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Introdução à Transformada
de Radon
Antônio Sá Barreto demos definir outras análogas, em que integra-se so-
bre variedades lineares de dimensão 1, 2, 3, · · · , n − 1.
Purdue University Por exemplo, em dimensão n = 3, podemos definir as
transformadas utilizando integrais sobre retas ou pla-
nos. A transformada em que se integra sobre retas leva
o nome de Transformada Raio-X.
Consideremos primeiramente o caso n = 2. Neste
caso, or hiperplanos são retas e a Transformada de Ra-
O
propósito deste artigo é apresentar ao estudante don coincide com a Transformada Raio-X. Será útil tra-
de graduação técnicas de equações a derivadas balhar com uma parametrização conveniente das retas.
parciais e de geometria integral por meio de um tópico Qualquer reta L ⊂ R2 é dada por uma equação
relativamente simples, mas ao mesmo tempo bastante
interessante e moderno. Esse tópico possibilitará ao x, ω = s ,
aluno um primeiro contato com um assunto de grande
em que x = ( x1 , x2 ) e x, ω = x1 ω1 + x2 ω2 . Note que
interesse em matemática, que começou a ser desenvol-
L = L(ω, s) = L(−ω, −s) é perpendicular a ω e, se
vido no século XX e que ainda desperta interesse de
|ω | = 1, está a uma distância |s| da origem (ver a fi-
muitos pesquisadores. O pré-requisito para se ler es-
gura 1). Mais precisamente, a Transformada de Radon
tas notas é um bom conhecimento de cálculo avançado.
no plano será definida por
Familiaridade com propriedades de funções de uma va-
riável complexa é desejável, mas não essencial. R f (ω, s) = f d , |ω | = 1 s ∈ R . (1.1)
x,ω =s
Este artigo é baseado nas notas de aulas de minicur-
sos sobre as Transformadas de Radon e problemas in- Essa é uma aplicação que transforma funções de ( x1 , x2 )
versos que tive a oportunidade de ministrar durante em funções de (ω, s).
duas edições do Simpósio em Teorias Espectral e de Es-
palhamento, realizadas em Recife e Serrambi, de 11 a
15 de agosto de 2003 e de 11 a 15 de agosto de 2008. y
Registro aqui meus agradecimentos à CAPES, ao Clay
Mathematics Institute, ao CNPq, à FACEPE, à FINEP,
ao Instituto do Milênio, à International Mathematical
Union, à National Science Foundation e à Universidade
Federal de Pernambuco, que patrocinaram esses encon-
s
tros.
L(ω, s)
Em seu famoso artigo [16], de 1917, Johann Radon ω
definiu a seguinte aplicação: dada uma função contí-
x
nua no espaço R n , n ≥ 2, de suporte compacto – isto
é, existe C > 0 tal que f ( x ) = 0 para | x | ≥ C – e um
hiperplano H (dimensão n − 1), tome a integral da fun- Figura 1: L(ω, s) = { x = ( x1 , x2 ) : x, ω = s}, com
ção f ao longo de H. Além dessa transformada, po- s ∈ R e ω ∈ S1 .
1
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{Artigo}
1) R é injetiva?
2) Qual é a imagem de R?
2
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A aplicacão dessa ideia é imediata. O médico deseja uma camada de pré-sal a quilômetros de distância den-
saber informações sobre os diferentes tecidos de uma tro da terra e embaixo de quilômetros de água? Uma
determinada parte do corpo humano a partir de medi- coisa é certa, a Petrobras nao sonhou com o mapa do te-
das feitas com raios-X. Por exemplo, a presença de uma souro. As companhias de petróleo têm grandes navios
anomalia num tecido gera uma diferença no seu coefi- que são equipados com um canhão de ar comprimido e
ciente de absorção e, determinando-se o coeficiente de uma rede, similar a uma de pesca, equipada com cen-
absorção, determina-se a presença de algo estranho no tenas de microfones. A rede é estendida na superfície
tecido. Mas essas medidas não dão diretamente o valor da água e puxada pelo navio. O canhão envia ondas
do coeficiente de absorção, apenas sua integral ao longo de som ao fundo do oceano e os microfones captam o
da reta percorrida pelo raio-X (ver a figura 4). Portanto, som refletido. Analisando-se as propriedades das on-
essa questão da medicina é traduzida exatamente no das de som que foram emitidas e refletidas, espera-se
problema de Radon, ou seja: é possível se determinar o deduzir propriedades do solo abaixo do mar, inclusive
coeficiente de absorção a partir de sua integral ao longo presença de petróleo. O modelo matemático envolvido
de retas? é bastante complicado, porém tem várias coisas em co-
A. Cormack, um físico sul-africano e um dos pionei- mum com o problema da Radon.
ros nas aplicações tomográficas, conta, em [3] – um ar- máquina de raios-X
tigo que escreveu para uma conferência que festejou os
setenta e cinco anos da Transformada de Radon – que
sensor
chegou a esse problema em 1956, quando trabalhava no
departamento de radiologia do Hospital Groote Schurr
(o mesmo onde foi feito o primeiro transplante de co-
ração), na cidade do Cabo, África do Sul. Ele recebeu
o Prêmio Nobel em medicina em 1979 pela contribui-
objeto com
ção que deu nessa área (sua palestra na cerimônia de diferentes
entrega do prêmio, que é de fácil leitura, pode ser en- coeficientes
de absorção
contrada em http://nobelprize.org/nobel_prizes/medicine/ sensor
laureates/1979/cormack-speech.html).
Esse exemplo também mostra a dificuldade de apli-
cação do método. Do ponto de vista prático, é impossí-
vel se fazerem medidas ao longo de todas as retas. Aí máquina de raios-X
aparecem outras perguntas – como quantas medidas se Figura 4: Espera-se detectar anomalias nos tecidos por
deve fazer para se ter uma aproximação boa – que não meio de medidas de raios-X.
serão consideradas neste artigo. Para mais detalhes, o
leitor deve consultar [1] e a bibliografia lá citada.
Esse tipo de problema é um exemplo do que se chama
de problema inverso. Neste exemplo, temos uma equação Antes de estudarmos as Transformadas de Radon, pre-
diferencial que sabemos resolver. O problema inverso é cisamos relembrar alguns fatos sobre a Transformada
encontrar o coeficiente da equação a partir de dados so- de Fourier, que deve ser conhecida do leitor.
bre suas soluções. Ou seja, conhecemos I1 e I0 e quere- Se f é uma função contínua de suporte compacto
mos determinar f a partir deste dado. Esta é uma área (denota-se f ∈ C00 (R n )), a Transformada de Fourier de
de pesquisa extremamente interessante e de aplicações f é definida pela integral
importantíssimas. Por exemplo, hoje se fala muito no
F f (ξ ) = f(ξ ) = e−i x,ξ f ( x ) dx , (3.1)
“pré-sal”. O leitor teria ideia de como se pode descobrir Rn
3
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em que x, ξ = x1 ξ 1 + ... + xn ξ n é o produto interno vamos assumir que n = 1. Porém esta demonstra-
√
canônico no espaço euclidiano e i = −1. ção pode ser generalizada para n maior. Primeiro re-
Seja S(R n ) o conjunto das funções infinitamente di- cordemos que uma função F (ξ 1 + iξ 2 ) = u(ξ 1 , ξ 2 ) +
√
ferenciáveis em Rn que satisfazem iv(ξ 1 , ξ 2 ), de classe C1 , em que i = −1 e ξ j ∈ R,
j = 1, 2, é analítica se satisfaz as equações de Cauchy-
(1 + | x |)k Dxm11 Dxm22 ...Dxmnn f ( x ) ≤ C , (3.2) Riemann
∂
F f (ξ ) = F (−ix j f )(ξ ) , Como f tem suporte compacto, ou seja, existe C > 0
∂ξ j tal que f ( x ) = 0 se | x | ≥ C, a integral converge e,
(3.5)
∂ portanto, F f (ξ 1 + iξ 2 ) está bem definida. A segunda
ξ j F f (ξ ) = F (−i f )(ξ )
∂x j
observação é que F f (ξ 1 + iξ 2 ) é uma função analítica
A demonstração desse teorema não será dada aqui. de z = ξ 1 + iξ 2 . Para demonstrar isso basta usar que
O leitor pode encontrá-la em [10], por exemplo. eixz é uma função analítica de z e que, pelo fato de f
O teorema seguinte decorre do teorema de Stone- ser contínua de suporte compacto, podemos comutar
Weierstrass, que em geral se estuda num primeiro curso as derivadas em ξ j , j = 1, 2, com a integral em x e ver
de análise matemática (ver [17], por exemplo). Vamos que
dar uma demonstração desse resultado em dimensão 1
∂ξ j F f (ξ 1 + iξ 2 ) = ∂ξ j e−ixξ 1 + xξ 2 f ( x ) dx ,
usando alguns fatos elementares da teoria de funções R
analíticas de uma variável complexa. para j = 1, 2. Assim, como e−ixξ 1 + xξ 2 satisfaz as equa-
Teorema 3.2. Seja f ( x ) uma função contínua de suporte ções de Cauchy-Riemann, F f também as satisfaz e,
compacto em R n , e suponha-se que, para todo polinômio portanto, é analítica. Finalmente, utilizaremos (3.6)
4
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injetora em S(R ). De fato ela é injetora também em di- em que ω pertence à esfera unitária S n−1 de R n e s é
versos outros espaços (ver [10]), entre os quais C00 (R ). um número real. Note-se que o hiperplano está a uma
Como F f = 0, temos então que f = 0. distância |s| da origem e é perpendicular ao vetor ω (a
Para demonstrar (3.7), primeiro é preciso notar que, figura 1 contém uma ilustração do caso bidimensional).
como f ∈ C00 (R ), isto nos permite comutar as derivadas Dada uma função f ∈ S(R n ), considere-se a integral
em ξ com a integral em x, logo de superfície da função f ao longo do plano H (ω, s),
∂m k isto é,
ξ 1 ∂ξ 2 F f ( ξ 1 + iξ 2 )
= ∂m k
ξ 1 ∂ξ 2 e−ixξ 1 + xξ 2 f ( x ) dx R f (ω, s) = f dS . (4.2)
H (ω,s)
R
= (−i )m e−ixξ 1 + xξ 2 x m+k f ( x ) dx Há algumas importantes obervações a serem feitas
R
e, portanto, quando ξ 1 = ξ 2 = 0, temos, em virtude de sobre a função R f (ω, s). Primeiro, notemos que se
Observemos que a condição de que f tenha suporte R f (ω, s) = R f (−ω, −s) . (4.4)
compacto é essencial e que se for substituída por f ∈
Finalmente, observemos que, dado k ∈ N,
S(R ) então o resultado não será mais válido. Para exi-
bir um contraexemplo, basta tomar uma função g ∈ sk R f (ω, s) ds = x, ω k f ( x ) dS ds . (4.5)
R R H (ω,s)
S(R ) tal que todas as suas derivadas se anulem em
ξ = 0 e usar f = F −1 g. De acordo com os cálculos Porém x, ω k é um polinômio homogêneo de grau k
que fizemos acima, f satisfaz (3.7), porém f = 0. A di- em ω, com coeficientes que também são polinômios ho-
ferença é que g não tem uma extensão analítica para o mogêneos de grau k em x. Quando calculamos a inte-
plano complexo. gral (4.5), obtemos um polinômio homogêneo de grau k
em ω. Portanto,
R n
Pk (ω ) = sk F (ω, s) ds (4.6)
R
A Transformada de Radon foi extensivamente estudada
é um polinômio homogêneo de grau k em ω.
por S. Helgason ([8]), F. John ([11]), P. Lax e R. Phillips
Definimos S(S n−1 × R ) como o conjunto das funções
([13]), D. Ludwig ([15]), e por muitos outros. Helga-
F ∈ C ∞ (S n−1 × R ) tais que, dado qualquer operador
son estendeu a teoria para espaços homogêneos mais
diferencial L em S n−1 , linear e com coeficientes de classe
gerais, inclusive para o espaço hiperbólico. A referên-
C ∞ , temos
cia principal é o excelente livro de S. Helgason ([8]). Os
teoremas incluídos aqui são clássicos e podem ser en- sup (1 + |s|)k | L( F )(ω, s)| < ∞. (4.7)
(ω,s)
contrados nessas referências.
Na verdade, esta definição envolve a noção de deriva-
Dado um hiperplano H ⊂ R n , n ≥ 2, tome-se a inte-
das de uma função definida numa esfera (que é uma va-
gral de f sobre H. Essa aplicação associa a f uma fun-
riedade diferenciável). Evitaremos discutir esse tópico
ção definida no espaço dos hiperplanos em R n . Para
e, para mais detalhes, remetemos o leitor a [18] ou ao
simplificar nossa discussão, entenderemos que qual-
Capítulo 2 de [9], que é uma referência mais específica
quer hiperplano H ⊂ R n pode ser representado por
para operadores diferenciais em variedades.
uma equação
O principal resultado desta seção é o seguinte teo-
H (ω, s) = { x ∈ R n : x, ω = s} , (4.1) rema.
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Teorema 4.1. R é uma aplicação inversível entre os espaços de H (ω, s) e o Teorema de Fubini, temos que
R : S(R ) −→ M , n R f (ω, s)e−iλs ds
R
= e−iλs f ( x ) dS ds
em que M é o subespaço das funções S(S n−1 × R ) que sa- R x,ω =s)
tisfazem (4.4) e (4.6).
= e−iλω,x f ( x ) dS ds
R x,ω =s
Necessitaremos de uma série de resultados para de- = e−iλω,x f ( x ) dx
Rn
monstrar o Teorema 4.1. Começaremos pelo seguinte
= f(λω ) .
lema, cuja demonstração fica como exercício para o lei-
tor. Isto completa a demonstração do lema.
∂2 R f P : S n−1 × [0, ∞) −→ R n
R(∆ f )(ω, s) = (ω, s) .
∂s2 (ω, s) −→ sω = x .
Usando-se esse lema, pode-se facilmente demonstrar a transformação que associa coordenadas polares (ω, s) a um
que R : S(R n ) −→ S(S n−1 × R ). A seguir, demons- ponto x ∈ R n . P desfruta das seguintes propriedades:
traremos que R é injetiva. Para isso, necessitaremos ex-
I. A restrição de P ,
plorar a conexão entre a Transformada de Radon e a de
Fourier. P0 : S n−1 × (0, ∞) −→ R n \ 0 ,
Lema 4.2. Se f ∈ S(R n ) então a Transformada de Fourier é um difeomorfismo (C ∞ e bijetiva) e sua inversa
de R f (ω, s) com respeito à variável s satisfaz
P0−1 : R n \ 0 −→ S n−1 × (0, ∞)
x
f (ω, λ) =
R R f (ω, s)e−iλs ds = f(λω ) . (4.9) x −→ ( , | x |)
|x|
R
é a inversa de P .
Demonstração. Como f ∈ S(R n ), temos, em virtude do
Lema 4.1, que R f ∈ S(S n−1 × R ) e, portanto, a integral II. Se f ∈ C ∞ (R n ) então f ◦ P ∈ C ∞ (S n−1 × [0, ∞)).
(4.9) é bem definida. Por outro lado, usando a definição Note-se que o intervalo inclui s = 0.
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III. Se F ∈ C ∞ (S n−1 × (0, ∞)), então F ◦ P0−1 ( x ) = Observe-se que in−1 = ±1 e que o lado direito de
F ( | xx| , | x |) está em C ∞ (R n \ 0), ou seja, é C ∞ em to- (4.11) é um número real se f é real.
dos os pontos, exceto possivelmente na origem.
Demonstração. Usando coordenadas polares em (3.4),
IV. Se F ∈ C ∞ (S n−1 × (0, ∞)), então f = F ◦ P0−1 se es- temos:
tende a uma função em C ∞ (R n ) (ou seja, é C ∞ também 1
f (x) = ei x,ξ f(ξ ) dξ
na origem) se e somente se F ∈ C ∞ (S n−1 × [0, ∞)) e (2π )n Rn
∞
1
= ei x,λω f(λω )λn−1 dλ dSω .
∂k (2π )n Sn−1 0
Pk (ω ) = ( F )(ω, 0) (4.10)
∂sk
Como n − 1 é par e x, λω não se altera se trocarmos
é um polinômio de grau k, para todo k ∈ N. (λ, ω ) → (−λ, −ω ), podemos estender a integral em λ
para todo R para obter
Sugestões para a demonstração. A demonstração da pro-
∞
priedade I é fácil. As propriedades I I e I I I são con- 1 1
f (x) = ei x,λω f(λω )λn−1 dλ dSω ,
2 (2π )n S n −1 −∞
sequências imediatas de I. A propriedade IV é a única
que não é trivial. Para demonstrá-la, escreva-se a série e, por causa de (4.9), chegar a
∞
de Taylor de F em s = 0. Use-se (4.10) para provar que 1 1 f (ω, λ)λn−1 dλ dSω .
f (x) = ei x,λω R
f = P0−1 F, que é C ∞ em R n \ 0, tem uma série de Taylor 2 (2π )n S n −1 −∞
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Note-se que, por causa de (3.5), quando m é um número suporte de f ( x ) é controlado pelo suporte de sua Trans-
par, temos |∂s |m f = ∂m
s f. formada de Radon (ver a figura 2).
Teorema 4.3. Seja n > 1, par. Então O leitor deve se perguntar por que assumimos essa
propriedade de decaimento de f ( x ). É fácil provar que
1
n −1
f (x) = |∂s | R f ( x, ω , ω ) dS . o resultado é falso sem essa hipótese. Trabalharemos
2(2iπ )n−1 S n −1
em dimensão n = 2 e utilizaremos propriedades de fun-
(4.12)
ções analíticas. Seja z = x + iy e tome-se uma função
A demonstração desse teorema é quase idêntica à do f (z) que é contínua em todo o plano C e que satisfaz
Teorema 4.2. A única diferença é que, quando se passa f (z) = z−m , m ∈ N, m ≥ 2, se |z| > 1. Pode-se cons-
da integral sobre (0, ∞) para a integral de (−∞, ∞), te- truir f ∈ C ∞ , com estas propriedades, mas isso é mais
mos de substituir λn−1 por |λ|n−1 , uma vez que nesse difícil. Mostraremos que para qualquer reta L ⊂ R2 tal
caso n − 1 é ímpar. Note-se que a observação que se se- que L ∩ B(0, 1) = ∅ (em que B(0, 1) = {z : |z| ≤ 1})
gue à demonstração do Teorema 4.2 não é mais válida temos L f d = 0.
quando n é par. Lembremos que o Teorema de Cauchy diz que se f é
Assim, respondemos às primeiras três perguntas fei- uma função analítica em uma região O ⊂ C e se Γ ⊂ O
tas na introdução. Vamos agora nos ocupar em respon- é uma curva fechada, que é união finita de curvas de
der à quarta pergunta, que é muito importante para as
classe C ∞ , então a integral de linha Γ f d vale zero.
aplicações. Por exemplo, voltemos à tomografia. Como Desta forma, seja C (0, R) o círculo de raio R centrado
vimos, o experimento com os raios-X mede a Transfor- na origem, e R >> 0. Seja Γ a curva fechada que de-
mada de Radon do coeficiente de absorção de um certo fine a região do plano limitada pela reta L e o círculo
meio, como um tecido do corpo humano. O radiolo- C (0, R) que não contém a origem. Como f é analítica
gista, então, compara esses dados com os de um tecido fora do disco B(0, 1), temos, pelo Teorema de Cauchy,
normal e percebe que as duas são idênticas fora de uma
que Γ f d = 0. Mas
certa região. Isso implica que, fora daquela região, não
há qualquer anomalia no tecido? O experimento seria f d = f d + f d = 0 ,
inútil se isto não fosse verdadeiro, ou seja, se uma ano- Γ C + (0,R) LR
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Tomando θ = 0, obtemos
(t∂s f (s, t) − s∂t f (s, t)) dt = 0 .
Figura 5: A curva Γ formada pelo segmento L R e pelo R
arco de círculo C + (0, R). Como f tem suporte compacto, o Teorema Fundamen-
tal do Cálculo implica que R ∂t f (s, t) dt = 0. Assim,
Demonstração do Teorema 4.4. Há várias provas e mui-
concluímos que
tas generalizações desse teorema, entre elas citamos
[2, 5, 7, 8, 15, 19]. Nós demonstraremos esse resultado ∂s t f (s, t) dt = 0 .
R
para o caso em que f tem suporte compacto e seguire-
Portanto, t f (s, t) dt é uma constante e, como f tem
mos a prova de Strichartz ([19]). O leitor interessado R
suporte compacto, f (s, t) = 0 se s é suficientemente
deve consultar o livro de Helgason ([8]) para a demons-
grande. Portanto, temos
tração do caso geral, pois, além de muito elegante, tam-
bém é muito instrutiva. Ela é, porém, muito mais com- t f (s, t) dt = 0 , s ≥ s0 .
plicada tecnicamente do que a demosntração que dare- R
mos aqui. Faremos a demonstração para o caso n = 2, Como R f (s, t) dt = 0, segue que R s f (s, t) dt = 0.
mas é fácil estendê-la para qualquer n > 2, e deixamos Assim, concluímos que para qualquer polinômio
isso como exercício para o leitor.
Primeiro, dada uma reta L tal que L ∩ Ω = ∅, es- L = { x1 = s } x1
colhemos um sistema de coordenadas x = ( x1 , x2 ) de
forma que a origem 0 = (0, 0) pertença a Ω e que L =
{ x1 = s0 }, e que para cada s ≥ s0 , a reta L = { x1 = s}
não intersecta Ω (ver a figura 6). Portanto, por hipótese,
θ
temos
f (s, x2 ) dx2 = 0, s ≥ s0 .
R Lθ
Como Ω é um conjunto convexo, podemos fazer uma Ω
rotação de uma reta L = { x1 = s}, s ≥ s0 , de um ân-
gulo θ bastante pequeno de forma que a reta assim ob-
tida seja tangente ao círculo centrado em 0 e de raio s,
mas que também nao intersecta Ω. Essa reta, que cha- Figura 6: Domínio Ω, coordenadas x e retas L e Lθ .
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p( x1 , x2 ) de grau 1 vale
p( x ) f ( x ) d x = 0 ,
L
L(ω, z)
para toda reta L tal que L ∩ Ω = ∅. Usando o mesmo
argumento para a função p( x ) f ( x ), no lugar de f , con- z
cluímos que para qualquer polinômio q( x ) de grau ar- ω
bitrário vale L q( x ) f ( x ) d x = 0, contanto que L ∩ Ω =
∅. Portanto, em particular, voltando a usar as coorde-
nadas ( x1 , x2 ) acima, obtemos que
tk f (s, t) dt = 0 , k ∈ N, s ≥ s0 . ω⊥
R
10
50 Matemática Universitária nº47
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Teorema 5.1. Sejam f , g ∈ C0∞ (R n ) e suponha-se que, dado Cauchy para a equação da onda se ,
ρ > 0,
∂2 u ∂2 u
− 2 = 0 em R × (0, ∞)
∂t2 ∂x (6.1)
( f (y) − g(y)) dy = 0 ∂u
L(ω,z) u( x, 0) = f 1 ( x ), ( x, 0) = f 2 ( x ) .
∂t
para toda reta L(ω, z) que não intersecta B(0, ρ). Então Nosso propósito é encontrar uma fórmula para u( x, t)
f ( x ) = g( x ) para todo x ∈ B(0, ρ). em termos do dados iniciais f 1 ( x ) e f 2 ( x ). Comecemos
pelo seguinte lema elementar, cuja prova, mais uma
Pode-se estabelecer uma relação entre a Transfor-
vez, fica para o leitor.
mada Raio-X e a Transformada de Fourier, de modo se-
∂2 u
melhante ao que foi feito com a Transformada de Ra- Lema 6.1. Se u(y, z) ∈ C ∞ (R2 ) satisfaz ∂y∂z = 0 então
don. Também pode-se usar essa relação a fim de conse- existem F, G ∈ C ∞ (R ) tais que
guir uma fórmula para a inversa da Transformada Raio-
u(y, z) = F (y) + G (z) .
X. Remetemos o leitor para o livro de Helgason ([8]).
Em alguns exemplos de problema inversos, obtém-se Fazendo a mudança de coordenadas
a integral de uma função, ou às vezes de um tensor, ao
y = x+t , z = x−t
longo de uma família de hipersuperfícies, que não são
necessariamente planos. Para um artigo expositório so- y+z y−z
e denotando U (y, z) = u 2 , 2 = u( x, t), segue de
bre alguns problemas inversos, recomendamos o artigo (6.1) que
[6].
∂2 U
= 0.
∂y∂z
L(θ, z)
θ⊥ ∩ ω⊥ Do Lema 6.1 concluímos que U (y, z) = F (y) + G (z).
z Portanto, temos que
ω ω⊥
u( x, t) = F1 ( x + t) + F2 ( x − t), F1 , F2 ∈ C ∞ (R ) .
θ
As condições iniciais de (6.1) nos dão que
F1 ( x ) + F2 ( x ) = f 1 ( x )
F1 ( x ) − F2 ( x ) = f 2 ( x ) .
Figura 8: Como se obtém a Transformada de Radon a
partir da Transformada Raio-X. Tomando a derivada da primeira equação e somando-a
à segunda, obtemos
Concluímos este artigo com uma aplicação da Trans- De modo semelhante, obtemos
formada de Radon em equações diferenciais parciais.
2F2 ( x ) = f 1 ( x ) − f 2 ( x ) .
Utilizaremos a Transformada de Radon para resolver o
Problema de Cauchy da equação da onda em dimensão Usando o teorema fundamental do Cálculo, encon-
n ímpar. A referência básica deste tratamento da equa- tramos que
ção da onda é [11]. Também remetemos o leitor a [20]. 1 1
1 x
F1 ( x ) − F1 ( x0 ) = f (x) − f ( x0 ) + f 2 (s) ds ,
Comecemos pelo caso n = 1. 2 1 2 1 2 x0
x
Dadas funções f 1 ( x ), f 2 ( x ) ∈ C0∞ (R ), uma função 1 1 1
F2 ( x ) − F2 ( x0 ) = f 1 ( x ) − f ( x0 ) − f 2 (s) ds .
u( x, t) de classe C ∞ (R2 ) é uma solução do problema de 2 2 1 2 x0
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Matemática Universitária nº47 51
{Artigo}
Portanto, t
1 1 x +t
u( x, t) = ( f ( x + t) + f 1 ( x − t)) + f 2 (s) ds . ( x, t)
2 1 2 x −t
(6.2)
∂2 v ∂2 v ∂2 v 1
∆v( x ) = + + . . . + . Ru(ω, s, t) = (R f 1 (ω, s + t) + R f 1 (ω, s − t))
∂x12 ∂x22 ∂xn2 2
1 s+t
Estudaremos o problema de valor inicial (ou Problema + R f 2 (ω, µ) dµ .
2 s−t
de Cauchy)
Agora temos de tomar a transformada inversa de Ra-
∂2 u
− ∆u = 0 em R n × (0, ∞) don de Ru. Como já vimos antes, há uma diferença
∂t2
∂u entre os casos em que n é par ou ímpar: o caso ímpar é
u( x, 0) = f 1 ( x ), ( x, 0) = f 2 ( x ), f 1 , f 2 ∈ C ∞ (R n ) .
∂t mais simples. De (4.11) obtemos que, com
(6.3)
1
Ou seja, como fizemos acima, queremos encontrar uma Cn = ,
2(2iπ )n−1
fórmula para u( x, t) em termos de f 1 e f 2 . A ideia prin-
cipal é a de reduzir esse caso ao unidimensional. Essa é vale
a utilidade da Transformada de Radon.
O primeiro passo é lembrarmos, do Lema 4.1, que ∂ n −1 R u
u( x, t) = Cn (ω, x, ω , t) dSω
S n−1 ∂sn−1
∂2 R f 1
n −1
R f1
(ω, s) = R(∆ f )(ω, s) . (6.4) = Cn
∂
(ω, x, ω + t)
∂s2 2 ∂sn−1
S n −1
Denotemos a Transformada de Radon na variável x de ∂ n −1 R f 1
+ (ω, x, ω − t) dSω
u( x, t) por Ru(ω, s, t). De (6.4) obtemos ∂sn−1
1 ∂ n −2 R f 2
∂2 R u ∂2 R u + Cn (ω, x, ω + t)
(ω, s, t) − (ω, s, t) = 0 2 S n −1 ∂sn−2
∂t 2 ∂s2
∂ n −2 R f 2
− ( ω, x, ω − t ) dSω .
e ∂sn−2
∂Ru
Ru(ω, s, 0) = R f 1 (ω, s) , (ω, s, 0) = R f 2 (ω, s) .
∂t Agora observamos que, como n é ímpar e R f (ω, s) =
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{Artigo}
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{Artigo}
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