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A OPINIÃO PÚBLICA E AS CONTRADIÇÕES SOBRE O PODER

JUDICIÁRIO

Thiago Braz da Silva


INTRODUÇÃO

Desde a invenção de Gutenberg, a circulação de ideias e informações


se intensificou, a reprodução textual ganhou escala e possibilitou a difusão de
conteúdo das mais variadas naturezas. A comunicação de massa alterou a
relação das pessoas com as coisas, as relações interpessoais e a interação
das pessoas com o poder Estatal, especialmente no contexto pós-moderno de
condutas técnico-científicas e em países com baixa tradição democrática como
o Brasil. 
Diante dessas relações urge refletir como os conhecimentos jurídicos
são veiculados pelos meios de comunicação de massa e a repercussão que
isso gera na atividade judicante. Nesse sentido, cabe ressaltar que a
divulgação pelos meios de comunicação pode representar, como diz Iamundo
(2013), “o poder de influência de determinado segmento social que possua
maior capacidade de expor determinada opinião como se fosse a expressão de
toda sociedade”.
A expressão opinião pública nesse caso é tratada como fator de
obstáculo na relação com o Direito sendo necessário o cuidado para que na
aplicação da lei não haja predominância de determinados segmentos sociais
com enorme poder de influência sobre a mídia e sobre o Estado.
Pode-se observar, que opinião pública, traz em si uma contradição,
entre os termos, sendo que o primeiro, remete há uma conotação singular, que
parte de um indivíduo sobre determinado assunto e o último se refere a um
coletivo de pessoas com uma ideia comum (LORDELO, 2017, p. 31). O que
não quer dizer que opinião pública significa consenso ou uma concordância
unânime sobre determinado assunto, mas, a ideia defendida por uma
determinada parcela da sociedade.
Quanto à relação da opinião pública com a criação de normas pelo
Poder Legislativo e a aplicação pelo Poder Judiciário pode-se ressaltar a
transmissão televisionada de debates do parlamento e de julgamentos pelo
Supremo Tribunal Federal ao vivo com ampla audiência. 
No Brasil dos últimos anos casos judiciais ganharam grande divulgação
pelos meios de comunicação, como por exemplo: os escândalos do Mensalão
e do Petrolão. Nesses dois casos fica evidente que a opinião pública tem
caráter punitivista e acaba por pressionar o judiciário a dar respostas rápidas e
eficazes com maior rigor sobre temas criminais, inclusive em Corte
Constitucional como a Brasileira que gozava da fama de garantista
(NOVELINO, 2014, p. 163). 

1. Julgamentos com grande repercussão: Mensalão e Petrolão

Cabe mencionar que a maioria dos casos dos casos julgados pela Corte
Constitucional brasileira nem se quer é alvo de conhecimento pelo público em
geral. Os casos de grande difusão midiática são exceção, visto que por ano
são julgados dezenas de milhares de processos, o que mostra como o fator
interesse é uma variável objetiva e importante nesse aspecto (NOVELINO,
2014, p. 173). 
O Supremo Tribunal Federal durante o julgamento da Ação Penal 470,
foi alvo de imensa atenção por parte da mídia e foi um dos períodos de maior
popularidade do Tribunal frente a população. A cobertura dos julgamentos foi
tão intensa que ministros viraram personalidades, a ponto do Relator do caso,
Joaquim Barbosa, aparecer entre candidatos à Presidência da República com
maior percentual de votos em pesquisas eleitorais no ano de 2012
(NOVELINO,2014, p. 162).
Neste mesmo caso outro ministro com interpretação divergente -
Ricardo Lewandowski - sobre a celeridade do julgamento se queixou da
pressão exercida pela opinião pública e da mídia para agilizar seu voto na
Corte, afirmando que aquele seria o voto-revisor mais curto da história do
Supremo Tribunal Federal em um processo criminal (NOVELINO, 2014, p.
163). 
Já no julgamento do escândalo do Petrolão com os desdobramentos da
operação Lava-Jato, os operadores do Direito jurisdicionados na 13º Vara
Criminal de Curitiba, afirmavam publicamente sobre a importância da Opinião
Pública no julgamento dos réus. Segundo Moro (2017), “Na Lava-Jato, a
Opinião Pública protegeu a Justiça das Pressões”. 
Esse caso em específico, evidencia a influência deletéria que a opinião
pública pode exercer sobe os Magistrados, visto que a maioria das decisões
tomadas em primeira e segunda instância foram anuladas pela Corte
Constitucional no Habeas Corpus (HC) 193726, relatado pelo Ministro Edson
Fachin. A variável subjetiva corresponde a como cada Juiz responderá às
influências de fatores extrajurídicos, ou seja, às pressões exercidas pela mídia
e pelos grupos de pressão (NOVELINO, 2014, p. 171).

2. A Eficácia das decisões

O Supremo Tribunal Federal, assim como as demais Cortes


Constitucionais, embora sejam órgãos técnicos, são instituições políticas
inseridas em conflitos de poder e de interesses. Logo, para que sua autoridade
e eficácia de suas decisões sejam seguidas e mantidas é necessária, em certa
medida, a confiança e o respeito das outras instituições e do público
(NOVELINO, 2014, p. 169). O acatamento voluntário das decisões judiciais é
indispensável para a segurança jurídica, especialmente em períodos de
conflitos e crise institucional.
Do ponto de vista da hipótese da legitimidade institucional, a opinião
pública pode ser levada em consideração por uma questão de estratégia, com
o intuito de fortalecer o prestígio do tribunal perante o público para garantir que
suas decisões serão cumpridas e executadas (FRIEDMAN, 2005, p. 323-324,
apud NOVELINO, 2014, p. 170).

3. O princípio Contramajoritário

Fator importante a ser considerado sobre as Cortes Constitucionais se


refere ao papel contramajoritário na defesa de minorias em desfavor de
maiorias democráticas eleitas e com representação legislativa. A lógica de dar
poder revisor de normas aprovadas pelo parlamento a um Órgão técnico
formado por membros não eleitos por voto popular se deve a essa defesa de
posições minoritárias (NOVELINO, 2014, p. 157). 
O Controle Normativo, num Estado democrático deve preservar os
interesses da maioria e os direitos, interesses e existência das minorias.
Segundo Kelsen (2000, p.67), o fato da existência de uma maioria pressupõe a
existência de uma minoria, disso, resulta a possibilidade de existir ferramentas
para defesa na minoria em face da maioria.
Para Rosa e Mendes (2014) nos julgamentos da ADI 4277/DF e da
ADPF 132/RJ que tratam sobre o direito das populações homoafetivas o papel
da mídia foi primordial para assegurar esses avanços institucionais que não
tinham andamento por parte do Poder Legislativo, por se tratar uma fração
minoritária da população, só foi possível o reconhecimento de direitos civis
para casais homoafetivos devido ao princípio do contramajoritarismo.
Além do Controle de Constitucionalidade das normas, verifica-se
também a possibilidade Controle existir em questões regionais e de maiorias
locais. Isso quer dizer que, uma decisão pode ser contramajoritária em termos
regionais, mas, majoritária em termos nacionais, em defesa da unidade
nacional e casos de ferimento do pacto federativo (NOVELINO, 2014, p. 160).
Sobre isso, ressalta-se a revogação feita pelo Supremo Tribunal de uma
Lei do Estado de Rondônia que proibia a linguagem neutra em escolas da rede
pública estadual. A legislação foi cassada pela tribuna virtual pela maioria dos
ministros sob a alegação da matéria se tratar de competência e diretrizes da
União.

CONCLUSÃO

Desse modo, cabe concluir, que o Judiciário por se tratar de um poder


técnico está obrigado a uma relação equidistante das partes que o provocam. A
atuação está restrita aos autos e devido a sua própria natureza de julgar e
promover a justiça deve se comportar com objetividade e isenção diante das
causas.

A opinião pública majoritária e a pressão popular apesar de muitas vezes


pressionar as instituições jurídicas de forma desproporcional em casos de alta
saliência política não deve intimidar/emparedar as instituições afim de fazer os
magistrados descumprirem as jurisprudências de seus respectivos tribunais,
embora a opinião pública também possa ser usada como um balizador de sua
atuação.

A mídia é um componente indispensável às democracias modernas por


atuar como meio de informar a sociedade e de funcionar como vetor para
manifestar os anseios da própria sociedade. Deve ser entendida com a devida
complexidade de sua atuação e as contradições que ocorrem no exercício de
suas prerrogativas. A opinião pública por ser efêmera e mutável não deve
obrigar ao juiz buscar o reconhecimento por si mesmo por parte da população.

REFERÊNCIAS

CUÉ. Carlos E. Sérgio Moro: “Na Lava Jato, a opinião pública protegeu a
Justiça das pressões”. EL PAÍS. Buenos Aires, 19 abr. 2017. Disponível em
<https://brasil.elpais.com/brasil/2017/04/04/politica/1491330324_778413.html.>
Acesso em: 25 jun. 2023.

IAMUNDO, Eduardo. Sociologia e antropologia do direito. 1. ed. São Paulo:


Saraiva, 2013.

KELSEN, Hans. A Democracia. Martins Fontes: São Paulo, 2000.

LORDELO, João Paulo. Noções Gerais de Direito e Formação Humanística.


Salvador: JusPODVIM, 2017.

NOVELINO, Marcelo. O STF e a opinião pública. Revista do Ministério


Público do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, nº 54, p. 155-180,
2014.

 ROSA, I. R.; MENDES, R. N. O Poder Judiciário e o Princípio


Contramajoritário: uma Análise do Posicionamento do Supremo Tribunal
Federal em Relação aos Casais Homoafetivos. Revista Da Faculdade De
Direito Da Universidade Federal De Uberlândia. Uberlância, v. 42, n. 2. 2014.

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