Você está na página 1de 23

ESPAÇO DO ATOR

CURSO DE FORMAÇÃO DE ATORES – 2° SEMESTRE/2022

COMPONENTE CURRÍCULAR: História do Teatro Brasileiro e Gaúcho

PROFESSOR: Diego Ferreira ANO LETIVO: 2° semestre/2022

CARGA HORÁRIA: 30h HORÁRIO: Segundas – feiras das 18h45min ás 21h45min

DRAMATURGIA GAÚCHA
O teatro gaúcho do século XIX revivido
Durante muito tempo, acreditou-se que a história da dramaturgia
produzida no Rio Grande do Sul foi protagonizada por um punhado de
nomes esparsos no tempo, como Araújo Porto Alegre (1806-1890),
Qorpo-Santo (1829-1883), Álvaro Moreyra (1888-1964), Ivo Bender
(1936), Carlos Carvalho (1939-1985) e Vera Karam (1959-2003). Destes,
Qorpo-Santo, Moreyra e Carvalho hoje emprestam seus nomes a salas de
espetáculo em Porto Alegre, mas não parece haver um continuum entre
eles. É nesse contexto que a monumental Antologia da literatura
dramática do Rio Grande do Sul (Século XIX), obra em oito volumes
escrita pelo pesquisador Antenor Fischer, vem derrubar alguns mitos.
Antes da divulgação do trabalho do estudioso gaúcho, era como se não
houvesse grassado no estado uma “verdadeira” tradição dramatúrgica,
cabendo a nós recompor seus fragmentos como um paleontólogo monta
um esqueleto a partir de fósseis encontrados aqui e ali. Essa lacuna
fundadora talvez ainda exerça algum efeito, mesmo que residual, na cena
gaúcha. Afinal, conhecer o passado é um passo necessário para
compreender o presente e refletir sobre as perspectivas no horizonte.
A questão soa grave porque, apesar dos diferentes centros de formação –
acadêmica ou não acadêmica – no Rio Grande do Sul, falta aos
personagens envolvidos no ofício (diretores, atores, dramaturgos, críticos,
espectadores, etc.) uma perspectiva sobre de onde viemos e para onde
vamos – mas, acima de tudo, sobre onde estamos na história do teatro
gaúcho.

Diferentes historiadores da literatura trataram o texto para teatro como gênero de

menor importância se comparado ao romance e à poesia. Nesta ‘ Antologia’, a

dramaturgia encontra papel de protagonista


É possível suspeitar que os inúmeros apelos do presente tenham
mitigado a ânsia de conhecimento pela antiga tradição textocêntrica. Entre
esses apelos da atualidade estão as teorias importadas e disseminadas nos
diferentes campos do saber acadêmico (que durante muito tempo nos
permitiram ler Qorpo-Santo exclusivamente como figura do teatro do
absurdo ou do surrealismo, e não como ator singular de uma história
brasileira), a irresistível dissolução das fronteiras entre linguagens e,
claro, a sedução da performance. Não é o caso de escolher,
evidentemente, entre o passado e o presente, mas de entender que, ao lado
do estudo das mais arrojadas manifestações cênicas deve haver um espaço
institucional sólido para a história do teatro no Rio Grande do Sul.
Foi sobre esse segundo aspecto – o olhar para o passado – que se
debruçou, durante mais de uma década, Antenor Fischer. Ele dedicou
mestrado, doutorado e dois pós-doutorados (na UFRGS e na PUCRS) à
dramaturgia produzida no Rio Grande do Sul. Como os trabalhos foram
realizados dentro da área de letras, o foco recaiu sobre a produção textual,
servindo de base para os pesquisadores que virão desbravar o fenômeno
teatral em relação aos aspectos da encenação e da recepção. Fischer, no
entanto, realiza importantes apontamentos nesse sentido.
Qorpo-Santo tem lugar assegurado na obra de Antenor Fischer Cedoc/Funarte

O resultado de sua inédita pesquisa começou a vir à tona fora do


ambiente acadêmico apenas no início de 2015, quando os principais
jornais do estado repercutiram o lançamento, ocorrido em novembro de
2014, de seu Dicionário de autores da literatura dramática do Rio
Grande do Sul, publicado de forma independente por um selo próprio, o
FischerPress.
O volume de 350 páginas trazia, pela primeira vez na história,
verbetes sobre dramaturgos de ofício e de ocasião que escreveram em solo
gaúcho. Há relativamente pouca análise estética das obras, mas o objetivo
do volume é claramente historiográfico – e, nesse sentido, de relevância
inegável. Constam inclusive os acervos onde podem ser encontrados os
textos mais raros de autores do século XIX. A lista abrange também
jovens em plena atividade como dramaturgos ou adaptadores, a exemplo
de Diones Camargo, Daniel Colin e Felipe Vieira de Galisteo.
Como resultado, a pesquisa de Fischer derrubou o mito da escassez
da dramaturgia gaúcha, comprovando que a produção de textos teatrais e
suas encenações foi constante e pujante desde o século XIX. Faltava
apenas alguém que espanasse a poeira dos documentos disponíveis nos
acervos históricos e os organizasse. A ironia é que algumas destas pistas
estavam à frente do nariz dos porto-alegrenses: Hilário Ribeiro (1847-
1886) e Eudoro Berlink (1840-1880), por exemplo, são nomes de ruas do
nobre e badalado bairro Moinhos de Vento, na capital.
Devido ao escopo da pesquisa, Fischer não chegou a restabelecer
um cânone – ou contracânone – da dramaturgia gaúcha do século XIX,
mas indicou nomes relevantes, como Arthur Rocha (1859-1888), autor
negro de origem humilde bastante encenado nos palcos gaúchos no século
XIX; Anna Aurora do Amaral Lisboa (1860-1951) que denunciou a
hipocrisia social, especialmente a masculina, da época; Damasceno Vieira
(1850-1910), que transitou por diferentes gêneros, inclusive pelo drama
nativista (as temáticas regionais não estiveram muito presentes no teatro
gaúcho daquele século); e Joaquim Alves Torres (1853-1910), prolífico
autor de peças de temas sociais, incluindo a emancipação feminina.

Tal perspectiva histórica nos permite repensar a missão do teatro em um


tempo no qual o audiovisual assumiu o lugar da mídia de massa

Foi apenas no final de 2015 que o estudioso publicou, também por


selo próprio, aquele que é um dos segmentos mais representativos de sua
pesquisa: a Antologia da literatura dramática do Rio Grande do Sul
(Século XIX), reunindo, em oito volumes, peças fundamentais do período,
sempre precedidas por um estudo temático. Para facilitar a leitura, um
nono livro trouxe os estudos introdutórios de cada um dos demais
volumes.
O primeiro tomo traz algumas das peças fundadoras do teatro no
estado, acompanhadas por um estudo que contextualiza a época e debate a
quem caberia o título de primeiro dramaturgo do Rio Grande do Sul. Há
quatro candidatos, dependendo dos critérios adotados (local de
nascimento, local de escrita da peça, local de publicação da peça, etc.):
Hipólito José da Costa (de Um amor d’estranja, de 1811), um autor
anônimo que publicou sob o pseudônimo Hum Militar Avulso (sua peça O
político, e liberal, por especulação é de 1832), José Manuel Rego Vianna
e Manuel José da Silva Bastos.
Já o segundo volume aborda a desonra como um dos temas mais
presentes na produção da época. Episódios que levavam à calúnia e à
difamação, como a perda da castidade da filha solteira ou a falência dos
negócios no caso dos homens, tinham um efeito comparável à desmedida
nos personagens da tragédia grega. No teatro oitocentista, a desonra
representava o fim da vida social.

Um dos aspectos mais ricos da Antologia é que recupera alguns dos


principais temas em debate na sociedade do século XIX, como fica claro
no terceiro volume, que traz o confronto entre a Igreja e a maçonaria. Um
personagem da peça Adelina (1879), de Damasceno Vieira, chega a fazer
um brinde à “extinção dos jesuítas”. As peças reunidas no quarto tomo
têm como questão central o divórcio, quase um século antes de ser
permitido em lei no Brasil, o que ocorreu apenas em 1977. O
envolvimento dos dramaturgos nos debates podia implicar também certo
ativismo, a exemplo das peças abolicionistas que tinham sua renda
revertida para a compra da liberdade de escravos. Como destaca a
introdução do quinto volume, a Sociedade Partenon Literário foi
importante nesse sentido. O “teatro de tese” do Partenon Literário também
foi verificado na defesa do ideal republicano, em oposição à monarquia –
tema do sexto volume.
Recuperando a importante dramaturgia de autoria feminina no Rio
Grande do Sul, o sétimo tomo interessa aos estudos feministas no sentido
de reescrever a história da participação das mulheres na criação artística.
Segundo Fischer, a primeira autora de uma peça teatral no estado foi
Maria da Cunha (1866-1911), que publicou o drama Uma lágrima
derramada ou O ramo de violetas e a comédia A flor do deserto, ambos
em 1887. Depois, veio Andradina de Oliveira (1878-1935), nome que tem
sido recuperado no meio acadêmico e teve seu romance O perdão (1910)
reeditado em 2010 pela Editora Mulheres. No teatro, escreveu os
dramas Viúva e virgem, Berço vazio e O sacrifício de Laura, os três de
1891. A pesquisa também destaca as irmãs Revocata Heloísa de Mello
(1860-1945) e Julieta de Melo Monteiro (1863-1928), além de Anna
Aurora do Amaral Lisboa (1860-1951).
O último volume da Antologia aborda as comédias, gênero que
correspondeu a um terço das peças gaúchas do século XIX estudadas pelo
pesquisador – mesmo que, na esteira de Aristóteles, o texto humorístico
fosse considerado menor quando comparado às manifestações tidas como
sérias. Molière era uma referência presente, tanto que Damasceno Veira
criou uma paródia do personagem Sganarello intitulada Por um
retrato (1875). Nessa seara, naturalmente há lugar assegurado para os
textos de Qorpo-Santo, talvez o dramaturgo gaúcho a quem tem sido
dedicada uma importante fortuna crítica – ainda modesta em quantidade,
mas honrosa se comparada a outros nomes muito menos conhecidos.
Fischer contextualiza, no estudo introdutório do primeiro volume, que os
fundamentos de “uma nova atividade mental e cultural” começaram a
aparecer apenas ao fim da Revolução Farroupilha, quase na metade do
século XIX. Escreve ele: “[F]oi no teatro que os intelectuais e homens de
letras sul-rio-grandenses daquele período encontraram, senão seus meios
mais adequados de expressão, pelo menos a forma de atingir um maior
número de pessoas, uma vez que a grande maioria da população gaúcha
era, como se viu, de iletrados e analfabetos”.
Tal perspectiva histórica nos permite repensar a missão do teatro
em um tempo no qual o audiovisual assumiu o lugar da mídia de massa,
enquanto o palco parece ter se tornado um fenômeno de nicho – seja em
manifestações de perfil mais comercial baseadas em estrelas da televisão e
voltadas ao público de alta renda, seja as de caráter exploratório da
linguagem cênica, frequentemente atraindo uma elite intelectual já
iniciada em seus procedimentos (embora a ânsia de atingir o maior
número de espectadores nunca tenha saído do horizonte dos criadores).
Fica claro, portanto, que a investigação de Fischer preenche uma
enorme lacuna na bibliografia sobre a dramaturgia gaúcha e, por extensão,
brasileira. Diferentes historiadores da literatura trataram o texto para
teatro como gênero de menor importância se comparado ao romance e à
poesia. Nesta Antologia, a dramaturgia encontra papel de protagonista.
Ainda restará por ser feito um enorme esforço a fim entender essa
produção em conexão com os demais aspectos do teatro. Resta torcer
(orar?) para que outros pesquisadores ampliem estes estudos e que os
criadores cogitem trazer alguns destes textos de volta ao lugar que lhes é
merecido: a cena.
DRAMATURGOS

QORPO SANTO

José Joaquim de Campos Leão (Triunfo, Rio Grande do Sul,


1829 - Porto Alegre, Rio Grande do Sul, 1883). Autor. Qorpo-Santo
escreve sua obra teatral no século XIX, mas suas peças só são
encenadas a partir da década de 1960. Uma boa parte da crítica
teatral brasileira do período o considera precursor do Teatro do
Absurdo. Antes de produzir sua obra literária, Qorpo-Santo trabalha
como comerciante e professor. Também exerce as atividades de
vereador e delegado de polícia na cidade de Alegrete, Rio Grande do
Sul. Começa a escrever para jornais desse Estado no ano de 1852. A
explicação do apelido é dada em um de seus escritos, quando tem 34
anos: "Se a palavra corpo-santo foi-me infiltrada em tempo que vivi
completamente separado do mundo das mulheres, posteriormente,
pelo uso da mesma palavra hei sido impelido para este mundo".

Por volta de 1864, o dramaturgo começa a sofrer de


alucinações, o que o leva a ser internado e examinado por médicos no
Rio Grande do Sul e no Rio de Janeiro. É desse período conturbado a
maior parte de seus trabalhos. Dezesseis peças são escritas entre
janeiro e maio de 1866. Em 1877, Qorpo-Santo decide criar a própria
tipografia. É nela que edita sua Ensiqlopédia ou Seis Mezes de Huma
Enfermidade, obra em nove volumes, dos quais, até o momento, são
conhecidos seis, que reúnem poemas, confissões, receitas culinárias,
máximas e suas dezessete peças teatrais. A grafia ensiqlopédia surge
de uma reforma ortográfica proposta pelo autor e defendida em artigo
no jornal A Justiça em 23 de outubro de 1868. Dessa reforma é que
também surge a grafia para o seu nome literário: Qorpo-Santo.
Importante lembrar que o escritor, em seus textos, algumas vezes
segue seu projeto ortográfico e em outras a ortografia da época.

Sua obra dramática é considerada inovadora para o Brasil do


século XIX. Comparando as peças de Qorpo-Santo com as de outros
dramaturgos da época, como Martins Pena e José de Alencar, o autor
gaúcho inova tanto na forma como no conteúdo. As Relações
Naturais, de 1866, por exemplo, apresenta prostitutas como
personagens, algo incomum para o teatro brasileiro da época. Além
disso, ele usa imagens surreais, como a de personagens que perdem
partes do corpo no decorrer da peça. Nesse texto há uma das mais
estranhas rubricas de seu teatro, no final do terceiro ato, em que ele
escreve: "Milhares de luzes descem e ocupam o espaço do cenário".

Em seu livro Os Homens Precários: Inovação e Convenção no


Teatro de Qorpo-Santo, Flávio Aguiar comenta a dramaturgia do autor
em relação aos dramaturgos brasileiros do século XIX: "Transposto
para os textos dramáticos, o inconformismo latente na vida de Qorpo-
Santo transformava-se na saudável libertinagem com que o autor
tratara os cacoetes do teatro brasileiro do século XIX, sempre tão bem
ajeitado e arrumado em seus enredos lógicos, em suas frases de
efeito, em seu moralismo marcante, permitindo-se, de vez em quando,
e sem grandes ofensas, um riso mais solto ou algumas lágrimas em
excesso. Em lugar disso, Qorpo-Santo apresentava peças em que os
enredos não tinham pé nem cabeça; a linguagem era violenta, direta,
onde a retórica comparecia como recurso paródico. Personagens
apareciam e desapareciam com rapidez meteórica; com frequência as
falas não se articulavam logicamente, ganhando uma poeticidade bem
ao gosto moderno".

O caráter estranho do teatro qorpo-santense faz com que suas


peças fiquem esquecidas entre o fim do século XIX e a primeira
metade do XX, não sendo conhecida nenhuma montagem de qualquer
uma delas nesse período. Qorpo-Santo morre em 1883, sem nenhum
reconhecimento do valor de sua obra. É a partir da década de 1950
que os volumes da Ensiqlopédia passam a ser lidos com atenção pelo
jornalista Aníbal Damasceno Ferreira. Em 1955, Ferreira e o diretor
teatral Antônio Carlos de Sena publicam poemas da autoria de Qorpo-
Santo no jornal porto-alegrense O Mocho. Após uma tentativa
frustrada de encenar as peças do autor no Curso de Arte Dramática
da Universidade Federal do Rio Grande do Sul - CAD/UFRGS, Sena
estreia em 1966, no Clube de Cultura, um espetáculo que reúne três
peças de Qorpo-Santo: As Relações Naturais; Eu Sou Vida, Eu Não
Sou Morte; e Mateus e Mateusa. O jornalista Valter Galvani descreve
o acontecimento: "Noite de ontem passou a ser no teatro histórica:
Redescoberta de Qorpo-Santo".

A montagem de Sena viaja para o Rio de Janeiro, em 1968, para


participar do Festival Nacional de Teatros de Estudantes, uma
realização de Paschoal Carlos Magno. Essas apresentações
possibilitam à dramaturgia de Qorpo-Santo receber o aval do crítico
teatral Yan Michalski: "Outro acontecimento de 1968 que ficará na
história: num Festival Nacional de Teatros de Estudantes realizado no
Rio, o Teatro do Clube de Cultura de Porto Alegre revela pela primeira
vez aos perplexos observadores, numa modesta mas convincente
montagem de Eu Sou Vida, Eu Não Sou Morte e Matheus e Matheusa,
a insólita obra de Qorpo-Santo, um inédito e desconhecido autor
gaúcho que em 1866 escrevera uma série de pequenas comédias
capazes de transformá-lo, segundo o ângulo sob o qual queiramos
encarar a sua delirante criação, num revolucionário precursor do teatro
do absurdo, ou fazê-lo aparecer como um louco de hospício, que é
como ele foi considerado pelos seus contemporâneos. Num arroubo
de entusiasmo que hoje pode parecer talvez precipitado, escrevi na
época que a descoberta da obra de Qorpo-Santo 'torna parcialmente
obsoletos todos os livros de história da dramaturgia brasileira'; mas a
importância da descoberta não foi, desde então, obscurecida pelas
dificuldades que os nossos diretores revelaram desde então em
transformar os pesadelos de Qorpo-Santo em realizações cênicas à
altura da originalidade dos textos". A partir desse momento as peças e
poemas de Qorpo-Santo recebem diversas encenações, e o autor
passa ser objeto de pesquisas acadêmicas. É o que garante a
atualidade e reitera a importância no teatro brasileiro da obra "do louco
manso do Guaíba".

ARTHUR ROCHA

Artur Rodrigues da Rocha ou Artur Rocha (Rio Grande, 1 de


janeiro de 1859 — Rio Grande, 26 de junho de 1888), foi
um poeta, dramaturgo e jornalista brasileiro.
Filho do ator dramático José Rodrigues Rocha e de Maria das
Dores Rocha, de família pobre, só pôde aprimorar seus estudos em
1872, com treze anos de idade, quando ingressou no Colégio
Gomes, em Porto Alegre, onde permaneceu até 1876. Fez parte de
um grupo de intelectuais negros livres do final do século XIX, que
tomaram posições radicais, através da imprensa, na crítica à
sociedade da época, defendendo a abolição da escravidão. Foi
redator dos jornais O Mosquito (1874), O Colibri (1877) e A
Lente (1877), em Porto Alegre. Em 1877, adquiriu
a tipografia do Diário de Notícias de Porto Alegre, fundando
o Correio da Tarde. Redigiu o Artista, de tendência liberal, lutou
pelo abolicionismo, foi membro da Sociedade Partenon Literário, e
colaborador da revista da Sociedade Ensaios Literários e do jornal
literário Álbum do Domingo. Como dramaturgo, escreveu: O filho
bastardo, O anjo do sacrifício, José, Os filhos da viúva, Deus e a
natureza, A filha da escrava. Empregado como carteiro em 1876, foi
promovido à oficial da administração, em 1883 e nomeado
encarregado da agência dos Correios de Rio Grande. Foi acusado
de desfalque, mas nunca sofreu processo criminal.
IVO BENDER

Ivo Cláudio Bender (São Leopoldo RS 1936). Dramaturgo,


tradutor e professor. Começa a escrever no início da década de
1960, influenciado pelo Teatro do Absurdo. Nas décadas de 1970 e
1980, produz a maior parte de suas peças, cujas principais
características são a crítica social, o humor e o recurso ao fantástico.
Traduz obras de Racine, Emily Dickinson e Harold Pinter.

Escreve sua primeira peça, As Cartas Marcadas ou Os


Assassinos, em 1961, a pedido da amiga Lúcia Mello, quando ainda é
estudante no curso de letras na Universidade do Rio Grande do Sul -
URGS. Conforme afirma, serve-se do método de escrita automática,
deixando-se levar livremente pela associação de ideias. Há no texto
claras afinidades com o Teatro do Absurdo. Após a boa recepção
de As Cartas Marcadas, encenada por amadores no Centro
Acadêmico da Faculdade de Filosofia da URGS, e contando com a
participação do autor também como intérprete, segue-se A Terra
Devorada, que estreia no Theatro São Pedro de Porto Alegre, em
1963. Por ser excessivamente hermético, o texto não tem boa
receptividade do público. A terceira, Os Alcatruzes, é renegada pelo
próprio autor.

Bender divide-se entre São Leopoldo e Porto Alegre, até 1965,


época em que se muda definitivamente para Porto Alegre. Além da
sua atividade como dramaturgo, trabalha como ator em alguns
espetáculos. Em 1967, escreve Auto das Várias Gentes no Dia de
Natal, dirigido ao público infantil, que é interditado pela censura no ano
seguinte; e a comédia musical A Fantástica Aparição de Red-Rider em
Brejo Seco Pondo Fim a uma Situação Insustentável ou O Saloon da
Consolação, nunca publicada ou encenada. Em 1969 escreve A
Casa atrás das Dunas, e, dois anos depois, o seu primeiro sucesso
comercial, Queridíssimo Canalha, com trama ambientada em um país
fictício da América Latina.

Maior sucesso de público obtém a peça seguinte, montada


simultaneamente em Porto Alegre e São Paulo, Quem Roubou Meu
Anabela? Novamente vale-se dos procedimentos do Teatro do
Absurdo para contar uma história que envolve traição e aspectos
sobrenaturais: "Transcorrida num ambiente fechado e sombrio [...] a
narrativa lida com elementos característicos do teatro do absurdo. Mas
amplia-os na direção da literatura fantástica, reconhecível nos
demônios de Genciana. [...] São estes elementos que configuram, de
modo simbólico, a temática da peça, de nítida conotação sexual".
Ainda em 1972, participa com A Casa Sitiada, da Feira Gaúcha
de Opinião, coordenada pelo Teatro de Arena de Porto Alegre, e
cria O Auto do Pastorzinho e Seu Rebanho, nova incursão no teatro
para crianças, público para o qual escreve três peças: O Macaco e a
Velha, A Invasão das Tiriricas e A Estrelinha Cadente. Sexta-Feira das
Paixões, que vem em seguida, em 1975, retoma algumas questões
tratadas em peças anteriores: a ação localizada em um país
fictício, em estado de sítio por causa de uma guerra civil; o
confinamento dos personagens dentro de uma casa; e o elemento
sobrenatural emoldurando o desenvolvimento das ações. Desta vez,
no entanto, o humor é deixado de lado, em favor de uma atmosfera
densa e sufocante, em que uma das personagens é vítima de chagas,
como as de Jesus Cristo, todos os anos, na Sexta-Feira Santa. A
trama faz uma crítica à situação política do Brasil da época.

O Cabaré de Maria Elefante, de 1981, é um texto episódico, em


que mais de 30 personagens dão vida a diversas situações, tendo
como eixo unificador o palco de um cabaré, onde são apresentados
números artísticos variados. Um vampiro, um bando de freiras, um
estuprador e um travesti, chamado Jean Harlow, são algumas das
pitorescas figuras criadas pelo autor, em um contexto muitas vezes
metateatral. A opção pelo humor, frequentemente anárquico, deixa
entrever a crítica social característica do autor, abordando "a
alienação vinculada aos meios de comunicação de massa, o
movimento feminista em seus aspectos radicais, as relações de
opressão no universo do trabalho [...] todos repassados por uma
linguagem eminentemente paródica e irônica".

Com o lançamento, em 1988, da Trilogia Perversa, inspirada em


alguns dos mais conhecidos mitos gregos, Bender inaugura mais
uma fase de sua carreira dramatúrgica. Em 1826, o mito de Atreu e
Tiestes é transposto para o contexto dos primórdios da colonização
alemã no interior do Rio Grande do Sul. Em 1874, a tragédia Ifigênia
em Áulis, de Eurípides, é adaptada para o episódio da matança dos
Mucker - colonos alemães reunidos sob a liderança messiânica de
Jacobina Maurer. Na peça 1941, o mito de Electra dá margem à
criação de uma trama ambientada durante a grande enchente de
1941, que devasta o território gaúcho. Conforme Maria da Glória
Bordini, "pela inovação temática, [...] pelo extremo despojamento
formal e pela concepção dramatúrgica à grega, seca e transparente,
essa obra representa uma contribuição para o teatro brasileiro de
caráter incomum".

Após a Trilogia Perversa, Bender publica textos como Marcos


IV, 23, adaptação, feita com Cláudio Cruz, adaptada de um conto de
Jorge Luis Borges; O Boi dos Chifres de Ouro, classificada pelo
dramaturgo como "comédia pampeira", uma homenagem ao escritor
Simões Lopes Neto, em que novamente a temática fantástica domina;
e Mulheres Mix, comédia dramática em que um grupo de mulheres
administra um brechó, por onde passam figuras excêntricas, em uma
estrutura fragmentada que lembra O Cabaré de Maria Elefante.

Diálogos Espectrais, texto não publicado, tem caráter


semiautobiográfico, e conta a história de um tradutor dos poemas de
Emily Dickinson que trava contato com o espectro da poetisa norte-
americana. Novamente a temática fantástica é dominante, porém sem
o caráter alegórico de antes, constituindo um texto muito mais intimista
e focado na impossível relação de amor entre a autora e o tradutor. O
escritor Caio Fernando Abreu, em depoimento de 1984, afirma que
"passando do cômico ao trágico, do subjetivo ao objetivo, capaz de
esmiuçar em profundidade não só os tormentos individuais como as
mazelas sociais, [...] o teatro de Ivo derrama-se por vários níveis de
leitura, passível de inúmeras interpretações".4 A fluência da escrita de
Ivo Bender em gêneros tão distintos quanto a tragédia e a comédia
demonstra seu domínio da linguagem dramática, em uma obra em que
se alternam a prolixidade de algumas peças como O Cabaré de Maria
Elefante e o discurso descarnado até o limite do indispensável, como
na Trilogia Perversa.

CARLOS CARVALHO

Carlos José Gomes de Carvalho (Porto Alegre RS 1939 - idem


1985). Autor, diretor, ator, contista e poeta. Um dos mais
representativos dramaturgos gaúchos das décadas de 1970 e
1980, encontra no drama do cotidiano urbano as fontes de criação
para o seu teatro de denúncia e resistência. Na juventude,
paralelamente à formação musical, publica contos e poemas em
suplementos literários de revistas e jornais. Em 1961, torna-se
funcionário da Assembléia Legislativa do Estado, vinculação que lhe
permite estabilidade financeira e fornece um campo pessoal que serve
de fonte à criação literária. Suas primeiras experiências teatrais
ocorrem em 1968, no curso de direção teatral do Centro de Arte
Dramática - CAD ligado à Faculdade de Filosofia da Universidade do
Rio Grande do Sul - URGS, em que se destaca pela apurada visão
crítica. No segundo ano do curso, obtém o papel de Mac Navalha
em A Ópera dos Três Vinténs, de Bertolt Brecht, com direção de Luiz
Paulo Vasconcellos, e recebe elogiosas críticas por sua atuação.
Também participa da encenação de La Pazzia Senile, de Adriano
Banchieri, com direção de Maria Helena Lopes, montagem baseada
na commedia dell'arte italiana, e na qual interpreta um
vaidoso dottore que, apesar dos diplomas, não encontra aplicação na
vida prática para sua erudição.

Nesse período, seu trabalho como escritor e encenador começa


a ganhar mais projeção: publica contos em duas antologias e recebe
menção especial do Prêmio Esso de Literatura, pelo conto Cabra-
Cega, além de dirigir seu primeiro espetáculo, Fim de Partida, de
Samuel Beckett. Em 1970, participa da comédia Casa de Orates,
de Artur Azevedo e Aluísio de Azevedo, dirigida por Luiz Paulo
Vasconcellos, e, no papel do Dr. Fortes, "tira o máximo de seu papel e
mostra confiança plena no palco".1 No mesmo ano, Colombo Fecha as
Portas de Teus Mares, texto de sua autoria, é encenado por Antônio
Carlos Sena. Trata-se, afirma Carlos Carvalho, de uma "gozação com
a nossa cultura vinda de fora, que nos é imposta, arbitrária e mal
digerida".2 A montagem de outra peça sua Não Saia da Faixa de
Segurança, um deboche sobre os veículos de comunicação, é
interditada pela censura no tenso período de ditadura militar.

Dirige O Baile dos Ladrões, de Jean Anouilh, no Grupo de


Teatro Província, em 1971. O prejuízo ocasionado pelo alto valor dos
direitos autorais do texto e o pouco retorno de público provocam a
saída de alguns de seus integrantes, entre eles o próprio Carlos
Carvalho. Na época, em solidariedade à grave crise financeira que
ameaça fechar as portas do Teatro de Arena de Porto Alegre - TAPA,
alguns professores do Departamento de Arte Dramática da
Universidade Federal do Rio Grande do Sul - DAD/UFRGS colocam-
se à disposição para ministrar cursos no teatro. A partir dessa
iniciativa, Carlos Carvalho dirige Queridíssimo Canalha, de Ivo
Bender, uma comédia de humor negro que surpreende o público e se
torna grande sucesso, mesmo sem muitos recursos de produção.

Seu primeiro livro de contos, Calendário do Medo, de 1975,


traduz o universo opressivo do regime autoritário da ótica do homem
comum. O reconhecimento do público se dá pelo fato de o escritor
transitar pela literatura e pela dramaturgia, até mesmo reescrevendo
para teatro alguns de seus contos, como é o caso de PT Saudações,
que, em 1976, recebe versão teatral dirigida pelo autor. Com direção
de Luiz Paulo Vasconcellos, estreia Boneca Teresa ou Canção de
Amor e Morte de Gelsi e Valdinete, peça sobre a solidão e a violência:
"sua dramaturgia, sua arte, enfim, constitui-se em sua arma de luta. É
em nome deste mesmo homem que ele representa agredido,
oprimido, massacrado, que ele escreve e traz até nós os seus textos".3

Após concluir o Curso de Direção Teatral, em 1976, é contratado


como professor colaborador de direção teatral da Universidade
Federal do Rio Grande do Sul - UFRGS. No mesmo ano,
publica Entrenós, juntamente com Ivo Bender, antologia de textos
teatrais com linguagem "simples, objetiva, quase científica. Um corte
vertical na realidade cotidiana é seu chão. Sua comunicabilidade
imediata".Duas de suas peças estreiam pelas mãos de jovens
diretores: O Pulo do Gato (O Dia Mais Feliz de Nossa Vida), é
encenada por Decio Antunes, do grupo Espia Só, em 1979, num
projeto de popularização do teatro feito por operários do setor da
indústria. A montagem profissional de O Pulo do Gato, de 1985,
também dirigida por Decio Antunes, com música de Nelson Coelho de
Castro e cenografia de Alziro Azevedo, conquista os principais
prêmios de teatro do ano. Esta É a Sua Vida, em 1981, baseada no
conto Hospede a Primavera em Sua Casa, é encenada por Luciano
Alabarse, a partir das improvisações do grupo Descascando o
Abacaxi.

Em 1982, motivado por forte identificação política e ideológica


com o que a personagem representa, Carlos Carvalho escreve e
dirige Que Se Passa, Che?, que concretiza um antigo desejo seu,
conforme palavras de Araci Esteves: "Desde que casamos, em 1973,
ele alimenta esse objetivo. Para isso, ele precisou não apenas
conhecer a figura do Che como homem e como revolucionário [...].
Depois dessa pesquisa ele transpôs para o papel o que achava que
era realmente importante. Não era uma peça sobre o Che Guevara.
Era mais um retrato da história da América Central e da América
Latina". Berço Esplêndido traz o retrato realista e contundente de uma
família de classe baixa às vésperas do desfile de sua escola de
samba. Em meio à greve da firma, o esforço pelo sustento da família
de um operário de obra e de sua mulher pelo sustento da família
termina de maneira fatal. O texto é premiado no Concurso de
Dramaturgia Qorpo-Santo, promovido pelo Instituto Estadual do Livro,
em 1980. Sua primeira montagem ocorre em 1982, realizada pelos
grupos paulistas de teatro Qorpo-Santo, de Mococa, e Encenação, de
São José do Rio Pardo, com direção de Jefferson Zanchi.

Artista de múltiplas facetas, na década de 1980 Carlos Carvalho


contribui para a qualificação do teatro para crianças. Escravos de Jó,
peça infantil baseada em seu conto homônimo, é encenada por Nestor
Monasterio: "Texto leve, claro, bem-humorado, Escravos de Jó tem
estrutura sólida, história simples e comunicação fácil. Graças a Deus
não pretende dar lições nem implantar conceitos na cabeça das
crianças". Dirige A Viagem de um Barquinho, de Sílvia Orthoff, e
obtém o Prêmio Tibiquera de melhor direção de 1983. A doentia
relação entre uma mãe dominadora e seu filho submisso, no dia do
encontro com a futura nora, é o tema de Champagne para Mãe Tuda.
Luiz Paulo Vasconcellos encena o texto em 1984, com Araci Esteves
no papel da personagem título: "O texto é uma espécie de brincadeira
séria a respeito de peças de fundo psicológico e melodramático,
semelhante às óperas que a personagem Mãe Tuda tanto aprecia".
Carlos Carvalho morre em agosto de 1985, aos 46 anos. Em sua
homenagem, a Secretaria da Cultura de Porto Alegre batiza com seu
nome uma das salas de espetáculos da Casa de Cultura Mario
Quintana, após a restauração do complexo cultural, em 1991. O teatro
é inaugurado com Hospede a Primavera em Sua Casa, adaptação de
Luiz Paulo Vasconcellos de várias versões de Esta É a Sua Vida,
com Araci Esteves no elenco.

VERA KARAM

Vera Maria Bandeira Karam (Pelotas RS 1959 - Porto Alegre RS


2003). Dramaturga, atriz. Em apenas dez anos de produção, Vera
Karam deixa uma dramaturgia sólida, em que se destacam o humor e
a ironia na abordagem de desencontros amorosos, especialmente em
peças premiadas como Maldito Coração, Me Alegra que Tu
Sofras e Ano Novo, Vida Nova. Professora de inglês e tradutora, ela
se aproxima do teatro no fim da década de 1970, como integrante do
Grêmio Dramático Açores, formado no âmbito do Teatro de Arena de
Porto Alegre (TAPA), e no início da década seguinte integra o
grupo Descascando o Abacaxi.

Ao cursar a oficina de criação literária do escritor Luiz Antonio de


Assis Brasil, na Faculdade de Letras da Pontifícia Universidade
Católica do Rio Grande do Sul (PUC/RS), passa a produzir contos e
textos para teatro. Sua apresentação no livro da Oficina Literária
demonstra o gosto pelo humor: "Vera Karam, também desconhecida
como Vera K, é natural de Pelotas, embora seja difícil de acreditar que
uma pessoa nascida em Pelotas seja 'natural'. É professora de inglês,
eterna estudante de letras e ex-atriz, tendo largado a carreira, por
razões obscuras, no auge do anonimato. Avisa aos estudiosos de sua
obra que esta pode ser dividida em A.O. e D.O. (Antes da Oficina e
Depois da Oficina). Adora cantoras de blues, é apaixonada por
Eugene O'Neill e fã incondicional de Lygia Fagundes Telles. Não
menciona idade, mas deixou escapar que lembra da revolução de 64,
da Casa Louro, da revista 'Escrita' e freqüentou os resquícios da
'esquina maldita'. Adora pimenta, sabe de cor ...E o Vento Levou e
leu A Convidada sete vezes. Tem o estranho hábito de falar de trás
para diante. Aceita críticas, mas só pelo correio e acompanhadas de
fotos 3x4".1

Em 1992, um de seus textos é incluído no espetáculo Quem


Sabe a Gente Continua Amanhã, com direção de Mauro Soares, seu
colega do Açores, ao lado de criações de outros quatro autores. No
ano seguinte, Dona Otília Lamenta Muito, também dirigida por Mauro
Soares, marca sua estreia propriamente como dramaturga, já com boa
aceitação, conforme registra o escritor Tabajara Ruas no programa da
peça: "Humor, absurdo, loucura, solidão, luta de classes, espanto - e
tudo sem gritaria... Antes, estilizados pelo meio-tom de uma ironia
quase imperceptível. É um trabalho meticuloso. A chama da paixão é
dominada em favor da sutileza, da sugestão. A autora não anda em
busca de vitórias fáceis".2 O texto recebe menção honrosa no Prêmio
Açorianos de Teatro, da Prefeitura Municipal de Porto Alegre, e é
publicado no ano seguinte pelo Instituto Estadual do Livro (IEL).

Em 1996, entra em cartaz Maldito Coração, Me Alegra que Tu


Sofras, novamente com direção de Mauro Soares, um monólogo
representado pela atriz Ida Celina . Sobre a peça, escreve o crítico
Miguel Arcanjo Prado, do jornal Folha de S.Paulo, por ocasião da
temporada paulista: "O texto de Vera Karam conta a história de uma
mulher presa em suas fantasias sobre um homem que teria amado no
passado. Diante de tantos atropelos e incoerências, na fala da mulher
fica a dúvida: o que seria verdade e o que seria invenção da mente da
personagem? A linha tênue que separa a sanidade da loucura está
presente em todos os momentos do espetáculo".3 Vera recebe várias
premiações de melhor texto: Troféu Açorianos Especial de Teatro, do
Sindicato dos Artistas e Técnicos de Espetáculos de Diversão do Rio
Grande do Sul (Sated/RS) e do Festival de Teatro de São José dos
Campos, São Paulo.

No mesmo ano, Ano Novo, Vida Nova ganha o primeiro lugar no


Concurso de Dramaturgia Qorpo-Santo e recebe o Prêmio Açorianos
na categoria literatura dramática. O texto, no entanto, só é montado
cinco anos mais tarde, com direção de Decio Antunes. As montagens
de textos dramáticos ou adaptações de contos para o teatro de Vera
Karam prosseguem no Rio Grande do Sul e outros estados. Por que
Você Não Disse que Me Amava? é encenada no Rio de Janeiro, com
direção de Paulo Betti. Ofendi?, reunindo dois contos da autora, é
apresentada no Recife. Sobre a peça, Roberto Lúcio, diretor do
espetáculo, escreve: "Vera Karam revela, em sua dramaturgia, o lado
cômico e por vezes triste dessa nossa limitação. Todos ofendemos a
todos o tempo inteiro, e o que é pior, por ninharias, verdadeiras
bobagens, crenças e preconceitos geralmente discutíveis". 4

Em entrevista à publicação Porto & Vírgula, a autora fala sobre a


presença do humor em sua dramaturgia: "O humor sempre esteve
presente na minha vida. É um humor meio pesado. É tragicômico,
como a vida é tragicômica. É meu jeito de ver o mundo". O escritor
Luiz Antonio de Assis Brasil reconhece no tratamento da linguagem a
qualidade de sua obra: "Surgida em meio ao besteirol, do qual hoje
muitos se arrependem, Vera lutou pela primazia e qualidade do texto,
o que é evidenciado pela preocupação com a forma. Era possível vê-
la, nas aulas, absorta com uma palavra. A mão amparando o queixo,
olhar à distância, buscava essa palavra num lugar que só ela
conhecia. Então dizia, toda alegre: 'Achei!' ".

JULIO CONTE

Júlio César Conte (Caxias do Sul, 1955) é um psicanalista, diretor


de teatro, ator e dramaturgo brasileiro. Formou-se em direção
teatral em 1984 e em medicina em 1985 pela Universidade Federal
do Rio Grande do Sul. Sua obra mais destacada é Bailei na curva[1],
o maior sucesso do teatro gaúcho do todos os tempos, e que retrata
as décadas de 1960, 1970 e 1980 através da visão de sete
pessoas, da infância à idade adulta.

Obras como escritor e diretor

 Vamos brincar de apagar a luz - Crianças tem que criar


brincadeiras quando falta luz e a televisão não funciona. Teatro
infantil no qual Julio Conte usa a técnica do Teatro da Aparência
onde o publico é convidado a escolher um final, escrita em 1980
e encenada em 1989;
 Um sonho realizado - Um velho ator num asilo recorda uma
encenação de um sonho encomendado por uma mulher triste na
tentativa de encontrar um pouco de felicidade. Drama, inspirada
na obra de Juan Carlos Onetti, escrita em 1981 e encenada no
D.A.D da UFRGS;
 Não pensa muito que dói - Acompanha os sonho de alunos da
Escola de Teatro até sua formatura para então se confrontar
com o mercado de trabalho restrito. Comédia agridoce, escrita
(com Flávio Bicca, Sônia Coppini, Cláudia Accurso, Torquato
Aisler, Regina Goulart e Hermes Mancilha) em 1982 e encenada
no mesmo ano;
 Bailei na curva - A trajetória de sete crianças ao longo de três
décadas tendo como pano de fundo o Golpe Militar de 1964.
Comédia dramática, escrita (argumento, roteiro e texto final) em
1983 e com várias montagens;
 Pedro e a girafa - Um menino com dificuldade para se
desenvolver e tem com amigo uma girafa de pano que o ajuda a
resolver seus problemas. Teatro infantil, escrita em 1983 e
encenada em 1988;
 Cabeça-quebra-cabeça - Quatro amigas que revisam suas
vidas frente a tentativa de suicídio de uma delas. Comédia
dramática, escrita (roteiro, argumento e texto final) e encenada
em 1986;
 Toda cobertura é uma ilha - Dois homens ilhados numa
cobertura tentando entender seus desejos. Drama, escrita em
1986 - inédita;
 Zona proibida - Escritor Ariel Calegari está tentando escrever
seu novo romance quando fantasmas de suas lembranças reais
o desafiam. A peça tem quatro finais diferentes sendo que cada
um ressignificar de modo peculiar a narrativa. Drama, escrita e
encenada em 1987;
 Chá de setembro - Três amigas, inseridas em círculos de
ação diversas, se encontram em eventos como chá de fraldas,
chá de panelas e o amor, amizade e morte. Comédia dramática,
escrita em 1992 - inédita;
 Detectice Story ou História de detetive - Uma trama policial
tão complexa que nem o autor sabe o que acontece. Sátira
farsesca, escrita em 1992 - inédita;
 Um negócio chamado família - Abel Schneider é homem em
crise quando consegue vender a loja da família que o libertaria,
nesta mesma noite, seu cunhado, Romulo Tasca, músico
clássico, ai até a loja depois de faltar um recital. Drama, escrita e
encenada em 1993;
 O rei da Escória - Xis, paciente psicótico crônico internado
num um hospital psiquiátrico, é levando por um jovem medico e
uma enfermeira para uma viagem de volta e sem volta em
direção a suas origens. Drama, escrita em 1994 e encenada em
2005;
 A coisa certa - Numa sessão de analise de família, a filha
discute com o pai, a mãe (separados) sua relação com um
homem na mesma idade do pai. Comédia dramática, escrita em
1994 e encenada em 1995;
 Se meu ponto G falasse - Quatro fases de mulheres em
processo de autonomia. comédia de costumes, escrita (com
Patsy Cecato e Heloísa Migliavacca) em 1997 e encenada no
mesmo ano;
 A pendenga matrimonial do casal Rosa - comédia, escrita em
1997 - inédita;
 O bafafá da calça azul marinho - Empregada tenta estimular a
Patroa deprimida quando o Janjão aparece. Comédia dramática,
escrita (com Patsy Cecato e Heloísa Migliavacca) em 1999 -
inédita;
 Sexysite@com.vc - Prostituta virtual que encena várias
personagens se envolve com cliente deprimido que perdeu a
mulher e o emprego de tanto freqüentar sites de relacionamento.
Comédia dramática, escrita em 1999 - inédita;
 Prendi o ar e... mergulhei - Irmãs envolvidas com o mesmo
homem se defrontam a o câncer. Drama, encenada em 2007.
 Pílula de Vatapá - Radio Desespero relato o drama anônimo
de uma cidade no qual os caminhos se entrecruzam. Drama,
encenada em 2007.
 Dançarei Sobre Teu Cadáver - Lifeboy é um rapaz maltratado
pela vida. Drama, encenada em 2008.
 Larissa Não Mora Mais Aqui - Múltiplas tramas se
desenvolvem num edifício tradicional que sem encontra
atualmente cercado por favelas e moradores discutem
possibilidade de demolição. Comédia dramática, encenada em
2009.
 Essa Noite Se Improvisa Com Júlio Conte - peça improvisada
com o público, encenada em 2010.
 A Milímetros de Mercúrio - drama, encenada em 2010.
 Essa Noite Se Improvisa Tennessee Williams - peça
improvisada com o público, encenada em 2011.
 Vendetta Corsa - Porque a Minha Ferida é Mortal - Diversos
crimes ocorridos numa cidade tem em comum uma faca que
determina a morte em quem a possuir, na lamina da faca esta
escrito Vendetta, porque minha ferida será mortal. drama,
encenada em 2011.
 Essa Noite Se Improvisa Nelson Rodrigues - peça
improvisada com o público, encenada em 2012.
 Beckett-Bion: Gêmeo Imaginário - encenação da peça sobre a
analise de Samuel Beckett com o psicanalista Wilfred Bion -
2013/2014
 A Mecânica do Amor [Julio Conte] Jambola e Caneta são dois
mecânicos numa oficina na beira de uma estrada quase vazia,
recebem a visita de Anselmo e Ricky, dois sujeito envolvidos
com corrupção. Trama tem quatro personagens que deve ser
interpelado por dois atores mesmo que na cena final os quatro
contracenem. Comédia macabra. 2016/2018
 A Partícula de Deus [Julio Conte e Marcelo Goldani] - Galileu
Galilei se encontra com Peter Higgs na sala de espera para falar
com Deus, mas podem ser dois loucos no psiquiatra. Texto
encenado em 2015/2016/2018.
 Latidos [Julio Conte] Uma mãe e uma filha no café da manhã
dias depois da morte do pai. Texto encenado em Porto Alegre,
estreia no Porto Verão Alegre 2018.[2][3]

Se meu ponto G falasse teve grande destaque [4], com temporadas


no Rio Grande do Sul e no Rio de Janeiro, com mais de 900
apresentações. Permaneceu dois anos em cartaz no Rio de
Janeiro, várias temporadas em Porto Alegre, e viajou no Circuito de
Espetáculos pelo interior do RS.
No plano editorial, Vamos brincar de apagar a luz recebeu edição
do IEL - Instituto Estadual do Livro, e Não pensa muito que
dói também foi editado pelo IEL, compondo a coleção de Roteiros
Teatrais.
Destaca-se também no plano editorial Bailei na curva que teve sua
primeira edição pela L&PM em 1984 esgotada e, uma segunda
edição em 1994, pela Editora Mercado Aberto, que encontra-se na
quarta edição.
A Editora WS está publicando O teatro de Júlio Conte, estando já
no segundo volume. Se meu ponto G falasse compõe o primeiro
livro e, o volume 2, apresenta A coisa certa.
Prêmios
Júlio Conte ganhou vários prêmios de teatro adulto e infantil, e entre
eles se destacam [5]:

 Prêmio Açorianos - Melhor Espetáculo e Melhor Direção -


por Não pensa muito que dói, em 1982.
 Prêmio Açorianos – Prêmio Especial do Júri – para Bailei na
Curva, em 1983.
 Troféu Mambembe - Os Melhores do Ano: Prêmio Inacen do
Ministério da Cultura - para Bailei na Curva, dirigido na cidade do
Rio de Janeiro, em 1985.
 Festival Internacional de Expressão Ibérica, na cidade
do Porto, em Portugal -representante do Brasil com Bailei na
curva, em 1986.
 Prêmio Açorianos de Melhor Texto Teatral - por Se meu ponto
G falasse, em 1998
 Prêmio Açorianos de Literatura para Texto Dramático - por Se
meu ponto G falasse, em 1999.
 Troféu Quero-quero de Melhor Diretor pelo Sindicato dos
Artistas - por Pedro e a girafa, em escolha feita pelos colegas da
classe teatral em votação democrática.
 Prêmio Corpo Santo de Dramaturgia Infantil - por Vamos
brincar de apagar a luz
 Prêmio Açorianos de Melhor Texto Dramático - por O rei da
Escória, em 2005.

Você também pode gostar