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– Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação


Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação

Som e Cor na Animação “O Menino e o Mundo” 1

Fernanda DEDA2
Michele BOARON3
Renata CEQUINEL4
Hilton CASTELO5
Universidade Positivo, Curitiba, PR

RESUMO

O filme “O Menino e o Mundo”, produzido por Alê Abreu faz uma crítica e alerta
sobre a sociedade e o capitalismo. A história possui uma estética com traços
simples capazes de transmitir todas as mensagens que o diretor deseja, prova
disso são os diversos prêmios que ganhou. Os sons e as cores são
indispensáveis, pois compõem o filme e proporcionam comoção do público com o
personagem e sua história. Elementos utilizados de formas brilhantes nesta
produção nos mostram que não é necessário usar toda a tecnologia disponível
atualmente para construir um filme rico em conteúdo e cheio de personalidade.

Palavras-chave: Cinema de animação; Som; Cor; “O Menino e o Mundo”.

INTRODUÇÃO

A animação brasileira “O Menino e o Mundo” é uma produção de Alê Abreu,


que foi lançada no festival Anima Mundi e logo ganhou espaço em diversos
festivais internacionais. Isso se deu por sua estética simples e bonita, e pela forma
como são trabalhados os sons e as cores como elementos fundamentais da
narrativa.
O objeto de pesquisa gira em torno da interpretação e análise de elementos
como os sons e as cores no decorrer do filme que, surpreendentemente não faz o
uso de falas entre os personagens, mas consegue transmitir todas as mensagens
que o diretor deseja com técnicas simples, porém, bem realizadas.

1
Trabalho apresentado na disciplina Pesquisa em Comunicação do curso de Publicidade e
Propaganda da Universidade Positivo.
2
Estudante de graduação do 3° ano do curso de Publicidade e Propaganda da Universidade
Positivo. E-mail fernandadeda@hotmail.com.
3
Estudante de graduação do 3° ano do curso de Publicidade e Propaganda da Universidade
Positivo. E-mail michiboaron@hotmail.com.
4
Estudante de graduação do 3° ano do curso de Publicidade e Propaganda da Universidade
Positivo. E-mail renata.cequinel@gmail.com.
5
Professor orientador. E-mail: hiltoncastelo@gmail.com.
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Em meio a diversas tecnologias que o cinema atual possui para suas


produções, é interessante perceber que todos esses recursos não são
indispensáveis, mas que outras técnicas mais simples podem ser implementadas e
que, se estiverem junto com a essência do diretor, a interpretação não se torna
limitada ou ultrapassada.
Os criadores deste gênero fílmico mantêm o cuidado de produzir histórias
para todos os públicos, oferecendo aos adultos críticas e histórias interessantes, e
às crianças a beleza da magia dos desenhos, cores, músicas e até das
brincadeiras. É interessante ponderar que sem uma única palavra o diretor de “O
Menino e o Mundo” consegue transmitir tudo o que quer, com enorme sucesso.
Não é difícil para os telespectadores entrarem na proposta do filme, logo nos
primeiros minutos e no decorrer da trama, quando cores e música se
complementam, transmitindo emoções e sentimentos do menino ao público.
Com embasamento nas teorias de Rodríguez, Martin, Padilha, Chion,
Gomes, Briscelance, analisamos como a cor e o som interferem na narrativa e
principalmente na construção do personagem Oninem. Cores que ditam momentos
e sentimentos, músicas que guiam emoções e empatias, capazes de cativarem o
público e de fazerem com que as pessoas se emocionem com o drama do menino,
além de se identificarem com ele.

1. A ANIMAÇÃO BRASILEIRA

A animação brasileira teve início em 1907, por meio do trabalho do


cartunista Raul Pederneiras que produzia charges animadas para um jornal
televisivo, o Pathé-Jornal. A partir do momento em que ele terminou e divulgou o
seu trabalho o cinema de animação ganhou vida. A animação começou como
simples experimento e aos poucos foi ganhando força.
Em 1917 o cinema de animação teve sua primeira exibição no Brasil, com o
filme “Kaiser” de Àlvaro Marins (Seth), onde Sampaio Corrêa financiou; o filme foi
projetado no Cine Pathé em 22 de janeiro de 1917, que fica no Rio de Janeiro.

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FIGURA 1: “Kaiser” de Àlvaro Marins (Seth).

FONTE: Internet. Disponível em: goo.gl/geQyDl. Acesso: 10/10/2016.

A animação também foi usada para alertar e protestar contra abusos


políticos, econômicos e sociais. Um exemplo disso foi em 1939, quando a Walt
Disney chegou ao Brasil, acarretando a aproximação entre os países das
Américas e ao repúdio a Hitler e ao nazismo.
Em 1985, um acordo firmado entre a National Filme Board e a Nacional
Embrafilme, deu origem a um núcleo de animação no Rio de Janeiro.

[...] permitiu o aparecimento de toda uma nova geração de animadores


como César Coelho e Aida Queiróz nas parcerias Alex (1987) e Tá limpo
(1991), César Coelho e Magalhães. Daniel Schorr com Viagem de Ônibus
(1986) e Fábio Ligrimi com Quando os morcegos se calam (1986). Como
conseqüência surgiram núcleos regionais com uma série de produções
ligadas a Universidade Federal de Minas Gerais, com coordenação de
José Tavares de Barros e no Ceará com José Rodrigues Neto (GOMES,
2008, p.16).

A partir daí, a indústria de animação brasileira não parou. Muitos filmes


foram muito bem recebidos pelos brasileiros, principalmente os filmes infantis, que
sempre atraíram grande público.

Cassiopéia (1996), o primeiro longa-metragem feito integralmente em


computador, que abriu novas possibilidades técnicas para animação. Sua
produção foi dirigida pelo animador Clóvis Vieira e uma equipe de três
diretores de animação e onze animadores, trabalhando em dezessete
microcomputadores 486 DXa-66 (GOMES, 2008, p.17).

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Em 1993, o animador Marcos Magalhães se juntou com Aida Queiroz,


Cezar Coelho e Léa Zagury para fundar o maior festival de animação brasileira, o
Anima Mundi. O evento é dedicado às animações produzidas em todas as
Américas, ocorrendo todos os anos no mês de julho com sede no Rio de Janeiro e
em São Paulo. “São centenas de filmes selecionados entre os melhores do
mundo, retrospectivas, especiais, oficinas abertas onde os frequentadores iniciam-
se nos segredos da animação” (GOMES, 2008 p. 22).
Como o Anima Mundi é o maior evento da categoria e detêm atrações
especiais, se tornou um dos festivais mais esperados do ano e todas as edições
contam com mais de oitenta mil pessoas.
A procura e a admiração por filmes brasileiros aumentam a cada ano. A
“Mostra Brasil”, onde são exibidos tais filmes, tem os seus ingressos esgotados em
pouco tempo. Isso mostra um aumento significativo no mercado da animação no
Brasil, como também um amadurecimento das produções. A evolução foi
constante através de novas técnicas que a tecnologia proporciona, como os
efeitos especiais e os formatos 2D e 3D.
Atualmente, a animação quebrou o tabu de ser somente destinada ao
público infantil, pois, também é feita para jovens e adultos, sendo capaz de
transmitir lições de vida, reflexões e críticas muito maduras e bem colocadas,
como, por exemplo, no filme “O Menino e o Mundo” do diretor Alê Abreu, lançado
no festival Anima Mundi em 2014.

2. A LINGUAGEM NO CINEMA DE ANIMAÇÃO

Composta por todos os elementos que formam um filme, como


enquadramentos, figurino, iluminação, cores e som, a linguagem concretiza e dá
rumo à narrativa. Assim, designa diversas possibilidades para os criadores e para
aqueles que o produzem. Levando em conta que cada elemento é dotado de um
significado, quando este é combinado com outros, gera significados ampliados e
que podem ser explorados. “Atuando em conjunto, os itens formam uma unidade
fílmica capaz de transmitir sentimentos e sensações para os espectadores”.
(ABREU; ANDRADE, 2016, p. 02).

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2.1 O SOM COMO LINGUAGEM

Em agosto de 1928, Eisenstein, Pudovikin e Alexandrov fizeram um


manifesto sobre o filme sonoro. Para eles o público não precisa pensar nas
imagens que vê, pois, o som explica tudo.

O som desempenha um papel essencial na narrativa audiovisual como


elemento de organização, unificando ou separando estruturalmente
sequências visuais compostas de múltiplos movimentos e mudanças de
ponto de vista. Esse uso do som como instrumento organizador tem
também uma relação muito direta com a lógica da percepção humana
(RODRÍGUEZ, 2006, p.328).

Martin (2007) divide os fenômenos sonoros em ruídos naturais (fenômenos


sonoros do mundo natural) e ruídos humanos (sons produzidos por pessoas, onde,
podem ser mecânicos como as máquinas; palavras que são as falas; música ruído
como personagens cantando).
Estudos feitos sincronizando o som à imagem geraram o primeiro filme
sonoro e falado: “O Cantor do Jazz”. Ele foi produzido pela Warner Bros em 1927
e promoveu um grande avanço na indústria cinematográfica.
Entretanto, o cinema sempre foi sonoro, pois mesmo antes da sua
existência havia o pré-cinema, que era teatro de sombra, lanterna mágica, teatro
mágico. As apresentações dos Irmãos Lumière, por exemplo, dispunham de um
pianista durante as sessões, que tocava os temas de acordo com o que estava
acontecendo na tela. Em seu artigo Demian Garcia atribui a Kurt London a
justificativa de que música “ao vivo” servia para camuflar os sons externos, que
eram muito altos, assim como os ruídos emitidos pelos primeiros projetores.

Desde suas primeiras sessões, os irmãos Lumière fazem acompanhar os


filmes por instrumentistas, mas ao contrário de Émile Reynaud, que
mandava compor uma música original adaptada a cada Pantomina
Luminosa, os músicos improvisam a partir dos filmes projetados, usando
partes de repertórios e misturando numa alegre miscelânea de música
erudita e popular (...) parecia natural que aquelas imagens em movimento
deveriam ser acompanhadas por música (BRISELANCE, 2010, p.114).

A importância do progresso tecnológico no cinema permitiu um


desenvolvimento precioso, atribuindo cores as imagens e possibilitando reproduzir
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e unir na mesma fita, imagem e som.


Desde então, a busca em aperfeiçoar as técnicas de captação de som
trouxe avanços significativos em todo o processo cinematográfico. “Da filmagem
até a pós-produção, o áudio percorre três etapas: a captação de som, a edição e a
mixagem” (NORONHA, 2012, p. 01). Criar a trilha sonora de um filme, é contar
através de sons aquilo que a imagem representa, e a maneira como um diretor
quer contar sua história.
De acordo com Michel Chion, segundo Ferreira (2013), podemos classificar
os sons existentes em três categorias: 1) In: são os sons perceptíveis pelos
personagens, como o diálogo entre os eles, por exemplo; podem ocorrer dentro da
cena, ou não; 2) Out: sons subjetivos que não são perceptíveis aos personagens,
mas que possuem grande importância para a interpretação, como efeitos sonoros
de palmas, por exemplo; 3) Off: sons subjetivos que transmitem a imaginação de
um personagem e que depois, retomam a realidade; acontecem fora do quadro, no
espaço extradiegético.
Uma quarta classificação pode ser incluída, que são os sons subjetivos, ou
seja, quando ouvimos o pensamento da personagem, por exemplo, este som está
dentro do quadro, mas apenas o espectador pode ouvir.
A construção da sonoridade de um filme, “a criação e manipulação nesses
espaços sonoros é uma ferramenta importante na construção de mundos, na
representação das sensações, e no processo de significação de cada som dentro
do filme” (GARCIA, 2014, p. 143).
Para interpretar os sons o ouvido realiza três funções: análise de
complexidade frequencial - timbre; análise da evolução dinâmica - intensidade;
análise da evolução do som – tom.
Ainda existe a trilha sonora, definida como uma música que acompanha o
filme. Ela possui um papel dramático em que transmite aspectos emotivos que
facilitam a interpretação das mensagens que o filme quer passar; além disso,
ainda tem um papel rítmico, responsável por substituir ruídos reais e realçar
movimentos visuais ou sonoros. A trilha sonora possui um papel lírico capaz de
proporcionar às imagens a dimensão lírica que elas não possuem sozinhas.

O silêncio é promovido como valor positivo, e sabemos o papel dramático


que ele pode desempenhar como símbolo de morte, ausência, perigo,
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angústia ou solidão. O silêncio, melhor do que a intervenção de uma


música, é capaz de sublinhar com força e tensão dramática de um
momento [...] (MARTIN, 2003, p.114).

Martin (2003, p.114) afirma ainda que a trilha sonora estabelece de certo
modo a continuidade, tanto na simples percepção quanto na sensação estética.
Para ele a trilha sonora é menos fragmentada que a imagem e o papel da música
é primordial para dar continuidade sonora material e dramática.

2.2 A COR NO CINEMA DE ANIMAÇÃO

A cor é um fenômeno físico-químico em que os raios luminosos chegam até


a retina dos olhos e estimulam os nervos ópticos que se ligam ao cérebro
(STAMATO; STAFFA; VON ZEIDLER, 2013, p. 02).
Elas estão classificadas de maneira diferente: cores primárias, que não
podem ser decompostas; cores secundárias, que surgem da combinação entre
cores primárias; cores quentes, cores frias, neutras e pastéis (misturadas com
branco).
A partir dessas classificações, chegamos ao círculo cromático. Nele é
possível estudar os tons, bem como as combinações entre eles.

FIGURA: Paleta de cores.

FONTE: Limão na Água. Disponível em: goo.gl/WWHSyg. Acesso: 14/10/2016.

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“As cores complementares, por exemplo, são aquelas que se ligam em uma
linha com ângulo de 180º e se combinam. Muitos filmes usam este círculo para
definir as cores do figurino, do cenário [...]” (STAMATO; STAFFA; VON ZEIDLER,
2013, p. 03).
Entretanto, as cores têm um papel importantíssimo na linguagem do
cinema. Além de definir em qual gênero tal filme está inserido, elas são
responsáveis por demonstrar componentes físicos e mentais, e também
emocionais.
Detendo um papel silencioso e livre de barreiras linguísticas, a cor atinge
um universo muito grande de pessoas. Ela possui uma função que vai muito além
do que somente estética. A cor obteve um papel tão importante no cinema, que
seu uso tornou-se mais intenso, simbolizando personalidade e sentimentos dos
personagens, como por exemplo, o preto para indicar tristeza, e branco a paz ou a
calma.
A partir deste papel sentimental, a cor em um filme pode influenciar as
atitudes do público. A partir da Escala Pantone, temos a definição da linguagem
padrão das cores, resultando na influência delas sob o público. Tal influência gera
reação individual, que varia conforme a cultura de cada um, associações afetivas e
materiais feitas pelas pessoas.
Construindo atmosferas diferentes, climas específicos e transmitindo
mensagens, as cores determinam o clímax de um filme. Por exemplo, a
predominância de tons quentes como vermelho, amarelo e laranja podem significar
verão, prazer, guerra, violência, amor e alegria.
Já o uso de tons frios como azul, verde e marrom significa natureza, calma,
saúde, tranquilidade, frio, melancolia.
Tons como branco representam paz; preto a morte, tristeza; cinza:
melancolia, velhice; e rosa representa o sonho, infância.
A partir destes significados, é possível usar este elemento para a
construção e definição de identidades. Tomemos por exemplo certo personagem
que “é retratado com cores frias e escuras, por viver uma vida triste e sem graça,
mas quando o jovem decide mudar o rumo de sua vida e ir atrás do seu sonho,
passa a ganhar cores fortes e alegres” (STAMATO; STAFFA; VON ZEIDLER,
2013, p. 08).

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3. AS CORES EM “O MENINO E O MUNDO”

“O menino e o mundo” é uma produção do diretor Alê Abreu, nascido em


março de 1971 e formado em Comunicação Social, que realizou diversos trabalhos
no cinema e na publicidade. Iniciou sua carreira no cinema em 1993 com o curta
metragem “Sírius”, a partir daí não parou mais. Produziu longas, seriados para TV,
ilustrações e seu último filme o “Menino e o Mundo”. A história faz uma crítica ao
capitalismo e gira em torno de um menino que vê seu pai saindo de casa para
trabalhar, a bordo de um trem representado por uma cobra de cor escura e
gigante, que some, leva seu pai e nunca mais volta com ele.
O diretor Alê Abreu utiliza as cores para denotar os sentimentos dos
personagens, mas, além disso, ele consegue transmitir ideias. Isso é utilizado no
filme inteiro e contribui para a construção do personagem. A felicidade é
representada através de muitas cores, música e agitação, como no início do filme,
por exemplo, onde o personagem é cercado de vida e um colorido predominante.
A tristeza, o cansaço e a poluição são representados por cores escuras que
representam coisas pesadas, como, por exemplo, o trem que leva o pai de
Oninem, representado por um animal que parecia uma cobra de feição irônica e
mal humorada, além de ser de cor escura e sumir sem deixar muitos sinais de
onde iria chegar.
Quando Oninem sai à procura do seu pai e se depara com uma realidade
diferente da colorida e feliz vida no campo junto com sua família. Ele vê cidades
escuras, cheias de poluição visual e de pessoas cansadas, tristes e deprimidas.
Em certo momento ele encontra música e cultura, trazendo alegria e cor
novamente, porém, de forma temporária. A partir do momento em que o seu pai
está indo em direção ao trem, as cores em volta começam a sumir um pouco,
como se a alegria estivesse indo com ele.
Outro exemplo é com relação à cultura e à música, estas, são
representadas com muita cor e agito, transmitindo a alegria e a esperança que
proporcionam ao personagem e aos que estão em volta, além disso, produzem
pequenas bolinhas coloridas que ficam pelo ar e flutuam se espalhando e, aos
poucos, se distanciam.

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FIGURA: Cultura.

FONTE: Internet. Disponível em: goo.gl/IpH9L3. Acesso: 14/10/2016.

O curioso sobre o filme é que ele não faz o uso de toda a tecnologia
disponível atualmente. O diretor optou por utilizar desenhos com traços simples e
em formato 2D para dar vida aos personagens, transmitindo infantilidade e
ingenuidade, com um fundo branco na maioria das cenas, como se estivesse
representando uma folha de papel, porém com o uso muito forte de sons e cores
vivas. “Ideias desconexas foram se juntando, ligadas muito mais por música e
desenhos [...]” (MOGADOURO, 2014, pg. 163).

FIGURA: Oninem.

Fonte: Internet. Disponível em: goo.gl/a5TNXD. Acesso: 15/10/2016.

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O filme não faz uso de falas, mas o autor optou, para as poucas cenas com
diálogo entre os personagens, fazer a leitura das palavras de trás para frente e o
próprio nome do personagem principal segue essa lógica: Oninem, que seria
menino. Outro exemplo é a forma como a mídia é representada no filme: “O
mesmo se aplica às propagandas e telejornais que estão sempre nesta linguagem
(escrita e falada), dispensando palavras claras.” (MOGADOURO, 2014, pg. 163).
Apesar de contar claramente a história de exploração, desigualdade social e
condições humanas presentes no continente latino-americano - o que fica fácil de
identificar logo de cara, pois faz parte da nossa história – o longa metragem não
localiza o público no tempo e nem no espaço.

4. O SOM EM “O MENINO E O MUNDO”

O filme “O menino e o Mundo” é representado por uma trilha sonora


composta pelo rapper Emicida. Ela proporciona ao filme o drama e as emoções
que complementam as imagens, sua letra é de forte significado e torna a aflição de
Oninem palpável para quem acompanha a trama.

(...) Saudades de pá, pai, quanto tempo faz, a esmo / Não é que esse
mundo é grande mesmo / A melodia dela, do coração, tema / Não perdi
seu retrato / Tipo adoniran em Iracema / São lágrimas no escuro e solidão
/ Quando o vazio é mais do que devia ser / Lembro da minha mão na sua
mão / E os olhos enchem de água sem querer / Aos olhos de uma criança
/ Gente, carro, vento, arma, roupa, poste / Aos olhos de uma criança /
Quente, barro, tempo, carma, roupa, nóis / Aos olhos de uma criança /
Mente, sarro, alento, calma, moça, sorte / Aos olhos de uma criança /
Sente o pigarro, atento, alma, louça, morte / Aos olhos de uma criança /
Menino, mundo, mundo, menino (EMICIDA, 2013)

No filme “O menino e o Mundo” o som possui grande importância, sendo


essencial para proporcionar o entendimento da história, além disso, promove a
organização da trama, além de ser um complemento para os elementos visuais.
Ao longo do filme podemos observar a presença dos fenômenos sonoros
naturais, como, por exemplo, no início em que o menino está em meio à natureza.
Estão presentes também os ruídos humanos, como quando Oninem chega na
cidade e se depara com o som dos carros, da agitação e das máquinas; ou então,
o som da música produzida em certos momentos.

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Além disso, o filme faz o uso das três classificações de sons propostas por
Chion (citado por FERREIRA, 2013): In, Out e Off. Os sons In são utilizados em
momentos em que determinados elementos do filme produzem sons e quem
assiste consegue ver de onde está vindo, como na cena do trem, pois, ouvimos
um barulho dele e logo o identificamos, ou então, quando vemos o cão latir, por
exemplo; os animais e os sons que eles produzem, ou os próprios passos dos
personagens.
A classificação Out se encontra em cenas como o próprio início do filme, há
uma tela branca e se inicia um ruído, como o som de uma flauta, surgindo aos
poucos uma pequena bolinha lilás que dá início a toda a magia colorida e ilustrada
do filme, com uma música que nós não conseguimos ver de onde vem, ou o sino
que a mãe toca e que Oninem ouve indo na direção da sua casa.
Um bom exemplo da classificação Off são as bolinhas coloridas produzidas
pela música, elas representam a lembrança que Oninem tem com relação à cultura
e ao que o seu pai o transmitiu. Elas estão presentes em grande parte da história,
inclusive o menino guarda uma delas com afeto e a tem como uma espécie de
conforto, pois ouve a música que ela transmite quando sente saudades do pai.
Alê Abreu utiliza também o silêncio como uma forma de impactar, mas além
disso, demonstrar o que o personagem está sentindo em seus momentos de
tristeza, saudade e agonia. Lembrando que a música é capaz de nos provocar
emoção, quem assiste adquire carinho por determinado personagem e acaba se
identificando com a história e com o sofrimento dele, isso faz com que as pessoas
acabem torcendo pelo menino e pela felicidade de encontrar o pai que ele tanto
busca, por este motivo o filme se torna tão impactante, pois o destino de Oninem é
algo inesperado.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O diretor Alê Abreu utiliza elementos técnicos para representar a história,


como ilustrações simples e de traços fortes que relatam a visão do menino,
através de desenhos em uma folha em branco.
O filme não possui falas, por isso, estimula a interpretação e imaginação
através de elementos como as cores e o som, que são responsáveis por situar o
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público ao decorrer da narrativa, fazendo com que se identifiquem com o


personagem e com o drama que ele vive.
Teorias de estudiosos da comunicação e de cinema se encaixam de forma
tão natural que até mesmo quem não tem muito conhecimento sobre estes temas
acaba os identificando ao decorrer da trama. Como, por exemplo, os conceitos de
Chion (citado por FERREIRA, 2013) sobre a classificação dos sons, ou o uso da
paleta de cores e os efeitos que elas proporcionam em quem assiste.
“O Menino e o Mundo” retrata uma realidade próxima dos dias atuais, de
forma que transmite inocência aos olhos do menino que se vê diante de uma vida
totalmente diferente da que levava no campo. Oninem é motivado pela partida de
seu pai e pelo vazio que ele deixou em sua vida, e sai à sua procura.
Pessoas se apegam e se comovem com personagens queridos, mas
principalmente, se identificam torcendo por eles, chorando e sorrindo pelo drama
que sofrem. Oninem é exemplo disso, não é necessário ter passado pela mesma
situação para conseguir entender e se comover com o que o menino sofre e com
tudo aquilo o que ele deseja.
Algo chama muita atenção em torno da produção e dos elementos
trabalhados em “O Menino e o Mundo”, pois, o filme não faz o uso de efeitos
especiais demasiados e não utiliza as técnicas mais revolucionárias para construir
o personagem. O diretor quis passar a visão de uma criança perante o mundo e
conseguiu com sucesso e maestria.
A tecnologia demasiada nem sempre é a melhor e única escolha de um
diretor. O Menino e o Mundo é um belo exemplo deste fato, pois prova que
elementos considerados simples, quando são bem utilizados, conseguem compor
com sucesso a trama, transmitir aquilo que o diretor deseja e o que o público
necessita para compreender a narrativa.

REFERÊNCIAS

ABREU, Tami de Castro; ANDRADE, Ana Lúcia M. O Uso da Cor no Cinema de


Animação de Tim Burton. Revista Anagrama: Revista Científica Interdisciplinar da
Graduação. Ano 10 – Volume 1 – Janeiro-Junho de 2016.

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BUNGARTEN, Vera. A relação do espectador com as imagens visuais no cinema.


Revista AV. 2004. Disponível em <https://goo.gl/O14A24>. Acesso em: 02 maio
2013.

BRISELANCE, M. F. Gramática do Cinema. Lisboa: Edições Texto & Grafia,


2010.

EMICIDA. Aos Olhos de uma criança. 2013. Disponível em: goo.gl/LF4tsC.


Acesso: 10/10/2016.

FERREIRA, Marina Mapurunga de Miranda. As Margens do Som: Uma análise


das imagens sonoras do curta-metragem Da Janela do meu quarto (2004), de Cao
Guimarães. Rio de Janeiro: UERJ/Conecos, 2013. Disponível em: goo.gl/4qxLsz.
Acesso: 10/10/2016.

FONTELES, Mauricio Gomes da Silva. A Dimensão Sonora e a Representação


do Espaço Imaginário no Cinema de Animação 3D. 2014. 147 f. Dissertação
(Programa de Pós-Graduação em Comunicação Social). Brasília: UNB, 2014.

GARCIA, Demian. O som no cinema e a música concreta. FAP Revista Científica.


2014. Curitiba, p. 143, jan./jun., 2014

GOMES, Andréia Prieto. História Da Animação Brasileira. Centro de Anális do


Cinema e do Audiovisual. Rio de Janeiro. 2008.

MOGADOURO, Claudia. O Menino e o Mundo – O simples e o Complexo na


mesma obra. Comunicação & Educação. São Paulo. 2014.

NORONHA, Danielle de. O som do cinema: Profissionais do som falam sobre o


áudio no cinema e suas etapas de produção. Associação Brasileira de
Cinematografia. 04 jan. 2012.

RODRÍGUEZ, A. A Dimensão Sonora da Linguagem Audiovisual. São Paulo:


Editora Senac SP, 2006.

STAMATO, Ana Beatriz Taube; STAFFA, Gabriela; VON ZEIDLER, Júlia Piccolo.
A Influência das Cores na Construção Audiovisual. Intercom: XVIII Congresso de
Ciências da Comunicação na Região Sudeste – Bauru - SP – 03 a 05/07/2013.

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