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BrazilianJournal of Development

Implantação de uma indústria cooperativa de processamento de peixes em


Mato Grosso: limites e possibilidades

Implementation of a cooperative fish processing industry in Mato Grosso:


limits and possibilities
DOI:10.34117/bjdv5n8-151

Recebimento dos originais: 14/08/2019


Aceitação para publicação: 02/09/2019

Janderson Salis de Almeida


Formação acadêmica mais alta: graduado - Universidade do Estado de Mato Grosso
(UNEMAT)
Instituição de atuação atual: Empresário
Endereço completo: Rodovia Juara/BransnorteKm 02 - Juara-MT CEP 78575-000
E-mail: salis33@hotmail.com

Ana Maria de Lima


Formação Acadêmica: Doutorado em Administração
Instituição de atuação atual: Universidade do Estado de Mato Grosso
Endereço completo: Rodovia Juara/BransnorteKm 02 - Juara-MT CEP 78575-000
Email: ana.lima@unemat.br

Vilma Eliane Machado de Oliveira


Formação Acadêmica: mestre em Administração pela Faculdades Alves Farias - ALFA
Instituição de atuação: Universidade do Estado de Mato Grosso
Endereço completo: Rodovia Juara/BransnorteKm 02 - Juara-MT CEP 78575-000
e-mail: vilma.eliane@unemaat.br

Adelice Minetto Sznitowski


Formação Acadêmica: Doutora em Administração
Instituição de atuação atual: Universidade do Estado de Mato Grosso
Endereço: Rod. MT 358 kM 07 - Jd Aeroporto - Tangará da Serra-MT CEP 78.300.000
E-mail: adeliceadm@gmail.com

RESUMO

O mercado de piscicultura cresce no Brasil e nos últimos anos a atividade pesqueira tem gerado
trabalho, renda e lazer em diversas regiões. No Vale do Arinos-MT há potencial territorial e
hidrográfico para o desenvolvimento dessa atividade. Nesse cenário o objetivo foi identificar
os limites e possibilidades na implantação e funcionamento de uma cooperativa de
processamento de peixes. A pesquisa na forma de estudo de caso envolveu a Cooperativa
Agropecuária Mista e Aquícola do Rio Arinos (COOPERARINOS) na cidade de Juara-MT. A
coleta de dados qualitativos abrangeu agentes ligados à cooperativa e consumo. Constatou que
o mercado e as condições hídricas são possibilidades favoráveis a piscicultura local e as
limitações foram a dificuldade de organização coletiva, acesso a recursos financeiros e
políticas públicas. Ainda observou-se que o frigorífico, embora contribuísse para o
processamento do peixe, não resultou no aumento da venda pela falta do Sistema de Inspeção
Federal (SIF).

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Palavras-chave: Piscicultura. Cooperativa. Produção. Desenvolvimento.

ABSTRACT

The fish farming market has grown in Brazil and in the last years the fishing activity has
generated work, income and leisure in several regions. In Vale do Arinos-MT there is
territorial and hydrographic potential for the development of this activity. In this scenario the
objective was to identify the limits and possibilities in the implantation and operation of a fish
processing cooperative. The research in the form of a case study involved the Cooperativa
Agropecuária Mista e Aquícola of Rio Arinos (COOPERARINOS) in the city of Juara-MT.
The collection of qualitative data included agents linked to the cooperative and consumption.
He observed that the market and water conditions are favorable possibilities for local fish
farming and the limitations were the difficulty of collective organization, access to financial
resources and public policies. It was also observed that the refrigerator, although it contributed
to the processing of the fish, did not result in the increase in sales due to the lack of the Federal
Inspection System (SIF).

Keywords: Pisciculture. Cooperativa. Production. Development.

1. INTRODUÇÃO
O mercado de piscicultura é vasto e com potencial de desenvolvimento. Entre os anos
de 2005 a 2010 a produção nacional de pescados em cativeiro teve um aumento 86,3%,
totalizando 479 mil toneladas. De acordo com a Organização das Nações Unidas para
Alimentação e Agricultura (FAO), o Brasil tem condições de produzir, de maneira sustentável,
20 milhões de toneladas por ano de pescado.
De acordo com Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (SEBRAE,
2017), no Brasil mais de 3.000 espécies de peixes já foram catalogadas. Entre os alevinos
nativos, muitos demonstraram ser vantajosos para na exploração da piscicultura, a saber, o
Dourado, Piau, Pintado, Jaú, Pirarucu, Bijupirá, dentre outros.
A produção total brasileira no ano de 2015 foi de 483.241 toneladas, com alta de 1,88%
em relação ao ano anterior. Quanto à exportação, o Brasil está em 22º lugar no mundo: com
cerca de 40 mil toneladas por ano (SEBRAE, 2017).
O Brasil reúne condições favoráveis à piscicultura. Além do potencial de mercado,
conta com clima favorável, disponibilidade de áreas, abundantes safras de grãos (soja, milho,
trigo, entre outros que geram matéria prima para ração animal) e ainda bom potencial hídrico
(BOZANO, 2002; KUBITZA et. al, 2012).
Mato Grosso se destaca na produção pecuária e agrícola (soja, bovinocultura de corte,
milho e algodão) e a piscicultura surge como uma das alternativas para os produtores rurais

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aumentarem seu mix de produtos dentro em suas propriedades. Além disso, a piscicultura
constitui alternativa para melhoria de vida de moradores rurais, ribeirinhos e povos indígenas.
Dados da Federação da Agricultura e Pecuária do Estado de Mato Grosso (FAMATO,
2014) apontam que o Estado de Mato Grosso produziu em 2011, aproximadamente 49 mil
toneladas de peixes em água doce, sendo o terceiro maior produtor nacional e o maior produtor
na região Centro-Oeste. De acordo com o Instituto de Defesa Agropecuária do Estado de Mato
Grosso (INDEA-MT), existiam 994 produtores de peixe até janeiro de 2014, distribuídos por
todo o Estado de Mato Grosso.
Quanto à localização, Juara pertence à Mesorregião Norte Mato-grossense, que tem o
Município de Sinop como polo regional e a norte faz limites com os estados de Amazonas e
Pará. Já a leste pelo Rio Xingu, ao sul pelo divisor de águas das bacias dos rios Amazonas e
Paraguai e a oeste com a Bolívia e o Estado de Rondônia. (TRUGILLO, 2009).
As condições hidrográficas favoráveis podem tornar a piscicultura uma atividade
promissora e com impactos positivos no âmbito social, econômico e ambiental. Nesse
contexto, forma de trabalho que fortaleçam os processos produtivos, como o cooperativismo,
é adequado. Para Furquim (2001, p. 23), o cooperativismo “é o instrumento mais perfeito de
organização da sociedade, por ser um sistema de organização social e econômico, cujo
objetivo não é o conjunto de pessoas, mas o indivíduo através do conjunto das pessoas”
constitui uma forma organizativa alternativa para os piscicultores, uma vez que oferece
benefícios àqueles que optam pelo trabalho cooperativo.
No trabalho de pequenos e médios produtores rurais, o cooperativismo passa ser um
mecanismo estratégico para o desenvolvimento humano e produtivo. A constituição de
cooperativas pode trazer soluções para muitos problemas locais, inclusive na busca por
inserção dos produtos no mercado. Desse modo, contribuirá com o desenvolvimento local por
meio da geração de renda e, em função disso, a melhoria da qualidade de vida da população.
(BRASIL, 2016).
Em face do exposto, o estudo teve como objetivo central identificar os limites e
possibilidades para a implantação e funcionamento de uma indústria cooperativa de
processamento de peixes.
A pesquisa tem sua relevância por apresentar uma alternativa para a geração de
trabalho e renda via produção e processamento de peixe, bem como proporcionar aos
produtores locais esclarecimentos a respeito do cooperativismo como forma organizativa.

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O artigo está dividido em cinco seções, sendo a primeira destinada a introdução onde
é destacado o contexto e o objetivo do estudo. A segunda traz o aporte teórico utilizado. A
terceira expõe os procedimentos metodológicos. A quarta analisa os resultados e por fim, na
quinta seção têm-se as considerações finais.

2. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
2.1 O COOPERATIVISMO
A origem de organizações chamadas de cooperativas ocorreu em dezembro de 1844,
quando "27 tecelões e uma tecelã do bairro de Rochdale, em Manchester, na Inglaterra,
fundaram a Sociedade dos Probos Pioneiros de Rochdale" (IRION, 1997, p. 25),
Com objetivos claros, esses trabalhadores economizaram vinte e oito libras para criarem
uma sociedade que atuaria no mercado, tendo o homem como principal finalidade na
associação e não o lucro. Pertinente destacar que, ao iniciarem seu negócio, foram motivo de
deboche por parte dos demais comerciantes. Contudo, logo no primeiro ano de funcionamento
o capital da cooperativa aumentou para cento e oitenta libras e cerca de dez anos mais tarde o
“Armazém de Rochdale” já contava com 1.400 cooperantes, prosperou economicamente,
funcionando de forma democrática e exercendo sua função social (IRION, 1997).
A cooperação se faz presente na história do homem. Vem do primitivismo quando
contribuía para que o homem alcançasse seus objetivos. No entanto, houve por algum tempo,
certa incompreensão do termo cooperativismo. Tal incompreensão gerava falta de clareza ou
coerência quando da comparação com outros modelos de sociedades. Neste sentido,
(BULGARELLI, 1967, p. 30 apud FRANZ 2006) menciona que:

As dificuldades iniciais dessa conceituação decorrem, em grande parte, de terem


sido as definições formuladas por economistas e com o sentido de realçar a
supressão do intermediário e o aspecto não lucrativo da atividade cooperativa,
elementos que por si só não eram capazes de conferir originalidade à
cooperativa, deixando margem de confusão com outras sociedades. [...] Por
outro lado, essas dificuldades eram agravadas pelo fato de as cooperativas,
atuando nos mais variados setores da atividade humana, se dividirem e
subdividirem em inúmeros tipos e categorias. (BULGARELLI, 1967, p. 30 apud
FRANZ 2006).

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As organizações cooperativas atuam na busca e desenvolvimento de princípios
organizacionais diferentes dos da iniciativa privada ou pública. Segundo Irion (1997, p. 51), o
Congresso da Aliança Cooperativa Internacional (ACI), realizado em Viena, atualizou em
1996 os princípios cooperativistas, os quais sinteticamente são enunciados no quadro 1.

Quadro 1 - Princípios do cooperativismo


PRINCÍPIOS DESCRIÇÃO
As cooperativas são organizações voluntárias, abertas a todas as
Adesão pessoas aptas a utilizar os seus serviços e assumir as
voluntária e responsabilidades como membros, sem discriminação de sexo,
livre idade, raça, preferências políticas e religiosas;
As cooperativas são organizações democráticas, controladas pelos
seus membros, que participam ativamente na formulação das suas
Gestão políticas e na tomada de decisões. A Diretoria eleita agirá por
Democrática e delegação e com responsabilidade para com os associados. Os
livre membros têm igual direito de voto (um membro, um voto).
Os sócios contribuem equitativamente para o capital das suas
cooperativas e controlam-no democraticamente. Parte desse capital
Participação é, normalmente, propriedade comum da cooperativa. Recebem,
econômica dos habitualmente, se houver uma remuneração limitada ao capital
sócios integralizado, como condição de sua adesão. O destino dos
excedentes visa sempre o desenvolvimento da cooperativa, seja por
meio da criação de reservas legais, em benefício dos sócios nas
transações com a sociedade ou, de apoio a outras atividades, sendo
necessária a aprovação via assembleia;
As cooperativas são organizações autônomas, de ajuda mútua, sob
Autonomia e controle de seus membros. As relações das cooperativas com outras
independência organizações sejam públicas ou privadas, devem ser exercidas de modo
a preservar seu controle democrático e autônomo.
As cooperativas promovem a educação e a formação dos seus
membros, dos representantes eleitos e dos colaboradores, de forma

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Educação, que estes possam contribuir, eficazmente, para o desenvolvimento
formação e das suas cooperativas. Informam o público em geral,
informação. particularmente os jovens e os líderes de opinião, sobre a natureza e
as vantagens da cooperação. É dever das cooperativas prestar
assistência técnica, educacional e social para os seus associados,
devendo constituir um fundo, previsto em estatuto para garantir a
realização desse princípio;
Além de suas atividades específicas de atendimento aos associados,
Inter as cooperativas trabalham juntas, regidas por estruturas locais,
cooperação regionais, nacionais e internacionais, que permitam manter o
desenvolvimento, o fortalecimento e a sustentação do movimento
cooperativo.
Fonte: Adaptado da Lei 5764/71

Os princípios citados no quadro 1 dão sentido social e democrático ao modelo de


organização, na qual o capital torna-se um instrumento de materialização dos objetivos
propostos, ou seja, não é um elemento determinante de sua constituição.
Há diversos tipos no Brasil de organizações cooperativas previstas pela legislação
brasileira (Lei 5764/71), os quais são apresentados no quadro 2.

Quadro 2 - Tipos de Cooperativas


TIPOS DESCRIÇÃO
Cooperativas Reúnem produtores rurais ou agropastoris e de pesca, que trabalham
Agropecuárias de forma solidária na realização das várias etapas da cadeia produtiva.
Cooperativas de Caracterizam-se pela compra em comum de artigos de consumo
Consumo para seus cooperantes, buscando diminuir o custo desses produtos.
Na prática funcionam como supermercados.
Cooperativas de São sociedades de pessoas destinadas a proporcionar assistência
Crédito financeira a seus cooperados.
(Financeiras)
Cooperativas Pais e alunos se uniram para enfrentar a falta de estrutura do ensino
Educacionais público e o alto custo das mensalidades das escolas particulares.

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Cooperativas São as cooperativas constituídas por pessoas que precisam ser
Especiais tuteladas, objetivando a organização e gestão de serviços sócios
(Cooperativas sanitários e educativos.
Sociais)
Cooperativas de São cooperativas destinadas à construção, manutenção e
Habitação administração de conjuntos habitacionais para seu quadro social.
Cooperativas de Cooperativas cuja finalidade é atender direta e prioritariamente o
Infra estrutura - próprio quadro social com serviços de infraestrutura.
Cooperativas de Cooperativas com finalidade de pesquisar, extrair, lavrar,
Mineração industrializar, comercializar, importar e exportar produtos
minerais.

Cooperativas de Cooperativas dedicadas à produção de um ou mais tipos de bens e


Produção mercadorias.

Cooperativas de Cooperativas que se dedicam à recuperação e preservação da saúde


Saúde- humana.

Cooperativas de Cooperativas de prestação de serviços de transporte de cargas ou


Transporte passageiros em suas várias modalidades.
Cooperativas de Cooperativas que têm por finalidade prestar serviços e/ou atender
Turismo e Lazer direta e prioritariamente o seu quadro social com serviços turísticos,
lazer, entretenimento, esportes, artísticos, eventos e de hotelaria.
Cooperativas de Cooperativas dedicadas à produção de um ou mais tipos de bens e
Trabalho serviços.
Fonte: Adaptado da Lei 5764/71

O cooperativismo se assenta sobre quatro fundamentos: liberdade, igualdade,


solidariedade e racionalidade. O quadro 3 cita cada um deles.

Quadro 3 - Fundamentos do cooperativismo


FUNDAMENTOS DESCRIÇÃO

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A democracia é a concretização da liberdade, pois possibilita a
Liberdade: participação, escolha e decisão sobre as ações na cooperativa,
garantindo seu sucesso.
Numa cooperativa os direitos e obrigações são iguais para todos.
Igualdade: Ninguém tem mais ou menos poder ou benefício, por ter mais ou
menos capital.
A solidariedade é a alavanca de todo e qualquer processo
Solidariedade: cooperativo, pois é por meio da ajuda mútua que se constrói uma
economia solidária e coletiva.
O uso da ciência e da tecnologia no cooperativismo deve ser motivo
Racionalidade de emancipação, respeito e dignidade nas condições socioeconômico
das pessoas.
Fonte: Adaptado da Lei 5764/71.

2.2 A PISCICULTURA E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL


A atividade de piscicultura faz parte de noticiários e debates em nível local, nacional e
internacional ligadas ao tema sustentabilidade como alternativa aos desequilíbrios ambientais
ocasionados pelos avanços econômicos. (REIGOTTA, 1998).
As práticas sustentáveis devem prever a inter-relação entre homem e natureza. Nessa
perspectiva de inter-relações Sato e Carvalho (2005) discorrem que esse contato não ocorre
isoladamente, no entanto é perceptível a ação do homem em seu desfavor na busca pelo
desenvolvimento a qualquer custo.
Nesse contexto, a sustentabilidade tornou-se um tema recorrente nos debates e
reflexões na tentativa de garantir um futuro com qualidade de vida. O tema não diz respeito
apenas à individualidade do ser humano, mas aos aspectos coletivos, em escala nacional e
internacional. Esses debates ocorrem em nível global em prol do interesse no
comprometimento com atitudes responsáveis e transformadoras que possam responder ás
necessidades do meio ambiente (SATO, 2005).
Discorre Sachs (2003), que o princípio do desenvolvimento sustentável está em
crescer economicamente, preservando o meio ambiente e erradicando a pobreza. Pois o
modelo econômico tradicional que impõe suas necessidades em face dos recursos finitos da
natureza e da desigualdade social, gera desequilíbrios; o desenvolvimento deve vir atrelado ao

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compromisso econômico, social, político, cultural, humano e ambiental, como instrumento da
vida em sociedade.
Nessa perspectiva, a piscicultura se mostra uma alternativa na geração de trabalho e
renda. Os subsídios governamentais, estudos de viabilidade, assessoria técnica, dentro outros,
são fatores que auxiliam o fomento da organização dos produtores. (PEREIRA et. al., 2013).
Para Barbosa (1992), a atividade de piscicultura apresenta vantagens, dentre as quais a
possibilidade de uso de áreas improdutivas para agropecuária, como os terrenos alagadiços, os
quais são propícios para a criação de peixes. Além disso, oferece rápido retorno comercial,
podendo apresentar crescimento considerável de produção por área, demandando pouco gasto
de energia para locomoção e é um produto de eficiência quanto à conversão alimentar. Essa
conversão pode ser mais bem entendida quando se observa economias como a do Japão,
Noruega e Estados Unidos, países com maior número de produtores de peixe do mundo.
A maior parte da produção de peixes tem a finalidade de alimentação, contudo, podem-
se identificar outras utilidades, inclusive para fins sanitários, como no combate a larvas de
mosquitos ou moluscos transmissores de doenças, podem servir ainda como despoluidores de
alguns ambientes aquáticos; fins biológicos com a realização de estudos genéticos e testes
laboratoriais; ornamentação em aquários; pesca esportiva em pesque-pague, povoamento e
repovoamento de aéreas agredidas; fonte de proteína animal, já que constitui alimento mais
saudável em comparação a carnes vermelhas (SOARES, 2003).
No processo produtivo a piscicultura pode se apresentar custo relativamente baixo,
com isso, torna-se uma atividade econômica e financeira interessante aos produtores.
Complementarmente, mostra-se como alternativa de diversificação nos espaços rurais,
sobretudo na agricultura familiar. Há ainda a possibilidade de retorno financeiro para fins
industriais em frigoríficos próprios com uso produtivo da pele, na fabricação de rações, na
remoção das hipófises para utilização em hormônios, etc. Assim, a piscicultura se diferencia
pelas possiblidades de atividades agrícolas em ambiente aquático e, constitui como prática de
produção sustentável. (VALENTI, 2000).

3. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
A pesquisa ocorreu na forma de estudo de caso utilizando-se de análise em
profundidade (YIN, 2001) de dados na perspectiva qualitativa por meio da análise de discurso.
(GODOI; COELHO, 2011). O objeto de análise foi a Cooperativa Agropecuária Mista e

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Aquícola do Rio Arinos (COOPERARINOS), com frigorífico de processamento de peixes
instalado na cidade de Juara-MT.
As técnicas de coleta de dados utilizadas foram: observações in loco, pesquisa
documental, questionários e entrevistas (quadro 4) com sócios e atores sociais ligados ao
empreendimento cooperativo em questão.

Quadro 4- atores sociais entrevistados 2018.


Sujeitos Denominação Questões abordadas Forma de
abordagem
Histórico da cooperativa,
Presidente da
dificuldade, oportunidades, Entrevista não
cooperativa de E1
participação dos sócios, políticas estruturada
peixes
públicas locais;
Presidente da
Históricos, número de associados,
associação dos Entrevista não
E2 demanda, dificuldades,
pescadores de estruturada
oportunidades, mercado.
rio.
Entrevista
Chefe de Exigências legais para atividade,
semi
vigilância E3 atendimento da cooperativa às
estruturada
sanitária. normas sanitárias.
(1h20 min)
Processo produtivo, produtividade,
dificuldades, oportunidades,
Produtor e
E4 participação política do município, (27 min).
comerciante 01
participação na cooperativa,
benefícios da cooperativa.

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Entrevista
Processo produtivo, produtividade,
semi
dificuldades, oportunidades,
Produtora e estruturada
E5 participação política do município,
comerciante 02 (sem gravação
participação na cooperativa,
a pedido do
benefícios da cooperativa
entrevistado).
Quantificação de quantidade de
Gestores de R1, R2, R3, vendas, atendimento de demanda,
Questionário
Restaurantes R4 qualidade do pescado, tipo do
pescado.
Quantificação de quantidade de
Gestores de M1, M2, M3, vendas, atendimento de demanda,
Questionário
Mercados M4 qualidade do pescado, tipo do
pescado.

As observações in loco versaram sobre a estrutura da indústria de processamento da


cooperativa. Ocorreu de forma assistida com um dos sócios em duas visitas, sendo uma em
outubro e outra em dezembro de 2017. Foram considerados para tal os equipamentos,
organização interna, capacidade produtiva e aspectos inerentes ao funcionamento sobre o
abate e empacotamento dos peixes. Quanto às entrevistas foram realizadas em outubro a maio
de 2017 e novembro e maio de 2018.

4. RESULTADOS E DISCUSSÕES
4.1 A INDÚSTRIA COOPERATIVA
Importante esclarecer que a seda da COOPERARINOS está localizada na cidade de Porto
dos Gaúchos-MT, município vizinho de Juara-MT, na ocasião de formação da cooperativa
(ano 2013) a prefeitura de Porto dos Gaúchos cedeu um espaço para a cooperativa, contudo,
vários sócios moram e tem propriedades em Juara-MT.
Com passar dos anos o processo de formação do frigorífico de peixes da cooperativa em
Juara-MT ocorreu a partir de diversas mobilizações da comunidade local. Foram necessárias
trinta e uma reuniões, algumas com o SEBRAE para treinamentos sobre cooperativismo, bem
como reuniões com a Organização de Cooperativas Brasileira (OCB-MT). Ainda aconteceram
visitas por parte de um grupo de cooperados até a Indústria Brasileira de Pescados Amazônicos

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(NATIV), localizada em Sorriso–MT, ao frigorífico Bom Futuro, em Cuiabá-MT, pelo fato
desse ultimo ter participado em vários encontros estaduais e nacionais sobre piscicultura,
conforme o relato de E1.
Segundo o entrevistado E1 um fator motivador para a cooperativa buscar fomentar a
planta da indústria para processamento de peixes em Juara-MT, foi a desativação do
funcionamento do frigorífico NATIV entre os anos de 2009 e 2013 no município de Sorriso–
MT, sendo então pensado em instalar uma unidade frigorífica local.
Somado a esse fato, nos últimos anos houve políticas públicas municipais em Juara-MT
incentivando a instalação de tanques para criação de peixes, sendo então, construídos em
algumas propriedades no município, fomentando a produção de peixes (E4).
Quanto a instalação do frigorífico, essa se deu na gestão municipal anos de 2013 a 2016,
envolvendo desde o projeto civil, escolha e vistoria do local, a fábrica de ração e ainda o
laboratório de “alevinagem”. Sendo em fevereiro do ano de 2017 concedida a licença para
operar no município (LIMA, 2017).
Conforme relatos do E1, em meio às dificuldades de produção e comercialização dos
peixes, os produtores buscaram instalar a cooperativa por iniciativa própria, não obtendo êxito
pelas dificuldades encontradas. Posteriormente, com o apoio dos órgãos SEBRAE e
Associação Comercial e Industrial de Juara (CEAJU) fomentou-se de forma mais incisiva a
ideia da cooperativa e que esta se estendesse pelo Vale do Arinos, uma vez que no município
vizinho à Juara-MT, Novo Horizonte do Norte-MT, é propício para a atividade piscicultora e,
em Porto dos Gaúchos-MT, seria estabelecida a sede da cooperativa.
Embora o comércio local seja propenso ao consumo de peixes industrializados, com o
atual custo de produção a cooperativa não consegue concorrer com as grandes indústrias, uma
vez que o licenciamento e demais despesas são as mesmas, seja para os pequenos ou para os
grandes produtores/fornecedores. Pertinente destacar que, o comércio local foi parceiro para a
implantação do frigorifico, fazendo doações de utensílios, vestimentas e valores em dinheiro,
como mencionado por E1.

4.2 LIMITES NA IMPLANTAÇÃO DA INDÚSTRIA


Quanto aos fatores limitadores para a implantação da indústria de peixes em Juara-MT,
de acordo com E4 o maior desafio para a atividade piscicultura está no número reduzido de
pessoas cooperadas e interessadas pela atividade. Somada a isso, tem-se a escassez de recursos
financeiros e apoio dos órgãos públicos.

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Todavia, apesar das dificuldades no decorrer das atividades, ressalta-se que a cooperativa
foi essencial para o desenvolvimento da atividade piscicultora na região, já que inicialmente
os cooperados não tinham ideia de como comercializar o peixe na cidade, o que os abrigava a
comercializar na feira municipal uma vez que não tinham como negociar em outras cidades
ou no comércio local, e o baixo preço vigente na época causava prejuízo. (DEPOIMENTO,
E4).
Antes da instalação da indústria, conforme o E1, os peixes não eram eviscerados, por não
existir local adequado, ou seja, abatedouro. Diante da necessidade constatada, houve o auxílio
de pessoas e órgãos públicos, tanto na doação do local, que a princípio era a Casa do Mel
(associação local), como também doações, incluindo os próprios cooperados, e ainda a
contrapartida do município com a elaboração do projeto da indústria.
Incialmente os peixes processados não seriam comercializados na feira municipal, a
intenção dos cooperados era vender no atacado, mas não foi possível. Conforme os cooperados
entrevistados E1 e E4, essa situação levou a abertura de um mercado de peixes no município
de Juara-MT, o que foi visto como positivo.
Ainda acerca das principais dificuldades para o grupo de cooperados se manterem
organizados no formato de cooperativa, o E1 relata como a principal o licenciamento. Relata
o fato envolvendo vistorias das águas dos tanques de doze produtores da cooperativa, a qual
foi protocolada na Secretaria de Estado do Meio Ambiente (SEMA) há mais de quatro anos,
sendo várias vezes já refeitas e não houve a efetivação da mesma. Essa demora acarreta atraso
das atividades da cooperativa, pois os produtores não conseguem recursos financeiros nas
entidades e órgãos parceiros sem essa licença. Essa situação causa desânimo crescente na
continuação da atividade, evidenciando a inviabilidade dessa atividade nesses moldes.
Igualmente desafiadora é a dificuldade enfrentada pela indústria de processamento de
peixe quanto às exigências de inúmeros órgãos e a morosidade desses em oficializar isso. Por
exemplo, a demora de três anos e meio para se conseguir o Licenciamento de Operação junto
à SEMA, somado a mais seis meses para a liberação junto ao Serviço de Inspeção Municipal
(SIM), isso requer o pagamento de alvará anual no Conselho Regional de Medicina Veterinária
do Estado de Mato Grosso (CRMV-MT), bem como pagamento do salário de um veterinário
permanente no local. Esses fatos envolvendo procedimentos burocráticos e custos tornam
onerosa a continuidade e avanço da referida cooperativa.
Somando a este cenário de dificuldades, e de acordo com o planejamento realizado pelo
SEBRAE, se faz necessário abater seis mil quilos de peixes ao mês para o alcance das metas

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e, considerando que a licença do SIM permite a comercialização somente dentro dos limites
do município de Juara-MT, não há demanda para todo o pescado, uma vez que existe
concorrência da colônia de pescadores local, da agricultura familiar e das vendas realizadas
de casa em casa de forma clandestina pelos indígenas da região, sem o selo de inspeção
municipal (Relato do E1).
Ainda de acordo com o E1, há somente um funcionário para processar o volume mínimo
de peixes previsto, sendo insuficiente. O aumento do número de funcionários acarretará
aumento do preço final do produto, o que faria o kg do peixe processado chegar a R$ 30,00,
colocando o produto em desvantagem no mercado em relação as carnes de bovinos, suínos e
aves.
Em relação à inspeção, o E3 relata que essa fica a cargo da secretaria municipal de
agricultura por meio de um médico veterinário que é responsável pela inspeção municipal, o
qual acompanha fiscaliza toda a produção de origem animal, que anteriormente precisa ter
licenciamento ambiental. Isso requer que a estrutura a ser construída tenha seu projeto de
engenharia aprovado para que, posteriormente seja feita a inspeção pelo médico veterinário
responsável pelo SIM. Esse acompanhamento permite averiguar a conformidade e só então,
liberar a indústria para processar os peixes.
No entanto, apesar desses obstáculos, após a implantação da indústria classificada como
mini frigorífico pode-se perceber aumento da demanda no mercado do peixe produzido no
município de Juara-MT, como cita o E3. Isso ocorreu porque os proprietários de pequenas
chácaras que possuíam tanques, e antes não tinham como colocar à venda no comércio local
por não ter um local apropriado para limpar o pescado, com a instalação do frigorifico isso foi
possível.
Considerando a média de venda ao mês superior a mil quilos de peixe, e na época da
quaresma e Semana Santa, atinge aproximadamente quatro mil quilos, percebeu-se um
acréscimo considerável, como pode ser notado nos relatos de E3 e reforçado por E4.
Se por um lado existem limitações, por outro, ficou evidente também alguns resultados
positivos. O que pode sinalizar positivamente, uma vez que empreendimentos cooperativos
nesse segmento de atividade deram certo. Pode-se citar o Estado do Rio Grande do Sul, como
cita Alves (s.d, p. 562) que entre os anos de 1990 a 2000 foram criadas organizações
cooperativas por um grupo de pescadores artesanais objetivando geração de renda para
diversas famílias. A Coopescas instalada no município de Torres-RS, com a finalidade de

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melhorar a comercialização e realizar a captura de pescados em alto mar. Esse trabalho teve
resultados positivos e foi possível atingir mercados maiores em Porto Alegre-RS.

4.3 POSSIBILIDADES QUANTO À IMPLANTAÇÃO DA INDÚSTRIA COOPERATIVA


Quanto às possibilidades, diante das constatações, para o mini frigorífico identificou-se a
necessidade de agregar mais sócios que sejam piscicultores com interesse em comum na
geração de trabalho e renda, seja de forma artesanal, seja por produção em tanques.
Percebeu-se que desde o início das atividades os associados da cooperativa receberam
apoio das prefeituras de Juara-MT, Novo Horizonte-MT e Porto dos Gaúchos-MT, além do
SEBRAE. Parcerias essas importantes para abertura da indústria e, como já citado, a prefeitura
de Juara-MT, além de outros incentivos, fez a doação do local. Destaca-se também o papel do
SEBRAE, a partir do qual os cooperados decidiram criar a cooperativa, e participar de cursos
e workshops, como citam o E4 e o E1.
No entanto, ficou evidenciada a desarticulação do grupo de sócios da cooperativa que
deixaram de perceber na piscicultura fonte de trabalho e renda, somados aos desgastes gerados
para a aquisição e liberação de uso da infraestrutura.
Pertinente destacar, de acordo com Ono e Campos (2011) que o segmento de piscicultura
revela que os produtores e empresas estão apostando no potencial de retorno da piscicultura e
buscando inovações tecnológicas que possibilitem expandir e diversificar seus
empreendimentos, da mesma forma oferecer produtos de melhor qualidade, com maior valor
agregado. Ou seja, a aquicultura no Brasil pode ser encarada como uma importante fonte de
alimento para a população brasileira.
Sobre possibilidades no que se ao consumo local, tendo em vista a percepção dos
pescadores, o estudo apresenta dados importantes para pensar a atividade de piscicultura no
município. Vale salientar que, o trabalho de campo não configurou como análise de demanda
de mercado com os critérios de uma pesquisa quantitativa, mas, apenas a percepção de
demanda a partir da realidade dos pescadores e do comércio tradicional local.
Sobre possibilidades no que se refere ao consumo pelo comércio local, a E2 afirma que
tem 32 pescadores associados, de modo que cada um tem a possibilidade de pescar até 125 Kg
de peixe por semana. Esses peixes são vendidos por cada pescador em restaurantes,
lanchonetes e até em outras cidades. Contudo, a E2 destacou que essa produção não atende as
necessidades da comunidade local, há falta de produto.

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Quanto à produção de peixes, segundo depoimento de E4 percebe-se que a
comercialização dos peixes industrializados pela cooperativa no comércio local aceitação em
lanchonetes e restaurantes, já nos mercados, somente nos menores. Os mercados maiores por
comprarem em grande quantidade, conseguem preços menores, a um valor que a cooperativa
não consegue oferecer.
Sobre a origem dos peixes comercializados em Juara-MT nos mercados e restaurantes, o
quadro 5 apresenta as principais fontes.

Quadro 5 - Principais fontes fornecedoras de pescados para os comércios de Juara-MT


Mercados Restaurantes
Fonte fornecedora
M1 M2 M3 M4 R1 R2 R3 R4

Fora do estado

Dentro do Estado de outras regiões

Cooperativa
Dentro do Estado e Associação de
da região do Vale Piscicultores
do Arinos Pescadores
Informais
Fonte: Pesquisa de Campo (2018)

Ao observar o quadro 5, nota-se que dentre os mercados apenas M3 adquire peixes da


Cooperativa e os demais mercados compram de fornecedores em outras regiões do estado e
também fora do estado, com exceção de M2, que adquire produtos oriundos da Associação de
Piscicultores do município de Juara-MT (outra organização coletiva).
Em relação aos restaurantes pesquisados mostrados no quadro 5, apenas R1 compra de
fornecedores fora do estado de Mato Grosso, uma vez que o R2, R3 e R4 têm como fontes
fornecedoras de pescados a Cooperativa e pescadores informais da região do Vale do Arinos,
ou seja, compram de piscicultores locais.

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Sobre o mercado consumidor de peixe em Juara-MT, os dados obtidos junto aos
responsáveis pelo setor de compras de comércios que possuem açougue e podem comercializar
carne de peixe, como Mercados (total de 4) e Restaurantes (total de 4), contatou-se a media
mensal de aquisições de peixes para a venda, como mostra o quadro 6.

Quadro 6- Média mensal de carne de peixe adquirido para venda em Juara-MT


TOTAL
Mercados Restaurantes
MÊS
Quantidade
R R R
M1 M2 M3 M4 R1
2 3 4
10 1 1 600
Até 100 kg 100 100 100
0 00 00
2 200
101 – 200 Kg
00
201 – 300 Kg
301 – 500 Kg
Acima de 501 (1500 1.500
Kg kg)
Cálculo da média mensal 2.300 Kg
Fonte: Pesquisa de Campo (2018)

De acordo com o quadro 6, verifica-se que, tanto para os mercados quanto para os
restaurantes abordados, 75% adquirem mensalmente até 100 kg de carne de peixe pra
comercialização. Somente o M3 (mercado) adquire mais de 501 kg, sendo 1500 kg de peixe
ao mês para comercialização, e apenas 01 (um) restaurante, aqui chamado de R3, adquire entre
101 e 200 kg de peixe para venda.
Segundo estimativas, "o consumo de peixe no Brasil foi de 9,0 kg per capita registrados
em 1961 e 20,2 kg per capita em 2015, em uma taxa média de expansão de 1,5% por ano. As
estimativas preliminares para 2016 e 2017 apontavam crescimento futuro de 20,3 kg per capita
e 20,5 kg per capita, respectivamente" (SOFIA, 2018).
Quanto a produção de peixes em quilogramas produzidos pela Associação de pescadores
artesanais em Juara-MT no período de um mês pode ser estimada no quadro 7.

Quadro 7- Estimativa de vendas dos produtores da Associação de Pescadores em Juara-MT

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Quant. kg/sem. Quant. pescadores Total Kg sem. Total mensal

150 32 4.864 kg 19.456 kg

Fonte: Pesquisa de Campo (2018)

A Associação de Pescadores da Lagoa do Juara é outra organização de pescadores locais


que se formou na região. Essa associação contribui para organização e reivindicação dos
pescadores locais junto ao poder público municipal e federal (E2).
Percebe-se que o valor declarado pelo comércio em geral é menor que o mencionado pelos
vendedores de peixes artesanais (quadro 7). Isso pode ser atribuído ao fato de que o comércio
local atendido por Restaurantes podem não ter controle exato das aquisições, além disso, a
comercialização dos peixes artesanais também ocorre em feiras e direto ao cliente. Salienta-
se ainda que os restaurantes analisados foram os localizados nas áreas do centro da cidade,
não sendo comtemplados no estudo os restaurantes estabelecidos nos bairros.
Em relação às espécies de peixes comercializadas nos mercados e restaurantes
pesquisados, as principais são: Pintado, Matrinxã, Tambaqui, Tabatinga, Trairão e Cachara.
Também foi questionado aos mercados se houve alguma dificuldade para a aquisição de
peixes da Cooperativa, sendo constatado que não. Quanto aos restaurantes, somente o R2 disse
não ter dificuldades na compra de pescados da Cooperativa. Já os demais, R1, R3 e R4 tiveram
dificuldades relacionadas a regularidade no fornecimento (R1 e R3) e o R4 sobre a qualidade
do produto, forma de pagamento e preço dos peixes.
Por fim, sobre o preço das espécies de peixes para comercialização pelos mercados e
restaurantes investigados, o quadro 8 traz a média de valores observados:

Quadro 8- Preço médio mensal de carne de peixe adquirido para venda em Juara-MT
Mercados Restaurantes
Média de Preço
M1 M2 M3 M4 R1 R2 R3 R4
Dourado - R$ 8 - - - - - -
Piau - - - - - - - -
R$ 18,
Pintado - - R$ 14 - R$ 32 R$ 40 R$ 15
90
Jaú - - - - - - - -
Pirarucu - - - - - - - -

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Matrinxã - R$ 9 - - - - R$ 25 -
Tilápia R$ 27 - - - - - - -
Tabatinga - - R$ 18 - - - - -
R$ 10, R$ 4,8
Tambaqui - - - - - -
66 0
Trairão - - - - - - R$ 30 -
Cachara - - - -- - - - R$ 15
Fonte: Pesquisa de Campo (2018)

O quadro 8 revela discrepância entre os valores pagos pelos restaurantes e os valores


pagos pelos mercados, tendo os últimos médias de preços menor, o que pode ser influenciado
pela quantidade maior de pescados adquirida. Ressalta-se que o R1 não informou a média de
valores pagos na aquisição de quaisquer espécies que compra.
A respeito dos peixes vendidos no comércio local e a responsabilidade pela fiscalização,
verificou-se que essa é feita pela Vigilância Sanitária local para identificar os peixes do
mercado estão regulares em relação a procedência, ou seja, se possuem selo SIM (do
município), se de fora do município, se possuem o serviço de Inspeção Sanitária Estadual
(SISE), ou Serviço de Inspeção Federal (SIF) quando oriundos de outros estados. Todo o peixe
a ser comercializado deve apresentar esses selos, conforme informou o E3.
Quanto aos peixes processados pela cooperativa, conforme o E4 percebe-se que há boa
aceitação no comércio local por parte das lanchonetes e restaurantes; já nos mercados, somente
os menores adquirem peixes da cooperativa, pelo motivo anteriormente exposto.
Também há fiscalização em restaurante e lanchonetes. Nesse sentido o E3 destaca que a
preocupação com a certificação e armazenamento dos pescados nesses estabelecimentos é a o
que já fora citada, bem como os procedimentos adotados quando do não cumprimento dos
requisitos estabelecidos.
Os dados revelam contradições entre as declarações dos gestores do comércio local,
formal e revendedores de peixes e os pescadores, já que, os números de vendas apresentados
pela associação são maiores. Essa contradição pode estar na prática de compra por parte do
comércio dos próprios pescadores sem registro, ou, o grande número de venda dos pescadores
direto ao cidadão via feiras e encomendas.
Diante dos dados apresentados, percebe-se oportunidade para que o mercado de peixe na
região cresça e fomente o desenvolvimento local, uma vez que há possibilidade para atender

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a região e atuar com a venda de peixes para outros estados brasileiros. Contudo, a limitação
pode estar na organização e gestão da associação e da cooperativa local. Isso porque, há maior
volume de venda de peixes in natura em feiras, entrega domiciliar de carne não processada.
Gestão profissional e maiores investimentos na indústria dariam maiores oportunidades de
vender a carne processada e garantir carne de qualidade e com maior facilidade de transporte.
Para Silva (2011), a piscicultura é percebida uma alternativa para os pescadores artesanais
e os pequenos produtores rurais e como tal, fortalece a agricultura familiar, promove o
associativismo e/ou cooperativismo e o desenvolvimento local.

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Percebe-se que a piscicultura na agricultura familiar organizada na forma cooperativa
tem potencial para promover o desenvolvimento local somado ao mercado e as condições
hídricas favoráveis para a atividade de piscicultura na região analisada. Isso posto, acredita-se
nas possibilidades de atuação da cooperativa de processamento de peixes no município de
Juara-MT. No entanto, essas possibilidades devem ser valorizadas e providas de suporte
estrutural e financeiro por parte dos órgãos públicos, o que consequentemente fortalece o
desenvolvimento local.
Diante do caso analisado, percebeu-se como possibilidades o mercado local que se
apresenta como potencial consumidor, e como tal, permite a expansão das atividades
produtivas da cooperativa e a retomada do trabalho coletivo dos piscicultores. Contudo, será
preciso desenvolver lideranças ativas capazes de reiniciar a mobilização e a reorganização dos
produtores rurais em torno do movimento cooperativista. Essas ações podem impactar
positivamente o desenvolvimento regional do Vale do Arinos.
Quanto às limitações de ordem interna, percebeu-se a morosidade nos procedimentos
burocráticos, limitações estruturais da cooperativa, escassez de mão-de-obra para o processo
produtivo, desarticulação entre os sócios, falta de recursos financeiros, variáveis essas que, no
percurso da cooperativa levaram ao enfraquecimento do empreendimento.
De caráter externo, observou-se como limitadores as operações produtivas da
cooperativa a cessão do apoio da prefeitura ao mini frigorífico após a implantação e também
a dificuldade de acesso a recursos financeiros para melhorar a estrutura da indústria, o que
impossibilita a obtenção do SIF.
As evidências trazidas pelo contexto analisado são pertinentes para refletir sobre o
papel dos agentes públicos, no caso os fiscalizadores, que a priori poderiam ser de orientação,
de consultoria e posteriormente fiscalizatórios. Isso se justifica pela característica do público

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que atua com a piscicultura, em sua maioria pequenos agricultores familiares sem muitos
recursos e como tal, precisam de apoio para desenvolver-se em suas atividades produtivas e
organizativas.
Parcerias podem ser feitas para mudar essa realidade. Uma das possibilidades seria a
Universidade do Estado de Mato Grosso contribuir por meio da pesquisa e extensão e com
isso, auxiliar na captação de recursos por meio da elaboração de projetos e também no auxilio
na organização do empreendimento.
Quanto à realização de estudos futuros, sugere-se os que envolvam casos múltiplos no
cenário estadual a fim de contextualizar as indústrias cooperativas de processamento de peixes
já implantadas e em plena atividade no estado. Tal investigação subsidiaria comparações com
os resultados mostrados nesse trabalho e, com isso trazer maior e melhor entendimento dos
limites e possibilidades deste tipo de empreendimento em termos de importância e
potencialidades.

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