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2015v17n2p157
entre teoria e empiria, fartamente atualizada pelo mônicas sobre o espaço urbano-metropolitano” (p.
caráter múltiplo e um tanto inédito dos movimentos 144). De outro lado, um projeto alternativo “preen-
de junho de 2013. A questão, a partir dessas refe- cheria” a governança metropolitana com outras
rências, afirma a autora, é “o lugar de onde procu- representações, imaginários e horizontes de eman-
ramos compreender o que de fato é o Estado, ou cipação social, questionando relações naturalizadas
melhor, uma etnografia sobre as práticas sociais, os entre Estado, sociedade e cidades num mundo
lugares e as linguagens que conformam os lugares globalizado e mercantilizado.
nas margens do Estado-Nação” (p. 103). Utili- Outros temas e questões ainda compõem essa
zando o repertório das ciências sociais e da socio- coletânea: a dimensão regional apresentada por
logia contemporânea, em particular, o artigo busca Hipólita Siqueira, que destaca as desigualdades
analisar as mobilizações insurgentes e a potencia- entre as regiões e o pacto federativo; o debate fede-
lidade de conflitos que ganharam a cena pública rativo e o caráter metropolitano da jovem capital
em 2013: aos movimentos de junho, somaram-se brasileira, no artigo de Benny Schvarsberg; as
as mobilizações em torno das intervenções vincu- questões de mobilidade urbana no âmbito metro-
ladas à Copa do Mundo e seus custos, passíveis de politano; a tensão entre fragmentação e integração
serem mensurados em lágrimas e sofrimento (como nas metrópoles brasileiras; o tema do planejamento
sugeriria Veena Das). Castro ainda tece um quadro e suas relações com a dimensão participativa por
de análise desses eventos a partir de uma reflexão meio das questões de Belo Horizonte, sistemati-
ancorada nos chamados estudos pós-coloniais, na zadas por Jupira Gomes de Mendonça, no âmbito
perspectiva de desconstrução de imagens, represen- metropolitano; por meio da discussão de Olinda,
tações e crenças que não questionam os parâmetros a perspectiva da conservação integrada e do que
impostos pelas raízes fincadas pela colonização. Para os autores Virgínia Pontual e Silvio Zanchetti
além de uma suposta uniformidade, a autora aponta identificaram como planejamento culturalmente
o que pulsa no “sentimento do brasileiro diante de orientado; os elementos e dimensões da questão
uma ordem política, social e jurídica que [...] [o] ambiental urbana, pela ótica de Maria Lucia Refi-
fragiliza, invisibiliza, subtrai da existência como netti Martins; e, finalmente, as “cidades da floresta”
cidadãos de direito e sujeitos capazes de pensar sobre pela ótica de Saint-Clair Cordeiro da Trindade Jr. Os
seus desejos, seus direitos e sua existência” (p. 117). vários artigos desse livro desenham as questões de
A segunda parte do livro dedica-se à reflexão um Brasil urbano, em suas determinações e tensões
dos espaços metropolitanos, das desigualdades e com o planejamento, a participação, o Estado, as
mobilidade urbana. O artigo de Jeroen Klink põe a relações de classe, as desigualdades e as dimensões
questão da governança (ainda que necessariamente teóricas e políticas que se articulam em cada prisma,
de ponta-cabeça) e o tema, inescapável, do Estado em cada elemento. No enovelamento e nas articula-
desenvolvimentista ao longo da história brasileira. ções, nas esquinas das cidades e no cruzamento dos
Na conclusão do artigo, o autor aponta os desafios textos, o leitor entrevê a necessidade e a urgência de
da articulação de escalas, circuitos econômicos, ir além do que está dado, de desvendar e revelar as
discursos e práticas espaciais contra-hegemônicos, urdiduras que constituem o Brasil e o urbano do
assim como uma herança tecnoburocrática que século XXI. Esse era o lugar que, naquele momento,
teria profissionalizado o planejamento participativo, o simpósio e seus resultados buscaram ocupar.
distanciando os movimentos sociais e “dissociando
o debate sobre o planejamento das discussões mais Cibele Saliba Rizek: cibelesr@uol.com.br.
amplas sobre poder, conflitos e representações hege-