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Autora: Diana Bogado1

Co-autores
José Peréz de Lama2
José María López Medina3
Mário Chagas4

O presente artigo tem como proposta apresentar o Museu das Remoções da Vila
Autódromo a partir de duas perspectivas: da museologia social e das metodologias
participativas. O Museu das Remoções é um museu social construído criativamente pela
comunidade Vila Autódromo em conjunto com a universidade Anhanguera, no âmbito
de um projeto de extensão universitária 5 . Seu objetivo ao ser criado era apoiar a
resistência à remoção da comunidade e denunciar as consequências da mercantilização
do território urbano intensificada no período de realização dos megaventos do Rio de
Janeiro.

Palavras- Chave: Museu das Remoções, museologia social, empreendedorismo urbano;


resistência criativa e afetiva, produção social do habitat, direito à cidade.

1
Diana Bogado é ativista, arquiteta e urbanista, doutora pela na Universidade de Sevilha; criou e
coordenou como professora do curso de arquitetura e urbanismo da Universidade Anhanguera o Projeto
de extensão à comunidade Vila Autódromo. No âmbito deste projeto Diana coordenou algumas
intervenções urbanísticas participativas na Vila Autódromo e em outras favelas, dentre elas a que deu
origem ao Museu das Remoções.
2
José Pérez de Lama é co-diretor do Centro IND (Fablab) da Escola Técnica Superior de Arquitetura de
Sevilha, professor da Escola Técnica Superior de Arquitetura de Sevilha e orientador da tese de doutorado
“Museu das Remoções: resistência criativa e afetiva como resposta sociocultural ao Rio de Janeiro dos
megaventos”, de Diana Bogado.
José María López Medina é poeta e arquiteto, Doutor em arquitetura pela Universidade de Sevilha,
pesquisador do projeto PLANPAIS da Universidad de Granada e co-orientador da tese da tese de
doutorado de Diana Bogado.
4
Mario Chagas é poeta, museólogo e cientista social. Coordenador cultural do Museu da República,
professor da Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologia e da Unirio, Universidade Federal do
Estado do Rio de Janeiro, e participou na idealização e criação do Museu das Remoções; e co-orientou a
tese de doutorado da autora.
O contexto sociopolítico
“O Museu das Remoções é um projeto que brotou
como as flores num campo de guerra, como os
girassóis da Vila... Em meio aos escombros nasce
um museu a céu aberto, que tem a missão de
semear, regar e multiplicar a história de
resistência e luta que está sendo dia após dia
cultivada no solo fértil da Vila Autódromo.”
Nathália Macena, moradora da Vila Autódromo,
em entrevista à autora.

A preparação do Rio de Janeiro ‘neoliberal’ 6 contextualiza-se num período marcado


pela implantação do ‘empreendedorismo urbano’ em diversas metrópoles do mundo
(Harvey, 2005, 2011), um modelo que coloca os interesses coletivos subjugados aos
interesses privados e representa constante ameaça aos direitos das populações
marginais. Esta nova forma de gestão relaciona-se com as características do mercado
global na era das finanças (Arantes, 2000), das quais destacam-se a rapidez das
negociações e a soberania dos interesses privados no redesenho do urbano. (Aguilera e
Naredo 2009).

Esta concepção mercadológica de gestão urbanística converte o território em um ‘ativo


financeiro’ e desconsidera as políticas de inclusão social. (Harvey, 2016; Rolnik, 2016).
O resultado é a violação do direito à cidade, o qual inclui diversos direitos, como o da
moradia e o da informação. (Rolnik, 2016; Santos, 2013). Neste contexto, Harvey
complementa que os megaeventos emergem como

“o cerne da cidade transformada em ativo


financeiro, marcada com códigos de barras e

6
O neoliberalismo surge como reto de direcionamento do pensamento político-econômico entre as
décadas de 70-80 (Harvey, 2005). A neoliberalização de cidades se coloca em curso no Brasil com a
implementação do planejamento estratégico no Rio de Janeiro pelo prefeito César Maia (1993-
1996),segundo modelos implementados anteriormente nos Estados Unidos e em Barcelona.
exposta nas gôndolas dos mercados mundiais” 7 .
(HARVEY, 2016).

No caso do Rio de Janeiro, às vésperas das Olimpíadas Rio 2016, a Prefeitura


Municipal removeu arbitrariamente inúmeras favelas com a finalidade de desencadear
processos de valorização imobiliária em diversas partes da cidade. Segundo dados
22.059 famílias8 foram removidas nos anos que antecederam o megaevento, incluindo o
seu ano de realização. Estes territórios, antes ocupados por populações de baixa renda
tornaram-se espaços modelos, produtos de um ‘urbanismo burocrático’ (Jacobs, 2013)
ou ‘mercadófilo’ (Mascarenhas, 2016). Os novos espaços concebidos (Lefebvre, 1994)
são capazes de acumular capital, gerar mais-valia e atrair consumidores e turistas.
Apresentam-se como “projetos urbanos, mas quase sempre são simplesmente projetos
imobiliários” (Jacobs, p. 17, 2013).

Harvey (2016) reforça que os negócios precisam ser garantidos, mas não podem ser o
sentido da gestão pública e nem serem usados para subjugar os interesses coletivos. Esta
submissão é o próprio ‘espírito da cidade-commodity’ (Harvey, 2016) 9 . As
transformações socioespaciais decorrentes da mercantilização da cidade são entendidas
por Garnier (2013) como parte do fenômeno da ‘reconquista urbana’. Segundo o autor,
assitimos a uma limpeza étnica: uma operação de retirada da população pobre,
imigrantes, clandestinos, marginais e outros ‘indesejados’ de partes da cidade, para dar
o lugar destes indivíduos locais à reprodução do capital, (Garnier, 2013) A atmosfera
dos megaeventos é a condição mais propícia para viabilização desta tática de
substituição de população.

Para justificar o procedimento mencionado trata-se de estigmatizar e criminalizar os


habitantes de bairros populares e implantar políticas públicas centradas no combate à
insegurança por meio da adoção de medidas opresssivas, como as chamadas políticas de
pacificação. Gonçalves (2012) explica que esta estratégia não é nova; mas praticada
tanto no Rio de Janeiro, quanto em outras cidades brasileiras. Em determinados
contextos, como no caso de megaeventos, chega-se a converter a cidade inteira – ou as
áreas de interesse imobiliário - em zonas de ‘segurança prioritária’ ou ‘zonas urbanas
sensiveis’. (Garnier, 2013; Agamben, 2005)

7
Anotações da autora de aula proferida pelo professor David Harvey na Praça da Cinelândia no Rio de
Janeiro em Setembro de 2016.
8
Em. http://olimpiadas.uol.com.br/noticias/redacao/2016/07/21/o-legado-das-remocoes-no-rio-violencia-
dividas-e-povo-na-mao-de-milicias.htm, acessado em Dezembro de 2017.
9
Anotações da autora de aula proferida pelo professor David Harvey na Praça da Cinelândia no Rio de
Janeiro em Setembro de 2016.
A Barra da Tijuca, na zona Oeste carioca, por exemplo, é um bairro projetado para
atender um perfil social específico; desconectado do contexto paisagístico, morfológico
e social em que se situa, o modelo do bairro é considerado fragmentado e arrogante por
alguns críticos (Jacobs, 2013; Santos, 2013). A Vila Autódromo, por sua vez, localizada
na zona em questão, representa a população não convidada ao ‘espetáculo’ da cidade
elitista (Debord, 1969). Justamente por não corresponder ao perfil de consumidor
solvente, a comunidade sofreu um violento processo de remoção levado a cabo pela
prefeitura municipal. O fato de seus moradores possuírem título de posse da terra e
direito de propriedade concedidos pelo governo do Estado não foi suficiente para
garantir a permanência da comunidade. (Azevedo e Faulhaber, 2016). A política de
remoções utiliza de tecnologias de poder que articulam táticas para atingir seus
objetivos de gestão da vida nos territórios urbanos. Neste contexto o Estado não se
apresenta como homogêneo e unívoco, porem complexo e multifacetado. (Foucault,
1976).

Observa-se que a existência de um status de legalidade adquirido pela Vila Autódromo


conferiu solidez à luta pela permanência de vinte famílias no local, mas não foi a razão
da vitória (Magalhães, 2015). Muitos moradores, apesar de possuírem a posse da terra,
cederam às pressões ‘biopolíticas’ e estratégias remocionistas e partiram para outras
favelas ou foram removidos para o Parque Carioca, condomínio do Programa Minha
Casa Minha Vida 10 construído para complementar o processo de remoção da Vila
Autódromo. (Foucault, 1976).

A emergência de um museu social


O Museu das Remoções é uma etapa da luta de resistência à remoção da Vila
Autódromo, um empenho coletivo de denúncia da violência sofrida pelas favelas
cariocas durante a concretização do projeto urbanístico ‘mercadófilo’ implantado no
Rio de Janeiro no período dos megaeventos (Mascarenhas, 2016).

10
Os reassentados da política remocionista são encaminhados para conjuntos habitacionais do Programa
Minha Casa Minha Vida, MCMV, que se em um primeiro momento foi criado para redução do déficit
habitacional, tornou-se, posteriormente, um complemento à política de remoção e um agravante do
déficit habitacional. O empreendedor privado é o agente central das decisões desta política habitacional,
característica que reforça o ideário neoliberal e acentua a dificuldade de realização de processos
participativose democráticos. Ao entregar ao agente imobiliário a deliberação sobre o ordenamento
territorial a respeito da localização dos condomínios, o programa contraria o art. 182 da Constituição
Federal, (BOGADO, 2017).
O museu é uma resposta-ação a contrapelo11 da dinâmica de esquecimento empreendida
pelas remoções olímpicas (Benjamin, 2005). Ele nasce da necessidade de enfrentar o
duplo processo de apagamento buscado pelas práticas estatais: tanto do espaço físico,
quanto das redes de relações (sociais e políticas) que a constituíram historicamente.
Portanto, seu objetivo não se restringe à denúncia, mas abrange-se a promover disputas
simbólicas com as narrativas oficiais a partir do resgate e comunicação da memória
local (Bogado e Chagas, 2017).

O projeto de extensão universitária da Anhanguera resultou na construção de sete


esculturas que deram origem ao museu. Idealizadas pelos alunos de arquitetura e
urbanismo a partir das oficinas de memória, as esculturas são as sementes do Museu das
Remoções. O Processo de construção do Museu das Remoções é marcado pela
colaboração:

“Reunidos todos em uma grande roda, escuto cada


reflexão e proposta enunciadas por cada pessoa
que participa dessa nova modalidade de
resistência da Vila. A partir de diferentes lugares
de fala, cada participante estampa sua marca no
processo de construção coletiva que se instaura na
comunidade no ano de 2016. Após tantas outras
formas de resistir que foram postas em prática na
localidade, como vigílias, barricadas, ocupas e
reuniões de todos os tipos, o processo do qual falo
consiste na construção de um museu comunitário a
céu aberto que, emanando horizontalidade,
criatividade e produção artística, dá início a uma
nova fase de lutas na Vila Autódromo.
Impulsionado por pujantes fluxos de ideias,
análises e práticas, que se cruzam na construção
de uma síntese coletiva, o museu é autogestionado
por cada participante engajado nesse processo,
seja este morador, ou membro das dezenas de
grupos da sociedade civil que se dedicam a apoiar
a Vila Autódromo na luta contra as remoções e
pela preservação da memória comunitária. Para

11
Considera-se o museu uma resposta-ação a contrapelo do curso da história do capitalismo poque
questiona e mina as ações da elite financeira mundial e não se alinha aos projetos hegemônicos previstos
para a cidade.
além das atividades e materiais gerados pelo
grupo, a metodologia que nutre o Museu por si só
cumpre o potente papel de marchar no
contrassenso da história, tendo em vista um
contexto urbano marcado por arbitrariedades,
violações e práticas de invisibilização, a partir do
momento em que expressa, em um formato não
convencional, a capacidade criativa de um grupo
verdadeiramente heterogêneo de reverter um
processo histórico que, a princípio, porta todos os
elementos necessários para ser bem sucedido. No
contrafluxo ao modelo de urbanismo aqui
criticado, mas também às formas tradicionais de
associativismo e ação coletiva, o Museu das
Remoções emerge como uma entidade
concretamente capaz de potencializar a voz das
populações historicamente oprimidas na luta
contra as formas de invisibilização do capitalismo
contemporâneo. Novos modos de opressão, formas
outras de agir. O Museu das Remoções depara-se
com o desafio de enfrentar as complexas
artimanhas contemporâneas do capital em
território urbano, inventando e reinventando a
cada dia mecanismos de agir e resistir.”12 (Petti,
2016)

Constituído a partir de um processo horizontal e participativo no qual os integrantes


tanto aportam quanto absorvem conhecimento, o Museu das Remoções é fruto da
práxis; elaborado coletivamente a partir das necessidades reais da Vila Autódromo em
cada etapa da luta. Ele é um museu em processo, cujas transformações e recriações são
constantes. As iniciativas autogeridas, as práticas participativas e a museologia social
possuem forte traço comum: O movimento.

No âmbito da pesquisa, a construção do museu é uma experiência de pesquisa-


intervenção ou pesquisa-ação (Latour, 2005), e fundamenta-se na ‘utopia do

12
O referido trecho do caderno de campo da antropóloga Daniela Petti, ativista integrante do Museu das
Remoções, reforça a coletividade do processo de concepção e construção do Museu das Remoções,
concedido por Daniela à autora.
interconhecimento’, que propõe o uso contra-hegemônico do conhecimento cientifico
(Sousa Santos, 2010, p. 35). A ‘ecologia dos saberes’ proposta por Boaventura de Sousa
Santos coloca a prática e a sabedoria dos atores locais como bases para a produção de
conhecimento. Segundo Boaventura abrir-se para aprender das ‘periferias do mundo’ é
a porta para os conhecimentos não científicos e não ocidentais que prevalecem nos
modos de vida do cotidiano. (Sousa Santos, 2010, p. 34 e 35)

Figura 1. Oficina de memória. Vila Autódromo, 2016. Foto: Luiza de Andrade

A ‘pesquisa-ação’ que resultou na construção do Museu das Remoções recusa a ideia de


isenção que sustenta que o indivíduo é politicamente neutro no campo de pesquisa, e
adota o princípio de que o indivíduo afeta e é afetado pelo campo. Dentro desta lógica o
Museu das Remoções foi construído a partir de uma ação direta no território da
comunidade, compreendendo o pesquisador como um ator capaz de desencadear
transformações socioespaciais. (Tripp, 2005, Virno, 2003, Malo, 2004, Montañés,
2009). Os pesquisadores-atores implicados nesta iniciativa museológica assumem um
posicionamento político em favor da luta pelo direito à moradia no Rio de Janeiro.

Ressalta-se aqui a importância da ação das “universidades junto às resistências locais


fazendo frente às atuações do poder público vinculadas à macropolitica urbana”:
Cidadãos, profissionais, professores e pesquisadores podem e devem posicionar-se
diante das disputas pelo direito à cidade e pela inclusão das minorias. (RENA, 2016, p.
2). O Museu das Remoções é uma luta potente e criativa que articula vários atores,
dentre os quais está a universidade. As atividades do projeto de extensão da
universidade Anhanguera que deram origem a sua construção se dividem em três
etapas:

Na primeira etapa buscou-se criar a proposta do museu com reuniões de apoiadores e


moradores para a concepção da ideia. Na segunda etapa do processo priorizou-se a
intensificação da comunicação na comunidade, com a realização de dinâmicas de
diálogo e oficinas de resgate de memória, com participação dos alunos do projeto
extensão, moradores e ex-moradores da Vila Autódromo e de comunidades do entorno.
Nesta etapa realizaram-se rodas de leitura, oficinas artísticas, oficinas de fotografia
coletiva, atividades para conhecimento e reconhecimento do lugar, devir pela
comunidade conduzido pelo morador Luiz Cláudio, abrangendo a área da comunidade e
a parte desapropriada pelo Parque Olímpico, entre outras atividades. Esta etapa também
contou com o resgate de equipamentos urbanos destruídos e escombros das casas
demolidas para constituição do acervo do museu. Algumas destas peças foram
incorporadas à coleção do Museu Histórico Nacional no Rio de Janeiro. Registros
gráficos, cartográficos, fotográficos, audiovisuais também foram produzidos nesta
etapa, para posterior sistematização pelos alunos pesquisadores e incorporação ao
acervo do Museu das Remoções.

A terceira etapa consistiu em intervenção participativa no espaço público da


comunidade: construção do Museu das Remoções. Esta atividade marcou os lotes que
tiveram suas edificações demolidas com instalações criativas elaboradas pelos alunos a
partir do reaproveitamento dos escombros das casas e equipamentos urbanos. Estas
instalações rememoram e identificam as casas removidas. Os subsídios imateriais e
materiais para criação das esculturas foram obtidos nas oficinas de memória realizadas
na etapa anterior e no reaproveitamento dos escombros da comunidade.

O Museu das Remoções foi inaugurado oficialmente no dia 18 de maio de 2016, dia
internacional dos museus, com a presença de moradores, pesquisadores, ativistas e
imprensa independente. Na ocasião o público conheceu as sete esculturas elaboradas
pelos alunos-pesquisadores, a partir de um percurso guiado pelos moradores da
comunidade que conduzia a cada uma das esculturas:

Figura 2. Escultura do Museu das Remoções ‘Vila de todos os Santos’. Vila Autódromo, 2016.
Foto: Luiza de Andrade

1) “Vila de Todos os Santos”, em homenagem à casa da Dona Heloísa Helena


Berto, que além de haver sido removida também sofreu com atos de racismo e
intolerância religiosa no processo de remoção; 2) “Penha de muitas faces”,
escultura em homenagem à casa da Dona Maria da Penha Macena, esta
instalação artística possui o símbolo feminino e representa o protagonismo
feminino na luta da Vila Autódromo e demais lutas sociais urbanas. Dona Penha
é uma mulher que influenciou significativamente todos os moradores que
permaneceram na luta até o final. A remoção de sua casa ocorreu no dia
internacional da mulher, mesmo dia em que ela ganhou o prêmio mulher cidadã
da ALERJ 13 ; 3) “Suporte dos males” escultura em homenagem à Dona Jane
Nascimento, a escultura rememora o protagonismo da Dona Jane nas lutas
sociais da Vila Autódromo, por muitos anos Dona Jane foi o suporte da luta
ativista na comunidade. 4) A intervenção “Luz que não se apaga” é única
escultura que faz alusão a uma edificação que não foi removida: a Igreja São
José Operário. Os alunos do projeto de extensão decidiram homenagear a igreja,
devido ao simbolismo que esta edificação tem para a comunidade, para além da
função religiosa este edifício foi usado como residência para moradores que
tiveram suas casas demolidas, como local de festas, de reuniões e recepções em
geral. A escultura que representa a igreja possui um elemento central que
simboliza um ninho e transmite a ideia de acolhimento. 5) “Doce infância”,
escultura em homenagem ao Parquinho que foi removido e demolido pela
prefeitura após ter sido reformado pelos alunos do projeto de extensão
universitário da Anhanguera, em conjunto com a comunidade. 6) “Espaço
Ocupa e Casa da Dona Conceição”, escultura que faz referência ao espaço onde
ocorriam os Festivais Ocupa Vila Autódromo; o espaço do festival Ocupa estava
ao lado da casa da Dona Conceição Queiroz, que tinha um papel acolhedor nos
eventos culturais da comunidade. Ela oferecia seu banheiro para uso de todos e
cozinhava a comida para as festas. O espaço Ocupa também tinha sido
reformado pelos moradores da Vila Autódromo, em conjunto com ativistas e
com os alunos do projeto de extensão da Anhanguera. 7) A escultura “A
Associação sou eu” é uma homenagem à Associação dos Moradores da Vila
Autódromo e possui elementos que permaneciam guardados dentro da
associação, a frase-título desta instalação faz referência à campanha organizada
pela comunidade quando esta edificação foi removida. “A Associação sou eu” é
uma mensagem ao poder público e significa que a associação da Vila
Autódromo é cada uma de suas casas e cada um de seus moradores, ela não
deixou de existir nunca, nem mesmo no dia da remoção do edifício da
Associação dos Moradores.

“A Vila Autódromo não cabe na rua onde foram


construídas as 20 casas novas. A Vila Autódromo não
cabe no território onde antes moravam mais de 600
famílias. A Vila Autódromo não cabe nem no Rio de
Janeiro. A Vila Autódromo é a casa de todos os teimosos

13
Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro
que acreditam que memória não se remove.” Luiza de
Andrade, cineasta e ativista.14

Cada morador e apoiador da Vila Autódromo faz parte de uma rede, cujos vínculos que
os une são afeto, amor e esperança em uma realidade urbana menos injusta. Nesta luta
cabe mencionar a atuação das mulheres. Dona Jane do Nascimento, Dona Conceição,
Dona Heloísa Helena Berto e Dona Maria da Penha Macena tiveram suas casas
representadas pelas esculturas. A homenagem feita pelos alunos-pesquisadores a estas
mulheres reafirmam o protagonismo feminino na luta da Vila Autódromo. Junto com
muitas outras mulheres, como Sandra Maria, Nathália Macena, Dona Sandra Regina,
Dona Inalva e tantas outras, elas constituem os pilares de sustentação da luta da
comunidade. Ressalta-se que muitos homens se destacaram e tiveram atuações decisivas
nesta trajetória. Entretanto, segundo relato dos próprios moradores e moradoras, as
mulheres foram protagonistas desta batalha, responsáveis por trazer ou manter seus
filhos, pais, irmãos, amigos e maridos na resistência nos momentos mais difíceis.15

As edificações homenageadas, no entanto, não correspondem aos atores ou casas mais


importantes da comunidade, seria incabível e equivocado pretender julgá-lo. A escolha
das esculturas foi espontânea e deve-se à percepção dos alunos e da relação de cada um
deles com os moradores e ex-moradores presentes nas inúmeras oficinas de memória
realizadas no processo de constituição do museu.

Assinala-se, entretanto, que o Museu das Remoções não se limita a uma intervenção
territorial ele também é uma ação simbólica que atua no resgate da história e da
memória da Vila Autódromo, a partir de uma prática museológica que celebra o
cotidiano. A memória entendida à luz desta nova museologia faz alusão ao passado, ao
presente e ao futuro; faz alusão àquilo que se realiza na concretude de todos os dias; dos
corpos e dos movimentos. Esta concepção compartilha com as dinâmicas participativas
a prioridade atribuída ao presente, à vida e ao cotidiano. (Bogado e Chagas, 2017).

14
Luiza de Andrade é ativista e cineasta engajada na construção e gestão do Museu das Remoções, sendo
responsável pela produção de imagens e mídias audiovisuais do museu, assim como pela materialização
conjunta das atividades do museu, desde a elaboração de aulas em conjunto com a autora deste artigo, da
concepção das oficinas de memória e da realização das atividades culturais que o museu permanece
desenvolvendo. Desde o inicio do Museu das Remoções, Luiza de Andrade foi atriz fundamental desta
luta efetiva e criativa.
15
Conforme relatos dos moradores à autora.
Apropriação da Museologia Social
O Museu das Remoções apresenta-se como parte do processo da articulação do
movimento social urbano, comunica a memória da Vila Autódromo e denuncia a
política de remoções levada a cabo pela prefeitura municipal do Rio de Janeiro
(Magalhães, 2015). A narrativa transgressora aqui exposta evidencia as violações e
contradições presentes na gestão urbana atual: enquanto a celebração hegemônica das
Olimpíadas está associada à memória do poder 16 , este museu apresenta o poder da
memória comunitária e a versão popular sobre os jogos olímpicos do Rio de Janeiro em
2016. (Bogado e Chagas, 2017).

A teoria que fundamenta este museu situa-se no campo das relações e se propõe a
“compreender e praticar os museus como acontecimentos e atos que potencializam a
vida do ponto de vista relacional, social e político”17. (Bogado e Chagas, 2017).

Diferente da museologia que predominou da primeira metade do século XIX até a


primeira metade do século XX, conservadora e burguesa, cuja prática de memória,
patrimônio e museu “estavam comprometidas com os valores das aristocracias e das
classes e religiões dominantes”; a chamada nova museologia apresenta uma perspectiva
libertária que estimula a insubordinação. (CHAGAS E GOUVEIA, 2014, p.15). Desde
1984, a museóloga Valdiza Russio18 já falava de uma prática museológica que deveria
ser construída “com” a comunidade, em oposição a uma museologia “para” a
comunidade. Este mesmo conceito de construção coletiva fundamenta os processos
participativos, que, por serem capazes de potencializar a espontaneidade das
comunidades, representam ameaça à estandardização perpetrada por determinados
setores acadêmicos e culturais. (Chagas e Gouveia, 2014)

Neste aspecto, a prática da museologia social contraria as teorias e práticas pedagógicas


fundamentadas em obediência absoluta e apresenta-se como ferramenta capaz de
enfrentar as crescentes tendências à ordem e ao controle do contexto sociourbano

16
Ver o texto “Memória e Poder: dois movimentos”, publicado nos Cadernos de Sociomuseologia,
disponível em http://revistas.ulusofona.pt/index.php/cadernosociomuseologia/article/view/367 (última
consulta 10 de dezembro de 2016).
17
O conteúdo sobre museologia social descrito neste artigo foi retirado do texto “Memória não se
remove” escrito em conjunto por Mário Chagas e Diana Bogado, publicado a no livro do seminário
“Memória das Olimpíadas: múltiplos olhares” organizado no âmbito do projeto “Preservação da Memória
das Olimpíadas: processos e ações” organizados pela Fundação Casa de Rui Barbosa e pela Fundação
Getúlio Vargas.
18
Waldisa Rússio Camargo Guarnieri foi professora e museóloga, nasceu em 1935, na cidade de São
Paulo. Uma das personalidades mais influentes no desenvolvimento do pensamento teórico
da Museologia e de sua consolidação como campo disciplinar no Brasil. Em sua trajetória foi
coordenadora do curso de Pós-Graduação de Museologia da Escola de Sociologia e Política de São Paulo
e membro do Conselho Internacional do Museu da Unesco.
contemporâneo. (CHAGAS E GOUVEIA, 2014, p.18). Segundo Hugo de Varine é
essencial entender “a teoria da educação como prática da liberdade”, capaz de
transformar o “homem-objeto da sociedade de consumo (...) em homem-sujeito”.
(VARINE, 1979, p.17)

Estima-se que a prática de uma museologia indisciplinada como base teórico-


pedagógica da atividade que originou o Museu das Remoções potencializou ainda mais
a habilidade de resiliência da Vila Autódromo e intensificou a capacidade de subversão,
reinvenção e reconstrução permanente da comunidade. (Bogado, 2017).

As metodologias participativas como perspectiva para intervenção na


comunidade

O museu é simultaneamente uma experiência de pesquisa e extensão e uma luta


popular. Como visto no âmbito pedagógico se fundamenta na museologia social e no
âmbito social representa um espaço de luta por direitos sociais. Tanto no que se refere à
gestão urbanística quanto à prática pedagógica, a referida iniciativa tem caráter contra-
hegemônico por contestar a normatização e por ter como princípio teorias que dão voz à
população. As obras do museu foram fruto de ação popular com apoio da universidade e
de uma rede de ativistas. Entretanto, a iniciativa não foi a primeira intervenção espacial
na Vila Autódromo no âmbito da extensão universitária.

Os espaços construídos/reformados no contexto da extensão universitária em conjunto


com a comunidade foram o parquinho, o espaço de eventos, chamado espaço Ocupa e o
Museu das Remoções, um museu de percurso. Os elementos fundamentais para
elaboração e execução destes projetos foram as contribuições de homens, mulheres,
jovens, crianças, idosos e demais conhecedores do local. Buscou-se que todos os “co-
planejadores”, alunos, ativistas e comunidade participassem ativamente do processo de
elaboração de projeto e intervenção no espaço público.

Os projetos de intervenção urbana desenvolvidos na Vila Autódromo tiveram como


diretriz o uso de metodologias participativas, como a Investigação-ação-participação,
IAP, que priorizam o conhecimento prático diante de qualquer outro conhecimento e
articulam pesquisa e intervenção social com o conhecimento local. (MALO, 2004, p.
32). O diálogo é a base metodológica das experiências participativas, parte-se da
premissa que a comunidade é o ator mais adequado para apontar as necessidades e os
problemas locais.

O método participativo é aberto, sua aplicação é estratégica e não programática


(Montañés, 2009), tanto o pesquisador social, quanto o arquiteto, num processo de
pesquisa participativa utilizam de metodologia para ter acesso à população e construir
juntos as perguntas e respostas do trabalho; sendo que no primeiro caso a resposta é a
direção para uma mudança social e no segundo caso um projeto de intervenção espacial
capaz de gerar transformações sociais. (LÓPEZ MEDINA, 2010, p.96).

O primeiro projeto de requalificação urbanística coordenado pela professora Diana


Bogado na comunidade foi a requalificação do parquinho, elaborado a partir de diversas
visitas à comunidade que consistiam na troca de experiência entre os alunos de
arquitetura e urbanismo da Anhanguera e os moradores. Esta troca foi estabelecida a
partir de debates, diálogos e “devir” pela comunidade tendo como premissa que o
trabalho de campo necessariamente “afeta e modifica os corpos e a subjetividade
daqueles que participam do processo”. (MALO, 2004, p.35). As experiências corpóreas
e afetivas são entendidas como fundamentais para a produção do conhecimento e de
subjetividades.

“La coproducción de conocimiento crítico genera cuerpos


rebeldes. El pensamiento sobre las prácticas de rebeldía da valor
y potencia a esas mismas prácticas. El pensamiento colectivo
genera práctica común. Por lo tanto, el proceso de producción de
conocimiento no es separable del proceso de producción de
subjetividad. Ni a la inversa.” (MALO, 2004, p. 35)

O primeiro contato com a comunidade consistiu em conhecimento socioespacial


necessário à posterior elaboração do projeto. Neste encontro discutiu-se as possíveis
intervenções, a partir das necessidades percebidas e transmitidas pelos moradores. Os
possíveis locais de projeto também foram discutidos e decididos em conjunto entre os
alunos e os moradores. Identificou-se a necessidade de reconstruir espaços comuns e
espaços públicos, uma vez que todos os espaços não residenciais haviam sido
transformados em escombros. Decidiu-se a requalificação de uma edificação semi-
demolida, que seria o centro cultural da comunidade e a requalificação do parquinho da
Vila Autódromo.

Os seguintes encontros tiveram a finalidade de absorver informações para elaboração do


programa dos projetos do centro cultural e do parquinho. As atividades foram
divulgadas publicamente na internet a fim de contar com maior número possível de
participantes para os mutirões de requalificação. Entretanto não foi possível executar os
dois projetos elaborados pelos alunos, porque na madrugada da véspera da data do
mutirão, segundo relato dos moradores funcionários da prefeitura haviam rompido os
pilares do edifício19 que seria convertido em centro cultural. A referida edificação ficou
em risco de desabamento o que inviabilizou o mutirão de construção do centro cultural.
Foi realizado apenas o mutirão de requalificação do parquinho.

“Os projetos de requalificação do parquinho e o


museu a céu aberto foram providenciais, pois chegaram
em um momento, onde a comunidade estava sendo
massacrada pelo poder público em nome da especulação
imobiliária. Essas ações nos revigoraram e esta tese
(referindo-se a tese de doutorado da autora) voltada para
o museu vai ajudar a imortalizar nossa história.” Luiz
Cláudio da Silva, ativista e morador da Vila Autódromo
em entrevista à autora.

Os processos participativos tornam-se importantes ferramentas de contribuição política


e teórica a todos os envolvidos; não somente pela troca de conhecimento que se
estabelece nestas experiências, mas também porque são pensados para responder
questões relacionadas aos problemas urbanos e aos impactos socioeconômicos e
ambientais gerados pelos demais projetos urbanos da cidade. A construção coletiva
destes espaços públicos na comunidade contraria a lógica dos espaços “espaços
concebidos” de cima para baixo (Lefebvre, 1994) e, além disto, fortalece o
cooperativismo entre os moradores (Miraftab, 2016).

Se as formas do planejamento urbano contemporâneas são usadas como instrumentos de


homogeneização para anular territórios e pessoas que não interessam à lógica do capital
(Harvey, 2016)20, a execução de projetos participativos comunitários, em contraposição,
se opõe à tendência de estandardização ao construir lugares que atendem à demanda
popular e as necessidades locais. Espaços públicos são espaços de diversidade e
inclusão quando são realmente públicos e abertos; desta forma contribuem para
democratização da cidade na contramão das tendências neoliberais de privatização do
território.

19
Segundo moradores em entrevista à autora, que nesta caso serão preservados devido ao teor da
informação, na véspera do dia marcado para a intervenção que seria 14 de Novembro de 2015, a referida
edificação semi-demolida que seria o centro cultural possuía a estrutura íntegra sem risco de
desabamento, constatado nas visitas anteriores. Entretanto ao amanhecer, a partir das 6h da manhã, os
moradores se depararam com os pilares da edificação partidos. O evento havia sido divulgado na internet,
e supõe-se que a Prefeitura os tenha quebrado na madrugada anterior. Cabe destacar que mais de uma vez
na Vila Autódromo foram identificados espiões da Prefeitura que tinham a finalidade de se informar das
estratégias de resistência e desarticular a luta; alguns ativistas e integrantes do movimento social sofreram
inúmeras ameaças. Sobre ameaças e desaparecimento de lideres de movimentos sociais ver dissertação de
mestrado IPPUR, UFRJ “Barra da Tijuca e o Projeto Olímpico: a cidade do capital” de Renato
Consentino.
20
Anotações de aula da autora, em aula proferida pelo professor David Harvey na praça da Cinelândia,
Rio de janeiro, Agosto de 2016.
Entende-se que a tomada de decisão coletiva é a característica que diferencia as
experiências participativas das metodologias tradicionais de elaboração de projetos
arquitetônicos e urbanísticos realizados normalmente sem consulta popular; como
ocorrido com o Parque Olímpico 21 , vizinho da Vila Autódromo, por exemplo. A
coletividade inerente à participação opõe-se à centralidade das decisões tomadas sem
diálogo. Lopéz Medina (2010) complementa que as metodologias participativas
apresentam-se como possibilidade de democratização da cidade, desta forma
contrapõem-se à prática do planejamento urbano atual que não possui canais de dialogo
com a população e concebe projetos urbanísticos de forma autoritária. (Miraftab, 2016).

Neste sentido a construção coletiva dos espaços da comunidade Vila Autódromo, no


âmbito do projeto de extensão universitária mencionado, representou o atendimento à
demanda popular e o resgate do modo de produção 22 socioespacial que existia
anteriormente ao processo de remoção - dinâmica natural das ‘periferias do mundo’
(Sousa Santos, 2010). Esta retomada da espontaneidade cotidiana decorrente dos
processos colaborativos consiste no resgate da prática do ‘habitar’ e da dimensão do
‘espaço vivido’ Lefebvriano (1976; 2001).

Conclusão
A luta da comunidade Vila Autódromo constituiu um espaço poético, subjetivo,
multifuncional e complexo de resistência e resiliência; o ‘habitar como um poeta’
ampliou-se à resistência como poeta contrapondo-se à proposta estandardizada do
‘habitat’, - padrão de referência dos projetos urbanísticos atuais-. (Lefebvre, 1976,
2001; Heidegger, 2005).

“O habitat foi instaurado pelo alto: aplicação de


um espaço global homogêneo e quantitativo
obrigando o 'vivido' a encerrar-se em caixas,
gaiolas, ou 'máquinas de habitar'" (LEFEBVRE,
1999, p. 79).

21
Maior estrutura construída para a realização das Olimpíadas Rio 2016.
22 A rede de relações que se constitui na favela é uma forma de driblar as faltas de acesso generalizada de
seus moradores, seja falta de comida, de dinheiro, de serviços estatais. A todas estas faltas os moradores
respondem com solidariedade uns aos outros, o que garante a sobrevivência dos mesmos é o chamado
“nós por nós”. O “nós por nós” é a cultura, por exemplo, do Complexo do Alemão, no Rio de Janeiro; ele
supre todas as faltas, é uma cultura de sobrevivência que tem como base a solidariedade, conforme
explica Thainã de Medeiros, morador do Complexo do Alemão, em entrevista a autora
A resistência criativa associada aos modos de vida marginais da Vila Autódromo
constitui a insurgência de uma disputa de significados com a narrativa hegemônica no
campo cultural, que fortalece a identidade local com base no sentimento de
pertencimento e autonomia. (Scott, 1990). O conceito de insurgência propõe a
descolonização das teorias de planejamento ao acionar a contra-hegemonia, a
transgressividade e a imaginação (Miraftab 2004) que respaldam as ações de
desobediência civil e a autonomia dos sujeitos.

A conquista da permanência da comunidade, celebrada nas atividades do Museu das


Remoções, é atribuída a diversos aspectos desta luta: resgate dos modos de vida locais
ou do ‘habitar’ das periferias que fortalecem os vínculos afetivos; articulação em rede
que projeta a luta para o global; táticas de resisitência criativa que respondem às
estratégias de remoção biopolítica23 do Estado.

Esta nova forma de resistência, inerente aos novos movimentos sociais, é mais
elaborada, criativa, dinâmica e inovadoras, que as antigas formas de luta. (Bogado,
2017). As resistências criativas compartem com a museologia social a priorização do
presente e da vida, e tem a espontaneidade como característica chave. Apresentam-se
como resposta às formas estandardizadas de vida impostas pelo status quo na metrópole
neoliberal ‘mercadófila’ (Mascarenhas, 2015). Assim, o Museu das Remoções afirma o
modo de vida e a presença da Vila Autódromo no Rio de Janeiro, que permanece,
existe, re-existe e garante que a “memória da Vila não se remove”.

23
A biopolítica para Michel Foucault é uma tecnologia de governar que efetiva o controle da sociedade e
dos sujeitos por instrumentos que não se restringem aos âmbitos ideológicos, e que exercem o biopoder
em esferas biológicas, abrangendo-se aos âmbitos de controle corporal. Na sociedade capitalista as
estratégias biopoliticas de governo se efetivam mediante o exercício da aplicação do poder em todos os
aspectos da vida cotidiana. (FOUCAULT, 1986, P. 134).
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