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66 ESTUDOS HiSTóRICOS -1994/13

o tema da conferência a ser proferida pelo profe88or Charles Dollar aborda o


desenvolvimento de estudos sobre as tecnologia. da informação e seus impactos
nos arquiv08 e n08 proglamas de gestão de documentos, particulal'mente sobre
imagem digitaI e estocagem de meios óticoe.
"I'ecnologias da infol"l11ação digitalizada e pesquisa acadêmica nas ciência"
sociais e humanas: o papel crucial da arquivologia", título desta conferência, é
fruto de an08 de experiência na área de pesquisa e de atividades técnicas, sendo,
portanto, mais uma importante contribuição do professor Charles Dollar para a
comunidade arquivÚ!tica.

Rio de Janeiro, 15 de setembro de 1993


Jainw Antunes da Silva
Diretor Geral do Arquivo Nacional

glande minha satisfação por en­ qui.a histórica. No entanto, quanto


contrar-me no Rio de Janeiro mais eu pensava no Assunto mais insa­
participando das comemorações do vi­ tisfeito me sentia, por me parecer que
gésimo aniversário do Centro de Pes­ meu enfoque deveria flX8r-se no futuro
quisa e Documentação de História da história na era do computador. His­
Contemporãnea do Brasil. O CPDOC toriador por formação e arquivista por
deve ser elogiado por aproveitar a experiência, sentia-me razoavelmente
oportunidade da. celebração de seu confortável para misturar história com
aniversário para uma avaliação do im­ arquivologia em minha conferência.
pacto das tecnologias da informação Só que, à medida em que foi sendo
digitalizada sobre a atividade acadê­ escrito, este texto foi tomando um rumo
mica contemporânea e futura. completamente diferente. De fato, o en­
Antes de entrar 110 tema que me cabe foque voltou se para o impacto das tec­
desenvolver, gostaria de explicar por nologia. da infol"lIlação sobre a pesquisa
que o título de minh a aplesentação di­ contemporânea Das ciências sociais e
fere daquele que foi publicado 110 convite humanas e para a contribuição crucial
para este evento. 'lbmei a liberdade de da arquivologia, incumbida de gerantir
mudá-lo porque um título deve 11>5umir que fontes infol'mativas digitalizadas
o conteúdo do trabalho. Por outro lado, confIáveis, autênticas e em condições de
é importante, pelo menos para mim, que serem utili2JIdas se tomem disponiveis
vocês entendam por que mudei o título 808 pesqUt58. dores e a autOSt usuarlOS.
• .

e o enfoque de minha apresentação. Em De certa forma, ""''''' enfoque foi precipi­


fevereiro pa588d o, ao submeter o título tado por um estudo recentemente publi­
de minha palestra aos orgenizadores do cado na The N.w York Times Book R.­
evento. pareceu-me oportuno relacionar vkw sob o título de "Floppy disks are
a teoria e a prâtica arquivísticas à pes- only knowledge but manuscripts are
TECNOLOGIAS DA INFORMAÇÃO DlGlTAUZADA 67

l 2
wisdom", no qual a professora JocIi futura. Mas essa perspectiva poderá
Daynard, da Universidade de Harvard, ser evitada se 08 preceilol!l da arquivo­
lamenta a substituição doe ma mISCritos logia, sobretudo no que dizem respeito
por disquetes e listagens de computa­ à criação, procedência e preservação de
dor. uEm breve", escieve ela, "nossos regish08, forem observados. O que é de
conceitos de 'texto' e 'autor' mudarão se esperar, pois a cada dia que paAAa os
inexoravelmente". Ou, como afil"ma Eli· arquimtal5 ee tornam mais conseien·
zabeth Falsey, '''Thxtos têm autoria. A tes de que 08 princípios da arquivolo­
infotJllação é anônima.·' Daynard en· gia, que tradicionalmente têm forneci­
cena seu estudo com estas palavras: do os fundamentos teóricos e metodo­
"Em breve, muito em breve - é o que 08 lógicos para a fidedignidade e a auten­
manuscritos parecem dizer-n05 - sere ticidade dos regislios - assunto abor­
mos apenas os papéis ou as listagens
• dado antes dá maneira tão clara pela
que deixarmos para trás." E claro para professora Duranti -são mais cruciais
ela que o advento das tecnologias da ainda quando se trata dos registros
info ....'AçãO digitalizada conduz inevita­ digitalizados presentes e futuros.
velmente à proliferação de uma ilÚor­ Nesse contexto, o elÚoque de minha
mação desprovida de sentido, anônima palestra recai sobre o papel crucial que
e descon textualizada. os arquivistas e a arquivologia desem­
Na realidade, tudo aquilo que os penham para assegurar que os docu­
indivíduos ou a sociedade deixam atrás
mentos eletrônicos que hoje estão sen­
de si como "memória" (isto é, artefatos,
do criados e usados possam no futuro
registros) é produto da tecnologia da
estar disponíveis aos estudiosos das
ilÚormação disponível na época. Sob
ciências sociais e humanas de urna for­
esse aspecto, o ambiente das tecnolo­
ma confiável e em condições de utiliza­
gias da irúormação digitalizada ora
ção. Meus comentários estão organiza­
emergentes não difere substancial­
dos em três partes distintas.
mente daquele da transição da memó­
A primeira parte concentra-se no
ria para a escrita. ou da escrita para a
ambiente atual das tecnologias da in­
imprensa. Não obstante, concordo que
forlllação digitalizada. Será feito um
o cenário futuro de Daynard possa per­
resumo das principais tendências das
feitamente ser um dos resultados da
tecnologias da ilÚormação digitalizada
utilização das tecnologiss da informa­
e de como elas podem afetar a criação,
ção digitalizada. Existem com certeza
o uso e a preservação de registros. En-
-

boas razões para. se prever que nas


próximas duas décadas, ou em torno fase especial será dada à ubiqüidade
disto, as tecnologias da ilÚonnação di­ dos computadores e dos dados digitali­
gitalizada tomaráo conta do mundo, zados em escritórios, locais de trabalho
transformando a maneira de 05 estu· e bibliotecas, ao acesso 808 enormes
diosos contemporáneos das ciências so­ bancos de dados digitalizados, e ao po­
ciais e humanas conduzirem suas pes­ der que têm as tecnologias da ilÚOIma­
quisas e disseminarem suas descober­ ção digitalizada para ''reinventar a h�­
tas. Mais ainda, a utilização cada vez tória" por meio da alteração de regis­
mais intensa de tecnologias da ilÚor­ tros sem deixar qualquer prova "visí­
mação digitalizada em escritórios, lo­ vel" de que houve falsificação. Dar-se-á
cais de trabalho e bibliotecas pode le­ atenção também ao problema da obso­
var ao surgimento de obstáculos incon­ lescência das tecnologias da informa­
tornáveis para a atividade acadêmica ção digitalizada, na verdade o proble-
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ma maior em matéria de conservação imediato e menos óbvio. O ponto-chave,


de uma "memória eletrônica", contudo, é que as tecnologias da infor­
A segunda parte revisará as práti­ mação digitalizada MO o mais impor­
cas COtientes das tecnologias da infor­ tante propulsor das rápidas mudanças
mação digitalizada na criação e manu­ que estão OCútiendo na sociedade. Para
tenção de fontes digitalizadas para a muit&e pessoas e instituições, as tecno­
peequisa acadêmica contemporánea logia" da informação digitalizada já se
nAe ciências Bociais e humanas. Serão incorporaram definitivamente às nos­
tratados de maneira sucinta: (1) as S85 atividades doméstiCAS, escolan;,s e
fontes de dados digitalizados; (2) as profISSionais, assim corno à produção de
fontes de texto digitalizado; e (3) o uso bens e serviços pelas forças armadas, as
de imagens digitalizadas para fins de instituições científicas, a medicina e a
preservação e acesso. educação, além dos prôprios órgãos g0-
A terceira parte tratará de como a vernamentais. Muitos - e eu me incluo
incorporação de três conceitos da ar­ n",ta comunidade - acreditam que o
quivologia - unicidade, autenticidade que hoje vemos não poses. de uma ma­
e preservação - na programação de rola, que na próxima década, ou antes,
sistemas de informação digitalizada se transfOl'lll8.rá em maremoto.
pode ajudar a superar os principais Passarei agora a tratar com mais
obstáculos ao uso acadêmico futuro dos detalh... desse "maremoto" emergente
documentos eletrônicos. Especifica­ das tecnologias da informação digitali­
mente, serão examinadas as possíveis zada sob as seguintes perspectivas: (1)
maneiras de S8 garantir: a unicidade o ambiente de sistemas abertos; (2) a
dos registros eletrônicos em uma base simplificação das tecnologias; (3) o au­
de dados compartilhada ou em rede; a mento de poder d08 usuári08 finais; (4)
autenticidade d08 document08 eletrô­ as redes eletrônica"; (5) a ''reinvenção
nicos diante de tecnologiss que p08si­ da realidade"; e (6) a forilla cambiante
bilitam a reinvenção da realidade (ou dOB documentos eletrôniC08. Implícita
das fontes histórica"), deixando pouco nesses comentários está minha convic­
ou nenhum vestígio da distorção ou ção de que não devemOB no. deixar
falsificação; e a preservação ao longo hipnotizar pelas tecnologias da infor­
do tempo de documentos eletrôniC08 mação, mas concentrar·nos nAS ques­
que são o produto de um ambiente em tões intelectuais, confIBntes de que, se
que a obsol...cência tecnológica é o fa­ as abordal"lm� da maneira coneta, as
tor mais importante de propulsão. questões tecnológicas serão equaciona­
das em seu devido tempo.

1.1 Arquitetura de sistemas abertos


1. O ambiente das tecnologias da
Informação digitalizada Na América do Norte e na Europa é
6"""n
"a de o interesse d08 usuários pela
Hoje em dia, talvez ninguém mais arquitetura de sistemas abert08, o que
coloque em dúvida a afirmação de que é acarretou a derrubada de baneiras
grande o impacto das tecnologias da dOB fabricantes ao intercâmbio de da­
infonllação digitalizada sobre pratica­ dOB e à interoperabilidade de softwares
mente todas as áreas da atividade hu­ que rodam em plataformas computa­
mana. Em algumas áreas esse impacto cionais heterogêneas, a partir do de­
é imediato e óbvio; em oultas, é menos senvolvimento e da adoção de padrões
TECNOLOGIAS DA INFORMAÇÃO DlGITAlJZADA 69

internacionais. Aaceitação dos sistemas a interconectividade (conexão entre


abertos na América do Norte representa sistemas muito diversos) nos possibili­
a aceitação de uma filosofia de compar­ tam a comunicação com praticamente
tilhamento de dados e aplicações e de qualquer localidade do mundo sem a
uso de platafo rmas de tecnologias da preocupação de como isto acontece.
infol'mação conformes às nOlülAS inter�
nacionais. Nesse contexto, arquitetura 1 .3 Aumento de poder do usuário
de sistemas abertos também significa final
que OB periféricos de BJ'lilazenamento
(drivea de fita e de disco) e os equipa­ o mercado de process amento da in­
mentos de dUJpl<gl (monitores e impres­ fOl'lilAÇão reconhece com clareza que a
eoras) têm de ser fisicamente compatí­ tecnologia da informação estã cami­
veis. Entre outnls coisas, isto implica a nhando para o aumento de poder do
abertura de porta. para a conexão do usuário final. Embora os computado­
ambiente original de sisteltlllB paten­ res de gIande porte não sejam ainda
teados com um ambiente público nã<>­ considerados dinossauros, a balança
patenteado. A arquitetura de sistemas pendeu claramente para o usuário fi­
abertos possibilita a ocol'l'ência da com­ nal, na medida em que os custos rapi­
putação em um ambiente de múltiplos damente dec1'escentes dos microcom­
fabricantes. putadores e a enol'me ampliação de seu
desempenho colocaram grande poder
1.2 Simplificação computacional nas mãos do usuário
final. Em linhas gerais, isto significa
Simplificação das tecnologias da in­ um poder e uma inteligência extraor­
fOimação significa desenvolvimento de dinários nas estações de treballio,jun­
interfaces de computação diretas, li­ tamente com 80fiwwes sofISticados e
VIes de ambigüidades e de fácil utiliza­ amigáveis, que propiciam 8.5 fetla·
ção. Sob esse aspecto, são muitos os mentas para a busca, recuperação e
que, na América do Norte, comparti­ análise de dados/infol'mação sem a na·
lham a opinião de que usar um compu­ cessidade de técnicos interluediári05.
tador deve ser uma coisa tão simples e
intuitiva que até as crianças podem 1.4 Redes
,

fazê-lo. E a isto que se destinam as


interfaces gráficas amigáveis (Graphi­ Em nossos tempos, o fenômeno de
cal User Interface). Naturalmente, es­ maior alcance na arena da digitaliza­
sa simplificação não será fácil. A histó­ ção eletrônica é provavelmente o cres­
ria dos prim6rdios da telefonia nos cimento das redes eletrônicas. Irei me
EUA é instrutiva a esse respeito. Na­ referir aqui especificamente à Internet
queles anoo, com 06 sistemas concor­ e à sua sucessora, a NREN (National
rentes de telefonia, uma empresa ou Reeearch Educatlon Network). No ano

um indivíduo podiam ter duas ou mais passado,Paul Peters, diretor executivo


linhas telefônicas conectadas a siste­ da Coalition for Networked Informa­
mas diferentes, de fOl'ma que a comu­ tion, esboçou a história da Internet
nicação se realizava em um ambiente desde 1973. A Internet,como ele obser­
muito heterogêneo. Com o tempo, evo­ vou, é ao mesmo tempo uma entidade
luiu-se para o conceito de mesa telefõ­ operadora e um campo de prova. Trinta
nica. Hoje,mais de um século depois,a e cinco nações estão hoje filiadas à
comutação automatizada de pacotes e Internet, o que llie dá cerca de três
70 ESTUDOS HlSTÓRlCOS -1994/13

milhõee de usuárioe diários. Cerca de t:ee, embora dramáticos, do poder desse


20% do tráfego de mensagens envol­ software de manipulação fotográfIca po­
vem agências governamentais; o res· dem ser vi8tos na. capas da revi8ta de
tante se dá no Âmbito acadêmico ou humor Spy Magazine: lima delas traz o
não-governamental. MaU. de 50% do roeto de Hillary Clinton no corpo de uma
tráfego total da rede englobam ativida­ mulher sumariamente vestida; na ou·
des de transferência de arquivos. tra, o rosto do presidente Bill Clinton é
Um doe maU. importantes fatores colocado no lugar do rosto do Pinóquio.
reetritivos ao aumento do uso da Inter­ O meslllo softwwe pode ser aplicado a
net é sua a!.'1al limitação de largura de outnxs tip:>e de imageM digitalizadae
banda. que dificulta muito a transferên­ com resultados igualmente dramáticoe.
cia de dadoe na fOl"lIIa de imagem. Ma. Ninguém há de levar a sério essas
o Higher Computer Penounance Act de dUAS "reinvençõeB da realidade", mas o
1992 criou a NREN. que. ao entrar em fato de a tecnologia poss ibilitá-las signi­
operação no próximo ano. trapi mudan­ fica que algumas pessoas reinventarão
Ç88 dramáticas nessa área. E bem pro­ a realidade de uma maneira muito me­
vável que em 1995-6 assu.tamos a taxas n06 vi8ível. criando imagens digitaliza­
de tl'Bnsferência de dados da ordem de das que nunca existiram e cuja autenti­
um bilhão de bits por segundo. Umas cidade não poderá ser validada com ba­
das implicações dess e fato é que a rede se nas própriAS imagens. Em alguns
poderá atender a usuários com os maU. aspectos, não se trata de um problema
variadoe inter.""",.. em matéria de da­ novo. porque historicamente tanto as
doe eletrôniooe. A atual tecnologia de imagens estáticas quanto as animadas
rede limita oe u.euários à irúotlnação tém sido utilizadas com objetivos ideo­
imprc.... a. orientada para o papel. p0- lógicoe ou de propaganda. E. natural­
rém larguras de banda maU. amplas mente. documentos foljad08 ou falaifi­
comportaráo todo tipo de dadoe eletrô­ cad06 não são fenômenos modernos. De
nicoe - fotografias, mapas em cores, fato. a ciência da diplomática foi criada
som. ftimes. videoe. Será um ambiente para estabelecer a autenticidade dos
verdadeiramente multimídia. documentos. A novidade está no poten­
cial de adulteração não-detectável dos
1.5 "A reinvenção da realidade" documentos e imagens arquivi8tic06 di­
gitalizados. Essa situação provavel­
Essa expressão foi tirada de um arti­ mente se tornará maU. complicada ain­
go publicado em 1993 no lmaging: The da à medida que aumenta a ubiqüidade
lmaging lndustr:y Magazine. com o títu­ dos documentos digitalizados e que os
lo ''Reinventing reality just got easier". documentos e imagens digitalizados são
O artigo descreve como um novo softwar transferidos de arquivos eletrônicoe e de
re de processamento fotográfico possibi­ outras fontes digitalizadas de infOl"l""­
lita a fusão dos elementos de duas foto­ ção histórica. Será inevitável que algu­
grafias diferentes. a mudança das con­ mas pessoas tentem reinventar a histó­
dições da fotografIa (da noite para o dia) ria criando imagens e documentos digi­
e a eliminação de distorções nas ima­ talizados que nunca existiram. Aqueles
gens fotográficas. Com esse software é a quem compete a tarefa de proteger
poss ível criar objetos (ou seja. fotogra­ regi8hU! da adulteração não devem su­
tias) que nunca existiram. Nas palavras bestimar o uso potencial dos softwares
do artigo, 'você só tem o limite de sua de manipulação fotográfIca para rein­
3
imaginação". DoU. exemplos chocan- ventar a história por meio de alterações
TECNOLOGIAS DA I NFORMAÇÃO DlGlTAUZADA 71

não-detectáveis de textos e imAgens di­ qual é incorporada em um registro que


gitalizados. é mostrado na tela, impresso ou envia­
do para o receptor. Naturalmente, ou­
1.6 Forma cambiante dos registros tro usuário pode ter acesso às mesmas
digitalizados tabelas, mas em um contexto inteira­
mente diferente. Nos dois casos, é ne­

Os registros digitalizados não exis­ cessária uma decisão específica de sal­

tem como entidades rlSicas enquanto var as tabelas a fim de se preservar a

tais. Na verdade, são apenas sinais ele­ prova dos. fatos e ações, mas decisões
trônicos - 1 e O - que não dependem de desse tipo podem criar uma avalanche
seu suporte como os registros em papel. de problemas, inclusive a destruição

Em Outr1lS palavras, os registros digita­ da própria noção de não-redundância.


lizados não estáo fISicamente p,,,sos a Como conciliar a não-redundância com
um tipo de aimazenagem específioo ou a preoervação da unicidade das tabelas
relacionais? Uma das possívei8 manei­
a um SUporte f'LSioo. Além disso, as tec­
ras de se garantir a preservação da
nologias digitais separam a apn,senta­
ção de documentos - a maneira como unicidade das tabelas relacionais é
preservar, juntamente com as próprias
aparecem para quem os ongma e quem
• •

06 recebe - de seu conteúdo infOl'lllati­


tabelas, as instruções de recuperação
utilizadas em seu manejo.
vo.A título de exemplo, os programAS
processadores de texto usam o padrão Os mesmos problemas estáo presen­
ASCII, mas nele estáo embutidos códi­ tes no projeto e na estrutura dos siste­
mas de infOlIllAçãO geográfica, que p0-
gos que não são impre6SQS para a defi­
dem ser considerados tabelas relacio­
nição da formatação, como margens, es­
pacejamento, fonte, paginação etc. Em­ nais com dadoe espaciais, entre 08 quais
hora todos os sinais eletrônicos que com­ imagens. mapas, desenhos e 8s.o,eme­
põem um documento digital existam de lliad08, que tendem a ser volum0508 em
tamanho. E claro que a manutenção dos
,

alguma f01'111.8, o documento em si só


dados espaciais recuperados viola o
existe quando aparece em uma tela ou
impw'5o. Este conceito é chamado de princípio da não-redundância. Porten­
"registro virtual", que conota a existên­ to, a preservação da unicidade dos do­
cumentos digitalizados gerados por um
cia temporária em um determinado
sistema de informação geográfica re·
ponto do tempo.
presenta um desafio sério aos arquivis­
O conceito de "registro virtual" está
tas e aos analistas de sistemas.
nOnualmente associado às bases de
dados relacionais, que consistem de
tebelas de informação passíveis de se­
rem manipuladas e exibidas de inúme­
2. Fontes digitalizadas para a
ras maneiras. Um dps objetivos funda­
mentais da tecnologia das bases de pesquisa acadêmica nas ciências
4
dados relacionais é minimizar a redun­ sociais e humanas
dância de dados - ou seja, as tabelas de
5
dados existem apenas em um lugar 2.1 Dados
para serem compartilhadas por múlti­ ,

plos usuários com diferentes propósi­ E cada vez-maior o volume de dados


tos. Ao se recuperar uma infol'mação políticos, demográficos, econômicos etc.
de uma base de dados, recupera-se disponiveis em forma digitalizada. O
apenas uma cópia do dado "original", a Interuniversity Consortium for Politi-
72 ESTImOS HISTÓRICOS - IIXl4/I3

cal and Social Reeearch, Incslizado na norte-americano, documentos gover­


UniversityofMichigan, talvez seja mais namentais, revistas de computação,
conhecido por seu acervo eletrônico de dicionários e trechoe dos volumes da
dadoe referentee a apumçães de elei­ Libmry of America.Mary Fenny e Sea­
ções, censoe e levantamento.. diversce, mus R.o88 acabamm de concluir um
entre oubos, aberto.. à consulta doe pee­ estudo semelhante sob oe auspícios da
quieador.... . O maior depositário de da­ British Academy, com o título de Infor­
doe de levantamento.. nos EUA, funda­ maticn technolcgy in humanities scho­
do em 1936, encontra·se na Universida­ larship: British achieuments, prospects
8
de de Connecticut. Este enorme corpo and barriers. Fenny e Raso demm
de dadoe digitalizados pode ser acsssa­ destaque ao Oxford Taxt Archive
do on line. Outra instituição importante (arA), entre inúmeras oubas tentati­
""" EUAC\\io acervo é composto, em sua vas comparáveis de digitalização de
maior parte, de dados digitalizadoe é o texto, juntamente com o desenvolvi­
Center for Elecb"nic Records dos Ar-
o
mento da Text Encoding Initiative
quivoe Nacionais doe EUA E a fonte (TE!). Esta última é extremamente
primária dos dadoe digitalizados gem­ importente, porque ....pecifica um for­
doe pelo gvverno. Seu acervo inclui da­ mato de intercâmbio que pelmite que
doe doe censos decenais, dados sobre a o texto digitalizado possa ser compar­
Guenll do Vietná, sobre finanças, saúde tilhado por plataformas de aplicações
pública e meio ambiente. Um estudo diferentes.
recente identificou mais de 500 bas.... de
dadoe de valor pennanente que passa­ 2.3 Imagens
rão pam a custódia do Center nos pró-
Xlmos anos.

Em muitas bibliotecas e arquivoo do


mundo, um problema eério com que se
2.2 Texto defronta boa parte da infol"mação que
tem o papel como suporte está precisa­
Tanto noo EUA quanto na Europa mente na deteriomção desse suporte,
são nume rosos os projetos em anda­ acarretando dificuldades crescentes de
mento pam converter as fontes im­ legibilidade. O manuseio desse mate­
pressas ou manuscritas a um formato rial pelos pesquisadores s6 faz agravar
6
digita1. Entre os mais notáveis estão o problema. A solução tradicional tem
o Thesaurus Linguae Gmecae (TLG), sido fotocopiar ou microfilmar os docu­
voltado para a digitalização de textos mentos, bloqueando-se o acesso dos
gregvs que vão desde 08 tempos homé­ pesquisadores aos originais. A fotocó­
ricos até cerca de 600 d.C., e o Medieval pia reproduz a portabilidade do origi­
and Modern Data Bank (MEMDB), nai, tanto na fOllna de página quando
que tmbalha com mais de "13 mil cota­ na de livro, mas se trata de uma solu­
ções pam a troca de moedas na Idade ção de curto prazo, uma vez que a
Média, de meados do século XII até o fotocópia acabará também se deterio­
7 9
ano de 1500". Além disso, a Data CoI­ mndo com o uso. Já o microfilme é
lection Initiative (DC!), uma volumosa produto de uma tecnologia de conver­
biblioteca global on Une de textos digi­ são muito poderosa, amplamente acei­
talizados para lingüistas especializa­ ta e de baixo risco. Processado e arma­
dos em computação, consiste de docu­ zenado de acordo com rígidas nOnnas
mentos de fontes diversas, como os nacionais, o microfilme tem uma vida
abstracts do Deparlment of Energy útil extremamente longa, chegando
TECNOlDGlAS DA I NFORMAÇAO DIGlTAUZADA 73

talvez aos 500 anos. 10 Além do mais, os cionados desde a Guena Civil Ameri­
negativ06 podem ser utilizados quase cana. O estudo, iniciado em 1987, de­
indefinidamente para a obtenção de monstrou que a tecnologia da digitali­
novas cópias sem que ocorra perda de zação da imagem e do sistema de recu­
ll
ilÚOl'lnação, Mas, não obstante eMes peração utilizado no projeto pode pro­
pontos fortes, o microfilme é pouco prá­ duzir imagens superiores e acelerar o
tico para 06 pesquisadores por não ter processo de recuperação para a própria
a portabilidade da fotocópia e não se equipe e para 05 pesquisadores.

prestar com facilidade nem à produção Os Arquivos Gerais da India, na Es-


de cópiBB nem à conversão para u m panha, estão desenvolvendo em Sevi­
fOllllAto eletrônico. lha um importante projeto de sistema
Nos EUAe na Europa são diversos os de digitalização de imagem e atlnaze­
projetos já concluídos ou em andamento namento ótico. A fase inicial do projeto,
"06 quais se utiliza a tecnologia da digi­ já concluída como parte das comemo­
talização da imagem em vez da microfll- rações do V Centenãrio das viagens de
magem. Na essencm, a digI·tal·1Z8Ç80
_ .
- da Cristóvão Colombo ao Novo Mundo,
imagem envolve"8 criação de uma ima­ engloba cerca de nove milhões de pági­
gem eletrônica a partir de um papel nas, do final do século XV ao final do
original ou de uma cópia feita a partir de século XIX. Quem já assistiu a de­
um microfilme. Como as imagens eletJô­ monstrações do sistema concorda em
n;ca. de páginas não podem ser pe .. qui­ que as tecnologias de digitalização da
sadas da mesma forllla que um texto imagem e de 8l"Inazenamento ótico po..
ASCII, torna_ neceo5SlÍna a criação de dem produzir resultados notãveis em
um índice detalhado para possibilitar a telU10S de melhoria da legibilidade e de
l2
recuperação. As vantagens da digitaliza­ aC6Sso. Pedro Gonzales, diretor dos
ção da imagem incluem a capacidade de Arquivos Gerais, me disse recente­
se melliorar significativamente a legibi­ mente que os usuários do sistema es­
lidade e a possibilidade de leitura do tão muito satisfeitos com o aumento de
material, na maioria dos casos, apenes sua capacidade de pesquisar o acervo.
com um pequeno esforço. Além disso, as E um pesquisador afu·mou que em al­
imagens digitalizadas podem ser lidas gumas horas identifica, recupera e
ou reproduzidas indefinidamente sem analisa documentos, operações que an­
la
perda de qualidade da imagem. Alguns tes lhe tomavam algumas semanas.
projetos combinam o reconhecimento Nos EUA, um estímulo importante
ótico do caractere do texto (isto é, a cna­ ao uso das tecnologias de digitalização
ção de um texto eletrônico pesquisável a da imagem para fins de preservação e
partir de uma imagem digitaliZAda) com acesso é o trabalho da National Comis­
a imagem do documento. Mesmo que a sion on Preservation and Access. Em
taxa de precisão do reconhecimento ótico 1990 a Comissão publicou um estudo
do caractere seja relativamente baixa �m que recomendava a exploração e o
(menos de 95%), o texto pesquisável vem uso de tecnologias da digitalização da
a ser um bom substitutivo para a inde­ imagem para fins de preservação e
. .
xação de Assunto. acesso. 14 Com o apolO da CoIDlSSao e -

Os Arquivos Nacionais dos EUA da Xerox Corporation, a CorneU Uni­


completaram recentemente um proje­ versity deu inicio a um estudo-piloto
to-piloto para o escaneamento, a me­ para escanear e al"mazenar digital­
lhoria de qualidade e a arlllAzenagem mente em discos óticos cerca de LOOO
,

em discos óticos de documentos sele- livws em condições precárias. A dife-


74 ESnJOOS HISTÓRICOS - 191W13

rença do projeto dos Arquivos Nacio­ to é garantida pela manutenção da pro­


naie, o Projeto Cornell sugere que a veniência, que é o fundamento da mo­
tecnologia de digitalização via ...ea­ derna arquivologia. Um dos grandes
neamento compete em custo com as obstáculos à manutenção da proveniên­
tecnologias da fotocópia e da digitaliza­ cia estã no fato de que boa parta da
ção da imagem.16 Outro estudo em cur­ infOl'JI!8çãO contextual dos regista", di­
so na Yale Univemity visa a conversão gitaliUldoe não é visível ou não pode ser
digital do microfilme, sobretudo do mi­ apreendida de maneira rotineira. Isto
cromme com imagem fraca, resultanta constitui um desafio formidável quando
de fllmagem, proc-..samento quimico se lida com uma haee de dados distribul­
ou armazenamento impróprios. da ou compartillmd a ou com um siste­
ma de infol'mação goográfica. 'Ibdavia,
não existem impedimentos tecnológieoe
inerentes para se capturar infolmações
3. TecnologIa da Informação contextuais apropriadas que atestem a
dlgltallzada e perspectIvas. das unicidade dos documentos digitaliUl­
ciências sociais e humanas dos. O veículo mais promissor para a
captura rotineira dP6AAS infOImações
Como observei anteriormente, o de­ contextuais é a inclusão dessa função no
senvolvimento e o uso de sistemas de próprio sistema de informação. Ajusti­
infollllaçãO digitalizada criam obstácu­ ficativa para essa inclusão deve ser o
los importantes para a utilização acadê­ fato de ela atender a interesses das em-
. .
mica futura dos documentoe eletrónieoe presas ou orgaruzaçoee, e nao a um in-
- -

que estão sendo criados hoje. Os ttês ter,....., arquivistico enquanto tal.
principais obstáculos que merecem hoje
l1088Q atenção são: a unicidade doe re 3.2 Autenticidade
gistnA digitalizadoe em uma bs... da
dados compartilhada ou em rede; a au­ Os estudiosos e pesquisadores que
tenticidade dos documentoe eletrónieoe utilizam algum material como fonte
diante do fato de a tecnologia poeeibili­ primária em sua pesquisa partem, em
tar a reinvenção da realidade (ou das geral, do pressuposto de que tal mate­
fontes histórica,,) deixando pouco ou ne­ rial é confiável e fidedigno. Trata-ee de
nhum vestígio de que houve distorção uma "autenticidade presuntiva", por­
ou falsificação; e a preservação ao longo que a maior parte do material conside­
do tempo de documentoe eletrónieoe que rado fonte primária - registros para 08
são produto de um ambiente em que a arquivistas - não passa de um subpro­
obsoleecência tecnológica é o fator mais duto de transações rotineiras exigidas
importante de propulsão. para se levar a cabo uma ação Gegal,
fmaneeira ou comercial), e esses sub­
3.1 Unicidade produto. acabsm fOl'mando um corpua
de materiais relacionad08 entre si. A
Como a professora Duranti observou presença de um documento em um cor.
em sua palestra, a unicidade doe docu­ pua constituído de tipos semelhantes
mentoe arquivisticos é atestada Wlas de material, que se sabe ou se acredita
relações contextuais dos criadores e terem sido produzidos de acordo com
W5IlÁM08 doe registt06, bem como peloe procedimentos-padrão, acaneta uma
próprios documentoe. Os arquivistas presunção de fidedignidade e autenti­
acreditam que a unicidade do documen- cidade. Por conseguinte, tanto o con-
TECNOLOGIAS DA INFORMAÇÃO DIGlTAUZADA 75

texto quanto o conteúdo doe documen­ na Bellcore, uma 8ubsidiéria da


tos dão testemunho da fidedignidade e AT&T.19 A primeira fase é a criação de
da autenticidade. um iesumo de ISO bits de um documen­
Diante do fato de que as tecnologiAS to digitalizado (texto, imagem ou dese­
da infOl"lllAçãO digitalizada possibili­ nho) de qualquer tamanho, lwumo que
tam mudanças fáceis em textos e ima­ é apenso ao documento. FAse apêndice
gens - a ''reinvenção da realidade" - é chamado de "tesumo unidirecional",
sem deixar prova visível desse ato, co­ porque não pode ser revertido para re
mo é possível garantir a autenticidade criar o documento original. O segundo
dos documentos digitalizados? estágio desse proce>:SO de autenticação
O meio tradicional de garantir que os liga o lesumo a um número matemati­
regislt08 pel'tuanecem autênticas ou camente único de ISO bits, que é deriva­
,,
"não-adulterados 16 é a "custódia inin­ do do número único de identificação dos
terrupta" em instalações especializa­ documentos digitalizados imediata­
das. No ambiente atual da infOJmação, mente anterior e posterior na fila do
em que os textos e imagens digitaliza­ CArimbo numerador. EMa ligação cria
dos são ubíqUa!, parece muito dificil o um "número carimbado" que não se re­
cumprimento dessa condição. Ironica­ pete para os númeiUB combinada! de
mente, dUAS soluÇÕES potenciAis para o ISO bits, que é então apenso ao docu­
problema da proteção da autenticidade mento digitalizado em questão. Assim,
doe registros digitalizados "",idem na um documento digitalizado "com núme­
própria tecnologia da infoilllação elebc>- ro carimbado" fica indissoluvelmente li­
. . . gado a outra! documentos digitalizados
ruca.17 A primeIra emprega o que se
chama de uma arquitetura cliente..ser­ igualmente IIcarimbad06" em um deter­
vidor segura,18 que bloqueia o acesso do minado período. O receptor de um docu­
usuário à base de dados ou aos arquivos mento ou um pesquisador no ano 2093
eletrénica!. Em uma arquitetura clien­ poderia comprovar sua autenticidade
te-servidor o usuário forolula suas per­ usando urna chave de verificação publi­
guntas para a base de dados ou emite as cada sE'manalmente noNew YOl"k Times
instruções para a recuperação de um ou para gerar um segundo rwumo do do­
mais documentos eletréniCt6 em uma cumento e compará-lo com o que está
estação de trabalho. E.sss instruções apenso ao documento eletrónico. Como
chegam ao servidor, o qual, depois da a mudança de apenas um bit em um
tradução adequada, 88 passa direta­ documento eletrénico modifica substan­
mente à base de dados. O sistema que cialmente 05 bits do resumo, os l"êSumos
gerencia a base de dados recebe e pro­ dos documentos digitalizados "numera­
cessa 85 perguntas e 85 instruções de dos pelo carimbo" poderiam ser indica­
recuperação, e os resultados são retor­ dOies poderosos de autenticidade.
nados ao servidor e daí ao usuário. Ca­
mo em uma arquitetura cliente-servi­ 3.3 Preservação
dor os documentos eletrénicos originais
nunca são acessados diretamente pelos A dificuldade de se IiQar com a unici­
usuários, eletronicamente falando tem­ dade e com a autenticidade dos registros
se a custódia ininterrupta dos regisba!. digitalizados é relativamente pequena
A segunda ferramenta eletrônica é quando se considera o desa/io de p",ser­
um "carimbo numerador" de duas fases vá-los em um contexto em que a obso­
para autenticar documentos digitaliza­ lescência tecnológica é inevitável e ines­
dos, atualmente em desenvolvimento capével. Na América do Norte, o fato de
76 ESTUDOS HISTÓRICOS -199(/13

o enfoque tradicional da preservação doe regist.w digitalizados para fins de


estar voltado para o suporte fl5ico da recuperação requer um software d"'�n­
informAção - papel, micromme, fita volvido para uma platafol'ma especifica
mAgnética - é de pouca ajuda para oe de .istema operacional. Um exemplo p0-
arquivistas engajadoe no esforço de des­ deria ser o indice para imageM digitali­
cobrir maneiras de minimizar oe efeitoe zadas de um sistema de recuperação de
da obsolesoência tecnológica. Mas o pon­ imageM. As entradas do Indice compor­

to de partida deve ser intelectual- mu­ tam indicadol'es lógicos e fisiroo para a
dar a ênfase da pl'eeervação do suporte localização das imagens desejadas. O
da informação ou do meio fisico de ar­ sistema de recuperação pode ser proje­
ma...nagem para a manutenção da pro­ tado de maneira que somente um deter­
Ce8I!IIbilidade ao longo do tempo.20 EMa minado software possa ser utilizado.
mudança na ênfase, já em curso nas Nesse CASO, o acesso ao índice e às pró­
comunidades arquivistica. e bibliotecá­ pria. imageM depende do softwwe. Em
riss, requer uma reorientação funda· outrw casos, o softwwe de recuperação
mental das abordagens, metodologiAs e requer um sistema operacional especifi­
prátiCAS da preservação. co, não sendo possível a recuperação da
A manutenção da processabilidade imagem sem esse sistema operacional,
dos registros digitalizados ao longo do muito embora os meios de 81mszena­
tempo é um procasso complexo que gem possam continuar sendo lidoe.
pode ser dividido em três processoe O terceiro aspecto da manutenção da
eeparados mas interdependentes: a le­ proc",,,,,,bilidade ao longo do tempo é o
gibilidade, a recuperabilidade e a inte­ da garantia da inteligibilidade da infor­
ligibilidade dos registros digitalizadoe. mação, de modo que ela continue com­
Legibilidade significa que a informa­ preensível para o ser humano. Em seu
ção pode ser processada em um siste­ nível mAis simples, a inteligibilidade
ma de computação ou em outro dispo­ ocorre quando dois sistemas de compu­
eitivo diferente daquele que criou ini­ tação usam ou entendem a mesma re­
cialmente a informação digitalizada ou presentação digital da informação, co­
em que ela se encontra atualmente mo um arquivo de textoASCII,que pode
armazenada. A não-legibilidade OCOl'le ser traduzido em uma fOl'lI1a que as
quando um dislX>5itivo de armazena­ pessoas reconhecem e compreendem.
gem antigo (uma fita ou um disco) não Oco,'.e um nível ma is elevado da inteli­
pode ser usado, com equipamentoe gibilidade quando dois sistemas de com­
mais modernos. E o que geralmente .e putador podem usar ou entender a mes­
chama de obsolescência do hOJ'dware, ma representação da informAção, mas
e ocorrerá quando os dispositivos de quando essa repr'8SE!ntação é apresenta­
armazenamento e os meios de trans­ da aos usuários, seu conteúdo é incom­
missão usados hoje se tornarem incom­ preensível. Nor1118lmente , esse proble­
patíveis com os novos produtoe desen­ ma está associado a dados codificados e
volvidos no futuro. numéricos, e a inteligibilidade dessas
Recuperabilidade, que se constrói s0- informações é assegurada pela preser­
bre a legibilidade, significa que o formato vação da documentação que define os
ou a organização lógica da infOl'lllação valores representados pelos números e
digitalizada pode ser orientado pera a códigoe. Tem-se o nível mais elevado de
seleção e recuperação de pedAços ou par­ inteligibilidade quando dois diferentes
tes identificáveis da infol'luação digitali­ so{tw(JJ'es, funcionando em diferentes
zada. Aorganizaçãoou a estrutura lógica ambientes computacionais, podem pro-
TECNOLOGIAS DA INFORMAÇÃO DlGITAUZADA 77

cesr
sa oe mesmos dados digitalizados sistamas operacionais se tornam obso­
com oe mesmoe Iesultados. E o que se letoe. Não obstante. ela fornece a plata­
chama de interoperabilidade. que em fOl"lUa em que se pxlem desenvolver
geral se torna evidente na. aplicações d'las diferentes abordagens. Aprimeira
de ba""" de dadoe relacionais semelhan­ delas seria a transferência de todoe oe
tes ao SQL. Ainteroperabilidade é par­ problemas de recuperabilidade e inteli­
ticulalmente difícil no caso de imagens gibilidade pera o futuro. na expectativa
digitalizadas em que se utilizam cabe­ de que 05 USUÁrios sejam capa1.e8 de
çalhoe de arquivo de imagem ou técni­ praticar a engenharia reversa do 8Oft­
cas de compressão que são patenteados, UJwe original ou de que o 80ftware e os
e não de domínio público. Os dad"" di­ eistemas operacionais sejam "inteligen­
gitalizadoe. sobretudo as imagens digi­ tes" o suficiente pera conseguirem a
talizadas. que só podem ser processados recuperabilidade e a inteligibilidade
em um deieJ'ülinado ambiente paten­ com pouca ou nenhuma intervenção hu­
teado. estão bem mais sujeitos a se tor­ mana. Daqui a duzentos anos. por
nar ininteligiveis à medida que o am­ exemplo, a engenharia reversa de um
biente vai se tornando obsoleto. 80ftware desenvolvido noe anos 80 terá
Asuperação da obsolescência tecno­ de basearse na consulta a extensa do­
lógica da digitalização requer dois tipos cumentação referente ao software origi­
de atividades: recopiagem periódica e nal. tarefa factível mas s � ita a um
migração para as novas geraçéee da sem-número de problemAS. .
tecnologia. A recopiagem periódica da Asegunda abordagem é confiar /las
infOllililÇão digitalizada com o objetivo normas internacionais que garantem a
de se manter em consonância com a interoperabilidade e as migrações de
tecnologia existente ofele ce uma garan­ atualização entre gerações de tecnolo­
tia absoluta de legibilidade. Quando o gias. A título de exemplo. uma norma
volume da infollnação digitalizada é re­ pera documentação eletrénica interati­
lativamente pequeno e o tempo trans­ va, como o Infonl1ation Resource Dictioa
corrido entre as cópias fica na faixa dos nary SY"tem (lRDS). visa estabelecer
dez anoe. tudo parece bastante atraen­ uma ponte entre sistemas de softwwe
te. Mas a verdade é que cópias periódi­ que de outra fOIDI a seriam incompetí­
23
ca8 a cada dez anos, ou menoe, podem veis. estendendo assim a inteligibili­
vir a constituir..,e em um pesado encar­ dade dos registms digitalizados por
go fmanceiro. até mesmo quando oe cus­ uma ou duas gerações da tecnologia.
tos dos meios de Bnnazenagem são ex· Existem oult-as noru,AS internacionais
tremamente baratos.21 As nOI'IUAS para em desenvolvimento. que. juntamente
intercâmbio de dados. que tratam da com o IRDS. formam um conjunto de
migração pera novas ve rsões de siste­ normAS as quais, caSO obtenham ade­
mas ou para novos sistemaa, podem são, poderão no curto prazo contribuir
estender o tempo entre cópias de dez. pera a solução de muitos dos problemas
por exemplo. para vinte anos. Essas da obsolescência tecnológica.
mesmas normas podem também ser
utilizadas na trallBição entre gerações
das tecnologias computacionais.
A manutenção da legibilidade da in­ Conclusão
fOlD18ção digitalizada ao longo do tempo
não garante a recuperabilidade e a in­ o que está em jogo pera o acesso
teligibilidade quando o 80ftwwe e os futuro aos registros digitalizados é o
78 ES1'UDOS HISTÓRICOS - I 994J1 S

Ieconhecimento fundamental de três preende a base inu.lectual para 0 desen­


principios. Primeiro, a ênfase que a volvimento de fenamentas e llDI'lII8S
arquivologia atribui às relações con­ capazes de oferecer à comunidade da
textuais dos registl\lG é essencial para infol'mação, em um sentido mais amplo,
a fidedignidade dos registros digitali­ indicadores sólidos da fidedignidade,
zados. Segundo, a importância atribuÍ­ auu.nticidade e condições de uso que se
da pela arquivologia à prou.ção dos tornarão cada vez mais importantes no
registlos contra a "adulu.ração" está futuro.
na base da garantia da auu.nticidade
dos registros digitalizados. Terceiro, a
relevância do princípio da arquivologia
de que a meta última da preservação é Notas
o acesso ao longo do u.mpo pode moldar
o desenvolvimento de fenllmentas e 1. TI", New York 71"",. Book Reuiew, 2
estratégias capazes de lidar com o pro­ de maio de 1993.
blema da obsolescência tecnológica. 2. Na verdade, seria o caso de reformu­
A promoção do desenvolvimento e a lar a frase de Fustel de Coulanges "Sem
fonles não há história" como "Sem fonles
implementação de n0I11188 internacioa
confiáveis não há história confiável". Aran­
naia que reflitam eeBee bêa princípioe
te desta nova frase é Ernst Posner, Are/d­
da arquivologia nos trazem a esperança
ve. in ti", AncielLt Wor/d (Cambridge, Har­
da superaçâo dos obstáculos inu.rpostos vard University Pres., 1972), p. 12.
à aplicação de novas tecnologias da in­
3. "Reinventing realityjust got easier ,
"

formação hoje e no futuro. Conseqüen­ Imaging. lhe lmaging Industry Magazine,


u.menu., os arquivistas devem procurar vol. 5, n' 2, ago 1993, p. 28.
compreender como opera o processo do
4. A exposição a seguir leva em conta
desenvolvimento e da implementação sobretudo a situação dos EUA, com a qual
de noilHAS , identificar e concentrar-se estou mais familiarizado. Mas não se deve
nas nOrInA8 de maior relevância para os esquecer o fato de que em qllQ!e todOB os
princípios da arquivologia e envolver-se países da América existem instituições que
ativamenu. no processo de desenvolvi­ coletam e tomam clis}XIJÚveis dados históri·
mento e implementação. Esse envolvi­ C08 digitalizados.

mento deve incluir a participação no 5. liDados" são aqui definidos como códi·
projeto dos catálogos de recursos infol"­ gos numéricos ou aJfanumériC"08 cqjo valor
macionais ou dos sisu.mas de metada­ é explicado pelos metadados (isto é, pela
dos, para garantir que os catálogos de documentação). "Thxto", a sua vez, é defini­
fato venham a conu.r toda a infol'lllação do como o materiaI documental tradicional
(por exemplo, cartas, livI'os e Assemelha­
contextual essencial à plena compreen­
dos), que é auto-referencial, não exigindo
são dos regist:oo em questáo. Os arqui­
documentação externa para ser inteligível.
vistas também devem envolver-se com
6. o que segue baseia-eeem grande parte
a elaboração do IRDS para assPgurar
em um ensaio rudimentar de Avra Michel­
que a nOIm a deu.rmine funções relacio­
.on e JeffRothenberg, "Scholary communi­
nadas com a proveniência.
cation and infonnation technology: expio­
As novas tecnologias da informação ring the impact of changes in the research
náo mudaram nem é provável que con­ pl"OCeS8 on archives", TI� American Archi­
sigam mudar a natureza dos regisboo vist, vol. 55, n' 2 (primavera de 1992), p.
como provas de ações e transações, que 236-315.
tém um contexto especifico de criação e 7. Op. cit., p. 226.
uso. Esse aspecto da arquivologia com- 8. (The British Academy, 1993).
TECNOLOGIAS DA INFORMAÇÃO DIGITALIZADA 79

9. É claro que se podem produzir suces­ tação, embora não té:u ,iea, encontra-ee em
sivas geraç'-:5 de cópias do documento em Bany Cipra, �ecbvnic timestamping: the
papel. notary public gcca digital", Science, vol. 261,
10. Trata�e do microfi}me em preto e jul l993, p. 162-163.
branoo com emulsão 8 base de sal halóide de 20. Em 1986, em um seminário na
prata, prc-4saado quimicamente de acordo OCLC, em Colwnbus, Ohio, defini a plftrer­
com a ANSI PH1.28. Ver preseJvaticm of vação doe regisbve eletrôni"-'8 oomo a ma _

lU.torical ,ocol'CÚI (Washington, DC, Natio­ nutenção do aoruo ao longo do tempo. Uma
nal Research Council, 1986), p. 49-55. exprusão mais feliz dcsse conceito é "ptv­
11. Isto não vale para a cópia de segunda exS8amento.contlnuo", introduzida por Dou­
geração, na qual a perda de informoção de glas van Houweling. Ver M. Stuart 4'nn e
wna geração para outra pode chegar a 20%. o 'Thchnology A-s8!sment Adviaory Com­
12. Para uma excelente avaliação, ver mittee to the Commie-ion on P.:aervation
Hans Rutimann e H. Stusrt. Lynn, '�mpu­ and AoocJtA , Pl'eBeJvatinn, and. Q")'Y',88 techllo­
terization Project of the Archivo General De wgy, ti", relationship between digital culd
olher media ccmverawn processes: a strllctll­
lndias, Seville, Spain", The Commission on
redgloasaJ'Y oftecllnical l6m8 (Commi ..ion
Preservation and Af1(f58 (Washington, mar·
on Prseervation and Arorre, age 1990), p. 3.
ço de 1992).
13. Conversa oom o autor, 11 de maio de 21. Enquanto o custo por byte oontinua a
1993. declinar para 08 meios de armazenagem, o
volume da informação digitalizada a exigir
14. Miehael Lask, "Image formais for
reoopiagem periódica Clesoe dramatica­
preservation and aoce3s", A report af the
mente. O desafio básico será então a taxa de
7l!clmology Asse8snumt Aduisory Commit­
transferência de dados relativamente baixa
tu to the Commission on Pl'eservation OJ,d
doa dispositivos disponíveis, sobretudo da­
Acc... (Washington, 1990).
queles fabricados para o meltAdo consumi­
15. Anne R. Kenney, Pl'ese1l)ing orehi­ dor (por exemplo, dl'Íues de fite DATou QIC
ual material t"l'Oug" digital tecJ"'DÚ>qy (l t­ e cassetes), Cl.\io ponto crítioo é o preço, e não
haca, New York, Cornell University, 1993). o desempenho. Dado o awnento substancial
16. O conceito de "não·adulterado" é ex­ no volume da infonnação digitalizada, as
traído de Lester K Bom, 'The De Archivis baixas taxas de transferência podem dificul­
Commentarius ofA1bertino Ban.oni (1587- tar muito, em te.nnoe financeiros e de tem­
-1667Y', AJ'chiuali8che 7...ü8Ch,.if/., n· 50-51, po, a OOpi8 dos dados para a próxima gera­
1955, p. 21, o qual, a sua vez, cita Justinia­ ção da teuiologia.
no.
22. Para lima das primeiras desaições
17. Boa parte dessa exposição está calca­ de alguns de!SE3 problemas, ver Charles
da em UArchivists and tecoreis managers in Dollar, "Documentation af machine reada.­
the information age", que será publicado em. ble records and research: a historians' view",
AJ'cJuool'ia. P,owglle: TI", Joul1lal of ti", National Ar­
18. Para wna boa apresentação daarqui­ cJliues, vol. 3, primavera de 1971, p. 27-31.
tetura cliente-servidor, ver ElJen Ullman,
23. Sistemas incompatíveis de so{tware
"Client/server ficcs data", Byte, vol. 18, n9 7, também incluem softwares que se torna­
jun 1993, p. 96-106.
ram obsoletos.
19. Para uma apresentação informativa
do "carimbo nwncrador digital", ver Peter
Graham, "Intellectual pteservation in the
electronic environrnent''. em Arnold Hirs­
Not,,: Este texto foi lido pelo professor
hon (org.),Afle,. ti", ,..,uollltio/l willYOIl b. ti", Charles Dollar 'no Seminário ·CPDOC 20
fil'.t ID go? (Chicago, American Library As­ anos". A tradução é de Francisoo de Castro
sociation, 1993), p. 24-33. Uma boa apresen- Azevedo.

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