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reflexões teórico-conceituais
Marcos Antônio Silvestre Gomes
Marcos Antônio Silvestre Gomes, «Cidades sustentáveis e parques: reflexões teórico-conceituais», Confins
[Online], 40 | 2019, posto online no dia 24 maio 2019, consultado o 10 fevereiro 2024. URL:
http://journals.openedition.org/confins/19428; DOI: https://doi.org/10.4000/confins.19428
Este artigo intenta uma reflexão sobre parques urbanos e sustentabilidade, evidenciando o
alinhamento ou não de projetos e de análises recorrentes na literatura às diretrizes de uma
agenda global imposta pelas Nações Unidas. O trabalho resulta de pesquisas bibliográficas,
observações de projetos, visitas de campo e análises específicas de parques, em nível nacional
e internacional, especialmente no Rio de Janeiro (Brasil) e em Lisboa (Portugal). Demonstra-se
que, mesmo após duas décadas da assinatura da Agenda 21, o termo desenvolvimento
sustentável é amplamente empregado por agentes públicos e privados que, com diferentes
sentidos e intenções, pautam seus discursos e ações no ideário da sustentabilidade urbana,
tendo os parques como um dos elementos dessas práticas. É demonstrado também que ainda
predominam estudos sobre cidades, parques e sustentabilidade sem avanços teórico-conceituais
que permitam desmistificar discursos e práticas na produção do espaço urbano.
Este artigo apresenta um esforço de análise para compreensão de uma temática atual premente
às agendas urbanas que, com diferentes sentidos e intenções, pautam seus discursos e ações
no ideário da sustentabilidade urbana, tendo os parques como um dos elementos dessas
práticas. Apresenta-se como desdobramento de outras reflexões já realizadas pelo autor1
Para uma análise dos parques urbanos no âmbito daquilo que agências internacionais, governos
locais e adeptos à onda das “boas práticas ecológicas” colocam como sustentabilidade é
necessário considerar duas escalas de análise, uma intraurbana e outra intraparque. A primeira
o aponta como um elemento fundamental da política pública para alcançar objetivos
socioambientais no espaço urbano simplesmente pela sua existência, materialização, que pode
ser, sobretudo quantificável, contribuindo para os índices de áreas verdes, áreas impermeáveis,
espaços livres públicos etc. A segunda, valendo-se da sua existência enquanto espaço instituído,
considera-o elemento que por sua concepção e materialização, em seus aspectos qualitativos
incorpora materiais e tecnologias ditas sustentáveis, o que o insere numa cadeia de
retroalimentação do sistema produção-consumo, revelador de responsabilidade ambiental.
Ao tempo em que difundem-se os parques por seus atributos ecológicos e suas qualidades
enquanto espaços de lazer, ignoram-se os interesses do setor privado que os projetam como
alegorias, simulacros de natureza que contribuem para grandes projetos imobiliários cujo
interesse é a reprodução das condições de ampliação de lucros e rendas na cidade.
Parque urbanos constituem elementos importantes para a compreensão das cidades e dos
agentes sociais que as produzem, especialmente nos grandes centros urbanos onde o capital
atua com maior intensidade e os agentes hegemônicos predominam diretamente na esfera
econômica e indiretamente, mas com frequência, nos interstícios da esfera política.
A reflexão aqui proposta avança para uma análise da relação entre parques urbanos e
sustentabilidade, demonstrando o alinhamento ou não de projetos às diretrizes da agenda
global. Contribui ainda para a ampliação do debate em diferentes escalas e temporalidades.
Desde que o Relatório “Nosso Futuro Comum” foi publicado pela Comissão Brundtland, das
Nações Unidas, em 1987, houve a disseminação do termo Desenvolvimento Sustentável3. Mais
tarde, por ocasião da aprovação da Agenda 21 no Rio de Janeiro em 1992 (CONFERÊNCIA DAS
NAÇÕES UNIDAS..., 1997), o termo sustentabilidade se cristalizou nas pautas públicas,
integrando-se, sobretudo, às políticas de planejamento. Prevalece até os dias atuais como algo
a ser perseguido, inclusive nas políticas urbanas.
Para Roger-Machart (1997) o conceito amplamente aceito de cidade sustentável como “a city
meeting the needs of its present citizens without bankrupting the resources of worldwide future
generations”, é comumente difundido na literatura como possível de ser alcançado através de
três principais mecanismos: “careful management of the demand for resources, maximising the
circularity of resource use, and maximising the efficiency of resource use”. Para este autor,
gestores públicos têm diferentes ideias sobre o nível de sustentabilidade desejado e isso
depende das suas concepções de meio ambiente, o que introduz incertezas para a
implementação de medidas.
Este discurso, para Acserald (2009, p. 31), apresenta-se sob dupla dimensão: uma prática, que
pretende mudanças na forma de apropriação e gestão da base material urbana, fazendo durar
os estoques e fluxos de matéria e energia; e uma retórica, que considera a incorporação da
variável ambiental um meio de neutralizar a crítica ambientalista e conferir legitimidade às
políticas urbanas. Conforme afirma, defendem-se a competitividade, e assim, “os conflitos
urbanos em torno dos ‘bens coletivos’, do ‘espaço não mercantil’ por meio do qual as práticas
espaciais se confrontam na disputa por sua ‘duração’, são os sintomas vivos da
insustentabilidade das cidades”.
Em resumo, sustentabilidade urbana, em geral, é difundida como possível de ser mensurada por
meio de alguns elementos, indicadores, sobretudo, de ordem socioambiental, como água
reutilizada, metro quadrado de área verde por habitante, produção e utilização de energia em
fontes renováveis, quantidade de materiais reciclados, níveis de escolaridade e renda etc. Os
indicadores, comumente, abordam questões físicas, econômicas, sociais e ambientais de um
território, constituindo-se instrumentos para ação (LEIVAS, 2011)”6. São utilizados para explicar
a realidade por meio de recortes analíticos, operados pela quantificação, sendo os de ordem
qualitativa, como a participação política, obscurecidos em muitos casos (BARBOSA, 2013).
Nas cidades, parques passaram a ser projetados e implantados com e como medidas que alguns
agentes públicos, privados e acadêmicos consideram como sustentáveis. Como se destaca nesta
análise, tanto na Europa quanto no Brasil, alguns estudos abordam esta temática a partir de
realidades específicas, e para fundamentar o caráter desta reflexão, apontam-se, como
resultado de um trabalho in loco, os elementos, princípios ou práticas caracterizadores de
“propostas sustentáveis” nos parques Tejo e Madureira.
Para o escopo desta análise, parques são entendidos como espaços públicos designados por lei,
oriundos do parcelamento do solo, do aproveitamento de terras públicas ou de processos de
desapropriação, cujos atributos permitem cumprir funções socioambientais. Constituem
equipamentos urbanos, subespaços no espaço urbano, que possibilitam a análise na escala
intraurbana, incorporando múltiplas dimensões, como lazer, cultura, meio ambiente etc. Há
muitos estudos que abordam aspectos inerentes aos parques e sustentabilidade, muitos deles
sem aprofundamento teórico quanto à compreensão do que se considera sustentável.
Trata-se mais de um discurso da moda, como afirma Rodrigues (2006, p. 8), do que de uma
análise reflexiva, onde a maioria dos que utilizam os termos desenvolvimento sustentável,
sustentabilidade parece aceitar a questão ambiental como agenda política “sem analisar como
se oculta a realidade”. Os espaços verdes são considerados componentes do quadro
socioambiental e econômico que caracteriza a sustentabilidade urbana, e os estudos quanto aos
mesmos abordam suas diversas qualificações, destacando-se, sobretudo, a promoção da
qualidade de vida humana e os seus benefícios quanto aos aspectos ecológicos.
Resumidamente, pode-se afirmar que
A abordagem relativa à análise da contribuição dos espaços verdes para o
desenvolvimento urbano sustentável, centra-se em três temáticas: uma dimensão
ecológica, onde se exploram aspectos como a capacidade de os espaços verdes
contribuírem para regulação micro-climática e para a qualidade do ar, as múltiplas funções
que a água desempenha no contexto urbano e a promoção da biodiversidade; uma
dimensão psicossocial, que trata de aspectos relacionados com a percepção e utilização
dos espaços verdes urbanos, nomeadamente os equipamentos e atividades ai
desenvolvidas e sua importância para a promoção da interacção social, a influência da
percepção de segurança e de orientação no espaço para a sua utilização e finalmente a
importância dos espaços verdes para a promoção de atitudes e comportamentos
pro-ambientais, através da aproximação da população aos processos e ciclos naturais; e
por último, as estruturas ecológicas enquanto forma de operacionalização e articulação
das duas primeiras (CESUR, 2007, p. 109).
É bastante conhecida a literatura que trata da importância dos espaços verdes urbanos. Apesar
da vasta contribuição de trabalhos brasileiros que ressaltam essa questão em análises empíricas
específicas, destacam-se aqui os inúmeros artigos publicados na Revista da Sociedade Brasileira
de Arborização Urbana e demais outros que apresentam esforços de sistematizar as funções
desempenhadas pelos espaços verdes.
Os espaços verdes, como os parques públicos, são frequentemente difundidos pelas agências
internacionais, governos e instituições privadas, como relevantes elementos da sustentabilidade
urbana e muitos estudos pautam-se em recomendações desses agentes. A Comissão Européia
do projeto Cidades Sustentáveis, na ocasião da 3ª Conferência Européia sobre as cidades
sustentáveis, em Hanover, 2000, (SARAIVA, 2010), divulgou como um dos indicadores comuns
europeus para um perfil de sustentabilidade local a “existência de zonas verdes públicas e de
serviços locais”, cujo objeto de medição seria o “acesso dos cidadãos a zonas verdes próximas e
a serviços básicos”9.
Em Portugal, entre as práticas ditas mais sustentáveis defendidas pela municipalidade de Lisboa
(CESUR, 2007, p. 38), constam os “espaços abertos naturais, proteção de zonas úmidas,
florestas, vales, habitats etc.; uso de compostos, biomassa, gestão integrada de pesticidas”,
etc. No entanto, outras práticas também indicadas pelo documento podem ser desenvolvidas
tendo como suporte o espaço do parque, por exemplo, condições de emprego baseadas na
educação; mobilidade a pé e por bicicleta; produção e consumo de energia solar; proteção e
utilização de sistemas hidrológicos naturais; redução, recuperação, reciclagem e reutilização de
resíduos de construção.
Estudos como o de Loures et al. (2007), sobre o Parque de Portimão, em Portugal, reforçam o
papel socioambiental dos parques e os consideram relevantes espaços de sustentabilidade ao
promoverem “regeneração” urbana e trazerem a natureza para perto das pessoas. A estratégia
utilizada no projeto foi denominada de “superposição”, na qual sobrepõem-se na proposta:
circulação, estrutura verde e áreas funcionais. O plano de circulação é fundamental porque
permite sistematizar todo o parque de modo que se torne funcional e integrado ao seu entorno,
sobretudo, a pé ou de bicicleta. No caso das estruturas verdes foram utilizadas espécies
autóctones que redimensionadas ao longo do parque permitiram sua integração na paisagem.
As áreas funcionais correspondem aos espaços dos equipamentos destinados às atividades de
lazer.
No plano econômico, Loures, et al. (2007) reforçam a importância do Parque de Portimão como
uma estrutura que contribui para o aumento dos preços das propriedades (terras e imóveis),
aumento de empregos e ressaltam que as ações do poder público devem evitar processos como
o de “gentrificação”. Dessas afirmações, considera-se aqui que a valorização imobiliária, como já
apontado nesta análise, distante de ser um aspecto positivo proporcionado pelo parque,
constitui um processo que, inevitavelmente, contribui para a expulsão das pessoas mais pobres
das suas proximidades, do mesmo modo que atrai um público de elevada renda interessado
tanto em residir quanto em realizar investimento, apropriando-se real ou simbolicamente das
qualidades do parque.
Ainda sobre a relação entre espaço verde e sustentabilidade, Jacome (2010), a partir de outra
perspectiva para compreensão desta temática, analisa a utilização de água em seu estudo sobre
o Jardim Botânico de Coimbra (Portugal). Este autor defende que a sustentabilidade em espaços
como parques resulta do equilíbrio dos vários elementos que compõem os espaços verdes,
como clima, solo, água e vegetação. O autor defende o desenvolvimento sustentável como
posto pelos organismos internacionais, afirmando que os espaços verdes têm papel fundamental
no espaço urbano.
No que se refere à água, algumas medidas para alcançar a pretensa sustentabilidade são
elencadas por Jacome (2010), que as reúne em dois grupos: sistemas permeáveis de drenagem
de água (pavimentos permeáveis, poços de infiltração, canais ou valas de infiltração, bacias de
retenção de infiltração) e uso de águas não potáveis (água subterrânea, água da chuva, água
residual - de uso doméstico, por exemplo, etc). Como resultado do seu estudo, Jacome (2010,
p. 70) propôs
medidas para promover o uso sustentavel da agua em espacos verdes e o natural
funcionamento do ciclo hidrologico em meio urbano, nomeadamente a utilizacao de
sistemas de drenagem permeaveis, a criacao de bacias de retencao e infiltracao, a
utilizacao de aguas nao potaveis, a escolha adequada de vegetacao e a utilizacao de
sistemas de rega mais eficientes.
Em Amsterdã, Chiesura (2004) analisou a percepção de usuários do Vondelpark (Figura 2) e,
sem apontar quaisquer elementos teórico-conceituais sobre sustentabilidade, destaca que em
oposição ao frenesi da vida urbana marcada pelo concreto e artificialidade das coisas materiais,
o parque provoca em seus frequentadores sentimentos e emoções que evocam à natureza,
como lugar de paz, liberdade e relaxamento, contribuindo para a qualidade de vida humana que
a autora considera ser um dos atributos de uma cidade sustentável.
No Brasil, mesmo não pontuando o que se entende por sustentabilidade, estudos como o de
Lagoa (2008) apresentam esforços de estabelecer diretrizes para o manejo sustentável de
parques considerando práticas adequadas de utilização de água, solo e vegetação. Nesse
trabalho sobre o Parque Água Branca, na cidade de São Paulo-SP, a autora preocupou-se em
analisar os perfis dos usuários, considerando os usos que fazem do parque para propor
intervenções que se adequem às necessidades dos mesmos. Defende a gestão participativa
como um elemento importante na promoção da sustentabilidade de parques.
Como constatado, na literatura sobre parques é recorrente a sua vinculação ao termo qualidade
de vida. Embora se constitua em um discurso que pretende justificar a importância do parque
para a população através dos benefícios para a saúde física e mental, não se explicita
conceitualmente o que seja. Em geral, qualidade de vida aparece como derivada da condição de
bem-estar da população propiciada, de um lado, pelos benefícios de ordem física e mental que
os parques enquanto espaços verdes oferecem por meio de atividades ativas e contemplativas;
e, de outro, pelas funções ecológicas que incidem sobre a qualidade do ar, condições de
umidade, temperatura etc.
Como outros estudos já destacados, o trabalho de Azevedo (2012), que apresenta uma
proposta para o Parque de Geão, em Santo Tirso (Portugal), ressalta a importância dos espaços
verdes atenderem sobretudo às necessidades da população, reforça que devem ser “sempre
espaços sustentáveis”, mas também não oferece nenhum alinhamento teórico que possibilite
compreender conceitualmente o que entende como sustentável. Baseado em Marques (2009),
destaca como princípios fundamentais para a sustentabilidade em espaços verdes urbanos:
O Parque Tejo foi projetado no contexto de uma proposta de novo conceito urbanístico na
cidade de Lisboa, no qual a sustentabilidade10 apareceu como um mote. Trata-se da Freguesia
do Parque das Nações (Figura 3), planejada e executada por ocasião de grande evento global: A
Exposição Mundial de Lisboa de 1998, imediatamente após a Conferência do Rio de 1992.
Com a implantação do Parque Tejo, o objetivo era contornar problemas ambientais graves na
área onde se implantou e evitar o inconveniente desse ônus para a população que habitaria no
seu entorno, considerando-se ainda a incompatibilidade da área para outros usos, pois
tratava-se de uma antiga área industrial de solos com alto índice de fatores contaminantes,
onde existia uma estação de tratamento de esgoto e um lixão a céu aberto, além de ser
atravessada pelo poluído Rio Trancão.
No caso do Parque Madureira, projetado no âmbito dos jogos Olímpicos Rio 2016 e Conferência
Rio+20, tornou-se amplamente conhecido na cidade do Rio de Janeiro pelas suas características
modernas, expressas no desenho, na composição paisagística e no mobiliário (Figura 5). Sua
peculiaridade está também no fato de se localizar em uma ampla zona periférica da cidade, a
zona Norte, cruzando bairros ao longo de 3,85 km de extensão, destacadamente ocupados por
camadas de médio-baixa renda. Nessas condições, o Parque não apenas significou um
incremento importante de áreas de lazer de uso público, mas possibilitou a esta camada da
população o acesso a estas áreas. Como área de lazer ativo e pela diversidade do mobiliário que
apresenta, sobretudo, a frequência torna-se elevada, permitindo usos distintos (Figura 6).
A análise dos dois parques demonstrou a consonância dos projetos com as diretrizes das
políticas municipais e com a noção de sustentabilidade, como expressa pelos órgãos
supranacionais. A incorporação de uma base técnico-material de elevada tecnologia se
sobressaiu nas propostas em detrimento das preocupações sociais que redundariam em ganhos
generalizados para a sociedade. Marcadamente o Parque Tejo foi projetado, sobretudo, mas não
exclusivamente, para um público em específico, com fins claros de valorização imobiliária da
zona onde se situa. No caso do Parque Madureira, apesar de se constatar alterações na lógica
de reprodução do espaço ao seu entorno, há indícios de valorização imobiliária que precisam ser
melhor investigados. Também, para a sua execução, estudos demonstram a expulsão da
população que antes habitava em parte do local, na denominada favela Vila das Torres,
destruída para as obras do Parque (ARRUDA et al, 2016).
Em comum, as ações ditas sustentáveis nestes parques que lograram êxito pautaram-se em
viabilizar a) meios e custos de acessibilidade ao Parque, com moderna rede de transporte
instalada nas proximidades; b) infraestruturas e programas de educação ambiental, mesmo
funcionando parcialmente; c) sistema de segurança que resguarde a integridade do usuário,
com monitoramento por guardas, câmeras e cavalarias; d) sistema de tratamento e reutilização
das águas; e) drenagem e reuso das águas da chuva nos banheiros e irrigação; f) coleta
seletiva e reaproveitamento adequado do lixo; g) adequação das espécies vegetais ao local com
prioridade para as nativas; h) limpeza e qualidade paisagística; i) adequação do orçamento
financeiro para gestão e manutenção eficientes.
No caso em específico do Parque Madureira, este apresentou avanços nas suas ações ao a)
incrementar mecanismos de valorização dos aspectos culturais e identitários locais, como
estruturas e eventos voltados ao samba; b) promover usos democráticos e diversificados por
usuários de diferentes estratos socioetários; c) disponibilizar e adequar o mobiliário ao perfil,
conforto e frequência dos usuários; d) implantar sistema eficiente de iluminação com alta
tecnologia; e) disponibilizar infraestruturas de mobilidade não-motorizada no interior do parque,
como bicicletas e pistas exclusivas; f) produzir ou utilizar energia de fontes alternativas, como a
solar (Figura 7).
As deficiências em ambos os parques estiveram relacionadas: a) a não valorização e
aproveitamento da base natural e social pré-existente, pois as áreas foram destituídas dos seus
conteúdos sociais e naturais; b) ao precário processo de mobilização e envolvimento da
comunidade na tomada de decisão; c) à falta de integração do projeto ao tecido urbano
envolvente, tanto imediato, como no Parque Madureira, quanto imediato, como no Parque Tejo.
Isto evidencia o caráter de projetos de gabinete, nos quais muitas aspirações da população não
são consideradas e onde o desenho dos parques e seus custos, por vezes, não condizem com a
realidade socioespacial da grande área onde estão situados. A propagação do “mote” da
sustentabilidade parece escamotear os diversos aspectos que perpassam o planejamento e
execução de espaços públicos, sendo negligenciados, sobretudo, a dimensão social desses
processos e a sua relação com o espaço urbano em sua totalidade.
Considerações finais
Como pôde se verificar, os princípios ou práticas consideradas sustentáveis em parques urbanos
são muitos e variados. Envolvem desde aspectos ecológicos, como qualidade, uso e manejo da
água, vegetação nativa, até aqueles de ordem social como favorecimento ao lazer e participação
política, e também infraestrutural, como qualidade dos materiais e formas de mobilidade. No
entanto, as análises recorrentes elencam e defendem as denominadas “boas práticas” sem
reflexão e análises críticas quanto aos fatores políticos determinantes dessas ações.
A análise apresentada demonstrou que ainda predominam estudos sobre cidades, parques e
sustentabilidade sem avanços teórico-conceituais que permitam desmistificar discursos e
práticas na produção do espaço urbano. Análises que depositam crença na tecnologia e no
capital como revertério dos problemas urbanos escamoteiam a perversidade do modo de
produção que cria e alarga condições socioambientais precárias que se revelam em moradias
insalubres, doenças, fome, violência, espaços públicos abandonados etc.
Sob o mote da sustentabilidade os parques incorporam papéis que vão desde a dimensão
ecológica que os perpassam até o economicismo que se embute nos projetos urbanísticos dos
quais fazem parte, como demonstrado especialmente no caso dos parques Tejo e Madureira. No
entanto, reconhece-se a importância de se implantar e ampliar os espaços públicos de lazer nas
áreas urbanas, sobretudo, quando se trata de bairros carentes dessas infraestruturas.
Parques são reconhecidamente espaços potenciais para o desenvolvimento de ações ambientais
e sociais de grande importância nas cidades. Devem ser implantados de forma democrática,
fortalecendo a participação cidadã e garantindo o seu pleno uso por toda a população.
Torna-se necessário debater o espaço público em suas múltiplas dimensões e na sua articulação
com o espaço da cidade, vista como totalidade. Em tempos de “crise urbana”, a propósito do
que afirma Maricato (2015), parques podem constituir-se em respostas aos desafios
urbanísticos, socioambientais e políticos, fortalecendo a participação social e favorecendo o
acesso democrático à cidade, no sentido daquilo que assevera Lefebvre (2006).
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Notas
1 Gomes (2014).
2 Sanchéz (2010).
3 A definição oficial de que o desenvolvimento sustentável se constitui “naquele que atende às necessidades
do presente sem comprometer a possibilidade de as gerações futuras atenderem às suas próprias
necessidades” (COMISSÃO MUNDIAL..., 1991, p. 46), abriu caminhos para variadas interpretações,
definições, consensos, onde se ocultam muitos interesses e, como assevera Sachs (1997, p. 15), “atua
como um cimento que junta todas as partes, tanto amigos quanto inimigos”.
4 “Destaca-se, neste domínio, a adopção em 1994, da Carta das Cidades Europeias para um Ambiente
Sustentável, conhecida por Carta de Aalborg, por iniciativa da Campanha Européia de Cidades e Vilas
Sustentáveis, cujos princípios são reafirmados em 2004 [Aalborg+10]. Outros documentos, como a
Estratégia Temática sobre o Ambiente Urbano, enfatizam que cada cidade deve encontrar o seu próprio
caminho na integração dos princípios da sustentabilidade em todas as políticas e fazer das especificidades
de cada cidade a base das estratégias locais adequadas, assim como as necessidades de estas reflectirem a
qualidade de vida da população urbana. Em 2007, a Carta de Leipzig, reconhecendo que o DUS
[Desenvolvimento Urbano Sustentável] ultrapassa o âmbito de intervenção de cada cidade, preconiza a
definição de bases para uma nova política urbana europeia, visando a resolução de problemas associados à
exclusão social, ao envelhecimento, às alterações climáticas e aos problemas de mobilidade, propondo o
fortalecimento das áreas centrais das cidades, o apoio a bairros desfavorecidos e o reforço das políticas de
financiamento a infra-estruturas urbanas”. (SARAIVA, 2010, p. 162).
7 Gomes (2013).
8 “Este trabalho envolveu 20 instituições: órgãos de administração pública em doze cidades e oito
instituições de apoio científico na Europa: Alemanha, Bulgária, Eslovênia, Grécia, Hungria, Itália e Polônia,
que participaram de uma equipe interdisciplinar, de maio de 2005 a agosto de 2008 [...] GreenKeys foi
cofinanciado pela iniciativa INTERREG III B (5) da Comunidade Europeia, com suporte financeiro do
Ministério Federal Alemão dos Transportes, da Habitação e Desenvolvimento Urbano.” (COSTA, 2010).
9 Os demais indicadores comuns são: satisfação do cidadão com a comunidade local; contribuição local para
as alterações climáticas globais; mobilidade local e transporte de passageiros; qualidade do ar na
localidade; deslocamento das crianças entre a casa e a escola; gestão sustentável da autoridade local e das
empresas locais; poluição sonora; utilização sustentável dos solos; produtos que promovem a
sustentabilidade.