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TEORIA DAS SINGULARIDADES

ALEXEI DAVYDOV

1. Introdução
Essencialmente trataremos de Teoria de Singularidades real, con-
siderando objectos reais. Vamos relembrar algumas noções básicas.
1.1. Variedades e aplicações.
Definição 1. Variedade é um objecto que é construido localmente,
como o espaço aritmético Rn (a dimensão n deste espaço também se
designa por dimensão).
Exemplos.
A recta real é uma variedade de dimensão 1 (Fig. 1a).
A esfera unitária x2 + y 2 + z 2 = 1 em R3 é uma variedade de
dimensão 2 e a bola aberta limitada por esta esfera é uma variedade
de dimensão 3 (Fig. 1b).
O nosso tempo-espaço (provavelmente) é uma variedade de dimensão
4.
A posição do corpo rı́gido em R3 é descrita por um ponto de uma
variedade 6-dimensional (Fig. 1c). A união dos eixos coordenados no
plano com a topologia induzida não é uma variedade (Fig. 1d).

x P y
S2

M
O centro de massa O x
al
re
ha
lin
S 2 - posição possível
de um aixo M P
S 1 - rotação em torno do eixo M P
(a) (b) (c) (d)

Figura 1. Variedades e não-variedades.

Nota 1. O significado de “localmente construı́do” será explicado mais


tarde aquando da introdução da noção de “relação de equivalência”.
Definição 2. Uma aplicação da variedade M na variedade N é uma
lei que a cada ponto x ∈ M faz corresponder um ponto y ∈ N
f : x → y = f (x).
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2 ALEXEI DAVYDOV

Continuidade e diferenciabilidade de uma aplicação são noções locais.


Devido a tal facto, define-se continuidade e diferenciabilidade de apli-
cações entre variedades da mesma forma como se define essas noções
no espaço aritmético (Fig. 2).
Assim, uma aplicação entre variedades diz-se localmente contı́nua
e diferenciável sse as suas componentes, em coordenadas locais, são
contı́nuas e diferenciáveis.
Desta forma
f pertence à classe C k sse fi pertence à classe C k
O conjunto de todas as aplicações entre as variedades M e N que
pertencem à classe C k denota-se, normalmente, por C k (M, N ), onde k
é ou um número não negativo e inteiro ou um dos simbolos “∞” e “w”
(quando k = w significa que a aplicação é analı́tica).
Nota 2. Sempre que se diz que uma aplicação é diferenciável, sem pre-
cisar a sua classe, deve entender-se que é C ∞ .

M N

U f f (x)
carta (U, φ) x V carta (V, ψ)
−1
ψ◦f ◦φ
φ ψ

φ(x) ψ(f (x))


φ(U ) em IR m ψ(V ) em IR n

Figura 2. Continuidade e diferenciabilidade de aplica-


ções entre variedades.

Exemplo 1. Considere a função latitude h : (x, y, z) → z definida na


superfı́cie terrestre normalizada (Fig.3) logo h é uma aplicação entre
a esfera e a recta real. Na vizinhança do Polo Norte a aplicação h é
diferenciável, uma vez que é possivel definir uma vizinhança do Polo
Norte na qual, considerando  as coordenadas locais x, y a nossa função
toma a forma f : (x, y) → 1 − x2 − y 2 .

1.2. Pontos crı́ticos e valores crı́ticos. A aplicação diferenciável


entre variedades (M e N ) define, de uma forma natural, a aplicação
entre os espaços tangentes (T M e T N ) associadas às variedades (Fig.
4):

f :M →N define f∗ : T M → T N
TEORIA DAS SINGULARIDADES 3

z

(x, y, z) −→ z = 1 − x2 − y 2

carta (U, φ) φ

y (x, y)
O
y

x
x2 + y 2 + z 2 = 1 x

Figura 3. A função latitude z definida na superfı́cie


terrestre é diferenciável.

v(x(t))
plano
tangente x(t)) f
M N
Tx M

plano
f (x(t)) tangente
Tf (x) N
x
x
f◦ f∗ (v(x(t)))

Figura 4. Aplicação induzida entre os espaços tan-


gentes das variedades M e N

Nas coordenadas locais usuais x, v e y, w na vizinhança de P e f (P ),


respectivamente, a aplicação induzida f∗ é definida por:
 
∂f
f∗ : (x, v) → y = f (x), w = (x)v
∂x
∂f
onde ∂x
(x) é a matriz Jacobiana da aplicação f calculada no ponto x.
Definição 3. Um ponto x ∈ M é designado por ponto crı́tico da
aplicação diferenciável f se a caracterı́stica da aplicação linear ∂f
∂x
(x)
não é máxima. A imagem de um ponto crı́tico é um valor crı́tico.
Nota 3. A caracterı́stica de uma aplicação linear é definida como a
dimensão da imagem da aplicação. Numa base concreta uma aplicação
linear é definida por uma matriz. Assim a caracterı́stica é igual ao
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número máximo de colunas ou linhas linearmente independentes dessa


matriz.

Agora vamos procurar tornar claro a importância dos pontos crı́ticos.

Se um ponto x0 não é um ponto crı́tico de uma aplicação diferen-


ciável então, em coordenadas locais apropriadas x1 , . . . , xm no espaço
das imagens recı́procas e y1 , . . . , yn no espaço das imagens com origens
no ponto x e na sua imagem, respectivamente, a aplicação considerada
toma a seguinte forma:

 y1 = x1
 


 y2 = x2

 y = x1 

 1  ......
y2 = x2
(1) se m ≥ n, ou ym = xm se m ≤ n,

 ...... 

 y =x 
 ym+1 = 0
n n 


 ......
yn = 0

As aplicações deste tipo são designadas por submersões e imersões,


respectivamente. Uma aplicação que seja, simultaneamente, uma imer-
são e uma submersão, num dado ponto, chama-se difeomorfismo local.

Considere-se que a nossa aplicação é uma função diferenciável, mais


concretamente consideremos que é a função potencial de um determi-
nado sistema mecânico que cresce infinitamente (Fig. 5). Se o sistema é
dissipativo então, na natureza a sua posição estacionária normalmente
tende para algum ponto onde o potencial é um mı́nimo local. Mas cada
mı́nimo é um valor crı́tico da função potencial.

E - energia total

m m

E = U (x)

O x
estados estáveis do sistema

Figura 5. Gráfico do potencial no plano posição-energia.


TEORIA DAS SINGULARIDADES 5

No inı́cio do desenvolvimento da teoria de singularidades Whitney


investigou singularidades tı́picas de aplicações definidas entre varieda-
des de dimensão dois. Ele mostrou que, num sistema de coordenadas
locais adequado, as singularidades tomam nas vizinhanças da origem
uma das seguintes três formas:
  
y1 = x1 y1 = x1 y1 = x1
, ou , ou ainda
y2 = x2 y2 = x22 y2 = x32 + x1 x2
(Fig. 6a a 6c, respectivamente).

x2 x2

x2 x1 x1 x1
O O O

y1 = x1 , y2 = x2 y1 = x1 , y2 = x22 y1 = x1 , y2 = x32 + x2 x1
y2 y1 y2 y1 y2 y1
O O

(a) (b) (c)

Figura 6. Classificação de Whitney.

Estas singularidades podem ser observadas ao investigar o contorno


visı́vel de duas montanhas (Fig. 7a). Cada ponto desse contorno é um
ponto crı́tico da aplicação definida na superfı́cie da montanha e com
imagem no plano.

(a) (b)

Figura 7. Duas montanhas e o reconhecimento de imagem.

O contormo visı́vel desempenha um papel importante na teoria do


reconhecimento de imagem (Fig. 7b).

Para traçar o contormo visı́vel é necessário resolver um problema


de extremos: encontrar a altitude máxima em cada direcção. Neste
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problema, a altitude é a função objectivo (de duas variáveis) e a di-


recção (azimute) é o parâmetro. Exemplos mais genéricos deste tipo
de problema têm a forma de um problema de extremos diferenciável
com restrições; isto é, o problema é do tipo:
Encontrar o mı́nimo (ou o máximo) de f (x) quando g(x) = a,
onde x, a satisfazem a restrição natural dim x ≥ dim a. O gráfico da
solução do problema pertence ao conjunto dos valores crı́ticos do par
de aplicações (f, g) (Fig. 8).

ra T
eratu
temp

altura H
O H

imagem de (H, T )
superficie montanhosa

Figura 8. Problema diferenciável de extremo e gráfico


da sua solução.

Esta observação implica a conhecida regra dos multiplicadores de


Lagrange:
Corolário 1.1. Se um ponto P é a solução de um problema de extremo
diferenciável com restrições:
f (x) −→ min(max) quando g(x) = a
onde dim x ≥ dim a, então existem multiplicadores (de Lagrange) λ0 , λ
tais que pelo menos um deles é diferente de zero e
λ0 df (P ) + λdg(P ) = 0.
Demonstração. Seja n = dim x. Se dim a também é n então facilmente
se verifica que o corolário é verdadeiro uma vez que num espaço de
dimensão n quaisquer n+1 vectores são linearmente dependentes. Seja
n > dim a e seja o ponto P solução do nosso problema. Considere-se o
par de aplicações f e g tais que
x → (t = f (x), a = g(x)).
Suponhamos que λ0 e λ não existem; então o ponto P não é ponto
crı́tico para esta aplicação. Desta forma, e porque n > dim a, o par
de aplicações é uma submersão na vizinhança deste ponto. Conse-
quentemente, o ponto (f (P ), g(P )) é um ponto interior da imagem da
aplicação (f, g). Por este motivo o ponto P não pode ser solução do
nosso problema.
TEORIA DAS SINGULARIDADES 7

Assim, o ponto P deverá ser ponto crı́tico da aplicação (f, g), o que
implica que existe λ0 , λ que verificam as condições do corolário.
1.3. Relações de equivalência. Relação de equivalência é uma rela-
ção binária “∼” entre dois objectos (habitualmente esses objectos são
da mesma natureza) que satisfaz as seguintes três condições:
1. para qualquer objecto X verifica-se que X ∼ X (reflexividade);
2. se X ∼ Y então Y ∼ X (simetria);
3. se X ∼ Y e Y ∼ Z então X ∼ Z (transitividade).
Dois objectos dizem-se equivalentes, com respeito a uma relação de
equivalência, se esses objectos satisfazem essa relação de equivalência.
O conjunto de todos os objectos equivalentes constitui uma classe que
se designa por classe de equivalência. Qualquer objecto de uma classe
de equivalência é seu representante.
Exemplo 2. As seguintes relações binárias são relações de equivalência
como facilmente se verifica.
• Relação de equivalência qualitativa: dois objectos são equivalentes
se eles possuem a mesma caracterı́stica qualitativa A. Por exem-
plo, dois corpos são equivalentes se a parte inteira dos seus pesos
(em kg) é a mesma.
• Duas variedades diferenciáveis são equivalentes se elas forem difeo-
morficas (diferenciáveis).
• Duas aplicações f e g entre duas variedades diferenciáveis M e N
são equivalentes se existe difeomorfismos h : M → M e k : N → N
tais que g = k ◦ f ◦ h−1 , ou em outras palavras o diagrama
f
M −→ N
(2) h↓ ↓k
g
M −→ N
é comutativo. Esta equivalência é chamada equivalência esquerda-
direita ou LR-equivalência devido ao facto de k actuar à esquerda
de f na formula k ◦ f ◦ h−1 e h actuar à direita (mudança de
coordenadas à esquerda (no espaço das imagens) e à direita (no
espaço das imagens recı́procas), respectivamente).
Definição de Germe
Dois objectos (curvas, conjuntos, aplicações, etc.) definidos na vizi-
nhança de um ponto P da variedade diferenciável M são equivalentes
nesse ponto se coincidirem em alguma vizinhança desse ponto. Para
este tipo de equivalência a classe de equivalência a que o objecto per-
tence é designada por um germe do objecto no ponto P . A cada objecto
desta classe dá-se o nome de representante do germe.
Por exemplo, as funções x e |x| na recta real têm o mesmo germe se
for considerada a parte positiva do eixo. Mas em qualquer outro ponto
fora dessa parte, aquelas funções têm germes diferentes.
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Nota 4. Agora já é possı́vel explicar o que significa afirmar que uma
variedade é localmente construı́da como um espaço aritmético de di-
mensão n. Para definir variedade considera-se um espaço topológico de
Hausdorff, X, possuindo uma base topológica numerável. A colecção
de homeomorfismos definidos entre subconjuntos abertos deste espaço
e subconjuntos abertos de Rn para algum n, define um C k -atlas no
espaço X se:
• o domı́nio destes homeomorfismos cobre todo o espaço X;
• quaisquer que sejam os homeomorfismos h1 e h2 pertencentes a
esta colecção, a composição h2 ◦ h−1 k
1 é ou de classe C ou não está
definida.
Dois C k -atlas são compatı́veis se a sua união é ainda um C k -atlas.
Uma variedade é um espaço X, definido como anteriormente, conjun-
tamente com a classe de equivalência formada por atlas compatı́veis.
Note-se que num espaço X podem ser introduzidas várias classes de
equivalência de atlas compatı́veis.
Nota 5. Um subconjunto de uma variedade diferenciável é designado
por C k subvariedade se o germe deste subconjunto em qualquer ponto
deste subconjunto coincide com o germe na origem de um plano r-
dimensional em C k -coordenadas locais apropriadas com a origem nesse
ponto; r é a dimensão da variedade. A diferença n − r, onde n é a
dimensão da variedade ambiente, é a codimensão dessa subvariedade.
Considere-se qualquer grupo de transformações actuando no espaço
de germes dos objectos que estamos a considerar.
Definição 4. Singularidade local de um objecto num ponto é a órbita
do germe deste objecto nesse ponto sob a acção deste grupo. A forma
normal desta singularidade é qualquer ponto dessa órbita, preferencial-
mente um dos mais simples representantes dessa órbita.
Note que a singularidade é unicamente definida, mas a sua forma
normal pode ter diferentes expressões.
Por exemplo, o grupo de LR-equivalência age no espaço de germes
das aplicações. A forma normal de um germe de uma aplicação de
caracterı́stica máxima é uma imersão ou uma submersão, com formas
normais (1).
O primeiro objectivo do curso é aprender a encontrar formas normais
para singularidades de funções diferenciáveis nos seus pontos crı́ticos.
No caso de funções de uma variável (para potenciais na recta) isso pode
ser feito directamente com base no lema de Hadamard:
Lema de Hadamard. Se uma função f de classe C k , k ≥ 1, em Rn
tem o valor zero num determinado ponto então, numa vizinhança desse
ponto, essa função pode ser escrita na forma
f (x) = x1 f1 (x) + x2 f2 (x) + · · · + xn fn (x)
TEORIA DAS SINGULARIDADES 9

onde todas as funções fi são de classe C k−1 , em qualquer sistema de


coordenadas diferenciáveis x1 , x2 , . . . xn com origem neste ponto.
Demonstração. Seja x1 , x2 , . . . xn qualquer sistema de coordenadas dife-
renciável com a origem no ponto que se está a considerar. Tomemos,
neste sistema de coordenadas, uma pequena bola centrada na origem
e considere-se um ponto x pertencente a esta bola.
Assim temos
1 1

n
n 1
d ∂f ∂f
f (x) = f (tx)dt = (tx)xi dt = xi (tx)dt
dt i=1
∂xi i=1
∂xi
0 0 0

1 ∂f
Todas as funções fi , fi (x) = ∂xi
(tx)dt, estão bem definidas na bola
0
k−1
considerada e são de classe C .
Corolário 1.2. Se uma função f da classe C k , k ≥ 1, em Rn está
definida na vizinhança de um ponto P ∈ Rn e, nesse ponto, todas as
suas derivadas até à ordem r, r < k, são nulas, então, na vizinhança
desse ponto, a função pode ser escrita na forma:

f (x) = xα fα (x)
|α|=r+1

onde α = (α1 , α2 , . . . , αn ) é o vector de inteiros não negativos, |α| é


a soma desses inteiros. Todas as funções fα , em qualquer sistema de
coordenadas diferenciável x1 , x2 , . . . , xn com origem nesse ponto, são
de classe C k−r−1 , e xα = xα1 1 xα2 2 . . . xαnn
A demonstração deste corolário é baseado no lema de Hadamard e
no princı́pio da indução matemática.
Vamos fazer uso do corolário a fim de obter localmente a forma
normal da função diferenciável, definida na recta real, na vizinhança do
ponto crı́tico P a menos de uma R-equivalência. Se no ponto P todas
as derivadas de ordem r da nossa função forem nulas e f (r+1) (P ) = 0
então, pelo corolário, na vizinhança do ponto P temos
f (x) − f (P ) = xr+1 fr+1 (x),
onde fr+1 é uma função diferenciável, em qualquer sistema de coorde-
nadas com a origem nesse ponto; por outro lado fr+1 (P ) = 0 porque
por hipotese f (r+1) (P ) = 0. Tomando,
 na vizinhança da origem, novas
coordenadas diferenciáveis: x̃ = x |fr+1 (x)| reduz-se a nossa função à
forma:
f (x̃) = f (P ) + x̃r+1 signfr+1 (O).
Portanto uma função diferenciável de uma só variável com uma ex-
pansão em série de Taylor diferente de zero, na vizinhança do seu ponto
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crı́tico com valor crı́tico zero toma uma das seguintes três formas nor-
mais:
ou x2s+1 quando r = 2s, ou ± x2s quando r = 2s − 1.
depois de uma adequada mudança de variável.
Agora é fácil verificar que o ponto crı́tico que se considera não fornece
nenhum extremo local da função no 1o sub caso, mas no 2o caso já se
verifica a existência de um extremo local (Fig. 9)

y y y

x 2s

x 2s+1
y=
x
=

y=
y

O x O x O x
−x 2s
y=

(a) (b) (c)

Figura 9. Formas normais de funções na vizinhança do


ponto crı́tico.

Definição 5. Um ponto crı́tico de uma função é designado não degene-


rado se a diferencial de segunda ordem, nesse ponto, é não degenerada.
Em coordenadas locais significa que a matriz Hessiana da função, nesse
ponto, tem caracterı́stica máxima.

2. Espaço dos Jactos e sua Topologia


Nesta secção introduzimos a noção de “proximidade” no espaço das
aplicações entre variedades.
2.1. Espaço das funções: a sua topologia fraca e fina. Começa-
mos esta secção com um simples exemplo, que ilustra a importância
do controlo das derivadas na natureza (os especialistas na condução
indicam que o controlo correcto da velocidade e da aceleração implica
a economia de combustı́vel até pelo menos metade). Seguidamente
vamos analisar um exemplo.
Exemplo 3. Considere-se o seguinte sistema mecânico cuja função po-
tencial é definida por U (x) = x2 e x ∈ R. O potencial tem apenas um
mı́nimo em x = 0 que corresponde ao único estado estacionário estável
do sistema.
Consideremos perturbações do potencial e a respectiva transformação
dos estados estacionários estáveis do sistema.
Se controlarmos apenas a variação dos valores do potencial então,
na vizinhança da função potencial existe uma nova função potencial,
diferenciável, com muitos pontos crı́ticos não degenerados nos quais,
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localmente, o potencial é mı́nimo (Fig. 10a). Estes novos estados


podem estar tão longe da origem quanto se queira e, cada um deles é
um estado estacionário estável do sistema.
Se existir possibilidade de controlar tanto o valor da função potencial
como a derivada da mesma, então pequenas perturbações dessa função
apenas originam pontos crı́ticos na vizinhança da origem e, portanto,
pode-se obter muitos mı́nimos locais em torno da origem (Fig. 10b).
Devido a tal facto todos os estados estacionários estáveis do sistema,
também, estão localizados na vizinhança da origem e existe pelo menos
um estado estacionário estável.

U
x2

x
U=


Ũ 
O x

2x
y=
O x

O x

Ũ 

Ũ 

O x O x Ũ  = 2

O x

(a) (b) (c)

Figura 10. Mı́nimos locais de perturbações de funções potencial.

Agora vamos considerar que é possı́vel controlar o valor do potencial e


as duas primeiras derivadas da função potencial, então qualquer função
potencial, suficientemente perto da função potencial inicial, tem apenas
um ponto crı́tico e este ponto é um mı́nimo local (global) da função
potencial (o estado estacionário estável do sistema) e está localizado
na vizinhança da origem (Fig. 10c).
Sendo possı́vel controlar as derivadas seguintes, também o fenómeno
observado vai ser o mesmo.
No espaço C k (Rm , R) (ou C k (U, R) onde U é um conjunto aberto de
m
R ) usualmente introduz-se uma topologia fraca ou forte, designada
por C r -topologia, r ≤ k. Um conceito importante que é necessário ex-
plicar é o conceito de vizinhança de um ponto f do espaço considerado
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nestas duas topologias. Para explicar este conceito fixemos quaisquer


coordenadas no espaço das imagens e das pré-imagens. Então, para:
i. qualquer subconjunto K do domı́nio (=Rm ) das funções em es-
tudo,
ii. qualquer função  positiva e contı́nua, definida nesse domı́nio
defina-se o conjunto V (f, K, ) das funções g cujas derivadas satisfazem
a desigualdade
∂ |α| (g − f )
| (P )| < (P ).
∂xα
para qualquer ı́ndice α, |α| ≤ r em qualquer ponto P do conjunto K.
Na topologia C r o conjunto aberto é uma união infinita ou uma
intersecção finita de conjuntos do tipo V (f, K, ). O conjunto K tem
que ser compacto, no caso da topologia fraca, e precisa coincidir com
todo o domı́nio Rm (ou com o conjunto U ) no caso da topologia forte
(ou fina). A topologia forte ou fina também é designada por topologia
de Whitney.
Com o objectivo de introduzir este tipo de topologias no espaço das
aplicações C k entre variedades é necessário uma noção adicional: con-
tacto de aplicações diferenciáveis.

2.2. Relações de Equivalência: contacto num ponto.

Definição 6. Duas aplicações, f e g, da classe C r , definidas de Rm


em Rn têm, no ponto x, contacto da ordem k, k ≤ r, se
|f (x̃) − g(x̃)|
−→ 0 quando x̃ → x,
|x̃ − x|k

onde |.| é a norma usual no espaço Euclideano.

A noção de contacto é uma noção local e, por isso, pode ser definida
para aplicações entre variedades diferenciáveis.

Lema 2.1. Contacto de ordem r, no ponto x, é uma relação de equi-


valência.

Demonstração. É óbvio que a propriedade de reflexividade é verificada,


pois: |f (x̃) − f (x̃)| ≡ 0.
Também é óbvio que a propriedade da simetria se verifica visto que:
|f (x̃) − g(x̃)| ≡ |g(x̃) − f (x̃)|.
Finalmente vamos provar que a propriedade da transitividade se ver-
ifica: Sejam as funções f, g, s para as quais se verifica
|f (x̃) − g(x̃)| |g(x̃) − s(x̃)|
−→ 0 e −→ 0 quando x̃ → x.
|x̃ − x|k |x̃ − x|k
TEORIA DAS SINGULARIDADES 13

Fazendo o uso da desigualdade triangular obtem-se:


|f (x̃) − s(x̃)| |f (x̃) − g(x̃) + g(x̃) − s(x̃)|
0≤ = ≤
|x̃ − x|k |x̃ − x|k
|f (x̃) − g(x̃)| |g(x̃) − s(x̃)|
≤ +
|x̃ − x|k |x̃ − x|k
Mas, por hipotese, os dois termos na parte direita da desigualdade
tendem para zero quando x̃ → x. Portanto, a propriedade da transi-
tividade é válida.
Definição 7. Uma classe de equivalência da relação de contacto de
ordem k, num ponto, é designada por jacto de ordem k nesse ponto.
O jacto de ordem k num ponto x que é definido pela aplicação f é
denotado por j k f (x).
Lema 2.2. Duas aplicações diferenciáveis têm o mesmo jacto de or-
dem k num ponto sse as derivadas destas funções, em coordenadas
locais, no espaço são iguais até à ordem k, inclusive.
Demonstração. A primeira afirmação segue-se trivialmente da segunda,
usando o lema de Hadamard.
Para demonstrar a implicação no sentido inverso (⇒) vamos assumir
o contrário, isto é, que:
“Duas aplicações têm o mesmo jacto de ordem k num ponto, mas
algumas das suas derivadas de ordem inferior a k + 1, nesse ponto, são
diferentes”.
Denotemos por l a menor das ordens das derivadas que verificam
a condição anterior e tomemos os mesmos componentes das nossas
funções que têm derivadas de ordem l diferentes.
Sem perda de generalidade podemos assumir que o ponto que es-
tamos a considerar é a origem. Pelo lema de Hadamard a diferença
entre os componentes considerados, f , pode ser escrita, na vizinhança
da origem, na forma:

f (x) = xα fα (x)
|α|=l

onde todas as fα são funções contı́nuas, e pelo menos uma delas não
se anula na origem, uma vez que os componentes escolhidos têm pelo
menos uma derivada de ordem l diferente, no ponto considerado.
Restingindo a função f a uma linha x = tv (para qualquer vector v
e t suficientemente pequeno) temos:

f (tv) = tl v α fα (tv).
|α|=l

Para t = 0 a soma no lado direito da equação anterior é um polinómio


homogéneo de ordem l com respeito a v. Este polinómio tem pelo menos
um coeficiente diferente de zero, uma vez que pelo menos uma fα não se
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anula na origem. Por isso, para t = 0 o valor do polinómio é diferente


de zero para algum vector v0 não nulo. O que implica, para x = tv0 ,
que:
α α
|tl | v0 fα (tv0 )| | v0 fα (tv0 )|
|f (tv0 )| |α|=l l−k |α|=l
= = |t| .
|tv0 |k |t|k |v0 |k |v0 |k
O lado direito da última expressão

não tende para zero quando t → 0
| v0α fα (tv0 )|
|α|=l
porque l ≤ k e a fracção |v0 |k
é diferente de zero quando t = 0.
Mas, por definição de contacto de ordem k, num ponto, o seu limite
tem que ser zero. Assim, temos uma contradição. Isto significa que o
lema é válido.
Nota 6. O último lema implica que para uma função analı́tica f o seu
jacto infinito num ponto (= j ∞ f (.)) define completamente o germe
dessa função no ponto. Isso não é sempre verdade para uma função
diferenciável. Duas funções na linha real, f ≡ 0, e g zero para x = 0 e
e−1/x quando x = 0, têm na origem contacto de ordem infinita mas as
2

duas funções são diferentes em todos os pontos excepto a origem (Fig.


11)!
y
y=1

y = e−1/x
2

y=0
O x

Figura 11. O jacto infinito de uma função diferenciável


não define o germe.
O espaço dos k-jactos de aplicações diferenciáveis entre duas varie-
dades M , N é designado por J k (M, N ). É uma variedade diferenciável
porque em coordenadas locais qualquer ponto j k f (x) deste espaço tem
coordenadas naturais definidas pelas coordenadas x na variedade M e
todas as derivadas de f nesse ponto até ordem k :
∂f ∂kf
(x), 1 ≤ i ≤ m; . . . ;
x1 , x2 , . . . , xm ; f (x); (x) com |α| ≤ k.
∂xi ∂xα
Por exemplo, o espaço dos k-jactos de funções na linha é uma varie-
dade (k + 2)-dimensional.
Devido à fórmula para a derivada da função composta, qualquer
mudança diferenciável de coordenadas locais na variedade implica uma
mudança diferenciável de coordenadas locais no espaço dos jactos. Para
o espaço dos 1-jacto esta aplicação é:
(x, f (x), f  (x)) → (y, f (φ(y)), f  (φ(y))φy (y))
TEORIA DAS SINGULARIDADES 15

se x = φ(y) e y é uma nova coordenada no espaço pré-imagem.


O desenvolvimento de Taylor de f num ponto x até ordem k define
j r f (x) para qualquer r, r < k. Portanto existe uma projecção natural
do espaço dos jactos de ordem superior para o espaço dos jactos de
ordem inferior. Isso dá a cadeia de projecções:

J 0 (M, N ) ← J 1 (M, N ) ← J 2 (M, N ) ← . . .

É claro que o espaço dos 0-jactos é simplesmente M × N e que há duas


projecções naturais dele em cada factor

M ←− J 0 (M, N ) = M × N → N.

2.3. Espaço das aplicações: suas topologias fraca e forte. Agora


vamos introduzir as topologias fraca e forte (fina) no espaço das apli-
cações diferenciáveis entre as variedades diferenciáveis M e N .
O espaço dos jactos J r (M, N ) é uma variedade diferenciável com a
topologia induzida de uma forma natural pela estrutura diferenciável
M e N . Existe uma distância ρ que define esta topologia e, conse-
quentemente, dá-nos a possibilidade de descrever as vizinhanças na C r -
topologia no espaço C k (M, N ), k ≥ r, praticamente da mesma forma
que são descritas no espaço das funções.
As vizinhanças de um ponto f do espaço C k (M, N ), k ≥ r, são
definidas da seguinte forma.

Definição 8. Para qualquer subconjunto K do domı́nio das nossas


funções e para qualquer função contı́nua e positiva  definida neste
domı́nio definimos o conjunto V (f, K, ) das funções g que satisfazem
a desigualdade:
ρ(j r f (P ), j r g(P )) < (P ).
para cada ponto P do conjunto K. Da mesma forma, nas C r -topologias
o conjunto aberto é uma união infinita ou uma intersecção finita de
conjuntos do tipo V (f, K, ), mas o conjunto K é um compacto na
variante fraca enquanto que na variante forte é a própria variedade M .

É de notar que numa variedade compacta as topologias fraca e forte


(ou fina) são a mesma coisa.

Nota 7. A aplicação j k f : x → j k f (x), x ∈ M é designada pela ex-


tensão ao jacto de ordem k da aplicação f . A base da C r -topologia forte
(ou fina) em C k (M, N ), k ≥ r, também pode ser definida da seguinte
forma:

Definição 9. Para um subconjunto aberto U no espaço dos jactos


J r (M, N ) o conjunto base B(U ) inclui todas as aplicações com a ex-
tensão ao jacto de ordem r que têm imagem em U .
16 ALEXEI DAVYDOV

A colecção de todos estes tipos de conjuntos também define a C r


topologia forte como é fácil verificar. Esta definição permite intro-
duzir uma topologia diferenciável forte no espaço das aplicações dife-
renciáveis. Nomeadamente, se Wr é a colecção de todos os subconjun-
tos abertos em C ∞ (M, N ), então a base da C ∞ -topologia é a união de
todos os Wr com todos os r não negativos (note-se que Wr ⊂ Wr+s
para qualquer s ≥ 1 devido à continuidade de projecção canónica
J r+s (M, N ) → J r (M, N ) a qual “esquece” as derivadas de ordem maior
que r).
Vamos agora mostrar que a topologia fina é realmente forte.
Proposição 2.3. Uma sucessão de aplicações {fn }∞ n=1 de classe C
k

converge na C r -topologia fina, r ≤ k, se e só se existir um compacto no


espaço das pré-imagens e ı́ndice n0 tais que neste compacto a sucessão
{j r fn }∞
n=1 converge uniformemente para a extensão ao jacto de ordem
r de alguma aplicação f de classe C k , e fora do compacto, qualquer
função fn com n ≥ n0 coincide esta função limite f.
Demonstração. Para um espaço de pré-imagens que seja compacto a
afirmação é trivial. Portanto, basta considerar o caso em que o espaço
das pré-imagens não seja compacto.
É também evidente que a existência de um compacto K e um indı́ce
n0 proporciona a convergência na C r -topologia. Para provar a neces-
sidade é suficiente mostrar que se tal não existir então a sequência não
converge. As seguintes afirmações são úteis.
Lema 2.4. Numa variedade existe uma sucessão de subconjuntos com-
pactos tais que qualquer compacto precedente pertence ao interior do
próximo e a própria variedade é a união de todos estes compactos.
Lema 2.5. Para um subconjunto compacto de uma variedade e para
qualquer vizinhança desse compacto existe uma função diferenciável
não-negativa que tem os valores entre zero e um e mais o valor um em
cada ponto deste compacto e zero fora dessa vizinhança.
Vamos usar os lemas para provar a necessidade na proposição 2.3 e
depois provaremos os lemas.
Denotemos para f o limite da nossa sucessão. Trata-se de uma
aplicação C r porque, em qualquer compacto, a convergência na topolo-
gia C r é uniforme para extensões a jactos de ordem r.
Vamos assumir o contrário: para qualquer compacto não existe o
ı́ndice procurado. Com base neste pressuposto mostramos que existe
uma subsucessão de funções {fij }, uma sequência de pontos {xij } e,
também, uma função positiva e contı́nua, , no espaço das pré-imagens
tais que ρ(j r fij (xij ), j r f (xij )) ≥ (xij ), onde ρ é uma métrica com-
patı́vel com a topologia em J r (M, N ). Mas isto vai contradizer a con-
vergência da nossa sucessão, logo, implicar a proposição (Fig. 12).
TEORIA DAS SINGULARIDADES 17

Esta parte da demonstração é baseada no princı́pio da indução ma-


temática. Tomemos a sucessão {Ki }∞ i=1 de compactos que satisfazem o
lema 2.4.
Assumir o contrário, implica que existem ı́ndices i1 e um ponto x1
tal que
ρ(j r fi1 (x1 ), j r f (x1 )) > 0.
Denotemos o valor da última distância por a1 . Seja s1 o menor ı́ndice
tal que o compacto Ks1 contém o ponto x1 e 1 é a função constante
com valor a1 . Este é o primeiro passo da indução.

J r (M, N ) j r fi1 (M )
a1
j r f (M )
al+1 al j r fil (M )

j r fil+1 (M )

xl+1 x1 xl
M
Ks1 Ks l
Ksl +1 Ksl+1

Figura 12. A topologia fina é realmente forte.

No segundo passo, vamos assumir que já encontramos pontos x1 ,


x2 , . . . , xl , aplicações fi1 , fi2 , . . . , fil com i1 < i2 < · · · < il , um com-
pacto Ksl contendo estes pontos e uma função positiva l tais que:

ρ(j r fij (xij ), j r f (xij )) ≥ l (xij ) ∀j, 1 ≤ j ≤ l.


No 3o passo da indução é necessário construir tais objectos para o valor
do ı́ndice igual a l + 1.
Devido ao facto de termos assumido o contrário, para o compacto
Ksl +1 não existe qualquer ı́ndice a partir do qual todas as aplicações
na nossa sucessão coincidam fora deste compacto. Portanto existe uma
aplicação fil+1 , com ı́ndice il+1 > il , diferente da aplicação limite em
algum ponto xil+1 situado fora do compacto Ksl +1 . Seja Ksl+1 o primeiro
compacto da nossa sucessão que contém o ponto xil+1 . Denotemos por
al+1 = ρ(j r fil+1 (xil+1 ), j r f (xil+1 )) e tomemos uma função φ, diferen-
ciável não negativa que satisfaz as condições do Lema 2.5, isto é, forma
o valor 1 no compacto Ksl e o valor nulo fora do compacto Ksl +1 e mais
com valores enter zero e um. A função, l+1 diferenciável e positiva é
definida da seguinte forma:

l+1 (x) = φ(x)l (x) + (1 − φ(x))al+1 .


É de notar que esta função é positiva e mais l+1 ≡ l no compacto Ksl .
18 ALEXEI DAVYDOV

Assim, existem pontos x1 , x2 , . . . , xl , xl+1 , aplicações fi1 , fi2 , . . . , fil ,


fil+1 com i1 < i2 < · · · < il < il+1 , um compacto Ksl+1 contendo estes
pontos e uma função positiva l+1 tais que:

ρ(j r fij (xij ), j r f (xij )) ≥ l+1 (xij ) ∀j, 1 ≤ j ≤ l + 1.


Aplicando o prı́ncipio da indução matemática deduzimos que fora da
vizinhança da nossa aplicação limite f que é definida pela função ∞ ,
existe uma subsucessão {fij }∞j=1 de aplicações da nossa sucessão. Este
facto contradiz a convergência desta sucessão para esta aplicação f .
Desta forma a nossa suposição não é válida ⇒ a proposição 2.3 é ver-
dadeira.
Agora vamos provar os lemas.
Demonstração do lema 2.4. Uma variedade tem base numerável da to-
pologia porque, de acordo com a definição, ela é um espaço topológico
de Hansdorff satisfazendo o segundo axioma de numerabilidade. Con-
sideremos elementos desta base que têm fecho compacto.
Em primeiro lugar é possı́vel enumerá-los U1 , U2 , . . . , Ul , . . . dado
que eles satisfazem a condição de numerabilidade. Em segundo lugar,
a união destes elementos cobre a variedade porque cada ponto da va-
riedade tem uma destas vizinhanças.
Definamos agora o compacto K1 como o fecho de U1 e, indutiva-
mente, o compacto Ki+1 como o fecho da união U1 , U2 , . . . , Ur do menor
número posı́vel de elementos que cobre o compacto Ki . De acordo com
a construção utilizada a cadeia K1 , K2 , . . . , Kl , . . . satisfaz a condição
do lema.
Demonstração do lema 2.5. Para provar o lema consideremos que a
nossa variedade é coberta por dois compactos: U1 e U2 que são a viz-
inhança e o complementar do compacto considerado, respectivamente.
Tomemos uma partição diferenciável da unidade subordinada à cober-
tura da variedade referida anteriormente. Definimos a função φ como
a soma dos funções dessa partição que têm suportes em U1 . A função
φ é diferenciável com os valores entre zero e um, e mais é igual a 1 no
nosso compacto e zero fora da sua vizinhança. Portanto, satisfaz as
condições do lema.
Nota 8. Uma partição diferenciável da unidade é uma colecção de fun-
ções diferenciáveis não negativas {φj } tais que:
• os seus suportes constituem, localmente, uma cobertura finita da
variedade;
• em cada ponto a soma dos valores das funções é igual a 1.
A partição é subordinada a alguma cobertura se, para cada função
da partição, existe um elemento da cobertura que contém o suporte
desta função.
TEORIA DAS SINGULARIDADES 19

Para qualquer cobertura de uma variedade existe uma partição dife-


renciável da unidade que é subordinada a essa cobertura [3].
A proposição 2.3 implica o seguinte corolário:
Corolário 2.6. O conjunto das aplicações próprias é aberto no espaço
das aplicações C k -diferenciáveis na topologia C r fina, r ≤ k.
Demonstração. Vamos assumir o contrário; existe uma função própria
que é ponto de fronteira do conjunto das funções próprias. Conside-
remos a sucessão de aplicações não próprias, mas que convergem para
esse ponto. De acordo com a Proposição 2.3 existe um compacto e
um ı́ndice tal que todas as aplicações com maior ı́ndice coincidem, fora
do compacto, com a aplicação f . Mas a restrição destas aplicações ao
compacto são aplicações próprias porque elas são contı́nuas. Então, a
partir deste ı́ndice todas as aplicações da nossa sucessão são próprias
o que contradiz a nossa suposição. Consequentemente, o corolário é
verdadeiro.
2.4. Algumas aplicações contı́nuas em topologias fortes. Nesta
secção vamos mostrar que algumas aplicações úteis são contı́nuas na
topologia forte.
Proposição 2.7. Para variedades diferenciáveis M , N a aplicação ex-
tensão ao jacto de ordem k
j k : f → j k f entre C ∞ (M, N ) e C ∞ (M, J k (M, N ))
é contı́nua nas topologias C k+s e C s finas, respectivamente, para qual-
quer inteiro não negativo s, e consequentemente nas C ∞ -topologias for-
tes (finas).
Esta proposição implica imediatamente que:
Corolário 2.8. Se a imagem de um conjunto fechado, sob a acção da
extensão ao jacto de ordem k de uma aplicação diferenciável, não tem
intersecções com algum subconjunto fechado do espaço dos jactos, então
essa imagem para qualquer aplicação, suficientemente próxima da ini-
cial, na topologia forte diferenciável (ou em qualquer C k+s -topologia
forte, s ≥ 0, ) também não intersecta esse subconjunto fechado.
Corolário 2.9. O conjunto das imersões (submersões) é aberto no
espaço das aplicações diferenciáveis na C 1 -topologia forte.
Corolário 2.10. O conjunto das funções apenas com pontos crı́ticos
não degenerados é aberto no espaço das funções de classe C 2 na C 2 -
topologia fina.
Corolário 2.11. O conjunto de campos de vectores que têm apenas
pontos estacionários não degenerados é aberto no espaço dos campos
C 1 na C 1 -topologia fina.
20 ALEXEI DAVYDOV

Demonstração dos corolários. As demonstrações são praticamente as


mesmas; mostraremos somente que o segundo decorre do primeiro:
Se uma função não é submersão ou imersão num ponto, então o 1-
jacto da função nesse ponto pertence ao subconjunto fechado no espaço
dos jactos, definido em coordenadas locais como a intersecção dos nı́veis
zero dos menorores de maior dimensão da matriz jacobiana. De acordo
com o corolário 2.8, o conjunto de funções com extensões do jacto de
ordem 1 que não tem intersecção com este conjunto é aberto.
Nota 9. Mas em todos estes corolários necessitamos de ter um controle
cuidado dos objectos no infinito no espaço das pré-imagens.
Por exemplo, o campo de vectores v(x) = e−|x| sin x (isto é um campo
C 1 ) definido na recta real tem apenas pontos estacionários não dege-
nerados. Mas os valores próprios associados à sua linearização nesses
pontos tende, exponencialmente, para zero à medida que o ponto se
aproxima do infinito. Assim, para preservar a não degenerescência
dos pontos estacionários necessitamos considerar vizinhanças do nosso
campo definidas por funções, , exponencialmente decrescentes na recta
real (se no espaço tridimensional das variáveis x, v, v  a função distância
é a Euclideana.)
Demonstração da Proposição 2.7. Podemos dizer, de uma forma muito
simples, que proposição afirma que o jacto de ordem s da extensão ao
jacto de ordem k de uma aplicação diferenciável depende continua-
mente da aplicação (e isto é óbvio). Para provar isto consideramos
um subconjunto aberto U pertencente a J s (M, J k (M, N )). É sufi-
ciente mostrar que para a base respectiva B(U ) - conjunto aberto -
em C ∞ (M, J k (M, N )) o conjunto (j k )−1 (B(U )) é também aberto em
C ∞ (M, N ).
Num ponto o jacto de ordem (k + s) de uma aplicação define o jacto
de ordem s da sua extensão ao jacto de ordem k, como fácilmente se
depreende.
Denotamos por jk,s a seguinte aplicação
jk,s : j k+s f (x) → j s (j k f )(x)
que é, certamente, contı́nua. As aplicações j s ◦ j k e jk,s ◦ j k+s são a
mesma aplicação em C ∞ (M, J s (M, J k (M, N ))) (veja-se a figura 13).
Portanto
(j k )−1 (B(U )) = B((jk,s )−1 (U ))
Mas o conjunto (jk,s )−1 (U ) é aberto pois é a pré-imagem de um aberto
por uma aplicação contı́nua; então, o conjunto B((jk,s )−1 (U )) é aberto
como elemento da base da topologia. Logo, o conjunto (j k )−1 (B(U )) é
também aberto.
Proposição 2.12. Sejam L, M , N variedades diferenciáveis. Para
uma aplicação φ : M → N a aplicação φ∗ : f → φ ◦ f entre C ∞ (L, M )
TEORIA DAS SINGULARIDADES 21

J k+s (M, N ) J s (M, J k (M, N ))


jk,s
j k+s f (x) jk,s ( j k+s f (x))
= j s (j k f )(x)

j k+s f j s (j k f )

x j k f (x)
M jkf
J k (M, N )

Figura 13. Diagrama comutativo com aplicações ex-


tensões de jactos.

e C ∞ (L, N ) é contı́nua em qualquer C k -topologia, e logo contı́nua na


topologia diferenciável fina.
Demonstração. Seja U um subconjunto aberto em J k (L, N ) e seja
B(U ) o respectivo subconjunto em C ∞ (L, N ); por definição de topolo-
gia B(U ) é aberto. Então, é suficiente mostrar que (φ∗ )−1 (B(U )) é um
conjunto aberto.
A aplicação φ induz de forma natural a aplicação diferenciável e
contı́nua:
Φ : j k f (x) → j k (φ ◦ f )(x)
entre os espaços dos jactos J k (L, M ) e J k (L, N ) (veja-se figura 14).
Então a pré-imagem Φ−1 (U ) é um conjunto aberto e o respectivo con-
junto base B(Φ−1 (U )) é aberto em C ∞ (L, M ) de acordo com a definição
de topologia.

J k (L, M ) J k (L, N )
Φ −1 (U ) Φ
U

ϕ∗
B(Φ−1 (U )) = ϕ −1
∗ (B(U ))
B(U )
C ∞ (L, N )

C (L, M )

Figura 14. Continuidade da L-equivalência.

Mas o último conjunto coincide com (φ∗ )−1 (B(U )) como facilmente
se vê. Assim, a aplicação φ∗ é contı́nua em qualquer C k -topologia fina,
e por isso também o é na topologia diferenciável fina.
22 ALEXEI DAVYDOV

Nota 10. A última proposição implica que a L-equivalência é contı́nua


nas topologias fortes. Mas se nesta proposição a aplicação fôr entre
as variedades L e M , então a aplicação φ∗ pode ser contı́nua ou não
dependendo tal facto da√aplicação φ. Por exemplo, para a função di-
ferenciável φ, φ(x) = x/ 1 + x2 , definida na linha real consideremos a
função composição f ◦ φ onde f é uma função diferenciável qualquer
(também definida na recta real). Se a respectiva aplicação φ∗ : f →
f ◦ φ é contı́nua na C k -topologia forte, então a pré-imagem, sob esta
aplicação, de uma vizinhança da função zero
{f | ρ(j k (f ◦ φ), 0) < e−x }
2

definida pela função (x) = e−x tem que ser aberta. Mas qualquer
2

função pertencente a esta pré-imagem tem que ter valor nulo no ponto
x = ±1. Logo não é possivel formar conjuntos abertos. Então a
aplicação φ∗ não é contı́nua nas topologias fortes.
Mas é contı́nua se assumirmos, adicionalmente, que a aplicação φ é
própria, em particular, se esta aplicação é um difeomorfismo. Então a
R-equivalência também é contı́nua nas topologias finas.

3. Transversalidade e Teoremas de Transversalidade


No espaço aritmético 3-dimensional duas linhas rectas não se inter-
sectam e dois hiperplanos tı́picos têm intersecção de dimensão 1. Nesta
secção vamos apresentar algumas generalizações muito distantes destes
factos.

3.1. Noções de transversalidade.


Definição 10. Sejam L, M, N variedades diferenciáveis. Duas aplica-
ções diferenciáveis f : L → N e g : M → N são transversais nos pontos
P ∈ L e Q ∈ M se:
• as imagens f (P ) e g(Q) são diferentes ou
• f (P ) = g(Q) e se verifica a igualdade
(3) f∗ (P )TP L + g∗ (Q)TQ M = TS N,
onde TP L, TQ M, TS N são espaços tangentes, f∗ e g∗ as aplicações
induzidas dos fibrados tangentes, e S = f (P ) = g(Q)
Definição 11. Estas aplicações são transversais nos conjuntos A ⊂ L
e B ⊂ M se são transversais para qualquer par de pontos P ∈ A e
Q ∈ B.
Definição 12. As aplicações f e g são transversais se a transversali-
dade toma lugar para A = L e B = M.
A notação utilizada para as definições acima são: f P,Q g, f A,B g,
f  g, respectivamente.
TEORIA DAS SINGULARIDADES 23

Exemplo 4. Sejam L, M linhas reais com coordenadas u e v, respec-


2
tivamente, e seja N o plano real Rx,y . Considere a aplicação induzida

pelo mergulho do eixo dos xx neste plano, e a aplicação definida pelas
fórmulas: x = v e y = v 2 + , onde o parâmetro  pode ser:
a) menor que zero, b) igual a zero ou c) maior que zero
(veja-se a figura 15).

y y y y

)
g (IR
)
g (IR )

g(IR)
g (IR

O L O L O L O L
x x x x
g∗ (0)T0 IR = TO Ox
g∗ (±)T±√ IR
(a)  < 0 (b)  = 0 (c)  > 0 (d)

Figura 15. Transversalidade e não transversalidade.

No subcaso (a) as imagens das nossas aplicações não se intersectam


e, portanto, as aplicações são transversais por definição.
No subcaso (b) as aplicações também são transversais, mas as ima-
gens têm dois pontos de intersecção.O primeiro termo da equação (2)
dá o subespaço linear horizontal R(1, 0) em qualquer ponto da imagem.
O segundo termo define o subespaço linear R(1, 2v) no ponto (v, v 2 + )
da imagem. A soma destes dois subespaços dá todo o plano se v = 0.
No subcaso considerado isto é verdadeiro porque para o ponto de in-
tersecção v 2 = − > 0.
Finalmente no caso (c) existe um ponto O que pertence à intersecção
das imagens, mas neste caso o segundo subespaço é também horizontal
uma vez que para este ponto v 2 =  = 0. Logo, a soma destes sub-
espaços coincide com cada um deles e não dá o plano tangente para o
espaço das imagens no ponto de intersecção. Então as aplicações não
são transversais nas origens.
Se a aplicção g é definida por x = 0, y = v 3 então as imagens das
nossas aplicações têm outra vez a origem como ponto de intersecção.
Neste ponto os espaços tangentes das imagens somados dão todo o
plano (veja-se figura 15). Mas as aplicações continuam a não serem
transversais nas pré-imagens deste ponto porque agora o segundo sub-
espaço linear é trivial (= 0-dimensional) como é fácil de ver.

Se na definição de transversalidade uma das variedades pré-imagem,


por exemplo M, é uma C 1 -subvariedade da variedade imagem e a
aplicação é apenas o mergulho induzido g = i : M → N, então
definiremos de maneira análoga a tranversalidade de f a M num ponto,
24 ALEXEI DAVYDOV

a transversalidade de f a M num subconjunto A ⊂ L e a transver-


salidade de f a M (A = L). Sendo a respectiva notação dada por:
f P M, f A M, f  M.
3.2. Corolários de noções de transversalidade. Seja L, M, N va-
riedades diferenciáveis e f, g são aplicações diferenciáveis de L e M,
para N , respectivamente. Algumas afirmações simples e úteis decorrem
da definição de transversalidade.
Corolário 3.1. Seja L uma C 1 -subvariedade de N com codimensão k,
g(Q) ∈ L para algum ponto Q ∈ M e z1 , z2 , . . . , zn são as coordenadas
diferenciáveis locais na vizinhança do ponto g(Q) no qual a subvarie-
dade L é definida pelas equações z1 = z2 = · · · = zk = 0. Então g Q L
se e só se o germe, no ponto Q, da aplicação g̃ : (.) → (g1 , g2 , . . . gk ) é
o germe da submersão ( onde g = (g1 , g2 , . . . gn )).
Demonstração. Em z-coordenadas escolhidas o espaço tangente da sub-
variedade L no ponto g(Q) coincide com o subespaço linear gerado pelos
vectores unitários dos eixos zi com k < i ≤ n (veja-se figura 16). Então,
se a aplicação g̃ é uma submersão no ponto Q, a imagem g∗ (Q)TQ M tem
que conter k vectores que, conjuntamente com os vectores unitários,
fornecem uma base para o espaço tangente Tg(Q) N , e, portanto, g Q
L. Reciprocamente, se g Q L então a imagem g∗ (Q)TQ M tem que
conter tais vectores adicionais, de acordo com isso, a aplicação g̃ tem
caracterı́stica máxima no ponto Q. Logo esta aplicação é submersão no
ponto Q.
z1 , z2 , . . . , zk

z1 , z2 , . . . , zk

g(M )

zk+1 , zk+2 , . . . , zn
L projecção φ(g(Q))
g(Q) = O
φ : z −→ (z1 , z2 , . . . , zk )
(φ◦g)∗ (Q)TQ M

M
Q
)T
(∗ Q
g

Figura 16. Em coordenadas apropriadas: transversal-


idade ⇔ submersão.

Exemplo 5. Consideremos um campo de vectores diferenciável na


recta real. Trata-se da secção g : x → (x, v(x)) do fibrado tangente
para a recta. Os seus pontos estacionários são exactamente a inter-
secção desta secção com a secção zero (v ≡ 0) que é a subvariedade
diferenciável do fibrado tangente da codimensão 1. De acordo com
o corolário 3.1, a secção g é transversal a esta subvariedade no ponto
Q, v(Q) = 0, se e só se a aplicação x → v(x) tem caracterı́stica máxima
TEORIA DAS SINGULARIDADES 25

neste ponto, isto é, v  (Q) = 0. Então, a transversalidade aqui significa


que o ponto estacionário, Q, é não degenerado.
O mesmo é verdadeiro para um campo de vectores numa variedade
de dimensão 1.
Exemplo 6. Consideremos o C 2 -potencial, U , no espaço aritmético
Rxm . Os seus pontos crı́ticos são exactamente aqueles onde U  = 0.
Então, o seu aparecimento corresponde ã intersecção da imagem da
extensão ao jacto de ordem 1 do potencial com a subvariedade diferen-
ciável no espaço dos jactos de ordem 1 definido pela equação U  = 0.
Tendo em conta o corolário 3.1, a extensão ao jacto de ordem 1 do
potencial é transversal a esta subvariedade se e só se a aplicação x →
U  (x) tem caracterı́stica máxima no respectivo ponto. Isto significa
que, em tal ponto, a matriz Hessiana U  é não degenerada. Logo,
aqui a transversalidade significa que o ponto crı́tico do potencial é não
degenerado.
Também se pode dizer o mesmo para um C 2 -potencial numa varie-
dade.
Corolário 3.2. Se para k ≥ 1 as aplicações C k f e g são transversais
então o conjunto S de todos os pontos P ∈ L, Q ∈ M satisfazendo
a igualdade f (P ) = g(Q) é vazio ou uma C k -subvariedade no produto
directo L × M de dimensão dim L + dim M − dim N (de codimensão
dim N ). Em particular, quando dim L + dim M − dim N < 0 este
conjunto é sempre vazio.
Demonstração. Se o conjunto S é vazio o corolário é válido. Seja S = ∅.
Sejam (P, Q) ∈ S e r a caracterı́stica da aplicação f no ponto P. Então,
quaisquer que sejam as coordenadas locais consideradas existem exac-
tamente r componentes desta aplicação com diferenciais linearmente
independentes no ponto P . Podemos, perto deste ponto, tomar estas
componentes como primeiras r componentes das coordenadas locais xi
no espaço das pré-imagens. Assim, depois da reordenação das coorde-
nadas locais no espaço das imagens, a aplicação f , toma a forma
zi = xi , 1 ≤ i ≤ r; zj = fj (x), r < j ≤ n,
onde x1 , x2 , . . . , xl e z1 , z2 , . . . zn são coordenadas locais de classe C k e
C ∞ , respectivamente, no espaço das pré-imagens e espaço das imagens
com origens nos pontos P e f (P ), respectivamente, e todos os fj são
funções C k . Todas as derivadas fj (P ), r < j ≤ n, são nulas pois, a
caracterı́stica de f no ponto Q é igual a r. Então, nestas coordenadas, a
imagem f∗ (P )TP L coincide com o espaço linear gerado pelos primeiros
r vectores unitários.
As aplicações f e g são transversais nos pontos P, Q. Então, a ima-
gem g∗ (Q)TQ M terá de nos dar os n − r vectores básicos do espaço
tangente Tf (P ) N . Portanto, nas coordenadas z escolhidas as últimas
26 ALEXEI DAVYDOV

n−r componentes da aplicação g têm diferenciais linearmente indepen-


dentes no ponto Q. Então, perto deste ponto, elas podem ser tomadas
como as últimas (n − r) coordenadas locais yi de classe C k , com quais-
quer outras coordenadas y1 , . . . , ym−n+r também de classe C k .
Nas coordenadas escolhidas a aplicação g assume a forma
zi = gi (y), 1 ≤ i ≤ r; zj = ym−n+j , r < j ≤ n,
onde todos os gj são funções C k .
Consequentemente, é fácil verificar que o conjunto S é definido, perto
do ponto (P, Q), pelo sistema de n equações

xi − gi (y) = 0, 1 ≤ i ≤ r; ym−n+j − fj (x) = 0, r < j ≤ n.


O lado esquerdo destas equações são funções C k , e as suas diferenciais
no ponto (P, Q) são linearmente independentes: a matriz das derivadas
calculada na origem contém a submatriz n×n, triangular com diagonal
unitária. Donde, pelo teorema da função implı́cita este sistema define,
próximo do ponto (P, Q), uma subvariedade C k de codimensão n ( ou
dimensão dim L + dim M − dim N ).
Nota 11. Se, para além das condições do último corolário, a aplica-
ção f é própria, então a restrição ao conjunto S da projecção natural
do produto directo L × M ao segundo factor (sendo domı́nio de g) é
também uma aplicação própria.
Nota 12. Se a variedade L é uma subvariedade em N e f é o mergulho
induzido então, a subvariedade S é definida naturalmente em M , e
neste caso ou é vazia ou a sua codimensão é igual à codimensão de L
em N .
Exemplo 7. Consideremos um potencial C 2 numa variedade diferen-
ciável M que depende diferenciavelmente do parâmetro λ percorrendo
uma variedade diferenciável Λ. No espaço dos potenciais dos 1-jactos
(como uma função de duas variáveis x ∈ M e λ) o conjunto de jactos
satisfazendo Ux = 0 é uma subvariedade diferenciável de codimensão
m = dim M. Pelo último corolário a transversalidade do potencial da
extensão ao 1-jacto a esta subvariedade implica que os seus pontos
crı́ticos formem uma subvariedade diferenciável de codimensão m (e
então, de dimensão dim Λ) no produto directo M × Λ.
Note-se que aqui transversalidade não significa que um ponto crı́tico
de um potencial tem de ser não degenerado. Por exemplo, o potencial
U (x) = x3 + λx no eixo real, onde a diferenciabilidade depende do
parâmetro real λ, tem uma extensão 1-jacto transversal à subvariedade
Ux = 0 mas para λ = 0 o seu único ponto crı́tico é degenerado (Fig.17).
O conjunto de todos os pontos crı́ticos forma a parábola λ = −3x2 que
é uma subvariedade de codimensão (dimensão) 1 no plano x, λ.
TEORIA DAS SINGULARIDADES 27

U λ

O
λ x

O
x
λ = −3x2

U = x3 + xλ

Figura 17. Pontos crı́ticos do potencial x3 + xλ.

Proposição 3.3. Para uma dada aplicação própria diferenciável g :


M → N o conjunto de todas as aplicações diferenciáveis f : L → N
transversais a g é aberto para a topologia fina C 1 .
Demonstração. É baseada no corolário 2.8. Por este corolário é sufi-
ciente mostrar que no espaço J 1 (L, N ) o conjunto S de jactos que nos
dão a não transversalidade à aplicação própria dada, g, é fechada.
Seja {σi }∞i=1 uma sequência convergente de jactos em S e σ o seu
limite. Precisamos de mostrar que σ ∈ S. Denotemos por Pi , Hi , (P ,
H) as imagens do jacto σi (σ, respectivamente) nas variedades L e N ,
respectivamente, sob as projecções naturais.
Seja fi um qualquer representante do jacto σi . Tomemos qualquer
ponto Qi na pré-imagem do ponto Hi sob a aplicação g tal que as
aplicações fi e g não são transversais nos pontos Pi , Qi . Aqui, a não
transversalidade significa que a caracterı́stica da aplicação linear
 
fi∗ (Pi ) 0
(4)
0 g∗ (Qi )
do plano tangente TPi L × TQi M no plano tangente THi N é menor que
dim N . Obviamente esta caracterı́stica é a mesma para qualquer re-
presentante (=fi ) do jacto σi .
Consideremos uma vizinhança qualquer do ponto H com fecho com-
pacto e pré-imagem deste fecho K sob a aplicação g. K é compacto pois
g é uma aplicação própria. Começando por um qualquer ı́ndice, todos
os pontos Hi pertencem a esta vizinhança, e então todos os pontos
Qi pertencem a este compacto. Pelo teorema de Bolzano-Weierstrass
existe uma subsequência convergente {Qij }∞ j=1 . Sem perda de generali-
dade podemos supor que esta subsequência é precisamente a sequência
{Qi }∞i=1 . Seja Q o seu limite.
Pela dependência contı́nua da aplicação linear (4) do jacto σi e do
ponto Qi a sua caracterı́stica para o jacto σ no ponto Q é também
menor que dim N. Daı́ que o jacto limite σ também pertença a S.
28 ALEXEI DAVYDOV

J 1 (L, N ) σ2 j 1 f2
j 1 f2 (L) σ j 1f L P2
j 1 f1 (L) σi 1 P
j fi
σ1 j 1 f (L)
j 1 fi (L) j 1 f1 Pi
P1
fi f f2
f1

Q1 Q2 Q
g H2
K Qi H1 Hi
H
M

g(M )
N

Figura 18. Conjunto de jactos supondo que a não


transversalidade é fechada.

Nota 13. Na proposição acabada de demonstrar a qualidade de ser


própria da aplicação g é muito importante para a abertura do conjunto
de aplicações f transversais a g. A afirmação não é verdadeira sem esta
suposição.
Por exemplo, consideremos a aplicação g : u → (0, u/(1 + u2 )1/2 ).
Então o mergulho no plano do cı́rculo (x−1)2 +(y−1)2 = 1 é transversal
com g porque as suas imagens não se intersectam. Mas existem per-
turbações delas, tão pequenas quanto queiramos, que não são transver-
sais com g (Fig. 19).

(x − 1)2 + (y − 1)2 = 1 (x − 1)2 + (y − 1 + )2 = 1


1

y
1 O g(IR)

Figura 19. A qualidade de ser própria é muito impor-


tante para a abertura.

3.3. Teoremas de Transversalidade. Os teoremas de transversali-


dade são uma das mais importantes ferramentas na teoria das singu-
laridades. Sejam L, M e N variedades diferenciáveis.
TEORIA DAS SINGULARIDADES 29

Teorema de transversalidade de Bakhtin-Lin. Para qualquer apli-


cação própria diferenciável g : M → N o conjunto de aplicações dife-
renciáveis f : L → N transversais a g é aberto para a topologia fina
C 1 e denso para a topologia fina C ∞ .
Teorema de transversalidade de jactos de Bahtin-Lin. Para qual-
quer aplicação própria diferenciável g : M → J k (L, N ) o conjunto de
aplicações diferenciáveis f : L → N com extensões k-jacto transversais
a g é aberto para a topologia fina C k+1 e denso para a topologia fina
C ∞.
Estas teoremas conduzen-nos às seguintes afirmações.
Corolário 3.4 (Teorema de transversalidade fraca). Para qualquer sub-
variedade C 1 , M em N fechada em N , o conjunto de aplicações dife-
renciáveis f : L → N transversais a M é aberto para topologia fina C 1
e denso para a topologia fina C ∞ .
Corolário 3.5 (Teorema de transversalidade de Thom). Para qualquer
subvariedade C 1 , M , em J k (L, N ), fechada em J k (L, N ), o conjunto
de aplicações diferenciáveis f : L → N de extensões k-jacto transver-
sais a M é aberto para a topologia fina C k+1 e denso para a topologia
fina C ∞ .
Primeiramente demonstremos os corolários recorrendo aos teoremas
de transversalidade de Bahtin-Lin.
Demonstração. O teorema de transversalidade fraca segue imediata-
mente do teorema de transversalidade de Bahtin-Lin onde a aplicação
g é tomada como o mergulho de M em N (que é uma aplicação própria
porque a subvariedade M é fechada em N ). Pelo mesmo argumento o
teorema de transversalidade de jactos de Bahtin-Lin implica o teorema
de transversalidade de Thom.
Nota 14. Os teoremas de transversalidade de Bahtin- Lin e os coro-
lários também são válidos para aplicações C r suficientemente diferen-
ciáveis, mas, neste caso, a densidade é para a topologia C r respectiva-
mente. Note-se que neste espaço o conjunto de aplicações diferenciáveis
é sempre denso [5].
Antes de demonstrarmos os teoremas de transversalidade de Bahtin-
Lin formularemos alguns corolários simples análogos aos Corolários
2.10, 2.11. Ilustraremos a utilidade dos teoremas de transversalidade.
Corolário 3.6. No espaço das funções diferenciáveis o conjunto de
funções apenas com pontos crı́ticos não degenerados é aberto para a
topologia fina C 2 e denso na topologia fina C ∞ .
Corolário 3.7. No espaço dos campos vectoriais diferenciáveis o con-
junto daqueles apenas com pontos crı́ticos não degenerados é aberto na
topologia fina C 1 e denso na topologia fina C ∞ .
30 ALEXEI DAVYDOV

Demonstração. O theorema de transversalidade de jactos de Bakhtin-


Lin implica estos corolários.
O 1-jacto de funçao num ponto crı́tico pertence ao subconjunto M
dos jactos com primeira derivada nula. Este subconjunto é uma sub-
variedade. Pelo theorema de transversalidade de jactos, o conjunto das
funções cuja extensão de 1-jacto é transversal a M é aberto na topolo-
gia fina C 2 e denso na topologia fina C ∞ . Mas aqui, ser transversal
significa que os pontos crı́ticos são não degenerados.
Analogamente, o 0-jacto de um campo vectorial num ponto crı́tico
pertence ao subconjunto M dos jactos com valor nulo de velocidade.
Este subconjunto é uma subvariedade. Pelo theorema de transversali-
dade de jactos, o conjunto dos campos, com extensões 1-jacto transver-
sais a M , é aberto natopologia fina C 1 e denso na topologia fina C ∞ .
Novamente aqui, ser transversal significa que pontos criticos são não
degenerados.

Nota 15. Diz-se que um objecto genérico (=tı́pico) tem alguma pro-
priedade se esta propriedade ocorre para qualquer objecto de um sub-
conjunto denso e aberto no espaço dos objectos na topologia apro-
priada. No nosso caso usaremos normalmente topologias finas diferen-
ciáveis (ou suficientemente diferenciáveis). Por exemplo, pelo Corolário
3.6 uma função diferenciável genérica tem apenas pontos crı́ticos não
degenerados.

3.4. Demonstração do teorema de transversalidade de Bahtin-


Lin.

Demonstração do teorema de Bahtin-Lin. Precisamos apenas de mos-


trar que o conjunto das aplicações transversais é denso no espaço das
aplicações na topologia diferenciável fina, pois devido à Proposição 3.3
verifica-se que esse conjunto é aberto.
As duas afirmações seguintes são muito úteis.

Teorema 3.8. Para variedades L, E, M e aplicação diferenciável F :


L×E → N transversal a uma aplicação própria g : M → N o conjunto
de  ∈ E para os quais a aplicação f : (., ) → F (., ) é transversal a g
é residual em E.

Teorema 3.9. O espaço das aplicações C k com a topologia C r fina,


para 0 ≤ r ≤ k, é um espaço de Baire.

Nota 16. Um subconjunto residual tem de conter uma intersecção nun-


ca maior do que um número contável de subconjuntos densos abertos.
Um espaço topológico diz-se um espaço de Baire se algum dos seus
subconjuntos residuais é denso. Por exemplo, qualquer variedade é um
espaço de Baire. É óbvio que a intersecção de um número contável de
subconjuntos residuais é residual.
TEORIA DAS SINGULARIDADES 31

Pela definição de topologia diferenciável fina é suficiente mostrar a


densidade das aplicações transversais para qualquer topologia fina C k ,
k ≥ 1.
Seja U um conjunto aberto de uma base topológica contável em N
com fecho compacto e pertencente a alguma vizinhança de coordenadas
V e seja K o fecho de algum conjunto do mesmo tipo mas apenas em
L. É suficiente mostrar a densidade do conjunto de todos os mapas f
transversais a g nos compactos K e g −1 (Ū ), respectivamente (o último
conjunto é compacto pelo facto de a aplicação g ser própria e da com-
pacidade do conjunto Ū ).
Na verdade, pela Proposição 3.3 este conjunto é aberto. Conse-
quentemente, tomando a intersecção de todos estes conjuntos sob, não
mais do que um número contável de pares desses compactos, obtemos
o subconjunto de aplicações residuais transversais a g (pois qualquer
variedade é coberta por tais compactos). Mas um subconjunto residual
é sempre denso em C ∞ (L, N ) para qualquer topologia fina, devido ao
Teorema 3.9.
Assim, precisamos de mostrar que existe uma pequena perturbação
para qualquer aplicação f ∈ C ∞ (L, N ) transversal a g nos compactos
K e g −1 (Ū ), respectivamente.
Se a intersecção f (K) ∩ Ū é vazia então não há necessidade de se
provocar qualquer perturbação, já que a aplicação f é, ela mesma,
transversal.
Seja f (K) ∩ Ū não vazia, e consideremos K  = K ∩ f −1 (Ū ). Pela
continuidade da função f existem vizinhanças W, W  do compacto K  ,
tão pequenas quanto queiramos, com fechos compactos e tais que W̄ ⊂
W  e f (W̄  ) ⊂ V . A imagem do compacto W̄  para qualquer aplicação
suficientemente próxima de f pertence à vizinhança de coordenadas V .
Mas, mantendo-nos nesta vizinhança podemos supor estar no domı́nio
do espaço aritmético n-dimensional Rn . Consequentemente, para valo-
res de  ∈ Rn suficientemente pequenos a perturbação

(5) f : x → f (x) + φ(x),

onde a função diferenciável φ é igual a um no compacto W̄ e zero fora do


compacto W̄  , da nossa aplicação inicial, está correctamente definida.
A diferença K \ W é compacta e, pela escolha de W , a sua imagem
sob a aplicação f não tem intersecção com o conjunto Ū . Por con-
seguinte, para valores suficientemente pequenos de , a imagem deste
compacto sob a aplicação f também não intersecta o conjunto Ū . Mas
isto significa que as aplicações f e g são transversais nos compactos
K \ W e g −1 (Ū ). Mais, a aplicação F : (x, ) → f (x) é uma submersão
no ponto (x, ) se x ∈ W̄ e o valor de  é suficientemente pequeno para
que a perturbação esteja bem definida. Mas uma submersão é transver-
sal a qualquer aplicação.
32 ALEXEI DAVYDOV

f −1 (Ū ) Ū

f (K)
 f
K K

V
f (W̄ )

W f (W̄  )
W

Figura 20. Transversalidade nos compactos K e g −1 (Ū )

Assim, existe um número positivo δ tal que, para qualquer valor de


, || ≤ δ, a aplicação F é transversal a g nos compactos (K\W ) ∪ W̄
e g −1 (Ū ), respectivamente. Mas K ⊂ (K\W ) ∪ W̄ . Então para tais
valores de  as aplicações F e g são transversais nos compactos K e
g −1 (Ū ), respectivamente, e portanto, em algumas vizinhanças suficien-
temente pequenas L e M  destes compactos respectivamente.
Pelo Teorema 3.8 o conjunto dos  que nos dão a transversalidade
entre f e g em L e M  , respectivamente, é residual na bola E =
{ | || < δ}. Portanto, existe um  arbitrariamente pequeno capaz de
nos fornecer tal transversalidade, e por conseguinte a transversalidade
entre f e g nos compactos K e g −1 (Ū ), respectivamente.
Mas a nossa perturbação está localizada no compacto W̄  e depende
continuamente do parâmetro . Portanto, numa dada vizinhança de f
a aplicação f pertence a esta vizinhança para um  suficientemente pe-
queno. Daı́ que o conjunto de aplicações transversais a g nos compactos
K e g −1 (Ū ) seja denso.
Assim concluimos a demonstração do Teorema de transversalidade
de Bahtin-Lin.
Nota 17. A demonstração do Teorema de transversalidade de jactos
de Bahtin-Lin pode ser feito da mesma forma. Só precisamos usar a
perturbação  é um polinomio de grau k e vizinhanças de tipo V na
espao̧ de jactos.
O Teorema 3.8 segue do Corolário 3.2 e da afirmação seguinte:
Teorema de Bertini-Sard. Para variedades diferenciáveis M , N e
aplicação g : M → N de classe C r , a medida dos valores crı́ticos desta
aplicação é zero se r > min{0, m − n}. Além disso, o conjunto dos
valores não crı́ticos é residual.
TEORIA DAS SINGULARIDADES 33

Nota 18. A demonstração do teorema de Bertini-Sard está omitida,


ela pode ser vista em [1], [3]. Note-se apenas que quando dim M <
dim N então a imagem da aplicação C 1 , g : M → N , tem medida
zero e não é densa mesmo localmente [5], qualquer conjunto aberto
contem um subconjunto aberto que não a intersecta. Em particular, o
complemento a esta imagem é residual. Portanto, neste caso o teorema
de Bertini-Sard é verdadeiro para a definição de ponto crı́tico como
ponto onde a derivada g∗ da aplicação não é uma submersão (ver [1]).
Demonstração do teorema 3.8. Pelo Corolário 3.2 a transversalidade
entre F e g implica que a equação F (x, ) = g(y) define no espaço
Lx × E × My uma variedade diferenciável S de codimensão dim N. A
restrição τ a esta subvariedade da projecção standard ao factor médio
é uma aplicação diferenciável. Pelo teorema de Bertini-Sard o conjunto
de valores regulares desta restrição é residual. Mas estes são exacta-
mente os valores para os quais as aplicações F (., ) : L → N e g são
transversais.
Na verdade, se algum 0 não pertence à imagem de τ então a inter-
secção F (L, 0 )∩g(M ) é vazia, e verifica-se a transversalidade necessária
pela definição. Para o caso dim S < dim E o conjunto de tal 0 é resi-
dual (ver nota acima).
Consideremos o caso dim S ≥ dim  e um valor regular 0 com pré-
imagem não vazia sob τ. Seja A = (P, 0 , Q) um ponto desta pré-
imagem. Precisamos de mostrar que as aplicações F (., 0 ) e g são
transversais nos pontos P, Q. No ponto A o espaço tangente a L×E×M
é a soma de dois subespaços que são o núcleo da projecção τ e o espaço
tangente a S neste ponto (Fig. 21). Qualquer vector (u, v, w) do último
espaço tem de satisfazer a igualdade
Fx (P, 0 )u + F (P, 0 )v − g  (Q)w = 0

ou

(6) F (P, 0 )v = g  (Q)w − Fx (P, 0 )u


e para qualquer um dos primeiros subespaços a sua segunda compo-
nente é zero. Mas, devido à condição de transversalidade entre F e g
nos pontos (P, 0 ) e Q, o plano tangente Tg(Q) N é a soma dos subes-
paços lineares F∗ (P, 0 )T(P,0 ) (L × E) e g∗ (A)TQ M. Pela equação (6) os
subespaços F∗ (P, 0 )T(P,0 ) (L×0 ) e g∗ (Q)TQ M dão o mesmo resultado.
Mas isso significa que F (., 0 ) e g são transversais nos pontos P e Q.
Isto conclui a demonstração do Teorema 3.8.

Demonstração do teorema 3.9. Para provar o Teorema 3.9 precisamos


de mostrar que qualquer conjunto não vazio V contém um ponto da
intersecção de um número contável de quaisquer subconjuntos abertos
densos {Ui }. Para fazer isso, indutivamente construı́mos a sequência de
34 ALEXEI DAVYDOV

TA S
S
E

Ker
A

Figura 21. O espaço tangente é a soma de dois espaços.

aplicações convergindo na topologia fina C k (e então, na topologia fina


C r ) com limite pertencente a todos estes conjuntos Ui e V .
O conjunto U1 é aberto e denso. Portanto a intersecção V ∩ U1 é
aberta e não vazia. Pela definição da topologia C r , existe um sub-
conjunto aberto W no espaço dos r-jactos tal que o conjunto base
B(W ) = {f |j r f (L) ⊂ W } pertence a esta intersecção e é não vazio.
Consideremos uma qualquer aplicação f1 ∈ B(W ) e uma vizinhança
W1 da imagem j r f1 (L) da sua extensão r-jacto tal que o conjunto
B(W̄1 ) ⊂ V ∩ U1 . Tal vizinhança existe porque pequenas perturbações
da aplicação provocam variações tão pequenas quanto queiramos dos
seus r-jactos.
O conjunto B(W1 ) é aberto pela definição da topologia e é não vazio
porque f1 ∈ B(W1 ). O conjunto U2 é aberto e sempre denso. Conse-
quentemente, a intersecção B(W1 ) ∩ U2 é aberta, não vazia e sempre
densa em B(W1 ). Então existe uma aplicação f2 pertencente a esta
intersecção e satisfazendo a desigualdade
1
(7) ρl (j l fs−1 (x), j l fs (x)) < para todo x ∈ L, 1 ≤ l ≤ s.
2s
onde s = 2 e ρl é uma métrica (completa) no espaço dos l−jactos
compatı́vel com a sua topologia. Do mesmo modo consideremos uma
vizinhança W2 da imagem j r f2 (L) tal que B(W̄2 ) também pertence a
esta intersecção.
Consideremos os conjuntos e aplicações satisfazendo a desigualdade
(7) construı́dos até algum ı́ndice i (Fig. 22). Precisamos de fazer isso
ao ı́ndice i + 1.
Mais uma vez o conjunto B(Wi ) é aberto devido à definição da
topologia e é não vazio porque fi ∈ B(Wi ). O conjunto Ui+1 é aberto e
sempre denso. Consequentemente, a intersecção B(Wi )∩Ui+1 é aberta,
não vazia e sempre densa em B(Wi ). Então existe uma aplicação fi+1
pertencente a esta intersecção e satisfazendo a desigualdade (7) com
s = i + 1. Portanto pela abertura da última intersecção existe uma
TEORIA DAS SINGULARIDADES 35

J r (L, N )
j r f1 (L)
W1
W2
j r f2 (L)
j r fi (L)
Wi

f1 f2 fi f
B(W̄1 ) ⊃ B(W̄2 ) ⊃ ... ⊃ B(W̄i ) ⊃ ...
∩ ∩ ∩
U1 ∩ V U2 ∩ B(W1 ) ... Ui ∩ B(Wi−1 ) ...
C ∞ (L, N )

Figura 22. Sequências de funções e de subconjuntos encerrados.

vizinhança Wi+1 da imagem j r fi+1 (L) tal que o conjunto B(W̄i+1 ) per-
tence a esta intersecção.
Então, indutivamente, obtivemos as sequências de conjuntos e as
sequências de aplicações que satisfazem a desigualdade (7). Esta de-
sigualdade implica a convergência uniforme em L da sequência das
extensões dos l-jactos das nossas aplicações e portanto a existência de
uma aplicação limite f . Esta aplicação limite é de classe C ∞ pois
nas coordenadas locais a convergência das extensões l-jacto é a con-
vergência uniforme de aplicações com todas as derivadas até à ordem
l.
O conjunto B(W̄i ) contém todas as aplicações da nossa sequência
com o maior ı́ndice, e portanto acontece o mesmo à aplicação limite.
Mas este conjunto pertence ao conjunto Ui e ao conjunto V pela con-
strução. Então a aplicação limite pertence à intersecção de todos os Ui
e V.
Isto conclui a prova do Teorema 3.9.

4. Classificações locais de singularidades


Algumas caracterı́sticas e formas normais de singularidades locais
são aqui apresentadas.

4.1. Noções algébricas úteis. A álgebra local de uma singularidade


é uma das suas caracterı́sticas mais importantes. Para a introduzir
recordamos, primeiramente, algumas noções necessárias.
Um semi-grupo é definido com uma operação binária associativa
(que é normalmente denotada por “ · ” ou por “+” com o signifi-
cado de “multiplicação” e “adição”, respectivamente). Um semi-grupo
é abeliano se a sua operação é comutativa. Um, elemento neutro
36 ALEXEI DAVYDOV

(=identidade) é um elemento que preserva os elementos na operação


com eles.
Um monóide é um semi-grupo com elemento neutro. Um grupo é um
monóide tal que cada elemento tem um inverso com respeito à operação
neste monóide.
Um anel associativo é um conjunto com duas operações binárias (=
“+ e “· ) tais que :
• com respeito a uma delas (=+) é um grupo abeliano;
• com respeito à outra (=·) é um semi-grupo, e
• verificam-se as leis de distribuição à direita e à esquerda , nomea-
damente:
a · (b + c) = a · b + a · c, (b + c) · a = b · a + c · a
para qualquer a, b, c do nosso conjunto.
Um anel é comutativo se a sua multiplicação é uma operação comu-
tativa. Um anel diz-se um anel com identidade se o seu semi-grupo
com respeito à segunda operação é um monóide.
Exemplo 8. O conjunto de funções C k numa variedade com a multi-
plicação como operação binária é um semi-grupo abeliano. Este semi-
grupo é também um monóide porque existe a identidade que é a função
constante com valor unitário. Mas este monóide não é um grupo pois
qualquer função que se anule em algum ponto não tem inverso em
relação à operação escolhida.
O mesmo conjunto de funções C k é grupo abeliano se a adição usual
de funções é a operação binária neste conjunto. Nesse caso a identidade
é a função zero (= 0).
Com estas duas operações o conjunto de funções C k forma um anel
comutativo e associativo porque, obviamente, se verificam as leis dis-
tributiva à esquerda e à direita.
Um corpo é um anel associativo e comutativo onde os elementos
não nulos formam um grupo para a multiplicação. Todos os números
racionais (reais, complexos) com as operações adição e multiplicação
usuais são exemplos de corpos.
Uma álgebra associativa é um anel associativo que também é um
espaço vectorial sobre algum corpo fixado e as igualdades
(8) a(f · g) = (af ) · g = f · (ag)
são válidas para todo a deste corpo e todos f, g do anel. Uma álgebra
é comutativa se o anel respectivo também o é.
Um módulo é uma generalização de espaço vectorial sobre um corpo,
quando em vez do corpo é usado um anel.
Exemplo 9. O conjunto de funções C k com as operações usuais de
adição e multiplicação é uma álgebra comutativa e associativa sobre
o corpo dos números reais. Na verdade, o conjunto de tais funções é
TEORIA DAS SINGULARIDADES 37

também um espaço linear sobre este corpo, e as igualdades (8) têm


lugar pois são apenas igualdades de números.
Este conjunto é também um módulo sobre o anel das funções C l para
l ≥ k.

Exemplo 10. O conjunto de funções lineares {a + bx}, onde a e b são


números reais, com a adição usual
(a1 + b1 x) + (a2 + b2 x) = (a1 + a2 ) + (b1 + b2 )x
e a multiplicação definida como:
(ax + b) · (cx + d) = (ad + bc)x + bd
é um anel associativo e comutativo. Mas é também o espaço linear
sobre o corpo de números reais. Pelas mesmas razões apresentadas
acima este conjunto é uma álgebra associativa e comutativa sobre este
corpo.
Uma subálgebra (subanel, subsemi-grupo) é um subconjunto numa
álgebra (um anel, um semigrupo, respectivamente) que é também uma
álgebra (um anel, um semigrupo, respectivamente) com respeito às
operações existentes.
Um ideal à esquerda é uma subálgebra (ou um subanel, ou então um
semi-grupo) que é fechada com respeito à multiplicação à esquerda por
elementos da álgebra (do anel, do semi-grupo, respectivamente). Uma
noção de ideal à direita é introduzida da mesma forma. Um ideal é
um ideal à esquerda e um ideal à direita simultaneamente. Um ideal
é maximal se não existe nenhum maior que o contenha e seja diferente
do conjunto que estamos a considerar.
Exemplo 11. Na álgebra das funções C k numa variedade diferenciável
todas as funções que se anulam em algum ponto formam um ideal
maximal. Para dois pontos diferentes os ideais maximais respectivos
são diferentes.
Os germes de todas as funções C k num ponto de uma variedade
formam uma álgebra sobre o corpo dos números reais para as operações
standard “+”, “·” entre funções. As funções que se anulam no ponto
fixado formam um ideal maximal nesta álgebra.
Numa álgebra (anel) na presença de um ideal, é possı́vel introduzir a
seguinte relação de equivalência: dois elementos são equivalentes se na
soma com todos os elementos do ideal ambos dão o mesmo resultado.
No conjunto das classes de equivalência as operações são induzidas de
forma natural. Nomeadamente, para as classes de equivalência {a},
{b} de elementos a, b, respectivamente, temos
{a} + {b} = {a + b} e {a} · {b} = {a · b}.
Estas operações estão definidas correctamente, e é óbvio que o con-
junto das classes de equivalência com as operações induzidas é também
38 ALEXEI DAVYDOV

uma álgebra (um anel, respectivamente). Elas formam uma álgebra


quociente (anel quociente) com respeito ao ideal escolhido.
Exemplo 12. Na álgebra de germes de funções num ponto a álgebra
quociente com respeito ao ideal maximal é isomorfa ao corpo dos nú-
meros reais.
Nota 19. Um homomorfismo entre dois sistemas algébricos da mesma
natureza (como álgebras, ou aneis, ou então grupos,...) é uma aplicação
que preserva a sua estrutura algébrica. Por exemplo, um homomorfismo
φ entre aneis tem de satisfazer as duas condições seguintes
φ(a + b) = φ(a) + φ(b), φ(a · b) = φ(a) · φ(b),
e entre álgebras mais uma condição, nomeadamente,
φ(λa) = λφ(a)
onde a, b são elementos do anel ou da álgebra e λ é um elemento do
respectivo corpo.
Um isomorfismo é um homomorfismo invertı́vel, isto é, um homo-
morfismo com inversa que é também um homomorfismo. Por exemplo,
a aplicação x → ex é um isomorfismo entre o grupo dos números reais
para a operação adição e o grupo dos números reais positivos para a
operação multiplicação porque ea+b = ea · eb . Aqui a inversa é a aplica-
ção y → ln y.
4.2. Álgebra local de uma aplicação num ponto. Esta é uma
noção local e por isso pode funcionar em coordenadas locais. Então,
seja (f, P ) um germe de uma aplicação diferenciável entre Rxm e Ryn .
Sem perda de generalidade podemos supor que o ponto P e a sua
imagem f (P ) são origens. Portanto f : (Rxm , O) → (Ryn , O).
Denotemos por Ax a R álgebra (=uma álgebra sobre o corpo dos
números reais) de termos de funções de alguma classe (formal, analı́tica,
diferenciável) no ponto P do espaço das pré-imagens e por my o ideal
maximal, na álgebra dos germes no ponto f (P ), de funções no espaço
das imagens que se anulam neste ponto e são da mesma classe.
A álgebra local de uma aplicação f num ponto P é a álgebra quociente
Qf = Ax /If
onde If = Ax · f ∗ my é o ideal gerado pelo pullback dos elementos do
ideal my .
Nota 20. Um ideal é gerado por alguns elementos se ele é o ideal mais
pequeno possı́vel contendo esses elementos.
Definamos um sistema gerador da álgebra local Qf como uma colec-
ção minimal de elementos de Ax tais que as classes equivalentes dadas
por estes elementos formam uma base do espaço linear da álgebra quo-
ciente respectiva. O número de tais elementos (=dimensão deste espaço
linear) é designado por multiplicidade local da aplicação f no ponto P .
TEORIA DAS SINGULARIDADES 39

A aplicação tem uma multiplicidade finita num ponto se a sua multi-


plicidade local nesse ponto é finita.
Exemplo 13. Seja f a aplicação x → x2 entre linhas reais, tomemos
a origem no ponto P , sendo a classe considerada o conjunto de funções
diferenciáveis. Então
• Ax é a álgebra de germes de funções diferenciáveis na origem;
• my é o ideal maximal de germes de funções diferenciáveis em
y que se anulam na origem, pelo lema de Hadamard qualquer
função deste tipo pode ser escrita perto da origem como yh(y)
para algumas funções h; consequentemente,
• o pullback f ∗ my dá-nos todas as funções da forma x2 h(x2 ) perto
da origem; portanto
• o ideal If = Ax ·f ∗ my na origem é formado por germes de todas as
funções que podem ser escritas, perto da origem, na forma x2 H(x)
onde H é uma função diferenciável; e, finalmente,
• a álgebra local Qf é a álgebra de funções lineares {ax + b} para
as operações adição e multiplicação introduzidas acima.
Na verdade, qualquer função diferenciável perto da origem pode ser
apresentada na forma g(x) = a+bx+x2 G(x) com constantes a = g(O),
b = g  (O) e alguma função diferenciável G, pelo corolário do lema
de Hadamard. Quaisquer funções nessas condições com os mesmos
primeiros dois termos e qualquer terceiro dão o mesmo resultado na
soma com o nosso ideal If . Portanto as classes de equivalência respec-
tivas são enumeradas por funções lineares {a+bx}. As operações induzi-
das com esta equivalência são exactamente as operações introduzidas
acima para a álgebra de funções lineares.
De facto para quaisquer duas funções g1 e g2 temos
{g1 + g2 } ={a1 + b1 x + a2 + b2 x + x2 (G1 (x) + G2 (x))}
=a1 + a2 + (b1 + b2 )x = {g1 } + {g2 }
e
{g1 g2 } ={a1 a2 + (a1 b2 + b1 a2 )x + x2 G(x)} = {g1 }{g2 },
onde
G(x) =b1 b2 + a1 G2 (x) + a2 G1 (x) + b1 xG2 (x) +
+ b2 xG1 (x) + x2 G1 (x)G2 (x).
Consequentemente a álgebra local da nossa aplicação tem dimensão
2 na origem.
Nota 21. Um tratamento análogo para f (x) = xk+1 leva à R-álgebra
dos polinómios de grau k. O espaço linear respectivo tem dimensão
k+1. A colecção de monómios 1, x, x2 , . . . , xk pode ser tomada como um
sistema gerador desta álgebra. A adição nesta álgebra é a soma usual
40 ALEXEI DAVYDOV

de dois polinómios com a junção de termos similares e a multiplicação


é também a operação usual mas com xk+1 = 0.
Nota 22. Para o caso m > n não existe uma aplicação de multiplici-
dade finita.
Exemplo 14. Recordemos a classificação de Whitney de singulari-
dades tı́picas das aplicações diferenciáveis entre duas variedades di-
mensionais. Qualquer singularidade tı́pica num sistema de coordenadas
locais apropriadas toma uma das seguintes três formas perto da origem:
  
y1 = x1 y1 = x1 y1 = x1
, ou , ou então
y2 = x2 y2 = x22 y2 = x32 + x1 x2
Álgebras locais destas aplicações (singularidades) na origem são iso-
morfas às álgebras de polinómios de graus 0, 1 e 2, respectivamente.
Para mostrar isto, consideremos no plano o reticulado de pontos com
coordenadas inteiras não negativas. Se o monómio xl1 xr2 é uma compo-
nente da nossa aplicação, então o nosso ideal inclui todos os monómios
 
xl1 xr2 com l ≥ l e r ≥ r (= pertencentes ao quadrante não negativo
com a origem no ponto (l, r)).
Logo para a primeira aplicação da lista de Whitney apenas o ponto
(0, 0) não pertence ao ideal respectivo ( Fig. 23a), e para a segunda
aplicação apenas os pontos (0, 0) e (0, 1) estão nas mesmas condições
(Fig. 23b). Estes pontos dão-nos os sistemas geradores respectivos {1}
e {1, x2 } para as álgebras locais destas duas singularidades.

grau x2 grau x2 grau x2


x32

x22
• 3
x2 x1 x2
• 3 3 •

x1 x1 x1
3 • 3 • 3 •
grau x1 grau x1 grau x1
(a) (b) (c)

Figura 23. Como encontrar um sistema gerador da


álgebra quociente

No terceiro caso a situação é um pouco mais complicada porque a


segunda componente da aplicação não é um monómio mas a soma de
dois. Estes dois monómios têm de ser marcados no nosso reticulado mas
eles têm de estar unidos pelo segmento, mostrando que estão incluı́dos
no ideal apenas para a soma. Este segmento não pode ser retirado
se não existem razões para tal. Na situação considerada o segundo
termo nesta soma pertence ao nosso ideal já que o monómio x1 também
pertence (e portanto o monómio x1 x2 também pertence). Isso implica
que a primeira também pertence ao ideal. Então, finalmente, os pontos
TEORIA DAS SINGULARIDADES 41

(0, 0), (0, 1) e (0, 2) são os únicos fora do ideal (Fig. 23c), e dão-nos o
sistema gerador {1, x2 , x22 } da respectiva álgebra quociente da última
singularidade.
Então podemos ver que as álgebras locais das três singularidades
tı́picas de aplicações entre variedades de duas dimensões não são iso-
morfas (por exemplo, devido à diferença de dimensões entre elas), e
portanto distinguem estas singularidades. Isso mostra que a álgebra
local de uma singularidade é a sua caracterı́stica mais importante.
Exemplo 15. Consideremos o germe na origem da aplicação f entre
planos reais: 
y1 = x 1 x 2
y2 = x21 ± x22
Todas as funções da forma x1 x2 g(x1 , x2 ) pertencem ao ideal If porque
o monómio x1 x2 também pertence. Multiplicando a soma x21 ± x22 por
x1 (por x2 ) temos que o monómio x31 (x32 , respectivamente) pertence ao
nosso ideal. Portanto fora do ideal só há monómios 1, x1 , x2 , x21 e x22 mas
os últimos dois na soma x21 ±x22 pertencem ao ideal. Logo a álgebra quo-
ciente desta aplicação na origem forma um espaço linear 4-dimensional,
e o seu sistema gerador pode ser tomado na forma {1, x1 , x2 , x21 } para
ambos os sinais. Mas estas duas álgebras (para sinais “+” e “-”) não
são isomorfas.
Na verdade, qualquer isomorfismo φ da primeira na segunda tem de
levar o elemento zero em zero e os elementos não nulos em elementos
não nulos. Denotemos por 1, y1 , y2 , y12 o respectivo sistema gerador da
nossa álgebra para o sinal “-” e assumamos que existe um isomorfismo
φ para a álgebra quociente para o sinal “+” na álgebra quociente para
o sinal “-”. Então as imagens dos elementos x1 e x2 são combinações
lineares
φ(x1 ) = a0 + a1 y1 + a2 y2 + a3 y12 e φ(x2 ) = b0 + b1 y1 + b2 y2 + b3 y12
onde todos os coeficientes são números reais. A igualdade φ(0) = 0
dá-nos as igualdades φ(x31 ) = 0 e φ(x32 ) = 0, e as últimas implicam,
imediatamente, a0 = b0 = 0. Portanto
φ(x21 ) = φ(x1 )2 = (a1 y1 + a2 y2 + a3 y12 ) = a21 y12 + a22 y22
porque y1 y2 e y13 pertencem ao nosso ideal If . Analogamente, temos
que
φ(x22 ) = φ(x2 )2 = (b1 y1 + b2 y2 + b3 y12 )2 = b21 y12 + b22 y22 .
Isso implica que
0 = φ(x21 + x22 ) =φ(x1 )2 + φ(x2 )2 =
=(a21 + b21 )y12 + (a22 + b22 )y22 = (a21 + b21 + a22 + b22 )y12
onde a última igualdade escrita é devida a y12 − y22 = 0 na nossa álgebra
quociente para “-”. Mas o lado direito da útima expressão pode ser
42 ALEXEI DAVYDOV

igual a zero se a1 = b1 = a2 = b2 = 0 porque y12 é diferente de zero


como elemento do sistema gerador da álgebra quociente.
Assim φ(x21 ) = (a3 y12 )2 = 0, o núcleo da aplicação φ não é trivial, e
esta aplicação não pode ser um isomorfismo. Isto contradiz a suposição
e mostra que as nossas álgebras quociente para “+” e para “-” não são
isomorfas.
4.3. Teorema da preparação de Weierstrass.
Teorema da preparação de Weirstrass. Seja f : (Rxm , O) → (Ryn , O)
uma aplicação de multiplicidade finita µ e {e1 , e2 , . . . , eµ } um sistema
gerador da sua álgebra local Qf na origem. Então qualquer função α
em x pode ser escrita, perto da origem, na forma
(9) α(x) = c1 (f (x))e1 (x) + c2 (f (x))e2 (x) + · · · + cµ (f (x))eµ (x)
onde todas as aplicações são da mesma classe (mas todos os ci são
funções em y).
Nota 23. A afirmação deste teorema é verdadeira para os casos ana-
lı́tico, diferenciável e formal.
Corolário 4.1 (Teorema de divisão de Mather). Se uma função dife-
renciável F de duas variáveis t, dim t = 1, e x tem na origem todas as
k+1
derivadas em ordem a t iguais a zero até à ordem k e ∂∂tk+1F (O) = 0,
então qualquer função diferenciável G nas mesmas variáveis pode ser
escrita, perto da origem, na forma
(10) G(t, x) = F (t, x)q(t, x) + a0 (x) + a1 (x)t + · · · + ak (x)tk
onde q e todos ai , 0 ≤ i ≤ k, são funções diferenciáveis.
Corolário 4.2. Se uma função diferenciável F de duas variáveis t e
x, com dim t = 1, tem, na origem, todas as derivadas em ordem a t
k+1
iguais a zero até à ordem k e ∂∂tk+1F (O) = 0, então, perto da origem, a
equação F (t, x) = 0 é equivalente à equação
(11) tk+1 = a0 (x) + a1 (x)t + · · · + ak (x)tk
para algumas funções diferenciáveis ai , ai (O) = 0, 0 ≤ i ≤ k.

Corolário 4.3 (Teorema da função implı́cita). Se uma equação


F (t, x) = 0 de variável t, com dim t = 1, e parâmetro x, tem uma
raiz t0 não degenerada para x = x0 , então, perto do ponto (t0 , x0 ), esta
equação tem uma única solução t = T (x) com t0 = T (x0 ), para alguma
função diferenciável T.
Demostração dos corolários. Para afirmar o primeiro deles considere-
mos a aplicação
(t, x) → (F (t, x), x).
TEORIA DAS SINGULARIDADES 43

Um sistema gerador da sua álgebra local na origem pode ser tomado na


forma {1, t, . . . , tk } como facilmente se vê. Pelo teorema da preparação
de Weirstrass qualquer função G pode ser apresentada na forma
G(t, x) = c0 (F (t, x), x) + c1 (F (t, x), x)t + · · · + ck (F (t, x), x)tk
onde todos os ci são funções diferenciáveis. Pelo lema de Hadamard
qualquer uma das últimas funções pode ser escrita perto da origem
como
ci (F (t, x), x) = ai (x) + F (t, x)bi (F (t, x), x)
para algumas funções diferenciáveis ai e bi . Substituindo a última ex-
pressão na fómula anterior e tomando
q(x, t) = b0 (F (t, x), x) + bi (F (t, x), x)t + · · · + bk (F (t, x), x)tk
obtemos a apresentação necessária da função G.
O segundo corolário segue imediatamente do primeiro. De facto, pelo
primeiro corolário, para a função G(t, x) = tk+1 temos a expansão
tk+1 = F (t, x)q(t, x) + a0 (x) + a1 (x)t + · · · + ak (x)tk
para algumas funções q e ai , 0 ≤ i ≤ k. Todas as derivadas em ordem
a t até à ordem k do lado esquerdo da última equação se anulam na
origem e a de ordem k + 1 não. Consequentemente isto também é
verdade para o lado direito. Mas para todas as derivadas da função F
também acontece o mesmo. Portanto todas as ai , 0 ≤ i ≤ k, se anulam
na origem mas q não.
Assim, podemos ver que, perto da origem, a equação F = 0 é equi-
valente à equação tk+1 = a0 (x) + a1 (x)t + · · · + ak (x)tk porque a função
q não é nula na origem nem perto desta devido à sua continuidade.
Isto conclui a demonstração do segundo corolário.
O terceiro corolário resulta do segundo tomando k = 0.
Demonstração do teorema da preparação. Demonstraremos o teorema
para o caso das séries formais de potências apenas, pelo método da
indução matemática [1].
Pelas definições de álgebra local e do seu sistema gerador, para qual-
quer série formal de potências α existe uma expansão

n
α(x) = c1 e1 (x) + c2 e2 (x) + · · · + cµ eµ (x) + αr (x)fr (x),
r=1

onde f = (f1 , f2 , . . . , fn ), todos os cr e αr são constantes e a série


formal de potências , respectivamente. A última soma é, pelo menos, do
primeiro grau em relação às componentes da aplicação f . Tal expansão
também pode ser escrita para cada um dos coeficientes αr :

n
αr (x) = c1,r e1 (x) + c2,r e2 (x) + · · · + cµ,r eµ (x) + αr,j (x)fr (x).
j=1
44 ALEXEI DAVYDOV

Substituindo esta expansão para αr na expansão anterior obtemos uma


nova expressão para α :

n
α(x) = [ck + ck,r fr (x)]e1 (x) + αr,j (x)fr (x)fj (x)
k=1 r=1 r,j=1

Na nova expressão a última soma é pelo menos do segundo grau em


relação às componentes da aplicação f , e o restante no lado direito
está na forma desejada com coeficientes polinomiais em relação a estas
componentes do grau que tem menos uma unidade do que o grau da
soma.
Fazendo a suposição indutiva de que podemos obter tal expressão
até uma ordem s desta soma e repetindo as mesmas manipulações com
os coeficientes da última soma, podemos obter a expansão desejada
para o grau s + 1. Pelo método de indução matemática, isso implica
a validação do teorema da preparação de Weierstrass para o caso das
séries de potências formais.
Exemplo 16. Mostremos a utilidade do teorema da preparação.
No espaço euclidiano 3-dimensional consideremos duas subvarieda-
des diferenciáveis de dimensões 1 e 2 com ponto comum P . A ordem
de tangência entre elas neste ponto é de menos uma unidade do que
a ordem de zero neste ponto da distância de pontos da variedade 1-
dimensional à variedade 2-dimensional. Por exemplo, o eixo dos x e o
cilindro parabólico y = x2 têm tangência de primeira ordem na origem;
o mesmo eixo e o cilindro z = y 2 têm, na origem, tangência de ordem
infinita.
A afirmação seguinte ilustra a utilidade dos corolários do teorema da
preparação.
3
Corolário 4.4. Se no espaço 3-dimensional Rx,y,z uma hipersuperfı́cie
diferenciável tem um ponto P com tangência de primeira ordem com
a linha vertical que passa por esse ponto. Então, perto deste ponto,
esta hipersuperfı́cie pode ser escrita como x = z 2 para um sistema de
coordenadas local diferenciável apropriado, com origem neste ponto,
que é fibrado em relação à direcção vertical.
Demonstração. Primeiro transferimos a origem para o ponto P . Cada
hipersuperfı́cie localmente diferenciável perto deste ponto pode ser to-
mada como o nı́vel zero não degenerado de uma função diferenciável F ,
isto é F (x, y, z) = 0 onde o eixo dos z corresponde à direcção vertical.
Temos que dF (O) = 0 porque o nı́vel não é degenerado, e Fz (O) =
0 = Fzz (O) devido à suposição sobre a tangência de primeira ordem
com a direcção vertical. Logo pelo Corolário 4.2 a equação F = 0 é
equivalente, perto da origem, a uma equação
z 2 = a(x, y)z + b(x, y).
TEORIA DAS SINGULARIDADES 45

Depois da introdução da nova coordenada z̃ = z − a(x, y)/2 (isso


preserva a fibração ao longo do eixo dos z) a útima equação toma
a forma
z̃ 2 = b(x, y) − a2 (x, y)/4.
O primeiro membro desta equação tem diferencial zero na origem, por-
tanto o segundo membro desta equação tem diferencial diferente de
zero na origem porque a função F também tem. Então ele pode ser
tomado como nova coordenada local x, e a nova coordenada y pode ser
tomada como mais uma qualquer.
Isto conclui a demonstração do corolário.
Nota 24. Os tratamentos análogos no caso da tangência de segunda
ordem com a direcção vertical dão uma equação z 3 = a(x, y)z + x
para uma função diferenciável a. Se ay (O) = 0 então esta equação,
perto da origem, toma a forma z 3 = yz + x para a nova coordenada
ỹ = a(x, y). Podemos mostrar, usando o teorema da transversalidade
de Thom, que isto é sempre verdade para uma função tı́pica F. Os três
casos de tangência com a direcção vertical de ordem 0, 1 e 2 correspon-
dem, exactamente, às três singularidades de Whitney da restrição da
projecção (x, y, z) → (x, y) na hipersuperfı́cie considerada.
4.4. Teorema de Tougeron e seus corolários. Um ponto crı́tico
de uma função diferenciável f diz-se com multiplicidade finita se neste
ponto a álgebra local da aplicação gradiente ( (.) → ∂f
∂x
(.) ) tem di-
mensão finita. Esta dimensão, µ, é designada por multiplicidade do
ponto crı́tico.
Teorema de Tougeron. Uma função diferenciável f perto de um pon-
to crı́tico de multiplicidade finita µ é R-equivalente ao seu polinómio
de Taylor de grau µ + 1 nesse ponto.
Nota 25. Um jacto de uma aplicação num ponto diz-se suficiente se
qualquer outra aplicação com o mesmo jacto neste ponto tem a mesma
singularidade neste ponto. Logo o teorema de Tougeron diz que o
(µ + 1)-jacto de uma função num ponto crı́tico de multiplicidade µ é
suficiente em relação à R-equivalência.
O ideal gradiente da função num ponto é o ideal do aplicação gra-
diente da função neste ponto. O teorema de Tougeron está provado
abaixo na base do seguinte teorema mais forte:
Teorema 4.5. Se, perto da origem, uma função Φ e as suas primeiros
derivadas estão no produto do ideal maximal e do ideal gradiente da
função f , os germes na origem das funções f e f + Φ são R-equiva-
lentes. Adicionalmente, se a função Φ depende de forma C ∞ de um
parâmetro, então Φ pode ser removida por um difeomorfismo depen-
dendo de forma C ∞ desse mesmo parametro.
Estas teoremas implicam:
46 ALEXEI DAVYDOV

Corolário 4.6 (Lema de Morse). O germe de uma função diferenciá-


vel f num seu ponto crı́tico não degenerado P é o germe na origem da
função:
(12) f (P ) + x21 + · · · + x2k − x2k+1 − · · · − x2m
em coordenadas diferenciáveis apropriadas x1 , . . . , xm com origem nesse
ponto. Além disso o número de termos positivos (negativos) na função
(12) não depende das coordenadas escolhidas e é um invariante do ponto
crı́tico.
Corolário 4.7 (Lema de Morse com parâmetro). Se uma função di-
ferenciável em Rm depende diferenciavelmente de um parâmetro λ ∈ Rk
e para λ = 0 o ponto P é um seu ponto crı́tico não degenerado, então,
perto desse ponto, essa função toma a forma:
(13) φ(λ) + x21 + · · · + x2k − x2k+1 − · · · − x2m
onde φ é uma função diferenciável, para λ suficientemente pequeno em
coordenadas diferenciáveis apropriadas x1 (λ), . . . , xm (λ) dependendo di-
ferenciavelmente do parâmetro, (x1 (0), . . . , xm (0)) = P. Além disso o
número de termos positivos (negativos) na função (13) não depende das
coordenadas escolhidas e é um invariante do ponto crı́tico.
De imediato, este lema implica:
Corolário 4.8 (Lema de Morse para um ponto crı́tico degenerado). O
germe de uma função diferenciável f num seu ponto crı́tico P de co-
caracterı́stica r é o germe na origem da função:
(14) φ(x1 , . . . , xr ) + x2r+1 + · · · + x2k − x2k+1 − · · · − x2m
onde φ é uma função diferenciável com dφ(P ) = 0, d2 φ(P ) = 0, em
coordenadas diferenciáveis apropriadas x1 , . . . , xm com origem neste
ponto. Além disso o número de termos positivos (negativos) na função
(4.8) não depende das coordenadas escolhidas e é um invariante do
ponto crı́tico.
Agora de inı́cio estabelecemos estes corolários, depois o Teorema de
Tougeron e por fim o teorema mais forte.
Demonstração do lema de Morse. A multiplicidade de um ponto crı́tico
não degenerado de uma função diferenciável é igual a 1 pois, perto de
tal ponto, a aplicação gradiente é um difeomorfismo local. Logo, pelo
teorema de Tougeron, perto de tal ponto a função é R-equivalente ao
seu polinómio de Taylor neste ponto de grau 2. Mas todas as primeiras
derivadas da função neste ponto são zero.
Portanto este polinómio é a soma de uma constante f (P ) com uma
forma quadrática. Esta forma é não degenerada porque o ponto crı́tico
é não degenerado. Mas qualquer forma quadrática não degenerada
pode ser reduzida a uma soma algébrica de quadrados de todas as
TEORIA DAS SINGULARIDADES 47

coordenadas por mudança linear de coordenadas. Depois disso uma re-


ordenação das coordenadas dá-nos a fórmula apresentada no corolário.
O número de termos positivos (negativos) é um invariante desta forma
e deste ponto crı́tico também. O lema de Morse esta provado.
Demonstração do lema de Morse com parâmetro. Pelo teorema da fun-
ção implı́cita, a equação
∂f
(x, λ) = 0
∂x
tem uma solução diferenciável única P (λ), P (0) = P, para λ suficien-
2
temente pequeno, pois a matriz Hessiana ∂∂xf2 (P, 0) é não degenerada.
A mudança da origem no espaço da variável x para o ponto P (λ) é
uma mudança diferenciável de coordenadas dependendo de forma C ∞
do parâmetro.
Depois disso temos fx (O, λ) ≡ 0 para valores suficientemente pe-
quenos de λ. Portanto, pelo corolário do lema de Hadamard, para tais
valores de λ a nossa função pode ser escrita, perto da origem, na forma:

f (x, λ) = f (O, λ) + xT Q(λ)x + xα aα (x, λ)


α,|α|=3

onde Q é uma matriz simétrica não degenerada dependente diferen-


ciavelmente de λ e todos os aα são funções diferenciáveis. Por uma
mudança linear das coordenadas x, dependendo diferenciavelmente de
λ, o termo xT Q(λ)x pode ser reduzido (para λ suficientemente pe-
queno) à soma algébrica de quadrados de coordenadas, nomeadamente
a:
x21 + · · · + x2k − x2k+1 − · · · − x2m
porque Q(0) é não degenerada. O número de termos positivos (nega-
tivos) é um invariante desta
forma e deste ponto crı́tico também.
Depois disso o termo xα aα (x, λ) pode ser eliminado, pelo Teo-
α,|α|=3
rema 4.5, porque este termo depende diferenciavelmente do parâmetro
λ e pertence, juntamente com as derivadas, ao produto do ideal maxi-
mal e do ideal gradiente da restante parte de nossa função.
Isto conclui a demonstração do lema de Morse com parâmetro.
Demonstração do lema de Morse num ponto crı́tico degenerado. Para
demonstrarmos o lema de Morse para um ponto crı́tico degenerado,
com matriz Hessiana de cocaracterística r, enumeramos as nossas co-
ordenadas de tal modo que, na origem, a submatriz (m − r) × (m − r)
abaixo e à direita desta matriz ( = a matriz das segundas derivadas da
nossa função em ordem a xr+1 , . . . , xm ) seja não degenerada. Tomemos
as primeiras r coordenadas como um parâmetro r-dimensional λ. A
aplicação do lema de Morse com parâmetro conclui a demonstração.
48 ALEXEI DAVYDOV

4.5. Demonstração dos teoremas. A afirmação seguinte é bastante


útil:
Lema 4.9. Se a origem é o ponto crı́tico de multiplicidade µ de uma
função diferenciável então o germe na origem de qualquer monómio de
grau µ pertence ao ideal gradiente dessa função na origem. Em parti-
cular, qualquer monómio de grau µ + 2 e suas derivadas pertencem ao
produto de ideal gradiente dessa função na origem com ideal maximal.
Demonstração do teorema de Tougeron. Este lema e o teorema 4.5 pro-
vam de forma imediata o teorema de Tougeron: De facto, pelo lema de
Hadamard, qualquer função Φ de grau µ + 2 no ideal maximal pode ser
representada na forma

xα hα (x)
α,|α|=µ+2

perto da origem, para algumas funções diferenciáveis hα . Consequente-


mente pelo lema 4.9 esta função pertence, juntamente com as derivadas,
ao produto do ideal maximal com o ideal gradiente da função f na
origem. Portanto, pelo teorema 4.5, tal função não tem influência na
singularidade da função f na origem.
Isto demonstra o teorema de Tougeron módulo lema 4.9.
De inı́cio vamos provar o lema:
Demonstração do lema 4.9. Qualquer monómio xα , |α| = µ, é o pro-
duto de µ funções coordenadas xi1 , xi2 , . . . , xiµ com ir ∈ {1, 2, . . . , m}.
As µ + 1 funções
1, xi1 , xi1 xi2 , ..., xi1 xi2 . . . xiµ−1 xiµ
são linearmente dependentes na álgebra local Qf , porque ela tem di-
mensão µ. Logo, existe uma combinação linear não trivial:
c1 + c2 xi1 + c3 xi1 xi2 + · · · + cµ xi1 xi2 . . . xiµ−1 xiµ
que pertence ao ideal If . Seja cj o primeiro coeficiente diferente de zero
nesta combinação então
xi1 . . . xij [cj + cj+1 xij+1 + · · · + cµ xij+1 xij+2 . . . xiµ−1 xiµ ] ∈ If .
Mas a função entre parêntesis rectos não se anula perto da origem, e
portanto tem inversa para a multiplicação na nossa álgebra. Multipli-
cando por esta inversa obtemos
xi1 . . . xij ∈ If , e portanto xi1 . . . xiµ ∈ If
porque, pela definição, um ideal é fechado em relação à multiplicação
de elementos da álgebra.
O lema está demonstrado.
Assim, para concluirmos as nossas demonstrações precisamos de es-
tabelecer a validade do Teorema 4.5.
TEORIA DAS SINGULARIDADES 49

Demonstração do Teorema 4.5. Primeiro provamos a afirmação não pa-


ramétrica.
Consideremos o caminho f + tΦ no espaço das funções. Ele liga a
nossa função inicial e a sua perturbação, quando t varia de 0 a 1.
A ideia de Thom era e encontrar, não o difeomorfismo que transfere
directamente o germe f no ponto em causa no de f + Φ, mas a famı́lia
de difeomorfismos gt tais que:
– gt preserva a origem, para todo t ∈ [0, 1],
– a famı́lia gt é dada por uma deformação diferenciável da identi-
dade, isto é, g0 (x) ≡ x,
– gt satisfaz a identidade
(f + tΦ)(gt (x)) ≡ f (x)
para alguma vizinhança da origem e qualquer t ∈ [0, 1].
Derivando a última identidade em relação a t obtemos a equação ho-
mológica:
(15) Φ(gt (x)) + Lvt (gt (x)) (f + tΦ) ≡ 0
onde Lv é o operador diferencial ao longo do campo v, e
d
vt (gt (x)) = ( gτ (x))|τ =t

é a velocidade da deformação da identidade.
A equação (15) tem de ser satisfeita identicamente em relação a
t ∈ [0, 1] e gt (x) suficientemente próxima da origem, e portanto identi-
camente em relação a t ∈ [0, 1] e x suficientemente pequeno. Isto leva
a que seja suficiente resolver, perto da origem, a equação
Lvt (f + tΦ)(x) ≡ −Φ(x).
Nas coordenadas locais x1 , x2 , . . . xm ela toma a forma (o argumento x
está omitido)

m
∂(f + tΦ)
(16) vt,i = −Φ,
i=1
∂x i

onde vt = (vt,1 , vt,2 , . . . vt,m ).


Pelas hipóteses do teorema temos apresentações

m
∂f ∂Φ
∂f
m
−Φ = hj e = hi,j
j=1
∂x j ∂xi j=1
∂x j

para algumas funções diferenciáveis hj , hi,j nulas na origem. Substi-


tuindo estas últimas expressões na nossa equação (16) obtemos


m
∂f
m
∂f
m
∂f
+t hi,j vt,i = hi ,
i=1
∂xi j=1
∂xj i=1
∂xi
50 ALEXEI DAVYDOV

ou


m
∂f
m
m
∂f
vt,i + t hj,i vt,j = hi ,
i=1
∂x i j=1 i=1
∂x i

Donde a solução diferenciável do sistema de m equações



m
∂f
vt,i + t hi,j vt,j = hi , 1 ≤ i ≤ m,
j=1
∂xj
dá-nos, obviamente, a solução desta equação homológica. Este sistema
é linear em relação às incógnitas vt,i , e a sua matriz é a identidade
quando x = 0 pois todos os hi,j se anulam na origem. Consequente-
mente existe uma solução única diferenciável deste sistema para x su-
ficientemente pequeno e t ∈ [0, 1]. Esta solução anula-se na origem
porque assim acontece ao segundo membro do sistema.
A integração do campo de vectores obtido dá-nos a famı́lia de difeo-
morfismo g t (x) necessária e implica a validade do Teorema 4.5 no caso
não paramétrico.
No caso paramétrico do Teorema 4.5 as razões são praticamente
as mesmas. Apenas as funções hj , hi,j dependem adicionalmente do
nosso parâmetro se anulam identicamente quando x = 0. Também,
na integração da solução, temos de usar adicionalmente o teorema so-
bre a dependência diferenciável da solução em relação ao parâmetro,
quando o respectivo campo de vectores depende diferenciavelmente do
parâmetro.
4.6. Singularidades simples de funções (potenciais). Como mos-
trámos acima, uma função tı́pica tem apenas pontos crı́ticos não degen-
erados, e, perto de um tal ponto, é a soma de uma constante com uma
forma quadrática não degenerada, em coordenadas locais apropriadas
com a origem nesse ponto. Mas vimos também que uma famı́lia tı́pica
de funções dependendo diferenciavelmente de um parâmetro pode ter
pontos crı́ticos degenerados para alguns valores do parâmetro. Por
exemplo, o potencial tı́pico U (x, λ) = x3 + λx tem um ponto crı́tico
degenerado na origem quando λ = 0. Aqui vamos classificar os pontos
crı́ticos simples de potenciais.
Uma função (ou aplicação) tem uma singularidade simples num ponto
com respeito a uma equivalência, se para perturbações suficientemente
pequenas do germe dessa função (aplicação) nesse ponto, obtemos ape-
nas representantes de um número finito de órbitas de tais germes sob
esta equivalência. Nós vamos usar R-equivalência (que é a mudança de
coordenadas que preserva este ponto crı́tico) em espaço dos germes na
origem dados por funções com um ponto crı́tico na origem com valor
crı́tico zero).
Exemplo 17. A função na recta real x → x2 tem uma singularidade
simples na origem. Na verdade, qualquer função com um ponto crı́tico
TEORIA DAS SINGULARIDADES 51

zero na origem e um 2-jacto fechado na origem tem a mesma singular-


idade na origem para a R-equivalência, pelo lema de Morse.
Os germes de duas funções na origem dizem-se R-equivalente estáveis
se eles se tornam R-equivalentes depois da adição de formas quadráticas
não degeneradas (a cada uma das funções adicionamos a sua forma).
Exemplo 18. Os germes na origem das funções x3 , x3 +y 2 , x3 +y 2 −z 2
(de diferentes números de variáveis!) são R-equivalente estáveis.
Teorema 4.10. Um germe de uma função diferenciável num ponto
crı́tico simples com valor crı́tico zero é R-equivalente estável ao germe
na origem de uma das seguintes funções:
Ak : ±xk+1 , k ≥ 1; Dk : x2 y ± y k−1 , k ≥ 4;
E6 : x3 ± y 4 ; E7 : x3 + xy 3 ; E8 : x3 + y 5 ;
Nota 26. Para k par, o sinal ± em Ak pode ser reduzido a “+” como
é fácil de ver, e para k ı́mpar isto não é possı́vel, pois + e − corres-
pondem, respectivamente, aos mı́nimo e máximo na origem da função
considerada.
O Teorema 4.10 e um cálculo directo implicam:
Corolário 4.11. Qualquer ponto crı́tico simples tem multiplicidade fi-
nita, nomeadamente, de multiplicidade k para uma singularidade do
tipo Ak , Dk , Ek (para todos os valores possı́veis de k).
Por exemplo, os cálculos de multiplicidade para o tipo Ek estão na
Fig. 24.

grau y grau y grau y

5y 4 •
4y 3• y3 • • 3 3
3xy2
3 3 3 • 3 3
x
3 3 3 3 3 3 3
3 3 • 3 3 •
3 • 3 3 •
3x2 grau x 3x2 grau x 3x2 grau x
E6 : x3 ± y 4 E7 : x3 + xy 3 E8 : x3 + y 5

Figura 24. Cálculo da multiplicidade de Ek

Demonstração do teorema 4.10. Pelo lema de Morse, uma função perto


de um ponto crı́tico degenerado de cocaracterı́stica r com valor crı́tico
zero toma a forma (14):
φ(x1 , . . . , xr ) + x2r+1 + · · · + x2k − x2k+1 − · · · − x2m
52 ALEXEI DAVYDOV

onde φ é uma função diferenciável tal que j 2 (O) = 0 em coordenadas


diferenciáveis apropriadas com a origem nesse ponto. Um germe na
origem de uma função nessa forma é R-equivalente estável ao germe na
origem da função φ (designado genótipo da singularidade) pela definição
dessa equivalência.
As seguintes afirmações mostrar-se-ão particularmente úteis:
Lema 4.12. Uma singularidade de uma função com um genótipo de
três ou mais variáveis não é simples.
Lema 4.13. Uma singularidade de uma função com um genótipo de
duas variáveis não é simples se o 3-jacto deste genótipo no ponto fixado
é zero.
Primeiro vamos usar estes lemas, e só depois os provaremos.
Pelos Lemas 4.12, 4.13 precisamos de considerar apenas genótipos
(A) de uma variável (x) ou (B) de duas variáveis (x, y) com 3-jactos
não nulos na origem.
No caso (A) o genótipo é uma função de uma variável. Na origem,
a sua derivada de alguma ordem é não nula porque a singularidade
considerada é simples (mas qualquer vizinhança do zero jacto tem in-
tersecção com um número infinito de órbitas dadas por xµ para µ ≥ 2).
Consequentemente, o genótipo toma a forma ±xk+1 (como vimos nas
primeiras aulas), depois de uma escolha apropriada de coordenadas, se
a ordem da primeira derivada não nula é k + 1. Portanto o caso (A)
corresponde a singularidades da série Ak .
Nota 27. A1 dá-nos o caso de um ponto crı́tico não degenerado.
No caso (B) o 3-jacto do genótipo é um polinómio homogéneo não
nulo de grau 3.
Lema 4.14. Um polinómio homogéneo de grau 3 pode ser reduzido a
uma das seguintes três formas:
ou (I) x2 y ± y 3 , ou (II) x2 y, ou então (III) x3
por uma mudança linear de coordenadas.
Demonstração. De facto, uma forma cúbica anula-se em três, ou duas,
ou então em (pelo menos) uma linha recta passando pela origem (isto
torna-se mais óbvio depois da substituição x = zy ou y = zx). Estas
linhas podem ser reduzidas, simultaneamente, às linhas y = 0 e x2 = y 2 ,
no primeiro caso, às linhas x = 0 e y = 0, no segundo, e x = 0 nos
terceiro subcasos, por uma mudança linear de coordenadas. O lema
de Hadamard implica que o 3-jacto pode agora ser escrito nas formas
y(x2 − y 2 )p, xyq(x, y) e xQ(x, y), para alguma constante não nula p,
alguma função linear q e alguma forma quadrática Q, respectivamente.
Depois de reescalado o primeiro subcaso, obtemos a forma normal
y(x2 − y 2 ) do tipo (I).
TEORIA DAS SINGULARIDADES 53

No segundo subcaso a linha q(x, y) = 0 tem que coincidir com x = 0


ou y = 0 porque o nosso 3-jacto anula-se exactamente em duas rectas.
Então, depois da mudança de escala e eventualmente da permutação
de variáveis obtemos o caso (II).
No terceiro subcaso a forma Q ou é definida positiva (ou negativa) ou
também se anula na linha x = 0. Na primeira variante, pela subtracção
do quadrado perfeito em relação a y, reduzimos o nosso 3-jacto à forma
x(ax2 +b(cx+y)2 ) para constantes a, b, c com ab > 0. A óbvia mudança
linear de coordenadas (qual ?) implica a forma y(x2 + y 2 ) do tipo (I).
Na segunda variante, temos Q(x, y) = ax2 , a = 0. Então, depois da
mudança de escala de x, obtemos a forma (III).
Então, precisamos de considerar o 3-jacto de um genótipo de um dos
tipos (I)-(III).
Tipo I. Qualquer função com 3-jacto=x2 y − y 3 se anula perto da
origem em três curvas diferenciáveis transversais aos pares passando
na origem (isso é óbvio depois da substituição y = zx na nossa função,
o cancelamento de x3 e depois disso a aplicação do teorema da função
implı́cita à função obtida perto dos pontos x = 0 e z ∈ {0, ±1}). É
óbvio que por uma mudança de coordenadas apropriada estas curvas
podem ser reduzidas às linhas y = 0, x = y e x = −y. O lema de
Hadamard implica que tal função possa ser escrito na forma (x2 y −
y 3 )h(x, y) para alguma função diferenciável h não nula na origem. A
mudança de escala x̃ = xh(x, y)1/3 e ỹ = yh(x, y)1/3 transforma a
função na forma normal D4 com sinal ”-”.
Qualquer função com 3-jacto=x2 y + y 3 se anula perto da origem
numa curva diferenciável passando na origem (mais uma vez isto é óbvio
depois da substituição y = zx, do cancelamento de x3 e, depois disso,
da aplicação do teorema da função implı́cita perto dos pontos x = 0 e
z = 0). Então, pelo lema de Hadamard, em coordenadas apropriadas
esta função pode ser escrita na forma yQ(x, y) para alguma função di-
ferenciável Q com um mı́nimo local não degenerado na origem. Pelo
lema de Morse com parâmetro, a função Q toma a forma φ(y) + x2
para alguma função φ, φ(0) = 0 = φ (0) = φ (0), depois de uma
escolha apropriada para a coordenada x.
Agora, pelo corolário do lema de Hadamard, a função φ pode ser
escrita na forma φ(y) = y 2 h(y) para alguma função diferenciável h.
Esta função tem que ser positiva perto da origem, uma vez que, neste
ponto, a função Q tem um mı́nimo não degenerado.
Perto da origem a função y(y 2 h(y) + x2 ) toma a forma y(x2 + y 2 )
da singularidade D4 para o sinal ”+” depois de mudanças de escala
apropriadas de x e y (quais?).
Tipo II. Uma função f com 3-jacto x2 y na origem anula-se perto
da origem nalguma curva diferenciável, que podemos tomar como y =
ax2 + o(x2 ) onde a é uma constante (como acima, para vermos isto é
suficiente substituir y = zx, cancelar x3 e aplicar o teorema da função
54 ALEXEI DAVYDOV

implı́cita no ponto x = 0, z = 0). Donde, depois da mudança de


coordenadas ỹ = y − ax2 − o(x2 ) que preserva o nosso 3-jacto, perto de
origem esta função pode ser escrita, pelo lema de Hadamard, na forma
(o ”til” na notação de y está omitido):
f (x, y) = y(x2 + F (x, y))
para alguma função diferenciável F , com j 2 F (O) = 0 pelo caso do
3-jacto considerado. Pelo lema de Morse com parâmetro y, a função
x2 +F pode ser apresentada na forma x2 +φ(y) para alguma função dife-
renciável φ, j 2 φ(0) = 0 devido a este caso de jacto j 3 f (O) considerado.
Lema 4.15. Se uma função f = y(x2 + φ(y)) tem uma singularidade
simples na origem então o jacto j ∞ φ(0) é diferente de zero.
Demonstração. De facto, se o jacto é nulo, então a função x2 y + y k ,
para um número natural k e  = 0 suficientemente pequeno, tem jactos
próximos dos respectivos jactos de f . Mas para valores de k diferentes
esta função tem singularidades diferentes na origem, pois as respecti-
vas multiplicidades são diferentes (compare-se com o Corolário 4.11).
Então o ponto crı́tico não pode ser simples. Chegamos assim à con-
tradição que implica o lema.
Mais uma vez, pelo lema de Hadamard, a nossa função f pode ser
escrita perto de origem na forma:
f (x, y) = x2 y + y k−1 Φ(y)
par algum k ≥ 5 natural e alguma função Φ diferenciável, Φ(0) = 0 se
j k−2 φ(0) = 0 e j k−1 φ(0) = 0.
Consequente, perto de origem a nossa função toma a forma:
x2 y ± y k−1
depois de óbvia mudanças de escala de x e y (quais são?).
Portanto no caso (II) obtemos a singularidade Dk para k ≥ 5.
Tipo III. j 3 f (O) = j 3 x3 (O). Discutimos tudo perto da origem.
Lema 4.16. Qualquer função diferenciável f de variaveis (x, y), com
j 3 f (O) = j 3 x3 (O), pode ser escrita perto da origem na forma:
f (x, y) = y 4 A(y) + xy 3 B(x, y) + x3
com A, B funções diferenciáveis, em coordenados locais apropriados
com a mesma origem.
Demonstração. Pelo lema de Hadamard a função f pode ser escrita na
forma:
f (x, y) = y 4 a(y) + xy 3 b(y) + x2 y 2 c(y) + x3 d(x, y)
para funções diferenciáveis a, b, c, d, com d(0) = 0 por causa de j 3 f (O) =
j 3 x3 (O) . A mudança de escala x̃ = xd(x, y)1 /3 implica a forma
y 4 a(y)+xy 3 b(x, y)+x2 y 2 c(x, y)+x3 da nossa função, para novas funções
diferenciáveis a, b, c (o ”til” esta omitido).
TEORIA DAS SINGULARIDADES 55

Destacamos o cubo (x+y 2 c(x, y))3 e tomámo-lo como o cubo de uma


coordenada nova x. Chegamos à forma y 4 a1 (x, y) + xy 3 b1 (x, y) + x3 da
nossa função, com funções diferenciáveis a1 , b1 .
Mais uma vez, pelo lema de Hadamard, a função a1 pode ser escrita
na forma a1 (x, y) = A(y) + xb2 (x, y) com A e b2 funções diferenciáveis.
Isso implica a forma:
(17) f (x, y) = y 4 A(y) + xy 3 B(x, y) + x3
com B = b1 + yb2 .
Lema 4.17. A singularidade na origem de função (17) não é simples
se B(0, 0) = 0 e j 1 A(0) = 0.
Demonstração. Como acima, pelo lema de Hadamard a nossa função
f pode ser escrita na forma:
f (x, y) = y 6 a(y) + xy 4 b(y) + x2 y 2 c(y) + x3 d(x, y)
para a, b, c, d funções diferenciáveis, com d(0) = 0 por causa de j 3 f (O) =
j 3 x3 (O). Depois de procedermos como acima, chegamos à forma:
y 6 A(y) + xy 4 B(x, y) + x3
da nossa função, para A, B funções diferenciáveis.
Uma mudança differenciável de coordenadas que preserve esta forma
da função tem que ter a forma x = x̃ + X, y = αỹ + Y com α real e X
e Y funções diferenciáveis de grau pelo menos 3 e 2, respectivamente.
Temos só um parâmetro α para suprimir perturbações pequenas dos
valores A(0) e B(0, 0), e por conseguinte a nossa singularidade não
pode ser simples.
Nota 28. Se o polinómio λ3 +λB(0, 0)+A(0) tem três raizes reais difer-
entes, o nivel zero de função y 6 A(y) + xy 4 B(x, y) + x3 perto de origem
é união de três curvas tendo, na origem, tangência dupla, da primeira
ordem (para vermos isto é suficiente substituir x = zy 2 , cancelar y 6 e
aplicar o teorema da função implı́cita perto dos pontos y = 0 e essas
raizes como valores de z).
O germe de duas destas curves é o germe na origem das curvas
x = 0 e x = y 2 num sistema de coordenadas diferenciáveis apropri-
ado com a mesma origem. A terceira curva tem, na origem, tangência
de primeira ordem com estas curvas e consequentemente pode ser repre-
sentada na forma x = y 2 H(y) para alguma função diferenciável H, com
0 = H(0) = 1.
Qualquer difeomorfismo que preserve a origem e as primeiras duas
curvas também não altera o valor H(0), pois tal difeomorfismo tem a
forma x = x̃h2 (x̃, ỹ), y = ỹh(x̃, ỹ) (por favor, verifique isto!). Isso faz
com que a singularidade da nossa função não seja simples.
Quando não temos três raizes diferentes, fazemos o mesmo mas pode-
mos precisar de trabalhar no domı́nio dos números complexos e com
jactos finitos.
56 ALEXEI DAVYDOV

l3 grauy
l2 y5

l1
y4 •
xy 3

x3

grau x
E6 , E8 , E7

Figura 25. Monómios das singularidades E6 , E7 e E8

Assim o desenvolvimento de Taylor da nossa função até à ordem 5 na


origem tem pelo menos um dos monómios y 4 , xy 3 , ou y 5 com coeficiente
não zero. Estos monómios pertencem a diferentes linhas rectas l1 , l2 e
l3 passando no ponto (3, 0) (Fig. 25). A afirmação seguinte conclui a
demonstração do Teorema 4.10:
Lema 4.18. Uma função x3 + x4 A(y) + xy 3 B(x, y) tem, na origem,
a singularidade E6 , E7 e E8 se o seu desenvolvimento de Taylor na
origem tem algum dos monómios y 4 , xy 3 ,ou y 5 com coeficiente não
zero, respectivamente, e os outros monómios (com coeficientes não nu-
los) acima das linhas li , 1 ≤ i ≤ 3.
Demonstração. Se A(0) = 0 algum mudança de escala de y implica a
forma x3 ± y 4 + xy 3 B(x, y) de nossa função para alguma função dife-
renciável B. Destacamos o ±(y ± xB(x, y)/4)3 e tomámo-lo como o
grau quatro com sinal ± da nova coordenada y. Chegamos à forma
x3 a(x, y) + x2 y 2 b(x, y) ± y 4
da nossa função, para funções diferenciáveis a, b, com a(0, 0) = 1.
Agora destacamos o cubo (x(a(x, y))1/3 + y 2 b(x, y)(a(x, y))−2/3 /3 e
tomámo-lo como o cubo da nova coordenada x. Isso implica a forma
x3 ± y 4 c(x, y) da nossa função, para alguma função diferenciável c, com
c(0, 0) = 1. Finalmente a mudança de escala de y dá-nos a forma
normal da singularidad E6 .
Se A(0) = 0 = B(0, 0), a mudança de escala de y e o lema de
Hadamard dão-nos a forma
x3 + xy 3 + y 5 a(x, y)
da nossa função, para alguma função diferenciável a. A função y 5 a(x, y)
e as suas primeiros derivadas estão no ideal gradiente da função x3 +xy 3 .
TEORIA DAS SINGULARIDADES 57

Pelo teorema 4.5, a função y 5 a(x, y) não tem influência na singularidade


da nossa função na origem. Obtemos assim a singularidade E7 .
Finalmente, se A(0) = B(0, 0) = 0 = A (0), a nossa função depois
da mudança de escala de y, toma a forma
x3 + y 5 + axy 4 + bx2 y 3 + cx2 y 2 + . . .
com a, b, c constantes e . . . representando os termos pertencentes, jun-
tamente com as suas derivadas, ao produto do ideal maximal com o
ideal gradiente {3x2 , 4y 4 } da função na forma normal.
Eliminemos as constantes a, b, c: A mudança x → x + cy 2 /3 elimina
o coeficiente c e reduz a nossa função à forma
x3 + y 5 + (a − c3 /3)xy 4 + bx2 y 3 + . . .
para novos termos . . . . De modo análogo, a mudança y → y + (a −
c3 /3)x/5 dá-nos a forma
x3 + y 5 + Bx2 y 3 + . . .
para alguma constante B e novos termos . . . . Finalmente, a mudança
x → x + By 3 /3, elimina o último coeficiente B:
x3 + y 5 + . . . .
E os termos . . . podem ser eliminados pelo Teorema 4.5. Isto conclui
a demonstração do Teorema 4.10 módulo Lemas 4.12 e 4.13.
Assim a demonstração do teorema está terminada, a menos dos lemas
4.12 e 4.13
Demonstração dos lemas 4.12 e 4.13. Polinómios homogéneos de três
variáveis (= 3-jactos na origem de funções de três variáveis (=x, y, z)
com 2-jactos zero na origem) formam um espaço aritmético 10-dimen-
sional. Os seus pontos são combinações lineares dos monómios x3 , x2 y,
x2 z, y 3 , y 2 x, y 2 z, z 3 , z 2 x, z 2 y, xyz.
Apenas o primeiro jacto de um difeomorfismo preservando a origem
actua nestas combinações. Mas o espaço destes 1-jactos é o espaço de
matrizes não degeneradas 3 × 3, e portanto 9-dimensional. Donde a
união de qualquer número finito de tais órbitas nunca é densa, pelo
teorema de Bertini-Sard (aqui qual é a aplicação respectiva?) e da
nota depois dele. Consequentemente qualquer singularidade com tal
genótipo de três variáveis não pode ser simples. Isto prova o Lema
4.12.
Analogamente, o conjunto dos polinómios homogéneos de grau 4
de duas variáveis forma um espaço aritmético 5-dimensional (=com-
binação linear dos monómios x5 , x4 y, x3 y 2 , x2 y 3 , xy 4 , y 5 ).
Apenas o primeiro jacto de difeomorfismos preservando a origem ac-
tua nestas combinações. Mas o espaço de tais jactos é o espaço das
matrizes não degeneradas 2 × 2, que é, portanto, 4-dimensional. Donde
a união de qualquer número finito de órbitas por esta acção nunca é
58 ALEXEI DAVYDOV

densa, pelo teorema de Bertini-Sard e a nota depois dele. Consequente-


mente, qualquer singularidade com um genótipo de duas variáveis com
3-jacto zero não pode ser simples. Isto prova o Lema 4.13.

4.7. Deformações versais de singularidades locais. Esta teoria


é local. Devido a isso consideramos germes na origem de aplicações
diferenciáveis entre espaços aritméticos. Tais dois germes de aplicações
f e f1 podem ser ligados no espaço de aplicações pelo caminho (f +
t1 (f1 − f ), O) quando o parâmetro t1 varia entre 0 e 1, e tais k + 1
germes de aplicações f, f1 , . . . , fk−1 , fk podem ser ligados pelo caminho
(f + t1 (f1 − f ) + t2 (f2 − f ) + · · · + tk (fk − f ), O) com k parâmetros
t1 , t2 , . . . , tk quando variam no cubo 0 ≤ ti ≤ 1, 1 ≤ i ≤ k.
Aqui estudamos qual o menor número de parâmetros e qual é a
respectiva deformação de um determinado germe que nos dá todas as
pequenas deformações possı́veis de uma aplicação perto do seu ponto
singular, a menos de mudanças de coordenadas.
Uma deformação de um germe f : (Rxm , 0) → Rn com a base Rλk é
um germe
F : ((Rxm × Rλk , (0, 0)) → Rn
de uma aplicação diferenciável, tal que (F (., 0), 0) = (f (.), 0).
Uma deformação F̃ é equivalent a uma deformação F com a mesma
base se (F̃ (x, λ), (0, 0)) = (F (g(x, λ), λ), (0, 0)) para alguma deformação
diferenciável g da identidade, e.c. g(x, 0) ≡ x.
Uma deformação F̃ com a base Rθl é induzida da deformação F com a
base Rλk se (F̃ (x, θ), (0, 0)) = (F (x, λ(θ)), (0, 0)) para alguma aplicação
diferenciável θ → λ(θ), λ(0) = 0, entre as bases.
Uma deformação F é versal se qualquer outra deformação F̃ é equi-
valente a alguma deformação induzida de F . Nas nossas notações isso
significa que existe uma apresentação

(F̃ (x, θ), (0, 0)) = (F (g(x, λ(θ)), λ(θ)), (0, 0)).
Exemplo 19. Pelo lema de Morse com parâmetro qualquer pequena
deformação do potencial f (x) = x2 toma a forma φ(λ)+x2 para alguma
função diferenciável φ depois de uma escolha apropriada da coordenada
x dependendo diferenciavelmente de λ. Consequentemente o nosso po-
tencial tem a deformação versal F (x, λ) = x2 + λ com um parâmetro
λ ∈ R.
Definimos a velocidade tangente v de uma aplicação f sob a acção de
uma deformação um-paramétrica g t da identidade (e.c. g t (x)|t=0 ≡ x)
t
como df (gdt(x)) |t=0 . Em coordenadas temos

n
∂f (g t (x)) dg t (x)

n
∂f (x)
v(x) = i
|t=0 = hi (x),
i=1
∂xi dt i=1
∂xi
TEORIA DAS SINGULARIDADES 59

onde h = (h1 , h2 , . . . , hm ) é a respectiva velocidade de deformação da


identidade, isto é, g t (x) ≡ x + th(x) + . . . onde as reticências são pelo
menos de segunda ordem em relação a t. As velocidades tangentes
formam o espaço tangente para a órbita da função f .
Exemplo 20. Para uma função o espaço tangente coincide com o seu
ideal gradiente porque as componentes hi da velocidade de deformação
da identidade são quaisquer funções diferenciáveis.
Uma deformação F de um germe de uma aplicação f diz-se ver-
sal infinitesimal se perto do ponto distinto (a origem) o espaço linear
definido pela colecção de funções (velocidades de deformações)
∂F ∂F ∂F
(x, 0), (x, 0), . . . , (x, 0)
∂λ1 ∂λ2 ∂λk
e o espaço tangente à órbita desta aplicação nos dão todas as de-
formações possı́veis desta aplicação. Isto significa que qualquer ve-
locidade de deformação diferenciável V da aplicação f pode ser apre-
sentada, perto do ponto distinto, na forma

n
∂f (x)

k
∂F
V (x) = hi (x) + cj (x, 0)
i=1
∂xi j=1
∂λj
para algumas funções diferenciáveis hi e constantes cj .
Teorema 4.19. Qualquer deformação versal infinitesimal é versal.
Corolário 4.20. Uma deformação versal do germe de uma função no
seu ponto crı́tico de multiplicidade finita µ pode ser tomado na forma

µ
F (x, λ) = f (x) + λi ej (x)
j=1

onde as funções e1 , e2 , . . . , eµ formam uma base da álgebra local Q∇f .


Corolário 4.21. A dimensão do parâmetro de uma deformação versal
do germe de uma função no seu ponto crı́tico de multiplicidade finita
µ não pode ser menor do que a dimensão da álgebra local da aplicação
gradiente da função no ponto distinto.
Corolário 4.22. As deformações versais de germes de funções em for-
mas normais pelo Teorema 4.10 podem ser tomadas na seguinte forma:
Ak : ±xk+1 + λ1 xk−1 + · · · + λk−1 x + λk , k ≥ 1;
Dk : x2 y ± y k−1 + λ1 x + λ2 y k−2 + · · · + λk−1 y + λk , k ≥ 4;
E6 : x3 ± y 4 + x(λ3 + λ2 y + λ1 y 2 ) + λ6 + λ5 y + λ4 y 2 ;
E7 : x3 + xy 3 + λ1 y 2 + y(λ4 x + λ3 x + λ2 x2 ) + λ7 + λ6 x + λ5 x2 ;
E8 : x3 + y 5 + x(λ4 + λ3 y + λ2 y 2 + λ1 y 3 ) + λ8 + λ7 y + λ6 y 2 + λ5 y 3 ;
60 ALEXEI DAVYDOV

Estes corolários seguem imediatamente do Teorema 4.19 (para sin-


gularidades dos tipos Ek compare-se com a Fig. 24). A demonstração
deste teorema pode ser vista no livro [1], onde também é demonstrado
que todas as deformações versais com k parâmetros são as mesmos até
difeomorfismos locais das bases. Uma deformação versal com o número
mı́nimo de parâmetros diz-se uma deformação miniversal.
O Teorema 4.19 juntamente com o teorema de Tougeron e o lema
4.9 implicam
Corolário 4.23. Uma deformação versal do germe de uma função no
seu ponto crı́tico P de multiplicidade finita µ pode ser tomado como

F (x, λ) = T (x, P ) + λα (x − P )α
α, |α|≤µ−1

onde T (x, P ) é o polinómio de Taylor da função f no ponto P até grau


µ + 1.
O diagrama de bifurcação de zeros para uma deformação F (x, λ)
de uma função f é o germe no ponto distinto (origem) no espaço dos
parâmetros do conjunto de todos os valores do parâmetro para os quais
o nı́vel zero da respectiva função F (., λ) é crı́tico.
Exemplo 21. Para a deformação versal x2 + λ1 de A1 o diagrama de
bifurcação de zeros é um ponto λ1 = 0 (Fig. 26A1 ).

λ1 λ2

λ1

O λ2
O Σ
O λ1

λ3

A1 A2 A3

Figura 26. Diagramas bifurcação para A1 , A2 e A3

Para a deformação versal x3 + λ1 x + λ2 de A2 o diagrama de bi-


furcação de zeros é a curva paramétrica λ1 = −3x2 e λ2 = 2x3 (Fig.
26A2 ).

Para a deformação versal x4 + λ1 x2 + λ2 x + λ3 de A3 o diagrama de


bifurcação parece-se com a Fig. 26A3 . A esta superfı́cie dá-se o nome
TEORIA DAS SINGULARIDADES 61

de cauda de andorinha.

Note-se que no caso do genótipo de uma variável o diagrama de


bifurcação é exactamente o conjunto de parâmetros para os quais a
função F (., λ) tem pelo menos uma raiz real múltipla. Na Fig. 27 está
representado o respectivo número de diferentes raı́zes reais. E na Fig.
28 está representado o gráfico do potencial U (x, λ) = x3 + λ1 x + λ2
para diferentes valores do parâmetro perto do diagrama de bifurcação.

λ1 λ2
duas raizes reais
sem λ1
raizes uma
reais raiz quatro raizes O
real reais
λ2
uma três
raiz O raizes
real reais O λ1 uma raiz
uma raiz real múltipla
real múltipla duas raizes
duas duas raizes reais ,
raizes duas raizes reais
, , reais múltiplas uma múltipla
reais uma múltipla λ3
sem raizes reais

A1 A2 A3

Figura 27. Número de raı́zes reais para A1 , A2 e A3

U U U U

O x O x O x O x

λ2
U U

O x O λ1 O x

U U U U

O O O O
x x x x

Figura 28. Gráficos do potencial x3 + λ1 x + λ2 para


diferentes λ
62 ALEXEI DAVYDOV

5. Estabilidade de aplicações
Aqui é investigada a estabilidade de aplicações.
5.1. Definição e exemplos. Consideremos uma aplicação f ∈ C ∞ (M, N ).
Recordemos que os difeomorfismos das variedades pré-imagem e ima-
gem actuam nesta aplicação do seguinte modo:
f
M −→ N
(18) ↓h ↓k
kf h−1
M −→ N
Então sob esta acção de grupos de difeomorfismos de dimensão in-
finita obtemos a órbita da nossa aplicação { kf h−1 | h ∈ Diff M, k ∈
Diff N }. A aplicação f diz-se RL-estável se esta órbita contém uma
vizinhança desta aplicação (na topologia por nós considerada).
Exemplo 22. Uma aplicação linear f : x → y = ax + b, a, b ∈ R,
entre linhas reais não é estável em qualquer topologia C k se a = 0, e
para a = 0 ela é estável na topologia C k para qualquer k ≥ 1.
Na verdade, para a = 0 a nossa aplicação é constante, e a sua imagem
é um ponto. É óbvio que a LR-equivalência preserva isso. É também
óbvio que qualquer vizinhança de uma aplicação constante contém uma
aplicação com pelo menos dois pontos na imagem. Consequentemente,
a aplicação constante não é RL-estável.
Para a = 0 a aplicação f é um difeomorfismo. O conjunto de difeo-
morfismos é aberto na topologia C k para qualquer k ≥ 1 (e é exac-
tamente uma órbita sob LR-equivalência). Donde, esta aplicação é
LR-estável.
Nas notações do diagrama (18) para qualquer aplicação g suficien-
temente próxima de f é suficiente tomarmos h é identidade e k : y →
g( y−b
a
) de modo a obtermos g(x) ≡ (k ◦ f ◦ h−1 )(x). Note-se que k é
um difeomorfismo porque a derivada da aplicação g estando suficiente-
mente próxima de f na topologia C 1 está próxima do valor a, e portanto
mesmo a derivada de k está próxima de a/a = 1. Mas uma aplicação
de uma linha em si mesma com derivada próxima de 1 é sempre um
difeomorfismo.
Exemplo 23. Uma aplicação x → y = ax2 + bx + c, onde a, b, c são
números reais, entre linhas reais é estável na topologia C k , k ≥ 1, se
a = 0 e b = 0 como foi visto acima.
Para a = 0 esta aplicação não é um difeomorfismo mas é estável
na topologia C k para qualquer k ≥ 2. De facto, qualquer aplicação f
suficientemente próxima de tal aplicação nesta topologia tem segunda
derivada próxima da constante 2a e limitada longe de zero. Portanto a
primeira derivada tem um único zero não degenerado, e a função tem,
ela mesma, um único ponto crı́tico x0 que é não degenerado e nos dá um
extremo global. O respectivo valor extremo y0 está localizado próximo
TEORIA DAS SINGULARIDADES 63

de c − b2 /(4a). As mudanças de coordenadas x̃ = x − x0 e ỹ = y − y0


levam estes ponto e valor em zero.
Logo, pelo Corolário do lema de Hadamard, a nossa aplicação pode
ser escrita, perto da origem, na forma f (x̃) = x̃2 h(x̃) para alguma
função diferenciável h; h(0) = 0 dado a origem ser um ponto crı́tico
não degenerado. Mas a função f anula-se apenas na origem pois tem
um único extremo global. Então, a respectiva representação existe em
toda a recta real, e a função diferenciável h (sendo igual a f (x̃)/x̃2 fora
de zero) nunca se anula. 
Finalmente, nas coordenadas x̄ = x̃ |h(x̃)|, ȳ = ỹ sign h(0) a apli-
cação toma a forma (a barra “ ¯ ” nas notações está omitida)

y = x2 .
Então todas as aplicações suficientemente próximas da aplicação qua-
drática inicial na topologia C k com k ≥ 2 pertencem à mesma órbita.
Donde, a nossa aplicação quadrática é LR-estável.
Exemplo 24. A aplicação dobra de Whitney

y1 = x 1
y2 = x22
entre planos reais é LR-estável na topologia C k para k ≥ 2. De facto,
para qualquer aplicação f = (f1 , f2 ), suficientemente próxima da apli-
cação dada, a sua primeira linha da matriz de Jacobi está próxima
da linha (1 0), e portanto a derivada f1,x1 é limitada longe de zero.
considerando as novas coordenadas x̃1 = f1 (x) reduzimos a primeira
componente da nossa aplicação à forma y1 = x̃1 .
A segunda derivada em ordem a x2 da segunda componente é iden-
ticamente igual a 2 para a nossa aplicação inicial, e portanto para um
aplicação f suficientemente próxima de tal derivada é positiva e limi-
tada longe de zero. Então, pelo teorema da função implı́cita a equação
f2,x2 = 0 tem uma solução única
x2 = h(x̃1 )
onde h é uma função diferenciável. Pelo corolário do lema de Hadamard
a segunda componente pode ser apresentada na forma
f2 (x̃1 , x2 ) = (x2 − h(x̃1 ))2 A(x̃1 , x2 ) + f2 (x̃1 , h(x̃1 ))
para alguma função diferenciável A sempre positiva (porque a segunda
derivada em ordem a x2 é positiva e longe de zero).
Agora em coordenadas

ỹ2 = y2 − f2 (y1 , h(y1 )), x̃2 = (x2 − h(x1 )) A(x1 , x2 )
a nossa aplicação toma a forma da inicial (só precisamos de omitir
o “til” nas notações). Portanto todas as aplicações suficientemente
próximas da aplicação inicial na topologia C k , k ≥ 2, pertencem à
64 ALEXEI DAVYDOV

mesma órbita sob LR-equivalência. Donde a nossa aplicação (=dobra


de Whitney) é LR-estável.
Exemplo 25. Uma aplicação x → xµ , µ ≥ 3, não é LR-estável pois há
pequenas perturbações desta aplicação que tomam, perto da origem, a
forma x → xµ + xk com k = 1 ou k = 2. Elas podem ter mais um
ponto crı́tico do que aplicação inicial. Donde a aplicação não é estável.
Encontrarmos uma redução análoga de uma aplicação numa boa
forma (normal) em situações mais complicadas não é um problema
simples. Existem formas mais simples de verificarmos a presença ou a
ausência de estabilidade.
5.2. Estabilidade Infinitesimal. Consideremos uma aplicação dife-
renciável f entre aplicações M e N , e o gráfico Γ desta aplicação
no produto directo M × N. Qualquer deformação diferenciável um-
paramétrica da nossa aplicação dá-nos a respectiva velocidade v da
deformação do gráfico ao longo da “direcção vertical” (=ao longo da
direcção da variedade imagem). Note-se que o domı́nio desta veloci-
dade é a variedade pré-imagem mas o seu valor num ponto x ∈ M
pertence ao plano tangente Tf (x) N (Fig. 29).

Ny y = f (x) + v(x)

y = f (x)

Mx

Figura 29. Possı́veis deformações de uma aplicação

É muito natural esperarmos que uma aplicação seja LR-estável sse


qualquer velocidade da deformação é dada por algumas deformações
das identidades nas variedades imagem e pré-imagem.
Sejam H e K deformações um-paramétricas das identidades, então
em coordenadas apropriadas temos
H (x) = x + h(x) + . . . e K (y) = y + k(y) + . . .
Onde “. . . ” são pelo menos de segunda ordem em relação a . Cálculos
simples para a respectiva deformação f = K f H−1 da aplicação dão:
f (x) =K f H−1 (x)
=f (x − h(x) + . . . ) + k(f (x)) + . . .
=f (x) + [k(f (x)) − f∗ (x)h(x)] + . . .
onde, mais uma vez, os “. . . ” são de pelo menos segunda ordem em
relação a .
TEORIA DAS SINGULARIDADES 65

Então a respectiva velocidade da deformação da aplicação inicial é


dada pela expressão entre parêntesis rectos:

(19) v(x) = k(f (x)) − f∗ (x)h(x)

É claro que a resolução desta equação não depende das coordenadas.


Uma aplicação (um germe de uma aplicação) diz-se RL-estável in-
finitesimal se a equação homológica (19) tem uma solução diferenciável
h, k para qualquer campo deformação v.
Teorema de Mather. Uma aplicação própria diferenciável entre va-
riedades é RL-estável se e só se ela fôr estável infinitesimal.
Nota 29. Existe também a versão local deste teorema para germes de
aplicações (válida para variantes diferenciáveis, analı́ticas e formais).
A demonstração do teorema de Mather é omitida. Ela pode ser vista
em [1] para a variante local, e em [3] para a global.
Exemplo 26. Voltemos aos nossos últimos exemplos e consideremo-
los no âmbito do teorema de Mather.
Para uma aplicação x → y = ax + b (a e b são reais) a equação
homológica toma a forma

v(x) = k(ax + b) − ah(x).


Para a = 0 o lado direito desta equação é constante e a equação não
tem solução num campo deformação não constante v. Para a = 0 a
nossa equação tem um número infinito de soluções, nomeadamente,
para qualquer k diferenciável podemos considerar h(x) = −(v(x) −
k(ax + b))/a. Assim, pelo teorema de Mather a nossa aplicação é LR-
estável quando a = 0 e não é LR-estável para a = 0.
Para uma aplicação x → y = ax2 +bx+c ( a, b, c são reais) a equação
homológica toma a forma
v(x) = k(ax2 + bx + c) − (2ax + b)h(x).
Para a = 0 esta equação tem sempre solução quando b = 0 e não tem
solução quando b = 0 como foi visto acima. Para a = 0 a aplicação
é própria e qualquer campo v pode ser representado na forma v(x) =
u(2ax + b). Então as funções k, k ≡ u(0), e h, −(2ax + b)h(x) ≡
u(2ax+b)−u(0), dão-nos a solução pretendida. Note-se que a existência
de uma solução diferenciável h da última equação segue do lema de
Hadamard. Assim, pelo teorema de Mather a nossa aplicação é LR-
estável quando a = 0.
Para a aplicação própria dobra de Whitney

y1 = x1
y2 = x22
66 ALEXEI DAVYDOV

a equação homológica respectiva toma a forma


      
v1 (x1 , x2 ) 1 0 h1 (x1 , x2 ) k1 (x1 , x22 )
=− +
v2 (x1 , x2 ) 0 2x2 h2 (x1 , x2 ) k2 (x1 , x22 )
As funções h1 ≡ −v1 , k1 ≡ 0, k2 (x1 , x2 ) ≡ v2 (x1 , 0) e h2 sendo a
solução da equação v2 (x1 , x2 ) − v2 (x1 , 0) = −2x2 h2 (x1 , x2 ) (que existe
pelo lema de Hadamard) dão-nos a solução desta equação homológica
para qualquer campo deformação v. Portanto a aplicação dobra de
Whitney é LR-estável pelo teorema de Mather.
Para a aplicação própria f : x → y = x5 entre linhas reais a equação
homológica toma a forma
v(x) = −5x4 h(x) + k(x5 ).
Ela não tem qualquer solução para v(x) = xk com k ∈ {1, 2, 3}. Pelo
teorema de Mather esta aplicação f não é LR-estável.
Algumas propriedades do germe de uma aplicação num ponto dizem-
se k-determinadas se o germe, neste ponto, de qualquer outra aplicação
com o mesmo k-jacto tem a mesma propriedade.
Exemplo 27. O teorema de Tougeron implica que a LR-classe do
germe de uma função no seu ponto crı́tico de multiplicidade finita µ é
(µ + 1)-determinado.
Teorema 5.1. Um germe LR-estável infinitesimal de uma aplicação
diferenciável numa variedade n-dimensional é (n + 1)-determinado.
Isto significa que, se existe um germe nestas condições, então ele é
LR-equivalente ao germe no ponto distinto de qualquer outra aplicação
com o mesmo (n + 1)-jacto.
Exemplo 28. Uma função f é uma aplicação na recta real (uma va-
riedade 1-dimensional). Então por este teorema a sua estabilidade
infinitesimal, próximo de um ponto crı́tico, é 2-determinada. Portanto
num qualquer destes pontos P a função tem de ser LR-equivalente
ao seu polinómio de Taylor de grau 2, nomeadamente, a f (P ) + Q(x)
onde Q é uma forma quadrática. Agora a condição de estabilidade
infinitesimal obriga imediatamente que a derivada Q tenha de ser um
difeomorfismo local, isto é, o ponto crı́tico tem de ser não degenerado.
5.3. Singularidades locais LR-estáveis em baixas dimensões.
As seguintes afirmações mostrar-se-ão particularmente úteis.
Proposição 5.2. No espaço das matrizes reais de dimensão n × m o
conjunto de matrizes de caracterı́stica menor ou igual a r é a imagem
por uma aplicação própria diferenciável de um espaço de dimensão
nm − (n − r)(m − r).
O espaço das matrizes de dimensão n × m é também o espaço das
aplicações lineares do espaço aritmético m-dimensional no espaço ari-
tmético n-dimensional, e o núcleo de uma tal aplicação é um subespaço
linear.
TEORIA DAS SINGULARIDADES 67

Consideremos a variedade dos subespaços lineares V de dimensão


n − r no espaço das pré-imagens, e o espaço dos pares (A, V ) tais
que V ⊂ ker A; este último é uma variedade de dimensão dada por
nm − (n − r)(m − r). A aplicação que procuramos pode ser tomada da
forma (A, V ) → A.
Esta proposição juntamente com o teorema da transversalidade de
jactos de Bathin-Lin implicam de imediato:
Corolário 5.3. O conjunto de aplicações de uma variedade m-dimen-
sional numa variedade n-dimensional sem singularidades de caracte-
rı́stica r tal que m < (n − r)(m − r), é aberto na topologia fina C 2 e
denso na topologia fina C ∞ .
A tabela seguinte mostra-nos a mais pequena caracterı́stica possı́vel
de uma aplicação tı́pica de uma variedade m-dimensional numa varie-
dade n-dimensional.
m\n 1 2 3 4 ...
1 0 1 1 1 ...
2 0 1 1 2 ...
(20)
3 0 1 2 2 ...
4 0 1 2 2 ...
... ... ... ... ... ...
Teorema 5.4. Uma aplicação genérica de uma variedade m-dimen-
sional numa variedade n-dimensional, para 1 ≤ n ≤ 3, tem apenas
singularidades locais LR-estáveis. Perto de qualquer um dos seus pon-
tos crı́ticos uma tal aplicação toma uma das seguintes formas:
I. Para n = 1:
x21 + · · · + x2r − x2r+1 − · · · − x2m
II. Para n=2:
(a) Aplicação dobra de Whitney:

y1 = x1
y2 = x22 + Q3,r (x)
(b) Aplicação cúspide de Whitney:

y1 = x1
y2 = x32 + x1 x2 + Q3,r (x)
III. Para n=3:
(a) Aplicação guarda-chuva de Whitney (m = 2):

 y1 = x 1
y2 = x2
 y = x2 x
3 1 2
68 ALEXEI DAVYDOV

(b) Aplicação dobra de Whitney (m ≥ 3):



 y1 = x1
y2 = x2
 y = Q (x)
3 3,r

(c) Aplicação cúspide de Whitney (m ≥ 3):



 y1 = x1
y2 = x2
 y = x3 + x x + Q (x)
3 3 1 3 4,r

(d) Aplicação cauda de andorinha (m ≥ 3):



 y1 = x1
y2 = x2
 y = x4 + x x2 + x x + Q (x)
3 3 2 3 1 3 4,r

em coordenadas locais diferenciáveis apropriadas com as origens no


ponto distinto e na sua imagem pela aplicação por nós considerada;
aqui tem-se sempre Qi,r (x) = x2i + · · · + x2r − x2r+1 − · · · − x2m .
TEORIA DAS SINGULARIDADES 69

6. Exercı́cios
1. Na recta real na topologia local, introduza dois atlas C ∞ que não
sejam C 1 -compatı́veis.
Há atlas que não são C 0 -compatı́veis? Justifique a resposta.
2
2. No plano real Rx,y com a topologia habitual consideremos a união
de duas rectas reais não paralelas. Prove que esta união não é
uma variedade na topologia induzida.
2
3. No plano real Rx,y considere o conjunto x5 +y 5 = 1 com a topologia
induzida. Introduza qualquer atlas diferenciável neste conjunto.
Pode este atlas ser formado apenas por uma carta?

4. Dois corpos rı́gidos estão unidos por uma ligação esférica. Quan-
tas coordenadas são necessárias de modo a definir unicamente a
sua posição no espaço (aritmético) 3-dimensional.

5. Construa um difeomorfismo C k do subconjunto do plano |x|+|y| <


1 no plano completo, k ≥ 0.

6. Mostre que numa variedade k-dimensional cada ponto tem uma


vizinhança honeomórfica a todo o Rk (Dica: use a solução de 5)

7. Para uma aplicação diferenciável f , um certo ponto não é crı́tico;


seja v uma velocidade não nula nesse ponto. Pode a imagem desta
velocidade, pela aplicação f∗ do espaço tangente, dar-nos veloci-
dade zero no ponto respectivo?

8. Para uma aplicação f entre variedades o seu gráfico é o conjunto


de todos os pontos (x, f (x)) no produto directo destas varieda-
des. Introduza neste gráfico uma topologia e uma estrutura dife-
renciável tal que o gráfico seja diferenciavelmente difeomórfico à
variedade pré-imagem.
2
9. Num plano Rx,y construa uma função diferenciável que seja nula
na origem e fora da bola unitária mas não é nula na bola aberta
perfurada 0 < x2 + y 2 < 1.

[GP] Mostre que os espaços aritméticos de diferentes dimensões não são


difeomórficos.

10. Mostre que a imagem de uma imersão não pode ser uma variedade
na topologia induzida.
70 ALEXEI DAVYDOV

[GP] Mostre que a imagem de um conjunto aberto por uma submersão


é um conjunto aberto.

11. Consideremos duas funções contı́nuas na recta real designadas


compatı́veis se:
(a) uma delas é igual à outra multiplicada por uma função contı́nua;
(b) uma delas é igual à outra multiplicada por uma função contı́nua
não nula.
Estas relações binárias, (a) ou (b), definem relações de equivalência?

12. Dois conjuntos coincidem numa vizinhança perfurada de um ponto.


Definem eles o mesmo germe neste ponto?

13. Duas funções diferenciáveis, no plano real, têm derivada nula no


eixo das abcissas até à ordem k1 e k2 . Que classe de diferencia-
bilidade podemos garantir à função que coincide com uma destas
funções na metade superior do plano e com a outra na metade
inferior?

14. Na recta real consideremos duas funções diferenciáveis tendo, na


origem, valor zero mas derivadas diferentes. Mostre que o número
de singularidades do germe na origem deste par de funções
– é infinito para a R-equivalência;
– e é um para a R+ -equivalência
(para além da R-equivalência, a R+ -equivalência permite a adição
de uma função diferenciável a ambas funções sob consideração).

15. Na situação analı́tica no problema 16 qual seria o número de sin-


gularidades para a R+ -equivalência se omitirmos a condição sobre
as derivadas na origem.

16. Mostre que as projecções naturais entre espaços jacto são sub-
mersões.

17. Duas funções analı́ticas num ponto têm contacto de ordem in-
finita. Definem elas o mesmo germe neste ponto?

[Ar] Calcule o conjunto de pontos crı́ticos e valores crı́ticos da apli-


2
cação Rx,y → Rx,y2
definida pela fórmula z → z 2 + z̄, onde
z = x + iy, z̄ = x − iy, e i,  são a unidade imaginária e uma
parâmetro real, respectivamente.

18. Pode o conjunto de valores crı́ticos de uma função real ser denso
em algum segmento?
TEORIA DAS SINGULARIDADES 71

19. Explique porque a convergência de uma sequência de aplicações


na topologia fina C k implica a convergência desta sequência na
topologia (fina) C r para qualquer r, r < k não negativo.
1
20. A sequência de funções fn (x) = e 1+nx2 , x ∈ R, 1 ≤ n < ∞, não
converge na (a) topologia fina C k , (b) topologia C k , para algum
inteiro não negativo k?

21. As duas funções seguintes definem ou não uma partição diferen-


ciável unitária na linha?
2 and 1 − 1+x2 ;
x x
(a) 1+x
2x2 2x2
(b) 1+x 2 and 1 − 1+x2 ;
x2 x2
(c) 1+x 2 and 1 − 1+x2 ;

Justifique a resposta.

22. A cocaracterı́stica de uma aplicação diferenciável f : M → N num


ponto é a diferença entre a sua caracterı́stica máxima possı́vel e a
sua caracterı́stica:

corankf (.) = min{dim M, dim N } − rankf (.).

Mostre que o conjunto de aplicações de cocaracterı́stica menor do


que algum inteiro k em cada ponto é aberto.

23. A cocaracterı́stica de um ponto crı́tico de uma função C k , k ≥ 2, é


definida (em coordenadas locais) como a cocaracterı́stica da ma-
triz Hessiana desta função neste ponto. Mostre que o conjunto de
funções com pontos crı́ticos de cocaracterı́stica menor ou igual a
k é aberto.

24. Quais pares de aplicações f : Sφ1 → Rx,y 2


e g : Rt → Rx,y2
são
transversais (φ é uma ângulo no cı́rculo)? Justifique a resposta.
(a) x = cosφ, y = sinφ e x = t, y = 0;
(b) x = cosφ, y = sin(2φ) e x = t, y = 0;
(c) x = cosφ, y = sin(2φ) e x = t2 , y = 0.
(d) x = cosφ, y = sin(2φ) e x = t2 , y = 1.

25. Mostre que o conjunto de aplicações f : Sφ1 → Rx,y


2
transversais a
g : t → (0, arctan t) não é aberto.

26. Mostre que o conjunto dos 1-jactos de aplicações C k , k ≥ 1, do


plano no plano com pontos crı́ticos de cocaracterı́stica máxima
formam uma subvariedade no espaço dos 1-jactos.
Qual o valor desta cocaracterı́stica e qual a codimensão desta
subvariedade?
72 ALEXEI DAVYDOV

Quais são as equações que definem esta subvariedade em coor-


denadas locais?
Se para k ≥ 2 a extensão 1-jacto de alguma aplicação é transver-
sal a esta subvariedade, então quantos pontos crı́ticos, de tal ca-
racterı́stica, tem esta aplicação?

27. Duas aplicações têm contacto de ordem 13 nalgum ponto. Uma


delas é transversal, nesse ponto, a alguma subvariedade C 1 no
espaço do 11-jacto. Será que a outra também tem de o ser ou
não? Justifique a resposta.

28. Duas aplicações têm contacto de ordem 19 nalgum ponto. Uma


delas é transversal, neste ponto, a alguma subvariedade C 1 no
espaço do 19-jacto. Será que a outra também tem de o ser ou
não? Justifique a resposta.

29. Mostre que o conjunto de aplicações f : Sφ1 → Rx,y 2


transversais
a g : t → (0, 1+t2 ) é aberto e denso enquanto a aplicação g não é
t

própria.
Isto contradiz o teorema da transversalidade de Bahtin-Lin?

30. Mostre que uma aplicação diferenciável genérica entre varieda-


des n-dimensionais não tem pontos crı́ticos de cocaracterı́stica
máxima se n > 1.

31. Mostre que duas funções diferenciais não têm pontos crı́ticos co-
muns se este par de funções é genérico.

32. Mostre que dois campos vectoriais diferenciáveis numa varieda-


de não têm pontos estacionários comuns se este par de campos é
genérico.

33. Mostre que uma aplicação diferenciável genérica de uma varieda-


de n-dimensional numa variedade 2n-dimensional não tem pontos
crı́ticos.

34. Mostre que o nı́vel zero de um potencial C 1 genérico (Hamiltoni-


ano genérico) é não degenerado.

35. Uma aplicação C 1 f : Sφ1 → Rx,y


2
é transversal à curva x4 +y 4 = 4.
O número das pré-imagens desta curva por esta aplicação tem ou
não de ser finito?

36. Uma aplicação C 1 f : Rt → Rx,y


2
é transversal à curva x4 + y 4 = 4.
O número das pré-imagens desta curva por esta aplicação tem ou
TEORIA DAS SINGULARIDADES 73

não de ser finito?

37. Mostre que o conjunto de valores crı́ticos de uma função diferen-


ciável na linha tem medida zero.

38. Podem os valores crı́ticos de uma função diferenciável na linha


formar um intervalo não vazio?

39. As funções diferenciáveis que se anulam em algum conjunto for-


mam um grupo? um anel? uma álgebra? um ideal na álgebra de
todas as funções diferenciáveis? Em qualquer dos casos introduza
a estrutura algébrica respectiva se “SIM” e justifique a resposta
se “NÃO”.

40. As funções diferenciáveis com primeiras derivadas nulas em al-


gum conjunto fixo formam um grupo? um anel? uma álgebra?
um ideal na álgebra de todas as funções diferenciáveis? Em qual-
quer dos casos introduza a estrutura algébrica respectiva se “SIM”
e justifique a resposta se “NÃO”.

41. Uma aplicação entre espaços aritméticos m-dimensionais tem a


forma
(x1 , x2 , . . . , xm ) → (xr11 , xr22 , . . . , xrmm )
para alguns inteiros positivos r1 , r2 , . . . , rm . Tem, a álgebra local
desta aplicação na origem, dimensão finita ou não? Porquê?

42. Uma imersão é uma aplicação de multiplicidade finita ou não?


Porquê?

43. Quando é que uma submersão é uma aplicação de multiplicidade


finita? Porquê?

44. Indique alguma base da álgebra local, na origem, da aplicação:


(a) (x, y) → (x5 + y 2 , y);
(b) (x, y) →
 (x2 + y 2 , x2 y);
(c) (x, y) → (x2 + y 2 , x2 y 2 );
(d) (x, y, z) →
 (x2 , y 2 , z);
(e) (x, y, z) → (x2 , y 2 , z 2 );

45. Pode alguma função diferenciável f de variáveis reais x, y ser rep-


resentada, perto da origem, na forma:
(a) f (x, y) = (x2 + y 2 )p(x, y) + xA(y) + B(y),
(b) f (x2 , y) = (x2 + y 2 )q(x2 , y) + C(y)
(c) f (x, y) = (x3 + y 2 )q(x, y) + xA(y) + C(y)
(d) f (x, y, z) = (x + y 1001 + z 2001 )q(x, y, z) + A(y)B(z)
74 ALEXEI DAVYDOV

para algumas funções diferenciáveis p, q, A, B, C?

46. É a origem um ponto crı́tico de multiplicidade finita das seguintes


funções?
(a) f (x, y) = x43 + y 59
(b) f (x, y, z) = x5 + yz 2 + z 8
(c) f (x, y) = xy 2 + y 99
(d) f (x, y, z) = x5 + y 2 z + z 8

47. O 5-jacto, na origem, das seguintes funções é suficiente em ordem


à R-equivalência?
(a) f (x, y) = x3 + y 3
(b) f (x, y, z) = x3 + xy 2
(c) f (x, y) = x2 y 2
(d) f (x, y, z) = x4 + y 4

48. Existe alguma deformação paramétrica (com a dimensão do parâ-


metro finita) versal de um germe na origem das seguintes funções?
(a) f (x, y) = x1001 + y 999
(b) f (x, y, z) = x5 + yz 2 + z 8
(c) f (x, y) = xy 2 + y 1001
(d) f (x, y, z) = x5 + y 2 z + z 8
Se “NÃO” justifique a resposta, se “SIM” indique a deformação
versal respectiva e a dimensão do parâmetro.

49. O 5-jacto das seguintes funções na origem é suficiente em relação


à R-equivalência?
(a) f (x, y) = x3 + y 3
(b) f (x, y, z) = x3 + xy 2
(c) f (x, y) = x2 y 2
(d) f (x, y, z) = x4 + y 4
Se “NÃO” justifique a resposta, se “SIM” indique a deformação
versal respectiva e a dimensão do parâmetro.

50. Os nı́veis zero de duas funções no plano real são não crı́ticos,
contêm a origem e têm tangência cúbica na origem. São, os 3-
jactos (4-jactos; 7-jactos) destas funções na origem suficientes para
a singularidade na origem da união dos seus nı́veis zero?

51. A origem não é um ponto crı́tico para cada uma de três funções
dadas tendo, neste ponto, valor zero e o mesmo 1-jacto mas 2-
jactos diferentes, aos pares. Podem os 3-jactos destas funções na
origem ser suficientes para a singularidade na origem da união dos
seus nı́veis zero?
TEORIA DAS SINGULARIDADES 75

52. A origem não é um ponto crı́tico de cada uma de três funções dadas
de duas variáveis com valor zero e o mesmo 1-jacto mas diferentes
2-jactos, aos pares, na origem. Podem os 13-jactos destas funções
na origem ser não suficientes para a singularidade na origem da
união dos seus nı́veis zero?

53. A origem não é um ponto crı́tico de cada uma de três funções


dadas de três variáveis com valor zero e nı́veis zero transversais
aos pares na origem. Podem os 1-jactos destas funções, na origem,
ser não suficientes para a singularidade na origem da união destes
nı́veis?

54. A origem não é um ponto crı́tico de cada uma de duas funções


dadas de três variáveis com valor zero e os mesmos 1-jactos na
origem. Podem os 2-jactos destas funções ser suficientes para a
singularidade na origem da união dos seus nı́veis zero?

55. A origem não é um ponto crı́tico de cada uma de duas funções


dadas de três variáveis com valor zero e os mesmos 1-jactos na
origem. Podem os 2-jactos destas funções ser não suficientes para
a singularidade na origem da união dos seus nı́veis zero?

Referências
[1] V.I. Arnol’d, A. Varchenko, S. Goussein-Zade - Singularités des Applications
Différentiables.
Éditions MIR, 1986.
[2] V.I. Arnol’d - Catastrophe theory.
Springer-Verlag, 1992.
[3] M.Golubitsky and V.Guillemin, - Stable Mappings and Their Singularities.
Springer, 1973.
[4] V.Guillemin and A.Pollack, - Differential topology.
Prentice-Hall, 1974.
[5] Morris W.Hirsh - Differential topology.
Springer, 1976.

Vladimir State University, Russia

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