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UNIVERSIDADE EVENGÉLICA DE GOIÁS

UNIEVANGÉLICA CAMPUS CERES


CURSO DE DIREITO

RONIER TAVARES SANTANA TORRES

LIBERDADE DE IMPRENSA E EXPRESSÃO: Digital, política e civil

CERES
2022
RONIER TAVARES SANTANA TORRES

LIBERDADE DE IMPRENSA E EXPRESSÃO: Digital, política e civil

Capítulo I do Trabalho de Curso II


apresentado ao curso de Direito da
Universidade Evangélica de Ceres-
campus Ceres, como requisito parcial
para a obtenção de grau de Bacharel em
Direito.

Professora Orientadora: Ma. Marina


Teodoro.

CERES
2022
2 FIM DA LIBERDADE CONSTITUCIONAL BRASILEIRA

2.1 CASOS DE REPERCUSSÃO POLÍTICA

A liberdade de expressão é um direito constitucional no Brasil, mas não é


absoluta. Há diversas organizações internacionais que manifestam preocupação
com as exceções possibilitadas pela Constituição de 1988. Relatórios como da
Freedom House e da Artigo 19 apontam que a liberdade de expressão no país é
ameaçada tanto no espaço público quanto no ambiente online. Assim, declarações,
matérias jornalísticas e protestos são censurados Todo cidadão brasileiro tem
direito, portanto, de se expressar sem sofrer qualquer tipo de retaliação (ZANFER,
2021).
O Brasil não pontua bem também no Ranking de Liberdade de Imprensa,
divulgado pelos Repórteres Sem Fronteiras. Em 2020, o Brasil apareceu apenas na
107º posição, o que evidencia as dificuldades da livre expressão no país. Segundo o
Freedom on the Net 2019, entre 65 países o Brasil é o terceiro que mais censura
conteúdos na web. Além disso, há sete anos, o Relatório da Sociedade
Interamericana de Imprensa apontou também preocupação com a recorrência de
decisões judiciais proibindo previamente a divulgação de informações pelos meios
de comunicação (SPERANDIO, 2020).
Além da ideia do senso comum sobre os limites da liberdade de expressão,
existe também a ideia de que esses limites se aplicam da mesma maneira em todos
os contextos, para todas as pessoas. Porém, o peso de uma afirmação varia de
acordo com a posição que o cidadão ocupa na sociedade. Mendes (2021, p. 01)
afirma que,
é muito diferente um cidadão comum estar falando num contexto com
capacidade de impactar um grupo pequeno de pessoas, ou um agente
político importante que está falando”. Seja porque esse agente político tem
mais capacidade de atingir um número maior de pessoas, seja porque essa
condição de agente político tem outro símbolo, outro poder, outra
capacidade jurídica.

Como o caso que aconteceu em fevereiro de 2021 do deputado federal e ex-


policial militar Daniel Silveira (Inquérito nº 4.781/DF) gerou grande controvérsia no
meio jurídico e na sociedade brasileira, não só em relação à garantia da liberdade de
expressão, mas também em relação à imunidade parlamentar. Daniel Silveira foi
preso em flagrante, após a repercussão de um vídeo onde faz apologia ao AI-5,
instrumento de repressão na época da ditadura militar brasileira, além de caluniar e
ameaçar ministros do Supremo Tribunal Federal. Silveira ficou conhecido também
por ter quebrado uma placa em homenagem à vereadora do PSOL assassinada,
Marielle Franco. Embora Daniel usufrua da imunidade parlamentar, há certos casos
em que a prisão em flagrante pode ser aplicada pelos agentes da lei. A prisão do
deputado foi materializada após crimes contra a segurança nacional, previstos na
Lei de Segurança Nacional, e crimes contra os ministros do Supremo Tribunal
Federal (SANTANA, 2021).
A seguir, apresenta-se um caso recente da política brasileira, sobre à
anulação da cassação do Deputado Fernando Destito. No dia 02 de junho de 2022,
o ministro Nunes Marques do STF (Supremo Tribunal Federal) derrubou a decisão
colegiada do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) que cassou o mandado de
Francischini por divulgar notícias falsas sobre as eleições, sendo o caso
emblemático, pois tratou-se da primeira cassação por fake news eleitoral. Portanto,
acontece que no dia 07 de junho de 2022, a 2ª Turma do STF decidiu por 3 votos a 2
derrubar a decisão do ministro Nunes Marques, restabelecendo a cassação do
mandato do deputado em tela (COITINHO, 2022).
Logo, o principal argumento apresentado para tal, especialmente o defendido
por Gilmar Mendes, foi o de que o discurso de ataque sistemático às urnas
eletrônicas, mais notadamente no dia das eleições, não pode ser tolerado em um
Estado Democrático de Direito, no qual se propugna o sufrágio universal como
direito fundamental considerado como cláusula pétrea. Inclusive, ao refletir sobre os
limites da liberdade de expressão, disse: “Nós temos que construir a ideia de uma
democracia defendente, que repugna esse tipo de ato. E acho que a Justiça eleitoral
é um bom exemplo nesse caso” (COITINHO, 2022, p. 01). Muitos consideram que a
liberdade de expressão do deputado nao foi respeitada, considerando que este tipo
de liberdade é constitutivo em uma democracia, da mesma forma que o é a
segurança jurídica.
Sperandio (2020), trás um caso que ocorreu em 2019, onde o ministro do STF
Alexandre de Moraes censurou reportagens do site O Antagonista e da revista digital
Crusoé, que tratavam sobre outro ministro da Corte, Dias Toffoli. Na prática, as
publicações informavam que a defesa de Marcelo Odebrecht juntou a um dos
processos no qual é réu um documento que identificava Toffoli – então advogado-
geral da União como um dos personagens mencionados em e-mails. A
determinação impôs a retirada do conteúdo das respectivas plataformas, pois, de
acordo com despacho de Moraes, tratava-se de um típico exemplo de fake news e
que eles extrapolaram a liberdade de expressão.
De acoro com Zanfer (2021), outro caso, foi em outubro de 2014, na sexta-
feira anterior às eleições presidenciais, o Tribunal Superior Eleitoral censurou a
revista Veja. O veículo também foi proibido de veicular publicidade paga em rádio,
TV, outdoor e internet sobre sua última edição, que trazia uma denúncia contra Lula
e Dilma em sua capa. A matéria era baseada em delação do doleiro Alberto Youssef
afirmava que os petistas sabiam de tudo” a respeito do esquema de corrupção da
Petrobras. De acordo com a defesa, a revista não tinha provas disso, a delação viria
a público apenas em 2015. Além disso, o ministro Admar Gonzaga sustentou a
decisão afirmando: “os contornos de propaganda eleitoral, a meu ver, atraem a
incidência da legislação eleitoral, por consubstanciar interferência grave em
detrimento de uma das candidaturas.
Por conseguinte, no ano de 2014, a juíza Maria Marleide exigiu o
recolhimento de uma edição da revista IstoÉ das bancas. A decisão aconteceu a
pedido do então governador do Ceará, Cid Gomes, cujo nome constava na delação
do ex-diretor da Petrobras, Paulo Roberto Costa. A edição censurada veiculava uma
reportagem sobre o caso. Em sua liminar, a magistrada afirmou entender o potencial
de a “veiculação de seu nome com os fatos ligados à operação Lava Jato lhe causar
(ao governador) dano irreparável ou de difícil reparação”. Segundo Gomes, as
informações prestadas à Polícia Federal eram falsas e, portanto, uma ação por
“calúnia, difamação e dano moral” foi movida contra o veículo. Por fim, a matéria
também foi retirada do site da revista (SPERANDIO, 2020).
Contudo, mesmo que se considere haver uma tendência de evolução
jurisprudencial que, em última análise, tem resultado em uma preservação da
liberdade de expressão nas cortes superiores, isso não é suficiente. Isso ocorre
porque, conforme demonstrado em diversos casos, decisões liminares em fase de
primeira instância são suficientes para provocar danos à livre manifestação, à
liberdade de imprensa e prejuízos econômicos.
2.2 LIBERDADE DE EXPRESSÃO E DIREITOS DA PERSONALIDADE

A liberdade de expressão está intimamente ligada às liberdades de


informação e imprensa. Asim, na atualidade, é possível constatar-se, com
frequência, que, dentre as condicionantes à liberdade de expressão, encontram-se
os direitos de personalidade. Os direitos de personalidade são uma construção
teórica muito recente e descendem do respeito ao ser humano em si (BERTOLDO;
SALLA, 2018).
Conforme Amaral (2017, p. 48) “os direitos de personalidade como sendo
direitos subjetivos que têm por objeto os bens e valores essenciais da pessoa, no
seu aspecto físico, moral e intelectual”. Dentre os diversos direitos abarcados pelos
direitos de personalidade, destaca-se o direito à vida, ao próprio corpo, ao nome, à
honra, ao recato, ao segredo, à imagem e à identidade. Os direitos de personalidade
são essenciais ao ser humano.
De lastro constitucional, consubstanciado na dignidade da pessoa humana
(art. 1º, III, CF), tais direitos, consoante Ascensão (2011, p. 72), “devem representar
mínimo, que crie o espaço no qual cada homem poderá desenvolver a sua
personalidade”, e, por outro lado, devem representar também um máximo, pela
intensidade da tutela que recebem. De acordo com Nobre Júnior (2014, p. 05),
“dentre os diversos direitos da personalidade, é de destacar-se, para fins de
contraste com a liberdade de expressão, o direito à honra, à intimidade e à imagem”.
O primeiro deles consiste na estima e conceito que alguém desfruta na sociedade
(honra objetiva), bem como na própria ideia que o titular faz de sua dignidade (honra
subjetiva).
Já a intimidade configura esfera reservada da pessoa, a ser protegida de
intromissões indevidas. Por conseguinte, o direito à imagem caracteriza-se pelo
atributo de poder decidir, no sentido de autorizar ou não a reprodução da própria
imagem em qualquer meio, assim como a sua exposição. A qualidade de limitadores
da liberdade de expressão resulta explícita da Constituição. Basta ver que o art. 5º,
X, reputa inviolável a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas,
com a garantia, em caso de agravo, de indenização por danos materiais ou morais
(BERTOLDO; SALLA, 2018).
Portanto, Guimarães (2015) ressalta que a liberdade de expressão, em
colisão com os direitos da personalidade, pode ser limitada. Um bom exemplo disso
foi a decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo que proibiu um grupo de teatro de
exibir uma peça inspirada no caso “Isabella Nardoni”. O tribunal acolheu o pedido
(preventivo) da mãe de Isabella, Ana Carolina de Oliveira, que alegou ameaça de
violação aos seus direitos da personalidade e os de sua filha. Acertadamente, o
TJSP suspendeu a estreia da peça, por haver clara violação ao direito à honra de
Ana Carolina de Oliveira e aos direitos à honra e à imagem (post mortem) da sua
filha, Isabella.
Outro exemplo que Guimarães (2015) divulga a a Justiça Federal da
Subseção Judiciária da cidade de Juazeiro, Bahia, julgou liminarmente Ação Civil
Pública (Processo nº 58-60.2013.4.01.3305) pela qual o Conselho Regional de
Enfermagem da Bahia (COREN-BA) pleiteou a suspensão de um Bloco
Carnavalesco de travestidos denominado As Poderosas, cujo tema de fantasia era
“Enfermeiras”, alegando provável situação vexatória perante as profissionais de
enfermagem ao associá-las a práticas eróticas. O juiz federal Eduardo Gomes
Carqueija indeferiu o requerimento do COREN-BA.
Já no nordeste, mais especificamente na 13ª Vara Cível de Aracaju, corre
processo envolvendo a neta de Lampião, que, em ação indenizatória movida contra
o autor da biografia de seu avô, pleiteia o valor de dois milhões de reais em razão da
venda não autorizada da obra na II Bienal de Salvador em 2011. Insta salientar que,
anteriormente, já havia sido proposta outra ação, que corre na 7ª Vara Cível da
mesma cidade, em que fora proibida a venda da referida biografia. A herdeira do
biografado alegou ofensa à honra da família ao ser explicitado no livro que o
cangaceiro era homossexual. Este último processo encontra-se, atualmente, em
sede de apreciação pelo Tribunal de Justiça de Sergipe (GARCIA, 2014).
Por conseguinte, Krusty (2021) divulga o caso de liberdade de expressão de
personalidade digital, envovlendo o youtuber, Felipe Neto, que por unanimidade, foi
negado pela 2ª Turma Recursal dos Juizados Especiais do Distrito Federal,
provimento ao recurso interposto pelo réu, o youtuber, Felipe Neto, mantendo a
sentença da juíza titular do 3º Juizado Especial Cível de Brasília, que o condenou a
indenizar, por danos morais, o presidente da Fundação Nacional do Índio - FUNAI,
Marcelo Augusto Xavier da Silva, e retirar as publicações ofensivas ao autor de seu
perfil no Twitter, sob pena se multa. De acordo com o autor, Felipe Neto teria, sem
motivação legítima, feito publicações ofensivas em sua rede social, com agressões
verbais, além de ter imputado ao autor condutas falaciosas e até criminosas, que
feriram sua honra e moral.
Outro caso envovendo personalidade digital aconteceu em junho de 2022,
onde o colunista Léo Dias vazou uma informação de que a Atriz Klara Castanho, de
21 anos, havia sofrido violência sexual, que ocasionou em uma gestação e ao parto
de uma criança enviada para a adoção. O caso levantou diversas discussões, dentre
elas a liberdade de imprensa e a segurança de dados pessoais, que deveriam estar
garantidos na disposição da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), no caso do
hospital onde ocorreu o vazamento de dados (SANDER, 2022). De acordo com
Fernandes (2022), o que acontece é que, a liberdade de imprensa assim como, a
liberdade de expressão está disposta constitucionalmente, art 5º. Sendo que Leo
Dias pode responder por crime de difamação após caso de Klara Castanho, pois
houve crime contra a honra, violação da privacidade, da intimidade, violação da
proteção de dados e do sigilo ético e profissional e o hospital pode sofrer sanções
até mesmo de multas de alto valor. O caso, além de ter sido uma violação dos dados
pessoais sensíveis, se tornou ainda mais comentado pelo caráter público da pessoa
que sofreu a violação.

2.3 REPRESSÃO OU ABUSO DO DIREITO DE LIBERDADE

O abuso do direito à liberdade de expressão, como qualquer abuso de direito,


deve ser sancionado, mas somente na seara civil. A sanção penal foi implicitamente
proibida pela Constituição, pois afetaria o núcleo essencial do direito à liberdade de
expressão (MOREIRA, 2017).
Para Moreira (2017) a consequência inevitável é a revogação, por ausência
de recepção constitucional, dos crimes contra a honra (calúnia, difamação, injúria e
desacato) previstos no Código Penal e na Lei de Imprensa. Há muito, já se sabia
que o interesse predominante nesses casos não é da sociedade, mas do indivíduo,
quanto mais porque a honra é considerada um bem disponível. Geralmente, esses
crimes são processados por meio de ação penal privada (privativa do ofendido). O
que a Constituição de 1988 fez foi retirar as ofensas contra a honra de modo
definitivo do campo público para o privado. E o fez exatamente para proteger um
bem maior: a liberdade de expressão.
Logo, Oliveira (2021) expõe que a crítica que os meios de comunicação por
ocasião do julgamento da ADPF 130/DF, dirigem às pessoas públicas,
especialmente às autoridades e aos agentes do Estado, por mais acerba, dura e
veemente que possa ser, deixa de sofrer, quanto ao seu concreto exercício, as
limitações externas que ordinariamente resultam dos direitos da personalidade. Vê-
se, pois, que a crítica jornalística, quando inspirada pelo interesse público, não
importando a acrimônia e a contundência da opinião manifestada, ainda mais
quando dirigida a figuras públicas, com alto grau de responsabilidade na condução
dos negócios do Estado, não traduz nem se reduz, em sua expressão concreta, à
dimensão de abuso da liberdade de imprensa, não se revelando suscetível, por isso
mesmo, em situações de caráter ordinário, à possibilidade de sofrer qualquer
repressão estatal ou de se expor a qualquer reação hostil do ordenamento positivo.

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