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Niterói
2011
Marcos Valle Machado da Silva
Niterói
2011
Ficha Catalográfica elaborada pela Biblioteca Central do Gragoatá
Banca Examinadora:
_________________________________________________
Prof. Dr. Marcial A. Garcia Suarez (Orientador)
Programa de Pós-Graduação em Estudos Estratégicos da Defesa e Segurança
(PPGEST) da UFF
_________________________________________________
Prof. Dr. Renato Petrocchi
Programa de Pós-Graduação em Estudos Estratégicos da Defesa e Segurança
(PPGEST) da UFF
_________________________________________________
Prof. Dr. Mauricio Santoro Rocha
Centro de Relações Internacionais da Fundação Getúlio Vargas
Niterói
2011
DEDICATÓRIA
Para
Handerson da Silva,
meu pai.
AGRADECIMENTOS
The aim of this work is to analyze whether after the attacks of September 11, 2001, the
George W. Bush administration reoriented U.S. foreign policy for the employment of military
power, so preemptive and unilateral, in line with neoconservative thinking. To achieve this
objective, the dissertation is structured in three main axis: identifying the origin and essence
of neoconservative thought, analyze and evaluate the weight of neoconservative thought on
the central core of foreign policy decision of the Bush administration after the attacks of
September 11; and analyze the penetration of neo-conservative thinking in the most relevant
strategic regulatory documents of George W. Bush administration, that is, the National
Security Strategy (NSS) 2002 and 2006. Each of these axes corresponds to a chapter of the
dissertation. Thus, the first one is to identify the genesis of neocon thinking and highlight its
key points, especially those pertaining to foreign policy issues. The second chapter seeks to
assess "if" and to what degree the neocon thought was present in the administration George
W. Bush, using as analytical base, according to the Theory of Decision Units, three decisions
of the Bush administration: the declaration of the "War on Terror", the war in Afghanistan
and the war in Iraq. Chapter 3 analyzes the content of the NSS and the NSS 2002, 2006,
regarding the convergence of the central points of neoconservative thought, especially
regarding the "preemptive military action." The job ends with concluding remarks about the
"War on Terror" and the restructuring of the George W. Bush administration’s foreign policy
to a growing unilateralism, rooted in the use of military force and regulated by the possibility
of "preemptive military action", in line with the central points of neoconservative thinking,
after the attacks of September 11, 2001.
INTRODUÇÃO .................................................................................................... 11
1 O NEOCONSERVADORISMO NOS EUA ....................................................... 16
1.1 A Gênese do Neoconservadorismo nos EUA ...................................................... 17
1.1.1 O Tradicionalismo .................................................................................................. 22
1.1.2 O Libertarianismo ................................................................................................... 22
1.1.3 O Neoconservadorismo .......................................................................................... 24
1.2 Pontos Centrais do Pensamento Neoconservador ............................................. 28
1.3 Política Externa e o Pensamento Neoconservador ............................................ 34
1.4 A Administração George W. Bush e o Neoconservadorismo ........................... 49
2 O PROCESSO DE TOMADA DE DECISÃO EM POLÍTICA EXTERNA
NOS EUA .............................................................................................................. 54
2.1 Margareth Hermann e o Modelo das Unidades de Decisão ............................. 56
2.1.1 Iniciando o Processo – o Reconhecimento de um Problema e a Ocasião para a
Decisão ................................................................................................................... 57
2.1.2 A Unidade de Decisão dominante .......................................................................... 58
2.1.2.1 Determinando a Unidade de Decisão Dominante em uma Ocasião para a
Decisão ................................................................................................................... 58
2.1.3 Condições Estruturais que Favorecem a Ação do Líder Predominante ................. 59
2.1.4 Condições Estruturais que Favorecem a Ação de um Grupo Único ...................... 59
2.1.5 Condições Estruturais que Favorecem a Ação da Coalizão de Agentes
Autônomos ............................................................................................................. 60
2.1.6 Determinando a Unidade de Decisão Dominante .................................................. 61
2.1.7 Resultados do Processo de Decisão ........................................................................ 61
2.2 A Estrutura Formal do Governo dos EUA ........................................................ 63
2.3 Identificando a Unidade de Decisão Dominante, em Política Externa, no
Primeiro Mandato de George W. Bush .............................................................. 66
2.4 Analisando a Coesão dos Vulcans e o Tipo de Resultado do Processo
Decisório ................................................................................................................ 68
2.5 A Ocasião para a Decisão: Os atentados de 11 de setembro de 2001 .............. 71
2.6 A decisão de invadir o Afeganistão e derrubar o Regime Talibã .................... 75
2.6.1 Analisando os pontos de contato da decisão da Guerra no Afeganistão com o
pensamento neoconservador ................................................................................... 79
INTRODUÇÃO
Estudos acerca da política externa dos Estados Unidos da América (EUA) têm
despontado na área acadêmica brasileira, principalmente após os atentados de 11 de setembro
de 2001. A administração George W. Bush é objeto de estudo de várias teses, dissertações,
monografias, ensaios e artigos de acadêmicos brasileiros. A maioria das análises resulta em
conclusões depreciativas acerca da política externa dos dois mandatos daquele presidente,
usualmente percebida como “capturada” por expoentes do chamado neoconservadorismo
estadunidense, supostamente presentes nos escalões decisórios mais elevados do executivo
dos EUA, nos dois mandatos do presidente George W. Bush. Nesse sentido, duas das marcas
da política externa da administração George W. Bush, a “Guerra contra o Terror” e a
possibilidade da “ação militar preemptiva1” são, muitas vezes, identificadas como fatores
causais de uma crescente percepção de insegurança e instabilidade no sistema internacional.
Neste contexto, passada uma década desde os atentados de 11 de setembro de 2001, esta
dissertação é uma contribuição adicional ao estudo da política externa dos EUA e tem como
Objeto de Estudo, as relações entre o pensamento neoconservador (neocon) estadunidense e a
"ação militar preemptiva", no contexto da chamada "Guerra contra o Terror". A moldura
temporal abrange o período compreendido entre 2001 a 2008, isto é, os dois mandatos do
presidente George W. Bush.
Como forma de contextualizar os antecedentes do Objeto de Estudo supracitado, é
pertinente recordar que o início da década de 1990 marcou a ascensão dos EUA como a única
superpotência do globo. O colapso da União Soviética, a coalizão montada contra o Iraque e a
fácil vitória militar contra esse país, bem como o crescimento da economia estadunidense,
proporcionaram a percepção de que os EUA se mostravam insuperáveis no aspecto militar,
econômico e cultural. Essa sensação de invencibilidade e invulnerabilidade refletia-se na
postura de muitos dos formuladores da política externa estadunidense que, gradativamente,
passaram a atuar sem levar em conta outros atores do sistema internacional.
Há que se considerar que, mesmo durante os dois mandatos do presidente Clinton, o
Congresso e vários expoentes da política externa dos EUA, já apontavam para uma postura
estratégica que tendia ao unilateralismo, pautado pela defesa dos interesses imediatos da
superpotência norte-americana. Neste contexto, os EUA deram as costas para diversos e
significativos acordos, normas e fóruns de negociação internacional. Esse processo é hoje
1
Uma ação militar iniciada em decorrência de uma evidência incontroversa de que um ataque inimigo é iminente
(USA, 2010, Department of Defense. Dictionary of Military and Associated Terms. JP 1-02, p. 369).
12
facilmente percebido ao vermos que, no período compreendido entre 1997 e 2000, o governo
estadunidense se recusou a assinar importantes tratados internacionais2. Com a eleição de
George W. Bush para presidente dos EUA, essas posições ganharam ímpeto. Um exemplo
disso foi o Protocolo de Kyoto, assinado pelo Presidente Bill Clinton em 1997 e retirado,
definitivamente, pelo presidente George W. Bush, da pauta de futuro encaminhamento ao
Senado, em março de 2001. Outro exemplo foi a decisão unilateral de retirar-se do Tratado de
Mísseis Antibalísticos3 (Antiballistic Missile Treaty – ABM), em dezembro de 2001, assinado
com a então URSS e que vigorava desde 1972.
Entretanto, a sensação de invulnerabilidade estadunidense foi abruptamente cortada no
dia 11 de setembro de 2001. Nesta data, quatro aeronaves comerciais foram seqüestradas por
terroristas da rede al-Qaeda, sendo que duas delas foram jogadas contra as torres gêmeas do
World Trade Center, e uma contra o Pentágono. A quarta aeronave, o Vôo 93 da United
Airlines, caiu em uma área rural na Pensilvânia, em decorrência da reação dos passageiros
contra os terroristas impedindo, assim, que um quarto alvo fosse atingido. Essas ações
simultâneas paralisaram, ainda que momentaneamente, a superpotência norte-americana. No
entanto, a resposta veio rapidamente e na forma de uma declaração de “Guerra contra o
Terror”, anunciada pelo presidente George W. Bush, no seu discurso no Congresso, na sessão
conjunta do dia 20 de setembro de 2001:
2
Como exemplos podemos citar que, em dezembro de 1997, o governo estadunidense rejeitou o Tratado sobre a
Proibição de Minas Terrestres, bem como em julho de 1998, rejeitou a participação dos EUA no Tribunal
Penal Internacional. O artigo de Richard Du Boff, publicado pelo Centre for Research on Globalization,
apresenta 21 tratados e acordos multilaterais rejeitados pelos EUA, até dezembro de 2001 (DU BOFF, 2001).
3
Em maio de 1972 foi assinado, com a URSS, o Tratado sobre Mísseis Anti-Balísticos (Anti-Ballistic Missile -
ABM) que limitava os sistemas de defesa antimíssil a duas áreas de lançamento, com um número máximo de
100 mísseis interceptadores para cada uma das duas superpotências. Posteriormente, em 1974, uma revisão
deste tratado limitou ainda mais a defesa estratégica antimísseis, permitindo apenas uma área de lançamento
para cada lado. O objetivo do Tratado ABM era, em essência, proibir o desenvolvimento em larga escala de
mísseis estratégicos antimísseis, de modo que a Destruição Mútua Assegurada, continuasse a ser uma premissa
nos cálculos de segurança das duas superpotências (GRAHAM, 2004, p. 90-91).
4
“On September the 11th, enemies of freedom committed an act of war against our country. […] Our war on
terror begins with al Qaeda, but it does not end there. It will not end until every terrorist group of global
reach has been found, stopped and defeated. […] From this day forward, any nation that continues to harbor
or support terrorism will be regarded by the United States as a hostile regime” (USA. Homeland Security
Department. Speeches and Statements. Address to a Joint Session of Congress and the American People
<http://www.dhs.gov/xnews/speeches/speech_0016.shtm>).
13
que teve sobre a formulação dessa política externa? Se não ocorreu, existe um modelo teórico
que explique esse processo de formulação e decisão da política externa dos EUA, em
consonância com um núcleo central de ideias, que após o 11 de setembro de 2001, poderia ser
percebido como próximo ao neoconservadorismo?
As questões supracitadas motivaram a elaboração da presente dissertação, cujo Objeto
de Estudo (OE), conforme exposto no início da presente Introdução, consiste nas relações
entre o pensamento neoconservador estadunidense e a "ação militar preemptiva", no contexto
da chamada "Guerra contra o Terror". A moldura temporal abrange o período compreendido
entre 2001 a 2008, isto é, os dois mandatos do presidente George W. Bush.
Assim sendo, o Objetivo Geral deste trabalho consiste em analisar se após os atentados
de 11 de setembro de 2001, a administração George W. Bush reorientou a política externa dos
EUA para o emprego do Poder Militar, de forma preemptiva e unilateral, em consonância
com o pensamento neoconservador.
Para a consecução do Objetivo Geral supracitado o trabalho foi estruturado em torno
de três Objetivos Específicos a seguir apresentados:
a) Identificar a gênese do pensamento neoconservador, seus pontos centrais, assim
como seus principais expoentes e seu alcance na Administração George W. Bush.
b) Analisar o processo de decisório da política externa do governo George W. Bush, à
luz da Teoria de Unidades de Decisão5, a fim de identificar qual o lócus decisório e quais os
atores participantes desse processo, bem como qual o peso da coesão de ideias, isto é, do
pensamento neoconservador, sobre os resultados desse processo, no governo George. W.
Bush, após os atentados de 11 de setembro de 2001.
c) Analisar se a Estratégia de Segurança Nacional dos EUA (National Security
Strategy – NSS), lançada em 2002 e a subseqüente NSS, divulgada em 2006, são consonantes
com os pontos centrais do pensamento neoconservador, principalmente no que tange à “ação
militar preemptiva”.
Os Objetivos Específicos supracitados são explorados ao longo dos três capítulos da
presente dissertação. Assim, o Capítulo 1, corresponde ao esforço de pesquisa para
alcançarmos o primeiro Objetivo Específico apresentado, isto é, identificar a gênese do
pensamento neocon; seus pontos centrais, com destaque para aqueles concernentes às
questões de política externa; e seu alcance na Administração George W. Bush.
5
Tal como apresentada por Margareth H. Hermann, em How Decision Units Shape Foreign Policy (Vide
Referências Bibliográficas) (Nota do autor).
15
6
Cabe aqui observar o sentido do termo metáfora como sendo o emprego de uma palavra em um sentido
figurado, o que permite que se transfiram atributos de um conjunto de circunstâncias para outro, a fim de que
se possa expressar uma percepção da realidade. Entendida desse modo, a metáfora de uma “Guerra contra o
Terror” expressava tanto a intenção do governo Bush de confrontar e derrotar aqueles que perpetraram os
ataques de 11 de setembro, quanto os sentimentos da nação agredida (Nota do autor).
16
7
Notadamente o livro O pensamento neoconservador em política externa nos Estados Unidos, de autoria de
Carlos Augusto Poggio Teixeira, publicado pela UNESP, em 2010 (Vide Referências Bibliográficas) (Nota do
autor).
17
8
O Apêndice A apresenta uma síntese biográfica de Irving Kristol e de outros expoentes do pensamento
neoconservador citados no presente trabalho, bem como de alguns personagens históricos, não
necessariamente ligados ao neoconservadorismo, mas também citados ao longo desta dissertação (Nota do
autor).
9
Vide Referências bibliográficas (Nota do autor).
10
“What exactly is neoconservatism?” (KRISTOL, 2004, p. 33).
11
“[...] ever since its origin among disillusioned liberal intellectuals in the 1970s, what we call neoconservatism
has been one of those intellectual undercurrents that surface only intermittently” (Ibid., p.33).
12
“[…] a ‘persuasion’ that manifests itself over time, but erratically, and one whose meaning we clearly glimpse
only in retrospect” (Ibid., p. 33).
18
13
Vide Apêndice A, para síntese biográfica correspondente (Nota do autor).
14
“The ‘neoconservative’ designation puzzled me. I had never thought of myself as a conservative of any kind.
What is a neoconservative?” (KIRKPATRICK, 2004, p. 235).
15
“[…] the neoconservative was born from a reaction to the counter-culture that dominated American politics
through the sixties and seventies” (Ibid., p. 235).
16
“As long as the United States was perceived as a virtuous society, policies that enhanced American Power
were also seen as virtuous. Morality and American Power were indissolubly linked in the traditional
conception. But with the U.S. defined as an essentially immoral society, valuing and/or enhancing power were
perceived as immoral. Morality now required transforming our deeply flawed society, not enhancing its
power” (Ibid., p. 236).
19
17
George McGovern foi escolhido pelo partido democrata para disputar as eleições presidenciais com o
candidato do partido republicano Richard Nixon, sendo por este derrotado (Nota do autor).
20
liberais que se opunham aos excessos da contracultura também criticavam essa postura
estratégica, defendendo uma atitude de enfrentamento dos regimes comunistas, o que os
colocava numa posição de distanciamento da administração Nixon, mas não do Partido
Republicano. A abordagem voltada para confrontar o comunismo e a expansão soviética
ganhou eco no Think Tank denominado Committee on the Present Danger18 (CPD),
originalmente criado em 1950 para construir um consenso nacional em prol da Política de
Contenção do presidente Truman. Na década de 1970, no contexto de oposição à détente, um
CPD renovado voltou a emergir, tendo como missão construir uma política afirmativa
destinada a promover a segurança dos Estados Unidos e seus aliados, bem como alertar para o
risco inerente de "apaziguar" o totalitarismo. Em outras palavras, prescreviam a adoção de
uma postura mais forte contra a URSS, caso os EUA desejassem vencer a chamada Guerra
Fria.
Nesse contexto, os intelectuais liberais, então ligados ou simpatizantes do partido
democrata que assumiram um posicionamento crítico sobre os rumos da política interna e
externa dos EUA, notadamente opondo-se à contracultura e a détente, receberam e, ao longo
do tempo, aceitaram a alcunha de neoconservadores. Uma parte desse grupo estava
essencialmente voltada para as questões, domésticas, isto é, a política interna, entre eles
destacavam-se: Irving Kristol, Daniel Patrick Moynihan, James Q. Wilson e Nathan Glazer19.
A outra parte desses “dissidentes” tinha como foco a política externa, particularmente o
aparente declínio da posição dos EUA frente à URSS, dentro do contexto da derrota no
Vietnã. Nesse grupo encontravam-se Jeane Kirkpatrick, Norman Podhoretz e Eugene V.
Rostow20 (MURAVICHIK, 2004, p. 244).
Essa pode ser considerada a primeira geração de neoconservadores nos EUA e alguns
periódicos tornaram-se os veículos de disseminação das ideias desses “liberais desiludidos”.
18
O Committee on the Present Danger (CPD) é uma organização que se define com não-partidária, tendo como
meta presente, o fortalecimento da decisão estadunidense de confrontar o desafio atual do terrorismo e as
ideologias que o promovem. Atualmente, o CPD retorna para confrontar uma nova ameaça: o islamismo
militante e o terrorismo que ele propaga. Em 2010, o CPD possuía entre seus membros mais de cem ex-
funcionários da Casa Branca, embaixadores, acadêmicos, escritores e vários peritos em política externa, sendo
co-presidido pelo ex-secretário de Estado George Shultz e pelo ex-diretor da Agência Central de Inteligência
(CIA) James Woolsey (Committee on the Present Danger. Mission.
<http://www.committeeonthepresentdanger.org/index.php?option=com_content&view=article&id=50&Itemid
=54>).
19
Vide Apêndice A para consultar a síntese biográfica desses expoentes da primeira geração de
neoconservadores estadunidenses (Nota do autor).
20
O mesmo da nota anterior(Nota do autor).
21
Assim, as revistas Commentary21, The Public Interest22 e The National Interest23, as duas
últimas criadas por Irving Kristol, converteram-se nos principais veículos de expressão para o
pensamento desses intelectuais (AYERBE, 2006, p. 80).
Outra abordagem acerca das origens do pensamento neoconservador é apresentada por
Adam Wolfson24 (2004, p. 216) que argumenta que os contornos básicos do
neoconservadorismo emergiram no contexto de seus dois principais rivais conservadores: o
libertarianismo25 e tradicionalismo. Essas três abordagens conservadoras – o libertarianismo,
o tradicionalismo e o neoconservadorismo – começaram a tomar a forma pela qual são hoje
conhecidas logo após a Segunda Guerra Mundial. No entanto, cada uma delas tem raízes
históricas e filosóficas que serão sumarizadas nas seções seguintes. De um modo geral, o
tradicionalismo tem suas raízes em Edmund Burke; o libertarianismo em Adam Smith e mais
recentemente em Frederich Hayek; e o neoconservadorismo em Alexis de Tocqueville
(WOLFSON, 2004, p 216). Assim, Wolfson descreve os principais segmentos constituintes
de cada uma dessas abordagens conservadoras:
21
Publicada pela primeira vez em 1945, a Commentary tornou-se, na década de 1970, um dos principais veículos
de propagação do pensamento neoconservador. Os artigos publicados abordam questões acerca da fé na
democracia e nos valores democráticos num mundo ameaçado por ideologias totalitárias; a segurança do
Ocidente e dos EUA; Israel e os EUA; e preservação da cultura “americana” em meio ao colapso dos valores
morais (COMMENTARY. About Us. <http://www.commentarymagazine.com/about/>).
22
Irving Kristol, juntamente com Daniel Bell, fundou a Public Interest em 1965. Até o ano do seu encerramento
– 2005 – a revista foi uma importante plataforma para o pensamento neoconservador nos temas afetos às
questões sociais e política interna (RIGHT WEB. Irving Kristol. <http://www.rightweb.irc-
online.org/profile/Kristol_Irving>).
23
Irving Kristol fundou a National Interest em 1985 tendo como linha editorial os interesses dos EUA nas
questões internacionais. A equipe editorial da National Interest congrega escritores alinhados tanto como o
neoconservadorismo quanto com o realismo, já que desde 2001, a revista foi adquirida pelo Nixon Center.
Entre seus editores alinhados com a visão realista das Relações Internacionais estão, por exemplo, Henry
Kissinger, John J. Mearsheimer e Graham Allison (RIGHT WEB. National Interest.
<http://www.rightweb.irc-online.org/profile/National_Interest>).
24
Vide Apêndice A, para síntese biográfica correspondente (Nota do autor).
25
Termo utilizado pelo autor para traduzir o original em inglês libertarianism (Nota do autor).
26
“Those of us who regret much of modern American life and find solace in old, inherited ways will cling to
traditionalism. Others, who celebrate the new freedoms and new technologies, will turn to libertarianism. As
for those who see in modernity admirable principles but also worrisome tendencies, their persuasion will be
neoconservatism” (WOLFSON, 2004, p. 217).
22
1.1.1 O Tradicionalismo
1.1.2 O Libertarianismo
de Locke27 e Stuart Mill28, e desde a década de 1950 tem sido um importante corpo de ideias
abraçadas pela direita estadunidense, tanto no partido republicano, quanto pelos
conservadores em geral
É pertinente observar que, aparentemente, há uma confusão entre os termos
conservadorismo libertarianista e os princípios liberais. Assim é pertinente recordar a que
“existe um liberalismo econômico que pretende dar ao mercado o maior espaço possível” e
existe, também, “um liberalismo político que insiste na igualdade de direitos, em uma
extensão tão ampla quanto possível das liberdades e também nos limites à intervenção do
Estado” (BOUDON apud AYERBE, 2006, p. 122). O libertarianismo busca conservar a
ambos, sendo, portanto incluído por Wolfson, como uma das correntes do pensamento
conservador estadunidense29.
Nesse sentido, em nenhuma outra questão a influência do libertarianismo é mais
perceptível do que na oposição conservadora ao “Big Government” e ao ceticismo com
relação ao moderno Estado de Bem-Estar Social. Tendo como referência o pensamento de
Friedrich Hayek, particularmente seu best-seller da década de 1940 - O Caminho da
Servidão30 -, esse segmento defende o progresso e as liberdades, tanto econômicas como
individuais. São contra a regulação do mercado e, conforme mencionado, desconfiam do
Welfare State e do Big Government, pois numa visão singular da obra de Hayek receiam que o
27
John Locke (1632-1704) produziu uma notável contribuição ao pensamento político, principalmente com sua
obra, hoje um clássico, da Ciência Política, Segundo Tratado sobre o Governo: um ensaio relativo sobre à
verdadeira origem, extensão e objetivo do governo civil. Nele Locke, sintetiza os limites do poder do Estado
perante o direito à vida, à liberdade e à propriedade. Assim, as instituições executivas do governo deveriam ser
regidas pela lei e que o consentimento é a base da obrigação política (LOCKE, 1979).
28
John Stuart Mill (1806-1873) é bastante conhecido por aprimorar o utilitarismo de Jeremy Bentham. No
entanto, sua obra de maior repercussão é o ensaio Sobre a Liberdade, uma apologia do individualismo liberal.
Na defesa dessa liberdade Mill deixa claro que nenhum indivíduo ou governo tem o direito de cercear a
palavra, a publicação de ideias, ou a conduta de outro indivíduo, exceto quando necessário evitar que isso
venha a causar dano a outra pessoa. Mill aborda ainda em seus ensaios a defesa do sufrágio universal e do
governo representativo, onde as minorias fossem também representadas (ADAMS; DYSON, 2006, p. 115-
119).
29
De modo geral, existe certa incoerência no uso dos termos liberal e conservador. Convém recordar, por
exemplo, que nos EUA, durante a Guerra Fria, os liberais foram associados à complacência ou simpatia para
com o socialismo e os conservadores associados ao anticomunismo. Mas, durante o esfacelamento do
comunismo no Leste europeu, no fim da década de 1980 e início de 1990, os defensores do comunismo foram
chamados de conservadores, ao passo que os pró-capitalistas foram denominados liberais (JOHNSON, 1997,
p. 51). Esse deslizamento no sentido dos termos ao longo do tempo e de lugar para lugar, gera essa aparente
confusão, cabendo essas observações complementares no presente trabalho (Nota do autor).
30
No original, The Road to Serfdom, foi escrito em 1944, como uma crítica ao totalitarismo nazista e soviético,
mas também à crescente popularidade do planejamento econômico e do socialismo no Ocidente. No Prefácio
das edições de 1956 e 1976, Hayek argumenta que a expansão do Welfare State nos EUA e na Europa
Ocidental poderia levar a uma redução da liberdade individual, em função da intervenção e regulação
crescente do Estado na vida econômica e civil da sociedade (WOLFSON, 2004, P. 221).
24
1.1.3 O Neoconservadorismo
31
O Instituto Cato é uma organização de pesquisa de políticas públicas - um Think Tank - dedicado aos
princípios da liberdade individual, governo limitado, mercados livres e a paz. Seus acadêmicos e analistas
conduzem pesquisas independentes, não partidárias, acerca de várias questões políticas relacionadas aos
pricípios supracitados (CATO INSTITUTE. About Cato. <http://www.cato.org/about.php>).
32
O AEI tem sua origem no American Enterprise Association (AEA), um pequeno grupo de empresários de New
York reunido em 1938 e que, no auge da Segunda Guerra Mundial, em 1943, decidiu abrir uma associação
para defender a rápida desmobilização econômica do pós-guerra e, mais genericamente, para melhorar a
compreensão do Congresso sobre as consequências econômicas das suas ações. Isso foi decorrente, dos
debates no Congresso, acerca da manutenção permanente do controle de preços e da produção, do período de
guerra, de forma a evitar que outra depressão no período de paz. Posteriormente, a Associação evoluiu para
Instituto, originando o American Enterprise Institute. Na década de 1970, alguns dos intelectuais democratas,
desiludidos com os rumos do partido, tais como, Irving Kristol, Jeane Kirkpatrick e Michael Novak,
ingressaram nas fileiras acadêmicas do AEI (AMERICAN ENTERPRISE INSTITUTE. History of AEI.
<http://www.aei.org/history>).
Atualmente, o Instituto congrega alguns dos expoentes do pensamento neocon, tais como: John R. Bolton,
Richard Perle e Paul Wolfowitz, (AMERICAN ENTERPRISE INSTITUTE. Scholars.
<http://www.aei.org/scholars>).
33
Fundada em 1973, a Heritage Foundation é um Think Tank, “cuja missão é formular e promover políticas
públicas conservadoras baseadas nos princípios da livre empresa, governo limitado, liberdade individual,
valores tradicionais americanos e uma forte defesa nacional” (THE HERITAGE FOUNDATION. About.
<http://www.heritage.org/About>).
25
34
“[…] hopeful, not lugubrious, forward-looking, not nostalgic; and its general tone is cheerful, not grim or
dyspeptic” (KRISTOL, 2004, p. 34).
26
Num extremo do espectro desta outra nação (em paralelo com a elite cultural da
nação dominante) encontra-se a "direita religiosa". Este é o núcleo duro da outra
nação - um determinado e articulado grupo de protestantes evangélicos. Em uma
pesquisa recente, 18 por cento do público se identificou com este rótulo. [...]
Quarenta e três por cento do público se descreve como "cristãos renascidos”, mas
apenas um terço desse segmento é associado à direita religiosa. Portanto, a outra
nação, se estende bem além da direita religiosa. Inclui protestantes tradicionalistas,
católicos, mórmons, alguns judeus ortodoxos e as pessoas sem afiliação religiosa,
mas de fortes convicções morais tradicionais36 (HIMMELFARB, 1998, p. 17)
(Tradução nossa).
35
Vide Apêndice A, para síntese biográfica correspondente (Nota do autor).
36
“At one end of the spectrum of this other nation (paralleling the cultural elite of the dominant nation) is the
"religious right." This is the hard core of the other nation--a determined and articulate group of evangelical
Protestants. In a recent survey, 18 percent of the public identified themselves under this label. […] Forty-three
percent of the public describe themselves as "born-again" Christians, but only one third of these associate
themselves with the religious right. The other nation, then, extends well beyond the religious right. It includes
traditionalist Protestants, Catholics, Mormons, some Orthodox Jews (the latter a very small number
proportionately), and individuals of no particular religious affiliation but of strong traditional moral
convictions” (HIMMELFARB, 1998, p. 17).
27
O resultado é uma inesperada aliança entre neoconservadores, que inclui uma boa
proporção de intelectuais seculares, com os tradicionalistas religiosos. Eles estão
unidos em questões afetas à qualidade da educação, às relações da Igreja com o
Estado, ao controle da pornografia [...] E já que o partido republicano tem agora uma
base substancial entre os religiosos, isso dá uma certa influência e até mesmo poder
aos neocons37 (Kristol, 2004, p. 35) (Tradução nossa).
37
“The upshot is a quite unexpected alliance between neocons, who include a fair proportion of secular
intellectuals, and religious traditionalists. They are united on issues concerning the quality of education, the
relations of Church and State, the regulation of pornography [...] And since the Republican Party now has a
substantial base among the religious, this gives neocons a certain influence and even power” (KRISTOL,
2004, p. 35).
38
"In the course of the 1970s and 1980s, however, the Republican party gradually 'modernized' itself to some
degree, in part because of the writings of neoconservatives" (KRISTOL, 1999, p. ix).
28
Essas atitudes podem ser resumidas nas seguintes ‘theses’ (como diria um marxista):
Primeiro, patriotismo é um sentimento natural e saudável, devendo ser encorajado
pelas instituições públicas e privadas [...]. Segundo, um governo mundial é uma
ideia terrível, uma vez que pode levar a uma tirania mundial. Assim, as instituições
internacionais que apontem para a meta do estabelecimento de um governo mundial
devem ser vistas com profunda suspeita. Terceiro, o estadista deve, acima de tudo,
ter a habilidade de distinguir entre amigos e inimigos. Isso pode não ser tão fácil
quanto parece, haja vista história da Guerra Fria, onde o número de que homens
inteligentes que não viam a URSS como um inimigo era absolutamente
surpreendente. Finalmente, para uma Grande Potência, o ‘interesse nacional’ não é
um termo geográfico [...]. Uma grande nação, cuja identidade é ideológica, como a
União Soviética no passado e os EUA de hoje, têm inevitavelmente interesses
ideológicos em adição às preocupações mais materiais40 (KRISTOL, 2004, p. 36)
(Grifo nosso) (Tradução nossa).
39
Vide o Apêndice A para consultar a síntese biográfica desses expoentes do neoconservadorismo estadunidense
(Nota do autor).
40
“These attitudes can be summarized in the following ‘theses’ (as a Marxist would say): First,
patriotism is a natural and healthy sentiment, and should be encouraged by both private and public institutions.
[…]. Second, world government is a terrible idea since it can lead to world tyranny. International institutions
that point to an ultimate world government should be regarded with the deepest suspicion. Third, statesmen
should, above all, have the ability to distinguish friends from enemies. This is not as easy as it sounds, as the
history of Cold War revealed. The number of intelligent men who could not count the Soviet Union as an enemy,
even though this was its own self-definition, was absolutely astonishing. Finally, for a great power, the ‘national
interest’ is not a geographical term […]. And large nations , whose identity is ideological, like the Soviet Union
of yesterday and the United States of today, inevitably have ideological interests in addition to more material
concerns” (KRISTOL, 2004, p. 36).
29
Segundo Max Boot (2004, p. 46), os neocons eram e ainda são a favor dos benefícios
do Welfare State, igualdade racial e outros princípios liberais. O neoconservadorismo é
também uma face do liberalismo. No em tanto, não se pode esquecer que as origens do
pensamento neocon surgiram como uma reação e oposição aos excessos do fim dos anos 1960
e do início da década de 1970, quando a criminalidade crescia nos EUA, a URSS ganhava
terreno na Guerra Fria e a ala dominante do partido democrata parecia não querer enfrentar
essas questões.
Assim, no que tange ao papel do Estado, os neocons se opõem às críticas dos
libertarianistas ao Big Government e também à compreensão do que entendem por liberdade.
Na visão neocon, os libertarianistas defendem qualquer tipo de liberdade individual, assim
tendem a ser favoráveis ao aborto, legalização das drogas, clonagem humana etc., dentro da
expansão da direito de escolha individual. O neoconservadorismo apresenta uma proposta de
41
“[…] to convert the Republican Party, and American conservatism in general, against their respective wills,
into a new kind of conservative politics suitable to govern a modern democracy” (KRISTOL, 2004, p. 33).
42
“Neocons do not like the concentration of services in the welfare state and are happy to study alternative ways
of delivering these services. But they are impatient with the Hayekian notion that we are on ‘the road to
serfdom’. Neocons do not feel that kind of alarm or anxiety about the growth of the State in the past century,
seeing it as natural, indeed inevitable” (Ibid., p. 35).
30
43
Escrito no contexto da débâcle da URSS, o artigo e, posteriormente, o livro faz uma apologia à supremacia do
sistema capitalista democrático liberal e o desaparecimento de alternativas a esse sistema (Nota do autor).
44
Foi publicado no mesmo ano no Brasil, com o título O dilema americano: democracia, poder e o legado do
neoconservadorismo (Vide Referências Bibliográficas) (Nota do autor).
31
45
“Not for annexation but to provide the helpless colony with the opportunity for freedom” (STELZER, 2004, p.
9).
32
Para Max Boot, existem os liberais “soft Wilsonians”, tais como o ex-presidente Jimmy Carter
e o próprio presidente Woodrow Wilson, que compartilham a fé de que as instituições
multilaterais como a Liga das Nações ou a ONU, devem ser as vias pelas quais os EUA
devem promover seus ideais e que o direito internacional deve ser o principal instrumento
dessa política. Já os neocons são “hard Wilsonians” que colocam sua fé não em "pedaços de
papel, mas na força dos EUA". Seus heróis são Theodore Roosevelt, Franklin D. Roosevelt,
Harry Truman e Ronald Reagan – todos presidentes que viam o poder a serviço de um
propósito maior. Segundo Boot, os neocons acreditam que os EUA devem usar a força
quando necessário para promover os interesses e ideais “americanos” não por humanitarismo,
mas porque a disseminação da democracia liberal aumenta a segurança dos EUA (BOOT,
2004, p. 49).
No que tange às instituições multilaterais, o pensamento neoconservador, à luz dos
autores selecionados neste trabalho, apresenta-se cauteloso, pois existe a percepção de que
essas instituições, particularmente a ONU, existem para vetar os interesses “americanos”, bem
como levar os EUA à assinatura de Tratados imperfeitos, simplesmente para manter a
harmonia internacional. Assim como muitos conservadores, os neocons são, em geral,
cautelosos com a ONU, a qual eles percebem como um fórum “antiamericano”. Nesse
sentido, Jeane Kirkpatrick e Robert Kagan, por exemplo, percebem a ONU como uma
organização em que os regimes não-democráticos e contrários aos EUA e seus valores,
exercem uma influência desproporcional ao seu real peso no sistema internacional
(STELZER, 2004, p. 10). Mas, ao contrário da direita radical, os neocons concordam que
existem causas defendidas nas Nações Unidas que são coincidentes com os interesses
estadunidenses e, portanto, a organização não pode ser descartada (BOOT, 2004, p. 50).
Stelzer (2004, p. 10) sumariza a visão neocon do seguinte modo: “[...] diplomacia se possível,
força se necessário, ONU se possível, coalizões ad hoc ou ação unilateral se necessário;
ataque preemptivo se for razoável para impedir uma ação hostil por parte dos inimigos dos
EUA46” (Tradução nossa) (Grifo nosso).
Em síntese, à luz dos cinco autores selecionados, todos identificados com o
pensamento acadêmico e que produziram trabalhos que buscam explicar e sistematizar a
persuasão neocon, foi elaborado o Quadro abaixo, a fim de permitir a visualização dos pontos
46
“[...] diplomacy if possible, force if necessary, the UN if possible, ad hoc coalitions or unilateral action if
necessary; pre-emptive strikes if it is reasonable to anticipate hostile action on the part of America’s enemies”
(STELZER, 2004, p. 10).
33
47
"Our present danger is one of declining military strength, flagging Will and confusion about our role in the
world" (KAGAN; KRISTOL, 2000, p. 4).
48
Expressão pela qual se tornou conhecida a política externa estadunidense no século XIX, decorrente da
posição declarada do então presidente Monroe, em 1823, de que os EUA não aceitariam a intervenção da
Santa Aliança, nas Américas, para tentar restabelecer o domínio da Espanha, sobre suas colônias que haviam
conquistado a independência (AYERBE, 2006, p. 90).
49
Tendo como pano de fundo o apoio a revolta cubana contra o colonialismo espanhol, a Guerra hispano-
americana teve como estopim a explosão do USS Maine, no porto de Havana. Como resultado, a Espanha
perdeu suas colônias em Cuba e Porto Rico, bem como as Filipinas e Guam. Cuba recebeu a “independência”,
já as Filipinas, Porto Rico e Guam passaram a ser colônias dos EUA (DOPCKE, 2007, p. 105-106).
35
50
Termo utilizado neste trabalho como sendo: “[...] um ramo da ciência política que se formou pela interação
dinâmica de três ramos de conhecimento: a Geografia (espaço físico), a Política (aplicação do Poder à arte do
governar) e a História (experiência humana)”. (MATTOS, 2007, p. 29).
51
Conceito geopolítico apresentado por Nicholas Spykman e que corresponde a dois continentes: a América do
Norte e a América do Sul, separados pelo “Mediterrâneo Americano” (SPYKMAN, 1970, p. 43).
36
como alguns democratas e também aqueles que passaram a ser identificados como
neoconservadores.
Para consolidarmos o entendimento do pensamento neoconservador estadunidense em
relação à política externa, é pertinente explorar uma percepção interna e sua relação de
causalidade com as possíveis posturas em relação ao exterior. Trata-se da percepção de que os
EUA são uma nação fundada sobre valores universais – igualdade, democracia e liberdade – o
que faz com que, junto ao senso comum, os valores “americanos” sejam percebidos como a
“encarnação do bem”. Na Constituição dos EUA esses valores são expressos de forma
inequívoca, já no seu preâmbulo (1787) e na primeira emenda (1789) que ficou conhecida
como Bill of Rights, a seguir transcritos:
Nós, o Povo dos Estados Unidos, a fim de formar uma União mais perfeita,
estabelecer justiça, assegurar a tranqüilidade interna, prover a defesa comum,
promover o bem-estar geral, assegurar as benções da liberdade para nós e nossa
posteridade, ordenamos e estabelecemos esta Constituição para os Estados Unidos
da América52 (Tradução nossa).
Uma nação fundada sobre esses valores passa a ser percebida por seus cidadãos com
uma nação singular, excepcional, por assim dizer, em relação àquelas existentes no século
XVII. Essa percepção se perpetuou de geração para geração e a crença nesse excepcionalismo
“americano”, transborda para a política externa por meio de duas posturas distintas. A
primeira delas identifica-se com a posição defendida por Thomas Jefferson (1743-1826) que o
país melhor serviria à causa da democracia universal por meio do exemplo da sua prática. Era
também a posição de John Quincy Adams (1767- 1848), sexto presidente dos EUA e que
proferiu a célebre frase: "A América não vai para o exterior em busca de monstros para
52
“We the People of the United States, in Order to form a more perfect Union, establish Justice, insure domestic
tranquility, provide for the common defense, promote the general Welfare, and secure the Blessings of Liberty
to ourselves and our Posterity, do ordain and establish this Constitution for the United States of America”
(THE CHARTERS OF FREEDOM. Constitution of United States.
<http://www.archives.gov/exhibits/charters/constitution_transcript.html>).
53
“Congress shall make no law respecting an establishment of religion, or prohibiting the free exercise thereof;
or abridging the freedom of speech, or of the press; or the right of the people peaceably to assemble, and to
petition the Government for a redress of grievances” (THE CHARTERS OF FREEDOM. Bill of Rights.
<http://www.archives.gov/exhibits/charters/bill_of_rights_transcript.html>).
37
destruir. Ela deseja a liberdade e a independência de todos. Ela é a campeã e defensora apenas
dela própria54" (Tradução nossa). Nas posturas supracitadas temos a gênese dos defensores do
isolacionismo estadunidense (FRACHON; VERNET, 2006, p. 26).
A outra postura decorrente da percepção do excepcionalismo “americano” é a do
intervencionismo no exterior. Essa postura remonta à visão de política externa dos presidentes
Andrew Jacson (1829-1837) e Theodore Roosevelt (1901-1908). Nesses dois casos tratava-se
de uma postura intervencionista ostensiva. Mas, outra face desse intervencionismo
apresentou-se matizada na forma de um proselitismo da democracia, revestido de legalidade,
durante a presidência de Woodrow Wilson (1912-1920) (Ibid., p. 27).
Dessas duas visões, a segunda inspira o neoconservadorismo, que promoveu uma
síntese entre o a visão de Andrew Jackson e Woodrow Wilson, estabelecida, não por acaso,
no fim da Guerra Fria. Na primeira metade da década de 1990, com fim do conflito Leste-
Oeste e a posterior dissolução da URSS (1991), a estrutura bipolar do sistema internacional
deixa de existir e os EUA despontam como única superpotência no globo, estando em uma
posição de preponderância militar e política sem precedentes na história estadunidense. Por
outro lado, a ruptura da estrutura bipolar permite a eclosão de surtos de nacionalismos, por
vezes violentos e alimentados pelo extremismo religioso, originando pontos de conflito antes
latentes.
Nesse período de transição de uma estrutura bipolar para algo novo, os
neoconservadores têm uma visão clara de qual deve ser a postura estratégica estadunidense e
que falta às correntes tradicionais da política externa: os EUA têm a força militar e moral para
ordenar a nova estrutura do sistema internacional e evitar o caos e a desestabilização de
regiões importantes para os interesses estadunidenses. A exportação da democracia está em
consonância com os valores “americanos” como também promoverá um incremento na
segurança estadunidense. A força militar incontrastável daquele momento deve ser utilizada
para exportar os valores “americanos”, principalmente a democracia. (Ibid., p. 27).
Conforme será apontado mais adiante neste trabalho, essas ideias são veiculadas de
forma ostensiva, sem refinos que possam impedir suscetibilidades de aliados tradicionais,
principalmente na Europa. As concepções formuladas alinham-se com os valores morais da
“América” – democracia e direitos humanos – portanto são “boas”. Não são imperialistas,
pois não visam à expansão física e territorial dos EUA, mas sim a exportação dos seus valores
54
"But she goes not go abroad in search of monsters to destroy. She is the well-wisher to freedom and
independence of all. She is the champion and vindicator only of her own" (PRESIDENTIAL RHETORIC.
COM. Historic Speeches. John Quincy Adams. Address on U.S. Foreign police, July 4, 1821.
<http://www.presidentialrhetoric.com/historicspeeches/adams_jq/foreignpolicy.html>).
38
e princípios, vistos como aspirações universais. Nesse sentido, sua implementação poderia
levar a democracia aos regimes dos Estados do Oriente Médio, caracterizados pelo
autoritarismo que alimenta o fanatismo religioso capaz de produzir terroristas suicidas
(FRACHON; VERNET, 2006, p. 28).
Essas ideias são formuladas e veiculadas, principalmente pela segunda geração de
neoconservadores que tem como seus expoentes Willian Kristol, Robert Kagan, Paul
Wolfowitz, Richard Perle, Charles Krauthammer, Francis Fukuyama55 entre outros. O artigo
de Willian Kristol e Robert Kagan, intitulado National Interest and global Responsibility que
se tornou o prefácio de Present Dangers: crisis and opportunity in American foreign and
defense policy, publicado em 2000, sintetiza o núcleo duro comum do pensamento
neoconservador no início de século XXI:
55
Vide Apêndice A para consultar a síntese biográfica desses expoentes da segunda geração de
neoconservadores estadunidenses (Nota do autor).
56
“But the collapse of the Soviet empire has not altered the fundamental purposes of American foreign policy.
[…] the overarching goal of American foreign policy – to preserve and extend an international order that is in
accord with both our interests and our principles – endures” (KAGAN; KRISTOL, 2001, p. 12).
57
“[…] so in the post-Cold War era a principal aim of American foreign police should be to bring about a
change of regime in hostile nations – in Baghdad and Belgrade, in Pyongyang and Beijing, and wherever
tyrannical governments acquire the military power to threaten their neighbors, our allies and United States
itself” (KAGAN; KRISTOL, 2001, p. 17).
58
Leo Strauss - foi um filósofo alemão que emigrou para os EUA, fugindo da perseguição nazista na Alemanha
e que lecionou na Universidade de Chicago, até 1973, ano em que faleceu (FUKUYAMA, 2006, p. 32).
59
Estrategista voltado para as questões da dissuasão e da proliferação nuclear, trabalhou na Rand Corporation na
década de 1950 e depois lecionou na Universidade de Chicago (FUKUYAMA, 2006, p. 41).
39
A questão do apoio da opinião pública é algo que não pode ser descartado no
entendimento do alcance e penetração do pensamento neoconservador. Como aponta Richard
Perle: “[...] a política americana é produzida através de instituições representativas que,
seguramente, não podem se afastar muito da opinião pública60” (FRUM; PERLE, 2004, p.
163) (Tradução nossa). Nesse sentido, Perle rebate a crítica de que o pensamento
neoconservador é dissociado de parcela expressiva da população estadunidense e argumenta
que talvez parte do eleitorado que vota também nas primárias do partido republicano, por
exemplo, no Kentucky, perceba que a política externa, principalmente após os atentados de 11
de setembro, deva ser conduzida de forma a combater os inimigos dos valores "americanos”.
Nesse sentido, essa convergência de visões, respalda junto à população estadunidense uma
política externa forte, frente aos desafios com os quais os EUA se defronta, tal qual a
defendida por aqueles que são apelidados de “Falcões”, na administração George W. Bush
(Ibid., p. 163-164).
O respaldo e aceitação dos pontos centrais do pensamento neoconservador, por parte
da opinião pública estadunidense, pode ser percebido nos resultados de algumas pesquisas de
opinião. Em 2003, ano da invasão do Iraque, uma pesquisa efetuada pelo Gallup, apontou que
56% dos “americanos” disseram que os EUA tinham a responsabilidade de ajudar outros
países a livrar-se de ditadores, bem como a se tornarem democracias. Por outro lado, as
pesquisas demonstram que a maioria dos “americanos” não deseja impor suas ideias a outros
países. Uma enquete realizada cinco vezes entre 2003 e 2004 pela CBS News apontou que
entre 48% e 62% dos entrevistados disseram que os EUA deveriam ficar fora das questões
internas de outros países (BOWMAN, 2004, p. 267).
Existem registros de dezenas de pesquisas de opinião efetuadas nos EUA acerca da
principal identificação ideológica da população. Usualmente, essas pesquisas apresentam ao
entrevistado algumas opções para que ele assinale sua identificação e visão política: Liberal,
Conservador, ou Moderado. Em julho de 2004, uma pesquisa efetuada pelo Gallup, CNN e
USA Today registrou que: 39% dos entrevistados se descreviam como Conservadores, 20%
como liberais e 38% como moderados (Ibid., p. 263). Em 2011, o percentual identificado com
o conservadorismo chegou a 41%. O Gráfico1 apresenta a evolução da identificação política
da população dos EUA de 1992 até 2011.
60
“[...] American policy is produced through representative institutions that cannot safely drift too far from
public opinion” (FRUM; PERLE, 2004, p. 163).
41
61
“The goal of American foreign policy should have been to turn what Charles Krauthammer called a “unipolar
moment” into a unipolar era” (KAGAN; KRISTOL, 2000, p. 6).
43
(RDPC) tinha iniciado a produção de material físsil para armas nucleares (KAGAN;
KRISTOL, 2000, p. 6).
Nesse contexto, Saddam Hussein, Slobodan Milosevic e o Regime totalitário da
RDPC, protagonizaram uma crise após outra ao longo da década de 1990, sendo que a
sobrevivência desses regimes estabelecia um distúrbio na “nova ordem mundial62” do período
pós-Guerra Fria, isto é, a mensagem implícita era a de que ditadores poderiam desafiar a paz,
massacrar inocentes no seu próprio Estado, bem como em Estados vizinhos e ainda
permanecer no poder. Para Kagan e Kristol tolerar esses eventos foi uma falha da política
externa estadunidense e que mais tarde voltariam a demandar ações dos EUA. Além disso,
para os dois autores, a década de 1990 foi o período de ascensão de uma China hostil e
beligerante, cujo governo, ao longo daquela década intensificou a repressão interna,
acentuando a falta de liberdade política. A resposta a todos esses comportamentos dissonantes
dos valores e interesses estadunidenses foi, segundo Kagan e Kristol, com poucas exceções,
uma política de apaziguamento (Ibid., p. 6-7).
Para os dois autores, era necessária uma mudança no modo como as lideranças e o
público estadunidense pensavam o papel dos EUA no mundo. Um pensamento sério acerca
desse papel envolvia recordar os princípios que guiaram a política externa estadunidense
durante as fases de sucesso na Guerra Fria (Ibid., p. 9). Os dois autores apontam que:
De fato, a América esteve perseguindo ao menos duas metas durante a Guerra Fria: a
primeira era a promoção de uma ordem mundial útil aos interesses e princípios
americanos; a segunda era a defesa contra o obstáculo mais imediato e ameaçador à
consecução daquela ordem. O esforço despendido para alcançar essa segunda meta
foi tão elevado que, quando a Guerra Fria chegou ao seu fim, muitos americanos
haviam esquecido a necessidade da primeira meta63 (KAGAN; KRISTOL, 2000, p.
12) (Tradução nossa).
62
É pertinente observar como a expressão cunhada pela administração George H. W. Bush, para tentar dar
sentido ao novo contexto do Pós-Guerra Fia apresenta múltiplas interpretações, por parte de múltiplos
segmentos. Como aponta Brzezinski (2007, p. 29-30): “para os tradicionalistas ‘Ordem’ sugere estabilidade e
continuidade; para os reformistas o adjetivo ‘Nova’ implica em um realinhamento de prioridades, para os
internacionalistas e idealistas a palavra ‘Mundial’ carregava a mensagem de que a universalidade seria o ideal
da política”. Essa flexibilidade da expressão, intencional ou não, possibilitou, momentaneamente, a percepção
de compreensão daquela nova e complexa realidade.
63
“In fact, America was pursuing two goals at once during the Cold War: first, the promotion of a world order
conducive to American interests and principles; and second, a defense against the most immediate and
menacing obstacle to achieving that order. The stakes surrounding the outcome of that latter effort became so
high, in fact, that when the Cold War ended, many Americans had forgotten about the former” (KAGAN;
KRISTOL, 2000, p. 12).
44
64
“This is the standard of a global superpower that intends to shape the international environment to its own
advantage” (Ibid., p. 14)
45
No que tange à mudança de regimes, os autores apontam que a tática para sua
implementação pode variar conforme as circunstâncias. Em alguns casos a melhor política
pode ser apoiar grupos rebeldes, tal como foi feito na Nicarágua durante a administração
Reagan. Em outros casos pode ser melhor apoiar dissidentes e (ou) aplicar sanções
econômicas e promover o isolamento diplomático dos regimes hostis aos EUA. Essas táticas
podem ser alteradas ou ajustadas, mas o propósito da política externa deve ser claro: "Quando
lidando com regimes ditatoriais, especialmente aqueles capazes de causar danos aos EUA e
(ou) aos seus aliados, deve ser buscada a transformação e não a coexistência65" (KAGAN;
KRISTOL, 2000, p. 20) (Tradução nossa).
Em 2004, William Kristol escreveu um postscript (2004, p. 75) acerca das suas ideias
expostas ao longo da década de 1990 e consolidadas em Present Dangers. Ele aponta que
nada do que ele havia escrito teve muito impacto durante a década de 1990. Suas ideias
começaram a ser levadas a sério nos círculos de política externa dos EUA, no fim da década
de 1990, mas apenas por uma minoria de republicanos e conservadores. Mesmo com a eleição
de George W. Bush nada aconteceu. No entanto, após os atentados de 11 de setembro de 2001
as lideranças políticas mostraram-se abertas à ideia de que a força, liderança e princípios
“americanos” eram necessários para lidar com os novos perigos que despontavam.
Repentinamente, a ideia de mudança de regimes e promoção da democracia como metas da
política externa estadunidense tornou-se convincente. Desse modo, a sugestão neocon de
“clareza moral” tornou-se importante para a política externa dos EUA. Assim, “essa nova
escola de pensamento pareceu influenciar ou mesmo guiar a administração Bush”,
manifestando-se na derrubada do regime do talibã afegão ao fim de 2001, na promulgação da
National Security Strategy de 2002, e na Guerra contra o Iraque para derrubar Saddam
Hussein em 2003 (Ibid., p. 75-76).
Paralelamente a esse corpo de ideias acerca de política externa, também ganhava
adeptos a linha de pensamento defendida por Charles Krauthammer, denominada por ele
como “realismo democrático”, onde “o interesse nacional não é definido em termos de poder,
mas de valores” (KRAUTHAMMER apud AYERBE, 2006, p. 99). Nesse sentido, a guerra
preventiva e a construção de Estados democráticos representavam uma alternativa coerente
para enfrentar os responsáveis pelo 11 de setembro (AYERBE, 2006, p. 99-100).
Ainda com relação a política externa, um ponto central a ser destacado é que todas as
análises referentes ao neoconservadorismo estadunidense apontam que o pensamento neocon
65
"When it comes to dealing with tyrannical regimes, especially those with the power to do us or our allies
harm, the United States should seek not coexistence but transformation" (KAGAN; KRISTOL, 2000, p. 20).
46
não é monolítico nem unificado. William Kristol, por exemplo, favoreceu a intervenção no
Kosovo, ao passo que Charles Krauthammer se opôs a ela; Kristol e Kagan apoiaram
entusiasticamente a criação de um Estado democrático no Iraque, enquanto James Q. Wilson e
outros viam aquele esforço como destinado ao fracasso. Dificilmente se poderia dizer que o
presidente George W. Bush seguiu cegamente o pensamento neocon como um “Road Map66”,
uma vez que não existia um caminho único nesse pensamento. Mesmo no Iraque, parte dos
neocons pressionava a administração Bush para enviar mais tropas àquele país, ao passo que
outros buscavam uma estratégia aceitável de saída daquele país (STELZER, 2004, p. 14-15).
Na década de 1990, os expoentes neoconservadores dividiam-se, basicamente, em dois
campos, compartilhando três pontos em comum: a oposição ao isolacionismo proposto por
Pat Buchanam67, bem como ao realismo do Secretário de Estado James Baker e do primeiro
presidente Bush, assim como ao humanitarismo cosmopolita da administração Clinton. Mas,
para além dessa convergência, os neocons estavam divididos em duas alternativas. Alguns
como William Kristol e Robert Kagan argumentavam que os interesses "americanos" seriam
melhor servidos por meio da promoção da democracia pelo mundo. Os integrantes dessa
corrente do pensamento neocon defendiam uma vigorosa resposta dos EUA a crises como a
do Kosovo e Ruanda, sendo apelidados, segundo Wolfson de “evangelistas da democracia”.
Mas, ao contrário dos “Wilsonians” liberais, a sua defesa da promoção da democracia e dos
direitos humanos não era um fim si mesma. A promoção da democracia era percebida como
meio para apoiar a segurança e a proeminência dos EUA, sendo, portanto, diretamente
relacionada com o interesse nacional dos EUA (WOLFSON, 2004, p 227).
O segundo campo, cujo principal expoente era Charles Krauthammer, priorizava uma
visão distinta, defendendo uma política externa proativa e baseada em princípios, porém
menos inclinada a ver os interesses nacionais dos EUA como perfeitamente coincidentes com
a promoção da democracia no exterior. Para esses neocons, a meta de fazer da democracia
uma preferência global universalmente aceita era inalcançável. Do mesmo modo, acreditam
que a participação em missões de caráter puramente humanitário, dissociadas dos interesses
dos EUA, como no caso do Kosovo, são mais propensas a fazer com que o público
estadunidense se desinteresse pelos temas de política externa, fortalecendo as posições
isolacionistas, rejeitadas pelo pensamento neoconservador (Ibid., p 227-228).
66
Conceito utilizado neste trabalho, tal como definido por Judit Goldstein e Robert O. Keohane, em Ideas and
Foreign Policy – Beliefes, Institutions, and Political Change (1993, p. 13-14), isto é: um conjunto de ideias
que serviriam de bússola, ou trajetórias conceituais (pathways), para formulação de estratégias para a ação
política.
67
Vide Apêndice A, para síntese biográfica correspondente (Nota do autor).
47
Mais próximo dessa posição, Paul Wolfowitz, em seu artigo Statesmanship in the New
Century (2000), analisa o período imediatamente posterior ao fim da Guerra Fria e apresenta
sua prescrição para política externa dos EUA. No que tange a mudança de regimes e a
promoção da democracia como um dos eixos da política externa dos EUA, ele é categórico ao
afirmar que: "O que é mais impressionante é a freqüência com que a promoção da democracia
tem realmente avançado outros interesses americanos. [...] A mudança democrática não é
apenas uma forma de enfraquecer os nossos inimigos, é também uma maneira de fortalecer os
nossos amigos68" (WOLFOWITZ, 2000, p. 319-320) (Tradução nossa).
No entanto, Wolfowitz alerta quanto ao cuidado para que não se implemente uma
política externa que dedique igual esforço para promover a democracia em todos os lugares,
independentemente de cada circunstancia particular. Nesse sentido ele destaca: “Além da
questão da importância de um país para os interesses dos EUA, não podemos ignorar o
incômodo fato de que as condições econômicas e sociais podem melhor preparar alguns
países para a democracia do que outros69” (Ibid., p. 320).
Ao apontar quais seriam as políticas que os EUA deveriam adotar para minimizar uma
futura guerra (“quente ou fria”) com alguma outra potência, Wolfowitz apresenta quatro
pontos centrais de natureza prática e moral, a seguir sumarizados (Ibid., p. 333-334):
• Fortalecer e ampliar o “consenso” acerca das vantagens da democracia liberal e do
livre mercado.
• Manter e fortalecer a estrutura de aliança dos Estados liberais-democráticos, incluindo
a OTAN e as alianças bilaterais que os EUA têm com outros Estados em outras
regiões.
• Lidar de forma efetiva com os Estados Párias, bem como com outros Estados
perturbadores da ordem internacional.
• Manter a liderança dos EUA, incluindo sua preponderância militar.
Em síntese, à luz dos autores analisados nesta seção e na anterior, podemos evidenciar
no quadro abaixo, os seguintes pontos do pensamento neoconservador estadunidense, acerca
da política externa, no período pós-Guerra Fria:
68
“What is more impressive is how often promoting democracy has actually advanced other American interests.
[…] Democratic change is not only a way to weaken our enemies, it is also a way to strengthen our friends”
(WOLFOWITZ, 2000, p. 319-320).
69
“Aside from the question of the importance of a country for U.S. interests, we cannot ignore the uncomfortable
fact that the economic and social conditions may be better prepare some countries for democracy than others”
(WOLFOWITZ, 2000, p. 320).
48
unilateral dos EUA na promoção da democracia, direitos humanos e livre mercado, bem como
pela manutenção da primazia estadunidense no mundo (BOOT, 2004, p. 45).
Boot argumenta que a lista acima tem nomes de peso, mas também revela que os
neocons não tinham representantes nos escalões superiores da administração Bush. O
presidente Bush, o vice-presidente Dick Cheney, o Secretário de Defesa Donald Runsfeld, o
Secretário de Estado Colin Powell e a Conselheira de Segurança Nacional Condoleezza Rice,
não são identificados, nem se identificam como neoconservadores. Boot aponta Powell como
um liberal internacionalista, e os demais como conservadores tradicionais (Ibid., p. 45). Boot
argumenta que a ideia de que os neocons haviam dominado a Casa Branca ganhou
plausibilidade quando os EUA derrubaram Saddam Hussein e abraçaram a promoção da
democracia no Oriente Médio – ações defendidas por anos pelos expoentes do pensamento
neoconservador. No entanto, Boot argumenta que essas políticas foram implementadas pelo
governo George W. Bush em função dos atentados de 11 de setembro (Ibid., p. 46).
Adam Wolfson (2004, p. 228) ressalta que, quando George W. Bush foi eleito para a
presidente, em 2000, nenhuma das duas visões dominantes do pensamento neocon, acerca da
política externa, parecia causar muita impressão no novo governo dos EUA70. Durante a
campanha presidencial, Bush e seus assessores apontavam para uma política externa contida,
principalmente no que tange às intervenções militares.
Os eixos centrais dessa política externa seriam a preservação da preponderância militar
dos EUA, a correção de alguns tratados afetos ao controle de armas nucleares com a Rússia, e
evitar o engajamento do país em intervenções humanitárias dissociadas dos interesses
estadunidenses (FRACHON; VERNET, 2006, p. 113). Os debates com o candidato
democrata Al Gore, no que tange a política externa, foram em grande parte centrados nas
posições divergentes entre Bush e Gore acerca do emprego das Forças Armadas
estadunidenses como “construtores de nações”, onde Bush criticava o envolvimento dos EUA
em casos como o da Bósnia e da Somália. Mais relevante para esse trabalho é fato de que o
combate ao terrorismo não aparecia como prioridade da política externa de nenhum dos dois
candidatos (BUSH, 2010, p. 205). Mas, os atentados de 11 de setembro de 2001 trouxeram
um novo contexto e uma nova realidade. No período subseqüente aos atentados, o presidente
Bush e seus assessores mais próximos passaram a defender uma política externa enérgica e
nacionalista. Defrontados com uma crise sem precedentes na história da segurança
70
Durante as primárias do Partido Republicano para a escolha do candidato que disputaria a presidência nas
eleições de 2000, a maioria dos neoconservadores apoiava abertamente o senador John McCain e criticava a
proposta de política externa do candidato George W. Bush por ser muito próxima do paradigma realista
(WOLFSON, 2004, p 226).
51
71
Já comentado na seção 1.1.2 deste trabalho (Nota do autor).
72
Think Tank fundado por William Kristol em 1997, com o objetivo de promover a liderança global
“americana”. Outros membros fundadores do PNAC foram Dick Cheney, Donald Runsfeld, Paul Wolfowitz e
Elliot Abrams, todos futuramente ocuparam posições-chave na administração, exceto Kristol (KAGAN;
KRISTOL, 2004, p. 5).
O PNAC é dedicado a disseminar as seguintes proposições: a liderança americana é boa para a América e para
o mundo, e essa liderança exige força militar, energia diplomática e compromisso com princípios morais
(PROJECT FOR A NEW AMERICAN CENTURY - PNAC. About PNAC. Disponível em:
<http://www.newamericancentury.org/aboutpnac.htm/>. Acesso em: 12 jun. 2011).
52
elaboradores - Irving Lewis "Scooter" Libby73 e Paul Wolfowitz74 - eram, então, funcionários
de nível intermediário do Departamento de Defesa, então a cargo de Richard Cheney. Apesar
de alterado para ressaltar o compromisso dos EUA com as Alianças existentes e destacar a
cooperação com os Estados que antes eram vistos como adversários, o documento plantou as
sementes para uma política externa unilateralista pautada no emprego da força militar de
forma preemptiva e, mesmo preventiva, que emergiu uma década depois, com estes
personagens em funções de próximas ao Vice-Presidente e ao Secretário de Defesa
(BRZEZINSKI, 2008, p. 80-81).
Os atentados de 11 de setembro viabilizaram e catalisaram a implementação dessa
política externa, mas existe também um componente decorrente da argumentação e da
capacidade de “persuasão” do pensamento neoconservador na sociedade estadunidense. Essa
“persuasão” apresentava-se disponível tanto nas questões afetas a política externa quanto
naquelas de política interna.
Nesse sentido, as ideias centrais do pensamento neoconservador foram veiculadas em
Think Tanks como o American Enterprise Institute (AEI) e o Project for a New American
Century (PNAC) e em publicações como The Weekly Standard75, The National Interest76 e
The Commentary77 (STELZER, 2004, p. 18). Nesse sentido a força do ideário neocon não
pode ser atribuída aos recursos disponíveis do seu principal Think Tank, o PNAC. Stelzer
aponta que o PNAC, até 2004, nunca teve mais do que quatro funcionários e um orçamento
anual de aproximadamente quatrocentos mil dólares.
73
Irving Lewis "Scooter" Libby exerceu as seguintes funções, durante a década de 1990, no Departamento de
Defesa: 1989-1992 - Deputy Undersecretary for Strategy and Resources; 1992-1995 - Deputy Undersecretary
for Policy. No período 2001 a 2005 retornou ao governo como Chefe de Gabinete e Conselheiro de questões
de Segurança Nacional do Vice-Presidente Dick Cheney (Assistant to the President, Chief of Staff to the Vice
President e National Security Affairs Adviser to the Vice President) (RIGHT WEB. 1992 Draft Defense
Planning Guidance. <http://www.rightweb.irc-online.org/profile/1992_Draft_Defense_Planning_Guidance>).
74
Entre 1989 e 1992 exerceu o cargo de Undersecretary of Defense for Policy. Entre 2001-2005 retornou ao
Departamento de Defesa como Deputy Secretary of Defense, tendo papel de destaque na formulação da
política de resposta aos ataques de 11 de setembro de 2001 (Ibid.).
75
Fundada em 1995 por William Kristol, filho de Irving Kristol, juntamente com Fred Barnes, e John Podhoretz,
a Weekly Standard é um veículo de propagação do neoconservadorismo contemporâneo, apresentando ideias
construídas em alguns Think Tanks neoconservadores, principalmente no Project for the New American
Century e no American Enterprise Institute (RIGHT WEB. Weekly Standard. <http://www.rightweb.irc-
online.org/profile/Weekly_Standard>).
76
Já comentada na seção 1.1 deste trabalho (Nota do autor).
77
Já comentadas na seção 1.1 deste trabalho (Nota do autor).
53
Se comparado com o Hudson Institute78 cujo orçamento era da ordem de oito milhões
de dólares, o orçamento do PNAC é irrelevante. Isso sem falar na Brookings Institution79 que,
em 2004, congregava cerca de 150 acadêmicos e um orçamento anual da ordem de 40 milhões
de dólares. Mesmo o AEI, Think Tank simpático ao pensamento neoconservador tinha, em
2004, 65 acadêmicos e orçamento de 18 milhões de dólares anuais (STELZER, 2004, p. 25).
Em síntese, a implementação das ideias associadas ao pensamento neocon são mais
um produto das circunstâncias específicas do cenário internacional do que o resultado do
sucesso de uma rede de conspiradores constituída por intelectuais que capturou os corações e
mentes do governo Bush. Os atentados de 11 de setembro de 2001 podem ter sido a causa
imediata da adoção de alguns pontos centrais do neoconservadorismo nas questões de política
externa. Mas, Stelzer (2004, p. 13) aponta que havia mais de uma década de debates,
argumentos, publicações nas quais essas ideias vinham tomando corpo e penetrando na
sociedade estadunidense. Essas ideias, já sistematizadas, forneceram a base intelectual para
política externa do governo Bush após os atentados de 11 de setembro.
No que tange à política externa, é também um dos objetivos do presente trabalho,
analisar o processo de decisão da política externa dos EUA, durante o governo do presidente
George W. Bush, após os atentados de 11 de setembro de 2001, a fim de verificarmos “se” e
“como” aquele contexto específico proporcionou a reorientação da política externa
estadunidense de forma consonante com os pontos centrais do pensamento neoconservador,
sem que houvesse neoconservadores nos escalões superiores da administração Bush. Esse é
um ponto central a ser analisado e, para, tanto, no capítulo seguinte, buscaremos analisar o
processo decisório da política externa dos EUA, à luz da Teoria de Unidades de Decisão80, a
fim de identificar quais atores participam desse processo, bem como qual o peso da coesão de
ideias sobre os resultados desse processo, no governo George. W. Bush, após os atentados de
11 de setembro de 2001.
78
O Hudson Institute é um Think Tank fundado em 1961, que se define como não-partidário e dedicado à
pesquisa e análise de temas voltados para a promoção da liberdade, prosperidade e segurança global
(HUDSON INSTITUTE. Mission Statement.
<http://www.hudson.org/learn/index.cfm?fuseaction=mission_statement>) No entanto, congrega entre seus
pesquisadores e colaboradores, alguns expoentes do pensamento neoconservador, tais como: Douglas Feith,
Lewis Libby, Irwin Stelzer e Norman Podhoretz (HUDSON INSTITUTE. Hudson Scholars.
<http://www.hudson.org/index.cfm?fuseaction=hudson_scholars>).
79
Fundada em 1916, a Brookings Institution é o mais antigo Think Tank dos EUA, caracterizando-se por
posições moderadas e suprapartidárias, embora seja considerada como uma instituição mais próxima do
partido democrata (AYERBE, 2006, p. 55).
80
Tal como apresentada por Margareth H. Hermann, em How Decision Units Shape Foreign Policy (Vide
Referências Bibliográficas) (Nota do autor).
54
81
Margaret Hermann é Professora de Ciência Política e diretora do Moynihan Institute of Global Affairs, na
Maxwell School, da Syracuse University. É especialista no estudo de liderança política, tomada de decisão em
política externa e gerenciamento de crises (MAXWELL SCHOOL OF SYRACUSE UNIVERSITY. Margaret
Hermann. < http://www.maxwell.syr.edu/hermann/>).
82
Conforme apontado no Capítulo 1, este é um conceito utilizado neste trabalho, tal como definido por Judit
Goldstein e Robert O. Keohane, em Ideas and Foreign Policy – Beliefes, Institutions, and Political Change
(1993, p. 13-14), isto é: um conjunto de ideias que serviriam de bússola, ou trajetórias conceituais (pathways),
para formulação de estratégias para a ação política (Nota do autor).
55
Nossa pesquisa por esse modelo teórico remeteu, inicialmente, aos consagrados
trabalhos de Graham T. Allison - Conceptual Models and the Cuban Missile Crisis e Essence
of Decision: Explaining the Cuban Missile Crisis - acerca de Modelos de Escolha Racional
aplicados ao processo decisório de política externa. No entanto, ampliando a pesquisa,
estudamos a Teoria de Unidades de Decisão, desenvolvida pela professora Margaret Hermann
e publicada na International Studies Review (2001), com o título How Decision Units Shape
Foreign Policy: A Theoretical Framework. Conforme explica Hermann (2001, p. 48) a
abordagem por ela utilizada foi baseada nos trabalhos já realizados por vários estudiosos dos
processos decisórios em política externa, tais como: Graham T. Allison, Robert Putnam,
Thomas Preston, Joe D. Hagan, Morton Halperin e Charles F. Hermann entre outros. Em
linhas gerais estes trabalhos analisam o processo decisório à luz de modelos que se
concentram na política burocrática, nas dinâmicas de grupo, nos sistemas de assessoria e
aconselhamento presidencial, na política governamental, liderança, políticas de coalizão, e nas
estratégias para lidar com a oposição interna. O modelo proposto por Hermann busca integrar
todas essas abordagens (HERMANN, 2001, p. 48).
Ao ser analisado, o constructo teórico em pauta nos pareceu capaz de responder
adequadamente às perguntas por nós formuladas, e apresentadas na página anterior, portanto,
selecionamos o Modelo proposto por Hermann para avaliar “se” e em que grau o pensamento
neocon esteve presente na administração George W. Bush, tomando por base analítica, à luz
do modelo selecionado, três decisões cruciais da Administração Bush: a declaração da
“Guerra contra o Terror”, a Guerra no Afeganistão e a Guerra no Iraque.
Para tanto, faremos uma descrição sucinta do modelo proposto por Hermann, a fim de
que possamos entender quais os conceitos apresentados pela autora em pauta, bem como a
dinâmica da sua utilização. Em seguida, analisaremos a estrutura legal do governo dos EUA,
nas questões afetas à decisão da política externa, a fim de que possamos evidenciar a estrutura
vigente na administração George W. Bush e, em consonância com ela, aplicar o modelo
teórico proposto por Hermann. Ato contínuo será aplicado o modelo em pauta, nas três
ocasiões específicas supracitadas para a tomada de decisão: a declaração de “Guerra contra o
Terror”, a Guerra no Afeganistão e a Guerra no Iraque. Desse modo, será identificado o lócus
decisório da política externa durante a administração George W. Bush, quais os seus
integrantes, qual a dinâmica decisória vigente, bem como o peso dos pontos centrais do
pensamento neoconservador nas decisões decorrentes do contexto posterior aos atentados de
11 de setembro de 2001.
56
Como base para o seu constructo teórico, Hermann denomina os atores participantes
do processo decisório, no âmbito da política externa, como “Unidades de Decisão”. A
premissa da autora é que existe um modo de classificar estas unidades de decisão que pode
incrementar a nossa capacidade de entendimento e predição do comportamento dos governos
no âmbito da política externa. Ela aponta que três tipos de unidades de decisão são
encontrados nos diversos tipos de organizações políticas: o Líder Predominante, o Grupo
Único, e a Coalizão de Agentes Autônomos (HERMANN, 2001, p. 47).
Embora reconhecendo que existem inúmeros fatores domésticos e internacionais que
podem exercer (e exercem) influência sobre a política externa, Hermann argumenta que estas
influências são necessariamente canalizadas através do aparelho político de um governo, o
qual identifica, decide e executa a política externa. Assim, a política é feita por pessoas, que
se articulam em configurações diversas, dependendo da natureza do problema e da estrutura
do governo. O argumento central é o de que, dentro de qualquer governo, existe um indivíduo
ou um conjunto de indivíduos com a capacidade de empenhar os recursos da sociedade e,
quando confrontado com um problema, possui a autoridade para tomar uma decisão frente a
esse problema. Hermann denomina esse conjunto de decisores como a Unidade de Decisão
Dominante e busca compreender como eles dão forma ao processo de decisão de política
externa (Ibid., p. 47-48).
Em linhas gerais o modelo proposto por Hermann tem as seguintes características e
componentes: (1) aborda a tomada de decisão como uma resposta aos problemas que
envolvem a política externa, sendo que esses problemas implicam em uma Ocasião para
Decisão; (2) tem seu foco em três tipos de Unidade de Decisão Dominante (o Líder
Predominante, o Grupo Único, e a Coalizão de Agentes Autônomos); (3) define os principais
resultados do processo, em função da Unidade de Decisão Dominante; e (4) liga os resultados
desses processos de decisão ao tipo de ação adotada. Quando combinados, estes componentes
articulam uma abordagem alternativa para o estudo da tomada de decisão em política externa.
O diagrama apresentado na Figura 1 apresenta as relações entre desses diferentes
componentes.
57
O Problema
Líder
Predominante
Ação a ser
Adotada
Os conjuntos de fatores considerados por Hermann para determinar qual dos três tipos
de unidades de decisão - o Líder Predominante, o Grupo Único, ou a Coalizão de Agentes
Autônomos - terá a autoridade final para responder a uma ocasião para decisão, levam em
conta tanto as estruturas formais quanto as informais de um determinado governo. A questão-
chave a ser respondida é: onde, na estrutura de um governo, o problema está sendo discutido e
recebendo atenção? Para responder a essa pergunta, precisamos determinar como o governo é
legalmente estruturado, bem como observar as normas que têm surgido em torno dos arranjos
institucionais vigentes. O foco deve estar, inicialmente, nas estruturas formais do governo
analisado, para depois passarmos para as estruturas informais que podem estar atuando nessa
59
À luz do exposto até o momento, a pergunta central é: quais são as regras para
identificar qual desses tipos de unidades de decisão tem a autoridade final, quando as
entidades têm características dos três tipos? Hermann argumenta que, para essa resposta,
precisamos de outras questões correlatas acerca de cada uma das unidades de decisão
consideradas. Assim, quando a ocasião para uma decisão é da competência de um Líder
Predominante, que utiliza conjunto de conselheiros, cabem os seguintes questionamentos:
Será que esse Líder Predominante tende a usar os seus conselheiros como consultores para
fornecer-lhe informações e conhecimentos, mas reserva-se o direito de tomar por a si só a
decisão? Ou será que este líder vê seus conselheiros como uma equipe que, com ele, toma as
decisões sobre as questões consideradas? No primeiro caso, teríamos uma unidade de decisão
tipo Líder Predominante. Já no segundo caso, teríamos um Grupo Único com um Líder
Predominante. Em outras palavras, enquanto o líder mantém a capacidade de fazer a escolha
de sua preferência, a unidade de decisão é do tipo Líder predominante. Se, no entanto, o líder
vê os conselheiros como membros de uma equipe de tomada de decisão, a unidade de decisão
assume as características de um Grupo Único que é interativa e coletiva na sua tomada de
decisão (HERMANN, 2001, p. 63).
Do mesmo modo, em sistemas de governos parlamentaristas, um gabinete de coalizão
é um Grupo Único, se a dinâmica e as estruturas dos partidos representados na coligação não
interferem no processo decisório. Um governo de coalizão funciona como múltiplos atores
independentes, quando os membros do gabinete geralmente participam de um processo de
dois níveis, em que há interação com os líderes dos partidos, bem como com outros membros
do gabinete no enfrentamento de problemas (Ibid., p. 63).
alguns dos envolvidos no processo de decisão têm suas preferências aceitas na decisão
adotada. Já no “acordo” (concurrence) há um senso comum que é evidente nas preferências
dos envolvidos no início do processo. Um “compromisso mútuo” indica que todas as partes
da unidade de decisão cederam algumas das suas posições, a fim de não perderem
participação no processo decisório. O “consenso” é um tipo particular de compromisso
mútuo, no qual todos cedem para que seja alcançada uma decisão aceita por todos. Com o
“impasse”, os componentes da unidade de decisão “concordam apenas em discordar” e,
portanto, nenhuma decisão pode ser tomada. Já a “ação simbólica fragmentada” é um impasse
em que o desacordo é exposto publicamente, com cada decisor tentando agir por conta própria
e / ou reclamando sobre o comportamento dos demais” (HERMANN, 2001, p. 68-69).
Desse modo, quando ocorre o “impasse” e / ou a “ação simbólica fragmentada” a
unidade é incapaz de tomar uma decisão. Em um “compromisso mútuo”, seja ele consensual
ou não, todos têm parte de suas preferências parcialmente atendidas. No “acordo”
(concurrence), a decisão representa as preferências compartilhadas por todos. Em síntese,
apenas na situação de “acordo” (concurrence) a decisão representa o que todos querem (Ibid.,
p. 69).
No que tange aos resultados, a decisão tende a ser mais extrema quando existe
“acordo” (concurrence), do que quando há “compromisso”. Isso porque no “acordo”
(concurrence) existe um senso comum daquilo que precisa ser feito para lidar com o
problema, isto é, existe uma forte coesão e um senso comum que é evidente nas preferências
dos envolvidos no início do processo. Assim sendo, os participantes podem (ou não) tomar
iniciativas, comprometendo (ou recusando-se a comprometer) os recursos, engajando em
atividades militares e econômicas, não se restringindo apenas à diplomacia. A decisão é clara,
tanto no que tange a cooperação quanto ao conflito. Já o “compromisso mútuo” leva a um
comportamento mais moderado da política externa, uma vez que implica em concessões
mútuas entre as unidades de decisão. Por outro lado, o “impasse” normalmente resulta em
mínima ou nenhuma ação (Ibid., p. 69-70).
O modelo proposto por Hermann foi por ela aplicado no exame de, aproximadamente,
cinco mil decisões, no contexto de 25 países, ao longo de uma década que, em síntese,
apresentaram as seguintes convergências: decisões resultantes de um processo de “acordo”
(concurrence) envolvem um maior comprometimento de recursos por parte do governo, maior
expressão de ações de cooperação ou conflito e maior foco sobre os instrumentos econômicos
e militares da política, em oposição a medidas apenas diplomáticas. No outro extremo,
63
Para prover o presidente dos EUA com o necessário apoio para o exercício do
governo, foi criado, em 1939, pelo presidente Franklin D. Roosevelt, o Escritório Executivo
do Presidente83 (EOP). Essa estrutura, administrada pelo Chefe de Gabinete da Casa Branca,
congrega os mais próximos assessores do Presidente, sendo constituído pelos seguintes
órgãos84:
• Council of Economic Advisers;
• Council on Environmental Quality;
• National Security Council (NSC) and Homeland Security Council (Grifo
nosso);
• Office of Administration;
• Office of Management and Budget;
• Office of National Drug Control Policy;
• Office of Science and Technology Policy;
• Office of the United States Trade Representative;
• Office of the Vice President;
• Executive Residence; e
• The White House.
Dentre os órgãos componentes do EOP, o Conselho de Segurança Nacional (National
Security Council - NSC) é o principal fórum para as questões afetas à segurança nacional e
83
Executive Office of the President (EOP) (Nota do autor).
84
THE WHITE HOUSE. Executive Office of The President (<http://www.whitehouse.gov/administration/eop>).
64
85
O Conselho de Segurança Nacional foi criado por meio do National Security Act of 1947 (PL 235 - 61 Stat.
496; U.S.C. 402), alterado pelo National Security Act Amendments of 1949 (63 Stat. 579; 50 U.S.C. 401 et
seq.). Mais tarde, em 1949, como parte do Plano de Reorganização, o Conselho foi colocado na estrutura
organizacional do Escritório Executivo do Presidente (THE WHITE HOUSE. President George W. Bush.
National Security Council. <http://georgewbush-whitehouse.archives.gov/nsc/>).
86
THE WHITE HOUSE. President George W. Bush. National Security Council (<http://georgewbush-
whitehouse.archives.gov/nsc/>).
87
Ibid.
65
fim de podermos iniciar a aplicação do modelo teórico das Unidades de Decisão, na Ocasião
para a Decisão, decorrente dos atentados de 11 de setembro de 2001. O Quadro 3, sumariza a
composição do NSC, no período compreendido entre 2001 e 2003:
À luz do exposto podemos perceber que o núcleo decisório das questões afetas à
segurança nacional e política externa se concentra entre os membros regulares do NSC, isto é,
o Presidente, o Vice-Presidente, os Secretários de Estado, do Tesouro e de Defesa, e o
66
Conselheiro de Segurança Nacional. Também fica evidente que a estrutura formal do governo
dos EUA, para as questões afetas à política externa, favorece a ação da unidade de decisão
tipo Líder Predominante, pois o presidente é o decisor de última instância nessas questões,
sendo o NSC o lócus onde os problemas de política externa recebem atenção e são discutidos.
No entanto, em consonância com o modelo teórico que estamos utilizando, cabe a seguinte
questão: o presidente Bush utilizava seus conselheiros como consultores para fornecer-lhe
informações e conhecimentos, reservando-se o direito de tomar por si só a decisão? Ou será
que via seus conselheiros como uma equipe que, com ele, tomava as decisões sobre questões
consideradas? Conforme visto anteriormente, a resposta afirmativa para a primeira pergunta
apontará para a Unidade de Decisão Dominante tipo Líder Predominante. Já a resposta
afirmativa para a segunda questão indicará que a Unidade de Decisão Dominante é o Grupo
Único. Portanto, para respondermos a essas questões e, assim, identificarmos qual tipo de
unidade de decisão dominante era favorecida no governo George W. Bush precisamos de
mais informações sobre como o Presidente em pauta utilizava seus assessores do NSC, nas
questões afetas à política externa.
romano do fogo e da metalurgia. Começou como uma brincadeira, entre Richard Armitage,
Condoleezza Rice, e Paul Wolfowitz, mas capturou a imagem que a equipe de política externa
de Bush percebia como adequada a campanha, isto é, transmitia uma ideia de poder,
tenacidade e durabilidade.
Com a eleição de Bush, e a subseqüente posse do presidente eleito e dos integrantes da
sua administração, em janeiro de 2001, a equipe de política externa formada parecia, nas
palavras de James Mann (2004, p. x), “a class reunion”. Isso porque muitos dos integrantes
dessa equipe já tinham trabalhado juntos em outras administrações presidenciais, e os laços
entre eles eram fortes. Assim, por exemplo, Donald Rumsfeld, o novo Secretário de Defesa,
havia trabalhado com o novo Vice-Presidente Richard Cheney, durante a administração
Nixon. Por sua vez, Cheney, quando fora Secretário de Defesa, durante o governo George H.
W. Bush havia indicado Colin Powell para o cargo de Chairman of the Joint Chiefs of Staff,
tendo trabalhado juntos por cerca de três anos. Richard Armitage, o novo Deputy Secretary of
State, havia trabalhado com Powell, no Pentágono, durante a administração Reagan. Paul
Wolfowitz, o novo Deputy Secretary of Defense, havia trabalhado em estreita colaboração
com Armitage, durante o governo Reagan. Além disso, Wolfowitz também servira no
Pentágono como assistente de Cheney, na administração “Bush pai”. Até mesmo Condoleezza
Rice, trabalhara, na assessoria de segurança nacional, na tarefa de coordenação política em
relação com a URSS, durante a administração de George H. W. Bush (Ibid., p. x).
E o presidente George W. Bush? Onde ele se encaixa nesse contexto? É notório que o
presidente não havia lidado com questões de política externa antes de 2001. Assim, em
decorrência dessa falta de experiência em política externa, ele contava com seus assessores
para ideias e informação. Para Mann (2004, p. xix), o presidente George W. Bush não poderia
tomar decisões de política externa se esses assessores não apresentassem as possíveis
escolhas. Do mesmo modo, o novo presidente não poderia formular uma política externa que
não emanasse das ideias apresentadas por esses assessores. Mesmo assim, esse contexto, não
minimiza sua importância no processo decisório, pois Bush, como presidente, continuava a
ser, formalmente, o decisor de última instância, isto é, aquele que decidia quando não havia
consenso entre seus assessores (Ibid., p. xix).
Nesse contexto, onde fica patente a inexperiência do presidente George W. Bush nas
questões afetas à política externa e, paralelamente, o modo como ele montou uma equipe de
assessores nessa área, com notada experiência pregressa, podemos depreender que o
presidente George W. Bush via seus conselheiros como uma equipe que forneceria todos os
subsídios para que ele pudesse decidir de forma adequada as questões de política externa, o
68
que aponta para uma unidade de decisão do tipo Líder Predominante. No entanto, se na
prática o presidente em pauta utilizasse seus assessores e conselheiros como membros de uma
equipe de tomada de decisão, nas questões de política externa tratadas no NSC, a unidade de
decisão dominante passaria a ser a de um Grupo Único com um Líder Predominante.
Identificado o lócus decisório, bem como os tipos mais prováveis de Unidade de
Decisão Dominante, no início do primeiro mandato do presidente Bush e considerando como
a Ocasião para a Decisão, o contexto decorrente dos atentados de 11 de setembro 2001, falta
ainda determinar se havia a existência de um senso comum nas preferências dos integrantes
do Grupo Único em pauta, para avaliarmos a natureza dos resultados possíveis em um
processo de tomada de decisão, ou seja, a “prevalência da posição de uma das partes”, o
“acordo” (concurrence), o “compromisso mútuo”, o “consenso”, o “impasse” e a “ação
simbólica fragmentada”. Para tanto, inicialmente, será evidenciado o grau de coesão do grupo
de assessores que, conforme exposto, tornou-se, para fins práticos, o principal alicerce em
política externa do presidente George W. Bush, isto é: Richard Cheney, Donald Rumsfeld,
Colin Powell, Condoleezza Rice, Paul Wolfowitz e Richard Armitage.
Para James Mann, os Vulcans, como grupo, encarnavam uma geração única na política
externa norte-americana, distinta de outras duas que fizeram história: os denominados Wise
Men (tais como Dean Achenson, George Kennan e Averell Harriman88), que criaram uma
nova política externa para os EUA nos anos subseqüentes à Segunda Guerra Mundial; ou os
Best and Brightest (que congrega Robert McNamara, McGeorge Bundy e Walt W. Rostow89)
que deram os rumos da política externa dos EUA na década de 1960. Mann aponta que os
Wise Men eram originários do mundo dos negócios, banqueiros ou advogados; homens
ligados a Wall Street e à rede de bancos de investimentos e empresas. Os chamados Best and
Brightest tinham suas origens na academia, nos campi de Cambridge, Massachusetts e
Harvard, onde muitos estudaram ou lecionaram. Já os Vulcans, pertenciam a um grupo
“militarizado”. Sua instituição comum era o Pentágono. A nova equipe de política externa do
governo George W. Bush incluía dois ex-Secretários de Defesa (Cheney e Rumsfeld), um ex-
Chairman of the Joint Chiefs of Staff (Colin Powell), um ex-Subsecretário de Defesa
88
Vide Apêndice A para consultar a síntese biográfica desses personagens históricos (Nota do autor).
89
O mesmo da nota anterior (Nota do autor).
69
democratas que se preocupavam com os abusos do poder e buscavam coibir esses abusos por
meio de acordos internacionais. Além disso, os Vulcans tendiam a ser otimistas acerca da
capacidade e do futuro dos EUA. Nesse sentido, eles diferem da perspectiva sombria de
Kissinger, que por perceber uma América enfraquecida, necessitava da détente. Os Vulcans,
ao contrário, assumiam que os EUA eram fortes e continuariam fortes (MANN, 2004, p. xvii).
Os dois pontos centrais supracitados, relativos à coesão dos Vulcans, isto é, a
percepção maniqueísta dos valores “americanos” como representantes do “Bem”; e o
otimismo acerca do poder e do futuro dos EUA, apresentam convergência com alguns dos
pontos centrais do pensamento neoconservador, evidenciados no Capítulo 1 deste trabalho.
No entanto, a convergência em pauta não é suficiente para apontar que a coesão existente
entre os principais assessores de política externa do presidente George W. Bush era cimentada
em torno dos pontos centrais do pensamento neoconservador, ou mesmo que o
neoconservadorismo era algo compartilhado por Cheney, Rumsfeld, Powell, Rice, Wolfowitz
e Armitage90.
À luz do exposto, dada a coesão dos Vulcans e o núcleo central de ideias por eles
compartilhadas – a crença nos valores “americanos”, bem como no poder e no futuro dos
EUA -, podemos inferir que o resultado possível das interações numa das duas possíveis
Unidades de Decisão Dominantes, o Líder Predominante ou o Grupo Único com Líder
Predominante, cujo lócus decisório se encontrava no NSC, tendia, para um resultado do tipo
“acordo” (concurrence). Em consonância com o modelo de Hermann, adotado neste trabalho,
a tendência quanto aos resultados tipo “acordo” (concurrence) é a da decisão se aproximar de
posições mais extremadas e pautadas no emprego da força militar e/ou da coerção econômica,
pois essa decisão é tomada em um contexto onde existe uma preferência comum em relação
àquilo que precisa ser feito para lidar com o problema.
Uma vez identificado o lócus decisório das questões de política externa da
administração George W. Bush (o NSC); as duas possíveis unidades de decisão dominantes
(Líder Predominante e Grupo Único com Líder predominante) e o grau de coesão e ideias
compartilhadas será analisado o resultado da decisão decorrente da Ocasião para a Decisão
oriunda dos atentados de 11 de setembro de 2001.
90
Apesar dos três primeiros, indiscutivelmente, terem ligações com o PNAC, um Think Tank, conforme já
comentado, ligado ao neoconservadorismo (Nota do autor).
71
Eu havia pensado cuidadosamente sobre o que eu queria dizer. Eu comecei com uma
declaração clara. “Estamos em guerra contra o terror. Deste dia em diante, esta é a
nova prioridade da nossa administração". [...] Então eu me virei para George Tenet e
perguntei: “Quem fez isso?" George respondeu com duas palavras: al-Qaeda92.
(BUSH, 2010, p. 134) (Tradução nossa).
Com base no relato do presidente George W. Bush, ainda na em Offutt ele já deixara
claro que tencionava utilizar a força militar no momento certo, e a resposta não seria apenas
um ataque de mísseis “Cruise” (Ibid., p. 135). Naquele mesmo dia o presidente Bush retornou
para Washington e pronunciou um discurso no salão oval da Casa Branca, em cadeia
nacional, destacando que naquele dia, o modo de vida e os valores "americanos" foram
atacados em uma série deliberada de atos terroristas e que ele (o presidente) estava aplicando
todos os recursos disponíveis para encontrar e fazer justiça aos responsáveis pelos ataques. O
91
“Ladies and gentlemen, this is a difficult moment for America; two airplanes have crashed into the World
Trade Center in an apparent terrorist attack on your country” (BUSH, 2010, p. 128).
92
"I had thought carefully about what I wanted to say. I started with a clear declaration. “We are at war against
terror. From this day forward, this is the new priority of our administration”. […] Then I turned to George
Tenet. “Who did this?” I asked. George answered with two words: al Qaeda" (BUSH, 2010, p. 134).
72
ponto central do discurso, no que tange à política externa, é que “não seria feita distinção
entre os terroristas que cometeram aqueles atos e aqueles dessem abrigo a eles93” (BUSH,
2010, p. 138) (Tradução nossa).
Após o discurso o presidente Bush reuniu o NSC para uma atualização das
informações disponíveis, bem como para iniciar o desenvolvimento das opções de resposta
aos ataques. No dia 12 de setembro, o NSC foi novamente reundo na Casa Branca e George
Tenet, o Diretor da CIA, confirmou que Osama Bin Laden era o responsável pelos atentados.
Também no dia 12 de setembro, o presidente Bush fez um novo pronunciamento, muito mais
incisivo, destacando que os atentados não eram apenas “atos de terror”, mas sim “atos de
guerra”: “Os ataques deliberados e mortais que foram realizadas ontem contra o nosso país
foram mais do que atos de terror, eles foram atos de guerra94” (Ibid., p. 141).
A forma final da reação aos “atos de guerra” executados contra os EUA foi
comunicada aos estadunidenses e ao mundo no discurso proferido pelo presidente no
Congresso, na sessão conjunta do dia 20 de setembro de 2001:
93
“We will make no distinction between the terrorists who committed these acts and those who harbor them”
(BUSH, 2010, p. 138).
94
“The deliberate and deadly attacks which were carried out yesterday against our country were more than acts
of terror, they were acts of war” (BUSH, 2010, p. 141).
95
"On September the 11th, enemies of freedom committed an act of war against our country. […] Our war on
terror begins with al Qaeda, but it does not end there. It will not end until every terrorist group of global
reach has been found, stopped and defeated. […] Americans are asking: How will we fight and win this war?
We will direct every resource at our command -- every means of diplomacy, every tool of intelligence, every
instrument of law enforcement, every financial influence, and every necessary weapon of war -- to the
disruption and to the defeat of the global terror network. […] From this day forward, any nation that
continues to harbor or support terrorism will be regarded by the United States as a hostile regime. […]The
course of this conflict is not known, yet its outcome is certain. Freedom and fear, justice and cruelty, have
always been at war, and we know that God is not neutral between them" (USA. Homeland Security
Department. Speeches and Statements. Address to a Joint Session of Congress and the American People
<http://www.dhs.gov/xnews/speeches/speech_0016.shtm>).
73
É pertinente destacar que essa Resolução foi aprovada por 98 votos “a favor” e
nenhum “contra” no Senado e 420 votos “a favor” e um “contra” na Câmara dos Deputados
(BUSH, 2010, p. 154). Ela reflete a coesão nacional daquele momento que respaldou a
declaração da “Guerra contra o Terror”, pois conferia ao presidente amplos poderes para
empregar os recursos da nação, incluindo a força, como apropriado, em resposta aos ataques
sofridos, bem como de forma a prevenir novos ataques.
Também não podemos ignorar, a despeito do modelo utilizado para apresente análise
que, o primeiro e mais marcante efeito político dos atentados terroristas de 11 de setembro foi
um salto enorme na aprovação pública do presidente Bush. Na pesquisa Gallup, realizada
entre 07-10 de setembro de 2001, a aprovação pública do presidente era de 51%. A pesquisa
seguinte, efetuada entre 14-15 setembro, registrou 86% de aprovação97. Assim, o ponto a ser
destacado é que o amplo apoio da opinião pública contribuiu sobremaneira para reforçar o
ímpeto da decisão tomada pela Unidade de Decisão Dominante, quanto ao desencadeamento
da denominada “Guerra contra o Terror”.
Nesse contexto, não identificamos a Decisão Resultante do processo decisório iniciado
os atentados de 11 de setembro de 2001, isto é, a declaração da “Guerra contra o Terror”
como decorrente da persuasão neoconservadora, nem como associada aos pontos centrais do
pensamento neocon quanto a política externa, evidenciados no Capítulo 1 deste trabalho.
Assim, a declaração da “Guerra contra o Terror”, a primeira das três decisões cruciais da
Administração Bush selecionadas para verificarmos a penetração do pensamento neocon na
96
"That the President is authorized to use all necessary and appropriate force against those nations,
organizations, or persons he determines planned, authorized, committed, or aided the terrorists attacks that
occurred on September 11, 2001, or harbored such organizations or persons, in order to prevent any future
acts of international terrorism against the United States by such nations, organizations, or persons" (BUSH,
2010, p. 154).
97
GALLUP ORGANIZATION. Presidential Job Approval Center
(<http://www.gallup.com/poll/124922/Presidential-Approval-Center.aspx>).
75
98
O United States Central Command (CENTCOM) é um dos 10 comandos combatentes da estrutura militar dos
EUA. Seis destes comandos, incluindo o CENTCOM, têm como área de responsabilidade uma região
geográfica específica do globo, onde podem vir a planejar e conduzir operações militares. O CENTCOM foi
estabelecido em 1983, abrangendo a área “central” do globo, localizada entre os Comandos da Europa e do
Pacífico, a qual compreende 20 países: Afeganistão, Bahrein, Egito, Irã, Iraque, Jordânia, Cazaquistão,
Kuwait, Quirguistão, Líbano, Omã, Paquistão, Qatar, Arábia Saudita, Síria, Tadjiquistão, Turcomenistão,
Emirados Árabes Unidos, Uzbequistão e Yemen (USA. United States Central Command. About CENTCOM.
<http://www.centcom.mil/about-u-s-central-command-centcom>).
99
“I Just want to make sure that all of us did agree on this plan, right?” (BUSH, 2010, p. 199).
100
“They all agreed” (Ibid., p. 199).
79
Bush, a Unidade de Decisão Dominante, na prática, foi o Grupo Único, com lócus no NSC e
cujos integrantes apresentavam forte grau de coesão e visão de mundo compartilhada. Além
disso, o contexto externo de apoio praticamente consensual aos EUA, bem como o ambiente
interno de forte união nacional diante da agressão sofrida, reforçaram a ocorrência da decisão
pautada no “acordo” (concurrence). O resultado desse processo foi a Guerra no Afeganistão, e
a Figura 3 sintetiza nossa análise, à luz do modelo das Unidades de Decisão:
posições divergentes entre Bush e Gore acerca do emprego das Forças Armadas
estadunidenses como “construtores de nações”. O então candidato Bush era contra missões
como as que foram realizadas na Bósnia e na Somália, percebidas como fatores que poderiam
levar a uma sobrecarga das Forças Armadas em missões não relacionadas com a atividade
fim. Nas palavras do presidente Bush: “Eu disse no primeiro debate [...] Eu terei muito
cuidado ao usar as nossas tropas como construtores de nação101” (BUSH, 2010, p. 205)
(Tradução nossa).
Quase que como uma ironia do destino, o presidente Bush mudou essa percepção após
os eventos de 11 de setembro de 2001. O uso da força militar no Afeganistão foi concebido
para, após a derrubada do Talibã e a debilitação da al-Qaeda, empregar as forças militares dos
EUA e dos demais integrantes da coalizão na estabilização do país e na construção de uma
sociedade democrática. Conforme declara o próprio presidente Bush:
[...] Depois do 9 / 11, eu mudei minha percepção. [...] Nós tínhamos libertado o país
de uma ditadura primitiva, e nós tínhamos a obrigação moral de deixar algo melhor.
Tivemos também um interesse estratégico em ajudar o povo afegão a construir uma
sociedade livre. [...] Um Afeganistão democrático seria uma alternativa promissora à
visão dos extremistas102 (BUSH, 2010, p. 205) (Tradução nossa).
O ponto central a ser destacado em nossa análise é que, no início do seu governo, os
indícios eram os de que as prioridades da política externa da administração Bush estariam
associadas à defesa dos interesses estadunidenses, reduzindo a participação externa em
eventos que não estivessem em consonância com esses interesses. Assim, conforme exposto
na seção 1.4 deste trabalho, os eixos centrais dessa política externa seriam a preservação da
preponderância militar dos EUA, a correção de alguns tratados afetos ao controle de armas
nucleares com a Rússia, e evitar o engajamento do país em intervenções humanitárias
dissociadas dos interesses dos EUA (FRACHON; VERNET, 2006, p. 113).
Nos primeiros meses do governo Bush, o Oriente Médio despontava como uma região
na qual o status quo satisfazia à visão do núcleo central da equipe de política externa da
administração Bush. A manutenção do apoio a Israel e das alianças com a Arábia Saudita e
Egito seriam pontos a preservar. Nada indicava ameaças significativas à segurança dos EUA
101
“I Said in the first debate [...] I would be very careful about using our troops as nation builders” (BUSH,
2010, p. 205).
102
“[...] after 9/11, I changed my mind. [...] We had liberated the country from a primitive dictatorship, and we
had a moral obligation to leave behind something better. We also had a strategic interest in helping the
Afghan people build a free society. […] A democratic Afghanistan would be a hopeful alternative to the vision
of the extremists” (Ibid., p. 205).
81
que viviam um momento de economia saudável e força militar predominante sob quaisquer
aspectos que fosse analisada. Mas, os atentados de 11 de setembro interrompem de forma
abrupta essa aparente invulnerabilidade "americana" (FRACHON; VERNET, 2006, p. 113).
Naquela data, um ator não-estatal surpreendeu a todos com uma ação destinada a
matar o maior número possível de pessoas em dois dos maiores símbolos dos EUA, o
Pentágono e o World Trade Center. Nesse contexto, as ideias oriundas de um segmento do
pensamento político dos EUA – o neoconservadorismo – começam a ressonar dentro da
sociedade estadunidense. Desde o término da Guerra Fria, alguns de seus expoentes, tais
como William Kristol, Lawrence Kaplan e Robert Kagan destacavam a necessidade de
“mudanças de regime” e promoção da democracia no Oriente Médio. Após o 11 de setembro
de 2001, os neoconservadores são lembrados como aqueles que, há anos, questionavam as
boas relações com regimes árabes autoritários, financiadores do islã radical e incapazes de
levar os benefícios da modernidade aos seus povos, em prol da manutenção da estabilidade na
região. Os atentados de 11 de setembro apontam que esse status quo alimentou o terrorismo
que acabava de golpear os EUA (Ibid., p. 114). Nos momentos subsequentes aos atentados,
onde o governo e a população dos EUA pareciam atônitos, os neocons despontaram como
aqueles que tinham a explicação para o que ocorreu e, mais importante, aparentavam ter uma
estratégia para lidar com essa nova situação.
No entanto, à luz da pesquisa efetuada podemos inferir que a decisão de empregar a
força militar contra a al-Qaeda e o regime teocrático do Talibã no Afeganistão foi decorrente
do desejo e necessidade de revidar o ataque sofrido, mas, principalmente, foi uma ação que se
configurava como consonante com o objetivo maior de impedir novos ataques da al-Qaeda.
Para tanto, era também necessário destruir seus santuários, isto é, a parte tangível da rede
terrorista encastelada no Afeganistão e apoiada pelo Talibã. Um ponto de contato com os
pontos centrais do pensamento neoconservador em política externa, evidenciados no Capítulo
1, encontra-se presente na importância da mudança de regime103: pois uma democracia afegã,
estaria contribuindo diretamente para o incremento da segurança dos EUA. No entanto, dado
o contexto imediatamente posterior ao 11 de setembro, esse não foi o aspecto central e
determinante da decisão de empregar a força militar no Afeganistão. Até mesmo a construção
de uma ampla coalizão, bem como da ação dentro do contexto do Conselho de Segurança da
ONU, isto é, dentro do Direito Internacional, apontam que a ação militar no Afeganistão, foi
103
Em consonância com o apresentado na seção 1.3 desta dissertação, recordamos o ponto central em pauta:
Exportar a democracia, inclusive por meio do emprego da força, não por humanitarismo, mas porque a
disseminação da democracia liberal aumentará a segurança dos EUA (Nota do autor).
82
No dia 19 de março de 2003, com o NSC reunido na Situation Room da Casa Branca,
o presidente Bush teve uma videoconferência com o General Tommy Franks (que estava na
base Aérea Prince Sultan na Arábia Saudita) e os Comandantes do Exército, Marinha,
83
Fuzileiros, Força Aérea e Operações Especiais. A todos eles o presidente perguntou se tinham
tudo o que precisavam para vencer e se estavam confortáveis com a estratégia concebida.
Todos responderam afirmativamente (BUSH, 2010, p. 223). A partir daquele momento
iniciava-se a Guerra no Iraque.
Antes de avançarmos na análise da decisão de empregar a força militar para depor
Saddam Hussein e efetivar a mudança de regime no Iraque é pertinente ressaltar que, na
década de 1990, o projeto de remover Saddam Hussein do poder já estava presente em parte
significativa do ideário político estadunidense, notadamente entre os principais expoentes do
pensamento neoconservador.
Com término da Guerra Fria e o posterior desaparecimento da URSS, em 1991, os
neoconservadores apontavam que essa nova era não implicaria, necessariamente, em um
período de paz e estabilidade global, nem no término das ameaças à segurança dos EUA.
Assim, conforme será exposto nesta seção, desde o início da década de 1990, os
neoconservadores delinearam o perfil do próximo inimigo: os regimes radicais que sustentam
grupos terroristas e buscam armas de destruição em massa (FRACHON; VERNET, 2006, p.
13). Nesse contexto, o Iraque aparece de forma recorrente entre as ameaças apontadas pelos
expoentes do neoconservadorismo. Mas quais os motivos para essa percepção? Por que o
Iraque?
Por uma série de fatores correlatos que, articulados ao longo do tempo, fornecem o
arcabouço para que Saddam Hussein seja percebido como uma ameaça, no mínimo potencial
aos EUA, principalmente no contexto posterior aos atentados de 11 de setembro de 2001. Em
1991, Saddam é visto como um tirano da pior espécie que desencadeara uma guerra contra o
Irã que durou oito anos (1980-1988) e depois iniciou outro conflito militar ao invadir o
Kuwait em agosto de 1990. Além disso, Saddam é também percebido como um ditador que
oprime os dois maiores segmentos da população iraquiana: os curdos e os xiitas (Ibid., p. 9-
10). No entanto, desde a sua derrota para a coalizão liderada pelos EUA, em 1991, o Iraque
foi colocado sob controle dos inspetores de desarmamento da ONU. Desde então o Iraque
pode ser considerado um país sob vigilância permanente e com soberania limitada (Ibid., p.
11).
Nesse contexto, o Iraque não pode ser uma ameaça. Mas, a postura de Saddam frente
aos inspetores de armas da ONU, na segunda metade da década de 1990, reacende os
holofotes da política externa estadunidense quanto ao Iraque. Com a expulsão dos inspetores
da ONU, a política de contenção de Saddam Hussein passa a ser percebida como inócua, pois
o ditador iraquiano continua a desafiar a comunidade internacional. Nesse contexto, em
84
janeiro de 1998, por iniciativa do Project for a New America Century (PNAC), os expoentes
do neoconservadorismo, bem com outras personalidades ligadas à política estadunidense
subscreveram uma carta ao presidente Clinton, com o propósito de convencê-lo a derrubar
Saddam Hussein, já que as sanções aplicadas sob os auspícios da ONU mostravam-se
ineficazes para conter Saddam. O documento foi assinado por: Elliott Abrams, Richard L.
Armitage, William J. Bennett, Jeffrey Bergner, John Bolton, Paula Dobriansky, Francis
Fukuyama, Robert Kagan, Zalmay Khalilzad, William Kristol, Richard Perle, Peter W.
Rodman, Donald Rumsfeld, William Schneider, Vin Weber, Paul Wolfowitz, James Woolsey
e Robert Zoellick104.
É pertinente observar que, em 2001, dos dezoito signatários da carta em pauta, doze
estarão presentes em postos da administração George W. Bush, conforme mostra o Quadro 5.
104
PROJECT FOR A NEW AMERICA CENTURY -PNAC. Letter to President Clinton on Iraq, January 26,
1998 (<http://www.newamericancentury.org/iraqclintonletter.htm>).
85
Se esses eventos demonstram que a mudança de regime no Iraque era parte inconteste
da agenda de segurança e da política externa do pensamento neoconservador, é pertinente
observar que essa questão também se manifestava no partido democrata, principalmente no
segundo mandato do presidente Clinton que, em dezembro de 1998105, em um
pronunciamento em cadeia nacional, feito no salão oval da Casa Branca, declarou:
A dura realidade é que enquanto Saddam permanece no poder, ele ameaça o bem-
estar de seu povo, a paz de sua região e a segurança do mundo. A melhor maneira de
acabar com essa ameaça, de uma vez por todas, é com um novo governo iraquiano -
um governo pronto para viver em paz com seus vizinhos, um governo que respeite
os direitos do seu povo.
É muito provável que uma pessoa que lesse esse discurso e fosse inquirida sobre qual
dos dois presidentes o proferiu, responderia George W. Bush. Mas o ponto que queremos
destacar vai mais além, pois ainda em 1998 o Congresso dos EUA aprovou o chamado Iraq
Liberation Act, que foi assinado em seguida pelo presidente Clinton. Esta lei promulgou a
nova política oficial dos EUA em relação ao Iraque: “Deve ser política dos Estados Unidos
apoiar os esforços para remover o regime liderado por Saddam Hussein do poder no Iraque e
promover o surgimento de um governo democrático para substituir aquele regime107”
(Tradução nossa).
105
O discurso em pauta foi feito no contexto da Operação Desert Fox – uma campanha de bombardeios contra
instalações iraquianas, com quatro dias de duração -, após Saddam Hussein ter expulsado os inspetores de
armas da ONU que estavam no país desde o término da Guerra do golfo em 1991, como verificadores de que o
governo iraquiano estava cumprindo a Resolução 687 da ONU, que proibia o Iraque de possuir ou produzir
armas nucleares, químicas ou biológicas (Nota do autor).
106
“The hard fact is that so long as Saddam remains in power, he threatens the well-being of his people, the
peace of his region, the security of the world. The best way to end that threat once and for all is with a new
Iraqi government – a government ready to live in peace with its neighbors, a government that respects the
rights of its people. […] If Saddam defies the world and we fail to respond, we will face a far greater threat in
the future. Saddam will strike again at his neighbors. He will make war on his own people. And mark my
words, he will develop weapons of mass destruction. He will deploy them, and he will use them” (CLINTON
apud BUSH, 2010, p. 227).
107
“It should be the policy of the United States to support efforts to remove the regime headed by Saddam
Hussein from power in Iraq and to promote the emergence of a democratic government to replace that
regime” (USA. The Library of Congress. H.R.4655 - Iraq Liberation Act of 1998. <http://thomas.loc.gov/cgi-
bin/query/D?c105:4:./temp/~c105FfXHYA>).
86
O ponto a ser destacado é que a ideia de mudança de regime no Iraque estava presente
tanto entre democratas quanto entre republicanos e, principalmente entre os
neoconservadores. Os atentados de 11 de setembro de 2001 possibilitaram nova visibilidade
para essas ideias de mudança de regime, pois a sociedade “americana” percebeu que há anos
um grupo de pensadores de política externa apontava que o período pós-Guerra Fria não seria
um período de ausência de ameaças à segurança dos EUA. Essas ameaças estariam
concentradas principalmente no Oriente Médio, na forma do radicalismo islâmico, alimentado
por regimes tirânicos, incapazes de promover o bem-estar às suas populações (FRACHON;
VERNET, 2006, p. 19).
Conforme já comentado na sessão anterior deste trabalho, nos primeiros oito meses do
governo Bush, o Oriente Médio era uma região na qual o status quo satisfazia à visão do
núcleo central da equipe de política externa, incluindo a questão do Iraque. Mas, nas palavras
do próprio presidente Bush, os atentados de 11 de setembro de 2001, mudaram a sua
percepção:
108
“Before 9/11, Saddam was a problem America might have been able to manage. Through the lens of the post
9/11 world, my view changed. I had just witnessed the damage inflicted by nineteen fanatics armed with box
cutters. I could only imagine the destruction possible if an enemy dictator passed his WMD to terrorists. […]
The stakes were too high to trust the dictator’s word against the weight of the evidence and the consensus of
the world. The lessons of 9/11 was that if we waited for a danger to fully materialize, we would have waited
too long. I reached a decision: We would confront the threat from Iraq, one way or another” (BUSH, 2010, p.
229).
87
al-Qaeda, reforçou a percepção de que aquela era postura estratégica a ser seguida, de modo a
impedir que novos atentados como o de 11 de setembro pudessem ocorrer. Mais ainda, a
possibilidade de um ataque com armas de destruição em massa, por mais remota que fosse,
era algo que a administração Bush estava disposta a impedir a qualquer custo. Mas, para que a
“Guerra contra o Terror” pudesse ter continuidade, era necessário que houvesse alvos e
objetivos tangíveis, de modo que a força militar dos EUA pudesse ser utilizada. Isso nos
permite entender a criação da entidade denominada “Eixo do Mal109”, cujo desenho trouxe
para a “Guerra contra o Terror” alvos mais visíveis – os “Estados Vilões” - identificados pelo
presidente Bush no seu discurso do Estado da União, feito no Congresso em 29 de janeiro de
2002: Coréia do Norte, Irã, Iraque. Percebe-se então uma busca por materialidade, uma vez
que a guerra, apesar de declarada contra o terrorismo, dirige-se contra os Estados que
apoiaram, apóiam ou podem vir a apoiar ataques terroristas, sendo que a mudança dos
Regimes de governo existentes nesses países passou a ser considerada como a solução a ser
instrumentalizada, por meio da força militar dos EUA. Nas palavras do próprio presidente
Bush:
Os Estados Unidos podem considerar qualquer nação que abrigou terroristas como
responsável pelos atos desses terroristas. Esta nova doutrina revogou a abordagem
do passado, que distinguia grupos terroristas dos seus patrocinadores. Nós tivemos
que forçar as nações a escolher entre combater os terroristas ou compartilhar o seu
destino. E nós tivemos que travar esta guerra na ofensiva, atacando os terroristas no
exterior, antes que eles pudessem nos atacar novamente em casa110 (BUSH, 2010, p.
137) (Tradução nossa).
109
A expressão "Eixo do Mal" foi utilizada pelo presidente George W. Bush, em seu discurso anual no
Congresso, em 2002, para se referir a três Estados percebidos como uma grave ameaça ao mundo e à
segurança dos Estados Unidos: Coréia do Norte, Irã e Iraque. Estes países, segundo Bush, desenvolviam armas
de destruição em massa ou patrocinavam o terrorismo regional e mundial, ou faziam as duas coisas ao mesmo
tempo (USA. The White House. President Delivers State of Union Address. <http://georgewbush-
whitehouse.archives.gov/news/releases/2002/01/20020129-11.html>).
110
“The United States would consider any nation that harbored terrorists to be responsible for the acts of those
terrorists. This new doctrine overturned the approach of the past, which treated terrorist groups as distinct
from their sponsors. We had to force nations to choose whether they would fight the terrorists or share their
fate. And we had to wage this war on the offense, by attacking the terrorists overseas before they could attack
us again at home” (BUSH, 2010, p. 137).
88
[...] neste momento, Estados e redes terroristas estão buscando armas nucleares,
químicas e biológicas que lhes permitam não apenas matar milhares, mas dezenas de
milhares ou mesmo centenas de milhares do nosso povo. Nosso objetivo na guerra
global contra o terror é impedi-los, para evitar ataques adicionais ainda piores, antes
que eles aconteçam.
Hoje, existe um número de Estados terroristas que estão tentando desenvolver armas
de assassinato em massa. Mas, como o presidente Bush deixou claro, o Iraque
representa uma ameaça única para a segurança de nosso povo e para a estabilidade
do mundo. Considere o seguinte histórico:
Saddam Hussein possui armas químicas e biológicas. Ele tem usado armas químicas
contra as forças estrangeiras e também contra seu próprio povo [...]. Ele invadiu dois
dos seus vizinhos, e lançou mísseis balísticos contra quatro deles. Ele abertamente
elogiou os ataques de 11 de setembro contra o nosso país. Seu regime apóia
terroristas e ordenou os atos de terror em solo estrangeiro. [...] Seu regime violou,
repedidamente, 16 resoluções das Nações Unidas, desafiando a vontade da
comunidade internacional - sem custos ou conseqüências.
Como o presidente alertou as Nações Unidas no ano passado, "o regime de Saddam
Hussein é um perigo grave". É um perigo para seus vizinhos, para os Estados
Unidos, para o Oriente Médio, e para a paz e a estabilidade internacionais. É um
perigo que não podemos ignorar111 (Tradução nossa).
111
“Yet, at this moment, terrorist networks and terrorist states are pursuing nuclear, chemical and biological
weapons - capabilities that will enable them to kill not simply thousands, but many tens of thousands or even
hundreds of thousands of our people. Our objective in the global war on terror is to stop them - to prevent
additional attacks that would be far worse - before they happen.
There are a number of terrorist states that are pursuing weapons of mass murder today. But as President
Bush has made clear, Iraq poses a threat to the security of our people, and to the stability of the world, that is
distinct from any other. Consider the record:
Saddam Hussein possesses chemical and biological weapons. He has used chemical weapons against foreign
forces and his own people […]. Iraq has invaded two of its neighbors, and has launched ballistic missiles at
four of its neighbors. He openly praised the attacks of September 11th against our country. His regime plays
host to terrorists, and has ordered acts of terror on foreign soil. […] His regime has violated some 16 U.N.
resolutions, repeatedly defying the will of the international community - without cost or consequence.
As the president warned the United Nations last fall, "Saddam Hussein's regime is a grave and gathering
danger." It is a danger to its neighbors, to the United States, to the Middle East, and to the international peace
and stability. It's a danger we cannot ignore” (U. S. DEPARTMENT OF DEFENSE. Speech. Remarks by
Secretary of Defense Donald H. Rumsfeld, Reserve Officers Association 2003 Mid-Winter Conference and
18th Annual Military Exposition, Washing, Monday, January 20, 2003.
<http://www.defense.gov/speeches/speech.aspx?speechid=165>).
89
de janeiro de 2003, que as “armas de terror em massa” do Iraque e as ligações deste Estado
com as “redes terroristas” eram ameaças interligadas e desarmar o Iraque era parte crucial do
esforço da “Guerra contra o Terror”:
Richard Perle, que presidiu o Defense Policy Board (um comitê de assessoramento do
Departamento de Defesa) entre 2001 e 2003, defendia abertamente a mudança de regime no
Iraque. Para ele, o Iraque era tanto um teste acerca da seriedade da “Guerra contra o terror”,
quanto o teste que demonstraria a intenção de levar a guerra aos inimigos, bem como a
oportunidade de “abrir os olhos” para o perigo dos vários radicalismos existentes no Oriente
Médio (FRUM; PERLE, 2004, p. 29). Ele aponta com clareza que derrubando Saddam
Hussein, os EUA estariam alcançando alguns grandes objetivos, entre eles:
• Colocar um fim nas armas de destruição em massa que Saddam possuía ou que
poderia vir a possuir.
• Alcançar uma grande vitória contra o terrorismo, uma vez que seria eliminado um
regime que, por mais de trinta anos, patrocinava o terrorismo na região.
• Negar aos inimigos a vitória que eles explorariam caso Saddam fosse deixado no
poder, após ter desafiado os EUA.
112
“As terrible as the attacks of September 11th were, however, we now know that the terrorists are plotting still
more and greater catastrophes. We know they are seeking more terrible weapons-chemical, biological, and
even nuclear weapons. In the hands of terrorists, what we often call weapons of mass destruction would more
accurately be called weapons of mass terror. The threat posed by the connection between terrorist networks
and states that possess these weapons of mass terror presents us with the danger of a catastrophe that could
be orders of magnitude worse than September 11th. Iraq's weapons of mass terror and the terror networks to
which the Iraqi regime are linked are not two separate themes - not two separate threats. They are part of the
same threat. Disarming Iraq and the War on Terror are not merely related. Disarming Iraq of its chemical
and biological weapons and dismantling its nuclear weapons program is a crucial part of winning the War on
Terror”(U. S. DEPARTMENT OF DEFENSE. News Transcript. Deputy Secretary Wolfowitz Speech on Iraq
Disarmament. <http://www.defense.gov/transcripts/transcript.aspx?transcriptid=1335>).
90
[...] O regime iraquiano tem estado, de fato, muito ocupado em incrementar a sua
capacidade em matéria de agentes químicos e biológicos. E eles prosseguem com o
programa nuclear iniciado anos atrás. Estas não são armas que tem como propósito
defender o Iraque, são armas ofensivas que têm como objetivo infligir a morte em
escala maciça e foram desenvolvidas para Saddam ameaçar qualquer um que ele
escolha, seja em sua própria região ou fora dela. [...] A mudança de regime no
Iraque poderá trazer uma série de benefícios para a região. Quando as mais graves
ameaças forem eliminadas, os povos amantes da liberdade da região terão uma
oportunidade de promover os valores que podem trazer uma paz duradoura. [...]
Extremistas na região teriam que repensar as suas estratégias de Jihad113 (Tradução
nossa).
113
“[…] The Iraqi regime has in fact been very busy enhancing its capabilities in the field of chemical and
biological agents. And they continue to pursue the nuclear program they began so many years ago. These are
not weapons for the purpose of defending Iraq; these are offensive weapons for the purpose of inflicting death on
a massive scale, developed so that Saddam can hold the threat over the head of anyone he chooses, in his own
region or beyond. […] Regime change in Iraq would bring about a number of benefits to the region. When the
gravest of threats are eliminated, the freedom-loving peoples of the region will have a chance to promote the
values that can bring lasting peace. […] Extremists in the region would have to rethink their strategy of Jihad”
(PROJECT FOR THE NEW AMERICAN CENTURY - PNAC. Vice President Cheney's Speech to the Veterans
of Foreign wars - August 26, 2002. <http://www.newamericancentury.org/iraq-082602.htm>).
91
No Departamento de Estado a questão não era se o Iraque deveria ou não ser atacado e
Saddam deposto. A questão era que isso deveria ser feito em consonância com as resoluções
do Conselho de Segurança da ONU. No discurso proferido na ONU, em fevereiro de 2003, o
Secretário de Estado Colin Powell tentou apresentar provas e argumentos de que o Iraque
continuava com programas de ADM e, portanto, desrespeitava de forma recorrente as
resoluções da ONU sobre essa questão. Nesse contexto, Powell tentou mostrar para a opinião
pública mundial que o programa de armas clandestino de Saddam era uma ameaça para a
segurança global e uma fonte de descrédito da ONU, caso nada fosse feito para reverter essa
situação. Além disso, procurou apresentar provas das ligações de Saddam com a al-Qaeda, do
risco que os EUA estariam correndo fruto dessas ligações e que o mesmo não poderia ser
aceito pelo governo estadunidense.
[...] Este órgão se coloca em perigo de irrelevância se permitir que o Iraque continue
a desafiar a sua vontade, sem responder de forma eficaz e imediata. [...] A gravidade
deste momento coincide com a gravidade da ameaça que as armas de destruição em
massa do Iraque representam para o mundo. [...] A nossa preocupação não é apenas
sobre essas armas, é sobre a possibilidade de ligação entre essas armas e terroristas e
suas organizações, os quais não têm escrúpulos em utilizar tais dispositivos contra
pessoas inocentes em todo o mundo. [...] Hoje, o Iraque abriga uma rede terrorista
mortal liderada por Abu Musab Al-Zarqawi, um associado de Osama bin Laden e
seus tenentes da Al Qaida. [...] Dada a história de agressão de Saddam Hussein, [...],
dado o que sabemos de suas associações terroristas e dada a sua determinação em
vingar-se daqueles que se opõem a ele, deveríamos assumir o risco que ele não vai
algum dia usar essas armas, no momento e lugar de sua escolha? Os Estados Unidos
não vão e não podem correr esse risco para o povo americano. Deixar Saddam
Hussein com a posse de armas de destruição em massa por mais alguns meses ou
anos não é uma opção no mundo pós 11 de setembro114 (Tradução nossa).
114
“[…] And this body places itself in danger of irrelevance if it allows Iraq to continue to defy its will without
responding effectively and immediately. […] The gravity of this moment is matched by the gravity of the threat
that Iraq's weapons of mass destruction pose to the world. […] Our concern is not just about these elicit
weapons. It's the way that these elicit weapons can be connected to terrorists and terrorist organizations that
have no compunction about using such devices against innocent people around the world. […] Iraq today
harbors a deadly terrorist network headed by Abu Musab Al-Zarqawi, an associated in collaborator of Osama
bin Laden and his Al Qaida lieutenants. […] Given Saddam Hussein's history of aggression, […], given what we
know of his terrorist associations and given his determination to exact revenge on those who oppose him, should
we take the risk that he will not some day use these weapons at a time and the place and in the manner of his
choosing at a time when the world is in a much weaker position to respond? The United States will not and
cannot run that risk to the American people. Leaving Saddam Hussein in possession of weapons of mass
destruction for a few more months or years is not an option, not in a post-September 11th world” (THE
WASHINGTON POST. U.S. Secretary of State Colin Powell's speech to the United Nations on Iraq.
<http://www.washingtonpost.com/wp-srv/nation/transcripts/powelltext_020503.html>).
92
À luz do seu discurso proferido na ONU, é possível inferir que o Secretário de Estado
também se mostrava convencido da necessidade de mudança de regime no Iraque, mas essa
ação deveria se executada com o respaldo da ONU, isto é, mediante uma nova Resolução do
Conselho de Segurança, mais explícita quanto à autorização do uso da força contra o Iraque,
que a Resolução 1441115.
Ainda com relação à identificação do peso e a coesão das ideias dentro do lócus
decisório de política externa da administração George W. Bush, no que tange à decisão da
Guerra contra o Iraque, cabe analisarmos a posição da Conselheira de Segurança Nacional,
Condoleezza Rice. Usualmente contida em suas declarações, em 23 de janeiro de 2003, o
jornal The New York Times publicou um artigo enviado por Rice, intitulado Why We Know
Iraq is Lying e que fornece indícios da sua posição em relação à “ameaça” representada pelas
armas de destruição em massa do Iraque.
Com base na análise das ideias dos principais integrantes do NSC, acerca da ameaça
representada pelo Iraque e da conveniência da mudança de regime naquele país, podemos
inferir e construir a Figura 4, que representa as preferências reveladas acerca dessa questão,
em 2003, dentro do lócus decisório de política externa da administração George W. Bush.
115
Adotada por unanimidade no Conselho de Segurança, no dia 8 de novembro de 2002, a Resolução 1441 oferecia
a Saddam Hussein uma oportunidade final para cumprir com suas obrigações de desarmamento, estabelecidas
por Resoluções anteriores do Conselho (Resoluções 660, 661, 678, 686, 687, 688, 707, 715, 986 e 1284). Além
disso, o item 13 da Resolução 1441, alertava o governo iraquiano que o país teria que enfrentar "sérias
conequências" em decorrência das repetidas violações das obrigações em pauta (UNITED NATIONS. Security
Council Resolutions 2002. Security Council Resolution 1441.
<http://www.un.org/Docs/scres/2002/sc2002.htm>).
116
“Many questions remain about Iraq's nuclear, chemical and biological weapons programs and arsenal -- and it
is Iraq's obligation to provide answers. It is failing in spectacular fashion. By both its actions and its inactions,
Iraq is proving not that it is a nation bent on disarmament, but that it is a nation with something to hide. Iraq is
still treating inspections as a game. It should know that time is running out” (RICE, CONDOLEEZA. Why We
Know Iraq Is Lying. In: THE NEW YORK TIMES. Opinion. Published: January 23, 2003.
<http://www.nytimes.com/2003/01/23/opinion/why-we-know-iraq-is-lying.html?src=pm>).
93
concreta da força militar dos EUA; derrubar um regime tirânico e hostil aos EUA; e iniciar a
mudança do status quo dos regimes do Oriente Médio, por meio da construção de regimes
democráticos, em consonância com os valores “americanos” e com o incremento da segurança
dos EUA.
É pertinente destacar que no dia 11 de outubro de 2002, o Congresso dos EUA
aprovou uma resolução autorizando o presidente a usar a força militar contra o Iraque. Essa
resolução foi aprovada com 296 votos “a favor” e 133 “contra”, na Câmara dos Deputados e
com 77 votos “a favor” e 23 “contra” no Senado. Em outras palavras, enquanto se
desenrolavam as negociações na ONU acerca do uso da força contra o Iraque, o Congresso
dos EUA autorizava o presidente George W. Bush a empregar a força militar contra o Iraque,
nos seguintes termos:
O presidente está autorizado a usar as Forças Armadas dos Estados Unidos como
entender ser necessário e adequado, para defender a segurança nacional dos Estados
Unidos contra a ameaça contínua representada pelo Iraque, e aplicar todas as
resoluções pertinentes do Conselho de Segurança das Nações Unidas acerca do
Iraque117 (BUSH, 2010, p. 241) (Tradução nossa).
117
“The President is authorized to use the Armed Forces of the United States as he determines to be necessary and
appropriate in order to defend the national security of the United States against the continuing threat posed by
Iraq; and enforce all relevant United Nations Security Council resolutions regarding Iraq” (BUSH, 2010, p.
241).
95
ainda que de forma relutante, ela endossava a opção do emprego da força militar (BUSH,
2010, p. 251).
O Secretário de Estado, Colin Powell era o que tinha as maiores reservas quanto ao
emprego da força militar contra o Iraque. Ele alertou ao presidente que ainda achava possível
lidar com o Iraque pelas vias diplomáticas. O presidente Bush recorda o seguinte diálogo com
o Secretário de Estado:
Eu disse a Colin que era possível que chegássemos ao ponto em que a guerra era a
única opção restante. Nenhum de nós queria guerra, mas eu perguntei se ele iria
apoiar uma ação militar como último recurso. "Se é isso que você tem que fazer", ele
disse: "Eu estou com você, Sr. Presidente118" (BUSH, 2010, p. 251) (tradução
nossa).
No dia 19 de março, o NSC foi reunido na Situation Room e o presidente Bush deu a
ordem para que fosse iniciada a Operação Iraq Freedom (Ibid., p. 253).
Aplicando o modelo das Unidades de Decisão ao contexto supracitado pode-se
identificar que a Ocasião para a Decisão apresenta-se com a prontificação do planejamento
militar e do desdobramento das forças militares no Golfo Pérsico e na fronteira do Iraque. À
luz da pesquisa efetuada inferimos que a Unidade de Decisão Dominante, permanece
118
“I told Colin it was possible that we would reach the point where war was the only option left. Neither of us
wanted war, but I asked if he would support military action as a last resort. ’If this is what you have to do’, he
said, ’I’m with you, Mr. President’” (BUSH, 2010, p. 251).
119
“The United Nations Security Council has not lived up to its responsibilities, so we will rise to ours. […]
Saddam Hussein and his sons must leave Iraq with forty-eight hours. Their refusal to do so will result in
military conflict, commenced at a time of our choosing” (BUSH, 2010, p. 253).
96
constante, isto é, Grupo Único, com lócus no NSC, cuja composição continua a mesma, desde
o 11 de setembro de 2001, exceto pelo novo Secretário do Tesouro John W. Snow120.
A visão comum, no caso a percepção de que o Iraque representava uma ameaça a
segurança dos EUA e que a mudança de regime naquele país incrementaria essa segurança,
era compartilhada por todos os integrantes do NCS, incluindo o Secretário de Estado, Colin
Powell que diferia do Grupo apenas quanto ao momento para utilizar a força militar contra o
Iraque. Nesse contexto, continuamos com a percepção de que a Unidade de Decisão
Dominante continuava a compartilhar uma visão comum, bem como coesão elevada. Assim, o
resultado esperado do processo decisório foi a Concurrence acerca da opção militar contra o
Iraque. A Figura 5 sintetiza a presente análise, à luz do modelo das unidades de decisão:
120
John W. Snow substituiu Paul O' Neill como Secretário do Tesouro em 3 de fevereiro de 2003, exercendo
esse cargo até 28 de junho de 2006 (Nota do autor).
97
É relevante destacar que a decisão em pauta não foi dissociada do respaldo da opinião
pública estadunidense, conforme foi levantado no histórico de pesquisas afetas ao percentual
de aprovação dos presidentes dos EUA. Na pesquisa Gallup, realizada entre 14-15 de março
de 2003, isto é, na semana que antecedeu a decisão de desencadear a Guerra contra o Iraque, a
aprovação pública do presidente era de 58%. Na pesquisa seguinte, realizada entre 22-23 de
março de 2003, ou seja, após a decisão em pauta, foi registrado um índice de 71% de
aprovação121. Assim, o ponto a ser destacado é que, se a opinião pública da vários países
condenou a decisão da Guerra contra o Iraque, a grande maioria da população dos EUA
aprovou essa decisão.
Finalizando a análise da decisão de desencadear a Guerra contra o Iraque é pertinente
abordar, ainda que como forma de suscitar futuros estudos acerca dessa decisão que, apesar de
não declarado por nenhuma autoridade da administração Bush, a deposição do Talibã e
destruição dos campos de treinamento da al-Qaeda no Afeganistão, poderiam não parecer
uma resposta suficientemente forte aos “inimigos” dos EUA. Nesse sentido, ainda no rescaldo
dos atentados de onze de setembro de 2001, era preciso demonstrar o poderio militar
estadunidense e o destino daqueles regimes considerados hostis. Dentre os possíveis inimigos,
isto é, o “eixo do Mal”, o Iraque preenchia todos os requisitos possíveis para ser escolhido
como o próximo inimigo a ser batido dentro da “Guerra contra o Terror”: detentor de alguma
força militar, porém não forte o suficiente para causar problemas às Forças Armadas
estadunidenses e de seus aliados (o que, provavelmente, não seria o caso do Irã e da RDPC); e
incapacidade de revidar de forma contundente sobre os EUA e/ou seus aliados (que seria o
caso da RDPC). Além disso, o Iraque apresentava uma população dividida por etnia (curdos e
árabes) e religião (sunitas e xiitas), onde dois grupos – curdos e xiitas, estes majoritários em
termos populacionais - eram oprimidos pela minoria sunita ligada a Saddam Hussein, o que
indicava que a maior parte da população receberia bem as forças militares dos EUA e de seus
aliados “libertadores”. Adionalmente, uma das maiores reservas de petróleo do mundo
passaria ao controle dos EUA. Em outras palavras, transformar o Iraque num protetorado
militar, dentro de um contexto da já estabelecida rede de alianças com todos os demais
Estados produtores do Golfo pérsico, à exceção do Irã, colocaria os EUA em uma posição
privilegiada frente a possíveis rivais estratégicos dependentes do petróleo do Oriente Médio.
Essas inferências não podem ser descartadas quando analisamos os motivos que nortearam a
121
GALLUP ORGANIZATION. Presidential Job Approval Center
(<http://www.gallup.com/poll/124922/Presidential-Approval-Center.aspx>).
98
decisão de desencadear a Guerra contra o Iraque, mesmo que não tenham sido determinantes
da decisão de desencadear aquele conflito.
É conveniente ressaltar que este estudo não aponta a questão do petróleo como
determinante chave para a decisão de iniciar a Guerra contra o Iraque, pois o petróleo
importado pelos EUA, oriundo dos Estados do Golfo Pérsico, em 2003, correspondia a 25 %
do total das importações, com o Iraque fornecendo 4,9% dessas importações. O Apêndice B
deste trabalho apresenta o quantitativo de petróleo importado pelos EUA, desde 2000 até
2009, por países fornecedores, indicando o percentual relativo de cada um deles. Assim, pode-
se perceber que em 2003, 69,1 % do petróleo importado pelos EUA vinha de outras regiões,
notadamente da própria América do Norte (32,5 %), além da América do Sul (16 %), da
África (13,8 %) e da Europa (6,8 %). Assim, não há sustentação inconteste para os
argumentos que indiquem que a decisão da Guerra contra o Iraque foi decorrente da
necessidade de petróleo iraquiano para os EUA. No entanto, isso não elimina a suposição de
que essa questão esteve presente, de forma secundária, perante os integrantes do lócus
decisório de política externa da administração George W. Bush.
Conforme exposto na seção 2.6, a Guerra no Afeganistão foi uma reação consensual
da Unidade de Decisão Dominante do governo Bush e contou com o apoio inconteste tanto da
opinião pública estadunidense quanto internacional. Foi também uma ação de emprego da
força em consonância com o Direito Internacional e legitimada por uma resolução do
Conselho de Segurança da ONU. A deposição do governo Talibã e o aparente sucesso em
desestruturar a al-Qaeda contribuíram para que, nos meses subseqüentes aos atentados de
onze de setembro, o ideário neoconservador fosse veiculado como um Road Map de sucesso
para as ameaças que se apresentavam aos EUA.
No que tange ao Iraque, a mudança de regime naquele país, isto é, a deposição de
Saddam Hussein, era defendida pelos expoentes do neoconservadorismo desde a década de
1990 e na visão destes, desencadearia uma alteração do status quo no Oriente Médio,
consonante os valores da sociedade “americana”, além de incrementar a segurança dos EUA.
Após os atentados de 11 de setembro de 2001 e do êxito em promover uma mudança de
regime no país que era o principal santuário da al-Qaeda, a ideia de mudança de regime no
99
Iraque ganha novo ímpeto. Ao longo de 2002, o Iraque passou a ser apontado e percebido
como o verdadeiro teste da “mudança de regime”.
Conforme exposto na seção anterior, as principais razões apresentadas para a mudança
de regime no Iraque, por meio da força militar, foram: Primeiro, o argumento de que Saddam
Hussein continuava com seu programa de armas químicas, biológicas e nucleares, ignorando
as resoluções da ONU quanto ao desarmamento das suas armas de destruição em massa e essa
situação implicava em um risco inaceitável para os EUA. O segundo motivo decorria dos
aparentes laços do regime iraquiano com redes terroristas, incluindo a al-Qaeda, o que
indicava a possibilidade de que essa rede viesse a dispor de armas de destruição em massa
fornecidas pelo Iraque; novamente implicando em um risco inaceitável para os EUA. O
terceiro motivo era “necessidade” de libertar o povo iraquiano da tirania de Saddam, bem
como de possibilitar a esse povo a oportunidade de desfrutar da liberdade proporcionada pela
democracia.
Das três grandes razões ou motivos apresentados à opinião pública estadunidense e
mundial para justificar e legitimar a Guerra contra o Iraque podemos observar pontos de
contato com os seguintes pontos centrais do pensamento neocon:
Exportar a democracia, inclusive por meio do emprego da força, não por
humanitarismo, mas porque a disseminação da democracia liberal aumentará a
segurança dos EUA;
A política externa deve refletir os valores das sociedades liberais democráticas;
Ceticismo a respeito da legitimidade e da eficiência das leis e instituições
internacionais, principalmente da ONU que, no entanto, não pode ser descartada;
Formar coalizões ad hoc ou partir para a ação unilateral, se necessário, para
garantir a segurança dos EUA; e
Ataque preemptivo se for necessário para impedir uma ação hostil por parte dos
“inimigos” dos EUA.
(1) Os interesses, metas e objetivos de alcançe mundial que são vitais para a
segurança nacional dos Estados Unidos.
(2) A capacidade de defesa nacional, a política externa e os compromissos mundiais
dos Estados Unidos, necessários para deter uma agressão e para implementar a
estratégia de segurança nacional do país.
(3) Os usos propostos, a curto e a longo prazo, dos elementos políticos, econômicos,
militares, e outros do poder nacional dos Estados Unidos, para proteger ou promover
os interesses e alcançar as metas e objetivos contidos no parágrafo (1).
(4) A adequação das capacidades dos Estados Unidos para levar a cabo a estratégia
de segurança nacional, incluindo uma avaliação do equilíbrio entre as capacidades
de todos os elementos do poder nacional dos Estados Unidos para apoiar a
implementação da Estratégia de Segurança Nacional.
122
Conforme citado na Introdução deste trabalho, a “ação militar preemptiva” é aquela iniciada em decorrência
de uma evidência incontroversa de que um ataque inimigo é iminente (USA, 2010, Department of Defense.
Dictionary of Military and Associated Terms. JP 1-02, p. 369).
123
USA. U. S. Senate. The National Security Act of 1947 (<http://intelligence.senate.gov/nsaact1947.pdf>).
102
124
“(1) The worldwide interests, goals, and objectives of the United States that are vital to the national security
of the United States.
(2) The foreign policy, worldwide commitments, and national defense capabilities of the United States
necessary to deter aggression and to implement the national security strategy of the United States.
(3) The proposed short-term and long-term uses of the political, economic, military, and other elements of the
national power of the United States to protect or promote the interests and achieve the goals and objectives
referred to in paragraph (1).
(4) The adequacy of the capabilities of the United States to carry out the national security strategy of the
United States, including an evaluation of the balance among the capabilities of all elements of the national
power of the United States to support the implementation of the national security strategy.
(5) Such other information as may be necessary to help inform Congress on matters relating to the national
security strategy of the United States” (USA. U. S. Senate. The National Security Act of 1947.
<http://intelligence.senate.gov/nsaact1947.pdf>).
125
NATIONAL DEFENSE UNIVERSITY LIBRARY. Digital Collections. Goldwater-Nichols Act.
(<https://digitalndulibrary.ndu.edu/cdm4/document.php?CISOROOT=/goldwater&CISOPTR=956&CISOSH
OW=869>).
103
EUA, acerca de diversos temas de segurança, defesa e política externa (DALE, 2008,
p. 2).
Feitas essas considerações basilares acerca do que representa o documento em pauta,
serão analisadas as duas NSS apresentadas durante a administração George W. Bush, a fim de
identificar se os respectivos conteúdos são consonantes com os pontos centrais do pensamento
neoconservador.
A NSS 2002 foi divulgada em setembro de 2002, cerca de um ano após os atentados
de 11 de setembro de 2001, tendo como prioridade o combate ao terrorismo, identificado
como a principal ameaça à segurança dos EUA. A Introdução do documento, iniciada com
uma explanação geral do presidente George W. Bush, não deixa dúvidas quanto ao contexto
supracitado, pois no quarto parágrafo o presidente declara:
No que tange à sua estrutura, a NSS 2002, após a introdução do presidente, apresenta
um panorama da estratégia internacional dos EUA, as três metas centrais a serem atingidas
(“liberdade política e econômica, relações pacíficas com outros Estados, e respeito pela
dignidade humana"), bem como oito grandes ações estratégicas para atingir essas metas. Para
cada uma das oito grandes ações, o documento lista um subconjunto de iniciativas que devem
ser implementadas para a consecução três metas centrais supracitadas. As oito grandes ações
estratégicas são (USA, 2002, p. 1):
126
“Defending our Nation against its enemies is the first and fundamental commitment of the Federal
Government. Today, that task has changed dramatically. Enemies in the past needed great armies and great
industrial capabilities to endanger America. Now, shadowy networks of individuals can bring great chaos and
suffering to our shores for less than it costs to purchase a single tank. Terrorists are organized to penetrate
open societies and to turn the power of modern technologies against us” (USA, 2002).
104
Cabe aqui expor a metodologia que será utilizada na análise da NSS 2002 (e também
na NSS 2006) em consonância com o objetivo deste capítulo. Será adotado como
procedimento metodológico, a análise dos subconjuntos de iniciativas de cada uma das oito
grandes ações estratégicas supracitadas, a fim de identificar se existe convergência com os
pontos centrais do pensamento neoconservador evidenciados no Capítulo 1 deste trabalho.
Nesse sentido, será iniciada a análise dos subconjuntos de iniciativas listados na grande ação
estratégica Patrocinar aspirações à dignidade humana.
Na ação estratégica em pauta é explicitado que as decisões do governo dos EUA sobre
a cooperação e a alocação de recursos para a ajuda internacional serão guiadas pelos seguintes
princípios: defesa da liberdade e defesa da justiça, pois “são princípios corretos e verdadeiros
para todas as pessoas e em todos os lugares” (USA, 2002, p. 3-4). Em consonância com esses
princípios, as iniciaticas prescritas para a consecução da ação estratégica Patrocinar
aspirações à dignidade humana abrangem a promoção e defesa da liberdade, da democracia,
dos direitos humanos, da liberdade religiosa e de consciência, contra governos repressivos que
cerceiam esses princípios universais afetos à dignidade humana (Ibid. , p. 4).
Comparando o conteúdo dessas iniciativas com os pontos centrais do pensamento
neoconservador, evidenciados no Capítulo 1 do presente trabalho, identificamos convergência
com os seguintes pontos:
Preservar e ampliar uma ordem internacional em consonância com os interesses,
valores e princípios dos EUA;
Exportar a democracia, inclusive por meio do emprego da força, não por
humanitarismo, mas porque a disseminação da democracia liberal aumentará a
segurança dos EUA; e
A política externa deve refletir os valores das sociedades liberais democráticas.
105
127
“The enemy is terrorism - premeditated, politically motivated violence perpetrated against innocents” (USA,
2002, p. 5).
128
“[...] disrupt and destroy terrorist organizations of global reach and attack their leadership; command and
control, and communications; material support; and finances” (Ibid., p. 5).
129
“[…] defending the United States, the American people, and our interests at home and abroad by identifying
and destroying the threat before it reaches our borders. While the United States will constantly strive to enlist
the support of the international community, we will not hesitate to act alone, if necessary, to exercise our right
of self-defense by acting preemptively against such terrorists, to prevent them from doing harm against our
people and our country; […]” (USA, 2002, p. 6) (Grifo nosso).
106
130
“A war initiated in the belief that military conflict, while not imminent, is inevitable, and that to delay would
involve greater risk” (2007, p. 427 e 2009, p. 428).
107
inimigo é iminente131” (2007, p. 424; 2009, p. 424 e 2010, p. 369) (Tradução nossa). No
Brasil, o termo é adotado como “Guerra Preemptiva”, expressando um “Conflito armado que
se estabelece quando os tomadores de decisão acreditam na iminência de ataques inimigos”
(BRASIL, 2007, p. 126). No nosso trabalho adotaremos os conceitos apresentados nas edições
do JP 1-02 supracitadas, uma vez que nos parece apropriado empregar os conceitos em pauta,
tal como utilizados pelo Estado cujas concepções estratégicas são objeto do nosso Estudo.
Feita essa revisão acerca do léxico empregado neste trabalho, retornamos à análise da
quarta grande ação estratégica da NSS 2002, na qual é explicitado que os EUA se defrontam
com novas ameaças, muito diferentes daquelas enfrentadas durante a Guerra Fria. Essas
ameaças, segundo o documento em pauta, emanavam dos Estados Párias (Rogue States) e dos
grupos terroristas por eles apoiados. É pertinente destacar que o documento em pauta
apresenta, nessa seção, a definição de Rogue States:
Nesse contexto, a ação estratégica em pauta alerta que os EUA devem estar preparados
para “parar os Estados Párias e seus clientes terroristas, antes que eles possam ameaçar ou
131
“An attack initiated on the basis of incontrovertible evidence that an enemy attack is imminent” (2007, p.
424; 2009, p. 424 e 2010, p. 369).
132
“In the 1990s we witnessed the emergence of a small number of rogue states that, while different in important
ways, share a number of attributes. These states:
• brutalize their own people and squander their national resources for the personal gain of the rulers;
• display no regard for international law, threaten their neighbors, and callously violate international treaties
to which they are party;
• are determined to acquire weapons of mass destruction, along with other advanced military technology, to
be used as threats or offensively to achieve the aggressive designs of these regimes;
• sponsor terrorism around the globe; and • reject basic human values and hate the United States and
everything for which it stands” (USA, 2002, p. 13-14).
108
usar armas de destruição em massa contra os EUA, e seus aliados133” (USA, 2002, p. 14)
(Tradução e grifo nossos). O documento esclarece que, em função das metas dos Estados
Párias e dos terroristas, os EUA não mais adotariam uma postura reativa, pois a magnitude
dos danos que poderiam ser causados é tamanha que não seria concebível permitir que esses
inimigos a atacassem primeiro (Ibid., p. 15).
Assim sendo, a NSS 2002 prescreve, nessa ação estratégica, que os EUA devem, se
necessário, agir preemptivamente e, no limite, partir para a “ação preventiva". Em síntese, a
NSS 2002 prescrevia que os EUA poderiam iniciar uma guerra se pensassem que poderiam
ser atacados, ou mesmo caso se sentissem ameaçados. Em função do impacto dessa nova
abordagem sobre o Direito Internacional, a então conselheira de Segurança Nacional,
Condoleezza Rice, ao comentar o conteúdo da NSS 2002, logo após a sua publicação,
afirmava que a preempção não era um conceito novo para os EUA, mas que só deveria ser
tomada com o último recurso e num contexto em que os riscos da espera fossem maiores que
os riscos da ação (RICE, 2002).
A Preempção não é um conceito novo. Nunca houve uma exigência moral ou legal
no sentido de que um país deva esperar ser atacado antes que possa enfrentar as
ameaças à sua existência. [...] Os Estados Unidos há muito afirmaram o direito à
autodefesa antecipada - desde a crise dos mísseis cubanos em 1962 até a crise na
península coreana, em 1994.
Mas esta abordagem deve ser tratada com grande cautela. O número de casos em
que poderá ser justificada será sempre pequeno. [...] A ameaça deve ser muito grave.
E os riscos de espera devem superam os riscos da ação134 (RICE, 2002).
133
"We must beprepared to stop rogue states and their terrorists clients before they are able to threaten or use
weapons of mass destruction against the United States and our allies and friends" (USA, 2002, p. 14).
134
“Preemption is not a new concept. There has never been a moral or legal requirement that a country wait to
be attacked before it can address existential threats. […] The United States has long affirmed the right to
anticipatory self-defense—from the Cuban Missile Crisis in 1962 to the crisis on the Korean Peninsula in
1994.
But this approach must be treated with great caution. The number of cases in which it might be justified will
always be small. […] The threat must be very grave. And the risks of waiting must far outweigh the risks of
action” (RICE, 2002).
109
decisivamente qualquer adversário, caso a deterrence venha a falhar135 (USA, 2002, p. 29)
(Tradução nossa) .
Em síntese, essa ação estratégica e seu subconjunto de iniciativas prescreve a
necessidade de transformação das principais instituições voltadas para a segurança dos EUA;
e que as forças militares dos EUA devem ser fortes o suficiente para dissuadir potenciais
adversários de iniciar programas de crescimento militar, que tenham como propósito superar
ou igualar o poder militar estadunidense. Assim, identificamos total convergência com o
seguinte ponto central do pensamento neoconservador:
Manter a liderança dos EUA, incluindo sua preponderância militar.
Finalizando essa seção apresentamos o Quadro 7, onde são sumarizados os pontos de
convergência das ações estratégicas contidas na NSS 2002 com os pontos centrais do
pensamento neoconservador, evidenciados no Capítulo 1 deste trabalho:
135
“Assure our allies and friends; dissuade future military competition; deter threats against U.S. interests,
allies, and friends; and decisively defeat any adversary if deterrence fails” (USA, 2009, p. 29).
112
Quadro 7 - Convergência das ações estratégicas contidas na NSS 2002 com os Pontos
Centrais do Pensamento Neoconservador.
À luz da presente análise, fica patente que o conteúdo normativo da NSS 2002
apresenta convergência com os pontos centrais do pensamento neoconservador, evidenciados
no primeiro capítulo deste trabalho. Em outras palavras, em setembro de 2002, isto é, cerca de
um ano após os atentados de 11 de setembro de 2001, o pensamento neocon aparece de forma
inconteste no documento normativo de mais alto nível da postura estratégica dos EUA. Dessa
forma podemos inferir que o neoconservadorismo passa ter seus pontos centrais atuando
como um Road Map da administração Bush, nas questões de política externa, principalmente,
naquelas afetas à segurança dos EUA. Três pontos centrais são recorrentes: a promoção dos
valores estadunidenses no exterior (democracia, liberdade individual, livre comércio,
economia de mercado etc.); o exercício da ação militar preemptiva para garantir a segurança
dos EUA frente à ameaça terrorista; e a manutenção da preponderância militar estadunidense.
Feita essa análise comparativa do conteúdo da NSS 2002, passaremos ao mesmo
procedimento metodológico em relação à NSS 2006, visando identificar se houve
continuidade, aprofundamento ou ruptura, com o pensamento neoconservador, no conteúdo
do documento estratégico normativo de mais alto nível do governo estadunidense.
113
A NSS 2006 manteve, basicamente, a mesma estrutura da NSS 2002, isto é, metas
centrais a serem atingidas136, grandes ações estratégicas para atingir essas metas e seus
respectivos subconjuntos de iniciativas que devem ser implementadas para a consecução das
metas supracitadas. Foi acrescentada uma nova grande ação estratégica - Aproveitar as
oportunidades e enfrentar os desafios da globalização-, elevando o total dessas grandes ações
estratégicas para nove, bem como foi incluída, em cada uma das oito grandes ações originais,
um tópico onde são apontados os "sucessos" alcançados desde 2002 e, a partir destes, o
“caminho a seguir”.
Uma outra diferença entre a NSS 2002 e a 2006 diz respeito ao contexto em que os
dois documentos foram publicados. A NSS 2002 foi lançada na esteira dos atentados de 11 de
setembro de 2001, da declaração da “Guerra contra o Terror”, do início da Guerra no
Afeganistão e no contexto de preparação para a Guerra contra o Iraque. A NSS 2006 foi
elaborada e divulgada no desenrolar de todas essas “guerras”, isto é, quase cinco anos após a
declaração da “Guerra contra o Terror” e o início da Guerra no Afeganistão e cerca de três
anos após o início da Guerra no Iraque. A Introdução da NSS 2006, iniciada com uma
explanação geral do presidente George W. Bush deixa claro esse contexto já no seu primeiro
parágrafo:
136
“Criar um mundo de Estados democráticos e bem-governados que atendam às demandas dos seus cidadãos,
bem como se conduzam de forma responsável no sistema internacional, de modo a prover uma segurança
duradoura para o povo americano” (USA, 2006, p. 1) (Tradução nossa).
137
“America is at war. This is a wartime national security strategy required by the grave challenge we face – the
rise of terrorism fueled by an aggressive ideology of hatred and murder, fully revealed to the American people
on September 11, 2001. This strategy reflects our most solemn obligation: to protect the security of the
American people” (USA, 2006).
114
138
"The first pillar is promoting freedom, justice and human dignity - working to end tyranny, to promote
effective democracies [...] Peace and international stability are most reliably built on foundation of freedom"
(USA, 2006).
115
139
“The United States will stand with and support advocates of freedom in every land. Though our principles
are consistent, our tactics will vary. They will reflect, in part, where each government is on the path from
tyranny to democracy. In some cases, we will take vocal and visible steps on behalf of immediate change. In
other cases, we will lend more quiet support to lay the foundation for future reforms. As we consider which
approaches to take, we will be guided by what will most effectively advance freedom’s cause while we balance
other interests that are also vital to the security and well-being of the American people” (USA, 2006, p. 6).
140
“[…] safe haven, financial support, and the support and protection that certain nation-states historically
have given them” (USA, 2006, p. 8).
116
Esforços pacientes para acabar com os conflitos não devem ser confundidos com a
tolerância ao intolerável. Genocídio é a intenção de destruir, no todo ou em parte,
um grupo nacional, étnico, racial ou religioso. O mundo precisa começar a honrar
um princípio que, nos últimos anos, muitos acreditam ter perdido sua força em
algumas partes da comunidade internacional: o genocídio não pode ser tolerado. É
um imperativo moral que os estados tomem medidas para evitar e punir o genocídio.
[...] Não devemos permitir que o debate jurídico sobre a definição técnica de
"genocídio" seja uma desculpa para a inércia. O mundo deve agir em casos de
atrocidades e assassinatos em massa que acabam por levar ao genocídio, mesmo que
as partes locais envolvidas não estejam preparadas para a paz141 (USA, 2006, p. 17)
(Tradução nossa).
A quarta grande ação estratégica contida na NSS 2006 - Impedir que inimigos
ameacem a nós, nossos aliados e nossos amigos, com Armas de Destruição em Massa (ADM)
– é aquela em que, tal como na NSS 2002, é feita a prescrição e a normatização da ação
militar preemptiva na agenda de segurança dos EUA. O documento reforça a mensagem de
que o primeiro dever do governo dos EUA continua sendo o de proteger o povo “americano”
e seus interesses e que, a maior ameaça à segurança estadunidense é um ataque terrorista
empregando Armas de Destruição em Massa. Nesse contexto, para “prevenir atos hostis dos
seus adversários, os EUA agirão, se necessário, preemptivamente no exercício do seu direito
de autodefesa142” (USA, 2006, p. 18) (Tradução nossa).
141
“Patient efforts to end conflicts should not be mistaken for tolerance of the intolerable. Genocide is the intent
to destroy in whole or in part a national, ethnic, racial, or religious group. The world needs to start honoring a
principle that many believe has lost its force in parts of the international community in recent years: genocide
must not be tolerated. It is a moral imperative that states take action to prevent and punish genocide. […] We
must not allow the legal debate over the technical definition of “genocide” to excuse inaction. The world must
act in cases of mass atrocities and mass killing that will eventually lead to genocide even if the local parties
are not prepared for peace” (USA, 2006, p. 17).
142
“To forestall or prevent such hostile acts by our adversaries, the United States will, if necessary, act
preemptively in exercising our inherent right of self-defense” (USA, 2006, p. 18).142
118
143
“The Iranian regime sponsors terrorism; threatens Israel; seeks to thwart Middle East peace; disrupts
democracy in Iraq; and denies the aspirations of its people for freedom” (Ibid., p. 20).
119
144
“If necessary, however, under long-standing principles of self defense, we do not rule out the use of force
before attacks occur, even if uncertainty remains as to the time and place of the enemy’s attack. When the
consequences of an attack with WMD are potentially so devastating, we cannot afford to stand idly by as grave
dangers materialize. This is the principle and logic of preemption. The place of preemption in our national
security strategy remains the same. We will always proceed deliberately, weighing the consequences of our
actions. The reasons for our actions will be clear, the force measured, and the cause just” (USA, 2006, p. 23).
145
“Economic freedom is a moral imperative. The liberty to create and build or to buy, sell, and own property is
fundamental to human nature and foundational to a free society. Economic freedom also reinforces political
freedom. It creates diversified centers of power and authority that limit the reach of government. It expands the
free flow of ideas; with increased trade and foreign investment comes exposure to new ways of thinking and
living which give citizens more control over their own lives” (USA, 2006, p. 27).
120
146
“Development reinforces diplomacy and defense, reducing long-term threats to our national security by
helping to build stable, prosperous, and peaceful societies” (Ibid., p. 33).
121
147
“Bilateral policies that ignore regional and global realities are unlikely to succeed” (USA, 2006, p. 36).
148
“Second, these relations must be supported by appropriate institutions, regional and global, to make
cooperation more permanent, effective, and wide-reaching” (Ibid., p. 36).
149
“America’s interest in promoting effective democracies rests on an historical fact: states that are governed
well are most inclined to behave well” (Ibid., p. 36).
150
“Fourth, while we do not seek to dictate to other states the choices they make, we do seek to influence the
calculations on which these choices are based” (Ibid., p. 36).
151
“Fifth, we must be prepared to act alone if necessary, while recognizing that there is little of lasting
consequence that we can accomplish in the world without the sustained cooperation of our allies and
partners” (Ibid., p. 37).
122
Quadro 8 - Convergência das ações estratégicas contidas na NSS 2006 com os Pontos
Centrais do Pensamento Neoconservador.
4. CONCLUSÃO
Boot, Irwin Stelzer e Francis Fukuyama que, desde a década de 1990, procuram sistematizar e
dar coerência ao pensamento neocon. Da análise dos textos de livros e artigos desses autores,
foram evidenciados os seguintes pontos centrais do pensamento neoconservador:
Preservar e ampliar uma ordem internacional em consonância com os interesses,
valores e princípios dos EUA;
Exportar a democracia, inclusive por meio do emprego da força, não por
humanitarismo, mas porque a disseminação da democracia liberal aumentará a
segurança dos EUA;
A política externa deve refletir os valores das sociedades liberais democráticas;
Ceticismo a respeito da legitimidade e da eficiência das leis e instituições
internacionais, principalmente da ONU que, no entanto, não pode ser descartada;
Formar coalizões ad hoc ou partir para a ação unilateral, se necessário, para
garantir a segurança dos EUA;
Ataque preemptivo se for necessário para impedir uma ação hostil por parte dos
“inimigos” dos EUA; e
Manter a liderança dos EUA, incluindo sua preponderância militar.
É perceptível que esses pontos buscam conciliar aquilo que os neoconservadores
entendem como um imperativo moral com a necessidade estratégica dos EUA. No seu
conjunto, conforme exposto no primeiro capítulo deste trabalho, esses pontos centrais têm
forte apelo e coerência para uma parcela expressiva da população dos EUA, mesmo sem
constituírem um corpo teórico.
No que tange à administração e ao presidente George W. Bush, nossa pesquisa
apontou que, quando foi eleito foi eleito em 2000, os pontos centrais do pensamento
neoconservador, não pareciam causar muita impressão ao novo presidente e aos principais
integrantes da sua equipe de governo, principalmente aqueles pontos relacionados à política
externa.
Durante a campanha presidencial, Bush e seus assessores apontavam para uma futura
política externa contida, particularmente no que tangia às intervenções militares. Nesse
sentido, buscamos evidenciar que os debates entre George W. Bush e o candidato democrata
Al Gore, no que tange a política externa, foram em grande parte centrados nas posições
divergentes acerca do emprego das Forças Armadas estadunidenses como “construtores de
nações. Além disso, o combate ao terrorismo não aparecia como prioridade da política externa
de nenhum dos dois candidatos. Mas, os atentados de 11 de setembro de 2001 expuseram um
novo contexto e uma nova realidade. Após a aparente perplexidade decorrente do vulto e
129
organização dos atentados, onde a administração George W. Bush defrontou-se com uma
crise sem precedentes na história da segurança estadunidense, o presidente e seus assessores
mais próximos passaram a defender uma política externa enérgica e nacionalista. Nesse
contexto, a administração Bush encontrou no neoconservadorismo um corpo de ideias capaz
de promover a união da sociedade, frente àquela ameaça, bem como uma estratégia a ser
implementada.
No entanto, nossa análise apontou que os atentados de 11 de setembro de 2001 podem
ter sido a causa imediata da adoção de alguns pontos centrais do neoconservadorismo nas
questões de política externa, pela administração Bush, porém, havia mais de uma década de
debates, argumentos e publicações nas quais essas ideias vinham tomando corpo e penetrando
na sociedade estadunidense. Essas ideias, já sistematizadas em 2001, forneceram a base
intelectual para política externa do governo Bush após os atentados de 11 de setembro.
Em síntese, o neoconservadorismo não é uma teoria, mas um pragmatismo militante
que teve sua gênese tanto nas questões afetas à política interna quanto naquelas afetas a
política externa. Seu propósito principal é a persuasão, isto é, convencer a sociedade
"americana" que os valores morais estão ligados aos interesses estadunidenses e a força
militar é o instrumento principal para promover esses interesses, bem como para garantir a
primazia dos EUA no sistema internacional.
Hoje o neoconservadorismo é percebido, de forma simplificada, naquilo que tange à
política externa, como uma postura unilateralista, pautada no emprego da força militar que
utiliza o discurso da promoção da democracia apenas para legitimar o emprego da força
militar na defesa dos interesses estadunidenses. O termo “neoconservador” sofreu uma
simplificação, tornando-se apenas a designação, ou rótulo de qualquer um considerado um
“falcão”. Essa simplificação dissocia o peso dos valores morais “americanos” na formulação
desse pensamento político. Na verdade, à luz da análise efetuada no presente trabalho, pode-
se perceber que o neoconservadorismo apresenta um conjunto de proposições coerentes com o
sistema de crenças e valores de um segmento expressivo da sociedade "americana", pautando-
se na busca pela preservação da preeminência dos EUA, em consonância com os princípios
morais que, segundo os neoconservadores, deveriam nortear a política interna e externa dos
EUA.
No segundo capítulo deste trabalho, foi analisado o processo de decisório da política
externa do governo George W. Bush, à luz da Teoria de Unidades de Decisão e deste modo
foi evidenciado seu lócus decisório e o peso dos pontos centrais do pensamento
neoconservador, após os atentados de 11 de setembro de 2001, sobre a unidade de decisão
130
152
Em consonância com o apresentado na seção 1.3 desta dissertação, recordamos o ponto central em pauta:
Exportar a democracia, inclusive por meio do emprego da força, não por humanitarismo, mas porque a
disseminação da democracia liberal aumentará a segurança dos EUA (Nota do autor).
132
153
Conforme exposto na Introdução deste trabalho, o termo metáfora é utilizado no sentido de uma palavra em
um sentido figurado, que permite que se transfiram atributos de um conjunto de circunstâncias para outro, a
fim de que se possa expressar uma percepção da realidade (Nota do autor).
135
154
O candidato do partido democrata venceu as eleições presidenciais de 2008, com 364 votos do colégio
eleitoral, contra 174 votos recebidos por McCain. No entanto, se observarmos os votos dos eleitores, podemos
perceber que vitória de Obama foi relativamente “apertada”, pois Barack Obama recebeu 53% dos votos dos
eleitores e John McCain obteve 46% dos votos válidos (ELECTION REFEREE. Barack Obama Elected 44th
President of the United States. <http://www.electionreferee.com/index.php/2008/11/05/barack-obama-elected-
44th-president-of-the-united-states/>).
155
McMAHON, Robert. Foreign Policy Brain Trusts: McCain Advisers (<http://www.cfr.org/us-election-
2008/foreign-policy-brain-trusts-mccain-advisers/p16194>).
136
Finalizando, cabe ressaltar que, mesmo com a crise econômica que emergiu em 2008,
os EUA ainda possuem a maior economia do mundo e a preponderância do poder militar em
escala global. Assim sendo, estudos que possam contribuir para a compreensão das diversas
correntes do pensamento político estadunidense, guardam coerência com os interesses de um
país que, como o Brasil, busca maior inserção e participação no sistema internacional.
137
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Adam Wolfson
Ph.D em Ciência Política pela University of Chicago. Foi editor da The Public Interest
e da Commentary. Atualmente é co-editor da The Liberal Tradition in Focus. É autor de
inúmeros ensaios e artigos publicados na The Weekly Standard; Commentary; National
Review; The Review of Politics; e Perspectives on Political Science156.
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Best and Brightest da administração Kennedy, teve papel relevante na defesa do envolvimento
dos EUA no Vietnã. McGeorge Bundy faleceu em 1996168.
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JOHN F. KENNEDY PRESIDENTIAL LIBRARY AND MUSEUM. McGeorge Bundy.
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171
PATRICK J. BUCHANAN. Biography (<http://buchanan.org/blog/biography>).
151
seguida foi Special Assistant, Strategic Arms Limitation Talks na Arms Control and
Disarmament Agency (1973-77). Durante a administração Reagan exerceu diversos cargos no
executivo: Assistant Secretary of State for East Asia and Pacific Affairs (1982-86); Director
of Policy Planning (1981-82) e Embaixador na Indonésia (1986-89). Decano e professor de
Relações Internacionais (1994-2001) na School of Advanced International Studies da Johns
Hopkins University. Foi Subsecretário de Defesa (2001-2005) e depois presidente do World
Bank Group (2005-2007). Desde 2008 preside o U.S.-Taiwan Business Council172.
Richard Perle
Mestre em Ciência Política pela Universidade de Princeton é Resident Fellow do
American Enterprise Institute. Foi membro da equipe do Senador Henry “Scoop” Jackson
(1969- 180); Assistant Secretary of Defense for International Security Policy (1981-1987);
Presidente (2001-2003) e membro (1987-2004) do Defense Policy Board do Departamento de
Defesa e; juntamente com David Frum escreveu An End to Evil, publicado nos EUA em
2004173.
172
AMERICAN ENTERPRISE INSTITUTE. Scholars & Fellows. Paul Wolfowitz.
(<http://www.aei.org/scholar/126>).
173
AMERICAN ENTERPRISE INSTITUTE. Scholars & Fellows. Richard Perle.
(<http://www.aei.org/scholar/49>).
152
para ser seu Secretário de Defesa, cargo que exerceu até 1968, já na administração Johnson.
Teve papel destacado no fracassado desembarque dos exilados cubanos na Baía dos Porcos
(1961), posteriormente, teve seu momento de maior brilho na crise dos mísseis em Cuba
(1962). Ao deixar o Departamento de Defesa em 1968, McNamara assumiu a direção do
Banco Mundial, cargo que exerceu até 1981. Na década de 1980 e 1990 seus escritos
contribuíram para o debate da política externa estadunidense. McNamara faleceu em julho de
2006, aos 93 anos de idade174.
174
USA. U.S. Department Of Defense. Secretaries of Defense. Robert S. McNamara
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JOHN F. KENNEDY PRESIDENTIAL LIBRARY AND MUSEUM. Walt W. Rostow.
(<http://www.jfklibrary.org/Research/Ready-Reference/Biographies-and-Profiles/Walt-W-Rostow.aspx>).
APÊNDICE B – Importações de Petróleo dos EUA: 2000- 2009
2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009
Total das Importações (milhões de barris) 3310,9 3.404,7 3.336,1 3.521 3.674,1 3.670,4 3.684,7 3.656,2 3.570,8 3.307,1
Principais Fornecedores (Golfo Pérsico) 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 % em 2003 % em 2009
Iraque 226,3 290,2 167,5 171,4 238,2 189,7 202,0 177,0 229,3 163,7 4,9 4,9
Kuwait 96,0 86,5 78,8 75,0 88,4 78,6 65,2 64,3 75,4 67,6 2,1 2,0
Arábia Saudita 555,9 588,0 554,4 629,2 546,7 524,7 518,7 530,2 551,3 360,9 17,9 10,9
Emirados Árabes Unidos 1,1 7,7 3,7 3,6 1,9 3,1 1,7 3,2 1,4 14,2 0,1 0,4
Total - Golfo Pérsico 879,3 972,4 804,5 879,2 875,2 796,1 787,6 774,8 857,3 606,4 25,0 18,3
Américas, África e Europa 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 % em 2003 % em 2009
Canadá 492,0 494,9 527,4 564,8 589,7 599,7 650,6 680,5 706,9 707,3 16,0 21,4
México 479,2 508,8 547,5 579,9 584,4 565,9 575,1 514,5 433,8 400,2 16,5 12,1
Venezuela 446,4 471,2 438,4 435,5 473,4 449,2 415,7 419,8 381,0 352,3 12,4 10,7
Colômbia 116,1 94,9 85,8 59,4 50,6 57,0 51,6 50,1 65,1 92,7 1,7 2,8
Equador 46 41 37 50 83 101 99 72 78 64 1,4 1,9
Brasil 1,8 4,7 21,2 17,4 18,7 34,5 48,6 61,0 84,4 107,3 0,5 3,2
Nigéria 319,4 307,3 215,0 305,7 388,8 386,9 380,7 394,9 338,0 281,3 8,7 8,5
Angola 107,7 117,2 117,2 131,9 112,0 164,2 187,1 181,2 184,5 163,8 3,7 5,0
Gabão 52,2 51,1 52,2 47,7 52,1 46,5 21,8 22,9 21,3 22,7 1,4 0,7
Noruega 110,2 102,6 127,0 60,0 53,5 43,5 35,9 20,3 10,9 22,3 1,7 0,7
Rússia 2,6 0,0 31,0 54,4 54,7 70,4 39,3 40,8 41,5 84,7 1,5 2,6
Reino Unido 106,2 89,1 147,8 126,5 86,2 80,1 46,7 37,1 27,4 37,9 3,6 1,1
Total – Outras regiões 2.279,4 2.283,1 2.347,0 2.433,5 2.547,4 2.598,4 2.552,5 2.495,2 2.372,8 2.336,0 69,1 70,6
Total 94,1 89,0
Outros fornecedores: Trinidad e Tobago, Indonésia, Líbia, Qatar, Argentina, Austrália, Brunei, Chad, Congo, Guiné Equatorial e Malásia.
Fonte: U.S. CENSUS BUREAU. The 2011 Statistical Abstract. Energy & Utilities: Crude Oil, Petroleum. Crude Oil Imports Into the U.S. by Country of
Origin. Disponível em: <http://www.census.gov/compendia/statab/cats/energy_utilities/crude_oil_petroleum.html>. Acesso em: 25 jun. 2011.
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