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Superintendência
Resumo Abstract Regional de Saúde de
Diamantina da Secretaria
O Programa de Educação Permanente �e Program for Continuing Education de Estado de Saúde de
Minas Gerais
para Médicos da Estratégia de Saúde da Fa- for Physicians in Family Health Strategy joaquimcezar@yahoo.
mília (PEP) foi implantado na Região Am- – PEP – was implanted in the Extended com.br
pliada de Saúde Jequitinhonha (RASJ), em Health Region Jequitinhonha – RASJ – in 2
Departamento de
Enfermagem da
2010, com a �nalidade de melhorar o nível de 2010 with the purpose of improving the level Universidade Federal dos
resolubilidade da Atenção Primária à Saúde, of solvability of Primary Health Care, with Vales do Jequitinhonha e
com a utilização da educação permanente the use of continuing education focused Mucuri – UFVJM
voltada ao Método Clínico Centrado na on the Person Centered Clinical Method
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Faculdade de Medicina
da UFVJM.
Pessoa (MCCP) e melhoria da performance – MCCP – and on the improvement of 4
Centro de Ciências
clínica dos médicos. Este trabalho objetivou the clinical performance of doctors. �is Biológicas e da Saúde da
avaliar o programa na RASJ. Foi desenvolvi- study evaluated the program in RASJ. It Universidade Estadual
de Montes Claros –
do em 14 municípios, com 31 médicos e 383 was developed in 14 municipalities, with UNIMONTES.
usuários dos serviços. Pesquisa descritiva e 31 doctors and 383 service users. Descrip- 5
Departamento de
quantitativa utilizou como instrumentos de tive and quantitative research utilized as Farmácia da UFVJM.
Introdução
A Atenção Primária à Saúde (APS), ape- Na área da saúde, a EP se apresenta
sar de ser um nível de atenção em que predo- como forma de transformar os serviços,
minam a utilização de poucos equipamentos trabalhando com todos os indivíduos envol-
e a baixa densidade tecnológica, exige dos vidos, oferecendo subsídios para que consi-
múltiplos pro�ssionais uma complexidade gam resolver seus problemas e estabeleçam
na articulação de seus diversos saberes. Em estratégias que amenizem, inclusive, as ne-
relação aos pro�ssionais médicos, percebe-se cessidades de sua comunidade. Intenciona
a necessidade de desenvolver uma aborda- aprimorar o método educacional em saúde,
gem adequada e efetiva de transformação tendo o processo de trabalho como seu ob-
em busca do atendimento a esse pressuposto. jeto de transformação, buscando melhorar
Outras necessidades comumente demanda- a qualidade dos serviços, visando alcançar
das são uma so�sticada síntese de saberes e equidade no cuidado, tornando-os mais
complexa interação de ações individuais e quali�cados para o atendimento das ne-
coletivas, curativas e preventivas, assisten- cessidades da população.
ciais e educativas (ABDALLA et al., 2009). De acordo com Ceccim e Ferla (2008),
É fato que o conhecimento se deteriora a EP convida à criação e à construção con-
com o tempo e, que para ser um bom pro- juntas, sendo requeridas para tanto novas
�ssional, além dos conhecimentos técnicos, sensibilidades e condutas: escuta, solidarie-
sobretudo é necessário aguçar os atributos dade, gestos, capacidade de afetar o outro
humanos. Em busca de um bom desempenho e de ser afetado por ele, transformando o
na pro�ssão, o médico deve ser capaz de per- cotidiano. Portanto, é necessário que os
ceber as inquietações de cada pessoa, adaptar- pro�ssionais adquiram novas habilidades,
se aos contextos variados e, após a formação rompam com os modelos hegemônicos, su-
pro�ssional, manter a Educação Permanente perem as modelagens de serviços centrados
(EP), instrumento que lhe fará crescer conti- em procedimentos, para que assumam o seu
nuamente no seu trabalho (BLANK, 2006). lugar ativo dentro da EP (CECCIM, 2005).
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Para Nicoletto et al. (2013), à medida que disponibilizados pelo programa. Essa estra-
os trabalhadores de saúde, como os atores tégia educacional busca estabelecer coope-
em ação no processo de trabalho, fazem ração contínua entre os médicos da região,
re�exão sobre suas práticas e avançam no voltada para o aperfeiçoamento da prática
conhecimento e na quali�cação das ações e pro�ssional (SILVÉRIO, 2007).
serviços de saúde, a EP promove mudanças Pendleton e colaboradores (2011) a�rmam
no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS) que a consulta médica deve envolver duas
brasileiro. Assim também aponta Sarreta perspectivas: a do médico e a do paciente.
(2010), quando a�rma que a implantação Ambas são importantes e necessárias. Para
da Política de EP possui elementos capazes tanto, torna-se necessária a aplicação de um
de aprimorar o processo de trabalho, uma modelo em que a consulta se centre no pacien-
vez que a formação sugerida parte das ne- te, buscando-se a abstração de informações
cessidades sentidas pelos sujeitos. que auxiliem o pro�ssional na construção do
Nessa perspectiva de adoção de novas prá- diagnóstico, bem como empoderamento e
ticas de saúde, no Estado de Minas Gerais, a maior adesão da pessoa ao tratamento.
EP em Saúde foi eleita como uma atividade es- Pelo fato de a consulta médica centrada
sencial aos pro�ssionais. Para tal �m, o Estado na pessoa ser o centro gravitacional da me-
criou, em 2005, o Programa de Educação Per- todologia de aprendizagem do programa, o
manente para Médicos da Estratégia de Saúde MCCP é utilizado durante os atendimentos.
da Família (PEP), como forma de intervir na Esse propõe um conjunto de seis componen-
educação dos pro�ssionais médicos, lidando, tes, inter-relacionados, que contribuem para
assim, com a grande heterogeneidade de com- que o pro�ssional possa fazer um atendi-
petências e a EP dos médicos da Estratégia de mento mais focado na pessoa. Baseia-se na
Saúde da Família (ESF) (SILVÉRIO, 2007). exploração e na interpretação da doença, bem
Os objetivos desse programa estão liga- como na experiência daquele que tem a doen-
dos à melhoria de qualidade da APS, uma vez ça; no entendimento do ser em sua totalidade;
que estimula o pro�ssional a trabalhar utili- na elaboração de uma programação conjunta
zando o Método Clínico Centrado na Pessoa de manejo da doença, com de�nição dos pa-
(MCCP), aperfeiçoando as habilidades de péis de cada um dos atores; na incorporação
comunicação e as habilidades clínicas, pro- de medidas de prevenção e de promoção da
curando melhorar sua performance clínica saúde; no fortalecimento da relação médico
e promovendo o estímulo ao autocuidado da e pessoa e no enfoque da viabilidade em rela-
pessoa. Para Mendes (2012), decisões clínicas ção a custo e tempo (STEWART et al., 2010;
devem ser exercidas com base em diretrizes BALLESTER et al., 2010).
clínicas construídas valendo-se de evidên- No MCCP, os pro�ssionais são encoraja-
cias cientí�cas que necessitam ser discutidas dos a utilizarem as habilidades de comuni-
com os usuários dos serviços, de forma que cação com o objetivo de alcançar a centra-
esses possam compreender melhor a atenção lidade na pessoa durante a consulta médica,
à saúde que lhes é prestada. e com isso a busca de atendimento integral,
O PEP está estruturado, entre outras ba- resolutivo e promoção do autocuidado do
ses, nos Grupos de Aperfeiçoamento Pro�s- paciente. Segundo Souto e Pereira (2011), a
sional, os GAPs, de estrutura �xa, formados coleta de uma história clínica centrada no su-
por oito a 12 médicos que trabalham em ESF jeito permite que �ua, automaticamente, ao
de uma mesma Região de Saúde e que condu- �nal dela, um rol de necessidades de saúde,
zem o processo continuado de autoaprendi- podendo gerar demandas de mobilização de
zagem individual e coletiva. Os GAPs devem equipe multipro�ssional, de identi�cação de
ser capazes de identi�car as necessidades dos redes de apoio e de quali�cação do processo
pro�ssionais para melhoria do desempenho assistencial, de EP para o pro�ssional, além
clínico, utilizando os recursos educacionais do próprio cuidado do indivíduo.
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da consulta e exploração dos problemas). Montes Claros sob o Parecer nº 3238/2012,
Posteriormente, as gravações foram anali- e seguiram as diretrizes e normas regu-
sadas pelos pesquisadores. lamentadoras envolvendo seres humanos,
A análise quantitativa dos dados foi feita de acordo com a Resolução do Conselho
utilizando-se o so�ware Epi Info. 6.04. Fo- Nacional de Saúde – CNS 196/96.
ram realizadas análises de estatística descri-
tiva, com o objetivo de veri�car os impactos
3 Resultados e discussões
do PEP para médicos da ESF. Foi aplicada a
estatística com cálculo de medidas de ten- O número total de municípios envol-
dência central (valores que representem bem vidos foi de 14, com a participação de 31
a distribuição da variável de interesse) e me- médicos e de 383 usuários.
didas de variabilidade (para análise do grau
de agregação/relação de signi�cância). Para Utilização do MCCP e melhoria
efeito de veri�cação de valores signi�cativos da performance clínica
ou não, foram utilizados, segundo Siqueira Na análise de seis variáveis relativas à
e Tibúrcio (2011), os testes estatísticos qui- melhoria da performance clínica e aplicação
quadrado (X2) e Teste Exato de Fisher. do MCCP, observamos que a maior parcela
O presente trabalho e seus instrumen- dos médicos entrevistados respondeu posi-
tos foram aprovados pelo Comitê de Ética tivamente. Os resultados estão apresentados
em Pesquisa da Universidade Estadual de na TAB. 1.
A maioria dos usuários (96,0%) que par- que pacientes portadores de dores crônicas
ticiparam da pesquisa a�rmou que o médico atendidos por pro�ssionais que utilizam o
da ESF dá orientações claras a respeito da sua MCCP tiveram maior compreensão acerca
doença, certi�cando-se do seu entendimen- do signi�cado de sua doença.
to. Da mesma forma, a maioria dos usuários Em relação à percepção dos usuários
(93,1%) a�rmou que o médico participan- quanto à inclusão pelo pro�ssional de seu
te do PEP explica, de forma clara, como se ponto de vista no momento de planejar
deve tomar o medicamento. Dados simila- o tratamento e o cuidado, a maioria des-
res também foram apontados no estudo de tes (57,0%) a�rmou que isso não ocor-
Sparrenberger et al. (2013), demonstrando reu durante suas consultas. Ao estudar a
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comunicação entre médicos e pacientes, médicos e pacientes no relacionamento é
Caprara, Rodrigues e Montenegro (2001) in�uenciada por questões que enfatizam a
relataram que, no começo da consulta, assimetria e di�cultam o estabelecimento
quase todos os médicos tentam estabe- de uma melhor relação. Essa diferença é
lecer relação empática com o paciente. rea�rmada pela compreensão da doença
Mas, apesar disso, esses autores a�rmam por parte do usuário, que perpassa por ca-
que 39,1% dos médicos não explicam de minhos diversos daqueles do médico.
forma clara e compreensiva o problema; A análise dos dados apresentados neste
em 58,0% das consultas, não é veri�cado estudo possibilita inferir, sob o ponto de
o grau de entendimento do paciente so- vista do usuário, melhoria do desempenho
bre o diagnóstico dado, ao passo que, em pro�ssional dos médicos frequentes no PEP.
53,0% das consultas não há veri�cação da
compreensão do paciente quanto às indi- Análise das entrevistas
cações terapêuticas. Em estudo posterior, das consultas médicas
Caprara e Rodrigues (2004) apontam que As consultas médicas (n=09) não foram
os médicos não reconhecem o paciente gravadas integralmente, mas apenas as en-
como sujeito capaz de assumir a responsa- trevistas, de forma a reduzir o impacto da
bilidade com o cuidado pela própria saúde, intervenção na consulta, uma vez que essa
além de não desenvolverem a autonomia precisa acontecer em uma situação de to-
e a participação do paciente no processo tal entrega do médico e do usuário, sem
de adesão ao tratamento e às práticas de interferências externas. Ao analisarmos o
prevenção e promoção da saúde. tempo utilizado para as entrevistas, a média
No trabalho de Nascimento Júnior foi de 6 minutos e 59 segundos (dp ± 4,3),
e Guimarães (2003), os autores a�rmam com tempo máximo de 14 minutos e 49
que a participação do paciente na tomada segundos e tempo mínimo de 2 minutos e
de decisões varia de acordo com a relação 56 segundos.
médico-paciente e apresentam três tipos Outros estudos analisaram a duração
de relação. No tipo de relação chamada de da consulta como um todo, e não apenas
“atividade-passividade”, o paciente abando- a entrevista, como feito neste trabalho.
na-se por completo e aceita passivamente os Franco, Bastos e Alves (2005) apontaram
cuidados médicos, sem mostrar necessidade a duração da consulta de oito a 15 minutos,
ou vontade de compreendê-los. Na relação enquanto Caprara e Rodrigues (2004) re-
de “direção-cooperação”, o médico assu- velaram a duração média de nove minutos
me seu papel de maneira, até certo ponto, com ampla variação de dois até 24 minutos.
autoritária, mas o paciente compreende e No trabalho de Cotta et al. (2006), 66,8%
aceita tal atitude, procurando colaborar. dos entrevistados relataram que a consulta
No tipo de relação de “participação mútua tinha duração de 15 a 30 minutos.
e recíproca”, o médico permanece no seu Caprara e Rodrigues (2004) informaram
papel de de�nir os caminhos e os procedi- que maior tempo de consulta está associado
mentos, mas o paciente compreende e atua a uma melhor qualidade do atendimento,
conjuntamente. Nesse caso, as decisões são permitindo a realização de uma anamnese
tomadas após troca de ideais e análise de mais adequada, melhor explicação do pro-
alternativas. O paciente assume a respon- blema e dos procedimentos diagnósticos e
sabilidade, havendo, então, uma interpene- terapêuticos, assim como a veri�cação do
tração de papéis, ou seja, uma aliança entre médico sobre a compreensão do paciente e
o cliente e o médico. a inclusão da perspectiva desse na consulta.
A experiência da doença pelo pacien- Ademais, maior tempo de consulta facilita
te envolve aspectos culturais, familiares e a escuta, o vínculo e o acolhimento (SILVA;
emocionais. A percepção diferenciada entre VASCONCELOS; MATOS FILHO, 2010).
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Figura 2: Relação entre o número de consultas e o percentual de usuários do SUS que afirmaram
melhoria no atendimento dos médicos participantes do Programa de Educação Permanente para
Médicos da Estratégia de Saúde da Família, Região Ampliada de Saúde Jequitinhonha, MG, 2012.
A linha expressa uma tendência logarítmica.
Observa-se tendência da percepção da me- pôde ser percebida por usuários do SUS e pelos
lhoria da qualidade do atendimento médico à pro�ssionais médicos, e estes últimos creditam
medida que se eleva o número de consultas; tal mudança à participação no Programa de
entretanto, não é uma relação diretamente Educação Permanente para Médicos da Estra-
proporcional, demonstrando que outros fa- tégia de Saúde da Família (PEP).
tores podem interferir nessa percepção.
É importante considerar que a EP, entre
Referências
outros pressupostos, deve redundar no au-
mento da satisfação do usuário do serviço de ABDALLA, I. G. et. al. Projeto pedagógico e as
saúde (ALBERTSON et al., 2002). Sabendo-se mudanças na educação médica. Rev Bras Educ
Med, v. 33, Supl.1, p.44-52, 2009.
que essa perpassa pela qualidade e pela resolu-
bilidade do atendimento, a satisfação do pro- ALBERTSON, G. et. al. Impact of a simple inter-
vention to increase primary care provider recog-
�ssional tem impacto direto na primeira. Leite nition of patient referral concerns. Am J Manag
e colaboradores (2012), ao avaliarem a EP em Care, v. 8, n. 4, p.375-81, 2002.
saúde na região Norte de Minas Gerais, obser- ASSIS, L. N. et. al. A percepção de médicos partici-
varam alto grau de contentamento e interesse pantes sobre o Programa de Educação Permanente
dos pro�ssionais médicos em relação ao PEP. para Médicos de Saúde da Família em um estado
da região Sudeste. R Enferm Cent O Min, v. 2, n.
3, p.394-409, 2013.
Conclusão BALLESTER, D. et. al. A inclusão da perspectiva
Com o desenvolvimento deste trabalho, do paciente na consulta médica: Um desa�o na
formação do médico. Rev Bras Educ Med, v. 34,
pode-se concluir que os médicos participantes n. 4, p.598-606, 2010.
do PEP na RASJ têm utilizado o MCCP e as
BECKMAN, H. B.; FRANKEL, R. M. �e e�ect of
habilidades de comunicação, primando por physician behaviour on the collection of data. An-
uma entrevista mais detalhada, o que pode nals of Internal Medicine, p.692-696, nov. 1984.
contribuir para a resolutividade dos problemas BERTAKIS, K. D.; AZARI, R. Medicina centrada
de saúde do usuário no nível da APS. A melho- no paciente: Melhor qualidade com menores custos.
ria da performance clínica e do atendimento Rev. Port. Clin. Geral, v. 27, n. 5, p.229-239, 2011.
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