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O ESTADO DE DIREITOS HUMANOS

Porquê Estado de Direitos Humanos e não Estado de Direitos Fundamentais?

O estado de direitos humanos é mais exigente, por assentar a seleção daquilo que deve
ser direito fundamental num critério objetivo, a dignidade humana, do que o estado de
direitos fundamentais, que assenta o seu critério no princípio democrático e na
subsequente discricionariedade do legislador. Como é que se evidencia esta menor
exigência do EDF, e a opção por um EDH?

1. Há um enfraquecimento dos direitos fundamentais. Porque se alargou tanto, que se


questiona quais é que são verdadeiramente importantes e relevantes para a sociedade.
O EDH, centra-se no que é realmente importante. Atualmente, entrega-se os direitos
fundamentais às coletividades, em contraste com os direitos humanos.

2. Hoje, existem direitos despersonalizados, como é o caso do direito ao ambiente.


Meros interesses difusos que foram elevados a direitos fundamentais, mas não se focam
a um individuo específico.

3. Nos tempos modernos, tentam-se criar direitos fundamentais contrários à dignidade


humana: como por exemplo: o direito à prostituição ou às barrigas de aluguer.

4. Através da clausula aberta, artigo 16º/1 da CRP, a lei tem direitos fundamentais, mas
existem outros fora da constituição. A lei pode criar direitos que vão ao encontro de
alguns que estão escritos na constituição.

Se tudo pode ser direito fundamental, a criação ilimitada de direitos fundamentais cria
concorrência e atrito entre os direitos já existentes.

Como opera a responsabilidade em matéria de direitos fundamentais?

❖ Os direitos fundamentais envolvem sempre tarefas fundamentais para o estado,


artigo 9º da CRP. Ou seja, todo o direito fundamental impõe obrigações ao estado:
segurança, prestação social, proteção perante terceiros, existência de um sistema de
justiça- tribunais. O estado deve também, promover o combate à discriminação

❖ Direitos fundamentais exigem deveres fundamentais. Não há direitos sem deveres,


sejam eles positivos, que integram uma ação, como por exemplo, a ação de pagar
impostos para financiar o direito à saúde, ou negativos, que compreendem uma
omissão, como por exemplo o dever de não tirar a vida a terceiro respeitando o seu
direito à vida. Os deveres significam a fase oculta dos direitos fundamentais. Os direitos
são o prossuposto da atuação do estado. A dignidade humana não é só fonte de direito,
mas também de deveres. Os deveres são a horizontalização dos direitos fundamentas.
Não é só o estado (vertical) que têm de respeitar esses mesmos direitos.

❖ Todos os direitos fundamentais têm custos. (O professor Paulo Otero considera que
também os direitos negativos comportam custos relacionados com os mecanismos de
segurança e justiça que permitem a sua efetiva proteção. No entanto, a verdade é que,
ao contrário dos direitos positivos, os direitos negativos existem sem custos associados,
ninguém precisa de pagar para que tenha direito à sua vida ou liberdade. Desta forma,
pode se colocar a questão de se efetivamente todos os direitos fundamentais
comportam custos, quando os direitos negativos por natureza não os comportam
podendo existir, mesmo que de maneira mais frágil e precária, sem que hajam
mecanismos efetivos de sua proteção, ao mesmo tempo que a sua plasmação enquanto
direito fundamental impõe funções de sua proteção ao Estado pelo que terão custos
associados) O direito à segurança exige que exista um sistema de segurança, o mesmo
acontece com a justiça, com a educação e com a saúde. Os custos pela defesa judicial
desses direitos.

Que ideias estruturam o Estado de Direitos Humanos?

1. MODELO DE SOCIEDADE ALICERÇADO NO RESPEITO PELA DIGNIDADE PELA PESSOA


HUMANA

A dignidade humana é um contributo quer do pensamento judaico-cristão, de


Mirandola, quer do pensamento de Kant; quero do existencialismo. É o ponto de
chegada da história do pensamento. O ser humano é sempre um fim em si mesmo,
nunca é um meio. Cada ser humano é individualmente consagrado.

O respeito pelo ser humano não é uma dádiva do poder, é o ser humano que se impõe
ao poder como uma realidade superior e anterior. Todos temos a mesma dignidade, esta
não varia consoante as pessoas. A dignidade prolonga-se para além da morte. A
dignidade é irrenunciável e inaliável, ninguém a pode renunciar, mesmo que admita
uma decisão voluntária e consciente.

Exige respeito e proteção da vida e da integridade física. A dignidade prossupõe uma


concessão de liberdade. A dignidade prossupõe ainda igual participação política.

Não existe dignidade sem liberdade. Existência convicta: não basta existir para ter
dignidade. A dignidade exige um espaço próprio, imune a intervenção do estado. A
dignidade impõe segurança, o estado também o faz para manter justiça social. Não deve
nunca existir um estado totalitário. Um primado do ser sobre o ter. As pessoas têm mais
valor do que as coisas.

A dignidade humana é um princípio e um valor, e um dos primeiros da constituição:


envolve uma obrigação geral de respeito. A minha dignidade tem o limite da dignidade
dos outros. A dignidade humana é a base de todos os direitos humanos.

- Função constitucional da dignidade;

Síntese da “consciência jurídica universal”. Primeiro princípio do ordenamento jurídico,


artigo 1º da CRP, de valor absoluto, é uma obrigação geral de respeito, que se projeta
sobre todo o ordenamento jurídico. Tem 3 dimensões essenciais:

Dimensão vertical relacionada relação da pessoa perante o poder (governo/Estado). Cria


uma obrigação do Estado não só defender, proteger, mas também garantir a dignidade;

Dimensão horizontal relacionada projeção da dignidade da pessoa sobre todas as


pessoas que se traduz na existência de deveres de respeito para com a dignidade do
outro;

Dimensão autorreferencial relacionada com a impossibilidade de dispor da nossa


dignidade.

A dignidade é uma vinculação universal. É então uma vinculação temporal, é o sentido


da história. Direitos e deveres da dignidade humana: direitos e deveres pessoais, sociais
e políticos.

2. A GARANTIA E A DEFESA DA CULTURA DA VIDA


❖ A inviolabilidade da vida humana, sempre, artigo 24º/1 da CRP. A legitima defesa é
uma exceção, não pode ser regra;

❖ A defesa da vida prossupõe livre desenvolvimento da personalidade, artigo 26º/1 da


CRP, prossupõe momentos de maturidade diferentes. (Não será mais correto encarar o
livre desenvolvimento da personalidade enquanto corolário da dignidade humana e não
necessariamente como um segmento da defesa da cultura da vida, no seguimento do
pensamento de Mirandola que encerra uma ligação umbilical entre a dignidade e a
liberdade?)

❖ Vinculação termológica da investigação científica e tecnologia devem estar ao serviço


da pessoa humana, artigo 26º/3 da CRP, nunca entrando em seu confronto. Caso
contrário é ilícito (experiências humanas, como cobaias);

❖ O princípio da solidariedade de Cícero, o pensamento judaico-cristão, Marsilio de


Pádua entre outros, traduz-se na opção por soluções que protejam a vida sem sacrifício
daqueles que cá estão. Ex: A ordem jurídica deve preferir a inseminação artificial à
adoção? A adoção solidifica a ideia de solidariedade.

3. A VINCULAÇÃO INTERNACIONAL À TUTELA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS

As matérias sobre direitos fundamentais/humanos não são uma questão exclusiva do


Estado. São questões que tem a ver com toda a dignidade natural e que, portanto,
conduzem à internacionalização da tutela dos direitos fundamentais através de:

• O reconhecimento do valor hétero-vinculativo do direito internacional (ius cogens,


artigo 8º/1 e artigo 16º/2);

• A “constituição” internacional tem primado sobre as constituições do Estados.

• A subordinação do estado ao conhecimento de jurisdição internacional, só esta


subordinação permite uma efetiva concretização da hétero-vinculação ao direito
internacional. Há tribunais específicos que podem julgar as pessoas responsáveis por
crimes contra a humanidade;

4. NORMAS CONSTITUCIONAIS SOBRE DIREITOS FUNDAMENTAIS COM EFICÁCIA


REFORÇADA
São assim mais fundamentais que as restantes normas. A eficácia reforçada nas normas
constitucionais. Exemplos:

1- As normas são dotadas de aplicabilidade direta: normas sobre direitos fundamentais


aplicam-se na ausência de lei ou contra lei expressa. Artigo 17º da CRP em conjugação
com o artigo 18º nº1. Logo as normas do direito fundamental vinculam todas as
entidades públicas e privadas.

2- O princípio da interpretação que conduz à máxima efetividade de uma norma.

3- A relevância que tem em matérias nucleares, a designada proibição do retrocesso da


proteção jus fundamental. Pode ser uma proibição absoluta, quando estamos perante
valores centrais como a dignidade humana ou a vida em que não pode existir qualquer
retrocesso na proteção desses valores (não é exatamente o que se sucede por cá quando
o TC considera ser constitucional a eutanásia por ex.), ou haver margem para retroceder
em determinados direitos, desde que respeitem a égide dum principio da necessidade
do artigo 18º/2 da CRP.

5. PODER POLÍTICO DEMOCRÁTICO

Assenta em democracia humana, na senda do defendido por Zagrebelsky, uma


democracia empenhada numa ordem de valores, ao serviço da pessoa humana. Com a
existência de prossupostos funcionais, como o pluralismo, a vinculação das autoridades
públicas à satisfação do bem-comum, a separação de poderes e imparcialidade do poder
político, a subordinação à juridicidade.

6. ORDEM JURÍDICA AXIOLOGICAMENTE JUSTA

A existência de uma ordem de valores justa, no respeito pela segurança, liberdade e


justiça. Naturalmente pressupõe garantias a favor da justiça, através do recurso às
estruturas do Estado para garanti-la, como aos tribunais, artigo 20º/1 da CRP.

O MODELO PERFEITO DE UM ESTADO DE DIREITOS HUMANOS, REÚNE ESTAS 6


CARACTERÍSTICAS

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