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Impacto social dos centros de acolhimentos LGBTQIA+ na cidade de Curitiba,

PR

Giuliana Mello Mencalha

RESUMO

Neste artigo, apresenta-se a explicação da sigla que faz referência à diversidade


LGBTQIA+, percorre a explicação histórica sobre o surgimento da cultura da
homofobia, constam relatos sobre a dificuldade na inserção social, apresenta as
histórias por trás das manifestações das lutas e conquistas nos direitos civis pela
comunidade, exibe as falhas no dimensionamento crítico dos planos e programas
governamentais no campo da segurança pública, voltados para a população
LGBTQIA+, exibe um mapeamento de informações dos casos de crime de
LGBTfobia de vítimas que buscam ajuda de instituições na cidade e a análise
geográfica de espacialidade de centros de acolhimento voltados à comunidade na
cidade de Curitiba.

Palavras-chave: Discriminação. Direitos. Acolhimento. População LGBTQIA+.


Curitiba.

1 INTRODUÇÃO

Ao decorrer dos anos, a sociedade ganha novas divisões de estilo de vida,


de tal forma que muitos não acompanham a velocidade que as gerações vão
moldando características para o seu bem-estar. A comunidade LGBTQIA+ vem se
redefinindo e se reclassificando, surgindo novas identidades e expressões no
vocabulário, do qual por sua vez causa dificuldades de entendimento em suas
distinções. (BAIOFF, 2018).
A sigla LGBTQIA+ é formada por lésbicas, gays, bissexuais, travestis,
transexuais, queer, intersexuais, assexuais, além de outras formas de manifestação
da identidade e expressão de gênero, bem como da orientação sexual (REIS, 2018).
A prefeitura de Curitiba em parceria com o Ministério dos Direitos Humanos,
desenvolve uma cartilha explicativa sobre a “Diversidade Sexual” que objetiva
compartilhar as definições de identidade de gênero e expressões que fazem
referência à diversidade dentro da comunidade. A Orientação sexual refere-se na
atração emocional e afetiva em relação a outra pessoa, podendo ou não ser do
mesmo gênero, são os bissexuais, assexuais, heterossexuais, homossexuais e
2

pansexuais. A Identidade de gênero é a percepção íntima que ela se identifica com


ela mesma, podendo se identificar sendo do gênero feminino, masculino ou de
alguma combinação dos dois, que pode ou não corresponder ao gênero biológico,
incluindo o conforto corporal (modificação da aparência física e cirúrgica) e outras
expressões de manifestações com vestimenta e modo de falar, à exemplo são os
transgênero, agênero, cisgênero, travesti, gênero fluído e gênero não binário.. A
Expressão de gênero, é a forma que a pessoa se apresenta ao público através de
caracterização de roupas, voz, cabelo, sendo assim a forma que ela gostaria de ser
vista e entendida, à exemplos: andrógeno, cross-dresser, drag-queen, queer, drag-
king. (CURITIBA, 2019).
A situação da população LGBTQIA+ é emblemática no sentido do elevado
grau de preconceito e violações de direitos condicionados pela marginalização da
cultura da discriminação (GIACOIA, 2014). A Constituição da República (BRASIL,
1988), prevê em seu artigo 3º, inciso IV, o incentivo do bem de todas as pessoas,
sem intolerância de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de
discriminação, esta cláusula é aberta a todo público. A LGBTIfobia é um crime na
qual há manifestação de violência, rejeição e ódio contra lésbicas, gays, bissexuais,
travestis, transexuais, intersexo e demais sexualidades não heteronormativas
(CURITIBA, 2019). Desde junho de 2019, o Supremo Tribunal Federal (STF)
reconhece as condutas de LGBTfobia como ato criminoso dentro da Constituição,
prevista no artigo 2º da Lei 7.716/1989. (BRASIL, 1988).
A disposição que a cidade oferece atividades de lazer e trabalho
favorece a integração da comunidade no meio social, visto que a locomoção e
a qualidade desse trajeto dizem respeito aos índices de oportunidades
profissionais. Não somente no âmbito profissional, mas a localidade que
dispõe de qualidade na infraestrutura promove maior segurança e bem-estar do
público frequentador (CALDEIRA, 2000).

2 JUSTIFICATIVA E OBJETIVOS

A capital Curitiba se torna um polo geográfico que mais gera empregos de


carteira assinada, facilitando a integração social e oportunidades de crescimento
profissional (CURITIBA, 2022). Mediante tamanha importância, a capital é procurada
para condicionamento de trabalho e abrigo residencial pelo público LGBTQIA+. O
3

desfalque pelo amparo à comunidade LGBTQIA+ vem causando o aumento nos


índices de violência e dificuldade de inserção social, não obstante, esse público se
torna vítima da criminalidade contra o desrespeito consequente da sua orientação
sexual (MELLO, 2014).
O trabalho visa com o objetivo geral, estudar a influência dos espaços e os
programas propostos dos centros de acolhimento voltados à comunidade LGBTQIA+
em Curitiba.
Ao dizer discriminação, devemos entender as vertentes por onde o
preconceito percorre. Como objetivo específico, a pesquisa procura explicar as
diversas situações de criminalidade com o público LGBTQIA+ imposta direta e
indiretamente pela sociedade, além de destacar a luta e conquistas por direito
constitucional.
Além disso, o estudo realizado juntamente com a instituições de apoio
cumpre a finalidade de expor a importância das atividades realizadas à comunidade,
exibir relatos de vítimas de homofobia, além de mapear o déficit de centros de
acolhimento na cidade de Curitiba.

3 MATERIAIS E MÉTODOS

Para atingir os objetivos propostos, foram realizados estudos em duas


etapas.
A primeira etapa constitui de leituras históricas de cunho psicológico e
religioso, para fins de entendimento a respeito do surgimento da discriminação por
orientação sexual. O texto se sustenta nos estudos do comportamento social que
Michel Foucalt exprime nas obras da História da sexualidade (1988). Tal etapa
fomenta na compreensão da simbologia cultural do preconceito implantado na
sociedade, os quais foram transcritos ao longo da história por médicos e vítimas.
A segunda etapa procede através de dados levantados juntamente com as
instituições Grupo Dignidade e Grupo Gay da Bahia, ONG’s sem fins lucrativos, que
defendem os direitos LGBTQIA+ no Brasil. As estatísticas referentes à cidade de
Curitiba, trazem relatos de vítimas que contribuíram para um maior entendimento de
como se mapeia a criminalidade na capital. Enfatiza-se que tais bases são de
4

trabalho autoral das instituições e não de ações governamentais, sendo assim, não
existem dados generalizados específicos da cidade de Curitiba.

4 REFERENCIAL TEÓRICO

4.1 ORIGEM DA DISCRIMINAÇÃO DE ORIENTAÇÃO SEXUAL

A infância é constituída por incontáveis sentidos cognitivos os quais servem


de base para formação da faculdade de personalidade do indivíduo. Esse estágio da
vida é marcado por uma educação básica que rege os padrões científicos da
natureza e política de implementação à sociedade (RIOS, 2002). A construção da
moralidade do indivíduo segue um arquétipo ditado pelo seu órgão reprodutor, onde
se convém dizer, que a ordem de nascimento inicia a forma que o indivíduo será
integrado à sociedade. O efeito do conjunto de significados desse postulado codifica
uma perspectiva que a educação básica parte de um modelo de ideias, símbolos e
interpretações regulados não somente biológico, mas sim sociocultural que
influencia a construção da personalidade (RIOS, 2002).
Rios (2002) menciona quando se há divergência imposta pela educação
básica, entendia-se que o indivíduo ia contra a doutrina. A identificação do gênero,
portanto, passava a ser assunto questionável e polêmico. Ao longo da história,
diversos grupos contribuíram para ênfase que a divergência seria vista como
contrariedade da natureza. Aos grupos religiosos, entendia-se que a relação sexual
entre o mesmo gênero era “fruto do pecado”. Uma cultura que surge a partir dos
fundamentos religiosos compreende que quaisquer discordâncias são “erradas
diante a Deus” (RIOS, 2002). A partir dessa teoria, a sociedade constrói uma série
de concepções julgadoras.
Cientificamente, os sentidos e desejos físicos que contrariavam o padrão
natural de gênero passaram a ser tratados como doença psíquica. O termo
“homossexualismo” surge no século XIX pelo médico austro-húngaro Karl M.
Kertbeny que dizia em 1869, que a homossexualidade seria um “mal social”
predominante nos grupos masculinos que viria de nascença e imutável (BEPPLER,
2006). Rios (2001) realiza em seu livro uma analogia na qual o filósofo D. Greenberg
se refere à homossexualidade como formação anatômica do sujeito em uma teoria
5

da degeneração no século XIX (GREENBERG, 1988, apud RIOS, 2001 p. 42). Na


obra de Sigmund Freud, o médico denota a má formação anatômica como a
capacidade de transformação da patologia física através do abuso mental (FREUD,
1913, apud. RIOS, 2002). 
A transexualidade origina antes do surgimento da palavra, o qual se dá pela
disjunção de gênero, o indivíduo se identifica com o gênero diferente de sua
nascença. A partir disso, o debate agrega não somente atração física, mas
identificação de personalidade e anseio por outra forma corporal (RIOS, 2002).
Tudo isso fomenta um conceito de relação sexual e identificação de gênero
como algo inaceitável, onde assim o indivíduo homossexual e transexual cria uma
rejeição com seus próprios desejos. Essa rejeição desencadeia um aumento de
suicídios e cresce a repercussão de anormalidade no princípio psíquico (RIOS,
2002). O behaviorismo1 como forma de tratamento médico, surge em clínicas de
tratamento de reorientação sexual ou “cura gay” com técnicas psicanalistas e
religiosas. No entanto, os pacientes eram expostos a intensos métodos abusivos
físicos e mentais, quando a eficácia do tratamento não era alcançada, muitos
pacientes cometiam suicídio pois de acordo com algumas crenças, estariam fadados
a cometerem pecados se seguissem seus desejos (PIMENTA, 2019).

4.2 ACEITAÇÃO ÍNTIMA

A forma que a sociedade priorizava a heteronormatividade e repudiava a


orientação de gênero gerava uma resistência para inserção do grupo ao coletivo.
Por anos, a cultura da rejeição privava o direito de um civil a exercer livremente suas
vontades e principalmente atividades remuneradas. Tal cominação causava o efeito
de repulsa de identidade no indivíduo, o qual associava sua imagem desfigurada de
anormalidade (USIEL, et al. 2011). Com a apropriação subjetiva dessas sentenças,
começava-se a sustentar a simbologia distorcida e negativa sobre ser homossexual

1
Teoria psicológica que objetiva estudar a psicologia através da observação do comportamento, com
embasamento em metodologia objetiva e científica fundamentada na comprovação experimental, e
não através de conceitos subjetivos e teóricos da mente como sensação, percepção, emoção e
sentimentos (PIMENTA, Tatiana, 2019).
6

ou transexual, e, consequentemente a orientação sexual despertava aversão interna


e o indivíduo entrava em quadro de crise moral (USIEL, et al. 2011).

4.3 VIOLÊNCIA
A perseguição contra os grupos minoritários comprova que a imparcialidade
se molda e gera um contexto agressivo a partir da divergência de opiniões. De
acordo com os registros realizados entre 2018 a 2020 pelo Grupo Gays da Bahia, o
Brasil teve 957 mortes motivados pela LGBTfobia, sendo pelo menos 20
homossexuais assassinados no Paraná em 2017 (GASTALDI, et al. 2020).
As práticas espaciais desses sujeitos também nos revelam o medo contido a
partir dessa imposição, portanto, o “estabelecimento dessa mesma conduta social
conta com o suporte de uma série de instituições e se traduz na perseguição e no
combate à diversidade sexual e de gênero” (ASSUNÇÃO, 2018, p. 55 apud.
GASTALDI, A.B.F et al.)

GRÁFICO 1 – NÚMERO DE MORTES DE LGBTQI+ POR ANO ENTRE 1990 A


2020.

FONTE: Acontece LGBTI+; Grupo gay da Bahia (2021).


7

Conforme análise do gráfico 01, de 2008 a 2020 os casos de mortes


cresceram de forma progressiva. São inúmeros os fatores que levam esse aumento
discrepante ao longo dos anos, sendo algum deles, aumento de grupos
conservadores de práticas de homofobia, suicídios e procedimentos cirúrgicos
ilegais.
Tais dados são considerados insuficientes ou hipotéticos, visto que há falta
de interesse governamentais em amparar a violência contra o grupo LGBTQIA+.
Programas criados como o Conselho Nacional de Combate à Discriminação (2001),
Programa Brasil sem Homofobia (2004), Conferência Nacional LGBT (2008), Plano
Nacional LGBT (2009), Processo Transexualizador no SUS (2013) entre outros,
sucedem através de manifestos da população em busca da equidade de gênero e a
luta contra a violência (CESAR; DUARTE, 2017, p. 145). A ineficácia nos planos de
segurança pública aponta o descompromisso da política pública do Estado com as
propostas no que diz respeito ao fornecimento de recursos, liberação de verba e
controle social. Em 2004, o Programa sem Homofobia promovia ações
insignificantes das quais não movia a frente do que a população exigia, e, de acordo
com a população eram consideradas “ações tímidas” do governo (MELLO L.,
AVELAR R.B, BRITO W. 2014).

Em nível de município, nós temos ações tímidas, como o Disque Cidadania,


que está precarizado, tá quase no esquecimento. É uma política que
funcionou bem no início, mas que agora tá muito precarizada. (MELLO L.,
AVELAR R.B, BRITO W. 2014).

Nos últimos três anos, o governo revoga as leis de direitos civis e


fortalece o poder teocrático no parlamento, e tal ação gera um efeito de retrocesso
na luta pela visibilidade e distende atos de discriminação pelo país (GASTALDI,
Alexandre, et al. 2020). O crescimento da prática de grupos conservadores, nascido
a partir da veneração partidária, preocupa toda a população que vem há anos
enfrentando o preconceito e a busca por direitos (RIOS, 2002). Os índices de
homofobia2 evidenciam que o motivo da rejeição social é desencadeado por uma
série de fatores que tangenciam não somente a da discriminação por gênero, mas
sim pela generalização da cultura da marginalização de caráter ético, dentre elas
2
Homofobia pode ser estendida para se referir a situações de preconceito, discriminação e
violência contra pessoas (homossexuais ou não) cujas performances e ou expressões de gênero
(gostos, estilos, comportamentos etc.) não se enquadram nos modelos hegemônicos postos por tais
normas. (Junqueira, 2007, p. 8-9, grifos no original)
8

injúrias raciais, por renda, por idade, por nacionalidade e etc (GASTALDI, Alexandre,
et al. 2020). GRÁFICO 2 e 3.
GRÁFICO 2- MORTES LGBTQI+ POR FAIXA ETÁRIA

FONTE: O Acontece LGBTI+; Grupo Gay da Bahia (2021). Adaptado pela autora (2022).

GRÁFICO 3 – MORTES LGBTQI+ POR RAÇA

FONTE: Acontece LGBTI+; Grupo Gay da Bahia (2021). Adaptado pela autora (2022).

Segundo os gráficos dentro desse grupo, jovens de 15 a 30 anos de


idade são as maiores vítimas e 54% dos assassinatos são de raça preto e pardo.

4.4 ACESSO AOS DIREITOS

A discriminação demonstra um conflito de poder capitalista o qual vende a


ideia de quem não atende à classificação normativa não tem valor (PORFÍRIO,
2020). No Brasil, a desigualdade social, racial e de gênero se torna um atributo às
lutas minoritárias a favor de respeito aos direitos civis, os quais afigurados por muito
tempo como uma população “marginalizado”. Em virtude da exclusão social, os
grupos sofrem dificuldade ao direito de acesso aos processos de participação
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política, social, profissional, acadêmica e familiar, assim como nos ambientes de


poder (SILVA, 2021).

A cidade historicamente se apresenta como espaço-tempo de realização da


exploração do trabalho e de inúmeras formas de opressão. Anunciada pela
classe dominante como espaço para todos os indivíduos, a realidade nos
mostra o inverso: a maioria da população se encontra submetida às
violações de direitos e modalidades de violência, que revelam que a cidade,
sob à égide do capital, se caracteriza pela falta de acesso com qualidade à
saúde, à educação, à segurança pública, à cultura, ao transporte e ao lazer.
(SILVA, A. L; SANTOS, S.M.M. 2016).

Datado como marco histórico, o dia 28 de junho é considerado o Dia


Internacional do orgulho LGBTQIA+ a partir da rebelião ocorrido em 1969 no bar de
Stonewall Inn em Nova Iorque. No dia, policiais abordaram violentamente
frequentadores no local que estavam saturados pela perseguição contra liberdade
de expressão. Tal rebelião tornou-se símbolo a favor dos direitos da visibilidade
afetiva. A partir de então, ocorre anualmente os eventos da Parada Gay como forma
de manifesto às lutas por conquistas de direitos de segurança, de integridade e
inserção social (GUEDES, 2021).
Os movimentos sociais discorrem o que pode ser chamado de ataque
positivo às frentes dos liberais modernos, seu objetivo é expandir os direitos,
liberdade, justiça e igualdade, e buscam medidas que compreendem os grupos
minoritários e alcançam os objetivos de forma mais eficaz. Para movimentos sociais
que enfatizam "a igual dignidade de todos os cidadãos" chamar a atenção para as
diferenças significa lutar pela expansão e "equalização de direitos" (TAYLOR, 1992,
Apud. CALDEIRA, 2000). Basicamente o objetivo é diminuir a discriminação em
termos de cidadania plena. Esses movimentos visam a vida pública e a comunidade
política onde os direitos de todos são igualmente respeitados, reduzindo assim a
desigualdade social.
Segundo Alexandre Frota, na justificativa da revogação da lei, ele defende a
participação de candidatos considerados LGBTQIA+ no espaço social, financeiro e
na política para campanhas eleitorais. Fundamentando a política de direitos, a
democracia representativa3 é feita para abrigar o conjunto de opiniões da população
3
As democracias representativas são regidas por constituições que estabelecem um Estado
Democrático de Direito. Nessas organizações políticas, todo cidadão é considerado igual perante a
lei, e todo ser humano é considerado cidadão. Não pode haver desrespeito à constituição, que é a
carta maior de direitos e deveres do país, e os cidadãos elegem representantes que vão legislar e
governar em seu nome, sendo representantes do poder popular nos poderes Executivo e Legislativo.
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como forma de governo, e pouco se vê exercer o acesso de direitos dentro da


câmara (FROTA, 2020).

Há 20 anos, houve uma visibilidade LGBT e um grande marco foi a criação


do Programa Brasil sem Homofobia, que possibilitou a criação de políticas
públicas, como centros de referência e delegacias especializadas no
combate a crimes contra pessoas LGBT. Em contrapartida, nos últimos
anos tivemos a reorganização de um setor muito preconceituoso, muito
homofóbico, que vem tentando questionar as políticas públicas em prol da
população LGBT, dizendo que elas são políticas de privilégios, quando na
verdade são de Direitos Humanos, diminuição dos índices de violência e
reparação social. É muito preocupante essa difamação de políticas públicas.
(FROTA, 2020. Pg. 3)

Ao passo que se fala em direitos iguais, há dificuldade no entendimento das


lutas dos grupos minoritários, pois tal julgamento errado implica levar a sociedade
acreditar que se trata de privilegiar um determinado coletivo. Enquanto houver essa
desinformação dos números de mortes, falta de apoio e intolerância, a comunidade
LGBTQIA+ aparentará inferiorizada e marginalizada perante a inclusão social. A falta
de representatividade no poder executivo desfalca em medidas contra o preconceito
e a violência do grupo (FROTA, 2020).
Num cenário atualizado, diversos direitos já foram conquistados e aprovados
legalmente na Constituição Federal. Dentre as aprovações, podemos citar o
reconhecimento de casamento entre pessoas do mesmo sexo no Brasil como
entidade familiar, por analogia à união estável, foi declarado aprovado pelo STF em
05 de maio de 2011. Em 14 de Maio de 2013, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ)
obriga todos os cartórios do país a registrar casamentos entre pessoas do mesmo
sexo (RODSTEIN, 2015).
Não existe conquista pelo direito da adoção de crianças no Brasil por casais
homossexuais. No entanto, há impasses regidos pela religião ou contraposições
psicológicas infantis que dificultam o sistema de adoção. O caput do art. 226 da
Constituição Federal diz: “A família, base da sociedade, tem especial proteção do
Estado”. Não havendo menção a respeito de quem compõe o âmbito familiar. Na
Constituição Federal não é explícito em nenhum diploma a necessidade de
diversidade de sexos para a consideração da composição familiar (LAURINDO,
2015).

(PORFÍRIO, Francisco. 2020).


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Dentre as mudanças na Constituição, devemos destacar o direito ao uso do


nome social, concedido no art. 58, da Lei n° 6.015/1973 pela Lei nº 9.708/98 em seu
art. 1º, admitindo a alteração do nome civil por um nome social de escolha
correspondente à identidade de gênero o qual a pessoa se identifica, sem haver
restrição associados aos documentos oficiais, tal ação promove a inclusão dos
grupos trans e reduz o desrespeito às diferenças sexuais na sociedade
(HOGEMANN, 2014, apud. SOUZA, 2019).

4.5 ESPAÇO PÚBLICO

O planejamento urbano, na teoria, são modelos das diversidades de


identidades da vida urbana, construídos a partir de suposições de conforto
satisfatório da população. Ao que tudo indica, na prática, não atingimos essa
subjetividade para integrar todas as comunidades, ao menos que os habitantes
enfrentem os desafios da vida na cidade. (BAUMAN, 2009). É paradoxal pensar no
grau de desenvolvimento de cidades tecnológicas e dizer que a cidade é feita para
todos, sendo que há contraposições e o espaço público se torna palco para
criminalidade e medo.
A partir do momento em que o espaço público da cidade corrobora com os
índices de mortes, visualizamos precariedade na infraestrutura de segurança na
cidade, o qual alimenta a ideia de abandono e marginalização (LIMA, 2015).
Mediante a falta de policiamento e degradação nos ambientes públicos, as ruas são
tão vulneráveis quanto ambientes privados, conforme Tabela 1.

TABELA 1 – LOCAL MORTE POPULAÇÃO LGBTQIA+


LOCAL DA MORTE QUANTITATIVO PERCENTUAL
Espaço público 132 60,82%
Residência 51 23,50%
Espaço privado 34 16,66%
TOTAL 217 100%
FONTE: O Acontece LGBTI+; Grupo Gay da Bahia (2021). Adaptado pela autora (2022).

Tais dados nos revelam que não há liberdade na atmosfera urbana. A


homofobia desenha a cidade e tem sob efeito regulamentar o modo como os corpos
circulam (CASSAL, 2019). As estatísticas do crime editam o modo de falar, como se
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vestir, quais horários podem performar e onde podem pisar, e ao fazer isso, combate
a desorganização da vida produzida pela experiência de ser vítima da violência. A
política de privatização do espaço surge como forma de conter os encontros casuais
capazes de proporcionar divergências e alternativas geradoras de impasse
(MACIEL, 2007).
Nas cidades, as barreiras de segurança pública estão enraizadas não
apenas nos discursos, mas também materialmente nos muros da cidade, nas ruas,
nas residências, e nas tecnologias de segurança (CALDEIRA, 2000).

4.6 CENTROS DE ACOLHIMENTO EM CURITIBA

Na região de Curitiba, são identificadas três instituições ativas, sem fins


lucrativos, com trabalhos voltados para o público LGBTQIA+, dentre os programas
das ONGs o tema representatividade política, centro de apoio psicológico e social,
pesquisas estatísticas, testes do HIV e das IST’s, ações de advocacy4 para políticas
públicas, e atividades culturais são um dos focos voltados à comunidade (GRUPO
DIGNIDADE, 2019). De acordo com as organizações, as vítimas procuram o grupo,
na maioria casos, com intuito de amparo jurídico ou abrigo, e no final recebem a
assistência necessária e o respeito que merecem.
Atualmente essas ONG’s estão configuradas na região central e no bairro
Portão na capital Curitiba, conforme ilustrado na Figura 1.

FIGURA 1 – MAPEAMENTO CENTRO DE ACOLHIMENTO EM CURITIBA

4
Processo de reivindicação de direitos que tem por objetivo influir na formulação e
implementação de políticas públicas que atendam às necessidades da população.
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FONTE: Mapa de arruamento Curitiba IPPUC (2020). Adaptado pela


autora (2022).
Segundo relatório feito no ano de 2017 pelo Grupo Dignidade, foram
entrevistados 1.326 participantes da comunidade LGBTQIA+ da região de Curitiba e
Região Metropolitana (DUARTE, et al., 2017). Através das pesquisas foi obtido o
seguinte mapa da concentração de habitantes LGBTQIA+ em Curitiba, conforme a
Figura 2.

FIGURA 2 – CONCENTRAÇÃO DE HABITANTES LGBTQIA+ POR BAIRRO DE CURITIBA


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FONTE: Relatório de pesquisas LGBTQIA+ no Projeto Comunicare pelo Grupo Dignidade (2017).
Mapa adaptado pela autora (2022).

Conforme Figura 1, é notório a centralização das instituições na cidade de Curitiba.


Como mostra a releitura do mapa da Figura 2, o bairro Centro acomoda maior parte da
população LGBQIA+. Fazendo a comparação do mapa da Figura 1 e o mapa da Figura 2,
podemos interpretar que a região central da cidade é ponto estratégico para promover
centros de acolhimento com facilidade de acesso nas áreas de trabalhos, educação e
atividades de lazer.
O relatório revela que 84,4% dos entrevistados que buscaram ajuda na instituição, já
foram discriminados nas ruas, instituições de ensino, no trabalho e na família, além disso
56,3% já pensaram em suicídio (DUARTE, et al., 2017).
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GRÁFICO 4 – LOCAL DE DISCRIMINAÇÃO POPULAÇÃO LGBTQIA+ CURITIBANA


800

700

600

500

400

300

200

100

0
Rua Escola / Casa Trabalho Comé rcio
faculdade

FONTE: Relatório de pesquisas LGBTQIA+ no Projeto Comunicare pelo Grupo Dignidade


(2017). Mapa adaptado pela autora (2022).

Analisando o Gráfico 4, compreende-se que as vítimas tendem a sofrer


LGTBfobia em espaços públicos quando se há conglomerado de praticantes de
violência verbal e em certos casos chegando à violência física.

5 CONCLUSÃO

O conjunto de informações fomenta a tese da precariedade de pontos físicos


que não somente trabalham com assistência social, mas lutem para exigir respaldo
na política pública ações que combatem à discriminação na cidade. Infelizmente, as
instituições da capital carecem de verbas para prosseguir com suas pesquisas e
atividades.
Em suma, é indispensável um ambiente que esteja disposto a auxiliar o
público LGBTQIA+ com o propósito de patentear a segurança pela liberdade de
orientação sexual e à identidade de gênero na espacialidade urbana de Curitiba.
Buscando ajudar o acesso dos direitos dessa população, o centro de acolhimento
juntamente com a prefeitura, devem centralizar os serviços sociais a fim de evitar
descaso dos prazos e levantar fundos para melhor auxílio de atividades como:
adoção, cursos profissionalizantes, casamentos e união estável, previdência social,
auxílio reclusão, mudança de nome e demais atendimentos de saúde bem como
psicólogo e teste de HIV.
Os mapas de distribuição de habitantes LGBTQIA+ em Curitiba, contribui
para a visualização espacial de onde a inserção do centro de acolhimento poderia
16

ter alcance à população. Devido a concentração da população na região central na


cidade, a instalação de um centro de acolhimento no bairro Centro, fomenta a ideia
de aproveitamento de serviços que a região oferece, podendo assim, intensificar a
presença LGBTQIA+ na sociedade.

6 BIBLIOGRAFIA
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