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Abrir portas onde se erguem muros Director: Manuel Carvalho Terça-feira, 5 de Abril de 2022 • Ano XXXIII • n.º 11.664 • Edição Lisboa • Assinaturas 808 200 095 • 1,50€

Eleições em França
Macron prepara o palco
para um novo duelo
com a extrema-direita
Dos nossos enviados a Paris,
Alexandra Prado Coelho e Nuno Ferreira Santos
Destaque, 8 a 11

Ucranianos vão ganhar em média 884

euros mas só um terço já pode trabalhar
Atrasos na emissão de certificados impedem milhares de refugiados de aceder a ofertas de emprego em
Portugal. UE divide-se sobre embargo ao gás russo após atrocidades em Bucha Destaque, 2 a 6 e Editorial
MIGUEL MANSO

Guerra na Ucrânia
No inferno de Bucha, “os russos
despejaram pessoas como se
fossem restos de comida”
Dos nossos enviados à Ucrânia,
Luciano Alvarez e Miguel Manso

Bloco central Plano estratégico Europa

PS e PSD vão Água ficará “É agora ou nunca” O que fará Orbán
garantir o pleno mais cara com para o mundo evitar com a sua nova
no Conselho o fim das tarifas a catástrofe climática
a supermaioria
de Estado abaixo de custo Painel da ONU alerta que começa a faltar tempo
empo
6/27
para travar aquecimento global Ciência, 26/27
na Hungria?
Política, 16/17 Sociedade, 18 Mundo, 22
ISNN-0872-1548

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2 • Público • Terça-feira, 5 de Abril de 2022

Guerra na Ucrânia

Nas traseiras da
igreja “os russos
despejaram corpos
como se fossem
restos de comida”
Três valas comuns escondem “centenas de corpos de homens
mulheres e crianças”. A maior parte dos edifícios de Bucha
estão intactos, mas os sinais do terror mostram-se por todo o
lado. Os idosos, em lágrimas, contam histórias de saques a casas
de gente pobre. A Bucha, muitos chamam-lhe hoje “o Inferno”
terra, revelando ainda meia dúzia russos começavam a abandonar a
Reportagem de grossos sacos de plástico pretos e cidade”. Porém, acrescenta, a
alguns panos brancos que deixam maior parte dos corpos que ali
perceber formatos de corpos jazem foram depositados por
Luciano Alvarez texto
humanos no seu interior. Uma mão cidadãos de Bucha. “Pessoas
Miguel Manso fotografia, em Bucha
humana fura o chão do solo negro. assassinadas, torturadas e deixadas

D
os olhos raiados de
vermelho do padre Halavin
escorre uma grossa
lágrima. “Só Deus nos deu
força para aguentar este
inferno. Só Deus me dá
força para conseguir contar o que
aqui vi”, diz, com a voz embargada,
o pároco da Igreja ortodoxa de
Santo André, em Bucha. O
sacerdote chora “o massacre” de
que a cidade e a população foram
alvo ao longo de 30 dias e as três
valas comuns que “os russos”
deixaram nas traseiras da sua igreja.
“Despejaram aqui pessoas como se
fossem restos de comida.”
Andrew Halavin, 46 anos, aponta
os locais onde os corpos estão
enterrados, junto a dezenas de
tijolos de cimento empilhados e que
se destinavam a uma obra na igreja.
Duas das valas estão já tapadas, a
terceira está apenas semicoberta de
A primeira vala, conta o padre, foi
aberta a 10 de Março, “já depois de a
cidade ter sido várias vezes
bombardeada e ocupada pelos
russos”. “Vieram ao Æm da tarde,
quase noite. Uma máquina entrou
no jardim da igreja e começou a
escavar um buraco. Depois, entrou
uma camioneta e começaram a
despejar corpos lá para dentro.
Alguns estavam quase nus. Depois
de os despejarem, ainda dispararam
sobre eles”, conta o padre Halavin
ao PÚBLICO.
Como é possível tanto mal?
Só na primeira vala o padre diz ter
contado 67 corpos. “Alguns dias
depois abriram uma segunda vala e
encheram com mais corpos e
começaram a tapar a primeira”,
continua. A terceira vala,
prossegue, “foi aberta há apenas
quatro dias, já alguns militares
pelas ruas. Como os cemitérios
estão cheios e encerrados, as
pessoas trouxeram os mortos para
aqui, porque corriam o risco de
serem comidos por cães”, aÆrma.
“Aqui, nestas três valas, foram
deixados homens, mulheres e
crianças, muitas crianças, algumas
de colo. Estão aqui centenas de
pessoas. Como é possível tanto mal?
Como é possível tanta maldade?
Meu Deus, meu Deus, ajuda-nos,
dá-nos força”, pede.
O padre vai contado as suas tristes destruição, partiram muita coisa Bucha, já dominada pelas forças
recordações a dezenas de por vingança”, conta ainda o padre. ucranianas, não foi, ao contrário de
jornalistas que por ali registam o O sacerdote lembra que as outras, uma cidade arrasada. A
sucedido. primeiras tropas russas entraram maioria dos edifícios, mesmos os
A Igreja de Santo André também em Bucha a 27 de Fevereiro, três mais altos, de dez, 12 andares de
foi atacada. As suas paredes estão dias depois do início da invasão. habitação, estão intactos, mas os
cravejadas de balas e outros pontos “Primeiro cercaram e sinais da guerra estão por todo o
furados por munição mais pesada. bombardearam a cidade e depois lado. Há casas destruídas, fachadas
“Entraram na igreja para a foram invadindo aos poucos, até de prédios e de armazéns
roubarem, mas o que tinha valor já ocuparem toda a cidade com igualmente desmoronados e
estava escondido. Deixaram homens e tanques”, revela Halavin. dezenas de carros civis e alguns
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blindados russos espalhados pelas
ruas. Muitos dos estabelecimentos
têm as portas arrombadas, com
sinais claros de terem sido
saqueados.
Os corpos espalhados pelas ruas,
muitos mutilados e amarrados,
cujas imagens chocaram o mundo,
“já foram levados para a morgue de
Kiev”, contam ao PÚBLICO
militares que controlam uma
barreira de segurança. Pelas ruas da
cidade, que antes da guerra tinha
cerca de 60 mil habitantes, quase
não se vê moradores.
“Queremos ouro, dólares...”
Num bairro, já um pouco afastado
do centro, uma mulher chora junto
à porta de um prédio de quatro
andares. A presença dos jornalistas
do PÚBLICO agita-a. Chama-nos
para o interior da sua casa no
primeiro andar. O interior está todo
revirado. Há vidros partidos, roupa,
loiças e móveis partidos espalhados
pelo chão da cozinha e pelas três
acanhadas assoalhadas.
“Primeiro lançaram uma bomba
no telhado e depois vieram os
A capitã “anaconda” que adora
Portugal e “matar russos”
Crónica
de guerra
Luciano Alvarez
Tínhamos acabado de
chegar a Irpin, quando
um carro civil pára ao lado
do nosso. Do interior saiu
uma mulher do Exército
ucraniano vestindo um
camuÇado e com uma
arma automática AK47
nas mãos. Assim que
percebe que somos
portugueses, faz uma
enorme festa.
“Adoro Portugal, estive lá
há pouco tempo, em Faro. O
vosso país é maravilhoso e o
Público • Terça-feira, 5 de Abril de 2022 • 3
São poucos os soldados. Entraram pela casa
edifícios dentro e revolveram tudo.
destruídos em ‘Queremos ouro, dólares, euros.
Bucha, mas o Onde estão?’, gritavam. Não tinha
cenário é nada para lhes dar, só tenho
dantesco, com pobreza. Partiram tudo. Não eram
muitos corpos soldados, eram ladrões”, diz Esya,
espalhados 75 anos, chorando compulsivamen-
pelas ruas, te. Já fora do prédio, mais três
com sinais de idosos estão sentados num banco
tortura e de madeira. Um deles dirige-se aos
execução. jornalistas. Diz chamar-se Sergui,
Quem tem 68 anos, e titubeia algumas
sobreviveu palavras em inglês: “Morte, morte,
conta horrores morte. Porcos russos.”
sobre a As autoridades ucranianas
passagem dos tinham anunciado no domingo que
russos pela as cidades nos arredores de Kiev
cidade recapturadas pelos militares do país
estavam encerradas aos jornalistas.
Como já se viu em Bucha, tal não
aconteceu. Ontem a cidade
mereceu até a visita do Presidente
ucraniano, Volodimir Zelenskii ,
que voltou a denunciar a existência
de crimes de guerra em Bucha.
O PÚBLICO — que, na véspera,
tinha tentado sem êxito entrar pela
auto-estrada repleta de carros e
blindados destruídos que dá acesso
à cidade — voltou ontem à referida
via rápida, mas saiu por uma
povo é irmão do ucraniano”, estrada secundária que também
diz de imediato a capitã leva a Bucha. Após os primeiros dois
Pavolva Olena, 39 anos. quilómetros deparámo-nos com
Diz ter amigos no nosso país mais um cenário de terror: seis
e aproveita a ocasião para blindados russos totalmente
agradecer o apoio que destruídos e calcinados. Por aqui
Portugal está a dar à Ucrânia. andam soldados e membros da
“São maravilhosos.” defesa territorial ucraniana. Tiram
Onde não tem amigos, fotograÆas em cima dos carros, com
garante, é na Rússia. “Aqui, na os dedos em “V” de vitória.
minha terra natal de Irpin, já Quando nos aproximamos mais
despachei uns quantos. Adoro dos carros saltam-nos à vista dois
matar russos. Eles também corpos totalmente calcinados
não gostam nada de mim. dentro de um deles. Noutro, junto a
Quero lá saber”, aÆrma, uma das “lagartas”, um outro corpo
rindo. mostra-se à luz do dia.
Antes de se despedir revela Seguimos até à aldeia de Zabucha.
o seu “nome do meio”. Um conjunto de 40, 50 casas no
“Anaconda, amiga de meio da Çoresta, a nove quilómetros
Portugal, inimiga dos russos.” de Bucha. Quando chegamos ao que
se pode chamar de via principal, um
Jornalista caminho de terra ladeado por
pequenas casas, um grupo de três
mulheres e um homem salta-nos ao
caminho. Cumprimentam-nos com
sorrisos. Uma das mulheres pede
um cigarro que fuma de maneira
sôfrega. Ksiniga Pahaljuk, 37 anos,
professora de Inglês no ensino
secundário em Kiev, fugiu com o
marido e o Ælho de seis anos para a
casa na aldeia logo no segundo dia
da invasão. “Não foi uma boa ideia.
Viemos para a boca do lobo. Os
tanques russos passaram
diariamente por aqui ao longo de 30
dias. Ouvíamos o seu ruído sempre.
Algumas bombas caíram e
destruíram três casas e daniÆcaram
mais, mas ninguém morreu”, conta.
“Foi um inferno”, acrescenta.
“Durante 30 dias passámos as
noites na cave de casa de Elena” — a
vizinha que nos pediu vários
cigarros. “Muitas vezes fomos para
lá também de dia.” Elena, 63 anos,
mostra-nos a cave. Por trás de uma
porta de ferro amontoa-se lixo no
chão e malgas de plástico com
comida para animais. Atrás de outra
porta de ferro, em duas escuras
assoalhadas, estão duas camas e um
cadeirão. “Eu e o meu marido, a
família de Ksiniga e os meus dez
gatos — os cinco cães Æcavam na
casa de cima — passámos aqui quase
todas as noites. Um terror, um
terror, mas estamos vivos”, diz.
“Agora, há quatro dias os russos
desapareceram. Espero que esses
porcos assassinos nunca mais
voltem”, acrescenta.
Depois de passarmos por Bucha e
antes do regresso a Kiev, ainda
entramos na cidade de Irpin,
ocupada pelos russos também
durante 30 dias e alvo de violentos
confrontos. Aqui, onde um pórtico
dá as boas-vindas “à rica cidade”, a
destruição de edifícios parece ser
bastante maior do que na cidade
vizinha. Para trás, como disseram a
professora de Inglês e o padre
ortodoxo, Æca aquilo a que hoje
chamam “o Inferno”.
Amanhã é outro dia.
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4 • Público • Terça-feira, 5 de Abril de 2022
Guerra na Ucrânia
Crimes de guerra
UE promete mais
sanções à Rússia
com todos os olhos
postos na Alemanha
João Pedro Pincha
Zelenskii diz que o cenário
que viu em Bucha torna
mais complicado negociar
a paz e há receios de que
seja “a ponta do icebergue”
A
companhado por jornalistas
de media ocidentais, o Pre-
sidente ucraniano deslocou-
se ontem a Bucha, a cidade
nos arredores de Kiev onde
corpos de civis assassinados
pejavam as ruas. “Isto são crimes de
guerra e serão reconhecidos pelo
mundo como um genocídio”, disse
Volodimir Zelenskii, de semblante
carregado, vestido à militar e rodeado
por soldados.
As tropas ucranianas, que recupe-
raram o controlo da cidade no Æm-de-
semana depois de os russos terem
começado a retirar-se da região de
Kiev, conduziram os jornalistas até
uma cave onde jaziam os cadáveres
de cinco homens com as mãos atadas
atrás das costas. “Foram alvejados na
cabeça ou no peito. Foram torturados
antes de serem mortos”, disse Anton
Herashchenko, assessor do ministro
do Interior, citado pela Reuters. “Esta-
mos a investigar e queremos mostrar
isto à imprensa internacional.”
As fotograÆas, vídeos e relatos de
aparentes execuções sumárias de
civis, que desde domingo têm surgido
a ritmo constante, levaram a mais
manifestações de repúdio generaliza-
do em relação à intervenção militar
russa na Ucrânia. “É muito difícil falar
[com a Rússia], quando vemos o que
aconteceu aqui”, aÆrmou Zelenskii
no Æm da visita a Bucha. O ministro
dos Negócios Estrangeiros ucraniano
avisou que Bucha “é apenas a ponta
do icebergue de todos os crimes
cometidos pelo Exército russo”.
Através do porta-voz do Kremlin,
primeiro, e do embaixador junto da
ONU, depois, a Rússia voltou a negar
responsabilidades. “Estamos choca-
dos com a escala e a brutalidade da
encenação organizada em Bucha, ao
melhor estilo do cinema do capacete-
-branco”, aÆrmou o representante
russo nas Nações Unidas, fazendo
referência à ONG que presta ajuda
humanitária na guerra civil síria. Dmi-
tri Polianski prosseguiu: “Os neonazis
ucranianos estão a ser completamen-
te Æéis à antiga escola de provocações
nazi e estão a tentar pôr as culpas na
Rússia. Há inconsistências e erros
graves na produção. Até já foram refu-
tados na Internet.”
A Rússia pediu uma reunião
extraordinária do Conselho de Segu-
rança da ONU para ontem, mas o
pedido foi negado pelo Reino Unido,
que detém a presidência rotativa
deste órgão. O conselho reúne-se
hoje a pedido da Ucrânia e António
Guterres deverá falar na reunião. Os
governos britânico e norte-america-
no anunciaram a intenção de sus-
pender a Rússia do Conselho dos
Direitos Humanos.
Olhos na Alemanha
O dia de ontem Æcou marcado por
uma catadupa de reacções aos relatos
que chegam de Bucha e por uma
renovada pressão para que a União
Europeia adopte mais sanções eco-
Dia 40. Como evolui a situação no terreno
nómicas contra a Rússia. Josep Bor-
ÁREAS Controladas Reivindicadas Sob avanço russo (sem controlo Ucranianos reivindicam
rell, que lidera a diplomacia dos 27,
pela Rússia pela Rússia russo, mas onde lançaram ataques) contra-ataque
disse que isso acontecerá “com carác-
ter de urgência”, mas o alcance das Combates significativos nas últimas 24 horas Cidades ocupadas Combates recentes
medidas ainda é uma incógnita.
No centro das atenções está a Ale- RÚSSIA
manha, o país comunitário mais BIELORRÚSSIA Retirada
dependente da importação de gás russa Donbass
russo e que, por esse motivo, está Exército russo está a
Retirada
mais hesitante em avançar com um russa reorganizar-se para concentrar
embargo a esta fonte de energia. O os seus esforços nesta região do
primeiro-ministro polaco acusou o leste da Ucrânia, seguindo a
Governo de Olaf Scholz de bloquear Ovruch mudança de estratégia já
Rivne
a imposição de sanções mais duras. Sumi anunciada pelo Kremlin
POLÓNIA Lutsk Bucha
“Qualquer pessoa que leia as notas Irpin Brovari
que saem das reuniões da UE sabe Iavoriv Jitomir Kiev
que a Alemanha é o maior empeci- Rio Dniepre Kharkiv
(Carcóvia)
lho”, aÆrmou Mateusz Morawiecki. Lviv Khmelntski
“Neste momento não é possível”,
declarou o ministro alemão das UCRÂNIA
Finanças, Christian Lindner, sobre a Izium
Dnipro
possibilidade de um embargo ao gás Kiev Lugansk
russo, antes da reunião do Eurogrupo Tropas russas que cercavam a Krivii Rih Zaporijjia Donetsk
que se realizou no Luxemburgo. Ape- cidade desde o início da invasão Oleksandrivka
sar disto, admitiu outras restrições: retiraram-se de todas as suas
“Podemos fazer uma distinção entre posições de ambos os lados do Mikolaiv Berdiansk
petróleo, carvão e gás.” rio Dnipro Mariupol
O assunto não é pacíÆco dentro do Kherson Melitopol Berdiansk
executivo de coligação. A ministra da Odessa Mar
Defesa, Christine Lambrecht, do SPD, de Azov
admitiu a hipótese de parar com as ROMÉNIA
importações de gás russo, mas um CRIMEIA
Mariupol
porta-voz governamental disse ao The Autocarros destinados ao
Guardian que o que está a ser pensa- resgate de civis de Mariupol
Mar Negro
do é uma “diversiÆcação” de fontes não conseguiram chegar à
que permita “reduzir a dependência” 100km
cidade sitiada no sul da Ucrânia
face à Rússia.
Fonte: Instituto para os Estudos da Guerra dos EUA PÚBLICO
Um estudo divulgado ontem pelo
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EPA
Regulador controla
Gazprom Germania
O regulador energético da
Alemanha, Bundesnetzagentur,
assumiu o controlo da
Gazprom Germania, uma
subsidiária da companhia
estatal russa de gás. A
Gazprom anunciou na semana
passada que deixaria de ter
participação na empresa.
“Todos os direitos de voto na
empresa serão transferidos
para o regulador. A ordem da
administração fiduciária serve
para proteger a segurança e a
ordem pública e para manter a
segurança do abastecimento”,
explicou o ministro alemão da
Economia, Robert Habeck,
acrescentando que o
regulador assumirá o controlo
até 30 de Setembro.
Segundo o ministro, a
decisão destinou-se a evitar
que a Gazprom Germania fosse
comprada por duas empresas
russas cuja propriedade não é
clara. “Não deixaremos a
infra-estrutura energética
sujeita às decisões arbitrárias
do Kremlin”, disse Habeck.
A Gazprom está a ser
investigada há meses por
alegadamente ter retido gás
que poderia ter disponibilizado
para fazer baixar os preços.
O Presidente do Governo
ucraniano visitou ontem
a cidade de Bucha
Conseil d’Analyse Économique, que
funciona na dependência do Governo
francês, concluiu que um embargo
energético à Rússia teria um impacto
a rondar 0,3% no PIB alemão, enquan-
to França, Espanha, Portugal e Itália
seriam os países europeus menos
afectados. Em piores condições Æca-
riam Estados-membros como a Lituâ-
nia, a Bulgária, a Eslováquia, a Finlân-
dia e a República Checa. “Tendo em
conta este impacto tão heterogéneo
de perdas económicas nos países
europeus, impor tarifas robustas a
nível europeu talvez seja mais eÆcaz
do que um embargo”, escrevem os
analistas.
Para já, o que a Alemanha anunciou
foi a expulsão de 40 funcionários
diplomáticos da embaixada russa em
Berlim, suspeitos de trabalharem
como espiões. França também vai
expulsar 35 diplomatas russos, à
semelhança do que têm feito vários
outros países europeus.
Mas a Alemanha não está sozinha
nas suas reticências a um embargo
energético. O ministro das Finanças
da Áustria, Magnus Brunner, diz que
o país é “extremamente dependente”
do gás proveniente da Rússia e que,
por isso, não é favorável à ideia.
“Somos contra as sanções sobre o
petróleo ou o gás, porque o princípio
das sanções é que elas não nos devem
atingir mais a nós do que à Rússia.”
Em Varsóvia, onde se encontrou
com a homóloga britânica, o ministro
dos Negócios Estrangeiros ucraniano
disse que “meias medidas já não são
suÆcientes”. “Eu peço que adoptem
as mais severas sanções. É este o ape-
lo das vítimas de violações e de assas-
sinatos. Se têm dúvidas sobre san-
ções, vão primeiro a Bucha”, atirou
Dmitro Kuleba.
“Este tipo é bárbaro”
O primeiro-ministro polaco também
não foi meigo para com Emmanuel
Macron: “Quantas vezes negociou
com Putin e o que conseguiu? Nós
não discutimos, não negociamos com
criminosos. Os criminosos têm de ser
combatidos. Ninguém negociou com
Hitler. Negociaria com Hitler, com
Estaline, com Pol Pot?”, perguntou
retoricamente Mateusz Morawiecki.
O Presidente francês, que está em
campanha para a primeira volta das
eleições, declarou que “as imagens de
Bucha são insuportáveis” e que “há
indícios muito claros de crimes de
guerra”, para os quais têm de se
encontrar e julgar os responsáveis.
O mesmo diria mais tarde Joe
Biden, que voltou a não usar palavras
simpáticas para com Vladimir Putin:
“Este tipo é bárbaro. O que aconteceu
em Bucha é revoltante.” O Presidente
dos Estados Unidos prometeu novas
sanções e anunciou que apoiará um
julgamento por crimes de guerra.
Pergunta e resposta O que são crimes de guerra? Quem os investiga? Quem os pode julgar?
E
ntre as dezenas de corpos
que terão sido abandonados
pelas forças russas em Bucha
— as autoridades locais falam
em 300 — há alguns em posições
que sugerem que foram
executados (incluindo pelo
menos um com as mãos atadas
atrás das costas. As imagens da
localidade dos arredores de Kiev
levaram os governos britânico,
francês, alemão e
norte-americano, entre outros, a
falar em crimes de guerra. Estas
não são as primeiras indicações
de execuções sumárias, nem de
crimes de guerra desde o início
da ofensiva russa. Já a 2 de
Março, o Tribunal Penal
Internacional tinha anunciado a
abertura de um inquérito sobre
crimes de guerra e crimes contra
a humanidade na Ucrânia desde
2014, quando começou o conflito
com a Rússia. “O nosso trabalho
de recolha de provas começou”,
disse então o actual
procurador-geral, Karim Khan.
O que são crimes de guerra?
“Até a guerra tem regras”, lê-se
no site do Comité Internacional
da Cruz Vermelha. As regras que
definem um crime de guerra
estão inscritas num conjunto de
tratados a que chamamos
“Convenções de Genebra”, bem
como noutros acordos e leis
internacionais mais antigas
conhecidos como “Leis e
Costumes de Guerra”. O Estatuto
de Roma, que instituiu o TPI, em
1998, é outro importante
documento que define estas
regras e as suas violações.
As três primeiras Convenções
de Genebra protegem
combatentes e prisioneiros de
guerra; a quarta, adoptada
depois da II Guerra Mundial,
protege os civis. Em 1949 foram
ratificadas por todos os
Estados-membros da Nações
Unidas, incluindo a Rússia.
A Quarta Convenção de
Genebra enumera o que são
considerados crimes de guerra:
assassínio intencional; tortura ou
tratamento desumano; grande
sofrimento ou lesões graves ao
corpo e à saúde causadas de
forma intencional; destruição
extensa e apropriação de
propriedade não justificada por
necessidade militar; tomada de
reféns; deportação ou
confinamento ilegal. Já o
Estatuto de Roma define crimes
de guerra como dirigir
intencionalmente ataques contra
a população civil ou contra civis
individuais que não participam
directamente nas hostilidades;
lançar intencionalmente um
Público • Terça-feira, 5 de Abril de 2022 • 5
ataque sabendo que vai causar
perda acidental de vidas ou
sofrimento de civis; ataques ou
bombardeamentos de cidades,
vilas, habitações ou edifícios
sem defesa. O texto proíbe
igualmente o recurso a
determinados tipos de armas
(incluindo agentes químicos e
biológicos) e refere ainda que
determinados edifícios,
incluindo hospitais, locais de
culto e escolas, não podem ser
alvo de ataques intencionais.
O que é um criminoso de
guerra?
A designação “criminoso de
guerra” aplica-se a qualquer
pessoa que viole o conjunto de
regras conhecido como “leis da
guerra”.
Quem investiga e pode
determinar se foram cometidos
crimes de guerra?
Há vários caminhos possíveis
para investigar crimes de guerra.
O TPI pode avançar com um
inquérito aprovado pelos seus
juízes, mas é mais rápido, se um
dos Estados-membros solicitar a
abertura de uma investigação ao
procurador-geral. Neste caso, a
Lituânia pediu ao TPI que
investigue possíveis crimes de
guerra cometidos pela Rússia e
pela Bielorrússia na Ucrânia. No
dia seguinte, um grupo de 38
países (incluindo Portugal)
liderado pelo Reino Unido
submeteu formalmente uma
informação de crimes de guerra
que podem ter sido cometidos
na Ucrânia. Esta é, segundo o
Guardian, a maior acção
conjunta na história do TPI. Na
prática, permite apressar o
processo de investigação que
estava já em curso.
Outra possibilidade é a ONU
decidir entregar o inquérito a um
tribunal internacional híbrido de
crimes de guerra criado
especificamente para este
conflito, como já aconteceu, por
exemplo, com a ex-Jugoslávia.
Uma terceira opção é a criação
de um tribunal para julgar
Vladimir Putin e outros
responsáveis por parte de
grupos ou países interessados
(NATO ou UE, por exemplo),
como aconteceu com o tribunal
de Nuremberga que julgou os
líderes nazis. Um caminho
diferente passa pelos tribunais
nacionais de países que
reconheçam o princípio da
jurisdição universal para crimes
de guerra — a Alemanha, por
exemplo, anunciou que está a
investigar a possibilidade de
Putin ter cometido crimes de
guerra na Ucrânia; o mesmo país
condenou recentemente dois
responsáveis sírios por crimes
contra a humanidade.
O que é que o TPI pode julgar?
O TPI pode julgar todos os
crimes referidos no seu
documento fundador, o Estatuto
de Roma. Há crimes de guerra
reconhecidos nas Convenções
de Genebra ou noutros
documentos que não aparecem
no Estatuto de Roma, como o
ataque e a ocupação de uma
central nuclear ou o ataque a
“corredores humanitários”.
Quem é que o TPI pode julgar?
Em princípio, o TPI pode acusar
indivíduos responsáveis por
crimes de guerra, crimes contra
a humanidade, genocídio e
crime de agressão dos seus 123
Estados-membros, sempre que
os tribunais nacionais não
queiram ou não possam fazê-lo.
Nem a Rússia nem a Ucrânia são
membros do TPI (como também
não são os Estados Unidos ou a
China) e Moscovo não
reconhece o tribunal a funcionar
em Haia desde 2002. No
entanto, a Ucrânia assinou em
2014 uma declaração a dar ao
tribunal jurisdição para alegados
crimes graves cometidos no seu
território a partir dessa data,
independente da nacionalidade
dos autores desses crimes. É
com base nessa autorização que
o TPI já lançou o seu inquérito e
tem investigadores no terreno
desde o início de Março.
Que julgamentos já
aconteceram no passado?
O Tribunal internacional militar
de Nuremberga, instituído pelos
aliados, funcionou entre 1945 e
1946 e terminou com 12
sentenças de morte, sete penas
de prisão e três absolvições. Um
processo semelhante em Tóquio
condenou vários comandantes
japoneses, em 1948.
Em 2012, era conhecida a
primeira sentença do TPI de Haia
(na sua versão permanente), que
condenou o senhor da guerra
congolês Thomas Lubanga a 14
anos de prisão por recrutar e usar
crianças como soldados. Na
mesma cidade dos Países Baixos,
funcionaram tribunais especiais
— órgãos das Nações Unidas
instituídos pela organização para
julgar crimes de guerra na
ex-Jugoslávia, Ruanda, Serra Leoa
e Camboja. O TPI para a
ex-Jugoslávia condenou o ex-líder
sérvio-bósnio Radovan Karadzic e
o comandante militar das forças
sérvias da Bósnia, Ratko Mladic, a
prisão perpétua por crimes de
guerra, genocídio e crimes contra
a humanidade. Sofia Lorena
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6 • Público • Terça-feira, 5 de Abril de 2022
Guerra na Ucrânia
Atrasos na emissão de certificados
Só um terço dos refugiados ucranianos que chegaram
a Portugal já pode aceder a ofertas de emprego
Joana Gorjão Henriques
Um mês após chegarem a
Portugal, há refugiados que
não conseguem trabalhar
por não terem certificado
de protecção temporária
C
om a chegada de refugiados
da Ucrânia, o Serviço de
Estrangeiros e Fronteiras
(SEF) acelerou procedimen-
tos e criou uma plataforma
própria para receber os pedi-
dos. Mas a emissão dos certiÆcados
não é imediata e não está a acompa-
nhar o ritmo dos quase 27 mil pedidos
registados: até agora só foram emiti-
dos 8500 certiÆcados de concessão
de autorização de residência ao abri-
go do regime de protecção temporá-
ria, sem o qual as pessoas não podem
começar a trabalhar nem aceder a
apoios. Dos quase 27 mil pedidos, um
terço são de menores de 18 anos; dos
8500 certiÆcados emitidos, 700 são
de menores.
Há um mês, quando anunciou a
plataforma, o SEF referiu que o site
SEFforUkraine.sef.pt ia “permitir
simpliÆcar a obtenção de protecção
temporária” por um ano, prorrogável
por dois períodos de seis meses, e
que, com base neste pedido, os cida-
dãos têm acesso a número de identi-
Æcação Æscal, de Segurança Social
(SS) e do Serviço Nacional de Saúde
(SNS), “pelo que podem, desde logo,
ter acesso aos vários serviços e ao
mercado de trabalho”.
Agora, questionado pelo PÚBLICO
sobre quantos dos pedidos estão vali-
dados, o SEF esclarece que emite os
certiÆcados assim que a SS, o SNS e a
Autoridade Tributária (AT) emitem os
respectivos números de utente e iden-
tiÆcação Æscal, mas aÆrma que a
Autoridade Tributária está a demorar
mais tempo, daí a discrepância entre
pedidos e emissões. Ao PÚBLICO o
serviço de imprensa do Ministério das
Finanças aÆrma que a AT “está, em
regra, a atribuir os NIF num prazo de
24 horas após recepção dos elemen-
tos de identiÆcação dos migrantes da
parte do SEF”. Mas ressalva: “VeriÆ#
cam-se, no entanto, algumas situa-
ções pontuais de necessidade de
conÆrmação adicional das identida-
des dos migrantes, designadamente,
quando os respectivos dados sejam
similares, mas não inteiramente coin-
cidentes com os de outros contribuin-
tes aos quais tenha sido previamente
atribuído NIF.”
Já o SNS refere que está a emitir os
números de “utente em menos de 24
Vera Lúcia Alves com Anna Kotova (à dir.) e Daryna Tolochoko (esq.), que acolheu em Portugal
Ofertas de emprego para refugiados têm salário médio de 884 euros
A
s cerca de 22 mil ofertas de
emprego para refugiados
vindos da Ucrânia,
registadas na plataforma
do Instituto do Emprego e
Formação e Profissional (IEFP),
propõem um salário médio de
884 euros brutos, abaixo do
salário médio em Portugal (que
em 2020 era de 1040 euros) e
acima do salário mínimo
nacional.
De acordo com os dados
publicados no site do IEFP, a 30
de Março, havia 21.926 vagas de
emprego para as áreas do
turismo, construção, indústria,
transportes, acção social,
tecnologias de informação ou
comércio, oferecendo salários
entre os 705 euros e os 4 mil
euros brutos. E, embora a média
salarial oferecida seja de 884
euros, 38% das vagas propõem
uma remuneração equivalente
ao salário mínimo (705 euros
mensais) e 25,7% pagam entre
706 e 797 euros. Ou seja, cerca
de 64% dos lugares
disponibilizados prevêem
salários abaixo dos 800 euros.
Em menos de 20% das ofertas,
os empregadores propõem-se
pagar entre 800 e mil euros;
10,5% oferecem entre 1001 e
1999 euros e apenas uma
pequena parte, 4,7%, paga 2 mil
euros ou mais por mês.
As ofertas com salários mais
elevados pedem profissionais
de marketing e programadores
de software (com salários de 4
mil euros brutos mensais);
chefes de cozinha (2500 euros)
ou carpinteiros (2600 euros).
A esmagadora maioria das
vagas corresponde a trabalho a
tempo inteiro, mas a base de
dados dá conta de 292 ofertas
de trabalho a meio tempo e
onde o salário mais baixo
corresponde a pouco mais de
310 euros para efectuar serviços
de limpeza, dar apoio a crianças
ou trabalhar em restaurantes e
no comércio.
As ofertas disponibilizadas são
para as várias regiões do país,
mas as que oferecem salários
mais altos situam-se em regra
em Lisboa ou no Porto. Há ainda
empresas que pedem
pessoal para efectuar
trabalho remoto (16
ofertas) nas áreas da
programação e
informática e outras
que oferecem
DANIEL ROCHA
alojamento aos trabalhadores.
A informação publicada pelo
IEFP serve para os refugiados
que chegam a Portugal terem
conhecimento das
oportunidades de emprego
disponíveis. Mas o próprio
instituto compromete-se a fazer
o levantamento das
competências dos
trabalhadores ucranianos
acolhidos, dos locais de
residência e das ofertas de
emprego disponíveis. Caso haja
correspondência entre os
candidatos e o perfil pretendido
pelas empresas, os centros de
emprego entrarão em contacto
com o empregador.
As empresas podem recorrer
ao “Compromisso Emprego
Sustentável”, que consiste num
apoio financeiro à contratação
sem termo (que pode ir até aos
11.400 euros por contrato),
conjugado com um apoio
financeiro ao
pagamento de
contribuições
para a segurança
social no primeiro
ano de vigência dos
contratos.
Raquel Martins
horas, não existindo lista de espera à
data”. Segundo esta entidade, já
foram emitidos 24.151 números de
utente no âmbito dos pedidos de pro-
tecção temporária. Também o Minis-
tério do Trabalho, da Solidariedade e
Segurança Social aÆrma que os núme-
ros da Segurança Social “estão a ser
atribuídos em menos de 24 horas
após o envio do pedido por parte do
SEF”.
A experiência de alguns refugiados
é, de facto, de atraso. Um mês depois
de terem chegado a Portugal, Daryna
Tolochoko e Irina Vozniak — que o
PÚBLICO entrevistou no início de
Março — ainda não tinham recebido
os certiÆcados até à hora de publica-
ção desta notícia. “É um problema
grande, porque não posso trabalhar”,
comenta Irina Vozniak, 40 anos, que
vivia no centro da Ucrânia e estava
disposta a trabalhar em qualquer área
em Portugal. Depois de acolhida por
uma portuguesa, SoÆa Romão, em
Sintra, Irina foi para um quarto em
Lisboa e aguarda com expectativa a
possibilidade de começar a trabalhar.
Já foi a um balcão do SEF, mas disse-
ram-lhe que não sabiam quando ia
chegar o seu documento.
Vera Lúcia Alves, que trabalha em
turismo e que acolheu a estudante de
português Daryna Tolochoko na sua
casa em Loures, conta: “Tem sido
difícil, porque, num caso, o SEF escre-
veu mal o endereço de email e então
ela não recebia.” Vera Alves acolheu
ainda a namorada do Ælho, Anna, mas
como ela já tinha vivido em Portugal
e tinha NIF, número de utente do SNS
e número de identiÆcação da Segu-
rança Social, o processo foi rápido.
Já depois da entrevista ao PÚBLICO
a sua família recebeu outra jovem
ucraniana que foi primeiro acolhida
por outro voluntário. Aqui o processo
complexiÆcou-se: “Toda a informa-
ção é enviada ao voluntário e não a
ela”, explica Vera Lúcia. “Já actuali-
zámos as informações pessoais no
SEF, mas as outras entidades conti-
nuam a usar os dados iniciais. A Segu-
rança Social e a AT não aceitam que
sejamos nós a actualizar os dados.
Segundo eles, tem de ser o SEF a fazer
a actualização, mas o SEF tem mais
que fazer e, portanto, tem sido uma
luta”, desabafa.
Já o Serviço Jesuíta aos Refugiados
refere que o feedback dos serviços é
que os processos têm sido mais rápi-
dos, “comparativamente com a expe-
riência com outros imigrantes”. Há
vários anos que há relatos sobre atra-
sos no sistema de regularização, com
imigrantes a esperar anos pela sua
autorização de residência.
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Público • Terça-feira, 5 de Abril de 2022 • 7

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8 • Público • Terça-feira, 5 de Abril de 2022
Destaque Eleições presidenciais francesas
Macron prepara-se
para combater
a extrema-direita
de Le Pen de novo
Procurando a reeleição, o Presidente francês apresenta-se
como o obstáculo ao avanço dos radicais. Tenta não deixar
de fora também a esquerda, naufragada nestas presidenciais
Clara Barata
A
pesar de Emmanuel Macron
continuar a ser o grande
favorito nas eleições presi-
denciais francesas e as son-
dagens mostrarem uma
diferença clara nas inten-
ções de voto em Macron e na segun-
da classiÆcada, Marine le Pen, de
extrema-direita, com a aproximação
da primeira volta das presidenciais
— a 10 de Abril —, a campanha do Pre-
sidente da República está a investir
no dramatismo do combate à extre-
ma-direita. E a piscar o olho aos deso-
rientados eleitores de esquerda.
“Diz-se que o seu programa [de Le
Pen] é gentil, que é como os outros,
que não é de extrema-direita. É pre-
ciso continuar a denunciar a realida-
de. Há uma dupla que está a avançar,
com ideias de extrema-direita, que
são defendidas por um clã e um
recém-chegado. Combato-as com
força, mas não as banalizo”, aÆrmou
Emmanuel Macron, referindo-se a
Le Pen e a Éric Zemmour.
Apesar de a candidata de extrema-
direita Le Pen estar com tendência
ascendente nas sondagens — tem
cerca de 22% na maioria dos estudos
de opinião —, Emmanuel Macron,
que disputa a reeleição, tem 27% a
28%, o que é ainda uma diferença
substancial. Em vésperas das elei-
ções de 2017, a seis dias da primeira
volta, uma sondagem Ifop dava 23%
das intenções de voto a Macron, con-
tra 22,5% a Le Pen, recorda a televi-
são BFM. Na segunda volta, Macron
bateu facilmente Le Pen, com 66,1%,
após um debate entre as duas voltas
em que a derrotou claramente.
No entanto, em 2017, a abstenção
não pesou como ameaça pesar este
ano, e as presidenciais eram as rai-
nhas da actualidade em França — em
2022, não, por causa da guerra na
Ucrânia, que faz passar tudo o resto
para segundo plano. Não haver deba-
tes do Presidente com os outros can-
didatos também não ajuda. A absten-
ção pode chegar a 30%, mais sete
pontos do que nas últimas presiden-
ciais, e o grupo etário dos 25 aos 34
anos é o menos convencido a depo-
sitar o seu voto nas urnas, diz uma
sondagem Ipsos-Sopra Steria para a
rádio France Inter.
A abstenção só foi mais elevada
em 2002, o ano em que Jean-Marie
le Pen, o pai de Marine, surpreen-
dentemente chegou à segunda volta,
que disputou com Jacques Chirac,
Le Pen promete
‘respeitar’ o direito
e a Constituição,
mas quer, na
realidade, mudá-los
de cima abaixo
Ivanne Trippenbach
e Franck Johannès
Jornalistas
depois de ter sido eliminado o can-
didato socialista, Lionel Jospin, que
tinha sido primeiro-ministro de Chi-
rac (em coabitação política, pois
Chirac era de centro-direita).
Esses fantasmas do passado agi-
gantam-se agora e levam o primeiro-
ministro, Jean Castex, a fazer campa-
nha, dizendo que a candidata de
extrema-direita “mostra a demago-
gia mais absoluta” ao avançar com
propostas que não são realizáveis.
“Marine le Pen e outros candidatos
não poderão fazer o que prometem,
não dizem a verdade aos franceses”,
e exempliÆcou com as promessas de
aumento dos salários em 10%.
“É o zero de imaginação, usar essa
estratégia estafada da rediaboliza-
ção. É de quem não tem nada para
dizer”, respondeu Marine le Pen,
com um salto em frente. Ela tem usa- tendência decrescente (tem cerca de Macron tenta captar para si
do como bandeira a defesa do poder 9,5%), mas os seus apoiantes são os os eleitores do centro-esquerda
de compra dos franceses, mas lá por mais activos nas redes sociais — é o
trás permanece um programa de presidente da “fachoesfera”, o cibe- bacia mineira do Norte de França.
extrema-direita, analisam no Le Mon- respaço composto por militantes de “Peço aos socialistas, Æliados ou só
de Ivanne Trippenbach e Franck extrema-direita —, como demonstra do coração, que não baixem a cabe-
Johannès. “Ela promete ‘respeitar’ o um estudo que juntou universidades ça e tenham orgulho”, apelou.
direito e a Constituição mas quer, na e empresas publicado no jornal Le O candidato de esquerda mais bem
realidade, mudá-los de cima abaixo”,
escrevem. “Tem a ambição de mon-
Monde na semana passada. colocado, com cerca de 15%, é Jean-
Marie Mélenchon, da França Insub-
tar um projecto que extirpa os direi- O que fazer com a esquerda? missa, esquerda radical. No Æm-de-
tos fundamentais e liberdades indi-
viduais sem os quais a democracia é
Isto acontece enquanto a esquerda
está em perda. Anne Hidalgo, a can-
semana, num comício em Toulouse,
incitou os seus eleitores a livrarem-se
só o poder da maioria e não o respei-
to de todos.”
didata do Partido Socialista (PS), tem
apenas 2% das intenções de voto.
da fatalidade de um duelo eleitoral
Macron-Le Pen. Com o seu habitual
Este “caldo” das ideias da extrema-
direita vai sendo apurado no imagi-
Podem ser ex-eleitores do PS muitos
dos que ponderam abster-se. “Mui-
estilo inÇamado, prometeu “ir arran-
car a vitória com os dentes”.
nário dos franceses, até porque exis-
te um outro candidato de extrema-
tos cidadãos dizem que não sabem
se vão votar, não sabem ainda em
As suas propostas são arrojadas:
aumentar o salário mínimo para
direita, Éric Zemmour — as sondagens quem votar ou dizem que ainda 1400 euros líquidos, baixar a idade
não têm sido favoráveis a este admi- podem mudar de opinião”, destacou de reforma para os 60 anos (hoje são
rador de Vladimir Putin. Vai numa Hidalgo, numa deslocação à antiga 62). Uma ideia ainda mais polémica
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Público • Terça-feira, 5 de Abril de 2022 • 9

SARAH MEYSSONNIER/REUTERS
Macron e Le Pen
destacam-se nas sondagens
Eleições francesas: um conto de dois destinos
France Inter
Le Figaro
Le Parisien defendem a União Europeia, de extrema-direita são sinais de que
Opinião acordo com a última grande em França se confrontam, de
EMMANUEL MACRON
sondagem, são inferiores a 50%. forma radical, os dois grandes
26%
27% Le Pen surge com uma nova destinos da Europa. Um tem como
28% camuÇagem, com uma linguagem horizonte uma Europa federal
menos radical, seguindo, desde a capaz de pesar na ordem do
MARINE LE PEN Álvaro Vasconcelos
21% expulsão do pai, uma estratégia de mundo, outro uma Europa

é tirar a França da Aliança Atlântica.
Diz não aceitar “uma ordem do mun-
do em que de um lado está a NATO e
do outro um bloco russo e chinês”.
Quanto a Macron, tem desestru-
turado a direita clássica — à força de
arrebatar apoios vindos de Os Repu-
blicanos e, dizem alguns, até ideias
do campo da candidata deste parti-
do, Valérie Pécresse, que anda pelos
9%.
Mas para o centro-esquerda, que já
sofre de desestruturação, Macron
tem sido menos atraente. Falta-lhe
uma narrativa motivadora para quem
em 2017 votou nele. O seu programa
ambiental, por exemplo, é conside-
rado muito insuÆciente — e ter o apoio
do presidente da Federação Nacional
dos Caçadores não ajudou.
É por isso que, nesta recta Ænal da
D
22% epois de cinco anos de
20% presidência, de uma
pandemia devastadora e
JEAN-LUC MÉLENCHON
15,5% da invasão da Ucrânia por
15% Putin, Macron surge
15,5% como favorito nas
ÉRIC ZEMMOUR
sondagens, com cerca de 28% das
11% intenções de votos na primeira
11% volta e 54% na segunda. A
11% reeleição dos presidentes
VALÉRIE PÉCRESSE franceses, porém, desde a crise
9,5% Ænanceira de 2008 que não é um
10% dado adquirido. Os dois últimos
9% presidentes, Sarkozy e Hollande,
YANNICK JADOT não foram reeleitos.
6% Já não é a clivagem clássica —
5% entre a esquerda democrática do
6% Partido Socialista, e a direita
FABIEN ROUSSELL democrática dos Republicanos, a
3% última das formas que foi tomando
3% o partido dos herdeiros de De
3% Gaulle — que atravessa a sociedade
JEAN LASALLE francesa. Os dois partidos correm
2,5% o risco de desaparecer, as suas
2,5% candidatas, Anne Hidalgo e
2% Valérie Pécresse, têm apenas 2% e
ANNE HIDALGO 9 % de intenções de voto,
2% respetivamente.
2% A guerra da Ucrânia veio
2% conÆrmar a clivagem entre uma
NICOLAS DUPONT-AIGNAN França que acredita no seu
1,5% destino europeu e uma França
2% nacionalista. À invasão da Ucrânia
2,5% por Putin opuseram-se Macron, o
PHILIPPE POUTON ecologista Jadot e a socialista Anne
1,5% Hidalgo. A reação dos
2% nacionalistas, de vários
1% quadrantes, foi bem diferente.
NATHALIE ARTHAUD
0,5% Marine le Pen é a candidata de
0,5% Putin, que Ænanciou a sua
0,5% campanha de 2016. Zemmour
aÆrmava querer ser “o Putin
Fonte: Sondagens France Inter, Le Figaro e Le Parisien
francês”. Jean-Luc Mélenchon teve
sempre uma posição ambígua
nar-se mais apelativo para a esquer- sobre Putin, justiÆcando a
da: isso viu-se no único comício da intervenção russa na Síria e a
sua campanha, no sábado, em La anexação da Crimeia e assacando
Défense (Paris), com múltiplas refe- a responsabilidade aos Estados
rências ao Presidente (socialista) Unidos. Os três candidatos
François Mitterrand — como a evo- partilham a oposição a tudo o que
cação do slogan “a força tranquila”,
que levou Mitterrand ao Palácio do
é supranacional, em particular a
União Europeia e assumem
Eliseu em 1981, e à “França Unida”,
que foi o mote da sua reeleição em
posições anti-NATO. O que os
diferencia, o que não é pouco, é
1988, nota o Le Monde —, apelos aos
professores, menções ecológicas.
que Mélenchon recusa o
etnonacionalismo e o
Quis tornar a sua mensagem uni-
versal: “Apelo a todas e todos os que
conservadorismo. Marine le Pen, a
candidata da extrema-direita,
hoje, da social-democracia ao gaullis- aparece com 21% das intenções de
mo, passando pelos ecologistas, que
ainda não se tenham juntado a nós,
votos na primeira volta, Zemmour
tem cerca de 11% e Mélenchon
que o façam. Desde o início, não
temos apenas um partido, é o nosso
cerca de 15%. As sondagens dão a
Le Pen cerca de 46% na segunda
país”, declarou Macron no comício.
Bastará para convencer os que não
volta.
Na primeira volta, as intenções
normalização do partido. Na
campanha, fala mais de poder de
compra, a principal preocupação
dos franceses, do que da sua
agenda identitária e iliberal, e
procura fazer esquecer o seu
apoio a Putin. O essencial do seu
programa, no entanto, não se
alterou, defendendo a revisão da
Constituição por referendo,
nomeadamente para que o
Conselho Constitucional não
possa “examinar uma lei aprovada
por referendo”. Continua a
defender a teoria racista dita da
“grande substituição” e por isso
quer inscrever na Constituição a
proibição de políticas que possam
alterar “a composição e a
identidade da França”. Basta ouvir
Zemmour, para sabermos o que Le
Pen esconde.
Zemmour, como Putin,
representa o estado supremo do
nacionalismo, que rompe o
consenso civilizacional francês do
pós-Vichy. Defende Pétain, profere
declarações racistas, evoca uma
guerra civil entre os franceses
“verdadeiros” e os milhões de
muçulmanos de França, assume a
defesa da sociedade patriarcal e
da virilidade, que, segundo ele,
“vai a par com a violência”.
Zemmour, que foi jornalista do
Figaro, consegue penetrar no
campo da direita democrática,
desviando votos para a
extrema-direita que podem ir
parar a Le Pen na segunda volta.
O apoio ao nacionalismo e a
popularidade dos líderes da
Não tenhamos
dúvidas de que nas
eleições francesas
se joga não só
o destino
democrático da
França, mas também
da União Europeia
e da paz
fragmentada pelo iliberalismo, o
etnonacionalismo, as identidades
tristes.
A presidência de Macron
atestou a convicção no destino
europeu da França, e essa é a
razão primeira para a defesa da
sua reeleição. As suas propostas
mais ambiciosas, mais federais,
encontraram a oposição da
Alemanha, mas com a pandemia
conseguiu impor a Angela Merkel
a necessidade do Programa de
Reconstrução e Resiliência. Com a
Guerra da Ucrânia, assumiu a
liderança da resposta europeia de
enorme Ærmeza no apoio ao povo
ucraniano e de abertura para
negociações diplomáticas, ao
mesmo tempo que impulsionava
um salto qualitativo na Europa da
Defesa.
O destino nacionalista, que
assombra a França, não é fruto do
acaso. Na sua base está a
convicção de largos setores das
classes populares, nomeadamente
dos operários, de que nem o
Estado francês nem a União
Europeia os protege da
globalização neoliberal. Nos
primeiros anos do seu mandato,
Macron, eleito com uma agenda
de pendor social-democrata, nada
fez que os convencesse do
contrário, continuando a política
económica dos seus antecessores.
A igualdade é um credo fundador
da democracia francesa, pelo que
há uma intolerância às
desigualdades. Com a pandemia,
Macron assumiu que o Estado tem
um papel essencial na economia,
mas junto de uma parte dos
eleitores o mal já estava feito.
Marine le Pen, ao contrário de
Trump e Bolsonaro, verbera
contra o neoliberalismo e por isso
a sua candidatura encontra apoio
signiÆcativo nas classes populares.
Não tenhamos dúvidas de que
nas eleições francesas se joga não
só o destino democrático da
França, mas também da União
Europeia e da paz no continente.
A vitória de Marine le Pen será o
triunfo do iliberalismo e Putin
poderá, com a sua cumplicidade,
chantagear a Europa. Se o destino
europeu da França se conÆrmar,
então haverá esperança na derrota
de Putin, na contenção da ameaça
autocrática e no renascimento
democrático.

campanha, Macron está a tentar tor- têm vontade de ir votar? de voto nos partidos que no continente Fundador do Fórum Demos
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10 • Público • Terça-feira, 5 de Abril de 2022
Destaque Eleições presidenciais francesas
Segunda geração e extrema-direita
Reportagem
“Sou francês, Alexandra Prado Coelho Texto,
Nuno Ferreira Santos Fotografia,
faço parte desta em Paris
A
s amendoeiras estão em
Çor em Blanc-Mesnil, um
história. Tirar-nos dos bairros do
departamento francês de
Seine-Saint-Denis, o
dela é dizer
famoso 93. É segunda-feira
de manhã, está sol, as ruas estão
tranquilas, as crianças saem das
escolas. Este foi, durante toda a
que não existo, infância, o mundo de Côme
Webembe Tuitcheu, francês de
origem camaronesa, artista,
que sou um erro” fotógrafo e cineasta. É esta a vida
“banal” que quer mostrar na
curta-metragem que fez a convite da
cadeia de televisão Arte (no âmbito
da série O 93 Convida-se para o
Eliseu) e a que chamou A Minha
Família É Política. Nela, entrevista a
mãe, a vizinha do prédio, os irmãos
e os amigos e põe-nos a discutir o
lugar da política na vida deles.
“É muito cansativo, há imagens
que dominam os meios de
Realizador francês, Älho de pais dos comunicação e muita gente que tem
imensas ideias sobre o local sem
Camarões, Côme Tuitcheu fez um Älme nunca aqui ter posto os pés”, diz
Côme, sentado à mesa da sala da
para mostrar que “o 93” é um bairro que casa dos pais, ao lado da mãe,
Marguerite, nascida nos Camarões e
não se revê em nada que o candidato de a viver em França há 40 anos.
extrema-direita Éric Zemmour diz dele Ambos sabem que, quando se fala
do 93, o que se espera é a imagem
estereotipada do banlieue
(subúrbio), local de pobreza e
violência, local de perigos nem
sempre claramente identiÆcáveis,
mas que despertam medos que o
candidato de extrema-direita às
eleições presidenciais (primeira
volta no próximo dia 10) Éric
Zemmour, ele próprio nascido no
93, em Drancy, mas “noutros
tempos”, tem sabido explorar.
“Este bairro representa as minhas
melhores recordações, os meus
amigos de infância, a minha família,
pessoas que trabalham, os meus
professores da escola, o
conservatório de música onde
estudei guitarra. Há um olhar muito
afectuoso. É a minha casa.” Mas
nada disso está nas imagens que
constantemente são produzidas
sobre o 93. Foi, em parte, o que
animou Côme a abandonar uma
carreira na Ænança, que o levou a
Marrocos e aos Estados Unidos,
para fazer um curso na escola de
cinema Kourtrajmé (o nome
signiÆca curta-metragem, em calão
africano), criada por Ladj Ly, Ælho
de imigrantes do Mali e realizador
do Ælme Os Miseráveis, Prémio do
Júri em Cannes em 2019 e candidato
francês aos Óscares em 2020.
Periferia de Paris, a região foi
desde sempre marcada pelo
estigma. É em Montfermeil (onde
Æca hoje a escola Kourtrajmé) que
Victor Hugo coloca a hospedaria do
tenebroso casal Thénardier, que
explora sem escrúpulos a órfã
Côme Tuitcheu com a mãe,
que continua sem
nacionalidade francesa ao
fim de 40 anos . “Vim para
aqui há muito tempo,
conheço bem o bairro,
reconheço-me nestas
pessoas”, diz Marguerite
Seine-Saint-Denis,
os contrastes do 93
A
pesar de ser o
departamento mais pobre
de França,
Seine-Saint-Denis tem
vindo a atrair cada vez mais
empresas, sobretudo start-ups,
e em bairros como
Blanc-Mesnil estão em
construção muitos edifícios
novos, assim como uma nova
linha de metro, com o
objectivo de atrair uma
população com maior poder
de compra — o que poderá
representar uma gentrificação
crescente. O dinamismo que
tem demonstrado levou já o
Presidente Emmanuel Macron
a dizer que a Seine-Saint-Denis
“só falta o mar para ser a
Califórnia”.
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Cosette, no seu romance Os
Miseráveis (1862). Depois, nas
décadas de 60 e 70 do século XX,
são os imigrantes portugueses,
italianos e outros que aqui se
instalam, e só mais tarde vêm os da
África Subsariana.
Quando, mais de um século
depois, Ladj Ly recupera o título do
romance de Victor Hugo, fala de
uma realidade muito diferente, a da
violência policial e a dos jovens
revoltados dos bairros pobres que
rodeiam a capital — os jovens que
em 2005 saíram à rua numa onda
de motins que começaram em
Clichy-sous-Bois e se espalharam
por várias cidades francesas, após a
morte dos adolescentes Zyed Benna
e Bouna Traoré, electrocutados por
se terem escondido da política
numa central de distribuição
eléctrica, ao voltarem de um treino.
Estamos na sala de Marguerite,
que trouxe chocolates e frutos secos
para irmos comendo, o sol entra e
as amendoeiras estão em Çor, mas a
conversa volta inevitavelmente aos
temas da violência e do mal-estar,
essa malaise que em França pode
ter muitas razões de ser. É frustrante
para Côme, mas ele próprio
reconhece que cai na armadilha.
Zemmour, e a também candidata de
extrema-direita, Marine Le Pen,
conseguiu, habilmente, que o tema
não saia do centro do debate
público.
“Quando Zemmour fala do
anti-semitismo que supostamente
existe aqui, ou diz que há mulheres
que não podem ir ao café, são coisas
que eu nunca vi”, garante o
realizador. “Vim para aqui há muito
tempo, conheço bem o bairro,
reconheço-me nestas pessoas. Isto
também sou eu”, completa
Marguerite, na sua voz suave. “As
pessoas não conhecem esta
realidade e, julgo, têm sobretudo
medo do desconhecido.” Quando
diz onde mora, por vezes a reacção
do interlocutor é de surpresa: “Ah, e
como faz? E eu respondo, faço
como você. Ficam muito
surpreendidos. E, no entanto, vivo
aqui, garanto-vos.”
Claro que há problemas. “Não
digo que não haja violência ou
tráÆco de droga, mas não são as
coisas que contam quando vivemos
aqui”, assegura Côme. Que uma
certa tensão existe conÆrmamo-lo
um pouco depois quando, ao
tentarmos tirar uma foto,
previamente autorizada, a um
grupo de senhoras numa paragem
de autocarro, dois homens se
aproximam e, num tom
intimidatório, perguntam-nos o que
fotografámos e insistem para que
apaguemos a foto. Mas é o único
momento tenso. De resto, o bairro
parece entregue a uma existência
normal de segunda-feira de manhã.
“Não me posso pôr na cabeça de
Zemmour e nem sequer sei se ele
acredita nas ideias que veicula, o
que sei é que funcionam bem. Em
França, hoje, agitar o medo e o
Números
1,6 milhões
Seine-Saint Denis tem
1,6 milhões de habitantes,
30% são imigrantes
e 36% têm menos de 25 anos
28,6%
A taxa de pobreza é de 28,6%,
o dobro da média francesa, e a
taxa de desemprego é de 12%
contra 8% da média nacional
70%
A grande maioria (70%)
dos empregos altamente
qualificados é ocupada
por não-residentes
32,49%
Registou 32,49% de abstenção
nas últimas presidenciais
contra 25,44% de média
nacional
Público • Terça-feira, 5 de Abril de 2022 • 11
ódio, funciona. É triste, mas há algo
de instintivo, de defesa.” O que
Côme sabe, por experiência, é que,
“quando ouvem os comentários
abjectos de Zemmour, as pessoas
aqui sofrem, sentem-se sós e
totalmente incompreendidas”.
Quando se ouve dizer que “uma
mãe que usa o véu não pode
acompanhar o Ælho à escola, é difícil
não Æcarmos afectados”, tal como
quando, perante algum problema,
as pessoas perguntam “onde é que
estão os pais destes jovens?”. Estão
a trabalhar, diz, como acontece com
a vizinha que Ælma também na sua
curta-metragem, a apanhar o
autocarro às cinco da manhã para o
primeiro trabalho, a mudar a meio
do dia para o segundo e a voltar a
casa, para junto dos Ælhos, às sete
da tarde. “Vê-los agredir estas
pessoas, que são sobre-humanas,
provoca uma revolta.”
Há, contudo, uma diferença na
forma como as gerações encaram o
discurso anti-imigrantes e anti-islão,
anti-banlieue, que tem vindo a
normalizar-se cada vez mais (uma
das propostas de Zemmour é para
proibir nomes próprios que não
sejam “franceses”). A geração dos
pais, como Marguerite, reage com
menor intensidade. “Nós sempre
fomos mais dóceis”, explica a mãe
de Côme, que, ao Æm de 40 anos,
ainda não tem a nacionalidade
francesa e, por isso, não vota nas
eleições aqui, mas que, por outro
lado, quando vai aos Camarões é
vista como “branca negra”. “Eu
conheci outras coisas, não posso
reagir da mesma forma. Estas são as
pessoas que me acolheram. Se
quero ser aceite, vou precisar de
dançar com os passos delas. Já os
meus Ælhos podem dizer ‘esta é a
minha casa’.”
É precisamente isso que repete
Côme: “Este é o meu país, temos
diÆculdade em compreender e em
aceitar sermos rejeitados no local
onde crescemos. Nascemos aqui,
não conhecemos mais nada,
quando estamos lá [nos Camarões],
apesar da ligação, estamos no
estrangeiro. É importante
sentirmo-nos aceites aqui e é isso
que nos provoca cólera. Como é que
se opõe o islão à história de França?
Eu sou francês, faço parte desta
história. A imigração faz parte desta
história. Tirar-nos dela é dizer que
não existo, que sou um erro.
Quando cresci, tinha um colega,
apenas um, com pais franceses. Nós
estamos aqui. A colonização faz
parte desta história.”
Não é surpreendente, por isso,
que quando passeamos com Côme
pelas ruas de Blanc-Mesnil e
passamos junto a uma parede com
cartazes dos candidatos
presidenciais, os únicos que estão
meio rasgados e riscados são os dos
candidatos que mais têm
diabolizado a imigração, Marine Le
Pen e, nos últimos tempos de forma
mais audível, Zemmour. Neste, a
frase de campanha “Para que a
França continue a França” já
desapareceu completamente.
De onde vem a força que têm em
França as ideias de laicização e de
assimilação? Para Côme, é possível
que tudo comece com o ideal da
“missão civilizadora” que remonta
à época da colonização e que se
reforça com o Iluminismo e a noção
de igualdade entre os homens. Mas,
diz, esse “pensamento
universalista” não pode ser feito à
custa do apagamento de todos os
sinais identitários e é isso que
acontece quando se passa da ideia
inicial de separar os serviços
públicos e a religião para uma ideia
mais alargada de fazer desaparecer
qualquer símbolo religioso do
espaço público, impedindo, por
exemplo, uma mulher muçulmana
de usar o véu.
E, mesmo as vozes que surgem a
criticar esta proibição, fazem-no
com algumas reservas, sentindo
necessidade de sublinhar sempre
que são contra ela, mas também
não são favoráveis ao uso do véu,
nota o realizador. É por isso que
muitos dos seus amigos se sentem
“impotentes”, preferem “desligar a
televisão”, afastar-se da política e
“refugiar-se no trabalho e nas suas
vidas pessoais”, muitas vezes
sonhando em “ir viver para outro
país”. Para Côme, isso é mais do
que “triste” e “deprimente” — “é um
fracasso total da democracia”.
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12 • Público • Terça-feira, 5 de Abril de 2022

Espaço público

O jornalismo, a opinião enviesada e a mentira

A
guerra na Ucrânia atingiu
Editorial novos patamares de bruta-
lidade e o discurso sobre
culpas, causas, verdades
ou consequências acom-
panhou a tendência. Perante as ima-
gens de civis assassinados em Bucha,
Manuel Carvalho custa ver na televisão um oÆcial gene-
ral dizer que as vítimas tinham uma
braçadeira branca, logo eram amigos
dos russos e foram mortos pelos ucra-
nianos. Ou um aspirante a espião pro-
movido a especialista em geostratégia
a apostar 50/50 nas possibilidades de
culpa de russos ou ucranianos. Criou-
Se intelectuais como -se assim um cenário tóxico que
Russell ou Chomsky impõe uma reÇexão sobre a liberdade
de expressão e o jornalismo.
foram ferozes críticos É importante situar o que está em
da Guerra Fria ou dos causa. Por muito que custe aos que se
‘arquipélagos de sangue’ irritam com quem, veladamente,
da América, não vemos mete no mesmo saco o jornalismo da
BBC e a propaganda do Russia Today,
por que razão se deve ou se ofendem com os que, perante
calar quem compare as imagens de Mariupol, se entretêm
a Rússia com a Ucrânia a falar de culpas da América, há um
princípio a preservar: eles têm o
direito de pensar o que pensam e de
dizer o que dizem. Como nós temos o
dever de dizer que eles estão errados
ou mentem. A sensatez e a inteligên-
cia acabarão por os derrotar. É a
superioridade moral da democracia.
Se outrora intelectuais como
Bertrand Russell ou Noam Chomsky
foram ferozes críticos da Guerra Fria
ou dos “arquipélagos de sangue” da
América, hoje não vemos por que
razão se deve calar quem, de forma
irrazoável ou por falta de escrúpulos,
compare a Rússia com a Ucrânia.
Claro que há nuances em todo este
debate azedo. Duvidar de qualquer
notícia que venha da frente pode ser
um acto de niilismo; dizer que os
mortos em Bucha eram pró-russos, é
desinformação. Ainda que as
fronteiras sejam ténues, a imprensa
tem o dever de escrutinar e separar
umas de outras. Pode recusar
veiculá-las por ofensa aos seus
valores. Combatê-las, até. Não deve é
apelar ao seu silenciamento.
Quer isso dizer que, dentro do
perímetro da liberdade de imprensa,
a desinformação que os majores
generais e os aprendizes de espiões
veiculam deve ser proibida? Não
deve. Cada jornal ou televisão
decidirá de acordo com o compromi-
sso com os seus leitores ou especta-
dores. Se há um reduto inexpugnável
para o jornalismo é o da liberdade de
expressão. Um bem precioso, mas
delicado, que é melhor ter a mais do
que a menos. Uma leve amputação
pode confortar a consciência no
presente — mas implica um risco para
o futuro. No PÚBLICO, cumprindo a
sua herança editorial, tudo faremos
para evitar a opinião baseada na
mentira e para ouvir a outra parte —
o que não signiÆca que o jornal se
transforme num veículo de
pensamento único norteado pelo
que a sua direcção e a sua redacção
defendem. A liberdade não é, nunca
foi, o mar da tranquilidade.

CARTAS AO DIRECTOR
Por favor, não apareçam
Correndo o risco de ser
politicamente incorrecto, vou
mesmo assim referir-me a uma
situação recorrente cada vez que há
um surto epidémico. Aparece
sempre nas notícias um proÆssional
de saúde, habitualmente alta
patente, dirigindo-se paternalmente
ao público, pedindo que não
apareça nos hospitais, só em caso
de verdadeira urgência. Que há
meios alternativos de consulta e que
a maioria das situações podem ser
tratadas em casa. Mas os meios
alternativos de consulta estão
formatados para nos dissuadir e os
tratamentos caseiros destas
situações podem desembocar em
tragédia. AÆnal o que são
verdadeiras urgências e quem tem
capacidade de as reconhecer? Os
utentes? Ou os proÆssionais de
saúde? Quem tem crianças de tenra
idade ou velhos debilitados a cargo
tem mais dúvidas. E só tem a
certeza que é (ou não) uma
verdadeira urgência no hospital. As
autoridades têm estatísticas das
falsas urgências, mas nunca
números referentes às verdadeiras
urgências que Æcaram por tratar.
Não vemos as autoridades sensíveis
a essa possibilidade, simplesmente
porque não entram nos números do
seu insucesso. Os cangalheiros
agradecem.
José Pombal, Vila Nova de Gaia
Inoperância e descuido
do Ocidente e dos EUA
AÆrma José Milhazes, no seu
excelente livro A mais Breve História
da Rússia que, após o atentado do 11
de Setembro de 2001, o chefe da
diplomacia russa, Igor Ivanov,
andou numa roda-viva pela Europa,
tentando aproveitar-se do
dinamismo europeu para estimular
o desenvolvimento da Rússia. Ora,
desde 2001 que, ainda segundo
Milhazes, a UE recorreu cada vez
mais aos fornecimentos do gás
russo e via na Rússia um dos
principais mercados para o
escoamento dos seus produtos e
serviços. Com o decorrer do tempo,
em 2004, aderiram à UE nove
países, oito dos quais antigos
Estados do campo comunista. Putin
não gostou e via nas chamadas
“revoluções coloridas” — Geórgia,
Ucrânia e Moldova — formas de
retirar esses países da inÇuência
russa, como se estes não tivessem
legitimidade para construir o seu
caminho.
Em 2003, as tropas americanas
invadem o Iraque — o que foi um
erro — sob o falso pretexto, como
mais tarde se veio a veriÆcar, de que
Saddam Hussein possuía armas de
destruição maciça. Putin protestou
e a pretexto de defender os
interesses dos “cidadãos russos
residentes na Ossétia do Sul”, região
separatista da Geórgia, invadiu a
Geórgia. Quando aconteceu a
invasão russa, Milhazes é de opinião
que o Ocidente e os EUA deveriam
ter endurecido as represálias e dado
um forte sinal de que não tolerariam
mais invasões. Não deixo, por isso,
de corroborar esta opinião. Se tal
endurecimento se tivesse
veriÆcado, talvez Putin pensasse
duas vezes antes de invadir a
Crimeia e, agora, a Ucrânia. Putin
apercebeu-se da inoperância e do
descuido do Ocidente e dos EUA e
jogou a cartada. O Ocidente
civilizado e os EUA têm um grave
problema para resolver.
António Cândido Miguéis, Vila Real
E se o PS?...
E se o PS tivesse indicado outra
pessoa, que não António Costa,
para o cargo de primeiro-ministro?
Faria o Presidente da República o
mesmo discurso de “amarração”,
na tomada de posse do Governo?
Parece-me lícita esta pergunta, já
que todos sabemos que as eleições
legislativas são para eleger os
deputados que constituirão a
Assembleia da República e não para
a cheÆa do executivo. Todos
sabemos, mas todos fazemos de
conta que assim não é, inclusive o
Presidente que tem obrigações
constitucionais e não pode Ængir
que não sabe. O Presidente tem
obrigações, mas... o professor
Marcelo — alter ego do primeiro —
não tem, embora também devesse.
Fazendo-se de “sonso” e utilizando
aquelas metáforas ínvias, de rua,
perante os microfones dos media,
até se mimetiza em povo, como se
fosse este que faz avisos a Costa em
tomada de posse. É também destes
“nadas” (?) que se faz o quotidiano
da política, [e] ainda o pensamen-
to político e cidadão de todos nós.
Fernando Cardoso Rodrigues, Porto
Aplausos para
o provedor
Aplaudo o artigo do provedor do
PÚBLICO de sexta-feira, no que diz
respeito ao uso e abuso de palavras
em inglês. Embora seja uma língua
falada mundialmente, exagera-se cá
no burgo, porque parece “bem”. No
próprio PÚBLICO por vezes
escrevem uma frase em inglês,
seguida da tradução para
português. Qual a razão? Outra
palavra que está enraizada nos
miúdos e graúdos é o malfadado
OK. No concurso Joker na RTP1,
bem apresentado por Vasco
Palmeirim, com o senão do empre-
go exagerado do OK, a propósito e a
despropósito. É certo que não é por
este reparo que Portugal Æca
melhor em vários aspectos mais
importantes, mas ao menos
preservemos a nossa língua pátria.
Carlos Leal, Lisboa

As cartas destinadas a esta secção têm de ser enviadas em exclusivo para o PÚBLICO e não devem exceder as 150 palavras (1000 caracteres). Devem indicar o nome, morada e contacto
85561

telefónico do autor. Por razões de espaço e clareza, o PÚBLICO reserva-se o direito de seleccionar e editar os textos e não prestará informação postal sobre eles cartasdirector@publico.pt
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ESCRITO NA PEDRA As palavras comidas
Não se deve jul-
gar os homens Ainda ontem
pelas suas opini-
ões, mas por
aquilo que essas
opiniões fazem
N
deles Georg Miguel Esteves Cardoso
Lichtenberg, o fosso entre aquilo que os
portugueses dizem e aquilo
físico que se escreve, encontra-se
muita coisa interessante:
toda uma arqueologia de
atitudes e de pendores que
O NÚMERO um dia ainda será mais difícil de descobrir
99%
do que é hoje.
Por cima dessas camadas espessas e
compactadas, onde se esconde o que
realmente dizemos e a maneira como
realmente falamos uns com os outros,
quando não está ninguém a ouvir (ou a
gravar), haverá um campo carnivalesco de
detritos plásticos e restos de conversas: o
lixo das redes, preservado para sempre.
Cerca de 99% da população Vejam-se os restaurantes e a maneira
do planeta respira ar com níveis como se escreve acerca deles: haverá
de poluição que excedem os alguma ligação à maneira como falamos
limites considerados aceitáveis, dos sítios onde se come?
diz a OMS Dou um exemplo. De longe, o
ZOOM JOVENS TARTARUGAS TENTAM CHEGAR AO MAR NUMA PRAIA DO CONGO
Christian Ndombe, guarda de um parque, solta na costa tartarugas ameaçadas de extinção. Ovos foram incubados
durante oito semanas num centro de incubação em Muanda, República Democrática do Congo
comentário mais frequente quando
alguém se pronuncia sobre a qualidade de
um restaurante é “come-se”. Alguma vez
leu “come-se” num comentário sobre um
restaurante? Pois, eu também não.
“Come-se” não é apenas comestível: é
bastante melhor do que isso. “Come-se” é
um bocadinho acima de “só comi porque
estava com fome”. Mas é abaixo de “não é
nada mau”.
“Come-se” é pior ou melhor do que
“deixa-se comer”? É preciso fazer o
desconto do suplemento irónico que
muitas vezes se associa ao “deixa-se
comer”. Em casos extremos “deixa-se
comer” pode ser o maior dos elogios.
Se eu fosse fazer um guia de
restaurantes bastar-me-iam seis
classiÆcações. Quatro são fáceis: o
come-se bem e o come-se muito bem de
um lado e o come-se mal e come-se muito
mal do outro.
Mas é no meio que está a riqueza
interpretativa: é o “come-se” sem mais
nada e o “come-se benzinho”.
O “benzinho” não é tão bom como
“bem” porque comer bem é do melhor
que pode haver.
No Norte, por exemplo, nem sequer se
reconhece o comer “muito bem”, sendo
considerado uma afectação sulista.
JUSTIN MAKANGARA/EPA
Público • Terça-feira, 5 de Abril de 2022 • 13
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14 • Público • Terça-feira, 5 de Abril de 2022
Espaço público
A justiça no programa do Governo: pouca parra e pouca uva
A
André Lamas Leite
quase total repetição do
programa do Governo para a
justiça entre o anterior e o actual
executivos signiÆca falta de
arrojo e não augura grandes
reformas no sector. As medidas
concretas não se medem aos palmos, mas o
espaço destinado à justiça representa 5,1% do
total do programa (cerca de nove páginas) e
não conÆgura nenhum dos desaÆos
estratégicos também repetidos. No meio de
aÆrmações programáticas, encontram-se
algumas medidas concretas. Após os chavões
da eÆciência, celeridade e simpliÆcação,
Æcamos a saber que, na justiça, as verbas da
“bazuca” vão, no essencial, para a
modernização, digitalização e interligação
entre serviços, o que é curto.
A jurisdição administrativa e fiscal, de longe
aquela que conta com maiores pendências,
fica-se pelo diagnóstico, desconhecendo-se a
terapêutica, pois aproveitar sinergias é mais
conversa de team building. Excepto, talvez, o
há muito prometido corpo de assessores
especializados para os juízes, tão urgente
quanto aparentemente utópico. As perícias
“Isto é o futuro”?
P
Manuel Loff
arece que nem se reparou. O
ultradireitista Viktor Orbán
ganhou as quartas eleições
consecutivas. Há doze anos no
poder, Orbán transformou por via
constitucional o sistema político
húngaro, para dele fazer um caso
paradigmático de liberalismo autoritário
(liberal nas formas, autoritário no conteúdo),
derrotou uma coligação verdadeiramente
inacreditável de forças da oposição que vão
desde os socialistas aos neofascistas do Jobbik,
e que escolheu um candidato para disputar o
Governo a Orbán que é toda uma metáfora
dos tempos que vivemos: Péter Márki-Zay é
um neoliberal de formação americana,
contrário ao salário mínimo e a imposto sobre
fortunas; católico conservador que, só para
efeitos da campanha eleitoral, se
serão mais rápidas, com mais meios para a
medicina legal, perícias informáticas e
tecnológicas, em linha com o combate ao
cibercrime e mais vagas na PJ. Passaremos a
ter (supostamente já o tínhamos no anterior
programa) um solene contrato bienal entre
Estado e cidadãos, em que saberemos como
estamos em termos de morosidade, por tipo
de processos e tribunais, de 1.ª instância e
superiores, num saudável exercício de
accountability. A ideia é boa, mas duvido da
sua exequibilidade, e de nada adianta ter um
semáforo que se Æque por aí, sem propostas
concretas para transformar o encarnado em
verde.
O mesmo se diga quanto a uma base de
dados em que os cidadãos poderão conhecer
as tendências das decisões, sobretudo das
penas acessórias. Descontando o travo a
“colecção Primavera-Verão”, em parte, as
Estatísticas da Justiça já o fazem, o que parece
apontar para que se pretenda passar esta
mensagem: não vale a pena pedirem isso que
os tribunais não estão a dar. Se assim for, é um
inaceitável cerceamento do acesso ao direito
por via de uma chantagem estatística. Se esse
fosse o pensamento dominante, as decisões
dos tribunais cristalizavam. Querem juízes
mangas-de-alpaca, é isso?
Outra curiosa ideia consiste em eliminar
“procedimentos e práticas que não resultem da
lei”: se vivemos num Estado de direito, cabe
aos magistrados impedir que tal aconteça,
sancionando-os com os instrumentos
existentes. Não vejo como tal seja uma
competência executiva, a não ser na proposta
comprometeu a deixar de opor-se ao divórcio
e ao aborto; e defensor da política de Orbán
de bloqueio à entrada de refugiados não
europeus. O ter apoiado, contra a posição do
Governo, o envolvimento húngaro na ajuda
militar à Ucrânia contra a Rússia parece ter-lhe
custado tantos votos que permitiu a Orbán
aparecer como o homem que quer proteger a
Hungria da guerra e ganhar por uma margem
maior que a anterior. Se podem ser limpas e
justas eleições disputadas no contexto
autoritário que é o húngaro, essa é outra
história; as dúvidas sobre a democraticidade
da Hungria levantam-se num contexto de
generalizada erosão democrática que tem as
suas componentes centrais no securitarismo
de Estado, na intimidação das minorias
étnicas e políticas, na hipervigilância feita
sistema, a que agora se soma uma nova
corrida ao armamento.
Normalizada, integrada, assumida. A
presença generalizada da extrema-direita por
toda a Europa faz de Orbán, juntamente com
o governo da extrema-direita católica polaca,
mais um caso de sucesso do que de exceção.
De norte a sul do continente, partidos da
extrema-direita povoam os corredores do
poder político e/ou as suas agendas e as suas
propostas são adotadas com mais ou menos
de eventual incremento do número e âmbito
desses instrumentos. Se se fazem coisas que a
lei não permite ou deseja, em última instância,
depois dos magistrados, deverão ser os
respectivos conselhos superiores a actuarem.
Parece que é desta que vamos apostar a
sério em mecanismos de resolução alternativa
de litígios, aumentando o número e as
competências dos julgados de paz, que
podem ser especializados em certas matérias,
ao que parece, regulação das
responsabilidades parentais, condomínio e
relações de vizinhança. Tirando as duas
últimas, que já existem e terão resultado de
desatenção, tenho muitas dúvidas de que a
primeira matéria se adeqúe ao processo junto
destes paratribunais, mas não custa lançar
experiências-piloto devidamente avaliadas e
publicitadas. Acresce que se quer reforçar a
mediação — sobretudo familiar e laboral.
Importante seria ressuscitar a mediação
penal que, qual zombie, está prevista desde
2007, mas não se aplica. Em termos de factores
jurídicos, tal exige, entre outros, alterar o
Uma vez mais
se conÄrma que
o sector da justiça só
no discurso é prioritário
adaptações por governos que se dizem
democráticos depois de encenarem a rejeição
do racismo, da xenofobia e do autoritarismo.
Ao contrário do que se tem escrito, a grande
maioria da extrema-direita (a começar pela
própria ucraniana) tem-se assumido como
anti-Putin e, coerentemente com o seu
discurso nacional-historicista, descreve a
Rússia como o inimigo ancestral daquilo a que
agora se voltou a chamar a civilização europeia
— precisamente a mesma que outras
extremas-direitas acham ter na Rússia de
Putin um dos seus defensores. No poder (da
Polónia, da Letónia, da Eslováquia), ela pode
posicionar-se a favor de tudo quanto possa
arrastar a NATO para uma guerra com a
Rússia, ou, pelo contrário, como no caso da
Hungria, manter com o governo russo uma
relação semelhante àquela que se tem
descrito haver (ou ter havido) entre a
extrema-direita francesa, italiana ou austríaca.
Não é, portanto, a posição perante Putin que
deÆne a extrema-direita, da mesma forma que
tomar partido nesta guerra, como bem se
percebe, não distingue quem é democrata de
quem não o é. O que a guerra tem propiciado
é uma normalização das extremas-direitas do
centro-leste da Europa, a começar pela polaca
e pela ucraniana, descritas agora como
paradigma, ligando-a à suspensão provisória
do processo e não à desistência de queixa,
bem como melhorar o acompanhamento do
cumprimento do acordo de mediação, que
não deve Æcar, na prática, nas mãos da vítima,
mas do MP. Mas também os factores
extrajurídicos: verdadeiro incentivo aos
procuradores para remeterem os processos
para mediação, o que se consegue por via da
hierarquia e da valorização do seu uso em
sede de inspecção destes magistrados, sob
pena de continuarmos no sistema em que um
processo em mediação é mais um pendente, o
que estraga as estatísticas. Sensibilização
também junto dos advogados, explicando-lhes
que não implica forçosamente perderem
honorários, e na população em geral, que nem
faz ideia de que este mecanismo existe.
Aumentar o leque de penas de substituição
num país que já é dos mais generosos
corresponde à linha que vem sendo seguida
de esvaziar administrativamente as prisões,
quantas vezes à custa da efectividade prática
sancionatória, em concessão excessiva do
direito à economia (embora se prometa mais
verbas para os estabelecimentos prisionais).
Algo de similar quanto ao projectado
aumento dos crimes que admitem desistência
de queixa: depende de quais e do bem
jurídico protegido. Em resumo: para já, pouca
parra e pouca uva, em especial num sector
que, conÆrma-se, só no discurso é prioritário.
Professor da Faculdade de Direito
da Universidade do Porto.
Escreve à terça-feira
“aliados Æéis” do Ocidente na luta contra a
Rússia. (Pensando bem, é exatamente o que
elas diziam de si próprias quando por toda a
região se aliaram a Hitler em 1941.) Outra das
lições destes anos de autoritarismo húngaro e
polaco — hoje com atitudes diferentes perante
a guerra na Ucrânia, mas que permanecem os
aliados de sempre nas suas políticas racistas —
é que nenhum deles pretende deixar a UE: o
que eles querem, como sublinha Steven Forti
(Extrema-derecha 2.0, 2021), é “mudá-la mas
não destruí-la”. Toda a extrema-direita do
Leste da Europa (a começar por Orbán) é
partidária da adesão quer à NATO, quer à UE,
e aquela que na Europa ocidental pôs em
causa não a primeira, mas a segunda, deixou
de o fazer a partir de 2017-18. Podem húngaros
e polacos enfrentar, com muita calma, de
resto, a ameaça de sanções de Bruxelas (de
que não mais se ouviu falar), mas nenhum dos
dois governos pretende abandonar a UE. Pelo
contrário, o que demonstra a reação ocidental
à guerra é que eles têm ganho um signiÆcativo
espaço de manobra. Como disse Orbán no
domingo, “o que estamos a dizer à Europa é
que isto não é o passado — isto é o futuro.”
Historiador. Escreve quinzenalmente
à terça-feira
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A Cultura, 2022-2026
A
Jorge Barreto Xavier
Cultura emprega, de acordos
com dados do INE de 2019,
mais de 130 mil portugueses,
existindo 62 mil empresas
neste domínio, com um
volume total de negócios de 6,5
mil milhões de euros, com um peso total de
2%, sendo que o seu valor acrescentado
bruto (VAB) corresponde a 2,4%, ambos em
relação ao total da economia. Os museus e
monumentos receberam, nesse ano, cerca
de 20 milhões de visitantes, dos quais, mais
de 50% eram estrangeiros. Dezassete
milhões de pessoas assistiram a eventos na
área das artes do espetáculo e 15,5 milhões
de pessoas foram ao cinema. O conjunto dos
municípios portugueses dedicou 510 milhões
de euros a este domínio. Por causa da
situação pandémica, 2020, 2021 e 2022 são
anos em que o domínio da Cultura foi
fortemente afetado, tendo o Estado
português, ao contrário de diversos Estados
europeus, reagido lenta e timidamente às
necessidades do sector, com danos
relevantes na área produtiva e no emprego.
A governação socialista dos últimos seis
anos pouco fez pela Cultura, como é
reconhecido pelo meio cultural. Os protestos
públicos do meio artístico sucederam-se com
manifestações que nem nos tempos difíceis
da troika aconteceram. Diversos museus
fecharam espaços por falta de pessoal. As
críticas do meio do cinema foram evidentes.
O investimento em reabilitação de
património cultural foi inexplicavelmente
baixo. O prometido aumento em
percentagem de Orçamento do Estado não
chegou a acontecer.
A visão socialista das políticas culturais é
de centralização do poder do Estado e de
dependência das benesses dos subsídios,
tantas vezes ancorada em simpatias e
aÆnidades.
Isto tem de mudar. Mudar de ponto de
vista é um ato eminentemente cultural. A
cultura corresponde ao modo como nos
vemos e como nos vêem. Às formas de
pensar e de sentir. A cultura está presente
em todas as decisões políticas, económicas e
sociais, pois estas são tomadas em função de
dada visão das pessoas e do mundo.
A Cultura não pode ser vista como uma
coutada do Estado. Têm de ser tomadas
medidas que garantam a libertação do setor
cultural do jugo que o modelo existente de
políticas públicas acarreta.
Agora, que vamos ter mais quatro anos de
governação socialista, apresento algumas
propostas sobre o que importa fazer:
— políticas públicas de cultura a nível
nacional conjugadas com os níveis regional e
local, criando, para o efeito, os adequados
instrumentos colaborativos;
— políticas do Estado promovidas com o
contributo das entidades empresariais e da
sociedade civil;
— interação das áreas departamentais
tradicionais que estruturam governos e
administração pública, para novos modelos
de governança;
— criação de incentivos Æscais,
autonomização de estruturas públicas
(direções gerais passam a institutos) e de
contratualização com privados.
Articulações das diferentes dimensões
geográÄcas
O planeamento, programação, execução,
monitorização e avaliação das políticas
públicas de cultura beneÆciará de um
aprofundamento das relações de trabalho
entre órgãos políticos nacionais, regionais e
locais e respetivos organismos da
administração pública. Para este, podem ser
criados instrumentos físicos e digitais de
dinâmica colaborativa.
Estado, empresas e sociedade civil
O Estado não tem de fazer tudo, não deve
fazer tudo. Garantir estímulos e gerar
conÆança para que empresas e sociedade
civil desenvolvam programas e atividades
conducentes a melhorar a produção e oferta
de bens culturais, assim como a sua
distribuição e fruição, não só é possível como
desejável. A desconcentração e a
descentralização de poder, dentro do
Estado, mas também na relação com as
empresas e a sociedade civil podem levar a
ganhos em termos de aumento das
condições de oferta cultural, criação de
emprego e geração de riqueza, de
qualiÆcação dos bens acessíveis aos cidadãos
e de aumento da sua quantidade.
Nova organização de competências
públicas
A organização tradicional de governos e
administração pública — por ministérios
temáticos e respetivas hierarquias
administrativas — está obsoleta, mas é esse
modelo, de forma conservadora, que este
Governo adotou. É evidente a
transversalidade das competências em
termos da cultura, que, efetivamente, não
estão adstritas, exclusivamente, a um
ministério da tutela. VeriÆca-se que as áreas
da Educação, dos Negócios Estrangeiros, da
Defesa, do Ambiente, do Turismo, do
Desporto, da Juventude, só para nomear
algumas, têm cruzamentos evidentes com o
domínio da Cultura. Assim, o exercício
governativo nesta área deve obedecer a uma
A visão socialista das
políticas culturais é de
centralização do poder
do Estado e de benesses
dos subsídios, tantas
vezes ancorada em
simpatias e aÄnidades.
Isto tem de mudar
PAULO PIMENTA
Público • Terça-feira, 5 de Abril de 2022 • 15
geometria variável: por um lado, a existência
de um Ministério da Cultura; por outro, a
existência de uma reunião intersectorial
regular tendo as políticas culturais, a exercer
de forma integrada, como agenda.
Incentivos Äscais, autonomização
de estruturas públicas e contratualização
com privados
Os incentivos Æscais existentes à atividade
cultural não são suÆcientes. A um modelo
baseado na subsidiação direta pelo Estado à
sociedade civil, deve suceder um modelo
misto, com obrigações por parte do Estado
mas com a geração de incentivos para a
presença cada vez mais ativa da sociedade
civil. Empresas, fundações, associações,
podem ter papéis muito mais relevantes do
que aqueles que têm hoje na geração,
estímulo e gestão da atividade cultural.
Assim, torna-se necessário reformar a lei do
mecenato cultural; gerar mais e melhores
incentivos para a produção cinematográÆca
e audiovisual internacional em Portugal;
promover os incentivos Æscais para a
qualiÆcação e oferta patrimonial, assim
como para a criação artística.
O modelo de direções gerais nem sempre é
o mais adequado para a gestão de interesses
públicos na área da Cultura. A criação de
modelos de maior autonomia administrativa
e Ænanceira para a área do património
cultural e das artes é desejável.
Correlativamente, devem aumentar os graus
de responsabilização e de gestão por
objetivos.
Nem sempre o Estado é o melhor a
administrar interesses que são públicos.
Contratualizar com privados domínios
especíÆcos de intervenção pública — de que
o estímulo ao desenvolvimento do design e
das indústrias criativas é exemplo — é
desejável. Contratos plurianuais com
rigorosa monitorização e avaliação podem
gerar melhores resultados e poupança de
recursos.
A Cultura é um bem essencial para uma
sociedade mais democrática, pelo
empoderamento da cidadania e qualiÆcação
dos Portugueses. Este é um contributo
crítico, acelerador das necessidades de
renovação no nosso modelo de
desenvolvimento. Portugal tem, nos últimos
anos, vindo, progressivamente, a perder
terreno em termos comparativos com a
maior parte dos países europeus, na
capacidade de gerar riqueza para os seus
cidadãos. Também a qualidade da
participação democrática tem diminuído.
Primeiro a pandemia e agora a situação de
guerra na Europa não podem servir de
desculpa para a inação. Antes pelo contrário,
é nestes momentos que a ação tem de ser
efetiva.
Precisamos de mais e melhor. Não de loas
na comunicação social e gestos gentis entre
companheiros de partido. Que este Governo
consiga uma intervenção neste setor
competente, criativa, independente e
orientada para resultados é o que se deseja.
Ex-secretário de Estado da Cultura;
professor universitário
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16 • Público • Terça-feira, 5 de Abril de 2022

Política PS e PSD monopolizam nomeações para manter “cerca” ao Chega

Bloco central
vai estender-se
ao Conselho
de Estado
Para evitar dar lugares ao Chega, PS e PSD
também não darão à IL. AR tem de eleger
85 representantes para entidades externas
Maria Lopes
A praxe parlamentar de ceder alguns
lugares institucionais ao terceiro e ao
quarto maiores partidos, como acon-
teceu durante anos com o PCP e o
Bloco, não irá ser aplicada nesta
legislatura. Isso Æcou bem patente na
distribuição dos membros da mesa
do Parlamento, em que PS e PSD par-
tilham entre si todos os 11 lugares
possíveis — os outros dois são os car-
gos de vice-presidentes do Chega e
Iniciativa Liberal que Æcaram por
eleger —, e o próximo caso deverá ser
o da eleição dos cinco representan-
tes da Assembleia da República (AR)
no Conselho de Estado.
Dentro das bancadas do PS e do
PSD, o sentimento é igual: passam a
ser cumpridas as regras à risca, sem
quaisquer “amiguismos”. Os sociais-
democratas não têm cargos para dis-
tribuir e o seu parceiro natural à direi-
ta deixou o Parlamento; do lado dos
socialistas, com uma maioria absolu-
ta, não precisam de fazer cedências
aos partidos da esquerda e antigos
parceiros da “geringonça”.
A par do Conselho de Estado, há
minação étnica na forma de assédio
por causa de uma publicação no
Facebook contra uma família cigana,
e que o líder do Chega recusou pagar
por “não reconhecer qualquer auto-
ridade” à comissão para limitar a sua
liberdade de expressão, tendo recor-
rido para o Tribunal Judicial de Lis-
boa. Que acabou por o absolver,
dando-lhe razão no argumento de
liberdade de opinião.
No caso do Conselho de Estado,
os socialistas tinham um acordo de
cavalheiros com o Bloco e o PCP des-
de 2015 para uma lista conjunta para
gerir os três lugares que lhe cabiam,
mas o líder parlamentar Pedro Filipe
Soares admite que este ano “não
houve qualquer contacto neste con-
texto”.
O PS e o PSD deverão indicar entre
si a totalidade dos membros e, pela
aplicação do princípio da represen- O Conselho de Estado é o órgão político de consulta do Presidente da República e é presidido pelo próprio che
tação parlamentar, são três lugares
para os socialistas e dois para os As restantes eleições só precisam
sociais-democratas. No PS, é ponto Composição do de maioria simples, como Conselho PS e PSD deverão
assente que o presidente, Carlos Superior do Ministério Público (oito indicar todos
César, se mantém, faltando saber os Conselho de Estado elementos), o Conselho Superior de
os membros
outros dois nomes (Ferro Rodrigues Segurança do Ciberespaço (dois
era membro por inerência do cargo deputados), Comissão de Acesso aos do Conselho

cerca de 80 nomes (entre deputados
e cidadãos de reconhecido mérito
fora da AR) para indicar, nos próxi-
mos meses, para entidades externas
ao Parlamento, que vão ser partilha-
dos quase exclusivamente pelos dois
maiores partidos: as únicas excep-
ções deverão ser quatro entidades
para as quais as respectivas leis pre-
vêem que cada grupo parlamentar
deva indicar um representante.
Isso fará com que o Chega e a IL
passem a ter representantes na
Comissão Nacional de Eleições
(CNE), no Conselho dos Julgados de
Paz, no Mecanismo Nacional de
Monitorização da Implementação da
Convenção sobre os Direitos das Pes-
soas com DeÆciência (Me-CDPD).
E também na Comissão para a
Igualdade e Contra a Discriminação
Racial: a mesma que condenou
André Ventura, em 2020, a uma mul-
ta de cerca de 3700 euros por discri-
de presidente do Parlamento e é dos
nomes mais falados para continuar
por eleição). Pelo PSD, estão Rui Rio
e Francisco Pinto Balsemão.
Trinta entidades externas
Há uma lista de 15 entidades exter-
nas ao Parlamento para as quais este
tem de indicar representantes a cada
nova legislatura e, dentro dela, um
conjunto de eleições que se mostram
sempre mais difíceis porque neces-
sitam da aprovação de dois terços
dos deputados — e em que o bloco
central tem mesmo que funcionar.
Neste caso estão o presidente do
Conselho Económico e Social (CES),
o Conselho Superior da Magistratura
(sete vogais e três suplentes), os con-
selhos superiores de Defesa Nacional
(dois deputados), de Informações
(dois deputados e dois suplentes), e
de Segurança Interna (dois deputa-
dos).
T
êm assento no órgão
político de consulta do
Presidente da República o
próprio chefe de Estado, o
presidente da Assembleia da
República, o primeiro-ministro,
o presidente do Tribunal
Constitucional, o provedor de
Justiça, os presidentes dos
governos regionais, os antigos
presidentes da República
(eleitos na vigência da
Constituição e que não tenham
sido destituídos), cinco
cidadãos designados pelo
Presidente da República para
um período correspondente à
duração do seu mandato e
cinco cidadãos eleitos pela AR
em harmonia com o princípio
da representação proporcional
e pelo período correspondente
à duração da legislatura.
Documentos Administrativos (um do
PS e outro PSD). E há também as
designações, sem necessidade de
votação, para a Comissão de Fiscali-
zação dos Centros Educativos (dois);
para o Conselho Geral (quatro ele-
mentos) e para o Conselho Pedagó-
gico (dois) do Centro de Estudos
Judiciários.
Depois, há ainda outras 15 entida-
des com mandatos que não estão
ligados a uma nova legislatura —
como são os casos dos juízes do Tri-
bunal Constitucional, do provedor
de Justiça ou alguns conselhos nacio-
nais ou de Æscalização — e para as
quais é igualmente necessário, perio-
dicamente, eleger representantes.
Como é o caso de algumas cujos
mandatos já terminaram e precisam
de eleições: os conselhos de Æscali-
zação do Sistema de Informações da
República (as secretas), com três ele-
mentos, da Base de Dados de PerÆs
de Estado, três
socialistas e dois
sociais-democratas
de ADN (três), e do Sistema Integra-
do de Informação Criminal (onde é
preciso substituir Isabel Oneto, que
assumiu lugar no Governo). E ainda
no Conselho Nacional de Educação
(eleger o presidente e cada grupo
parlamentar indica dois membros,
um efectivo e outro suplente).
Em Outubro, será preciso eleger a
nova Comissão Nacional de Protec-
ção de Dados (três elementos, um
deles o presidente) e ainda renovar
toda a Entidade Reguladora para a
Comunicação Social. Para novos juí-
zes do Tribunal Constitucional, só
deverá haver eleições em 2024 e
para a Provedoria de Justiça em
2025.
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Público • Terça-feira, 5 de Abril de 2022 • 17

Política

Ribau Esteves fora da corrida

RODRIGO ANTUNES/LUSA

à liderança do PSD
Carolina Amado
O presidente da Câmara
de Aveiro anunciou ontem
que não é candidato à
liderança do PSD e deixou
críticas a Luís Montenegro
José Ribau Esteves não será candida-
to à liderança do PSD nas eleições
directas do Partido Social Democrata,
a 28 de Maio. “Quero agradecer a
todos os que manifestaram o seu
apoio, mas a verdade é que é preciso
mais tempo e mais trabalho para ter-
mos uma alternativa forte dentro do
PSD”, aÆrmou ontem o presidente da
Câmara Municipal de Aveiro em con-
ferência de imprensa.
O antigo secretário-geral do partido
assumiu, a 11 de Fevereiro, estar a
ponderar uma candidatura, mas,
após avaliar a “situação política do
PSD” e “auscultar os militantes”,
Ribau Esteves disse agora não ter con-
seguido estruturar uma equipa nacio-
nal “de combate” para vencer as elei-
ções. “Não me interessam disputas
para marcar posição ou aparecer nas
notícias”, esclareceu, assumindo que
“era preciso mais tempo” para pre-
parar uma candidatura vencedora.
Na perspectiva do autarca, o par-
tido precisa de uma “reforma pro-
funda na sua organização, estrutura
territorial, na sua imagem e mensa-
gem política”, para que se assuma
“verdadeiramente como partido
popular social-democrata”.
O autarca criticou a bancada par-
lamentar social-democrata e tam-
bém o funcionamento interno do
partido, considerando que “o conse-
O autarca de
Aveiro considera
não estarem
reunidas
as condições
necessárias para
uma candidatura
lho nacional e as estruturas distritais
do PSD estão hoje tomados pelo
medo de perder, estão sem capaci-
dade de arriscar por um futuro dife-
rente e estão tolhidos por compro-
missos cruzados e assumidos nas
últimas disputas”.
Ribau Esteves deixou, ainda, críti-
cas ao (por enquanto) único candi-
dato à liderança do partido: Luís
Montenegro. Um rosto do “passado”,
“em campanha há seis anos” para
liderar o PSD, numa luta “sôfrega e
lamentável por condicionar o futuro
do PSD”. “Por essa via, não vamos lá.
Feita a ponderação, decidi não ser
candidato à liderança”, concluiu.
As eleições directas para escolher
o sucessor de Rui Rio são a 28 de
Maio. Para já, há um candidato: Luís
Montenegro. Já o ex-ministro Jorge
Moreira da Silva anunciou que no
próximo dia 14 de Abril irá revelar a
sua decisão quanto a uma eventual
candidatura à presidência social-de-
mocrata.

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efe de Estado

Em termos práticos, o Chega e a IL Foi uma “má jogada”, diz o inves-

não vão ter lugar em nenhuma des-
tas entidades tão cedo, como se per-
cebeu na passada semana no Parla-
mento no chumbo dos seus candida-
tos a vice-presidentes da AR.
O “erguer da cerca” sanitária
Os liberais — que não querem comen-
tar o assunto — são tendencialmente
mais vítimas dos sociais-democratas;
e o Chega como alvo da larga maioria
dos partidos.
O politólogo Riccardo Marchi, que
se dedica ao estudo do radicalismo
de direita, aÆrma que este caso foi o
“erguer da cerca” prometida ao Che-
ga logo na noite eleitoral. O investi-
gador do Instituto Universitário de
Lisboa considera que os dois parti-
dos actuaram mal ao “desvaloriza-
rem” o chumbo dos seus nomes.
A IL porque jogou “a cartada mais
alta que tinha, o seu presidente”, e
depois desistiu; e o Chega por não
insistir na repetição da eleição até
esgotar todo o grupo parlamentar e
pela “incapacidade ou má estratégia
de comunicação” ao recorrer à argu-
mentação da questão racial.
tigador que monitoriza as redes
sociais do partido de Ventura e que
tem dados que indicam que “a ques-
tão racial não pega no eleitorado do
Chega”. A vitimização “não funcio-
na: um partido de combate, de luta
e contestação ao sistema não pode
choramingar porque os seus candi-
datos foram chumbados”.
A possibilidade de haver apenas
uma repetição foi combinada na con-
ferência de líderes, mas Marchi
defende que o Chega devia ter con-
tinuado a exigir nova eleição e, “se
Qual o valor de um sonho?
fossem chumbados os 12 deputados,
então o Parlamento estava a chum-
bar o partido, e não esta ou aquela
Ajude-nos a tornar realidade
pessoa, e este poderia recorrer ao
Tribunal Constitucional para denun-
os sonhos de mais de 420 crianças
ciar a inconstitucionalidade do com- e jovens em Portugal.
portamento da AR”.
A “cartada” seria “levar o sistema
institucional a cometer ilegalidades Doe 0,5% do seu IRS, sem qualquer custo para si!
para manter um partido fora” dos
lugares que a lei lhe reserva e depois
“denunciar esses embustes de
poder”. “O partido anti-sistema
encostava o sistema e todo o Parla-
NIF 500 846 812 NO QUADRO 11
mento à parede.”
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Os conteúdos disponibilizados ao Utilizador assinante não poderão ser copiados, alterados ou distribuídos salvo com autorização expressa do Público – Comunicação Social, S.A.
18 • Público • Terça-feira, 5 de Abril de 2022
Sociedade Aumentos médios podem chegar em alguns casos aos 50%
Portugueses vão pagar mais pela água
com o Ɗm das tarifas abaixo de custo
País precisa de investir 6,6 mil milhões na melhoria e manutenção da infra-estrutura nesta década, segundo
o plano estratégico. Terá de aplicar o princípio do utilizador-pagador, com tarifas sociais para compensar
Abel Coentrão
Num inquérito realizado em 2018
pelo grupo Águas de Portugal, a esma-
gadora maioria dos inquiridos recu-
sava a ideia de que a tarifa da água
fosse a melhor arma para moderar o
consumo deste recurso, em Portugal.
Mas, num país em que muitos muni-
cípios ainda entregam água abaixo de
custo, a estratégia nacional para esta
década, no sector, avança para o Æm
desse cenário, o que pode levar a
aumentos médios de até 50% dos pre-
ços a cobrar pelo abastecimento de
um metro cúbico e pelo tratamento
do respectivo eÇuente. A aplicação
do princípio do utilizador-pagador,
acomodada, nos casos de necessida-
de, pela tarifa social, é “essencial”
para o equilíbrio de contas de um
serviço no qual vai ser preciso investir
idealmente, uns 6,6 mil milhões de
euros até 2030.
Portugal chegou a esta década com
bons indicadores em termos de
cobertura de água e uma evolução
positiva com espaço para melhoria,
no saneamento, mas mantém alguns
déÆces, como por exemplo na gestão,
cujo fenómeno mais visível é o das
perdas de água nas redes, que ainda
rondam, em média, os 30%, mas tam-
bém na aplicação de tarifários que
não cobrem os custos de serviço. Até
2030, as entidades responsáveis pelos
sistemas em alta, mas principalmen-
te os municípios, que exploram a
maioria dos sistemas em baixa, que
abastecem consumidores domésti-
cos, comerciais e industriais, vão ter
de investir no incremento dos indica-
dores de qualidade e na acessibilida-
de, mas terão de apostar, principal-
mente, na manutenção da rede e na
sua melhoria contínua.
O Plano Estratégico para o Abaste-
cimento de Água e Gestão de Águas
Residuais e Pluviais 2030 (Pensaarp
2030) estima vários cenários de inves-
timento, em diversas áreas, para
aumentar os patamares de qualidade
de serviço. Que, representando 30%
da água consumida no país (a agricul-
tura consome 70%), não deixa de
estar pressionado pelos desaÆos cli-
máticos que nos colocam numa rota
de aumento da escassez deste bem.
O país investiu 13,8 mil milhões de
euros nas últimas duas décadas, nos
sistemas de água e saneamento. E
nem sequer há dados sobre quanto
terá sido gasto, ainda, nos sistemas de
águas pluviais, aos quais, fruto da
Em Portugal, muitos municípios ainda entregam água para consumo doméstico abaixo de custo
Somos fãs da água... engarrafada
O
s autores deste plano
estratégico consideraram
também importante dar
conta de um
contra-senso. “Tendo o país
uma elevada qualidade da
água da rede pública (98,7 %
de cumprimento dos exigentes
padrões da legislação
europeia), os portugueses
consomem 14 vezes mais água
engarrafada (centenas de
vezes mais cara) do que se
consome na Suécia, oito vezes
mais do que na Finlândia, sete
vezes mais do que na
Dinamarca, cinco vezes mais
do que na Holanda e 3,5 vezes
mais do que no Reino Unido.” E
explicam que se o consumidor
português tivesse um padrão
de consumo similar ao dos
britânicos “haveria uma
poupança de cerca de 300
milhões de euros por ano, valor
que cobriria o défice tarifário no
sector”. Ou seja, beber mais
água da torneira, um gesto com
óbvios impactos na redução de
resíduos de plástico, não só sai
mais barato, como poderia
minimizar, parcialmente, as
necessidades anunciadas de
aumento da tarifa da própria
água da torneira. A.C.
DANIEL ROCHA
crise climática e da alteração do regi-
me de chuvas, vai ser preciso dar mais
atenção. Os valores podem parecer
elevados, mas a verdade é que deve-
riam ter sido ainda maiores, pois
segundo as avaliações realizadas ao
plano estratégico ainda em vigor,
houve um subinvestimento na manu-
tenção das redes.
Recuperar esse atraso e impedir
que as próximas gerações tenham de
pagar muito mais pelo mau planea-
mento dos decisores actuais implica-
rá seguir um cenário maximalista, e
“ideal”, previsto na estratégia e no
plano de acção que o acompanha,
que atira o investimento total desta
próxima década para cerca de 6,6 mil
milhões de euros. Calculados com
dados anteriores à pandemia, estes
valores até podem vir a revelar-se
conservadores, se o actual cenário de
aumento de custos com matérias-pri-
mas, mão-de-obra e taxas de juro
deixarem marcas persistentes na eco-
nomia nacional e global.
Para pagar esta despesa, e não
podendo contar com muito mais
apoios comunitários — que ainda
Ænanciarão alguns investimentos —,
vai ser preciso mexer na estrutura
tarifária, que é muito desequilibrada,
principalmente no abastecimento em
baixa, que chega ao consumidor Ænal.
Para cumprir o tal cenário “ideal” de
investimentos, a equipa que elaborou
o Pensaarp 2030 admite que os
aumentos, na entrega da água e no
tratamento dos esgotos, possam ron-
dar em média os 50%, passando de
um valor médio de 2,06 €/m3 (das
duas tarifas juntas), para 3,10 €/m3.
Os aumentos serão díspares e aca-
barão por ser mais sentidos pelos
portugueses que hoje obtêm o serviço
a um preço abaixo dos custos reais,
que nalguns casos podem ver a factu-
ra mensal dobrar, e menos por quem
viva em municípios onde a tarifa já
esteja ajustada à estrutura de custos
efectiva. Mesmo assim, insiste-se,
comparando com outros 15 países
europeus, essas tarifas colocam-nos
a par dos que cobram menos, em ter-
mos de PIB/per capita, pelo serviço.
“É um facto que o nível de desen-
volvimento económico do país há
muito que permite que a sustentabi-
lidade Ænanceira do sector possa ser
uma realidade, mas a percepção
enraizada na população e o receio
político dos decisores tem constituído
barreiras ao progresso, desviando o
país dos “imperativos estruturais” há
muito diagnosticados. Há ainda que
notar que o tarifário social continua-
rá a funcionar como mecanismo com-
plementar de protecção das famílias
economicamente mais desfavoreci-
das em termos de acessibilidade eco-
nómica”, lê-se no documento que
está em discussão pública e disponí-
vel para leitura e sugestões no Portal
Participa, até 12 de Maio.
Este aumento pode resolver outros
problemas. Em Portugal, as tarifas de
gestão de águas residuais são “sem-
pre inferiores (cerca de 85%) às de
abastecimento de água, o que contra-
ria a tendência nos países mais des-
envolvidos. Este facto deve merecer
uma reÇexão sobre a eventual insuÆ#
ciência de actual regulação ambiental
no país”, alerta-se na estratégia para
esta década. Na qual se preconiza que
os portugueses devem ser claramen-
te informados do custo efectivo de
cada parcela da “factura de serviços
ambientais” que, constata-se, muitas
vezes confundimos com uma mera
factura da água, o que não é o caso.
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O marketing “cria unidade”
ou “desintegra uma sociedade”?
Ãngela R. Pereira
Terceiro debate da edição
do PSuperior Talks
organizado pelo PÚBLICO
decorreu no ISEG, em
Lisboa
Com as eleições legislativas ainda
frescas e à luz das discussões sobre
o Orçamento do Estado para 2022,
questiona-se qual o papel do marke-
ting na política e a sua inÇuência na
forma como se percepciona (e cons-
trói) a realidade.
Ontem, na terceira conversa da
mais recente edição do PSuperior
Talks do PÚBLICO, que decorreu no
Instituto Superior de Economia e
Gestão da Universidade de Lisboa
(ISEG), analisou-se o peso desta fer-
ramenta numa era em que as pessoas
têm cada vez mais acesso à informa-
ção e como se deve aplicá-la.
Para debater esta ideia, numa ses-
são moderada por Marta Moitinho
Oliveira, editora de Política do PÚBLI-
CO, juntou-se um painel com diferen-
tes visões e áreas de especialização:
Rui Almeida, director de Insight &
Marketing Sciences da Mediabrands,
Sandra Maximiano, professora do
ISEG, e Joaquim Fidalgo, jornalista e
Juiz do Tribunal da Relação do Porto
absolvido de difamação de magistrada
Ana Henriques
Não ficou provada autoria
de insultos dirigidos a Paula
Sá no Facebook através da
conta do desembargador
Marcolino de Jesus
O juiz desembargador que dirige uma
das secções criminais do Tribunal da
Relação do Porto (TRP), Marcolino de
Jesus, foi absolvido na passada sexta-
feira da acusação de ter difamado
outra magistrada, fazendo insinua-
ções sobre a sua vida privada.
O caso faz parte de uma guerra sem
quartel que Marcolino de Jesus man-
tém há mais de uma década contra a
juíza de primeira instância Paula Sá,
que exerce no Minho, e que tem dado
origem a variadas acções judiciais um
contra o outro. O conÇito já alastrou
aos seus familiares mais próximos.
Numa peça processual de um des-
professor na Universidade do Minho.
Para complementar com uma pers-
pectiva mais jovem, o debate contou
ainda com a participação dos estu-
dantes do ISEG: Miguel Inverneiro,
da licenciatura em Economia, e João
Souto, do mestrado em Economia
Monetária e Financeira.
De uma forma geral, o painel con-
cordou que marketing empresarial
e político são duas realidades muito
semelhantes. Nesta óptica, Rui
Almeida aÆrmou que há dois parâ-
Instituto Superior de Economia e Gestão da UL foi o palco do debate
ses litígios, o desembargador sexage-
nário fez alusões à origem da gravidez
da sua arqui-inimiga e aos seus “ex-
maridos”, numa nota de rodapé que
inseriu no documento que entregou
em tribunal. Comportamento que
tentou justiÆcar com uma carta anó-
nima enviada para o Conselho Supe-
rior da Magistratura (CSM) no Verão
de 2013 e cuja autoria assaca a Paula
Sá e também a um irmão seu já fale-
cido e com quem mantinha igualmen-
te mau relacionamento.
Nessa missiva, além de ser acusado
de tráÆco de diamantes e de armas, o
magistrado era tratado por “gajo” —
expressão que garante que em Trás-
os-Montes, onde nasceu, signiÆca
“corno”. Foi para se defender deste
epíteto que contra-atacou a juíza, ale-
ga. AÆrmou também ter ouvido dizer
que foi a própria juíza a primeira a
falar da origem da sua gravidez no
Tribunal de Famalicão, desencadean-
do falatório entre funcionários, cole-
metros cruciais em consideração,
sendo estes o posicionamento, que
no caso da política tem que ver com
os programas eleitorais e os ideais
em causa, e a segmentação, ou o
grupo de pessoas a quem se quer
passar uma mensagem. Perante esta
perspectiva, os dois alunos do ISEG
salientaram a necessidade de traba-
lhar continuamente em estratégias
mais transparentes e conhecer o
público.
Sandra Maximiano disse que a
MATILDE FIESCHI
gas e advogados. Por outro lado, Pau-
la Sá foi apodada de mentirosa e
desonesta num fórum fechado de
juízes, através da conta de Facebook
de Marcolino de Jesus. E, se num pri-
meiro momento o magistrado assu-
miu a autoria deste comentário, mais
tarde mudou de ideias e passou a ale-
gar que foi a esposa que acedeu ao
seu portátil e escreveu em seu nome.
A mulher do juiz corroborou esta ver-
são dos factos, dizendo que foi mes-
mo ela a proferir os insultos.
A guerra entre os dois juízes
remonta a 2011, altura em que o hoje
dirigente do TRP era inspector judi-
cial e foi encarregado de averiguar
Guerra entre
magistrados
judiciais dura
há uma década
e tem resultado
em várias acções
judiciais
Público • Terça-feira, 5 de Abril de 2022 • 19
política e o marketing andam de
mãos dadas, explicando que a for-
ma como é “vendida” pode contri-
buir para “criar unidade” ou “des-
integrar uma sociedade”. Mas, para
Joaquim Fidalgo, se o marketing (e
em especial aplicado à política) con-
tribui para construir percepções, há
uma entidade que surge como con-
tracorrente: “O jornalismo, às vezes,
é uma ferramenta para a descons-
trução do marketing”, diz, argu-
mentando que este pode contribuir
para a alteração do tipo de estraté-
gias que se implementam. Referiu
que, apesar de as duas áreas incidi-
rem em matérias semelhantes, os
objectivos Ænais e procedimentos
são distintos. Assim, por vezes o
marketing corrige-se em função do
que está a acontecer “na bolha
mediática” e vice-versa.
No contexto da percepção pública,
questiona-se se o marketing é utili-
zado de forma a ocultar determina-
das ideias. Aproveitando a ideia tra-
zida pelo jornalista, Rui Almeida
explica que no marketing político se
“cristaliza uma determinada ideia”,
acabando por “bloquear a visibilida-
de sobre as perspectivas contrárias”,
mas isso não signiÆca que se escon-
dam as “partes más”. Texto editado
por Pedro Sales Dias
se Paula Sá tinha ou não chamado
mentiroso, numa conversa telefóni-
ca, a um colega responsável pela sua
avaliação proÆssional. Descobriu
que a magistrada tinha arrolado para
testemunhar a seu favor outro juiz
que não podia ter ouvido a dita con-
versa, pela simples razão de estar a
presidir a um julgamento à hora a
que o diálogo teve lugar. A magistra-
da de primeira instância acabou con-
denada pelo CSM, por violação do
dever de honestidade, mas o Tribu-
nal Europeu dos Direitos Humanos,
para o qual recorreu com sucesso
desta punição disciplinar, disse que
Paula Sá não tinha tido direito a um
julgamento justo e equitativo.
Na sexta-feira, o Supremo Tribunal
Justiça decidiu também que, sendo
impossível apurar se Marcolino de
Jesus ou a mulher tinham escrito o
comentário no Facebook, a única
solução possível era ilibar o desem-
bargador deste crime.
Sociedade
Cinquenta
queixas de
assédio em
Direito, Lisboa
Aberto canal de denúncias
que recebeu queixas
relativas a 10% dos docentes
da Faculdade de Direito da
Universidade de Lisboa
A Faculdade de Direito da Universi-
dade de Lisboa abriu um canal para
receber denúncias de assédio e dis-
criminação e em 11 dias recebeu 50
queixas, relativas a 10% dos professo-
res, noticiou ontem o Diário de Notí-
cias (DN). Sete dos 31 professores alvo
de queixa concentram mais de meta-
de dos relatos e a associação acadé-
mica fala num “sentimento de impu-
nidade” e de “clima de medo”.
Segundo o DN, o canal aberto pela
escola para a recepção de denúncias
recebeu 29 queixas de assédio moral
e 22 de assédio sexual. Houve igual-
mente denúncias de práticas discri-
minatórias de sexismo, xenofobia/
racismo e homofobia.
Este foi o resultado de 11 dias de
“canal aberto”, de 14 a 25 Março, na
Faculdade de Direito da Universida-
de de Lisboa (FDUL), para envio de
relatos de assédio ou más práticas
por parte do corpo docente. O rela-
tório desta experiência, criada por
iniciativa do Conselho Pedagógico,
conclui pela existência de “proble-
mas sérios e reiterados de assédio
sexual e moral perpetrados por
docentes da faculdade”. No total,
foram recebidas 70 denúncias, 50
das quais foram validadas como rele-
vantes. Dizem respeito a 31 docentes,
ou seja, cerca de 10% do total de pro-
fessores e assistentes da escola. Sete
deles concentram mais de metade
(30) das queixas e há um deles com
nove e dois com cinco.
“Os alvos de xenofobia/racismo
terão sido alunos brasileiros, negros
ou originários de países africanos de
língua oÆcial portuguesa” e, “no caso
do sexismo, todos os casos se referem
a discriminação de pessoas do género
feminino”, escreve o DN.
O presidente do conselho pedagó-
gico, António Barreto Menezes Cor-
deiro, diz ao jornal não ter conheci-
mento de nos vários mandatos ante-
riores do órgão terem sido
apresentados casos de assédio, pelo
menos com “contornos desta gravi-
dade”, acrescenta o jornal.
Contactada pelo jornal, a directora
da FDUL garantiu não ter ainda
conhecimento do relatório sobre
assédio e discriminação, que, segun-
do o DN, irá ser analisado hoje pelo
conselho pedagógico, sendo também
apresentado à direcção. Lusa
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20 • Público • Terça-feira, 5 de Abril de 2022
Sociedade
TdC condena dois reitores da Universidade
do Minho por infracções em ajustes directos
Samuel Silva
Em causa estão, entre
outros, negócios com uma
empresa de que era sócio
um outro elemento da
equipa da reitoria
A mesma obra dividida em dois con-
tratos para evitar concursos públi-
cos, ajustes directos irregulares ou
empreitadas adjudicadas por valo-
res superiores aos deÆnidos em
concurso. Foram estas práticas na
gestão da Universidade do Minho
(UM), entre 2014 e 2017, que vale-
ram condenações pelo Tribunal de
Contas (TdC) a três dos seus respon-
sáveis, incluindo o actual e o ante-
rior reitor. O caso mais grave envol-
ve negócios feitos com uma empre-
sa de que era sócio um outro
elemento da reitoria.
Na base deste processo está uma
investigação da Inspecção-Geral de
Educação, noticiada pelo PÚBLICO
no Ænal de 2017, que concluiu que o
ajuste directo era a regra nas con-
tratações da UM — no período ana-
lisado, a instituição fez 70% das
empreitadas de obras públicas e
aquisição de bens e serviços sem
concurso.
O Ministério Público (MP) enten-
deu que a matéria merecia interven-
ção do TdC, que, no início deste
ano, conÆrmou a condenação de
três responsáveis da universidade (o
anterior reitor, o actual reitor e o
antigo administrador). Essa decisão,
em resposta a um recurso dos visa-
dos, conÆrma, quase na íntegra,
uma primeira sentença de Agosto.
A UM não está directamente envol-
vida no caso. O processo incide indi-
vidualmente sobre os responsáveis
da instituição. Eram todos membros
do seu conselho de gestão.
O principal visado é António
Cunha, que foi reitor da UM entre
2009 e 2017 — e é presidente da
Comissão de Coordenação e Desen-
volvimento Regional do Norte desde
Outubro de 2020. Foi condenado
por quatro infracções Ænanceiras
por negligência e uma infracção “a
título de dolo”. Tem de pagar multas
que totalizam mais de 15 mil euros.
O segundo responsável que acu-
mulou mais infracções é o então
administrador da universidade —
que recentemente passou a desem-
penhar o cargo de pró-reitor —, José
Fernandes. Foi condenado por duas
infracções por negligência e uma
infracção dolosa. Tem de pagar mul-
tas no valor total de 10 mil euros.
O caso que valeu a condenação,
TERESA PACHECO MIRANDA
“a título de dolo”, a mais grave de
todas neste processo, a António
Cunha e José Fernandes envolve um
outro elemento da reitoria — que
não é directamente visado no pro-
A contratação cesso do TdC. Trata-se de Guilherme
Borges Pereira, pró-reitor na altura
reiterada ao e actualmente. Era então sócio, jun-
mesmo fornecedor tamente com a esposa, da empresa
OPT, que, segundo o MP, fez 13 con-
[era] utilizada na tratos com a universidade entre
UM desde 2008, 2014 e o início de 2017, totalizando
580 mil euros. Os contratos da
antes do início empresa do pró-reitor com a UM
das minhas funções representavam 91,53% do negócio
da sociedade comercial.
de reitor O negócio que valeu a condena-
António Cunha ção mais grave ao ex-reitor e ao ex-
Antigo reitor e actual presidente administrador envolve a aquisição
da CCDRN de sistemas de detecção de incêndio
JOÃO SILVA
A universidade (edifício da
reitoria na foto) não está
directamente envolvida no caso
à OPT, em 2016. Num espaço de 19
dias, a universidade adjudicou dois
contratos que tinham “por objecto
a aquisição de sistemas de seguran-
ça contra incêndios em edifícios,
que se complementam”, lê-se na
sentença. Os dois contratos tinham
o mesmo valor: 74.500 euros.
Segundo o TdC, a intenção foi evitar
abrir um concurso público. A UM
usou o mesmo procedimento na
aquisição de um sistema de contro-
lo de acessos às suas instalações.
Depois deste caso, em 2020, a UM
criou uma Unidade de Serviços de
Contratação Pública, com o objec-
tivo de “reforçar os mecanismos de
controlo dos procedimentos contra-
tuais”.
A “contratação reiterada ao mes-
mo fornecedor” era “utilizada na
UM desde 2008, antes do início das
minhas funções de reitor”, justiÆca
António Cunha. Quando assumiu
funções, a prática manteve-se. A
solução prática “nunca foi contes-
tada em sede de auditorias”, lem-
bra, por seu turno, o actual reitor,
Rui Vieira de Castro, condenado por
uma única infracção Ænanceira nes-
te processo.
Além disso, Cunha lembra que,
“durante o período em questão, a
UM viveu uma situação de emergên-
cia na Escola de Ciências”, em resul-
tado de um incêndio, que “obrigou
a uma resposta muito rápida, que
envolveu quatro das infracções con-
sideradas pelo TdC”, aÆrma. Esta
argumentação foi usada em sede de
julgamento, mas recusada pelo tri-
bunal, que não deu como provado
que a universidade tivesse de facto
considerado o fecho de instalações
na sequência do incidente.
Os responsáveis da universidade
recorreram da decisão para o Tribu-
nal Constitucional. Só depois de
transitado em julgado, é que podem
ser extraídas certidões de eventuais
ilícitos criminais na sequência deste
processo.
A UM é uma fundação pública de
direito privado desde Dezembro de
2015. No julgamento, os seus diri-
gentes invocaram a autonomia de
que gozam as instituições de ensino
superior e o regime fundacional a
que estão vinculados para contestar
as decisões do TdC. No entanto, o
tribunal considerou que “as receitas
das universidades-fundação pública
com regime de direito privado, mes-
mo quando próprias, são dinheiros
públicos” e que por isso “estão
sujeitas à jurisdição do TdC.
Novo acórdão
O TdC emitiu a primeira sentença
sobre este caso a 30 de Agosto, que
foi objecto de recurso pelos respon-
sáveis da universidade. Em Janeiro,
o Plenário do TdC emitiu novo acór-
dão, em que retira uma condenação
a cada um dos responsáveis, mas
mantém todas as outras decisões.
Entre os condenados, está tam-
bém o actual reitor da UM, Rui Viei-
ra de Castro, que era vice-reitor no
anterior mandato. Foi condenado
por uma infracção a título de negli-
gência, bem como a uma multa de
2550 euros. Em causa está a obra de
reformulação do Piso 3 da Bibliote-
ca Central do Campus de Gualtar
(Braga). Em Julho de 2016, a univer-
sidade lançou um concurso público
para esta obra, com um preço-base
de 196 mil euros. O concurso não
teve concorrentes e a instituição
acabou por entregar a empreitada
por ajuste directo, com convite a
uma única empresa, por 250 mil
euros, três meses volvidos.
Vieira de Castro defende-se dizen-
do que “as decisões tomadas foram-
no com base na convicção da lega-
lidade dos procedimentos adopta-
dos”. Nem a inspecção nem o
tribunal “discutem, sindicam ou
sugerem que o investimento efec-
tuado não fosse necessário e que os
recursos afectos não fossem os jus-
tiÆcados”, acrescenta.
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Estão a ser usados detectores de metais nos sítios arqueológicos Local
Nova onda de vandalismo do património
arqueológico varre o Alentejo
Grupos de indivíduos arrombaram uma das portas do castelo de Noudar em Barrancos munidos
de detectores de metais à procura de artefactos. Não se sabe o que levaram
Carlos Dias
No dia 18 de Março, um grupo de
indivíduos munidos de detectores
de metais arrombou uma porta do
Castelo de Noudar, entraram no seu
interior e Æzeram mais de meia cen-
tena de perfurações na busca de
artefactos metálicos que pudessem
estar ali enterrados.
Cláudia Costa, vereadora da
Câmara de Barrancos, conÆrmou ao
PÚBLICO a “intrusão das pessoas”
após a saída de uma arqueóloga e
uma técnica de restauro que estão
a fazer o levantamento arqueológico
num troço de muralhas em recupe-
ração. Terão permanecido no inte-
rior da fortaleza entre as 19h30 e as
8h do dia seguinte. Três dias depois,
o castelo voltou a ser “visitado”.
Desta vez “subiram pelos andaimes
que foram instalados para os traba-
lhos de recuperação da muralha” e
voltaram a perfurar o solo.
A autarca diz que o município
“não tem registo de alguma vez o
Castelo de Noudar ter sido sujeito a
actos de vandalismo como os que
foram observados nos dias 18 e 21 de
Março”. Como em outras situações
análogas, desconhece-se o que os
“detectoristas” subtraíram na
sequência das suas intervenções.
O que se sabe é que, além de não
se conhecer o que levaram, foi des-
truído o contexto arqueológico
onde estava inserido. O caso foi
comunicado à GNR e à Direcção
Regional de Cultura do Alentejo
(DRCAlentejo). A directora regional,
Ana Paula Amendoeira, disse ao
PÚBLICO que, ao tomar conheci-
mento do que ocorreu no Castelo de
Noudar, alertou “os destacamentos
territoriais da GNR do Alentejo”,
dadas as “competências” que esta
força policial dispõe em matéria de
Æscalização de “utilização indevida
de detectores de metais”.
Ao longo das últimas semanas,
grupos de indivíduos, alguns de
nacionalidade espanhola, conforme
referiram ao PÚBLICO vários
arqueólogos, “vandalizaram sítios
arqueológicos em Pias (Serpa), Beja
e Messejana (Aljustrel)”. Nesta loca-
lidade, daniÆcaram o local de enter-
ramento de um convento do século
XVI/XVII na busca de objectos que
pudessem estar nas ossadas huma-
nas, que Æcaram expostas.
Paula Amendoeira refere que a
frequência de atentados ao patrimó-
Um grupo de indivíduos esteve nio arqueológico justiÆcou a apre-
uma noite inteira dentro do sentação, há cerca de três anos, de
castelo de Noudar e fizeram uma proposta de alteração à Lei n.º
vários buracos 121/99 de 20 de Agosto, que regula
a utilização de detectores de metais.
A legislação em vigor encontra-se
“desactualizada em muitos aspec-
tos”, assinala Paula Amendoeira.
O seu articulado diz que “é proi-
bida a utilização de detectores de
metais na pesquisa de objectos e
De norte a sul artefactos relevantes para a história,
para a arte, para a numismática ou
do país, há locais para a arqueologia”. No entanto, os
arqueológicos atentados ao património prosse-
guem perante “a inacção das auto-
que estão a ser ridades, o que está a encorajar as
vandalizados acções dos ‘detectoristas’”, critica
Regis Barbosa, presidente do Sindi-
por amadores e cato dos Trabalhadores de Arqueo-
proÄssionais que logia (Starq).
O dirigente do Starq garante que,
usam detectores de norte a sul do país, há locais
de metais para arqueológicos que estão a ser van-
dalizados por amadores e proÆssio-
encontrar peças nais que usam detectores de metais
históricas para encontrar peças históricas,
Público • Terça-feira, 5 de Abril de 2022 • 21
NELSON GARRIDO
que, por vezes, acabam por ser ven-
didas nos sites de vendas e leilões
online. “[O problema é que] só as
descobrimos depois de o crime ter
tido lugar”, salienta Regis Barbosa,
realçando os sinais de actividade
dos indivíduos que continuam a ser
divulgados através do YouTube.
Por parte das instituições públicas
“deve haver uma maior robustez no
modo de actuação” para travar a
delapidação de bens patrimoniais,
que “são de todos e não de quem os
encontra”, reivindica o presidente
do Starq, lamentando a “falta de
resposta da DGPC” às denúncias do
sindicato.
Aqueles que recorrem aos detec-
tores de metais estão “quase sem-
pre” associados ao mercado ilegal
das peças, refere o sindicalista, que
diz defender um “reforço” do papel
Æscalizador da DGPC.
Uma praga destrutiva
A DGPC adianta ao PÚBLICO que
“está ao corrente da situação”, a
qual se encontra a ser “directamen-
te acompanhada pela Direcção
Regional de Cultura do Alentejo”.
No quadro da Lei de Bases do Patri-
mónio Cultural (Lei nº 107/2001), é a
DGPC que emite as licenças de utili-
zação de detectores de metais. Em
2021, este organismo adianta que
“recebeu 30 pedidos, mas apenas
foram autorizados 12”. Foram ainda
“recepcionados” 44 pedidos de infor-
mação sobre a emissão dessas licen-
ças. Em 2019, foram recebidos na
DGPC 27 pedidos para uso de detec-
tores e atribuídas 12 licenças.
“Os detectores de metais são uma
praga muito destrutiva do patrimó-
nio no nosso país. É como arrancar
folhas de um livro sem o ler”, disse
ao PÚBLICO Luís Raposo, arqueólogo
e presidente do International Council
of Museums — ICOM Europa.
Depois do contributo técnico que
deu para a elaboração da Lei n.º
121/99, que regula a utilização de
detectores de metais, Luís Raposo
reconhece que o seu articulado deve
ser melhorado. E aponta alguns
aspectos que considera necessário
pôr em prática. Como a acção poli-
cial não se tem revelado eÆcaz,
defende “uma Æscalização mais
intensa, punições exemplares para
os infractores e uma legislação mais
inteligente”. E dá alguns exemplos:
a lei deve “obrigar” a que se comu-
nique a descoberta de artefactos
arqueológicos e os indivíduos que
os localizam “devem ser compensa-
dos”, uma forma de “os atrair para
o lado da lei e assim isolar os traÆ#
cantes”, advoga.
Em reforço destas medidas, pro-
põe que as autarquias elaborem
cartas arqueológicas dos seus con-
celhos, evitando assim que o patri-
mónio histórico e arqueológico
continue a ser delapidado e a desa-
parecer através das redes interna-
cionais de tráÆco.
Encontram-se inventariados
37.127 sítios arqueológicos em todo
território de Portugal continental,
correspondendo a 35.146 localiza-
dos em meio terrestre e 1981 em
meio subaquático. Sendo comple-
tamente impossível manter todos
estes locais vigiados e perante a
recente actividade do “detectoris-
tas”, “é legítimo temer” que se
tenha perdido mais património
arqueológico “nas últimas décadas
do que em todos os séculos anterio-
res”, conclui Luís Raposo.
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22 • Público • Terça-feira, 5 de Abril de 2022

Mundo Dois líderes pró-russos com vitórias categóricas nas eleições

O que fará Orbán com a sua nova

supermaioria na Hungria?
Prevê-se que a dimensão da vitória, que deu ao Governo uma nova maioria de dois terços,
tenha consequências na política externa da Hungria, especialmente em relação à Rússia
BERNADETT SZABO/REUTERS

Maria João Guimarães

O discurso de vitória do primeiro-mi-
nistro húngaro, Viktor Orbán, não
deixou dúvidas: a vitória irá ser vista
em Bruxelas. Sobre quem são os
adversários, também não houve dúvi-
das: Orbán mencionou o Ælantropo
George Soros (um adversário recor-
rente) e o Presidente ucraniano, Volo-
dimir Zelenskii.
O facto de o Fidesz ter vencido
com um resultado muito favorável,
longe do taco a taco com a oposição
unida que as sondagens vinham a
sugerir, deu a Orbán um novo fôlego
para continuar a sua “democracia
iliberal” e aproximar-se mais da Rús-
sia, país em relação ao qual tem sido
dúplice — aprovou as primeiras san-
ções por causa da invasão da Ucrâ-
nia, mas recusou mais medidas,
incluindo a passagem de armas pelo
seu território.
“Orbán sempre conseguiu ganhar
pontos com retórica de batalha”, nota
a responsável pela Deutsche Welle
húngara, Dóra Diseri. “Nos últimos
anos, lutou contra os altos custos das
rendas, contra Bruxelas, contra Geor-
ge Soros, contra migrações, contra
ONG — e agora luta contra a guerra”,
comenta: Orbán apresentou-se como
a garantia de que a Hungria não se iria
ver envolvida na guerra na Ucrânia.
Enquanto isso, os media estatais
mantinham a divulgação de propa- Viktor Orbán celebrou uma vitória “contra a esquerda”, os “burocratas em Bruxelas” e até “o Presidente ucraniano”
ganda pró-russa e comentários favo-
ráveis a Moscovo. À medida que Ucrânia continuar, arrisca-se a que não é sustentável, as medidas no pla-
Orbán ia usando a guerra a seu favor,
o tom foi subindo, e o ministro dos
Confirma-se a hegemonia de Vucic na Sérvia Varsóvia quebre o acordo que sem-
pre foi benéÆco para os dois países,
no interno também não. As “pren-
das” pré-eleitorais Æzeram aumentar
Negócios Estrangeiros da Hungria, de se apoiarem mutuamente nas o déÆce numa altura em que a econo-

Péter Szijjártó, acusou a Ucrânia de
inÇuenciar as eleições na Hungria.
“O mundo inteiro pode ver que a
nossa política democrata cristã, con-
servadora, patriótica, venceu”, disse
Orbán aos seus apoiantes no discurso
de vitória no domingo à noite. “Esta-
mos a mandar uma mensagem à
Europa de que isto não é o passado
— isto é o futuro.”
Orbán mencionou os seus vários
adversários: “Esta vitória vai ser lem-
brada porque tínhamos o maior
número [de opositores] para vencer.
A esquerda em casa, a esquerda inter-
nacional, os burocratas em Bruxelas,
o dinheiro do império de Soros, os
media internacionais e, no Æm, até o
Presidente ucraniano”, declarou.
No plano externo, Orbán arriscou
isolar-se mais — e pôs em risco a ami-
zade com a Polónia e, se a guerra na
O
Presidente sérvio,
Aleksandar Vucic, foi
reeleito com 59% dos votos
nas eleições presidenciais
de domingo, e também viu o seu
partido, o Partido Progressista
Sérvio (SNS), alcançar uma
maioria parlamentar. Os
resultados devem permitir a
Vucic, no poder desde 2017,
cimentar o seu poder.
O SNS conseguiu manter a
maioria no Parlamento, ao
alcançar 43% dos votos. A
coligação oposicionista
Unidos pela Vitória ficou em
segundo lugar, com 13%,
enquanto o seu líder, o
general na reserva
Zdravko Ponos,
também ficou em
segundo nas presidenciais, com
17%. O Partido Socialista,
provável parceiro de coligação
do SNS, ficou em terceiro com
11%.
A guerra na Ucrânia teve um
papel importante na eleição. No
discurso de vitória, Vucic, que
goza de boas relações com o
Kremlin, garantiu que a Sérvia irá
manter a “neutralidade militar”.
“Vamos continuar com uma
política importante para os
europeus, russos e
americanos”, afirmou,
referindo que a Sérvia “vai
manter relações
amigáveis e de
parceria em
muitas áreas”
com a Rússia.
questões do Estado de direito e de o
voto de um proteger o outro em rela-
ção a potenciais sanções europeias.
Em Varsóvia, a vitória de Orbán foi
vista com sentimentos contraditó-
rios, diz a Reuters. “Putin é uma
ameaça a longo prazo também para
a Hungria e quem quer que não veja
isso está a cometer um grande erro”,
disse o vice-ministro dos Negócios
Estrangeiros da Polónia, Marcin
Przydacz.
No plano interno, o Governo gas-
tou muito dinheiro (seis mil milhões
de euros) em medidas para que a
população não sinta o efeito da inÇa-
ção, como a Æxação de tectos máxi-
mos para os preços dos combustível
e dos alimentos, e adiamento de
aumentos dos preços de gás e electri-
cidade com dinheiro público.
Se o jogo duplo no plano externo
mia está a sentir os efeitos dos pro-
blemas de falta de materiais no sector
automóvel.
Neste contexto, seria muito útil
para o Governo receber os fundos do
plano de recuperação e resiliência,
suspensos por Bruxelas por causa do
Estado de direito (o que está a acon-
tecer também com a Polónia).
“A expectativa de que pudesse
haver um acordo relativamente rápi-
do com a Comissão Europeia [sobre
estes fundos] é questionável depois
de no seu discurso de ontem [domin-
go] Orbán ter lançado farpas a Bru-
xelas”, disse Peter Virovacz, do grupo
Ænanceiro ING em Budapeste, à Reu-
ters. “Não podemos esperar que este
Governo, com a sua maioria de dois
terços, esteja tão disposto a compro-
missos como estaria com uma maio-
ria simples.”
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24 • Público • Terça-feira, 5 de Abril de 2022

Economia Lote para a barragem de Castelo de Bode não foi licitado

Endesa ganha Alto Rabagão à EDP

na maratona do terceiro leilão solar
Leilão solar esteve aberto mais de 12 horas. A disputa manteve-se acesa até ao Änal pelos projectos
do Alqueva e de Vilar Tabuaço. Licitação destacou-se pelos baixos preços de venda alcançados
JOSÉ COELHO/LUSA

Ana Brito
O Alto Rabagão, a albufeira que viu
nascer o primeiro projecto de energia
solar Çutuante em Portugal (um pilo-
to da EDP instalado no Ænal de 2016),
vai agora acolher um projecto da
Endesa, que foi uma das vencedoras
de um dos lotes mais disputados no
leilão de solar que se iniciou na
manhã de ontem, 4 de Abril, e que já
depois da hora de fecho desta edição
(22h) ainda decorria.
Eram quase sete da tarde quando
se soube que o vencedor dos 42
megawatts (MW) do Alto Rabagão
ofereceu uma compensação Æxa
anual ao sistema eléctrico de quase
46 mil euros por megawatt hora
(MWh). Trata-se de um desconto de
cerca de 70% face ao preço de refe-
rência Æxado para o leilão (em torno
dos 41 euros por MWh) e resulta
numa tarifa de venda de energia em
torno de 12 euros por MWh.
À semelhança do que se passou nos
leilões de 2019 e 2020 (para projectos
fotovoltaicos convencionais), este
leilão voltou a destacar-se pelos bai-
xos preços de venda alcançados, num
momento em que o mercado eléctri-
co continua sem dar tréguas: o preço
médio grossista para terça-feira Æxou-
se nos 265,02 euros.
Foi uma maratona que se estendeu
até depois das 22h e por 21 rondas,
levando até ao Ænal a disputa pelos
100 MW projecto do Alqueva (lote Projecto de fotovoltaico de venda de 41,03 euros MWh, mais de aguardar por Ænal de 2013. “hibridização” estava vedada aos
um), onde a EDP já tem prevista a flutuante, instalado pela EDP na próxima daquilo que têm sido os valo- As empresas disputaram o direito lotes dois e três.
instalação de um projecto de solar albufeira do rio Rabagão, perto res históricos do mercado grossista). a injectar na rede eléctrica a sua pro- No contrato com a APA, os vence-
Çutuante de 4 MW, e os 17 MW da bar- de Montalegre, em 2016 Os lotes cinco e seis foram adjudi- dução renovável de origem fotovol- dores irão pagar apenas a taxa de
ragem de Tabuaço (lote sete). cados pela modalidade de compen- taica e também terão de assinar um recursos hídricos (que é devida em
Para obter o título de reserva de sação Æxa ao sistema, resultando em contrato de concessão com a duração função do espaço ocupado na albu-
capacidade de injecção na rede, os compensações de 3934,1 euros e 7779 de 30 anos com a Agência Portuguesa feira) e que rondará, para o conjunto
promotores tinham de oferecer as euros por MWh, respectivamente, o do Ambiente (APA), que gere os recur- dos espaços, perto de 300 mil euros
melhores ofertas em duas modalida- que se traduz em preços de venda da sos hídricos. por ano.
des: ou uma compensação Æxa ou energia de 38,87 euros por MWh e de De acordo com o programa do pro-
sistema (ganhando quem oferecesse 36,40 euros por MWh. Mira posta na eólica cedimento, será hoje, dia 5 de Abril,
a compensação mais alta) ou aceitan- Já o projecto de Castelo de Bode O contrato com o Sistema Eléctrico que o júri encabeçado pelo ex-presi-
do uma tarifa garantida, vencendo (que ligava à subestação do Pego, Nacional (SEN) é de 15 anos, embora dente da ERSE, Vítor Santos, irá vali-
aquele que apresentasse um maior onde a Endesa ganhou há dias o leilão as empresas possam continuar a dar os resultados do leilão e comuni-
desconto face ao preço de referência A Endesa ofereceu para instalar eólica, solar e produção explorar as centrais para lá deste pra- cá-los aos concorrentes, que em
(Æxado em torno de 41 euros por de hidrogénio em substituição da cen- zo, de acordo com os seus contratos cinco dias úteis deverão fazer a sua
MWh).
uma compensação tral a carvão) parece não ter desper- de concessão. pronúncia.
Se os lotes três (33,3 MW no Cabril), Äxa anual ao tado grande interesse de nenhum dos Para os promotores, um dos prin- “Após ponderação da pronúncia
cinco (12,5 MW em Paradela) e seis concorrentes. cipais chamarizes do procedimento dos concorrentes, o júri elabora, no
(8,3 MW em Salamonde) Æcaram
sistema eléctrico Ou, tendo interessado apenas a um é a possibilidade de virem a aprovei- prazo de 2 (dois) dias úteis, um rela-
fechados nas rondas iniciais, o lote de quase 46 mil deles, não foi a leilão e essa empresa tar o ponto de injecção na rede (que tório fundamentado com os resulta-
dois (50 MW para a barragem de Cas- terá a opção de Æcar com o lote pelo é neste momento um bem escasso), dos Ænais da licitação, que submete
telo de Bode) nem foi a leilão.
euros por preço médio Ænal. Se não aceitar esse para poderem instalar outros equipa- ao director-geral de Energia e Geolo-
De acordo com dados recolhidos megawatt hora preço, o lote irá a um futuro leilão. mentos, nomeadamente turbinas gia e ao conselho directivo da APA,
pelo PÚBLICO, o lote três fechou com Castelo de Bode e Alqueva são os eólicas, conseguindo rentabilizar os para aprovação, no prazo de 2 (dois)
um desconto de 1,01% face ao preço
e venceu os 42 MW dois únicos lotes com ligação imedia- projectos com duas fontes de energia dias úteis”, seguindo-se a publicação
de referência (resultante numa tarifa de Alto Rabagão ta à rede eléctrica, tendo os restantes complementares. O recurso a esta dos resultados.
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Oferta de empréstimos à habitação “verdes”
está a aumentar mas benefício é reduzido
Rosa Soares
Vários bancos já oferecem
bonificações nos créditos
para compra ou construção
de imóveis com classe
energética mais elevada
Está a crescer em Portugal a disponi-
bilização de descontos na taxa de juro
ou na isenção de algumas comissões
nos empréstimos para compra de
imóveis com boa classiÆcação ener-
gética. As boniÆcações são, no entan-
to, reduzidas, variando entre 0,05%
e 0,10%, na maioria dos casos, e não
é certo que os clientes não consigam
taxas de juro iguais ou mesmo mais
baixas na compra de imóveis sem o
selo “green”.
A oferta deste tipo de produtos,
que tem conhecido forte dinamismo
em Espanha, tem preocupações
ambientais, uma vez que os imóveis
com classiÆcação de A+, A ou mesmo
B são mais sustentáveis, porque con-
somem menos energia e ou utilizam
fontes renováveis. E estima-se que o
parque residencial represente cerca
de 40% das emissões de CO2 na União
Europeia, porque cerca de 90% foi
construído antes do ano 2000, e só
muito recentemente a construção
passou a obedecer a algumas regras
especíÆcas neste domínio.
Mas há também um racional eco-
nómico para as instituições bancárias,
tendo em conta que estas habitações,
ao permitirem maior poupança nos
consumos de energia, são mais valo-
rizadas no mercado, reforçando,
assim, a garantia hipotecária dos cré-
ditos. Para além disso, o Banco Cen-
tral Europeu está a exigir aos bancos
que aumentem a concessão de crédi-
to sustentável.
Numa ronda pelos principais ban-
cos a operar no mercado português,
é possível encontrar produtos espe-
cíÆcos na União de Créditos Imobiliá-
rios (UCI), Bankinter, Novo Banco,
Banco Santander Totta e Millennium
BCP. E a oferta vai crescer nos próxi-
mos meses, uma vez que mais duas
instituições se preparam para lançar
produtos semelhantes, como é o caso
da Caixa e do BPI, e está ainda previs-
to um alargamento da oferta da UCI.
“A Caixa Geral de Depósitos tem
previsto lançar, brevemente, uma
oferta com condições especiais para
a contratação de operações de crédi-
to habitação para a aquisição de imó-
veis com melhor desempenho ener-
gético”, disse fonte oÆcial da institui-
ção ao PÚBLICO.
Também do BPI conÆrma que a sua
oferta não contempla nenhum pro-
duto distintivo, mas fonte oÆcial avan-
ça que a instituição “projecta dispor,
em breve, de um produto ou produ-
tos com essas características”.
Benefício directo no BCP
A UCI, instituição detida pelo Banco
Santander e BNP Paribas, que foi a
primeira instituição de crédito a lan-
çar as hipotecas “green” em Portugal,
com uma boniÆcação de 0,10% na
taxa de juro dos empréstimos para
aquisição de imóveis novos ou para a
construção de moradias com classiÆ#
cação energética A, prepara-se para
criar, até Junho, um outro produto
para empréstimos destinados à com-
pra e reforma de imóveis usados, com
crédito suplementar para obras, de
forma a melhorar a sua eÆciência
energética através da mudança de
janelas, estores térmicos, painéis
fotovoltaicos ou bombas de calor, ou
outras soluções, avançou ao PÚBLICO
Pedro Megre, presidente executivo da
instituição em Portugal.
Nos bancos com ofertas especíÆ#
cas, a modalidade mais seguida é a
garantia de uma boniÆcação no
spread, uma das componentes da
taxa Ænal, ou na taxa Æxa, que no
Novo Banco e no Bankinter também
é de 0,10%, para imóveis com certi-
Æcados de eÆciência energética igual
ou superior a A. Este é também o
valor da oferta mais comum em
Espanha.
Já no Banco Santander Totta, a
redução é mais modesta, Æcando em
0,05%, “até ao limite mínimo da gre-
lha em vigor”, para imóveis com clas-
siÆcação energética A+ ou A, “e
enquanto esta se mantiver”, com esta
instituição a salvaguardar que “reser-
va-se o direito de descontinuar este
benefício, devendo a sua vigência ser
veriÆcada em cada momento”.
O benefício do crédito “verde” tem
características diferentes no Millen-
nium BCP, já disponível no simulador
do banco, mas que ainda não foram
objecto de divulgação, o que deve
acontecer brevemente. Trata-se de
uma compensação Ænanceira quase
imediata. Ou seja, no caso de aquisi-
ção ou construção de imóvel com
classe energética de A+, A ou B, o ban-
co atribui ou devolve o valor da
comissão de dossier (290 euros) e da
de formalização (200 euros), num
total de 490 euros e respectivo impos-
to de selo.
A oferta do banco liderado por
Miguel Maya também se estende ao
crédito para obras, sendo atribuído
o valor equivalente ao da comissão
de dossier e do custo do certiÆcado
energético (máximo 200 euros),
Público • Terça-feira, 5 de Abril de 2022 • 25
Economia
MIGUEL MANSO
adiantou a instituição ao PÚBLICO.
Concorrência elevada
Como a oferta de imóveis novos, habi-
tualmente com classiÆcações energé-
ticas mais elevadas, é reduzida, “a
concorrência entre instituição de cré-
dito para agarrar este crédito é eleva-
da”, adianta Pedro Megre. Ainda
assim, o presidente da UCI avança
que o crédito verde representou cer-
ca de 8% do volume de crédito colo-
cado pela UCI no último ano, sendo
que nos primeiros meses de 2022 já
se aproxima dos 10%.
Tendo em conta a idade do parque
habitacional nacional e a baixa eÆ#
ciência energética, Pedro Megre
adianta que o universo de mercado
para crédito “green” é muito grande,
e a UCI quer participar. Mas neste
caso, explica, a mudança depende
menos da oferta dos bancos e mais da
disponibilização de fundos comuni-
tários, como os que estão previstos
no Plano de Recuperação e Resiliên-
cia (PRR), para apoiarem a reabilita-
ção de edifícios inteiros, uma vez que
a mudança de janelas, a instalação de
painéis fotovoltaicos ou caldeiras de
calor já não resolvem os problemas.
Na frente dos apoios à reabilitação
de edifícios, que os condóminos não
conseguem assegurar sozinhos, o
presidente da UCI refere que “Espa-
A instalação de equipamentos nha vai a todo o vapor”, mas diz espe-
para aproveitar a energia solar rar que em Portugal, agora que o novo
são cada vez mais frequentes Governo já tomou posse, se possa
acelerar nesta matéria.
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ERNESTO JOSÉ
GOUVEIA MACEDO
(1942-2022)
Oitenta anos vividos plenamente, intensamente, sempre com
disponibilidade para ouvir, participar e ajudar. Um cavalheiro
em todas as circunstâncias, um rochedo nas situações mais
difíceis, um homem que defendeu o bem – o bem para todos
– e nunca, jamais tolerou o mal e o injusto. Lutou e defendeu
ideias, expôs-se, assumiu confrontos, nunca ficou na fila de trás
à espera que outros dessem o primeiro passo por ele. Soube
ganhar, soube perder. A racionalidade temperou o sentido de
urgência que o definia, preferia um plano a uma ação súbita
e inconsequente. Ernesto Macedo, Nezé para os amigos, teve
uma vida em cheio. Teve a sorte e a inteligência e o talento de
partilhar a vida com uma mulher excecional – tão diferentes, tão
unidos. Um grande e indestrutível amor.
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26 • Público • Terça-feira, 5 de Abril de 2022

Ciência Crise climática

Projecção das emissões de gases com

efeito de estufa em vários cenários
Segundo os compromissos de cada país anunciados antes da COP26, as
emissões tornam provável que se ultrapasse o limite de 1,5ºC e torna-se
difícil limitar o aquecimento global abaixo dos 2ºC depois de 2030.

80 Todas as emissões de gases com efeito de estufa

70

60

50

40

30

20

10

-10
2010 2015 2020 2025 2030 2035 2040 2045 2050
Tendência das medidas aplicadas

Aquecimento limitado a 2ºC ou regresso ao aquecimento

até 1,5ºC depois de se ter ultrapassado esse valor
Limitar o aquecimento a 2ºC (>67%)
limitar o aquecimento a 1,5ºC
sem ultrapassar esse valor
Emissões anteriores de GEE e incerteza para 2015 e 2019
(ponto indica a mediana)
Fonte: relatório IPCC PÚBLICO

Só uma redução
Claudia Carvalho Silva
O novo relatório do Painel Intergover-
namental para as Alterações Climáti-
terço. “Mesmo que façamos isto, é rado. E a ciência é clara: para manter-
quase inevitável que excedamos tem- mos os 1,5 graus acordados em Paris,
porariamente este limite de tempe- temos de cortar as emissões globais
ratura, mas poderemos voltar a estar em 45% nesta década, mas as metas

imediata nas cas (IPCC) divulgado na tarde de

ontem está pontuado por altos e bai-
xos: é grave constatar que entre 2010
e 2019 as emissões de gases com efei-
abaixo dele até ao Ænal do século”,
lê-se no comunicado. “É agora ou
nunca”, asseverou o vice-presidente
do IPCC, Jim Skea. “Sem reduções
actuais signiÆcariam um aumento de
14% das emissões.”
E apontou o dedo aos grandes paí-
ses que mais poluem: os radicais

emissões pode to de estufa estiveram “no seu nível

máximo na história dos humanos”,
mas a boa notícia é que o ritmo desse
profundas e imediatas nas emissões
em todos os sectores, será impossí-
vel” limitar o aquecimento global a
extremistas são os países que estão a
aumentar os combustíveis fósseis,
não os activistas climáticos, disse. O

limitar subida
crescimento abrandou. É preocupan-
te ouvir que, se continuarmos sem
uma acção imediata para um corte
profundo nessas emissões, será
1,5ºC. Uma acentuada redução nas secretário-geral da ONU repetiu por
emissões terá de continuar em 2030, várias vezes a ideia de que se deve
2040 e 2050. apostar em energias renováveis e que
investir em infra-estruturas que

da temperatura
“impossível” limitar o aquecimento
global a 1,5ºC. Mas a boa notícia é que
já há provas de que as medidas para
travar as alterações climáticas estão
“Não é Äcção, nem exagero” dependam de combustíveis fósseis é
“Estamos num caminho acelerado uma “loucura”, sobretudo numa altu-
para um mundo inabitável, para o ra em que “as desigualdades estão
desastre climático”, asseverou o num nível sem precedentes”, com a

a 1,5ºC
a surtir efeito. A escolha do caminho
que será feito até 2030 é crucial.
“Estamos numa encruzilhada”,
declarou o presidente do IPCC, Hoe-
sung Lee. “As decisões que tomamos
agora asseguram um futuro habitável.
Temos as ferramentas e o conheci-
mento para limitar o aquecimento”,
aÆrmou, dizendo que têm sido toma-
das medidas eÆcazes que poderão ser
replicadas por todo o mundo para
secretário-geral da ONU, António
Guterres, numa mensagem áspera e
urgente na tarde de ontem, durante
a conferência de imprensa do IPCC.
“Não é Æcção, nem é exagero: é aqui-
lo que a ciência nos diz que acontece-
rá.” Sem dizer nomes, acusou alguns
líderes mundiais de mentir, de “dize-
rem uma coisa e fazerem outra”.
“Os governos e as empresas não
estão só a fechar os olhos — estão a
crise climática, a pandemia, a guerra
e a inÇação.
As emissões têm aumentado desde
1850 por causa da actividade humana
e as emissões médias de gases com
efeito de estufa entre 2010 e 2019
foram “mais altas do que em qual-
quer década anterior”, mas ainda
assim o ritmo de crescimento nessa
década foi menor do que na década
de 2000 a 2009.

garantir que é possível reduzir as
emissões globais.
Para limitar a subida da tempera-
tura a 1,5ºC (até ao Ænal do século e
É altura de diminuir emissões para em relação aos níveis pré-indus-
garantir um “futuro habitável”. O pico das triais), o “pico” das emissões tem de
ocorrer até 2025, no máximo — e terá
emissões terá de ocorrer até 2025 e ser de ser reduzido em 43% até 2030. O
IPCC diz ainda que as emissões de
reduzido a metade até ao Änal da década metano terão de diminuir até um
45%
juntar gasolina às chamas, estão a
sufocar o planeta. Continuam a apos-
tar em combustíveis fósseis, quando
as energias renováveis estão mais
baratas”, argumentou António Guter-
res. “Saímos da COP26 com um opti-
mismo ingénuo, baseado em novas
é o valor estimado do corte
de emissões que é necessário
promessas e compromissos, mas o fazer na próxima década para
grande problema — as emissões enor- cumprir as metas definidas no
mes — continua a ser totalmente igno- Acordo de Paris
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FRIEDEMANN VOGEL/EPA
As emissões têm aumentado
desde 1850 por causa
da actividade humana
Outra má notícia: as reduções nas
emissões ainda têm sido menores do
que o aumento causado pela expan-
são da actividade global na indústria,
energia, transporte, agricultura e edi-
fícios. Ao mesmo tempo, a boa notícia
é que o custo de tecnologias para
reduzir as emissões tem estado a bai-
xar desde 2010 — ainda que, nos paí-
ses em desenvolvimento, esta “ino-
vação” se tenha atrasado. É preciso
uma “acção climática acelerada e jus-
ta”, alerta o IPCC.
Por Æm, o “alinhamento de Çuxos
Ænanceiros para atingir os objectivos
do acordo de Paris permanece lento”.
Se os compromissos nacionais de
cada país que faz parte do Acordo de
Paris (NDC) anunciados antes da
COP26 se mantiverem, tal não será
suÆciente para limitar o aquecimento
global e tornará “provável que o aque-
cimento ultrapasse os 1,5 graus duran-
te o século XXI”.
A neutralidade carbónica pode ser
atingida em 2050, se se conseguirem
cumprir os cenários que limitam o
aquecimento global a 1,5 graus. Caso
se ultrapasse e o aquecimento global
Æque antes abaixo dos dois graus, a
neutralidade carbónica pode ser con-
seguida no início dos anos 2070. Só
nessa altura será possível estabilizar
as temperaturas do planeta. Os meca-
nismos para remoção de dióxido de
carbono para contrabalançar as emis-
sões residuais mais difíceis de extin-
guir serão “inevitáveis”.
Qualquer um destes cenários impli-
ca “reduções rápidas e profundas nas
emissões e, na maior parte dos casos,
reduções imediatas” em todos os sec-
tores de actividade. Tal implica uma
transição de combustíveis fósseis
para fontes de energia neutras em
carbono (ou muito reduzidas), como
as energias renováveis.
Uma redução de 40% a 70%
Muitas têm sido as medidas para
melhorar a eÆciência energética e,
desde 2010, houve uma redução nos
preços da energia solar e eólica que
chega aos 85%, revela o relatório do
IPCC. Neste relatório, Æca claro que
“limitar a subida da temperatura glo-
bal exigirá grandes transições no sec-
tor da energia”, o que implica uma
grande redução dos combustíveis
fósseis — mas também o uso de com-
bustíveis alternativos e uma maior
eÆciência energética. Para o vice-pre-
sidente do IPCC Priyadarshi Shukla,
é preciso ter as “medidas certas, as
infra-estruturas e a tecnologia a pos-
tos”, que, por sua vez, “permitem
mudanças nos nossos comportamen-
tos e estilo de vida”. Isto possibilitará
uma redução entre 40% e 70% das
emissões de gases com efeito de estu-
fa até 2050 e resultará também numa
melhoria “da nossa saúde e bem-
estar”, diz Shukla, citado num comu-
nicado do IPCC.
Nas cidades, por exemplo, há várias
oportunidades para reduzir o impac-
to que temos no planeta: se as cidades
forem “compactas” e permitirem que
se caminhe até aos serviços essen-
ciais, se os transportes passarem a ser
eléctricos, se houver mais espaços
verdes (que funcionam como reser-
vatórios de carbono). No sector da
indústria, que conta com quase 25%
do total das emissões globais, é neces-
sário que se usem os materiais de
forma mais eÆciente. Tornar esta
indústria neutra em carbono será um
“desaÆo” e exigirá “novos processos
de produção”.
As melhorias nos transportes aju-
dariam não só a reduzir as emissões
de dióxido de carbono, mas também
teriam impactos positivos na qualida-
de do ar, na saúde, no acesso mais
igual a serviços de transporte e ainda
ajudariam a reduzir o trânsito.
Muitas das medidas de descarbo-
nização tiveram impactos positivos,
mas também houve casos em que
resultaram em “impactos negativos
a curto prazo em grupos vulnerá-
veis, de baixos rendimentos, e em
alguns casos beneÆciaram grandes
empresas, em vez de pequenas
empresas, por exemplo”, aÆrmou a
investigadora Laura Diaz Anadon,
citada num documento do IPCC. Os
pacotes de medidas que permitem
a inovação e criam recursos são
melhores a apoiar uma mudança
rumo a um futuro mais justo de
reduzidas emissões do que medidas
individuais, lê-se no relatório.
IPCC publica novo relatório
sobre o clima: e agora?
Opinião
F
Joana Portugal Pereira
oi publicado ontem o
último diagnóstico de
avaliação sobre a
redução de emissões de
gases com efeito de
estufa (GEE) do Painel
Intergovernamental para as
Alterações Climáticas (IPCC, na
sigla inglesa) — o órgão máximo
sobre a ciência do clima nas
Nações Unidas. Durante os últimos
cinco anos, centenas de
especialistas de todas as regiões do
planeta sintetizaram de forma
colaborativa os mais recentes
avanços cientíÆcos sobre as
alterações climáticas. Após
intensas reuniões entre
especialistas e decisores políticos,
o relatório foi Ænalmente aprovado
e adotado pelos 195 países
membros do IPCC.
Ao longo das últimas três
décadas, o IPCC desenvolveu seis
ciclos de avaliação (AR) que
gradualmente aprimoraram a
confiabilidade e precisão da
ciência do clima. A mensagem é
inequívoca e unânime: o
aquecimento global do planeta
não tem precedentes e resulta do
aumento da concentração de GEE
na atmosfera terrestre, decorrente
maioritariamente da combustão
de combustíveis fósseis e de
atividades agropecuárias.
E agora? Agora já sabemos, sem
qualquer sombra de dúvida, que o
aumento da temperatura média do
globo atingiu 1,1 graus Celsius,
comparativamente a níveis
pré-industriais. Já sabemos que
esta anomalia desencadeia uma
série de processos com perdas
irreversíveis para os ecossistemas
naturais e humanos. Atualmente
mais de 3000 milhões de
habitantes vivem numa tremenda
vulnerabilidade climática e, até ao
final do século, estima-se que três
quartos da população mundial
ficarão expostos a eventos
climáticos extremos que afetarão a
habitabilidade do planeta.
Já sabemos que ano após ano —
com um curtíssimo interregno
devido à disrupção da pandemia
da covid-19 — as emissões anuais
de GEE batem recordes
consecutivos, atingindo o marco
de 60,0 mil milhões de toneladas
(Gt) em 2021. Já sabemos que
algumas economias conseguiram
desacelerar o aumento das suas
Público • Terça-feira, 5 de Abril de 2022 • 27
emissões, mas também que a
população 10% mais rica emite
aproximadamente 40% do total de
GEE no planeta.
Já sabemos que, apesar dos
esforços iniciados pelas estratégias
de mitigação no âmbito do Acordo
de Paris (as denominadas “NDC”),
se continuarmos a seguir as
políticas anunciadas de redução de
emissões, o globo Æcará 2,4-3,5
graus Celsius mais quente do que
há dois séculos. Isso fará com que
os eventos extremos sejam o novo
normal da realidade
meteorológica. Já sabemos que é
necessário atingir o pico das
emissões até 2025 e aumentar em
sete vezes a ambição climática,
para chegarmos a um patamar de
neutralidade de GEE e estabilizar o
aquecimento global a níveis
próximos de dois graus Celsius até
ao Ænal do século.
Portanto, já sabemos que os
próximos anos são cruciais para
garantir um mundo seguro e
sustentável para a população de
todas as regiões do planeta. Já
sabemos que não existem soluções
mágicas, mas que temos
disponíveis um conjunto de
opções efetivas com inúmeros
benefícios colaterais para um
desenvolvimento sustentável. Já
sabemos que é necessária uma
reforma Æscal que aplique
instrumentos regulatórios e
económicos para corrigir as falhas
de mercado e que contabilize
externalidades ambientais
decorrentes do uso de
combustíveis fósseis. É
fundamental canalizar os 5,9
biliões de dólares (7% do PIB
global) de subsídios perversos que
anualmente Ænanciam a indústria
de carvão, petróleo e gás para
setores hipocarbónicos que
promovam uma economia verde.
Mais de 30 Gt de emissões de GEE
podem ser evitadas até 2030 a um
Já sabemos que
os próximos anos
são cruciais para
garantir um
mundo seguro
e sustentável para
a população de
todas as regiões
do planeta
custo inferior a 100 dólares por
tonelada de GE, se investirmos em
inovações energéticas de baixo
carbono.
Já sabemos que é indispensável
investir em bens públicos a longo
prazo, designadamente transitar
para matrizes renováveis de
geração de energia elétrica e
eletriÆcar os setores-chave da
economia. Já sabemos que na
última década o custo da energia
elétrica gerada por sistemas
solares e eólicos desceu 85% e 55%,
respetivamente, tornando-os os
pilares-chaves para garantir a
segurança energética,
especialmente em contextos de
conÇitos geopolíticos. Já sabemos
que é fundamental melhorar a
nossa eÆciência energética, para
conseguirmos ter acesso aos
mesmos serviços, consumindo
menos energia. Já sabemos que
conservar as nossas Çorestas e
ecossistemas naturais é a forma
menos dispendiosa de reduzir
emissões. Com isso,
conseguiremos evitar até 14 Gt de
GEE e garantir a sustentabilidade
de serviços dos ecossistemas,
nomeadamente disponibilidade de
água e biodiversidade.
Já sabemos da enorme
relevância de repensarmos os
nossos padrões de consumo. Se
adotarmos padrões de mobilidade
urbana baseados em transportes
públicos eÆcientes, modos suaves
e, em paralelo, limitarmos a
utilização de veículos de
combustão interna nas nossas
cidades, conseguiremos reduzir
75% das emissões do transporte
rodoviário de passageiros e
melhorar a qualidade do ar nas
cidades, assim como aumentar o
bem-estar da população urbana. E
já sabemos que, ao
reequacionarmos as nossas dietas
alimentares e reduzirmos o
excesso de consumo de alimentos
derivados de animais, podemos
reduzir até 8 Gt de emissões de
GEE, além de termos melhorias
signiÆcativas na saúde pública.
A ciência já apresentou todas
estas evidências. Temos
conÆabilidade sobre as soluções
para que os decisores políticos,
indústrias e a sociedade civil deem
os passos decisivos na direção de
trajetórias de baixo carbono e
resilientes à variabilidade
climática, para satisfazer as
necessidades da sociedade atual e
das gerações vindouras. E agora?
É agora!
Investigadora e autora líder do
6.º Ciclo de Avaliação do IPCC
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28 • Público • Terça-feira, 5 de Abril de 2022
Cultura A dança sobre a memória de Teorias da Inspiração, no TBA
No palco do TBA, em Lisboa, estão David Marques, Francisco Rolo, Luís Guerra e Nina Botkay
O início na
Gonçalo Frota
Nos últimos anos, em contexto de
workshops ou de desenvolvimento
dança de David dos seus projectos artísticos, David
Marques viu-se muitas vezes na
posição de partilhar ideias e obser-
vações sobre a dança amadora, a
Marques não Æm de criar com os outros partici-
pantes “um imaginário sobre movi-
mento”. Ao fazê-lo, o coreógrafo e
foi bem isto
bailarino activava as suas próprias
memórias e reforçava a consciência
de que a experiência com a dança
amadora ocupava um lugar central
no seu trajecto. Enquanto experiên-
cia formadora e enquanto memória
das aulas de dança em Torres Novas
nos anos 90, mas também enquan-
to fonte de inspiração e matéria
criativa que encontrava forma de se
inÆltrar no seu discurso autoral
De hoje e até 9 de Abril, o coreógrafo actual. Aos poucos, e percebendo
e bailarino regressa ao espectáculo que em criações como Dança sem Vergo-
nha o quanto esse contacto inicial
o pôs no caminho da dança. Teorias com a dança reemergia nas suas
peças, foi crescendo em David Mar-
da Inspiração reinterpreta memórias ques a vontade de recuar ainda mais
ÁGATA XAVIER
e regressar ao espectáculo que, em “as VHS todas, horas e horas”, à pro-
1992, tinha então seis anos, moldou cura dessa pista, concluiu que talvez
o seu percurso. alguém não soubesse da sua impor-
Teorias da Inspiração, no Teatro tância e tivesse gravado algum pro-
do Bairro Alto, Lisboa, entre hoje e
9 de Abril, partiu desse mergulho na
fonte, no “momento inaugural” do
seu desejo de expressão artística e
grama da televisão por cima.
Na ausência de um registo Ælma-
do, contactou a professora de Dança
Helena Azevedo e algumas das alu-
de se envolver numa vida criativa.
“E foi também o momento inaugu-
ral”, explica David Marques ao
nas que participaram no espectácu-
lo, tentando recuperar essas memó-
rias. E só então descobriu que aque-
PÚBLICO, “de perceber que podia
partilhar uma certa sensibilidade
com outras pessoas, algo muito
importante num contexto de Torres
Novas, em que sentia uma certa soli-
dão.” Esse primeiro impulso é muito
claro: o tal espectáculo de 1992, inti- Aqui existe essa
tulado Mulher Traço Variações, apre-
sentado no Teatro Virgínia, que dimensão da
David teve gravado numa cassete fantasia e da
VHS vista e revista vezes sem conta.
Agora, no processo de pensar e pre- possibilidade de
parar a peça, quando foi tentar recu- pensar como age
perar essa gravação, o coreógrafo e
bailarino percebeu que a cassete se sobre o passado
tinha perdido — a fonte transforma- David Marques
da em balde de água fria. Após ver Bailarino e coreógrafo
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Público • Terça-feira, 5 de Abril de 2022 • 29

Cultura

le exemplo primeiro de ousadia

artística que lhe formara o imaginá-
rio, e que tinha guardado como um
gesto de absoluto arrojo, fora, aÆnal,
uma aposta clara da professora num
espectáculo de gosto popular, depois
de no ano anterior os pais terem
abandonado a sala insatisfeitos com
a apresentação. E isso faz com que
Teorias da Inspiração se construa
sobre as memórias transmitidas por
David Marques ao restante elenco
(Francisco Rolo, Luís Guerra e Nina
Botkay), com a única fonte docu-
mental a consistir num arquivo de
fotograÆas a que o coreógrafo con-
seguiu ter acesso, mas também em
confronto com a verdade daquele
espectáculo que transportou consi-
go ao longo de anos.
Quando os quatro entram em pal-
co com o rosto adornado por proe-
minentes narizes postiços, estamos,
portanto, diante de um símbolo que
aponta em dois sentidos distintos:
tanto sublinha os gestos de inspira-
ção profunda que descrevem ao
encher os pulmões junto do compu-
tador que, pousado sobre uma mesa,
ostenta uma fotograÆa do espectá-
culo original, quanto nos remete de
imediato para a Ægura de Pinóquio
e para a sugestão de que a memória
tende a romantizar as experiências
marcantes e pode, mais ou menos
involuntariamente, falsear ou distor-
cer acontecimentos. “Claro que na
peça [original] as bailarinas não usa-
vam narizes”, ressalva David Mar-
ques. “Mas aqui existe essa dimen-
são da fantasia e da possibilidade de
pensar como age sobre o passado.”
Os narizes, cómicos pelo seu
óbvio exagero, tentam também
dizer-nos que nada em palco é leva-
do “demasiado a sério”. Por muito
que, como refere o criador, “haja
uma emoção muito forte associada
a isto”, no seu caso. Mas é a sua pró-
pria mitologia que quer pôr em cau-
diferentes olhares sobre aquele
objecto, pensando até que pode ser
ele a olhar-nos a nós.”
Se esse passado é representado,
algo paradoxalmente, por um com-
putador, há nisso também uma iro-
nia que o criador traz para cima da
mesa, através da presente omnipre-
sença dos portáteis nas processos de
criação de espectáculos de dança, e
um certo fetichismo com a memória,
com as fontes, com a pesquisa que
há-de revelar-se mais tarde, quando
os intérpretes voltam àquele mesmo
lugar e erotizam a relação com os
mesmos elementos. “Um erotismo
ligeiramente circense, carnavalesco
ou ritualístico”, pormenoriza David
Marques. “[Mas esse fetichismo alar-
ga-se também à] maneira de nos
relacionarmos com a arte como
objecto de desejo e isso constituir-se
também como um motor da nossa
necessidade de continuar a produzir
e a usufruir de objectos artísticos.”
Só depois de realmente se liberta-
rem da esfera de inÇuência dessa
simbologia do passado, na verdade,
é que os quatro acabarão por subir
a um pequeno palco colocado em
cena, onde reinterpretarão com
muitas liberdades a memória que
David transporta de Mulher Traço
Variações. Adoptam expressões de
espanto, medo, pena, pânico, tran-
se, loucura ou desespero, avançam
por solos dançados enquanto A mor-
te saiu à rua, de José Afonso, ou A
vaca de fogo, dos Madredeus, soam
como um eco distante, numa traves-
sia de várias décadas. Se no primeiro
caso o desÆle de expressões fazia
realmente parte do espectáculo de
1992, no segundo só a pose de mãos
nas ancas com que Teresa Salgueiro
então cantava recupera essa fonte
original. De resto, o excesso ilustra-
tivo com que a letra da canção dos
Madredeus é dançada brinca com os
preconceitos relativos à dança ama-
Olivia Rodrigo, Silk Sonic, Jon
Batiste e Volodimir Zelenskii
foram as estrelas dos Grammys
MÁRIO ANZUONI/REUTERS
Apelo do Presidente
ucraniano para encher de
música o silêncio deixado
pelas bombas russas
marcou cerimónia
Olivia Rodrigo levou para casa três
prémios, entre eles os de artista
revelação e de melhor álbum pop,
o músico de jazz Jon Baptiste viu o
seu We Are reconhecido como
álbum do ano e Silk Sonic, com o
hino soul Leave the door open, arre-
cadou o gramofone de gravação e
canção do ano.
Com os Óscares ainda bem frescos
na memória, a gala da 64.ª edição
dos Grammys (anteontem em Las We Are, de Jon Baptiste: álbum do ano
Vegas), com três meses de atraso
devido à pandemia de covid- 19, não que puderem, mas não com o vosso mesmo para os que não os podem
pôde fugir ao episódio Chris Rock/ silêncio”, disse. “Preencham o silên- ouvir. Mas a música vai passar”, dis-
Will Smith, mas decorreu sem inci- cio com música”, continuou o chefe sera Zelenskii momentos antes,
dentes e com um convidado de hon- de Estado, num discurso a que se garantindo que o seu povo luta pela
ra, que chegou ao auditório via vídeo seguiu John Legend, interpretando liberdade de que gozam todos os que
e com um apelo pungente — Volodi- a sua mais recente canção, Free. subiram ao palco na sala de espectá-
mir Zelenskii. “Rain down freedom until we’re all culos de Las Vegas, luta pelo direito
Na cerimónia, que teve actuações free”, enquanto eram projectadas “a viver, a amar, ao som”.
de Lil Nas X, Billie Eilish e BTS, con- imagens do conÇito e informações Os prémios para Jon Batiste e para
tando com Joni Mitchell, numa das sobre formas de auxílio aos refugia- Silk Sonic, projecto que junta Bruno
suas raras aparições públicas, para dos ucranianos. Mars e o rapper Anderson Paak,
apresentar Brandi Carlile, Zelenskii Em palco, Legend teve a seu lado beneÆciaram do facto de a indústria
surgiu numa mensagem previamen- as músicas ucranianas Mika Newton da música que os Grammys celebram
te gravada para pedir aos artistas e Suzanna Iglidan. ter o hábito de privilegiar os artistas
que enchessem de música o silêncio “Os nossos músicos usam coletes que honram a sua herança musical,
deixado pelas bombas russas. à prova de balas, em vez de smokings. escreve Mark Savage, jornalista da
“Apoiem-nos de todas as formas Cantam para os feridos nos hospitais, BBC. PÚBLICO
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sa: talvez a peça que ajudou a deÆnir
a sua vida não tenha sido, bem vistas
as coisas, assim “tão interessante”.
Só que isso pouco interessa e David
Marques sabe-o bem: relevante é o
efeito que produziu em si na altura
e não aquilo que um qualquer olhar
mais desapaixonado, com a distân-
cia, revelaria hoje.
dora, como se fosse uma fatalidade
cair nesta armadilha de traduzir no K   W  Z >  D  E d K   h Z K W  h
corpo versos como “À porta daquela        / E  D  d     W K Z d h ' h  ^ 
igreja / vai um grande corrupio” ou
“Soltaram uma vaca em chamas /
 W Z  ^  E d  D
com um homem a guiar.” Mas aí hD/>K 3 DIAS  CINEMA /KK
estamos diante de uma provocação LUX-PRÉMIO KWj>/K
de David Marques.
Essa é uma secção, aÆnal, que
QUO VADIS, AIDA?

GREAT FREEDOM

explora o interesse do coreógrafo

Fetichismo da memória na criação de uma “tensão na litera-
ĚĞ:KE^WK,ZZ^Dh^^E

Quando os narizes dos quatro inspi- lidade” e na tentativa de “encontrar

ram profundamente o ar junto complexidade dentro da literalida-
FLEE, A FUGA

daquele computador, há sempre um de”. Mesmo que Teorias da Inspira-

ĚĞ^^d/ED/^E
8 ABRIL | 19H00
7 ABRIL | 19H30
6 ABRIL | 19H00

dos intérpretes que se solta do cír- ção seja uma peça cheia das leituras
culo lugar, afastando-se, protagoni- que vêem mais do que aquilo que
ĚĞ:^D/>E/

zando um pequeno solo, antes de está no palco. Como no solo que,

regressar à posição inicial — como
se fosse impossível de cortar o mag-
netismo daquele lugar. O passado
está sempre lá e dele não se conse-
guem desligar. “Há um movimento
de atracção em que não se percebe
se os nossos olhares são de conÆr-
mação de alguma coisa, de cópia ou
até de contemplação”, reÇecte
David Marques. “Tentamos que haja
essas camadas ou possibilidades de
associado à canção, originalmente
tinha uma qualquer carga ritualista
e levando a que David crescesse a
pensar que aquela rapariga sozinha,
no meio do palco, vestida de preto,
enquanto um coro coreográÆco de
mulheres que dançava nas suas cos-
tas, era uma autêntica Sagração da
Primavera. E é possível que fosse.
Pelo menos, não há VHS que o des-
minta.
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30 • Público • Terça-feira, 5 de Abril de 2022
Cultura
O Tremor está de volta e promete continuar
a não ser só um festival de música
Rui Pedro Paiva
Festival que hoje começa
inclui uma peça criada
por cem pessoas da região,
uma orquestra modular
e jantares comunitários
No salão do Centro Paroquial de S.
José, centro de Ponta Delgada, 30
pessoas estão sentadas em círculo.
Apresentam-se uma a uma: nome,
idade, proÆssão, signo. Depois, reve-
lam os gostos. Quando algum dos
presentes não percebe, interrompe
e questiona. A conversa Çui natural-
mente.
São homens e mulheres de dife-
rentes idades e vocações, oriundos
de vários pontos de São Miguel e do
país. O primeiro dia de ensaios de
Atlas — São Miguel , a que o PÚBLICO
assiste, é também o arranque não
oÆcial do Tremor, festival que desde
2014 vem agitando a cultura açoriana
e cuja edição 2022 hoje começa.
O espectáculo de Ana Borralho e
João Galante, que terá duas apresen-
tações no Tremor, sexta e sábado,
resulta de uma das residências artís-
ticas do festival e vai juntar cem pes-
soas em palco, “todas amadoras”,
que responderam a um apelo públi-
co da organização. É uma “oportu-
nidade” única para muitos.
“Sempre gostei desta área. Nunca
tive a oportunidade e agora que tive
decidi participar. Estava muito ansio-
sa”, revela Vanessa Janeiro, de 21
anos. Natural da Ponta Garça, uma
freguesia rural da ilha que Æca a mais
de 30 quilómetros do centro de Pon-
ta Delgada, a distância impediu-a de
frequentar o teatro na adolescência.
“Encontrei aqui uma oportunidade
de dar voz àquilo que sinto.”
A jovem trabalha numa óptica e
“adora” escrever poemas, “sobretu-
do tristes”. Com o Tremor, encon-
trou um campo para se “aÆrmar”,
como se viesse à tona uma ilha den-
tro desta ilha ainda marcada por um
conservadorismo estrutural. “Às
vezes quero ler o meu poema ou
expressar a minha arte e há sempre
alguém a dizer que é uma parvoíce,
que não vale nada. Mas é o que gosto.
Porque é que somos criticados por
aquilo que gostamos de fazer?”
Um “projecto de família”
A versão micaelense de Atlas, peça
originalmente estreada em 2011, é o
reÇexo ideal do Tremor, que fez da
ligação à comunidade a sua essência.
O espectáculo já passou por quase
50 cidades, dentro e fora da Europa,
e todas as suas encarnações têm um
Casper Clausen foi um dos
convidados do Tremor 2021;
em baixo, um ensaio de Atlas
O que aqui se passa
é condicionado
pela ilha. No
sentido positivo.
Fazemos o que
nos deixam fazer
Mário Laranjeira
Promotor do Tremor
DR
cunho local. Em São Miguel não vai
ser diferente. “Esta peça é muito rei-
vindicativa. Vamos incluir desejos
das pessoas e também tentar encon-
trar problemas do arquipélago para
pôr em palco”, explica Andrea Sozzi,
da associação cultural casaBranca.
DeÆnir que problemas serão esses
é tarefa a que os voluntários se dedi-
carão nos próximos dias, mas a dis-
cussão já começou. “Temos vindo a
identiÆcar alguns aspectos próprios
da insularidade que nós que mora-
mos no continente, mesmo já tendo
passado aqui umas férias, não senti-
mos na pele”, assinala o produtor,
apontando o material de construção
que “demora seis meses a chegar”
ou os níveis elevados de consumo de
drogas e de abandono escolar.
No meio do grupo está Iva Matos,
VERA MARMELO
directora da Biblioteca Pública e
Arquivo Regional de Ponta Delgada,
que se inscreveu ao ver o anúncio
nas redes sociais. “Isto é uma opor-
tunidade de dissecar o que nos preo-
cupa enquanto membros da socie-
dade para eventualmente mudar ou
alertar”, diz, registando as “visões
completamente diferentes” que vão
permitir “apresentar uma “radiogra-
Æa da sociedade sem medo, sem Æl-
tros e sem preconceitos”.
Mais ao lado está Vítor Reis, de 64
anos, para quem o Atlas é um “pro-
jecto de família”. Veio com a mulher
e com a Ælha que tem autismo. “É
importante para nós. Eu até conheci
a minha mulher no teatro”, recorda
o electricista agora reformado. É
natural do Cacém e sempre teve o
“bichinho”, mas abandonou o teatro
amador há 40 anos, quando passou
a viver nos Açores. “Há falta de gru-
pos de teatro. As pessoas cá estão
mais viradas culturalmente para as
bandas de música e portanto isto foi
uma oportunidade”, diz.
Uma oportunidade há muito per-
seguida. “Desde 2020 que quería-
mos fazer o Atlas”, confessa Márcio
Laranjeira, organizador do Tremor,
explicando que a ideia teve de ser
suspensa devido à pandemia. “É o
espectáculo com maior envolvência
da comunidade que já Æzemos.”
Um cartaz ecléctico
No cartaz do Tremor 2022, Atlas é
também um símbolo do pós-pande-
mia. A última edição do festival foi
empurrada de Abril para Setembro
e foi marcada por constrangimentos:
“Organizá-lo já foi uma vitória.”
Desta vez, não há restrições. “Os
bilhetes estão quase esgotados e há
muito público que vem pela primei-
ra vez”, prossegue Márcio Laranjei-
ra, lembrando que nunca a distância
entre edições foi tão curta.
O Tremor 2022, que vai passar por
vários palcos de Ponta Delgada e da
Ribeira Grande, arranca hoje com as
“sonoridades ligadas ao jazz e à nova
música africana” de Tristany, segui-
do do metal dos quenianos Duma.
Nos dias seguintes, haverá o “post-
punk dançável” dos Baby’s Berserk,
o “projecto estético-artístico-políti-
co” Trypas Coração, o “afrodisco”
dos L’Eclair, os “mestres do jamba-
core” The Rite of Trio, o “experimen-
talismo” dos MadMadMad, a música
electrónica africana dos Nyege Nye-
ge, Rodrigo Amarante e os “ritmos
dançantes” dos Kebraku. “Continua-
mos na senda a que o Tremor já nos
habituou da mistura e do eclectismo.
Não é tentar agradar a toda a gente.
É tentar que muita gente encontre
algo especial na programação.”
Mas há mais. O festival envolve-se
com a paisagem e com as pessoas.
Vai voltar a acontecer o Tremor
Todo-o-Terreno, que propõe uma
caminhada ao som de uma compo-
sição criada de propósito para o per-
curso; tal como o Tremor na Estufa,
que promove “concertos-surpresa”
em espaços revelados pouco antes
da hora marcada e que tanto podem
ser uma estufa, uma pequena loja ou
um local recôndito da ilha.
Continuando a desbravar cami-
nhos e a “criar coisas novas”, o Tre-
mor dispôs-se este ano a fundar uma
orquestra modular, celebrando a
“união social” das Ælarmónicas do
arquipélago. Outra novidade são as
“experiências gastronómicas” parti-
lhadas com a comunidade. Uma
delas consistirá num jantar colectivo
com pratos típicos, a ter lugar na
Casa do Espírito Santo de Rabo de
Peixe, espaço destinado às festas em
honra da terceira Ægura da santíssi-
ma trindade, um dos traços mais
vincados da religiosidade açoriana.
A outra “experiência” porá peque-
nos grupos de pessoas a ter um jan-
tar tradicional em casas de famílias
daquela freguesia piscatória.
“O que acontece aqui é condicio-
nado pela ilha. No sentido positivo.
Fazemos o que nos deixam fazer”,
realça o organizador. “É mesmo
especial.” Uma ligação simbiótica
entre uma ilha, a cultura e a comuni-
dade: “O Tremor nunca foi só um
festival de música.”
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Público ClassiÄcados • Terça-feira, 5 de Abril de 2022 • 31

TRIBUNAL JUDICIAL TRIBUNAL JUDICIAL TRIBUNAL JUDICIAL TRIBUNAL JUDICIAL

DA COMARCA
DE LISBOA NORTE
Juízo Local Cível de Loures - Juiz 2
Processo: 9041/21.3T8LRS
ANÚNCIO
Acompanhamento de Maior
Requerente: Manuel Carlos Neto da Silva Pinto
Requerido: Joaquim da Silva Pinto
Faz-se saber, que nos autos de
Acompanhamento do Maior, acima
identificados, por sentença já transitada
em julgado, foram decretadas as medidas
de acompanhamento de Joaquim da Silva
Pinto, com residência em domicílio: Rua
dos Girassóis, 6 e 6A, Hospital do Mar
Unidade Cuidados Especializados, 2695-
458 BOBADELA, o quadro de incapacidade
permanente reporta-se ao dia 30-11-2019.
Foi designada como Acompanhante
Manuel Carlos Neto da Silva Pinto, filho
do Acompanhado, a quem incumbirá a
representação geral do Beneficiário Joaquim
da Silva Pinto, beneficiando de medidas que
se descriminam: Representação geral artigo
145.º, n.º 1 alínea b) e 258.º do C.C.;
O Património do Acompanhado deverá ser
totalmente administrado pelo Acompanhante
nomeado - artigo 145.º, n.º 1 alínea c) do C.C.;
Poderá o Acompanhante movimentar as
contas bancárias e/ou aplicações financeiras
tituladas pelo Acompanhado, com o intuito
de proceder a pagamentos de despesas
correntes;
Deverá o Acompanhante assegurar que o
Acompanhado seja observado periodicamente
por médico de medicina geral e familiar e de
neurologia e psiquiatria - artigo 145.º, n.º 1
alínea e);
Deverá o Acompanhante assegurar que as
prescrições médicas sejam seguidas;
Deverá ainda o Acompanhada manter a sua
atual residência, com apoio de cuidadores
24h/dia;
Caso venha a revelar-se necessário, poderá
o Acompanhado ser integrada em outra
instituição apta a suprir as incapacidades
acima referidas;
Poderá o Acompanhante aceitar tratamentos
que medicamente sejam indicados e
propostos ao Acompanhado (i.e., decisões
de saúde);
Deverá ser objeto de autorização judicial prévia
quaisquer decisões de recusa de tratamento
proposto de acordo com as leges artis que
gerem uma possibilidade de redução do
Freguesia de Arnoia
ASSEMBLEIA GERAL
CONVOCATÓRIA EDITAL
Carlos Vítor da Costa Moura, Presidente da Junta de
Nos termos do n.º 1, do Artigo 32.º dos Estatutos, convoco os
Associados no pleno gozo dos seus direitos estatutários para a Freguesia de Arnoia, Concelho de Celorico de Basto
Assembleia Geral Ordinária da Associação dos Industriais da Distrito de Braga, em conformidade com o disposto no
Construção Civil e Obras Públicas – AICCOPN, a qual terá lugar às regulamento do Cemitério da Freguesia e do Decreto
14:00 horas, do dia 22 de abril de 2022 (sexta-feira), com a seguinte 48770 de 18 de dezembro de 1968, faz saber que
foram consideradas abandonadas as sepulturas
ORDEM DE TRABALHOS
330, 333, 336, 338, 340 da 8.ª secção do Cemitério
1. Apreciação, discussão e votação do Relatório e Contas desta
da freguesia.
Associação, com referência a 31 de dezembro de 2021;
2. Decisão sobre a aplicação do saldo de gerência, dando Informam-se as pessoas que possam ter direito
cumprimento à alínea c), do n.º 1, do artigo 82.º dos Estatutos. sobre o uso privativo das referidas sepulturas, que
as deve reivindicar no prazo de 60 (sessenta) dias a
contar da data da publicação deste edital, na sede da
Nota: Na abertura da Assembleia, é concedido um período de 30 Junta de Freguesia, ou pelos canais de comunicação
minutos antes do ponto 1 da Ordem de Trabalhos para estabelecidos. Este edital será também publicado no
apreciação de quaisquer assuntos de interesse para a Associação.
Jornal local O Povo de Basto com edição datada de
31 de março de 2022 e ainda no Jornal nacional “O
Se à hora marcada não estiverem presentes, pelo menos, metade dos
Associados, a Assembleia Geral funcionará decorrida meia hora sobre Público” de 5 de abril de 2022.
a hora marcada. Findo este prazo, sem que sejam encontrados ou
reconhecidos habilitantes às referidas sepulturas,
Os Senhores Associados poderão optar por fazer-se representar
nesta Assembleia Geral por outro Associado, devendo para tal efeito deverão estas considerar-se prescritas a favor da
Junta de Freguesia de Arnoia, dando esta enquanto
ser entregue, procuração/carta dirigida ao Presidente da Mesa da
Assembleia Geral, da qual conste a ordem de trabalhos e os poderes entidade gestora, o destino considerado conveniente
que lhe são conferidos, sendo que nenhum Associado poderá aos restos mortais mineralizados que se encontrem
representar mais de dois Associados. nas citadas sepulturas, nos termos da legislação em
vigor.
Porto, 5 de abril de 2022
Arnoia, 31 de março de 2022
O Presidente da Mesa da Assembleia Geral,
Joaquim António Nogueira da Hora O Presidente da Junta
Carlos Vítor da Costa Moura
DA COMARCA
DE LISBOA NORTE
Juízo Local Cível de Loures - Juiz 2
Processo: 586/22.9T8LRS
ANÚNCIO
Acompanhamento de Maior
Requerente: Ministério Público
Acompanhado: Victória José
Faz-se saber que foi distribuído
neste tribunal, o processo de
Acompanhamento de Maior, em que
é requerido Victória José, nascido
em 17-06-1979, com domicílio:
Casa Santa Maria - Associação
Profissionais Hospital de Santa
Maria, Alameda Dr. Francisco Sá
Carneiro, N.º 30, Camarate, 2680-040
Camarate, com vista à aprovação
de medidas que visam assegurar o
seu bem-estar, a sua recuperação,
o pleno exercício de todos os seus
direitos e o cumprimento dos seus
deveres, salvo as exceções legais ou
determinadas por sentença.
Passei o presente e outro de igual teor
para serem afixados.
N/ Referência: 152097262
Loures, 22-03-2022
O Juiz de Direito
Dr. Diogo Alves
A Oficial de Justiça
Ana Maria Branco C. Corda
Público, 05/04/2022
TRIBUNAL JUDICIAL
DA COMARCA
DE LISBOA NORTE
Juízo Local Cível de Loures - Juiz 2
Processo: 3190/22.8T8LRS
ANÚNCIO
Acompanhamento de Maior
Requerente: Ministério Público
Acompanhado: Renato Demétrio de
Carvalho Samuel Samba
FAZ-SE SABER que foi distribuído
DA COMARCA
DE LISBOA NORTE
Juízo Local Cível de Loures - Juiz 2
Processo: 2990/22.3T8LRS
ANÚNCIO
Acompanhamento de Maior
Requerente: Ministério Público
Acompanhado: Eva Carine Straub
Botelho
Faz-se saber que foi distribuído
neste tribunal, o processo de
Acompanhamento de Maior, em que é
requerido Eva Carine Straub Botelho,
com domicílio: Rua Vasco da Gama,
4 - 2.º C, Urb. do Infantado, 2670-393
Loures, com vista a serem definidas
medidas de acompanhamento, com
vista à aprovação de medidas que
visam assegurar o seu bemestar, a
sua recuperação, o pleno exercício
de todos os seus direitos e o
cumprimento dos seus deveres, salvo
as exceções legais ou determinadas
por sentença.
Passei o presente e outro de igual teor
para serem afixados.
N/ Referência: 152098426
Loures, 22-03-2022
O Juiz de Direito
Dr. Diogo Alves
A Oficial de Justiça
Ana Maria Branco C. Corda
Público, 05/04/2022
DA COMARCA
DE LISBOA NORTE
Juízo Local Cível de Loures - Juiz 2
Processo: 3039/22.1T8LRS
ANÚNCIO
Acompanhamento de Maior
Requerente: Ministério Público
Beneficiário: Rosa Martins Marques
Faz-se saber que foi distribuído
neste tribunal, o processo de
Acompanhamento de Maior, em que
é requerido Rosa Martins Marques,
nascido em 01-10-1941, filho(a)
de Antonio Marques Junior e de
Olivia Margarida Martins, natural de:
Albergaria-a-Velha, com domicílio:
Praceta Pedro Manuel Pereira, N.º
4 - 5.º Esq.º, 2675-179 Povoa de
Santo Adrião, com vista à aprovação
de medidas que visam assegurar o
seu bem-estar, a sua recuperação,
o pleno exercício de todos os seus
direitos e o cumprimento dos seus
deveres, salvo as exceções legais
ou determinadas por sentença.
Passei o presente e outro de igual
teor para serem afixados.
N/ Referência: 152100050
Loures, 22-03-2022
O Juiz de Direito
Dr. Diogo Alves
A Oficial de Justiça
Ana Maria Branco C. Corda
Público, 05/04/2022
REPÚBLICA
FEDERATIVA DO BRASIL
Consulado-Geral do Brasil em Faro
EDITAL DE CASAMENTO
Cláudia Angélica Vasques Silva, Cônsul-
Geral Adjunta do Brasil em Faro, usando
das atribuições que lhe confere o art.º
18 da Lei de Introdução ao Código Civil,
faz saber que pretendem casar Weslley
de Assis Oliveira, natural de Rio de
Janeiro, Rio de Janeiro, Brasil, nascido
a 06/10/1994, residente e domiciliado
na Rua de São Pedro, n.º 82, Alcáçovas,
Portugal, Código Postal: 7090-041, nesta
jurisdição consular, filho de Adriano da
Conceição Oliveira e de Bianca de Assis
da Silva e Laryssa Cristiane Eugenio
Ferreira, natural de Rio de Janeiro, Rio
de Janeiro, Brasil, nascida a 05/05/1996,
residente e domiciliada na Rua de São
Pedro, n.º 82, Alcáçovas, Portugal,
Código Postal: 7090-041, nesta jurisdição
consular, filha de Aluisio Antonio Ferreira e
de Marisa da Conceição Eugenio Ferreira.
Apresentaram os documentos exigidos
pelo Art.º 1.525 do Código Civil.
Se alguém souber de algum impedimento,
oponha-o na forma da Lei. Lavrado o
presente para ser afixado em lugar visível
da Chancelaria deste Consulado-Geral.
Tereza Cristina da Silva Santos
Oficial de Registro Civil “ad-hoc”

MARIA ANTONIETA SALES

neste tribunal, o processo de
PIRRALHA – MARTIM
conforto e bem-estar do Acompanhado;
Nos termos do disposto no artigo 147.º do Acompanhamento de Maior em
C.C., foi determinado a restrição dos seguintes que é requerido Renato Demétrio
direitos pessoais: Capacidade de testar;
Realização de transações da vida corrente. 2003/2022 OFEREÇA de Carvalho Samuel Samba, filho
de Pedro Manuel Samba e de
N/ Referência: 152234883
Loures, 31-03-2022
O Juiz de Direito
Dr. Diogo Alves
Ano após ano,
A nossa vida se vai desenrolando. FILMES & SÉRIES
Teresa Maria de Carvalho Samuel
Samba, nascido em 18 de Agosto
de 2003, natural de Angola com
domicílio: Rua Cândida Aires de
LOURENÇO MOURO
A Oficial de Justiça Entre vales e montes, Magalhães, 6 R/c Dt.º, 2675-517

Ana Maria Branco C. Corda
Público, 05/04/2022
JERÓNIMO MARTINS, SGPS, S.A.
AGRADECIMENTO
Os dias nascem e florescem. Odivelas, com vista à aprovação
de medidas que visam assegurar o
seu bemestar, a sua recuperação,
o pleno exercício de todos os seus
direitos e o cumprimento dos seus
deveres, salvo as excepções legais
ou determinadas por sentença.
Sua Família agradece desde já a todas
N/ Referência: 152155392
Loures, 25-03-2022 as pessoas que se dignaram a estar
O Juiz de Direito
Dr. Diogo Alves presentes no funeral, assim como a todos
A Oficial de Justiça
Ana Maria Branco C. Corda

Rua Actor António Silva, n.º 7, Lisboa MAIS INFORMAÇÕES:

MAIS INFORMAÇÕES
loja.publico.pt
loja publico pt || 210
210 111
111 010
010 Público, 05/04/2022 que de alguma forma lhes manifestaram
Capital Social de Euro 629.293.220,00
Matrícula na Conservatória do Registo Comercial
o seu pesar.
de Lisboa e NIPC: 500 100 144

ADITAMENTO À CONVOCATÓRIA Câmara Municipal de Loulé

Agência Funerária Magno-Alvalade
800 204 222 - servilusa.pt
DA ASSEMBLEIA GERAL ANUAL
Em cumprimento das disposições conjugadas do artigo 378.º
AVISO
do Código das Sociedades Comerciais e do artigo 23.º-A do Nos termos do n.º 2 do artigo 78.º do Decreto-Lei n.º 555/99,
Código dos Valores Mobiliários, informam-se os acionistas de de 16 de dezembro, alterado e republicado pelo Decreto-Lei n.º
JERÓNIMO MARTINS, SGPS, S.A. de que foi apresentado, 136/2014, de 9 de setembro, torna-se público que a CÂMARA
por um acionista detentor de mais de 2% do capital social, um MUNICIPAL DE LOULÉ, emitiu em 23/03/2022, o Aditamento
pedido de inclusão de assunto na ordem do dia da Assembleia ao Alvará de Licenciamento de Operação de Loteamento n.º
1/2016, em nome de GROWING SPRING - INVESTIMENTOS
Geral Anual da Sociedade, convocada para se realizar no
IMOBILIÁRIOS E TURÍSTICOS, S.A., na sequência da deliberação
próximo dia 21 de abril de 2022, pelas 11 horas, na sua sede
camarária de dezassete de março de dois mil e vinte e um, através
social, sita na Rua Actor António Silva, n.º 7, em Lisboa, e do qual foi licenciada a alteração às especificações do Alvará
onde os acionistas poderão participar presencialmente ou por
Engenheiro
de Loteamento n.º 1/2016, emitido em quinze de dezembro de
meios telemáticos nos termos previstos na Convocatória. dois mil e dezasseis, relativo aos Lotes 1 e 2, que incide sobre
Porque o pedido obteve deferimento, a Ordem de Trabalhos os prédios sitos em Forte Novo ou Cavacos, da Freguesia de
da Assembleia Geral Anual anteriormente referida passou a
incluir mais um ponto, que será o ponto 6, “Deliberar sobre
Quarteira, descritos na Conservatória do Registo Predial de Loulé
sob o número treze mil e quarenta e três, barra, dois mil e dezoito,
SÉRGIO MANUEL FERREIRA
a remuneração dos membros da Comissão de Vencimentos”.
A partir da data de divulgação do presente aditamento à
zero quatro, zero dois, inscrito na matriz predial urbana sob o
artigo número dezasseis mil quatrocentos e dezassete, e número DOS SANTOS BRITO
treze mil e quarenta e quatro, barra, dois mil e dezoito, zero quatro,
convocatória encontrar-se-ão à disposição dos acionistas,
para consulta, na página do Grupo Jerónimo Martins na
zero dois, inscrito na matriz predial urbana sob o artigo número
dezasseis mil quatrocentos e dezoito, da respetiva freguesia.
FALECEU
internet (www.jeronimomartins.com), bem como na sede da Área abrangida pelo Plano Diretor Municipal.
Sociedade, durante as horas de expediente, para além dos Após a alteração titulada pelo aditamento ao alvará de loteamento
Esposa, filhas, genros e netos participam
elementos e informações preparatórios da Assembleia Geral, n.º 1/2016, a operação de Loteamento passa a ter as seguintes o seu falecimento. O seu funeral será
designadamente os previstos no artigo 289.º, n.º 1 do Código características:
das Sociedades Comerciais e no artigo 21.º-J, n.º 1 do Código Não existe alteração na área do prédio a lotear; realizado amanhã, dia 06 de Abril, saindo
dos Valores Mobiliários, o requerimento de inclusão do novo Não existe alteração nas áreas totais de implantação e de da Igreja de Nossa Senhora da Conceição
assunto na ordem do dia, bem como os documentos que construção;
o instruem. Não existe alteração no número de lotes, no número de fogos e - Lisboa às 10h00, para Almagreira -
nas suas finalidades; Pombal, onde será realizada missa de
Advertem-se os acionistas de que, em tudo o que não contenda
A alteração à operação de loteamento compreende a alteração
com a alteração da ordem de trabalhos que agora se divulga, corpo presente às 15h00. Será sepultado
das cotas de soleira de 8.00 para o Lote 1 e de 8.50 para o Lote 2;
se mantém o regime constante da convocatória da aludida Não existem alterações nas áreas de cedência à Câmara Municipal.
Assembleia Geral Anual.
Loulé, 23 de março de 2022
em seguida no cemitério local.
Lisboa, 4 de abril de 2022 VÍTOR MANUEL GONÇALVES ALEIXO, Presidente da Câmara
Municipal de Loulé Agência Funerária Magno-Alvalade
O Presidente da Mesa da Assembleia Geral 800 204 222 - servilusa.pt
Abel Bernardino Teixeira Mesquita PROC. 17LT/04 LOTE
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32 • Público • Terça-feira, 5 de Abril de 2022
Guia
leituras
publico.pt/leituras
Sugestões
Natasha Brown,
a escritora que não
teme nomear
o elefante na sala
Os Retornados
de Xangai
Autoria: António
Caeiro
(Ed.: Tinta-da-
-china; 208 págs.,
17,90€;
quinta-feira
nas livrarias)
Em Julho de 1991, estava António
Caeiro há apenas seis meses na
China (onde viveu 19 anos) como
enviado da agência Lusa quando,
durante uma visita do ministro da
Educação português Roberto
Carneiro, soube que havia uma
comunidade portuguesa em
Xangai desde o século XIX. A sua
curiosidade acerca dela nunca
desapareceu, conta no prólogo
de Os Retornados de Xangai —
Histórias de Portugueses do
Oriente. “Como a revelação de
uma fotografia em câmara escura,
a pouco e pouco, depois de
muitas horas de entrevistas, de
pesquisa em arquivos e de
recordações diversas, mil e uma
histórias começaram a emergir.”
Uma das histórias é a do pai do
então ministro, o músico Art
Carneiro, pioneiro do jazz em
Portugal. Livro é apresentado por
Dulce Maria Cardoso e Guilherme
de Oliveira Martins no dia 7, às
18h30, na Gare Marítima da Rocha
do Conde de Óbitos, em Lisboa.
Em 2020, ano em que a Feira do
Livro de Frankfurt aconteceu
virtualmente por causa da
pandemia, o primeiro romance da
britânica Natasha Brown, descrita
pela editora Hermione Thompson
como uma “escritora que não tem
nenhum problema em nomear o
elefante na sala”, foi um dos livros
que conseguiram um avanço na
ordem dos seis dígitos quando
ainda não estava totalmente
escrito. Assembly, vendido para
vários países, foi publicado em
Portugal no mês de Março pela
Livros do Brasil com o título
Encontro. Podendo ser incluído
no género de autoficção, aborda
o racismo, o assédio no local de
trabalho e a igualdade de género,
a emigração e ascensão social
numa sociedade em que a classe
social determina muitas vezes as
oportunidades individuais.
Natasha Brown estudou
Matemática em Cambridge,
trabalhou no mercado financeiro
e foi seleccionada pelo Women’s
“Tenho O Prazer
de Informar
o Senhor
Director...” —
Cartas de
Portugueses
à PIDE (1958-
-1968)
Autoria: Duncan Simpson
(Ed.: BookBuilders; 184 págs.,
16,90€; quarta-feira nas
livrarias)
“O meu argumento é que a
relação entre a sociedade
portuguesa e a PIDE foi sempre
muito mais activa, interactiva e
multifacetada do que tem sido
reconhecido até hoje. (...) Ao
integrar as diversas formas de
relações vindas ‘de baixo para
cima’ entre cidadãos individuais e
a PIDE, e recorrendo também à
ampla historiografia das ‘práticas
acusatórias’ e da vida quotidiana
em ditaduras contemporâneas ao
Estado Novo, pretende-se trazer à
luz do dia os vários tipos de
interacções que marcaram o
relacionamento entre cidadãos
comuns e a PIDE”, escreve na
introdução o investigador do
Instituto de Ciências Sociais
Duncan Simpson. Um texto seu
publicado no PÚBLICO sobre o
tema suscitou a reacção de Luís
Farinha, Luísa Tiago de Oliveira,
Irene Pimentel e Luís Reis Torgal.
Prize for Fiction 2022 como uma
das dez melhores autoras abaixo
dos 35 anos. Este livro conta-nos
a história de uma mulher negra
britânica que trabalha no
mercado financeiro e perante um
diagnóstico de saúde tem de
tomar uma decisão. Durante um
dia, em que irá com o namorado a
uma festa da família deste, a
narradora reflecte sobre si e sobre
o que os outros vêem nela. Este
primeiro romance, de 120
páginas, é feito de memórias,
fragmentos de conversas,
poemas, pequenos ensaios
(citações de bell hooks, entradas
de dicionários para as palavras
“branco” e “preto”…). Se a sua
estrutura é por vezes dispersa, é
incisivo nos temas que trata. Um
deles, o livre-arbítrio.
A determinada altura, a narradora,
que sabe que “um pormenor
qualquer pode ser o suficiente
para dar cabo de tudo”, participa
numa reunião com vários colegas,
todos homens, na empresa onde
Entre Dois Fogos:
Verdade,
Ambição e
Compromisso na
Rússia de Putin
Autoria: Joshua
Yaffa (Ed.: Relógio
d’Água
384 págs., 20€; nas livrarias
durante esta semana)
Joshua Yaffa é correspondente
da revista New Yorker em
Moscovo desde 2016. Estudou
na Universidade de Georgetown
e fez o mestrado em Jornalismo
e Estudos Internacionais na
Universidade de Columbia. Em
Entre Dois Fogos: Verdade,
Ambição e Compromisso na
Rússia de Putin, Yaffa “traça um
retrato das lutas internas
travadas entre os que sustentam
o autoritarismo de Putin”, explica
a editora.” Sobre este livro
escreveu Anne Applebaum: “É
um estudo sobre o
compromisso, o oportunismo e
os delicados dilemas morais
existentes na Rússia de Putin.
Através de um conjunto de
histórias criteriosamente
fundamentadas, Joshua Yaffa
demonstra como as pessoas
escolhem — por vezes,
conscientemente — adaptar-se,
mudar e ‘desenrascar-se’ num
Estado autoritário.”
O Livro do Clima, de Greta Thunberg, em Outubro
O novo livro da jovem activista tem “uma perspectiva
global sobre as várias crises que o planeta enfrenta
e como estão interligadas”, e reúne mais de cem
especialistas (Johan Rockström, Michael Mann, Carlos
Nobre ou Thomas Piketty). É lançado em Portugal
pela Objectiva a 27 de Outubro.
Encontro
Autoria:
Natasha Brown
(Ed. Livros do
Brasil; 120
págs.; 14,40€;
nas livrarias)
trabalha. Depois da sua
apresentação, fazem um intervalo
para descansar. “Um homem
aponta para a máquina do café,
diz que não sabe como funciona:
em que botão se tem de carregar,
onde pôr a cápsula. Quando é
que a recepcionista volta? Os
outros fazem coro com ele,
também não sabem.
Perguntam-me, talvez eu saiba.
Pois. Tiro-lhes cafés. E, se
quiserem, posso acrescentar leite
em espuma por cima. Aliviados,
os homens dizem ah, obrigado.
Obrigada” (pág. 39).
Ela “só conhece a Jamaica das
histórias” e para a família afastada
Doce Tóquio
Autoria: Durian
Sukegawa
(Ed. Asa;192
págs., 13.90€;
já nas livrarias)
Quem viu o filme
Uma Pastelaria em
Tóquio, de Naomi Kawase (2015),
e se emocionou com a história da
amizade entre o vendedor de
dorayaki e a velha senhora que
fazia a melhor pasta de feijão do
mundo pode agora ler em
português o livro do japonês
Durian Sukegawa a partir do qual
foi feito o filme. “Uma brisa com
um aroma adocicado soprava na
Rua das Cerejeiras. Sentarô
passava os dias inclinado sobre
uma chapa quente no interior da
loja Doraharu, a confeccionar
panquecas para os seus dorayaki.
A Rua das Cerejeiras era uma
degradada rua comercial numa
zona desertificada da cidade,
uma rua mais digna de nota pelas
lojas vazias do que pelas
cerejeiras esparsamente
plantadas nos passeios. Contudo,
naquele diam talvez por as
árvores se encontrarem em plena
floração, viam-se mais pessoas do
que é habitual. Sentarô levantou a
cabeça e reparou numa idosa de
um chapéu branco na cabeça que
estava parada no passeio (...).”
“é a prima inglesa” mas desde
pequena enfrenta várias lutas.
“Nascida aqui, de pais nascidos
aqui, sempre vivi aqui… e, no
entanto nunca fui daqui. A cultura
deles torna-se uma farsa no meu
corpo” (pág. 66).
Uma noite, o namorado, oriundo
de uma família conservadora,
com dinheiro, influência e
propriedades herdadas de
geração para geração, dorme nu
a seu lado — “com um ressonar
esporádico e asmático”, “numa
pose querubínica”, com “o sexo
cor-de-rosa pousado na coxa”—
ela questiona-se: “Preferia eu isto
a dormir sozinha?”
Sobre este Encontro, a escritora
Ali Smith disse que é “sobre tudo
o que tem mudado e ainda
precisa de mudar, do ponto de
vista social, histórico, político e
pessoal. Pequeno, mas de
impacto gigantesco; acredito que
é o tipo de livro que marca a
fractura entre um antes e um
depois”. Isabel Coutinho
Amor Cão e
Outras Palavras
Que não
Adestram
Autoria: Rosa
Alice Branco
Editora: Assírio
& Alvim
80 págs., 14,40€; quinta-feira
nas livrarias)
A poeta publica o seu segundo
livro na editora Assírio & Alvim.
Doutorada em Filosofia
Contemporânea, lança agora
Amor Cão e Outras Palavras Que
não Adestram “num diálogo
pessoalíssimo com a obra de
Konrad Lorenz, estes são versos
que questionam e desequilibram
dominações antigas: o criador
sobre a criação, o humano sobre
o animal, o homem sobre a
mulher”, resume a editora. “A
escrita é um cão a ganir à porta
que se abre/para lhe dar mimos, o
agasalha à lareira com / um osso
farto e tanto o escorraça, mesmo
se é/ moite e uma carnificina de
neve lhe imobiliza/ as mandíbulas.
O cão escava fundo e tapa, ou
deixa/buracos escondidos como
luras, outros como túneis/ de
metro ligando cidades e a porta
abre ou fecha/mas o cão nunca
desiste das palavras que não/
adestram. Se o dono castiga,
sofre mais ainda /(…).”
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Os conteúdos disponibilizados ao Utilizador assinante não poderão ser copiados, alterados ou distribuídos salvo com autorização expressa do Público – Comunicação Social, S.A.
Cinema
Lisboa
Cinema City Alvalade
Av. de Roma, 100. T. 218413040
O Crime de Georgetown M12. 13h20,
15h25, 17h25, 21h50; Uma Réstia de
Esperança M12. 13h35; Mães Paralelas
M12. 18h40; Drive My Car M12. 15h35,
21h10; Belfast M12. 15h10; Competição
Oficial M12. 19h25; The Batman M14.
21h05; Cordeiro M14. 17h10, 19h20; O Que
Vemos Quando Olhamos para o Céu? M12.
21h30; Esquecido M14. 19h; Depois do
Amor M12. 13h20; Sonic 2: O Filme M6.
13h40, 16h10 (V.Port./2D)
Cinema City Campo Pequeno
Centro de Lazer. T. 217981420
O Crime de Georgetown 13h50,
19h; Cantar! 2 11h30 (V.Port./2D); Belle M12.
19h20; Morbius M12. 13h40, 15h55, 18h50,
21h20; Um Susto de Família 2 M6. 15h20
(V.Port./2D); Belfast M12. 17h15; The
Batman M14. 15h20, 17h40, 19h45,
21h; Koati 11h40 (V.Port./2D); The
Contractor 21h50; As Aventuras de
Lia 15h15 (V.Port.); Ambulância - Um Dia
de Crime M14. 21h40; Sonic 2: O Filme M6.
15h35, 16h20, 17h35 (V.Port./2D) 15h45,
18h40, 21h25 (V.Orig./2D); RRR 21h
Cinema Ideal
Rua do Loreto, 15/17. T. 210998295
Drive My Car M12. 18h; O Poder do
Cão 14h15; Petite Maman - Mamã
Pequenina M12. 16h30; O Que Vemos
Quando Olhamos para o Céu? M12. 21h15
Cinemas Nos Alvaláxia
Alvaláxia Shopping e Lazer. T. 16996
O Crime de Georgetown M12. 13h10; Morte
no Nilo M12. 17h20, 21h05; Dune - Duna M12.
18h; Homem-Aranha: Sem Volta a
Casa M12. 14h20, 17h50; Morbius M12.
13h15, 16h, 18h45, 21h30; Uncharted M12.
13h25, 16h05, 18h55, 21h45; Belfast M12.
21h10; Competição Oficial M12. 13h20;
The Batman M14. 13h30, 16h40, 17h40, 21h,
21h35; Dog: A Aventura de Uma Vida M12.
14h10, 16h50, 19h20; Jackass Para
Sempre M16. 14h30; The Contractor 19h,
21h40; O Poder do Cão 15h40, 18h35,
21h20; X M16. 21h55; Ambulância M14.
14h35, 21h25; Sonic 2: O Filme M6. 13h25,
16h15, 19h05 (V.Port./2D), 21h50 (V.Orig.)
Cinemas Nos Amoreiras
Av. Engº Duarte Pacheco. T. 16996
King Richard: Para Além do Jogo M12.
14h10, 17h20; O Domingo das Mães M12.
21h30; Drive My Car M12.
13h30; Morbius M12. 13h20, 15h50, 18h20,
21h; Uncharted M12. 17h50,
20h30; Belfast M12. 13h50, 16h10, 18h50,
21h10; Competição Oficial M12. 13h10,
15h40, 18h30; The Batman M14. 14h, 17h40,
21h20; O Que Vemos Quando Olhamos
para o Céu? M12. 20h50; Sonic 2 M6.
13h40, 16h20, 19h (V.Port.), 21h40 (V.Orig.)
Cinemas Nos Colombo
Av. Lusiada. T. 16996
Morte no Nilo M12. 13h10, 16h, 18h50,
22h; Uncharted M12. 12h50, 15h20, 18h,
20h50; The Batman M14. 12h30, 14h30,
16h10, 18h10, 20h30, 21h50; Jackass Para
Sempre M16. 13h40, 16h40, 19h20; The
Contractor - Mercenário M16. 13h20,
15h50; X M16. 21h40; As Aventuras de
Lia M6. 13h25 (V.Port./2D); Ambulância -
Um Dia de Crime M14. 18h20, 21h20; Sonic
2: O Filme M6. 13h, 15h40, 18h30 (V.
Port./2D), 21h10 (V.Orig./2D); Morbius M12.
Sala IMAX - 12h40, 15h, 17h30, 20h, 22h30
Cinemas Nos Vasco da Gama
Parque das Nações. T. 16996
Morte no Nilo 14h; Morbius M12. 13h20,
16h10, 18h50, 21h30; Uncharted M12. 13h15,
16h, 18h45, 21h40; The Batman M14. 13h10,
17h20, 21h10; Ambulância - Um Dia de
Crime M14. 17h40, 20h50; Sonic 2: O
Filme M6. 13h30, 16h20, 19h10 (V.Port./2D),
14h, 17h, 21h 22h (V.Orig./2D)
Estreias
Cordeiro
De Valdimar Jóhannsson. Com
Noomi Rapace, Hilmir Snær
Guðnason. POL/Afeganistão/
Islândia/SUE. 2021. 104m. M14.
María e Ingvar lutam contra o
vazio que a trágica morte da Ælha
lhes deixou. Quando descobrem
uma bebé recém-nascida no
curral das ovelhas, resolvem
dar-lhe o nome de Ada, tal como
a criança que perderam, e criá-la
como se fosse sua.
O Que Vemos
Quando Olhamos para o Céu?
De Aleksandre Koberidze.
ALE/Geórgia. 2021. 150m.
Drama. M12.
Lisa e Giorgi esbarram-se por
acaso numa rua da cidade de
Kutaisi, na Geórgia. Entre ambos
surge uma atracção tão intensa
que, antes de se afastarem,
combinam encontrar-se no dia
seguinte.
Esquecido
De Daria Onyschenko. Ucrânia.
2019. 105m. Dra, Guerra. M14.
Nina é professora de ucraniano
em Luhansk (Ucrânia), ocupada
por separatistas pró-russos.
Um dia, assiste à captura de
Andrii, um rapaz de 17 anos,
depois de ele hastear a bandeira
da Ucrânia no telhado da escola
como forma de protesto.
Morbius
De Daniel Espinosa.
Com Jared Leto, Michael
Keaton. EUA. 2022. 104m.
Drama, Aventura. M12.
Michael Morbius nasceu com
uma doença de sangue incurável.
Hoje, cientista reputado na área
da biomedicina, anseia por
encontrar a cura. Depois de anos
de estudo, decide testar em si
próprio um soro constituído por
ADN de morcegos. A experiência
parece correr bem, até conhecer
os efeitos colaterais.
O Domingo das Mães
De Eva Husson. Com Olivia
Colman, Colin Firth, Odessa
Young. GB. 2021. 104m. Drama,
Romance. M12.
Numa espécie de despedida,
Jane concorda em passar a tarde
na companhia de Paul, seu
amante, que se encontra sozinho
em casa e que, em breve, se
casará com outra mulher.
Isolados do mundo, eles
entregam-se uma última vez
àquela paixão clandestina.
Sonic 2: O Filme
De Jeff Fowler. JAP/EUA. 2022.
122m. Animação, Aventura. M6.
Sonic é um ouriço azul de origem
alienígena que acidentalmente
aterrou no planeta Terra durante
uma fuga às forças malignas do
seu planeta natal. Foi assim que
conheceu Tom Wachowski, a
quem se aliou na luta contra o
terrível Dr. Ivo Robotnik.
Público • Terça-feira, 5 de Abril de 2022 • 33
Cartaz, críticas, trailers
e passatempos em
cinecartaz.publico.pt
Medeia Nimas
Av. 5 Outubro, 42B. T. 213142223
Conto de Outono M6. 21h45; Drive My
Car M12. 13h30; O Que Vemos Quando
Olhamos para o Céu? M12. 19h; Ouistreham
- Entre Dois Mundos M12. 17h
UCI Cinemas - El Corte Inglés
Av. Ant. Aug. Aguiar, 31. T. 213801400
Festa do Cinema Italiano 14h30, 16h30,
19h; O Crime de Georgetown M12. 14h05,
16h45, 19h15, 21h25; Uma Réstia de
Esperança M12. 14h10, 16h40; Morte no
Nilo M12. 16h05, 21h20; Casa
Gucci 13h15; Licorice Pizza M12. 13h25,
18h45; O Domingo das Mães M12. 16h30,
21h15; Drive My Car M12. 18h15,
21h45; Morbius M12. 14h, 16h35, 19h05,
21h45, 00h25; A Pior Pessoa do
Mundo M14. 18h55, 21h45; Uncharted M12.
18h40, 21h35, 00h05; Belfast M12. 13h55,
16h20, 18h55, 21h20; Resistência M14.
13h45, 16h25, 19h05, 21h40; Competição
Oficial M12. 16h15, 21h50; The Batman M14.
13h50, 17h30, 21h30; Um Herói M12.
13h30; Cordeiro M14. 16h25, 21h50; The
Contractor - Mercenário M16. 13h35, 16h,
21h20; Ambulância - Um Dia de Crime M14.
16h10; Depois do Amor M12. 14h15,
19h10; Ouistreham - Entre Dois
Mundos M12. 13h40, 18h50; Sonic 2 M6.
13h20, 15h55 (V.Port./2D); Lekh 19h
Amadora
Cinema City Alegro Alfragide
C.C. Alegro Alfragide. T. 214221030
Morte no Nilo M12. 21h45; Encanto M6.
15h50 (V.Port./2D); Clifford - O Cão
Vermelho M6. 15h10, 17h15 (V.
Port./2D); Morbius M12. 15h20, 17h35.
19h35, 21h10, 21h40; Nightmare Alley -
Beco das Almas Perdidas M14.
21h25; Uncharted M12. 15h30, 17h55,
21h50; Belfast M12. 21h40; Resistência M14.
19h, 21h20; Competição Oficial M12.
19h15; The Batman M14. 15h15, 16h10, 18h10,
21h; The Contractor - Mercenário M16.
19h20; As Aventuras de Lia M6. 15h15, 17h15
(V.Port./2D); Ambulância - Um Dia de
Crime M14. 21h30; Sonic 2: O Filme M6.
15h10, 16h, 17h40, 18h50 (V.Port./2D) 15h55,
18h40, 21h45 (V.Orig./2D)
UCI Cinemas - Ubbo
C.C. da Amadora, Estrada Nacional 249/1.
Encanto 14h10, 16h50 (V.Port./2D); Cantar!
2 M6. 13h40, 16h20 (V.Port./2D); Homem-
Aranha: Sem Volta a Casa M12. 13h15,
18h45; Morbius M12. 14h, 16h35, 19h05,
21h20, 21h45; Uncharted M12. 13h50,
16h25, 18h50, 21h40; Competição
Oficial M12. 19h10, 21h30; The Batman M14.
13h45, 17h30, 21h15, 21h35; The Contractor
- Mercenário M16. 16h30, 21h50; As
Aventuras de Lia M6. 14h25, 16h40, 18h55
(V.Port./2D); Ambulância - Um Dia de
Crime M14. 13h20, 16h05, 18h50,
21h55; Sonic 2: O Filme M6. 13h30, 16h10,
18h40 (V.Port.) 21h25 (V.Orig.); Lekh 19h
Sintra
Cinema City Beloura
Quinta da Beloura II, Linhó. T. 219247643
O Crime de Georgetown M12.
21h40; Morbius M12. 17h35, 19h40, 21h30
; Belfast M12. 19h50; Competição
Oficial M12. 18h45; The Batman M14.
21h; Cordeiro M14. 19h35; As Aventuras de
Lia M6. 17h35 (V.Port./2D); Ambulância -
Um Dia de Crime M14. 21h45; Sonic 2 M6.
17h55 (V.Port./2D) 17h30, 21h50 (V.Orig./2D)
Castello Lopes - Alegro Sintra
Alegro Sintra, Alto do Forte. T. 219184352
Homem-Aranha: Sem Volta a Casa M12.
14h40, 17h50; Morbius M12. 13h30, 14h30,
15h50, 16h40, 18h10, 19h10,
20h30; Uncharted M12. 14h15, 16h40,
19h05, 21h30; The Batman M14. 13h50,
17h15, 20h40; Cordeiro M14.
Guia
21h; Ambulância - Um Dia de Crime M14.
13h10, 15h50, 18h30, 21h10; Sonic 2M6.
13h30, 16h, 18h30 (V.Port./2D) 21h (V.Orig.)
Leiria
Cinema City Leiria
Ponte das Mestras. T. 244845071
Cantar! 2 M6. 15h20 (V.
Port./2D); Morbius M12. 15h35, 17h50,
19h40, 21h35; Uncharted M12. 21h55;
The Batman M14. 15h20, 21h05; Koati
- A Aventura na Selva M6. 15h30
(V.Port./2D); Jackass Para Sempre M16.
22h10; The Contractor - Mercenário M16.
17h40; As Aventuras de Lia M6. 14h40
(V.Port./2D); O Que Vemos Quando
Olhamos para o Céu? M12. 18h30
; Ambulância - Um Dia de Crime M14.
21h25; Esquecido M14. 19h; Sonic 2:
O Filme M6. 15h25, 17h55, 19h, 21h30
(V.Port./2D) 16h10, 17h30, 19h50, 21h40
(V.Orig./2D)
Cineplace - Leiria Shopping
C.C. Leiria Shopping. T. 244826516
O Crime de Georgetown M12. 21h50;
O Domingo das Mães M12. 14h40,
17h; Morbius M12. 14h50, 17h10, 18h40,
19h30, 21h10, 21h45; Uncharted M12. 16h,
18h30, 21h15; Competição Oficial M12.
19h20; The Batman M14. 14h20, 17h50,
21h20; The Contractor - Mercenário M16.
21h; As Aventuras de Lia M6. 14h15, 16h20
(V.Port./2D); Ambulância - Um Dia de
Crime M14. 18h20; Sonic 2: O Filme M6.
14h10, 16h10, 16h30 (V.Port./2D), 19h, 21h30
(V.Orig./2D)
Loures
Cineplace - Loures Shopping
Quinta do Infantado, Loja A003.
O Crime de Georgetown M12.
21h; Morbius M12. 14h50, 17h10, 19h30,
21h45; Um Susto de Família 2 M6. 14h15
(V.Port./2D); Uncharted M12. 16h30, 19h,
21h30; Competição Oficial M12. 18h30;
The Batman M14. 14h20, 17h45, 21h10;
The Contractor - Mercenário M16.
21h40; As Aventuras de Lia M6. 15h30,
17h30, 19h40 (V.Port./2D); Ambulância
- Um Dia de Crime M14. 15h40; Sonic 2:
O Filme M6. 16h20, 18h50 (V.Port./2D),
21h20 (V.Orig./2D)
Odivelas
Cinemas Nos Odivelas Strada
C.C. Strada Shopping.
Morbius M12. 13h20, 15h50, 18h30,
21h10; Um Susto de Família 2 M6. 15h,
17h45 (V.Port./2D); Uncharted M12. 15h20,
18h10, 21h20; The Batman M14. 13h, 16h40,
20h30; Ambulância 20h45; Sonic 2:
O Filme M6. 13h40, 16h15, 18h50 (V.
Port./2D), 21h30 (V.Orig./2D)
Oeiras
Cinemas Nos Oeiras Parque
C. C. Oeirashopping. T. 16996
O Crime de Georgetown M12. 14h; Morte
no Nilo M12. 21h45; Drive My Car M12.
13h45; Morbius M12. 13h30, 16h10, 18h45,
21h30; Uncharted M12. 17h30,
20h30; Competição Oficial M12. 13h15,
16h20, 19h; The Batman M14. 13h, 17h,
21h10; Ambulância - Um Dia de Crime M14.
16h40, 20h40; Sonic 2: O Filme M6. 12h40,
15h20, 18h10 (V.Port./2D), 21h (V.Orig./2D)
Torres Novas
Castello Lopes - TorreShopping
Bairro Nicho - Ponte Nova. T. 249830752
Morbius M12. 14h30, 16h50, 19h10,
21h30; The Batman M14. 14h, 17h20,
20h40; Sonic 2: O Filme M6. 13h10, 15h40,
18h10 (V.Port./2D) 20h40 (V.Orig./2D)
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34 • Público • Terça-feira, 5 de Abril de 2022
Guia
Lazer
CINEMA
15.ª Festa do Cinema Italiano
LISBOA Vários locais.
De 1/4 a 10/4. 3,20€ a 5€/sessão
Numa rota que, até 28 de Maio,
tem passagem marcada por outros
pontos do país, o foco aponta para
Pier Paolo Pasolini, realizador
homenageado com uma
retrospectiva à boleia das
celebrações do centenário do seu
nascimento. No cartaz lisboeta
(disponível em www.
festadocinemaitaliano.com), além
dos Ælmes que vão à tela, estão
ainda conversas, leituras,
exposições, aulas de italiano,
Salvador Sobral a homenagear
Franco Battiato e um cinejantar
dedicado a Ugo Tognazzi, entre
outros momentos.
DANÇA
Teorias da Inspiração
LISBOA Teatro do Bairro Alto.
De 5/4 a 8/4. Terça e quarta, às
19h30; quinta e sexta, às 21h30.
M/6. 12€
Depois de Mistério da Cultura e de
Dança sem Vergonha, o coreógrafo
português David Marques (n. 1985)
estreia a sua nova peça de grupo.
Acompanhado por Francisco
Rolo, Luís Guerra e Nina Botkay, e
transformando o palco num
“labirinto de espelhos e sopros”,
vai beber a episódios passados —
onde habitam espectáculos de
Ænal de ano lectivo num teatro de
Torres Novas, cassetes VHS,
registos de vídeo perdidos e
apresentações vanguardistas
inspiradas na mitologia do autor —
para chegar a uma “Æcção
conspirativa sobre estes
espectáculos sem rasto
reactivados agora pela memória e
pela imaginação”, explica a
sinopse.
EXPOSIÇÃO
Viagem ao Interior da Cidade
LISBOA Museu de Lisboa —
Palácio Pimenta. Terça a
domingo, das 10h às 18h. 3€
Cerca de dez mil miniaturas
recriam a capital pré-sismo de
1755, naquela que é uma das peças
mais emblemáticas do acervo do
museu. Organizada
cronologicamente, a maqueta
“revela a evolução de Lisboa
desde o Paleolítico (...) até ao
esplendor que a cidade atingiu no
reinado de D. João V”, desvenda a
nota de imprensa.
Jogos Jogue também online.
Palavras-cruzadas, Lotaria Clássica 5 0 3 1 3
bridge e sudoku em
1.º Prémio 600.000€
publico.pt/jogos
Esta informação não dispensa a consulta da lista oficial de prémios
Cruzadas 11.664 Paulo Freixinho
palavrascruzadas@publico.pt
HORIZONTAIS: 1. Novo líder do CDS. Preposição que designa posse. 2. Jurisdição. Naipe
das cartas de jogar. 3. Carrie (...), diz que não é recandidata à chefia do governo de Hong
Kong. Laguna. 4. “Há sempre feira quando o tolo desce à (...)”. Fechar as asas (a ave) para
descer mais rapidamente. 5. Agora. Tosquei. Esquecimento (fig.). 6. Rio afluente do
Zêzere, que atravessa a cidade de Tomar. 7. Segmento estrito de mercado. Globo. 8. (...)
Fagundes Telles, a grande dama da literatura brasileira (1923-2022). O ente consciente.
9. Pronome pessoal feminino (pl.). As fibras deste fruto têm um efeito laxante. 10. «Em» +
«o». Uma das aldeias mais bonitas de Espanha. 11. Grande quantidade, por exemplo, de
sismos. Infelicidade (pop.).
VERTICAIS: 1. Casa comercial. Suave. 2. Interjeição que designa cansaço. Fibra sintética
poliamida. 3. Título. Capital da Letónia. 4. Sufixo (agente). Numeração romana (4).
Preocupação constante. 5. Chuva miúda e persistente. O mantra mais importante do
Hinduísmo e outras religiões. 6. Visitava. «A» + «o». Procede. 7. Apologia. Símbolo de libra
(unidade de massa). Alguma. 8. Alternativa. Uma das colinas de Jerusalém. Unidade de
trabalho no sistema CGS. 9. Acusou o Governo de querer TAP “regional”. 10. República
Dominicana, na Internet. Prefixo (afastamento). Mata de buxos. 11. Conjunto de versos.
Oportunidade.
Solução do problema anterior
HORIZONTAIS: 1. Maia. Sageza. 2. Eno. Toga. Es. 3. AD. Orbán. Fe. 4. Raivar. Aval. 5. Prezem. 6. Pé.
Lituânia. 7. Chau. Mia. 8. Avia. Debate. 9. In. Coliges. 10. Algor. Ata. 11. Haiku. Rosto.
VERTICAIS: 1. Mear. Pua. Ah. 2. Andapé. Vila. 3. Io. Ir. Cingi. 4. Ovelha. Ok. 5. Trazia. Cru. 6. Sobretudo.
7. Agá. Mu. Elar. 8. Gana. Âmbito. 9. Veniagas. 10. Zefa. Iate. 11. Aselha. Esmo.
João Fanha © Alastair Chisholm 2008
Bridge bridgepublico@gmail.com Sudoku www.indigopuzzles.com
parece estar sobre rodas. No
Dador: Sul Problema 11.102 (Fácil)
entanto, há que jogar o jogo pela
Vul: Todos ordem certa.
O Ás de espadas faz a primeira
NORTE vaza e o primeiro passo a tomar é
Ƅ A6 jogar já um pau do morto em
Ɔ A4 direcção ao Rei. O jogador em Este
Ƈ Q65
apressa-se a fazer o Ás de paus para
ƅ 1097632
contra-atacar ouros (a melhor
OESTE ESTE defesa, jogar trunfo eliminaria o
Ƅ KQJ9542 Ƅ7 corte a espadas mas em
Ɔ Q9 Ɔ 65 contrapartida deixar-nos-ia sem Solução 11.100
Ƈ9 Ƈ KJ1087432 perdentes a trunfo). Em mão no Ás
ƅ 854 ƅ AQ de ouros, qual deverá ser o passo
SUL seguinte?
Ƅ 1083 Todo o cuidado é pouco. Se de
Ɔ KJ108732 forma desleixada, jogarmos já uma
ƇA espada para fora o que acontece?
ƅ KJ Oeste faz a vaza e Este balda a Dama
de paus! Oeste joga paus e Este
corta, infligindo assim um cabide
Oeste Norte Este Sul inevitável para o carteador.
1Ɔ O que Sul deve fazer, de modo a
3Ƅ X passo 4Ɔ evitar esta situação, é bater o Rei de
Todos passam paus antes de jogar a espada. Assim,
garantirá as suas dez vazas. Oeste faz
Leilão: Qualquer forma de Bridge. o 9 de espadas e volta a Dama de Problema 11.103 (Difícil)
Carteio: Saída: KƄ. Qual a melhor
linha de jogo?
espadas. Cortamos com o Ás do
morto e continuamos com um trunfo
para o Valete, Oeste faz a Dama mas
é a última vaza da defesa, contrato
Solução: Colocando a mão de Sul cumprido!
como sendo a mão base, até porque
é a mão mais comprida em trunfo, Considere o seguinte leilão:
Oeste Norte Este Sul
podemos contar com cinco
perdentes possíveis: duas espadas, 1ƅ 1Ɔ
Solução 11.101
um trunfo e dois paus. Uma das
perdentes a espadas pode 1Ƅ X 2Ƅ ?
desaparecer graças a um corte no
morto, mas atenção esse corte O que marca com a seguinte mão?
deverá vir a ser feito com o Ás de Ƅ72 ƆA10982 ƇK982 ƅA8
copas para evitar um recorte de Este!
Relativamente ao naipe de paus, Resposta: Marque três ouros. O
poderemos ter apenas uma perdente parceiro deverá ter pelo menos
se o Ás estiver bem colocado (é mais quatro cartas a ouros (e duas cartas a
natural que o Ás esteja em Este copas), para além de alguns pontos.
devido à barragem de Oeste). Tudo Vamos competir.
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Público • Terça-feira, 5 de Abril de 2022 • 35

Guia

CINEMA Televisão Os mais vistos da TV

O Que Está por Vir
TVCine Edition, 22h
Nathalie Chazeaux é professora de
FilosoÆa em Paris, onde vive feliz
com o marido e os dois Ælhos.
Tudo muda quando o marido lhe
pede o divórcio. Apesar do choque
inicial, ela percebe que este pode
ser o momento por que tanto
esperava. Com 55 anos e uma
enorme vontade de se renovar,
aproveita aquela sensação de
liberdade para recomeçar. Isabelle
Huppert, André Marcon, Roman
Kolinka e Edith Scob interpretam
este Ælme com realização e
argumento de Mia Hansen-Løve.
Escândalo de Amor
RTP1, 00h34
Um marido ciumento, dois
amantes e um plano de morte
fazem o enredo da primeira
longa-metragem do mestre do
cinema italiano Michelangelo
Antonioni. Lucia Bosé, Massimo
Girotti e Ferdinando Sarmi
ocupam os papéis principais.
Shutter Island
Fox Movies, 00h42
O xerife Teddy Daniels (Leonardo
DiCaprio) e o seu parceiro Chuck
Aule (Mark Ruèalo) são enviados
para o Hospital Psiquiátrico
Asheclièe, na ilha Shutter, para
descobrir o paradeiro de Rachel
Solando, uma assassina que
desapareceu da sua cela. A única
pista é uma folha de papel com
uma pergunta indecifrável.
Ninguém na instituição parece
querer cooperar e há algo de
particularmente misterioso com o
Dr. Cawley (Ben Kingsley).
Dirigido por Martin Scorsese, o
Ælme baseia-se na obra Paciente
67, de Dennis Lehane.
RTP1
6.30 Bom Dia Portugal 10.00 Praça da
Alegria 12.59 Jornal da Tarde 14.25 Os
Nossos Dias 15.08 A Nossa Tarde
17.30 Portugal em Directo 19.06 O
Preço Certo
19.59 Telejornal
21.00 Joker
22.10 É ou Não É? - O Grande Debate
23.51 Operação Maré Negra:
A Travessia Suicida
0.34 Escândalo
dalo
de Amor
2.21 Super Sentidos 2.49 Televendas
SIC
6.00 Edição da Manhã 9.05 Alô
Portugal 10.10 Casa Feliz 13.00
Primeiro Jornal 14.40 Linha Aberta
16.10 Júlia 18.15 Fina Estampa 18.35
Amor Eterno Amor 19.00 Casados à
Domingo, 3
% Aud. Share
Big Brother - As Escolhas TVI 12,6
Isto é Gozar Com Quem... SIC 12,3
Jornal da Noite SIC 11,5
Big Brother Famosos TVI 11,4
Big Brother - A Expulsão TVI 10,8
FONTE: CAEM
RTP2
6.32 Repórter África 7.00 Afazeres do
Mês 7.07 Espaço Zig Zag 10.35 Joga
Quem Quizzer 10.55 Folha de Sala
11.05 O Tempo Que Faz 11.54 Afazeres
do Mês 12.01 Mr. Selfridge 12.50 Visita
Guiada 13.32 Vamos à Descoberta
14.00 Sociedade Civil 15.02 A Fé dos
Homens 15.38 Afazeres do Mês 15.44
Joga Quem Quizzer 16.09 Dá Deus
Nozes... História do Mundo dos
Esquilos 17.00 Espaço Zig Zag 20.33
Folha de Sala 20.38 Alhambra:
Fortaleza Mediterrânea
21.30 Jornal
rnal 2
22.01 Pandora
ndora
22.46 Folha de Sala 22.56 Nada Será
Como Dante 23.26 João Gabriel: The
Last Day of Summer 23.57
Eurodeputados 0.30 Sociedade Civil
1.33 E2 - Escola Superior de
Comunicação Social 2.01 Euronews
TVI
6.05 Viva o Rei Juliano! 6.30 Diário da
Manhã 7.00 Esta Manhã 10.09 Dois às
10 12.58 Jornal da Uma 14.45 A Única
Mulher 16.05 Goucha 18.10 Big Brother
RTP1 8,5%
% DOCUMENTÁRIOS
24,5
RTP2 0,7 Alhambra — Fortaleza
22,0 SIC 17,3 Mediterrânea
RTP2, 20h38
TVI
21,3
20,7 15,9 Uma viagem à Andaluzia em
direcção ao Alhambra, em
Cabo
26,5
41,3 Granada, com o objectivo de
conhecer, por fora e por dentro,
aquele que é um dos monumentos
TVCINE TOP
mais visitados de Espanha. O
17.55 Godzilla Vs. Kong 19.45 Protótipo palácio-fortaleza, que ali se ergue
21.30 Os Novos Mutantes 23.05 desde meados do século XIII, é
The Empty Man 1.20 #Sem Saída dos maiores tesouros patrimoniais
do país e um exemplar imenso e
riquíssimo do estilo mourisco e da
FOX MOVIES arte islâmica. O documentário de
17.31 Duelo Imortal 19.27 Sabotagem Thierry Fessard e Yohann Thiriet
21.15 Sherlock Holmes: Jogo de percorre-o enquanto lhe traça a
Sombras 23.18 A Cilada 0.42 Shutter história e se debruça sobre a sua
Island arquitectura.
Porque Ignoramos as
HOLLYWOOD Alterações Climáticas?
17.55 3 Dias para Matar 19.55 Gangsters Odisseia, 22h30
da Velha Guarda 21.30 Um Presente do Na abertura da programação Mês
Passado 23.20 Bullet Head 0.55 Shot da Terra — em antena de terça a
Caller - Sobreviver a Todo o Custo quinta, a esta hora —, o Odisseia
estreia este documentário que
problematiza a negligência
AXN individual, colectiva e política face
18.53 Investigação Criminal 22.00 a um quadro de crise ambiental
The Good Doctor 22.50 DOC 23.51 bem conhecido, estudado e em
The Blacklist 0.38 Focus 2.20 The curso. Resultante de um “trabalho
Good Doctor de investigação cientíÆca”,
sublinha o canal, “descodiÆca os
mecanismos comportamentais
FOX que explicam porque é que,
17.40 C.S.I. Miami 19.09 Magnum P.I. apesar de nunca termos estado
20.41 Hawai Força Especial 22.15 tão cientes do risco de colapso
Baywatch: Marés Vivas 0.15 Die Hard: ambiental, continuamos a estar
A Vingança 2.17 C.S.I. renitentes no que respeita às
transformações que são
necessárias implementar no nosso
DISNEY CHANNEL
dia-a-dia”. Propõe ainda “pistas
17.15 Gravity Falls 17.35 A Maldição de para superar os medos e
Molly Mcgee 18.05 Ghostforce 18.25 contradições associados”.
Patoaventuras 18.50 Anfibilândia 19.35
Casa da Coruja 20.25 Os Green na Águas Desconhecidas
Cidade Grande 21.10 A Maldição de com Jeremy Wade
Molly Mcgee National Geographic, 23h

SÉRIE
Primeira Vista Estreia. O biólogo Jeremy Wade,
19.15 Jornal das 8 que conhecemos enquanto
DISCOVERY anÆtrião de Grandes Rios, Mistérios
Pandora 19.58 Jornal da Noite 17.10 NASA, Ficheiros Secretos 19.05 das Profundezas e Águas
RTP2, 22h01 19.55
9.55 Aventura à Flor da Pele 20.00 Dirty Jobs:
Ave Profundas, mergulha aqui em rios,
Estreia. Um escândalo de Futebol:
utebol: Trabalhos
Trab Essenciais 22.00 Aventura à lagos e mares de vários pontos do
corrupção e outro sexual, numa 21.55 Por Ti Benfica
enfica x Flor da Pele XL 23.50 Extinct or Alive globo — da Islândia à Amazónia,
Bruxelas pré-eleições, afecta as Liverpool
verpool 1.30 Dirty Jobs: Trabalhos Essenciais passando pelo Quénia — em busca
vidas de uma activista, uma juíza, (Liga
iga dos 2.15 Já Estavas Avisado! das criaturas que os habitam e de
um político e uma jornalista, neste 22.40 Amor Amor Campeões)
ampeões)) respostas para mistérios que as
thriller belga em dez episódios, perseguem. Há novo episódio a
para ver nos serões dos dias úteis. HISTÓRIA
HIS cada terça-feira.
23.25 A Serra 17.0 A Prova Existe Algures 18.49
17.06

DESPORTO
Futebol: Benfica x Liverpool
TVI, 19h55
Directo. O BenÆca recebe o clube
inglês em casa, nos
quartos-de-Ænal da Liga dos
Campeões. O jogo, dirigido pelo
árbitro espanhol Jesús Gil
Manzano, será o 11.º encontro
entre as duas equipas nas
competições da UEFA.
0.05 Bom Sucesso
0.30 Casados à Primeira Vista 1.30
Passadeira Vermelha 3.20 Linha
Aberta
O Inexplicável
In 20.52 Forjado no Fogo João Gabriel — The Last
0.53 O Preço da Guerra Day of Summer
RTP2, 23h26
22.05
2.05 Festa É Festa De uma incursão a um atelier
ODISSEIA
OD situado nas Caldas da Rainha
117.0 Masai Mara 17.56 Estranhas
17.05 nasce este olhar, realizado por
22.35
2.35 Quero É Viver Amizades na Natureza 18.47 Coral, o
A
Am Bernardo Nabais, sobre o processo
Coração do Oceano 19.13 Veterinários
Cor criativo de João Gabriel (Leiria,
do ÁÁrctico 20.17 O Sol e o Homem 21.47 1992), artista cujo trabalho tem
23.20 Para Sempre 0.00 Big Brother Lendas das Profundezas Marinhas sido marcado por temas como o
2.20 Defesa à Medida 3.00 Doce 22.30 Porque Ignoramos as Alterações corpo, o desejo, o erotismo e
Tentação 3.35 Fascínios Climáticas? 23.23 Irão Desde o Ar referências de Ælmes porno dos
anos 1970 e 80.
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36 • Público • Terça-feira, 5 de Abril de 2022

Guia

Meteorologia
PORTUGAL PRÓXIMOS DIAS LISBOA
Viana do Castelo Quarta-feira, 6 Quinta-feira, 7 Sexta-feira, 8
Bragança
6º
14º
16º
11º 17º 13º 18º 12º 17º
Braga -2º
17 º Índice UV Alto Índice UV Baixo Índice UV Baixo
4º Vila Real
13º Porto Vento Fraco Vento Fraco Vento Fraco
1,0m
16º Humidade 65% Humidade 67% Humidade 73%
16 º 0º
5º

Viseu
Guarda
MEDIDOR DE CO2 QUALIDADE DO AR
Aveiro 15 º
16º 2º 12º Mauna Loa, Havai Portugal
6º -1º Partes por milhão
(ppm) na atmosfera Porto Muito
Coimbra Valores por semana Bom
18º Coimbra Bom
4º Semana de 27 Mar. 420,37
Castelo Branco
Semana de 20 Mar. 418,18 Lisboa Médio
Leiria 11 º Há um ano 417,41
3º Há dez anos 395,30
16º Évora Fraco
7º
Nível de segurança 350
Faro Mau
Nível pré-industrial 280
Santarém
Portalegre
12 º
6º 8º
3º SOL Lisboa LUA Lisboa

Lisboa 9 Abr. 07h48

12 º 16 Abr. 19h55
7º Évora
Setúbal 10º 23 Abr. 12h56
13º 5º Nascente Poente Nascente Poente
7º 30 Abr. 21h28 09h31 00h34*
07h16 20h03
*de amanhã

EUROPA
Diversidade
Sines Beja

14º 12º Estocolmo

Helsínquia
9º 6º Oslo
15º Talín

nos media:
1,0m Riga
Copenhaga

Vílnius
Dublin Berlim

PÚBLICO
Amesterdão
Londres Varsóvia
Sagres 15º
10º Bruxelas
15º Faro Praga
11º Paris
Viena

lança estágio
Budapeste
16º Genebra
1,5m
Açores Milão

profissional
Corvo Roma
Istambul
Madrid
Flores Lisboa
Graciosa 17ºº
18º Atenas
16º 1,0m
São Jorge 16º
17º 13º
Jornalistas em início de carreira 2,0m
ou finalistas do curso de Comunicação Faial
Terceira TEMPERATURAS ºC
Pico
Social, que pertençam a comunidades 17º São Miguel
Min. Máx. Min. Máx.
étnico-raciais menos representadas 17º 13º Amesterdão 8 12 Roma 3 18
2,0m Atenas 9 20 Viena 8 11
nas equipas de jornalistas em Portugal. Ponta Delgada
Berlim 5 8 Bissau 22 35
Duração de seis meses e orientação Bruxelas 9 13 Buenos Aires 16 23
Sta Maria
por profissionais do PÚBLICO Madeira Bucareste 3 17 Cairo 26 39
Porto Santo Budapeste 4 13 Caracas 18 29
Copenhaga 0 7 Cid. do Cabo 14 18
Madeira
Saiba mais em 18º 15º 17º 18º Dublin 5 14 Cid. do México 14 30
12º 13º
1,5m 3,0m Estocolmo -6 3 Díli 23 31
publico.pt/estagiodiversidade2022
Frankfurt 9 13 Hong Kong 17 27
Funchal Genebra 2 14 Jerusalém 17 28
Istambul 6 14 Los Angeles 15 26
MARÉS Preia-mar Baixa-mar *de amanhã Kiev 5 8 Luanda 24 30
Londres 8 14 Nova Deli 23 38
Leixões m Cascais m Faro m
Madrid 4 10 Nova Iorque 9 14
06h08 3,2 05h44 3,2 05h50 3,1 Milão 0 11 Pequim 7 25
12h09 0,9 11h41 1,1 11h33 0,9 Moscovo 1 5 Praia 20 26
Oslo -6 6 Rio de Janeiro 24 31
18h22 3,1 17h58 3,1 18h04 3,0 Paris 7 16 Riga -1 5
00h31* 1,0 00h04* 1,1 23h53* 1,0 Praga 8 10 Singapura 25 32
Apoio financeiro da Rede Aga Khan:
Fontes: AccuWeather; Instituto Hidrográfico; QualAR/Agência Portuguesa do Ambiente; NOAA-ESRL
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Público • Terça-feira, 5 de Abril de 2022 • 37

Líder do campeonato repõe vantagem sobre o Sporting Desporto

ESTELA SILVA/LUSA

I Liga
Jornada 28
Sp. Braga-Benfica 3-2
Belenenses SAD-Portimonense 2-0
Estoril-Vizela 1-2
Arouca-Gil Vicente 2-1
Famalicão-Boavista 1-2
Marítimo-Tondela 1-3
Moreirense-V. Guimarães 0-1
Sporting-P. Ferreira 2-0
FC Porto-Santa Clara 3-0
J V E D M-S P
1. FC Porto 28 24 4 0 71-19 76
2. Sporting 28 22 4 2 56-17 70
3. Benfica 28 19 4 5 70-28 61
4. Sp. Braga 28 15 7 6 46-28 52
5. Gil Vicente 28 12 10 6 39-28 46
6. V. Guimarães 28 11 6 11 38-37 39
7. Estoril 28 8 10 10 32-34 34
8. Marítimo 28 8 9 11 32-37 33
9. Paços Ferreira 28 8 9 11 25-34 33
10. Santa Clara 28 7 10 11 30-46 31
11. Boavista 28 5 15 8 33-41 30
12. Vizela 28 6 11 11 31-46 29
13. Portimonense 28 7 8 13 26-34 29
14. Famalicão 28 6 10 12 34-43 28
Fábio Vieira,
16. Tondela 28 7 4 17 36-54 25
com dois
16. Arouca 28 6 8 14 27-49 26
golos, abriu
17. Belenenses SAD 28 4 9 15 17-46 21
caminho ao
18. Moreirense 28 4 8 16 24-45 20
triunfo
portista Próxima jornada Gil Vicente-Moreirense,
P. Ferreira-Marítimo, Boavista-Arouca,
Benfica-B. SAD, Portimonense-Famalicão,
Tondela-Sporting, Sta. Clara- Estoril,

Arte de Fábio Vieira desenha

V. Guimarães-FC Porto, Vizela-Sp. Braga

e suÆciente para puxar o tapete aos

açorianos. Prestes a recolher aos bal-
neários sem um golo, o FC Porto
encontrou num lance estudado a fór-

rótulo de invencibilidade
FC Porto igualou série recorde de 56 partidas sem perder no campeonato e ofereceu
a Sérgio Conceição, na bancada, o título de segundo técnico portista mais vitorioso
Crónica de jogo
Augusto Bernardino
O fecho da 28.ª jornada da Liga ofere-
cia ao FC Porto a possibilidade de
acrescentar dois capítulos à história
do campeonato e de Sérgio Concei-
ção, que os “dragões” cumpriram na
perfeição (triunfo por 3-0 sobre o
Santa Clara). Mas igualar o recorde de
56 jogos sem derrotas no campeona-
to, estabelecido pelo BenÆca de John
Mortimore em 1977-78, ou superar os
números de Artur Jorge enquanto
segundo treinador com mais triunfos
(187) ao serviço do clube eram meros
pormenores do plano principal:
repor a vantagem de seis pontos para
o segundo classiÆcado, deixando ain-
da o terceiro a 15 de distância.
Para levar a cabo essa tarefa, frente
a um Santa Clara que só perdera fren-
te a Sporting (Taça da Liga) e BenÆca
(campeonato) nos últimos 12 jogos,
Sérgio Conceição apostou no mesmo
“onze” que venceu o derby no Bessa,
decidido por Fábio Vieira.
Com Taremi desgastado pelas via-
gens para representar o Irão, numa
altura em que cumpre o Ramadão,
Fábio manteve a titularidade e a capa-
cidade de decidir, desta vez a dobrar,
com um “bis” decisivo a terminar
uma primeira parte de incerteza.
De regresso a uma casa onde pas-
sou uma década, oito anos como atle-
ta e dois como técnico, Mário Silva
estava privado de Anderson Carvalho
e Cryzan, tendo prescindido de Mori-
ta, regressado da selecção.
Os açorianos ainda tentaram dis-
farçar essas lacunas com um disposi-
tivo homogéneo, vocacionado para
missões defensivas, sem abdicar dos
compromissos atacantes.
Mas a alta rotatividade portista,
com Otávio a inventar espaços e Pepê
a criar desequilíbrios, deixou o Santa
Clara numa posição de equilíbrio bas-
tante precário e que só não viu com-
prometido mais cedo porque Pepê
desperdiçou uma ocasição Çagrante
FC Porto
Fábio Vieira 38’ e 41’,
Zaidu 84’
Santa Clara
Estádio do Dragão, no Porto.
Espectadores 30.250
FC Porto Diogo Costa, João Mário
(Taremi, 73’), Mbemba, Pepe, Zaidu,
Otávio, Uribe Grujic, 55’), Vitinha,
Pepê, Evanilson (Galeno, 82’), Fábio
Vieira (Francisco Conceição, 82’).
Treinador Sérgio Conceição
Santa Clara Marco, Rafael Ramos
(Sagna, 46’), Boateng, Tassano,
Mansur, Júlio Romão (Rúben Oliveira,
79’), Nené (Pipe Gomez, 74’),
Lincoln, Allano (Óscar Barreto, 62’),
Ricardinho, Rui Costa (Tagawa, 62’).
Treinador Mário Silva
Árbitro António Nobre (AF Leiria)
VAR Fábio Melo (AF Porto)
3 Positivo/Negativo
Fábio Vieira
Depois de ter marcado no
Bessa, voltou a ser decisivo
0 com dois golos em três
minutos, determinantes
para quebrar a resistência
do adversário e levar a
equipa a um triunfo
tranquilo.
Otávio
Verdadeiro acelerador de
partículas, criou os
desequilíbrios e os espaços
de que os companheiros
precisavam.
Mansur
Atraso fatal a precipitar a
derrota do Santa Clara
numa altura em que a
equipa ainda tentava
digerir o primeiro golo.
mula para bater Marco.
Vitinha cobrou livre a punir falta
sobre Pepê e o pé esquerdo de Fábio
Vieira fez a diferença (38’). O mesmo
pé transformaria, três minutos
depois, um erro de Mansur no segun-
do golo da noite, colocando o FC Por-
to a salvo de um Ænal de nervos como
o que viveu no Bessa.
Ainda assim, mesmo depois de
uma entrada forte na segunda parte,
com um remate de Vitinha a rasar a
barra e um golo invalidado a Pepe, o
FC Porto teve que gerir a reacção do
adversário juntamente com alguns
problemas que obrigaram a riscar
pedras importantes como Matheus
Uribe e João Mário.
O Santa Clara cerrava os dentes e,
com as substituições, chegava-se à
frente para obrigar Diogo Costa a
brilhar na baliza do FC Porto, garan-
tindo, assim, o terceiro jogo conse-
cutivo sem sofrer golos, outra marca
importante para reforçar a conÆança
na fase decisiva do campeonato.
Só que, ao contrário do que suce-
deu na ronda anterior, os portistas
mantiveram sempre as rédeas do
jogo bem Ærmes nas mãos, acabando
por resolver, em deÆnitivo, a questão
fundamental com um golo de Zaidu
(84’). Um remate a completar um
lance de Galeno, acabadinho de
entrar para explorar a velocidade e
bloquear qualquer tentativa de rebe-
lião dos açorianos, algo que o FC
Porto conseguiu sem problemas.
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38 • Público • Terça-feira, 5 de Abril de 2022

Desporto

Benfica-Liverpool: jogar
pelo que resta da época
“Encarnados” recebem o segundo classiÄcado da Premier
League, nos quartos-de-Änal da Liga dos Campeões.
“Reds” somam dez vitórias consecutivas no campeonato
MOLLY DARLINGTON/REUTERS

Marco Vaza
A Europa tem sido um refúgio para
o BenÆca. Já sem muito por que
lutar a nível interno, os “encarna-
dos” têm-se superado na Liga dos
Campeões, mais como o BenÆca de
outros tempos e nada que ver com
o BenÆca que vai desiludindo sema-
na sim, semana não na Liga portu-
guesa. Hoje (20h, TVI), depois de
mais um desaire, o BenÆca volta ao
seu palco mais confortável, mas
com uma missão que não podia ser
mais difícil, a de enfrentar o Liver-
pool na primeira mão dos quartos-
de-Ænal da Champions. Os “encar-
nados” esperam viver na Luz mais
uma grande noite europeia, como
já tiveram esta época, mas os “reds”
são uma equipa em grande forma,
com o moral em alta e os objectivos
intactos.
É verdade que o BenÆca tem sabi-
do quase sempre reagir na Cham-
pions às adversidades sofridas na
Liga portuguesa. Em Dezembro do
ano passado, depois de um desaire
caseiro com o Sporting, ainda com
Jorge Jesus no comando, os “encar-
nados” triunfaram na Luz sobre o
Dínamo Kiev e selaram o apuramen-
to para os “oitavos”. Mais à frente,
já com Nélson Veríssimo, o BenÆca
resistiu ao Ajax na Luz (2-2) depois
de um empate no Bessa, selando o
apuramento para os “quartos” em
Amesterdão com um triunfo por 0-1,
poucos dias após empate caseiro
com o Vizela.
Será na ressaca do desaire em
Braga (que deixou a equipa a nove
pontos do segundo lugar) que as
“águias” regressam à Champions,
com uma equipa quase na máxima
força (apenas sem Lucas Veríssimo
e Rodrigo Pinho) e disposta a fazer
o mesmo ao Liverpool que já fez
esta época a Barcelona e Ajax.
“Campeonato e Champions são
competições diferentes, com envol-
vências diferentes. A equipa tem
dado resposta e espero que volte a
dar uma boa resposta”, assinala Nél-
son Veríssimo, cuja passagem pelo
banco dos “encarnados”, com a
excepção dos jogos com o Ajax, não
tem sido um grande sucesso — ape-
nas oito vitórias em 17 jogos.
“Temos de reconhecer que o
Mohamed Salah durante o treino do Liverpool
Liverpool é uma equipa com poten-
cial individual e colectivo muito
elevado. É uma eliminatória com-
plicada, mas acreditamos que pode-
mos dividi-la com o Liverpool. Reco-
nhecemos qualidade, capacidade e
mérito ao Liverpool. Estando ao
nosso nível, podemos suprimir os
pontos fortes do Liverpool, que tem
variedade nas dinâmicas ofensivas
e gosta de pressionar alto. Vamos
ter de ter uma competência muito
grande”, analisou o técnico dos
“encarnados”.
Uma derrota em 2022
O Liverpool parece ser um desaÆo
com um grau de diÆculdade superior
aos que o BenÆca já enfrentou esta
época na Champions. Não só pelo
estatuto, mas também pela forma
actual — dez vitórias seguidas na Pre-
mier League, com um impressionan-
te registo de 25 golos marcados e
apenas dois sofridos. É por isto que
Estando ao nosso nível,
podemos suprimir os
pontos fortes do Liverpool,
que tem variedade nas
dinâmicas ofensivas
Nélson Veríssimo, Benfica
os “reds” estão a apenas um ponto
de distância do Manchester City no
campeonato e podem até passar
para a frente já no domingo, em caso
de triunfo, no Etihad, sobre o rival.
O Liverpool parece invencível, mas
não é. E a única derrota que os “reds”
sofreram em 2022 foi precisamente
na segunda mão dos oitavos-de-Ænal,
um 0-1 em AnÆeld frente ao Inter
Milão que chegou para assustar a
equipa de Jürgen Klopp — os
“nerazzurri” Æcaram a meio da recu-
peração de uma derrota por 0-2 na
primeira mão, e, não fosse a expulsão
de Alexis Sánchez, aos 63’, o resulta-
do podia ter sido bem diferente.
Esta será a segunda vez que o
Liverpool defronta uma equipa por-
tuguesa nesta época, depois do
duplo confronto (e dupla vitória)
diante do FC Porto na fase de gru-
pos. E Klopp diz que está bem infor-
mado sobre o BenÆca, graças às
conversas com Diogo Jota e com os
adjuntos Pepjin Linders (que esteve
seis anos ligado à formação do FC
Porto) e Vítor Matos (também um
ex-FC Porto). Também tentou sacar
informação a Luis Díaz, que até
Dezembro passado jogava na Liga
portuguesa, mas não conseguiu.
“Estive com os jogadores de
manhã, já partilhámos informações
e vamos usá-las. O Díaz tentou, mas
não percebemos uma palavra”,
comentou o técnico alemão. E acres-
centoi: “O BenÆca é um oponente
forte, uma boa equipa, temos de ser
realmente muito bons.” Nélson Veríssimo apela a uma “competência muito grande” de toda a equi
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PEDRO NUNES/REUTERS
Atlético quer pleno das
equipas de Manchester
N
ão tem sido nada fácil a
época para o Atlético
Madrid. A defesa do título
conquistado em 2021 não
tem corrido bem — o primeiro
lugar é uma miragem — e a
carreira na Liga dos Campeões
tem sido um carrossel, mas a
equipa de João Félix está a
chegar à melhor forma na
altura em que mais precisa.
Terá de provar esse bom
momento esta noite (20h,
Eleven2), no Etihad, frente a
um Manchester City que tem
muito com que se preocupar —
desde a Champions que nunca
conquistou até à liderança da
Premier League que terá de
defender no domingo, frente
ao Liverpool.
Depois de ter eliminado o
United nos “oitavos”, com um
triunfo por 0-1 em Old Trafford,
Diego Simeone quer fazer o
mesmo no Etihad, apesar de
reconhecer que gosta de ver
jogar a equipa que deverá ter
no “onze” Bernardo Silva e João
Cancelo. “Não tenho dúvidas
de que o City tem jogadores
extraordinários, talvez até
melhores do que os nossos,
mas são dois jogos”, comentou
o argentino. Salientou que há
muitas diferenças entre o
United e esta equipa de
Guardiola: “O City é mais
posicional e domina todos os
registos, e temos de aumentar
e melhorar tudo o que fizemos
há duas semanas.”
O Atlético continua em
busca do seu primeiro título
europeu, tal como o City, que
ainda não conseguiu atingir
esse patamar na era Guardiola.
O técnico espanhol enfrenta
problemas para formar a sua
defesa — não tem Rúben Dias,
lesionado, nem Kyle Walker,
castigado —, mas diz que está
a preparar algo diferente para
este confronto com o campeão
espanhol: “Adoro pensar
demasiado nestas coisas e
criar tácticas estúpidas, e
quando não ganhamos sou
crucificado. Sinto-me
inspirado e vou criar uma
táctica incrível. Vamos jogar
com 12!”
Este será o primeiro
encontro europeu entre City e
Atlético, mas não entre
Guardiola e Simeone — o
catalão tem vantagem, com
duas vitórias em três jogos,
mas o argentino ganhou uma
eliminatória ao Bayern com
Guardiola no banco em 2015-16.
ipa
Benfica venceu em Inglaterra em 2006
Há 16 anos, Beto não queria
assistir Miccoli em Anfield
Diogo Cardoso Oliveira
O ex-jogador do Benfica
recorda ao PÚBLICO que a
bicicleta do italiano foi um
acaso e que andou sempre
atrás de Steven Gerrard
Qualquer aventura duradoura do
BenÆca na Liga dos Campeões traz à
memória, aos jornais e às conferên-
cias de imprensa a temporada 2005-
06. Nessa época, houve jogos épicos
em Manchester e Liverpool, antes da
queda em Barcelona. Esse foi, desde
as Ænais perdidas nos anos 80, o gran-
de desempenho do BenÆca na Cham-
pions, já que as outras três chegadas
aos “quartos” foram bastante menos
homéricas do que nesse ano de
Ronald Koeman.
Sobre essa aventura europeia fala-
se de muita coisa. Todos sabem que
o improvável Beto marcou de fora da
área ao United, ainda na fase de gru-
pos, e que Moretto defendeu um
penálti de Ronaldinho em Camp Nou,
já nos “quartos”. Pelo meio, fala-se da
bicicleta do italiano Fabrizio Miccoli
em AnÆeld e do golaço de Simão
Sabrosa, de fora da área. Mas há mais
para dizer dessa eliminatória, que
hoje terá repetição, com início no
Estádio da Luz.
Beto é, provavelmente, dos jogado-
res mais importantes de entre os pou-
co importantes que já passaram pelo
BenÆca. As façanhas europeias do
médio brasileiro, de farta cabeleira
loira, justiÆcam essa aura e também
uma chamada do PÚBLICO, atendida
no Brasil, onde gere uma loja de mate-
rial desportivo.
Lembra-se bem do tal golo de Mic-
coli, com aquela bicicleta engenhosa
dentro da área? Segundo Beto, nada
daquilo era para ter acontecido assim.
“Tive participação nesse golo. Primei-
ro, recuperei a bola, passei-a ao Mic-
coli e ele passou ao Simão. Entretan-
to, Æz um sprint muito longo, voltei a
receber a bola e cruzei para o Micco-
li, que fez aquela ‘pintura’. Fiz um
cruzamento-remate.” “Mas era mes-
mo um cruzamento-remate, Beto?”,
questionámos. “OK, a minha intenção
era chutar à baliza. Não queria cruzar,
queria rematar. Mas deu certo assim
e Æcou perfeito para o vólei do Micco-
li”, admitiu.
“Não deixes o Gerrard jogar”
Hoje, pelas 20h, o BenÆca volta a cru-
zar-se com o Liverpool. Agora, já não
há Miccoli para as bicicletas, Luisão
para golos de cabeça, Simão para a
meia distância ou Moretto para os
penáltis. Mais: não há Beto. E não
Público • Terça-feira, 5 de Abril de 2022 • 39
haver Beto é estar refém de um “cão
de guarda” para um dos craques do
Liverpool.
Porquê falar disto? Em bom rigor,
foi Beto quem falou. “Em Lisboa,
antes da viagem, eu já sabia que ia ser
titular. O Koeman gostava de nos cha-
mar à parte e dizer a cada um qual
seria a sua função. Com o United,
andei atrás do Paul Scholes. Com o
Barcelona, segui o Deco. Para o Liver-
pool, o Koeman chamou-me após um
treino e disse: ‘Não vais deixar o Ger-
rard jogar. Ele não pode tocar na bola
e organizar o jogo.’ Ele sabia que eu
tinha muita força na marcação”,
explicou ao PÚBLICO.
Hoje, a famosa piada futebolística
que incentivava um jogador a ir atrás
do adversário nem que ele fosse à
casa de banho já está ultrapassada. O
futebol está diferente nos esquemas
defensivos e o próprio BenÆca tam-
bém está.
Jorge Jesus, não chegando ao ponto
de promover marcações individuais
a campo inteiro, não tinha problema
em pedir aos jogadores referências
individualizadas na forma como pres-
sionavam sem bola. Nélson Veríssimo
tem tentado, por outro lado, dotar a
equipa “encarnada” de maior contro-
lo espacial e zonal, algo que, em tese,
Com o United, andei atrás
do Scholes. Com o
Barcelona, segui o Deco.
Para o Liverpool, o Koeman
disse-me que não podia
deixar o Gerrard jogar
Beto, ex-jogador do Benfica
Miccoli no momento do golo acrobático ao Liverpool, em 2006
Desporto
inviabilizará uma táctica “à Koeman”,
destacando um “Beto” (Meité?) para
um “Gerrard” (Thiago?).
A eliminatória que começa hoje
não tem Beto nem Gerrard, mas há
algo que não mudou: há BenÆca, há
Liverpool, há Luz e há AnÆeld. O ex-
jogador do BenÆca recorda o que viu
e sentiu no dia em que entrou no míti-
co estádio inglês. “Chegámos a
AnÆeld e havia poucos adeptos do
Liverpool. Depois, quando fomos
aquecer, a mesma coisa. Quando saí-
mos para o balneário, pensámos: ‘Vai
ter poucos adeptos.’ Dez minutos
depois, quando voltámos da cabine,
o estádio estava cheio e parecia que
ia cair. Em dez minutos, passou de
vazio a um ambiente incrível. Essa
surpresa deu-me aquele frio na bar-
riga”, admite Beto.
No Æm, quem sorriu em Inglaterra
foi o BenÆca, com golos de Simão e
Miccoli nesse 0-2, e o antigo médio
garante que “os adeptos do Liverpool
aplaudiram o BenÆca de pé”. “Foi
emocionante”, recorda, sobre um
dos jogos mais importantes que viveu
na carreira.
Para chegar a um feito semelhante
são precisas “apenas” duas coisas:
que o BenÆca de Veríssimo seja tão
competente como o de Koeman e que
o Liverpool de Klopp seja tão incapaz
como o de Benítez. No plano teórico,
nenhum desses pressupostos é de
alta probabilidade, sobretudo no que
diz respeito ao Liverpool — jogadores
como Finnan, Traoré, Warnock, Sis-
soko, Luis García, Kewell, Morientes
ou Crouch não eram Alexander-Ar-
nold, Van Dijk, Robertson, Hender-
son, Mané, Salah, Jota ou Firmino.
Beto aponta que “tudo começou
com um bom jogo em Lisboa [vitória
por 1-0, com golo de Luisão]” e essa
premissa permite encerrar este texto:
em 2022, como em 2006, tudo tem
de começar em Lisboa.
PHIL NOBLE/REUTERS
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Terça-feira, 5 de Abril de 2022

BARTOON LUÍS AFONSO

As Miss e os Mister Rússia 2022 desejam a paz no mundo

STANISLAV KOZLIUK/EP
ideia tão genial que decidiram
O respeitinho acabar o texto com ela. De facto,
não é bonito como é que o Vladimir e o
Volodimir ainda não se lembraram
que a melhor forma de acabar
com a guerra é avançar para a paz?
Da senhora Ana Margarida ao
senhor Viriato, aqui Æcam 20
parecem composições
mal-amanhadas de quarta classe,
que só falta virem acompanhadas
de um desenho com cores a pisar
os contornos e uma pomba
raquítica com um ramo no bico?
Porquê tamanha indigência? A
minha única explicação é a de um

A
João Miguel Tavares
paz, a paz, a paz, a
paz, queremos muito
a paz, a paz, a paz, a
paz. Ouvir tantas
exigências de paz a
propósito da Guerra
da Ucrânia desperta em mim os
piores instintos. A paz, a paz, a
paz, a paz, queremos muito a paz,
a paz, a paz, a paz. As Miss e os
Mister Rússia que desÆlam pelas
televisões e pelos jornais deste
país a suspirar pela paz no mundo,
a felicidade dos seres humanos, o
amor entre mamíferos e a
harmonia de todo o reino animal
estão a deixar-me à beira da
apoplexia.
No Expresso, 20 personalidades
portuguesas reuniram-se para
escrever um artigo intitulado “Pela
paz contra a criminalização do
pensamento”, onde declaram,
logo a abrir, que aquilo “que
melhor defende a civilização da
selvajaria da guerra é o apelo
incessante e incondicional à paz”.
E para não serem acusados de
serem pessoas pouco práticas, até
deixam uma solução para o
conÇito: “A solução está na
coragem de avançar para a paz e a
obrigatória cooperação entre
todos os povos.” Apontaram?
Vale a pena recapitular: 20
excelentes lusitanas cabeças
reuniram-se para reÇectir sobre a
guerra na Ucrânia e, após longas
horas de ruminação, uma delas
teve o seu momento eureka: “Já sei
qual é a solução para acabar com a
guerra!” As outras 19 cabeças
imploraram: “Diz-nos!” Algum
suspense. “Avançar para a paz!” As
20 excelentes cabeças acharam a
obrigados por tamanha
perspicácia e lucidez.
Na verdade, 21. Porque ontem o
antigo deputado do PS Pedro
Bacelar de Vasconcelos, talvez
entristecido por não se terem
lembrado da sua pessoa para
co-assinar o artigo do Expresso,
escreveu neste jornal um texto que
casa bem com ele, intitulado
“Contra a guerra!” O título
justiÆca-se porque — imaginem —
Bacelar de Vasconcelos não
aprecia guerras. O senhor Pedro
não tem, ao contrário das 20
excelentes cabeças do Expresso,
propriamente uma solução para
Porque é que 21 acabar com o conÇito. Mas tem
excelentes cabeças uma “esperança”: “Que surja por
Æm um poderoso movimento
lusitanas assinam paciÆsta global capaz de acabar
textos sobre o Äm com esta e com todas as outras
carniÆcinas actualmente em
da guerra e o amor curso.” Também não está mal
à paz que parecem lembrado, não senhor.
Pergunta: porque é que 21
composições de excelentes cabeças lusitanas
quarta classe? assinam textos sobre o Æm da
guerra e o amor à paz que
curto-circuito intelectual: essas
pessoas sabem que a invasão russa
é, a todos os títulos, indefensável,
mas consideram a América
capitalista e imperialista o seu
verdadeiro inimigo e por isso
sentem-se incapazes de tomar
partido com clareza na guerra da
Ucrânia.
A essa incapacidade chamam
“espírito crítico”, “capacidade de
pensar” e “cidadania exigente e
participativa”. Só que não é nada
disso, porque a “capacidade de
pensar” tem de ir um pouco além
do discurso asinino de Miss
Mundo, onde a solução para o
conÇito entre a Rússia e a Ucrânia
é… o apelo à paz. Isso não é
“espírito crítico”, nem “cidadania
exigente e participativa”. É apenas
o grau zero do pensamento. A paz,
a paz, a paz, a paz, queremos
muito a paz, a paz, a paz, a paz. E
um bocadinho de vergonha, não?
Jornalista
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PÚBLICO, Comunicação Social, SA. Todos os conteúdos do jornal estão protegidos por Direitos de Autor ao abrigo da
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