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DOSSIÊ IPHAN {Festa de Sant’Ana}

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DOSSIÊ IPHAN {Festa de Sant’Ana}

DOSSIÊ IPHAN {Festa de Sant„Ana de Caicó}

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DOSSIÊ IPHAN {Festa de Sant’Ana}

PRESIDENTE DA REPÚBLICA
SUPERINTENDENTE IPHAN-RN
Luiz Inácio Lula da Silva Jeanne F. Leite Nesi
FOTOGRAFIAS ANTIGAS
MINISTRO DA CULTURA
João Luiz Silva Ferreira Acervo Digital – Museu do Seridó
PRESIDENTE DO IPHAN FOTOGRAFIAS
Luiz Fernando de Almeida
Maria Iglê de Medeiros (fotos)
PROCURADOR-CHEGE FEDERAL
Antônio Fernando Alves Neri Vilma Vitor Cruz (fotos)

DIRETORA DO DEPTº DE PATRIMÔNIO IMATERIAL


Márcia Genésia de Sant'Anna

CONSULTORIA IPHAN – INVENTÁRIO

Romero de Oliveira COORDENADORES DO INRC – SERIDÓ POTIGUAR

Marcos Vinícius Garcia Julie Cavignac (Formas de Formas de Expressão)

COORDENAÇÃO GERAL DO INVENTÁRIO DA CULTURA DO Muirakytan Kennedy (Celebrações)


SERIDÓ
Maria Isabel Dantas (Ofícios e Modos de Fazer)
Julie Cavignac (DAN/UFRN)
Paula Sônia de Brito (Lugares)
Jeanne F. Leite Nesi (IPHAN/RN)
CONSULTORIA EM ANTROPOLOGIA

Cyro H. de Almeida Lins

CONSULTORIA EM HISTÓRIA

Ana Cristina Oliveira

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PESQUISADORES (BOLSISTAS) Gracineide Pereira dos Santos Thaís Fernanda S. De Brito

Ana Nery Silva de Oliveira Gilson José R. Junior Helder Almeida

Flávio Rodrigo F. Ferreira Helder Macedo FOTOS DE CAPA E CONTRA CAPA

Túlio Gabriel de Cortês José Antônio F. De Iracema Nogueira Batista Capa: Imagem de N.S. de Sant‟Ana durante a
Melo procissão (Foto: Acervo do IPHAN)
Juarez de Brito M. Junior
Contra-capa: Detalhe do Arco do Triunfo da Igreja
Luis Eduardo de N. Neto Matriz (Foto: Acervo do IPHAN)
PESQUISADORES (COLABORADORES)
Maria Dolores de A Vicente
Andréa Lúcia V. De Aguiar
Maria Lúcia B. Alves INSTITUTO DO PATRIMÔNIO
Alessandro A de Azevedo HISTÓRICO E ARTÍSTICO NACIONAL -
Maria Isabel Dantas Marcelo de Freitas IPHAN
Andrey Jonathon de M. Morais Cardoso
SBN Quadra 2 Bloco F Edifício Central
Ana Zélia Maria Moreira Custódio Olívia Morais de M. Neta Brasília
Cep: 70040-904 Brasília – DF
Jacinto de Medeiros Paula Sônia de Brito Telefones: (61) 3414.6176, 3414.6186,
3414.6199
Erivan Ribeiro de Faria Rosenilson da Silva Santos Faxes: (61) 3414.6126 e 3414.6198
http://www.iphan.gov.br
Francimário Vito dos Santos Sebastião Genicarlos dos Santos
webmaster@iphan.gov.br

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EDIÇÃO DO DOSSIÊ E EDIÇÃO DE TEXTO FINALIZAÇÃO DO DOSSIÊ


Cyro H. de Almeida Lins
José Antônio F. De Melo Ana Cristina Oliveira
Cyro H. de Almeida Lins
REVISÃO DE FICHAS
Ana Cristina Oliveira
Ana Cristina Oliveira
TEXTO DE ABERTURA
Cyro H. de Almeida Lins
Romero de Oliveira (IPHAN-PE)
AGRADECIMENTOS
TEXTO PRINCIPAL
Diocese de Caicó
Paróquia de Sant'Ana de Caicó
Ana Cristina Oliveira
Museu do Seridó e Casa de Cultura de Caicó
Cyro H. de Almeida Lins
Zezinho Vídeo
Julie Cavignac
Lydia Brito
Maria das Dores Medeiros
Fábrica Murielle
Maria Isabel Dantas
Tarcisio Salustiano Silva
Marta Maria de Araújo
Site Kurtição
Muirakytan Macedo
SEBRAE-CAICÓ
Paula Sonia de Brito
REDESIST/IE/UFRJ
Romero de Oliveira
Associação dos Caminhoneiros de Caicó

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APRESENTAÇÃO

Caicó é o maior município do


comunidade caicoense e seridoense, Estes elementos, associados a muitos
numa troca coletiva de experiências outros, compõem uma espécie de
culturais e de fé. Apesar de seu caráter contexto cultural sertanejo, gestado
Seridó e a sua povoação começou na
eminentemente religioso, a Festa de durante séculos, no transcorrer de um
Fazenda Penedo, em 1735. O município
Sant‟Ana aglutina elementos diversos processo que envolveu, sobretudo,
está localizado na região centro-sul do
da cultura sertaneja, incluindo a populações ibéricas e ameríndias,
estado e fica distante cerca 269 km da
indumentária (bordados, chapéus), a principais fontes do amálgama humano
capital e possui cerca de 60.000
culinária (chouriços, filhoses, ali observável. A Festa de Sant‟Ana
habitantes.
buchadas), o artesanato (fabricação de possui ainda um forte componente
A Festa de Sant’Ana de Caicó
imagens, trabalhos com couro e produtor de sociabilidades, já que gera
é um bem cultural da mais alta
madeira), e as mais diversas formas de um clima de revisitação de uma
importância para a vida dos sertanejos
expressão (como a arte de enfeitar memória que, em termos oficiais, já
do Rio Grande do Norte, e para pessoas
altares e andores e ritos como o “beija”, conta com mais de dois séculos e meio
que, vindas das mais diversas partes do
estabelecendo-se uma relação afetiva ininterruptos, mesmo nos anos de fortes
Brasil e do mundo, afluem para o
com a imagem da Santa). Ela também secas (como nos fins do século XIX).
Seridó Potiguar no período da Festa.
reforça a existência de lugares
São filhos da terra vivendo em lugares
sagrados, como o mítico poço de
distantes, pagadores de promessa,
Sant‟Ana (o “poço que nunca seca”) e
pesquisadores, curiosos, juntando-se à
o local onde hoje se encontra a matriz.
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Introdução do Seridó e, finalmente, Caicó.1 Possui cultura seridoense. A Festa torna–se


expressividade regional nos setores relevante do ponto de vista cultural,
A Festa de Sant’Ana de Caicó: agropecuário, educacional e cultural histórico e social, pois é um dos

uma tradição viva com destaque para o artesanato de principais veículo da memória e da
bordados, comidas e bebidas típicas. identidade coletiva, em especial os
Celebrada há 259 anos, a Festa de relacionados com as expressões ligadas
Sant‟Ana, realizada entre o final de à fé católica.
Localizada no semi-árido da julho e início de agosto, destaca-se
entre as múltiplas festas de padroeiro
região do Seridó Norte-Riograndense, a por revivificar os laços de solidariedade
atual “capital do Seridó” teve a sua e acionar registros específicos da
origem em 1687 com a construção da
casa Forte do Cuó e, em 1735, com o
1 De acordo com Câmara Cascudo (1955), a origem
do nome Caicó é indígena. Entre as versões existentes,
povoamento da Fazenda Penedo, o nome Caicó seria formado a partir dos termos Acauã
posteriormente denominada Vila Nova e Cuó que servem à designação de acidentes geográficos
(rio e serra, respectivamente) da região. Acauã
do Príncipe. Em 1890, elevou-se à
pertence ao idioma tupi, enquanto Cuó, à língua dos
categoria de cidade, recebendo os Tapuias ou Tarairiús. As populações indígenas
identificavam ainda o rio pelo nome de "quei", o que
nomes de Cidade do Príncipe, Cidade
sugere que Caicó seja uma corruptela de "Queicuó", o
mesmo que rio do Cuó (Macedo 2005; 2007: 41;).

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Senhora Doce e Clemente,


Mãe da graça e do perdão
Abrigai-nos docemente,
Dentro em vosso coração!

Salve, Sant'Ana gloriosa,


Nosso amparo e nossa luz
Salve, Sant'Ana ditosa,
Terno afeto de Jesus.

Vossos filhos desta terra


Vos suplicam que sejais
O seu refúgio na guerra
E sua alegria na paz.

(Hino de Sant’Ana . Letra: Palmyra e Carolina Wanderley


Música: Manoel Fernandes)

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SUMÁRIO
A HISTÓRIA 43 A MISSA DE ENVIO DAS IMAGENS E OS 87 TRANSFORMAÇÕES RECENTES:
PEREGRINOS DE SANT’ANA ENCONTRO DE GERAÇÕES, A ILHA DE
06 APRESENTAÇÃO SANT’ANA
49 E COMEÇA A FESTA! ABERTURA
07 INTRODUÇÃO OFICIAL DA FESTA DE SANT’ANA 95 PROFISSIONALIZAÇÃO DA FESTA DE
SANT’ANA
11 A LENDA DO VAQUEIRO E A CRIAÇÃO 52 PAVILHÃO E FEIRINHA DE SANT’ANA
DA CIDADE DE CAICÓ: PRIMÓRDIOS DA A FESTA DE SANT’ANA
CELEBRAÇÃO NOS SÉCULOS XVII E XVIII 56 A CAVALGADA E A CARREATA DE
SANT’ANA: TRADIÇÃO E MODERNIDADE
COMO OBJETO DE
18 A CONSTRUÇÃO DA CAPELA JUNTAS REGISTRO
PRIMITIVA E IGREJA MATRIZ: A
CONSOLIDAÇÃO DA FÉ EM SANT’ANA 59 MISSA SOLENE, O BEIJA DA IMAGEM 103 ELEMENTOS ESSENCIAIS PARA A
DE SANT’ANA E A PROCISSÃO EXISTÊNCIA DA FESTA
24 A PASSAGEM DO VISITADOR GERAL E
A PROIBIÇÃO DAS CELEBRAÇÕES 69 BAILES, BANQUETES E REENCONTROS: 106 CONCLUSÃO
NOTURNAS BAILE DOS COROAS E FESTA DA
108 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
JUVENTUDE
28 ENFIM, A MODERNIDADE: O
73 CELEBRANDO REENCONTROS ANEXOS
PROGRESSO E SUA INFLUÊNCIA

76 ARTESANATOS E COMIDAS FESTIVAS: 116 ANEXO 1 – MAPAS E CROQUIS DA


A FESTA HOJE UM PASSEIO PELOS COSTUMES DO FESTA DE SANT’ANA

39 A ATUAÇÃO DA PARÓQUIA: SERIDOENSE


118 ANEXO 2 - LINHA DO TEMPO
ORGANIZAÇÃO E GESTÃO DA FESTA DE
SANT’ANA 120 ANEXO 3 – ÍNDICE DE ILUSTRAÇÕES

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A HISTÓRIA

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responsável pela construção dessa que, ao adentrar numa densa mata


identidade do povo seridoense. É sagrada, morada de um deus indígena,
difícil, porém, separar com precisão o se viu repentinamente atacado por um
que é mito do que é história na devoção touro bravo. Diante de tão grande
do povo seridoense a senhora Sant‟Ana. perigo, o tal vaqueiro fez um voto à
O que se sabe sobre o surgimento dessa
prática devotiva, é que ela está
associada à criação da cidade de Caicó,
que por sua vez também estava muito

A senhora Sant‟Ana para o mais ligada aos interesses da coroa


portuguesa em colonizar o interior do
Brasil. Por toda uma tradição oral e
povo seridoense representa não apenas
escrita, sabe-se que o surgimento do
a fé, mas também a tradição e, mais
lugar Caicó está associado à construção
recentemente a modernidade, ela é,
de uma capela votiva dedicada à santa.
antes de tudo símbolo de identidade e
Por essa tradição, conta-se e reconta-se
união do povo, sua festa, aparece como
que ela foi erguida por um vaqueiro
um grande evento cultural e social,
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Senhora Sant'Ana de erguer uma igreja, comandante das tropas militares e seus Seridó pela fé do vaqueiro e do senhor
se ela o livrasse da fúria incontida ajudantes que combatiam alguns índios (sesmeiro e comandante de tropas) que
daquele animal selvagem. Salvo que haviam se rebelado. Segundo a adentraram nessas terras pelos
milagrosamente pela Santa, tratou logo cultura local, foi um milagre que “caminhos das águas,” rasgando as
de cumprir sua promessa. Os trabalhos motivou a entronização da Senhora distâncias para desafiar o intrincado da
de edificação foram iniciados. Ano de Sant´Ana naquela capelinha, erguida caatinga e o solo de pedregulhos,
seca sob sol escaldante, a única fonte de sem ostentação, em meio a pedras e áspero e cortante.
água disponível era a de um poço no leito cactos da vegetação nativa, já os Em 1683 foi construída a Casa
do Rio Seridó. Novamente, o vaqueiro estudiosos referem-se à popularidade da Forte do Cuó, origem da Cidade de
clamou pela intercessão da Santa, que santa entre os colonos brasileiros, com Caicó. Os alicerces desta construção
operou mais um milagre: impediu que o
culto público celebrado em templos ainda se conservam no Sítio Penedo.
poço secasse. Agradecido, passou a
religiosos e devoção privada dentro dos Esta Casa Forte foi construída por
denominá-lo de Poço de Sant´Ana e este,
lares, em volta dos oratórios iniciativa do Coronel Antônio de
segundo conta a tradição local, nunca mais
domésticos. Modelo de Mãe e Mestra Albuquerque da Câmara, um dos
secou, mesmo quando haviam longas
estiagens. exemplar, Sant‟Ana era tida como primeiros sesmeiros da Região do
padroeira dos mineiros, marceneiros, Seridó, densamente habitada pelos
A história oficial nos conta que indígenas Tapuios (Janduís, Canindés e
proprietários de terras (espargindo
essa primitiva Capela foi erguida em Pegos ou Paccas). Quando começaram
benções sobre as fazendas) e defensora
1695, nas proximidades da Casa Forte a implantação das Fazendas de gado
das mulheres casadas, ao protegê-las da
do Cuó (ou Acauã), mais ou menos nesta região, os indígenas reagiram
morte súbita de seus maridos. Essa
entre os anos de 1683 e 1697, pelo iniciando, dessa forma um conflito que
devoção venerável foi introduzida no
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ficaria conhecido como a Guerra dos do Arraial – que deveria chamar-se e expostos criminosos), que era o
Bárbaros (1683-1713), travada entre os Queiquó – ocorreu em 1700, porém, símbolo da autoridade da Coroa e a
indígenas e os colonizadores que aqui somente em 07 de julho de 1735 na bênção pelo Padre Messias José Pereira
chegaram para iniciar o processo de Fazenda Penedo, foi instalada da imagem de Sant'Ana. Esta antiga
interiorização dos domínios imagem de Sant'Ana,
da coroa de Portugal. Assim, doada pelo cearense
em meados do século XVII, Luiz da Fonte Rangel,
a coroa portuguesa daria, por encontra-se de pé, até
fim, início ao processo de hoje no nicho lateral da
interiorização da Capitania Catedral de Sant‟Ana,
do Rio Grande, concedendo tombada pelo IPHAN
doações de terras – desde 1962. A
Sesmarias – que eram solenidade foi na Praça
destinadas basicamente a da Capela e da Casa da
criação de gado. A Suplicação (Casa da
construção de uma capela Fazenda). Em 1788 a
dedicada à Sant‟Ana fez povoação seria elevada
com que as pessoas que já à categoria
oficialmente a Povoação do Caicó, com
freqüentavam o local, pudessem fazer administrativa de Vila, e quase um
a colocação do pelourinho (colunas de
sua morada na terra. Segundo o século depois transformada em
pedra colocadas em lugar público
historiador Helder Macedo, a fundação Município, mais precisamente em 1868.
da cidade ou vila onde eram torturados
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Quanto ao nome da cidade “Caicó”, não designavam o pássaro que dava nome que comprove a existência dessa tribo
se sabe ao certo sua origem, o que ao rio e à região. Considerando a na região.
podemos afirmar é que existem várias partícula "quei", como sendo "rio", rio A religiosidade é um marco
versões. No dicionário da língua Tupi- Acauã seria o mesmo que "Queicuó", e característico do povo seridoense, a
Guarani, por exemplo, deriva da língua posteriormente se tornaria Caicó. vivência dessa religiosidade, refletia um
Cariri e significa "Mato Ralo". Alguns Porém, a versão mais aceita é a do forte grau de conformação a
historiadores acreditam que a região foi folclorista Luiz da Câmara Cascudo o providencia celestial, a quem se atribuía
habitada pelos índios Caiacós, da qual, fala que o nascimento do nome a abundancia das chuvas ou os rigores
família dos Cariris, e que os mesmos Caicó vem dos nomes "Acauã" e da seca, portanto, para o povo tudo
denominaram a região de Cai-icó, que "Cuó", que designam dois acidentes estava nas mãos de Deus. A fé e a
significaria "macaco esfolado" por geográficos (rio e serra, confiança na força sobrenatural da avó
causa dos serrotes cuja vegetação era respectivamente). "Acauã" pertence a de Jesus podem ser percebidas nos
desmatada. Já o pesquisador Olavo de língua Tupi, enquanto "Cuó" ao dialeto nomes de algumas cidades, serras ou
Medeiros Filho, diz que o nome vinha dos Tapuias e Tarairius. Tais tribos construções que compõe a região do
de uma ave agourenta, comedora de ainda identificavam o rio pelo termo Seridó Potiguar – Serra de Santana, Ilha
cobras e que havia em abundância no "quei", o que sugere que Caicó seja de Santana, Poço de Santana, Barra de
curso d'água que passava próximo a uma derivação de "Queicuó", o mesmo Santana, Santana do Seridó – ou nos
casa-forte do cuó, chamado rio Acauã. que rio do Cuó. Essa teoria desmistifica lugares habituais de culto: igrejas,
Os nomes "acauã" e "cuó" seriam a lenda que relata a existência de uma capelas e oratórios a ela dedicados,
sinônimos, a primeira forma em tupi e a tribo chamada Caiacós, supracitada, cujos estudos nos revelaram as
segunda em tarairiu, e ambas as formas pois não há registro histórico algum, devoções, atos religiosos e festivos dos

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povoadores do Seridó antigo e seus por alguns historiadores locais que da Casa de Suplicação, em 7 de julho
descendentes. consideram um equívoco de interpretação de 1735. Após o rito litúrgico, a
atrelar a primeira Festa à instalação da população beijou a imagem da santa,
Ao interpretar os postulados que Freguesia. Se, no ano de 1699, foram cujo gesto religioso exprimiu a
tecem os alicerces dessa prática concedidas indulgências à Capela de reverência para com o “objeto”
devocional, um questionamento se Senhora Sant´Ana do Acauã (ou Cuó), se investido de sacralidade; ao mesmo
impõe: em qual ano começou a ser havia uma população, mesmo pequena, tempo, a renovação do fervor
celebrada a Festa da Senhora Sant´Ana que se movia em torno do Arraial e,
devocional que se inscreve no culto
de Caicó? Há uma tendência em ainda, se os curas do Piancó prestavam
coletivo para com a protetora do lugar.
considerar-se a primeira Festa quando da assistência espiritual e religiosa aos
Assim, se a nota geral da religiosidade
instalação solene da Freguesia, com título moradores da Ribeira do Seridó, sem
dos católicos, naqueles tempos era dada
e invocação de Sant´Ana do Seridó, pelo dúvidas, a Festa foi celebrada desde o
pelas festas, é evidente que os núcleos
padre Francisco Alves Maia, em 26 de início do setecentos.
urbanos cultuavam festivamente os
julho de 1748. Naquele mesmo dia, o Mais um indício, não menos
santos titulares de suas igrejas e
primeiro padre da Freguesia e as pessoas impactante, emerge da documentação
“de melhor nota” escolheram um novo capelas. E, em Caicó, não foi diferente.
para emprestar aos historiadores os
lugar para a construção da Matriz (atual Essa corrente vem tomando cada dia
elementos que lhes asseguram afirmar a
Catedral) e da residência do vigário, uma mais corpo entre alguns religiosos
celebração dos festejos antes de 1748.
vez que a primitiva Capela havia sido estudiosos dos festejos de Sant‟Ana no
Durante a cerimônia pública para
construída em terreno acidentado, o que Seridó, embora ainda não haja fontes
instalar a Povoação do Caicó, o padre
dificultava o acesso de pessoas idosas. cabíveis que comprovem tal fato. Nesse
Messias José Pereira celebrou uma
Todavia, essa data vem sendo contestada sentido, indaga-se ainda: qual a
missa na Praça da Capela de Sant´Ana e
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DOSSIÊ IPHAN {Festa de Sant’Ana}

composição do cerimonial para deve ter acontecido com a presença com a imagem da Santa. O cortejo
exaltação de Senhora Sant´Ana, obrigatória dos poucos moradores do provavelmente foi formado pelo
celebrado em Caicó, nas primeiras lugar e de seus arredores até uma légua sacerdote, seguido pelos agricultores,
décadas do século XVIII? Mesmo que de distância, conforme determinavam criadores e vaqueiros instalados na
ainda hajam lacunas a serem as Ordenações do Reino. Pelo Ribeira do Seridó, acompanhados pelos
preenchidas nas fontes oficiais, é cerimonial instituído pela Igreja moradores do Arraial que,
possível vislumbrar as primeiras Católica, os atos litúrgicos compungidos ou alegres, formulavam
manifestações festivas se for possivelmente envolveram repiques de as suas preces em meio aos cânticos
considerado o contexto histórico e sino, iluminação da capela, missas, religiosos.
religioso daquela época. A realização récita de orações, tendo como ponto
de um tríduo religioso, pelo menos, alto a procissão conduzindo o andor

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DOSSIÊ IPHAN {Festa de Sant’Ana}

criada a capela primitiva, em 1695. visitador Manoel Machado Freire criou


Após ser firmado o Tratado de paz a nova Freguesia de Sant‟Ana de Caicó,
entre brancos e indígenas, (a guerra cumprindo um decreto feito no dia 20
continuou em outras localidades até o de fevereiro de 1747, fazendo assim
Século XVIII), foi possível a com que a Freguesia se tornasse enfim,
construção da Capela de Sant'Ana, paróquia independente. Em Julho de
erguida próxima à Casa Forte pelo 1748, o padre Francisco Alves Maia,
Comandante e subordinados da Casa primeiro vigário de Caicó, ergueu um
Forte do. Cruzeiro, que daria início a construção
A edificação da capela, foi da atual Catedral de Sant‟Ana. A Festa

A origem dos lugares, dos


intermediada pelo frei Antônio do
Amor Divino (pároco das tropas das
de Sant‟Ana de Caicó, ao longo dos
tempos tem se perpetrado como uma

pequenos vilarejos e cidades quase guarnições da Capela de Olinda), e das maiores festividades sócio-

sempre estava ligada a construção de consagrada à Senhora Sant‟Ana. Em religiosas da região Nordeste, sua

uma capela dedicada a algum santo, 1730, foi criada a Freguesia de Nossa grandiosidade é conhecida além dos

essas práticas deram origem às raízes Senhora do Bom Sucesso do Piancó, limites do estado, chegando até mesmo

da devoção do povo seridoense a onde hoje é a atual cidade de Pombal, ao exterior, pois muitos dos

Sant’Ana. Essa devoção nasceu quase na Paraíba, ficando toda a região Seridó conterrâneos de Caicó que saem da
pertencente a essa Paróquia. Em 1748 o cidade para tentar a vida lá fora, levam
que no mesmo instante em que foi
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DOSSIÊ IPHAN {Festa de Sant’Ana}

consigo a fé e devoção a santa, assumir os dispêndios com os grandeza e o poder do sagrado. Na


passando assim, aos seus herdeiros o paramentos litúrgicos, ornamentos, crônica do sertão, as festas religiosas
mesmo sentimento de pertencimento música, foguetório e iluminação interna representavam não somente uma
que eles próprios têm com a padroeira e do Templo. No término dos festejos, a manifestação de fé e devoção coletiva,
a cidade. realização da procissão pelas ruas do mas também momento de sociabilidade,
Não se sabe ao certo quando os Povoado, em cujo séqüito hierarquizado educabilidade e congraçamento. Por
festejos para louvar a Senhora Sant´Ana destacavam-se os sacerdotes, as assim ser, o ato de festejar mereceu por
passaram a ter maiores solenidades no autoridades, os “irmãos” das parte do Bispo de Pernambuco – Dom
âmbito da Freguesia do Seridó. É bem Irmandades de Sant´Ana e do Thomaz da Encarnação Costa e Lima –
provável que, após ser fundada a Santíssimo Sacramento (criada em em 1777, disposições normativas
Irmandade de Sant´Ana, em 1754, uma 1756) e, por fim, os devotos da Santa. disciplinadoras, em especial, contra a
nova composição festiva tenha sido À noite, a Matriz ganhava luminárias prática abusiva de novenas em casas
introduzida, já que competia a ao povo que anunciavam aos moradores do particulares com festejos e solenidades
promover a devoção à excelsa lugar haver, no dia seguinte, próprias da Igreja. Ao mesmo tempo,
Padroeira e organizar ano-a-ano as suas celebrações mais solenes. Desse modo, propôs a proibição de danças, bebidas e
festividades. Enquanto eficiente o rito litúrgico era revestido de pompas cânticos ilícitos, por serem ofensivos à
instrumento de sustentação material do para estabelecer a distinção dos atos religião católica, à moral e aos bons
culto, também era sua atribuição religiosos semanais e para realçar a costumes.

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DOSSIÊ IPHAN {Festa de Sant’Ana}

A primitiva capela edificada sob contribuiu para que se construísse uma capela ter sido elevada ao posto de
a invocação da Senhora Sant‟Ana no nova sede, em espaço mais acessível, Paróquia, hoje, atual Igreja Matriz de
século XVII, situava-se em local principalmente devido ao crescimento Sant‟Ana de Caicó. Com a instalação
acidentado e de difícil acesso, fato que da freguesia e pelo fato de também a da freguesia da Gloriosa Senhora

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DOSSIÊ IPHAN {Festa de Sant’Ana}

Sant‟Ana do Seridó, em 26 de julho de do Pe. Francisco de Brito Guerra10 em vãos de arcos ogivais, todas com
1748, os seridoenses escolheram um entre 1804-1843, segundo fontes cercaduras de massa. No coro existem
novo local para ser erguida a Matriz, colhidas junto a Diocese de Caicó.
três janelas protegidas por
conforme registrou na época o Padre Hoje, a Igreja Matriz apresenta
guarda-copos de ferro. Seu interior é
Francisco Alves Maia, primeiro vigário
constituído por capela-mor, naves, coro
da recém criada freguesia. Iniciada a
e pia batismal. A Catedral localiza-se
construção de um templo maior - a
na Praça que recebe o nome do
atual Catedral de Sant‟Ana - a antiga
Monsenhor Walfredo Gurgel, padre,
capela perdeu parte de sua importância,
educador e político caicoense. Um dos
funcionando a partir daí como Capela
fundadores do Ginásio Diocesano,
de Nossa Senhora do Rosário. Seu
deputado, senador e governador do Rio
desaparecimento ocorreu entre 1789 e
Grande do Norte. A então Igreja Mariz
1800. Atualmente, restam seus
de Sant‟Ana de Caicó passou por
vestígios junto à Casa-Forte do Cuó,
várias transformações, uma delas em
como marco das primeiras construções
1823, e outra para o acréscimo da
do Seridó. No transcorrer dos anos, o
segunda torre, em 1955, quando era
terreno doado para a construção da
bispo Diocesano D. José Adelino
Paróquia de Sant‟Ana foi aos poucos frontispício curvilíneo, ladeado por
Dantas, foi também durante o seu
tendo suas dimensões alteradas, desde o duas torres sineiras. Possui uma porta
bispado que foi erguido o Arco do
inicio da construção da Matriz em central, assentada em vão de arco
Triunfo, em homenagem a passagem de
1748, até sua finalização no paroquiado pleno, ladeada por duas outras portas
N.S. de Fátima por Caicó em 1953. O
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DOSSIÊ IPHAN {Festa de Sant’Ana}

templo passou ao longo dos anos por apesar do tempo, dentre eles podemos do cargo de vigário colado (sacerdote
diversas reformas, a fim de torná-lo citar o sobrado que serviu durante um fixo, na época, nomeado pela coroa), da
mais claro, ventilado e funcional. Em bom tempo de casa para o Padre freguesia do Seridó. Passou a residir no
1920 foram suprimidas as tribunas, as Guerra, esse sobrado teve sua sobrado, acompanhado de sua mãe e
cadeiras individuais foram substituídas construção iniciada em 1810 e foi das irmãs, morou por 34 anos, e veio a
por bancos coletivos e instalada a concluído um ano depois. Esse sobrado falecer no Rio de Janeiro, no dia 26 de
iluminação elétrica no seu interior, nos apresenta dois pavimentos, tendo uma fevereiro de 1845. No prédio,
anos de 1960-1970, os altares da nave sóbria fachada, na qual se divisam funcionou por muito tempo a primeira
central (exceto o altar mor), e das naves cinco portas e igual número de janelas, Escola de Latim do Seridó. Hoje o
laterais foram retirados e na década de estas protegidas por grades de ferro. O sobrado abriga a Casa de Cultura do
1980 foi erguida a segunda torre e seu interior já sofreu alterações. A município de Caicó, porém seu estado
construída a capela em honra a N.S. de mobília original, infelizmente, já se inspira cuidados, e precisa ainda ser
Fátima na nave lateral, ao longo da perdeu com o tempo; consta que o restaurado. Além do famoso sobrado,
década de 80 e inicio de 90, várias padre Guerra utilizou móveis de podemos perceber no entorno da
outras pequenas reformas e mudanças madeira de lei e talheres, copos, Matriz, um vasto casario de diversos
foram feitas na Catedral. O local que colheres, estribos, salva, brida de prata. estilos arquitetônicos que vai desde o
hoje abriga a Matriz de Sant‟Ana Ele o construiu, após ter retornado do estilo colonial ao moderno.
também é rodeado por um belíssimo Rio de Janeiro, depois de ter se
conjunto arquitetônico bem conservado submetido ao concurso para provimento

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DOSSIÊ IPHAN {Festa de Sant’Ana}

No entorno das construções das vários que traziam os fazendeiros e suas comemorações natalinas. Essas
primeiras capelas ainda nos séculos XVI famílias para as festas de Igreja. festividades representavam uma trégua na
e XVII, formaram-se os núcleos centrais Chegavam a cavalo, bem cedinho, para dureza da vida cotidiana do mundo rural
das cidades, as edificações das capelas fugirem do calor do sol, sendo seguidos e mesmo da pequena Vila.
ocorriam, como já citado anteriormente, pelos arrieiros que tangiam as mulas com
em sua maioria como cumprimento de as cargas de alimentos, roupas e objetos.
promessas aos santos devotivos de seus As casas da “rua”, que permaneciam
benfeitores. Para a Vila do Príncipe, até quase sempre fechadas, eram abertas para
então única Freguesia e município do as festas: da Padroeira – a Gloriosa
Seridó, em fins do século XVIII e inicio Senhora Sant´Ana – de Nossa Senhora do
do século XIX, convergiam os caminhos Rosário, das Benditas Almas e para as

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DOSSIÊ IPHAN {Festa de Sant’Ana}

categoricamente qualquer celebração com as velas? De fato, a despesa com a


noturna na Igreja Matriz e capelas de iluminação das igrejas pesava nos
toda a Freguesia, exceção para os cofres das irmandades de leigos que
últimos três dias da Semana Santa, mantinham o culto aos santos patronos,
Noite de Natal, e no caso de levar-se o desequilibrando as suas contas. O
Viático a algum enfermo. Não há acatamento a essa medida deve ter
indícios que possam justificar os limitado as manifestações festivas do
motivos para a adoção dessa medida e antigo modo de vida da Vila do
até quando ela vigorou nos limites da Príncipe (antigo nome da cidade de
Freguesia do Seridó. Seria a noite Caicó), onde se misturavam
propícia à transgressão ou eram as singelamente a devoção e a diversão.
festas que ensejavam diversões Parece-nos que o condicionamento dos

A Freguesia da Gloriosa consideradas inaceitáveis pelo Padre ofícios religiosos da Freguesia da


Visitador? É certo que os ensinamentos Gloriosa Senhora Sant´Ana do Seridó à
Senhora Sant´Ana do Seridó, no ano de da Igreja Católica prescreviam aos fiéis duração do dia, onde metaforicamente a
1809, foi surpreendida com a decisão uma determinada orientação de vida luz se opõe às trevas, vigorou por
do Visitador Geral e Delegado dos pautada na oração, na penitência, na pouco tempo. Segundo o escritor José
Crismas dos sertões baixos do Norte – virtude cristã e na recusa a tudo que Melquíades, durante o vigariato do
Padre Inácio Pinto de Almeida e Castro pudesse afastá-los da prática religiosa Padre Brito Guerra (1802-1845), a
– que, num presumível arroubo de fervorosa. Ou seria, ainda, uma medida Matriz de Senhora Sant´Ana passou a
autoridade eclesiástica, proibiu econômica para evitar gastos avultados ser conhecida em todo o sertão pelo

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DOSSIÊ IPHAN {Festa de Sant’Ana}

“esplendor de suas alfaias” e pela civis, que temiam o cometimento de não perturbassem as famílias e o
suntuosidade das celebrações festivas, excessos em meio ao entusiasmo sossego público. Durante o século XIX,
que emprestavam novos atrativos às festivo da comunidade visitante e dos as grandes cerimônias litúrgicas
populações espalhadas na amplidão da moradores locais. Assim, a ordenação continuaram reservadas aos festejos de
paisagem sertaneja. Tal afirmação pode do espaço e do tempo festivo seguia Senhora Sant‟Ana: suas solenidades,
ser um indicativo para a realização de normas e regras determinadas. Em seus simbolismos, seus propósitos
cerimônias múltiplas à noite, uma vez dispositivo de 1835, a Câmara formativos, suas atrações não cessavam
que a profusão luminosa dos círios no Municipal da Vila do Príncipe de crescer a cada ano. Mais do que em
interior do Templo realçava o fausto regulamentou a apresentação de qualquer outro lugar sertanejo, a Festa
das alfaias e a estética dos ornamentos, espetáculos públicos nas ruas do assegurou a afirmação do prestígio das
bem como a pompa dos ritos litúrgicos. vilarejo durante os dias de Festa e a autoridades locais (religiosas e civis)
A vida social da Vila do Príncipe venda de bebidas “espirituosas,” de perante o poder público provincial.
gravitava basicamente em torno dos modo a assegurar a prática de
É por isso que, no ano de 1861,
festejos da Padroeira que, a cada ano, entretenimentos em consonância com a
o Presidente da Província, o
tornavam-se mais concorridos, atraindo ordem social, a moral cristã e os
Comendador Pedro Gomes de Leão
devotos, festeiros, negociantes e artistas costumes sertanejos. Outrossim, em
Velloso (que governou o Rio Grande do
populares das províncias de 1855, a municipalidade fixou o horário
Norte de 1861-1863), alimentador da
Pernambuco, do Ceará e da Paraíba, de funcionamento dos divertimentos e
idéia de que, por meio da difusão da fé
principalmente. As manifestações das “funções com vozerias” nos limites
católica, a Igreja opera na educação e
exteriores ao culto devocional urbanos da Vila, os quais não podiam
progresso das sociedades, visitou a Vila
causavam apreensão nas autoridades exceder às nove horas da noite para que
do Príncipe em Festa da Padroeira.
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DOSSIÊ IPHAN {Festa de Sant’Ana}

(“Relatório apresentado à assembléia nos dias dos festejos. Chamaram-lhe a 1864, a municipalidade regulamentou a
[...]”, 1862). Com essa visita, o atenção os gestos de boas vindas aos execução dos trabalhos de pintura das
Presidente Leão Velloso inauguraria, visitantes, bem como a elegância e o casas, reparos das calçadas e limpeza
naquele longínquo ano, uma prática jeito das mulheres caicoenses “de das ruas, para o início do mês de julho
político-social que ganharia seguidores costumes puros, sinceras nas suas (o mês de Senhora Sant´Ana), sob pena
através dos anos, a qual se mantém nos afeições e fiéis aos deveres de família e de seus proprietários serem multados se
tempos atuais: visitar a cidade em Festa religião”. Nas vilas interioranas, se as assim não procedessem. Tal medida
de Senhora Sant´Ana. Fez-se festas traduziam a força da classe revela, emblematicamente, como a Vila
acompanhar pelo Deputado Provincial e dirigente, elas também revelavam o foi se organizando em função da Festa,
historiador Manoel Ferreira Nobre, este dinamismo econômico do lugar, a a qual promovia a ocupação das suas
na condição de Ajudante de Ordens e organização do urbano, ao mesmo ruas e praças para a vivência de muitas
de cronista da sua visita oficial e da tempo em que exprimiam a aparente cenas culturais e pedagógicas.
aparição pública ao lado da população unidade da comunidade social que
Atrações educativas - visuais,
em festividade. Atento aos ornamentos, celebrava em exultação seus santos e
cênicas e literárias - tais como: queima
às alfaias, à magnificência e esplendor santas patronas. Em meio ao
de fogos, cosmoramas, representações
do culto devocional, asseverou Ferreira entusiasmo manifesto, tornou-se um
teatrais, comédias, mágicas, danças de
Nobre que a Festa foi bastante imperativo para o poder público da Vila
corda e apresentação de poetas e
concorrida, tanto pelos moradores do Príncipe, proporcionar aos
cantadores populares eram
locais quanto pelos das freguesias visitantes, aos devotos e festeiros um
proporcionadas aos festeiros após as
vizinhas, bem como pelos negociantes ambiente acolhedor, aprazível e uma
novenas. Nos últimos dias dos festejos,
de outras províncias que afluíram à Vila paisagem urbana civilizada. No ano de
eram promovidos “certames” literários
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DOSSIÊ IPHAN {Festa de Sant’Ana}

entre os poetas e improvisadores de fundamento reavivar uma encenação da


trovas e cantigas, os quais ensejavam permanência dos postulados católicos,
lições e aprendizagens para a sociedade culturais e educativos no seio das
sertaneja, do mesmo modo em que famílias sertanejas. Nesses tempos de
proporcionavam lineamentos de coesão outrora (bem como hoje em dia), longos
social. A variedade dos espaços de preparativos precediam os festejos, os
sociabilidades e a diversificação dos quais envolviam a organização do
entretenimentos nas celebrações cerimonial sócio-religioso, o
festivas permitiram aos legisladores da recolhimento das anuidades da
Cidade do Príncipe, em 1871, estender Irmandade de Sant´Ana, o recebimento
o horário de funcionamento das lojas, de prendas para o leilão, a preparação
das tabernas e das diversões públicas dos foguetórios, a contratação da banda
para as dez horas da noite, durante o de música, a limpeza das ruas e pintura
período da Festa de Senhora Sant´Ana, das edificações da cidade e, de modo
instituindo assim o “tempo do todo especial, a ornamentação do
permitido” e alterando a rotina diária da templo religioso.
vida citadina. Não é demais repetir, que
as celebrações festivas continuaram a
pleno vapor, no final do século XIX,
cada vez mais revestidas de solenidades
e ritos litúrgicos que tinham por

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DOSSIÊ IPHAN {Festa de Sant’Ana}

semanário “O Povo” anotou, em 1890,


que os pais de família abriram mão de
suas economias para as meninas

Nos termos apregoados pelo


trajarem de acordo com os ditames da
elegância urbana. Vestir-se bem era
uma norma compartilhada pelos
semanário “O Povo”, a Festa de 1890
estratos sociais com maior poder
foi aguardada com entusiasmo pelos
aquisitivo - ao mesmo tempo indicativo
caicoenses, uma vez que estavam sendo
de bom gosto e distinção. Com efeito,
programadas diversões populares e
afirmou Manoel Dantas que para
“importantes bailes” a serem
Também eram divulgadas as atrações cultivar esse refinamento as famílias de
patrocinados pelas famílias da
culturais e sociais, bem como posses faziam compras uma vez por
sociedade local. A programação das
noticiadas as iniciativas do comércio ano na “praça” do Recife, de onde
festividades para exaltar a Padroeira da
local em face desse evento festivo. traziam sempre o que existia de novo
cidade ganhava (dessa data em diante)
em matéria de vestuário.
maior dizibilidade e visibilidade pelas Para atender as exigências dos
Bem vestidos, os devotos e festeiros,
páginas da imprensa periódica local ao fregueses, as lojas, instaladas na Praça
após o novenário, postavam-se no adro
anunciar as cerimônias religiosas dos do Mercado (hoje, Praça da Liberdade),
da Igreja Matriz e suas adjacências para
dez dias de festejos, que começavam renovavam os seus estoques para
assistirem à queima de fogos de
numa quinta-feira e terminavam no apresentar à clientela uma variedade de
artifício. Durante alguns anos, os
primeiro domingo após o dia artigos de qualidade e de acordo com os
artistas Joaquim Cordeiro e Inácio de
consagrado à Senhora Sant´Ana. padrões da época. O observador do
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DOSSIÊ IPHAN {Festa de Sant’Ana}

Loyola proporcionaram ao público ensinamentos, atrativos e ornamentos Maio”, na década de 80 do século XIX,
ávido por novidades um espetáculo exteriores ao cerimonial religioso, que a Festa de Senhora Sant´Ana ganhou
pirotécnico digno de nota, oferecendo- asseguram a sua continuidade no tempo novo brilhantismo proporcionado pelas
lhe, de modo bem especial no ano de histórico. No período dos festejos, as notas harmoniosas executadas pelos
1890, um “girassol” e um “amor- ruas ganhavam iluminação e adornos instrumentistas dessa agremiação, sob a
perfeito,” os quais deslumbraram os especiais com muitos arcos floridos, em regência do professor e maestro Manoel
espectadores pela sua beleza luzidia. face de novas exigências criadas pelas Fernandes de Araújo Nóbrega.
Ao lado das figuras riscadas nos céus famílias e visitantes. As pessoas Apresentava-se bem ensaiada, afinada e
pelos “fogos de vista,” espocavam as ocupavam os logradouros públicos em com bom repertório de peças variadas e
girândolas de dez dúzias de foguetões e busca de lazer e de congraçamentos modernas para um público que
os cordões de bombas que retumbavam, vários: praticavam as brincadeiras de começava a descobrir o gosto pelo
ao longe, entre as serras que circundam tiro ao alvo, as “pescarias” e as corridas gênero musical tido como erudito.
a cidade. Vivenciar o espaço festivo de argolinha que produziam diversão e Extinta essa banda, uma nova
com suas luzes, sons, imagens, aromas competição entre os jovens festeiros. filarmônica foi formada na cidade, em
e sabores, bem como ampliar os Buscavam as barracas de bebidas 1907, por iniciativa do Dr. Augusto
momentos de sociabilidade e reafirmar (incluindo os licores e aluás produzidos Monteiro, recebendo, em 17 de
laços de amizade e de vizinhança, na cidade), de bolos, de doces – sendo Novembro de 1909, o nome de
confirmam a função social, estética, muito apreciadas as puxa-puxas e os “Recreio Caicoense,” afirma padre
cultural e educativa dos festejos da alfenins de Açu, cujo sabor, forma e Eymard L. Monteiro. Mais do que
Gloriosa Senhora Sant´Ana de Caicó. cores agradavam à meninada. Com a compor a atmosfera musical da cidade,
Destarte, a Festa reveste-se de criação da Banda de Música “4 de acompanhava os ofícios religiosos e

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DOSSIÊ IPHAN {Festa de Sant’Ana}

animava os festejos sociais promovidos Luciano Herbert, depois da saudação a novena, no coreto da Praça da
pelos organizadores da Festa. musical à Senhora Sant´Ana, “a banda Liberdade: era o momento da retreta,
No passado, assim pura poesia musical para o
como no presente, às cinco deleite e emoção de muitos
horas da manhã, a festeiros e dos casais de
“Furiosa” (carinhosamente namorados.
apelidada pelos Esporadicamente, era
caicoenses) garbosamente contratada outra filarmônica
desfilava pelas ruas do para o “abrilhantamento da
Caicó antigo para despertar Festa de Sant´Ana.” Cita-se,
os moradores da cidade como exemplo, a Festa de
com a sonoridade das 1924 que contou com a
marchas, dos dobrados e participação da Banda de
espocar dos fogos. Era a Música do Batalhão de
alvorada festiva, anunciando mais um saía pelas ruas da cidade executando Segurança da capital do Estado. Era a
dia de celebrações religiosas, de seu repertório e arrastando atrás de si primeira vez que uma banda militar
folguedos e atrações diversas. Ao meio um grupo de meninos que apresentava-se no Seridó e,
dia, era o momento da tocata. A banda acompanhava o passo lento e particularmente, em Caicó, informa o
postava-se no patamar da Igreja, perto cadenciado dos músicos”. Entre o ano jornal “O Seridoense.” Mas não foram
do mastro onde ficava hasteado o de 1918 e a década de noventa do somente no contexto da festa em si que
estandarte da Santa. Na escrita de mesmo século, passou a exibir-se, após as mudanças aconteceram, ao longo

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DOSSIÊ IPHAN {Festa de Sant’Ana}

desses dois séculos de festividades e bispo diocesano e quando era pároco de diferente chegava a Caicó, em julho de
devoção, também a Igreja Matriz Sant‟Ana o Mons. Walfredo Gurgel. A 1906: era o carrossel de Francisco
passou por várias transformações, uma devoção a Nossa Senhora de Fátima foi Azevedo, que se tornou o divertimento
delas bem visível, segundo o padre amplamente divulgada nos fins da preferido da meninada e da rapaziada.
Antenor, foi a construção da segunda primeira metade do século XX, quando No ano seguinte, nos termos do
torre, antes a igreja possuía apenas foi reconhecida oficialmente pela Igreja correspondente do jornal Comércio de
uma, porém ao ser elevada ao posto de a partir da aparição da Virgem Maria a Mossoró, novamente, “tivemos a boa
Igreja Matriz, segundo o padre, fez-se três crianças na pequena aldeia de diversão do Carrossel que foi muito
necessária a construção da segunda Fátima, em Portugal, no ano de 1917. A concorrida”, trazendo, mais uma vez, a
torre da Igreja, ainda no mandado do sua venerável imagem, desde então, alegria esfuziante para os apreciadores
Padre Guerra, visto que, precisava-se de tem peregrinado pelo mundo inteiro desse brinquedo.
uma segunda torre para abrigar os sinos levando a mensagem de Fátima. Com as diversões ampliadas,
que a igreja passaria a possuir como Ao longo dos tempos, diferentes ano após ano, os parques animaram (e
Matriz, outra mudança significativa foi tipos de entretenimentos ocuparam os continuam animando) os festejos de
a construção de um arco em espaços públicos da cidade, cuja Senhora Sant‟Ana, com o balanço das
homenagem a Nossa Senhora de destinação considerava as canoas, o barulho e o colorido dos jipes,
Fátima: o Arco do Triunfo. Foi erguido diferenciações sociais (elites e o encantamento da roda-gigante, dentre
para comemorar a visita da imagem populares) e, ao mesmo tempo, as tantas outras atrações modernas. Na
peregrina de Nossa Senhora de Fátima oposições entre homens e mulheres, crônica de José Lucas, no suave embalo
ocorrida aos 22 de novembro de 1953, solteiros e casados, adultos e crianças. da roda-gigante, os casais de
quando D. José Adelino Dantas era Nesse sentido, uma diversão bem namorados ascendiam às alturas, sob
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DOSSIÊ IPHAN {Festa de Sant’Ana}

um céu estrelado, para contemplarem a instalados em salas da Intendência da Banda “Recreio Caicoense,” as
cidade aos seus pés. Bem agarradinhos, Municipal durante a Festa de Senhora feiras de caridade (substituídas, anos
escutavam pelo serviço de alto-falantes Sant´Ana de 1910, momento em que os depois, pela feira de comidas típicas),
do Parque Lima os sucessos musicais caicoenses puderam assistir, pela as barracas, os “chás dançantes”
do momento, que lhes eram dedicados primeira vez, à projeção de imagens em (organizados pela professora Júlia
em código („de um apaixonado para movimento. Dessa data em diante, os Medeiros), os bailes realizados no
uma jovem trajando vestido azul‟), cosmoramas, com seus quadros fixos de Pavilhão da Festa e em residências,
para que não fossem identificados pelos paisagens naturais, de cidades e de constituindo-se em ocasiões propícias
bisbilhoteiros do Jornal da Festa. Tudo batalhas sangrentas, deixaram de ser ao aprimoramento das maneiras de
isso conferia ao público festeiro o atrativos para ceder lugar ao cinema, sociabilidade do caicoense. É certo que,
regozijo redobrado e a emoção intensa exibido a cada mês de julho. Somente no modo polido de comportar-se das
vivenciada nas tardes amenas e nas no ano de 1925, em plena Festa de mulheres e homens, residia o sucesso
noites coloridas do mês consagrado à Senhora Sant´Ana, Enico Monteiro desses acontecimentos realizados no
Senhora Sant´Ana. Efetivamente, no inaugurou um cinema de sua interior das festividades devotadas a
transcurso dos séculos, a Festa se propriedade para ser integrado à vida Senhora Sant´Ana.
constituiu em monumento patrimonial cultural de Caicó. A Festa também se apresentava
de diversões culturais e educativas para As famílias promoviam eventos como momento ideal para a difusão de
expor a vitrine das novidades a serem sociais em benefício da Matriz ou das padrões e valores culturais modernos.
experimentadas na cidade. Mas, sem obras sociais da cidade os quais se Para tanto, contaria com a atuação da
dúvida, a novidade surpresa foram os tornavam muito concorridos: os leilões, imprensa local, em especial d´O
dois aparelhos cinematográficos, as quermesses animadas pelas retretas Binóculo, do Jornal da Festa, do Jornal

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DOSSIÊ IPHAN {Festa de Sant’Ana}

das Moças e d´O Novenário. À medida outros concursos organizados pelo Júlia Medeiros) foi a grande vitoriosa,
que esses periódicos procuravam Jornal da Festa sempre no período dos sendo coroada no salão nobre da
inspirar entre os caicoenses padrões e festejos de Senhora Sant´Ana: no ano Prefeitura Municipal. Em sua
valores modernos, buscavam de 1926, Theresa Dantas foi a homenagem, a sociedade caicoense
igualmente legitimar novos estilos de ganhadora e, em 1927, a jovem ofereceu-lhe um baile com a orquestra
vida em detrimento de outros por vezes considerada a mais linda da Festa foi regida pelo Maestro Manoel Vitoriano
superados. O mais eficaz exemplo Generosa Araújo. De todos os de Fontes (Bedé), que proporcionou um
dessa sagacidade consistiu na promoção concursos até então realizados, o que belo espetáculo festivo na cadência
de um concurso, encetado pelos mais mobilizou os caicoenses, inclusive desse novo estilo de vida em ascensão
redatores d´O Binóculo, para a escolha as autoridades do município, as quais (Medeiros; Araújo, 2006).
da jovem mais simpática da Festa de foram indicadas para a comissão Ao colocar em evidência a
Sant´Ana no distante ano de 1916. A apuradora de votos, foi o “certame” prática de realização desses concursos
eleita foi a senhorita Maria da Nóbrega, para a escolha da Rainha da Festa de como marca distintiva de uma dinâmica
cuja vitória repercutiu nas “rodas da 1930. O Jornal da Festa justificou a cultural recente, a imprensa periódica,
elite caicoense” como legítima, por realização desse evento, alegando que promotora desses “certames,” oferecia
resumir os verdadeiros traços de uma “todos os países do mundo civilizado às jovens das elites caicoenses
simpatia cativante. No ano seguinte, o têm feitos concursos, inclusive o nosso possibilidades de romperem com a
mesmo periódico promoveu um Brasil com o fim de escolher a sua imagem idealizada e simplória de
concurso de beleza, sendo agraciada a Miss.” Com apenas quatorze anos de mulher recatada, aparentemente restrita
jovem Delmira Araújo com o título de idade, a jovem Severina Dantas ao ambiente doméstico. Em oposição à
“A mais bela da Festa.” Sucederam-se (sobrinha da professora e feminista mentalidade conservadora de certos

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DOSSIÊ IPHAN {Festa de Sant’Ana}

setores desse universo sertanejo, os constituía-se no ápice da programação motivo das atenções dos presentes pela
intelectuais da cidade aclamavam a social. Depois de um largo período, os beleza juvenil, pela elegância
nova imagem de mulher – sofisticada, bailes animados pelas grandes demonstrada e pela simpatia cativante,
culta, bela, profissional e feminista – orquestras, promovidos pelas (e para emprestando ao elegante evento social
condizente com o alargamento da esfera as) elites caicoenses, passaram a ser um charme todo especial.
pública em detrimento da esfera íntima. realizados no Caicó Tênis Clube, onde Também, durante a Festa de
Na programação social, o evento elegantes pares se exibiam pelos salões Senhora Sant´Ana, esse clube promovia
mais esperado e comentado era o baile ao som e compasso dos gêneros desfiles (o mais famoso era o
que se realizava no prédio da musicais da época: samba-canção, patrocinado pelos tecidos Bangu e pela
municipalidade de Caicó, após o bolero, mambo, salsa e outros ritmos. Loja Copacabana, na época importante
encerramento dos festejos religiosos, Nessas ocasiões, predominavam o bom casa comercial de Caicó), festas
cujo ambiente ganhava uma decoração gosto das toilettes das senhoras e temáticas e bailes para homenagear
primorosa, iluminação e perfume de senhoritas (confeccionadas pelas personalidades políticas, profissionais
essência de eucalipto. Acontecimento habilidosas modistas da cidade) e a liberais e empresários. Na década de
fechado para a maioria da população, distinção dos jovens cavalheiros que sessenta do século XX, as instalações
estava aberto para a confirmação de “emprestavam à festa um caráter do Caicó Tênis Clube foram adquiridas
namoros, oficialização de noivados ou puramente aristocrático,” observou o pela Associação Atlética do Banco do
mesmo para reforçar os laços de cronista do Jornal da Festa. No ano de Brasil (AABB), que passou a realizar o
amizade e de convivialidade 1956, o êxito maior foi atribuído às Baile de Debutantes, promoção do
estabelecidos antes e durante os festejos presenças das misses do Rio Grande do Lions Clube de Caicó, ocasião em que
da Padroeira. Assim, o Baile da Festa Norte, do Ceará e do Distrito Federal, as jovens da cidade, ao completarem

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DOSSIÊ IPHAN {Festa de Sant’Ana}

quinze anos, eram apresentadas com Outras festas menos glamorosas, mas confeccionados, e um perfume à base
muito glamour à sociedade local em cheias de animação, aconteciam no de flores, na maioria das vezes,
ritual festivo. Às vezes, esse evento Caicó Esporte Clube, conhecido como a comprado na capital. O clube tinha suas
acontecia nos salões da Associação dos “Sede dos Morenos.” Os segmentos normas através das quais definia
Sargentos e Subtenentes de Caicó sociais que não tinham acesso aos padrões aceitáveis de comportamento.
(ASSEC), clube dos militares do clubes das elites (fosse pela condição Os freqüentadores não deviam
Exército brasileiro. As soirées deixaram social ou pela cor da pele) encontravam consumir bebidas alcoólicas em
as residências e ganharam os salões dos nesse clube um ambiente acolhedor, excesso e os casais de namorados não
clubes Grêmio Social e Cultural de acalorado e democrático. Em seus podiam beijar na boca para evitar
Caicó ou da ASSEC, tendo como tempos áureos (década de cinqüenta e situações embaraçosas.
público alvo, notadamente, os jovens começo dos anos sessenta do século No rol das festividades, o
que se esbaldavam no ritmo frenético XX), os bailes organizados na “Sede passeio em volta da pracinha do coreto
do rock n‟roll, do twist e que dos Morenos”, durante a Festa de (Praça da Liberdade) era muito
“mandavam brasa” ao som do iê-iê-iê Senhora Sant´Ana, eram muito apreciado pelas jovens da cidade e de
nacional. Nessas ocasiões, eles concorridos, animados e se estendiam outras localidades, enquanto os rapazes
afastavam-se da tradição e inovavam na até a madrugada. Para a jornalista circulavam em sentido contrário ou
maneira de se vestir: a mini-saia para as Arizela Cunha, nessas ocasiões ficavam sentados nas cadeiras do bar,
mulheres e as calças justas com “boca especiais, o terno de linho branco e os paquerando as mocinhas ao vê-las
larga” para os homens, de acordo com sapatos de bico fino estavam em voga passar. Durante anos, a pracinha
as tendências da moda juvenil dos para os homens, enquanto as mulheres tornou-se o ponto de encontro da
grandes centros urbanos brasileiros. usavam vestidos de seda, bem juventude após as novenas, onde grupos

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DOSSIÊ IPHAN {Festa de Sant’Ana}

eram formados e namoros iniciados. No quatro zonas. Em meados da década de cultuam a santa cujo final da festa se dá
alto do Coreto, a Filarmônica “Recreio 1950 o padre Galvão Celestino, visando exatamente no dia 26 de julho, dia da
Caicoense” executava músicas o crescimento da Festa de Caicó, padroeira segundo o calendário
românticas ou os sucessos do momento. resolve mudar sua data de finalização, canônico, as manifestações em louvor a
Por volta das vinte e três Sant‟Ana na cidade de Currais
horas, a pracinha começava a Novos não apresenta a mesma
ficar esvaziada, pois muitos dimensão que apresenta em
dos seus freqüentadores Caicó, Currais Novos se
dirigiam-se aos clubes para diferencia pelos atores que
mais uma festa dançante. compõem a festa na
Além das mudanças atualidade, novos cânticos,
sociais, o século XX também novos hinos, festas públicas
trouxe outro grande em praças, o que pouco tem
acontecimento para o povo ocorrido em Caicó, dessa
seridoense: a criação em fins forma, podemos observar que
da década de 1930, da a Festa de Sant‟Ana de Caicó,
Diocese de Caicó, a 25 de a cada ano se tornou a maior em níveis
fazendo-a terminar no ultimo domingo
novembro de 1939, pelo Papa Pio XII, regionais para seus devotos. As
do mês de julho, ao contrário da Festa
desmembrada da Diocese de Natal com mudanças mais significativas ocorridas
de Sant‟Ana da vizinha cidade de
uma superfície de 9.372 km². A
na Paróquia de Sant‟Ana começaram a
Diocese de Caicó, hoje subdivide-se em Currais Novos e demais cidades que
ocorrer, segundo relatos do Pe.
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DOSSIÊ IPHAN {Festa de Sant’Ana}

Antenor, pároco emérito da Catedral de


Sant‟Ana a partir de 1917, e com a
chegada a Caicó do padre Walfredo
Gurgel em 1936 a cidade de Caicó
ganharia também uma voz forte no
processo de criação da Diocese. A
participação de toda a região nas
celebrações a Sant‟Ana se faz presente
visto que as cidades seridoenses
comungam de uma religiosidade
marcante arraigada aos lugares e
tradições, isso reforça a manutenção
das práticas religiosas que se destacam
na atualidade, no cenário do Rio
Grande do Norte, mantendo os aspectos
tradicionais ligados ainda ao período de
colonização desse território.

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DOSSIÊ IPHAN {Festa de Sant’Ana}

A FESTA HOJE

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DOSSIÊ IPHAN {Festa de Sant’Ana}

A festa de Sant‟Ana é a celebração


Sant‟Ana envolve cavalgadas,
carreatas, novenas e procissões,
apresentações artísticas, bailes, venda
do catolicismo tradicional difundido ao
de comidas, bebidas e artesanatos
longo da colonização, em que as
típicos. A presença da música, da
invocações a Nossa Senhora, a Jesus
dança, dos shows, dos fogos, da comida
Cristo e aos santos protetores, como
e da bebida, muitas vezes em excesso,
intermediários entre Deus e os homens
poderia levar-nos a pensar a festa
sempre estiveram presentes. As
inserida no assim denominado tempo
devoções são relacionadas a milagres
de promessas e na realização de festas profano. A festa é a poesia que não
realizados por santos próximos, pois
aos santos padroeiros. Momento ímpar existe sem a prosa, é a desordem que
são eminentemente humanos. A
na sociabilidade seridoense, tanto não se concretiza sem a ordem. É
identidade cultural e religiosa é
festivo quanto solene, a Festa de condição inerente para o cotidiano, sua
baseada, principalmente, no pagamento
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DOSSIÊ IPHAN {Festa de Sant’Ana}

quebra e, simultaneamente sua dividem-se na elaboração de um intenso Carreata de Sant'Ana, as Novenas, a


retomada. A festa é, na verdade, um dos calendário sócio-religioso que faz da Missa Solene, a Procissão, além dos
elementos que funda o coletivo, Festa de Sant'Ana um dos mais bingos, leilões, shows e bailes,
fundamentando-se em um ritual que significativos acontecimentos sócio- registramos a presença de uma
marca o princípio de reciprocidade, que religiosos do Rio Grande do Norte. Em sociabilidade festiva e uma
é central a toda vida social. A paróquia, eventos como as Peregrinações rural e religiosidade peculiares, fundadas em
o poder público e a iniciativa privada urbana, a Cavalgada de Sant’Ana, a valores morais fixados pela tradição.

Os festejos em homenagem à organização e gestão de toda a parte a cada ano a Comissão é em certa
Sant'Ana de Caicó acontecem sempre a litúrgica, religiosa e sócio-cultural medida renovada, com a saída de
partir da quinta-feira que antecede o dia promovida pela paróquia. A Comissão alguns membros e a entrada de outros.
26 de julho, dia de Sant'Ana no da Festa veio somar esforços ao antigo Seus componente, em sua maioria, são
calendário litúrgico, tendo seu Conselho Paroquial, inaugurado por pessoas mais ligadas à Igreja, com
encerramento no primeiro domingo Monsenhor Antenor Salvino de Araújo grande devoção à Sant'Ana e
subsequente, com a realização da ao longo de seus 39 anos de paroquiado participação nas celebrações ordinárias,
procissão. No entanto, podemos afirmar (de 1968 a 2007). Contudo, a Comissão sejam estudantes, professores,
que, de fato, a Festa de Sant'Ana tem manteve parte das atribuições do antigo funcionários públicos ou profissionais
início bem antes disso, já em meados conselho, mudando a sua composição e liberais. Estas pessoas realizam trabalho
do mês de abril, quando é realizada a forma de atuação. A Comissão da Festa voluntário e demonstram grande
primeira reunião da Comissão da Festa de Sant'Ana de Caicó é composta de 40 satisfação em participar da organização
de Sant'Ana de Caicó, responsável pela (quarenta) membros não fixos, ou seja, da mais expressiva festa de padroeiro

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DOSSIÊ IPHAN {Festa de Sant’Ana}

da região. A Comissão é dividida em organização e gestão dos vários eventos paróquia. A tabela abaixo mostra as
subcomissões compostas de um a cinco que ocorrem dentro da programação subcomissões existentes e suas
membros, cada uma responsável pela sócio-religiosa promovida pela atribuições:

Subcomissão Atribuições
Feirinha Logística e gestão da Peregrinação Organização das novenas
Pavilhão de Organização, logística e Feirinha de Sant'Ana: Urbana (inscrição das pessoas
Sant'Ana (ou gestão do Pavilhão: organização e interessadas em receber
Pavilhão contratação e distribuição das novenas em suas casas);
Cultural) – são organização das barracas barracas; elaboração de calendário;
duas e bares; do palco e telões decoração; venda de ornamentação das
subcomissões, e da programação comidas e bebidas, imagens peregrinas e
uma para os cultural. controle financeiro e coordenação do encontro
bares, outra prestação de contas. das imagens peregrinas.
para as comidas.

Beija Agenciamento do espaço


Organização dos Jantar de Logística e gestão: e coleta das ofertas.
Festa dos Doces
expositores/vendedores. Sant'Ana elaboração do cardápio, Novenas Organização do
decoração do espaço; (Noitários) calendário das novenas e
Almoço de Logística e gestão: coordenação das mobilização dos
Sant'Ana elaboração do cardápio, cozinheiras e organização noitários.
decoração do espaço; das mesas. Comunicação e Divulgação da festa,
coordenação das Marketing elaboração de plano de
cozinheiras e organização mídia e arrecadação de
Peregrinação Organização das novenas
das mesas. patrocínios.
Rural (inscrição das
comunidades rurais
Cavalgada Organização da parte interessadas),
litúrgica da Cavalgada: ornamentação da
acolhimento dos imagem peregrina;
cavaleiros, organização elaboração do calendário
da missa e da benção dos de peregrinações e
animais organização e gestão
financeira dos leilões.
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DOSSIÊ IPHAN {Festa de Sant’Ana}

A primeira reunião da Comissão intuito de “profissionalizar a Festa de Comissão costuma receber mais
costuma acontecer em meados de abril; Sant'Ana no que diz respeito à sua voluntários, geralmente parentes ou
em 2010 a primeira reunião já ocorreu produção”. Nesse sentido é elaborado amigos daqueles que a compõem
no dia 10 de março, com o objetivo de um plano de mídia apresentado a oficialmente. Com isso podemos notar
dar início à organização da possíveis patrocinadores da Festa – que a Festa de Sant'Ana possui uma
Peregrinação Rural, uma das principais políticos, empresas da iniciativa pública significante participação popular não só
fontes de arrecadação para cobrir as e privada, instituições, etc. enquanto expectadores, mas enquanto
despesas de preparação da Festa de Ao longo dos meses que realizadores dos festejos. O trabalho é
Sant'Ana. Contudo, no sentido de antecedem a Festa, a Comissão da Festa realizado integralmente de forma
angariar fundos para a Festa foi mobiliza seus esforços nos voluntária, demonstrando o forte apego
fundamental a criação da comissão de preparativos, acionando amplas redes e zelo do caicoense por esta celebração
comunicação e marketing, composta de sociabilidade no sentido de que, mais do que qualquer outra,
por pessoas ligadas à área de conseguir executar suas tarefas. No expressa profundamente as
comunicação social de Caicó, período da Festa propriamente dita, os peculiaridades do modo de vida deste
radialistas, jornalistas e blogueiros. esforços aumentam proporcionalmente povo.
Essa comissão atua desde 2007 com à quantidade de trabalho que surge, a

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DOSSIÊ IPHAN {Festa de Sant’Ana}

As
receber a imagem da santa, No caso da peregrinação rural, a
visitas das imagens mobilizando amigos e parentes para imagem da santa percorre os sítios, as
uma recepção calorosa. Durante a visita fazendas e os povoados mais próximos.
peregrinas nas zonas urbana e rural –
Os rituais de celebração compostos por
peregrinação urbana e rural – que se
novenas e missas, geralmente
iniciam nos meses de junho e abril
finalizam-se com leilões de produtos
respectivamente, são organizadas e
agrícolas e outros bens doados, bem
geridas por leigos e lideranças
como com vendas de bebidas e
religiosas locais sob coordenação da
comidas, que se torna fonte de
Comissão da Festa; tem como objetivo
arrecadação para a realização da Festa.
o estabelecimento de uma rede de
A peregrinação das imagens de
visitação da imagem de Sant‟Ana nas
Sant'Ana é encerrada com o “Encontro
casas dos fiéis e marcam o ciclo de
das Imagens” e a chegada da Caravana
preparação da Festa de Sant'Ana.
Ilton Pinheiro em frente à Catedral,
Representando a figura máxima da
onde é celebrada uma missa em ação de
família, a avó de Jesus, Sant‟Ana, vem
graças aos peregrinos de Santa'Ana.
reavivar os laços de parentesco e
rezam novenas, depositam suas ofertas A peregrinação rural ocorre ao
solidificar a fé entre os sertanejos. É o
na urna de Sant‟Ana e confraternizam- longo de 15 sábados que antecedem o
momento em que as famílias católicas
se com lanche provido pelos anfitriões. início oficial da Festa, e é organizada
se preparam espiritualmente para
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DOSSIÊ IPHAN {Festa de Sant’Ana}

por uma subcomissão formada a partir bebidas até animais de pequeno e maioria dos itens são arrematados pelo
da Comissão de Festas Religiosas. A médio porte (galinhas, patos, porcos, dobro ou triplo de seu valor de
cada ano são praticamente os mesmos garrotes, carneiros, etc). comercialização; de acordo com a
sítios e fazendas que recebem a imagem Geralmente os anfitriões, subcomissão da peregrinação, cada
peregrina de Sant'Ana, o que expressa a juntamente com a subcomissão da leilão rende em média R$ 4.000,000
existência de uma rede de sociabilidade peregrinação rural são responsáveis (quatro mil reais), integralmente
já consolidada em torno do evento. A pela arrecadação dos itens a serem destinados à organização da Festa de
iniciativa de receber a peregrinação leiloados, assim como pela Sant'Ana. A peregrinação urbana é
urbana por vezes parte de cada comercialização de bebidas e comidas iniciada no início de junho, ocorrendo
proprietário, que procura a paróquia durante os leilões. O leilão de Sant'Ana diariamente até a véspera da abertura
para manifestar o desejo de receber é um evento fundamental para a Festa oficial da Festa de Sant'Ana; consiste
uma novena em sua propriedade. A de Sant'Ana, pois toda a renda na visita de imagens peregrinas em
peregrinação rural se divide em dois arrecadada é destinada à sua realização. diferentes bairros da cidade de Caicó. A
momentos: um mais devocional, no Além disso, o leilão põe em evidencia maioria das imagens – cerca de
qual se celebra pequena missa em um aspecto interessante da cinquenta – assim como o roteiro da
homenagem à Sant'Ana; outro mais sociabilidade seridoense, arrematar um celebração da novena são providos pela
lúdico, com a realização de leilões de item durante um leilão é mais do que o própria paróquia, que realiza uma
diversos produtos doados pela desejo de contribuir com a realização seleção de articuladores, responsáveis
comunidade, desde pequenos da Festa, é também a “dramatização” de por organizar e conduzir os rituais de
souvenires, pratos prontos de comidas um status social evidenciado pela recepção da imagem peregrina em sua
típicas, doces, produtos agrícolas, demonstração de poder econômico. A comunidade, entrando em contato com

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DOSSIÊ IPHAN {Festa de Sant’Ana}

as famílias que desejam recebê-la em articuladores dos bairros que as Festa de Sant'Ana, quando as imagens
sua casa; providenciando sua receberão. Diferentemente da peregrinas deixam os diversos bairros e
ornamentação e o local de realização peregrinação rural, o rito da comunidades de Caicó em procissão e
das novenas – seja numa residência ou peregrinação urbana é integralmente se encontram no cruzamento das
em algum centro comunitário, escola ou conduzido por leigos, e podem ocorrer principais avenidas da cidade (Av.
outro espaço público. O início da concomitantemente em diferentes Seridó com Av. Coronel Martiniano),
peregrinação urbana é marcado pela bairros; é de bom grado que, após a recepcionando a caravana de peregrinos
realização da missa do envio, durante a celebração, cada anfitrião ofereça um que saem à pé da cidade de Acari,
qual são distribuídas as imagens de jantar ou uma degustação simples de distante cerca de 60 km de Caicó. O
Sant'Ana que vão percorrer os bairros iguarias típicas da região. Quando num evento é conhecido como o Encontro
até a véspera da abertura oficial da mesmo bairro ou comunidade houver das Imagens, e é marcado por muita
Festa. A missa do envio acontece mais de um anfitrião para a imagem emoção e manifestação de fé e apego
sempre no domingo que antecede as peregrina, esta é conduzida em cortejo do caicoense à Senhora Sant'Ana.
primeiras novenas, trata-se da para “dormir” no local onde será
celebração de uma missa regular ao realizada a próxima novena. O ciclo da
final da qual se apresenta e distribui as peregrinação urbana é encerrado na
imagens peregrinas para os véspera do dia de abertura oficial da

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DOSSIÊ IPHAN {Festa de Sant’Ana}

à Sant'Ana. Inicialmente a idéia era trecho entre Currais Novos e Acari, na BR

partir desde Natal, cumprindo um 427, rodovia cheia serrotes e de curvas

percurso de quase 270 km. No entanto sinuosas, obstáculos perigosos para quem
caminha às suas margens.
as idealizadoras pensavam que o
Ao longo do percurso os
percurso seria demasiado longo,
peregrinos, em uma quantidade que
especialmente para as pessoas de idade
varia entre 40 e 50 pessoas por ano,
mais avançada; decidiu-se então
param apenas para alimentar-se e
realizar a peregrinação partindo da
dormir, ou em caso de extrema
cidade de Currais Novos, que também
A peregrinação a Sant'Ana “Caravana necessidade. Ao longo do caminho
tem Sant'Ana como padroeira, passando
Ilton Pacheco” teve início no ano de rezam e cantam o hino do peregrino e
pelas cidades de Acari, Cruzeta e São
2000 a partir da idéia de três mulheres outras canções sacras, e são
José do Seridó, num percurso de
caicoenses que residiam em na capital calorosamente recebidos em pontos de
praticamente 85 km. A partir de seu
Natal, desde 2004 a caravana recebe o quarto ano, a peregrinação sofreu uma
apoio distribuídos em residências nas
nome de um de seus mais dedicados redução no seu percurso, partindo da cidades e na zona rural dos municípios
membros, falecido naquele ano. cidade de Acari. A mudança ocorreu por percorridos, onde podem realizar
Inspiradas pela peregrinação a Santiago questão de segurança, uma vez que os refeições, cuidar de eventuais
de Compostela, na Espanha, as três peregrinos encontraram dificuldades em ferimentos nos pés e compartilhar suas
amigas decidiram realizar uma conseguir o apoio de batedores da Polícia experiências com os demais. A cada
peregrinação até Caicó em homenagem Rodoviária Federal para acompanhá-los no ano a comissão organizadora da
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DOSSIÊ IPHAN {Festa de Sant’Ana}

Caravana solicita uma taxa de inscrição Mariz, o Marizão, por autoridades do de Sant'Ana, constituindo-se numa das
para arcar com os custos da caminhada, poder público local, representantes da primeiras e mais emotivas
o dinheiro arrecadado é utilizado na paróquia, e um grande público de manifestações de fé e apego do
confecção de camisetas e bonés, na devotos. São homenageados com caicoense à Sant'Ana. A paróquia
compra de alimentos e água, de foguetório e com a apresentação da aparece nestes eventos quase como uma
combustível para os veículos de apoio e Banda de Música Recreio Caicoense, a coadjuvante, pois são organizados e
pagamento de hospedagem; o montante Furiosa. Logo em seguida seguem sua geridos por leigos, demonstrando a
que eventualmente sobra é doado para a caminhada até o centro da cidade, onde dedicação dos devotos caicoenses e sua
paróquia de Caicó. Ao chegar em está localizada a Catedral de Sant'Ana. vontade de contribuir de todas as
Caicó, sempre na véspera da abertura No cruzamento das avenidas Seridó e formas não só na celebração da Festa,
oficial da Festa de Sant'Ana, a Coronel Martiniano, ocorre um dos mas na sua própria concepção. O
Caravana Ilton Pinheiro é acontecimentos mais emocionantes da Encontro das Santas e os Peregrinos de
calorosamente recebida em frente ao Festa de Sant'Ana, qual seja, o encontro Sant'Ana são iniciativas pessoais de
estádio de futebol Dinarte de Medeiros da Caravana com as imagens devotos que, juntamente com outras
peregrinas de Sant'Ana. Todos, então, formas de manifestação de devoção,
se dirigem à Catedral de Sant'Ana, onde passaram a integrar de forma
é celebrada uma missa de ação de significativa a programação religiosa da
graças pela chegada dos peregrinos. O Festa de Sant'Ana.
Encontro das Santas com os Peregrinos
de Sant'Ana marcam o início da Festa

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DOSSIÊ IPHAN {Festa de Sant’Ana}

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DOSSIÊ IPHAN {Festa de Sant’Ana}

com uma passeata de caráter solene, novenário e as missas solenes,


saindo da Catedral de Sant'Ana e acontecem os batismos coletivos e
percorrendo as principais avenidas e mutirões de confissão, intensificando
ruas do centro de Caicó (Avenida ainda mais a programação religiosa.
Seridó, Rua Renato Dantas, Rua Celso Depois das celebrações de
Dantas e Avenida Cel. Martiniano) até abertura, no Pavilhão de Sant'Ana,
retornar ao largo da Catedral, momento espaço destinado à realização da

Apesar de o Encontro das


em que o estandarte de Sant'Ana é programação sócio-cultural promovida
hasteado em mastro localizado em pela paróquia, é oferecido o Jantar de
frente à Catedral, sendo retirado Sant'Ana, realizado desde 1985. Para
Santas, que coincide com a chegada dos
somente após a procissão de participar do tradicional banquete, é
Peregrinos de Sant'Ana, ocorrer sempre
encerramento. Encerra-se a abertura preciso comprar uma senha, que dá
na quarta-feira que antecede o dia de
solene da Festa de Sant'Ana, que acesso ao espaço de onde é servido, o
Sant'Ana (26/07), a Festa de Sant'Ana é
durante dez dias anima a cidade de que implica uma restrição em seu
oficialmente iniciada um dia depois,
Caicó com uma vasta programação público – cerca de 1000 pessoas –
sempre na quinta-feira precedente ao
religiosa e sociocultural. Nos dias de composto basicamente por gente de
dia 26 de julho. A abertura oficial da
Festa a igreja praticamente não para, classe média-alta, que reúne-se com
Festa tem inicio, geralmente às 16h,
entre as celebrações principais, como o familiares e amigos de uma forma que o
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DOSSIÊ IPHAN {Festa de Sant’Ana}

critério de ocupação das mesas é


espontaneamente definido de acordo
com os grupos familiares presentes. No
Jantar de Sant'Ana são servidas
algumas comidas típicas da região,
como a paçoca de carne de sol com
macaxeira, dentre outros. A venda das
senhas, a organização do local, a
preparação do cardápio bem como a
tarefa de servi-lo fica tudo ao encargo
de uma subcomissão criada dentro da
Comissão das Festas Religiosas. O
Jantar de Sant'Ana é o primeiro evento
social promovido pela paróquia na
Festa de Sant'Ana, no qual as famílias e
amigos se reúnem e onde os caicoenses
que vivem longe se reencontram,
reafirmando seus laços e construindo
novas redes de sociabilidade.

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DOSSIÊ IPHAN {Festa de Sant’Ana}

As novenas são celebrações no pavilhão, de onde os fiéis podem feminino no RN, tendo fundado em
comuns durante as festas religiosas acompanhar a celebração. Durante as Natal a revista “Via-Láctea”, de
católicas, são reuniões de fiéis para a novenas existem os ritos iniciais, circulação voltada para o público
realização de orações, geralmente compostos por canções de louvor e feminino, em 1914. O professor Manoel
direcionadas à um santo específico. As invocações habituais das missas Fernandes ficou com a incumbência de
novenas, conforme sugere o nome, são católicas, em seguida reza-se a ladainha musicar o poema. Outra particularidade
realizadas ao longo de nove dias, de Sant'Ana como forma de evocação à das novenas da Festa de Sant'Ana
coincidindo com o período de duração santa. Depois a novena segue conforme ocorre na noite do dia 26 de julho, dia
da festa. No caso da Festa de Sant'Ana a praxe católica, com a leitura e de Sant'Ana, quando é declamado o
são onze dias de celebração, e as pregação da palavra, a adoração ao Ofício de Sant'Ana, criado na década de
novenas são celebradas todas as noites, Santíssimo Sacramento e a comunhão. 1970 por Monsenhor Antenor Salvino
exceto na do dia de abertura oficial da A novena se encerra com o Hino de de Araújo, sua irmã poetisa Hilda
Festa, e na última quando ocorre a Sant'Ana, cantado pelo Coral de Araújo, juntamente com os poetas Iara
procissão. As novenas sempre contam Sant'Ana e fervorosamente Diniz e José Lucas de Barros. Trata-se
com um público além da capacidade de acompanhado pelos fiéis. O Hino foi de um poema sacro que é declamado
acomodação das dependências internas composto pelas primas Palmira e em antifonia entre público e celebrante,
da Catedral, por este motivo uma Carolina Wanderley, poetisas enaltecendo as virtudes de Sant'Ana e
estrutura de telões e cadeiras é montada consideradas precursoras do jornalismo seu esposo São Joaquim, assim como
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DOSSIÊ IPHAN {Festa de Sant’Ana}

pedindo proteção e graças. Além do culinária seridoense. Em 2007, a Festa


significado devocional as novenas de Sant'Ana entra para a “era digital”,
também apresentam um aspecto de com as novenas e a Missa Solene sendo
sociabilidade. A cada noite a novena transmitidas ao vivo pela rede mundial
ocorre em homenagem a vários de computadores.
segmentos da sociedade: universidades,
escolas, associações, sindicatos, grupos
beneficentes, profissionais, movimentos
religiosos, pastorais, paróquias da
região do Seridó, instituições publicas e
privadas, etc.
Após as novenas os devotos podem
desfrutar de apresentações culturais no
Pavilhão de Sant'Ana, brincar no
parque de diversões ou simplesmente
passear pelas praças da Matriz e da
Liberdade, onde existem barracas com
venda de comidas e bebidas, lugar de
reunião de parentes e amigos, de flertes
e conversas animadas acompanhadas de
uma bebida e algum petisco da

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DOSSIÊ IPHAN {Festa de Sant’Ana}

Compondo o cenário da Festa


novenas e missas. Estes momentos são
desfrutados, geralmente, por mais que o

há o Pavilhão de Sant'Ana, uma área


dobro de público comportado no
delimitada pela paróquia com o auxílio
interior da Catedral, pois são instalados
da Prefeitura Municipal ao redor da
telões ao lado do palco do pavilhão,
Catedral de Sant'Ana, onde ocorrem os
através dos quais as celebrações são
eventos sócio-culturais promovidos pavilhão, que se estendem até meia
transmitidas. Todas as noites, durante
pela paróquia, como apresentações de noite, dando lugar à intensa
as novenas, centenas de cadeiras são
artistas locais, a venda de artesanato e programação dos clubes e da Ilha de
dispostas em frente aos telões, para que
comidas típicas, o Jantar e a Feirinha Sant'Ana.
os fiéis possam desfrutar de um mínimo
de Sant'Ana. Além de abrigar toda a O evento que se destaca como
de conforto. Ao término das
programação sociocultural realizada um acontecimento lúdico e profano no
celebrações reigiosas, as cadeiras são
pela paróquia, o pavilhão funciona Pavilhão é a Feirinha de Sant'Ana,
removidas para dar lugar às
como uma extensão da Catedral nos realizada sempre na ultima quinta-feira
apresentações culturais no palco do
momentos de celebração, como nas do mês de julho, feriado municipal em
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DOSSIÊ IPHAN {Festa de Sant’Ana}

homenagem à padroeira. A feirinha é o passado, apreciar a culinária, festejar, carnavalescos de Caicó, que
ponto de encontro entre peregrinos, encontrar amigos, etc. confeccionam camisetas específicas
turistas, famílias de Caicó e migrantes, O nome no diminutivo – para a feirinha, realizando um
os chamados “caicoenses ausentes.” feirinha – exprime o afeto que o verdadeiro carnaval fora de época
Nesse momento, evidencia-se a caicoense tem para com o evento, mas dentro da principal festa religiosa da
estratificação social identificada nos não condiz com a sua grandiosidade, região. A venda de bebidas alcoólicas
diferentes estilos de vida, visíveis nas pois trata-se de um dos eventos mais na Feirinha de Sant'Ana é um assunto
práticas e atitudes correspondentes à esperados e frequentados da Festa de um tanto polêmico, muitos devotos
posição social de cada grupo. Os filhos Sant'Ana e extrapola os limites do sustentam a opinião de que a paróquia,
das famílias mais abastadas disputam Pavilhão, território “oficial” da por reconhecer que o álcool é
com as pessoas de origem mais feirinha, se estendendo até a Praça responsável pela desestruturação da
humildes os espaços cobiçados da praça Senador Dinarte Mariz (Praça da
pública durante o dia animado por trios Liberdade) localizada na quadra ao lado
de forró. Representantes da política do Pavilhão. São praticamente duas
local e regional não deixam de feirinhas antagônicas, mas que ocorrem
participar desse momento de grande em harmonia: aquela “oficial”, onde se
visibilidade social. As casas de família congregam as famílias no espaço
acolhem todos os parentes e amigos, respeitoso organizado pela paróquia; e
aplicando o preceito cristão da outra paralela na Praça da Liberdade,
generosidade e hospitalidade. Todos realizada de forma espontânea pelos
aproveitam a ocasião para lembrar o jovens integrantes de blocos

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DOSSIÊ IPHAN {Festa de Sant’Ana}

instituição familiar, não deveria bastante singular de fazer filhós, uma frequentadores quanto para
permitir a comercialização dese tipo de massa frita à base de batata coberta com acondicionar os produtos
bebida. No entanto a paróquia não vê o mel de engenho ou mel de rapadura; comercializados. A falta de uma
problema nisso, pois consideram que ou o mítico chouriço, um doce feito padronização nas barracas além de
aqueles que frequentam a feirinha ou o com sangue de porco. Como afirmou causar impacto negativo do ponto de
pavilhão ao longo da Festa consomem um dos participantes da feirinha, “no vista estético, gera problemas em sua
bebida alcoólica de forma moderada. dia da feirinha, ninguém faz comida em montagem e distribuição. Ainda assim,
Além disso, sua comercialização e o casa, e você não vê ninguém nos a feirinha é o evento social mais
apoio dado por uma das maiores restaurantes da cidade, tá todo mundo significativo da Festa de Sant'Ana, é
cervejarias do país (Brahma Chopp) são comendo na feirinha.” Em termos nela onde se aglutinam os elementos
fontes de renda fundamentais para estruturais, a feirinha conta com mais significativos da identidade
cobrir os gastos da realização da Festa. centenas de mesas distribuídas no seridoense, representados pela
É também na feirinha onde se espaço do pavilhão, e com a montagem culinária, artesanato e manifestações
pode encontrar os pratos mais típicos da de tendas e barracas onde são artísticas, assim como pela
culinária seridoense: galinha caipira, comercializadas bebidas e comidas hospitalidade bastante peculiar, que se
bode assado, buchada, panelada, carne típicas. Nos últimos anos a feirinha vem faz questão de ser expressa pelas
de sol, paçoca, entre outras iguarias são enfrentando sérios problemas com pessoas de Caicó.
itens indispensáveis como prato relação à sua estrutura, os
principal da maioria das refeições em organizadores reclamam sobretudo da
dias de festa. A doçaria seridoense é falta de espaço e de instalações
bastante peculiar, com um modo adequadas para receber tanto os

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DOSSIÊ IPHAN {Festa de Sant’Ana}

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DOSSIÊ IPHAN {Festa de Sant’Ana}

A Cavalgada de Sant‟Ana é
santa e receber benção para seus caminhões que transportavam os
animais. Por volta da década de 1970, camponeses em dias de feiras e festas
para a cidade.
uma expressão da devoção dos
Desde 2002, um grupo de
vaqueiros à santa. Nas décadas de 1950
caicoenses retomou essa tradição e, em
a 1970 este evento, então denominado
conjunto com a Associação dos
cavalaria, era celebrado pelas pessoas
Vaqueiros, realiza no primeiro domingo
que residiam na zona rural do
da Festa a Cavalgada de Sant´Ana. O
município de Caicó. Estas pessoas
evento, além de contar com a
usavam os animais (jegues, mulas e
participação dos cavaleiros que residem
cavalos) como único meio de
nas zonas rurais, atrai também pessoas
transporte, sobretudo para se dirigir à
que residem em Caicó, cidades vizinhas
cidade nos dias de feiras, trazendo seus
com a chegada do automóvel à zona e amantes das vaquejadas. Os
produtos para comercializarem.
rural do município, esta expressão foi participantes, montados em seus
Estando em Caicó no período da Festa
extinta. O meio de transporte utilizando cavalos e carros de bois, alguns
de Sant'Ana, estes agricultores se
os animais passou a ser substituído por trajando a vestimenta típica do vaqueiro
organizavam em cavalgada até o pátio
carros, sobretudo caminhonetes e sertanejo – perneira, guarda-peito,
da Catedral de Sant'Ana para louvar a
gibão e chapéu de couro – percorrem as
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DOSSIÊ IPHAN {Festa de Sant’Ana}

principais ruas e avenidas da cidade, com a cavalgada outro evento


saindo do Parque de Exposições de tradicional da foi reavivado, o Leilão de
Caicó, na BR 427, com destino ao Pátio Sant'Ana, que antigamente logo após a
da Catedral de Sant'Ana. Durante o celebração da chegada da cavalaria.
percurso da cavalgada os participantes Segundo um dos organizadores da
conduzem estandartes, há vaquejada, em 2001 o Leilão de
acompanhamento de músicas religiosas Sant'Ana arrecadou cerca de R$ 400,00
e diversas outras aclamações como (quatrocentos reais), a partir de 2002
preces e aboios. Ao chegarem, são com a retomada da antiga cavalaria,
recebidos com a celebração de uma hoje chamada cavalgada, o leilão de
missa e com a benção aos animais. É Sant'Ana foi reencontrando seus dias de
um evento que une a devoção do explendor, culminando numa
seridoense às narrativas de fundação da arrecadação de mais de R$ 10.000,00
cidade de Caicó, que teria surgido a (dez mil reais) em 2009.
partir das preces de um vaqueiro.
Em 2002, quando a cavalgada
foi retomada, houve a participação de
cerca de 40 montarias, em 2007 este
número subiu para cerca de 300
montarias, com um recorde de mais de
400 participantes em 2009. Juntamente

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DOSSIÊ IPHAN {Festa de Sant’Ana}

A carreata de Sant'Ana, também Para se chegar ao atual percurso, os ainda assim foi contabilizado um
denominada carreata dos motoristas, organizadores fizeram diversos montante de mais de 60 caminhões que
ocorre sempre na noite da novena experimentos, partindo de lugares receberam benção no largo da Catedral.
dedicada aos motoristas, última sexta- distintos, como do clube dos Atualmente a carreata é
feira da Festa de Sant'Ana, desde a caminhoneiros localizado às margens organizada pela Associação dos
década de 1940. Não há registros do açude Itans. Conforme o Caminhoneiros de Caicó, que se divide
precisos a respeito da origem da crescimento do número de nas tarefas de buscar patrocínio,
carreata, mas especula-se que ela tenha participantes, assim como do porte dos mobilizar os motoristas e de ornamentar
sido criada como forma de pagamento veículos (caminhões e carretas), a o caminhão que carregará a imagem
de promessa de um devoto. Ela carreta sofreu uma redução no seu principal de Sant'Ana e a de São
congrega caminhoneiros, motoristas, percurso, passando a percorrer apenas Cristóvão, padroeiro dos motoristas.
motoqueiros e até mesmo ciclistas e as principais e mais largas avenidas de Desde que a carreata passou a ser
pedestres, que seguem em cortejo desde Caicó. Em suas primeiras ocorrências, a organizada pela Associação dos
o Parque de Exposições localizado na carreata aglutinava não mais do que 20 Caminhoneiros, em 1991, algumas
BR 427 até a Catedral de Sant'Ana, veículos, chegando hoje a mais de 300 inovações foram levadas à cabo, como
seguindo praticamente o mesmo entre carros, motos e caminhões. algumas mudanças no percurso, ou a
percurso da cavalgada. Ao chegarem Segundo os organizadores, em 2009 busca de patrocínio junto a empresas do
na Catedral, os motoristas e seus mesmo com a alteração em seu ramo rodoviário, o que possibilitou, por
veículos recebem bençãos de um padre percurso no sentido de facilitar o fluxo exemplo, em 2007 a participação de
e acompanham a novena em sua de veículos, a carreata enfrentou um veículos da “Fórmula Truck” na
homenagem. sério problema de congestionamento, carreata. Empresas fabricantes de

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DOSSIÊ IPHAN {Festa de Sant’Ana}

caminhões, concessionárias, postos de ornamentação do veículo que carrega as antigos de veículos são outras atrações
gasolina e comerciários do ramo imagens, com a compra de fogos de que fazem da carreata um evento
automotivo apoiam financeiramente a artifícios e com a oferta oferecida à bastante peculiar da Festa de Sant'Ana.
carreata, cobrindo custos com a paróquia. A decoração e os modelos

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DOSSIÊ IPHAN {Festa de Sant’Ana}

As celebrações mais importantes da Catedral, e ainda um momento de


Festa, são as Missas de Abertura, preparação para a Procissão de
realizada na quarta-feira, a Missa Encerramento. A missa começa às
Solene celebrada às dez horas da manhã 10:00h e finda por volta do meio-dia. A
no último domingo da festa, e a grande igreja fica completamente lotada com
procissão de encerramento. Ápice da pessoas tentando assisti-la até mesmo
festividade e antecedendo o momento do lado de fora da Catedral. A
final da festa, a procissão reúne grandiosidade que esse evento assume é
peregrinos, população local, retratada pelo Monsenhor Antenor,
autoridades religiosas e civis, Padre Emérito da Paróquia de Sant´Ana
percorrendo as principais ruas da como:
[...] Culto divino que se centraliza na altar e da igreja fica diferenciada dos
cidade: uma multidão de fiéis
eucaristia. No entanto, o povo se encanta bem demais dias da festa; com especial
acompanha o andor da Gloriosa
mais com as novenas, que são muito bonitas, decoração de enfeites e flores, a igreja
Sant'Ana, pagando promessas, entoando
muito solenes; mas [...] não teria sentido uma
fica no maior esplendor. Todo esse
cantos e orações. Após o cortejo, há festa de padroeiro sem a missa solene, a
aparato é acompanhado das vestes
uma missa campal, seguida da eucaristia (informação verbal, julho de 2007).
solenes dos celebrantes e das roupas de
exposição da imagem da Santa para É na Missa Solene que muitos
luxo que o público faz questão de
veneração. A Missa Solene acontece devotos aproveitam para pagar
ostentar.
sempre no último domingo da festa. É promessas. Espaço onde o sagrado, com
Algumas pessoas fazem questão
um momento em memória ao dia de suas imagens, se impõe e pleiteia a
de assistir a missa de pés descalços ou
Sant‟Ana, ápice da religiosidade na atenção dos fiéis. A ornamentação do

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DOSSIÊ IPHAN {Festa de Sant’Ana}

vestindo roupa branca. São inúmeros os há mais de trinta anos arca com os público de curiosos para ver como ficou
meios de se diferenciar e assim cumprir custos de trazer uma equipe de a ornamentação daquele ano e já para
o pagamento votivo. A Missa é também ornamentadores de João Pessoa – PB e deixar alguma oferta para a santa.
um momento de agradecimento por de importar flores naturais diretamente
mais um ano de Festa de Sant‟Ana. A de São Paulo – SP.
missa é transmitida desde tempos Depois da preparação dos
imemoriais pelas rádios da região do andores as imagens são retiradas do
Seridó, e em 2007 teve sua primeira altar da Catedral , único dia do ano que
transmissão ao vivo via internet. a imagem de Sant'Ana deixa seu nicho.
Ao término da Missa Solene As poucas pessoas que tem acesso ao
conclui-se a ornamentação dos andores interior da Catedral naquele momento
utilizados para conduzir as imagens de aplaudem fervorosamente o momento
Sant'Ana e São Joaquim durante a em que a imagem é retirada do altar.
procissão. O andor é levado para o Com muito zelo ela é acomodada no
interior da Catedral, que permanece de andor, e caprichosamente recebe os
portas fechadas até a conclusão dos últimos retoques dos ornamentadores,
trabalhos de ornamentação, iniciados na que trabalham o tempo inteiro com uma
noite anterior com a colocação das introspecção perceptível, demonstrando
bases nas quais são fixadas as flores. A fé e dedicação ao seu ofício. Por volta
ornamentação dos andores é das quatorze horas as portas da Catedral
patrocinada por uma única família, que são abertas novamente, recebendo um

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DOSSIÊ IPHAN {Festa de Sant’Ana}

Com a imagem de Sant'Ana já final, depois que a imagem da Santa durante os pouco mais de dois minutos
acomodada em seu andor e retorna ao interior da Catedral, ocorre em que os fiéis se engalfinham na
devidamente ornamentada, os devotos um segundo momento do beija, tentativa de pegar ao menos uma da
podem adentrar à Catedral onde já estão acompanhado de uma acirrada disputa rosas que acompanhou Sant'Ana em seu
posicionados próximos à imagem os pelas flores que ornamentam o andor e cortejo devocional. Nesse sentido, há
cestos que recolherão as ofertas a imagem. Muitos acreditam que o chá uma organização prévia do espaço,
(doações) dos fiéis. Esse é um momento dessas flores é milagroso, outros realizada antes mesmo da procissão,
particular da Festa de Sant'Ana de guardam como lembrança ou fazem o dispondo-se os bancos da Catedral em
Caicó, quando os devotos veneram a voto de mantê-las intactas até a um formato de meia lua ao redor da
imagem de Sant'Ana, depositam sua procissão do ano seguinte, outras imagem, com dois ou três sacristões
oferenda e com um gesto de profunda pessoas se contentam simplesmente em sempre atentos a qualquer
reverência beijam a própria mão e tocar o andor ou os pés da imagem. É desestabilização na imagem. Em 2010 a
tocam a imagem, transferindo todo seu um momento de profunda manifestação imagem principal de Sant'Ana deixou a
afeto simbolizado no beijo, este é de fé e reverência à Senhora Sant'Ana, Catedral para passar pelo seu quarto
denominado o momento do beija, gesto que exige muito esforço e organização processo de restauração, e ao que tudo
que se repete desde a cerimônia pública por parte da comissão paroquial indica ganhará uma redoma de vidro
de instalação da Povoação do Caicó, em responsável pelo momento. Há um para não sofrer mais deterioração. A
1735, antes mesmo da criação da cuidado especial em evitar qualquer paróquia já demonstra preocupação
paróquia de Sant'Ana. Após a procissão acidente com a imagem, sobretudo com a reação dos devotos, que não mais
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DOSSIÊ IPHAN {Festa de Sant’Ana}

poderão tocar a imagem. Contudo, é apresenta uma tradição estética distinta imagem primitiva foi leiloada, ficando
importante equacionar as perdas e daquela difundida entre os santeiros do sob posse da família do Sargento Mor
ganhos em relação ao isolamento da sertão seridoense. Em uma outra Manoel Gonçalves de Mello, que a
imagem, uma vez que ao longo dos versão, a imagem teria sido trazida do deixou como herança para seu filho,
anos foram observadas diversas avarias Rio de Janeiro pelo padre Francisco de José Batista de Mello. Sem herdeiros, o
muitas vezes causadas por devotos Brito Guerra, no início do séc. XIX. Pe. José Batista teria doado a imagem
demasiado fervorosos. Tudo que se sabe, através dos registros primitiva à um dos descendentes da
Segundo o laudo dos paroquiais, é que a imagem principal de família Fonte Rangel. Sant'Ana
restauradores Hélio de Oliveira e Sant'Ana está em Caicó desde 1811. primitiva foi finalmente devolvida à
Neilton Santana da Silva, “no Em janeiro de 2010 a Paróquia de paróquia em julho de 1999, onde
panejamento das figuras é flagrante o Caicó entrou com pedido de permanece em um nicho localizado em
desgaste que ao longo dos anos o tombamento da imagem principal de uma das paredes laterais da Catedral de
conjunto vem sofrendo dado o apego Sant'Ana. Uma outra imagem primitiva Sant'Ana. Esta imagem é tombada pelo
dos fiéis em tocar o seu referencial de de Sant'Ana, que é retratada em pé, está IPHAN, conforme notificação nº 887 de
fé”. A origem da “imagem principal da presente em Caicó pelo menos desde a 25 de junho de 1962. Em março de
Senhora Sant'Ana”, retratada sentada instalação oficial da povoação do 2009 um episódio curioso marcou a
com uma jovem ao lado, permanece Caicó, em 1735. Foi doada pelo vida devocional dos caicoenses, quando
desconhecida. Uma versão dá conta de cearense Luiz da Fonte Rangel, ficando foi anunciada a retirada da imagem de
que a imagem foi escupida em Caicó, no altar principal da Igreja de Sant'Ana Sant'Ana para restauração. Houve uma
por Tomás de Aquino, versão pouco até o ano de 1823, quando foi mobilização popular que resistia à idéia
sustentada, uma vez que imagem substituída pela imagem atual. A de retirar a Senhora Sant'Ana de seu

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DOSSIÊ IPHAN {Festa de Sant’Ana}

Cicco em outubro de 1919. Segundo


relatos de Ms Antenor Salvino de
Araújo14, a substituição da imagem de
Sant'Ana, que naquela ocasião passou a
ser denominada Sant'Ana Velha, a
mesma que hoje é denominada
principal, causou insatisfação dos
“lar”. No entanto, a imagem destinada à devotos. Ainda segundo Ms. Antenor, a
restauração não era a principal, que sai Sant'Ana Velha foi restaurada em 1935,
atualmente em procissão, como e somente em 1947 foi recolocada no
pensavam os devotos, mas sim a altar central da Catedral de Sant'Ana,
imagem primitiva, tombada desde passando a ser denominada como a
1962. Apesar de seu enorme valor imagem principal da Senhora Sant'Ana.
histórico e artístico, diante dos fatos
ocorridos percebeu-se que a imagem
primitiva de Sant'Ana não possui o
mesmo valor afetivo que tem a imagem
principal para os caicoenses.
Há ainda uma terceira imagem
de Sant'Ana, também retratada de pé,
que foi entronizada pelo Cônego Celso

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DOSSIÊ IPHAN {Festa de Sant’Ana}

A procissão final da festa de


Sant‟Ana de Caicó continua sendo até
hoje o maior aglutinador de todos os
festejos religiosos da região do Seridó,
reunindo um público estimando em
mais de cem mil pessoas no ano de
2009, bastante significativo para uma
cidade de pouco mais de sessenta mil
habitantes. A cada ano esta celebração
agrega um número maior de
participantes, oriundos de diversos
lugares. Desde a saída até retornar para
o largo da catedral, onde é celebrada
uma missa campal, torna-se notória a relação dos fiéis com a imagem da Emérito da Paróquia de Sant'Ana dá o
devoção a Sant‟Ana. Em se tratando da santa, o Monsenhor Antenor, Padre seguinte depoimento:

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DOSSIÊ IPHAN {Festa de Sant’Ana}

“Eu acho Sant´Ana um encanto o ano todo,


porém o momento alto, o ápice é quando ela
toma posição na soleira da Catedral, daí, pára.
Então, ela vai, o andor começa a ser dirigido
pelos devotos. Ela vem do interior da igreja e
toma posição na soleira da Catedral. Todo
mundo vê, bate palmas. É uma coisa!!! Eu fico
olhando... Cada ano pra mim é novidade. Eu
acho que naquele momento tudo vira outra
forma.
Parece que ela “envivece”, parece que ela está
se comunicando, parece que ela está ouvindo,
parece que está dizendo, parece que ela está...
é uma coisa de impressionar, é um estrondo!
(julho de 2007)”.

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DOSSIÊ IPHAN {Festa de Sant’Ana}

O cortejo inicia-se sempre às 16:30h, significação especial para o povo de Federal vai à frente do cortejo, abrindo
quando a multidão devota deixa a Caicó, como: a Catedral de Sant‟Ana; a espaço para a procissão passar. Em
Catedral percorrendo as principais ruas Praça da Matriz; a Praça da Liberdade; seguida formando duas fileiras
e avenidas da cidade de Caicó, o Mercado Público; o Grupo Escolar paralelas, vem os coroinhas seguidos do
cumprindo o seguinte itinerário: Av. Senador Guerra e a Prefeitura de Caicó. grupo de escoteiros abrindo o cortejo,
Seridó, Rua Pedro Velho, Av. Celso Os moradores das ruas e avenidas por entre as fileiras um diácono carrega um
Dantas e Av. Cel. Martiniano, onde passa a procissão contribuem crucifixo conduzindo uma terceira fila
retornando pela Av. Seridó até chagar deixando os caminhos livres, sem composta pelos porta-bandeiras das
novamente à Catedral de Sant‟Ana. carros ou motos estacionados e, mesmo ordens religiosas e pastorais que
O percurso atual teve início em aqueles que não acompanham a compõem a Diocese de Caicó.
meados da década de 1990, diante do procissão participam dela, estendendo Seguindo os escoteiros nas fileiras
crescimento de número de fiéis, fez-se lençóis brancos e exibindo imagens da laterais, vem as ministras da eucaristia
necessário aumentar o caminho santa em suas janelas. Ao longo de todo entre as quais vem tocando a Banda
percorrido. Com as proporções que a o trajeto ouve-se os foguetórios em Recreio Caicoense, a Furiosa,
procissão foi tomando também foi homenagem à Senhora Sant'Ana, juntamente com duas fileiras formadas
preciso introduzir carros de som ao misturando-se ao som dos cânticos e lado a lado por associações e pastorais
longo do cortejo, para facilitar a orações declamados pelos devotos. religiosas, condutores de estandartes e
comunicação entre os celebrantes e os A procissão apresenta uma bandeiras. Fechando a comissão de
devotos, evitando assim a sua organização básica que parece se repetir frente da procissão, ao fim das fileiras
dispersão. Nesse percurso, há lugares ao longo dos anos, com pouca variação: laterais estão os seminaristas da
de memória que possuem uma os batedores da Policia Rodoviária diocese, entre eles as autoridades

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DOSSIÊ IPHAN {Festa de Sant’Ana}

eclesiásticas, formando cinco filas conseguem contentam-se em segurar o andor, num furor que não se pode
paralelas. Na fila central, o Bispo é o ombro de alguém que o esteja conter. Ao chegar no interior da
primeiro à sua esquerda, o Pároco de alcançando, formando verdadeiros Catedral, em frente ao altar principal, a
Sant'Ana. Não se sabe precisar desde cordões humanos que emanam a partir imagem de Sant'Ana é posicionada para
quando passaram também a formar um da imagem, como se as bençãos da o segundo momento do beija, quando
cordão humano composto de jovens santa fossem atravessando os corpos, além de tocar a santa, os devotos
voluntários da paróquia, separando as chegando a cada um dos fiéis. O andor arrancam as flores do andor, cujo chá
autoridades eclesiásticas da multidão é objeto muito disputado, todos querem acredita-se ser milagroso. Enquanto
que vem seguindo o cortejo, ter o prestígio ou cumprir promessa de isso, o clero se posiciona para a
envolvendo a primeira imagem carregá-lo, nem que seja por poucos celebração de uma missa campal de
conduzida, a de São Joaquim, marido segundos. Os que querem ter o encerramento, no pátio frontal da
de Sant'Ana, que certamente goza de privilégio de carregar o andor de Catedral, lugar que se torna minúsculo
prestígio bem menor em comparação à Sant'Ana desde sua saída da Catedral já para as quase cem mil pessoas que
sua esposa, que vem em seguida. A chegam ao recinto cerca de duas horas acompanham o cortejo. Na procissão de
procissão de encerramento da Festa de antes da saída do cortejo. As imagens encerramento a fé e devoção à Senhora
Sant'Ana é um momento magnífico, um de Sant'Ana e São Joaquim são Sant‟Ana emanam nos gestos de fiéis
desfile de comoção e fé do sertanejo, recebidas de volta à Catedral com o que vem acompanhar sua padroeira em
que não mede esforços no pagamento repicar dos sinos e fogos de artifícios. cortejo solene pelas ruas e avenidas da
de suas promessas, que se engalfinha na Enquanto a imagem toma posição para cidade de Caicó. Muitos são os
tentativa de ao menos tocar um pedaço voltar ao altar, os devotos avançam para pagadores de promessas que vem
do andor de Sant'Ana; os que não retirar as flores que ornamentam seu agradecer as “graças alcançadas” por
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DOSSIÊ IPHAN {Festa de Sant’Ana}

intercessão da avó de Jesus. Percorrer o principais destaques deste evento que que só depois de um ano deixará
trajeto da procissão conduzindo o andor culmina com a bênção final e o novamente seu altar-mor, para visitar as
da padroeira constitui-se como um dos arreamento do Estandarte de Sant'Ana, ruas de Caicó.

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DOSSIÊ IPHAN {Festa de Sant’Ana}

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DOSSIÊ IPHAN {Festa de Sant’Ana}

Principal
Liberdade, o Poço de Sant‟Ana, o
acontecimento
Colégio Diocesano Seridoense (CDS),
os clubes (Atlético Clube Coríntians de
sociocultural de todo o sertão do Rio
Caicó, Caicó Iate Clube, etc.) e, hoje, a
Grande do Norte, as festas religiosas
são sempre motivo de Ilha de Sant‟Ana, destacam-se como

confraternizações, de encontros ou espaços onde acontecem as festas.

reencontros das famílias, dos amigos e Durante as comemorações a Senhora

dos visitantes que se unem nas Sant‟Ana, esses lugares transformam- identidade construída, às vezes, mais na
homenagens à Padroeira da cidade. se num novo “espaço” onde funcionam subjetividade do “sentir-se caicoense”
Assim como a Senhora Sant´Ana abriga múltiplas redes de sociabilidades. Nesse do que numa identidade religiosa. Não
docemente em seu coração todos os sentido, cada festa cristaliza-se como obstante ser uma demonstração de fé e
filhos dessa e de outras terras, também um novo cenário recuperado pela devoção religiosa, a Festa de Senhora
a sua Festa comporta festividades, memória coletiva que se faz presente Sant´Ana sempre foi, como comprovam
comemorações, solenidades cívicas e em todos aqueles que vivenciam tais os registros históricos, objeto de
eventos diversos organizados não pela práticas. São espaços de encontro nos encontros e congraçamentos.
paróquia, mas pelos poderes públicos quais o sagrado e o profano se Apresentava-se e ainda se apresenta
municipal e estadual e pela iniciativa misturam no sentido de estabelecer como tempo propício de retorno à
privada. A Catedral de Sant‟Ana, o laços de sociabilidade e, cidade, quando o caicoense (o “filho
Pavilhão de Sant'Ana, a Praça da principalmente, de afirmação de uma ausente”) deixa-se levar pelos caminhos
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DOSSIÊ IPHAN {Festa de Sant’Ana}

que o reconduzem à sua terra natal para chegada dos conterrâneos costuma ser dos que vieram com os que sempre
compartilhar dos atos litúrgicos e anunciada efusivamente pela imprensa permaneceram aqui,” escreveu o
festivos de exaltação à Padroeira. Num periódica. “A Festa oferece condições cronista.
gesto de pura cortesia e saudação, a para tudo isso, porque ela é o encontro

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DOSSIÊ IPHAN {Festa de Sant’Ana}

Com a intenção de reviver o tipo de bebida a ser consumida, políticas, representantes dos poderes
glamour e o encanto dos bailes do permitindo-se consumir apenas uísque públicos e lideranças religiosas de todo
passado, animados musicalmente por ou vinho; traje passeio completo para o estado e até mesmo de outras partes
grandes orquestras, em 1974, foi os homens e mulheres, as quais só terão do país. E a juventude festeira? Para ela,
idealizada a Festa dos Coroas, ou Baile acesso ao baile se estiverem usando em substituição às soirées, a realização dos

dos Coroas, pelos senhores Darci vestido. Por sua vez, os homens, ao shows de grandes bandas no Caicó Iate

Fonseca, Automendes José e Erivanor adentrarem nos salões do Atlético Clube, na ASSEC, na AABB, na Ilha de
Sant'Ana e nos bares espalhados pela
Bezerra. O sucesso desse evento Clube Coríntians de Caicó, não podem
cidade. Nessas ocasiões, os jovens
festivo, sempre na última sexta-feira da em nenhum momento dispensar o uso
apresentam um visual despojado, trajam
Festa de Sant'Ana, terminou por do paletó. O acesso ao Baile é feito
roupas modernas de acordo com a moda
substituir o antigo Baile de mediante a aquisição de uma mesa, com
ditada pela cultura de consumo em vigor e
Encerramento que era realizado após a direito a entrada de quatro pessoas, adotam atitudes independentes.
procissão. Tendo um público assíduo, a custando em torno de trezentos reais, ou Acompanham com o corpo o ritmo da
cada ano atrai novos freqüentadores de através da compra de senhas avulsas, música sertaneja, o gingado do forró, o
diferentes categorias sociais do Rio saindo por volta de cem reais por compasso do axé e o molejo do pagode.
Grande do Norte e de outros estados pessoa. Em 2008 o Baile dos Coroas foi Agrupam-se por faixa etária, demarcam
brasileiros. O seu sucesso reside no transmitido ao vivo pela primeira vez territórios na praça e no clube e vivem a

diferencial: ambiente totalmente através da emissora TV União, fugacidade do momento num “ato coletivo
jubilatório.” Para o público jovem duas
iluminado, com guarda de honra na demonstrando a notoriedade do evento,
programações se destacam: a Festa da
entrada, animado por grandes frequentado pelas mais abastadas
Juventude e a Ilha de Sant'Ana.
orquestras de baile, com restrição ao famílias, empresários, personalidades

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DOSSIÊ IPHAN {Festa de Sant’Ana}

A Festa da Juventude, realizada há mais cantores que fazem sucesso no funcionando desde 2007, ano em
de vinte anos, surgiu em contraposição momento, com preferência pelas bandas agregou espaço à Festa de Sant'Ana
ao Baile dos Coroas, com toda a sua de forró e axé. pela primeira vez. O Complexo
pompa e formalidade. Segundo os Certamente a programação Turístico Ilha de Sant'Ana comporta
organizadores, o Baile dos Coroas não festiva não religiosa mais frequentada uma estrutura de bares e restaurantes,
despertava interesse no público jovem, pela juventude é a que ocorre na Ilha de além de um anfiteatro, um ginásio
que preferia uma programação festiva Sant'Ana, ilha fluvial localizada em um poliesportivo e palcos para shows.
mais despojada, ficando sem uma dos rios que corta a cidade de Caicó, o Durante a Festa de Sant'Ana a Ilha
alternativa na sexta-feira da Festa de rio Seridó. Foi inaugurada oficialmente recebe um parque de diversões um
Sant'Ana. Foi então que um grupo de em julho de 2008, mas já vem grande palco central, onde ocorrem os
amigos, funcionários do Banco do principais shows, com bandas
Brasil, decidiram criar a Festa da de sucesso regional e
Juventude para acolher esse público, nacional. Sem sombra de
ocorrendo nas dependências da dúvidas é o espaço que mais
Associação Atlética Banco do Brasil agrega a juventude festeira,
(AABB). A Festa da Juventude pois seu acesso é totalmente
acontece sempre na última sexta- gratuito, com as atrações em
feira da Festa de Sant'Ana, mesmo sua maioria patrocinadas pelo
dia e horário do Baile dos Coroas, governo do estado em parceria
sempre animada por bandas e com a prefeitura municipal.

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DOSSIÊ IPHAN {Festa de Sant’Ana}

A Festa de Sant'Ana é o lugar


promovida pelo Colégio Diocesano
Seridoense, criado em 1942, mais
conhecido como o CDS.
privilegiado dos reencontros, é a
A festa do reencontro teve início
oportunidade dos “filhos ausentes”
no ano de 1983 sob iniciativa da “Loja
retornarem para visitar seus familiares e
Maçônica Regeneração do Seridó”,
amigos. O período da Festa, que
então presidida pelo Venerável Mestre rigor em relação aos trajes. Em sua
coincide com o recesso escolar da
Francisco Santiago. Segundo seus primeira edição houve uma parceria
metade do ano, propicia a oportunidade
organizadores, o objetivo da festa do entre a igreja católica e a loja maçônica
de muita gente retornar ao seu lugar de
reencontro era agregar mais uma Regeneração do Seridó, que só se
origem. Além do Pavilhão de Sant'Ana
atrativo à grande Festa de Sant'Ana, manteve mesmo na primeira festa. A
e das celebrações religiosas, existem
propiciando um espaço festivo de festa do reencontro já teve como palco
pelo menos duas celebrações que são
reencontro entre o citadinos e seus a Assoiação AtlÉtica Banco do Brasil
diretamente destinadas ao objetivo de
conterrâneos que viviam fora. (AABB), a Associação dos Servidores
promover o reencontro de amigos e
Ocorrendo sempre no último sábado da da Caern de Caicó (ASSEC) e até
familiares que vivem distante e que
Festa de Sant'Ana, a festa do reencontro mesmo o Atlético Clube Coríntians de
aproveitam a ocasião da Festa de
teve seus estilo inspirado no baile dos Caicó, mesmo lugar onde ocorre o baile
Sant'Ana para rever os seus. São a Festa
coroas, que acontece no dia anterior, dos coroas, finalmente se fixando pelos
do Reencontro e as festas de Ex-
mas certamente com menos pompa e últimos dez anos no Caicó Iate Clube.
Alunos, com destaque para aquela
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DOSSIÊ IPHAN {Festa de Sant’Ana}

Assim como no baile dos coroas, o (CDS), esta última apontada como a A festa do ex aluno envolve
acesso à festa do reencontro é pago por mais tradicional. As primeiras uma composição ritual um pouco mais
meio da aquisição de mesas ou de tentativas de se organizar um festa em elaborada, com a celebração de uma
senhas avulsas, comportando um homenagem aos ex alunos do CDS missa, seguida de aulas da saudade das
público que varia entre oitocentas e mil datam de meados da década 60 do séc. turmas de 10, 20, 30, 40 e 50 anos,
pessoas. O principal interesse dos XX, mas sem uma continuidade. finalizando com uma festa animada
participantes nessa festa, conforme seus Apenas a partir de 1986, com os geralmente por alguma banda da região.
relatos é o da confraternização entre esforços da Associação dos Ex Alunos Outra característica particular é o
aqueles residentes na cidade, e os do CDS, a festa passou a ter mais horário de sua realização, iniciando
amigos que retornam em época de consistência, ocorrendo a cada ano com sempre às oito e trinta da manhã do
férias coincidente com a Festa de um público cada vez maior. Um dos primeiro sábado da Festa de Sant'Ana,
Sant'Ana. É com esse espírito que objetivos da festa, em seus primórdios, com a celebração de uma missa na
transcorre a comemoração, muitos era o de arrecadar fundos para a igreja Matriz de São José, antiga capela
cumprimentos, abraços e conversas manutenção das dependências físicas do CDS, seguida das aulas da saudade.
calorosas, ao som das tradicionais do CDS, bem como das bolsas de A parte cerimonial é destinada
orquestras de baile. As festas de ex estudo que até hoje são concedidas para exclusivamente aos ex alunos, e só a
alunos propiciam outro espaço de estudantes de baixa renda. Há vinte e partir do meio-dia as portas do CDS se
reencontros, se tem conhecimento de quatro anos a festa do ex aluno do CDS abrem para acolher também familiares e
pelo menos duas: a do Centro é organizada e gerida pela sua amigos dos ex alunos. O público é
Educacional José Augusto (CEJA) e a Associação de Ex Alunos. limitado com a venda de uma
do Colégio Diocesano Seridoense quantidade de senhas equivalente ao

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DOSSIÊ IPHAN {Festa de Sant’Ana}

público máximo que comporta o


colégio, cerca de mil e quinhentas
pessoas, que tem direito a churrasco e
vinho à vontade. Tudo ocorre nas
próprias dependências do CDS, que
empresta momentaneamente seu espaço
formal de estabelecimento de ensino ao
orgiasmo festivo do reencontro. A cada
ano há homenagens à uma turma ou
grupo de ex alunos, dentre os quais
podemos encontrar várias
personalidades religiosas e políticas,
assim como empresários e profissionais
liberais bem sucedidos, formados nos
quadros de uma das mais respeitadas
instituições de ensino do estado.

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DOSSIÊ IPHAN {Festa de Sant’Ana}

Nas festas de padroeiro em geral, e


em especial, na Festa de Sant'Ana de
Caicó, nos deparamos com um conjunto
de ofícios e modos de fazer rituais e
cotidianos, cada qual com funções e
significados simbólicos, estéticos,
sociais e econômicos particulares,
atribuídos pelos executantes e por
apreciadores. São saberes e fazeres –
ligados à alimentação,à arte decorativa,
ao artesanato – que podem ser
encontrados em todos os municípios do
Seridó, concentrando-se em Caicó nos
períodos de festejps, sobretudos
naqueles em homenagem à Sant'Ana.
As comidas festivas, e os bordados
fazem parte da vida cotidiana dessa
população e configuram seu universo
cultural, sendo reconhecidos como
patrimônio cultural da região.
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DOSSIÊ IPHAN {Festa de Sant’Ana}

As festas de padroeiros, em parentes que moram distantes, para sertão nordestino. Muito embora o
especial a de Sant‟Ana, se constituem comemorar aniversários, casamentos e ofício seja de domínio de homens e de
como um momento ideal para os batizados e em outras datas especiais, mulheres, os primeiros têm uma
caicoenses viverem o passado no como as festas de fim de ano e Natal. presença mais expressiva na produção
presente, ao saborearem as apetitosas Dentre as “comidas festivas” presentes do queijo de manteiga. As mulheres se
comidas de outrora. Apesar de na culinária do município de Caicó e relacionam mais com a produção do
pertencer ao domínio e ao espaço das que são degustadas na Festa de queijo de coalho. Mesmo assim, a
donas de casa, algumas se especializam Sant‟Ana, figuram pratos tradicionais produção de queijo é uma fonte de
na profissão e passam a ser convidadas como a buchada, a panelada, a fritada, a renda familiar, complementar ou
e / ou contratadas para preparar o galinha caipira, a carne de criação e de integral, que termina por envolver
cardápio de festas familiares e porco torrada, a paçoca de carne de sol, diversos membros do grupo doméstico.
comunitárias que são regadas a os queijos de manteiga e de coalho, os No imaginário coletivo, os queijos de
“comidas festivas.” A culinária do biscoitos (raivas, sequilhos, palitos) e coalho e de manteiga artesanais são
Seridó oferece uma variedade de os doces, como o chouriço e os filhoses comidas tipicamente nordestinas,
“comidas tradicionais” que são guarnecidos com mel. especialidades da culinária local.
disponibilizadas aos comensais em O ofício de queijeiro e o modo de Acredita-se que o queijo de coalho teria
ocasiões festivas. Essas são elaboradas feitura dos queijos de coalho e de surgido com a necessidade que tinham
com mais freqüência no ensejo de manteiga constituem um saber os viajantes, ao realizarem longas
festas de padroeiros, para recepcionar relacionado ao ciclo da pecuária no jornadas, de acondicionar o leite nas

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DOSSIÊ IPHAN {Festa de Sant’Ana}

mochilas (matulões) fabricadas a partir que a massa ganhe uma consistência ainda mantêm as formas e
do estômago de animais jovens. Com mais firme, recebendo, no final, o apresentações de acordo com as
isso, os viajantes observaram que o leite tempero da “manteiga da terra”. As técnicas e regras antigas.
coagulava e que a massa era muito denominações queijo de coalho e queijo No passado, com raríssimas exceções, o
saborosa. Daí surgiu o queijo de coalho. de manteiga devem-se, ofício de doceira e o modo de feitura de
Contudo, esse conhecimento já era respectivamente, ao uso, em suas chouriço, filhoses, biscoitos de goma de
dominado por alguns povos antigos, receitas, do coalho e da manteiga. Essas mandioca, assim como de outras
conforme nos lembra Cascudo (1973, iguarias são saboreadas frescas, guloseimas da doçaria seridoense, era
2004). Tanto o queijo de manteiga assadas, ou como “tempero” ou reservado às mulheres, como outras
como o de coalho têm no leite seu acompanhamento de alguns pratos atividades culinárias e domésticas.
ingrediente principal, diferenciando-se regionais. Com a fabricação Tratava-se de um saber-fazer
quanto ao sabor, ao modo de feitura, às industrializada dos queijos, um praticamente assistemático, aprendido e
formas de apresentação e de fenômeno surgido nas últimas décadas, transmitido no seio familiar, onde as
comestibilidade. Enquanto a fabricação os modos de feitura sofreram algumas humílimas doceiras, ainda meninas,
do queijo de coalho é baseada na modificações. Buscando ajustarem-se iniciavam-se na doçaria. Era exigido
simples coagulação do leite de vaca ou às normas da vigilância sanitária e dos esmero e dedicação na feitura dos
de cabra, por meio de produto químico mercados consumidores, muitos quitutes, sob pena de se pôr em risco a
ou de coalho animal e na prensagem da queijeiros passaram a seguir uma reputação da família. Em clima
massa, na do queijo de manteiga, o leite padronização em seus produtos, quanto familiar, algumas mulheres não se
é coagulado com o soro de leite e à forma, ao peso e à embalagem. A contentavam com a simples reprodução
depois é submetido ao cozimento, para despeito dessas modificações, alguns de “receitas da vovó” e inventavam

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DOSSIÊ IPHAN {Festa de Sant’Ana}

novas receitas e combinações a partir crescendo e que gera renda para a que ficam impressas nas guloseimas. É
dos elementos disponíveis no contexto. economia doméstica, um crescimento pelo nome delas que os produtos
Com o passar do tempo, esse saber- diretamente associado à valorização das circulam na comunidade. Além das
fazer vem sendo acumulado e “coisas da terra” nos mercados regional doceiras citadas e respectivas famílias,
transformado com novos ingredientes e e nacional. Todos os recursos materiais há muitas outras famílias
novas tecnologias. Antigamente, necessários para a feitura dos biscoitos desenvolvendo essa atividade na região.
mesmo existindo algumas doceiras que são oriundos das doceiras e de sua O estudo da importância dessa
faziam as especialidades por família. Em geral, a fabricação dos atividade e de sua relevância para a
encomenda, prática que ainda subsiste, doces envolve o trabalho de membros economia familiar ainda está por ser
a grande maioria da produção era para da família e de “ajudantes”, os quais feito.
consumo da própria família. As iguarias recebem salário pelo serviço prestado. O filhóes ainda é um doce
eram apropriadas para serem servidas A mulher continua à frente desse apreciadíssimo, mas segue receita
e/ou presenteados aos visitantes e segmento de produção alimentar, apesar diferente das variações da doçaria
convivas mais exigentes. Alguns tipos de a participação do homem vir portuguesa. No Seridó, ele é servido
eram fabricados principalmente para crescendo, nas últimas décadas, com mel feito de rapadura ou de
ocasiões especiais e pelas famílias que conforme observações das doceiras. engenho e é mais consumido no
tinham melhores condições Elas detêm o controle da produção e da carnaval, durante a Quaresma e na
socioeconômicas. Hoje, grande parte do comercialização dos doces e biscoitos, Festa de Sant'Ana. Segundo as doceiras,
que é produzido é comercializada na em parceria com familiares. Apesar da antigamente o filhós era produzido no
região e exportada para outras cidades. participação dos ajudantes na feitura dia de carnaval, conhecido como
Trata-se de uma atividade que vem dos “doces”, são as marcas das doceiras “domingo de entrudo” ou “domingo

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DOSSIÊ IPHAN {Festa de Sant’Ana}

mela-mela”, quando se faziam festas e pelas doceiras seridoenses, há aqueles uma prática muito antiga que continua
“mela-mela” com goma e outros em que se utiliza, como matéria-prima em vigor entre os seridoenses. Os
produtos afins pelas ruas da cidade. As básica, a fécula de mandioca, também biscoitos ainda são utilizados como
pessoas tinham o costume de se conhecida como polvilho, ou araruta. A guloseimas especiais para se
sujarem com goma e mel e saírem raiva, o biscoito de leite e os sequilhos, presentearem parentes e amigos, status
“melando” as outras, dentro das casas. ou iscas, são os três tipos de “biscoitos de que também goza o chouriço. O
A brincadeira era uma maneira de caseiros” mais requintados e mais chouriço é fruto de uma combinação
proporcionar um prazer a mais na apreciados pela população. A produção culinária de sangue e banha de porco,
alimentação da família e de integrar e o consumo desses biscoitos é mais rapadura, castanha de caju, leite de
vizinhos e amigos na alegria do período intensa nos períodos de festas na coco, farinha de mandioca, especiarias
carnavalesco. Outro fato associado à localidade, quando os moradores (canela, erva-doce, cravo, pimenta do
feitura dos filhoses, no período de costumam receber visitas de parentes reino e gengibre) e água. Algumas
carnaval, era a presença dos ou amigos em suas residências, pois os mestras costumam usar também um
“papangus”. Estes se fantasiavam com biscoitos caseiros são atrativos a serem pouco de gergelim e uma e sal. A
máscaras , trajavam-se com roupas oferecidos aos convivas. Afora as feitura acontece no espaço da casa e é
velhas e saíam assustando as pessoas, ocasiões festivas, os biscoitos são um evento culminante e ideal para se
principalmente as crianças, dentro de iguarias indispensáveis no “café de reunir a família “extensa” – parentes,
suas casas. Para que eles não fizessem finado”, oferecido aos parentes, amigos vizinhos e amigos – e para o sangue de
medo às crianças, os adultos davam- e conhecidos da família, após a missa porco tornar-se comestível. Para que
lhes filhoses com mel e, então, eles iam de trinta dias ou de ano do falecimento isso aconteça, são necessárias, em
embora. Dentre os biscoitos produzidos de um de seus membros. Trata-se de média oito horas de fogo doméstico e a

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DOSSIÊ IPHAN {Festa de Sant’Ana}

por alguns sobretudo, principalmente ou carne-seca, da lingüiça de carne


por ser feito de sangue de porco A bovina ou suína. Alguns marchantes
carne-de-sol, ou carne-seca, é a carne também são especializados na
bovina salgada de modo especial, uma preparação da buchada. Para realizarem
iguaria muito apreciada pelos suas atividades, a maioria deles precisa
seridoenses e produzida pelo da colaboração de ajudantes,
marchante. O ofício de marchante é conhecidos na região como abatedores,
perícia técnica de uma mestra – como é uma prática predominantemente magarefes e ajudantes. Geralmente, os
conhecida a mulher que faz o doce na masculina, normalmente aprendida e ajudantes tornam-se – posteriormente –
região – e de ajudantes, mulheres e transmitida na própria família ou entre marchantes ou somente abatedores,
homens. Estes últimos geralmente pessoas conhecidas, marchantes e responsabilizando-se apenas pelo abate
participam mexendo o doce no tacho. ajudantes. O marchante é um e pela preparação das carnes.
Apesar de o chouriço ser um doce comerciante especializado na compra, As denominações que a carne-
praticamente feito por mulheres, na venda e no abate de bovinos,
encontramos alguns mestres de caprinos, ovinos e suínos. Ele também
chouriço na região. O chouriço comercializa a carne desses animais e
permanece como uma iguaria singular pode realizar a castração artesanal dos
na doçaria sertaneja, uma guloseima machos. Além de suas atividades
não recomendada para pessoas doentes comerciais, ele também domina o modo
e apreciado, sobretudo, por ter sabor de conservação das carnes por meio do
doce. Mas é também um doce rejeitado salgamento e a feitura da carne-de-sol,

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DOSSIÊ IPHAN {Festa de Sant’Ana}

de-sol recebe estão associadas ao fato assada – na paçoca ou em pedaços. Já a base de vísceras finas, misturadas ou
de que, antigamente, em sua buchada é uma “iguaria festiva” da não com essas partes. Normalmente, as
preparação, ela era salgada e depois culinária sertaneja – feita ora com carne “buchadinhas” são cozidas
exposta ao sol ou em ambiente fresco ora como vísceras de caprinos ou conjuntamente com os mocotós, as
até ficar seca. Ao discorrerem sobre o ovinos – cujo modo estrutural de tripas e a cabeça da criação (nome
processo de fabricação dessa carne, os preparo, em especial seu recheio, associado a espécies de caprinos e
marchantes dizem que, no passado, ela apresenta variações de município para ovinos, assim como a carne desses
era feita por salgamento e secagem ao município. Contudo, em todas as animais), num caldo que serve para
sol e ao vento, para ser desidratada e situações, trata-se de uma comida feita fazer o pirão. As partes da carne do
conservar-se por mais tempo. Apesar de com bucho de criação, no formato de animal que acompanham as buchadas
hoje praticamente os marchantes não pequeno saco – chamado de “buchada” formam a “panelada”. Assim, a
deixarem mais a carne secando ao sol, o ou “buchadinha” – costurado e buchada completa é um prato composto
processo de feitura da carne-de-sol recheado com algumas partes desse tipo de duas comidas.
pouco mudou. O consumo da carne- de carne. Em alguns municípios, o O consumo da buchada é mais
seca bovina pelos seridoenses é um recheio é composto por carne de intenso durante os fins de semana,
hábito que vem desde o desbravamento criação cortadinha ou moída e feriados e festividades e ainda é
da região pelos colonos. Nessa região, temperada, podendo conter alguns bastante associado à matança de
ela é considerada um alimento forte, pedaços de vísceras, em outros, ele é caprinos e ovinos. Desde muito tempo,
saudável e substancioso, indispensável preparado com fígado, coração, bofe e é um costume, na região do Seridó,
na alimentação, principalmente no dia- sangue (estes dois últimos, opcionais). quando do ensejo da matança de uma
a-dia. É saboreada, normalmente, Há, ainda, uma especialidade feita à criação, a feitura da buchada ou da

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DOSSIÊ IPHAN {Festa de Sant’Ana}

panelada, de preferência para ser sagrado (o cordeiro). Hoje, o hábito comensalidade. Como outrora,
saboreada no dia seguinte. Mesmo ainda existe, mas em menores continuam enfeitiçando a memória dos
assim, é comum a comercialização, no proporções. sertanejos, sobretudo quando estes são
mercado local, da buchada crua (já As comidas festivas fazem parte da capturados pelos seus aromas e sabores
preparada ou para ser feita) ou cozida. culinária sertaneja e do vasto vindos das “cozinhas maternas” durante
A buchada cozida é um dos “pratos” da patrimônio imaterial do Seridó as festividades. Pois são nestas
cozinha regional também apreciado em Potiguar. Na qualidade de acepipes, excepcionalidades que estes parecem
bares e restaurantes. No passado, era elas vêm sendo elaboradas e saboreadas reafirmar seu estatuto de comidas
muito freqüente o consumo de buchada na atualidade, a despeito de algumas festivas.
de carneiro no Sábado de Aleluia, por mudanças vivenciadas em seus modos
ser essa comida derivada de um de feitura, de comestibilidade e de
símbolo

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DOSSIÊ IPHAN {Festa de Sant’Ana}

A arte do “bordado de Caicó” Madeira, a partir do bordado à mão. “arrumar um bom casamento” eram
(ou do Seridó), segundo os Inclusive, os padrões tradicionais praticamente obrigadas a ter as
interlocutores, chegou até a região do remetem aos da Ilha da Madeira, em habilidades de bordar e costurar.
Seridó trazida pelas mulheres dos Portugal, com flores, folhas e pistilos. Apesar de tratar-se de uma prática
colonizadores portugueses, no final do Antigamente, o ofício de bordadeira predominantemente feminina –
século XVII e início do século XX, assim como o de costureira eram tão desenvolvida normalmente na
advinda, provavelmente, da Ilha da importantes que as moças que queriam residência da bordadeira, nos últimos

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DOSSIÊ IPHAN {Festa de Sant’Ana}

anos tem havido a inclusão de homens ainda, a máquina industrial, que garante renascença e labirinto. A linha de seda,
na produção de bordados. Dentre os mais rapidez e dispensa o controle com que tem sido produzida em grande
municípios que mais produzem os pés. Foram acrescentados, nesse escala nos últimos anos, é usada como
bordados, estão Caicó e Timbaúba dos processo, outros pontos e estilos de se mais freqüência no bordado de
Batistas. Os bordados de Caicó é o item bordar bem como alguns incrementos enxovais. O bordado tem um amplo
mais comercializado no período da na matéria-prima. No entanto, a repertório e acompanha com freqüência
Festa de Sant'Ana, segundo pesquisas máquina industrial tende à imprecisão a moda. Atualmente, as peças mais
desenvolvidas pelo SEBRAE/Caicó nos bordados que pedem maior produzidas são: caminhos de mesa,
desde 2002. A princípio, o bordado era detalhamento. panos de bandeja, lençóis de cama,
feito à mão. Mas, nos anos de 1940, As principais matérias-primas toalhas para lavabo, toalhas de banho e
com o surgimento da máquina de dos bordados são os tecidos e as linhas. redes. Fazem-se, ainda, camisetas e
bordar Singer na região, os pontos à Borda-se com cores e matizes. Os blusas de cambraia bordadas. Esses
mão fossem adaptados ao estilo do pontos utilizados são: ponto cheio, produtos são feitos a partir da leitura
bordado à máquina. Segundo as matiz, turco, richelieu, granito (variação que as bordadeiras fazem da moda.
interlocutoras, a primeira mulher a ter do ponto doido), ponto reverso Usam-se, também, bordados no enxoval
contato com esse tipo de bordado foi a (também conhecido como haste ou de recém-nascidos. Antigamente, era
caicoense Dona Maria do Vale. Além atrás), crivo, bainha, ponto aberto, comum a mulher passar toda a gestação
das de Caicó, as bordadeiras de pesponto (variação do ponto arroz ou elaborando as peças que compunham o
Timbaúba dos Batistas e de outros ponto contado, feito à mão). enxoval, o qual incluía: o cueiro (lençol
municípios absorveram a técnica do Atualmente, aliada aos pontos de uso diário, com barrado bordada à
bordado à máquina. Atualmente, há, tradicionais, há a junção de renda mão geralmente com motivos florais,

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DOSSIÊ IPHAN {Festa de Sant’Ana}

com matiz, ponto sombra, ponto arroz e Os diversos usos das peças, Apesar de pequenas variações
ponto cheio), a camisinha de pagão, os como descrito acima, revelam a no desenvolvimento dos ofícios e
vestidos, para as meninas, e os lençóis variedade de possibilidades para o uso modos de fazer das comidas festivas e
para sair. O enxoval do batizado era do bordado, que vai dos enxovais, às dos bordados, esses são emblemáticos
especial: incluía o lençol e a camisa roupas, passando por momentos da região do Seridó: são referências que
comprida, regularmente brancos, importantes da vida e das relações entre expressam e representam a cultura
matizados. No eventos religiosos mais as esferas do sagrado e do profano. seridoense. Correspondem a
solenes da Festa de Sant'Ana, como as Como são diversos os usos, torna-se conhecimentos e práticas sociais
missas e procissão, fiéis e clero se impossível determinarem-se detalhes transmitidos de geração a geração,
preparam de modo sui generis, fazendo muito específicos como também as normalmente no seio familiar e/ou entre
uso do bordado. As vestes brancas de dimensões das peças. Há referências pessoas conhecidas, os quais estão
grande parte dos fiéis se evidenciam aos bordados da Ilha da Madeira e enraizados no cotidiano da comunidade,
por meio dos bordados, principalmente outros tipos de pontos, mas a tendo expressiva importância social,
os de richelieu. Os paramentos criatividade das bordadeiras é ilimitada simbólica e econômica para ela. Trata-
litúrgicos da igreja e dos padres e está, ainda, relacionada às intenções se de bens referenciais e significativos,
também fazem uso desse tipo de do mercado e da moda. Assim, com os quais os caicoenses constroem
adereço. É comum, ainda, que a última observamos modificações e alterações um sentimento de pertencimento a um
veste usada pela bordadeira, no leito de de temas e de modelos, com o passar do lugar, a uma cultura, e se diferenciam
morte – a mortalha – seja feita com tempo e surgimento de novas de outros povos, pois esses bens
bordado, muitas vezes, confeccionado tecnologias e novos materiais. refletem uma representação coletiva e
por ela própria, em vida. uma identidade social.

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DOSSIÊ IPHAN {Festa de Sant’Ana}

geração, sucessivamente. Por não ser Salvino de Araújo, responsável em


imóvel, a Festa de Senhora Sant'Ana grande parte pelo desenvolvimento que
abre-se às inclusões e adaptações em a Festa conheceu nas últimas décadas.
face das demandas da comunidade que Filho de uma das famílias mais
celebra. Por se tratar de uma Festa tradicionais do sertão
plural – em torno da qual se imbricam norteriograndense, possuidor de uma
vários eventos, tradições, costumes astúcia retórica bem peculiar, Mons.
seculares e inovações – novos Antenor conseguiu, ao longo dos seus
componentes foram, ao longo dos quarenta e sete anos à frente da
tempos, incorporados à programação paróquia de Sant'Ana de Caicó,
social dos festejos da Padroeira. “dobrar” representantes do poder
Algumas mudanças bastante público e da iniciativa privada,

Mesmo
significativas ocorreram a partir do ano conseguindo angariar importantes
conservando a de 2007, com o advento da Ilha de apoios para a realização da Festa de
Sant'Ana e a mudança do pároco de Sant'Ana, demonstrando grande
pedagogia formal das celebrações
Sant'Ana de Caicó. desenvoltura enquanto gestor de um
religiosas, ocorrem inovações no
A Festa de Sant'Ana foi evento que crescia a cada ano. Seus
interior do acontecimento festivo, cuja
tomando maiores proporções sobretudo esforços para a criação, em 1980, do
regularidade, ritmo e encadeamento
a partir da segunda metade do séc. XX, Conselho Paroquial, tendo
engendram a herança histórica que
no paroquiado do Monsenhor Antenor representação de diversos seguimentos
passa a ser transmitida de geração a
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DOSSIÊ IPHAN {Festa de Sant’Ana}

da sociedade caicoense, contribuiu programação quanto na própria


sobremaneira para a organização e organização da Festa de Sant'Ana, que
gestão dos festejos de Sant'Ana. Além vem crescendo cada vez mais em
disso, o atual pároco emérito da número de participantes, patrocinadores
paróquia de Sant'Ana tinha (e ainda e eventos nos anos de seu paroquiado.
tem) o costume de cobrar publicamente
aos políticos melhorias para a Festa de
Sant'Ana e pra própria cidade de Caicó,
não medindo esforços para angariar o
apoio dos poderes públicos municipal e
estadual. A Ilha de Sant'Ana, construída
em 2006, é o maior ícone de sua luta
pelo aumento “do chão de Sant'Ana,
que estava ficando pequeno para esta
Festa grandiosa que hoje aí está”. Em
2007 Monsenhor Antenor é nomeado
Pároco Emérito, e indica Padre Edson
Medeiros de Araújo, seu primo, para
lhe suceder enquanto Pároco de
Sant'Ana de Caicó. Este passa a realizar
uma série de inovações tanto na

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DOSSIÊ IPHAN {Festa de Sant’Ana}

Percebe-se que todos os eventos Diocese de Caicó, que sentiu a cidade de Jucurutu-RN. O arrastão
que compõem a programação necessidade de integrar o público jovem seguiu até a Catedral, onde houve
concebida pela paróquia, procura-se na programação religiosa da Festa, que celebração eucarística presidida por Pe.
envolver toda a sociedade em seus encontra grande concorrência nos João Paulo Pereira de Araújo e animada
diversos níveis, desde o pequeno eventos “profanos” promovidos na Ilha pelo Ministério de Música da
agricultor até os grandes empresários; de Sant'Ana, clubes e bares da cidade. Comunidade Católica Shalom, da
do funcionário público mais subalterno O arrastão ocorreu no primeiro dia da Renovação Carismática Católica. Em
até as principais lideranças políticas; e Festa, antecedendo a primeira novena 2010 a paróquia pretende repetir o
das crianças aos idosos. Uma inovação que tinha a juventude como um de seus evento, e espere receber um público
ocorrida a partir de 2007 na noitários, saindo às 17h da Praça Dom ainda maior, ampliando também a
programação religiosa da Festa veio no José Delgado, bairro Paraíba, indo até a programação de atrações artísticas
sentido de contemplar os públicos de Praça da Catedral de Santana. O religiosas no Pavilhão de Sant'Ana,
gerações distintas. Sendo assim, a arrastão da juventude “Sou por Jesus” tudo isso com o intuito de agregar ainda
paróquia agregou dois eventos foi animado por trio-elétrico puxado mais a participação dos jovens nos
especiais: a Marcha dos Idosos e o pelo Pe Heliton Marconi da paróquia de Festejos de Sant'Ana que em 2010 será
Arrastão da Juventude. O arrastão da Cruzeta, que já gravou seu segundo CD dedicada à juventude, levando o tema
juventude ocorreu pela primeira vez no com músicas religiosas, acompanhado do ano da juventude da Diocese:
ano de 2009, sob a iniciativa do Setor pelo Ministério de Música Recado de “Jovem, levanta-te!”.
Diocesano de Juventude (SDJ), da Deus, da paróquia de São Sebastião da

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DOSSIÊ IPHAN {Festa de Sant’Ana}

A Marcha dos Idosos teve início no ano Marcha tem seu dia marcado na Festa lazer e de interação entre eles, fazendo-
de 2001 por meio de uma parceria de Sant'Ana, sempre na primeira sexta- se ampliar ainda mais as redes de
firmada entre a Secretaria Municipal de feira, saindo por volta das oito da sociabilidade.
Ação Social de Caicó e o Movimento manhã da Prefeitura Municipal de
de Integração e Orientação Social Caicó com destino à Catedral de
(MEIOS) do Governo do Estado do Rio Sant'Ana. O cortejo leva à sua frente
Grande do Norte. Ela teria sido uma imagem de Sant'Ana e é
idealizada por um político local em acompanhado pela Filarmônica Recreio
articulação com alguns municípios Caicoense (A Furiosa).
vizinhos, a idéia era reunir os idosos de Na Catedral, a Marcha é
seus municípios e trazê-los para os recebida com uma celebração
festejos de Sant'Ana de Caicó. eucarística, depois da qual é oferecido
Atualmente a Marcha dos Idosos um “almoço dançante”, oferecido pelos
cresceu, sendo integrada na promotores da Marcha no Caicó Iate
programação religiosa oficial da Festa Clube, onde podem desfrutar de uma
de Sant'Ana. São idosos de diversos programação de lazer que segue até o
municípios da região, que partem de final da tarde. A Marcha contribui não
suas cidades com o apoios dos poderes só com a participação dos idosos de
públicos, que disponibilizam um outros municípios no maior festejo da
transporte e uma equipe de apoio. A região, mas propicia uma ocasião de

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DOSSIÊ IPHAN {Festa de Sant’Ana}

A maior transformação ocorrida ginásio de esportes, erigida numa ilha Ilha foi pela primeira vez utilizada
na Festa de Sant'Ana nos últimos fluvial localizada no meio do rio numa Festa de Sant'Ana. Contudo, sua
tempos adveio com a construção do Seridó. Foi idealizada por Monsenhor inauguração oficial só ocorreu em
Complexo Turístico Ilha de Sant'Ana. Antenor, que lutou incansavelmente 2008, conforme noticiado pelo governo
Uma grande estrutura com praça, bares, pela sua realização, vendo seu sonho estadual:
restaurantes, palcos, um anfiteatro e um ser materializado em 2007, quando a

“O Governo do Estado entregou à


população de Caicó, no dia 23 de julho, o
Complexo Turístico da Ilha de Sant‟Ana. Foram
investidos R$ 18 milhões na construção do espaço
que já vinha sendo utilizado pelos caicoenses
para eventos como a Festa de Sant‟Ana,
padroeira do município, que atrai turistas e
conterrâneos durante todo este mês de julho. O
complexo foi construído para incrementar o
turismo de eventos na região. O espaço consiste
num parque temático, parque infantil, palco
para os shows com praça de alimentação, boxes
para artesanato, anfiteatro e um ginásio dotado
de quadra poliesportiva com dimensões oficiais e
arquibancada com capacidade para 3.000
pessoas. O complexo deve atrair também pousadas
que vão atender aos visitantes durante todo o
ano, principalmente nos grandes eventos e festejos
do calendário turístico de Caicó.”
(Governo do Estado. Disponível em:
http://www.rn.gov.br/acoes-do-
governo/complexo-turistico-da-ilha-de-
santana/12/
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DOSSIÊ IPHAN {Festa de Sant’Ana}

Segundo o próprio Monsenhor Governo do Estado, a Prefeitura No anfiteatro “Hilda Araújo*"


Antenor, a Ilha foi idealizada como Municipal de Caicó e instituições ocorre o espetáculo “Terra de
forma de resolver o problema da “falta financeiras. A FAMUSE Reúne Sant'Ana”, que dramatiza a “lenda do
de chão” para a Festa de Sant'Ana, que artesãos de todo o Seridó, de várias vaqueiro”, narrativa de fundação da
crescia a cada ano, disputando espaço localidades do Estado e do Nordeste cidade de Caicó. Ao longo dos dez dias
com barracas, palcos e parques de brasileiro, cujo colorido e qualidade das de Festa, dividem o grande palco
diversão. A construção da Ilha, de fato, produções em tecido, palha, barro, instalado na Ilha atrações musicais
“desafogou” a Festa de Sant'Ana, madeira, couro e metal encantam os regionais e nacionais, como os cantores
abrigando três estruturas que até então olhos dos visitantes. Os bordados em Raimundo Fagner, Elba Ramalho,
funcionavam nas adjacências da linho e organdi formam um espetáculo bandas como Calcinha Preta, Aviões do
Catedral: os parques de diversões, os à parte pela beleza, delicadeza e Forró, dentre outros. Além do
shows promovidos pela prefeitura e criatividade dos desenhos “desafogo” no espaço da Festa de
governo do estado e a Feira de cuidadosamente elaborados e Sant'Ana, a Ilha trouxe benefícios
Artesanato dos Municípios do Seridó, executados com habilidade e perfeição financeiros para a cidade, conforme
mais conhecida como FAMUSE, pelas artesãs das cidades seridoenses. demonstra estudos dos Arranjos
coordenada pelo Comitê Regional das Durante a realização dessa feira de Produtivos Locais (APL)da Festa de
Associações e Cooperativas Artesanais artesanato são oferecidas aos visitantes Sant'Ana, concluído em 2008 pela
do Seridó – CRACAS, tendo como dos stands variadas atrações musicais e Redesist/UFRJ:
parceiros o Serviço de Apoio a Micro e artísticas com valores da terra.
Pequena Empresa – SEBRAE, o

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DOSSIÊ IPHAN {Festa de Sant’Ana}

“A partir da utilização da Ilha para a


realização de shows os impactos econômicos
puderam ser sentidos, principalmente porque, exceto
as atrações principais que são de fora, faz-se
questão que tudo seja adquirido em Caicó, afirma
com orgulho o secretário municipal de planejamento
[…] O secretário destaca o aumento no consumo
em geral e, consequentemente, da arrecadação de
ICMS, que geralmente é o dobro em agosto, quando
comparado a julho.”
(Nota Técnica 13/2008 – APL Festa de
Sant'Ana de Caicó/RN: Fé, Arte e Gastronomia, p.
58)

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DOSSIÊ IPHAN {Festa de Sant’Ana}

De fato, para suportar os Caicó e adjacências. Além disso, a Ilha programação de shows da Festa de
eventos realizados durante a Festa de abriga em seu território dois espaço Sant'Ana, o Carnaval, encontros de
Sant'Ana, a Ilha conta com um grande bastante significativos para a identidade motociclistas, chegando a servir até
aparato material e humano, como a e história de Caicó, quais sejam, o mesmo como ponto de apoio para o
montagem de palco, tendas, stands, Serrote da Cruz, onde foi fixada uma Rally dos Sertões, a maior competição
bares, banheiros químicos, gerador de cruz em 1901 em comemoração à deste gênero no país. Com sua praça de
energia, policiamento, corpo de passagem de século, recebendo em alimentação, com estrutura de parque
bombeiros, médicos. Enfim, uma série 1940 uma capela votiva à São infantil, telões e palcos para shows e
de recursos contratados ou Sebastião; e o mítico Poço de Sant'Ana, apresentações de pequeno porte, a Ilha
disponibilizados com forma de apoio no lugar que abriga as principais narrativas de Sant'Ana se tornou imediatamente
próprio município. De fora, apenas as de origem da cidade. Nas palavra de um dos pontos prediletos de lazer tanto
bandas contratadas para realizar os Monsenhor Antenor “a Ilha hoje é a para visitantes quanto para moradores
shows e o patrocínio do espetáculo sala de visitas de Caicó”, é nela onde de Caicó, durante o ano inteiro.
Terra de Sant'Ana que ainda assim é ocorrem os principais eventos
encenado por atores, em sua maioria, de socioculturais da cidade, como a

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DOSSIÊ IPHAN {Festa de Sant’Ana}

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DOSSIÊ IPHAN {Festa de Sant’Ana}

É
realizada ou apoiada pela paróquia
notável a transformação passa necessariamente por esta
Comissão, que é dividida em
sobretudo no modo de organização e
subcomissões responsáveis por cada
gestão da Festa de Sant'Ana a partir da
evento (feirinha, pavilhão,
atuação de Monsenhor Edson, que
peregrinações, jantar, liturgia, etc.).
passa a almejar uma maior
Monsenhor Edson e sua Comissão são
“profissionalização” no que diz
responsáveis também por inovações
respeito à produção do evento. Nesse
bastante significativas na concepção,
sentido foi criada, no primeiro ano de
produção e gestão da Festa, que a vem
seu paroquiado, a Comissão da Festa de
fazendo tomar proporções maiores a para integrar o séquito de colaboradores
Sant'Ana responsável por conceber,
cada ano. Podemos destacar, assim, a de sua realização. Nesse sentido, é
produzir e gerir a Festa de Sant'Ana.
realização do Café com a Imprensa, apresentada uma programação prévia
Trata-se de uma equipe de voluntários,
realizado desde 2008 com o objetivo sobre a qual os jornalistas, blogueiros e
formada por leigos da paróquia que não
não só de divulgar a cada ano a colunistas sociais podem opinar,
medem esforços para realizar a cada
programação da Festa de Sant'Ana, mas inclusive sugerindo modificações.
ano uma Festa cada vez mais grandiosa
de mobilizar os profissionais deste setor
e bem organizada. Toda a programação
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DOSSIÊ IPHAN {Festa de Sant’Ana}

Outra novidade substancial foi a criação estudos realizados pela RedeSist/UFRJ, padroeira do sertão nordestino. As
da comissão de comunicação e em 2008 a Festa de Sant'Ana teve a inovações ocorridas em sua concepção,
marketing, dentro da comissão da festa, adesão de quatorze patrocinadores organização e gestão buscam
sendo responsável pela divulgação da oficiais. Outra façanha da comissão de acompanhar as dimensões que a Festa
Festa, assim como pela elaboração e comunicação e marketing foi a de Sant'Ana vem tomando, com o
comercialização de um plano de mídia. elaboração de um website oficial da desafio de não se deixar de lado tudo
Essa comissão é composta em média Festa, através do qual o evento vem aquilo que dá o caráter peculiar aos
por cinco pessoas, entre estudantes sendo transmitido ao vivo desde 2007. festejos em homenagem à Senhora
universitários e profissionais da área de De acordo com a própria comissão, Sant'Ana promovidos na cidade de
comunicação (radialista e blogueiros). objetivo num futuro próximo é ampliar Caicó.
A mentalidade desta comissão é a de a abrangência do plano de mídia, assim
criar um grupo de patrocinadores como viabilizar a transmissão televisiva
oficiais da Festa de Sant'Ana, que ao vivo dos principais momentos da
desejem ter sua marca divulgada Festa (Abertura, Missa Solene,
naquele que é o evento religioso mais Procissão, etc.). São notórias as
expressivo da região, saindo da transformações que a Festa de Sant'Ana
informalidade do “pedido de uma de Caicó vem sofrendo ao longo dos
ajudinha” para um plano de mídia anos. Sua notoriedade vem
profissional, conforme salienta um dos extrapolando as fronteiras locais,
membros da comissão. Os esforços concretizando-se a cada ano como uma
geraram resultados e, segundo os das mais significativas festas de

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DOSSIÊ IPHAN {Festa de Sant’Ana}

A FESTA DE SANT'ANA
COMO OBJETO DE
REGISTRO

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DOSSIÊ IPHAN {Festa de Sant’Ana}

A região do Seridó é lugar de antropologia. Podemos aproximar esta A Festa de Senhora Sant‟Ana de Caicó
perspectiva à de Nathan Wachtel, não apenas socializa, educa e instaura o
destaque no cenário do sertão do Rio
quando ele propõe a abordagem da tempo da celebração, ela constrói
Grande do Norte, por sua história
“problemática da construção da história, tece escolhas em torno de
original, sua religiosidade vivida no
identidade nas suas relações com a espaços públicos e desenha a
cotidiano, sua tradição culinária e
memória coletiva.” Com efeito, o cartografia dos festejos religiosos e não
festiva, motivos de orgulho dos filhos
registro da Festa de Sant‟Ana de Caicó religiosos. Além disso, produz e
da terra de Sant‟Ana. Se, localmente,
mostra a cultura do Seridó em ação e divulga a cultura popular e erudita. Isso
essa particularidade é reconhecida e
revela regimes de temporalidade que implica em considerar as formas e os
valorizada, verificamos que não
orientam os discursos sobre o passado. diversos gêneros de expressão cultural
existiam ainda ações dos órgãos
Na tentativa de uma leitura cruzada da que constam na vasta programação:
governamentais para a promoção e a
festa, das práticas cotidianas dos exposições de pintura e de arte popular,
valorização da cultura local. Ao eleger-
moradores, dos seus discursos e das apresentação de grupos de teatro e
se a Festa de Sant‟Ana como objeto de
suas narrativas, sublinhamos a cantores locais, lançamentos de livros,
registro, abrem-se novas perspectivas
importância desses elementos na discos, revistas e jornais com encartes
que permitem entender como se
elaboração de uma identidade e, através especiais, que circulam amplamente no
elaboram os processos identitários
desta, de uma apropriação peculiar da período dos festejos. Enquanto “ato de
conjuntamente à reiteração de uma
história e do espaço locais que devem participação comunitária,” a Festa da
cultura nativa através da tradição - via
ser amplamente registrados, Padroeira enseja maneiras de convívio
recorrentemente utilizada pela
salvaguardados e divulgados. social e pedagogicamente
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DOSSIÊ IPHAN {Festa de Sant’Ana}

fundamentadas ao longo dos séculos, complementares: a espontaneidade


matizadas por um sentimento comum popular e a institucionalização dos
de veneração à Padroeira e de festejos sócio-religiosos estabelecida
pertencimento ao lugar Caicó. Sob as pela Igreja Católica e poderes público e
orientações prescritivas da pedagogia privado. A pluralidade das celebrações
católica, atuou e atua como uma imprime à moldura dessa Festa a
instância implementadora de possibilidade da (re)criação do modelo
religiosidades articulada com festivo que se articula,
aprendizagens instrutivas, culturais e simultaneamente, com a tradição e
educativas, envolvendo condutas de modernidade (renovação), com o
convivência pública e comportamentos religioso e social, com o lúdico e
socialmente aceitos. Por outro lado, a cultural e com a devoção permanente e
Festa de Senhora Sant´Ana de Caicó (quase) única a Senhora Sant‟Ana,
permanece situada na confluência de Padroeira dos caicoenses de outrora e
duas dinâmicas culturais de então.

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DOSSIÊ IPHAN {Festa de Sant’Ana}

todos são iguais, sejam ricos sejam identidade caicoense. O chouriço, doce
pobres. A procissão de encerramento da típico da culinária local, também
Festa de Sant'Ana é um momento merece lugar de destaque entre os
magnífico, um desfile de comoção e fé elementos essenciais da Festa de
do sertanejo, que não mede esforços no Sant‟Ana, pois como foi dito
pagamento de suas promessas. anteriormente, é em dias de festa que a
A Procissão de Sant’Ana família se une para preparar o quitute e
Momento máximo da expressão servi-lo, seja para a própria família, seja
de fé do povo do Seridó, a procissão de para vender na típica feirinha de
Nossa Senhora de Sant‟Ana é o cume Sant‟ana.Com o intuito de salvaguardar
dos festejos religiosos da região, os ofícios de bordadeira e mestra de
responsável por reunir milhares de chouriço e dos modos de fazer bordado
pessoas todos os anos provenientes de e doce de chouriço, propõe-se ações
várias partes do Brasil e do exterior, tão que incentivem e garantam a
forte é essa expressão que nos últimos transmissão dos saberes para as
Ofício de bordadeira e mestra de
anos teve seu trajeto modificado e gerações mais novas, como a realização
chouriço
ampliado para atender a demanda de de oficinas, mostras e concursos
Caicó carrega o título de “terra
fiéis que seguem em cortejo até a Igreja culturais, bem como a documentação
do bordado”, se sobressaindo
Matriz. É nesse momento que a ela se textual e visual destes ofícios.
internacionalmente pela qualidade de
juntam as diversas irmandades, os
seus bordados. Os bordados de Caicó
diversos setores. Durante a procissão
dão o ponto na tão tradicional
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DOSSIÊ IPHAN {Festa de Sant’Ana}

A culinária típica: doces, biscoitos vemos além da fé e dedicação de um com referências e protagonistas
filhoses e pratos regionais. povo religioso, um banquete de encher comuns: o vaqueiro, o touro, um poço e
É impossível conceber a Festa os olhos, tamanha é a variedade de Sant‟Ana. Local onde segundo a
de Sant‟Ana sem a sua culinária típica. carnes, doces e biscoitos delicados de tradição oral tudo começou, o poço de
As comidas festivas, como já falado, massa fina que são feitos especialmente Sant‟Ana é parte essencial da história
fazem parte da culinária sertaneja e do para a festa. São comidas que perduram não apenas da Festa, mas também da
vasto patrimônio imaterial do Seridó até hoje, passadas de mãe a filha e que cidade de Caicó. O lugar foi palco
Potiguar. Os filhóses e os doces são também, a exemplo dos bordados também da enérgica resistência popular
muito apreciados. No Seridó, bem típicos da região, já ganharam o mundo. quando em Caicó um grupo de pessoas,
como em todo o nordeste a culinária é na revolta ”Quebra-Quilos”, em 1873,
um prazer à parte, dessa forma, não se contra a adoção do sistema métrico-
pode pensar em festança no nordeste decimal no Império, atirou ao poço
sem falar da culinária. É assim também quilos de pesos metálicos. Hoje o poço
durante os festejos de Sant‟Ana, onde fica dentro do Complexo da Ilha, e é
um dos lugares mais visitados pelos
fiéis devotos de Sant‟Ana, que vêm a
Caicó durante os festejos religiosos.

O poço de Sant’Ana
Apesar das diferentes versões
míticas, a fundação de Caicó emerge

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DOSSIÊ IPHAN {Festa de Sant’Ana}

Calvagada de Sant’Ana longo dos tempos ela foi se


Entre as atividades que tornando escassa, mas em 2002
compõe o cenário da Festa, um grupo de caicoenses
encontramos a Cavalgada de retomou essa tradição e, em
Sant‟Ana como expressão da conjunto com a Associação dos
devoção dos vaqueiros que saem Vaqueiros, realiza no primeiro
da cidade de Acari, cidade que domingo da Festa a Cavalgada última sexta-feira da Festa de
dista a 65 km, e finaliza em de Sant´Ana. O evento conta Sant'Ana, desde a década de
frente a catedral na Praça da com a participação dos 1940. Não se sabe precisamente
Matriz. Celebrada desde a cavaleiros que residem nas a sua origem, mas especula-se
décaca de 1950, a cavalgada de zonas rurais, e também de que ela tenha sido criada como
Sant‟Ana é um dos ícones da pessoas que residem em Caicó, forma de pagamento de
festa, no ínicio realizada pelos cidades vizinhas e amantes das promessa de um devoto. A
moradores das zonas rurais, ao vaquejadas. É um evento carreata, a exemplo da
significativo para os festejos a Cavalgada de Sant‟Ana, tornou-
Sant‟Ana, e muito esperado se símbolo de fé do homem do
pelos amantes da cavalaria. interior, que agradecido pelas
Carreata de Sant’Ana graças alcançadas, vêm todos os
A carreata de Sant'Ana, anos à Festa para celebrar
ocorre sempre na noite da Sant‟Ana.
novena dedicada aos motoristas,

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DOSSIÊ IPHAN {Festa de Sant’Ana}

A Festa de Sant‟Ana de Caicó sobretudo no que diz respeito à cotidiana dos habitantes de Caicó.
sociabilidade fundada no Esses têm orgulho em expressar um
demarca um tempo e um espaço de interconhecimento. Assim, o espaço sentimento de autoctonia fundada numa
sociabilidade no qual o sagrado e o sagrado, as expressões narrativas, os religiosidade e num conjunto cultural
profano se entrelaçam na construção de atores sociais envolvidos e a tradição material e imaterial que se adapta às
uma identidade coletiva. É uma ocasião festiva são elementos que permitem configurações temporais e espaciais. A
especial para relembrar a história da manter a continuidade entre o passado e festa configura-se como um bom
cidade, reavivar laços de solidariedade o presente. Reminiscências, observatório para entender as mudanças
fundados na família ampliada, reafirmar permanências e variações que, no sociais ocorridas recentemente, em
valores cristãos e acionar registros entanto, mantêm uma tradição atuante particular as referentes à
específicos da cultura seridoense, nos diversos momentos da vida patrimonialização da figura da santa

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DOSSIÊ IPHAN {Festa de Sant’Ana}

com o desenvolvimento de um turismo atraindo assim, turistas que lotam os Sant‟Ana de Caicó é importante em
cultural - processo pelo qual a presença hotéis e pousadas da cidade em busca todos os aspectos da vida dos
do passado no presente se expressa de alento para suas dores, ou caicoenses, reconhecê-la como
numa polifonia em que o velho e o simplesmente em agradecimento por patrimônio cultural é não apenas
novo se cruzam, na evocação de uma um ano de bênçãos. A Festa de preservá-la, mas também dar a ela o
temporalidade contínua. Diante da reconhecimento devido que a faz ser
grandeza e magnitude dessa festa que já parte da cultura de um povo.
existe há mais de 200 anos não se pode
deixá-la passar despercebida dos
brasileiros, pois algo que persistiu há
tanto tempo merece e deve continuar
sendo preservado para as gerações
futuras, a Festa de Sant‟Ana vem ao
longo dos anos se reinventando e sua
importância para a cidade de Caicó
deixou de ser apenas meramente
religiosa, visto que a festa atrai muito
mais que os filhos devotos que foram
morar longe de sua terra, ela passou a
fazer parte do calendário religioso do
estado do Rio Grande do Norte,

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115
DOSSIÊ IPHAN {Festa de Sant’Ana}

ANEXO 1 – MAPAS E CROQUIS


DA FESTA DE SANT’ANA

Mapa de Atrações Turísticas. (fonte: Paróquia de Sant'Ana de Caicó) 116


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Croqui do Pavilhão de Sant'Ana. (fonte: Paróquia de Sant'Ana de Caicó)


DOSSIÊ IPHAN {Festa de Sant’Ana}

ANEXO 2 – LINHA DO TEMPO 1754 – Criação da Irmandade de Sant’Ana 1824 – Passagem de Frei Caneca pela vila em
outubro.
1756 – Fundação da Irmandade do Santíssimo
1683 – Construção da Casa Forte do Cuó, no Sacramento 1858 – Criação da comarca do Seridó,
Sítio Penedo compreendendo Vila do Príncipe e Acari.
1771 – Criação da Irmandade dos Negros do
1689 – A região enfrenta uma grande seca, que Rosário 1868 – Elevação da Vila Nova do Príncipe à
duraria até 1692. condição de cidade pela Lei Provincial n. 612.
1777 – Proibição por parte da Igreja de
1695 – Construção da Capela Primitiva novenas particulares nas casas. 1870 – Construção do Mercado Público e da
dedicada a Sant’Ana, após a construção da Praça do Mercado (hoje Praça da Liberdade).
Igreja Matriz, essa capela passou a pertencer a 1778 – Emancipação política de Caicó com a

N.S. do Rosário, até 1800, quando então foi instalação da Vila Nova do Príncipe, pelo 1876 – Criação da primeira banda de música da

destruída, pelo tempo. desembargador Antônio Felipe Soares cidade.


Bederode.
1700 – Fundação do Arraial do Queiquó por 1889 – Lançamento do Jornal O povo (9 de

Manuel de Souza Forte, um dos primeiros 1805 – Restauração da Igreja Matriz. março) e Fundação do Centro Republicano

sesmeiros da região. Seridoense (7 de abril).


1809 – Visita canônica à Paróquia de Sant’Ana

1735 – Elevação do Arraial a Povoação, pelo visitador Padre Inácio Pinto de Almeida e 1890 – A cidade muda mais uma vez de nome,

passando a ser chamado de Povoação do Castro, irmão de Frei Miguelinho. passando a ser chamada de Seridó, esse nome

Caicó. perdurou entre 1 de fevereiro de 1890 até 7 de


1812 – Construção da Casa de Câmara e Cadeia
julho do mesmo ano, quando a cidade volta a
1748 – Inicio da construção da Igreja Matriz de da Vila do Príncipe.
ser chamada de Caicó.
Sant’Ana do Caicó. Nesse mesmo ano é criada
1818 – A comarca de Caicó deixa de ser
a Freguesia de Nossa Senhora de Sant’Ana. 1909 – Criação da Banda Recreio Caicoense,
subordinada a Comarca da Paraíba
existente até os dias atuais.

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DOSSIÊ IPHAN {Festa de Sant’Ana}

1918 – A Praça do Mercado passa a se chamar 1949 – Criação do jornal Folha de Caicó em 3 1996 – Posse do quinto bispo diocesano, D.
Praça da Liberdade. de dezembro. Jaime Vieira Rocha.

1926 – O presidente Washington Luiz visita a 1952 – Posse do segundo bispo da Diocese de 2006 – Posse do sexto e atual bispo diocesano,
cidade. Caicó, D. José Adelino Dantas. D. Frei Manoel Delson Pedreira da Cruz.

1931 – Construção do Coreto Primitivo da 1953 – Chegada da imagem de N.S. de Fátima à 2007 – Ano de transição da paróquia de
Praça da Liberdade. cidade. Sant’Ana, saída do Mons. Antenor e posse do
atual pároco, Mons. Edson.
1933 – Visita do Presidente Getúlio Vargas. 1954 – Lançamento do jornal A Folha em 6 de
março
1939 – Criação da Diocese de Caicó pelo Papa
Pio XII 1958 – Construção do Arco do Triunfo na
Catedral de Sant’Ana, em homenagem a
1940 – Instalação da Diocese de Caicó pelo
passagem de Nossa Senhora de Fátima por
Mons. Paulo Herôncio de Melo, vigário de
Caicó.
Currais Novos, representando o Senhor Bispo
de Natal D. Marcolino Esmeraldo de Souza 1959 – Posse do terceiro bispo diocesano D.
Dantas, em sessão solene antes da Missa Manuel Tavares Araújo.
Solene da Festa de Sant’Ana, em 28 de julho.
1962 – Primeira Festa dos Ex- Alunos do
1941 – Posse do primeiro bispo da Diocese de Colégio Diocesano.
Caicó D. José de Medeiros Delgado, dentro da
1978 – Posse do quarto bispo diocesano de
Festa de Sant’Ana em 26 de julho.
Caicó, D. Heitor de Araújo Sales.
1943 – Construção do novo e atual Coreto da
1984 – Fundação do Mosteiro das Clarissas por
Praça da Liberdade.
D. Heitor de Araújo Sales.
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DOSSIÊ IPHAN {Festa de Sant’Ana}

ANEXO 3 – ÍNDICE DE 21- Detalhe da imagem primitiva de Sant’Ana 50- Extensão da Catedral nas noites de novena.
(acervo: Museu do Seridó) (foto: acervo IPHAN)
ILUSTRAÇÕES
23- Procissão de Sant'Ana em finais do século 54- Feirinha de Sant'Ana. (foto: acervo IPHAN)
XIX (acervo: Museu do Seridó)
56- Espaço da Feira de Sant'Ana. (foto: acervo
30- Os primeiros componentes da Banda Recreio IPHAN)
1-Capa: Imagem de N.S. de Sant’Ana durante a Caicoense. (foto: acervo do Museu do Seridó)
procissão (Foto: Acervo do IPHAN) 58- Cavaleiros de Sant'Ana. Caminhão recebendo
36- Pracinha do Coreto, onde ocorriam as feiras e
a benção ao passar sob o Arco do Triunfo. (foto:
2-Contra-capa: Detalhe do Arco do Triunfo da apresentações durante os festejos mais antigos.
Maria Iglê)
Igreja Matriz (Foto: Acervo do IPHAN) (foto: acervo do Museu do Seridó)
60- Caminhão levando a imagem de Sant’Ana
8- Imagem de N.S. de Sant’Ana. (FOTO: Maria 37 – Igreja Matriz na década de 50 já com a
durante a Carreata. (foto: Maria Iglê)
Iglê) segunda torre e o arco construídos. Abaixo,
detalhe da imagem de N.S. de Fátima, 62- Missa Solene na Matriz (Foto: Maria Iglê)
11- Igreja de Sant’Ana em 1924, na época da
homenagem feita a esta, quando de sua passagem
inundação. (foto: acervo do Museu do Seridó). 65- O beija em dois momentos. (foto: Maria
pela cidade de Caicó na década de 1930.
12- O Mítico Poço de Sant’Ana em meados do século Iglê).
XIX.(Acervo fotográfico do Museu do Seridó) 38- Detalhe do Arco a noite, em dia de Procissão.
66- Procissão de Sant'Ana pelas ruas de Caicó
14- Detalhe de pintura sobre parede no Museu do 46- Produtos vendidos durante o leilão de tendo em destaque, as imagens de Sant'Ana e São
Seridó (foto: Equipe INRC-Seridó - 2007 Sant’Ana. (Foto: Acervo IPHAN) Joaquim. (Foto: Maria Iglê)

17 - Imagem de Sant’Ana em procissão pelas ruas 47- O encontro das imagens peregrinas na Igreja 67- Procissão em torno da Matriz (Foto: Maria
da cidade de Caicó. (FOTO: Maria Iglê) Matriz. (Foto: Acervo IPHAN) Iglê)

20- Igreja Matriz de Sant’Ana em 1940, antes 48- Mapa do R.N com o detalhe das cidades 70- Procissão na Av. Seridó, uma das principais
de ser construída a segunda torre. (acervo: Museu percorridas pelos peregrinos. (elaborado a partir avenidas da cidade. (foto: Maria Iglê)
do Seridó) do original de Darlan P. de Campos).

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71- Itinerário da Procissão de Sant'Ana. (foto: 94- Anfiteatro da Ilha de Sant'Ana (Fonte:
Maria Iglê) Acervo IPHAN).

73- Baile dos coroas. (foto: acervo IPHAN) 96- Vista parcial da Ilha de Sant’Ana. (Foto:
Vilma Vitor)
75- Festa da Juventude. (foto: acervo IPHAN)
98- Ilha de Sant'Ana a noite (Fonte: Acervo
78-Festa do Ex Aluno do CDS (Colégio Diocesano IPHAN)
Seridoense). (foto: acervo IPHAN)
101- Detalhe da Imagem de Sant’Ana tendo a
79- Bordado de Caicó (pano de bandeja). A sua frente o Arco do Triunfo e a imagem de Nossa
tradicional buchada de bode. (foto: acervo Senhora de Fátima. (Foto: Maria Iglê)
IPHAN).
103- Frontão da Igreja Matriz, vista a noite,
84- Acima à esquerda: Tacho de chouriço pronto. acima percebe-se o detalhe da cruz iluminada.
Abaixo a direita: Doces diversos da culinária (Foto: acervo IPHAN)
nordestina. (Foto: Acervo IPHAN).
104- Filhose e a preparação do doce de Chouriço.
86- Biscoitinhos típicos de Caicó. (Foto: Acervo (fotos: acervo IPHAN)
IPHAN).
105- Cavaleiros da cavalgada de Sant’Ana e
87- Bordado típico de Caicó (Foto: Acervo Caminhões passando pelo arco do triunfo durante
IPHAN). a Carreata.
91- Devoto de Sant'Ana. (foto: acervo IPHAN). 107- Imagem de Sant’Ana à frente da Matriz.
93- Arco do Triunfo iluminado a noite, (Foto: Maria Iglê)
tendo no detalhe N.S. de Fátima. (foto:
acervo IPHAN)

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