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Paisagem Urbano: Viver a Cidade entre o


Artificial e o Natural

Chapter · January 2009

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4 authors, including:

Isabel Loupa Ramos Fátima Bernardo


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I PAISAGEM URBANA:

110 | MÉTODOS E TÉCNICAS PARA O DESENVOLVIMENTO URBANO SUSTENTÁVEL — A EXPERIÊNCIA DOS PROJECTOS POLIS
MÉTODOS E TÉCNICAS PARA O DESENVOLVIMENTO URBANO SUSTENTÁVEL — A EXPERIÊNCIA DOS PROJECTOS POLIS
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112 | MÉTODOS E TÉCNICAS PARA O DESENVOLVIMENTO URBANO SUSTENTÁVEL — A EXPERIÊNCIA DOS PROJECTOS POLIS
PAISAGEM URBANA:
VIVER A CIDADE
ENTRE O ARTIFICIAL
E O NATURAL
3.1. O PAPEL DOS ESPAÇOS VERDES NO
DESENVOLVIMENTO URBANO SUSTENTÁVEL

Num contexto de desenvolvimento urbano sustentável, o papel dos espaços verdes na cidade
não pode ser ignorado no seu contributo para a qualidade de vida, sobretudo tendo em conta
que “a qualidade ambiental que contribui para a harmonia social e vitalidade cultural torna-se
um dos factores chave do sucesso económico de uma cidade” (Nova Carta de Atenas, 2003:19).
Neste contexto, emerge a necessidade de proporcionar orientações/recomendações no que
diz respeito ao planeamento e concepção dos espaços verdes, no sentido de potenciar as suas
funções ecológicas, hidrológicas e atmosféricas, favorecer a sua utilização e aumentar o grau
de satisfação dos seus utilizadores.
No futuro, estas funções podem vir a ganhar ainda maior relevância perante um quadro de
alterações climáticas, a subsequente ocorrência de eventos meteorológicos extremos (i.e. tem-
peratura e distribuição espacial e temporal da precipitação), assim como a densificação das áre-
as urbanas, a progressiva urbanização da população e a procura de espaços de evasão e de
reencontro com a natureza, o que justifica o investimento na construção de espaços verdes para
as pessoas, com a presença e interacção dos elementos naturais, integrados na malha urbana.
O desempenho das funções ecológicas e sociais dos espaços verdes também depende da
sua inserção na cidade e da ligação que lhe é permitida estabelecer com a sua envolvente. Ao

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beneficiarem de espaços de proximidade ligados aos locais residenciais e de trabalho, promo-
vem uma apropriação desses espaços pela população, sendo que “as cidades e as aglomera-
ções urbanas mais apreciadas são aquelas que proporcionam uma experiência ambiental rica
e positiva” (Nova Carta de Atenas, 2003:19).
Num contexto em que se verifica um aumento da sedentariedade das populações, uma in-
tensificação dos níveis de stress relacionados com a vivência em zonas urbanas e com o agra-
vamento dos riscos ambientais, evidências empíricas salientam a importância das funções
sociais e psicológicas desempenhadas pelos espaços verdes urbanos. Estes podem ter um
efeito restaurativo, contribuindo para a redução do stress mental e promovendo sentimentos e
um humor positivo.
Os efeitos benéficos dos espaços verdes assumem maior ou menor influência, consoante a
nserção dos es- sua inserção na cidade, neste sentido, são considerados como exemplo, um conjunto seleccio-
POLIS nas cida- nado de espaços verdes projectados no âmbito do Programa Polis, tais como Leiria, Coimbra,
se Castelo Branco, Beja e Viseu, representativos de um leque de tipologias, sobretudo no que
respeita a relação espacial do novo espaço verde com a cidade, assim como a presença ou
ausência de rio (Figura 24).

Em Leiria e Viseu verifica-se uma intervenção estruturada de forma linear ao longo do rio.
Enquanto no primeiro caso esta cruza a cidade, no segundo caso assume um posicionamento
periférico. A intervenção em Coimbra marca a transição de uma tipologia linear e para uma
tipologia pontual. Apesar do seu posicionamento junto ao Rio Mondego, ao não acompanhar
as margens de uma forma contínua, apresenta-se com carácter mais pontual. Esta tipologia
pontual é mais evidente em Castelo Branco, inscrevendo-se no centro da cidade, e em Beja,
onde se localiza na franja urbana. Estas diversidades de relações espaciais traduzem-se numa
diversidade de relações funcionais destes espaços verdes, por um lado, entre a cidade e os
seus habitantes, e por outro, entre o espaço urbano e a sua envolvente.

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3.2. DIMENSÕES DA SUSTENTABILIDADE ECOLÓGICA
E SOCIAL DOS ESPAÇOS VERDES URBANOS

A abordagem relativa à análise da contribuição dos espaços verdes para o desenvolvimento


urbano sustentável, centra-se em três temáticas: uma dimensão ecológica, onde se ex-
ploram aspectos como a capacidade de os espaços verdes contribuírem para regulação
micro-climática e para a qualidade do ar, as múltiplas funções que a água desempenha no
contexto urbano e a promoção da biodiversidade; uma dimensão psico-social, que trata de
aspectos relacionados com a percepção e utilização dos espaços verdes urbanos, nomeada-
mente os equipamentos e actividades aí desenvolvidas e sua importância para a promoção
da interacção social, a influencia da percepção de segurança e de orientação no espaço para
a sua utilização e finalmente a importância dos espaços verdes para a promoção de atitudes
e comportamentos pró-ambientais, através da aproximação da população aos processos e
ciclos naturais; e por último, as estruturas ecológicas enquanto forma de operacionalização
e articulação das duas primeiras.
No âmbito da análise dos espaços verdes urbanos a distinção entre uma dimensão eco-
lógica e social é, de certa forma, artificial. As preferências dos utilizadores relativas às ca-
racterísticas dos espaços verdes não se distanciam muito do que é considerado favorável na
perspectiva do equilíbrio dos ecossistemas e
da paisagem. Neste âmbito, ressaltam con-
cordâncias no que respeita a aspectos rela-
cionados com a presença de água, a flora e 8dchZgkVdYV EZgXZedYV

fauna, assim como com a forma como se or- {\jVZegdbdd eV^hV\ZbZYV


YVW^dY^kZgh^YVYZ hZ\jgVcV
ganizam no espaço para criar situações de di-
versidade, complexidade e coerência entre os
vários elementos. Desta estrutura depende a ESTRUTURAS
ECOLÓGIAS
capacidade dos espaços verdes contribuírem GZ\jaVd
8dbedgiVbZcidh
Xa^b{i^XVZ
para a regularização micro-climática, para a fjVa^YVYZYdVg
eg‹"VbW^ZciV^h

melhoria da qualidade do ar, e assim, para o


:fj^eVbZcidh
conforto climático percepcionado pelos utili-
— usos e
zadores, o qual condiciona os seus comporta- VXi^k^YVYZh

mentos e a forma com usam os equipamentos


que lhe são disponibilizados (Figura 25).

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3.2.1. A PERCEPÇÃO DA PAISAGEM
E AS PREFERÊNCIAS DOS UTILIZADORES
A investigação sobre a percepção e a avaliação da paisagem consolidou-se em torno de três
temas, como a necessidade humana de compreender, o desejo de explorar ou a preferência
por ambientes naturaisÐ.
No que diz respeito ao tema ‘compreender’, o ser humano tem a necessidade de dar sentido
ao que o rodeia, e para tal tem que ser capaz de compreender o que observa. Desta necessida-
de humana decorre a preferência por paisagens que sejam coerentes, isto é, cuja organização
dos elementos presentes faça sentido, e tenham uma boa ‘legibilidade’, ou seja, um grau de
‘distintividade’ que permite o observador compreender ou categorizar o conteúdo do cenário.
Daqui decorre a preferência humana por ambientes que lhe sejam familiares.
Para além de compreender, o ser humano, gosta de paisagens que o estimulem ou que o mo-
tivem a ‘explorar’ a cena. Verifica-se, assim, uma preferência por paisagens com algum nível de
complexidade em termos de número e variedade de elementos presentes (e.g.: texturas, cor, mo-
vimento), e por cenários que contenham a dimensão ‘mistério’, isto é, que contenham elementos
que estimulem a obtenção de informação suplementar. Nos espaços verdes urbanos, aumentar
a experiência de complexidade e mistério pode significar a criação deliberada de ambientes con-
trastantes, ou seja, a alternância de abertos e fechados, de clareiras e matas, de sombra e luz, de
planos verticais e horizontais, ou ainda, a introdução de curvilínearidade ao nível dos caminhos
e das orlas. Contudo, verifica-se que em contexto urbano o desejo de explorar aparece por vezes
entrecruzado com a percepção de insegurança, o que pode condicionar a utilização do espaço.
Constata-se, ainda, a preferência humana pelos ‘ambientes naturais’ e por paisagens
com forte presença de vegetação, de água, e de animais. Para além destes elementos serem
importantes fontes de estimulação sensorial, há evidências científicas fortes que os espaços
naturais em oposição aos espaços construídos são ambientes que podem ajudar as pesso-
as a refazerem-se ou recuperarem da fadiga mental decorrente das actividades do dia a dia.
Tem-se vindo a confirmar de forma sistemática a importância destes espaços em contextos
específicos, que pela sua natureza conduzem a altos níveis de stress: como as zonas urbanas
onde os sujeitos são submetidos a uma constante sobrestimulação sensorial, ou ainda, em
situações de redução das capacidades cognitivas que acontecem naturalmente com a idade
ou com patologias específicas (e.g.: doença de Alzheimer), em que os espaços verdes podem
funcionar como formas de estimulação cognitiva.
Tem sido demonstrado que o ser humano perante a situação de presença, ou apenas visua-
lização, de espaços verdes demonstra uma redução muito significativa dos níveis de stress.

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O quotidiano exige uma atenção dirigida para as actividades. Contudo, o ser humano revela
uma capacidade limitada de processamento cognitivo constante, conduzindo-o frequentemen-
te à fadiga mental. Essa fadiga revela-se, por exemplo, na dificuldade de concentração, au-
mento de erros e irritabilidade. Os ambientes naturais têm-se revelado espaços importantes
na recuperação da fadiga mental, pelo que EXEMPLOS
CIDADES POLIS
são considerados espaços restaurativos.
Quatro factores estão na base dos efeitos LEIRIA
Grande diversidade
restaurativos dos ambientes naturais como
de situações que
os espaços verdes urbanos: são proporcionadas
ao longo do rio em
conjunto com a
— pela possibilidade de afastamento curvilienaridade dos
percursos e do rio
das actividades diárias por não exigi- favorece a presença de
rem uma atenção dirigida; mistério e o desejo de
explorar.
— por serem espaços que tem elemen-
tos que fascinam; Caminho sem saída,
cujo único objectivo é
— por serem espaços compatíveis com permitir ao utilizador
as necessidades e vontades do mo- o acesso a uma vista
privilegiada da queda
mento; de água.
— por a ligação do sujeito àquele espaço
Os caminhos
que lhe permite ter uma sensação de curvilíneos, ao ocultar
bem-estar e tranquilidade. parte do percurso,
estimulam o desejo de
explorar.
Em relação à preferência humana pelos
Cruzamento de
ambientes naturais destaca-se a importância caminhos no passadiço
da água, como já foi anteriormente referido. que atravessa a
mata, cujos caminhos
Contudo, a presença da água não assegu- são em formato
circular. Permite aos
ra necessariamente a preferência pela pai-
utilizadores, explorar
sagem. A presença de lixo, maus cheiros a área, “perder-se” ter
liberdade cognitiva em
e alteração da cor da água são elementos
segurança. (Fotografia de
considerados muito negativos. Verifica-se António Bettencourt Ó)

também que a percepção positiva da água


pelos utilizadores frequentemente não está
associada ao valor ecológico da água. Em
certas situações de águas com presença de

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LEIRIA elevada densidade de vegetação resultan-
Acesso a vistas
privilegiadas na mata, tes de forte poluição podem ser valorizados
em ambiente complexos pelos utilizadores do ponto de vista estético,
e que estimulam a
exploração, com acesso assim como a presença de vegetação natural
facilitado e reduzindo o e importante em termos ecológicos ao longo
impacto humano sobre
o ambiente.(Fotografia de das margens pode ser negativamente avalia-
António Bettencourt Ó)
da pelo observador não técnico, quando não
COIMBRA apresenta um aspecto estético ordenado.
Presença de elemento
Uns exemplos clássicos de avaliação nega-
de água multisensorial:
auditivo, visual e táctil. tiva de habitats importantes são os sapais, e
a percepção positiva por cursos de água in-
LEIRIA
A presença de festados com espécies invasoras, como por
elementos surpresa,
como as pontes
exemplo, o jacinto de água.
temáticas em Leiria, Assim, os benefícios ambientais ineren-
contribui para a
complexidade de
tes aos espaços verdes contribuem para o
cenários. bem-estar físico e psicológico, nomeada-
VISEU
mente pela promoção da actividade física e
Criação de situações da interacção social e pelas características
que permitem
aproximar as pessoas
restaurativas destes espaços que contri-
do rio. buem para a redução do stress diário.

3.2.2. ÁGUA NO MEIO URBANO:


REINTEGRAR O CICLO
HIDROLÓGICO
A água, nas suas várias formas, influencia a
localização, o desenvolvimento, a morfologia
e as vivências da cidade, podendo constituir
um elemento unificador desses sistemas.
Rios e cursos de água são elementos valo-
rizadores do espaço urbano, onde as frontei-
ras entre as dimensões sociais, económicas,
estéticas, culturais e ambientais se diluem.
Em climas mediterrânicos, a gestão da
água assume extrema importância pois a

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sua disponibilidade não coincide temporalmente com os períodos de maior carência. As cida-
des possuem geralmente uma grande quantidade de superfícies impermeáveis, que impedem
a infiltração da água no solo. Se, por um lado, no período estival a baixa pluviometria, agravada
pela escassez de água no solo, aumenta o desconforto urbano, e por outro, as distribuições
pluviométricas intensas nos meses de chuva associadas ao rápido escoamento superficial,
conduzem a um padrão de drenagem que aumenta o risco de cheias urbanas. Risco esse, que
pela sua relevância no espaço Europeu, deu recentemente origem à Directiva Comunitária das
Cheias que visa o desenvolvimento de acções para diminuir e controlar os riscos que as cheias
representam para a saúde, o ambiente, o património cultural e as actividade económicas.
Esta problemática, passa sobremaneira, pela actuação a montante das áreas de risco, de
forma (a) a reduzir e (b) a retardar o escorrimento superficial. Nestas duas vertentes os es-
paços verdes e a vegetação desempenham um papel fundamental (Figura 26): A vegetação
intercepta parte da água da chuva, diminuindo a velocidade e quantidade de água que chega
ao solo. Quando cai sobre a terra, parte da água infiltra-se, outra perde-se por evaporação e
apenas quando os solos ficam saturados a água escoa para as zonas mais baixas e para os
sistemas de águas pluviais. Por outro lado, ao cair numa superfície impermeável, uma maior
quantidade de água tenderá a escoar rapidamente atingindo-se o pico de cheia mais cedo e
sobrecarregando os sistemas de águas pluviais.

Os sistemas de gestão de águas pluviais em meio urbano, visam contrariar o escorrimento


superficial no meio urbano, assim como a recolha e condução da água para bacias de retenção
onde esta pode ser sujeitas a um processo de depuração, melhorando a qualidade da água
devolvida aos ecossistemas aquáticosÐ.

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Simultaneamente, os espaços verdes cons-
tituem-se como oportunidade para a imple-
mentação de medidas pró-activas de redução
do risco de cheia, tal como, a construção de
sistemas de retenção, ou em formato bacia
que se pode materializar em pequenas de-
pressões no terreno com coberto vegetal
que permitem a acumulação temporária de
água, ou mesmo mediante a construção de
estruturas de contenção, como por exemplo,
os açudes presentes ao longo de uma linha
de água no bairro de Kronsberg em Berlim
(Figura 28).
Durante os meses de verão, no entanto, a
sobrevivência dos espaços verdes depende
frequentemente da rega, sendo que uma me-
nor disponibilidade de água no meio urbano
origina temperaturas mais elevadas o que
favorece a evaporação, a transpiração das
plantas e, consequentemente, uma menor quantidade de água no solo. Deste modo reveste-
-se de uma particular relevância equacionar sistemas eficientes do uso e gestão da água nos
espaços verdes que permitem a sua reintegração do ciclo hidrológico através da retenção de
água in situ, da redução do consumo de água e a sua reciclagem.
A operacionalização destes princípios inicia-se com a concepção de espaços verdes eficazes
relativamente à retenção da água. A infiltração pode ser favorecida mantendo a predominância
de áreas permeáveis, e mediante a utilização de pavimentos semipermeáveis em áreas de maior
utilização. Com o aumento da densidade do coberto vegetal também aumenta a intercepção da
água, enquanto a introdução de matéria orgânica e Mulch*, bem como a existência de sombras
minimiza a água perdida por evaporação. Os “green-roofs”, jardins no topo de edifícios, são
também uma solução interessante quando se pretende diminuir a velocidade de escoamento da
água na cidade. Podem ainda ser utilizadas cisternas e outras estruturas de armazenamento
que proporcionam a possibilidade de utilização da água da chuva nos meses mais quentes.
A redução do consumo da água contribui para a sustentabilidade dos espaços e passa pela
diminuição de áreas cobertas com vegetação muito consumidora em água (i.e. tipicamente

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relvados), da utilização preferencial de espécies autóctones mais adaptadas às características
do clima mediterrânico, bem como, do uso de sistemas de rega localizada inteligentes, tais
como, o sistema de rega gota-a-gota, em que o solo é regado apenas junto das raízes das
plantas ou o uso de sistemas computorizados que interrompem a rega por aspersão quando
está muito vento ou chuva, ou que avisam da necessidade de rega face a quantidade de água
presente no solo.
No que respeita a reciclagem, o conceito de “ruas verdes” poder ser integrado nos espaços
verdes no sentido de reter e tratar naturalmente a água proveniente das chuvas e da drenagem
dos pavimentos, com vista à gestão racional da água em ambientes mediterrânicos. Nas bacias
de depuração de água as plantas actuam como agentes purificantes, absorvendo as impurezas
da água e o solo age como filtro. Este processo permite, para além reutilização de águas drena-
das das superfícies urbanas na rega dos espaços verdes, reutilizar águas limpas das habitações
mais próximas. Em Portalegre, (Figura 29) podemos encontrar um bom exemplo de reciclagem
da água: a depressão no centro do terreno promove a infiltração na zona do relvado, no entanto,
quando a precipitação é mais intensa a água escoa lentamente para a linha de água artificial
no centro do terreno. Nesse local, a água é integrada num sistema cíclico que atravessa todo o
parque. As pedras promovem a oxigenação e conferem e reduzem a energia da água.
Os cursos de água assumem funções estruturantes na paisagem urbana. A presença de
água na paisagem é identificada como elemento valorizador, estando relacionado com múltiplos

Figura 29:E
água em Porta
potencial para s
num sistema de
grado de águas
meio urb

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sentidos da percepção humana. A explicação para esta preferência quase universal assenta
fortemente sobre o reconhecimento da água como elemento indispensável à vida. Deste modo,
o desenvolvimento de metodologias para a valorização dos rios em meio urbano, sob o ponto
de vista ecológico, sócio-económico, e também estético, assume um carácter relevante nas
operações de reabilitação de zonas ribeirinhas urbanas, encontrando respostas para as alte-
rações qualitativas e quantitativas nos cursos de água que resultam da dinâmica inerente aos
processos urbanos.
As situações em que os espaços verdes se localizam junto a linhas de água representam uma
oportunidade única de valorização ecológica dos rios em meio urbano. Quando se associa os es-
paços verdes às linhas de água em espaço urbano produz-se uma simbiose perfeita. O espaço
ximo cuidado promove o acesso e usufruto da linha de água, em troca, os espaços verdes podem ofere-
melhor cer mais conforto, podem ver os seus custos de manutenção diminuir pelo recurso a água não ca-
nalizada para rega, e ainda, beneficiam de um elemento multisensorial e de elevado potencial de
utilização. Estes espaços verdes podem contribuir para a valorização ecológica dentro do espaço
urbano. Deste modo, promove-se a biodiversidade da flora e da fauna num espaço onde prevalece
a artificialidade. Um aspecto particular de frentes ribeirinhas é constituído pelas áreas sujeitas ao
efeito das marés. Nestes casos, e apesar de os sapais não serem as zonas mais preferidas pela
populaçãoÐ, o seu valor ecológico requer um tratamento especial onde se articula uma interven-
ção pouco intrusiva, compatível com a dinâmica do sistema, com uma forte componente de in-
formação e educação ambiental, no sentido de
comunicar a relevância da sua conservação.
Perante um melhor entendimento destas áre-
as, a vegetação natural, o ambiente de sapal, a
ocorrência de fauna característica e as vivên-
cias durante as diferentes marés, podem ser
fruídas, por exemplo, para quem passa num
passadiço que atravessa sobrelevado todo este
espaço, como por exemplo, no Parque Tejo e
Trancão (Figura 30).
As intervenções em linhas de água em meio urbano devem ser observadas no contexto da
respectiva bacia hidrográfica, contrariando situações de regularização dos leitos cujo enfoque
se situe exclusivamente no aumento da velocidade de escoamento mediante um redimensio-
namento da secção de vazão. As obras estruturais beneficiam em situar-se a montante das
áreas urbanas, tanto no sentido, de reduzir o risco de cheias para a população urbana, como

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também de poder aproveitar melhor a oportunidade da presença dos rios em meio urbano EXEMPLOS
CIDADES POLIS
enquanto local de reencontro com a natureza, recorrendo a “boas práticas”23 de intervenção
que respeitem a inserção das linhas água no ciclo hidrológico e na dinâmica dos ecossistemas. BEJA
Sistema de depuração
de água

COIMBRA
O uso de água do
Mondego para rega do
espaço verde, permite
reduzir os custos de
manutenção e o uso
mais racional da água
canalizada.

VIANA DO CASTELO
O passadiço sobre
o sapal potencia o
entendimento da
importância ecológica
deste espaço.

LEIRIA
Manutenção da vegeta-
ção arbórea ribeirinha,
muito embora a sem
necessária intervenção
ao nível arbustivo e
herbáceo, no sentido de
estabilizar as margens
do rio.

BEJA
O uso de sistemas de
rega gota-a-gota, per-
mite reduzir os gastos
com água da rega.

CACÉM
As obras hidráulicas
podem ser amenizadas
de forma a proporcio-
nar espaços de lazer
informal e o contacto
com a água.

VISEU
As modelações de ter-
reno permitem conter a
água em caso de cheias.

MÉTODOS E TÉCNICAS PARA O DESENVOLVIMENTO URBANO SUSTENTÁVEL — A EXPERIÊNCIA DOS PROJECTOS POLIS
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3.2.3. DIVERSIDADE DA PAISAGEM: OS ESPAÇOS VERDES
URBANOS COMO HABITATS
A promoção da biodiversidade não é restrita às áreas designadas para a conservação da natu-
reza sendo as cidades um espaço de oportunidades neste domínio: “With the creation of urban
parks and green median strips, residents can enjoy beautiful surroundings that are more sui-
table for wildlife”.24 Muito embora o valor ecológico desses espaços possa não ser equivalente
ao dos habitais naturais, a sua proximidade com a população urbana carente de contacto com
a natureza, confere-lhe um valor e um estatuto especial.
Apesar da pressão exercida pela urbanização, algumas espécies mais cosmopolitas e com
maior capacidade de adaptação conseguem encontrar condições de sobrevivência no espaço
actividade urbano. A presença destas espécies, sobretudo as pertencentes a níveis tróficos superiores, fa-
auna num vorece as condições de salubridade ao contribuir para o controle de pragas. São disso exemplo,
anfíbio num as aves de rapina que se alimentam de pombos, ou as corujas que aproveitam a abundância
nos jardins de pequenos roedores no espaço urbano. Os utilizadores dos espaços verdes também revelam
bra. preferência pela presença de fauna, nomeadamente de aves (movimento e som), de pequenos
mamíferos, como os esquilos, ou mesmo, de anfíbios (Figura 31).

A criação de espaços verdes que promovam a instalação de fauna inicia-se pela criação
de condições favoráveis à sua presença, ou seja, com a construção de um habitat cujas carac-
terísticas vão ao encontro dos requisitos ecológicos das potenciais espécies colonizadoras. O
sucesso da colonização depende da qualidade do habitat, mas também, do seu grau de isola-
mento à escala urbana, isto é, da atractividade do espaço e o seu grau de acessibilidade às vá-
rias espécies. Neste contexto, é útil o conhecimento das espécies de flora e fauna, que existem

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no espaço, antes de se efectuar qualquer tipo
intervenção, tal como foi realizado para a avi-
fauna junto ao rio Lis o na encosta no Castelo
no âmbito do Programa Polis de Leiria, mas
também, levantamentos que se estendem às
periferias urbanas, de modo a conhecer as
espécies com potencial de colonização des-
tes novos espaços verdes.
A qualidade do habitat proporcionado por
um espaço verde aumenta com a sua com-
plexidade (horizontal e vertical), a alternância
de áreas abertas e fechadas, o aumento da
interface entre habitats (densidade de orla);
a diversidade de espécies presentes, em par- Fi
ticular de espécies da flora autóctone, a pre- compl
sença de água, assim como, a sua inserção longo d
numa estrutura ecológica que promova situa-
ções de continuidade.
A complexidade vertical do habitat aumen-
ta significativamente com a sua maturidade. O
que significa que ao longo da sucessão ecoló-
gica se criam situações com um maior núme-
ro de estratos, tanto ao nível da vegetação (i.e.
herbáceo, arbustivo e arbóreo — Figura 32),
mas também ao nível do solo, através da cria-
ção de perfis mais evoluídos e mais estáveis,
nomeadamente devido à presença de hori-
zontes com elevado teor de matéria orgânica.
Deste modo, intervenções à escala urbana que
promovam a preservação das áreas onde estão
presentes estas comunidades mais maduras
beneficiam, numa fase inicial, a instalação de
fauna. Este efeito é amplificado quando estas
áreas, tipicamente em formato de matas, são

MÉTODOS E TÉCNICAS PARA O DESENVOLVIMENTO URBANO SUSTENTÁVEL — A EXPERIÊNCIA DOS PROJECTOS POLIS
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Ninhos numa geridas de forma a criar pequenas bolsas de vegetação mais densa e impenetrável em regime
ntro de Oslo de regeneração natural, ou através da criação de estruturas em rede que assegurem condições
de continuidade ecológica.
Novos muros A biodiversidade em meio urbano pode ainda ser favorecida por medidas activas de promoção
no jardim da
de instalação de espécies, tais como, a oferta de “ninhos” (Figura 33), a simples existência de mu-
ão Calouste
ros ou paredes de pedra não rebocados, ou a criação de muros texturados e irregulares (Figura 34).
an em Lisboa

Algumas espécies de aves têm vindo a perder o seu habitat de nidificação em meio urbano,
em muito, devido a obras de recuperação em edifícios ou muros. Por exemplo, o guarda-rio
(Alcedo atthis), espécie emblemática confinada aos ecossistemas ribeirinhos e protegida ao
abrigo da Directiva das Aves e da Convenção de Berna, instala em ambientes naturais o seu
ninho num túnel escavado em barreiras nas margens de cursos de água. Numa situação urba-
na pode beneficiar da manutenção de partes de muros não rebocadas nos troços canalizados
do rio de forma a permitir a sua nidificação nos orifícios entre as pedras. Esta medida simples
tem-se mostrado eficaz para outras espécies, como na conservação do sapo-parteiro (Alytes
obstetricans) no Campo de Santa Cruz em Coimbra, ou ainda, no caso do centro histórico de
Cáceres que alberga a maior colónia de peneireiros-das-torres (Falco naumanni).
Para além da estrutura do habitat, também a sua composição florística é um aspecto fun-
damental para o sucesso de colonização de áreas recentemente instaladas, devendo ser dada
prioridade a espécies da flora autóctone. Assumindo-se as áreas verdes como ecossistemas
de substituição, a vegetação beneficia em ser organizada nas associações que em que ocorre
naturalmente, por forma a melhor poder desempenhar as suas funções ecológicas. Por exem-
plo, a introdução de algumas espécies melíferas, aromáticas ou com bagas são importantes
para a atracção de insectos e outros organismos que servem de alimento a espécies de níveis
tróficos superiores, como aves ou répteis.

126 | MÉTODOS E TÉCNICAS PARA O DESENVOLVIMENTO URBANO SUSTENTÁVEL — A EXPERIÊNCIA DOS PROJECTOS POLIS
Sendo a água um elemento essencial à vida, a presença de água dos espaços verdes é
crucial. Mesmo situações mais artificializadas, como fontes e tanques, são benéficas à fauna.
Contudo, quanto mais diversificada e naturalizada a sua presença e o seu acesso, maior o
leque de espécies podem beneficiar. Situações próximas do estado natural, como pequenas
charcas, podem ainda não só acolher espécies aquáticas, mas servirem de base à recriação de
um ecossistema de água doce. Este novo tipo de intervenções pode ser observado mais recen-
temente no jardim da Fundação Calouste Gulbenkian em Lisboa (Figura 35).
Estes ecossistemas podem ser criados por mão humana a partir de situações de grande
artificialização e degradação, como por exemplo em Viena de Áustria, onde o projecto “Innovation
Gruen” provou que com a criação de uma situação base mínima (i.e. água e alguma vegetação
pioneira) com o tempo se desenvolvem ecossistemas complexos de elevado valor (Figura 36).

MÉTODOS E TÉCNICAS PARA O DESENVOLVIMENTO URBANO SUSTENTÁVEL — A EXPERIÊNCIA DOS PROJECTOS POLIS
| 127
A biodiversidade em meio urbano tem vindo a ser reconhecida e valorizada nas grandes
cidades Europeias, onde é actualmente utilizada como indicador da qualidade de vida e como
uma medida da sustentabilidade do desenvolvimento urbano. Cidades, como Londres e Dublin,
contribuem para este objectivo através do desenvolvimento de estratégias, planos e códigos de
boas práticasÐ.

EXEMPLOS CIDADES POLIS

LEIRIA impactes daí resultantes foi introduzida LEIRIA


A presença do guarda-rios teria justi- uma escada de peixes que permite a Passadiço de acesso à encosta Norte
ficado uma intervenção mais ajustada passagem de algumas espécies duran- do Castelo proporciona a fruição e
nos margens construídas do rio, ou te o período de fecho das comportas. contemplação de uma mata consoli-
deixando a pedra à vista ou criando dada através da construção de uma
orifícios artificiais no muro. CACÉM estrutura sobrelevada em madeira que
A criação de terraços fluviais não aces- se moldou ao relevo e à presença da
VISEU síveis aos utilizadores permite o desen- vegetação pré-existente, assegurando,
O objectivo de permitir a fruição de um volvimento de bolsas de vegetação mais assim, o seu elevado valor ecológico,
espelho de água nos meses de verão naturalizadas e menos perturbadas. estético e espiritual, sem que a circula-
levou a que o troço urbano do rio Pavia ção seja prejudicial para o equilíbrio do
foi sujeito a obras que incluem a con- VISEU espaço. (Fotografia de António Bettencourt
strução de uma sucessão açudes. Esta A integração de uma derivação da água Ó)
artificialização do regime natural do rio do rio permite a criação de um sistema
afecta sobretudo o ecossistema aquáti- húmido.
co. No sentido de minimizar os

128 | MÉTODOS E TÉCNICAS PARA O DESENVOLVIMENTO URBANO SUSTENTÁVEL — A EXPERIÊNCIA DOS PROJECTOS POLIS
3.2.4. REGULARIZAÇÃO MICRO CLIMÁTICA E MELHORIA
DA QUALIDADE DO AR
As cidades têm tendência a constituir-se como ‘ilhas de calor’, pela acumulação do calor que
produzem, a incapacidade de o dissipar devido a alteração da composição da atmosfera, e tam-
bém, pela reduzida capacidade de o diminuir. A pedra, o asfalto e outras superfícies imperme-
áveis que substituem a vegetação têm uma alta capacidade de absorver calor proveniente da
radiação solar. Por outro lado, a precipitação é rapidamente escoada antes que a evaporação
consiga diminuir a temperatura do ar. O calor produzido pela população, as suas actividades e
pelos veículos contribuem para o aquecimento. Todos estes processos se agravam nas cidades
do interior pela ausência de brisas marinhas.
A radiação solar é fundamental para a vida das plantas e seres vivos. A reduzida quan-
tidade de luz solar que alguns países recebem durante o Inverno é prejudicial física e men-
talmente para as pessoas. No entanto, durante o período estival a excessiva radiação solar
pode ser desconfortável. Os materiais utilizados na construção têm nesse sentido, duas ca-
racterísticas muito importantes no que concerne à radiação: a absorção de luz e o albedo, ou
seja, a quantidade de luz que um material reflecte. Por exemplo, as cores claras dos edifícios
tradicionais no sul do país têm como objectivo aumentar a quantidade de luz reflectida para
diminuir a temperatura no interior das casas. Também, nos espaços exteriores a radiação
durante o verão é por vezes excessiva, e por isso devem ser evitados os pavimentos com
cores muito claras que provocam desconforto pelo reflexo da luz e devem existir locais em
condições de ensombramento.
De entre os processos com potencial de diminuir a temperatura destacam-se a evaporação
directa de água para a atmosfera e a evapotranspiração através da qual a vegetação liberta
água para a atmosfera pela superfície folear. A evaporação fica comprometida pelo facto das
superfícies dos materiais presentes no ambiente urbano exibirem reduzida capacidade de re-
tenção de água.
Neste contexto, a vegetação desempenha várias funções ao nível do controlo da tempe-
ratura: aumenta a evaporação aumentando a retenção da água, possibilita a ocorrência da
evapotranspiração, e proporciona ensombramento. O processo de evapotranspiração, em con-
jugação com outros factores, como o ensombramento, terá dependendo de cada situação em
particular capacidade de reduzir a temperatura registada nos espaços verdes em vários graus
centígrados face ao ambiente urbano imediato.
Nas cidades mediterrânicas, a necessidade de regulação térmica, sobretudo de reduzir as
amplitudes térmicas diárias, revela-se particularmente relevante, dada a tendência para os

MÉTODOS E TÉCNICAS PARA O DESENVOLVIMENTO URBANO SUSTENTÁVEL — A EXPERIÊNCIA DOS PROJECTOS POLIS
| 129
EXEMPLOS eventos extremos se agudizarem perante as alterações cli-
CIDADES POLIS
máticas, o que pode elevar as temperaturas na época estival
BEJA a níveis não experienciados previamente. Por exemplo, em
A disposição de
linhas arbóreas Lisboa o número de noites tropicais (com temperatura não
que se introduzem inferior a 20ºC) aumentou de um valor médio de 7 noites/ano
parcialmente no relvado
proporciona sombra nos anos 70 para cerca de 20 noites/ano na década de 90.26
parcial assegurando
No que concerne o ensombramento, este depende so-
a transparência
necessária para a bremaneira da presença de árvores, e varia com as espécies
utilização deste espaço.
escolhidas (forma, dimensão e densidade da copa) e com a
CASTELO BRANCO idade dos indivíduos. Este último aspecto é especialmente
A existência de
crítico nos espaços verdes recém-constituídos onde as ár-
pérgolas facilita uma
mais rápida cobertura vores ainda não atingiram o estado adulto. A intercalação
vegetal com herbáceas.
de espécies de rápido crescimento pode reduzir a carência
PORTALEGRE de sombra na fase inicial. Outra solução é a instalação de
A manutenção de
vegetação pré-
estruturas provisórias ou definitivas de ensombramento as-
-existente, tomando sociadas a locais de estadia. Também a escolha de mobili-
medidas activas de
protecção favorece a
ário urbano condiciona o conforto climático. Este deve ser
existência de sombra adequado às condições climáticas do local, sendo que, por
deste a fase inicial.
exemplo, os bancos de cores escuras ou de aço inoxidável
COIMBRA têm tendência a aquecer demasiado quando expostos ao sol,
Os relvados, apesar
do seu elevado valor e os últimos podem ainda ser frios no Inverno.
para recreio activo, De entre as variáveis climáticas, o vento é aquele que o
criam sobretudo na
fase inicial situações ser humano tem mais capacidade de percepcionar e o sen-
de grande desabrigo e timento resultante dessa experiência é muito negativo. A
ausência de sombra.
vegetação colocada em faixa formando uma sebe perpendi-
CASTELO BRANCO cular à direcção dominante do vento, reduz a velocidade do
Os jogos de água, são
uma forma de refrescar ar ao nível do solo e força o vento a circular acima das copas
e divertir. criando uma área de conforto com um comprimento até cer-
ca de sete vezes a altura da sebe.
As características das sebes, especialmente as compos-
tas por várias espécies diferentes de folhas intricadas, per-
mitem ainda diminuir o ruído provocado, por exemplo, pelo
trânsito viário. Esse efeito é ainda potenciado se a vegetação
estiver sobrelevada relativamente à área de estadia.

130 | MÉTODOS E TÉCNICAS PARA O DESENVOLVIMENTO URBANO SUSTENTÁVEL — A EXPERIÊNCIA DOS PROJECTOS POLIS
3.2.5. ACTIVIDADES, EQUIPAMENTOS E PROMOÇÃO
DA INTERACÇÃO SOCIAL
Os equipamentos presentes num espaço verde urbano determinam as actividades aí desenvol-
vidas e o grau de atractividade do espaço para diferentes públicos. A presença de determina-
dos equipamentos, tal como o próprio desenho do espaço verde onde se encontram inseridos,
podem conduzir à exploração de dimensões, que de outra forma ficariam vedadas aos utili-
zadores. Por exemplo, em espaços verdes que são atravessados ou que ficam junto a rios a
existência de desportos náuticos ou a possibilidade de contacto directa com as zonas de água
é facilitada.
Assim, de uma forma directa, a escolha dos equipamentos vai determinar as categorias de
sujeitos que vão estar presentes nos diferentes locais deste espaço. Na distribuição dos equi-
pamentos pela área do parque é importante ter em conta a complementaridade entre equipa-
mentos, a adequação destes em termos de conforto climático, assim como, a adequação aos
objectivos a que se propõem.
A desadequação dos equipamentos em relação às condições climáticas pode conduzir à
sua não utilização, ou a uma utilização desadequada. Por exemplo, a ausência de sombras em
espaços verdes ou a utilização de equipamentos ou estruturas cujos materiais sofrem altera-
ções de temperatura em função das condições climatéricas exteriores (e.g., bancos metálicos).
Alguns equipamentos potenciam significativamente a sua utilização pela presença de outros
nas suas imediações que, de uma forma directa ou indirecta, os complementam. Por exemplo, os
equipamentos infantis, cujos utilizadores directos só se podem deslocar ao local acompanhados
por adultos, frequentemente idosos, ganham atractividade quando situados perto de bancos,
ou junto a locais de restauração, que cumpram também a função de apoio alimentar a adultos
e crianças. Contudo, também há equipamentos que estimulam práticas comportamentais que
os tornam incompatíveis com outros equipamentos. Por exemplo, parques radicais que ficam
perto de caminhos de grande fluxo pedonal ou de parques infantis, podem conduzir a acidentes.
Os espaços verdes em contexto urbano são também elementos importantes na promoção
da interacção e coesão social. De uma forma geral podem ser distinguidos dois tipos de espa-
ço, a que correspondem equipamentos distintos:

— Espaço “Sociopetal”— ambiente cuja disposição funcional dos objectos facilita a inte-
racção social;
— Espaço “Sociofugal” — ambiente nos quais a disposição funcional dos objectos dificulta
aos sujeitos oportunidades de contacto interpessoal e facilita assim o isolamento.

MÉTODOS E TÉCNICAS PARA O DESENVOLVIMENTO URBANO SUSTENTÁVEL — A EXPERIÊNCIA DOS PROJECTOS POLIS
| 131
Tanto uns espaços como os outros são importantes, contudo, cumprem funções diferentes
e complementares. O espaço “sociopetal” tem o objectivo de promover a interacção social,
podendo ter um papel importante em termos de coesão do bairro e da cidade, e contribuir para
aumentar ou reforçar a ligação e identidade ao local e à comunidade. O espaço “sociofugal”
tem funções mais individuais, promovendo o isolamento, a contemplação, a reflexão e a ligação
ao local.
Um desafio que se coloca na concepção dos espaços verdes é o processo de apropriação
do espaço não ser necessariamente realizado pelos utilizadores do modo que foi previsto. A
apropriação de um lugar não se relaciona apenas com a utilização reconhecida do espaço, mas
é o processo pelo qual os utilizadores, mediante um processo activo, e por vezes socialmente
partilhado, de acção-transformação e de identificação, vão adequando o espaço às suas ne-
cessidades e modos de estar.
Assim, em algumas situações verifica-se uma não utilização do espaço ou a utilização do
EXEMPLOS
CIDADES POLIS
espaço para fins não previstos. As razões que estão na base desta desconexão podem ser
múltiplas e nem sempre podem ser previstas por quem concebe o espaço. De qualquer modo,
COIMBRA
Actividades desenvolvi-
estas alterações do uso ou criação de novas utilizações, podem em função das situações, ser
das no rio (pescar e detectadas num processo de monitorização, e subsequentemente, após avaliação, devem
tomar banho) utilizando
a mesma estrutura. constituir-se como objecto de uma redefinição dos objectivos de utilização do espaço.

LEIRIA
ausência de sombras
dificulta a utilização
dos equipamentos em
determinadas horas
do dia.

CASTELO BRANCO
complementaridade
entre equipamentos
— presença conjunta de
parque infantil, bar e
bancos.

BEJA
Existência de equipa-
mentos diversificados
para as diferentes
classes etárias (i.e.
parques radicais junto
de parques infantis)
que não beneficiam de
muita proximidade.

132 | MÉTODOS E TÉCNICAS PARA O DESENVOLVIMENTO URBANO SUSTENTÁVEL — A EXPERIÊNCIA DOS PROJECTOS POLIS
CASTELO BRANCO
Exemplo da coexistên-
cia de espaços que
promovem a interacção
humana e o isolamento.

COIMBRA
Espaço sociofugal
através da criação de
distância e isolamento
em ligação com o plano
de água.

PORTALEGRE
Criação de espaços de
sociofugais recorrendo
à modelação do ter-
reno.

CASTELO BRANCO
presença de bancos que
podem ser movimenta-
dos pelos utilizadores,
no sentido de criar
espaços de interacção
social ou espaços de
isolamento.

LEIRIA
Criação de espaços
multifuncionais que
permitem a ocorrência
de eventos, como por
exemplo, a “Feira de
Abril”.

Apropriação do espaço
contíguo ao parque
radical. Os utilizadores
do parque radical usam
as elevações do relvado
como se tratassem de
equipamentos para a
prática de desportos
radicais.

MÉTODOS E TÉCNICAS PARA O DESENVOLVIMENTO URBANO SUSTENTÁVEL — A EXPERIÊNCIA DOS PROJECTOS POLIS
| 133
LEIRIA
O mapa resultante da
observação durante 2
dias (Maio 2007) revela
que à diversidade de
situações e equipa-
mentos proporcionada
corresponde um vasto
leque de utilizações —
a linearidade e con-
tinuidade da interven-
ção em Leiria favorece
sobretudo o passeio.

3.2.6. OS UTILIZADORES: PERCEPÇÃO DE SEGURANÇA,


ORIENTAÇÃO E SATISFAÇÃO
No sentido de criar espaços verdes urbanos que sejam vivenciados, estes beneficiam em ser
concebidos para dar suporte às necessidades e requisitos da população alvo. A desadequação
dos espaços verdes em contexto urbano tem custos que inclui a sua não-utilização, utilização
deficiente ou transformação do espaço em lugar de marginalidade.
Deste modo, é necessário tratar a adequação entre as características do espaço verde à po-
pulação para quem se destina. Vários aspectos há a considerar. Em termos da caracterização
dos utilizadores é necessário recolher informação sobre: as características socio-demográficas,
frequência e padrão de visitas ao longo do dia, semana e ano; objectivos e actividades desen-
volvidas, origem e meios de transporte que utilizam. É importante caracterizar, ainda, os não-
-utilizadores, isto é, a população que estando na área de influencia da área verde não a utiliza.
Para além das suas características socio-demográficas, é importante identificar as barreiras

134 | MÉTODOS E TÉCNICAS PARA O DESENVOLVIMENTO URBANO SUSTENTÁVEL — A EXPERIÊNCIA DOS PROJECTOS POLIS
ao uso dos espaços verdes como os factores
internos ao sujeito (e.g., falta de tempo ou de
interesse), assim como, identificar as carac-
terísticas dos espaços verdes entre as quais
se destacam: a falta de infra-estruturas, a
presença de sujeitos indesejáveis, a percep-
ção de insegurança e a qualidade ambiental
(e.g., presença de lixo)27.
Neste contexto é importante considerar
também a posição geográfica do espaço verde
na cidade (e.g., central ou periférica) e que vai
influenciar os padrões de utilização do espaço
verde ao longo do dia e o tipo de utilizadores. Uma análise dos padrões de utilização dos espaços
verdes das cidades de Beja, Coimbra, Leiria e Castelo Branco (Figura 37), torna evidente que en-
quanto os dois últimos, por se localizarem no centro da cidade, usufruem de uma utilização predo-
minantemente ao longo do dia, com um máximo de utilização a meio do dia, os dois primeiros (em
Beja e Coimbra) situados num local mais periférico, só atingem a utilização plena ao final do dia. Os
posicionamentos mais centrais favorecem uma integração destes espaços na vivência quotidiana
da cidade, enquanto que os mais periféricos necessitam de um movimento intencional ao espaço.
Em relação aos utilizadores potenciais do parque, variam em função das características
deste, e do seu raio de atracção. A investigação neste domínio tem apontado três factores
principais na satisfação dos utilizadores com espaços verdes: as actividades que podem ser
desenvolvidas naquele espaço e que decorrem dos equipamentos presentes, das acessibilida-
des, da percepção de segurança e da capacidade de orientação.
Apesar de ser reconhecido o valor ecológico e atractividade visual e estética de extensas
áreas verdes no meio urbano, a sua utilização pode questionar os seus utilizadores sobre a sua
segurançaÐ. Dizer às pessoas que o seu medo é infundado não se revela efectivo na redução
da sua percepção de insegurança. O espaço verde não pode apenas ser seguro mas tem que
parecer seguro. Assim, conhecendo as características que contribuem para a percepção de
insegurança, tem que se lidar com factores como a estrutura do parque e a sua manutenção
para criar espaços que permitam, por um lado, a percepção de segurança, sem, por outro,
colocarem em causa o seu potencial para explorar e surpreender o utilizador. Aspectos como
a criação de acesso visual, promover a familiaridade com o espaço e a presença de sinais hu-
manos têm-se revelado factores importantes.

MÉTODOS E TÉCNICAS PARA O DESENVOLVIMENTO URBANO SUSTENTÁVEL — A EXPERIÊNCIA DOS PROJECTOS POLIS
| 135
Vários são os factores que podem contribuir para a percepção de insegurança:

1. Envolvente social — a localização do espaço verde determina em muito o modo como é


percepcionado, e na ausência de conhecimento é feita uma associação entre o parque e
o estereótipo da envolvente.
2. Sinais de vandalismo — a presença de sinais de vandalismo, como graffitis ou equipa-
mentos destruídos, salienta a presença de grupos de sujeitos com comportamentos
anti-sociais, e transmite a informação que a área não é protegida ou está fora de con-
trole.
3. Limpeza — para além das questões estéticas e de higiene pública, a presença de lixo
salienta que o parque não é cuidado, e simultaneamente, que não existe presença pes-
soal de manutenção no parque, sendo que este é sempre percepcionados como poten-
ciais ‘protectores do espaço’ e dos seus utilizadores.
4. Acesso visual — vistas obstruídas ou limitadas podem contribuir para aumentar o receio
ou insegurança. A forma como os elementos construídos ou a vegetação está distribu-
ída pode aumentar ou reduzir a visibilidade criando espaços obstruídos onde podemos
percepcionar que alguém se pode esconder. As zonas junto aos caminhos são particu-
larmente problemáticas. Há várias formas de aumentar a visibilidade, tais como, a co-
locação de vegetação rasteira, suficientemente baixa para que não crie a sensação que
algo ou alguém se pode esconder por detrás, ou em zonas de árvores deixar os troncos
livres para que possa existir visibilidade através deles. Também, a criação de miradou-
ros ou pequenas elevações que permitam ter uma visibilidade geral da área, aumentam
a familiaridade com o espaço, levando a que os sujeitos se sintam mais confortáveis e
confiantes.
5. Presença humana ou sinais da presença humana — A presença de utilizadores, pes-
soas ligadas à manutenção ou presenças de elementos que transmitam a ideia de que
o lugar é cuidado e protegido.

Uma dimensão importante e que está associada à percepção de segurança é a orientação.


Sendo estes espaços construídos para a promover a sensação de evasão e ter efeitos restaura-
tivos do stress diário, devem exigir aos seus utilizadores um baixo esforço cognitivo, facilitando
a leitura do espaço. A adequada concepção do espaço, assim como a existência de mapas de
orientação, sinais e símbolos nos pontos de decisão, contribui significativamente para a quali-
dade da experiência no cenário natural.

136 | MÉTODOS E TÉCNICAS PARA O DESENVOLVIMENTO URBANO SUSTENTÁVEL — A EXPERIÊNCIA DOS PROJECTOS POLIS
EXEMPLOS
CIDADES POLIS

BEJA
Sinais de vandalismo
salientam a falta de
vigilância e de cuidado
com o local contribuin-
do para a percepção de
insegurança.

COIMBRA
Grafittis contribuem
para a percepção de
insegurança.

MARINHA GRANDE
WC para cães con-
tribuem para a limpeza
da área e podem ser
considerados pistas
ambientais que nos
lembram que não se
deve sujar a área.

COIMBRA
Presença de lixo, pode
ser percepcionado
como falta de manuten-
ção, de abandono,
contribuindo para a
percepção de insegu-
rança.

LEIRIA
Pontes e túneis, quando
amplos e bem ilumi-
nados não contribuem
para a percepção de
insegurança.

CASTELO BRANCO
Hortas no centro da
cidade podem estar
desadequadas das car-
acterísticas culturais da
população e não serem
particularmente valori-
zadas pelo facto de se
tratar de uma cidade
cuja envolvente é mar-
cadamente rural.

COIMBRA
Equipamentos como
MÉTODOS E TÉCNICAS PARA O DESENVOLVIMENTO URBANO SUSTENTÁVEL — A EXPERIÊNCIA DOS PROJECTOS POLIS
| 137
3.2.7. PROMOÇÃO DE ATITUDES E COMPORTAMENTOS PRÓ-AMBIENTAIS
Os espaços verdes apresentam condições ideias para, em contexto descontraído de laser,
oferecerem oportunidades educacionais (formais e informais) para todos os grupos etários.
Reconhecida a importância do envolvimento das pessoas na promoção de atitudes e comporta-
mentos pró-ambientais, tem-se concluído que as formas mais eficazes de sensibilização para
estas questões, e em particular promover comportamentos adequados, são os métodos da
experiência directa e o desenvolvimento de competências ambientais, através da:

a) introdução de pistas ambientais através de pequenos cartazes ou sinalética que “lem-


bra” a necessidade de ter determinados comportamentos;
b) informação ambiental sobre as espécies presentes na área e/ou descrição dos proces-
sos biológicos e ecológicos;
c) disponibilização de equipamentos para educação ambiental que de forma lúdica per-
mita adquirir e manipular informação ambiental;
d) informação ao público das práticas introduzidas na concepção ou sistema de manu-
tenção do espaço verde que revelam preocupações ambientais. Por exemplo, o uso de
materiais recicláveis, o recurso a água do rio para a rega (e.g., Coimbra), a utilização
de água oriunda de uma ETAR num lago artificial integrado num espaço verde (e.g.,
Beja). Esta informação não só informa os utilizadores das preocupações ambientais da
entidade promotora do projecto, como dá exemplos de protecção ambiental exequíveis.
Simultaneamente, numa época em que as atitudes pró-ambientais são socialmente va-
lorizadas, esta informação serve também para reforçar a identidade ao local;
(e) existência de equipamentos que facilitam os comportamentos pró-ambientais (e.g.,
EXEMPLOS parque para bicicletas em Viseu);
CIDADES POLIS (f) centros de Interpretação ambiental integrados nos espaços verdes (e.g., Leiria e Coimbra).
COIMBRA
exemplo de informação
ambiental sobre as
espécies arbóreas pre-
sentes.

BEJA
A presença de um
sistema de depuração
hídrica sem informação
adequada pode condi-
cionar a aceitação da
população.

138 | MÉTODOS E TÉCNICAS PARA O DESENVOLVIMENTO URBANO SUSTENTÁVEL — A EXPERIÊNCIA DOS PROJECTOS POLIS
COIMBRA
Presença de centros de
interpretação ambiental

LEIRIA
Parques para bicicletas
são equipamentos que
facilitam as práticas
pró-ambientais ao
promover a mobilidade
sustentável.

3.3. AS ‘ESTRUTURAS ECOLÓGICAS’: OPORTUNIDADE


PARA UMA VISÃO INTEGRADA

A contribuição dos espaços verdes urbanos para o Desenvolvimento Urbano Sustentável de-
pende sobremaneira de uma alteração no entendimento das relações entre o artificial e o
natural, o qual passa incontornavelmente pela valorização dos sistemas ecológicos em meio
urbano e da sua integração em estruturas ecológicas que favoreçam o reencontro da popula-
ção urbana com a natureza e com os ciclos naturais.
Observam-se uma multiplicidade de visões sobre a forma como delimitar conceptualmente
as estruturas ecológicas. Algumas abordagens centram-se em valores ecológicos, na sua di-
mensão estritamente biofísica, construindo-se sobre o conceito de ‘continuum naturale’. Outras
apoiam-se no enquadramento proporcionado pelos ‘corredores verdes’ (‘Greenways’29) difundi-
dos a partir dos EUA, os quais têm como objectivo principal criar uma estrutura contínua que
permita o acesso e o movimento da população através da natureza, colocando enfoque nas fun-
ções recreativas. A partir deste conceito desenvolve-se, mais recentemente, a figura das ‘infra-
-estruturas verdes’ (‘green infrastructure’30) que visam criar condições para uma maior coesão
entre a sociedade e a natureza em áreas fortemente urbanizadas. As ‘infra-estruturas verdes’
encontram correspondência nas ‘redes ecológicas’ (‘ecological network’31) que se desenvolvem
no contexto europeu, a partir da Holanda. Estas ‘redes ecológicas’ assumem-se como estrutura
multifuncional baseada na integração dos valores ecológicos e das procuras sociais. Esta visão
parece mais ajustada para o desenvolvimento de estruturas ecológicas nas paisagens culturais
europeias, e nomeadamente nas áreas urbanas, por criar um enquadramento onde a dimensão
ecológica e social se podem interceptar com objectivo de melhorar a qualidade de vida da popu-
lação. Nesta acepção, estas constituem-se como estruturas contínuas inseridas na paisagem

MÉTODOS E TÉCNICAS PARA O DESENVOLVIMENTO URBANO SUSTENTÁVEL — A EXPERIÊNCIA DOS PROJECTOS POLIS
| 139
que ligam espaços e vivências e desempenham um conjunto de funções relevantes: estéticas,
ao contribuírem para o carácter e identidade do lugar; psico-sociais ao criarem ambientes que
favorecem o bem-estar da população; educacionais pela oportunidade da população urbana
experienciar e compreender natureza; recreativas pela proximidade às áreas de residência; e
ecológicas pela criação de condições favoráveis à instalação da vida selvagem.
Em Portugal o enquadramento legal para a implementação de ‘Estruturas Ecológicas’ foi
criado pelo RJIGT32 com o objectivo de assegurar a “compatibilização das funções de protec-
ção, regulação e enquadramento com os usos produtivos, o recreio e o bem-estar das po-
pulações”. Prevendo-se neste âmbito a sua delimitação e operacionalização no contexto dos
Planos Directores Municipais e nos Planos de Urbanização, as estruturas ecológicas emergem
como oportunidade para uma visão integrada no planeamento e concepção de espaços verdes
urbanos que possam, tanto através da sua localização, como da sua estrutura, contribuir para
um desenvolvimento urbano mais sustentável.

140 | MÉTODOS E TÉCNICAS PARA O DESENVOLVIMENTO URBANO SUSTENTÁVEL — A EXPERIÊNCIA DOS PROJECTOS POLIS

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