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Fusca & Cia 3

LUIZ GUEDES JR.

PROJETOS DE VIDA
Nos últimos dez anos, o paulistano Amauri Garbin investiu boa parte de suas economias e de seu tempo livre na realização de
um sonho: concluir a restauração aliada ao projeto de customização que converteram uma antiga sucata no belo e raro Split Window
Brezel 1952 que ilustra a capa desta edição. Tarefa que exigiu não apenas uma grande soma em dinheiro, mas também horas de dedi-
cação e pesquisas para definir cada detalhe e encontrar cada peça de um intricado quebra-cabeça. Como resultado, Amauri tem agora
não só um besouro diferenciado que chama atenção nas ruas e nos encontros. Acima de tudo, ele conquistou uma imensurável rede
de novos amigos e colaboradores espalhados em vários países, que de alguma forma auxiliaram na complexa tarefa de trazer o antigo
Sedan de volta à vida.
Já o contador André Turbiani precisou esperar bem menos tempo entre o início e o fim dos trabalhos que devolveram a aparência
de zero-quilômetro ao familiar Fusquinha 1978 abordado na seção Relíquia. Mas se foram concluídos em “apenas” nove meses, os
serviços de oficina refletem o sonho acalentado durante anos na companhia do tio e antigo proprietário do besouro – que infelizmente
faleceu antes de colocar os planos em prática.
Outra experiência que certamente deixará marcas eternas na relação entre proprietários e seus besouros é a história narrada em
Fusca Paixão, sobre um grupo de amigos da pequena Caxias do Sul (RS) que topou encarar o desafio de percorrer as insólitas estra-
das da Patagônia a bordo de antigos Volkswagen. Aventura que acabou virando o livro Fuscaustral, escrito por um dos viajantes.
Ainda nesta edição, trazemos um especial sobre a Kombi nacional na versão Pick-up. Voltada para o trabalho pesado, a popular
“Cabrita” foi usada à exaustão, o que torna os raros exemplares sobreviventes cada vez mais atrativos aos olhos dos colecionadores.
Por fim, a seção Técnica detalha a evolução da suspensão dianteira do besouro em solo brasileiro, com a descrição das vantagens e
desvantagens de cada configuração sob a ótica dos especialistas. Boa leitura!

Luiz Guedes Jr.


Editor-Executivo
fuscacia@gmail.com

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Fusca & Cia 5
Índice

Personalizado
26
Split Brezel 1952

18
ganha restauração
com personalidade
Relíquia
Desde zero na família,
Sedan recupera o brilho!

08

38Especial
O nascimento e a
evolução da Kombi na
versão Pick-up 58

50 Fusca Paixão
A aventura dos besouros no
extremo da América do Sul

SEÇÕES
08 Reunião 14 Painel VW 58 Técnica 64 ClassiFusca
A festa dos besouros na Destaques e curiosidades A evolução da suspensão Encontre o modelo dos seus sonhos e
“germânica” Pomerode da cultura VW a ar dianteira no Fusca entre para a cultura do carro antigo

12 Correio 16 Vitrine 62 Oficina 66 Garagem do Opa


A palavra dos leitores e as Compras, acessórios e mimos Nosso especialista tira as Todo mês, um acessório raro e curioso
dúvidas na coluna Placa Preta para o seu Volkswagen dúvidas no correio técnico de época que só o “opa” conhece

FOTOS DE CAPA
LUIZ GUEDES JR. E SAULO MAZZONI
6 Fusca & Cia
Fusca & Cia 7
Fusca & Cia 7
Reunião
FOTOS: GERSON AMPESSAN / DIVULGAÇÃO

Vo l k s f r i e n d s
A
previsão não era das melhores: chuva durante toda a semana com o risco
de temporal durante os dois dias da 9ª edição do Volksfriends, realizado
nos dias 5 e 6 de dezembro último, na pequena e simpática cidade de
Pomerode (SC). Mas quis o destino que o evento abrisse as portas em
um sábado de muito sol e céu azul, para alegria dos expositores e público
visitante. Já o domingo amanheceu nublado, passando por períodos de chuva intensa,
o que não afastou os participantes.
Ao todo, mais de 5 mil visitantes passaram pelos portões nos dois dias de festa, que
reuniu aproximadamente 1200 veículos expostos – incluindo proprietários e clubes
de várias regiões do Brasil e até mesmo de países vizinhos, o que só vem confirmar

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O SOL COMPARECEU E ILUMINOU A PRESENÇA
DE MAIS DE 1.200 VEÍCULOS PARTICIPANTES

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Reunião

a posição do Volksfriends entre os melhores encontros nacionais. Alguns participantes surpre-


enderam pela distância percorrida, sendo que um deles encarou mais de 4 mil quilômetros de
estradas para estar presente no evento de Pomerode.
E quem foi não se arrependeu. Como já é de costume, a 9ª edição do Volksfriends reuniu
modelos raros e pouco conhecidos do público brasileiro, caso do Fusca 1302 Cabriolet, do
Volkswagen Tipo 3 Notchback e de versões da Kombi como Tipo 2 Westfalia e T3 Vanagon. De
resto, tanto o pavilhão interno como a área externa exibiam corredores formados por modelos de
extrema originalidade, além de exemplares customizados nas mais variadas tendências. Quem
perdeu a oportunidade já pode se preparar para a 10ª edição do Volksfriends, que acontecerá
nos dias 3 e 4 de dezembro de 2016.

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Modelos originais e customizados convivem harmoniosamente nas diversas áreas do evento catarinense

Nem mesmo a chuva de domingo estragou a


festa. Ao todo, mais de 5 mil pessoas visitaram
o local durante os dois dias de exposição

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Correio Dicas, críticas e sugestões? Entre em contato com a redação! fuscacia@gmail.com

Feliz 2016! Notchback


Prezados amigos de Fusca & Cia, saúde e paz para vocês em 2016! As Sou proprietário de um Zé do Caixão (VW 1600) nacional de quatro
edições do último ano estavam ótimas! E tomara que não subam o preço portas ano 1970 e escrevo para elogiar a matéria publicada na capa
da gasolina em 2016, senão terei de empurrar o Fusca... da última edição com o similar europeu. Eu já conhecia a história do
protótipo renegado no Velho Continente e que acabou dando origem
Gilnei Cunha ao modelo nacional, mas não sabia que a versão alemã, mesmo sendo
Porto Alegre-RS mais antiga, oferecia tantos detalhes de luxo e conforto inexistentes no
modelo brasileiro.
Meus votos de muitas felicidades, saúde, paz e amor a todos desta brilhan-
te revista. E que este novo ano seja repleto de sucesso e prosperidade.
Natan dos Santos
São Paulo-SP
Pedro Flores e família
Angra dos Reis-RJ

Gostaria de desejar à equipe de Fusca & Cia um feliz 2016! O número


de edições é prova do respeito que a revista conquistou junto aos leitores.
Confesso que não sei o que seria hoje do nosso universo “fuscamaníaco”
sem essa ilustre publicação! Então que este ano seja repleto de muito
trabalho, a fim de manter esta bandeira erguida!

Rogério Caldas de Oliveira


São Paulo-SP

Divisão 3 de rua!
A matéria sobre o Fusca Divisão 3, mostra-
da na capa da edição 125, traz muitas
coincidências com o besouro preparado
pelo meu primo Nelson. Ele também
comprou um Fuscão zero-quilômetro
1972, freio a disco, cor laranja, para
arrancada de rua. E o preparador foi
justamente o badalado Amador Pedro.
Receita do veneno? Motor 2.100 cm³, virabrequim
roletado, carburadores Weber 48, alta taxa de compressão para as gasolinas
especiais, cárter seco, câmbio caixa 2 com primeira longa, segunda curta, ter-
ceira longa e quarta curta, suspensões preparadas, roda aro 14 e velocímetro
aferido. Preço da brincadeira? O valor de outro Fuscão novo na época. Na
única foto que tenho do carro, é possível notar o para-lama traseiro “aletado”
para colocação de um radiador de cada lado. O legal é que quando o Fuscão
passava em uma poça de água, saía fumaça de vapor pelas aletas...

Eduardo Ohara
São Paulo-SP

G E M DA V EZ
GARA
O Fuscão 1971 da foto pertence ao leitor Leonardo Farinha, morador da
cidade do Rio de Janeiro (RJ). Ele conta que adquiriu o modelo em 2012
e aos poucos foi investindo em acessórios no estilo German Look. “Uso
esse carro somente em encontros e exposições, inclusive dentro de
shoppings de grande circulação. Apesar de algumas ofertas generosas,
jamais cogitei tirá-lo da minha garagem”, garante o feliz proprietário.

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P O R A L U Í Z I O L E M O S *

PLACA PRETA
Estou restaurando um Sedan 1950 e gostaria 1
de saber qual o formato das grades de buzina
(redondas ou ovaladas?) e também se ambas
eram abertas ou se uma delas era falsa?

Caio Fernandes
Belo Horizonte-MG

Originalmente as grades são redondas, sendo a


do lado do motorista aberta para a buzina (foto
1), enquanto a grade no para-lama do lado do
2
passageiro é falsa (foto 2).

Tenho um Fusca 1300 1970 2ª Série. Sou o segundo


Mil Milhas proprietário e o primeiro dono jura que esse carro nunca
Foi um privilégio comprar a última edição de Fusca & Cia e ler foi mexido. Acontece que o volante cálice dele é branco,
enquanto todo o restante das ferragens é na cor preta.
a história da participação do besouro na prova inaugural das Mil Sempre que vou a algum evento me falam que o padrão
Milhas Brasileiras. Sobretudo com o texto assinado pelo piloto Bird está errado. Só que alguns dizem que o certo é trocar
Clemente, verdadeira lenda viva das nossas pistas. Parabéns a toda o volante por um preto, enquanto outros afirmam que
equipe da revista por nos trazer reportagens como essa! eu teria de substituir as ferragens por componentes
brancos. Qual o padrão correto?
Flávio Augusto Sanches Hélio Lopes
São Paulo-SP Recife-PE

Originalmente o volante é preto. Porém, em 1970 houve um incêndio


na fábrica, levando os modelos 1300 de 1971 a saírem com volante
branco. Isso pode ter acontecido com seu exemplar 1970, dependendo
do mês de produção.

Tenho um Fusca 1300-L 1978 que estou restaurando e estou com dúvidas
sobre o padrão da tapeçaria interna. Qual o tecido de bancos, laterais de
portas, assoalho e teto? Haviam opções de cores ou de material (carpete
para o assoalho, por exemplo)?

Denis Cabral
E-mail

A forração do teto é a conhecida como balãozinho (bico de jaca),


os bancos possuem o centro em veludo e as bordas em courvim
preto, mesmo material usado nas laterais internas e de portas. O
único opcional existente era de forração marrom, conhecida como
monocromática (foto), sendo que neste caso o volante e todos os
comandos internos acompanhavam essa cor.

Erramos
Observei que na matéria (Edição 122) com o Fusca 1500 ano
1973, branco com interior vinho, o texto diz: “Outra novidade
podia ser vista na tampa do motor, que ganhou novas ranhuras de
ventilação – passando de oito para um total de 26 aberturas...”. Na
verdade, o modelo apresenta 14 aberturas de ventilação em cada
lado da tampa do motor, totalizando 28 aberturas.

Marcelo Meireles Bahia


Fortaleza-CE
*Aluizio Lemos é ex-Diretor Técnico e ex-Presidente
Marcelo, você tem toda a razão. Inclusive o número
da Comissão de Avaliação para Veículo de Coleção do Fusca
anterior de ranhuras também não era oito, como citado Clube do Brasil. Cartas para essa seção: fuscacia@gmail.com
no texto, mas sim 10 aberturas de ventilação.

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Painel VW

Tradição

FOTOS: REPRODUÇÃO
na praça
Nos últimos 20 anos, dois Fusca Táxi no ponto do Largo da Usina. Diante do risco tudo em dias de chuva, quando os carros mais
ano 1995 têm sobressaído na dura tarefa de da aposentadoria dos modelos, o motorista modernos derrapam no paralelepípedo molha-
vencer as estreitas e íngremes ladeiras de Marcos Cardoso, 55 anos, taxista há 28 anos, do”, apontou Marcos, em entrevista a um jornal
paralelepípedo do bairro do Alto da Boa Vista, organizou junto do primo Luís Cláudio Cardoso local. A boa notícia é que o prefeito acatou a
na zona norte da cidade do Rio de Janeiro de Azevedo, proprietário do outro Fusca Táxi, reivindicação popular e baixou um decreto que
(RJ). Tradição que poderia ter desaparecido no um abaixo assinado com a participação de permitirá aos dois besouros continuarem na ati-
último dia 23 de dezembro, quando acabaria mais de 3 mil moradores da região. “Além de va, apenas com uma pintura diferenciada, com
a vigência da permissão especial concedida patrimônio cultural, o Fusca é o veículo ideal a tradicional faixa lateral azul dos táxis cariocas
para que os besouros continuassem atuando para encarar as ladeiras aqui do bairro, sobre- passando a quadriculada.

Besouros iluminados
Numa ação inusitada, o grupo Lords VW RJ organizou
um verdadeiro desfile natalino noturno, com os besouros
dos associados ornamentados com coloridas lâmpadas
de Led, entre outros adereços típicos da data festiva.
A ação, batizada como “Natal Luz Lords VW RJ”,
aconteceu nos dias 12 e 19 de dezembro, num trajeto
que partiu da Barra da Tijuca e incluiu a Lagoa Rodrigo
de Freitas e toda a orla da zona sul da cidade do Rio
de Janeiro (RJ), passando por bairros turísticos como
Leblon, Ipanema, Copacabana e Leme.
Centenas de pessoas saíram às ruas para admirar o
iluminado comboio e tirar fotos dos coloridos besouros.

MEMÓRIA
FICHA CORRIDA
Na edição de novembro de 1966, o jornal interno Volkswagen em
Foco apresentava este besouro 1963 e sua incrível ficha corrida
confirmada pelos registros dos serviços das concessionárias: 209
mil quilômetros rodados – apesar da aparência de novo. E tudo sem
nunca ter aberto o motor! Na verdade, o único problema presente
no “currículo” fora uma válvula queimada, trocada aos 185 mil
km. O carro pertencia ao Laboratório Clímax, de Sorocaba (SP), e
atuava em longas viagens por todo o interior promovendo produtos
farmacêuticos. No fim da matéria, um desafio: “quem é capaz de
apresentar um VW que tenha rodado mais e sem abrir o motor?”

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Vitrine
Engate rápido
Um dos acessórios mais populares no
universo da customização, a alavanca
Empi Trigger Shifter garante engates
rápidos e possui trava para liberar
a marcha-à-ré. Acompanha chapa
Partida guia. R$ 380, na Mamede Haus
no botão (facebook.com/mamedehaus)
De fácil instalação, o botão
de partida garante charme
e ainda pode ser usado
como dispositivo antifurto. Fôlego extra
R$ 180, na Mamede Kit de pistão AFP nas medidas 87 mm / 90.5
Haus (facebook.com/ mm / 94 mm e 94.5 mm, produzido em liga
mamedehaus) de alumínio especial 2618 aeroespacial de
alta qualidade. Contém alto grau de cobre e
níquel, o que o torna de maior elasticidade
e resistência a fadiga. Acompanha camisa,
pistões AFP, anel, trava e pino. R$ 1.577,60,
na Sportsystem (15) 3363-5151 ou
sportsystem.com.br

Pegada alemã
Volante original do Fusca alemão,
com o brasão de Wolfsburg na área
da buzina. R$ 1 mil, na CarVW
(11) 95037-6090

Reflexo Calota tricolor


de época Curiosa calota para a linha
Réplica do retrovisor interno do
do besouro dos anos 1960
Fusca, disponível para vários
com o logotipo do São Paulo
anos. R$ 130, na Matos Autos
Futebol Clube. R$ 450 o jogo,
Antigos (11) 3334-0667 ou
na Atlas (11) 3331-7771 ou
matosautosantigos.com.br
atlasacessorios.com.br

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Relíquia

MISSÃO
cumprida
Após a morte do antigo proprietário, sobrinho assume o
legado atrás do volante e os planos de recuperar o brilho
deste conservado Sedan Standard 1978
TEXTO: LUIZ GUEDES JR. • FOTOS: SAULO MAZZONI

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R
azões não faltam rar nas mãos do meu tio”, ex- dois de que um dia iriam
para explicar o plica o paulistano de 38 anos, juntos restaurar o Sedan,
sentimento que o acrescentando um detalhe que deixando-o como novo. “Só
contador André faz toda a diferença na história. que ele acabou falecendo em
Tadeu Turbiani “Acontece que esse meu tio meados de 2013, antes que
nutre por este Fusca 1300 ano resolveu colocar o besouro em pudéssemos realizar o traba-
1978. “O modelo está desde meu nome. E olha que na épo- lho”, lamenta o contador.
zero-quilômetro na minha ca eu ainda nem tinha idade O zelo do antigo proprietá-
família. Foi comprado por um para dirigir”, emenda. rio com o besouro ficou claro
tio da minha mãe, passou para André relembra com para André já no dia em que
a filha dele como presente de nostalgia os passeios com o ele resolveu tomar posse de
casamento e acabou indo pa- tio e os planos traçados pelos sua herança. “Meu tio havia

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Relíquia

A linha 1978 instalado uns seis alarmes e “Achei que seria uma justa e com o visual um pouco des-
marcou o ninguém conseguia ligar o car- merecida homenagem ao meu gastado pela ação do tempo.
surgimento da
trava de “pino” ro”, diverte-se o contador, que tio”, argumenta. “Isso acabou facilitando
nas portas. E foi só recentemente, no início de Como sempre pertenceu bastante os serviços realiza-
o último ano do 2015, decidiu seguir em frente à família, o Fusquinha 1978 dos pela oficina especializada
retrovisor externo com o antigo plano e restau- conservava muito de sua Garage Web. Ao todo, foram
de metal cromado
rar o exemplar por completo. originalidade, estando apenas exatos nove meses de traba-

INSTALADAS A PEDIDO DO PROPRIETÁRIO, AS


AVANTAJADAS CALOTAS CROMADAS SÃO O ÚNICO
DETALHE QUE FOGE À ORIGINALIDADE

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lho, o mesmo que uma ges- interior, bancos e revestimen- componentes desgastados O trabalho de
tação completa”, compara o tos de portas, assoalho e teto por novos. “Até o velocímetro restauração levou
nove meses para
novo guardião do besouro. foram refeitos com tecidos no foi restaurado e zerado, o que ser concluído e
O carro foi totalmente padrão de época. Por fim, toda traduz bem o resultado final da envolveu apenas
desmontado e a carroceria a mecânica 1300 foi revisada, restauração. O modelo de fato componentes no
ganhou uma nova pintura na aproveitando o que era pos- ficou como zero-quilômetro”, padrão de época
tonalidade bege Jangada. No sível aproveitar e substituindo comemora André, que ainda

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Relíquia

ATÉ MESMO O VELOCÍMETRO FOI


RESTAURADO E ZERADO, REFLETINDO A
ATUAL APARÊNCIA DO MODELO

O Sedan 1300 mantém o manual original que meu avô de 88 anos viu o que foge da originalidade
ganhou uma de fábrica, bem como fez carro pronto e se emocionou são as avantajadas calotas
nova grafia de
velocímetro
questão de preservar no ao lembrar do filho”, conta o cromadas nas rodas, colo-
em 1978. Já os painel os ímãs de santinhos atual proprietário. cadas a pedido de André.
“santinhos” na colocados pelo tio sobre a “Acho as calotas pequenas
tampa do rádio
são um capricho
tampa que cobre o buraco DETALHES DE ÉPOCA de plástico preto, chama-
do antigo dono
do rádio. “O mais bacana é O único detalhe estético das de copinho, muito sem

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charme”, justifica. De resto, daquele ano foi a introdu- adotou um novo grafismo O novo padrão
o exemplar familiar é um ção de um novo tanque de para o velocímetro, inspi- da tapeçaria
dos bancos e
perfeito testemunho dos combustível com o bocal rado na versão mais cara a maçaneta
pormenores que marcaram de abastecimento pas- e potente, de 1.600 cm³. embutida na
a versão mais básica do sando para o exterior do E não para por aí: o ano lateral de porta
besouro na linha 1978. veículo. Além disso, foi em marcou também a estreia também eram
novidades da
A principal novidade 1978 que o Sedan 1300 de um novo padrão para os linha 1978

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Relíquia

Presente desde bancos, que passaram a direção, contando ainda as maçanetas embutidas
zero-quilômetro exibir faixa central listrada com indicador luminoso no na forração lateral. Como
na mesma família,
o exemplar ainda com courvim preto nas la- velocímetro. curiosidades, vale citar
preserva o manual terais, enquanto o interrup- Ainda no interior, a linha que as sapatas dos pedais
do proprietário tor do pisca-alerta migrou 1978 passou a contar com de freio e de embreagem
original de fábrica do painel para uma peque- travas em formato de pino ficaram mais largas e que
na alavanca na coluna de nas portas, que tiveram a fábrica oferecia a opção

A MECÂNICA FOI TOTALMENTE REVISADA,


PRESERVANDO TUDO O QUE ERA POSSÍVEL APROVEITAR

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de revestimento de carpete importantes. Foi, por exem- portas, tampa do motor e O bocal de
para o assoalho (o padrão plo, o último ano do mode- ignição, marcou sua derra- abastecimento
do tanque do
era de borracha). lo com retrovisor externo deira aparição totalmente lado externo da
E se contou com muitas cromado (passaria a plástico em metal. A partir de 1979, carroceria foi a
novidades, a linha 1978 da preto no ano seguinte). Além o Fusca passava a deixar principal novidade
versão 1300 também mar- disso, a chave, que pela a fábrica com chave com do Fusca nacional
na linha 1978
cou algumas despedidas primeira vez era única para cabeça de plástico.

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Personalizado

PROJETO
cosmopolita
TEXTO E FOTOS: LUIZ GUEDES JR.

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O
volante veio da aqui mesmo, no Brasil, onde o
Noruega. O painel projeto deste raro Split Window

O garimpo para reunir todas as teve os instrumen-


tos achados na Ho-
Brezel 1952 começou a virar
realidade há exatos 10 anos.
peças deste raro Split Brezel landa, os botões na
França e a caixa de som nego-
“Achei o modelo anunciado
na internet em 2005. Estava
1952 levou exata uma década ciada em Portugal. O nariz de no interior do Rio Grande do
placa foi localizado na Bélgica, Sul e resumia-se a uma parte
e incluiu buscas e negociações em o capô traseiro encontrado na da carroceria, chassi e docu-

mais de 10 países diferentes Suécia, as lanternas fabricadas


na Espanha e os faróis rastrea-
mentação. Faltava o motor, a
elétrica e todo o acabamento.
dos na Grécia. E, obviamente, Ainda assim fechei negócio,
muita coisa foi descoberta realizei o depósito e o antigo

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Personalizado

28 Fusca & Cia


A CARROCERIA ESTAVA PODRE DA CINTURA PARA BAIXO, O QUE
ESTENDEU OS TRABALHOS DE FUNILARIA POR DOIS ANOS

carroceria estava praticamente podre


da linha da cintura para baixo, o que
estendeu os trabalhos de funilaria por
longos dois anos. Período no qual
O recorte nos vidros Amauri aproveitou para dar início à ver-
proprietário en- das portas é original
viou a carcaça de de fábrica e servia dadeira caçada que seria reunir todos
plataforma para para ventilar a os componentes e acessórios de época
cabine numa época que iriam compor o ousado projeto.
a minha casa,
em que o Fusca Foi nessa época, também, que o
onde vi pesso- ainda não contava
almente pela com quebra-ventos gestor ambiental percebeu que os va-
primeira vez o lores cobrados por alguns negociantes
tamanho da encrenca em que havia me no Brasil tornariam a brincadeira muito
metido”, descreve o gestor ambiental mais cara que o inicialmente previsto,
Amauri Garbin, 50 anos, morador de o que o levou a um verdadeiro “garim-
São Bernardo do Campo, município da po” ao redor do mundo. “Além de uma
Grande São Paulo. questão de custo, também havia o
Já na oficina, constatou-se que a

As lanternas de
dupla função são
criação do espanhol
Samuel Andújar
González, da
marca Sam Steel

Fusca & Cia 29


Personalizado

AS “ORELHAS DE PADRE” SÃO NACIONAIS E FORAM ELEITAS NO


LUGAR DAS “BANANINHAS” POR SEREM ACESSÓRIOS QUASE ESQUECIDOS

O nariz de placa Hella convertido em brake-light e as entradas de ar originais do Split Brezel 1952 são curiosidades que chamam atenção nos eventos

30 Fusca & Cia


O brasão de Berlin
foi adquirido
na Alemanha e
recebeu como
moldura uma rara
peça fabricada no
mercado nacional
dos anos 1960

as ruas e os eventos dedicados ao


universo Volkswagen no segundo
semestre de 2015. E não há quem
desejo de customizar o modelo com não pare para admirar a beleza e a
acessórios raros que dificilmente qualidade da inusitada customiza-
eu encontraria por aqui”, detalha o ele recorreu ao bom e velho escambo! ção que devolveu o outrora surrado
proprietário, que acabou fazendo “O pessoal da Europa é doido por besouro 1952 à vida.
contatos e amizades em diferentes vidros laterais traseiros basculantes, o O primeiro detalhe a causar
países. “O legal é que hoje olho para que é raro e chega a custar 400 euros impacto e confusão nas pessoas são
o carro e cada peça me faz lembrar por lá”, comenta. “Então eu percorria as charmosas rodas raiadas, que
a pessoa que me vendeu”, afirma. os ferros-velhos daqui e comprava os muita gente chega a comparar com
Outro fato curioso no proces- componentes por R$ 50, para depois as do antigo Fordinho. “Na verdade
so empreendido por Amauri foi a trocar por peças do meu interesse”, são modelos da nacional Fumagalli,
maneira nada convencional que ele diz. “Perdi as contas de quantos vidros feitos na década de 1960 para a linha
encontrou para economizar em suas mandei para fora nessa brincadeira.” Volkswagen de cinco parafusos”,
negociações. Assim como europeus detalha Amauri, que pintou os com-
e nossos índios fizeram no século 16, ponentes de preto e alargou a tala,
DETALHES RAROS
O resultado de tamanho empe-
nho e criatividade finalmente ganhou
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Personalizado

A ANTIGA MALETA COMPRADA EM ANTIQUÁRIO FOI TRANSFORMADA


EM CAIXA DE SOM PELO PROPRIETÁRIO DO BESOURO
32 Fusca & Cia
A tapeçaria é
nacional e lembra o
padrão original de
época. Já o volante
Petri Super Banjo
passando para 4,5 polegadas na frente é o grande atrativo
e 5,5 polegadas, atrás (eram de 4 do interior do raro
polegadas originalmente). “Já os pneus sores Albert e Sedan customizado
são de medida 155/60R15 na dianteira do incomum
e 205/60R15 na traseira”, aponta. brasão com o urso de Berlim, ambos
A esportividade do conjunto é comprados na Alemanha. “O brasão
ditada pela suspensão rebaixada por eu adquiri do Alex Woa, sendo que a
meio de catraca e facão regulável, peça que o emoldura é um raríssimo
enquanto os para-choques pintados acessório nacional de época”, des-
na cor da carroceria reforçam o visual creve o proprietário.
sóbrio do besouro. De resto, chamam Como ainda não contava com
atenção os faróis Hella achados na quebra-ventos, o Sedan 1952 Brezel
Grécia, além dos legítimos retrovi- leva um pequeno recorte superior nos
vidros das portas. “O carro tinha um
único vidro desses original, porém
estava todo riscado pelo uso e ação do
tempo. Então o levei a uma empresa
especializada que o usou como molde
para a fabricação de duas novas pe-
ças”, conta o gestor ambiental. Outro
detalhe curioso, presente apenas nos

A caixa de som
no painel e
a avantajada
alavanca de
câmbio de Kombi
também são
destaques na
cabine do besouro

Fusca & Cia 33


Personalizado

COM TALA ALARGADA E PINTURA NA COR DA CARROCERIA, AS RODAS


RAIADAS SÃO O GRANDE DIFERENCIAL NO VISUAL EXTERNO

34 Fusca & Cia


modelos fabricados entre janeiro de
1951 e julho de 1952, são as entradas
de ar presentes nas laterais, popular-
mente conhecidas como “gela-saco”. convencional é seguida na traseira
Outra tentativa da fábrica de melhorar do Split Window. A começar pelas
a circulação de ar na cabine antes do lanternas, feitas pelo espanhol Samuel
advento do quebra-vento... Andújar seguindo o padrão da época,
Ainda visto lateralmente, o exem- porém com lente de dupla função (lan-
plar de Amauri chama atenção pela terna e pisca). “O nariz de placa é origi-
ausência das “bananinhas” de sinaliza- nal Hella com o logotipo VW, mas teve
ção em favor das não menos curiosas a carcaça cromada e a lente trocada
“orelhas de padre”. “Decidi adotá-las por uma vermelha, convertendo-se
por serem acessórios nacio- numa espécie de brake-light”,
nais raros que estão caindo O projeto mescla aponta o proprietário, que
com equilíbrio
no esquecimento, visto que e bom gosto também criou uma segunda
hoje é muito fácil adquirir um detalhes originais luz de advertência montada
par de bananinhas original ou e acessórios raros no para-choque com a estru-
reprodução”, defende. de época, dando tura de um farol de milha e a
vida a um dos mais
E a receita de fugir do belos besouros da lente com a inscrição “Pare”
atualidade retirada de um ônibus antigo.
“Assim espero que nin-
guém jamais bata na minha traseira”,
argumenta. Por fim, a tampa do motor
com aberturas de ventilação, original
da versão Cabriolet, foi encontrada e
adquirida na Wolfparts, da Suécia.
Como é praticamente impossível
achar atualmente um motor 1100
de 25 cv do carro original, a solução
foi adotar um 1200 comprado aqui
mesmo no Brasil. “O propulsor foi
reformado com lataria nova da Empi,
ganhou um filtro de ar Cyclone ale-

Fusca & Cia 35


Personalizado

ASSIM COMO O NARIZ DE PLACA “BRAKE-LIGHT”, A ARTESANAL


LANTERNA “PARE” TEM COMO MISSÃO EVITAR COLISÕES TRASEIRAS

36 Fusca & Cia


O motor 1200
adotado na
portas e teto. “Comprei customização
tudo aqui no Brasil. ganhou um filtro de
mão e passou a atuar com o câmbio ar Cyclone alemão
Busquei tecidos que
de 1300, já com a primeira marcha e a companhia
lembrassem ao máximo O toque de modernidade fica
sincronizada”, detalha Amauri, que de um moderno
os originais de fábrica, câmbio de 1300 por conta da avantajada alavan-
também modernizou o sistema elétri-
ainda que não sigam o ca de câmbio cromada original
co de 6 para 12 volts. De acordo com
padrão de época”, narra de Kombi, além do aparelho de
ele, o fato deste câmbio ter a quarta
o proprietário. CD-Player instalado no porta-luvas à
marcha 9% mais curta que a original
O painel teve os instrumentos frente do motorista. Mas o ar vintage
do modelo não prejudicou o desem-
originais importados da holandesa volta a ditar o ambiente na inusitada
penho do besouro. Viajo numa boa a
Paruzzi, “enquanto a rara caixa de caixa de som repousada no chiquei-
uma velocidade de 110 km/h”, atesta
som foi negociada com um portu- rinho. Criação do próprio Amauri,
o gestor ambiental.
guês que a comprou na feira de Bad trata-se de uma antiga maleta de
Camberg, na Alemanha”, lista Amauri. viagem comprada em um antiquário.
INTERIOR CLÁSSICO Mas o verdadeiro destaque do interior “A levei a uma casa de som onde
Embora igualmente customiza- é mesmo o volante Petri Super Banjo, instalaram dois alto-falantes e dois
do, o interior da cabine preserva o comprado na Noruega e restaurado no tweeters”, finaliza o proprietário, que
aspecto clássico que marcou os be- Brasil, onde ganhou o botão de buzina agora pode enfim curtir suas músicas
souros na primeira metade dos anos conhecido como Golden Lady. em tantos idiomas quanto foi neces-
cinquenta. A começar pela tapeçaria sário usar para finalizar o projeto do
de bancos, assoalho, laterais de charmoso besouro.

Antes de inciar o
projeto, o besouro
resumia-se a parte
da carroceria
original, sem
mecânica, elétrica
ou componentes de
acabamento...

Fusca & Cia 37


Especial

CARGA
nacional
Popularmente batizada de “Cabrita”, a versão Pick-up
demorou para surgir na linha nacional da Kombi. E seu
“nascimento” guarda segredos ainda hoje não desvendados
TEXTO E FOTOS: LUIZ GUEDES JR.

D
esde a implantação singular. Isso porque a versão existiu década para que os brasileiros vol-
de sua fábrica local, a normalmente durante todo o período tassem a contar com a configuração
Volkswagen do Brasil de importação e montagem dos ve- “Cabrita”, como a Kombi Pick-up
sempre teve como ículos em kits CKD, desaparecendo acabou apelidada popularmente.
política adotar as ino- subitamente a partir de setembro de Afinal, foi apenas no Salão do Auto-
vações da matriz alemã com alguma 1957, quando a marca deu início à móvel de São Paulo, realizado em
demora. Mas a derivação Pick-up produção nacional do utilitário. novembro de 1966, que a Volkswa-
da Kombi é um caso ainda mais E levaria praticamente uma gen do Brasil (re)apresentou a

38 Fusca & Cia


“novidade” ao público. Na ocasião, nacional, visto que na congênere plicável espera de oito meses que
o modelo em exposição já exibia a alemã a caçamba seguia alinhada separou o lançamento da Pick-up
avantajada plataforma de carga com ao tamanho do carro). Contudo, o no Salão do Automóvel à sua estreia
1.885 mm de largura, 2,75 mm de visual e os materiais usados nesta nas concessionárias, o que só veio a
comprimento e 400 mm de altura, primeira plataforma de carga dife- acontecer em julho de 1967.
cujas dimensões excediam as da riam bastante do produto final que Ao que tudo indica, a fábrica
própria carroceria (característica acabaria chegando ao mercado, o demorou mais do que o previsto
exclusiva que marcaria a versão que talvez justifique a longa e inex- para definir o padrão construtivo

Fusca & Cia 39


Especial
da caçamba do utilitário nacional. relevo. Esse modelo contou ainda a plataforma fornecida pela Karman-
As unidades inaugurais, incluindo com algumas evoluções, inclusive n-Ghia preservava as dimensões
aí o protótipo exposto no Salão e a pintura na cor da carroceria, para excedendo o tamanho da carroceria.
o exemplar utilizado nas primeiras somente depois surgir aquela que Além disso, a peça ganhava agora
campanhas publicitárias, exibiam seria a caçamba definitiva, produ- um visual mais agradável, imitando
uma plataforma de carga feita de zida pela Karmann-Ghia do Brasil. os estampos de retângulos em
placas de madeira fixadas a uma Feita totalmente de aço (apenas baixo relevo já usados pela matriz
estrutura metálica. Em seguida, com ripas de madeira no piso e nas alemã (a diferença é que a Pick-
substituiu-se a madeira por chapas laterais internas, visando proteger a -up fabricada no Velho Continente
de aço lisas, sem nenhum vinco ou estrutura do contato com as cargas), ostentava quatro retângulos nas

O LANÇAMENTO COMERCIAL ACONTECEU APENAS EM JULHO DE 1967

Devido à demora
no lançamento, a
Pick-up estreou nas
concessionárias
com as novidades
estéticas da linha
Kombi de 1967

40 Fusca & Cia


O motor 1500 era
novidade na ocasião.
Já o compartimento
fechado de carga
imitava as antigas
unidades importadas

Fusca & Cia 41


Especial

A plaqueta de
identificação
traz o código
Tipo 261
como detalhe
exclusivo da
versão Pick-up

A ÁREA DA CAÇAMBA ERA 1M² MAIOR QUE NAS DEMAIS PICAPES DO MERCADO

laterais e três na traseira, enquanto adquirir o modelo sem caçamba, o apreciavam algo que a diferenciava
a versão nacional levava apenas que fez surgir diversos fornecedores totalmente das Kombis: o motor
três desenhos nas laterais e dois na independentes com diferentes pro- quase inaudível por estar separado
traseira, onde a área central exibia postas no mercado paralelo (de cai- e distante da cabine. Nem parecia
ainda um grande logotipo VW igual- xotes de madeira a compartimentos veículo da família VW a ar.
mente estampado). Por fim, cada frigoríficos). Além disso, foi sobre a
caçamba levava uma plaqueta na Kombi Pick-up que a Karmann-Ghia LINHA EVOLUTIVA
área próxima à porta do motorista, lançaria mais tarde seus famosos Como acabou chegando ao mer-
com a inscrição “Fabricação Kar- motor-homes, conceito também cado apenas no segundo semestre
mann Ghia” e um número de série. seguido por outras empresas. de 1967, a Kombi “Cabrita” já estreou
Vale lembrar que era possível Todos que dirigiam a Pick-up com sistema elétrico de 12 volts

42 Fusca & Cia


O velocímetro
graduado até 120
km/h surgiu junto
do advento do
motor de 1.500
cm³, em 1967

O exemplar 1975
ganhou bancos
personalizados com
courvim vermelho
Turim, material usado
pela fábrica no Fusca

A customização
também ganhou caráter
esportivo com alavanca
de câmbio Empi e
suspensão rebaixada

Fusca & Cia 43


Especial

Assim como
o restante da
família Kombi, a
Pick-up aderiu à
chamada geração
Clipper a partir
da linha 1976

44 Fusca & Cia


As lentes de pisca
na cor branca
são o único
item que foge
à originalidade
nesta versão 1991
(o padrão eram
lentes laranjas)

A PLAQUETA DA KARMANN-GHIA ATESTA A ORIGINALIDADE DA CAÇAMBA

acompanhado do motor 1500 de 44 Tipo 261 (a Kombi Luxo 6 portas a Kombi Pick-up tinha capacidade
cv e velocímetro graduado até 120 era Tipo 201, a Luxo 4 portas Tipo para transportar até uma tonela-
km/h. Além disso, ao contrário de 204, a Standard Tipo 231, o Furgão da de peso, qualidade bastante
seus primeiros protótipos, já incorpo- Tipo 211 e a Ambulância identificada explorada pela fábrica nas publici-
rava as novidades estéticas da linha como Tipo 271). dades. Além disso, as propagandas
daquele ano, como novos para-cho- Como também contava com um também destacavam o fato de o
ques e rodas de 14 polegadas. Já a segundo compartimento fechado utilitário Volkswagen não contar com
plaqueta de identificação do chassi de bagagem (onde ficava o estepe), proeminentes para-lamas invadin-
diferenciava-se das demais versões localizado sob a caçamba e aces- do a área de carga, o que lhe dava
por definir o veículo com o código sível por meio de uma porta lateral, aproximadamente 1 m² a mais de

Fusca & Cia 45


Especial

A Kombi evoluiu
ao longo dos
anos, ganhou
motor 1600
e, com isso,
o velocímetro
passou a marcar
até 140 km/h

46 Fusca & Cia


área de caçamba comparado às ainda pneus mistos na traseira, passou a contar com a opção do
picapes da concorrência. com sulcos mais pronunciados, motor a Diesel, caracterizado por
Em 1968, o modelo passou a mas saiu de catálogo após dois um amplo radiador frontal. Na
contar com a opção do diferen- anos em função da baixa procura. mesma ocasião, surgiu a picape
cial travante, sistema comandado Nos anos seguintes, a Pick-up cabine dupla, que ao contrário da
por uma alavanca (semelhante à acompanhou todas as evoluções “Cabrita” nacional seguia o padrão
do freio de mão do Fusca) abai- técnicas e estéticas da linha Kom- alemão, com caçamba limitada às
xo do assento do motorista, que bi, seguindo sempre o padrão de dimensões da carroceria.
interrompia a ação do diferencial, acabamento da versão Standard
melhorando a tração em pisos (inclusive com limitada opção de DUAS GERAÇÕES
escorregadios. A novidade incluía tonalidades). Em 1981, o modelo Conhecida como “Corujinha” e

A PICK-UP SEGUIA O PADRÃO DE ACABAMENTO DA KOMBI STANDARD

Extremamente
conservado, o
modelo 1991
preserva até
mesmo os cintos
de segurança com
data de fabricação

Outra curiosidade
é o antigo selo
de patrimônio
governamental

Fusca & Cia 47


Especial

marcada pelo para-brisa biparti- personalização de pegada espor- Lançada a partir de 1976, a
do, a primeira geração da Kombi tiva. “Retirei e guardei os bancos geração denominada Clipper é
nacional foi produzida até o final originais, substituindo-os por um marcada pelo amplo para-brisa
de 1975, justamente o ano da modelo revestido com courvim inteiriço e pela estreia do mo-
Pick-up branco Lotus que ilustra vermelho Turim usado no Sedan. tor 1600, caso do outro modelo
esta reportagem. Propriedade do Fora isso, apenas instalei uma ala- abordado nas fotos, um perfeito
empresário Marcello Filoni, 48 vanca de câmbio Empi e rebaixei exemplar 1991 pertencente ao
anos, o exemplar preserva toda a levemente a suspensão, todas administrador Hélio Kalil, 40 anos –
estrutura original de época, em- mudanças facilmente reversíveis”, que a exemplo do amigo Marcello
bora exiba atualmente uma leve destaca o proprietário. também integra o Kombi Clube do

A DEMORA PARA DEFINIR O PADRÃO DA CAÇAMBA TALVEZ EXPLIQUE


Os primeiros
protótipos
apresentados ao
público e usados
em campanhas
publicitárias
ainda possuíam
caçamba com
placas de
madeira. Pouco
depois o material
foi substituído
por chapas lisas
de metal

48 Fusca & Cia


Ambas gerações
se diferem
também nas
caçambas, sendo
que a mais
moderna exibe
vincos exclusivos

Brasil. “Esse carro pertencia a um ainda colado na carroceria. acima dos retângulos estampados
órgão do governo em Brasília e Além das óbvias diferenças nas laterais da plataforma de carga.
foi a leilão há alguns anos. Ao que de cada geração e da evolução Em 1998, a linha Kombi ganhou
parece, era usado apenas no trans- ano-a-ano, é curioso observar uma de suas maiores evoluções
porte de material de escritório e ou- que ambos os modelos das fotos técnicas: o motor 1600 arrefecido a
tras cargas leves, o que explica seu também se diferem num detalhe ar passou a contar com sistema de
incrível estado de conservação”, referente à caçamba fornecida pela injeção eletrônica de combustível
afirma o dono, apontando para Karmann-Ghia. Ao contrário da ver- multiponto (MPFI). Dois anos mais
detalhes raros e inusitados, como o são “Corujinha”, o exemplar mais tarde, em 2000, a versão Pick-up
selo de patrimônio governamental moderno exibe uma faixa vincada teve sua produção encerrada.

OS OITO MESES QUE SEPARARAM A APRESENTAÇÃO DA CHEGADA AO MERCADO


A caçamba de
metal evoluiu
para a versão
com vincos e
estampos criada
pela Karmann-
Ghia do Brasil. A
Pick-up também
era vendida sem
caçamba e, na
década de 1980,
ganharia a opção
do motor Diesel

Fusca & Cia 49


Fusca Paixão

austral
AVENTURA

Quatro Fuscas, uma Kombi, 13 amigos e um carro de apoio


encaram 9,6 mil quilômetros de estradas e desbravam três
países vizinhos da América do Sul em 22 dias de muitas
aventuras e... alguns perrengues
TEXTO: LUIZ GUEDES JR. • FOTOS: DIVULGAÇÃO

50 Fusca & Cia


I
r à Patagônia de Fusca! A tiva de angariar possíveis voluntá-
proposta partiu do corretor rios ou, como ele prefere chamar,
de seguros Cláudio Costa soldados para a sua aventura.
e foi inicialmente recebida Um ano mais tarde, pontualmente
com desdém por amigos e às 4h43 da manhã do dia 18 de
familiares. A motivação e argumen- dezembro de 2010, quatro Fuscas
tação de que era possível estava e uma Kombi deixavam a cidade
em uma reportagem de revista, de Caxias do Sul, no Rio Grande
cuja narrativa contava a história de do Sul, rumo à BR-116.
três jovens que partiram do Rio de A bordo dos modelos, cada um
Janeiro e chegaram a Santiago, no dos proprietários que havia topado
Chile, a bordo de um Fusca 1968. o desafio seguia na companhia de
“Se eles puderam, por que nós um amigo escalado como copiloto.
não?”, indagava Cláudio, na tenta- “Assim estaríamos todos entre ami-

“TIVEMOS TODO TIPO DE PROBLEMA,


MENOS AQUELES PARA OS QUAIS
ESTÁVAMSO PREPARADOS”

Fusca & Cia 51


Fusca Paixão

“TODA VEZ QUE PARÁVAMOS ERA PRECISO


EMPURRAR A KOMBI, PROTAGONIZANDO
CENAS DE PEQUENA MISS SUNSHINE”

gos dos amigos”, afirma Cláudio. dro Ravizoni e Mateus Zanotto. A


Dessa forma, o Sedan verde 1959 Kombi, por ser maior, levaria três
de Fabiano Gasperin levava Rodri- ocupantes: Daniel Marchet, Juarez
go Savaris. A dupla Cláudio Costa Marchet e Vandré Pereira. Na
e Eduardo Costa seguia no Fusca porta de cada um dos veículos, o
branco 1963. O besouro verde logotipo com o batismo da aven-
1300, ano 1970, compunha o dueto tura: Fuscaustral, em referência à
Maximiliano Dantas e Ricardo famosa Carretera Austral, que corta
Pinto, enquanto o Fuscão laranja boa parte da região Sul do Chile. “O
1974 seguiria ao comando de Lean- projeto ganhou corpo e chamou a
52 Fusca & Cia
atenção da mídia em Caxias do Sul, bastante completo. “Tinha tudo
atraindo inclusive patrocinadores”, o que se pode imaginar: dezenas
aponta o idealizador. de platinados, lâmpadas reservas,
Além disso, somava-se ao cabos, distribuidores, carburadores,
extravagante comboio a “moder- etc. Mas, claro, a Lei de Murphy
na” picape Ford F-1000 1982 dos fez com que praticamente não
amigos Daniel Dallago e Estevan usássemos nada do que levamos.
Bordin, cuja missão seria atuar E não porque não tivemos im-
como carro de apoio. “Afinal, se as previstos todos os dias, mas sim
chances de um Fusca quebrar já porque não quebrou quase nada
é grande, imagine a possibilidade do que pensávamos que quebraria.
quando se reúne cinco modelos. É Em compensação, tivemos todo
praticamente certeza de problema tipo de problema inusitado, como
todos os dias”, argumenta Cláudio. a quebra de uma maçaneta de
E de fato a estatística não decep- porta, rompimento de um varão de
cionou o grupo neste quesito... câmbio e até a falência definitiva do
virabrequim do meu Fusca, que não
PÉ NA ESTRADA teve conserto e acabou voltando
Ao longo de um ano de pre- rebocado pelo carro de apoio uma
parativos, todos tiveram a oportu- boa parte do trajeto de retorno para
nidade de revisar os veículos de casa”, narra o corretor de seguros.
modo a minimizar qualquer defeito. Para todos os outros infortú-
Além disso, o grupo montou um kit nios, entretanto, o grupo sempre
mecânico de “primeiros socorros” acabou dando uma solução. “Já

“À NOITE, OS FARÓIS DE 6 VOLTS


ERAM COMO VELAS QUE POUCO
AJUDAVAM NA VISIBILIDADE”

Fusca & Cia 53


Fusca Paixão

“NENHUM DOS NOSSOS CARROS


RECEBEU EQUIPAMENTO ESPECIAL.
E ALGUNS TÊM PLACA PRETA”

54 Fusca & Cia


no terceiro dia de viagem, por do um dos faróis do Sedan 1959”,
exemplo, o motor de partida da conta Cláudio, vítima de alguns dos
Kombi entregou os pontos. Dali mais complicados reveses com seu
em diante, passou a ser necessá- besouro 1963. “A alavanca do câm-
rio empurrá-la toda vez que pará- bio simplesmente rompeu na junção
vamos, protagonizando autênticas com a base. Vimos que a única
cenas do filme Pequena Miss maneira de trocar as marchas seria
Sunshine”, descreve Cláudio. diretamente pelo varão, enfiado no
Em outra ocasião, o para-brisa túnel e com um pequeno espaço de
de um dos besouros recebeu uma acesso. Acabamos encontrando na
pedrada e trincou em território Kombi o cabo de um macaco tipo
argentino. “Tivemos de mandar jacaré, que milagrosamente encai-
fabricar outro vidro e perdemos dois xou como uma luva, atuando como
dias de viagem. Isso porque a antiga uma perfeita alavanca”, afirma o
linha Volkswagen é extremamente proprietário. “O único detalhe é que,
rara na Argentina, o que torna o mer- sem a alavanca montada na posição
cado de peças bastante escasso”, original, o movimento do varão e as
explica o idealizador do projeto. marchas passaram a funcionar na
Pneus furados pelas traiçoeiras direção inversa, o que exigiu certo
estradas de pedra tornou-se coisa cuidado para não engatar a marcha-
corriqueira e já nem era encarado -à-ré por engano”, detalha.
como problema pelo grupo, que Algo que chamou a atenção
também tirou de letra a troca do de todo o grupo ao longo do
cilindro mestre do freio do Fuscão trajeto foi o carinho e a recepti-
1974 em pleno acostamento. “A tre- vidade das pessoas em relação
pidação da estrada às vezes era ta- aos Fuscas. “Todo mundo sempre
manha que também acabou trincan- se aproximava com uma história

Fusca & Cia 55


Fusca Paixão

sobre o modelo para contar. Até inesquecíveis, como a prática de


mesmo a polícia, que temíamos rafting em Futaleufú, na região dos
ser truculenta, foi extremamente lagos chilena”, relembra Cláudio.
simpática conosco”, garantem os No total, os antigos Volkswa-
viajantes caxienses. gen percorreram exatos 9.614
Regada a muito chimarrão, a quilômetros em 22 dias de via-
aventura do grupo gaúcho tam- gem, passando por mais de duas
bém foi recheada de belas me- dezenas de cidades no Uruguai,
mórias e paisagens fantásticas, na Argentina e no Chile. Diário de
imortalizadas em mais de duas mil bordo que acabou inclusive viran-
fotografias. “Visitamos lugares in- do livro: “Fuscaustral”, escrito
críveis como Bahia Blanca, Puerto por Fabiano Gasperin, proprietá-
Madryn, Torres del Paine, Glacial rio do Sedan 1959, o mais antigo
Perito Moreno, Península Valdez exemplar da frota.
e o nosso destino final, Puerto Para quem pensa repetir a
Natales. Sem falar na desafiadora aventura, o grupo tem como
Carretera Austral e em momentos conselho maior atenção à pre-

“SE A CHANCE DE UM FUSCA QUEBRAR É SEMPRE


GRANDE, IMAGINA JUNTAR CINCO MODELOS VW”

56 Fusca & Cia


paração dos carros e um estudo alguns trechos, chegamos a levar
profundo de cada trajeto. “Não mais de 10 horas para percor-
investimos em nenhum equipa- rer 400 quilômetros. E mesmo
mento extra nos carros, sendo levando galões extras acabamos
que dois dos modelos têm placa ficando sem combustível no meio
preta. Os faróis originais de seis da noite”, descreve.
volts, por exemplo, eram como “Por fim”, ressalta, “nunca
A aventura do grupo
velas que pouco ajudavam a visi- desdenhe o potencial de nenhum de Caxias do Sul
bilidade”, aponta Cláudio. vilarejo, por menor que seja. A acabou virando o livro
Sobre a estrada, o corretor alavanca de câmbio quebrada Fuscaustral, escrito
aponta a necessidade de levan- do meu Fusca, por exemplo, foi por Fabiano Gasparin
tar a distância entre um posto e soldada por um mecânico por-
outro, de modo a planejar muito tuguês que encontramos em um
bem os abastecimentos. “Por povoado com não mais que 30
conta das condições precárias de habitantes”, encerra.
Fusca & Cia 57
Técnica
SOBE E DESCE
Ao longo dos anos, a suspensão dianteira do Fusca nacional
contou com duas configurações distintas. Entenda as diferenças
teóricas e práticas entre cada uma delas
TEXTO: LUIZ GUEDES JR. • FOTOS: SAULO MAZZONI

A
o lançar o Fuscão adotou a suspensão por pivô 1
1500 em julho de na mesma ocasião. Na ver-
1970, a Volkswa- dade, a fábrica – por motivos
gen do Brasil inexplicáveis – manteve o
pela primeira vez 1300 básico com suspensão
adotou no besouro nacional dianteira por embuchamento
o sistema de suspensão dian- até o final de 1982. E isso
teira popularmente conhe- porque 1983 foi um ano
cida por pivô (articuladores atípico, no qual a Volkswagen
esféricos) que já equipava interrompeu temporariamente
os integrantes da chamada a produção do Fusca 1600
Família Tipo 3 (VW 1600 “Zé em favor de um único modelo
do Caixão”, Variant e TL). Dali equipado com mecânica 1300
em diante, a linha do Sedan e carroceria híbrida (mesclava
ficaria dividida não apenas elementos das duas versões),
pela potência do motor e o que possibilitou ao besouro
sofisticação no acabamento, menos potente sair de fábrica
mas também pelo desenho com a suspensão dianteira
da suspensão dianteira, uma por pivô. De 1984 em diante,
vez que a básica versão 1300 o besouro nacional passou a
preservou o antigo sistema contar exclusivamente com
de pinos, popularmente a chamada “nova” mecânica
chamado de suspensão por 1600 e, obviamente, saiu ape-
embuchamento (valendo nas com a configuração mais
destacar que a versão 1300-L moderna da suspensão...
tinha carroceria baseada na
linha mais potente e, portan- DETALHES TÉCNICOS
to, levava suspensão diantei- Na teoria, ambas as
ra por pivô). configurações têm o mesmo
Em 1975, o Fusca 1300 princípio de funcionamento –
básico passou a usar as braços arrastados superpostos
mesmas rodas de quatro atrelados a feixes de lâminas
parafusos que já equipavam de torção – e oferecem o
os modelos 1500 e 1600. mesmo nível de dirigibilidade
Contudo, ao contrário do que e segurança, tendo a fábri-
muitos entusiastas acredi- ca modernizado o sistema
tam, o modelo standard não puramente por uma questão

58 Fusca & Cia


2 3

de simplicidade na constru- e, pior, levar a rápido desgaste


ção e manutenção. Bem mais dos pinos e suas buchas”,
complexa, a suspensão por aponta o engenheiro Walter
embuchamento (foto 1) tem Abramides, sócio da oficina
os braços ligados à manga de paulistana Garage Web. “Além
eixo por dois pinos horizontais, disso, é preciso engraxar os
sendo que a manga se articula embuchamentos a cada 2.500
por meio de um pino-mestre km”, emenda o especialista
vertical. O batente de suspen- Alexandre Caretta, proprietário
são do curso de compressão da oficina Katraka.
(foto 2, inexistente na configu- Mais moderna, a suspensão
4
ração por pivô) é um cone de por pivô tem os braços fixados
borracha encaixado num su- à manga de eixo por articula-
porte dedicado na ligação em dores esféricos (foto 6). Além
chapa de aço dos dois tubos disso, a distância entre eles (foto
do corpo do eixo, em cada ex- 7) é cerca de quatro centímetros
tremidade, e que serve como maior quando comparada ao
ponto de fixação superior do conjunto por embuchamento.
amortecedor. O fim do curso Mais simples na construção e
de compressão se dá quando na manutenção, a configuração
o braço arrastado inferior atin- por pivô tem a vantagem de ter
5
ge o cone de borracha. no braço superior, na sua fixa-
A distância entre os bra- ção com a manga de eixo, uma
ços (foto 3) é menor que no bucha sextavada excêntrica
sistema de pivô, assim como (foto 8) para ajuste do câmber,
o amortecedor também se impossível na suspensão por
difere na fixação do terminal embuchamento.
superior (foto 4). Por fim, conforme já citado
“Na prática, é uma sus- acima, o amortecedor tam-
pensão mais macia, porém bém se difere pelo sistema de
com um grau muito maior de fixação do terminal superior
dificuldade no ajuste. Cada (foto 9), não havendo, ainda,
pino horizontal (foto 5) tem um o batente externo de curso de
jogo com 10 arruelas e sua compressão, que é interno, no
colocação precisa ser precedi- próprio amortecedor (cuja fixa-
da de medições precisas com ção inferior é na extremidade
auxílio de ferramenta especial do braço arrastado, e não no
para que o perfeito paralelismo meio, como na configuração
de projeto entre os pinos e a por embuchamento, garantin-
manga de eixo seja mantido, do mais eficácia no controle
sob pena de alterar o câmber da suspensão dianteira). Por

Fusca & Cia 59


Técnica
6 7

fim, a montagem dos braços tambor ou a disco. “Por conta vel de ser realizado. Para fazer configuração leva vantagem
arrastados no corpo do eixo disso, muitos proprietários esse trabalho, é preciso reduzir de acordo com a vontade do
passou a ser por rolamentos de besouros equipados com artesanalmente os braços ori- cliente. “Se for para rebaixar
de agulhas, em vez de buchas, o antigo sistema por embu- ginais da suspensão por pivô”, de forma contida, a de pivô
reduzindo a necessidade de chamento ainda hoje buscam explica o especialista, que é melhor. Mas se o desejo é
engraxamento para 10.000 modernizar a suspensão aponta: “Vale lembrar ainda que ‘socar’ a suspensão no limite
km – os articuladores esféricos dianteira para pivô”, comen- atualmente a Empi já oferece do asfalto, a de embuchamento
dispensam essa operação. ta Alexandre Caretta. “Mas uma manga de eixo especial é melhor”, garante o especialis-
Outra grande vantagem da para isso não basta retirar um que permite adaptar o freio a ta da Katraka. “Por esse motivo
suspensão dianteira por pivô conjunto e instalar o outro no disco no Fusca com suspensão já fiz o caminho contrário de
era a possibilidade de a fábrica lugar, visto que a diferença na por embuchamento”. muita gente e alterei um Zé do
poder montar o carro com distância entre os braços torna Já quando o assunto é Caixão de pivô para embucha-
mangas de eixo para freio a o simples intercâmbio impossí- rebaixar a suspensão, cada mento”, finaliza Alexandre.

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Agradecimento: Garage Web – Tel.: (11) 3222-1424 / Katraka – Tel.: (11) 3539-2100
60 Fusca & Cia
Oficina Por Bob Sharp * fuscacia@gmail.com

Câmbio perfeito?
Olá, Bob. Estou iniciando o projeto
de restauração de um Fusca 1974
com mecânica original 1300. O
carro foi adquirido em péssimo
estado de conservação e ainda
estou estudando se irei manter o
motor nos padrões de fábrica ou
se irei incluir algum veneno extra.
No momento, no entanto, minha
dúvida é com relação ao câmbio.
Como o modelo veio sem câmbio
algum, estou incerto sobre qual
câmbio devo comprar. Do 1300
mesmo? De 1500? 1600? Ou o
“famoso” câmbio de SP2, que
também equipou o Fusca 1600 a
partir de 1984? Na sua opinião,
qual o melhor câmbio para o
motor boxer que a VW do Brasil já
produziu e qual será o ganho que
terei se adotá-lo?

Ricardo Xavier
Rio de Janeiro-RJ

Ricardo, o câmbio usado nos


motores boxer é o mesmo de
1961 até a última Kombi de
Receita 356
Caro Bob, estou customizando um besouro 1964 com vários componentes (rodas, instrumentos de painel,
dezembro de 2013, só o que logotipos, faróis, lanternas, volante, bancos etc.) do Porsche 356. Gostaria também de converter meu motor
muda é a relação de diferencial. VW 1200 ao estilo do que o pessoal de Stuttgart fazia na época, mais precisamente o boxer Super 90. Quais
Não existe um que seja o melhor. mudanças técnicas e estéticas tenho de fazer para isso? Posso aproveitar minha unidade 1200 ou seria
Recomendo manter o câmbio melhor adquirir um novo motor 1300 ou 1500 para esse projeto?
do 1300, se usar o do 1600
seu Fusca ficará lento demais Caio Figueiredo
na acelerações e retomadas de São Paulo-SP
velocidade. Há um ditado que
diz “câmbio certo não melhora, Caio, o motor Super 90 (foto) já era o de carcaça Porsche tripartida. A carcaça 1200 (bipartida) é muito
câmbio errado atrapalha.” limitada para modificações. Chegou a 1.488 cm³ no Porsche 356 (houve um 1.286-cm³ antes), mas
precisava de virabrequim roletado, já que não havia espaço na carcaça para as cabeças de biela passarem
em razão do maior curso dos pistões (de 64 para 74 mm). Recomendo partir para a carcaça tripartida VW,
que começa no Brasil com o motor 1300. Lembro que existiu na Alemanha o motor 1200 com carcaça
tripartida, de 34 cv, 4 cv mais que o antigo 1200. O visual dos motores dos 356 se diferenciava dos VW
basicamente pelos dois carburadores com filtros de ar tipo malha metálica Knecht e o filtro de óleo externo
fixado à carcaça da turbina de arrefecimento, bem como o distribuidor sem a câmara do avanço a vácuo.

Vazamento paralelo
Prezado Bob, tenho um Fusca 1968 e o interruptor da luz de freio, ainda original, apresentou problemas.
Comprei a peça para substituição, mas a nova peça ficou pingando um pouco de óleo. Recolocando a peça
original, não há nenhum vazamento. Há alguma marca de peça ou outra recomendação que você pudesse
dar para resolver este caso?

Carlos Casado
São Paulo-SP

Carlos, não tenho uma indicação para lhe dar, mas você pode entrar em contato com a oficina Garage Web,
na pessoa do engenheiro Walter Abramides, que com toda certeza terá a resposta. Telefone (11) 3222-1424,
contato@garageweb1.com.br . Diga-lhe ser leitor da Fusca & Cia.

62 Fusca & Cia


Raio de manivela?
Olá, Bob. Li um artigo seu em um dos fascículos da coleção O Grande Livro do Fusca no
qual você menciona o “raio de manivela”. Poderia me explicar o que é isso?

Giovani Rocha
E-mail

Giovani, é uma das medidas da árvore de manivelas (ou virabrequim), que é a metade do
curso dos pistões. Por exemplo, nos Fuscas de carcaça tripartida, o curso dos pistões é 69
mm. Dividindo esse número por 2 obtêm-se como raio da manivela 34,5 mm.

Calor na traseira
Caro Bob, depois de algum tempo sem consultá-lo, gostaria de obter uma orientação sua
novamente. Tenho um Fusca 1967 que desmontei completamente em 2011 para restaurá-
lo. Acontece que refiz o motor dele (agora, em agosto de 2015), que era o original 1300,
sendo que aproveitei apenas o bloco para transformá-lo em um 1600. O acabamento da
lataria é de aço inox da marca Empi, enquanto o bloco e algumas peças foram pintados
de vermelho com tinta para alta temperatura (foto). Porém, quando o utilizo em trajetos
inferiores a 15 km, a saia traseira (onde fica, por exemplo, o engate da tranca da tampa do
motor) esquenta demais, a ponto de criar bolhas na pintura. Ele estava com escapamento
de Puma, e achei que esse fosse o problema, pois os canos daquele silencioso ficam
muito próximos da parte de trás da saia traseira. Retirei o silencioso de Puma e refiz
a pintura do local, porém, mesmo utilizando o silencioso próprio do Fusca, o local
continua esquentando muito – inclusive já criou uma nova bolha! Acabei de comprar um
escapamento da EMPI (GT 4x1 1330-1600) na Fuscanet, mas estou preocupado se este
também esquentará... Então pergunto: 1) Tem relação a nova potência do motor e o fato
de a tampa ser fechada (sem ventilação)? 2) As latarias que envolvem o motor, de aço
inox, podem estar refletindo o calor e causando o problema? 3) Ou o problema é mesmo
do silencioso? Se for isso, posso criar uma barreira isolante (chapa de alumínio) entre o
silencioso e a lataria? Isso pode prejudicar o motor? Alguma outra dica?

João Alberto C. Gonçalves


Vitória-ES

João Alberto, que o problema tem como única causa o calor emanado do sistema de
escapamento, sem dúvida. Por que este escapamento que você comprou está esquentando
demais, a ponto de causar bolha, é que é o mistério. Posso lhe assegurar que não é a maior
cilindrada, tampouco a tampa sem ventilação, tenho experiência disso. Descarto também
as partes cromadas do motor. Ficam duas possibilidades, uma, o próprio escapamento
novo; outra, a temperatura dos gases de escapamento estar muito alta, cujas causas são
mistura ar-combustível muito pobre e/ou avanço de ignição insuficiente. Experimente
deixar o avanço inicial (“ponto”) com mais 5º em relação ao que está hoje e observe se não
ocorre detonação (“batida de pino”) e, ao mesmo tempo, se a chapa terminal fica mais fria.
Se houver sucesso, avance mais 2º30’ e observe. Com relação à mistura ar-combustível,
coloque giclê principal 5 pontos maior. Se ainda assim não resolver pode se colocado um
defletor de calor feito em alumínio entre o silenciador e a chapa, sem problema.

*Bob Sharp é jornalista e ex-piloto, colaborador de várias publicações no Brasil e no exterior, além de manter o blog AUTOentusiastas
Fusca & Cia 63
ClassiFusca Sedan Turbo Brasilia LS Fuscão
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Ano: 1969 Ano: 1978/79 Ano: 1971
Motor: 1.600 cm³ turbo / 0,5 bar Motor: 1.600 cm³ Motor: 1.500 cm³
IMPORTANTE: Detalhes: visual retrô de 1962, Detalhes: raro interior azul original, Detalhes: rara cor laranja Granada,
as informações vidros elétricos sem quebra-vento, 40 mil km, vidros verdes, manual, motor novo, placa preta, há 15 anos
contidas nos rodas aro 14, catraca na dianteira estepe origina, nunca restaurada na família, carro de coleção
classificados são de Preço: R$ 13 mil Preço: R$ 23 mil Preço: R$ 25 mil
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dos anunciantes mariocspereira@gmail.com

Gol S Split Window Fusca Brasilia

Ano: 1983 Ano: 1950 Ano: 1982 Ano: 1979


Motor: 1.600 cm³ Motor: 1.100 cm³ Motor: 1.300 cm³ Motor: 1.600 cm³
Detalhes: 42 mil km, álcool, origi- Detalhes: Split Brezel, certificado Detalhes: Rodas Porsche Cup 1 Detalhes: Carro conservado e
nal de fábrica, estepe nunca rodou AutoMuseum Alemanha, acom- originais, interior novo original com 48 mil km
Preço: R$ 25 mil panha peça para restauração Preço: R$ 25 mil Preço: R$ 18 mil
Contato: (11) 99752-3197 Preço: a combinar Contato: (11) 99775-9030, Contato: (51) 9973-7528, com
Contato: (11) 94772-9097 tratar com Luiz Luiz Maggi

Mini Fusca Fusca 1600 Fuscão Nick Dacon

Motor: 1.600 cm³ Ano: 1986 Ano: 1971 Ano: 1989


Detalhes: Encurtado e legal- Motor: 1.600 cm³ Motor: 1.500 cm³ Motor: 2.0 litros
izado para 2 lugares, bancos Detalhes: carro 100% original Detalhes: Placa Preta, manual Detalhes: Todo original, modelo
BMW, instrumentos Gol TSI, Preço: R$ 18 mil original, verde Tropical, para impecável, com ar-condicionado
vidros e travas elétricos Contato: (11) 99907-0105, pessoas exigentes Preço: R$ 30 mil
Preço: R$ 25 mil com Vicente Preço: R$ 30 mil Contato: (11) 99903-6583.
Contato: (11) 94722-9097 Contato: (11) 94772-9097 com Paulo Tohmé

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Garagem do Opa Por Rudinei Junkes *

UNIVERSO KAMEI
A empresa sediada em Wolfsburg criou uma ampla
gama de acessórios para o Fusca, sendo o mais
curioso e raro o spoiler batizado como Aerofix

I
niciada em 1949, a Kamei deve seu capas para os pedais, organizador de
nome às iniciais de seu fundador, porta-luvas, defletor do ar quente para o
Karl Meier, um ex-funcionário da para-brisa, polainas, alto-falantes, faróis
Volkswagen que decidiu abrir a sua auxiliares, travesseiro com ventosas para
própria empresa de acessórios na apoiar a cabeça nos vidros laterais, etc.
cidade de Wolfsburg. O negócio começou Entre as soluções mais famosas, estão
com a fabricação de capas de bancos o tampão do chiqueirinho e o porta-ob-
para o Fusca, vendidas para as próprias jetos de plástico imitando bambu para
concessionárias VW, mas o leque de ser instalado sob o painel (que chegou
produtos logo foi ampliado. Em pouco inclusive a ser fornecido para as con-
tempo, a Kamei tornou-se um dos maiores cessionárias com o logo
fabricantes de acessórios, conquistando VW). Porém, nada supera
mercados em toda a Europa, nos EUA e em curiosidade e raridade
até mesmo no Brasil, onde era possível o spoiler criado ainda no iní-
encontrar alguns de seus componentes cio dos anos 1950. Desen-
entre as décadas de 1950 e 1970. volvido por um engenheiro
Embora tenha desenvolvido produtos aeronáutico, o acessório foi
para outros modelos, o Fusca sempre foi batizado como Aerofix.
o principal “cliente” da área de criação Para fabricar a peça, a
da Kamei. O besouro contou com uma Kamei firmou parceria com a
incrível gama de acessórios da marca, tais Phillip Roth de Stuttgart, mais
como capas de proteção do capô dian- tarde conhecida como a empre-
teiro, rodas e calotas esportivas, faixas sa Perohaus. Segundo relatos de
laterais decorativas, encosto de cabeça, Andrae Meier, filho de Karl Meier,
capas de volante, consoles, alavancas apenas 40 unidades do spoiler
esportivas, manoplas, capas de banco, foram fabricadas entre 1952 e
apoio de braço entre os bancos dian- 1953, o que torna o Aerofix um
teiros, suportes para esquis, sistemas dos acessórios de época para o
para reclinamento dos bancos dianteiros, Fusca mais raros do mundo.

*Rudinei Junkes é funcionário público, vive em Curitiba (PR) e mantém o


blog opasgarage.blogspot.com, onde publica sua vasta pesquisa sobre os
acessórios que acompanharam o Fusca ao longo de décadas
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