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Educação Social,

Política e Ética: a
Sociologia Urbana
e da Violência
Profª. Silvana Braz Wegrzynovski

Indaial – 2019
1a Edição
Copyright © UNIASSELVI 2019

Elaboração:
Profª. Silvana Braz Wegrzynovski

Revisão, Diagramação e Produção:


Centro Universitário Leonardo da Vinci – UNIASSELVI

Ficha catalográfica elaborada na fonte pela Biblioteca Dante Alighieri


UNIASSELVI – Indaial.

W412e

Wegrzynovski, Silvana Braz

Educação social, política e ética: a sociologia urbana e da


violência. / Silvana Braz Wegrzynovski. – Indaial: UNIASSELVI, 2019.

191 p.; il.

ISBN 978-85-515-0422-2

1. Serviço social. - Brasil. II. Centro Universitário Leonardo Da


Vinci.

CDD 360

Impresso por:
Apresentação
Olá, prezado acadêmico! Sou Silvana Braz Wegrzynovski, professora
responsável por este livro didático. Sou assistente social, especialista em
Gestão Pública e mestre em Desenvolvimento Regional. Tenho experiência
profissional na área das políticas públicas, como assistência social, habitação
popular, meio ambiente, como profissional e como gestora. Fui docente
do curso de Serviço Social da UNIASSELVI e, atualmente, trabalho como
assistente social na área de segurança pública.

A disciplina que se inicia neste momento, Educação Social, Política


e Ética: a Sociologia Urbana e a Violência, no curso de Educador Social, tem
como objetivos contextualizar o papel do educador social no processo de
desenvolvimento humano na educação social do Brasil e suas competências
pedagógicas, fundamentar, através de conceitos, teorias e tipos de violência,
enfatizando a violência urbana e seus reflexos na sociedade atual.

Esta disciplina é essencial para o curso, pois apresentará eixos


fundamentais para compreendermos de que forma o educador social se
tornou um profissional reconhecido no mercado de trabalho. No contexto
social em que estamos inseridos é necessário termos clareza dos conceitos
básicos que permeiam a profissão do educador social, como a ética e a
violência.

A atuação do educador social, nos mais diversos campos profissionais,


faz com que esse profissional trabalhe diretamente com a população de
uma determinada comunidade. Nesse sentido, esta disciplina mostrará
determinadas propostas do trabalho do educador social, de forma a orientá-
lo em sua jornada profissional.

Bons estudos!

Professora Silvana Braz Wegrzynovski

III
NOTA

Você já me conhece das outras disciplinas? Não? É calouro? Enfim, tanto para
você que está chegando agora à UNIASSELVI quanto para você que já é veterano, há
novidades em nosso material.

Na Educação a Distância, o livro impresso, entregue a todos os acadêmicos desde 2005, é


o material base da disciplina. A partir de 2017, nossos livros estão de visual novo, com um
formato mais prático, que cabe na bolsa e facilita a leitura.

O conteúdo continua na íntegra, mas a estrutura interna foi aperfeiçoada com nova
diagramação no texto, aproveitando ao máximo o espaço da página, o que também
contribui para diminuir a extração de árvores para produção de folhas de papel, por exemplo.

Assim, a UNIASSELVI, preocupando-se com o impacto de nossas ações sobre o ambiente,


apresenta também este livro no formato digital. Assim, você, acadêmico, tem a possibilidade
de estudá-lo com versatilidade nas telas do celular, tablet ou computador.
 
Eu mesmo, UNI, ganhei um novo layout, você me verá frequentemente e surgirei para
apresentar dicas de vídeos e outras fontes de conhecimento que complementam o assunto
em questão.

Todos esses ajustes foram pensados a partir de relatos que recebemos nas pesquisas
institucionais sobre os materiais impressos, para que você, nossa maior prioridade, possa
continuar seus estudos com um material de qualidade.

Aproveito o momento para convidá-lo para um bate-papo sobre o Exame Nacional de


Desempenho de Estudantes – ENADE.
 
Bons estudos!

UNI

Olá acadêmico! Para melhorar a qualidade dos


materiais ofertados a você e dinamizar ainda mais
os seus estudos, a Uniasselvi disponibiliza materiais
que possuem o código QR Code, que é um código
que permite que você acesse um conteúdo interativo
relacionado ao tema que você está estudando. Para
utilizar essa ferramenta, acesse as lojas de aplicativos
e baixe um leitor de QR Code. Depois, é só aproveitar
mais essa facilidade para aprimorar seus estudos!

IV
V
LEMBRETE

Olá, acadêmico! Iniciamos agora mais uma disciplina e com ela


um novo conhecimento.

Com o objetivo de enriquecer teu conhecimento, construímos, além do livro


que está em tuas mãos, uma rica trilha de aprendizagem, por meio dela terás
contato com o vídeo da disciplina, o objeto de aprendizagem, materiais complementares,
entre outros, todos pensados e construídos na intenção de auxiliar teu crescimento.

Acesse o QR Code, que te levará ao AVA, e veja as novidades que preparamos para teu estudo.

Conte conosco, estaremos juntos nessa caminhada!

VI
Sumário
UNIDADE 1 – O EDUCADOR SOCIAL NO PROCESSO DE DESENVOLVIMENTO
HUMANO NA EDUCAÇÃO SOCIAL NO BRASIL E SUAS
COMPETÊNCIAS PEDAGÓGICAS...........................................................................1

TÓPICO 1 – AS FUNÇÕES E COMPETÊNCIAS PEDAGÓGICAS DO


EDUCADOR SOCIAL NO CONTEXTO BRASILEIRO..............................................3
1 INTRODUÇÃO........................................................................................................................................3
2 O EDUCADOR SOCIAL NO CONTEXTO BRASILEIRO..............................................................4
RESUMO DO TÓPICO 1........................................................................................................................13
AUTOATIVIDADE..................................................................................................................................15

TÓPICO 2 – A NECESSIDADE DE UMA FORMAÇÃO CONSISTENTE


PARA O EDUCADOR SOCIAL......................................................................................17
1 INTRODUÇÃO......................................................................................................................................17
2 O EDUCADOR SOCIAL NO BRASIL: PERSPECTIVAS HISTÓRICAS
E DISCUSSÕES ATUAIS ....................................................................................................................17
RESUMO DO TÓPICO 2........................................................................................................................30
AUTOATIVIDADE..................................................................................................................................32

TÓPICO 3 – A FORMAÇÃO DO EDUCADOR SOCIAL NO BRASIL.........................................33


1 INTRODUÇÃO......................................................................................................................................33
2 EDUCADOR SOCIAL E O RECONHECIMENTO PROFISSIONAL.........................................33
LEITURA COMPLEMENTAR................................................................................................................52
RESUMO DO TÓPICO 3........................................................................................................................58
AUTOATIVIDADE..................................................................................................................................60

UNIDADE 2 – ÉTICA, EDUCAÇÃO SOCIAL E POLÍTICA: CONCEITOS


FUNDAMENTAIS E A GARANTIA DOS DIREITOS HUMANOS...................61

TÓPICO 1 – ÉTICA NO COTIDIANO, UMA REFLEXÃO PENSANDO NO OUTRO.............63


1 INTRODUÇÃO......................................................................................................................................63
2 A GARANTIA DOS DIREITOS HUMANOS E A DE SER UM PROFISSIONAL ÉTICO.....63
RESUMO DO TÓPICO 1........................................................................................................................74
AUTOATIVIDADE..................................................................................................................................76

TÓPICO 2 – EDUCAÇÃO E CIDADANIA E A CONSTRUÇÃO DO SABER.............................79


1 INTRODUÇÃO......................................................................................................................................79
2 A IMPORTÂNCIA DA EDUCAÇÃO NO PROCESSO DA CONSTRUÇÃO
DA CIDADANIA ..................................................................................................................................80
RESUMO DO TÓPICO 2........................................................................................................................93
AUTOATIVIDADE..................................................................................................................................95

VII
TÓPICO 3 – ÉTICA E POLÍTICA: PARÂMETROS DAS EXIGÊNCIAS DOS
DIREITOS HUMANOS....................................................................................................97
1 INTRODUÇÃO......................................................................................................................................97
2 ÉTICA E SUAS RELAÇÕES................................................................................................................97
LEITURA COMPLEMENTAR..............................................................................................................110
RESUMO DO TÓPICO 3......................................................................................................................113
AUTOATIVIDADE................................................................................................................................116

UNIDADE 3 – CONCEITOS, TEORIAS E TIPOLOGIAS DE VIOLÊNCIA,


VIOLÊNCIA URBANA E SEUS REFLEXOS NA SOCIEDADE ATUAL..........117

TÓPICO 1 – CONCEITOS E FORMAS DE VIOLÊNCIA...............................................................119


1 INTRODUÇÃO....................................................................................................................................119
2 CONCEITOS, TEORIAS E TIPOLOGIAS DE VIOLÊNCIA......................................................119
RESUMO DO TÓPICO 1......................................................................................................................132
AUTOATIVIDADE................................................................................................................................134

TÓPICO 2 – O CENÁRIO DA VIOLÊNCIA URBANA..................................................................135


1 INTRODUÇÃO....................................................................................................................................135
2 A VIOLÊNCIA URBANA É UMA CARACTERÍSTICA DE TODA A
SOCIEDADE BRASILEIRA...............................................................................................................135
RESUMO DO TÓPICO 2......................................................................................................................151
AUTOATIVIDADE................................................................................................................................153

TÓPICO 3 – VIOLÊNCIA E A EXCLUSÃO SOCIAL......................................................................155


1 INTRODUÇÃO....................................................................................................................................155
2 A VIOLÊNCIA COM UM FENÔMENOSOCIAL ENTRE A INCLUSÃO E A
EXCLUSÃO SOCIAL..........................................................................................................................155
LEITURA COMPLEMENTAR..............................................................................................................172
RESUMO DO TÓPICO 3......................................................................................................................179
AUTOATIVIDADE................................................................................................................................181

REFERÊNCIAS........................................................................................................................................183

VIII
UNIDADE 1

O EDUCADOR SOCIAL NO
PROCESSO DE DESENVOLVIMENTO
HUMANO NA EDUCAÇÃO SOCIAL
NO BRASIL E SUAS COMPETÊNCIAS
PEDAGÓGICAS
OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
A partir do estudo desta unidade, você deverá ser capaz de:

• compreender o papel do educador social no processo de desenvolvimen-


to humano na educação social no Brasil;
• estudar as competências pedagógicas do educador social no país;
• analisar funções e competências pedagógicas do educador social no con-
texto brasileiro;
• fundamentar a necessidade de uma formação consistente para o educa-
dor social;
• conhecer a formação do educador social no Brasil.

PLANO DE ESTUDOS
Esta unidade está dividida em três tópicos. No decorrer da unidade você
encontrará autoatividades com o objetivo de reforçar o conteúdo apresentado.

TÓPICO 1 – AS FUNÇÕES E COMPETÊNCIAS PEDAGÓGICAS DO


EDUCADOR SOCIAL NO CONTEXTO BRASILEIRO
TÓPICO 2 – A NECESSIDADE DE UMA FORMAÇÃO CONSISTENTE
PARA O EDUCADOR SOCIAL
TÓPICO 3 – A FORMAÇÃO DO EDUCADOR SOCIAL NO BRASIL

CHAMADA

Preparado para ampliar seus conhecimentos? Respire e vamos


em frente! Procure um ambiente que facilite a concentração, assim absorverá
melhor as informações.

1
2
UNIDADE 1
TÓPICO 1

AS FUNÇÕES E COMPETÊNCIAS PEDAGÓGICAS DO


EDUCADOR SOCIAL NO CONTEXTO BRASILEIRO

1 INTRODUÇÃO
Neste primeiro tópico será discutido o conceito de educador social e quais
as competências pedagógicas do educador social no processo de desenvolvimento
do ser humano, principalmente no que diz respeito à educação social no Brasil.
Destacando primeiramente o conceito, o perfil do educador social e a importância
de uma formação específica para esse profissional no contexto do mercado de
trabalho na sociedade brasileira.

Portanto, este tópico tem como objetivo apresentar a relevância desse


profissional e sua contribuição no contexto de desenvolvimento humano e
transformação social, possibilitando a você, caro acadêmico, perceber que a
formação específica do educador social é de extrema importância, pois irá auxiliá-
lo no processo de transformação dos indivíduos de determinado espaço social, ou
seja, poderá ser um instrumento na sua prática profissional.

O educador social, como profissional, pode contribuir para a construção


de uma sociedade democrática, desenvolvendo sujeitos ativos que tenham
uma identidade social própria e que estejam fortalecidos com o núcleo familiar
e sociedade como um todo. Nesse sentido, o educador social é um agente
transformador. Então, quem é o educador social?

De acordo com as autoras Souza e Müller (2009, p. 29), pode-se conceituar


o educador social como sendo: um personagem fundamental na cena composta
da educação social ideal. Ele deve ser alguém que faça a diferença, que fique
na memória dos meninos e meninas como alguém que acreditou, estimulou,
apresentou caminhos, ensinou sobre coisas grandes e pequenas da vida, ensinou
ou reacendeu a esperança, e ainda, generosamente, deu/recebeu afeto nessa
relação.

Outra ideia que queremos ressaltar é a de que o educador se faz


sujeito. A pessoa torna-se ou converte-se em sujeito à medida que pode viver
sua cultura, seus direitos e dar continuidade a sua história tanto coletiva como
individualmente, agindo e pensando sua realidade, conquistando as condições
necessárias para fazê-lo.

3
UNIDADE 1 | O EDUCADOR SOCIAL NO PROCESSO DE DESENVOLVIMENTO HUMANO NA EDUCAÇÃO SOCIAL NO BRASIL
E SUAS COMPETÊNCIAS PEDAGÓGICAS

A condição de ser sujeito na vida, portanto, não pode ser dada


simplesmente. Há de existir a vontade do recebimento dessa condição. Há de se
estabelecer uma relação respeitosa entre quem deve oferecer a oportunidade e
quem vai, se quiser, acolhê-la.

É necessário, portanto, que o educador social seja hábil, conhecedor


de estratégias que possam interferir no desejo da menina e do menino que se
encontram sem esperanças, sem vontade, sem atitude positiva para um movimento
a favor da vida, a favor de si mesmos. O educador precisa ter a fé inabalável nas
crianças e adolescentes, na sua reação e capacidade de reverter uma situação.

2 O EDUCADOR SOCIAL NO CONTEXTO BRASILEIRO


Neste subtópico, pretende-se mostrar a você, acadêmico, quais são as
competências pedagógicas do educador social no processo de desenvolvimento
do ser humano na educação social no Brasil.

FIGURA 1 – EDUCADOR SOCIAL

FONTE: <https://www.chegadetrabalhoinfantil.org.br/wp-content/uploads/2017/12/educador-
social_credito-portal-vermelho.jpeg>. Acesso em: 20 jul. 2019.

Nesse sentido, nos aprofundaremos, de modo específico, a respeito do


conceito de educação social para a compreensão da educação não formal, e por
intermédio da descrição do perfil e das competências pedagógicas do educador
social pretender-se-á mostrar a importância de uma formação consistente e
específica para esse profissional atuar na sociedade brasileira.

Acadêmico, neste tópico aprofundaremos nossos estudos por meio de


estudos bibliográficos realizados por diversos autores em relação à desigualdade
sociocultural e socioeconômica que estão cada vez mais intensas na nossa
sociedade. Assim, a educação social se torna uma ponte para combater os
problemas gerados por essas desigualdades, construindo um elo entre a educação
e a sociedade, visando à transformação do ser humano.

De acordo com Trilla, Romans e Petrus (2003, p.170):

O educador social se transforma muitas vezes no ponto de confluência


das tensões vividas entre famílias e instituições, entre indivíduos

4
TÓPICO 1 | AS FUNÇÕES E COMPETÊNCIAS PEDAGÓGICAS DO EDUCADOR SOCIAL NO CONTEXTO BRASILEIRO

e grupos, entre o processo de melhoria e o de deterioração de um


indivíduo que se estanca em seu processo de socialização. A lentidão
em alcançar resultados, a escassez de recursos nas entidades, as
mudanças de orientações no trabalho devido a determinações políticas,
as limitações pessoais e da equipe, as dúvidas sobre se o que se faz
é correto e vale a pena fazê-lo podem converter-se em um foco de
contradições que dia a dia vão pesando no desempenho da profissão.

Nesse sentido, é visível a relevância de inserir um profissional bem


preparado no mercado de trabalho, de maneira teórica e prática, para que ele
possa intervir em espaços de educação social.

Contudo, percebemos a necessidade de uma formação específica e


permanente que seja direcionada ao contexto da educação social, para que o
educador social na sua atuação profissional seja o mais bem preparado para atuar
nesses espaços de intervenções.

Assim, a atuação do educador social é mais significativa, devido à


amplitude de sua atuação profissional e, dessa maneira, teria as melhores
condições pessoais e sociais de transformar a sua vida pessoal e profissional e da
comunidade em que está intervindo.

O educador social, como profissional, tem um perfil diferenciado perante


o contexto que atua, pois ele apresenta uma visão crítica do meio social, buscando
sempre estar atento às manifestações dos indivíduos para que possa ajudar as
pessoas a formular e alcançar bons resultados. O educador social crê e age com
as possibilidades que proporcionem a independência e autonomia do sujeito,
transformando-o no principal agente de sua própria história pessoal.

Desse modo, problematiza-se: como que o profissional, educador


social, pode contribuir para o desenvolvimento do ser humano nos espaços
socioeducativos? Vejamos!

A sociedade cada vez mais está preocupada com o desenvolvimento


da tecnologia e da ciência, porém preocupa-se cada vez menos com as relações
humanas e éticas. Contudo, existem grupos preocupados com a formação do ser
humano como sujeito da sua história.

Dentre os grupos, destacam-se: os abrigos, as ONGs, as instituições sociais,


os centros comunitários, os espaços socioeducativos. Com isso, o educador social,
como profissional, pode contribuir nesses espaços de modo geral na emancipação
social, no sentido de construir uma sociedade democrática que permita a qualquer
sujeito o desenvolvimento e a formação de uma própria identidade.

Essa atuação do educador social precisa ser coerente com a realidade,


proporcionando aos indivíduos novas experiências com a finalidade de estimular
vínculos familiares e sociais, potencializando e descobrindo novos valores,
fazendo com que adquiram e fortaleçam a sua autonomia e seu autoconhecimento.

5
UNIDADE 1 | O EDUCADOR SOCIAL NO PROCESSO DE DESENVOLVIMENTO HUMANO NA EDUCAÇÃO SOCIAL NO BRASIL
E SUAS COMPETÊNCIAS PEDAGÓGICAS

Para chegar aos objetivos descritos anteriormente, ser coerente com a


realidade, proporcionando aos indivíduos novas experiências com a finalidade
de estimular vínculos familiares e sociais, potencializando e descobrindo novos
valores, é necessário ter um conhecimento sobre o conceito de educação não
formal. De acordo com Gohn (2010), deu-se através das diferentes realidades
existentes de diversas atividades que eram interferidas por relações educativas,
mas não eram classificadas como educação porque não seguiam a normatização,
regulamentação e padrões comportamentais previamente definidos, mas a
prática, na atuação comunitária e não comunitária, porém, construía diferentes
formas de compreensão e socialização do processo ensino-aprendizagem, por
ocorrer de maneira espontânea em ambientes informais.

Nesse sentido, a educação não formal também é fonte de aprendizado


significativo para a sociedade. Para Libâneo (1994), as escolas convencionais não
são exclusivamente o único modo de expressão do método educativo, pois assim
como o desenvolvimento da sociedade, é necessário um número maior de sujeitos
que estejam participando ativamente das decisões que envolvam a comunidade.

A sociedade necessita de técnicas educativas que sejam intencionais, que


tenham objetivos que tratem de questões sociais explícitas, métodos, lugares,
conteúdos e situações distintas de educação, visando proporcionar às pessoas
uma participação ativa, crítica e consciente na vida coletiva e global.

Caro acadêmico, você pode constatar que a educação não formal trata-
se de atividades que possuem características de intencionalidade, mas que
apresentam um baixo nível de sistematização e estruturação e que acabam
implicando as correlações pedagógicas, mas de maneira não formalizadas. De
acordo com Gohn (2010), a educação não formal é aquela que se adquire “no
mundo da vida”, diante dos caminhos de partilhar experiências, especialmente
com exercícios cotidianos.

Pode-se perceber que o objetivo da educação não formal é buscar formar


cidadãos capazes de olhar, conhecer, explicar o mundo a sua volta, que é parte do
olhar, interesses e necessidades de cada indivíduo, para construir suas relações
sociais que são capazes de transformar a realidade em que vivem.

A educação não formal ultrapassa a capacitação das pessoas para atuarem


no mercado de trabalho e na geração de renda, mas fazem parte dos interesses
comuns que integram um processo de valorização que resgata a cidadania de
uma comunidade.

A educação não formal caracteriza-se principalmente por: ressaltar quem


aprende e não ensina; flexibilidade e ênfase no que se refere à prática, e que
estão vigorosamente relacionadas ao âmbito das pessoas que estão participando.
Com isso, pode-se destacar que a educação não formal complementa e auxilia o
processo dos outros campos educacionais.

6
TÓPICO 1 | AS FUNÇÕES E COMPETÊNCIAS PEDAGÓGICAS DO EDUCADOR SOCIAL NO CONTEXTO BRASILEIRO

Para Gohn (2010, p.26):

Outra forma encontrada para descrever a educação não formal, com


abordagem na mesma linha da educação social, são as propostas que
a caracteriza como sinônimo de práticas educativas desenvolvidas
junto a comunidades compostas por populações em situações de
vulnerabilidade social ou algum tipo de exclusão social.

É possível perceber que, dessa forma, sempre haverá uma troca entre a
educação formal e não formal, e essas ações podem ser consolidadas por meio de
diversas formas, como a arte, a música, a inclusão social, a educação e a cultura, e,
nesse sentido, da educação não formal, existe o educador social, um profissional
que se torna o sujeito que interage com a sociedade.

Para compreender melhor as diversas funções do educador social diante


das definições anteriores, citamos Trilla, Romans e Petrus (2003), nas quais
podemos identificar e caracterizar as diversas funções do educador social em
meio interno, externo e as funções próprias que podem ser exercidas em ambos
os meios. Para esses autores, as funções do meio externo são aquelas que partem
de uma instituição interna, para o meio externo.

As práticas educativas, nesse sentido, podem ser realizadas por meio de


funções com a comunidade e ações para determinado indivíduo, comunidade e
familiares que estão envolvidos nesse processo de educação.

As atividades do educador social, nas instituições, são bastante dinâmicas,


pois cada instituição tem objetivos, estilos, filosofias, públicos específicos e
diferenciados, assim a atividade educativa passa a ser no ritmo de cada entidade.
O educador social precisa se adaptar à cada realidade institucional.

Diante das diferenças que são encontradas nas funções do educador social,
tanto no meio externo como no meio interno, é de suma importância destacar
algumas que são comuns em ambos, como a função de elaborar projetos educativos:
estudos de atividades educativas e de integração social; inclusão dos familiares
e dos indivíduos atendidos; atividades com a equipe da própria instituição; o
envolvimento de equipes externas e entidades similares e, por fim, fazer a supervisão
e acompanhamento dos resultados atingidos (TRILLA; ROMANS; PETRUS, 2003).

O educador social tem sua atuação profissional no campo social


ultrapassando o meio externo ou interno, mas, para Trilla, Romans e Petrus
(2003), envolvem funções que estão relacionadas à gestão, divididas em dois
aspectos: gestão própria da atividade educativa reproduzida e gestão de direção
ou coordenação.

As funções do educador social como profissional são direcionadas para


equilibrar, coordenar, encaminhar, realizar acompanhamentos, avaliar resultados,
gerenciar administrativa e economicamente a instituição e liderar os profissionais
nas suas devidas responsabilidades e ações.

7
UNIDADE 1 | O EDUCADOR SOCIAL NO PROCESSO DE DESENVOLVIMENTO HUMANO NA EDUCAÇÃO SOCIAL NO BRASIL
E SUAS COMPETÊNCIAS PEDAGÓGICAS

Por intermédio dessa perspectiva de compreender de modo geral as


atividades desenvolvidas pelo educador social, Gohn (2010, p. 33) afirma que
“devem também buscar desenhar cenários futuros; os diagnósticos servem para
localizar o presente, mas também para estimular imagens e representações sobre
o futuro”.

Para que todas essas funções do educador social sejam realizadas, faz-
se necessário um trabalho investigativo por parte da instituição, devem conter
dados sociogeográficos e econômicos para uma compressão e entendimento da
realidade local em que as ações serão praticadas para que sejam eficazes e que
tragam realmente uma melhoria para todos os sujeitos envolvidos.

Com tudo isso, compreendemos a importância do educador social em


adquirir e desenvolver algumas competências pedagógicas pertinentes ao seu
trabalho dentro de uma instituição, para que as mesmas funções citadas sejam
realizadas de forma eficaz e cumpram seus objetivos.

Para Mezzaroba (2008), o educador social precisa e deve ter a competência


de intervir, refletir e avaliar. No Quadro 1, você pode avaliar cada uma das
competências do educador social.

QUADRO 1 – COMPETÊNCIAS DO EDUCADOR SOCIAL

• Atuar diretamente na situação e dar uma resposta para as


necessidades servindo de apoio para o caráter pedagógico, social,
cultural, e recreativo aos sujeitos, equipes e comunidades compostos
por ferramentas sociais, visando melhorar as condições de vida.
• Contribuir na averiguação, estudos e avaliações de planejamento de
progresso comunitário e social, no reconhecimento de dificuldades
Intervir
em preencher períodos livres e de ensinamentos sobre a preparação
desse meio social.
• Ter embasamento teórico e experiência prática e, dessa forma,
proporcionar, progredir e apoiar atividades de caráter educativo,
cultural e recreativo no preenchimento de períodos livres desde as
crianças até os idosos.
Instruir a comunidade sobre a necessidade de um trabalho em equipe
e um esforço maior dos profissionais da instituição, para que as ações
possam abranger de forma eficaz as necessidades do grupo.
Informar, orientar e assessorar para que a comunidade, familiares ou
indivíduo conheçam os serviços se recursos sociais disponibilizados aos
seus interesses.
Refletir
Estimular e colaborar para atividades de caráter educativo por meio da
prática de campanhas, cursos e construção familiar.
Proporcionar, conforme as indicações estabelecidas à junção entre o
mecanismo social, família e outras entidades, assim como funções da
comunidade, incentivando e colaborando em programas, reuniões de
progresso ou outras ações em crescimento a classe comunitária.

8
TÓPICO 1 | AS FUNÇÕES E COMPETÊNCIAS PEDAGÓGICAS DO EDUCADOR SOCIAL NO CONTEXTO BRASILEIRO

Saber elaborar seu plano de trabalho, de acompanhamento, avaliação


dos casos e, por fim, o papel de intervenção educativa refletindo suas
ações e relações futuras.
Refletir sobre sua própria prática, ou seja, conhecimento profissional e
técnico de suas funções, o conhecimento oferecido a ele como educador
e o saber se relacionar com o outro, que permitirá ao profissional a
habilidade da interação necessária nas intervenções de cunho educativo
Avaliar
e social.
Promover a igualdade, o respeito entre todos os sujeitos ao seu redor,
prestando a devida atenção para a necessidade de cada um, detectando e
buscando resolução de situações de risco ou exclusão social, respeitando
e protegendo os direitos desses sujeitos, a privacidade, a autonomia,
prevenindo situações que possam trazer alguma forma de incentivo à
exclusão e marginalização.

FONTE: Adaptado de Mezzaroba (2008)

Com isso, percebe-se que o educador social é um ator capaz de se tornar


independente e conscientizar a comunidade na qual está inserido, por meio de
sua habilidade de interação e orientação, pois ele tem autonomia de intervir
junto à comunidade que está inserido. Por meio de sua habilidade de interação
e de orientação, cabe a esse profissional intervir junto à comunidade com
métodos e projetos de cunho educativo e social que lhes mostrem uma forma
de vida alternativa. Com isso, o educador social procura viabilizar e orientar
continuamente suas escolhas, resultando em mudanças e crescimento para a
comunidade local.

Logo, a atuação do Educador Social no mercado de trabalho é de gerar


a igualdade, o respeito com todos os sujeitos do seu contexto, visando buscar
a atenção devida para a necessidade de cada ser humano, respeitando sua
individualidade, por meio do respeito e proteção dos direitos desses sujeitos, a
privacidade e a autonomia.

Nesse sentido, cabe ao educador social utilizar-se de sua experiência


profissional como uma das formas para melhorar a qualidade de vida dos sujeitos,
de suas famílias e da comunidade em situação de vulnerabilidade social, ou seja,
a batalha contra a pobreza, mazelas e a luta pela justiça social igualitária.

Mezzaroba (2008) enfatiza também que o educador social, como um


profissional que busca a transformação social através de sua prática profissional
em que está inserido, se diferencia por diferentes estilos na atual sociedade. Para
ela, existem quatro tipos de educadores, são eles:

QUADRO 2 – TIPOS DE EDUCADORES


Educador Centra-se nos aspectos pouco estimulantes de sua profissão; queixa-se de
resignado tudo, mas pouco trabalha para melhorar as coisas.
Educador Excessivamente aplicador dos recursos; rigorosamente técnico, mas
tecnicizado desvinculado do “social”.

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UNIDADE 1 | O EDUCADOR SOCIAL NO PROCESSO DE DESENVOLVIMENTO HUMANO NA EDUCAÇÃO SOCIAL NO BRASIL
E SUAS COMPETÊNCIAS PEDAGÓGICAS

Educador Mero executor de suas atividades; sem excessivas esperanças e sem graves
conformista decepções.
“Realista”, porém, não estranho a uma atitude proativa; otimizador; apoia
alternativas inovadoras de melhora; destaca-se por sua atitude construtiva
Educador crítico
e otimista; sempre olha para frente; capta os desajustes e contribui para
melhora do seu trabalho.

FONTE: Adaptado de Mezzaroba (2008)

DICAS

Com o que foi apresentado até o presente momento neste primeiro tópico, é
importante refletirmos se realmente a prática do educador social está comprometida com
a profissão e se estamos preparados efetivamente para sermos agentes de transformação
na vida dos usuários que atendemos.

Depois do que abordamos, é fundamental refletirmos sobre a importância


do papel do educador social e até onde se estabelece sua atuação profissional
e pessoal nas diversas situações enfrentadas nas diferentes situações que
enfrentamos no nosso cotidiano como sujeitos transformadores da realidade.

O educador social é o profissional que tem um olhar diferenciado perante


as circunstâncias que lhe são apresentadas, esse profissional possui a sensibilidade
social em suas ações no dia a dia.

Nesse sentido, é necessário ter a clareza de que o educador social e a família


possuem papéis diferenciados no contexto geral, ambos têm como finalidade em
comum o dever de contribuir com a educação de crianças e adolescentes.

O educador social, muitas vezes, não consegue distinguir a sua ação e


tomada de postura, separando o nível profissional do pessoal, acabando por
si sendo negativo na construção do processo de autonomia, emancipação e de
cidadania das famílias envolvidas em seu todo.

Nesse sentido, é importante ressaltar mais uma vez que o educador social
e a família têm significações, representações e contribuições diferenciadas na
vida do educando, crianças e adolescentes. A relação de educando-educador não
pode substituir, por exemplo, a relação pai-filho e mãe-filho, jamais pode ocupar
um espaço na vida do educando que, por algum motivo emocional e psicológico
transfere essa falta no núcleo familiar para a figura do educador social.

No que diz respeito à relação ao papel da família na vida do educando,


Pelzer (1998) afirma que:

10
TÓPICO 1 | AS FUNÇÕES E COMPETÊNCIAS PEDAGÓGICAS DO EDUCADOR SOCIAL NO CONTEXTO BRASILEIRO

A família é a esfera íntima da existência que une por laços


consanguíneos ou por afetividade os seres humanos[...]. É o ambiente
imediato no qual os seres humanos exercem seus papéis e que lhes
provê recursos essenciais necessários para facilitar o enfrentamento e
ajustamento a condições internas e externas que estão em constante
mudança (PELZER, 1998, p. 106).

Com isso, afirma-se a importância de distinção entre os papéis na relação do


educador social, educando e família. Sabe-se que é na família que deve se originar
as possiblidades de representação de papéis, em que a criança e o adolescente
consigam reconhecer as figuras de seus pais como tal e assim sucessivamente.

Diante desse contexto, faz-se necessário realizar uma análise e uma reflexão
sobre o tipo de relação que o educador social tem com o educando. Sabe-se que
uma das suas competências é de intervir para o fortalecimento, empoderamento,
promovendo a emancipação e a autonomia dos usuários que são atendidos e
jamais criar vínculos de dependências nessa relação.

E
IMPORTANT

É importante destacar algumas contribuições para a autoproteção do


educador social. Você deve estar se perguntando: De que o educador social deve se
proteger?

Em nossa prática profissional, na difícil tarefa de lidar cotidianamente com


problemas sociais se faz necessário intervir em questões pessoais. Nesse sentido,
são apresentados alguns fatores como subsídio para auxiliar essa autoproteção.

FIGURA 2 – FATORES DE SUBSÍDIO PARA AUXILAR A AUTOPROTEÇÃO


Características individuais do Educador Social

Apoio afetivo Apoio social externo


FONTE: Adaptado de Mezzaroba (2008)

O apoio externo significa: a família, os colegas, os amigos, entre outros.


Com isso, Mezzaroba (2008) sinaliza outras categorias ou comportamentos que
auxiliam a manter a saúde mental do educador social. São eles:
11
UNIDADE 1 | O EDUCADOR SOCIAL NO PROCESSO DE DESENVOLVIMENTO HUMANO NA EDUCAÇÃO SOCIAL NO BRASIL
E SUAS COMPETÊNCIAS PEDAGÓGICAS

QUADRO 3 – CATEGORIAS OU COMPORTAMENTOS QUE AUXILIAM


A MANTER A SAÚDE MENTAL DO EDUCADOR SOCIAL

Insight Hábito de fazer perguntas e dar respostas honestas.


Distanciamento físico e emocional enquanto satisfaz suas próprias
Independência
demandas.
Equilíbrio entre as próprias necessidades e a capacidade de dar/doar-se aos
Relacionamento
outros.

FONTE: Adaptado de Mezzaroba (2008)

Essas contribuições vêm auxiliando o educador social a conseguir lidar


com a resiliência, ou seja, a capacidade de superar a adversidades, de resistir às
frustações, de reagir e poder deixar o sofrimento para trás e ir além em prol de
uma causa maior.

Com isso, é evidente o educador social e a família possuírem papéis


diferenciados no contexto geral, ambos têm como finalidade o dever de contribuir
com a educação de crianças e adolescentes.

Este tópico buscou oferecer o suporte teórico para os subsídios da


prática dos educadores, no sentido de provocar reflexões inerentes à temática
entre educadores sociais e promover muitos questionamentos e indagações em
relação à efetividade da intervenção profissional, durante o exercício profissional.
Assim, o educador social não poderá confundir-se com o papel da família no
envolvimento de situações que transcorrem no cotidiano de seu educando.

DICAS

Para aprofundarmos os nossos conhecimentos sobre o tema proposto neste


tópico, indicamos a leitura da obra a seguir, de Mari da Glória Gohn (2010).

FIGURA – LIVRO DE MARI DA GLÓRIA GOHN

FONTE:<https://images-na.ssl-images-amazon.com/images/I/919nrHBhyvL._AC_UL320_
SR212,320_.jpg>. Acesso em: 27 set. 2019.

12
RESUMO DO TÓPICO 1
Neste tópico, você aprendeu que:

• A desigualdade sociocultural e socioeconômica estão cada vez mais intensas


na nossa sociedade.

• A educação social se torna uma ponte para combater os problemas gerados por
essas desigualdades.

• Existe a necessidade de uma formação específica e permanente que seja


direcionada ao contexto da educação social.

• A atuação do educador social é mais significativa e, dessa maneira, teria as


melhores condições pessoais e sociais de transformar a sua vida pessoal e
profissional e da comunidade na qual está intervindo.

• O educador social, como profissional, tem um perfil diferenciado perante o


contexto que atua, pois ele apresenta uma visão crítica do meio social.

• A sociedade cada vez mais está preocupada com o desenvolvimento da


tecnologia e da ciência, porém se preocupa cada vez menos com as relações
humanas e éticas.

• A atuação precisa ser coerente com a realidade, proporcionando aos indivíduos


novas experiências com a finalidade de estimular vínculos familiares e sociais.

• A educação não formal também é fonte de aprendizado significativo para a


sociedade.

• A sociedade necessita de técnicas educativas que sejam intencionais, que


tenham objetivos que tratem de questões sociais explícitas, métodos, lugares,
conteúdos e situações distintas de educação.

• A educação não formal ultrapassa a capacitação das pessoas para atuarem no


mercado de trabalho e na geração de renda, mas fazem parte dos interesses
comuns que integram um processo de valorização que resgata a cidadania de
uma comunidade.

• As práticas educativas podem ser realizadas por meio de funções com a


comunidade e ações para determinado indivíduo, comunidade e familiares
que estão envolvidos nesse processo de educação.

13
• As funções do educador social como profissional são direcionadas para
equilibrar, coordenar, encaminhar, realizar acompanhamentos, avaliar
resultados, gerenciar administrativa e economicamente a instituição e liderar
os profissionais nas suas devidas responsabilidades e ações.

• O educador social é um ator capaz de tornar independente e conscientizar a


comunidade na qual está inserido, por meio de sua habilidade de interação e
orientação, pois ele tem autonomia de intervir junto à comunidade a qual está
inserido.

• O educador social é o profissional que tem um olhar diferenciado perante as


circunstâncias que lhe são apresentadas, esse profissional possui a sensibilidade
social em suas ações no dia a dia.

• O educador social e a família possuem papéis diferenciados no contexto geral,


ambos têm como finalidade em comum o dever de contribuir na educação de
crianças e adolescentes.

14
AUTOATIVIDADE

1 De acordo com Magalhães (2011, p. 13), “por vezes, as atividades e o caráter


dos serviços prestados pelas instituições suscitam dúvidas e indagações
quanto à competência de ação dos seus profissionais e até mesmo quanto
aos objetivos de determinada instituição”. Sobre os espaços institucionais,
analise as afirmativas a seguir.

I- A incompletude é uma propriedade inerente a qualquer instituição.


II- O espaço institucional vinculado às políticas sociais reflete o contraditório da
sociedade. As contradições aparecem não só nas relações socioprofissionais
e nas interações de linguagem, mas também nos poderes — explícitos ou
implícitos — que permeiam essas relações.
III- Apenas nas instituições mais organizadas democraticamente é que não
encontramos os micropoderes.

Assinale a alternativa CORRETA:


a) ( ) Somente as afirmativas I e II estão corretas.
b) ( ) Somente as afirmativas II e III estão corretas.
c) ( ) Somente a afirmativa II está correta.
d) ( ) As afirmativas I, II e III estão corretas.

2 Atualmente, a educação social está desenvolvendo e construindo seu próprio


sistema independente de conceitos, mesmo que não esteja completamente
delimitada em uma teoria única. O trabalho que está sendo realizado busca
elementos normativos e descritivos de nossa prática profissional combinados
com elementos da pedagogia, da psicologia, da sociologia, da antropologia,
da filosofia etc. A prática de educadoras e educadores sociais implica,
pois, a habilidade de educação social e caráter profissional, assim como os
conhecimentos teóricos e práticos, métodos e instrumentos. O educador ou
educadora social deve:

• Estar familiarizado com as teorias educativas básicas mais reconhecidas e


aceitas.
• Ter capacidade para buscar e adquirir teorias e métodos educativos,
psicológicos, sociológicos, antropológicos etc. relevantes e adequados e
incluí-los em seu trabalho.
• Ter a capacidade de adquirir e utilizar métodos adequados e reconhecidos
no trabalho. Por exemplo: o trabalho em grupo.
• Ser capaz de estabelecer as razões para as ações e atividades baseando-se em
teorias e métodos reconhecidos.
• Ter capacidade para contribuir com a geração de conhecimentos baseando-
se em descrições reconhecidas e reflexões sobre a experiência do trabalho de
educação social.

FONTE: <http://aeessp.org.br/marcoconceitual.htm#4.2.6>. Acesso em: 20 jul. 2019.

15
Diante da contextualização exposta, produza um texto de, no mínimo
10 linhas, conceituando e apontando exemplos que você conheça da prática
profissional do educador social.

16
UNIDADE 1
TÓPICO 2

A NECESSIDADE DE UMA FORMAÇÃO


CONSISTENTE PARA O EDUCADOR SOCIAL

1 INTRODUÇÃO
Caro acadêmico, o Tópico 2 tem o objetivo de apresentar e fundamentar
a necessidade de uma formação consistente para o educador social no Brasil.
A necessidade de uma formação consistente, para o educador social, é uma
intervenção relacionada à teoria e prática, garantindo para toda população
usuária, ou seja, o público com quem o educador social irá intervir, podendo ser:
usuário das políticas públicas, de entidades não governamentais, entre outros,
que conheça as políticas públicas e consiga acessá-las. A atuação do educador
social acaba refletindo no que se refere às demandas da exclusão social.

No cotidiano, o profissional educador social, independentemente de sua


área de atuação, encontrará demandas relacionadas à cidade, ao meio ambiente,
à saúde, à educação, à cultura etc., pois todo cidadão está inserido em um espaço
de atuação profissional.

2 O EDUCADOR SOCIAL NO BRASIL:


PERSPECTIVAS HISTÓRICAS E DISCUSSÕES ATUAIS
Chegamos ao segundo tópico desta unidade, que se refere à discussão
complexa sobre a profissionalização do educador social como sujeito de
transformação.

No Brasil, atualmente tem surgindo discussões sobre a necessidade de uma


formação específica para o educador social, e do reconhecimento profissional de
sujeitos que atuam com processos socioeducativos nos mais diversos contextos.

17
UNIDADE 1 | O EDUCADOR SOCIAL NO PROCESSO DE DESENVOLVIMENTO HUMANO NA EDUCAÇÃO SOCIAL NO BRASIL
E SUAS COMPETÊNCIAS PEDAGÓGICAS

FIGURA 3 – FORMAÇÃO PROFISSIONAL DO EDUCADOR SOCIAL

FONTE: <https://cdn.psicologado.com.br/images/2019/05/09/a-atuacao-do-psicologo-no-
contexto-escolar.jpg>. Acesso em: 27 set. 2019.

Este tópico será um breve histórico sobre a pedagogia social no Brasil,


exaltando as suas relações com a educação popular. Outro aspecto a ser abordado
são os apontamentos sobre a proposta de uma lei que foi aprovada em 2017 para
o reconhecimento profissional do educador social. Por último, serão discutidos os
aspectos referentes a uma formação específica do educador social, considerando
exemplos de outros contextos, levando em consideração as peculiaridades do
nosso país.

No momento atual é importante compreender as discussões sobre a


profissionalização do educador social, perante isso se faz necessário descrever o
percurso histórico que a pedagogia social no Brasil teve enquanto área acadêmica
e de formação profissional.

Nessa trajetória da pedagogia social no Brasil, dois aspectos são relevantes:


o primeiro é referente à íntima relação entre as discussões que essa pedagogia
teve com a educação popular. O segundo é a atuação do educador social, que no
contexto brasileiro já existe há muito tempo, porém foi reconhecido a pouco tempo
com essa terminologia. Esse profissional, o educador social, não era reconhecido
com características específicas, deveres e direitos garantidos.

A terminologia Pedagogia Social aparece no país pela primeira vez


relacionada à terminologia Educação Popular, “no início do século XX, as duas
estavam atreladas a um contexto histórico em que não se tinha o acesso à escola,
não sabiam ler e escrever” (RIBAS, 2010, p. 94).

Logo após a Proclamação da República, nos primeiros anos do século


vinte, o momento político em que o Brasil se encontrava enaltecia a necessidade
de promover o desenvolvimento e a modernização da sua população, e teve como
referência as nações Europeias e da América do Norte.

Esse movimento teve influências que atingiram especificamente a


educação, por meio da luta pela ampliação dos níveis de escolarização da
população, além da preparação e profissionalização dos educadores para que
estivessem preparados para atuar nesse processo. Esse era o momento em que
estava sendo constituído o sistema educacional brasileiro.

18
TÓPICO 2 | A NECESSIDADE DE UMA FORMAÇÃO

Para Saviani (2008, p. 317):

Na Primeira República, a expressão “educação popular”, em


consonância com o processo de implantação dos sistemas nacionais
de ensino ocorrido ao longo do século XIX, encontrava-se associada à
instrução elementar que se buscava generalizar para toda a população
de cada país, mediante a implantação de escolas primárias. Coincidia,
portanto, com o conceito de instrução pública. Esse era o caminho
para erradicar o analfabetismo. Foi com esse entendimento que se
desencadeou a mobilização pela implantação e expansão das escolas
primárias, assim como as campanhas de alfabetização de adultos.

Nessa mesma época apareceram as práticas de educação alternativas, que,


para Brandão (2002, p. 143), surgiram em bairros operários de São Paulo, do Rio
de Janeiro e do Rio Grande do Sul. Concretizavam-se em projetos de educação
realizados por meio de escolas de trabalhadores para operários adultos e a filhos
de operários, com escolas de fundamentos anarquistas, e algumas comunistas,
criadas em bairros próximos às fábricas. Para esse autor, os operários militantes
trouxeram para o Brasil o ideário da Escola Moderna.

No período brasileiro, contextualizado por Brandão, “na Primeira


República, aborda que muitos intelectuais defendiam a responsabilidade do
Estado na escolarização de toda a população, considerando a educação um
grande instrumento de participação política” (SAVIANI, 2008, p. 177).

Na Primeira República aconteceu a criação da Associação Brasileira


de Educação (ABE), no ano de 1924, passando a organizar a partir do ano de
1927 as Conferências Nacionais de Educação. Foi um espaço de congregação de
ideias educacionais originais, e de um meio político de organização e lutas por
legitimação de novas práticas educacionais, que fossem originais e também um
meio político de organização e lutas por legitimação de novas ideias educativas.

Diante desse movimento é possível visualizar os impactos do contexto


social, político e econômico na educação brasileira, conforme Saviani (2008, p. 193):

Caracterizado o contexto, parece claro que foi no clima de


ebulição social característico da década de 1920 que, no campo
educacional, emergiram, de um lado, as forças do movimento
renovador impulsionado pelos ventos modernizantes do processo
de industrialização e urbanização; de outro lado, a Igreja Católica
procurou recuperar terreno organizando suas fileiras para travar
a batalha pedagógica. Essas duas forças desempenharam um
papel de relativa importância como dispositivos de sustentação do
“Estado de compromisso”, concorrendo, cada um à sua maneira e
independentemente de seus propósitos explícitos, para a realização
do projeto de hegemonia da burguesia industrial.

Perpassando os aspectos descritos por Saviani (2008), Xavier (1999, p. 22)


tenta “compreender esse movimento de disputas entre intelectuais da educação
do período, esse tinha como pano de fundo o processo de modernização, isso
significava, na época, década de 1920, uma busca por uma identidade nacional,

19
UNIDADE 1 | O EDUCADOR SOCIAL NO PROCESSO DE DESENVOLVIMENTO HUMANO NA EDUCAÇÃO SOCIAL NO BRASIL
E SUAS COMPETÊNCIAS PEDAGÓGICAS

em que a educação passou a ser o meio privilegiado, na crença de intelectuais


voltados à educação, no qual conseguiria a unificação de toda a nação brasileira
de uma nova maneira de educar”.

Esse movimento em prol de uma nova maneira de educar passou a ser


visto como uma “missão” (PÉCAUT, 1999, p. 15) “pelos intelectuais da área da
educação, e procedeu na organização de um grupo que focou na reconstrução da
educação brasileira a partir de percepções inovadoras”.

Nesse contexto, é de suma importância conhecer e compreender as


terminologias que serão analisadas neste tópico e que eram compreendidas na
época, década de 1920, em estudo. Para Monarcha (1989, p. 17), “a proposta da
Nova Escola traz uma compreensão de Educação Popular e uma organização de
uma Pedagogia Social, significava uma tentativa de democratização do acesso
das massas populares à educação, por isso se chamava popular, como também
uma formação de uma sociedade sistemática por meio de uma pedagogia que
atendesse essa demanda social”.

Nesse sentido, Monarcha (1989) chama a atenção sobre a base positivista


que se expressava nas teorizações e práticas dos intelectuais em questão,
especialmente na defesa de uma pedagogia científica e experimental, sendo
alguns mais explicitamente do que outros.

Outra questão relevante é a base epistemológica que foi importante para a


contribuição da formação da corrente da Escola Nova no Brasil, e que possuía suas
bases na teoria de John Dewey, sendo assimilados principalmente por Anísio Teixeira.
Defender a democracia e a ciência são os aspectos relevantes de John Dewey.

E
IMPORTANT

John Dewey, professor e filósofo americano, defendeu a ideia de unir a teoria


e a prática ao ensino. Foi um dos fundadores da escola filosófica de Pragmatismo, pioneiro
em psicologia funcional e representante principal do movimento da educação progressiva.

FIGURA – JOHN DEWEY

FONTE: <https://andragogiabrasil.com.br/john-dewey/>. Acesso em: 27 set. 2019.

20
TÓPICO 2 | A NECESSIDADE DE UMA FORMAÇÃO

Conectado ao conceito de educação popular surge a terminologia


pedagogia social. Nas pesquisas realizadas por Monarcha (1989), estas indicam
que quem utilizou o conceito de educação popular pela primeira vez foi Fernando
Azevedo:

Por meio de Fernando de Azevedo, estudamos também “que os povos


se acomodam no interior das velhas estruturas, cabendo à pedagogia
social fazer com que se liberem das amarras da tradição”. Essa
tradição, para os pioneiros, não era peso morto que se prolongava pelo
tempo; ao contrário, era força viva e atuante que agia no presente. Daí
a necessidade de uma revolução cultural (MONARCHA, 1989, p. 21).

A terminologia pedagogia social, que foi utilizada por Fernando de


Azevedo, não tinha como objetivo indicar uma nova área do conhecimento,
porém defendia que a educação pensada para a população brasileira deveria ser
conscientizadora e proporcionar a transformação da realidade social.

As terminologias da pedagogia social, com o passar dos anos, passaram


por um processo de ressignificações. Nesse caso, a educação popular começa
a ser discutida novamente na década de 1960 e a pedagogia social ressurge no
início dos anos 2000.

Segundo Saviani (2008, p. 317), foi na “primeira metade dos anos de 1960
que a concepção de Educação Popular sofreu modificações, admitindo outro
significado”. Para o autor, essa educação popular emergente dos anos 1960
assume em seu entendimento uma preocupação com a participação política das
massas com a tomada de consciência da realidade.

Para Saviani (2008, p. 317), a educação passa a ser vista como um meio de
conscientização “do povo, pelo povo e para povo”, repreendendo uma educação
tradicional e compreendendo como uma “educação das elites, dos dirigentes e
dominantes, para povo, a fim de controlá-lo e manipulá-lo adaptando a ordem
existente”.

Saviani (2008) justifica essa reelaboração do significado de educação


popular por meio de uma série de acontecimentos que são sucedidos de diferentes
públicos em resposta a uma realidade opressora vivenciada na época:

O clima favorável a essa mobilização e a essa metamorfose conceitual


foi propiciado pelas discussões e análises da realidade brasileira
efetuadas no âmbito do ISEB e do CBPE; pelas reflexões desenvolvidas
por pensadores cristãos e marxistas no pós-guerra europeu; e pelas
mudanças que o espírito do Concílio Vaticano II tendia a introduzir na
doutrina social da Igreja. As principais iniciativas que medraram nesse
clima foram os Centros Populares de Cultura (CPCs), os Movimentos
de Cultura Popular (MCPs) e o MEB. Apesar de suas diferenças e
particularidades, esses movimentos tinham em comum o objetivo da
transformação das estruturas sociais e, valorizando a cultura do povo
como sendo a autêntica cultura nacional, identificavam-se com a visão
ideológica nacionalista, advogando a libertação do país dos laços de
dependência com o exterior (SAVIANI, 2008, p.317).

21
UNIDADE 1 | O EDUCADOR SOCIAL NO PROCESSO DE DESENVOLVIMENTO HUMANO NA EDUCAÇÃO SOCIAL NO BRASIL
E SUAS COMPETÊNCIAS PEDAGÓGICAS

Diante desse contexto, Paiva (1986, p. 28) explica que as “mudanças que
ocorreram na Igreja Católica resultaram em grande parte em ações católicas que
estavam voltadas para a educação não escolar da população adulta, por meio
do financiamento público”, ainda, segundo a autora, “reduziu a importância da
disputa entre escola pública X escola privada” (PAIVA, 1986, p. 29).

Outro fator que deve ser destacado foi que o viés optado pelo Movimento
da Educação de Base (MEB) e dos desdobramentos das ideias e pensamentos que
orientavam os jovens católicos naquele período permitiram uma aproximação
dos princípios pedagógicos de renovação escolar.

NOTA

Foi nesse contexto que a maioria das ações católicas viram na obra de Paulo
Freire o grande respaldo e fundamento para ser colocado em prática.

Nesse sentido, Brandão (2002, p. 145) explica que a “Educação Popular,


a partir dos anos sessenta, teve no grande educador popular Paulo Freire o seu
principal idealizador, como também nos movimentos de cultura popular, sendo
a sua agência prioritária de criação de ideias e de realização de experiências”.
Brandão (2002) chama a atenção para três pontos que mostram a complexidade
da área de atuação do educador social, mas que acabaram contribuindo para sua
compreensão.

QUADRO 4 – COMPLEXIDADE DA EDUCAÇÃO POPULAR

É o de uma ampla frente polissêmica de ideias e de ações,


nunca tão política ou ideologicamente centralizada.
Seria o lugar em que propostas e experiências de
um também trabalho pedagógico, mas quase nunca
formalmente escolar dirigido de maneira especial a
pessoas adultas excluídas da escola quando crianças ou
1º ponto: relação ao seu espaço de jovens, no campo e na cidade, tomou corpo em grêmios
germinação estudantis, emergências da Igreja Católica, junto a
sindicatos e embriões de movimentos populares, e até
dentro de estruturas do próprio Estado, como seria o
caso da Campanha Nacional de Alfabetização abortada
pelo Golpe Militar de 1964. Havia mesmo uma marcada
intenção em comprometer o Governo Nacional com um
novo modelo de educação.

22
TÓPICO 2 | A NECESSIDADE DE UMA FORMAÇÃO

Nos anos sessenta se instaura dentro e fora das


universidades uma ampla e nunca unitária crítica de
teor ideológico dirigida à educação vigente, o perfil
que se começa então a delinear é o de também ampla
e difusa proposta nacional de cultura popular. O autor
esclarece que estudantes secundaristas e, sobretudo
universitários, ao lado de educadores acadêmicos e não
2º ponto: ampla e nunca unitária
acadêmicos, juntam-se a artistas, a militantes políticos
crítica de teor ideológico
e a outros intelectuais no afã de participarem de uma
verdadeira mobilização em prol da crítica das condições
sociais de produção cultural em vigência. É a partir
deste movimento que o “popular” vem a ser atrelado a
esta cultura. Seriam manifestações de uma nova cultura
popular criada a partir dos encontros entre os intelectuais
engajados e homens e mulheres trabalhadoras.
Os percursos pedagógicos e os objetivos imediatos ou
em longo prazo dos trabalhos de cultura popular na
educação, que nunca foram homogêneos. Segundo o
autor, a crítica feita à educação era a deque ela nunca foi
neutra e menos ainda o era na sociedade industrial e no
3º ponto: fundamentos ideológicos modo de produção
capitalista; de um modo ou de outro ela servia a
interesses de classe. “Nada se aprende que não provenha
de uma visão de mundo e não conduza a uma ideologia
política, a uma ética devida, a uma visão de destino”
(BRANDÃO, 2002, p. 148).

FONTE: Adaptado de Brandão (2002, p. 148)

Nas décadas de 1970, 1980, 1990, no período que vai da Ditadura Militar ao
processo de redemocratização do país, discussões características foram surgindo,
atrelando a educação popular a processos escolares.

Para Streck (2006), a educação popular surgiu muitas vezes contra a


educação formal, o autor enfatiza que era comum encontrar posicionamentos
contra e a favor da possibilidade de uma autêntica educação popular dentro do
sistema escolar “uma vez que o caráter controlador era visto como inerente à
ordem institucional da qual a escola faz parte” (STRECK, 2006, p. 67).

De acordo com Streck (2006), dois fatos que colaboraram como


fundamentos dessas discussões foram: Paulo Freire assumir o cargo de Secretário
Municipal de Educação na cidade de São Paulo na década de 1980 e a conquista
do poder local por governos que assumiram a proposta de uma educação popular
nesse mesmo momento de redemocratização do país.

Desse modo, Streck (2006, p. 67) afirma que “a educação popular passou,
assim, a aproximar-se do lugar onde se gera o discurso pedagógico hegemônico,
com todas as vantagens e com todos os riscos”.

Os argumentos de Streck (2006) contribuem para o entendimento de que


a educação popular é uma terminologia atrelada a um conceito que continua em

23
UNIDADE 1 | O EDUCADOR SOCIAL NO PROCESSO DE DESENVOLVIMENTO HUMANO NA EDUCAÇÃO SOCIAL NO BRASIL
E SUAS COMPETÊNCIAS PEDAGÓGICAS

movimentação constante, e que varia no decorrer dos anos, atendendo sempre às


demandas que surgem por meio de uma conjuntura política, econômica e social.

Nesse sentido, é possível constatar nas análises de Brandão (2002) e


Streck (2006) que as mudanças recentes nas percepções e finalidades da educação
popular provavelmente estariam fragilizando a área educacional. Diante dessa
perspectiva, Brandão (2002) buscou retomar o sentido que deu a caraterística
histórica da educação popular.

Para Brandão (2002), são quatro pontos que a perspectiva da educação


popular é inovadora perante as tradições pedagógicas. São eles:

QUADRO 5 – PERSPECTIVAS DA EDUCAÇÃO POPULAR X TRADIÇÕES PEDAGÓGICAS

1º ponto: é em relação ao Pode ser transformado continuamente em algo melhor, mais


mundo em que se vive justo e humano.
2º ponto: respeito a esta É um direito e dever de todas as pessoas que devem sentir-se
constante mudança partícipes desse contexto.
3º ponto: finalidade da Cabe a ela formar as pessoas para que possam sentir-se e
educação identificar-se como coconstrutoras do mundo em que vivem.
Para que sejam pensados por todas as pessoas, tornando-
4º ponto: relaciona-se à cultura
as conscientes de sua condição, de seus saberes e de seus
e o poder
projetos sociais.

FONTE: Adaptado de Brandão (2002, p. 169)

Você, acadêmico, deve estar se perguntando: o que é educação popular


hoje? Vejamos! Para Brandão (2002), a resposta para essa pergunta é:

[...] quais as educações disponíveis para crianças, adolescentes, jovens,


adultos e idosos reconhecidos como de algum modo pertencentes a
“classes”, “camadas”, “segmentos” ou “culturas” populares hoje, no
Brasil? E quero chamar a atenção para o fato de que “popular” não
precisa ser tomado aqui como um adjetivo de teor ideológico, no mais
das vezes associado a alguma “política de esquerda”. O próximo censo
do IBGE haverá de nos demonstrar que entre mendigos confessos (se
é que o censo os ouve), desempregados crônicos, famílias abaixo do
nível social da pobreza, segundo critérios da ONU, trabalhadores
submetidos a um dos mais baixos salários mínimos do Continente,
as pessoas populares somam cerca de dois terços de quem somos:
as e os brasileiros. O fato de que algumas revistas de elite prefiram
tratá-los como a faixa nível “C” ou “D” da população brasileira, pouco
significa, no caso, principalmente se levarmos em conta o fato de que
quem assim pensa e classifica os outros está na “faixa A”. Pois bem,
de que “educações” pode ou deve participar esta imensa maioria de
pessoas? (BRANDÃO, 2002, p. 170).

Diante do seu questionamento, em querer saber o que é a educação


popular hoje, Brandão (2002) afirma ainda que, nos dias de hoje, essa “classe
popular” pode participar da educação formal, ou seja, a educação oferecida nas

24
TÓPICO 2 | A NECESSIDADE DE UMA FORMAÇÃO

escolas públicas, oferecida nas redes municipais, estaduais e até federais. Existe
também uma educação que é oferecida por instituições conveniadas, como
exemplo, isso ocorre quando uma escola é mantida por recursos públicos e com
recursos e trabalhos civis, particulares, empresariais ou de Organizações Não
Governamentais (ONGs).

A população envolvida pode participar de diferentes tipos de treinamentos,


por meio de qualificação profissional ou de formação pessoal. Normalmente,
esses tipos de treinamentos ocorrem nas instituições patronais, como o Serviço
Nacional de Aprendizagem (SENAI). Brandão (2002) afirma que no Brasil são
muitos os casos, concluindo que essas pessoas conseguem, com isso, participar de
muitas experiências pedagógicas que são oferecidas pelas instituições civis, tanto
no âmbito dos governos municipais e estaduais.

As propostas do trabalho cultural por meio dessa forma de educação


incluem, de modo geral, palavras, expressões e ideias centradas na educação
popular. Identifica-se que esses assuntos, quando são evidenciados, tornam-se
considerados como educação popular. Atualmente, essas pressuposições são
debatidas pelos autores Moura, Neto e Silva (2009), ao tentarem definir a “Cara
da Pedagogia no Brasil”.

E
IMPORTANT

Surge, atualmente, com o novo contexto econômico, social e político e


educacional brasileiro uma relação pedagógica e idearia entre Educação Popular e
Pedagogia Social.

A pedagogia social, por meio de um próprio movimento de legitimação,


vai em busca de um reconhecimento enquanto área de formação profissional,
acadêmica e de pesquisa, no que diz respeito às questões pedagógicas tradicionais
no país.

Streck (2006) assegura que após o período de Ditadura Militar no Brasil,


aconteceu uma configuração diferente da educação formal e não formal no Brasil,
em que essa divisão específica, entre ambas, foi deixada de lado.

Essas diferenças podem estar relacionas a algumas propostas


proporcionadas pela pedagogia social, que aparece como uma nova alternativa na
área da educação, e, com isso, não admite a divisão da educação formal, informal
e não formal.

A Ciência da Educação, diante dessa nova perspectiva, acaba sendo


dividida entre Pedagogia Escolar e Pedagogia Social. O educador social passa
25
UNIDADE 1 | O EDUCADOR SOCIAL NO PROCESSO DE DESENVOLVIMENTO HUMANO NA EDUCAÇÃO SOCIAL NO BRASIL
E SUAS COMPETÊNCIAS PEDAGÓGICAS

a perceber que a educação popular não está mais centralizada e restrita apenas
aos sindicatos, às igrejas, às entidades e aos grupos com objetivo alternativo e
popular. A educação popular passa a ser incorporada ao fluxo da política e da
pedagogia em sua totalidade. Com isso, pode-se afirmar que a pedagogia social,
por meio de suas finalidades, começa a atender a essas demandas, e é possível
perceber que ela surge com as novas práticas políticas pedagógicas.

Ainda citando Streck (2006), faz-se necessário perceber que esse autor
destaca uma nova identidade por meio da refundamentação ou refundação
da educação popular, com a busca de uma linguagem que venha de encontro
às novas realidades, sendo uma ponte entre a pedagogia social, que com suas
propostas começa a ser identificada com a educação popular.

O autor citado anteriormente identifica a volta da conotação da termologia


educação popular como sendo uma educação pública e que seja para todos.
Atualmente, as políticas públicas relacionam essa demanda às perspectivas
educacionais em tempo integral, com isso integra-se também a pedagogia social
(STRECK, 2006).

Vista como um processo de democratização do acesso ao ensino de forma


que o sujeito envolvido consiga realizar outras habilidades, essa nova perspectiva
educacional de tempo integral segue o caminho fundamentado em uma nova
postura de educação para toda população, estando fundamentada em novos
princípios. Tanto a educação popular como a pedagogia social seguem e se
integram com essas novas discussões.

Ao finalizar toda essa argumentação, Streck (2006) destaca que a educação


popular não fica apenas restrita aos grupos pobres da população, mas envolve
todos. Essa afirmação está fundamentada como os princípios da pedagogia social,
pois a ênfase dos discursos que envolve outros países e o Brasil são voltadas
para práticas educativas que estão vinculadas a demandas sociais e as camadas
populares.

E
IMPORTANT

Paulo Freire, em sua obra Pedagogia do Oprimido (1978), defende que é por
meio da comunhão entre homens e de sua conscientização crítica da realidade que o
oprimido deixa de ser oprimido e opressor deixa de ser opressor.

No Brasil, vem crescendo cada vez mais as práticas educativas que são
voltadas e desenvolvidas em diversos espaços públicos e não governamentais,
por exemplo, podemos citar: o Centro de Referência de Assistência Social

26
TÓPICO 2 | A NECESSIDADE DE UMA FORMAÇÃO

(CRAS), o Centro de Referência Especializado em Assistência Social (CREAS), o


Centro de Atenção Psicossocial (CAPS), as casas de acolhimentos e de passagem,
os programas e projetos com idosos, as Organizações Não Governamentais
(ONGs), que acontece nos hospitais, nos centros de ressocialização, nos presídios
e penitenciárias e nos diversos movimentos sociais e muitos outros.

Com toda essa variedade de práticas educativas é necessária a existência


de profissionais responsáveis. Na maioria das vezes, levam a demonização de
“educadores”, porém acabam recebendo outras denominações, como agentes
sociais, arte educadores, animadores culturais, educadores sociais, entre outros.

Esses educadores possuem os mais diversos níveis de formação e de


conhecimento, com distintos interesses em suas práticas. Diante dessa realidade,
encontram-se muitos voluntários, que por uma determinada vocação ou para
realizar uma boa ação acabam se envolvendo com essa demanda educacional,
além de existirem os funcionários contratados, os efetivos e os indicados
politicamente.

Nesse sentido, surge o questionamento: quem são esses profissionais?


Quais seriam suas formações? Já que todas essas práticas são consideradas como
educação social e este passa a usar o adjetivo “social”.

De acordo com Oña (2005, p.2), o profissional educador social:

[...] é uma pessoa capacitada para desenvolver duas funções: por


um lado, deve elaborar uma crítica e uma transformação dos valores
educacionais e da estrutura da sociedade e por outro, deve intervir
com sujeitos e ajudá-los a potencializar seus fatores pessoais de
desenvolvimento, capacitando-os socialmente para: desenvolvimento
de autoestima, autoconhecimento, habilidades sociais, consciência
crítica etc., a fim de facilitar as condições objetivas da pessoa com o
seu meio [...]. O Educador Social é o mediador entre o educando, a
sociedade e acultura.

Oliveira (2004) destaca a importância que os educadores possuem ao


desenvolverem suas práticas fundamentadas na teoria freiriana, em que são
conhecidos e chamados de educadores populares, e, desde a década de 1960,
atuam com comunidades por meio de práticas culturais e processos voltados à
emancipação e transformação social.

Para Paiva (2011) e Ribas (2010), a necessidade do reconhecimento


profissional e a formação específica para esses chamados educadores sociais
devem possuir fundamentos freirianos, usando como exemplo as práticas
desenvolvidas pela educação popular.

Com isso, pode-se afirmar que o grande desafio colocado para esses
trabalhadores é o reconhecimento como profissional e da própria profissão, sendo
que o número de sujeitos que estão envolvidos nesses processos é considerado
alto, nos mais diversos grupos e classes sociais.

27
UNIDADE 1 | O EDUCADOR SOCIAL NO PROCESSO DE DESENVOLVIMENTO HUMANO NA EDUCAÇÃO SOCIAL NO BRASIL
E SUAS COMPETÊNCIAS PEDAGÓGICAS

Outro aspecto que é importante considerar é que a existência de um


profissional educador social no Brasil pode contribuir com as atividades e
com trabalho que vem sendo desenvolvido nas áreas de Assistência Social, da
Psicologia e da Pedagogia. Essa profissão não se torna uma concorrência aos
profissionais mencionados, e sim devem ser considerados um especialista nesse
processo de educação das pessoas com suas diferentes necessidades.

Diante disso, destaca-se que a profissão do educador social no Brasil, cada


vez mais é uma necessidade, porém é uma área muito complexa. No Ministério
do Trabalho e Emprego, através do documento: Classificação Brasileira de
Ocupações (COB), de 2002, no seu código n° 5.153, declara os profissionais de
atenção e defesa das pessoas em situação de risco, incluindo os educadores sociais
nesta categoria profissional.

Para Gohn (2010), esse documento tem a função e atribuições, assinalando


que o acesso a essa ocupação é livre e sem necessidades de requisitos escolares.

DICAS

Para saber mais sobre o documento COB, você pode acessar este link: http://
www.mtecbo.gov.br/cbosite/pages/pesquisas/BuscaPorTituloResultado.jsf.

Cabe ao educador social, em sua atuação prática, dinamizar e construir


um modelo participativo com qualidade através de metodologias que supõem
fundamentos teóricos e ações práticas. Nesse sentido, sua atuação profissional deve
ser fundamentada em princípios, métodos e metodologia de trabalho, a pedagogia
social deve substituir essas práticas socioeducativas através do embasamento
teórico, pois esse profissional atua nos marcos de uma proposta socioeducativa, de
construção de saberes a partir das culturas locais (GOHN, 2010).

28
TÓPICO 2 | A NECESSIDADE DE UMA FORMAÇÃO

DICAS

FIGURA – PEDAGOGIA DO OPRIMIDO

FONTE: <https://images-na.ssl-images-amazon.com/images/I/51k5kvkE%2BZL.jpg>.
Acesso em: 27 set. 2019.

O autor propõe um método abrangente, pelo qual a palavra ajuda o homem a tornar-se
homem. Assim, a linguagem passa a ser cultura. Através da decodificação da palavra, o
alfabetizando vai-se descobrindo como homem, sujeito de todo o processo histórico. O
método de Paulo Freire não possui qualquer atitude paternalista em relação ao analfabeto.
Ele aplica pela primeira vez no campo da pedagogia as palavras Conscientização/
Conscientizar, que em seu conteúdo vernacular específico se incluem no vocabulário
de idiomas como o francês e o alemão, tidos como acabados e, em consequência,
totalmente infensos à aceitação de neologismos. Quando o Brasil aceita o grande desafio
do desenvolvimento, nada mais necessário que atentar para seu processo de civilização.
O livro é um rumo neste caminho, pois não é possível supor êxitos no campo econômico,
sem o alicerce de um povo que se educa para civilizar-se.

Vale a pena a leitura!

29
RESUMO DO TÓPICO 2
Neste tópico, você aprendeu que:

• No Brasil, atualmente, tem surgido discussões sobre a necessidade de uma


formação específica.

• É importante compreender as discussões sobre a profissionalização do


educador social, perante isso se faz necessário descrever o percurso histórico
que a pedagogia social no Brasil teve enquanto área acadêmica e de formação
profissional.

• A terminologia pedagogia social aparece no país pela primeira vez relacionada


à terminologia educação popular, no início do século XX.

• Em 1924, aconteceu a criação da Associação Brasileira de Educação (ABE),


passando a organizar, a partir do ano de 1927, as Conferências Nacionais de
Educação.

• A Escola Nova no Brasil possuía suas bases na teoria de John Dewey, sendo
assimilados principalmente por Anísio Teixeira.

• Conectado ao conceito de educação popular surge a terminologia pedagogia


social.

• A terminologia pedagogia social, que foi utilizada por Fernando de Azevedo,


não tinha como objetivo indicar uma nova área do conhecimento, porém
defendia que a educação pensada para a população brasileira deveria ser
conscientizadora e proporcionar a transformação da realidade social.

• A educação passa a ser vista como um meio de conscientização “do povo, pelo
povo e para povo”.

• A educação popular, a partir dos anos 1960, teve no grande educador popular
Paulo Freire o seu principal idealizador, como também nos movimentos de
cultura popular, sendo a sua agência prioritária de criação de ideias e de
realização de experiências.

• Educação popular é uma terminologia atrelada a um conceito que continua em


movimentação constante, e que varia no decorrer dos anos, atendendo sempre às
demandas que surgem através de uma conjuntura política, econômica e social.

• Nos dias de hoje, essa “classe popular” pode participar da educação formal, ou
seja, a educação oferecida nas escolas públicas, oferecidas nas redes municipais,
estaduais e até federais.

30
• A pedagogia social, através de um próprio movimento de legitimação, vai
em busca de um reconhecimento enquanto área de formação profissional,
acadêmica e de pesquisa, no que diz respeito às questões pedagógicas
tradicionais no país.

• As Ciências da Educação acabam sendo divididas entre pedagogia escolar e


pedagogia social.

• No Brasil, vem crescendo cada vez mais as práticas educativas que são voltadas
e desenvolvidas em diversos espaços públicos e não governamentais.

• O grande desafio colocado para os educadores sociais é o reconhecimento como


profissional e da própria profissão, sendo que o número de sujeitos que estão
envolvidos nesses processos é considerado alto, nos mais diversos grupos e
classes sociais.

• Em 24 de abril de 2019, foi aprovado o Projeto de Lei do Senado n° 328, de 2015,


que dispõe sobre a regulamentação da profissão de Educadora e Educador
Social.

31
AUTOATIVIDADE

1 O pensamento pedagógico de Paulo Freire parte de alguns princípios que


marcam, de forma clara e objetiva, o seu modo de entender o ato educativo.
Considerando as características do pensamento desse autor, analise as
afirmações que seguem.

I- Ensinar é um ato que envolve a reflexão sobre a própria prática.


II- Modificar a cultura originária é parte do processo educativo.
III- Superar a consciência ingênua é tarefa da ação educativa.
IV- Educar é um ato que acontece em todos os espaços da vida.
V- Educar é transmitir o conhecimento erudito e universalmente reconhecido.

De acordo com o pensamento de Paulo Freire, quais afirmações estão


CORRETAS?
a) ( ) I e II.
b) ( ) II e V.
c) ( ) I, III e IV.
d) ( ) I, IV e V.
e) ( ) I, II, III e IV.

2 A educação popular atualmente vem ganhando destaque perante as


perspectivas prática pedagógica e teoria da educação, com a concepção para
a contribuição do pensamento pedagógico universal. A sua contribuição
para a sociedade é vista de forma positiva na construção de novas maneiras
de fazer política, de pensar e de construir a democracia, dessa forma
potencializa a formação humana. Perante esse contexto, o que significa para
você a educação popular? Escreva um texto com o mínimo de 10 linhas
acercado que você compreendeu sobre os conceitos de educação popular.

32
UNIDADE 1
TÓPICO 3

A FORMAÇÃO DO EDUCADOR SOCIAL NO BRASIL

1 INTRODUÇÃO
Caro acadêmico, o terceiro tópico tem o objetivo de apresentar a você
quais são as perspectivas da formação profissional do educador social no Brasil.
Neste tópico, será apresentada a legislação que foi aprovada e que regulamenta
a profissão do educador social no país, sendo esse um marco de referência para
esse profissional na sociedade brasileira.

O percurso realizado para o reconhecimento profissional, educador social,


no Brasil, vem de um longo espaço de tempo, pois procurou-se a consolidação de
um trabalho que na prática, em muitos casos, era visto como uma ação voluntária
ou para pessoas desocupadas.

Ganhando espaço no meio acadêmico, nas chamadas ciências da educação,


a educação social se fortaleceu e ficou visível no âmbito social, através dos
importantes debates, congressos e produções acadêmicas, além da aproximação
com as organizações e entidades sociais.

2 EDUCADOR SOCIAL E O
RECONHECIMENTO PROFISSIONAL
Então, caro acadêmico, o que é ser educador social? Quais são suas
competências e atividades profissionais? Seria um profissional da área da
educação? O que diz a legislação sobre essa atividade profissional? O que está
escrito na LDBEN nº 9.394/96? Com certeza esses questionamentos estão sendo
constantes no decorrer de seus estudos.

33
UNIDADE 1 | O EDUCADOR SOCIAL NO PROCESSO DE DESENVOLVIMENTO HUMANO NA EDUCAÇÃO SOCIAL NO BRASIL
E SUAS COMPETÊNCIAS PEDAGÓGICAS

FIGURA 4 – A FORMAÇÃO DO EDUCADOR SOCIAL

FONTE: <https://editalconcursosbrasil.com.br/wp-content/uploads/2019/05/o-que-faz-um-
educador-social-287x189.jpg>. Acesso em: 27 set. 2019.

Neste tópico, serão apresentadas as características psicofísicas, ou seja,


as qualidades e habilidades fundamentais para ser um educador social e estar
preparado para o mercado de trabalho. Iniciamos com a suposição de que as
qualidades que são necessárias para atuar como um educador social nas demandas
do trabalho social estão elencadas com a educação, ou seja, pedagógicos.Com essa
afirmação, justifica-se considerar que esses profissionais seriam trabalhadores da
educação e que desempenham suas funções em espaços alternativos, que não
são as escolas. Com isso, esses profissionais deveriam serem regulados pela
Lei de Diretrizes e Base nº 9.394/96, visto que em termos de formação e atuação
estão redirecionados, dessa maneira, à percepção subjacente no que se refere à
regulamentação do profissional de educador social.

Essas hipóteses surgiram por meio das reflexões e debates em torno da


regulamentação da profissão de educador social, que tramitou na Câmara Federal
e Senado, por meio de dois projetos de leis, sendo eles: o PL nº 5.346/2009 e o PLS n°
328/2015, que trouxeram o questionamento sobre o campo de atuação e formação
profissional dessa profissão. Visto que tem suas ações centralizadas no processo
educativo do trabalho social, levantando a dúvida: qual seria o enquadramento
desse trabalhador, na educação e na assistência social? (BRASIL, 2009, 2015).
Alguns autores e pesquisadores defendem a ideia de ser um trabalhador da
educação, independentemente de seu espaço de atuação como profissional.

Esse debate foi de grande impacto nas decisões sobre a regulamentação


da profissão, pois uma delas considera como sendo um trabalhador social que
estaria subordinado à política de assistência social e não à educação, pois está
configurado no Sistema Único de Assistência Social (SUAS), através da Resolução
nº 09/2014, do Conselho Nacional de Assistência Social (CNAS),que distingue a
função e o tipo de formação desse profissional quando está atuando dentro da
assistência social (BRASIL, 2014).

34
TÓPICO 3 | A FORMAÇÃO DO EDUCADOR SOCIAL NO BRASIL

E
IMPORTANT

De acordo com a Resolução nº 09/2014, o Orientador Social ou Educador


Social possui as seguintes funções:

a) Desenvolver atividades socioeducativas e de convivência e socialização visando à


atenção, defesa e garantia de direitos e proteção aos indivíduos e famílias em situações
de vulnerabilidade e/ou risco social e pessoal, que contribuam com o fortalecimento
da função protetiva da família.
b) Desenvolver atividades instrumentais e registro para assegurar direitos, (re)construção
da autonomia, autoestima, convívio e participação social dos usuários, a partir de
diferentes formas e metodologias, contemplando as dimensões individuais e coletivas,
levando em consideração o ciclo de vida e ações intergeracionais.
c) Assegurar a participação social dos usuários em todas as etapas do trabalho social.
d) Apoiar e desenvolver atividades de abordagem social e busca ativa.
e) Atuar na recepção dos usuários possibilitando ambiência acolhedora.
f) Apoiar a identificação e registro de necessidades e demandas dos usuários, assegurando
a privacidade das informações.
g) Apoiar e participar no planejamento das ações.
h) Organizar, facilitar oficinas e desenvolver atividades individuais e coletivas de vivência
nas unidades e/ou na comunidade.
i) Acompanhar, orientar e monitorar os usuários na execução das atividades.
j) Apoiar a organização de eventos artísticos, lúdicos e culturais nas unidades e/ou na
comunidade.
k) Apoiar o processo de mobilização e campanhas intersetoriais nos territórios de vivência
para a prevenção e o enfrentamento de situações de risco social e/ou pessoal, violação
de direitos e divulgação das ações das unidades socioassistenciais.
l) Apoiar a elaboração e distribuição de materiais de divulgação das ações.
m) Apoiar os demais membros da equipe de referência em todas etapas do processo de
trabalho.
n) Apoiar a elaboração de registros das atividades desenvolvidas, subsidiando a equipe com
insumos para a relação com os órgãos de defesa de direitos e para o preenchimento do
Plano de Acompanhamento Individual e/ou familiar.
o) Apoiar a orientação, informação, encaminhamentos e acesso a serviços, programas,
projetos, benefícios, transferência de renda, ao mundo do trabalho por meio de
articulação com políticas afetas ao trabalho e ao emprego, dentre outras políticas
públicas, contribuindo para o usufruto de direitos sociais.
p) Apoiar o acompanhamento dos encaminhamentos realizados.
q) Apoiar a articulação com a rede de serviços socioassistenciais e políticas públicas.
r) Participar das reuniões de equipe para o planejamento das atividades, avaliação de
processos, fluxos de trabalho e resultado.
s) Desenvolver atividades que contribuam com a prevenção de rompimentos de vínculos
familiares e comunitários, possibilitando a superação de situações de fragilidade social
vivenciadas.
t) Apoiar a identificação e acompanhamento das famílias em descumprimento de
condicionalidades.
u) Informar, sensibilizar e encaminhar famílias e indivíduos sobre as possibilidades de
acesso e participação em cursos de formação e qualificação profissional, programas e
projetos de inclusão produtiva e serviços de intermediação de mão de obra.
v) Acompanhar o ingresso, frequência e o desempenho dos usuários nos cursos por meio
de registros periódicos.
x) Apoiar o desenvolvimento dos mapas de oportunidades e demandas.

35
UNIDADE 1 | O EDUCADOR SOCIAL NO PROCESSO DE DESENVOLVIMENTO HUMANO NA EDUCAÇÃO SOCIAL NO BRASIL
E SUAS COMPETÊNCIAS PEDAGÓGICAS

Da maneira que está colocado, não defende uma formação específica e


ou superior para esse profissional, pois no trabalho social já tem um profissional
de nível superior, o assistente social. Sabe-se que no campo do trabalho social
possuem atividades que são da competência da educação e requerem um
profissional com conhecimentos pedagógicos, sendo estes adquiridos através de
um longo processo de formação e a partir da relação teoria e prática.

Com esses parâmetros, defende-se que não seja considerado um


profissional da educação, mas é necessário defender a formação inicial de
superior para educador social. Não se pode idealizar um trabalho social que seja
desempenhado de forma irresponsável, sem formação técnica, e que fique sempre
à mercê das práticas religiosas ou políticas compensatórias, que acabam não
resolvendo as demandas sociais de pessoas e grupos historicamente excluídos e
com vulnerabilidade social.

Com essa afirmativa, qualquer manifestação contrária à formação


do educador social não se justifica. As manifestações contrárias à formação
específica desse profissional concentram-se pela ideia do gasto desnecessário de
recursos financeiros e humanos com o trabalho socioeducativo para pessoas em
situação de vulnerabilidades social. Para essas pessoas contrárias à formação do
educador social, o retorno social e político é pouco, comparado com o montante
que é direcionado para as políticas públicas da área social. Resumindo esse
pensamento, não precisa-se de profissionais qualificados para trabalhar com as
pessoas das classes mais vulneráveis.

Partindo desses pressupostos é necessário avaliar essa questão,


primeiramente através da conceituação de educação, enfatizando a LDBEN nº
9.394/96 no que se refere aos trabalhadores da educação, e analisar as ligações
existentes entre a educação social e o educador social, e quais são suas características
necessárias para atuação como profissional no mercado de trabalho.

Conclui-se afirmando, resumidamente, que esse profissional é da área


da educação, levando uma defesa de uma necessária reforma da LDBEN para
que sejam incluídos os trabalhadores da educação e outros que tenham em sua
formação e atuação profissional o pedagógico-social.

O trabalho do educador social está centrado na educação das pessoas


em situação de vulnerabilidade social, focando a promoção cognitiva e social
delas. Acredita-se que educação social é um mecanismo de garantir a existência
da dignidade humana para essas pessoas. Isso acontece através de um processo
de conscientização libertador possibilitando a reconstrução de suas condições
sociais e materiais.

Para Pinto (1993, p. 29), a educação precisa ser compreendida e entendida


com um processo libertador, finalizando em si dois aspectos ontológicos:
primeiro, em “[...] sentido amplo (e autêntica) a educação diz respeito à existência
humana em toda a sua duração e em todos os seus aspectos” visando à autonomia

36
TÓPICO 3 | A FORMAÇÃO DO EDUCADOR SOCIAL NO BRASIL

dos sujeitos; segundo, em sentido restrito, como o autor afirma: “[...] formação
(Bildung) do homem pela sociedade, [sendo um] processo pelo qual a sociedade
atua constantemente sobre o desenvolvimento do ser humano no intento de
integrá-lo no modo de ser social vigente e de conduzi-lo a aceitar a buscar os fins
coletivos” (PINTO, 1993, p. 30).

Nesse sentido, Castoriadis (1982, 1992, 2007) nos faz ter uma melhor
compreensão desses dois aspectos da educação quando afirma que eles se
asseguram na contradição, sendo então: buscar libertar os sujeitos e também
inserir neles as instituições sociais.

O autor citado reconhece em seu discurso que a educação, em primeira


instância, é o lugar de interiorização dos aspectos subjetivos e objetivos das instituições
criadas pelos homens no seu processo civilizatório, porém precisa assumir seu papel
de autonomização dos sujeitos, através de suas práxis pedagógicas.

Citando ainda Castoriadis (2007, p. 178), o autor afirma que é por meio
da educação que ocorre “[...] a autonomia do indivíduo — e essa autonomia tem
condições estabelecidas historicamente, tanto na história do indivíduo, quanto
naquela coletividade onde ele vive —, dizemos que é preciso educar o indivíduo
para que ele seja autônomo”.

Para Castoriadis (2007), isso não significa caso não haja solução desse
impasse. Para ele, ao contrário, afirma a necessidade de anular a antipedagogia que
oprime e aliena para uma pedagogia da autonomização capaz de libertar subjetiva
e objetivamente os sujeitos. Aborda ainda que essa libertação decisivamente se
inicia no processo de autonomia individual para a coletiva das pessoas. Com isso,
a educação deverá ser explorada como práxis e não mais somente como uma
técnica de internalização de conhecimentos.

Castoriadis (1982, p. 94) ressalta em seus estudos que o desenvolvimento


e o exercício da autonomia social através das práxis, sendo essa a única condição
de emancipação individual e social, segundo ele, “[...] práxis é aquilo que visa
o desenvolvimento da autonomia como fim e utiliza para esse fim a autonomia
como meio”, intencionando a libertação do outro.

Para o referido autor, Castoriadis (1982, p. 94), a práxis é um “[...] fazer


no qual o outro ou os outros são visados como seres autônomos e considerados
como o agente essencial do desenvolvimento da sua própria autonomia”, posto
que está no sujeito as possibilidades históricas de sua emancipação.

A educação social se insere nessa perspectiva como sendo uma ação


prática de resistência e protegida na concepção da educação popular, que busca a
autonomia dos sujeitos oprimidos pela sociedade. A educação social recorre aos
ensinamentos da pedagogia de Paulo Freire para materializar uma pedagogia
social e antipedagógica a partir do momento que assume a práxis pedagógica no
processo de conscientização das classes sociais.

37
UNIDADE 1 | O EDUCADOR SOCIAL NO PROCESSO DE DESENVOLVIMENTO HUMANO NA EDUCAÇÃO SOCIAL NO BRASIL
E SUAS COMPETÊNCIAS PEDAGÓGICAS

Nesse processo cíclico, a educação social passa a ser uma área de


conhecimento e de atuação profissional que acrescenta e agrega diferentes ações
e práticas educativa com as pessoas em vulnerabilidade social, focando a sua
promoção cognitiva e social.

Pereira (2011, p. 52) ressalta que a educação social está presente em diversos
setores da vida social das pessoas, e que sua intencionalidade é “[...] resolver as
questões sociais que se apresentam e tomando as populações oprimidas como
sujeitos de sua prática”.

Pereira (2016) define a educação social e identifica a pedagogia social


como sendo a ciência dessa ciência, pois visa sistematizar as práticas educativas
sociais existente no meio social, tornando-se um:

[...] campo de conhecimento com práticas educativas diversas, voltadas


para a reintegração de indivíduos e grupos histórica e socialmente
excluídos. É uma educação que se vincula a uma concepção crítica de
sociedade, tendo como ciência a pedagogia social, que estuda tais práticas
nas suas especificidades ontológicas e dimensões epistemológicas,
respondendo se são ou nãopráxis transformadoras, ao mesmo tempo
em que indica possibilidades de superação daquelas ações não exitosas
no interior da prática em investigação (PEREIRA, 2016, p. 94).

Na mesma linha conceitual, Gadotti (2012, p. 16) define a educação social


como uma prática emancipadora de diversas dimensões múltiplas que “[...]
compreende o escolar e o não escolar, o formal, o informal e o não formal” e que
o adjetivo social é porque ela prescinde da sociedade e intenciona a socialização
dos indivíduos. O autor pressupõe ainda que existe uma relação próxima entre
educação social e educação popular, no qual o ponto de união entre elas está na
intenção emancipadora de todos os sujeitos oprimidos.

Gadotti (2012) afirma ainda que a educação social se faz presente em


vários setores e segmentos da vida social e produtiva, como:

[...] a inclusão digital, a segurança alimentar e social, o desenvolvimento


local, a convivência social (gestão de conflitos), a acessibilidade
urbana e outros campos que têm a ver com o bem viver das pessoas,
exercendo uma função que vai do diagnóstico, ao terapêutico, ao de
apoio psicossocial, e, ao mesmo tempo, ao de animador sociocultural.
Toda essa abrangência lhe confere um status especial na história da
educação e das ideias pedagógicas (GADOTTI,2012, p. 17).

Gadotti (2012) considera também que a educação social possui uma forte
relação com as outras formas de educação e pedagogias, e incorpora, de forma
harmoniosa, construindo uma relação ao contexto de opressão dos educandos,
visto que:

[...] educação social compreende a educação de adultos, popular,


comunitária, cidadã, ambiental, rural, educação em saúde e se
preocupa, particularmente, com a família, a juventude, a criança e o
adolescente, a animação sociocultural, o tempo livre, a formação na

38
TÓPICO 3 | A FORMAÇÃO DO EDUCADOR SOCIAL NO BRASIL

empresa, a ação social. O educador social atua no âmbito da Educação


de adultos, Educação parental, Educação de deficientes, Educação
laboral e ocupacional, Educação para o tempo livre, Educação
cívica, Educação comunitária, Educação para a saúde, Educação
penitenciária, Educação intercultural, Educação ambiental e outros
(GADOTTI, 2012, p.18).

Seguindo o mesmo pensamento, Streck (2012) considera também


que a área da educação social é ampla, heterogênea e tem relação direta com
a socialização das pessoas, resultando numa transformação positiva para toda
sociedade. Assim:

[...] a pedagogia social tem a possibilidade de inserir-se em diversos


espaços do tecido social ou das redes sociais e operar as transformações
de dentro destes espaços. Isso implica um conhecimento aprofundado
do funcionamento e da estruturação da sociedade e, ao mesmo
tempo, da formação e atuação dos sujeitos dentro da sociedade.
Esse conhecimento é indispensável para todas as áreas da educação,
mas no caso da pedagogia social ela se torna um foco prioritário
(STRECK,2012, p. 37).

Gadotti (2012) e Streck (2012) ressalvam a existência forte e a próxima


relação entre educação social e educação popular, visto que a primeira menciona
as distintas práticas educativas com pessoas em situação de vulnerabilidade
social, com o objetivo de dinamizar já a segunda menciona a concepção de uma
educação subjacente às práticas educativas, existindo uma diferença entre essas
duas práticas educativas.

Segundo Streck (2012, p. 37), a diferença entre educação social e educação


popular é ofertada pelo público e pela proposta educativa, pois “[...] enquanto
a pedagogia social tem sua constituição definida pelo público com o qual atua
ou pelos contextos em que é realizada, a educação popular se apresenta mais
propriamente como uma proposta teórico-metodológica”.

Já Gadotti (2012) garante que a educação social é uma prática de educação


popular, mas que se diferencia quando pretende a construção de uma pedagogia
própria — a pedagogia social, ciência da educação social, construção essa a partir
da sistematização das práticas.

Santos e Paulo (2017) afirmam que a educação popular é um viés que serve
de inspiração para uma pedagogia social brasileira, visto que ela já nasce nos
meios acadêmicos europeus. Os autores dispõem que elas convivem no mesmo
espaço educativo e se mostram de maneira contraditória, mas são, na dialética,
um projeto de emancipação das classes oprimidas.

Autores como Leiro, Moraes e Santos (2015) apontam a atenção para o


fato de que a relação educação popular e educação social é uma acomodação
tipicamente brasileira e acabam permitindo que se tenha uma proposta de
educação mais avançada, de forma crítica e essencialmente localizada, a partir
dos problemas do país.

39
UNIDADE 1 | O EDUCADOR SOCIAL NO PROCESSO DE DESENVOLVIMENTO HUMANO NA EDUCAÇÃO SOCIAL NO BRASIL
E SUAS COMPETÊNCIAS PEDAGÓGICAS

Paula (2017) afirma em seus estudos que a educação popular é uma prática
de resistência historicamente concretizada pelos grupos sociais, visando à busca
da emancipação social, e, com isso, se torna para a pedagogia social a principal
referência, pois traz os estudos de Paulo Freire para uma educação emancipatória.

Para Graciani (2006), existe uma relação próxima com essas educações
com a base freiriana. A autora afirma ainda que a educação social é uma
prática educativa revolucionária porque tem uma teoria e ação emancipadora,
ela acontece no interior das classes menos privilegiadas, assumindo assim um
diálogo com Freire, dando a possibilidade de transformação do educador e do
educando; nesse sentido, é uma prática orientada por uma pedagogia libertadora
que parte do protagonismo das classes populares.

Graciani (2006) conclui que só é possível a prática dessa pedagogia a partir


da busca incessante da:

[...] sabedoria popular, [que está] expressa em seus códigos,


dramaturgia, religiosidade, produtos culturais e senso comum, base
fundamental que deve servir de plataforma para ele (indivíduo, grupo,
classe popular) e os intelectuais orgânicos possam chegar à hegemonia
da sociedade civil no processo concomitante de sua libertação social,
econômica e política; de outro, entender que o povo não se apresenta
como uma entidade única (GRACIANI, 2006, p.8).

Para Scocuglia (2006), a pedagogia de Paulo Freire é uma pedagogia


social que vem se de contraponto às educações e às pedagogias neoliberais
e globalizantes que buscam cada vez mais a alienação dos trabalhadores e de
suas famílias. O autor sustenta que a pedagogia social é contra hegemônica,
desalienadora e vai contra os mecanismos opressores do sistema capitalista que
cada dia vem colocando a educação no caminho da empregabilidade em vez da
formação integral da classe trabalhadora.

A defesa da educação social acontece pela formação integral das pessoas


excluídas socialmente, fazendo delas as protagonistas de sua história. Esse modelo
de educação inclui tanto a aquisição de novos saberes, a construção de uma
consciência crítica e a mobilização das pessoas numa luta constante de acesso,
mudança e construção de políticas sociais de moradia, de saúde, de educação, de
emprego e renda.

E
IMPORTANT

A luta por esses direitos não é uma tarefa fácil e requer a presença efetiva do
educador social como trabalhador, profissional, orgânico da educação.

40
TÓPICO 3 | A FORMAÇÃO DO EDUCADOR SOCIAL NO BRASIL

O educador social enfrenta uma outra luta, que é a de ver a sua profissão
ser reconhecida legalmente para que possa desfrutar de todos os direitos próprios
do seu trabalho. Para esse profissional, um dos desafios está na definição do seu
campo de atuação profissional de educação ou de trabalho social. A sua atuação
profissional tem evidenciado um pertencimento educativo, indicando que se trata
de um profissional da área da educação, mesmo não sendo, em tese, contemplado
na LDBEN n° 9.394/96.

E
IMPORTANT

A LDBEN considera quem como os trabalhadores da educação?


O artigo 61 diz que são “[...] profissionais da educação escolar básica [...] em efetivo
exercício e tendo sido formados em cursos reconhecidos”; ou seja, logo de início já limita
o campo de atuação — não é aquele que atua em qualquer educação, mas a escolar,
desconsiderando os da educação não escolar (BRASIL, 1996, p. 8).

A LDBEN finaliza seu texto de forma indireta, incluindo outros


trabalhadores da educação escolar e não escolar. Essa lei se refere ao docente e
aos gestores da educação escolar básica; no entanto, é possível ponderar dentro
de sua proteção outros trabalhadores, mesmo porque ela não determina se
essa “educação escolar básica” seria apenas na perspectiva da educação formal
pertinente à escolarização organizada pelo Estado, como também diz respeito
à educação não escolar, numa perspectiva de educação social ou popular,
concretizada por instituições da sociedade civil, buscando a libertação dos
oprimidos, como ocorre com muitos movimentos sociais.

Essa lei não determina qual é a função dos trabalhadores na educação


básica. Em seu texto, fica o viés para diferentes interpretações, porém quando
fala da formação desses profissionais, visa sinalizar a questão da certificação das
formações e de experiências de outras atividades, ainda no artigo 61:

A formação dos profissionais a que se refere o inciso III do art. 61 far-


se-á por meio de cursos de conteúdo técnico-pedagógico, em nível
médio ou superior, incluindo habilitações tecnológicas. Parágrafo
único. Garantir-se-á formação continuada para os profissionais a que
se refere o caput, no local de trabalho ou em instituições de educação
básica e superior, incluindo cursos de educação profissional, cursos
superiores de graduação plena ou tecnológicos e de pós-graduação
(BRASIL, 1996, p. 1).

Para Pereira (2019), esse artigo evidencia também que esses profissionais
podem ser formados em cursos que não necessariamente sejam o de pedagogia,
mas que contenham conteúdos pedagógicos, porque a educação trabalha com o
que é pedagógico em todas as suas dimensões e instituições.

41
UNIDADE 1 | O EDUCADOR SOCIAL NO PROCESSO DE DESENVOLVIMENTO HUMANO NA EDUCAÇÃO SOCIAL NO BRASIL
E SUAS COMPETÊNCIAS PEDAGÓGICAS

Pereira (2019) afirma ainda que a Resolução CP/CNE nº 1/2006, que


estabelece as diretrizes do curso de pedagogia, afirma que o pedagogo é formado
para ser docente e gestor da educação básica, portanto, esse profissional não entra
em conflitos com outros trabalhadores da educação (BRASIL, 2006).

O autor ainda observa que tanto a LDBEN nº 9.394/96 como as Diretrizes


Curriculares do Curso de Pedagogia não determinam quem são esses outros
trabalhadores da educação, o que é bastante interessante, porque não fecha nos
docentes e especialistas, mas abre possibilidades de inclusão de outros trabalhadores
que tenham como campo de atuação a educação básica (não) escolar.

Diante desse contexto, essa questão deve ser levada em conta pelos
pesquisadores e estudiosos dessa área e que ainda não centralizaram suas
pesquisas somente no foco com o docente e acabam esquecendo dos outros e
novos trabalhadores da educação.

Oliveira (2010) e Gatti (2013) centralizam o debate de suas ideias nas


demandas da profissionalidade e formação do professor, e acabam não abordando
o papel de outros profissionais no processo da educação, de educar, da escola e
de outras instituições sociais que intencionam a reintegração de pessoas.

Ao analisar a formação e a profissionalidade dos trabalhadores da


educação, Oliveira (2010) foca apenas os professores, como se eles fossem os
únicos trabalhadores da educação, ou pelo menos merecedores de uma formação
ampla e específica nas questões pedagógicas que os tornem profissionais da área
educacional.

Gatti (2013, p. 52) fica próxima a esse conceito, mesmo que reconheça
que a educação seja uma ação para além do âmbito escolar, afirmando que é
papel dos docentes educar as gerações futuras e que caso isso ocorra deve gerar
uma representação positiva a favor da formação pedagógica qualitativa desses
profissionais da educação, pois:

[...] a ação [educativa] mais direta, neste sentido, é desenvolvida


pelos professores com seus alunos, e são professores, também, os que
assumirão outras funções tanto na escola (por exemplo, a direção,
a coordenação pedagógica) quanto na rede em geral (supervisão,
funções técnicas diversas etc.). A importância social da formação
inicial de docentes fala por si (GATTI, 2013, p. 52).

Atualmente, são poucos os estudos e pesquisas voltados para outros


profissionais da educação. Trojan e Tavares (2007) e Vargas (2015) apontam essa tal
preocupação em seus estudos. Eles focam suas ideias nos trabalhadores escolares
chamados de não docentes, como as secretárias escolares, as bibliotecárias, as
merendeiras, os auxiliares de limpeza e de segurança, os técnicos de informática.

Trojan e Tavares (2007), em seus ensinamentos sobre os trabalhadores da


educação não docentes posicionam esses profissionais como sendo protagonistas

42
TÓPICO 3 | A FORMAÇÃO DO EDUCADOR SOCIAL NO BRASIL

da educação, pois eles contribuem de maneira decisiva para o êxito da educação


na escola. Assim, pressupõem que sua formação é o somatório qualitativo da
educação escolar, com isso, não pode ser negligenciada pelos estados e municípios
que têm a responsabilidade pela qualificação de todo o corpo funcional escolar.

Existe uma centralidade no status de professor nas escolas e fora dela,


quando se busca assumir funções e cargos educativos nessa profissão. Porém,
existem outros profissionais que assumem um papel tão importante quanto o
professor, nesse caso, os educadores sociais, que atuam tanto dentro das políticas
públicas de educação como fora dela, conforme já citamos anteriormente.

Para Pereira (2019, p. 10):

O educador (a) social é um dos profissionais da educação social; não é o


único, mas certamente o mais central, porque trabalha diretamente com
grupos e pessoas socialmente desprivilegiados, aviltados, oprimidos
em suas condições objetivas e subjetivas, sendo que sua presença é
marcante em organizações governamentais e não governamentais que
assistem crianças, adolescentes, jovens, adultos e velhos em situação
de vulnerabilidade social. Atua na execução de políticas sociais que
tenham a educação social como uma das práticas de promoção social.

Pereira (2019) afirma ainda que é uma atividade central em uma sociedade
que cada dia produz situações de vulnerabilidade para crianças, adolescentes,
jovens, adultos e velhos. Diante disso, ao afirmar que o trabalho educativo precisa
de um profissional com formação ampla e crítica, mas que precisa ser reconhecido
legalmente como um profissional da educação; sem isso não tem como garantir
para as populações oprimidas uma ação educativa e social eficaz, a ponto de elas
alcançarem outras condições de vida que sejam protagonistas do processo.

O reconhecimento dessa profissão deve acontecer primeiramente através


de uma ação que foque no processo do seu fortalecimento. Com isso, o Estado
ficaria responsável pela formação desses profissionais através da formulação de
políticas de formação e atuação profissional.

Até então, essa responsabilidade é do próprio educador social, que busca


a sua formação através dos mais diversos cursos, tanto de nível médio e superior
e/ou, então, quando estão atuando na área, é a instituição que oferece alguma
formação continuada a partir do serviço prestado à comunidade, sem pensar na
continuidade e permanência dessa formação. Com isso, fica a dúvida de como
realizar as atividades de trabalho importantes, mas sem reconhecimento do
Estado essas atividades acontecem de maneira precária.

Alguns autores afirmam que esse profissional está ligado à área da


educação, mesmo que a LDBEN nº 9.394/96 não traga diretamente nenhum artigo
sobre esse profissional.

Pereira (2019) defende a coerência entre ação e legislação no processo de


regulamentação da profissão do educador social, pois a terminologia “educador”

43
UNIDADE 1 | O EDUCADOR SOCIAL NO PROCESSO DE DESENVOLVIMENTO HUMANO NA EDUCAÇÃO SOCIAL NO BRASIL
E SUAS COMPETÊNCIAS PEDAGÓGICAS

já subentende que se trata de um trabalhador da educação e não de outra área do


conhecimento e atuação, que está dentro e fora da escola.

Assim, Gadotti (2012, p. 15) afirma que é necessário “ser mais atuante
nos espaços não escolares, mesmo porque os seus educandos tiveram o direito à
educação negado”.

Novamente citando Pereira (2019), a atuação profissional do educador


social prova que se trata de um trabalhador da educação, porque consiste numa
atividade de enfrentamento da marginalização de pessoas, a partir de práticas
educativas e sociais que possibilitem outra condição de vida que não aquela em
que se encontram.

Assim, essa atividade é caracterizada por uma diversidade de atributos


psicofísicos (competências e habilidades) e sempre dependendo do setor de
atuação desse profissional, como mostram os estudos de Pereira (2016), Paiva
(2012), Machado (2013), Ujiie, Natali e Machado (2009), Ferreira (2016), Souza e
Müller (2009), Santos e Streck (2012), Graciani (2006), conforme o quadro a seguir,
desenvolvido por Pereira (2019):

QUADRO 6 – COMPETÊNCIAS E HABILIDADES DO EDUCADOR SOCIAL

Autores Competências e habilidades


“No caso do educador social, sua profissionalidade também gira em torno
de saberes sobre o fazer e o pensar determinado pela reflexão da prática
educativa, que o qualifica para uma atuação transformadora, desenvolvendo
PEREIRA, Antonio. nele competências psicofísicas, como, por exemplo, a capacidade de análise e
crítica da realidade dos atores sociais que ele atende, ou ainda a capacidade
de autonomização permanente em relação a sua prática, aos atores, aos
agentes públicos e privados que articulam políticas de proteção, aos colegas
de profissão, dentre outros” (PEREIRA, 2016, p. 1302).
“A escuta do educador social [...] é a escuta humanizante onde o educando
não é um mero cliente, mas um ser humano cheio de possibilidades [...]. A
importância de aprender a escutar os meninos/as e a devolver essa escuta,
PAIVA, Jacyara. problematizada, em forma de questões, ajudando o educando a situar-se no
mundo, valorizando suas histórias, sua cultura, estabelecendo com ele uma
verdadeira caminhada pedagógica e a partir daí ir gerando um conhecimento
novo, percebo de maneira clara em suas falas a vontade de fazer conhecimento
através do diálogo, que é uma escuta social” (PAIVA, 2012, p. 8-9).
“Este profissional é definido por dois âmbitos: pelo social, em função de seu
MACHADO, trabalho, e pelo caráter interventivo de sua ação, cuja demarcação teórica
Evelcy. persiste controvertida devido a ideologias, filosofia e visão antropológica
[...], o Educador Social atua no campo de intervenção sócio educativo [...]”
(MACHADO, 2013, p. 7-8).
“Cabe, pois, ao educador social a atenção aos educandos como co-partícipes
UJIIE, Nájela; do processo educativo, bem como a atenção aos diferentes contextos
NATALI, Paula; culturais constitutivos da ação humana [...] deve apontar as injustiças e as
MACHADO, Erico desigualdades sociais, visando à construção de um projeto de sociedade
Ribas. baseada em relações mais justas e igualitárias [...]. Entendemos também como
fundamental, na ação educativa, o ato reflexivo promovido pelo educador
social” (UJIIE; NATALI; MACHADO, 2009, p. 125-126).

44
TÓPICO 3 | A FORMAÇÃO DO EDUCADOR SOCIAL NO BRASIL

“Sua atuação profissional se constrói a partir de três critérios: as demandas


específicas dos grupos em vulnerabilidade social, a busca de conteúdos que
FERREIRA, embasem um atendimento digno para as demandas dessas camadas sociais
Arthur. e uma relação dialógica estabelecida tanto entre os distintos especialistas que
transitam no seu campo educacional quanto com os sujeitos empobrecidos,
foco de sua prática profissional” (FERREIRA, 2016, p. 70).
“É necessário, portanto, que o educador social seja hábil, conhecedor de
estratégias que possam interferir no desejo da menina e do menino que
SOUZA, Cléia
se encontram sem esperanças [...] precisa ter a fé inabalável nas crianças
Renata; MÜLLER,
e adolescentes, na sua reação e capacidade de reverter uma situação [...]
Verônica.
ter responsabilidade com os acordos feitos em sua prática educativa, deve
cumpri-los e possibilitar a apropriação deste princípio para com as crianças
e adolescentes [...]” (SOUZA; MÜLLER, 2009, p. 3211-3212).
“[...] figura fundamental no desenvolvimento das intervenções educativas.
É ele quem direciona a ação, que propõe alternativas para a mudança na
realidade. Ações que vinculam desde cuidados com alimentação, higiene,
SANTOS, Karine; recreação, apoio familiar, até incentivo à escola formal. Assim, o campo da
STRECK, Danilo. Pedagogia Social é, em síntese, o campo de prática dos educadores sociais,
que atuam junto a instituições, fundações, programas governamentais,
desenvolvimento comunitário, entre tantos outros que possam existir e
que assumam o compromisso com uma intervenção educativa intencional”
(SANTOS; STRECK, 2012, p. 12).
“O primeiro e fundamental passo do educador social é efetivar um diagnóstico
situacional local, nacional e internacional para executar sua ação educativa
[...], caracterizando os problemas e necessidades, estabelecendo prioridades,
identificando as condições básicas para o enfrentamento, custos, recursos,
infraestrutura, para potencializar suas ações educativas, [...] a identificação
GRACIANI, Stela.
por parte do educador do que o educando ‘sabe’ (a partir de sua experiência
de vida) implementará sua prática educativa no que se refere à ampliação e
sistematização do conhecimento universal [...], a ação educativa pressupunha
a permanência de uma análise da ação/reflexão e para rever, redimensionar,
reler e refazer o caminho da ação” (GRACIANI, 2006, p. 11-12).

FONTE: Adaptado de Pereira (2019)

De acordo com Pereira (2019), esses estudiosos distinguem algumas


competências e habilidades que todo educador precisa adquirir/desenvolver na
sua trajetória formativa e profissional.

Pereira (2016) aponta para as competências de análise e síntese da realidade


social do educador social, em sua atuação prática, bem como a de realizar uma
prática com ações educativa, reflexiva e autônoma que possibilitem ao educando
a tomada de consciência.

De acordo com o quadro anterior, contata-se que Paiva (2012) dirige para as
competências que são focadas na escuta sensível do educando, da problematização
de sua prática e das condições de vida dos educandos, de dialogar com eles, de
maneira que possam compreender a situação opressora em que se encontram.

Para Machado (2013), deve-se considerar que existe a possibilidade do


educador social, através da habilidade de saber, intervir pedagogicamente em

45
UNIDADE 1 | O EDUCADOR SOCIAL NO PROCESSO DE DESENVOLVIMENTO HUMANO NA EDUCAÇÃO SOCIAL NO BRASIL
E SUAS COMPETÊNCIAS PEDAGÓGICAS

uma determinada situação educativa e social, sendo esse um requisito essencial


para que o educador social tenha sucesso nas suas atividades profissionais.

Ujiie, Natali e Machado (2009) ponderam que a capacidade de organização


política dos educadores sociais é de fundamental importância para que o educando
se transforme em um protagonista de uma sociedade mais humana e justa.

Para Ferreira (2016), a principal competência que o educador social deverá


ter é a capacidade dialógica em todo o processo de intervenção educativa e social
com e junto do educando. Diante disso, é necessário oferecer conteúdo para o
processo de profissionalidade desse profissional.

Souza e Müller (2009) distinguem outras competências para o educador


social, elas estão entrelaçadas às questões da fé e à esperança nos educandos,
vendo os educandos como de suas vidas a partir do processo educativo, além
de desenvolver habilidades que possam cumprir acordos pedagógicos que
possibilitem a libertação dos educandos.

Santos e Streck (2012) adicionam essas competências e habilidades àquelas


que dizem respeito ao saber fazer através de práticas que vão desde o cuidado
com o educando à conscientização de sua situação escolar, social e familiar.

Já Graciani (2006), em seus estudos, aponta que as capacidades de


contextualizar, de diagnosticar e de escutar, para o educador social, são essenciais
para a sua atuação como profissional na área de educação social. Para o autor,
essas capacidades compreendem um processo voltado à análise local e global da
realidade social dos educandos para melhor intervenção na prática. Para o autor,
se faz essencial no processo educativo que ocorra o levantamento das prioridades
a serem resolvidas no processo de emancipação desses sujeitos e a consideração
sobre a realidade dos educandos como um elemento essencial no seu processo
educativo.

NOTA

Para a atuação do educador social, além dessas e outras habilidades, é preciso


ter como foco de atuação ações educativas.

Você, caro acadêmico, deve estar se perguntado: o que significa as


competências e habilidades do educador social no mudo do trabalho? De acordo
com os pensamentos de Machado (2007), o que se tem de noção de competência
está relacionado à disposição cognitiva/social, sendo então, intelectual, oferecendo
possibilidades aos trabalhadores de exercer uma atividade de trabalho com

46
TÓPICO 3 | A FORMAÇÃO DO EDUCADOR SOCIAL NO BRASIL

competência para resolver os problemas. Essas competências são alcançadas


e desenvolvidas a partir das ações no mundo do trabalho e no social, sendo
considerado:

[...] fenômeno que se realizaria somente no interior da ação prática,


no território do fazer, que só adquiriria significado na atividade
real e situada. Um acontecimento datado por adquirir conteúdos,
formas e sentidos conforme o lugar, as circunstâncias e o momento
em que ocorre. Socialmente determinado por ser síntese da conjunção
de interesses, às vezes contraditórios, que se colocam em jogo
(MACHADO, 2007, p. 6).

O mesmo autor destaca o fato de que competências não são as bases


do mundo das ideias, sendo, ao contrário, materializadas a partir do trabalho
concreto, das ações, atitudes, recursos técnicos e tecnológicos e das experiências
dos trabalhadores. Assim:

[...] a materialização destas estruturas subjetivas ricas, variáveis e


hipotéticas ocorreria mediante a articulação e mobilização adequada,
dentro de um contexto particular, de um conjunto diversificado
de recursos: tecnologias, informações, saberes, conhecimentos,
habilidades, relacionamentos, atitudes, valores etc. (MACHADO,
2007, p. 6).

Nesta mesma linha, Machado (2007) afirma que na noção de competência,


a ideia de produção e de conhecimentos e de saberes de uma específica área de
trabalho sobrevém diretamente na valorização dos profissionais, resignado às
profissões e possibilitando o surgimento de outras novas, pois no mercado de
trabalho atual é possível pensar em profissão e seus profissionais sem pensar nos
tipos de competências necessárias para atuar como profissional e para incluir-se
no processo de desenvolvimento formativo.

Araújo (1999) e Ramos (2001) sinalizam que as habilidades se aludem à


capacidade de saber fazer profissional, sendo mais restritas que as competências.
Para os autores, o conjunto das habilidades forma as competências, que, por sua
vez, o conjunto de competências e habilidades fazem com que o educador social
possa agir com autonomia e agilidade perante uma dimensão cognitiva e física.
Esses dois autores definem essa relação chamando de atributos psicofísicos, ou
seja, um conjunto misto de capacidades cognitivas e físicas, ou então de atributos
individuais.

Pereira (2019) destaca que os estudos na área de trabalho e educação da


Sociologia do Trabalho possuem críticas que estão relacionadas às qualidades
exigidas para o trabalhador nessa nova ordem social e produtiva e que não
podemos ignorá-las quando pensamos para o educador social.

Alguns pesquisadores estão levantando e sistematizando atributos


individuais e sociais e estão sinalizando que sua constituição se dá a partir das
experiências e necessidades do campo da educação social e assistência social, pois
é um profissional que atua no enfrentamento da pobreza.
47
UNIDADE 1 | O EDUCADOR SOCIAL NO PROCESSO DE DESENVOLVIMENTO HUMANO NA EDUCAÇÃO SOCIAL NO BRASIL
E SUAS COMPETÊNCIAS PEDAGÓGICAS

Na Classificação Brasileira de Ocupações (CBO), Portaria nº 397/2002


do Ministério do Trabalho e Emprego, encontra-se diversas competências e
habilidades do educador social, ainda que na versão pragmática, porém centradas,
em particular, no educativo (BRASIL, 2002).

Conforme citado anteriormente, no Sistema Único de Assistência Social


(SUAS), Resolução nº 09/2014 do Conselho Nacional de Assistência Social
(CNAS), embora se tenha mais competências do âmbito do trabalho social que
em outras ações.

A discussão de regulamentação e criação da profissão no Brasil vem


sendo discutida desde 2009, quando foi apresentado o Projeto de Lei nº 5.346,
de 2009, pelo então Deputado Federal na época, Chico Lopes, do PCdoB, que
visava à criação da profissão de educador social no país. Esse projeto propunha
a educação social como profissão do educador social e de profissionais com a
formação específica em “Pedagogia Social”. Sendo uma das propostas:

Propõe-se que o Ministério da Educação (MEC) se responsabilize pela


elaboração e regulamentação da Política Nacional de Formação em
Educação Social dos profissionais que trata esta Lei, nos diferentes
níveis de escolarização, bem como pela manutenção de programas
de educação continuada voltados ao segmento. Estabelece-se o
nível médio como o nível mínimo de escolarização para o exercício
profissional e adscreve-se à União, aos Estados, ao Distrito Federal e
aos Municípios a competência de reenquadramento na nova profissão
dos profissionais que atuam nos contextos educativos supracitados;
de criação e provimento dos cargos públicos de educador e educadora
social, que poderão diferenciar-se de acordo com a escolaridade; e de
elaboração dos Planos de Cargos, Carreira e Remuneração da nova
profissão (BRASIL, 2009, p. 2).

Em 24 de abril de 2019, foi aprovado o Projeto de Lei do Senado n° 328,


de 2015, de autoria do Senador Telmário Mota (PDT/RR), que dispõe sobrea
regulamentação da profissão de Educadora e Educador Social, relacionada à
realização de ações afirmativas, mediadoras e formativas, com atuação dentro ou
fora dos âmbitos escolares, a partir das políticas públicas definidas pelos órgãos
federais, estaduais, do Distrito Federal ou municipais.

48
TÓPICO 3 | A FORMAÇÃO DO EDUCADOR SOCIAL NO BRASIL

QUADRO 7 – OBJETIVOS DOS PROJETOS DE LEIS

Projeto de Lei do Senado Federal n° Projeto de Lei da Câmara Federal n° 5346/2009


328/2015
Art. 4º São atribuições do Educador Social, em Art. 2° Ficam estabelecidos como campo de
contextos educativos situados-fora-do âmbito atuação das educadoras e educadores sociais,
escolar, as atuações que envolvem: os contextos educativos situados dentro ou fora
I- as pessoas e comunidades em situação de dos âmbitos escolares e que envolvem ações
risco ou vulnerabilidade social, violência, educativas com diversas populações, em distintos
exploração física e psicológica; âmbitos institucionais, comunitários e sociais,
II- a preservação cultural e promoção dos em programas e projetos educativos e sociais,
povos e remanescentes e tradicionais; a partir das políticas públicas definidas pelos
III- os segmentos sociais prejudicados órgãos federais, estaduais, do Distrito Federal ou
pela exclusão social, mulheres, crianças, municipais.
adolescentes, negros, indígenas e
homossexuais; Art. 3º São atribuições dos profissionais de que
IV- a realização de atividades socioeducativas, trata esta Lei ações de educação e mediação que
em regime fechado, semiliberdade e meio envolvam os direitos e deveres humanos, a justiça
aberto para adolescentes e jovens envolvidos social e o exercício da cidadania com pessoas de
em atos infracionais; qualquer classe social, gênero, idade, etnia, cultura,
V- a realização de programas e projetos nacionalidade, dentre outras particularidades,
educativos destinados à população carcerária; por meio da promoção cultural, política e cívica
VI- as pessoas portadoras de necessidades (BRASIL, 2015).
especiais;
VII- enfrentamento à dependência de drogas;
VIII- as atividades socioeducativas para
terceira idade;
IX- a promoção da educação ambiental;
X- a promoção dos direitos humanos e da
cidadania (BRASIL, 2009).

FONTE: Adaptado de Brasil (2009) e Brasil (2015)

Assim, a educação social como área profissional e com formação


específica passa a ser reconhecida. Com isso é necessário entender que a atuação
do educador social é de forma abrangente e não limitada, por meio de práticas
educativas que acontecem dentro e fora da entidade, com os mais diversos grupos
e classes sociais.

Em âmbito nacional, a União, os Estados e Municípios, quando abrem


concurso ou seleção para educadores sociais, no edital exigem essas competências
e habilidades, entre outras relacionadas ao mundo da educação social.

DICAS

Para saber mais sobre os dados técnicos da profissão, acesse o link: https://
www.salario.com.br/profissao/educador-social-cbo-515305/.

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UNIDADE 1 | O EDUCADOR SOCIAL NO PROCESSO DE DESENVOLVIMENTO HUMANO NA EDUCAÇÃO SOCIAL NO BRASIL
E SUAS COMPETÊNCIAS PEDAGÓGICAS

Na íntegra, você pode ler o projeto de lei do Senado, n° 328, de 2015,


aprovado pelo Senado em 2019.

PROJETO DE LEI DO SENADO Nº 328, 2015

Dispõe sobre a regulamentação da profissão de educadora e educador social e


dá outras providências.

O CONGRESSO NACIONAL decreta:

Art. 1º - Fica regulamentada a profissão de Educadora e Educador Social, nos


termos desta Lei.
Parágrafo único: A profissão que trata o caput deste artigo possui caráte
rpedagógico e social, devendo estar relacionada à realização de ações
afirmativas, mediadoras e formativas.
Art. 2º - Ficam estabelecidos como campo de atuação das educadoras e
educadores sociais, os contextos educativos situados dentro ou fora dos
âmbitos escolares e que envolvem ações educativas com diversas populações,
em distintos âmbitos institucionais, comunitários e sociais, em programas
e projetos educativos sociais, a partir das políticas públicas definidas pelos
órgãos federais, estaduais, do Distrito Federal ou municipais.
Art. 3º - Compete à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
I- adequar para a denominação “educadora ou educador social” os cargos
ocupados por profissionais com o campo de atuação em contextos
educativos que se enquadram no que trata os artigos 1º e 2º desta Lei;
II- criar e prover os cargos públicos de educadoras e educadores sociais,
podendo estabelecer níveis diferenciados de admissão destes profissionais
de acordo com a escolaridade;
III- elaborar os Planos de Cargos, Carreira e Remuneração desta profissão.
Art. 4º - São atribuições da Educadora e do Educador Social, dentro ou fora
dos âmbitos escolares, as atuações que envolvem:
I- a promoção dos direitos humanos e da cidadania;
II- a promoção da educação ambiental;
III- as pessoas e comunidades em situação de risco ou vulnerabilidade social,
violência, exploração física e psicológica;
IV- os segmentos sociais excluídos socialmente, tais como mulheres, crianças,
adolescentes, negros, indígenas e homossexuais;
Art. 5º - Ficam revogadas as disposições contrárias.
Art. 6º - Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

FONTE:<https://legis.senado.leg.br/sdleg-getter/documento?dm=4427478&ts=15592454969
94&disposition=inline>. Acesso em: 25 jul. 2019.

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TÓPICO 3 | A FORMAÇÃO DO EDUCADOR SOCIAL NO BRASIL

DICAS

FIGURA – CAMINHOS DO EDUCADOR SOCIAL NO BRASIL

FONTE: <https://www.pacolivros.com.br/imagem/index/12238302/G/1837.jpg>. Acesso


em: 27 set. 2019.

Esta obra é uma contribuição significativa para a Pedagogia Social e Educação Social, pois
historicamente essa área se desenvolve e se fortalece em contextos de crise buscando
dar respostas aos problemas sociais. A autora percorre vários Estados do Brasil, Finlândia
e Angola na perspectiva de produzir um conhecimento emancipador, fundamental para a
formação do educador. Recomendamos a leitura!

FONTE: PAIVA, J. S. Caminhos do Educador Social no Brasil. São Paulo: Paco, 2019.

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UNIDADE 1 | O EDUCADOR SOCIAL NO PROCESSO DE DESENVOLVIMENTO HUMANO NA EDUCAÇÃO SOCIAL NO BRASIL
E SUAS COMPETÊNCIAS PEDAGÓGICAS

LEITURA COMPLEMENTAR

EDUCAÇÃO NÃO FORMAL NA PEDAGOGIA SOCIAL

Maria da Glória Gohn

1 DISTINÇÕES ENTRE EDUCAÇÃO NÃO FORMAL,


FORMAL E INFORMAL

A educação não formal designa um processo com várias dimensões tais


como: a aprendizagem política dos direitos dos indivíduos enquanto cidadãos;
a capacitação dos indivíduos para o trabalho, por meio da aprendizagem
de habilidades e/ou desenvolvimento de potencialidades; a aprendizagem e
exercício de práticas que capacitam os indivíduos a se organizarem com objetivos
comunitários, voltadas para a solução de problemas coletivos cotidianos; a
aprendizagem de conteúdos que possibilitem aos indivíduos fazerem uma leitura
do mundo do ponto de vista de compreensão do que se passa ao seu redor; a
educação desenvolvida na mídia e pela mídia, em especial a eletrônica etc. Em
suma, consideramos a educação não formal como um dos núcleos básicos de uma
Pedagogia Social.

Quando tratamos da educação não formal, a comparação com a educação


formal é quase que automática. O termo não formal também é usado por alguns
investigadores como sinônimo de informal. Consideramos que é necessário
distinguir e demarcar as diferenças entre estes conceitos.

A princípio podemos demarcar seus campos de desenvolvimento:

• A educação formal é aquela desenvolvida nas escolas, com conteúdos


previamente demarcados.
• A informal como aquela que os indivíduos aprendem durante seu processo
de socialização — na família, bairro, clube, amigos etc., carregada de valores e
culturas próprias, de pertencimento e sentimentos herdados.
• E a educação não formal é aquela que se aprende “no mundo da vida”, via os
processos de compartilhamento de experiências, principalmente em espaços e
ações coletivos cotidianas.

Vamos tentar demarcar melhor essas diferenças por meio uma série de
questões, que são aparentemente simples, mas nem por isso simplificadoras da
realidade, a saber:

Quem é o educador em cada campo de educação que estamos tratando?


Em cada campo, quem educa ou é o agente do processo de construção do saber?

• Na educação formal sabemos que são os professores.


• Na não formal, o grande educador é o outro, aquele com quem interagimos ou
nos integramos.
52
TÓPICO 1 | AS FUNÇÕES E COMPETÊNCIAS PEDAGÓGICAS DO EDUCADOR SOCIAL NO CONTEXTO BRASILEIRO

• Na educação informal, os agentes educadores são os pais, a família em geral,


os amigos, os vizinhos, colegas de escola, a igreja paroquial, os meios de
comunicação de massa etc.

Onde se educa? Qual é o espaço físico territorial onde transcorrem os atos


e os processos educativos?

• Na educação formal, esses espaços são os do território das escolas, são


instituições regulamentadas por lei, certificadoras, organizadas segundo
diretrizes nacionais.
• Na educação não formal, os espaços educativos localizam-se em territórios
que acompanham as trajetórias de vida dos grupos e indivíduos, fora das
escolas, em locais informais, locais onde há processos interativos intencionais
(a questão da intencionalidade é um elemento importante de diferenciação).
• Já a educação informal tem seus espaços educativos demarcados por referências
de nacionalidade, localidade, idade, sexo, religião, etnia etc. A casa onde se
mora, a rua, o bairro, o condomínio, o clube que se frequenta, a igreja ou o local
de culto a que se vincula sua crença religiosa, o local onde se nasceu etc.

Como se educa? Em que situação, em qual contexto?

• A educação formal pressupõe ambientes normatizados, com regras e padrões


comportamentais definidos previamente.
• A não formal ocorre em ambientes e situações interativos construídos
coletivamente, segundo diretrizes de dados grupos, usualmente a participação
dos indivíduos é optativa, mas ela também poderá ocorrer por forças de
certas circunstâncias da vivência histórica de cada um. Há na educação não
formal uma intencionalidade na ação, no ato de participar, de aprender e de
transmitir ou trocar saberes. Por isso, a educação não formal situa-se no campo
da Pedagogia Social, aquela que trabalha com coletivos e se preocupa com os
processos de construção de aprendizagens e saberes coletivos.
• A informal opera em ambientes espontâneos, onde as relações sociais se
desenvolvem segundo gostos, preferências, ou pertencimentos herdados.

Qual a finalidade ou objetivos de cada um dos campos de educação


assinaladas?

• Na educação formal, entre outros objetivos, destacam-se os relativos ao ensino


e aprendizagem de conteúdos historicamente sistematizados, normalizados
por leis, dentre os quais destacam-se o de formar o indivíduo como um
cidadão ativo, desenvolver habilidades e competências várias, desenvolver a
criatividade, percepção, motricidade etc.
• A educação informal socializa os indivíduos, desenvolve hábitos, atitudes,
comportamentos, modos de pensar e de se expressar no uso da linguagem,
segundo valores e crenças de grupos que se frequenta ou que pertence por
herança, desde o nascimento. Trata-se do processo de socialização dos indivíduos.
• A educação não formal capacita os indivíduos a se tornarem cidadãos do
mundo, no mundo. Sua finalidade é abrir janelas de conhecimento sobre
53
UNIDADE 1 | O EDUCADOR SOCIAL NO PROCESSO DE DESENVOLVIMENTO HUMANO NA EDUCAÇÃO SOCIAL NO BRASIL
E SUAS COMPETÊNCIAS PEDAGÓGICAS

o mundo que circunda os indivíduos e suas relações sociais. Seus objetivos


não são dados a priori, eles se constroem no processo interativo, gerando um
processo educativo. Um modo de educar surge como resultado do processo
voltado para os interesses e as necessidades que dele participa. A construção
de relações sociais baseadas em princípios de igualdade e justiça social,
quando presentes num dado grupo social, fortalece o exercício da cidadania.
A transmissão de informação e formação política e sociocultural é uma meta
na educação não formal. Ela prepara os cidadãos, educa o ser humano para a
civilidade, em oposição à barbárie, ao egoísmo, individualismo etc.

Quais são os principais atributos de cada uma das modalidades educativas


que estamos diferenciando?

• A educação formal requer tempo, local específico, pessoal especializado.


Organização de vários tipos (inclusive a curricular), sistematização sequencial
das atividades, disciplinamento, regulamentos e leis, órgãos superiores etc. Ela
tem caráter metódico e, usualmente, divide-se por idade/classe de conhecimento.
• A educação informal não é organizada, os conhecimentos não são sistematizados
e são repassados a partir das práticas e experiência anteriores, usualmente é o
passado orientando o presente. Ela atua no campo das emoções e sentimentos.
É um processo permanente e não organizado.
• A educação não formal tem outros atributos: ela não é organizada por séries/
idade/conteúdos; atua sobre aspectos subjetivos do grupo; trabalha e forma
a cultura política de um grupo. Desenvolve laços de pertencimento. Ajuda
na construção da identidade coletiva do grupo (este é um dos grandes
destaques da educação não formal na atualidade); ela pode colaborar para o
desenvolvimento da autoestima e do empowerment do grupo, criando o que
alguns analistas denominam, o capital social de um grupo. Fundamenta-se
no critério da solidariedade e identificação de interesses comuns e é parte do
processo de construção da cidadania coletiva e pública do grupo.

Quais são os resultados esperados em cada campo assinalado?

• Na educação formal espera-se, além da aprendizagem efetiva (que, infelizmente


nem sempre ocorre), há a certificação e titulação que capacitam os indivíduos
a seguir para graus mais avançados.
• Na educação informal os resultados não são esperados, eles simplesmente
acontecem a partir do desenvolvimento do senso comum nos indivíduos,
senso este que orienta suas formas de pensar e agir espontaneamente.

A educação não formal poderá desenvolver, como resultados, uma série


de processos tais como:

• consciência e organização de como agir em grupos coletivos;


• a construção e reconstrução de concepção de mundo e sobre o mundo;
• a contribuição para um sentimento de identidade com uma dada comunidade;
• forma o indivíduo para a vida e suas adversidades (e não apenas capacita-o
para entrar no mercado de trabalho);
54
TÓPICO 1 | AS FUNÇÕES E COMPETÊNCIAS PEDAGÓGICAS DO EDUCADOR SOCIAL NO CONTEXTO BRASILEIRO

• quando presente em programas com crianças ou jovens adolescentes a educação


não formal resgata o sentimento de valorização de si próprio (o que a mídia e
os manuais de autoajuda denominam, simplificadamente, como a autoestima);
• ou seja, dá condições aos indivíduos para desenvolverem sentimentos de
autovalorização, de rejeição dos preconceitos que lhes são dirigidos, o desejo
de lutarem para ser reconhecidos como iguais (enquanto seres humanos),
dentro de suas diferenças (raciais, étnicas, religiosas, culturais etc.);
• os indivíduos adquirem conhecimento de sua própria prática, os indivíduos
aprendem a ler e interpretar o mundo que os cerca.

2 ALGUMAS CARACTERÍSTICAS DA EDUCAÇÃO NÃO FORMAL:


METAS, LACUNAS E METODOLOGIAS

A seguir, listamos algumas características que a educação não formal


pode atingir em termos de metas. Consideramos estas metas como um campo a
ser desenvolvido pela Pedagogia Social:

• Aprendizado quanto às diferenças — aprende-se a conviver com demais.


Socializa-se o respeito mútuo.
• Adaptação do grupo a diferentes culturas, e o indivíduo ao outro, trabalha o
“estranhamento”.
• Construção da identidade coletiva de um grupo.
• Balizamento de regras éticas relativas às condutas aceitáveis socialmente.

O que falta na educação não formal:

• Formação específica a educadores a partir da definição de seu papel e atividades


a realizar.
• Definição de funções e objetivos de educação não formal.
• Sistematização das metodologias utilizadas no trabalho cotidiano.
• Construção de instrumentos metodológicos de avaliação e análise do trabalho
realizado.
• Construção de metodologias que possibilitem o acompanhamento do trabalho
realizado.
• Construção de metodologias que possibilitem o acompanhamento do trabalho
de egressos que participaram de programas de educação não formal.
• Criação de metodologias e indicadores para estudo e análise de trabalhos da
educação não formal em campos não sistematizados. Aprendizados gerados
pela vontade do receptor.
• Mapeamento das formas de educação não formal na autoaprendizagem dos
cidadãos (principalmente jovens no campo da autoaprendizagem musical).

CONCLUSÕES E DESAFIOS

Articular a educação, em seu sentido mais amplo, com os processos de


formação dos indivíduos como cidadãos, ou articular a escola com a comunidade
educativa de um território, é um sonho, uma utopia, mas também uma urgência

55
UNIDADE 1 | O EDUCADOR SOCIAL NO PROCESSO DE DESENVOLVIMENTO HUMANO NA EDUCAÇÃO SOCIAL NO BRASIL
E SUAS COMPETÊNCIAS PEDAGÓGICAS

e uma demanda da sociedade atual e uma necessidade na Pedagogia Social. Por


isso, trabalhamos com um conceito amplo de educação que envolve campos
diferenciados, da educação formal, informal e não formal. Acreditamos que
propostas se fazem com ideias e fundamentos; por isso, dedicamos a primeira
parte do texto à qualificação e diferenciação de um conceito que tem centralidade
no tema que estamos discutindo, qual seja: a importância da educação não
formal. Conceituamos a educação não formal no campo da Pedagogia Social,
aquela que trabalha com coletivos e se preocupa com os processos de construção
de aprendizagens e saberes coletivos.

Reiteramos neste texto a perspectiva que aborda a educação como


promotora de mecanismos de inclusão social. Entende-se por inclusão as formas
que promovem o acesso aos direitos de cidadania, que resgatam alguns ideais
já esquecidos pela humanidade, como o de civilidade, tolerância e respeito ao
outro; contestam-se concepções relativas às formas que buscam, simplesmente,
integrar indivíduos atomizados e desterritorializados, em programas sociais
compensatórios.

A gestão compartilhada em suas diferentes formas de conselhos,


colegiado etc. precisa desenvolver uma cultura participativa nova, que altere as
mentalidades, os valores, a forma de conceber a gestão pública em nome dos
direitos da maioria e não de grupo lobista. Isso implica a criação de coletivos
que desenvolvam saberes não apenas normativos — legislações, formatos de
aplicação de verbas etc., embora esses itens também sejam importantes, dado o
papel dos fundos públicos no campo de disputa política em torno das verbas
públicas. É preciso desenvolver saberes que orientem as práticas sociais, que
construam novos valores, aqui entendidos como a participação de coletivos de
pessoas diferentes, com metas iguais. Isso tudo está no campo da educação não
formal e da Pedagogia Social, perfil do educador social se constrói e está sendo
reinventado neste processo.

Entretanto, se não houver sentido nas formas de participação na área da


educação, com projetos de emancipação dos cidadãos que objetivem mudanças
substantivas e não instrumentais, corre-se o risco de se ter espaços mais autoritários
do que já eram quando centralizados. Como democratizar esses espaços?
Como ressignificá-los para que as obras e serviços realizados numa escola, por
exemplo, não sejam vistos como dádivas de uma diretora, ou de algum político
ou administrador público, e sim como direito da população? Como resgatar o
direito à educação enquanto política educacional ao nível das instâncias locais,
sem esquecer que elas são parte de um todo que extrapola as fronteiras nacionais?
Como gerar novas políticas na gestão dos fundos públicos?

São desafios e tarefas gigantescas. Não dá para contar apenas com


heroísmos de alguns gestores públicos bem-intencionados ou de poucas
lideranças da sociedade civil, pois construir sentido e significados novos na
gestão da escola é uma prática que tem que se pautar por um outro olhar em
relação ao papel da escola num dado território. Não é mais possível permanecer

56
TÓPICO 3 | A FORMAÇÃO DO EDUCADOR SOCIAL NO BRASIL

no conformismo diante de espaços dominados por antigos métodos clientelistas,


pela ordem tradicional. É preciso criatividade e ousadia porque as novidades só
ganham força quando passam a ter hegemonia em certos coletivos organizados
mais amplos. Por isso, é preciso voltar os olhos para a organização da sociedade
civil, para os processos de educação não formal que nela se desenvolvem, e para
o papel que a escola pode ter como campo de formação de um novo modelo
civilizatório. Precisamos de uma nova educação que forme o cidadão para atuar
nos dias de hoje, e transforme culturas políticas arcaicas, arraigadas, em culturas
políticas transformadoras e emancipatórias. Isso não se faz apenas em aulas e
cursos de formação tradicionais, formulados no gabinete de algum burocrata, ou
de seminários de capacitação — usualmente só técnica; isto se faz sim a partir da
prática da gestão compartilhada escola/comunidade educativa, no exercício das
tarefas de uma dada escola, numa determinada comunidade territorial. Participar
dos conselhos e colegiados das escolas é uma urgência e uma necessidade
imperiosa, mas exige uma preparação contínua, um aprendizado permanente,
uma atividade de ação e reflexão. Não basta um programa, um plano, ou mais
um conselho. É preciso reconhecer a existência e a importância da educação não
formal no processo de construção de uma sociedade sem injustiças, democrática.
É preciso sistematizar dados, gerar e extrair saberes, e produzir conhecimentos
no campo da Pedagogia Social.

Construir cidadãos éticos, ativos, participativos, com responsabilidade


diante do outro e preocupados com o universal e não com particularismos, é
retomar as utopias e priorizar a mobilização e a participação da comunidade
educativa na construção de novas agendas. Essas agendas devem contemplar
projetos emancipatórios que tenham como prioridade a mudança social,
qualifique seu sentido e significado, pense alternativas para um novo modelo
econômico não excludente que contemple valores de uma sociedade em que o ser
humano é centro das atenções e não o lucro, o mercado, o status político e social,
o poder em suma. A educação não formal é um campo valioso na construção
daquelas agendas, e para dar sentido e significado às próprias lutas no campo da
educação visando à transformação da realidade social.

Concluímos este texto com uma proposta de caráter sociopolítico: a de


transformar as escolas em centro de referências civilizatórias nos bairros onde
se localizam. Para isso propomos a articulação dos processos de participação da
sociedade civil organizada com as escolas. Propomos, em suma, a articulação
da educação formal com a não formal para dar vida e viabilizar mudanças
significativas na educação e na sociedade como um todo. Com isso, a Pedagogia
Social se legitimará como área fundamental no campo da produção de
conhecimento.

FONTE: GOHN, M. G. da. Educação não-formal na pedagogia social. 2006. Disponível em:
http://www.proceedings.scielo.br/scielo.php?pid=MSC0000000092006000100034&script=sci_
arttext&tlng=pt. Acesso em: 27 set. 2019.

57
RESUMO DO TÓPICO 3
Neste tópico, você aprendeu que:

• A suposição de que as qualidades que são necessárias para atuar como um


educador social nas demandas do trabalho social estão elencadas com a
educação, ou seja, pedagógico.

• Esses profissionais, educadores sociais, deveriam ser regulados pela LDBEN


(Lei de Diretrizes de Base) nº 9.394/9.

• No campo do trabalho social do educador social, possuem atividades que são


da competência da educação e requer um profissional com conhecimentos
pedagógicos.

• É necessário avaliar esta questão, da ação do educador social, primeiramente


através da conceituação de educação, enfatizando a LDBEN nº 9.394/96 no que
se refere aos trabalhadores da educação.

• O trabalho do educador social está centrado na educação das pessoas em


situação de vulnerabilidade social, focando a sua promoção cognitiva e social.

• A educação deverá ser explorada como práxis e não mais somente como uma
técnica de internalização de conhecimentos.

• A diferença entre educação social e educação popular é ofertada pelo público e


pela proposta educativa.

• A educação social é uma prática de educação popular, mas que se diferencia


quando pretende a construção de uma pedagogia própria.

• A educação social é uma prática educativa revolucionária porque tem uma


teoria e ação emancipadora, ela acontece no interior das classes menos
privilegiadas, assumindo assim um diálogo em Freire.

• A defesa da educação social acontece pela formação integral das pessoas


excluídas socialmente, fazendo delas as protagonistas de sua história.

• O educador social enfrenta uma outra luta, que é a de ver a sua profissão ser
reconhecida legalmente para que possa desfrutar de todos os direitos próprios
a seu trabalho.

• São poucos os estudos e pesquisas voltados para outros profissionais da


educação.

58
• A formação é o somatório qualitativo da educação escolar, com isso não pode
ser negligenciada pelos estados e municípios que têm a responsabilidade pela
qualificação de todo o corpo funcional escolar.

• O reconhecimento dessa profissão deve acontecer primeiramente através de


uma ação que foque o processo do seu fortalecimento.

• A discussão de regulamentação e criação da profissão no Brasil vem sendo


discutida desde 2009, quando foi apresentado o Projeto de Lei nº 5.346, de 2009,
sendo aprovada em 2017.

• Em 24 de abril de 2019, foi aprovado o Projeto de Lei do Senado n° 328, de


2015, de autoria do Senador Telmário Mota (PDT/RR), que dispõe sobre a
regulamentação da profissão de educadora e educador social, relacionada à
realização de ações afirmativas, mediadoras e formativas, com atuação dentro
ou fora dos âmbitos escolares, a partir das políticas públicas definidas pelos
órgãos federais, estaduais, do Distrito Federal ou municipais.

59
AUTOATIVIDADE

1 É de suma importância destacar que nem o PL n° 5.346/2009 e nem o PLS


n° 328/2015 sinalizam atributos individuais necessários à ação profissional,
mas focam suas atenções ao campo de atuação tanto na área do processo
educativo como social. Já o PLS n° 328/2015 propõe algo, mesmo que vago,
na direção das competências de saber intervir pedagogicamente, mediar as
relações educativas e sociais na promoção dos sujeitos em vulnerabilidade
social (BRASIL, 2009, 2015).Neste sentido, descreva as competências do
educador social contidas em cada PL, sistematizando cada um deles
mediante a atuação do educador social com exemplos de práticas.

2 De acordo com a Norma Operacional Básica de Recursos Humanos do


Sistema Único de Assistência Social (NOB – RH/SUAS, 2011), as equipes
de referência são aquelas constituídas por servidores efetivos responsáveis
pela organização e oferta de serviços, programas, projetos e benefícios de
proteção social básica e especial, levando-se em consideração o número de
famílias e indivíduos referenciados, o tipo de atendimento e as aquisições que
devem ser garantidas aos usuários Analisando as definições da NOB-RH/
SUAS, as constituições das equipes dos CRAS e as dos CREAS procederam
no seguinte processo:

a) ( ) Elaboração de tática de organização individual.


b) ( ) Manifestação da importância do trabalho do assistente social.
c) ( ) Instalação de nova divisão sociotécnica do trabalho.
d) ( ) Elaboração dos processos de produção e reprodução das relações sociais.

60
UNIDADE 2

ÉTICA, EDUCAÇÃO SOCIAL


E POLÍTICA: CONCEITOS
FUNDAMENTAIS E A GARANTIA DOS
DIREITOS HUMANOS
OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
A partir do estudo desta unidade, você deverá ser capaz de:

• compreender o que é ética e sua função no cotidiano profissional;

• analisar as atuais competências da educação no período contemporâneo;

• analisar as funções da cidadania na construção do saber;

• fundamentar as concepções da ética na política;

• conhecer os parâmetros das exigências dos direitos humanos.

PLANO DE ESTUDOS
Esta unidade está dividida em três tópicos. No decorrer da unidade você
encontrará autoatividades com o objetivo de reforçar o conteúdo apresentado.

TÓPICO 1 – ÉTICA NO COTIDIANO, UMA REFLEXÃO PENSANDO NO


OUTRO

TÓPICO 2 – EDUCAÇÃO E CIDADANIA E A CONSTRUÇÃO DO SABER

TÓPICO 3 – ÉTICA E POLÍTICA: PARÂMETROS DAS EXIGÊNCIAS DOS


DIREITOS HUMANOS

CHAMADA

Preparado para ampliar seus conhecimentos? Respire e vamos


em frente! Procure um ambiente que facilite a concentração, assim absorverá
melhor as informações.

61
62
UNIDADE 2
TÓPICO 1

ÉTICA NO COTIDIANO, UMA


REFLEXÃO PENSANDO NO OUTRO

1 INTRODUÇÃO
Diante da importante tarefa de interpretar o discurso constitucional e
buscar fundamentar a seriedade desta para a consolidação da cidadania no Estado
brasileiro, este tópico buscará apresentar, através de uma visão metodológica,
a possibilidade de averiguação do sentido e da importância dos princípios
que regem a dignidade do ser humano para interpretação constitucional. Com
a promulgação da Constituição Federal de 1988, aconteceram significativas
mudanças paradigmáticas que afetaram diretamente fatores culturais, além de
mecanismos institucionais e práticas sócio-políticas enraizadas na sociedade
brasileira.

A Constituição Federal de 1988 constitui um legado inovador para toda
população, dando respaldo a todos os segmentos sociais e para os três poderes:
judiciário, legislativo e executivo; a concretude e efetividade das conquistas e
direitos contidos na Constituição. A ética permeando a efetivação da cidadania
deve ter seus princípios fundamentalmente na garantia dos direitos humanos.

2 A GARANTIA DOS DIREITOS HUMANOS E A DE SER UM


PROFISSIONAL ÉTICO

FIGURA 1 – ÉTICA E CIDADANIA

FONTE: <http://sustentahabilidade.com/wp-content/uploads/2017/03/%C3%89tica.png>.
Acesso em: 6 nov. 2019.

A efetivação da cidadania passa pela possibilidade do cidadão usufruir


seus direitos, conquistas e benefícios trazidos e defendidos na Constituição

63
UNIDADE 2 | ÉTICA, EDUCAÇÃO SOCIAL E POLÍTICA: CONCEITOS FUNDAMENTAIS E A GARANTIA DOS DIREITOS HUMANOS

Federal de 1988, considerando a necessidade de superar a concepção moderna


de cidadania, sendo esta uma cidadania efetiva que luta por uma realidade de
abrangência de direitos materializados e concretizados no pleno exercício dos
diferentes aspectos que envolvem a participação e justiça social por meio de
práticas de igualdade.

O desenvolvimento e a efetivação da cidadania passam por meio de


processos de construção do espaço político, do direito de ter voz e ser ouvido, ter
condições necessárias para o crescimento humano e ter prioridade no atendimento
às exigências de direitos humanos. Nesse sentido, sociologias e as práticas das
ciências políticas vêm buscando postular a ampliação do conceito de cidadania.

É necessário superar a dimensão tradicional que se tem da concepção


conceitual de cidadania, que é a superação de suas limitações e deficiências. Para
Bauman (2000, p. 143), isso significa:

Daí a segunda dimensão do paradoxo endêmico à ideia de tradição.


A tradição só pode entrar na consciência humana introduzida pelo
tradicionalismo. Recomendação da escolha a ser feita e implicando, pois,
a escolha e a necessidade humana de escolher, o tradicionalismo está,
portanto, organicamente ligado à sociedade autônoma; sua presença,
de fato, é prova da autonomia da sociedade em que ocorre. Mas o
tradicionalismo é um sintoma da sociedade envergonhada da própria
autonomia, que não sente à vontade com isso e sonha em escapar dessa
liberdade. Assim como a hipocrisia é um tributo indireto pago à verdade
pela mentira, da mesma forma o tradicionalismo é um tributo enviesado,
embaraçado e envergonhado pago à autonomia pela heteronomia.

Buscando superar o conceito tradicional, encontra-se a experiência e o


sentido histórico-genético que possuía em seu princípio, pois a “evolução da
cidadania começou na sociedade europeia branca e cristã, sem diferenças internas
insuperáveis além das contradições de classe, e com poucas minorias raciais,
nacionais ou religiosas” (PINSKY; PINSKY, 2003, p. 345).

Com isso, Pinsky e Pinsky (2003) propõem uma expansão do sentido em


direção às fronteiras das grandes comunidades sociais, dos grandes dilemas da
política atual e dos atuais desafios relativos aos direitos humanos.

Assim, exercitar a cidadania não significa, em nenhum momento, delegar


ao Estado o gerenciamento das políticas púbicas, das ações estratégicas ou
investimentos em prol da justiça social. Isso sem dúvida são quesitos de uma
condição essencial para que a política desempenhe sua função em prol de uma
sociedade mais justa.

Nessa linha de raciocínio, a cidadania não é considerada uma atitude


passiva e nem menos representativa, na qual se delega aos representantes
políticos, que teoricamente são munidos de poder por um mandato eletivo. Se
essa é a ideia que se tem de ser cidadão, a definição de cidadania está limitada e
focada na visão tradicional. Está centrada num pensamento assistencialista e com
concepções paternalistas de Estado.
64
TÓPICO 1 | ÉTICA NO COTIDIANO, UMA REFLEXÃO PENSANDO NO OUTRO

Para Bittar (2006, p. 12), essa visão afirma que:

O que se pensa é que a questão da cidadania é uma problemática inerente


a um povo. É este povo que bem conhece suas carências, deficiências,
necessidades etc. É também este povo que possui as condições para a
transformação de sua condição, o que, no entanto, não se consegue sem
a organização da sociedade civil, sem a mobilização das comunidades,
sem a conscientização dos grupos minoritários, sem a adesão das
mentalidades ao projeto social que pode transformar seu quotidiano.

A afirmação de Bittar (2006) nos mostra que, à medida que se vive um


período de transição, em que se abrigou mentalidades coletivas, uma determinada
decepção com paradigmas e promessas acabou gerando apatia e abandono do
compromisso com os ideais sociais básicos que regem a estruturação do nosso
meio social. Para Júnior (1992, p. 252):

O discurso pós-moderno levanta questões importantes para problemas


graves das sociedades “pós-industriais” serve para a crítica do homem
parido pela sociedade de massas, massificado, tão bem descrito pelo
Le Monde quando o equiparado ao novo egoísta: “Pragmatismo, e
cinismo. Preocupações a curto prazo. Vida privada e lazer individual.
Sem religião. Apolítico, amoral, naturista, narcisista. Na pós-
modernidade, o narcisismo coincide com a deserção do indivíduo
cidadão que não mais adere aos mitos e ideais de sua sociedade”.
Daí estar coberto de razão Felix Guatari quando afirma ser a “pós-
modernidade” o “paradigma de todas as submissões”.

Nessa concepção pós-moderna e mediante as experiências práticas


e históricas de abertura para uma nova concepção de cidadania. O terceiro
setor surgiu com o propósito de alinhar o Estado na efetivação da cidadania
fundamentada nos direitos humanos. De acordo com os autores Pinsky e Pinsky
(2003), isso requer a seguinte análise:

Por ora, vamos nos ater a uma definição mais genérica: compreendem
o terceiro setor todas as entidades que não fazem parte da máquina
estatal, não visam lucro e não se afirmam com discurso ideológico,
mas sim sobre questões específicas da organização social. Se o aspecto
negativo da definição é claro – sabemos que não é terceiro setor –,
o lado afirmativo deve ser particularizado. Ou seja, uma vez que o
terceiro setor engloba um sem números de entidades com origens e
finalidades diversas, a compreensão só acontece no âmbito de cada
categoria (PINSKY; PINSKY, 2003, p. 565).

DICAS

A história do Brasil revela que a partir da década de 1980 surgiu no país um


tipo de organização inexistente até o momento, sendo entidades voltadas a questões de
interesse público, com capacidade de organizar projetos, monitorar, executar e prestar
contas de suas finanças, as chamadas Organizações não Governamentais (ONGs).

65
UNIDADE 2 | ÉTICA, EDUCAÇÃO SOCIAL E POLÍTICA: CONCEITOS FUNDAMENTAIS E A GARANTIA DOS DIREITOS HUMANOS

O surgimento de uma nova categoria para o pensamento político,


envolvendo o Estado, a sociedade civil e a população que vincula o papel desses
novos atores no cenário públicos, se transformou em um tema de fundamental
importância para os estudos sociológicos dos últimos anos.

Com as experiências de novas formas de estruturação de diversos


segmentos sociais, nas décadas de 1970, 80 e 90, e no crescente processo de
aperfeiçoamento das estruturas que dão suporte e estruturação aos grupos que
estão organizados, o agente do processo de construção e de reconstrução da
cidadania fica sobre a responsabilidade do coletivo.

A partir da nova concepção sobre a definição cidadania é necessário se


modular para estabelecer uma nova coerência na administração dos conflitos
nos diversos segmentos de participação pública que envolva principalmente as
decisões políticas para toda população.

Com a ineficiência do Estado no gerenciamento e na distribuição de bens


fundamentais, moradia, alimentação, segurança e outros, surgiram alterativas
voltadas aos modos tradicionais de se idealizarem por meio de práticas jurídicas
e políticas, a fim de suprir as carências existentes.

O texto que fundamenta na Constituição Federal de 1988 é normativo,


sendo uma chave para construção de novos comportamentos humanos e sociais,
como novas condutas para elaboração e efetivação de política públicas, tornando-
se o elo para uma sociedade com princípios éticos.

Para Bittar (2006), diante dos novos comportamentos humanos existem


algumas inquietações a serem listadas, são elas:

QUADRO 1 – MUDANÇAS NO COMPORTAMENTO ÉTICO DAS PESSOAS


1 Uma ética da dignidade humana, do modo mais lato que se puder compreender
a expressão, tendo em vista o seu amplo alcance, a sua ampla aplicabilidade e sua
repercussão em todos os setores do próprio texto constitucional e de todas as ciências
jurídicas.
2 Uma ética da igualdade (art. 5º, inc. I).
3 Uma ética da não invasividade à personalidade humana (art. 5º., incs. V, X e XII), que se
expressa pela proteção contra o dano à moralidade, a repressão ao abuso invasivo dos
caracteres, da intimidade, da personalidade humana, com a proteção à honra, à imagem
e à vida privada.
4 Uma ética do não abuso de poder, da não violência, da preservação de direitos humanos
consagrados internacionalmente, inclusive aos criminosos e aos presos (art. 5º., incs. III,
XXXIX, XLII, XLV, XLVI, XLVII, XLVIII, XLIX, L, LXI, LXII, LXIII, LXIV, LXV, LXVI).
5 Uma nova ética das relações de trabalho, fundada na valorização do homem como
pessoa humana engajada em atividades produtivas, facultando-se a todos a livre escolha
de profissão, salvo qualificações mínimas exigidas por lei, como garantia técnica e
social de higidez profissional, enfocando-se, sobretudo, as necessidades familiares e
alimentares de que se revestem os institutos de direitos e deveres sociais ligados ao
trabalho (Artigos 6º. e 7º.).

66
TÓPICO 1 | ÉTICA NO COTIDIANO, UMA REFLEXÃO PENSANDO NO OUTRO

6 Uma ética da liberdade intelectual, com vistas à formação de consciências ideológicas,


científicas, literárias e artísticas livres de quaisquer embaraços ou vínculos ou
impedimentos, tendo-se em vista a necessidade de pluralismo na formação do
pensamento e do diálogo sociais, com especial alento para a formação de ideologias
contrárias às ideias preponderantes, valorizando, inclusive economicamente, a proteção
do autor e do criador por meio de instrumento previstos em lei (art. 5º., incs. IV, VIII, IX,
XXVII).
7 Uma ética da tolerância, seja religiosa, seja racial, com vista à construção de valores
igualitários, não podendo um cidadão oprimir o outro, e muito menos o Estado
incorporar qualquer credo como instituição oficial do país, vedando as manifestações,
culto e crença em qualquer de seus sentidos (art. 5º., incs. VI, XLI).
8 Uma ética universalista, tendo-se em vista a igualdade de brasileiros e estrangeiros,
com vistas à eliminação de qualquer ética xenófoba, tendo em vista a própria formação
pluralista e étnica do povo brasileiro, a própria tradição de miscigenação de raças que
alberga o solo brasileiro, entendendo-se salutar a convivência harmônica e interativa de
pessoas de diversas origens, sob a proteção da Lei Maior brasileira (art. 5º., caput).
9 Uma ética administrativa, com acentuado tônus para a moral administrativa (art. 37,
caput), com vistas à digna e proba atuação dos agentes públicos em atividades essenciais
desenvolvidas pelo Estado, com vistas ao desenvolvimento de uma cultura do respeito
ao erário público e às necessidades sociais, com vistas à formação de uma consciência
generalizada da solidez institucional dos órgãos do Estado (incisos, art. 37).
10 Uma ética ambiental e preservacionista, que reconhece o potencial genético do país,
que visa proteger e desenvolver os recurso naturais a partir das próprias forças e meios
nacionais, de modo a se poder valorizar o que o meio ambiente está apto a oferecer, sem
degradação e desgaste excessivos, evitando-se o sério comprometimento dos recursos
escassos e limitados da natureza (hídricos, minerais, vegetais, biológicos…) para as
futuras gerações e como forma de garantia da autossuficiência nacional (art. 225, incisos
e parágrafos).
11 Uma ética familiar, com vistas ao fortalecimento do núcleo elementar de formação de
toda sociedade como forma única de manutenção e construção de uma sociedade justa,
solidária e integrada, a começar pela educação e pela solidez dos valores repartidos no
âmbito familiar, relevando-se, sobretudo, não a formalidade do casamento como meio
de acesso à família reconhecida, mas promovendo-se legalmente integração da união
estável ao conjunto das intenções de formação de núcleos familiares na sociedade (art.
226, incisos e parágrafos).
12 Uma ética voltada para a integração da criança e do jovem em meio aos anseios sociais,
por meio da integral proteção legal de suas necessidades, por meio do provimento de
suas carências, com a transferência à família das responsabilidades sociais de construção
da ambiência comunitária, vedada a discriminação e o tratamento desigual aos filhos
havidos fora do casamento, com ativo compromisso do Estado no estímulo e na proteção
da criança contra o abuso, a violência familiar e o trabalho precoce (Artigos 227, 228 e
229).
13 Uma ética de apoio e sustentação ao idoso como dever da família e do Estado, no sentido
de valorização da longevidade e de dignificação da vida da pessoa humana durante
todo o tempo de sua duração, seja ela produtiva ou não, do ponto de vista do trabalho
(art. 230).
14 Uma ética da não discriminação e da valorização de outras raças e culturas, com vistas
à abolição da visões hegemônicas e civilizadoras instituídas por tradição no território
brasileiro, garantindo-se aos povos indígenas tratamento digno e proteção específica
contra a exploração, contra a deterioração de costumes, contra a invasão das terras e
contra a destruição do meio ambiente ao qual pertencem e do qual necessitam para a
sobrevivência (Artigos 231 e 232).

67
UNIDADE 2 | ÉTICA, EDUCAÇÃO SOCIAL E POLÍTICA: CONCEITOS FUNDAMENTAIS E A GARANTIA DOS DIREITOS HUMANOS

15 Uma ética científica com vista à formação de uma consciência das prioridades de
conhecimento e de aplicação tecnológica do país, bem como com vista à implantação de
programas de auxílio às atividades de pesquisa em todos os setores do conhecimento
humano, como forma de garantia o crescimento intelectual e a formação de pesquisas
documentadas em torno das necessidades regionais e culturais brasileiras (art. 218).
16 Uma ética da comunicação social, com vista à criação de órgãos controlados pelo Poder
Público, vedada a formação de monopólios ou oligopólios de comunicação, de difusão
de cultura, de dispersão de informações e de veiculação de notícias e dados, relevando-
se o fato de que os meios de comunicação, salvo algumas restrições éticas e jurídicas,
devem possuir total liberdade de atuação para que se possa cogitar da implantação do
ideário democrático em solo nacional (Artigos 220 e 221).
17 Uma ética da ordem econômica e do equilíbrio das relações de consumo, com vista ao
desenvolvimento do país, à estruturação de setores primário, secundário e terciário
estáveis (art. 192, art. 170, caput, até o art. 181).

FONTE: Adaptado de Bittar (2006)

Com essas preocupações listadas, percebe-se que a ética é decorrente


do princípio da dignidade humana, mesmo estando constitucionalizada, para
concretizá-la é preciso reformar como ser humano em uma sociedade que muitas
vezes é adversa a esses princípios éticos.

Os princípios éticos humanos são equivalentes a um abrigo para todas


as esferas que defendem os direitos humanos. Nesse sentido, a justiça social
não deve ser pensada de forma isolada, sem o princípio da dignidade humana,
e não pode ser exercida sem o princípio da dignidade humana, ou seja, uma
depende da outra. Resume-se que todos os demais princípios e valores orientam
e fundamentam a criação dos direitos nacional e internacional e se fundam a uma
identidade comum entre os povos.

A própria Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948 confere a


posição de universalidade e superioridade antes dos princípios e valores éticos.
Essa declaração se tornou referência motivadora da cultura dos direitos humanos.
Mesmo com a universalidade, sua constituição não é fruto de uma indução da
razão, mas de um processo histórico, considerando as diversidades entre povos.

A palavra dignidade (dignitas, do latim) é desprovida de quaisquer


universalismos, porém corresponde a um importante foco, sendo respeitável
o centro convergente de ideias, princípios e preocupações sociais em meio as
disseminações pós-modernas, pois o destaque é decorrente da conquista histórica
dos direitos humanos.

Para Felippe (1996, p. 100):

A dignidade é o fim. A juridicidade da norma positiva consiste em


se poder reconhecer que, tendencialmente, ela se põe para esse
fim. E se não se põe, não é legítima. A razão jurídica se resolve em
uma determinada condição humana em que cada indivíduo é, para
a humanidade, o que uma hora é para o tempo: parte universal e
concreta do todo indissolúvel.

68
TÓPICO 1 | ÉTICA NO COTIDIANO, UMA REFLEXÃO PENSANDO NO OUTRO

Contextualizar a história dos direitos humanos numa perspectiva que se


expande para o século XXI é refletir que a dignidade passa a perder seu valor,
seu sentido, recompondo-se para se tornar parte do embasamento e do discurso
jurídico que permeia nosso milênio. Esse discurso é marcado, por, muitas vezes,
violar os direitos fundamentais colocando a pessoa humana novamente em foco
e também da valorização de seus princípios éticos.

É importante ressaltar que a violação dos direitos humanos não é uma


realidade praticada efetivamente, mas está nas preocupações de muitos juristas,
estudiosos de questões jurídicas, além de profissionais da área, como assistente
social, psicólogo, educador social, entre outros.

Muitas violações dos direitos humanos foram necessárias acontecer, como


também diferentes situações de indignidade, a partir da forma de tratamento
com o ser humano, além de práticas de exploração do homem, para que a própria
sociedade tivesse mais clareza da noção de dignidade diante dos pensamentos
contemporâneos.

Comparato (1999, p. 44) afirma que: “o sofrimento como matriz da


compreensão do mundo e dos homens, segundo a lição luminosa da sabedoria
grega, veio aprofundar a afirmação histórica dos direitos humanos”. A partir
dessa afirmação, entende-se que o personagem a recuperar o espaço perdido dos
valos da erosão da ética que aconteceram nas últimas décadas do século XX e ao
extenso processo que deu origem ao niilismo – sendo esta uma doutrina filosófica
que sugere um pessimismo e ceticismo extremos diante de qualquer situação ou
realidade possível, incide na negação de todos os princípios religiosos, políticos e
sociais – ao tecnicismo, a era tecnicista é marcada pela pedagogia tecnicista que
surge nos Estados Unidos na segunda metade do século XX e chega ao Brasil entre
as décadas de 1960 e 70, inspirada nas teorias behavioristas da aprendizagem, em
que dever-se-ia moldar a sociedade à demanda industrial e tecnológica da época;
ao ceticismo, que é um corrente de pensamento filosófico que protege a ideia da
impossibilidade do conhecimento de qualquer verdade, e a relativização absoluta
de todos valores humanos da sociedade.

Com isso, percebemos que a sociedade recuperou seu sentido de


valorização do ser humano, preenchendo o vazio das experiências céticas e
materialistas do tecnologismo que permeava o século XX e estava invadindo a
diferentes linhas de pensamentos ocupadas com os acontecimentos da história
contemporânea.

O autor Bittar (2006) afirma que:

Os discursos que se afinam e depuram na aurora do século XXI se


aprimoram em proteger, conhecer, desvendar, em uma palavra, dignificar
a personalidade humana, não em atitude de idolatria, mas em atitude de
autoconhecimento, ao estilo socrático (gnoûth autos, gr., “conhece-te a ti
mesmo”), verdadeiro caminho para a compreensão do eu, atalho para
o entendimento do outro, de suas querências e direitos, bem como da
sociedade, de sua mecânica e finalidade (BITTAR, 2006, p. 24).

69
UNIDADE 2 | ÉTICA, EDUCAÇÃO SOCIAL E POLÍTICA: CONCEITOS FUNDAMENTAIS E A GARANTIA DOS DIREITOS HUMANOS

A sintonia existente entre a comunhão e a afinidade dos discursos, no


âmbito da ciência, da religião, do senso comum, da arte, da filosofia e outras,
satisfaz a um estado de espírito humano abatido, que se encontra nos modelos
que originaram o esgotamento dos valores do final do século passado com muitas
mudanças comportamentais.

As mudanças são possíveis de enxergar a partir do desenvolvimento das


nações e dos povos, que acontecem na mesma medida da evolução e expansão da
consciência ética. Comparato (1999, p. 411) descreve que se “há uma base firme
de esperança sobre a qual assentar os esforços em vista da proteção da dignidade
humana: é o fortalecimento geral da consciência ética”.

Se a percepção dos direitos humanos é decorrente do ideário de dignidade,


esta então deve ser o caminho para construção de uma sociedade com a visão
aberta e ideias pluralista, começando pela necessidade de superar as dicotomias
clássicas existentes, sendo elas:

• competência constitucional e legitimidade processual;


• Estado e sociedade civil;
• direito público e interesse privado e outras.

Essas dicotomias dividem e interrompem o cenário jurídico em direção


à construção de um serviço voltado aos interesses da própria sociedade. Para se
ter uma sociedade aberta e pluralista implica resgatar os valores que não estejam
estancados e controlados de forma centralizada apenas pela visão autoritária do
Estado.

Quando analisamos o valor da “dignidade da pessoa humana” dentro da


cultura de uma determinada sociedade, sendo ela aberta e pluralista, implica não
somente a dominação dessa visão sobre todos os outros valores, ou seja, aquele
que poderia ser tido como a regra comum de todos os direitos humanos. Mas,
principalmente, que seus valores consagrados por meio de normas jurídicas,
sendo a Constituição, uma delas e de maior importância, a qual desempenha uma
função espetacular e pluralista.

Esses valores estão em permanente processo de troca intersubjetiva


com todos os envolvidos nesse processo de construção da dignidade humana e
que pertençam ao nível do diálogo comum em torno dos princípios. Também é
importante a atuação participativa em espaços públicos para debater suas críticas
e discussões, a fim de um acordo comum para um agir ético.

Para que esse processo de construção ética comum aconteça, faz-se


necessária uma sociedade pluralista e que possua seus valores por meio de
princípios, como, por exemplo, o princípio da “dignidade da pessoa humana”,
ou com normas de caráter constitucional, como exemplo podemos citar o caso de
desapropriação por interesse social para fins da reforma agrária, previsto no art.
184 da Constituição Federal. E também deve ser considerada a situação de sua

70
TÓPICO 1 | ÉTICA NO COTIDIANO, UMA REFLEXÃO PENSANDO NO OUTRO

consagração como direitos fundamentais, previsto no artigo 5º, inciso XXXV da


Constituição Federal de 1988, não somente ao debate público, mas de acordo com
uma ética fundamentada no agir comunitário.

NOTA

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza,
garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do
direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
XXXV- a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito
(BRASIL, 1988).

Para Bittar (2006), essa interpretação autêntica não é somente no sentindo


daquela que deliberará as normas do ordenamento, mas de um aglomerado de
jogos contínuos entre as linguagens, o qual será responsável por permanentes
mudanças dessas interpretações, para que a Constituição não se torne apenas
um documento formal, de posse de Estado, legislador, para Estado, juiz, mas sim
um documento real, de Estado, legislador para sociedade, agentes sociais, e de
sociedade para Estado, juiz.

Discutido o princípio da dignidade da pessoa humana acerca de


uma interpretação constitucional e decorrente do compromisso que o texto
constitucional mantém com a garantia da probabilidade de exercício da
consciência ética, essa expressão traduz e clama por justiça em torno de todas
as aflições humanas, como: miséria, injustiça, sofrimento, exploração, desvio,
corrupção e degradação e outras tantas mazelas vividas pelo povo brasileiro em
situação de vulnerabilidade, porém somente diante disso que se pode afirmar
como expressão fundamental para a cultura dos direitos.

Essa cultura dos direitos está exclusivamente dedicada a proteger os


valores construídos historicamente pelas próprias mazelas sociais. E você,
acadêmico, como futuro educador social, atuará diretamente na sua prática
profissional para a construção da dignidade da pessoa humana, garantindo
eticamente seus direitos humanos.

Alguns fatos mais acentuados do século XX ocasionaram a necessidade de


gravar como norma fundadora do Direito Internacional dos Direitos Humanos, na
Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948, em seu art. 1º que identifica
na “dignidade da pessoa humana” o cerne de todos os demais valores a serem
protegidos em nível internacional.

71
UNIDADE 2 | ÉTICA, EDUCAÇÃO SOCIAL E POLÍTICA: CONCEITOS FUNDAMENTAIS E A GARANTIA DOS DIREITOS HUMANOS

DICAS

Acadêmico, acesse o link a seguir para conhecer a Declaração dos Direitos


Humanos de 1948: https://declaracao1948.com.br/declaracao-universal/declaracao/.

No atual contexto sociocultural, com intensas reviravoltas paradigmáticas,


caracterizado pela sensação de insegurança e incerteza, a expressão “dignidade
da pessoa humana”, sem anseios e pretensões de universalismo e absolutismo,
serve como referência da proteção dos valores fundamentais conquistados pela
humanidade. Desistir ou abrir mão dessa conquista é ser tão alienado quanto
abandonar a própria civilização em nome da barbárie universal.

NOTA

Universalismo: quando se afirmar que algo é universal, refere-se a uma visão


que expressa um fato existente e que está sempre presente.
Absolutismo: considerado um regime político em que apenas uma pessoa exerce poderes
absolutos, com amplos poderes, em que só ele manda, geralmente um rei ou uma rainha.

Se as reivindicações pós-modernas, de certo modo, influenciaram repensar


a modernidade, isso não significa abdicar das conquistas e dos valores. Mesmo
que os direitos humanos começaram a ser discutidos ao longo da afirmação da
modernidade, através da expressão fundada no liberalismo burguês, que devem
hoje ser repelidos a pretexto de repulsarem os valores liberais.

Torna-se imprescindível resguardar essas conquistas, com a necessidade


de afirmar uma cultura de efetivação dos direitos fundamentais, com um
instrumento fundamental de proteção da dignidade da pessoa humana.

Ter uma posição ante a modernidade não significa desistir das conquistas
modernas, mas sim de valorizá-las sobre o foco das experiências pós-modernas,
visando romper com a modernidade injusta que se aflora sobre a sociedade,
ou seja, exploradora, alienadora, acumulativa, individualista e outras, deve-se
efetivar os aspectos positivos da modernidade justa, dos direitos sociais, da ética,
da solidariedade da proteção social etc.

Só existe dignidade quando a própria condição humana é entendida,


compreendida e respeitadas em todas as suas diferentes dimensões. Isso impõe

72
TÓPICO 1 | ÉTICA NO COTIDIANO, UMA REFLEXÃO PENSANDO NO OUTRO

a necessidade de uma expansão da consciência ética como prática de respeito ao


ser humano, também pode ser considerado como um ideal e, como todo ideal,
existe um objetivo a ser atingido, e não necessariamente é um ideal utópico, por
se encontrar na estreita conexão da própria pessoa.

DICAS

Acadêmico, indicamos a leitura da obra Ética, Educação, Cidadania e Direitos


Humanos, de Eduardo C. B. Bittar:

FIGURA – LIVRO

FONTE: <https://images-na.ssl-images-amazon.com/images/I/51gFvxA5GCL._
SR600,315_SCLZZZZZZZ_.jpg>. Acesso em: 5 dez. 2019.

Essa obra reflete a experiência docente e as preocupações filosóficas do autor, consagrado


em suas reflexões jus filosóficas, projetando-as para campos de total pertinência contextual
com o conturbado momento sociocultural da atualidade. Ao abordar a crise axiológica dos
nossos tempos e discutir o desmoronamento dos arquétipos institucionais que orientavam
o pensamento, a conduta e as estruturas sociais, o autor analisa as transformações vividas
por todos nós em meio à ventania das mudanças pós-modernas. Enfrentando temáticas
de alta relevância social, discute cidadania, ética, engajamento político, num dinamismo
que perturba, por ser altamente explosiva a combinação de autores que colaboraram para
a composição do texto final. Dialoga com Paulo Freire na educação, discute a gravíssima
situação da cidadania brasileira, polemiza Habermas e seu projeto cosmopolita, abre
discussão sobre os direitos humanos na ordem internacional e discute valores e problemas
políticos, entre outras contribuições. O texto é extremamente convidativo em sua leitura,
pelo eixo filosófico que o conduz, além de ser recomendado especificamente para alunos
de graduação e pós-graduação em Direito, interessados em leituras éticas e direitos
humanos, para alunos de graduação e pós-graduação em Relações Internacionais e em
Filosofia, além de interessados em geral.

FONTE: BITTAR, E. C. B. Ética, educação, cidadania e direitos humanos. Barueri-SP:


Manole, 2003.

73
RESUMO DO TÓPICO 1
Neste tópico, você aprendeu que:

• A efetivação da cidadania passa pela possibilidade de usufruir dos direitos,


conquistas e benefícios trazidos por uma Constituição.

• O envolvimento da cidadania passa por meio de processos de construção do


espaço político, do direito de ter voz e ser ouvido, ter condições necessárias para
o desenvolvimento humano e ter prioridade no atendimento das exigências de
direitos humanos.

• É necessário superar a dimensão tradicional que se tem da concepção conceitual


de cidadania, da superação de suas limitações e das deficiências.

• Exercitar a cidadania não significa, em nenhum momento, delegar ao Estado


o gerenciamento das políticas púbicas, ações estratégicas ou investimentos em
prol da justiça social. Isso sem dúvida é uma condição essencial para que a
política desempenhe sua função em prol de uma sociedade mais justa.

• A concepção pós-moderna, e mediante as experiências práticas e históricas


de abertura para uma nova concepção de cidadania, em que o terceiro setor
surgiu com o propósito de alinhar o Estado na efetivação da cidadania é
fundamentada nos direitos humanos.

• A partir da nova concepção sobre cidadania é necessário se modular para


estabelecer uma nova coerência na administração dos conflitos nos diversos
segmentos de participação pública.

• O texto que fundamenta a Constituição Federal de 1988 é normativo, sendo


uma chave para construção de novos comportamentos humanos e sociais, como
novas condutas para elaboração e efetivação de política pública, tornando-se o
elo para uma sociedade com princípios éticos.

• A ética é decorrente do princípio da dignidade humana, mesmo estando


constitucionalizada, para concretizá-la é preciso se reformar como ser humano
em uma sociedade em que muitas vezes é adversa a esses princípios éticos.

• A própria Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948 confere a


posição de universalidade e superioridade antes os princípios e valores éticos.

• As mudanças são possíveis de enxergar, a partir do desenvolvimento das


nações e dos povos, que acontecem na mesma medida da evolução e expansão
da consciência ética.

74
• As reivindicações pós-modernas, de certo modo, influenciaram repensar a
modernidade, isso não significa abdicar das conquistas e dos valores.

• Só existe dignidade quando a própria condição humana é entendida,


compreendida e respeitadas em todas as suas diferentes dimensões. Isso impõe
a necessidade de uma expansão da consciência ética como prática de respeito
ao ser humano.

75
AUTOATIVIDADE

1 “O caráter universalizante dos direitos do homem [...] não é da ordem do


saber teórico, mas do operatório ou prático: eles são invocados para agir,
desde o princípio, em qualquer situação dada” (François Julien, filósofo e
sociólogo). Nesse ano, em que são comemorados os 60 anos da Declaração
Universal dos Direitos Humanos, novas perspectivas e concepções
incorporam-se à agenda pública brasileira. Uma das novas perspectivas
em foco é a visão mais integrada dos direitos econômicos, sociais, civis,
políticos e, mais recentemente, ambientais, ou seja, trata-se da integralidade
ou indivisibilidade dos direitos humanos. Dentre as novas concepções de
direitos, destacam-se:

• a habitação como moradia digna e não apenas como necessidade de abrigo


e proteção;
• a segurança como bem-estar e não apenas como necessidade de vigilância e
punição;
• o trabalho como ação para a vida e não apenas como necessidade de emprego
e renda.

Tendo em vista o exposto, selecione uma das concepções destacadas e esclareça


por que ela representa um avanço para o exercício pleno da cidadania, na
perspectiva da integralidade dos direitos humanos. Seu texto deve ter entre 8
e 10 linhas.

FONTE: <http://www.pucrs.br/edipucrs/enade/formacaogeral-2006-2007-2008.pdf>. Acesso


em: 11 ago. 2019.

2 O caráter especial dos diplomas internacionais sobre direitos humanos


lhes reserva lugar específico no ordenamento jurídico brasileiro: eles estão
abaixo da Constituição, porém acima da legislação interna.

O status normativo supralegal dos tratados internacionais de direitos


humanos subscritos pelo Brasil, dessa forma, torna inaplicável a legislação
infraconstitucional com eles conflitante, seja ela anterior ou posterior ao ato
de adesão [...]. A prisão civil do depositário infiel não mais se compatibiliza
com os valores supremos assegurados pelo Estado Constitucional, que não
está mais voltado para si mesmo, mas compartilha com as demais entidades
soberanas, em contextos internacionais e supranacionais, o dever de efetiva
proteção dos direitos humanos.

FONTE: BRASIL. Supremo Tribunal Federal. RE nº 349.703-1. 2008. Disponível em: http://redir.
stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=595406. Acesso em: 5 dez. 2019.

No que se refere à aplicação dos dispositivos dos tratados internacionais no


direito interno, avalie as seguintes asserções e a relação proposta entre elas.

76
I- A recepção da Convenção Americana sobre Direitos Humanos – Pacto de
San José da Costa Rica – pelo ordenamento jurídico brasileiro acarretou
impedimento legal à prisão civil do depositário infiel.

PORQUE

II- A previsão constitucional para prisão civil do depositário infiel foi revogada
por força do status normativo supralegal dos tratados internacionais de
direitos humanos subscritos pelo Brasil.

Com relação às asserções anteriores, assinale a alternativa CORRETA:

a) ( ) As asserções I e II são proposições verdadeiras, e a II é uma justificativa


da I.
b) ( ) As asserções I e II são proposições verdadeiras, mas a II não é uma
justificativa da I.
c) ( ) A asserção I é uma proposição verdadeira, e a II é uma proposição falsa.
d) ( ) A asserção I é uma proposição falsa, e a II é uma proposição verdadeira.
e) ( ) As asserções I e II são proposições falsas.

77
78
UNIDADE 2 TÓPICO 2

EDUCAÇÃO E CIDADANIA E A
CONSTRUÇÃO DO SABER

1 INTRODUÇÃO
Frequentemente, ouvimos falar em “cidadania europeia”, “cidadania
multicultural”, “cidadania para planetária”. O que seriam esses tipos de cidadania
persiste numa “educação para a cidadania” e numa sociedade democrática. Sem
perceber, estamos insistindo de certa forma em afirmar uma “falta de cidadania”,
argumentando e explicando a nossa ausência de participação e de organização
enquanto cidadãos.

Precisamos ter clareza de qual entendimento temos por cidadania e, com


isso, precisamos de algumas respostas para sanearmos algumas dúvidas sobre
as questões relacionadas à cidadania, como: quantos tipos de cidadania existem?
Qual o nosso papel na construção da cidadania? A educação desenvolve qual
função nesse processo de construção da cidadania?

Para responder a essas perguntas, precisamos ir às raízes do conceito da


palavra cidadania, para entendermos o que pretendemos com ela. Com isso é
necessário discutir o papel da escola e da família na construção da cidadania.

Na compreensão de que a educação se constrói numa proposta dialética


e dialógica, por meio da inter-relação entre teoria e prática, práxis, e não pela
divisão de ambas, devemos acreditar que se faz necessário o exercício do discurso
de um processo de conscientização, da busca pela emancipação e pela construção
da cidadania.

79
UNIDADE 2 | ÉTICA, EDUCAÇÃO SOCIAL E POLÍTICA: CONCEITOS FUNDAMENTAIS E A GARANTIA DOS DIREITOS HUMANOS

2 A IMPORTÂNCIA DA EDUCAÇÃO NO
PROCESSO DA CONSTRUÇÃO DA CIDADANIA

FIGURA 2 – EDUCAÇÃO E CONSTRUÇÃO DA CIDADANIA

FONTE: <https://nova-escola-producao.s3.amazonaws.
com/6G5kKfgN42XDSrF9NY4NdhKbEb4nDSYtHBbGEfvsBJVFb5yJsXRxspZaXP5Y/orientador-
educacional-blog-aluno-em-foco.png>. Acesso em: 5 dez. 2019.

O termo “cidadania” tem, dentre outras, a seguinte definição, segundo o


dicionário Novo Aurélio do Século XXI: “qualidade ou estado de cidadão”. Para
o termo “cidadão”, a conceituação presente em tal fonte de referência é, dentre
outras, as seguintes: “1. Indivíduo no gozo dos direitos civis e políticos de um
Estado, ou no desempenho de seus deveres para com este. 2. Habitante da cidade
(FERREIRA, 1999, p. 469).

Conforme o dicionário da Academia de Ciências de Lisboa (2001) sugere,


a palavra de raiz grega polis significa cidade e a palavra “politize” significa
“participação na vida da cidade”. No latim, a etimologia de civitas, attis ou
cidade significa uma “unidade territorial e política na Antiguidade”, na qual seus
membros se autogovernam, ou seja, governam a si próprios. A palavra “cidadão”
é uma pessoa com plena posse dos seus direitos civis e políticas para com um
estado livre, estando sujeito a todos os direitos e obrigações próprias dessa
combinação.

No período da Idade Média, com o feudalismo, as relações sociais


passaram a distinguir-se pela servidão e pela negação da liberdade e por conta
da participação das pessoas comuns nas questões políticas e sociais, tendo apenas
o clero e a nobreza esse direito e poder.

As reivindicações pelos direitos de liberdade, igualdade e participação na


vida política e no exercício do poder volta ao cenário com o ideário da Revolução
Francesa e com a chegada da burguesia ao poder.

Diante do acelerado processo de desenvolvimento do modo de produção


capitalista, a cidade passa a ser o centro de desenvolvimento industrial, além de
se tornar novamente o espaço por excelência de participação social.

80
TÓPICO 2 | EDUCAÇÃO E CIDADANIA E A CONSTRUÇÃO DO SABER

Com esses conceitos, podemos concluir que ser cidadão provoca o


exercício de direitos e deveres, indo além, através de uma negociação entre
direitos e deveres de maneira que prevaleça sempre o bem comum.

Assim, acadêmico, ser cidadão implica uma identidade e pertença,


também, em ser participativo e defensor de uma causa comum.

As nossas leis representam a constituição de normas e regras sociais para


que as pessoas, os cidadãos, consigam viver de maneira agradável uns com os
outros. Podemos comparar as leis como um conjunto de andaimes que vão se
suportando e se enquadrando aos modos desejáveis na sociedade.

O Brasil é considerado um país com um conjunto de leis perfeitas, mas


a falta de cidadania, ou então as práticas centralizadoras que são tradicionais
acabam impondo as regras de cima para baixo, dificultando a suas aplicabilidades
na sociedade como um todo.

Como alguns referenciais normativos internacionais, para as práticas de


cidadania temos a Declaração Universal dos Direitos Humanos, apresentada
no tópico anterior, e a Convenção dos Direitos da Criança, e ainda podemos
citar outra não tanto conhecida, como a Convenção Contra as Formas de
Discriminação, a Convenção para a Igualdade de Mulheres e Homens no
Trabalho e a Declaração Universal das Responsabilidades Humanas, todas têm
o propósito da garantia de direitos e de responsabilidades aos diversos níveis
da sociedade civil.

Existem outras declarações, mas uma delas é importante citar, e que se


faz presente na atuação do educador social no seu agir profissional, que é a Carta
do Porto (INSTITUTO PAULO FREIRE, 2004), que orienta para uma cidadania
multicultural planetária, construindo relações humanas baseadas na convivência
emancipatória, amorosa, sensível, criativa, fortalecendo a cidadania, a democracia
e o carácter público da educação.

A construção da cidadania perpassa vários instrumentos, a escola


é um lócus de fundamental importância de educação para cidadania,
um mecanismo cívico essencial. Para Oliveira Martins (1992, p. 41), a
escola não deve ser vista como “antecâmara para a vida em sociedade”,
mas constituindo o primeiro degrau de uma caminhada que a família e a
comunidade enquadram.

Oliveira Martins (1992, p. 41) afirma ainda que a escola tem o papel de
proporcionar a “cultura do outro”, através da “necessidade de compreensão
de singularidades e diferenças”, possibilitando a responsabilidade pessoal e
comunitária, oferecer o conhecimento metódico da vida e das coisas e buscar a
compreensão de culturas, de nações, do mundo.

81
UNIDADE 2 | ÉTICA, EDUCAÇÃO SOCIAL E POLÍTICA: CONCEITOS FUNDAMENTAIS E A GARANTIA DOS DIREITOS HUMANOS

A escola deve fornecer um horizonte completamente amplo, em que as


crianças e os jovens inscrevam sua própria história. Diante disso, a necessidade de
ter uma educação de responsabilidade e compromisso social. Segundo Oliveira
Martins (1992, p. 41): “[...] agente de mudança e factor de desenvolvimento […] tem
que se assumir basicamente não só como um potenciador de recursos, mas também
comum lugar de abertura e de solidariedade, de justiça e de responsabilização
mútua, de tolerância e respeito, de sabedoria e de conhecimento”.

O papel da escola, tanto pública como a privada, é importante na educação


para a cidadania, a escola pública tem um diferencial por acolher a todos, sendo
parte complementar da vida e da cidade democrática.

No clássico O Meu Credo Pedagógico, Dewey (1999) afirma que a maioria da


nossa educação é falha, pois acaba esquecendo o princípio fundamental da escola
como modo de vida comunitário. Para Sarmento (2006), a escola é o primeiro pilar
de socialização pública das crianças, enfatizando a importância da construção da
experiência escolar pelos próprios atores sociais, sendo um fundamental fator de
aprendizagem e cidadania.

A escola, sendo um mecanismo de aprendizagem e cidadania deve,


simultaneamente, destacar em uma perspectiva de educação e formação ao longo
da vida, através de estratégica educação não escolar, da educação não formal, da
educação de adultos. Distinguindo a importância educativa das instituições não
escolares, como meios de comunicação, a publicidade, as redes sociais, os bairros,
as igrejas, os grupos, as associações, os movimentos populares, os partidos
políticos e outros.

Para Polakow (1993, p. 159), “a escola deve proporcionar para as novas


gerações um sentido de lugar”. Afirma que “um lugar é mais do que a soma
das suas rotinas, regras, horários, resultados de avaliação […] um lugar onde as
crianças e os jovens sintam que são importantes, não instrumentalmente, porque
estão presentes e fazem parte de um número determinado, mas existencialmente,
porque se trata de uma paisagem em que elas têm significado e um sentido de
pertença”.

NOTA

Compreendemos que o melhor sentido que o latim dá à palavra civitas,


anteriormente mencionado, é de onde emergiram palavras como (educação) cívica,
civismo e cidadania.

82
TÓPICO 2 | EDUCAÇÃO E CIDADANIA E A CONSTRUÇÃO DO SABER

O primeiro espaço de afeto, de segurança, de diversidade é a família, sendo


considerado o primeiro espaço de educação para cidadania, pois é a instância
matriz da socialização das pessoas, que inicia no seu nascimento.

A família, vista num sentido mais amplo, como, por exemplo, uma
comunidade, pode ter diferentes formas: famílias tradicionais, famílias
monoparentais, famílias de acolhimento e outras. Deve ser um exemplo de
participação na vida cívica, atenta ao meio que a cerca, um instrumento de
abertura e solidariedade.

Porém, as famílias podem ser lugares problemáticos, em que


acontecem muitos casos de exploração e vitimização. Diariamente, somos
tomados por uma onda de notícias, através dos meios de comunicações, com
notícias sobre esse respeito. Estas ultrapassam classes sociais e as condições
socioeconômicas.

Existem núcleos familiares que são fechados entre si mesmos, se isolam


socialmente, e acabam sem condições para tornar-se espaços de cidadania. Se
a cidadania se inicia no núcleo familiar, podemos afirmar que os paradigmas
são construídos desde a infância. O autor Sarmento (2006) apresentou, em um
de seus trabalhos, uma concepção alternativa de uma cidadania da infância, e
que foi introduzido no plural, cidadanias, na qual descreve os diferentes tipos de
cidadania.

Sarmento (2006) começa abordando a ideia de cidadania social: baseado


na nova “sociologia da infância” e na construção de uma “ideia” de infância
contraposta à existência de vários tipos de infância. Afirma a importância de
aceitar a voz das crianças como expressão legítima de participação na vida da
“cidade”.

Outra ideia apresentada por Sarmento (2006) é de que a cidadania


organizacional se fundamenta com a indigência de oferecer às crianças a pertença
a comunidades de aprendizagem, procurando a desburocratização da escola,
investindo numa organização curricular aberta. A “escola pública” deve ser uma
“casa” para a criança, e não espaço de tabus.

Os autores Moss e Petrie (2002) falam de “espaços da infância” e não de


“espaços para a infância”, esclarecendo nesses termos:

São espaços físicos (certamente), mas são espaços simultaneamente


sociais, culturais, discursivos – espaços criados como serviço público,
lugares de vida cívica (em contraponto alugares destinados a
transações comerciais). Nestes lugares as crianças encontram-se umas
com as outras e com os adultos. Eles colocam o presente em primeiro
plano mais do que pensarem no futuro: são parte da vida, não apenas
uma preparação para a vida. São espaços para os temas de interesse
das crianças, ainda que não excluam as agendas» dos adultos. Nesses
espaços as crianças são reconhecidas como cidadãs com direitos,
membros participantes dos grupos sociais de que fazem parte, agentes

83
UNIDADE 2 | ÉTICA, EDUCAÇÃO SOCIAL E POLÍTICA: CONCEITOS FUNDAMENTAIS E A GARANTIA DOS DIREITOS HUMANOS

das suas próprias vidas, mas, também, interdependentes dos outros,


co-construtores de saberes, de identidades e de cultura, crianças que
coexistem e convivem com as outras crianças, na base do que são, mais
do que daquilo que possam vir a ser. Os espaços das crianças são para
todas as crianças numa base democrática, cruzando diferentes grupos
sociais. São espaços para a criança total, não para a criança seccionada
de muitos «serviços para as crianças» (MOSS; PETRIE, 2002, p. 120).

Outro conceito introduzido por Sarmento (2006) é o de cidadania


cognitiva, que é decorrente de formas múltiplas de aderir ao conhecimento. Pode
compreender as perspectivas de Loris Malaguzzi, fundador das escolas de Reggio
Emilia, quando cita as “cem linguagens” da criança (EDWARDS; GANDINI;
FORMAN,1999), ou confirmar a “Teoria das Inteligências Múltiplas” de Howard
Gardner (1985), que afirma uma pluralidade de formas de exercício cognitivo e
de apropriação da realidade pelo raciocínio.

A “cidadania cognitiva” assegura a criança como sujeito do seu próprio


conhecimento, em que pode desafiar seus educadores a desconfiar de tantos
produtos que o mercado promove, mecanismos de educação para ajudar a
trabalhar as mentes das crianças, de acordo com as orientações curriculares em
vigor. Isso acaba esquecendo a importância, nomeadamente durante os primeiros
anos, do imaginário lúdico infantil, do lazer gratuito como espaço de emergência
da criatividade, essencial para o desenvolvimento da criança e consequentemente
a sua cidadania.

Finalizando, Sarmento (2006) dispõe sobre a cidadania íntima como um


espaço de afirmação da identidade e da alteridade, de reconhecimento de uma
diferença não menor no que toca gênero, cultura, religião, origem social ou étnica,
língua, outras.

Para Lévinas (1982), a cidadania íntima surge na capacidade de


ultrapassar estereótipos, numa real curiosidade pelo outro centralizada numa
ética da responsabilidade que nos leva a não deixar “parar a vela do moinho” ou
a continuar “a dar corda ao relógio”.

Essa última forma de cidadania põe os outros no centro, leva-nos a


ultrapassar interesses comuns imediatos, a aceitar “o outro” e acaba colocando
limites a nossa própria individualidade de cada ser humano.

O importante Relatório coordenado por Jaques Delors para a Unesnco,


de 1996, Educação – um Tesouro a Descobrir, reafirma a importância dos quatros
pilares da educação:

84
TÓPICO 2 | EDUCAÇÃO E CIDADANIA E A CONSTRUÇÃO DO SABER

FIGURA 3 – PILARES DA EDUCAÇÃO

FONTE: A autora

Esses pilares continuam sendo um quadro de referência importante diante


do que se procura assegurar a construção de novas cidadanias na infância.

Para os autores Canário e Cabrito (2005), é muito importante constituírem


“territórios educativos” e não apenas “escolares”. Nesse sentido, é necessário que
ultrapassemos a nossa forma de funcionar, construindo recursos que busquem
recursos entre si, tendo múltipla complexidade. A ideia de cidadania solidária
vem de encontro com essa afirmação dos autores Canário e Cabrito (2005).

Conforme a Carta de Porto (2004), grande diversidade das sociedades


atuais e os diferentes movimentos migratórios apelam cada vez para uma
cidadania migratória. As salas de aula, como a educação não formal, na sua
grande diversidade, deve ser, no papel de uma educadora, não apenas uma lição
de geografia, mas sim uma lição de humanidade e cidadania.

Um outro componente da cidadania a ser considerado vincula com a


cidadania das mulheres. Como nós, educadores sociais, podemos intervir nas
questões de gênero? De que forma nós, como profissionais, podemos acolher
as novas cidadanias de mulheres? Como contornamos os espaços escolares em
espaços onde não se criem estereótipos de gênero, de raça, de cultura, à mercê
dos materiais que ofertamos, da maneira que organizamos o espaço, ou como
selecionamos materiais pedagógicos, como jogos, livros e outros?

Para Morin (2000), quando aborda os sete saberes necessários à educação


do futuro, destaca a importância de educar novas gerações para uma cidadania
planetária, afirmando:

A compreensão é ao mesmo tempo meio e fim da comunicação


humana. Planeta necessita, em todos os sentidos, de compressões
múltiplas. Dada a importância da educação para a compreensão, em
todos os níveis educativos e em todas as idades, o desenvolvimento da

85
UNIDADE 2 | ÉTICA, EDUCAÇÃO SOCIAL E POLÍTICA: CONCEITOS FUNDAMENTAIS E A GARANTIA DOS DIREITOS HUMANOS

compreensão necessita da reforma planetária das mentalidades; esta


deve ser atarefa da educação do futuro (MORIN, 2000, p. 104).

Retornando ao conceito de “cidadania íntima”, explicitado por Sarmento


(2006), somos levados a ultrapassar uma concepção mais restrita de cidadania
para nos estabelecer sem uma postura ética, que é definida por Paul Ricoeur
(1997), tendo em conta o bem do outro, o bem comum, o bem maior para a
humanidade. Diante disso, surge a necessidade de educarmos para uma ação
com critérios que balance e contrabalance o reacional com o afetivo, misto de
lucidez e de sensibilidade (MOITA, 2006).

O autor Bruner (1996, 2000) afirma que é preciso educar para se ter uma
deliberação individual, o que se chama de uma cultura mais alargada, tornando-
se fundamental numa educação que se quer construir cidadania entre as pessoas.

Muitas vezes nos encontramos em situações utópicas e temos que ir mais à


frente nas situações do nosso cotidiano profissional. Para Oliveira Martins (1992),
a utopia dever ser vista como horizonte de aperfeiçoamento e de exigências. Para
o autor, a utopia como “não lugar” é um ponto de referência e de busca que não
tem fim.

Os cidadãos inquietos de um determinado espaço, que normalmente
sempre está incompleto deve, como diz o poeta Bertold Becht (1898-1956):
é preciso “mudar a sociedade e, depois de mudar a sociedade, […] mudar a
sociedade mudada”.

A fração do poema que serve de início a este trabalho estende-se na sua


essência: a consciência da nossa incompletude, o desejo de horizontes infinitos, de
solidariedade radicada na cultura e, transcendendo-a, a responsabilidade perante
aquilo que é a nossa de fato a nossa casa comum, nesse sentido o poema a seguir
ilustra toda essa afirmação:

Universalidade
Aqui declaro que não tem fronteiras.
Filho da sua pátria e do seu povo,
A mensagem que traz é um grito novo
Um metro de medir coisas inteiras
Redonda e quente como um grande abraço
De polo a polo, a sua humanidade,
Tendo raízes e localidade,
É um sonho aberto que fugiu do laço.
Vento da primavera que semeia
Nas montanhas, nos campos e na areia
A mesma lúcida semente,
Se parasse de medo no caminho
Também parava a vela do moinho
Que mói depois o pão de toda a gente.
(Miguel Torga, Nihil Sibi)
86
TÓPICO 2 | EDUCAÇÃO E CIDADANIA E A CONSTRUÇÃO DO SABER

De acordo com Chauí (1997), a igualdade, a liberdade e a participação


pertencem à tradição democrática e são direitos que definem os cidadãos e o
conceito de cidadania, estes foram criados ao mesmo tempo em que aconteceu a
invenção da democracia.

Chauí (1997) afirma que para um direito existir, não basta apenas a mera
declaração do cidadão. É necessário que se criem condições para sua existência
e isso acontece por meio de reivindicação por parte da sociedade para que tal
direito seja de fato um direito real.

No contexto histórico, o conceito e a extensão do significado desses direitos,


assim como o conceito e o real significado de cidadania sofreram alterações. Esses
fatos ocorreram devido aos diferentes discursos apropriarem-se do uso desses
termos na tentativa de explicar e regularizar suas intenções e princípios teóricos,
como também de justificar e legitimar a concretização desses direitos.

Com isso, torna-se comum que apareçam formas contraditórias no uso


do termo cidadania, pois pessoas, partidos políticos, propostas pedagógicas,
opiniões diferentes em governos sobre esse assunto utilizam esse termo para
proteger seu ponto de vista perante os demais.

Para Covre (2002), no mundo contemporâneo, o tema cidadania está mais


presente, junto a seus diversos significados.

Ele aparece na fala de quem detém o poder político [...], na produção


intelectual e nos meios de comunicação [...)], e também junto às
camadas mais desprivilegiadas da população [...]. Assim, a cidadania
é atualmente assunto de debate tanto na democracia ocidental quanto
no socialismo do leste, entre classes abastadas e as menos abastadas,
e aparece na pauta de diversos movimentos sociais [...]. Mas de que
cidadania fala cada um desses grupos sociais, personagens que ocupam
posições tão diferentes na sociedade? [...] O que é cidadania para uns
e o que é para outros? [...] É importante apreender de que cidadania
se fala. Podemos delinear concepções diferentes e até mesmo opostas
(COVRE, 2002, p. 7-8).

Conceituar cidadania, para Canivez (1991), requer um status jurídico, e o


autor faz as seguintes considerações:

A cidadania define a pertença a um Estado. Ela dá ao indivíduo um


status jurídico, ao qual se ligam direitos e deveres particulares. Esse
status depende das leis próprias de cada Estado, e pode-se afirmar que
há tantos tipos de cidadãos quantos tipos de Estado. O problema da
cidadania, porém, não é apenas problema jurídico ou constitucional;
se provoca debates apaixonados, é porque coloca a questão do modo
de inserção do indivíduo em sua comunidade, assim como a de sua
relação com o poder político (CANIVEZ,1991, p. 15).

O termo cidadania vem sendo abordado cada vez mais em diversos


segmentos da sociedade, no meio político, e com significados diferentes. Nesse
sentido se justifica, como já citado anteriormente, abordar alguns conceitos do

87
UNIDADE 2 | ÉTICA, EDUCAÇÃO SOCIAL E POLÍTICA: CONCEITOS FUNDAMENTAIS E A GARANTIA DOS DIREITOS HUMANOS

termo cidadania e seus direitos constitutivos, para relacioná-los ao processo de


democratização escolar, formal e não formal.

Para Puig et al. (2000), a educação é a decorrência de duas linhas educativas


inseparáveis: a instrução e a formação:

A educação é instrução na medida em que prepara os jovens e as


jovens para se adaptar e para melhorar o mundo dos saberes culturais,
instrumentais e científicos [...]. Em todos esses casos, a instrução
tem muito de transmissão de saberes informativos necessários para
se viver eficazmente no mundo cultural e profissional. A educação
é formação na medida em que prepara os jovens e as jovens para
se relacionar da melhor maneira possível com o mundo dos seres
humanos: consigo mesmo, com os outros e como conjunto de regras e
normas de convivência que configuram a vida social (PUIG et al., 2000,
p. 15-16).

Citando novamente Puig:

Educar para a cidadania implica, portanto, a instrução e a formação de


um cidadão participativo, entendido como uma pessoa que participa
da vida pública, comprometido com seus direitos e sua liberdade, sem
deixar de comprometer-se com o bem comum e com a coletividade
da qual faz parte. Uma pessoa capaz de refletir, de dialogar e de viver
segundo valores e normas sociais (PUIG, 2003, p. 53).

De acordo com o senso comum presente nos meios acadêmicos, nos meios
de comunicação e até nos meios populares, estamos vivendo atualmente num
mundo completamente diferente daquele delineado pela visão iluminista da
modernidade, constituindo assim uma nova ordem mundial.

Estamos vivendo em um período de plena revolução tecnológica, em


que somos levados a ter a capacidade de lidar com a produção e transmissão de
informações em enorme velocidade. Sendo um processo de globalização não só
da cultural, mas também da economia e da política.

Esse momento é marcado pelo privilégio da iniciativa privada, pela


minimalização da ingerência do Estado nos negócios humanos, pela maximalização
das leis do mercado, pela ruptura de todas as fronteiras.

Essa situação leva Ianni (1998, p. 28) a afirmar que: “o que está em causa
é a busca de maior e crescente produtividade, competitividade e lucratividade,
tendo em conta mercados nacionais, regionais e mundiais. Daí a impressão de
que o mundo se transforma no território de uma vasta e complexa fábrica global
e, ao mesmo tempo, em shopping center global e disneylândia global”.

A sociedade atual vive um período da sua história caracterizado por


grandes transformações, decorrentes principalmente do progresso tecnológico,
nas diversas esferas de sua essência, como a produção econômica dos bens
naturais, nas muitas relações políticas da vida social e na constituição cultural.

88
TÓPICO 2 | EDUCAÇÃO E CIDADANIA E A CONSTRUÇÃO DO SABER

Toda essa nova condição requer um novo pensar nas práticas mediadoras
de sua realidade histórica, sejam o trabalho, a sociabilidade e a cultura simbólica.
Nesse sentido, requer, da educação, a mediação como uma dessas práticas, com
capacidade de enfrentar os grandes desafios impostas no Terceiro Milênio. Sendo
alguns deles: o investimento sistemático nas forças construtivas dessas práticas,
de modo a cooperar com mais eficaz na solidificação da cidadania, tornando-se
essencial a educação do ser humano mais social. Para Severino (2000, p. 65):

A educação, como processo pedagógico sistematizado de intervenção


na dinâmica da vida social, é considerada hoje objeto priorizado de
estudos científicos com vistas à definição de políticas estratégicas para
o desenvolvimento integral das sociedades. Ela é entendida como
mediação básica da vida social de todas as comunidades humanas.
Essa reavaliação, que levou à sua revalorização, não pode, no entanto,
fundar-se apenas na sua operacionalidade para a eficácia funcional
do sistema socioeconômico, como muitas vezes tendem a vê-la as
organizações oficiais, grandes economistas e outros especialistas que
focam a questão sob a perspectiva da teoria do capital humano.

A existência verdadeira e real do ser humano é marcada pelos fatores,


pois essa dimensão econômica é entendida como uma referência condicionante
para outras dimensões da vida humana, uma vez que está ligada à vida material.

As definições dos processos sociais, no âmbito dos processos educacionais,


não ficam restritas na sua funcionalidade operatória. Têm-se de um lado a realidade
dos fatos que permite que a educação possua alguma incidência social, já de
outro lado, essa só ganha legitimidade humana se mencionar as significações que
ultrapassem seu desempenho operacional. Apontar esses valores e significações
vem de encontro com uma abordagem filosófica da educação, mesmo restritos
aos limites de espaço de que se dispõe para a construção da cidadania.

Discutir filosoficamente a educação no processo de construção da


cidadania não é descartar os dados e análises que as ciências especializadas podem
trazer e fazer, e sim, é uma abordagem filosófica como foco educacional, sendo
necessário considerar essa representação por inteiro, valorizando o que a ciência
faz da educação nos dias atuais. O refletir filosófico não é parte das referências
abstratas e idealizadas, mas, preferencialmente colocadas em sua realidade de
seu objeto. Dessa forma, consideram-se as conclusões das ciências, procurando
clarear os objetivos e finalidade que precisam ser selecionadas e privilegiadas,
podendo subsidiar as políticas sociais.

É nesse sentido que se estabelece o diálogo entre as perspectivas científicas,


filosófica e política. Essa última perspectiva é compreendida como o planejamento
e a execução de ações que intervêm em toda dinâmica social e na construção da
cidadania.

Considerando que a prática econômica e a política são essenciais à


configuração do modo de existir do ser humano, é indispensável analisar que o
agir do homem tem suas especificidades, não se pode reduzir ao determinismo

89
UNIDADE 2 | ÉTICA, EDUCAÇÃO SOCIAL E POLÍTICA: CONCEITOS FUNDAMENTAIS E A GARANTIA DOS DIREITOS HUMANOS

ontoessencialista da metafísica, como também ao mecanicismo naturalista da


ciência, ou ao seu pragmatismo funcionalista.

Com isso, podemos concluir que a prática humana esboça seu modo
de ser, de agir e de pensar, não é apenas uma prática mecânica, transitiva. Ao
oposto, é considerada uma prática intencionalizada, que está marcada desde
suas origens pela simbolização. É que, instaurando-se como uma extensão das
forças energéticas espontâneas, a subjetividade forma-se como um equipamento,
modificando-se em um instrumento de ação dos humanos. Para Severino (2000,
p. 69):

Tanto a prática produtiva quanto a prática política só se tornam


práticas humanas porque são atravessadas por uma terceira
dimensão específica do agir humano: trata-se da simbolização,
da prática simbolizadora. Com efeito, a atividade técnica
de transformação da natureza só se torna viável à medida
que os homens, graças a seu equipamento de subjetividade,
são capazes de duplicar simbolicamente os objetos de sua
experiência, lidando com eles para além de sua imediatez.

De acordo com Severino (2000, p. 70), esse “contexto é como um tecido


que vai se complexificando pela contínua articulação de novas experiências, já
tornadas possíveis pelas experiências passadas e acumuladas, é a cultura sendo
uma das mediações concretas da existência dos homens”.

Severino (2000) afirma que a cultura é o universo do saber. Essa afirmação


é válida tanto no plano da experiência epistêmica do indivíduo e ¾ trata-se
sempre de uma experiência que vai se construindo, acumulando, sintetizando,
reorganizando, sistematizando dados ¾ quanto no plano da própria humanidade,
tanto na perspectiva ontogenética como na perspectiva filogenética.

A existência humana pode ser equacionada e mediada através do tríplice


do universo do trabalho da sociedade e da cultura. Esse triângulo se complementa
e se implica reciprocamente, em que um depende do outro, mesmo diante de
cada especificidade. E a cidadania se solidifica a partir desse princípio.

Nesse contexto é que se pode compreender as relações do conhecimento


de todo o universo social. O conhecimento se pressupõe por um solo de relações
sociais, não apenas como referência circunstancial, mas como uma matriz que
nutre todo seu processamento. Contudo, a trama das relações sociais em que
se constitui as relações dos indivíduos, de forma que ocorre nas diferentes
sociedades, interferindo a solidificação social do ser humano, enquanto cidadão,
pelo poder que torna política a sociedade atual. Para Severino (2000, p. 70):

O saber aparece, portanto, como instrumento para o fazer técnico-


produtivo, como mediação do poder e como ferramenta da própria
criação dos símbolos, voltando-se sobre si mesmo, ou seja, é sempre um
processo de intencionalização. Assim, é graças a essa intencionalização
que nossa atividade técnica deixa de ser mecânica e passa a se dar
em função de uma projetividade, o trabalho ganhando um sentido.

90
TÓPICO 2 | EDUCAÇÃO E CIDADANIA E A CONSTRUÇÃO DO SABER

Do mesmo modo, a atividade propriamente política se ideologiza e


a atividade cultural transfigura a utilidade pragmática imediata de
todas as coisas.

Severino (2000) afirma que a educação deve ser entendida nesse contexto
histórico social como uma prática técnica e política, transversal por uma
intencionalidade teórica, fertilizada pela significação simbólica, intercedendo a
integração dos sujeitos educandos na tríplice do universo Mediando a integração
dos sujeitos educandos nesse tríplice universo das mediações existenciais: no
universo do trabalho, da produção de material, das relações econômicas; no
universo das mediações institucionais da vida social, lugar das relações políticas,
esfera do poder; no universo da cultura simbólica, lugar da experiência da
identidade subjetiva, esfera das relações intencionais. A educação só se legitima
internacionalizada à prática histórica dos homens.

Assim, espera-se que a educação seja realmente um processo de


humanização. Nesse sentido, ela precisa se transformar em um instrumento
de mediação e que viabilize, que invista na construção dessas mediações
fundamentais, contribuindo para que efetivem suas condições objetivas e reais.

Porém, esse processo não é algo automático, não decorre de forma


mecânica na vida das pessoas. Ao superar a chamada transitividade do instinto
da univocidade das repostas às circunstâncias, o ser humano ganha muito mais
flexibilidade no seu pensar e agir.

Ao mesmo tempo, se torna vítima fácil das diversas forças alienantes, em


que todas as mediações são ambivalentes, ou seja, constituem simultaneamente
o lugar da personalização, e o lugar da desumanização, e da despersonalização
das características de cidadania. Citando novamente Severino (2000), ser humano
em sua vida sendo ela na vida em sociedade, o trabalho, as formas culturais e as
vivências subjetivas podem estar levando não a uma forma mais adequada de
existência, da perspectiva humana, mas antes as formas de despersonalização
individual e coletiva, ao império da alienação.

E
IMPORTANT

É bom sempre lembrar que o trabalho pode degradar o homem, sua vida
social pode de certa forma oprimi-lo e a cultura pode acabar alienando-o e idealizando-o.

Acadêmico, podemos esperar da educação que se estabeleça de forma


efetiva e prática, por meio de um investimento na consolidação das forças
produtivas dessas mediações, visando a uma sociedade mais justa, fraterna e com
características de cidadania.
91
UNIDADE 2 | ÉTICA, EDUCAÇÃO SOCIAL E POLÍTICA: CONCEITOS FUNDAMENTAIS E A GARANTIA DOS DIREITOS HUMANOS

É por isso que o lado do investimento, na transmissão de conhecimentos


científicos e técnicos aos educandos de uma forma geral, atribui que a educação é
uma mediação da percepção das relações situacionais possibilitando a apreensão
das complexas redes das políticas da realidade social. Sendo que, a partir disso, é
possível dar conta do significado de suas atividades técnicas e culturais.

Assim, cabe à educação, no contexto da intencionalidade da consciência,


apontar os princípios ideológicos de sua atividade. Com isso, evita que se
instaure como uma mera força de reprodução social, e, sim, se transforme em um
instrumento de mudança da sociedade, de forma que contribui para erradicar
todos os focos de alienação.

DICAS

Acadêmico, para aprofundar seus conhecimentos, indicamos a leitura do livro


a seguir:

FIGURA – O QUE É CIDADANIA

FONTE: <http://www.livrariaresposta.com.br/fotos/bras_cidadania_q.jpg>. Acesso em: 5


dez. 2019.

Relacionada ao surgimento da vida nas cidades, a cidadania significa em última instância o


direito à vida no sentido pleno. Esse livro claro e oportuno mostra que esse direito precisa
ser construído coletivamente, tanto na luta pelo atendimento de necessidades básicas
(alimentação, moradia, saúde, educação) quanto num plano mais abrangente, que envolve
a discussão sobre o papel do próprio homem no Universo

FONTE: COVRE, M. de L. M. O que é cidadania? Coleção Primeiros Passos. São Paulo:


Brasiliense, 1991.

92
RESUMO DO TÓPICO 2
Neste tópico, você aprendeu que:

• O termo “cidadania” tem, dentre outras, a seguinte definição, segundo o


dicionário Novo Aurélio do Século XXI: “qualidade ou estado de cidadão”.

• A palavra “cidadão” é uma pessoa com plena posse dos seus direitos civis e
políticas com um estado livre, sujeito a todos os direitos e obrigações próprias
dessa combinação.

• No período da Idade Média, com o feudalismo, as relações sociais passaram


a distinguir-se pela servidão e pela negação da liberdade e por conta da
participação das pessoas comuns nas questões políticas e sociais, tendo apenas
o clero e a nobreza esse direito e poder.

• As reivindicações pelos direitos de liberdade, igualdade e participação na vida


política e no exercício do poder volta ao cenário com o ideário da Revolução
Francesa e com a chegada da burguesia ao poder.

• Com o acelerado processo de desenvolvimento do modo de produção


capitalista, a cidade passa a ser o centro de desenvolvimento industrial, além
de se tornar novamente o espaço por excelência de participação social.

• As nossas leis representam a constituição de normas e regras sociais para que


as pessoas, cidadãos, consigam viver de maneira agradável uns com os outros.

• A construção da cidadania perpassa vários instrumentos, a escola é um lócus


de fundamental importância de educação para cidadania, um mecanismo
cívico essencial.

• O papel da escola, tanto pública como a privada, é importante na educação


para a cidadania, a escola pública tem um diferencial por acolher a todos,
sendo parte complementar da vida e da cidade democrática.

• O primeiro espaço de afeto, de segurança, de diversidade é a família.

• Um outro componente da cidadania a ser considerado vincula com a cidadania


das mulheres.

• De acordo com Chauí (1997), a igualdade, a liberdade e a participação pertencem


à tradição democrática e são direitos que definem os cidadãos e o conceito de
cidadania, estes foram criados ao mesmo tempo em que aconteceu a invenção
da democracia.

93
• O termo cidadania vem sendo abordado cada vez mais em diversos segmentos
da sociedade, no meio político, e como significados diferentes. Nesse sentido
se justifica ao abordar alguns conceitos do termo cidadania e seus direitos
constitutivos, para relacioná-los ao processo de democratização escolar, formal
e não formal.

• A sociedade atual vive um período da sua história caracterizado por grandes


transformações, decorrentes principalmente do progresso tecnológico, nas
diversas esferas de sua essência, como a produção econômica dos bens naturais,
nas muitas relações políticas da vida social e na constituição cultural.

• A existência verdadeira e real do ser humano é marcada pelos fatores, pois essa
dimensão econômica é entendida como uma referência condicionante para
outras dimensões da vida humana, uma vez que está ligada à vida material.

94
AUTOATIVIDADE

1 “Não vamos nos esquecer de que em todas as sociedades existem oprimidos


e opressores em todos os níveis da vida social. Os que oprimem impõem
aos oprimidos sua visão de mundo e de cada coisa desse mundo, para que
sejam obedecidos e reine a sua paz. Para se libertarem, os oprimidos devem
descobrir sua própria visão da sociedade, suas necessidades, e contrapô-
las à verdade dominante, opressiva” (Augusto Boal, A estética do oprimido).
“Atores somos todos nós e cidadão não é aquele que vive em sociedade,
é aquele que a transforma” (Augusto Boal). Considerando-se o contínuo
processo de segregação social presente na sociedade contemporânea, qual a
relação com os dias de hoje?

a) ( ) A segregação social caminha no sentido da cidadania.


b) ( ) Toda sociedade, independentemente das condições econômicas e
sociais, é justa.
c) ( ) A imagem denota futuro promissor e o texto denota a impossibilidade
de futuro.
d) ( ) O espetáculo da fome permite a construção de outra visão da sociedade.
e) ( ) A segregação social e a cidadania se constroem pela fome.

FONTE: <http://editora.pucrs.br/Ebooks/Pdf/978-85-397-0343-2.pdf>. Acesso em: 5 dez. 2019.

2 “Não há, em suma, um direito justo no céu dos conceitos platônicos, e um


direito imperfeito e injusto no nosso pobre e imperfeito mundo sublunar.
O problema do Direito Natural não é descobrir esse celestial livro de
mármore onde, gravadas a caracteres de puro ouro, as verdadeiras leis
estariam escritas, e que, ao longo dos séculos, sábios legisladores terrenos
não conseguiram vislumbrar” (CUNHA, 2001, p. 94).

FONTE: CUNHA, P. F. da. O ponto de Arquimedes: natureza humana, direito natural, direitos
humanos. Coimbra: Almedina, 2001. p. 94.

Considerando as reflexões contidas no texto sobre os direitos humanos na


atualidade é possível afirmar que:

a) ( ) A afirmação histórica dos direitos humanos, desde o jus naturalismo,


se iniciou apenas muito recentemente, no final do século XX, por isso
ainda são desconhecidos dos juristas.
b) ( ) O grande problema dos direitos humanos é o de que não estão
positivados, por isso não são efetivados.
c) ( ) O problema atual dos direitos humanos é o de que, apesar de positivados
e constitucionalizados, carecem de ser efetivados.
d) ( ) O problema atual dos direitos humanos é o de sua fundamentação
lógica, na medida em que ainda são considerados deduções teológicas
ou frutos de conjunturas econômicas.

95
e) ( ) Os direitos humanos são, em todas as suas manifestações, garantias
negativas da cidadania, por isso não carecem de nenhum tipo de
prestação econômica por parte do Estado.

FONTE: <http://www.pucrs.br/edipucrs/enade/direito2006.pdf>. Acesso em: 18 ago. 2019.

96
UNIDADE 2 TÓPICO 3

ÉTICA E POLÍTICA: PARÂMETROS DAS


EXIGÊNCIAS DOS DIREITOS HUMANOS

1 INTRODUÇÃO
A formação do educador no Brasil vem sendo alvo de discussões
historicamente, desde a segunda metade do século XX, através dos primeiros
cursos de formação de educadores, legitimando a maneira que se apresenta a
preocupação constante em relação ao conhecimento adquirido e a pouca atenção
que se dá à formação ética e política do educador.

Este tópico tem como foco compreender uma análise qualitativa, qual o
conceito e o papel do educador perante a constituição histórica desses profissionais
e o retorno à tradição para uma crise na formação ética e política.

Além de analisar as demandas da formação do educador, aprofundará


uma breve reflexão histórica-filosófica das circunstâncias em que se encontram a
formação dos educadores.

Existem inúmeras reivindicações para que os Estados nacionais tenham


uma postura ética, rompendo com a tradicional postura maquiavélica da separação
entre moral e política. Que se tornaram visíveis a partir dos acontecimentos
registrados nas guerras mundiais, nas guerras colônias e na guerra fria, que
aconteceram no século XX.

2 ÉTICA E SUAS RELAÇÕES


FIGURA 4 – A ÉTICA NO COTIDIANO

FONTE: <http://bit.ly/2PqXbYw>. Acesso em: 21 ago. 2019.


97
UNIDADE 2 | ÉTICA, EDUCAÇÃO SOCIAL E POLÍTICA: CONCEITOS FUNDAMENTAIS E A GARANTIA DOS DIREITOS HUMANOS

O principal objetivo deste tópico é discutir através de uma reflexão histórica


o modo de evolução da ética e educação, uma vez que o processo educacional em
sua totalidade é visto como uma necessidade à formação da cidadania.

Desde a nossa infância, somos educados pelos nossos pais ou responsáveis


de nossa criação para agirmos de acordo com a educação que nos foi conduzida.
Contudo, toda ação do ser humano é baseada em determinados valores que
estão atrelados as nossas vivências e experiências adquiridas pelo meio em que
vivemos.

As figuras paternas e maternas são essenciais para uma boa formação do


caráter do indivíduo, o educador e professor também são fundamentais nesse
processo. O educador tem um papel importante na vida das pessoas, pois ele tem
o poder de lapidar as ações de seus educandos.

A ética, dessa maneira, pode ser considerada como questões indispensáveis


para o sucesso no trabalho do educador, é através dela que os educadores
desempenham seus papéis fundamentais, com responsabilidade, compromisso,
viabilizando um diálogo constante para melhorar a convivência com alunos e
demais profissionais da educação.

Sobre a questão da ética na educação, o educador auxilia a sua ação


profissional a trazer de certa forma segurança, autocrítica e autoconfiança aos
alunos, oferecendo uma aula educativa, em que os educandos possam exercer
seus limites, com respeito à individualidade de cada um.

A história educacional brasileira, mesmo nos contextos de fechamento


político, em que o Estado se dissociava da sociedade civil, gerando dificuldades
concretas no exercício da cidadania na dimensão mais simples, sendo elas:
política, legislação educacional – nunca deixou de mencionar como foco principal
o processo educacional – e a formação do cidadão. Nesse sentido, nunca foi
explícito o tipo de cidadania que se pretende e se estava propondo.

Dessa forma, é possível questionar se, na probabilidade de educar para


a cidadania, achamos ser necessário, em caso afirmativo, especificar de que
cidadania se está propondo e falando. A política educacional formal e não formal
no Brasil nunca tratou essas questões de forma específica, somente no modo
genérico.

No sentido exposto, pode-se afirmar que a educação no país sempre esteve


voltada a um determinado tipo de cidadania, sendo através do controle social e
econômico. Isso significa de algum modo um certo conformismo e obediência,
mas, conforme o processo educacional se desenvolve no triângulo: educador –
educando – conhecimento, pode gerar o desenvolvimento intelectual e aumentar
a compressão do educando em relação ao meio natural ou social em que vive.
Dessa forma, começa a ter uma ação não mais coercitiva, contribuindo para a
formação de um indivíduo mais crítico e reflexivo.

98
TÓPICO 3 | ÉTICA E POLÍTICA: PARÂMETROS DAS EXIGÊNCIAS DOS DIREITOS HUMANOS

E
IMPORTANT

Diante dessa visão, o modo com que a educação se desenvolve não é neutra
em relação ao tipo de cidadania que se almeja.

As diferentes compreensões de educação sempre estão presentes no


planejamento educacional e curricular. No âmbito escolar, quando se opta por
objetivos educacionais, por conteúdos, metodologias e critérios de avaliações
do processo de aprendizado está escolhendo por um determinado projeto de
educação, este de maneira alguma é neutro em relação à formação da cidadania.

Uma educação voltada à cidadania não precisa estar moldada somente ao


meio escolar, deve ultrapassar limites através de diferentes práticas profissionais,
como exemplo podemos citar o educador social na sua ação prática. Sobre isso e
a ética como princípio básico da cidadania no processo educacional, é importante
destacar seu surgimento para uma melhor compressão dos significados das palavras:
“a Ética teria Surgido com Sócrates, quando o filósofo foi investigar e explicar as
normas morais que o levava a agir não só por tradição, educação ou hábito, mas
principalmente por convicção e inteligência” (TADÊUS; CUNHA, 2009, p. 143).

Comparato (2006) comenta em sua obra que, no mudo antigo, todas as


decisões eram tomadas pela religião em que não se distinguia a ética da moral.
A religião, para ele, era autoridade máxima na avaliação dos comportamentos
humanos.

O que era tradição sobre as ideias do ser humano era acatado, já que o
novo, ou seja, o que fazia as pessoas cogitarem sobre suas ações fora da situação
de onde estavam inseridas, sendo vistas com desconfianças.

Conforme o Dicionário Aurélio Buarque de Holanda (1999, p. 300 e


p. 471), ética e moral são “o estudo dos juízos de apreciação que se referem à
conduta humana susceptível de qualificação do ponto de vista do bem e do mal,
seja relativamente determinada pela sociedade, seja no modo absoluto”.

Para falar de ética é necessário fazer a distinção entre ética e moral, pois as
duas palavras são empregadas com frequência e indicado um significado comum
do outro. Comparato (2006) afirma que ética é a busca da felicidade de como a
recompensa de um esforço constante do ser humano, sendo este o que se tem de
mais valioso na vida do ser humano. Para ele, ainda é relevante investigar sobre
o que é bom ou sobre o que é mau para se alcançar a felicidade.

Cotidianamente, vivemos essa busca, tornando-se comum, mesmo quase


que impossível, pois a cada momento a idealização dessa felicidade muda, ou

99
UNIDADE 2 | ÉTICA, EDUCAÇÃO SOCIAL E POLÍTICA: CONCEITOS FUNDAMENTAIS E A GARANTIA DOS DIREITOS HUMANOS

porque o objetivo já foi almejado e existe outro a ser alcançado, mesmo que o
convívio e interação comum nos tragam percepções diferentes a cada momento.
Para Caetano e Silva (2009), a ética gira em torno de princípios e valores, orientando
a ação do estabelecimento de regras para o bem.

Todas as pessoas possuem direitos e deveres no meio em que vivem, a


diferença que se faz entre ética e moral tem como foco a intenção de salientar o
caráter crítico da reflexão, o que comporta um determinado distanciamento da
ação, para análise e reforma constantes, quando necessário.

Por ser considerada uma ação reflexiva, a ética possui um caráter teórico.
Não se limita o gesto da reflexão por mera vontade de fazer um “exercício de
crítica”. A crítica é gerada, instigada, por problemas, e variáveis assuntos que se
encaram diariamente.

E
IMPORTANT

Uma reflexão ética só pode acontecer se identificar porque está articulada a


essas ações, nos diversos contextos sociais.

A prática cotidiana transita continuamente no território da moral, seu percurso


é iluminado pelo recurso à ética. Para Vázquez (1992, p. 2), “é um comportamento
pautado por normas em que consiste o bom, visando pelo comportamento moral, do
qual faz parte o procedimento do indivíduo concreto de todos”.

No que se refere ao respeito, a moral do ser humano pode ser compreendida


como “um conjunto de normas que regulam o comportamento do homem em
sociedade, e estas normas são adquiridas pela educação, pela tradição e pelo
cotidiano” (TADÊUS; CUNHA, 2009, p. 142).

Pode-se concluir que tanto a ética como a moral vem sendo cada dia mais
objeto de discussão nos meios acadêmicos e nos diversos ramos da ciência e da
filosofia. Mesmo sendo muito comum no dia a dia, serem igualados os significados
de ética e moral.

Esses conceitos são distinguidos através de uma análise, a ética que várias
vezes é vista como uma “[...] daquelas coisas que todo mundo sabe o que são,
mas que não são fáceis de explicar, quando alguém pergunta” (VALLS, 1993,
p 7). É importante considerar que a ética é um vocábulo a ser interpretado e
compreendido considerando a cultura em que questão.

A moral é considerada um conjunto de normas e condutas que estão


adequadas ao comportamento humano em meio à sociedade. A moral constitui
100
TÓPICO 3 | ÉTICA E POLÍTICA: PARÂMETROS DAS EXIGÊNCIAS DOS DIREITOS HUMANOS

princípios de vida capazes de orientar a vida do ser humano para condutas


moralmente corretas. O ser humano por sua essência é um ser moral, um indivíduo
que avalia sua ação a partir de valores para instituir regras e princípios legitimando
ou determinando cada indivíduo como único, ou de uma comunidade específica.

Um dos desafios da educação é contribuir para a formação ética – moral


dos educandos como cidadão. É essencial que a educação seja construída e
problematizada através da participação do indivíduo na sua vida pública. Isso
se reflete através de uma consciência da realidade, dos conflitos, dos interesses
individuais e sociais, conhecimento de organismos de controle e defesa de direitos
a informação de limites e possibilidade de defesa e controle dos direitos, a noção
dos limites e das possibilidades de atividades individuais e coletivas.

Para Benedetti e Urt (2008, p. 142): “há característica individuais, além


de sociais e ambientais, que concorrem para moldar a personalidade ou definir
comportamentos, sobretudo a qualidade dos relacionamentos humanos”.

Para Sobrinho (2004), no sistema educacional, por muito tempo as provas


escritas, os testes e exames apontavam o único modo de avaliar os alunos, como
se esses instrumentos avaliativos fizessem parte da essência das aprendizagens e
das formações, como se a qualidade da formação de um educando se afirmasse
apenas aos resultados alcançados por meio dessas avaliações. O autor ainda diz
que, na realidade, a avaliação nem sempre é aplicada com função pedagógica,
formativa e de emancipação pessoal e social.

É comum ainda, nos dias de hoje, a sociedade estabelecer e criticar esses


métodos antigos de avaliação. Porém, não criam instrumentos e técnicas novas
para estimular o conhecimento e ter resultados positivos sobre o processo de
aprendizagem, de forma que possa intervir na vida de todos os cidadãos, cogitando
uma desenvoltura e responsabilidade no contexto sociocultural em que está inserida.

A centralidade na formação ética e moral do educador são fundamentais.


“A escola é o principal agente para potencializar e sensibilizar o comportamento
ético, moral e civil de seus educandos, sendo indispensáveis para uma boa
convivência e participação ativa na sociedade” (FREIRE, 1996, p. 17).

A fim de obter resultados, essa luta deve estar inserida no cotidiano da


prática educativa, e sempre que for necessário passar por uma reavaliação de
seus conceitos e qualidades para que a educação seja exercida com qualidade,
através da valorização dos conhecimentos adquiridos e experiências vivenciadas,
independentemente do modo de avaliação aplicada.

Rodrigues (2001) afirma em sua obra que as crianças estão sendo encaminhadas
cada vez mais cedo, precocemente, para a escola e nesse ambiente permanecerão
por um logo período de suas vidas. Para ele, “cada vez mais a escola exercerá ou
poderá exercer um papel que a ela jamais foi atribuído em tempos passados: o de ser
a instituição formadora dos seres humanos” (RODRIGUES, 2001, p. 253).

101
UNIDADE 2 | ÉTICA, EDUCAÇÃO SOCIAL E POLÍTICA: CONCEITOS FUNDAMENTAIS E A GARANTIA DOS DIREITOS HUMANOS

Com isso, é necessário estar precavido em relação à qualidade no que se


diz respeito ao papel do educador, que acaba refletindo na formação educacional
desde o primeiro contato com a instituição que vai atuar.

A educação formal, na contemporaneidade, fica sob a responsabilidade


social de uma instituição de ensino, ou seja, a escola. Dada a intensidade do
trabalho realizado, essa instituição tem exercido um papel de extrema importância
na vida das pessoas, tanto individualmente como coletivamente.

A escola, de fato, institui a cidadania. É ela o lugar onde as crianças


deixam de pertencer exclusivamente à família para integrarem-se numa
comunidade mais ampla em que os indivíduos estão reunidos não por
vínculos de parentesco ou de afinidade, mas pela obrigação de viver
em comum. A escola institui, em outras palavras, a coabitação de seres
diferentes sob a autoridade de uma mesma regra (CANIVEZ, 1991, p. 33).

Quando a criança inicia a fase escolar já deve ter uma noção dos conceitos
básicos de respeito, não que esses sejam completos para sua formação, pois não
atingiram ainda a sua maturidade. Porém, é um processo de oportunidade e
adequação para efetivar as tarefas que estão por vir, sendo estes, seres humanos
em desenvolvimento ético. Nessa fase precisam de proteção, afeição e de todos
os cuidados especiais, como afeto e atenção, mas sabemos que a realidade não é
bem assim, que nem todas as crianças recebem essa proteção. Muitas famílias não
conseguem dar conta de realizar o papel de formação primária, para que criança
consiga ter uma convivência em sociedade.

Para Freire (2014), é necessário que o educador se liberte para o novo,


que seja um ser crítico em seu aprender – ensinar. Os educadores devem estar
preparados para desafios do futuro, e que demandam um repensar e aprender
constante como novas formas de comportamento. Para Masetto (2012), o educador
que “sabe, sabe ensinar”, não sendo esse um ato de fornecer somente aula, ou
repassar a matéria, pois isso qualquer profissional da educação saberia fazer.

Os educadores ficam aprisionados aos livros didáticos ou pelos currículos


rígidos, que são fechados e predeterminados e acabam esquecendo o fundamental
papel que têm na formação dos educandos. Segundo Cavalcanti e Cohen (2012),
os educadores precisam buscar sempre um feedback de suas ações durante a sua
vida profissional. O educador está diante de muitos desafios, que o fazem um
eterno aprendiz, em que sua formação deve ser continuada e permanente.

O educador como profissional que se preocupa com a formação de seus


educandos, efetiva o ensinar e o aprender destes por meio da afirmação de
valores, do conjunto de saberes, proporcionando autonomia de pensamentos e
saberes (TADÊUS; CUNHA, 2009).

Os autores Rocha e Carrara (2011, p. 1) afirmam que “os professores


constituem importantes modelos e funcionam como ambiente social relevante
para a emissão de comportamentos de seus alunos”.

102
TÓPICO 3 | ÉTICA E POLÍTICA: PARÂMETROS DAS EXIGÊNCIAS DOS DIREITOS HUMANOS

A ética é algo essencial que necessita ser adotado no cotidiano, tanto na


vida profissional, como na vida pessoal. A educação é um espaço fundamental
que oportuniza a formação de uma sociedade crítica, para que os educandos
não absorvam apenas os conteúdos, mas que coloquem em prática por meio
de suas opiniões e valores, contribuindo para uma sociedade mais digna, justa
e, sobretudo, ética. A ética no nosso dia a dia é vista como um desafio, pois ao
mesmo tempo em que as pessoas se referem a ela com determinada frequência,
percebe-se descrença em relação à probabilidade de sua interferência.

O educador deve sempre estar disposto às mudanças, para que novas


ideias possam surgir e consequentemente transformar o espaço de educação
em atividades coletivas, não apenas com foco de competitividade e individuais.
Transformando as atividades participativas, na qual a coletividade imponha o
individual.

Quando consegue compreender as noções e os princípios éticos que


sustentam a ética individual, as pessoas são levadas a refletirem sobre suas ações
e assim suas práticas são engajadas em princípios e moralidade.

O educador, como um agente de transformação, contribui para reforçar


que vale a pena aprender, levando sempre em consideração que a vida tem
mais aspectos positivos que negativos, que nesse processo o ser humano em sua
totalidade está evoluindo e que pode cada vez mais se realizar.

O educador é visto como uma referência e exemplo para seus educandos.


Nesse sentido, é necessário repensar suas ações como agente transformador
da realidade. Faz-se necessário agir com ética interferindo a construção do
conhecimento de seus educandos, tanto na educação formal, como na informal.
As ações educativas devem ser repensadas no sentido de formar cidadãos e não
pessoas competitivas, mas sim colaboradoras, com uma conduta cultural de ética
e cidadania.

O entendimento em que o educador age com ética e moral dignifica que


suas ações a favor de uma adequada ação pessoal e profissional acaba beneficiando
a favor da própria dignidade humana.

Mesmo ciente da carência na formação inicial relativa aos métodos que


são usados, muitas vezes “arcaicos”, que se ensina no processo de educação
escolar, existe aqueles profissionais que conseguem manter-se atualizados com
as novas informações, buscando sempre a renovação de conhecimentos, que com
métodos alternativos e diferenciados conseguem almejar resultados excelentes na
sua própria formação e a de seus educandos.

Faz-se necessário conhecer e respeitar as pessoas, o processo dos grupos,


as diferenças culturais e as formas de organização que são importantes para o
educador que tem vontade de compartilhar, que busca estratégias para sua
atuação, caminhando com mais segurança em busca de seus objetivos.

103
UNIDADE 2 | ÉTICA, EDUCAÇÃO SOCIAL E POLÍTICA: CONCEITOS FUNDAMENTAIS E A GARANTIA DOS DIREITOS HUMANOS

O educador deve sempre acreditar no potencial do processo de


aprendizagem, na condição de estar sempre evoluindo e se integrando em
experiências, e, ao mesmo tempo, compreender e aceitar seus limites. Também
deve defender que a educação contribua para que os indivíduos se reconheçam
e reconhecerem um ao outro, através do respeito de suas diferenças, e busca da
autonomia de seus educandos.

É primordial que os educadores sempre estejam abertos a questionamentos


no que se refere a suas ações, como também na sua ação ética pedagógica, pois a
ética não atua de forma isolada. Ela avança em todos os segmentos da sociedade,
através de atitudes de todos os indivíduos que dela vivenciam.

E
IMPORTANT

“A cabeça da gente é uma só, e as coisas que há e que estão para haver são
demais de muitas, muito maiores diferentes, e a gente tem de necessitar de aumentar a
cabeça, para o total” (João Guimarães Rosa).

Essa afirmação de Guimarães Rosa é chamativa para assumirmos uma


atenção para a necessidade de termos uma atitude crítica diante das diversas
questões que cotidianamente nos incomodam e nos desafiam. Ter um olhar crítico
significa ver a realidade com clareza, profundidade e abrangência das questões
éticas que transcorrem no cotidiano e que resulta em uma plena cidadania.
Buscar e ter uma visão para o total provoca uma atitude humilde e corajosa no
ser humano.

Toda atitude crítica é considerada humilde, pois se reconhece seus limites.


Nossa cabeça é uma só, mas as coisas que reconhecemos são muitas e quem
reconhece o que não sabe, pode ter certeza de que existe muito a ser conhecido,
explorando uma busca no sentido de ampliar o seu saber. Quem busca ampliar
seu saber é um ser corajoso porque sempre tende a enfrentar perigos e ameaças.
Possuir um olhar crítico aponta coisas e possiblidades que podem nos incomodar,
exigindo mudanças que, para quais, nem sempre estamos preparados.

Como educadores, devemos estar dispostos a refletir e pensar


criticamente sobre os problemas, questões e limites com que nos deparamos em
nossas ações cotidianas. Muitas questões que devemos e necessitamos superar
nos incomodam, porque nos vemos sem probabilidade de superar de imediato.
Acabam constituindo um desafio que nos levam a perguntar: o que devemos
fazer? Nos remetendo a uma reflexão que vem de encontro com a ética. A palavra
ética vem da etimologia ethos, que significa costume, caráter, marca. “O ethos é a
casa do homem”, afirma Vaz (1988, p. 12).

104
TÓPICO 3 | ÉTICA E POLÍTICA: PARÂMETROS DAS EXIGÊNCIAS DOS DIREITOS HUMANOS

É superando as condições da natureza, rompendo com a necessidade


estabelecida na physis, que os homens, interagindo, instauram o mundo da cultura,
fruto de sua liberdade. Assim, se estabelece o ethos, “jeito de ser”, consequência
do trabalho próximo dos homens, instituidor de definições diversas para as ações
e relações no interior de cada sociedade.

É no campo do ethos que vamos deparar o que titulamos de moral. Refere-


se a um conjunto de princípios, crenças, preceitos e normas que orientam o viver
das pessoas em sociedade. A moral possui um caráter normativo. É ela que nos
conduz e orienta o que devemos fazer no nosso dia a dia.

O trabalho das instituições sociais é conduzir, de forma que se mantém


e transformam a cultura, os valores sustentadores da conduta ética de cada
sociedade. Ao estar, agir e ser em sociedade, as pessoas replicam a apontadas
solicitações, que lhes são proporcionadas sob a formato de deveres.

Quando dizemos sim ao dever, estamos de certa forma obedecendo, e,


quando dizemos não, desobedecemos. Pode-se, dessa forma, afirmar que a
responsabilidade, nesse sentido, se torna o núcleo da moralidade. Nos tornamos
responsáveis pela atitude e ações que resolvemos tomar e agir. Dessa forma,
replicamos para as outras e com as outras pessoas de nossa sociedade a nossa
conduta moral. Com isso, afirma-se que a moral tem um efeito político.

Sempre assumimos decisões e posições mediante uma conjuntura


organizada, de certa forma determinando um posicionamento, chamamos essa
conduta de tomar partido. Esse ato político, tomar partido, é muito diferente de
pertencer a um partido. Para Heller (1982, p. 55), “tomar partido significa não
ficar indiferente em face das alternativas sociais, participar e produzir em relação
com toda a vida civil e social”.

Num gesto político, sempre existe a afirmação de uma vontade, que sugere
uma determinada responsabilidade. Com isso, somos responsáveis e acabamos
respondendo e nos comprometemos com nossas escolhas. O comprometimento
é um ato que se torna próprio da essência das pessoas. Só elas podem prometer,
comprometer e entender.

A política envolve todas as experiências de maneira privada, no interesse


pessoal de cada indivíduo ou dos grupos de que fazem parte, e também no domínio
de participação na esfera pública. No ambiente da vida pública, afirma Arendt
(1993, p. 102): os seres humanos “atingem sua plena realidade como homens,
porque não apenas são (como na privacidade da casa); também aparecem”.

Assim, mesmo quando estamos sozinhos, possuímos como alusão a nossa


inclusão com as outras pessoas e desenvolvemos ações em conjunto. Agindo de
forma moral, mas nem sempre alcançamos uma reflexão ética. Quando agimos
moralmente nem sempre conseguimos constatar integração dos valores e o real
fundamento ético das ações. A sociedade contemporânea é carente dessas ações.
O que precisamos fazer então?
105
UNIDADE 2 | ÉTICA, EDUCAÇÃO SOCIAL E POLÍTICA: CONCEITOS FUNDAMENTAIS E A GARANTIA DOS DIREITOS HUMANOS

A resposta nos é oferecida nos códigos, sendo estes formalizados,


legalizados ou não, em que se localizam as regras, normas e leis.

NOTA

A ética, meditação crítica sobre a ação mora, é chamada de “ciência do ethos”.

Quando estamos no campo da ética, nosso foco deve ser o de investigar,


questionar pelo sentido dos valores, e não defini-los, como na moral. Com isso,
percebemos que a ética não determina o que devemos fazer, ela se questiona pelo
fundamento do dever. Nesse sentido, cabe realizar a pergunta: como queremos
viver? (COMTE-SPONVILLE; FERRY, 1999).

A resposta a essa pergunta remete o que se considera uma boa vida, por
meio do espaço de afirmação dos direitos garantidos e na construção do bem
comum da sociedade. Devemos ter cuidado ao fazer referência ao bem comum,
porque essa expressão está distinta e marcada ideologicamente. Muitos conceitos
são usados indevidamente por diferentes concepções e ideologias presentes na
sociedade contemporânea.

Nas ideias liberal, ou neoliberal, deparamos a referência ao bem comum


e à cidadania. O que é o bem comum numa sociedade que é permeada pela
desigualdade, na qual a elite dominante interfere as políticas por meio de suas
concepções. Será que a dominação de bem comum equivale àquilo que a sociedade
necessita?

Referir-se às necessidades, muitas vezes, se resume apenas nas imediatas


e básicas. O que é chamado de bem comum, muitas vezes vai de encontro a
instâncias particulares. Se através de um olhar crítico voltamos às necessidades
concretas dos diferentes grupos sociais, podemos chamar de globalizado.

O escritor Mia Couto, no belíssimo texto intitulado Por um mundo


escutador, nos faz um desafio. Afirma ele: “não existe alternativa: a globalização
começou com o primeiro homem. O primeiro homem (se é que alguma vez
existiu ‘um primeiro homem’) era já a humanidade inteira” (COUTO, 2005, p.
155). Nessa afirmação, o autor apresenta um alerta: num ser humano se encontra
a humanidade. Com isso, rompemos com o pensamento de uma humanidade
abstrata, fora do contexto social.

Como seres humanos, temos nossas relações sociais, nossa essência


humana é assegurada na relação da convivência e na confiança. Justifica-se
pensar quais as formas dessa convivência, quais são os valores que a amparam e

106
TÓPICO 3 | ÉTICA E POLÍTICA: PARÂMETROS DAS EXIGÊNCIAS DOS DIREITOS HUMANOS

nos princípios que a norteiam. Se a sociedade é reconhecida através das ações do


ser humano, o maior desafio imposto é que o ser humano seja constituído com
princípios éticos, de justiça, respeito e solidariedade.

O objetivo da ética é a solidificação da dignidade humana, através da


afirmação dos direitos de cada ser humano, por meio da sua participação na
construção de uma história em que identidade e alteridade, diferença e igualdade
se constituam e se garantam a cada instante.

Podemos afirmar que a ética é o verdadeiro significado de cidadania, e


que não é uma questão geográfica, como se pretende determinar muitas vezes.
Como exemplo: nascer em um determinado país não significa ser cidadão dele. A
cidadania passa a se caracterizar através do acesso aos bens aí produzidos, pela
possibilidade livre de participar da forma que, diariamente, se dá a esse país,
pelas maneiras que se têm de reconhecimento do direito de dizer sua voz e ser
ouvido pelos outros cidadãos. Com isso só se tem condições de se concretizar em
um espaço de democracia. Para Maturana (1988, p. 75-76):

[...] a democracia é uma obra de arte político-cotidiana que exige atuar


no saber que ninguém é dono da verdade, e que o outro é tão legítimo
como qualquer um. Além disso, tal obra exige a reflexão e a aceitação
do outro e, sobretudo, a audácia de aceitar que as diferentes ideologias
políticas devem operar como diferentes modos de ver os espaços de
convivência.

Nessa chamada democracia autêntica, institui-se o espaço para que se


levantem conjuntamente as regras e se estabeleçam novos horizontes e caminhos.
A relação que existe entre cidadania e democracia especifica-se no fato de que
ambas são processos em construção. O comprometimento coletivo necessita se
dar na direção de uma nova democratização, assim como de uma constituição
contínua da cidadania.

A cidadania é considerada uma consciência de atribuição a uma


determinada comunidade. Estende-se a todos os indivíduos na sociedade, sem
discriminação de raça, gênero, credo religioso etc. É o direito de todos a uma vida
com qualidade digna, uma boa vida, como se objetiva a ética. Esse é um desafio
porque não estão sendo oferecidas todas as categorias para a construção da vida
melhor. O ser humano precisa descobrir algumas delas e criar outras.

O que se promove é uma expectativa utópica, que, por um lado, tem


informação clara das propriedades do presente, dos limites que nos bloqueiam.
E, ao mesmo tempo, de novas possibilidades e alternativas que construímos para
superar os problemas.

Para Santos (1996, p. 75), “a utopia é a exploração de novas possibilidades


e vontades humanas, por via da oposição da imaginação à necessidade do que
existe, só porque existe, em nome de algo radicalmente melhor que a humanidade
tem direito de desejar e por que merece a pena lutar”. Esse ambiente da utopia
é cheio de incerteza, mas também de esperança. O termo utópico não significa
107
UNIDADE 2 | ÉTICA, EDUCAÇÃO SOCIAL E POLÍTICA: CONCEITOS FUNDAMENTAIS E A GARANTIA DOS DIREITOS HUMANOS

aquilo que a sua essência é impossível, mas sim, é o que ainda não permanece
ao rumo do que temos que nos mobilizar. Segundo Galeano (1999, p. 328): “em
língua castelhana, quando queremos dizer que ainda temos esperança, dizemos:
abrigamos a esperança. Bela expressão, belo desafio: abrigá-la, para que não
morra de frio nas implacáveis intempéries dos tempos que correm”.

Nessa sociedade complexa e desafiadora em que vivemos, essa é uma lição


que temos que estar em constante aprendizado. Como educadores, não devemos
ficar à espera, temos que utilizar constantemente o verbo esperançar.

Cidadania é dever de povo.


Só é cidadão
quem conquista o seu lugar
na perseverante luta
do sonho de uma nação.
É também obrigação:
a de ajudar a construir
a claridão na consciência
de quem merece o poder.
Força gloriosa que faz
um homem ser para outro homem
caminho do mesmo chão,
luz solidária e canção.
(Thiago de Mello)

DICAS

Acadêmico, indicamos a seguinte leitura:

FIGURA – O QUE É ÉTICA

FONTE: <https://image.slidesharecdn.com/lvarol-m-valls-oquetica-110710194427-
phpapp01/95/lvaro-lm-valls-o-que-tica-1-728.jpg?cb=1310327101>. Acesso em: 5 dez. 2019.

108
TÓPICO 3 | ÉTICA E POLÍTICA: PARÂMETROS DAS EXIGÊNCIAS DOS DIREITOS HUMANOS

Não existe povo ou lugar que não tenha noções de bem e mal, de certo e errado. Da
Grécia Antiga aos nossos dias, a ética é um conceito que sempre esteve presente em todas
as sociedades. Mas apesar disso, as dúvidas são muitas. Seria a ética apenas um conjunto
de convenções sociais? Teria ela um princípio supremo que atravessa toda a história da
humanidade? E numa sociedade capitalista, qual a relação entre ética e lucro?

FONTE: VALLS, A. L. M. O que é ética. São Paulo: Brasiliense, 2005.

109
UNIDADE 2 | ÉTICA, EDUCAÇÃO SOCIAL E POLÍTICA: CONCEITOS FUNDAMENTAIS E A GARANTIA DOS DIREITOS HUMANOS

LEITURA COMPLEMENTAR

ÉTICA, EDUCAÇÃO E CIDADANIA

Brígida Vergilio Nascimento Andrade

Ética e cidadania são palavras que chegam ao português através de duas


línguas clássicas, o latim e o grego.

Ética é o nome dado ao ramo da filosofia dedicado aos assuntos morais.


A palavra ética é derivada do grego, e significa aquilo que pertence ao caráter. A
palavra “ética” vem do Grego “ethos” que significa “modo de ser” ou “caráter”.

Cidadania significa o conjunto de direitos e deveres pelo qual o cidadão,


o indivíduo estão sujeitos no seu relacionamento com a sociedade em que vive. O
termo cidadania vem do latim, civitas, que quer dizer “cidade”.

Ética e cidadania são dois conceitos fulcrais na sociedade humana. A ética


e cidadania estão relacionados com as atitudes dos indivíduos e a forma como
estes, interagem uns com os outros na sociedade.

Assim, o significado de Ética e Cidadania gira em torno do agir bem


enquanto cidadão e enquanto pessoa.

A Educação engloba os processos de ensinar e aprender. É um fenômeno


observado em qualquer ensinar e aprender. É um fenômeno observado em
qualquer sociedade e nos grupos constitutivos dessas, responsável pela sua
manutenção, perpetuação, transformação e evolução da sociedade a partir da
instrução ou condução de conhecimentos, disciplinamentos (educar a ação),
doutrinação, às gerações que se seguem, dos modos culturais de ser, estar e agir
necessários à convivência e ao ajustamento de um membro no seu grupo ou
sociedade.

ÉTICA, EDUCAÇÃO E CIDADANIA

Ética e cidadania são conceitos que devem estar na base de qualquer espécie
de sociedade humana. Eles têm a ver com as atitudes tomadas pelos indivíduos e
como eles interagem em sociedade, ou seja, como se tratam e convivem.

Ética é o nome escolhido para um ramo da filosofia que se dedica a estudar


conteúdos morais, ou seja, aquilo que é referente à retidão do caráter humano, o
que é certo.

Na filosofia, o campo que se ocupa da reflexão sobre a moralidade humana


recebe a denominação de ética. Esses dois termos, ética e moral, têm significados
próximos e, em geral, referem-se ao conjunto de princípios ou padrões de conduta
que regulam as relações dos seres humanos com o mundo em que vivem.
110
TÓPICO 3 | ÉTICA E POLÍTICA: PARÂMETROS DAS EXIGÊNCIAS DOS DIREITOS HUMANOS

Uma educação ancorada em tais princípios, deve converter-se em um


âmbito de reflexão individual e coletiva que permita elaborar racionalmente e
autonomamente princípios gerais de valor, princípios que ajudem a defrontar-se
criticamente com realidades como a violência, a tortura ou a guerra.

De acordo com a Unesco, a educação também é exercida para além do


ambiente formal das escolas e adentra em outras perspectivas caracterizadas
como: educação não formal e educação informal sendo compreendido por
educação não formal todo processo de ensino e aprendizagem ocorrido a partir
de uma intencionalidade educativa mas sem a obtenção de graus ou títulos,
sendo comum em organizações sociais com vistas a participação democrática.
E educação informal como aquela ocorrida nos processos cotidianos sociais, tais
quais com a família, no trabalho, nos círculos sociais e afetivos.

Ainda na linha de compreensão do papel da educação para a formação


ética dos seres humanos, a educação do cidadão e da cidadã deve levar em conta a
dimensão comunitária das pessoas, seu projeto pessoal e também sua capacidade
de universalização, que deve se construir valores na Escola e na sociedade
dialogicamente, pois, dessa maneira, elas poderão ajudar na construção do melhor
mundo possível, demonstrando saber que são responsáveis pela realidade social.

De forma específica, a educação ética e moral deve ajudar na análise


crítica da realidade cotidiana e das normas sócio morais vigentes, de modo que
contribua para idealizar formas mais justas e adequadas de convivência.

Cidadania, assim como sua origem latina, diz respeito ao cidadão, aos
direitos e deveres aos quais está sujeito em uma vida em sociedade. Assim como
ética, cidadania também tem a ver com agir de maneira correta.

Cidadania também tem a ver com nacionalidade, pois cada país possui
diferentes direitos e deveres do cidadão. É possível ter cidadania dupla, o que
quer dizer ter a cidadania do país onde nasceu e de algum outro, no qual more ou
de onde tenha tido família imigrante. Basta um processo judiciário.

No Brasil, os direitos e os deveres dos cidadãos são expressos na


Constituição Federal e deve buscar sempre fazer cumprir o texto constitucional,
para que as pessoas possam ter uma vida digna.

Um dos pressupostos da cidadania é a nacionalidade, pois desta forma


ele pode cumprir os seus direitos políticos. No Brasil os direitos políticos são
orquestrados pela Constituição Federal. O conceito de cidadania tem se tornado
mais amplo com o passar do tempo, porque está sempre em construção, já que
cada vez mais a cidadania diz respeito a um conjunto de parâmetros sociais.

A cidadania pode ser dividida em duas categorias: cidadania formal e


substantiva. A cidadania formal é referente à nacionalidade de um indivíduo e
ao fato de pertencer a uma determinada nação. A cidadania substantiva é de um
caráter mais amplo, estando relacionada com direitos sociais, políticos e civis.
111
UNIDADE 2 | ÉTICA, EDUCAÇÃO SOCIAL E POLÍTICA: CONCEITOS FUNDAMENTAIS E A GARANTIA DOS DIREITOS HUMANOS

De forma específica, lidar com a dimensão comunitária, dialogar com a


realidade cotidiana e as normas sócio morais vigentes nos remete ao trabalho com a
diversidade humana, à abordagem e ao desenvolvimento de ações que enfrentem
as exclusões, os preconceitos e as discriminações advindos das distintas formas
de deficiência, e pelas diferenças sociais, econômicas, psíquicas, físicas, culturais,
religiosas, raciais, ideológicas e de gênero. Conceber esse trabalho na própria
comunidade onde está localizada a escola, no bairro e no ambiente natural, social
e cultural de seu entorno, é essencial para a construção da cidadania.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A construção de sociedades e escolas inclusivas, abertas às diferenças e


à igualdade de oportunidades para todas as pessoas, é um objetivo prioritário
da educação atualmente. Nesse sentido, o trabalho com as diversas formas de
deficiências e uma ampla discussão sobre as exclusões geradas pelas diferenças
social, econômica, psíquica, física, cultural, racial, de gênero e ideológica, devem
ser foco de ação das escolas.

Devendo buscar estratégias para melhorar a condição de vida da


população, na igualdade de oportunidades para todos os seres humanos e na
construção de valores éticos socialmente desejáveis por parte dos membros das
comunidades escolares é uma maneira de enfrentar essas exclusões e um bom
caminho para um trabalho que visa à democracia e à cidadania.

Construindo valores na escola e na sociedade cujo objetivo é contribuir


para que educadores comprometidos possam trabalhar na escola e na sociedade
a ética, a convivência democrática, os direitos humanos, a inclusão social e as
relações entre escola e comunidade, dando condições de vida para a população,
na igualdade de oportunidades para todos os seres humanos e na construção de
valores éticos socialmente desejáveis por parte dos membros para todos os seres
humanos e na construção de valores éticos socialmente desejáveis por parte dos
membros das comunidades escolares é uma maneira de enfrentar essa situação e
um bom caminho para um trabalho que visa à democracia e à cidadania.

FONTE: <https://www.webartigos.com/artigos/etica-educacao-e-cidadania/146421>. Acesso em:


25 ago. 2019.

112
RESUMO DO TÓPICO 3
Neste tópico, você aprendeu que:

• Por meio da reflexão histórica, entende-se o modo de evolução da ética e da


educação, uma vez que o processo educacional em sua totalidade é visto como
uma necessidade à formação da cidadania.

• As figuras paternas e maternas são essenciais para uma boa formação do


caráter do indivíduo, o educador e professor também são fundamentais nesse
processo.

• O educador tem um papel importante na vida das pessoas, pois ele tem o poder
de lapidar as ações de seus educandos.

• A história educacional brasileira, mesmo nos contextos de fechamento político,


em que o Estado se dissociava da sociedade civil, gera dificuldades concretas
no exercício da cidadania.

• As diferentes compreensões de educação sempre estão presentes no


planejamento e educacional e curricular.

• Uma educação voltada à cidadania não precisa estar moldada somente no meio
escolar, deve ultrapassar limites, através de diferentes práticas profissionais,
como exemplo podemos citar o educador social, na sua ação prática.

• Todas as pessoas possuem direitos e deveres no meio em que vivem, a diferença


que se faz entre ética e moral tem como foco a intenção de salientar o caráter
crítico da reflexão, o que comporta um determinado distanciamento da ação,
para análise e reforma constantes, quando necessário.

• Por ser considerada uma ação reflexiva, a ética possui um caráter teórico.

• A prática cotidiana transita continuamente no território da moral, seu percurso


é iluminado pelo recurso à ética.

• A ética, como a moral, vem sendo cada dia mais objeto de discussão nos meios
acadêmicos e nos diversos ramos da ciência e da filosofia.

• A moral é considerada um conjunto de normas e condutas que estão adequadas


ao comportamento humano em meio à sociedade.

113
• O ser humano, por sua essência, é um ser moral, um indivíduo que avalia
sua ação a partir de valores para instituir regras e princípios legitimando ou
determinando cada indivíduo como único, ou de uma comunidade específica.

• É comum ainda nos dias de hoje a sociedade estabelecer e criticar esses


métodos antigos de avaliação. Porém, não criam instrumentos e técnicas novas
para estimular o conhecimento e ter resultados positivos sobre o processo
de aprendizagem, de forma que possa intervir na vida de todos os cidadãos,
cogitando uma desenvoltura e responsabilidade no contexto sociocultural em
que está inserida.

• Os educadores ficam aprisionados aos livros didáticos ou pelos currículos


rígidos, que são fechados e predeterminados, e acabam esquecendo o
fundamental papel que têm na formação dos educandos.

• A ética é algo essencial que necessita ser adotado no cotidiano, tanto na vida
profissional, como na vida pessoal.

• A ética no nosso dia a dia é vista como um desafio, pois ao mesmo tempo
em que as pessoas se referem a ela com determinada frequência, percebe-se
descrença em relação à probabilidade de sua interferência.

• O educador, como um agente de transformação, contribui para reforçar que


vale a pena aprender, levando sempre em consideração que a vida tem mais
aspectos positivos que negativos, que, nesse processo, o ser humano em sua
totalidade está evoluindo, e que pode cada vez mais se realizar.

• O educador deve sempre acreditar no potencial do processo de aprendizagem,


na condição de sempre estar evoluindo e de integrar sempre novas experiências,
e, ao mesmo tempo, compreender e aceitar seus limites.

• Ter um olhar crítico significa ver a realidade com clareza, profundidade e


abrangência das questões éticas que transcorrem no nosso dia e que resulta em
uma plena cidadania.

• O comprometimento é um ato que se torna próprio da essência das pessoas. Só


elas podem prometer, comprometer e entender.

• Quando estamos no campo da ética, nosso foco deve ser o de investigar,


questionar pelo sentido dos valores, e não defini-los, como na moral.

• Como seres humanos, temos nossas relações sociais, nossa essência humana
é assegurada na relação, na convivência e na confiança. Justifica-se pensar
quais as formas dessa convivência, quais são os valores que a amparam e nos
princípios que a norteiam.

114
• A cidadania passa a se caracterizar através do acesso aos bens aí produzidos,
pela possibilidade livre de participar da forma que diariamente acontece nesse
país, pelas maneiras que se têm de reconhecimento do direito de dizer sua voz
e ser ouvido pelos outros cidadãos.

CHAMADA

Ficou alguma dúvida? Construímos uma trilha de aprendizagem


pensando em facilitar sua compreensão. Acesse o QR Code, que levará ao
AVA, e veja as novidades que preparamos para seu estudo.

115
AUTOATIVIDADE

1 O sujeito ético-moral é somente aquele que preenche os seguintes requisitos:

a) ( ) ser consciente de si, mas não precisa reconhecer a existência dos outros
como sujeitos éticos iguais a si.
b) ( ) saber o que faz, conhecer as causas e os fins de sua ação, o significado de
suas intenções e de suas atitudes e a essência dos valores morais.
c) ( ) não precisa controlar interiormente seus impulsos, suas inclinações e
suas paixões, deixando-as fluir livremente.
d) ( ) dizer o que as coisas são, como são e por que são. Enunciar, pois, juízos
de fato.
e) ( ) ser responsável, mas não precisa reconhecer-se como autor da sua
própria ação nem avaliar os efeitos e as consequências dela sobre si e
sobre os outros

FONTE: <https://descomplica.com.br/blog/filosofia/questoes-comentadas-moral-e-etica/>.
Acesso em: 25 ago. 2019.

2 (ENEM, 2011)  O brasileiro tem noção clara dos comportamentos éticos e


morais adequados, mas vive sob o espectro da corrupção, revela pesquisa.
Se o país fosse resultado dos padrões morais que as pessoas dizem aprovar,
pareceria mais com a Escandinávia do que com Bruzundanga (corrompida
nação fictícia de Lima Barreto). O distanciamento entre “reconhecer” e
“cumprir” efetivamente o que é moral constitui uma ambiguidade inerente
ao humano, porque as normas morais são:

a) ( ) decorrentes da vontade divina e, por esse motivo, utópicas.


b) ( ) parâmetros idealizados, cujo cumprimento é destituído de obrigação.
c) ( ) amplas e vão além da capacidade de o indivíduo conseguir cumpri-las
integralmente.
d) ( ) criadas pelo homem, que concede a si mesmo a lei à qual deve se
submeter.
e) ( ) cumpridas por aqueles que se dedicam inteiramente a observar as
normas jurídicas.

FONTE: <https://descomplica.com.br/blog/filosofia/questoes-comentadas-moral-e-etica/>.
Acesso em: 25 ago. 2019.

116
UNIDADE 3

CONCEITOS, TEORIAS E
TIPOLOGIAS DE VIOLÊNCIA,
VIOLÊNCIA URBANA E SEUS
REFLEXOS NA SOCIEDADE
ATUAL
OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
A partir do estudo desta unidade, você deverá ser capaz de:

• compreender os conceitos do termo violência;

• analisar quais as formas de violência que ocorrem em nossa sociedade;

• discutir sobre o cenário da violência urbana;

• conhecer a relação existente entre violência e exclusão social.

PLANO DE ESTUDOS
Esta unidade está dividida em três tópicos. No decorrer da unidade você
encontrará autoatividades com o objetivo de reforçar o conteúdo apresentado.

TÓPICO 1 – CONCEITOS E FORMAS DE VIOLÊNCIA

TÓPICO 2 – O CENÁRIO DA VIOLÊNCIA URBANA

TÓPICO 3 – VIOLÊNCIA E A EXCLUSÃO SOCIAL

CHAMADA

Preparado para ampliar seus conhecimentos? Respire e vamos


em frente! Procure um ambiente que facilite a concentração, assim absorverá
melhor as informações.

117
118
UNIDADE 3
TÓPICO 1

CONCEITOS E FORMAS DE VIOLÊNCIA

1 INTRODUÇÃO
Acadêmico, neste Tópico 1, o principal objetivo é oferecer a você uma
visão geral do conceito de violência e de sua contextualização na realidade da
sociedade do nosso país. Este tópico apresentará e descreverá várias questões
da violência. Para compreender e enfrentar as diferentes formas de violência,
devemos relacionar a sua discussão no contexto e no conjunto dos problemas dos
diversos problemas sociais, quais condições, quais situações e o estilo de vida das
pessoas envolvidas.

Algumas definições que existem sobre a termologia da violência divergem


entre si. Por ser elemento complexo e multicausal que, de certa forma, atinge
quase todas as pessoas afetando emocionalmente a violência, escapa a qualquer
conceito preciso e cabal. Nesse sentido, é relevante distinguir os conceitos de
violência e de agressividade. Muitas definições são contraditórias, podemos
afirmar, de acordo com Freud (1980), que a agressividade é um impulso nato,
essencial à sobrevivência, à adaptação e à defesa dos seres humanos. Constitui-se
como um elemento protetor que permite a construção do espaço interior de cada
indivíduo, em que acontece uma diferenciação em o “Eu” e o “Outro”. Assim,
precisamos saber que a agressividade, ao contrário da violência, insere-se no
processo de constituição da subjetividade de cada ser.

Nos modelos de sociedade existentes não conhecemos nenhuma que esteja


isenta de violência. Esse ato consiste no uso da força, do poder e do privilégio
para reprimir, submeter e provocar danos aos outros, podendo ser indivíduos,
grupos e/ou coletivos. Existem sociedades que são mais violentas que as outras, o
que demonstra é o peso da cultura na maneira de solucionar os conflitos.

2 CONCEITOS, TEORIAS E TIPOLOGIAS DE VIOLÊNCIA


O conceito do termo “violência” é duvidoso, complexo e provoca vários
elementos e posições teóricas, implicando dissolução ou cancelamento em
diversos elementos e outros conceitos teóricos. As formas de violência são muitas,
sendo difícil de elencá-las de forma satisfatória. Os diferentes profissionais, em
destaque os que trabalham com a mídia, manifestam-se a respeito dela e oferecem
119
UNIDADE 3 | CONCEITOS, TEORIAS E TIPOLOGIAS DE VIOLÊNCIA, VIOLÊNCIA URBANA E SEUS REFLEXOS NA SOCIEDADE ATUAL

escolhas de solução, mas a violência surge na sociedade sempre de forma nova e


não se consegue evitá-la por completo.

FIGURA 1 – TIPOS DE VIOLÊNCIA

FONTE: <https://st2.depositphotos.com/1610517/10130/i/950/depositphotos_101301644-stock-
photo-violence-cup-word-cloud.jpg>. Acesso em: 30 ago. 2019.

Nesse panorama, cabe à filosofia, em especial a ética, realizar reflexões


sobre suas origens, sua natureza e quais são as consequências morais e materiais
no contexto social. A violência pode ser considerada natural ou artificial. Sendo:

• Violência natural: ninguém está livre dela, ela é própria de todos os seres
humanos.
• Violência artificial: é um excesso de força de uns sobre os outros.

O termo “violência” tem sua origem do latim, violentia, que propaga o


ato de violar. O termo em si indica algo fora do estado natural, que está ligado
à força, à ousadia, em um comportamento definido que lança danos físicos,
como: ferimentos, tortura, morte ou danos psíquicos, que acabam produzindo
humilhações, ameaças e ofensas ao outro.

De maneira mais filosófica, a prática da violência propaga atos contraditórios


à liberdade e à vontade de outra pessoa, residindo numa dimensão ética e moral.
As características do conceito de violência, de modo geral, variam no tempo e no
espaço, dependendo dos padrões culturais de cada grupo ou época e acabam sendo
explicadas pelas dificuldades semânticas do conceito do termo violência.

E
IMPORTANT

Para exemplificar como o termo violência varia no tempo e no espaço, temos


a realidade social e história do casamento, na qual a mulher que, muitas vezes, em certa
sociedade, é submetida a imposições em que outra sociedade é considerada inadequada.

120
TÓPICO 1 | CONCEITOS E FORMAS DE VIOLÊNCIA

Outro exemplo importante para citar é a pena de morte, seja ela legal ou
ilegal, mas que sempre implica um sentido ético-moral para quem quer analisar
sua existência de maneira radicalizada. Muitos outros exemplos distinguem as
relações existentes entre a violência, a ordem social e a ordem legal, ou com a
consciência moral de cada pessoa.

As ciências divergem nas diversas teorias e definições do termo violência,


cada uma utiliza-se do objeto ou do método de investigação. Com isso, a violência
pode ser amplamente descrita, analisada e interpretada pelas áreas da sociologia,
antropologia, biologia, psicologia, serviço social, teologia, psicanálise, filosofia,
direito e pela educação.

Os profissionais têm uma gama de possibilidades para essas áreas de


conhecimento e de outras, referem-se à violência definindo como um ou mais
aspectos, mas não consideram esse fenômeno em sua totalidade. Com isso,
no campo filosófico, mesmo sendo poucos filósofos a estudarem o assunto,
cabe a tarefa de problematizar esse conceito, reformulando perguntas sobre o
tema violência perante uma visão mais ampla que envolve todos os aspectos
metafísicos, epistemológicos e éticos que cercam o indivíduo.

No que se refere às relações existentes entre a moral, a ética e a violência,


conseguem observar diferentes posições. Há os que se opõem à ética e à violência,
distinguindo os dois campos. Existem outros que apresentam a violência como
sendo uma dimensão completamente ética, garantindo que a violência provoca a
intenção de praticar qualquer ato violento.

Faz-se necessário levar em consideração que o termo violência está em


evidência cotidianamente. Através da mídia, nas ruas e, atualmente, pela internet.
No senso comum é visto de maneira simplificada e parcial, sendo necessário
examinar quais são as condições de uso. Dependendo da linguagem utilizada
para se referenciar, pode estar revestido por diferentes pressupostos ideológicos,
podendo perder o sentido global.

Quando se questiona sob a ponto de vista ético é possível


observar a diferenciação entre a violência possível e a necessária, mediante os
comportamentos que são aceitos ou não pela sociedade. Também é possível
relacionar a violência legal e que provoca o mal, ou seja, a humilhação, entre a
violência natural, que é aquela que impõe dor, percebe-se que ela acaba sendo
gerada pelo desacordo de duas partes – que iniciam o conflito e pode ser mais ou
menos intenso – o sofrimento. A classificação anterior tem o objetivo de esclarecer
o conceito de violência.

É necessário observar que a violência está tão equilibrada em nosso


cotidiano e é pouco estudada pelos filósofos ou analisada indiretamente em
alguns textos de filósofos mais conceituados, mas esse fenômeno vem recebendo
maior atenção por sua crescente vinculação nos meios de comunicação.

121
UNIDADE 3 | CONCEITOS, TEORIAS E TIPOLOGIAS DE VIOLÊNCIA, VIOLÊNCIA URBANA E SEUS REFLEXOS NA SOCIEDADE ATUAL

Para Paviani (2016), com exceção de Foucault, Hanna Arendt, Eric Weil,
Zizek, Aganbem e, no Brasil, além de Marcelo Perine e Marilena Chaui, são poucos
os que se dedicaram a analisar a violência como um fenômeno. Paviani (2016)
afirma que na história da filosofia encontra-se teorias implícitas da violência,
pois podemos classificar que, desde Platão até Marx, passando por Aristóteles,
Hobbes, Locke, Rousseau, Kant, Nietzsche, Russel e outros, são defensores de
uma violência subjetiva invisível.

Diante das situações do nosso cotidiano é possível analisar as circunstâncias


familiares que não dão origem à violência e apontar alguns acontecimentos ou
reações por falta de apoio. Nesse sentido, qualquer tumulto, confronto social ou
conflito não resolvido pode originar atos de violência.

Mediante uma perspectiva ética e de como se produz o conhecimento


sobre esse fato é possível investigar as determinadas condições que levam às
pessoas a reagirem de forma violenta. Como isso, verifica-se também o quanto
tudo depende ou não dos aspectos biológicos ou do grau civilizatório de cada
indivíduo que está envolvido, em especial, da própria vontade e da liberdade dos
seres humanos.

Zizek (2010) afirma que há uma violência objetiva, consequência do


sistema capitalista, mas que a violência subjetiva e simbólica (Pierre Bourdieu) é
mais significativa e pressupõe distinguir a questão da violência como resultado
da sociabilidade humana, ou melhor, das relações conflitantes de classe. Esse
autor ainda faz uma crítica ao conceito de tolerância, considerado por alguns
autores como uma das virtudes éticas da contemporaneidade. Para ele, é uma
forma de violência, de elogio à violência invisível.

Conseguimos encontrar as origens da violência, no sentido filosófico, nos


mitos e na cultura de um determinado povo. Se analisarmos o Brasil, um modelo
de exemplo é referenciado como processo de democracia racial e na imagem,
mal explicada, da consideração sobre a cordialidade do brasileiro, considerando
a história da não violência no país. Nesse processo, esconde uma modalidade de
violência exibida como uma hipótese positiva de convívio social, quando, no real,
acontece a origem e formas reais de violência.

Além da dificuldade de conceituar a termologia violência, também existe


o problema sobre as formas da natureza em relação à violência. A classificação
das formas sobre a natureza da violência permeia os critérios escolhidos, das
ênfases da realidade empírica, das formas de combater a violência e de outras
modalidades.

O conceito de violência é um dos mais amplos que existe, com isso torna-
se difícil abranger todas as formas. Mesmo assim, os tipos de violência podem
ser úteis para considerar suas modalidades. Diante das formas de violência que
existem, destaca-se:

122
TÓPICO 1 | CONCEITOS E FORMAS DE VIOLÊNCIA

• A violência provocada e a gratuita.


• A real e a simbólica.
• A sistemática e não a sistemática.
• A objetiva e a subjetiva.
• A legitimada e a ilegitimada.
• A permanente e a transitória.

Essa descrição sobre as formas de violência, de certa forma, é problemática,


tem-se uma relação com o objetivo didático, possibilitando uma melhor visão
desse fenômeno. Temos, assim, algumas formas: guerra, revolução, terrorismo,
genocídio, assassinato, crime organizado, violência urbana, violência contra a
criança, contra o adolescente, contra a mulher, contra o idoso, estupro, assédio
sexual, bullying, vandalismo, entre outras. Podemos acrescentar também a
corrupção como uma forma de violência e seus resultados, como: nepotismo,
propina, extorsão, tráfico de influência e outras.

As diferentes teorias estudadas sobre a violência fazem-se necessárias


para descrever, avaliar e explicar esse fenômeno. Essas teorias podem ser
consideradas científicas, filosóficas ou mistas. As teorias que são consideradas
científicas são muitas, mesmo concentradas em uma única área de conhecimento,
e, como consequência, surgem outras teorias, sendo:

• Teorias sociológicas.
• Psicológicas.
• Psicanalíticas.
• Biológicas.
• Jurídicas.
• Feministas.

“É  possível  falar, numa  teoria biológica, a  violência  que


teria como  âmbito  a  agressão  como  resultado  do instinto
e superação dos conflitos na luta pela sobrevivência” (PAVIANI, 2016, p. 11).

De acordo com Cesare Lombroso (1836-1909), a herança biológica explica


o comportamento agressivo dos seres humanos. Existem autores que defendem os
cromossomos como definitivos da agressividade, sendo essas teorias muito criticadas
por alguns autores como Erich Fromm e Hannah Arendt (PAVIANI, 2016).

Existem as teorias psicofísicas que garantem substâncias químicas ou


elementos psicológicos como as drogas, as punições, o ódio e o estresse, que são
a origem da violência. Nessas áreas, muitas das teorias específicas conseguem
descrever e analisar quais são as origens e as situações de violência existentes em
um determinado momento.

Segundo Freud (1980), a violência é própria ao ser humano, torna-


se necessária na medida em que o instinto de agressividade, de morte está
estabilizado com o instinto de garantir a vida (eros), para garantir a preservação
do indivíduo e de sua espécie.
123
UNIDADE 3 | CONCEITOS, TEORIAS E TIPOLOGIAS DE VIOLÊNCIA, VIOLÊNCIA URBANA E SEUS REFLEXOS NA SOCIEDADE ATUAL

Em seu texto, Arendt (1985) traz a importância da descrição das palavras-


chaves, pois, até então, as palavras-chaves: poder, força, vigor, autoridade e
violência não eram distinguidas. Essas palavras, que são muitas vezes usadas,
porém com pouca preparação conceitual, mencionam diferentes categorias
quando são explicitadas. Para Arendt (1985), após descrevê-las em pequenos
parágrafos, percebe-se que a violência se distingue por seu caráter instrumental.
A autora ainda destaca que: a violência “está próxima do vigor, uma vez que
os instrumentos da violência, como todos os demais, são concebidos e usados
para o propósito da multiplicação do vigor natural até que, no último estágio de
desenvolvimento, possam substituí-lo” (ARENDT, 1985, p. 25).

Segundo Arendt (1985), o poder pertence ao grupo e só existe à medida que


este está unido. O vigor é uma força individual, considerada como propriedade de
um objeto ou pessoa, pertencendo ao seu caráter e conduta, pode experimentar-
se a si mesmo na relação com os outros. Na linguagem comum, a força se
caracteriza com a violência, mas deveria recomendar as forças da natureza ou
das circunstâncias vividas.

A autoridade vai de encontro aos cargos de hierarquia para aqueles que


dão as ordens e para os que as obedecem. Arendt (1985) afirma que a violência
está associada ao vigor, pois as execuções da violência são planejadas e usadas
como desígnio de multiplicar o vigor natural.

A primeira parte da obra de Arendt (1985, p. 17) afirma que “a violência na


forma de guerra e revoluções” pode ser analisada com um processo cronológico
contínuo, sendo isso verdade, os pregadores da violência teriam ganho um ponto.
Contudo, essa realidade nunca foi comprovada e, além disso, é função de toda ação
interromper esse processo. Seu objetivo é observar, entre guerra e política, violência
e poder e, ainda, a natureza e as causas da violência em suas revelações atuais.

Na segunda parte, Arendt (1985) faz um questionamento sobre a violência


nos comandos da política e acrescenta que a violência ocorre mesmo sendo algo
difícil. A autora menciona Sorel, que garante que as dificuldades da violência
permanecem obscuras e logo acrescenta que existe uma concordância entre os
estudiosos de que “a violência nada mais é do que a mais fragrante manifestação
de poder” (ARENDT, 1985, p. 19).

A demanda, nesse sentido, depende do que se compreende por poder. De


acordo Voltaire (apud ARENDT, 1985, p. 13), “o poder consiste em fazer com que os
outros ajam como eu quero”. A autora, ainda na mesma obra, cita D’Entrèves, quando
afirma que não existe nenhum poder maior do que aquele que provém do cano de
uma arma. Para a autora, o Estado-nação surgiu com a noção de poder absoluto.

Para Paviani (2016), o significado do termo poder foi confirmado pela


tradição judaico-cristã e pela concepção imperativa de Direito, apesar de outra
tradição não relacionar poder e Direito, mas como uma ação de autoridade e
obediência.

124
TÓPICO 1 | CONCEITOS E FORMAS DE VIOLÊNCIA

Arendt (1985) sintetiza a forma extrema de poder “todos contra um” e


extrema de violência “uma contra todos”. Por meio desses conceitos, Arendt
apresenta que a ciência política carece de distinguir entre poder, força, vigor,
autoridade e violência. Essa relação, com esses conceitos citados, não significam
um sinônimo, mas existe uma relação entre a violência, o poder e a autoridade, só
que isso não significa que sejam a mesma coisa.

Para equiparar poder e violência é possível apresentar “a violência


como última opção para que a estrutura de poder seja mantida”, também que
a “violência é um pré-requisito do poder” tendo um “vácuo entre teoria e
realidade”, como exemplo podemos citar uma revolução. Tudo depende do
“poder atrás da violência” (ARENDT, 1985, p. 26). A perda e desintegração do
poder governamental pode dar origem às revoluções e aos conflitos divergentes
de opiniões, porém não significa que isso ocorra, são necessários circunstâncias e
grupos de homens.

Segundo Arendt (1985), não existe um governo que seja exclusivamente


baseado nos organismos da violência, nem mesmo os governos totalitários são
baseados exclusivamente na violência que utilizam a tortura e necessitam de uma
base de poder, de um policiamento secreto e até de informantes. Os governos
violentos precisam do apoio de outros para chegar a seus objetivos. Como afirma
Arendt (1985, p. 27): “assim, nas questões internas, a violência funciona como o
último recurso do poder contra os criminosos ou rebeldes”. O poder é considerado
uma parte essencial de qualquer governo, e podemos afirmar que também ocorre
com a violência. Para Arendt (1985, p. 28), “a violência é por natureza instrumental,
como todos os meios, está sempre à procura de orientação e de justificativas pelo
fim que busca”. O poder como ato governamental não precisa de justificativas e
de legitimidade: “A legitimidade baseia-se em um apelo ao passado, enquanto a
justificativa diz respeito a um fim que se encontra no futuro. Ninguém questiona
o uso da violência em legítima defesa, pois o perigo é não apenas nítido como
também presente, e o fim que justifica os meios é imediato” (ARENDT, 1985, p. 28).

Embora sejam considerados fenômenos distintos e diferentes, o poder e


a violência expõem-se juntos. Quando convém, o poder se torna fundamental e
predominante.

“A violência não depende de números ou de opiniões, mas sim de formas


de implementação, e as formas de implementação da violência, como todos os
demais instrumentos, aumentam e multiplicam a força humana. A violência tende
a destruir o poder e da violência jamais floresce o poder” (ARENDT, 1985, p. 29).

Outro conceito distinguido por Arendt (1985) é o de terror e de violência.


Para ela, todo o vigor do terror depende quase que exclusivamente do grau de
atomização social. A autora caracteriza de maneira distinta o domínio totalitário,
que é fundamentado no terror, e as tiranias e ditaduras, que são estabelecidas
pela violência. A primeira volta-se não apenas aos seus inimigos, mas contra seus
próprios amigos e correligionários, decorrência de temer todo poder, mesmo

125
UNIDADE 3 | CONCEITOS, TEORIAS E TIPOLOGIAS DE VIOLÊNCIA, VIOLÊNCIA URBANA E SEUS REFLEXOS NA SOCIEDADE ATUAL

o poder dos amigos. “O clímax do terror é alcançado quando o estado policial


começa a devorar os seus próprios filhos, quando o carrasco de ontem torna-se a
vítima de hoje” (ARENDT, 1985, p. 30).

A violência como um fenômeno acontece onde o poder está sempre em


perigo. A não violência significa que não é o oposto da violência. “A violência
pode destruir o poder, mas é incapaz de criá-lo” (ARENDT, 1985, p. 31).

Arendt (1985), em seus estudos, não aceita a afirmação de que a violência


como um ato, fenômeno, não se origina do poder, porém para compreender
esse pensamento se faz necessário estudar quais são as raízes e a natureza da
violência. Um outro conceito explicado por Arendt é o da agressividade do ser
humano. Esta, como algo instintivo, é um achado que uma certa relação com a
natureza dos “instintos sexual e nutritivo no processo vital do indivíduo e da
espécie” (ARENDT, 1985, p. 34).

E
IMPORTANT

Pressupõe-se que a violência não é um fenômeno considerado animalesco


nem irracional, como afirmam algumas teorias.

Arendt (1985) afirma ainda que a violência se origina através do ódio,


sendo um lugar comum. Contudo, o ódio é um fenômeno irracional e patológico.
O ódio não é considerado uma reação automática à miséria e também ao
sofrimento. Nenhum ser humano reage ao ódio a uma doença incurável, ou então
a um terremoto ou às condições sociais inflexíveis. O ódio aparece onde existem
razões para suspeitar que as categorias podem ser transformadas. Só reagimos se
o senso de justiça for afrontado.

Mesmo os indivíduos reagindo com agilidade contra a essência do ódio e


da violência não significa que sejam irracionais. Alguns autores consideram que
tanto na vida pública como na privada existem situações em que a violência se
torna o único remédio correspondente. Para Pavani (2016), em alguns casos, a
violência equilibra a balança da justiça. “A ausência de emoções não causa nem
promove a racionalidade. O oposto do emocional não é o racional, mas o não se
sentir sensibilizado. O ódio e a violência são irracionais apenas quando dirigidos
contra substitutos. É o caso do racismo e da Revolução Francesa com Robespierre”
(PAVANI, 2016, p. 16).

Os pretextos históricos que são a favor da violência dos autores Sorel,


Pareto e Fanon não falam da injustiça, mas mencionam a hipocrisia. Para esses
autores, a violência se glorifica por si mesma. Esses três autores acabaram sendo
motivados por um ódio da sociedade burguesa e por vez levados a realizar uma
126
TÓPICO 1 | CONCEITOS E FORMAS DE VIOLÊNCIA

ruptura com os padrões morais da sociedade. Acabaram voltando-se contra


a hipocrisia, mas para Arendt (1985), essa violência não é de nenhuma forma
irracional. Nessa visão, a hipocrisia não é considerada um comportamento
razoável, com aparência de racionalidade; acaba utilizando a razão como uma
armadilha. Assim, a violência contra a hipocrisia não tem nenhuma razão de
existir.

De acordo com Paviani (2016, p. 17), “a eficácia da violência não


depende de números, embora violência coletiva seja mais perigosa e na ação
militar ou revolucionária o individualismo desapareça. As atividades ilícitas, os
crimes comuns exigem de cada indivíduo que cometa um crime para se tornar
participante do grupo criminoso. Todos se unem em torno de um todo”.

Na visão de Fanon (apud ARENDT, 1985, p. 38) existe uma certa


fraternidade nos chamados campos de batalha, em que, nesse caso, um dos
fatores de nivelamento é quando se chega à morte. Ter essa consciência da morte
acaba que sendo uma consciência antipolítica. Se tornando o “extremo da solidão
e da impotência”.

Arendt (1985) afirma que a morte desempenha um papel mínimo mediante


a filosofia política. Somente para Hobbes a morte dentro da política possui
uma função determinante. Segundo Hobbes, o mais admirável nesses termos
é a igualdade de temor da morte que é importante e não a igualdade perante
a morte. Antes mesmo da descoberta do autor Korand Lorenz sobre a função
estimulante da vida realizada pela agressividade no reino animal, a violência é
um fenômeno deslumbrado com vigor e vitalidade. Já Soreal, guiado pelo élan
vital de Bergson, conduz contra a sociedade de consumo e também de seus
intelectuais. Contrapondo suas teorias às do trabalhador (ARENDT, 1985). Soreal
(apud ARENDT, 1985) afirma que o trabalhador deveria criar novas qualidades
morais e acabar os Parlamentos repletos de “acionistas”, sendo enfim contra a
sociedade burguesa, porque a Guerra Civil pode vir a eliminar os sentimentos
contra os quais o moralismo é impotente. É possível compreender quais razões
levam o ser humano a glorificar tanto a violência em abstrato. O que contribui
para Soreal e Pareto destacarem a violência nas revoluções foi o caso real Dreyfus,
que ocorreu na França (ARENDT, 1985).

A autora Arendt (1985) intriga o reflorescimento das filosofias de Bergson


e de Nietzsche na visão “sorelina” diante da combinação entre violência, vida e
criatividade. A violência sendo um fenômeno considerado uma força criadora da
vida; e a criatividade como um dos maiores bens comuns do homem, com noções
muito antigas, já definidas.

De acordo como Arendt (1985, p. 39), o “comprovante biológico da


vida está relacionado” aos mais perniciosos elementos de nossas mais antigas
tradições do pensamento político”, existindo uma relação entre poder e violência.
Um exemplo a ser citado são os reis, não por motivos morais, mas em decorrência
do temor biológico. Na visão de Fanon (apud ARENDT, 1985), existe uma
determinada loucura criativa nos atos de violência.
127
UNIDADE 3 | CONCEITOS, TEORIAS E TIPOLOGIAS DE VIOLÊNCIA, VIOLÊNCIA URBANA E SEUS REFLEXOS NA SOCIEDADE ATUAL

Arendt (1985) argumenta que nada é mais perigoso do que a cultura do


pensamento orgânico na política, em que poder e violência são fundamentados
através de um acordo biológico. O senso comum, em uma sociedade doentia,
acaba promovendo a violência. A violência, quando é coletiva, é olhada como
suposição para a vida coletiva da humanidade. Com isso, é importante ter
cuidado com as metáforas que envolvem o problema racial, pois acabam sendo
perigosas coletivamente.

E
IMPORTANT

Por si só o racismo é um ato violento. Não pode ser considerado um fato de


vida, mas sim uma IDEOLOGIA.

Dessa maneira, Arendt (1985) expõe um conjunto de conceitos e enunciados


estudados sobre o fenômeno da violência, exigindo um estudo mais aprofundado
em suas pesquisas. Suas pesquisas sobre a demanda da violência apontam
implicações morais e éticas, sociais e políticas. Segundo Perine (1987), autor da
obra de Filosofia e violência: sentido e intenção da filosofia de Eric Weil, a violência é
um dos conceitos centrais estudados na obra de Eric Weil. Perine (1987, p. 109),
em seu estudo, expõe em questão a própria filosofia e os diferentes modelos
de “uma simples afirmação de fato, arbitrária e violenta, de uma afirmação de
direito, justificada e justificante”. Ou seja, coloca em questão o que diferencia a
violência da razão. Na Lógica da Filosofia, de Eric Weil, nasce irreduzível dualidade:
violência e discurso ou violência e razão.

Essa questão inclui ao discurso e às possiblidades de entender o ser


humano nas suas mais profundas realizações. Esse discurso forma-se no decorrer
da história do ser humano enquanto se combate as formas de violência e seu
afastamento e desaparecimento. De acordo com a obra de Weil (1990), a sociedade
moderna está compreendida e organizada mediante a luta progressiva com
natureza exterior, em que os primeiros grupos de seres humanos se organizam
para a luta com a natureza do ambiente.

Para Paviani (2016), o ser humano não resiste à natureza, mas à luta contra
o mundo exterior, da sociedade. A natureza exterior, a violência primeira, não
é a luta do indivíduo. Ele não pode resistir à natureza. A luta contra o mundo
exterior é o da sociedade.

Paviani (2016) afirma que sociedade humana é considerada superior à


sociedade animal. Mas essa violência natural tem referência histórica. Assim, essa
violência define-se em relação à sociedade e a uma época. Em Lógica da Filosofia,
Perine (1987) inicia sua obra com um texto que apresenta a filosofia e a violência.

128
TÓPICO 1 | CONCEITOS E FORMAS DE VIOLÊNCIA

Para ele, o homem natural é considerado um animal, não um animal como os


demais, pois além das necessidades, também tem desejos.

O ser humano, na visão de Perine (1987), age de forma violenta porque


está insatisfeito. Muitas vezes não pode dizer não. A sua linguagem é constituída
por aquilo que ele é realmente e não é. A negatividade do homem se transforma e
acaba como consequência mudando a forma de transformar, decorrente da razão.

Com isso, uma nova definição de homem apareceu, sendo compreendido


como um ser que, com sua linguagem, busca libertar-se das coisas com as quais
não se contenta. Nesse sentido, ser um ser humano razoável é ser capaz de realizar
sua conveniente sensação de negatividade, isso significa produzir o que ainda
não é a partir do que é. Segundo Paviani (2016, p. 19):

A capacidade de discurso, de razão, de desejo constitui uma


possibilidade para o homem. Mas, a realidade interior da qual se
desenha a possibilidade da linguagem razoável, do discurso coerente,
da filosofia, faz aparecer a violência. O homem é o único a revelar a
violência, pois é o único a criar um sentido para a vida e para o mundo.
(Os animais não são violentos).

De acordo com Perine (1987), a violência só existe porque se tem a


existência da razão. Nesse sentido, a violência é como uma espécie de sombra
que acompanha o ser humano na sua trajetória. “A violência é original, radical
e, enquanto possibilidade, irredutível. A razão só se afirma sobre o fundo da
violência, porque ela é sempre razão finita, razão do ser humano em situação”
(PERINE, 1987, p. 8).

Weil (1990) afirma que o homem não é essencialmente a razão (Kant),


porém é apenas razoável. Ele, como ser humano, é originalmente violento e pode
voltar a qualquer momento para a violência, por conta da razão.

Como ser humano, e com o poder de decidir, o homem pode se recusar


à razão. A filosofia tem sua história permeada na renúncia da violência pela
razão. A filosofia como uma ciência ultrapassa a violência pela percepção das
satisfações razoáveis ligadas aos desejos e vontades legítimas.

Na visão de Weil (1990), como filósofo, a violência precisa desaparecer


do mundo. Diante disso, ele enfrenta a violência de frente. Com isso, a natureza
do fenômeno violência não se encontra na razão. Mesmo sendo Weil, filósofo,
considerado o homem da razão, é necessário que ele passar pela ação para
entender os outros conceitos filosóficos.

129
UNIDADE 3 | CONCEITOS, TEORIAS E TIPOLOGIAS DE VIOLÊNCIA, VIOLÊNCIA URBANA E SEUS REFLEXOS NA SOCIEDADE ATUAL

NOTA

Outros estudos sobre violência poderiam ser apresentados neste tópico,


mas a apresentação e discussão dos autores citados é suficiente para mostrar a você,
acadêmico, o quanto este tema sobre a violência é complexo.

O conceito de violência, em consequências as suas diversas formas, ganha


na sociedade contemporânea uma relevância muito grande. Na obra Os anjos bons
da nossa natureza: por que a violência diminuiu, Pinker (2013) afirma que a violência
nos dias atuais vem diminuindo no mundo, porém é uma demanda das mais
urgentes e que precisa de uma atenção.

Enquanto acadêmicos e pesquisadores, temos a consciência da natureza da


violência e dos seus efeitos na sociedade. Nesse sentido, é fundamental examinar
as relações existentes entre ética e violência. Assim, é fundamental citar a obra de
Chauí (1998), em Ensaio: ética e violência, a autora parte de um conceito de moral e
ética ao dizer que uma ação só é considerada ética se for consciente, estar livre e
ser responsável, sendo somente virtuosa conforme o bom e o justo.

Para Chauí (1998), a ética existe pela e na ação de cada sujeito individual
ou sociais, resultado das formas de sociabilidade criadas pelas próprias ações
do ser humano em determinadas condições históricas. Com essas observações, a
autora Chauí determina algumas características da violência. Segundo a autora,
a violência pode ser considerada tudo que age usando a força para ir contra a
natureza de algum ser; é todo ato de força contrário à espontaneidade, à vontade e
à própria liberdade de uma pessoa; é considerado todo ato de violação de alguém
ou de alguma coisa valorizada de forma positiva pela sociedade; é todo ato de
transgressão contra aquelas coisas e ações que alguém ou uma determinada
sociedade definem sendo justas e com um direito.

Chauí (1998), após realizar a caracterização da violência como um


ato de brutalidade, sevícia e de abuso físico ou psíquico contra outra pessoa,
individualiza as relações intersubjetivas e sociais que são definidas pela opressão,
pela intimação, pelo medo e também pelo terror. A violência se opõe à questão
ética pelo motivo que trata de seres racionais e sensíveis, dotados de linguagem e
de liberdade, ou seja, não são coisas. Resume-se que a ética é um ato inseparável
do sujeito racional, livre, responsável e voluntário (CHAUÍ, 1998).

Acredita-se que, dessa maneira, todos os estudos e pesquisas sobre as


implicações morais e éticas da violência incidam a ser merecedoras de uma atenção
específica ou direta da filosofia. O conceito de violência através de diversos autores
pode ser mais elaborado e aprofundado de maneira mais explícita por meio de
propostas que tragam a solução ou a diminuição da violência no mundo e podem,
de certa forma, ser melhor encaminhadas para serem colocadas em prática.
130
TÓPICO 1 | CONCEITOS E FORMAS DE VIOLÊNCIA

DICAS

Acadêmico, indicamos a obra O que é violência, de Nilo Odallia (1991):

FIGURA – O QUE É VIOLÊNCIA

FONTE: <https://img.travessa.com.br/livro/BA/47/47fa512c-cae3-41c0-9756-
74caabfa3887.jpg>. Acesso em: 6 dez. 2019.

Desde o momento em que um longínquo ancestral do homem fez de um osso a primeira


arma, a violência sempre caminhou lado a lado com a civilização. E chega aos dias de hoje
nas mais diversas formas – física, racial, sexual, política, econômica. Neste livro, o professor
Nilo Odalia procura os porquês da violência e reflete sobre suas relações com a sociedade
e com o homem. Um animal essencialmente violento.

FONTE: ODALIA, N. O que é violência. São Paulo: Editora Brasileira, 1991.

131
RESUMO DO TÓPICO 1

Neste tópico, você aprendeu que:

• O conceito do termo “violência” é duvidoso, complexo e provoca vários


elementos e posições teóricas, implicando dissolução ou cancelamento aos
diversos elementos e outros conceitos teóricos.

• A violência pode ser considerada natural ou artificial.

• O termo “violência” tem sua origem do latim, violentia, que propaga o ato de
violar.

• As características do conceito de violência, de modo geral, variam no tempo


e no espaço, dependendo dos padrões culturais de cada grupo ou época e
acabam sendo explicadas pelas dificuldades semânticas do conceito do termo
violência.

• As ciências divergem nas diversas teorias e definições do termo violência, cada


uma utiliza-se do objeto ou do método de investigação.

• No que se refere às relações existentes entre a moral, a ética e a violência


conseguem observar diferentes posições. Há os que se opõem à ética e à
violência, distinguindo os dois campos.

• Quando se questiona sob o ponto de vista ético é possível observar a diferenciação


entre a violência possível e a necessária, mediante os comportamentos que são
aceitos ou não pela sociedade.

• Qualquer tumulto, confronto social ou conflito não resolvido pode originar


atos de violência.

• Além da dificuldade de conceituar a termologia violência, também existe o


problema sobre as formas da natureza em relação à violência. A classificação
das formas sobre a natureza da violência permeia os critérios escolhidos, das
ênfases da realidade empírica, das formas de combater a violência e de outras
modalidades.

• Existem as teorias psicofísicas que garantem substâncias químicas ou elementos


psicológicos como as drogas, as punições, o ódio, o estresse, que são a origem
da violência.

132
• Não existe um governo que seja exclusivamente baseado nos organismos da
violência, nem mesmo os governos totalitários são baseados exclusivamente
na violência que utilizam a tortura e necessitam de uma base de poder, de um
policiamento secreto e até de informantes.

• A violência como um fenômeno acontece onde o poder está sempre em perigo.

• Nenhum ser humano reage ao ódio, a uma doença incurável, ou então a um


terremoto ou às condições sociais inflexíveis. O ódio aparece onde existem
razões para suspeitar que as categorias podem ser transformadas.

• A violência, quando é coletiva, é olhada como suposição para a vida coletiva


da humanidade. Com isso, é importante ter cuidado com as metáforas que
envolvem o problema racial, pois acabam sendo perigosas coletivamente.

• Como ser humano, e com o poder de decidir, o homem pode se recusar à razão.

• O conceito de violência, em consequências as suas diversas formas, ganha na


sociedade contemporânea uma relevância muito grande.

• A ética existe pela e na ação de cada sujeito individual ou sociais, resultado


das formas de sociabilidade criadas pelas próprias ações do ser humano em
determinadas condições históricas.

• A violência se opõe à questão ética pelo motivo que trata de seres racionais e
sensíveis, dotados de linguagem e de liberdade, ou seja, não são coisas.

• A ética é um ato inseparável do sujeito racional, livre, responsável e voluntário


(CHAUÍ, 1998).

• O conceito de violência através de diversos autores pode ser mais elaborado


e aprofundado de maneira mais explícito, por meio de propostas que tragam
a solução ou a diminuição da violência no mundo e podem de certa forma ser
melhor encaminhadas para serem colocadas em prática.

133
AUTOATIVIDADE

1 As melhores leis a favor das mulheres de cada país-membro da União


Europeia estão sendo reunidas por especialistas. O objetivo é compor uma
legislação continental capaz de contemplar temas que vão da contracepção à
equidade salarial, da prostituição à aposentadoria. Contudo, uma legislação
que assegure a inclusão social das cidadãs deve contemplar outros temas,
além dos citados. Quais são os dois temas mais específicos para essa
legislação?

a) ( ) O aborto e a violência doméstica.


b) ( ) As cotas raciais e o assédio moral.
c) ( ) A educação moral e o trabalho.
d) ( ) O estupro e a imigração clandestina.
e) ( ) A liberdade de expressão e o divórcio.

FONTE: <http://www.pucrs.br/edipucrs/enade/formacaogeral-2006-2007-2008.pdf>. Acesso


em: 2 set. 2019.

2 “Ninguém nasce mulher: torna-se mulher. Nenhum destino biológico,


psíquico, econômico define a forma que a fêmea humana assume no seio
da sociedade; é o conjunto da civilização que elabora esse produto entre o
macho e o castrado que qualificam o feminino” (BEAUVOIR, S. O Segundo
sexo. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1980).

Na década de 1960, a proposição de Simone de Beauvoir contribuiu para


estruturar um movimento social que teve como marca:

a) ( ) a ação do Poder Judiciário para criminalizar a violência sexual.


b) ( ) a pressão do Poder Legislativo para impedir a dupla jornada de trabalho.
c) ( ) a organização de protestos públicos para garantir a igualdade de gênero.
d) ( ) a oposição de grupos religiosos para impedir os casamentos
homoafetivos.
e) ( ) o estabelecimento de políticas governamentais para promover ações
afirmativas.

FONTE: <http://www.educadores.diaadia.pr.gov.br/arquivos/File/gabaritando_enem/2017/
gabarito_comentado_gabaritando_enem.pdf>. Acesso em: 2 set. 2019.

134
UNIDADE 3
TÓPICO 2

O CENÁRIO DA VIOLÊNCIA URBANA

1 INTRODUÇÃO
A violência urbana é, hoje, um assunto de extrema importância no debate
brasileiro. A violência, tanto no campo como nas cidades, sempre teve uma
postura e formas específicas de acordo com o momento histórico, atingindo as
camadas subalternas da população brasileira, sendo praticada diretamente pelo
Estado, por seus agentes, por grupos dominantes ou até por facções criminosas,
sempre deixando cicatrizes intensas.

A concepção da violência urbana deve ser realizada de forma crítica


e reflexiva, pois é necessário avaliar e compreender as políticas públicas
desenvolvidas pelas autoridades políticas, focando a diminuição do índice
desse tipo de violência. Também, deve ser vista como uma questão social que
está inserida na realidade da sociedade contemporânea e deve ser compreendida
como um reflexo do crescimento desordenado das nossas cidades brasileiras.

Como educadores sociais, devemos ter a clareza da atuação profissional


diante das mazelas do sistema capitalista.

2 A VIOLÊNCIA URBANA É UMA CARACTERÍSTICA


DE TODA A SOCIEDADE BRASILEIRA
No contexto urbano deste milênio, a violência vem sendo um
fenômeno que chama a atenção dos moradores de todas as cidades brasileiras,
independentemente se for de grande, médio ou pequeno porte.

Atualmente, o tamanho da cidade está sendo ignorado para que diversos


delitos, de variados tipos, ocorram, deixando as pessoas que moram nas cidades
apreensivas em relação às causas de tanta violência. Diariamente, a mídia, sendo
ela televisiva ou pela internet, noticiam muitos casos de violência que ocorrem
nas cidades. De outro lado, ao andarmos pelas ruas das grandes cidades e centros
urbanos, o que se percebe nas conversas das pessoas é que normalmente estão
relacionadas aos crimes e fatos ocorridos.

135
UNIDADE 3 | CONCEITOS, TEORIAS E TIPOLOGIAS DE VIOLÊNCIA, VIOLÊNCIA URBANA E SEUS REFLEXOS NA SOCIEDADE ATUAL

FIGURA 2 – VIOLÊNCIA URBANA E SUAS CARACTERÍSTICAS

FONTE: <https://domtotal.com/blog/robson/wp-content/uploads/sites/11/2015/09/012.jpg>.
Acesso em: 4 set. 2019.

Se voltarmos ao tempo, percebemos que escutávamos as pessoas


conversarem sobre a imigração, sobre o futebol, sobre a política ou sobre a crescente
industrialização. Ocorre que nas cidades de médio porte, os moradores observam
estarrecidos ao crescente índice de violência, em paralelo, o surgimento dos
chamados bolsões de pobreza, que cognominados como tais após a padronização
do espaço urbano entre as classes sociais com nível mais elevado.

Nas cidades que são consideradas de pequeno porte, os moradores, há


pouco tempo, começaram a conviver com casos de violência, que vão desde a
doméstica até a violência contra costumes e cultura, envolvendo pessoas idosas,
mulher, criança e adolescente, entre outros tipos, que eram vistos pelos moradores
dessas pequenas cidades somente através da mídia.

Para Pinheiro (2003), a violência urbana subverte e desvirtua a função


das cidades, drena recursos públicos, já escassos, ceifa vidas – especialmente as
dos jovens e dos mais pobres – dilacera famílias, modificando nossas existências,
dramaticamente, para pior.

Quando decidimos estudar a violência urbana, devemos ter em mente


a realidade social que está impactada pela política econômica globalizada que
atinge as instituições, como a família, a escola e a igreja. Devemos saber avaliar
e compreender quais são as influências da política econômica sobre cada uma
dessas instituições e quais as consequências.

Se estudarmos o tema da violência urbana presente na sociedade


contemporânea é necessário compreendermos de qual maneira e forma pelas
quais os bolsões de pobreza estão se polarizando nos centros urbanos, e de
qual maneira as pessoas que estão inseridas nessas áreas organizam suas táticas
e estratégias de sobrevivência mediante o sistema capitalista. O modo de vida
dessas pessoas é padronizado pela sociedade em geral, em especial pela mídia.

136
TÓPICO 2 | O CENÁRIO DA VIOLÊNCIA URBANA

Nesses espaços de exclusão social, como as favelas, os guetos, os


bolsões de pobreza, deve-se entender de maneira crítica o porquê ocorre a
troca de ferramentas de trabalho por outras formas de sobrevivência, que acaba
influenciando a mídia na criação de um padrão comportamental das pessoas que
ali vivem, assim como a forma que surge a economia informal nesses locais.

E
IMPORTANT

Acadêmico, é importante você perceber que a existência de uma influência


simbólica dos meios de comunicação, estes, ao entrarem no contexto das instituições,
como nas cidades de pequeno porte, por sua vez influenciam a cultura dos moradores
com os padrões de vida que são dominantes na sociedade capitalista.

De acordo com Bourdieu (2007), o espaço social e as diferenças que nele


se projetam espontaneamente tendem a trabalhar simbolicamente como estilos
de vida ou como “stands”, ou seja, grupos qualificados por comportamentos
diferentes.

Pode-se afirmar que na luta pela determinação da visão verdadeira de


mundo social, em que as ciências estão envolvidas, os influentes responsáveis
detêm um poder proporcional ao seu capital ou ao grupo que representa em
determinado momento.

Para Bourdieu (2007), o poder simbólico é um poder que aquele que lhe
está sujeito dá àquele que o exerce um crédito com que um credita o outro, uma
fides, uma auctoritas, que se lhe confia, depositando nele sua confiança; é algo
como a potência mágica, o crédito, o carisma, a crença, o credo, a obediência ao
divino de onde se espera a proteção.

Nessas alternativas das interações cotidianas, as pessoas dominadas pelas


relações de forças simbólicas acabam entrando na luta de forma isolada, aceitando
a situação de resignada, submissa e/ou revoltada, mediante significado dominante
de sua identidade ou então pela busca da identificação dessa assimilação. Esta
acaba supondo um trabalho que possa desaparecer os sinais que são propostos
a lembrar o estilo de vida, vestuário, vocabulário, costumes e outros, que venha
propor através de estratégias de dissimulação e mentiras, a imagem de si, o menos
distante possível da real identidade.

A temática sobre as questões da violência urbana nasce como proposta


de estudo interdisciplinar e de pesquisa, através de um núcleo conectado nas
diversas áreas das Ciências Sociais, Sociologia, Pedagogia, Serviço Social, Filosofia,
Antropologia, Economia, Psicologia, Comunicação, Direito, História e demais
áreas afins, com o objetivo de compreendermos, através de estudos, pesquisas e
137
UNIDADE 3 | CONCEITOS, TEORIAS E TIPOLOGIAS DE VIOLÊNCIA, VIOLÊNCIA URBANA E SEUS REFLEXOS NA SOCIEDADE ATUAL

trabalhos científicos, os variados aspectos da violência urbana. Esperando como


resultado um direcionamento nas mudanças socioideológicas que orientarão
políticas públicas que são focadas para as causas e consequências da violência no
meio urbano.

Na atual conjuntura do terceiro milênio, todas as pessoas que moram


nas cidades são, de certa forma, abordadas pela violência, que acaba isolando e
separando as pessoas, mas também ao mesmo tempo as une por medo do que as
inspira.

E
IMPORTANT

As cidades eram consideradas sinônimos de sociedade civilizatória, atualmente


são reconhecidas como um meio fragmentado, segregado e descivilizado.

Pedrazzini (2006) afirma que as categorias territoriais e o urbanismo da


opressão são afrontados pelas sociedades urbanas, modernizando novas técnicas
de invasões bárbaras que devem nascer do interior da cidade. Podemos afirmar
que os baixos salários e o alto nível de desemprego são causas do empobrecimento
da classe média e o aumento de pessoas em situação de vulnerabilidade social,
o que vem, como consequência, gerando muitos crimes que afetam o patrimônio
alheio, como furtos, roubos, assaltos.

Um outro fator a ser considerado é a ocupação de terrenos e conjuntos


habitacionais que, ainda mesmo em construção, acontece a depreciação dos
equipamentos de uso coletivo. A nossa sociedade vive em constante conflito,
podemos citar alguns fatores como a depredação e a agressão ao meio ambiente
e o alcoolismo. Esses fatores mostram que as cidades cresceram e evoluíram,
acabaram expandindo, surgindo os bairros periféricos, que se revelam através das
precárias condições de vida dos moradores e da degradação do meio ambiente,
apresentando uma face da violência urbana.

Para Santos (2009), o mercado, a industrialização, a proletarização e


as fábricas pertencem a uma sociedade desigual; a cidade industrial foi uma
transposição construída, e a cidade pós-industrial, a transposição ao vivo de uma
sociedade “sem trabalho”, o que não exclui a exploração de classes.

Segundo Pedrazzini (2006), as separações urbanas não são socialmente


neutras; elas atuam em benefício de algumas pessoas e contra a “libertação” das
massas, fato que preocupa alguns ideólogos. Como acabam sendo abandonados
pelas instituições, esses atores sociais são obrigados a adotar novas estratégias
para sobreviver, pois necessitam estar inseridos na política neoliberal.

138
TÓPICO 2 | O CENÁRIO DA VIOLÊNCIA URBANA

NOTA

NEOLIBERALISMO

O neoliberalismo busca atender ao escopo de desregulamentar a intervenção sindical, a


ação do Estado na economia e promover a política de cortes de gastos sociais.

O Neoliberalismo é uma premissa econômica e social que se manifesta em defesa do


Estado mínimo, que seria a menor intervenção possível do Estado na economia. Trata-
se de uma retomada das ideias liberais existentes nos séculos XVIII e XIX e que estavam
relacionadas ao pensamento do economista escocês Adam Smith.

A diferença básica entre liberalismo e neoliberalismo, primeiramente, é o contexto histórico


em que surgiram (o primeiro no século XVIII e o segundo no século XX) e, em segundo
lugar, o fato de o neoliberalismo apregoar eventuais intervenções estatais na economia
em tempos de crise, para socorrer o mercado.

Mas o que significa dizer que o Estado não deve intervir na economia?

Muitas pessoas não compreendem a ideia de “Estado mínimo”, afinal, independente do


regime político adotado, os governos estão sempre controlando os rumos da economia,
seja para aumentar ou diminuir as taxas de juros ou os valores salariais, por exemplo. Mas
nesse caso, a mínima intervenção pública no mercado significa a retirada do Estado em
ações de empresas e a extinção ou a menor existência possível de instituições públicas.
Diante disso, a principal face do neoliberalismo são as privatizações, que representam a
venda ou transferência das instituições públicas para a iniciativa privada.

Outra expressão do modelo econômico neoliberal são os cortes dos gastos públicos. A
fim de desonerar de impostos a população e, principalmente, as grandes empresas (que,
ao menos em tese, seriam responsáveis pela geração de empregos), o governo deveria
evitar gastos com políticas sociais e de infraestrutura, além de reduzir investimentos em
educação e saúde. Para os neoliberais, esses setores da sociedade são melhor oferecidos
pela iniciativa privada e a presença do Estado só atrapalharia o lucro dos empresários e a
geração de empregos por eles oferecida.

FONTE: <https://alunosonline.uol.com.br/geografia/neoliberalismo.html>. Acesso em: 6


dez. 2019.

A desestruturação dos centros urbanos, nos aspectos mais visíveis, que


são a informalidade espacial, econômica e social, institui, no decorrer dos tempos,
novas maneiras de reprodução social, que acabam sendo ligadas pelos três eixos
da socialização.

139
UNIDADE 3 | CONCEITOS, TEORIAS E TIPOLOGIAS DE VIOLÊNCIA, VIOLÊNCIA URBANA E SEUS REFLEXOS NA SOCIEDADE ATUAL

FIGURA 3 – EIXOS DE SOCIALIZAÇÃO

FONTE: A autora

Os moradores dessas áreas, por meio das suas compreensões intuitivas da


realidade dos fatos, são levados através do seu caráter ao senso comum, mesmo
com necessidades de mudanças não buscam compreender de maneira crítica
teorizar e resistir, apropriando-se delas mediante uma lógica do caos.

Segundo Pedrazzini (2006), isso acontece porque os moradores necessitam


viver, antes de tudo. A condição caótica do espaço urbano não combina nem
colabora para suas atividades, sejam elas exercidas de maneiras formais ou
informais. As primeiras pessoas a entender que ninguém se responsabilizaria
de cuidar de suas adversidades foram os que se encontram em situação de
vulnerabilidade social. A violência, muitas vezes, está à margem das atividades
diárias e, em outras vezes, se torna a forma de sobrevivência do ser humano.

Para Pedrazzini (2006), a violência urbana deve ser analisada como parte
de um sistema socioespacial dinâmico cujos elementos estruturantes seriam a
economia liberal globalizada e a cidade como modelo ambiental hegemônico.
Mediante esses dois elementos considerados fundadores da nossa civilização,
outros elementos completariam:

• Sociais, crescimento das desigualdades.


• Políticos, criminalidade da pobreza.
• Espaciais, fragmentação do território.
• Ideológicos, sujeição da democracia à segurança.

Esses elementos combinam entre si para delinear um projeto de sociedade,


chamado de selvagem e inquietante. Segundo Pedrazzini (2006), é fundamental
analisar e entender de que forma os principais setores da economia globalizada
tentam um determinado modelo de urbanismo, de arquitetura e de cidade globais,
desde então, como a urbanização contemporânea globalizada começou a impor
práticas sociais e espaciais que contribuíram para o crescimento da violência
urbana.

140
TÓPICO 2 | O CENÁRIO DA VIOLÊNCIA URBANA

A cidade contemporânea é considerada perigosa à medida que a


globalização vem se dividindo em fragmentos antagônicos e acabam se
transformando em conflitos nas diferentes forças de interesses. Segundo Santos
(2009), a partir da década de 1980 do século XX, os programas de estabilização de
macroeconomia e de ajuste estrutural que foram impostos pelo Fundo Monetário
Internacional (FMI) e Banco Mundial aos países em desenvolvimento para que
fossem renegociadas levaram centenas de milhões de pessoas ao empobrecimento.
Os programas como o de Ajuste Estrutural (PAES) contribuíram, amplamente,
para desestabilizar moedas nacionais e arruinar as economias dos países em
desenvolvimento.

Para Chossudovsky (1999), os PAES tinham como foco desempenhar


um papel importante e chave na decomposição da economia nacional de países
endividados com o FMI e Banco Mundial e de recompô-los em uma nova relação
econômica mundial. Ainda de acordo com Chossudovsky (1999), as reformas
econômicas implicaram na decomposição e na recomposição das diversas
estruturas produtivas e de consumo nacionais.

Perante essa realidade, a compressão dos lucros reais ocasionou a


diminuição dos custos da mão de obra e da decadência dos níveis de consumo de
massa, sendo considerados os artigos de primeira necessidade, por grande parte
da população. Já de outro lado, aconteceu um aumento no consumo do segmento
de alta renda, os que envolvem bens duráveis e de luxo, que são de alcance de
pequena parcela da população.

Essa chamada decomposição e recomposição de todos os países


endividados e a inserção deles na economia globalizada, fundamentada na mão
de obra barata, ascenderam a compressão de uma demanda e abomináveis níveis
de vida, pobreza, salários baixos e uma grande mão de obra barata, sendo as
representações na explosão da violência urbana.

Segundo Pedrazzini (2006), essas causalidades, apesar de difíceis de serem


comprovadas pela natureza de sua complexidade e superposição dos múltiplos
níveis de realidade, não impedem que o observador dos fatos sociais urbanos
questione a violência urbana na sociedade contemporânea.

Para Giddens (apud BOURDIEU, 2007), se compreendermos como os


outros vivem podemos adquirir melhor entendimento dos problemas nos quais
eles estão envolvidos. Nesse sentido pode-se afirmar que os aspectos da vida
social modelam nossa forma de sentir, pensar e agir. A violência das pessoas
em situação de vulnerabilidade social afeta a violência da globalização e acaba
fragmentando as estratégias impostas pelas cidades.

Como estudantes e futuros profissionais, antes de formularmos


qualquer “pré-conceito” referente aos conflitos urbanos, precisamos identificar
os moradores dos territórios que são dominados pela violência, pois estes são
possuidores incontestes das respostas sobre os diversos conflitos.

141
UNIDADE 3 | CONCEITOS, TEORIAS E TIPOLOGIAS DE VIOLÊNCIA, VIOLÊNCIA URBANA E SEUS REFLEXOS NA SOCIEDADE ATUAL

É necessário conhecer “in loco” a realidade, ir a esses locais, conversar


com as pessoas que ali vivem e tentar buscar respostas inesgotáveis para a relação
da violência com o outro, e do estranhamento dos seus próximos com os atos
aterrorizantes.

Os espaços que são mais afetados pelos conflitos gerados pela globalização
são os bairros mais pobres das cidades, independentemente do seu porte, pois estes
estão mais expostos aos efeitos negativos da política liberal, ou seja, da globalização.

Os responsáveis por essa situação, na maioria são os governantes, porque


não oferecem aos habitantes dessas áreas uma proteção digna contra os efeitos
desse mal, que reflete em toda sociedade.

Os jovens dos bairros mais pobres das cidades se tornam um problema


social para as autoridades e para a polícia. Pois, para esses jovens, com um pré-
conceito de estilo de vida formado são excluídos da sociedade e a violência se torna
uma resposta imediata e cômoda para um mundo em permanentes mudanças.

E
IMPORTANT

Os meios de comunicação, sendo eles através da mídia televisiva, emissoras


de rádios, outdoors, vitrines de lojas, internet apresentam produtos que representam todos
os padrões de conforto, de bem-estar e de status, despertando o interesse pelo consumo
excessivo.

Para conseguir esses objetos de consumo trabalha-se, luta-se, dando a


sensação de se tornar pessoas felizes, ricas, importantes aos olhos dos outros.
A felicidade fica atrelada à posse de bens materiais mediante a sociedade. O
fenômeno da violência urbana é constituído por um conjunto de situações
conflitantes e complexas, como também incontroláveis, tanto pelo poder público,
pelos especialistas do setor privado como pela comunidade em geral.

A sociedade globalizada nesse contexto verifica um abatimento das defesas


de todo sistema social, com valores de solidariedade e laços comunitários, sendo
que estes são individualizados no mundo atual. Diante da complexidade das
causas da violência urbana no domínio arrepiador da globalização da economia
e da cultura, se faz necessário estudá-la num contexto interdisciplinar para que
se tenha um conhecimento científico com resultados concretos, em que se consiga
direcionar as políticas públicas com eficácia para que aconteça a redução da
violência urbana e suas consequências sobre a sociedade como um todo.

A violência urbana vem assustando e isolando os moradores em suas


próprias moradias e estão virando fortalezas. Em todas as cidades brasileiras, o

142
TÓPICO 2 | O CENÁRIO DA VIOLÊNCIA URBANA

número de casas com cercas elétricas, porta com grades de proteção, câmeras de
segurança ou placas que identificam empresas de segurança que monitoram vinte
e quatro horas por dia algumas residências, como forma de impedir que estas
sejam invadidas por pessoas que escolham o crime como forma de sobrevivência
no contexto social em que estão inseridos.

Atualmente, as pessoas vêm se equipando com tudo o que a tecnologia


moderna oferece no que se refere à alimentação, à informação, ao lazer e à
comunicação, evitando sair de casa nos horários de folga. Acabam desfrutando os
fins de semana com programas de televisão via internet ou por assinatura, jogos
eletrônicos, horas nos celulares, tele-entrega de alimentos, entre outros. Já para os
que têm acesso limitado, sobra a programação de TV aberta.

É considerado que as pessoas que saem de casa em alguns determinados


horários estão se arriscando e pouco têm a oferecer aos envolvidos no crime. Os
que possuem algo de valor buscam sair de casa em horário preestabelecido e
frequentam lugares onde se têm maior segurança, tanto pública como privada.
Santos (2009, p. 9), em seus estudos, afirma que:

A expansão de empresas de segurança privada que vendem seus


serviços, os quais variam desde cercas elétricas com monitoramento
a seguranças particulares, é uma realidade, em se tratando das mais
variadas cidades. Essas empresas crescem e as pessoas que podem
arcar com o custo dos seus serviços não se incomodam em pagar por
eles, para se sentirem mais seguras dentro de suas casas ou ao saírem
delas para seus afazeres diários. Percebemos, ainda, a enorme procura
por serralherias que fabricam grades e portões de ferro maciço que
deem o mínimo de proteção às pessoas de ganho mais inferior quando
estiverem dentro de suas residências.

Em outro extremo da esfera social, nos bairros periféricos, a vulnerabilidade


social mostra-se explicitamente, em que as pessoas que ali moram sobrevivem do
duro trabalho, para conseguirem ter o mínimo de condições de segurança. Em
algumas residências são vistos cacos de vidros presos com cimento nos muros,
como forma de segurança para que suas casas não sejam invadidas.

É comum em algumas cidades, no período da noite, os carros padronizados


das empresas de segurança transitarem pelas principais ruas e ficarem em pontos
estratégicos à espera de um sinal de alerta da central de monitoramento para
agirem em prol da segurança.

Com essas iniciativas de segurança privada, percebemos que o foco da


segurança pública, a prevenção, está sendo substituída e administrada pelas
empresas privadas, que com a falta de políticas públicas focadas na segurança
acabam ganhando espaço.

Nos centros das cidades, em suas ruas, as pessoas andam com pressa
e agarram suas bolsas e suas pastas, é difícil alguém parar para dar uma
informação, e, quando isso acontece, estão sempre com um olhar atento ao que

143
UNIDADE 3 | CONCEITOS, TEORIAS E TIPOLOGIAS DE VIOLÊNCIA, VIOLÊNCIA URBANA E SEUS REFLEXOS NA SOCIEDADE ATUAL

está acontecendo ao redor. É difícil encontrar pessoas andando a pé para curtir e


conhecer a cidade.

Em muitos lugares e horários, os motoristas não respeitam mais aos sinais


de trânsito com medo de serem assaltados e quando precisam parar o seu veículo,
o fazem o mais rápido possível. Para Santos (2009), ao percorremos, à noite, as
ruas da cidade, podemos assustar outra pessoa simplesmente pelo olhar ou vice-
versa. Calamos o medo e desviamos nossos olhares.

De acordo com Pedrazzini (2006), houve tempos em que a cidade era vista
como um “bem” para o ser humano (a promessa de um futuro melhor), sendo
considerado um crescimento importante para as pessoas e para o território, pois
representa um progresso da civilização, da cultura, elevação e ampliação do
mercado e das oportunidades.

Porém, esses tempos decorreram para quem, nos dias de hoje, vê a cidade
como um espaço de sobrevivência em condições que são consideradas relativas
e aceitáveis. Atualmente, estamos vivendo em uma época em que as cidades
são consideradas duais. Isso significa que a insegurança, o medo, o pânico, a
violência e o tráfico são tidos como conteúdos chamados duplos, ou seja, duais.
Pedrazzini (2006) afirma que a cidade contemporânea é perigosa na medida em
que a globalização a divide em fragmentos antagônicos, transformando-a em um
conflito de forças e interesses.

O contexto e o cenário urbano apresentam um conjunto de rupturas,


fissuras, conflitos e distorções na área social. Perante isso, consegue afirmar
que a violência urbana é resultado dos aspectos contemporâneos do modelo
de urbanização. Estes englobam os modelos determinados pela globalização e
pela política neoliberal, explicada anteriormente, como objetivo de promoverem
estratégicas de preponderância no mercado global. Conforme Santos (2009, p.
11), “do bairro pobre, parcialmente globalizado, como fragmento de uma cidade
ou metrópole globalizada, emerge uma categoria de atores potencialmente e
simbolicamente globalizados para práticas de atividades criminosas”.

Nesse sentido, Santos (2009) afirma que esses atores adquirem, através de
atividades ilegais e internacionais, uma cultura cosmopolita que não corresponde
ao contexto e cultura de um determinado bairro ou cidade onde estão residindo.
Diante dessa realidade, vem aumentando um número de jovens e adolescentes
que criticam a política neoliberal, através da ilegalidade e da violência. Ao
entrarem no mundo do crime, como o tráfico, eles acreditam manter o comando
e a probabilidade de estarem inseridos na modelo de vida que envolve o mundo
globalizado.

O tráfico, para muitos que estão envolvidos, é considerado uma profissão


e que está em constante transformação, sendo uma atividade realizada de
forma artesanal nas ruas e esquinas das cidades e se tornando um dos setores
da sociedade que mais vem rendendo na economia mundial. Todavia, a escolha

144
TÓPICO 2 | O CENÁRIO DA VIOLÊNCIA URBANA

por esse meio de sobrevivência tem uma ascensão social, que é interrompida de
maneira bruta. Pesquisas já realizadas estimam que 60% dos jovens envolvidos
com o tráfico acabam sendo presos ou mortos.

Grande parte das cidades são consideradas fábricas do terror, do medo,


e que vêm favorecendo a divisão social, possibilitando a determinados atores o
poder de orientar e determinar objetivos e formas de os alcançarem mediante
uma ordem social como visão capitalista.

No contexto das cidades, considerando a violência, a poluição, a pobreza, a


fome, a falta de políticas de saúde, educação e outras, assim como os fascínios dos
meios de comunicação, a diversidade cultural, o crescimento de pessoas criando
e inventando algo, fazendo uma história, são algumas situações que as cidades,
sendo elas metrópoles ou não, oferecem ou podem retirar de seus moradores.

Os moradores das cidades são levados a criar estratégias contra seus


próprios medos e fantasmas. Essas estratégias mudam de acordo com o território,
o bairro da residência, nível econômico, cultural e social.

Como foi citado anteriormente, com a tendência da privatização dos


meios de segurança diante do crescimento do aparato de seguranças privados e
particulares e das empresas privadas que prestam esses serviços para proprietário
de residências, a tendência é segregação do espaço e do território urbano.

A arquitetura urbana começa a ter sucesso com modelos de arquitetura


estilo militarizada, visando ao lucro diante da insegurança vivida pelos
habitantes das cidades. Essas iniciativas oferecem ao cidadão uma segurança e
uma civilização em clausura.

Pedrazzini (2006) tem uma visão do urbanismo contemporâneo que


é geralmente uma atividade policial, segundo o modelo implantado por
Hausmannem Paris, no século XIX, que visava a um melhor controle dos espaços
públicos. Para Pedrazzini (2006), se o urbanismo atual (contemporâneo) privilegia
a segurança, essa arquitetura é dissuasiva e militar (arquitetura de fortificações
relativamente dissimuladas nas paisagens urbanas e uma ocupação militar do
solo urbano). E, dessa forma, estamos assistindo à vitória do medo e, como
consequência, à banalização urbanística do medo.

Não apenas as classes dominantes são submetidas ao espeço urbano com


a privatização em decorrência das razões de medo. As pessoas de classes médias,
ou menos favorecidas, se submetem também a essa condição. O preço e a forma
de se pagar por tal segurança são diferentes para as pessoas.

Os portões de ferro ou de cacos de vidros têm um custo inferior e razoável


se forem comparados às empesas de segurança privadas que monitoram vinte e
quatro horas as residências e os comércios.

145
UNIDADE 3 | CONCEITOS, TEORIAS E TIPOLOGIAS DE VIOLÊNCIA, VIOLÊNCIA URBANA E SEUS REFLEXOS NA SOCIEDADE ATUAL

FIGURA 4 – URBANISMO DO MEDO

FONTE: <https://gauchazh.clicrbs.com.br/porto-alegre/noticia/2018/05/cercas-muros-e-
guaritas-o-medo-da-violencia-que-encheu-porto-alegre-de-grades-cjgr5ky9z02c801payt6shuuv.
html>. Acesso em: 6 set. 2019.

Podemos considerar que os crescentes contextos de segregação,


considerando os direitos de propriedade, acabam cedendo aos privilégios de
acesso de segurança à violência urbana. A segurança passou a ser considerada
um serviço e um acesso que não são oferecidos mais como artigo de luxo para as
pessoas das camadas dominantes da população.

Na visão de Pedrazzini (2006), o urbanismo contemporâneo transpassa


a propagação de um sentimento de insegurança, pois os projetos de segurança
idealizados visando à proteção de determinados conjuntos de habitantes das
cidades beneficiam, de maneira desigual, o seu acesso aos locais considerados
seguros. O olhar de Pedrazzini (2006) pode ser verificado no seguinte e texto da
reportagem a seguir, em uma das metrópoles do país.

CERCAS, MUROS E GUARITAS: O MEDO DA VIOLÊNCIA


QUE ENCHEU PORTO ALEGRE DE GRADES

Frente à insegurança, população busca se proteger, mas já há quem


defenda limitar uso de equipamentos para preservar um padrão mínimo de
estética e urbanismo

Cercas elétricas, concertinas, grades metálicas, muros e guaritas são


elementos comuns em presídios, zonas de guerra e, cada vez mais, nas ruas de
Porto Alegre.

O medo da violência vem redesenhando o espaço urbano da Capital


a ponto de dar à cidade o aspecto de região conflagrada, criar áreas isoladas
e despertar controvérsia. Há quem veja a fortificação urbana como uma
necessidade frente à insegurança, e há quem defenda limitar os aparatos
antiladrão para preservar padrões mínimos de estética, urbanismo e

146
TÓPICO 2 | O CENÁRIO DA VIOLÊNCIA URBANA

convivência. Nem mesmo monumentos ou prédios históricos, feitos para


serem admirados sem obstáculos, escapam do cercamento em razão do risco
de vandalismo.

A transformação de espaços públicos e privados em cidadelas


guarnecidas por lâminas cortantes e barras de ferro ganhou impulso na década
passada e, nos últimos anos, ganhou novas (e mais agressivas) formas de
proteção. Um dos recursos empregados hoje — e que mais lembram o cenário
de uma zona em conflito — é a chamada concertina, ou cerca tipo ouriço. Em
meados dos anos 2000, era vista somente no Aeroporto Internacional Salgado
Filho e no Porto Seco, na Zona Norte.

Hoje, segundo estimativa de um dos pioneiros na venda e na fabricação


do material em Porto Alegre, em uma semana seriam instalados até 2 mil
metros desse tipo de tira metálica com ganchos afiados na cidade. É pelo
menos quatro vezes mais do que o estimado para uma década atrás.

— Quando começamos, havia uma resistência muito grande das


pessoas em instalar (a concertina) pela questão estética. Mas as pessoas
resolveram abrir mão disso para se sentir mais seguras. Nosso último castelo
é a nossa casa — analisa o diretor da empresa Bloquer, Edilson Trindade, que
fabrica e instala o produto.

Síndico de um prédio na Avenida Aureliano de Figueiredo Pinto,


o comerciante Elvandir Severo dos Santos, 56 anos, decidiu implantar duas
fileiras de metal cortante na sacada depois que um ladrão escalou uma árvore
e invadiu o quarto de um casal de idosos pela janela da rua há cerca de cinco
anos.

— Desde então, não tivemos mais invasão. É feio, mas funciona. Se


alguém cair ali, se estraçalha todo. Quanto mais se mexe, mais crava na carne
— diz Santos.

Do lado de dentro das cercas e dos muros, os moradores se sentem


mais seguros. Mas, do lado de fora, o resultado pode ser o oposto.

— O grande paradoxo do cercamento é que quanto mais as pessoas e


o comércio se afastam do espaço público, criando enclaves privados, mais se
acentua o problema da violência. Ou seja, quanto mais nos protegemos, mais
insegurança há — analisa o arquiteto e urbanista Marcelo ArioliHeck, diretor
da seção gaúcha do Instituto de Arquitetos do Brasil e professor da Univates.

Esse paradoxo tem relação com o célebre princípio dos "olhos da


rua" — conceito desenvolvido pela autora canadense Jane Jacobs (1916-2006)
segundo o qual quanto mais pessoas observarem uma via pública, mesmo de
dentro de suas casas, mais segura ela será.

147
UNIDADE 3 | CONCEITOS, TEORIAS E TIPOLOGIAS DE VIOLÊNCIA, VIOLÊNCIA URBANA E SEUS REFLEXOS NA SOCIEDADE ATUAL

Heck afirma ainda que a estética do medo deprecia o valor urbanístico


dos monumentos e prédios históricos sitiados em Porto Alegre — casos, por
exemplo, do Instituto de Educação Flores da Cunha, localizado na Redenção,
e da Fonte Talavera, diante da prefeitura, protegida por grades desde que um
manifestante danificou parte da estrutura em 2005.

— Nos casos de espaços e prédios públicos, os governos devem dar


exemplo e permitir uma melhor relação com as pessoas. Muitas vezes, recebem
grades não só em função da insegurança, mas especialmente para evitar o
vandalismo. A questão que se coloca é: o que interfere mais em uma fachada
histórica, uma pichação ou uma cerca? — questiona Heck.

Para psiquiatra, excesso de muros exerce "efeito depressivo"

Os artefatos destinados a desencorajar ladrões ou vândalos, como


muros, grades e cercas, também exercem impacto sobre o cidadão comum de
Porto Alegre. O psiquiatra, psicanalista e escritor Celso Gutfreind, autor do
livro infantil Monstros e Ladrões — no qual aborda a violência urbana —,
sustenta que a simples visão das barreiras metálicas e de concreto desempenha
um papel depressivo sobre a população em geral.

Há múltiplos fatores associados a problemas como depressão ou


melancolia, incluindo questões genéticas, orgânicas, afetivas e sociais. Mas,
segundo Gutfreind, o ambiente é outro elemento que pode exercer influência
sobre o estado de espírito de quem circula por uma cidade cada vez mais
amuralhada.

— O ambiente em que vivemos é mais triste, mais opressivo, mais feio.


Há um prejuízo claro na relação entre o indivíduo e o espaço público — diz o
psiquiatra.

Gutfreind lembra, em oposição a esse cenário entristecedor, que


crianças expostas desde cedo à beleza — seja artística ou urbanística — tendem
a desenvolver-se melhor em termos emocionais:

— Mostrar a beleza do mundo desenvolve uma espécie de camada de


proteção contra a desintegração afetiva ou a depressão. Por isso, a arte é tão
importante para a saúde mental.

Tentativas de reduzir o número de muros e grades na cidade têm


fracassado diante da insegurança urbana. O consultor e projetista de segurança
patrimonial Luiz Antônio Allgayer conta que, recentemente, os arquitetos de
um empreendimento imobiliário no bairro Menino Deus pretendiam erguer
um condomínio sem cercas, com um bucólico jardim separando a calçada da
porta principal.

148
TÓPICO 2 | O CENÁRIO DA VIOLÊNCIA URBANA

— Fizemos uma análise dos riscos do entorno e apresentamos para


os arquitetos. Acabaram optando pelo muro. Se deixar a porta como única
barreira, é fácil entrar em qualquer prédio. Infelizmente, não temos como fazer
ambientes abertos na situação urbana que vivemos hoje — afirma Allgayer.

FONTE: <https://gauchazh.clicrbs.com.br/porto-alegre/noticia/2018/05/cercas-muros-e-guaritas-
o-medo-da-violencia-que-encheu-porto-alegre-de-grades-cjgr5ky9z02c801payt6shuuv.html>.
Acesso em: 6 set. 2019.

Para Pedrazzini (2006), o chamado urbanismo do medo gera uma


radicalização dramática dos processos de segregação espacial, ocasionado uma
fragmentação urbana, e também uma fragmentação planejada dos territórios,
considerando o grau de segurança ou de perigo. “Essa seleção pode ser observada
no reaquecimento do mercado imobiliário, principalmente em zonas centrais, que,
ao passarem por um período de quase abandono estatal e imobiliário, renascem
para projetos de requalificação urbana” (PEDRAZZINI, 2006, p. 121).

O aparecimento do urbanismo de segurança, não traz total melhoria


para as cidades ou para regiões. Apenas instaura uma dualidade nas ações de
segurança, por meio de repostas ao sentimento de medo e da violência dos ricos
e dos pobres, que se ouve, se plagiam e até mesmo se opõem, de cada lado,
mediante a cortina de ferro da economia. Santos (2009, p. 14) afirma que:

Ao combinarem o urbanismo do medo e a detenção do poder nas


mãos de poucos, além da combinação com o urbanismo da urgência
e a precariedade de vida de muitos, as medidas de segurança, criadas
nesse contexto, estão modelando, cada vez mais, um meio segregado. A
segurança passa a ser o fetiche para conjurar o mal e apresenta-se como a
origem da construção de novas desigualdades sociais no contexto urbano.

De acordo com Santos (2009), se considerarmos, por outro ponto de vista,


como exemplo o mercado mundial da defesa contra o terrorismo é avaliado em
100 bilhões de euros, já o de segurança das redes de informação em 50 bilhões,
estamos conscientes de que Osama Bin Laden, quando lançou os aviões sobre
as cidades de Nova York e Washington, estava convicto de que daria início a
uma guerra contra o terror. Porém, Osama Bin Laden não planejou que o começo
desse conflito atrairia fortemente um mercado que lucraria demasiadamente com
a insegurança e com o medo que as pessoas convivem no dia a dia.

Segundo Pedrazzini (2006), a insegurança e a incerteza do mundo não


apareceram com os ataques dos terroristas islâmicos, mas espetaculares acabaram
estimulando a venda de armas e de sistemas de segurança, devido ao acesso
desigual entre as classes dominantes e da classe em situação de vulnerabilidade
a esses equipamentos. Nesse sentindo, o capital da segurança se junta ao capital
financeiro e ao capital simbólico (PEDRAZZINI, 2006).

A violência urbana e a insegurança que estão inseridos nas pessoas são


elementos que estão prendidos na vida diária de quem reside ou convive nos

149
UNIDADE 3 | CONCEITOS, TEORIAS E TIPOLOGIAS DE VIOLÊNCIA, VIOLÊNCIA URBANA E SEUS REFLEXOS NA SOCIEDADE ATUAL

centros urbanos. Compreender o conceito desses elementos a partir de um ponto


de vista interdisciplinar pode considerar uma das maneiras de encaminharmos
aos poderes públicas respostas para algumas incógnitas que relacionadas aos
efeitos de políticas públicas realizadas nas cidades.

DICAS

Acadêmico, aprofunde seus estudos a partir da leitura deste livro:

FIGURA – A VIOLÊNCIA DAS CIDADES

FONTE: <http://lojasaraiva.vteximg.com.br/arquivos/ids/2137184/963235.
jpg?v=637007506222970000>. Acesso em: 6 dez. 2019.

Este é um livro para quem busca entender a cidade e o que ela representa para diversas
sociedades, e que não faz distinção de nível social. Não poucas vezes, a chamada “visão
do pobre” é de extrema importância e abre novos caminhos neste território. – Porque
o urbano assusta e encanta a muitos, esta obra aborda com amplitude os estudos e
as observações dos aspectos inerentes a sua história e rotina.  Diante de problemas
catastróficos, a atribuição de responsabilidade à classe mais desfavorecida é constante.
Mas é preciso estar alerta para combater isso. Seja por medo ou fascínio, não há indivíduo
que ignore por completo o ambiente em que vive, pois conhecê-lo é uma forma de
conservá-lo. Não se pode mais pensar em urbanização como uma composição de favelas
e castelos. entre as classes e caracteriza a vida nas cidades. Não se pode mais pensar em
urbanização em uma atmosfera de favelas e castelos. Essa obra promete aprofundar todos
estes pontos, com destaque para a insegurança urbana e a globalização. Em suas páginas
se encontram diversas abordagens e aponta uma sadia desobediência aos modelos
impostos, para solucionar os grandes e muitas vezes desafiadores problemas do meio
urbano. Yves Pedrazzini é pesquisador do Laboratório de Sociologia Urbana da Escola
Politécnica Federal de Lausanne, na Suíça.

FONTE: PEDRAZZINI, Y. A violência das cidades. Tradução de Giselle Unti. Petrópolis:


Vozes, 2006.

150
RESUMO DO TÓPICO 2

Neste tópico, você aprendeu que:

• A violência vem sendo um fenômeno que chama a atenção dos moradores de


todas as cidades brasileiras, independentemente se for de grande, médio ou
pequeno porte.

• A mídia, sendo ela televisiva ou pela internet, noticiam muitos casos de


violência que ocorrem nas cidades.

• Nas cidades que são consideradas de pequeno porte, os moradores, há


pouco tempo, começaram a conviver com casos de violência, que vão desde
a doméstica até a violência contra costumes e cultura, envolvendo pessoas
idosas, mulher, criança e adolescente, entre outros tipos, que eram vistos pelos
moradores dessas pequenas cidades somente através da mídia.

• A existência de uma influência simbólica dos meios de comunicação, estes, ao


entrarem no contexto das instituições, como nas cidades de pequeno porte, por
sua vez, influenciam a cultura dos moradores, com os padrões de vida que são
dominantes na sociedade capitalista.

• O espaço social e as diferenças que nele se projetam espontaneamente tendem


a trabalhar simbolicamente como estilos de vida ou como “stands”, ou seja,
grupos qualificados por comportamentos diferentes.

• A temática sobre as questões da violência urbana nasce como proposta de


estudo interdisciplinar e de pesquisa, através de um núcleo conectado nas
diversas áreas das ciências sociais

• Os baixos salários e o alto nível de desemprego são causas do empobrecimento


da classe média e o aumento de pessoas em situação de vulnerabilidade social,
que vem, como consequência, gerando muitos crimes que afetam o patrimônio
alheio, como furtos, roubos, assaltos.

• Outro fator a ser considerado é a ocupação de terrenos e conjuntos habitacionais


que, ainda mesmo em construção, acontece a depreciação dos equipamentos
de uso coletivo.

• A desestruturação dos centros urbanos, nos aspectos mais visíveis, que são a
informalidade espacial, econômica e social, institui, no decorrer dos tempos,
novas maneiras de reprodução social, que acabam sendo ligadas pelos três
eixos da socialização.

151
• As primeiras pessoas a entender que ninguém se responsabilizaria de cuidar de
suas adversidades foram os que se encontram em situação de vulnerabilidade
social.

• É fundamental analisar e entender de que forma os principais setores da


economia globalizada tentam um determinado modelo de urbanismo, de
arquitetura e de cidade globais.

• Os jovens dos bairros mais pobres das cidades se tornam um problema social
para as autoridades e para a polícia. Pois, para esses jovens, com um pré-
conceito de estilo de vida formado, são excluídos da sociedade e a violência
se torna uma resposta imediata e cômoda para um mundo em permanente
mudanças.

• A violência urbana vem assustando e isolando os moradores em suas próprias


moradias e estão virando fortalezas.

• Atualmente, as pessoas vêm se equipando com tudo o que a tecnologia moderna


oferece no que se refere à alimentação, à informação, ao lazer e à comunicação,
evitando sair de casa nos horários de folga.

• O contexto e o cenário urbano apresentam um conjunto de rupturas, fissuras,


conflitos e distorções na área social.

• O aparecimento do urbanismo de segurança não traz total melhoria para as


cidades ou para regiões.

• A violência urbana e a insegurança que estão inseridos nas pessoas são


elementos que estão prendidos na vida diária de quem reside ou convive nos
centros urbanos.

152
AUTOATIVIDADE

1 Escreva um texto sobre a sua visão de violência urbana. Ele deverá ter no
mínimo 20 linhas.

2 Mais de um quarto dos presos do Centro de Detenção Provisória (CDP) de


Pinheiros I, na zona oeste da capital paulista, havia morado nas ruas. Há
alguns anos, percebe-se progressiva mudança da população carcerária dos
CDPs de São Paulo: além da tradicional parcela de acusados e condenados
por crimes patrimoniais com emprego de violência ou por tráfico de
drogas, passou a integrar o quadro prisional uma parcela da população sem
histórico de violência, habitante, majoritariamente, das ruas do centro da
cidade. Nos últimos três anos, o número de presos provenientes das ruas
da região central da capital paulista aumentou significativamente; a maioria
deles é presa pela prática de pequenos furtos e/ou porte de drogas. Os casos
são, em geral, similares: pessoas dependentes de crack que vivem nas ruas
e são flagradas furtando lojas ou tentando roubar transeuntes, sem o uso de
armas. Como são crimes leves, os acusados poderiam aguardar a conclusão
do inquérito em liberdade.

FONTE: Adaptado de <http://ibccrim.jusbrasil.com.br>. Acesso em: 25 jul. 2015.

Tendo esse texto como referência e considerando a relação entre políticas


públicas de segurança e realidade social nas metrópoles brasileiras, avalie as
seguintes asserções e a relação proposta entre elas.

I- A presença de policiais nas ruas das grandes cidades brasileiras atende, em


geral, à solicitação de lojistas, que constantemente se queixam da presença
de moradores de rua dependentes de crack.

PORQUE

II- O encarceramento de moradores de rua viciados em crack que praticam


pequenos delitos não resolve os problemas que afetam a população, como
os de segurança, violência, saúde, educação e moradia.

A respeito dessas asserções, assinale a opção CORRETA:


a) ( ) As asserções I e II são proposições verdadeiras, e a II é uma justificativa
correta da I.
b) ( ) As asserções I e II são proposições verdadeiras, mas a II não é uma
justificativa correta da I.
c) ( ) A asserção I é uma proposição verdadeira, e a II é uma proposição falsa.
d) ( ) A asserção I é uma proposição falsa, e a II é uma proposição verdadeira.
e) ( ) As asserções I e II são proposições falsas.

153
3 A sua cidade, o seu território, também está inserida no contexto da violência
urbana. Relate através de um texto (mínimo 20 linhas) e de forma crítica um
fato que ocorreu nos dois últimos anos em sua região.

154
UNIDADE 3
TÓPICO 3

VIOLÊNCIA E A EXCLUSÃO SOCIAL

1 INTRODUÇÃO
Este terceiro tópico tem como objetivo refletir a existência de novos
sentidos e significados do fenômeno da violência no Brasil. Também busca
argumentar que o seu aparecimento está vinculado às mudanças da natureza da
atual sociedade brasileira e está, por sua vez, inserida nos contextos das mudanças
que são consideradas mais abrangentes, ajustando os processos da globalização
de fragmentação.

A reflexão deste tópico articulará os novos ângulos de diagnósticos


e análises que levam a refletir a violência sendo uma relação entre a exclusão
e inclusão social. Compreendidas não como configurações excludentes e
dicotômicas, mas sim como conjuntos que integram uma mesma dinâmica.
Os atores, diante dessa dinâmica, são levados a vivenciar de maneira alterada
os modos de inclusão e exclusão decorrente de processos de cunho sociais e
fragmentados.

2 A VIOLÊNCIA COM UM FENÔMENOSOCIAL


ENTRE A INCLUSÃO E A EXCLUSÃO SOCIAL
A exclusão social, atualmente, tem sido uma categoria em destaque e
presente nas análises realizadas que visam incluir a violência e direitos civis.
Destaca-se o caso de que as pessoas excluídas dos seus direitos se tornam alvos e
até mesmo atores mais próximos da violência.

155
UNIDADE 3 | CONCEITOS, TEORIAS E TIPOLOGIAS DE VIOLÊNCIA, VIOLÊNCIA URBANA E SEUS REFLEXOS NA SOCIEDADE ATUAL

FIGURA 5 – EXCLUSÃO E INCLUSÃO?

FONTE: <http://www.ateuracional.com.br/2014/02/como-pode-o-sentido-sincero-de.html>.
Acesso em: 7 set. 2019.

Não se pode, de forma alguma, negar a importância dos vínculos, que, de


maneira geral, associam esses fenômenos que estão sendo propostos a refletir e
de forma igual aos aspectos como as manifestações e contextos de violência, em
que os protagonistas estão inseridos nas diferentes camadas ou grupos sociais,
onde são considerados quase sempre como incluídos.

Ou então, não seria mais relacionado refletir os contextos e as situações


nas quais as inclusão e exclusão, idealizadas como categorias que permeiam as
dimensões sociais, econômicas, políticas, religiosas e culturais de um determinado
espaço social. Nesse sentido, podem cruzar um lapso de um mesmo sistema de
atuação como um ator social, ou individual e/ou coletivo.

Esse enfoque se justifica mediante a contradição de reduzir a análise do


fenômeno para qualquer grupo de maneira unificadora, mas pela necessidade
de descobrir novos ângulos que consigam pensar a violência como uma relação
dinâmica e ágil entre a inclusão e exclusão. Deverão ser vistas não mais de
maneiras dicotômicas e excludentes, mas de forma contrária, como sendo
categorias complementares de uma dinâmica só, em que os atores sociais
vivenciam de formas alteradas a inclusão e exclusão social, que são consequências
dos processos sociais.

E
IMPORTANT

Este tópico está, basicamente, dividido em duas partes:

• A primeira, procura mostrar e analisar as transformações que ocorreram na natureza


do espaço social do país, trazendo através de uma relação ao movimento da inserção
da sociedade brasileira nos processos de mudanças que vão além da nossa sociedade
enquanto país.
• A segunda parte refletirá como os novos sentidos da violência articulam perante as
mudanças que vêm acontecendo.

156
TÓPICO 3 | VIOLÊNCIA E A EXCLUSÃO SOCIAL

As atuais mudanças que a nossa sociedade vem passando devem ser


compreendidas e analisadas como implementadas no contexto de transformações,
que tem como foco o contexto mundial e que acabam concordando em diversas
formas no processo de globalização e de fragmentação. Essas mudanças que
são decorrentes, mudam de maneira radical a natureza da organização social,
mostrando que as reflexões e os estudos voltados a realidades nacionais devem
levar em consideração sua inclusão no mundo globalizado.

O tema da violência tem o benefício de ampliar o conjunto conceitual e


também o espaço empírico por meio dos quais a violência pode ser analisada.
Mesmo que o objetivo da análise for a compreensão dos métodos e processos que
têm como foco a sociedade brasileira, entende-se a influência dos contornos do
Estado-Nação como ajuste para essa reflexão. Isso acontece devido às mudanças
que cruzam o conjunto da sociedade, desenvolve nos contextos das mudanças de
nível mundial e colocam reflexões com caráter nacional nessas transformações,
que são ponderadas em um só tempo como sendo resultantes do processo de
globalização mundial.

Essas transformações devem ser refletidas a um só tempo, sendo


propulsoras e resultantes desse processo de globalização no mundo. É importante
destacar que nessa discussão não está em questão a hipótese da superação do
Estado brasileiro.

Algumas das temáticas que estão nas agendas governamentais do Brasil


e de países europeus possuem semelhanças e alguns pontos de contatos, nas
quais as respostas encontradas possuem uma natureza com especificidades e
singularidades consideradas de certo ponto nacionais, de caráter irredutível aos
processos globalizados.

A globalização, por um lado, adquire o instituto de uma camada articulada


com o pensamento e análise a indicar a inclusão e a radicalidade de certas
mudanças, que não implicam a identificação da globalização e homogeneização.

Se é necessário supor que essas mudanças, em especial no nível


tecnocientífico, abordem o domínio planetário, das formas nas quais esse
movimento consegue se encontrar através das configurações sociais e
diferenciadas. Com isso, leva a definições e redefinições do espaço sociocultural
de forma diferenciada, em que o movimento da globalização, como uma tendência
e fragmentação, como um espaço empírico que acontece manifestações, podendo
constituir um só processo.

Pode-se definir como um movimento que ressalva a tarefa de análise que


apreciam as relações existente entre o geral e o particular na visão sociológica
da história. Através desses parâmetros de explicação que se pretende analisar e
compreender qual é inclusão da sociedade brasileira no contexto atual mediante
o mundo globalizado. E é nesse contexto que se espera pensar o fenômeno da
violência no país.

157
UNIDADE 3 | CONCEITOS, TEORIAS E TIPOLOGIAS DE VIOLÊNCIA, VIOLÊNCIA URBANA E SEUS REFLEXOS NA SOCIEDADE ATUAL

Com isso, o foco é aumentar o conhecimento e os estudos sobre a natureza


da questão social nas manifestações de violência que vêm ocupando determinados
lugares. Nesse sentido, é importante considerar, em primeiro lugar, que são
questões flexíveis e mutantes em uma sociedade, determinadas em épocas e
ambientes socioculturais e se nomeia como violência.

Em segundo lugar, respaldar o fato de acontecer algumas relações entre


as manifestações de fenômenos de violência com os processos de globalização
mundial que se percebem de forma imediata e direta. Essas formas são fáceis
de compreender se entendidos mediante os diversos mecanismos de mediação
que existem e acabam se fortalecendo entre os fenômenos de violência. Sobre o
primeiro aspecto, essa avaliação vai de encontro para perceber o que ocorre no
Brasil atualmente: uma ressignificação do fenômeno da violência.

A dificuldade de definir o conceito de violência é consequência do fato


que não se pode considerar como um conceito sociológico, mas de uma categoria
de ordem empírica de manifestação social, onde sua compreensão depende das
disposições societárias de que surgem.
As recorrências que surgem das análises é que o fenômeno da violência se
diferencia como algo ambíguo e muito relativo.

Michaud (1978) afirma que essas ambiguidades da violência e relatividade


da noção de violência precisam ser investigadas por meio de uma análise que
interrogue sobre o que se considera sobre este fenômeno. Para Michaud (1978, p.
23), “é a violência da violência, isto é, as condições a partir das quais a violência é
apreendida como tal”. Para o autor, nessa análise permite surgir o uso político que
se faz da categoria e dos discursos que são feitos sobre o fenômeno da violência
diante dos contextos sociais marcados.

[...] a noção de violência é... por princípio ambígua, sua significação


estabelecida por procedimentos políticos segundo o grupo que, em
um dado momento, tem o poder de rotulá-la contra outros [grupos]
pode aparecer e desaparecer segundo quem fala. Concretamente,
isto significa que ela pode continuar sendo o que é ainda que nem
sempre seja reconhecida ou desconhecida como tal. As multidões
de torcedores de equipes esportivas não cometem violências mais
‘depredações em função da má educação do público esportivo’.
As brigas que se seguem aos bailes de sábado à noite tornaram-se
violência, ao passo que durante muito tempo elas eram apenas parte
do folclore do alcoolismo nacional. De maneira menos benevolente,
um opositor político pode ser, segundo o caso, um criminoso, sujeito
ao direito comum, um terrorista, um dissidente, um contestador ou
um esquizofrênico; não se trata simplesmente de uma questão de
palavras: pode-se aperceber disso a partir do tipo de ‘tratamento’ a
que será submetido (MICHAUD, 1978, p. 92).

No conjunto de exemplos que Michaud (1978) cita percebe-se o


remanejamento de sentido, em que, atualmente, é a condição de violência que
são compreendidos os distúrbios que acontecem provocados pelas torcidas
esportivas. Outro exemplo parecido na realidade da sociedade brasileira são

158
TÓPICO 3 | VIOLÊNCIA E A EXCLUSÃO SOCIAL

os crimes de violência sexual. Situações como essas se aproximam com o que o


profissional Educador Social faz no seu cotidiano de trabalho.

Há algumas décadas, o estupro e a violência contra mulher eram atos


tratados no contexto social e não eram vistos como violência. Com a criação das
delegacias da mulher e com a criminalização dos atos de violência contra mulher
sinalizam novos sentidos do que se entende por violência, colocando a mulher em
outra condição. Esse novo cenário desponta para uma maior igualdade entre os
sexos, em que a mulher consegue na medida se constituir como pessoa portadora
de direitos adquiridos.

Nesse mesmo sentido, segue em relação ao que se admite de acordo com


as esferas do público e do privado, o que permite o reconhecimento de crianças
e adolescentes também como sujeitos de direitos, que, em suas próprias defesas,
conseguem discutir juridicamente o arbítrio do poder familiar.

Esse assunto também é importante para se pensar sobre as condições de


minorias sexuais, em que as conquistas rumo ao reconhecimento das diferenças
que existem têm favorecido o deslocamento das questões de gênero, num grau
físico-biológico, nas quais as diferenças sexuais eram vistas e assumidas como
uma doença, e nesse contexto a opção sexual é vista com um direito.

As transformações na preocupação com a noção de violência, conforme


os exemplos anteriores mencionados, sinalizam um novo momento da história.
O qual não está se esperando que as formas de preconceito e as manifestações de
violência venham a desparecer da sociedade brasileira, mas que evidenciam de
certa maneira as mudanças na natureza das questões sociais, nas mudanças que
as análises sociológicas terão que se esforçar para compreender e avaliar.

Essas análises deverão ser utilizadas como mecanismos para desenvolver


uma fundamentação que avança na orientação dessas reflexões sobre o tema da
violência. Podemos considerar como hipótese e que caminham para duas direções
de raciocínio.

A primeira hipótese defendida por Elias (1990), de maneira pouco ortodoxa


em sua análise do processo civilizatório, julga que a sociedade brasileira traspõe de
novos patamares nesse processo, ocorrendo uma reconceitualização da violência,
de forma a incluir e nomear como forma de violência fatos e ocorrências que antes
eram vistas como práticas costumeiras de regulamentação das relações sociais.
As práticas que são estabelecidas em uma rígida hierarquização das questões
sociais são constituídas a desigualdade como sendo um processo legítimo, na
fundamentação do social.

Para Freire (2006), essas práticas nas quais a diferenciação do público e


do privado propiciava, segundo o autor, o desenvolvimento de uma sociedade,
defendida “menos pela ação oficial do que pelo braço e pela espada do particular”
(FREIRE, 1963, p. 69). Segundo Porto (2000, p. 5): “a mudança, que parece

159
UNIDADE 3 | CONCEITOS, TEORIAS E TIPOLOGIAS DE VIOLÊNCIA, VIOLÊNCIA URBANA E SEUS REFLEXOS NA SOCIEDADE ATUAL

pertinente assinalar, refere-se fundamentalmente à propensão a se nomear e a


se reconhecer a violência, sendo concomitante a essa realidade a recusa em se
atribuir legitimidade à violência enquanto forma de estruturação e de regulação
do social”.

No contexto nacional, as organizações da sociedade civil propiciam


indicações que confirmariam a ligação dessa hipótese, quando sinaliza como
sendo uma crise ou barbárie, formas de violência que foram muitas vezes vistas no
passado como traços culturais da sociedade da época. Com isso, pode-se afirmar
que, atualmente, a sociedade brasileira vê a violência de forma diversa das que se
conformavam o social nas épocas da casa-grande e senzala. Não é muito ressaltar,
mas não estamos enfatizando nenhuma afirmação em relação a uma avaliação
quantitativa do fenômeno da violência. Nessa argumentação não está em questão
que se trata mais ou menos da violência, mas, sim, do fato do significado social
que aparece atualmente, diferente do que foi em tempos anteriores.

Esse fato também está junto à percepção que tal mudança se semelha
simultaneamente com o despertar de uma suscetibilidade coletiva, em que, por
mais duvidosa que essa noção possa ser, mais afiada intercede como inaceitável a
estruturação das demandas sociais pelo fenômeno da violência.

Na segunda direção, para qual essa hipótese caminha, sem conjecturar


com as relações mecânicas de causa e de efeito, não é necessário ainda descartar
os níveis de dependência entre reconceitualização da violência. Nesses termos,
a maior visibilidade do fenômeno da violência acaba se potencializando com o
mecanismo e processo de redemocratização. De acordo com Porto (2000, p. 6):

Enquanto produto de demandas e conquistas da sociedade civil,


o retorno à democracia, ou de práticas sociais institucionalizadas,
articula-se a um movimento amplo de reivindicação do estado de
direito enquanto condição de realização da igualdade na cidadania. Isso
significa, também no nível jurídico, a reivindicação de procedimentos
menos particularistas, mais conforme ao apelo por normas mais
universalistas, características da modernidade.

Considerando que esses processos são principiantes, o significado para


a reconstrução institucional não pode ser considerado desprezível. Para que os
objetivos da análise das hipóteses se concretizem, é pertinente exigir uma maior
visibilidade do fenômeno da violência no processo de redemocratização. Ou
então da sua rejeição como consequência de um aprimoramento que se chama
de sensibilidade coletiva, por meio desta acontece uma articulação igualmente a
uma postura energética da sociedade diante da violência impune.

Na argumentação de Elias (1990), mesmo que se corra o risco de


compartilhar um determinado viés evolucionista, é compreensível arriscar uma
afirmação de que a sociedade brasileira conquistou patamares de civilidade que a
viram intransigente diante da violência, sendo compreendido o que se considera
como redefinição, e há impunidade para os atos e atores da violência.

160
TÓPICO 3 | VIOLÊNCIA E A EXCLUSÃO SOCIAL

O chamado por penalidade e por justiça em relação à violência policial,


que por meios de comunicação se tornam mais visíveis no vigor de práticas
consideradas democráticas, sendo esse um exemplo a ser considerado. Para
Michaud (1978, p. 101), a unidade social que impede a violência de surgir repousa
sobre metodologias rígidas de dominação: “[...] não é sem significação que a
noção de violência tenha aparecido e continue a aparecer preferencialmente em
sociedades mais democráticas do que totalitárias e que duvidem delas mesmas: o
terror produz ao contrário todas as aparências de calma”.

Michaud (1978) afirma ainda que o mundo moderno se pensa de forma


mais violenta que no passado, essa comparação é carente de qualquer sentido: “o
que era brutalidade, rudeza, ordem normal da miséria ou da dominação tornou-
se insuportável” (MICHAUD, 1978, p. 101).

E
IMPORTANT

Caro acadêmico, nesta conjuntura podemos fazer o seguinte questionamento:


quais relações poderiam e deveriam ser pensadas entre os processos de globalização
mundial, sua relação com a questão social no Brasil e a violência?

Existe uma primeira relação fundamental para ser analisada que está
evoluindo, conecta-se à ocorrência que, no Brasil, a sociedade não está ausente
das mudanças científicas e tecnológicas que ocorrem mundialmente. A maneira
que o modo se concretiza foge dos objetivos deste tópico, pois o estudo dessa
questão exige um estudo com análises empíricas e específicas.

No entanto, vale refletir sobre as possíveis repercussões das mudanças em


algumas dimensões do contexto e da vida social, como exemplo podemos citar os
processos de informação. O Brasil, pode-se dizer, que imergiu de maneira mais
radical do que os países considerados avançados, na chamada “era das novas
tecnologias”.

Não parece exagerado afirmar que a radicalidade e a abrangência


das mudanças seriam de alguma maneira formas de violência, pois estas
interrompem, redefinem, desarticulam e extrapolam o habitual e tradicional.
Ainda os procedimentos de organização social, afeta a sociedade em muitos
aspectos e diversos domínios:

• Da economia.
• Da social.
• Da política.
• Da cultual.
• Da religiosa, entre outras.
161
UNIDADE 3 | CONCEITOS, TEORIAS E TIPOLOGIAS DE VIOLÊNCIA, VIOLÊNCIA URBANA E SEUS REFLEXOS NA SOCIEDADE ATUAL

O excessivo consumo tecnológico em que a sociedade brasileira está


mergulhada deve ser analisada e compreendida com profundez, pois vem se
mostrando um elemento fundamental nas descrições culturais. As transformações
no mundo tecnológicos são decorrentes dos progressos da ciência que alteram a
relação existente física e cultural com determinado espaço e território.

Podemos citar que o Brasil está cada vez mais inserido na cultura
consumista, através dos shoppings centers, de espaços que são tecnologicamente
organizados e controlados, tanto nos aspectos que dizem respeitos à segurança
e aos mecanismos de sociabilidade que estão em discussão nos espaços urbanos.

Tais mudanças afetam a extensão espaço x tempo, em dimensões que


não eram pensadas até poucos anos. Esses novos processos de produção de
conhecimento acabaram revolucionado os métodos de divulgação da informação.
Nessa realidade, consegue-se afirmar o surgimento de um mundo virtual em
que existe a convivência em níveis diferenciados de tensão e de integração com
o mundo real, através de mudanças radicais no sentindo que possa vir a ser a
experiência.

Os mais diferentes meios eletrônicos, ao mesmo tempo que permitem a


simultaneidade entre os episódios e as informações que ocorrem no mundo no
exato momento, de certa maneira preservam os indivíduos, intermediando os
mais diversos contatos com o mundo real.

NTE
INTERESSA

O mundo virtual “constrói” o mundo real.

Como exemplos de que o mundo virtual interfere o mundo real são os


aplicativos de relacionamentos, ou se viaja no espaço interplanetário ou sentem
os horrores da guerra através dos computadores ou dos jogos eletrônicos. Já em
outro contexto, consegue transformar o real em um espetáculo, através dos meios
de comunicação de massa. Segundo Porto (2000, p. 7):

Isso acontece com o fenômeno da violência, que acaba transformando


em produto, é o que ocorre, por exemplo, com o fenômeno da violência,
transformado em produto, com amplo poder de venda no mercado de
informação, e em objeto de consumo, fazendo com que a ‘realidade’ da
violência passe a fazer parte do dia-a-dia, mesmo daqueles que nunca a
confrontaram diretamente enquanto experiência de um processo vivido.

A violência passa a fazer parte de um movimento dinâmico, no qual o


consumo excessivo faz parte do processo de reprodução da violência. E acaba
multiplicando as categorias da forma que se percebe a violência.
162
TÓPICO 3 | VIOLÊNCIA E A EXCLUSÃO SOCIAL

TUROS
ESTUDOS FU

A inclinação das pessoas para o consumo em evidência ao tecnológico é


uma temática que será refletida com mais intensidade, pois está articulada com objetivos
propostos dessa unidade, diante da participação dos processos de ressignificação das
demandas sociais e da violência como parte das mudanças que demandam na sociedade
brasileira.

O segundo viés de reflexão é decorrente de transformações que vêm se


efetivando em especial no mundo do trabalho, que têm sua direção apontada
para sua superação como componente hegemônico de organizações social, como
também nas relações sociais.

Em uma sociedade regida pelo trabalho, as classes sociais poderiam ser


efetivadas como categorias que unificam o social. Isso pode ser considerado um
elo organizador de materiais e ideais, enquanto meio de estruturação no campo
de lutas sociais, ou então como um espaço construtivo de identidades, que na sua
maioria é relacionada as demandas de trabalho.

As transformações tecnológicas que ocorrem sobre o mundo do trabalho


de forma direta acabam deslocando sua atitude de centralizador enquanto
organizador de um espaço sociocultural. Acabam transformando as demandas
sociais e afetam o trabalho e todas suas dimensões ideológicas, essas que são
essenciais para definir as condutas e modos de vida de cada indivíduo.

Considerando o trabalho enquanto valor, que é responsável pela unidade


do social e por uma representação unificada, as mudanças desse mundo e
os valores que nele estão centrados, confirmam o aparecimento de um social
fragmentado e sem referências em pontos fixos e estratégicos.

O homem e os grupos sociais não reconhecem quais são seus valores


e normas coletivas, o que fornece diferentes disposições societárias, que são
completamente articuladas com o surgimento de novos atores e a redefinição
de atores tradicionais ao meio em que estão inseridos. Dois aspectos devem ser
respaldados: a multiplicidade valorativa, que está potencializada nestas e por novas
mudanças e a sua afinidade com as ressignificações do fenômeno da violência.

Nessa perspectiva, Michaud (1978) enfatiza a preocupação em isolar


os fatos sociais de suas manifestações individuais recorrendo as delimitações
das maneiras cristalizadas de vida, que em si são regras morais, jurídicas e
os mitos populares que são constitutivos como referências para as ações. Para
se fundamentar nessa teoria, Michaud se baseia na teoria de Durkheim, que
reconhece a ocorrência de circunstâncias nas quais haveria correlações entre a
forma cristalizada e a dinâmica social.

163
UNIDADE 3 | CONCEITOS, TEORIAS E TIPOLOGIAS DE VIOLÊNCIA, VIOLÊNCIA URBANA E SEUS REFLEXOS NA SOCIEDADE ATUAL

E
IMPORTANT

FIGURA – DAVID ÉMILE DURKHEIM

FONTE: <https://s1.static.brasilescola.uol.com.br/be/conteudo/images/1-mile-durkheim.jpg>.
Acesso em: 6 dez. 2019.

David Émile Durkheim nasceu em 15 de abril de 1858, no seio de uma família judia, na região
francesa de Lorena. Deixou de lado os estudos numa escola rabínica e posteriormente
optou por uma educação secular, seguindo um caminho em alta numa França marcada
pela ascensão do discurso da modernidade e da corrente positivista. Foi aprovado para
ingressar na École Normale Supérieure, grande centro de formação da elite intelectual
francesa.

Após a formação em filosofia, Durkheim lecionou em várias escolas francesas e depois


mudou-se para a Alemanha, onde estudou ciências sociais e publicou vários artigos que
lhe renderam renome internacional. Ao retornar para a França, tornou-se professor na
Universidade de Bordeaux em 1887 e foi encarregado a assumir o curso de Ciências
Sociais e Pedagogia, sendo o primeiro curso desta natureza na França.

A primeira grande contribuição de Durkheim para a sociologia é a proposição de um


método científico autônomo, positivo, capaz de alcançar o mesmo nível de confiabilidade
e prestígio das outras ciências já consolidadas no século XIX. Em “As Regras do Método
Sociológico”, Durkheim dirá que a primeira e mais importante regra da sociologia é “a de
considerar os fatos sociais como coisas”.

Ao equiparar os fatos sociais como “coisas”, Durkheim afirmava que o mundo social
era passível de ser estudado da mesma forma que o mundo natural, com objetividade
e independente das ações individuais, buscando observar suas regularidades da mesma
maneira que um químico observa um fenômeno no laboratório.

O sociólogo deveria deixar de lado suas pré-noções para poder tratar os fatos sociais
com imparcialidade, como fenômenos exteriores ao universo psíquico dos indivíduos e
assim obter resultados válidos, elaborar leis e até prever ações. A obra de Auguste Comte
exerceu forte influência na construção desses pressupostos.

FONTE: <https://medium.com/paiol/a-sociologia-de-%C3%A9mile-durkheim-cc8a5be292ca>.
Acesso em: 9 set. 2019.

De acordo com Michaud (1978), essa eventualidade é uma possibilidade


de não encontrar os pontos fixos para se objetivar um fato social, ou que esses
pontos fixos sejam variáveis, sendo essa uma expressão contraditória até mesmo

164
TÓPICO 3 | VIOLÊNCIA E A EXCLUSÃO SOCIAL

de Durkheim, assumida como uma pluralidade conflitual de questões fixas que


tem a pretensão de validade. Segundo Michaud (1978, p. 98):

Trata-se da eventualidade de que, com relação a certos fenômenos,


haja uma pluralidade de maneiras de percebê-los. Ora, é exatamente
isto o que ocorre com relação à violência.... Enquanto existem pontos
fixos, fruto do consenso cultural ou da imposição pela força, a
violência não pode aparecer enquanto tal: os dominantes a exercem,
os dominados sofrem-na, mas ela não pode ser dita.... Quando cai por
terra a inquestionabilidade dos pontos fixos, abre-se o espaço, ainda
que restrito, no qual os discursos podem dizer a violência – entretanto,
eles serão necessariamente conflituais uma vez que os pontos fixos
são, a partir daí, diversos e variáveis sem relação a eles mesmos.

Como em uma determinada sociedade, a violência é identificada de formas


múltiplas e diferenciadas, é, para Michaud (1978), a consequência da inexistência
de pontos fixos para que aconteça a objetivação do social. Esse fenômeno é
abordado de maneira contundente na análise da modernidade defendida por
Max Weber, em termos do paradoxo de valores e da guerra dos deuses (WEBER,
1986).

Diante da perspectiva que está sendo considerada, e mantendo a sociedade


brasileira como referência, as mudanças que estão sendo analisadas é o que
está se titulando sua inserção na sociedade moderna e globalizada, através da
reconstrução dos processos de democratização. E acabam sendo potencializadoras
da fragmentação valorativa, que se conforma como um método de dissolução de
regras e normas que unificam uma visão sobre o social. As considerações descritas
levam à segunda parte deste tópico de estudo, que se objetiva pensar as reflexões
realizadas e os significados da violência.

Diante das argumentações que foram abordadas até agora, a violência não
pode ser analisada fora do campo social e que está inserida. Se a natureza do social
muda, as maneiras de manifestações da violência e seus significados também
mudam. O social, sem uma categoria ou um ponto fixo de referência, fica passível
a vários arranjos societários, uma decorrência que pode ser possível é a explosão
de diversas lógicas de ação como também de organização e reorganização do
espaço e do contexto social.

Essas lógicas abrem mão de soluções diferenciadas de ação e de atuação,


as quais podem considerar os recursos à violência. Essa que vem sendo
caracterizada como prolixa e automatizada diante dos sentidos de origem, sendo
uma violência sem foco, despolitizada e instrumentalizada. A violência não é um
fato recente que surgiu na sociedade moderna, isso quer dizer que sua presença
insinua continuidade do fenômeno, ou seja, é o novo que dá essas características
à violência. As violências modernas e contemporâneas possuem formas que a
diferencia de seus hábitos tradicionais de manifestação, contribuindo para sua
destruição e redefinição. Tais formas estão vinculadas a dois fatores:

165
UNIDADE 3 | CONCEITOS, TEORIAS E TIPOLOGIAS DE VIOLÊNCIA, VIOLÊNCIA URBANA E SEUS REFLEXOS NA SOCIEDADE ATUAL

QUADRO 1 – FATORES E ASPECTOS DA VIOLÊNCIA MODERNA

Fator Aspectos Descrição


1º Questão de Valores Acontece por meio da fragmentação
sociocultural, falta de uma
representação unificada do social,
falha de pontos fixos de referência
norteadores de conduta, são
expressões de uma fragmentação
valorativa, com repercussões,
por exemplo, nos processos de
construções identitárias
2º Violência, como manifestação das mudanças do Esta estaria catalogada à questão
mundo contemporâneo da legitimidade, das formas como
ela é apreendida e do conteúdo
mesmo da noção de legitimidade.
A violência política é um exemplo,
com característica das décadas
60 e 70, procurava sua aspiração
de legitimidade na própria
legitimidade da causa, no foco que a
estabelecia.

FONTE: Adaptado de Porto (2000)

Esse conteúdo é que repassava e informava a representação que todos


os atores estabeleciam em suas práticas. Essa representação estava ligada ao
que se chama de autoconsumo dos atores da violência, funcionando como uma
moeda de troca. Com isso, buscava-se ampliar a sua legitimidade na sociedade,
desqualificando seus inimigos.

Essas formas da violência não foram extintas completamente, mas deram


espaço a outros conteúdos. Podemos citar como exemplo o deslocamento de
valor do conjunto trabalho que destrói a identidade e produz o crescimento
do ser humano individualizado, como que, ao mesmo tempo, elabora novas
identidades coletivas, que são articuladas a uma multiplicidade de perspectivas
que acabam sendo mais complexas que a polarização da relação capital e trabalho
e que acabaram sendo legitimadoras de alguns sentidos que a violência assumia
para si.

Tal mudança é experimentada na reflexão fundamenta por Wieviorka


(1997). Com relação aos países da Europa Ocidental:

O declínio do movimento operário e a perda do lugar central das


relações de produção industriais tornam improváveis a ideia de
uma ligação entre importantes violências sociais e a inserção de seus
agentes num conflito estrutural de classe, no sentido habitual da
expressão. Não é mais a luta contra a exploração, a sublevação contra
um adversário que mantém com os atores uma relação de dominação,
e sim a não relação social, a ausência de relação conflitual, a exclusão
social, eventualmente carregada de desprezo cultural ou racial,
que alimentam hoje em toda parte do mundo, inclusive na Europa

166
TÓPICO 3 | VIOLÊNCIA E A EXCLUSÃO SOCIAL

ocidental, condutas amotinadoras ou uma violência social mais difusa,


fruto da raiva e das frustrações (WIEVIORKA, 1997, p. 7).

Wieviorka (1997) sinaliza ainda o fato de a violência, hoje, não possuir


mais legitimidade social ou política na condição de regulamentação social,
registrando-se como não social e que acaba invadindo o social. Mesmo correndo
o risco de generalizações inconsideradas e até mesmas precipitadas às últimas
manifestações que ocorreram na Europa apontam para a renúncia de legitimidade
à violência política.

Nessa probabilidade da esfera valorativa, aparecem novas formas de


manifestação da violência, que parecem ter esgotado das práticas dos conteúdos
de normatividade e de sentido, assegurando-se como recurso de ação, de
mecanismo e de meio. O social é considerado múltiplo, decorrente das diversas
lógicas de ação que nele estão presentes. Diante dessa condição de recurso, a
violência está inserida em um rol de estratégicas e ações.

A sua utilização não se vincula com nenhuma estrutura de hierarquia


valorativa, sendo considerada uma questão de eficácia ou de oportunidade de
acordo com o contexto em que está inserida. Com isso, pode-se afirmar que é
uma violência que se autonomiza diante de sentidos de origem ou que se constrói
enquanto violência desprovida de qualquer objeto.

Os fenômenos de violência estão inseridos enquanto produto no


contexto de mudanças através de processos na sociedade contemporânea, esses
se constituem em fator de mudança do social na medida em que as interações
resultantes da violência se interagem. Os grupos sociais, que são considerados
atores de violência, conseguem impor formas de regulação a partir da lógica
violência. Esses atores instituem novos mecanismos de interação, criando uma
multiplicidade de novas identidades.

Essas identidades são construídas com muito mais referências culturais


do que econômicas e sociais. Um exemplo é a formação de identidades coletivas,
que acontece pelo apelo racial, religioso, biológico, social e outros.

Diante da pluralidade de valores e de conformações sociais que são


resultados dos processos de transformação social, os sentidos, as definições de
violência são sempre variáveis. Quando percebemos a natureza do novo contexto
na violência, identificamos o surgimento de novas lógicas de ação, sendo incluída
a violência como uma prática instrumentalizada, despolitizada.

A natureza das influências mútuas sociais a elas subjacentes e esses novos


atores que são produzidos devem ser submetidos a uma análise sociológica.
Segundo Wieviorka (1997), um componente importante nessa tarefa é a
necessidade de perceber níveis ou até mesmo instância que faz essa mediação
entre as transformações sociais e os fenômenos de violência. Segundo Wieviorka
(1997, p. 11):

167
UNIDADE 3 | CONCEITOS, TEORIAS E TIPOLOGIAS DE VIOLÊNCIA, VIOLÊNCIA URBANA E SEUS REFLEXOS NA SOCIEDADE ATUAL

Se há certamente uma ligação entre a violência e essas mudanças


sociais, tal ligação não é automática e imediata, a violência deve ser
concebida a partir dessas mediações. Ela não surge diretamente da
mobilidade descendente, ou da crise; assim, os motins dos bairros
difíceis da França ou da Inglaterra ou das grandes metrópoles
americanas sobrevêm por ocasião de excessos policiais ou de decisões
inadequadas da justiça, bem mais do que como um protesto contra
o desemprego; a raiva e o ódio dos jovens exprimem-se certamente
tendo por trás um cenário marcado por dificuldades sociais, mas
correspondem acima de tudo a sentimentos fortes de injustiça e de não
reconhecimento, de discriminação cultural e racial. O desemprego e a
pobreza não se traduzem imediatamente ou diretamente em violências
sociais, mas, sobretudo alimentam frustrações.

A citação de Wieviorka (1997) insere o pensar a respeito de manifestações


de violência que ocorrem no Brasil e que envolvem a violência policial. Não
se pretende realizar um estudo de caso, mas pode-se citar dois exemplos que
aconteceram há algum tempo, mas que chamou a atenção de todo país. Esses dois
fatos ocorridos e mencionados foram objeto de mobilização nas diferentes esferas
da sociedade.

E
IMPORTANT

O primeiro fato trata-se de atos de violência exercitados por policiais militares


contra populares na Favela Naval em Diadema, São Paulo. As agressões foram gravadas
em vídeo e exibidas pela televisão, no Brasil e no exterior.

No outro fato, cinco jovens, sendo um menor, jogaram álcool e atearam fogo no índio
Pataxó, Galdino Jesus dos Santos, que dormia em um ponto de ônibus, queimando-o
vivo e gerando sua morte. O fato aconteceu a 20 de abril, véspera da data em que se
comemora o Dia do Índio, no Brasil.

A violência oriunda de jovens, ou então de indivíduos das camadas


consideradas médias na sociedade deveriam ser pensadas como uma manifestação
em que os atores vivenciam os processos de inclusão e exclusão. Para Porto (2000,
p. 11):

Jovens integrados na dimensão socioeconômica, participantes dos


direitos que os definem como cidadãos, manifestam, pela violência,
uma exclusão dos processos identitários. Os grupos ou gangues em
que se inserem não parecem constituir uma expressão da construção
de identidade, mas de um individualismo que apenas atua através do
grupo. Mergulhados, mais do que inseridos, em um social carente de
pontos fixos de referência, estes indivíduos expressam uma exclusão
que não é social, é existencial.

Segundo Weber (1986), os excluídos do que seja a percepção de um


sentido de vida acabam inviabilizando a percepção do sentido do que é morte.
168
TÓPICO 3 | VIOLÊNCIA E A EXCLUSÃO SOCIAL

Como no caso dos jovens de Brasília, uma brincadeira que acabou dando errado
e resultando em morte.

Atualmente, não existe uma instrumentalização da violência, pois não


existe um objetivo a ser atingido. Não existem nem estratégias e nem táticas
para executar a violência, pois os atores lutam contra um sistema, mas podemos
considerar uma afirmação de força como cede à negação do sujeito.

A violência sem objeto de ação e destituída de qualquer sentido, age pela


emoção, pelo jogo e pelo poder, constituindo em um fim em si próprio, indiferente
se as pessoas são vistas como objetos. Citando Porto (2000, p. 11) novamente: “uma
destruição que se transforma em autodestruição, uma necessidade de inclusão
(afirmação como sujeito) que leva à exclusão, expressa em comportamentos de
automarginalização”.

O fenômeno da violência na categoria policial está vinculado à outra


ordem de significados. É o resultado de uma crise que vem se alastrando nos
processos de seguranças, e que acaba transitando nos perímetros frágeis entre a
violência legítima, aquela que é exercida por meio do monopólio do Estado, em
que o ator é a autoridade policial e ilegítima, que é o desdobramento da mesma
autoridade.

O frágil sistema e a precariedade materiais do agente policial e da inserção


social, que estabelece os limites entre a integração formal do sujeito de direitos e a
sua exclusão de participação da sociedade de consumo, em relação à expectativa
e possibilidade de satisfação de suas demandas, sendo elas material, econômico e
social, ou ideal, cultural, religiosa e política.

Essas são pessoas marginalizadas diante da escala de prestígio social, mas


que são detentoras, mesmo através do ato de intervenção policial, do poder e
de autoridade, que significa o poder de escolha entre a vida ou a morte. Nesse
caso, consegue-se pensar nos resultados e nas consequências no que se refere à
construção social de suas identidades, sendo elas consideradas individuais ou
coletivas.

As subjetividades que são reprimidas e colocam em ação uma lógica


duvidosa, em que a violência legítima e ilegítima que se entrosam em um processo
onde a violência como mecanismo, instrumento, recurso ou estratégia se manifesta
igualmente aos sentimentos de revoltas e raivas, que a descriminação social desse
conjunto faz vir à tona diante do fenômeno da violência. Para Wieviorka (1997, p.
37), esses são contextos nos quais a violência tem:

[...] a marca de uma subjetividade negada, arrebentada, esmagada,


infeliz, frustrada...Deste ponto de vista, a violência é suscetível
de emergir na interação ou no choque de subjetividades negadas
ou destruídas, como se observa em determinados motins, onde o
sentimento, por parte dos amotinados, de não serem reconhecidos
remete os policiais à convicção simétrica de serem desvalorizados ou
insultados por aqueles que ele deve reprimir.

169
UNIDADE 3 | CONCEITOS, TEORIAS E TIPOLOGIAS DE VIOLÊNCIA, VIOLÊNCIA URBANA E SEUS REFLEXOS NA SOCIEDADE ATUAL

Os meios de comunicação estão repletos diariamente de notícias com


situações atuais em que a repressão policial é utilizada para manter a ordem, em
casos que têm ares de guerra civil, produzindo uma violência exagerada, fora
de seu contexto. Do outro lado expõe quando a produção social da insegurança
faz da violência uma reprodução onipresente, com a institucionalização da
segurança privada, como sendo a solução para essa demanda. Segundo Paixão
(1995), quadro que beira a anomia, quando esta última se efetiva através do que
chama, ao lado de outras possíveis modalidades, de grupos neo Vigilantes de
venda privada de segurança pública.

A crise dos poderes públicos na esfera da segurança pública e na


precariedade de vida material e simbólica dos trabalhadores, agentes dessa
segurança são componentes para uma manifestação associativa entre o público e o
privado, que busca se constituir para a consolidação de uma sociedade moderna.

No início deste tópico foram discutidas sobre as transformações na natureza


da sociedade brasileira como produto de mudanças no mundo globalizado,
como apresenta as representações destas transformações nos sentidos sociais da
violência.

Ao mesmo tempo, marca a impossibilidade de se situar as relações diretas


entre esses fenômenos de violência ou a urgência de uma análise sociológica que
possa refletir sobre as condições de mediações que viabilizam o entendimento
dos novos sentidos da violência no país, mediante as variáveis que pontuam
as diferenças culturais. As reflexões que foram expostas neste tópico andam no
sentido de mostrar a natureza do espaço público como sendo uma alternativa
viável para se pensar tais mediações.

A elaboração de um espaço público com níveis crescentes de autonomia


e também de institucionalização geram o espaço para consolidar as demandas
mais universais diante dos interesses particulares, ou nos espaços de participação
social da sociedade civil. Wieviorka (1997, p. 38), em seus estudos, argumenta:

Se a violência, mesmo não política, infra ou metapolítica, remete ao


ponto central onde se situa a política, isso significa que ela surge e
se desenvolve através das carências e dos limites do jogo político, e
que ela pode também, se as condições políticas estiverem reunidas,
regredir ou desaparecer em função de um tratamento institucional das
demandas que ela vem traduzir.

Interpretando a fundamentação de Wieviorka (1997), pode-se constatar


que se a delimitação de um espaço público, diferente da ordem privada e da esfera
estatal se torna parte constituinte do aprimoramento das demandas coletivas,
sendo também que sua carência responde pelos novos sentidos dos fenômenos
da violência no alcance que coage as possibilidades de consolidar mecanismos de
institucionalização do debate e do conflito.

A pluralidade de valores e a fragmentação do social nos diversos graus


que a modernidade tem lançado precisam de espaços de manifestações das
170
TÓPICO 3 | VIOLÊNCIA E A EXCLUSÃO SOCIAL

diferenças socioculturais e dos conflitos, como instrumentos de prevenção contra


a violência na sociedade brasileira.

DICAS

Acadêmico, segue uma dica de leitura para aprofundar seus conhecimentos:

FIGURA – CRIME E CASTIGO

FONTE: < https://d38h3sy5jr28pf.cloudfront.net/capas-livros/9788573262087-fiodor-


dostoievski-crime-e-castigo-439743951.jpg>. Acesso em: 6 dez. 2019.

Com muita honra aceitei o convite do amigo e colega Salah Khaled, para prefaciar a obra que
o leitor tem em mãos, de grande relevo para o debate criminológico contemporâneo, em
especial no que se refere à Criminologia Cultural. O que justifica para nós o conhecimento
e os estudos da Criminologia Cultural, como produto importado, é a busca necessária
de um novo paradigma de pesquisas e análises, que leve em consideração as emoções
humanas e seja sensível às demandas e avanços sociais. Um modelo de pensamento mais
produtivo que as abordagens criminológicas tradicionais, conservadoras e retrógradas;
uma alternativa realista e viável ao discurso simplório e violento do punitivismo de cunho
fascista, que especialmente hoje, domina o debate nacional, principalmente na mídia, cuja
ação, segundo a Criminologia Cultural, é hoje estudo indissociável e obrigatório a qualquer
abordagem mais abrangente do sistema penal, do crime e do controle da criminalidade, no
mundo inteiro. Apesar de as suas principais obras de referência ainda estarem sem versão
em português, alguns intelectuais brasileiros, como o autor dessa obra, contribuem com
produção e publicações que fazem uma excelente aproximação dos conceitos, abordagens
e métodos inovadores propostos, dentro do objetivo de perturbar intelectualmente, ou
"manter girando o caleidoscópio das maneiras pelos quais pensamos sobre o crime e,
mais importante, sobre as respostas jurídicas e sociais à quebra de regras.", nas palavras
de Hayward. Para essa atingir essa meta, um bom começo é se dedicar à proveitosa
leitura das páginas que seguem, de modo a obter uma ideia muito clara do que é e o que
pretende essa proposta de revisão conceitual e metodológica dos estudos sobre crime e
controle de criminalidade. Trata-se, portanto, de leitura instigante e prazerosa, uma vez que
os capítulos são autônomos, dinâmicos, bem escritos e fundamentados, produzidos em
prosa madura e cuidadosa. O que resulta é a inspiração ao debate e à pesquisa, [...]

FONTE: JUNIOR SALAH, H. K. Crime e Castigo. Ensaios de Resistência, Controle Social e


Criminologia Cultural: Portuguese Brazilian Paperback, 2018.

171
UNIDADE 3 | CONCEITOS, TEORIAS E TIPOLOGIAS DE VIOLÊNCIA, VIOLÊNCIA URBANA E SEUS REFLEXOS NA SOCIEDADE ATUAL

LEITURA COMPLEMENTAR

A CARTA DA TERRA

PREÂMBULO

Estamos diante de um momento crítico na história da Terra, numa época


em que a humanidade deve escolher o seu futuro. À medida que o mundo torna-
se cada vez mais interdependente e frágil, o futuro enfrenta, ao mesmo tempo,
grandes perigos e grandes promessas.

Para seguir adiante, devemos reconhecer que, no meio da uma magnífica


diversidade de culturas e formas de vida, somos uma família humana e uma
comunidade terrestre com um destino comum.

Devemos somar forças para gerar uma sociedade sustentável global


baseada no respeito pela natureza, nos direitos humanos universais, na justiça
econômica e numa cultura da paz.

Para chegar a este propósito, é imperativo que nós, os povos da Terra,


declaremos nossa responsabilidade uns para com os outros, com a grande
comunidade da vida, e com as futuras gerações. Terra, Nosso Lar A humanidade
é parte de um vasto universo em evolução.

A Terra, nosso lar, está viva com uma comunidade de vida única. As
forças da natureza fazem da existência uma aventura exigente e incerta, mas a
Terra providenciou as condições essenciais para a evolução da vida.

A capacidade de recuperação da comunidade da vida e o bem-estar da


humanidade dependem da preservação de uma biosfera saudável com todos
seus sistemas ecológicos, uma rica variedade de plantas e animais, solos férteis,
águas puras e ar limpo.

O meio ambiente global com seus recursos finitos é uma preocupação


comum de todas as pessoas. A proteção da vitalidade, diversidade e beleza da
Terra é um dever sagrado.

A Situação Global Os padrões dominantes de produção e consumo estão


causando devastação ambiental, redução dos recursos e uma massiva extinção de
espécies.

Comunidades estão sendo arruinadas. Os benefícios do desenvolvimento


não estão sendo divididos equitativamente e o fosso entre ricos e pobres está
aumentando. A injustiça, a pobreza, a ignorância e os conflitos violentos têm
aumentado e são causa de grande sofrimento.

172
TÓPICO 3 | VIOLÊNCIA E A EXCLUSÃO SOCIAL

O crescimento sem precedentes da população humana tem sobrecarregado


os sistemas ecológico e social. As bases da segurança global estão ameaçadas.
Essas tendências são perigosas, mas não inevitáveis.

Desafios Para o Futuro A escolha é nossa: formar uma aliança global para
cuidar da Terra e uns dos outros, ou arriscar a nossa destruição e a da diversidade
da vida. São necessárias mudanças fundamentais dos nossos valores, instituições
e modos de vida.

Devemos entender que, quando as necessidades básicas forem atingidas,


o desenvolvimento humano será primariamente voltado a ser mais, não a ter
mais. Temos o conhecimento e a tecnologia necessários para abastecer a todos e
reduzir nossos impactos ao meio ambiente.

O surgimento de uma sociedade civil global está criando novas


oportunidades para construir um mundo democrático e humano. Nossos desafios
ambientais, econômicos, políticos, sociais e espirituais estão interligados, e juntos
podemos forjar soluções includentes.

Responsabilidade Universal Para realizar estas aspirações, devemos


decidir viver com um sentido de responsabilidade universal, identificando-nos
com toda a comunidade terrestre bem como com nossa comunidade local.

Somos, ao mesmo tempo, cidadãos de nações diferentes e de um


mundo no qual a dimensão local e global está ligada. Cada um compartilha da
responsabilidade pelo presente e pelo futuro, pelo bem-estar da família humana
e de todo o mundo dos seres vivos.

O espírito de solidariedade humana e de parentesco com toda a vida é


fortalecido quando vivemos com reverência o mistério da existência, com gratidão
pelo dom da vida, e com humildade considerando em relação ao lugar que ocupa
o ser humano na natureza.

Necessitamos com urgência de uma visão compartilhada de valores


básicos para proporcionar um fundamento ético à comunidade mundial
emergente. Portanto, juntos na esperança, afirmamos os seguintes princípios,
todos interdependentes, visando um modo de vida sustentável como critério
comum, através dos quais a conduta de todos os indivíduos, organizações,
empresas, governos, e instituições transnacionais será guiada e avaliada.

PRINCÍPIOS

I. RESPEITAR E CUIDAR DA COMUNIDADE DA VIDA

1. Respeitar a Terra e a vida em toda sua diversidade. a. Reconhecer que todos os


seres são interligados e cada forma de vida tem valor, independentemente de
sua utilidade para os seres humanos. b. Afirmar a fé na dignidade inerente de

173
UNIDADE 3 | CONCEITOS, TEORIAS E TIPOLOGIAS DE VIOLÊNCIA, VIOLÊNCIA URBANA E SEUS REFLEXOS NA SOCIEDADE ATUAL

todos os seres humanos e no potencial intelectual, artístico, ético e espiritual


da humanidade.

2. Cuidar da comunidade da vida com compreensão, compaixão e amor. a. Aceitar


que, com o direito de possuir, administrar e usar os recursos naturais vem o
dever de impedir o dano causado ao meio ambiente e de proteger os direitos
das pessoas. b. Assumir que o aumento da liberdade, dos conhecimentos e do
poder implica responsabilidade na promoção do bem comum.

3. Construir sociedades democráticas que sejam justas, participativas,


sustentáveis e pacíficas.
a. Assegurar que as comunidades em todos níveis garantam os direitos
humanos e as liberdades fundamentais e proporcionem a cada um a
oportunidade de realizar seu pleno potencial. b. Promover a justiça
econômica e social, propiciando a todos a consecução de uma subsistência
significativa e segura, que seja ecologicamente responsável.

4. Garantir as dádivas e a beleza da Terra para as atuais e as futuras gerações.


a. Reconhecer que a liberdade de ação de cada geração é condicionada pelas
necessidades das gerações futuras. b. Transmitir às futuras gerações valores,
tradições e instituições que apoiem, em longo prazo, a prosperidade das
comunidades humanas e ecológicas da Terra. Para poder cumprir estes
quatro amplos compromissos, é necessário:

II. INTEGRIDADE ECOLÓGICA

5. Proteger e restaurar a integridade dos sistemas ecológicos da Terra, com


especial preocupação pela diversidade biológica e pelos processos naturais
que sustentam a vida.
a. Adotar planos e regulamentações de desenvolvimento sustentável em
todos os níveis que façam com que a conservação ambiental e a reabilitação
sejam parte integral de todas as iniciativas de desenvolvimento.
b. Estabelecer e proteger as reservas com uma natureza viável e da biosfera,
incluindo terras selvagens e áreas marinhas, para proteger os sistemas de
sustento à vida da Terra, manter a biodiversidade e preservar nossa herança
natural.
c. Promover a recuperação de espécies e ecossistemas ameaçadas.
d. Controlar e erradicar organismos não-nativos ou modificados
geneticamente que causem dano às espécies nativas, ao meio ambiente, e
prevenir a introdução desses organismos daninhos.
e. Manejar o uso de recursos renováveis como água, solo, produtos florestais
e vida marinha de forma que não excedam as taxas de regeneração e que
protejam a sanidade dos ecossistemas.
f. Manejar a extração e o uso de recursos não-renováveis, como minerais e
combustíveis fósseis de forma que diminuam a exaustão e não causem
dano ambiental grave.

174
TÓPICO 3 | VIOLÊNCIA E A EXCLUSÃO SOCIAL

6. Prevenir o dano ao ambiente como o melhor método de proteção ambiental e,


quando o conhecimento for limitado, assumir uma postura de precaução.
a. Orientar ações para evitar a possibilidade de sérios ou irreversíveis danos
ambientais mesmo quando a informação científica for incompleta ou não
conclusiva.
b. Impor o ônus da prova àqueles que afirmarem que a atividade proposta
não causará dano significativo e fazer com que os grupos sejam
responsabilizados pelo dano ambiental.
c. Garantir que a decisão a ser tomada se oriente pelas consequências humanas
globais, cumulativas, de longo prazo, indiretas e de longo alcance.
d. Impedir a poluição de qualquer parte do meio ambiente e não permitir o
aumento de substâncias radioativas, tóxicas ou outras substâncias perigosas.
e. Evitar que atividades militares causem dano ao meio ambiente.

7. Adotar padrões de produção, consumo e reprodução que protejam as


capacidades regenerativas da Terra, os direitos humanos e o bem-estar
comunitário.
a. Reduzir, reutilizar e reciclar materiais usados nos sistemas de produção e
consumo e garantir que os resíduos possam ser assimilados pelos sistemas
ecológicos.
b. Atuar com restrição e eficiência no uso de energia e recorrer cada vez mais
aos recursos energéticos renováveis, como a energia solar e do vento.
c. Promover o desenvolvimento, a adoção e a transferência equitativa de
tecnologias ambientais saudáveis.
d. Incluir totalmente os custos ambientais e sociais de bens e serviços no preço
de venda e habilitar os consumidores a identificar produtos que satisfaçam
as mais altas normas sociais e ambientais.
e. Garantir acesso universal à assistência de saúde que fomente a saúde
reprodutiva e a reprodução responsável.
f. Adotar estilos de vida que acentuem a qualidade de vida e subsistência
material num mundo finito.

8. Avançar o estudo da sustentabilidade ecológica e promover a troca aberta e a


ampla aplicação do conhecimento adquirido.
a. Apoiar a cooperação científica e técnica internacional relacionada a
sustentabilidade, com especial atenção às necessidades das nações em
desenvolvimento.
b. Reconhecer e preservar os conhecimentos tradicionais e a sabedoria
espiritual em todas as culturas que contribuam para a proteção ambiental
e o bem-estar humano.
c. Garantir que informações de vital importância para a saúde humana e para
a proteção ambiental, incluindo informação genética, estejam disponíveis
ao domínio público.

III. JUSTIÇA SOCIAL E ECONÔMICA

9. Erradicar a pobreza como um imperativo ético, social e ambiental.

175
UNIDADE 3 | CONCEITOS, TEORIAS E TIPOLOGIAS DE VIOLÊNCIA, VIOLÊNCIA URBANA E SEUS REFLEXOS NA SOCIEDADE ATUAL

a. Garantir o direito à água potável, ao ar puro, à segurança alimentar, aos


solos não contaminados, ao abrigo e saneamento seguro, distribuindo os
recursos nacionais e internacionais requeridos.
b. Prover cada ser humano de educação e recursos para assegurar uma
subsistência sustentável, e proporcionar seguro social e segurança coletiva
a todos aqueles que não são capazes de manter-se por conta própria.
c. Reconhecer os ignorados, proteger os vulneráveis, servir àqueles que
sofrem, e permitir-lhes desenvolver suas capacidades e alcançar suas
aspirações.

10. Garantir que as atividades e instituições econômicas em todos os níveis


promovam o desenvolvimento humano de forma equitativa e sustentável.
a. Promover a distribuição equitativa da riqueza dentro dos e entre as nações.
b. Incrementar os recursos intelectuais, financeiros, técnicos e sociais das
nações em desenvolvimento e isentá-las de dívidas internacionais onerosas.
c. Garantir que todas as transações comerciais apoiem o uso de recursos
sustentáveis, a proteção ambiental e normas trabalhistas progressistas.
d. Exigir que corporações multinacionais e organizações financeiras
internacionais atuem com transparência em benefício do bem comum e
responsabilizá-las pelas consequências de suas atividades.

11. Afirmar a igualdade e a equidade de gênero como pré-requisitos para o


desenvolvimento sustentável e assegurar o acesso universal à educação,
assistência de saúde e às oportunidades econômicas.
a. Assegurar os direitos humanos das mulheres e das meninas e acabar com
toda violência contra elas.
b. Promover a participação ativa das mulheres em todos os aspectos da
vida econômica, política, civil, social e cultural como parceiras plenas e
paritárias, tomadoras de decisão, líderes e beneficiárias.
c. Fortalecer as famílias e garantir a segurança e a educação amorosa de todos
os membros da família.

12. Defender, sem discriminação, os direitos de todas as pessoas a um ambiente


natural e social, capaz de assegurar a dignidade humana, a saúde corporal e
o bem-estar espiritual, concedendo especial atenção aos direitos dos povos
indígenas e minorias.
a. Eliminar a discriminação em todas suas formas, como as baseadas em raça,
cor, gênero, orientação sexual, religião, idioma e origem nacional, étnica ou
social.
b. Afirmar o direito dos povos indígenas à sua espiritualidade, conhecimentos,
terras e recursos, assim como às suas práticas relacionadas a formas
sustentáveis de vida.
c. Honrar e apoiar os jovens das nossas comunidades, habilitando-os a
cumprir seu papel essencial na criação de sociedades sustentáveis. d.
Proteger e restaurar lugares notáveis pelo significado cultural e espiritual.

IV. DEMOCRACIA, NÃO VIOLÊNCIA E PAZ

176
TÓPICO 3 | VIOLÊNCIA E A EXCLUSÃO SOCIAL

13. Fortalecer as instituições democráticas em todos os níveis e proporcionar-


lhes transparência e prestação de contas no exercício do governo, participação
inclusiva na tomada de decisões, e acesso à justiça.
a. Defender o direito de todas as pessoas no sentido de receber informação clara
e oportuna sobre assuntos ambientais e todos os planos de desenvolvimento
e atividades que poderiam afetá-las ou nos quais tenham interesse.
b. Apoiar sociedades civis locais, regionais e globais e promover a participação
significativa de todos os indivíduos e organizações na tomada de decisões.
c. Proteger os direitos à liberdade de opinião, de expressão, de assembleia
pacífica, de associação e de oposição.
d. Instituir o acesso efetivo e eficiente a procedimentos administrativos e
judiciais independentes, incluindo retificação e compensação por danos
ambientais e pela ameaça de tais danos.
e. Eliminar a corrupção em todas as instituições públicas e privadas.
f. Fortalecer as comunidades locais, habilitando-as a cuidar dos seus
próprios ambientes, e atribuir responsabilidades ambientais aos níveis
governamentais onde possam ser cumpridas mais efetivamente.

14. Integrar, na educação formal e na aprendizagem ao longo da vida, os


conhecimentos, valores e habilidades necessárias para um modo de vida
sustentável.
a. Oferecer a todos, especialmente a crianças e jovens, oportunidades
educativas que lhes permitam contribuir ativamente para o desenvolvimento
sustentável.
b. Promover a contribuição das artes e humanidades, assim como das ciências,
na educação para sustentabilidade.
c. Intensificar o papel dos meios de comunicação de massa no sentido de
aumentar a sensibilização para os desafios ecológicos e sociais.
d. Reconhecer a importância da educação moral e espiritual para uma
subsistência sustentável.

15. Tratar todos os seres vivos com respeito e consideração.


a. Impedir crueldades aos animais mantidos em sociedades humanas e
protegê-los de sofrimentos.
b. Proteger animais selvagens de métodos de caça, armadilhas e pesca que
causem sofrimento extremo, prolongado ou evitável.
c. Evitar ou eliminar ao máximo possível a captura ou destruição de espécies
não visadas.

16. Promover uma cultura de tolerância, não violência e paz.


a. Estimular e apoiar o entendimento mútuo, a solidariedade e a cooperação
entre todas as pessoas, dentro das e entre as nações.
b. Implementar estratégias amplas para prevenir conflitos violentos e usar a
colaboração na resolução de problemas para manejar e resolver conflitos
ambientais e outras disputas.
c. Desmilitarizar os sistemas de segurança nacional até chegar ao nível de
uma postura não provocativa da defesa e converter os recursos militares
em propósitos pacíficos, incluindo restauração ecológica.
177
UNIDADE 3 | CONCEITOS, TEORIAS E TIPOLOGIAS DE VIOLÊNCIA, VIOLÊNCIA URBANA E SEUS REFLEXOS NA SOCIEDADE ATUAL

d. Eliminar armas nucleares, biológicas e tóxicas e outras armas de destruição


em massa.
e. Assegurar que o uso do espaço orbital e cósmico mantenha a proteção
ambiental e a paz.
f. Reconhecer que a paz é a plenitude criada por relações corretas consigo
mesmo, com outras pessoas, outras culturas, outras vidas, com a Terra e
com a totalidade maior da qual somos parte.

O CAMINHO ADIANTE

Como nunca antes na história, o destino comum nos conclama a buscar


um novo começo. Tal renovação é a promessa dos princípios da Carta da Terra.

Para cumprir esta promessa, temos que nos comprometer a adotar e


promover os valores e objetivos da Carta. Isto requer uma mudança na mente e
no coração.

Requer um novo sentido de interdependência global e de responsabilidade


universal. Devemos desenvolver e aplicar com imaginação a visão de um modo
de vida sustentável aos níveis local, nacional, regional e global.

Nossa diversidade cultural é uma herança preciosa, e diferentes culturas


encontrarão suas próprias e distintas formas de realizar esta visão. Devemos
aprofundar expandir o diálogo global gerado pela Carta da Terra, porque temos
muito que aprender a partir da busca iminente e conjunta por verdade e sabedoria.

A vida muitas vezes envolve tensões entre valores importantes. Isto


pode significar escolhas difíceis. Porém, necessitamos encontrar caminhos para
harmonizar a diversidade com a unidade, o exercício da liberdade com o bem
comum, objetivos de curto prazo com metas de longo prazo.

Todo indivíduo, família, organização e comunidade têm um papel vital


a desempenhar. As artes, as ciências, as religiões, as instituições educativas, os
meios de comunicação, as empresas, as organizações não-governamentais e os
governos são todos chamados a oferecer uma liderança criativa.

A parceria entre governo, sociedade civil e empresas é essencial para uma


governabilidade efetiva. Para construir uma comunidade global sustentável,
as nações do mundo devem renovar seu compromisso com as Nações Unidas,
cumprir com suas obrigações respeitando os acordos internacionais existentes e
apoiar a implementação dos princípios da Carta da Terra com um instrumento
internacional legalmente unificador quanto ao ambiente e ao desenvolvimento.

Que o nosso tempo seja lembrado pelo despertar de uma nova reverência
face à vida, pelo compromisso firme de alcançar a sustentabilidade, a intensificação
da luta pela justiça e pela paz, e a alegre celebração da vida.

FONTE: <https://www.mma.gov.br/estruturas/agenda21/_arquivos/carta_terra.pdf>. Acesso em:


2 set. 2019.
178
RESUMO DO TÓPICO 3

Neste tópico, você aprendeu que:

• A exclusão social atualmente tem sido uma categoria em destaque e presente


nas análises que são realizadas que visam incluir a violência e direitos civis.

• Não se pode, de forma alguma, negar a importância dos vínculos, que, de


maneira geral, associam esses fenômenos que estão sendo propostos a refletir
e de forma igual aos aspectos como as manifestações e contextos de violência,
em que os protagonistas estão inseridos nas diferentes camadas ou grupos
sociais, onde são considerados quase sempre como incluídos.

• As atuais mudanças que a nossa sociedade vem passando devem ser


compreendidas e analisadas como implementadas no contexto de
transformações.

• O tema da violência tem um benefício de ampliar o conjunto conceitual e


também o espaço empírico por meio dos quais a violência pode ser analisada.

• A globalização, por um lado, adquire o instituto de uma camada articulada


com o pensamento e análise a indicar a inclusão e a radicalidade de certas
mudanças.

• A dificuldade de definir o conceito de violência é consequência do fato que


não se considerando como um conceito sociológico, mas de uma categoria de
ordem empírica de manifestação social.

• As organizações da sociedade civil propiciam indicações que confirmariam


a ligação desta hipótese, quando sinaliza como sendo uma crise ou barbárie,
formas de violência que foram muitas vezes vistas no passado como traços
culturais da sociedade da época.

• Vale refletir sobre as possíveis repercussões das mudanças em algumas


dimensões do contexto e da vida social, como exemplo, podemos citar os
processos de informação.

• O Brasil, pode-se dizer, que imergiu de maneira mais radical do que os países
considerados avançados, na chamada “era das novas tecnologias”.

• As transformações no mundo tecnológicos são decorrentes dos progressos


da ciência que alteram a relação existente física e cultural com determinado
espaço e território.

179
• O mundo virtual interfere o mundo real, são os aplicativos de relacionamentos,
ou se viaja no espaço interplanetário ou sentem os horrores da guerra através
dos computadores ou dos jogos eletrônicos. Já em outro contexto, consegue
transformar o real em um espetáculo, através dos meios de comunicação de
massa.

• A violência passa a fazer parte de um movimento dinâmico, no qual o consumo


excessivo faz parte do processo de reprodução da violência.

• As transformações tecnológicas que ocorrem sobre o mundo do trabalho


de forma direta acabam deslocando sua atitude de centralizador enquanto
organizador de um espaço sociocultural.

• A violência não é um fato recente que surgiu na sociedade moderna, isso quer
dizer que sua presença insinua continuidade do fenômeno, ou seja, é o novo
que dá essas características a violência.

• O social é considerado múltiplo, decorrente das diversas lógicas de ação que


nele estão presentes. Diante dessa condição de recurso, a violência está inserida
em um rol de estratégicas e ações.

• A violência oriunda de jovens, ou então de indivíduos das camadas consideradas


médias na sociedade, deveriam ser pensadas, como uma manifestação em que
os atores vivenciam os processos de inclusão e exclusão.

180
AUTOATIVIDADE

1 (UEM, 2012) A constituição da Sociologia como ciência passou pelo


desenvolvimento de uma metodologia própria, algo que Émile Durkheim
procurou realizar em sua obra As regras do método. A partir deste autor,
analise as sentenças e marque V para as verdadeiras e F para as falsas:

a) ( ) Partindo do pressuposto de que os fenômenos sociais são muito diferentes


dos naturais, Durkheim defendeu a incorporação da subjetividade do
cientista nos estudos sociológicos.
b) ( ) Durkheim defendia o abandono dos preconceitos e das prenoções,
pois essas ideias preconcebidas poderiam nos conduzir a confusões na
observação dos fenômenos.
c) ( ) Segundo Durkheim, as principais ferramentas metodológicas da
Sociologia são a observação, a descrição, a comparação e a estatística.
d) ( ) Na concepção durkheimiana, a compreensão efetiva dos fenômenos
sociais se dá pela identificação dos interesses e das motivações subjetivas
dos atores sociais envolvidos.
e) ( ) Ao afirmar que o sociólogo deve encarar o fato social como coisa,
Durkheim procurou defender a definição do objeto sociológico como
algo externo ao pesquisador.

181
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