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RELATÓRIO FINAL DE ATIVIDADES DO ESTUDANTE BOLSISTA E VOLUNTÁRIO DOS PROGRAMAS

PIBIC, PIBIC-AF, PIBITI E PIBIC-EM/CNPq - UFPE


(Refere-se às atividades realizadas no período de setembro de 2021 a agosto de 2022)

1. IDENTIFICAÇÃO

Nome do(a) Orientador(a): Karla Galvão Adrião


Nome do(a) Estudante: Larissa Barbagelata Cabral
Área do projeto: Psicologia Social
Título do projeto: Contextos de sociabilidade homossexual da Região
Metropolitana do Recife
Houve alteração do nome do
projeto original? Se sim,
acrescente aqui o nome do
projeto originalmente
aprovado
ID do projeto 210716738
ODS na qual projeto se insere

2. RESUMO

Este relatório final buscou elucidar as atividades realizadas no projeto “Contextos de


sociabilidade homossexual da Região Metropolitana do Recife”, que se vincula ao projeto
guarda-chuva “Contextos sociais, respostas programáticas e marcações subjetivas na
vulnerabilidade ao HIV/AIDS de homens que fazem sexo com homens da Região
Metropolitana do Recife”. De acordo com os objetivos, foram desenvolvidas investigações
que se concentram nas condutas sexuais de homens que fazem sexo com homens (HSH),
residentes na Região Metropolitana do Recife (RMR), com a finalidade de compreender os
diferentes contextos e vivências de interação homossexual em suas relações com a
vulnerabilidade ao HIV/AIDS. Além disso, é considerada a dimensão online da existência,
dada a relação da pesquisa com o contexto da pandemia do COVID-19, na qual o universo
online ganha força em sua relação com o universo off-line. Desse modo, foram realizadas
entrevistas com o intuito de apreender materiais correspondentes à identificação dos
informantes, homossociabilidade e às formas de prevenção ao HIV/AIDS. Por fim, as
informações obtidas através das entrevistas foram postas num quadro de análise para
melhor visualização das narrativas e, assim, os conteúdos evidentes no material puderam
ser analisados e correlacionados aos objetivos pertinentes a esta pesquisa.

3. INTRODUÇÃO

1
O Brasil vem, nos últimos anos, experimentando um aumento nos indicadores de
vulnerabilidade e risco para o HIV na população em geral, especialmente entre os homens
que fazem sexo com homens. Segundo dados do Programa Conjunto das Nações Unidas
sobre HIV/AIDS (UNAIDS), em 2019, o risco de contrair o HIV era 26 vezes superior para
homens gays e outros HSH do que para o resto da população adulta masculina (UNAIDS,
2021). Isso revela uma epidemia de múltiplas dimensões, relacionadas, principalmente, a
fatores estruturais, como estigma, discriminação e violência com base na orientação sexual e
identidade de gênero; e fatores políticos, como o conservadorismo e a criminalização do
comportamento sexual entre pessoas do mesmo sexo. Tais aspectos dificultam a
disponibilidade e o acesso às informações sobre o HIV/AIDS e a adoção aos serviços de
prevenção, testagem, tratamento e cuidados (UNAIDS, 2021). Além disso, a alta prevalência
da infecção entre os HSH pode estar relacionada aos novos comportamentos sexuais
(QUEIROZ, 2017), estimulados por aplicativos de namoro, que facilitam o ato sexual
ocasional e permitem a possibilidade de um maior número de parceiros, com os quais, na
maioria das vezes, as pessoas fazem sexo sem proteção.
A epidemia da infecção pelo HIV e da AIDS constitui um fenômeno dinâmico, instável
e complexo, configurando-se como um verdadeiro mosaico de sub-epidemias regionais, que
espelha as desigualdades socioeconômicas encontradas no território brasileiro. Dessa forma,
ainda que haja registro de ocorrência de casos em quase todo o território nacional, a
distribuição da AIDS não mostra-se homogênea quanto às regiões de residência, sexo, idade,
grau de escolaridade nem no que se refere às categorias de transmissão (BRITO; CASTILHO;
SZWARCWALD, 2001). Nesse sentido, segundo pesquisa encomendada pelo Ministério da
Saúde, de 2006 a 2015 as taxas de AIDS nas regiões Norte e Nordeste - as mais pobres do
país - apresentaram um aumento de 36,6% e 61,1%, respectivamente. Nesse mesmo
período de tempo, os casos de AIDS em HSH aumentaram de 35,5% para 46,2%, em
comparação com todas as categorias de casos de AIDS relatados entre os homens (KERR et
al, 2018). Ainda, estudo brasileiro realizado com HSH em 2016 mostrou uma prevalência do
HIV de 18,4%. No Recife, a prevalência saltou de 5,3%, em estudo realizado em 2003, para
21,5% (KERR et al, 2013; KERR et al, 2018). Dessa forma, os dados sinalizam um considerável
e preocupante avanço da epidemia entre homens com práticas homossexuais (KERR et al,
2013; KERR et al, 2018).
Para operacionalizar uma análise de vulnerabilidade ao HIV e outras ISTs,
pesquisadores têm ressaltado a importância de compreender a sinergia entre dimensões
sociais (relações de poder engendradas por marcadores sociais, como classe, idade/geração,
raça/etnia, sexo/gênero etc.), programáticas (respostas governamentais à epidemia) e
subjetivas (identidades, conhecimento, capacidades pessoais e emoções) que confluem para
tornar pessoas e grupos mais suscetíveis aos agravos (AYRES et al, 2003; PAIVA. 2008;
AYRES, PAIVA e FRANÇA JUNIOR, 2010).
Destacando os aspectos subjetivos da vulnerabilidade, compreendemos os corpos
como territórios das experiências subjetivas (CSORDAS, 2008; RIOS, 2013), onde se
inscrevem os marcadores sociais de diferença (idade, raça/cor, renda, classe, sexo/gênero,
sexualidade, estado de saúde, etc.). Para aprendê-los utilizamos a noção de estilização
corporal (BUTLER, 1990), buscando identificar os processos de posicionamento e significação
que os marcadores realizam. Segundo Rios (2008), compreender como os grupos dão
sentido aos acontecimentos corporais pode oferecer subsídios para construir estratégias em
respostas a diferentes agravos sociais, em especial àqueles fortemente marcados por
processos de estigmatização.
Moutinho (2006) discute a dinâmica dos afetos e prazeres de jovens homossexuais

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negros cariocas, moradores de favelas e do subúrbio a partir de marcadores de raça, classe,
gênero e território. A autora sugere que estes jovens homossexuais possuem um "campo de
possibilidades” afetivo-sexuais mais amplo do que os de rapazes e moças heterossexuais, e
mesmo de lésbicas e travestis, que habitam aquelas áreas, podendo percorrer e ultrapassar,
na dinâmica erótica que estabelecem, as linhas de classe/raça/gênero do Rio de Janeiro.
Pesquisas sobre homossexualidade masculina no Brasil têm constantemente buscado
estabelecimentos comerciais voltados para a população gay (boates, bares, saunas, etc)
como locus investigativo ou onde homens são acessados para participação das pesquisas
(PERLONGHER, 1987; MONTEIRO et al., 2010; SIMÕES, FRANÇA E MACEDO, 2010; FRANÇA,
2013; MOUTINHO, 2006; RIOS, 2018). Nesse sentido, a literatura clássica tem apontado para
a emergência de territórios de homossociabilidade nos centros das grandes cidades, locais
mais impessoais, e que à noite possibilitam maior anonimato para os transeuntes
(PERLONGHER, 1987; PARKER, 1991); ou, com o advento da internet, nos aplicativos e sites
de bate-papo ou de busca de parceiros (RIOS, 2018). Buscam ainda, se encontrar em
coletivos sexodissidentes, a partir de elementos artísticos, tais como performances, escritas
literárias e artes plásticas, fomentando festas e encontros onde a segurança entre pares é o
mote maior, além de uma crítica a um modelo capitalista dominante. A partir dessa crítica,
constroem, nestes espaços, possibilidades de trocas financeiro-ético-estéticas (MEIRA;
ADRIÃO, 2020).
Em relação à formação de grupos de amigos, Rios (2008) mostra a importância das
amizades para a ressignificação do estigma da homossexualidade e para a aquisição das
competências necessárias (conhecer os códigos) para interagir na comunidade homossexual.
Neste trabalho, são apresentadas análises e interpretações de narrativas
relacionadas aos espaços de homossociabilidade na Região Metropolitana do Recife, a partir
da fala dos informantes, buscando relacioná-las aos processos de produção de lugares e do
senso de pertencimento. A partir da investigação das redes de sociabilidade e vivências de
HSH, objetivamos compreender suas organizações e dinâmicas em relação às
vulnerabilidades relacionadas ao HIV.

4. OBJETIVOS

O objetivo geral do projeto é analisar os diferentes contextos e vivências de


interação homossexual em suas relações com a vulnerabilidade ao HIV/AIDS. Os objetivos
específicos são: 1) Mapear territórios offline e online frequentados pelo HSH residentes na
RMR; 2) Descrever densamente os espaços de homossociabilidade, em particular circuitos
alternativos de festas sexodissidentes; 3) Identificar se/como os marcadores sociais de
classe, raça, gênero, conformação corporal e idade produzem modalidades de inserção nas
dinâmicas dos espaços por onde transitam os HSH; e, por fim, 4) Identificar como as
dinâmicas identificadas podem ser protetivas ou vulnerabilizantes para a infecção pelo HIV.

5. METODOLOGIA

O plano de trabalho, que partiu de uma perspectiva etnográfica, previu treinamento;


revisão da literatura; ajuste nos instrumentos de pesquisa; observação participante online e
off-line (dentro das possibilidades que a pandemia da Covid-19 permitir), nos espaços de
homossociabilidade da Região Metropolitana do Recife; realização de entrevistas em
profundidade com os HSH; e, por fim, transcrição, tratamento e análise das 38 entrevistas
que constavam no banco de dados da pesquisa.
A técnica da observação participante objetiva possibilitar uma Descrição Densa dos

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contextos de investigação (GEERTZ, 1987). Desde 2013 a equipe do núcleo de pesquisa ao
qual esse projeto está vinculado realiza observações em espaços de sociabilidade
homossexual da RMR. Assim, as observações foram iniciadas nos espaços já identificados,
ampliando as localidades pesquisadas de acordo com a própria dinâmica do campo.
Conforme apresentado no projeto ao qual o plano está vinculado, nosso plano de
observação focou nos seguintes tópicos: a) invisibilidade/visibilidade identitária das pessoas
na interface com os lugares públicos (parques, praças e praias) e privados (saunas, bares,
boates e festas sexodissidentes); b) as conexões entre sociabilidade homossexual e espaços
de comércio do erótico1 (bares, clubes, cinemas, saunas, festas sexodissidentes); c) as
interfaces entre sociabilidade on line e off line, suas especificidades interacionais; d) lugares
mais propícios para interações sexuais penetrativas, dinâmicas interacionais e sexo mais
seguro; e) presença de iniciativas de promoção à saúde e prevenção. As observações foram
realizadas entre setembro de 2021 e março de 2022 e foram registradas em diário de
campo.
Paralelamente às observações, foram realizadas entrevistas temáticas com enfoque
biográfico (foco na historicidade dos eventos). Estas entrevistas abordaram dois eixos: 1)
lugares de homossociabilidade e suas dinâmicas; 2) práticas soroadaptativas e novidades da
prevenção. Buscou-se garantir heterogeneidade de marcações dos entrevistados (sexo-
gênero, idade, classe social, escolaridade, religião e raça/cor). Até o final da execução do
projeto, o banco de dados da pesquisa contou com 38 entrevistas, das 40 previstas para
serem realizadas; as quais foram gravadas, transcritas e tabuladas no quadro analítico.
Embora trate de dois eixos temáticos, o foco de análise deste plano de trabalho esteve
voltado para o primeiro eixo (lugares de homossociabilidade e suas dinâmicas), enquanto o
segundo foi objeto de trabalho de outros integrantes da equipe.
A partir de uma leitura flutuante das entrevistas e tendo como norte os objetivos de
cada plano de trabalho de PIBIC, o coletivo de pesquisadores do LabESHU chegou a um
quadro temático, no qual cada bolsista adicionava fragmentos de entrevista em acordo com
as categorias. Dessa forma, a análise das entrevistas era precedida da leitura da transcrição
do áudio, identificando e destacando frases que pudessem ser classificadas de acordo com
os seguintes eixos temáticos que constituíam o quadro de análise: identificação do
informante; dados sociodemográficos/marcadores sociais; indicadores de classe; território;
sociabilidade; estilizações; sexualidade; uso da camisinha; e outras medidas de prevenção.
A partir do quadro de análise foi possível que cada integrante do laboratório pudesse
visualizar verticalmente as informações dos marcadores equivalentes ao campo de pesquisa
individual. Assim, a análise dos dados obtidos nas entrevistas, fundamentada na dupla
hermenêutica (GIDDENS, 1984) e análise temática de conteúdo (BLANCHET; GOTMAN,
1992), se baseou em identificar recorrências e atribuir elementos que possibilitaram a
compreensão de similaridades e diferenças identificadas a partir dos fragmentos narrativos
transpostos para o quadro de análise. Foram estabelecidas, então, conexões entre os
espaços de homossociabilidade, marcadores sociais e dinâmicas protetivas ou
vulnerabilizantes para a infecção pelo HIV, de acordo com as narrativas apreendidas a partir
dos campos do quadro de análise que são do interesse desta pesquisa.

6. APRESENTAÇÃO E DISCUSSÃO OBJETIVA DOS RESULTADOS OBTIDOS

O primeiro esforço analítico a partir das 38 entrevistas coletadas pela equipe


resultou numa tentativa inicial de descrever os espaços de homossociabilidade, em
particular circuitos alternativos de festas sexodissidentes; identificar se/como os marcadores
sociais de classe, raça, gênero, conformação corporal e idade produzem modalidades de

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inserção nas dinâmicas dos espaços por onde transitam os homens que fazem sexo com
homens; e relacionar tais contextos e vivências de interação à vulnerabilidade ao HIV/AIDS.
Convém destacar, ainda, que o contexto de realização da pesquisa foi atravessado pela
pandemia da COVID-19, principalmente entre o início dos anos de 2020 e 2021, período no
qual as festas e outros circuitos de sociabilidade ficaram suspensos, a fim de conter a
disseminação do vírus. Dessa forma, um dos eixos de análise desta pesquisa relaciona-se à
dimensão online da existência e aos espaços de sociabilidade online frequentados pelos HSH.
O trabalho desta pesquisa está direcionado para a análise, principalmente, do eixo
Território, focando nos espaços e na sociabilidade. Dessa forma, serão analisados os
fragmentos narrativos das categorias de entrada nos territórios gays; mudanças percebidas
(território e sociabilidade); onde vai para se divertir e onde procura parceiros; referência à
cidade/bairro de residência; relação de espaços com violência; classificação dos espaços
gays; opinião sobre os espaços gays; opinião sobre espaços “héteros”; dimensão online da
existência; e saunas, banheirões, parques e afins. Há um esforço analítico, ainda,
direcionado para o eixo de Estilizações, voltado para Estilizações de Saúde/Doença, onde
analisaremos a opinião dos informantes sobre o espaço de homossociabilidade relacionadas
às ISTs. Por fim, veremos que analisar os espaços de sociabilidade e as relações com a
vulnerabilidade ao HIV/AIDS é insuficiente, se não levarmos em consideração os dados
sociodemográficos e marcadores sociais; entendendo e reconhecendo a importância e
relação que possui a categoria classe social com as possibilidades que esta pode oferecer ao
modo de vida e contextos de sociabilidade. Ou seja, é necessário reunir diferentes campos
de análise, sejam eles de território e espaços, atribuição financeira ou estilizações, para
assim compreender os diferentes contextos e vivências de interação homossexual em suas
relações com a vulnerabilidade ao HIV/AIDS.
A partir da análise dos dados de identificação e marcadores sociais dos 38
informantes foi possível estabelecer alguns perfis: as idades variaram entre vinte a trinta e
oito anos, o que corresponde a um público de jovens adultos e adultos. No que diz respeito
à identidade sexual referida pelo próprio informante, vinte e três se disseram gays; dois se
disseram homens; três disseram ser homens cis; quatro se disseram bissexuais; um se disse
bicha, um masculina e um fluido. No que se refere aos estilos de gênero, as pintosas estão
entre a maioria dos entrevistados: quinze deles. Ressalto que a categoria pintosa, aquela
que abarca características socialmente reconhecidas no que se refere ao feminino, são
homens vistos como afeminados, as chamadas “bichas”, que estilizam e performatizam o
gênero de forma “extremamente feminina”. Já na categoria referente aos boys, aqueles que
se portam de acordo com a masculinidade hegemônica, ainda que se identifiquem enquanto
homem homossexual, temos onze entre os informantes.
Ainda segundo os dados do quadro de análise, a raça dos informantes é
predominantemente negra, incluindo pretos (dez) e pardos (quinze). Há apenas treze
informantes que se reconheceram enquanto brancos. Já o estado civil, por sua vez,
prevalece o status de solteiro. Apenas cinco informantes relatam estar namorando,
enquanto outros três informam estar coabitando com o parceiro. A maior parte dos
informantes residem com familiares, variando entre dois a doze o número de pessoas que
residem na mesma casa; e somente três entrevistados relataram morar sozinhos.
Além disso, os entrevistados apresentam diferentes níveis de escolaridade, o que
varia entre ensino médio concluído a nível superior. Seis dos informantes possuem ensino
médio completo; vinte apresentam superior incompleto; onze informantes são graduados
(ensino superior completo), estando um deles na pós-graduação; e somente um
entrevistado afirmou possuir formação técnica.
A renda individual não é informada por dez de um total de trinta e oito informantes,

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uma vez que não há obrigatoriedade por parte do entrevistado em responder a todos os
questionamentos que lhe são feitos. No que diz respeito aos demais, dois relatam ganhar
menos que ½ salário; três aproximadamente meio salário; onze no entorno de um salário,
dez no entorno de dois salários; e dois com aproximadamente quatro salários.
Já a renda familiar variou entre um a dez salários mínimos, sendo que sete dos
entrevistados não quiseram ou não sabiam informá-la. Cinco mencionam renda de um
salário e um salário e dois; outros cinco de cinco salários, mais cinco falam em seis salários e
meio e sete salários e meio; e dois em torno de dez salários. Vale também informar que o
número de integrantes da residência variou de duas a doze pessoas, sendo que quatro
respondentes não quiseram informar esse dado.
Assim, ao cruzar as informações presentes nos eixos de Território e Marcadores
Sociais que estão no quadro de análise, observamos que a circulação de HSH por locais de
lazer aciona diversas representações desses homens acerca de diferentes temáticas que
qualificam os espaços por eles frequentados. É possível apreender que frequentar
determinados espaços e a sociabilidade que existe neles se relaciona inicialmente com renda
e idade, com implicações de “gosto”, entendido como aquilo que dá prazer. Na fala de John
(23, homem gay, pintosa, pardo, solteiro), por exemplo, podemos notar a referência ao
marcador social de idade:

"Atualmente eu tô frequentando muito a Terça do Vinil, mas é só


porque eu gostei mesmo, me senti mais acolhido do que os outros
lugares na qual eu participava, e acho que pelo fato das pessoas
serem mais maduras, é totalmente um ambiente diferente que no bar
do céu, metrópole, essas coisas, por que o que eu to notando, é que
como eu tô com 23 anos atualmente, a maioria desses lugares que eu
frequentava: bar do céu, Miami, metrópole; são frequentadas por
crianças, que são aquelas pessoas de 18 anos que se descobriu agora,
que tá indo e fazendo volume, então quando se faz volume num lugar
desse, a chance de você tentar conversar com alguém, ou até mesmo
paquerar alguém são pequenas, pelo fato de serem, de você se sentir
meio ... que barrado, pelo fato de você ser mais velho do que aquelas
pessoas que estão frequentando. E também pela, como é o nome...
toxicidade de algumas gays em Recife."

A referência à idade é mencionada novamente na fala de outro informante, Rogério


(29 anos, pintosa, branco, solteiro, três salários), quando perguntado para onde vai para se
divertir:

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“Vou muito pra onde? Só o conchitas mesmo. [De barzinho? E o
Metrópole? Deixasse...] Não. Deixei de ir. Metrópole não faz mais
parte da … Porque a Metrópole era para o Rogério adolescente. O
Rogério iniciando. Hoje em dia eu sou outro Rogério neh. A gente tem
outras visões, outras perspectivas, e não combina muito o espaço
não.”

Como observado com as narrativas em destaque acima, John e Rogério, apesar das
suas especificidades, acionam as fases da vida; que, por sua vez, possuem interfaces com
profissão, renda e o que se procura em determinados lugares; como um elemento
determinante para suas escolhas.
Por outro lado, a renda, enquanto um marcador social analisado isoladamente, não
mostrou influência nas decisões de espaços a serem frequentados pelos informantes, como
exemplifica Johnny (22 anos, boy, negro, solteiro, três salários):

“Eu vou muito pra bar de posto, porque a bebida é barata e é um


ambiente legal. E eu também já fui pra uma sauna já. Já fui pra boate
gay, também, lá em Salvador. Mas o que eu mais gosto assim é ir pra
posto mesmo. (...)”

Johnny (22 anos) e Rogério (29 anos), ambos recebem três salários; mas, enquanto o
primeiro prefere bar de posto, o segundo prefere um bar gay. Certamente, o que se agrega à
identidade e o que se gasta para estar nos dois lugares é bem diferente. O Conchitas é um
bar direcionado às camadas médias1, onde o custo da bebida é bem maior que o do bar de
posto. Mas, o que parece diferenciar o gosto é menos a renda, mas outras dimensões
existenciais, como idade/geração, e, possivelmente, ocupação/profissão e escolaridade.
Sendo assim, Johnny, que possui ensino médio e é soldado do exército, tem preferência para
lugares distintos em relação a Rogério, graduado e professor de educação física. Johnny se
refere a ir em lugares gays (boate e sauna) fora da cidade de residência, na cidade busca por
um lugar mais “discreto” talvez por “combinar” melhor com o fato de ser soldado do
exército, uma ocupação em que estilizações hegemônicas de masculinidade são exigidas.
Bares em postos de gasolina parecem a melhor escolha2.
Nota-se, portanto, que diversos marcadores convergem para determinar as
preferências por espaços a serem frequentados pelos HSH na região metropolitana. Assim, a
sociabilidade reúne faixa etária, renda, gostos, e até mesmo as estilizações na escolha de
espaços de lazer; classe e estilo de vida. Algumas narrativas acionam a estilização de gênero
enquanto marcador dos espaços de homossociabilidade, como a de Caio (22 anos, boy,
estudante de graduação, solteiro, renda familiar de dez salários mínimos):

“Hoje eu frequento pouco por falta de oportunidade mesmo, porque


hoje eu já penso diferente e já tenho outros posicionamentos sobre
muita coisa então meus amigos são muito quietos e não gostam muito
de festas. [Uhum... Mas e os espaços de lazer que tu frequenta tipo, a
casa dele?] A casa de amigos. E também meus amigos normalmente
são muito quietos, não gostam muito de festas, mas que eu
frequento…. é a casa de amigos… Também circular na cidade também
1O bar Conchitas localiza-se no circuito chamado “Vale das Ninfas”, localizado no bairro da Boa Vista, no centro do
Recife (RIOS et al, 2022)
2Trabalho realizado por Rios et al (2022), sobre os circuitos de sociabilidade de homens que fazem sexo com homens,
na Região Metropolitana do Recife, durante o primeiro ano da pandemia de COVID-19.

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é um pouco diferente né… então assim, Recife Antigo é um espaço
que a gente circula muito e tal, por questão de segurança e tal. E eu
me me acho hoje um pouco heteronormativo e tal, então para mim é
um pouco mais fácil de lidar com essas situações de espaços…[Quando
tu vai no antigo vocês ficam mais aonde?] Passeando, mas também
mais naquela parte perto do marco zero.”

Já Rogério (29 anos, pintosa, solteiro, três salários) relata:

“[É, tu pode me dizer quais são os lugares que tu frequentas


atualmente? Desses espaços homossexuais?] Desses lugares? É, eu já
não considero como espaço só homossexual, considero como espaços
alternativos neh. Porque hoje em dia não tem mais essa questão de só
espaço homossexual, neh. [Hum.] É eu vou muito para o Conchitas.
[Hum.] Vou muito pra onde? Só o Conchitas mesmo. [De barzinho? E o
Metrópole? Deixasse…] Não. Deixei de ir.”

Outras narrativas mencionam novamente a questão da estilização do gênero, mas


abordando espaços alternativos e coletivos sexodissidentes como locais de sociabilidade,
enquanto fomentadores de encontros que permitem trocas político-estéticas. É o caso, por
exemplo, de Túlio (20, gay, pintosa, branco, renda familiar superior a quatro salários
mínimos):

“[Além desses lugares que você citou, você frequenta outros lugares
em que há a presença de pessoas com práticas homossexuais? ] Eu
acho que só tem três espaços que de fato tem essa vivência que são
nos dois grupos de dança que eu participo, um é o Lahn, que é aqui
em Aldeia mesmo, e o outro é o Perna de Palco, que hoje em dia não
tem um lugar fixo por conta da pandemia, mas geralmente acontece
em Recife. Aí sempre tem e também tem os meus colegas que são
homossexuais e também na faculdade, tanto na minha sala quanto no
próprio ambiente do campus mesmo.”

Tarcísio (24, pintosa, pardo, renda individual de um salário mínimo, renda familiar
superior a três salários mínimos e meio) também aponta em sua fala a busca por espaços
não-hegemônicos e que diferem dos bares e festas:

“[Tu poderia falar um pouco sobre os lugares que tu frequenta


atualmente e o que acontece nesses lugares?] Certo… Bom, é,
recentemente fiz a descoberta de um espaço LGBT que é um espaço
de beleza, de estética, que é Isa Barbeira, que lá é um espaço voltado
pra comunidade LGBT, a priori né, assim, que recebe a gente de uma
forma bastante agradável, que lá é onde você pode cortar o cabelo,
fazer penteados…Então ela é uma barbeira que acolhe assim essas
pessoas LGBT pra [?], porque muitas vezes as pessoas não se sentem
confortáveis em um ambiente heteronormativo pra fazer coisas
básicas como cortar o cabelo, fazer as unhas… essas coisas, sabe? [E lá
dá pra paquerar, dá pra fazer alguma coisa?] Ah, com certeza né,
porque eu acompanhando pelo Instagram as pessoas que cortam os

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cabelos lá, a gente vê “meu Deus!”, pergunta no story quem é… então
acaba sendo por consequência um ambiente de paquera, ali mesmo
sendo uma barbearia por exemplo, como um espaço LGBT.”

Apesar da diferença de idade, raça e locais frequentados para se divertir, é possível


notar tanto na fala de Túlio, quanto na fala de Tarcísio, o marcador da estilização de gênero
e a preferência por espaços que, ainda que não sejam destinados para festas e paquera
(como no caso da barbearia citada por Tarcísio), fomentam encontros que prezam pela
segurança dos frequentadores e permitem a identificação entre os pares.
Outro aspecto importante a ser analisado nos discursos dos informantes diz respeito
aos impactos da pandemia da COVID-19 nos espaços de homossociabilidade. Nesse sentido,
a necessidade de isolamento social para conter o avanço da pandemia e a disseminação do
vírus, no início do ano 2020, acarretaram na mudança dos espaços de sociabilidade offline
para o contexto online.
O espaço offline antes, já era descrito nas narrativas de alguns informantes como
forma de entrada nos territórios gays, como no caso de Júlio (30, pintosa, branco, renda
familiar superior a 7 salários mínimos):

“Pronto, meu primeiro contato realmente foi no bate-papo UOL, no


espaço (ininteligível), seria…foi o bate-papo UOL, porque antes não
havia o “Grindr”, ainda…é…e quando eu vi, ainda não tinha
smartphone, uma coisa assim; eu não peguei o início do Grindr, apesar
de ter muita curiosidade.”

E, ainda, como forma de buscar parceiros, por meio de aplicativos de namoro, como
menciona a fala de Alisson (28 anos, urso, branco, solteiro), ao ser perguntado sobre o lugar
que utilizava para pegação; o meio utilizado para encontrar alguém: “Deixa eu vê, visse?
Vamos lá! O que tava sendo o mais frequente é o Grindr, né?”.
No entanto, com o avanço da pandemia, as interações online tornaram-se ainda mais
frequentes, como relata Alan (28 anos, boy, preto, solteiro), quando perguntado sobre
espaços para a busca de parceiros durante o período de isolamento social:

“Rapaz! Eu não tenho ido mais para esses lugares, eu acho que... eu
tô tendo que fazer minhas interações on-line, assim... (Risos). [Pronto.
É isso também] Pronto. Eu tô fazendo minhas interações em grupos,
em sites de... aplicativos de relacionamento, aí a pessoa conversa,
marca de se encontrar, de se conhecer, e pode acontecer, depois, algo
mais. [Entendi. Quais são os aplicativos que tu tens usado?] Eu uso
Tinder, eu uso Grindr, eu uso Badoo e eu uso o Dating do Facebook,
que é o namoro do Facebook.”

Nota-se, nesse sentido, que os aplicativos de relacionamento configuram-se


enquanto espaços de homossociabilidade, seja para a busca de parceiros, seja para
interações sociais de forma geral: dos 38 entrevistados, apenas um afirmou não fazer uso de
aplicativos de relacionamento; 37 informantes disseram utilizar ou já ter utilizado algum
aplicativo ou site de relacionamento. Entre os recursos online mais utilizados, destacam-se
na narrativa dos informantes: Tinder, Grindr, Happn, Scruff e Badoo. Outros informantes
afirmam fazer uso das redes sociais, como Facebook, Instagram, Twitter e Whatsapp para

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buscar parceiros ou interações sociais.
É importante notar, ainda, que por configurar-se como espaços de
homossociabilidade, podemos encontrar novamente os marcadores sociais mencionados no
início deste tópico, principalmente no que diz respeito à estilização de gênero e
conformação corporal. Júlio (30 anos, bissexual, branco, solteiro), por exemplo, ao falar
sobre a forma como as interações ocorrem nesse meio virtual, cita o termo “império do
corpo padrão”:

“Pronto. Então, eu iniciaria com…dizendo que o conceito de corpo


padrão, ele é difuso; ou seja, pra algumas pessoas pode ser um
espectro, pra outras pessoas pode ser outro espectro. Aí, por
exemplo, no Grindr, eu não acho que há um império de corpos
padrão, digamos assim. Eu já falei com pessoas de todos os corpos,
vivências e expectativas diferentes possíveis, assim; e eu sinto que no
Grindr tem mais margem para negociar…e, realmente, você tá ali no
seu espaço, você…você tem a sua privacidade…por exemplo, se você
quiser proteger a foto, você pode; é…se você não quiser mostrar seu
rosto, você não mostra, enfim. Tem uma coisa chamada encontro às
cegas, que eu não faço, mas tem gente que propõe; tem gente que
não manda foto de rosto de jeito nenhum, só pessoalmente; é…e o
Grindr é muito transacional né, você…é isso em troca disso; você troca
foto…é, enfim…“eu moro aqui, você mora onde?”...entendeu? É
muito…é lá e cá; se o (ininteligível) fica muito material, a coisa já não
vinga.”

Esses espaços online de homossociabilidade guardam outras características em


relação à dimensão offline da existência, como o fato de serem fomentadores da formação
de uma identidade, a partir do reconhecimento de estilos de vida e gostos em comum.
Nesse sentido, a fala de Adalberto (25 anos, gay, pintosa, pardo, namorando) exemplifica
essa característica dos espaços on-line:

"[Entendi. Certo. O grupo que tu fala é de Whatsapp?] Whatsapp. [aí


tipo é um grupo de conhecidos? Como é?] Não. É um grupo de,
homossexual de Recife, todos os bairros. [Entendi. Aí, vocês discutem
o que nesse grupo?] Muito é questão de encontro [hum] ta, de festas
quando vai ocorrer em casa de show. Fala muito sobre isso, encontro
pra novas amizades. [Rola paquera nesse grupo?] Tem, rola também.”

Cláudio (32, boy, pardo, namorando) fala mais um pouco sobre a questão das
interações nesses aplicativos de namoro e como elas costumam ocorrer:

“É! O Grindr é mais famoso, a diferença do Grindr e do Scruff é que o


Scruff você tem um acervo de fotos que você pode salvar e liberar
para as pessoas, e o Grindr tem aquela foto de perfil que você, tipo,
eu tenho vários perfis na minha tela e aí eu escolho um, pelas
características que as pessoas colocam, ou não, e a gente conversa,
vai trocando fotos etc. O Scruff, ele já tem mais abrangência porque
ele não tem essa versão paga, pra você ter acesso a mais perfis, pra
você ter acesso a mais fotos daquela pessoa, aquela pessoa pode

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liberar uma parte de fotos para você. Então, esses aplicativos eles são
mais sexuais, não é feito o Tinder que é mais para conversar e marcar
encontro. Eles são mais, tipo: - “Oi, você é ativo ou passivo, vamo
transar que horas?” É basicamente isso, os dois aplicativos, a
finalidade dos dois é o mesmo: o sexo.”

O aspecto descrito pelo informante Cláudio anteriormente está relacionado ao uso


dos aplicativos de relacionamento e a facilidade para encontrar parceiros, facilitando o sexo
casual. Isso, entretanto, pode ser considerado um fator de vulnerabilidade à infecção pelo
HIV. Nesse sentido, Wellington (21, pintosa, preto, solteiro) traz a seguinte fala, quando
perguntado sobre o uso de aplicativos e sites de relacionamento:

[Certo. É, tu usa aplicativo ou algo desse tipo?] Eu usava bastante, só


que como eu te disse, quando eu me formei em fazer técnico de
enfermagem, comecei a me abranger mais sobre essa área, eu vi que
é muita doença sexualmente transmissível, mulher [P: Hum]. E: E eu
não queria interrompido [Tu usava quais?] Eu usava mais o Grindr. Eu
nunca usei o Tinder muito não. Usei o Tinder uma vez só, fui ficar com
o cara, o cara foi um babaca comigo, aí eu não quis mais. Mas o Grindr
eu usava bastante. Mas me desliguei mais por causa da doença e tal.
Eu não queria ser só mais um com AIDS por aí, entendesse? [Entendi.
É, então, digamos assim, tua forma de se prevenir contra doenças
sexualmente transmissíveis é deixar de ir a alguns locais? Tu tem
isso?] Humrum. Com certeza. Eu tenho medo. Eu fiquei com medo
mesmo, com paranóia mesmo de transar com qualquer pessoa. É
camisinha pra tudo que eu vou fazer." [Tu já participou também de
algum tipo de comunidade pra homossexuais?] Não. [Algo desse tipo?
Algum grupo de Facebbok, de Whatsapp?] Ah, de facebook já.”

Tomando como ponto de partida a fala de Wellington referida acima, é válido


considerar os aspectos relacionados ao aumento do uso de aplicativos e a proteção ou
vulnerabilidade ao HIV/AIDS. Nesse sentido, alguns informantes trouxeram nos seus
discursos um cuidado maior com a proteção durante as relações sexuais, decorrentes com
os cuidados para evitar a disseminação do Coronavírus, no auge da pandemia. Tarcísio (24,
pintosa, pardo, solteiro) afirma que a pandemia provocou mudanças no seu estilo de vida, o
que acarretou, consequentemente, em uma maior proteção à infecção pelo HIV:

“[Massa. E a pandemia, ela mudou alguma coisa, ela te impossibilitou


de sair de casa? Ou manteve mais respeito às normas?] Sim, com
certeza, antes da pandemia eu me considerava uma pessoa muito
mais ousada, sabe? Eu dava mais a cara pra me relacionar com
pessoas que eu conhecia a partir da internet ou através desses
espaços que eu citei. Sendo que com o advento né, do vírus, é… a
minha perspectiva de conhecer novas pessoas mudou, hoje em dia a
gente tem que manter uma maior cautela na questão de manter um
distanciamento social pra evitar o máximo a proliferação do vírus né, e
eu notei que eu passei a ser uma pessoa que buscava parceiros fixos
onde eu possa ter experiências mais seguras, sabe? Sem compartilhar
muito… sem me compartilhar muito com outras pessoas, sabe? Como
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eu já cheguei a fazer muito antes da pandemia.”

Por fim, ainda em relação à opinião sobre o espaço de homossociabilidade


relacionadas às ISTs, podemos identificar que os espaços de sociabilidade configuram-se,
muitas vezes, como vulnerabilizantes à infecção pelo HIV, pela facilidade para encontrar
parceiros e ter relações sexuais casuais. Se considerarmos, no entanto, a profilaxia e os
cuidados com a AIDS e outras ISTs nos espaços offline, como festas e saunas, há a facilidade
de acesso aos meios de proteção sexual, cabendo aos indivíduos decidirem se irão ou não
fazer uso das camisinhas e lubrificantes. Nesse sentido, Cláudio (32, boy, pardo,
namorando), quando perguntado sobre como vê a questão da profilaxia às DSTs nesses
lugares, afirma:

“Então, na Sauna, tudo é opcional, na verdade, todas as pessoas elas


têm a consciência, hoje em dia não tem nem como não ter consciência
de que tem que usar preservativo, né? Porque não é só o HIV, tem
inúmeras outras doenças, né? Tem sífilis, hepatite, tem tantas coisas
que são transmitidas sexualmente, né? HPV, Gonorreia, etc.,
candidíase. E muitas doenças elas, pela falta da profilaxia. E elas são
opcionais, as pessoas elas conhecem as doenças, quando eu vejo uma
pessoa dizendo que não conhece eu acho que ela tá mentindo, porque
é inocência demais, sabe, que não tem doença. Eu acho que hoje em
dia, no mundo que estamos, não tem essa inocência muito não. E nos
lugares, na Metrópole tem festas, Dark Room, não sei o quê, o povo
sabe, festa Dark Room não, “festa Dark”. Tu já foi? [Não]. Pronto. Tem
essas festas Dark’s, que são ... festas Neon’s, você usa pulseiras
Neons, se você quiser você se pinta de Neon, você ... eles pedem mais
pra você ir de branco pra você jogar tinta pra brilhar, né? Na Boate.
Nessas festas, geralmente ... Na entrada da Metrópole tem uma caixa
com camisinhas pra quando você quiser sair de lá e ir pra algum lugar,
você se prevenir. E na Sauna também têm as caixas com camisinhas
lubrificantes, então, na entrada se você já quiser pegar, você pega
bota no bolso, e como é um ambiente pra sexo você usa se quiser.”

7. CONCLUSÕES

É importante assinalar que, para desenvolver compreensões sobre a interação e


dinâmica sexual entre homens, que fazem sexo com homens da RMR, foi percebida a
importância de obter dados que pudessem fomentar o entendimento de como e em que
medida as práticas e preferências sexuais são impelidas por marcadores sociais,
principalmente no que diz respeito à idade, estilização de gênero e estilo de vida.
Entretanto, o marcador de renda e classe social, por si só, não foi o único a atravessar as
escolhas na hora de estabelecerem relações com os espaços de sociabilidade.
Ainda em relação à estilização de gênero e conformação corporal enquanto fatores
de influência na preferência por espaços de interação social, é importante notar que os
coletivos artísticos têm ganhado força, por serem espaços que permitem trocas artísticas,
políticas, éticas e estéticas; fomentam a segurança daqueles que os frequentam; e permitem
a formação de identidades.
Outra conclusão a qual podemos chegar a partir dos esforços analíticos empregados

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nesta pesquisa diz respeito à força que os aplicativos de namoro ganharam nos últimos
tempos, principalmente após a pandemia da COVID-19. Esses espaços online têm sido
utilizados não só para buscar parceiros, mas também para interações sociais de forma geral
e sofrem as mesmas influências dos espaços offline, no que diz respeito aos marcadores
sociodemográficos.
Por fim, ao considerarmos os aspectos vulnerabilizantes ou protetivos à infecção
pelo HIV e outras ISTs, é válido ressaltar que a pandemia da COVID-19 intensificou as formas
de proteção individual: na tentativa de evitar a contaminação do novo coronavírus, alguns
HSH passaram a evitar relacionar-se com diferentes parceiros. Muitas vezes, o contato físico
durante a pandemia era feito até mesmo com máscara, ou sem o uso da mesma, na “hora
do tesão”. Em outros espaços de sociabilidade, como por exemplo, saunas e festas, a
proteção fica a cargo da escolha individual, já que esses espaços costumam oferecer
métodos de prevenção sexual masculinos.

8. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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factsheet-gay-men_pt>. Acesso em 15 set 2022.

9. ATIVIDADES PARALELAS DESENVOLVIDAS PELO ESTUDANTE

A bolsista foi discente do quinto período do curso de Bacharelado em Psicologia da


Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e cursou 02 disciplinas ofertadas pela
graduação: Ética e Direitos Humanos e Teoria e Técnica da Terapia Cognitivo-
Comportamental. Além disso, a discente realizou estágio obrigatório (Estágio de
Planejamento de Intervenção) na Policlínica e Maternidade Professor Barros Lima e um
estágio extracurricular na clínica Instituto do Autismo.

10. DIFICULDADES ENCONTRADAS NO DESENVOLVIMENTO DO PROJETO

A bolsista encontrou dificuldades na realização das entrevistas, previstas no plano de


trabalho da pesquisa, visto que iniciou as atividades no laboratório durante a execução das
etapas do projeto. Dessa forma, o fato da aluna ter sido integrada ao laboratório enquanto
as etapas da pesquisa estavam sendo conduzidas, assim como a falta de preparo para a
realização de algumas atividades, como a condução de entrevistas, constituiu uma
dificuldade encontrada.

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Data e assinatura do(a) orientador(a) Data e assinatura do(a) estudante

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