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Faculdade de Direito de Bissau

Centro de Estudos e de Apoio às Reformas


Legislativas

Regime jurídico do uso, ocupação e transformação


do solo em vigor na Guiné-Bissau

Adilson DYWYNÁ DJABULÁ

Setembro de 2009
0
Plano de trabalho

1. Introdução

2. Os principais instrumentos jurídicos que disciplinam o uso de solo na Guiné-


Bissau

3. Propriedade da terra nos principais instrumentos jurídicos sobre o solo, em


especial na Lei da Terra

4. O regime de concessão de terrenos na área limítrofe de Bissau

5. O uso do solo na Lei de Minas e dos Minerais

6. O uso do solo na Lei das Pedreiras

7. O uso do solo no Código de Águas

8. O uso do solo na Lei Florestal

9. O uso do solo no Projecto de Lei de Bases do Ambiente e nos seus


instrumentos de execução (AIA)

10. Os planos urbanísticos e a gestão do solo

11. O uso do solo no Código Civil

12. Os solos marítimos

13. A gestão do solo no Direito Comunitário, em especial o Código Mineiro


Comunitário

Conclusões

1
1. Introdução

1.1. Razões justificativas do âmbito do estudo

A questão da titularidade da propriedade do solo e da sua gestão


racional é problema comum a todas as sociedades humanas. São vários os
argumentos que permitam sustentar esta afirmação.

Em primeiro lugar, o solo é suporte físico necessário a todas as


realizações do homem, e, em geral, de todos os seres vivos.

Em segundo lugar, o solo é instrumento indispensável à satisfação de


necessidades básicas do homem, nomeadamente o solo urbano é um
instrumento de concretização do direito fundamental à habitação.

Em terceiro lugar, o solo pela sua característica é um bem, embora


aparentemente em abundância, rara e irreproduzível. Salvos casos pontuais da
actividade humana de conquista de porções do mar pela extensão da terra e de
efeitos de erosão, o solo é um bem condenado à inércia estática. Pode-se
afirmar, sem grandes reservas, que a superfície de solo de hoje é igual a que
há 100 séculos atrás a humanidade conheceu.
Do mesmo modo pode-se afirmar que a superfície geográfica da Guiné-
Bissau continuará a ser a mesma daqui a 200 séculos, não havendo, sublinha-
se, o fenómeno de fusão dos Estados ou de cisão do Estado. Ainda que se
possa falar do processo contínuo de transformação da terra, a confirmar este
fenómeno, deve-se dizer que ela só lentamente ocorre.

Em quarto lugar, além das características assinaladas, deve-se


acrescentar ainda, que o solo agrícola é instrumento de produção de alimentos
para os seres vivos inclusive para aqueles que vivem nas águas dos mares ou
que vivem predominantemente no espaço aéreo.

2
Na Guiné-Bissau, a questão da titularidade da propriedade e da sua
gestão racional tem suscitado, não menos frequentemente, debates públicos.

Pelo curto passeio nos Bairros de Bissau, salta logo à vista a questão de
uma falta de política racional e eficiente de gestão dos solos.
As principais referências dos Bairros de Bissau que podem marcar logo
a atenção de um transeunte são: conjunto de casas precárias; falta de acesso
das habitações à via pública; falta de esgotos públicos e saneamento básico.
Ou seja, percebe-se logo pala representação destes aspectos, que são
matérias nucleares do Direito do Urbanismo, que ainda que possam existir
algumas normas jurídicas a esse respeito, não se pode falar, na verdade, da
existência do Direito de Urbanismo na Guiné-Bissau, na medida em que as
supostas normas não conseguem modelar a conduta de maior parte dos seus
destinatários.

Por outro lado, não raras vezes assistimos, em presença ou pelas


media, a disputas entre os particulares e entre estes e o próprio Estado sobre a
titularidade de parcelas de terrenos e minifúndios rurais.
No caso destas últimas, o Estado aparece sempre alegando a sua
titularidade sobre solo contra qual, geralmente, se opõem os particulares,
contra-alegando-se o título costumeiro.
Na verdade, a questão da titularidade da propriedade da terra nem
sempre parece clara, nem para o legislador guineense e muito menos para o
cidadão comum.

Com ascensão à independência da Guiné-Bissau em 1973 e por


aplicação da Lei 1/731, o país passou a herdar legislações, do período colonial
de matriz quase liberal, inspiradas numa lógica de propriedade privada do solo
como expressão de garantia de direitos fundamentais dos cidadãos, o caso,
por exemplo, do Código Civil português de 1966 e da Lei n.º 2030, de 22 de

1
Publicada no B. O. n.º 1 de 4 Janeiro de 1975.

3
Junho de 1948 sobre a expropriação de imóveis, ainda hoje em vigor na Guiné-
Bissau.
A par destas legislações o Estado foi adoptando, depois da
independência, legislações avulsas, com incidência sobre utilização e
aproveitamento dos solos, as mais das vezes contraditórias, mormente no que
diz respeito à questão da titularidade da propriedade do solo.

A esse propósito parece legítimo e pertinente a pergunta: qual o regime


do utilização do solo em vigor na Guiné-Bissau?

Eis o objectivo dessa curta digressão pelos instrumentos jurídicos que


disciplinam a utilização e aproveitamento dos solos na Guiné-Bissau: procurar
dar respostas a essa questão curiosa.

1.2. Delimitação

Nesta digressão pelos instrumentos jurídicos que disciplinam a utilização


do solo, pouca atenção será dada aos comentários doutrinários sobre esta
matéria. Pois o objectivo fundamental deste estudo é apurar o direito
efectivamente em vigor na Guiné-Bissau sobre o uso, ocupação e
transformação de solo.
Sendo este o objectivo do presente estudo, a nossa análise aos
instrumentos jurídicos terá um pendor marcantemente descritivo.
O estudo terá com objecto principal o solo, dizendo por outras palavras,
a terra ou o território na sua acepção restrita de território terrestre e território
marítimo submerso.

Na medida em que a compreensão do regime do solo ficaria incompleta


sem tomar em consideração actividades humanas conexas ou com uma
influência indirecta sobre a utilização do solo, serão ainda tomadas em
consideração neste trabalho outros instrumentos jurídicos que disciplinam tais
actividades humanas com incidência indirecta sobre o solo, tais como o Código
4
das águas, a Lei Florestal, a Lei-Quadro das Áreas Protegidas e os seus
instrumentos de execução; e o Projecto de Lei de Base do Ambiente e os
respectivos instrumentos de aplicação.

Por razões que têm a ver com a exiguidade do tempo e da falta de


documentação legal, não vamos falar no presente estudo da Lei do petróleo, da
Carreira e do Regulamento de Ocupação e Concessão de Terrenos nas
Províncias Ultramarinas, parcialmente revogado pela Lei da Terra2.

1.3. A intervenção reguladora do Estado no mercado do solo

O solo tendo em conta suas características, a sua gestão racional de


forma a garantir a sua disponibilidade as gerações futuras constitui um
imperativo para todos os Estados, na sua missão principal de prossecução do
interesse colectivo.
Deixar que os particulares utilizam os solos como entendem, quando
entendem, construindo casas ou retendo grandes porções de solos com fins
meramente especulativos sem construir ou realizar neles qualquer actividade,
poderá criar grandes inconveniências para o interesse público.
Em primeiro lugar, a utilização irracional do solo poderá levar, a longo
tempo, ao seu esgotamento face a um aumento cada vez maior do número da
população mundial acompanhado, consequentemente, da multiplicação de
necessidade de uso do solo, ante a particularidade natural do solo ser um bem
irreproduzível.
Em segundo lugar, a retenção ou entesouramento dos solos com fins
especulativos terá como consequência imediata o encarecimento dos terrenos.
E por conseguinte, o encarecimento de terrenos poderá levar à implementação
de bairros em zonas afastadas, o que origina:

2
O Regulamento foi aprovado pelo Decreto n.º 43894, de 6 de Setembro de 1961 e publicado
no Suplemento ao Boletim Oficial n.º 38.

5
i) O desordenado crescimento das infra-estruturas urbanísticas e dos
equipamentos sociais;
ii) Afastamento de locais de trabalho dos habitantes;
iii) Repercussões nos orçamentos familiares e na economia geral.

Com efeito, o facto de o solo ser indispensável à satisfação das


principais necessidades humanas e de não ser reprodutível impede que a sua
utilização seja abandonada completamente ao jogo não controlável da livre
iniciativa e à vontade do particular. Uma ordem social e jurídica justa exige,
pelo contrário, que os interesses gerais sejam salientados no caso do solo
numa medida mais forte do que nos outros bens económicos.
O solo por causa da sua do seu significado tanto económico, como
social não é equiparável sem mais aos restantes bens económicos.

Portanto uma intervenção do Estado (Administração Pública), torna-se


necessária com o objectivo de: i) combater a especulação fundiária através de
medidas de estimula ao aumento de oferta de solos por iniciativa dos
particulares e medidas dissuasoras da retenção de solos urbanos; ii) satisfazer
as necessidades das pessoas colectivas públicas de base territoriais, de
terrenos para espaços verdes públicos e de utilização colectiva, infra-estruturas
e equipamentos públicos; iii) constituir reservas de solos nas mãos de
entidades públicas com um duplo fim:

a) Introduzir no mercado do solo um factor de correcção das disfunções,


através da colocação à disposição dos promotores privados de
terrenos a preço não especulativos e possibilitar a realização de
operações urbanísticas por iniciativa e responsabilidade pública;
b) Promover e incentivar as operações de renovação urbana.

Portanto, o solo não pode ser tratado no comércio como um bem móvel.
Ou seja, esclarecendo-se, a necessidade de intervenção da Administração nos
solos se justifique a dois níveis: resolver o problema da disponibilidade de solos
à geração presente e futura para os diferentes usos, v.g., urbanização e
6
construção, agricultura, pecuária e espaços de lazeres; combater a
especulação fundiária e incentivar a reconstrução e a reabilitação em
detrimento das novas construções.

A intervenção da Administração Pública nos solos pode assumir várias


formas entre as quais podemos encontrar as medidas de nacionalização de
solos e sua consequente sujeição ao regime de bens dominiais. Ou seja, com a
sujeição do solo ao regime de bens dominiais o Estado pretende, pela
importância social de bem e devido à sua característica particular de ser um
bem irreproduzível, retirar o bem em causa do comércio jurídico entre os
particulares. É o que se passa entre nós, com a Lei nº 4/75, de 5 de Maio de
1975, que nacionalizou o solo, pela sua integração no domínio público.

2. Os principais instrumentos jurídicos que disciplinam o uso de solo na


Guiné-Bissau

Na Ordem jurídica guineense existe um conjunto de instrumentos


jurídicos de origem interna e internacional que disciplina o uso do solo. Em
relação aos de origem interna, encontramos:
A Constituição da República da Guiné-Bissau de 1984, na versão revista
e aprovada pela Lei Constitucional n.º 1/96, publicada no B. O. n.º 50 de 16 de
Dezembro de 1996. A Constituição em vários artigos dispersos fala da questão
da titularidade de direito sobre solo, da forma de acesso dos particulares ao
uso do solo e da competência legislativa em matéria dos solos.
O Regulamento da Capitania dos Portos da Província da Guiné,
aprovado pelo Decreto n.º 209, de 7 de Novembro de 1913, e publicado no
Suplemento ao B.O, n.º 52. O Regulamento estabelece a competência das
autoridades marítimas e portuárias sobre a gestão da faixa costeira.
O Foral da Câmara Municipal de Bissau, aprovado pelo Diploma
Legislativo n.º 1.415, de Junho de 1948, e publicado no Suplemento ao B.O n.º
24, de 15 de Junho de 1948. Posteriormente foi alterado pelo Diploma
Legislativo n.º 1.757, de 27 de Maio de 1961, publicado n.º B.O. 21, de 27 de
7
Maio de 1961. O Foral Regula a concessão urbana de terrenos no Sector
Autónomo de Bissau.
A Lei da expropriação de imóveis, Lei n.º 2.030, de 22 de Junho de
1948, publicada no Diário do Governo, I Série, n.º 143, de 22 de Junho de
1948. Para a garantia dos particulares cujos imóveis foram expropriados,
encontramos a Lei n.º 2.063, de 3 de Junho de 1953, sobre recursos em
matéria de expropriações por utilidade pública, publicada no Diário do Governo,
I Série, n.º 117, de 3 de Junho de 1953.

A regulamentação exclusiva ou específica sobre uso, ocupação,


transformação e aproveitamento dos solos poderá ser encontrada: na Lei n.º
4/75, de 5 de Maio de 1974, publicada no B.O n.º 19, de 10 de Maio de 1975;
no Decreto-Lei n.º 4/86, de 29 de Março de 1986, publicado no Suplemento ao
B.O n.º 13, de 29 de Março de 1986; na Lei da Terra, Lei n.º 5/98, de 28 de
Abril de 1998, publicada no Suplemento ao B.O n.º 17, de 28 de Abril de 1998;
e na Lei de Minas e dos Minerais, aprovada pala Lei n.º 1/2000, de 24 de Julho,
publicada no B.O. n.º 30, de 24 de Julho de 2000.
A Lei n.º 4/75, de 5 de Maio de 1974, integra o solo no domínio público
do Estado; o Decreto-Lei n.º 4/86, de 29 de Março de 1986 estabelece o
regime jurídico sobre a exploração de pedreiras; e a Lei n.º 5/98, de 28 de Abril
de 1998, conhecida pela Lei da Terra, vem regulamentar o regime geral de
utilização das terras por particulares.

A par destes instrumentos jurídicos encontramos ainda muitos outros


com incidência secundária, indirecta ou parcial sobre o solo, é o caso da Lei
Florestal, aprovada pelo Decreto-Lei n.º 4-A/91, de 29 de Outubro de 1991 e
publicada no Suplemento ao B.O n.º 43, de 29 de Outubro de 1991; do Código
de Águas, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 5-A/92, de 17 de Setembro de 1992;
do Código Civil Português, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 47.344, de 25 de
Novembro de 1966, publicado no B.O n.º 38.º, de 25 de Setembro de 1967. Por
Portaria n.º 22.869 do Ministério do Ultramar, de 4 de Setembro de 1967, o
Código foi extensivo às, então, províncias ultramarinas, entre as quais se
encontrava a que agora é conhecida por República da Guiné-Bissau.
8
Continuando ainda em perseguição dos instrumentos jurídicos com
incidência secundária ou indirecta sobre o solo, deve-se referir ainda à Lei-
Quadro das Áreas Protegidas, aprovada pelo Decreto-Lei. n.º 3/97 e publicada
no Suplemento ao B.O. n.º 21, de 26 de Maio de 1997. Em sua execução foram
emanados vários outros instrumentos de execução o caso do Decreto de
criação do Parque Nacional do Grupo de Ilhas de Orango (Decreto n.º 11/00,
publicado no B.O. n.º 49, de 4 de Dezembro de 2000); do Decreto de criação
do Parque Natural dos Tarrafes do Rio de Cacheu (Decreto n.º 12/00,
publicado no B.O. n.º 49, de 4 de Dezembro de 2000); do Decreto de criação
do Parque Natural das Lagoas de Cufada (Decreto n.º 13/00, publicado no B.O.
n.º 49, de 4 de Dezembro de 2000); do Decreto de criação do Parque Nacional
Marinho João Vieira Poilão (Decreto n.º 6-A/00, de 23 de Agosto, publicado no
2º Suplemento ao B.O. n.º 34, de 23 de Agosto de 2000); do Decreto de
criação da Área Marinha Protegida Comunitária das Ilhas de Formosa, Nago e
Chediã (Ilha Urok) (Decreto n.º 8/05, publicado no Suplemento ao B.O. n.º 28,
de 12 de Julho de 2005).

Paralelamente aos instrumentos jurídicos que se encontram em vigor


merece ainda assinalar, pela sua importância, um conjunto de incitativas
logísticas com uma projecção sobre a utilização dos solos. Trata-se a
Anteprojecto de Lei de Base do Ambiente de 2008; Proposta do Projecto de Lei
sobre a Avaliação Ambiental, aprovada no Conselho de Ministros de 19 de
Março de 2008, Proposta de criação do Parque Nacional de Cantanhez,
Decreto n.º __/2007, respectivamente3.
Com enfoque para os espaços marítimos, deve-se referir à Lei n.º 2/85
de 17 de Maio 1985, publicada no Suplemento ao B.O. n.º 19, de 17 de Maio
de 1985, que estabelece as linhas de base rectas a partir das quais é medida a
largura do Mar Territorial; e à Lei n.º 3/85 de 17 de Maio 1985, publicada no
Suplemento ao B.O. n.º 19, de 17 de Maio de 1985, que fixa a largura do Mar

3
Uma fonte a que conseguimos ter acesso fala da aprovação da proposta em causa no Conselho de
Ministros.

9
Territorial e da Zona Económica Exclusiva, respectivamente a 12 e 200 milhas
marítimas e acolhe o conteúdo da Sentença Arbitral de 14 de Fevereiro de
1985, sobre a delimitação das fronteiras marítimas entre a República da Guiné-
Bissau e a República da Guiné.

No que tange aos instrumentos jurídicos de origem internacional,


encontramos:
Em primeiro lugar, a Convenção luso-francesa de 12 de Maio de 1886,
sobre a delimitação da fronteira terrestre entre, por um lado, a Guiné-francesa
e a Guiné-portuguesa e, por outro lado, entre esta última e o Senegal.

Em segundo lugar, o Acordo luso-francês de 26 de Abril de 1960, sobre


a delimitação da fronteira marítima entre o Senegal e a Guiné-Portuguesa.
Entre outros espaços, o Acordo determinou a fronteira do Mar Territorial e da
Plataforma Continental entre os dois países.

Em terceiro lugar, o Acordo de Gestão e de Cooperação entre o


Governo da República do Senegal e o Governo da República da Guiné-Bissau
de 14 de Agosto de 1993. Através deste Acordos as partes criaram uma zona
marítima de exploração comum e uma entidade internacional a quem foi
confiada a competência para gestão e exploração dos recursos existentes na
zona. Na sequência deste Acordo foi concluído entre as partes, em 12 de
Junho de 1995, um Protocolo de Acordo, Relativo à Organização e ao
Funcionamento da Agência de Gestão e de Cooperação entre a República do
Senegal e a República da Guiné-Bissau, instituída pelo Acordo de 14 de
Outubro de 1993.

Em quarto lugar, a Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do


Mar de 10 de Dezembro de 1982, (Convenção de Montego Bay). A Convenção
de Montego Bay é o principal instrumento jurídico de Direito Internacional que
estabelece o estatuto jurídico dos solos marinhos. A Convenção foi ratificada

10
pela Guiné-Bissau em 25 de Maio de 19864, e entrou em vigor em 16 de
Novembro de 1994, ou seja, um ano depois do depósito do sexagésimo
instrumento de ratificação pela Guiana, ex vi do disposto no art. 308.º, n.º 1 do
respectivo texto.

Em quinto lugar, temos ainda que contar com o Código Mineiro


Comunitário da UEMOA, adoptado pelo Regulamento n.º 18/2003/CM/UEMOA
de 23 de Dezembro de 2003. O Código regula o conjunto das actividades
relativas à prospecção, pesquisa, exploração, detenção, circulação, tratamento,
transporte, possessão, transformação e comercialização de substâncias
minerais em todo o território da União.

3. Propriedade da terra nos principais instrumentos jurídico sobre o solo,


em especial na lei da terra

3.1. A competência legislativa em matéria do solo

Nos termos da Constituição guineense em vigor a competência


legislativa em matéria do solo pertence à Assembleia Nacional Popular. Assim,
nos termos do 86.º, compete à Assembleia Nacional Popular legislar sobre as
seguintes matérias: b), estatuto da terra e a reforma da sua utilização; j),
definição dos limites das águas territoriais da zona económica exclusiva.
Igualmente no art. 87.º, a Constituição reconhece a competência
legislativa à Assembleia Nacional Popular, mas, desta vez, salvaguarda a
possibilidade do Governo legislar mediante da Assembleia Nacional Popular
sobre as seguintes matérias: expropriação e requisição por utilidade pública al.
c); delimitação dos sectores de propriedade e das actividades, entre outras.

4
Sobre a data da ratificação da Convenção pela Guiné-Bissau, vide a lista cronológica de
ratificações, adesões e sucessões à Convenção Unidas, de 20 de Julho de 2009, disponível no
http://www.un.org/Depts/los/reference_files/chronological_lists_of_ratifications.htm#The United
Nations Convention on the Law of the Sea.

11
Esclarecendo, nos termos do art. 87.º, da CRGB, a Assembleia Nacional
é o único órgão com competência para dizer a quem pertence a propriedade da
terra na Guiné-Bissau, quais são os poderes do seu proprietário, como é que
os terceiros poderão ter acesso ao uso do solo, al. b); é também à Assembleia
Nacional Popular a entidade que cabe fixar os limites do Mar Territorial e da
Zona Económica Exclusiva.

Uma prevenção é necessário fazer em relação a este segundo espaço


marítimo. A zona económica exclusiva não abrange o solo e subsolo marinho.
Por esta razão não interessa à linha mestra deste estudo. Porém, em relação
aos solos e subsolos marítimos que ficam além do Mar Territorial, ou sejam,
além das 12 milhas marítimas, Plataforma Continental, a Constituição
guineense é completamente omissa. Não faz nenhuma referência à Plataforma
Continental e muito menos quanto à competência legislativa sobre esta
matéria.

Nos termos do art. 87.º, à ANP é reconhecida a competência relativa


para legislar sobre as matérias supracitadas. Ou seja, tanto a ANP assim como
o Governo, mediante a autorização legislativa da ANP, podem legislar sobre a
matéria da expropriação dos imóveis, requisição por utilidade pública e sobre a
delimitação dos sectores de propriedade e das actividades económica.
Esclarece-se, tanto a ANP assim como o Governo podem, ao abrigo
desta competência, determinar o regime de passagem de imóveis dos
particulares para as entidades públicas por motivo de interesse público
(expropriação); o regime de uso temporário dos bens dos particulares por
entidades públicas; ou ainda decidir sobre os bens que pertencem às entidades
públicas e os que não lhes pertencem.

3.2. O Estado guineense era, foi e é dono da terra...

A Guiné-Bissau ascendeu à independência numa altura em que não


estava preparada para produzir instrumentos jurídicos para todos os sectores
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da vida social, onde vigoram as legislações coloniais. Assim, por Lei 1/73, o
Estado guineense não hesitou em manter em vigor todas as legislações
colónias que à data da independência vigoravam no seu território sob a
condição única de não contrariarem as regras e princípios de novo Estado. No
entanto, os instrumentos jurídicos anteriormente em vigor tinham uma matriz
ocidental, inspirada mais numa lógica liberal, que, ao lado da propriedade do
Estado, reconhecia aos particulares a possibilidade de constituição de direito
de propriedade sobre o solo.
A Constituição de 1973, apesar de se assentar numa lógica socialista de
organização do Estado, onde a questão do uso do solo constitui uma matéria
de interesse fundamental do Estado e onde o solo é submetido, geralmente, ao
domínio público do Estado, é completamente omissa quanto ao estatuto dos
solos e subsolos, assim como em relação à matéria de delimitação dos
sectores da propriedade.

Em 1974, o Estado guineense quebrou o silêncio com a publicação da


Lei n.º 4/75, de Maio de 1975, que nacionaliza os solos pela sua integração, na
totalidade, no domínio público do Estado, salvaguardando contudo os direitos
dos particulares sobre as implantações ou construções realizadas sobre os
solos desde que ostentam sinais de uma ocupação evidente e uma valorização
efectiva do terreno.

Eis o conteúdo do diploma:

BASE I
«O solo, na totalidade do território nacional, quer seja urbano, rústico ou
urbanizado, é integrado no domínio público do Estado, sendo insusceptível de
redução a propriedade particular».

BASE II
«Sem prejuízo dos direitos dominiais do Estado sobre os terrenos em
que estão implantados, são continuados os direitos dos particulares sobre as

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construções, culturas e quaisquer benfeitorias realizadas nesses terrenos, os
quais se consideram em seu uso e fruição a título de concessão».

BASE III
«As construções, culturas e outras benfeitorias a que se refere a base
precedente deverão revelar, para que se produza o efeito nela prescrito, uma
ocupação evidente e uma valorização efectiva do terreno».

BASE IV
«O Conselho dos Comissários de Estado fixará, por decreto, as
modalidades de concessão de terrenos».

Na esteira desta Lei, a Constituição de 1984, embora profundamente


influenciada pelo modelo de organização do Estado previsto na Constituição de
1973, procurou fazer a distinção entre os sectores da propriedade. Nos termos
do art. 12.º, consagra três sectores da propriedade: propriedade do Estado,
propriedade cooperativa e a propriedade privada.
A propriedade do Estado é considera como o património comum de todo
de todo o povo (al. a)). A propriedade cooperativa é considerada como aquela
que é organizada na base de livre consentimento e que incide sobre a
exploração agrícola, a produção de bens de consumo, o artesanato e outras
actividades fixadas por lei (al. b)). Por fim a propriedade privada é definida por
exclusão de partes. Ou seja, considera-se como propriedade privada aquela
que incide sobre bens distintos dos do Estado.
Proclamando a propriedade do Estado como património comum de todo
o povo, e em estrema sintonia com a Lei da nacionalização dos Solos, a
Constituição de 1984, considera agora expressamente como propriedade do
Estado o solo, o subsolo, as águas, as riquezas minerais, as principais fontes
de energia, a riqueza florestal, os meios básicos de produção industrial, os
meios de informação e comunicação, os bancos, os seguros, as infra-
estruturas e os meios fundamentais de transporte (art. 12.º, n.º 2).

14
Vista estas normas isoladamente, à partida, podia-se pensar que é de
todo impossível a fruição dos solos pelos particulares.
Todavia, não obstante a nacionalização dos solos pelo Estado e não
obstante a distinção clara feita pela Constituição entre o que pertence ao
Estado e o que pode pertence aos particulares, a Constituição de 1984 permite
o acesso dos particulares à exploração da propriedade estatal, através da
concessão, desde que esta sirva o interesse geral e aumenta as riquezas
sociais.

A versão do texto actual da Constituição guineense, apesar de se


desviar da versão primitiva da Constituição de 1984, quanto ao modelo de
organização do Estado e da economia, mostrando-se aberta à iniciativa e à
propriedade privadas, pela consagração de um modelo de economia do
mercado, continua presa àquela no que tange à questão da propriedade do
solo e dos recursos nele existentes, pela reprodução, quase servil, do conteúdo
dos artigos 12.º e 13.º daquela.
Assim, nos termos do art. 11.º da actual versão da CRGB, «a
organização económica e social da República da Guiné-Bissau assenta nos
princípios da economia de mercado, da submissão do poder económico ao
poder político e da coexistência das propriedades pública, cooperativa e
privada» (n.º 1).
«A organização económica e social da República da Guiné-Bissau tem
como objectivo a promoção contínua do bem-estar do povo e a eliminação de
todas as formas de sujeição da pessoa humana a interesses degradantes, em
proveito de indivíduos, de grupos ou de classes.

Pelo art. 12.º, n.º 1, estabelece que «na República da Guiné-Bissau são
reconhecidas as seguintes formas de propriedade:
a) A propriedade do Estado, património comum de todo o povo;
b) A propriedade cooperativa que, organizada sob a base de livre
consentimento, incide sobre a exploração agrícola, a produção dos
bens de consumo, artesanato e outras actividades fixadas por lei;

15
c) A propriedade privada, que incide sobre bens distintos dos do
Estado».

Já no n.º 2 do mesmo artigo, e diferentemente do art. 12.º, n.º 2 da


versão primitiva, consagra agora um núcleo reduzido de bens insusceptíveis de
apropriação individual.
Considera agora como propriedade do Estado o solo, o subsolo, as
águas, as riquezas minerais, as principais fontes de energia, a riqueza florestal
e as infra-estruturas sociais (art. 12.º, n.º 2).
Ou seja, a Constituição reduziu agora a propriedade do Estado aos solos
e aos seus componentes naturais integrantes.

O n.º 2 do art. 12 da CRGB é muito restritivo quanto à propriedade do


Estado. Fala apenas da propriedade sobre imóvel.
Pois nos termos da lei civil considera-se imóveis os prédios rústicos e
urbanos; as águas; as árvores, os arbustos e os frutos naturais, enquanto
estiverem ligados ao solo; os direitos inerentes aos imóveis mencionados nas
alíneas anteriores; as partes integrantes dos prédios rústicos e urbanos (art.
204.º, n.º 1, als. a), b), c), d) e e) do CC).
Por prédio rústico entende-se uma parte delimitada do solo e as
construções nele, existentes que não tenham autonomia económica, e por
prédio urbano qualquer edifício incorporado no solo, com os terrenos que lhe
sirvam logradouro (n.º 2).
Por parte integrante entende-se toda a coisa móvel ligada materialmente
ao prédio com carácter de permanência (n.º 3).
Na categoria dos imóveis não se encontram as coisas móveis com
autonomia jurídica em relação aos imóveis, ou sejas, os móveis que não são
partes integrantes dos imóveis. É certo que o Estado tem também o direito de
propriedade sobre alguns dos bens móveis. Mas o art. 12.º, n.º 2 da CRGB
quando faz a enumeração dos bens que integram a propriedade do Estado,
deixa de fora os bens móveis com autonomia jurídica. Muito provavelmente, o
legislador ao fazer a enumeração dos bens que integram a propriedade do

16
Estado estava a pensar mais naquelas propriedades integradas no domínio
público do Estado e não em todas as propriedades do Estado.

Por uma análise atenta do disposto no art.11.º e no 13.º, n.º 1 da CRGB,


podemos constatar que há uma estreita conexão entre as duas disposições. A
consagração de propriedade privada da terra segundo um modelo liberal puro,
regulado pelas leis do marcado, poderá conduzir a uma situação em que uns
teriam terras em abundância e outros ficavam sem nada, sem abrigo e serem
obrigados, por falta de terras próprias, para abrigo e produção de alimentos, à
sujeição dos barões da terra.

O Estado da Guiné-Bissau por se pugnar pela ideia da justiça na


repartição das riquezas, nos valores da dignidade da pessoa humana e na
igualdade entre as pessoas e se condenar expressamente a sujeição da
pessoa humana a interesses degradantes, em proveito de indivíduos, de grupo
ou de classes, (art. 11.º, n.º 2, art. 17. º, n.º 1, 2ª parte e art. 24.º da CRGB), e
por ter a consciência da importância do solo e do risco de um modelo de matriz
puramente liberal da propriedade privado do solo, quis garantir a todos o gozo
e fruição dos solos e das riquezas neles existentes através da sua submissão
ao regime dominial, na certeza de que estes bens passarão a integrar o
património comum de todo o povo e poderem ser colocados à exploração dos
particulares, através da concessão, desde que sirva o interesse geral e
aumenta as riquezas sócias5.

Nesta lógica dispõe a Lei da terra que na República da Guiné-Bissau a


terra é propriedade do Estado e património comum de todo o povo (art. 2.º, n.º
1. Na mesma lógica estabelece o n.º 2 do mesmo artigo que «a terra como
suporte físico fundamental da comunidade é valor eminentemente nacional,

5
Ainda que se admite o acesso dos particulares à exploração dos solos a título de direito de uso
privativo, o legislador guineense, muito provavelmente, consciente de que a concessão poderá levar à
retenção de grandes porções ilimitadas de solos a favor das pessoas com maior poder económico em
detrimento da maioria, procurou estabelecer limites máximos de áreas geográficas sobre as quais um
os
particular pode ser titular de direito de uso privativo. Vide o disposto no art. 15.º, n. 4 e 5 da Lei da
Terra.

17
qualquer que seja a forma da sua utilização e exploração». E no art. 4.º, n.º 1
estabelece que «a todos os cidadãos é reconhecido, nos termos da presente
lei, o direito de uso privativo da terra, sem discriminações de sexo, de origem
social ou de proveniência dentro do território nacional». E acrescenta o número
2 do mesmo artigo: «para fins de exploração económica, habitacional, de
utilidade social e outras actividades produtivas e sociais, o Estado pode conferir
direitos de uso privativo das terras a entidades nacionais ou estrangeiras,
individuais ou colectivas, tendo em conta o interesse nacional superiormente
definido nos planos e nos objectivos de desenvolvimento económico e social».

Nesta senda, em sintonia com o disposto no art. 12.º, n. 2, o art. 9.º


proclama que «a República da Guiné-Bissau exerce a sua soberania:
1) Sobre todo o território nacional, que compreende:
a) A superfície emersa compreendida nos limites das fronteiras
nacionais;
b) O mar interior e o mar territorial definidos na lei, assim como os
respectivos leitos e subsolos;
c) O espaço aéreo suprajacente aos espaços geográficos referidos
nas alíneas anteriores;
2) Sobre todos os recursos naturais, vivos e não vivos que se
encontram no seu território.

Para terminar, importa agora fixar o sentido jurídico da dominialidade


dos bens do Estado, ou o domínio público.
Antes de mais é preciso dizer que a dominialidade não se confunde com
a propriedade do Estado. O facto de um bem ser propriedade do Estado ou
dalguma entidade pública não significa automaticamente que ele passa a fazer
parte do domínio público do Estado ou daquela entidade pública. A propriedade
do Estado ou de qualquer entidade pública para integrar a categoria dos bens
dominiais públicos é necessário que haja uma lei que dispõe expressamente
neste sentido. De contrário, a propriedade fica integrada no regime de bens de
domínio privado do Estado ou da respectiva entidade pública.

18
No caso, porém dos solos, a Lei da nacionalização, na sua BASE I,
estatui expressamente que estes, na totalidade do território nacional, são
integrados no domínio público do Estado.

No art. 202.º, n.º 2 do CC se estabelece elementos característicos dos


bens do domínio público. De acordo com este artigo, «consideram-se, porém,
fora do comércio todas as coisas que não podem ser objecto de direitos
privados, tais como as que se encontram no domínio público e as que são, por
sua natureza, insusceptíveis de apropriação individual».
Significa isto que o solo, enquanto propriedade do Estado integrada no
domínio público, não pode ser objecto de relação jurídica, segundo as regras
de Direito Privado, entre os particulares. Ou seja, o solo não pode ser objecto
de compra e vende, doação ou transmissão entre os particulares nos termos
regulados pelo Direito Privado.
Dizendo isto, equivale dizer que o solo não é juridicamente uma coisa.
Pois nos termos do art. 202.º, n.º 1 do CC só é coisa o que pode ser objecto de
relações jurídicas.
Ora, dizendo isto não quer dizer que, necessariamente, não seja
possível em nenhum circunstância aplicar aos bens dominiais as regras do
Direito Privado.
O Direito privado pode ser aplicado aos bens dominiais a título
subsidiário ou supletivo e de uma forma qualificada, ou seja, não na sua forma
pura mas com as necessárias adaptações. Esclarecendo-se, com respeito da
natureza própria do domínio público. É o que dispõe o art. 1304.º CC.
De acordo com o seu conteúdo, «o domínio das coisas pertencentes ao
Estado ou a quaisquer outras pessoas colectivas públicas está igualmente
sujeito às disposições deste código em tudo o que não for especialmente
regulado e não contrarie a natureza própria daquele domínio».

19
3.3. O acesso dos particulares ao solo e as suas condicionantes

Na esteira da Lei da nacionalização do solo que na sua BASE II, que


nacionalizando o solo, salvaguarda os direitos dos particulares que se
traduzem em ocupações evidentes sobre solo, a título de concessão, a
Constituição da República da Guiné-Bissau, no seu art. 13.º, n.º 1 estabelece
que os particulares podem ter a acesso à exploração do solo, à propriedade
dominial do Estado, através da concessão.

Em desenvolvimento desta norma a Lei n.º 5/98, de 28 de Abril,


conhecida pela Lei da Terra, vem estabelecer o regime de utilização do solo
pelos particulares.
Pretendendo-se regulamentar a utilização do solo pelos particulares, a
Lei da Terra não se mostrou tão fiel à orientação constante no art. 13.º, n.º 1 da
Constituição. Na verdade, não consagra a concessão do solo como única via
através da qual podem os particulares acederem à utilização do solo. A par da
concessão, a Lei da Terra estabelece também uma nova figura através da qual
podem aos particulares acederem à utilização do solo: o uso consuetudinário.

Ou seja, nos termos da lei da terra há duas formas de os particulares


acederem à utilização do solo: a concessão ou uso consuetudinário.
Através de uma destas formas os particulares podem adquirir um direito
sobre o solo a que a Lei da Terra qualifica de direito de uso privativo (arts. 4.º,
n.º 1, n.º 2, corpo principal e 9.º).

Podem ser objecto de uso privativo, os terrenos rurais ou urbanos,


livres de ocupação, com exclusão das zonas de protecção integral e das
ocupadas pelo Estado para fins de utilidade pública (art. 9.º, n.º 1).
Nos termos do art. 3.º, g), considera-se terreno rural ou urbano livre de
ocupação todo o terreno não afecto a usos privativos, por uso consuetudinário
ou por concessão, a fins de utilidade pública, ou incluído em zonas de
protecção integral.

20
A redacção deste artigo não é muito clara, pode sugerir a interpretação
de que existem terrenos sobre os quais não se podem constituir direitos de uso
privativo. Na verdade, o que pretende salvaguardar são apenas os direitos dos
particulares sobre solos objectos de concessões anteriores ou do uso
consuetudinário, solos ocupados pelo Estado para fins de utilidade pública e
solos incluídos na zona de protecção integral de uma área protegida.

Independentemente da forma da sua constituição, o direito de uso


privativo, confere ao respectivo titular faculdades muito próximas às de um
proprietário. Ao seu titular é conferido o direito de uso e de fruição, em
exclusivo, das terras dominiais a que respeitam, para os fins e com os limites
consignados no respectivo contrato (art. 12.º, n.º 1).
No caso da utilização permitida envolver a realização de obras ou
alterações, o direito de uso privativo abrange outrossim poderes de construção
e de transformação. E sobre as construções efectuadas no solo, assim como
as instalações desmontáveis e as benfeitorias realizadas é assegurado ao
respectivo titular o direito de propriedade durante o período de vigência do
direito de privativo.

Muito coerente com o princípio de que a terra é o património comum de


todo povo, para garantir a sua disponibilidade a todos os cidadãos e evitar a
dominação de certas classes ou grupos sobre outros, o legislador guineense
estabelece limites máximos das áreas do solo sobre as quais um particular ou
uma pessoa colectiva privada podem ter direito.

Assim, para áreas rurais, estabelece que, para explorações familiares e


por pessoas, não é admissível a atribuição de direito de uso privativo cuja área
de incidência geográfica, em conjunto, seja superior a 100 hectares.
Para explorações por sociedades ou cooperativas agrícolas a área
máxima estabelecida é de 500 hectares. A atribuição de direito de uso privativo
cuja área geográfica ultrapasse, no conjunto, estes limites só é possível
mediante a prévia autorização do Conselho de Ministros, tendo em conta,
nomeadamente a capacidade de uso e de regeneração dos solos, as culturas a
21
explorar, de forma a conseguir-se o dimensionamento e o ordenamento
adequado da exploração; e a importância estratégica dos empreendimentos
para a economia nacional (art. 15.º, n.os 3, 4 e 5, da Lei da Terra).

Já para as áreas urbanas e suburbanas o legislador remete a fixação


dos limites mínimos e máximos para os respectivos planos directores, a
elaborar nos termos de legislação própria (art. 15.º, n.º 1, da Lei da Terra). O
mesmo se estabelece em relação às áreas das Comunidades Locais. Para
estas remete a demarcação das respectivas fronteiras para legislação própria,
com ressalva de que serão respeitados os limites históricos e territoriais.

As preocupações ambientais de gestão racional do solo não


escaparam a tenção do legislador. O legislador da Lei Terra mostrou-se muito
preocupado com a questão de preservação e protecção das potencialidades
naturais dos solos para a produção de alimentos e garantia do equilíbrio
ecológico. Faz reflectir está preocupação em várias disposições que
consagram deveres especiais de gestão.

Com efeito, ao estabelecer os princípios fundamentais que devem


presidir a gestão da terra, estabelece-se que:
Primeiro, a protecção dos solos é de interesse geral e integra as
políticas de protecção do ambiente e do desenvolvimento sustentado;
Segundo, os solos constituem património comum e um recurso natural
não renovável de importância vital para a humanidade presente e futura;
Terceiro, a utilização dos solos tomará em consideração a multiplicidade
das suas funções ecológicas e a sua consideração como recurso limitado;
Quarto, a protecção dos solos deverá ser tomada em consideração na
definição das políticas agrícolas, silvícolas, industriais, de transporte,
urbanismo e de ordenamento do território (art. 5.º, n.º 1, als. a), b), c) e d) da
Lei da Terra).

Pelo art. 7.º, o legislador faz uma conciliação entre o interesse na


utilização do solo pelos particulares e o interesse na protecção dos

22
ecossistemas sensíveis através das áreas protegidas. Com efeito, estabelece-
se no n.º 1 deste artigo que são acolhidos na Lei da Terra os conceitos e as
provisões constantes da Lei-Quadro das áreas protegidas e da legislação
complementar. Em segundo lugar e em estreita sintonia com a Lei-Quadro das
Áreas Protegidas, prevê-se, no n.º 2 do artigo em apreço, que as terras
localizadas em áreas protegidas, salvo se incluídas em zonas de protecção
integral, podem ser objecto de uso privativo, desde que as actividades aí
desenvolvidas não contrariem o disposto na legislação ambiental. E na mesma
ordem de ideia, estatui-se, no n.º 3º do artigo em causa, que «é garantido o
direito de acesso das populações residentes nas Comunidades Locais aos
Matos Sagrados e a outros sítios de importância cultural e social situados no
interior das áreas protegidas».

Já nos termos do art. 13.º, consagra deveres aos quais ficarão adstritos
os titulares do direito de uso privativo na utilização do solo. De acordo com o
n.º 1 deste artigo «a utilização dos terrenos dominiais objecto de uso privativo
deverá respeitar os princípios da adequação dos sistemas de produção às
características ecológicas da região, da plena e racional utilização dos solos,
bem como da manutenção da sua capacidade de regeneração».

E no art. 15.º n.º 3, estabelece-se que «as áreas dos terrenos afectos a
cada exploração agrícola, resultantes da atribuição de direitos de uso privativo,
terão como base uma racional articulação entre a dimensão e o rendimento
fundiário, tendo em especial atenção a capacidade de uso e de regeneração
dos solos e as culturas a explorar, de forma a conseguir-se o dimensionamento
e o ordenamento adequado da exploração».

23
3.3.1. O contrato administrativo de concessão de uso privativo

3.3.1.1. As modalidades de concessão de concessão

A Lei da Terra consagra duas modalidades de concessão que são: a


concessão rural e a concessão de superfície (art. 22.º, n.os 2 e 3).
A Concessão rural é um contrato administrativo, oneroso ou gratuito,
pelo qual o Estado transfere para uma entidade particular o uso privativo da
terra, para fins agrícolas, pecuários, agro-pecuários, agro-industriais, silvícolas
e turísticos, em zonas localizadas fora dos limites das áreas urbanas (art. 3.º,
al. d)).
A concessão de superfície é um contrato administrativo, oneroso ou
gratuito, pelo qual o Estado transfere para uma entidade particular a faculdade
de construir ou manter, perpétua ou temporariamente, uma obra para fins
habitacionais, comerciais, industriais ou culturais, entre outros, em terrenos
localizados dentro dos limites das cidades ou povoações e respectivas zonas
de expansão (art. 3.º, al. e)).

Podem ser objecto de uma das modalidades de concessão qualquer


terreno não incluído nas áreas das Comunidades locais, não afecto a fins de
utilidade pública, nem incluído em zonas de protecção integral.

A que regime jurídica se sujeita os contratos de concessão de uso


privativo? É a questão que se propõe no item que se segue.

3.3.1.2. Regime jurídico do contrato administrativo concessão


de uso privativo

Falar do regime jurídico destes contratos significa falar antes da


identidade das partes no contrato, do prazo de validade, da forma e
24
formalidades do contrato, da forma de transmissão de direitos de uso privativo,
dos encargos patrimoniais inerentes à constituição, à utilização, à conversão e
à transmissão do direito de uso privativo e dos modos de extinção do direito de
uso privativo constituído por concessão.
Vejamos então cada um destes elementos.

3.3.1.2.1. Partes no contrato administrativo de concessão

Já atrás falamos da titularidade do direito da propriedade do solo na


Guiné-Bissau. É lógico também pensar que uma das partes neste contrato seja
o Estado. No entanto, sendo o Estado uma pessoa colectiva de fins múltiplos
representado, as mais das vezes, na sua actuação, por órgãos ou pessoas
colectivas de fins singulares que no seu interesse prosseguem alguns fins,
interessa aqui mais saber a quem compete, em nome do Estado, celebrar o
contrato o contrato de concessão; saber se o contrato é celebrado por um dos
órgãos do Estado ou se a competência para celebração do contrato pertence a
uma pessoa colectiva diferente do Estado que no interesse deste prossegue
determinados fins públicos ou ainda se a competência para celebrar o contrato
pertence a uma pessoa colectiva que prossegue fins diferentes dos do Estado.

A resposta a estas questões varia consoante estejamos perante um


contrato de concessão de rural ou um contrato de concessão de superfície.

Tratando-se do contrato administrativo de concessão rural, a


competência para sua celebração pertence à Direcção do Serviço Nacional de
Geografia e Cadastro outorgar, que aqui actua em nome do Estado (29.º, n.º 2
da Lei da Terra).

Tratando-se de um contrato de concessão de superfície a competência


para a sua celebração compete ao Município, pessoa colectiva que prossegue

25
fins também múltiplos diferentes dos do Estado que outorga, em nome do
Estado (art. 29.º, n.º 3 da lei da Terra).
Na verdade, aos Municípios Compete a gestão das terras urbanas e
suburbanas situadas sob a sua jurisdição, em conformidade, entre outros, com
os forais municipais, os códigos de postura municipais, regulamento geral dos
edifícios urbanos e os planos de urbanização em vigor (art. 43.º da Lei da
Terra).

Da parte do concessionário, pode-se perguntar quem pode ser o


concessionário do direito de uso privativo.

A resposta a esta questão é nos dada pelo disposto nos arts. 4.º, n.º 1, 2
e 30.º da Lei da terra.
Adianta o n.º 1 do art. 4.º que «a todos os cidadãos é reconhecido, nos
termos da presente lei, o direito de uso privativo da terra, sem discriminações
de sexo, de origem social ou de proveniência dentro do território nacional». E
no n.º do mesmo artigo, estabelece-se que «para fins de exploração
económica, habitacional, de utilidade social e outras actividades produtivas e
sociais, o Estado pode conferir direitos de uso privativo das terras a entidades
nacionais ou estrangeiras, individuais ou colectivas, tendo em conta o interesse
nacional superiormente definido nos planos e nos objectivos de
desenvolvimento económico e social».
Nos termos do art. 30.º, n.º 1, prevê-se que «toda a pessoa singular ou
colectiva, nacional ou estrangeira, com capacidade jurídica, pode ser titular de
direitos de uso privativo da terra, nos termos do presente diploma».

Resumindo, o concessionário de direito de uso privativo pode ser


qualquer pessoa, singular ou colectiva, nacional ou estrangeira. A Lei da Terra,
partindo de postulado superior de que a terra é património comum de todo o
povo e de que a organização económica e social da República da Guiné-
Bissau tem como o objectivo a promoção contínua do bem-estar do povo e a
eliminação de todas as formas de sujeição de pessoa humana a interesses
degradantes, em proveito de indivíduos, de grupos ou de classes, e tendo em
26
conta a importância do solo na vida dos particulares, quer garantir o seu
acesso a todos os particulares independentemente do seu sexo ou raça. Por
isso, não faz qualquer tipo de discriminação no acesso ao solo.

O concessionário tento pode ser uma pessoa singular isoladamente


como pode ser um grupo de pessoas, actuando em regime de co-titularidade
de direito de uso privativo, atribuído num único contrato administrativo de
concessão (art. 35.º, n.º 1 da Lei da Terra).
Sempre que for este o caso, «as formas de utilização, de fruição e de
distribuição dos benefícios, obedecem às regras constantes de contrato prévio
outorgado pelos co-titulares e reconhecido por Notariado Público Oficial, o qual
fará parte integrante do contrato administrativo de concessão». É o que dispõe
o n.º 2 do art. 35.º da Lei da Terra.

3.3.1.2.2. Prazo de validade do contrato

O prazo de validade do contrato varia consoante o tipo de contrato de


concessão.

No caso do contrato de concessão rural, o prazo máximo de validade é


de 90 anos, o qual é automaticamente renovado se não for denunciado, com a
antecedência mínima de três anos (art. 22.º, n.º 2 da Lei da Terra).
Tratando-se do contrato de concessão de superfície, a validade do
contrato é perpétua. Porém, a perpetuidade do contrato não impede a sua
extinção por ocorrência de determinados factos previstos na lei. Neste sentido
dispõe expressamente o n.º 3, do art. 22.º da Lei da Terra.

27
3.3.1.2.3. Forma e formalidade do contrato de concessão

O contrato administrativo de concessão de uso privativo é um contrato


solene. A lei exige para a sua válida celebração, a redução do contrato à
escritura particular (art. 10.º, n.º 1 da Lei da Terra).

Todavia, para ser oponível aos terceiros é exigível o registo do contrato


junto da respectiva Conservatória do Registo Predial (arts. 37.º, n.os 2, 46.º, n.º
2, da Lei da Terra). O registo deve ser feito no prazo de 30 dias contados da
celebração do contrato. E no mesmo prazo deve o titular do direito de uso
privativo depositar uma cópia na Comissão Fundiária Nacional (art. 10.º, n.º 2
da Lei da Terra).

As formalidades prévias à celebração do contrato começam com


proposta contratual do interessado na atribuição de direitos de uso privativo da
terra dirigida ao Ministro de Tutela da Direcção do Serviço Nacional de
Geografia e Cadastro, no caso das concessões rurais ou ao Presidente da
respectiva Câmara Municipal no caso das concessões urbanas.
Da proposta devem constar todos os elementos pertinentes para a sua
apreciação, designadamente: i) a identificação completa do requerente; i) a
identificação do terreno pretendido, representada pelo croqui, esboço ou
planta, definindo os contornos, a localização e a área; iii) a indicação do fim a
que se destina o terreno pretendido (art. 31.º, n.º 1, als. a), b), e c) da Lei da
Terra).

Em relação às propostas de concessão de áreas superiores a 30


hectares para explorações familiares e por pessoas singulares e superiores a
100 hectares para explorações por pessoas colectivas, delas deverão ainda
constar: i) o plano geral de ocupação e de exploração, devidamente
fundamentado; b) o volume do investimento previsto e o seu financiamento; c)
os elementos comprovativos de que o requerente dispõe de capacidade técnica
e financeira (art. 31.º, n.º 2 da Lei da Terra)
28
À fase se proposta contratual segue-se a fase de consulta pública. A
fase de consulta pública é coordenada pela Direcção do Serviço Nacional de
Geografia e Cadastro. A consulta é aberta à participação de muitas entidades e
particulares interessados.
O Ministério de Tutela dos sectores da Agricultura, Recursos Naturais e
Ambiente, é obrigatoriamente ouvido em todos os casos em que sejam
requeridas concessões com áreas superiores a 5 hectares (art. 32.º, n.º 3, al. a)
da Lei da Terra)
Os Ministérios de Tutela dos sectores da Economia, Finanças e Indústria
são obrigatoriamente consultados sempre que haja investimentos em capital
estrangeiro e a concessão envolva empreendimentos de natureza económica,
comercial ou industrial (n.º 3, al. b).
As Comunidades Locais são obrigatoriamente consultadas, quando o
terreno a concessionar se situe em área demarcada daquelas comunidades
(n.º 3, al. c)).
E por fim, também as autoridades Marítimas e Portuárias são
obrigatoriamente consultadas, quando o terreno a concessionar se situe em
área sob a sua jurisdição (n.º 3, al. d)).

Os particulares interessados são assegurados o direito de, durante a


fase da consulta, reagirem contra a proposta contratual. Da decisão de
oposição dos particulares cabe recurso hierárquico para o Ministro da Tutela da
Direcção do Serviço Nacional de Geografia e Cadastro (art. 33.º, n.os 3, 4 e 5,
da Lei da Terra).

Os elementos de menção obrigatória no contrato estão previstos no art.


34.º. são eles: a identificação do concessionário; a identificação do terreno
concedido, através da respectiva demarcação; a indicação do objecto e do fim
da concessão; o prazo da concessão e as condições exigidas para eventuais
prorrogações; as condições de revisão contratual; a indicação dos direitos e
obrigações recíprocas; a indicação da autorização do Conselho de Ministros,

29
nos casos previstos nos n.os 4 e 5 de artigo 15.º da Lei da Terra; a indicação do
parecer dos representantes das Comunidades Locais, no caso de concessão
de terras em áreas no regime de uso consuetudinário (art. 34.º, n.º 2, als. a), b),
c), d), e), f) e g), da Lei da Terra).

3.3.1.2.4. Transmissão de direito de uso privativo

Nos termos da Lei da Terra ao concessionário, titular do direito de uso


privativo, é assegurado a faculdade de transmitir o seu direito por actos inter
vivos e por morte (art. 23.º, n.º 1, da lei da Terra).
Todavia, a transmissão por acto inter vivos é condicionada à autorização
prévia da entidade concedente (art. 23.º, n.º 1, da Lei da Terra). No
requerimento de pedido de autorização, o concessionário é obrigado a indicar
expressamente: a entidade para a qual pretende transmitir a sua posição
contratual; os motivos determinantes da sua pretensão; e as condições da
transmissão (art. 23.º, n.º 2, als. a), b) e c) da Lei da Terra).

Em caso do deferimento do requerimento, serão notificados o requerente


e o transmissário para celebração do contrato de cessão da posição contratual,
o qual deverá ser, no prazo de 30 dias, registado na competente Conservatória
e depositada uma cópia na Comissão Fundiária Nacional (art. 23.º, n.º 5 da Lei
da Terra).
Em caso de indeferimento do requerimento do pedido de autorização,
recusa da autorização de transmissão, ao concessionário querente é garantido
o direito de impugnação contenciosa da decisão de recusa (art. 23.º, n.º 8, da
Lei da Terra).

Já em relação à transmissão por morte, nomeadamente a sucessão


hereditária, a lei não estabelece qualquer condicionalismo. A transmissão de
direito de uso privativo não depende de autorização, ficando apenas sujeita à

30
notificação da entidade concedente e à Comissão Fundiária Nacional e ao
registo, no prazo de 30 dias (art. 23.º, n.º 7, da Lei da Terra).

3.3.1.2.5. Encargos patrimoniais inerentes à constituição,


utilização, conversão e transmissão do direito de uso
privativo

O contrato de concessão de direito de uso privativo pode ser gratuito ou


oneroso (art. 11.º, n.º 1 da lei da Terra).
O contrato é sempre gratuito quando o concessionário é uma das
seguintes entidades: organismos e instituições públicos; organismos e
associações de utilidade pública, sem fins lucrativos; entidades estrangeiras de
direito público (art. 11.º, n.º 2, als. a), b) e c) da Lei da Terra). Para estas
entidades também é isento o pagamento de qualquer imposto fundiário (art.
41.º, n.º 1, als. a), b), c) e d), da Lei da Terra).
Porém, tratando-se das entidades estrangeiras de direito público, a
concessão só será gratuita e isenta de imposto fundiário se existir
reciprocidade ou acordo entre o respectivo país estrangeiro e a República da
Guiné-Bissau (arts. 11.º, n.º 2, al. c) e 41.º 2, al. d) da Lei da Terra).

No caso de transmissão de direito de uso privativo constituído


gratuitamente para terceiros, que não sejam organismos e instituições públicos,
organismos e associações de utilidade pública, sem fins lucrativos, entidades
estrangeiras de direito público, o contrato será sempre oneroso (art. 11.º, n.º 3,
da Lei da Terra).
Ou seja, a transmissão de direitos de uso privativo por uma associação
de utilidade pública, que o tenha adquirido gratuitamente, para um particular
será sempre onerosamente.

31
Feitas estas considerações torna-se necessário chamar atenção para a
necessidade de distinguir a onerosidade do contrato administrativo de
concessão do imposto fundiário.
Dizer que o contrato administrativo pode ser gratuito não significa
necessariamente que o seu concessionário fica também isento de pagamento
de imposto fundiário.
O legislador foi muito cauteloso na distinção das duas figuras. Assim, no
art. 11.º fala da onerosidade do contrato administrativo de concessão de direito
de uso privativo e do art. 38.º a art. 41.º fala do regime do imposto e das taxas
fundiários.

Antes de mais, a onerosidade do contrato significa que, pela atribuição


do direito de uso privativo, é devida uma contrapartida patrimonial da parte do
seu concedente. Pelo contrário, por imposto fundiário entende-se um imposto
anual que é devido pelo concessionário pelo uso privativo do terreno dominial
titulado por contrato administrativo de concessão (art. 38.º, n.º 3, da Lei da
Terra). Ao pagamento deste imposto estão apenas isentos as entidades atrás
assinaladas por nós.
Mas dizer que estas entidades estão isentas de pagamento do imposto
fundiário não significa que estão isentas de pagamento de qualquer outra taxa
fundiária. Pois em contrapartida dos serviços prestados no âmbito dos
processos de atribuição e de modificação de direitos de uso privativo por
concessão, é devida uma taxa única, denominada taxa de concessão (art. 38.º,
n.º 1, da lei da Terra). Tais entidades não estão isentas de pagamento desta
taxa.
Também em contrapartida dos serviços prestados no âmbito dos
processos de conversão e transmissão, gratuita ou onerosa, de direitos de uso
privativo concessionados, é devida uma taxa única, denominada taxa de
transferência de títulos de concessão (art. 38.º, n.º 2, da Lei da Terra). Desta
taxa também não estão isenta tais entidades.

32
3.3.1.2.6. Modos de extinção do direito de uso privativo
constituído por concessão

A Lei da Terra consagra quatro modos de extinção do contrato


administrativo de concessão do direito de uso privativo, que são: a caducidade,
a rescisão, a revogação e a renúncia.

No referente à extinção do contrato pela caducidade, estabelece que


o contrato de concessão de concessão caduca pelo decurso do prazo de
vigência; pela morte da pessoa singular se não houver lugar à sucessão
legítima; pela extinção da pessoa colectiva; pelo desaparecimento ou
inutilização do objecto da concessão; e pela expropriação por utilidade pública
(art. 24.º, n.º 1, als. a), b), c), d) e e), da Lei da Terra.

No entanto a produção da caducidade não se opera ipso fato. Não basta


a ocorrência de facto que a lei considera relevante para a extinção do contrato
de concessão de uso privativo. Pois, além da ocorrência do facto legalmente
relevante, o legislador faz depender a extinção do contrato pela caducidade da
declaração de caducidade emitida pela entidade concedente e da sua
publicação no Boletim Oficial (art. 24.º, n.º 2, da Lei da Terra).
Contra a declaração de caducidade é a assegurado ao respectivo titular
o direito de impugnação contenciosa (art. 24.º, n.º 3, da Lei da Terra).

Antes de passarmos para os restantes modos de extinção do contrato de


concessão, vejamos sucintamente as espécies modalidades que de se reviste
a caducidade.

33
a) - Caducidade do contrato pelo decurso do prazo de vigência

Lembra-se, o contrato administrativo de concessão rural tem o prazo


máximo de validade de 90 anos renovável automaticamente se não for
denunciado, com antecedência mínima de três anos.
Aproximando-se o fim do prazo de validade do contrato, a parte que não
quer ver renovado do contrato deve notificar a contraparte desta intenção três
anos antes do fim do prazo. Exercendo esta faculdade, termina o prazo de
validade do contrato, extingue o contrato.

Ora se é adequado falar desta modalidade de caducidade em relação ao


contrato administrativo de concessão rural, já não parece ser adequado falar
em relação ao contrato administrativo de concessão de superfície. Pois como
sabemos este contrato é de validade perpétua. Sendo perpétua, escusado será
dizer que não tem o prazo de validade e, por conseguinte, nunca poderá ser
extinto pelo mero decurso do prazo de vigência.
Não sendo possível a extinção do contrato, pergunta-se que alcance tem
a norma do art. 22.º, n.º 3, da Lei da Terra que, ao prescrever que o contrato
administrativo de concessão de superfície é perpétuo, acrescenta que a
perpetuidade do contrato não prejudica as normas relativas à extinção e à
caducidade, previstas no presente capítulo e aplicáveis com as devidas
adaptações.
A resposta a esta questão não anda muito longe. O legislador ao
salvaguardar as normas relativas à extinção e à caducidade, não pretende,
muito provavelmente, salvaguardar também a norma que prevê a extinção do
contrato administrativo de concessão pelo mero decurso do prazo de vigência,
pelas razões já assinaladas, mas apenas aquelas normas sobre a extinção do
contrato por caducidade que sejam adequadas ou adaptáveis à vigência
perpétua deste contrato.

Mais será que as restantes espécies da caducidade são adequadas ou


adaptáveis ao regime de vigência perpétua do contrato administrativo de

34
concessão de superfície? É o que vamos procurar saber nas alíneas que se
seguem.

b) – Caducidade do contrato pela morte da pessoa singular, não


havendo lugar à sucessão legítima

Fala o art. 24.º, n.º 1, al. b), da Lei da Terra da extinção do direito de uso
privativo por morte da pessoa singular, na falta da sucessão legítima.
A esse propósito pode-se questionar se o contratado de concessão de
superfície pode extinguir mesmo por morte da pessoa singular se não houver
lugar à sucessão legítima.

A resposta parece ser negativa. A Lei da Terra garante a todos os


titulares de direitos de uso privativo, constituídos por contrato administrativo de
concessão, a faculdade de transmissão dos respectivos direitos por actos inter
vivos e por morte. No caso da transmissão por morte, a Lei da Terra não cria
nenhum condicionalismo (art. 23.º, n.os 1 e 7).
E nos termos do art. 2133.º, do Código Civil, em vigor na Guiné-Bissau,
estabelece-se as classes de sucessíveis e a ordem por que são chamadas. De
acordo com esta norma os susceptíveis chamados pela seguinte ordem:
descendentes, ascendentes, irmãos e seus descendentes, cônjuge, outros
colaterais até ao sexto grau e por fim o Estado (art. 2152.º do CC).
No limite, pode-se dizer que não será possível nunca a extinção do
direito de uso privativo por morte da pessoa singular se não houver lugar à
sucessão legítima. Sendo o Estado sucessível, haverá sempre a sucessão
legítima.
Todavia, sendo o Estado o proprietário do solo, não havendo outros
sucessíveis, verificar-se-á a plenitude do direito de propriedade do Estado pela
reintegração do direito de uso privativo que antes onerava o direito da
propriedade. Portanto, adequado seria aqui falar não da extinção do direito de
uso privativo por morte da pessoa singular se não houver lugar à sucessão

35
legítima, mas da extinção do direito de uso privativo por reunião na mesma
pessoa do direito de uso privativo e do direito da propriedade.
Igual resposta vale aqui para a questão de saber se pode extinguir o
contrato administrativo de concessão rural por morte da pessoa singular se não
houver lugar à sucessão legítima.

c) - Caducidade do contrato por extinção da pessoa colectiva

No art. 24.º, n.º 1, al. d), da Lei da Terra, prevê-se a caducidade do


contrato por extinção da pessoa colectiva.
Parece que não se duvidar que o direito de uso privativo atribuído por
um contrato administrativo de concessão de superfície pode extinguir com a
dissolução da pessoa colectiva não havendo nenhuma sub-rogação
estatutariamente estabelecida quanto aos destinos dos bens. Neste caso,
apesar do contrato de concessão de superfície ser perpétuo, extingue-se com a
extinção do seu titular. Por maior de razão, também a mesma solução é válida
em relação ao contrato de concessão de superfície.

d) – Caducidade do contrato pelo desaparecimento ou inutilização


do objecto da concessão

A caducidade do contrato pelo desaparecimento ou inutilização do


objecto da concessão vem prevista no art. 24.º, n. 1, al. d), da Lei da Terra.
Parece que ninguém duvida que se desaparecer área do solo a qual
incide o direito de uso privativo extingue também o direito de uso privativo. O
solo é o pressuposto de facto de existência do direito de uso privativo. Não
existe o solo, não existe a propriedade dominial, não existe o direito de uso
privativo.
Entretanto, quando o desaparecimento do solo não poder ser imputado
ao concessionário, a este é reconhecido o direito à indemnização contra o
Estado (art. 27.º, n.º 2, da Lei da Terra).

36
e) – Caducidade do contrato pela exploração por utilidade pública

A caducidade do contrato pela expropriação por utilidade pública art.


24.º, n.º 1, al. c), da Lei da Terra.
A figura de expropriação pode criar alguma perplexidade na articular
com a dominialidade do solo. Pois não se compreende bem que o Estado
sendo dono do solo se faça a expropriação a um particular de uma coisa que
lhe pertence. Se o Estado quiser recuperar a plenitude dos poderes que
integram o conteúdo da propriedade, parece ser mais adequado recorrer ao
expediente de resgate do contrato administrativo de concessão de uso
privativo, por motivo de utilidade pública.
O resgate é uma figura do Direito Administrativo a partir do qual o
Estado pode num contrato administrativo concluído com um particular fazer
extinguir unilateralmente o contrato por motivo de interesse público, passando
ele a assumir a direcção do interesse público dantes cometido ao particular
pelo contrato.
É uma questão a ponderar em sede da construção doutrinária, que
menor interesse tem para a linha directora deste trabalho, fazer o levantamento
do regime jurídico do solo em vigor na Guiné-Bissau segundo numa
abordagem estritamente descritiva.
Por agora queremos deixar assente que é possível nos termos da Lei
da Terra extinguir o direito de uso privativo pela sua expropriação por motivo de
utilidade pública.

Havendo a expropriação de direito de uso privativo, ao concessionário é


garantido o direito à indemnização contra o Estado (art. 27.º, n. 27.º, n.º 3, da
Lei da Terra).

Nos casos em que ao concessionário é assegurado o direito à


indemnização contra o Estado, a indemnização é calculada atendendo-se ao
valor real dos bens, móveis e imóveis, e benfeitorias integrantes ou afectos à
concessão na data da sua extinção (art. 27.º, n.º 3, da Lei da Terra). Ao
37
montante assim calculado acrescer-se-ão uma quantia equivalente aos lucros
líquidos previstos para um período adicional de cinco anos, estimados com
base na média dos lucros líquidos dos últimos três anos; e um juro pelo período
que mediar entre a data da extinção da concessão e a data do pagamento da
indemnização, calculado à taxa de desconto do Banco da Guiné-Bissau (art.
27.º, n.º 4, als. a) e b), da Lei da Terra).

O regime jurídico de expropriação por utilidade pública encontra-se


regulado na Lei n.º 2.030, de 22 de Junho de 1948, conhecida por lei da
expropriação.
Desta Lei merece assinalar cinco aspectos fundamentais em relação ao
regime nela estabelecido.

Primeiro, na lei da expropriação, procurou-se esclarecer quais os bens


ou direitos susceptíveis de expropriação por utilidade pública.
Assim, no seu art. 1.º, 1, estabelece que podem ser expropriados por
causa da utilidade pública, mediante o pagamento da justa indemnização, os
bens imóveis e direitos a eles relativos.

Segundo, procurou-se fazer uma certa ligação entre a questão da


expropriação e a da execução do plano. Com efeito, prevê-se a expropriação
como um dos instrumentos de execução do plano urbanístico.
Assim, no art. 5.º, n.º 1, estatui-se que «no caso de abertura,
alargamento ou regularização de ruas, praças, jardins e outros lugares
públicos, poderá expropriar-se uma faixa adjacente, contínua, com
profundidade não superior a 50 metros, destinada a edificações e suas
dependências».
Já no n.º 2 do mesmo artigo estabelece-se que «a faculdade prevista no
número anterior só poderá exercer-se quando os bens a expropriar forem
destinados à execução em prazos estabelecidos, de um plano particularizado
de obras que se integre no plano geral ou parcial de urbanização, aprovado
nos termos da lei».

38
De novo, no art. 6.º, n.º 1, estabelece-se que «a expropriação pode
abranger toda a área destinada a urbanização, conforme o plano
estabelecido». E no n.º 6 do mesmo artigo, prescreve-se que «quando a
expropriação se não consumar por motivo de alteração do primitivo plano, o
proprietário terá direito a ser compensado dos prejuízos directa e
necessariamente resultantes de o prédio ter sido reservado para
expropriação».

Terceiro, tendo em conta a importância do solo para as pessoas e a


tendência da parte dos seus titulares de o retendo para fins especulativos,
especulação fundiária, o legislador em várias disposições consagrou a
expropriação como mecanismo dissuasor do entesouramento fundiário.
Nesta conformidade, estabelece-se que os prédios rústicos não
expropriados quando, por virtude de obras de urbanização ou abertura de
grandes vias de comunicação, aumentem consideravelmente de valor pela
possibilidade da sua aplicação como terrenos de construção urbana, ficam
sujeitos a um encargo de mais-valia, ou seja, o titular de direito sobre aquela
área do solo fica obrigado a pagar a entidade que fizer as obras 50% sobre a
importância da valorização que o terreno passou a ter (art. 17.º, n.os 1 e 4, da
lei da expropriação).
Além disto, o titular de terreno sujeito ao encargo de mais valia fica ainda
obrigado, dentro do prazo três anos, a fazer o aproveitamento do terreno para a
construção urbana adequada sob pena de transcorrido este prazo, não
havendo legítimo motivo que impossibilita o aproveitamento do terreno, poder-
lhe ser expropriado (art. 18.º, n.º 1, al. a)).
Igual cominação se estabelece para os titulares de terrenos próprios
para construção, adjacentes a vias públicas de cidades, quando forem
notificados para os aproveitarem em edificações, o não fizerem no prazo de
três anos (art. 18.º, n.º 1, al. b))

Quarto, a lei da expropriação enquadra-se naquelas legislações do


período colonial inspiradas numa lógica liberal da propriedade privada do solo
em clara contradição com o regime dominial do solo. A possibilidade dos
39
particulares poderem constituir o direito da propriedade sobre o solo é
manifesta em várias disposições da lei da expropriação.
Com efeito, estabelece-se que, em caso da expropriação os prédios
continuam na posse e propriedade dos seus donos enquanto não estiver pago
ou depositado o preço da expropriação (art. 6.º, n.º 5.º, 1ª parte). E no n.º 6 do
mesmo artigo, prescreve-se que «quando a expropriação se não consumar por
motivo de alteração do primitivo plano, o proprietário terá direito a ser
compensado dos prejuízos directa e necessariamente resultantes de o prédio
ter sido reservado para expropriação. E já no art. 7.º, depois de o seu n.º 1
estabelecer que os terrenos expropriados para construção, não destinados a
fins de interesse público ou a casas económicas a fazer pelo Estado, serão
vendidos em hasta pública e em lotes acomodados às obras previstas, nos n. os
2 e 3 consagra-se o direito de preferência a favor dos respectivos proprietários.
O art. 8.º, falando do direito dos expropriados poderem ter a reversão
dos bens, mediante a restituição do preço da indemnização recebido, se a obra
cuja necessidade determinou a expropriação não estiver realizada nos prazos
inicialmente estabelecidos ou nas prorrogações devidamente autorizadas; ou
se os bens forem aplicados a fim diverso, adianta que a faculdade de obter a
reversão não poderá ser exercida passados 30 anos sobre a data da
expropriação ou quando, por lei, os bens deverem ser integrados no domínio
do Estado ou das autarquias, ou ainda quando lhes for dado um novo destino
de utilidade pública (n.º 1, als. a), b), n.º 2, 3ª parte).
Ora os bens poderão ser integrados no domínio público do Estado ou
das autarquias locais quando se antes da sua integração pertenciam outros
domínios diferentes destas entidades. Ou seja, só faz sentido a previsão da 3ª
parte do n.º 2 do art. 8.º, num regime onde é admitido a propriedade privada do
solo.
Para reforçar ainda, a ideia de que a lei da exploração tem por base uma
matriz de inspiração liberal da propriedade privada da terra, pode-se lançar
mão da nossa já conhecida norma do art. 18.º, n.º 1, al. b), que permita a
expropriação de terrenos próprios para construção, adjacentes a vias públicas
de cidades, quando os proprietários, notificados para os aproveitarem em
edificações, o não fizerem no prazo de três anos.
40
Quinto, para garantia dos direitos dos expropriados:
i) – Estabelece-se que a utilidade pública só poderá ser declarada se o
expropriante tiver capacidade financeira para o pagamento das
indemnizações (art. 13.º, n.º 1 da lei da expropriação). No caso do
expropriante ser uma entidade particular, terá antes de caucionar,
por qualquer das formas em direito admitidas, a importância provável
da indemnização (art. 13.º, n.º 2).

ii) - Prescrevendo-se no art. 4.º, n.º 1 que «a expropriação será limitada ao


necessário para a realização do seu fim, podendo todavia atender-se
às exigências futuras concretamente previstas», estabelece o nº 2 do
mesmo artigo que «se não for preciso expropriar mais do que uma
parte do prédio, poderá o proprietário requerer a expropriação total,
se a outra parte não assegurar, proporcionalmente, os mesmos
cómodos que oferecia todo o prédio».

iii) – No art. 6.º, n.º 5, 1ª parte, estabelece-se que os prédios continuam na


posse e propriedade dos seus donos enquanto não estiver pago ou
depositado o preço da expropriação». E no n.º 6 do mesmo artigo,
prescreve-se que quando a expropriação se não consumar por
motivo de alteração do primitivo plano, o proprietário terá direito a ser
compensado dos prejuízos directa e necessariamente resultantes de
o prédio ter sido reservado para expropriação.

iv) No art. 10.º, n.º 1, estabelece-se que, pela expropriação, será arbitrada a
justa indemnização com base no valor real dos bens expropriados,
devendo sempre calcular-se o valor da propriedade perfeita. Deste
valor sairá o que deva corresponder a quaisquer ónus ou encargos.
No caso de expropriação de prédios rústicos, destinada a obras de
urbanização ou abertura de grandes vias de comunicação, a norma
do art. 10.º, n.º 1, terá, entre outras, as seguintes modificações,
quanto ao valor do terreno: a indemnização terá por base o valor
41
real, aumentado de 20% da mais-valia resultante do novo destino
permitido pelas obras ou melhoramentos projectados (art. 11.º, n.º 1,
al. a)); nos concelhos em que vigorar o regime de cadastro
geométrico da propriedade rústica, o valor do terreno será
determinado pelo rendimento colectável, acrescido de 20% da mais-
valia (art. 11.º, n.º 1, al. b)).

Concluída a análise sucinta dos principais aspectos do regime jurídico


da expropriação de imóveis por utilidade pública, retomamos de novo a
questão da extinção de direito de uso privativo, agora, com a descrição dos
restantes modos de que pode extinguir o direito em causa.

f) – Rescisão do contrato

A rescisão do contrato de uso privativo vem prevista no art. 25.º da Lei


da Terra. De acordo com este artigo, o Estado poderá rescindir o contrato
sempre que o concessionário: não cumprir as obrigações legais e contratuais a
que se vinculou, com grave prejuízo para a produtividade ou para a função
económica e social das terras; abandonar total ou parcialmente a respectiva
utilização; ceder a sua posição contratual sem para tal estar autorizado; usar os
terrenos para fins diferentes do estipulado no contrato (art. 25.º, n.º 1, als. a),
b), c) e d), da Lei da Terra).
A rescisão do contrato, será declarada pela entidade concedente, e só
produzirá efeitos depois da sua publicação no Boletim Oficial (art. 25.º, n.º 2, da
Lei da Terra).
Em garantia dos direitos do concedente admite-se o recurso contencioso
do acto de rescisão a interpor, nos termos e prazos legais, para o Tribunal
competente (art. 25.º, n.º 3, da Lei da Terra).

Da parte do concessionário, prevê-se também a possibilidade de


rescisão do contrato, por iniciativa própria e a todo tempo, por causas

42
imputáveis à entidade concedente que impeçam o normal e pontual
cumprimento da sua actividade (art. 26.º, n.º 2, da Lei da Terra).

g) – Extinção do contrato por acordo das partes ou por renúncia do


titular do direito de uso privativo

A extinção do direito de uso privativo por acordo das partes ou por


renúncia do titular do direito de uso privativo vem prevista no art. 26.º, n.º 1, da
Lei Terra. Na primeira parte, prevê-se a extinção do contrato por acordo das
partes, ou seja, por revogação. E na segunda parte do mesmo número prevê-
se a rescisão por renúncia do titular do direito de uso privativo.
Eis o conteúdo do artigo: «o contrato de concessão pode cessar em
qualquer altura por acordo ou por iniciativa do titular do direito de uso privativo,
que neste caso deverá avisar a entidade concedente e a Comissão Fundiária
Nacional, com a antecedência mínima de 1 ano».

h) - Efeito de extinção de direito de uso privativo

Regra geral, a extinção dos direitos de uso privativo por qualquer das
causas que acabamos de analisar implica a reversão para o Estado da terra e
de todas as infra-estruturas, construções e benfeitorias nela foram realizadas,
(art. 27.º, n.º 1, da Lei da Terra).

No cálculo da indemnização atender-se-á ao valor real dos bens, móveis


e imóveis, e benfeitorias integrantes ou afectos à concessão na data da sua
extinção (art. 27.º, n.º 3, da lei da Terra). Ao montante assim calculado
acrescerão: uma quantia equivalente aos lucros líquidos previstos para um
período adicional de cinco anos, estimados com base na média dos lucros
líquidos dos últimos três anos; um juro pelo período que mediar entre a data da
extinção da concessão e a data do pagamento da indemnização, calculado à

43
taxa de desconto do Banco da Guiné-Bissau (art. 27.º, n.º 4, als. a) e b), da Lei
da Terra).

3.3.1.2.7. Mecanismos de defesa do titular de direito de


uso privativo

Os mecanismos de defesa do titular de direito de uso privativo


aparecem, de modo geral, previstos no art. 28.º, da Lei da Terra. De acordo
com este artigo, sempre que nalgum terreno dominial sujeito a direitos de uso
privativo o respectivo titular for perturbado por ocupação abusiva ou outro meio,
pode este requerer à entidade concedente que intime o contraventor a
desocupar o terreno ou a demolir as obras feitas, no prazo que lhe for marcado,
ou adopte outras providências que, no caso, se revelem mais eficazes (art.
28.º, n.º 1).
Decorrido o prazo fixado sem que a intimação se mostre cumprida e sem
prejuízo das penas que no caso couberem ou da efectivação da
responsabilidade civil do contraventor pelos danos que causar, a entidade
concedente assegurará o destino normal do terreno ocupado, pelos meios que
a lei lhe facultar (art. 28.º, n.º 2).
E para os casos da inacção ou falta de tomada de medidas adequadas
por parte do Estado, prevê-se a responsabilidade civil deste perante o titular
dos direitos de uso privativo, nos termos gerais, por todos os danos que para o
titular advierem da falta, insuficiência ou inoportunidade das providências
adequadas à garantia dos seus direitos, legais e contratuais, de uso privativo
(art. 28.º, n.º 3, da Lei da Terra).

3.3.2. O uso consuetudinário

O uso consuetudinário é uma das formas a partir da qual os particulares


podem aceder à utilização do solo.

44
A noção do uso consuetudinário aparece defina no art. 3.º, al. b) da Lei
da Terra. De acordo com esta disposição por uso consuetudinário, entende-se
a utilização da terra de acordo com as regras, costumes e práticas tradicionais
de uma determinada Comunidade Local, que definem poderes e deveres
recíprocos e disciplinam a sua gestão.
Fala-se da utilização de terra de acordo com as regas e práticas (...) de
uma comunidade local. O conceito da Comunidade Local é estabelecida na
alínea b) do mesmo artigo como uma entidade consuetudinária de base
territorial, correspondente ao agregado formado por famílias e indivíduos
residentes em certa circunscrição do território nacional (tabancas ou conjunto
de tabancas), para prossecução de interesses históricos, económicos, sociais e
culturais comuns e que inclui as áreas habitacionais, agrícolas e florestais, as
pastagens, os pontos de água, os sítios de importância cultural e as
respectivas zonas de expansão.

Às comunidades locais, compete: gerir e distribuir as terras de uso


consuetudinário às populações residentes no interior das Comunidades, de
acordo com os costumes e práticas locais; dar parecer nos casos de
transmissão dos direitos de uso consuetudinário a terceiros não residentes,
nem vizinhos da Comunidade e nos casos da sua conversão em concessão;
dar parecer sobre os processos de atribuição de direitos de uso privativo por
concessão, em terrenos sob a sua jurisdição; organizar e coordenar os
processos de consulta pública nos casos em que for obrigatória; gerir e
administrar a parte das receitas resultantes da cobrança de taxas, que lhe
cabe, nos termos da lei (art. 44.º, als. a), b), c), d) e e), da Lei da Terra).

Podem ser objecto de atribuição de direitos de uso privativo, por uso


consuetudinário, os terrenos rurais ou urbanos livres de ocupação, incluídos
nas áreas reservadas para as Comunidades Locais (art. 16.º, n.º 1, da Lei da
Terra).
Nas áreas das terras de uso consuetudinário incluem-se para além das
zonas já cultivadas e habilitadas, as zonas e recursos inexplorados mas

45
atribuídos aos residentes da Comunidade Local pelos seus respectivos
representantes (art. 17.º, n. º 1, da Lei da Terra).

Em relação às terras de pastagem, são reconhecidas e garantidas as


servidões já existentes, mantendo os residentes nas Comunidades Locais o
acesso à água e a outros recursos naturais e florestais de utilização comum, de
acordo com os usos e costumes tradicionais e os regulamentos específicos que
vierem a ser adoptados (art. 8.º, n.º 1, da Lei da Terra). Os proprietários,
pastores ou guardas das manadas de gado têm direito de acesso livre aos
pastos e água, em zonas reservadas para o efeito, não podendo esse acesso
acarretar prejuízos para os residentes das Comunidades Locais, constituindo-
se na obrigação de indemnizar os prejuízos efectivamente causados (art. 8.º,
n.º 2, da Lei da Terra).

O Estado reconhece, sem prejuízo do que venha a ser disposto em


legislação própria, às populações residentes o direito de gestão e de
exploração comunitária das terras, das florestas e outros recursos naturais, de
acordo com os costumes e práticas locais (art. 17.º, n.º 3, da Lei da Terra).
Aliás, a gestão e distribuição das terras de uso consuetudinário às
populações residentes no interior das Comunidades Locais, obedecerá aos
costumes e práticas de cada uma dessas comunidades e subsidiariamente, na
parte omissa, ao disposto na Lei da Terra (art. 17.º, n.º 2, da Lei da Terra).

Nestas áreas da terra, as Comunidades Locais exercem poderes de


gestão de acordo com os respectivos usos e costumes, em toda a área situada
nos seus limites históricos e territoriais, incluindo as zonas habitadas, as
cultivadas e em pousio, as áreas de uso comum, as pastagens, os recursos
hídricos e marítimos, as matas sagradas ou destinadas a outros fins sociais,
culturais e económicos, aplicando-se, na parte omissa, a presente lei (art. 6.º,
n.º 4, da Lei da Terra).

No exercício destes podres de gestão, as Comunidades Locais são


obrigadas a adoptar medidas de conservações racionais que garantam o
46
equilíbrio dos recursos e a satisfação das necessidades das populações.
Assim, no art. 20.º, n.º 1, da Lei da Terra, estabelece-se que as Comunidades
Locais deverão procurar sempre uma gestão racional e equilibrada dos
recursos e a satisfação das necessidades básicas das populações.

Na medida do possível e por forma faseada e participada das


populações residentes nas Comunidades, deverão procurar compatibilizar e
adequar as práticas tradicionais de utilização das terras com os planos de
urbanização e de ordenamento do território (art. 20.º, n.º 2, da Lei da Terra).
Ainda no mesmo artigo, n.º 3, prescreve-se que as normas e práticas
tradicionais de defesa face à utilização e exploração dos recursos naturais e
destinadas a garantir o equilíbrio entre essas actividades e a sua conservação,
devem ser aplicadas tanto às populações residentes, como às não residentes,
salvo disposição legal em contrário.

Feitas estas considerações poderemos agora fazer as seguintes


perguntas, tal como fizemos em relação ao direito de uso privativo atribuído
pelo contrato de concessão de superfície: qual é o prazo de validade do direito
de uso privativo constituído por via de uso consuetudinária? Qual é forma ou
formalidades a que a sua constituição está sujeita? Qual a forma da sua
transmissão? Quais encargos estão inerentes à sua constituição, utilização,
conversão e transmissão? E quais os modos da sua extinção?

Em relação ao prazo de validade, estabelece-se no art. 16.º, n.º 2, da


Lei da Terra, que os direitos de uso privativo atribuídos por via uso
consuetudinário são de validade perpétua.

A constituição do direito de uso privativo, mediante uso consuetudinário,


não está dependente de qualquer formalidade ou forma solene. O direito de
uso privativo da terra atribuído por uso consuetudinário é garantido pelo
Estado, independentemente de contrato escrito e de registo, devendo, no
entanto e na medida do possível, as Comissões Fundiárias promoverem, em

47
articulação com os serviços cadastrais e de registo, a sua permanente
utilização (art. 17., n.º 4, da Lei da Terra).

A Lei da Terra permite a transmissão do direito de uso privativo quer


por acto inter vivor quer por morte causa (arts. 11.º, n.º 2, 1ª parte e 18.º, n.os 1
e 3).
É reconhecido às populações residentes nas Comunidades Locais o
direito de negociar, livre e directamente, a transmissão dos direitos de uso
privativo de que sejam titulares (art. 19.º, n.º 2).
No entanto, a lei estabelece regimes diferentes para efeitos de encargos
entre a transmissão dentro e fora da Comunidade Local.

Regra geral, a constituição e a transmissão de direito de uso privativo


mediante o uso consuetudinário é sempre gratuito (art. 11.º, n.º 2, 1ª parte, da
Lei da Terra).
A transmissão dos direitos de uso privado atribuídos por via
consuetudinária, é gratuita para as pessoas singulares ou colectivas residentes
dentro dos limites territoriais da Comunidade Local onde se localiza a terra em
questão (art. 18.º, n.º 1).
Será também gratuita a transmissão efectivada a favor de pessoas
residentes em comunidades vizinhas (art. 18.º, n.º 2). Nestes casos, as
transmissões operadas nos termos deste artigo serão regidas pelos usos e
práticas locais, independentemente de contrato ou registo, por simples
notificação aos representantes das respectivas Comunidades (art. 18.º, n.º 4).

Fora da situação de transmissão de pessoas residentes em


comunidades vizinhas, a transmissão para terceiros dos direitos de uso
privativo sujeitos ao regime do uso consuetudinário, implica a concordância
expressa do Estado e das Comunidades Locais, deverá observar a forma e o
procedimento previstos na Lei da Terra para a transmissão de direito de uso
privativo atribuído por contrato administrativo de concessão (art. 19.º, n.º 1, da
Lei da Terra).

48
Nessas transmissões, aos terceiros não residentes na comunidade
vizinha são impostas determinadas condicionalismos: deverão dar
conhecimento aos residentes das tabancas sobre as actividades que
pretendem desenvolver na terra situada no interior das Comunidades, cujas
funções não poderão ser alteradas sem o consentimento das populações
directamente interessadas, sob pena de extinção do respectivo direito de uso
(art. 19.º, n.º 3, da Lei da Terra).

Diferentemente daquilo que se estabelece em relação à utilização do


solo no âmbito do direito de uso privativo atribuído por contrato administrativo
de concessão, pela utilização do solo ao abrigo de direito de uso privativo
constituído mediante o uso consuetudinário não está previsto qualquer
pagamento de imposto fundiário.

Ao titular de direitos de uso consuetudinário é reconhecido a faculdade


de convertê-los em direitos de uso privativo titulados por contrato administrativo
de concessão e sujeitos ao respectivo regime, suportando apenas os encargos
administrativos com o processo (art. 21.º, da Lei da Terra).

No que diz respeito à extinção, apesar do direito de uso privativo


atribuído por via do uso consuetudinário ser de validade perpétua, tal como o
direito de uso privativo atribuído por via contrato de concessão de superfície,
difere deste porém, por não ser susceptível de expropriação ou, em geral, de
extinção segundo os restantes modos previstos na Lei da Terra.
Ou seja, não tem sentido falar em relação ao direito de uso privativo
atribuído por via do uso consuetudinário dos restantes modos de extinção, o
caso da rescisão, por iniciativa do Estado ou do particular, da renúncia do
titular do direito e da revogação por mútuo acordo.

49
3.4. O direito de uso privativo do solo, uma nova categoria jurídica do
direito real ou o direito de propriedade privada camuflado

O direito de uso privativo tem características muito semelhantes ao


conteúdo de direito da propriedade. Ao seu titular é reconhecido o direito de
uso, de fruição e de disposição, direitos esses são de conteúdo igual ao do
direito da propriedade.
Desta forma, pode-se questionar se o direito de uso privativo do solo não
será, no fundo, uma nova categoria jurídica do direito real ou o direito de
propriedade privada camuflado. É uma questão a ponderar no âmbito da
doutrina.

3.5. Mecanismos de controlo pelo Estado da transmissão do solo

Na Lei da Terra, ao Estado ou às Autarquias Locais são reconhecidos


vários mecanismos de intervenção no mercado do solo por forma a garantir a
sua disponibilidade a todos.
Desde logo, podem realizar a expropriação de direitos de usos atribuídos
mediantes contratos administrativos de concessão; podem rescindir
unilateralmente contratos de concessão por incumprimentos de obrigações
contratuais por parte do concessionário; têm uma palavra a dizer no caso da
transmissão do direito de uso privativo atribuído por contrato administrativo de
concessão; e têm uma palavra a dizer no caso da transmissão, para terceiros
não residentes na comunidade vizinha, de direito de uso privativo constituído
mediante o uso consuetudinário.

3.6. A oneração do direito de uso privativo pela servidão administrativa

As servidões administrativas são encargos impostos num prédio a favor


de outro prédio por motivo de interesse público.

50
Quanto à origem, as servidões podem derivar directamente da lei ou de
um acto administrativo. A existência da servidão constituída por acto
administrativo carece de uma habilitação legal prévia.
No art. 3.º da Lei da Expropriação dos Imóveis por utilidade pública,
encontramos a previsão sobre: a habilitação legal para a constituição da
servidão por acto administrativo; o efeito jurídico da constituição da servidão
administrativa; e o efeito jurídico da constituição da servidão legal.

De acordo com este artigo, «poderão constituir-se sobre imóveis as


servidões necessárias à realização de fins de utilidade pública previstos na lei.
As servidões derivadas directamente da lei não dão direito à indemnização,
salvo quando a própria lei determinar o contrário.
As servidões constituídas por acto administrativo dão direito à
indemnização, quando envolverem diminuição efectiva no valor dos prédios
servientes (art. 3.º, n.os 1, 2 e 3)».

A figura da servidão administrativa parece ser adequada ao regime


dominial do solo. O Estado é proprietário do solo, nas terras que tenham sido
atribuído ou reconhecido o direito de uso privativo do solo, as faculdades do
Estado enquanto proprietário do solo, assemelham-se às faculdades de um
proprietário despido dos poderes de gozo e de fruição.
Desta forma, com a constituição da servidão administrativa sobre um
terreno, fica também onerado o direito de uso privativo nele existente.

4. O regime de concessão de terrenos na área limítrofe de Bissau

O regime de concessões de terrenos na área limítrofe da cidade de


Bissau vem estabelecido no Foral da Câmara Municipal de Bissau, aprovado
pelo Diploma Legislativo n.º 1.415, de 15 de Junho de 1948. O Diploma foi
posteriormente alterado pelo Diploma Legislativo n.º 1.757, de 27 de Maio de
1961.

51
O Foral da Câmara começa por fazer enumeração das áreas que
integram a cidade de Bissau.

De acordo com o diploma, a cidade de Bissau é constituída:

1) Pela cidade de S. José de Bissau que, abrangendo uma área total de


1.094 hectares, tem o seu contorno perimetral definido por 8 marcos
numerados de 1 a 8 e pelo prolongamento dos alinhamentos 2-1 e 7-8
até ao mar. O marco nº 1 fica situado no pântano de Antula, na orla do
rio Gêba à distância de 1.714 metros da marca GUC, situada no interior
da Fortaleza de S. José, junto ao topo do baluarte da Puana (Nordeste)
e no azimute 233.52 grados dessa marca. O lado 1-2 tem de
comprimento 2269.80 metros e o azimute de 122.49 grados. O lado 2-3
tem de comprimento 783.95 metros e o azimute de 112.55 grados. O
lado 3-4 tem de comprimento 760.32 metros e o azimute de 30.20
grados. O lado 4-5 tem de comprimento 1809.46 metros e o azimute de
11.56 grados. O lado 5-6 tem de comprimento 709.12 metros e o
azimute de 394.85 grados. O lado 6-7 tem de comprimento 2026.68
metros e o azimute de 381.96 grados. O lado 7-8 tem de comprimento
364.60 metros e o azimute de 369.65 grados. O marco nº 8 fica situado
no sopé da colina de Bandim junto ao rio Gêba, à distância de 3.540
metros da marca GUC do baluarte da Puana da Fortaleza de S. José e
no azimute de 35.94 grados dessa marca.

2) Pelos subúrbios da cidade, cujos limites exteriores são definidos por


meio de alinhamentos rectilíneos paralelos aos lados que constituem o
contorno perimetral da cidade, e a 3.000 metros destes, e serão
assinalados por marcos especiais com as iniciais CMB colocadas em
correspondência com os marcos do contorno perimetral da cidade.

52
3) Pelos ilhéus do Rei e dos Pássaros (Bandim) (art. 1.º, n.º 1, 2 e 3 do
Foral da Câmara)6.

De acordo com a titularidade, as áreas da cidade encontram divididas


em três áreas: a área de domínio pleno da Câmara Municipal, a área
pertencente ao Estado e a área pertencente aos particulares.

A área sob domínio pleno do da Câmara Municipal é determinação


por exclusão de partes. Ou seja, a Câmara Municipal de Bissau exerce domínio
pleno sobre os terrenos compreendidos na área da cidade de Bissau, que não
pertencem ao Estado ou aos particulares (art. 3.º do Foral da Câmara).

Ao Estado Pertencem: os terrenos confinantes com a baía e o estuário,


numa zona contínua de 80 metros medidos da linha da máxima preia-mar de
águas vivas7, que à data do Foral da Câmara Municipal não estejam
aproveitados, observado o disposto na Portaria nº 10.872 de 20 de Fevereiro
de 1945; os terrenos ocupados por edifícios públicos não municipais e suas
dependências; os terrenos reservados para o Estado por qualquer disposição
legal (art. 4.º, a), b) e c), do Foral da Câmara).
Além destas áreas, o Estado poderá ainda, a todo o tempo, reservar
para si quaisquer terrenos livres de que venha a carecer para fins de utilidade
pública (art. 4.º, § único).

Pertencem aos particulares todos os terrenos que tenham adquirido


por título ou modo legítimo, e continuem na sua posse (art. 5.º do Foral da
Câmara).

6
Os limites da área de Bissau foram alterados depois em 1995 pelo Decreto n.º 16/95, de 30
de Outubro. Vide infra, 10.1.1.
7
Esta zona faz, geralmente, parte da faixa costeira, quando esta existe.

53
Resumindo, o Foral da Câmara Municipal é uma daquelas legislações
em vigor na Guiné-Bissau, de cunho fortemente liberal, baseado a propriedade
privada do solo.

A área da cidade de Bissau é classificada em terrenos da primeira,


segunda e terceira classes.
São terrenos da primeira classe todos os terrenos da área urbana da
cidade (art. 6.º, al. a) do Foral da Câmara).
Fazem partes dos terrenos da segunda classe, todos os terrenos da
área suburbana (art. 6.º, al. b) do Foral da Câmara). E na terceira classe,
encontram-se os terrenos dos ilhéus do Rei e dos Pássaros (Bandim) (art. 6.º,
al. c) do Foral da Câmara).

Em cada uma destas áreas, a Câmara procederá à divisão dos terrenos


em quarteirões numerados e subdividirá estes em talhões também numerados.
Por quarteirão entendendo-se o terreno circundado por ruas ou
avenidas, e por talhões as partes em que estes quarteirões se dividem,
fazendo-se as necessárias alterações na planta cadastral, quanto aos terrenos
divididos por outra forma, afim de todos os terrenos da área da cidade
obedecerem a uma só ordem numérica (art. 7.º, do Foral da Câmara).

Os talhões da área urbana da cidade são destinados à construção de


casas para habitação com as suas dependências, quintais ou jardins, ou para o
exercício do comércio ou indústria, instalações desportivas, bairros indígenas,
obedecendo a normas de construção condigna, fixadas pela Câmara, tendo-se
sempre em vista a higiene e embelezamento da cidade.
Os talhões da parte suburbana destinam-se aos fins anteriormente
citados, designadamente aos bairros indígenas e pequenas culturas (art. 9.º,
corpo principal do Foral da Câmara). Preferencialmente, os estabelecimentos
comerciais e industriais serão construídos nas zonas da cidade reservadas
para esse género de edificações (art. 9.º, § único).

54
Nos terrenos da parte suburbana haverá os talhões necessários para o
estabelecimento de bairros indígenas, os quais serão dados de arrendamento a
estes nos termos e condições a fixar pela Câmara (art. 10.º, do Foral da
Câmara).

Com excepção dos terrenos que a Câmara, com a aprovação da


estação tutelar, conceda gratuitamente para a fundação de missões, asilos ou
qualquer instituição de beneficência, assistência ou instrução8 e dos terrenos
que a Câmara, com autorização da estação tutelar, se for caso disso, conceda
para alinhamentos, procedendo-se à avaliação de terreno pela soma de vinte
pensões de foro que pagaria se fosse aforado, as concessões de terrenos
municipais, que constituem o presente Foral, serão sempre feitas pela
Câmara, reunida em sessão, por meio de aforamento em hasta pública,
com as formalidades prescritas neste diploma (art. 8.º, § único, als. a) e b),
do Foral da Câmara).

A importância do foro anual será sujeita a licitação e terá como base:


nos bairros populares, de $40 por metro quadrado; na zona compreendida
entre o rio Gêba, o prolongamento da Avenida Carvalho Viegas e o
prolongamento da Avenida do Brasil, de $40 por metro quadrado; nos terrenos
de primeira classe não compreendidos nas duas primeiras situações, de 1$00
por metro quadrado; nos terrenos de segunda classe, de $60 por metro
quadrado; nos terrenos de terceira classe, de $40 por metro quadrado.
Em relação aos terrenos concedidos com dispensa de hasta pública
nos termos das alíneas b) e c) do artigo 8.º do Foral da Câmara, o foro anual
será metade da base fixada no corpo deste artigo (art. 11.º do Diploma
Legislativo n.º 1.757, de 27 de Maio de 1961, que introduziu algumas
alterações ao Foral da Câmara Municipal).

8
Nestas concessões se estipulará sempre a condição de que os terrenos concedidos,
reverterão imediatamente para a propriedade da Câmara, com todas as suas benfeitorias,
desde que não sejam utilizadas pela forma e prazo expressamente estabelecidos.

55
O processo de concessão de terreno (quarteirão ou talhão demarcado
de terreno), por aforamentos, começa com um requerimento do interessado
dirigido, por si, ou por seu representante legal, ao Presidente da Câmara, com
indicação do respectivo número da planta cadastral (art. 12.º, corpo principal do
Farol da Câmara).

No requerimento deve constar, o nome do interessado, estado, idade,


profissão, naturalidade, nacionalidade e o fim a que se destina o terreno. O
requerimento ter ainda assinatura legalizada por via de reconhecimento notarial
e ser instruído com os seguintes documentos: documento comprovativo da
identidade do requerente, não sendo conhecido na Secretaria da Câmara;
certidão comprovativa da constituição regular do requerente, quando se trate
de pessoa colectiva; conhecimento de depósito feito na Tesouraria da Câmara,
do valor da renda anual (...) (art. 12.º, § 1.º, als. a), b) e c) do Farol da Câmara).
Tratando-se de um requerente estrangeiro, o pedido fica dependente de
prévia autorização do Governo, em conformidade com o disposto no n.º 1.º do
art. 223.º da Carta Orgânica do Império Colonial Português, devendo o
interessado apresentar, além dos documentos supracitados, uma declaração
jurada feita perante notário que desiste do seu foro nacional e se sujeita às leis
e tribunais portugueses em tudo quanto tiver relação com a sua concessão;
declaração expressa no sentido de que se obrigará ao cumprimento dos
preceitos deste diploma e das condições estipuladas no título da concessão
(art. 12.º, § 2.º, do Farol da Câmara).
No mesmo requerimento o interessado deverá indicar quem, nas suas
ausências ou impedimentos, o represente nesta cidade para os termos do
processo de concessão, habilitando-o com o respectivo mandato, sob pena de,
quando ausente, lhe não serem feitos os avisos a que se refere este diploma.
(art. 12.º, § 3.º, do Farol da Câmara).

56
Recebido o requerimento de concessão de terreno, e depois de
informado pelo técnico municipal9 e pelo chefe da secretaria10, na primeira
sessão ordinária resolverá a Câmara sobre a alienação (art. 13.º, corpo
principal).
Deliberando a Câmara deferir o pedido, por despacho do Presidente
será designado dia e hora para a arrematação em hasta pública. Se a Câmara
deliberar indeferir o pedido, serão restituídos ao requerente os depósitos que
tenha efectuado (art. 14.º, do Foral da Câmara).

A hasta pública deve ser anunciada com uma antecedência não inferior
a 20 dias, por meio de editais e dos meios de publicidade que sejam
determinados no respectivo despacho, sendo também notificado, por aqueles
editais, quaisquer interessados que se julguem com direito ao terreno
pretendido para deduzirem suas reclamações, até três dias antes do designado
para a arrematação (art. 15.º, do Foral da Câmara).

No dia e hora designados para arrematação, o Presidente da Câmara


fará anunciar por um empregado municipal a abertura da praça e pôr a lanços
a concessão de terreno na base do preço por metro quadrado fixado nos
termos do artigo 11.º do Foral da Câmara (art. 18.º, corpo principal).
Só serão admitidos a licitar os pretendentes que tenham depositado na
tesouraria municipal uma importância igual à depositada pelo requerente da
concessão e estejam nas condições estabelecidas no art. 12º, sendo ao
requerente dado o direito de preferência, pelo maior lanço que a concessão
obtenha em praça.

9
O técnico municipal na sua informação descreverá devidamente o terreno pretendido em
função da sua situação, importância urbana do local e trabalhos municipais iniciados ou
projectados e dará, justificando-a, a sua opinião sobre a conveniência da alienação em atenção
a futuras necessidades municipais de arruamento, embelezamento ou construções para os
serviços próprios (art. 13.º, § 1.º, do Foral da Câmara).
10
A informação do chefe da secretaria deve conter a indicação da situação jurídica do prédio,
se o terreno está compreendido no Foral da Câmara e se esta pode legalmente dele dispor, e
bem assim quais as pretensões anteriores que tenham recaído sobre o mesmo terreno ou
parte dele (art. 13.º, § 2.º, do Foral da Câmara).

57
O pregoeiro anunciará em voz alta o primeiro lanço oferecido acima do
valor-base, e os mais que se sucederem, tomando nota dos respectivos
licitantes, só encerrando a praça, depois de autorizado pelo Presidente e de ter
anunciado por três vezes o lanço mais elevado, sem este ser coberto (art. 18.º,
§ 1.º e 2.º, do Foral da Câmara).
Terminada a licitação, o residente ordenará, no caso do maior lanço não
ter sido oferecido pelo requerente da concessão, que este seja interpelado para
declarar se pretende usar do seu direito de preferência, e em seguida mandará
lavrar o respectivo auto que será assinado por ele, Presidente, pelo
arrematante, pelo pregoeiro e pelo chefe da secretaria, que também o
subscreverá.
A ausência ou falta de resposta do requerente da concessão, quando
seja interpelado significa, que desistiu ou não quis usar do seu direito de
preferência.
Caso o requerente faltar à hasta pública será anulado todo o processo,
perdendo o interessado direito ao depósito e despesas efectuadas (art. 18.º, §
3.º e 4.º, do Foral da Câmara).
Não havendo licitantes, e tendo decorrido uma hora sobre a abertura da
praça será a concessão adjudicada ao requerente dela, pelo preço-base da
licitação (art. 18.º, § 5.º do Foral da Câmara).

Depois da adjudicação, o depósito realizado pelo requerente será


convertido em receita municipal como pagamento da renda anual. Entretanto, o
arrematante deverá depositar na tesouraria municipal e no prazo de três dias a
contar da arrematação, o excesso do seu lanço sobre o preço-base da
licitação, sob pena de ser anulada a arrematação e perder os depósitos que
tenha feito e que ficarão constituindo receita do município (art. 20.º, corpo
principal e § único).

Concluída a arrematação, o arrematante entrará, desde logo, no uso e


fruição do terreno, pelo prazo de dois anos e nas seguintes condições:
primeira, o arrematante pagará uma renda anual no valor do foro anual fixado;
segunda, o arrematante deverá, no decurso do prazo marcado neste artigo

58
sujeitar à aprovação da Câmara o projecto da construção ou construções a
realizar no terreno, observando as condições regulamentares estabelecidas; e
terceira, de harmonia com o projecto aprovado, deverá o arrematante realizar
no terreno as edificações projectadas, dentro do prazo indicado no corpo deste
artigo (art. 21.º, do Diploma Legislativo n.º 1.757, de 27 de Maio de 1961, que
alterou algumas disposições do Foral da Câmara Municipal de Bissau.

A Câmara, depois de ouvidos os técnicos municipal e de sanidade,


aprovará ou rejeitará o projecto, tendo em atenção a importância do terreno e
do local, o valor e a importância da obra, as circunstâncias de estética e
segurança, salubridade pública, etc.. (art. 22.º, corpo principal, do Foral da
Câmara).

Concluídas as obras dentro dos prazos devidos, e depois de tal ser


verificado pelo técnico municipal, a Câmara, a requerimento dos interessados,
passará a estes o respectivo alvará da concessão logo que os mesmos
apresentem o conhecimento do pagamento da contribuição devida e quaisquer
outros documentos, porventura necessários, e paguem na tesouraria municipal
o respectivo foro anual. O título de aforamento será passado e registado pela
forma determinada nos artigos 26º e seguintes (art. 24.º, corpo principal e §
único).
Ou seja, os títulos de concessão são compostos por quatro partes
distintas. A primeira deve conter o alvará de concessão, assinado pelo
Presidente da Câmara. A segunda deve conter a planta da propriedade,
acompanhada de um diagrama numérico que rigorosamente identifique a sua
situação e área. A terceira destina-se à inscrição de todos os actos jurídicos
sujeitos a registo que recaiam sobre a propriedade. A quarta é destinada aos
endossos (art. 26.º, do Foral da Câmara).

Os títulos de aforamento serão registados na Conservatória do Registo


Predial antes de serem entregues aos concessionários. Os registos serão feitos
a requisição da Câmara e por conta dos concessionários. A requisição
assinada pelo presidente da Câmara será, com o competente título,
59
apresentada na Conservatória por um empregado municipal que rubricará no
diário a nota de apresentação. O Conservador, que poderá exigir preparo, nos
termos legais, feito o registo nos competentes livros da Conservatória, lançará
na terceira parte do título a nota daquele registo que deverá datar e assinar,
apondo-lhe ainda o carimbo da Conservatória (art. 28.º, corpo principal, § 1.º,
2.º e 3.º, do Foral da Câmara).

Além dos actos do registo a que se refere o presente foral, devem ficar
consignados nos títulos todos os demais actos jurídicos que recaiam sobre a
propriedade e sejam sujeitos a registo, devendo as competentes notas deste
ser escritas, datadas, assinadas e carimbadas pelos respectivos
Conservadores (art. 30.º, do Foral da Câmara)

Com efeito, os títulos devidamente passados e registados fazem prova


plena em juízo, tanto no que respeita ao diploma que os conferiu como à
identificação dos prédios a que digam respeito (art. 29.º, do Foral da Câmara).

.
Porém, quando forem verificados em qualquer tempo deficiência de
implantação de um talhão ou lote de terreno, ou ainda quando for verificada
falta de aproveitamento conveniente no prazo legal a este destinado, deverá
ser substituído ou cancelado o registo do respectivo título na Conservatória,
com os efeitos legais correspondentes, tudo em consequência de deliberação e
a requisição da Câmara Municipal (art. 32.º, do Foral da Câmara).

Quanto à transmissão dos direitos inerentes ao título de aforamento,


estes são transmissíveis por endosso mediante a autorização prévia da
Câmara Municipal (art. 33.º, corpo principal do Farol da Câmara). Para que
haja a autorização do endosso é necessário que os terrenos concedidos se
encontrem aproveitados nos termos deste Foral e o enfiteuta não esteja em
dívida de foros e Impostos (§ 1.º). Porém, no caso de o foro estar remido,
sendo assim a propriedade plena e perfeita, só é necessária autorização
quando a transmissão for a favor de indivíduo ou sociedade estrangeira (§ 2.º).

60
Em caso da transmissão por morte do concessionário, em virtude de
acção, execução ou de outros casos em que o endosso não seja ou não possa
ser feito pelo transmitente, deverá o Conservador, ao lançar na terceira parte a
nota de registo da transmissão, consignar na quarta a declaração: “Este título
fica pertencendo a (nome do novo enfiteuta) em virtude de (motivo de
transmissão) sendo tal declaração datada e assinada pelo mesmo Conservador
(art. 34.º, do Foral da Câmara).

Para finalizar, importa dizer que o Foral da Câmara permite a remissão


de foros mediante o pagamento de vinte anuidades, mas apenas quando o
foreiro prove estar quite com a Câmara da importância de todos os foros
anteriores, ter ocupado e aproveitado devidamente os terrenos aforados e estar
em dia com as contribuições que incidem sobre os mesmos (art. 35.º, corpo
principal do Foral da Câmara). Para efeito desta norma, consideram-se não
ocupados ou aproveitados os terrenos onde existem construções inacabadas,
edifícios em ruínas, demolidos, inabitáveis ou que não ofereçam condições de
segurança, ainda que tais terrenos se mostrem murados, e, de um modo geral,
todos os terrenos onde não exista construção alguma ou a que não tenha sido
dado destino próprio (§ único do art. 35.º, do Foral da Câmara).

Pelo art. 36.º do Foral da Câmara, prescreve-se que o domínio directo é


imprescritível.

Na sua parte final o Foral da Câmara Municipal consagra duas normas


fundamentais: uma relativa aos terrenos em regime de propriedade perfeita e
outra relativa ao direito subsidiariamente aplicável à concessão de terrenos.

Em relação aos terrenos em regime de propriedade perfeita abrangidos


pela área urbana da cidade de Bissau e que não se mostrem aproveitados,
prevê-se um imposto anual, cujo montante será igual a 2$00 por metro
quadrado ou fracção no primeiro ano; 3$00 por metro quadrado ou fracção, no
segundo ano; 5$00 por metro quadrado ou fracção, no terceiro ano; 7$50 por
metro quadrado ou fracção, no quarto ano e nos seguintes até que se verifique

61
o aproveitamento dos referidos terrenos. No entanto, a cobrança do imposto
deixará de se efectuar a partir do momento em que, os interessados, munidos
da necessária licença municipal, iniciem as obras de utilização dos terrenos
para o destino que lhe for próprio, não as interrompam, por mais de três meses
e as terminem no prazo de dois anos (art. 42.º do Foral da Câmara)

No que se refere ao direito subsidiariamente aplicável, estabelece-se no


art. 44.º, será aplicável, aos casos omissos no Foral da Câmara, Regulamento
de Ocupação e Concessão de Terrenos nas Províncias Ultramarinas, aprovado
pelo Decreto n.º 43894, de 6 de Setembro de 1961 e publicado no Suplemento
ao Boletim Oficial n.º 38.

5. O uso do solo na Lei de Minas e dos Minerais

5.1. Considerações de enquadramento

A exploração das minas vem regulada na Lei n.º 1/2000, de 24 de Julho,


conhecida por Lei de Minas e dos Minerais.
A Lei de Minas estabelece o regime geral da prospecção e exploração
de minas.
Todavia, a nossa análise vai limitar-se apenas a certos aspectos do seu
regime, vg., aqueles que consideramos mais importantes facultar a um leitor
que pretende ter uma ideia suscita do regime jurídico em vigor em matéria de
prospecção e exploração de minas.

Assim, a nossa análise limitar-se-á aos seguintes aspectos: objectivos,


âmbito, objecto de aplicação da Lei de Minas; conceito de mina e de figuras
afins; titularidade de direito e formas de acesso às minas e mirais pelos
particulares; alteração dos direitos de mineração; transmissão do direito de
mineração; extinção do direito e mineração e mecanismos de resolução de
litígios.
62
Passamos agora à análise de cada um destes aspectos.

5.2. Objectivo, âmbito, objecto de aplicação da Lei de Minas

É objectivo da Lei de Minas e dos Minerais (LMM), estabelecer as


disposições que regulam os direitos relativos aos recursos minerais do País, os
regimes do seu aproveitamento, a competência para execução e fiscalização
do cumprimento dos seus objectivos, isto é, a prospecção, a mineração, o
tratamento e a comercialização dos recursos minerais no território da Guiné-
Bissau (art. 1.º).
O seu âmbito de aplicação abrange todos os assuntos relacionados com
a exploração, extracção e a produção comercial de substâncias minerais
existentes no solo ou no subsolo e sob as águas territoriais à excepção do
petróleo (art. 2.º, 1ª parte da LMM).

Para prevenir o conflito entre as legislações que regulam a utilização e


aproveitamento do solo, no art. 23.º da LMM, o legislador consagrou o princípio
de prevalência da Lei de Minas e dos Minerais sobre qualquer outro
instrumento jurídico com incidência.
Eis o conteúdo literal da norma: «um direito de mineração e os direitos
por ele conferidos estarão sujeitos às disposições desta Lei, e nenhuma
regulamentação, ou outra legislação alterarão de forma alguma os Direitos de
Mineração concedidos ao abrigo da presente Lei».

5.3. Conceito de mina e de figuras afins

O legislador no art. 9.º da LMM, estabelecendo o conceito de mina,


procura diferenciá-lo de figuras afins maxime mineração, mineral e petróleo.

Por mina entende-se «(...) qualquer local, fosso, poço, carreira, plano ou
outra escavação e qualquer galeria, vala, pista, veio, filão, recife, salina ou obra
63
que de algum modo envolva qualquer operação relacionada com a actividade
mineira, executada juntamente com os edifícios, instalações, construções e
dispositivos, quer estejam à superfície ou no subsolo, e que sejam usados no
contexto de tal operação ou para extracção, o tratamento ou a preparação de
qualquer mineral com o propósito de beneficiar ou refinar minerais» (art. 9.º, n.º
18, da LMM).

Pelo contrário, a Mineração significa a extracção e o tratamento de


materiais naturais, quer sob a forma sólida, líquida ou gasosa, provenientes da
superfície terrestre ou do seu subsolo, com o objectivo de obter e tratar tais
materiais ou os seus derivados para a venda posterior (art. 9.º, n.º 19, da
LMM).

Por Mineral, entende-se qualquer substância material, orgânica,


inorgânica metálica ou não metálica, que exista em forma sólida, líquida ou
gasosa, que ocorra naturalmente à superfície terrestre, ou no seu subsolo,
excluindo o petróleo (art. 9.º, n.º 20, da LMM).

E por Petróleo, entende-se um hidrocarboneto complexo gasoso e/ou


líquido de ocorrência natural que, após a destilação e remoção de impurezas,
fornece uma série de combustíveis, produtos petroquímicos e lubrificantes, mas
não inclui carvão ou xisto betuminoso (art. 9.º, n.º 26, da LMM).

5.4. Titularidade de direito e formas de acesso às minas pelos


particulares

O art. 3.º, 1ª parte começa por reafirmar a propriedade do Estado sobre


o solo, o subsolo, as águas e todos os recursos minerais, prescrevendo que as
suas posses são inalienáveis, imprescritíveis e inextinguíveis.
No mesmo sentido, prescreve-se, na segunda parte do artigo citado, que
todos os direitos de posse, prospecção, extracção, tratamento e alienação de

64
minerais e dos seus subprodutos são feitos através do órgão do Estado
encarregue do Sector.
E na mesma esteira, vem o art. 7.º dizer que os direitos de mineração
serão concedidos e exercidos exclusivamente de acordo com um sistema sob o
qual qualquer indivíduo ou qualquer entidade poderão ter acesso através de
um processo público normalizado.
Também no mesmo sentido, dispõe o art. 12.º da LMM que poderá o
Estado, no exercício do direito de propriedade, conceder Direitos de Mineração
directamente a órgãos estatais, através de organismos descentralizados ou
conferir a particulares, a entidades legais, nacional ou estrangeira, ou a uma
Comunidade, devidamente reconhecidos pelo Governo.

Resumindo, o legislador, ao mesmo tempo que faz reafirmar a


propriedade do Estado sobre os recursos minerais existentes nos solos e
subsolos, admite o acesso de todos os particulares ao seu aproveitamento nos
termos fixados pelos órgãos do Estado encarregue do sector Mineiro.

As formas a partir das quais os particulares poderão aceder ao


aproveitamento dos recursos minerais estão previstas no art. 15.º da LMM. Eis
as formas:
Licença de mineração artesanal; licença de prospecção; arrendamento
de mineração; retenção de arrendamento de mina; licença de mineração e
certificado de abandono de operações de mineração.

Mas antes de passarmos para análise do regime jurídicos de cada uma


destas formas, importa advertir para duas coisas: a primeira tem a ver com a
questão da titularidade de direitos sobre o solo e a segunda, com a questão de
direito costumeiro das comunidades locais.

Quanto à primeira questão, o legislador da Lei de Minas e dos Minerais


não assumiu uma posição clara quanto à propriedade de solo. Apesar de, no
art. 3.º, 1ª parte, afirmar que o solo, o subsolo, as águas e todos os recursos
minerais pertencem ao Estado, ao longo de todo o texto da Lei de Minas e dos
65
Minerais encontramos disposições dispersas que parecem apontar no sentido
da propriedade privada do solo. Por exemplo, ao definir o Contrato de Acesso
no art. 9.º, n.º 7, afirma que «Contrato de Acesso significa um contrato
celebrado voluntariamente ou, através de Arbitragem, entre o Titular de um
Direito de Mineração e qualquer proprietário, ocupante legal ou Comunidade,
que tenham direitos reconhecidos pelo Governo à superfície de terras
relativamente às quais subsista tal Direito de Mineração, ou que seja
necessário proporcionar acesso às terras abrangidas pelo Direito de
Mineração, para regular a Prospecção e as Operações de Mineração e/ou
outras actividades a ser executadas nessas terras que esta Lei autoriza».
No art. 11.º da LMM prescreve-se que, «salvo disposições em contrário
consignadas nesta e outra Lei, nenhuma das cláusulas desta Lei operará de
forma a impedir que o proprietário ou o ocupante legal de qualquer terreno, não
abrangido por um Direito de Mineração, extraia Materiais de Construção, na
abertura de estradas ou para fins agrícolas, quando os materiais assim
extraídos se destinem a uso dessas terras e sem fins lucrativos».
Nos arts. 30.º, 31.º, 32.º, 79.º e outros faz-se igual referência ao
proprietário ou ocupante legal.

Ora bem, seria inadequado pensar, em relação a estes artigos, que, com
referência ao proprietário da terra, se pretende referir ao Estado. A referência
ao proprietário só tem sentido se for entendida como uma pessoa privada
distinta do Estado. Sendo este o sentido adequado, deve-se dizer que
legislador da Lei de Minas e dos Minerais se relevou incoerente quanto à
questão da titularidade do solo. Pois nos termos da Lei da Terra, o Estado é o
proprietário do solo e os particulares só podem ter algum direito sobre o solo a
título do direito de uso privativo, o qual pode ser atribuído tanto por via de um
contrato administrativo de concessão como por via do uso consuetudinário.

Feita esta consideração, resta uma questão curiosa que é a de saber


que sentido poderá dar à expressão ocupante legal.
Fala o legislador do proprietário ou ocupante legal de um terreno. Se a
expressão “proprietário” pode ser entendida como o titular de um direito de uso
66
privativo sobre o solo, o que se deverá entender pela expressão “ocupante
legal”? Será que se deve evitar qualquer tendência da sua recondução ao
titular do direito de uso privativo reconhecido por via de uso consuetudinário?
Parece-se que não é aceitável esta última interpretação, porque, no
limite, também se pode considerar o titular de um direito de uso privativo
reconhecido ou atribuído por via de uso consuetudinário como um ocupante
legal na medida em que é a própria lei que reconhece essa forma de acesso ao
solo às comunidades legais.
Aliás, se reconduzirmos a expressão “proprietário” ao titular de direito de
uso privativo adquirido por via do contrato administrativo de concessão e
recusarmos a recondução da expressão ocupante legal ao titular de direito de
uso privativo adquirido por via de uso consuetudinário, a expressão ocupante
tradicional ficaria sem correspondência prático-legal e sem sentido útil.
Portanto, o melhor aproveitamento que se poderá fazer da expressão ocupante
legal, é admiti-la como sinónimo do titular de direito de uso privativo adquirido
por via do uso consuetudinário.

Esclarecida a primeira questão, passamos agora para a segunda, ou


seja, a questão do acolhimento do direito costumeiro das comunidades locais,
na Lei de Minas e dos Minerais.

Importa antes dizer que, não obstante a reafirmação da propriedade do


Estado sobre recursos minerais existentes nos solos e subsolos, o legislador
da Lei de Minas e dos Minerais não se descorou da realidade da sociedade
guineense, constituída por uma pluralidade de etnias dotadas, cada uma delas,
de regras jurídicas próprias que disciplinam a utilização do solo e dos recursos
neles existentes.
Nos termos do art. 11.º da LMM permite-se ao proprietário ou o
ocupante legal de qualquer terreno, não abrangido por um Direito de
Mineração, extrair Materiais de Construção, na abertura de estradas ou para
fins agrícolas, quando os materiais assim extraídos se destinem a uso dessas
terras e sem fins lucrativos.

67
Além desta forma de acesso, o legislador consagrou ainda uma forma
particular de acesso dos membros de comunidades locais aos recursos
minerais: a chamada licença de mineração artesanal, que será objecto da
nossa análise mais à frente.

Por agora retomas a questão de formas de acesso ao aproveitamento de


recursos minerais previstas na Lei de Minas e do Minerais.

5.4.1. Licença de mineração artesanal

A licença de mineração artesanal é uma das formas a partir da qual


pode uma particular fazer o aproveitamento dos recursos minerais (art. 15.º, n.º
1 da LMM).
A licença de mineração artesanal confere ao seu titular direitos
exclusivos de extracção mineira na área para qual a licença foi concedida (art.
33.º e art. 42.º, 1ª parte da LMM).
Podem ser titulares destes direitos apenas cidadãos nacionais
originários (art. 17.º, da LMM). Ao cidadão nacional originário ou comunidade
local que tenha descoberto um depósito mineral é reconhecido a faculdade de,
se quiser, requerer ao Ministro responsável pelo sector das minas, atribuição
de uma licença de mineração artesanal (art. 34.º, da LMM).

A área máxima que uma licença de mineração artesanal poderá cobrir é


de quatro hectares (art. 35.º da LMM).
Não é permitida a acumulação da licença com qualquer outra. A cada
indivíduo ou comunidade local só é permitida ser titular de uma única licença
de mineração artesanal em todo o território nacional (art. 36.º, da LMM).
A licença tem o prazo de validade de dois anos renovável por igual
prazo, na falta de ocorrência de qualquer facto que a Lei de Minas considera
relevante para a recusa da sua renovação (art. 40.º, da LMM).

68
Pela produção dos minerais na área abrangida pela licença em apreço, o
seu titular, em contrapartida, pagará ao Ministério responsável pelo sector uma
taxa equivalente a cinco por cento (5%) dos minerais produzidos, em espécie
ou dinheiro, a título de Royalty (art. 3.º, n.º 32 e art. 43.º, da LMM).

5.4.2. Licença de prospecção

A licença de prospecção é uma outra forma a partir da qual podem os


particulares aceder aos recursos minerais (art. 9.º, n.º 16 e art. 15.º, n.º 2 da
LMM).
Diferentemente de licença de mineração artesanal, a licencia de
prospecção pode ser atribuída a quaisquer indivíduos, nacionais ou
estrangeiros, entidades e os seus encarregados que participem em operações
de prospecção (art. 49.º, da LMM).

A licença não confere ao seu titular direitos exclusivos sobre qualquer


área, ou qualquer prioridade no tocante ao requerimento de um arrendamento
de mineração numa determinada área e muito menos o direito de mineração
(art. 50.º, 2ª parte e art. 51.º corpo principal, da LMM).
Como o próprio nome sugere, a licencia de prospecção confere, ao seu
titular, apenas o direito de desempenhar os actos e acções necessários, ou
razoavelmente apropriados, para proceder à procura de depósitos minerais
(art. 50.º, 1ª parte, da LMM).

Além destes actos, a licença abrange ainda alguns direitos que, muito
embora não se circunscrevem à actividade de prospecção, são acessórios ou
complementares a esta, o caso do direito de: submeter espécimes minerais
para análise, com um peso máximo de vinte quilos cada, com o propósito de
determinar a presença, a quantidade e a natureza dos minerais contidos no
espécime; submeter a tratamento, não mais de um metro cúbico de material,
de forma a obter o espécime mineral; abrir um furo, por qualquer processo, até
uma profundidade de não mais de cinquenta metros, à procura de espécimes
69
minerais; escavar uma fossa, por qualquer processo, não superiores a três
metros de profundidade, largura e comprimento para obtenção de espécimes
minerais; pesquisar e elaborar mapas da superfície da terra, com o propósito
de localizar minerais; proceder ao levantamento, por meios geofísicos,
geoquímicos, de fotografia aérea e por satélite, ou por meio de radar, à
superfície da terra ou sobre a mesma (art. 51.º, n.os 1, 2, 3, 4 5 e 6 da LMM).

A licença de prospecção tem o prazo de validade de dois anos (art. 50.º,


1ª parte, in fine da LMM), renovável por um período não superior a dois anos, a
requerimento do interessado, não havendo incumprimento pelo seu titular dos
aspectos essenciais da Lei de Minas (art. 57.º, da LMM).

O requerimento para a concessão de licença é dirigido ao Ministro


responsável para o Sector (art. 53.º corpo principal da LMM).
O Ministro tem um poder vinculado de emitir licença. A licença deverá
ser emitida num prazo de 60 dias após a recepção do requerimento. Ou seja, é
vedado ao Ministro a possibilidade de fazer a opção entre emitir ou não emitir
licença.
O Ministro só poderá recusar a emissão de licença de prospecção por
ocorrências de um dos motivos expressamente previstos na Lei de Minas, que
são: impedimentos legais de requerente possuir uma Licença de prospecção
ao abrigo da Lei de Minas; a violação pelo requerente dos seus deveres legais
no âmbito de outro direito de mineração anteriormente concedido; e a
condenação do requerente por alguma contravenção da Lei de Minas (art. 54.º,
n.os 1, 2 e 3 da LMM).

A Lei de Minas estabelece expressamente algumas obrigações para o


titular de licença de prospecção.
Assim, nos termos do art. 59.º, o titular de licença de mineração deverá
iniciar as operações de prospecção dentro de sessenta dias contados da data
de emissão de licença;

70
Deverá apresentar ao Ministro, semestralmente, um relatório do
progresso dos trabalhos desenvolvidos que servirá de suporte para efeitos da
renovação da licença;
Deverá requerer um Arrendamento de Mineração ao descobrir qualquer
depósito mineral de possível valor comercial, dentro de trinta (30) dias da data
da descoberta, ou, em alternativa, comunicará ao Ministro tal descoberta num
prazo de sessenta dias contados da data da descoberta.
A comunicação é acompanhada de um mapa com a identificação do
local da descoberta, e um relatório contendo todas as informações obtidas que
digam respeito á referida descoberta e aos minerais nela existentes (art. 59.º,
n.os 1, 2, 3 e 4, da LMM).

Mais, em contrapartida da concessão de licença de prospecção o seu


titular fica obrigado ao pagamento de uma taxa. O valor da taxa via consoante
a nacionalidade e natureza da pessoa. Com efeito, tratando-se de cidadão
nacional taxa é de 60.000 FCFA. Tratando-se de um cidadão estrangeiro a taxa
é de 300.000 FCFA. E tratando-se de uma pessoa que seja empregada ou
agente de um entidade, nacional ou estrangeira, a taxa é de 600.000 FCFA
(art. 60.º, n.os 1, 2 e 3, da LMM).

5.4.3. Arrendamento de Mineração

Nos termos do art. 9.º, n.º 2, da LMM, o Arrendamento de Mineração é


uma área de terreno de utilização exclusiva pelo seu titular, para o exercício
dos respectivos direitos de mineração e a execução de operações de
mineração, de acordo com os termos e as condições estabelecidos na Lei de
Minas.

Ao emitir um Arrendamento de Mineração, o Governo deve assegurar


antes que o requerente esteja em condição de proceder à exploração e à
extracção de substâncias minerais dentro da área do Arrendamento de
Mineração, com vista à sua comercialização (art. 62.º, da LMM).
71
O Arrendamento de Mineração pode ser concedido a qualquer particular,
nacional ou estrangeiro (art. 62.º, da LMM). É permitido a acumulação de
vários Arrendamentos de Mineração (art. 66.º, da LMM).
Sempre que haja mais de um requerimento Arrendamento de Mineração
sobre a mesma área de terreno, a prioridade deverá ser concedida àquele que
primeiro tenha dado entrado no Ministério (art. 67.º, da LMM). Para esse efeito,
todos os requerimentos de Arrendamento de Mineração apresentados
devidamente pelos requerentes são registados, imediatamente, num registo
mantido para esse fim, e atribuídos, um número com indicação da data e hora
em que o requerimento foi recebido.
Sobre esse registo é emitido um recibo oficial de entrega a favor do
requerente (art. 68.º, da LMM).

O Arrendamento de Mineração é válido por um período de 25 anos,


renovável sucessivamente por igual período. A sua renovação é, todavia,
condicionada à renovação da Licença de Mineração (art. 62.º, da LMM).

Um Arrendamento de Mineração é constituído por uma Unidade de


Arrendamento de Mineração ou por unidades de Arrendamento de Mineração
contíguas, que formam uma área com uma superfície máxima de 10.000
hectares (art. 65.º, da LMM).
O Arrendamento de Mineração abrange todos os minerais que possam
existir dentro da Área do Arrendamento (art. 64.º, da LMM)

Nos 180 dias subsequentes a emissão de um Arrendamento de


Mineração, o terreno abrangido pelo Arrendamento é convenientemente
inspeccionado, e os seus limites são assinalados com marcos colocados em
cada um dos seus cantos e ao longo das partes laterais do perímetro exterior,
com um intervalo mínimo de 500 metros entre cada um deles (art. 76.º, da
LMM).
Se durante o termo de validade do Arrendamento de Mineração, os
limites do mesmo forem modificados por qualquer razão, os novos limites
72
deverão ser objecto de reconhecimento através de assinalação com marcos
dentro de um prazo de 180 dias após essa emenda (art. 77.º, da LMM). O
respeito destas normas é fundamental para a manutenção do Arrendamento de
Mineração sobre qualquer área do território pelo seu titular, pois o
incumprimento dará lugar à revogação do Arrendamento de Mineração (art.
75.º, in fine da LMM).

Em contrapartida do concessão do Arrendamento de Mineração, o seu


titular paga uma taxa.
O valor da taxa varia em função do tempo de duração do Arrendamento
de Mineração.
Assim, nos primeiros quatro anos do Arrendamento, a taxa é de 600
FCFA por ano, por Hectare Mineiro. Já a partir do quinto ao oitavo ano, a taxa é
de 1.200 FCFA por ano, por Hectare Mineiro (art. 72.º, da LMM)11.

O acto de Arrendamento de Mineração poderá ser revogado, e


consequentemente ser passada a respectiva área de território para o Estado ou
para o terceiro se passados oito anos, o seu titular não tiver realizado uma das
seguintes acções: requerimento de uma Licença de Mineração, ou
cumprimento das obrigações impostas pela Licença de Mineração;
requerimento de uma extensão única de dois anos, para desenvolver mais
actividades de prospecção, a troco de uma taxa de concessão mineira anual
equivalente a 2.400 FCFA por hectare, mineiro; submissão de um requerimento
de produção mineira; requerimento de uma retenção do arrendamento de mina,
em vez de apresentar um requerimento de produção mineira, ou o titular estiver
impossibilitado de cumprir as exigências da Licença de Mineração devido a
condições de natureza não económica que estejam fora do seu controlo (art.
73.º, n.os 1, 2, 3 e 4 da LMM).

11
As condições de pagamentos estão previstas no art. 71.º da LMM.

73
5.4.4. Retenção de Arrendamento de Mina

É uma licença provisória que desobriga o titular de Arrendamento de


Mineração e/ou de uma Licença de Mineração do desempenho das actividades
de acordo com a Lei de Minas, por razões de ordem económicas, temporárias,
imprevisíveis (art. 9.º, n.º 31.º e art. 79.º corpo principal da LMM).

A licença de retenção de arrendamento de mina é concedida mediante o


requerimento do interessado dirigido ao Ministro responsável pelo Sector.

O requerimento é acompanhado do pagamento de uma taxa de estudo


no valor de 3.000.000 FCFA, e de estudos preparados por peritos apropriados
ou por consultores aceitos pela indústria mineira, que devem abranger: a
extensão das condições económicas adversas, as perspectivas de
recuperação, e a importância comercial, no futuro, do depósito mineral ou da
mina, ou; as condições do mercado, as tendências e os factores económicos
relevantes que afectam o desenvolvimento ou a reabertura da mina; e
quaisquer outras informações que o Ministro possa razoavelmente exigir, com
respeito às propostas do requerente para a retenção e o desenvolvimento
futuro do depósito, ou a produção futura a partir deste (art. 79.º, corpo principal
e art. 80.º, n.os 1 e 2, da LMM).

No próprio requerimento o interessado deve indicar as razões pelas


quais se requer a retenção de arrendamento de mina. Nos termos da Lei de
Minas o interessado só pode invocar um dos dois motivos, que são:

Primeiro, o titular identificou um depósito mineral dentro da área do


Arrendamento de Mineração, susceptível de ter valor comercial, mas esse
depósito mineral não pode ser explorado de imediato, devido às condições
económicas situadas fora do controlo do Titular, que sejam ou possam ser de
natureza temporária, ou;
Segundo, as operações de Mineração não podem prosseguir, devido às
condições adversas no mercado ou outros factores económicos situados fora
74
do controlo do Titular, que sejam ou possam ser de carácter temporário (art.
79.º, n.os 1 e 2 da LMMM).

A licença de retenção do arrendamento de mina é concedida por um


período de 3 mês renovável por igual período apenas uma vez (art. 81.º, n. os 1
e 2 da LMM).

5.4.5. Licença de Mineração

A Licença de Mineração é uma licença concedida para desenvolver,


minerar, produzir, tratar, comercializar e vender minerais, produtos minerais e
seus derivados produzidos num Arrendamento de Mineração, de acordo com
os termos e condições da Lei de Minas (art. 9.º, n.º 14 e art. 15.º, n.º 5 da
LMM).

Licença é concedida pelo Ministro responsável pelo sector mineiro, a


requerimento do interessado, mediante um parecer favorável dos Serviços de
Geologia e Minas (art. 103.º, corpo principal, ab initio).
O requerimento de autorização para a produção mineira é acompanhado
necessariamente do programa de operações de mineração; do plano de
ambiente do requerente; das propostas do requerente a respeito do emprego,
da assistência médica, do alojamento e da formação profissional daqueles
cidadãos nacionais que serão empregados ou agentes do requerente no local
da mina; e do parecer de uma empresa de consultaria independente e de
reconhecida internacionalmente (art. 103.º, corpo principal in fine e art. 105.º,
n.os 1, 2, 3, 4 e 5, da LMM).

Para que haja a concessão de licença de mineração é fundamental que


o requerente demonstre, através do parecer da empresa de consultaria
independente, que: existem reservas suficientes e exploráveis comercialmente;
a área de terreno, em relação à qual se pede uma Licença de Mineração, não
excede à área razoavelmente necessária para a execução do programa de
75
Operações de Mineração proposto pelo requerente; as reservas foram
avaliadas segundo normas internacionalmente reconhecidas de boas práticas
mineiras e que o programa de operações de mineração proposto pelo
requerente assegura o uso eficiente e benefício dos recursos minerais da área
relativamente à qual se solicita a Licença de Mineração; o Plano Ambiental do
requerente obedece às especificações e às práticas estabelecidas por normas
internacionais para a gestão do meio ambiente, no tocante à forma como é
afectado por Operações de Mineração; as dimensões e a natureza das
Operações de Mineração propostas pelo requerente respeitantes ao emprego e
à formação dos cidadãos nacionais são adequadas, e; o requerente não está a
infringir nenhuma das cláusulas do seu Arrendamento de Mineração, nem
nenhuma das disposições desta da Lei de Minas (art. 103.º, n.os 1, 2, 3, 4, 5 e 6
1ª parte da LMM).

Uma vez observada estas formalidades, v.g., tendo o requerente o


parecer favorável de uma empresa de consulta independente
internacionalmente reconhecida e o parecer favorável dos Serviços de
Geologia e Minas, o Ministro fica vinculado a conceder a Licença, a qual deverá
ser feita 120 dias depois da recepção do requerimento (art. 103.º, corpo
principal, 1ª parte da LMM).

A licença é concedida por um prazo solicitado pelo requerente, o qual


não deverá ultrapassar um período de 25 anos. A licença é renovável a
requerimento do interessado por um período máximo de 25 anos, observadas
as condições previstas nos arts. 109.º a 113.º (art. 104.º, da LMM), inter alia, o
requerimento de renovação será acompanhado de uma taxa de examinação de
3.000.0000 de FCFA (art. 110.º).

Além dos direitos exclusivos e expressamente reconhecidos para levar a


cabo Operações de Mineração e Operações de Prospecção dentro da área do
Arrendamento de Mineração, a licença atribui ainda ao seu titular determinados
direitos implícitos que resultam da necessidade de executar todos os outros
actos e acções que sejam necessários ou razoavelmente apropriados para o
76
desenvolvimento dessas Operações, nomeadamente o direito de, dentro dos
limites do seu Arrendamento de Mineração, pessoalmente ou por intermédio
dos seus Arrendamento de Mineração ou por intermédio dos seus empregados
ou agentes: celebrar o Contrato de Arrendamento de Mineração e tomar todas
as medidas razoáveis, à superfície ou abaixo dela, para fins das Operações de
Mineração; erigir o equipamento, as instalações e os edifícios necessários para
fins da extracção mineira, do transporte, da beneficiação ou do tratamento dos
minerais recuperados no decorrer das Operações Minerais; dispor de qualquer
produto mineral obtido, por venda ou por outros meios, dentro ou fora do
território nacional; fazer prospecções dentro da área mineira, relativamente a
quaisquer minerais, e; empilhar ou descarregar quaisquer produtos minerais ou
desperdícios (art. 108.º, corpo principal e n.º 1 a 5 da LMM).

5.4.6. Limites e condicionantes de acesso aos recursos minerais

A Lei de Minas estabelece restrições de acesso aos recursos minerais


quer em relação às pessoas quer em relação a determinadas áreas de terreno.

Em relação às pessoas, temos interdições comuns e interdições


específicas ou por motivo de funções pública.

No que concerne às interdições comuns de acesso, estão impedidos de


obter direito de mineração: o menor de 18 anos de idade; o falido; ou quem
venha a ser declarado falido nos termos de qualquer lei escrita, ou entre em
acordo ou esquema de acordo com os seus credores, ou venha a se beneficiar
de qualquer processo legal, destinado a auxiliar devedores falidos ou
insolventes; uma Entidade que esteja em vias de liquidação12; e os condenados
por uma infracção prevista na Lei de Minas (art. 19.º da LMM).

12
Exceptuam-se os casos de liquidação que faça parte integrante de um esquema para a
reestruturação da entidade ou para fusão da entidade com uma outra companhia.

77
No que diz respeito às interdições específicas de acesso, ou interdições
por motivo de funções públicas, estão impedidos de obter quaisquer direitos de
mineração, durante o exercício das suas funções e até 3 anos após o seu
término:
Os membros dos órgãos de soberania nacional, os funcionários
superiores e subalternos dos órgãos de Tutela do Sector Mineiro e das minas e
das suas dependências;
Os membros das Forças Armadas e Forças Paramilitares no activo;
Indivíduos que, nas divisões administrativas do país, exerçam funções
como governadores, presidentes, administradores, intendentes, comissários de
polícia, representantes de divisão e seus subordinados, presidentes de
municípios, conselhos municipais e notários, chefes de repartições de registo
de bens imóveis, e membros do respectivo pessoal; salvo se designado pelo
titular, os administradores, empregados, trabalhadores, arrendatários, técnicos
e conselheiros do titular dentro de uma área com um perímetro de 10 km do
Arrendamento de Mineração onde trabalham, e;
Os parentes consanguíneos dos indivíduos supracitados até segundo
grau, os seus conjugues e os respectivos familiares consanguíneos em
primeiro grau (art. 20.º da LMM).

A proibição não abrange, todavia, os direitos de mineração adquiridos


antes da tomada de posse ou do início do período de função ou de cargo.
Porém, tratando-se de entidades em que o indivíduo impedido seja um sócio ou
um accionista principal estabelecido antes da sua nomeação para o cargo
público, o indivíduo impedido poderá continuar como sócio dessa entidade,
desde que não participe na administração ou na gestão da entidade, e as
acções ou quotas dessa entidade pertencentes ao indivíduo impedido sejam
colocadas em fideicomisso para serem administrados sob o controle de uma
terceira pessoa (art. 21.º da LMM).

Comum a ambas interdições, prescreve-se a nulidade do acto de


concessão de direito de mineração praticado em violação das normas que
impõem impedimentos.
78
A nulidade é declarada ex ofice pelo Ministro e implica a transferência
para o Estado, a título gracioso, dos direitos adquiridos pelo particular infractor
(art. 22.º, LMM).

Em relação às áreas de acesso, salvo a autorização da Autoridade


Competente, é proibido desenvolver operações de mineração ou de
prospecção a menos de 100 metros de: área destinada para servir de
cemitérios; local de algum monumento antigo ou monumento nacional; local de
qualquer edifício, ou represa e massa de água aí estabelecida, pertencente ao
Estado; um aeroporto ou aeródromo (art. 26.º, n.os 1, 2, 3 e 4 da LMM).

Em especial é proibido, salvo autorização da autoridade competente, o


desenvolvimento de operações de mineração ou de prospecção: a menos de
200 metros de distância de qualquer instalação militar; na área reservada para
qualquer linha ferroviária ou que esteja a 100 metros de distância de qualquer
linha ferroviária; em qualquer rua, estrada ou auto-estrada; na área integrada
num Parque Nacional; na área contida dentro de uma Floresta Nacional ou que
seja usada como viveiro florestal, plantação, depósito de madeiras, serração,
ou outra instalação usada em actividades florestais13; e nas áreas que devem
formar os limites de qualquer cidade, município ou aldeia para os quais seja
estabelecido um Conselho14 ao abrigo da legislação (art. 26.º, corpo principal e
n. os 5, 6, 7, 8, 9 e 10 da LMM).

5.5. Transmissão dos direitos de mineração

A transmissão dos direitos de mineração aparece regulada no capítulo


XVII, vg., art. 126.º a 130.º, da Lei de Minas.

13
Esta proibição reflecte a preocupação da protecção do ambiente nas operações de mineração e de
prospecção, vg., o princípio de prevenção.
14
No modelo de organização administrativa adoptado na Guiné-Bissau não existe a figura de Conselho.
A referência ao Conselho aqui poderá ter resultado do erro na transposição de outra realidade da qual
se inspirou a legislador da Lei de Minas.

79
Regra geral, a transmissão de direito de mineração é permitida, mas
está condicionada ao consentimento prévio do Ministro responsável do Sector
Mineiro. (art. 126.º da LMM).
Qualquer transmissão efectuada sem o consentimento prévio do Ministro
é nula e, como tal, não produzirá qualquer efeito (art. 130.º da LMM).

O requerimento de consentimento para a transmissão de direito de


mineração é acompanhado de pagamento de 600.000 FCFA como taxa de
estudo (art. 128.º da LMM). No requerimento de consentimento deve o
requerente fazer constar as qualidades da entidade para quem se pretende
transmitir os direitos por forma a que o Ministro possa aferir a sua aptidão face
às exigências impostas na Lei de Minas (art. 127.º da LMM).

Para efeito de aplicação da norma do art. 126.º, que condiciona a


transmissão ao consentimento do Ministro, considera-se ainda como
transmissão de um direito de mineração o estabelecimento de uma associação
de capital (“joint venture”) ou de um consórcio mineiro, uma venda, uma
hipoteca, um ónus ou outra forma de cessão ou encargo hipotecário (art. 129.º
da LMM).

Todavia, não obstante essa restrição, ao titular de um direito de


Mineração é permitido ainda celebrar acordo de opção, por meio de um
instrumento legal, do qual poderá resultar a venda ou a cessação do
Arrendamento de Mineração ou do Alvará de Retenção do Arrendamento de
Mina. Tais opções, assim como os termos da sua resolução final deverão ser,
contudo, submetidos ao Ministro, a título confidencial, para sua informação.

5.6. Garantia jurídica dos particulares

A Guiné-Bissau, sendo um país em vias de desenvolvimentos, com


graves problemas, sociais e económicos e financeiros, a atracção de
investimento, maxime no sector de minas, representa o país um interesse
80
público, pela mais-valia que este poderá proporcionar à economia e ao bem-
estar da sua população, nomeadamente pela criação e multiplicação dos
postos de trabalhos; pela ampliação de fontes de receita tributária para o
Estado; e pelo fornecimento da matéria-prima ao mercado interno e externo, o
qual vai contribuir para o equilíbrio da balança de pagamento.

Por estas razões, encontra-se disseminada nas legislações internas todo


um conjunto de preocupações voltas a incentivar, acarinhar o aparecimento do
investimento estrangeiro. É elucidativo desta situação o Código do
Investimento, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 4/91 de 14 de Outubro.

A Lei de Lei de Minas e dos Minerais não é alheia a esta preocupação.


Na mesma esteira procura incentivar o investimento no sector mineiro e criar
mecanismos de garantia dos direitos dos particulares investidores nesse
sector. Nesta ordem de ideia, dispõe o art. 5.º que “ a indústria mineira é de
interesse público e a promoção do investimento neste sector é de interesse
nacional. A extracção mineira, em todas as suas fases, é considerada de
interesse público. Consequentemente e, de acordo com esta lei, é apropriada a
criação de incentivos para encorajar o investimento na indústria mineira e no
seu desenvolvimento”.
Na mesma direcção envereda o disposto no art. 3.º, 2ª parte, in fine, ao
estatuir, inter alia, que (...) o Governo terá de desenvolver um sistema de
registos, incentivar o investimento, regulamentar as operações minerais a nível
nacional (...).

É também esse o espírito que preside as regras sobre a resolução dos


eventuais litígios que possam surgir entre o Governo e a Empresa titular de
licença de Mineração.
Em caso de litígios na interpretação e aplicação das disposições da Lei
de Minas e dos Minerais, não deverá o Governo partir para imposição de uma
decisão unilateral sua, mas antes, na impossibilidade de funcionamento do
mecanismo de conciliação, recorrer à arbitragem (art. 101.º art. 115.º, n.º 2 e
art. 180.º, da LMM).
81
Assim, ao prever aqui arbitragem como via privilegiada para a resolução
de litígios, o Estado, através do legislador, quer assegurar ao investidor, no
domínio mineiro, a garantia de que ele (o Estado) é uma pessoa de bem (que
comporta de boa fé) e que não prejudicará injustamente o seu interesse
económico da contraparte.

É também, por fim, esta ideia que norteia as regras sobre a revogação,
na expressão da lei, cancelamento, das licenças de mineração por motivo de
incumprimento das obrigações por parte do seu titular, ao preverem a
revogação como acto de último recurso, que só poderá funcionar se decorrido
o prazo previsto na lei, o mínimo de 90 e máximo de120 dias, após a
notificação do faltoso, este não tomar providências para sanar e nem iniciar a
sanar a situação, ou, na insusceptibilidade de sanação, não tenha oferecido
uma compensação razoável (arts. 25.º, 125.º, n.º 3 131.º e 132.º da LMM).

5.7. Preservação do meio ambiente

As normas sobre a preservação do ambiente aparecem especialmente


previstas no capítulo XII, vg., art. 90.º a 103.º, da LMM.
No art. 90.º impõe-se aos titulares de Arrendamento de Mineração o
dever de elaborar estudos de Impacto ambiental e planos de gestão ambiental
para evitar, minorar, controlar, reabilitar e compensar os efeitos ambientais e
sociais derivados das suas actividades.

O Plano Ambiental é aprovado pelo Ministro responsável pelo Sector


mineiro, ouvido os serviços competentes antes da emissão de uma Licença de
Mineração (art. 90.º, 2ª parte da LMM). A sua elaboração deverá obedecer às
especificações e às práticas estabelecidas por normas internacionais para a
gestão do meio ambiente, em relação ao modo como o Plano é afectado por
Operações de Mineração.

82
Para evitar a dispersão de conteúdo o legislador estabelece um conjunto
de matérias que deve constituir o conteúdo mínimo do Plano Ambiental.
Assim, o Plano Ambiental deverá conter uma descrição do projecto e
dos meios ambientais a serem aplicados, os quais deverão estar orientados
para:
Conservar e proteger a flora e a fauna selvagens, o ar, água, as belezas
paisagísticas, o solo, as comunidades nativas e as características de interesse
cultural, arquitectónico, arqueológico, histórico ou geológico;
Prevenir, fiscalizar e o controlo da contaminação, da desarborização, da
erosão e da sedimentação;
Rearborizar e restaurar as áreas afectadas pelas Operações de
Mineração;
Programas de manutenção de reservatórios, equipamento, canalizações,
tanques de armazenamento, estradas e obras civis em geral;
Planos de emergência e contra acidentes, para fazer face a
derramamentos de produtos contaminantes em cursos de água, no mar e na
terra;
Meios de reacção a eventualidades e acidentes inesperados;
Processos da recolha para a eliminação final de resíduos, lixos, detritos
e obras civis complementares, e;
Compensar, sob a forma de pagamentos, para a substituição de bens
privados legalmente detidos antes da concessão do Arrendamento de
Mineração, se tais bens forem afectados pelas Operações de Mineração (art.
93.º, n.º 1, I), II), IV), V), VI), VII) e VIII), da LMM).

O Plano Ambiental deverá ainda conter, em termos de medidas de


preservação do ambiente: uma descrição do tratamento a ser dado a resíduos
sólidos e fluentes líquidos e gasosos antes de serem descarregados no meio
ambiente, e; programas permanentes de formação e consciencialização
ambiental, dirigidos aos empregados do titular, para estimular acções que
minimizem o impacto ambiental (art. 93.º, n.os 5 e 6 da LMM).

83
Além, dos deveres que resultam do Plano Ambiental os titulares de
direitos de mineração ficam ainda adstritos a deveres de adoptar medidas
especiais de preservação sempre que as suas actividades comportam
determinadas riscos para o ambiente. Entre estes deveres encontramos:

O dever de devolver as águas utilizadas no trabalho ao seu curso


original, ao lago ou à lagoa de onde foram retiradas isenta de contaminação, de
modo a não afectar a saúde humana ou a vida normal da flora e da fauna (art.
94.º, da LMM);

O dever de preservar, armazenar e substituir o solo, sempre que


possível, e de replantar a área afectada com espécies naturais da área, sempre
que Operações Minerais exigirem trabalhos em fossas abertas ou outras
técnicas que obriguem a limpeza de solos, ervas, arbustos e/ou de árvores (art.
95.º, da LMM);

O dever de tomar precauções estritas contra a contaminação do solo ou


das áreas vizinhas, construindo represas ou valas para despejos que sejam
necessárias, na acumulação resíduos minerais ou metalúrgicos (art. 96.º, da
LMM);

O dever de dar tratamentos especiais as espécies vegetais e animais de


comprovado valor científico ou económico dentro da área afectada pelas
Operações Minerais, de forma a contribuir para a sua preservação, sempre que
tais espécies existem na zona (art. 97.º, da LMM);

O dever de transportar os refugos - que devido à sua natureza não


sejam biodegradáveis, tais como o vidro, os plásticos, o alumínio, o ferro, e
outros materiais - para locais pré-estabelecidos, para a sua eliminação (art.
98.º, n.º 1, da LMM), e;

O dever de depositar em locais pré-estabelecidos os restantes refugos


não biodegradáveis, o caso de lixo e dos desperdícios domésticos, para serem
84
submetidos a um processo de composição, de modo a que se obtenham
produtos, como o húmus, que servirão para programas de reabilitação das
áreas afectadas (art. 98.º, n.º 2, da LMM).

6. O uso do solo na Lei das Pedreiras

Na esteira da Constituição de 1984, o Decreto-Lei n-º 4/86, de 29 de


Março de 1986, vem reafirmar, num único, o direito da propriedade do Estado
sobre as pedreiras. Assim, de acordo com o conteúdo do art. 1.º, n.º 2, «a
propriedade das pedreiras pertence ao Estado nos termos da Constituição».

Na sua parte preambular o legislador do Decreto-Lei n-º 4/86, fez alusão


à importância económica nacional das explorações de substâncias minerais e à
necessidade de conciliação do imperativo económico de exploração de
pedreiras com o equilíbrio ecológico do ambiente, ou seja, mostrou-se
preocupado em encontrar um meio-termo entre a necessidade dos homens de
fazer o aproveitamento dos recursos naturais e a necessidade de garantir as
condições de sobrevivência para os seres vivos, em geral, pela garantida de
um equilíbrio ambiental.

Eis o conteúdo do preâmbulo:

«A Constituição da República da Guiné-Bissau atribui ao Estado a


propriedade do solo, subsolo, águas e riquezas minerais. No mesmo diploma
legal autoriza-se a concessão às cooperativas e outras pessoas jurídicas
singulares ou colectivas a exploração da propriedade estatal desde que sirva o
interesse geral e promova o desenvolvimento sócio-económico. O
enquadramento legal das explorações de substâncias minerais está longe de
corresponder à sua, cada vez maior, importância na economia nacional.
As substâncias minerais, exploradas sob o regime de pedreiras,
constituem um factor prioritário para a Reconstrução Nacional e uma riqueza
que tem vindo a pesar na economia nacional, não só pelo valor obtido na sua

85
extracção, mas, principalmente, através do valor acrescentado pelas indústrias
que elas alimentam.
A ineficácia e a desactualização da legislação herdada sobre a matéria,
aliada à proliferação de pedreiras e ao emprego crescente de poderosos meios
mecânicos que poderão vir a atentar contra os aspectos urbanísticos e
ecológicos do País, levou-nos a legislar sobre tal matéria de modo a que se
concilie o imperativo económico de exploração de pedreiras com o desejado
equilíbrio ecológico do território. Havendo necessidade de proteger
convenientemente os interesses de um património que é do Estado e cujo uso
importa que reverta em benefício directo ou indirecto da comunidade nacional.

7. O uso do solo no Código de Águas

7.1. Considerações de enquadramento

As águas de acordo com o art. 204.º, n.º 1, al. b) do CC, são coisas
imóveis. Nesta qualidade, a utilização ou aproveitamento das águas no seu
estado natural mexe directamente com a utilização do solo.
Desta forma, o conhecimento completo do regime de utilização do solo
exige também a análise dos instrumentos jurídicos que regulam a utilização e
aproveitamentos dos recursos integrantes no solo.

O regime jurídico de utilização das águas vem estabelecido no Decreto-


Lei nº 5-A/92, de 17 de Setembro de 1992, conhecido por Código de Águas.

No essencial, o Código de Águas, procurou estabelecer o regime jurídico


de utilização das águas, tendo em consideração os seguintes aspectos:
definição dos objectivos do Código de Águas; domínio público do Estado;
gestão das águas; acesso dos particulares à utilização de águas; deveres e
encargos legais dos utentes de águas; e a protecção do ambiente.

86
No que concerne à definição dos objectivos do Código de Águas,
estabelece-se no art. 1.º, als. a), b), c), d), e) e f), que o Código de Águas tem
por objectivo:

Definir o regime jurídico geral de todas as actividades relativas à gestão


dos recursos hídricos;
Definir o quadro institucional e normativo de execução da política geral
de gestão das águas em benefício de toda a população e do interesse
económico e social do país;
Assegurar a execução da política de gestão dos recursos hídricos da
Guiné-Bissau sob qualquer forma em que se apresentarem;
Assegurar a inventariação e a utilização, o aproveitamento e a
fiscalização mais racionais dos recursos hídricos e a sua administração;
Regular toda a utilização para fins domésticos, agrícolas, industrias,
hidroeléctricos e outros;
Assegurar a protecção qualitativa das águas contra a poluição, o
desperdício e sobre-exploração.

E nos termos do art. 2.º, do Código de Águas, reafirma-se o domínio


público do Estado sobre os recursos naturais, maxime as águas.
De acordo com este artigo, fazem parte do domínio público dos recursos
hídricos: todos os recursos hídricos sob qualquer forma em que se apresentem:
atmosféricos, superficiais e subterrâneos; as fontes de águas de qualquer
natureza que sejam; o mar territorial; os leitos das águas superficiais, naturais,
contínuas e descontínuas; todas as obras e equipamentos hidráulicos e as
suas dependências, realizadas com o objectivo de utilização pública pelo
Estado ou por sua conta.
Em consonância com o disposto no art. 202.º, n.º 2 do Código Civil,
prescreve o art. 3.º, n.º 1, do Código de Águas, que o domínio hídrico do
Estado é inalienável e imprescritível e não pode ser susceptível a propriedade
privada.

87
Porém, não obstante a reafirmação do domínio público do Estado sobre
as águas, no n.º 3 do art. 3 do Código de Águas, em consonância com a Lei da
Terra, acolheu-se o direito costumeiro das comunidades na utilização das
águas.
De acordo com o citado artigo, o Estado reconhece e garante os direitos
de uso tradicionais no âmbito do presente Decreto-Lei e dos títulos
regulamentares concedidos para sua execução.

Quanto à gestão das águas, compete ao Ministério responsável pelas


águas através da Direcção Geral dos Recursos Hídricos (DGRH), em
cooperação com outras autoridades concernentes, segundo as disposições do
Código de Águas e dos regulamentos de aplicação, a administração domínio
público dos recursos hídricos (art. 4.º, n.º 1, do Código de Águas).

A utilização dos recursos de água será objecto duma planificação,


contida no Plano Director das Águas, a qual deverá ter por objectivo atingir um
melhor abastecimento das necessidades de água, aumentando as
disponibilidades, e visando a protecção da qualidade das águas, e a
racionalização do seu uso em harmonia com outros recursos naturais, o
ordenamento do território e o equilíbrio ecológico (art. 15.º, n. os 1 e 2 do Código
de Águas).
O Plano Director das Águas é aprovado pelo Comité Interministerial das
Águas (CIMA) redigido em coordenação com a planificação geral do País e
será objecto duma actualização e revisão periódica. As suas prescrições serão
obrigatórias para as diferentes administrações concernentes (art. 16.º, n. os 1 e
2, do Código de Águas).

Constituem o conteúdo do Plano Director das Águas, entre outros, o


inventário dos recursos hídricos; os aproveitamentos hidráulicos, utilizações e
necessidades de água existentes e previstas; os critérios de preferência e
definição de prioridades entre os diferentes usos e aproveitamentos; atribuição
e reserva dos recursos de água para os usos e necessidades actuais e futuras,

88
assim como para conservação ou recuperação do meio natural; as normas
básicas para utilização e protecção dos aquíferos; as características principais
de qualidade das águas, e medidas para sua protecção; as normas básicas
para as diferentes utilizações de água, que deverão permitir e garantir a melhor
gestão dos recursos hídricos e das terras; os perímetros de protecção com as
medidas para protecção e recuperação dos recursos hídricos concernentes; os
programas e Projectos hidráulicos a realizar pela Administração; as infra-
estruturas básicas necessárias para a realização do Plano Director; as medidas
de ordem técnica, económica, institucional ou legal que permitirão o
desenvolvimento do Plano (art. 17.º, al. a) a k), do Código de Águas).

Em matéria de acesso dos particulares à utilização de águas,


prescreve o art. 3.º, n.º 2, que os indivíduos, as colectividades, as empresas
públicas e privadas só podem obter direitos de utilização segundo as formas
previstas no Código de Águas.
Nesta lógica, adianta o art. 16.º, n.º 2, que nenhuma pessoa singular ou
colectiva de direito público ou privado, poderá retirar ou usar água do domínio
público hídrico sem estar devidamente autorizada nos termos do presente
decreto-lei e dos diplomas regulamentares que forem adoptados para a sua
execução.

No entanto, além da ressalva feita no n.º 3 do art. 3.º à utilização das


águas pelos particulares de acordo com o direito costumeiro, no art. 3.º, n.º 3,
estabelece-se as formas de acesso dos particulares em geral de acesso à
utilização das águas. São elas: uso livre, declaração de uso, autorizações de
uso e concessões de uso.

89
7.2. Formas de acesso dos particulares à utilização da água

7.2.1. Regime de uso livre

O regime de uso livre resulta do art. 6.º, n.º 3, al. a) conjugado com o art.
7.º do Código de Águas.
De acordo com este último artigo, «o proprietário ou usufrutuário dum
terreno tem o direito de utilizar livremente a água das chuvas que caiem no seu
terreno, outras águas do domínio público, com vista à satisfação das
necessidades domésticas, pessoais e familiares dos utentes incluindo o
abeberamento do gado e a rega da sua horta, com meios tradicionais e sem
meios mecânicos (n.º 1).
Nos casos de acumulação artificial das águas para os usos supra
mencionados, poderá ser exigido do proprietário ou usufrutuário a declaração
da capacidade e da natureza das suas instalações (n.º 2).

Analisando este artigo pode-se constata uma manifestação de ideia


liberal do princípio da propriedade privada do solo. O seu n.º 1., começa por
dizer que o proprietário ou usufrutuário dum terreno tem direito de utilizar
livremente a água (....). Ora, tanto uma ou outra das figuras só existem num
regime onde é reconhecido a propriedade privada sobre o solo. Na nossa
ordem jurídica a propriedade do solo pertence ao Estado a qual está integrado
no seu domínio público. Não obstante o Estado ter nacionalizado o solo desde
de 1975, e as sucessivas leis constitucionais terem reafirmado o direito da
propriedade do Estado sobre o solo, o legislador do Código de Águas ficou
agarrado ainda a uma concepção de matriz liberal.
Assim, face às exigências de hermenêutica jurídica impõe-se fazer uma
leitura actualista do art. 7.º, n.º 1, tendo em conta o contexto jurídico da sua
aplicação.
Com efeito, onde está o proprietário ou usufrutuário dum terreno tem o
direito de utilizar livremente a água, deve-se ler como «o titular do direito de
90
uso privativo do solo ou qualquer outra pessoa, que mediante a sua
autorização faz o gozo e fruição do solo, tem o direito de utilizar livremente a
água das chuvas que caiem no seu terreno, outras águas do domínio público
com vista à satisfação das necessidades domésticas, pessoais e familiares dos
utentes incluindo o abeberamento do gado e a rega da sua horta, com meios
tradicionais e sem meios mecânicos».
Igual leitura recomenda-se para todas as disposições que falam da
propriedade privada do solo ou do proprietário ou do usufrutuário. O caso por
exemplo do n.º 2 do mesmo artigo.

7.2.2. Regime de declaração de uso

O regime de declaração de uso é um regime definido por exclusão de


partes. A esse regime, estão sujeitas todas as utilizações de águas de carácter
não livre, nomeadamente, todas as instalações permanentes ou não
permanentes que permitam elevar águas subterrâneas ou superficiais por
meios mecânicos; todas as instalações ou obras que, sem comportar meios
mecânicos, constituem utilizações de água não livre nos termos do artigo 7.º do
presente decreto-lei.
Por meio mecânico se entende todo equipamento que utiliza meios não
tradicionais de captação (art. 6.º, n.º 3, al. b) e art. 8.º, als. a) e b), do Código
de Águas).

7.2.3. Regime de autorização do uso

A esse regime estão sujeitos: a) as utilizações de águas do domínio


público hídrico cujo uso não seja livre uso nos termos do art. 7.º do presente
Código de Águas ou que não estejam submetidas ao regime das concessões
de aproveitamento; b) os depósitos, plantações e culturas nas margens e no
leito dos cursos de água e dos lagos; c) os trabalhos de investigação e de
91
captação de águas subterrâneas, uso ou aproveitamento destas águas; d) a
extracção de areias, pedras e terra do leito de um rio ou de lagos ou das suas
margens (art. 9.º).

Analisando este artigo, a alínea a) parece remeter-se para uma confusão


com o regime de declaração de uso. O legislador não estabelece um critério de
distinção claro e preciso entre os dois regimes. Em ambos procurou
estabelecer as respectivas definições por exclusão do regime de uso livre. De
ius constituendo seria desejável a tomada de uma posição clara.
A alínea b) do art. 9.º reconduz-nos para a utilização das águas nas
faixas costeiras. Em geral, tanto alínea b), como nas alíneas c) e d), prevêem-
se formas de utilização de águas que mexem directamente com o solo. Aliás
mesmo, nas alíneas b) e d), o que se regula é mesmo o aproveitamento do
solo na zona costeira e não propriamente a utilização das águas. Embora se
deve admitir que nestas situações o aproveitamento do solo vai mexer com a
qualidade natural da água. Daí o interesse desse actividade ser regulada no
Código de Água.
Da captação das águas subterrâneas havemos de voltar mais à frente.

7.2.4. Regime de concessão

O regime de concessão de uso vem previsto no art. 10.º, do Código de


Águas. De acordo com este artigo, «as concessões de uso de águas serão
normalmente celebradas entre o Ministério responsável pelas águas e pessoas
colectivas públicas ou privadas cuja instalação ou actividades revestem um
carácter de interesse geral ou de utilização pública ou que sejam
concessionárias de um serviço público. As concessões de uso de águas são
renováveis».
Ou seja, prevê-se neste artigo uma forma de acesso à utilização da água
diferente de todas que até agora vimos falando. A forma de acesso aqui
prevista é um contrato administrativo de concessão de serviço público ou de

92
exploração e fornecimento de águas entre o Estado e um particular, pessoa
singular ou colectiva. Através deste contrato o Estado transfere para o
particular a prossecução de um determinado interesse público.
Pelo contrato o particular passa a fazer extracção da água, no seu
estado natural, tratamento e fornecimento ao público.
O Código de Águas prevê, de modo particular, os modos de extinção do
contrato administrativo de concessão de uso de águas. Assim, nos termos do
art. 11.º, as concessões de aproveitamento de águas terminam por um dos
motivos seguintes:
a) Realização do termo de concessão, salvo o caso de prorrogação;
b) Rescisão do termo da concessão;
c) Rescisão a título de sanção por desrespeito das obrigações
contratuais;
d) Rescisão por falta de uso das águas por um período de 1 (um) ano, e;
e) Por razões de força maior que possam ter conduzido ao
desaparecimento temporário ou definitivo da água.

Feita a descrição das formas previstas no Código de Águas de acesso


dos particulares à utilização dos bens dominiais, recursos hídricos, deve-se
antes dizer que o regime de autorização e o da concessão de uso têm em
comum várias normas. São ambos:
a) Pessoais e intransmissíveis, sem acordo da administração concedente;
b) Atribuídas sob reserva dos direitos de terceiros;
c) Renováveis sob reserva das modificações introduzidas pela administração
concedente no interesse geral;
d) Revogáveis, modificáveis ou reduzidas por motivos de interesse geral ou em
caso de circunstâncias extraordinárias, como, entre outras, a conservação da
quantidade ou qualidade da água, o abastecimento das populações em água
potável em caso de secas extremas, para prevenir ou fazer cessar dos danos
causados pela água. Em caso de revogação permanente o beneficiário terá
direito a uma compensação fixada pela administração ou pelo tribunal
competente;
e) Revogáveis pelo desrespeito do titular das obrigações após a notificação;
93
f) Susceptível de pagamento de taxas de uso cujos montante e condições
serão estabelecidos por via regulamentar;
g) Concedidas segundo as disponibilidades das águas, as outras solicitações
concorrentes, e segundo as previsões do plano das águas;
h) Registadas no Cadastro dos usuários (art. 12.º, n.º 1 als. a) a h), do Código
de Águas).

Além disso, em casos de requerimentos competitivos, dispõe o n.º 3 do


mesmo artigo que terão prioridade aqueles que: foram apresentados em data
anterior; melhor satisfazem o interesse geral; estão em conformidade com as
prioridades e normas fixadas pelo plano das águas (respectivamente als. a), b)
e c)).

Para as autorizações de concessões de uso de águas, prevê-se de


modo particular que: i) podem ser declaradas de utilidade pública oficiosamente
ou à solicitação do concessionário; neste caso, se poderá utilizar o domínio
público para a execução de trabalhos; ii) serão limitados aos usos de águas
previstos nos títulos, e a eventuais condições técnicas de exploração
estabelecidas pela autoridade competente, tais como caudais máximos
instantâneos e anuais de captação, distâncias mínimas entre captações,
exigências construtivas e do equipamento, condições de despejo das águas
usadas e outras.

7.3. Deveres e encargos legais dos utentes de águas

O Código de Águas estabelece obrigações gerais a que os utilizadores


das águas ficarão sujeitos.
São obrigações dos utentes, utilizar a água de maneira racional e
económica; respeitar as condições estabelecidas no acto constitutivo do direito;
zelar pela qualidade da água; e respeitar o direito dos outros utentes legítimos
das águas (art. 14.º, als. a), b), c) e d)).

94
Nos casos em que, pela localização dos terrenos pertencentes a titulares
diferentes, escoam águas entre terrenos vizinhos, o legislador estabelece a
servidão legal entre os terrenos que se encontram nesta situação.
Assim, nos termos do Código de Águas, os terrenos inferires estão
sujeitos a receber as águas que, naturalmente, escoam dos terrenos
superiores, assim como a terra e pedras levadas pela água (art. 18.º, n.º 1, do
Código de Águas).
Neste caso, não pode o titular do direito de uso privativo do terreno
inferior erguer obras que impeçam estas servidões, nem o titular do direito de
uso privativo do terreno superior pode levantar obras que lhe agravem (art.
18.º, n.º 2, do Código de Águas).

No requerimento de autorização ou de concessão das águas podem os


requerentes-interessados pedir que as servidões necessárias a evacuação ou
passagem para canalização das águas ou para afluir de um bebedouro ou
construção de um reservatório, sejam incluídas nas autorizações e
concessões. Todavia, a inclusão só poderá ser efectuada, havendo um acordo
com o titular do direito de uso privativo, ou o terceiro por aquele autorizado, do
terreno a utilizar.
Para as situações em que a constituição da servidão necessária poderá
criar danos para o titular do direito de uso privativo do terreno a utilizar, prevê-
se a possibilidade do acordo prever as indemnizações ou direitos que
comportem essa utilização (artr.19.º, do Código de Águas).

A par das servidões por motivo de interesse privado, o Código de Águas


também estabelece a servidão legal por motivo de interesse público cuja
existência dispensa qualquer tipo de acordo com o titular do direito de uso
privativo do terreno a utilizar.
Com feito, à Administração das águas é assegurada o direito de instalar
todos os meios de sinalização, de medida de controlo das águas como de
qualquer outra instalação necessária, bem como os meios de acesso e estas
instalações (art. 20.º, n.º 1, do Código de Águas). No entanto, no exercício
deste direito, impõe-se à Administração o deve de abster de tudo quanto pode
95
ultrapassar a razão pela qual a servidão foi estabelecida (art. 20.º, n.º 2, do
Código de Águas).

Para os dois tipos de servidões, remete-se a para a regulamentação


futura a fixação das respectivas modalidades de exercício e de extinção (art.
20.º, n.º 3, do Código de Águas).

7.4. Regime das águas subterrâneas

O Código de Águas regula a utilização das águas subterrâneas de modo


particular no seu capítulo VI.
Qualquer trabalho de pesquisa, captação ou aproveitamento de águas
subterrâneas que brotem ou está sujeito ao regime de autorização ou de
concessão de uso (art. 26.º, n.º 1, 1ª parte.). As autorizações de captação
serão outorgadas, tendo em conta os direitos dos terceiros anteriormente
legalizados.
Havendo danos para direitos dos terceiros, o titular da nova autorização
será responsável, devendo este indemnizar pelas afectações reais causadas
(n.º 2).
Pelo art. 26.º, n.º 1, 2ª, remete-se para o regulamento a fixação das
condições técnicas e administrativas de pesquisa, captação e aproveitamento.

As águas subterrâneas gozam de medidas particulares de protecção.


Com efeito, institui-se perímetro de protecção em torno de cada furo, poço ou
obra destinada a alimentação em água potável das cidades ou aglomerações
cujos limites são fixados, em cada caso, pelo Ministério responsável pelas
águas (art. 27.º, n.º 1, do Código de Águas).
No interior dos perímetros de protecção é proibido inter alia: construir
habitações ou edifícios de qualquer tipo; instalar estabelecimentos industriais
ou comerciais, matadouros e currais de gado; introduzir animais, depositar ou
enterrar lixo ou imundícies de qualquer tipo; instalar sepulturas ou fazer
96
escavações; instalar canalizações e reservatórios de hidrocarbonetos ou de
águas usadas de qualquer tipo; estabelecer terrenos de cultura e espalhar
estrume, fertilizantes ou qualquer outro produto destinado à fertilização dos
solos ou à protecção dos solos ou protecção das culturas (art. 27.º, n.º 2, als. a)
a f), do Código de Águas).

A enumeração é meramente exemplificativa, pois para além da


expressão, entre outros, contida na parte final do corpo principal do n.º 2, no n.º
3, prevê-se expressamente que na fixação dos limites dos perímetros de
protecção poderão proibir ainda actividades suplementares não enumeradas no
n.º 2.
Os actos de fixação dos limites dos perímetros poderão ainda impor o
estabelecimento de uma zona de protecção imediata no interior do perímetro
de protecção cujos terrenos deverão ser adquiridos em plena propriedade e ser
vedados pelo organismo responsável. Nos casos em que as proibições
impostas conduzirem à utilização de terras anteriormente aproveitadas, o titular
de direito poderá exigir a sua expropriação (art. 27.º, n.º 2, 2ª parte).

7.5. Protecção do ambiente

Preocupações sobre a protecção do ambiente não escaparam a atenção


do legislador do Código de Águas. Para além dos perímetros de protecção
previstos em relação ao aproveitamento das águas subterrâneas, em dispersos
artigos encontramos disposições que consagram medidas que visam proteger
o ambiente nas suas várias dimensões.

Com efeito, em relação à protecção do solo prevê-se no art. 28.º, que


«sem prejuízo de outras disposições jurídicas em vigor, nomeadamente em
matéria florestal e de luta contra a erosão, quem desejar empreender trabalhos
ou realizar equipamentos em terrenos susceptíveis de perturbar a existência ou
caudal de fontes, lagos ou cursos de água deverá solicitar autorização prévia
do Ministério responsável pelas águas. Antes de tomar uma decisão o

97
Ministério responsável pelas águas consultará os Ministérios responsáveis pela
agricultura e florestas e pelo planeamento territorial».
Em relação ao saneamento da água, prevê-se no art. 29.º, n.º 5, que é
obrigatório o tratamento prévio das águas residuais usadas antes da sua
evacuação nos casos em que no estado bruto elas podem afectar o bom
funcionamento da rede pública de saneamento e as instalações de depuração.
Está-se em causa, uma medida conhecida na doutrina pelo princípio de
correcção na fonte, na sua vertente espacial ou de lugar de ocorrência do
perigo ambiental.

Em relação à inundação, prevê-se que a defesa contra inundação é uma


obrigação de toda a pessoa física, ou colectiva, pública ou privada, inclusive
das corporações (art. 30.º, n.º 1, do Código de Águas). E no n.º 2, do mesmo
artigo, estabelece-se que o Ministério responsável pelas águas estudará os
planos e executará todas as acções pertinentes, se necessário, em cooperação
com outros departamentos do Estado competentes ou interessados, para
facilitar a evacuação das águas de inundação ou para adopção de medidas
preventivas ou de urgência.

No art. 32.º, prevê-se que os outros problemas relacionados com a


água, tais como, as secas, erosão hidráulica, sedimentação, salinização das
águas e solos e outros, serão objecto de regulamentação pelo Ministério
responsável pelas águas, adoptada em coordenação com outros
departamentos de Estado interessados.

No art. 33.º, n.º 1, prescreve-se que «a ninguém é lícito poluir ou


contaminar as águas que não consome, correndo as despesas e os trabalhos
para restituir a salubridade das águas à custa do infractor que, além de uma
eventual responsabilidade criminal, responderá pelas perdas e danos e
administrativamente.
Na mesma esteira, no n.º 2 do mesmo artigo proíbe-se a poluição das
águas superficiais ou subterrâneas através dos efeitos directos ou indirectos da

98
rejeição, introdução ou disposição de resíduos sólidos ou líquidos nas massas
de águas e nos aquíferos.
No n.º 3 prevê-se a obrigatoriedade de estudo do impacto ambiental
sobre as águas, para a aprovação de determinados projectos, que possam
incidir sobre a sua qualidade.

Já no n.º 5 do artigo em apreço, prevê-se a possibilidade da


Administração estabelecer zonas de reservas de águas, relativas a águas
superficiais ou aquíferos, com limitação de exploração de água, totais ou
parciais, limitações de certas actividades, por motivos de carácter ecológico ou
por actividades previstas no Plano Director das Águas.

No art. 35.º, n.º 1, sujeita-se à autorização administrativa a realização de


toda a obra de natureza hidráulica ou de todo o trabalho no domínio hídrico do
Estado. E no n.º 2 do mesmo artigo, prevê-se que as obras hidráulicas de
interesse geral deverão ser integradas no Plano Director das Águas.

No art. 40.º, n.º 1, prescreve-se que, sem prejuízo das suas


competências próprias, o Ministério responsável pelas águas cooperará
segundo as necessidades com os outros departamentos do Estado
interessados pela gestão das águas, nomeadamente os Ministérios
responsáveis pela Agricultura, o Plano, a Saúde Pública, a Indústria e a
Energia, os Negócios Estrangeiros e Obras Públicas, Construção e Urbanismo
e Promoção Feminina. E no n.º 2, 1ª parte do mesmo artigo, prevê-se o
estabelecimento, por decreto, de um Conselho Nacional de Águas, órgão de
coordenação interministerial, que funciona junto ao Ministério responsável,
pelas águas, com competência para se pronunciar sobre os diferentes
aspectos de política geral de gestão das águas do país e zelar pelo seu
cumprimento15.

15
Em causa está o princípio de colaboração, um princípio do Direito do Ambiente.

99
No art. 41.º, n.º 1 e 2, permite-se a criação das associações de interesse
hídrico para a utilização, gestão e a luta contra efeitos nocivos das águas a
nível local ou regional, cujas normas relativas à formação, competências,
reconhecimento e funcionamento serão estabelecidas pelo despacho do
Ministério responsável pelas águas em colaboração com outros Ministérios
interessados.

8. O uso do solo na Lei Florestal

8.1. Considerações introdutórias

A floresta, pela sua diversidade e natureza dos bens e serviços que


proporciona, é conservada como um recurso natural renovável, essencial à
manutenção de todas as formas de vida. A sua importância é bem marcada na
economia, na manutenção de ecossistemas, na melhoria da qualidade do ar,
na diminuição do crescimento das emissões de gases responsáveis pelo efeito
de estufa e no combate ao fenómeno de alterações climáticas.

Devido a esta importância a floresta é eleita geralmente com uma área


que deve ser objecto de uma política de desenvolvimento sustentável de
conservação e de protecção.

Na Guiné-Bissau, a preocupação de exploração sustentável das


florestas não escapou a atenção do legislador.

Na Guiné-Bissau, o regime de uso, exploração de florestas vem


estabelecido no Decreto-Lei n.º 4-A/91, de 29 de Outubro de 1991, conhecido
por Lei Florestal.

Antes de mais é preciso lembrar que o regime de utilização e exploração


das Florestas implica muito com o de utilização do solo. Aliás, não se pode
falar do regime de utilização do solo sem falar necessariamente das suas
componentes integrantes. É elucidativo desta afirmação o Código Civil ao
100
considerar como coisas imóveis as árvores, os arbustos e os frutos naturais,
enquanto estiverem ligados ao solo (art. 204.º, n.º 1, c)). Neste sentido se
aponta também expressamente a Lei florestal, como teremos a oportunidade
de ver no decurso da dessa exposição, um pouco mais à frente.

8.2. Objectivo da Lei Florestal

A Lei Florestal começa logo, no seu art. 1.º, com a consagração do seu
objectivo. De acordo com este artigo a Lei Florestal, tem por objectivo
promover a gestão racional dos recursos que integram o domínio florestal da
Guiné-Bissau, tendo em vista optimizar a sua contribuição para o
desenvolvimento económico, social, cultural e científico do País de acordo com
o interesse nacional, regional e local e a qualidade de vida do povo (art. 1.º,).

No domínio florestal estão integradas:

Todas as florestas, quer a sua função predominante seja a produção


quer seja a protecção;

Todos os terrenos de aptidão florestal e os que tenham sido


especialmente classificados e submetidos ao regime florestal16;

Todas as áreas protegidas nas suas diferentes modalidades cuja


finalidade seja o estudo, a protecção e a conservação de matéria-prima
lenhosa, combustíveis vegetais, fibras, cascas, folhas, resinas, gomas,
“tanantes”, flores, frutos sementes de natureza silvestre, fauna, “avi-fauna”,
espécies cinegéticas, apícolas e do meio aquático, e;

16
Nos termos do artigo 17.º da Lei Florestal.

101
Todas as zonas que visem a exploração ordenada dos recursos agora
supracitados (art. 1.º, n.º, 2, al. c), da Lei Florestal).

8.3. Acesso dos particulares aos recursos do domínio florestal

O acesso dos particulares aos bens de domínio florestal é


particularmente condicionado pelo regime estabelecido para cada área florestal
e varia em função deste. O art. 9.º, n.º 2 fala em dois regimes florestais: o
regime florestal de protecção e o regime florestal de produção. Mas, além,
destes dois a lei prevê ainda um terceiro regime florestal que é a floresta
comunitária (art. 22.º da Lei Florestal).

Passamos agora à análise de cada um destes regimes.

8.3.1. Área de floresta sob regime de protecção

Estão submetidos ao regime protecção, as florestas, os recursos que


integram o domínio florestal e os terrenos de vocação florestal cuja localização
abrange: áreas afectadas por queimadas nas quais a reconstituição do coberto
vegetal seja indispensável para a conservação dos solos e protecção contra a
erosão e desertificação; as margens dos rios e dos demais cursos de água, em
faixas cuja largura mínima da cheia do rio ou curso de água, não podendo ser
inferior a 15 metros; as margens de lagos ou de quaisquer reservatórios
naturais ou artificiais numa faixa envolvente cuja largura será definida, em cada
caso pela Direcção Geral das Florestas e Caça ou serviço equiparado, não
podendo ser inferior a 15 metros; as nascentes de água; os topos dos montes,
encostas abruptas ou cujo declive seja superior ao definido pela Direcção Geral
das Florestas e Caça ou serviço equiparado; as restingas fixadoras de dunas

102
ou estabilizadoras de mangais (art. 11.º, n.º als. a), b), c), d), e), f, da Lei
Florestal)17.

Estão ainda sujeitas ao regime florestal de protecção: as árvores


situadas em vias ou logradouros públicos; as áreas e os demais terrenos, que,
integram o domínio florestal de protecção, se destinam a: fixar dunas,
estabilizar o regime hidrológico, contrariar os processos de erosão e
desertificação; construir faixas de protecção ao longo das vias; auxiliar a defesa
do território nacional de acordo com o critério das autoridades militares;
proteger, conservar e assegurar a gestão da paisagem natural de excepcional
beleza, da vida selvagem e dos ecossistemas de características de
reconhecido interesse e importância cultural e científica; assegurar a
intervenção florestal em terrenos ou em florestas para cuja conservação a
mesma seja indispensável (art. 11. n.º 2 e art. 12.º, n.º 1, als. a), b), c), d) e e),
da Lei Florestal)18.

Regra geral, é proibido o bate das árvores neste área (art. 13.º, n.º 1, da
Lei Florestal). Excepcionalmente é permitido o abate com a finalidade de
realização de obras de construção que visam à satisfação de necessidades
domésticas individuais ou de interesse geral, mediante autorização da Direcção
Geral das Florestas e Caça ou do Serviço equiparado (art. 13.º, n.º 2, da Lei
Florestal).

Nos casos em que é admitido o abate o beneficiário da autorização fica


obrigado, entre outras coisas, a proceder ao” reflorestamento” ou, em
alternativa, a financiar a plantação de uma área equivalente à ocupada pelo
objecto de corte; e ao pagamento de uma taxa (art. 13.º, n.º 3, al. e) e n.º 3, da
Lei Florestal).

17
Essas áreas, uma vez classificadas, como áreas sob regime de protecção, jamais poderão
ser desclassificadas (art. 14.º, n.º 1, da Lei Florestal).
18
As áreas abrangidas pelo art. 12.º poderão ser desclassificadas do regime de protecção
mediante Decreto, sempre que a sua sujeição a esse regime vier a relevar incompatível com a
realização de obras ou projectos de interesse geral (art. 14.º, n.º 2, da Lei Florestal).
103
8.3.2. Área florestal sob regime de produção

O regime de produção é o regime regra. Regra geral, as florestas estão


sujeitas ao regime de produção, ou seja, o regime em que permitido o abate
das árvores (art. 15.º, n.º 2, da Lei Florestal).
A gestão e a exploração dos recursos florestais nesta zona são feitas
mediante os Planos de Ordenamento (art. 16.º e 25.º, da lei Florestal).
O Plano de Ordenamento pode ser elaborado tanto pelo Ministério do
Desenvolvimento Rural e Agrícola como pelos particulares. Neste segundo
caso, o Ministério pode apoiar a sua elaboração e em qualquer dos casos a
competência para a aprovação pertence ao Ministério. Eventualmente, poderá
o Ministério, em causa, apoiar a respectiva execução a qual será, em qualquer
caso, fiscalizada pela Direcção Geral das florestas e Caça (art. 16.º, n.º 1, da
Lei Florestal).
O Plano de ordenamento poderá prever zonas de protecção especial,
que funcionará no interior de áreas florestais sob regime de produção (art. 16.º,
n.º 3 e 19.º, n.º 3, da Lei Florestal).

No entanto, importa esclarecer que o facto do regime de produção ser o


regime regra não significa também que existe a liberdade de aproveitamento
dos recursos florestas.
Pelo contrário, a actividade de abate, recolha, transporte dos recursos
florestais, carece de autorização prévia da Direcção Geral das Florestas e
Caças (art. 29.º, da Lei Florestal). A sujeição de uma área florestal ao regime
de produção significa apenas que os recursos abrangidos podem ser
aproveitados pelos particulares mediante a autorização prévia do Serviço
competente.

Só é dispensável a autorização prévia da Direcção Geral das Florestas e


Caças para aqueles casos em que o abate total ou parcial de árvores ou de
vegetação arbórea, situadas em terrenos agrícolas, ou em terrenos delimitados

104
circundando uma habitação, um edifício industrial, comercial ou administrativo,
se destine à utilização do próprio. Mas, quando se destina à utilização por
terceiros terá o respectivo proprietário que requerer à Direcção Geral das
Florestas e Caça autorização prévia de abate e proceder ao pagamento das
taxas em vigor e efectuar a venda de acordo com as tabelas vigentes (art. 29.º,
da Lei Florestal).

Na área florestal sob regime de produção pode ter ainda lugar ao


aproveitamento comercial de madeira e ao arroteamento.

8.3.2.1. O aproveitamento comercial de madeira

O aproveitamento comercial de madeira vem regulado no capítulo II,


v.g., art. 31.º a art. 40.º da Lei Florestal e o arroteamento no capítulo III, vg., art.
41.º, também da lei Florestal.

A Lei Florestal prevê formas para o aproveitamento dos recursos


florestais: venda de árvores, autorização de abate e contrato de gestão e
aproveitamento florestal (art. 31.º, n.º 1, als. a), b) e c)).

A venda de árvores é o contrato a título oneroso mediante o qual a


Direcção Geral das Florestas e Caça cede determinadas árvores, podendo
encarregar-se do respectivo abate e do transporte até às vias de acesso (art.
32.º, da lei Florestal).

A autorização de abate é concedida pela Direcção Geral das Florestas


e Caça, mediante o requerimento do interessado, por um período de 12 meses,
contados da data da sua emissão (art. 35.º, da Lei Florestal). No pedido de
autorização deve já o particular fazer contar determinadas medidas de
gestação racional dos recursos, tais como: o número de árvores por espécie e

105
respectivo volume previsível, bem como a localização das mesmas; as regras
de abate que melhor asseguram a preservação dos recursos e a protecção do
solo; a obrigação do reflorestamento mediante indicação das espécies e
correspondentes números de indivíduos por espécie (art. 35.º, als. c), e) e f), da
Lei Florestal).

O respeito das regras de exploração e a realização do reflorestamento


nos termos indicados na autorização são assim condições fundamentais para a
renovação da autorização de abate (art. 36.º, da Lei Florestal).

O contrato de gestão e aproveitamento é um contrato celebrado entre


o Estado, representado pela Direcção Geral das Florestas e Caça, e uma
entidade pública ou privada nacional ou estrangeira que visa regular as
condições de aproveitamento dos recursos florestais. O contrato de gestão e
aproveitamento é acompanhado de um caderno de encargo e obriga
necessariamente a existência de plano de ordenamento relativo à área a
explorar (art.º 38.º, n.os 1 e 2, Lei Florestal).

O contrato pode ter a duração máxima de 15 anos, renováveis (art. 31.º).


Durante a execução do contrato, e no sentido da realização dos objectivos
estabelecidos no plano de ordenamento, deverá o co-contraente
concessionário submeter à aprovação prévia da Direcção Geral das Florestas e
Caça, o plano de trabalho bianual cuja aprovação dependerá da execução
satisfatória do plano precedente (art. 39.º, n.º 2, da Lei Florestal).

8.3.2.2. O arroteamento

O arroteamento previsto no Capítulo III, art. 41.º da Lei Florestal. De


acordo com o n.º 2 do citado artigo, existe arroteamento quando a vegetação
arbórea ou arbustiva de um terreno de domínio florestal é cortada, arrancada
ou destruída por qualquer processo, incluindo queimadas, com vista a dar ao
solo outra afectação.
106
Está excluído do regime de arroteamento o corte ou a destruição por
qualquer processo, de vegetação arbórea ou arbustiva de um terreno do
domínio florestal, prévia e temporariamente realizados para fins de exploração
agrícola, quando forem seguidos por uma regeneração natural ou por
repovoamento (art. 41.º, n.º 3, da Lei Florestal).

Regra geral, o arroteamento no domínio florestal carece de uma prévia


autorização do Serviço Florestal ou de outra autoridade definida em diploma
regulamentar (art. 41.º, n.º 1 da Lei Florestal).

O ateamento do fogo para efeitos de arroteamento deverá ser feito na


presença do titular da autorização e após declaração prévia junto do presidente
da secção ou das secções interessadas.
O titular da autorização é responsável pela propagação do fogo se
houver negligência da sua parte. (art. 44.º, n.º 2 da Lei Florestal).

No caso dos terrenos agrícolas ou utilizados unicamente para fins


pastoris, o ateamento de fogo deverá ser sempre feito na presença do chefe da
tabanca em nome da qual os terrenos estão registados ou do proprietário ou
concessionário da exploração e após declaração prévia junto do presidente da
secção e do responsável florestal territorialmente competente.
Neste caso, o chefe da tabanca, o proprietário ou concessionário da
exploração, segundo os casos, serão responsáveis pela propagação do fogo se
houver negligência da sua parte (art. 44.º, n.º 3, da Lei Florestal).

O titular da autorização de arroteamento, o chefe da tabanca, o


proprietário ou concessionário da exploração florestal, consoante os casos,
deverão adoptar as medidas necessárias para evitar a propagação do fogo, as
quais devem a presença de uma brigada de luta contra os incêndios (art. 44.º,
n.º 4, da Lei Florestal).

107
8.3.3. Florestas comunitárias

As florestas comunitárias abrangem, por exclusão de partes, as áreas


excluídas do regime de protecção e de produção que venham a ser objecto de
registo de harmonia com a Lei de Terras (art. 22.º, n.º 1, 1ª parte da Lei da
Florestal).
A gestão das florestas comunitárias é assegurada pelas respectivas
tabancas titulares de direitos, no devido respeito pelas disposições da Lei
Florestal e das normas regulamentares adoptadas para a sua execução (art.
22.º, n.º 1, 2ª parte da Lei Florestal)19.
As florestas comunitárias não podem ser alienadas, divididas, objectos
de hipoteca, avalizar créditos, salvo se alguma disposição legal o permitir (art.
22.º, n.º 2 da Lei Florestal).

8.4. Medidas preventivas e repressivas

A Lei Florestal no capítulo VI estabelece medidas preventivas e


repressivas para comportamentos dos particulares violares das suas
disposições.

Assim, em termos de medida preventiva prevê-se um corpo de


fiscalização designado por agentes de fiscalização florestas.
Os agentes de fiscalização são considerados forças paramilitares e
compreendem os agentes da Direcção Geral das Florestas e Caça ou serviço
equiparado; os guardas florestais; e todos os funcionários habilitados a
participar infracções no âmbito da legislação geral da Guiné-Bissau (art. 48.º,
n.º 1, als. a), b), n.º 2, da Lei Florestal).

19
Estas normas regulamentares são os meios materiais e institucionais que o Estado poderá
facultar às tabancas para o exercício das suas responsabilidades.

108
Compete, em especial, aos agentes de fiscalização, entre outras coisas:
orientar as populações, em geral, e as tabancas, em particular, no sentido de
respeito pelas disposições da Lei Florestal e dos regulamentos adoptadas para
a sua execução, aconselhando-os a praticar ou a omitir actos respectivamente
favoráveis à conservação dos recursos ou susceptíveis de contribuir para
destruição dos mesmos; elaborar autos de transgressão ou de notícia e
proceder a inquéritos permitidos por lei, nas áreas que correspondem ao
exercício das suas funções as quais (...); apreender os produtos e instrumentos
obtidos ou utilizados na prática das infracções; ordenar a prisão quando se
trate de crime de queimadas em flagrante delito; ordenar a suspensão ou a
paralisação das actividades conduzidas em violação da Lei Florestal e dos
regulamentos adoptados para a sua execução; exercer a vigilância e fiscalizar
todas as actividades que a Lei Florestal visa assegurar ou impedir, bem como
as que decorrem das competências da Direcção Geral das Florestas e Caça ou
serviço equiparado (...) (art. 49.º, n.º 2, als. a), b), c), d), e) e f), da Lei
Florestal).

Em jeito de medidas repressivas, a Lei Florestal prevê sanções para


condutas violadoras das suas disposições.
São previstas três tipos de sanção: as sanções de natureza cível, as de
natureza administrativa e as de natureza criminal (art. 52.º e ss).
Às medidas repressivas de natureza penal acrescem ainda outras
previstas nos arts. 156.º, 157, 158.º e 159.º do Código Penal guineense,
aprovado pelo Decreto-Lei n.º 4/93, publicado no Suplemento ao Boletim Oficial
n.º 41, de 13 de Outubro.

109
9. O uso do solo no Projecto de Lei de Bases do Ambiente e nos seus
instrumentos de execução (AIA)

9.1. Considerações introdutórias

Com excepção dos instrumentos jurídicos sobre as áreas protegidas, na


Ordem guineense, não existe nenhum instrumento jurídico de âmbito geral que
estabelece o regime geral de gestão do ambiente. As normas sobre a gestão
do ambiente encontram referencialmente previstas, em diplomas diversos cujos
objectivos principais estão voltados para regulação de outras matérias. Nestes
diplomas, as questões ambientais só aparecem a título secundário.

No presente, existem duas importantes propostas sobre o regime geral


de gestão ambiental: o Projecto de Lei de Bases do Ambiente 2008 e a
Proposta do Projecto de Lei da Avaliação Ambiental, também do mesmo ano.

Muito embora não passam de simples propostas, devido à sua


importância para a gestão do solo e partindo do pressuposto de que, as
propostas em causa, serão traduzidas em Leis num futuro breve, achamos
convenientes antecipar já algumas considerações sobre os regimes que estão
sendo perspectivados.

9.2. Concepções legais do ambiente

De açodo com o art. 5.º, n.º 2, al. a) do Projecto de Lei de Bases do


Ambiente (PLBA), o Ambiente é “(...) o conjunto dos sistemas físicos, químicos,
biológicos e suas relações e dos factores económicos, sociais e culturais com
efeito directo ou indirecto sobre os seres vivos e a qualidade de vida do
homem”.
O conceito do ambiente assim estabelecido é um conceito amplo que
apanha os componentes naturais e os componentes ambientais humanos.
110
Ou seja, neste conceito estão abrangidos quer os bens essencialmente
naturais (os componentes ambientais naturais) quer os bens culturais
(componentes ambientais humanos). Trata-se de resquícios que apontam para
acolhimento de uma visão antropocêntrica do ambiente.

Os componentes ambientais naturais e humanos estão previstos nos


arts. 6.º e 17.º, n.º 7, respectivamente.

Nos termos do art. 6.º são componentes ambientais naturais o ar, a luz,
a água, o solo e o subsolo, a flora e a fauna (art. 6.º, als. a), b), c), d), e) e f), do
PLBA).

Integram-se nos componentes ambientais humanos, de acordo com o


art. 17.º, n.º 3, als. a), b) e C) do PLBA, a paisagem, o património natural e
construído e a poluição.

A par deste conceito amplo do ambiente, o Projecto de Lei de Base do


Ambiente parece também acolher a noção restrita do ambiente, que aponta
para uma protecção da natureza enquanto bem em si, tendo em atenção
apenas sua capacidade regenerativa e abstraindo de quaisquer considerações
utilitaristas.

Com efeito, prescreve-se no art. 2.º, n.º 2 do PLBA que “a política de


ambiente tem por fim optimizar e garantir a continuidade de utilização dos
recursos naturais, qualitativa e quantitativamente, como pressuposto básico de
um desenvolvimento durável”.

E no art. 4.º, als. d), e) e m) do PLBA, estabelece-se, a título


exemplificativo, que a existência de um ambiente propício à saúde e bem-estar
das pessoas e ao desenvolvimento social e cultural das comunidades, bem
como à melhoria da qualidade de vida, requerem a adopção de medidas que
visem, inter alia: a manutenção dos ecossistemas que suportam a vida, a
utilização racional dos recursos vivos e a preservação do património genético e
111
da sua diversidade; a conservação da natureza, o equilíbrio biológico e a
estabilidade dos diferentes habitats nomeadamente através da
compartimentação e diversificação das paisagens, da constituição de parques
e reservas naturais e outras áreas protegidas, corredores ecológicos e espaços
verdes urbanos e suburbanos, de modo a estabelecer um continuum naturale;
e a prossecução de uma estratégia nacional de conservação.

Estamos perante elementos que permitam para acolhimento de uma


visão ecocêntrica do ambiente.

9.3. Princípios do Direito do Ambiente

Os princípios do Direito do Ambiente são frutos de movimentos que se


têm registado nos últimos três décadas, que visam o aumento gradual de
influência das preocupações ambientais nos textos relativos às matérias
díspares.
A esse fenómeno os autores anglo-saxónicos baptizaram com o nome
de «esverdear da legislação».
Por força destes movimentos, os princípios do Direito do Ambiente
aparecem consagrados expressa ou implicitamente em textos, quer de Direito
interno quer do Direito internacional.

No Projecto de Lei de Bases do Ambiente, os princípios aparecem


enumerados no art. 3.º. Neste artigo foram acolhidos seis princípios
internacionalmente reconhecidos no Direito do Ambiente: o princípio da
prevenção, o princípio da precaução, princípio do poluidor pagador, princípio da
integração, o princípio da participação e o princípio da cooperação. Não
obstante a previsão de um número significativo dos princípios, fora desta
enumeração está um importante princípio, bastante recente no Direito do
Ambiente: princípio da correcção na fonte, conhecido também por princípio do
produtor-eliminador, princípio da auto-suficiência ou princípio da proximidade.

112
Vejamos então o conteúdo de cada um dos princípios previstos no art.
3.º do PLBA.

9.3.1. Princípio da prevenção

O princípio da prevenção encontra-se previsto no art. 3.º, al. a) do PLBA,


da seguinte forma: “(...) as actuações com efeitos imediatos ou a prazo no
ambiente devem ser consideradas de forma “antecipativa”, reduzindo ou
eliminando as causas, prioritariamente à correcção dos efeitos dessas acções
ou actividades susceptíveis de alterarem a qualidade do ambiente”.

Trata-se de uma norma que resulta da regra de bom senso, aquela que
determina que, em vez de contabilizar os danos e tentar repará-los, se tente,
sobretudo, evitar a sua ocorrência, antes de eles terem acontecido. Diz-se no
ditado comum: «mais vale a pena prevenir do que remediar».

9.3.2. Princípio da precaução

O princípio da precaução aparece previsto no art. 3.º, al. b) do PLBA,


sem a previsão do correspondente conteúdo.
Sabe-se contudo que o princípio tem o seu campo de aplicação dirigido
aos casos de dúvida, implicando que o ambiente deve ter a seu favor o
benefício da dúvida sempre que estamos ante incerteza e falta de provas
científicas suficientes para demonstrar a inocuidade ambiental de determinado
comportamento.
Pode-se falar de uma espécie do princípio «in dúbio pró ambiente», ou
seja, na dúvida sobre a perigosidade de uma acção, em relação ao ambiente,
decide-se a favor do ambiente e contra o potencial poluidor.
O princípio implica a transferência do ónus de prova da inocuidade de
uma acção, em relação ao ambiente, do Estado para os potenciais poluidores
113
interessados na autorização para exercício de uma determinada actividade que
comporta riscos para o ambiente.

9.3.3. Princípio do poluidor pagador

O princípio do poluidor pagar encontra-se expressamente consagrado no


art. 3.º, al. c) do PLBA. Nos termos do citado artigo “(...) o poluidor fica
obrigado a corrigir ou a recuperar o ambiente, suportando os encargos daí
resultantes, não lhe sendo permitido continuar a acção poluente”.

9.3.4. Princípio da integração

O princípio da integração vem consagrado no art. 3.º, als. d) e f), do


PLBA, respectivamente, com o rótulo do equilíbrio ecológico e da unidade de
gestão e acção. De acordo com os respectivos conteúdos: “(...) devem criar-se
os meios adequados para assegurar a integração das políticas de crescimento
económico e social e de conservação da natureza, tendo como finalidade o
desenvolvimento integrado, harmónico e sustentável” (art. 3.º, al. d));
“ (...) deve existir um órgão nacional responsável pela política do
ambiente e ordenamento do território, que normalize e informe a actividade dos
agentes públicos ou privados interventores, como forma de garantir a
integração da problemática do ambiente, do ordenamento do território e do
planeamento económico, quer a nível global, quer sectorial” (art. 3.º, als. f)).

Ou seja, partindo-se da premissa de que não há uma só actividade


humana que não seja susceptível de afectar de maneira directa ou indirecta,
em maior ou menor grau o ambiente, o princípio da integração aconselha uma
interdependência entre as políticas de protecção do ambiente e as do
ordenamento do território e do planeamento económico, quer ao nível global,
quer ao nível sectorial.
114
Por outras palavras, de acordo com este princípio o ambiente deve ser
elemento de ponderação a ter em consideração não só em decisões
imediatamente relacionadas com o ambiente, mas também em decisões só
mediatamente relacionadas com o ambiente, o caso de matérias de agricultura,
de pesca, de indústria, de comércio, de transporte, da energia, do turismo, da
economia, etc..

9.3.5. Princípio da participação

O princípio da participação encontra-se previsto no art. 3.º, al. e) do


PLBA. Nos termos deste artigo, “(...) os diferentes grupos sociais devem intervir
na formulação e execução da política do ambiente e do ordenamento do
território, através dos órgãos competentes de administração central, regional e
local e de outras pessoas colectivas de direito público ou de pessoas colectivas
e entidades privadas”.

9.3.6. Princípio da cooperação

O princípio da cooperação vem previsto no art. 3.º, al. g), do PLBA. O


princípio aparece previsto apenas na vertente de cooperação internacional. De
acordo com o citado artigo, “a cooperação internacional significa a procura de
soluções concertadas com outros países ou organizações internacionais para
os problemas do ambiente e da gestão dos recursos naturais”.

9.4. Tutela preventiva do ambiente

Dissemos a propósito do princípio da prevenção, inter alia, que no


Direito do Ambiente, mais do que desenvolver instrumentos de reacções aos
115
atentados ambientais, interessa que as actuações com efeitos imediatos ou a
prazos no ambiente devem ser consideradas de forma antecipada, reduzindo
ou eliminando as causas susceptíveis de alterarem a qualidade do ambiente.

Para cumprir este desiderato pode-se lançar mão de vários instrumentos


de carácter preventivo nomeadamente:
A sujeição dos recursos naturais ao domínio público e o consequente
condicionamento do seu aproveitamento pelos particulares ao pagamento de
uma taxa de utilização, o que teria o mérito de levar à redução do consumo ou
aproveitamento desses recursos;
A criação de zonas de protecção especial, nomeadamente as áreas
protegidas, a Reserva Agrícola Nacional, a Reserva Ecológica Nacional (art.
27.º, n.º 1, als. c) e d), do PLBA);
A criação de certas obrigações e proibições impostas pela
Administração, o caso, por exemplo, de proibições de caça e pesca ou de
emissão de determinados gazes e efluentes; o caso de suspensão de
actividades lesivas ao ambiente (art. 27.º, n.º 1, al. i), do PLBA);
A actuação directa da Administração Pública enquanto inspector e
polícia (art. 27.º, n.º 1, al. m), do PLBA);
Licenciamento ambiental (art. 27.º, n.º 1, al. h), do PLBA);
Sujeição de actividades potencialmente perigosas para o ambiente ao
instituto da avaliação de Impacto Ambiental (art. 27.º, n.º 1, al. g, do PLBA)20.

Passamos agora à análise de alguns destes instrumentos.

Quanto à criação de áreas protegidas, pelo seu interesse a matéria será


abordada mais à frente autonomamente.
No que tange à Reserva Agrícola Nacional e à Reserva Ecológica
Nacional, importa antes dizer que desconhecemos a existência de diplomas

20
A Avaliação de Impacto Ambiental é o mais importante instrumento específico do Direito do
Ambiente.

116
que as regulam especialmente na Guiné-Bissau. O Projecto de Lei de Bases do
Ambiente apenas as faz referência sem regular o respectivo regime.

Nos itens que se seguem vamos apenas falar da Avaliação do Impacto


Ambiental e da Licenciamento ambiental

9.4.1. Avaliação de impacte Ambiental

9.4.1.1. Considerações prévias

A avaliação de impacte ambiental (AIA) foi consagrada pela primeira vez


nos Estados Unidos da América, através da elaboração do National
Environmental Protection Act (NEPA), que entrou em vigor em 01 de Janeiro de
1970.
Foi posteriormente adoptada por quase todo o mundo como instrumento
de prevenção de danos ambientais.
Ao nível do Direito Internacional a AIA foi adoptada definitivamente na
Declaração do Rio nos seguintes termos: «a AIA, como instrumento nacional,
deve ser efectuada em relação a determinadas actividades que possam vir a
ter um impacto adverso, significativo sobre o ambiente e estejam dependentes
de uma decisão de uma autoridade nacional competente».

Na Guiné-Bissau existe um Projecto de Lei de Avaliação Ambiental de


2008, que aguarda a sua transformação em lei.

Curiosamente, o Projecto de Lei de Avaliação Ambiental (PLAIA) não dá


a definição da AIA, a definição é nos dada pelo Projecto de Lei de Bases do
Ambiente. De acordo com o Projecto de Lei de Bases do Ambiente, a Avaliação
de Impacte Ambiental é o Instrumento de política e de gestão ambiental de
empreendimentos, formado por um conjunto de procedimentos capaz de

117
assegurar, desde o início do processo, que: se faça um exame sistemático dos
impactes ambientais de uma proposta (projecto, programa, plano ou política) e
de suas alternativas; se apresentem os resultados de forma adequada ao
público e aos responsáveis pela tomada de decisão, e por eles considerados;
se adoptem as medidas de protecção do meio ambiente determinadas, no caso
de decisão sobre a implantação do projecto (art. 5.º, n.º 2, al. m)).

Por outras palavras, a AIA é um procedimento administrativo que


garanta que, antes de autorização de um projecto, os seus potenciais
significativos sobre o ambiente serão satisfatoriamente avaliados e tidos em
consideração.

9.4.1.2. Objecto da avaliação de impacte ambiental

A AIA aplica-se a projectos (públicos ou privados), programas, planos e


políticas com incidência no ambiente e na saúde humana (art. 1.º, n.º 1 e art.
30.º, n.º 1, do PLAIA).
Todavia, nem todos os projectos estão sujeitos à AIA, mas apenas
aqueles que são susceptíveis de produzir efeitos significativos sobre o
ambiente.
Nos anexos I, II e III ao Projecto de Lei de Avaliação de Impacte
Ambiental estão enumerados os projectos susceptíveis de produzir efeitos
significativos sobre o ambiente, ex vi do art. 2.º, n.º 1, do PLAIA.

Nos termos do art. 7.º, n.º 1, als. a), b) e c) do PLAIA, os projectos são
classificados em três categorias: projectos da categoria A, projectos da
categoria B e projectos da categoria C.

Os projectos da categoria A correspondem àqueles que comportam altos


riscos e os impactes negativos que produzem sobre o ambiente e saúde
humana são por vezes irreversíveis e com efeitos sentidos em larga escala (art.
7.º, n.º 2, do PLAIA).

118
Os projectos da categoria B correspondem àqueles projectos
susceptíveis de ter sobre a população e ambiente impactes negativos menos
graves que os da categoria anterior e são geralmente impactes de natureza
local com possibilidades de serem concebidas medidas de atenuação especial
(art. 7.º, n. 3, do PLAIA).

E os projectos da categoria C correspondem àqueles projectos cujos


impactes negativos sobre o ambiente e sobre a saúde humana são
insignificantes ou mesmo nulos. Estes projectos são isentos de qualquer outra
mediada de avaliação ambiental depois de um exame prévio de categorização
(art. 7.º, n.º 4, do PLAIA).

Para determinar a categoria correspondente a um projecto, os projectos


são sujeitados a um exame prévio de categorização como condição
fundamental para o licenciamento ambiental (art. 8.º, n.º 1, do PLAIA).
Depois da categorização, os projectos da categoria A e B são
obrigatoriamente submetidos à AIA (art. 8.º, n.os 2 e 3, 1ª parte do PLAIA). Os
projectos da categoria C são isentos da AIA (art. 7.º, n.º 4, 2ª parte e art. 8.º, n.º
3, 2ª parte do PLAIA).

9.4.1.3. Procedimento de AIA

Numa primeira fase, o dono da obra apresenta o projecto, à autoridade


de Avaliação Ambiental21, com a descrição sumária, acompanhado do
requerimento para concessão de licença de implementação de um projecto, o
qual deve respeitar os requisitos matérias constantes do art. 10.º, 1, als. a), b),
c), d) e e) do PLAIA.
Segue-se depois o exame de categorização do projecto e indicação do
tipo de instrumentos de AIA a utilizar pelo dono da obra (art. 10.º, n.º 2, do
PLAIA).
21 os
O Primeiro-Ministro (arts. 43.º, corpo principal, als. a) e c), art. 44.º, n. 1 e 2 do PLAIA).

119
Numa segunda fase, tem lugar à apresentação do Termo de Referência
(Tdr), pelo dono da obra, para avaliação ambiental, à autoridade de Avaliação
Ambiental, com respeito dos requisitos estabelecidos no art. 12.º, n.º 2, do
PLAIA).

Numa terceira fase, tem lugar à realização da AIA a cargo do dono da


obra, em obediência do princípio da precaução (art. 13.º do PLAIA).

Numa quarta fase, tem lugar à audiência pública dos interessados


promovida pelo dono da obra (art. 14.º, do PLAIA).

Numa quinta fase, o dono da obra submete o Relatório do Estudo de


Impacte Ambiental (REIA) à autoridade de Avaliação Ambiental, para
apreciação técnica (art. 21.º, n.º 1, do PLAIA).

Numa sexta fase, tem lugar à apreciação técnica do Relatório do


Estudo de Impacte Ambiental pelo Comité ad hoc criado no âmbito da
Autoridade de Avaliação Ambiental (22.º, do PLAIA).

Numa sétima fase, tem lugar, de novo, à audiência pública dos


interessados com base nos comentários feitos pelo Comité ad hoc (art. 24.º, n.º
1, do PLAIA).

Numa oitava fase, fase final, tem lugar à concessão de licenças


ambientais.
As licenças ambientais são de dois tipos e complementáveis: Declaração
de Conformidade Ambiental (DCA) e Certificado de Conformidade Ambiental
(art. 25.º e 26.º do PLAIA).

A Declaração de Conformidade Ambiental pode ser favorável,


condicionalmente favorável ou desfavorável (art. 27.º, n.º 1, do PLAIA).

120
9.4.1.4. Força jurídica do resultado da AIA

9.4.1.4.1. Força jurídica da Declaração de Conformidade


Ambiental

A Declaração de Conformidade Ambiental (DCA) favorável ou


condicionalmente fixa as condições em que o projecto pode ser licenciado e
contém as medidas de minimização dos impactes ambientais negativos que o
dono da obra deve adoptar na fixação do projecto (art. 27.º, n. os 2 e 3 do
PLAIA).

A autorização do projecto sujeito ao procedimento de avaliação


ambiental só poderá ser feita após a notificação da Declaração de
Conformidade Ambiental favorável ou condicionalmente favorável ou após o
decurso do prazo para a tomada de decisão sobre a Declaração de
Conformidade Ambiental (arts. 30.º e 29.º, do PLAIA).

Em relação ao valor jurídico da Declaração de Conformidade Ambiental


desfavorável o art. 30.º não nada adianta, pelo menos, de modo expresso.
Todavia, o espírito do instituto de Avaliação de Impacte Ambiental pressupõe
que a Declaração de Conformidade Ambiental desfavorável deve ter um valor
vinculativo de rejeitar a implementação do projecto.
Sob pena de inutilidade do expediente de AIA, uma protecção eficaz do
ambiente exige que, sempre a avaliação ambiental de um projecto seja
negativa, o resultado da avaliação deva ser vinculativo, não podendo o projecto
ser aprovado ou licenciado.

121
9.4.1.4.2. Força jurídica do Certificado de Conformidade
Ambiental

O Certificado de Conformidade Ambiental é emitido tendo em conta os


resultados alcançados com a implementação das medidas recomendadas na
Declaração de Conformidade Ambiental (art. 27.º, n.º 4 e art. 32.º, n.º 1 do
PLAIA).

Tendo em conta a implementação das condições estabelecidas na


Declaração de Conformidade Ambiental, o Certificado de Conformidade
Ambiental fixa novas condições e exigências ambientais e sociais que o
projecto deve respeitar (art. 32.º, n.º 1, in fine do PLAIA).

Sob pena de nulidade, o acto de autorização de projectos sujeitos ao


procedimento de AIA só pode ser praticado após a notificação do respectivo
CCA favorável ou condicionalmente favorável ou após o decurso do prazo
previsto no artigo anterior (art.35.º do PLAIA).
Se, depois de emissão do Certificado de Conformidade Ambiental
favorável ou condicionalmente favorável, o dono da obra vier a não respeitar as
condições estabelecidas neste, a Autoridade de Avaliação Ambiental pode
adoptar uma das seguintes medidas: suspender ou revogar o Certificado de
Conformidade Ambiental (art. 32.º, n.º 2, do PLAIA).

O Certificado de Conformidade Ambiental tem o prazo de validade que


varia entre 1 a 5 anos (art. 26.º, 1, b) do PLAIA). O dono da obra pode requerer
a sua renovação com antecedência mínima de 120 dias contados da data sua
expiração (art. 36.º, n.º 2 do PLAIA).
Tendo um prazo curto de vigência, no fundo, acaba o Certificado de
Conformidade Ambiental por desempenhar o papel de um mecanismo de
controlo sucessivo da execução do projecto de acordo com as condições em foi
licenciado.

122
9.4.1.5. Conteúdo do estudo de impacte ambiental

O estudo de impacte ambiental é a peça mais importante de todo o


procedimento de avaliação de impacte ambiental. É elaborado por técnicos e
analisa questões como: o estado ou locais onde o projecto poderá vir a ser
implementado; as características do próprio projecto; a previsão de impactes
do projecto relativamente a cada componente ambiental; riscos ligados ao
funcionamento do projecto.

A descrição de medidas para evitar, reduzir e remediar os eventuais


impactes negativos é especialmente importante para a hipótese de um projecto
com impactes ambientais negativos vier a ser autorizado, apesar dos seus
efeitos negativos sobre o ambiente, considerando o seu interesse económico.

Para facilitar a compreensão do texto por quem não seja técnico, o


Estudo de Impacte Ambiental comporta um resumo não técnico, facilitando,
desta forma, o acesso do público em geral aos seus resultados (art. 16.º, n.º 1,
al. a) e art. 17.º, n.º 1 do PLAIA).

Para evitar qualquer omissão grave no Estudo de Impacte Ambiental,


devido à variação da composição das equipas de trabalho de projecto por
projecto, o Projecto de Lei de Avaliação de Impacte Ambiental estabelece um
conteúdo mínimo que o Estudo de Impacte Ambiental deve comportar (art. 16.º,
n.º 1 e art. 18.º do PLAIA).

9.4.2. Licenciamento ambiental

O Licenciamento ambiental é o “(...) instrumento de política e gestão


ambiental de carácter preventivo, formado por um conjunto de leis, normas
técnicas e procedimentos administrativos que consubstanciam, na forma de
licenças, as obrigações e responsabilidades do poder público e dos donos da
123
obra, com vistas à autorização para localização, construção, instalação,
modificar, operação e desactivação de qualquer empreendimento potencial ou
efectivamente capaz de causar alterações no ambiente, promovendo sua
implantação de acordo com os princípios do desenvolvimento sustentável” (art.
5.º, n.º 2, al. i), do PLBA e art. 5.º, n. 18, do PLAIA).

Ou seja, o licenciamento ambiental é um procedimento administrativo


especial do Direito do Ambiente, que tem por finalidade imediata a emissão de
licença ambienta que, nos termos do art. 5.º, n.º 2, al. o) do PLBA e do art. 5.º,
n. 17, do PLAIA, é “(...) um documento com prazo de validade definido,
resultante do procedimento administrativo pelo qual o órgão ambiental
competente, estabelece as condições, restrições e medidas de controle
ambiental que deverão ser obedecidas pelo empreendedor, pessoa física ou
jurídica, para localizar, instalar, ampliar ou modificar e operar empreendimentos
ou actividades utilizadoras dos recursos ambientais consideradas efectiva ou
potencialmente poluidoras ou aquelas que, sob qualquer forma, possam causar
degradação ambiental”.

Se queremos simplificar podemos dizer que, no fundo, a licença


ambiental é um instrumento preventivo dos danos ambientais que concretiza o
princípio de proibição sob reserva de permissão.
Com a exigência de obtenção prévia de licença ambiental como
condição para exercício de uma actividade que comporta risco para o
ambiente, ao particular é negado a possibilidade de emitir poluição proveniente
da exploração de determinadas actividades industriais para o ar, água e solo,
sem munir previamente de acto administrativo conformador dos limites desse
desgaste (art. 27.º, al. h) do PLAIA).

Uma certa doutrina portuguesa, de reconhecida autoridade, distingue o


licenciamento ambiental do procedimento de AIA. A esse propósito afirma a
mesma doutrina, com base na realidade portuguesa que serviu de fonte de
inspiração para o autor dos Projecto de Lei de Bases do Ambiente e de

124
Avaliação do Impacte Ambiental, que só alguns projectos submetidos à AIA
devem ser objecto de licenciamento ambiental.
Esclarece a mesma doutrina, contudo, que um procedimento não exclui
o outro, antes o completa. Primeiro tem lugar a AIA e depois o licenciamento
ambiental.

Todavia, o Projecto de Lei de Avaliação de Impacte Ambiental parece


apontar no sentido da licença ambiental ser uma fase consequente do
procedimento de Avaliação do Impacte Ambiental.

Assim, o art. 5.º, n.º 6 do PLAIA ao fixar o sentido da Autoridade


Competente prescreve que esta significa a autoridade administrativa suprema
na gestão de Avaliação Ambiental, com a competência para emitir as licenças
ambientais como Declaração de Conformidade Ambiental e Certificado de
Conformidade Ambiental.
No mesmo sentido dispõe o art. 44.º, n.º 2, do PLAIA que “(...) a
autoridade de tutela é a competente para conceder o licenciamento ambiental,
designadamente emitir a Declaração da Conformidade Ambiental e Certificado
da Conformidade Ambiental e em matéria de projectos, programas, planos e
políticas”.

Na mesma esteira, a secção V do Projecto de Lei de Avaliação de


Impacte Ambienta após se abrir com epígrafe intitulado “Do Licenciamento
Ambiental”, segue-se logo o seu primeiro artigo com epígrafe intitulado “tipos
de licenças ambientais” (art. 26.º).
Nos termos deste artigo há dois tipos de licenças ambientais: a
Declaração de Conformidade Ambiental e o Certificado de Conformidade
Ambiental (art. 26.º, n.º 1, als. a) e b)).

Também no mesmo sentido parece enveredar o art. 30.º, n. os 2 e 3, do


PLBA que, prevendo, de modo autónomo, a avaliação ambiental, prescreve
que:

125
“Serão regulamentadas por diploma próprio as condições em que será
efectuada a avaliação ambiental, os seus instrumentos, conteúdo, métodos,
procedimento e técnicas, bem como as entidades responsáveis pela análise
das suas conclusões e pelo licenciamento de obra ou trabalhos previstos e
ainda pela auditoria (n.º 2);

“A aprovação do relatório de estudo ambiental é condição essencial para


o licenciamento final das obras e trabalhos pelos serviços competentes, nos
termos da lei” (n.º 3).

9.5. Tutela repressiva

9.5.1. Responsabilidade penal

Os crimes ambientais vêem previstos na Lei Florestal, no art. 54.º a art.


60.º, e no Código Penal, no art. 156.º a 159.º.
No art. 46.º do PLBA estabelece-se que além dos crimes previstos e
punidos no Código Penal, serão ainda considerados crimes as infracções que a
legislação complementar qualificar como tal de acordo com o disposto no
Projecto de Lei de Base do Ambiente.

Podem ser passíveis de responsabilidade criminal ambiental também as


pessoas colectivas (art. 11.º, do Código Penal).

Os ofendidos pela prática do crime ambiental que são titulares do


interesse que a incriminação da conduta visa proteger, podem constituir-se
assistentes no processo criminal (art. 66.º, n.º 1, al. a), do Código do Processo
Penal) e ficam investidos de poderes especiais do assistente constantes no art.
69.º do Código do Processo Penal.

126
9.5.2. Responsabilidade contravencional

O autor do Projecto de Lei de Bases do Ambiente, contrariamente à Lei


de Bases do Ambiente portuguesa da qual serviu de fonte de inspiração,
prefere usar o termo multa ao invés da coima para a responsabilização das
condutas infractoras das disposições do Projecto de Lei de Bases do Ambiente
que não sejam consideradas crimes.
Com efeito, estabelece-se no art. 47.º, n.º 1 que as restantes infracções
ao Projecto de Lei de Bases do Ambiente serão consideradas puníveis com
multa, em termos a definir pela legislação complementar, compatibilizando os
vários níveis da Administração em função da gravidade da infracção.

No n.º 2 do mesmo artigo estabelece-se que se a mesma conduta


constituir simultaneamente crime punível com pena de prisão e de multa
poderão ser, por cúmulo jurídico, aplicadas.

Em conformidade com as características fundamentais do Direito de


Mera Ordenação social, no n.º 3 ,do artigo em apreço, estão previstas sanções
acessórias que poderão ser aplicadas conjuntamente com a sanção principal,
em função da gravidade da pena e da culpa do agente. São elas: interdição do
exercício de uma profissão ou actividade; privação do direito de subsídio
outorgado por entidades ou serviços públicos; cessação de licenças ou
autorizações relacionadas com o exercício da respectiva actividade; apreensão
e perda a favor do Estado dos objectos utilizados ou produzidos aquando da
infracção; perda de benefícios fiscais, de benefícios de crédito e de linhas de
financiamento de estabelecimentos de crédito de que haja usufruído (art. 47.º,
n.º 3, als. a), b), c), d) e), do PLBA)22.

22
Estas sanções são geralmente mais gravosas para o condenado do que a sanção principal. Pensa-se,
por exemplo, nos danos que o infractor poderá sofrer com encerramento do respectivo
estabelecimento durante dois ou mais anos.

127
São ainda susceptíveis de punição com, aquilo o autor do Projecto de
Lei de Bases do Ambiente qualifica de, pena de multa, a negligência e a
tentativa (art. 47.º, n.º 4), à semelhança daquilo que se passa em quase todos
os diplomas sobre as contra-ordenações ambientais. A punição da negligência
e tentativa reflecte a preocupação de que quando estão em causa os bens
ambientais todo o cuidado é pouco.

9.5.3. Responsabilidade civil

No Projecto de Lei d Bases do Ambiente encontramos muitas


disposições dispersas que fazem referência à responsabilidade civil quer na
sua modalidade de responsabilidade civil subjectiva quer na sua modalidade
objectiva.

Assim, logo no art. 3.º, al. j), estabelece-se a responsabilidade como um


dos princípios que devem orientar à actuação dos agentes no domínio
ambiental23.
Mais à frente, no art. 40.º, n.os 4 e 5, estabelece-se o direito dos lesados,
inclusive dos poderes locais, de pedir, nos termos gerais de direito, a cessação
das causas de violação e a respectiva indemnização.

No art. 41.º, n.º 1, estabelece-se a responsabilidade civil objectiva pelo


risco.

No art. 43.º, consagra-se o seguro de responsabilidade civil nos


seguintes termos: “aqueles que exerçam actividades que envolvam alto grau de
risco para o ambiente e como tal venham a ser classificados serão obrigados a
segurar a sua responsabilidade civil”.
23
Eis o conteúdo do preceito: “o princípio geral constante do artigo anterior implica a
observância dos seguintes princípios específicos: (...) da responsabilização: aponta para a
assunção pelos agentes das consequências, para terceiros, da sua acção, directa ou indirecta,
sobre os recursos naturais”.

128
E finalmente no art. 48.º, n.º 1, deu-se a preferência à reconstituição
natural na reparação do dano.

9.6. O uso de solo na Lei-Quadro das áreas protegidas e nos seus


instrumentos de aplicação

9.6.1. As áreas protegidas: considerações introdutórias

Do ponto de vista jurídica e institucional, uma área protegida consiste na


delimitação de um território a um estatuto particular com o fim de assegurar a
gestão durável e responsável dos recursos nela existentes, no interesse geral
do Estado costeiro, em particular, e, por arrastamento, de toda comunidade
internacional, em geral. A sua criação é um daqueles pouco casos onde existe
um quase consenso entre os cientistas e os governantes.

Contrariamente àquilo que se verifica na terra cuja superfície beneficia


de um estatuto de protecção de mais de 12%, no domínio marítimo a protecção
não ultrapassa 0,6% da superfície. Ou seja, temos perto de 100.000 lugares
protegidos na terra contra cerca de 4.300 lugares protegidos no mar; mais de
18 milhões de km2 de terra protegida contra menos de 2 milhões km 2 das áreas
marinhas protegidas.

Nos últimos anos, à medida que a modernização dos barcos de pesca


tem permitido um significativo aumento de número de capturas, verifica-se uma
tendencial saturação no stock de 3/4 das espécies marinhas comercializadas
no plano mundial. Este facto levou à tomada de consciência sobre a
necessidade de criação de áreas marinhas protegidas. Com efeito, nos últimos
trinta anos, o número dos espaços marítimos que beneficia do estatuto de
protecção triplicou, com maior incidência nos países em vias de
desenvolvimento.

129
O objectivo é, de acordo com a Conferência Mundial para
Desenvolvimento Durável de Johannesburg de 2002, criar reservas que
cubram 20 a 30% da superfície marítima até 2012.

Em virtude desta triplicação, as áreas marinhas protegidas estão hoje


disseminadas por todo o planeta. Como instrumento de políticas públicas, são
adoptadas por todos os governantes, sejam eles dos países desenvolvidos ou
em vias de desenvolvimento.

Na Guiné-Bissau, na sequência da execução do programa de


Planificação Costeira pela UICN em 1988, que implica a parceria com as
instituições do Estado e das ONG, foi proposta a criação de muitas áreas
protegidas, na qual o Arquipélago dos Bijagós era eleito como a zona prioritária
de intervenção para a valorização do conjunto de ecossistemas presentes da
região ocidental africana. Nesta esteira, foi proposto fazer dele uma Reserva de
Biosfera, facto que acabou por ficar oficialmente reconhecido pela UNESCO
em 1996.

Na costa ocidental africana, maxime de norte de Mauritânia a Sul da


Guiné-Conakry, as áreas protegidas cobrem um conjunto de ecossistemas
costeiros diferentes cuja superfície, terrestre e marítima, é estimada em
2.700.000 hectares, habitada por uma população de 170.000 habitantes.
Dentre as áreas protegias mais importantes desta zona, estão o “Parc National
du Banc d’Argun”, em Mauritânia, a “Réserve de Biosphère du Delta du
Saloum”, no Senegal e a Reserva de Biosfera do Arquipélago de Bolama-
Bijagós, na Guiné-Bissau.

A Reserva de Biosfera do Arquipélago de Bolama-Bijagós cobre uma


superfície total de 1.046.950 hectares, donde o domínio marítimo constitui a
maior parte.

A Reserva abrange todas as ilhas partes do Arquipélago de Bolama-


Bijagós. Nela encontramos o Parque Nacional do Grupo de Ilhas de Orango, o
130
Parque Nacional Marinho João Vieira Poilão e a Área Marinha Protegida
Comunitária das Ilhas de Formosa, Nago e Chediã. Além destes, existem ainda
na parte continental três áreas protegidas de interesse para gestão dos
recursos vivos e não vivos da Guiné-Bissau: Parque Natural dos Tarrafes do
Rio de Cacheu, Parque Natural das Lagoas de Cufada e o Parque Nacional de
Cantanhez.

A diferença terminológica que existe entre as supracitadas áreas


protegidas deve-se ao disposto no art. 3.º da Lei-Quadro das Áreas Protegidas
(LQAP)24, que classifica as áreas marinhas em Parques nacionais, Parques
naturais, reservas naturais, perímetros de meio ambiente sensível, santuários
ecológicos e florestas sagradas25.

No seu conjunto, as áreas protegidas, foram instituídas para exercer as


seguintes funções:

a) Funcionar como uma reserva da biodiversidade, que abriga as


populações viáveis de espécies cuja sobrevivência fica precária nas
zonas que não beneficiam de protecção formal;

24
Aprovada pelo DL n.º 3/97.
25
Sem preocupação de análise do conteúdo, nos termos do artigo supracitado «Parques nacionais são
áreas destinadas à protecção da integridade ecológica dos seus ecossistemas para as gerações presentes
e futuras, excluindo a exploração ou ocupação inadequada aos objectivos da área, e oferecendo a
oportunidade de visitas científicas, educacionais e recreativas. Sendo as mesmas compatíveis com o uso
e costumes das populações residentes; Parques naturais são áreas onde a interacção das populações e
o seu meio ambiente constitui um carácter excepcional, com valores estéticos, ecológicos e culturais de
reconhecido interesse, apresentando ainda uma alta diversidade biológica. Salvaguardar a integridade
dessa interacção tradicional é indispensável a protecção, manutenção e evolução dessas áreas; Reservas
naturais são áreas que sofreram pouca ou nenhuma modificação dos seus ecossistemas e que
apresentam uma baixa densidade demográfica. Sua protecção e gestão são voltadas à preservação do
seu estado natural; Perímetros de Meio Ambiente Sensível são áreas destinadas à protecção e
manutenção da biodiversidade a longo prazo e ao mesmo tempo promovendo a utilização durável dos
seus recursos naturais para atender às necessidades das comunidades residentes. Santuários ecológicos
são áreas sujeitas a uma gestão voltada à protecção e manutenção de habitats essenciais à flora de
importância ou à fauna, nomeadamente a migratória; Florestas sagradas são espaços naturais
destinados exclusivamente a manifestações tradicionais de cunho cultural e religioso onde a gestão dos
seus recursos naturais é determinada pelos usos e costumes da comunidade que os utilizam».

131
b) Constituir um caroço perfeitamente preservado a partir do qual o
repovoamento das zonas adjacentes pelas espécies ameaçadas ou
fortemente exploradas se torna possível26;

c) Contribuir para a conservação da biodiversidade ao nível mundial, na


medida em que seja capaz de viabilizar a concretização de uma rede
regional de áreas protegidas em África Ocidental e afigurar-se como
uma zona de importância internacional para as populações de pássaros
migradores e de tartarugas marinhas;

d) Criar as condições favoráveis a um desenvolvimento durável da região


na qual estão localizadas através de promoção de actividades de
desenvolvimentos compatíveis com a conservação da biodiversidade;

e) Apoiar as instituições do Estado na gestão dos oceanos e dos ambientes


naturais, em geral. Ou seja, as áreas protegidas podem constituir uma
base de experimentação, de recolha de informação e de produção de
conhecimentos científicos, que permitam apoiar as Administrações do
Estado nas suas actividades de gestão dos ambientes naturais.

Quando a sua implementação é bem sucedida, as áreas marinhas


protegidas podem, e acabam quase sempre, por funcionar, na prática, como
suportes de actividades turísticas e recreativas, pela sua atracção a inúmeros
visitantes. Desta forma, funcionam também como meios de melhorar os
resultados económicos do turismo local. Não admira mesmo, que, hoje em dia,
se assista a iniciativas um pouco por todo lado de protecção de ambientes

26
As áreas marinas protegidas poderão ser consideradas como um factor de equilíbrio para o conjunto
do Arquipélago, ajudando à conservação dos stocks haliêuticos explorados pela pesca artesanal
comercial pelo auto-consumo.

132
ameaçados, sensíveis, marcantes com vista à generalização das áreas
marinhas como instrumentos de novas políticas socioeconómicas, conhecidas
por ecoturismo.

9.6.2. As principais áreas protegidas da Guiné-Bissau e as


respectivas importâncias para a gestão dos recursos naturas

Na Guiné-Bissau existem seis áreas protegidas: três na parte insular e


três na parte continental do país. À excepção do Parque Nacional de
Cantanhez que cuja área geográfica se circunscreve apenas a uma parte do
território terrestre, todas as áreas protegidas abrangem partes do território
terrestre e marítimo. As situadas na parte insular do país fazem parte
integrante da Reserva de Biosfera do Bolama-Bijagós.

Cada uma destas áreas exerce, com menor ou maior grau, uma certa
influência no ecossistema da respectiva zona geográfica da sua localização.
Com efeito, o grau de influência que exercem na respectiva zona determina a
posição de cada uma no que tange à respectiva importância para gestão dos
recursos naturais. Vejamos a potencialidade de cada uma delas para a gestão
dos recursos:

9.6.2.1. Parque Nacional do Grupo de Ilhas de Orango (Parque


de Orango)

O Parque Nacional do Grupo de Ilhas de Orango (Parque de Orango) foi


institucionalizado pelo Decreto n.º 11/2000. É a maior área protegida do
Arquipélago dos Bijagós. Situa-se a 11º 08´ 40´´ de latitude Norte e 16º de
longitude Oeste, no Arquipélago dos Bijagós, ou bem, nos trechos sudeste do
sector de Orango e sudoeste do sector de Bubaque. Abrange as ilhas de
Orango-Grande, Orangozinho, Imbone, Maneque e Canogo e ilhéus de
133
Adonga, Acapa-Imbone, Acapa, Amenopo, Ancurum, Anhetibe, Anabela,
Canuopa, bem como todas as demais feições geográficas situadas
internamente no seu perímetro.

O Parque de Orango conta com uma área total de 158.479 ha, os quais
abrangem 16,8% de terra firme, 10,9% de mangais, 8,5% de banco de arreia,
3% de rios e 60,6% do mar.

A nível ecológico o Parque de Orango é o mais rico do Arquipélago dos


Bijagós. Possui uma grande diversidade de habitats, donde sobressaem
grandes superfícies de mangal com importância capital a nível da produtividade
biológica, da reprodução de certas espécies de peixes, moluscos e crustáceos.
O ambiente marinho do Parque de Orango comporta várias rias inexploradas,
uma presença de certas espécies raras, o caso do hipopótamo, crocodilo,
tartarugas marinhas, “manatins” (peixe-boi), entre outras.

Excluídos os cetáceos, o hipopótamo (Hippopotamus amphibius) é o


terceiro maior animal existente em África. No Arquipélago dos Bijagós existe
uma população de hipopótamos com hábitos muito particulares. Passa a maior
parte da sua vida na água do mar. É um hábito raro entre este tipo de recursos.
Diz-se: a população de hipopótamos existente no Arquipélago dos Bijagós “é
uma população original”, pelo menos, em relação às espécies existentes ao
nível das costas africanas. Por isso mesmo, alguns estudiosos convencionaram
apelidá-la de hipopótamos marinhos.

A zona do grupo das ilhas de Orango é a zona da sua maior


concentração na Guiné-Bissau. Este facto contribuiu, sobremaneira, para a
selecção deste grupo de ilhas para a implementação do primeiro Parque
nacional na Guiné-Bissau, O Parque Nacional do Grupo de Ilhas de Orango.

Calcula-se que existem perto de 112 a 140 indivíduos de hipopótamos


(hipopotammos amphibius), que se concentram sobretudo perto da “tabanca”
de Angôr a sudoeste de Orango-Grande e na ilha de Imbone.

134
À semelhança do que acontece em geral nas águas do Arquipélago dos
Bijagós, nas águas do Parque de Orango existem algumas espécies
ameaçadas no mundo e na Guiné-Bissau em particular, o caso do “manatim”,
das cinco espécies de tartarugas marinhas e das espécies de crocodilo: o
crocodilo de Nilo e o crocodilo anão.

9.6.2.2. Parque Nacional Marinho João Vieira Poilão (Parque


João Vieira Poilão)

O Parque Nacional Marinho João Vieira Poilão (Parque João Vieira


Poilão) foi criado pelo Decreto n.º 6-A/2000. Situa-se no sudoeste dos
Arquipélagos dos Bijagós e corresponde a uma extensão da Plataforma
Continental perto de 5 a 10 km ao redor das ilhas. Tem uma superfície de 495
km2 e caracteriza-se por uma fraca profundidade das águas marítimas. A sua
área geográfica cobre quatro principais ilhas (João Vieira, Maio, Cavalos e
Poilão) e três ilhotes (Cobras, Águias e Gaivotas), com uma superfície total de
16 km.

Além das terras emersas permanentemente, o Parque de João Veira


Poilão inclui ainda grandes zonas interditais formadas de bancos da área e
algumas rochas, cobrindo cerca de 2500 he. O limite externo do Parque
coincide com a isóbita de 10 m. Entretanto, algumas das suas zonas, o caso do
canal do Maio (entre Maio e João Vieira), podem apresentar profundidades
activas até aos 20 ou 30 m.

A zona é muito rica em peixes, principalmente caranguejo (Caranx sp) e


tubarões. Nela existem ainda as tartarugas marinhas, os mamíferos marinhos
(golfinhos, manatins” e hipopótamos), as colónias “nicheuses de sternes” de
importância internacional assim como uma multidão de pássaros migratórios 27.

27
O Parque abriga as comunidades de pássaros piscícolas particularmente ricos. A mais importante é a
família de “sternes” (Sternidae). Milhares de pares de “sternes royales” (Sterna maxima) nidificam sobre
a ilha de Gaivotas. Perto de 600 ninhos de “sternes caspiennes” (Sterna Caspia) foram registados em
Outubro de 2000. Vistos os seus efectivos, estas duas colónias podem ser consideradas de importância
135
Das sete espécies de tartarugas internacionalmente reconhecidas, por certas28,
cinco delas ocorrem nas Águas Territoriais da Guiné-Bissau: (Chelonia mydas,
Lepidocheles olivacea, Eretmochelys imbricata, Caretta caretta, Dormocheys
coreacea)29.

Do ponto de vista da fauna marinha, o Parque João Vieira Poilão é


sobretudo caracterizado por um número importante de tartarugas verdes
(Chelonia mydas) que todos os anos vêm ocupar as praias da ilha de Poilão, as
quais representam para esta espécie o mais importante lugar de ponte em toda
a costa ocidental da África. Os dados de estudos conduzidos em 2000 apontam
para perto de 10.000 lugares de ponte no Poilão. O seu óptimo habitat é nas
águas rasas com abundância de vegetação submersas. Aliás, as adultas são
principalmente herbívoras. Por causa da existência de grandes ervas na
Mauritânia (Banc d’Argun), após a desova no Poilão, os adultos vão alimentar-
se nas águas daquela.

No Parque João Vieira Poilão, as tartarugas verdes assim como as


restantes espécies encontram um óptimo habitat de conservação, favorecido,
em geral, pelo hábito alimentar dos guineenses, e, muito particularmente, pela
tradição dos Bijagós. Na Guiné-Bissau as tartarugas marinhas têm pouca
utilidade e não são tradicionalmente comercializadas.

internacional, pois, segundo os estudiosos, elas ultrapassam muito largamente os critérios definidos na
Convenção de Ramsar para a classificação de zonas húmidas de importância internacional. Outras
espécies pássaros piscícolas de importância internacional existem ainda neste Parque, o caso das
populações de sternes negros (Chlidonias niger), de “ardeidae”, da águia pescador africano (Haliaetus
vocifer) e do “vautour palmiste” (Gypohierax angolensis). O Arquipélago é internacionalmente
conhecido pela importância das populações de pássaros migradores que nele vêm instalar
periodicamente. Perto de 700.000 “limicoles” provenientes da Europa e do Antárctico vêm passar o
inverno e alimentam-se sobre os numerosos bancos de areia e vasières descobertos nas marés baixas.
28
As duas espécies que não existem nas águas territoriais da Guiné-Bissau são Natator depressus e
Lepidochelys kempi, cf. Une Stratégie Mondiale pour la Conservation des Tortues Marines, UICN,
Commission de la Sauvegarde des Espèces de l’UICN, États-Unis, 1995, p. 1.
29
PAULO CATRY, STÉPHANE BOUJU e JEAN-CHRISTOPHE VIÉ, op. cit., p. 4.

136
Por outro lado, por tradição local, as ilhas da localização do Parque João
Vieira Poilão não são habitadas permanentemente. As quatros principais ilhas
são propriedade tradicional de quatro “tabancas”30 da Ilha de Canhabaque, que
desde séc. XII as vinham utilizando periodicamente para o cultivo do arroz,
colheita dos produtos das palmeiras ou para a realização de cerimónias
religiosas.
Em Poilão, o principal lugar do ponto, é proibida qualquer actividade
económica e ninguém está autorizado a manter nele residência fixa. A ilha
pertence ao clã Oracuma da “tabanca” de Ambeno em Canhabaque, que a
utiliza para as cerimónias de “intronação” do régulo e para as do fanado.

9.6.2.3. Área Marinha Protegida Comunitária das Ilhas de


Formosa, Nago Chediã (Ilha Urok)

O complexo das lhas do Urok situa-se na parte Norte do Arquipélago dos


Bijagós. Tem uma superfície de 545 km dos quais se destacam 147 k de meio
terrestre, 66 km2 de mangal, 203 km2 de zonas “intertidais vasosas” e 8 km 2 de
canais profundos31.

Abrange para além das ilhas de Formosa, Nago e Chediã, vários ilhéus
e ilhotas desabitados, entre os quais Acôco, Maramba, Papagaio, Quai e
Ratum32. Ao conjunto destas ilhas e ilhéus designa-se, tradicionalmente, Urok.
À semelhança do que se passa com as restantes ilhas do Arquipélago dos
Bijagós, Urok faz parte também da área abrangida pela Reserva de Biosfera de
Bolama dos Bijagós.

30
Aldeias, na linguagem vulgar.
31
Vide o preâmbulo do Decreto n.º 8/2005, sobra a criação da Área Marinha Protegida Comunitária das
Ilhas de Formosa, Nago e Chediã (Ilhas Urok).
32
Ibidem.

137
A zona costeira deste grupo de ilhas é particularmente interessante em
termos de biodiversidade. As partes “vasosas intertidais”, os densos mangais e
inúmeros canais apresentam-se habitats críticos para a reprodução e o
crescimento de numerosas espécies de peixes e custráceos.

Característico da sua fauna marinha é o manatim (Trichechus


senegalensis). Urok abriga uma das mais fortes concentrações de manatins da
sub-região.

O Manatim africano ou peixe-boi (pis-bus)33 é um mamífero aquático da


família das sirenídeos, que pode pesar até 450 kg. Tem um corpo cilíndrico
com, na sua extremidade, uma barbatana em forma horizontal. As fêmeas têm
um par de mamas volumosas, situadas sob as barbatanas peitorais.

Pode ser encontrado no rio Senegal ao afluente do rio Cuanza, em


Angola. O arquipélago dos Bijagós é a zona da sua maior concentração na
África Ocidental. Faz parte do livro vermelho da UICN sobre as espécies
ameaçadas ou vulneráveis. A sua intensidade na Guiné-Bissau está fortemente
ligada aos factores como: a abundância dos mangais, que representam a base
da sua alimentação, a presença de uma rede hidrográfica densa, a existência
de lençóis de água sub-marinhos e as fracas pressões “antrópicas”.

Em termos da “avifauna”, Urok é o mais importante do Arquipélago e o


segundo sítio de importância para as aves migradores a nível da África
Ocidental34. Cerca de 190.000 indivíduos pertencendo a 96 espécies,
provenientes da Europa do Norte e da Sibéria, passam pelas ilhas de Urok35.

33
Nome local.
34
Vide o preâmbulo do Decreto n.º 8/2005, sobre a criação da Área Marinha Protegida Comunitária das
Ilhas de Formosa, Nago e Chediã (Ilhas Urok).
35
Ibidem.

138
Segundo o critério utilizado pela Convenção de Ramsar para a
classificação de zonas húmidas de importância internacional, Urok representa,
para várias espécies, uma zona húmida de importância internacional 36.

9.6.2.4. Parque Natural dos Tarrafes do Rio Cacheu (Parque de


Cacheu)

O Parque Natural dos Tarrafes do Rio Cacheu (Parque de Chaceu)


localiza-se no noroeste da Guiné-Bissau na Região Administrativa de Cacheu.
É limitado ao Norte pela estrada que liga Suzana a São Domingos, a Leste pelo
Rio Antoninho e Rio de Djopa, ao Sul pela baixa do rio Caboi e pelo Rio
Cacheu e a oeste pelo Rio Bolor e Rio Defame. Tem uma área aproximada de
80.000 ha, que cobrem 37,5% de mangais, 20,6% de “tannes”, 13% florestas e
savanas, 12% de agricultura e povoações e 7% de áreas ocupadas pelos rios.

Nos rios do Parque encontramos algumas espécies que estão


ameaçadas de extinção na Guiné-Bissau, o caso das populações de
hipopótamos (Hipopótamus amphibius), de crocodilos (Crocodylus niloticus) e
de Manatins (Trichechus senegalensis).

Ao nível da “avifauna” o Parque alberga uma grande diversidade de


aves. Nele encontramos um grande número de aves migradoras provenientes
de Europa e Ásia, maxime as limícolas.

A grande particularidade do Parque reside no povoamento significativo


dos mangais. O ecossistema dos mangais é um dos mais produtivos no
mundo, é responsável pela nutrição de uma ictiofauna de origem oceânica.
Dele dependem cerca de 80% da captura pesqueira mundial.

36
A Convenção de Ramsar utiliza como critério o limite mínimo de 1% dos efectivos totais de uma
população de uma espécie de aves aquáticos, estacionando simultaneamente, para classificar as zonas
húmidas de importância internacional.

139
Estima-se que os mangais ocupam uma superfície mundial de 182.000
km2. Cerca de 17% destas áreas ocupadas pelos mangais encontram-se na
África Ocidental.

Na Guiné-Bissau os mangais ocupam uma área total de 2.484 km 2,


correspondente a 8% da extensão do território nacional. O rio Caheu, o rio
Mansoa, a região de Tombli e a ilha de Orango são as zonas da sua maior
concentração.

Os Parques de Cacheu e de Orango albergam 14,3% e 6,8%,


respectivamente, dos mangais existentes no país.

O Parque de Cacheu alberga a quinta maior mancha de mangal de


África e é de todas a mais homogénea e importante, em parte, pela sua
potencialidade em camarão. É a mais importante zona de reprodução e
crescimento de camarões. Com efeito, o alto valor comercial deste recurso
ostenta desde logo a importância económica do Parque de Cacheu para Guiné-
Bissau.

Na verdade, a pesca de camarão é uma das mais significativas fontes de


divisas para o país. De acordo com a estimativa de 1993 a Guiné-Bissau
recolhe uma receita anual 5.5. a 6 milhões de USD pela concessão de licenças
de pesca de camarão. Em geral, 70% do potencial de pesca do país advém
dos recursos que dependem do mangal directa ou indirectamente.

9.6.2.5. Parque Natural das Lagoas de Cufada (Parque de


Cufada)

O Parque Natural das Lagoas de Cufada (Parque de Cufada) situa-se no


leste da região de Quinara, no Sul da Guiné-Bissau, entre os 11º 34´e 11º 51´
de latitude Norte e os 14º 49´e 15º 16´de longitude Oeste. Com uma área total
de 700 km2, o Parque é delimitado pelo rio Corubal, rio Grande de Buba, rio
Fulacunda e pelas estradas Fulacunda Uaná-Porto e Buba-Nhala-rio Corubal.
140
Não obstante a terminologia Parque Natural das Lagoas de Cufada, a
sua área não se circunscreve à lagoa de Cufada, antes abrange três lagoas:
Cufada, Bionra e Bedasse e algumas áreas terrestres. Lagoa de Cufada é,
contudo, a mais importante bacia da água doce do país. É o coração do
Parque. Milhares de aves esvoaçam permanentemente nas lagoas de Cufada,
as quais representam para estas um autêntico espaço de nidificação e
passagem nas suas longas deslocações migratórias da Europa e do continente
africano. No Parque de Cufada, em geral, vivem perto de 203 espécies de
aves, 54 de mamíferos e 63 de diferentes tipos de répteis. Entre estas,
encontramos algumas espécies ameaçadas na Guiné-Bissau, o caso de
Hipopótamo (Pippopotamus anphibius), tartaruga aquática (Tryonix trionguis) e
crocodilo (Crocodilus niloticus), inter alia.

Devido à sua importância em biodiversidade, sobretudo em “avifauna”


aquática, no período colonial era já proposto para a conservação em regime de
reserva especial. O mesmo interesse determinou em 1991 a adesão da Guiné-
Bissau à Convenção de Ramsar (acordo internacional de protecção das áreas
húmidas), com a finalidade da sua preservação no quadro de uma política de
promoção do desenvolvimento sustentável dos recursos naturais.

O mesmo interesse determinou a integração do Parque de Cufada num


projecto mais global, da responsabilidade da União Europeia, de apoio à
preservação da biodiversidade, que conta com o apoio técnico e financeiro de
Portugal.

Ao longo de muitos anos os recursos existentes nestas lagoas foram


sendo protegidos pela cultura dos povos residentes na zona, nomeadamente
os “beafadas” e fulas. Para estes povos os recursos naturais fazem parte do
sagrado e são geridos pelos chefes tradicionais ou pela família do dono do
mato ou da lagoa.

141
Com efeito, o acesso a estes recursos carece de uma autorização prévia
do “irã”, a qual é obtida mediante a cerimónia, de “ronea” ou de oferta de
bebidas e/ou de sacrifícios de animais, dirigida pelo chefe tradicional. A
cerimónia é obrigatória tanto para a “desmatação” ou utilização dos produtos
das florestas sagradas, assim como para a actividade de pesca. Por exemplo,
a caça do hipopótamo e a decisão do número de cabeças a bater devem ser
precedidos de cerimónias, sem as quais as consequências podem ser mortais
para o caçador.

No entanto, esta prática foi-se perdendo devido à ocorrência de vários


factores. Em primeiro lugar, o impacto do processo de islamização nos
“beafadas”. Em segundo lugar, a guerra de libertação desnaturalizou certos
lugares sagrados, por um lado, e, por outro, durante o período desta guerra, as
autoridades coloniais passaram a não tolerar a aglomeração de populações
que escapava ao seu controlo. Em terceiro lugar, o desaparecimento físico dos
anciãos mais conservadores provocou a crise de autoridade37.

Em consequência do desuso destas regras consuetudinárias, a


conservação destes recursos passou pela fase de profundas crises. Com
efeito, com o objectivo de salvaguardar a riqueza deste ecossistema, por
Decreto n.º 13/2000, a zona foi institucionalizada como Parque Natural das
Lagoas de Cufada.

9.6.2.6. Parque Nacional de Cantanhez

O Parque Nacional de Cantanhez fica situado no Sul da Guiné-Bissau,


mais precisamente na região administrava de Tombali, abrangendo os sectores
de Bedanda, Cacine e Quebo com uma superfície de 105.767 hectares,

37
Idem, ibidem, pp. 18 e 19.

142
correspondentes a 1.067,67 km2 (art. 3.º, n.º 1, do Projecto de Decreto de
criação do Parque de 200738).

A fronteira do Parque começa a partir da fronteira com a Guiné-Conakry,


nas coordenadas geográficas aproximadas de 11° 14’ 50’’ N e 14° 49’ 40’’ W;
segue o percurso do rio Gadamel que coincide com o limite entre o sector de
Cacine e de Bedanda, depois continua e segue o rio Bendugo, seguindo
sempre os limites entre os dois sectores e chega ao rio Cachadebã, segue este
até à sua foz junto do rio Cacine; em seguida desce todo o rio Cacine até à sua
foz nas coordenadas geográficas aproximadas 10° 52’ N e 15° 15’ W, contorna
a Ilha de Melo e junta-se ao rio Cumbijã na sua foz, nas coordenadas
geográficas aproximadas 11° 02’ N e 15° 19’ W, sobe todo o rio Cumbijã e
continua com o rio Balana, até às coordenadas geográficas aproximadas 11°
25’ 02’’ N e 14° 43’ W.

Já no sector de Quebo, muda de direcção e segue o rio Balanazinho,


desce paralelamente à estrada de Cacine e contorna a monte de areia ("Vendu
Nudérè Morsô"). Segue depois atravessando o rio Gaduar e chega à fronteira
com a Guiné-Conakry nas coordenadas geográficas aproximadas de 10° 20’
08’’ N e 14° 46’ 10’’ W . Depois desce toda a linha fronteira até ao ponto de
partida na coordenada geográfica aproximada de 11° 14’ 50’’ N e 14° 49’ 40’’ W
(art. 3.º, n.º 2, do Decreto de criação).

Característico do Parque Nacional de Cantanhez é a sua mata. A mata


de Cantanhez representa a última mancha de floresta “subhúmida” mais
setentrional da África Ocidental.

A mata de Cantanhez alberga uma grande diversidade de fauna e de


flora, entre as quais, encontram-se algumas espécies consideras raras e/ou
endémicas.

38
Não tivemos acesso ao Decreto de criação do Parque. Mas segundo a fonte que tivemos
acesso, IBAP, o Parque vinha funcionando na prática sem uma cobertura legal. Em 2007 foi
elaborado um projecto de Decreto da sua criação o qual foi posteriormente aprovado pelo
Conselho de Ministros. Não sabe contudo se o diploma chegou a ser promulgado ou publicado.

143
Cantanhez é classificado pelo Centro Mundial de Seguimento da
Conservação (WCMC) como um dentre os 9 sítios importantes do ponto da
biodiversidade. Faz parte das 200 eco-regiões mais importantes do mundo
identificadas pelo Fundo Mundial para a Natureza (WWF)39.

9.6.3. A gestão dos recursos: “park for people and with people”40

O legislador guineense adoptou para a gestão das áreas protegidas um


modelo de gestão participativa, a gestão das áreas marinhas protegidas por um
conjunto de órgãos no qual intervêm os representantes da Administração
Pública e da sociedade civil.

Merece destaque especial o papel activo reconhecido aos


representantes das comunidades residentes neste modelo.

A criação, organização e funcionamento das áreas protegidas na Guiné-


Bissau é toda ela baseada na filosofia park for people and with people. Esta
filosofia acompanha a vida da área protegida em três momentos: nascimento,
funcionamento e germinação ou distribuição dos benefícios da área.

Logo no primeiro momento, o momento de nascimento da área


protegida, a filosofia de park for people and with people impõe-se. Às
comunidades residentes na zona de Parque projectado são asseguradas o
direito de participação activa na criação do Parque. Reza o art. 7.º, n.º 1 da
LQAP (Lei Quadro das Áreas Protegidas)41: “a proposta de criação de uma

39
Vide o preâmbulo do Projecto de Decreto da sua criação.
40
Preferimos aqui usar a expressão tal qual é frequente aparecer nos documentos da Administração
Pública Guineense, por razões da comodidade linguística. Desta forma, eximindo-nos do risco de uma
tradução literária do seu sentido.
41
Aprovada pelo DL. n.º 3/97.

144
área protegida e da sua “zonagem” será formulada em concertação com as
comunidades locais concernentes”.

A participação das comunidades locais aqui referida ultrapassa a mera


faculdade de consulta, exige antes a negociação das posições entre os
representantes do Estado e as comunidades locais. Ao abrigo deste direito,
cada parte procura convencer, persuadir e seduzir o seu interlocutor, sobre a
melhor forma de gestão da zona, aceitando ela própria cedência para chegar a
um consenso na decisão final.

O que se pretende é chegar a um consenso com as comunidades locais,


que afasta qualquer ideia de que a área protegida resulta de uma imposição
exógena e que incute a consciência de um compromisso consensual de ambas
as partes, que salvaguarda os interesses das comunidades locais dignos de
protecção, tanto pela compensação dos prejuízos que a sua criação poderá
lhes causar (art. 6.º, al. b) da LQAP, como pela reserva à gestão exclusiva
destas comunidades de uma determinada zona dentro da circunscrição do
Parque para manifestação de cunho cultural e religioso de acordo com os
respectivos usos e costumes (floresta sagrada). Neste último caso, às
comunidades locais competiriam fixar as regras de acesso ao espaço (arts. 3.º,
n.º 1, f) e 38.º, n.os 1, 3 e 4 da LQAP).

Durante o momento de funcionamento do Parque a filosofia de park


for people and with people manifesta-se em diversas situações.

Primeira, no seio de conselho de gestão. Em cada Parque ou área


protegida existem, como órgãos internos, um Director e um conselho de
Gestão.

O Conselho de Gestão é composto por um número máximo de 26


membros, de diferentes proveniências: Estado, associações legalmente
constituídas e as comunidades residentes no Parque. Metade destes membros
é constituída pelos representantes das comunidades residentes (art. 18.º, n. os 1
e 2 da LQAP). Significa isto que na hipótese da tomada da deliberação do
145
Conselho de Gestão exigir o voto da maioria simples ou qualificada, nunca
poderá ela ser toda contra a vontade das comunidades locais.

As comunidades locais unidas têm um verdadeiro poder de veto. Isto faz


todo sentido, pois, de contrário, uma deliberação tomada contra a vontade das
comunidades locais enfrentaria o risco de cair no fracasso por falta de uma
autoridade efectiva das autoridades estaduais de a fazer respeitar, perante o
desacato daquelas. Pelo contrário, uma deliberação que respeita a vontade das
comunidades locais criaria nestas o espírito do bem comum, da gestão comum
e do interesse comum na preservação dos recursos abrangidos. E,
consequentemente, as comunidades locais seriam transformadas no primeiro
polícia da área objecto de protecção.

Segunda, é condição sine qua non para a realização de qualquer


actividade nos Parques nacionais a sua compatibilidade não só com os
objectivos das áreas, mas também com os usos e costumes das populações
residentes (art. 3.º, n. al. a) da LQAP).

Terceira, além da sua actuação por via de representação no Conselho


de Gestão, às comunidades residentes são reconhecidas a faculdade de
intervirem directamente, por via de consulta, por cada concessão de licença
temporária para a realização de actividades nas zonas definidas como de
exploração controlada (art. arts. 32.º, n.º 1 e 34.º, n.º 1 da LQAP).

A filosofia park for people and with people está ainda presente no
momento de germinação ou de distribuição dos benefícios.

Em primeiro lugar, nos casos em que for admitida a concessão de


licença temporária para realização de uma actividade nas zonas de exploração
temporária, em contrapartida, o seu beneficiário fica obrigado ao pagamento de
uma taxa, a qual reverterá exclusivamente para o financiamento de construção

146
ou de serviços de interesse comum às comunidades residentes (art. 36.º, da
LQAP).

Em segundo lugar, aos membros das comunidades são garantidos o


direito de preferência na contratação das pessoas para o exercício de
actividade a que a concessão de licença implica (art. 34.º, n.º 5 da LQAP).

Em terceiro lugar, a filosofia park for people and with people manifesta-
se ainda na prioridade de acesso aos recursos naturais existentes na área
protegida. Por exemplo, nas zonas de preservação natural, salvo o caso da
pesca científica de que beneficia a comunidade científica, a pesca é reservada
apenas às comunidades locais para fins de subsistência. Nas zonas tampões,
excluindo a pesca científica, são admitidas apenas a pesca de subsistência e a
pesca comercial, sendo ambas reservadas às comunidades locais.

Na verdade, a filosofia do park for people and with people reconhece às


comunidades residentes não só um mero direito de participação na gestão das
áreas marinhas protegidas, mas antes uma posição de reais gestores e de
beneficiários directos de toda a política proteccionista.

9.6.4. O acesso aos recursos nas áreas protegidas

Tendo em conta o carácter não homogéneo das áreas geográficas


integradas numa área protegida, as medidas de conservação foram concebidas
para serem aplicadas segundo um grau de intensidade progressivo de modo a
amortecerem os impactos negativos inerentes ao aproveitamento dos recursos.
Ou seja, quanto mais for sensível ou frágil uma determinada área maior será a
restrição de acesso aos recursos que nela se encontram.

147
Com efeito, as medidas de conservação aplicáveis às áreas protegidas
aparecem com graus de intensidade diferentes de acordo com a divisão interna
das zonas.

Em função da população residente e das características internas –


fragilidade, sensibilidade - as áreas protegidas são organizadas com base no
princípio de “zonamento”, o qual condiciona o acesso aos recursos nelas
existentes.

Assim, em aplicação do disposto no art. 23.º, que permite a divisão do


território de cada área protegida em zonas de preservação e zonas de
exploração controlada, encontramos em todas as áreas protegidas, salvo o
caso do Parque de Cufada e do Parque João Vieira Poilão, uma divisão
tripartida que classifica o espaço da área em zonas de preservação ou central,
zonas tampão e zonas de desenvolvimento durável. Pelo contrário, no Parque
de Cufada a divisão interna obedece ao seguinte molde: zona de preservação
natural e zona de exploração controlada. Por sua vez, esta última divide-se em
áreas de utilização sustentável e áreas preferenciais para turismo e recreio (art.
3.º do Decreto n.º 13/2000)42. Em relação ao Parque João Vieira Poilão, o
respectivo Decreto de criação não estabelece o sistema de “zonamento”43.

As zonas de preservação podem ser consideradas como zonas centrais


ou coração do sistema. São zonas de maior biodiversidade ou de reprodução
dos recursos naturais (arts. 6.º, n.º 1 dos Decretos n.os 11 e 12/2000).
Protegem as áreas sagradas e locais de iniciação, da mesma forma que as

42
Analisando sucintamente as disposições deste Decreto maxime arts. 10.º, n.º 1, al. c), 11.º,
n.º 2, als. c) e i) tudo indica que a zona de preservação natural corresponde às zonas de
preservação e às subdivisões de zona de exploração controlada às zonas tampão e às de
desenvolvimento durável, respectivamente.
43
Decreto n.º 8/2005, sobre a criação da Área Marinha Protegida Comunitária das Ilhas de
Formosa, Nago e Chediã (Ilha Urok).

148
populações das espécies das mais emblemáticas do património nacional e
internacional.

O acesso aos recursos, em particular aos recursos naturais é mais


restrito. Regra geral, não é permitida a realização de nenhuma obra, instalação
ou qualquer outra actividade nesta zona. Como excepção, o acesso aos
recursos vivos é reservado exclusivamente à população residente e à
comunidade científica, para fins alimentares (pesca de subsistência) ou
cerimoniais (religiosos) e científicos, respectivamente44; é permitida vistas
públicas nas condições estabelecidas no regulamento interno de cada parque;
e é permitida ainda realização de obras mas apenas para fins de visitas
públicas e estudos científicos (art. 24.º, als. a), b), c) e d), da LQAP; art. 7.º do
Decreto n.º 6-A/2000; art. 6.º, n.º 1, als. a), b), c) e d), art. 8.º, n. os 1 e 2 dos
Decretos n.os 11 e 12/2000; art. 10.º, n.º 1, als. a), b), c) e d), do Decreto n.º
13/2000; art. 4.º, n.º 1, al. a) e art. 6.º, al. a), do Projecto de Decreto de 2007
sobre o Parque Nacional de Cantanhez).

As zonas tampões são áreas de transição entre as zonas de


preservação e as zonas de desenvolvimento durável45. Elas jogam, por um
lado, um papel de tampão à volta das zonas de preservação e, por outro lado,
asseguram uma protecção especial aos meios que são base da produtividade
do meio marinho, o caso do mangal, dos bancos de lado e de areia.

Diferentemente das zonas de preservação, nas zonas tampões a pesca


comercial é admitida a par da pesca de subsistência e da pesca para fins
cerimoniais. No entanto, o seu acesso é exclusivamente reservado à

44
Vide arts. 4.º, n.º 1, al. a) e 6.º, al. a) do Decreto n.º 8/2005, sobre a criação da Área Marinha
Protegida Comunitária das Ilhas de Formosa, Nago e Chediã (Ilha Urok); arts. 5.º, al. a) e 6.º,
n.º 1, al. b) dos Decretos n.os 11 e 12/2000, sobre a criação do Parque Nacional do Grupo de
Ilhas de Orango e sobre a criação do Parque Natural dos Tarrafes do Rio de Cacheu,
respectivamente; e arts. 3.º, n.º 1, al. a) e 10.º, n.º 1, als. b) e c) do Decreto n.º 13/2000, sobre
a criação do Parque Natural das Lagoas de Cufada.
45 os
Vide arts. 6.º, n.º 3 dos Decretos n. 11 e 12/2000.

149
comunidade residente (art. 6.º, al. b) do Decreto n.º 8/2005)46. Os engenhos de
pesca admitidos nestas zonas são também os susceptíveis de causarem
menores danos no equilíbrio ecológico.

As zonas de desenvolvimento durável47 são as zonas onde a população


e os serviços estão concentrados. Abrangem também os rios, nomeadamente
alguns canais que separam as ilhas, no caso das áreas protegidas localizadas
na parte insular do país. Destinam-se às formas de desenvolvimento
económico que beneficiam as comunidades residentes através da exploração
durável dos seus recursos naturais48 (arts. 6.º, n.º 2 dos Decretos n.os 11 e
12/2000).

A pesca é admitida, nestas zonas, nas suas diferentes modalidades:


pesca de subsistência, comercial, desportiva e científica. Com efeito, tanto as
comunidades residentes como as não residentes, incluindo os estrangeiros,
gozam do direito de acesso aos recursos mediante concessão de licença
emitida pela autoridade pública competente (art. 6.º, al. c) do Decreto n.
8/2005; art. 10.º, n.º 1 dos Decretos n.os 11 e 12/2000)49.

Além das construções efectuadas pelos membros das comunidades


residentes no interno da área protegida, todo o trabalho imobiliário susceptível
de modificar o estado natural do local, tal como a construção de ruas, estradas,

46
Desconhecemos a regulamentação existente nas restantes áreas marinhas em matéria de
os
acesso aos recursos haliêuticos nestas zonas. Pois o art. 6.º, n.º 3 dos Decretos n. 11 e
12/2000, sobre a criação do Parque de Orango e de Cacheu, respectivamente, único que faz
referência a estas zonas, não nos dá resposta sobre esta questão.
47
Zona de transição é terminologia utilizada pelo Decreto de criação da Área Marinha das Ilhas
Urok (arts. 4.º, n.º 1, c) e 6.º, al. c) do Decreto n.º 8/2005).
48
Nomeadamente pela garantia de oportunidades de emprego e de desenvolvimento.
49
As zonas em apreço são também designadas por zona de desenvolvimento e de
solidariedade para significar que dos esforços de gestão não devem beneficiar unicamente as
comunidades residentes, mas sim todo o país na sua generalidade.

150
diques ou casas, está subordinado à autorização prévia do Director do
Conselho de Gestão (art. 28.º, da LQAP).

As autorizações para actividades compatíveis com os objectivos do


Parque, cujos beneficiários são pessoas estranhas ao mesmo, são concedidas
sob forma de licença cuja duração não deve exceder 12 meses.

Tratando-se de actividades que supõem uma ocupação exclusiva do


solo, pode ser concedida licença com prazo de validade até o máximo de 5
anos (art. 32.º, n.º 1 da LQAP).

As licenças ou concessões temporárias são emitidas pelo Presidente do


Conselho de Coordenação das Áreas Protegidas, sob proposta do Director do
Parque, mediante o parecer do Conselho de Gestão e após consulta às
comunidades residentes (art. 34.º, n.º 1, da LQAP).

Com algumas variações de área à área protegida, em geral, estão


sujeitas, nas Zonas de Desenvolvimento Durável, ao licenciamento as
seguintes actividades:

Alteração do uso actual dos terrenos, particularmente nas zonas de


tarrafe, zonas húmidas e em toda a orla costeira;

Instalações de linhas eléctricas ou telefónicas aéreas; edificação,


construção, reconstrução ou ampliação;

Corte ou colheita de quaisquer espécies botânicas de porte arbustivo ou


arbóreo, particularmente do tarrafe, nas zonas não agrícolas, bem como a
introdução de espécies botânicas exóticas ou estranhas ao ambiente;
introdução de novas espécies zoológicas exóticas;

Caça, apreensão de quaisquer espécies animais selvagens;


estabelecimento de novas actividades industriais, florestais, agrícolas, minerais
ou turísticas;

Descarga de efluentes domésticos ou industriais, sólidos, líquidos ou


gasosos, que possam originar a poluição do ar, do solo ou da água;

151
Abertura de poços ou furos de captação de água, bem como o
estabelecimento de redes de distribuição ou drenagem das águas;

Instalação de estações de tratamento de esgoto (art. 9.º, n.º 1, dos


Decretos n.os 11 e 12/2000 e art. 11.º, n.º 2, do Decreto n.º 13/2000).

Nas matérias da sua competência, o Director do Parque ou o Conselho


de Gestão podem ordenar um estudo de impacto ambiental por forma a
determinar as implicações que um projecto poderá acarretar sobre o meio
ambiente e sobre condições de vida das comunidades residentes, antes de se
decidir sobre o pedido de autorização (art. 28.º, n.º 3, da LQAP).

Além desta faculdade, o regulamento de cada área protegida poderá


ainda prever os casos em que o estudo de impacto ambiental deverá ser
obrigatório (art. 28.º, n.º 4, 1ª parte da LQAP).

Nos casos do Parque Nacional do Grupo de Ilhas de Orango e Parque


Natural dos Tarrafes do Rio de Cacheu, os pedidos de autorização serão
obrigatoriamente instruídos com estudos de impacto ambiental sempre que os
projectos sujeitos a licenciamento respeitarem uma das seguintes actividades:
emparcelamento rural; hidráulica agrícola ou marítima; aquacultura e extracção
de sal; transporte de energia eléctrica; estradas portos ou aerodrómos;
acampamentos ou empreendimentos turísticos; loteamentos e urbanização;
estação de tratamento de esgotos (art. 11.º, n.º 1, als. a), b), c), d), e) f), g) e h),
dos Decretos n.os 11 e 12/2000).

No caso do Parque Nacional de Cantanhez, prescreve-se que os


pedidos de licenciamento carecem obrigatoriamente de estudos de impacto
ambiental prévios, nos termos previstos na Lei-Quadro das Áreas Protegidas

(art. 8.º, n.º 2 do Projecto de Decreto de criação).

152
10. Os planos urbanísticos e a gestão do solo

10.1. Considerações prévias

Os planos urbanísticos fazem parte das regras sobre o uso, ocupação e


transformação do solo e constituem o segundo pilar das normas mais
importantes do Direito do Urbanismo.

Na Ordem jurídica guineense, não existe nenhum instrumento jurídico de


carácter geral que funciona como instrumento de base ou que estabelece o
regime jurídico geral dos instrumentos de gestão do território.

O que existe é um instrumento de gestão territorial de aplicação local: o


Regulamento do Plano Geral Urbanístico de Bissau, aprovado pelo Decreto n.º
17/95, de 30 de Outubro50.

De interesse ainda para a disciplina do solo encontramos o Regulamento


Geral de Construção e Habitação Urbana, aprovado pelo Decreto-Lei n.º
7/2006, de 31 de Julho51. Todavia, o regulamento em causa está mais voltado
para a disciplina de normas técnicas aplicáveis às construções.

O vazio existente em termos de legislação de carácter geral que


disciplina os instrumentos de gestão territorial poderá no futuro próximo ser
ultrapassado com a materialização em Lei do Projecto de Lei de Bases do
Ordenamento Territorial e Urbano da República da Guiné-Bissau de 2009.
Não vamos neste estudo analisar o conteúdo deste Regulamento,
primeiro, por se tratar ainda de Projecto de Lei e não da Lei, segundo, por já
nos restar pouco tempo para concluir e entregar o presente estudo.

50
Publicado no Suplemento ao B.O. n.º 44 de 30 de Outubro de 1995.
51
O Decreto-Lei foi publicado no B.O., n.º 31 de Julho de 2006.

153
Vejamos agora, em termos resumidos, o conteúdo do Regulamento do
Plano Geral Urbanístico de Bissau e o do Regulamento Geral de Construção e
Habitação Urbana.

Mais antes de passarmos para a análise destes Regulamentos, importa


fazer uma ilustração da área de aplicação do Regulamento do plano Geral
Urbanístico de Bissau.

10.2. O novo limite da cidade de Bissau

O limite da cidade de Bissau foi redefinido pelo Decreto n.º 16/95, de 30


de Outubro52.

No seu preâmbulo, o Decreto n.º 16/95, prescreve como ocatio legis que
determinou a redefinição do limite da cidade de Bissau pela sua ampliação: o
crescimento populacional e urbano de Bissau em detrimento dos Sectores
lmítrofes de safim e de Prabis, facto que impõe à adopção de medidas
coerentes em matéria de planeamento e gestão do solo urbano e peri-urbano;
e a elaboração do Plano Geral Urbanístico de Bissau cuja amplitude territorial
interfere a médio e longo prazos com os territórios dos Sectores de Safim e de
Prabis.

De acordo com o novo limite estabelecido, o Sector Autónomo de Bissau


(SAB), abrange uma parte do território continental e insular com uma área
geográfica aproximada de 118 km2, cujo perímetro é definido por 10 pontos
localizados de seguinte modo:

O ponto n.º 1 fica situado no pântano de Antula, concretamente à


entrada do canal do Impernal;

52
O Decreto foi publicado no Suplemento ao B.O., n.º 44 de 30 de Outubro de 1995.

154
O lado 1 - 2 tem o comprimento de 8.500 metros, segue o canal do
Impernal até a antiga estrada Bissau/Nhacra;
O lado 2 – 3 tem o comprimento de 6.300 metros seguindo o braço do
mesmo canal;
O lado 3 – 4 tem o comprimento de 2.400 metros e o azimute de 288.º
00’;
O lado 4 – 5 tem o comprimento de 1.000 metros e o azimute de 20.º
00’;
O lado 5 – 6 tem o comprimento de 500 metros e o azimute de 28.º 00’;
O lado 6 – 7, tem o comprimento de 4.050 metros e o azimute de 199.º
00’;
O lado 7 – 8 tem o comprimento de 2.000 metros;
O lado 8 – 9 tem o comprimento de 10.000 metros, segue o contorno do
afluente do rio Nhacete até a estrada de Bissau/Prabis;
O lado 9 – 10 tem o comprimento de 5.000 metros, parte da estrada de
Bissau/Prabis e via até ao Pântano de Bôr na orla do canal de Geba;
E por fim, o ponto 10 fica situado no pântano de Bôr na orla do canal
Geba (art. 1.º, n. º, als. a), b), c), d), e), f), g), h), i), j), k), do Decreto n.º 16/95).

O território do Sector Autónomo de Bissau, assim definido se encontra


dividido em três zonas: zona urbana, zona sub-urbana e zona intermédia de
expansão para cuja definição se remete para os Planos de Ordenamento
Territorial, Gerais ou Directores de Urbanização.

Em conformidade com o Foral da Câmara Municipal a gestão das áreas


pertencentes ao Sector Autónomo de Bissau, compete ao presidente da
Câmara Municipal de Bissau (art. 2.º do Decreto n.º 16/95).

10.3. Regulamento do Plano Geral Urbanístico de Bissau

O Regulamento do Plano Geral Urbanístico de Bissau começa no seu


art. 1.º, n.º 1, por definir o objectivo do Plano Geral Urbanístico de Bissau.
155
De acordo com o citado artigo, o Plano Geral Urbanístico de Bissau
(PGUB) tem por objectivo estabelecer as regras a que deverá obedecer a
ocupação, uso e transformação do território da cidade de Bissau, e definir as
normas de gestão gerais de gestão Urbanística a utilizar na implementação do
plano.

O PGUB tem o período de vigência de 20 anos duração (art. 4.º) e é


aplicável à toda área urbana da cidade de Bissau (art. 2.º, n.º 2, do Decreto n.º
16/95).

A aplicação do PGUB é feita por intermediação de planos e


projectos de urbanização de grau hierárquico inferir, nomeadamente: os
Planos Urbanísticos Detalhados, os Planos de Pormenor, os Projectos de
Parcelamentos e os Projectos de Infra-estruturas Urbanísticas (art. 6.º, n.º 1 e 2
do Decreto n.º 16/95).
Além desta intermediação exigida, a execução do PGUB deve ainda
passar pela elaboração do Programa de Execução Urbanística, tendo em
devida conta o Plano de Desenvolvimento Económico (art. 6.º, n.º 3, do
Decreto n.º 16/95).

Excepcionalmente o PGUB poderá directamente, sem


intermediação necessária, pelos planos e projectos de urbanização de grau
hierárquico inferior. Mas neste caso, deverá servir de base e documento para a
execução de Planos Urbanísticos Detalhados (PUD) e Plano Pormenor (art. 2.º,
n.º 3, do Decreto n.º 16/95).

O PGUB, não obstante não ser exequível, em princípio directamente,


acaba indirectamente por condicionar à actividade dos particulares e entidades
públicas em toda área de Bissau. Com efeito, com base no PGUB a ocupação
das diversas zonas de cidade de deve passar pela realização de Planos
Detalhados e Planos de Pormenor, os quais servirão de base à realização dos
projectos de urbanização e de construção, uso industrial (art. 9.º do Decreto n.º
16/95).
156
Para o efeito de construção, o território da cidade de Bissau é dividido
em quatros áreas: áreas de 1.º nível, áreas de 2.º nível, áreas de 3.º nível e
áreas de 4.º nível (art. 10.º, Decreto n. 16/95).

As áreas de 1.º nível abrangem todo o centro da cidade e o Bairro de


Ajuda primeira e segunda fases. Esta zona é uma zona que não sujeita à
mudança da respectiva função actual e por isso, nela é também dispensável a
elaboração de Planos Urbanísticos Detalhados para toda a zona (art. 11).
Porém, é possível a realização de qualquer tipo de obras na zona desde
que estejam devidamente enquadradas na malha urbana e com devida
autorização da Câmara Municipal de Bissau (art. 11.º, n.º 3, do Decreto n.º
16/95).

As áreas de 2.º nível abrangem as zonas não ocupadas ou com índice


de ocupação muito baixas e não urbanizadas (art. 12.º, n.º 1, do Decreto n.º
16/95). Nesta zona, sempre que seja necessário, é obrigatório a realização de
Planos Urbanísticos Detalhados e de Planos Pormenores (art. 12.º, n.º 2, do
Decreto n.º 16/95).

As áreas de 3.º nível abrangem zonas com taxa de ocupação muito


elevada e não urbanizadas (art. 13.º, n.º 1, do Decreto n.º 16/95 ). Nesta zona,
não é permitida a realização de obras de reconstrução, salvo casos
excepcionais de extrema necessidade e mediante a autorização da Câmara
Municipal de Bissau, baseada no parecer positivo do MES (art. 13.º, n.º 2, do
Decreto n.º 16/95).

As áreas de 4.º nível abrangem zonas situadas fora do limite do PGUB,


até a zona definida como território do Sector Autónomo de Bissau. Prevê-se, no
futuro, a transformação desta zona no centro da cidade. Por isso, qualquer
actuação na zona deverá realizar-se em consonância com PGUB, tem em
vistas as suas futuras funções (art. 14.º, n.os 1, 2 e 3, do Decreto n.º 16/95).

157
No Regulamento do Plano Urbanístico de Bissau, prevê-se ainda
normas destinadas à criação e protecção de zonas verdes e recreativos.
Desta forma, junto aos principais pontos de localização das infra-
estruturas do tipo (reservatórios, poços, estações de deputação) e depósitos de
lixo, cemitérios e zonas industriais, deve-se reservar terrenos para zona verde
(art. 29.º, n.º 3, do Decreto n.º 16/95).

Nas zonas verdes é proibido construir edifícios que não estejam ligados
ao uso da zona (art. 30.º, n.º 1, do Decreto n.º 16/95). E toda a construção de
edifícios ligados ao uso da zona, o caso equipamentos destinados à recreação,
carece de uma prévia aprovação pela Câmara Municipal de Bissau com base
no Plano Urbanístico Detalhado (art. 30.º, n.º 2, do Decreto n.º 16/95).

10.4. Regulamento Geral de Construção e Habitação Urbana

O Regulamento Geral de Construção e Habitação Urbana tem pouco


interesse no que tange às normas sobre uso, ocupação e transformação do
solo. Como o seu nome deixa sugerir, o Regulamento limita-se mais à
consagração de normas técnicas sobre a construção.

O âmbito de aplicação do Regulamento Geral de Construção e


Habitação Urbana (PGCHU) abrange questões como: a execução de novas
edificações ou de quaisquer obras de construção civil, a reconstrução, a
ampliação, a reparação, ou a demolição das edificações e obras existentes e
bem como os trabalhos que impliquem a alteração da topografia actual, dentro
do perímetro urbano e das zonas rurais de protecção fixadas para as sedes de
Município e de Sector e para as demais localidades sujeitas por lei a plano de
urbanização e expansão (art. 2.º, do PGCHU).

Fora destes casos, o Regulamento Geral de Construção e Habitação


Urbana pode aplica-se ainda às povoações a que poderá ser tornado extensivo
por deliberação municipal aprovada pelo Ministro que tiver a tutela do
158
licenciamento das construções e, em todos os casos, às edificações de
carácter industrial ou de utilização colectiva (art. 2.º, do PGCHU).

A realização de qualquer das obras supracitadas exige uma prévia


obtenção de licença (art. 3.º, n.º 1, do PGCHU).

No geral, encontramos no Regulamento Geral de Construção e


Habitação Urbana normas:

Destinadas a garantir a segurança das edificações, ou seja, aquelas


normas que destinam a evitar riscos para os que habitam no prédio e para o
público em geral (art. 7.º, n.os 1 e 8; art. 33.º; art. 46; art. 67.º, art. 69.º, n.º 1,
art. 70.º, art. 71.º, do PGCHU);
Sobre a salubridade das edificações, o caso das normas que visam
garantir a luminosidade e ventilação das edificações (art. 45.º; art. 67.º, 69.º, n.º
2, art. 73.º do PGCHU);

Sobre o ordenamento do conjunto urbano. Nelas se integram normas


com objectivos mais amplos sobre o urbanismo. Exemplo de normas
respeitantes às distâncias entre construções; norma sobre a largura das ruas
(art. 32.º, n.º 1, al. a); e art. 33.º do PGCHU);

Destinadas a garantir a estéticas e conservação de edifício de interesse


histórico, artístico ou arqueológico (art. 30.º, n.º 2, al. b); art. 39.º; art. 41.º, do
PGCHU).

Destinadas a garantir a sanidade (art. 32.º, n.º 1, als. c) e d); art. 34.º;
art. 36.º, art. 37.º; art. 38.º do PGCHU).

159
11. O uso do solo no Código Civil

No Código Civil existe um acervo muito considerável de normas que


estabelece a disciplina jurídica sobre a utilidade do solo.
No presente estudo não vamos analisar todas normas jurídicas que
estabelecem a disciplina jurídica sobre o solo pela simples razão que tem a ver
com a exiguidade do tempo.
A nossa digressão pelo Código Civil vai-se centrar apenas sobre
algumas das suas normas que ostentam a disciplina jurídica sobre o solo, com
especial atenção para as do Livro III, normas dos Direitos Reais. No Livro III
nossa análise não vai centrar, em princípio, sobre estudo de artigos isolados,
mas sobre institutos que consagram normas sobre utilização do solo.

Feitas estas considerações passamos agora para a análise de alguns


institutos jurídicos do Livro III do Código Civil que consagram normas sobre a
utilização do solo.

Começamos pelo nosso já conhecido art. 204.º do CC. Este artigo faz
uma enumeração dos elementos integrantes no conceito do imóvel. De
acordo com o seu conteúdo fazem parte de coisas imóveis: os prédios rústicos
e urbanos; as águas; as árvores, os arbustos e os frutos naturais, enquanto
estiverem ligados ao solo; os direitos inerentes aos imóveis supracitados; as
partes integrantes dos prédios rústicos e urbanos (art. 204.º, n.º 1, als. a), b),
c), d) e e), do CC).

Por prédio rústico entende-se uma parte delimitada do solo e as


construções nele existentes que não tenham autonomia económica, e por
prédio urbano qualquer edifício incorporado no solo, com os terrenos que lhe
sirvam de logradouro (art. 204.º, n.º 2, do CC).
Considera-se como parte integrante toda a coisa móvel ligada
materialmente ao prédio com carácter de permanência (art. 204.º, n.º 3, do
CC).

160
O instituto jurídico da posse é uma outra situação em que podemos
encontrar normas jurídicas com implicação com o regime jurídico de utilização
do solo.

A posse, nos termos do art. 1251.º do CC, é o poder que se manifesta


quando alguém actua por forma correspondente ao exercício do direito de
propriedade ou de outro direito real.
Pertencendo o solo com todas as partes nele integrantes à propriedade
dominial do Estado, é hoje impossível haver posse jurídica sobre estes bens,
uma vez que se tratam de coisas subtraídas da relação jurídica privada (art.
202.º, n.º 2, do CC).
Também o mesmo se pode dizer em relação ao instituto da usucapião,
não sendo possível a posse sobre os solos, deixa de ser possível também a
aquisição da propriedade do solo por meio da usucapião53.
Pode-se questionar, contudo, se será possível aquisição do direito de
uso privativo, por via do uso consuetudinário, recorrendo-se à figura da
usucapião. É uma questão a explorar no próximo estudo.

No art. 1304.º do CC consagra-se o princípio da subsidiariedade das


normas do Código Civil em relação aos bens dominiais. De acordo com
este artigo, o domínio das coisas pertencentes ao Estado ou a quaisquer outras
pessoas colectivas públicas está sujeito às disposições do Código Civil em tudo
o que não for especialmente regulado e não contrarie a natureza própria
daquele domínio.

O art. 1305.º do CC, estabelecendo o conteúdo do direito de


propriedade, dispõe que o proprietário goza de modo pleno e exclusivo dos
direitos de uso, fruição e disposição das coisas que lhe pertencem, dentro dos

53
A noção da usucapião vem estabelecida no art. 1287.º do CC. De acordo com o citado artigo
“a posse do direito de propriedade ou de outros direitos reais de gozo, mantida por certo lapso
de tempo, faculta ao possuidor, salvo disposição em contrário, a aquisição do direito a cujo
exercício corresponde a sua actuação: é o que se chama usucapião”.
161
limites da lei e com observância das restrições por ela impostas. Visto este
artigo, à partida, parece não implicar com o regime jurídico do solo na medida
em que solo é excluído da apropriação privada.
Todavia, deve-se lembrar que o Código Civil assenta sobre uma matriz
que tem por base a propriedade privada do solo. Aliás, uma manifestação
desta matriz é a figura de usucapião sobre imóveis e da propriedade
imobiliária.

Nos regimes onde existe a propriedade privado do solo, entende alguma


doutrina que as faculdades compreendidas no art. 1305.º, maxime os direitos
de uso, abrangem também, tratando-se do solo, o direito de construir edifício
no espaço.

Imbuído ainda numa lógica da propriedade dispõe o art. 1324.º, n.º 1 do


CC, que “se aquele que descobrir coisa móvel de algum valor, escondida ou
enterrada, não puder determinar quem é o dono dela, torna-se proprietário de
metade do achado; a outra metade pertence ao proprietário da coisa móvel ou
imóvel onde o tesouro estava escondido ou enterrado”.
Dizendo que o proprietário do imóvel toma também metade do achado,
está-se a referir aqui o particular proprietário do solo, que entre nós por não
existir deve ser lido como titular do direito de uso privativo.

A figura da acessão é um dos casos que deixam transparecer o regime


de propriedade privada do solo.
A acessão é a união entre duas mais coisas pertencentes a proprietários
diferentes (art. 1325.º, do CC). Diz-se natural quando a união resultar
exclusivamente da força da natureza (art. 1326.º, n.º 1, do CC). Diz-se
industrial quando, quando a união resultar do trabalho do homem (art. 1326.º,
n.º 1, 2ª parte, do CC). Por sua vez, a acessão industrial pode ser mobiliária ou
imobiliária consoante a natureza da das coisas (art. 1326.º, n.º 2, do CC)

162
Regra geral, em matéria da acessão natural, pertence ao dono da coisa
tudo o que a esta acrescer por efeito da natureza (art. 1327.º, do CC).

Em conformidade com esta regra, estabelece-se no art. 1328.º, n.º 1, do


CC, que pertence aos donos dos prédios confinantes com quaisquer correntes
de água tudo o que, por acção das águas, se lhes unir ou neles for depositado,
sucessiva e imperceptivelmente.
Acrescenta o n.º 2 do mesmo artigo que a mesma regra é aplicável ao
terreno que insensivelmente se for deslocando, por acção das águas, de uma
das margens para outra, ou de um prédio superior para outro inferior, sem que
o proprietário do terreno perdido possa invocar direitos sobre ele.

A regra geral, em matéria de acessão imobiliária, vem prevista no art.


1339.º, do CC. De acordo com o citado artigo “aquele que em terreno seu
construir obra ou fizer sementeira ou plantação com materiais, sementes ou
plantas alheias adquire os materiais, sementes ou plantas que utilizou,
pagando o respectivo valor, além da indemnização a que haja lugar.

Casos particulares de acessão industrial imobiliária estão previstos nos


art. 1340.º a 1343.º, do CC.

No art. 1343.º, prevê-se um caso muito particular em que o proprietário


de um terreno poderá ver alargado a sua área de terreno pela anexação do
terreno contíguo, pertencente a um titular diferente, mediante a construção de
edifício, em terreno próprio, que ocupa uma parcela do terreno alheio.
Neste caso, estando de boa fé o proprietário do terreno invasor do
terreno alheio, passa adquirir sobre a parcela de terreno alheia a propriedade,
pagando valor de terreno e reparando o prejuízo causado, se passar três
meses a contar do início da ocupação não houver a oposição do proprietário do
terreno alheio.

163
O núcleo fundamental de normas sobre o regime jurídico do solo no
Código Civil encontra-se previsto no Capítulo III, do título II do Livro III, relativo
à propriedade de imóveis, vg., art.1344.º a 1402.º, do CC.

No art. 1344.º, n.º 1, do CC, estabelece-se os limites matérias da


propriedade dos imóveis. Nos termos desse artigo, “a propriedade dos imóveis
abrange o espaço aéreo correspondente à superfície, bem como o subsolo,
com tudo o que neles se contém e não esteja desintegrado do domínio por lei
ou negócio jurídico”.

Os restantes artigos, falam de direitos e deveres do proprietário dos


solos.

No capítulo da propriedade horizontal pode também ser encontrado


alguns subsídios para a compreensão da disciplina jurídica do solo no Código
Civil.

O art. 1414.º, do CC, faz uma descrição do que é uma propriedade


horizontal. De acordo com este artigo, “as fracções de que um edifício se
compõe, em condições de constituírem unidades independentes, podem
pertencer a proprietários diversos em regime de propriedade horizontal”.

Na propriedade horizontal existem partes individuais ou exclusivas e


partes comuns do edifício. Cada condómino é proprietário exclusivo da fracção
que lhe pertence e comproprietário das partes comuns do edifício (art. 1420.º,
n.º 1, do CC).
O solo, por exemplo, faz parte, inter alia, das partes comuns (art. 1421.º,
n.º 1, al. a), do CC). Nesta qualidade, não pode ser alienado separadamente
dos direitos relativos a partes individuais ou exclusivas e muito menos pode ser
renunciado como meio de o condómino se desonerar das despesas
necessárias à sua conservação ou fruição (art. 1420.º, n.º 2, do CC).

164
Em caso de destruição do edifício ou de uma parte que represente, pelo
menos, três quartos do seu valor, qualquer dos condóminos tem o direito de
exigir a venda do terreno e dos materiais, pela forma que a assembleia dos
condóminos vier a designar (art. 1428.º, do CC).

Na parte relativa ao usufruto é possível também encontrar normas


relativas ao uso e aproveitamento do solo.

Usufruto é o direito de gozar temporária e plenamente uma coisa ou


direito alheio, sem alterar a sua forma ou substância (art. 1439.º, do CC). A
coisa alheia aqui referida tanto pode ser um imóvel como um móvel.

No art. 1453.º, n.º 1, do CC, estabelece-se que “ao usufrutuário de


árvores ou arbustos é lícito aproveitar-se das que forem perecendo
naturalmente”. Porém, tratando-se de árvores ou arbustos frutíferos, o
usufrutuário é obrigado a plantar tantos pés quantos os que perecerem
naturalmente, ou a substituir esta cultura por outra igualmente útil para o
proprietário, se for impossível ou prejudicial a renovação de plantas do mesmo
género”.

No art. 1457.º, n.º 1 do CC, prescreve-se que “o usufrutuário de


concessão mineira deve conformar-se, na exploração das minas, com as
praxes seguidas pelo respectivo titular”.
E no n.º 2, estabelece-se que “o usufrutuário de terrenos onde existam
explorações mineiras tem direito às quantias devidas ao proprietário do solo,
quer a título de renda, quer por qualquer outro título, em proporção do tempo
que durar o usufruto”.

Em relação à exploração de pedreiras, prescreve o n.º 1 do art. 1458.º,


do CC, que o usufrutuário não pode abrir de novo pedreiras sem consentimento
do proprietário, salvo se estas já estiverem em exploração ao começar o
usufruto, caso em que terá o usufrutuário a faculdade de explorá-las,
conformando-se, neste caso, com as praxes observadas pelo proprietário.
165
Todavia, em quaisquer dos casos, ao usufrutuário é assegurado sempre o
direito de extrair pedra do solo para reparações ou obras a que seja obrigado
(art. 1458.º, n.º 2, do CC).

Ao usufrutuário de direito que incide sobre o solo, é ainda assegurado o


direito de, em benefício do prédio usufruído, procurar águas subterrâneas por
meio de poços, minas ou outras escavações (art. 1459.º, n.º 1, do CC).

Relativamente à constituição de servidões activas, o usufrutuário goza


dos mesmos direitos do proprietário, mas não lhe é lícito constituir encargos
que ultrapassem a duração do usufruto (art. 1460.º, n.º 1, do CC).

No capítulo relativo à enfiteuse, podemos encontrar algumas regras


relativas à utilização do solo.

Chama-se emprazamento, aforamento ou enfiteuse o desmembramento


do direito de propriedade em dois domínios: directo e útil (art. 1491.º, n.º 1, do
CC). O prédio sujeito ao regime enfitêutico pode ser rústico ou urbano e tem o
nome de prazo (art. 1491.º, n.º 2, do CC). Ao titular do domínio directo dá-se o
nome de senhorio; ao titular do domínio útil, o de foreiro ou enfiteuta (art.
1491.º, n.º 3, do CC).

A enfiteuse pode ser constituída por contrato, testamento ou usucapião


(art. 1497.º, do CC).

A constituição da enfiteuse confere ao senhorio os seguintes direitos:


a) O direito a receber anualmente o foro, e a haver o triplo dos foros em
dívida quando haja mora no cumprimento;
b) O direito a alienar ou onerar o seu domínio por acto entre vivos ou por
morte;
c) O direito a preferir na venda ou dação em cumprimento do domínio útil,
ficando graduado em último lugar entre os preferentes legais;

166
d) O direito a suceder no domínio útil, na falta de herdeiro testamentário ou
legítimo do enfiteuta, com exclusão do Estado, e;
e) O direito a receber o prédio por devolução, no caso de deterioração (art.
1499.º, als. a), b), c), d) e e), do CC).

Do lado da enfiteuta, a constituição da enfiteuse confere os seguintes


direitos:
a) O direito a usar e fruir o prédio como coisa sua;
b) O direito a constituir ou extinguir servidões ou o direito de superfície;
c) O direito a alienar ou onerar o seu domínio por acto entre vivos ou por
morte;
d) O direito a preferir na venda ou dação em cumprimento do domínio
directo, ficando graduado em último lugar entre os preferentes legais;
e) O direito a obter a redução do foro ou a encampar o prazo, e;
f) O direito a remir o foro.

Feita esta breve análise sobre o regime jurídico da enfiteuse, importa


referir que na Guiné-Bissau, se considera revogada tacitamente o instituto da
enfiteuse por via da Constituição da República, nomeadamente do seu artigo
11º e seguintes e das legislações que reservam para o Estado a propriedade
do solo, sujeitando-a ao regime de bens dominiais.
A revogação do instituto da enfiteuse leva por conseguinte à revogação
parcial do Foral da Câmara Municipal de Bissau, aprovado pelo Diploma
Legislativo nº 1.415, de 15 de Junho de 1948.

O capítulo relativo ao direito de superfície pode-se ser apontado


também como uma parte do Código Civil que consagra normas sobre a
utilização do solo.

O direito de superfície consiste na faculdade de construir ou manter,


perpétua ou temporariamente, uma obra em terreno alheio, ou de nele fazer ou
manter plantações (art. 1524.º, do CC).

167
Tendo por objecto a construção de uma obra, o direito de superfície
pode abranger uma parte do solo não necessária à sua implantação, desde
que ela tenha utilidade para o uso da obra (art. 1525.º, n.º 1, do CC). Este
direito, não abrange, todavia, a construção de obra no subsolo, a menos que
ela seja inerente à obra superficiária (art. 1525.º, n.º 2, do CC).

O uso e a fruição do subsolo pertencem ao proprietário; este é, porém,


responsável pelos prejuízos causados ao superficiário em consequência da
exploração que dele fizer (art. 1533.º, do CC).

Regra geral, o direito de superfície pode ser constituído por contrato,


testamento ou usucapião, e pode resultar da alienação de obra ou árvores já
existentes, separadamente da propriedade do solo (art. 1528.º, do CC).

Enquanto não se iniciar a construção da obra ou não se fizer a plantação


das árvores, o uso e a fruição da superfície pertencem ao proprietário do solo,
que, todavia, não pode impedir nem tornar mais onerosa a construção ou a
plantação (1532.º, do CC).

Tanto o direito de superfície, assim como o direito de propriedade do


solo são transmissíveis por acto entre vivos ou por morte (art. 1534.º, do CC).

Por fim, o direito de superfície extingue-se: se o superficiário não


concluir a obra ou não fizer a plantação dentro do prazo fixado ou, na falta de
fixação, dentro do prazo de dez anos; se, destruída a obra ou as árvores, o
superficiário não reconstruir a obra ou não renovar a plantação, dentro dos
mesmos prazos a contar da destruição; pelo decurso do prazo, sendo
constituído por certo tempo; pela reunião na mesma pessoa do direito de
superfície e do direito de propriedade; pelo desaparecimento ou inutilização do
solo; pela expropriação por utilidade pública (art. 1536.º, n.º 1, als. a), b), c), d),
e) e f), do CC).

168
No título constitutivo pode-se estipular que do direito de superfície se
extingue em consequência da destruição da obra ou das árvores, ou da
verificação de qualquer condição resolutiva (art. 1536.º, n. 2, do CC).

Posto isto, deve dizer que, não existindo, entre nós, a propriedade
privada sobre o solo, a figura de direito de superfície muito dificilmente se pode
compatibilizar com o direito de uso privativo. Na opinião de alguma doutrina, o
direito de superfície se encontra hoje revogado na nossa Ordem Jurídica.

Um outro instituto do Código Civil em que podemos encontrar as normas


sobre a utilização do solo é o instituto das servidões prediais.
As servidões prediais se encontram previstas no art. 1543.º a 1575.º, do
CC.
A servidão predial é o encargo imposto num prédio em proveito
exclusivo de outro prédio pertencente a dono diferente; diz-se serviente o
prédio sujeito à servidão e dominante o que dela beneficia (art. 1543.º, do CC).

12. Os solos marítimos

O regime jurídico dos solos marítimos encontra-se fundamentalmente


estabelecido na Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar de 10
de Dezembro de 1982, conhecida também por Convenção de Montego Bay
(CMB).
A Convenção foi ratificada pela Guiné-Bissau em 25 de Agosto de 1986
e entrou em vigor em 16 de Novembro de 1994, ou seja, um ano depois do
depósito do sexagésimo instrumento de ratificação pela Guiana, ex vi do
disposto no art. 308.º, n.º 1 da CMB.

A Convenção de Montego Bay divide os espaços marítimos em dois


grupos: espaços submetidos à soberania ou jurisdição do Estado costeiro e
espaços não submetidos a esta jurisdição. Assim, as Águas Interiores, o Mar
Territorial, as Águas Arquipelágicas, a Zona Contigua, a ZEE e a Plataforma
169
Continental são espaços submetidos à jurisdição do Estado costeiro. O Alto
Mar e a Área são os que estão livres desta jurisdição.
Vamos neste estudo falar apenas dos empeços marítimos sob a
soberania nacional. Entre estes espaços vamos falar apenas daqueles que
abrangem os solos e subsolos marítimos.
Assim, fora do âmbito deste estudo ficam a Zona Contígua e Zona
Económica Exclusivas que só abrangem a coluna de água. Aliás mesmo, a
Zona Contígua não existe na ordem jurídica guineense por falta da sua
reivindicação pelo nosso Estado.

A Convenção de Montego Bay reconhece a todos os Estados costeiros a


faculdade de, se quiser, exercerem poderes de soberania e/ou de jurisdição
sobre os espaços susceptíveis de apropriação nacional.
No entanto, a submissão destes espaços à jurisdição e/ou soberania do
Estado costeiro não se opera automaticamente ipso facto, salvo o caso da
Plataforma Continental (art. 77.º, n.º 3 da CMB). O Estado costeiro que
pretende exercer os poderes de jurisdição e/ou de soberania neles
reconhecidos precisa necessariamente de manifestar tal vontade. No caso da
Zona Contígua, a Guiné-Bissau não a reivindicou, por isso, não a tem.

Na Guiné-Bissau existem os seguintes espaços marítimos, de acordo


com o Direito Internacional estabelecido na Convenção de Montego Bay: as
Águas Interiores, o Mar Territorial, a Zona Económica Exclusiva e a Plataforma
Continental. Com excepção da Zona Económica Exclusiva todos eles
abrangem solo e subsolos.
Mais antes de passarmos para a análise de cada um destes espaços,
impor fazer algumas considerações sobre um espaço terrestre muito
influenciado palas águas, a chamada faixa costeira.

170
12.1. O regime da faixa costeira

A faixa costeira é a zona da costa marítima influenciada pelas águas


marítimas. Geralmente é determinada a partir das linhas naturais de influência
das águas na preia-mar, ou seja, conta-se a partir dos pontos onde acabam as
águas nas marés altas até a uma determina distância, em direcção à superfície
da terra firme, fixada pelo respectivo Estado.

Na Guiné-Bissau os limites da faixa costeira encontram-se estabelecidos


no Regulamento da Capitania dos Portos da Província da Guiné, aprovado pelo
Decreto n.º 209, de 07 de Novembro de 1913, publicado no Suplemento ao
Boletim Oficial n.º 52.
Nos termos do art. 4.º deste Regulamento, “a jurisdição da Capitania dos
Portos compreende as costas marítimas, portos, rios, canais e estuários da
província, desde o limite das águas territoriais até a linha do máximo preia-mar
e mais 80 metros acima desta linha em terrenos do domínio público”54.

Nesta ordem, o art. 47.º da Lei da Terra reconhece a compete às


Autoridades Marítimas e Portuárias sobre a gestão das terras dominiais sob a
sua jurisdição nos termos do Regulamento Geral das Capitanias dos Portos e
sobre a prática de todos os actos que lhe estão cometidos na Lei da Terra.

Desta forma, nos termos da Lei da Terra, as Autoridades Marítimas e


Portuárias são obrigatoriamente ouvidas na concessão de direito de uso
privativo sobre uma área de terreno situada na zona da sua jurisdição (art. 32.º,
n.º 3, al. d), da Lei da Terra) e às elas competem também, neste caso,
proceder à demarcação das áreas abrangidas pela concessão (art. 36.º, n.º 5,
da Lei da Terra).

54
Itálico nosso.

171
12.2. As águas interiores: noção, limites, titularidade de direito
sobre os recursos e acesso aos recursos

Águas Interiores são águas situadas entre as linhas de preia-mar e as


linhas de baixa-mar ou, em alternativa, entre as linhas de preia-mar e as linhas
de bases restas (art. 5.º, 7.º, n.os 1 e 3, da CMB).
Na Guiné-Bissau as Águas Interiores existem por aplicação do método
do traçado das linhas de base rectas adoptado pela Guiné-Bissau para definir a
largura do Mar Territorial e dos restantes espaços marítimos, que estão sob a
sua jurisdição e/ou soberania.

Pela Lei n.º 2/85 de 17 de Outubro, o Estado guineense adoptou o


método das linhas de base rectas para fixação dos limites dos espaços
marítimos que se encontram sob a sua jurisdição e/ou soberania.

Assim, os pontos relevantes de coordenadas geográficas, que


constituem as linhas de bases rectas são fixados em: Ponto 1 – (latitude 12º
20´ 20´´ N a longitude 16º 43´ 05´´ W); Ponto 2 – (latitude 11º 38´ 12´´ N a
longitude 16º 35´ 12´´ W); Ponto 3 – (latitude 11º 16´ 18´´ N a longitude 16º 28´
53´´ W); Ponto 4 – (latitude 11º 01´ 34´´ N a longitude 16º 11´ 04´´ W); Ponto 5
– (latitude 10º 51´25´´ N a longitude 15º 43´ 35´´ W); Ponto 6 – (latitude 10º 50´
00´´ N a longitude 15º 10´ 30´´ W) (art. 1.º da Lei n.º 2/85)

Por força do disposto nos arts. 7.º, n.º 3 e 8.º, n.º 1, da CMB, as zonas
do mar situadas dentro do traçado das linhas de base rectas são submetidas
ao regime das Águas Interiores.

Se olharmos para o mapa do país, as linhas de bases rectas ficam assim


situadas nos postos mais afastados, em direcção ao Alto Mar, das ilhas que
compõem o Arquipélago dos Bijagós.

As Águas Interiores numa posição vertical abrangem não só a coluna da


água, mas o espaço aéreo, até a uma distância de 480 km2, e também o solo e
172
subsolo marítimos numa profundidade que vai até ao centro do globo terrestre
(decorre do n.º 1 do art. 2.º conjugado com o n.º 2 do mesmo artigo da CMB).

Ora, tendo em conta a configuração da costa marítima da Guiné-Bissau,


cercada por um conjunto de mais de 90 ilhas, cuja distância do território
continental varia entre 2 a 37 milhas marítimas, o tracejado destas linhas por
método das linhas de base rectas tem por consequência imediata incluir no
regime das Águas Interiores uma grande porção do mar.
Ou seja, pela aplicação deste método, a Guiné-Bissau passa a ter as
Águas Interiores três vezes mais largas do que o seu Mar Territorial.
Ou seja, a Guiné-Bissau possui um espaço marítimo chamado Águas
Interiores com uma largura de 37 milhas marítimas, que cobrem, em toda a sua
extensão, solo e subsolo marítimos.

Em toda esta zona a Guiné-Bissau exerce, de acordo com o Direito


Internacional, o Direito de Soberania de conteúdo idêntico ao que exercido
sobre o seu território terrestre (art. 2.º, n.º 1, da CMB). Por isso, essa zona é
também considerada como território do Estado: uma parte do seu território
marítimo.

Nesta zona, só a Guiné-Bissau pode fazer exploração dos recursos


naturais nela existentes. O acesso dos particulares ao aproveitamento dos
recursos existentes nessa zona só é possível, havendo uma autorização prévia
do Estado guineense.

12.3. O Mar territorial: noção, limites, titularidade de direito sobre


os recursos e acesso aos recursos

O Mar Territorial é o espaço do mar que pode estar adjacente à terra


firma, às águas interiores ou às águas arquipelágicas. No caso da Guiné-
Bissau, o Mar Territorial encontra-se adjacente às Águas Interiores.

173
A Guiné-Bissau, em conformidade com a norma do art. 3.º da CMB, que
permite a cada Estado costeiro fixar a largura do seu Mar Territorial até a um
máximo de 12 milhas marítimas, fixou a largura do seu Mar Territorial em 12
milhas marítimas, contadas a partir das linhas de base rectas (art. 2.9 da Lei n.º
3/85, de 17 de Maio de 1985).

Já em relação ao limite horizontal externo do Mar Territorial, a Lei, em


apreço, nada adianta. Sabe-se, contudo, que nos termos do art. 4.º da CMB, o
limite exterior do Mar Territorial é definido por uma linha em que cada um dos
pontos fica a uma distância do ponto mais próximo de base, entre nós as linhas
de base rectas, igual à largura do Mar Territorial.

Tal como as Águas Interiores, o Mar Territorial, visto numa posição


vertical, abrange também a coluna da água, o espaço aéreo, até a uma
distância de 480 km2, e o solo e subsolo marítimos numa profundidade que vai
até ao centro do globo terrestre (art. 2.º, n.º 2, da CMB).

Neste espaço, o Estado costeiro, maxime a Guiné-Bissau, exerce


podes de soberania de conteúdo idêntico ao que exerce sobre o seu território
terrestre. Em relação aos solos e subsolos, os poderes de soberania do Estado
costeiro não sofrem mesmo nenhuma restrição, contrariamente àquilo que se
passa em relação à coluna da água e ao espaço aéreo a partir de uma
determinada altitude, onde o Direito Internacional impõe restrições aos poderes
de soberania do Estado para assegurar aos terceiros a passagem (art. 17.º e
ss, art. 38.º e ss e art. 125.º da CMB).

Tal como se passa nas Águas Interiores, também nesta zona só a


Guiné-Bissau pode fazer a exploração dos recursos naturais nela existentes.
O acesso dos particulares ao aproveitamento dos recursos existentes
nessa zona só poderá ter lugar mediante autorização prévia do Estado.

174
12.4. A Plataforma Continental: noção, limites, titularidade de
direito sobre os recursos e acesso aos recursos

Há duas noções da Plataforma Continental: uma geomorfológia e outra


jurídica. Ambas são acolhidas no texto da Convenção de Motego Bay.

A noção geomorfológica da Plataforma Continental tem a ver com uma


determinada estrutura típica do solo e subsolo marítimos que constitui o
prolongamento natural submerso do território terrestre por mar. Essa estrutura
é caracterizada, na terminologia utilizada pela Convenção de Montego Bay, por
crista terrestre, sopé continental, pé de talude (art. 76.º, n.º 1 e 3).
A noção assim estabelecida abrange os solos e subsolos marítimos que
ficam além do Mar Territorial, ou seja, que ficam depois das 12 milhas
marítimas e vão até ao limite da extensão dessa formação natural.

A Plataforma Continental, em sentido jurídico, pode não ser coincidente


com o sentido geomorfolígica. Em sentido jurídico a Plataforma Continental tem
a ver com os limites mínimos e máximos impostos pela Convenção de Montego
Bay.
Independentemente da configuração dos solos e subsolos a Convenção
de Montego Bay confere a todos os Estados uma largura mínima de 200 milhas
marítimas, cuja existência não carece de reivindicação expressa e nem de
ocupação efectiva (art. 76.º, n.º 1 e art. 77.º, n.º 3, da CMB).

Para os Estados cuja Plataforma Continental ultrapassa as 350 milhas


marítimas impõe essa distância como o limite máximo inultrapassável. Só
podem fazer estender as respectivas Plataforma Continental até a essa
distância, segundo os procedimentos estabelecidos na Convenção e no seu
Anexo II, v.g., art. 76.º, n.º 2, 3, 4, 5 e 8; e art. 4.º e ss da Anexo II da CMB.

Em relação ao caso guineense, não existe nenhuma legislação que fixa


o limite exterior da Plataforma Continental. O Estado guineense prefere-se, no
175
silêncio, conformar-se com o limite mínimo de 200 milhas marítimas
reconhecido a todos os Estados costeiros nos termos do art. 76.º, n.º 1 da
CMB, que, ev vi do art. 77.º, n.º 3 da CMB, não carece de qualquer
reivindicação e muito menos de qualquer ocupação para existir.
É neste sentido que nos parece que se deve enquadrar o disposto no n.º
2 do art. 3.9. da Lei 3/85, quando afirma que “são exclusivos do Estado da
Guiné-Bissau as pesquisas e explorações dos recursos vivos e naturais
existentes no mar e na Plataforma Continental, taludes e fundos da Zona
Económica Exclusiva”.
A referência aqui à Plataforma Continental sem a fixação da respectiva
largura e limite externo, significa que o Estado guineense exerce a sua
soberania sobre este espaço até ao limite mínimo de 200 milhas marítimas
garantido a todos os Estados costeiros pela Convenção de Montego Bay.

Neste caso, as 200 milhas marítimas contam-se a partir dos pontos


extremos das ilhas dos Bijagós mais afastados do território continental, i.e., a
partir das 37 milhas marítimas da costa continental.

Em consequência directa desta fixação, das linhas de base rectas, a


Guiné-Bissau passa a ter uma Plataforma Continental, muito embora de 200
milhas marítimas, mais avançada ao Alto Mar do que os restantes Estados
costeiros da África Ocidental. É um facto não menosprezável. Pois, somando a
largura das suas Águas Interiores com as do Mar Territorial e da Plataforma
Continental, sem contar com a vasta zona de águas continentais, a Guiné-
Bissau, na prática, acaba por ter um prolongamento natural do território
submerso de 237 milhas marítimas.

Tudo isso sem contar com uma eventual extensão do limite exterior da
Plataforma Continental para além das 200 milhas marítimas.

Pois, em 13 de Maio deste ano, a Guiné-Bissau manifestou a sua


intenção de estender o limite exterior da sua Plataforma Continental para além

176
de 200 milhas marítimos com a submissão de informações preliminares às
Nações Unidas.

Em toda a sua extensão, o Estado costeiro exerce poderes de soberania


exclusiva sobre a Plataforma Continental para efeitos de exploração e
aproveitamento dos seus recursos naturais (art. 77.º, n.os 1 e 2, da CMB). Os
poderes são de conteúdo semelhantes ao que exerce sobre o território
terrestre.

Só o Estado costeiro pode explorar os recursos naturais existentes na


Plataforma Continental.
Os terceiros só podem ter acesso ao aproveitamento dos recursos nesta
zona mediante a sua autorização prévia (art. 77.º, n.º 2, da CMB).

Porém, no caso da extensão da Plataforma Continental além das 200


milhas marítimas, pela exploração dos recursos naturais na parte que vai além
das 200 milhas, o Estado costeiro fica obrigado a pagar, anualmente, uma
contribuição em espécie à Autoridade Internacional dos Fundos Marinhos (art.
82.º, n.os 1 e 2, CMB).
Desse pagamento, ficam, contudo, isentos os países em vias de
subdesenvolvimento que sejam importadores substanciais dos respectivos
recursos minerais extraídos da sua Plataforma Continental (art. 82.º, n.º 3, da
CMB).

12.5. As fronteiras marítimas da Guiné-Bissau

As fronteiras marítimas da Guiné-Bissau encontram-se delimitadas a Sul


com a da Guiné-Conacky e a Norte com a do Senegal.

A Sul, com a Guiné-Conackry, a fronteira foi delimitada pela sentença do


Tribunal Arbitral de 14 de Fevereiro de 1985, que estabeleceu o limite
fronteiriço a partir da intersecção do Talvegue do Cajete, passando pelo
177
meridiano de 15° 06' 30" de longitude oeste, unido através de loxodromias os
seguintes pontos:

Latitude Norte longitude ocidental

A 10º 50' 00" 15° 09' 00"

B 10° 40' 00" 15° 20' 30"

C 10º 40' 00" 15° 34' 15'"

Segue depois uma linha loxodromica de azimute de 236° do Ponto C


supracitado ao limite exterior dos espaços marítimos reconhecidos a cada
Estado pelo Direito Internacional geral, i.e., as 200 milhas marítimas 55. A
fronteira assim traçada foi confirmada pelo legislador guineense pela Lei n.º
3/85 de 17 de Maio de 1985, art. 1.º.

A Norte, com o Senegal, a fronteira marítima foi delimitada pelo Acordo


luso-francês de 26 de Abril de 1960 concluído entre Portugal e França, que
determina que a fronteira do Mar Territorial, da Zona Contígua e a Plataforma
Continental seguiria o azimute de 240º a partir do ponto da intersecção do
“prolongamento da fronteira terrestre” da linha de baixa-mar representada por
este efeito pela linha de Cabo Roxo.

Em 1993, na sequência de sentença do Tribunal Internacional da Justiça


de 12 de Novembro de 1991, sobre a disputa jurisdicional travada entre a
Guiné-Bissau e o Senegal relativa à validade do Acordo de 26 de Abril de 1960,
para esfriar as tensões, as partes concluíram, extrajudicialmente, o Acordo de
Gestão e de Cooperação, assinado em 14 Outubro de 1993, que põe fim ao
conflito. Por via deste Acordo as partes criaram, assim, a zona de exploração

55
Vide art. 1.º, al. c) da Lei n.º 3/85 de 17 de Maio de 1985.

178
comum, cuja gestão e exploração é confiada a uma agência internacional
criada no âmbito do Acordo.

Em 12 de Junho de 1995, em Bissau, as partes assinaram o Protocolo


de Acordo sobre a organização e funcionamento da referida Agência de Gestão
e de Cooperação.

Concluído por um período de 20 anos, renovável por tácita recondução


(art. 8.º de Acordo de 1993), o Acordo versa essencialmente sobre três
questões: delimitação da zona de exploração comum, partilha dos recursos
haliêuticos e modalidades de exploração em comum dos recursos.

Nos termos do Acordo luso-francês de 1960, o tracejado da linha que


delimita a fronteira do Mar Territorial, da Zona Contígua e a Plataforma
Continental entre o Senegal e a Guiné-Portuguesa, seguiria o azimute de 240º
a partir do ponto da intersecção do prolongamento da fronteira terrestre da
linha de baixa-mar representada por este efeito pela linha de Cabo Roxo.

Para a criação da zona de exploração comum, as partes eram


obrigadas, cada uma, a fazer concessão de uma parte do respectivo espaço
marítimo a favor da zona comum de exploração. Assim, a Guiné-Bissau teve
que fazer uma concessão de 20º em direcção a Sul do azimute de 240º, e
Senegal, uma concessão de 28º do seu espaço em direcção ao norte do
azimute de 240.º.

Em consequência destas concessões, a zona de exploração comum


passa a situar-se entre os azimutes 268.º e 220.º, traçados a partir do Cabo
Roxo, com exclusão de maior porção dos Mares Territoriais dos respectivos
Estados (art. 1.º, § 1º, 2º e 3º do AGC 1993).

A partilha dos benefícios de exploração dos recursos da Plataforma


Continental da zona de exploração comum é extremamente desigual. O
Senegal perceberá 85% de recursos em hidrocarboneto que advêm da
exploração da zona, enquanto a Guiné-Bissau deverá contentar-se apenas
com 15% (art. 2.º, § 1, 2ª parte do AGC1993).
179
Por conseguinte, o Direito senegalês é o Direito aplicável no domínio
mineiro e petroleiro. Todavia, prevê-se a possibilidade da Alta Autoridade de
propor aos Estados partes as modificações ou emendas necessárias à
regulamentação em vigor (art. 24.º, n.os 1, 2 e 3 do PAROFAGC).

Os recursos existentes nesta zona são geridos pela Agência de Gestão


e de Cooperação.

Sob a designação da Agência de Gestão e de Cooperação, o Protocolo


de 1995, cria, na realidade, duas instituições distintas, ainda que uma é
estreitamente dependente doutra: a organização internacional propriamente
dita (Agência) e o seu instrumento de acção (Empresa).

Com a constituição da Agência a Guiné-Bissau e o Senegal ficam


substituídos nos direitos e obrigações que detinham relativamente à exploração
dos recursos da zona comum e consequentemente deixam de poder intervir
directamente na exploração destes recursos (art. 5.º do AGC1993). A sua
intervenção na actividade desenvolvida na zona comum passa a ser conjunta e
indirectamente através dos diferentes níveis da estrutura da Agência e da
Empresa, onde é assegurada a representação.

Pois bem, a Agência é uma organização interestadual, composta por um


órgão deliberativo, a Alta Autoridade, e um órgão executivo, o Secretariado-
Geral (art. 7.º, 10.º, n.º 1 e art. 11.º, n.º 1 do PAROFAGC).

A Alta Autoridade é composta pelos chefes de Estado ou de Governo ou


pelas personalidades designadas por estes. É presidida rotativamente pelos
chefes de Estado ou de Governo ou pelos seus representantes, por um
mandato de 2 anos (art. 9.º, § 1º, 2º e 3º PAROFAGC).

O Secretariado-Geral é assegurado por um Secretário-Geral, nomeado


pela Alta Autoridade, o qual é assistido, por um Secretário-Geral Adjunto,
também nomeado pela Alta Autoridade (art. 11.º, n.º 1 do PAROFAGC).

A Agência tem dupla função: a gestão dos recursos da zona de


exploração comum e a promoção da cooperação entre os Estados (art. 4.º do
PAROFAGC).
180
Para prossecução da primeira função, a Agência detém o exclusivo dos
títulos mineiros ou petrolíferos, assim como os direitos de pesca na zona (art.
6.º do PAROFAGC).

Assim, no domínio no domínio mineiro e petrolífero, compete à Agência:

Empreender e fazer empreender todos os estudos geológicos,


geofísicos, todos os trabalhos de perfuração, todas as actividades que visam
as pesquisas, exploração e aproveitamento dos recursos minerais ou
petrolíferos da zona;

Promover as actividades de pesquisa, exploração e aproveitamento dos


recursos mineiros ou petrolíferos da zona;

Garantir a comercialização de toda ou parte da produção mineira ou


petrolífera realizada que lhe caiba (art. 5.º, al. a), § 1.º, 2.º e 3º do
PAROFAGC).

No âmbito da função de cooperação, a Agência pode associar-se com


os Estados partes e com as organizações internacionais competentes, para
assegurar, na zona, a segurança, o controlo dos regulamentos e a fiscalização
das actividades de investigação, de exploração e de aproveitamento dos
recursos, a protecção do ambiente marinho, a prevenção e a luta contra a
poluição (art. 5.º, a. c), § 2º do PAROFAGC).

Compete ao Secretariado-Geral, entre outras coisas, proceder à partilha


dos resultados das actividades de exploração dos recursos da zona, segundo a
proporção prevista no art. 2.º do AGC1993 (art. 11. n.º 4, al. g) do
PAROFAGC).

181
Da análise do texto do Protocolo podemos retirar duas modalidades de
gestão dos recursos naturais pela Agência: a gestão directa e a gestão
indirecta.

Por via de gestão directa, a Agência pode através da Empresa realizar


directamente, por si só ou em associação com outras sociedades ou
organizações internacionais (em regime de “joint ventures”) a actividade de
pesquisa e exploração dos recursos da zona.

E por fim, por via de gestão indirecta, pode a Agência confiar a


exploração dos recursos da zona a um terceiro a título de concessão (art. 4.º, §
1º, art. 5.º, al. c), § 3º e art. 6.º, § 2º, 1ª parte do PAROFAGC) 56. É através
desta segunda via que os particulares podem ter acesso aos recursos da Zona
Comum de Exploração.

13. A gestão do solo no Direito Comunitário, em especial no Código


Mineiro Comunitário da UEMOA

13.1. Considerações de enquadramento e âmbito de aplicação do


CMC

Em 2003, a UEMOA, União Económica Monetária Oeste Africana, uma


organização sub-regional da qual a Guiné-Bissau é membro, adoptou o Código
Mineiro Comunitário da UEMOA através do Regulamento n.º
18/2003/CM/UEMOA de 23 de Dezembro de 2003.

O Código Mineiro Comunitário da UEMOA (CMC), regula o conjunto das


actividades relativas à prospecção, pesquisa, exploração, detenção, circulação,

56
Nenhuma disposição fala expressamente da concessão, mas esta possibilidade resulta implicitamente
da leitura global do Protocolo.

182
tratamento, transporte, possessão, transformação e comercialização de
substâncias minerais em todo o território da União com excepção dos
hidrocarbonetos líquidos ou gasosos (art. 2.º, do CMC).

O Código se aplica, ainda, de modo uniforme em toda a extensão do


território da União à toda a pessoa física ou moral (art. 3.º do CMC).

Nos termos do seu art. 4.º cada Estado membro é o proprietário de


todas as substâncias minerais constantes no respectivo território terrestre e
marítimo, nomeadamente as constantes no solo e subsolo terrestres, nas
Águas Territoriais e na Plataforma Continental.

Porém, não obstante a propriedade das substâncias mineiras pertencer


ao Estado, os particulares poderão aceder ao seu aproveitamento, no espaço
da União, mediante a obtenção prévia do respectivo título nas condições
fixadas pelo regulamento em vigor no seio da União (art. 5.º, do CMC).

Nos termos do Código Mineiro Comunitário os depósitos naturais de


substâncias minerais ou fósseis estão classificados em carreiras e minas (art.
6.º, § 1.º, do CMC).

Na categoria dos depósitos de substâncias minerais sujeitos ao regime


das carreiras, encontram: além dos “turfa-pântanos”, os depósitos de materiais
de construção, ornamentação, “empierrement” e viabilidade, dos materiais para
a indústria cerâmica, dos materiais de emenda para as culturas de terra e
outras substâncias análogas com excepção dos fosfatos, nitratos, sais de álcali
e outros sais associados da mesma camada (art. 6.º, § 2.º, do CMC).

Na categoria dos depósitos minerais sujeitos ao regime de minas,


encontram-se todos os depósitos de substâncias minerais ou fósseis excluídos
do regime das carreiras (art. 6.º, § 3.º, do CMC).

183
Não obstante esta classificação, certos depósitos podem ser ainda
classificadas como carreiras ou como minas consoante o uso ao qual as
substâncias minerais compreendidas são destinadas nas condições definidas
pelos regulamentos de execução do Código Mineiro Comunitário (art. 7.º, corpo
principal do CMC).

As instalações e facilidades anexas v.g., as instalações necessárias à


exploração ficam sujeito ao regime ao qual estão sujeitos os respectivos
depósitos naturais de substâncias minerais (art. 7.º, § 2.º, do CMC).

O regime relativo: às regras de segurança e de higiene aplicadas aos


trabalhos de prospecção, de pesquisa e exploração de substâncias minerais;
ao transporte; a stockes; à utilização das substâncias explosivas e produtos
perigosos; à protecção do ambiente; à reabilitação dos lugares exploradas; e à
conservação do património florestal e arqueológico, é fixado pela
Regulamentação Mineira da União (art. 11.º, do CMC).

Para a fase de exploração mineira, prescreve o Código que sempre que


o titular de um título mineiro tomar a decisão de explorar uma jazida, com base
num estudo de fiabilidade, deve tomar as diligências para a criação de uma
sociedade de exploração correspondente a esse título de mineral.
Na referida Sociedade de exploração ao Estado membro concedente do
título deve ser reservado uma participação de 10% no capital social durante
todo o período da exploração da mina (art. 12.º, corpo principal, do CMC).
A participação do Estado é isenta de todos os encargos e não pode ser
sujeita a nenhuma diminuição em caso do aumento do capital (art. 12.º, § 2.º
do CMC).

Feitas estas considerações, importa salientar que o Código Mineral


Comunitário, não obstante se proclamar a sua aplicação de modo
uniforme em todo o espaço da União, acaba por remeter a regulação de
grande parte das matérias para a legislação nacional de cada Estado, na
falta de instrumentos jurídicos comunitários específicos.
184
Com efeito, o Código Mineral Comunitário remete para a legislação
nacional a regulação das seguintes matérias, entre outras:

a) A fixação o regime jurídico das carreiras (art. 8.º, do CMC);

b) A determinação de natureza dos títulos minerais, obrigações, direitos


ligados aos títulos minerais e sua gestão administrativa (art. 9.º, do
CMC);

c) O estabelecimento do regime da ocupação de terrenos necessários à


actividade de prospecção, de pesquisa ou de exploração de substâncias
minerais e às industrias que a ela estejam ligadas, assim como as
relações entre os proprietários do solo e outros ocupantes e detentores
de títulos minerais (art. 10.º, do CMC);

d) A fixação do regime de fiscalidade aplicável aos titulares de títulos


mineiros relativos à pequena mina e à exploração mineira artesanal,
assim como as vantagens que são concedidas aos respectivos titulares
(art. 20.º, do CMC).

13.2. Garantias jurídicas reconhecidas aos titulares dos títulos


mineiros

O Código Mineiro Comunitário impõe aos Estados membros adopção de


medidas de garantia a favor dos titulares de títulos mineiros, dos seus
fornecedores e dos seus subcontratantes.

Assim, os Estados membros ficam obrigados a garantir aos titulares de


títulos mineiros, inter alia:

185
a) O direito de dispor livremente dos seus bens mobiliários e imobiliários,
materiais ou imateriais e de organizar a sua empresa (art. 13.º, § 1.º, 1ª
parte do CMC);

b) A protecção contra toda medida de nacionalização, de expropriação ou


de requisição (art. 13.º, § 1.º, 1ª parte, in fine, do CMC);

c) A protecção da propriedade privada em todos os seus aspectos jurídicos


e comerciais, seus elementos e seus desmembramentos, sua
transmissão e os contratos dos quais seja objecto (art. 13.º, § 1.º, 2ª
parte do CMC);

d) A livre importação das mercadorias, materiais, matérias, máquinas,


equipamentos, peças de sobressalente e bens consumíveis, sob reserva
do Código Mineiro Comunitário e do Código Aduaneiro da UEMOA (art.
13.º, § 2.º, do CMC);

e) A livre escolha dos fornecedores, dos subcontratantes assim como dos


sócios (art. 14.º, corpo principal do CMC).

f) A livre transferência de divisas necessárias aos exercícios das


actividades abrangidas pelo título mineiro, v.g., com o objectivo de
assegurar os pagamentos normais e correntes a favor dos seus
credores e fornecedores fora da União (art. 15.º, § 1.º do CMC);

g) A livre escolha da política de gestão dos recursos humanos, com


ressalva de, em caso de recrutamento, ser concedida a preferência, de
acordo com às exigências de qualificações iguais, aos nacionais da
União (art. 16.º, § 1.º do CMC);

h) A livre circulação e comercialização dos produtos semi-finais e finais,


assim como de todas as substâncias e produtos provenientes das
actividades de exploração (art. 16.º, § 2.º do CMC);
186
i) A livre circulação de amostras destinadas aos testes e análises (art. 16.º,
§ 3.º do CMC);

j) A estabilidade do regime fiscal e aduaneiro previsto na regulamentação


em vigor no seio da União durante o período de validade dos títulos
mineiros (art. 17.º, corpo principal, 1ª parte do CMC);

13.3. Obrigações impostas aos titulares de títulos mineiros

Os titulares de títulos mineiros, os seus fornecedores e subcontratantes


são obrigados a respeitar, no exercício das suas actividades, a legislação
nacional do lugar das suas actividades e ainda, na falta de textos comunitário,
as seguintes obrigações gerais:

a) Respeitar a ordem pública;

b) Conformar-se à regulamentação que rege a criação e o funcionamento


das empresas;

c) Realizar os estudos de impacto ambiental para a fase de exploração;

d) Respeitar os regulamentos sobre o ambiente;

e) Implementar um plano de fiscalização assim como um programa de


reabilitação de ambiente;

f) Fornecer às autoridades competentes os documentos de contas e


financeiros, relatórios de execução do programa, emprego e outras
informações (art. 19.º, do CMC).

187
Além destas obrigações os titulares de títulos mineiros são ainda
obrigados a:

Utilizar, tanto quanto possível, os serviços e materiais de origem


comunitária, os produtos fabricados ou vendidos dentro do espaço da União,
dento do quadro em que estes serviços e produtos são disponibilizados a
condições competitivas de preço, qualidade, garantia e prazo de expiração (art.
14.º, § 1.º do CMC);

Adoptar o sistema de contabilidade em vigor no seio na UEMOA


denominado Sistema Contabilidade Oeste Africano (art. 19.º, do CMC);

Pagamento dos direitos fixos ligados aos pedidos de atribuição,


renovação, cessão, transmissão, transformação de títulos mineiros relativos à
prospecção, pesquisa ou exploração cujos montantes e modalidades são
determinados, na ausência de textos comunitários, pela legislação mineira
nacional de cada Estado membro (art. 21.º, do CMC);

Pagamento anual de uma taxa superficiária cujos montante e


modalidades são fixados, na falta de textos comunitários, pela legislação
mineira nacional de cada Estado (art. 22.º, do CMC);

Pagamento, na fase de exploração, de uma licença de mineração cuja


taxa e base são fixados pelos regulamentos de execução do Código Mineiro
Comunitário (art. 23.º, do CMC).

Além dos pagamentos de direitos fixos, de taxas superficiárias e de


licenças de mineração, os titulares de títulos minerais estão ainda sujeitos ao
pagamento de impostos, direitos aduaneiros e taxas de efeito equivalente de
acordo com a regulamentação comunitária em vigor (art. 24.º, do CMC).

188
CONCLUSÕES

O solo tendo em conta suas características, a sua gestão racional de


forma a garantir a sua disponibilidade as gerações futuras constitui um
imperativo para todos os Estados, na sua missão principal de prossecução do
interesse colectivo.

Na Ordem Jurídica guineense existem vários instrumentos jurídicos que


de modo especial regulam a utilização do solo pelos particulares. Entre estes
instrumentos temos: a Lei da nacionalização do solo, a Lei da Terra, o Foral da
Câmara Municipal de Bissau, Lei de Minas e dos Minerais, Lei das pedreiras,
Código das águas, Lei Florestal, Lei Florestal, Projecto de Lei de Bases do
Ambiente e nos seus instrumentos de execução (AIA), Áreas protegidas, Os
planos urbanísticos e a gestão do solo, No Código Civil, Convenção das
Nações Unidas sobre o Direito do Mar e Código Mineiro Comunitário da
UEMOA.

Por força da Lei da nacionalização dos solos e da Constituição da


República, a propriedade do solo e de todos os recursos nele integrante
pertence ao Estado.

Em consequência da nacionalização do solo, algumas legislações do


período colonial, se encontram hoje parcialmente revogadas devido à sua
incompatibilidade com as normas de nacionalização dos solos. É o caso por
exemplo, do Foral da Câmara Municipal e de algumas disposições do Código
Civil, na parte em que continuam a falar da propriedade privada do solo.

Também deve-se considerar revogadas ou alteradas parcialmente


algumas legislações nacionais, que não obstante serem posteriores à Lei da
189
Nacionalização do solo, continuam ainda a falar da propriedade privada do
solo.

O regime geral de utilização do solo vem estabelecido na Lei da Terra. A


Lei da Terra consagra duas formas de acesso dos particulares aos recursos
naturais: a concessão e o uso consuetudinário. A concessão é um contrato
administrativo que concede ao particular concessionário o direito de utilizar e
fazer o aproveitamento de solo a título de direito de uso privativo.

Nos termos da lei da Terra, existem duas modalidades de concessão:


concessão de superfície e a concessão rural.

A concessão de superfície confere ao seu titular a faculdade de construir


ou manter, perpétua ou temporariamente, uma obra para fins habitacionais,
comerciais, industriais ou culturais, entre outros, em terrenos localizados dentro
dos limites das cidades ou povoações e respectivas zonas de expansão.

A concessão rural confere ao seu titular o uso privativo da terra, para fins
agrícolas, pecuários, agro-pecuários, agro-industriais, silvícolas e turísticos, em
zonas localizadas fora dos limites das áreas urbanas.

O uso consuetudinário é uma forma dos particulares acederem à


utilização da terra de acordo com as regras, costumes e práticas tradicionais de
uma determinada Comunidade Local, os quais definem poderes e deveres
recíprocos e disciplinam a sua gestão do solo.

190
Os restantes instrumentos jurídicos estabelecem disciplinas especiais de
utilização do solo. Entre eles há alguns aspectos comuns: todos eles admitem
o acesso dos particulares à utilização e aproveitamento dos recursos naturais;
em todos eles verifica-se uma preocupação de conservação do ambiente; e em
quase todos eles existe o reconhecimento de direitos costumeiros das
comunidades locais.

191
LEGISLAÇÕES INTERNAS CITADAS

- Anteprojecto de Lei de Base do Ambiente de Lei de Bases do Ambiente


de 2008.

- Código Civil Português, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 47.344, de 25 de


Novembro de 1966, publicado no B.O., n.º 38.º, de 25 de Setembro de
1967. Portaria n.º 22.869 do Ministério do Ultramar, de 4 de Setembro
de 1967, o Código foi extensivo às, então, províncias ultramarinas, entre
as quais se encontrava a que agora é denominada da República da
Guiné-Bissau.

- Código de Águas, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 5-A/92, de 17 de


Setembro, publicado no Suplemento ao Boletim Oficial nº 37, de 17 de
Setembro de 1992.

- Constituição da República da Guiné-Bissau de 1984, na versão revista e


aprovada pela Lei Constitucional n.º 1/96, publicada no B. O. n.º 50 de
16 de Dezembro de 1996.

- Constituição da República da Guiné-Bissau, de 1973, publicada no B.O,


n.º 1 de 4 Janeiro de 1975.

- Constituição da República da Guiné-Bissau, de 1984, na sua versão


original, publicada no Suplemento ao B.O, n.º 19, de 16 de Maio.

- Decreto de criação do Parque Nacional do Grupo de Ilhas de Orango,


Decreto n.º 11/00, publicado no B.O. n.º 49, de 4 de Dezembro de 2000.

- Decreto de criação do Parque Nacional Marinho João Vieira Poilão,


Decreto n.º 6-A/00, de 23 de Agosto, publicado no 2º Suplemento ao
B.O. n.º 34, de 23 de Agosto de 2000.

192
- Decreto de criação do Parque Natural das Lagoas de Cufada, Decreto
n.º 13/00, publicado no B.O. n.º 49, de 4 de Dezembro de 2000.

- Decreto de criação do Parque Natural dos Tarrafes do Rio de Cacheu,


Decreto n.º 12/00, publicado no B.O. n.º 49, de 4 de Dezembro de 2000.

- Decreto n.º 8/05, sobre a criação da Área Marinha Protegida


Comunitária das Ilhas de Formosa, Nago e Chediã (Ilha Urok), publicado
no Suplemento ao B.O. n.º 28, de 12 de Julho de 2005.

- Código Penal guineense, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 4/93, publicado


no Suplemento ao Boletim Oficial n.º 41, de 13 de Outubro.

- Foral da Câmara Municipal de Bissau, aprovado pelo Diploma


Legislativo n.º 1.415, de Junho de 1948, e publicado no Suplemento ao
B.O n.º 24, de 15 de Junho de 1948.

- Lei da exploração de pedreiras, Decreto-Lei n.º 4/86, de 29 de Março de


1986, publicado no Suplemento ao B.O., n.º 13, de 29 de Março de
1986.

- Lei da expropriação de imóveis, Lei n.º 2.030, de 22 de Junho de 1948,


publicada no Diário do Governo, I Série, n.º 143, de 22 de Junho de
1948.

- Lei da nacionalização do solo, Lei n.º 4/75, de 5 de Maio de 1974,


publicada no B.O., n.º 19, de 10 de Maio de 1975.

- Lei da Terra, Lei n.º 5/98, de 28 de Abril de 1998, publicada no


Suplemento ao B.O n.º 17, de 28 de Abril de 1998.

193
- Lei de Minas e dos Minerais, aprovada pala Lei n.º 1/2000, de 24 de
Julho, publicada no B.O., n.º 30, de 24 de Julho de 2000.

- Lei Florestal, aprovada pelo Decreto-Lei n.º 4-A/91, de 29 de Outubro de


1991 e publicada no Suplemento ao B.O., n.º 43, de 29 de Outubro de
1991.

- Lei n.º 2/85 de 17 de Maio 1985, publicada no Suplemento ao B.O. n.º


19, de 17 de Maio de 1985, estabelece as linhas de base rectas a partir
das quais é medida a largura do Mar Territorial.

- Lei n.º 3/85 de 17 de Maio 1985, publicada no Suplemento ao B.O. n.º


19, de 17 de Maio de 1985, fixa a largura do Mar Territorial e da Zona
Económica Exclusiva, respectivamente a 12 e 200 milhas marítimas e
acolhe o conteúdo da Sentença Arbitral de 14 de Fevereiro de 1985,
sobre a delimitação das fronteiras marítimas entre a República da
Guiné-Bissau e a República da Guiné.

- Lei nº 1/73, de 24 de Setembro de 1973, publicada no B.O., n.º 1, de 4


de Janeiro de 1975, acolhe o Direito português que não for contrário à
soberania nacional, à Constituição, às leis ordinárias da República e aos
princípios e objectivos do PAIGC.

- Lei-Quadro das Áreas Protegidas, aprovada pelo Decreto-Lei. n.º 3/97 e


publicada no Suplemento ao B.O. n.º 21, de 26 de Maio de 1997.

- O novo limite da cidade de Bissau, fixado pelo Decreto n.º 16/95, de 30


de Outubro, publicado no Suplemento ao B.O., n.º 44 de 30 de Outubro
de 1995, fixa.

- Projecto de Lei de Bases do Ordenamento territorial e Urbano da


República da Guiné-Bissau de 2009.

194
- Proposta de criação do Parque Nacional de Cantanhez, Decreto n.º
__/2007, respectivamente.

- Proposta do Projecto de Lei sobre a Avaliação Ambiental, aprovada no


Conselho de Ministros de 19 de Março de 2008.

- Regulamento da Capitania dos Portos da Província da Guiné, aprovado


pelo Decreto n.º 209, de 07 de Novembro de 1913, publicado no
Suplemento ao Boletim Oficial n.º 52.

- Regulamento do Plano Geral Urbanístico de Bissau, aprovado pelo


Decreto n.º 17/95, de 30 de Outubro, Publicado no Suplemento ao B.O.
n.º 44 de 30 de Outubro de 1995.

- Regulamento Geral de Construção e Habitação Urbana, aprovado pelo


Decreto-Lei n.º 7/2006, de 31 de Julho e publicado no B.O., n.º 31 de
Julho de 2006.

LEGISLAÇÕES INTERNACIONAIS CITADAS

- Acordo de Gestão e de Cooperação entre o Governo da República do


Senegal e o Governo da República da Guiné-Bissau de 14 de Agosto de
1993.

- Acordo luso-francês de 26 de Abril de 1960, sobre a delimitação da


fronteira marítima entre o Senegal e a Guiné-Portuguesa.

- Código Mineiro Comunitário da UEMOA, adoptado pelo Regulamento n.º


18/2003/CM/UEMOA de 23 de Dezembro de 2003.

195
- Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar de 10 de
Dezembro de 1982, (Convenção de Montego Bay).

- Convenção luso-francesa de 12 de Maio de 1886, sobre a delimitação da


fronteira terrestre entre, por um lado, a Guiné-francesa e a Guiné-
portuguesa e, por outro lado, entre esta última e o Senegal.

- Protocolo de Acordo de12 de Junho de 1995, de Relativo à Organização


e ao Funcionamento da Agência de Gestão e de Cooperação entre a
República do Senegal e a República da Guiné-Bissau, instituída pelo
Acordo de 14 de Outubro de 1993.

196
ÍNDICE

Plano de trabalho ------------------------------------------------------------------------------- 1

1. Introdução ----------------------------------------------------------------------------------- 2
1.1. Razões justificativas do estudo --------------------------------------------------- 2
1.2. Delimitação ----------------------------------------------------------------------------- 4
1.3. A intervenção reguladora do Estado relativamente ao solo --------------- 5

2. Os principais instrumentos jurídicos que disciplinam o uso de solo na


Guiné-Bissau ------------------------------------------------------------------------------- 7

3. Propriedade da terra nos principais instrumentos jurídicos sobre o


solo, em especial na Lei da Terra ------------------------------------------------- 11
3.1. A competência legislativa em matéria do solo ------------------------------- 11
3.2. O Estado guineense era, foi e é dono da terra ------------------------------ 12
3.3. O acesso dos particulares ao solo e as suas condicionantes ----------- 20
3.3.1. O contrato administrativo de concessão de uso privativo -- 24
3.3.1.1. As modalidades de concessão --------------------------------- 24
3.3.1.2. Regime jurídico do contrato administrativo concessão de
uso privativo -------------------------------------------------------------- 24
3.3.1.2.1. Partes no contrato administrativo de concessão -- 25
3.3.1.2.2. Prezo de validade do contrato administrativo de
concessão ----------------------------------------------------------- 27
3.3.1.2.3. Forma e formalidade de contrato ---------------------- 28
3.3.1.2.4. Transmissão de direito de uso privativo ------------- 30
3.3.1.2.5. Encargos patrimoniais inerentes à constituição,
utilização, conversão e transmissão do direito de uso
privativo -------------------------------------------------------------- 31

197
3.3.1.2.6. Modos de extinção do direito de usos privativo
constituído por concessão -------------------------------------- 33

a) - Caducidade do contrato pelo decurso do prazo de


vigência --------------------------------------------------------------- 34
b) - Caducidade do contrato pela morte da pessoa singular,
não havendo lugar à sucessão legítima ---------------------- 35
c) - Caducidade do contrato por extinção da pessoa colectiva -
--------------------------------------------------------------------------- 36
d) - Caducidade do contrato pelo desaparecimento ou
inutilização do objecto da concessão ------------------------- 36
e) - Caducidade do contrato pela exploração por utilidade
pública ---------------------------------------------------------------- 37
f) - Rescisão do contrato -------------------------------------------- 42
g) - Extinção do contrato por acordo das partes ou por
renúncia do titular do direito de uso privativo --------------- 43
h) - Efeito de extinção de direito de uso privativo -------------- 43
3.3.1.2.7. Mecanismos de defesa do titular de direito de uso
privativo -------------------------------------------------------------- 44
3.3.2. O uso consuetudinário ----------------------------------------------------- 44
3.4. O direito de uso privativo do solo: uma nova categoria jurídica do direito
real ou o direito de propriedade privada camuflado ------------------------ 50
3.5. Mecanismos de controlo pelo Estado da transmissão do solo ---------- 50
3.6. A oneração do direito de uso privativo por servidão administrativa ---- 50

4. O regime de concessão de terrenos na área limítrofe de Bissau ------ 51

5. O uso do solo na Lei de Minas e dos Minerais ------------------------------- 62


5.1. Considerações de enquadramento --------------------------------------------- 62
5.2. Objectivo, âmbito, objecto de aplicação da Lei de Minas ----------------- 63
5.3. Conceito de mina e de figuras afins -------------------------------------------- 63
5.4. Titularidade de direito e formas de acesso às minas pelos particulares --
-------------------------------------------------------------------------------------------- 64

198
5.4.1. Licença de mineração artesanal ---------------------------------------- 68
5.4.2. Licença de prospecção ---------------------------------------------------- 69
5.4.3. Arrendamento de Mineração --------------------------------------------- 71
5.4.4. Retenção de Arrendamento de Mina ----------------------------------- 74
5.4.5. Licença de Mineração ------------------------------------------------------ 75
5.4.6. Limites e condicionantes de acesso aos recursos minerais ----- 77
5.5. Transmissão dos direitos de mineração --------------------------------------- 80
5.6. Garantia jurídica dos particulares ----------------------------------------------- 81
5.7. Preservação do meio ambiente ------------------------------------------------- 82

6. O uso do solo na Lei das Pedreiras ---------------------------------------------- 85

7. O uso do solo no Código de Águas ---------------------------------------------- 86


7.1. Considerações de enquadramento --------------------------------------------- 86
7.2. Formas de acesso dos particulares à utilização da água ----------------- 90
7.2.1. Regime de uso livre --------------------------------------------------------- 90
7.2.2. Regime de declaração de uso ------------------------------------------- 91
7.2.3. Regime de autorização de uso ------------------------------------------ 91

7.2.4. Regime de concessão ----------------------------------------------------- 92


7.3. Deveres e encargos legais dos utentes de águas -------------------------- 94
7.4. Regime das águas subterrâneas ----------------------------------------------- 96
7.5. Protecção do ambiente ------------------------------------------------------------ 97

8. O uso do solo na Lei Florestal ---------------------------------------------------- 100

8.1. Considerações introdutórias ---------------------------------------------------- 100

8.2. Objectivo da Lei Florestal ------------------------------------------------------- 101

8.3. Acesso dos particulares aos recursos do domínio florestal ------------ 102

8.3.1. Área de floresta sob regime de protecção -------------------------- 102

8.3.2. Área florestal sob regime de produção ------------------------------- 104


8.3.2.1. O aproveitamento comercial de madeira ------------------- 105
8.3.2.2. O arroteamento --------------------------------------------------- 106
199
8.3.3. Florestas comunitárias --------------------------------------------------- 108
8.4. Medidas preventivas e repressivas ------------------------------------------- 108

9. O uso do solo no Projecto de Lei de Bases do Ambiente e nos seus


instrumentos de execução (AIA) ------------------------------------------------- 110
9.1. Considerações introdutórias ---------------------------------------------------- 110
9.2. Concepções legais do ambiente ----------------------------------------------- 110

9.3. Princípios do Direito do Ambiente ----------------------------------------- 112


9.3.1. Princípio da prevenção --------------------------------------------------- 113
9.3.2. Princípio da precaução --------------------------------------------------- 113
9.3.3. Princípio do poluidor pagador ------------------------------------------ 114
9.3.4. Princípio da integração --------------------------------------------------- 114
9.3.5. Princípio da participação ------------------------------------------------ 115
9.3.6. Princípio da cooperação ------------------------------------------------- 115

9.4. Tutela preventiva do ambiente ---------------------------------------------- 115


9.4.1. Avaliação de impacte Ambiental --------------------------------------- 117
9.4.1.1. Considerações prévias ------------------------------------------ 117
9.4.1.2. Objecto da avaliação de impacte ambiental --------------- 118
9.4.1.3. Procedimento de AIA -------------------------------------------- 119
9.4.1.4. Força jurídica do resultado da AIA --------------------------- 121
9.4.1.4.1. Força jurídica da Declaração de Conformidade
Ambiental ---------------------------------------------------------- 121
9.4.1.4.2. Força jurídica do Certificado de Conformidade
Ambiental ---------------------------------------------------------- 122
9.4.1.5. Conteúdo do estudo de impacte ambiental ---------------- 123
9.4.2. Licenciamento ambiental ------------------------------------------------ 123

9.5. Tutela repressiva ----------------------------------------------------------------- 126


9.5.1. Responsabilidade penal ------------------------------------------------- 126
9.5.2. Responsabilidade contravencional ------------------------------------ 127
200
9.5.3. Responsabilidade civil ---------------------------------------------------- 128

9.6. O uso do solo na Lei-Quadro das Áreas Protegidas e nos seus


instrumentos de aplicação --------------------------------------------------- 129
9.6.1. As áreas protegidas: considerações introdutórias ---------------- 129
9.6.2. As principais áreas protegidas da Guiné-Bissau e as respectivas
importâncias para a gestão dos recursos naturais ------------------ 133
9.6.2.1. Parque Nacional do Grupo de Ilhas de Orango (Parque de
Orango) ------------------------------------------------------------------ 133
9.6.2.2. Parque Nacional Marinho João Vieira Poilão (Parque João
Vieira Poilão) ------------------------------------------------------------ 135
9.6.2.3. Área Marinha Protegida Comunitária das Ilhas de Formosa,
Nago Chediã (Ilha Urok) --------------------------------------------- 137
9.6.2.4. Parque Natural dos Tarrafes do Rio Cacheu (Parque de
Cacheu) ------------------------------------------------------------------ 139
9.6.2.5. Parque Natural das Lagoas de Cufada (Parque de Cufada)
------------------------------------------------------------------------------ 140
9.6.2.6. Parque Nacional de Cantanhez ------------------------------- 142
9.6.3. A gestão dos recursos: “park for people and with people” ------ 144
9.6.4. O acesso aos recursos nas áreas protegidas ---------------------- 147

10. Os planos urbanísticos e a gestão do solo ---------------------------------- 153


10.1. Considerações prévias --------------------------------------------------- 153
10.2. O novo limite da cidade de Bissau ------------------------------------ 154
10.3. Regulamento do Plano Geral Urbanístico de Bissau ------------- 155
10.4. Regulamento Geral de Construção e Habitação Urbana ------- 158

11. O uso do solo no Código Civil ---------------------------------------------------- 160

12. Os solos marítimos ------------------------------------------------------------------- 169


12.1. O regime da faixa costeira ---------------------------------------------- 171
12.2. As Águas Interiores: noção, limites, titularidade de direito sobre os
recursos e acesso aos recursos ----------------------------------------------- 172
201
12.3. O Mar Territorial: noção, limites, titularidade de direito sobre os
recursos e acesso aos recursos ----------------------------------------------- 173
12.4. A Plataforma Continental: noção, limites, titularidade de direito
sobre os recursos e acesso aos recursos ---------------------------------- 175
12.5. As fronteiras marítimas da Guiné-Bissau ---------------------------- 177

13. A gestão do solo no Direito Comunitário, em especial no Código


Mineiro Comunitário ----------------------------------------------------------------- 182
13.1. Considerações de enquadramento e âmbito de aplicação do CMC
------------------------------------------------------------------------------------------ 182
13.2. Garantias jurídicas reconhecidas aos titulares dos títulos mineiros
------------------------------------------------------------------------------------------ 185
13.3. Obrigações impostas aos titulares de títulos mineiros ----------- 187

CONCLUSÕES ------------------------------------------------------------------------------ 189

LEGISLAÇÕES INTERNAS CITADAS ------------------------------------------------ 192


LEGISLAÇÕES INTERNACIONAIS CITADAS -------------------------------------- 195
ÍNDICE ----------------------------------------------------------------------------------------- 197

202

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