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UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE

Convergência Absoluta e
Incondicional em Espaços de Banach

Anita Genoveva Mamani Champi

Rio de Janeiro, Dezembro de 2005


Anita Genoveva Mamani Champi

DISSERTAÇÃO DE MESTRADO

Orientador: Nilson da Costa Bernardes Jr.

Rio de Janeiro, Dezembro de 2005


Agradecimentos

Agradeço ao meu orientador prof. Nilson da Costa Bernardes Junior pelo


apoio constante, pela orientação objetiva, pela paciência que me prestou na
elaboração deste trabalho.
Agradeço ao prof. Dinamérico Pereira Pombo Jr. pelo apoio particular
nas horas difı́ceis.
Agradeço aos colegas e amigos da UFF e, em especial, ao Ricardo por
todo apoio que me tem dado.
Agradeço a toda minha famı́lia e, em especial, a Graciela, Reyna e Jesús
pelo apoio moral.
Agradeço aos professores Cláudia Ferreira Reis Concordido, Luiza Amália
de Moraes e Dinamérico Pereira Pombo Jr. pela participação na banca exa-
minadora e pelos comentários sobre o trabalho.
Finalmente, agradeço à CAPES pelo suporte financeiro durante meus
estudos.
Resumo

Nosso objetivo é estudar os conceitos de convergência absoluta e de con-


vergência incondicional para séries em espaços de Banach arbitrários. Anali-
samos quando estes conceitos são equivalentes, apresentando o Teorema de
Dvoretzky-Rogers. Também estabelecemos algumas caracterizações interes-
santes da noção de convergência incondicional e analisamos propriedades do
conjunto das somas das reordenações convergentes de uma dada série, apre-
sentando o Teorema de Lévy-Steinitz e o contra-exemplo de Marcinkiewicz.
Sumário

Introdução 3

1 Preliminares 6
1.1 Álgebra Linear . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 6
1.2 Análise Funcional . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 8
1.3 Integral de Lebesgue . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 9

2 Séries em Espaços de Banach 12


2.1 Convergência de séries . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 12
2.2 Convergência absoluta . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 16
2.3 Convergência incondicional . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 17

3 Convergência Absoluta versus Convergência Incondicional 25


3.1 O caso de dimensão finita . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 25
3.2 O Teorema de Dvoretzky-Rogers . . . . . . . . . . . . . . . . . 26
3.3 O Teorema de Orlicz . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 32

4 Reordenações Convergentes 40
4.1 O Teorema de Riemann . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 40
4.2 O Teorema de Reordenação . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 42
4.3 O Teorema de Lévy-Steinitz . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 48

1
4.4 O Contra-exemplo de Marcinkiewicz . . . . . . . . . . . . . . 54

Referências Bibliográficas 57

2
Introdução

Na presente dissertação estudamos alguns tópicos envolvendo as noções


de convergência absoluta e de convergência incondicional de séries em espaços
de Banach arbitrários.
X∞
Dada uma série xn de termos em um espaço de Banach real ou com-
n=1
plexo X, relembremos que a série é dita absolutamente convergente quando
X∞ X∞
kxn k < ∞ e é dita incondicionalmente convergente quando xP (n) con-
n=1 n=1
verge qualquer que seja a permutação P de N.
Um resultado clássico devido a Dirichlet [6] afirma que convergência ab-
soluta e convergência incondicional são conceitos equivalentes para séries de
escalares. Este resultado pode ser facilmente estendido a espaços de Banach
de dimensão finita. Já no caso geral, é uma conseqüência da completude do
espaço que convergência absoluta implica convergência incondicional, con-
forme foi observado por Banach em sua tese [1]. O problema de saber se
convergência incondicional implica convergência absoluta em espaços de Ba-
nach de dimensão infinita foi proposto por Banach em seu livro [2]. Alguns
contra-exemplos fáceis foram encontrados em vários espaços clássicos, até
que Dvoretzky e Rogers provaram em [7] que todo espaço de Banach de
dimensão infinita contém uma série incondicionalmente convergente que não
é absolutamente convergente. Assim, a equivalência entre convergência abso-
luta e convergência incondicional de séries em espaços de Banach caracteriza

3
os espaços de Banach de dimensão finita.
Um outro resultado clássico, agora devido a Riemann [17], afirma que

X
se uma série convergente xn de números reais não converge absoluta-
n=1
mente, então para qualquer x ∈ R existe uma permutação P de N tal que

X
xP (n) = x. Lévy [12] estendeu esse resultado a séries de números comple-
n=1
xos, mostrando que dada qualquer série convergente em C , o conjunto das
somas de suas reordenações convergentes ou é unitário, ou é uma reta em C ,
ou é todo o plano complexo C . Lévy propôs que sua demons-tração (alta-
mente não trivial) funcionaria para séries de vetores em Rn para n > 3 , mas
havia um problema. Steinitz [20] completou a demonstração e também
descobriu um argumento totalmente novo, estabelecendo o seguinte resul-
tado: para qualquer série convergente em Rn , o conjunto das somas de
suas reordenações convergentes é uma translação de um subespaço. Identifi-
cando Cn com R2n , segue então que para qualquer série convergente em Cn ,
o conjunto das somas de suas reordenações convergentes é uma translação
de um subespaço real. Como todo espaço de Banach de dimensão finita n é
isomorfo a Rn ou Cn , dependendo do corpo de escalares em questão, vemos
que a conclusão do Teorema de Lévy-Steinitz é válida em todo espaço de Ba-
nach de dimensão finita. O problema de estender este teorema a espaços de
Banach de dimensão infinita foi colocado como Problema 106 no “Scottish
Book” [14] e foi resolvido, quase que de imediato, por Marcinkiewicz, que
produziu um contra-exemplo. Kadets [8] estendeu o exemplo de Marcinki-
ewicz a espaços de Banach de dimensão infinita arbitrários, mostrando que
todo espaço de Banach de dimensão infinita contém uma série cujo conjunto
das somas de suas reordenações convergentes não é sequer convexo. Assim,
a validade da conclusão do Teorema de Lévy-Steinitz também caracteriza os
espaços de Banach de dimensão finita.

4
No Capı́tulo 1 apresentamos alguns preliminares sobre Álgebra Linear,
Análise Funcional e Integral de Lebesgue.
No Capı́tulo 2 desenvolvemos um estudo básico sobre convergência de
séries em espaços de Banach, incluindo os conceitos de convergência abso-
luta e de convergência incondicional, além de algumas caracterizações inte-
ressantes da noção de convergência incondicional.
No Capı́tulo 3 apresentamos o resultado de Dirichlet e o Teorema de
Dvoretzky-Rogers. Também apresentamos o Teorema de Orlicz que está
relacionado com o Teorema de Dvoretzky-Rogers.
No Capı́tulo 4 estabelecemos o Teorema de Riemann e o Teorema de
Lévy-Steinitz, e apresentamos o contra-exemplo de Marcinkiewicz.

5
Capı́tulo 1

Preliminares

1.1 Álgebra Linear


Em tudo o que se segue, N denotará o conjunto dos números inteiros
positivos {1,2,3,. . . } e K denotará ou o corpo R dos número reais ou o corpo
C dos números complexos.
Assumiremos que o leitor possua uma formação básica em Álgebra Line-
ar que envolva os seguintes tópicos: espaços vetoriais, subespaços vetoriais,
bases e dimensão, transformações lineares, determinante e traço de matrizes
quadradas. Tais tópicos são normalmente cobertos em cursos de Álgebra
Linear a nı́vel de graduação (veja [3] e [13], por exemplo).
Também precisaremos de alguns conceitos e resultados envolvendo o pro-
duto escalar de Kn . Dados dois vetores x = (x1 , . . . , xn ) e y = (y1 , . . . , yn )
em Kn , relembremos que o produto escalar de x por y é definido por

(x|y) = x1 y1 + · · · + xn yn .

A norma euclidiana de x é então dada por


p p
kxk = (x|x) = |x1 |2 + · · · + |xn |2 .

6
A Desigualdade de Cauchy-Schwarz nos diz que

|(x|y)| 6 kxkkyk.

Dizemos que x é ortogonal a y quando (x|y) = 0; neste caso, vale a seguinte


versão do Teorema de Pitágoras:

kx + yk2 = kxk2 + kyk2 .

Um conjunto {z1 , . . . , zr } de vetores em Kn é dito ortonormal quando zj é


ortogonal a zk sempre que j 6= k e kzj k = 1 para todo j. Neste caso, vale
que
p
kλ1 z1 + · · · + λr zr k = |λ1 |2 + · · · + |λr |2

para qualquer escolha de escalares λ1 , . . . , λr . O complemento ortogonal de


um subespaço vetorial W de Kn é definido por

W ⊥ = {x ∈ Kn : (x|y) = 0 para todo y ∈ W },

que é um subespaço vetorial de Kn . É verdade que

Kn = W ⊕ W ⊥ ,

ou seja, cada vetor x ∈ Kn se escreve de modo único na forma

x = y + z com y ∈ W e z ∈ W ⊥ .

O vetor y é chamado a componente de x em W e o vetor z é chamado a


componente de x em W ⊥ . Definindo P (x) = y, obtemos um operador linear
P : Kn → Kn cuja imagem é W e cujo núcleo é W ⊥ . P é dito o operador
projeção ortogonal de Kn sobre W . Segue do Teorema de Pitágoras que

kP (x)k 6 kxk.

7
No caso particular em que W = [w] (o subespaço unidimensional gerado por
um vetor não nulo w), temos que P é dado por
(x|w)
P (x) = w.
kwk2
As demonstrações das afirmações feitas acima também podem ser encontra-
das em [3] e em [13].
Enfatizamos que, no que se segue, sempre consideraremos Kn munido de
sua norma euclidiana.

1.2 Análise Funcional


Assumiremos que o leitor possua uma formação básica sobre espaços de
Banach que inclua os seguintes tópicos: continuidade da adição, da multi-
plicação por escalar e da norma, os espaços clássicos c0 e `p (1 6 p 6 ∞),
aplicações lineares contı́nuas, espaços normados de dimensão finita, o Teo-
rema do Gráfico Fechado e o Teorema de Hahn-Banach. Tais tópicos são
cobertos pelos capı́tulos 2, 4, 7 e 8 do livro [16], por exemplo.
Dado um espaço de Banach (real ou complexo) X, denotamos por BX a
bola unitária fechada de X e por SX a esfera unitária de X. Assim,

BX = {x ∈ X : kxk 6 1} e SX = {x ∈ X : kxk = 1}.

Se Y também é um espaço de Banach, denotamos por L(X, Y ) o conjunto


de todas as aplicações lineares contı́nuas de X em Y . L(X, Y ) também é um
espaço de Banach quando munido das operações de adição e de multiplicação
por escalar usuais e da norma

kuk = sup ku(x)k.


x∈BX

8
No caso particular em que Y = K, obtemos o dual topológico L(X, K) de X,
que denotamos por X ∗ .
Para aplicações lineares, muitas vezes escreveremos ux em lugar de u(x)
e escreveremos uv em lugar de u ◦ v.
Os resultados mais substanciais que nós usaremos serão os seguintes:

Teorema 1.1 (Teorema do Gráfico Fechado) Sejam X e Y dois espaços de


Banach e seja u : X → Y uma aplicação linear cujo gráfico

Gr(u) = {(x, ux) : x ∈ X}

é fechado em X × Y . Então u é contı́nua.

Veja o capı́tulo 7 de [16] para uma demonstração.

Teorema 1.2 Seja X um espaço de Banach. Para todo x ∈ X, existe x∗ ∈


X ∗ tal que

kx∗ k = 1 e x∗ (x) = kxk.

Este é um corolário canônico do Teorema de Hahn-Banch. Veja o capı́tulo


8 de [16] para uma demonstração. Uma conseqüência imediata deste resul-
tado é o seguinte fato:

Corolário 1.3 Seja X um espaço de Banach. Para todo x ∈ X, temos que

kxk = ∗max |x∗ (x)|


x ∈BX ∗

1.3 Integral de Lebesgue


Também assumiremos alguns conceitos e resultados básicos sobre a inte-
gral de Lebesgue unidimensional, conforme pode ser encontrado nos capı́tulos
de 3 a 6 do livro [19].

9
Estamos particularmente interessados nos espaços de Banach Lp [0, 1] para
p = 1, 2 e ∞. Para cada número real 1 6 p < ∞, relembremos que Lp [0, 1]
é o espaço das funções f : [0, 1] → K tais que |f |p é Lebesgue integrável em
[0, 1] munido da norma
³Z 1 ´ p1
p
kf kp = |f (t)| dt .
0

L∞ [0, 1] é o espaço das funções Lebesgue mensuráveis f : [0, 1] → K que são


essencialmente limitadas munido da norma

kf k∞ = supremo essencial de |f | em [0,1].

Na verdade, nos espaços Lp [0, 1] nós identificamos funções que são iguais em
quase todos os pontos de [0,1].
A seguinte desigualdade desempenha um papel importante na teoria dos
espaços Lp [0, 1]:

Teorema 1.4 (Desigualdade de Hölder) Sejam 1 6 p, q 6 ∞ tais que

1 1
p
+ q
= 1,

1
onde convencionamos que ∞
= 0. Se f ∈ Lp [0, 1] e g ∈ Lq [0, 1], então
f g ∈ L1 [0, 1] e

kf gk1 6 kf kp kgkq .

Veja o capı́tulo 6 de [19] para uma demonstração.

Para cada f ∈ L1 [0, 1] e cada g ∈ L∞ [0, 1], definimos


Z 1
hg, f i = f (t)g(t)dt.
0

Note que a integral acima existe já que f g ∈ L1 [0, 1]. O próximo resultado
nos será útil mais tarde:

10
Teorema 1.5 Para cada g ∈ L∞ [0, 1], a função Fg : L1 [0, 1] → K definida
por

Fg (f ) = hg, f i

é um funcional linear contı́nuo. Além disso, a função F : L∞ [0, 1] → L1 [0, 1]∗


definida por

F (g) = Fg

é uma aplicação linear bijetiva com

kF (g)k = kgk∞ para todo g ∈ L∞ [0, 1].

Assim, podemos identificar L1 [0, 1]∗ com L∞ [0, 1]. Veja o capı́tulo 6 de
[19] para uma demonstração.

11
Capı́tulo 2

Séries em Espaços de Banach

2.1 Convergência de séries


Nesta seção definiremos o conceito de convergência de séries em espaços de
Banach arbitrários e apresentaremos algumas de suas propriedades básicas.
Observamos que, a menos que se diga explicitamente o contrário, os espaços
de Banach considerados podem ser reais ou complexos.

X
Definição 2.1 Seja xn uma série de termos em um espaço de Banach
n=1
X∞
X. Dizemos que a série xn é convergente se a seqüência de somas parciais
n=1
m
X
(sm )m∈N , sm = xn , converge em X. Neste caso, o limite s da seqüência
n=1

X
de somas parciais é chamada a soma da série e escrevemos s = xn .
n=1

Exemplo 2.2

1. Seja X = c0 . Para cada n ∈ N, seja

en = (0, . . . , 0, 1, 0, 0, . . .)

12
a seqüência cuja n-ésima componente vale 1 e cujas demais componentes
valem 0. Para todo x = (xn )n∈N ∈ X, temos que

X
x= xn en .
n=1

Com efeito,
° °
° m
X °
° °
°x − xn en ° = sup |xn | −→ 0 quando m → ∞,
° ° n>m
n=1

uma vez que lim xn = 0.


n→∞

2. Seja X = `p com 1 6 p < ∞ e sejam e1 , e2 , . . . como no item an-


terior. Para todo x = (xn )n∈N ∈ X , temos que

X
x= xn en .
n=1

De fato,
° ° Ã ∞ ! p1
° m
X ° X
° °
°x − xn e n ° = |xn |p −→ 0 quando m → ∞,
° °
n=1 n=m+1


X
já que |xn |p < ∞.
n=1

3. Seja X = `∞ e sejam e1 , e2 , . . . como antes . Não é verdade que para todo


x = (xn )n∈N ∈ X a série

X
xn e n
n=1

seja convergente. Por exemplo, com x = (1, 1, 1, . . .) ∈ X obtemos a série


X∞
en , que não é convergente, uma vez que
n=1
° m °
°X k
X °
° °
° en − en ° = 1 sempre que m 6= k.
° °
n=1 n=1

13

X
Proposição 2.3 Se xn é uma série convergente em um espaço de Ba-
n=1
nach X, então lim xn = 0.
n→∞

Demonstração. Seja sn = x1 + · · · + xn (n ∈ N). Por hipótese, existe


s = lim sn . Também temos s = lim sn−1 . Logo,
n→∞ n→∞

0 = s − s = lim sn − lim sn−1 = lim (sn − sn−1 ) = lim xn ,


n→∞ n→∞ n→∞ n→∞

como desejado. 2

A recı́proca da proposição acima é falsa mesmo para séries de escalares.


X∞
1
Por exemplo, sabemos que a série harmônica não é convergente.
n=1
n


X
Proposição 2.4 (Critério de Cauchy para séries) Uma série xn em um
n=1
espaço de Banach X é convergente se e somente se a seguinte condição se
verifica: para todo ² > 0, existe n0 ∈ N tal que
° s °
°X °
° °
° xn ° < ² sempre que s > r > n0 .
° °
n=r

Demonstração. Note que a condição acima equivale a dizer que a seqüência



X
de somas parciais da série xn é uma seqüência de Cauchy. Como o espaço
n=1

X
X é completo, isto é equivalente à convergência da série xn . 2
n=1


X ∞
X
Proposição 2.5 Sejam xn e yn séries convergentes em um espaço
n=1 n=1

X
de Banach X. Então a série (xn + yn ) é convergente e
n=1


X ∞
X ∞
X
(xn + yn ) = xn + yn .
n=1 n=1 n=1

14

X ∞
X
Demonstração. Sejam s = xn e r = yn , e consideremos as corres-
n=1 n=1
m
X m
X
pondentes somas parciais sm = xn e rm = yn . Como lim sm = s e
m→∞
n=1 n=1
m
X
lim rm = r, vemos que lim (xn + yn ) = lim (sm + rm ) = s + r. 2
m→∞ m→∞ m→∞
n=1


X
Proposição 2.6 Seja xn uma série convergente em um espaço de Ba-
n=1

X
nach X e seja α um escalar. Então a série αxn é convergente e
n=1

X ∞
X
αxn = α xn .
n=1 n=1

Demonstração. Com efeito,


m
X m
X m
X ∞
X
lim αxn = lim α xn = α lim xn = α xn . 2
m→∞ m→∞ m→∞
n=1 n=1 n=1 n=1

Proposição 2.7 Sejam X e Y espaços de Banach e seja T : X → Y uma



X
aplicação linear contı́nua. Se xn é uma série convergente em X, então a
n=1

X ∞
X ³X
∞ ´
série T xn é convergente em Y e T xn = T xn .
n=1 n=1 n=1


X
Demonstração. Seja s = xn . Como T é linear e contı́nuo,
n=1

³ m
X ´ ³X
m ´ m
X
Ts = T lim xn = lim T xn = lim T xn . 2
m→∞ m→∞ m→∞
n=1 n=1 n=1


X
Proposição 2.8 Seja xn uma série convergente em um espaço de Ba-
n=1
nach X. Então

15
° °
°X ∞ ° X ∞
° °
° xn ° 6 kxn k.
° n=1 ° n=1


X
Demonstração. Se kxn k = ∞ então a desigualdade é trivial. Logo,
n=1

X m
X
podemos supor kxn k < ∞. Assim, existe lim kxn k. Agora, pela
m→∞
n=1 n=1
Desigualdade Triangular, temos
° m °
°X ° X m
° °
° xn ° 6 kxn k para todo m ∈ N.
° °
n=1 n=1

Fazendo m → ∞, obtemos
° ° ° °
°X∞ ° °Xm ° m
X ∞
X
° ° ° °
° xn ° = lim ° xn ° 6 lim kxn k = kxn k,
° ° m→∞ ° ° m→∞
n=1 n=1 n=1 n=1

X
pela convergência da série xn e continuidade da norma. 2
n=1

2.2 Convergência absoluta



X
Definição 2.9 Uma série xn em um espaço de Banach X é dita absolu-
n=1

X
tamente convergente se a série das normas kxn k é convergente em R.
n=1

Proposição 2.10 Toda série absolutamente convergente em um espaço de


Banach é convergente.

X
Demonstração. Seja xn uma série absolutamente convergente em um
n=1

X
espaço de Banach X. Tome ² > 0 . Como a série kxn k é convergente, o
n=1

16
Critério de Cauchy para séries (Proposição 2.4) garante que existe n0 ∈ N
tal que
s
X
kxn k < ² sempre que s > r > n0 .
n=r

Logo, usando a Desigualdade Triangular, obtemos


° s °
°X ° X s
° °
° x n° 6 kxn k < ² sempre que s > r > n0 .
° °
n=r n=r

Aplicando novamente o Critério de Cauchy para séries, concluı́mos que a série


X∞
xn é convergente em X. 2
n=1

A recı́proca da proposição acima é falsa mesmo para séries de escalares.


X∞
(−1)n
Por exemplo, sabemos que a série alternada é convergente mas
n=1
n
não é absolutamente convergente.

2.3 Convergência incondicional



X
Definição 2.11 Uma série xn em um espaço de Banach X é dita
n=1
incondicionalmente convergente se para toda permutação P de N, a série
X∞
xP (n) é convergente.
n=1


X ∞
X
Uma série da forma xP (n) é dita uma reordenação da série xn .
n=1 n=1


X
Proposição 2.12 Se uma série xn em um espaço de Banach X é incon-
n=1
dicionalmente convergente, então

X ∞
X
xP (n) = xn
n=1 n=1

17
para toda permutação P de N.

Demonstração. Suponhamos, por absurdo, que existe uma permutação P



X ∞
X
de N tal que xP (n) 6= xn . Vamos mostrar então que existe uma outra
n=1 n=1

X
permutação Q de N tal que xQ(n) não é convergente. Isto será uma
n=1
contradição, o que provará a proposição.
Tomemos um inteiro positivo r1 tal que
° °
°X∞ r1
X °
° °
° xP (n) − xP (n) ° < 1
° °
n=1 n=1

e tomemos um inteiro positivo s1 tal que

{P (n) : 1 6 n 6 r1 } ⊂ {n : 1 6 n 6 s1 }

e
° °
°X ∞ Xs1 °
° °
° xn − xn ° < 1.
° n=1 n=1
°

Agora, tomemos um inteiro positivo r2 tal que

{n : 1 6 n 6 s1 } ⊂ {P (n) : 1 6 n 6 r2 }

e
°∞ °
°X r2
X °
° °
° xP (n) − xP (n) ° < 1/2,
° °
n=1 n=1

e então tomemos um inteiro positivo s2 tal que

{P (n) : 1 6 n 6 r2 } ⊂ {n : 1 6 n 6 s2 }

e
° °
°X∞ s2
X °
° °
° xn − xn ° < 1/2.
° °
n=1 n=1

18
E assim sucessivamente. Agora, seja Q a permutação de N obtida listando-
se os elementos de N da seguinte forma: primeiro listamos P (1) até P (r1 ) ,
e em seguida os elementos de {1, . . . , s1 } ainda não listados. Então listamos
os elementos de {P (1), . . . , P (r2 )} ainda não listados seguidos dos elementos
de {1, . . . , s2 } ainda não listados, e etc. Como a seqüência de somas par-
X ∞ X∞
ciais de xQ(n) tem uma subseqüência convergindo para xn e outra
n=1 n=1

X ∞
X
convergindo para xP (n) , vemos que xQ(n) não é convergente. 2
n=1 n=1


X
Proposição 2.13 Se uma série xn em um espaço de Banach X é
n=1
absolutamente convergente, então ela é incondicionalmente convergente.

X
Demonstração. Seja xn uma série absolutamente convergente em X .
n=1
Por definição,

X
kxn k < ∞.
n=1

Fixemos uma permutação P de N. Para cada m ∈ N, seja km ∈ N tal que

{P (1), . . . , P (m)} ⊂ {1, . . . , km }.

Então
m
X km
X ∞
X
kxP (n) k 6 kxn k 6 kxn k
n=1 n=1 n=1

para todo m ∈ N . Isto implica que



X
kxP (n) k < ∞ .
n=1


X
Pela Proposição 2.10, concluı́mos que a série xP (n) é convergente. 2
n=1

19
A validade da recı́proca da proposição anterior será analisada no
Capı́tulo 3.
Vejamos agora algumas caracterizações interessantes de convergência in-
condicional.

X
Teorema 2.14 Seja xn uma série em um espaço de Banach X. Então
n=1
as seguintes afirmações são equivalentes:

X
(i) A série xn é incondicionalmente convergente.
n=1

(ii) Para todo ² > 0, existe m² > 0 tal que se M é um subconjunto finito
°X °
° °
de N com min M > m² então ° xn ° < ².
n∈M

(iii) Para toda seqüência estritamente crescente (kn )n∈N de inteiros positi-

X
vos, a subsérie xkn é convergente.
n=1


X
(iv) Para toda escolha de sinais ²n = ±1 , a série ²n xn é convergente.
n=1


X
(v) Para todo (bn )n∈N ∈ `∞ , a série bn xn é convergente.
n=1

Demonstração. (i) ⇒ (ii): Suponhamos que (ii) é falso. Então existe


² > 0 para o qual a conclusão de (ii) não se verifica. Com m = 1, vemos que
existe M1 ⊂ N finito tal que
°X °
° °
min M1 > 1 e ° xk ° > ².
k∈M1

Com m = max M1 , vemos que existe M2 ⊂ N finito tal que


°X °
° °
min M2 > max M1 e ° xk ° > ².
k∈M2

20
Continuando este processo, construimos uma seqüência (Mn )n∈N de subcon-
juntos finitos de N tal que, para todo n ∈ N,
° X °
° °
max Mn < min Mn+1 e ° xk ° > ².
k∈Mn

Seja P uma permutação de N que aplica cada intervalo inteiro [min Mn ,


min Mn+1 −1] nele próprio de modo que o intervalo inteiro [min Mn , min Mn +
|Mn | − 1] é levado em Mn , onde |Mn | denota o cardinal do conjunto Mn . As
X∞
somas parciais de xP (n) não formam uma seqüência de Cauchy, pois
n=1
° °
°min Mn +|Mn |−1 ° °
° X ° ° X ° °
° x °
P (j) ° = ° xk ° > ².
°
° j=min Mn ° k∈Mn


X
Por conseguinte, xP (n) não é convergente, o que contradiz (i).
n=1

(ii) ⇒ (i): Seja P uma permutação de N. Fixado ² > 0, existe m² ∈ N tal que
°X °
° °
° xn ° < ² sempre que M ⊂ N é um conjunto finito com min M > m² .
n∈M
Sejam j1 , . . . , jm² ∈ N tais que P (j1 ) = 1, P (j2 ) = 2, . . . , P (jm² ) = m² . De-
fina n² = max{j1 , . . . , jm² } de modo que {1, . . . , m² } ⊂ P ({1,
° . . . , n² }).
° Se
°X s °
° °
s > r > n² então min{P (r), P (r+1), . . . , P (s)} > m² , donde ° xP (n) ° < ².
° n=r °
X∞
Pelo Critério de Cauchy para séries, a série xP (n) é convergente.
n=1
°X °
° °
(ii) ⇒ (iii): Dado ² > 0, existe m² ∈ N tal que ° xn ° < ² para
n∈M
todo subconjunto finito M de N com ° s min M ° > m² . Como kn > n para
°X °
° °
todo n ∈ N , se s > r > m² então ° xkn ° < ². Pelo Critério de Cauchy
° °
n=r

X
para séries, a série xkn é convergente.
n=1

21
(iii) ⇒ (iv): Para cada n ∈ N, seja ²n = ±1. Definindo

S + = {n ∈ N : ²n = 1} e S − = {n ∈ N : ²n = −1},
X
segue de (iii) que ambas as séries xn são convergentes. Fixemos ² > 0.
n∈S ±
Note que se r 6 s são números naturais e

M ± = {n ∈ S ± : r 6 n 6 s},

então
s
X X X
² n xn = xn − xn .
n=r n∈M + n∈M −
X ° X ° ²
° °
Segue da convergência de xn que ° xn ° < sempre que r for su-
2
n∈S ±° °n∈M ±
°X s °
° °
ficientemente grande. Logo, ° ²n xn ° < ² para todo r suficientemente
° n=r °

X
grande. Pelo Critério de Cauchy para séries, a série ²n xn é convergente.
n=1

(iv) ⇒ (ii): Suponhamos que (ii) é falso. Então existe ² > 0 para o qual
existe uma seqüência (Mn )n∈N de subconjuntos finitos de N tal que
° X °
° °
max Mn < min Mn+1 e ° xk ° > ²
k∈Mn

para todo n ∈ N. Definamos


 [

 +1 se k ∈ Mn
²k = n

 −1 caso contrário.


X
Então as somas parciais de (1 + ²n )xn não formam uma seqüência de Cau-
n=1

X ∞
X
chy. Portanto, xn ou ²n xn não converge, o que contradiz (iv).
n=1 n=1

22
(v) ⇒ (iv): Evidente.

(ii) ⇒ (v): Fixemos b = (bn )n∈N ∈ `∞ e ² > 0. Por (ii), existe m² ∈ N


tal que
°X °
° °
° xn ° < ²
n∈M

para todo conjunto finito M ⊂ N com min M > m² . Afirmamos que


° °
°X s °
° °
° bn xn ° 6 4kbk∞ ²
° n=r °

sempre que s > r > m² . Pelo Critério de Cauchy para séries, isto implicará

X
que a série bn xn é convergente. Para provarmos nossa afirmação, fixemos
n=1
s > r > m² . Pelo Teorema 1.2, existe x∗ ∈ X ∗ tal que
° °
³X s ´ °X s °
° °
kx∗ k = 1 e x∗ b n xn = ° b n x n °.
n=r
° n=r
°

Logo,
° °
°X s ° ³Xs ´ Xs
° ° ∗
° bn xn ° = x bn xn 6 kbk∞ |x∗ (xn )|.
° n=r ° n=r n=r

Agora, sejam

M + = {r 6 n 6 s : Re x∗ (xn ) > 0}

M − = {r 6 n 6 s : Re x∗ (xn ) < 0}.

Como kx∗ k = 1, obtemos


s
X ¯ ³ X ´¯ ¯ ³ X ´¯
∗ ¯ ∗ ¯ ¯ ∗ ¯
|Re x (xn )| = ¯Re x xn ¯ + ¯Re x xn ¯
n=r n∈M + n∈M −

23
¯ ³ X ´¯ ¯ ³ X ´¯
¯ ∗ ¯ ¯ ¯
6 ¯x xn ¯ + ¯ x∗ xn ¯
n∈M + n∈M −

° X ° ° X °
° ° ° °
6 ° xn ° + ° xn ° < 2².
n∈M + n∈M −

s
X
Analogamente, |Im x∗ (xn )| < 2² . Por conseguinte,
n=r
° °
°Xs ° s
X
° °
° bn xn ° 6 kbk∞ |x∗ (xn )| 6 4kbk∞ ² .
° °
n=r n=r

Isto completa a demonstração. 2

24
Capı́tulo 3

Convergência Absoluta versus


Convergência Incondicional

3.1 O caso de dimensão finita


Comecemos com um resultado clássico devido a Dirichlet [6]:

X
Proposição 3.1 Uma série xn de escalares converge absolutamente se
n=1
e somente se converge incondicionalmente.

Demonstração. Já vimos que convergência absoluta implica convergência


X∞
incondicional (Proposição 2.13). Suponhamos que xn é incondicio-
n=1
nalmente convergente. Para cada n ∈ N , seja θn ∈ [0, 2π) tal que
exp(iθn )xn = |xn |. Como a seqüência (exp(iθn ))n∈N pertence a `∞ , o
Teorema 1.14 garante que a série
X∞ ∞
X
exp(iθn )xn = |xn |
n=1 n=1

X
é convergente. Logo, xn é absolutamente convergente. 2
n=1

25
O resultado anterior pode ser facilmente estendido a espaços de Banach
de dimensão finita:

Proposição 3.2 Em qualquer espaço de Banach de dimensão finita, con-


vergência absoluta e convergência incondicional de séries são equivalentes.

Demonstração. Como todo espaço de Banach sobre K de dimensão finita m


é isomorfo a Km , basta provarmos a proposição para o espaço Km . Já sabemos
que convergência absoluta implica convergência incondicional (Proposição
X∞
2.13). Seja vn uma série incondicionalmente convergente de vetores em
n=1
Km . Para cada n ∈ N, escreva

vn = (xn,1 , . . . , xn,m ).

X
Então, para cada 1 6 j 6 m, a série xn,j é incondicionalmente conver-
n=1
gente, donde ela é absolutamente convergente (Proposição 3.1). Consequen-
temente,

X ∞ ³
X ´
kvn k 6 |xn,1 | + · · · + |xn,m |
n=1 n=1

X ∞
X
= |xn,1 | + · · · + |xn,m | < ∞,
n=1 n=1

como querı́amos demonstrar. 2

3.2 O Teorema de Dvoretzky-Rogers


Nesta seção provaremos o Teorema de Dvoretzky-Rogers [7] que implica
que todo espaço de Banach de dimensão infinita contém uma série incondi-
cionalmente convergente que não é absolutamente convergente. Portanto, a
equivalência entre convergência absoluta e convergência incondicional para

26
séries em espaços de Banach caracteriza os espaços de Banach de dimensão
finita. Observamos que nossa exposição se baseia no livro [4].
Comecemos com o seguinte lema elementar:

Lema 3.3 Sejam X um espaço de Banach, P : Kn −→ Kn um operador


projeção ortogonal com imagem W 6= 0 e u : Kn −→ X uma aplicação
linear. Então

kuP k = max{kuP xk : x ∈ SW }.

Demonstração. Por definição,

kuP k = sup{kuP xk : x ∈ SKn } > sup{kuP xk : x ∈ SW }.

Como SKn é compacta e uP é contı́nua, podemos tomar x ∈ SKn tal que


kuP xk = kuP k. Escreva x = a + b, onde a = P x ∈ W e b = x − P x ∈ ker P .
Então

uP x = u(P a + P b) = uP a,

donde

kuP k = kuP xk = kuP ak.

Logo, se a = 0 então a conclusão do lema se verifica trivialmente. Supo-


nhamos a 6= 0. Como a é ortogonal b, temos 1 = kxk2 = kak2 + kbk2 . Logo,
se kbk > 0 então kak < 1, donde
° °
° a ° kuP ak kuP k
°uP kak °= kak
= kak
> kuP k.
a
Como kak
∈ SKn , isto é um absurdo. Portanto, b = 0 e x = a ∈ W , o que
completa a demonstração. 2

O próximo lema profundo é a chave para a demonstração do Teorema de


Dvoretzky-Rogers.

27
Lema 3.4 Seja X um espaço de Banach 2n-dimensional. Existem n vetores
x1 , . . . , xn ∈ BX , cada um de norma > 12 , tais que para quaisquer escalares
λ1 , . . . , λn tem-se
° °
°Xn ° ³Xn ´1
° ° 2 2
° λ j xj ° 6 |λj | .
° °
j=1 j=1

Demonstração. Se F é um espaço vetorial de dimensão finita e w é um


operador linear em F , definimos det(w) e tr(w) de maneira usual, como
sendo o determinante e o traço da matriz de w em relação a qualquer base
de F . Sabemos que esta definição não depende da escolha da base de F .
No que segue, também consideraremos determinantes de aplicações lineares
u de K2n em X. Para tal, fixamos uma base α de K2n e uma base β de X e
consideramos det(u) como sendo o determinante da matriz de u em relação
às bases α e β. Note que, neste caso , det(u) depende da escolha das bases α
e β. Por esta razão, α e β permanecerão fixadas por toda a demonstração.

Passo 1. Existe um isomorfismo u : K2n −→ X de norma 1 tal que

|tr(u−1 v)| 6 2nkvk

para toda aplicação linear v : K2n −→ X.


De fato, tomemos u ∈ L(K2n , X) com kuk = 1 tal que

| det(u)| = max{| det(v)| : v ∈ L(K2n , X), kvk = 1}.

A compacidade da esfera unitária de L(K2n , X) e a continuidade da função


determinante garantem a existência de tal aplicação linear u. Provemos que
u tem a propriedade desejada. Sejam ε um escalar não-nulo e v ∈ L(K2n , X).
Pela escolha de u, para |ε| pequeno temos que
¯ µ ¶¯
| det(u + εv)| ¯¯ u + εv ¯¯
= ¯det 6 | det(u)|,
ku + εvk2n ku + εvk ¯

28
donde

| det(u + εv)| 6 | det(u)|ku + εvk2n 6 | det(u)|(1 + |ε|kvk)2n .

Denotemos por id o operador identidade sobre K2n . Como det u 6= 0, u é


invertı́vel. Logo,

| det(u + εv)| = | det(u)|| det(id + εu−1 v)|

= | det(u)||1 + ε tr(u−1 v) + R(ε)|,

onde R(ε) satisfaz


|R(ε)|
→ 0 quando ε → 0.
|ε|
Portanto, usando a fórmula do Binômio de Newton, obtemos
| det(u + εv)|
|1 + ε tr(u−1 v) + R(ε)| =
| det(u)|

6 (1 + |ε|kvk)2n = 1 + 2n|ε|kvk + S(ε),

onde S(ε) também satisfaz


|S(ε)|
→ 0 quando ε → 0.
|ε|
Escolhendo ε da forma δ exp(−iθ) com δ > 0 e θ = arg(tr(u−1 v)) (θ = 0 se
tr(u−1 v) = 0), obtemos |ε| = δ e ε tr(u−1 v) = δ|tr(u−1 v)| = |ε tr(u−1 v)|. Por
conseguinte, |1 + ε tr(u−1 v)| = 1 + |ε tr(u−1 v)| e a desigualdade anterior nos
fornece

1 + |ε tr(u−1 v)| − |R(ε)| 6 |1 + ε tr(u−1 v) + R(ε)| 6 1 + 2n|ε|kvk + S(ε).

Logo,

|tr(u−1 v)| 6 2nkvk + C(δ),

29
para δ > 0 pequeno, onde
|R(δ exp(−iθ))| + S(δ exp(−iθ))
C(δ) = .
δ
Note que C(δ) → 0 quando δ → 0+ . Portanto, fazendo δ → 0+ obtemos

|tr(u−1 v)| 6 2nkvk.

Passo 2. Se P : K2n −→ K2n é um operador projeção ortogonal com imagem


m-dimensional, então kuP k > m/2n.
Com efeito,

m = tr(P ) = tr(u−1 uP ) 6 2nkuP k,

pelo Passo 1.

Passo 3. Construção dos vetores x1 , . . . , xn .


Como kuk = 1, existe y1 ∈ K2n com ky1 k = 1 e kuy1 k = 1. Seja
P1 : K2n −→ K2n o operador projeção ortogonal de K2n sobre o complemento
ortogonal [y1 ]⊥ do espaço gerado por y1 . Pelo Passo 2,

kuP1 k > (2n − 1)/2n .

Logo, pelo Lema 3.3, existe y2 ∈ [y1 ]⊥ com

ky2 k = 1 e kuy2 k = kuP1 y2 k = kuP1 k > (2n − 1)/2n.

Seja P2 o operador projeção ortogonal de K2n sobre o complemento ortogonal


[y1 , y2 ]⊥ do espaço gerado por y1 e y2 . Pelo Passo 2,

kuP2 k > (2n − 2)/2n

e, pelo Lema 3.3, existe y3 ∈ [y1 , y2 ]⊥ com

ky3 k = 1 e kuy3 k = kuP2 y3 k = kuP2 k > (2n − 2)/2n.

30
Continuamos este processo até obtermos yn ∈ [y1 , . . . , yn−1 ]⊥ com

kyn k = 1 e kuyn k = kuPn−1 yn k = kuPn−1 k > (n + 1)/2n.

Agora, definimos xj = uyj para j = 1, . . . , n. Então

kxj k = kuyj k > (2n − j + 1)/2n > 1/2 para todo j = 1, . . . , n.

Além disso, dados λ1 , . . . , λn escalares, a ortonormalidade dos yj ’s nos fornece


° ° ° Ã !° ° ° Ã ! 12
°X n ° ° X n ° °Xn ° Xn
° ° ° ° ° °
° λj xj ° = °u λj yj ° 6 kuk ° λj yj ° = |λj |2 .
° ° ° ° ° °
j=1 j=1 j=1 j=1

Isto completa a demonstração. 2

Passemos agora ao resultado principal:

Teorema 3.5 (Teorema de Dvoretzky-Rogers) Seja X um espaço de Banach


de dimensão infinita. Dado (λn )n∈N ∈ `2 , existe uma série incondicional-
X∞
mente convergente xn em X com kxn k = |λn | para todo n ∈ N.
n=1

Em particular, escolhendo (λn )n∈N em `2 mas não em `1 , obteremos



X
uma série xn em X que é incondicionalmente convergente mas não é
n=1
absolutamente convergente.

Demonstração. Fixemos uma seqüência (λn )n∈N ∈ `2 e escolhamos inteiros


positivos n1 < n2 < n3 < · · · tais que, para cada k ∈ N,
X
|λn |2 6 2−2k .
n>nk

Para cada k ∈ N, como X tem dimensão infinita, podemos aplicar o Lema


3.4 a um subespaço Yk de X de dimensão 2(nk+1 − nk ) munido da norma
induzida para obtermos vetores ynk , . . . , ynk+1 −1 ∈ BYk ⊂ BX de norma
> 1/2 tais que

31
°n −1 ° Ãn −1 ! 12
° k+1
X ° X
k+1
° °
° αn yn ° 6 |αn |2
° n=n ° n=n
k k

para quaisquer escalares αnk , . . . , αnk+1 −1 . Escolhendo arbitrariamente ve-


tores y1 , . . . , yn1 −1 ∈ BX de norma > 1/2 , obtemos então uma seqüência
(yn )n∈N de vetores em BX de norma > 1/2 tal que
° N ° Ã N ! 12
°X ° X
° °
° αn yn ° 6 |αn |2
° °
n=nk n=nk

para toda seqüência (αn )n∈N de escalares, todo k ∈ N e todo nk 6 N < nk+1 .
Definamos xn = λn yn /kyn k (n ∈ N). Para qualquer escolha de sinais εn =
±1 e para qualquer nk 6 N < nk+1 , a desigualdade acima nos fornece
° ° ° ° Ã ! 21
°XN ° °X N
εn λn ° ° XN
|λn | 2
° ° °
° εn xn ° = ° yn ° 6 6 2−k+1 .
°n=n ° °n=n kyn k ° n=n
kyn k 2
k k k


X
Daı́ segue que a seqüência das somas parciais de εn xn é de Cauchy,
n=1

X
provando que a série εn xn é convergente. Como isto vale para toda
n=1

X
escolha de sinais εn = ±1, o Teorema 2.14 garante que a série xn é
n=1
incondicionalmente convergente. Finalmente, é óbvio que kxn k = |λn | para
todo n ∈ N. 2

3.3 O Teorema de Orlicz


Para todo espaço de Banach X de dimensão infinita, o Teorema de
Dvoretzky-Rogers nos diz que dada qualquer seqüência (λn )n∈N em `2 , existe
X∞
uma série incondicionalmente convergente xn em X com kxn k = |λn |
n=1
para todo n ∈ N . É natural perguntarmos se poderı́amos melhorar este

32
resultado no sentido de considerarmos um espaço de seqüências maior do
que `2 (por exemplo, `p com p > 2). O próximo teorema, devido a Orlicz
[15], responde negativamente a esta pergunta, mostrando que a conclusão do
Teorema de Dvoretzky-Rogers é a melhor possı́vel em geral.

X
Teorema 3.6 (Teorema de Orlicz) Se fn é uma série incondicional-
n=1

X
mente convergente em L1 [0, 1], então kfn k21 < ∞.
n=1

Para demonstrarmos este teorema precisaremos de uma desigualdade


envolvendo as seguintes funções:

Definição 3.7 Para cada inteiro n > 0, a n-ésima função de Rademacher é


a função rn : [0, 1] −→ R dada por rn (t) = sign(sen(2n πt)).

r0 r1 r2
1 1 1

1 1 1

−1 −1 −1

Uma das caracterı́sticas importantes das funções de Rademacher é que


elas possuem boas propriedades de ortogonalidade, no seguinte sentido:

Proposição 3.8 Se 0 < n1 < n2 < · · · < nk e p1 , p2 , . . . , pk > 0 são


números naturais, então

Z 1  1
p1 pk
se pj é par para todo j = 1, . . . , k
rn1 (t) · · · rnk (t) dt =
0  0 caso contrário.

33
Demonstração. Se pj é par para todo j = 1, . . . , k, então rnj (t)pj = 1, com
excessão do número finito de pontos onde rnj se anula. Logo,
Z 1 Z 1
p1 pk
rn1 (t) · · · rnk (t) dt = 1dt = 1.
0 0

Observe também que se algum pj é par, onde j ∈ {1, . . . , k}, então rnj (t)pj
pode ser retirado da expresão e podemos analisar somente o que acontece
com a integral do produto

rn1 (t)p1 · · · rnj−1 (t)pj−1 rnj+1 (t)pj+1 · · · rnk (t)pk .

Assim, para concluirmos a demonstração, basta analisarmos o caso em que


pj é ı́mpar para todo j = 1, . . . , k . Mas analisar este caso, é o mesmo que
analisar o caso em que p1 = . . . = pk = 1 , já que rn (t)p = rn (t) sempre
que p é·ı́mpar. Para¸ isto procederemos indutivamente: Para n1 < n2 , defina
j j + 1
Ijn1 = , ( j = 0, . . . , 2n1 − 1). Pela construção das funções de
2n1 2n1
Rademacher, temos que rn2 (t) assume os valores ±1 em Ijn1 em quantidades
iguais de subintervalos de comprimento 2n12 e, portanto,
Z
rn2 (t)dt = 0 para todo j = 0, . . . , 2n1 − 1.
n
Ij 1

Logo,
Z 1
n1 −1
2X Z
rn1 (t)rn2 (t)dt = (±1) rn2 (t)dt = 0.
n
0 j=1 Ij 1

Para n1 < n2 < n3 , defina Ijn1 como anteriormente. Então,


Z 1
n1 −1
2X Z
rn1 (t)rn2 (t)rn3 (t)dt = (±1) rn2 (t)rn3 (t)dt = 0.
n
0 j=1 Ij 1

Mas, para cada j = 0, . . . , 2n1 − 1, temos que


(j+1)2n2 −n1 −1
[ · ¸
l+1 l
Ijn1 = Iln2 , onde Iln2 = n2 , n2 ,
2 2
l=j2n2 −n1

34
Z
e pela construção de rn3 (t) segue que rn3 (t)dt = 0. Logo,
n2
Il

Z 1
n1 −1
2X (j+1)2n2 −n1 −1
X Z
rn1 (t)rn2 (t)rn3 (t)dt = (±1) (±1) rn3 (t)dt = 0.
n2
0 j=1 Il
l=j2n2 −n1

Procedendo recursivamente obtemos os demais casos, concluindo assim a de-


monstração. 2

Em particular, temos que



Z 1  1 se n = m
rn (t)rm (t)dt =
0  0 se n =
6 m.

Lema 3.9 Para quaisquer a1 , . . . , am ∈ R, temos que


à m ! 21 ¯ m ¯
X √ Z 1 ¯X
¯
¯
¯
a2n 6 3 ¯ an rn (t)¯ dt.
0 ¯ ¯
n=1 n=1

Esta desigualdade é um caso bem particular da chamada Desigualdade


de Khinchin ([4], Seção 1.10), mas é suficiente para os nossos propósitos.

Demonstração. Defina
m
X
f (t) = an rn (t) (t ∈ [0, 1]).
n=1
Como
Z 1 ¯Xm ¯2
¯ ¯
kf k22 = ¯ an rn (t)¯ dt
0 n=1

Z 1 ³X
m ´³ X
m ´
= an rn (t) ak rk (t) dt
0 n=1 k=1

m X
X m Z 1 m
X
= an ak rn (t)rk (t)dt = a2n ,
n=1 k=1 0 n=1

35
temos que provar que

kf k2 6 3kf k1 .

Afirmamos que

4
kf k4 6 3kf k2 .

Com efeito,
Z¯ m ¯4
¯X 1 ¯
¯ ¯
¯ an rn (t)¯ dt
0 ¯ n=1 ¯
Ã
Z 1 X m
!Ã m !Ã m !Ã m !
X X X
= ai ri (t) aj rj (t) ak rk (t) al rl (t) dt
0 i=1 j=1 k=1 l=1
m
X Z 1
= ai aj ak al ri (t)rj (t)rk (t)rl (t)dt.
i,j,k,l=1 0

Z 1
Pela Proposição 3.8, ri (t)rj (t)rk (t)rl (t)dt vale 1 quando os ı́ndices são
0
iguais em pares e vale 0 nos demais casos. Logo,
Z 1 ¯¯Xm
¯4
¯ m
X m
X
¯ ¯ 2 2
¯ a r
n n (t) ¯ dt = 3 a a
i j − 2 a4i
0 ¯ ¯
n=1 i,j=1 i=1
³X
m ´2
6 3 a2n = 3kf k42 .
n=1

Isto prova a nossa afirmação. Agora, usando a Desigualdade de Hölder (Te-


orema 1.4), obtemos
° ° ° ° ° °
° 2 4° ° 2° ° 43 °
kf k22 = °|f | 3 |f | 3 ° 6 °|f | 3 ° 3 ° |f | °
1 2
3

2 4 1 2 4
= kf k13 kf k43 6 3 3 kf k13 kf k23 .

Daı́, kf k2 6 3kf k1 , como querı́amos demonstrar. 2

36
Também necessitaremos do seguinte resultado na demonstração do Teo-
rema de Orlicz:

X
Lema 3.10 Se xn é uma série incondicionalmente convergente em um
n=1
espaço de Banach X, então a função u : X ∗ −→ `1 definida por

u(x∗ ) = (x∗ (xn ))n∈N

é uma aplicação linear contı́nua.



X
∗ ∗
Demonstração. Para cada x ∈ X , a série de escalares x∗ (xn ) con-
n=1

X
verge incondicionalmente já que xn converge incondicionalmente. Logo,
n=1
ela converge absolutamente (Proposição 3.1), o que mostra que a aplicação
u está bem definida. Obviamente u é linear. Resta mostrarmos que u é
contı́nua. Pelo Teorema 1.1, basta verificarmos que o gráfico de u é fechado.
Suponhamos

x∗k −→ x∗ em X ∗ e u(x∗k ) −→ y = (yn )n∈N em `1 .

Como as projeções πj : (λn )n∈N ∈ `1 7−→ λj ∈ K são contı́nuas,

x∗k (xj ) = πj (u(x∗k )) −→ πj (y) = yj quando k → ∞.

Mas

x∗k (xj ) −→ x∗ (xj ) quando k → ∞,

já que x∗k −→ x∗ em X ∗ . Portanto, yj = x∗k (xj ) para todo j ∈ N , ou seja,


y = u(x∗ ). 2

Demonstração (do Teorema 3.6) Basta considerarmos funções de valores


reais. Pelo Teorema 1.5 e pelo Lema 3.10, a aplicação v : L∞ [0, 1] −→ `1

37
dada por v(g) = (hg, fn i)n∈N é uma aplicação linear contı́nua. Logo, para
qualquer seqüência de sinais ²n = ±1 e qualquer m ∈ N, o Corolário 1.3 nos
dá
°Xm ° ¯D X m E¯ ∞
X
° ° ¯ ¯
° ² f
n n° = sup ¯ g, ² f
n n ¯ 6 sup |hg, fn i| = kvk.
1 g∈BL∞ g∈BL∞
n=1 n=1 n=1

Para todo m ∈ N, podemos usar a Desigualdade de Cauchy-Schwarz para


obtermos
m
X m ³Z
X 1 ´2 m ³Z
X 1 ´³ Z 1 ´
kfn k21 = |fn (s)|ds = |fn (s)|ds |fn (t)|dt
n=1 n=1 0 n=1 0 0

Z 1 ³X
m Z 1 ´
= |fn (s)| |fn (t)|dt ds
0 n=1 0

Z 1 ³X
m m ³Z
´ 12 ³ X 1 ´2 ´ 21
2
6 fn (s) |fn (t)|dt ds
0 n=1 n=1 0

³X
m ´ 12 Z 1 ³X
m ´ 12
= kfn k21 fn (s) 2
ds.
n=1 0 n=1

Daı́,
³X
m ´ 12 Z 1 ³X
m ´ 12
kfn k21 6 fn (s)2 ds.
n=1 0 n=1

Agora, pelo Lema 3.9,


Z 1³Xm ´1 √ Z 1 Z 1 ¯Xm ¯
2 2 ¯ ¯
fn (s) ds 6 3 ¯ fn (s)rn (t)¯dt ds.
0 n=1 0 0 n=1

Trocando a ordem de integração ([21], Teorema 4.2c), o lado direito da desi-


gualdade acima se transforma em
Z 1°Xm °
√ ° °
3 ° rn (t)fn ° dt,
0 1
n=1

38

que é limitado superiormente por 3kvk já que rn = ±1 para todo t fora do
conjunto enumerável dos racionais diádicos {k2−n : 0 6 k 6 2n , n ∈ N}.
Portanto,
³X
m ´ 12 √
kfn k21 6 3kvk < ∞,
n=1

o que implica o resultado desejado. 2

39
Capı́tulo 4

Reordenações Convergentes

4.1 O Teorema de Riemann


Apresentaremos a seguir o clássico Teorema de Riemann [17] sobre re-
ordenações de séries de números reais. Cabe observar que a demonstração
dada por Riemann tinha uma passagem incompleta, a qual foi completada
por Dini [5].

X
Teorema 4.1 (Teorema de Riemann) Para toda série an de números
n=1
reais, o conjunto S das somas de suas reordenações convergentes ou é vazio
ou é unitário ou é toda a reta.

Demonstração. Para cada n ∈ N, defina


 
 a se a > 0  0 se an > 0
n n
pn = e qn =
 0 se a 6 0  −a se a 6 0.
n n n

Então pn > 0 , qn > 0 , an = pn − qn e |an | = pn + qn para todo n ∈ N.


Se an 9 0 então é claro que S = ∅. Suponhamos lim an = 0. Então
n→∞

lim pn = 0 e lim qn = 0.
n→∞ n→∞

40

X ∞
X ∞
X ∞
X
Se pn e qn convergem então |an | = (pn + qn ) converge, ou seja,
n=1 n=1 n=1 n=1

X
an converge absolutamente, o que implica que S é unitário (Proposições
n=1

X ∞
X
2.12 e 2.13). Por outro lado, se pn converge e qn diverge, ou vice-versa,
n=1 n=1
então S = ∅ já que
N
X N
X N
X N
X
aP (n) = (pP (n) − qP (n) ) = pP (n) − qP (n) ,
n=1 n=1 n=1 n=1

para qualquer permutação P de N. Suponhamos então



X ∞
X
pn = qn = +∞.
n=1 n=1

Provaremos que S = R. Fixemos c ∈ R. Reordenaremos os termos da série


X∞
an tomando como primeiros termos p1 , p2 , . . . , pn1 , onde n1 é o menor
n=1
ı́ndice tal que

p1 + p2 + · · · + pn1 > c.

Em seguida, tomamos os termos negativos −q1 , −q2 , . . . , −qn2 , onde n2 é o


menor ı́ndice tal que

p1 + p2 + · · · + pn1 − q1 − q2 − · · · − qn2 < c.



X ∞
X
As escolhas de n1 e n2 são possı́veis porque pn = qn = +∞. Conti-
n=1 n=1
nuamos assim: escolhemos o menor ı́ndice n3 tal que

p1 + p2 + · · · + pn1 − q1 − q2 − · · · − qn2 + pn1 +1 + · · · + pn3 > c

e depois o menor ı́ndice n4 tal que

p1 + p2 + · · · + pn1 − q1 − q2 − · · · − qn2 + pn1 +1 + · · · + pn3 − qn2 +1 − · · · − qn4 < c.

41

X
Proseguindo desta maneira, obtemos uma reordenação da série an tal que
n=1

X
as somas parciais sn da nova série bn tendem a c. Com efeito, para todo
n=1
i ı́mpar temos

sni+1 < c < sni , 0 < sni − c 6 pni e 0 < c − sni+1 < qni+1 .

Daı́ resulta que lim sni = c. Além disso, para cada i ı́mpar, ni < n < ni+1
i→∞
implica sni+1 6 sn 6 sni , e para i par, ni < n < ni+1 implica sni 6 sn 6

X
sni+1 . Por conseguinte, lim sn = c, ou seja, bn = c. 2
n→∞
n=1

Note que a demonstração do Teorema de Riemann deixa claro que o



X
caso “S unitário” ocorre exatamente quando a série an é absolutamente
n=1
convergente.

4.2 O Teorema de Reordenação


Nosso próximo objetivo é estabelecer o Teorema de Lévy-Steinitz, que
estende o Teorema de Riemann a séries em Rn (n ∈ N). Para tal fim,
necessitaremos de dois ingredientes importantes, o Teorema do Confinamento
Poligonal e o Teorema de Reordenação, que serão desenvolvidos nesta seção.
Observamos que nossa exposição se baseia no artigo [18].

Teorema 4.2 (Teorema do Confinamento Poligonal) Para cada dimensão fi-


nita n > 1, existe uma constante Cn tal que a seguinte propriedade se verifica:
m
X
n
se {v1 , v2 , . . . , vm } é um conjunto finito de vetores em R com vi = 0
i=1
e kvi k 6 1 para todo i = 1, . . . , m, então existe uma permutação P de
{2, . . . , m} tal que

42
° °
° j
X °
° °
°v 1 + vP (i) ° 6 Cn para todo j = 2, . . . , m.
° °
i=2
p
Além disso, podemos tomar C1 = 1 e 1 6 Cn 6 4(Cn−1 )2 + 1 para todo
n > 2.

Demonstração. Usaremos indução sobre a dimensão n.


Consideremos o caso n = 1. Seja {v1 , v2 , . . . , vm } um conjunto finito de
números reais satisfazendo as hipóteses. Se v1 > 0, escolhemos um ı́ndice
P (2) tal que vP (2) 6 0, e se v1 < 0, escolhemos P (2) tal que vP (2) > 0. No
caso geral, se v1 + vP (2) + · · · + vP (i−1) > 0, escolhemos um ı́ndice P (i) ainda
não usado tal que vP (i) 6 0, e se v1 + vP (2) + · · · + vP (i−1) < 0, escolhemos
P (i) ainda não usado tal que vP (i) > 0. Note que a existência de um tal
ı́ndice P (i) decorre da hipótese de que a soma dos v’s é zero. O processo
terminará quando todos os v’s forem usados. Como |vi | 6 1 para todo
i = 1, . . . , m, é claro que cada soma parcial nesta reordenação tem módulo
no máximo 1. Portanto, o resultado vale com C1 = 1.
Suponhamos agora que n > 1 e que existe uma constante Cn−1 com a
propriedade descrita no teorema. Provaremos a existência de Cn . Conside-
remos um conjunto finito {v1 , v2 , . . . , vm } de vetores em Rn satisfazendo as
hipóteses. Como existe apenas um número finito de possı́veis somas parciais
dos v’s que começam com v1 , podemos escolher uma tal soma parcial L com
comprimento máximo dentre todas estas somas parciais. Digamos que

L = v 1 + u1 + · · · + us ,

onde {u1 , . . . , us } ⊂ {v2 , . . . , vm }. Denotemos por w1 , . . . , wt os demais v’s,


de modo que

L + w1 + · · · + wt = 0.

43
Vamos agora provar que cada ui forma um ângulo agudo com L enquanto
cada wi forma um ângulo obtuso com L.

• (ui |L) > 0 para todo i = 1, . . . , s :

De fato, suponha que (ui |L) < 0 para algum i. Então


³ ¯ ´
¯ L 1
kL − ui k > L − ui ¯ kLk = kLk − kLk
(ui |L) > kLk,

o que contradiz a maximalidade do comprimento de L.

• (v1 |L) > 0 :

De fato, suponha que (v1 |L) < 0. Então


³ ¯ ´ ³ ¯ ´
¯ −L ¯ −L
kv1 + w1 + · · · + wt k > v1 + w1 + · · · + wt ¯ kLk = v1 − L¯ kLk

1
= kLk − (v |L)
kLk 1
> kLk,

contradizendo a maximalidade do comprimento de L.

• (wi |L) 6 0 para todo i = 1, . . . , t :

De fato, se existe um ı́ndice i tal que (wi |L) > 0, então


³ ¯ ´
¯ L 1
kL + wi k > L + wi ¯ kLk = kLk + kLk
(wi |L) > kLk,

uma contradição.

Sabemos que Rn = [L] ⊕ [L]⊥ , onde

[L] = {λL : λ ∈ R} e [L]⊥ = {v ∈ Rn : (v|L) = 0}.

Para cada v ∈ Rn , denotamos por v 0 a componente de v em [L]⊥ , ou seja,

44
(v|L)
v0 = v − kLk2
L.

Projetando L = v1 + u1 + · · · + us sobre [L]⊥ , obtemos

v10 + u01 + · · · + u0s = 0,

e projetando L + w1 + · · · + wt = 0 sobre [L]⊥ , obtemos

w10 + · · · + wt0 = 0.

Como dim[L]⊥ = n − 1, podemos aplicar nossa hipótese de indução aos


conjuntos {v10 , u01 , u02 , . . . , u0s } ⊂ [L]⊥ e {w10 , w20 , . . . , wt0 } ⊂ [L]⊥ , e obtermos
uma permutação Q de {1, . . . , s} tal que
° °
° j
X °
° 0 0 °
°v 1 + uQ(i) ° 6 Cn−1 para todo j = 1, . . . , s,
° °
i=1

e uma permutação R de {2, . . . , t} tal que


° °
° j °
° 0 X 0 °
°w 1 + wR(i) ° 6 Cn−1 para todo j = 2, . . . , t.
° °
i=2

Definimos R(1) = 1. A idéia agora é preservar as ordens relativas dos u’s


e dos w’s determinadas pelas permutações Q e R (o que nos dá controle
sobre os comprimentos das somas parciais das componentes em [L]⊥ ), e al-
ternadamente intercalar u’s e w’s a fim de manter as somas parciais das
componentes em [L] limitadas em módulo por 1 (como no caso n = 1).
Como (v1 |L) > 0, (ui |L) > 0 para todo i = 1, . . . , s e (wi |L) 6 0 para todo
i = 1, . . . , t, podemos escolher o menor inteiro r1 > 1 tal que
r1
X
(v1 |L) + (wR(i) |L) 6 0,
i=1

e então podemos escolher o menor inteiro s1 > 1 tal que


r1
X s1
X
(v1 |L) + (wR(i) |L) + (uQ(i) |L) > 0,
i=1 i=1

45
e então escolhemos o menor inteiro r2 > r1 tal que
r1
X s1
X r2
X
(v1 |L) + (wR(i) |L) + (uQ(i) |L) + (wR(i) |L) 6 0,
i=1 i=1 i=r1 +1

e assim por diante. Agora, reordenamos os v’s colocando-os na seguinte


ordem:

v1 , wR(1) , . . . , wR(r1 ) , uQ(1) , . . . , uQ(s1 ) , wR(r1 +1) , . . . , wR(r2 ) , . . . .

Nesta reordenação temos que para cada soma parcial, a sua componente em
[L] tem módulo no máximo 1 enquanto a sua componente em [L]⊥ tem
norma no máximo 2Cn−1 . Logo, pelo Teorema de Pitágoras, a norma de
p
cada soma parcial é no máximo 4(Cn−1 )2 + 1 . Isto completa a demons-
tração. 2

De agora em diante, Cn (n ∈ N) denota a constante dada pelo teorema


anterior.

Corolário °
4.3 Seja ° ² > 0 e seja {v1 , . . . , vm } um conjunto finito de vetores
°X m °
n ° °
em R com ° vi ° 6 ² e kvi k 6 ² para todo i = 1, . . . , m. Então existe
° °
i=1
uma permutação P de {1, . . . , m} tal que

kvP (1) + vP (2) + · · · + vP (r) k 6 ²(Cn + 1) para todo r = 1, . . . , m.

m+1
X
Demonstração. Definamos vm+1 = −v1 − · · · − vm , de modo que vi =
i=1
0. Aplicando o Teorema do Confinamento Poligonal ao conjunto de vetores
n o
1
v
² i
: i = 1, . . . , m+1 ⊂ Rn , obtemos uma permutação Q de {2, . . . , m+1}
tal que
° °
°1 Xr
1 °
° °
° v1 + vQ(i) ° 6 Cn para todo r = 2, . . . , m + 1.
°² ² °
i=2

46
Definindo Q(1) = 1, obtemos então
° r °
°X °
° °
° vQ(i) ° 6 ²Cn para todo r = 1, . . . , m + 1.
° °
i=1

Agora vamos ordenar os v’s de acordo com Q mas omitindo vm+1 . Como
kvm+1 k = k − (v1 + · · · + vm )k 6 ², isto muda a norma das somas parciais
por no máximo ². Logo, com esta nova permutação P obtemos

kvP (1) + vP (2) + · · · + vP (r) k 6 ²(Cn + 1) para todo r = 1, . . . , m. 2

Vamos agora estabelecer o resultado principal desta seção.

Teorema 4.4 (Teorema de Reordenação). Se uma subseqüência da seqüên-


cia de somas parciais de uma série de vetores em Rn converge para S e se
a seqüência de termos da série converge para zero, então existe uma reor-
denação da série que soma S.

X
Demonstração. Seja vi uma série de vetores em Rn cuja seqüência dos
i=1
m
X
termos converge para zero, e seja Sm = vi para cada m ∈ N. Suponha
i=1
que uma certa subseqüência (Smk )k∈N de (Sm )m∈N converge para S. A idéia
é usar o Corolário 4.3 para obter reordenações de cada famı́lia

{vmk +1 , . . . , vmk+1 −1 } (para k ∈ N fixo)

de modo que todas as somas parciais dessas famı́lias sejam pequenas. Mais
precisamente, para cada k ∈ N, seja δk = kSmk − Sk. Então δk → 0 e
°m −1 ° °m °
° Xk+1 ° °X k+1 mk
X °
° ° ° °
° v i° = ° v i − v i − v mk+1 °
° ° ° °
i=mk +1 i=1 i=1

6 kSmk+1 − Sk + kS − Smk k + kvmk+1 k = δk+1 + δk + kvk+1 k.

Logo, definindo

47
n o
²k = max δk+1 + δk , sup{kvi k : i > mk } para k ∈ N,

temos que ²k → 0 e
°m −1 °
° X
k+1 °
° °
° vi ° 6 2²k .
° °
i=mk +1

Pelo Corolário 4.3, para cada k ∈ N, existe uma permutação Pk de {mk +


1, . . . , mk+1 − 1} tal que
° °
° X r °
° °
° vPk (i) ° 6 2²k (Cn + 1) para todo r = mk + 1, . . . , mk+1 − 1.
° °
i=mk +1

Agora, ordene os v’s deixando cada vmk na mesma posição mk e ordenando


os vi ’s, para mk + 1 6 i 6 mk+1 − 1, de acordo com Pk :

. . . , vmk , vPk (mk +1) , . . . , vPk (mk+1 −1) , vmk+1 , . . . .

0
Seja (Sm )m∈N a seqüência das somas parciais nesta reordenação. Note que,
0
para cada k ∈ N, Smk = Smk e
m
X
0 0
Sm − Smk = vPk (i) para mk + 1 6 m 6 mk+1 − 1.
i=mk +1

Portanto,

0 0 0 0
kSm − Sk 6 kSm − Smk k + kSmk − Sk 6 2²k (Cn + 1) + kSmk − Sk

0
sempre que mk 6 m 6 mk+1 − 1 (k ∈ N). Daı́ segue que Sm → S. 2

4.3 O Teorema de Lévy-Steinitz


Nesta seção estabeleceremos a seguinte generalização do Teorema de Ri-
emann:

48
Teorema 4.5 (Teorema de Lévy-Steinitz) Para qualquer série de vetores em
Rn , o conjunto de todas as somas de suas reordenações convergentes é o
conjunto vazio ou uma translação de um subespaço.

Identificando Cn com R2n , vemos que o teorema acima implica imediata-


mente que: para qualquer série de vetores em Cn , o conjunto de todas as so-
mas de suas reordenações convergentes é o conjunto vazio ou uma translação
de um subespaço real.

O caso n = 2 do Teorema 4.5 foi provado por Lévy [12], que propôs
que sua demonstração também funcionaria para n > 3. Todavia, havia uma
lacuna na demonstração de Lévy no caso n > 3, a qual foi completada por
Steinitz [20], que também obteve um argumento totalmente novo.
A fim de provarmos o teorema acima necessitaremos da seguinte con-
seqüência do Teorema do Confinamento Poligonal:

Lema 4.6 Sejam ² > 0, {v1 , . . . , vm } um conjunto finito de vetores em Rn


Xm
com kvi k 6 ² para todo i = 1, . . . , m, w = vi e 0 < t < 1. Então
p i=1
kv1 − twk 6 ² (Cn−1 )2 + 1 ou existem uma permutação P de {2, . . . , m} e
° X r ° p
° °
um r ∈ {2, . . . , m} tais que °v1 + vP (i) − tw° 6 ² (Cn−1 )2 + 1.
i=2

Demonstração. Podemos supor w 6= 0, já que o caso w = 0 é trivial.


Consideremos o caso n = 1. Multiplicando por −1 se necessário, pode-
mos assumir w > 0 . Seja s o menor i tal que

v1 + · · · + vi > tw .

Como

v1 + · · · + vs−1 6 tw e |vs | 6 ² ,

49
temos que

|v1 + · · · + vs − tw| 6 ² .

Assim, no caso n = 1, o resultado se verifica com Cn−1 = C0 definido como


sendo zero. Note que não foi necessário fazer qualquer reordenação neste
caso.
m
X
Agora, consideremos o caso n > 1. Projetando w = vi sobre [w]⊥ ,
i=1
obtemos

v10 + · · · + vm
0
= 0,

onde vi0 é a componente de vi em [w]⊥ para i = 1, . . . , m. Como kvi0 k 6


kvi k 6 ² para todo i = 1, . . . , m, aplicando o Teorema do Confinamento
n o
1 0 1 0
Poligonal ao conjunto ² v1 , . . . , ² vm ⊂ [w]⊥ obtemos uma permutação P
de {2, . . . , m} tal que
° °
°1 0 1 0 1 0 °
° ² v1 + ² vP (2) + · · · + ² vP (j) ° 6 Cn−1 para todo j = 2, . . . , m.

Além disso,
³ ¯ ´ ³ ¯ ´ ³ ¯ ´
¯ w ¯ w ¯ w
v1 ¯ kwk + vP (2) ¯ kwk + · · · + vP (m) ¯ kwk = kwk > 0

e
¯³ ¯ ´¯
¯ ¯ w ¯
¯ vi ¯ kwk ¯ 6 ² para todo i = 1, . . . , m.

Portanto, o caso n = 1 nos dá um r ∈ {2, . . . , m} tal que


¯³ ¯ ´ ³ ¯ ´ ³ ¯ ´ ¯
¯ ¯ w ¯ w ¯ w ¯
¯ v1 ¯ kwk + vP (2) ¯ kwk + · · · + vP (r) ¯ kwk − tkwk¯ 6 ².

Pelo Teorema de Pitágoras, concluı́mos que

kv1 + vP (2) + · · · + vP (r) − twk2 6 ²2 (Cn−1 )2 + ²2 ,

50
como querı́amos demonstrar. 2

Demostração (do Teorema 4.5). Seja S o conjunto de todas as somas



X
de reordenações convergentes de uma série vi de vetores em Rn . Supo-
i=1
nhamos S não-vazio. Substituindo v1 por v1 − v se necessário, onde v é
qualquer elemento de S, podemos assumir que 0 ∈ S. Provaremos então que
S é um subespaço.
Sejam S1 , S2 ∈ S e mostremos que a soma S1 + S2 ∈ S. Seja {²m }m∈N
uma seqüência de números reais positivos que converge para zero. Como S1
é a soma de alguma reordenação, existe um conjunto finito I1 de inteiros
°X °
° °
positivos tal que 1 ∈ I1 e ° vi − S1 ° < ²1 . Como 0 é a soma de alguma
i∈I1
reordenação, existe um conjunto finito J1 de inteiros positivos tal que J1 ⊃
°X °
° °
I1 e ° vi − 0° < ²1 . Como S2 é a soma de alguma reordenação, existe
i∈J1 °X
°
um conjunto finito K1 de inteiros positivos tal que K1 ⊃ J1 e ° vi −
° i∈K1
°
S2 ° < ²1 . Agora, tomamos um conjunto finito I2 contendo K1 e {2} tal
°X °
° °
que ° vi − S1 ° < ²2 , e assim por diante. Dessa forma, construimos
i∈I2
indutivamente conjuntos finitos Im , Jm e Km de inteiros positivos tais que

{1, . . . , m} ⊂ Im ⊂ Jm ⊂ Km ⊂ Im+1 ,
°X ° °X ° °X °
° ° ° ° ° °
° vi − S1 ° < ² m , ° vi ° < ²m e ° vi − S2 ° < ² m .
i∈Im i∈Jm i∈Km

Para cada m, começando por m = 1, ordene os elementos de Jm de modo


que aqueles em Im situem-se no começo e então ordene os elementos de Km
de modo que aqueles em Jm situem-se no começo. Então ordene os elementos
de Im+1 de modo que aqueles de Km situem-se no começo. Obtemos assim
uma permutação P do conjunto dos inteiros positivos e seqüências crescentes
{im }, {jm }, {km } de inteiros positivos de modo que

51
im < jm < km < im+1 ,
° ° °j ° ° °
°Xim ° °X m ° °Xkm °
° ° ° ° ° °
° vP (i) − S1 ° < ²m , ° vP (j) ° < ²m e ° vP (k) − S2 ° < ²m ,
° ° ° ° ° °
i=1 j=1 k=1

para todo m ∈ N. Note que im = |Im |, jm = |Jm | e km = |Km | para todo


m ∈ N. Além disso
° ° ° °
° X km ° °X km jm
X °
° ° ° °
° vP (i) − S2 ° = ° vP (i) − vP (j) − S2 ° < 2²m ,
° ° ° °
i=jm +1 i=1 j=1

donde
°i °
°Xm km
X °
° °
° vP (i) + vP (i) − (S1 + S2 )° < 3²m .
° °
i=1 i=jm +1

Para cada m, reordene os vetores em {vP (i) : i = im + 1, . . . , km } colocando


os vetores em {vP (i) : i = jm + 1, . . . , km } antes dos vetores em {vP (i) : i =
im + 1, . . . , jm }. Nesta nova reordenação vemos que existe uma subseqüência
da seqüência de somas parciais que converge para S1 + S2 . Como estamos
supondo S 6= ∅, temos que vi → 0. Assim, o Teorema de Reordenação implica
que existe uma reordenação que soma S1 + S2 . Portanto, S1 + S2 ∈ S.
Resta mostrarmos que se s ∈ S então ts ∈ S para todo t ∈ R. Pela
aditividade de S, isto vale se t for um inteiro positivo. Portanto, basta con-
siderarmos os casos t ∈ (0, 1) e t = −1. Fixemos t ∈ (0, 1) e consideremos
S1 , S2 e P como no parágrafo anterior. Provaremos que tS2 ∈ S. Já vimos
que
° °
° X
km °
° °
° vP (i) − S2 ° < 2²m para todo m ∈ N.
° °
i=jm +1

Sejam
n o
δm = sup kvP (i) k : i = jm + 1, . . . , km

52
km
X
um = vP (i) − S2 .
i=jm +1

Pelo Lema 4.6, existe uma permutação Qm de {P (jm + 1), . . . , P (km )} com
Qm (P (jm + 1)) = P (jm + 1) e existe um rm ∈ {jm+1 , . . . , km } de modo que
° °
° X rm ° p
° °
° vQm (P (i)) − t(S2 + um )° 6 M δm , onde M = (Cn−1 )2 + 1.
° °
i=jm +1

Então
° °
° X
rm °
° °
° vQm (P (i)) − tS2 ° 6 M δm + |t|kum k < M δm + 2²m ,
° °
i=jm +1

donde
°j °
°X m rm
X °
° °
° vP (i) + vQm (P (i)) − tS2 ° < M δm + 3²m .
° °
i=1 i=jm +1

Assim, vemos que existe uma reordenação para a qual uma subseqüência
da seqüência de somas parciais converge para tS2 . Pelo Teorema de Reor-
denação, tS2 ∈ S. Provemos agora que −S2 ∈ S. Como
° j ° °j °
° X m+1 ° °X m+1 km
X °
° ° ° °
° v P (i) − (−S )
2 ° = ° v P (i) − v P (i) − (−S )
2 °
° ° ° °
i=km +1 i=1 i=1
°j ° °k °
°X m+1 ° °X m °
° ° ° °
6 ° vP (i) ° + ° vP (i) − S2 °
° ° ° °
i=1 i=1

< ²m+1 + ²m ,

temos que
°j °
°Xm jm+1
X °
° °
° vP (i) + vP (i) − (−S2 )° < ²m+1 + 2²m .
° °
j=1 i=km +1

Logo, existe uma reordenação para o qual uma subseqüência da seqüência de


somas parciais converge para −S2 . Pelo Teorema de Reordenação, −S2 ∈ S.
Isto completa a demonstração. 2

53
Observação 4.7 Tendo em vista o Teorema de Lévy-Steinitz, é natural per-
guntarmos se qualquer translação de qualquer subespaço de Rn é o conjunto
de somas das reordenações convergentes de alguma série em Rn . É fácil ver
que a resposta é sim. De fato, seja v ∈ Rn e seja M um subespaço de Rn .
Se M = {0}, basta considerarmos a série

v + 0 + 0 + 0 + ··· .

X
Suponhamos dim M > 1 e seja {b1 , b2 , . . . , bm } uma base de M . Seja λi
i=1
uma série de números reais que é convergente mas não é absolutamente con-
vergente (por exemplo, podemos tomar λi = (−1)i /i para todo i > 1). Segue
do Teorema de Riemann que todo número real é a soma de alguma reor-

X
denação convergente da série λi . Consequentemente, o conjunto de todas
i=1
as somas obtidas de reordenações convergentes dos vetores em

{v} ∪ {λi bj : j = 1, . . . , m; i = 1, 2, 3 . . .}

é igual a v + M .

4.4 O Contra-exemplo de Marcinkiewicz


Um problema natural é saber se o Teorema de Lévy-Steinitz pode ser
estendido a espaços de Banach de dimenção infinita. Este problema foi colo-
cado explicitamente como Problema 106 no “Scottish Book” [14] e foi resol-
vido, quase que de imediato, por J. Marcinkiewicz que produziu o seguinte
contra-exemplo:

Exemplo 4.8 Consideremos o espaço de Banach L2 [0, 1] e definamos

f0 = 1,

54
f1 = χ[0, 1 ) , f2 = χ[ 1 ,1) ,
2 2

f3 = χ[0, 1 ) , f4 = χ[ 1 , 2 ) , f5 = χ[ 2 , 3 ) , f6 = χ[ 3 ,1) , · · ·.
4 4 4 4 4 4

Veja os gráficos abaixo:

f0 f1 f2
1 1 1

0 1 0 0
1/2 1 1/2 1

f5 f6
f3 f4

0 1/4 1 1/2 1 1/2 3/4 1 3/4 1


X
Consideremos a série gn , onde
n=0

g2n = fn e g2n+1 = −fn (n > 0).

Como kfn k2 → 0, temos que



X
gn = f0 − f0 + f1 − f1 + f2 − f2 + f3 − f3 + · · · = 0.
n=0

Além disso, como

f1 + f2 − f0 = f3 + f4 − f1 = f5 + f6 − f2 = · · · = 0,

vemos que a seguinte reordenação soma 1:

55
f0 + f1 + f2 − f0 + f3 + f4 − f1 + f5 + f6 − f2 + · · · = 1.

X
Qualquer reordenação de gn só pode convergir para uma função em
n=0
L2 [0, 1] de valores inteiros. Logo, o conjunto das somas de reordenao̧ões
X∞
convergentes da série gn não é sequer convexo.
n=0

O exemplo acima foi estendido por Kadets [8] a espaços de Banach de


dimensão infinita arbitrários. Pouco depois um resultado mais surpreen-
dente foi obtido independentemente por Enflo (não publicado), Kadets e
Woźniakowski [9] e Kornilov [10,11]: Todo espaço de Banach de dimensão
infinita contém uma série tal que o conjunto das somas de suas reordenações
convergentes consiste de exatamente dois pontos.

56
Referências Bibliográficas

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plications aux équations intégrales, Fund. Math. 3 (1922), 131-181.

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