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SISTEMAS ESTRUTURAIS HÍBRIDOS

Professor Mauro César de Brito e Silva

MISTO, COMPOSTO OU HÍBRIDO?

Os materiais podem ser compostos considerando os níveis e as ligações dos


componentes, tais como: vigas mistas de perfis de aço + lajes de concreto armado moldado in
loco, vigas mistas de perfis de aço + lajes de concreto armado pré-fabricado protendido, vigas
mistas de perfis de aço + lajes do tipo Steel deck, e vigas mistas de perfis de aço + painéis de
madeira laminada colada – CLT.

O escopo da norma brasileira NBR 8800 de 2008 – Projeto de estruturas de aço e de


estruturas mistas de aço e concreto de edifícios, prescreve que esta se aplica exclusivamente aos
perfis de aço não híbridos e caso sejam usados perfis híbridos as adaptações necessárias serão
conforme 1.11 da norma.

O item 17 – Composite Beams, Trusses, and Joists da norma canadense, CAN/CSA-S16-


01 – Limit States Design of Steel Structure, prescreve que as vigas podem ser compostas de
perfis de aço, treliças de aço suporte do telhado, vigas horizontais de aço que suportam pisos ou
forros. Estas vigas e treliças devem estar interconectadas tanto com lajes de concreto armado
moldado in loco como lajes do tipo steel deck.

A Norma da União europeia, Eurocode 4: Design of composite steel and concrete


structures – Part 1-1: General rules and rules for buildings, aplica-se aos projetos de estruturas
e elementos compostos para edifícios e obras de engenharia civil. Está em conformidade com os
princípios e requisitos para a segurança e manutenção das estruturas, com base em seu projeto e
verificação fornecidos na EN 1990. São compostos os componentes de concreto e de aço
estrutural ou formado a frio, interconectado por conexão de cisalhamento, de modo a limitar o
deslizamento longitudinal entre concreto e aço e a separação de um componente do outro.

A três normas fazem analises das vigas que formam os sistemas estruturais de barras aço
e lajes de concreto armado /steel deck. A norma brasileira considera que as peças estruturais
formadas por aço e concreto nos edifícios são mistas (figura 1), enquanto as outras normas,
canadense e europeia, chamam estas peças estruturais de compostas (figura 1). E o objetivo
central deste texto é analisar os sistemas estruturais híbridos. Logo, o estudo principal será das
estruturas híbridas, tais como: aço – madeira, aço – concreto armado, concreto armado –
madeira, alvenaria estrutural – aço.

Figura 1 - Viga mista/composta: aço + concreto armado


SISTEMAS DE ESTRUTURA HÍBRIDA
(Engel, H., Structure Systems – Hybrid structure system, Gerd Hatje Publishers, USA, 1997)

Dois sistemas estruturais com diferentes mecanismos de redirecionamentos de forças


podem ser unidos para formar um único sistema com uma nova mecânica: sistemas de estrutura
híbrida. E a pré-condição para o sistema de estrutura híbrida é que os dois sistemas que têm
função de suporte são basicamente equivalentes e que em seu novo comportamento eles
dependem um do outro. Os sistemas híbridos não devem ser entendidos como combinações de
sistemas em que um dos sistemas desempenha um papel menor no redirecionamento de forças ou
em que cada sistema no processo de suporte desempenha uma função separada para si, como
recepção de carga, transferência de carga, estabilização, etc. Os sistemas híbridos não se
qualificam como uma estrutura de “família” única ou como uma estrutura de característica
“tipo”, ou seja, não possuem um mecanismo inerente para o redirecionamento de forças, não
desenvolvem uma condição específica de forças ou de atuação de tensões, e não têm
características estruturais próprias. Diferindo das famílias de estruturas típicas, os sistemas de
estrutura híbrida, portanto, são caracterizados não por um mecanismo particular de
redirecionamento forças e por uma distinção de formas estruturais, mas pelo comportamento
específico decorrente da junção dos sistemas e pelas ligações resultantes entre eles.
Para formar uma construção híbrida, é possível através de três tipos básicos de ligação de
sistemas: União paralela = Sobreposição ou alinhamento; União sucessiva = acoplamento;
Junção cruzada = interpenetração.
No tipo de superposição de ligações de sistemas híbridos, o redirecionamento de forças será
realizado coletivamente por dois sistemas de estrutura diferentes unidos em ordem paralela ao
longo de todo o comprimento funcional. Normalmente, a ligação paralela sobrepõe um sistema
ao outro, mas também é possível teoricamente um alinhamento lateral dos sistemas. No tipo de
acoplamento da ligação de sistemas híbridos, o redirecionamento de forças será realizado, na
medida em que diferentes sistemas estruturais são selecionados de acordo com os requisitos
mecânicos prevalecentes nas várias seções do comprimento funcional e são unidos
sucessivamente um atrás do outro. Assim, também são possíveis múltiplos acoplamentos. Uma
ligação híbrida também pode ser obtida fazendo com que os elementos de um tipo de estrutura
cruzem os de outro em grelha: junção cruzada. Esse tipo de ligação, no entanto, até agora não foi
reconhecido na teoria e na prática e, portanto, ainda não será aceito como uma alternativa válida.
Existe um amplo campo para a aplicação de sistemas de estrutura híbrida, em particular,
através da ligação das treliças de vetor-ativo ou das vigas de massa-ativa com estruturas de
cabos: Sistemas com suporte de cabo externo e Sistemas com tensão de cabo integrada. O
potencial dos sistemas de estrutura híbrida, no entanto, não deve ser visto apenas na junção da
capacidade de carga de dois sistemas, mas nas possibilidades correlacionadas da exploração das
disparidades dos sistemas, ou seja, compensação recíproca de tensões críticas, funções duplas ou
múltiplas de transpor os componentes de cada sistema e aumento da rigidez através da deflexão
de sistemas opostos.
A concepção de sistemas de estrutura híbrida se preocupa essencialmente com dois
objetivos: criar uma unidade entre dois sistemas independentes, tanto no sentido mecânico
quanto estético, traçando e mantendo as relações correlatas entre as famílias dos sistemas. Para
dominar essas tarefas, é necessário um conhecimento abrangente sobre todos os diferentes
sistemas estruturais, especialmente com relação ao seu fluxo de cargas e suas deflexões quando
as solicitações são variáveis. Os sistemas de estrutura híbrida são particularmente apropriados
para edifícios com solicitações extremas, ou seja, estruturas de grande porte e arranha-céus.
Embora a causalidade mecânica dos sistemas híbridos esteja além de qualquer dúvida,
considerações estéticas ainda visuais podem se tornar um ponto de partida e objetivo final para o
desenvolvimento de novos sistemas híbridos; Os sistemas de estrutura híbrida, portanto, ocupam
um campo particular dentro da teoria das estruturas. Embora não tenha um mecanismo próprio e,
consequentemente, não se qualifique como um tipo de sistema estrutural, ainda assim seu
potencial vai além de uma variedade infinita de possibilidades.

SISTEMAS ESTRUTURAIS HÍBRIDOS

Estes sistemas combinam os benefícios de diferentes materiais estruturais para superar as


limitações individuais de cada um deles. Os benefícios incluem aumento na capacidade de
absorver os carregamentos atuantes, resistência ao fogo e economia de custos. Os desafios das
estruturas híbridas são relativos às propriedades dos materiais estruturais utilizados. E uma das
dificuldades do projeto é relativa às conexões entre os materiais que formam o sistema estrutural.
Logo, o projeto da ligação entre estes elementos pode ser mais difícil, pois as variações de
temperatura e umidade têm efeitos diferentes nos materiais. E a elaboração dos projetos de
arquitetura e estrutural deverá considerar a linguagem de cada material estrutural na construção
das estruturas híbridas.

1 AÇO – MADEIRA

Apesar das vantagens óbvias da elaboração de projetos utilizando sistemas estruturais


híbridos de aço e madeira, estas ainda precisam ser mais bem estudadas para que padrões sejam
estabelecidos e comprovação teórica e prática sejam obtidas da eficácia de sua utilização na
construção das edificações. Recentemente, o NAHB Research Center desenvolveu um guia do
construtor para detalhes de conexões híbridas de aço e madeira para sistemas estruturais
considerados leves. E ficou evidente que ao combinar aço e madeira, os projetistas devem
considerar as vantagens e limitações de cada material e utilizá-las da melhor maneira possível,
pois a revisão da literatura para a elaboração de tal guia destacou a existência de lacunas de
conhecimento para os estudos dos edifícios híbridos de aço – madeira.
O estudo dos sistemas estruturais híbridos deve ser feito considerando uma compreensão
aprofundada das propriedades de cada material envolvido na construção da edificação. Os
materiais devem ser analisados para que seja entendido o comportamento mecânico de cada um
deles. Ou seja, os projetos devem ser elaborados por profissionais de engenharia e arquitetura
que tenham consciência dos pontos fortes de cada material. Quando o sistema estrutural está
sendo solicitado a carregamentos externos, a madeira pode ser muito flexível, mantendo a
resistência ao flexionar e é incrivelmente resistente quando comprimida na vertical. A madeira é
menos resistente à compressão perpendicular do que à compressão paralela às suas fibras. No
entanto, a madeira apresenta boa resistência à tração paralela as fibras. A fibra transversal de
qualquer tipo reduz materialmente a resistência à tração da madeira, uma vez que a resistência à
tração perpendicular às fibras é apenas uma pequena fração daquela paralela a fibra. Ao contrário
da madeira, o aço se destaca na tração (Kulak, 2005). O aço é considerado isotrópico, o que
significa que suas propriedades são as mesmas em qualquer direção. No entanto, a madeira
possui propriedades mecânicas únicas e independentes nas direções de três eixos mutuamente
perpendiculares: longitudinal, radial e tangencial. O eixo longitudinal L é paralelo às fibras; o
eixo radial R é perpendicular às fibras na direção radial; e o eixo tangencial T é perpendicular às
fibras, mas tangente aos anéis de crescimento (figura 2). Como as diferenças nas propriedades da
madeira entre as direções radial e tangencial são menores em comparação com as diferenças
mútuas na direção longitudinal, a maioria das propriedades da madeira para aplicações
estruturais são dadas apenas para direções paralelas as fibras (longitudinal) e perpendicular às
fibras (radial e tangencial).

Figura 2 – Eixos da seção da madeira

Figura 3 – Perfil soldado + CLT


O Residence Hall para a Rhode Island School of Design – RISD em Providence, Rhode
Island – New England, EUA é um edifício híbrido residencial de seis andares com sistema
estrutural composto de pilares e vigas de perfis metálicos de aço e lajes de painéis de madeira
CLT – Cross Laminated Timber (figuras 4). Os projetos de arquitetura e estrutural foram
elaborados por NADAA Architects e Odeh Engineers respectivamente. Para fabricação dos
painéis de CLT foi contratada a empresa canadense Nordic Structures of Quebec
(https://www.structuremag.org/?p=14845). As vigas de aço são perfis metálicos formados por três
chapas que são soldadas em maquinas de solda contínua de arco submerso e as lajes de painéis
de madeira não são solidarizados por conectores de cisalhamento aos perfis de aço (figura 3),
portanto não formam uma viga mista de aço e madeira, logo o edifício é considerado híbrido de
painéis de madeira CLT e perfis de aço soldado (figura 4).

Figura 4 - Residence Hall

2 AÇO – CONCRETO ARMADO

São dois materiais estruturais de alta resistência e o edifício da Reitoria da UFG


localizado no Campus Samambaia em Goiânia – GO (figuras 5 e 6) é um dos exemplos que
ilustra a capacidade portante dos dois materiais. O aço é utilizado nas barras das treliças suporte
da cobertura e forro do edifício, enquanto o concreto armado é utilizado nos pilares de concreto
armado moldado in loco de altura em torno de 7 metros que são suporte das treliças de aço com
vãos em torno 15 e 18 metros (figura 7). Além da cobertura os pilares também suportam um piso
do pavimento superior de vigas e lajes de concreto armado moldado in loco.

Figura 5 – Edifício da Reitoria UFG


Figura 6 – Edifício da Reitoria UFG

Figura 7 – Projeto de montagem da cobertura do edifício da Reitoria UFG


A cobertura das quadras de Peteca (figuras 8 e 9) para o Country Clube de Goiás é outro
exemplo de estrutura híbrida de aço e concreto armado. A solução utilizada pelo arquiteto foi um
sistema estrutural com treliças de aço para suportar de maneira suave e com leveza - estrutural e
plasticamente - o peso da cobertura de telhas de aço zincado, que por sua vez exigia uma solução
de captação da água pluvial e de uma estrutura que recebesse os esforços da cobertura. Que foi
viabilizado com um conjunto estrutural de concreto armado moldado in loco: viga calha e pilar
em forma de “H”, onde desceriam de maneira menos aparente os dutos de água pluvial.

Figura 8 – Quadras de peteca do Country Clube de Goiás

Figura 9 – Construção da cobertura das quadras de peteca do Country Clube de Goiás


3 CONCRETO ARMADO – MADEIRA

O salão de festas do Clube de Regatas Jaó é um exemplo de sistema estrutural híbrido de


pilares de concreto armado moldado in loco e vigas de cobertura de madeira laminada colada. É
um projeto de arquitetura pouco conhecido do arquiteto Sérgio Bernardes, mas que demonstrou a
coerência de suas ações projetivas e revelou um significativo momento de pesquisa material e
formal que fez parte da sua trajetória eclética. A opção estrutural foi por um sistema de vigas de
cobertura em madeira laminada colada - MLC de vãos livres de cerca de 20 m e balanços de
aproximadamente 5 m, que são sustentadas por pilares de concreto armado moldado in loco
(figura 10). As vigas de madeira laminada suportam telhas de cimento amianto desenhadas pelo
próprio arquiteto, que foram produzidas a partir de tubos de cimento amianto de 6 m de
comprimento, com dois diâmetros diferentes, cortados ao meio e utilizadas de modo similar à
telha de barro tipo “capa e canal”. A indústria LAMINARCO foi responsável pela fabricação das
vigas em São Paulo, de onde foram trazidas e montadas no local da obra.

Figura 10 – Clube de Regatas Jaó – Salão de Festas e balanços externos

Figura 11 – Complexo de esportes Marie - Victorin


Com uma área total de 12200 m2, o complexo de esportes Marie - Victorin está localizado
ao norte da cidade de Montreal - Canada, no campus universitário do Marie - Victorin College.
Consiste de um grande ginásio de esporte, uma pista de corrida coberta, um estádio de futebol,
uma grande área de armazenamento multifuncional, uma loja, escritórios e outras instalações. O
sistema estrutural híbrido (figura 11) da cobertura do estádio de futebol consiste de 10 arcos com
vão livre de 70 m, constituídos por elementos de MLC de 250 x 1980 mm, suportados por
grandes estruturas de concreto armado (KARSH, 2009).

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