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Direitos humanos e relações étnicos raciais

Assistência social e saúde pública


SUMARIO
1. Conceito e considerações preliminares
2. Concepções
3. Características
4. Formação da sociedade patriarcal e do sistema escravista
5. Controle Social e Reprodução da Ordem Escravista
6. Subalternidade e controle pela violência contra indígenas e
africanos. Conflitos e resistências. Imigrantes e controle
social.
7. Fundamentos eugênicos
DIREITOS HUMANOS

1. Conceito e considerações preliminares.

Apesar de direitos humanos ainda estar em formação, existem basicamente


dois conceitos de direitos humanos, um amplo e outro estrito. O amplo está
relacionado com a figura humana e que tem conexão com o direito natural
(vida, liberdade e justiça – dar a cada um o que é seu). O sentido estrito vai
além, porque não basta se correlacionar com o direito natural, havendo
necessidade de estar positivado em tratados e convenções internacionais. Por
outro lado, se forem incorporados no ordenamento jurídico interno de
determinado país, passam a ser chamados de direitos fundamentais.
Assim, direitos humanos são aqueles que surgem em função da figura humana,
conexos aos direitos naturais e positivados em tratados ou convenções
internacionais, que visam efetivar a dignidade da pessoa humana.
O núcleo do conceito de Direitos Humanos está na dignidade da pessoa
humana, que expressa um sistema de valores e orienta toda a ordem jurídica.
A expressão “direitos humanos” é moderna, mas o princípio invocado é antigo
como a própria humanidade, porque são fundamentais na medida em que, sem
eles, a pessoa humana não consegue existir, se desenvolver e participar da
vida em sociedade.

2. Concepções

Para a concepção jusnaturalista, os direitos fundamentais do homem são


imperativos do direito natural, e existem antes mesmo da estruturação estatal.
Não haveria, então, nem mesmo necessidade de previsão positiva, porque os
direitos não podem ser negados, já que são inerentes à natureza humana. Esta
concepção, como se vê, está presente no Direito e na Filosofia, e serviu para
combater o Estado absolutista e fundamentar revoluções, em especial para
modificar o “status quo”.
A concepção positivista, pelo contrário, entende que os direitos do homem são
faculdades concedidas pela lei, e não pela natureza das coisas. Não havendo
previsão no direito positivo, ter-se-á expectativa de direito, e não direito em si.
A concepção idealista, por seu turno, entende que os direitos do homem são
ideias abstratas, que nascem do imaginário e que vão sendo absorvidas pela
realidade ao longo do tempo.
Já para a concepção realista, os direitos do homem não nascem do imaginário
e nem são absorvidos com o tempo de maneira natural. Muito ao contrário, os
direitos fundamentais do homem são resultados reais das lutas sociais e
políticas travadas na história. Para se chegar a eles, quase sempre há um rasto
de sangue e muita luta por trás.
A concepção liberal, que trata os direitos humanos como liberdades
fundamentais, porque a liberdade é que dá força e possibilita modificar,
inclusive, a natureza das coisas, porque os seres humanos podem, então, se
associar, se reunir e lutar. Os direitos humanos estariam vocacionados para
preservar a autonomia da vida do homem.
A concepção histórica-crítica vincula fortemente os direitos humanos à sua
característica de historicidade, porque estes seriam construções históricas
marcadas por contradições, condições e nuanças da realidade social, política,
econômica e cultural.

3. Características
3.1.Imprescritibilidade.

Os direitos humanos não prescrevem. Interessante lembrar que na CF/88 a


imprescritibilidade é a regra, sendo imprescritíveis o racismo e a ação de
grupos armados, civis ou militares, contra a ordem constitucional e o Estado
Democrático (art. 5º, XLII, XLIV). Existe discussão para saber se estes rol
constitucional de imprescritibilidade é taxativo ou exemplificativo: a doutrina
majoritária entende que é exemplificativo, possibilitando inclusão de outros
crimes imprescritíveis, desde que para proteção da pessoa humana, como
ocorre no Estatuto de Roma (criação do TPI), uma vez que seus arts. 5º e 29
preveem a imprescritibilidade dos crimes de genocídio, contra a humanidade,
de guerra e agressão – este ainda não regulamentado.

3.2.Efetividade.
O reconhecimento não basta. Somente a positivação não significa que os
direitos humanos estão sendo respeitados, daí porque se exige a real aplicação
na prática no território nacional. Caso o Estado partícipe não conseguir efetivar
os direitos humanos (no caso, fundamentais), existem garantias como o
“habeas corpus”. A efetividade realça a dimensão objetiva dos direitos
fundamentais, porque é uma garantia de estabilidade dos mesmos no
ordenamento jurídico e ainda impõe ao Estado a criação de planejamentos e
procedimentos para sua efetivação para toda a sociedade.

3.3.Irrenunciabilidade.

Não podem ser abdicados ou negociados, porque fazem parte da própria


existência do ser humano. Pode deixar de ser exercido, mas seu titular não
pode dispor dos mesmos de forma definitiva (não se pode exigir que um doente
em estado terminal aceite a eutanásia). É costume dizer que a
irrenunciabilidade não é absoluta, porque em alguns casos é possível renunciar
algum direito fundamental, como é o caso de renunciar à integridade física,
para fazer doação de rim para parente (vide Lei 9434/97, que trata da doação
de órgãos, tecidos e partes do corpo humano), ou de fixar cláusula contratual
para limitar a liberdade de expressão, para que o funcionário não divulgue
segredo industrial da empresa em que trabalhou. A irrenunciabilidade,
diferentemente da inviolabilidade, visa a proteção do próprio titular do direito
fundamental, e não está previsto explicitamente na Constituição; a
inviolabilidade, por seu turno, está prevista na Constituição e protege o
indivíduo contra terceiros.

3.4.Inalienabilidade.

A alienação também está vedada (não são disponíveis como se fosse um


patrimônio qualquer).

3.5.Historicidade.

Se por trás de cada direito há um rastro, senão de sangue, pelo menos de luta,
é evidente que o direito fundamental é um direito histórico;
3.6.Relatividade.

Nada na vida é absoluto. O direito, mesmo o fundamental, também não é e


nem pode ser absoluto, porque é preciso, em vários casos, limitá-lo, mesmo
em se tratando de um direito fundamental. O direito fundamental da liberdade,
por exemplo, pode ser limitado, a bem da sociedade. Alguns entendem que o
direito de não ser torturado e de não sofrer penas cruéis, e o direito de não ser
reduzido à condição análoga de escravo, seriam direitos fundamentais
absolutos.

3.7.Proibição do retrocesso.

Se o direito fundamental foi conquistado, não pode mais ser extirpado4. Por
exemplo: se o direito fundamental contido em uma norma constitucional de
eficácia limitada foi regulamentado, não pode uma regulamentação posterior
acabar com o direito concretizado pela norma anterior. Para quem leva esta
proibição do retrocesso às últimas consequências, entende que nem mesmo
uma nova Constituição poderá acabar com os direitos fundamentais, porque os
direitos naturais seriam limites ao poder constituinte originários (neste caso, o
poder constituinte teria natureza jurídica jusnaturalista, e não normativista,
como entende a maioria).

3.8.Interdependência.

Não há choque irremediável entre os direitos fundamentais, porque eles devem


se relacionar permanentemente para atingirem suas finalidades.

3.9.Complementaridade.

A interpretação de um direito fundamental deve levar em conta os outros


direitos fundamentais.
Não se interpreta um direito fundamental isoladamente.

3.10. Inviolabilidade.

Não pode ser tolerada violação dos direitos humanos, seja pela lei, pela
autoridade ou pelo poder, órgão ou entidade pública, sob pena de
responsabilização civil, administrativa e criminal. Inviolabilidade, como se viu,
existe para proteção contra terceiros, e irrenunciabilidade para proteção contra
o próprio titular.

3.11. Universalidade e indivisibilidade.

Os direitos humano/fundamentais nascem para todos os homens,


independentemente de raça, nacionalidade, sexo, credo ou convicção política
ou filosófica. A Declaração de Direitos Humanos de Viena, de 1993, no item 5,
diz que “Todos os direitos humanos são universais, indivisíveis
interdependentes e inter-relacionados. A comunidade internacional deve tratar
os direitos humanos de forma global, justa e equitativa, em pé de igualdade e
com a mesma ênfase. Embora particularidades nacionais e regionais devam
ser levadas em consideração, assim como diversos contextos históricos,
culturais e religiosos, é dever dos Estados promover e proteger todos os
direitos humanos e liberdades fundamentais, sejam quais forem seus sistemas
políticos, econômicos e culturais.”
Ainda se fala em exigibilidade e justiciabilidade. A exigibilidade seria o
reconhecimento de que cada cidadão tem a possibilidade de demandar a
satisfação de seus direitos humanos, cabendo ao Estado e à própria
sociedade, oferecer condições para sua efetivação. A justiciabilidade, por sua
vez, imporia o reconhecimento de que os direitos humanos, por serem
justiçáveis, podem ser demandados judicialmente caso não sejam realizados,
especialmente nos dias atuais em que, em face do neoconstitucionalismo e do
pós-positivismo, o Direito se aproxima da Ética, há aumento da jurisdição
constitucional e o Judiciário é cada dia mais proativo.

4. Formação da sociedade patriarcal e do sistema escravista

O patriarcado – entendido como o poder que o homem exerce por meio


dos papéis sexuais – se constitui junto com as sociedades de classes, o que
significa dizer que precede o modo de produção capitalista, e nele assume
formas singulares de existência. Essa existência tão antiga do patriarcado, bem
como as diversas faces que ele assume na história, valendo-se das diferenças
culturais, históricas e de classes para se perpetuar, faz com que, às vezes,
essa opressão – construída por meio de tão hábeis estratégias – pareça
indestrutível. No entanto, a cada nova forma na qual essa opressão se
expressa, novas vozes surgem para combatê-la, às vezes equivocadas,
às vezes acertadas; nesse quadro, entre perdas e retomadas, a opressão
ganha a maioria das batalhas, embora sempre se levantem vozes, solitárias ou
coletivas, de mulheres (e, mesmo que minoritárias, até de homens) para
combatê-la. Para comemorar (trazer à memória, lembrar junto), nas lutas das
mulheres, como sexo/gênero e classe trabalhadora, contra essa forma
específica de opressão, é preciso, inicialmente, denunciar que a ideologia
burguesa/patriarcal tenta transformar essas comemorações em celebrações
(fazer festa), tentando apagar da memória coletiva fatos que todas as pessoas
comprometidas com a revolução socialista devem lembrar. As mulheres não
têm o que celebrar, mas têm muito a comemorar.

A industrialização moderna ocorreu de início do século XIX na Europa e


é lá, no final daquele século, em que inicialmente se desenvolveu a luta das
mulheres, tendo por pauta a inclusão na vida política, expressa no
direito de votar e ser votada. Hobsbawm (1998) afirma que, em meados
do mesmo século, apesar dos avanços e da ocupação de espaços em que,
anteriormente, elas não tinham pene-tração, ainda era pequeno o número
de mulheres que se ocupavam com essa luta. As mulheres, por sua vez,
eram principalmente européias e pertencentes às camadas médias e
superiores, sendo escassa a presença popular. Assim, as conquistas da luta
pouco se efetuaram na vida tanto das mulheres de outros continentes como
das comunidades européias agrícolas.

Nas sociedades pré-industriais havia a divisão sexual do trabalho, mas


não ocorria a separação entre homens e mulheres quanto ao local de
trabalho. As funções eram exercidas todas no mesmo ambiente, não havendo
separação entre as familiares e as de trabalho. As mulheres no campo
trabalhavam na terra, na cozinha e criavam os(as) filhos(as), e nos
povoados, conduziam o comércio de seus maridos (artesãos e pequenos
lojistas). Ocorria um significativo aumento das indústrias domésticas e
domiciliares para a confecção de mercadorias, o que em princípio não
ocasionou quebra no padrão anterior, nem separação entre domicílio e local de
trabalho, combinando a produção doméstica e a de fora de casa. No entanto,
as mudanças econômicas necessariamente acarretavam mudanças em outros
domínios da vida societal, de forma que essas indústrias domésticas não
tardaram a contribuir para diminuir a diferença entre o trabalho considerado
feminino (a ser realizado por mulheres) e o considerado masculino (a ser
realizado por homens). Essas mudanças no trabalho implicaram em mudanças
na estrutura familiar, que afetavam desde a forma como se davam os
casamentos, até o número de filhos (as) que cada casal podia ter.

A dependência pessoal caracterizava tanto as condições sociais da


produção material quanto as esferas de vida estruturadas sobre ela. Como
diz Marx, “[...] essa dependência pessoal não tarda a mudar de forma, a criar
novas clivagens nas relações patriarcais estabelecidas entre homens e
mulheres.” (1988, p. 74).

Até esse momento histórico, a terra era ainda a principal forma de


riqueza e dela se extraíam, quase que exclusivamente, os meios de
subsistência; sua extensão e produtividade determinavam, portanto, a
configuração da vida familiar, isto é, o grupo familiar tinha de ser pensado de
acordo com as características da terra. Isso condicionava não só o tamanho
das famílias, como a decisão sobre o momento apropriado para que os
casamentos ocorressem e entre quais grupos sociais. O aproveitamento
de homens, mulheres e crianças nas indústrias domésticas trouxe, como
consequência, a diminuição da dependência da terra. Dessa forma, já não
era mais necessário que o grupo social fizesse o controle do equilíbrio entre
meios de produção e pessoas. A possibilidade de todo o grupo familiar poder
exercer as funções ligadas à indústria – neste momento ainda no interior da
casa –, dá uma maior autonomia àquele grupo em relação à comunidade,
favorecendo a superação da dependência exclusiva da terra como meio
de subsistência. A nascente indústria capitalista, ao engendrar novas relações
econômicas necessárias ao seu desenvolvimento, engendrava também novas
formas de relações pessoais, o que trazia modificações significativas na vida
das mulheres. Tratava-se do desmantelamento da família camponesa em
direção à família nuclear.
Mas a característica marcante do modo de produção capitalista, que
nesse período conhece um grande impulso, é a de revolucionar
constantemente os meios de produção como condição para existir.
Em consequência disto, a forma de organização em indústrias
domésticas se tornou insuficiente para atender a procura que
crescia junto com os novos mercados e foi suplantada. Assim,
como as indústrias domésticas não supriam mais as
necessidades do capital, essas perdiam o seu caráter de
manufatura familiar e assumiam, cada vez mais, o caráter de
trabalho executado por mulheres, pois permitiam que essas
exercessem o trabalho pago, a gerência da casa e os cuidados com
os(as) filhos(as), isto é, que continuassem a exercer suas obrigações
de gênero, enquanto os homens se deslocavam para um local de
trabalho, fora da casa.

Essa passagem da história evidencia o papel crucial que o


patriarcado exerce na implantação e perpetuação do capitalismo
(bem como de quaisquer outras sociedades de classe, sempre
de um modo apropriado à dominação vigente). Nessa
necessidade que o capital apresenta de constituir indústria em
locais separados do domicílio, se não houvesse o patriarcado,
seria necessário o desenvolvimento de novas formas de dominação
para escolher quem iria para a fábrica, quem ficaria em casa e quem
se responsabilizaria pelas tarefas da produção ou da reprodução.
Além das dificuldades inerentes a essa possível nova forma, haveria
sempre o risco de suscitar objeções de toda ordem. Entretanto,
nada disso se fez necessário, dada a existência e solidez do
patriarcado, internalizado e legitimado por homens e mulheres.

A separação entre o local de produção e o de moradia foi a mais


importante consequência que a industrialização ocasionou para a vida das
mulheres, segundo Hobsbawm (1998). As grandes fábricas, que substituíram
as indústrias domésticas, necessitavam de lugares amplos, com cada vez
mais máquinas e pessoas para executarem a produção das mercadorias,
o que não poderia ser feito no âmbito duma habitação. Nesse processo,
separava-se a fábrica, local de produção de valor – que produz valor novo,
essencial, no capitalismo, para a produção da mais-valia –, do domicílio, local
de reprodução da vida – em que se reproduz, não se cria valor novo, não se
extrai mais-valia. Ao separar esses mundos, valorizando moralmente o mundo
da produção e tornando o da reprodução ideologicamente desvalorizado, o
capital garantia ambos, enquanto dividia ao meio a classe trabalhadora
entre homens e mulheres, e não remunerava as essenciais tarefas de
reprodução. O trabalho da mulher continuava a existir, mas subsumido pelas
atividades exercidas pelo homem fora de casa.
Essa separação em que às mulheres coube a casa – excluídas,
assim, da economia dominante, isto é, do sistema de assalariamento – reforça
a opressão por meio desta nova dependência econômica.

No campo, mesmo com a divisão sexual do trabalho, o resultado deste


era comum, não havendo a separação entre os frutos de acordo com a atuação
de cada um, homem ou mulher. Quando a industrialização promove a saída
dos homens para o trabalho assalariado, fora de casa, e já que a terra não
mais garantia sua subsistência, a renda conseguida pelo homem sustentaria
todos, criando-se uma relação de dependência econômica de novo tipo,
que reforça ainda mais a opressão sobre as mulheres. Portanto, se antes da
industrialização todos dependiam da terra, com o advento da
industrialização mulheres e crianças passam a depender do homem. É
importante ressaltar que tal dependência é exercida diferentemente conforme
a classe social à qual o homem pertence: o patrão detém e exerce o poder
sobre a totalidade da vida como um todo, pública e privada; o trabalhador
detém o poder sobre a vida privada, que exerce contra a mulher e filhos.

Mas a lógica do capital, que busca sempre novas formas de aumentar a


mais-valia, diminuindo a quantia paga ao (à) trabalhador (a) para a sua
sobrevivência, logo exerce sua tendência de pauperização destes (as), de
forma que em pouco tempo o salário dos homens, que tinham saído de casa
para as fábricas, não era suficiente para sustentar a família, tornando-se
imprescindível o trabalho das mulheres e crianças, estas com salários
ainda menores. E aqui novamente se re-vela a relação simbiótica: o
capitalismo promove a separação entre público e privado (mulheres em
casa e homens na fábrica), implantada por encontrar raízes sólidas no
patriarcado. Este, por sua vez, prepara o campo para que, quando o capital
necessite pagar salários menores para aumentar a extração da mais-valia,
possa fazê-lo – sem contestação e algumas vezes sob aplausos.Como nos
lembra Marx (1988, p. 8):

A burguesia não pode existir sem revolucionar permanentemente os


instrumentos de produção – por conseguinte, as relações de
produção e, com isso, todas as relações sociais. A conservação
inalterada do antigo modo de produção era, pelo contrário, a
condição primeira de todas as anteriores classes industriais. A
contínua subversão da produção, o ininterrupto abalo de todas as
condições sociais, a permanente incerteza e a constante agitação
distinguem a época da burguesia de todas as épocas precedentes.

Dessa forma, no início do século XIX, o aprofundamento da


industrialização traz, por um lado, alguns avanços para as mulheres, mas por
outro, lhes foram tirados muitos dos direitos, especialmente no que se refere aos
direitos políticos e sexuais, inclusive em alguns deles ocorrendo retrocessos. No
período anterior à industrialização, algumas mulheres cuidavam pessoalmente
de suas propriedades e empresas, o que era encarado com naturalidade,
mesmo que não fosse uma prática massiva. No século XIX, com a
industrialização, essa prática torna-se malvista por conta da “masculinizarão” do
trabalho: há a expulsão das mulheres do trabalho assalariado, da economia
e do mundo público, criando um preconceito contra o trabalho das
mulheres, especialmente as casadas, transformando o seu direito ao trabalho em
concessão, permitida apenas às mulheres mais pobres.

Como observa Hobsbawm, “[...] se a economia estava assim


masculinizada, também o estava a política” (1998, p. 282), e “[...] à medida que a
democratização avançava e o direito do voto – local e nacional-mente – era
concedido, após 1870, as mulheres eram sistematicamente excluídas.”
(HOBSBAWM, 1998, p. 282).

O modo de produção capitalista, que se constitui por meio de


contradições, ao mesmo tempo em que necessita e promove o
aprofundamento da industrialização, alija as mulheres do espaço público.
Durante os séculos XVII e XVIII, em determinados estados do EUA, as
mulheres não só tinham direito ao voto como chegaram a exercer o
poder parcialmente, até a sua proibição com o ad-vento da Revolução
Americana. Também na Revolução Francesa – o símbolo máximo dos
direitos humanos da sociedade burguesa – as mulheres, pelo menos as
mais pobres, também lutaram e tomaram parte nas diversas formas que a
vida política assumia, inclusive participando das barricadas e revoluções, mas
foram empurradas para fora, até guilhotinadas, quando ousaram estender os
direitos humanos também para si. Tais exemplos são emblemáticos do
caráter patriarcal do capitalismo nascente. Em suma, a divisão entre o
público e o privado, que o sistema capitalista aprofunda como necessidade
fundamental para a produção de mercadorias, afastava as mulheres do espaço
público e alijava-as da vida política.

O constante revolucionar de suas próprias estruturas que


necessariamente o sistema capitalista produz, impulsiona novamente
mudanças na situação das mulheres, assim como em todos os setores da vida
social. Deste modo, as transformações estruturais e tecnológicas, acontecidas
no final do século XIX, acabaram por promover um aumento nas formas de
assalariamento das mulheres, especialmente em lojas, escritórios e no
magistério infantil, trabalho que passa de condenável a desejável. A
necessidade da força de trabalho das mulheres no final do século XIX se
explica devido às novas exigências do aumento da tecnologia, que requer uma
força de trabalho especializada, fazendo necessário o investimento em
educação, a começar pela infantil. No magistério, o capital mostra seu
interesse pelo trabalho das mulheres motivado pelo barateamento de força de
trabalho, visto que como estas eram especialistas em cuidar de suas próprias
crianças, não seria necessário investimento em formação de educadores.

5. Controle Social e Reprodução da Ordem Escravista

É demonstrativamente certo que, sem o Brasil,Portugal é uma


insignificante potência; e que o Brasil sem forças é um preciosismo tesouro
abandonado a quem o quiser ocupar.’’ esta afirmação do secretário da Marinha
e Ultramarao vice-rei do Brasil revela uma das preocupações primordiais da
metrópole colonizadora: a de manterá colônia exclusivamente para si, a fim de
que só Portugal pudesse auferir as riquezas coloniais. Defesa militar e
dominação política eram os dois mecanismos que asseguravam a
exclusividade portuguesa sobre esse “preciosismo tesouro”. A defesa militar da
colônia foi uma preocupação constante da metrópole e ocupou boa parte da
correspondência oficial. Nem sempre, porém, dizia respeito apenas à defesa
contra agentes externos. A questão aparece claramente detectada num
parecer do Conselho Ultramarino de 1732, no qual o conselheiro Antônio
Rodrigues da Costa afirmava que

“a dois gêneros de perigos estão sujeitos todos os


Estados, uns externos outros internos – os externos
são os da força e violência que podem fazer
as outras nações; os internos são os que poderão
causar os naturais do país e os mesmos vassalos”.
Considerando que a extensa costa brasileira era impossível de ser
fortificado, que os tratados de paz podiam ser facilmente quebrados e as forças
navais portuguesas eram inferiores às de outras potências européias, advertia
ele ser preciso cuidar da submissão e fidelidade dos vassalos, que,
descontentes e aliados às forças externas, podiam desejar “livrar-se da
obediência do príncipe a quem servem”. Recomendava, portanto, a reta e
pronta administração da Justiça e o cuidado na escolha dos governantes e
ministros para promover a afeição e a confiança na grandeza e na justiça reais;
maior rapidez e eficiência nas apelações à Corte para eliminar queixas,
demoras e prejuízos nos negócios da Justiça, Fazenda e Milícia; especial
ponderação nos tributos sobre os gêneros coloniais e nas contribuições para os
casamentos das filhas dos reis para não cultivar o descontentamento, o
vexame e a opressão dos súditos e o conseqüente ódio ao Governo. O
desdobramento e a expansão da exploração colonial, que acirrava as tensões
na colônia, a maior concorrência colonial entre as potências e o aparecimento
progressivo de “novas idéias” abriam brechas, cada vez maiores, para a
manifestação de interesses divergentes entre os colonos e a metrópole. Era
preciso cuidar, também, da defesa interna e impedir que as insatisfações
coloniais se aliassem à ambição de outras potências. Assim, ao mesmo tempo
em que se controlavam os passos dos viajantes e que jesuítas e quaisquer
pessoas com “práticas que podem ser tendentes à sedição” eram
perseguidos, ordenava-se, também, maior controle contra os contrabandos,
maior cuidado na arrecadação das alfândegas e “maior e mais exata disciplina”
das tropas, consideradas pelo marquês do Lavradio úteis não só para “a defesa
e segurança deste Estado” como também um meio eficaz para indução dos
povos ao “costume da subordinação”. Data da segunda metade do século XVIII
a organização e o controle militar dos moradores, as proibições contra a
entrada de “ideias jacobinas” na colônia, paralelamente à ampliação do poder
dos governadores coloniais e à interferência mais direta da Coroa nos negócios
coloniais. Progressivamente, a defesa voltava-se também para assegurar a
submissão dos colonos. Várias outras instruções e relatórios aos governantes
coloniais do século XVIII mencionam tanto a necessidade de tropas para a
defesa das partes do Sul e dos portos marítimos quanto a importância da
administração da Justiça e do controle dos moradores, além dos cuidados com
a produção colonial. Novamente, as recomendações do secretário da Marinha
e Ultramar constituem um exemplo cristalino:
“Entre as muitas e muito importantes obrigações do governo de V. Exa.
[afirma ele ao vice-rei Luiz de Vasconcellos] são as principais as que têm
objeto a conservação e aumento da religião, a exata, imparcial e pronta
administração da Justiça aos povos, a boa arrecadação e administração da
Real Fazenda, a conservação da tropa e forças do Estado, a cultura das terras,
a navegação e o comércio, um vigilante cuidado em evitar os contrabandos e
tudo quanto respeita à polícia da capital do Brasil que V. Exa. vai governar.”
Controle dos moradores, defesa contra invasores, produção que
resultasse em grandes lucros – estes os pontos que asseguravam
a continuidade da exploração colonial . Que asseguravam a dominação da
metrópole portuguesa sobre sua colônia na América e garantiam a
exclusividade de sua exploração pela Coroa. Contudo, a exploração colonial
não foi única; imbricada nela houve ainda outra forma de exploração: aquela
efetivada pelo senhor sobre o trabalho escravo. Este, o modo da produção das
riquezas acumuladas na metrópole, a base sobre a qual esteve fundada a
exploração colonial. Neste sentido, sem perder de vista a vinculação extrema
entre eles, podemos afirmar que há, com efeito, dois níveis de apropriação no
Sistema Colonial: a realizada pelo senhor no nível da produção escravista e da
exploração do trabalho escravo, e a colonial propriamente dita, realizada pela
Coroa, pelos negociantes e centros econômicos europeus. Estas duas formas
de apropriação supõem duas formas básicas de dominação: a senhorial
(presente na relação senhor-escravo) e a colonial (na relação metrópole-
colônia).
Vem daí a tensão entre os interesses da metrópole e dos colonos, que
tendia a manifestar-se com maior força conforme avançava a dominação e a
exploração coloniais. Se, por um lado, a metrópole estava interessada em
manter a colônia para si e subjugar os colonos enquanto súditos fiéis,
regulamentando a continuidade da exploração colonial em termos mais amplos,
por outro, o colono tinha o interesse específico de preservação do seu
empreendimento particular. Desde o século XVII, a Coroa portuguesa concedia
vários privilégios aos senhores de engenho a fim de promover a cultura da
cana-de-açúcar e evitar que as penhoras e sequestros nas fábricas,
escravarias e fazendas interrompessem a produção. Estes mesmos privilégios
foram concedidos aos senhores de engenho e lavradores de cana dos Campos
dos Goitacases, que, a partir de 1776, não podiam ter penhoradas ou
arrematadas suas fazendas, só os rendimentos delas. Os negociantes do Rio
de Janeiro, porém, julgando-se sem garantias, deixaram de vender a prazo
para a vila de São Salvador, o que obrigou o pedido de revogação do privilégio
em menos de um ano. Neste caso específico, embora teoricamente as medidas
metropolitanas visassem a preservação da economia açucareira campista, na
prática ocorria exatamente o contrário. Daí sua revogação, a pedido dos
próprios lavradores e senhores de engenho. Do mesmo modo, a Coroa tinha
todo interesse em promover técnicas que permitissem um maior
aproveitamento do solo e/ou melhor, produtividade. Por meio do ofício de 20 de
março de 1798, recomendou expressamente aos camaristas de São Salvador
dos Campos dos Goitacases que cuidassem de introduzir nas áreas sob sua
jurisdição “o método do arado e o uso do bagaço de cana para as fornalhas
dos engenhos”, que resultariam “tanta grandeza [...] não só ao público como
ainda ao particular”. Os lavradores e fabricantes de açúcar não adotaram essas
medidas, porém, alegando que o bagaço de cana não produzia o efeito
pretendido, acarretando muito trabalho para produção de pouco açúcar, e
ainda de má qualidade, e que “o uso do arado neste país não tinha lugar por
respeito das muitas raízes e tocos de paus que de instante a instante se
encontravam, do que resultavam embaraços grandes nos serviços, os quais se
abreviavam mais e melhor a braço com a enxada [...] usando dos braços da
escravatura”.
Contudo, para além de técnicas mais produtivas e instrumentos jurídico-
administrativos que preservassem as unidades produtoras coloniais,
necessário se fazia pensar também na continuidade da exploração senhorial do
trabalho escravo. Evidentemente, a Coroa portuguesa estava interessada na
manutenção da escravatura e na sua submissão a seus senhores. Legislou
sobre o tráfico de maneira a manter uma oferta regular de cativos, necessária à
produção colonial, ao mesmo tempo em que assegurava (por mecanismos
administrativos e fiscais ligados ao tráfico) a transferência da renda do setor
produtivo para o comercial, tentando equilibrar os ganhos dos negociantes
metropolitanos e da própria Coroa. A maior parte da legislação portuguesa
relativa aos escravos refere-se ao tráfico: navios, pagamento de direitos sobre
o transporte e a comercialização dos africanos, portos, companhias ou
negociantes privilegiados para esse comércio. Preocupada com a continuidade
da produção escravista e com a remessa dos lucros (provindos também dos
tributos sobre o tráfico), a metrópole não só garantiu o abastecimento de mão
de obra como também interveio em outros aspectos da economia que
asseguravam a exploração colonial, salvaguardando a exploração senhorial.
Assim, por exemplo, o alvará de 5 de janeiro de 1785, que proibia fábricas e
manufaturas de tecido na colônia (privilegiando, portanto, a produção dos
gêneros coloniais e os interesses da manufatura metropolitana), resguardou os
teares que produziam “fazendas grossas de algodão, que servem para uso e
vestuário dos negros”, e para enfardar e empacotar os produtos.

Fonte de lucros enquanto objeto de comércio e mão de obra produtiva, o


escravo e a escravidão eram preservados de qualquer contestação. Ao mesmo
tempo em que a Coroa interferia na repressão às rebeliões e legislava,
também, a respeito das fugas e dos quilombos, chegava a expulsar da colônia
os que opinassem contrariamente à escravatura: os jesuítas Gonçalo Leite e
Miguel Garcia sustentaram, no século XVI, que o cativeiro dos africanos era
injusto e, por este motivo, foram obrigados a voltar para a Europa; no final do
século XVIII aconteceu o mesmo com o frei José Bolonha, capuchinho italiano
que permaneceu 14 anos na Bahia. E, especialmente após os acontecimentos
no Haiti, no final do século, cresceu o receio com relação aos “abomináveis
princípios” que não só incitavam os vassalos à sublevação, mas podiam
também levantar os escravos contra seus senhores. Numa carta de 21 de
fevereiro de 1792, dirigida ao conde de Rezende, Martinho de Mello e Castro
mandava permitir a entrada, nos portos da capitania, de dois navios franceses
de uma expedição científica. Mas recomendava toda a vigilância, em virtude
das ideias de liberdade e igualdade que anarquizavam a Europa:
“com a propagação destes abomináveis princípios
atearam os mesmos clubes nas colônias francesas
o fogo da revolta e da insurreição, fazendo levantar
os escravos contra seus senhores e excitando
na parte francesa da ilha de São Domingos uma
guerra civil entre uns e outros, em que se cometeram
as mais atrozes crueldades”.
Em carta de 13 de fevereiro de 1799, afirmava dom Fernando José de Portugal
que
“o que sempre se receou nas colônias é a escravatura, em razão de sua
condição, e porque é o maior número dos habitantes delas, não sendo tão
natural que os homens empregados e estabelecidos, que têm bens e
propriedades, queiram concorrer para uma conspiração ou atentado de que
lhes resultariam péssimas consequências, vendo-se até expostos a serem
assassinados pelos seus próprios escravos”. Se a metrópole estava
interessada em manter a exploração escravista como um todo, era o senhor,
contudo, quem tinha o interesse imediato na manutenção dos escravos
enquanto trabalhadores submetidos à sua exploração.
Para a metrópole, a exploração escravista colonial interessava a nível
geral (do todo da colônia); para o senhor, ela era fundamental para a
continuidade do seu empreendimento particular. Em outros termos: à metrópole
interessava predominantemente o controle colonial, enquanto ao senhoreado, o
controle escravista. Esta distinção é particularmente importante no que diz
respeito ao controle social da colônia. Para a metrópole, esse aspecto
significava, em primeiro lugar, manter a dominação dos vassalos (e, portanto,
dos colonos) e, para o senhor colonial, a continuidade do domínio sobre os
escravos.
Para controle dos colonos, a Coroa portuguesa dispunha de diversos
mecanismos econômicos, políticos, jurídicos e mesmo sociais. “A exata,
imparcial e pronta administração da justiça aos povos é o meio de os ter
sossegados, contentes e felizes”: afirmações como esta são muito freqüentes
na correspondência das altas autoridades coloniais, especialmente no correr do
século XVIII.
6. Subalternidade e controle pela violência contra indígenas e africanos.
Conflitos e resistências. Imigrantes e controle social. Xenofobia .

CONTATO, ALIANÇAS E CONFLITOS


Ao chegar a São Vicente, os primeiros portugueses reconheceram
de imediato a importância fundamental da guerra nas relações intertribais.
Procurando racionalizar o fenômeno, convenceram-se de que os
intermináveis conflitos representavam pouco mais que vendetas sem maior
sentido; ao mesmo tempo, porém, perceberam que podiam conseguir muito
através de seu engajamento com elas. Considerando o estado de
fragmentação política que imperava no Brasil indígena, as perspectivas de
conquista, dominação e exploração da população nativa dependiam
necessariamente do envolvimento dos portugueses nas guerras intestinas,
através de alianças esporádicas. Ademais, pelo menos aos olhos dos
invasores, a presença de um número considerável de prisioneiros de guerra
prometia um possível mecanismo de suprimento de mão-de-obra cativa
para os eventuais empreendimentos coloniais.
Os índios, por sua vez, certamente percebiam outras vantagens
imediatas na formação de alianças com os europeus, particularmente nas
ações bélicas conduzidas contra os inimigos mortais. Entretanto, estes logo
descobriram claramente os efeitos nocivos de semelhantes alianças. A
conseqüente transformação da guerra, agravada pelos freqüentes surtos de
doenças contagiosas, trazia sérias rupturas na organização interna das
sociedades indígenas. Mais importante ainda, o apetite insaciável dos
novos aliados por cativos - porém não no sentido tradicional - ameaçava
subverter a principal finalidade da guerra indígena: o sacrifício ritual no
terreiro.
Já na primeira metade do século X:VI, os Tupiniquim começaram a
enfrentar estes problemas na capitania de São Vicente. Quando da
chegada dos portugueses em 1531-2, eles haviam aceitado a presença
européia justamente porque esta não apresentava nenhuma ameaça
ostensiva ao bem-estar indígena. Afinal de contas, as principais aldeias
tupiniquins estavam localizadas em cima da serra, ao longo do rio Tietê.
Além disso, encontrava-se entre os principais "guerreiros" tal de João
Ramalho, português que anos antes tinha se integrado ao grupo local
chefiado por Tibiriçá. "Casado" com uma filha deste chefe, Ramalho acabou
estabelecendo outra aldeia, que serviria de llase para a futura vila
portuguesa de Santo André da Borda do Campo.
Com toda-a certeza, a aliança entre os Tupiniquim e os portugueses
muito se deveu à presença de João Ramalho. Para o recém-chegado
jesuíta Manuel da Nóbrega, baseado em il.'iformações secundárias,
Ramalho era um português totalmente indigenizado. Escreveu Nóbrega: "[
... ] toda sua vida e de seus filhos segue a dos índios [ ... ] Têm muitas
mulheres ele e seus filhos, andam com irmãs e têm filhos delas tanto o pai
quanto os filhos. Seus filhos vão à guerra com os índios, e suas festas são
de índios e assim vivem andando nús como os mesmos índios.

Apesar de seu desgosto inicial pelos modos gentílicos de Ramalho,


Nóbrega reconheceu imediatamente a fundamental importância da presença
dele na capitania. De fato, quando da sua primeira visita às aldeias do planalto,
a comitiva inaciana contou com o apoio do filho mais velho de Ramalho, André,
"para dar mais autoridade ao nosso ministério, porque [João Ramalho] é muito
conhecido e venerado entre os gentios, e tem filhas casadas com os principais
homens desta Capitania, e todos estes filhos e filhas são de uma índia filha dos
maiores e mais principais desta terra". Mais tarde, quando os portugueses
resolveram povoar o planalto, o principal assentamento luso-tupi cresceu em
torno da aldeia de João Ramalho.

Porem, mesmo antes da ocupação mais concentrada do planalto pelos


portugueses, na década de 1550, a aliança foi submetida a sérias provas. O
desenvolvimento das empresas coloniais no litoral, sobretudo a partir da
década de 1540, havia começado a aumentar a demanda pela mão-de-obra
indígena e pelo abastecimento de gêneros de primeira necessidade. Embora
algumas unidades maiores, como a da família Schetz de Antuérpia, houvessem
chegado a importar escravos da África Ocidental, a maioria buscou sua força
de trabalho entre a população indígena. Em 1548, segundo um relato da
época, a capitania já dispunha de seis engenhos de moer cana e uma
população escrava superior a 3 mil cativos.
Na procura por trabalhadores indígenas, os colonos buscavam suprir-se,
inicialmente, de duas maneiras: através do escambo ou da compra de cativos.
Na primeira forma de recrutamento, os portugueses ofereciam ferramentas,
espelhos e bugigangas aos chefes indígenas na expectativa de que estes
orientassem mutirões para as lavouras européias. Embora útil na derrubada
das matas para o preparo das roças, esta forma mostrou-se inadequada,
esbarrando na aparente inconstância dos índios. Na segunda forma de
recrutamento, os portugueses procuravam fomentar a guerra indígena com o
intuito de produzir um fluxo significativo de cativos que, em vez de sacrificados,
seriam negociados com os europeus como escravos. Entretanto, nenhuma das
duas estratégias mostrou-se eficiente, devido sobretudo à recusa dos índios
em colaborar à altura das expectativas portuguesas. Expectativas estas que,
ademais, provocaram rupturas nas relações intertribais já existentes antes da
chegada dos europeus. O impacto negativo dos produtos europeus sobre as
sociedades nativas foi sublinhado na década de 1550, peio jesuíta Pedro
Correia, da seguinte maneira:

Se os índios do Brasil são agora mais guerreiros e mais maldosos do


que deviam ser, é porque nenhuma necessidade têm das coisas dos
cristãos, e têm as casas cheias de ferramentas, porque os cristãos andam
de lugar em lugar e de porto em porto enchendo-lhes de tudo que eles
querem. E o índio que em outros tempos não era ninguém e que sempre
morria de fome, por não possuir uma cunha para fazer uma roça, agora têm
quantas ferramentas e roças que quiserem, comem e bebem de continuo e
andam sempre a beber vinhos pelas aldeias, ordenando guerras e fazendo
muitos males, o que fazem todos os que são muito dados ao vinho por
todas as partes do mundo.

Atrás deste discurso moralista está a sugestão das profundas


transformações e da desestruturação que tomaram conta das aldeias indígenas
em contato com os portugueses. Com o passar do tempo, a postura dos índios
começou a subverter o projeto dos europeus, justamente porque a
transformação das sociedades nativas não caminhava na direção desejada
pelos portugueses. Um problema imediato surgiu com o fracasso do sistema de
escambo enquanto mecanismo que visava o suprimento das necessidades dos
colonizadores, sobretudo no abastecimento de gêneros alimentícios. Os
horticultores tupi-guarani produziam excedentes com facilidade e parecia
possível expandir esta produção com a ajuda de utensílios de ferro. Os relatos
quinhentistas, por exemplo, contêm numerosas referências a aldeias indígenas
que apresentavam abundantes estoques de milho ou farinha de mandioca.
Vicente Rodrigues, um jesuíta radicado em Pernambuco, escreveu que
"vinham os. gentios de seis e sete léguas pela fama dos Padres, carregados de
milho [mandioca] e o mais que tinham para lhes oferecer ... ". Um colega de
Rodrigues em Pernambuco, Antonio Pires, relatou que certa vez chegou à
missão "um principal de outra aldeia, que vinha carregado, com sete ou oito
negros, de milho". No Sul, na mesma época, os Guarani ficaram conhecidos
pela abundância de comestíveis que forneciam aos europeus. "Muitas vezes
vinham muitos índios com grandes presentes de veados e galinhas, peixes,
cera e mel", escreveu o jesuíta Leonardo Nunes ao descrever sumariamente os
Carijó.

Para o desagrado dos colonizadores, no entanto, os índios forneciam


provisões apenas esporadicamente e de maneira limitada, ao passo que os
portugueses começaram a depender mais e mais da produção e mão-de-
obra indígena para seu próprio sustento. É verdade que, em meados do
século XVI, as relações de troca chegaram a florescer, mas cada parte
atribuía-lhes um sentido radicalmente distinto. A oferta de gêneros por parte
dos índios não foi - como querem Alexander Marchant e outros autores
subseqüentes - uma simples "resposta" econômica a uma situação de
mercado. Muito pelo contrário, tanto a aquisição quanto a oferta de
"mercadorias" devem ser compreendidas mais em termos de sua carga
simbólica do que por seu significado comercial. Tomadas fora de contexto,
as observações dos jesuítas acima citados podem conduzir a uma noção
equivocada sobre a produção indígena nesta conjuntura crucial. Por
exemplo, o padre Pires assim explicou o suprimento de gêneros por um
principal indígena: "O seu intento é que lhe demos muita vida e saúde e
mantimento sem trabalho como os seus feiticeiros lhe prometem". Do
mesmo modo, Leonardo Nunes revelou que os Guarani traziam seus
"grandes presentes" na expectativa de uma contrapartida espiritual por
parte dos jesuítas.
Assim, cabe ressaltar que o escambo ganha sentido apenas na
medida em que se remete à dinâmica interna das sociedades indígenas.
Longe de se enquadrarem no contexto de uma economia de mercado em
formação, as relações de troca estavam vinculadas intrinsecamente ao
estabelecimento de alianças com os europeus. Portanto, os índios
aceitaram e até promoveram semelhantes relações desde que elas
contribuíssem para a realização de finalidades tradicionais.
Paradoxalmente, foi nesta postura ostc::nsivamente conservadora que os
grupos tupi contribuíram para a transformação acelerada das relações
intertribais e luso-indígenas.

Na medida em que o escambo se mostrou um modo pouco eficaz para


atender às necessidades básicas dos europeus, estes procuraram reformular a
base da economia colonial através da apropriação direta da mão-de-obra
indígena, sobretudo na forma da escravidão. Inicialmente, a aquisição de
escravos permanecia subordinada à configuração das relações intertribais.
Contudo, com a presença crescente dos europeus, as guerras intertribais
passaram a adquirir características de "saltos", promovidos com o objetivo de
cativar escravos para as empresas coloniais. Nesse sentido, como sugere o
padre Correia no trecho acima citado, o resultado principal destas relações
iniciais foi a intensificação da guerra entre inimigos tradicionais, tais como os
Tupiniquim e Tupinambá, com conseqüências desastrosas para os grupos
indígenas.

Os portugueses acreditavam que o aumento de prisioneiros de


guerra acarretaria a formação de um considerável mercado de escravos,
uma vez que mesmo a legislação colonial sancionava esta forma de adquirir
trabalhadores. 56 Mas os cativos não se transformavam em escravos tão
facilmente. Os europeus logo enfrentaram resistência à venda de
prisioneiros não apenas entre os captores como também entre os próprios
cativos. Assim, por exemplo, quando o jesuíta Azpilcueta ofereceu-se para
comprar um prisioneiro tupinambá na hora do sacrifício deste, foi a vítima
que impediu a transação: "ele disse que não o vendessem, porque lhe
cumpria a sua honra passar por tal morte como valente capitão" .
Paulatinamente, ficava mais e mais claro para os portugueses que a
transformação do prisioneiro em escravo, através da manipulação da
guerra, envolvia antes a redefinição ritual e social do sacrifício humano.
Apesar de a maior parte dos grupos locais lutar pela preservação de suas
tradições, as relações euro indígenas acabaram provocando mudanças
significativas. Alguns grupos tupiniquim, por exemplo, sobretudo após a
chegada dos jesuítas, abandonaram a antropofagia e passaram a dar um
enterro cristão aos inimigos mortos. Anchieta, ao comentar a dificuldade em
eliminar por completo o sacrifício dos prisioneiros, escreveu que, "entre
tanta multidão de infiéis, algumas poucas ovelhas se abstenham ao menos
de comer seus próximos''.

Na capitania de São Vicente, os portugueses buscaram aumentar a


oferta de mão-de-obra indígena por meio da aliança com os Tupiniquins,
transformando-a de uma relação de relativa igualdade para uma de
subordinação. Não se conhecem em maiores detalhes os elementos precisos
desta transformação, mas parece claro que já na década de 1540, os
portugueses controlavam - direta e indiretamente - algumas aldeias tupiniquim.
O papel do genro de Tibiriçá, João Ramalho, foi fundamental na expansão da
influência e autoridade dos colonizadores. De acordo com Ulrich Schrnidel, um
alemão que visitou uma aldeia luso-tupiniquim em 1553, Ramalho "pode reunir
cinco mil índios em um só dia". Assim, ao apropriar-se dos atributos de um
chefe tupi, Ramalho acabou sendo o intermediário ideal, colaborando
sobremaneira na moldagem das relações lusoindígenas em favor dos
portugueses.

Igualmente, o caso específico de João Ramalho e sua relação com


Tibiriçá ilustra outro elemento crucial no processo de dominação
portuguesa. No século xvr, o casamento e o concubinato tornaram-se
formas importantes através das quais os portugueses firmaram sua
presença entre os índios do Brasil. De acordo com o padre Nóbrega: "Nesta
terra há um grande pecado, que é terem os homens quase todos suas
negras por mancebas, e outras livres que pedem aos negros por mulheres,
segundo o costume da terra, que é terem muitas mulheres" .Em São
Vicente, o concubinato atingiu proporções tão alarmantes, pelo menos aos
olhos dos jesuítas, que Pedro Correia, demonstrando certo desgosto,
observou: "Há muito pouco tempo que me lembro que se perguntava a uma
mamaluca quê índias e escravas são estas que traz com você; respondia
ela dizendo que eram mulheres de seu marido, as quais elas sempre
trazem consigo e olhavam por elas assim como uma abadessa com suas
monjas". Contudo, não se tratava simplesmente da adoção de práticas
nativas pelos portugueses carentes na ausência de mulheres brancas. Mais
importante a poligamia e o concubinato refletiam, às vezes, as alianças
pactuadas entre portugueses e índios, conferindo aos colonos certo
prestígio dentro das estruturas indígenas.

Embora os portugueses conseguissem a adesão de alguns chefes locais


por meio dessas alianças, tais estratégias de consolidação do controle nem
sempre foram bem-sucedidas. Conforme veremos adiante, a resistência de
outros elementos tupiniquim aos avanços dos portugueses evidentemente
provocava sérias crises de autoridade entre os grupos locais, levando a um
facciosismo agudo. Contudo, mesmo os colaboradores mais próximos
mostravam-se inconstantes. Até Tibiriçá, considerado pelos jesuítas um caso
exemplar de conversão, chegou a repugnar ao irmão Anchieta quando insistiu
em sacrificar um prisioneiro guaianá "à moda gentílica". Mais dês concertante,
pelo menos no ponto de vista de Anchieta, foi a manifestação entusiasmada
dos demais índios presentes, "até os próprios catecúmenos, por ser isso
exactamente o que desejavam, e gritavam à uma que se matasse".

Apesar das dificuldades enfrentadas na dominação dos Tupiniquim, os


portugueses de São Vicente conseguiram incitar os aliados a intensificar os
conflitos com os Tupinambá. Em vista desta escalada, diversos grupos
tupinambá, ao longo do litoral de Cabo Frio a São Vicente, aliaram-se,
formando um poderoso movimento de resistência. Entre as décadas de 1540 e
1560, todo o litoral e muitas partes da Serra Acima foram envolvidos na
chamada Guerra dos Tamoios.
De forma significativa, esta guerra refletiu mudanças importantes na
estrutura dos conflitos intertribais no Brasil meridional. Se, no início, a
guerra estava arraigada na lógica das relações e rivalidades pré-coloniais,
agora ficava claro que as ações bélicas passavam a ser subordinadas às
pressões e demandas do colonialismo nascente. Estas transformações, por
sua vez, teriam efeitos profundos sobre as estruturas internas das
sociedades indígenas. Jean de Léry, ao relatar a tentativa dos franceses em
comprar alguns cativos tememinó aos Tupinambá, elucida esta questão:
Por mais esforços que fizéssemos, porém, nossos intérpretes só
conseguiram resgatar parte dos prisioneiros. Que isso não era do agrado
dos vencedores percebi-o pela compra de uma mulher com seu filho de dois
anos, que me custaram quase três francos em mercadorias. Disse-me
então o vendedor: "Não sei o que vai acontecer no futuro, depois que pai
Colá (Villegaignon] chegou aqui já não comemos nem a metade de nossos
prisioneiros''.

Ademais, ficava cada vez mais claro para as autoridades portuguesas


que a insubordinação e rebeldia indígena estavam intrinsecamente ligadas às
provocações européias, na medida em que a exploração desenfreada da mão-
de-obra indígena aparentemente levava tanto à resistência armada quanto ao
declínio demográfico. A percepção desta ligação entre demandas européias e
comportamentos indígenas contribuiu para a alteração radical da política
portuguesa para o Brasil, política esta que envolvia pela primeira vez a própria
Coroa enquanto agente colonial. De fato, ao redigir o Regimento de Tomé de
Sousa em 1548, a Coroa não apenas estabeleceu as bases de um governo
colonial como também esboçou a primeira manifestação de uma política
indigenista, dando início a uma série interminável de leis, decretos, ordens e
regimentos que fariam parte de uma legislação no mais das vezes ambígua e
contraditória. A nova postura expressa no Regimento admitia abertamente que
o fracasso da maioria das capitanias tinha raízes no cativeiro ilegítimo e
violento praticado pelos colonos. Ao mesmo tempo, de forma mais velada, o
Regimento reconhecia que o êxito da Colônia dependia, em última instância, da
subordinação e exploração da mesma população indígena.

7. Fundamentos eugênicos
O Estado Eugênico

A Primeira Guerra Mundial rompeu o tênue e tenso equilíbrio entre as


potências industriais e seus impérios imperialistas. Entre 1918 e 1929, criou-se
uma nova correlação de forças e interesses capitalistas que penderam
favorável e fortemente para os Estados Unidos. Ficou para os impérios
capitalistas europeus a crise, a destruição em diferentes intensidades, maior na
derrotada Alemanha, além de uma nova geopolítica trazida pelo surgimento da
URSS.

Essa tendência a uma hegemonia estadunidense no capitalismo


internacional foi interrompida pela econômica a partir de 1929. Ela atingiu a
Europa e favoreceu a chegada dos nazistas ao poder na Alemanha. O nazismo
e a ruptura do Tratado de Versalhes (1919) criaram a empresários alemães e
brasileiros oportunidades de restabelecerem antigos laços de negócios,
anteriores a 1914, ou de criarem novas possibilidades de acumulação. Em
particular na área bélica e siderúrgica, com destaque às empresas Krupp, suas
vendas de armas para as forças armadas brasileiras (Silva, 1998) e seus
interesses na compra de carvão mineral e instalação de siderurgia, envolvendo
a Carbonífera Próspera (Criciúma-SC), sob direção de Renato Rocha Miranda
(Belloli, 2002).

Os interesses macroeconômicos, no período de 1929 até a declaração


de Guerra do Brasil à Alemanha em 1942 e as formas de inserção dos dois
países neste contexto tenso não podem ser percebidas de forma determinista,
automática, nem linear. A existência, porém, destas relações não pode ser
negada. Entre os dois países houve um forte trânsito econômico e ideológico
naquele período, pelo tão intenso quanto às relações com os EUA, com a
Inglaterra e com a França.

O envolvimento do Estado Nacional brasileiro com Alemanha nazista,


com o nazismo e com o pensamento eugenista deve ser compreendido dentro
de uma perspectiva ampla. Deu-se através da aproximação de organizações
políticas nacionais (como a AIB), pela diplomacia com o Estado Nacional
alemão e pelos interesses de associação, concorrência ou dependência do
capitalismo brasileiro com o capitalismo germânico.
A aproximação do governo brasileiro pós-1930, com os Estados de
comum ideologia corporativista, cada vez mais óbvia no regime de Vargas no
transcorrer da década, foi intensa. As relações com a Itália de Mussolini, a
Alemanha de Hitler, a Espanha de Franco e Portugal de Salazar acentuaram-
se no transcorrer da década. Essa aproximação se fez notar na política externa
e também na política interna. O projeto contra golpista da oligarquia cafeeira
falhou em 1932, mas culminou na Assembléia Nacional Constituinte de 1933-
34. Nela houve cooptação de muitos dos desafetos paulistas ao executivo
federal, com o apoio de vários constituintes paulistas para propostas nascidas
no Executivo Federal da República, como ficou demonstrado na força do
anteprojeto governista para a educação eugênica, com forte adesão da
bancada paulista, como por exemplo, de Pacheco e Silva, de Abreu Sodré e de
Carlota P. de Queiróz, a primeira deputada federal da história do Brasil e
ativista da Revolução Constitucionalista de 1932.

A condução da dinâmica constituinte ficou nas mãos de um grupo muito


diversificado formado por oligarquias agrárias e regionais, burguesia
extrativista, industrial e financeira, setores médios urbanos e a bancada
católica. Foram grupos que se organizaram em torno da nova estrutura de
Estado. O processo histórico transcorrido de 1930 até a imposição e a
consolidação do Estado Novo (1937) agregou no poder um espectro ideológico
amplo, que tendeu ao autoritarismo, ao nacionalismo e ao racismo com a
aproximação da ditadura.

O tratamento que a governança getulista deu aos considerados por ela


como inconvenientes provou que a ideologia hegemônica no poder era, mesmo
antes do golpe de Estado, a política corporativista assemelhada a outras
governanças do período (nazismo, fascismo, franquismo, salazarismo). O
Golpe de 1937 foi um “fato histórico” de muitos significados dentro um processo
mais amplo que começou anos antes. O golpe do Estado Novo revelou o
projeto político repressivo, anticomunista e antisemita, contidos na farsa do
“Plano Cohen” que serviu de justificativa golpista. Há algum tempo se dava,
principalmente a partir de 1935, a perseguição de lideranças partidárias e
sindicais, de intelectuais de oposição, a identificação do anarquismo como
insanidade mental, a reação massacrante aos movimentos da esquerda ligados
ao Partido Comunista, a permissividade às ações fascistas, o esgotamento e
posterior proibição aos sindicatos independentes e de oposição, o policiamento
político da sociedade comandado por Filinto Müller e suas prisões arbitrárias,
torturas e assassinatos.

No Brasil, a recuperação econômica (após a crise de 1929) foi


acompanhada de uma diversificação de produtos e mercados, nacionais e de
exportação. O aumento da tensão internacional que culminou na Segunda
Guerra favoreceu a balança comercial brasileira, a indústria local (pela
diminuição na entrada de produtos importados) e a exportação (borracha,
algodão, açúcar, carne, minérios e outros produtos primários e secundários). A
diminuição relativa das importações elevou a demanda interna por produtos
nacionais e favoreceu a expansão de um capitalismo interno mais complexo e
dinâmico. O aumento da demanda externa, que se agigantou com o conflito
mundial, favoreceu as exportações brasileiras, pelo menos enquanto o Estado
brasileiro conseguiu manter-se fora do conflito. Foi um período de expansão do
capitalismo brasileiro, caracterizado por forte intervenção do Estado, como
investidor estratégico nas áreas de interesse do empresariado e como
interventor autoritário no movimento e nas organizações dos trabalhadores.
Essa conjuntura introduziu novas características nas relações capital/trabalho e
nas políticas públicas e privadas de disciplinamento e arregimentação da força
de trabalho, evidenciado no deslocamento de trabalhadores entre estados e
regiões do Brasil.

No Brasil, até fins da década de 1920, a propagação de teorias


eugenistas e higienistas construiu uma situação favorável à entrada de
europeus. Na década de 1930, cresce a restrição aos movimentos migratórios.
As proibições começaram pelos asiáticos e africanos. A queda na entrada de
imigrantes passou a servir também de justificativa para a promoção ou
imposição de deslocamentos de brasileiros de uma região para outra, servindo
aos interesses da exploração econômica do trabalhador ou da simples
desocupação e concentração fundiária.

As teorias da superioridade da brancura (e suas fórmulas de


“embranquecimento” do indivíduo e da sociedade), associadas à teoria do
arianismo (da pretensa superioridade da pressuposta raça ariana),
desvalorizaram o trabalhador nacional, econômica e “racialmente” chegou a ser
visto como incapaz ao trabalho fabril. A introdução de mão de obra barata,
quase sempre formada por excluídos econômicos e sociais de outros
continentes, colaborou para a diminuição das tensões sociais explosivas em
suas regiões, além de ter perpetuado e acentuado a desvalorização do trabalho
braçal no Brasil.

As teorias e políticas de “embranquecimento” da sociedade brasileira do


século XIX modernizaram-se nas três primeiras décadas do século XX. As
concepções de eugenia estadunidense, francesa, inglesa, italiana e alemã
disputaram e compuseram, nas escolas e arcadas, nos quartéis, nos tribunais e
nas tipografias as justificativas para a superioridade e inferioridade raciais.
Davenportismos, lamarquismos, spencerismos, mendelismos e darwinismos
sociais, lambrosianismos e assemelhados (a biologização da sociologia, a
naturalização dos comportamentos, o biopsiquismo, a antropometria, a
criminologia) produziram embates nas sociedades de eugenia, mas não
ficaram a elas circunscritos.

As teorias racistas, que compuseram o ideário imperialista e de


oposição à soberania popular nos países centrais do capitalismo, fortaleceram-
se e ganharam complexidade com a conquista do continente africano e
asiático. Na América e, em especial, no Brasil, as novas teorias raciais ou as
antigas, togadas com a última moda, ganharam espaço entre as elites com a
crise da escravidão, o crescimento do trabalho assalariado e a imigração
européia. As teorias raciais, que no colonialismo moderno explicavam-se e
justificavam-se na religião e na guerra justa34, passaram a se firmar na ciência
a partir do século dezenove35. Mantiveram, porém, uma semelhança: serviram
de instrumentos para dominação e opressão. A industrialização trouxe consigo
uma aceleração até então desconhecida das pesquisas científicas e,
sobretudo, de suas derivações técnicas. A ciência tornou-se o tipo de
conhecimento mais valorizado e lucrativo, conseqüentemente o mais
importante numa sociedade de hegemonia burguesa, principalmente quando
mitificado.
Com a ampliação do atrelamento econômico do Brasil ao mundo
nazifascista europeu e aos EUA anteriores à equidade de direitos civis,
acentuaram-se por aqui as práticas da segregação. As relações de poder
material e simbólico estruturaram-se de maneira ainda mais excludente para
aqueles cujas historias eram vinculadas à base do processo de expropriação
que acompanhou a conquista portuguesa.

Os regimes fascista, nazista e assemelhados autoritários, tanto na


Europa quanto na América, aumentaram o isolamento e a repressão sobre os
movimentos organizados de esquerda e favoreceram com o racismo, a
concentração de riquezas. O caso mais exemplar foi o da vitória de Francisco
Franco na Espanha, que mostrou ao mundo a capacidade de articulação das
ditaduras burguesas do período, em contraposição à solidariedade da aliança
republicana de esquerda. O isolamento ou a extinção de movimentos sociais
organizados e autônomos facilitou a concentração de riquezas e a exclusão
social, não só na Espanha, mas em significativa parte do globo naquele
período. No Brasil, também houve um movimento nessa direção ao longo dos
anos trinta. O Estado Nacional autoritário respondeu à pressão do capitalismo
e criou impedimentos e inviabilizações à livre organização da sociedade civil
que se urbanizava, favorecendo o capital em detrimento do trabalho. A
sociedade brasileira de então, teve sua história composta pelas disputas e
intervenções imperialistas do período, oriundas dos conglomerados
empresariais e seus respectivos mecanismos de poder: as máquinas estatais
das regiões centrais do capitalismo - sobretudo os impérios inglês, francês,
alemão, italiano e estadunidense.

Esta época das grandes guerras, das tragédias humanas e dos violentos
impérios marcou profundamente a formação da sociedade brasileira e a
consolidação do Estado regente e hegemônico do Brasil contemporâneo. A
estrutura sindical, os Ministérios do Trabalho, da Saúde e da Educação e a
Legião Brasileira de Assistência são alguns exemplos possíveis. No período
designado Era Vargas e em toda a teia de fatos e seus variados significados e
conexões – as “revoluções” de 1930 e 32, o movimento comunista de 1935 e o
golpismo integralista, o golpe do Estado Novo de 1937 e a implantação da
ditadura, encontram-se as bases da infra-estrutura produtiva, das instituições
militares e das instituições educacionais do Brasil de hoje.

O Rio de Janeiro, então capital federal, era cosmopolita à brasileira. Ao


mesmo tempo era republicana e de traço imperial-escravista. “Nobres e
plebeus”, “senhores e escravos” conviviam numa urbanidade de sociedade
racista e economicamente segregada. Central na geografia do poder e
radicalmente contraditória em seu cosmopolitismo e em seu provincianismo,
ela serviu de canal de destaque na inserção do Brasil no mundo e na recepção
dos que chegavam do além-mar: migrações internacionais, capital, produtos,
idéias, modos de vida e de organização social.

A proximidade e o envolvimento de grupos importantes da burguesia, do


poder estatal brasileiro e do integralismo com empresários, políticos e
ideólogos da Alemanha nazistas ficaram evidentes nesta pesquisa. Além dos
negócios das empresas Krupp com o Estado brasileiro e com a Cia Próspera,
há outro fato relevante: Gustav Krupp von Bohlen und Halbach e seu filho e
sucessor Alfried Krupp von Bohlen und Halbach, donos do conglomerado de
empresas “Krupp” (ambos condenados pelo Tribunal de Nuremberg por
exploração de trabalho escravo de judeus sendo que Alfried foi Ministro da
Economia de Guerra de Hitler) escolheram Campina do Monte Alegre – SP e a
Fazenda Retiro Feliz, adquirida de Otávio Rocha Miranda,como refúgio depois
da Guerra para o único herdeiro do império empresarial: Arndt von Bohlen
Krupp und Halbach, filho de Alfried com Annelise von Bohlen Krupp and
Halbach. Em Campina do Monte Alegre, ela ficou conhecida como a “Madame
Krupp”, mesmo sendo divorciada de Alfried desde 1938, e o filho Arndt, era
conhecido na região, como o “Barãozinho”.

Os negócios dos Krupp com o Estado brasileiro eram antigos: canhões


usados pelo exército para massacrar Belo Monte (Guerra de Canudos – 1894-
1897) foram fabricados pelos Krupp. Os negócios arrefeceram como
conseqüência da Primeira Guerra Mundial e do “Tratado de Versalhes”, mas na
década de trinta voltaram com vigor. Ressurgiu o comércio bélico e surgiram
novas possibilidades de negócios, como o interesse de estabelecer a primeira
grande siderúrgica no Brasil. Renato Rocha Miranda, irmão de Otávio e
também empresário na capital nacional, durante o período que dirigiu a
Companhia Carbonífera Próspera e suas jazidas em Criciúma-SC (direção que
se estendeu até 1938), manteve negócios com os Krupp. Ele intermediou
negociações de fornecimento de carvão para a futura siderúrgica Krupp no
Brasil. Nesse momento, o Estado brasileiro ainda buscava capital e tecnologia
estrangeira para o feito. A empresa Krupp, além de fabricantes de armas da
qual o Ministério da Guerra do Estado Brasileiro era cliente e devedor em
193937, figurava internacionalmente como uma das maiores empresas do
mundo na área siderúrgica . Tal negócio chocou-se ao projeto da Companhia
Siderúrgica Nacional (CSN) que foi reforçado com o desenrolar da Segunda
Guerra Mundial.

Depois que as negociações emperraram por conta da eclosão da


Segunda Guerra e do posicionamento do Estado em criar uma empresa
estatal, Guilherme Guinle acabou presidindo a “Comissão Executiva do Plano
Siderúrgico Nacional” para “realizar os estudos finais para a construção de uma
usina siderúrgica e (...) organizar uma companhia nacional para a construção e
exploração da usina” .Guilherme Guinle era, à época, sócio de Renato Rocha
Miranda nos Hotéis Copacabana Palace e Glória. Juntas, as duas famílias
também se associaram na fundação do Fluminense Yacht Club (a partir de
1946, nomeado Iate Clube do Rio de Janeiro) que, dos 28 fundadores, 10 eram
das famílias Guinle ou Rocha Miranda41. Tais famílias foram posteriormente
unidas também por laços de casamento.

Tais relações privadas (familiares, de negócios e de amizade) estiveram


em consonância circunstancial com a política e as relações públicas nacionais
e internacionais do período. De um lado, havia o IIIº Heich e seus capitalistas
interessados no fortalecimento de suas posições na América do Sul. De outro,
existia a orientação Varguista de procurar um equilíbrio nas relações com as
potências e, assim, buscar maior autonomia nas relações internacionais
(marcadas historicamente por uma maior vinculação à Inglaterra e aos EUA).
Os interesses dos stableshiments alemão e brasileiro estiveram, dessa forma,
em sintonia parcial de interesses, da ascensão de Hitler à primeira fase da
Segunda Guerra Mundial.
A Alemanha estava presente no Brasil não só no comércio. Sua estética
pode ser encontrada nas arquiteturas, em afrescos, em esculturas, na literatura
e na política da época. A doxa totalitária acompanhou o capital. O avanço do
capital germânico encontrou interesses coincidentes com setores do capital
local e se associaram em negócios, ideias, comportamentos e gostos.

As estratégias de reprodução e acumulação de capital adotaram


algumas racionalidades técnico-científicas semelhantes e que atingiram as
políticas públicas com a lógica racista-classista (políticas de “saneamento
social”, remoções, expulsões e transferências de indivíduos e grupos sociais).
A classe trabalhadora mais empobrecida e, principalmente, as de tradições
históricas diferentes das elites econômicas foram as mais atingidas. No Brasil,
o racismo foi anti-semita e nisso comungavam com os nazistas da mesma
época, mas os racistas daqui, assim como os da Alemanha, adotaram
raciologias mais amplas que atingissem a classe trabalhadora mais
empobrecida. No Brasil das primeiras décadas do século XX, a segregação de
“pretos e pardos” e de imigrantes de primeira geração, especialmente os
asiáticos, mantinham baixos o valor da mão de obra. Fosse por alegações de
“superioridade-inferioridade raciais”, ou por justificativas como a “degeneração
da mistura racial”, a estética “ariana” era tida como superior e espelho, mesmo
que quebrado, da burguesia brasileira, como aparecem nas idéias de Renato
Khel, Gustavo Barroso, Miguel Couto e Oliveira Vianna, por exemplo. Assim, a
pretensa “superioridade gênica” dos ricos sobre os pobres, reforçava a
liberdade da propriedade privada em detrimento da equidade jurídica e política
entre os seres humanos.

É preciso enfatizar que o pensamento eugenista foi autoritário, pois


justificou a intromissão e a intervenção do Estado tanto na vida pública quanto
na vida privada dos indivíduos. Interveio no amor, no trabalho, na política e no
conjunto das relações sociais, sem permitir qualquer liberdade de participação
nas decisões, porque se justificava na pretensa verdade absoluta da ciência.
As instituições autoritárias e as práticas de segregação se reforçaram
mutuamente. Há um vasto número de estudiosos e de estudos sobre as
relações entre varguismo, bonapartismo, populismo, fascismo, salazarismo,
franquismo e nazismo. As relações entre o varguismo e nazismo sempre foram
as mais incômodas à exposição pública após a Segunda Guerra Mundial.
Afinal, esta relação trazia a discussão do racismo como política de estado e a
implosão da teoria da “democracia racial” no Brasil.

No Brasil da década de 1930 foi criado o Partido Nazista, exclusivo a


alemães e aos descendentes de pai e mãe alemães, por restrição do próprio
partido. Era estatutariamente integrado ao Partido Nazista da Alemanha. Entre
os imigrantes trabalhadores alemães, a adesão ao partido foi reduzida, até
porque, o nazismo era visto por muitos como “estrangeirismo”, algo perigoso
para os trabalhadores vindos de fora do país. Entre empresários alemães
radicados no Brasil, empresários brasileiros com interesses voltados à
Alemanha e no contorno sócio-cultural das elites econômicas a divulgação da
ideologia nazista e sua verborragia eugenista-autoritária foram bem mais
comuns. Esta pesquisa revelou a existência de ideário publicamente assumido
de eugenia e racismo, não necessariamente nazista, em importantes setores
das elites brasileiras (intelectuais, artísticas, políticas e econômicas). Havia
uma lógica racial, amplamente difundida nas representações que as elites
faziam das classes sociais sem bens materiais que enveredava,
sistematicamente, para práticas de racismo.

A tragédia de Olga Prestes, o arianismo de Oliveira Viana e Gustavo


Barroso e outros exemplos que serão mostrados, revelam os estandartes
racistas cariocas, facetas de uma realidade de violência mais ampla44. No
Brasil, as relações sócio-econômicas sustentadas na lógica das raças e na
exclusão racista possuem uma história de encontro entre a ideologia nazista,
de uma potência aspirando expandir seu império na América Latina, com uma
realidade de consolidação das classes sociais depois de séculos de relações
de trabalho baseadas nas senzalas e nos pelourinhos, justificadas pela cor da
pele e pela teologia católica.

Até a “história” (história oficial) contada pelos livros didáticos era


eurocêntrica, ademais de muitas vanguardas e propostas alternativas e de
resistência no mesmo período. Nas palavras de Bittencourt (1995):

“A leitura das obras didáticas, notadamente as que foram produzidas


depois de trinta, indica que a maioria delas possui uma certa
homogeneidade quanto ao tempo histórico veiculado. Predominava,
nos conteúdos de História do Brasil a fixação de uma crença na
civilização tecnológica, tendo a Europa como berço e em certa
medida a América do Norte como modelo americano possível para os
demais países da América. A inserção de História do Brasil na
História da Civilização pela reforma Francisco Campos procurava
esclarecer as relações do estudo a partir da Antiguidade, iniciando o
Brasil no período da modernidade, incluindo-se a História do
continente americano” (p.89) 45

A produção artística com fomento estatal era também europeizada. À


exclusão por motivações classista somou-se outra: a identificação das culturas
não européias como formas de barbárie. O menino brasileiro euro descendente
estudava sua “história”, os outros não tinham direito sequer à História. A
condição de exclusão compunha-se, também, por uma moralidade moralista,
de forte teor religioso, defensora de valores e comportamentos europeus.

A mitificação do “progresso” das ciências pode ser percebida no


surgimento de novas áreas do “conhecimento científico” dentre elas o
higienismo, o sanitarismo, a criminologia, a antropométrica e a eugenia, ou
seja, uma politecnia de engenharias sociais. Na visão de seus defensores e de
suas lógicas científicas, essas ciências passavam pelo controle social.
Acreditavam na idéia de que o controle era necessário para a realização dos
experimentos sociais voltados à pretensa evolução da(s) raça(s) da nação. Na
prática, era moralização dos costumes e disciplinamento comportamental.
Teorias e práticas que por princípio e fim não aceitavam a liberdade para todos.

Nas décadas de 1920 e 1930 o pensamento lamarckista–spenceriano–


social perdeu força, acompanhando sua crise nas ciências biológicas. Na
história brasileira de fins do XIX e início do XX, as teorias raciais mais
difundidas eram as de origem francesa o que tendeu a mudar quando os
modelos políticos, filosóficos e científicos racistas mais influentes chegaram da
Alemanha e dos EUA e se compuseram, pela via interpretativa de Oliveira
Viana, com um pensamento racista brasileiro de persistente fundamentação na
moral católica e norteado pelo princípio político-jurídico do Homem Bom da
história da conquista portuguesa e da escravidão. Os anos de 1930 e 1940
revelaram que os caminhos feitos pelos racistas das escolas anglo-germânicas
e estadunidenses acabaram em políticas segregacionistas (nazismo na
Alemanha, apartheid na África do Sul e leis segregacionistas em várias
unidades da federação estadunidense).

No Brasil, esta naturalização do processo histórico criou um plano


conceitual modernizante-conservador que sustentou a criminologia e a
antropométrica de Nina Rodrigues a Afrânio Peixoto. Deu sustentação ao
sanitarismo e ao higienismo de Artur Neiva, Belizário Penna e de Paula Souza.
Influenciou a educação de Capanema e de Fernando de Azevedo, a eugenia
de Miguel Couto, Afrânio Peixoto e Renato Kehl. Marcou o pensamento jurídico
de Francisco Campos, a literatura de Monteiro Lobato e a “democracia
autoritária” do arianismo de Oliveira Viana e Gustavo Barroso. Inúmeros outros
exemplos poderiam ser citados, mas estes já permitem uma análise bastante
caleidoscópica da intersecção do plano teórico-científico com teórico-político na
construção do Estado e da “Raça” na consolidação de um capitalismo no
Brasil, cujo ideal de Nação não pressupunha uma equidade jurídica, política e
de cidadania para o conjunto da sociedade.

Nesse sentido, torna-se importante destacar a elaboração intelectual


que dialogou com as idéias eugenistas da época. Faz-se necessário
compreender o ideário dos que influenciaram ou atuaram diretamente nas
políticas públicas em defesa de práticas de pressuposta eugenia e verificar
como essas idéias chegaram até a elaboração das leis e nas práticas de
políticas públicas.

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