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ATIVIDADES LÚDICAS NO

AUTISMO
Caro(a) aluno(a),

A Faculdade Anísio Teixeira (FAT), tem o interesse contínuo em proporcionar


um ensino de qualidade, com estratégias de acesso aos saberes que conduzem ao
conhecimento.

Todos os projetos são fortemente comprometidos com o progresso educacional


para o desempenho do aluno-profissional permissivo à busca do crescimento
intelectual. Através do conhecimento, homens e mulheres se comunicam, têm
acesso à informação, expressam opiniões, constroem visão de mundo, produzem
cultura, é desejo desta Instituição, garantir a todos os alunos, o direito às
informações necessárias para o exercício de suas variadas funções.

Expressamos nossa satisfação em apresentar o seu novo material de estudo,


totalmente reformulado e empenhado na facilitação de um construtor melhor para
os respaldos teóricos e práticos exigidos ao longo do curso.

Dispensem tempo específico para a leitura deste material, produzido com muita
dedicação pelos Doutores, Mestres e Especialistas que compõem a equipe docente
da Faculdade Anísio Teixeira (FAT).

Leia com atenção os conteúdos aqui abordados, pois eles nortearão o princípio de
suas ideias, que se iniciam com um intenso processo de reflexão, análise e síntese
dos saberes.

Desejamos sucesso nesta caminhada e esperamos, mais uma vez, alcançar o


equilíbrio e contribuição profícua no processo de conhecimento de todos!

Atenciosamente,

Setor Pedagógico
SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 5
A IMPORTÂNCIA DO LÚDICO NO PROCESSO DE ENSINO-APRENDIZAGEM
NO DESENVOLVIMENTO DA INFÂNCIA ................................................................. .6
.
DESENVOLVIMENTO COGNITIVO INFANTIL ............................................................. .7
O JOGO SIMBÓLICO ....................................................................................................................... .11
O LUGAR DO LÚDICO NO DESENVOLVIMENTO COGNITIVO DA CRIANÇA...... 13
LÚDICO E APRENDIZAGEM INFANTIL ............................................................................... 16
O LÚDICO NA APRENDIZAGEM DA CRIANÇA COM AUTISMO ............................ 26
ATIVIDADES LÚDICAS ................................................................................................................ 45

4
INTRODUÇÃO

Considerando que as atividades lúdicas despertam a atenção de qualquer criança,

nota-se a relevância dessa metodologia no desenvolvimento infantil. Grandes estudiosos

como Piaget, Skinner, Chomsky, Vygotsky, defendem metodologias que estimulem a

aprendizagem.

O desenvolvimento humano refere-se ao desenvolvimento mental e ao

crescimento orgânico. O desenvolvimento mental é uma construção contínua. Estas são

as formas de organização da atividade mental que vão se aperfeiçoando e se

solidificando até o momento em que todas elas. Algumas dessas estruturas mentais

permanecem ao longo de toda a vida.

O lúdico é parte integrante do mundo infantil da vida de todo ser humano. Os jogos

e brinquedos fazem parte da infância das crianças, onde a realidade e o faz de conta

intercalam-se. O olhar sobre o lúdico não deve ser visto apenas como diversão, mas sim, de

grande importância no processo de ensino-aprendizagem na fase da infância.

A criança, ao brincar e jogar, envolve-se com a brincadeira e põe em ação seus

sentimentos e emoção. Pode-se afirmar que a atividade lúdica funciona como um elo

integrador entre os aspectos motores, cognitivos, afetivos e sociais, portanto a partir do

brincar, desenvolve-se a facilidade para a aprendizagem, o desenvolvimento social,

cultural e pessoal e contribui para uma vida saudável, física e mental.

Ao brincar a criança também adquire a capacidade de simbolização, permitindo

que ela possa vencer realidades angustiantes e domar medos instintivos. O brincar é um

impulso natural da criança, que aliado à aprendizagem torna-se mais fácil à obtenção do

aprender devido à espontaneidade das brincadeiras através de uma forma intensa e total.

5
A IMPORTÂNCIA DO LÚDICO NO PROCESSO DE ENSINO-

APRENDIZAGEM NO DESENVOLVIMENTO DA INFÂNCIA

Maiane Santos Malaquias

Suely de Souza Ribeiro

A problemática, que será analisada a partir de agora, busca compreender a

importância dos jogos e brincadeiras como subsídios eficazes na construção do

conhecimento infantil através de estimulações necessárias na produção de sua

aprendizagem. Com o objetivo de servir aos educadores, pais, psicólogos e a

profissionais de áreas afins, o incentivo da ludicidade as crianças como uma das

principais fontes de aprendizagem. Portanto, partindo de tal pressuposto fundamenta-se

a necessidade de evidenciar como lúdico influência no processo de ensino-

aprendizagem infantil estabelecendo a consciência da importância dos jogos no

desenvolvimento e na educação da criança?

Nesse sentido, de forma geral, buscou-se analisar a importância do lúdico no

processo de ensino-aprendizagem para o desenvolvimento infantil na faixa etária de 3 –

6 anos. E de maneira específica, estudar sobre o desenvolvimento cognitivo da criança;

compreender a importância do lúdico para o desenvolvimento cognitivo e analisar as

formas pelas quais o lúdico facilita os processos de ensino-aprendizagem no

desenvolvimento infantil.

O presente estudo desenvolveu-se através da pesquisa bibliográfica ou fontes

secundárias, fazendo parte de uma documentação indireta. Tal pesquisa implica no

levantamento de dados de bibliografias já publicada a respeito do estudo. Em relação ao

6
método utilizado, empregou-se o indutivo onde parte-se do que já existe de científico

publicado. Este método explica conhecimentos existentes cujo objetivo é ampliar o saber.

Por sua vez, o método de procedimento abordado, aquele no qual está restrito as ciências

sociais foi o método monográfico cujo estudo determinado é realizado observando grupos,

indivíduos, comunidades, instituições comparando generalizações entre tais.

O mundo infantil difere de uma maneira qualitativamente do mundo adulto,

nele há fantasia, faz de conta, sonhar e o descobrir. Por meio das brincadeiras, ação

mais comum da infância, que a criança terá oportunidade de se conhecer e constituir-se

socialmente. Através da espontaneidade do brincar que a criança poderá explicitar as

diferentes percepções concebidas dentro do seu contexto familiar e social.

DESENVOLVIMENTO COGNITIVO INFANTIL

O ser humano, desde a concepção ultrapassa por uma série de processos de

desenvolvimentos, formando um ser biopsicossocial e espiritual, devido à interação

entre o indivíduo e seu meio. Pode-se dizer que a infância é a fase onde a criança vai

gradativamente e lentamente se adequando ao mundo. Ao falar em desenvolvimento,

integra-se tal termo à ideia de crescimento, sobretudo o físico e o biológico. Mas essa

expressão vai muito mais além do que é apenas visível.

O desenvolvimento humano resulta em um processo de construção de uma série de

fatores, entre influências biológicas, intelectuais, sociais e culturais. Bock (2002, p.98) diz

que “o desenvolvimento humano refere-se ao desenvolvimento mental e ao crescimento

orgânico. O desenvolvimento mental é uma construção contínua, que se caracteriza pelo

aparecimento gradativo de estruturas mentais.” O crescimento orgânico

7
entende-se aquele ligado ao desenvolvimento físico do ser humano, que acontece desde

o nascimento.

A produção de conhecimentos pela criança é espontaneamente produzidos,

mediante a cada estágio de desenvolvimento em que está se encontra. Para Piaget citado

por Bock (2002), a criança passa por quatro estágios de desenvolvimentos, sendo eles: o

primeiro período compreendido pelo estágio sensório-motor (0 a 2 anos); segundo

período, correspondido pelo pré-operatório ( 2 a 7 anos); terceiro período, operações

concretas (7 a 12 anos); e por último o quarto período que são as operações formais (12

anos em diante).

Bock (2002), descreve os períodos de desenvolvimento segundo a perspectiva de

Piaget: O período sensório-motor, o bebê vai assimilando o mundo através de suas

percepções e ações (movimentos), nota-se um crescimento acelerado do desenvolvimento

físico, ocasionando novos comportamento e habilidades. Em relação à linguagem,

caracteriza-se pelo balbucio, mais conhecida como ecolalia, cujo significado é a repetição

de sons e palavras. Como exemplo, a criança diz “leite”, para dizer que quer leite.

O período pré-operatório é caracterizado pelo aparecimento da linguagem, o que

viabiliza assim, desenvolvimento nos aspectos afetivos, sociais e intelectual da criança. O

pensamento egocêntrico, centrada em si mesmo, não conseguindo assim, se colocar

abstratamente no lugar do outro. Com a decorrência do desenvolvimento do pensamento,

inicia-se a famosa fase dos “porquês”, onde para todas as coisas devem ter uma explicação.

O jogo simbólico, o faz de conta, e a fantasia, acontecem fazendo com que a criança crie

imagens mentais sem a presença do objeto ou ação. Caracteriza-se também nesse estágio, o

animismo, onde a criança “dá alma” aos objetos inanimados, como por

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exemplo, o caminhão foi “dormir’, há a transformação também do objeto em satisfação

do prazer (tampa de panela como volante de um carro). Nesse período a criança leva-se

pela aparência sem relacionar os fatos, por exemplo, um menino diz que tem mais suco

do que sua irmã porque seu suco foi despejado em um copo alto e fino, e o dela em um

outro copo, só que pequeno e largo.

O terceiro período, das operações concretas, a criança já compreende regras,

ordena elementos por tamanho, peso, desenvolvimento das noções de tempo, espaço,

ordem, entre outros. Ao estabelecer relações, a criança passa a pensar logicamente,

diminuindo seu egocentrismo, levando em conta inúmeros aspectos de uma determinada

situação. Adquire a noção de reversibilidade, que é a capacidade de compreender um

processo inverso ao observado anteriormente.

E por fim, o período das operações formais, é o ápice do desenvolvimento

cognitivo. O pensamento antes representativo, torna-se abstrato, o pensamento torna-se

hipotético-dedutivo, ou seja, é capaz de pensar em diferentes relações possíveis, a partir

de hipóteses e não apenas pela observação da realidade. Nessa fase, através da

possibilidade de pensar e lidar com os conceitos de liberdade e justiça, no plano

emocional o adolescente vivencia conflitos desejando liberta-se do adulto mesmo

dependendo dele.

Portanto, para o autor citado acima, o desenvolvimento cognitivo é atrelado por

mudanças tanto qualitativas como quantitativas relacionadas aos períodos anteriores,

permitindo que o indivíduo se construa e reconstrua a cada estrutura, tornando cada vez

mais apto ao equilíbrio. As mudanças caracterizadas como qualitativas, são aqueles

referentes em números ou quantidade, como peso, altura, tamanho do vocabulário. Já, as

9
quantitativas, alude a mudança na estrutura do indivíduo, ou seja, são aprendizagens de

novas habilidades, tomando como exemplo nas crianças, a comunicação não verbal para

a verbal.

A criança, à medida que evolui vai-se ajustando à realidade circundante, e

superando de modo cada vez mais eficaz, as múltiplas situações com que se confronta.

Na concepção de Vygotsky apud Nunez (2009), a aprendizagem desenvolve-se a partir

das relações sociais, e o pensamento e linguagem são processos interdependentes, desde

o início da vida. Para Vygotsky, o sujeito é interativo pois, a partir das relações intra e

interpessoais e de troca com o seu meio, passa a adquirir o conhecimento.

A formação da criança é influenciada através das trocas sociais, ou seja,

através da interação com o meio que a criança vai se desenvolvendo, consequentemente

com as práticas educacionais à qual irá ser submetida. Caso não ocorra a interação entre

o indivíduo e o meio, o desenvolvimento ficará defasado, devido à falta de situações

propícias ao aprendizado.

[...] essa importância que Vygotsky dá ao papel do outro social no


desenvolvimento dos indivíduos cristaliza-se na formulação de um
conceito específico dentro de sua teoria, essencial para a compreensão
de suas ideias sobre as relações entre desenvolvimento e aprendizado:
o conceito de zona de desenvolvimento proximal (OLIVEIRA, 1995,
p. 58).

A relação entre o desenvolvimento e a aprendizagem está atrelada ao fato de o

ser humano viver em meio social, sendo este a alavanca para estes dois processos, um

caminhando ao lado do outro. Para uma melhor compreensão do processo de ensino

aprendizagem, Vygotsky propõe estudar a aprendizagem a partir do conceito de “Zona

de Desenvolvimento Proximal ”, o qual ele definirá como:

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A distância entre o nível de desenvolvimento determinado pela
capacidade de resolver um problema e o nível de desenvolvimento
potencial, determinado através da solução de um problema sob a ajuda
de um adulto ou em colaboração com outro colega capaz
(VYGOTSKY, 1989, p.89).

A Zona de Desenvolvimento Proximal, pode-se melhor entender, como a

distância entre a capacidade de algo que a criança pode fazer sozinha e o que ela é capaz

de realizar com a mediação de alguém. Vale ressaltar, que a capacidade de realizar

determinada tarefa, depende muito do certo tipo de nível de desenvolvimento à qual está

no momento.

Outro aspecto a ser debatido, diz respeito à afetividade como um outro fator

influenciável também no desenvolvimento da aprendizagem. Através da afetividade

Marrocos (2008) ratifica que as funções cognitivas se correlacionam seja de forma

operacional ou dialética, juntamente no meio social à qual está inserida. A criança ao

receber uma gama de afetividade, constrói seu saber de uma forma mais consistente.

Pinheiro (1999) apud Mendonça (2009, p. 22) alerta que sobre a importância do afeto “a sua

importância é primordial, pois considera o alimento afetivo tão imprescindível, como os

nutrientes orgânicos”. Ultrapassando as emoções e sentimentos, o aspecto afetivo

proporciona ao impulso que a criança almeja aprender, buscando novos conhecimentos. Por

meio dessa dimensão, o sujeito manifesta externamente suas emoções e vontades.

O JOGO SIMBÓLICO

É na infância que inicia-se o fantasiar, fazendo um paralelo do mundo real com

o imaginário. Devido à realidade ser difícil em ser assimilada e aceita, a criança cria seu

próprio universo, onde encontra-se resoluções para tudo, através de seus personagens

imaginários, super-heróis, princesas, fadas, monstros, bruxas, entre outros, atribuindo

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seus próprios sentimentos nos brinquedos e histórias. Por exemplo, é a boneca que está

com raiva porque a mãe brigou com ela, ou o urso que está chorando porque o pai foi

trabalhar, enfim, as crianças dão vida e sentimentos aos objetos inanimados como se

fossem pessoas de verdades.

Têm-se até hoje a opinião de que a imaginação da criança é mais rica do


que a do adulto. A infância é considerada a idade de maior
desenvolvimento da fantasia e segundo essa opinião, à medida que a
criança vai crescendo, diminuem a sua imaginação e a força de sua
fantasia. [...] Goethe dizia que as crianças podem fazer tudo de tudo, e
essa falta de pretensões e exigências da fantasia infantil, que já não está
livre na pessoa adulta, foi interpretada frequentemente como liberdade ou
riqueza da imaginação infantil (...). Tudo isso junto serviu de base para
afirmar que a fantasia funciona na infância com maior riqueza e variedade
do que na idade madura. A imaginação da criança [...] não é mais rica, é
mais pobre do que a do adulto; durante o desenvolvimento da criança, a
imaginação também evolui e só alcança a sua maturidade quando homem
é adulto.( VYGOTSKY apud ELKONIN 1998, p.124)

O jogo simbólico caracteriza-se pela representação da realidade, por uma

tendência imitativa e imaginativa. Aplica-se à imaginação, devido ao fato de ser situações

as quais são impossíveis de serem realizadas sozinhas, devido à sua faixa etária. Para

Vygotsky apud Arce (2004), uma das atividades principais da infância é a brincadeira,

relacionando com a sua teoria, a brincadeira cria uma zona de desenvolvimento proximal da

criança, pois permite à criança a interiorização de ações que ultrapassam sua idade, mas

permitindo uma aquisição da sua realidade circundante de maneira criativa.

Através do jogo simbólico, a criança passa a adquirir a capacidade de

representar simbolicamente suas ações por meio de sua capacidade de pensar. Pode-se

tomar como exemplo, os bonecos/bonecas que as crianças tomam, como pai/mãe,

filho/filha, as caixas de papelões que tomam com carros entre outras coisas, que

simbolizam coisas da realidade.

12
Através da utilização dos jogos simbólicos, as crianças exprimem seus desejos

por meio do real. E é uma maneira também de facilitar a compreensão acerca da

realidade, já que ainda são incapazes de entender respostas realistas. Uma função dessas

inúmeras fantasias elaboradas pelas crianças, é a de equilibrá-la emocionalmente,

oportunizando dessa forma uma melhor elaboração e diminuição de suas angústias e

ansiedades, agindo também, como método de autodefesa e autoafirmação.

O crescer é algo inerentemente conflituoso, no entanto a criança ultrapassa a

linha da racionalidade e atribui na fantasia como forma de elaboração para as mais

diversas vivências. Dessa forma, quando na brincadeira a mesma fica doente, morre, são

formas destas lidarem com suas angústias.

Para dominar os problemas psicológicos do crescimento – superar


decepções narcisistas, dilemas edípicos, rivalidades fraternas, ser
capaz de abandonar dependências infantis; obter um sentimento de
individualidade e de autovalorização, e um sentido de obrigação moral
– a criança necessita entender o que está se passando dentro de seu
inconsciente. Ela pode atingir essa compreensão, e com isto a
habilidade de lidar com as coisas, não através da compreensão
racional da natureza e conteúdo de seu inconsciente, mas
familiarizando-se com ele através de devaneios prolongados –
ruminando, reorganizando e fantasiando sobre elementos adequados
da estória em resposta a pressões inconscientes, o que capacita a lidar
com este conteúdo (BETTELHEIM 1980, p.16).

Já que a vida para a criança muitas vezes é desconcertante, há necessidade da

criança entender esse mundo caótico, e o lúdico possibilita as crianças uma elaboração de

seus conflitos internos, organizando simbolicamente o mundo real. O jogo para Freud apud

Ferreira (2000), além de ser uma fonte de prazer, promove uma economia na despesa

psíquica, além de fazer um investimento emocional altíssimo, já que leva a sério o mundo

da fantasia. “A criança brinca não porque não sabe falar, como querem alguns teóricos, mas

porque deseja.” O brincar da criança é determinado por desejos” (Freud, 1976 [1908],

13
p. 151 apud Ferreira 2000). Assim como nos sonhos, a criança realiza suas fantasias por

meio das brincadeiras.

A criança exprime seus desejos, assim como nos sonhos, fantasias por meio

dos jogos e brincadeiras, principalmente naquelas de faz de conta, onde seus

sentimentos são expostos através do simbólico. Por meio do brincar, à apreensão da

realidade é mais fácil, o brinquedo vai muito mais além de um simples produto, torna-se

um processo pelo qual é de fundamental importância no desenvolvimento da infância.

O LUGAR DO LÚDICO NO DESENVOLVIMENTO COGNITIVO DA CRIANÇA

A atividade lúdica é um instrumento que possibilita as crianças a aprenderem a

se relacionarem com os outros e promove maior desenvolvimento cognitivo, motor,

social e afetivo. Por meio do brincar, a criança experimenta, descobre, inventa, adquire

habilidades, além de estimular a criatividade, autoconfiança, curiosidade, autonomia,

proporciona o desenvolvimento da linguagem, do pensamento e da concentração devido

a situação de alguns jogos e brincadeiras, consequentemente gerando uma maturação de

novos conhecimentos.

O eixo da infância é o brincar, sendo um dos meios para o crescimento, e por

ser um meio dinâmico, o brinquedo oportuniza o surgimento de comportamentos,

padrões e normas espontâneas. Caracteriza-se por ser natural, viabilizando à criança

uma exploração do mundo exterior, quanto interior. Através dos brinquedos algumas

carências das crianças são satisfeitas, mas tais necessidades vão progredindo no

decorrer do seu desenvolvimento.

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A brincadeira representa um sistema que integra a vida social da criança,

funcionando como um alimento para a personalidade que está se constituindo. Segundo

Piaget (1975) e Winnicott (1975), conceitos como jogo, brinquedo e brincadeira são

formados ao longo de nossa vivência. É a forma que cada um utiliza para nomear o seu

brincar.

O desenvolvimento da inteligência caminha célebre na educação infantil e


também nos primeiros anos do ensino fundamental. Além das mudanças
biológicas que se sucedem, o estímulo inefável de fazer novos amigos e o
ambiente desafiador da sala de aula vai promovendo alterações marcantes.
A inteligência sensório-motora salta do período de funções simbólicas –
no qual a criança já se mostra plenamente capaz de separar e reunir –
organizações representativas mais amplas e complexas. Outras
inteligências desabrocham e permitem a assimilação das próprias ações.
Entre quatro e cinco anos, a criança já revela capacidade de avaliar e
enumerar o que há de comum e de diferente nos objetos com que tem
contato no dia a dia e é praticamente “assaltada” por uma onda de
mapeamentos espaciais e numéricos. Em pouco tempo, com uma rapidez
que surpreende até mesmo os mestres mais experimentados, o mundo da
criança, simbolizando por sua escola, passa a ser visto como um lugar em
que se podem contar coisas. Nessa idade, as crianças querem contar tudo,
das caretas de um desenho aos gestos diferenciados de uma dança
(ANTUNES, 2004, p. 37).

Cooperação, comunicação eficaz, competição honesta e redução da

agressividade, formam algumas habilidades sociais fortificadas por meio dos jogos. As

crianças progridem com os brinquedos, é ainda através da brincadeira que as crianças

constituem o seu espaço e o diferem do lugar do outro.

Freud (1974, p. 135), reflete sobre o brinquedo:

Errado supor que a criança não leva esse mundo a sério; ao contrário, leva
muito a sério sua brincadeira e despende na mesma muita emoção. A
antítese de brincar não é o que é sério, mas o que é real. Apesar de toda a
emoção com que a criança caracteriza seu mundo de brinquedo, ela o
distingue perfeitamente da realidade, e gosta de ligar seus objetos e
situações imaginados às coisas visíveis e tangíveis do mundo real. Essa
conexão é tudo o que diferencia o “brincar infantil” do “fantasiar”.

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Comumente parte da sociedade deduz que o brincar refere-se apenas como

tempo perdido, sem valor pedagógico algum no desenvolvimento infantil, como se não

somasse nada na vida da criança. Grandes serviços são prestados aos pais através da

brincadeira, tendo em vista, que as crianças tornam-se capazes de interagir e

compartilham momentos espontâneos e dinâmicos com os adultos do seu âmbito social.

É muito comum os pais se mobilizarem para momentos de brincadeira, proporcionando

um estado de alegria que muitas vezes foi perdido e é reencontrado e revivido através

dos filhos. Toda brincadeira gera um significado para a criança, além de proporcionar

aprendizado é uma maneira pela qual ela apropria-se do mundo de acordo sua

percepção. O brincar passa a ser uma língua da infância sob o universo.

LÚDICO E APRENDIZAGEM INFANTIL

O ensino é uma importante ferramenta na construção da aprendizagem. É

através da exploração que a criança expande seus pensamentos e aprendizados, adjunto

à observação e investigação do mundo. Quanto mais a criança explora as coisas do

mundo, mais ela é capaz de relacionar fatos e ideias, tirar conclusões, ou seja, mas ela é

capaz de pensar e compreender. A criança processa o conhecimento através da

exploração concreta do elemento. Ou seja, a criança absolve qualquer tipo de

informação, contribuindo assim para uma maior carga de experiências e conhecimentos

para seu desenvolvimento cognitivo.

Aprendizagem é toda atividade cujo resultado é a formação de novos


conhecimentos, habilidades, hábitos naquele que a executa, ou a aquisição
de novas qualidades nos conhecimentos, habilidades, hábitos

16
que já possuam. O vínculo interno que existe entre a atividade e os
novos conhecimentos e habilidades residem no fato de que, durante o
processo da atividade, as ações com os objetos e fenômenos formam
as representações e conceitos desses objetos e fenômenos
(GALPERIN, 2001[d], p.85).

É por meio de uma série de fatores (emocionais, sociais, neurológicos) que a

aprendizagem se constitui, o que acaba gerando mudanças comportamentais nos

indivíduos. Aprender é o resultado da interação entre estruturas mentais e o meio

ambiente. Para Vygotsky (1984, p.103) “a aprendizagem e o desenvolvimento estão

estritamente relacionados, sendo que as crianças se inter-relacionam com o meio objetal

e social, internalizando o conhecimento advindo de um processo de construção.”

Portanto, para que ocorra aprendizagem é preciso que uma série de fatores se

interliguem. E através da junção de vários meios (familiares, sociais, escolares) que a

criança desenvolve também a aprendizagem.

A aquisição da aprendizagem como foi dita, deriva-se de várias esferas, dentre

elas, social, cognitivo, biológico e afetivo. Assim, a família sendo a primeira

organização social à qual a criança participa, exerce um fator importante na elaboração

dos princípios e valores que vão acompanhá-los pela sua trajetória de vida.

[...] para a psicanálise, a família é tida como as condições mínimas,


necessárias que garantem o advento de uma subjetividade. Condição
essa que se refere ao Outro. Outro no sentido de outro real imediato,
dos cuidados, Outro no sentido da linguagem, da cultura, que definirá
para esse sujeito por advir o lugar que ele ocupará (MENDONÇA,
2009, p.23).

A estrutura psíquica do indivíduo pode ser moldada devido aos fatores aos quais

está inserido, e as relações parentais devem ser vivenciadas de forma dinâmica e funcional,

para que a aprendizagem e o desenvolvimento normal não seja comprometido. Ao nascer, a

criança é totalmente dependente dos pais, e à medida que vai se

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desenvolvendo, essa necessidade de cuidados vai sendo diminuída, e a dependência se

tornando desnecessária. Os pais precisam respeitar as necessidades e capacidades de

seus filhos, para que estes possam desenvolver sua autonomia, mas ao mesmo tempo

compartilhar todas as etapas de desenvolvimentos de uma forma íntegra e afetiva.

Contribuindo assim, significativamente na obtenção de conhecimentos e construção de

uma identidade.

[...] a família ainda é o lugar privilegiado para a promoção da


educação infantil. Embora a escola, os clubes, os companheiros e a
televisão exerçam grande influência na formação da criança, os
valores morais e os padrões de conduta são adquiridos essencialmente
através do convívio familiar (GOMIDE, 2009, p. 9).

Legitimando a importância da cultura na infância, destaca-se a escola como um

local onde são conduzidas uma série de conhecimentos que influenciam o

desenvolvimento da aprendizagem. A escola é caracterizada como uma instituição

organizada, com intuito da promoção do desenvolvimento do saber e do ensino, além de

proporcionar estabelecimento de vínculos afetivos e sociais. Onde os métodos utilizados

são variados de acordo com a idade do aluno. Portanto, a escola, família e sociedade são

responsáveis não só pela transmissão de conhecimentos, valores, cultura, mas também

pela formação da personalidade social dos indivíduos.

A construção do conhecimento na sala de aula é um processo social e


compartilhado. A interação se dá em um contexto socialmente pautado,
no qual o sujeito participa de práticas culturalmente organizadas com
ferramentas e conteúdos culturais. As perspectivas socioculturais
enfatizam a interdependência entre os processos individuais e os sociais
na construção do conhecimento. Sua interpretação dos processos de
aprendizagem fundamenta-se na ideia de que as atividades humanas estão
posicionadas em contextos culturais e são mediadas pela linguagem e por
outros sistemas simbólicos (COLL, et al 2004, p. 105)

Os conteúdos escolares, adquiridos pela aquisição de conhecimentos e construção

de valores são constituídas também pela imagem adquirida do sujeito no grupo

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social e familiar ao qual faz parte. Portanto, o meio ao qual o indivíduo está inserido

trata-se uma grande referência, podendo assim, interferir na construção pedagógica já

que a elaboração do saber trata-se de uma construção conjunta, interativa e não

individualmente. Ao se envolver nas atividades escolares, a família influencia o

aprendizado das crianças, transmitindo ao filho/aluno uma maior segurança na

aprendizagem. Porém, a escola torna-se imprescindível na construção de experiências

do sujeito, constituindo exemplo de valores e atitudes positivas relacionadas ao

aprendizado. Além da transmissão de conhecimentos, a escola também é uma via de

socialização, no qual a criança convive com outras crianças, com seus professores,

sendo um espaço de trocas, ou seja, promove conhecimentos e interações sociais, além

de expandir o cognitivo.

Esse binômio, família e escola formam a base necessária para que haja

desenvolvimento integral da criança. Porém, esses pilares são construídos por

intermédio da solidificação dessa parceria com a soma de esforços de ambas as partes.

Um dos objetivos do trabalho lúdico é o de auxiliar a criança a obter melhor

desempenho na aprendizagem através da utilização de uma metodologia espontânea,

divertida e recreativa, o lúdico age também como forma de comunicação das crianças,

tornando a aprendizagem de acordo como seu modo de ver o mundo, respeitando suas

características e raciocínios próprios.

A educação lúdica, na sua essência, além de contribuir e influenciar na


formação da criança e do adolescente, possibilitando um crescimento
sadio, um enriquecimento permanente, integra-se ao mais alto espírito
de uma prática democrática enquanto investe em uma produção séria
do conhecimento. A sua prática exige a participação franca, criativa,
livre, crítica, promovendo a interação social e tendo em vista o forte
compromisso de transformação e modificação do meio (ALMEIDA,
1994, p.41).

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A obtenção de um melhor desempenho da aprendizagem, pode ser obtida por

meio da ludicidade. Dentre os inúmeros benefícios uma educação lúdica, pode-se

enfatizar algumas: a melhoria da capacidade cognitiva da criança, a potencialização da

sua capacidade psicomotora, bem como, da sua capacidade de se relacionar com seus

grupos de iguais. Pode-se dizer que um dos fatores além do genético para se obter o

desenvolvimento psicossocial equilibrado do ser humano, considera-se o brincar

fundamental.

O brincar permite à criança um espaço para a resolução de problemas que as

rodeiam, conduz a relacionamentos grupais, facilita o crescimento, podendo ser uma

forma de comunicação consigo mesmo e com os outros. O brincar é mais que um

divertimento. Santos (1999) relata que brincando a criança ordena o mundo à sua volta

assimilando experiências e informações, e ainda mais, incorporando comportamentos e

valores. É através do brinquedo e do jogo que a criança consegue reproduzir e recriar o

meio a sua volta.

Com a era da tecnologia, os brinquedos e os jogos eletrônicos vêm

acompanhados de um manual, onde descreve todas as maneiras de brincar, para tal,

diminui o processo de imaginação, fantasia e aumenta a comodidade das crianças,

reduzindo o afloramento da criatividade. Não é desmerecendo os avanços tecnológicos,

pois estes apresentam suma importância na vida do homem, mas o que entra em questão

é o fato que esses instrumentos sejam utilizados de maneira inteligente, sem que crie

uma dependência. As crianças acabam por se tornarem acomodadas, pois os brinquedos

dispensam a imaginação, e como consequência o resultado são crianças com mentes

cada vez mais preguiçosas.

20
É importante salientar que o biológico e o social não se dissipam, e dentre as

atividades lúdicas proporcionam também o desenvolvimento da coordenação motora,

resistência física e habilidades. Ao brincar, as crianças evocam a importância também

dos hábitos favoráveis à saúde física. Elas precisam utilizar o corpo, braços e pernas

para descerem e subirem nas árvores, assim, fortalecendo a musculatura no processo de

crescimento dos ossos.

Na vivência de troca dos afetos e estabelecimento de vínculos por meio das

brincadeiras, a criança interage com seu ambiente e com outras crianças, facilitando

inclusive o desenvolvimento da aprendizagem, da leitura e da escrita em seu devido

tempo. Pode-se assim dizer, que o lúdico enquadra-se numa abordagem

multidisciplinar, intercalando-se numa relação cognitiva, biológica, social e recreativa.

Paiva (2009) explana a respeito da infância, que este período está diminuindo casa

vez mais, e ao mesmo tempo que a sociedade roga pelos direitos da criança, em brincar,

viver conforme seus direitos, entra uma contradição quando os adultos não fazem

à passagem ao ato para tal idealização. A criança quando privada do brincar,

dificilmente produzirá vínculos significados com o outro e com o meio ao qual está

inserida. A criança necessita de experimentação acerca de conhecimentos, sendo está a

melhor forma de incorporação dos mesmos.

A linguagem, segundo Vygotsky (1984), tem importante papel no

desenvolvimento cognitivo da criança à medida que sistematiza suas experiências e a ainda

colabora na organização dos processos em andamento. Muitas situações vividas no

cotidiano das crianças são reproduzidas na brincadeira, as quais, pela imaginação e pelo faz-

de-conta são reelaboradas. O jogo é crucial para o desenvolvimento cognitivo, pois é

21
o processo de criar situações imaginárias, leva ao desenvolvimento do pensamento

abstrato. Isso acontece porque novos relacionamentos são criados no jogo entre

significados e objetos e ações.

A introdução do lúdico na vida escolar do educando torna-se uma forma eficaz

de repassar pelo universo infantil para imprimir-lhe o universo adulto. Promover uma

alfabetização significativa a prática educacional é a proposta do lúdico. Através das

atividades lúdicas na escola, de acordo Luckesi (2000, p.21) pode-se “auxiliar o

educando a ir para o centro de si mesmo, para a sua confiança interna e externa; não é,

também, difícil, coisa tão especial estimulá-lo à ação, como também ao pensar”.

O jogo apresenta sempre duas funções no processo de ensino-aprendizagem. A

primeira é lúdica, onde a criança encontra o prazer e a satisfação no jogar, e a segunda é

educativa, onde através do jogo a criança é educada para a convivência social, já que o

mundo à qual faz parte possui leis e regras as quais precisam ser conhecidas e

internalizadas. A criança estando em um constante processo de desenvolvimento, ela

brinca, porque a brincadeira propõe subsídios a se desenvolver.

É importante ressaltar, que a motivação do educador escolar para proporcionar

a atividade lúdica é fundamental para que o aluno possa despertar o interesse para criar,

desenvolver, participar, buscando a construção do conhecimento. O desenvolvimento

lúdico nas práticas pedagógicas na escola, não deve ser visto apenas como

descontração, mas sim, como meio para o desenvolvimento do aprimoramento do

raciocínio lógico, cognitivo e social de maneira espontânea e prazerosa para a criança.

Os adultos enquanto educadores devem ter cautela no que expõem para as crianças, pois

uma das ferramentas da aprendizagem infantil é a repetição.

22
A criança quando não brinca, acarreta uma série de perturbações, dentre as

quais, não se socializa com o outro, torna-se agressiva, impossibilitando novos

conhecimentos e alcance de objetivos. A ausência do lúdico na infância, permeia o

aparecimento de alguns fatores, como inabilidade social, comprometimento nas

estruturas psíquicas e/ou psicológicas na infância.

A educação por meio do lúdico possibilita um favorável crescimento da

criança, investindo numa elaboração íntegra do conhecimento infantil. Enquanto joga e

brinca, podem ser recriados conceitos cotidianos, compreendendo, encenando,

reelaborando a realidade, contribuindo assim para uma maneira melhor de se relacionar

com o outro e desenvolvendo sua identidade e autonomia.

O lúdico como método pedagógico prioriza a liberdade de expressão e criação. Por

meio dessa ferramenta, a criança aprende de uma forma menos rígida, mais tranquila e

prazerosa, possibilitando o alcance dos mais diversos níveis do desenvolvimento. Cabe

assim, uma estimulação por parte do adulto/professor para a criação de ambiente que

favoreça a propagação do desenvolvimento infantil, por intermédio da ludicidade.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

No transcorrer desse trabalho difundiu-se ideias a respeito da importância do

lúdico no processo de ensino aprendizagem infantil, desvelando que a ludicidade é um

grande laboratório para o desenvolvimento integral da criança, que merece atenção dos

pais e dos educadores, pois é através das brincadeiras que a criança descobre a si

mesmo e o outro.

23
O ser humano passa por constantes evoluções, resultando numa construção de

uma série de processos que se interligam (biológicos, intelectuais, sociais e culturais). O

desenvolvimento cognitivo perpassa por uma série de períodos, atrelados por mudanças

tanto no plano qualitativo, quanto no quantitativo em cada estágio vivenciado. O que

permite ao sujeito uma construção e reconstrução a cada estrutura, tornando-o mais apto

ao equilíbrio. Cabe aqui ressaltar, que o desenvolvimento de cada ser humano, varia de

acordo com os fatores internos (biológico) e externos aos quais estão inseridos.

Devido o mundo real ser de uma difícil assimilação, a criança cria seu próprio

universo, mais conhecido como as fantasias infantis. Nesse universo inventado, elas

fazem um paralelo do imaginário com a realidade, e através de seus personagens

imaginativos encontram resoluções para qualquer situação. Por meio do simbólico, os

desejos e vontades são explicitados, além de permitir que a criança exponha e elabore

também seus conflitos e angústias do mundo real.

O lúdico viabiliza uma série de aprimoramentos em diversos âmbitos dos

desenvolvimentos, cognitivo, motor, social e afetivo. Através do brincar a criança

inventa, descobre, experimenta, adquire habilidades, desenvolve a criatividade,

autoconfiança, autonomia, expande o desenvolvimento da linguagem, pensamento e

atenção. Por meio de sua dinamicidade, o lúdico proporciona além de situações

prazerosas, o surgimento de comportamentos e assimilação de regras sociais. Ajuda a

desenvolver seu intelecto, tornando claras suas emoções, angústias, ansiedades,

reconhecendo suas dificuldades, proporcionando assim soluções e promovendo um

enriquecimento na vida interior da criança.

24
Verificou-se que a atividade lúdica fornece uma evolução nas funções das

habilidades psíquicas, da personalidade e da educação. Por meio dos jogos e

brincadeiras a criança aprende a controlar os seus impulsos, a esperar, respeitar regras,

aumenta sua autoestima e independência, servindo também para aliviar tensões e

diminuir frustrações, pois através do brincar a criança reproduz situações vividas no seu

habitual, reelaborando através dos faz de conta.

A utilização de jogos e brincadeiras no meio educacional propicia as crianças o

aprimoramento de diversos conhecimentos de forma lúdica. Aos educadores, estes além

de estarem motivados também com o lúdico, é preciso um conhecimento mais

elaborado acerca do tema, para poder intervir nas brincadeiras das crianças. Contudo,

faz-se necessário auxiliar a criança, de maneira sutil, para que brinque com diversos

tipos de brinquedos.

A partir de agora, você terá acesso ao artigo apresentado no encontro de estudos

multidisciplinares em cultura, realizado em Salvador- BA, em agosto de 2019. Nele,

você encontrará algumas respostas lúdicas para o desenvolvimento da criança autista a

partir de um estudo de caso e, em seguida, encontrará algumas dicas de atividades

lúdicas encontradas em diversos sites de apoio à pessoa autista.

Disponível em http://www.enecult.ufba.br/modulos/submissao/Upload-

484/112140.pdf. Acesso em 29 jul. 2020.

25
O LÚDICO NA APRENDIZAGEM DA CRIANÇA COM AUTISMO:

ROMPENDO A CÁPSULA

Tathiana Andrade Sanches

Resumo

Como é de domínio comum e presente em todas as culturas e sociedades, a atividade lúdica ocupa um
lugar primordial na infância. Através dessa temática o fenômeno lúdico será abordado nesta pesquisa,
colocando em evidência a sua importância no desenvolvimento infantil, e a contribuição no âmbito da
intervenção pedagógica diante do empobrecimento da vida imaginativa e do brincar de forma peculiar de
crianças com autismo. O objetivo geral do estudo é identificar e analisar atividades lúdicas enquanto
estímulo ao desenvolvimento social da criança com autismo em classe regular. A pesquisa tem uma
abordagem qualitativa, teve como procedimento teórico estudo de caso com observação participante e
descreve através de relatos a possibilidade de dar visibilidade a estas crianças no ambiente educacional e
ampliar a capacidade de participação delas em atividades que envolvam coletivamente a cultura lúdica e o
brincar, promovendo o seu desenvolvimento.

Palavras-chave: Autismo, ludicidade, socialização, infância, cultura lúdica.

INTRODUÇÃO

Escrever sobre o autismo gera um amplo desafio e requer a articulação de múltiplos


olhares, uma vez que é classificado como um transtorno do neurodesenvolvimento, que
ainda solicita importantes estudos devido à complexidade que abrange o seu espectro. Pode-
se ressaltar que o interesse em desenvolver esse trabalho surgiu quando vivenciei uma das
experiências mais surpreendentes da minha vida, foi como estudante do curso de pedagogia
e na condição de professora de Educação Infantil em uma creche escola da rede privada de
ensino, quando o processo de inclusão levou aos meus cuidados educacionais, duas crianças
com transtorno do espectro autista.
Eu como educadora não tinha nenhuma formação em Educação Especial,
desconhecia quase que totalmente o transtorno que acometia aquelas crianças, o que me
tornou um tanto insegura, pois a inclusão era uma realidade nova para mim e as
especificidades apresentadas por aquelas crianças eu desconhecia quase que totalmente.
A partir do momento que recebi essas crianças pude constatar o quanto estava
despreparada para lidar com a nova situação.

26
Nesse sentido me questionei: Será que todos os autistas são presos em uma
redoma? Aquele espaço educativo era o ideal para aquelas crianças, ou deveriam
frequentar uma escola especial? Quanto à condição autista limitava ou potencializava o
desenvolvimento de habilidades? Que metodologia de ensino seria utilizada? Até que
ponto estava qualificada para trabalhar com aquelas crianças? De que forma poderia
fazer contato com aquelas crianças “encapsuladas” e penetrar em seu mundo incógnito?
Questionamentos esses aflorados por previamente não haver recebido, não possuir
informações e nem especialização para trabalhar com aquelas crianças.
Foi de princípio atemorizante na minha situação como professora, eu estava
diante de duas crianças com transtorno do espectro autista com características distintas
completamente mergulhadas em seu eu, ambas ignoravam e não se comunicavam com o
mundo exterior, passando a visão de estarem “encapsuladas”, ou seja, está protegida por
uma membrana que as resguardavam do contato com o mundo exterior, e fazerem a
questão de se manter naquela situação.
Para Tustin (1975), (apud AMY 2001, p. 37) a criança neste estado que ela
denominou de “crianças encapsuladas”, dar ares de estar trancada em um estado autístico
inalterável com raro desenvolvimento do mundo interno como se houvesse paralisado em
um estágio precoce da vida, causando um tipo de imaginação muito restrita centrada nos
processos corporais, porém, para a autora, não passa de uma criança tomada de pânico,
apesar de parecer apática e imperturbável, ela vaga fantasmaticamente por um buraco negro
onde a sua forma de defesa é a inibição, o processo de encapsulamento a absorve
completamente, negando-se até mesmo aos cuidados de quem a cria.
Com base nessas primeiras indagações de docente, observam-se que angústias,
dúvidas e inquietações, constituíram o meu contato inicial com as crianças com
autismo, pois tudo que já havia lido ou ouvido falar, demonstravam que o sujeito com
autismo não se comunicava, e na prática, eu estava evidenciando naquele momento o
isolamento físico e a falta de reciprocidade daquelas crianças. O enigma estava lançado
em minhas mãos. Como poderia contactar aquelas crianças que apesar de tão pequenas,
recusavam aceitar o contato social evitando ativamente qualquer forma de aproximação,
e ficavam horas isoladas em um canto da sala, ou então andando sem parar e sem um
foco ou destino a chegar, apenas andavam.
Os dias iniciais com essas crianças eu me contentei em observar e às vezes era
observada por um olhar que se desviava assim que cruzava com o meu. Além das
primeiras impressões, Baptista e Bosa (2002) afirmam que a mídia se encarrega de

27
propagar uma caricatura do autista como um ser incapaz de falar, sorrir, ou mostrar
carinho pelos outros. Essa visão midiática deturpa o autismo de tal forma que seres sem
conhecimento do problema, chegam a usar o termo autista para se referir a indivíduos
sem habilidades, sem nem ao menos procurar compreender o mínimo de particularidade
que compõe o espectro autista.
Minha aflição inicial tinha como princípios básicos essa descrição feita pela
mídia, mas, ao mesmo tempo, era uma espécie de fascinação e dúvidas sobre a
“incapacidade” delas. O “encapsulamento” protetor daquelas crianças passou a me
arrebatar de curiosidade, ao observar aqueles olhos, que me pareciam pedir motivos
para sorrir. Ellis (1996) esclarece que o autismo causa no sujeito uma perturbação da
interação social e que se faz necessária intervenção especial, uma vez que: [...] a
perturbação social, muito mais que outros de tais problemas, têm um efeito devastador
porque retira aqueles afetados do alcance das fontes ordinárias de aprendizado e do
apoio emocional que os outros seres humanos poderiam lhe proporcionar.
A menos que a natureza de suas perturbações sejam entendidas e sejam
proporcionados ensino hábil e cuidados, as pessoas socialmente perturbadas ficam
psicologicamente isoladas em um mundo que elas não podem entender. (ELLIS 1996,
p.26) Devido a essa perturbação social relatada por Ellis (1996) a qual vivência a
maioria as crianças com autismo, a minha experiência com elas, de início, foi frustrante
e desmotivadora, não conseguia entender o porquê se interessavam por contato com
objetos, já que estavam sempre com algum nas mãos e não se interessavam por contato
com pessoas se isolando do mundo.
Mas não desisti, procurei explicação para o que inicialmente era, para mim, um
grande desafio. Foram inúmeras tentativas de penetrar naquele universo particular,
porém, sem êxito. Passei a refletir, recorri à literatura e a diálogos com profissionais que
trabalham com crianças com autismo em busca de uma “fórmula mágica” que
contribuísse para o desenvolvimento daquelas crianças. Encontrei no lúdico uma fresta
nessa cápsula na qual seria possível penetrar. Notei que sempre, mesmo que por alguns
momentos, as atividades que envolviam música, brincadeiras, artes, jogos e contação de
histórias com fantoches, chamavam à atenção daquelas crianças ainda que não se
aproximassem, então passei a apostar nessa metodologia como forma de aproximação
das crianças com autismo, conseguindo assim abrir uma fresta na cápsula.
Com base neste panorama inicial apresentado, decidi realizar esta pesquisa, por
compreender que o lúdico é uma das formas de minimizar as barreiras autísticas da

28
sociabilidade, comunicação e imaginação, proporcionando a essas crianças
oportunidades de aprendizagem e socialização considerável.
A utilização do brincar como forma de interação social e aprendizagem da
criança com autismo é um grande desafio. As atividades ligadas ao corpo podem
produzir experiências agradáveis ou desagradáveis, conduzindo o sujeito a uma
aventura conflitual constante com o meio, esses conflitos, muitas vezes, têm origem em
distúrbios cognitivos, intelectuais e emocionais, para Gibello (1984), essa perturbação
social pode ser facilmente associada ao autismo, o déficit de interação social, ausência
de comunicação e imaginação, repúdio ao toque em vez do uso da imaginação e do
jogo, representam o isolamento autístico.
Conforme Saldanha (2014), as pesquisas em relação à importância do brincar na
Infância são várias, e as diferentes concepções sobre estas são muitas vezes confundidas
tornando o brincar como uma atividade que se mantém espontânea, ou
contraditoriamente, engessadas e que não recebe o seu devido valor nas disciplinas
educativas.
Ellis (1996) destaca que a educação não pode curar um severo déficit, mas pode
melhorar a capacidade da criança com transtorno autístico a enfrentar o mundo, já que, as
dificuldades no ensino da criança autista estão no desafio de atrair e prender a sua atenção,
nesse sentido os comportamentos da criança com autismo para brincar podem ser ensinados
utilizando jogos, brinquedos e brincadeiras, já que ao brincar a criança experimenta diversas
sensações, aprende regras e a apresentar uma conduta social aceitável, evitando isolar-se
dos outros, nesse sentido Luckesi (2000), afirma que brincar, jogar, agir ludicamente, exige
uma entrega total do ser humano, corpo e mente, ao mesmo
tempo. O professor deve buscar estímulos e adequar atividades que possam inserir estas
crianças ao grupo social incorporando a sua prática, jogos, cantigas de roda, e
brincadeiras e que essas práticas não sejam utilizadas apenas como recursos
pedagógicos, porque perdem o sentido da brincadeira e até mesmo a própria ludicidade,
servindo somente para atingir resultados educacionais de ensino esperados. Como
alguns sujeitos com autismo apresentam resistência ao aprendizado, é indispensável
criar meios para incentivar sua participação nas atividades.
De acordo com Saldanha (2014): Trabalhar pedagogicamente, com crianças autistas
e jovens com autismo, é um permanente e um instável desafio. Permanente, porque as
situações de aprendizagem requerem uma atenção ininterrupta; instável, porque a
imprevisibilidade de cada momento seguinte é a grande única certeza. (SALDANHA,

29
2014, P.15) No que se refere ao desafio de trabalhar com sujeito com autismo, para não
haver demasiadas surpresas em seu comportamento e as suas reações a novos estímulos,
se faz necessário que em se tratando de atividades lúdicas, o educador antecipe o que
vai acontecer na realização da atividade, seja por gesto, palavras ou demonstrando para
criança como ela será desenvolvida.
Saldanha (2014) nos traz que através do caráter simbólico na atividade lúdica, a
criança compensa-se de frustrações e insatisfações, fazendo representação do objeto ou
de situações ausentes, a autora afirma que a criança com autismo possui dificuldade
extrema em desenvolver o jogo simbólico de brincar de faz-de-conta, mas que esse não
é um fato impossível de acontecer ensinando-as os jogos de faz de conta com técnicas
de mudança de comportamento, na medida em que interage com os outros, permitindo
assim que a criança entre no mundo de fantasia. Enfim, as atividades lúdicas não devem
ser forçadas devem acontecer e envolver a criança para que assim haja ludicidade.
Tendo a ludicidade como parceira o professor provavelmente conseguirá
bastante êxito na interação social e na aprendizagem da criança com autismo A
interação da criança autista com a professora e com as outras crianças na instituição
pesquisada ao iniciarmos a exposição do estudo, se faz necessário apresentar o sujeito
dessa pesquisa o João, que é o nome fictício da criança com autismo, que em época da
escrita desse estudo encontrava-se com três anos e cinco meses.
Quando João chegou aos cuidados educacionais da pesquisadora na escola tinha
um ano e seis meses, não era diagnosticado com autismo e os pais só achavam incomum
em seu comportamento à ausência de linguagem verbal, ele não falava e nem
balbuciava até mesmo palavras como mamãe, papai e água, vocábulos que normalmente
os bebês começam a balbuciar com apenas alguns meses de vida.
Entre outros comportamentos incomuns de João podemos citar que ele evitava
contato visual, não atendia se chamado, apresentava estereotipias motoras girando e
balançando as mãos por bastante tempo (flaps), não utilizava os brinquedos de forma
convencional apenas ficava com eles nas mãos, não manifestava desejos e vontades na
forma de solicitação verbal, recusava ser tocado, mas segurava as pessoas pela mão
conduzindo-as ao que desejava se fosse algo que não estivesse ao seu alcance, utilizava
chupeta e um paninho nas mãos o tempo todo e tinha a rotina de dormir toda a manhã fica
muito agitado se não fosse colocado ao berço. Quando acordava gostava de enfileirar as
cadeiras da escola e alguns bonecos, depois ficava olhando para o que fez sem nenhuma

30
expressão, apenas observava, ou chorava se alguém mexesse, essa ação era realizada de
forma consecutiva por longos períodos se não fosse interrompida por algum adulto.
Em seus aspectos psicomotores João não possui déficits significativos, andava com
desenvoltura, subia escadas, escalava os brinquedos do parquinho, balançava-se e saltava
com facilidade, também apresentava uma boa coordenação motora fina, segurava o lápis de
forma correta e tinha sensibilidade no movimento de pinça, se alimentava sozinho e de
forma educada, raramente se sujava, porém esses momentos das refeições às vezes se
tornavam tensos, se lhe fosse oferecido um alimento que ele não queria naquele momento, a
recusa gerava uma fúria que o fazia atirar longe o alimento e por diversas vezes derrubava
as cadeiras do refeitório para mostrar a sua insatisfação. João não interagia com os colegas,
se afastava deles quando aproximavam ou apenas ficava os observando, não trocava afeto e
não participava das brincadeiras com as outras crianças, ele não apresentava comportamento
agressivo com os colegas, apenas os evitava.
Com cinco meses no ambiente escolar ele foi diagnosticado por uma equipe
multidisciplinar com Autismo infantil e era apresentado pelos médicos até aquele
momento como autista não verbal, apesar de todos os estímulos em casa, na escola e nas
consultas com a fonoaudióloga ele não falava nenhuma palavra. Foi necessária
reestruturação na rotina escolar para privilegiar e incluir João nas atividades da turma, o
hábito de ficar recolhido ao berço e dormir toda a manhã também foi modificado e de
forma espontânea, ele passou a demonstrar também avanços significativos e
comportamentos mais adaptados ao cunho social, ficava no meio da roda nas cirandas,
interagia nas brincadeiras livres e estava se saindo muito bem nas brincadeiras dirigidas
pela professora, gostava de fazer trabalhos com tinta, colagem, brincar com massinha e
com jogos de encaixe.
Ainda havia momentos de oposição, contudo, a participação de João já era
constante em diversas atividades de potencial lúdico, ele mostrava preferência em
permanecer na companhia das crianças com maior idade, passou a imitar tudo o que um
colega de cinco anos fazia o que favoreceu bastante a sua aprendizagem. Foi nesse
período, no momento de uma brincadeira cantada, que para surpresa de todos, João se
expressou verbalmente pela primeira vez, todos cantavam a música popular, “A
pombinha voou, voou, caiu no laço e se embaraçou. Ai me dá um abraço que eu
desembaraço essa pombinha que caiu no laço”.
As crianças eram chamadas pelo nome e iam abraçar a pesquisadora, sempre ao
cantar essa música o nome de João era o primeiro a ser citado pra ir dar o abraço, mas ele

31
nunca se manifestava de forma autônoma para que isso ocorresse, a professora ia ao seu
encontro para o abraçar. Nesse dia o nome dele não foi inicialmente chamado como de
costume, após ouvir a canção com os nomes das outras crianças e não o dele, João que
estava em pé observando, falou bem alto o seu nome seguidamente, deixando todos
perplexos. Nesse sentido Chiote (2015) revela que no processo de agir para o outro, a
criança toma “para si” o significado cultural da ação, modificando o seu modo de
interagir com esse outro e vai se inserindo no universo semiótico participando das
práticas culturais de seu grupo.
A partir desse momento os ânimos afloraram para ver João progredir
desenvolvendo a linguagem verbal, foram confeccionadas fichas com gravuras,
realizadas abundantemente atividades de potencial lúdico envolvendo músicas, contação
de histórias com fantoches e fantasias e diversos outros recursos para estimular a
linguagem. Além do trabalho coletivo a pesquisadora passou a desenvolver um trabalho
individual com João, aproveitando que ele demonstrava satisfação em está com ela e
cooperava realizando as atividades. Ele aos poucos foi desenvolvendo a linguagem,
mesmo que de forma ainda não tão compreensível, seu repertório vocabular era de
palavras soltas e foi aumentando gradativamente, apesar de nem todas as crianças
compreenderem o que João falava, elas se entendiam em diferentes situações,
transformando aprendizagem de todos em um processo prazeroso através da cultura
lúdica proporcionada. Atividades lúdicas desenvolvidas com a criança com autismo.
Durante o período da pesquisa foram desenvolvidas diversas atividades, criadas
situações para que a criança com autismo se aproximasse das outras crianças, brincasse
e interagisse. Algumas dessas situações coletivas serão relatadas, enfatizando o
comportamento de João e colocando em evidências a importância de práticas
diversificadas para auxiliar a aprendizagem e socialização da criança com autismo com
atividades lúdicas. Todo o processo não se prendeu as limitações de João, ele superou
diversos obstáculos e podemos afirmar que a mediação nas situações de brincadeiras foi
fundamental para modificar positivamente o seu comportamento. Todas as imagens das
atividades foram arquivadas no diário de bordo da pesquisadora.

Atividade 1 - Casinha encantada - Uma das características das crianças do autismo é a


ausência da capacidade do jogo simbólico, ou seja, elas não brincam de faz de conta, a
criança não manifesta o desejo de assumir papéis, não brincam de fingir de forma flexível e
adequada à idade, como brincar de casinha fazendo comidinha, brincar de médico,

32
motorista ou professor, ações que devem ser livres com situações criadas pelas próprias
crianças.
Nessa atividade propiciamos que no espaço houvesse uma variedade de acessórios
como bonecas, utensílios brinquedos de cozinha, telefone, kit médico, carrinhos, fantoches,
fantasias e tudo que pudesse culminar no processo criativo das crianças. João não mostrava
interesse por esse tipo de brincadeira, entrava na casinha pegava os brinquedos, mas não
utilizava para fazer representação como as outras crianças.
No início, imaginamos ser por falta da fala, mas depois que começou a se
expressar verbalmente a situação permanecia. Assim, foi necessário, promover diversas
situações para tentar estimular João a fazer representações simbólicas, Segundo
Saldanha (2014) é através das tentativas de desempenho de papéis, que a criança
aprende a ter diferentes perspectivas e começa a entender a natureza a natureza das
relações sociais, sendo também possível que o jogo simbólico ajude a criança em outras
formas de atividade simbólica dentre elas a mais importante é a linguagem.
Nesse sentido a pesquisadora passou a brincar de casinha com as crianças,
interagia estimulando as representações foram necessárias inúmeras tentativas sem
sucesso, até que uma das crianças enfileirou as cadeiras e chamou outras crianças para
brincar de ônibus, todos participaram da brincadeira e João manifestou o desejo de
também “dirigir” o ônibus.
João também começou a representar simbolicamente em outra ocasião utilizando
fantoches, ele estava com o fantoche do porquinho e a pesquisadora começou interagir
com ele, João disse “o poquinho vai tomer casa da pó” a pesquisadora entrando na
brincadeira falou “não porquinho, não venha, pois tenho medo”. João se aproximou com
o fantoche para pegar a pesquisadora e ao se aproximar deu-lhe uma mordida e falou
“comeu”.
A brincadeira de casinha também passou a despertar a sua atenção, ele pedia
para tirar a camisa, pegava uma miniatura de ferro de passar roupa e ia brincar,
reproduzindo atividades executadas por adultos, outras vezes brincava de “kik iki”, ou
seja, piquenique utilizava fogãozinho, panelinhas, pratinhos e talheres de brinquedo
comendo e nos oferecendo alimentos imaginários, (Figura 01).
Em algumas ocasiões a pesquisadora vestia fantasias e as disponibilizava também
para que as crianças brincassem e gerassem atos simbólicos e funcionais, (Figura 02).
Assim que a pesquisadora notou que João estava realizando atos simbólicos de forma

33
autônoma e não mais fracassava, passou a deixá-lo livre para gerar significação às suas
brincadeiras. Figura 01 Figura 02.
Atividade 2 - Ciranda musical - A música para trabalhar com crianças é uma
ferramenta importantíssima para o seu desenvolvimento em diversos aspectos. No
ambiente escolar na educação infantil, a música é utilizada diversas vezes durante as
aulas, os professores incentivam as crianças a ficarem na rodinha e cantarem melodias
simples fazendo o uso de canções repetitivas com finalidade distinta o que acaba
tornando esses momentos que envolvem músicas em momentos mecânicos que
eliminam as possibilidades de ludicidade e de socialização.
Analisando possibilidades de desenvolvimento cognitivo, corporal, sensorial e
principalmente da comunicação e socialização da criança com autismo, elaboramos a
atividade, cujo objetivo era evitar que as crianças ficassem estáticas, afinal, podemos
cantar e dançar sozinho, mas fazer isso acompanhado é muito mais divertido.
Nesse sentido Szabo (1995) relata que a música tem como função ajudar todo ser
humano e no caso da criança com autismo que possui dificuldade em entrar em contato
com o mundo exterior, a música serve como meio de abrir um canal de comunicação
muito difícil de conseguir através de outros meios, já que as crianças com autismo tem
fascínio pela música ela pode contribuir para maior estabilidade emocional e
autoconfiança, pois a música é tão valorosa quanto a palavras e conceitos.
Para a realização das atividades confeccionamos alguns instrumentos musicais
feitos de materiais recicláveis, também utilizamos alguns instrumentos já existentes no
ambiente escolar. Com mediação, as crianças foram encontrando a funcionalidade dos
instrumentos. A pesquisadora cantava músicas que faziam parte do repertório cultural e
musical das crianças utilizando um instrumento musical chamado maracás, a atenção
das crianças foi imediata, alegria e euforia de todas elas, o som dos instrumentos as
vozes ecoaram por toda a escola, todas dançando, tocando e cantando, João dissipava
alegria com o instrumento escolhido nas mãos, dançava e interagia tocando o seu
xilofone. (figura 03).
Esse tipo de atividade passou a ser rotineira na escola, acrescentamos como
suporte o uso de uma caixa amplificada para ampliar a voz, pois foi observado o
fascínio de João por cantar com o microfone, o que lhe proporcionava o ganho de
habilidades linguísticas. (figura 04). Figura 03 Figura 04
Atividade 3 - Círculo de afetividade - Brincar com bambolê é uma atividade
bastante divertida, todas as crianças gostam desse brinquedo, o bambolê ajuda a

34
desenvolver a cinestesia, aspectos cognitivos, interação, criatividade, equilíbrio e
movimento do corpo, atividades lúdicas ligadas ao corpo são imprescindíveis para
apropriação e constituição da cultura lúdica e a história social nesse, sentido Vigostky
traz que: As crianças podem imitar uma variedade de ações que vão muito além dos
limites das suas próprias capacidades. Em uma atividade coletiva ou sob a orientação de
adultos, usando a imitação, as crianças são capazes de fazer muito mais coisas. Esse
fato, que parece ter pouco significado em si mesmo, é de fundamental importância na
medida em que demanda uma alteração radical de toda doutrina que trata da relação
entre aprendizado e desenvolvimento em crianças. (VIGOTSKI, 1998, p. 115-116).
Pensando nessas possibilidades desenvolvemos algumas atividades utilizando o
bambolê e envolvendo coletividade como ferramenta para fomentar a interação de João
com os colegas, diversos bambolês foram disponibilizados para as crianças,
inicialmente elas exploraram livremente o brinquedo, João ficou com o dele nas mãos
sem tentar explorar o objeto, já algumas crianças giravam o bambolê ao chão ou ao
corpo, outras amassavam, modificando a sua forma ou jogavam para cima, ou para o
lado. Colocamos músicas e mostramos como convencionalmente se usava o bambolê,
nesse momento notamos que o interesse de João pelo objeto passa a se evidenciar, a
partir dos movimentos giratórios que sempre despertavam a sua atenção.
Kishimoto (2010) enfatiza que: Ao brincar, a criança experimenta o poder de
explorar o mundo dos objetos, das pessoas, da natureza e da cultura, para compreendê-
lo e expressá-lo por meio de variadas linguagens. Mas é no plano da imaginação que o
brincar se destaca pela mobilização dos significados. Enfim, sua importância se
relaciona com a cultura da infância, que coloca a brincadeira como ferramenta para a
criança se expressar, aprender e se desenvolver. (KISHIMOTO, 2010, p.1).
Corroborando com Kishimoto quando relaciona a cultura da infância como elo
entre o desenvolvimento e novas experiências, observamos que João sorria
acompanhando a rotação do brinquedo sem soltar o seu, tornando-se necessário instruí-
lo e o inserir no contexto brincante, Saldanha (2014, p.279) assevera que “É importante
ensinar a criança a manejar os brinquedos de modo não repetitivo, e ensinar-lhe regras
mínimas de socialização, para que elas possam juntar-se às brincadeiras dos outros”
concordamos com Saldanha, e nesse sentido propomos novas formas de brincar com os
bambolês, sugerimos que as crianças colocassem os bambolês ao chão para fazermos
um circuito, utilizamos também alguns cones plásticos coloridos, todas as crianças

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participaram juntas, pulando dentro dos bambolês ao som da música e executando
outros movimentos aos comandos da pesquisadora com auxílio das auxiliares.
João rejeitou participar dizendo “não quer”, permanecendo sentado olhando
atentamente os movimentos realizados por colegas e não soltava o seu bambolê.
Utilizamos a estratégia de chamar as crianças pelo nome, para individualmente
participarem, estratégia essa elegida, por já ter sido observado anteriormente pela
pesquisadora que em algumas situações, João ficava esperando ouvir o seu nome para
realizar determinadas atividades. As crianças foram convidadas, por palmas e entoação
um pequeno chamado que dizia assim “Quem será, quem será, quem será que agora vai
brincar? Será o (a) ...? Será (a)...? Venha correndo e pegue em minha mão”. Ao ouvir o
seu nome João abandonou o bambolê ao chão e reproduziu o que antes observava os
colegas fazer, prevalecendo-se da situação a pesquisadora direcionou as atividades para
que ele interagisse com a turma, foi feito o círculo da afetividade, uma brincadeira
realizada em dupla, em vez de fazer o circuito individualmente, as crianças tinham que
pegar um bambolê e em dupla executar os comandos na brincadeira.
Ao observar os colegas, João pegou o bambolê e o levantou e colocou o colega
dentro dele, a pesquisadora foi auxiliar para que entrasse também. A brincadeira foi
dinâmica, João participou bastante empolgado, os risos eram constantes ele gritava
“caiu”, quando o bambolê de algum colega ou o seu caia, quando chegava ao final da
trilha ele falava “parabéns você conseguiu” repetindo o que falávamos. Entre os
comandos dado pela pesquisadora, um deles era trocar de parceiros na brincadeira,
proporcionando que João interagisse com colegas de várias faixas etárias, o que
proporcionou a diminuição de dificuldade em realizar alguns comandos, que por vezes
João ou se retardava ou não conseguia realizar sem ajuda, e ao ser auxiliado por seu
parceiro ele realizava. Kishimoto (2010) afirma que às experiências expressivas,
corporais e sensoriais proporcionadas pelo brincar são de enorme variedade, devendo-se
na prática pedagógica se observar e conhecer as crianças, já que cada uma é diferente,
tem preferências conforme sua singularidade e em qualquer agrupamento infantil, as
crianças avançam em ritmos diferentes.
Por isso essa atividade foi realizada em dias consecutivos, para que a criança com
autismo conseguisse antecipar o que aconteceria e assimilar a situação do trabalho proposto.
Apresentação e análise dos resultados dos dados recolhidos essa pesquisa é um despertar
sobre a ludicidade como forma de aprendizagem das crianças, principalmente da criança
com autismo. Para fazer a análise dos resultados dos dados recolhidos, foram

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coletados informações a partir de registros do diário de campo. Foi necessário bastante
sensibilidade para selecionar e retratar algumas das diversas atividades que foram
realizadas.
O sujeito a quem esse estudo direcionou a atenção surpreendeu a todos,
superando as expectativas iniciais desse estudo, ele passou do processo de apatia em
que permanecia, para um processo harmônico com o meio social que estava inserido,
rompendo a cápsula que o mantinha invólucro. A cártula mágica desse processo foi sem
dúvida a cultura lúdica que envolveu as crianças de diversas faixas etárias,
possibilitando vivências singulares de ludicidade, rica de significados, além de ter sido
fundamental a modificação da estrutura da escola para englobar um trabalho que
pudesse beneficiar tanto as crianças com o desenvolvimento neurotípico, quanto à
criança com o desenvolvimento atípico, acometida pelo transtorno do espectro autista.
É importante ressaltar que a criança com autismo observada está dentro do
espectro, possui um comprometimento moderado, apesar dos relatos descritos da
observação de modificação de alguns dos sintomas e da permanência de outros, não
tivemos a intenção de minimizar os efeitos do transtorno nessa criança, nem temos
conhecimento da extensão dele. Podemos revelar como efeito positivo da pesquisa o
fato da criança com autismo poder ter tido a oportunidade e aprender como se brinca de
faz de conta, com técnicas de modificação do comportamento e com a participação da
pesquisadora induzindo esse aprendizado.
O que de início parecia ser impossível, passou para um jogo simbólico pobre, e
desse processo, para a representação mais esquematizada, que permitiu a criança ir além
do que foi ensinado. De tal modo, trabalhar com a criança com autismo nos trouxe a
tona um leque de possibilidades e de esperanças da capacidade dos sujeitos com
autismo desenvolverem o jogo simbólico.
Por concluir, sabemos que o autismo ainda intriga a medicina e a sociedade, mas
acreditamos nas potencialidades desses sujeitos, pois merecem e têm direito a
oportunidades de serem ensinadas de forma adequada, não há dimensões para que esse
direito seja oportunizado e esses sujeitos ocupem o seu lugar na sociedade.

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REFERÊNCIAS

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relação terapêutica. Rio de Janeiro: Jorge Zarat, 2001.

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reflexões e propostas de intervenção. Porto Alegre: Artmed, 2002.

CHIOTE, Fernanda de Araújo Binatti. Inclusão da criança com autismo na educação


infantil: trabalhando a mediação pedagógica. 2ª Ed. Rio de Janeiro, Wak, 2015.

ELLIS, Kathryn. Autismo. Tradução de Pedro Paulo Rocha. Rio de janeiro: Reinventer,
1996.

GIBELLO, Bernard. A criança com distúrbios de inteligência. Porto Alegre: Artes


Médicas, 1986.

KISMOTO, Tizuko Morchida. Brinquedos e brincadeiras na Educação Infantil


Anais Do I Seminário Nacional: Currículo Em Movimento – Perspectivas Atuais. Belo
Horizonte, novembro de 2010. Disponível em : . Acesso em: 08, set 2016.

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uma proposta pedagógica a partir da Biossíntese. In LUCKESI, Cipriano Carlos (org.)
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LUCKESI, Cipriano. Ludicidade e atividades lúdicas: uma abordagem a partir da


experiência interna. Disponível em: www.luckesi.com.br. Acesso: mar. 2006.

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SZABO, Cleusa Barbosa. Autismo em questão. São Paulo: MAGEART, 1995
VIGOTSKI, L.S. A Formação Social da Mente. São Paulo: Ed. Martins Fontes, 1998

A partir de agora, você terá acesso a algumas atividades lúdicas sugeridas no site
https://cursodebaba.com/brincadeiras-atividades-criancas-autistas/ Para mais
brincadeiras, acesse o site. Importante que você saiba também que não se deve
subestimar as crianças autistas, pois, se não houver interferências de outras síndromes, a
inteligência não é totalmente comprometida. Pode-se, então, aplicar as diversas
brincadeiras que já existem para crianças fora do espectro. Se julgar necessário,
adaptações, pois cada criança tem sua própria limitação.

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REFERÊNCIAS

ALVES, Denise de Oliveira. Sala de recursos multifuncionais: espaços para atendimento


educacional especializado / Ministério da Educação. Secretaria de Educação Especial.Brasília,
2006. Disponível em: < http://www.oneesp.ufscar.br/orientacoes_srm_2006.pdf>. Acesso em:
17 MAR. 2013.

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possibilidades e limitações. 3. ed. Petropólis, RJ: Vozes, 2011.

ESTRELA, Albano. Teoria e prática de observação de classes. Lisboa: INIC, 1986. EVANS,
Peter. Algumas Implicações da obra de Vygotsky na Educação Especial. In.: DANIELS, Harry.
Vygotsky em foco: Pressupostos e desdobramentos. Trad. MARTINS, mônica Saddy.Cestari,
Elisabeth Jafet. Campinas, SP: Papirus, 1994.

FONSECA, Hellen Vieira. Histórias de vida de uma professora de alunos com autismo:
constituição de identidade profissional.2009.Tese(doutorado).Programa de Pós-Graduação
stricto senso em Psicologia da Universidade Católica de Brasília. 2009. Disponível em:
http://www.bdtd.ucb.br/tede/tde_arquivos/5/TDE-2009-11-
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acesso em 15 Mar. 2013.
Referências webgráficas

BRINCADEIRAS PARA CRIANÇAS AUTISTAS. 10+ Atividades e Brincadeiras para


Crianças Autistas. Disponível em https://cursodebaba.com/brincadeiras-atividades-criancas-
autistas/ Acesso em 20 jul. 2020.

RIBEIRO, Maiane Santos Malaquias e Suely de Souza. A Importância do Lúdico no Processo


de Ensino-Aprendizagem no Desenvolvimento da Infância. Psicologado, [S.l.]. (2013).
Disponível em https://psicologado.com.br/atuacao/psicologia-escolar/a-importancia-do-ludico-
no-processo-de-ensino-aprendizagem-no-desenvolvimento-da-infancia . Acesso em 31 jul 2020.

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