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Revista Expresso, 2 de Março de 2002

JONAS SAVIMBI

Savimbi (foto Revista Expresso)

O grande problema com vista à pacificação é que a «UNITA savimbista»


nunca aceitou os acordos de Lusaka

"Jonas, Savimbi morreu de armas na mão e entrou na lenda. Único, insubstituível,


como sempre quis ser e foi. A União Nacional para a Independência Total de
Angola (UNITA), que criou em 1966 e refundou várias vezes, morreu com ele.

No entanto, todos os analistas coincidem numa opinião: a sobrevivência da UNITA


como grande força de oposição é fundamental para dar continuidade ao processo
de democratização em curso em Angola e determinará, a médio e largo prazo, a
natureza do regime, o modelo de desenvolvimento e o lugar de Angola na África
Austral e no Mundo.

O futuro da UNITA, o movimento do Galo Negro, será traçado pela nova direcção
que emergirá (ou não?) da fase de transição que agora começa. Um período difícil
e cheio de incertezas, para a UNITA mas também para o Movimento Popular para
a Libertação de Angola (MPLA, principal partido no poder em Luanda), as
oposições, as Igrejas, as Organizações Não Governamentais (ONG), habituados a
reagir às iniciativas de Savimbi, o «Mais Velho». Para não falar das pressões da
comunidade internacional, liderada pelos Estados Unidos, que colocou como
primeiras prioridades da sua agenda a solução da crise humanitária, a melhoria
das condições de vida da população e a estabilidade e segurança regionais. Os
candidatos à sucessão de Savimbi vão ter que equacionar cuidadosamente todos
estes factores, sob pena de repetirem erros estratégicos que levaram o líder à morte
e o Galo Negro ao impasse. O «trono» não ficou vazio: a megalomania não cegou
Savimbi ao ponto de se julgar eterno. Nas últimas entrevistas fez alusões à sua
morte.
Savimbi (foto Revista Expresso)

As mortes de Salupeto Pena (em 1992) e de Arlindo Pena «Ben-Ben» (em 1998)
fizeram fracassar uma «solução dinástica», que fazia destes dois sobrinhos de
Savimbi- filhos da sua irmã mais velha - herdeiros naturais do «rei», segundo
«Grande Chefe», na tradição matrilinear dos bailundos. Na última fase da guerra,
Savimbi encarou a possibilidade de ser capturado ou de ficar incapacitado, por
ferimento ou doença.

Deixou instruções que os seus homens mais fiéis começaram a pôr em prática,
jurando fidelidade ao vice-presidente, António Dembo, alcandorado a presidente
interino até ao próximo congresso. Os comandantes militares das várias «forças
residuais» (como as chamou o Presidente José Eduardo dos Santos) têm carta
branca para continuar as operações, sem contactos com «o Estado Maior
General». Há bastante tempo que tinham aprendido a viver à sua custa, sem
contar com a «logística» do movimento - desarticulada depois de 1999, com a
queda dos últimos bastiões no planalto central angolano. O isolamento das várias
unidades foi progressivamente agravado pelas sanções decretadas pela ONU, a
«selagem» (nunca completamente estanque) das fronteiras terrestres e a
desarticulação da rede de comunicações. Estas forças, avaliadas oficialmente em 8
a 12 mil homens, estão concentradas no Norte de Angola e entre Benguela e o
Kuanza Sul. É desta UNITA que o general Dembo é agora presidente e é com ele
que o Governo angolano quer estabelecer uma trégua e negociar a conclusão do
processo de paz assinado em Lusaka.
Eduardo dos Santos e Jonas Savimbi assinaram em Lisboa
um acordo de paz que previa o fim da guerra civil (foto Revista Expresso)

O problema é que «esta» UNITA nunca aceitou os acordos de Lusaka, embora


Dembo, numa entrevista à rádio Voz da América, em Janeiro, tivesse aceite esse
protocolo, assinado em 1994, como «ponto de partida, não de chegada».

A «frente da rejeição» de Lusaka é liderada pelo actual secretário-geral da


UNITA, Paulo Lukamba «Gato», «desaparecido» há vários meses. Sempre
defendeu que a organização não pode sobreviver sem o seu «braço armado». Antes
e depois das eleições de 1992, durante as tentativas da ONU para negociar um novo
cessar-fogo e ainda depois de Lusaka e da formação do Governo de Unidade e
Reconciliação Nacional, agitou a ameaça de um genocídio e do assassínio de
Savimbi. Esperará Gato ainda ganhar a guerra? Na posse do que resta do
aparelho, dos apoios externos e do «tesouro de guerra», os seus apoiantes
acreditam que podem «virar a situação» contra Eduardo dos Santos. A campanha
lançada no exterior para tentar provar que Savimbi não morreu derrotado pelas
Forças Armadas Angolanas (FAA), mas assassinado por mercenários a soldo dos
«neo-colo-nialista» portugueses, é um incitamento à resistência armada que põe em
risco a vida de Dembo e dos seus homens, encurralados pelas FAA na província de
Moxico.
Savimbi no Huambo a 7 de Novembro de 1975 (foto Revista Expresso)

No pólo oposto está a «UNITA de Luanda», formada por quadros políticos e


militares que ficaram na capital. Conhecem bem a sociedade urbana angolana e as
fraquezas do MPLA. Acreditam que o poder se conquista em Luanda, mas estão
divididos sobre a maneira de o conseguir. Há os que permanecem fiéis a Savimbi,
apesar das ameaça e pressões. E os que, como o ex-secretário-geral Eugênio
Manuvakola, optaram pela ruptura, «refundando» a UNITA, sem Savimbi nem
exército.

Outros tentaram a aventura em 1992 e fracassaram: Jorge Chicoti e o seu Fórum


Democrático Angolano; Nzau Puna, Tony da Costa Fernandes e Paulo Tchipilica,
fundadores da Tendência de Reflexão Democrática. Acusados de terem sido
«comprados pelo MPLA» para traírem o seu partido de origem e liquidarem
Savimbi, são apresentados pela propaganda do Galo Negro como «parte da
nomenclatura corrupta». A UNITA Renovada teria tido a mesma sorte se não
contasse com a personalidade de Ma-nuvakola e com os apoios que este filho de
padre consegue angariar junto de algumas igrejas protestantes, inquietas com a
influência da Igreja Católica.

Manuvakola é o presidente da UNITA «legal e democrática», reconhecida pelo


Governo, estatuto que não fez ganhar muitos adeptos mas lhe garante lugar à mesa
das negociações, seja qual for o desfecho da crise. Abel Chivukuvuku preferiu
adoptar uma posição equidistante da «UNITA savimbista» e da «Renovada», com
a secreta esperança de vir a ser o reunifícador do que descreve como uma «manta
de retalhos». E Jaka Jamba já propôs convocar toda a «família da UNITA», sem
exclusóes, numa convenção para definir o futuro do partido.

Mas o único homem que soube, até agora, lidar com todas as facções é o ex-chefe
da representação da UNITA na Comissão Conjunta encarregue da aplicação dos
acordos de paz, Isaías Samakuva, hoje refugiado em Paris. Tido como um homem
recto e conciliador, de uma fidelidade sem falha ao «Mais Velho». Samakuva não
gosta de queimar etapas. Enquanto Dembo for vivo, não reconhecerá outro
presidente. Depois, se verá. "
Jonas Savimbi e N'Zau Puna (foto Revista Expresso)

O galo voa
«...E o vosso galo????»

- "Voa"

"Foi assim que vi Jonas Savimbi «incendiar» um enorme comício em Luanda, na


capital eleitoral de 1992. O «Galo Negro» fez-se esperar durante horas a fio, horas
de cantos e danças africanas envoltas em panos estampados da UNITA.

Depois o carisma do velho guerrilheiro levava multidões ao rubro, cercadas de


homens armados, sempre atentos ao detalhe. A disciplina férrea dos homens da
UNITA nunca desarmava. Em 1992, durante as escassas semanas em que Jonas
Savimbi viveu em Luanda, no bairro Miramar, todo o quarteirão era vigiado pela
chamada «Guarda Presidencial do dr. Jonas Savimbi». Uma «guarda» dentro da
cidade, um detalhe apenas da estrutura de Estado dentro do Estado com que
Savimbi mantinha a UNITA instalada em Angola. Nos redutos de Savimbi, em
Luanda ou no Andulo, o «Mais Velho» mantinha ao seu redor uma corte de gente
silenciosa e de obediência cega. No interior de Angola no Andulo, o chefe militar
fazia questão de exibir um escritório de político. Sobre uma robusta secretária,
juntava as biografias de Margaret Thatcher e de J. F. Kennedy. Político hábil e
matreiro, em Outubro de 1992 Savimbi finta todas as contagens e chama os
jornalistas ao Huambo para avançar com os primeiros resultados das únicas
eleições angolanas. De uniforme militar, ou de sapato de verniz, Savimbi exibia
uma face diplomática no contacto pessoal, contrastante com a muralha de
dificuldades que se encontrava nos acessos. Derrota era um conceito que não
concebia."

Cândida Pinto
SAVIMBI
Ele foi o pior inimigo de si
próprio
O autor (foto Revista Expresso)

A vida de Savimbi dividiu-se em três fases.


Na fase inicial foi um produto do sistema colonial
português
Por: Sousa Jamba*

Jonas Savimbi era um homem altamente complexo e cheio de contradições.


Gostava muito de livros e da educação, mas matou muitos intelectuais que
divergiram dele. Afirmava ser um lutador pela democracia e pela economia livre,
mas criou escolas para quadros, onde eu próprio me licenciei, que ensinavam o
maoismo. Dizia-se um democrata, mas não tolerava as críticas. Para alguns
angolanos, Savimbi é a encarnação do diabo; para outros, é um dos líderes mais
inteligentes, mais determinados e mais corajosos que Angola teve até hoje. Qual
será, então, a verdade?
Jonas Savimbi (foto Revista Expresso)

A vida de Jonas Savimbi pode ser dividida em três fases: o Savimbi da etapa
inicial, o Savimbi da etapa intermédia e o Savimbi da etapa final. O da etapa
inicial foi um produto do sistema colonial português. Nasceu em 1934 em
Munhango, estação da linha de caminho-de-ferro de Benguela, onde o pai era
chefe de estação - na época, um lugar impressionante para um africano. Savimbi
sofreu a humilhação por que passaram muitos negros angolanos, inteligentes e
ambiciosos. Tinha antipatia pelos «assimilados» e por alguns mulatos que faziam
então parte da classe privilegiada. (Mais tarde, Savimbi iria atenuar a sua
hostilidade em relação aos brancos, criando grandes amizades com alguns deles).
Foto Revista Expresso

Em finais dos anos 50 obteve uma bolsa de estudo para Lisboa a fim de estudar
Medicina, mas, depois de muitas perseguições movidas pelas autoridades
portuguesas, fugiu para a Suíça onde estudou Ciências Políticas. Voltou para
África, aderiu à FNLA e tornou-se seu secretário para os Assuntos Externos.
Viajou por todo o mundo e estabeleceu ligações com muitos nacionalistas africanos
incluindo Jomo Kenyata, do Quénia, e o falecido Felix Houphouêt-Boigny, da
Costa do Marfim. Savimbi foi para a China, onde conheceu o Presidente Mão, e
adoptou a revolução chinesa como modelo. Regressou clandestinamente a Angola
e, em Dezembro de 1966, levou a cabo o primeiro ataque, em Luau, na província
do Moxico. Em 1974, por ocasião da revolução em Lisboa que derrubou o regime
colonial fascista, a UNITA, de Savimbi tornou-se num dos três movimentos de
libertação que competiram entre si pelo apoio dos angolanos. Os outros dois eram
a FNLA e o MPLA. O MPLA seria o vencedor da guerra civil que se seguiu à
partida dos portugueses.

O Savimbi da etapa intermédia vai de 1975, quando os apoiantes da UNITA foram


forçados a fugir das cidades para o mato, até 1983, quando, com a ajuda dos
americanos e dos sul-africanos, o movimento atingiu o seu apogeu. O Savimbi da
etapa intermédia era carismático, eficiente e amado pelos seus colaboradores mais
próximos.
Sem Savimbi a UNITA teria desaparecido nessa altura. Savimbi conseguiu,
habilmente, atrair muitos professores, enfermeiros, mecânicos e burocratas, que
vinham das terras altas centrais para o mato a fim de participarem na
administração dos territórios que controlava e que, a certa altura, abrangiam
grande parte do território de Angola. O Savimbi da etapa intermédia falava em
nome dos angolanos pobres que sempre tinham sido marginalizados.

Regresso a Luanda em 1991 depois do Acordo de Bicesse


(foto Revista Expresso)

Milhares de jovens, especialmente do grupo étnico ovimbundo, viam em Savimbi


um pai adoptivo. Aqui estava, finalmente, um homem que infundia respeito em
alguns círculos internacionais e que também sabia relacionar-se com os mais
humildes camponeses angolanos.

Casa no Huambo onde residiu Jonas Savimbi. (foto Net)


Savimbi era igualmente eficiente a descobrir e a estimular talentos. As figuras que
estavam nas posições cruciais subiam não através de nepotismo, mas sim pela sua
competência. Se este Savimbi tivesse sido Presidente de Angola, o país teria tido
uma história mais risonha. Contudo, o Savimbi da etapa intermédia começou a
manifestar características que o haviam de marcar até ao fim da vida matando
opositores políticos, por vezes por razões infundadas. Este Savimbi começou a ver-
se como a encarnação da causa da UNITA e permitiu que um culto da
personalidade se desenvolvesse à sua volta. Os músicos só podiam cantar canções
em seu louvor; outros podiam escrever poemas desde que tivessem uma estrofe de
glorificação do líder. Este culto foi estimulado por informadores ansiosos de estar
nas boas graças do líder. Alguns deles viriam, mais tarde, a passar-se para o lado
governamental.

Agostinho Neto abraça Jonas Savimbi à chega a Luanda


(foto Revista Expresso)

O Savimbi da etapa intermédia também começou a abandonar qualquer ideia de


liderança colectiva para o movimento. O destacado secretário para os Assuntos
Externos, Orneias Sangumba, foi morto por ser alegadamente um agente da CIA.
Apesar das ligações estreitas que acabou por estabelecer com americanos e sul-
africanos, Savimbi nutria uma grande desconfiança em relação à CIA. Nessa
altura, o então chefe do Estado Maior, Waldemar Chindondo, militar distinto que
foi um dos primeiros oficiais negros do Exército português, foi igualmente morto
devido a acusações infundadas. Kashaka Va-kulukuta, anteriormente um
colaborador muito próximo de Savimbi, foi metido numa prisão e acabou por
morrer de doença. Segundo a direcção do movimento - a qual toda a gente tinha de
aceitar - figuras como Sangumba estavam numa qualquer região remota do
território controlado pela UNITA. Mas era uma grande mentira.

A mentira, especialmente aos órgãos de informação internacionais, era possível


porque Savimbi tinha o controlo completo do movimento. Tudo o que os seus
seguidores faziam devia depender do facto de serem ou não leais à sua causa. A
UNITA não tardou a desenvolver uma intrincada rede de informadores que
reportavam sempre ao líder. Ele sabia tudo - pelo menos era isso o que as pessoas
pensavam.
Em 1990, Savimbi entrou em litígio com Tito Chingunji, o seu secretário para
Assuntos Externos, um homem igualmente brilhante, acusando-o de se ter tornado
demasiado próximo dos americanos. Apesar de todas as suas qualidades, é difícil
perdoar Savimbi pelo modo como se vingou da família de Chingunji: os outros três
irmãos de Tito e os seus filhos foram executados.

Savimbi devia pensar que ia ganhar as eleições de 1992 e realizar o sonho da sua
vida de ser Presidente de Angola, e que todos aqueles que ele tinha matado seriam
esquecidos. Mas não foi isso o que aconteceu. A UNITA perdeu as eleições, disse
que os resultados tinham sido fraudulentos e Savimbi e os seus colegas voltaram a
pegar nas armas. Este período, desde 1992 até à sua morte, marca o Savimbi da
etapa final.

Savimbi vestiu-se à civil para votar


(foto Revista Expresso)

Savimbi discursando na campanha eleitoral em 1992


O Savimbi da etapa final nunca se poderia ter adaptado a uma sociedade digna e
com regras. Tratava-se de um Savimbi cuja única motivação era o poder e o
controlo absoluto. Este Savimbi tinha pouco respeito ou consideração por aqueles
que lhe estavam próximos - incluindo as suas mulheres e amantes. É um segredo
por todos conhecido que Savimbi tinha uma intrincada vida doméstica. Os filhos
tinham de lutar entre si para atrair a atenção paternal. Oficialmente tinha uma
mulher, Ana Paulino, mas também uma série de amantes; estas teriam sortes
diversas, tais como os membros do seu gabinete ou do alto comando. O círculo
íntimo de Savimbi era como uma corte medieval: os cortesãos disputavam entre si
influência e poder (principalmente para serem ouvidos pelo «rei») através de
intrigas.

Savimbi com Ana Isabel (foto Revista Expresso)


Savimbi com uma das suas mulheres e filho
(foto Revista Expresso)

O Savimbi da etapa final também sabia lançar as famílias mais influentes umas
contra as outras, através do seu sistema clientelar. Jonas Savimbi nunca se
interessava pelo dinheiro em si. Isto talvez derivasse da sua educação de
protestante. Contudo, estava mais interessado no poder do que naquilo que o
dinheiro poderia dar a alguém. Um dos fracassos da UNITA foi o de ser um
movimento cujo líder tinha ilusões de vir a governar um Estado. Ainda me recordo
dos tempos em que os líderes da UNITA diziam que esta tinha tanto dinheiro que
dava para envergonhar o tesouro de muitos países africanos. O próprio Savimbi
gabou-se um dia numa entrevista que havia africanos que vinham ter com ele para
lhe pedirem lições de economia. (Quem recusaria tais lições se, no fim, lhes era
entregue um envelope com alguns diamantes?).

O Savimbi da segunda fase, a do apogeu, era carismática,


eficiente e amado pelos mais próximos
Claro que ninguém se atrevia a dizer que este tipo de comportamento não era
digno de um líder. (Alguns dos comandantes mais jovens de Savimbi começaram a
imitá-lo e acabaram por ter uma série de mulheres e filhos, alguns dos quais vivem
agora em condições terríveis nos campos de refugiados na Zâmbia). É chocante
como estes jovens comandantes começaram a imitar Savimbi em todos os aspectos
- incluindo o modo como ele andava, falava ou dançava. Era estranho, por
exemplo, ver um grupo de homens na casa dos vinte anos, todos calçando botas
mexicanas iguais porque era assim que o líder gostava. Também começaram a
copiar a sua inflexibilidade e tendência para personalizar todos os problemas.
Savimbi com um dos seus filhos
(foto Revista Expresso)

É verdade que, depois de 1992, o Governo angolano tratou mal os apoiantes da


UNITA em Luanda tendo sido assassinadas pessoas inocentes das etnias
ovimbundo e kinkongo, apenas em consequência das suas origens. Contudo, depois
de ambos os lados terem aceite, no acordo de Lusaka, que o caminho para a frente
era a reconciliação, a importância que estava a ser dada ao estatuto do Dr.
Savimbi fez passar para segundo plano o verdadeiro problema. Houve então
momentos em que pareceu que a UNITA tinha estado no mato unicamente para
dar um posto importante a Jonas Savimbi em Angola.

Na madrugada de 31 de Outubro dirigentes e apoiantes da UNITA


foram chacinados em Luanda (foto Revista Expresso)
O Savimbi da etapa final era impiedoso e estava pronto a sacrificar centenas de
vidas pela sua causa. Savimbi queria, acima de tudo, estar no comando - e este
desejo de um controlo total tinha atingido proporções patológicas. Era também
altamente caprichoso - e, face a diversos reveses militares, começou a assacar todas
as culpas aos seus comandantes.

Cientes do futuro que lhes estava reservado, muitos deles acabaram por desertar
para as fileiras do Governo, onde eram devidamente recompensados compostos
aliciantes. Muitas famílias importantes da etnia ovimbundo, a maior de Angola,
confiavam em Savimbi e entregavam-lhe os seus filhos. Por ocasião da sua morte,
muitos destes falaram mal dele. Muitos perceberam que Savimbi queria implantar
um estado totalitário em Angola. Não foi o Governo angolano enquanto tal que
destruiu o falecido líder da UNITA; Jonas Savimbi foi o pior inimigo de si próprio.
Isto explica a estranha apreensão da elite governamental de Angola na sequência
da morte de Savimbi: agora que o papão nacional desapareceu eles terão de provar
do que são capazes. Por exemplo, será que vão continuar a desviar a riqueza da
nação para contas em bancos estrangeiros, será que vai haver uma verdadeira
democracia nos assuntos do Estado?

O Savimbi da última fase nunca poderia ter-se adaptado a


uma sociedade digna e com regras
Mas como é que Savimbi, o nacionalista empenhado, se transformou num
potencial ditador africano? Há muitos anos que, como ovimbundo que sou, me
interrogo como foi possível que uma pessoa que eu tanto admirei se tivesse
transformado numa de quem me envergonho de dizer que fui colaborador.

Ninguém duvida de que era um homem extremamente inteligente, cuja capacidade


de trabalho e boa memória o colocaram acima dos outros. Trabalhei durante
pouco tempo como tradutor no gabinete de Savimbi - e não hesito em dizer que ele
foi uma das pessoas mais brilhantes que conheci. Foi também muito corajoso até
ao fim. Foi isto, inevitavelmente, que levou muitas pessoas - especialmente da etnia
ovimbundo, a maior de Angola - a segui-lo. Contudo, ultimamente, muitos
ovimbundos começaram a perder a fé nele. Isto não significa que tenham agora
começado a aceitar a cleptocracia de Luanda - . com as suas passagens de modelos
e sumptuosas mansões em Palm Beach contrastando com tanta miséria. O que
acontece é que tinham seguido um líder com muitos defeitos e que lhes estava a
sair demasiado caro.
Savimbi morto (foto Revista Expresso)

Primeira Campa de Savimbi no cemitério do Moxico (foto Net)

Jonas Savimbi tinha profetizado em diversas ocasiões a sua morte. Num discurso
na Jamba, então o quartel-general da UNITA no leste de Angola, disse que iria
morrer de morte violenta. Em vida, Savimbi já se tinha tornado numa lenda. Na
morte, poderá, para muitos dos seus ardentes apoiantes, tornar-se no perfeito
mártir. Tanto a UNITA como o MPLA têm heróis - alguns são uma pura criação
dos departamentos de propaganda - que disseram terem posto o interesse colectivo
acima dos seus interesses individuais. No entanto, todos concordam que Savimbi se
manteve fiel aos seus princípios - ou seja, a conquista do poder - até ao último
momento. Não parou de disparar mesmo depois de sete balas se terem alojado no
seu corpo.

*escritor angolano
Comente no meu Livro de Visitas

Almirante Vermelho
Rosa Coutinho
Este "mabeco
sarnento"morreu em
02.Junho.2010
Revolução do 25 de Abril de 1974 O TRAIDOR
Dog Murras - Angola Extrato do video editado no
Hora Quente Google:
CFB Angola - 2009 Combóio Mala Angola - US, UN, and Communist
As Maravilhas de Portugal no Mundo, Revolutionary Tactics in Africa
Convento do Carmo, Angola
ENTREVISTA A CARLOS
ANGOLA de outros tempos
PACHECO
Luanda 1904 - 2008 Programa «O Que Fica do que
LUANDA: a miserável e milionária Passa», canal Q (18/01/2011)
Chuva em Luanda
O outro lado de Luanda
DW Angola vozes da cidade ALICE
As Gentes de Angola
Trânsito em Luanda
Angola 1961 - Sublevação da Baixa do Cassange

Angola, 4 de Fevereiro de 1961


Batalha de Luanda uma história mal contada?
(Dipanda 11 de Novembro de 1975)
DIPANDA (Independência 11.NOV.1975)

A Batalha de Cuito Canavale (Victória Mitica


de Cuba)
The Battle of Cuito Canavale (South Africa
version)
Eleições em Angola - 1992
Norte de Angola 1961
Angola, 27 de Maio de 1977
Havemos de Voltar - Agostinho Neto
Morte de Agostinho Neto
Entrevista com Jonas Savimbi
Savimbi - Definição do Povo Angolano (1)

Savimbi - Definição do Povo Angolano (2)

Discurso do Presidente de Angola José Eduardo


dos Santos
A espectacular visita de José Eduardo dos
Santos
Cabinda Independência ou morte
Cabinda não é Angola! -
Comunidade Mwangolé -
http://www.mwangole.net/portal//index.php
Canal Angola Online - http://www.canalangola.net/
Novela brasileira na Central da Periferia em
Luanda
Cesaria Evora - Angola Cesaria Evora -
África Nossa
Lura - Nha Vida
Duo Ouro Negro -Kurikutela
Entrevista na TV Martí ao general cubano
Rafael del Pino
1ª Parte 2ª Parte
Fidel Castro em Angola
Guantanamera
Cinquenta anos de revolução cubana 1ª parte
2ªparte
Guerra em Angola
ANGOLA (1) ANGOLA (2)
ANGOLA (3) ANGOLA (4)
CHE GUEVARA, ANATOMIA DE UM MITO

Angolana arrebentando o violão !

PPS DE CIDADES DE ANGOLA COM SOM


E IMAGENS RECENTES:
Miss Angola
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O Outro Lado de Luanda
Ilha do Mussulo
Uige
Sumbe
Gabela
N'dalatando
Bragança a minha terrra
NET FOR CUBA INTERNATIONAL
Os meus vídeos (Kuribeka)
http://www.youtube.com/kuribeka

Lisboa
(Portugal)

Telémaco A.
O autor"kota"em 08. 2008
Pissarro
r.petrinus@netcabo.pt

Índice
MEMÓRIA
S
Angola 1951-1975
Atenção pessoal de Angola!Àqueles que nasceram depois de 1975 (Dipanda)
certamente lhes foi ensinado nas escolas que foi o MPLA e Agostinho Neto, o
chamado "pai da pátria angolana" que lutou pela descolonização para que o povo
se libertasse do jugo colonial e tivesse uma vida melhor. Neste site vereis
pormenorizadamente que isso não passa de uma utopia e não corresponde à
verdade dos factos devido às guerras fraticidas provocadas pela ambição do poder
do MPLA e dos outros partidos porque, actualmente, Angola <> sendo um país com
uma riqueza natural enorme, está bem pior que em 1975 que era o país mais
próspero da costa ocidental de África.

Já fui acusado de não ser imparcial no que escrevi neste site. O que escrevi foi
baseado nas minhas memórias e no que encontrei em livros, jornais e na Internet.
Por isso, peço a quem quiser relatar as suas memórias baseado em factos reais
credíveis que o faça e me envie os textos ou fotos que eu os colocarei neste site para
que se possa ver a opinião de ambos os lados do que se passou antes e depois da
descolonização. Há muita coisa que não está nos livros nem na Internet mas há
vivências pessoais que contadas me ajudarão a repor a verdade doa a quem doer.
Podem usar um pseudónimo se quiserem, o mais importante é que os factos
relatados sejam reais, credíveis e sem facciosismo político. Obrigado pela vossa
colaboração.

Introdução
Fui para Angola em 1951 ainda jovem com 19 anos cheio de ilusões para conseguir
uma vida melhor do que aquela que tinha em Portugal continental. Como milhares
de outros portugueses (cerca de 500 mil) devido à cegueira políticade alguns ultra-
esquerdistas do MFA mentores do 25 de Abril, a minha esposa e os meus quatro
filhos tiveram de abandonar em 8 de Junho de 1975 a sua querida e amada terra
que os viu nascer. Eu só regressei ao meu país natal em 25 de Outubro de 1975 por
não ter mais condições e com risco da própria vida, tendo deixado tudo o que
conseguimos com muito trabalho e sacrifício durante mais de 20 anos.

Pesquisando na Internet sobre a descolonização de Angola encontrei muita coisa


que me servirá de base para escrever estas Memórias além da minha vivência
pessoal. Depois de muitas horas de pesquisa intensiva encontrei muitas opiniões de
jornalistas, de individualidades que tiverem responsabilidade na dita
descolonização, de políticos e relatos dos valentes que combateram a barbárie no
norte de Angola e muitas outras coisas mas não encontrei nenhum escrito de
memórias pessoais que relatassem com fidelidade o que realmente se passou em
Angola desde 1961. Tive também a sorte de ter encontrado, já amarelecidos pelo
tempo, (30 anos) alguns jornais de a Província de Angola de 1974/75 que tinha
guardado na cave donde tirei informações fidedignas do que aconteceu naquela
época.

Li alguns livros escritos por jornalistas que, com risco da sua vida acompanharam
os nossos valentes soldados nas operações no norte de Angola de onde obtive a
maior parte das fotografias, algumas incrivelmente chocantes que irei colocar no
texto para assim poder mostrar ao mundo da Internet a realidade nua e crua que
propositadamente foi encoberta e desmistificar o que se disse e escreveu em
Portugal sobre a descolonização de Angola, sobretudo pelos partidos de extrema
esquerda. Eventualmente poderei escrever algumas imprecisões nas datas dado os
anos que já se passaram e que terei de citar de memória pelo que me penitencio.

Começarei por uma descrição sumária do que aconteceu em Angola a partir de


1961 até à independência em Novembro de 1975 e, só depois, escreverei a minhas
Memórias desde a minha infância até à data que regressei a Portugal,
inclusivamente dos primeiros anos que aqui residimos. Não omitirei nada que seja
do meu conhecimento mesmo que isso vá dar uma provável má imagem nossa.
Tenho conversado com alguns dos meus amigos que viveram noutras localidades de
Angola diferentes onde vivi procurando obter informações fidedignas que me
ajudem a repor a verdade doa a quem doer. Vai ser um trabalho árduo e que só
será possível levá-lo a bom termo graficamente e ilustrado com fotografias dada a
minha experiência na edição de sites na Internet.

1961
Janeiro 4-24

Prelúdio ao inferno. Na Baixa do Cassange, em Angola, negros fazem greve nas


plantações algodoeiras e lançam a Guerra de Maria, assim chamada por um dos
seus inspiradores ter sido António Mariano, próximo da União das Populações de
Angola (UPA). Queimam sementes, destroem pontes fluviais, missões católicas,
lojas e casas de brancos, louvam Patrice Lumumba, líder revolucionário do Congo,
e clamam pela independência de Angola. As Forças Armadas esmagam a revolta
com companhias de caçadores especiais e bombas incendiárias lançadas de aviões.
Um responsável da Força Aérea diz ao embaixador americano em Lisboa, C. Burke
Elbrick, que a violência teve origem na exploração dos nativos pela Cotonang,
firma algodoeira luso-belga. O turbilhão na Baixa do Cassange é omitido da
opinião pública. O esforço militar português orienta-se desde 1959 para África e
retém lições da Argélia, onde a França enfrenta a subversão nacionalista, com meio
milhão de soldados, mas os preparativos de defesa continuam em lume brando.

Fevereiro 4-5

Centenas de negros atacam a Casa de Reclusão Militar e as cadeias civis de


Luanda, com o objectivo falhado de libertarem presos políticos. Nos confrontos
morrem quarenta assaltantes e sete polícias. O Governo vê-se forçado a emitir um
aviso contra os esforços dos brancos para fazerem justiça pelas próprias mãos. A
partir de Conackry, o MPLA reclama o 4 de Fevereiro como o início da luta
armada em Angola. (...)

Durante o funeral dos polícias, grupos civis armados fazem batidas aos musseques
na periferia de Luanda e deixam algumas vítimas. (...) Uma combustão de violência
e de pânico convulsiona Luanda. A mitologia da coexistência racial e da harmonia
social - trave mestra da política africana de Portugal - sofre um abalo de
credibilidade. (...)

Março 6

Botelho Moniz (Ministro da Defesa) e Elbrick encontram-se durante três horas. Na


maior da confidências, o embaixador diz ter recebido instruções do secretário de
Estado, Dean Rusk, para pressionar Salazar a aceitar o princípio da
autodeterminação em África. Botelho Moniz defende umaremodelação que dilate a
base social do Governo, de forma a incluir elementos não comunistas da oposição, e
a autonomia ultramarina no quadro de uma relação de "tipo Commonwealth".
Introduz assim no imaginário político português uma perdurável e falhada
projecção: a comunidade transcontinental, de inspiração britânica, que durante
treze anos inspirou personalidades como Marcelo Caetano e António de Spínola.

Março 7

Elbrick transmite a Salazar o documento enviado por Rusk, a mando de Kennedy.


Os Estados Unidos prevêem convulsões graves em Angola, do tipo das do Congo ou
piores, e vão votar contra Portugal em 15 de Março. Sentem que faltariam ao seu
dever, como aliados na NATO, se não pedissem a Portugal a realização de reformas
graduais em África, no sentido da "autodeterminação dentro de um prazo
realista". (...) Salazar recusa a proposta de Washington para que Portugal acerte o
passo com a comunidade internacional e, ao fazê-lo, assume a solidão num mundo
hostil.

Março 15-18

[No Conselho de Segurança das Nações Unidas] (...) os Estados Unidos, numa
inversão da política da Administração Eisenhower, votam pela primeira vez contra
Portugal ao lado da União Soviética.

De madrugada, na Fazenda Primavera, perto de São Salvador, grupos de bacongos,


empunhando catanas e canhangulos e julgando-se imunes às balas dos brancos,
lançam uma ofensiva contra propriedades e povoações na zona de fronteira com o
Congo, na Baixa do Cassange, até às cercanias de Vila Carmona (Uige). O Norte de
Angola é avassalado por uma onda de brutalidade tribal: assassínios em massa,
incêndios, destruições e rapina de haveres, violação de mulheres e crianças. Os
tumultos espalham-se às plantações de café isoladas, aos postos de abastecimento,
às vias de transporte. Esse terror apocalíptico lançado pela UPA tem por objectivo
arrasar o sistema vital das comunidades brancas. (...)

Richard Beeston, do Daily Telegraph,único repórter estrangeiro a viajar pelas áreas


da violência depois do 15 de Março, conta a um diplomata americano em Londres
que oitocentos portugueses, entre uma população de dez mil, foram massacrados
em três dias. "Os rebeldes não estavam bem armados e, antes de lançarem a sua
ofensiva, pareciam ter uma fraca organização. Foram convencidos por feiticeiros
de que podiam matar os portugueses sem perigo para eles próprios e que as terras e
propriedades dos brancos ficariam para eles." Muitos fazendeiros empreendem a
fuga do inferno, chegam a Luanda e partem daí para Portugal. Mas outros juntam-
se para defender o que é seu pelo trabalho, pegam em armas e formam milícias.
Sem surpresa, a contra-ofensiva faz depredações semelhantes às dos bacongos e por
todo o Norte vulgarizam-se cenas de horror e crueldade. (...)

Março 22

Concentração de tropas no Norte de Angola. A Força Aérea bombardeia povoações


nos distritos do Congo, Cuanza Norte e Malanje. O ministro do Ultramar,
almirante Lopes Alves, parte para Angola. Mais de três mil e quinhentos colonos
são evacuados por ponte aérea. Em Luanda, cerca de quatrocentos brancos cercam
e isolam o consulado americano e atiram às águas da baía o carro do cônsul
William Gibson. A inspiração americana da revolta da UPA é indisfarçável. (...)
Henry Kissinger, secretário de Estado, confirmou mais tarde o apoio a Holden
Roberto. (...)

História e Ciência – José Ferreira Nunes.

Acordo de Alvor
Na sequência do 25 de Abril, finalmente, no Alvor (Portugal), os três concertaram
com o Governo português um acordo sobre a fórmula pela qual Angola se tornaria
independente.

No Alvor, os três movimentos foram reconhecidos como únicos e legítimos


representantes do povo angolano, e Angola como país indivisível, incluindo o
enclave de Cabinda.

Seria estabelecido um governo de transição, baseado numa fórmula de coligação.


Um alto-comissário seria nomeado por Portugal, sob ordens directas do presidente
da República, Costa Gomes, e o Governo de transição seria constituído por 12
ministros, três portugueses e os restantes nove distribuídos igualmente pelos
movimentos de libertação.

Um conselho presidencial, constituído por um representante de cada movimento,


presidiria ao Governo, rotativamente, até à data marcada para a independência, 11
de Novembro.

O Governo devia tomar posse até ao fim de Janeiro, marcar eleições no prazo de
nove meses, e deveria ser constituído um exército unificado. Na altura da
independência, essas forças militares unificadas deveriam ter 48 mil homens - 24
mil efectivos portugueses e oito mil de cada um dos movimentos. Os militares
portugueses em excesso seriam evacuados até 30 de Abril, e todas as tropas
portuguesas deveriam deixar Angola até Fevereiro de 76.

Os interesses dos portugueses residentes eram assegurados, e os movimentos


comprometiam-se a considerar angolanos todos os que tivessem nascido em Angola,
ou os que ali vivessem e se declarassem angolanos por opção. Contudo, a concessão
de cidadania aos não nascidos em Angola era remetida para o que fosse
estabelecido na futura Constituição.

Assinaram por baixo, por Portugal, o ministro sem pasta major Melo Antunes, o
ministro dos Negócios Estrangeiros, Mário Soares, o ministro da Coordenação
Interterritorial, Almeida Santos, e, por Angola, os líderes do MPLA, da FNLA e da
UNITA.

JN temas especiais – José Gomes

Independência e Guerra Civil


Na sequência do derrube da ditadura em Portugal (25 de Abril de 1974), abre-se
perspectiva imediata para a independência de Angola. O Governo português,
negoceia com os três principais movimentos de libertação ( MPLA - Movimento
Popular de Libertação de Angola, FNLA - Frente Nacional de Libertação de
Angola e UNITA - União Nacional para a Independência Total de Angola ), o
período de transição e o processo de implantação de um regime democrático em
Angola (Acordos de Alvor, Janeiro de 1975).

A independência de Angola não foi o ínicio da paz, mas o ínicio de uma nova guerra
aberta. Muito antes do dia da Independência, a 11 de Novembro de 1975, já os três
grupos nacionalistas que tinham combatido o colonialismo português lutavam entre
si pelo controle do país, e em particular da capital, Luanda. Cada um deles era na
altura apoiado por potências estrangeiras, dando ao conflito uma dimensão
internacional.

A União Soviética e Cuba apoiavam o MPLA, que controlava a cidade de Luanda e


pouco mais. Os cubanos não tardaram a desembarcar em Angola (5 de Outubro de
1975).

A África do Sul que apoiava a UNITA, por seu lado, invade Angola (9 de Agosto de
1975).

O Zaire que apoiava a FNLA invade também este país (Julho de 1975). A FNLA
conta também com o apoio da China, mercenários portugueses e também com o
apoio da África do Sul.

Os EUA que apoiaram inicialmente apenas a FNLA, não tardam a ajudar também
a UNITA. Neste caso, o apoio manteve-se até 1993. A sua estratégia foi durante
muito tempo dividir Angola.

Lusotopia - Carlos Fontes.

MEMÓRIAS - ÍNDICE POR PÁGINAS: 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19


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ÍNDICE POLÍTICO Em Luanda


Português, Combatente, Abandonado
A Vingança do macaco rafeiro Abandonar Angola - Um Olhar à Distância
Biografia de António de Oliveira Salazar Portugal, os Estados Unidos e a Guerra
FNLA - MPLA - UNITA Angolana
O Início da Luta Armada em Angola Ilha dos Castros (CUBA)
Antecedentes da Sublevação da Baixa do
Cassange POLÍTICA ACTUAL
Sublevação da Baixa do Cassange Biografia oficial do Presidente José Eduardo
Antecedentes da Guerra - Coronel Mello dos Santos
Machado Kuando-Kubango é uma provícia abandonada
Memórias de África - A Multirracialidade Angola o país do futuro
A Explosão do ensino em Angola Sócrates vai a Angola enquanto a Europa vira
4 de Fevereiro de 1961 as costas a Santos
Porquê o 4 de Fevereiro ? José Eduardo dos Santos é o maior obstáculo à
A Verdade sobre o 4 de Fevereiro de 1961 democracia em Angola
4 de Fevereiro de 1961 - O Papel do Cónego OPINIÃO por Eugénio Costa Almeida
D. Queirós Alves, arcebispo do Huambo
Manuel das Neves
(comentários)
Os "heróis" do 4 e 11 de Fevereiro de 1961
A golpada do alegado "golpe de estado" em
Angola
Guerra Colonial em Angola: estórias na As parcerias portuguesas de Isabel dos Santos
primeira pessoa Direitos Humanos em Angola
Norte de Angola 1961 - O Velho Cafaia Direitos fundamentais para os angolanos
Norte de Angola 1961 - O Alferes Robles Visita de José Sócrates a Angola
Norte de Angola 1961 - Palavras Enigmáticas José Sócrates em Angola
1961 Operação Viriato a conquista de José Sócrates em Angola
Nambuangongo José Sócrates em Angola
O Massacre de Cólua Angola tem feitico e Portugal perdeu o
Angola, 15 de Março de 1961 enguiço...
Norte de Angola 1961 Cabinda, comentários de Agostinho Chicaia,
Norte de Angola, Golongongo presidente da "Mpalabanda"
Angola - Vitória Militar no Leste Os dias de uma professora na Gabela, Angola
Memórias de José Carlos Rodrigues Eduardo dos Santos Um "deus" contestado
A Última conversa em Família- Marcelo A Fortuna de Savimbi
Caetano Samakuva ataca o regime
25 de Abril de 1974 Os Lugares Comuns de José Eduardo dos
25 de Abril de 1974 (comentários) Santos
Esse 25 de Abril... Chuvadas em Luanda
Quem é que em 1975 pôs o PCP na ordem? A Vergonha da reconstrução vs cidade de
Os Flechas Luanda
Com o Chão a Fugir Debaixo dos Pés Em que Pé ficamos
MPLA: Fome, violentações, assassínios.
O ÊXODO Governação de Luanda
Marcelo admitiu Angola Independemnte Regresso a Angola
Os meses alucinantes do "Almirante Luanda de Luxo
Vermelho" O rosto de Angola
Texto integral do Acordo de Alvor Miala e o regime
Pontos essenciais dos Acordos de Bicesse Angola/32 anos
Discurso de Agostinho Neto no Acordo de Quem não tem dinheiro em Angola morre
Alvor
Drama das minas assombra Angola
Discurso de Holden Roberto no Acordo de
Angola quer ser potência econónima "a curto
Alvor
prazo"
O esvaziamento do Acordo de Alvor
Angola tem um pensamento totalitário - José
Álvaro Cunhal, Vasco Gonçalves e Mário
Agualusa
Soares
Agostinho Neto, Jonas Savimbi e a sua morte LUANDA: a miserável e a milionária
AGOSTINHO NETO (biografia) (Comentários)
Agostinho Neto - 1 José Socrates elogia o trabalho do Governo
Agostinho Neto - 2 Angolano
Morte de Agostinho Neto "versão da URSS" A ressurreição do Huambo
MPLA promete um milhão de empregos
JONAS SAVIMBI (biografia) Ex-combatentes da UNITA
Morte de Savimbi José Eduardo dos Santos
Morte de Savimbi por Pedro Mafuma Eleições em Angola 2008 (0)
Os últimos dias de Savimbi Eleições em Angola 2008 (1)
EUA e Israel ajudaram a assassinar Jonas Eleições em Angola 2008 (2)
Savimbi Eleições em Angola 2008 (3)
O 25 de Abril e as suas consequências em Eleições em Angola 2008 (4)
Angola (Jonas Savimbi) Eleições em Angola 2008 (5)
Plataforma de entendimento (Jonas Savimbi) Eleições em Angola 2008 (6)
O dedo envenenado Russo-Cubano (Jonas
Eleições em Angola 2008 (7)
Savimbi)
Eleições em Angola 2008 (8)
Negritude e racismo (Jonas Savimbi) Eleições em Angola 2008 (9)
A Paz e as suas prespectivas (Jonas Eleições em Angola 2008 (10)
Savimbi) Eleições em Angola 2008 (11)
Biografia de Holden Roberto
Eleições em Angola 2008 (12)
Há quatro anos assassinaram o lider histórico
Eleições em Angola 2008 (13)
da UNITA
O Bastião da resistência de Jonas Savimbi Eleições em Angola 2008 (14)
Pepetela confessa-se Eleições em Angola 2008 (15)
Recordação de um Desastre Angola: raids TT na alvorada do turismo
O Guerrilheiro que Salvou Agostinho Neto Entrevista. Luis Araujo, SOS Habitat
A Convicção Messiânica de Nito Alves Restos mortais de ex-militares são uasados
O 27 de Maio de 1977 para magia negra
27 de Maio de 1977 (2) Cuando-Cubango no projecto Kaza Park
Explicação política do 27 de Maio de 1977 pelo "Angolagate" atinge figuras políticas francesas
general Del Pino
A Revolução perdida de Sita Valles Reflexões do companheiro Fidel
27 de Maio (Purga em Angola) Terceiro fôlego de Eduardo dos Santos
Nuvem Negra-O drama do 27 de Maio de 1977 Esta "princesa" investiu milhões na nossa
Holocausto em Angola banca
Acordo de Alvor Visita de José Eduardo dos Santos a Portugal
Acordo de Alvor foi apenas um pedaço de (1)
papel - Almeida Santos Visita de José Eduardo dos Santos a Portugal
Taição ao Acordo de Alvor - Pinheiro de
Azevedo (2)
Ficheiros Secretos da Descolonização de Visita de José´Eduardo dos Santos a Portugal
Angola (1) (3)
Ficheiros Secretos da Descolonização de Visita de José Eduardo dos Santos a Portugal
Angola (2)
(4)
MÁRIO SOARES
Visita do Papa a Angola (1)
MÁRIO SOARES e a PIDE/DGS
Visita do Papa a Angola (2)
Chegada a Angola de Savimbi e de Agostinho
Neto Visita do Papa a Luanda (3)
Governo de Transição de Angola Portugueses saem à descoberta das noites
Os Judas de 30 rublos loucas de Luanda
Rosa Coutinho Inflama Angola e A Batalha de Luanda preserva e reabilita o seu centro
Luanda histórico
Comunicado da FNLA ao povo angolano Pequenos empresários portugueses que
(1975) triunfaram em Angola
Encontro de Holden Roberto com a Imprensa Pepetela - O Planalto e a Estepe
(1975) Lider angolano vive dilema na transsição
Entrevista de Holden Roberto ao DN (1999) O caso Miala (cometários de "Jango")
Comentários de Holden Roberto, Jonas O povo a quem um poeta deu a independência
Savimbi, Eleições Tchizé compra o bairro Katambor
Independência de Angola Angola: a maioria do povo está a ficar mais
Em conclusão pobre
O Adeus Português Sonangol e Isabel dos Santos
O arriar da bandeira no Palácio e na Fortaleza URSS quase apoiou FNLA e admitiu apostar
de S. Miguel
em Savimbi
Os Dias da Vergonha
Povo angolano em estado de asfixia
QUEM ATIROU A PRIMEIRA PEDRA?
UNITA acusa MPLA de governar pelo medo
O fim do Ultramar Português
Isabel dos Santos: A face invisível dos negócios
Eduardo dos Santos recusa diálogo
Coutada de priviliagiados de Angola em Portugal
Eleições em Angola, Setembro de 1992 A mulher mais poderosa de Portugal é
Guerra Civil em Angola angolana
A Guerra do Kuito O poder para o povo
Comentários Internacionais Mártires de Cassanje exigem indemnizações
Regresso a Portugal "com comentários"
Angola, Anatomia de Uma Tragédia Luanda: Insegurança não assusta portugueses
ANGOLA RECONSTRUÇÃO NACIONAL José Eduardo dos Santos perpetua-se na
(Comentários) Presidência
A Realidade de Cabinda Um acordo político que não evitou a guerra em
Cabinda Angola
Agostinho Chicaia presidente da Nova Constituição angolana reforça poderes
"Mpalabanda" Cabinda do Presidente
Presidente de Cabinda com comentários Oposição angolana critica presidencializão do
de Jonas Savimbi e Eduardo dos Santos (vídeo- regime
clip) O Príncipe Perfeito
Memórias de Cabinda Manuel Alegre, "desertor"
O Memorando de Entendimento para a Paz e Manuel Alegre. Passado militar persegue o
Reconciliação em Cabinda candidato
Genocídio continua em Cabinda Viuva de Agostinho Neto vai ser julgada por
Cabinda, relato de 14 horas fatais de tortura difamação em Lisboa
Angola: país rico, povo pobre
Morte do Almirante Vermelho Rosa Coutinho
A Jamba mineira
Independência de Angola
Cuba no Mundo (Angola)
Visita do Presidente Cavaco Silva a Angola
Os cubanos em Angola - Gen. Rafael Del Pino
Diaz Jovens devem conhecer a trajectória do poeta
Os cubanos em Angola (1) Gen. Rafael del António Angostinho Neto
Pino Independêcia de Cabinda
Os cubanos em Angola - Fui para Angola como
Luanda a vida na cidade dos extremos
um cão
O Velho Pitbull-José Desencantado
Influência do armamento nuclear sul-africano
na guerra de Angola
A Derradeira Batalha
A Derradeira Tentativa
Batalha de Luanda ? "Uma história mal HISTÓRIA
contada" Humbe
Porque não Conquistamos Luanda (Santos e Angola (História)
Castro) História de Angola
A batalha de Kifangondo nas vésperas da Rainha Jinga Mbamdi
Independência Raínha Jinga Mbandi (2)
Operação Savana 1975 (rio Queve) Soba Mandume Ndemufayo
Operação Savana 1975 (rio Nhia Angola - Abolição da escravatura
Os cubanos em Angola - Angola a Guerra Abastecimento de Água a Luanda
Injusta Subsídios para a história de Luanda
Os cubanos em Angola -O Exército O Quissanje
Mercenário O Xilofone-Marimba
Os cubanos em Angola - Acontecimentos
Transcendentais DIVERSOS
Os cubanos em Angola - Operação Carlota Fotografias 1972-1974
Os bastardos de "Carlota" Fotografias de Angola
Fidel Castro saqueou Angola e torturou Fotografias tradicionais
angolanos Ritual Kioko da Circuncisão - Lunda
Os cubanos em Angola - Ay Carlota Fotografias do Kuito depois da guerra
Os cubanos em Angola - Batalha da UNITA Fotografias do Huambo depois da guerra
Os cubanos em Angola - Cuito Cuanavale Fotografias da estrada do Huambo depois da
A Batalha de Cuito Cuanavale "versão sul- guerra
africana" Imagens de belezas naturais de Angola
Ofensiva do Lomba (Cuito Cuanavale Fotografias das gentes do interior de Angola
Fotografias do Liceu Nacional Salvador
revisitado)
Correia em Luanda
A Batalha de Cuito Cuanavale
Fotografias do lixo em Luanda
"Estalinegrado angolano" A nossa convivência com as gentes de Angola
Os combatentes que nunca esistiram A Arte Kioka
Castro explica porque perdeu a guerra contra Máscaras Mayaca
a SADF Duo Ouro Negro- Música africana dos anos
Cuba. As memórias do líder da revolução 60/70
1989, O caso Ochoa Bonga
A Decisão Final - Del Pino O Pintor de Angola Neves e Sousa
Proa à Liberdade - Del Pino Nova música angolana quer esquecer a guerra
Fidel Castro (Paulo Flores)
Tu também morrerás Fidel
Che Guevara
Debate sobre os restos mortais de Che
Guevara
Angola, a mulher cubana e a família
Café uma riqueza em extinção
30 Anos de Angola Independente
Longe de quase tudo e perto de quase nada -
Jorge Eurico

MEMÓRIAS
Nasci a 25 de Março do ano de 1931 na Freguesia de Sª Maria na cidade de
Bragança no Nordeste Transmontano. O meu pai era sargento do exército na
altura prestando serviço no Regimento de Infantaria 10 mais tarde Batalhão da
Caçadores 3 que estava instalado junto do castelo e que mais tarde foi demolido
para dar uma visão mais ampla do castelo. Infelizmente o meu pai faleceu aos 33
anos de idade e tinha eu apenas 3. Sou o mais velho de três irmãos felizmente ainda
vivos. A nossa mãe, viúva mas ainda jovem, tinha um irmão mais velho em Angola
na povoação do Chengue próxima da cidade de Silva Porto (Kuito) onde tinha uma
casa e a loja comercial. Por isso resolveu ir para Angola com a intenção de voltar a
casar e nos poder dar um futuro melhor.

Este meu tio que não cheguei a conhecer pessoalmente, vivia com uma preta e
tinha, como é evidente, filhos mestiços, todos eles reconhecidos. Mesmo assim, em
1974/75 foi barbaramente assassinado à catanada pelos chamados
revolucionároslocais a quem, como era costume, devia ter vendido fiado (a crédito)
tudo o que eles necessitavam.

Ficámos entregues a uma tia que nos criou com muito carinho e sacrifício não
obstante recebermos uma pequena pensão do Estado pela morte do nosso pai. Esta
tia foi praticamente a nossa mãe tendo inclusivamente vendido todo o seu
património que herdara para nos criar porque a nossa mãe, embora já casada,
devido às complicações com a Segunda Grande Guerra Mundial, nem sempre tinha
possibilidade de nos enviar os meios suficientes para o nosso sustento.

A minha tia Maria

Como se fora hoje, recorda-me da velha escola primária que frequentei no bairro
da Estacada e o meu primeiro professor Sr. Vinhas, pessoa respeitável com barba
comprida tipo judeu. Nas proximidades da velha escola estava já a ser construída
uma escola nova moderna com características arquitectónicas completamente
diferentes, mandada construir pelo governo de Salazar. Toda a estrutura principal
era de granito, amplas salas de aula com lareira e sanitários num recinto coberto
para nos intervalos das aulas nos abrigarmos quando chovia. Em Bragança havia
pelo menos quatro dessas escolas, duas para rapazes e outras duas para raparigas.
Ainda cheguei a frequentar uma dessas escolas novas na 4ª classe.

Eu e os meus dois irmãos mais novos

Tenho bem presente na memória que nas salas de aula na parede por detrás da
mesa do professor, havia dois quadros: um com o retrato do Presidente da
República na altura Marechal Carmona e do Primeiro Ministro Dr. Oliveira
Salazar. No centro um crucifixo. Nas paredes laterais da sala de aulas havia
quadros, não me lembra quantos, os chamados quadros de Salazar. Recorda-me
apenas de dois que ficaram, não sei porquê, gravados na minha memória. Num
deles do lado esquerdo via-se uma velha escola e o professor bêbado. Os alunos
insubordinados saltavam pelas janelas para a rua. Do lado direito viam-se as
escolas tal como aquela que eu vi construir. O outro era um quadro onde, do lado
esquerdo, se via um automóvel da época talvez um Ford circulando numa estrada
toda cheia de buracos. Do lado direito as estradas novas mandadas construir pelo
Governo de Salazar.

Recordo, também, que num recital feito na escola se exaltavam os quadros de


Salazar. A mim coube-me dizer a introdução: "Os quadros de Salazar são a mais
alta lição que ao Mundo se pode dar à Grei e a toda a Nação". E, naquele tempo,
assim foi. Foram construídas as ditas escolas nas principais cidades, estradas cujo
piso em paralelipipedos ligavam as principais cidades do país e pontes modernas
para a época que ainda hoje estão activas. Foram também construídas outras
importantes obras de arte.
Foto do meu primeiro BI quando entrei
para a Escola Industrial.

Terminado o estudo primário (4ª classe) fui matriculado na Escola Industrial de


Bragança que, naquele tempo, tinha apenas duas especialidades para os alunos do
sexo masculino: carpintaria e serralharia. O liceu devido às nossas fracas
possibilidades económicas era interdito às classes mais desfavorecidas porque não
havia dinheiro para pagar as propinas e os livros. Por isso, a escola industrial era o
meio mais económico para quem queria continuar estudando e fazer um curso
prático que lhe daria no futuro algumas possibilidades de emprego.

Nas tardes quentes de Verão íamos tomar banho no rio Sabor que é um afluente do
Douro e ficava a cerca de 2 km da cidade. As suas águas, naquele tempo,
cristalinas, com muitos peixes: barbos, escalos e bogas que nós pescávamos.
Aproveitávamos para tomar banho, principalmente nos fundões e na represa da
ponte nova que tinha uma agueira (canal) para o moinho do Castanheira. No início
dessa agueiraque era ladeada por arbustos, salgueiros e amieiros, as jovens
costumavam tomar banho vestindo apenas as camisas interiores de Verão que, com
a água, ficavam transparentem e pegadas aos corpos e nós, já rapazotes,
aproveitávamos para dar uma espreitadela e apreciar com volúpia a intimidade dos
seus esbeltos corpos.
Ponte nova do Sabor (foto do autor)

A estrada que ia de Bragança a Miranda do Douro já era asfaltada e passava junto


rio ao Sabor estando ladeada de cerdeiros(cerejeiras) bravos que davam frutos mais
pequenos mas que depois de maduros eram muito saborosos. Era o que nos valia
para saciar o apetite depois de uma tarde inteira no rio. Essas árvores tinham mais
de 6 metros de altura e o seu tronco era muito liso, por isso, era preciso muita
destreza para engatar(trepar) até ao cimo e poder comer as apetecíveis cerejas o
que nem todos conseguiam fazer.

Entretanto, para conseguir algum dinheiro e também ocupar o tempo


principalmente nas noites de Inverno, juntamente com alguns amigos fui para a
banda dos Bombeiros Voluntários de Bragança onde aprendi música e a tocar um
instrumento que na altura estava vago. Sax soprano e depois mais tarde Sax alto.

Nos dias de romaria nas aldeias no distrito de Bragança era costume contratarem
uma banda de música para animar a festa e a banda dos Bombeiros Voluntários de
Bragança era, na altura, a preferida por ser a melhor da região. No final do Verão,
os lucros da nossa actividade nas festas eram distribuídos pelos elementos da banda
que, naquele tempo, dava pelo menos, para comprar um bom fato de fazenda de lã
e também um bom par de sapatos.

O nosso grupo da Banda dos BVB (1950)


Estávamos em plena 2º Grande Guerra Mundial e Salazar para agradar a gregos e
troianos enviava para a Inglaterra e para a Alemanha as sobras de Portugal. Havia
racionamento de todos os bens alimentares e cada família tinha de adquirir senhas
para os comprar de acordo com o agregado familiar. A nossa alimentação diária
devido à escassez de meios financeiros era frugal, uma sopa de legumes com um
courato e um fio de azeite por cima. Um copito de tinto normalmente acompanhava
as refeições diárias que pouco variavam. Para quem vivesse na cidade como nós
mas tivesse meios financeiros, havia sempre possibilidade de comprar no mercado
negro o que era necessário.

Mesmo assim, com essa alimentação simples e natural nunca tomei nenhum
medicamento e a primeira injecção que apanhei foi contra a febre amarela quando
embarquei para Angola tinha 18 amos de idade. As constipações por vezes muito
frequentes no Inverno devido ao frio eram curadas com suadouro: um copo de bom
vinho tinto bem quente adoçado com mel. Normalmente resultava mas houve
amigos meus com mais posses que morrerem de tuberculose.

Recordação do Jardim da Vila, Bragança e a Praça da Sé 1951 (fotos autor)

No nosso distrito havia minas de volfrâmio, mineral que era utilizado juntamente
com o aço no fabrico de canhões e que era vendido a bom preço aos países
beligerantes. Muita gente ganhou bastante dinheiro com o volfrâmio mas como não
estavam habituados a tanta fartura era gasto em bens desnecessários e supérfluos e,
assim como vinha, também se ia rapidamente.

Num local onde se fazia a feira semanal em Bragança chamado Toural havia uma
separadora de volfrâmio estrangeira alemã. Nas imediações viam-se escórias
provenientes do metal purificado ou apenas grosseiramente separado do minério
bruto. Os largos portões da separadora eram de madeira mas estavam quase
sempre em reparação tantas vezes eram partidos. Viatura carregada de volfrâmio e
perseguida pelas autoridades que entrasse na dita separadora estava a salvo.

Bragança vista do Jardim da Vila e o Calvário, 1951 (fotos autor)

Em Maio de 1945 a Alemanha assinou a rendição. Logo pela manhã a banda da


qual fazia parte deu uma volta à cidade tocando uma marcha alegremente para
comemorar a rendição que acabava com o tormento da guerra e,
consequentemente, com o racionamento que nos fora imposto durante alguns anos.

Havia um convívio saudável entre rapazes e raparigas da mesma geração e nas


romarias ou nas festas da cidade eram frequentes os bailaricos donde saía por vezes
um namorico que no início era quase sempre escondido.

Bragança, Cidadela. A casa onde residi até ir para Angola (foto autor 1980)

BRAGANÇA por kuribeka

Concluído o curso industrial não era fácil conseguir um emprego. Com sorte, um
amigo que pertencia também à banda do Bombeiros Voluntários disse-me que no
Notário onde era amanuense precisavam de mais um empregado. Fui recomendado
para o lugar pelo meu amigo e por lá fiquei durante uns anos onde pratiquei
dactilografia numa velha máquina de escrever Remington e também escrita
manual nos livros do cartório, aperfeiçoando assim o estilo de escrever. O
vencimento para a época não era grande coisa, por isso, ou continuava como
amanuense no Notário até melhorarem as condições ao que parecia estava para
breve, ou teria de procurar outro modo de vida. Só me restavam poucas
alternativas: aos 19-20 anos ir como voluntário para a aviação em Alverca, fazer o
curso de furriel miliciano e por lá ficar o que não era fácil ou, então, ir para a PIDE
como alguns dos meus amigos fizeram. Sempre era melhor do que estar
desempregado.
Como amanuense do único notário de Bragança, conhecia muitas pessoas e, entre
elas, algumas jovens que depois da conclusão do 5º ano do liceu e para ingressarem
na Escola Nornal (Escola Superior de Educação) para se formarem em professoras
do Ensino Primário (Essino Básico) precisavam reconhecer as assinaturas dos
respectivos requerimentos. Por isso, quando me encontrava com elas na rua ou nos
jardins mantinhamos uma conversa amena e muito agradável que ainda hoje,
passados 58 anos, recordo com saudade e amor, porque não dizê-lo também.
Naquela época (anos 50) recorda-me também de uma canção romântica brasileira
que se chamava Copacabana cantada pelo "Braguinha" que uma dessas minhas
amigas frequentemente cantava e que era transmitida pela Emissora Nacional ou
pelo Radio Clube Português a qual, depois de muita pesquisa na Net consegui obter
na versão original que podereis ouvir aqui. Estou certo de que as pessoas desse
tempo que a ouvirem sentirão a mesma nostalgia que eu sinto.
Eu (no centro) e os meus irmãos (1951)

Como sempre tive uma grande aptidão para a electrónica, com algum sacrifício,
comprei alguns livros sobre o tema, muito comuns naquela época traduzidos do
Francês, onde ensinavam a fazer receptores com detectores de galena, as chamadas
simplesmente Galenas. Montei um desses receptores com o parco material que
consegui eu mesmo fazer, inclusivamente os auscultadores que eram a peça
principal e que foram feitos com fio muito fino do secundário de uma bobina de
ignição avariada de um automóvel e com duas caixas de pomada para calçado
vazias. Como não tinha minério de galena natural preparei-a com enxofre e limalha
de chumbo tudo fundido num tubo de vidro até cristalizar. Com esse aparelho
rudimentar conseguia escutar a BBC. Foi uma alegria indescritível. Mais tarde, já
com mais conhecimentos de electrónica e mais possibilidades económicas, fiz um
receptor com válvulas alimentado por pilhas e com os auscultadores apropriados.
Com este pequeno receptor e com uma antena exterior conseguia ouvir não só a
BBC como a Emissora Nacional e outras.

Entretanto a minha mãe que tinha casado há anos e estava vivendo em Vila Luso
(Luena), Angola, sabendo da minha situação, escreveu-me dizendo-me que era
melhor eu ir para Angola porque lá teria mais facilidade de conseguir um emprego
possivelmente na Diamang. Que me enviaria os meios monetários necessários para
a passagem e a respectiva carta de chamada na altura estupidamente obrigatória.
Perante todas as alternativas que tinha optei por ir para Angola.

Contactei uma agência no Porto que se encarregava de conseguir passagens por via
marítima para Angola. Em Junho de 1951 fui contactado por eles dizendo-me que
tinha passagem marcada no navio Moçambique para 15 (?) de Junho e, por isso,
comprei passagem de comboio para o Tua, daí para o Porto e depois para Lisboa.

Foi uma viagem longa a que não estava habituado. Chegado a Lisboa, tinha à
minha espera um primo que trabalhava como continuo no Ministério das Colónias.
Passei de eléctrico pelo Terreiro do Paço e, foi aí, que pela primeira vez na vida vi o
Tejo e o mar. Não fiquei muito surpreendido. No dia seguinte fomos à Companhia
Colonial de Navegação para confirmar a passagem. Como ele tinha contactos
frequentes com os funcionários da companhia perguntou a um dos seus amigos se
havia uma passagem marcada em meu nome para o navio Moçambique. Para meu
espanto não estava nada marcado. A agência do Porto sacou-me o dinheiro e fui
enganado.

Como o meu primo tinha conhecimentos na companhia, pediu ao amigo que me


conseguisse uma passagem em terceira suplementar. Ouvi o funcionário dizer-lhe
baixinho:

- Esse é mesmo teu primo ou é dos nossos primos ?

- Não, este é mesmo meu primo, vê lá o que podes fazer.

E fez mesmo, conseguiu-me uma passagem em terceira suplementar para o Lobito


no navio Moçambique. Entretanto, à noite, no Terreiro do Paço assisti encantado à
passagem das Marchas Populares de Santo António de Lisboa.

No dia seguinte foi mostrar-me o navio Moçambique que estava atracado no cais da
Rocha. Foi a primeira vez que vi um navio daquele porte. Mas, mesmo assim, no
meu imaginário, pareceu-me pequeno e, por isso, perguntei-lhe:

- É pá isso não é um navio muito pequeno?

Ele respondeu-me: - Não, é um barco normal e leva muitos passageiros e carga


para África.

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