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Tema:

INICIAÇÃO E TRADIÇÃO
MATERIAL DIDÁTICO DE APOIO
Expositor: Eder Manccini de Oliveira Barros

Ementa: O que é Tradição e o que são formas tradicionais; o lapso da comunicação tradicional segundo a
memória e a sabedoria populares; a degradação do gênero humano; a iniciação como veículo de formas
tradicionais; iniciação e metanóia; o mecanismo iniciático; a função da egrégora.

1) Fundamentos mitológicos (exemplos):

SEGUNDO O GÊNESIS: E formou o Senhor Deus o homem do pó da terra, e soprou em suas


narinas o fôlego da vida; e o homem foi feito alma vivente. E plantou o Senhor Deus um jardim no Éden,
do lado oriental; e pôs ali o homem que tinha formado... Porquanto deste ouvidos à voz de tua mulher, e
comeste da árvore de que te ordenei, dizendo: Não comerás dela, maldita é a terra por causa de ti; com dor
comerás dela todos os dias da tua vida. Espinhos, e cardos também, te produzirá; e comerás a erva do
campo. No suor do teu rosto comerás o teu pão, até que te tornes à terra; porque dela foste tomado;
porquanto és pó e em pó te tornarás... O Senhor Deus, pois, o lançou fora do jardim do Éden, para lavrar
a terra de que fora tomado. E havendo lançado fora o homem, pôs querubins ao oriente do jardim do
Éden, e uma espada inflamada que andava ao redor, para guardar o caminho da árvore da vida.
(Gênesis 2,7-8; 3,17-19.23-24)

SEGUNDO OS GRECO-ROMANOS: De ouro foi a primeira Idade, quando a fé e a justiça se


mantinham pelo livre arbítrio e não pela lei, ameaça ou vingança. Corriam rios de leite e rios de doce
néctar, e o mel era extraído de carvalhos verdejantes.
Depois de Saturno haver sido expulso para o obscuro reino da morte, e de o mundo estar sob a
influência de Júpiter, a raça de prata chegou, pior do que a de ouro, mas melhor do que bronze
amarelado.
Então, depois disto, a terceira chegou, a raça de bronze, de índole mais severa e mais rápida a
pegar em armas, mas não ainda ímpia.
A Idade de ferro veio no fim. De uma vez, todo o mal irrompeu nesta era desprezível: a modéstia, a
verdade e a fé abandonaram a terra, e em seu lugar apareceram as artimanhas e conspirações,a violência
e a amaldiçoada ganância pelo lucro. O convidado não estava a salvo do anfitrião, nem o sogro do genro;
o amor escasseava, mesmo entre irmãos. O marido ansiava pela morte da sua esposa e ela pela do seu
marido. A devoção foi derrotada, e o último dos imortais abandonou a terra encharcada de sangue.
Quando o filho de Saturno observou isto do seu elevado trono gemeu, e concebeu na sua alma uma
poderosa fúria digna de Júpiter e reuniu os deuses em concílio. (Ovídio, Metamorfoses)

SEGUNDO A CRONOLOGIA VÉDICA: Ouça de mim, Maitreya, exatamente as circunstâncias do


fim de todas as coisas, e a dissolução que acontece no fim de um Kalpa, ou aquela que acontece no fim da
vida de Brahma. Um mês de mortais é um dia e noite dos progenitores; um ano de mortais é um dia e
noite dos deuses. Duas vezes mil agregados das quatro eras é um dia e noite de Brahma. As quatro eras
são a Krita, Treta, Dwapara, e Kali; compreendendo juntas doze mil anos dos deuses. Há sucessões
infinitas dessas quatro eras, de uma descrição semelhante, a primeira das quais sempre é chamada de
Krita, e a última de Kali. Na primeira, a Krita, é aquela era que é criada por Brahma; na última, que é a
era Kali, uma dissolução do mundo acontece... A observância de casta, ordem, e institutos não prevalecerá

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na era Kali, nem aquela do cerimonial ordenado pelo Sama, Rik, e Yajur Vedas. Matrimônios nessa era
não serão de acordo com o ritual, nem as regras que ligam o preceptor espiritual e seu discípulo estarão
em vigor. As leis que regulam a conduta de marido e esposa serão desconsideradas, e oblações para os
deuses com fogo já não serão oferecidas... Um homem regenerado será iniciado de toda e qualquer
maneira, e atos de penitência que possam ser realizados não serão acompanhados por quaisquer
resultados. Será escritura todo texto que as pessoas escolham considerar desse modo; todos os deuses serão
deuses para aqueles que os adorarem [deuses não reconhecidos receberão honra]; e todas as ordens de vida
serão igualmente comuns para todas as pessoas. Na era Kali, jejum, austeridade, generosidade,
praticados de acordo com a vontade daqueles por quem eles são observados, constituirão retidão. Orgulho
de riqueza será inspirado por posses muito insignificantes... (Vishnu Purana, Livro 6, Capítulo 1)

NB: Grande parte de nossa herança cultural sugere uma corrupção do gênero humano.

2) Conceitos – A Tradição:

YUGA sf (sânscrito) Era, idade, período em que se observa o declínio constante da Verdade, da lei
cósmica que a expressa e das normas sociais em harmonia com essa lei (dharma). Tal decadência
(“catabolé”) ocorre ao longo de quatro yugas, gradativamente mais obscuras, e o conjunto das quatro
yugas caracteriza um ciclo de tempo maior (sânscrito: mahayuga; cerca de 4 milhões de anos, segundo
fontes védicas). Comparar com as Eras de Ouro, Prata, Bronze e Ferro de Ovídio e o sonho de
Nabucodonosor relatado em Daniel 2,31-35, onde a pedra rolante representa o tempo cíclico.

Tu, ó rei, estavas vendo, e eis aqui uma grande estátua; esta estátua, que era imensa, cujo
esplendor era excelente, e estava em pé diante de ti; e a sua aparência era terrível. A cabeça daquela
estátua era de ouro fino; o seu peito e os seus braços de prata; o seu ventre e as suas coxas de cobre; As
pernas de ferro; os seus pés em parte de ferro e em parte de barro. Estavas vendo isto, quando uma pedra
foi cortada, sem auxílio de mão, a qual feriu a estátua nos pés de ferro e de barro, e os esmiuçou. Então foi
juntamente esmiuçado o ferro, o barro, o bronze, a prata e o ouro, os quais se fizeram como pragana das
eiras do estio, e o vento os levou, e não se achou lugar algum para eles; mas a pedra, que feriu a estátua, se
tornou grande monte, e encheu toda a terra. (Daniel 2:31-35)

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TRADIÇÃO sf (latim: tradere, “passar adiante”, derivado de trans-, “além” + dare, “entregar”). A
tradição primordial, ou, como se costuma escrever, Tradição com “t” maiúsculo, é o suposto corpus do
saber original da Humanidade. É nossa herança espiritual comum; a unidade metafísica e original de
todas as religiões. A palavra “Tradição” tem assim o mesmo significado conceitual do hebraico Cabalá.O
conhecimento da Tradição implica na posse do estado primordial da Humanidade, que, através dos
milênios, sofreu declínio tanto espiritual, quanto intelectual. Consequentemente, há um “ruído” na sua
transmissão histórica. Foram estabelecidas, entretanto, “formas tradicionais” em diversas partes do
mundo e em diferentes épocas, que, enquanto derivações da Tradição, representam-na de maneira
fragmentada, porém legítima.

FORMAS TRADICIONAIS são conjuntos de tradições secundárias derivadas da tradição


primordial, portanto degradações desta, que podem ser transmitidas de forma exotérica ou esotérica,
através de ritos e símbolos, ou por via oral ou escrita. Embora a cultura ocidental tenha rompido com o
pensamento tradicional pelo menos desde o fim da Idade Média, ainda preserva as formas representadas
pelo Cristianismo, notadamente a Igreja Católica, e pelas iniciações de ofício, das quais deriva a
Maçonaria.

A PERDA DA TRADIÇÃO é um fenômeno decorrente da corrupção gradativa do gênero


humano, em um movimento catabólico, que é explicado alegoricamente pelo mito da Queda do Homem.

E era toda a terra de uma mesma língua e de uma mesma fala. E aconteceu que, partindo eles do
oriente, acharam um vale na terra de Sinar; e habitaram ali. E disseram uns aos outros: Eia, façamos
tijolos e queimemo-los bem. E foi-lhes o tijolo por pedra, e o betume por cal. E disseram: Eia, edifiquemos
nós uma cidade e uma torre cujo cume toque nos céus, e façamo-nos um nome, para que não sejamos
espalhados sobre a face de toda a terra. Então desceu o Senhor para ver a cidade e a torre que os filhos
dos homens edificavam; E o Senhor disse: Eis que o povo é um, e todos têm uma mesma língua; e isto é o
que começam a fazer; e agora, não haverá restrição para tudo o que eles intentarem fazer. Eia, desçamos e
confundamos ali a sua língua, para que não entenda um a língua do outro. Assim o Senhor os espalhou
dali sobre a face de toda a terra; e cessaram de edificar a cidade. Por isso se chamou o seu nome Babel,
porquanto ali confundiu o Senhor a língua de toda a terra, e dali os espalhou o Senhor sobre a face de
toda a terra. (Gênesis 11,1-9)

3) A transmissão ou bênção iniciática

EXEMPLO DA BÍBLIA: Porque este Melquisedeque, que era rei de Salém, sacerdote do Deus
Altíssimo, e que saiu ao encontro de Abraão quando ele regressava da matança dos reis, e o abençoou; A
quem também Abraão deu o dízimo de tudo, e primeiramente é, por interpretação, rei de justiça, e depois
também rei de Salém, que é rei de paz; Sem pai, sem mãe, sem genealogia, não tendo princípio de dias
nem fim de vida, mas sendo feito semelhante ao Filho de Deus, permanece sacerdote para sempre.
(Hebreus 7,1-3)
E Melquisedeque, rei de Salém, trouxe pão e vinho; e era este sacerdote do Deus Altíssimo. E
abençoou-o, e disse: Bendito seja Abrão pelo Deus Altíssimo, o Possuidor dos céus e da terra; E bendito
seja o Deus Altíssimo, que entregou os teus inimigos nas tuas mãos. E Abrão deu-lhe o dízimo de tudo.
(Gênesis 14,18-20)

EXEMPLO AMERÍNDIO: Foi na imensa e fértil região das águas de montanhas e areias, que vem
do Espírito Santo até o Rio de Janeiro, que apareceu Sumé, o venerando velho, pai da agricultura, cuja
memória foi tão criminosamente perdida pela ingratidão dos homens.
Nessa larga faixa de terra, cujos cabos e promontórios rochosos invadem o mar, quase tocando
ilhas fecundas, que verdejam ao sol, entre bancos de areia, — vivia um povo forte e valente, respeitado na
paz e temido na guerra. Eram os Tamoios, cujas canoas guerreiras dominavam a costa, desde o cabo de S.
Tomé até Angra dos Reis, guardando as aldeias, formadas de cabanas sólidas, cercadas de altas

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paliçadas inexpurgáveis. Quando as tribos vizinhas ousavam invadir a seu território, — o canto
do pajé concitava os filhos da grande nação. E, ao som dos chocalhos de pedras, das buzinas de madeira,
dos tambores e das flautas de taquara, — os grandes exércitos tamoios abalavam em hostes cerradas,
para repelir o invasor. E a nação não descansava, enquanto os inimigos não fugiam ao valoroso embate
das suas armas de gloriosas, — maças pesadas feitas de lenho de palmeira, formidáveis machados chatos
de madeira vermelha, flechas agudas, arcos da altura de um homem. Mais de uma vez, assim, os
Goitacazes e Goianazes tiveram de ver castigada a sua ousadia. Quando a guerra findava, toda a tribo
comemorava com grande festa a vitória de seus filhos. E a música e a dança celebravam, em torno dos
prisioneiros que tinham de ser comidos vivos, a derrota dos inimigos. Depois vinha de novo a livre e
arriscada existência da paz, — a pesca, nas canoas ligeiras que voavam como as aves do mar à flor das
águas, e a caça dentro dos matos bravos, povoados de feras.
Ora, um dia, em que uma grande multidão da tribo, à beira-mar, estava reunida, celebrando uma
vitória, — viram todos que sobre o largo oceano, vinha, do lado em que o sol aponta, uma grande figura,
que mais parecia de deus que de homem.
Era um grande velho, branco como a luz do dia, trazendo, espalhada no peito, como uma toalha
de neve, até os pés, uma longa barba venerável, cuja ponta roçava a água do mar. E houve um grande
espanto entre os Tamoios, vendo assim um homem, como eles, caminhar sem receio sobre as ondas como
sobre terra firme.
Era Sumé, enviado de Tupã, senhor do Céu e da Terra. E Sumé operava prodígios nunca vistos.
Diante dele, os matos mais cerrados se abriam por si mesmos, para lhe dar passagem: a um aceno seu,
acalmavam-se os ventos mais desencadeados: quando o ma furioso rugia, um simples gesto de sua mão
lhe impunha obediência. A sua presença fazia abaterem as tempestades, cessarem as chuvas, abrandarem
as secas. E até as feras quando o viam, vinham submissamente lamber-lhe os pés, arrastando-se, de rojo,
na areia. E os Tamoios, cativos de sua bondade, conquistados pelo assombro dos seus milagres, tomaram
Sumé para seu conselheiro. E todas as tardes, os chefes adiantavam-se para ele, — enquanto em roda,
mulheres, homens e crianças paravam a escutar, — vinham contar-lhe a história de seu povo, e interrogá-
lo sobre as suas crenças, e pedir-lhe conselhos e lições.

INICIAÇÃO sf (latim: iniciare, “introduzir”, derivado de in-, “dentro” + ire, “ir”). Literalmente:
ser recebido ou admitido; ir para dentro de um círculo ou grupo. É iniciado quem não só “aufere” a
Tradição, mas também se vê integrado na cadeia invisível que a mantém. Não se deve confundir iniciação
com metanóia.

METANÓIA sf (grego: meta, “além” + noos, “mente”) Em geral se traduz a palavra metanóia como
“arrependimento”, mas literalmente significa uma mudança de pensamento, de atitudes, de caráter;
revelação. É uma transformação interna que pode ser catalisada pela iniciação.

CADEIA INVISÍVEL sf (latim: catena, “corrente”). Nome que se dá à conexão sequencial


(encadeamento) de elementos em sintonia com a Tradição, que estabelecem uma ligação com o estado
original da Humanidade. Isso se dá através de um rapport. Os elementos da cadeia podem ser físicos
(depositários da mesma tradição, ordens, linhagens, castas, etc.) ou metafísicos (antepassados, mestres
desencarnados, espíritos, totens, santos, anjos, deuses, etc.). Esta cadeia obedece a princípios similares
aos do circuito elétrico, onde cada “elo” tem função de carga, o rapport a função de condutor e a egrégora,
de fonte. Eventualmente os elos e a egrégora podem trocar de função “energética”.

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Portanto nós também, pois que estamos rodeados de uma tão grande nuvem de testemunhas,
deixemos todo o embaraço, e o pecado que tão de perto nos rodeia, e corramos com paciência a carreira que
nos está proposta. (Hebreus 12:1)

4) Dinâmica iniciática

SINTONIA sf (grego: syntonos, “estirado junto”, derivado de syn-, “junto com” + tonos,”alongar”)
Refere-se ao que vibra na mesma frequência que outro.

ENERGIA sf (grego: energia, “operação, atividade, trabalho”, derivado de en-, “em” + ergon,
“ação”). Força capaz de manipular uma ação. Há vários tipos de energia. Aquela à qual nos referimos se
denomina luz astral.

LUZ ASTRAL sf Princípio mais elevado do “Iliaster”, que se espessa ao redor dos centros de
consciência do corpo humano (“chakras”), interconectando-os.

ILIASTER sm (do grego: hylé, “matéria” + o latim: astrum, “estrela”) Termo paracelsiano que
indica a matéria-prima, ou seja, o componente fundamental do cosmo, que promove o crescimento e a
multiplicação das formas através de sua própria condensação (geração de massa). Comparar com João
1:1-5.

RAPPORT sm (francês: rapporter, “trazer de volta”, derivado de re-, “novamente” + apporter,


“trazer) Refere-se à ligação de duas ou mais pessoas por laços de empatia. Pode ocorrer por vários meios
(ensinamentos, contato físico, rituais, etc.), mas sempre envolvendo uma sintonização energética entre as
partes.

EGRÉGORA sf (derivado do grego: grex, “rebanho, manada, grei, reunião”; talvez composto com
gregoreo, “vigilante”) Paracelso cunhou o termo “aquastor” para se referir a uma entidade formada por
intensa concentração do pensamento humano, similar ao conceito tibetano de “tulpa”. A egrégora é um
aquastor coletivo: uma condensação de luz astral pela sintonia de uma cadeia invisível, que se torna tão
complexa a ponto de demonstrar certa autonomia e agir como um ser livre. Essa ideia da relativa
independência egregórica tem alguma similaridade com a teoria dos memes de Dawkins. Também fala-se
“egrégoro”, sm.

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EGRÉGORA

Rapport

Partiu, pois, Elias dali, e achou a Eliseu, filho de Safate, que andava lavrando com doze juntas de
bois adiante dele, e ele estava com a duodécima; e Elias passou por ele, e lançou a sua capa sobre ele.
(1 Reis 19:19)

A egrégora é
constituída pela
projeção do ideal
do grupo, sendo
tanto mais forte
quanto este é
coeso e
intermitente, e
personifica a
própria Cadeia
Invisível.

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5) Conclusão

 A iniciação é o método pelo qual a Tradição (ou tradição substituta) é transmitida e perpetuada
em nosso tempo.
 A iniciação pode ou não produzir metanóia, da mesma forma que a metanóia pode se produzir
sem iniciação.
 O mecanismo iniciático exige um rapport através do qual o candidato entra em sintonia com a
egrégora tradicional.

6) Sugestões de leitura

MARTIN LINGS. Sabedoria tradicional e superstições modernas (Polar Editorial).

JEAN TOURNIAC. Melquisedeque ou a Tradição Primordial (Madras).

RENÉ GUÉNON. O Reino da Quantidade e os sinais dos tempos (Instituto René Guénon de
Estudos Tradicionais).

FULCANELLI. Finis gloriae mundi (Pensamento).

ANNIE BESANT, C. W. LEADBEATER. Formas de pensamento (Pensamento).

C. A. TORRES PASTORINO. Técnica da mediunidade (Sabedoria).

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