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1. Introdução
Estas são notas de cinco aulas de um mini-curso que foi parte do “Symposium on Spectral
and Scattering Theory,” realizado em Recife e Serrambi, de 11 a 22 de Agosto de 2003.
O propósito desse mini-curso foi de apresentar ao estudante de graduação técnicas modernas
de equações a derivadas parciais através de um tópico relativamente simples, mas ao mesmo
tempo bastante moderno, e que talvez seja o primeiro contato do estudante de graduação com
um assunto de matemática desenvolvido no século 20. Os principais pré-requisitos para se ler
essas notas são um bom conhecimento de cálculo avançado e uma certa maturidade matemática.
Em seu famoso artigo [14], de 1917, Johann Radon definiu a seguinte aplicação: Dada uma
função contı́nua no plano R2 e de suporte compacto– isto é, existe C > 0 tal que f (x, y) = 0
para |(x, y)| > C– e um vetor ω ∈ R2 com |ω| = 1, a integral de linha da função f ao longo da
reta L(ω, s) que é perpendicular a w, e que está a uma distância s da origem, veja a figura 1,
será denotada por
Z
(1.1) Rf (ω, s) = f dl, s ∈ R, |ω| = 1,
L(ω,s)
Essa é uma aplicação que leva funções de (x, y) em funções de (ω, s). Na verdade vamos
demonstrar que
R : C0∞ (R2 ) −→ C0∞ (S1 × R)
(1.2)
f 7−→ Rf
leva uma função C ∞ de suporte compacto em R2 em uma função C ∞ de suporte compacto em
Sn−1 × R. Há várias perguntas naturais sobre esta aplicação:
1) R é injetiva?
2) Qual é a imagem de R?
3) É possivel se encontrar uma fórmula para a inversa de R?
Também é fácil de se ver que, se f (x, y) = 0 para todo (x, y) com |(x, y)| > ρ, então Rf (s, ω) =
0 para |s| > ρ, veja figura 2. Uma pergunta natural e muito importante é se a recı́proca é
verdadeira. Ou seja
4) Se Rf (ω, s) = 0 para |s| > ρ e para todo ω ∈ S1 , é verdade que f (x, y) = 0 para todo (x, y)
tal que |(x, y)| > ρ?
Finalmente, provavelmente o leitor está se perguntando:
5) Por que cargas d’água Radon ia se preocupar com uma coisa dessas?
A resposta da última pergunta é fácil: Eu não sei, e nem tenho certeza que Radon tinha de
fato um propósito para estudar essas perguntas. Fritz John escreve em [7] que o interesse de
1
2 SÁ BARRETO
ω
x
L(s, ω)
f=0
x
L(s, ω), s > ρ
Figura 2. Se f (x, y) = 0 quando |(x, y)| > ρ, então Rf (ω, s) = 0 quando |s| > ρ.
Radon por estas questões foi motivado por problemas em mecânica do contı́nuo, mas não dá
detalhes. Entretanto, recentemente as transformadas de Radon têm sido aplicadas em muitos
problemas práticos.
Muitas coisas em matemática, ou de um modo mais geral em ciências, são assim, se estuda
um problema por que ele é interessante, e a princı́pio pode vir a ter aplicações ou não.
Como este é um curso de matemática, aqui nós vamos procurar entender rigorosamente as
propriedades dessa transformada. Também vamos estudar a transformada raio-x.
Ω
I0
é baseada na transformada de Radon. A idéia básica desse procedimento, que primeiro foi
discutida em [3], é a seguinte:
Seja Ω ⊂ Rn um objeto no espaço Rn ; n = 2, 3, são os casos que interessam na prática. Seja ξ
uma reta no Rn e suponha um raio-x é direcionado a Ω ao longo da reta ξ. Veja figura 3. Sejam
I0 e I a intensidade do raio-x antes de penetrar em Ω e depois de sair de Ω repectivamente.
Quando o raio-x percorre uma distância ∆x ao longo de ξ ele sofre uma perda de intensidade
∆I. O modelo fı́sico diz que
∆I
= −f (x)∆x,
I
onde f (x) é chamado de coeficiente de absorção.
Portanto
dI
= −f (x) dx
I
Integrando esta equação ao longo da reta ξ temos
µ ¶ Z
I0
log = f (x) dx.
I ξ
A. Cormack, autor de [3], é um fı́sico sul-africano e um dos pioneiros nas aplicações to-
mográficas dos raios-x. A. Cormack conta em [4]– um artigo que escreveu para uma conferência
que festejou os setenta e cinco anos da transformada de Radon– que chegou a este problema
em 1956 quando trabalhava no departamento de radiologia do hospital Groote Schurr (o mesmo
onde foi feito o primeiro transplante de coração) na cidade do Cabo, África do Sul.
A aplicacão desta idéia é imediata. O médico deseja saber informações sobre os diferentes
tecidos de uma determinada parte do corpo humano a partir de medidas feitas com raios-x.
Por exemplo, a presença de uma anomalia num tecido gera uma diferença no seu coeficiente de
absorção e, se determinando o coeficiente de absorção, determina-se a presença de algo estranho
no tecido. Mas essas medidas não dão diretamente o valor do coeficiente de absorção, apenas
sua integral ao longo da reta percorrida pelo raio-x, veja figura 4. Portanto esta questão de
4 SÁ BARRETO
Maquina de Raios−x
Sensor
Objeto
com diferentes
coeficientes
~
de absorcao
~
Sensor
Maquina de Raios−x
Exercı́cio 3.1. Construa uma função em C ∞ (Rn ) que tenha suporte compacto.
1
Sugestão: Mostre primeiro que a função f (x) = e− x se x > 0 e f (x) = 0 se x ≤ 0, é C ∞ e
TRANSFORMADAS DE RADON 5
todas as suas derivadas se anulam em x = 0. Mostre que g(x) = f (x)f (1 − x) é uma função C ∞
e que g(x) = 0 se x ≤ 0 ou x ≥ 1.
A demonstração de (3.4) não será dada aqui. O leitor pode encontrá-la no livro [11].
4. Transformada de Radon em Rn
A transformada de Radon foi extensivamente estudada por S. Helgason [10], F. John [8],
P. Lax & R. Phillips [12], D. Ludwig [13] e por muitos outros. Helgason estendeu a teoria
para espaços homogêneos mais gerais, icluı́ndo o espaço hiperbólico. A referência principal é
o excelente livro de S. Helgason [10]. Os teoremas incluı́dos aqui são clássicos e podem ser
encontrados nas referências acima, mas algumas das provas são um pouco diferentes das que
encontrei na literatura.
Dados um vetor unitário ω na esfera de raio 1 em Rn , que será denotada por Sn−1 , e um
número real s, o conjunto
Dada uma função f ∈ S(Rn ) considere a integral de superfı́cie da função f ao longo do plano
H(ω, s), isto é
Z
(4.2) Rf (ω, s) = f dS.
H(ω,s)
Há duas importantes obervações a serem feitas sobre a função Rf (ω, s). Primeiro note que
H(ω, s) = H(−ω, −s), portanto
Rf (ω, s) = Rf (−ω, −s).
Segundo, observe que dado k ∈ N,
Z Z Z
(4.3) sk Rf (ω, s) ds = hx, ωik f (x) dS ds.
R R H(ω,s)
Porém hx, ωik é um polinômio homogêneo de grau k em ω, com coeficientes que também
são polinômios homogêneos de grau k em x. Quando calculamos a integral (4.3) obtemos um
polinômio homogêneo de grau k em ω.
Essas duas observações nos dizem que para uma função F (ω, s) estar na imagem da aplicação
R é necessário que F satisfaça duas condições:
(4.4) F (ω, s) = F (−ω, −s),
Z
(4.5) sk F (ω, s) ds = Pk (ω) é um polinômio homogêneo de grau k em ω.
R
Exercı́cio 4.4. Uma função f : Rn −→ R é dita ser radial se existe g : R −→ R tal que
f (x) = g(|x|), para todo x ∈ Rn . Prove que se f é radial, então
Z ³ ´ Z ∞ ³ ´
1 1
(4.6) Rf (ω, s) = F (s) = g (s2 + |y|2 ) 2 dy = Ωn−1 g (s2 + t2 ) 2 tn−2 dt.
Rn−1 0
TRANSFORMADAS DE RADON 7
z= s ω + t θ
sω
Desta forma a integral em (4.9) converge. Por outro lado, da definição de H(ω, s) e do teorema
de Fubini, temos que
Z Z ÃZ !
−iλs −iλs
Rf (ω, s)e ds = e f (x) dS ds =
R R H(ω,s)
Z ÃZ ! Z
e−iλhω,xi f (x) dS ds = e−iλhω,xi f (x) dx = fb(λω).
R H(ω,s) Rn
8 SÁ BARRETO
Portanto já sabemos que R : S(Rn ) ←→ M tem uma inversa. É portanto natural tentar
computar R−1 . Aqui aparece uma grande diferença entre os casos n par e ı́mpar.
Já que sabemos inverter a transformada de Fourier, e temos uma fórmula que relaciona as
tranformadas de Radon e de Fourier, vamos portanto utilizá-las.
O objetivio do próximo exercı́cio é encontrar uma fórmula mais direta para (4.11) quando
n = 2.
10 SÁ BARRETO
R2
x2
R1
x1
ρ 0
Exercı́cio 4.10.
Teorema 4.5. Seja f ∈ C ∞ (Rn ) tal que |x|k |f (x)| → 0, quando |x| → ∞, para todo k ∈ N. Se
Rf (s, ω) = 0 para |s| > ρ então f (x) = 0 para |x| > ρ.
Demonstração. Há várias provas e muitas generalizações deste teorema, entre elas citamos [2, 5,
9, 10, 13, 18, 16]. Nós seguiremos a demonstração de Helgason [10], que além de muito elegante,
também é muito instrutiva. Com a exceção da demonstração de Strichartz [18], que na verdade
é para o caso particular em que n = 2, todas as outras demonstrações são mais sofisticadas.
Começaremos a prova do Teorema 4.5 com um resultado que a princı́pio não tem relação
nenhuma com o que queremos provar, mas que será muito útil. Este resultado também é
importante por si mesmo.
Proposição 4.1. Seja f : Rn −→ R uma função C ∞ que satisfaz |x|k f (x) → 0 quando |x| → ∞.
Para x ∈ Rn , e r > 0 sejam
S(x, r) = {y : |y − x| = r}
a esfera centrada em x de raio r, e
B(z, r) = {y ∈ Rn : |y − z| < r}
a bola centrada no ponto z e de raio r. Suponha que existe ρ > 0 tal que
Z
f (y) dSy = 0, para todos x, r tais que B(x, r) ⊃ B(0, ρ),
S(x,r)
Veja a figura 6. Então f (x) = 0 para todo x tal que |x| > ρ.
TRANSFORMADAS DE RADON 11
Demonstração. Fixemos uma bola B(x, r) = {y : |y − x| < r} tal que B(x, r) ⊃ B(0, ρ). Temos
portanto que
Z Z
f (y) dy = f (y) dy = C, uma constante
B(x,r) Rn
Considere o campo vetorial F (y) = f (x + y)(0, ...0, 1, 0, ..., 0), 1 na k-ésima posição. O teorema
da divergência nos dá que
Z Z
div F (y) dy = hF, ~ni dS.
B(0,r) S(0,r)
∂f
Mas div F (y) = + z) e hF, ~ni = f (x + y)ωk = f (x + y) yrk . Portanto obtivemos que
∂yk (x
Z Z
f (x + y)yk dS = f (x + y)(xk + yk ) dS = 0.
S(0,r) S(0,r)
Isso quer dizer que as hipóteses do teorema continuam valendo para a função xk f (x). Repetindo
o argumento concluimos que
Z
(4.12) f (y)P (y) dSy = 0, para todo polinômio P (y).
S(x,r)
Exercı́cio 4.11. Use o Teorema de Weierstrass, veja por exemplo o Teorema 7.24 de [15], para
demonstrar que (4.12) implica que f (x) = 0 se |x| > ρ.
Como em [10], provaremos primeiro o Teorema 4.5, com a hipótese adicional de que f é radial.
Ver exercı́cio 4.4 para a definição. Neste caso, sabemos do exercı́cio 4.4 que
Z ∞ ³ ´
1
F (s) = g (s2 + t2 ) 2 tn−2 dt.
0
Se n = 3 temos
1 dF (s)
= g(s).
s ds
12 SÁ BARRETO
Isso portanto garante que g(s) = 0 se s > ρ, como querı́amos demonstrar. Se n > 3 repetimos o
argumento usado acima n − 2 vezes e obtemos
µ ¶
1 d n−2 dn−3 g(s)
(4.13) F (s) = .
s ds dsn−3
Portanto, usando as hipóteses de decaimento de g, concluı́mos que g(s) = 0 se s > ρ. Isto
termina a demonstração para n > 2. O caso n = 2 é mais difı́cil pois o argumento usado acima
não funciona. Neste caso temos
Z ∞ ³ ´
1
(4.14) F (s) = g (s2 + t2 ) 2 dt.
0
Comecemos pelo seguinte
Exercı́cio 4.12. O objetivo deste exercı́cio é provar que se T : R −→ R é uma função de classe
C 1 e H(u) é definida por
Z u
T (v)
H(u) = 1 dv,
0 (u2 − v 2 ) 2
então
Z v
π d uH(u)
T (v) = du.
4 dv 0 (v 2 − u2 ) 21
Sugestão. Faça o seguinte:
Passo 1: Multiplique H(u) por u(λ2 − u2 ) e integre de 0 a λ. Use o teorema de Fubini para trocar
a ordem de integração.
Passo 2: Mostre que
Z λ
1 1 π
u(u2 − v 2 )− 2 (λ2 − u2 )− 2 du =
s 4
Fazendo a mudança de variáveis u = s−1 e v −2 = u2 − s2 em (4.14) obtemos
µ ¶ Z u −2 −1
1 1 v g(v )
F = 1 dv.
u u 0 (u2 − v 2 ) 2
¡ ¢
Aplicando o exercı́cio 4.12 para H(u) = u1 F u1 e T (v) = v −2 g(v −1 ) obtemos
Z v
−2 −1 d F (u−1 )
v g(v ) = du
dv 0 (v 2 − u2 ) 21
Como F (s) = 0 para s > ρ segue que F (u−1 ) = 0 se u < ρ1 . Portanto se v < ρ1 a integral é zero.
Assim g(v −1 ) = 0 se v < ρ1 , como querı́amos demonstrar.
Portanto demontramos que se f é radial, decai mais rapidamente que qualquer potência
negativa de |x| quando |x| → ∞, e que se Rf (ω, s) = 0 para |s| > ρ, então f (x) = 0 para
|x| > ρ.
Exercı́cio 4.13. Observe que no caso em que f é radial nós provamos um resultado mais forte.
Veja que o fato de que f (|x|) decai mais rapidamente de que qualquer potência negativa de
|x| quando |x| → ∞ não foi na verdade utilizado. Analise a prova do teorema para este caso
particular e estabeleça a ordem de decaimento necessária para que o argumento funcione.
TRANSFORMADAS DE RADON 13
Agora iremos reduzir o caso geral a uma combinação do caso radial com a Proposição 4.1.
Seja |S(x, r)| a área da superfı́cie da esfera S(x, r). Dada uma função contı́nua f : Rn −→ R,
a média esférica de f com respeito a S(x, r) é definida por
Z
1
Mf (x, r) = f (y) dSy .
|S(x, r)| S(x,r)
Mas |S(x, r)| = rn−1 Ωn , onde Ωn a área da esfera de raio 1 em n dimensões. Por exemplo
Ω2 = 2π, Ω3 = 4π 2 . Fazendo a mudança de variáveis y − x = rθ, θ ∈ Sn−1 , deduzimos que
Z
1
Mf (x, r) = f (x + rθ) dSθ
Ωn Sn−1
Consideremos r = |z|, z ∈ Rn . Tomando a transformada de Radon de Mf (x, •) com respeito a
z temos, conforme exercı́cio 4.4,
Z Z ∞
Ωn−1
RMf (x, s) = f (x + (s2 + t2 )θ)tn−2 dtdSθ .
Ωn Sn−1 0
Por outro lado, consideremos a integral
Z
I(x, s) = Rf (ω, s + hx, ωi) dSω .
Sn−1
Usando a definição da transformada de Radon temos
Z ÃZ ! Z ÃZ !
I(x, s) = f (y) dSy dSω = f (y) dSy dSω =
Sn−1 hy,ωi=hx,ωi+s Sn−1 hy−x,ωi=s
Z ÃZ !
f (x + z) dSz dSω .
Sn−1 hz,ωi=s
Portanto da Proposição 4.1 concluimos que f (x) = 0 se |x| > ρ. Isto conclui a demonstração do
Teorema 4.5. ¤
14 SÁ BARRETO
y B
R
A 1 x
Figura 7. Exercı́cio 4.14. Mostre que a integral na região limitada pela reta e
pelo semi-cı́culo é igual a zero. Popr outro lado, a integral ao longo do semi-cı́culo
vai para zero quando R → ∞.
1
c) Mostre que o resı́duo de em z = z0 é z1k e em z = 0 é − z1k .
z k (z−z0 )
R0 0
d) Use o cálculo dos resı́duos para mostrar que S(z0 ,r) g dSω = 0 para todo cı́rculo S(z0 , r) que
contém B(0, 1).
c) Conclua que o Teorema 4.5 não se aplica neste caso.
O Teorema 4.5 tem sido estendido para situações muito mais gerais do que a transformada
de Radon em Rn . Veja por exemplo [16, 17], porém esta questão do decaimento de f não é bem
compreendida. O objetivo do próximo exercı́cio e de dar uma demonstração para o Teorema 4.5
para o caso n = 2. Esta prova deve-se a R. Strichartz [18].
Exercı́cio 4.15.
TRANSFORMADAS DE RADON 15
t (x,t)
x−t x+t x
Exercı́cio 5.2. a) Mostre que se f1 (x) = 0 e f2 (x) = 0 para |x| > R, então u(x, t) = 0 se
|x| > t + R.
b) A interpretação fı́sica deste resultado é que as informações que se propagam através de (5.1)
o fazem com velocidade finita.
O próximo passo é resolver a equação das ondas em dimensões maiores do que um. Primeiro
recordamos que o Laplaciano ∆ em Rn é definido por:
∂2u
− ∆u = 0 Rn × (0, ∞)
(5.3) ∂t2
∂u
u(x, 0) = f1 (x), (x, 0) = f2 (x), f1 , f2 ∈ C ∞ (Rn ).
∂t
Ou seja, como fizemos acima, queremos encontrar uma fórmula para u(x, t) em termos de f1 e f2 .
A idéia principal é a de reduzir este caso ao uni-dimensional. Esta é a utilidade da transformada
de Radon. O primeiro passo é lembrarmos que do exercı́cio 4.2,
∂ 2 Rf
(5.4) (ω, s) = R(∆f )(ω, s).
∂s2
TRANSFORMADAS DE RADON 17
Denotemos a transformada de Radon na variável x de u(x, t) por Ru(ω, s, t). De (5.4) obtemos
∂ 2 Ru ∂ 2 Ru
(ω, s, t) − (ω, s, t) = 0
∂t2 ∂s2
∂Ru
Ru(ω, s, 0) = Rf1 (ω, s), (ω, s, 0) = Rf2 (ω, s).
∂t
Agora temos de tomar a transformada inversa de Radon de Ru. Como já vimos antes, há uma
diferença entre os casos n par e ı́mpar, sendo o caso ı́mpar mais simples. De (4.10) obtemos que,
1
com Cn = 2(2iπ) n−1 ,
Z
∂ n−1 Ru
u(x, t) = Cn n−1
(ω, hx, ωi, t) dSω =
Sn−1 ∂s
Z µ n−1 ¶
1 ∂ Rf1 ∂ n−1 Rf1
Cn (ω, hx, ωi + t) + (ω, hx, ωi − t) dSω +
2 Sn−1 ∂sn−1 ∂sn−1
Z µ n−2 ¶
1 ∂ Rf2 ∂ n−2 Rf2
Cn (ω, hx, ωi + t) − (ω, hx, ωi − t) dSω .
2 Sn−1 ∂sn−2 ∂sn−2
Esta fórmula nos dá u em termos das transformadas de Radon de f1 e f2 e é a base da Teoria
de Espalhamento de Lax & Phillips, [12]. Pode-se transformá-la em uma fórmula envolvendo f1
e f2 diretamente, mas nós só faremos isso aqui no caso n = 3.
Tomando n = 3 em (5.5) obtemos
Z Z
1 ∂ 2 Rf1 1 ∂Rf2
u(x, t) = − 2 2
(ω, hx, ωi + t) dSω − 2 (ω, hx, ωi + t) dSω =
8π Sn−1 ∂s 8π Sn−1 ∂s
Z Z
1 ∂2 1 ∂
− 2 2 Rf1 (ω, hx, ωi + t) dSω − 2 Rf2 (ω, hx, ωi + t) dSω .
8π ∂t Sn−1 8π ∂t Sn−1
18 SÁ BARRETO
(x,t)
t 3
R
x
t
S(x,t)
−4πu(x, t) =
Z Z ∞ Z Z ∞
∂2 2 2 21 ∂ 1
2
f1 (x + (s + t ) ω)s ds dSω y)) + f (x + (s2 + t2 ) 2 ω)s ds dSω =
∂t Sn−1 0 ∂t n−1 0
µ Z Z ∞ ¶ Z S Z ∞
∂ ∂ 1 ∂ 1
t f1 (x + (s2 + t2 ) 2 ω) ds dSω t f2 (x + (s2 + t2 ) 2 ω) ds dSω .
∂t S n−1 0 ∂s S n−1 0 ∂s
Portanto
µ Z ¶ Z
∂ t t
(5.6) u(x, t) = f1 (x + tω) dSω + f2 (x + tω) dSω .
∂t 4π Sn−1 4π Sn−1
cn Ωn u(x, t) =
õ ¶ n−3 Z ! µ ¶ n−3 µ Z ¶
∂ 1∂ 2
n−2 1∂ 2
t f1 (x + tω) dSω + tn−2 f2 (x + tω) dSω .
∂t t ∂t Sn−1 t ∂t Sn−1
u=0
u=0 u=0
suporte de f e f
1 2
L(ω, z )
z
ω
y
ω
6. A Transformada Raio-x
Nas seções anteriores nós tratamos a transformada de Radon, mas nas questões que levantamos
na primeira seção, as integrais obtidas eram ao longo de retas, e não ao longo de hiperplanos.
Aqui estudaremos um pouco da transformada raio-x. Primeiro necessitamos encontrar uma
parametrização para as retas do Rn . Vimos no caso da transformada de Radon, que os hiper-
planos são parametrizados por um vetor ω ∈ Sn−1 e um número real s, ou seja qualquer hiper-
plano H pode ser descrito por (4.1).
No caso de uma reta L, sabemos que para caracterizá-la necessitamos de um vetor ω ∈ Sn−1 ,
o vetor diretor, e um ponto, mas temos de ter um pouco de cuidado, pois a parametrização tem
de ser 1 − 1. Tomemos o ponto z = L ∩ ω ⊥ , onde ω ⊥ é o hiperplano perpendicular a ω. Veja
figura 11. E denotamos L = L(ω, z).
Dada uma função contı́nua f ∈ S(Rn ), considere a aplicação
Z
Xf (ω, z) = f (y) dly .
L(ω,z)
L( θ,z)
θ ω
z ω
ω
Portanto, conhecida Xf (ω, z) para toda reta L, também se conhece Rf (x, s) para todo ω ∈
Sn−1 e todo s ∈ R. Assim deduzimos dos teoremas ja demonstrados para a transformada de
Radon
para toda reta L(ω, z) que não intercepta B(0, ρ). Então f (x) = g(x) para todo x 6∈ B(0, ρ).
Este resultado tem uma interpretação interessante. Por exemplo, não creio que seja muito
saudável bombardear o fı́gado ou o coração de alguém com raios-x. Mas o teorema acima diz
que para se obter informações sobre outros órgãos, não é necessário atingir essas partes vitais
com radiação.
Pode-se estabelecer uma relação entre a transformada raio-x e a transformada de Fourier, de
modo semelhante ao que foi feito com a transformada de Radon. Também pode se usar esta
relação para conseguir uma fórmula para a inversa da transformada raio-x. Referimos o leitor
para o livro de Helgason [10].
7. Agradecimentos
Este trabalho foi financiado em parte pela National Science Foundation projeto número DMS-
0140657.
Agradeço ao CNPq, à FINEP e ao Instituto do Milênio pela generosidade em financiar o
Symposium on Scattering and Spectral Theory, mesmo em tempos economicamente difı́ceis. A
ajuda da International Mathematical Union também foi fundamental para a realização deste
evento.
Os Professores Francisco Brito, Fernando Cardoso e Gunther Uhlmann foram generosos em
lerem essas notas, fazeres correções e darem sugestões.
Também agradeço ao Departamento de Matemática da UFPE pela hospitalidade durante a
semana em que este curso foi ministrado.
22 SÁ BARRETO
Referências
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[2] J. Boman. Helgason’s support theorem for Radon transforms– a new proof and a generalization. Mathematical
Methods in Tomography (Oberwolfach, 1990), Lecture Notes in Math.1497, 1-5 Springer, Berlin, (1991).
[3] A. Comrack. Representation of a function by its line integrals. J. Appl. Phys., 34, 2722-2727, (1963).
[4] A. Cormack. My connection with the Radon transform. 75 years of Radon transform. Conference Proceedings
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[5] B. Droste. A new proof of the support theorem and the range characterization for the Radon tranform.
Manuscripta Math. 2-3, 289-296, (1983).
[6] P. Funk. Über eine geometrischr anwendung der abelschen integralgleichung. Math. Ann. 77, 129-135, (1916).
[7] F. John. Reminiscences. 75 years of Radon transform. Conference Proceedings and Lecture Notes in Mathe-
matical Physics, Vol. 4. S. Gindikin & P. Michor, editores. International Press Inc. Boston, (1992).
[8] F. John. Plane waves and spherical means. Wiley-Interscience, New York, (1955).
[9] S. Helgason. A duality in integral geometry: some generalizations of the Radon transform. Bull. Amer. Math.
Soc. 70 , 435-446, (1964).
[10] S. Helgason. Radon transform. Birkhäuser 1980, 2a edição (1999).
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