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RESENHA
“O Príncipe que virou sapo - Considerações à respeito da dificuldade de aprendizagem das crianças na
alfabetização”, Luiz Carlos Cagliari.
Raquel Pessanha de Oliveira Garcia
Matrícula: 201308058691
Estágio - Psicologia Escolar.
Professora - Fátima Uhr
8 de outubro de 2018
O texto de Cagliari origina-se a partir de dois artigos sobre o desenvolvimento infantil valendo-se de um
debate através do raciocínio Piagetiano. Expressa-se, inicialmente, com a consideração e conscientização
do valor significativo da fase vivida no período escolar, bem como todo o processo de alfabetização.
Destaca-se a relação do aprender na vida com o aprender na escola, bem como a temática acerca do
quanto o processo sócio-cultural impregna os processos educacionais, principalmente nas crianças
marginalizadas e menos favorecidas.
O autor explicita o quanto o assunto possui contribuições acadêmicas e como isto favorece seu
entendimento, do mesmo modo que o torna complexo a ponto de se fazer necessário ensaios
multidisciplinares para atingir o objetivo proposto. Objetivo este iniciado a partir de um posicionamento
pessoal acerca do tema que entende como carecido de explicações, este citado como uma problemática
advinda da linguística. Traz ao debate a Síndrome da Deficiência de Aprendizagem (SDA) e causas
associadas a ela.
Seguindo a linha de raciocínio, Cagliari traz à margem a discussão piagetiana sobre a ontogênese da
cognição, citando exemplos que mais tarde julga necessitar de ponderações, tais quais a básica humana
que é viver e desvendar o mundo, e como o fazemos de uma forma ou de outra, invariavelmente. Por si só, o
ciclo da vida, embora seja ele único e paradoxal, pertence ao indivíduo e como este se relaciona com o
mundo. Atribui-se a ideia de que o homem ao nascer interage, sente, manipula o ambiente, raciocina e fala,
de modo natural em um processo cognitivo gradualmente adquirido - e elaborado.
Traz a reflexão sobre como as crianças são facilmente rotuladas como deficientes, enquanto o adulto -
dentro de um contexto similar - possui diversas justificativas que corroborem sua falha e/ou dificuldade.
“Para as crianças existem as regras, para os adultos as exceções!” finaliza com o pensamento. Por si só,
segue o autor, a linguagem já é uma das mais difíceis construções do ser humano, de alta complexidade
devido a todas as suas manifestações e, sabendo-se disto, Cagliari questiona se a criança que fala, porém
não atinge o estágio lógico-formal dentro do tempo devido, pode ser considerada deficiente. Estabelece,
neste segmento, que engessar o julgamento sobre a capacidade de uma criança somente ao que esta
realiza na escola é pouco inteligente, pois a vida - em seu significado amplo - é muito maior que a realidade
restrita do aluno dentro de uma escola.
De fato suprimir a ideia de inteligência à linguística parece injusto e unilateral. O texto traz esta reflexão
sobre brilhantes jogadores de bola, mas que em um momento se questionados sobre o que fazem, como
fazem e por quê fazem (valendo-se da linguística para tal) este deixa de ser um astro para se reduzir a um
ignorante. Portanto, a linguagem é complexa, mas não deve ser margem de conclusão para a inteligência de
qualquer indivíduo. “A habilidade linguística e a habilidade manual são coisas muito diferentes na sua
natureza, mas ambas servem igualmente como expressão da inteligência humana.”
No desenrolar do texto o autor apresenta sua visão sobre as dificuldades vivenciadas pelas crianças no
momento da aprendizagem, bem como na execução de tarefas direcionadas por seus professores. É
notável como há razão no discurso de Cagliari, pois, de fato, muito se dá pela falha de comunicação, uma
falha linguística. Muito do que não é respondido como desejado pelos menores não é pela deficiência
cognitiva ou qualquer dificuldade motora, mas sim porque não compreendem os motivos de tais
experimentos.
“Não é o luxo que produz gente inteligente, nem a pobreza que produz gente ignorante.” A frase se dá
mediante toda a estruturação crítica do autor acerca do potencial existente em qualquer criança, isto
porque se prevalece da condição humana - e as habilidades inatas como falar e andar, ainda que a mesma
não as faça. Isto não quer dizer que nunca saberá ou que, por fazer errado, possui um déficit a ser tratado.
Existem formas subjetivas da estruturação do e uso do abstrato e concreto que não devem ser, de fato,
estipulados por teorias limitantes como a da ontogênese cognitiva.
Há sim limitação na pobreza, porém não a inteligência. Esta não está atrelada ao núcleo econômico do
indivíduo. Mesmo que fuja aos padrões institucionalizados, é necessário ter uma visão mais alongada para
definir se uma criança possui, realmente, uma deficiência ou se está apenas se expressando de modo
É notável, no texto, o quanto Cagliari se coloca ao lado das questões sociais e como isto influencia sua
visão sobre o ser humano, de como isto o humaniza no julgamento científico. Embora tenha conhecimento
linguístico e domine as técnicas da argumentação, o autor é inclusivo e trabalha na disseminação de ideias
que proponham o mesmo, que emergem na consciência do leitor uma visão holística do ser humano
marginalizado. Do preconceito linguístico, da distanciação do pobre e a marginalização interpessoal. A
ciência se mostra favorável à discriminação e é preciso um olhar atento mediante essa reflexão, para que
nossos julgamentos pessoais não se assemelhem à isto.
A instituição escolar é vista pelo autor como a doente, muito mais vezes do que a criança diagnosticada
com SDA. Atribui-se ao formato restritivo de aprendizagem a dificuldade de gerar e propagar um
conhecimento universal. De trabalhar as potencialidades do sujeito em suas mais diversas formas, não
somente na preocupação de ensinar o bê-a-bá. Assim o autor estabelece que a padronização para o ensino
é prejudicial, pois a vida pregressa do aluno conta muito em seu interesse de realizar as tarefas.
Uma criança que já teve acesso ao livro, lápis, contos ou desenhos naturalmente parecerá atrasada em uma
classe que trabalha apenas com massinhas coloridas. A falta de estímulo é fator agravante no
distanciamento e nos erros cometidos pelos alunos, pois estes não se sentem desafiados ou sequer se
vêem diante de uma situação nova e atraente o bastante para propagar a onda de interesse necessário para
realizar as tarefas. É necessário uma reformulação nas condutas dos profissionais escolares, para que
estes possam avaliar a criança exclusivamente e adequar sua interação de acordo com a demanda que
aquela criança traz.
Na conclusão, Cagliari cita sobre as questões materiais que podem ou não favorecer as manifestações
devidas, corroborando sua ideia de que estas não destroem e limitam qualquer coisa. O fato de uma criança
conseguir estabelecer um vínculo com o seu meio e através disto interagir linguisticamente com ele já a
torna uma criatura altamente sofisticada cognitivamente.
“Na escola, ensinar é um ato coletivo, mas aprender é um ato individual.” A falta de visão das instituições
de ensino prejudicam na interpretação, tornando-a generalista, ao invés individual. O que é prejudicial ao
aluno e sua formação, pois, ainda que sejam indivíduos de mesma faixa etária, cada um aprende de uma
forma. Tornou-se uma desculpa confortável assumir que a dificuldade de aprendizado se dá pelo problema
no aluno e não na formulação pedagógica praticada em sala de aula. É mais fácil pôr a culpa no outro do
que assumir os erros de escolhas mal feitas.