados interessados. Em outros casos, o Conselho
pode convocar uma conferência formal dos Estados, principalmente interessadas
em buscar uma solução para o problema particular.
B. Ficou acordado que os Três Governos deveriam, cada um, abordar um
convite idêntico aos governos da China e da França para aprovar este texto e
aderir à criação do Conselho. O texto do convite aprovado foi o seguinte:

Conselho de Ministros das Relações Exteriores

Esboço de convite idêntico a ser enviado separadamente por


cada um dos três governos para os governos da China e
França

Os governos do Reino Unido, dos Estados Unidos e da União das Repúbli-


cas Socialistas Soviéticas consideram necessário começar sem atrasar o trabalho
preparatório essencial sobre os acordos de paz na Europa. Para isso, concorda-se
que deve ser estabelecido um Conselho dos Ministros das Relações Exteriores das
Cinco Grandes Potências para preparar tratados de paz com os Estados inimigos
europeus, para submissão às Nações Unidas. O Conselho também teria o poder
de propor assentamentos de questões territoriais pendentes na Europa e conside-
rar outros assuntos como os Governos-Membros podem concordar em referir-se
a ela.
O texto aprovado pelos Três Governos é o seguinte:
“De acordo com os governos de ... o Governo de... estende um convite cordial
ao Governo da China (França) para aprovar o texto citado acima e aderir à criação
do Conselho.
O Governo de... atribui muita importância à participação do Governo chinês
(Governo francês) nos acordos propostos e espera receber uma resposta anteci-
pada e favorável a este convite.”
C. Entendeu-se que a criação do Conselho de Ministros das Relações Exte-
riores para fins específicos nomeados no texto seria sem prejuízo do acordo da
Conferência da Crimeia de que deveria haver consulta periódica entre os Chan-
celeres dos Estados Unidos, da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas e do
Reino Unido.
D. A Conferência também considerou a posição da Comissão Consultiva Eu-
ropeia à luz do acordo para estabelecer o Conselho de Ministros das Relações
Exteriores. Observou-se com satisfação que a Comissão tinha exonerado as suas
802 Obras Escolhidas

principais tarefas pelas recomendações que havia fornecido para os termos de


rendição para a Alemanha, para as zonas de ocupação na Alemanha e na Áustria
e para os mecanismos de controle interaliados nesses países. Sentiu-se que um
trabalho de caráter mais detalhado para a coordenação da política aliada para
o controle da Alemanha e da Áustria, no futuro, ficaria sob a competência da
Comissão de Controle Aliada em Berlim e da Comissão Aliada em Viena. Assim,
a Conferência concordou em recomendar aos Governos-Membros da Comissão
Consultiva Europeia que a Comissão pudesse agora ser dissolvida.
[O texto subsequente é omitido, posto que se repete no Comunicado sobre a Conferência
Tripartite de Berlim. – Nota do Tradutor.]
IV- Disposição da Marinha e Marinha Mercante Alemã
A – Foram acordados os seguintes princípios para a distribuição da Marinha
alemã:
(1) A força total da marinha de superfície alemã, excluindo navios afundados
e aqueles que foram tomados das Nações Aliadas, mas incluindo navios em cons-
trução ou reparo, será dividida igualmente entre a URSS, Reino Unido e Estados
Unidos.
(2) Navios em construção ou reparo significam aqueles navios cuja construção
ou reparo podem ser concluídos dentro de três a seis meses, de acordo com o tipo
de navio. Se tais navios em construção ou reparo serão concluídos ou reparados,
será determinado pela comissão técnica nomeada pelos Três Poderes e referidos
abaixo, sob o princípio de que sua conclusão ou reparo deve ser alcançado dentro
dos prazos acima previstos, sem qualquer aumento do emprego qualificado nos
estaleiros alemães e sem permitir a reabertura de qualquer indústria de navios
alemães ou indústrias conectadas. A data de conclusão significa a data em que
um navio é capaz de sair em sua primeira viagem, ou, sob padrões de tempo de
paz, se referiria à data habitual de entrega pelo estaleiro ao Governo.
(3) A maior parte da frota de submarinos alemã deve ser afundada. Não
mais de trinta submarinos devem ser preservados e divididos igualmente entre a
URSS, o Reino Unido e os EUA para fins experimentais e técnicos.
(4) Todos os estoques de armamento, munição e suprimentos da Marinha
alemã pertencentes aos navios transferidos nos termos dos parágrafos (1) e (3)
deste documento serão entregues aos respectivos Poderes que recebem tais na-
vios.
(5) Os Três Governos concordam em constituir uma comissão naval tripartite
composta por dois representantes de cada Governo, acompanhados pelo pessoal
necessário, para apresentar recomendações acordadas aos Três Governos para a
alocação de navios de guerra alemães específicos e para lidar com outras ques-
tões detalhadas decorrentes do acordo entre os Três Governos em relação à frota
alemã. A Comissão realizará sua primeira reunião até 15 de Agosto de 1945,
em Berlim, que será a sua sede. Cada delegação da Comissão terá o direito com
base na reciprocidade de inspecionar navios de guerra alemães onde quer que
estejam localizados.
(6) Os Três Governos concordaram que as transferências, incluindo as dos
navios em construção e reparo, serão concluídas o mais rapidamente possível,
mas não mais tarde do que 15 de fevereiro de 1946. A Comissão apresentará
J. V. Stalin 803

relatórios quinzenais, incluindo propostas para a alocação progressiva dos navios


quando acordada pela Comissão.
B – Foram acordados os seguintes princípios para a distribuição da Marinha
Mercante Alemã.
(1) A Marinha Mercante Alemã, entregue às Três Potências e onde quer que
esteja localizada, será dividida igualmente entre a URSS, o Reino Unido e os
EUA. As transferências reais dos navios para os respectivos países ocorrerão as-
sim que possível após o fim da guerra contra o Japão. O Reino Unido e os Es-
tados Unidos fornecerão de suas partes dos navios mercantes alemães entregues
montantes apropriados para outros Estados Aliados cujas marinhas mercantes so-
freram pesadas perdas na causa comum contra a Alemanha, exceto que a União
Soviética fornecerá de sua parte para a Polônia.
(2) A alocação, a lotação e a operação desses navios durante o período da
Guerra japonesa devem estar sob o conhecimento e a autoridade do Conselho
combinado de Ajuste de Navegação e da Autoridade Marítima Unida.
(3) Enquanto a transferência real dos navios deve ser adiada até o fim da
guerra com o Japão, uma Comissão tripartite de navegação fará um inventário e
valoração de todos os navios disponíveis e recomendará uma distribuição especí-
fica de acordo com o parágrafo (1).
(4) Os navios lacustres e de cabotagem alemães determinados necessários para
a manutenção da economia básica alemã de paz pelo Conselho de Controle Ali-
ado da Alemanha não devem ser incluídos no agregado marítimo, portanto, não
serão divididos entre as Três Potências.
(5) Os Três Governos concordam em constituir uma comissão da Marinha
Mercante tripartite composta por dois representantes para cada Governo, acom-
panhado do pessoal necessário, apresentar recomendações acordadas aos Três
Governos para a alocação de navios mercantes alemães específicos e para lidar
com outras questões detalhadas decorrentes do acordo entre os Três Governos
em relação aos navios mercantes alemães. A Comissão realizará sua primeira
reunião até 1º de setembro de 1945, em Berlim, que será a sua sede. Cada de-
legação da Comissão terá o direito com base na reciprocidade de inspecionar os
navios mercantes alemães onde quer que estejam localizados.
[O texto subsequente é omitido, posto que se repete no Comunicado sobre a Conferência
Tripartite de Berlim. – Nota do Tradutor.]
XIV – Irã
Foi acordado que as tropas aliadas deveriam ser retiradas imediatamente de
Teerã, e que novas etapas da retirada das tropas do Irã deveriam ser consideradas
na reunião do Conselho de Ministros das Relações Exteriores a ser realizada em
Londres em setembro de 1945.
XV – A Zona Internacional de Tânger
Uma proposta do Governo soviético foi examinada e as seguintes decisões
foram tomadas.
Tendo examinado a questão da Zona de Tânger, os Três Governos concorda-
ram que esta Zona, que inclui a Cidade de Tânger e a área adjacente a ela, em
vista de sua importância estratégica especial permanecerá internacional.
804 Obras Escolhidas

A questão de Tânger será discutida em um futuro próximo em uma reunião


em Paris de representantes dos Governos da União das Repúblicas Socialistas
Soviéticas, dos Estados Unidos da América, do Reino Unido e da França.
XVI – O Estreito do Mar Negro
Os Três Governos reconheceram que a Convenção concluída em Montreal
deveria ser revista, pois não cumpria as condições atuais.
Ficou acordado que, como próximo passo, o assunto deveria ser objeto de
conversas diretas entre cada um dos Três Governos e o Governo turco.
XVII – Vias Navegáveis Interiores Internacionais
A Conferência considerou uma proposta da delegação dos EUA sobre este
assunto e concordou em encaminhá-la para apreciação da próxima reunião do
Conselho de Ministros das Relações Exteriores em Londres.
XVIII – Conferência de Transporte Interior da Europa
As delegações britânicas e americanas na Conferência informaram à delega-
ção soviética do desejo dos governos britânico e norte-americano de reunir no-
vamente a Conferência Europeia de Transporte Interior e afirmaram que gosta-
riam de garantir que o Governo soviético participaria do trabalho da Conferência
reunida. O Governo soviético concordou em participar desta Conferência.
XIX – Diretivas aos Comandantes Militares no Conselho de Controle Aliado
para a Alemanha
Os Três Governos concordaram que cada um enviaria uma diretiva ao seu
representante no Conselho de Controle sobre questões que caiam no âmbito de
sua competência.
XX – Uso de Propriedade dos Aliados para reparação de Satélites ou “Troféus
de Guerra”
A Conferência decidiu aceitar, em princípio, a proposta da Delegação Ameri-
cana. A redação desta proposta deve ser acordada através do canal diplomático.
[O texto subsequente é omitido, posto que se repete no Comunicado sobre a Conferência
Tripartite de Berlim – Nota do Tradutor.]
J. V. Stalin
Harry S. Truman
C. R. Attlee
J. V. Stalin 805

ANEXO 3 – LEGISLAÇÃO E
DECLARAÇÕES CONCERNENTES À
QUESTÃO NACIONAL
Declaração dos Direitos dos Povos da Rússia

A revolução de outubro dos operários e camponeses começou sob a bandeira


comum de emancipação. Os camponeses estão sendo emancipados do poder dos
latifundiários, pois não existem mais o direito de propriedade do latifundiário
sobre a terra – ele foi abolido. Os soldados e marinheiros estão sendo emancipa-
dos do poder dos generais autocráticos, pois os generais passarão a ser eletivos e
sujeitos a revogação. Os operários estão sendo emancipados dos caprichos e da
vontade arbitrária dos capitalistas, pois doravante se estabelecerá o controle dos
operários sobre os engenhos e fábricas. Tudo o que é vivo e capaz de viver está
sendo emancipado das amarras odiosas. Restam apenas os povos da Rússia, que
sofreram e estão sofrendo a opressão e a arbitragem e cuja emancipação deve ser
iniciada imediatamente, cuja libertação deve ser efetuada com determinação e
de forma definitiva.
Durante o período do tsarismo, os povos da Rússia foram sistematicamente
incitados não contra os outros. Os resultados de tal política são conhecidos; mas-
sacres e pogroms de um lado, escravidão dos povos do outro.
Não pode haver e não deve haver retorno a essa política de instigação. Dora-
vante, a política deve ser substituída por uma de união voluntária e honesta dos
povos da Rússia.
No período do imperialismo; Depois da revolução de fevereiro, quando o
poder foi transferido para as mãos da burguesia cadete, a política de instigação
nua e deu crua lugar a uma de desconfiança covarde entre os povos da Rússia, a
uma política de censura e provocação, de “liberdade” e “igualdade” dos povos. Os
resultados de tal política são conhecidos; o crescimento da inimizade nacional, o
comprometimento da confiança mútua.
Deve-se pôr fim a essa política indigna de falsidade e desconfiança, de censura
e provocação. Doravante, deve ser substituído por uma política aberta e honesta
que conduza à total confiança mútua do povo da Rússia. Somente como resultado
de tal confiança, pode ser formada uma união honesta e duradoura dos povos
da Rússia. Somente como resultado de tal união, os operários e camponeses dos
povos da Rússia podem ser consolidados em uma força revolucionária de resistir
a todas as tentativas da burguesia imperialista anexionista.
Partindo dessas premissas, o primeiro Congresso dos Sovietes, em junho deste
ano, proclamou o direito dos povos da Rússia à autodeterminação livre.
O segundo Congresso dos Sovietes, em outubro deste ano, reafirmou este
direito inalienável dos povos da Rússia de forma mais decidida e definitiva.
A vontade unificada destes Congressos, o Conselho dos Comissários do Povo,
806 Obras Escolhidas

resolveu basear a sua atividade sobre a questão das nacionalidades da Rússia,


expressa nos seguintes princípios:
1. A igualdade e soberania dos povos da Rússia.
2. O direito dos povos da Rússia à autodeterminação livre, mesmo ao ponto
de separação e formação de um Estado independente.
3. A abolição de todos e quaisquer privilégios bem como obrigações ou ônus
nacionais e religiosos-nacionais.
4. O livre desenvolvimento das minorias nacionais e grupos etnográficos que
habitam o território da Rússia.
Os decretos concretos que decorrem de estes princípios serão elaborados ime-
diatamente após a constituição de uma Comissão de Assuntos da Nacionalidade.
Em nome da República da Rússia,
Presidente do Conselho dos Comissários do Povo, V. Ulianov (Lenin).
Comissário do Povo para Assuntos de Nacionalidade, Josef Dzhugashvili (Sta-
lin).
J. V. Stalin 807

Apelo do Conselho do Povo aos Muçulmanos


Trabalhadores da Rússia e do Oriente
3 de dezembro de 1917

Camaradas, camaradas! Irmãos, irmãos!


Grandes eventos estão acontecendo na Rússia! O fim está se aproximando
da guerra assassina, iniciada pelas guerras de potências estrangeiras. O governo
dos saqueadores que exploram os povos do mundo está titubeando. A antiga
cidadela da escravidão e da servidão está se desfazendo sob os golpes da revolução
russa. O mundo da violência e opressão está se aproximando de seus últimos dias.
Um novo mundo está nascendo, um mundo dos trabalhadores e dos libertos. À
frente desta revolução está o Governo dos trabalhadores e camponeses da Rússia,
o Conselho dos Comissários do Povo.
Conselhos revolucionários de deputados operários, soldados e camponeses
estão espalhados por toda a Rússia. O poder no país está nas mãos do povo.
Como massas trabalhadoras da Rússia ardem com o único desejo de alcançar
uma paz honrosa e de ajudar os povos oprimidos do mundo a conquistar sua
liberdade.
A Rússia não está sozinha nesta causa sagrada. O poderoso apelo à liberdade
soado pela revolução russa foi aceito por todos os trabalhadores do Oriente e do
Ocidente. Os povos da Europa, exaustos pela guerra, já nos estendem as mãos,
no nosso trabalho pela paz. Os trabalhadores e soldados do Ocidente já estão
reunindo sob a bandeira do socialismo, atacando como fortalezas do imperia-
lismo. Mesmo a longínqua Índia, aquela terra oprimida pelos ladrões europeus
“iluminados” por tantos séculos, elevou o estandarte da revolta, organizando seus
conselhos de deputados, jogando de seus ombros o odiado jugo da escravidão e
convocando os povos do Oriente à luta e à liberdade.
O império da pilhagem capitalista e da violência está caindo em ruínas. O
chão está escorregando sob os pés dos ladrões imperialistas.
Diante desses grandes eventos, voltamo-nos para vocês, muçulmanos labuta-
dores e deserdados da Rússia e do Oriente.
Muçulmanos da Rússia, tártaros do Volga e da Crimeia, Quirguizes e Sartos
da Sibéria e Turquestão, turcomanos e tártaros da Transcaucásia, chechenos e
cossacos das montanhas! Todos vocês, cujos santuários das mesquitas foram des-
truídos, cuja fé e figurinos foram violados pelos czares e opressores da Rússia!
Daqui em diante suas crenças e figurinos, suas instituições nacionais e culturais,
são declarados livres e invioláveis! Construa sua vida nacional livremente e sem
obstáculos. É seu direito. Saibam que seus direitos, como os de todos os povos da
Rússia, serão protegidos pelo poder da revolução, pelos Conselhos de Deputados
Operários, Soldados e Camponeses!
Apoie esta revolução e seu governo autorizado!
Muçulmanos do Oriente! Persas, turcomanos, árabes e hindus. Todos vocês
cujas vidas e propriedades, cuja liberdade e terra natal os vorazes ataques sa-
quearam durante séculos! Todos vocês cujos países os ladrões que começaram a
guerra agora desejam compartilhar entre si! Declaramos que os tratados secre-
808 Obras Escolhidas

tos do tsar destronado sobre a anexação de Constantinopla, confirmados pelo


deposto Kerensky, são agora nulos e sem efeito. A República Russa e seu go-
verno, o Conselho dos Comissários do Povo, opõem-se à apreensão de território
estrangeiro; Constantinopla deve permanecer nas mãos dos muçulmanos.
Declaramos que o tratado para a partição da Pérsia é nulo e sem efeito. Ime-
diatamente após a cessação das operações militares, as tropas serão retiradas da
Pérsia, e os persas terão garantido o direito de determinar livremente seu próprio
destino.
Declaramos que o tratado para a partição da Turquia, que iria despojá-la da
Armênia, é nulo e sem efeito. Logo após a cessação das operações militares, os
armênios terão garantido o direito de determinar livremente seu destino político.
Não é da Rússia e de seu governo revolucionário que você deve temer a es-
cravidão, mas dos ladrões imperialistas europeus, aqueles que devastaram suas
terras nativas e como conversor em suas colônias.
Derrubem esses ladrões e escravizadores de seus países! Agora, quando a
guerra e a desolação estão demolindo os pilares da velha ordem, quando o mundo
inteiro está ardendo de indignação contra os bandidos imperialistas, quando a
menor centelha de fogo explode em uma poderosa chama da revolução, quando
até mesmo os muçulmanos indianos, oprimidos e jogados pelo jugo estrangeiro,
estão se rebelando contra seus feitos de escravos – agora é impossível ficar em
silêncio. Não perca tempo em jogar para um jugo dos antigos opressores de sua
terra! Não mais os permitam violar seus lares! Vocês devem ser mestres em sua
própria terra! Vocês mesmos devem organizar sua vida como acharem melhor!
Vocês têm o direito de fazer isso, pois seus destinos estão em suas próprias mãos!
Camaradas, camaradas! Irmãos, irmãos!
Avancemos com firmeza e determinação para uma paz justa e democrática!
Inscrevemos a libertação dos povos oprimidos do mundo em nossas bandeiras!
Muçulmanos da Rússia!
Muçulmanos do Oriente!
Esperamos sua simpatia e apoio na obra de regeneração do mundo.
Comissariado dos Povos
Josef Dzhugashvili (Stalin)
J. V. Stalin 809

ANEXO 4 – MARXISMO E PROBLEMAS


DE LINGUÍSTICA
Marxismo e Problemas da Linguística

Publicado pela primeira vez em 20 de junho, 4 de julho e 2 de agosto de 1950 no


Pravda

Sobre o marxismo na linguística.


Um grupo de camaradas mais jovens me pediu para dar minha opinião na
imprensa sobre problemas relacionados à linguística, particularmente em refe-
rência ao marxismo na linguística. Não sou um especialista em linguística e,
claro, não posso satisfazer totalmente o pedido dos camaradas. Quanto ao mar-
xismo em linguística, como em outras ciências sociais, isso é algo diretamente no
meu campo. Por conseguinte, concordei em responder a uma série de perguntas
feitas pelos camaradas.
PERGUNTA: É verdade que a linguagem é uma superestrutura na base?
RESPOSTA: Não, não é verdade.
A base é a estrutura econômica da sociedade numa dada fase de seu desenvol-
vimento. A superestrutura são as visões políticas, jurídicas, religiosas, artísticas
e filosóficas da sociedade e as instituições políticas, jurídicas e outras correspon-
dentes a elas.
Cada base tem sua própria superestrutura correspondente. A base do sistema
feudal tem sua superestrutura, seus pontos de vista políticos, jurídicos e outros,
bem como as instituições correspondentes; a base capitalista tem sua própria
superestrutura, assim como a base socialista. Se a base mudar ou for eliminada,
então, seguindo isso, sua superestrutura muda ou é eliminada; se uma nova base
surgir, então, seguindo isso, surge uma superestrutura correspondente a ela.
A este respeito, a linguagem difere radicalmente da superestrutura. Veja, por
exemplo, a sociedade russa e a língua russa. Ao longo dos últimos trinta anos, a
antiga base capitalista foi eliminada na Rússia e uma nova base socialista foi cons-
truída. Correspondentemente, a superestrutura na base capitalista foi eliminada
e uma nova superestrutura criada correspondente à base socialista. As antigas
instituições políticas, jurídicas e outras, consequentemente, foram suplantadas
por novas instituições socialistas. Mas, apesar disso, a língua russa permaneceu
basicamente o que era antes da Revolução de Outubro.
O que mudou na língua russa nesse período? Em certa medida, o vocabulá-
rio da língua russa mudou, no sentido de que foi reabastecido com um número
considerável de novas palavras e expressões, que surgiram em conexão com o sur-
gimento da nova produção socialista, o surgimento de um novo Estado, uma nova
cultura socialista, novas relações sociais e morais, e, por último, em conexão com
o desenvolvimento da tecnologia e da ciência; uma série de palavras e expressões
mudaram seu significado, adquiriram uma nova significação; uma série de pala-
810 Obras Escolhidas

vras obsoletas caíram do vocabulário. Quanto ao estoque básico de palavras e ao


sistema gramatical da língua russa, que constituem a base de uma língua, eles,
após a eliminação da base capitalista, longe de terem sido eliminados e suplan-
tados por um novo estoque básico de palavras e um novo sistema gramatical da
língua, foram preservados em sua totalidade e não sofreram mudanças sérias –
foram preservados precisamente como a base da língua russa moderna.
Além disso, a superestrutura é um produto da base, mas isso não implica que
ela apenas reflete a base, que é passiva, neutra, indiferente ao destino de sua base,
ao destino das classes, ao caráter do sistema. Pelo contrário, tomando existência,
torna-se uma força extremamente ativa, auxiliando ativamente sua base a tomar
forma e se consolidar, e fazendo o máximo para ajudar o novo sistema a terminar
e eliminar a antiga base e as antigas classes.
Não pode ser de outra forma. A superestrutura é criada pela base precisa-
mente para atendê-la, para ajudá-la ativamente a tomar forma e se consolidar,
para lutar ativamente pela eliminação da antiga base moribunda juntamente com
sua antiga superestrutura. A superestrutura só tem que renunciar a esse papel
de auxiliar, tem apenas que passar de uma posição de defesa ativa de sua base
para uma de indiferença em relação a ela, para adotar uma atitude igual a todas
as classes, e perde sua virtude e deixa de ser uma superestrutura.
A este respeito, a linguagem difere radicalmente da superestrutura. A lin-
guagem não é um produto de uma ou outra base, antiga ou nova, dentro da
sociedade dada, mas de todo o curso da história da sociedade e da história das
bases por muitos séculos. Foi criada não por uma classe, mas por toda a socie-
dade, por todas as classes da sociedade, pelos esforços de centenas de gerações.
Foi criada para a satisfação das necessidades não de uma classe particular, mas
de toda a sociedade, de todas as classes da sociedade. Justamente por isso foi
criada como uma única linguagem para a sociedade, comum a todos os membros
dessa sociedade, como a linguagem comum de todo o povo. Daí o papel funcio-
nal da linguagem, como meio de relação entre as pessoas, não consiste em servir
uma classe em detrimento de outras classes, mas de servir igualmente toda a so-
ciedade, todas as classes da sociedade. Isso explica de fato por que uma língua
pode servir igualmente tanto ao antigo sistema moribundo quanto ao novo sis-
tema em ascensão; tanto a antiga base quanto a nova base; tanto os exploradores
quanto os explorados.
Não é segredo para ninguém que a língua russa serviu o capitalismo russo e a
cultura burguesa russa antes da Revolução de Outubro, assim como agora serve
ao sistema socialista e à cultura socialista da sociedade russa.
O mesmo deve ser dito do ucraniano, bielorrusso, uzbeque, cazaque, geor-
giano, armênio, estoniano, letão, lituano, moldávio, tártaro, azeri, bashkiriano,
turcomeno e outras línguas das nações soviéticas; eles serviram o antigo sistema
burguês dessas nações tão bem quanto servem ao novo sistema socialista.
Não pode ser de outra forma. A linguagem existe, a linguagem foi criada
precisamente para servir a sociedade como um todo, como meio de relação en-
tre as pessoas, a fim de ser comum aos membros da sociedade e constituir a
linguagem única da sociedade, servindo igualmente aos membros da sociedade,
independentemente de seu status de classe. Uma língua só tem que se afastar
J. V. Stalin 811

dessa posição de ser uma linguagem comum a todo o povo, ela só tem que dar
preferência e apoio a algum grupo social em detrimento de outros grupos soci-
ais da sociedade e perde sua virtude, deixa de ser um meio de relação entre as
pessoas da sociedade e se torna o jargão de algum grupo social, degenera e está
condenada a desaparecer.
A este respeito, embora difere, em princípio, da superestrutura, a linguagem
não difere dos instrumentos de produção, dos mecanismos, digamos, que são tão
indiferentes às classes quanto a linguagem e podem, de igual maneira, servir a
um sistema capitalista e a um sistema socialista.
Além disso, a superestrutura é o produto de uma época, a época em que a base
econômica dada existe e opera. A superestrutura é, portanto, de curta duração;
é eliminado e desaparece com a eliminação e desaparecimento da base dada.
A linguagem, pelo contrário, é o produto de um número inteiro de épocas,
no curso das quais toma forma, é enriquecida, desenvolve e é suavizada. Uma lín-
gua, portanto, vive incomensuravelmente mais do que qualquer base ou qualquer
superestrutura. Isso explica por que o aumento e a eliminação não só de uma
base e sua superestrutura, mas de várias bases e suas superestruturas correspon-
dentes, não levaram na história à eliminação de uma determinada linguagem, à
eliminação de sua estrutura e à ascensão de uma nova linguagem com um novo
estoque de palavras e um novo sistema gramatical.
Faz mais de cem anos desde que Pushkin morreu. Neste período, o sistema
feudal e o sistema capitalista foram eliminados na Rússia e um terceiro surgiu,
um sistema socialista. Assim, duas bases, com suas superestruturas, foram eli-
minadas, e uma nova base socialista surgiu, com sua nova superestrutura. No
entanto, se tomarmos a língua russa, por exemplo, ela não sofreu, neste longo
período de tempo, nenhuma mudança fundamental e a língua russa moderna
difere muito pouco em estrutura da língua de Pushkin.
O que mudou na língua russa nesse período? O vocabulário russo foi muito
enriquecido; um grande número de palavras obsoletas saiu do vocabulário; o
significado de muitas palavras mudou; o sistema gramatical da linguagem me-
lhorou. Quanto à estrutura da língua Pushkin, com seu sistema gramatical e seu
estoque básico de palavras, em todos os fundamentos permaneceu como base do
russo moderno.
E isso é bastante compreensível. De fato, que necessidade há, após cada re-
volução, para que a estrutura existente da linguagem, seu sistema gramatical e o
estoque básico de palavras sejam destruídos e suplantados por novas, como geral-
mente é o caso da superestrutura? Que objeto haveria em chamar “água”, “terra”,
“montanha”, “floresta”, “peixe”, “homem”, “andar”, “fazer”, “produzir”, “para
negociar”, etc., não água, terra, montanha, etc., mas outra coisa? Que objeto
haveria em ter a modificação das palavras em uma língua e a combinação de
palavras em frases não seguem a gramática existente, mas alguma gramática to-
talmente diferente? O que a revolução ganharia com tal revolta na linguagem?
A história em geral nunca faz nada de qualquer importância sem alguma ne-
cessidade especial para ela. O que, pergunta-se, pode ser a necessidade de tal
revolução linguística, se foi demonstrado que a linguagem existente e sua estru-
tura são fundamentalmente adequadas às necessidades do novo sistema? A velha
812 Obras Escolhidas

superestrutura pode e deve ser destruída e substituída por uma nova ao longo
de alguns anos, a fim de dar livre espaço para o desenvolvimento das forças pro-
dutivas da sociedade; mas como pode uma linguagem existente ser destruída e
uma nova construída em seu lugar ao longo de alguns anos sem causar anarquia
na vida social e sem criar a ameaça da desintegração da sociedade? Quem além
de um Dom Quixote poderia abraçar tal tarefa?
Por último, uma outra distinção radical entre a superestrutura e a lingua-
gem. A superestrutura não está diretamente ligada à produção, com a atividade
produtiva do homem. Está ligada à produção apenas indiretamente, através da
economia, através da base. A superestrutura reflete, portanto, mudanças no
nível de desenvolvimento das forças produtivas não imediatamente e não dire-
tamente, mas apenas após mudanças na base, através do prisma das mudanças
feitas na base pelas mudanças na produção. Isso significa que a esfera de ação
da superestrutura é estreita e restrita.
A linguagem, pelo contrário, está ligada diretamente à atividade produtiva
do homem, e não apenas com a atividade produtiva do homem, mas com todas
as suas outras atividades em todas as suas esferas de trabalho, da produção à
base e da base à superestrutura. Por essa razão, a linguagem reflete mudanças
na produção de forma imediata e direta, sem esperar por mudanças na base.
Por essa razão, a esfera de ação da linguagem, que abrange todos os campos da
atividade do homem, é muito mais ampla e abrangente do que a esfera de ação
da superestrutura. Mais, é praticamente ilimitada.
É isso que explica principalmente por que a linguagem, ou melhor, seu vo-
cabulário, está em um estado de mudança quase constante. O desenvolvimento
contínuo da indústria e da agricultura, do comércio e do transporte, da tecno-
logia e da ciência, exige que a linguagem reponha seu vocabulário com novas
palavras e expressões necessárias para seu funcionamento. E a linguagem, refle-
tindo diretamente essas necessidades, repõe seu vocabulário com novas palavras
e aperfeiçoa seu sistema gramatical.
Daí: a) Um marxista não pode considerar a linguagem como uma superes-
trutura na base; b) Confundir linguagem e superestrutura é cometer um erro
grave.
PERGUNTA: É verdade que a linguagem sempre foi e é uma linguagem de classe, que
não existe essa coisa de linguagem que é a linguagem única e comum de uma sociedade,
uma linguagem não classista comum a todo o povo?
RESPOSTA: Não, não é verdade.
Não é difícil entender que em uma sociedade que não tem classes não pode
haver tal coisa como uma linguagem de classe. Não havia classes no sistema pri-
mitivo do clã comunitário, e consequentemente não poderia haver linguagem de
classe – a língua era então a linguagem única e comum de toda a comunidade. A
objeção de que o conceito classe deve ser tomado como cobertura de toda comu-
nidade humana, incluindo a comunidade comum primitiva, não é uma objeção,
mas um brincar com palavras que não vale a pena refutar.
Quanto ao desenvolvimento subsequente das línguas dos clãs às línguas tri-
bais, das línguas tribais às línguas das nacionalidades e das línguas das nacionali-
dades às línguas nacionais, em todos os lugares e em todas as fases de desenvolvi-
J. V. Stalin 813

mento, a linguagem, como meio de relação entre o povo de uma sociedade, era a
linguagem comum e única dessa sociedade, servindo seus membros igualmente,
independentemente de seu status social.
Não estou me referindo aqui aos impérios dos períodos escravagista e medi-
eval, aos impérios de Ciro ou Alexandre, o Grande, digamos, ou de César ou
Carlos, o Grande, que não tinham fundamentos econômicos próprios e eram
associações militares e administrativas transitórias e instáveis. Não só esses im-
périos não tinham, como não poderiam ter uma única língua comum a todo o
império e compreendida por todos os membros do império. Eram conglomera-
dos de tribos e nacionalidades, cada uma das quais vivendo sua própria vida e
possuindo sua própria língua. Consequentemente, não são esses ou impérios si-
milares que tenho em mente, mas as tribos e nacionalidades que os compunham,
que tinham suas próprias bases econômicas e suas próprias línguas, que haviam
evoluído em um passado distante. A história nos diz que as línguas dessas tribos
e nacionalidades não eram línguas de classe, mas línguas comuns a toda uma
tribo ou nacionalidade e compreendidas por todo o seu povo.
Lado a lado com isso, havia, é claro, dialetos, vernáculos locais, mas eles eram
dominados e subordinados à linguagem única e comum da tribo ou nacionali-
dade.
Mais tarde, com o surgimento do capitalismo, a eliminação da divisão feudal e
a formação de mercados nacionais, nacionalidades se desenvolveram em nações
e as línguas das nacionalidades em línguas nacionais. A história mostra que
as línguas nacionais não pertencem a classes específicas, mas línguas comuns,
comuns a todos os membros de cada nação e constituindo a língua única daquela
nação.
Já foi dito acima que a linguagem, como um meio de relação entre as pessoas
de uma sociedade, serve a todas as classes da sociedade igualmente, e a este res-
peito exibe o que pode ser chamado de indiferença às classes. Mas as pessoas, os
vários grupos sociais, as classes, estão longe de serem indiferentes à linguagem.
Eles se esforçam em utilizar a língua para seus próprios interesses, para impor
sua própria linguagem especial, seus próprios termos especiais, suas próprias ex-
pressões especiais sobre ela. Os estratos superiores das classes proprietárias, que
se divorciaram e detestam as pessoas comuns, a nobreza aristocrática, os estratos
superiores da burguesia, particularmente se distinguem a este respeito. Diale-
tos de “classe”, jargões, “línguas” da alta sociedade são criadas. Esses dialetos
e jargões são muitas vezes referidos incorretamente na literatura como línguas
– a “linguagem aristocrática” ou a “língua burguesa” em contraposição à “lín-
gua proletária” ou à “língua camponesa”. Por essa razão, por mais estranho que
possa parecer, alguns de nossos camaradas chegaram à conclusão de que a língua
nacional é uma ficção, e que apenas línguas de classe existem na realidade.
Não há nada, eu acho, mais errado do que esta conclusão. Esses dialetos e
jargões podem ser considerados línguas? Certamente que não. Eles não podem,
em primeiro lugar, porque esses dialetos e jargões não têm sistemas gramaticais
ou estoques básicos de palavras próprios – eles os tomam emprestados da língua
nacional. Eles não podem, em segundo lugar, porque esses dialetos e jargões
estão confinados a uma esfera estreita, são correntes apenas entre os estratos
814 Obras Escolhidas

superiores de uma determinada classe e são totalmente inadequados como um


meio de relações humanas para a sociedade como um todo. O que, então, eles
têm? Eles têm uma coleção de palavras específicas refletindo os gostos especí-
ficos da aristocracia ou dos estratos superiores da burguesia; um certo número
de expressões e de frases distinguidas pelo refinamento e galanteio e livres das
expressões e frases “grosseiras” da língua nacional; por último, um certo número
de palavras estrangeiras. Mas todos os fundamentos, ou seja, a esmagadora mai-
oria das palavras e o sistema gramatical, são emprestados da linguagem comum
e nacional. Os dialetos e jargões são, portanto, desdobramentos da língua na-
cional comum, desprovidos de toda a independência linguística e condenados à
estagnação. Acreditar que dialetos e jargões possam se desenvolver em línguas
independentes capazes de destituir e suplantar a língua nacional significa perder
o senso de perspectiva histórica e abandonar a posição marxista.
Referências são feitas a Marx, e a passagem de seu artigo St. Max é citada
que diz que os burgueses têm “sua própria língua”, que essa linguagem “é um
produto da burguesia”313 que é permeada pelo espírito do mercantilismo e do
mascateio. Alguns camaradas citam essa passagem com a ideia de provar que
Marx acreditava no “caráter de classe” da linguagem e negou a existência de uma
única língua nacional. Se esses camaradas fossem imparciais, deveriam ter citado
outra passagem deste mesmo artigo St. Max, onde Marx, tocando na forma como
as línguas nacionais únicas surgiram, fala da “concentração de dialetos em uma
única língua nacional resultante da concentração econômica e política”.314
Marx, consequentemente, reconheceu a necessidade de uma única língua na-
cional, como uma forma superior, à qual os dialetos, como formas inferiores, são
subordinados.
O que, então, pode essa linguagem burguesa ser a qual Marx diz “é um pro-
duto da burguesia”? Marx a considerava tanto uma língua como a língua nacio-
nal, com uma estrutura linguística específica própria? Ele poderia ter conside-
rado uma linguagem assim? Claro que não. Marx apenas queria dizer que os
burgueses tinham poluído a única língua nacional com seu dialeto de mascates,
que os burgueses, em outras palavras, têm o jargão de seus regateios.
Parece assim que esses camaradas deturparam Marx. E eles o deturparam
porque citavam Marx não como marxistas, mas como dogmatistas, sem se apro-
fundar na essência da matéria.
Referências feitas a Engels, e as palavras de seu Condição da Classe Traba-
lhadora na Inglaterra são citadas onde ele diz que na Grã-Bretanha “... a classe
trabalhadora gradualmente tornou-se uma raça totalmente distante da burguesia
inglesa”, que “os trabalhadores falam outros dialetos, têm outros pensamentos e
ideais, outros costumes e princípios morais, uma religião diferente e outras po-
líticas que as da burguesia”.315 Certos camaradas concluem a partir desta pas-
sagem que Engels negou a necessidade de uma língua comum, nacional, que ele
acreditava, consequentemente, no “caráter de classe” da linguagem. Verdade,
313 A passagem pode ser encontrada em MARX, Karl; ENGELS, Friedrich. A ideologia alemã. São
Paulo: Boitempo, 2018 (N.T)
314 Idem (N.T)
315 ENGELS, Friedrich. A Situação da Classe Trabalhadora na Inglaterra. São Paulo: Boitempo,

2008. (N.T)
J. V. Stalin 815

Engels fala aqui de dialetos, não de línguas, percebendo plenamente que, sendo
um desdobramento da língua nacional, um dialeto não pode suplantar a língua
nacional. Mas, aparentemente, esses camaradas consideram a existência de uma
diferença entre uma língua e um dialeto sem entusiasmo particular.
É óbvio que a citação é inadequada, porque Engels aqui não fala de “línguas
de classe”, mas principalmente de pensamentos de classe, ideais, costumes, prin-
cípios morais, religiosos, políticos. É perfeitamente verdade que os pensamentos,
ideais, costumes, princípios morais, religiosos e políticos dos burgueses e prole-
tários são diretamente antitéticos. Mas o que isso tem a ver com uma língua
nacional, ou o “caráter de classe” da linguagem? A existência de antagonismos
de classe na sociedade pode servir como argumento a favor do “caráter de classe”
da linguagem, ou contra a necessidade de uma única língua nacional? O mar-
xismo diz que uma língua comum é um dos principais destinos de uma nação,
embora sabendo muito bem que há antagonismos de classe dentro da nação. Os
camaradas a que nos referimos reconhecem essa tese marxista?
Referências são feitas a Lafargue316 e se diz que em seu panfleto A Língua
Francesa Antes e Depois da Revolução ele reconhece o “caráter de classe” da lingua-
gem e nega a necessidade de uma língua nacional comum a todo o povo. Isso não
é verdade. Lafargue realmente fala de uma “linguagem nobre” ou “aristocrática”
e dos “jargões” de vários estratos da sociedade. Mas esses camaradas esquecem
que Lafargue, que não estava interessado na diferença entre línguas e jargões
e se referia aos dialetos agora como “línguas artificiais”, agora como “jargões”,
definitivamente diz neste panfleto que “a linguagem artificial que distinguia a
aristocracia . . . surgiu da linguagem comum a todo o povo, que era falada tanto
por burgueses quanto por artesãos, pela cidade e pelo interior.”
Consequentemente, Lafargue reconhece a existência e a necessidade de uma
linguagem comum de todo o povo, e percebe plenamente que a “linguagem aris-
tocrática” e outros dialetos e jargões são subordinados e dependentes da lingua-
gem comum a todo o povo.
Acontece que a referência a Lafargue passa ao largo do problema.
Refere-se ao fato de que, em algum momento, na Inglaterra, os senhores feu-
dais falavam “durante séculos” em francês, enquanto o povo inglês falava inglês,
e isso é alegado ser um argumento a favor do “caráter de classe” da língua e
contra a necessidade de uma língua comum a todo o povo. Mas isso não é um
argumento, é uma anedota. Em primeiro lugar, nem todos os senhores feudais
falavam francês naquela época, mas apenas um pequeno estrato superior de se-
nhores feudais ingleses ligados à corte e às sedes do condado. Em segundo lugar,
não era uma “língua de classe” que eles falavam, mas a linguagem comum a todos
os franceses. Em terceiro lugar, sabemos que, com o passar do tempo, essa moda
francesa desapareceu sem deixar rastros, cedendo lugar à língua inglesa comum
a todo o povo. Esses camaradas acham que os senhores feudais ingleses “durante
séculos” mantiveram relações com o povo inglês através de intérpretes, que não
usavam a língua inglesa, que não havia língua comum a todos os ingleses naquela

316Paul Lafargue (1842-1911), conhecido ativista dos movimentos operários franceses e internacio-
nais, propagandista marxista e publicitário. Ele foi um dos fundadores do Partido dos Trabalhadores
Franceses, estudante e camarada de armas de Marx e Engels e marido da filha de Marx, Laura. (N.T)
816 Obras Escolhidas

época, e que a língua francesa na Inglaterra era então algo mais do que a língua
da alta sociedade, corrente apenas no círculo restrito da alta aristocracia inglesa?
Como pode-se negar a existência e a necessidade de uma linguagem comum a
todo o povo com base em “argumentos” anedóticos como esses?
Houve um tempo em que aristocratas russos na corte do tsar e na alta soci-
edade também fizeram uma moda da língua francesa. Eles se orgulhavam do
fato de que quando falavam russo muitas vezes caíam no francês, que só podiam
falar russo com sotaque francês. Isso significa que não havia uma língua russa
comum a todo o povo naquela época na Rússia, que uma linguagem comum a
todo o povo era uma ficção e “línguas de classe” uma realidade?
Nossos camaradas estão aqui cometendo pelo menos dois erros.
O primeiro erro é que eles confundem linguagem com superestrutura. Eles
acham que, como a superestrutura tem um caráter de classe, a linguagem tam-
bém deve ser uma linguagem de classe, e não uma linguagem comum a todo
o povo. Mas eu já disse que a linguagem e a superestrutura são dois conceitos
diferentes e que um marxista não deve confundi-los.
O segundo erro desses camaradas é que eles concebem a oposição dos inte-
resses da burguesia e do proletariado, a feroz luta de classes entre eles, como
significando a desintegração da sociedade, como uma ruptura de todos os laços
entre as classes hostis. Eles acreditam que, uma vez que a sociedade se desinte-
grou e não há mais uma sociedade única, mas apenas classes, uma única língua
da sociedade, uma língua nacional, é desnecessária. Se a sociedade se desinte-
grou e não há mais uma linguagem comum a todo o povo, uma língua nacional,
o que resta? Restam classes e “línguas de classe”. Naturalmente, cada “lingua-
gem de classe” terá sua gramática de “classe” – uma gramática “proletária” ou
uma gramática “burguesa”. É verdade que tais gramáticas não existem em lu-
gar nenhum. Mas isso não preocupa esses camaradas: eles acreditam que tais
gramáticas aparecerão no devido tempo.
Uma vez houve “marxistas” em nosso país que afirmaram que os caminhos
deixados para nós após a Revolução de Outubro eram caminhos burgueses, que
seria impróprio para nós marxistas usá-los, que eles deveriam ser destruídos e
novos caminhos “proletários” construídas. Por isso, foram apelidados de “troglo-
ditas”.
Não é preciso dizer que uma visão tão primitiva-anarquista da sociedade, das
classes, da linguagem não tem nada em comum com o marxismo. Mas, sem
dúvida, existe e continua a prevalecer nas mentes de certos de nossos camaradas
confusos.
É claro que é errado dizer que, devido à existência de uma luta de classes
feroz, a sociedade se dividiu em classes que não estão mais economicamente co-
nectadas umas com as outras em sociedade. Pelo contrário, enquanto o capita-
lismo existir, os burgueses e os proletários estarão unidos por cada fio econômico
como partes de uma única sociedade capitalista. Os burgueses não podem viver
e enriquecer a menos que tenham trabalhadores assalariados ao seu comando;
os proletários não podem sobreviver a menos que eles se aluguem para os capita-
listas. Se todos os laços econômicos entre eles cessassem, significaria a cessação
de toda a produção, e a cessação de toda a produção significaria a desgraça da
J. V. Stalin 817

sociedade, a desgraça das próprias classes. Naturalmente, nenhuma classe quer


incorrer em autodestruição. Consequentemente, por mais acentuada que seja a
luta de classes, ela não pode levar à desintegração da sociedade. Apenas a igno-
rância do marxismo e o completo fracasso em entender a natureza da linguagem
poderiam ter sugerido a alguns de nossos camaradas o conto de fadas sobre a
desintegração da sociedade, sobre línguas “de classe” e gramáticas de “classe”.
Referência ainda é feita a Lenin, e aponta-se que Lenin reconheceu a exis-
tência de duas culturas sob o capitalismo – burguesa e proletária – e que o slogan
da cultura nacional sob o capitalismo é um slogan nacionalista. Tudo isso é ver-
dade e Lenin está absolutamente correto aqui. Mas o que isso tem a ver com o
“caráter de classe” da linguagem? Quando esses camaradas se referem ao que
Lenin disse sobre duas culturas sob o capitalismo, é evidentemente com a ideia
de sugerir ao leitor que a existência de duas culturas, burguesa e proletária, na
sociedade significa que também deve haver duas línguas, na medida em que a
linguagem está ligada à cultura – e, consequentemente, que Lenin nega a neces-
sidade de uma única língua nacional, e, consequentemente, que Lenin acredita
em línguas de “classe”. O erro que esses camaradas cometem aqui é que eles
identificam e confundem linguagem com cultura. Mas cultura e linguagem são
duas coisas diferentes. A cultura pode ser burguesa ou socialista, mas a lingua-
gem, como meio de relação, é sempre uma linguagem comum a todo o povo e
pode servir tanto a cultura burguesa quanto a socialista. Não é fato que o russo,
o ucraniano, as línguas uzbeques estão agora servindo a cultura socialista dessas
nações tão bem quanto serviram suas culturas burguesas antes da Revolução de
Outubro? Consequentemente, esses camaradas estão profundamente enganados
quando afirmam que a existência de duas culturas diferentes leva à formação de
duas línguas diferentes e à negação da necessidade de uma única língua.
Quando Lenin falou de duas culturas, ele o fez precisamente a partir da tese
de que a existência de duas culturas não pode dar à negação de uma única língua
e à formação de duas línguas, que deve haver uma única língua. Quando os
bundistas317 acusaram Lenin de negar a necessidade de uma língua nacional e
de considerar a cultura como “não nacional”, Lenin, como sabemos, protestou
vigorosamente e declarou que estava lutando contra a cultura burguesa, e não
contra as línguas nacionais, a necessidade da qual ele considerava indiscutível. É
estranho que alguns de nossos camaradas devem seguir os passos dos bundistas.
Quanto a uma única língua, a necessidade da qual Lenin é acusado de negar,
seria bom prestar atenção às seguintes palavras do próprio Lenin:
“A linguagem é o meio mais importante da relação humana. A unidade da linguagem
e seu desenvolvimento sem obstáculos formam uma das condições mais importantes para
relações comerciais genuinamente livres e extensas adequadas ao capitalismo moderno,

317Bund, União Geral dos Trabalhadores Judeus da Lituânia, Polônia e Rússia, foi uma organização
fundada em um congresso realizado em Vilna em outubro de 1897, que trabalhou principalmente
entre os artesãos judeus. No Primeiro Congresso do Partido Operário Social-Democrata russo em
1898, o Bund juntou-se ao POSDR como “uma organização autônoma independente preocupada
apenas com os problemas especiais do proletariado judeu”. Uma vez que se juntou ao Partido, no
entanto, ele propagou o nacionalismo e o separatismo no movimento da classe trabalhadora russa. O
ponto de vista burguês-nacionalista foi severamente repudiado pelo jornal Iskra fundado por Lenin.
818 Obras Escolhidas

para um agrupamento livre e amplo da população em todas as suas classes separadas.”318


Segue-se que nossos respeitados camaradas deturparam as opiniões de Lenin.
A referência, por último, é feita a Stalin. A passagem de Stalin é citada que
diz que “a burguesia e seus partidos nacionalistas foram e permanecem neste pe-
ríodo a principal força de direção dessas nações”.319 Isso é verdade. A burguesia
e seu partido nacionalista realmente dirigem a cultura burguesa, assim como o
proletariado e seu partido internacionalista direcionam a cultura proletária. Mas
o que isso tem a ver com o “caráter de classe” da linguagem? Esses camaradas
não sabem que a língua nacional é uma forma de cultura nacional, que uma lín-
gua nacional pode servir tanto à cultura burguesa quanto à socialista? Nossos
camaradas desconhecem a conhecida fórmula dos marxistas de que as atuais cul-
turas russa, ucraniana, bielorrussa e outras culturas são socialistas em conteúdo
e nacionais em forma, ou seja, na linguagem? Eles concordam com esta fórmula
marxista?
O erro que nossos camaradas cometem aqui é que eles não veem a diferença
entre cultura e linguagem e não entendem que a cultura muda de conteúdo a
cada novo período no desenvolvimento da sociedade, enquanto a linguagem per-
manece basicamente a mesma em vários períodos, servindo igualmente tanto a
nova cultura quanto a antiga.
Daí: a) A linguagem, como meio de relação, sempre foi e continua sendo a única
linguagem de uma sociedade, comum a todos os seus membros; b) A existência de dialetos e
jargões não nega, mas confirma a existência de uma linguagem comum a todo o povo dado,
dos quais são desdobramentos e aos quais estão subordinados; c) A fórmula do “caráter de
classe” da linguagem é errada e não marxista.
PERGUNTA: Quais são as características da linguagem?
RESPOSTA: A linguagem é um daqueles fenômenos sociais que operam ao
longo da existência de uma sociedade. Ela surge e se desenvolve com a ascensão
e desenvolvimento de uma sociedade. Morre quando a sociedade morre. Fora da
sociedade, não há linguagem. Assim, a linguagem e suas leis de desenvolvimento
só podem ser compreendidas se estudadas em conexão inseparável com a história
da sociedade, com a história das pessoas a quem pertence a língua em estudo e
que são seus criadores e repositórios.
A linguagem é um meio, um instrumento com a ajuda do qual as pessoas se
comunicam umas com as outras, trocam pensamentos e se entendem. Estando
diretamente ligada ao pensamento, a linguagem registra e opera em palavras,
e as palavras combinadas em frases, os resultados do processo de pensamento
e conquistas da atividade cognitiva do homem, assim possibilitando a troca de
pensamentos na sociedade humana.
A troca de pensamentos é uma necessidade constante e vital, pois sem ela, é
impossível coordenar as ações conjuntas das pessoas na luta contra as forças da
natureza, na luta para produzir os valores materiais necessários; sem ela, é impos-
sível garantir o sucesso da atividade produtiva da sociedade e, portanto, a própria
existência da produção social torna-se impossível. Consequentemente, sem uma
318 LENIN, Vladimir. The right of nations to self-determination. In: LENIN, Vladimir. Collected
Works. Vol 20. Moscou: Progress Publishers, 1972, p. 393-454 (N.T.)
319 STALIN, J. V. O Marxismo e a Questão Nacional. São Paulo: Edições Nova Cultura, 2019 (N.T.)
J. V. Stalin 819

linguagem entendida por uma sociedade e comum a todos os seus membros, a


sociedade deve deixar de produzir, deve se desintegrar e deixar de existir como
sociedade. Nesse sentido, a linguagem, embora seja um meio de relação, é, ao
mesmo tempo, um instrumento de luta e desenvolvimento da sociedade.
Como sabemos, todas as palavras em uma língua tomada em conjunto consti-
tuem o que é conhecido como seu vocabulário. A principal coisa no vocabulário
de uma língua é seu estoque básico de palavras, que inclui também todas as pa-
lavras raiz, como seu núcleo. É muito menos extenso do que o vocabulário da
língua, mas persiste por muito tempo, por séculos, e fornece à linguagem uma
base para a formação de novas palavras. O vocabulário reflete o estado da língua:
quanto mais rico e mais diversificado o vocabulário, mais rica e mais desenvolvida
a língua.
No entanto, por si só, o vocabulário não constitui a língua – é sim o mate-
rial de construção da língua. Assim como nas obras, os materiais de construção
não constituem o edifício, embora este último não possa ser construído sem eles,
assim como o vocabulário de uma língua não constitui a língua em si, embora ne-
nhuma língua seja concebível sem ela. Mas o vocabulário de uma língua assume
uma tremenda importância quando ele se encontra sob o controle da gramática,
que define as regras que regem a modificação das palavras e a combinação de
palavras em frases, e assim faz da linguagem uma função coerente e significativa.
Gramática (morfologia, sintaxe) é a coleção de regras que regem a modificação
das palavras e sua combinação em frases. É, portanto, graças à gramática que
se torna possível para a linguagem investir os pensamentos do homem em um
integumento linguístico material.
A característica distintiva da gramática é que ela dá regras para a modificação
das palavras não em referência a palavras concretas, mas às palavras em geral,
não tomadas concretamente; que dá regras para a formação de sentenças não
em referência a sentenças concretas particulares – com, digamos, um assunto
concreto, um predicado concreto, etc.- mas a todas as sentenças em geral, inde-
pendentemente da forma concreta de qualquer sentença em particular. Assim,
abstraindo-se, no que diz respeito às palavras e frases, a partir do particular e con-
creto, a gramática pega o que é comum e básico na modificação das palavras e sua
combinação em frases e a constrói em regras gramaticais, leis gramaticais. A gra-
mática é o resultado de um processo de abstração realizado pela mente humana
durante um longo período de tempo; é uma indicação da tremenda realização
do pensamento humano.
Nesse sentido, a gramática se assemelha à geometria, que ao dar suas leis abs-
trai a si mesma de objetos concretos, considerando objetos como corpos desprovi-
dos do concreto, e definindo as relações entre eles não como as relações concretas
de objetos concretos, mas como as relações dos corpos em geral, desprovidas de
toda a concretude.
Ao contrário da superestrutura, que está ligada à produção não diretamente,
mas através da economia, a linguagem está diretamente ligada à atividade produ-
tiva do homem, bem como com todas as suas outras atividades em todas as suas
esferas de trabalho, sem exceção. É por isso que o vocabulário de uma língua,
sendo o mais sensível à mudança, está em um estado de mudança quase cons-
820 Obras Escolhidas

tante, e, ao contrário da superestrutura, a linguagem não precisa esperar até que


a base seja eliminada, mas faz mudanças em seu vocabulário antes que a base seja
eliminada e independentemente do estado da base.
No entanto, o vocabulário de uma língua não muda na forma como a superes-
trutura muda, ou seja, abolindo o antigo e construindo algo novo, mas repondo
o vocabulário existente com novas palavras que surgem com as mudanças no sis-
tema social, com o desenvolvimento da produção, da cultura, da ciência, etc.
Além disso, embora um certo número de palavras obsoletas geralmente aban-
done o vocabulário de uma língua, um número muito maior de novas palavras é
adicionado. Quanto ao estoque básico de palavras, ele é preservado em todos os
seus fundamentos e é usado como base para o vocabulário da língua.
Isso é bastante compreensível. Não há necessidade de destruir o estoque bá-
sico de palavras quando ele pode ser efetivamente utilizado ao longo de vários
períodos históricos; para não falar do fato de que, sendo impossível criar um
novo estoque básico de palavras em pouco tempo, a destruição do estoque bá-
sico de palavras acumulado no decorrer dos séculos resultaria em paralisia da
linguagem, na completa ruptura da relação entre as pessoas.
O sistema gramatical de uma linguagem muda ainda mais lentamente do que
seu estoque básico de palavras. Elaborado no decorrer das épocas, e tendo se
tornado parte da carne e do sangue da linguagem, o sistema gramatical muda
ainda mais lentamente do que o estoque básico de palavras. Com o lapso de
tempo, ele, é claro, passa por mudanças, se torna mais aperfeiçoado, melhora
suas regras, torna-as mais específicas e adquire novas regras; mas os fundamentos
do sistema gramatical são preservados por muito tempo, uma vez que, como a
história mostra, eles são capazes de servir a sociedade efetivamente através de
uma sucessão de épocas.
Assim, o sistema gramatical e o estoque básico de palavras constituem a base
da linguagem, a essência de seu caráter específico.
A história mostra que as línguas possuem grande estabilidade e um tremendo
poder de resistência à assimilação forçada. Alguns historiadores, em vez de ex-
plicar esse fenômeno, limitam-se a expressar sua surpresa com ele. Mas não há
razão para surpresas. As línguas devem sua estabilidade a estabilidade de seus
sistemas gramaticais e estoques básicos de palavras. Os assimiladores turcos se
esforçaram por centenas de anos para mutilar, quebrar e destruir as línguas dos
povos dos Balcãs. Durante esse período, o vocabulário das línguas dos Balcãs
sofreu uma mudança considerável; algumas palavras e expressões turcas foram
absorvidas; havia “convergências” e “divergências”. No entanto, as línguas dos
Balcãs mantiveram-se próprias e sobreviveram. Porque? Porque seus sistemas
gramaticais e estoques básicos de palavras estavam em seu cerne preservados.
Vem de tudo isso que uma língua, sua estrutura, não pode ser considerada
como o produto de uma época. A estrutura de uma linguagem, seu sistema
gramatical e o estoque básico de palavras é o produto de uma série de épocas.
Podemos supor que os rudimentos da linguagem moderna já existiam na an-
tiguidade primeva, antes da época da escravidão. Era uma linguagem bastante
simples, com um estoque muito escasso de palavras, mas com um sistema grama-
tical próprio - verdade, primitivo, mas um sistema gramatical, no entanto.
J. V. Stalin 821

O desenvolvimento da produção, o aparecimento das classes, a introdução da


escrita, a ascensão do Estado, que precisava de uma correspondência mais ou
menos bem regulamentada para sua administração, o desenvolvimento do co-
mércio, que precisava de uma correspondência ainda mais bem regulamentada,
o aparecimento da imprensa, o desenvolvimento da literatura – tudo isso cau-
sou grandes mudanças no desenvolvimento da linguagem. Durante este tempo,
tribos e nacionalidades se separaram e se espalharam, misturadas e intercaladas;
mais tarde surgiram línguas e estados nacionais, revoluções ocorreram e sistemas
sociais antigos foram substituídos por novos. Tudo isso causou mudanças ainda
maiores na linguagem e seu desenvolvimento.
No entanto, seria um erro profundo pensar que a linguagem se desenvolveu
da mesma forma como a superestrutura se desenvolveu – pela destruição do que
existia e pela construção de algo novo. Na verdade, as línguas não se desenvol-
veram pela destruição das línguas existentes e pela criação de novas, mas por
estender e aperfeiçoar os elementos básicos das línguas existentes. E a transição
da linguagem de uma qualidade para outra não tomou a forma de uma explosão,
da destruição a um golpe do antigo e da criação do novo, mas do acúmulo gra-
dual e duradouro dos elementos da nova qualidade, da nova estrutura linguística
e da morte gradual dos elementos da velha qualidade.
Diz-se que a teoria de que as línguas se desenvolvem por estágios é uma teoria
marxista, uma vez que reconhece a necessidade de explosões súbitas como condi-
ção para a transição de uma linguagem de uma qualidade antiga para uma nova.
Isso é, naturalmente, falso, pois é difícil encontrar algo parecido com marxismo
nesta teoria.
E se a teoria dos estágios realmente reconhece explosões súbitas na história
do desenvolvimento de línguas, tanto pior para essa teoria. O marxismo não re-
conhece explosões súbitas no desenvolvimento de línguas, a morte súbita de uma
língua existente e a ereção súbita de uma nova língua. Lafargue estava errado
quando falou de uma “revolução linguística repentina que ocorreu entre 1789 e
1794” na França (ver o panfleto de Lafargue A Língua Francesa Antes e Depois da
Revolução). Não houve revolução linguística, muito menos repentina, na França
àquela época. É verdade, durante esse período o vocabulário da língua francesa
foi reposto com novas palavras e expressões, um certo número de palavras ob-
soletas caiu de uso e o significado de certas palavras mudou – mas isso foi tudo.
Mudanças dessa natureza, no entanto, não determinam o destino de uma lín-
gua. A principal coisa em uma língua é seu sistema gramatical e vocabulário
básico de palavras. Mas longe de desaparecer no período da revolução burguesa
francesa, o sistema gramatical e o estoque básico de palavras da língua francesa
foram preservados sem mudanças substanciais, e não só foram preservados, mas
continuam a existir na língua francesa de hoje. Não preciso dizer que cinco ou
seis anos é um período ridiculamente pequeno para a eliminação de uma língua
existente e a construção de uma nova língua nacional (“uma revolução linguística
repentina”!) – séculos são necessários para isso.
O marxismo sustenta que a transição de uma linguagem de uma qualidade
antiga para uma nova não ocorre por meio de uma explosão, da destruição de
uma linguagem existente e da criação de uma nova, mas pelo acúmulo gradual
822 Obras Escolhidas

dos elementos da nova qualidade, e, portanto, pela morte gradual dos elementos
da velha qualidade.
Deve-se dizer em geral em benefício dos camaradas que têm uma paixão por
explosões que a lei de transição de uma qualidade antiga para uma nova por meio
de uma explosão é inaplicável não apenas para a história do desenvolvimento das
línguas; nem sempre é aplicável a outros fenômenos sociais de caráter básico ou
superestrutural. Aplica-se à necessidade de uma sociedade dividida em classes
hostis. Mas isso não se aplica necessariamente a uma sociedade que não tem
classes hostis. Em um período de oito a dez anos, fizemos uma transição na agri-
cultura do nosso país do sistema burguês, individual-camponês, para o sistema
socialista, de fazenda coletiva. Esta foi uma revolução que eliminou o antigo sis-
tema econômico burguês no campo e criou um novo sistema socialista. Mas essa
revolução não ocorreu por meio de uma explosão, ou seja, pela derrubada do
poder governamental existente e pela criação de um novo poder, mas por uma
transição gradual do antigo sistema burguês no campo para um novo sistema.
E foi possível fazer isso porque foi uma revolução de cima, porque a revolução
foi realizada por iniciativa do poder existente com o apoio da maior parte dos
camponeses.
Diz-se que os numerosos casos de encontros linguísticos na história passada
fornecem razão para acreditar que quando as línguas cruzam uma nova língua é
formada por meio de uma explosão, por uma transição repentina de uma quali-
dade antiga para uma nova. Isso é bastante errado.
O encontro linguístico não pode ser considerado o único impacto de um golpe
decisivo que produz seus resultados dentro de alguns anos. O encontro linguís-
tico é um processo prolongado que continua por centenas de anos. Não pode
haver, portanto, nenhuma questão de explosão aqui.
Ademais, seria muito errado pensar que o encontro de duas línguas resulta
em uma nova terceira língua que não se assemelha a nenhuma das línguas cruza-
das e difere qualitativamente de ambas. Na verdade, uma das línguas geralmente
emerge vitoriosa do encontro e mantém seu sistema gramatical e seu estoque bá-
sico de palavras e continua a desenvolver-se de acordo com as leis inerentes ao seu
desenvolvimento, enquanto a outra língua gradualmente perde sua qualidade e
gradualmente morre.
Consequentemente, um encontro não resulta em alguma nova terceira lín-
gua; uma das línguas persiste, mantém seu sistema gramatical e estoque básico
de palavras e é capaz de desenvolver de acordo com as leis inerentes ao seu de-
senvolvimento.
É verdade que, no processo, o vocabulário da língua vitoriosa é um pouco
enriquecido a partir da linguagem derrotada, mas isso a fortalece ao invés de
enfraquecê-la.
Foi o que aconteceu, por exemplo, com a língua russa, com a qual, no curso
do seu desenvolvimento histórico cruzou com as línguas de vários outros povos e
que sempre emergiu vitoriosa.
Claro, no processo o vocabulário da língua russa foi ampliado em detrimento
dos vocabulários das outras línguas, mas longe de enfraquecer, isso enriqueceu
e fortaleceu a língua russa.
J. V. Stalin 823

Quanto à individualidade nacional específica da língua russa, ela não sofreu


nem um pouco, porque a língua russa preservou seu sistema gramatical e o esto-
que básico de palavras e continuou a avançar e aperfeiçoar-se de acordo com as
leis inerentes ao seu desenvolvimento.
Não há dúvida de que a teoria dos cruzamentos tem pouco ou nenhum valor
para a linguística soviética. Se é verdade que a principal tarefa da linguística é
estudar as leis inerentes ao desenvolvimento da linguagem, é preciso admitir que
a teoria do cruzamento nem sequer estabelece essa tarefa, muito menos a realiza
– ela simplesmente não a nota ou não a entende.
PERGUNTA: O Pravda agiu corretamente ao iniciar uma discussão aberta sobre
problemas de linguística?
RESPOSTA: Sim, ele agiu.
Em que linhas os problemas de linguística serão resolvidos, ficará claro na
conclusão da discussão. Mas pode-se dizer já que a discussão tem sido muito útil.
Trouxe à tona, em primeiro lugar, que em corpos linguísticos tanto no centro
quanto nas repúblicas prevaleceu um regime que é alheio à ciência e aos homens
da ciência. A menor crítica ao estado das coisas na linguística soviética, mesmo
a tentativa mais tímida de criticar a chamada “nova doutrina” na linguística, foi
perseguida e suprimida pelos principais círculos linguísticos. Trabalhadores vali-
osos e pesquisadores em linguística foram demitidos de seus postos ou rebaixados
por criticarem a herança de N. Y. Marr ou expressarem a menor desaprovação
de seus ensinamentos. Estudiosos linguísticos foram nomeados para cargos de
liderança não por seus méritos, mas por causa de sua aceitação incólume das
teorias de N. Y. Marr.
É geralmente reconhecido que nenhuma ciência pode se desenvolver e flores-
cer sem uma batalha de opiniões, sem liberdade de crítica. Mas essa regra geral-
mente reconhecida foi ignorada e desrespeitada da forma mais sem cerimônia.
Surgiu um grupo próximo de líderes infalíveis, que, tendo se assegurado contra
qualquer possível crítica, tornaram-se uma lei para si mesmos e fizeram o que
quisessem.
Para dar um exemplo: o chamado “Curso Baku” (palestras ministradas por
N. Y. Marr em Baku), que o próprio autor havia rejeitado e proibido a republi-
cação, foi republicado, no entanto, por ordem desta casta de líderes (o camarada
Meshchaninov os chama de “discípulos” de N. Y. Marr) e incluído sem qual-
quer reserva na lista de livros-texto recomendados aos alunos. Isso significa que
os alunos foram enganados por um “Curso” rejeitado pelo próprio autor sendo
sugerido a eles como um livro confiável. Se eu não estivesse convencido da in-
tegridade do camarada Meshchaninov e dos outros líderes linguísticos, eu diria
que tal conduta equivale a sabotagem.
Como isso pode ter acontecido? Isso aconteceu porque o regime de Arakche-
yev320 estabelecido na linguística cultiva irresponsabilidade e incentiva tais ações
arbitrárias.
320A expressão russa provém do regime de Arakcheyev, nomeado em homenagem ao político reacio-
nário Conde Arakcheyev, foi um estado policial ditatorial desenfreado, despotismo de um senhor da
guerra e um governo brutal imposto na Rússia no primeiro quarto do século XIX. Stalin usa o termo
aqui para indicar a dominação predominante de Marr nos círculos linguísticos soviéticos (N.T.)
824 Obras Escolhidas

A discussão provou ser muito útil antes de tudo porque trouxe este regime de
Arakcheyev à luz do dia e esmagou-o em cacos.
Mas a utilidade da discussão não termina aí. Ele não só esmagou o antigo
regime da linguística como também trouxe à tona a incrível confusão de ideias
sobre questões cardeais da linguística que prevalece entre os círculos principais
neste ramo da ciência. Até que a discussão começasse, os “discípulos” de N. Y.
Marr mantiveram o silêncio e iludiram sobre o estado insatisfatório de coisas na
linguística. Mas quando a discussão começou o silêncio tornou-se impossível, e
eles foram obrigados a expressar sua opinião na imprensa. E o que encontra-
mos? Acontece que nos ensinamentos de N. Y. Marr há uma série de defeitos,
erros, problemas mal definidos e proposições esboçadas. Por que, pergunta-se,
os “discípulos” de N. Y. Marr começaram a falar sobre isso somente agora, depois
que a discussão começou? Por que não perceberam isso antes? Por que eles não
falaram sobre isso no devido tempo, aberta e honestamente, como deve ser com
os cientistas?
Tendo admitido “alguns” erros de N. Y. Marr, seus “discípulos”, parece, pen-
sam que a linguística soviética só pode ser avançada com base em uma versão “re-
tificada” da teoria de N. Y. Marr, que eles consideram marxista. Não, salve-nos
do “marxismo” de N. Y. Marr! N. Y. Marr realmente queria ser, e se esforçou
para ser, um marxista, mas ele não conseguiu se tornar um. Ele não passava
de um simplificador e vulgarizador do marxismo, semelhante aos “proletculis-
tas”321 ou aos “rappistas”322 .
N. Y. Marr introduziu na linguística a fórmula incorreta e não marxista de
que a linguagem é uma superestrutura e se colocando em uma confusão colocou
a linguística em uma confusão. A linguística soviética não pode avançar com base
em uma fórmula incorreta.
N. Y. Marr introduziu na linguística outra fórmula incorreta e não marxista,
em relação ao “caráter de classe” da linguagem, e entrou em confusão e colocou a
linguística em uma confusão. A linguística soviética não pode avançar com base
em uma fórmula incorreta que é contrária a todo o curso da história dos povos e
línguas.
N. Y. Marr introduziu na linguística um tom imodesto, arrogante e falastrão,
estranho ao marxismo que tende a uma negação ousada e espontânea de tudo
feito em linguística antes de N. Y. Marr.
N. Y. Marr abusou do método comparativo-histórico de forma “idealista”. No
entanto, deve-se dizer que, apesar de suas sérias deficiências, o método comparativo-
histórico é, no entanto, melhor do que a análise realmente idealista de quatro
elementos de N. Y. Marr323 , porque o primeiro dá um estímulo ao trabalho, ao
estudo de línguas, enquanto o último só dá um estímulo para refestelar-se em
sua poltrona e ler o futuro na xícara de chá dos quatro elementos celebrados.
321 Proletkult é a abreviatura da expressão russa “proletarskaya kultura” (пролетарская культура), que

significa “cultura proletária”. Foi um movimento literário surgido na Rússia em 1917. (N.T.)
322 Referência à RAPP (Российская ассоциация пролетарских писателей, РАПП) – Associação Russa

de Escritores Proletários. (N.T.)


323 Marr afirmava que a pronúncia da linguagem primitiva da humanidade evoluiu a partir somente

das quatro sílabas sal, ber, yon e rosh. Sobre Marr ver SÉRIOT, P. Un paradigme perdu: la linguis-
tique marriste, Cahiers de l’ILSL, Nº 20, Université de Lausanne: 2005 (N.T.)
J. V. Stalin 825

N. Y. Marr descontava todas as tentativas de estudar grupos (famílias) de lín-


guas, alegando que era uma manifestação da teoria da “proto-linguagem”324 . No
entanto, não se pode negar que a afinidade linguística de nações como as nações
eslavas, por exemplo, é inquestionável, e que um estudo da afinidade linguística
dessas nações pode ser de grande valor para a linguística no estudo das leis do
desenvolvimento da língua. A teoria da “proto-linguagem”, eu mal preciso dizer,
não tem nada a ver com a acusação de Marr.
Ao ouvir N. Y. Marr, e especialmente seus “discípulos”, pode-se pensar que
antes de N. Y. Marr não havia tal coisa como a ciência da linguagem, que a ciência
da linguagem apareceu com a “nova doutrina” de N. Y. Marr. Marx e Engels
eram muito mais modestos: eles sustentavam que seu materialismo dialético era
um produto do desenvolvimento das ciências, incluindo a filosofia, em períodos
anteriores.
Assim, a discussão foi útil também porque trouxe à tona deficiências ideoló-
gicas na linguística soviética.
Acho que quanto mais cedo nossa linguística se livrar dos erros de N. Y. Marr,
mais cedo será possível tirá-la de sua crise atual.
Eliminação do regime de Arakcheyev em linguística, rejeição dos erros de
N. Y. Marr, e a introdução do marxismo na linguística, na minha opinião, são
as maneiras pela qual a linguística soviética poderia ser colocada em uma base
sólida.

Pravda, 20 de junho de 1950

Sobre certos problemas de linguística, resposta


para a camarada E. Krasheninnikova

Camarada Krasheninnikova,
Estou respondendo suas perguntas.
PERGUNTA: Seu artigo mostra convincentemente que a linguagem não é
nem a base nem a superestrutura. Seria correto considerar a linguagem como
um fenômeno característico tanto da base quanto da superestrutura ou seria mais
correto considerar a linguagem como um fenômeno intermediário?
RESPOSTA: Claro, o caráter da linguagem, como fenômeno social, é aquela
característica comum inerente a todos os fenômenos sociais, incluindo a base e a
superestrutura, ou seja: serve à sociedade assim como a sociedade é servida por
todos os outros fenômenos sociais, incluindo a base e a superestrutura. Mas isso,
propriamente falando, esgota essa característica comum que é inerente a todos os
fenômenos sociais. Para além disso, importantes distinções se apresentam entre
fenômenos sociais.
A questão é que os fenômenos sociais têm, além dessa característica comum,
suas próprias características específicas que os distinguem uns dos outros e que
324A postulação de uma descrição plausível dos contornos desta protolíngua, através da observação
das similaridades e diferenças sistemáticas das línguas indo-europeias entre si, foi uma das grandes
realizações dos linguistas a partir do início do século XIX. (N.T.)
826 Obras Escolhidas

são de importância primária para a ciência. As características específicas da base


consistem em atender economicamente à sociedade. As características específi-
cas da superestrutura consistem em que ela atende a sociedade por meio de ideias
políticas, jurídicas, estéticas e outras e proporciona à sociedade correspondentes
instituições políticas, jurídicas e outras. Quais são então as características especí-
ficas da linguagem, distinguindo-a de outros fenômenos sociais? Elas consistem
no fato da linguagem servir à sociedade como meio de relação entre as pessoas,
como meio de troca de pensamentos na sociedade, como meio que permite que
as pessoas se entendam e coordenem o trabalho conjunto em todas as esferas da
atividade humana, tanto no âmbito da produção quanto no âmbito das relações
econômicas, tanto no âmbito da política quanto no âmbito da cultura, tanto na
vida social quanto na vida cotidiana. Essas características específicas são carac-
terísticas apenas da linguagem e precisamente por serem características apenas
da linguagem, a linguagem é objeto de estudo por uma ciência independente
– a linguística. Se não houvesse características tão específicas da linguagem, a
linguística perderia seu direito à existência independente.
Resumindo: a linguagem não pode ser incluída na categoria de base ou na
categoria de superestrutura.
Também não pode ser incluída na categoria de fenômenos “intermediários”
entre a base e a superestrutura, pois tais fenômenos “intermediários” não exis-
tem.
Mas talvez a linguagem pudesse ser incluída na categoria das forças produti-
vas da sociedade, na categoria, digamos, de instrumentos de produção? De fato,
existe uma certa analogia entre linguagem e instrumentos de produção: instru-
mentos de produção se manifestam, assim como a linguagem, uma espécie de
indiferença em relação às classes e podem servir igualmente diferentes classes da
sociedade, tanto antigas quanto novas. Essa circunstância fornece espaço para a
inclusão da linguagem na categoria de instrumentos de produção? Não, não é
assim.
Certa vez, N. Y. Marr, vendo que sua fórmula, “a linguagem é uma superes-
trutura na base” – encontrou objeções, decidiu “remodelá-la” e anunciou que “a
linguagem é um instrumento de produção”. N. Y. Marr estava certo em incluir a
linguagem na categoria de instrumentos de produção? Não, ele certamente não
estava.
A questão é que a semelhança entre linguagem e instrumentos de produção
termina com a analogia que acabei de mencionar. Mas, por outro lado, há uma
diferença radical entre linguagem e instrumentos de produção. Essa diferença
reside no fato de que, enquanto os instrumentos de produção produzem riqueza
material, a linguagem não produz nada ou “produz” palavras apenas. Para ser
mais claro, as pessoas que possuem instrumentos de produção podem produzir
riqueza material, mas essas mesmas pessoas, se possuem uma linguagem, mas não
instrumentos de produção, não podem produzir riqueza material. Não é difícil
ver que se a linguagem fosse capaz de produzir riqueza material, os tagarelas
seriam os homens mais ricos do mundo.
PERGUNTA: Marx e Engels definem a linguagem como “a realidade imedi-
J. V. Stalin 827

ata do pensamento”, como “prática, ... consciência real.”325 “Ideias”, diz Marx,
“não existem divorciadas da linguagem”. Em que medida, em sua opinião, a
linguística deve ocupar-se com o aspecto semântico da linguagem, semântica,
semasiologia histórica e estilística, ou deve ser a forma sozinha o objeto de lin-
guística?
RESPOSTA: A semântica (semasiologia) é um dos ramos importantes da lin-
guística. O aspecto semântico das palavras e expressões é de grande importância
no estudo da linguagem. Assim, a semântica (semasiologia) deve ter assegurado
seu devido lugar na linguística.
No entanto, ao trabalhar em problemas de semântica e na utilização de seus
dados, sua significância não deve de forma alguma ser superestimada e, ainda
menos, deve ser abusada. Tenho em mente certos filólogos que, tendo uma pai-
xão excessiva pela semântica, desconsideram a linguagem como “a realidade ime-
diata do pensamento” inseparavelmente ligada ao pensamento, divorciam o pen-
samento da linguagem e afirmam que a linguagem está superando sua época e
que é possível viver sem linguagem.
Ouça o que N. Y. Marr diz:
“A linguagem só existe na medida em que se expressa em sons; a ação do
pensamento ocorre também sem ser expressada.... A linguagem (falada) já co-
meçou a entregar suas funções às últimas invenções que estão conquistando es-
paço, enquanto o pensamento está em atualização, partindo de seus acúmulos
não utilizados no passado e suas novas aquisições e deve suplantar e substituir
totalmente a linguagem. A linguagem do futuro é o pensamento que estará se
desenvolvendo em técnica livre de matéria natural. Nenhuma língua, mesmo a
língua falada, que é ela toda mesma ligada aos padrões da natureza, será capaz
de resistir a ele” (ver Obras Selecionadas por N. Y. Marr).
Se interpretarmos essa baboseira de “magia do trabalho” em linguagem hu-
mana simples, pode-se concluir que:
a) N. Y. Marr divorcia o pensamento da linguagem; b) N. Y. Marr considera
que a comunicação entre as pessoas pode ser realizada sem linguagem, com a
ajuda do próprio pensamento, que está livre da “matéria natural” da linguagem,
livre dos “padrões da natureza”; c) divorciando-se o pensamento da linguagem
e “tendo libertado” da “matéria natural” da linguagem, N. Y. Marr pousa no
pântano do idealismo.
Diz-se que os pensamentos surgem na mente do homem antes de serem ex-
pressos na fala, que surgem sem material linguístico, sem integumento linguís-
tico, em, digamos, uma forma nua. Mas isso é absolutamente errado. Quaisquer
que sejam os pensamentos que surgem na mente humana e em qualquer mo-
mento, eles podem surgir e existir apenas com base no material linguístico, com
base em termos e frases da linguagem. Pensamentos nus, livres do material lin-
guístico, livres da “matéria natural” da linguagem, não existem. “A linguagem é
a realidade imediata do pensamento” (Marx). A realidade do pensamento se ma-
nifesta na linguagem. Só os idealistas podem falar de pensar não estar conectado
com “a questão natural” da linguagem, de pensar sem linguagem.

325 MARX, Karl; ENGELS, Friedrich. A Ideologia Alemã. São Paulo: Boitempo, 2007.
828 Obras Escolhidas

Resumindo: a superestimação e o abuso da semântica levaram N. Y. Marr ao


idealismo.
Consequentemente, se a semântica (semasiologia) é salvaguardada contra exa-
geros e abusos do tipo cometidos por N. Y. Marr e alguns de seus “discípulos”, a
semântica pode ser de grande benefício para a linguística.
PERGUNTA: Você diz com justiça que as ideias, conceitos, costumes e princí-
pios morais da burguesia e do proletariado são diretamente antitéticos. O caráter
de classe desses fenômenos é certamente refletido no aspecto semântico da lin-
guagem (e às vezes em sua forma – no vocabulário – como é corretamente apon-
tado em seu artigo). Ao analisar o material linguístico concreto e, em primeiro
lugar, o aspecto semântico da linguagem, podemos falar da essência de classe
dos conceitos expressos pela linguagem, particularmente nos casos em que a lin-
guagem expressa é não só o pensamento do homem, mas também sua atitude
em relação à realidade, onde sua afinidade de classe se manifesta com especial
clareza?
RESPOSTA: Colocando-o mais brevemente, você quer saber se as classes in-
fluenciam a linguagem, se elas introduzem na linguagem suas palavras e expres-
sões específicas, se há casos em que as pessoas anexam um significado diferente
a uma e a mesma palavra ou expressão dependendo de sua afinidade de classe?
Sim, as classes influenciam a linguagem, introduzem na linguagem suas pró-
prias palavras e expressões específicas e às vezes entendem uma mesma palavra
ou expressão de forma diferente. Não há dúvida sobre isso.
No entanto, não segue que palavras e expressões específicas, bem como a di-
ferença na semântica, possam ser de grande importância para o desenvolvimento
de uma única linguagem comum a todo o povo, que são capazes de prejudicar
seu significado ou de mudar seu caráter.
Em primeiro lugar, tais palavras e expressões específicas, bem como casos de
diferença na semântica, são tão poucos na linguagem que dificilmente compõem
um por cento de todo o material linguístico. Consequentemente, toda a massa
avassaladora de palavras e expressões, bem como sua semântica, são comuns a
todas as classes da sociedade.
Em segundo lugar, palavras e expressões específicas com um toque de classe
são usadas na fala não de acordo com regras de algum tipo de gramática de
“classe”, que não existe, mas de acordo com as regras gramaticais da linguagem
existente comuns a todo o povo.
Assim, a existência de palavras e expressões específicas e o fato das diferen-
ças na semântica da linguagem não refutam, mas, pelo contrário, confirmam a
existência e a necessidade de uma única linguagem comum a todo o povo.
PERGUNTA: Em seu artigo você avalia corretamente Marr como um vulga-
rizador do marxismo. Isso significa que os linguistas, incluindo nós, os jovens
linguistas, devemos rejeitar toda a herança linguística de Marr, que ao mesmo
tempo tem a seu crédito uma série de valiosas pesquisas linguísticas (camara-
das Chikobava, Sanzheyev e outros escreveram sobre elas durante a discussão)?
Aproximando-se de Marr criticamente, não podemos tirar dele o que é útil e
valioso?
J. V. Stalin 829

RESPOSTA: É claro que as obras de N. Y. Marr não consistem apenas em


erros. N. Y. Marr cometeu erros muito grosseiros quando introduziu elementos
do marxismo de forma distorcida na linguística, quando tentou criar uma teoria
independente da linguagem. Mas N. Y. Marr tem certas obras boas e habilmente
escritas, nas quais ele, esquecendo suas alegações teóricas, de forma conscienci-
osa e hábil investiga línguas individuais. Nessas obras não se pode encontrar um
pouco que seja valioso e instrutivo. Claramente, essas coisas valiosas e instrutivas
devem ser tiradas de N. Y. Marr e utilizadas.
PERGUNTA: Muitos linguistas consideram o formalismo uma das principais
causas da estagnação da linguística soviética. Gostaríamos muito de saber sua
opinião sobre o que o formalismo na linguística consiste e como ele deve ser
superado.
RESPOSTA: N. Y. Marr e seus “discípulos” acusam de “formalismo” todos os
linguistas que não aceitam a “nova doutrina” de N. Y. Marr. Isso, é claro, não é
sério ou inteligente.
N. Y. Marr considerou que a gramática é uma “formalidade” vazia, e que
as pessoas que consideram o sistema gramatical como a base da linguagem são
formalistas. Isso é completamente tolo.
Acho que o “formalismo” foi inventado pelos autores da “nova doutrina” para
facilitar sua luta contra seus oponentes na linguística.
A causa da estagnação da linguística soviética não é o “formalismo” inventado
por N. Y. Marr e seus “discípulos”, mas o regime de Arakcheyev e as lacunas teó-
ricas na linguística. O regime de Arakcheyev foi levantado pelos “discípulos” de
N. Y. Marr. A confusão teórica foi trazida para a linguística por N. Y. Marr e seus
colegas mais próximos. Para acabar com a estagnação, tanto um quanto o outro
devem ser eliminados. A remoção desses pontos doentes colocará a linguística
soviética em uma base sólida, vai levá-la a uma estrada ampla e permitirá que a
linguística soviética ocupe o primeiro lugar na linguística mundial.
Pravda, 4 de julho de 1950

Sobre certos problemas de Linguística, 29 de junho


de 1950, resposta ao camarada Sanzheyev

Estimado camarada Sanzheyev,


Estou respondendo à sua carta com considerável atraso, pois somente ontem
foi encaminhada a mim pelo aparato do Comitê Central.
Sua interpretação do meu ponto de vista sobre a questão dos dialetos é abso-
lutamente correta.
Os dialetos de “classe”, que seria mais correto chamar jargões, não servem à
massa do povo, mas a uma estreita crosta superior social. Além disso, eles não
têm um sistema gramatical ou estoque básico de palavras próprias. Diante disso,
eles não podem se desenvolver em línguas independentes.
Os dialetos locais (“territoriais”), por outro lado, servem à massa do povo e
têm um sistema gramatical e um estoque básico de palavras. Diante disso, alguns
dialetos locais, no processo de formação de nações, podem se tornar a base das
830 Obras Escolhidas

línguas nacionais e desenvolver-se em línguas nacionais independentes. Este foi


o caso, por exemplo, com o dialeto de Kursk-Orel (o “falar” Kursk-Orel) da lín-
gua russa, que formou a base da língua nacional russa. O mesmo deve ser dito
do dialeto de Poltava-Kiev da língua ucraniana, que formou a base da língua na-
cional ucraniana. Quanto aos outros dialetos de tais línguas, eles perdem sua
originalidade, se fundem com essas línguas e desaparecem nelas.
Processos contrários também ocorrem, quando a linguagem única de uma na-
cionalidade, que ainda não se tornou uma nação devido à ausência das condições
econômicas necessárias de desenvolvimento, entra em colapso como resultado da
desintegração do estado dessa nacionalidade, e os dialetos locais, que ainda não
tiveram tempo de ser totalmente uniformizados na língua única, revivem e dão
origem à formação de línguas independentes separadas. Possivelmente, este foi
o caso, por exemplo, com a única língua mongol.
Pravda, 2 de agosto de 1950

Sobre certos problemas de Linguística, aos


camaradas D. Belkin e S. Furer, 11 de julho de 1950

Recebi suas cartas.


Vosso erro é que vocês confundiram duas coisas diferentes e substituíram ou-
tro assunto pelo que examinei em minha resposta a camarada Krasheninnikova.
Nessa resposta eu critiquei N. Y. Marr que, lidando com a linguagem (falada)
e o pensamento, divorcia a linguagem do pensamento e, portanto, recai no ide-
alismo. Portanto, referi-me na minha resposta aos seres humanos normais que
possuem a faculdade de expressão. Sustento, além disso, que com tais seres hu-
manos os pensamentos só podem surgir com base no material linguístico, que
pensamentos nus desconectados com material linguístico não existem entre as
pessoas, que possuem a faculdade de expressão.
Em vez de aceitar ou rejeitar essa tese, vocês introduzem seres humanos anô-
malos, pessoas sem linguagem, surdos-mudos, que não têm linguagem à sua dis-
posição e cujos pensamentos, é claro, não podem surgir com base no material
linguístico. Como você vê, este é um assunto totalmente diferente que eu não to-
quei e não poderia ter tocado, uma vez que a linguística se preocupa com aqueles
que possuem a faculdade de fala e não com surdos-mudos que não possuem a fa-
culdade de expressão.
Você substituiu o assunto em discussão por outro assunto que não tinha sido
discutido.
Da carta do camarada Belkin é evidente que ele coloca em igualdade a “lin-
guagem das palavras” (língua falada) e a linguagem do gesto (linguagem da
“mão”, de acordo com N. Y. Marr). Ele parece pensar que a linguagem do gesto
e a linguagem das palavras são de igual significado, que em um dado momento
a sociedade humana não tinha linguagem de palavras, que a linguagem “mão”
naquela época desempenhava o papel da linguagem das palavras que apareceu
mais tarde.
Mas se o camarada Belkin realmente pensa assim, ele está cometendo um
J. V. Stalin 831

grave erro. A língua falada ou a linguagem das palavras sempre foi a única
linguagem da sociedade humana capaz de servir como um meio adequado de
relação entre as pessoas. A história não conhece uma única sociedade humana,
seja a mais atrasada, que não tinha sua própria língua falada. A etnografia não
conhece uma única tribo retrógrada, seja ela tão primitiva ou até mais primitiva
do que, digamos, os australianos ou aqueles da Terra do Fogo do século pas-
sado, que não tivesse sua própria língua falada. Na história da humanidade, a
língua falada tem sido uma das forças que ajudaram os seres humanos a emergir
do mundo animal, unir-se nas comunidades, desenvolver sua faculdade de pen-
samento, organizar a produção social, travar uma luta bem sucedida contra as
forças da natureza e alcançar o estágio de progresso que temos hoje em dia.
A este respeito, o significado da chamada linguagem de gestos, tendo em
vista sua extrema pobreza e limitações, é insignificante. Falando corretamente,
esta não é uma língua, e nem mesmo um substituto linguístico que poderia de
uma forma ou de outra substituir a língua falada, mas um meio auxiliar de possi-
bilidades extremamente limitadas às quais o homem às vezes recorre a enfatizar
este ou aquele ponto em sua fala. A linguagem de gestos e a língua falada são
tão incomparáveis quanto a enxada de madeira primitiva e o moderno trator de
lagarta com seu arado de cinco sulcos ou uma colheitadeira.
Aparentemente, você está principalmente interessado nos surdos-mudos, e
apenas em segundo lugar em problemas de linguística. Evidentemente, foi pre-
cisamente essa circunstância que o levou a fazer uma série de perguntas para
mim. Bem, se você insiste, eu não sou avesso a conceder o seu pedido. Como
as coisas estão em relação aos surdos-mudos? Eles possuem a faculdade de pen-
samento? Os pensamentos surgem com eles? Sim, eles possuem a faculdade
de pensamento e pensamentos surgem com eles. Claramente, uma vez que os
surdos-mudos são privados da faculdade de fala, seus pensamentos não podem
surgir com base no material linguístico. Isso pode significar que os pensamentos
dos surdos-mudos estão nus, não estão conectados com os “padrões da natureza”
(expressão de N. Y. Marr)? Não, não pode. Os pensamentos dos surdos-mudos
surgem e só podem existir com base nas imagens, sensações e concepções que
formam no cotidiano sobre os objetos do mundo exterior e suas relações entre
si, graças aos sentidos de visão, de tato, paladar e olfato. Além dessas imagens,
sensações e concepções, o pensamento está vazio, é privado de todo o conteúdo.

Ao camarada A. Kholopov

28 de julho de 1950

Recebi sua carta.


A pressão do trabalho atrasou um pouco a minha resposta.
Sua carta provém tacitamente de duas premissas: a partir da premissa de que
é permitido citar a obra deste ou daquele autor, sem se considerar o período
histórico que a citação trata, e, em segundo lugar, a partir da premissa de que
esta ou aquela conclusão ou fórmula do marxismo, derivada como resultado do
estudo de um dos períodos de desenvolvimento histórico, é boa para todos os
832 Obras Escolhidas

períodos de desenvolvimento e, portanto, deve permanecer invariável.


Devo dizer que ambas as premissas estão profundamente equivocadas.
Alguns exemplos.
Nos anos quarenta do século passado, quando ainda não havia um capitalismo
monopolista, quando o capitalismo estava se desenvolvendo mais ou menos sua-
vemente ao longo de uma linha ascendente, espalhando-se para novos territórios
que ainda não havia ocupado, e a lei do desenvolvimento desigual ainda não po-
dia operar plenamente, Marx e Engels concluíram que uma revolução socialista
não poderia ser vitoriosa em um determinado país, que só poderia ser vitoriosa
como resultado de um golpe conjunto em todos ou na maioria dos países civili-
zados. Essa conclusão tornou-se, posteriormente, um princípio norteador para
todos os marxistas.
No entanto, no início do século XX, especialmente no período da primeira
guerra mundial, quando ficou claro para todos que o capitalismo pré-monopólio
tinha definitivamente se desenvolvido em capitalismo monopolista, quando o ca-
pitalismo em ascensão havia se tornado capitalismo moribundo, quando a guerra
revelou as fraquezas incuráveis da frente imperialista mundial, e a lei do desen-
volvimento desigual predeterminava que a revolução proletária amadureceria em
diferentes países em diferentes épocas Lenin, procedendo da teoria marxista,
chegou à conclusão de que, nas novas condições de desenvolvimento, a revolução
socialista poderia ser plenamente vitoriosa em um país tomado separadamente,
que a vitória simultânea da revolução socialista em todos os países ou na maioria
dos países civilizados, era impossível devido ao amadurecimento desigual da re-
volução nesses países, que a velha fórmula de Marx e Engels não correspondia
mais às novas condições históricas.
É evidente que aqui temos duas conclusões diferentes sobre a questão da vi-
tória do socialismo, que não só contradizem, mas excluem uma à outra.
Alguns textualistas e talmudistas que citam mecanicamente sem se aprofun-
dar na essência da matéria, e além das condições históricas, podem dizer que
uma dessas conclusões deve ser descartada como sendo absolutamente incorreta,
enquanto a outra conclusão, como a absolutamente correta, deve ser aplicada
a todos os períodos de desenvolvimento. Os marxistas, no entanto, não podem
deixar de saber que os textualistas e os talmudistas estão enganados, não podem
deixar de saber que ambas as conclusões estão corretas, embora não absoluta-
mente, cada uma sendo correta para o seu próprio tempo: a conclusão de Marx
e Engels – para o período do capitalismo pré-monopólio; e a conclusão de Lenin
– para o período do capitalismo monopolista.
Engels, em seu Anti-Dühring, disse que após a vitória da revolução socialista,
o Estado está fadado a perecer. Por esses motivos, após a vitória da revolução
socialista em nosso país, textualistas e talmudistas do nosso Partido começaram
a exigir que o Partido tomasse medidas para garantir o rápido murche de nosso
estado, para dissolver órgãos estatais, abrir mão de um exército perene.
No entanto, o estudo da situação mundial do nosso tempo levou os marxistas
soviéticos à conclusão de que nas condições do cerco capitalista, quando a revo-
lução socialista foi vitoriosa apenas em um país e o capitalismo reina em todos
os outros países, a terra da revolução vitoriosa não deve enfraquecer, mas em
J. V. Stalin 833

todos os sentidos fortalecer seu estado, órgãos estatais, órgãos de inteligência e


exército, se essa terra não quer ser esmagada pelo cerco capitalista. Os marxistas
russos chegaram à conclusão de que a fórmula de Engels tem em vista a vitó-
ria do socialismo em todos ou na maioria dos países, que não pode ser aplicada
no caso em que o socialismo é vitorioso em um país tomado separadamente e o
capitalismo reina em todos os outros países.
Evidentemente, temos aqui duas fórmulas diferentes sobre o destino do Es-
tado socialista, cada fórmula excluindo a outra.
Os textualistas e talmudistas podem dizer que esta circunstância cria uma
situação intolerável, que uma dessas fórmulas deve ser descartada como sendo
absolutamente errônea, e a outra – como a absolutamente correta – deve ser apli-
cada a todos os períodos de desenvolvimento do Estado socialista. Os marxistas,
no entanto, não podem deixar de saber que os textualistas e talmudistas se con-
fundem, pois ambas as fórmulas estão corretas, embora não absolutamente, cada
uma sendo correta para o seu tempo: a fórmula dos marxistas soviéticos – para o
período da vitória do socialismo em um ou vários países; e a fórmula de Engels
– para o período em que a vitória consecutiva do socialismo em países separa-
dos levará à vitória do socialismo na maioria dos países e quando as condições
necessárias terão sido criadas para a aplicação da fórmula de Engels.
O número desses exemplos poderia ser multiplicado.
O mesmo deve ser dito das duas fórmulas diferentes sobre a questão da lin-
guagem, tiradas de várias obras de Stalin e citadas pelo camarada Kholopov em
sua carta.
O camarada Kholopov refere-se à obra de Stalin sobre o marxismo na lin-
guística, onde se conclui que, como resultado do cruzamento, digamos, de duas
línguas, uma delas geralmente sai vitoriosa, enquanto a outra morre, que, conse-
quentemente, o encontro não produz alguma nova terceira língua, mas preserva
uma das línguas. Ele se refere ainda a outra conclusão, tirada do relatório de
Stalin ao Décimo Sexto Congresso do PCUS, onde se diz que no período da vi-
tória do socialismo em escala mundial, quando o socialismo se consolidar e se
tornar parte da vida cotidiana, as línguas nacionais inevitavelmente se fundirão
em uma língua comum que, naturalmente, não será nem o grande russo nem o
alemão, mas algo novo. Comparando essas duas fórmulas e vendo que, longe de
coincidir, elas se excluem, o camarada Kholopov entra em desespero. “A partir
do seu artigo”, ele escreve em sua carta, “Eu entendi que o cruzamento de lín-
guas nunca pode produzir uma nova linguagem, enquanto antes do seu artigo eu
estava firmemente convencido, em conformidade com seu discurso no XVI Con-
gresso do PCUS, que sob o comunismo, as línguas se fundiriam em uma língua
comum.”
Evidentemente, tendo descoberto uma contradição entre essas duas fórmulas
e estando profundamente convencido de que a contradição deve ser removida, o
camarada Kholopov considera necessário se livrar de uma dessas fórmulas como
incorreta e agarrar a outra como sendo correta para todos os períodos e países;
mas qual fórmula deve se agarrar – ele não sabe. O resultado é algo de uma situ-
ação sem esperança. Camarada Kholopov nem suspeita que ambas as fórmulas
podem estar corretas.
834 Obras Escolhidas

É sempre assim com textualistas e talmudistas que não se aprofundam na


essência da matéria, citam mecanicamente e independentemente das condições
históricas das quais as citações tratam e invariavelmente se encontram em uma
situação sem esperança.
No entanto, se alguém examinar a essência do assunto, não há motivos para
considerar a situação sem esperança. O fato é que o panfleto de Stalin sobre
marxismo em linguística, e o discurso de Stalin no 16º Congresso do Partido,
referem-se a duas épocas totalmente diferentes, devido às quais as fórmulas, tam-
bém, provam ser diferentes.
A fórmula dada por Stalin em seu panfleto, na parte em que fala do cru-
zamento das línguas, refere-se à época anterior à vitória do socialismo em es-
cala mundial, quando as classes exploradoras são o poder dominante no mundo;
quando a opressão nacional e colonial permanece em vigor; quando o isolamento
nacional e a desconfiança mútua entre as nações são consolidados pelas dife-
renças entre os Estados; quando, ainda não há igualdade nacional de direitos;
quando o encontro de línguas ocorre como uma luta pela dominação de uma das
línguas; quando as condições necessárias para a cooperação pacífica e amigável
das nações e línguas ainda faltam; quando não é a cooperação e o enriquecimento
mútuo das línguas que estão na ordem do dia, mas a assimilação de alguns e a
vitória de outras línguas. É evidente que, nessas condições, só pode haver línguas
vitoriosas e derrotadas. É precisamente essas condições que a fórmula de Stalin
tem em vista quando diz que o encontro, digamos, de duas línguas, resulta não
na formação de uma nova língua, mas na vitória de uma das línguas e na derrota
da outra.
No que diz respeito à outra fórmula de Stalin, tirada de seu discurso no 16º
Congresso do Partido, na parte que toca na fusão das línguas em uma língua
comum, tem em vista outra época, ou seja, a época após a vitória do socialismo
em escala mundial, quando o imperialismo mundial não existe mais; quando
as classes exploradora são derrubadas e a opressão nacional e colonial é erradi-
cada; quando o isolamento nacional e a desconfiança mútua entre as nações são
substituídos pela confiança mútua e pela aproximação entre as nações; quando
a igualdade nacional foi posta em prática; quando a política de suprimir e as-
similar línguas é abolida; quando a cooperação das nações foi estabelecida, e é
possível que as línguas nacionais se enriqueçam livremente entre si por meio de
sua cooperação. É evidente que nessas condições não pode haver dúvida sobre a
supressão e derrota de algumas línguas e da vitória de outras. Aqui não teremos
duas línguas, uma delas a sofrer a derrota, enquanto a outra irá emergir da luta
vitoriosa, mas centenas de línguas nacionais, das quais, como resultado de uma
cooperação econômica, política e cultural prolongada das nações, primeiro apa-
recerão línguas zonais unificadas mais enriquecidas e posteriormente as línguas
zonais se fundirão em uma única língua internacional, que, é claro, não será nem
alemão, nem russo, nem inglês, mas uma nova língua que absorveu os melhores
elementos das línguas nacionais e zonais.
Consequentemente, as duas fórmulas diferentes correspondem a duas épocas
diferentes no desenvolvimento da sociedade, e precisamente porque correspon-
dem a elas, ambas as fórmulas estão corretas – cada uma para sua época.
J. V. Stalin 835

Exigir que essas fórmulas não estivessem em desacordo entre si, que não se
excluíssem umas às outras, é tão absurdo quanto seria exigir que a época da
dominação do capitalismo não estivesse em desacordo com a época da dominação
do socialismo, que o socialismo e o capitalismo não deveriam excluir uns aos
outros.
Os textualistas e talmudistas consideram o marxismo e conclusões separadas
e fórmulas do marxismo como uma coleção de dogmas, que “nunca” mudam,
apesar das mudanças nas condições do desenvolvimento da sociedade. Eles acre-
ditam que se aprenderem essas conclusões e fórmulas de cor e começarem a
citá-las aleatoriamente, poderão resolver qualquer problema, calculando que as
conclusões e fórmulas memorizadas servirão para todos os tempos e países, para
todas as ocasiões da vida. Mas esta pode ser a convicção apenas de pessoas que
veem a letra fria do marxismo, mas não sua essência, que aprendem decorando
os textos de conclusões e fórmulas do marxismo, mas não entendem seu signifi-
cado.
O marxismo é a ciência das leis que regem o desenvolvimento da natureza e
da sociedade, a ciência da revolução das massas oprimidas e exploradas, a ciência
da vitória do socialismo em todos os países, a ciência da construção da sociedade
comunista. Como ciência, o marxismo não pode ficar parado, desenvolve-se e
é aperfeiçoado. Em seu desenvolvimento, o marxismo não pode deixar de ser
enriquecido por novas experiências, novos conhecimentos – consequentemente
algumas de suas fórmulas e conclusões não podem deixar de mudar no curso do
tempo, não podem deixar de ser substituídas por novas fórmulas e conclusões
correspondentes às novas tarefas históricas. O marxismo não reconhece con-
clusões e fórmulas invariáveis, obrigatórias para todas as épocas e períodos. O
marxismo é o inimigo de todo o dogmatismo.
836 Obras Escolhidas

ANEXO 5 – CORRESPONDÊNCIAS COM


MOLOTOV
[12 de julho de 1925]
Rostov 7/12
Camarada Molotov,
Gostaria que mostrasse esta carta aos sete depois de lê-la.
1) Os companheiros de Rostov estavam aqui para me ver. Acontece que o ren-
dimento bruto da safra este ano é de aproximadamente 500 milhões de puds [1,8
toneladas], ou seja, perto do número recorde de 1914 (estou falando de Yugo-
vost). Há um superávit de cerca de 270.300 milhões de poods. Na visão de nossos
amigos de Rostov, nossos escritórios de exportação (em Yugovost) poderiam le-
vantar 150170 milhões de poods. Assim, 150.170 milhões de poods poderiam
ser enviados para o exterior da região de Yugovost. Nada mau. Devemos levar
esse fato em conta.
2) É evidente pelos jornais que as agências econômicas da URSS já desenha-
ram um programa para a construção de novas fábricas. Temo que eles comecem
a construir nas regiões fronteiriças sem levar em conta uma série de fatores des-
favoráveis envolvidos, e então, se perdermos o momento, será impossível corrigir
erros. Por exemplo, eles querem construir novas fábricas em Peter e Rostov; isso
não é conveniente. Ao elaborar o programa de construção, penso que duas con-
siderações devem ser levadas em conta, além do princípio da proximidade das
fábricas com matérias-primas e combustíveis: a ligação com o campo e a posição
geograficamente estratégica da localização das novas fábricas. Nosso interior bá-
sico é: os Urais, a região de Volga, a Terra Negra ao sul (Tambov, Voronezh,
Kursk, Orel, etc.). Estas são exatamente as áreas (se você não contar os Urais)
que estão sofrendo com a falta de indústria. Enquanto isso, estas são as áreas
que representam a retaguarda mais conveniente para nós em caso de compli-
cações militares. Portanto, estas são precisamente as áreas onde a construção
industrial deve ser desenvolvida. A esse respeito, Peter é completamente inade-
quado. Haverá pressão dos moradores, é claro, mas isso tem que ser superado.
Esta questão é tão importante para nós que deve ser colocada na pauta do ple-
nário do Comitê Central, se é isso que é necessário para superar a pressão local.
Seria bom saber a opinião dos sete sobre isso.
Cordialmente,
J. Stalin
P.S. Estou indo para Sochi hoje.

7/20/25
Camarada Molotov,
No número 159 (15 de julho) da Ekonomicheskaia zhizn [Vida econômica], li
uma notícia, “Exame do Projeto de Construção Dnepr” [Dneprostroi], do qual é
J. V. Stalin 837

evidente que o partido (e o Conselho Econômico Supremo) podem ser arrastados


pouco a pouco para a querela Dneprostroi, exigindo até 200 milhões de rublos, se
não tomarmos medidas preventivas a tempo. O camarada Dzerzhinsky publicou,
ao que parece, uma “ordem” segundo a qual o camarada Trotsky foi solicitado
a apresentar um plano técnico e financeiro para a construção “até meados de
outubro”, para que “os empréstimos necessários para as operações preparató-
rias ainda possam ser incluídos no orçamento de 1925- 1926.”’ A quantidade de
30.000 rublos foi liberada para o camarada Trotsky para a elaboração do plano.
O aviso contém algumas pequenas reservas sobre a necessidade de cautela e assim
por diante. Mas como 30.000 rublos já foram liberados e um prazo para apresen-
tação do plano foi estabelecido, o projeto começa a assumir uma natureza prática
e, portanto, séria.
Não acho que possamos nos dar ao luxo de enfrentar Dneprostroi este ano ou
no próximo, dada a nossa situação financeira. Faz pouco tempo que rejeitamos
o plano para a fábrica de petróleo no Transcáucaso326 , embora seja mais realista
no momento e somente a um quarto do custo. Em que motivos devemos aceitar o
plano Dneprostroi, que é menos realista para o presente e quatro vezes mais caro?
Temos mesmo tanto dinheiro? Será que o Donbass (a região onde Dneprostroi
será localizado) realmente sofre uma escassez de combustível ou não é o oposto
do caso? Por que há tanta pressa com Dneprostroi?
Precisamos, em primeiro lugar, de novos equipamentos para nossas fábricas
e plantas desgastadas. Essa necessidade foi realmente satisfeita?
Precisamos, além disso, expandir nossas fábricas de máquinas agrícolas, por-
que ainda somos forçados a comprar no exterior as ferramentas agrícolas mais
elementares por dezenas de milhões de rublos.
Precisamos, ainda mais, construir pelo menos uma fábrica de tratores, uma
fábrica nova e grande, porque sem uma ou mais dessas fábricas, não podemos
nos desenvolver mais.
Precisamos, finalmente, organizar fundições de cobre, desenvolver a produ-
ção de chumbo, melhorar nossa indústria militar, porque sem isso eles vão nos
vencer com as próprias mãos.
Essas necessidades já estão todas satisfeitas?
Como nós, que sofremos com a escassez de capital, podemos esquecer tudo
isso?
Penso que, além de todos os tipos de outros perigos, enfrentamos um sério
perigo de desperdiçar alguns dos kopecks que conseguimos acumular, de gastá-
los por nada, sem pensar, e assim tornar nossa construção mais difícil. Há um
mês, o camarada Dzerzhinsky entendeu tudo isso. E agora, aparentemente, ele
se empolgou...
Peço muito a você, Camarada Molotov, que leia esta carta ao Camarada Dzerzhinsky.
Tendo em vista a importância do assunto, leia-o para os sete e me envie uma nota
para me informar da opinião deles.
Cordialmente
J. Stalin
326 Tal decisão foi revista posteriormente no pleno do CC (N.T.).
838 Obras Escolhidas

[28 de julho de 1925]


Sochi 28/07/25
Camarada Molotov,
Temos que pensar sobre [quem vai dirigir] o Departamento organizacional e
de atribuição do partido. Parece que Gei não é o homem certo para o trabalho.
Ele é jovem, pouco conhecido, sem muita história e não terá autoridade. Per-
gunte a qualquer um que eles lhe dirão. Krinitskii não seria bom também, na
verdade, ele é ainda menos apropriado do que Gei (pelas mesmas razões). Talvez
seja hora de [S.V.] Kosior assumir e enviar Gei para o posto na Sibéria? Talvez
possamos contar com Shvernik ou Yanson? Sozinho, Bauman não seria o sufici-
ente, não é? Acho que ele não será adequado. Realmente, nomear alguém para
este departamento é uma noz que temos que quebrar antes do Congresso.
Outro dia, li nos jornais que o sindicato têxtil decidiu não expandir muito
a produção no próximo ano por causa da escassez de matérias-primas, princi-
palmente algodão do Turquestão. Se isso é verdade e se a razão realmente tem
a ver com as matérias-primas, então a decisão do sindicato, na minha opinião,
está profundamente equivocada. Seria muito mais rentável para nós comprar
mais matérias-primas na América (a propósito, o algodão americano está barato
agora) e processá-lo aqui em nosso país do que comprar têxteis do exterior. É
mais rentável em todos os aspectos. Este é um assunto sério, digno de atenção.
A inércia do sindicato é compreensível: não quer expandir a produção, já que a
expansão significa mais dores de cabeça por que trazer dores de cabeça desne-
cessárias se o sindicato está indo bem sem elas? Essa inércia ruinosa que surge
de sua posição de monopólio tem que ser superada não importa o que aconteça.
Fale com Dzerzhinsky sobre isso; mostre-lhe a minha carta e peça-lhe para co-
locar pressão sobre o sindicato. Repito, esta é uma matéria séria que merece
atenção. Ou resolvemos corretamente no interesse do Estado, dos trabalhadores
e dos desempregados, que poderiam ser colocados em empregos se a fabricação
fosse expandida, ou, se não resolvermos corretamente, além de tudo, perderemos
dezenas de milhões com isso para os proprietários de fábricas têxteis estrangeiras.
Lembranças calorosas,
J. Stalin

[Julho de 1925]
Camarada Molotov,
A questão do Conselho de Defesa do Trabalho, é claro, não está indo bem.
Dzerzhinsky está chateado, ele está estafado, mas não há fumaça sem fogo, é
claro. Na verdade, o próprio Politburo está em uma posição embaraçosa porque
foi tirado dos assuntos econômicos. Dê uma olhada na Ekonomicheskaia Zhizn
e verá que nossos fundos estão sendo alocados por Smilga e por Strumilin e
Groman, enquanto o Politburo... o Politburo está mudando de um órgão diretor
para um tribunal de apelações, para algo como um “conselho de anciãos”. Às
vezes é ainda pior do que isso: não é sequer a Gosplan327 mas “seções” dela e

327 Gosplan era o nome coloquial da política de economia planejada da União Soviética. A palavra
J. V. Stalin 839

seus especialistas é quem estão no comando. Está claro por que Dzerzhinsky
está infeliz. E o trabalho não pode deixar de sofrer com isso. Não vejo outra
alternativa senão reestruturar a adesão ao Conselho de Defesa do Trabalho e
trazer para ele membros do Politburo.
Saudações
Seu, Stalin.

[1 de agosto de 1925]
Sochi 8/1/25
Camarada Molotov,
1) Me disseram que Manuilskii enviou ao L’Humanité o primeiro rascunho
do artigo de Trotsky para publicação, não acidentalmente, mas de propósito. Se
isso é verdade, é um ultraje. Se for verdade, então estamos lidando, não com
um “erro”, como você me escreveu, mas com a política de algumas pessoas que,
por alguma razão, não estão interessadas em publicar o artigo de Trotsky em
sua versão final editada. Este é, sem dúvida, o caso. Este assunto não pode ser
deixado como está. Proponho levantar a questão com os sete e condenar a ação
intolerável de Manuilskii, uma vez que ele colocou o Partido Comunista Russo
e o L’Humanité em uma posição ridícula; ao fazê-lo, devemos definitivamente
descobrir quem foi que instigou Manuilskii a dar este passo malicioso. Como
pano de fundo, deixe-me dizer-lhe vários fatos necessários: a) os documentos
foram entregues a Manuilskii a pedido por escrito de Manuilskii (deveria estar
nos arquivos do Comitê Central) e com o conhecimento dos sete (Zinoviev levan-
tou a questão de dar a Manuilskii os documentos em [uma reunião dos] sete);
b) os documentos foram dados antes da versão final do artigo de Trotsky estar
disponível; c) foram entregues para informar as pessoas da cúpula do Comintern
e não para publicação (veja, a propósito, o pedido de Manuilskii); d) a questão
da publicação dos documentos, especificamente, da publicação do meu memo-
rando sobre o livro de Eastman, foi discutida pelos sete, e na verdade todos nós
tínhamos em mente publicar meu memorando após a publicação da versão final
do artigo de Trotsky; Manuilskii sabia disso; e) antes da partida de Manuilskii
para a Alemanha (no início de julho ou final de junho) pedi a Manuilskii que
devolvesse ao Secretariado do Comitê Central todos os documentos. Ele concor-
dou, mas ainda assim ele não devolveu os documentos e os levou com ele. Esses
são os fatos. Peço urgentemente aos sete que acompanhem este assunto e, assim,
ponham um fim a tais truques sujos em nosso partido.
2) Não concordo com os sete relativos à publicação apenas do artigo de Trotsky
em sua versão final. Em primeiro lugar, o artigo de Krupskaya também deve ser
publicado. Em segundo lugar, é bem possível publicar alguns documentos (in-
cluindo meu memorando sobre o livro de Eastman) após a publicação do artigo
de Trotsky, a fim de provar que Trotsky escreveu o artigo apenas sob pressão do
Partido Comunista Russo (caso contrário, Trotsky pode aparecer como o salvador
do prestígio do partido).

“Gosplan” é uma aglutinação de Gossudarstvênnîi Komitet po Planirovâniu, órgão cuja principal


função era o estabelecimento dos planos quinquenais soviéticos.
840 Obras Escolhidas

3) Reporte-me sobre o destino dos artigos de Trotsky e Krupskaya sobre East-


man: Foram publicados na Inglaterra ou não? Eu pedi isso três vezes e ainda
não tenho uma resposta.
4) Ainda não tenho uma resposta sua à minha carta sobre Dneprostroi. Dê
sua resposta verbalmente para Tovstukhahe me escrever.
5) Eu não acredito que Trotsky “não leu” o artigo de Eastman que você enviou
para os membros do Politburo. Trotsky está te enganando.
6) Li as “respostas” de Trotsky à delegação alemã. Não concordo com tudo
nelas. O Pravda concorda com elas? Esta é uma plataforma para o grupo de
Trotsky.
7) Estou melhorando. As águas de Matsestinskii (perto de Sochi) são boas
para curar a esclerose, reviver os nervos, dilatar o coração e curar ciático, gota e
reumatismo. Eu deveria trazer minha esposa aqui.
Cordialmente,
J. Stalin

[Posterior a 1 de agosto de 1925]


Aos Sete:
Uma vez, os sete decidiram publicar o artigo de Trotsky e a carta de Krups-
kaya sobre Eastman na imprensa russa depois que foram impressos na imprensa
estrangeira. Eles já devem ter aparecido no exterior agora, mas por alguma ra-
zão eles não foram impressos em nosso país, então eu não considero supérfluo
lembrá-los disso. Sua publicação seria de grande importância, especialmente
agora, quando Manuilskii planejou complicar as coisas e, portanto, involuntaria-
mente levantou a questão da autenticidade do artigo de Trotsky. Se ele [artigo de
Trotsky] fosse impresso aqui, a questão de sua autenticidade seria removida por si
só. E isso seria uma vantagem para o partido, e não só para o nosso partido, mas
para os partidos comunistas estrangeiros, especialmente os partidos comunistas
da Inglaterra e da América.
J. Stalin

[9 de agosto de 1925]
Sochi 8/9/25
Camarada Molotov,
Leia esta carta para Bukharin.
Recebi sua carta de 5 de agosto.
1) Aparentemente, a nomeação de Gei ocorreu antes de você receber minha
carta sobre a nomeação de Shvernik ou outra pessoa como chefe do Departa-
mento organizacional e de Atribuição. Nós realmente tínhamos um acordo sobre
Gei, mas depois mudei de opinião, sobre a qual eu te informei, mas, infelizmente,
tarde demais. Bem, vamos ver como Gei vai se comportar. Uma decisão que foi
tomada duas vezes não vale mais a pena mudar.
2) Em relação ao Dneprostroi. Estou um pouco preocupado porque o projeto
J. V. Stalin 841

é na casa de centenas de milhões e as pessoas querem decidir isso a todo vapor.


Medidas preventivas devem ser tomadas antes que seja tarde demais; além disso,
você deve tentar evitar que os interesses da causa sofram e não hesitar mesmo
que Dzerzhinsky e Trotsky fiquem um pouco ofendidos. O assunto tem que ser
decidido pelo sete.
3) Quanto a Manuilskii, há algum tipo de mal-entendido aqui, se não chan-
tagem. Mais uma vez eu disse que 1) dei os documentos a Manuilskii, com o
conhecimento dos sete, para permitir que ele informasse os altos funcionários
do Comintern, e não para publicação; 2) Contei a Manuilskii sobre a publicação
no exterior, juntamente com a publicação do texto final do artigo de Trotsky, de
vários outros documentos, e exatamente, quais documentos seriam (e só pode-
riam ser) decididos pelos sete; 3) Eu não dei e não poderia ter dado nenhuma
diretiva a Manuilskii sobre a publicação do artigo inacabado de Trotsky, uma vez
que eu defendi e continuo a defender a publicação do artigo de Trotsky em sua
melhor e não sua pior forma; 4) Eu não poderia ter dado tal diretiva a Manuilskii,
uma vez que exigi dele antes de sua partida para o exterior o retorno ao Comitê
Central de todos os documentos (ele concordou com isso, mas, por alguma razão,
ele não o fez). Pergunte a Manuilskii por que ele não devolveu os documentos
antes de sua partida.
4) A impressão da carta de Krupskaya foi decidida pelos sete; a revisão foi
atribuída a mim, Bukharin, Rykov e Zinoviev. Bukharin, Rykov, e eu o revisamos
e aprovamos. Zinoviev estava ausente. As pessoas têm uma memória surpreen-
dentemente curta, especialmente Bukharin.
5) Os sete decidiram publicar o artigo de Trotsky e a carta de Krupskaya na im-
prensa russa após sua publicação no exterior, sem abrir, no entanto, de qualquer
forma uma discussão [pública] sobre esta questão. É possível que essa decisão
tenha sido revogada pelos sete. Isso, é claro, é assunto deles. Mas se não foi re-
vogada, eles devem ser publicados em nossa imprensa. Pode me reportar algo a
esse respeito?
6) Quanto à publicação do meu memorando sobre Eastman, podemos falar
sobre isso quando eu voltar das férias. Não há pressa.
7) Diga a Bukharin que o Pravda deve comentar as respostas de Trotsky se não
concordar com elas.
8) Como está a saúde de Frunze?
9) Kotovskii foi morto sob que circunstâncias! É uma pena, ele era uma pessoa
excepcional.
Saudações
J. Stalin
Não me repreenda por uma carta tão longa.
842 Obras Escolhidas

[18 de agosto de 1925]


8/18
Camarada Molotov,
A carta de Manuilskii é covarde e enganadora.
Eu defendo inteiramente a minha declaração sobre os truques fraudulentos e
sujos, apesar da insatisfação de alguns camaradas.
A declaração de Kamenev, de que o principal objetivo de Stalin, neste caso, era
obter seu próprio memorando sobre Eastman publicado, eu considero desonesta.
Ele está medindo outros usando seu próprio parâmetro...
Você e Bukharin fizeram a coisa errada votando contra a proposta sobre os
documentos relativos a Eastman. Vocês não deveriam estar impedindo os Comi-
tês Centrais dos partidos estrangeiros de receber os documentos sobre Eastman.
Kamenev e Zinoviev querem estabelecer as pré-condições para tornar necessá-
rio a remoção de Trotsky do Comitê Central, mas eles não terão sucesso nisso
porque não têm fatos de apoio. Em sua resposta ao livro de Eastman, Trotsky
determinou seu destino, ou seja, ele se salvou.
Saudações,
J. Stalin

[Agosto de 1925]
Camarada Molotov,
Recebi sua carta de 20 de agosto. Falei com Bukharin hoje.
1) Você está propondo uma agenda de cinco questões para o plenário: 1) Co-
mércio Exterior, 2) os sindicatos; 3) o Comintern; 4) salários; 5) reforma agrária
na Ásia Central. Não me oponho a essa agenda. É importante preparar a ques-
tão dos salários (o aumento planejado dos salários e assim por diante). Este item
foi levantado pelos sete, e Shmidt foi designado para prepará-lo a parte do Po-
litburo. Coloque pressão nele. Enquanto a questão está sendo preparada, ela
deve passar pelo Politburo o mais prontamente. Seria bom acrescentar a questão
da construção industrial, com um relatório de Feliks [Dzerzhinsky] ou Piatakov.
(Smilga não deve meter o nariz nisso; ele é uma farsa como líder econômico, e
além disso, isso não é uma questão da economia como um todo, mas da indús-
tria.) Se Feliks não pode dar um relatório agora, ele pode ser apresentado até o
próximo plenário, mas com a previsão de que uma garantia firme deve ser dada
que nenhuma fábrica de significância nacional será construída para este período
sem a sanção do Politburo.
2) Nada deve ser formalizado sobre a questão dos Comitês Ucranianos de
Camponeses Pobres. A decisão do Comitê Central Ucraniano sobre esta questão
coincide inteiramente com as decisões da XIV Conferência do Partido. Seria me-
lhor colocar um relatório da conferência rural na agenda do plenário do Comitê
Central na forma de uma questão separada e descrever neste relatório os Comi-
tês dos Camponeses Pobres, outros comitês camponeses, e assim por diante. Na
verdade, isso confirmará a decisão do Comitê Central Ucraniano. Você deveria
fazer o relatório. Sem falhas.
J. V. Stalin 843

3) O plano econômico pode ser colocado na agenda do próximo plenário, se


for necessário, dando o relatório não para a Gosplan, mas para Rykov (Conselho
de Comissários) ou Kamenev.
(Conselho de Defesa do Trabalho) com o envolvimento da Comissão Central
de Controle.
4) Falaremos mais tarde sobre a agenda do Congresso.
5) Se você tiver tempo, escreva mais, responderei em detalhes (tenho muito
tempo).
6) Bukharin diz que agora você está muito sobrecarregado. Tentarei estar em
Moscou no dia 10, ou até mais cedo, para tirar parte da sua carga.
Eu sou saudável. Eu fiz uma recuperação bastante boa.
Saudações
Seu, J. Stalin.
P.S. As teses sobre os sindicatos são, em geral, aceitáveis, mas as formulações
individuais precisam ser reformuladas porque são fracas e insuficientemente pre-
cisas. Elas definitivamente têm que ser revistas no espírito do conhecido discurso
de Andreev.
J. Stalin

[24 de maio de 1926]


Olá
Eu cheguei aqui domingo à noite. O tempo estava péssimo. A perspectiva de
colheita no Cáucaso Norte é boa. Isso é bom.
Belenkii me disse que 1) Trotsky estava de volta a Moscou já na manhã de
quarta-feira; 2) Preobrazhenskii foi visitá-lo em Berlim (para um rendevous?).
Interessante.
Bem, tudo de bom,
J. Stalin
Segunda-feira. Sochi.

[26 de maio de 1926]


Olá de novo,
Já que estão todos ocupados com grandes assuntos, alguns assuntos triviais
podem passar por você. Acho que não será fora de ordem para lembrá-lo de
vários detalhes necessários:
1) Você deve lembrar Bukharin do artigo contra a “oposição dos trabalhado-
res”. Não deve ser adiado por mais tempo. Deve ser escrito imediatamente. É
mais vantajoso para nós se Bukharin o escrever, e não Grisha [Zinoviev], que per-
deu criminalmente todos os prazos. Seria estrategicamente vantajoso se Bukha-
rin escrevesse o artigo. Bukharin está totalmente dentro de seus direitos para
fazê-lo, uma vez que Grisha sabotou a atribuição do Politburo.
2) Devemos publicar o texto completo da resolução de nossos trabalhadores
844 Obras Escolhidas

(de todas as regiões) em apoio aos grevistas britânicos em geral e aos mineiros
de carvão, em particular em todas as línguas mais importantes do Ocidente o
mais rapidamente possível. Eu acho que deveria ser publicado na forma de um
folheto com um prefácio de Bukharin ou Tomskii. Nem Grisha nem Lozovskii
são necessários aqui. O prefácio deve ser escrito por Bukharin ou Tomskii. Este
é um assunto candente e não deve cair no esquecimento. Pode ser publicado
pelo Conselho Sindical ou pela Editora do Estado. Não deve ser publicado pela
própria Comintern, isso pode fazer mal. Melhor que venha dos sindicatos.
3) Diga-me algo sobre esse assunto alarmante que Uglanov e Yagoda nos rela-
taram. Se estiver tudo bem, telegrafe a mensagem “Sentindo-se bem”; se as coisas
estão ruins, telegrafar em código a mensagem “Sentindo-se doente”.
É isso por enquanto. O tempo melhorou.
26/5/26
J. Stalin

[1 de junho de 1926]
TELEGRAMA CODIFICADO DE MOLOTOV E BUKHARIN PARA STA-
LIN
Em 28 de maio, Molotov enviou-lhe uma carta detalhada sobre as teses de Zi-
noviev sobre as lições dos ataques britânicos. Acreditamos que é extremamente
importante para você estudar essas teses imediatamente e nos enviar sua opi-
nião. Zinoviev está reavaliando nossa análise da estabilização capitalista e das
táticas do Comintern, lançando lama na política existente do Comintern e fa-
zendo referências ao partido e a membros individuais do Comitê Central, como
fez anteriormente em “Filosofia da Era”, e ele está pronto para assumir a inicia-
tiva de romper imediatamente com o Conselho Geral. Trotsky também defende
uma ruptura demonstrativa com o Conselho Geral. Creio que esta é uma es-
tupidez consumada da variedade “retiradista” e o Comitê Central deve se opor
impiedosamente a ela. Oportunismo disfarçado por frases “esquerdistas” deve
ser exposto. As teses de Zinoviev devem ser refutadas e opostas com teses politi-
camente precisas do Comitê Central, incluindo nosso direito e dever de criticar
impiedosamente e expor os direitistas e todos os esquerdistas do Conselho Geral,
mas sem iniciar uma ruptura com o Conselho Geral. Entre nós, há total unani-
midade sobre o ponto básico. Bukharin prefere não apresentar nossas próprias
contra teses, mas fazer correções apropriadas às teses de Zinoviev. Estamos adi-
ando uma discussão sobre as lições britânicas por cinco dias enquanto pensamos
sobre nossas teses. Estamos esperando sua resposta imediata. Zinoviev fez um
discurso na Universidade Sverdlov no espírito das teses dele. Trotsky o ecoou.
Bukharin falou contra ambos sem citar nomes.
Molotov. Bukharin.

[1 de junho de 1926]
TELEGRAMA CODIFICADO DE MOLOTOV PARA STALIN
Bukharin está escrevendo contra teses para Zinoviev. Zinoviev e Trotsky estão
J. V. Stalin 845

nos colocando em uma terrível pressa. Em minha opinião, nossas teses devem
fornecer um ataque com determinação contra as tentativas de Zinoviev e Trotsky
de conduzir uma revisão radical, embora covarde, da política do Comintern, do
partido e do Conselho Sindical; nossas teses devem expor não só o ultra esquer-
dismo, mas aquilo que o permite ocorrer, ou seja, o esquerdismo no Comintern,
como Lenin ensinou. O “retiradismo” oportunista sobre a questão do rompi-
mento com o Conselho Geral deve ser exposto. Ao mesmo tempo, devemos: 1)
enfatizar a natureza condicional da estabilização e o crescimento de complicações
que podem levar à revolução nos países capitalistas, embora o resultado possa ir
para qualquer lado; 2) [enfatizar] a traição dos direitistas e a capitulação dos
esquerdistas no Conselho Geral; na verdade, os esquerdistas têm a principal res-
ponsabilidade objetiva para isso, porque eles têm maioria no Conselho Geral; 3)
demonstrar que nos unimos e podemos permanecer no Comitê Anglo-Soviético
[sic], por causa do contato com as massas de trabalhadores britânicos, sem res-
tringir de forma alguma o nosso direito de criticar qualquer ação do Conselho
Geral ou nosso apoio aos elementos revolucionários do movimento operário bri-
tânico. O Partido Comunista da Inglaterra deve ser decisivamente defendido
contra a acusação de Trotsky no Pravda de 26 de maio, de que é um elemento
de “inibição não revolucionária”. Sua opinião é necessária imediatamente. Se-
ria melhor se você viesse pessoalmente para Moscou; então (nós) adiaríamos a
decisão sobre a questão britânica até 7 de Junho. Aguardando sua resposta.
Molotov

[3 de junho de 1926]
TELEGRAMA CODIFICADO DE STALIN PARA MOLOTOV
Comitê Central
Partido Comunista da União
Camarada Molotov,
Decifrar imediatamente
Basicamente, as teses de Grisha [Zinoviev] partem da premissa que 1) a esta-
bilização está terminando ou já terminou; 2) estamos entrando ou já entramos
em uma fase de explosões revolucionárias; 3) a tática de reunir forças e trabalhar
nos sindicatos reacionários está perdendo sua viabilidade e está recuando em se-
gundo plano; 4) a tática de uma frente unida sobreviveu a si mesma; 5) devemos
construir nossos próprios sindicatos, confiando no movimento das “minorias”.
Daí a proposta de Grisha de assumir a iniciativa de uma ruptura total com o
Conselho Geral.
Dadas as circunstâncias históricas, toda esta premissa, na minha opinião, é
fundamentalmente incorreta porque joga a ação nas mãos de Amsterdã e da
Segunda Internacional e condena nossos partidos comunistas ao sectarismo.
Eu acho que:
1) A estabilização não terminou, embora tenha sido e continua instável;
2) A provocação da greve [geral] dos conservadores britânicos foi a tentativa da
capital de solidificar a estabilização, ou seja, neste caso, o capital, não a revolução,
846 Obras Escolhidas

estava no ataque.
3) Esta tentativa não levou a um fortalecimento da estabilização, nem poderia.
Mas também não levou a um desenvolvimento triunfante da luta revolucionária
dos trabalhadores ou à destruição da estabilização; além disso, como resultado
da greve, algumas categorias de trabalhadores não foram capazes de preservar
nem mesmo suas antigas condições de trabalho e luta.
4) Como resultado, não temos uma nova fase de ataque tempestuoso pela re-
volução, mas uma estabilização contínua, temporária, não duradoura, mas esta-
bilização, no entanto, repleta de novas tentativas do capital de fazer novos ataques
aos trabalhadores, que continuam a ser forçados a se defender.
5) Nossa tarefa é continuar a reunir forças e [formar] uma verdadeira frente
unida; preparar a classe trabalhadora para resistir a novos ataques pelo capital;
para transformar esta defesa em um ataque revolucionário de base ampla pelo
proletariado contra o capital, em uma transição para uma luta pelo poder.
6) Daí a necessidade de um trabalho mais intenso dos comunistas nos sindi-
catos reacionários com o propósito de transformá-los internamente e de assumir
o controle deles.
7) Daí a necessidade de uma luta determinada contra Zinoviev e Trotsky, que
vêm defendendo a divisão do movimento sindical e se opuseram a uma frente
unida, em benefício de Oudegeest e Sassenbach.
8) Daí uma luta determinada contra Zinoviev e Trotsky, que estão empur-
rando o movimento sindical britânico para os braços de Amsterdã e da Federação
Americana do Trabalho (AFL).
9) Daí uma refutação decisiva da linha de Zinoviev e Trotsky, que leva ao
isolamento dos partidos comunistas das massas e ao abandono das massas ao
monopólio da liderança formada pelos reformistas.
10) Portanto, uma refutação decisiva de qualquer tentativa de assumir a inici-
ativa de dividir o Conselho Sindical [soviético] do movimento sindical britânico,
uma vez que uma ruptura com o Conselho Geral sob essas condições deve levar
a uma ruptura com os sindicatos da Inglaterra em favor de Amsterdã.
11) A ruptura com o Conselho Geral certamente levará a uma ruptura na
política de um movimento sindical unificado na França e na Alemanha também,
uma vez que os reformistas na França e na Alemanha não são melhores do que
os seus colegas britânicos.
12) Trabalho com o Profintern e as “minorias” deve ser intensificado e sua
autoridade aumentada.
13) O Partido Comunista Britânico deve ser incondicionalmente defendido
contra os esforços de Zinoviev e Trotsky para desacreditá-lo.
14) Uma série de propostas práticas feitas pelo Camarada Lozovskii devem
ser aprovadas, e um acordo completo deve ser estabelecido entre Tomskii e Lo-
zovskii.
15) É absolutamente necessária uma crítica implacável aos centristas e esquer-
distas no Conselho Geral.
16) Esta crítica não exclui e não pode excluir a possibilidade [e] a necessidade
de preservar o Comitê Anglo-Soviético [sic].
J. V. Stalin 847

17) Separadamente das teses do Comintern, devemos tomar uma decisão que
o Conselho Sindical aprove uma resolução (depois de ouvir um relatório do [seu]
presidium sobre os resultados da greve de maio) criticando a traição dos direi-
tistas e a falta de caráter dos esquerdistas. A resolução deve ser transmitida pelo
rádio e também enviada ao Partido Comunista Britânico e à minoria [sindical],
bem como ao Conselho Geral para informação.
18) A minoria sindical e o Partido Comunista Britânico devem lançar uma
campanha vigorosa para novas eleições para os comitês executivos dos sindicatos
e do Conselho Geral visando a expulsão dos traidores Thomas e seus asseclas
entre os esquerdistas; o partido britânico deve apoiar sua substituição por novos
líderes revolucionários.
19) As teses de Bukharin devem levar em conta as decisões do Politburo e
da Comissão Britânica sobre a greve britânica, tendo em mente que Zinoviev
rompeu com essas decisões em suas teses.
20) As teses de Zinoviev devem ser completamente refutadas como liquidaci-
onistas e substituídas por nossas teses.
21) A rejeição das teses de Grisha pode levar a ameaças de renúncia que não
devem assustá-lo de forma alguma.
22) Não acho que minha viagem seja necessária.
23) Se ainda forem necessárias conversações em linha direta, envie um tele-
grama e eu responderei.
Enviado em 3 de junho
J. Stalin

[3 de junho de 1926]
TELEGRAMA CODIFICADO DE STALIN PARA MOLOTOV
Moscou
Comitê Central
Partido Comunista da União Soviética
Camarada Molotov,
Decifrar imediatamente
Fim do Telegrama Codificado nº 2
Nas teses de Bukharin, você deve definitivamente notar os erros muito im-
portantes de Zinoviev sobre a questão da greve britânica, sobre Pilsudski e sobre
a revolução chinesa, e criticá-los completamente da maneira que você escolher,
porque esses erros estão no ar e encontrarão apoio entre aqueles no Comintern
com tendências direitistas.
1) Na primeira sessão do Politburo durante o início da greve britânica, Zi-
noviev veio com um rascunho de diretrizes para os comunistas britânicos que
ele havia desenvolvido com a ajuda de certos membros do Comintern que estão
entre aqueles que simpatizam com a oposição. No rascunho, como bem sabem
os membros do Politburo, não houve uma única palavra sobre a necessidade de
mudar a greve geral para uma maior luta política; nem havia qualquer indício
848 Obras Escolhidas

do slogan “Abaixo o governo conservador, viva o governo dos trabalhadores”. A


maioria do Politburo introduziu esta nova diretiva e um novo slogan no projeto
de Zinoviev como alterações que Zinoviev foi obrigado a aceitar. Esta omissão do
slogan mais importante sobre o movimento de greve na Inglaterra não é trivial;
ele joga os trabalhadores nas mãos do grupo de Thomas. Não há garantia de
que tais erros não se repitam no trabalho de Zinoviev e seus apoiadores. A fim
de proteger o partido de tais erros descarados, os erros de Zinoviev devem ser
discutidos em nossas teses.
2) Na famosa sessão do Politburo, há cerca de um mês, Zinoviev veio com uma
proposta puramente liquidacionista sobre a conveniência de o Partido Comu-
nista abandonar o Kuomintang, assim [deixando-o] nas mãos de sua ala direita.
Quando a maioria do Politburo comentou que a proposta de Zinoviev levaria à
liquidação do movimento revolucionário na China, Zinoviev e Radek, após tenta-
tivas fracassadas de defender sua proposta, foram forçados a retirá-la e aceitar a
proposta do Politburo de intensificar o trabalho do Partido Comunista dentro do
Kuomintang e concentrar nossos esforços contra a ala direita dentro do Kuomin-
tang. Como não há garantia de que Zinoviev não cometerá tal erro novamente,
é essencial discutir isso em nossas teses.
3) Em uma reunião da Comissão Polonesa do Politburo, no dia em que os
primeiros relatórios foram recebidos sobre a tomada de Varsóvia por Pilsudski,
Zinoviev apresentou, na presença de Unshlikht, Dzerzhinsky, Domski, Wenecki,
e muitos outros, um rascunho de diretrizes aos comunistas poloneses, dizendo
que a neutralidade dos comunistas na luta de Pilsudski com os fascistas era inad-
missível. Assim, de acordo com as teses de Zinoviev, Pilsudski é visto como um
antifascista e o movimento Pilsudski é visto como um movimento revolucionário,
mas não há uma única palavra sobre o fato de que apoio comunista a Pilsudski é
ainda mais inadmissível.
A maioria da comissão introduziu uma alteração básica sobre a não possibi-
lidade de se apoiar Pilsudski, e Zinoviev foi obrigado a aceitar esta alteração,
revisando todo o projeto da diretiva. Estou certo de que os erros dos comunistas
poloneses sobre os quais Zinoviev escreve tão alegremente agora são inteiramente
um reflexo da visão profundamente oportunista de Zinoviev sobre a suposta na-
tureza revolucionária da aventura Pilsudski. Como não há garantia de que esses
erros não se repitam, é essencial levá-los em conta nas teses de Bukharin. Ao
informá-lo sobre tudo isso, peço que circulem este documento entre nossos ami-
gos mais próximos.
3 de junho, 21h
Stalin

[3 de junho de 1926]
TELEGRAMA CODIFICADO DE TOVSTUKHA A STALIN
Enviado de Moscou, 3 de junho de 1926 Recebido e decifrado em 3 de junho
Tiflis, Comitê Regional Transcaucasiano
Para: Ordzhonikidze
Decifrar imediatamente para o Camarada Stalin
J. V. Stalin 849

Ontem, contra teses sobre a Inglaterra, assinadas por Bukharin, Tomskii e


Molotov, foram enviadas a todos os membros do Politburo. Os demais deram
seu consentimento na íntegra. Hoje, as questões britânicas foram discutidas no
Politburo, com uma transcrição feita por insistência de Zinoviev. Recebemos seu
telegrama durante a reunião. Nós afirmamos nosso acordo absoluto com você,
incluindo os detalhes. A batalha no Politburo foi de seis horas.
Trotsky votou a favor de Zinoviev. As teses de Zinoviev foram rejeitadas. As
teses dos três foram aceitas em princípio e enviadas à comissão. Zinoviev exigiu
que ele fosse autorizado a defender seu ponto de vista no Comintern. O Politburo
recusou seu pedido. Trotsky também votou contra isso. Detalhes a seguir em
uma carta. Estamos enviando as teses dos três hoje para Sergo [Ordzhonikidze].
Também vamos mandá-las para Sochi.
Tovstukha

[15 de junho de 1926]


6/16/26
Saudações, Molotov, Saudações, Bukharin,
Voltei para Sochi hoje, 15 de junho. Em Tiflis eu tive uma forte dor de
estômago (eu tive intoxicação alimentar ao comer alguns peixes) e agora estou
tendo dificuldade em me recuperar. Hoje eu li suas cartas (sem data) e a carta
de Bukharin (também sem data). Minha opinião:
1) Suas teses se saíram bem. Grisha [Zinoviev] deve ser exposto sobre a ques-
tão polonesa também, já que ele mesmo arrastou Warski para ela e agora tenta
frustra-lo contra você. Realmente, a ousadia de Grisha não conhece limites.
2) Não havia necessidade de dizer ao Comintern que as teses foram aprovadas
por unanimidade. A unanimidade foi formal, mas na realidade não houve unani-
midade. Encobrir o desentendimento com Grisha agora significaria incentivá-lo
em seu trabalho anti-partido e nos colocar em uma posição estúpida.
3) Se Lashevich está organizando reuniões ilegais, se Grisha Zinoviev está or-
ganizando o voo de R. Fischer para a Alemanha, e se Sokolnikov está sendo envi-
ado para a França para o Congresso significa que eles decidiram, juntamente com
Trotsky, dividir o partido através do Comintern. Não acredito que seja possível,
mas muitos conflitos serão bem possíveis. A partir disso, é preciso que façamos,
se quisermos proteger o partido de qualquer surpresa, um novo reagrupamento
de pessoas da oposição. Quanto às medidas contra Lashevich, você está correto.
Também seria bom preparar a questão sobre Zinoviev de uma forma ou de outra.
A melhor maneira, penso eu, seria dar ao plenário o relatório do Politburo sobre
as questões do Arquivo Especial 3 e, ao discuti-lo no plenário, mencionar todas
as disputas no Politburo, para que o plenário possa ter sua palavra.
4) Se Trotsky diz a Bukharin que ele logo espera ter uma maioria no partido,
isso significa que ele espera intimidar e chantagear Bukharin. Quão pouco ele
sabe e o quanto ele subestima Bukharin! Mas acho que em breve o partir vai
quebrar os devaneios de Trotsky e Grisha junto com Kamenev e transformá-las
em divisores isolados, como Shliapnikov.
5) Sokolnikov deve ser imediatamente chamado da França, e o Comitê Central
850 Obras Escolhidas

francês deve ser informado de que Sokolnikov não tem atribuições sobre assuntos
franceses do Comitê Central do partido ou do Comintern.
6) Não estou alarmado com questões econômicas. Rykov será capaz de cuidar
delas. A oposição ganha absolutamente zero pontos em questões econômicas.
7) É muito bom que Bukharin tenha decidido se apresentar em Moscou e
Peter [Petrogrado].
Bem, adeus por enquanto. Atenciosamente
J. Stalin
15 de junho de 1926
P.S. Rudzutak junto com Mikoian propõe adiar o plenário para 20 de julho.
Eu não tenho objeções.
J. Stalin

[25 de junho de 1926]


Sochi, 25/6/26
Para Molotov, Rykov, Bukharin, e outros amigos,
Há muito tempo penso na questão do caso Lashevich, indo e voltando ligando-
o à questão dos grupos de oposição em geral; várias vezes eu cheguei a várias
opiniões e finalmente me decidi sobre o seguinte:
1) Antes do surgimento do grupo Zinoviev, aqueles com tendências oposicio-
nistas (Trotsky, a oposição dos trabalhadores e outros) se comportaram mais ou
menos lealmente e eram mais ou menos toleráveis;
2) Com o surgimento do grupo Zinoviev, aqueles com tendências oposicionis-
tas começaram a se tornar arrogantes e quebrar os limites da lealdade;
3) O grupo Zinoviev tornou-se o mentor de todos na oposição que queriam
dividir o partido; na verdade, tornou-se o líder das tendências de divisão no
partido;
4) Esse papel coupe ao grupo de Zinoviev porque a) é mais familiarizado com
nossos métodos do que qualquer outro grupo, b) é mais forte em geral do que
os outros grupos e tem o controle do Comitê Executivo da Comintern ([Zinoviev
é] presidente do Comitê Executivo do Comintern), que representa uma força
séria; c) por isso se comporta mais arrogantemente do que qualquer outro grupo,
fornecendo exemplos de “ousadia” e “determinação” para aqueles com outras
tendências;
5) Portanto, o grupo Zinoviev é agora o mais prejudicial, e o golpe deve ser
dado precisamente contra esse grupo no plenário;
6) Não só Lashevich deve ser removido do Comitê Central, mas Zinoviev deve
ser removido do Politburo com um aviso de que ele será removido do Comitê
Central se ele não cessar seu trabalho na preparação de uma cisma;
7) Ou damos este golpe agora com o cálculo de que Trotsky e os outros se
tornarão mais uma vez leais, ou corremos o risco de transformar o Comitê Cen-
tral e seus corpos em instituições inviáveis incapazes de trabalhar, e em muito em
breve teremos que lidar com uma tremenda confusão no partido que prejudicará
J. V. Stalin 851

a causa e nossa unidade;


8) É possível que, depois disso, Zinoviev apresente sua demissão do Comin-
tern. Devemos aceitá-la. De qualquer forma, depois de ser removido do Polit-
buro, Zinoviev não pode mais ser presidente; todos os partidos membros enten-
derão isso e tirarão a conclusão necessária. No Comintern, passaremos de um
sistema com um presidente para um sistema com secretariado. Isso desarmará o
grupo de Zinoviev e liquidará a arrogância de Zinoviev na preparação do cisma
(lembre-se do que foi dito sobre Estocolmo no Congresso!);
9) Asseguro-lhe que no partido e no país este caso vai passar sem as menores
complicações, ninguém vai sentir pena de Zinoviev, porque eles o conhecem bem;
10) Anteriormente, eu tinha pensado que uma resolução ampla sobre a uni-
dade era necessária no plenário. Agora eu acho que seria melhor deixar tal
resolução para a Conferência [XV] ([onde poderíamos fornecer] uma base teó-
rica e assim por diante) ou para o Congresso. No plenário, podemos e devemos
limitar-nos a uma breve resolução sobre a unidade no sentido estreito da palavra
em conexão com o caso Lashevich, citando a resolução de Lenin sobre a unidade
no Décimo Congresso. Esta resolução deve dizer que Zinoviev está sendo remo-
vido do Politburo não por causa de diferenças de opinião com o Comitê Central,
não há discordâncias menos profundas com Trotsky, afinal, embora a questão
de remover Trotsky do Politburo não esteja na ordem do dia, mas por causa de
sua política de cisma (Zinoviev). Penso que isso será melhor: os trabalhadores
entenderão, pois valorizam a unidade partidária, e isso será um sério aviso para
os outros grupos de oposição.
Dzerzhinsky pode ser trazido para o Politburo para substituir Zinoviev. O
partido receberia isso bem.
Ou o número de membros do Politburo pode ser aumentado para dez tra-
zendo tanto Dzerzhinsky quanto Rudzutak. Obviamente, com uma ampla reso-
lução de plenário (o plano anterior), seríamos forçados a unir Zinoviev e Trotsky
oficialmente em um campo, o que talvez seja prematuro e estrategicamente ir-
racional agora. É melhor quebrá-los individualmente. Deixe Trotsky e Piatakov
defenderem Zinoviev, e ouviremos. De qualquer forma, isso será melhor nesta
fase. Então veremos.
Falaremos com mais detalhes quando eu vier a Moscou. Acho que estarei em
Moscou três ou quatro dias antes do plenário. O que me dizem disso?
P.S. Eu não sei vocês, mas eu acho que com o caso Lashevich, os Zinovievitas
cortaram suas próprias gargantas, especialmente se este caso está ligado com o
caso Guralski. E, de fato, deve estar ligado.
Atenciosamente, J. Stalin.

[3 de agosto de 1926]
8/3 (terça-feira)
Molotov
1) Kamenev entregou sua renúncia antes da revisão no Politburo da questão
do plano de exportação-importação, e propõe que Mikoian o substitua.
852 Obras Escolhidas

2) O Politburo revisou a questão do plano de exportação-importação e o decla-


rou “desfavorável”, tendo criado a comissão Rudzutak para melhorar as questões
no Comissariado do Comércio.
3) Aceitaremos a renúncia de Kamenev na quinta-feira (5 de agosto) e no-
mearemos Mikoian, após a votação dos membros do Comitê Central sobre este
assunto.
4) Estamos pensando em enviar Kamenev para o Japão e Aralov para a China
(o governo chinês exige a remoção de Karakhan, e nós vamos ter que fazê-lo);
Kopp poderia talvez ir para a Itália, chamando Kerzhentsev para Moscou, já que
ele não deu certo na Itália.
5) As coisas, em média, não estão indo tão mal. Todos os grandes partidos
ocidentais saíram em apoio ao nosso Comitê Central (incluindo a França e a
Tchecoslováquia) contra a oposição.
6) Bukharin ainda não retornou. Há seis pessoas agora no Politburo: Ry-
kov, Rudzutak, Kalinin, Stalin, Trotsky e Kamenev (Kamenev vota já que não há
outros candidatos em Moscou).
7) Você já sabe sobre a nomeação de Kuibyshev para o Conselho Econômico
Supremo. A oposição está mantendo um perfil discreto no Politburo.
Saudações a todos os amigos em Sochi.
Atenciosamente
Stalin
Envie-me uma transcrição de seus discursos o mais rápido possível. Decidimos
publicar o caso Lashevich na próxima edição, ou seja, os debates sobre este caso.

[27 de agosto de 1926]


Para Molotov (para nossos amigos),
1) A delegação de mineiros britânicos de carvão deve chegar a qualquer dia,
se ainda não chegou. Eles devem ser recebidos “por todas as regras do jogo”
e o máximo de dinheiro possível deve ser coletado para eles. Ouvi dizer que
os americanos prometeram 1 milhão de dólares. Temos que coletar e enviar
possivelmente 1 milhão ou 2 milhões de rublos (menos do que os americanos é
impossível) ou talvez um total de 3 milhões. A situação na Inglaterra é séria e
nos obriga a fazer sérios “sacrifícios”.
2) Penso que devemos dizer a Andreev que ele deve insistir em um embargo.
O embargo é agora a questão mais urgente. Os comunistas britânicos estão tra-
vando uma campanha intensificada para o embargo. O Conselho Geral não deve
ser autorizado a se safar com meras chamadas para coletar dinheiro. Isso não é
suficiente agora. Agora [nós] devemos empurrar o embargo o mais forte possí-
vel. A propósito, como está indo o trabalho de Andreev?
3) Acho que nem a nossa própria imprensa nem a imprensa comunista britâ-
nica exploraram devidamente a fuga de Thomas e Henderson de prestar contas
aos congressos do “Partido Trabalhista” e dos “sindicatos do Conselho Geral”
(eles “saíram de férias”, um para o Canadá e outro para a Austrália). Devemos
trombetear tanto na nossa como na imprensa britânica que esses traidores fu-
J. V. Stalin 853

giram da responsabilidade, de modo que, quando a greve foi discutida, sua au-
sência os impediria de serem insultados. Devemos transmitir o fato de que o
Conselho Geral e o Comitê Executivo do Partido Trabalhista os ajudaram a fu-
gir de prestar contas e assim assumiram a responsabilidade por suas traições. É
estranho que a imprensa britânica (e nossa) esteja em silêncio sobre isso (li os
jornais comunistas britânicos, e sei que esses fatos não estão expostos lá.)
4) Como o Comintern reagiu à sua carta sobre a campanha para dissolver o
Parlamento e ter novas eleições? O que os comunistas britânicos pensam sobre
isso?
5) Você não deve adiar indefinidamente a questão da publicação do Kom-
munisticheskiy internatsional [Comunista Internacional] como semanal. Você
e Bukharin devem começar isso. Será extremamente importante para melhorar
e reorganizar todo o trabalho do Comintern e seus partidos membros. O que
Bukharin acha disso?
6) Como está a situação econômica? Como estão as coisas com aquisições
[agrícolas]? Que tal as exportações? Dê-me um breve relatório se houver tempo.
Bem, tudo de bom,
J. Stalin
27 de agosto de 1926

Resposta à Carta de Stalin (de 27 de agosto)


No ponto 1, a) Tomskii prometeu organizar hoje um apelo do Comitê Central
dos Mineiros aos mineiros britânicos sobre a greve de quatro meses. O apelo deve
dizer que nosso apoio continuará e será o mesmo de antes. Ele dirá diretamente
que [nosso] Comitê Central dos Mineiros está certo de que o desejo do Conselho
Sindical de 1% [contribuição] será aprovado. Isso é importante para hoje porque
em 2 de setembro haverá uma conferência dos mineiros de carvão em greve.
b) Devemos tomar a decisão de enviar os 2 milhões de rublos em uma reu-
nião cerimonial entre os sindicatos e uma delegação de mineiros logo antes do
Congresso Sindical dos Comerciários (antes de 6 de setembro).
Vamos discutir este último item b) no Politburo.
Eu concordo inteiramente sobre os pontos 2 e 3. Além disso, uma campanha
deve ser lançada, especialmente e sobretudo na Inglaterra, com slogans políticos
(dissolução do Parlamento, “Abaixo o governo conservador, para um governo
trabalhador genuíno”).
Molotov

[30 de agosto de 1926]


Olá, Molotov,
1) As coisas estão chegando ao ápice e não podemos evitar levantar a questão
da remoção de Grigorii [Zinoviev] do Comintern. Isto é indicado pela resolu-
ção de várias partes ocidentais (Inglaterra, Alemanha) sobre sua remoção. O
primeiro item da agenda (“questões internacionais”) para nossa (próxima) con-
854 Obras Escolhidas

ferência também fala sobre isso. Seria incompreensível e antinatural se nós (os
comunistas russos) “nos contorcermos” da questão de removê-lo ao mesmo tempo
em que as circunstâncias tornam a questão inevitável e dois partidos ocidentais
propuseram definitivamente removê-lo. Portanto, podemos e devemos tomar
uma decisão sobre a conveniência de removê-lo.
2) A tramitação formal do assunto deve ser feita em um plenário ampliado do
Comitê Executivo da Comintern. Se todos os partidos ou a grande maioria deles
falar em favor da remoção de Grigorii, tal expressão de vontade pode ser consi-
derada com segurança a vontade autêntica de todos os partidos, isto é, de todo o
Congresso. Uma decisão final pode ser tomada pelo [próximo] Congresso.
2) Já deveríamos estar pensando nas linhas gerais ou no primeiro (áspero!)
rascunho das teses sobre os sindicatos e a situação econômica. Existem tais ras-
cunhos na Secretaria, ou seja, a Secretaria recebeu esses “rascunhos”? Se não,
temos que nos apressar.
3) Você não acha que seria conveniente apresentar aos sindicatos um “sistema”
ou uma “instituição” de ativistas por sindicatos, ou talvez por vários ramos dos
sindicatos de manufatura? Se esse “sistema” ainda não foi introduzido, deveria
ser, porque tanto promoveria novas pessoas quanto aproximaria os sindicatos da
produção e, em geral, revigoraria os sindicatos. Só é necessário garantir que o
grupo ativista (em têxteis, petróleo, carvão e assim por diante) seja amplo, que
consista não apenas de funcionários sindicais, não apenas de comunistas, mas
também de trabalhadores não partidários (digamos cinquenta e cinquenta), e
assim por diante. O que você acha disso?
4) Você não acha que a questão de Kamenev deve ser levantada no plenário
do Comitê Central? O Comissário de Relações Exteriores está trabalhando para
que Kamenev seja enviado ao Japão?
Bem, tudo de bom,
J. Stalin
30 de agosto de 1926
Ps: Eu li o artigo de Stetskii sobre a nova oposição. O artigo é bom, mas há
algumas maçãs individuais nele que estragam todo o barril. Segundo Stetskii,
parece que não devemos nos esforçar para alcançar “predomínio completo dos
proletários e dos semiproletários nos sovietes”. Isso não está correto. A diferença
com a oposição não está nisso, mas, em primeiro lugar, que o proletariado não
pode predominar fisicamente naqueles distritos onde há muitos poucos prole-
tários; segundo, na medida em que a predominância deve ser entendida como
política e não apenas estatística; e terceiro, na discordância radical dos métodos
de alcançar o predomínio que a oposição nos recomendou. É muito ruim que
ninguém tenha ajudado Stetskii a corrigir tais erros...

[4 de setembro de 1926]
9/4
Molotovich,
Sergo estava aqui para me ver outro dia. Ele está furioso com a declaração do
J. V. Stalin 855

Comitê Central sobre sua retirada. Ele vê a formulação do recall como punição,
como um insulto dado pelo Comitê Central por alguma razão desconhecida. Ele
sente que a frase sobre Sergo ser transferido para Rostov “no lugar de Mikoian”
é um indício de que Mikoian é mais importante que Sergo, que Sergo só é bom o
suficiente para ser vice de Mikoian, e assim por diante. Ele entende que o Comitê
Central nunca teve e nunca poderia ter o desejo de ofendê-lo, insultá-lo, colocá-lo
sob Mikoian, e assim por diante, mas ele acredita que aqueles que recebem uma
cópia da resolução do Comitê Central poderiam entendê-lo como de fato um
ataque a Sergo, e que deveria ser formulado melhor e mais precisamente. Acho
que devemos satisfazê-lo, já que ele é objetivamente colocado na posição de uma
pessoa ofendida por causa de um erro acidental na formulação. A formulação
pode ser corrigida aproximadamente da seguinte forma:
1) Acatar o pedido de Camarada Ordzhonikidze para aliviá-lo de suas funções
como primeiro secretário do Comitê Regional do Partido Transcaucasiano e rejei-
tar a exigência das organizações transcaucasianas (os comitês centrais nacionais e
o Comitê Regional Transcaucasiano) em manter o Camarada Ordzhonikidze em
seu antigo posto.
2) Adiar por vários meses, tendo em vista a recusa definitiva do Camarada
Ordzhonikidze de se transferir imediatamente para Moscou, a questão de no-
mear o camarada Ordzhonikidze Comissário da Inspeção Operário-Camponesa
e suplente do Conselho de Comissários.
3) Aceitar a proposta do Comitê Regional do Partido Norte-Caucasiano de
confirmar camarada Ordzhonikidze como primeiro secretário do Comitê Cauca-
siano do Norte (se o camarada Ordzhonikidze consentir).
Quanto mais cedo você cuidar dessa coisinha, melhor, e então uma nova cópia
da resolução do Comitê Central terá que ser enviada a todos que receberam a
cópia antiga.
Pode-se dizer que isso tudo é bobagem. Talvez. Mas devo dizer que essa
bobagem pode prejudicar seriamente a causa, se não a corrigirmos.
Nazaretian está desempenhando um papel muito desagradável neste caso,
que só fere o orgulho de Sergo e o constrange. Não sei qual é o propósito espe-
cífico dele.
Bem, tudo de bom,
J. Stalin

[8 de setembro de 1926]
9/8
Recebi sua carta.
1) Nossa delegação em Berlim se comportou muito bem. O relatório do Con-
selho Sindical está em média aceitável. O apelo do Conselho Sindical é bom. A
entrevista de Tomskii é boa. Eu não insisto em um empréstimo [em oposição a
uma concessão total] ao Conselho Geral ou à Federação dos Mineiros de Carvão.
Acho que a questão do empréstimo pode ser adiada por enquanto. Levantei a
questão do empréstimo para mostrar à “Europa” que não somos uma república
856 Obras Escolhidas

“feita de dinheiro”, mas pessoas com cálculo, capazes de salvar um kopeck, que
damos empréstimos para sermos pagos, e assim por diante. Mas este assunto
pode ser adiado ou talvez descartado completamente.
2) Eu já enviei um telegrama codificado sobre a China. Estou certo de que
Kopp e Serebriakov não cumprirão nossa política; eles só darão a Chang [Tsolin]
a oportunidade de explorar nossas pequenas diferenças e arruinar nossa causa.
Enviar Kopp de volta ao Japão significará praticamente negar a decisão do Po-
litburo sobre Kopp e Kamenev. Não vai parecer bom se as decisões tomadas pelo
Politburo em relação a um conjunto de membros forem anuladas pelo mesmo
Politburo contra outro conjunto de membros sem fundamentos suficientes. É
claro que, no momento, você pode ver as coisas melhor [em Moscou], mas ainda
não devemos correr de um extremo para outro porque Chang, encorajado por
Kopp, tomou isso em sua cabeça para nos chantagear.
Bem, tudo de bom.
Saudações J. Stalin

[16 de setembro de 1926] Olá, Molotov,


Recebi sua carta de 12 de setembro.
1) É bom que os mal-entendidos com Serebriakov e Kopp tenham sido fi-
nalmente eliminados. Caso contrário, teríamos demolido nossa própria política,
essas pessoas teriam sido reféns de Chang e dos japoneses, e nós, por sua vez,
teríamos nos encontrado reféns dessas pessoas. A força de Chang deriva, aliás,
do fato de que ele agora sabe (Kopp e Serebriakov o deixaram saber) que não
embarcaremos em uma intervenção militar, que mesmo naquela época, há meio
ano, não estávamos pensando em avançar sobre Harbin, que ele não tem nada a
temer e pode se permitir ser descarado, vendendo “tal e tal” para os japoneses
ou (especialmente) os britânicos, a fim de obter algum tipo de ajuda. Essa é a
questão. Kopp e Serebriakov disseram a Chang (por causa de sua indiscrição)
um segredo de nossa diplomacia, o segredo de que estamos apenas assustando
Chang, mas não entraremos em guerra pela Ferrovia Oriental Chinesa. Eles ti-
veram a ideia de que poderiam comprar Chang e os japoneses com suavidade e
logorreia! Obviamente eles também tinham um propósito de facção aqui, reali-
zado de acordo com a linha do Comissário de Relações Exteriores com a ajuda
de Litvinov.
2) Agora posso dizer com total confiança que Chang se restringirá a “peque-
nos golpes” e que não chegará a tomar a Ferrovia Oriental Chinesa nesta fase.
Chang, e o Japão (e a Inglaterra) através dele, estão sondando, testando a força
de nossa resistência. É precisamente por isso que Karakhan não deveria ter sido
chamado agora. Mas apenas por essa razão. Porque me parece que Karakhan,
que se envolveu totalmente nos esquemas dissimulados dos Fengitas e outros “ge-
nerais” chineses, agora constitui um fator negativo da perspectiva da substância
da nossa política na China. Teremos que considerar a questão da Ferrovia Ori-
ental Chinesa e Chang em um futuro próximo.
3) Eu não escrevi para você da última vez sobre Sergo em detalhes. Mas agora
devo informá-lo que tanto Sergo como, especialmente, Nazaretian me deixaram
J. V. Stalin 857

com uma impressão desagradável em relação ao incidente envolvendo sua “reti-


rada” do Transcaucaso. Eu discuti com o Sergo, chamei-o de mesquinho e parei
de vê-lo (ele está agora em Novo Monte Athos). A questão da composição da se-
cretaria do Comitê Regional do Partido Transcaucasiano deve agora ser discutida
separadamente. Nazaretian não será substituto de Sergo na secretaria (ele não
tem estatura; ele não é sério e nem sempre é verdadeiro).
4) No que diz respeito aos números-alvo, acho que temos que pressionar agora
e, definitivamente, reduzir os funcionários dos comissariados e dos órgãos de
autofinanciamento de cima. Caso contrário, falar sobre austeridade econômica
permanecerá vazio. A participação da indústria deve definitivamente ser aumen-
tada.
5) As negociações com a Krupskaya não apenas estão mal programadas agora,
como são politicamente prejudiciais. Krupskaya é uma divisora (veja seu discurso
sobre “Estocolmo” no XIV Congresso). Ela tem que ser derrubada, como uma
divisora, se quisermos preservar a unidade do partido. Não podemos ter duas
linhas contraditórias, lutando contra divisores e fazendo as pazes com eles. Isso
não é dialética, é bobagem e desamparo. É possível que amanhã Zinoviev saia
com uma declaração sobre a “falta de princípio” de Molotov e Bukharin, [di-
zendo] que Molotov e Bukharin “ofereceram” a Zinoviev (através de Krupskaya)
um “bloco” e que ele, Zinoviev, “rejeitou esse flerte intolerável com desdém”, e
assim por diante e assim por diante.
6) Você está absolutamente certo sobre o “bloco de agosto”. Não apenas um,
mas vários artigos de Ilich [de Lenin] devem ser publicados, e junto com eles,
devemos contar a história de como este bloco surgiu. Temos que liberar Sorin
para este assunto. Um discurso seu e de Bukharin é absolutamente necessário.
É um assunto sério.
7) É bom ouvir que o comércio e os salários estão indo muito bem.
8) Não seria uma má ideia destruir os novatos de Nechaev.
9) O poema de Demian [Bednyi] não vai funcionar. É muito seco e sem vida.
Eu escrevi-lhe sobre isso.
10) Estou melhorando um pouco, mas meu braço ainda dói.
11) Bukharin é um porco e talvez pior do que um suíno porque ele considera
abaixo de sua dignidade escrever até mesmo duas linhas sobre suas impressões
sobre a Alemanha. Vou me vingar por isso.328
Bem, é isso por enquanto.
Atenciosamente
J. Stalin
16 de setembro de 1926
Adição à carta
Uma impressão extremamente ruim é produzida pelos constantes comunica-
dos da imprensa (especialmente na imprensa econômica) sobre a completa viola-
ção das diretrizes do Comissariado do Comércio e do Partido pelas cooperativas e
pelas agências locais e centrais de compras. A impunidade virtual desses crimino-
328Stalin aqui está sendo jocoso, sua relação com Bukharin em 1926 era de grande proximidade
(N.T.)
858 Obras Escolhidas

sos óbvios é água para o moinho dos homens da NEP [intermediários privados]
e outros inimigos da classe trabalhadora que desmoraliza todo o aparato econô-
mico e soviético, transforma nossas diretrizes e nosso partido em fantoches sem
sentido. Isso não pode ser tolerado mais se não quisermos ser capturados por
esses bastardos que afirmam “aceitar” nossas diretrizes, mas na realidade zom-
bam de nós. Proponho exigir ao Comissário de Comércio (e Inspeção Operária-
Camponesa [fazer o seguinte]:
1) Os infratores da política de preços sobre aquisições estatais devem ser re-
movidos e entregues aos tribunais e os nomes dos criminosos publicados.
2) Retirar imediatamente e entregar aos tribunais os infratores da política de
preços relativa às vendas de bens industriais ao público (visando a redução dos
preços no varejo), publicar [seus nomes completos] e assim por diante.
3) Rodar uma circular partidária sobre como esses infratores são inimigos da
classe trabalhadora e como a luta com eles deve ser impiedosa.
Insisto de forma adamante na minha proposta e peço a todos vocês que a
aceitem. Entenda que sem essas medidas perderemos a campanha contra os ele-
mentos da NEP que estão sentados em nossos órgãos estaduais de compras e
cooperativas. Sem essas medidas, será um desastre.
Aguardando sua resposta,
J. Stalin 16 de setembro de 1926

[23 de setembro de 1926]


Camarada Molotov,
Recebi sua carta de 20 de setembro.
1) Em relação aos salários, acho que você acertou bastante. É importante que
os estratos inferiores recebam algo tangível. Também seria bom dar algo aos tra-
balhadores do petróleo que não recebem muito no geral, mas se não houver uma
oportunidade neste momento eles terão que ser recusados, apesar das queixas
do povo Baku.
2) Se Trotsky “está com raiva” e pensa em “abertamente apostar tudo”, isso
é tudo pior para ele. É bem possível que ele seja expulso do Politburo, mas isso
depende do comportamento dele.
A questão é a seguinte: ou eles devem se submeter ao partido ou o partido
deve se submeter a eles.
É claro que o partido deixará de existir como partido se permitir a última
possibilidade.
3) Quanto a Smirnov, após o aviso que ele já teve, apenas uma solução resta,
expulsá-lo, pelo menos temporariamente.
4) Eu acho que o plenário não pode “encobrir” a questão de Medvedev. Talvez
você tenha um meio de “diminuir” se assim o for, diga-me qual é.
5) Talvez você esteja certo sobre a questão de o bloco de oposição ser levantada
na conferência. Ainda assim, não devemos nos antecipar; melhor observar como
esse bloco vai se comportar agora.
6) Você e Bukharin devem apressar-se com o seu discurso sobre a questão do
J. V. Stalin 859

bloco de agosto, não há razão para esperar agora, eu acho.


7) Escrevi a Demian [Bednyi] que seu conto é “seco e sem vida” e “não vai
dar” (ou algo assim) e que “não deve ser impresso”. Eu não tenho uma cópia ou
eu enviaria para você imediatamente.
Quanto a este conto ser um “sintoma” ruim no sentido da posição de Demian
estar piorando eu duvido.
Falaremos mais quando eu vier.
8) Não dê a Karakhan liberdade sobre a China ou ele vai arruinar a coisa
toda, isso é certo. Ele sobreviveu à sua utilidade: ele foi e permaneceu como
embaixador da primeira fase da revolução chinesa e é totalmente inútil como
líder na nova situação atual, tanto os chineses quanto a situação internacional,
dado os novos eventos que ele não entende e não consegue entender por conta
própria, pois ele é uma pessoa terrivelmente frívola e limitada (no sentido de
perspectiva revolucionária). Mas quanto à audácia e imprudência, arrogância e
presunção, isso ele tem de sobra. O que é especialmente perigoso. Karakhan
nunca entenderá que Hankow logo se tornará a Moscou chinesa...
Bem, os melhores cumprimentos,
J. Stalin
23 de setembro de 1926
Sochi. Estou melhorando, mais ou menos.
P.S. Não estou certo de que um apelo aberto ao Conselho Geral do Conse-
lho Sindical sobre um protesto conjunto contra o bombardeio de Wanhsien está
correto. Parecerá que estamos insultando o Conselho Geral e os Conservado-
res desnecessariamente. Isso é necessário? Seria melhor pegar outras rotas mais
eficazes.

[23 de dezembro de 1926]


Olá, Viacheslav,
Você não precisa se apressar de volta, você poderia facilmente permanecer
mais uma semana (ou até mais) além do prazo final. As coisas estão indo muito
bem aqui para nós.
1) as compras e exportações estaduais estão indo bem;
2) as receitas para o orçamento do Estado não estão sendo bem aportadas;
3) os Chervonets329 estão indo bem;
4) a indústria está avançando um pouco;
5) decidimos baixar o preço de atacado em uma série de bens de consumo;
6) estamos elaborando medidas imediatas e concretas para reduzir os preços
no varejo (vamos pressionar brutalmente a rede comercial e cooperativa).
O Congresso dos Sindicatos aprovou “normalmente” como diria Tomskii; ou
seja, preservamos tudo o que tínhamos, mas não adicionamos nada de novo ao
nosso arsenal.
O plenário expandido do Comitê Executivo da Comintern deu certo. A reso-
329 Nota de dez rublos em circulação à época (N.T.)
860 Obras Escolhidas

lução da XV Conferência foi aprovada por unanimidade (um apoiador de Bor-


diga da Itália se absteve). Nossos oposicionistas são realmente tolos. Por que di-
abos eles pularam na briga eu não sei, mas eles ficaram bem e verdadeiramente
chicoteados. Quando Kamenev fez um discurso irresponsavelmente prejudicial,
tive que lembrá-lo nas observações finais do telegrama a M. Romanov. Kame-
nev saiu com uma “refutação”, dizendo: “É uma mentira”. Zinoviev, Kamenev,
Smilga e Fedorov trouxeram uma “declaração” de “refutação” ao Politburo, exi-
gindo que fosse publicada. Publicamos a declaração no Bolchevik com a resposta
do Comitê Central e com documentos que massacraram Kamenev politicamente.
Consideramos que Kamenev está fora de serviço e não estará mais no Comitê
Central.
Bem, é isso por enquanto. Te direi mais, pessoalmente.
Lembranças, Koba.
23 de dezembro de 1926

[23 de junho de 1927]


Caro Viacheslav,
1) Dei uma olhada (muito rapidamente) na “transcrição da sessão da Comissão
Central de Controle” sobre o caso Zinoviev e Trotsky.
A impressão dada é de total confusão por parte da Comissão Central de Con-
trole. Zinoviev e Trotsky, não os membros da Comissão, interrogaram e acusa-
ram. É estranho que alguns dos membros da Comissão não apareceram. Onde
está o Sergo? Onde ele foi e por que está se escondendo? Que vergonha para
ele! Protesto resolutamente contra o fato de que a comissão para acusar Trotsky
e Zinoviev se transformou em um fórum para acusações contra o Comitê Central
e o Comintern, com ênfase no “caso” contra Stalin, que não está em Moscou e
sobre quem, portanto, qualquer acusação pode ser fixada. Será que Trotsky e
Zinoviev realmente receberão esta “transcrição” para distribuir! Isso é tudo que
precisamos.
2) Observe os documentos sobre Trud [Trabalho]. Um expurgo deve ser con-
duzido em Trud.

[27 de junho de 1927]


Queridos Viacheslav e Nikolai,
1. Recebi suas últimas cartas (24 de junho) e a resolução do Politburo sobre
o Comitê Anglo-Russo. Ela os esmagou em pedaços muito bem (quero dizer o
Conselho Geral), sem fazer muito barulho, mas minuciosamente. Eles podem
romper [conosco] a fim de “demonstrar” sua “independência” de Moscou e ga-
nhar o louvor de Chamberlain. Mas eles perderão mais em romper agora do
que [se tivessem rompido] durante o período da greve do carvão, uma vez que
a ameaça real de guerra afeta todos os trabalhadores, e muito profundamente.
Eles tentarão fazer grande parte das execuções, mas isso não vai funcionar por
muito tempo, especialmente se você tentar fornecer alguma declaração bem ar-
gumentada sobre esse resultado. Você deve atirar de volta em “seus” rostos que
J. V. Stalin 861

eles estão ajudando seus mestres a lançar e travar uma guerra.


2. Eu já escrevi sobre Feng [Yu Hsiang] no telegrama codificado. Aparente-
mente, o relatório sobre Feng corresponde à realidade. Temo que Wuhan perca
a coragem e fique sob o comando de Nanquim. Não vale a pena discutir com
Wuhan sobre Borodin (se Wuhan quiser removê-lo). Mas devemos insistir infle-
xivelmente em Wuhan não se submeter a Nanquim enquanto ainda há uma opor-
tunidade de insistir. Perder Wuhan como um centro separado significa perder
pelo menos algum centro para o movimento revolucionário, perder a possibili-
dade de livre montagem e comícios para os trabalhadores, perder a possibilidade
da existência aberta do Partido Comunista, perder a possibilidade de uma im-
prensa revolucionária aberta em uma palavra, perdendo a possibilidade de orga-
nizar abertamente o proletariado e a revolução. Para obter tudo isso, garanto-lhe,
vale a pena dar a Wuhan mais 35 milhões, mas apenas com alguma garantia de
que Wuhan não se renderá às misericórdias de Nanquim, com nosso dinheiro
desperdiçado por nada.
3. Recebi um telegrama outro dia de Wang Ching Wei e dei-lhe uma resposta
bastante longa. Leia e me diga sua opinião em breve.
4. Não tenho objeções em relação a Lozovskii.
5. Quanto à conveniência de tornar “oficial” nossas relações com Chiang,
tenho minhas dúvidas. A analogia com Chang Tsolin não se sustenta. Reconhe-
cemos Chang há três anos. Se o assunto viesse à tona hoje, não o reconheceríamos
oficialmente. Reconhecer Chiang agora (neste minuto) significaria dar um golpe
contra Wuhan (Wuhan ainda existe) e jogar a luva para Chang Tsolin (lembre-
se da Ferrovia Oriental Chinesa). Seria melhor esperar por Chiang e manter o
status quo.
6. Não é surpresa que R. tenha entrado no esquerdismo em grande estilo.
Isso significa que ele perdeu por um minuto a oportunidade de “planejar”, “ma-
nobrar”, e assim por diante. Mas Mikoian é um iniciante na política, um iniciante
talentoso, mas um iniciante mesmo assim. Quando ele crescer, vai melhorar.
Enfim, lembranças,
J. Stalin
27 de junho de 1926
864 Obras Escolhidas

Você também pode gostar