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Acta Tecnológica, Vol.

7, N° 2 (2012), 65 - 72

Acta Tecnológica
http://portaldeperiodicos.ifma.edu.br/

Tartrazina: uma revisão das propriedades e análises de quantificação


Arlan Silva Freitas 1
RESUMO

A grande representatividade do consumo de alimentos industrializados no país tem merecido um enfoque maior no
que se refere aos aditivos adicionados e suas respectivas análises de quantificação. A cor, uma das características sensoriais
associadas pelo consumidor com a qualidade, sabor, odor e a conservação do alimento, ainda é fator decisivo na escolha do
alimento. A utilização dos corantes alimentícios, em função da sua indiscutível relevância, torna sua adição indispensável na
formulação dos alimentos industrializados. A classe dos corantes artificiais é inofensivo à saúde desde que obedeça aos
percentuais máximos de ingestão diária aceitável recomendada pela ANVISA (Agência Nacional de Vigilância Sanitária de
Alimentos) e/ou Codex Alimentarius. Pela legislação atual através das resoluções n. 382 e 388 da ANVISA, no Brasil é
permitido o uso de 11 corantes artificiais (amaranto, vermelho de eritrosina, vermelho 40, ponceau 4R, amarelo crepúsculo,
amarelo tartrazina, azul de indigotina e azul brilhante, azorrubina, verde rápido e azul patente V). Dos corantes apresentados
vale ressaltar, o amarelo tartrazina devido sua associação a reações adversas (urticária, asma, hiperatividade) em
consumidores. A comercialização deste composto tem requerido avaliação de sua toxicidade e suas propriedades como
solubilidade em água e/ou solventes alcoólicos; inatividade química ou baixa reatividade com outros componentes do
alimento tais como ácido, base, aromatizantes e conservantes; assim como estabilidade do corante quanto à luz, calor e
umidade.

Termos para indexação: Aditivos, corantes, alimentos, legislação, INS 102.

Tartrazine: a review of its properties and quantification analysis.

ABSTRACT

The high share of processed food consumption in the country has received increased attention regarding the
additives added and their quantification analysis. The color, one of the sensitive characteristic associated by consumers
with quality, taste, odor and preservation offood, is still a prime factor in choosing food. The use offood colorants, due to
their indisputable relevance, turns its addition essential in the formulation offoods. The class ofsynthetic dyes is harmless
to health provided they meet the maximum acceptable percentage of daily intake recommended by ANVISA (National
Agency for Food Sanitary Vigilance) and/or Codex Alimentarius. The current Brazilian ANVISA legislation, resolutions 382
and 388, allow the use of11artificial dyes (amaranth, erythrosine red, red 40, ponceau 4R, sunset yellow, tartrazine yellow,
indigo blue and bright blue, azorubine, fast green and blue patent V). Among these, the yellow tartrazine colorant is
noteworthy because of its association with adverse reactions (hives, asthma, hyperactivity) in consumers. The
commercialization of this compound requires rigorous assessment of its toxicity and properties such as water solubility
and/or alcoholic solvents, chemical inertness or low reactivity with other food’s components, e. g. acid, base, flavorings and
preservatives, as well as stability of the dye concerning light, heat and humidity.

Index terms: Tetrazine, additives, dyes, food, legislation, INS 102.


1 Professor de Tecnologia de Alimentos. Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Maranhão – IFMA. Campus São Luis – Monte Castelo. Departamento Acadêmico de Química
e Alimentos - DAQ. e-mail: arlan@ifma.edu.br
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INTRODUÇÃO ou químicas. Como consequência, durante os processos de
fabricação, parte destes corantes é perdida e frequentemente
A utilização de aditivos químicos, como os ocasionam problemas ambientais. Estas indústrias utilizam
corantes, é um dos mais polêmicos progressos da indústria tipos de corantes e pigmentos que se classificam em corante
de alimentos, visto que seu uso em vários alimentos se orgânico natural, corante orgânico sintético (artificial e
explica apenas por questões de hábitos alimentares. Em idêntico ao natural), corante inorgânico, caramelo e
geral, a importância da aparência do produto para sua caramelo obtido pelo processo de amônia (RIGONI, 2006).
aceitabilidade é a maior justificativa para o seu emprego Os corantes artificiais são uma classe de aditivos
(PRADO e GODOY, 2003). sem valor nutritivo, introduzidos nos alimentos e bebidas
Segundo o Item 1.2 da Portaria SVS/MS 540/97 com o único objetivo de conferir cor, tornando-os mais
aditivo alimentar é qualquer ingrediente adicionado atrativos. Devido esse motivo, do ponto de vista da saúde, os
intencionalmente aos alimentos, com o objetivo de corantes artificiais em geral não são indicados, justificando
modificar as características físicas, químicas, biológicas ou seu uso, quase que exclusivamente, do ponto de vista
sensoriais, durante a fabricação, processamento, comercial e tecnológico (RIEDEL, 1987). Contudo, os
preparação, tratamento, embalagem, acondicionamento, corantes são largamente aplicados nos alimentos e bebidas
armazenagem, transporte ou manipulação de um alimento devido à sua grande importância no aumento da aceitação
sem propósito de nutrir. Ao agregar-se poderá resultar em dos produtos (PRADO e GODOY, 2003).
que o próprio aditivo ou seus derivados se convertam em Os corantes artificiais têm maior fixação que os
um componente de tal alimento. Esta definição não inclui naturais, o que propicia cores mais fortes e um aumento na
os contaminantes ou substâncias nutritivas que sejam tonalidade com maior estabilidade e menor custo (CALIL e
incorporadas ao alimento para manter ou melhorar suas AGUIAR, 1999).
propriedades nutricionais (ANVISA, 1997). Os corantes naturais usados pelas indústrias
alimentícias obtiveram expressiva substituição pelos
CORANTES ARTIFICIAIS corantes orgânicos sintéticos ou artificiais em função do
baixo custo de produção, maior estabilidade, maior
São produzidas mundialmente, aproximadamente capacidade tintorial, maior faixa de coloração, garantindo,
700.000 toneladas/ano de 10.000 diferentes tipos de ainda, a uniformidade dos alimentos produzidos em grande
corantes e pigmentos, fazendo parte dos processos escala(KUNZetal.,2002).
industriais das mais diversas áreas (HABIBI et al. 2005). Os corantes sintéticos mais utilizados na indústria
Conforme a Resolução n. 44 de 1977, elaborada pela alimentícia, farmacêutica e de cosméticos são a tartrazina e
Comissão Nacional de Normas e Padrões para Alimentos o amarelo crepúsculo. Em alimentos, estes corantes são
(CNNPA), considera-se corante a substância ou a mistura muito utilizados em sucos em pó, refrigerantes e balas e o
de substâncias que possuem a propriedade de conferir ou processo de degradação destes altera conforme o estado
intensificar a coloração de alimento. Desta forma, a físico em que estão inseridos, com a composição de cada
coloração dos refrigerantes apresenta problemas, pois os produto alimentício e o tipo de embalagem. Para
produtos naturais são difíceis de serem utilizados em refrigerantes, a embalagem mais empregada é o
produtos padronizados. politereftalato de etileno (PET), devido à baixa
Para isso foram criados corantes sintéticos para permeabilidade ao CO2, alta estabilidade química, baixa
superar os problemas de refrigerantes com pigmento densidade em comparação ao vidro, podendo ser 100%
insuficiente (RIGONI, 2006). reciclável (ABEPET, 2003).
O uso da coloração dos alimentos data de tempos
mais antigos. Em meados do século XIX, os corantes A QUÍMICA E AS PROPRIEDADES DATARTRAZINA
disponíveis eram de origem animal, vegetal ou mineral e os O emprego de aditivos, notadamente os corantes, é
pigmentos naturais foram progressivamente sendo o mais discutido dentre as tecnologias utilizadas na indústria
substituídos por corantes sintetizados, submetidos às alimentícia (BARUFFALDI e OLIVEIRA, 1998; CALIL e
disposições legais próprias de cada país (SANTOS e AGUIAR, 1999; EVANGELISTA, 2000).
NAGATA, 2005). A comercialização destes compostos para fins
Diferentes tipos de corantes são usados pelas alimentícios tem promovido uma rigorosa avaliação de sua
indústrias alimentícias, farmacêuticas, têxteis, automotivas toxicidade e propriedades como solubilidade em água e/ou
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solventes alcoólicos; inatividade química ou baixa 534,35781 g mol-1 , solubilidade a 25°C em água de 20
reatividade com outros componentes do alimento como g/100mL, em glicerina 18 g/100 mL, em propileno 7 g/100
ácido, base, aromatizantes e conservantes; assim como mL e em etanol <0,1 g/100 mL. A Ingestão Diária Aceitável
estabilidade do corante à luz, calor e umidade. Em (IDA) é de 7,5 mgkg-1 peso corpóreo, possui registro no
concentrações rigorosamente controladas no Brasil, o banco de dados do Chemical Abstracts Service (Número
Ministério da Saúde (Art. N. 55781/65, de 1965) tem CAS) 1934-21-0 e Sistema Internacional de Numeração
permitido o uso de poucos corantes em artigos alimentícios (INS) 102 e DL50 em camundongos: 2000 mgkg-1 .
(RIGONI, 2006). (COSMOQUÍMICA IND. E COM., 2009).
Grande parte dos corantes sintéticos é instável
frente a fatores como aquecimento e luz. Esta instabilidade
promove redução no tempo de vida de prateleira (shelf-
life) de um produto ocorrendo a perda de algumas
características organolépticas, depreciando o produto final.
Conhecendo-se a influência da radiação luminosa, do pH e
da presença de outros aditivos alimentares é possível Figura 01. Estrutura da tartrazina
conhecer o processo de degradação do corante e chegar no
nível crítico do atributo de qualidade e, portanto, a vida de Devido sua alta solubilidade em meio aquoso, pode
prateleira (OSTROSKI, BARICCATTI e LINDINO, ser identificado e quantificado por espectrofotometria UV-
2005). VIS, cujo máximo de absorção localiza-se no comprimento
Corantes compreendem dois principais de onda próximo a 426 nm (soluções aquosas em pH 7)
componentes: o grupo cromóforo, responsável pela cor que (DIRETIVA 95/45/CE, 1995).
absorve a luz, e o grupo funcional, que está diretamente
ligado à fixação. Vários grupos cromóforos estão sendo METODOLOGIAS DE ANÁLISE DA TARTRAZINA
utilizados atualmente na síntese de corantes. Contudo, o
grupo mais representativo e amplamente aplicado pertence Para cada corante, ou mistura desses, deve ser
à família dos corantes azóicos que se caracterizam por detectado e quantificado individualmente, o que tem sido
apresentarem um ou mais grupamentos –N=N– ligados a inibido, principalmente, pela falta de metodologias
sistemas aromáticos. Os corantes azóicos representam analíticasapropriadas(PRADOeGODOY,2003).
cerca de 60% dos corantes atualmente utilizados no mundo A necessidade do controle de qualidade sobre as
(KUNZ et al., 2002). empresas e a regulamentação dos corantes tem forçado a
De acordo com as estruturas químicas, os corantes ampliação de novas técnicas analíticas capazes de responder
sintéticos são classificados em duas categorias: grupo Azo ao número de análises de forma rápida e confiável (PRADO
e grupo Nonazo (INOUE et al., 2006). Grupo azo é um e GODOY, 2007).
grupo funcional do tipo R-N=N-R’, no qual R e R’ são
grupos que contêm átomos de carbono e átomos de Espectrofotometria
nitrogênio, ligados a dois radicais aromáticos, como no A espectrofotometria derivativa tem sido uma
caso dos corantes tartrazina, amarelo crepúsculo e ferramenta analítica adicional que auxilia na resolução de
vermelho 40. São chamados compostos azóicos, diversos problemas analíticos. A derivatização dos espectros
azoderivados ou azocompostos (SASAKI et al., 2002). O admite separar sinais sobrepostos e eliminar “background”
grupo nonazo é o grupo funcional constituído por anéis ocasionado pela presença de outras espécies na amostra.
aromáticos, que não são unidos por ligações nitrogenadas. Deste modo, torna-se dispensável uma etapa preliminar de
Como exemplos destacam-se o corante azul separação das espécies a serem determinadas, simplificando
brilhanteeocoranteeritrosina(INOUEetal.,2006). o procedimento analítico e aumentando a velocidade
Sintetizado a partir da tinta do alcatrão de carvão, analítica (SAYAR e ÖZDEMIR, 1998).
o corante sintético amarelo tartrazina, com nomenclatura Vidotti e Rollemberg (2006) determinaram simultaneamente
oficial (IUPAC) de Sal Trissódico 5-hidroxi-1-(4- os corantes amarelo crepúsculo e amarelo tartrazina em
sulfonatofenil)-4-(4-sulfonato-fenilazo)-H-pirazol-3-carbo- produtos alimentícios, utilizando o método
xilato (Figura 1), é inserido na classe dos monoazos espectrofotométrico derivativo.
possuindo fórmula C16H9N4Na3 O9S 2, massa molar Santos, Demiate e Nagate, (2010) estudaram
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o potencial das metodologias matemáticas como o A técnica utilizada pelos autores foi a eletroforese capilar.
princípio da aditividade, espectrofotometria derivativa e Os corantes selecionados, dentre eles o amarelo tartrazina,
técnica multivariada (Regressão por Mínimos Quadrados foram determinados em eletrólitos de diversas composições.
Parciais - PLSR) na determinação simultânea dos corantes A variação da concentração e pH do eletrólito, tensão
alimentícios Amarelo Crepúsculo e Amarelo Tartrazina, aplicada e tempo de injeção, assim como a incorporação de
extraídos com lã natural. Os autores observaram que aditivos como o dodecil sulfato de sódio (SDS),
aplicação desta metodologia em amostras reais mostrou ciclodextrina, brij 35 ou acetonitrila ao eletrólito foram os
que em todas as amostras analisadas as concentrações principais parâmetros testados durante a otimização dos
destes corantes estavam de acordo com os limites métodos para a determinação dos corantes. Os resultados
estabelecidos pela legislação brasileira. mais promissores foram apresentados pelos eletrólitos
compostos por borato, brij 35 e acetonitrila.
Cromatografia A eletroforese capilar trata-se de uma técnica de
Atualmente, vários métodos envolvendo a custo elevado sendo pouco difundida (principalmente
cromatografia líquida de alta eficiência (CLAE) estão quando comparada à espectrofotometria), necessitando de
sendo usados para determinar qualitativa e um acompanhamento técnico especializado durante sua
quantitativamente os corantes alimentares (LANCASTER utilização (SANTOS, 2005).
e LAWRENCE, 1991).
Em pesquisa sobre alguns tipos de guloseimas de Voltametria
vários sabores, sendo balas, gomas de mascar e confeitos Medeiros e Fatibello-Filho (2001) utilizaram um
de chocolate coloridos artificialmente e mais três marcas eletrodo de diamante dopado com boro para a determinação
diferentes de cereais matinais, contendo vários sabores, do corante alimentício tartrazina em diferentes amostras
Prado e Godoy (2007) determinaram simultaneamente, utilizando a voltametria de pulso diferencial. Os autores
utilizando o método CLAE, os corantes permitidos no concluíram que os teores de tartrazina encontrados nos
Brasil presentes nestes alimentos. Os autores observaram produtos alimentícios pelo procedimento proposto foram
que a maioria das amostras analisadas obedecia ao limite concordantes com aqueles teores encontrados empregando-
estabelecido pela legislação brasileira. se o método de referência.
Prado e Godoy (2004), em sua pesquisa na Kapor et al. (2001) analisaram amostras de balas
determinação de corantes artificiais em pó para gelatina, sabores abacaxi e hortelã utilizando a técnica voltamétrica.
utilizaram a CLAE para as análises. Os autores afirmaram Segundo os autores a simplicidade do pré-tratamento da
que a escolha desse alimento para as análises foi devido ao amostra, usando diluição direta do produto comercial, a alta
fato de ser um produto ampla e habitualmente consumido, sensibilidade do método, velocidade de análise e baixo custo
principalmente pela população infantil, e por ser um da instrumentação são algumas das principais vantagens
produto no qual os corantes artificiais são tradicionalmente oferecidas pela técnica.
empregados em sua composição.
Embora a metodologia de CLAE seja eficiente nos TOXICOLOGIA
métodos de quantificação, e nas separações destes aditivos De todos os aditivos utilizados na indústria
alimentícios, a técnica apresenta alto custo e geralmente as alimentícia, os corantes são os mais genotóxicos (SASAKI
amostras precisam de pré-tratamento para torná-las et al., 2002). Em países demasiadamente industrializados a
compatíveis com a fase estacionária (SANTOS, 2005). incidência de câncer intestinal torna-se comum, podendo
existir a possibilidade de estar ligado diretamente ao
Eletroforese Capilar consumo demasiado de alimentos com corantes azóicos
A eletroforese capilar é uma das mais recentes (CHUNG, 1983).
tendências na análise de corantes alimentícios (SANTOS, Os corantes azóicos são degradados por
2005). Nesta técnica instrumental os compostos são microrganismos intestinais e possivelmente a toxicidade
separados com base na diferença das mobilidades e/ou a carcinogenicidade pode ter origem dos produtos
eletroforéticas dos compostos, que estão relacionados com degradados destes corantes (CHUNG et al., 1978).
a razão carga-massa e fatores estruturais (HATIMONDI, A ligação direta entre aditivos alimentares e
JAGER e TAVARES, 2002). hipercinesia despertou a atenção científica após resultados
Hatimondi, Jager e Tavares (2002) desenvolveram de que 40% das crianças hiperativas ou que apresentavam
métodos analíticos para os corantes artificiais presentes em distúrbios de aprendizagem amenizavam tais sintomas
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quando eram submetidas a uma dieta isenta de corantes, efeitos associados a outros carcinógenos (MOUTINHO,
aromatizantes artificiais e alimentos contendo salicilatos BERTGES e ASSIS, 2007).
(dieta de Feingold). Estudos posteriores não conseguiram Em pesquisa realizada com remédios, o corante
mostrar essa correlação, mas por outro lado, não foram tartrazina foi encontrado em dois produtos: dipirona 500 mg
totalmente conclusivos, sugerindo uma possível ação (gotas) e paracetamol (gotas). Foi identificada que sua
farmacológica manifestada por decréscimo da atenção presença ocorre, especialmente, em produtos designados ao
(SCHVARTSMAN, 1982). uso pediátrico. Esse excipiente é responsável por reações de
Observou-se que quantidade significativa de hipersensibilidade em pacientes com predisposição alérgica
pacientes com hipersensibilidade à aspirina reagia a alguns como anafilaxia, broncoconstrição, angioedema, urticária,
aditivos, particularmente os de coloração amarela, laranja e dores abdominais e vômitos, bem como dermatite de contato
vermelha, como a tartrazina, amarelo crepúsculo, Ponceau (BUCK, 1996).
4R e amaranto. As manifestações mais comuns são: asma Sob o ponto de vista tecnológico, os aditivos
(2/3 dos pacientes), urticária e angiodema (1/3 dos assumem papel importante na produção de alimentos. No
pacientes) e rinite (1/10 dos pacientes). Doses de 1 a 5 mg entanto, deve haver uma preocupação maior no que se refere
de tartrazina foram suficientes para provocar urticária e de aos riscos toxicológicos provocados pela ingestão diária
1 a 10 mg, casos de broncoespasmo (SCHVARTSMAN, dessas substâncias (POLONIO e PERES, 2009).
1982).
Dentre os corantes “azo”, a tartrazina tem enfoque A LEGISLAÇÃO BRASILEIRA
maior para os toxicologistas e alergistas, sendo relacionada Os aditivos não são nocivos à saúde, desde que se
com várias reações adversas, desenvolvendo urticária, obedeça aos limites máximos instituídos pela ANVISA
asma (PRADO e GODOY, 2003), náuseas, eczema, (Agencia Nacional de Vigilância Sanitária) e/ou Codex
bronquite, renite, broncoespasmos e dor de cabeça Alimentarius. Estes órgãos instituem para os aditivos uma
(SAMPAIO, 2004). A estimativa é que uma em cada 10 mil Ingestão Diária Aceitável (IDA). Todos os corantes
pessoas apresenta reações alérgicas a esse corante. artificiais aceitados pela Legislação Brasileira possuem
Possivelmente pessoas sensíveis ao ácido acetilsalicílico valor definido de IDA, embora estejam sujeitos a alterações
(AAS) (de 8 a 20%) também possuem sensibilidade a contínuas, dependendo dos resultados toxicológicos. O
tartrazina. No entanto, é um dos corantes mais aplicados Comitê conjunto FAO/OMS de peritos em aditivos
em alimentos sendo permitido em países desenvolvidos, alimentares, JECFA (“Joint Expert Committee on Food
como Canadá, Estados Unidos e União Européia (PRADO Additives”), em nível internacional, recomenda que cada
e GODOY, 2003). país verifique periodicamente o consumo total de cada
O amarelo tartrazina tem sido alvo de estudos de aditivo, com base em estudos de dieta, para se assegurar que
mutagênese e carcinogênese por produzir, como todos os a ingestão total do aditivo não ultrapasse a IDA (PRADO e
corantes azoicos, uma amina aromática ácido sulfanílico, GODOY, 2007).
após ser metabolizado pela microflora gastrintestinal Altinöz e Toptan (2002) descrevem em seu trabalho
(MOUTINHO, BERTGES e ASSIS, 2007). que o corante Amarelo Tartrazina pode ser encontrado em
A tartrazina induz ao dano no DNA em estômago, alimentos como, bebidas, iogurtes, sorvetes, doces, geléias
cólon e/ou bexiga urinária com dose de 10 mg.kg-1. Esta pós para sucos (BERZAS NEVADO; RODRÍGUEZ
dose é próxima a aceitável para o consumo pela IDA FLORES; VILLASEÑOR LLERENA, 1998) sendo também
(SASAKI et al., 2002). amplamente utilizado como aditivo em produtos cosméticos
Os efeitos do uso prolongado do corante amarelo (CAPITÁN-VALLVEY et al., 1997).
tartrazina na mucosa gástrica de ratos foram investigados. O corante tartrazina foi avaliado toxicologicamente
O referido corante é um dos mais utilizados nas indústrias pelo Joint FAO/WHO Expert Committee on Food Additives
alimentícias. Foi observado um aumento significativo na – JECFA, com enfoque em análise de risco. O JECFA
produção de linfócitos e eosinófilos na mucosa do antro determinou a IDA numérica de 7,5 mg.kg-1 de peso
gástrico dos ratos. Não foram observadas alterações corpóreo para tartrazina. Isso significa, por exemplo, que
carcinogênicas em nenhuma das regiões gástricas com a uma criança de 30 kg e um adulto de 60 kg podem consumir
dose e tempo utilizados (7,5 mg de tartrazina/kg/dia até 225 mg e 450 mg de tartrazina por dia, respectivamente,
durante dez meses), respectivamente. Os autores sugerem sem risco provável à saúde, à luz dos conhecimentos
estudos modificando-se a dose e tempo de exposição ao disponíveis na época da avaliação (ABIMA, 2007).
corante tartrazina, de forma a permitir a observação dos Os rótulos dos alimentos coloridos artificialmente
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"COLORIDO ARTIFICIALMENTE" e ter relacionado nos ANVISA. Resolução - RE nº 572, de 5 de abril de 2002.
ingredientes o nome completo do corante ou seu número de Disponível em:
INS (International Numbering System) (ASSOCIAÇÃO <http://www.anvisa.gov.br/legis/resol/2002/572_02re.htm>.
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2001).
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Tartrazina, conforme a Resolução da Diretoria Colegiada <http://www.anvisa.gov.br/legis/portarias/540_97.htm>.
(RDC) 137/03 da ANVISA (BRASIL, 2003), em sua Acesso em: 12 de julho de 2011.
formulação, deverão conter na bula e nos rótulos das
embalagens secundárias a advertência: "Este produto ANVISA. Resolução-CNNPA nº 44, de 1977. Disponível
contém o corante Amarelo Tartrazina que pode causar em: <http://www.anvisa.gov.br/legis/resol/44_77.htm>
reações de natureza alérgica, entre as quais, asma Acesso em: 12 de julho de 2011.
brônquica e urticária, especialmente em pessoas alérgicas
ao Acido Acetilsalicílico". ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DAS INDÚSTRIAS DA
ALIMENTAÇÃO Compêndio da legislação de alimentos:
CONCLUSÃO consolidação das normas e padrões de alimentos. 8 ed. v.
1ª. São Paulo, 2001.
Corantes artificiais são os aditivos mais
especulados e pesquisados, pois, além de serem BERZAS NEVADO, J. J.; GUIBERTEAU CABANILLAS,
considerados por muitos como não essenciais, muitos têm C.; CONTENTO SALCEDO, A.M. Method development
demonstrado ação carcinogênica e um número significativo and validation for the simultaneous determination of dyes in
é considerado responsável por reações de foodstuffs by capillary zone electrophoresis. Analytica
hipersensibilidade. Chimica Acta, v. 378, p. 63-71, 1999.
É necessária a participação efetiva dos órgãos de
regulação na vigilância desses produtos visando à proteção BRASIL. Agência Nacional de Vigilância Sanitária. RDC nº
e promoção da saúde. 137, de 29 de maio de 2003. Autoriza, apenas, o registro/
Os estudos de consumo de corantes artificiais renovação de regulamento de medicamentos
deveriam servir de base para a elaboração de estratégias pertencentes às classes/princípios ativos, só se as bulas e
para a vigilância alimentar e nutricional com a finalidade embalagens contiverem a advertência pertinente.
de reduzir o consumo dessas substâncias e promover Disponível em:<http://www.anvisa.gov.br>. Acessado em:
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