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Amor
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A vivência do amor é apenas uma necessidade passageira ou algo a
que estamos fatalmente destinados? No que consiste esse sentimento? Como
ele se manifesta? Quais as virtudes a ele vinculado? Do que o amor é capaz?
 
 
A vivência do amor é apenas uma necessidade passageira ou algo a que estamos
fatalmente destinados? Na nota explicativa da questão 938, de O Livro dos
Espíritos, temos as seguintes considerações de Allan Kardec:
 
A Natureza deu ao homem a necessidade de amar e de se sentir amado.
Um dos maiores prazeres que lhe sejam concedidos sobre a Terra é o de
reencontrar corações que se simpatizam com o seu, o que lhe dá as
premissas de uma felicidade que lhe está reservada no mundo dos
Espíritos perfeitos, onde tudo é amor e benevolência. [1]
 
Suas palavras estão intrinsecamente associadas a uma das muitas definições do
que seja o amor: “Sentimento que impele as pessoas para o que se lhes afigura belo,
digno ou grandioso.” [2]
 
Se estamos fatalmente destinados à vivência desse sentimento belo, digno e
grandioso – porque se assim não fosse, não nos impulsionaria à benevolência em
nossas escolhas e atitudes –, torna-se imprescindível o conhecimento de suas
várias possibilidades, bem como das virtudes que abarca.
 
O que é amar? Como esse sentimento se manifesta?
 
Na Primeira Epístola aos Coríntios (13:1-13), o Apóstolo Paulo traz um dos mais
belos cânticos sobre o que seja o genuíno amor:
 
Ainda que eu fale as línguas dos homens e dos anjos, se não tiver amor,
serei como o bronze que soa, ou como o címbalo que retine.
Ainda que eu tenha o dom de profetizar e conheça todos os mistérios e
toda a ciência; ainda que eu tenha tamanha fé, a ponto de transportar
montanhas, se não tiver amor, nada serei.
E ainda que eu distribua todos os meus bens entre os pobres e ainda que
entre o meu próprio corpo para ser queimado, se não tiver amor, nada
disso se aproveitará.
O amor é paciente, é benigno; o amor não arde em ciúmes, não se ufana,
não se ensoberbece, não se conduz inconvenientemente, não procura os
seus interesses, não se exaspera, não se ressente do mal; não se alegra
com a injustiça, mas regozija-se com a verdade; tudo sofre, tudo crê,
tudo espera, tudo suporta. [3]
 
Em suas palavras, o Apóstolo se refere a nove virtudes do amor. Portanto,
comentemos sobre elas.
 
A primeira a ser elencada é a paciência, quando diz que “o amor é paciente”; e a
paciência é a “virtude de quem suporta males e incômodos sem queixumes nem
revolta.” [2]
        
No entanto, tal virtude não representa a omissão ou a submissão diante das
inconvenientes atitudes alheias, mas trata-se, na realidade, de um equilíbrio mental
e emocional que permite à pessoa sustentar a serenidade e a firmeza na condução
de qualquer relacionamento, até mesmo naqueles marcados por sérios conflitos. O
Espírito Emmanuel afirma:
 
A verdadeira paciência é sempre uma exteriorização da alma que
realizou muito amor em si mesma para dá-lo a outrem, na
exemplificação. [4]
 
Por sua vez, a paciência relaciona-se com a tolerância. Por isso é que o amor “não
se exaspera”.
 
A tolerância, segunda virtude do amor, é o “direito que se reconhece aos outros de
terem opiniões diferentes ou até diametralmente opostas às nossas.” [2] O tolerante
é aquele que, por aceitar e compreender que cada indivíduo possui sua própria
maneira de pensar, sentir e comportar-se, age com tato, cautela e benevolência,
procurando extrair dos outros o que eles, intimamente, possuem de melhor.
 
A vida e as pessoas não são exatamente o que gostaríamos que fossem; quanto
mais aceitarmos este fato, menos estressados e infelizes seremos.
 
A terceira virtude é a benevolência, pois o amor “é benigno”.
 
A criatura benigna é aquela que se compraz em fazer o bem. Como a afetuosidade
e a gentileza são as suas principais características, ela mesma se satisfaz ao
promover a satisfação alheia.
 
O genuíno amor sempre nos possibilita desejar o melhor a quem quer que seja,
impulsionando-nos a tomar as devidas atitudes para que os benefícios realmente
se concretizem. Dessa forma, ele não é somente sentimento, mas, sobretudo,
ação. O Espírito André Luiz afirma: “O verdadeiro amor, para transbordar em
benefícios, precisa trabalhar sempre”. [5]  
        
Ademais, a benevolência promove a incondicionalidade do amor. Esta é, portanto,
sua quarta virtude, porque, de acordo com o apóstolo Paulo, o amor “não procura
seus interesses”.
 
Amor incondicional, por definição, é aquele que não impõe condições – seja por
meio de chantagens, cobranças ou exigências – para que possa existir ou
expressar-se. É, portanto, a atitude de quem não espera por recompensas ou
retribuições pelos benefícios que oferece a outrem. Hammed alerta:
 
Somos nós mesmos que nos iludimos, por querer que as criaturas deem
o que não podem e que ajam como imaginamos que devam agir. [6]
 
Nenhum de nós tem o poder de fazer com que outra pessoa nos ame, mas todos
temos a possibilidade de amá-la em primeiro lugar. E será a manifestação
incondicional de nossos sentimentos que atrairá a atenção de muitas delas para
nós.
 
Quem ama intensamente só pode acreditar, confiar, aceitar e ter a
esperança de receber amor de volta. Mas não existem garantias. Quem
guarda seu amor para o momento em que tiver certeza de receber amor
igual corre o risco de esperar para sempre. E quando amamos com
qualquer expectativa, corremos o risco de nos desapontarmos, porque
não é provável que consigamos encontrar quem atenda a todas as
nossas necessidades, por maiores sejam o amor e a dedicação dessa
pessoa, pois as pessoas nos dão o que podem e quando podem, não
necessariamente o que queremos e quando queremos.
(...) Quando deixamos de impor condições para amar, damos um enorme
passo na direção do aprendizado do amor.
Mas como renunciar às nossas exigências e desenvolver o amor em seu
estado mais puro? Acredito que a melhor forma de aprender a amar é
mergulhando profunda e intensamente na vida. Como começar? Acho
que uma boa maneira é abrindo-se para o amor, estando atento para
suas manifestações, procurando não deixar passar uma ocasião de
manifestá-lo. E convencendo-se de que, por mais difícil que pareça ser,
você é capaz de mudar. Confie em si e trabalhe, invista.
(...) Já que vivemos em um mundo imperfeito, onde nosso amor nem
sempre é correspondido, é bom nos fortalecermos para continuar a
amar. Repetir sempre: “Amo porque quero. Amo por mim, não pelos
outros. Em primeiro lugar, amo pela alegria que o amor me dá. Em
segundo, amo pela alegria que o amor dá aos outros. Se retribuírem meu
amor, ótimo. Se não, vou procurar não dar importância, porque o que eu
quero é amar”. Lembrar que vivemos pela alegria de amar. Esperar que
os outros façam o mesmo, mas sem expectativas nem exigências.
Assim, se formos correspondidos, ficamos duplamente felizes. [7]
 
A quinta virtude é a maturidade, porque o amor “não arde em ciúmes”.
        
O ciúme trata-se de uma inquietação mental e emocional que ocorre diante da
possibilidade – ainda que irreal – de perder algo que julgamos ser nosso por
direito. Mas é justamente no campo afetivo que ele mais se expressa e
desenvolve-se.
 
Certo grau de ciúme é bastante natural em muitos de nós. Paulo, entretanto, refere-
se ao ciúme doentio, pois esse excessivo desassossego mental e emocional faz
sofrer quem o alimenta e quem o suporta, prejudicando consideravelmente a
relação. O psicanalista de origem suíça Valério Albisetti ensina:
 
O ciúme faz parte de uma visão possessiva do ambiente, do outro, de si.
(...) É neurose.
É uma doença.
Não faz crescer.
(...) Viver com o ciumento significa, na verdade, não ter vivido.
(...) Baseia-se na insegurança do próprio eu, em sua não completa,
correta e sadia evolução.
(...) Quem acredita que sentindo ciúme tem amor está no caminho
errado. O amor é respeito pelo outro, pelas suas escolhas, quaisquer que
elas sejam.
(...) Desconfie da pessoa que tem ciúme de você. Ela quer dominá-lo,
possuí-lo, não amá-lo, pois o ciumento usa o ciúme como arma para
manter a outra pessoa em seu poder. Controlam, espreitam, desconfiam
de tudo, asfixiam o parceiro com perguntas reduzindo-lhe ao mínimo a
liberdade.
Não de deve aceitar passivamente a vida com uma pessoa ciumenta.
Nem devemos iludir-nos pensando que tudo passará sem alguma
intervenção planejada. Infelizmente, esse tipo de neurose não melhora
com o passar do tempo, pois os ciumentos não percebem e nem
admitem que o seu problema é sério.   [8]
 
A sexta virtude é o respeito, porque o amor “não se conduz inconvenientemente”.
        
No tumulto de nossas emoções, agimos inadequadamente quando não fazemos
uso do bom senso, do equilíbrio e do respeito em nossas relações com dos
demais, esquecendo que “nossa liberdade termina onde começa a do outro”. Em
nome do amor, não temos o direito de ultrapassar os próprios limites, de invadir a
privacidade alheia, de cercear-lhe a liberdade. Ainda de Hammed:
 
Ter limites é o ato de concretizar nossos sentimentos e pensamentos
sem subtrair os direitos dos outros, ou seja, é escolher atividades e
tomar atitudes com respeito pelas pessoas e por nós mesmos.
(...) Indivíduos descontrolados não possuem limites. Não respeitam as
possibilidades, tampouco a individualidade dos outros. Invadem, de
forma constante, nossa privacidade e transgridem nossos territórios
emocionais, acreditando estar no direito de fazer isso.
(...) Quando queremos que os outros pensem e ajam pelos nossos
padrões existenciais, desrespeitamos seus limites emocionais, mentais
e espirituais, atraindo fatalmente pessoas que agirão da mesma forma
para conosco.  Somente se dá aquilo que se possui. Como, pois, exigir
limites de alguém, se ainda não soubemos estabelecer nossos próprios
limites? [9]
 
A sétima virtude é a capacidade de perdoar, porque o amor “não se ressente do
mal”.
 
Em diversas situações, ficamos “cozinhando” o nosso rancor, não deixando com
que a raiva e o ressentimento, simplesmente, passem por nós. Não estamos
errados em sentir tais emoções, mas, uma vez que insistimos em alimentá-las,
torna-se imprescindível descobrirmos os motivos dessa necessidade, visando ao
entendimento e à mudança dos aspectos de nossa personalidade que estão
favorecendo essa permanência.
 
Como preservar-nos das desagradáveis atitudes alheias se ficarmos, única e
exclusivamente, enfocando os aspectos negativos dos outros? Como desenvolver
o perdão, se não compreendemos que todos têm as suas razões para fazer o que
fazem? Temos condições de avaliar, com o devido acerto, as dores e as alegrias
alheias?
 
O que realmente sustenta uma vida de amor é nosso desejo de
permanecer num espaço amoroso e de reagir com amor nos momentos
difíceis. É muito fácil amar quando tudo vai bem e se está rodeado de
pessoas amigas. É completamente diferente sentir amor pelos outros
(ou pela própria vida) em meio ao caos ou quando nos sentimos
agredidos pelas atitudes dos outros – quando você é criticado, quando
as pessoas invadem seu espaço ou quando lhe respondem com
indiferença a um gesto generoso.  [10]
 
A oitava virtude é a lealdade, pois “o amor não se alegra com a injustiça, mas
regozija-se com a verdade”.
 
A pessoa leal é ética em tudo o que sente, pensa e faz. Suas atitudes, portanto,
estão sempre alicerçadas na honestidade, na sinceridade e, acima de tudo, na
fidelidade. Tal é o sentido do seguinte ditado: “viva de forma que, quando pensarem
em justiça e integridade, pensem em você”.
 
E, por fim, a nona virtude é a humildade, porque o amor “não se ufana, nem se
ensoberbece”.
        
Ufanar-se e ensoberbecer-se significa tornar-se orgulhoso, envaidecido. Dessa
forma, a humildade coloca um selo nos lábios para que não fiquemos nos
vangloriando de nossos gestos de paciência, tolerância, benevolência,
incondicionalidade, maturidade, respeito, perdão e lealdade para com os demais.
Se o inverso, porém, ocorrer, eles poderão sentir-se coagidos a nos retribuir de
maneira idêntica. Obviamente que os bons sentimentos que, porventura, venham a
alimentar por nós carecerá da sempre necessária espontaneidade.
 
****
                  
O apóstolo Paulo, depois de descrever as nove virtudes do genuíno amor, oferece-
nos uma síntese do que ele é capaz: “tudo sofre, tudo crê, tudo espera, tudo
suporta”.
 
É somente através da real vivência desse sentimento-atitude que fortalecemo-nos
no sentido de relevar os atritos que muitos de nossos relacionamentos ainda
carregam, numa tentativa de construir vinculações afetivas verdadeiramente
enriquecedoras e gratificantes.
        
Acima de tudo, porém, tende amor intenso uns para com os outros, porque o
amor cobre a multidão de pecados. (Pe 4:8) [11]
 
 
Silvia Helena Visnadi Pessenda
sivipessenda@uol.com.br (mailto:sivipessenda@uol.com.br)  
 
 
REFERÊNCIAS  
 
[1] KARDEC, Allan. O Livro dos Espíritos. Tradução de Salvador Gentile, revisão de
Elias Barbosa. 100. ed. Araras, SP: IDE, 1996.
 
[2] Michaelis: moderno dicionário da língua portuguesa. São Paulo: Companhia
Melhoramentos, 1998.
 
[3] BÍBLIA. Português. Bíblia de Estudo Almeida. Barueri, SP: Sociedade Bíblica do
Brasil, 1999.
 
 [4] EMMANUEL (espírito); XAVIER, Francisco Cândido (psicografado por). O
Consolador. 16. ed. Rio de Janeiro: Federação Espírita Brasileira, 1993. q. 254.
 
[5] ANDRÉ LUIZ (espírito); XAVIER, Francisco Cândido (psicografado por). Nosso
lar. 49. ed. Rio de Janeiro: Federação Espírita Brasileira.1999. Cap. 16.
 
[6] HAMMED (espírito); SANTO NETO, Francisco do Espírito (psicografado por). As
dores da alma. 1. ed. Catanduva, SP: Boa Nova Editora, 1998. p. 53.
 
[7] CARLSON, Richard; SHIELD, Benjamin (Org.). Os caminhos do coração: ensaios
originais sobre o amor. Rio de Janeiro: Sextante, 2000. Cap. “Celebrando o amor”.
(Literatura não-espírita)
 
[8] ALBISETTI, Valerio. Ciúme: conhecer, enfrentar, superar. Tradução de Antonio
Efro Feltrin. 5. ed. São Paulo: Paulinas. 2000. (Literatura não-espírita)
 
[9] HAMMED (espírito); SANTO NETO, Francisco do Espírito (psicografado por). A
imensidão dos sentidos. 3. ed. Catanduva, SP: Boa Nova Editora, 2000. Cap.
“Ausência de limites”.
 
[10] CARLSON, Richard; SHIELD, Benjamin (Org.). Os caminhos do coração: ensaios
originais sobre o amor. Rio de Janeiro: Sextante, 2000. Cap. “O amor é uma
escolha”. (Literatura não-espírita)
 
[11] BÍBLIA. Português. Bíblia de Estudo Almeida. Barueri, SP: Sociedade Bíblica do
Brasil, 1999.
 
 
Literatura não-espírita
 
DRUMMOND, Henry. O Dom Supremo. Versão original: The greatest thing in the
world. Tradução e adaptação de Paulo Coelho. Rio de Janeiro: Rocco. 1992.
 
 
SHINYASHIKI, Roberto. A Carícia Essencial: uma psicologia do afeto. 1. ed. São
Paulo: Editora Gente. 1985.

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