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CANTREVA, Philipe
Universidade Federal Fluminense
do Rio de Janeiro que possui apoio da FAPERJ material já publicado (livros, artigos e
(Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do periódicos) e visita a campo de forma delimitar
Rio de Janeiro) desde 2017 e é desenvolvida mais precisamente o real estado de conservação
desde 2015. A região portuária sempre foi da mesma e as intervenções realizadas.
atendida pelas iniciativas governamentais de
saneamento com foco no escoamento da Fragilidades e Desigualdades
produção e na utilização das principais vias para
o tráfego intenso, no entanto, poucas foram as Arquitetura. Uma pequena palavra, mas com
iniciativas do mesmo, nesta área, com relação à grande abrangência e alçada. No Brasil,
habitação social; pequenos conjuntos em simboliza poder, este podendo ser usado para
diferentes épocas podem ser apontados. Com o segregação ou contemplação. No estado do Rio
projeto contemporâneo de revitalização de Janeiro, é uma palavra capaz de ser utilizada
novamente é alterado o perfil do local pela por poucos e desconhecida por muitos; onde os
injeção de capital objetivando a comercialização poucos são detentores de riquezas e muitos são
de lotes que, próximos ao Centro e dotados de urbanisticamente vulnerabilizados. A esta
infraestrutura e transportes estavam sendo realidade acrescenta-se o apagamento histórico
subutilizados. Dedicar um olhar específico à frente à cidade contemporânea que atinge o
questão da habitação popular frente a esta universo da arquitetura e urbanismo, ainda
intervenção na área portuária do Rio de Janeiro assim há quem resista e se sobressaia mesmo
é o objetivo onde, pontualmente, é possível que em uma simples arquitetura de habitação
registrar projetos que foram preservados como a social – inicialmente para operários, ou
Vila da Gamboa. proletária.
Mendonça, em 1931, era o aluguel das 4). A proposta da equipe, que realizava um
residências (PROURB, s/data, p. 1). trabalho, concluiu pela necessidade de um
projeto referente à Vila Operária da Gamboa que
O lar para existência mínima, como cita Moreira vá mais além de uma reforma física, abarcando
ao rever as notas do CIAM realizado em valores culturais, históricos e sociais, a fim de
Frankfurt (1929) e Bruxelas (1930) tem sua gerar novos pontos de lazer e renda para a
representação brasileira na Vila Operária da região. Neste propõe a participação de equipe
Gamboa (MOREIRA, 2005, p. 8). Oskman técnica voluntária, doação de empresas de
reforça em sua tese a influência do CIAM na materiais de construção bem como a
produção de moradias sociais: “Temas como implantação de um memorial na edificação
habitação social e cidade funcional permeavam contando a história do prédio.
os primeiros congressos, estabelecendo os
principais campos de discussão dos grupos que No workshop em edificação e exposição
os coordenavam. ” (OKSMAN, 2017, p. 56). As realizado durante o 8º Seminário Docomomo
quatorze unidades foram implantadas no lote Nacional 2009, Ganz e sua equipe verificaram,
estreito em distribuição linear e com dois em visita a Vila da Gamboa, a quase total
pavimentos, estes seguem os princípios básicos ausência de processos colaborativos entre os
do Modernismo instaurados pela Carta de próprios moradores, entre estes e o poder
Atenas, como: racionalização do espaço, vãos público e os órgãos do patrimônio, sendo as
livres, cobertura plana e pilotis. soluções individualizadas (GANZ, 2009, p. 1).
Conforme a figura 2 a concepção do projeto de No mesmo ano a Vila passou por um processo
doze apartamentos se deu a partir de quatro de restauração, eliminando as demais alterações
quadrados, também observados na figura 1, que descaracterizavam o projeto original e
destes, dois para quartos, um para sala e o trazendo-o a sua concepção inicial novamente;
restante com sua área dividida entre cozinha e entretanto, nesses 10 anos subsequentes a
banheiro. Outros dois apartamentos, em edificação já se encontra novamente alterada
primeiro plano na fotografia, são conjugados pelos seus moradores visto que o projeto inicial
com banheiro. O aproveitamento do terreno foi não atende as necessidades e demandas do
máximo. presente, o que define o potencial construtivo e
intervencionista de seus moradores mesmo que
As marquises demarcam as entradas das sem o auxílio público, técnico ou qualificado
unidades. Para Cavalcanti o acabamento da para tal.
construção era bastante apurado; as cores
originais das paredes eram verdes e havana e do Buscando compreender como a construção se
passadiço metálico, com trama quadriculada, encontra nos dias atuais, a equipe de bolsistas do
branco (CAVALCANTI, 2001, p. 181). Em Grupo de Pesquisa Análise e Representação da
1988, pelo decreto nº 7351188 o imóvel foi Forma da UFF (Universidade Federal
preservado pelo que aperfeiçoou a APA (Área Fluminense) realizou visita à edificação. Apesar
de Proteção Ambiental) do SAGAS (bairros da de bastante alterado, o seu partido arquitetônico
Saúde, Gamboa e Santo Cristo) delimitando a foi mantido, fato mais visível na fachada. A
área e suas subáreas. O conjunto se localiza na inacessibilidade ao interior, obstáculo a
C – Santo Cristo 1 ((PCRJ, 2012, p. 6 - 12). primeiro momento, não foi um impedimento
para que se soubesse como se encontra sua
Século XXI divisão interna frente ao que originalmente era.
Nos diálogos com os moradores ficou explícito
Um “Grupo Focal” da disciplina Reabilitação que a dimensão das unidades foi ampliada e seus
Social em Projetos Urbanos do PROURB / aspectos internos não foram preservados, esses
UFRJ (Programa de Pós-Graduação em em função das necessidades contemporâneas,
Urbanismo da Universidade federal do Rio de que exigiram modificações com consequências
Janeiro) realizou com algumas moradoras da aparentes. A figura 3 representa a planta do
edificação, no final de 2008, questões conjunto atualmente e a legenda à direita desta
relacionadas ao seu estado de conservação e esclarece as alterações efetuadas.
levantou as possibilidades de intervenção para a
melhoria das condições de moradia Telhas e calhas metálicas, pisos cerâmicos
(MUCHINELLI, SANTOS e LOBO, 2008, p. (figura 4) e novas esquadrias foram algumas das
várias intervenções realizadas por seus Conhece a história de quem morava antes? 9.
moradores, que por falta de conhecimento Quantas famílias moram na vila? 10. O que acha
técnico e acesso ao mesmo, propuseram de morar nessa vila? 11. Qual o benefício e o
soluções mais simples e que são de fácil malefício? 12. O que mudaria?
manuseio; o que por efeito demonstra o
sentimento de pertencimento e apropriação forte Na visita, realizada a 05 de dezembro de 2019,
na relação entre residente e residência. foram entrevistados dois moradores que
preferiram não se identificar. Das perguntas de
A figura 5, uma fotografia de Ivo Korytowski, 1 a 5 a resposta foi a negativa. Sobre o tempo de
fornece a visualização por um ponto de vista moradia, ambas famílias estão no local há
acima do que tem o observador que passa pela muitos anos e assistiram e realizaram várias
Rua Barão da Gamboa, e permite verificar a modificações, algumas como a colocação de
instalação de diversos telhados e a criação de um cerâmicas de piso nas áreas comuns, que na
cômodo sob os mesmos nas unidades, alterando verdade foi iniciativa de um só proprietário, sem
de forma substancial a volumetria do conjunto. consentimento da PMCRJ (Prefeitura Municipal
da cidade do Rio de Janeiro). Das 14 unidades,
A equipe também redigiu perguntas que, 13 estão ocupadas com famílias que variam de
respondidas deram embasamento para um morador até seis membros. Sobre o que
entendimento da situação atual do conjunto. representa morar na vila, a senhora considerou
Estas foram nesta ordem apresentadas: 1. Sabe a tranquilo e confortável em vista das reformas
história do edifício? 2. Conhece a arquitetura do internas feitas na unidade. O senhor, também fez
projeto? 3. Conhece a planta original? 4. Sabe modificações nas esquadrias e abreviou o tempo
qual a alteração feita no projeto original? 5. Sabe da entrevista. Entre o recebimento do aceite do
se houve restauro do edifício? 6. Quanto tempo nosso trabalho, 04 de março e a presente data
mora? 7. Conhece quem morava antes? 8. não foi possível realizar nova visita devido a
necessidade de isolamento social para conter a DINIZ, Luciana Nemer. Rio de Janeiro: 100 anos de
pandemia. A equipe pretende complementar Habitação Popular. Vitória: Milfontes, 2019.
esta atividade assim que for indicado pela
GANZ, Louise. 8° Seminário Docomomo Nacional: Costa e
universidade. Warchavchik – Museu Vila Operária da Gamboa,
2009, Rio de Janeiro, Workshop, Intervenção em
Edificação e Exposição.
Conclusões
MOREIRA, Pedro. Alexandre Altberg e a Arquitetura Nova no
Na Vila Operária da Gamboa a pesquisa vem Rio de Janeiro. Revista Vitruvius - Arquitextos. N. º
058, 2005.
demonstrando que o passado relativamente
distante foi deixado para trás e deu lugar a MUCHINELLI, Lívia Ribeiro Abreu, SANTOS, Terena Brito
dos e LOBO, Maria da Silveira. Dilemas da
histórias recentes de famílias e moradores que se Conservação da Vila Operária da Gamboa no Rio
apropriaram dos espaços e fizeram daquele de Janeiro: Proposta de Intervenção Física com a
lugar, seja permanecendo ou repassando a Participação Comunitária. Trabalho de Conclusão da
Disciplina Reabilitação Social em Projetos Urbanos.
terceiros através de aluguel. PROURB / UFRJ, Rio de Janeiro, RJ, Brasil, 2008.
contempla. Por esta razão faz-se preeminente o SANTOS, Milton. Espaço e Sociedade. Petrópolis: Editora
desenvolvimento de trabalhos de Vozes, 1979.
conscientização dos residentes em conjuntos
preservados. Ações como as da equipe da
disciplina do PROURB, de implantação de um
memorial na edificação contando a história do
prédio, que poderia se dar através de painéis
fixados no edifício, colaboraria
substancialmente neste sentido.
Referências Bibliográficas