Você está na página 1de 14

EDUARDO MACHADO DE SOUSA

APLICABILIDADE E LIMITAÇÕES DO DIREITO BRASILEIRO NA VIDA


PRIVADA DOS POLÍTICOS E CELEBRIDADES

Risoleyde de Almeida Matos1


Luiz Carlos Ribeiro Leite2
Eduardo Machado de Sousa3

Sumário: 1. Princípios Fundamentais da Constituição de 1988: 1.1 Direito à Vida; 1.2 – Direito
à Privacidade; 1.3. Direito à Vida Privada; 1.4 – Direito à Informação; 1.5 – Direito ao
esquecimento. 2. Direito a vida privada e a informação como direitos fundamentais e qual
prevalece quando colidem?. 3. Direito ao esquecimento: Políticos e Celebridades e os impactos
e consequências nas suas vidas privadas com a divulgação excessiva de informações na mídia
e pela internet.

Resumo: O artigo possui o escopo de se verificar a aplicabilidade e as limitações do direito


brasileiro na vida privada dos políticos e das celebridades. Para isso, mostra-se o liame entre o
direito à vida privada e à informação como direitos fundamentais e qual deve prevalecer quando
se colidem. Também se analisa por que políticos e celebridades sofrem impacto substancial em
suas vidas privadas com a divulgação excessiva de informações e dados na grande mídia e pela
internet. Outrossim, busca apresentar as consequências que podem ocorrer nas vidas dessas
pessoas com a exposição de suas vidas na grande mídia. A hipótese é que por serem pessoas
públicas, qualquer notícia relacionada a essas pessoas causam engajamento na mídia e na
internet. Sempre que é noticiado, muitas das vezes, de forma excessiva, informações sobre
pessoas públicas, o conflito se dá entre o direito à vida privada e o direito a informação dos
veículos de noticias. Devendo sempre prevalecer o direito a vida privada. Além do mais, muitas
das vezes, ao expor, voluntariamente, suas vidas na grande mídia e pela internet, na maioria das
oportunidade de forma demasiada, essas pessoas criam o interesse de grande parte da população
que passam a buscarem e exporem cada vez mais essas pessoas. A pesquisa delimita-se no
direito à vida privada e à informação como direitos fundamentais: aplicabilidade e limitações
na vida privada dos políticos e celebridade. Para dar maior sustento ao estudo, utiliza-se da
Pesquisa de documentação indireta com abordagem dedutiva, em que o procedimento é
descritivo na busca de responder a problemática do estudo: - Onde está o liame entre o direito
à vida privada e à informação como direitos fundamentais. Qual prevalece quando se colidem?
Por que políticos e celebridades sofrem um impacto substancial em suas vidas privadas com a
divulgação excessiva de suas informações e dados na grande mídia e pela internet?

Palavras-chave: Direito ao Esquecimento; Direito a vida; Direito a Informação; Políticos;


Celebridades

1
Professora Mestre, em Psicologia Comunitária (Centro Universitário de Ensino Superior do Amazonas – CIESA)
Mestranda Ciência Jurídicas pela Universidade Univali (Itajaí – Santa Catarina); Mestranda em Ciência Política -
Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias (Portugal) –E-mail: risoleyde@posciesa.com
2
Professor Mestre (Centro Universitário de Ensino Superior do Amazonas – CIESA);
3
Graduando (Centro Universitário de Ensino Superior do Amazonas – CIESA).
1. Princípios Fundamentais da Constituição de 1988
Para se analisar como se dá o direito ao esquecimento, é importante se observar alguns
princípios fundamentais elencados na Constituição Federal Brasileira de 1988.

1.1 – Direito à Vida – Para Silva4 Todo ser dotado de vida é indivíduo, isto é: algo que
não se pode dividir, sob a pena de deixar de ser. O homem é um indivíduo, mas é mais que isto,
é uma pessoa5. “Além dos caracteres de indivíduo biológico tem os de unidade, identidade e
continuidade substanciais.”6 No dizer de Ortega y Gasset, mencionado por Recaséns Siches, “la
vida consiste em la compresencia, en la coexistência del yo com um mundo, de um mundo
conmigo, como elementos inseparables, inescindibles, correlativos”7. A vida humana, que é o
objeto do direito assegurado no art. 5°, caput, integra-se de elementos materiais (físicos e
psíquicos) e imateriais (espirituais). A “vida é intimidade conosco mesmo, saber-se e dar-se
conta de si mesmo, um assistir a si mesmo e um tomar posição de si mesmo”8. Por isso é que
ela constitui a fonte primária de todos os outros bens jurídicos. De nada adiantaria a
Constituição assegurar outros direitos fundamentais, como a igualdade, a intimidade, a
liberdade, o bem-estar, se não erigisse a vida humana num desses direitos. No conteúdo do seu
conceito se envolvem o direito à dignidade da pessoa humana, o direito à privacidade, o direito
à integridade físico-corporal, o direito à integridade moral e, especialmente, o direito a
existência.

Deve ser entender a grande relevância desse direito fundamental, tendo em vista, que a
Constituição Federal não teria sentido, caso deixasse de evidenciar de uma forma clara e
abrangente o quão importante é a vida no ordenamento jurídico brasileiro.

Corroborando também sobre a relevância do direito a vida, para Moraes9 a Constituição


Federal garante que todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza,
garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à
vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade. O direito à vida é o mais

4
SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 41°.ed. São Paulo: Malheiros, 2018, p.
199.
5
Cf. Recasén Siches, Vida humana, sociedade y derecho, p. 254.
6
Idem, p. 254.
7
Idem, p. 61.
8
Idem, p. 60
9
MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 36°. Ed. São Paulo: Atlas, 2020, p. 113.
fundamental de todos os direitos, já que se constitui em pré-requisito à existência e exercício
de todos os demais direitos.

A constituição Federal de 1988 assegura em seu texto o respeito e a proteção ao direito


a vida no capitulo que trata dos direitos e garantias fundamentais, mais precisamente no caput
do artigo 5°:

Art. 5° Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza,
garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a
inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à
propriedade.10

O tema encontra respaldo além da Constituição Federal Brasileira. A Declaração


Universal dos Direitos Humanos de 1948, também tutela esse princípio fundamental em seu
Artigo 3°:

Art. 3° Toda pessoa tem direito à vida, à liberdade e à segurança pessoal.11

1.2 – Direito à Privacidade – Para Silva,12 A Constituição declara invioláveis a


intimidade, a vida privada, honra e a imagem das pessoas (art. 5°, X)13. Portanto, erigiu,
expressamente, esses valores humanos à condição de direito individual, mas não o fez constar
do caput do artigo. Por isso, estamos considerando-o um direito conexo ao da vida. Assim, ele
figura no caput como reflexo ou manifestação deste. O dispositivo põe, desde logo, uma
questão, a de que a intimidade foi considerada um direito diverso dos direitos à vida privada, à
honra e à imagem das pessoas, quando a doutrina os reputava, com outros, manifestação
daquela. De fato, a terminologia não é precisa. Por isso, preferimos usar a expressão direito à
privacidade, num sentido genérico e amplo, de modo a abarcar todas essas manifestações da
esfera íntima, privada e da personalidade, que o texto constitucional em exame consagrou.
Toma-se, pois, a privacidade como “o conjunto de informação acerca do individuo que ele pode
decidir manter sob seu exclusivo controle, ou comunicar, decidindo a quem, quando, onde em
que condições , sem a isso poder ser legalmente sujeito”14. A esfera de inviolabilidade, assim,

10
BRASIL, Constituição da Republica federativa do. Disponível no site:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm
11
Idem
12
SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 41°.ed. São Paulo: Malheiros, 2018,
p. 208.
13
Sobre o assunto, cf. Paulo José da Costa Júnior, Agressões à intimidade, Malheiros Editores, 1997.
14
Cf. J. Matos Pereira, Direito de Informação, p. 15.
é ampla, “abrange o modo de vida doméstico, nas relações familiares e afetivas em geral, fatos,
hábitos, local, nome, imagem, pensamentos, segredos, e, bem assim, as origens e planos futuros
do individuo”15.

A privacidade deve ser respeitada em todas as esferas que norteiam a vida de um


individuo. Quando ocorre uma violação, é uma ofensa que pode causar resultados, muitas das
vezes, negativos, tanto para o detentor desse direito, como também para as pessoas que o
cercam.

Cada vez mais tem se observado que as pessoas tem tido sua privacidade atacada,
principalmente as pessoas deste estudo, como as facilidades que os tempos modernos tem
proporcionado. Com o advento dos smartphones, internet e das redes sociais, ficou ainda mais
fácil registrar e propagar qualquer situação e evento que antigamente ficavam apenas restritos
as pessoas que participaram do evento.

Em decorrência desse avanço tecnológico e com cada vez mais ameaças a privacidade
das pessoas, o congresso nacional estabeleceu princípios, garantias, direitos e deveres para o
uso da internet no Brasil. A lei n° 12.965 de 23 de abril de 2014 (Marco Civil da Internet) dispõe
em seu art. 3°:

Art. 3° A disciplina do uso da internet no Brasil tem os seguintes Princípios:

[...]

II- Proteção da Privacidade (Brasil, 2014) 16

1.3 – Direito a Vida Privada – De acordo com Silva17 é também, inviolável a vida
privada (art. 5°, X). Não é fácil distinguir vida privada de intimidade. Aquela, em última
análise, integra a esfera íntima da pessoa, porque é repositório de segredos e particularidades
do foro moral e íntimo do indivíduo. Mas a Constituição não considerou assim. Deu destaque
ao conceito, para que seja mais abrangente, como conjunto de modo de ser e viver, como direito

15
Cf. Moacyr de Oliveira, “Intimidade”, in Enciclopédia Saraiva do Direito, v. 46/100. Note-se que esse
autor está referindo-se à intimidade em concepção ampla, nos parecendo, desse modo, possível utilizar seu
conceito em referência à privacidade segundo a posição assumida no texto.
16
BRASIL, Marco Civil da Internet. Disponível no site:
http://www.planalto.gov.br/CCIVIL_03/_ATO2011-2014/2014/LEI/L12965.HTM Acesso: 15/04/2021.
17
SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 41°.ed. São Paulo: Malheiros, 2018,
p. 210.
de o individuo viver sua própria vida.18 Parte da constatação de que a vida das pessoas
compreende dois aspectos: um voltado para o exterior e outro para o interior. A vida exterior,
que envolve a pessoa nas relações sociais e nas atividades públicas, pode ser objeto das
pesquisas e das divulgações de terceiros, porque é pública. A vida interior, que se debruça sobre
a mesma pessoa, sobre os membros de sua família, sobre seus amigos,19 é a que integra o
conceito de vida privada, inviolável nos termos da Constituição.

Com essa conceituação, distinguindo o que trata da vida pública e da vida privada do
indivíduo, fica mais claro como a Constituição protege a vida privada das pessoas. Quando o
aspecto que está sendo mostrado, falado, explorado ou divulgado for um assunto que não tenha
relação com a vida pública da pessoa em questão, por exemplo um passeio em família no final
de semana, não deveria ser explorado pela grande mídia, permitindo assim, que as pessoas
possam ter uma vida mais tranquila e com o mínimo de paz, sem estarem o tempo todos nos
holofotes.

Na Constituição Federal o direito a vida privada é tutelada também seu capitulo que
trata sobre as garantias fundamentais, em seu artigo 5°, inciso X, como segue:

Art. 5° Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza,
garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a
inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à
propriedade.

[...]

X – São invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das


pessoas, assegurando o direito a indenização pelo dano material ou moral
decorrente de sua violação.20

A violação desse direito fundamental é tão grave, que no mesmo inciso que se trata da
vida privada, a carta magna brasileira deixa bem claro que, havendo qualquer tipo de dano
moral ou material decorrente dessa violação o dever de reparar é assegurado a pessoa ofendida.

Em oposição a essa proteção constitucional, Moraes21 explica que essa proteção


constitucional em relação àqueles que exercem atividade política ou ainda em relação aos

18
Cf. Eduardo Novoa Monreal, ob. Cit., pp. 36 a 38.
19
Sobre isso , cf. Pierre Kayser, ob. Cit., p.11
20
BRASIL, Constituição da República Federativa do. Disponível no site:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso 13/04/2021
21
MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 36°. Ed. São Paulo: Atlas, 2020, p. 152.
artistas em geral deve ser interpretada de uma forma mais restrita, havendo necessidade de uma
maior tolerância ao se interpretar o ferimento das inviabilidades à honra, à intimidade, à vida
privada e à imagem, pois os primeiros estão sujeitos a uma forma especial de fiscalização pelo
povo e pela mídia,22 enquanto o próprio exercício da atividade profissional dos segundos exige
maior e constante exposição à mídia. Essa necessidade de interpretação mais restrita, porém,
não afasta a proteção constitucional contra ofensas desarrazoadas, desproporcionais e,
principalmente, sem qualquer nexo causal com a atividade profissional realizada.23

1.4 – Direito à informação – Para Silva24 o direito de informar, como aspecto da


liberdade de manifestação de pensamento, revela-se um direito individual, mas já contaminado
de sentido coletivo, em virtude das transformações dos meios de comunicação, de sorte que a
caracterização mais moderna do direito de comunicação, que especialmente se concretiza pelos
meios de comunicação social ou de massa, envolve a transmutação do antigo direito de
imprensa e de manifestação do pensamento, por esses meios, em direitos de feição coletiva.

A informação deve ser tratada com muita responsabilidade pelos órgãos estatais,
veículos de impressa e Mídias que são os responsáveis e que possuem credibilidade perante a
sociedade. Desta forma, se presume que as informações que estão sendo divulgadas nesses
canais são verdadeiras e que devem ser utilizadas pela grande massa como informações
confiáveis.

Nesse entendimento, Jairo Gilberto Schafer e Nairane Decarli (2007, p. 128) evidenciam
como é prejudicial uma divulgação equivocada e distorcida dos fatos:

A Constituição não protege as informações errôneas, as distorções da


verdade, bem como a má-fé do informador, aproveitando-se de sua liberdade

22
Em relação à liberdade de imprensa e liberdade de expressão e à vida privada de autoridades públicas,
conferir no Brasil o julgamento da ADPF n° 130/DF e na suprema Corte Americana o caso New York Times vs.
Sullivan. Na doutrina: DWORKIN, Ronald. O direito da liberdade: a leitura moral da constituição norte-americana.
São Paulo: Martins Fontes, 2006, item II, 7 até 11, p. 261-416.
23
Conforme decidiu o Supremo Tribunal Federal: “Crime contra a honra e discussão politico-eleitoral:
limites de tolerância. As discussões politicas, particularmente as que se travam no calor de campanhas eleitorais
renhidas, são inseparáveis da necessidade de emissão de juízos, necessariamente subjetivos, sobre qualidades e
defeitos dos homens públicos nelas diretamente envolvidos, impondo critério de especial tolerância na sua
valoração penal, de modo a não tolher a liberdade crítica, que os deve proteger, mas a tolerância há de ser menor,
quando ainda que situado no campo da vida pública ou da vida privada de relevância pública do militante politico,
o libelo do adversário ultrapassa a linha dos juízos desprimorosos para a imputação de fatos mais ou menos
concretos, sobretudo, se invadem ou tengenciam a esfera da criminalidade” (Pleno – Inquérito n° 503/RJ – questão
de ordem – v. u. – Rel. Min. Sepúlveda Pertence, Diário da Justiça, Seção I, 26 mar.1993, p. 5.001). No mesmo
sentido: STF – Pleno – Inquérito n° 496/DF – v. u. – Rel. Min. Ilmar Galvão, Diário da Justiça, Seção I, 12 nov.
1993, p. 24.022; STJ – 1 Seção – CC n° 22/PR – Rel. Min. José de Jesus – Ementário n° 01/267.
24
MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 36°. Ed. São Paulo: Atlas, 2020, p. 262.
constitucionalmente assegurada. Barroso (1998) exemplifica casos em que a imprensa
fez mau uso de sua atividade, citando jurisprudência do Tribunal de Justiça do Rio de
Janeiro (RDA 185/198, AC 3.059/91, Rel. Des. Carlos Alberto Direito) que assegura
e impede a intromissão na vida privada, pois não é lícito que os meios de comunicação
de massa tornem pública doença de quem quer que seja, ainda mais quando a notícia
é baseada apenas em boatos. Tal informação se encontra na esfera ética da pessoa,
desrespeitando sua intimidade e vida privada 25

Atualmente, com o advento da internet, outros meios tem se tornado fontes de


divulgação de informações com um alcance cada vez maior. Plataformas digitais de vídeo, redes
sociais e aplicativos de mensagens tem se tornado cada vez mais possibilidades de acesso a
informação na palma da mão, devido a popularização dessas plataformas e o acesso mais
facilitado pela grande parte da população.

A constituição Federal permite e protege a liberdade de manifestação de pensamento


como direito fundamental no seu art.. 5°, IV:

Art. 5° Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza,
garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a
inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à
propriedade.

[...]

IV– É livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato.26

Para não deixar dúvidas a respeito do tema, a constituição federal de 1988 estipulou um
capítulo da comunicação (arts. 220 a 224), para tratar da liberdade de informar:

Art. 220 - A manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a


informação, sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer
restrição, observando o disposto nesta Constituição.27

1.4 – Direito ao esquecimento – Maysa de Paula Paiva28 o direito ao


esquecimento consiste na possibilidade do indivíduo não permitir que um fato pretérito, seja
exposto ao público em geral, causando-lhe sofrimento ou transtornos. Segundo Pablo
Dominguez Martinez:

25
PRISMA, Revista. A Colisão dos Direitos à Honra, à Intimidade, à Vida Privada e à Imagem versus
a Liberdade de Expressão e Informação. Disponível no site:
https://periodicos.uninove.br/prisma/article/view/1133/860 acesso 15/04/2021
26
BRASIL, Constituição da República Federativa do. Disponível no site:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm Acesso 13/04/2021.
27
Idem.
28
PAIVA, Maysa de Paula. O direito de ser esquecido. 2017: Disponível no site:
http://intertemas.toledoprudente.edu.br/index.php/ETIC/article/view/6186/5889 . Acesso em 17/09/2021
[...] é a possibilidade de defesa que, como uma redoma, permite a um particular
que não autorize a veiculação ou retire desta um fato pretérito que o expõe ao
publico em geral, causando-lhe sofrimento e transtornos. Pode-se dizer que
esta esfera de proteção funciona como um mecanismo de isolamento
direcionado à informação intertemporal. (2014, p. 81)29

A Constituição Federal de 1988, de forma implícita, fazendo uma interpretação sobre o


artigo 1°, III trata sobre o Direito ao esquecimento quando fala sobre o princípio da dignidade
da pessoa humana:

Art. 1°A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos
Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado
Democrático de Direito e tem como fundamentos.

[...]

IV– A dignidade da pessoa humana(BRASIL, 1988).30

O tema passou a ter uma maior relevância no âmbito do direito brasileiro quando o
Conselho da Justiça Federal aprovou o Enunciado 531 na VI jornada de Direito Civil,
reconhecendo o direito ao esquecimento: “A tutela da dignidade da pessoa humana na sociedade
da informação inclui o direito ao esquecimento”. (BRASIL, 2013).

2. Direito à Vida Privada e à Informação como Direitos Fundamentais e Qual


Prevalece Quando se Colidem?

O direito à vida privada e o direito à informação já foram demonstrados como direitos


fundamentais garantidos pela Constituição Federal de 1988.

O que se busca entender neste momento é o liame entre esses dois direitos tão
importantes no ordenamento jurídico brasileiro.

A colisão entre eles ocorre com bastante frequência no dia a dia dos Políticos e das
Celebridades. Por se tratarem de pessoas com uma grande visibilidade na mídia escrita, falada
e televisada, geralmente, qualquer informação sobre suas vidas profissionais ou privadas
acabam sendo noticiadas de forma instantânea, devido ao grande apelo que provocam no
público.

29
MARTINEZ, Pablo Dominguez. Direito ao Esquecimento: A proteção da Memória Individual na
Sociedade da Informação. Rio de Janeiro: Lúmen Juris, 2014.
30
BRASIL, Constituição da República Federativa do. Disponível no site:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm Acesso 13/04/2021
Antes do advento da internet, a forma de divulgação dessas informações eram,
praticamente, restritas a uma pequena parcela de grupos de televisão e revistas, que possuíam
o monopólio dessas divulgações, podendo dessa forma controlar e editar o que seria interessante
tanto para os meios de comunicação como para as pessoas envolvidas nessas noticias.

Essa garantia, além de ser constitucional, possui respaldo na norma infra legal, na Lei
de Imprensa de n. 5.250/67, que determina em seu artigo 1°:

Art. 1° É livre a manifestação do pensamento e a procura, o recebimento e a


difusão de informações ou idéias por qualquer meio, e sem dependência de
censura, respondendo cada um, nos termos da lei, pelos abusos que cometer.31

Tanto a Constituição Federal como a Lei de Imprensa, deixam claro, que é possível sim
divulgar e expor as informações com total liberdade na grande mídia, mas sempre tendo a
responsabilidade com o conteúdo que será disponibilizado ao público em geral, caso contrário,
os responsáveis pela divulgação podem ser penalizados na forma da lei pelos abusos que
cometerem.

É nesse contexto que o conflito se dá entre o direito à vida privada versus o direito à
informação. As Celebridades e os políticos devido a sua grande notoriedade conseguiriam
conciliar uma vida pública e uma vida privada com maior naturalidade e sossego?

Se antes da internet, o acesso e a disponibilização das informações eram restritos aos


meios de comunicação de grande repercussão nacional, com a internet, a forma de acesso a
informação e divulgação de fotos, vídeo, áudios mudou completamente tanto positivamente
quando negativamente.

32
Hoje em dia, a maioria da população possui smartphones conectados a plataformas
digitais de vídeo, de mensagem e nas redes sociais. Essa interatividade cada vez maior,
proporcionou um aumento significativo na divulgação de informações de todo tipo, inclusive
relacionado a vida privada das celebridades e políticos.

É muito comum essas pessoas serem abordadas por fãs, seguidores ou opositores,
dependendo da situação, em locais totalmente desconexos com os de suas profissões.

31
Lei de imprensa de n. 5.250/67. Disponível no site: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l5250.htm
acesso 20/09/2021.
32
É um telefone celular, e significa telefone inteligente, em português. É um celular com tecnologias
avançadas, o que inclui programas executados um sistema operacional, equivalente aos computadores. São capazes
de conectar redes de dados para acesso à interne, sincronizar dados como um computador além de agenda de
contatos. https://www.significados.com.br/smartphone. Acesso em 20/09/2021.
Aeroportos, praias, bares, restaurantes, praticando atividade física, com a família, a
possibilidade de alguém fotografa-las, filmarem ou serem abordados para uma conversa
amistosa ou nem tanto assim, é praticamente certa.

Para Luis Roberto Barroso33 ensina que, ao contrário das regras, comandos de definição
de natureza biunívoca, ou seja, que só admitem duas espécies de situação, apresentando-se
válidas ou inválidas, os princípios se comportam de maneira diversa. Como comandos de
otimização que são, pretendem ser realizados da forma mais ampla possível, admitindo,
contudo, aplicação mais ou menos ampla de acordo com as possibilidades jurídicas existentes,
sem que isso comprometa sua validade. Permanecem, pois, no sistema, mesmo quando
competitivos, vocacionados ao conflito, reclamando, nessa hipótese, um nível de equilíbrio,
revelado por um critério de ponderação de interesses.

Desta forma, quando ocorre um conflito entre dois princípios fundamentais, garantidos
pela Constituição Federal de 1988, deve se adotar o critério de ponderação de interesses, sempre
analisando o caso concreto para se buscar a melhor solução para o conflito.

3. Direito ao Esquecimento: Políticos e Celebridades e os Impactos e


Consequências nas suas Vidas Privadas com a Divulgação excessiva de
informações na Mídia e pela Internet.

As Celebridades e Políticos estão, querendo ou não, sempre em evidência. Todos os


seus movimentos são monitorados diariamente através da grande mídia e da população em
geral, tanto no âmbito profissional quanto no pessoal.
Muitas das vezes, são divulgados e propagadas informações negativas dessas pessoas
que se perpetuam na internet, vindo a prejudicar suas carreiras e também sua convivência
familiar.
Nessa seara, alguns exemplos evidenciam como se torna difícil a convivência em
sociedade dessas pessoas que tem a vida privada exposta de uma maneira tão excessiva e as
vezes vexatória.
A apresentadora Xuxa com a idade de 17 anos participou de um filme chamado Amor
Estranho Amor, filme de 1982, um drama erótico, onde em uma cena Xuxa tem relações sexuais

33
GODOY, op. cit., p.58.
com um garoto de 12 anos. Essa participação lhe rendeu alguns comentários relacionados a
pedófilia, ainda mais que anos depois, ela viria a se tornar uma apresentadora infantil e esse
passado poderia de certa forma, manchar a sua reputação e imagem de “Rainha dos Baixinhos”.
Para tentar evitar que essa busca fosse realizada na internet, Xuxa entrou com uma ação contra
o Google para que a “expressão “Xuxa pedófila” fosse excluída da pesquisas e deixasse de
disponibilizar imagens dela nua. A defesa de Xuxa invocou o direito ao esquecimento para
tentar solucionar o caso, porém não teve êxito pelo fato de ter feito um pedido genérico e não
um pedido claro e especifico como determina o parágrafo 1° do artigo 19 da Lei 12.965/14, o
Marco Civil da Internet:

Art. 19° Com o intuito de assegurar a liberdade de expressão e impedir a


censura, o provedor de aplicações de internet somente poderá ser
responsabilizado civilmente por danos decorrentes de conteúdo gerado por
terceiros se, após a ordem judicial especifica, não tomar as providências para,
no âmbito e nos limites técnicos do seu serviço e dentro do prazo assinalado,
tornar indisponível conteúdo apontado como infringente, ressalvadas as
disposições legais em contrário.

§ 1° A ordem judicial de que trata o caput deverá conter, sob pena de


nulidade, identificação clara e especifica do conteúdo apontado como
infringente, que permita a localização inequívoca do material34

A artista recorreu, tendo seu caso chegado ao Supremo Tribunal Federal, através de uma
Reclamação, mas também teve sua pretensão negada pelo Ministro Celso de Mello35 que
manteve a permissão para que o Google revelasse fotos e vídeos da apresentadora após
pesquisas que relacionam seu nome a pedofilia.

Outro exemplo recente, dessa vez relacionado a um político, evidencia muito bem como
a exposição excessiva de vídeos e fotos, podem prejudicar e muito a reputação de uma pessoa
conhecida.
Na campanha eleitoral para governador do Estado de São Paulo em 2018, surgiu um
vídeo intimo em um motel do então Candidato João Doria participando de uma festa com várias
mulheres. O vídeo com a suposta participação do candidato se espalhou rapidamente nas redes
sociais e aplicativos de mensagem.

34
BRASIL, Marco Civil da Internet. Disponível no site:
http://www.planalto.gov.br/CCIVIL_03/_ATO2011-2014/2014/LEI/L12965.HTM Acesso: 15/04/2021
35
TARTUCE, Flavio. Direito ao esquecimento Xuxa x Google julgamento no STF
https://flaviotartuce.jusbrasil.com.br/noticias/142265662/direito-ao-esquecimento-xuxa-x-google-julgamento-no-
stf Acesso em 20/092021.
A Revista Veja 36 solicitou um laudo de uma perita criminal para atestar a veracidade
do vídeo e se realmente era Joao Doria quem participava da festa. O resultado da pericia
identificou que o homem que estava com cinco mulheres em um motel foi manipulado
digitalmente para mostrar o rosto de João Doria sobre a face de uma outra pessoa.
Por outro lado, dois dias após a divulgação do laudo da Revista Veja, o site Metrópoles37
divulgou uma matéria onde apontava que João Doria era o homem do vídeo. Surgiu um novo
laudo, onde o perito afirmava que o homem gravado no vídeo tem características compatíveis
com as imagens pessoais do então candidato. O perito, no entanto, não revelou quem o contratou
para analisar as imagens do vídeo, alegando sigilo profissional.

O que se pode extrair dessa situação, o vídeo sendo verdadeiro ou não, é que pessoas
famosas estão mais suscetíveis a sofrerem exposições danosas a sua imagem devido a sua
grande notoriedade e interesse que provocam na sociedade. Independente de como a exposição
é feita, pode gerar retorno positivo para a vida profissional e pessoal, como no caso
demonstrado, uma depreciação da imagem pública, afetando de forma contundente a sua
imagem perante a opinião pública.

36
QUINTELLA, Sergio. Reportagem Veja São Paulo. Disponível https://vejasp.abril.com.br/blog/poder-
sp/pericia-aponta-montagem-em-video-intimo-atribuido-a-joao-doria/ Acesso em 20/09/2021.
37
METROPOLES, Revista. Disponível em https://www.metropoles.com/brasil/eleicoes-2018/novo-
laudo-aponta-que-video-intimo-de-joao-doria-e-verdadeiro Acesso em 20/09/2021.
REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BRASIL, CONSELHO DA JUSTIÇA FEDERAL. ENUNCIADO 531 VI JORNADA DE DIREITO CIVIL.


DISPONÍVEL EM HTTPS://WWW.CJF.JUS.BR/ENUNCIADOS/ENUNCIADO/142, ACESSO 13/04/2021.
BRASIL, CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO. DISPONÍVEL NO SITE:
HTTP://WWW.PLANALTO.GOV.BR/CCIVIL_03/CONSTITUICAO/CONSTITUICAO.HTM , ACESSO EM
13/04/2021.
BRASIL, Marco Civil da Internet. http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-
2014/2014/lei/l12965.htm, acesso em 15/04/2021.

COSTA JUNIOR, Paulo José da. Agressões à Intimidade. São Paulo: Malheiros Editores, 1997.

DWORKIN, Ronald. O direito da liberdade. A leitura moral da Constituição norte-americana.


São Paulo: Martins Fontes, 2006.

MARTINEZ, Pablo Dominguez. Direito ao Esquecimento: A proteção da Memória Individual


na Sociedade da Informação. Rio de Janeiro: Lúmen Juris, 2014

METROPOLES, Revista. Disponível em https://www.metropoles.com/brasil/eleicoes-


2018/novo-laudo-aponta-que-video-intimo-de-joao-doria-e-verdadeiro Acesso em 20/09/2021

MONREAL, Eduardo Novoa. Derecho a la Vida Privada y Libertad de Informacion. 2 ed.


México: Sigilo Veintiuno, 1981.

MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 36°. Ed. São Paulo: Atlas, 2020.

OLIVEIRA, Moacyr de. “Intimidade”, in Enciclopédia Saraiva do Direito. São Paulo: Saraiva,
1980.

PAIVA, Maysa de Paula. O direito de ser esquecido. 2017: Disponível no site:


http://intertemas.toledoprudente.edu.br/index.php/ETIC/article/view/6186/5889
PEREIRA, J. Matos. Direito de Informação. Lisboa: Associação Portuguesa de Informática, ed.
do autor, 1980. Acesso 17/09/2021.

PRISMA, REVISTA. A COLISÃO DOS DIREITOS À HONRA, À INTIMIDADE, À VIDA PRIVADA E À


IMAGEM VERSUS A LIBERDADE DE EXPRESSÃO E INFORMAÇÃO. DISPONÍVEL
HTTPS://PERIODICOS.UNINOVE.BR/PRISMA/ARTICLE/VIEW/1133, ACESSO EM 15/04/2021.

QUINTELLA, Sergio. Reportagem Veja São Paulo. Disponível


https://vejasp.abril.com.br/blog/poder-sp/pericia-aponta-montagem-em-video-intimo-
atribuido-a-joao-doria/ Acesso em 20/09/2021

SICHES, Recasén. Vida Humana, Sociedad y Derecho. 3 ed. México: Porrúa, 1952.

SILVA, JOSÉ AFONSO. CURSO DE DIREITO CONSTITUCIONAL POSITIVO. 41 ED. – SÃO PAULO:
EDITORA MALHEIROS, 2018.

KAYSER, Pierre. La Protection de la Vie Privée: Protection du secret de la Vie Privée.


Marseille: Presses Universitaires d`Aux-Marseille, 1984.
MORAIS, Luciano Pires de. Inoformação versus privacidade: quando direitos fundamentais
entram em rota de colisão. 2017. Disponível em : https://jus.com.br/artigos/59075/informacao-
versus-privacidade-quando-direitos fundamentais-entram-em-rota-de-colisao/2, Acesso em
20/09/2021

TARTUCE, Flávio. Direito ao esquecimento. Xuxa x Google. Julgamento no STF. 2014.


Disponivel em: https://www.sedep.com.br/artigos/direito-a-imagem-de-pessoas-famosas-nao-
e-ilimitado/ , Acesso em 20/09/2021.

Você também pode gostar