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Faculdade de Letras
2022
0
ABREVIATURAS
1
AGRADECIMENTOS
2
RESUMO
Palavras-chave
Pintura; Arquitetura; Portugal; Manuelino; Renascimento
3
ABSTRACT
Keywords
Painting; Architecture; Portugal; Manuelino; Renaissance
4
“Já Alberti tinha aproximado a pintura da história, ao afirmar: Posso muito
bem deter-me a contemplar um quadro (…) com o mesmo prazer que sentiria lendo
uma boa narrativa histórica, pois ambos – pintor e historiador – são pintores; um pinta
com a palavra, o outro com o pincel”
5
ÍNDICE GERAL
INTRODUÇÃO .................................................................................................................7
ESTADO DA QUESTÃO ...............................................................................................19
1. CONTEXTUALIZAÇÃO DA PINTURA PORTUGUESA COM A EUROPA
DO SÉCULO XVI .........................................................................................................37
1.1 O desenvolvimento das relações artísticas entre Espanha, Itália e Flandres com
Portugal................................................................................................................42
1.2 O estatuto social dos artistas na Europa versus a realidade portuguesa ..............51
1.3 O fenómeno da mobilidade artística, transmissão de conhecimentos e os mode-
los na pintura portuguesa quinhentista ................................................................66
1.3.1 A importância da gravura para a construção de modelos pictóricos ..........72
1.3.2 As leituras da Tratadística e a sua importância no contexto da pintura por-
tuguesa .................................................................................................................80
1.3.3 As novas linguagens expressivas: a pintura manuelina e joanina e o gosto
italianizante..........................................................................................................91
1.4 Os locais de aprendizagem e a importância dos mestres ...................................103
2. AS REPRESENTAÇÕES DE ARQUITETURA NA PINTURA DO RENASCI-
MENTO EM PORTUGAL. CASOS DE ESTUDO..................................................112
BIBLIOGRAFIA ...........................................................................................................193
WEBGRAFIA ...............................................................................................................203
6
INTRODUÇÃO
Partimos de uma visão atualizada das obras dos pintores Vasco Fernandes,
Gregório Lopes, Cristóvão Fernandes, Garcia Fernandes e André de Padilha, que
redefiniram, no seu tempo, o panorama artístico nacional, enquanto precursores de uma
nova viragem estética, da produção artística de Quinhentos. Aqui iremos visualizar
7
determinadas produções pictóricas como a confluência de vários fatores, não só de
representação perspética ou iconográfica, mas também numa tentativa de perceber qual
o peso de cada elemento compositivo da representação. Posto isto, o pintor é o principal
criador da obra e face a esta afirmação, nada aparece na composição pictórica que não
tenha um significado ou uma razão de ser.
As obras de Gregório Lopes (figs. 19, 34, 91, 102, 143, 170, 182, 183, 206, 212,
213, 221, 224, 232 e 246) constituíram o momento da viragem face a introdução de
novos ecos italianizantes, o designado Primeiro Maneirismo de Antuérpia, sob uma
revisão de valores pré-existentes, dos influxos renascentistas por via antuerpiana, numa
conversão precursora do Maneirismo na pintura portuguesa, que prevaleceu. Estes
segundos planos, de diversas influências dependiam da originalidade e qualidade
pictórica auferida pelo pintor, sendo que apesar da vontade do encomendante, estes
preenchiam os planos fundeiros mediante a temática que mais lhes comprazia e onde,
lhes era possível demonstrar os conhecimentos artísticos que dotavam, sem se afastarem
da temática e da iconografia religiosa a que estavam associados. Os pintores aplicavam,
nas suas obras, conhecimentos de uma teoria artística e arquitetónica que dirigia o olhar
do espectador para os pormenores e para as estruturas arquitetónicas dos planos
fundeiros. Os fundos de arquitetura detinham uma funcionalidade, acompanhar as
8
composições de uma forma idealizada ou mediante a cópia de obras de outros pintores.
Todavia estas arquiteturas poderiam ser suscetíveis de uma arquitetura fingida, ou
pintada, e uma arquitetura precursora da real, ou seja, construída, numa tentativa de “ir
além” da arquitetura idealizada pelos arquitetos, pela evolução das formas, que nem
sempre são passíveis de ser realizáveis (capítulo 2.1). Estes segundos planos, de
arquitetura ou de paisagem, adquirem uma real relevância no contexto pictórico,
dignificam a cena principal da composição, situação idêntica que se passava no
Renascimento espanhol, tendo como exemplo a pintura “Martírio de Santa Inês”, de
Juan Vicente Masip.
Aqui é revelada uma autonomia, por parte do pintor, que passa pela associação
de uma paisagem construtiva, para transmitir pictoricamente, de forma expressiva,
fundos arquitetónicos reais ou fictícios, ou melhor dizendo demonstrar a capacidade
pictórica de evocar referências retidas pela memória e ainda a mestria do pintor, em
representar uma singularidade inexistente. A arquitetura retratada na pintura da Idade
Moderna expressa o desejo da transformação do mundo e da realidade através de uma
atividade construtiva, segundo formas de utopias edificatórias, de cidades ideais e de
utopias insulares, ou seja, o desejo de transformação do mundo “visto serem um dos
diversos modos de “ver e fazer obra de arquitetura”, sob o sopro renovador de
inspiração italiana”1.
1
POLICARPO, Isabel Ponce de Leão. Gregório Lopes e a “ut pictura architectura”: os fundos
arquitectónicos na pintura do Renascimento português. Dissertação de Mestrado em História da Arte
apresentada à Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, Coimbra, 1996, p. 3.
9
O principal objetivo desta dissertação de mestrado é estudar um património
conhecido, contudo abordando metodologias diferenciadoras das demais utilizadas,
enquadrando esse património introduzido noutros conceitos, ou seja, identificando um
património que é referido, fundamentalmente, na história da pintura, mas também como
eco de preocupação que regressava na sociedade portuguesa da época, sendo neste caso,
no meio artístico sobre as questões de arquitetura. O que pretendemos aqui, é
demonstrar que um património estudado pode e deve ser lido de variadíssimas formas a
par de questões estritas a representações iconográficas, de primeiro plano e que fazem a
narrativa da obra, porém existem outros elementos passíveis de interpretação. É aqui,
que nos interessa chegar, perceber como os fundos de arquitetura evoluem em Portugal.
10
as representações da arquitetura na pintura do ponto de vista dos modelos, formas e
significados. Como era a disseminação da tratadística em Portugal, ao tempo do
Renascimento? Que ideias circulavam? Como a tratadística está patente nos edifícios
que estão figurados em pintura? Como representam a arquitetura? Qual a razão de ser
figurada a arquitetura em pintura? É somente real ou imaginada? Como é espelhado o
modo como o pintor perceciona o presente da sua atividade e as suas influências
culturais e artísticas? Existem representações convencionais, iconográficas invocativas
de modernidade? Os edifícios pintados são pré-existentes ou projetam-se traças que não
existem? As influências culturais e artísticas atingiram a pintura do Renascimento em
Portugal?
2
“o estudo da arquitectura do Renascimento não ficaria completo sem a inclusão dos fundos
arquitectónicos, que se revelam como um dos seus capítulos mais interessantes e inovadores (…) A
análise conjunta dos vários critérios de representação da arquitectura na pintura renascentista
portuguesa visa então um maior conhecimento sobre a objectividade destes pintores ao materializarem
as arquiteturas fingidas pela pintura, tendo em conta os vários fatores de influência que aí confluem, e
ainda sobre as diferentes formas de adequação realmente concretizadas por estas arquitecturas
pintadas.”: POLICARPO, Isabel. Gregório Lopes e a “ut pictura architectura”: os fundos
arquitectónicos na pintura do Renascimento português, Coimbra, 1996, p. 3.
11
A ligação ao mundo dos literatos e o acesso a fontes de informação deveu-se ao
progressivo aumento de encomendas de obras de arte, no século XV, que beneficiou
com a ascensão do estatuto do artista na Europa, situação de clivagem entre o artista e o
artesão. O artista era um oficial intelectual livre, contudo, para além das restrições a que
estavam sujeitos, o pintor era obrigado a uma atividade polivalente, ou seja, fruto das
exigências do mercado e das diretrizes dos encomendantes: pintor de dourado e
estofado, pintor de têmpera e fresco e pintor de imaginária de óleo, três modalidades
distintas, todavia não haveria nenhuma diferenciação entre elas3 (capítulo 1.3). No
entanto, esta situação alterou-se com o surgimento do Maneirismo, em Portugal,
manifestação estética que resultou de um gosto dominante de soluções anti-
renascentistas e da terrabilità que invadiram as composições pictóricas, subordinadas a
uma outra iconografia e a um novo gosto.
12
expressivas – manuelino-joanino e o gosto italianizante (capítulo 1.3.3) “A
originalidade do Manuelino decorre por um lado de aspectos intrínsecos, dada a sua
linguagem formal, espacial e estilística inovadora e inconfundível, mas resulta
igualmente do facto histórico, mais “acidental”, da sua extrema difusão
intercontinental e transoceânica, seguindo os caminhos da Expansão Marítima
portuguesa. (…) entendemos o Manuelino sobretudo como um estilo e uma prática de
carácter experimentalista, procurando alegremente inovar, quer as formas e espaços
arquitectónicos quer as soluções decorativas.”6, seguindo depois para os locais de
aprendizagem e a importância do mestre.
1) Ao romano;
2) Ut pintura architectura;
3) Micro-arquiteturas;
6
ALMEIDA, Isabel Cruz; NETO, Maria João. Sphera Mundi: arte e cultura no tempo dos
descobrimentos. Congresso Internacional Sphera Mundi - Arte e Cultura no Tempo dos Descobrimentos,
Caleidoscópio, Lisboa, 2015, pp. 371-372.
13
temática – Vasco Fernandes, Gregório Lopes, Cristóvão de Figueiredo, Garcia
Fernandes e André de Padilha.
No que respeita aos casos de estudo, procurámos entender qual seria o grupo de
obras a analisar e, feita essa pesquisa, verificou-se a recolha de treze imagens, porém
estreitámos o grupo de estudo para seis, Chegada das Relíquias de Santa Auta (c. 1522),
de Gregório Lopes, Menino Jesus entre os Doutores (1520-1530), de Cristóvão de
Figueiredo, Os Santos Mártires de Lisboa (1530), de Garcia Fernandes, Nossa Senhora
da Misericórdia (1535-1536), de André de Padilha, Cristo em casa de Marta e Maria
(1535-1540), de Vasco Fernandes, e Martírio de São Sebastião (1536-1538), de
Gregório Lopes.
Isto significa que estes pintores beneficiaram de uma pintura de ar livre que
despontou com a autonomia e modernidade ofertada pelo Maneirismo. Segundo Isabel
Policarpo, até que ponto podemos atentar que as arquiteturas pintadas nos fundos das
pinturas foram de alguma forma anunciadoras das construções reais, ou seja, como é
possível transitar a ideia de pintura para arquitetura, e sobretudo para o facto de as
arquiteturas imaginárias pela pintura se adiantarem à arquitetura realizada pelos
arquitetos. Nesta dualidade entre pintor/arquitetura reflete-se a atualidade equiparada a
14
uma modernidade inventiva que se traduziu numa arquitetura experimental decisiva no
desenrolar da arquitetura do Renascimento e Maneirismo português e europeu7.
7
"(...) até que ponto estas arquitecturas pintadas dos fundos das pinturas num momento muito concreto e
específico da estética do Renascimento e proto Maneirismo, foram de alguma forma precursoras das
construções reais. Ou seja, como foi possível transitar da ideia de "assim como a pintura a arquitectura"
para o facto de as arquitecturas fingidas pela pintura se adiantaram à arquitectura dos arquitectos (…)
Nesta "paragona" pintor/arquitecto, espelha-se certamente a actualidade, versus uma rebeldia virtual
que inova, traduzindo assim até que ponto esta arquitectura experimental foi realmente importante e
crucial no desenrolar da arquitectura do Renascimento e do Maneirismo": POLICARPO, Isabel.
Gregório Lopes e a “ut pictura architectura”: os fundos arquitectónicos na pintura do Renascimento
português, Coimbra, 1996, pp. 156-159.
8
“De tal modo a sua personalidade se constituiu à sombra tutelar da magna Roma, que dele se diria que
«fala, vive e obra como italiano «Cristóvão de Sousa).”: PEREIRA, Paulo. Arte Portuguesa. História
Essencial. Círculo dos Leitores e Temas e Debates, Lisboa, 2017, pp. 275-276.
15
face às correntes tradicionalistas que perduram e, com a difusão de uma nova linguagem
pictórica anticlassicista, à maniera de Itália.
A categoria “ut pintura architectura”, visível nas obras Menino Jesus entre os
Doutores (fig. 31), Chegada das Relíquias de Santa Auta (fig. 34), Nossa Senhora da
Misericórdia (fig. 65), Cristo em casa de Marta e Maria (fig. 72) e Martírio de São
Sebastião (fig. 92) indicam uma manifestação entre modernidade e antiguidade numa
tentativa de adaptação ao “modo de Itália”. A abertura produzida pelo desenho, pintura,
arquitetura e escultura, denota importância para o tema global segundo novos conceitos
perspéticos traduzidos nas obras pictóricas portuguesas. A pintura do Renascimento em
Portugal, durante o período manuelino-joanino “As sucessivas componentes estilísticas,
espaciais e formais provindas da arte europeia (…) iriam florescer em Portugal (…)
num novo tipo de arte e arquitectura – correspondendo ao “grande salto” de
desenvolvimento económico e social do País nesta época. Esse florescimento traduzir-
se-ia num conjunto de produção arquitectónica de grande originalidade, que a
historiografia de Oitocentos designou por Manuelino, do nome do rei que cronológica e
principalmente lhe correspondeu.”9, denota picturalmente elementos retrógrados
paralelamente a elementos de influência flamenga, o denominado Primeiro Maneirismo
de Antuérpia. A introdução de ideais italianizantes surgiu através da divulgação de
tratados, da vinda, tardia, de pintores estrangeiros para Portugal e da adoção de fórmulas
maneiristas contra os valores vigentes. A pintura portuguesa foge do convencionalismo
da iconografia habitual das composições pictóricas, onde melhor se espelha a veia
italianizante, de atividade humanística e, a rigidez estrutural das composições, a
característica do desenho e o colorido, dado pela luz das escolas flamengas,
representativos nos fundos de paisagem e de arquitetura, na pintura portuguesa do
século XVI.
16
gravuras, tratadística e da realidade quotidiana, conferindo uma unificação de espaço e
uma sintaxe de vocabulário onde a estrutura micro-arquitetónica procura uma integração
com a sua envolvência. Esta ligação, arquitetura e pintura, advém da nova mentalidade
humanística de ideal artístico renascentista e de fontes teóricas, o que permitiu
enquadrar as cenas em profundidade e relacioná-las com as figuras, estabelecendo
diferentes relações espaciais.
17
diversas formas de representação destas arquiteturas produzidas picturalmente. Em
suma, as obras escolhidas são representativas destas categorias, na singularidade da
reprodução de arquitetura pela capacidade de representar a perspetiva e pelo tratamento
da composição das paisagens e dos fundos arquitetónicos, figurativos, ou de inspiração
construtiva "Todas estas obras (…) estão já deliberadamente integradas num gosto
renascentista, áulico e refinado, de ressaibos cortesãos, onde as orientações iniciais se
diluem em favor de uma nova organização dos espaços e de um desenho mais ousado,
nas suas formas sinuosas, nos seus rostos oblongos e nos fundos agitados de paisagem
e ricas arquitecturas virtuais, com elaboradas rovine clássicas e casario de nervosa
pincelada, povoadas de figurinhas em movimento (…)."10
10
SERRÃO, Vítor. História da Arte em Portugal: O Renascimento e o Maneirismo. Editorial Presença,
Lisboa, 2002, p. 87.
18
ESTADO DA QUESTÃO
11
POLICARPO, Isabel. Gregório Lopes e a “ut pictura architectura”: os fundos arquitectónicos na
pintura do Renascimento português, Coimbra, 1996.
12
SERRÃO, Vítor. História da Arte em Portugal: O Renascimento e o Maneirismo, Lisboa, 2002.
13
KAVALER, Ethan Matt. Renaissance Gothic: Architecture and the Arts in Northern Europe, 1470-
1540. Yale University Press, New Haven, 2012.
14
PIMENTEL, António Filipe. A arquitectura imaginária. Pintura, escultura, artes decorativas, Lisboa,
MNAA-INCM, 2012.
15
“segundos planos aí patentes, são inerentes fundos arquitectónicos particularmente representativos da
versatilidade e ecletismo que caracteriza a pintura dos reinados de D. Manuel I e de D. João III,
nomeadamente da chamada “escola de Lisboa”: POLICARPO, Isabel. Gregório Lopes e a “ut pictura
architectura”: os fundos arquitectónicos na pintura do Renascimento português, Coimbra, 1996, p. 3.
19
inventadas ou imaginadas e reais perante um estudo conjunto da tratadística da
arquitetura Renascentista e da compreensão de um nova linguagem arquitetónica e
pictural. A figura de Gregório Lopes permitiu-nos entender e definir, no tempo e no
espaço, o desenvolvimento da arquitetura do Renascimento em Portugal, patente nas
obras arquitetónicas, sob um levantamento exaustivo do elenco documental e
iconográfico das representações arquitetónicas fingidas e reais, não descurando a
aplicabilidade dos modelos clássicos que se encontram descritos na tratadística, assim
como recorrerem a desenhos, estampas e gravuras, como modelos de inspiração, que
influenciaram a representação da arquitetura nos fundos da pintura do início do século
XVI.
16
POLICARPO, Isabel. Gregório Lopes e a “ut pictura architectura”: os fundos arquitectónicos na
pintura do Renascimento português, Coimbra, 1996, p. 8.
17
“A Antiguidade clássica e todos os valores que são inerentes ao regresso às fontes greco-latinas da
cultura Europeia, impondo um culto pelo all’antico e o triunfo da liberalità, num movimento que teve
início em Itália, vão servir de modelo e influir a todos os níveis (artísticos, cultural, filósofos, literário),
permitindo que uma transformação das mentalidades anteceda todas as outras formas de “estar” e de
“fazer” do Renascimento.”: Idem, ibidem.
18
“(…) arquitecto, pintor, humanista (…) iniciando em definitivo a generalização da escrita de tratados
no Renascimento e inaugurando uma panóplia de questões que se irão tornar basilares da teoria e da
20
tratados são indissociáveis do desenho, tal como acontece com Palladio, Sérlio, Vicenzo
Scamozzi, entre outros.
crítica da arte ao longo de toda a Idade Moderna. (…) escreveu os tratados De Pintura (1436), De re
aedificatoria (1452) (…)”: ALMEIDA, Isabel Cruz; NETO, Maria João. Sphera Mundi: arte e cultura no
tempo dos descobrimentos, Lisboa, 2015, p. 171.
19
RAMALHO, Américo da Costa. Estudos sobre o século XVI. IN/CM, Temas Portugueses, 2ª edição,
Lisboa, 1983; RAMALHO, Américo da Costa. Os Humanistas e a Divulgação dos Descobrimentos. In
Actas do Congresso O Humanismo e os Descobrimentos Portugueses, Coimbra, 1991.
20
“(…) internacionalização da corte de D. João III e da sua abertura ao humanismo, trazendo consigo a
valorização da memória da Antiguidade, numa indiscutível vontade de orientar para novos caminhos o
pensamento português”: POLICARPO, Isabel. Gregório Lopes e a “ut pictura architectura”: os fundos
arquitectónicos na pintura do Renascimento português, Coimbra, 1996, p. 3.
21
ideais italianizantes foram introduzidos mais tarde e, apresentados segundo a divulgação
de tratados e da presença de artistas estrangeiros no nosso país, segundo as diretrizes
das fórmulas maneiristas, resultado da rebelião contra as normas correntes. No caso
português, a nível pictórico vai prevalecer o sentimentalismo tradicional das escolas
flamengas, sem esquecer os traços nacionais. A pintura portuguesa desta época é
marcada por mestres que se diferenciam no desenho, na luz, nos fundos de paisagem e
de arquitetura, fatores que permitem uma singularidade pictural que até então era
espelhada por um convencionalismo de uma iconografia constante a nível compositivo.
A atividade humanista vivenciada, a nível nacional, vai ser guiada por uma veia
italianizante paralelamente à relação ao flamenguismo, de formas rígidas, contudo de
grande versatilidade, entendimento esse, realçado pelo pitoresco das arquiteturas
regionais traduzido nas paisagens e nos fundos arquitetónicos. O monarca D. João III
vai assinalar um momento de rutura, pelo valor da nova corrente estética ao romano,
pela difusão de tratados, Cesare Cesariano ou Diego de Sagredo, com a obra original do
tratado Medidas del Romano (1526), pela mão de Chanterene (as suas obras apontam
nesse sentido), que pela sua relevância vai ser editado em 1542, em Portugal, e de
gravuras italianizantes, pela vinda de artistas estrangeiros e pelos estágios em Roma de
artistas portugueses, que lá encontram o Maneirismo como corrente artística vigente, e é
precisamente isso que trazem para Portugal, todavia sem o sentido profundo de rebeldia
que caracteriza o movimento em Itália.
21
Idem, p. 35.
22
da teatralidade, os valores da nova maniera italiana e regula a noção de individualidade
do pintor, uma renovação de valores e de mentalidades, onde artistas passam a assinar
as suas obras e a debater pontos de vista com os clientes, os termos e os pagamentos dos
contratos, ou seja, um subjacente reconhecimento social e cultural de um estatuto
vinculado à liberalidade.
23
da pintura adiantava-se face à arquitetura dos arquitetos, o que possibilitou a um maior
descerramento para as investigações vindouras e para as visões imaginárias 22. As
arquiteturas pintadas, edifícios e cidades, representadas nos fundos da pintura,
explicitam a real importância do papel das mesmas dentro da pintura e do testemunho
aplicado face a uma cultura arquitetónica ligada a uma nova conceção espacial e de
tridimensionalidade, quer em espaços interiores como exteriores.
22
DOMINGUEZ, Juan António Ramírez. Cinco Lecciones sobre Arquitectura y Utopia. Departamento de
Historia del Arte de la Universidad de Málaga, Málaga, 1971, p. 177.
23
“… assim como ao pintor convém ter notícia da arquitectura para saber fazer o ornamento com base
em medidas e proporções, também ao arquitecto interessa saber a perspetiva porque com esse exercício
melhor imagina todo o edifício já com a ornamentação… tudo deriva das cinco ordens que usavam na
Antiguidade”: GAMBUTI, Alessandro. L’architettura dei Pittori nel Quattrocento italiano. Alinca
Editrice, Firenze, 1994, p. 5.
24
DOMINGUEZ, Juan António Ramírez. Cinco Lecciones sobre Arquitectura y Utopia, Málaga, 1971,
pp. 175-178.
24
pintadas às arquiteturas reais, traduzindo a adoção de ideias e, não de práticas, oriundas
da influência dos tratados.
25
POLICARPO, Isabel. Gregório Lopes e a “ut pictura architectura”: os fundos arquitectónicos na
pintura do Renascimento português, Coimbra, 1996, p. 91.
26
Idem, ibidem.
25
descurando o facto dos pintores já as terem visualizado e estudado a gramática
construtiva e ornamental a partir de desenhos, gravuras e tratados “vai funcionar não só
em termos das imagens em si, como dos novos critérios construtivos aí contidos (…)
estes vão ser transmitidos também pelas arquitecturas pintadas, com um carácter que
se pode considerar experimental, porque ligado ao intuito de uma renovação
construtiva, atingido a própria arquitectura realmente construída.”27. As
representações ideais advêm das ditas arquiteturas imaginárias e utópicas, de cidade
ideal, que poderão evoluir no sentido de uma arquitetura concreta de idealização, uma
ligação simbólica entre referência espacial e temporal, a par de um caráter iconográfico
de ligação à ideia transmitida pela pintura, que objetifica uma experimentação
construtiva. Já as representações decorativas que derivam da cópia de gravuras italo-
flamengas, que circulavam, foi primordial para a assimilação dos artistas flamengos da
arte romana do Renascimento28, sobretudo pelos elementos mais influentes, como
colunas, balaústres e capitéis.
Em suma, Isabel Policarpo, assume que deve realiza-se uma menção para as
relevantes arquiteturas que delimitam a cena principal, o que nos permite estabelecer
uma agradável ligação entre as figuras de primeiro plano e os planos fundeiros,
compostos por arquitetura30. A mesma afirma que a arquitetura pode ter influenciado a
27
Idem, p. 133.
28
Idem, ibidem.
29
“nem sempre as arquitecturas pintadas refletem necessariamente a arquitectura contemporânea ou
local, podendo simplesmente ser puramente imaginárias, ou pelo menos, distintas das construções
verdadeiras (…) Estes fundos de arquitetura, longe de obrigatoriedade terem qualquer valor como
documento histórico, podem ser mesmo absolutamente inúteis para fornecer informações fiéis sobre o
estilo e a arte da época em que foram pintadas”: Idem, p. 110.
30
Idem, p. 131.
26
real “e, por outro, é possível verificar que se trata de uma arquitectura
experimental/virtual, de inovação, ligada ao intuito de uma renovação construtiva,
tanto pela susceptibilidade de ser construída, como pela reprodução de um real.”31
27
e a Expansão, numa modernidade imposta pela renovação de conhecimentos, suscetível
de ser representada no domínio compositivo da pintura portuguesa. Tal como refere
Delfim Sardo, podemos considerar a arquitetura como uma prática artística presente na
pintura, um imaginário espacial ou, um espaço que existe para ser vivido. Neste sentido,
o termo imaginário induz-nos à produção de situações que unificam a produção de
espaço, efeito da imersão do espetador a organizações arquitetónicas.
33
Idem, pp. 32-62.
34
Idem, p. 50.
35
Idem, pp. 92-127.
28
narrativa ou acessória. O campo da pintura, a rota é percorrida por uma arquitetura
«pintada» ou «gravada», tendo sempre por base a formulação das representações
arquitetónicas que produzem, maioritariamente, um efeito linguístico, o da metáfora, ou
seja, imagens que simulam, equivalem ou induzem a uma “metarrealidade” de
estruturas arquitetónicas. A iconografia do lugar provoca, através da arquitetura, um
poder evocador de lugares imaginários. Paulo Pereira menciona que o tema «fundos na
arquitetura» merece uma abordagem isolada das demais, dado que se trata de uma
tradução plástica de elementos com valor cenográfico, mais acertadamente no campo
arquitetónico, porém são as construções, as protagonistas da ação, a parte integrante da
narrativa compositiva, embora, a maioria dos fundos sejam cópias ou adaptações das
fontes de inspiração que circulavam no nosso país, nomeadamente gravuras. As obras,
das principais oficinas, da primeira metade do século XVI, denunciam um classicismo
«contra o tempo», pelas plantas dos edifícios figurados e, nos elementos arquitetónicos
que tendem para o antigo, paralelamente a um gosto e, a uma evolução estilística, tendo
como exemplo a obra Aparição de Cristo à Virgem atribuída a Jorge Afonso que marca
o particular interesse formal pelo Renascimento por parte deste pintor e dos demais
pintores do século XVI, sendo que a este interesse desenvolvesse o interesse simbólico
que só a arte da pintura pode manifestar36.
Lurdes Craveiro37 alude-nos a uma ideia de «saber fazer», reforçada pela cultura
humanista do Renascimento aliada a uma teoria do conhecimento das ordens clássicas,
traduzida nos tratados e gravuras disponíveis para a época:
36
Idem, p. 99.
37
Idem, pp. 128-147.
29
formativo por excelência no enfrentar do repto face à organização e gestão das
ordens.”38.
O caso português, no século XVI, denota uma perceção das ordens, sobretudo
com a divulgação de Vitrúvio (tradução de Cesare Cesariano, 1521) e dos textos de
Diego de Sagredo (Toledo, 1526; e Lisboa, 1541 e 1542), nomeadamente por via das
Medidas del Romano que gerou o espaço orgânico que a cultura humanista modelou
com maior evidência em Tomar ou Coimbra40.
38
Idem, p. 135.
39
“No reinado de D. João III acentua-se o melhor da cultura e a estética italiana. A circulação das
teorias renascentistas não só se fazia através das traduções de obras importantes, mas com contratação
de arquitetos italianos ou da deslocação de artistas portugueses para Itália como foi o caso de Francisco
de Holanda ou de Duarte Coelho e João Castilho (…)”: ALMEIDA, Isabel Cruz; NETO, Maria João.
Sphera Mundi: arte e cultura no tempo dos descobrimentos, Lisboa, 2015, pp. 11-12.
40
“Disso dá conta a divulgação de Vitrúvio (sobretudo na tradução de Cesare Cesariano, 1521) e dos
textos de Sagredo (Toledo, 1526; e Lisboa, 1541 e 1542), na exposição desse grau de fantasia e
inventividade com que se interpretam as lições de Vitrúvio sem, no entanto, comprometer as grandes
linhas de força que presidem ao corpo teórico avançado desde o século XV. Por via das Medidas del
romano, de Sagredo, construiu-se também, afinal, o espaço orgânico que a cultura humanista plasmou
com maior visibilidade em Tomar ou em Coimbra.”: PIMENTEL, António Filipe. A arquitectura
imaginária. Pintura, escultura, artes decorativas, Lisboa, MNAA-INCM, 2012, p. 133.
41
SERRÃO, Vítor. História da Arte em Portugal: O Renascimento e o Maneirismo (1500-1620), Lisboa,
2002.
30
nossa produção artística, surge impulsionada pelo predomínio de materiais e tecnologias
inferiores, todavia esta denominação é inadequada face às matérias-primas empregues,
calcário, madeira de castanho e de carvalho, granito, entre outros. A idade de ouro
manuelina, ano de 1500, beneficiou com a economia, as condições de exportação, o
tempo da tradição artística goticizante, o papel das feitorias portuguesas do Norte e as
novidades estilísticas do classicismo all’antico difundidas pelo Humanismo cristão de
raiz italiana. A partir de 1557, assumimos uma nova cultura italianizante de doutrinação
neoplatónica e, de sentido maneirista aliado, posteriormente à conjuntura da Contra-
Reforma e, aos efeitos da instalação do Santo Ofício e da Companhia de Jesus.
42
A partir do século XX, o termo «primitivos» serviu para designar os mestres anteriores ao
Renascimento, todavia também para os pintores que constituíram uma cultura a nível nacional.
CANDEIAS, António; DIAS, Cristina; RODRIGUES, Dalila; CAETANO, Joaquim Oliveira; BRITO,
Joaquim Pais de; CARVALHO, José Alberto Seabra; MIRÃO, José; PIORRO, Luís; AFONSO, Luís
Afonso; REIS, Pedro Cabrita; VALADAS, Sara. Primitivos Portugueses 1450 – 1550 - O século de Nuno
Gonçalves. Museu Nacional de Arte Antiga, Athena, Lisboa, 2010, p. 16.
31
congéneres italianas”43. As obras que saíram das oficinas do país traçam uma linha
dominante de inspiração nos modelos flamengos. As nossas oficinas exploraram a via
pessoal, de cada artista, enquanto «escola», numa via de propaganda pela imagem. A
linguagem plástica portuguesa, tradicional, que procura incessantemente inspiração
noutras zonas artísticas da Europa:
O pintor André de Padilha, ativo de 1517 a 1561, assume, nas suas obras, um
interesse pelos fundos de pintura de paisagem e de liberdades de paisagismo, com
influências hispano-flamengas (fig. 65). Já Vasco Fernandes (1501-1543) atende sob
43
CANDEIAS, António; DIAS, Cristina; RODRIGUES, Dalila; CAETANO, Joaquim Oliveira; BRITO,
Joaquim Pais de; CARVALHO, José Alberto Seabra; MIRÃO, José; PIORRO, Luís; AFONSO, Luís
Afonso; REIS, Pedro Cabrita; VALADAS, Sara. Primitivos Portugueses 1450 – 1550 - O século de Nuno
Gonçalves, Lisboa, 2010, p. 78.
44
TAQUENHO, Maria. Pintura flamenga em Portugal. Os retábulos de Metsys, Morrison e Ancede;
estudo técnico e material. Dissertação de Doutoramento em História da Arte apresentada à Universidade
de Évora, Évora, 2013, p. 57.
45
CANDEIAS, António; DIAS, Cristina; RODRIGUES, Dalila; CAETANO, Joaquim Oliveira; BRITO,
Joaquim Pais de; CARVALHO, José Alberto Seabra; MIRÃO, José; PIORRO, Luís; AFONSO, Luís
Afonso; REIS, Pedro Cabrita; VALADAS, Sara. Primitivos Portugueses 1450 – 1550 - O século de Nuno
Gonçalves, Lisboa, 2010, p. 80.
32
uma vertente de dominância flamenga em proveito de um referencial baseado no
contexto arquitetónico clássico-italiano, sem abandonar as paisagens fragosas, rasgadas
de grutas e povoadas de misteriosos castelos e sem deixar de revelar a pureza das
atmosferas, as gradações tonais nas representações fundeiras e o naturalismo dos valores
plásticos na sua obra pictórica (figs. 71, 106, 107, 161 e 176). A figura de Gregório
Lopes (figs. 19, 34, 91, 102, 143, 170, 182, 183, 206, 212, 213, 221, 224, 232 e 246),
que emergiu da oficina de Jorge Afonso, é a mais desejada face uma representação
evoluída do Renascimento português, artista que afirmou nas suas obras os cânones
flamengistas, conhecimento adquirido na oficina de Jorge Afonso, sem deixar de
descurar os fundos agitados de paisagem e ricas arquiteturas virtuais. O painel do
Calvário (fig. 224) reporta uma Cidade de Deus, que aduz a “ruínas clássicas, entre um
portal ciclópico, diversas torres, sinuosidades de ruas, arcos, praças e muros
acastelados, e o corpo centralizado da Civitas Dei como simbolização neoplatónica da
ilha da Utopia.”46, já o Martírio de São Sebastião (fig. 92) abre portas a um
Maneirismo com evocação ao all’antico da Roma Antiga.
46
Idem, p. 126.
47
Idem, p. 77.
33
O Renascimento, em Portugal, revelou-se um período transitório e fugaz. O
Maneirismo48 substituiu o Renascimento, como movimento oficial na segunda metade
do século XVI, sob o decurso progressivo de renovação e modernidade latente na
consciência dos artistas portugueses de Quinhentos.
48
“O Maneirismo vinha substituir os valores estabelecidos de ordem, harmonia, equilíbrio,
normatividade e rigor classicistas, por um vocabulário artístico feito de irrealismos, tensões deliberadas,
ambiguidades, bizarria, desconstrução das ordens, terribilità, teatralidade, nostalgias, caprichos. Mais:
o Maneirismo fazia-se herdeiro, fora de Itália, de uma situação de modernidade que a conjuntura tardia
de recepção dos vários «renascimentos» não tornara possível: uma frenética busca de novos temas,
efeitos tonais, complexidade dos espaços e composições e, sobretudo, uma nova e afirmada
individualidade dos artistas”: Idem, p. 168.
34
aquele fino e inquieto nervosismo do primeiro Maneirismo florentino, o de um Rosso e
de um Pontormo. Mas – aqui está o nosso problema, que verdadeiramente pomos pela
primeira vez – distingue-se num vasto grupo das nossas pinturas do final do século XVI
uma nítida influência vasariana, não só no desenho e composição (que poderia ser
explicada através da circulação de gravuras), mas na cor, no tom de certos amarelos e
certos alaranjados e violáceos”.49
49
Idem, p. 238.
35
subjacente já só foi revelada após exames minuciosos. Esta introdução fornece uma
historiografia sucinta do tardo-gótico e, de como esta se difere dos períodos
antecedentes. Kavaler, acentua o seu estudo e gosto sensorial pelo ornamento, a
indumentária pendida no corpo da estrutura, um ornamento vivo que exprime e melhor
enquadra o sentido estético por direito. A geometria surge como tema central, não como
processo de construção de edifícios, mas sim como objetos de experiências visuais “the
paradigm of very late Gothic architecture was the complex figured vault”50. O autor
define “microarchitecture stood somewhere between conventional sculpture and
architecture proper”51, como uma microarquitectura em forma de estar, entre a
escultura convencional e a arquitectura própria, ou seja, uma extrapolação das formas
matemáticas de um só espaço, onde a notabilidade do mestre entra em destaque, criando
trabalhos relevantes e de pequena escala ou, projectos que conseguiriam ser edificados
do real todavia poderiam ser estruturalmente impossíveis ou, exigir décadas até serem
totalmente construídos.
50
KAVALER, Ethan Matt. Renaissance Gothic: Architecture and the Arts in Northern Europe, 1470-
1540, New Haven, 2012, p. 133.
51
Idem, p. 167.
36
1. CONTEXTUALIZAÇÃO DA PINTURA PORTUGUESA COM A EUROPA
DO SÉCULO XVI
52
PEREIRA, Paulo. Arte Portuguesa. História Essencial, Lisboa, 2017, p. 507.
37
exploração capitalista, são aspetos fundamentais para uma melhor compreensão da
sociedade dos inícios de Quinhentos53.
53
SERRÃO, Vítor. O Maneirismo e o estatuto social dos pintores portugueses, Lisboa, 1983, p. 67.
54
RODRIGUES, Dalila. Grão Vasco. Alêtheia Editores, Lisboa, 2007, p. 40.
55
“O panorama de crescimento do Reino português e dos territórios mostra, a propósito do ambiente de
trabalho artístico então desenvolvido, uma dinâmica nunca antes atingida e um grande esforço de
modernização sob tutela centralizada (…) Essa euforia de uma idade de ouro, que se consubstancia no
38
perseverança, a obstinação e o sentido de oportunidade que se revela parte importante
da identidade portuguesa, tanto em momentos de gesta grandiosa como de amorfa e
desencantada existência, onde vai assumir uma importância determinante na introdução
do Renascimento. Desta forma, e de tal maneira, o Renascimento e os Descobrimentos
conformam um genuíno ensaio dos limites do saber do Homem do mundo e da
reformulação dos conceitos e das formas. O legado artístico dos séculos XV e XVI
garante-nos a elevação da experiência histórica de renovação conseguinte dos
Descobrimentos e do Renascimento enquanto Revolução Cultural, contribuindo para a
criação dos conceitos formados do que se identifica como Modernidade. Por esse
motivo, o vasto deslumbramento que o Renascimento formalizou sobre as distintas
transformações do Modernismo56.
Este gosto eclético imperava sob uma modernidade que ressalvava na Europa
ocidental, já as novidades estéticas que derivavam de Itália representaram a
transformação cultural e educacional que o monarca procurava levar a cabo em
Portugal, com o decorrer do conhecimento da iconografia e da funcionalidade dos
esforço de um poder absoluto e centralizado, teve imensa repercussão no discurso da arquitetura e das
artes decorativas manuelinas (…)”: ALMEIDA, Isabel Cruz; NETO, Maria João. Sphera Mundi: arte e
cultura no tempo dos descobrimentos, Lisboa, 2015, p. 186.
56
“Assim, tanto o Renascimento como os Descobrimentos configuram uma autêntica experiência dos
limites, tanto no conhecimento do Homem do mundo como na reinvenção dos conceitos e das formas. A
herança artística dos séculos XV e XVI fala-nos, pois, directamente, da exaltante a experiência histórica
de mudança decorrente tanto dos Descobrimentos como do Renascimento enquanto Revolução Cultural
sem precedentes, comparticipando como temos vindo a dizer, na génese dos conceitos estruturadores do
que se reconhece como Modernidade. Daí advém, sem dúvida, uma grande parte do fascínio que o
Renascimento exerceu e continua a exercer sobre as diferentes metamorfoses do Modernismo.”:
PEREIRA, Fernando António Baptista. O legado do Renascimento, Faculdade de Belas Artes, Lisboa,
2000, p. 28.
57
PEREIRA, Paulo. Arte Portuguesa. História Essencial. Lisboa, 2017, p. 414.
39
espaços litúrgicos “Tratava-se de verificar a existência em Portugal de um
Renascimento partícipe do grande movimento de mutação das estruturas mentais que
transformou a cultura europeia XV e XVI – um conceito periodológico que, convirá
dizê-lo, entendemos no seu sentido mais “clássico” tal como definido na própria época
(Vasari) (…); e ao mesmo tempo de o posicionar no conjunto dos restantes
Renascimentos europeus nascidos dos influxos que desde data recuada se propagaram
a partir da Itália em vagas, ritmos e cambiantes muito variados.”58.
58
MOREIRA, Rafael. A arquitectura do Renascimento no sul de Portugal. A Encomenda Régia entre o
Moderno e o Romano. Dissertação de Doutoramento em História da Arte apresentada à Faculdade de
Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, Lisboa, 1991, pp. 1-2.
59
“No capitulo da pintura (…) para se deslocaram os grandes artistas do Reino, na peugada da Côrte,
como era natural, e os mestres estrangeiros que em Portugal, (…), se tinham fixado (…) copiosa
quantidade de pintores portugueses, alguns flamengos originais, outros nascidos cá, castelhanos,
alemães e italianos, dos géneros de óleo e têmpera, tiveram suas oficinas na cidade, e causa espanto
como tantos e bons artistas mantinham o nível de compra numa Terra interior, com poucos atractivos
naturais, mas populosa e então opulenta de bom gosto, tradição religiosa, mais riqueza e principalmente
cultura artística para distribuir, com exuberância, como jamais se repetiu. Mas não é apenas a pintura
que floresce: paralelamente a uma rica produção arquitectónica (…)”: VILELA, José Stichini.
Francisco de Holanda – Vida, Pensamento e Obra. Biblioteca Breve, Instituto de Cultura e Língua
Portuguesa, Ministério da Educação e das Universidades, Lisboa, 1982, p. 11.
40
todavia, similarmente a pintura foi palco de uma declaração afirmativa de gosto e
desafeição, com a asseveração da arte da encomenda a ganhar aos italianismos no
decorrer dos primeiros quarenta anos do século XVI, sendo que foi na pintura à
flamenga e não à italiana que se pintou60.
Conseguiu-se um novo gosto artístico, uma nova concepção pictórica, uma nova
mentalidade, uma nova forma de civilização, e o mais importante, alteraram-se as
correntes espirituais que perduravam no país nesta centúria “Com efeito, sabemos que
se o primeiro período (o século XV) e exprimia ainda a psicologia da história heróica,
por assim dizer, local, do Portugal «gótico», país continental, quase fechado no
interior das suas fronteiras europeias, mas dominados já pelo sonho do seu destino
marítimo, o segundo período, período de realizações e transições, é o período da
pintura, num certo sentido, internacional.”61.
60
PEREIRA, Paulo. Arquitetura Portuguesa. História Essencial. Temas e Debates. Círculo dos Leitores,
Lisboa, 2022, p. 275.
61
JIRMOUNSKY, Myron Malkiel. Pintura à sombra dos mosteiros. A pintura religiosa portuguesa dos
sécs. XV e XVI. Edições Ática, Lisboa, 1957, p. 29.
62
MOREIRA, Rafael. A arquitectura do Renascimento no sul de Portugal. A Encomenda Régia entre o
Moderno e o Romano, Lisboa, 1991, p. 3.
41
os territórios ultramarinos. Isto permitiu o progresso de uma classe nacional de artistas,
tal como a afluência de estrangeiros que foram surgindo no país, nomeadamente
arquitetos, escultores, entalhadores, pintores, iluminadores, ourives, canteiros,
marceneiros e outros artesãos, como convidados ou atraídos pela conjuntura propícia de
trabalho. A maioria dos pintores estrangeiros que laboravam em Portugal, na primeira
metade do século, eram de origem flamenga, e muitos deles fundavam oficinas e
estabeleciam-se em regime de parcerias ou por laço de parentesco com pintores
portugueses.
Sabemos, assim, que a pintura portuguesa beneficiou com todos estes momentos
de viragem, onde chegaram obras, ideias, tratados, gravuras e, sobretudo, experiências
de testemunhos diretos, nomeadamente através da passagem de artistas portugueses por
outras cidades da Europa.
63
GORDO, Ana Rita. A Anunciação. Estudo e conservação de uma pintura do séc. XVI. Relatório de
Estágio de Mestrado em Conservação e Restauro apresentado ao Instituto Politécnico de Tomar, Escola
Superior de Tecnologia de Tomar, Tomar, 2011, p. 14. In DIAS, Pedro. Portugal e a arte flamenga na
42
As relações entre Portugal e Flandres foram fundadas desde 1159, devido ao
estabelecimento de laços dinásticos e à ida, em comitiva, de muitos portugueses
incluindo mercadores e artistas, para Bruges.
época dos descobrimentos, Tomar, 2011; PORTUGAL. Museu Nacional de Arte Antiga; AMARAL,
Maria da Conceiçãot; DIAS, Pedro. No tempo das feitorias: a arte portuguesa na época dos
descobrimentos, vol. I, p. 115.
64
Humanista italiano que chegou a Portugal, em 1548, chamado por D. João III, e que marcou a
introdução do Humanismo em Portugal. In COSTA, José Maria Martins da. [Recensão a] Cataldo
Parísio Sículo – Epístolas IUParte. Instituto de Estudos Clássicos da Faculdade de Letras, da
Universidade de Coimbra, Coimbra, 2005, p. 496.
65
Álvaro Pires de Évora é o mais antigo pintor nascido em Portugal documentado na região da Toscana,
em Itália. Aqui trabalhou entre 1410-1434, deixando uma marca no retábulo da Igreja de Santa Croce de
Fossabanda, perto de Pisa, e onde de refere oriundo de Évora. O historiador Giorgio Vasari refere-se a
este pintor como «Alvaro Piero di Portogallo». In Catálogo de Exposição: Alvaro Pirez d’Évora - Um
pintor português em Itália nas vésperas do Renascimento. Museu Nacional de Arte Antiga, Polo Museale
della Toscana, Imprensa Nacional, Lisboa, 2019.
66
Pintor português do século XV, que viveu e trabalhou na zona da Toscana, pintando à maneira dos
mestres florentinos.
67
LOPES, Rui Oliveira. A função da imagem artística: segundo a tradição medieval da igreja e a prática
da pintura portuguesa do renascimento. Arte Teoria, número 9, Lisboa, 2007, p. 37.
68
“Por conseguinte, os refinamentos que transformaram a arte europeia entre os séculos XIV e XVII não
se deveram apenas à Itália. No entanto, os homens do Renascimento sentiam que a Itália lhes trouxera
uma libertação, uma civilização superior, principalmente porque lhes devolvia os valores há muito
esquecidos do mundo antigo. Este sentimento não era apenas uma miragem.”: DELUMEAU, Jean. A
civilização do Renascimento. Edições 70, Lisboa, 2021, p. 83.
43
importação de obras de arte. Em Portugal, o grande número de obras flamengas que
aqui se encontram advém da importação conduzida pelos feitores portugueses, entre o
século XV e o ano de 1548.
69
CLODE, Luiza – A arte flamenga na ilha da Madeira, Madeira, 1997. In PEREIRA, Fernando António
Baptista Pereira – Arte Flamenga, Madeira, 1997.
70
SALGUEIRO, Joana. A pintura portuguesa quinhentista de Vasco Fernandes: estudo técnico e
conservativo do suporte. Dissertação de Doutoramento em Conservação de Pintura apresentada à
Universidade Católica Portuguesa, vol. I, Lisboa, 2012, p. 29.
71
DESTERRO, Maria Teresa. Francisco de Campos (c.1515-1580) e a Bella Maniera: entre a Flandres,
Espanha e Portugal, Lisboa, 2008, p. 97.
44
distribuição internacional com exatamente com igual gama de produtos de Bruges,
todavia a nação portuguesa transferiu-se na sua totalidade em 1510-1511 para
Antuérpia72. Falamos de uma época em que o intercâmbio de mercadorias e de
indivíduos era altíssimo, o que favoreceu ao encadeamento de um intercâmbio cultural e
artístico, sobretudo pela riqueza que aqui se proporcionou a Portugal com a importação
de pinturas encomendadas por monarcas, nobres e clero. Este fluxo artístico foi,
essencialmente, motivado pela difusão de obras de arte como por pintores de origem
flamenga. Alguns destes mestres flamengos vieram para Portugal onde aportuguesaram
o seu nome que, ainda nos dias de hoje, se desconhecem o verdadeiro local de origem,
tendo como maior exemplo os pintores de Frei Carlos e Francisco Henriques. Todavia,
importa referir também a ida de Eduardo, o Português, para a Flandres, local onde terá
trabalhado na oficina de Quentin de Metsys e colaborado com um seguidor de Hugo van
der Goes73. Esta envolvência pode estar intimamente relacionada na corrente da
importação do mestre Quentin para Portugal, e na circunstancial passagem de
conhecimentos/aprendizagens que avançaria revelar a pintura portuguesa da primeira
metade do século XVI74.
72
TAQUENHO, Maria. Pintura flamenga em Portugal. Os retábulos de Metsys, Morrison e Ancede;
estudo técnico e material, Évora, 2013, p. 11.
73
MOURA, Maria. As peças de ourivesaria presentes nas pinturas tendo por tema a Adoração dos
Magos – Tipologia de peças, circulação de modelos e evolução estilística. Dissertação de Mestrado em
História da Arte e Património apresentada à Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, Lisboa,
2021, p. 68.
74
PEREIRA, Paulo. Arte Portuguesa. História Essencial, Lisboa, 2017, p. 474.
45
“Importante, embora difícil, é saber qual o perfil do cliente, isto é: quem é que
na sociedade portuguesa possuía os instrumentos de valoração critica e a
imprescindível capacidade de desencadear estímulos criativos nas oficinas de
pintura. Tanto a nível de produção artística como ao nível das importações, o
mecenato parece desenvolver-se em torno de dois polos fundamentais: a corte,
tendo como figuras centrais o rei D. Manuel e a rainha D. Leonor (1458-1525),
viúva de D. João II e a Igreja, que tem no bispado, alguns representantes
exemplares”75.
75
TAQUENHO, Maria. Pintura flamenga em Portugal. Os retábulos de Metsys, Morrison e Ancede;
estudo técnico e material, Évora, 2013, p. 22.
76
ALMEIDA, Isabel Cruz; NETO, Maria João. Sphera Mundi: arte e cultura no tempo dos
descobrimentos, Lisboa, 2015, p. 175.
77
DESTERRO, Maria Teresa. Francisco de Campos (c.1515-1580) e a Bella Maniera: entre a Flandres,
Espanha e Portugal, Lisboa, 2008, p. 73.
46
pela sua comercialização. Tendo como exemplo a distinta Guilda de São Lucas78 (fig.
1), que atingiu o seu auge em meados do séculos XVI e que outorgou benefícios na
venda de objetos artísticos à mais afamada galeria de venda de retábulos e pinturas, que
subsistia desde 1460, a Onser Liever Vrouwen Pand.79. Nas respetivas guildas, as peças
vendidas tinham de ser certificadas através de um selo antes de serem colocadas à
venda, sendo que os objetos artísticos vendidos cingiam-se, maioritariamente, a pintura,
escultura, tapeçarias e iluminuras.
78
A mais famosa guilda de pintores e de outros artífices da Europa da Idade Moderna.
79
DESTERRO, Maria Teresa. Francisco de Campos (c.1515-1580) e a Bella Maniera: entre a Flandres,
Espanha e Portugal, Lisboa, 2008, p. 73.
80
SALGUEIRO, Joana. A pintura portuguesa quinhentista de Vasco Fernandes: estudo técnico e
conservativo do suporte, Lisboa, 2012, p. 30.
47
“um significativo volume de pinturas serviu de valor de troca nas transacções
efectuadas pela comunidade de negociantes portugueses estabelecidos na
Flandres, com destino à Ilha da Madeira. Paralelamente e à medida que os
contingentes da importação aumentava, aumentaria também o fenómeno de
adesão às novidades importadas por parte de artistas e artesãos, estimulados
(pressionados), há um tempo, pela generalização do gosto da clientela (…)
quanto pela influência dos artistas do Norte da Europa que se deslocavam para
o Sul.”81.
81
Idem, ibidem.
82
“No Diário de Albrecht Dürer, nas folhas dos anos de 1520 e 1521, encontram-se muitas indicações de
dádivas aos nossos compatriotas, nomeadamente Francisco Pessoa, Rodrigo de Portugal e João
Brandão, de nada mais nada menos que duzentas e vinte e uma obras: vinte e quatro gravuras em cobre,
cento e oitenta e seis de madeira, seis retratos, cinco pinturas a óleo e uma escultura”: Idem, p. 29.
83
SALGUEIRO, Joana. A pintura portuguesa quinhentista de Vasco Fernandes: estudo técnico e
conservativo do suporte, Lisboa, 2012, p. 28.
48
Jan Van Eyck, em Portugal, em 1428, não provocou qualquer impacto na arte nacional,
todavia importa mencionar que só no período manuelino-joanino é que vemos a criação
de uma escola de pintura flamengo-portuguesa, que caminha na direção dos mestres
oriundos de Bruges e de Antuérpia do século XVI84.
Este género de presentes, pintura e não só, alfaias religiosas, livros, tapeçarias,
vieram a ser um dos importantes veículos de criação de um gosto pela arte flamenga,
arte essa divulgada nos novos mundos pelos portugueses.. A expansão marítima
proporcionou transportar alfaias de culto, mobiliário, pintura, escultura, retábulos,
frontais de altar e tapeçarias para África, ilhas Atlânticas, Brasil e várias zonas da Ásia,
sendo que estes produtos artísticos mais apreciados viriam a integrar o acervo das novas
igrejas erigidas além-mar.
84
CARVALHO, José Alberto Seabra. A Exposição. Cem Anos de Primitivos Portugueses. In
CANDEIAS, António; DIAS, Cristina; RODRIGUES, Dalila; CAETANO, Joaquim Oliveira; BRITO,
Joaquim Pais de; CARVALHO, José Alberto Seabra; MIRÃO, José; PIORRO, Luís; AFONSO, Luís
Afonso; REIS, Pedro Cabrita; VALADAS, Sara. Primitivos Portugueses 1450 – 1550 - O século de Nuno
Gonçalves, Lisboa, 2010, p. 16.
85
“(…) definiu-se a si mesmo como um movimento virado para o passado – sentido aparentemente
oposto ao do nosso mundo moderno virado para o progresso. (…) queria regressar às origens do
pensamento e da beleza.”: DELUMEAU, Jean. A civilização do Renascimento, Lisboa, 2021, p. 73.
86
JIRMOUNSKY, Myron Malkiel. Pintura à sombra dos mosteiros. A pintura religiosa portuguesa dos
sécs. XV e XVI, Lisboa, 1957, p. 111.
49
sobretudo a partir dos novos movimentos vigentes, volvendo assim a técnica das artes
mais artificial e ornamental87.
87
“(…) distinguiam-se já por uma nova concepção do mundo e do indivíduo. O «mundo exterior»
adquire realidade para eles (…), com as suas formas individuais, com homem real ao centro, natureza e
a sua vida terrestre. Esta mudança de psicologia do artista do Renascimento, mudou também a sua
maneira de trabalhar, a sua técnica, surgida dos estilos novos e variados. (…) A técnica das artes
ressente-se, vivamente, dessa evolução psicológica. Acima de tudo, torna-se mais artificial e também
mais ornamental.”: Idem, ibidem.
88
PEREIRA, Fernando António Baptista. O legado do Renascimento, Lisboa, 2000, pp. 27-28.
50
1.2 O estatuto social dos artistas na Europa versus a realidade portuguesa
89
GONÇALVES, Carla Alexandra. A oficina de João de Ruão: os escultores, a relação oficinal e a
gestão do trabalho. Imprensa da Universidade de Coimbra, Coimbra, 2020, p. 111.
90
Idem, ibidem.
51
O estatuto do artista alterou-se, nos finais do século XV, nomeadamente com o
aumento das remunerações. Contudo é importante expor que depende, a nível europeu,
do centro artístico a que nos estamos a referir, tendo como exemplo, o caso de Itália,
que beneficiou significativamente com o número de encomendas, por parte da Cúria
papal, importante cliente do mercado de arte. Todavia, é de ressalvar, que a Itália do
Quatrocentro redefiniu o sentido de estatuto do artista plástico.
“(…) todo o movimento das guildas (corporações) deve a sua origem à luta
para evitar tal desproporção no interesse dos produtores; as autoridades da
guilda só fechavam os olhos às infracções dos seus estatutos quando a falta de
trabalho já não parecia uma ameaça. Os artistas ficaram devendo a sua
independência, não à boa vontade dos humanistas, mas ao facto de esse perigo
91
DESTERRO, Maria. Francisco de Campos (c.1515-1580) e a Bella Maniera: entre a Flandres,
Espanha e Portugal, Lisboa, 2008, pp. 98-99.
92
Idem, p. 99.
93
SERRÃO, Vítor. O Maneirismo e o estatuto social dos pintores portugueses, Lisboa, 1983, p. 57.
52
se tornar cada vez mais insignificante. (…) a referida Independência do
produtor de arte não deve ser considerada, mesmo no caso italiano do século
XV, de forma linear. Ainda em meados da centúria, Lorenzo Valla não inclui os
artistas na sua lista de profissões liberais, e, bastante mais tarde, ainda os
escultores e os pintores aparecem classificados como «oficiais mecânicos»”94.
O artista definia-se como alguém “destro em alguma arte”, seja ela liberal ou
mecânica, sendo de sublinhar que o conceito de artista é totalmente diferente do que
vigora nos dias de hoje. Francisco de Holanda defendeu que o essencial do artista não é
a obra em si, mas sim a conceção mental do mesmo. Os artistas eram incentivados a ir
para as cortes em virtude de maior liberdade criativa que aí lhes era proporcionada, ao
passo que nas cidades, os clientes eram meticulosos em não infringir as tradições já pré-
estabelecidas, procurando-se uma conformidade apropriada, ou seja, nas cortes
procurava-se privilegiar a novidade e a originalidade diferenciadora em contraposição à
convencional.
94
SERRÃO, Vítor. O Maneirismo e o estatuto social dos pintores portugueses, Lisboa, 1983, pp. 57-58.
95
Idem, p. 50.
96
Idem, ibidem.
53
organizadas e hierarquizadas, de instrução aos artistas. O reconhecimento das atividades
artísticas conduziu à nobilitação dos próprios artistas. As primeiras formas de nomeação
foram familiaris e “valet de chambre”, títulos que traziam prestígio aos artistas e
deixava-os mais próximos dos seus protetores, ou seja, estes dois títulos resumiam-se à
condição que integrava o artista à família doméstica, conotação estabelecida através da
relação de confiança com o rei, ou protetor97. Com o avançar dos anos, torna-se
frequente a concessão de títulos nobiliárquicos aos artistas.
97
DESTERRO, Maria. Francisco de Campos (c.1515-1580) e a Bella Maniera: entre a Flandres,
Espanha e Portugal, Lisboa, 2008, pp. 100-101.
98
ALMEIDA, Isabel Cruz; NETO, Maria João. Sphera Mundi: arte e cultura no tempo dos
descobrimentos, Lisboa, 2015, p. 186.
99
SERRÃO, Vítor. O Maneirismo e o estatuto social dos pintores portugueses, Lisboa, 1983, p. 58.
100
Idem, p. 11.
54
“artistas”, mas sim “artesões” devido à sua arte ser considerada desprestigiada dada a
sua ligação ao trabalho manual de utilidade prática e não estética.
A Casa dos Vinte e Quatro foi criada por D. João I, em 1383, com o intuito de
acolher as corporações mesterais das doze Bandeiras de ofícios, dois de casa mester, nos
meios urbanos, que se organizavam por ofícios. O termo «Bandeira dos Ofícios» foi
reconhecido por todos como um agrupamento de profissões livres que protegem os seus
interesses, todavia denunciam autoridades próprias dos ofícios embandeirados,
nomeadamente juízes, escrivão e mordomos, e autoridades de cada ofício revelado,
sobretudo examinadores-vedores encarregados da examinação dos mesterais e das suas
obras. Esta é a entidade que efetivamente está na significação especial da Casa dos
101
Idem, p. 61.
102
BATORÉO, Manuel. “Primitivos Portugueses” e a Gravura do Norte da Europa – A Utilização
Instrumental de Fontes Gráficas. Caleidoscópio, Lisboa, 2011, p. 31.
103
LANGHANS, Franz-Paul de Almeida. A casa dos vinte e quatro de Lisboa: subsídios para a sua
história, Impresa Nacional de Lisboa, Lisboa.
55
Vinte e Quatro, colaborando anualmente com dois homens, com idade superior a
quarenta anos, por bandeira, para formação daquela Casa, que no que lhe concerne
nomeava o juiz do povo, medianeiro máximo dos ofícios junto do poder central e do
rei.104 (fig. 2 e 3). Esta organização permitiu conferir à classe dos artistas, que incluía
pintores, escultores, ourives de ouro ou prata, iluminadores, mestres de pedraria, entre
outros, uma consequente malha de subordinações, incumbências e contribuições devidas
face ao regimento das respetivas Bandeiras gremiais, sem hipóteses de emancipação
social, cooperando periodicamente com pesadas contribuições para as festividades e
procissões das suas cidades105.
104
SERRÃO, Vítor. O Maneirismo e o estatuto social dos pintores portugueses, Lisboa, 1983, p. 51.
105
Idem, p. 84.
106
SERRÃO, Vítor. História da Arte em Portugal: O Renascimento e o Maneirismo, Lisboa, 2002, p. 85.
107
SERRÃO, Vítor. O Maneirismo e o estatuto social dos pintores portugueses, Lisboa, 1983, p. 70.
56
regulamentação de 1539, a classe de pintores movimentou-se no sentido da desanexação
dos encargos da Bandeira de S. Jorge “A questão da proeminência entre os diversos
ramos das Artes Liberais, que movimentou a classe dos pintores de óleo por um novo
estatuto de classe, que desse reconhecimento a «nobreza» e «liberalidade» da sua
profissão, prende-se - como vimos - com dois aspectos essenciais, ambos inerentes à
realidade do século XVI europeu: - a renovação de valores e situação sócio-económica
dos produtores de arte, inseridos na estrutura medieva das corporações dos «ofícios
mecânicos».”108. Ambos os pontos de vista, possibilitam evidenciar a luta dos pintores
de óleo em oposição aos pintores-artesãos da Bandeira de S. Jorge, às autoridades
administrativas e aos avultados impostos e encargos a que estavam sujeitos, face a uma
renovação de valores, gosto e ideais que se evidenciava na própria crise da época109.
108
Idem, p. 76.
109
Idem, ibidem.
110
“os nossos pintores (…) serão, sobretudo, fornecedores da corte (mesmo quando se trata de pintores
do rei ou tenham recebido vários privilégios e distinções) e não criados da corte ou operários submetidos
a um modo de produção que, sendo em boa parte oficinal, não era colectivista (…)”: BATORÉO,
Manuel. “Primitivos Portugueses” e a Gravura do Norte da Europa – A Utilização Instrumental de
Fontes Gráficas, Lisboa, 2011, pp. 31-32.
111
Idem, p. 32.
57
pintores, Michael Baxandall enuncia a diferenciação entre o valor do material precioso e
o valor do trabalho hábil com materiais112.
Nos meios mais pequenos, de norte a sul de Portugal, reinava o caráter das
oficinas que ditavam a regionalização das empreitadas:
112
“(…) é decisiva para o nosso raciocínio ponto essa é uma distinção que não é estranha para nós. Na
verdade, é perfeitamente compreensível, embora habitualmente não seja elemento fundamental no nosso
modo de pensar os quadros. No início da Renascença, contudo, essa distinção constituía o ponto central.
A dicotomia entre a qualidade do material e a qualidade da habilidade técnica se repetia regularmente e
de forma evidente em todos os debates sobre pintura e escultura”: Idem, ibidem.
113
SERRÃO, Vítor. O Maneirismo e o estatuto social dos pintores portugueses, Lisboa, 1983, p. 56.
114
As corporações de ofício, em geral, eram constituídas por dois juízes, um escrivão, dois mordomos e
um examinador, cujas funções foram-se alterando à medida que as regulamentações se iam alterando.
Inicialmente cabia aos juízes, inspecionar as oficinas dos mestres e verificar se as prescrições eram
cumpridas. O escrivão servia para acompanhar os juízes enquanto os mordomos eram os responsáveis por
convocar os oficiais para os ajuntamentos, determinavam penas a quem faltasse, guardavam a bandeira,
58
de classe que congregavam os mesterais de determinado grupo de artífices, e que
cooperavam para a normatização singular das relações laborais dentro de cada mester,
sendo que as corporações ditavam aos mesterais a observância das normas inflexíveis de
produção, normas essas a que os denominados «regimentos» procediam de forma
regular. Deste modo, cada profissão manual ou ofício surge-nos disposta segundo
diretrizes rígidas de exercício do mester, do qual desempenho ficavam sujeitos todos
aqueles que se acolhiam no contexto da corporação, desde o mestre ao mero aprendiz115.
59
Armando Vieira Santos afirma “O conhecimento do clima espiritual serviu de
base a estas condições de trabalho é essencial para quem quiser estudar, com
imparcialidade, as razões de ser da pintura portuguesa dos séculos XV e XVI e
compreender melhor quais foram os seus objetivos e limitações. Às tendências
individualistas reveladas pelos pintores sobrepunha-se a sua natural aceitação das
tarefas colectivamente realizadas, visando o perfeito acabamento das obras
encomendadas, tanto na sua contextura formal virgula como ideológica”118.
118
Idem, p. 53.
119
“(…) cunhado do também pintor Francisco Henriques, do pedreiro Marcos Pires e do carpinteiro
Pêro Anes. Aquele pintor viria a casar uma das filhas com um dos seus discípulos, Gregório Lopes,
tornando-se também tio de outros oficiais do seu atelier, nomeadamente Cristóvão de Figueiredo e
Garcia Fernandes e, ainda, do escultor João de Ruão que casaria, por sua vez, com outra das filhas de
Pêro Anes.”: DESTERRO, Maria. Francisco de Campos (c.1515-1580) e a Bella Maniera: entre a
Flandres, Espanha e Portugal, Lisboa, 2008, p. 104.
120
Ferradores, espadeiros, pintores, bate-folhas, ferreiros, coronheiros, bainheiros, fundidores de
artilharia, guardamecileiros, lanceiros, douradores, serralheiros, cutileiros, besteiros, latoeiros,
60
de 1539, o monarca [D. João III] ordenou a revisão dos «regimentos» existentes através
de uma nova lei orgânica, regulamentando a nova seriação dos ofícios embandeirados,
os processos de eleição para o órgão dos Vinte e Quatro e dentro de cada mester
específico, e a primazia de alguns ofícios-cabeças dentro das Bandeiras - esforço
legislativo tendente a fortalecer o sistema sócio-económico, a atenuar eventuais
conflitos de classe, e a melhorar significativamente a qualidade da produção e a
economia de mercado”121 padroeiro dos que trabalhavam o ferro e fogo, atividade que
nada tinha a ver com a dos pintores, sendo que a classe dos pintores dependia de uma
das doze bandeiras mesteirais, a Bandeira de S. Jorge, na qual se mantinha ainda em
1539122.
“a sua duração podia variar entre os três e os nove anos, sendo em média de
cinco; a idade do aprendiz situava-se entre os catorze e os dezasseis anos
(havendo casos em que até já era mais velho); este tinha obrigação de servir o
mestre tanto na arte que aprendia, como noutras tarefas servis; o ensino da dita
arte incluía modalidades diversas relacionadas com a mesma, desde a
caldeireiros, etc, são os estratos mecânicos anexos à Bandeira de S. Jorge, embandeirado com cabeça dos
barbeiros e armeiros. SERRÃO, Vítor. O Maneirismo e o estatuto social dos pintores portugueses,
Lisboa, 1983, pp. 68-69.
121
SERRÃO, Vítor. O Maneirismo e o estatuto social dos pintores portugueses, Lisboa, 1983, pp. 67-68.
122
BATORÉO, Manuel. “Primitivos Portugueses” e a Gravura do Norte da Europa – A Utilização
Instrumental de Fontes Gráficas, Lisboa, 2011, p. 31.
61
preparação dos materiais, numa primeira fase, à possível colaboração com o
mestre, numa fase final, entre outras.”123.
123
DESTERRO, Maria. Francisco de Campos (c.1515-1580) e a Bella Maniera: entre a Flandres,
Espanha e Portugal, Lisboa, 2008, p. 105.
124
“(…) Jorge Afonso com D. Manuel I (…) não deixaram de percorrer caminho similar ao de todos os
pintores-artesãos corporativamente organizados: exerceram a sua actividade profissional após lenta
aprendizagem na «tenda», tendo passado por todos os graus do ofício, tiveram carta de examinação
integraram-se em «parcerias» nelas diluindo em parte o seu individualismo de criadores, e estiveram
obrigados, em dose maior ou menor, às obrigações da respectiva Bandeira.”: SERRÃO, Vítor. O
Maneirismo e o estatuto social dos pintores portugueses, Lisboa, 1983, pp. 55-56.
125
RODRIGUES, Dalila. Modos de expressão na pintura portuguesa: o processo criativo de Vasco
Fernandes (1500-1542). Dissertação de Doutoramento em História da Arte apresentada à Faculdade de
Letras da Universidade de Coimbra, vol. I, Coimbra, 2000, p. 277.
62
vizinho e com os grémios italianos. Uma significativa parte das obras da primeira
metade do século XVI revelam o produto de parcerias. Esta proposta foi formulada por
Reynaldo dos Santos face a atribuição de determinada obra a determinado pintor, como
Frei Carlos, Garcia Fernandes ou Cristóvão de Figueiredo. Esta situação era revelada
através métodos de exame e análise como meios complementares de identificação e/ou
atribuição, que permitiam identificar os pigmentos e visualizar os desenhos subjacentes,
as técnicas empregues, as sobreposições de camadas de pintura e as várias fases
decorrentes do processo criativo, nas quais os pintores dissolviam a sua individualidade
e liberdade expressa com outros artistas, num contexto artístico marcado pela rigidez
das formas.
“Na pintura portuguesa dos séculos XV e XVI, (…), o grande número de obras
executadas por mestres desconhecidos (…) se tem procurado estabelecer
identificações mais ou menos engenhosas. (…) pareceu-nos ser, por ora, mais
indicado limitar as atribuições àquelas obras de que os contratos ou as
assinaturas apostas nos quadros documentam a autoria, ou sempre que esta
apareça assentar em bases que não sofram discussão. Não nos esqueçamos
porém que nesses tempos recuados as encomendas realizadas em parceria eram
as usuais; que elas eram sempre efetuadas em apertada colaboração de mestres,
126
SERRÃO, Vítor. O Maneirismo e o estatuto social dos pintores portugueses, Lisboa, 1983, p. 53.
63
oficiais e aprendizes e que, por vezes, os contratantes não eram os executores
das obras”127.
Por outro lado, temos de ter em conta a itinerância dos pintores, ou seja, a
dispersão geográfica das suas obras, sendo que este fator predomina artistas de trabalho
reconhecido e valorizado. É precisamente o que se passa com Garcia Fernandes,
justificando-se deste modo a existência de obras de parceria em zonas do nosso país
como Ferreirim, Évora, Lisboa, Montemor-o-Velho e Vila Viçosa.
127
CARVALHO, José Alberto Seabra. “Que hacen los conservadores?” A propósito do incomodativo
problema da existência de mestres desconhecidos nas tabelas dos museus. Revista de História da Arte,
Instituto de História da Arte – Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade de Lisboa, nº 8,
Lisboa, 2008, p. 140.
128
DESTERRO, Maria. Francisco de Campos (c.1515-1580) e a Bella Maniera: entre a Flandres,
Espanha e Portugal, Lisboa, 2008, p. 106.
129
JIRMOUNSKY, Myron Malkiel. Pintura à sombra dos mosteiros. A pintura religiosa portuguesa dos
sécs. XV e XVI, Lisboa, 1957, p. 31.
64
parceria entre pintores portugueses continua a ser frequente130. No entanto, é de
ressalvar, que a criação destas associações se baseava para o facto das obras serem de
tal modo de grandes dimensões que só o trabalho em parceria poderia corresponder às
espectativas e às necessidades dos encomendantes, ou seja, privilegiando a celeridade
na resposta dos pintores ao associar a um sem número de solicitações, para as quais as
parcerias eram o único meio para levar a cabo os vários compromissos.
“Nunca antes essa inserção no mundo dos artífices e mesterais fora posta em
causa pelos pintores! Independentemente das benesses concedidas a alguns
artistas da modalidade de óleo, já sob a égide do ideário renascentista -
sabemos de casos de pintores que ocuparão cargos importantes dentro dos
quadros da nobreza -, é facto que o amplo edifício corporativo dinamizado em
sequência da revolução burguesa de 1383-1385 se mantinha sólido, fechado e
inflexível. Agora, e pela primeira vez, se desenham sintomas de um afã
reivindicativo e individualizante - que é extremamente curioso verificar quando
o sabemos nascido em pleno ciclo de intolerância contra-reformista -, o qual
põe em causa a inferior situação social do pintor de óleo.”131.
130
“À parte alguns casos esporádicos de artistas que são contemplados pela corte, ascendendo a cargos
de nobreza, sem por isso se verem dissociados do estatuto artesanal, a generalidade da classe continua
abrilhoada aos «regimentos» dos «oficiais mecânicos» como classe servil e obscura, adstrita ao mundo
dos pequenos assalariados. O pintor não deixa de ser ainda um artesão, mesmo quando aufere,
excepcionalmente, de altas tarefas (…)”: SERRÃO, Vítor. O Maneirismo e o estatuto social dos pintores
portugueses, Lisboa, 1983, p. 66.
131
Idem, p. 12.
65
liberalità. Diego de Sagredo, em 1526, publicou em Toledo, as Medidas del Romano,
que são uma sequência de ideais sobre as artes mecânicas e liberais, que diferenciam a
pintura, a escultura e a arquitetura, como artes liberais:
66
única peça artística. Nesta individualidade artística, o mestre concebia um esboço ou
modelo com base no gosto de quem encomendava.
132
“No séc. XV a pintura flamenga assumiu, a par do Renascimento italiano, características muito
próprias e que os pintores desenvolveram nos anos seguintes.”: TAQUENHO, Maria. Pintura flamenga
em Portugal. Os retábulos de Metsys, Morrison e Ancede; estudo técnico e material, Évora, 2013, p. 56.
133
Os autores Vítor Serrão e Manuel Batoréo defendem a ideia de que o Mestre da Lourinhã é o
iluminador Álvaro Pires. LOPES, Rui Oliveira. A função da imagem artística: segundo a tradição
medieval da igreja e a prática da pintura portuguesa do renascimento, Lisboa, 2007, p. 39.
134
BATORÉO, Manuel. “Primitivos Portugueses” e a Gravura do Norte da Europa – A Utilização
Instrumental de Fontes Gráficas, Lisboa, 2011, pp. 32-33.
135
““Estão neste caso Francisco Henriques, que deve ter chegado a Portugal por volta de 1500”:
CASIMIRO, Luís Alberto. Pintura e Escultura do Renascimento no Norte de Portugal. Revista da
Faculdade de Letras, Ciências e Técnicas do Património, I Série, vol. V-VI, Universidade do Porto, Porto,
2006-2007, p. 91.
136
“um frade hieronimita que poderá ter vindo da Flandres com Francisco Henriques, numa altura em
que este lá se deslocou (…) Frei Carlos que se fixou no convento hieronimita do Espinheiro nas
67
intermédio da Feitoria Portuguesa, local que erradia influência flamenga. Por efeito do
governo de D. Manuel I, confirmou-se a sucessão de intercâmbio comercial, cultural,
diplomático e artístico entre Portugal e Flandres, cuja relação originou a importação de
obras de arte e a circulação de pintores entre Portugal e os Países Baixos “(…) são os
pintores oriundos de outras latitudes que adaptam a sua pintura aos valores nacionais,
embora deixando a marca do seu país de origem, enquanto os pintores portugueses
recorrem a um vocabulário muito próprio que os distingue dos seus pares e dão ao
Renascimento português a sua aura de especificidade e de originalidade.”137.
Segundo Reynaldo dos Santos a obra do pintor Frei Carlos (figs. 111, 112 e 121)
é a que melhor revela o prosseguimento da tradição flamenga através de uma pintura
“«que se encontra embebida da ternura de Memling e de Gérard David».”138, todavia
reconhecemos também outras influências de pintores flamengos na sua obra,
nomeadamente Albert Bouts, Quentin Metsys ou Jan Provost, mantendo-se, contudo,
absorto de influências italianas. Isto leva a particularidades conferidas à sua obra,
especialmente uma incontestável imagem arcaizante, situação a que não será distanciada
o seu isolamento no mosteiro hieronimita, porém importa salientar que efetuou a sua
atividade em exclusividade para encomendas da sua ordem religiosa139.
68
causa impacto na cultura artística portuguesa. Todavia esta influência não só se operou
na obra de Francisco Henriques como se cingiu a um leque vasto de artistas da oficina
de pintura de Jorge Afonso, onde emergiram seguidores desta reforma de linguagens e
técnicas, como Gaspar Vaz, Gregório Lopes, Cristóvão de Figueiredo e Garcia
Fernandes, com as oportunidades abertas pela perspetiva e com a mestria de patentear
os dissemelhantes tempos de uma história no espaço de representação pictórica. Esta
situação veio a advir da experiência renascentista, tanto na Itália como na Flandres141.
141
LOPES, Rui Oliveira. A função da imagem artística: segundo a tradição medieval da igreja e a
prática da pintura portuguesa do renascimento, Lisboa, 2007, p. 44.
142
Idem, p. 33.
69
Português, Afonso Castro e Eduardo o Português trabalham na Flandres, enquanto a
permanência de vários artistas flamengos entre nós está atestada. Destes podemos
mencionar Vitor Vizeti, Roëlfe Van Velpen, além de outros que se limitaram a curtas
estadias. Num processo semelhante ao referido quanto à escultura, é por esta via que se
começa a fazer sentir a influência da pintura do Renascimento e não por relação
directa com arte italiana. Só mais tarde se começa a verificar o seu impacto directo
através dos pintores D. João III. Mas a actividade destes desenvolveu-se apenas depois
do termo do período que nos interessa e que limitamos a 1540. E só depois «a onda
avassaladora do italianismo tudo vai submergir, tirando a pintura nacional o seu
profundo carácter nacionalista e ilírico»”143.
Este conhecimento artístico com Itália foi declarado pela tomada de contacto dos
pintores portugueses com a Antiguidade Clássica, todavia Francisco de Holanda declara
que o paradigma artístico português ficou aquém do eclodir do verdadeiro
Renascimento, que imperava em território italiano144. Aqui, Holanda identifica a
diferença incontestável entre as artes pictóricas de Itália e Portugal. Contudo, apesar do
fenómeno de mobilidade artística e a transição de conhecimentos realizada
presencialmente ou através de fontes (tratadística, gravura, desenhos), a pintura que se
executa em Portugal não é a mesma que se pinta em Itália, ou seja, o Renascimento
vivenciado em Portugal é deveras diferenciador do Renascimento ao modo de Itália, tal
como menciona Miguel Ângelo, em Diálogos em Roma, onde defende que a boa pintura
é exclusivamente italiana e completamente inconfundível145. Esta afirmação é legítima,
todavia não pode nem deve vincular a «pintura de Portugal».
O que podemos compreender aqui é que uma boa obra pictórica italiana não se
prende só com o modo italiano de pintar, mas sim com o pintar ao modo ao antigo
“Assim que não se chama pintura de Itália qualquer pintura feita em Itália, mas
qualquer que for boa e certa (…) Porém, do Antigo ainda ficou em nossa Itália mais
143
VILELA, José Stichini. Francisco de Holanda – Vida, Pensamento e Obra, Lisboa, 1982, pp. 18-19.
144
“Mas de uma cousa é infamada Spanha e Portugal; e esta é que em Spanha, nem em Portugal, não
conhecem a pintura, nem fazem a boa pintura; nem tem seu honor a pintura.”: LOUSA, Maria Teresa
Viana. Francisco de Holanda e a Ascensão do Pintor. Dissertação de Doutoramento em Belas Artes, na
especialidade em Ciências da Arte, apresentada à Faculdade de Belas Artes da Universidade de Lisboa,
Lisboa, 2013, p. 99.
145
“E mais digo (…) que de quantos climas ou terras alumia o Sol e a Lua, em nenhuma outra se pode
bem pintar senão em o reino de Itália.”: Idem, p. 100.
70
que em outro reino do mundo, e nela cuido eu que acabará.”146, o que reforça a
importância da Antiguidade e o protagonismo de Itália na sua redescoberta.
146
Idem, pp. 100-101.
147
CANTERA, María José Redondo. El arte de la Roma antigua y moderna en la obra de Alonso
Berruguete. In DACOS, Nicole. Roma qvanta fvit ipsa rvina docet. Jesús Palpmero Páramo (Eds.)
Universidad de Huelva, Huelva, 2016, p. 21.
71
1.3.1 A importância da gravura para a construção de modelos pictóricos
148
BATORÉO, Manuel. “Primitivos Portugueses” e a Gravura do Norte da Europa – A Utilização
Instrumental de Fontes Gráficas, Lisboa, 2011, p. 270.
149
LOPES, Rui Oliveira. A função da imagem artística: segundo a tradição medieval da igreja e a
prática da pintura portuguesa do renascimento, Lisboa, 2007, pp. 136-137.
150
“um novo estádio na qualidade das gravuras”: BATORÉO, Manuel. “Primitivos Portugueses” e a
Gravura do Norte da Europa – A Utilização Instrumental de Fontes Gráficas, Lisboa, 2011, p. 52.
72
(1434-1519) e Albrecht Dürer (1471-1528), essencialmente na oficina de Viseu, de
Coimbra e de Lisboa.
151
DESTERRO, Maria. Francisco de Campos (c.1515-1580) e a Bella Maniera: entre a Flandres,
Espanha e Portugal, Lisboa, 2008, pp. 132-133.
152
AFONSO, Luís Urbano. A pintura mural portuguesa entre o Gótico Internacional e o fim do
Renascimento: formas, significados, funções. Vol. I. Fundação Calouste Gulbenkian, Fundação para a
Ciência e a Tecnologia, Lisboa, 2009, p. 119.
153
BATORÉO, Manuel. “Primitivos Portugueses” e a Gravura do Norte da Europa – A Utilização
Instrumental de Fontes Gráficas, Lisboa, 2011, p. 12-13.
73
Contudo torna-se relevante referir que o surgimento da imprensa em território
nacional deteve uma importância hegemónica na importação de tendências artísticas
conduzidas pelos impressores, contudo, desde o século XV, que Bruges possuía um
comércio especializado na venda de gravuras154. A influência da gravura leva-nos a
afirmar que a mesma circulava de mão em mão, como legado ao sucessor de qualquer
oficina, e que muitas dessas gravuras deram exemplos de imagens que objetivassem ser
reproduzidas a óleo155. É de denotar de tímido desenvolvimento, em Portugal, quando
comparado com os restantes países europeus, sendo que o mercado de gravuras, no
nosso país, era inexistente e, por isso estas gravuras utilizadas pelos pintores, provinham
da aquisição destas, em feiras internacionais ou nacionais.
154
Idem, p. 51.
155
LOPES, Rui Oliveira. A função da imagem artística: segundo a tradição medieval da igreja e a
prática da pintura portuguesa do renascimento, Lisboa, 2007, p. 39.
156
BATORÉO, Manuel. “Primitivos Portugueses” e a Gravura do Norte da Europa – A Utilização
Instrumental de Fontes Gráficas, Lisboa, 2011, p. 30.
157
Idem, p. 46.
74
formas e da retidão estrutural, à maneira ao romano158. A gravura prosperou, em
Portugal, ao sabor das conjunturas que o país atravessava, uma vez que, no final do
século XVI, as oficinas especializadas e o número de gravadores e tipógrafos, de origem
portuguesa e estrangeira, multiplicaram-se no nosso país.
158
“Procurava-se então fazer vingar aquilo que na altura se designava por obra ao antigo ou obra ao
romano, ou seja, a arquitectura de modelo antiquizante e clássico, de inspiração italianizante.”:
PEREIRA, Paulo. Arte Portuguesa. História Essencial, Lisboa, 2017, p. 416.
159
BATORÉO, Manuel. “Primitivos Portugueses” e a Gravura do Norte da Europa – A Utilização
Instrumental de Fontes Gráficas, Lisboa, 2011, p. 12-13.
160
BATISTA, Jorge. Contributos para o percurso e evolução da gravura em Portugal entre os séculos
XVI e XVII. MODOS. Revista de História da Arte, nº. 2, Campinas, 2018, p. 114.
75
Os modelos adotados foram integrados através da perspetiva geral da
composição pictórica, questão essa que fora, na maioria dos casos, desenvolvida e
idealizada, entre o pintor e o encomendante, tal como constata Manuel Batoréo, que nos
elucida sobre o facto de que os pintores portugueses trabalhavam, essencialmente, por
encomenda, e não para uma eventual clientela161. Todavia os temas representados
denotavam uma diversidade iconográfica insignificativa, uma vez que existiam regras
que condicionavam a liberdade criativa, de quem produzia uma gravura, levantando
questões relativas à temática iconográfica162.
A única questão que aqui se coloca é que, as gravuras para os artistas serviram,
maioritariamente, como instrumento de trabalho e fonte de inspiração, numa primeira
fase do processo criativo, o que conduz a uma reprodução seletiva e não integral, da
gravura, cujas figuras e fundos arquitetónicos são os mais copiados aquando da
realização artística de uma pintura, de modo a alcançar resultados formais ou
iconográficos163. De forma predominante, as gravuras serviram para desenvolver a
inventividade e não para a subjugar, prova disso é o menor emprego de propostas de
modelos quanto maior é as particularidades da produção. As fontes gráficas foram
somente uma ferramenta empregue justamente na primeira fase da metodologia criativa
161
BATORÉO, Manuel. “Primitivos Portugueses” e a Gravura do Norte da Europa – A Utilização
Instrumental de Fontes Gráficas, Lisboa, 2011, p. 270.
162
“[…] o assunto é […] popular e por vezes infantil; animais, plantas, aves, o sol, a lua, as estrelas,
demónios de expressões insofridas e homens de desmesurados troncos e diminutos membros inferiores.
[…] Nas outras composições mais apuradas revela-se o artista, rasgando a madeira com mão firme e
definindo todo o pensamento do debuxador; são quase sempre assuntos de carácter religiosos os
inspiradores desses trabalhos. Influências estrangeiras acentuam o vigor do desenho e a execução da
gravura. Vêm elas até nós da Alemanha ou da Itália, trazidas pelos primeiros impressores oriundos
dessas nações. E, ainda que algumas dessas composições possam ter tido execução no nosso país, como
o revelam o assunto puramente nacional e a adaptação à obra que ilustram, natural será que o artista
tenha sido trazido até nós pelos seus conterrâneos aqui estabelecidos. Pode por isso afirmar-se, com
propriedade, resultante deste estudo comparativo, que o trabalho de xilogravura é de assunto popular e
o de gravura artística de motivos religiosos e raras vezes nacionais”: BATISTA, Jorge. Contributos para
o percurso e evolução da gravura em Portugal entre os séculos XVI e XVII, Campinas, 2018, p. 117.
163
ANTUNES, Vanessa; SERRÃO, Vítor; COROADO, João; CARVALHO, Maria Luísa. Preparar a
imagem: as camadas de preparação na pintura portuguesa dos séculos XV-XVI – a gravura e a
preparação. ARTIS - Instituto de História da Arte da Faculdade de Letras, da Universidade de Lisboa,
Conservar Património, Número 27, Lisboa, 2018, p. 46.
76
e pelo motivo do gosto, da capacidade técnica e das exigências expressivas que foram
crescendo, enquanto a aplicação dos apoios se foi resumindo164.
Conforme refere Manuel Batoréo “No que refere à Oficina de Viseu temos ainda
de considerar uma obra onde Dagoberto Markl considera terem sido utilizadas
gravuras de Dürer com toda a intencionalidade, isto é, relevando “do grau de cultura,
seja do encomendador e/ou ideólogo, seja do artista, que conheceriam o significado,
por vezes pouco óbvio, da gravura utilizada, conferindo-lhe uma relação concreta no
contexto da cena representada”. A pintura em questão é Cristo em casa de Marta e
Maria, proveniente do Paço Episcopal de Fontelo para onde foi encomendada pelo
bispo D. Miguel da Silva, que será feito representar na cena e cujas armas foram
164
BATORÉO, Manuel. “Primitivos Portugueses” e a Gravura do Norte da Europa – A Utilização
Instrumental de Fontes Gráficas, Lisboa, 2011, p. 271.
165
LOPES, Rui Oliveira. A função da imagem artística: segundo a tradição medieval da igreja e a
prática da pintura portuguesa do renascimento, Lisboa, 2019, p. 38.
166
“D. Miguel da Silva (filho do Conde de Portalegre, valido do Venturoso), o qual completara os seus
estudos em humanidades e teologia na Universidade de Paris, como agente de D. Manuel junto da Cúria
Romana, cujo mecenato em Viseu, à frente da cátedra episcopal se revelaria determinante na divulgação
do formulário renascentista em Portugal, é também sintomático do novo espírito intelectual que grassava
entre alguns círculos eruditos. (…) o D. Miguel da Silva, que permanecera em Roma como embaixador
pontifício durante três pontificados (1515-1525), homem de cultura italiana e amigo de humanistas como
Lattanzio Tolomei ou Baltasar Castiglione. Detentor de uma vastíssima biblioteca, além de magníficas
colecções de moedas antigas e moldagens de estátuas romanas, o prelado traria um arquitecto de
Roma”: DESTERRO, Maria. Francisco de Campos (c.1515-1580) e a Bella Maniera: entre a Flandres,
Espanha e Portugal, Tomar, 2008, p. 178-181.
77
inscritas nos plintos das colunas.”167. Vasco Fernandes engloba duas gravuras:
Melancolia I (1514), que retrata Maria, contemplativa, em primeiro plano (fig. 6), e O
Filho Pródigo (c. 1496), numa reprodução similar da paisagem de fundo (fig. 7), a
partir dos modelos das gravuras de Albrecht Dürer (fig. 72). Graças ao programa de
renovação artística impulsionado por Francisco Cremona168, Viseu passou a ser um dos
espaços de receção da nova linguagem classicista.
167
BATORÉO, Manuel. “Primitivos Portugueses” e a Gravura do Norte da Europa – A Utilização
Instrumental de Fontes Gráficas, Lisboa, 2011, pp. 258-259.
168
“vindo também a transformar-se no principal mecenas do pintor Vasco Fernandes.”: DESTERRO,
Maria. Francisco de Campos (c.1515-1580) e a Bella Maniera: entre a Flandres, Espanha e Portugal,
Tomar, 2008, p. 181.
169
Idem, p. 19.
170
Idem, pp. 270-271.
171
BATORÉO, Manuel. “Primitivos Portugueses” e a Gravura do Norte da Europa – A Utilização
Instrumental de Fontes Gráficas, Lisboa, 2011, p. 53.
78
de banquetes e trocas de presentes, entre os quais, especiarias, animais exóticos,
doçaria, panos de luxo, e sobretudo a oferta de gravuras, desenhos e pinturas, do artista.
79
trabalho, revelaram-se meios técnicos de expressão e difusores de novidade, ideia que
resultou da sugestão que havia de copiar as gravuras dos melhores mestres para
aperfeiçoar a técnica “… to take pain and delight in always copying the best things that
he can find by the hand of great masters (Libro dell’Arte de Cennino Cennini, Florença,
c. 1390)”174. A generalidade dos artistas portugueses e gravadores, em particular,
possuíam escassos recursos económicos para se deslocarem ao estrangeiro e, contactar,
de perto, com as obras de grandes mestres.
O período que vai desde o final da Idade Média até ao início do século XVII
produziu uma literatura distinta dedicada à história, à crítica e à interpretação das artes
visuais, tanto na esfera sagrada como na secular, influência essa espelhada na Europa,
que forneceu os principais temas da educação artística académica, moldando a perceção
e a prática da arte e da história da arte presente nos séculos XV-XVII. O panorama
174
SMITH, Paul; WILDE, Carolyn. A Companion to Art Theory. Blackwell Publishing, Companions in
Cultural Studies, UK, 2002, p. 56.
80
artístico em Portugal e a nível europeu resultou de uma realidade pautada pelo decurso
da Idade Moderna, por forma a reconhecer as tradições decorrentes de uma arte
acompanhada da tratadística, da reflexão e teoria:
“A tratadística sobre a arte da Pintura em Portugal nos séculos XVI e XVII não
abunda de protagonistas e de textos verdadeiramente significativos. Salvo os
escritos de Francisco de Holanda e Félix da Costa Meesen, não dispomos de
uma produção original de testemunhos estéticos sobre a essência dessa arte,
para além do que marginalmente integra os receituários e os manuais práticos
de trabalho de pintores, iluminadores e desenhadores.”177.
175
MEDEIROS, Vasco. A Ciência Pictórica na Europa: 1430-1530. Iconopoiese e Ensino, Confluência e
Singularidade. Dissertação de Doutoramento no ramo de História, na especialidade de História da Arte,
apresentada à Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, vol. I, Lisboa, 2019, p. 13.
176
PEREIRA, Paulo. Arquitetura Portuguesa. História Essencial, Lisboa, 2022, p. 273.
177
SERRÃO, Vítor. Tratados de pintura, iluminura e caligrafia no Maneirismo português: entre Giraldo
Fernandes de Prado (1560-1561) e o anónimo autor do Breve Tractado de Iluminaçam (c. 1635). In
MOREIRA, Rafael; RODRIGUES, Ana Duarte. Tratados de Arte em Portugal. Editora Scribe, Lisboa,
2011, p. 73.
81
É de ressalvar que cada tratado de arte era alvo de várias edições, e
consequentemente traduzido em várias línguas. Nesta época, as línguas mais acessíveis
para os portugueses eram o latim, o espanhol, o francês e o italiano.
Tal como refere Rafael Moreira, num tratado de arte participam relatos e guias
de viagens a efeitos de descrição de edifícios reais ou imaginados, a biografias de
artistas e mecenas a monografias acerca de obras concretas, de fórmulas técnicas a
observações estéticas178, todavia Françoise Choay define, de forma restrita, tratado
como um género da literatura da arte, porém correta através de cinco pontos chave:
“(1) é um livro, apresentado como uma totalidade organizada; (2) esse livro é
assinado por um autor (que pode ser anónimo ou pseudónimo) o qual reivindica
a sua paternidade e escreve na primeira pessoa; (3) o seu discurso é autónomo,
não se quer subordinado a nenhuma disciplina ou tradição; (4) tem como
objetivo o método de concepção, a elaboração de princípios universais e de
regras generativas que permitam a criação, e não a Transmissão de preceitos
ou receitas; (5) tais princípios e regras destinam-se a gerar e a cobrir a
totalidade de um campo”179.
178
MOREIRA, Rafael; RODRIGUES, Ana Duarte. Tratados de Arte em Portugal, Lisboa, 2011, p. 9.
179
Idem, ibidem.
180
“O fenómeno admirável da tratadística moderna que percorre a Europa do século XV ao século
XVIII, após a Itália do Renascimento e a sua “redescoberta” de Vitrúvio (25 a.C.), não deixou Portugal
à margem, como repetia a doutrina na aceite por pura inércia.”: Idem, p. 8.
181
“os tratados vitruvianos recentemente aparecidos em Itália e que rapidamente chegaram até nós.
Vitrúvio era então um nome perfeitamente desconhecido em Portugal. Aparece pela primeira vez citado
no inventário da biblioteca do arcebispo de Braga D. Jorge da Costa (1485-1501) pelo ano de 1500, sob
o nome Betruvio de Architectura. (…) infelizmente desaparecido com a dispersão da biblioteca capitular
já no século XVIII”: MOREIRA, Rafael. A arquitectura do Renascimento no sul de Portugal. A
Encomenda Régia entre o Moderno e o Romano. Dissertação de Doutoramento em História da Arte
apresentada à Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, Lisboa, 1991,
pp. 287-288.
82
O surgimento da impressão e do tratado impresso com ilustrações foi um dos
maiores desenvolvimentos transformadores da história da arquitetura, e por isso é de
ressalvar que os tratados de arquitetura, a partir de 1520, passaram a ser ilustrados por
gravuras, tornando-se, em regra geral, modelos visuais para a construção de novos
edifícios ou como resultado de inspiração para produção pictórica, sobretudo para os
planos fundeiros, todavia, Mario Carpo afirma que esta reprodução mecânica eliminou a
deriva criativa inerente a um sistema de cópias182. Em suma, estas cópias demonstram
que o advento da impressão da tratadística não deve ser entendido estritamente como
uma mudança de paradigma, mas sim como uma alteração à prática arquitetónica, que
acelerou face a rápida difusão de uma variedade de modelos, altamente ornamentados, e
afirmou a importância dos detalhes arquitetónicos na prática artística renascentista.
Nesta época, como poucos artistas tinham viajado a Roma, as cópias de desenhos
arquitetónicos eram uma prática extremamente comum da atividade na Renascença, e
acabaram por circular por toda a Europa, no século XV e XVI.
182
WATERS, Michael J. A Renaissance without Order Ornament, Single-sheet Engravings, and the
Mutability of Architectural Prints. Institute of Fine Arts, New York University, New York, 2012, p. 489.
183
“Talvez os seus novos privilégios o dispersassem pela Corte, em Lisboa, ou o seu carácter humanista
e o seu entendimento do “estatuto de artista” o orientassem na fruição da beleza, da leitura e do estudo,
distanciando-o do trabalho contínuo, próprio dos oficiais mecânicos.”: HENRIQUES, Francisco. O
Retábulo da Pena de Nicolau Chanterene – Geometria e Significação. Dissertação de Mestrado em
Teorias da Arte apresentada à Faculdade de Letras de Belas-Artes, Lisboa, 2006, p. 42.
184
Impresso em Lisboa, na oficina de Luís Rodrigues, a 10 de Junho de 1514.
83
de viragem estética resumiu-se a uma influência italiana desarticulada à maneirista. No
que diz respeito à arte nacional, este tratado proporcionou a difusão de motivos ao
romano, bem como o primeiro autor que escreveu, exclusivamente, sobre as ordens
clássicas de arquitetura na Península Ibérica e também o primeiro quem nela distingue o
perfil dos arquitetos (liberais) dos canteiros (oficiais mecânicos) (fig. 8): “aqellos se
llamã oficiales mecanicos q trabajan con el con o ingenio y con las manos: como son
los canteros (...). Em oposição, Diego de Sagredo, define o arquiteto sob o seguinte
desígnio: liberales se llaman los que trabajan solamente con el espiritu y con el
ingenio”185. Terá sido a partir da publicação do Medidas del Romano de Diego de
Sagredo que o termo «arquitecto» se torna público por toda a Península Ibérica, tal
como refere Carlos Ruão186.
185
SAGREDO, Diego de. Medidas del Romano, Toledo, Remon de Petras, 1526, folio 7v. In SILVA,
Ricardo. O paradigma da arquitetura em Portugal na Idade Moderna. Entre o Tardo-Gótico e o
Renascimento: João de Castilho “O mestre que amanhece e anoitece na obra”. Dissertação de
Doutoramento em História, na especialidade de História da Arte apresentada à Faculdade de Letras da
Universidade de Lisboa, Lisboa, 2018, pp. 414-415.
186
SILVA, Ricardo. O paradigma da arquitetura em Portugal na Idade Moderna. Entre o Tardo-Gótico
e o Renascimento: João de Castilho “O mestre que amanhece e anoitece na obra”, Lisboa, 2018, p. 413.
84
foi aplicado pela primeira vez a Mateus de Couto (…) então titulado
«arquitecto, do officio de mestre de obras»”187.
187
ABREU, Susana. «Arquitecto, do Officio de Mestre das Obras». A introdução do título de Arquiteto
em Portugal: ambiguidades de uma questão em aberto - Parte I. História da arquitetura: perspetivas
temáticas, CITCEM - Centro de Investigação Transdisciplinar Cultura, Espaço e Memória, Universidade
do Porto, Porto, 2018, pp. 329-331.
188
GRILO, Fernando. Andrea Sansovino e Nicolau Chanterene. As duas faces da introdução do
Renascimento em Portugal. Actas do Colóquio A arte da Península Ibérica ao tempo do Tratado de
Tordesilhas, 1994, p. 267.
189
“Os textos de maior impacto no Portugal renascentista do século XVI serão, porventura, os de
Sebastiano Serlio, presentes na generalidade das Casas religiosas e nas mãos da encomenda e da mão-
de-obra de prestígio.”: CRAVEIRO, Maria de Lurdes. A arquitetura “ao romano”. Arte Portuguesa da
Pré-História ao Século XX. Fubo Editores, Vila Nova de Gaia, 2009, p. 16.
85
a impressão foi o principal agente de mudança, que ao seu nível mais básico, tentou
impor um sistema de ordens, a partir de 1537, soltando uma infinidade de modelos que
desafiaram a sistematização e tornaram-se um ponto de entrada para o mundo da
Antiguidade (fig. 10), e importantes referências de transmissão que derivavam de uma
variedade de fontes desenhadas, entre elas as ordens dórica, jónica, coríntia, toscana e
compósita. Já a obra de Vignola permitiu ilustrar a teoria da arquitetura de tal forma que
se tornou mais fácil empregar as ordens clássicas e onde o novo método baseou-se
numa única unidade de medida denominada módulo.
190
Os três exemplares da edição latina foram conservados no Mosteiro de São Vicente de Fora, na
Biblioteca das Necessidades e na Biblioteca Pública de Évora. MOREIRA, Rafael; RODRIGUES, Ana
Duarte. Tratados de Arte em Portugal, Lisboa, 2011, pp. 25-26.
191
A edição italiana traduzida por Cosino Bartoli era propriedade do Colégio de São Roque da
Companhia de Jesus. MOREIRA, Rafael; RODRIGUES, Ana Duarte. Tratados de Arte em Portugal,
Lisboa, 2011, p. 26.
192
DELUMEAU, Jean. A civilização do Renascimento, Lisboa, 2021, p. 95.
193
MOREIRA, Rafael; RODRIGUES, Ana Duarte. Tratados de Arte em Portugal, Lisboa, 2011, p. 43.
86
essa foi a metodologia avançada por Leon Battista Alberti, que estabeleceu um rumo
teórico para transformar a prática artística e florescer o Renascimento194.
Posto isto, Pedro Nunes196 traduziu o tratado vitruviano em 1541 “em 1541 que
devemos atribuir a recepção em Portugal do De Architectura num contexto de teoria
das ciências matemáticas (…). É no De Architectura de Nunes, nos diagramas, plantas
e esquemas geográficos que a deviam ilustrar, e na sua “leitura científica” oposta à
“leitura artística” de artistas como Nicolau Chanterene, João de Ruão, Manuel Pires,
João e Diogo de Castilho e Torralva, que a arquitetura portuguesa realmente
construída a partir dos últimos anos da década de 40 do século XVI por homens como
Miguel de Arruda (…)”197. O manuscrito da tradução de Vitrúvio foi levado por Juan de
Herrera para Madrid, porém, como refere Manuel Justino Maciel nada se sabe do seu
paradeiro, poderá estar num arquivo espanhol, esquecido ou até mesmo encadernado de
forma anónima, como tantos outros manuscritos198.
194
ALMEIDA, Isabel Cruz; NETO, Maria João. Sphera Mundi: arte e cultura no tempo dos
descobrimentos, Lisboa, 2015, p. 171.
195
PEREIRA, Fernando António Baptista. O legado do Renascimento, Lisboa, 2000, p. 31.
196
Matemático e cosmógrafo-mor. MOREIRA, Rafael; RODRIGUES, Ana Duarte. Tratados de Arte em
Portugal, Lisboa, 2011, p. 60.
197
Idem, pp. 60-61.
198
Idem, p. 61.
87
de um círculo cortesão e humanista português que lhe permitiu ir, na comitiva do
embaixador D. Pedro de Mascarenhas, a Itália, em 1538, talvez por influência do
Infante D. Luís, a casa do qual Holanda pertencia como Moço de câmera, tomar
contacto com a Antiguidade, com o próprio Renascimento e os seus valores, e
relacionar-se e estabelecer contactos, que lhe proporcionaram conviver com Vittoria
Colonna e Michelangelo Buonarroti, o maior artista vivo do seu tempo:
Escreveu extensivamente sobre a pintura como mãe de todas as arti del disegno,
e por isso também anotou algumas linhas sobre arquitetura, sendo o primeiro autor
renascentista a defender, numa base centrada na teoria, a atividade multifacetada do
arquiteto preeminentemente motivados e guiados pelo desenho.
199
MOREIRA, Rafael; RODRIGUES, Ana Duarte. Tratados de Arte em Portugal, Lisboa, 2011, pp. 90-
91.
200
“Nessa viagem viveu experiências únicas e fantásticas, que o transformariam num dos homens mais
cultos e cosmopolitas da sua época em Portugal, sendo um neoplatónico convicto e o primeiro tratadista
88
Ao regressar a Portugal, após a sua viagem a Itália, de ano e meio (de 1538 a
1540), Francisco de Holanda revestiu-se da importância da introdução da maniera
italiana e as influências de Miguel Ângelo, para além da coleções de desenhos e
gravuras que trouxe de Polidoro da Caravaggio, Marcantonio Raimondi, Ugo da Carpi,
Marco Dente, Agostino Veneziano e as mais recentes edições, nomeadamente de
Vitrúvio por Fra Giocondo, o De Sculpture, de Gauricus, as Cartas, de Aretino, a
tradução da História Natural, de Plínio, e a Divina Comédia, de Dante, o Livro IV do
tratado De Architettura, de Serlio, entre outros, todavia deteve pouca relevância na
introdução do Renascimento em Portugal “Se é passado o primeiro decénio do século
XVI que surgem em Portugal os primeiros sinais do novo estilo, só para muito mais
tarde se puder marcar a implantação de uma arte de orientação que nas Renascentista.
Este facto deve se tanto a persistência dum naturalismo de origem flamenga e da forma
do gótico tardio que foi o Manuelino, como ao gosto por um exotismo orientalista, fruto
das viagens marítimas, que se verifica também em toda a Europa depois da Embaixada
de D. Manuel a Leão X.”201, empreendeu a elaboração do tratado Da Pintura Antiga
(1548), seguido de Do Tirar pelo Natural (1549). Ambos os textos criticam a forma de
pintar, à flamenga, “sem razão nem arte”202.
a fazer a aplicação da Idea platónica à Teoria da Arte, tentando alargar as suas teorias a dimensões
universais, num verdadeiro espírito renascentista, dedicando inclusivamente um capítulo da Pintura
Antigua à arte do Novo Mundo e do Extremo Oriente.”: DESTERRO, Maria. Francisco de Campos
(c.1515-1580) e a Bella Maniera: entre a Flandres, Espanha e Portugal, Tomar, 2008, p. 184.
201
VILELA, José Stichini. Francisco de Holanda – Vida, Pensamento e Obra, Lisboa, 1982, pp. 15-16.
202
SERRÃO, Vítor. História da Arte em Portugal: O Renascimento e o Maneirismo, Lisboa, 2002, p.
173.
203
“(…) eu fui o primeiro que n’este Reino louvei e apregoei ser perfeita a antiguidade, e não haver
outro primor nas obras, e isto em tempo que todos quasi querião zombar d’isso. (…) E o conhecer isto
me fez desejar de ir ver Roma, e quando d’ella tornei não conhecia esta terra, como quer que não achei
pedreiro ou pintor que não dixesse que o antigo (a que elles chamão modo de Itália) que esse levava a
tudo”: VILELA, José Stichini. Francisco de Holanda – Vida, Pensamento e Obra, Lisboa, 1982, pp. 40-
41.
89
nem tem seu honor a pintura. Definem-se, assim, três aspectos deste tema: o
desconhecimento do que seja «a boa pintura», ou seja, do estilo clássico; a inexistência
de artistas que o pratiquem; e, por fim, a desvantajosa posição da arte e dos artistas em
Portugal.”204, todavia tece duras críticas aos pintores portugueses, de grande nível, da
primeira metade do século XVI, pelo desconhecimento do primor da pintura antiga e
pela ausência dos modelos classicistas, situação equiparada à vivenciada e conhecida
por Holanda, em Itália, e referindo também que desconsiderava os modos de expressão
da pintura flamenga, que deteve real impacto na pintura portuguesa nas primeiras
décadas de quinhentos.
O valor que Francisco de Holanda tenta passar com o tratado Da Pintura Antiga
tem a ver com a sua reflexão e o seu posicionamento na História, a par da separação
rigorosa que estabelece entre o antigo e o velho, ou entre o antigo e o novo:
204
Idem, p. 40.
205
VILELA, José Stichini. Francisco de Holanda – Vida, Pensamento e Obra, Lisboa, 1982, pp. 39-40.
90
valores e à dualidade existente entre boa e má pintura a ser praticada. Esta remissão de
valores é estabelecida na medida em que o moderno só será bom se tiver como
paradigma a presença do antigo, sendo que é a partir daqui que se fundamenta a teoria
da história do Renascimento, da mesma maneira que o ato de reconhecer a
proeminência da pintura de Itália será um dos seus resultados206, ou seja, esta ideia é
reforçada pela importância da Antiguidade e pelo protagonismo de Itália face à sua
redescoberta.
“Holanda insiste na analogia de Deus como pintor «Deos quando quis pintar
tudo o que vemos, como perfectissimo pintor, sobre a escuridade e trevas que
cobria o grão retauolo do mundo, começou logo com o claro, e por isto he mas
nobre o claro que o escuro». É por isso que Francisco de Holanda insisto na
importância da formação intelectual dos artistas, os quais deveriam ter uma
cultura sólida e diversificada nas letras, nas ciências, nas escrituras e nas
disciplinas próprias desta arte (geometria, perspectiva, matemática, etc.).”207.
206
RODRIGUES, Dalila. Modos de expressão na pintura portuguesa: o processo criativo de Vasco
Fernandes (1500-1542). Dissertação de Doutoramento em História da Arte apresentada à Faculdade de
Letras da Universidade de Coimbra, vol. I, Coimbra, 2000, p. 35.
207
AFONSO, Luís Urbano. A pintura mural portuguesa entre o Gótico Internacional e o fim do
Renascimento: formas, significados, funções, Lisboa, 2009, p. 149.
91
europeus “A nossa cultura artística da segunda metade do século XV e do primeiro
terço do século XVI, porque tradicionalmente arreigada ao espírito do Gótico
internacional e aos modelos nórdicos, recebeu tardiamente também, e sob formas
difusas ou polémicas, o sopro classicista emanado da Itália da Renascença. Se o
pensamento humanístico florescente desenvolvia, em círculos restritos aliás, uma
produção cultural que assimilava tais valores, a actividade artística resistiu a esses
valores – fosse no seu património construído, que prolongava a lição do Outono
medieval através do brilhante ciclo do «Manuelino», fosse na pintura, na iluminura e
noutros sectores (…)”208, sendo que esta introdução baseou-se em diversos fatores: na
prorrogação do movimento literário entusiasta da Antiguidade; na evolução das riquezas
e da vida cortesã; e na vinda de artistas italianos e na ida de artistas da Península Ibérica
a Itália209.
Este novo gosto que se impôs, na pintura portuguesa, entre 1500-1540, decorreu
de circunstâncias históricas, sobretudo com a subida ao trono de D. Manuel I, situação
essa, que determinou a rutura com o gosto dos seus antecessores, e consequentemente
208
SERRÃO, Vítor. O Maneirismo e o estatuto social dos pintores portugueses, Lisboa, 1983, pp. 32-33.
209
“Podemos acrescentar a menção dos italianos, aventureiros ao contatos, espanhóis, já educados ou
praticantes nos novos estilos, que entre nós estiveram em maioria na execução das obras renascentistas
dos primeiros tempos”: VILELA, José Stichini. Francisco de Holanda – Vida, Pensamento e Obra,
Lisboa, 1982, p. 16.
210
Idem, p. 19.
92
procurou-se o que de melhor se fazia na Europa, ou seja, um novo olhar sob a pintura
manuelino-joanino, um realismo da pintura do Norte da Europa pautado na produção
portuguesa, particularmente, em situações de grandes encomendas de corte ou de cariz
religioso211 e a vinda de pintores oriundos da Flandres, ou de regiões mais próximas, é a
prova de que o gosto estava a mudar, e sobretudo com as regiões que se estabeleciam
relações comerciais mais próximas.
211
“1500, ano-chave do estabelecimento de uma espécie de «idade de ouro» manuelina, de largo
desafogo económico e condições excepcionais de exportação, tempo de perenidade da tradição artística
goticizante (não só na tipologia nas obras realizadas de arquitectura, escultura, pintura, iluminura,
ourivesaria, etc., mas também no quadro anónimo, corporativo e colectivista em que se situam muitos
dos seus praticantes), de reforço do papel das feitorias portuguesas do Norte, e em que se processa a
lenta mas eficaz abertura às novidades do classicismo all’antico difundidas, entretanto, pelo Humanismo
cristão de raiz italiana (através de mecenas como Frei Brás de Barros, D. Miguel da Silva, o Infante D.
Luis o Frei António de Lisboa na fase joanina), ciclo este de experimentação do antigo que tem na figura
do « rei-imperador» D. Manuel I, o Venturoso, o seu primeiro e principal agente empreendedor.”:
SERRÃO, Vítor. História da Arte em Portugal: O Renascimento e o Maneirismo, Lisboa, 2002, p. 12.
212
“Este período de navegações e de empresas coloniais grandiosas é acompanhado de um
extraordinário incremento da vida artística, tão rica, completa e fulgurante termina uma era brilhante -
de curta duração é certo - em que Portugal pôde aspirar, no Universo, à hegemonia material e
espiritual.”: JIRMOUNSKY, Myron Malkiel. Pintura à sombra dos mosteiros. A pintura religiosa
portuguesa dos sécs. XV e XVI, Lisboa, 1957, p. 8.
213
“Era aqui que entravam em contacto as 3 grandes civilizações, diversas e originais: a simbolização
romano-gótica europeia, a civilização árabe - os restos do domínio mourisco - e a civilização hindu,
93
Já com a subida ao trono de D. João III, a nova conjuntura cultural procurará nos
modelos all’antico a sua linguagem, onde a referência visual deixa de ser a Flandres e
passará a ser o que então se apontava como “modo de Itália”. Efetivamente consistia
mais num conjunto de regras absorvidas por via literária, do que por via de uma
experiência visual regular, tal como se passava no seio das artes visuais em Itália. Os
motivos decorativos all’antico invadiram praticamente todas as áreas das artes, ao longo
da década de 1530, todavia na pintura careceram quase de modo completo
conhecimentos diretos, no entanto, em contrapartida, a arquitetura usufruiu dos tratados
e dos arquitetos com experiências e noções em meios classicistas. Isto não
impossibilitou a que os pintores portugueses fossem recetivos ao gosto, da nova
clientela relacionada com a corte humanista de D. João III214.
trazida do outro lado dos oceanos. Este triplo cruzamento, realizado de maneira particularmente feliz na
arte monumental, na arquitetura, deixou um cunho singular na própria vida da capital.”: Idem, ibidem.
214
CANDEIAS, António; DIAS, Cristina; RODRIGUES, Dalila; CAETANO, Joaquim Oliveira; BRITO,
Joaquim Pais de; CARVALHO, José Alberto Seabra; MIRÃO, José; PIORRO, Luís; AFONSO, Luís
Afonso; REIS, Pedro Cabrita; VALADAS, Sara. Primitivos Portugueses 1450 – 1550 - O século de Nuno
Gonçalves, Lisboa, 2010, p. 25.
94
«motivos de retorno», inspirados no contacto com os modos de ver e sentir de
outros povos (Índia, África, Brasil)”215.
215
SERRÃO, Vítor. História da Arte em Portugal: O Renascimento e o Maneirismo, Lisboa, 2002.
216
“É todo um problema de estudo da trajectória dos modelos artísticos, para considerar
individualmente em cada caso e em que seria necessário determinar os elementos que (…) resultam
apenas da inabilidade ou deficiente expressão estética que se queria, de facto, clássica. (…)”: VILELA,
José Stichini. Francisco de Holanda – Vida, Pensamento e Obra, Lisboa, 1982, p. 18.
217
Idem, ibidem.
218
AFONSO, Luís Urbano. A pintura mural portuguesa entre o Gótico Internacional e o fim do
Renascimento: formas, significados, funções, Lisboa, 2009, p. 90.
95
obra identificada e mais relevante, tendo como exemplo Cristóvão de Figueiredo,
Garcia Fernandes e Gregório Lopes, todavia importa referir que para além da oficina de
Lisboa existiram outras de real importância no panorama da produção nacional, como a
de Viseu, com Vasco Fernandes e Gaspar Vaz, com a de Évora, com Frei Carlos e como
a de Minho, com André de Padilha. O conjunto dos exemplares das grandes oficinas
portuguesas conjeturam o reconhecimento de um sentido de unidade e de uma
sobreposição de processos, entre pintores estabelecidos em determinado local ou nas
mesmas regiões e que preservaram colaborações mais ou menos incessantes, como é o
caso da obra de Gregório Lopes, próxima da do pintor Cristóvão de Figueiredo do que
da de Vasco Fernandes. Estes ditos conjuntos contêm a consequência de procedimentos
individuais e a singularmente declarada, no entanto, quando se fala em oficina de
Lisboa, evoca-se a dimensão coletiva de um ou mais núcleos ou a individualidade e
modos de expressão objetivos219.
No que diz respeito à arquitetura, esta aliou a última fase da arte gótica às
formas de expressão do Renascimento, numa aliança de formas diversas com elementos
nacionais, antigos e exóticos:
219
RODRIGUES, Dalila. Modos de expressão na pintura portuguesa: o processo criativo de Vasco
Fernandes (1500-1542), Coimbra, 2000, p. 417.
96
período (Joaquim de Vasconcelos), ora como um ramo meio colonial da
«monstruosa» arte hindu introduzida na Europa (Haupt), ora como um produto
original do naturalismo nacional português (Ramalho Ortigão e Herculano),
ora, enfim, como um complexo invisível de todos esses elementos com um cunho
nítido da tradição mourisca (W. Crum Watson).”220.
220
JIRMOUNSKY, Myron Malkiel. Pintura à sombra dos mosteiros. A pintura religiosa portuguesa dos
sécs. XV e XVI, Lisboa, 1957, pp. 23-24.
221
“(…) Portugal foi, no início do século, participante do movimento humanista que colocou em contacto
intelectuais de toda a Europa graças à universalidade da língua latina”: SANTOS, Helena. O pintor
Francisco João (act. 1563-1595): materiais e técnicas na pintura de cavalete em Évora na segunda
metade do século XVI. Dissertação de Doutoramento em Conservação e Restauro de Pintura apresentada à
Universidade Católica Portuguesa, Lisboa, 2012, p. 41.
97
Esta relação entre os dois processos, influência flamenga e italiana, ocorreu num
período cronológico reduzido, o primeiro nas três primeiras décadas de Quinhentos e o
segundo atuou prontamente numa inscrição e redimensionamento do outro. A título de
exemplo, designamos o percurso dos pintores da primeira geração manuelina Cristóvão
de Figueiredo e Vasco Fernandes favorável a este processo, cujas formações decorreram
no seio de um ambiente flamengo. Já os pintores, mais jovens, Gregório Lopes e Garcia
Fernandes dignificam o processo de italianização. Como se verá, este novo processo de
renovação irá operar em simultâneo com a difusão do Humanismo e com a afirmação e
valorização das formas artísticas renascentistas, a partir de diversos testemunhos
documentais, nomeadamente a tratadística e a gravura, que circulam de forma
generalizada pelo território português.
“Como se verá, não é difícil identificar, na viragem do séc. XV para o séc. XVI,
(…) a emergência de novidades artísticas, de novas soluções criativas,
relativamente ao que se vinha produzindo no País, no campo da pintura. Já
relativamente ao processo de italianização (…) é necessário atender também a
factores de natureza intrínseca. A necessidade de tornar mais penetrantes essas
novidades importadas parece ter conduzido a pintura portuguesa a uma
progressiva demarcação do contributo nórdico. Considerando que o processo
de construção representativa, de acordo com os pressupostos estéticos
importados dos Países Baixos meridionais, se desenvolve a partir do mundo
sensível e da visão natural – o que pressupõe uma centralidade dada ao
descritivo, uma atitude mimética do pintor –, o sentido de autonomia parece
decorrer como uma consequência inevitável. Quer isto também dizer que a
circunstância dos pintores passarem a incorporar elementos de feição
98
italianizante no campo figurativo não significa de modo algum que a matriz
nórdica tenha sido substituída pela italiana.”222.
222
RODRIGUES, Dalila. Modos de expressão na pintura portuguesa: o processo criativo de Vasco
Fernandes (1500-1542), Coimbra, 2000, p. 98.
223
Idem, p. 99.
99
pintura”224. A pintura aqui é compreendida como uma configuração visível do
pensamento e uma materialização da função da imagem que caminha para o sentido
intrínseco da ideia.
224
LOPES, Rui Oliveira. A função da imagem artística: segundo a tradição medieval da igreja e a prática
da pintura portuguesa do renascimento, Lisboa, 2007, p. 36.
225
“(…) O pintor inicia com esta obra um processo de autonomização crescente do seu estilo,
progressivamente mais aberto a modelos italianizantes com uma nova noção da importância da figura,
pelo seu isolamento, pela idealização dos modelos femininos e pela forma como os panejamentos se vão
moldar ao corpo.": CASIMIRO, Luís Alberto. Aspetos desconhecidos das pinturas portuguesas do
Renascimento, p. 199.
226
RODRIGUES, Dalila. Modos de expressão na pintura portuguesa: o processo criativo de Vasco
Fernandes (1500-1542), Coimbra, 2000, p. 60.
100
recolhêramos em devido tempo, vinculados então aos flamengos, quem sabe se
para guardar o nosso próprio carácter.”227.
227
SERRÃO, Vítor. A pintura maneirista em Portugal, Lisboa, 1991, p. 12.
228
RODRIGUES, Dalila. Modos de expressão na pintura portuguesa: o processo criativo de Vasco
Fernandes (1500-1542), Coimbra, 2000, pp. 97-98.
101
ou imaginário, papel que cabe ao pintor provocar tal sensibilidade no que diz respeito à
introdução de classicismo italiano no panorama pictórico português de Quinhentos,
procurando rececioná-las através de soluções e formas compositivas e espaciais mais
arrojadas229. Esta mudança de gosto, que resultou da sua receção e desenvolvimento,
evidencia ser um dos resultados da diligência de modernização cultural que a sociedade
portuguesa se sujeitou ou da “batalha do Humanismo português que ferozmente se
travava no tempo”230.
Tal como refere Vítor Serrão “A nossa História da Arte tem insistido, por vezes,
na questão de uma pretensa falta de originalidade, sobre o ponto de vista compositivo,
do acervo de pintura produzido no território português, como se esse acervo tivesse
sido globalmente subvertido por uma totalitária dominação de modelos flamengos. Na
realidade, o que se verifica é que a produção pictural portuguesa (…) assumiu uma
determinante caracterização sui generis que melhor a individualiza como «escola» no
contexto da Europa coetânea. Se essa individualização foi condicionada, por exemplo,
pelo peso da gravura importada, tal deverá ser observado como um fenómeno alargado
e corrente de modernização das fontes utilizadas pelas oficinas e seus clientes.”231, ou
seja, a pintura portuguesa assumiu contornos originais enquanto «escola» artística
independente face aquilo que se produzia na restante Europa, todavia não fecha portas a
inspiração oriunda de outras zonas influentes, nomeadamente modelos flamengos e
italianizantes.
Por esta razão, há que encontrar referências basilares quer de cariz artístico e
cultural, quer do ponto de vista da forma, das ideias ou até mesmo da organização
formal de espaço e de composição pictórica, inclusive até ao segundo quartel do século
XVI, toda a pintura portuguesa espelha na sua execução plástica e nos valores
imagéticos sobre a qual foi criada, uma forte espiritualidade que orientou os nossos
229
“(…) para identificar objectivamente os factores que estão na origem do prestígio da arte italiana e
na emergência de uma nova sensibilidade artística são extraordinariamente escassos. Tal como sucedeu
na arquitectura, na escultura, na ourivesaria e nas demais formas de expressão (…)”: Idem, p. 137.
230
CAETANO, Joaquim Oliveira. Ao modo de Itália: a pintura portuguesa na idade do Humanismo. A
Pintura Maneirista em Portugal, (cat. exp.), Lisboa, 1995, p. 104.
231
SERRÃO, Vítor. História da Arte em Portugal: O Renascimento e o Maneirismo, Lisboa, 2002, pp.
77-78.
102
artistas e a integridade oficinal em que foi conferida e elaborada232, sem esquecer a
linguagem renascentista que os nossos quiseram narrar sob temas devocionais233.
232
SERRÃO, Vítor. A pintura maneirista em Portugal, Lisboa, 1991, p. 12.
233
“Até fins do século XVI, a semelhança desempenhou um papel construtivo no saber da cultura
ocidental. Foi ela que orientou em grande parte a exegese e a interpretação dos textos: foi ela que
organizou o jogo dos símbolos, permitiu conhecimento das coisas visíveis e invisíveis, guiou a arte de as
representar.”: FOUCAULT, Michel. As palavras e as coisas – uma arqueologia das ciências humanas,
Lisboa, 2002, p. 73.
234
“Por assim ser, o agrupamento dos pintores do período, segundo nexos geracionais (tanto mais que
se estabeleceram entre eles laços de parentesco significativo de um mundo corporativo, de algum modo
fechado e marcado por aprendizagens partilhadas) é um útil método de abordagem, apto a distinguir,
dentro de um aparente gosto unitário, aquilo que vão sendo contributos ou inovações de uma tradição do
goticismo tardio de uns para o partido mais classicizante de outros.”: PEREIRA, Paulo. Arte
Portuguesa. História Essencial, Lisboa, 2017, p. 475.
103
“grotesco” ou de figuras, decoradores de proas de navios, avaliadores de
retábulos, etc.(…)”.235.
235
PESTANA, Maria Isabel. Das coisas visíveis às invisíveis: contributos para o estudo da pintura
maneirista na Ilha da Madeira (1540-1620). Dissertação de Doutoramento em História da Arte da Época
Moderna apresentada à Universidade da Madeira, Funchal, 2004, p. 54.
236
SALGUEIRO, Joana. A pintura portuguesa quinhentista de Vasco Fernandes: estudo técnico e
conservativo do suporte. Dissertação de Doutoramento em Conservação de Pintura apresentada à
Universidade Católica Portuguesa, vol. I, Lisboa, 2012, p. 87.
104
linha «fechada» -estilos que esteticamente, se contradizem e não podem
harmonizar-se, - isto era totalmente impossível em Portugal.”237.
105
seus autores e que podem fornecer alguns pontos de referência para identificar o papel
dos seus criadores, até mesmo nas grandes obras colectivas.”239. As circunstâncias, em
Portugal, foram totalmente diferenciadoras, sendo que as morfologias arquitetónicas em
si, farão parte das influências recebidas por parte do pintor e da sua oficina ou da oficina
a que pertence, como veio a surgir com o caso das arquiteturas construídas, a verificar
nas relações estabelecidas entre pintor e arquiteto.
239
JIRMOUNSKY, Myron Malkiel. Pintura à sombra dos mosteiros. A pintura religiosa portuguesa dos
sécs. XV e XVI, Lisboa, 1957, p. 32.
240
“um estatuto importante pela exigências de aprofundamento da história material destas obras, de
avaliação da sua planificação e construção primitivas necessariamente associadas à sua situação e
função originais ponto. E ainda, quanto à verificação, também nesses aspetos, de potenciais afinidades
ou diferenças recíprocas ou com outras obras da mesma época, abrindo por vistas quanto à
caracterização e individualização de práticas tradicionais de oficina que colaboravam na realização de
conjuntos retabulares”: SALGUEIRO, Joana. A pintura portuguesa quinhentista de Vasco Fernandes:
estudo técnico e conservativo do suporte, Lisboa, 2012, pp. 22-23.
106
Esta afirmação ocasionou que alguns historiadores reportassem uma obra a uma
determinada oficina ou parcerias, designação pautada pelo trabalho coletivo de diversos
pintores, e consequentemente realizado por várias mãos, que dificultou a identificação
segura dos seus intervenientes:
241
BATORÉO, Manuel; SERRÃO, Vítor. O retábulo de São Bartolomeu da Sé de Lisboa. Garcia
Fernandes numa obra de "Parceria”. in Garcia Fernandes. Um pintor do Renascimento eleitor da
Misericórdia de Lisboa, Lisboa, 1998, pp. 97-100.
107
Vasco Fernandes (…). Ainda hoje atribuem a esse mestre quadros de estilos muito
diferentes, de uma técnica notável em certos casos e de uma franqueza rudimentar
noutros, muito «flamingantes» umas vezes e de um estilo mais pessoal noutras, etc. A
despeito de toda a evolução possível em uma longa atividade artística, temos
dificuldades em reconhecer nessas obras a mão de um mesmo e único mestre. Não
esqueçamos que o artista pode mudar de estilo, mas não de temperamento. A mesma
observação deve ser feita quanto às obras atribuídas a um Jorge Afonso ou Francisco
Henriques, a um Gregório Lopes, a um Cristóvão de Figueiredo, etc. (…)”242.
242
JIRMOUNSKY, Myron Malkiel. Pintura à sombra dos mosteiros. A pintura religiosa portuguesa dos
sécs. XV e XVI, Lisboa, 1957, p. 33.
243
SERRÃO, Vítor. História da Arte em Portugal: O Renascimento e o Maneirismo, Lisboa, 2002, p. 83.
244
DESTERRO, Maria Teresa. Francisco de Campos (c.1515-1580) e a Bella Maniera: entre a Flandres,
Espanha e Portugal, Tomar, 2008, p. 97.
108
submetido a um exame final245, não na oficina, mas sim, junto das “tendas” dos
mesteres, conforme diz o regimento, e se o superasse, poderia abrir a sua própria oficina
e ter os seus próprios aprendizes, ou então poderia continuar a trabalhar com o seu
mestre, em trabalhos de parceria ou como assalariado, adquirindo assim o estatuto de
oficial.
A gravura de Jan Collaert I246 (fig. 18) é um dos exemplos mais representativos
daquilo que seria um interior de uma oficina de um mestre, todavia é de ressalvar que a
maioria das oficinas detinham semelhanças à representada na imagem. Relativamente
ao caso português não detemos nenhuma informação referente à organização oficinal,
bem como às tarefas desempenhadas pelo aprendiz, oficial e mestre.
A respeito de uma obra encomendada à oficina, esta pode ficar ou não ao critério
do pintor dependendo do contrato estabelecido entre encomendante e pintor e, entre
outros fatores, tema, dimensões da obra, materiais a utilizar, o prazo de execução e as
datas de pagamento:
245
O exame decorria em casa do juiz e o candidato a pintor tinha de levar uma tábua de quatro ou cinco
palmos em quadra, onde pintava a imagem que lhes era indicada, sendo desta forma colocadas à prova as
suas aptidões tanto em pintura, como em marcenaria. In SANTOS, Sofia Martins dos. Francisco Correia,
o mesmo nome para dois pintores maneiristas. Estudo artístico e técnico-material das suas obras,
documentadas e atribuídas, Lisboa, 2014, p. 61.
246
Gravura intitulada “New Inventions of Modern Times [Nova Reperta], The Invention of Oil Painting,
plate 14”, de c. 1600 do artista Jan Collaert I. In Search the Collection | The Metropolitan Museum of Art
(metmuseum.org).
109
função delas. Isto é, os debuxos prévios, ou as fontes gráficas utilizadas que as
apoiaram, teriam de obedecer não apenas a limitações físicas impostas pela
obra como, decorrente disto, a sua colocação e ângulos de observação.”247.
247
BATORÉO, Manuel. Os “Primitivos Portugueses” e a Gravura do Norte da Europa – A Utilização
Instrumental de Fontes Gráficas, Lisboa, 2011, p. 26.
248
“A originalidade da representação não é um valor, como hoje. Por isso, não é de estranhar que, por
vezes, a um pintor seja encomendada uma obra igual a outra que já tinha realizado antes, ou que uma
obra, qualquer que seja o estatuto do seu autor, se materialize em mais do que um exemplar.”: CRUZ,
António João. A oficina do artista, ou as relações entre a ciência e a arte a propósito de uma imagem.
Revista Interacções, nº3, Instituto Politécnico de Santarém, Escola Superior de Educação, Santarém,
2006, pp. 90-91.
249
SERRÃO, Vítor. História da Arte em Portugal: O Renascimento e o Maneirismo, Lisboa, 2002, p. 80.
110
cosmopolitas criadas no seio da oficina de Jorge Afonso e de outros mestres. O pintor
Gregório Lopes escapou com o seu estilo individual, de rasgos ondulantes e de
referências eruditas, já os demais pintores e seus contemporâneos, como Garcia
Fernandes e Cristóvão de Figueiredo, se confundem entre si, possivelmente devido a
ambos terem frequentado o mesmo ambiente de trabalho de Jorge Afonso.
111
2. AS REPRESENTAÇÕES DE ARQUITETURA NA PINTURA DO
RENASCIMENTO EM PORTUGAL. CASOS DE ESTUDO.
250
GOMBRICH, Ernst Hans. En quête de l’histoire culturelle. Gerard Monfort, 1992, pp. 61-62.
112
fundos arquitetónicos dos planos fundeiros, que até então eram condicionados pelo
convencionalidade imposto pela Igreja e que por norma era estipulado em contratos a
iconografia de temática religiosa nas composições pictóricas.
251
“Passam assim a constituir pequenos quadros, verdadeiras surpresas valorizadas pela autonomia que
a reprodução do pormenor lhes confere”: SANTOS, Reynaldo dos. A Paisagem e o Naturalismo dos
Segundos Planos nos Primitivos Portugueses. Colóquio, Revista de Artes e Letras. Vols. 5-6, 1959, pp. 1-
23.
113
cidade acastelada, com edifícios de diferentes tipologias, salientando este um
paisagismo através de sfumatos, S. Pedro (c. 1529), de Vasco Fernandes (fig. 20), que
ilustra uma cidade, também ela amuralhada, e Santo António Pregando aos Peixes (c.
1535-1540), que é definida por um enquadramento arquitetónico, marcado, do lado
direito, por uma arcaria gótica, ao fundo, por um edifício profundamente renascentista
(fig. 21) e ao lado desse edifício, sobressai uma janela de gosto mudéjar (fig. 22).
252
SERRÃO, Vítor. História da Arte em Portugal: O Renascimento e o Maneirismo, Lisboa, 2002, p. 87.
114
eram apreendidos através de livros impressos (com elementos gravados) e gravuras, tal
como testemunham as dezenas de tratados de arquitetura e não só, muitos livros do final
do século XV e sobretudo da primeira metade do século XVI apresentam páginas com
gravuras e iluminuras com elementos arquitetónicos, sobretudo elementos decorativos e
portadas.
253
“Da importância de António de Hollanda como principal artista do Livro de Horas dito de D.
Manuel, embora não considerado como autor único, nos falam os documentos. (…) a produção de
António de Hollanda poderá realmente contribuir para um melhor conhecimento da sua colaboração no
principal Livro de Horas saído, na 1.ª metade do século XVI, de uma oficina marcadamente portuguesa,
embora subsidiária da escola ganto-burgense onde, provavelmente, Hollanda terá feito a sua
aprendizagem antes de rumar para Portugal, num período fértil de contactos luso-flamengos.”:
MARKL, Dagoberto. Livro de Horas de D. Manuel. Imprensa Nacional Casa da Moeda, Lisboa, 1983,
pp. 46-47.
254
“Durante estes 62 anos, são recenseáveis, contando com os forais, as cartas de nobreza, os
compromissos das Misericórdias, e os exemplares cartográficos, centenas de trabalhos de iluminura,
com maior ou menor grau de perfeição, mais ou menos inspirados nas oficinas lisboetas.”: Idem, p. 11.
255
“Maria Alice Beaumont (…) escreve (…) «O grande centro de produção dos Livros de Horas foi, a
partir do século XV, o norte de França e a Flandres. Daí o estabelecerem-se em certas páginas,
sobretudo nas do calendário, modelos mais ou menos seguidos. Não admira portanto, dadas as nossas
estreitas relações culturais e comerciais com a Flandres, que, vindos para Portugal muitos Livros de
Horas flamengos, aqueles que eram feitos e iluminados no nosso país se inspirassem nesses
protótipos».”: Idem, p. 14.
256
Idem, ibidem.
257
Idem, p. 47.
115
A questão mais levantada aqui é por que razão o Livro de Horas é
tradicionalmente como pertencente a D. Manuel. José de Figueiredo afirma que temos
de colocar a feitura do livro em 1538258, contudo esta declaração torna-se discutível. No
decorrer do estudo realizado por Dagoberto Markl indica-se a data de 1517259,
reconhecida por Ramalho Ortigão, como início das Horas ditas de D. Manuel, e o
período de feitura acabado por volta de 1538, todavia “(…) mas que começava em 1517,
e isso em virtude desta última data figurar nas duas iluminuras com que abre o Livro e
ilustram a parte relativa ao cálculo do número áureo e da letra dominical. (…) Assim, e
nada tendo com a sua realização a data de 1517, o que se conclui é que o livro deve ter
sido encomendado dentro do quarto decénio do século XVI e terminado no começo do
decénio seguinte.”. Em consequência desta afirmação, alguns historiadores sustentam a
ideia de que a feitura do livro tenha sido terminada em 1551260, pela última cena que
ilustra o Ofício dos Mortos (fólio 130) (fig. 27), cena essa que está intimamente
relacionada com as cerimónias fúnebres, enterro e transladação dos restos mortais de D.
Manuel I para o Mosteiro dos Jerónimos, em 1551. À vista desta declaração, a obra terá
sido concluída no reinado de D. João III (1521-1557), filho e sucessor de D. Manuel.
258
“(…) O facto de se ver nele o enterro de D. Manuel bastava para o darmos como feito após a morte
desse monarca, falecido em Dezembro de 1521. Essa data tem porém de ser trazida para depois daquele
ano, visto algumas moedas que se vêem na «Adoração dos Magos» terem sido cunhadas em 1538», e
mais adiante, «Para quem foi feito este Livro de Horas? (…) Não é também fácil dizê-lo, embora o facto
da iluminura do Paço da Ribeira servir para enquadrar e ilustrar o começo do Evangelho de S. João,
com que abre a parte comum do Livro, torne plausível a hipótese de este ter sido feito para D. João III,
ou quem sabe se mesmo para o filho, o Príncipe D. João, nascido em Évora a 3 de Junho de 1537. Esta
última hipótese é talvez mesmo a mais provável».”: Idem, p. 15.
259
Idem, p. 55.
260
MatrizNet (dgpc.pt)
116
Para além destas duas referências, torna-se relevante mencionar que o manual
Medidas del Romano de Diego de Sagredo e o livro de Sebastiano Serlio detiveram
importância em Portugal, nomeadamente na divulgação das mais notáveis antiguidades
romanas e na explicação da aplicabilidade do sistema arquitetónico clássico em novos
edifícios. Estes tratados estimularam o gosto pela cópia dos antigos ao “modo de Itália”
e ajudaram ao progressivo abandono das formas goticizantes do Manuelino, que
perduraram até às primeiras décadas do reinado de D. João III. Ou seja, a tratadística
impulsionou a aprendizagem do architectus vitruviano ou a versão moderna de Alberti,
e até mesmo da geração seguinte que impulsionou uma arquitetura de detalhes formais e
técnicos ao “modo de Itália”261 (capítulo 1.3.2).
261
“Com as possibilidades abertas pela perspectiva, a capacidade de representar os diversos tempos de
uma istoria no espaço de representação pareciam infinitas. E assim veio a acontecer, logo no arranque
da experiência renascentista, tanto na Itália (…), como na Flandres (…)”: AZAMBUJA, Sónia Talhé.
Plantas, Animais e Paisagem: da iconografia à iconologia na pintura dos séculos XV e XVI em Portugal,
Lisboa, 2021, p. 33.
117
azues de azull fino”262, que na sua generalidade apenas se preocupa com as cores, figura
humana e tratamento dos panejamentos, deixando para trás, qualquer alusão aos
pormenores das arquiteturas fundeiras, todavia, na realidade, embora, em número
reduzido de contratos, existe a referência relativamente ao que deve ser pintado nos
fundos de pintura. Aqui, a descrição de “campos” corresponde aos planos fundeiros, de
arquitetura e de paisagem, que dignificam a cena principal.
Tal como refere Carlos Ruão, foi a partir da publicação do «Medidas del
Romano» que o termo «arquitecto» se tornou conhecido por toda a Península Ibérica263.
262
POLICARPO, Isabel Ponce de Leão. Gregório Lopes e a “ut pictura architectura”: os fundos
arquitectónicos na pintura do Renascimento português, Coimbra, 1996, p. 93.
263
RUÃO, Carlos. O Eupalinos Moderno Teoria e Prática da Arquitectura Religiosa em Portugal (1550-
1640). Dissertação de Doutoramento apresentada à Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra,
policopiada, Coimbra, 2006, p. 114.
264
“Pelos anos trinta do séc. XVI, é já possível identificar no percurso de alguns mestres um expressivo
desejo de modernização, que se traduz no recurso a uma linguagem mais ousada, quer dizer, fundada
numa concepção dominantemente expressiva da forma e no recurso a novas soluções compositivas e
espaciais. A este processo de lentas sedimentações, em grande parte traduzidas em ensaios tímidos de
novas experiências criativas, não foram seguramente alheios os estímulos de uma clientela erudita, o
alargamento de fontes inspirativas (directamente de Itália, mas também, e talvez dominantemente, a
partir dos já tradicionais circuitos nórdicos), e muito menos as experiências inovadoras no campo da
arquitectura e da escultura.”: PEREIRA, Fernando António Baptista. O legado do Renascimento,
Lisboa, 2000, p. 99.
118
Esta assimilação dos artistas flamengos do gosto all’antico, permitiu que os
pintores portugueses optassem por construir os seus próprios ideais compositivos,
influenciados pelas fontes de essência decorativa no campo da arquitetura.
Paralelamente, ao campo das gravuras, a influência da tratadística e dos desenhos
superou o imaginado face ao estudado por diversos pintores e arquitetos que
teoricamente funcionam como imagem e como novos critérios construtivos, que mais
tarde, irão ser construídos pictoricamente, e que se pode considerar como experimental
ou imaginado, de renovação construtiva, atingindo uma arquitetura totalmente real e
contruída. Contudo, só alguns pintores portugueses conseguiram esta adequação dos
fundos arquitetónicos nesta nova realidade da arquitetura pintada, onde é manifestada
sob uma maior versatilidade para a cena principal da composição, feito direto da
liberdade triunfal que os pintores detiveram na construção do espaço compositivo e na
inserção de elementos arquitetónicos e escultóricos no campo pictural.
“No seu tempo, toda a Europa culta conhecia, admirava e adquiria pintura,
cujo realismo era louvado, livros iluminados, somente igualados pelos italianos
(…) Outro sector da produção artística e cultural da Flandres que contribuiu de
um modo evidente para o prestígio da região foi a produção de livros ricamente
iluminados.”265.
265
GARCÍA, Bernardo José; GRILO, Fernando. Ao modo da Flandres: disponibilidade, inovação e
mercado da arte na época dos Descobrimentos (1415-1580). Actas do Congresso Internacional,
Universidade de Lisboa e Fundación de Carlos Amberes, 2005, pp. 83-84.
119
Todavia, a feitoria portuguesa em Antuérpia deteve uma enorme influência na
articulação com o comércio português com o Norte da Europa, desde 1411 até ao
encerramento da mesma por D. João III, em 1549: “o tempo do Renascimento
correspondeu economicamente a tempos difíceis e o investimento na cultura e na arte
foi um risco assumido. Há que saber decifrar o tempo em que as competências culturais
e artísticas mais se evidenciam, o ritmo a que se expandem, a linguagem artística
escolhida.”266, sendo que a evolução e a vontade artística explicam a relação do
mecenatismo, a nível individual e de grupo com os portugueses, bem como os contactos
que se estenderam com Albrecht Dürer, numa tradição à novidade, exprimindo a riqueza
de uma época, disseminando o gosto e a arte flamenga no Portugal dos Descobrimentos.
Nesta época encomendavam-se peças de ourivesaria ou de matais preciosos, tecidos
para vestuário ou para decoração, tapeçarias, pinturas, esculturas e livros iluminados267.
Olhar para a arquitetura na pintura é separar aquilo que é uma arquitetura real de
uma arquitetura imaginada, sendo que as pessoas preferem que os fundos sejam tratados
com representações não reais, segundo um conjunto de sentidos e de valores que não
são parecidos aos de Itália nem aos da Flandres, e inclusive existe em Portugal um
conjunto relativo de pintura flamenga comparativamente à italiana, que é parca, todavia
sobrevalorizada. Os retábulos flamengos completavam o discurso religioso, político e
mitográficos, num sentido de arte pública, destinada a uma comunidade social, e nesse
sentido, seduzir pela emoção e pelos sentidos, numa prática de representação de fundos
arquitetura e paisagem que a comunidade não tinha conhecimento nem tinha visualizado
“Talvez seja, por conseguinte, verdade, ao invés do que foi afirmado, que se aderia à
266
Idem, p. 51.
267
Idem, p. 170.
120
Flandres por ostentação e à Itália por devoção.”268. Na altura não se tinha
conhecimento disso, mas a arte da Flandres era denominada como pináculo da
expressão artística em Portugal, ou seja, o gosto era dominantemente flamengo, à
maneira da Flandres, e onde a presença da pintura italiana era declinada quase por
completo, tendo como maior exemplo o políptico de Lamego (c.1506-1511) (fig. 28), de
Vasco Fernandes, onde se observa a influência flamenga bem patente, todavia com um
ou outro motivo nacional e com alguns reflexos de um italianismo aceite por via
indireta269, dando primazia, por parte dos pintores portugueses, à reprodução de cenários
flamengos, que eram copiados, maioritariamente, de desenhos ou estampas adquiridos
ou pertencentes aos seus mestres, para compor e adaptar às figurações desejadas ou às
necessidade das encomendas:
268
Idem, p. 167.
269
MOURA, Vasco Graça. Vasco Fernandes, ou a pintura entre a Flandres e as Beiras, pp. 11-12.
270
RODRIGUES, Dalila. Grão Vasco e a pintura europeia do Renascimento, Lisboa, 1992, pp. 25-26.
121
“Este importante centro pictórico, cortesão e cosmopolita, integrava então
diversos aprendizes, auxiliares e pintores já formados de actividade autónoma,
alguns dos quais de origem e formação nórdica. (…) Se as duas primeiras
décadas do século XVI ficaram marcadas pelas relações artísticas com a
Flandres – quer pela presença de artistas flamengos, que trabalharam em Viseu
e Lamego – quer por um gosto determinado, que se traduziu na importação das
obras (…) A pluralidade linguística que se pode identificar em inúmeras obras
deste período confirma a transição do modelo nórdico do Renascimento para o
italiano que, não sem alguma conflitualidade ainda algo confusamente
estudada, se afirma tardiamente em Portugal.”271.
271
RODRIGUES, Dalila. Vasco Fernandes, ou a contemporaneidade do diverso, p. 52.
122
poesia», contudo conferiu à pintura europeia «um pouco do nosso temperamento e
experiência quotidiana»272.
123
alvenaria que delimita o desenrolar da cena principal, em primeiro plano, todavia esta
transição de espaços de arquitetura e paisagem acentuam a profundidade da
composição, através do emprego de sucessivos planos, nomeadamente o do casario, do
lago, das arquiteturas e paisagens esfumadas que encontramos nos últimos planos da
composição, já o plano fundeiro da obra Casamento da Virgem (fig. 30) revela um
interior religioso, com esculturas de vulto encimadas por colunas, que se abre para o
exterior de uma cidade de influência flamenga.
124
arquitetonicamente ou paisagisticamente, não é a minha terra, mas sim a terra real ou
ideal, de quem executa a obra, ou seja não é o nosso referencial de paisagem, é
caracterizado como uma desmaterialização do real para ajudar a complementar a
narrativa iconográfica, e é neste sentido que a arquitetura pode ingressar,
nomeadamente quando esta é ligada à tratadística, o que resulta numa declaração
assumida de modernidade.
E é aqui que a arte portuguesa de quinhentos constata que existe, de uma forma
geral, uma liberdade compositiva de representações que opera nos planos fundeiros,
onde aqui se tratam representações arquitetónicas e paisagísticas, não impedindo
qualquer interação com alguma influência artística “La arquitectura, permanente o
efímera, y la ciudade tenían capacidades metafóricas, podían “transmutarse” en
espacios escenográficamente construidos (…)”275.
275
HERNÁNDEZ, Luis. Ut architectura poesis: relaciones entre arquitectura y literatura en la Nueva
España durante el siglo XVII. Universidad Iberoamericana, México, 2013, p. 176.
276
POLICARPO, Isabel Ponce de Leão. Gregório Lopes e a “ut pictura architectura”: os fundos
arquitectónicos na pintura do Renascimento português, Coimbra, 1996, p. 97.
125
sobretudo pelas fontes que detinham em sua posse, sendo estas indutoras de uma
capacidade construtiva relacionada com a dos denominados mestres-de-obras ou
arquitetos, ou caracterizadas por uma reprodução de uma construção real.
277
“… assim como ao pintor convém ter notícia da arquitectura para saber fazer o ornamento com base
em medidas e proporções, também ao arquitecto interessa saber a perspectiva porque com esse exercício
melhor imagina todo o edifício já com a sua ornamentação… tudo deriva das cinco ordens que usavam
na Antiguidade”: POLICARPO, Isabel Ponce de Leão. Gregório Lopes e a “ut pictura architectura”: os
fundos arquitectónicos na pintura do Renascimento português, Coimbra, 1996, p. 97.
278
RODRIGUES, Dalila. Grão Vasco e a pintura europeia do Renascimento, Lisboa, 1992, p. 64.
279
SCIOLLA, Gianni Carlo. La città ideale nel Rinascimento. Utet, Torino, 1975.
280
António Averlino, conhecido como Filarete, descreve cidade imaginária como Sforzinda, em
homenagem ao duque de Milão, Francesco Sforza. Esta nova forma de propor uma nova cidade
126
“Cidade Ideal”, imaginada ou idealizada, segue as novas teorias intelectuais de cada
pintor, e que por sua vez implica a uma incursão de elementos definidores que irão
servir de referencial de espaço e tempo, cujo caráter iconográfico e iconológico está
intimamente ligado a uma ideia transitada pela arquitetura pintada, tendo como objetivo
primitivo o da experimentação representativa de arquiteturas não existentes.
influenciou a construção de cidades feitas de raiz, numa disposição exterior baseada num duplo quadrado,
semelhante à da cidade de Milão, rodeada por muralhas. MURTINHO, Vítor. Alberti e Filarete: da
perspetiva à cidade ideal. Imprensa da Universidade de Coimbra, Coimbra, 2017, pp. 235-246.
281
POLICARPO, Isabel Ponce de Leão. Gregório Lopes e a “ut pictura architectura”: os fundos
arquitectónicos na pintura do Renascimento português, Coimbra, 1996, p. 111.
127
Quanto às diversas representações arquitetónicas nos planos fundeiros, estas são
de árdua análise pelas múltiplas referências e influências que lhes estão subjacentes.
Tudo isto a par da já referida capacidade intelectual de representar a realidade e do
auxílio à imaginação:
Deve notar-se que estes segundos planos dependiam mais do pintor do que a
propriamente da vontade do encomendador, bem como da qualidade pictórica deste,
que, apesar de não se distanciar do tema ou da iconografia habitual, a religiosa,
preenchia os planos fundeiros com a temática que mais lhe aprazia, e onde, sobretudo,
poderia exibir os seus dotes e conhecimentos artísticos em paisagens, arquiteturas de
interiores ou de ar livre:
282
SERRÃO, Vítor. A pintura maneirista em Portugal, Lisboa, 1991, pp. 19-20.
128
irradiação, ainda que, também este, a intendência localizada (Coimbra, Évora).
De facto, o classicismo italiano insinuou-se apenas nos nossos programas
artísticos a um nível semântico, e com inegável caráter de experimentação,
tendo passado em geral despercebido de clientes e de artistas.”283.
283
SERRÃO, Vítor. O Maneirismo e o estatuto social dos pintores portugueses, Lisboa, 2002, p. 42.
284
RODRIGUES, Dalila. Grão Vasco, Lisboa, 2007, p. 44.
129
construções constituem uma unidade autónoma para o estudo da pintura e da arquitetura
do Renascimento português.
285
“(…) dos pintores provenientes da maneira manuelina, foi ele que acabou por fornecer às gerações
seguintes mais elementos de contaminação, o que, só por si, traduz a maior atualização que, no
panorama português, a sua pintura deteve, sensível a um italianismo precoce (…)”: Idem, ibidem.
130
1517, todavia, hoje, encontra-se no MNAA, em Lisboa. Iconograficamente, o que se
revela no quadro é a chegada ao convento, em solene procissão, das relíquias de Santa
Auta, as quais ainda se encontram na riquíssima igreja do convento. Estas relíquias
foram ofertadas a D. Leonor pelo imperador Maximiliano I, do Sacro Império Romano-
Germânico, seu primo. A rainha D. Leonor encontra-se revelada muito discretamente no
quadro, vestida de preto, em sinal de luto pois já tinha enviuvado, e de mãos postas, ao
fundo à esquerda.
286
“Esta pintura é (…) a representação de uma paisagem real, o Convento da Madre de Deus, Lisboa
(atual Museu Nacional do Azulejo)”: RODRIGUES, Dalila. Grão Vasco, Lisboa, 2007, p. 265.
287
O portal manuelino no centro da composição desta obra de arte serviu de inspiração para o restauro
do Convento da Madre de Deus no século XIX, com a colocação de um portal neomanuelino idêntico na
fachada sul.”: Idem, ibidem.
288
“O emblema do rei D. João II era o pelicano, que surge na fachada do convento; o pelicano é um
símbolo do sacrifício de Cristo, devido à lenda segundo a qual esta ave picava o próprio peito para
alimentar as crias com o seu sangue.”: Idem, ibidem.
289
“(…) o gosto pelas superfícies brilhantes e lustrosas, como no mármore polido e cerâmicas orientais,
com a preferência franciscana por materiais pobres (…) de grande êxito cada vez mais voltada à
produção em série e à venda para o exterior (…) destinados a enquadrar-se na arquitectura. O que tem
sido ignorado, é que o mais antigo testemunho hoje conhecido da exportação dessas obras em terracota
vidrada de Florença destinou-se a Portugal, e precisamente ao Conde de Ourém. Uma anotação
referente ao carregamento de sete caixas (7 chasse di lavorj de terachotta envetriata del Marchese di
Valenza) surge, ao lado de embalagens de salitre e brocado carmesim, numa lista de bens entregues a 28
131
Florença, das oficinas dos irmãos Della Robbia (fig. 49), envolto numa cercadura de
festões de folhagem acastanhada e com frutos amarelados, e colocado sobre uma mísula
e debaixo da janela retangular, e o telhado de telhas mouriscas de três fiadas cor-de-rosa
separadas por faixas amarelas, e uma gárgula gótica no ângulo (fig. 50), similares às
originais do convento (fig. 51), que encerra o plano mais recuado da obra, do lado
direito da composição, e num contraposto face a localização do mosteiro, sobretudo
pelo emprego fictício do rio Tejo e as caravelas (fig. 52), que supostamente deveria
estar à frente como verdadeiramente acontece, deixando a composição livre para a Santa
e o cortejo processional.
de Maio de 1454 em Pisa a um Bernardo de Évora, a fim de serem embarcadas para Lisboa (che lo
mãdasi a Lisbona).”: MOREIRA, Rafael. A arquitectura do Renascimento no sul de Portugal. A
Encomenda Régia entre o Moderno e o Romano, Lisboa, 1991, pp. 16-17.
290
“No início do século XVI, a fachada deste convento possuía um medalhão de Della Robbia, com a
escultura da Virgem com o Menino, envoltos em cercadura de folhagem.”: RODRIGUES, Dalila. Grão
Vasco, Lisboa, 2007, p. 265.
291
“é nessa data (…) que pintor surge a testemunhar um protocolo notarial, em que o Convento de S.
Domingos de Lisboa autoriza os negros foros Pedro Álvares e Beatriz Lopes a cederem a Gregório
Lopes, pintor, o aforamento de umas casas do mosteiro situadas próximo da ermida de Nossa Senhora da
Estada. Testemunham a transacção, ocorrida nas casas do pintor régio Jorge Afonso, que era sogro de
Gregório Lopes, Pero Vaz, Gaspar Vaz e Garcia Fernandes, «todos pintores que lavram em casa do dito
jorge afomso».”: CAETANO, Joaquim Oliveira. Garcia Fernandes. Um Pintor do Renascimento Eleitor
da Misericórdia de Lisboa, (catálogo de exposição). Santa Casa da Misericórdia de Lisboa/Museu de S.
Roque, Lisboa, 1998, p. 20.
132
Henriques, Garcia Fernandes, sub cuja direção trabalhava em 1518-1519, nas
decorações desaparecidas, para o Tribunal da Relação de Lisboa, primeira referência à
sua existência, relacionar-se-á por parentesco e ofício com Cristóvão de Figueiredo,
pintor do Cardeal Infante D. Afonso. Independentemente da oficina à qual pertenceu,
Garcia Fernandes surge relacionado, desde o primeiro momento, aos mais importantes
pintores do seu tempo, enquadrado no grupo da aristocracia mesteiral associado à
encomenda de corte. Esta ligação é comprovada por um documento, sem indicação do
ano, onde Bartolomeu de Paiva escreve a Afonso Monteiro292, retratando a rivalidade do
meio artístico lisboeta, o olhar sob os intermediários, artista e encomenda régia e sob a
tríade Cristóvão de Figueiredo, Gregório Lopes e Garcia Fernandes293, que aqui é
descrita e que posteriormente irá funcionar como «parceiros» nas empreitadas dos
retábulos de Ferreirim. Estes pintores, dos mais notáveis do seu tempo, estiveram
ligados à oficina de Francisco Henriques e, ao pintor régio Jorge Afonso, mestre da
oficina de Lisboa.
292
“It. Hesses pintores que hão de pintar há hobra da rrolaçam tem lla huma pouca deferença sobre a
dita pintura a saber Handre Gonsaluez com Gregorio Lopez e Figuejredo e Gracja Fernam e porque sua
allteza tem já detremjnado ho que sobre yso hãoo de fazer há quall he que ho Handre Gonsaluez pjnte na
hobra de Sãoo Gjhãao e os outros tres na hobra da rrolaçam”: CAETANO, Joaquim Oliveira. Garcia
Fernandes. Um Pintor do Renascimento Eleitor da Misericórdia de Lisboa (catálogo de exposição),
Lisboa, 1998, p. 21.
293
“Tratam-se de artistas de elevada qualidade que percorreram o país dando resposta a diversas
encomendas facto que comprova o grande apreço que havia na época pela actividade destes artistas.”:
CASIMIRO, Luís Alberto. Pintura e Escultura do Renascimento no Norte de Portugal, Porto, 2005, p.
98.
294
“Segundo a lenda transmitida pelos séculos, os três Santos Mártires de Lisboa, Veríssimo, Máxima e
Júlia, viveram na época em que ocorreram as grandes perseguições aos cristãos e surgiram numerosos
mártires dos quais destacaríamos São Vicente, provavelmente o mais importante no culto português, e
também os irmãos São Crispim e São Crispiniano, só reconhecidos entre nós a partir da conquista de
Lisboa, por ter sido a 25 de Outubro que a cidade foi tomada aos mouros. Todavia, é importante notar
que, nessa mesma data, já Veríssimo, Máxima e Júlia eram venerados em Lisboa, como atesta o relato do
133
oriundo do Renascimento do Norte da Europa, do primeiro quartel do século XV, pelo
espaço e revelo que as figuras ocupam na composição, característica que até então não
era atribuída, reforçando a ideia de símbolo identitário e de fundo compositivo:
cruzado Osberno, em duas passagens do seu texto, escrito muito pouco tempo depois. Vale a pena citar:
Sob o domínio dos reis cristãos, antes que os mouros a tomassem, num lugar junto da cidade, e que se
chama Campolide, venera-se a memória dos três mártires Veríssimo, Máxima e Júlia, virgem, de cuja
igreja, totalmente arrasada pelos mouros, restam somente três pedras como lembrança da sua
destruição, as quais nunca dali puderam ser retiradas.”: BATORÉO, Manuel. A iconografia dos Santos
Mártires de Lisboa em quatro pinturas do século XVI: linguagem e significados. Cultura Revista de
História e Teoria das Ideias vol. 27, Lisboa, 2010, p. 188.
295
BATORÉO, Manuel. Os “Primitivos Portugueses” e a Gravura do Norte da Europa – A Utilização
Instrumental de Fontes Gráficas, Lisboa, 2011, p. 120.
134
Sant’Angelo e, ao cimo, o Palácio papal na construção anterior ao edifício barroco que
hoje conhecemos.”296 (figs. 59 e 60).
Contudo, importa também salientar que o plano fundeiro também poderá realçar
a arquitetura do Palais des Papes, em Avinhão (fig. 61), construído em 1335 e
considerado como o maior palácio gótico do mundo.
296
BATORÉO, Manuel. A iconografia dos Santos Mártires de Lisboa em quatro pinturas do século XVI:
linguagem e significados, Lisboa, 2010, p. 192.
297
“A identificação da cidade de Lisboa estará sempre conectada com o rio Tejo e o seu estuário que nos
aproxima do oceano. As construções portuguesas mantiveram sempre essa relação com o mar, que
acentuava a conquista das rotas comerciais dominadas pelas naus e depois pelas caravelas (…)”:
ALMEIDA, Isabel Cruz; NETO, Maria João. Sphera Mundi: arte e cultura no tempo dos descobrimentos,
Lisboa, 2015, pp. 16-17.
298
“qualquer panorâmica quinhentista de Lisboa, todas dominadas pelo longo edifício perpendicular ao
rio, tornará tudo o que podemos saber sobre este palácio evidente”: SENOS, Nuno. O Paço da Ribeira
(1501-1581), Lisboa, 2002, p. 18.
299
AZAMBUJA, Sónia Talhé. Plantas, Animais e Paisagem: da iconografia à iconologia na pintura dos
séculos XV e XVI em Portugal, Lisboa, 2021, p. 281.
135
retomada no tratado de Alberti. (…) realmente original é a localização deste paço junto
ao rio, às portas (fluviais e as mais importantes da cidade, constituindo-se assim, por
força da sua configuração longitudinal, perpendicular ao rio, projectando-se para lá
da antiga linha muralhada, do ponto de vista formal, em elemento forte da sua fachada
de aparato, e do ponto de vista simbólico, em metáfora da sua ligação ao mar.” 300 (fig.
64). Já a representação distorcida alude-nos ao baluarte de Belém, em Lisboa, um dos
símbolos dos Descobrimentos portugueses, construído no reinado de D. Manuel I, e
projetado pelo arquiteto, em estruturas defensivas, Francisco de Arruda, que dirigiu as
obras de execução do monumento dedicado a São Vicente301. O baluarte é denominado
obra ímpar de veículo de poder real, do gosto manuelino, que indicia um gosto que, a
pouco e pouco, se vai estender à sociedade portuguesa quinhentista, indicador esse
proporcionado pela não existência arquitetónica de nada igual ou similar noutra parte do
mundo, e que defendia a cidade, junto a barra do rio Tejo302.
300
SENOS, Nuno. O Paço da Ribeira (1501-1581). Notícias Editorial, Lisboa, 2002, p. 18.
301
“A designação de forte, fortim, fortaleza, baluarte, torre, torreão e castelo na identificação da “Torre
de Belém” é conectada com a sua função de defesa e também de representação do poder político.
Poderemos afirmar que a sua simbologia sobrepôs-se hoje à sua relação funcional e forma, mas é nesse
sentido que é um “baluarte” dos Descobrimentos e do reinado de D. Manuel I, o “Príncipe”,
constituindo neste caso da modernidade defensiva associada e conectada com a representação política.
Com Alberti designa o edifício como objecto-monumento, a Torre de Belém é erguida e projectada como
edifício-monumento com um significado histórico-ideológico, e a sua forma representa a modernidade
baseada na forma original como estabelece o diálogo entre a torre medieval e a forma poligonal do
baluarte.”: ALMEIDA, Isabel Cruz; NETO, Maria João. Sphera Mundi: arte e cultura no tempo dos
descobrimentos, Lisboa, 2015, p. 20.
302
“A denominação de baluarte e não torre a esta edificação representa uma perspectiva moderna de
fortaleza. Por outro lado, o rei D. Manuel I designava esta edificação por “Castelo de São Vicente a par
de Belém” que reflecte a simbologia da encomenda, que se vai também incidir numa linguagem de
transição para os parâmetros renascentistas, reinterpretando elementos tarde-góticos numa perspectiva
nacionalista para enfatizar e epopeia dos Descobrimentos.”: Idem, p. 14.
136
artísticas.”303. É um pintor que apresenta recursos interessantes dentro da estética do
Renascimento, e revela, na sua obra pictórica, influências flamengas e do norte de Itália
que se complementam304. Vítor Serrão demonstra-nos o quanto foi revelante este pintor
para o contributo pictórico português sob um foco de renovação na arte, na era
quinhentista, nas linhas de ação dos novos modelos do Renascimento:
303
CASIMIRO, Luís Alberto. Pintura e Escultura do Renascimento no Norte de Portugal, Porto, 2006-
2007, p. 101.
304
“assumindo os contornos de um mestre regional eivado de singular originalidade quer no desenho
solto, quer na largueza da composição, quer no cromatismo opulento, quer na sensibilidade ao “ar
livre” quer na abertura que revela às novidades do Renascimento de um mundo ainda tradicionalmente
alheio aos confins da estética do outono da Idade Média”: Idem, ibidem.
305
SERRÃO, Vítor. André de Padilha e a pintura quinhentista entre o Minho e a Galiza, Lisboa, 1998, p.
35.
306
“A obra remanescente mostra-nos um artista muito personalizado, sempre respeitado e bem pago
pelos seus clientes, já adestrado numa linguagem renascentista que é de superação da tradicional raiz
hispano-flamenga (…)”: Idem, p. 27.
307
“Estamos, sem dúvida, perante uma rara e valiosa pintura da primeira metade de Quinhentos, mas
que nem por isso tem deixado passar despercebida do grosso dos estudiosos da antiga arte portuguesa.”:
Idem, p. 32.
137
“Não se trata (…) de obra saída dos círculos de influência ou inspiração
flamenguizante da «escola» de Lisboa, e muito menos de obra importada do
Norte da Europa (…). A despeito da sua superior qualidade, podemos atestar
que esta pintura se filia numa oficina renascentista regional, oficina essa activa
na antiga vila de Viana da Foz do Lima (hoje cidade de Viana do Castelo)
durante o final do reinado de D. Manuel I e todo o reinado de D. João III,
reveladora de um nível inventivo que poderemos classificar como de muito forte
expressão clástica, e que se mantinha, até hoje, totalmente ignorada.”308.
308
Idem, p. 34.
309
Idem, p. 110.
310
SERRÃO, Vítor. André de Padilha e a pintura quinhentista entre o Minho e a Galiza, Lisboa, 1998, p.
114.
138
Esta tábua alude-nos a uma composição que indicia ainda o gosto pelo gótico-
flamenguizante, e que inspira a uma referência à xilogravura do Compromisso da Santa
Casa da Misericórdia de Lisboa (fig. 66), de 1516, de Hermão de Campos, definida de
uma forma menos rígida e convencionalizada em comparação ao representado na
estampa, nomeadamente pelo rasgar da composição com a introdução de paisagem. A
composição pictórica é repartida em dois, religiosos à esquerda, e aristocratas e
burgueses à direita, sob o manto azul da Virgem Maria, distribuindo-se a sociedade do
tempo, numa renovação da fé e numa atemporalidade dos poderes terrenos, todavia as
potencialidades da obra encontram-se, na medida em que, a construção do espaço,
sobretudo os fundos de paisagem e de arquitetura que ladeiam o grupo de figuras, numa
suavização específica no campo da perspetiva “(…) a qualidade plástica desta pintura é
indiscutível e obriga-nos a imaginar as estradas aventureiras de um mestre regional
que se formou certamente em destacado convívio com os meios de pintura hispano-
flamenga do dealbar do Renascimento, num percurso à margem dos círculos realengos
lisboetas da «escola de Jorge Afonso», e aberto, por aquela via, a penetração de
modelos e receitas neerlandesas renascentistas.”311.
311
SERRÃO, Vítor. André de Padilha e a pintura quinhentista entre o Minho e a Galiza, Lisboa, 1998, p.
127.
312
“Grão Vasco é um dos pintores portugueses mais interessantes e o que mais foi celebrado ao longo
dos séculos. (…) era uma espécie de pintor-herói, a cujo nome se associavam todas as pinturas antigas,
139
era associado a todas as pinturas antigas que eram autenticadas com alguma
particularidade313. Este pintor viveu e trabalhou no seio de região geográfica provincial,
em Viseu:
“Um outro elemento da fantasiada história (…) diz respeito a sua formação,
concretamente a uma viagem que teria efectuado a Itália, a expensas de um
bispo ou, numa variante julgo mais tardia, de um padrinho rico seu homónimo.
É também Pietro Guarienti (…) que dá ao tema aparente “credibilidade
científica”, ao afirmar que “parece pela sua particular maneira que havia
estudado na escola de Perugino, havendo desenhado com primor sobre o estylo
daquele século e expressado com atitude e evidencia a commoção do espírito”.
Mas é também o já citado cónego José de Oliveira Berardo, autor do exaustivo
levantamento das informações orais e da primeira pesquisa de arquivo, que
tenta demonstrar a significativa densidade histórica da informação, quando
afirma que ouvira “contar a um velho que existia já em 1730, que, pela
protecção de bispo de Vizeu, Grão Vasco tinha ido estudar a Itália.”314.
de norte a sul do país, é que se reconhecia alguma qualidade [século XIV]. (…) por ter sido o
protagonista de um período brilhante da pintura numa região geográfica que não tinha neste campo
qualquer expressão, e que não teve depois contributos com mérito igualável ao seu ou mesmo ao dos seus
colaboradores e imitadores”: RODRIGUES, Dalila. Grão Vasco, Lisboa, 2007, p. 7.
313
“Além do famoso Vasco, cujo apelido se havia perdido com o uso recorrente do epíteto “Grão”, e de
outros nomes que se mantêm ainda enigmáticos na historiografia actual (sem obra atribuída e sem dados
biográficos suficientemente elucidativos), emergem à luz da História os maiores protagonistas daquele
período, nomeadamente Jorge Afonso, Frei Carlos, Cristóvão de Figueiredo, Gregório Lopes e Garcia
Fernandes (…)”: RODRIGUES, Dalila. Modos de expressão na pintura portuguesa: o processo criativo
de Vasco Fernandes (1500-1542), Coimbra, 2000, p. 79.
314
RODRIGUES, Dalila. Grão Vasco, Lisboa, 2007, pp. 18-20.
315
Idem, p. 20.
140
influenciou o pintor e o gosto da sua clientela, sobretudo a elite social e a Igreja 316. A
obra do Viseense testemunhava, na sua globalidade, o reflexo das novas realidades
vivenciadas para aquele tempo, balanceando as influências oriundas da Flandres e Itália,
por via humanista, fatores que permitiram revelar a mudança de gosto ao nível nacional.
Paulo Pereira alude a cidade manuelina como uma modernidade praticável, não
abrangendo as cidades renascentistas e longe de ser indicada como “Cidade Ideal”
renascentista, no que diz respeito à arquitetura, todavia quando nos referimos à pintura,
os pintores tentam representar e até mesmo transformar todas as cidades numa nova
cidade romana “Muito embora o urbanismo tivesse surgido já com D. Manuel, no que
respeita à criação e redefinição de praças, a abertura de ruas, a racionalização diários
preexistentes ou às transformações de espaços arquitectónicos de acordo com as novas
concepções do poder, fazia-se ainda de forma incipiente, abrindo, não obstante,
caminho para uma escola de urbanismo português e, o que só irá acontecer num
segundo tempo. A representação de cidades nos fundos das pinturas renascentistas
portuguesas, funciona sobretudo como um marco referencial do espaço e do tempo, o
que não impede, que, nalguns casos, possam ser completamente indiferentes em relação
à cena principal, geralmente carácter religioso.”317. Esta situação é visualizada em
pintores como Vasco Fernandes ou Gregório Lopes, nas suas representações fundeiras
de arquiteturas que nos levam a idealizar uma cidade.
A obra, Cristo em casa de Marta e Maria (fig. 72), que pertencia à Capela de
Santa Maria do antigo Paço Episcopal do Fontelo, hoje, ao MNGV, reflete os ideais do
encomendante humanista e o programa artístico de D. Miguel da Silva318 (fig. 73), bispo
316
“um significativo volume de pinturas serviu de valor de troca nas transacções efectuadas pela
comunidade de negociantes portugueses estabelecidos na Flandres, com destino à Ilha da Madeira.
Paralelamente e à medida que os contingentes da importação aumentavam, aumentaria também o
fenómeno de adesão às novidades importadas por parte de artistas e artesãos, estimulados
(pressionados), a um tempo, pela generalização do gosto da clientela (…) quanto pela influência dos
artistas do Norte da Europa que se deslocaram para o Sul.”: SALGUEIRO, Joana. A pintura portuguesa
quinhentista de Vasco Fernandes: estudo técnico e conservativo do suporte, Lisboa, 2012, p. 30.
317
POLICARPO, Isabel Ponce de Leão. Gregório Lopes e a “ut pictura architectura”: os fundos
arquitectónicos na pintura do Renascimento português, Coimbra, 1996, p. 115.
318
“D. Miguel da Silva (c.1480-1556) fazia parte dos círculos intelectuais de Roma, para onde foi 151,
como primeiro embaixador de D. Manuel junto da corte papal de Leão X, tendo aí convivido com
primeiras figuras do humanismo, tais como Baldassare Castiglione - Que, inclusivamente, lhe dedicará o
141
de Viseu (1525-1540) “Voltando a Portugal, em 1525, cedo se vê, naturalmente,
deslocado num ambiente onde prevaleciam valores ainda cavaleirescos (ou seja,
manuelinos) e onde o sentido humanista e antiquizantes da cultura renascentista
ensaiava os seus primeiros passos. Foi D. João III quem, ao chamá-lo
propositadamente de volta a Portugal, o impediria de ascender então à dignidade
cardinalícia, sendo feito depois, porém, bispo de Viseu.”319, através da ideia da
supremacia do poder espiritual sobre o poder temporal “(…) a relação do pintor com o
bispo D. Miguel da Silva, o encomendante, precisamente, das pinturas monumentais
que se exibiam na sé no período dois séculos em que a história mítica do Grão Vasco -
em estreita relação com as pinturas, diga-se - se foi construindo. Proveniente da corte
papel romana por decisão régia, e nomeado bispo da diocese de Viseu em 1525, D.
Miguel da Silva teve uma acção decisiva não apenas no percurso artístico do Grão
Vasco, mas nas reformas que promoveu na cidade, devendo este traço fantasioso ser
visto como um valioso testemunho dizem que as tuas, relação entre artista e
cliente.”320, numa linguagem que se traduz através das expressões fllamenguização e
italianização.
livro fundamental para a cultura renascentista que é Il cortegiano (Veneza, 1528)”: PEREIRA, Paulo.
Arquitetura Portuguesa. História Essencial, Lisboa, 2022, p. 275.
319
Idem, p. 276.
320
RODRIGUES, Dalila. Grão Vasco, Lisboa, 2007, p. 20.
321
“o inquestionável gosto de D. Miguel pela Antiguidade, seja filológico seja arqueológico e artístico, a
sua obsessão pelas lápides comemorativas com caracteres clássicos”: RODRIGUES, Dalila. Modos de
expressão na pintura portuguesa. O processo criativo de Vasco Fernandes (1500-1542), Coimbra, 2000,
p. 260.
142
e daí a introdução dos modelos clássicos terem surgido na arquitetura do Renascimento
português devido à contribuição deste mestre pedreiro romano. Assim, como se viu,
facilitou o conhecimento e assimilação do saber construir ao romano face a este
contacto direto com influências oriundas de Itália.
322
RODRIGUES, Dalila. Grão Vasco, Lisboa, 2007, p. 25.
323
“uma das tábuas mais interessantes da Escola de Viseu, pela variedade e profusão de aspectos que
apresenta, e pelos problemas que sugere, afigura-se-me característica de Vasco no motivo central e nos
dois retratos masculinos do segundo plano; semelhante ao Presumível Gaspar Vaz no ponto de vista do
colorido; e ao pintor António Vaz no desenho de certos pormenores e, em especial, no desenho de
algumas roupas femininas”: RODRIGUES, Dalila. Modos de expressão na pintura portuguesa. O
processo criativo de Vasco Fernandes (1500-1542), Coimbra, 2000, p. 260.
324
“À formulação desta hipótese não é alheia a circunstância de se incluir o retrato de D. Miguel no
outro painel destinado ao mesmo espaço, o Cristo em Casa de Marta e Maria.”: PEREIRA, Fernando
António Baptista. O legado do Renascimento, Lisboa, 2000, p. 258.
143
autorretrato de D. Miguel da Silva, embaixador junto do Papa Leão X, em 1514,
tornando-se o segundo representante de Portugal, junto da Cúria romana, no Concílio de
Latrão, tendo permanecido em Roma, durante três pontificados: o de Leão X (1513-
1521), o de Adriano VI (1522-1523) e o de Clemente VII (1523-1534), sendo que fora,
em 1525, chamado a retornar a Portugal para receber a nomeação do episcopado de
Viseu “Mas será importante não esquecer que o encomendador, o bispo D. Miguel da
Silva era o “perfetto corttegiano” com profunda formação nos meios humanistas
italianos.”325. Com esta representação o pintor tem como objetivo enaltecer e dar a
conhecer a figura do encomendante e como ele procurará, através do campo das artes
portuguesas, reproduzir o ambiente romano.
325
BATORÉO, Manuel. A iconografia dos Santos Mártires de Lisboa em quatro pinturas do século XVI:
linguagem e significados, Lisboa, 2010, p. 261.
326
“Mas ao contrário do que sucede com a Última Ceia, cremos ser mínima a participação de Vasco
Fernandes nesta pintura. Apesar dos múltiplos repintes que lhe desvirtuam valores, e das inegáveis
semelhanças com o seu repertório figurativo, é uma pintura francamente distante da sua habilidade
compositiva e da sua personalizada e elaborada escrita pictural. De resto, será importante notar que à
concepção da Última Ceia, em determinados pormenores iconográficos, parecem não ter sido alheias
idênticas fontes inspirativas. É de todo provável que Vasco Fernandes estivesse já a trabalhar em
Coimbra no momento em que D. Miguel vê concluídas as obras da sua magnífica quinta de Fontelo e
encomenda as duas pinturas em questão. Mas é também provável que tenham sido feitas em simultâneo,
na oficina, e que o mestre tivesse tomado maior encargo na concepção do tríptico.”: PEREIRA,
Fernando António Baptista. O legado do Renascimento, Lisboa, 2000, pp. 262-263.
144
Já a forma de concha, semelhante à da Igreja do Grilo, do Porto (fig. 79 e 80), é
um dos reportórios do renascimento de base tratadística e não manuelina, numa abertura
que desemboca, ao que parece ser, uma capela iluminada por dois vitrais (fig. 81):
327
REIS-SANTOS, Luís. Vasco Fernandes e os Pintores de Viseu do Século XVI, Lisboa, 1946, pp. 403-
404.
145
não é observado no campo visual que o pintor pretendeu executar, com uma composição
fundeira semelhante à da gravura “The Return of the Prodical Son”, de Lucas van
Leyden (figs. 88 e 89), sem esquecer as figuras que nos dão a noção da escala dos
edifícios.
Este painel define com uma maior objetividade o relacionamento entre o cliente,
o pintor e as fontes gráficas foram ofertadas, a ver, pelo próprio mecenas. Nesta obra
pictórica, a arquitetura remonta-nos a um monumento ao romano, numa tentativa de
renovação artística da cidade de Viseu por parte do bispo D. Miguel da Silva, numa
protagonização que se espelha nas arquiteturas nacionais, maioritariamente em obras
religiosas, onde mais imperou a arquitetura clássica experimental de Francisco de
Cremona. Importa ressalvar que a corte D. João III viveu nas áreas de Lisboa e Évora330.
328
“Em Portugal (…), transparece uma certa “artesanalização” da perspectiva científica na análise
espacial das pinturas, em que prevalecem fórmulas de certo modo empíricas (baseadas em princípios
geométricos extremamente elementares como o paralelismo, a simetria e a proporcionalidade), numa
paradoxal simbiose com a perspectiva racional italiana.”: POLICARPO, Isabel Ponce de Leão.
Gregório Lopes e a “ut pictura architectura”: os fundos arquitectónicos na pintura do Renascimento
português, Coimbra, 1996, p. 113.
329
“É também essa a via para as paisagens, de bosques e de escarpas, rasgando se através de
arquitecturas regulares, no recorte das janelas, ou nos vãos de colunatas e arcadas que abrem para o
céu azul-ferrete esvaindo-se até ao horizonte (…)”: RODRIGUES, Dalila. Grão Vasco e a pintura
europeia do Renascimento, Lisboa, 1992, p. 13.
330
“Évora, não sendo a segunda cidade do reino, que era o Porto, pesava fortemente pela frequente
presença da corte e da multidão clientelar que a acompanhava”: PARDAL, Rute. As elites de Évora ao
146
A cidade de Évora adquiriu relevância ao longo dos séculos XV e XVI tornando-se a
capital do Humanismo, sendo que já neste período, Nicolau Chanterene é homem de
corte e Miguel de Arruda, mestre arquiteto, dá os primeiros passos.
Segundo a opinião de Luís-Reis Santos e Reynaldo dos Santos esta é “uma obra
de colaboração, certamente com Gaspar Vaz, em cujas paisagens encantadoras paira
uma sugestão cosmopolita, quase giorgionesca, estranha ao espírito e à sensibilidade
de Grão Vasco”331, todavia Dagoberto Markl aponta-a como uma totalmente atribuível
a Vasco Fernandes. Apesar desta hipótese prevalecer na historiografia portuguesa, é a
associação do encomendante, D. Miguel da Silva, e a utilização das gravuras, de
Albrecht Dürer, que marcam um parecer, face a uma chamada de atenção de uma
linguagem marcadamente renascentista pelo seu interior doméstico paralelamente a um
exterior tipicamente flamengo.
tempo da dominação filipina: estratégias de controlo do pode real (1580-1640). Biblioteca – Estudos &
Colóquios, nº 14, Publicações do Cidehus, Edições Colibri, Évora, 2007.
331
RODRIGUES, Dalila. Modos de expressão na pintura portuguesa. O processo criativo de Vasco
Fernandes (1500-1542), Coimbra, 2000, p. 403.
332
SERRÃO, Vítor. O Maneirismo e o estatuto social dos pintores portugueses, Lisboa, 1983, pp. 64-65.
147
passando o seu tambor interior a funcionar como capela-mor. Durante a centúria de
quinhentos, a Charola foi enriquecida por obras de pintura retabular e mural, estuque,
talha dourada e escultura em madeira.
O autor Joaquim Oliveira Caetano fundamenta que a obra pintada foi para um
local onde a perspetiva da pintura não se subordinava:
333
“Todo o convento de Cristo corresponde a um programa iconográfico específico, onde, no dizer de
Paulo Pereira, está patente a avaliação formal e o entendimento estético do Manuelino, os seus
exotismos estruturais e decorativos, a simbologia do Poder Real, constituindo-se como objecto de uma
iconologia aplicada.”: POLICARPO, Isabel Ponce de Leão. Gregório Lopes e a “ut pictura
architectura”: os fundos arquitectónicos na pintura do Renascimento português, Coimbra, 1996, p. 117.
334
BATORÉO, Manuel. Os “Primitivos Portugueses” e a Gravura do Norte da Europa – A Utilização
Instrumental de Fontes Gráficas, Lisboa, 2011, p. 250-251.
148
terminados pelos sentidos de percurso da Charola, posicionamentos estes
acompanhados pelo formato da pedra sobre os pés de S. Sebastião.”335.
Gregório Lopes reforça a ideia de uma narrativa passada na cidade Roma (fig.
96), palco do suplício do guarda pretoriano, e da representação de um dos mais
significativos monumentos da Antiguidade Clássica, o Coliseu de Roma (fig. 97), no
fundo compositivo, muito embora, o pintor se afaste, decididamente dos modelos do
Renascimento clássico italiano, para uma abertura aos novos valores do Maneirismo,
testemunhando um valor de avanço a nível estrutural e pictural. A composição é
particularmente interessante porque no centro reflete S. Sebastião, ladeado por dois
archeiros que manejam as suas armas em direção ao corpo do santo, amarrado a um
poste e crivado de setas num espaço aberto com uma cidade por fundo, e por outro, o
processo de viragem “anti-renascentista” de transição maneirista que se começa a
manifestar a partir de 1536, perdendo progressivamente os modelos manuelinos de
grande limpidez cromática, de perfeição técnica a nível de aplicabilidade dos
pigmentos, do desaparecimento da habitual clareza clássica da narrativa e de
interpretação rigorosa e deleitosa dos pormenores do dia-a-dia e da própria relação de
proporções na construção dos espaços de forma ambígua.
149
iconografia, ou seja, a imagem tem de cumprir com a sua função, funciona com uma
linguagem de comunicação.
337
“quer pela introdução de figuras num plano intermédio entre a cena em primeiro plano e as
arquitecturas fundeiras, onde a perspectiva da praça, as casas de telhados esconços e, o grande edifício
redondo quase inclinado (…)”: POLICARPO, Isabel Ponce de Leão. Gregório Lopes e a “ut pictura
architectura”: os fundos arquitectónicos na pintura do Renascimento português, Coimbra, 1996, p. 42.
338
BATORÉO, Manuel. Os “Primitivos Portugueses” e a Gravura do Norte da Europa – A Utilização
Instrumental de Fontes Gráficas, Lisboa, 2011, p. 249.
150
Primeiro Maneirismo de Antuérpia, com base na ornamentação dos grotescos e na
importância desempenhada pelos fundos arquitetónicos ou paisagísticos:
“Ainda que a directa influência italiana tenha sido em todo este processo
essencial, não deveremos também desapreciar outras vias de «penetração
italianizante» ao tempo verificadas. A tradicional influência flamenga continuou
a verificar-se na segunda metade do século XVI, quer através de mestres
maneiristas que entre nós trabalharam (…)”339.
339
SERRÃO, Vítor. O Maneirismo e o estatuto social dos pintores portugueses, Lisboa, 1983, p. 42.
340
Idem, pp. 37-38.
151
se os objetos à sua versão mais simplificada, criando assim uma imagem o mais real
possível da realidade.
341
POLICARPO, Isabel Ponce de Leão. Gregório Lopes e a “ut pictura architectura”: os fundos
arquitectónicos na pintura do Renascimento português, Coimbra, 1996, p. 118.
342
Idem, Ibidem.
152
2.2 Os diversos modos de “ver e fazer obra de arquitectura”: “ao romano”, “ut
pintura architectura”, “microarquiteturas” e fundo de arquitetura figura-
da, imaginada e decorativa
343
“(…) designava-se na época por moderno e por ao romano aquilo que nós hoje chamamos de
“gótico” e de “renascentista”, numa inversão dos respectivos sentidos históricos (…) Esse aparente
paradoxo põe, afinal, a nu o choque de concepções da História e de modelos de cultura que separava o
mundo medieval do que dele nascia e reclamava a diferença (…)”: MOREIRA, Rafael. A arquitectura do
Renascimento no sul de Portugal. A Encomenda Régia entre o Moderno e o Romano, Lisboa, 1991, p. 5.
153
chegaria a Portugal pelos mesmos canais em que se escoaria também o
“pacote” mais global do Renascimento artístico.”344.
344
CRAVEIRO, Maria de Lurdes. A arquitetura “ao romano”. Arte Portuguesa da Pré-História ao
Século XX, Vila Nova de Gaia, 2009, p. 13.
345
MOREIRA, Rafael; RODRIGUES, Ana Duarte. Tratados de Arte em Portugal, Lisboa, 2011, p. 58.
346
“Quando, num acto contratual, se estabelece a obrigação de fazer “obra romana”, está-se em
presença de uma cultura arquitectónica que forja alternativas face à “obra moderna”, ou seja, a
tentativa de abrir caminho à imposição de comportamentos de clássica definição, ultrapassando a
“maneira gótica” que rege ainda a arquitectura portuguesa na transição do século.”: CRAVEIRO,
Maria de Lurdes. A arquitetura “ao romano”. Arte Portuguesa da Pré-História ao Século XX, Vila Nova
de Gaia, 2009, p. 9.
154
“A oposição romano vs. moderno, isto é a fase inicial de um Renascimento
perfeitamente entendido no seu conflito de vida ou de morte contra um
Manuelino moribundo e um tardo-gótico já debilitado - o eclodir de uma nova
visão da vídeo do mundo mais humana, racionalista, moderna e materializável à
imitação dos Antigos - domina toda esta década de 30 do século XVI,
avançando quase de ano para ano com novas fundações - palácios rurais,
igrejas paroquiais, conventos, obras públicas - de senhores da alta aristocracia
não comprometidos com o regime de D. Manuel e, muito ao contrário, fiéis ao
filho D, João III (1521-57) na sua clara política de abertura ao Humanismo.
Ambos os “modos” (estilos) rivalizam, convivem, justapõem-se, por vezes numa
mesma obra, mas sem nunca se fundirem, pois que um significava a morte do
outro, conduzindo por fim a vitória em toda a linha do “modo Romano” ao
barrir irreversivelmente qualquer lembrança do Manuelino ou traço de
goticismo e ser adoptado pela encomenda régia (…)”347.
347
MOREIRA, Rafael. A arquitectura do Renascimento no sul de Portugal. A Encomenda Régia entre o
Moderno e o Romano, Lisboa, 1991, p. 58.
348
“Há aí grande diferença entre o antigo, que é muitos anos antes que Nosso Senhor Jesus Cristo
encarnasse, na monarquia de Grécia e também na dos Romanos; e entre o antigo a que eu chamo velho,
que são as coisas que se faziam no tempo velho dos reis de Castela e de Portugal, jazendo a boa pintura
ainda na cova. Porque aquele primeiro antigo é o excelente e o elegante; e este velho é o péssimo e sem
arte (PA I, 11). (…) «porque se celebra a Pintura Antigua e que cousa é», e que diz o seguinte: porque
não cuide alguem que são algumas velhices desacostumadas por que ao menos tão nova coisa é ela em
Espanha e Portugal que estou em afirmar que nunca ainda foi vista nele (PA I, 12).”: RODRIGUES,
Dalila. Modos de expressão na pintura portuguesa. O processo criativo de Vasco Fernandes (1500-
1542), Coimbra, 2000, pp. 34-35.
155
emergem valores de remissão, onde o moderno só será denominado bom se envolver o
paradigma do antigo.
349
CRAVEIRO, Maria de Lurdes. A arquitetura “ao romano”. Arte Portuguesa da Pré-História ao
Século XX, Vila Nova de Gaia, 2009, p. 7.
156
Antiguidade Clássica350. O humanista Francisco de Holanda defende que a cidade de
Roma é o local onde se encontram as mais dignas obras de pintura e cultura, como que
evocando as maravilhas do universo centrado nas ruínas de um passado grandioso,
sendo um ponto de concentração e de acumulação de obras de arte, no geral, todavia,
manifesta que a arte romana não é das mais belas manifestações, no que diz respeito à
pintura da antiguidade. Quanto a isto, Holanda designa pintura antiga como toda a arte
produzida pelo desenho, conferindo esta o título de pintura oriunda de Itália.
350
“Esta pintura a que chamo antigua, se acha somente nos edifícios e statuas e pilos das obras da
grande Roma, ou onde quer que houver outras taes como aquellas, também ali chamarei Roma (…)”:
DESTERRO, Maria. Francisco de Campos (c.1515-1580) e a Bella Maniera: entre a Flandres, Espanha
e Portugal, Tomar, 2008, p. 257.
351
PIMENTEL, António Filipe. A arquitectura imaginária. Pintura, escultura, artes decorativas, Lisboa,
2012, p. 9.
157
Estamos, pois, perante casos de estudo selecionados e a outras referências
artísticas, às quais observamos a aplicabilidade da microarquitetura, que assumiu desde
logo e ao longo da centúria, diferentes feições, sendo notório nas obras Menino Jesus
entre os Doutores (fig. 31), Chegada das Relíquias de Santa Auta (fig. 34) e Cristo em
casa de Marta e Maria (fig. 72), todavia, este modo de caracterização cenógrafa
caracteriza-se através de significativas presenças arquitetónicas miniaturizadas e
decorativas, entre elas:
158
entre o objeto e o estilo, tendo como principal fonte a natureza ou a
índole abstrata e geométrica (brasões, medalhões, tondi, vieiras, escudos,
cartelas, entre outros)352. Exemplos: Chegada das Relíquias de Santa
Auta (c. 1522), de Gregório Lopes (tondi) (fig. 117) e São Pedro (c.
1529) de Vasco Fernandes (escudo e concha) (figs. 118 e 119).
As microarquiteturas denotam uma vontade inquestionável que o pintor detinha
em patentear, nas suas composições pictóricas, construções espaciais que combinavam
com o novo vocabulário arquitetónico, italiano e flamengo, que surgia na era de
Quinhentos, mas também é verdade que, por vezes estes artistas geraram estruturas e
espaços que se ligaram aos seus modelos, não só formalmente, mas também no seu
significado narrativo:
“Esta é uma das razões pela qual podemos distinguir entre uma
«microarquitetura», em que a miniaturização do construído obedece a uma
coerência arquitetónica, e a utilização decorativa, mais morfológica que
sintática, de elementos da decoração arquitetónica, utilizados contudo de uma
forma subordinada ao objeto em que se apresentam.”353.
352
“O ornamento é entendido como elemento isolado e potencialmente destacável da totalidade mas que,
de facto, não adquire leitura fora do contexto a que pertence. O mesmo é dizer que, idealmente, as
unidades ornamentais podem ser submetidas a uma interpretação diferenciada daquela que adquirem
quando integradas num conjunto de uma dinâmica articulada com outros elementos decorativos. Por seu
turno, a decoração projecta-se em ritmos de continuidade que abordam o ornamento numa expressão de
coerência formal e interpretativa.”: CRAVEIRO, Maria de Lurdes. A arquitetura “ao romano”. Arte
Portuguesa da Pré-História ao Século XX, Vila Nova de Gaia, 2009, p. 9.
353
PIMENTEL, António Filipe. A arquitectura imaginária. Pintura, escultura, artes decorativas, Lisboa,
2012, p. 45.
159
mais avançado desenho arquitetónico, a exploração espacial e uma forma de escultura
arquitetural abstrata»”354. Esta linguagem que impulsionou o poder criativo do artista
português do século XVI incorporou uma inevitável comunicação entre os meios,
pintura, escultura e arquitetura, e um ensaio de formas da arte de construir e um
complexificar das formas arquitetónicas associadas ao designado manuelino e a novos
gostos exigidos pelos novos tempos, de inspiração clássica e flamenga:
“procuram, por um lado, representar o real com maior ou menor fidelidade, por
outro, partir para a imaginação alegórica dos modelos arquitectónicos (quase
sempre ao romano) e, por último, ensaiar soluções virtuais e fantásticas e, por
último, ensaiar soluções virtuais e fantásticas e, por estes motivos, irrealizáveis.
Em alguns casos, as arquitecturas por eles utilizadas nos retábulos não são
mais do que a reprodução de modelos ou exemplos da realidade artística que
tiveram ensejo de apreender pelos vários territórios por onde passaram.”357.
354
Idem, p. 64.
355
Idem, p. 113.
356
As arquiteturas fundeiras aqui representadas evocam a arquitetura do tempo de D. Manuel I, e ao estilo
do primeiro Renascimento francês. In FLOR, Pedro. Imagens da Cidade – os fundos de arquitectura na
escultura retabular em pedra do Renascimento em Portugal (1500-1550), Lisboa, 2003, p. 150.
357
Idem, ibidem.
160
uma adequação mental face à presença do Humanismo português e da influência externa
que se fazia sentir no país.
161
mesmo que, no plano das ideias, estes possam ter desempenhado, algures no tempo, um
papel catalisador.”358.
358
Idem, p. 8.
359
Idem, p. 11.
360
“Os quadros saídos da oficina do flamengo Frei Carlos (…) revelam uma crescente atracção pelos
fundos arquitectónicos de carácter renascentista, com capitéis e molduras à antiga, medalhões e colunas
balaustres em posição de relevo (com destaque para a “Aparição de Cristo à Virgem”, de 1529, (…) com
certas sugestões espaciais que a pintura manuelina desconhecia.”: MOREIRA, Rafael. A arquitectura do
Renascimento no sul de Portugal. A Encomenda Régia entre o Moderno e o Romano, Lisboa, 1991, p.
224.
162
Renascimento, nomeadamente pelas colunas candelabro de mármore vermelho (fig.
123), com uma estrutura semelhante à representação realizada no tratado Medidas del
Romano de Diego de Sagredo, de 1526 (fig. 124) e à gravura de Bernandim Ribeiro
(1482-1552) (fig. 125), e ao colunelo idêntico da obra ao patenteado no retábulo da
Pena da capela-mor do mosteiro de São Marcos, de Chanterene (figs. 126 e 127). A
coluna é encimada por um putti que segura uma cartela com a data da feitura da obra
(fig. 128). A cena principal é separada da secundária por uma arcaria (fig. 129), de
influência renascentista, onde surgem os justos saídos do limbo pela intervenção de
Cristo, destacando-se em primeiro plano as figuras do Antigo Testamento: Adão e Eva
(fig. 130). Já a arcaria é sustentada por uma coluna central, e encimada por um tondi
com a referência ao Antigo Testamento, o sacrifício de Abraão e Isaque (figs. 131 e
132). O pintor faz com que a obra sobressaia pelo seu carater inventivo na construção
diferenciadora dos cinco capiteis exibidos (fig. 133), sendo de ressalvar o capitel
tipicamente gótico (fig. 134), com elementos discoides, patenteando ao que parece ser
um conjunto de contas e rosário em todo o perímetro, da janela, com portadas (fig. 135),
que se abrem para o exterior, com estruturas urbanas góticas (fig. 136), numa
transformação ou tentativa de criar um capitel ao nível do Renascimento.
361
“A arte do Mestre da Lourinhã (…) assume-se com nitidez neste clima “intelectualizado” e
humanístico do Portugal manuelino, em que os valores do Renascimento desabrocham e colidem com a
forte tradição goticista de raiz nórdica”: AMARAL, Maria da Conceição; DIAS, Pedro. No tempo das
feitorias: a arte portuguesa na época dos descobrimentos, vol. 2, MNAA, Lisboa, 1992, p. 85.
362
CARVALHO, José Alberto Seabra. Dois mestres luso-flamengos: Mestre da Lourinhã e Frei Carlos.
In Primitivos Portugueses 1450 – 1550 - O século de Nuno Gonçalves, Lisboa, 2011, p. 156.
363
“Os tectos decorativos em madeira são uma marca histórica e arquitectónica da herança patrimonial
portuguesa. As suas primeiras manifestações em Portugal datam do século XV onde eram
maioritariamente utilizados em edifícios religiosos (…)”: MOREIRA, Maria Irene. Tectos decorativos
163
semelhante ao modelo apresentado na capela do Noviciado do Convento de Cristo, em
Tomar (figs. 141 e 142), e no livro impresso (fig. 143), sendo que ao centro, detemos o
altar da igreja iluminado por duas estreitas janelas e coberto por uma abóbada de
cruzaria, com seis arestas, e à direita, apenas visualizamos o óculo da nave.
164
consoante a sua dimensão, na composição pictórica, enquanto interesse formal por parte
dos pintores da era do Renascimento, tendo como maior exemplo Apresentação de
Jesus no Templo, de Garcia Fernandes (fig. 152), obra que constitui uma das principais
revelações de um desenrolar de cena num fundo monumental, numa mistura entre
Gótico e Renascimento, com arquiteturas de grande escala, em modo de templo aberto
em quatro faces, o que contraria o representado até então. A obra exibe, ao centro, um
belíssimo pórtico (fig. 153) que nos remete, com evidente ligação e semelhança, ao
gravado Hypnerotomachia Poliphili (fig. 154), de Francesco Colonna, e a um dos
desenhos do tratado Medidas del Romano de Diego de Sagredo (fig. 155), e com
colunas candelabro (fig. 156), estruturalmente similares às do retábulo da capela-mor da
Igreja do mosteiro de S. Marcos (1522-23), atribuído a Nicolau Chanterene (fig. 157),
com capitéis da ordem coríntia (fig. 158), com acantos e vegetalismos do gótico, que
nos remonta aos capiteis de Diego de Sagredo (fig. 159). Importa ressalvar ainda a
correlação com a estrutura do Arco de Constantino, em Roma, devido às suas
reentrâncias e pilastras avançadas (figs. 160 e 161), tal como exibe portal da obra em
questão. Todavia a composição fundeira abre-se para o exterior através de janelões que
nos permitem visualizar uma paisagem verdejante, sendo que a restante cena exibe
arcos apontados, decorados com motivos vários e colunas com capitéis e escultura de
vulto.
366
PEREIRA, Fernando António Baptista. O legado do Renascimento, Lisboa, 2000, p. 31.
165
maioritariamente interpretado como um sintoma cultural e como objetos ambicionados,
indispensáveis e concordantes, que resultam numa projecção de uma imagem que tende
a construir uma arquitetura-arquitetura, com base num classicismo latente nas oficinas
ativas do século XVI, em Portugal, todavia esta referência acompanha uma evolução
estilística e de gosto.
367
RODRIGUES, Dalila. Modos de expressão na pintura portuguesa: o processo criativo de Vasco
Fernandes (1500-1542), Coimbra, 2000, p. 137.
166
janelas abertas para o exterior, com dois dos episódios evangélicos da vida do Apóstolo,
à esquerda, O Chamamento do Pescador, e à direita, Quo Vadis?, e o trono pontifical,
que se dispõe ao centro, de inspiração italiana e de extrema riqueza decorativa, com
possíveis referências às gravuras de dois Livros de Horas: Ces presentes heures a
lusaige de Rôme so[n]t au lo[n]g sa[n]s req[ue]rir.... (fig. 163) e Ces presentes heures
a lusage de Chalons toutes au long sa[n]s req[ue]rir: auec les figures et signes de
lapocalipse: les miracles nostre dame les accide[n]s de lho[m]me: et plusieurs austres
hystoires.... (fig. 164), cujo espaço central superior é ocupado pela concha, que nos
remete à igreja dos Grilos, do Porto (figs. 165 e 166), seguida de uma moldura de
enrolamentos, enquanto a superfície restante é adornada por diversos elementos
decorativos, nomeadamente por duas coroas suportadas por escudos papais, que
definem os remates laterais do trono, já que nos braços do mesmo encontramos dois
putti, animais, semelhantes aos representados no Ces presentes heures a lusaige de
Rôme so[n]t au lo[n]g sa[n]s req[ue]rir.... (figs. 167 e 168), e escudos. Esta loggia que
se abre para ambos os planos fundeiros, revela uma arquitetura imaginária de duas
cidades de influência flamenguizante (figs. 169 e 170).
368
HERNÁNDEZ, Luis. Ut architectura poesis: relaciones entre arquitectura y literatura en la Nueva
España durante el siglo XVII, México, 2013, p. 153.
167
universo simples e familiar a olhar dos seus devotos destinatários. (…) o objetivo
parece ser o de activar o diálogo com o espectador, criando-lhe a ilusão de que o
espaço da representação é, ou poderá ser, o prolongamento do seu próprio espaço.”369.
No que diz respeito aos motivos de ordem perspética, estes derivam das
múltiplas linhas de perspetiva que aludem a uma noção de alongamento compositivo em
profundidade de toda a composição pictórica, situação que pode estar associada à
inclinação do templo. A entrada para o anfiteatro é alcançada por uma escadaria, tendo
na sua passagem para o interior, um arco de volta perfeita encimado por uma gramática
ornamental que remonta à arte moçárabe. Não deve ser incluída, neste caso, a
denominação de arquiteturas idealizadas, tendo em conta o seu sentido iconográfico.
369
RODRIGUES, Dalila. Grão Vasco, Lisboa, 2007, p. 36.
168
women, youths, young boys, fowls, small dogs, birds, horses, sheep, buildings,
landscape and all similar things. (Tratado De Pictura, Leon Battista Alberti, 1973)”370.
370
SMITH, Paul; WILDE, Carolyn. A Companion to Art Theory, UK, 2002, p. 57.
169
Renascimento europeu (fig. 176), a destacar no evidente italianismo da obra S.
Sebastião (1530-1535) (fig. 177), de Vasco Fernandes. Aqui, à esquerda, encontramos
uma cidade “esfumada”, mais elevada (fig. 178), comparativamente com a restante,
todavia, à direita, destaca-se a possível “entrada” da cidade (fig. 179), de influência
flamenga, idêntica à gravura de Lucas van Leyden (fig. 180), podendo afirmar que
poderia ter sido um possível referial na produção da obra por parte do pintor português,
já para não mencionar o pormenor decorativo das janelas mudéjares que ornamentam o
varandim (fig. 181), aproximado do exemplo de arquitura da Catedral de Santa María de
Medievilla, em Teruel (fig. 182). Já as personagens indicam o quanto são indiferentes à
arquitetura, de diversas tipologias edificatórias.
Em alguns casos, tal como acontece na Anunciação (c. 1539-1541) (fig. 183), de
Gregório Lopes371, a própria cena entra na organização interna do edifício e conquista
os elementos decorativos, procurando tratar os motivos formais e recriar uma ambiência
a partir do vocabulário e da estrutura arquitetónica criada e impulsionada na intenção de
relacionar o primeiro plano das figuras com os motivos de microarquitetura. Esta
dinâmica permite enquadrar o desenrolar da ação e o desviar da atenção do observador
da envolvência da cena pictórica, ainda que a noção de profundidade sublinha um
alinhamento de relevância. Já na obra, Fuga para o Egipto (c. 1523) (fig. 184), o pintor
Gregório Lopes aproveita o plano fundeiro para o adornar a paisagem nórdica de colinas
e declives, numa arquitetura edificada à beira do precipício (fig. 185), e onde se
destacam os torreões, o aqueduto, possivelmente o da Água da Prata, em Évora (figs.
186 e 187), e outros edifícios, elementos esses que possibilitam decifrar a história
compositiva da ação principal, à maneira flamenga, bem como a função decorativa que
a arquitetura aqui transmite através das formas irreais a que os edifícios foram sujeitos
para a cena.
371
“Gregório Lopes é, sem dúvida, um dos pintores mais representativos, seja pela sua invulgar
capacidade de representar a perspectiva, seja pela liberdade, ousadia e soltura que demonstra no
tratamento da composição das paisagens e fundos arquitectónicos. A singularidade da reprodução de
conjuntos de arquitectura, ponto e serem tanto as “arquitecturas” de carácter decorativo com realce
para a ornamentação, como os edifícios aqui experimentalmente construídos, é realçada pelo pitoresco
de arquitecturas regionais, de cidades como Lisboa ou Tomar, em pormenores de execução minuciosa
que toma forma na obra deste pintor régio”: POLICARPO, Isabel Ponce de Leão. Gregório Lopes e a
“ut pictura architectura”: os fundos arquitectónicos na pintura do Renascimento português, Coimbra,
1996, p. 3.
170
No que concerne ao desenho, os pintores portugueses destacam-se pela liberdade
compositiva, pelo debuxo mais livre e pela apresentação das arquiteturas fundeiras que
se agarram à correta utilização da perspetiva, tendo como exemplo a obra Santo António
pregando aos peixes, de Garcia Fernandes (fig. 188), de sublime utilização perspética,
todavia de menor liberdade pictórica, embora os planos de fundo de cariz arquitetónica
tivessem, possivelmente, sido herdados da tratadística, notório pelo tratamento de
origem gótica, tanto ao nível da forma como do conteúdo compositivo, presente na
decoração das janelas góticas do torreão. Aqui está patente uma mistura entre
arquitetura gótica (arcos) (fig. 189), renascentista (portal) (fig. 190) e do Norte da
Europa (torres) (fig. 191).
O portal renascentista ostenta três fases de colunas, sendo que a principal leva de
colunas é sustentada por plintos ao jeito de Diego de Sagredo (figs. 192 e 193), e é
decorado na parte central por uma representação de um carro alegórico clássico. A
estrutura apresenta um entablamento e um frontal triangular decorado com esculturas
em baixo-relevo. Na estrutura arquitetónica anexa, a fachada central serve de exemplo
semelhante à Basilica di Sant’Andrea, em Mântua (figs. 194 e 195), já a loggia
patenteia colunas balaustradas ao jeito de Diego de Sagredo, e a grilhagem exibe
elementos de grotescos. O aspeto mais interessante e relevante da obra são as duas
janelas com ajimez mudéjar (fig. 196), aproximado ao exemplo apresentado (fig. 197),
patente no edifício circular ao fundo da composição (fig. 198), semelhante às estruturas
da Iglesia de Santiago del Arrabal, em Toledo (fig. 199) e do Mosteiro de Castro de
Avelãs, em Castro de Avelãs (fig. 200). No que concerne ao edifício, do lado direito da
composição, este é decorado com arcos góticos cegos e rematado, no piso superior, por
uma cúpula, estrutura essa aproximada do exemplo arquitetónico ortogonal da Catedral
de Toledo, em Toledo (figs. 201 e 202).
Quanto à obra Visitação (c. 1550) (fig. 203), do Mestre de Arruda dos Vinhos,
insere-se nos fundos de arquitetura figurada, como contextualização do real, que recorre
ao estudo da tratadística para uma melhor representação de uma arquitetura dita
experimental. Aqui é notável a tentativa de inserir as leis da perspetiva, todavia com
uma certa dificuldade em empregá-las, contudo adapta-as a uma arquitetura de tipologia
circular de um quase tempietto, com semelhanças ao representado no plano fundeiro da
tábua Santo António pregando aos Peixes (figs. 204 e 205). Do mesmo políptico,
detemos uma outra obra Encontro de Sant’Ana e S. Joaquim (c. 1550) (fig. 206), do
171
Mestre de Arruda dos Vinhos, onde se evidencia, num primeiro plano, um trecho de
arco dourado, e no plano fundeiro, uma arquitetura invulgarmente real.
372
POLICARPO, Isabel Ponce de Leão. Gregório Lopes e a “ut pictura architectura”: os fundos
arquitectónicos na pintura do Renascimento português, Coimbra, 1996, pp. 126-127.
373
BATORÉO, Manuel. A iconografia dos Santos Mártires de Lisboa em quatro pinturas do século XVI:
linguagem e significados, Lisboa, 2010, p. 192.
172
Esta ligação é exemplificada na pintura portuguesa desta centúria no sentido que
qualquer arquitetura ideal poderá vir a tornar-se uma arquitetura concreta.
Na verdade, existe uma relação entre as construções reais e a utopia virtual, que
não existe, com lugar a representações de arquitetura na pintura portuguesa, em quatro
níveis, tal como enuncia Isabel Policarpo:
Deste modo, qualquer fundo de pintura pode, ou não, refletir uma representação
pintada, e exibir uma arquitetura local ou regional, sem descurar o simples facto de a
representação ser somente imaginária, ou diferenciada das reais, com valor nos
documentos históricos. Em muitos dos casos, este valor como documento histórico de
nada serve, e de longe fornece alguma informação útil sobre o fundo de arquitetura.
374
POLICARPO, Isabel Ponce de Leão. Gregório Lopes e a “ut pictura architectura”: os fundos
arquitectónicos na pintura do Renascimento português, Coimbra, 1996, p. 110.
173
pórtico com elementos decorativos de um Renascimento clássico, em que se evidenciam
medalhões para figuras nos diafragmas, a arquitrave de linhas direitas dividida
horizontalmente, decorada com folhagens, um frontão de pequenas dimensões
interrompido por um nicho para imagem, e também as colunas balaústres e os
contrafortes/pilastras que surgem no tratado de Sagredo, decorados com motivos
grotescos com enrolamentos, seja percetível esta evolução também na arquitetura, e
ainda a particularidade de a composição de abrir através de uma janela aberta para o
fundo de paisagem.
174
influência que as reais, pelo caráter inovador que exercem. Assim, podemos rematar
esta problemática arquitetónica com a denominação de uma iconografia do lugar, ou
melhor, a concepção de uma arquitetura de lugar imaginário, de natureza clara e
plausível na identificação entre a prática arquitetónica e aquilo que foi visualizado pelo
pintor. Perante este género de representação, o tema não deve ficar sujeito à inquietação
da identificação da iconografia tradicional, pois a arquitetura imaginada é uma mera
ilustração de um ideal construtivo. Assim, veja-se o exemplo da obra Natividade (1523)
(fig. 222), de Gregório Lopes, que apesar de não utilizar a arquitetura claramente
visível, opta pelo aparecimento de ruínas, a céu aberto, e as arquiteturas como símbolo
de lugar abandonado, situação visível para consciência do pintor em auxiliar-se dos
fundos de pintura como conceção de um espaço imaginado, ambiente este similar ao
presentado na iluminura do Livro de Horas do D. Manuel (figs. 223 e 224).
375
PIMENTEL, António Filipe. A arquitectura imaginária. Pintura, escultura, artes decorativas, Lisboa,
2012, p. 96.
175
e racional transmita-se a toda a composição, e passe das arquiteturas pintadas às
construídas.”376.
“Chanterene foi cada vez mais atraído pelo apelo da arquitectura como fonte de
todas as artes, tendo mesmo sido o primeiro artista a explorar de um modo
sistemático, quase obsessivo, as potencialidades semânticas das regras da
Perspectiva. (…) No caso português, a sedução da Arquitectura só pode fazer
sentido se tiver o valor de uma descoberta. Artista de passado gótico embalado
na aprendizagem do idioma do Renascimento, é no contexto duma crescente
familiaridade com o seu vocabulário e do manejo dos seus princípios
sintácticos, com entusiasmo e uma desenvoltura que superam o virtuosismo
escultórico para chegar à experimentação e beirar o vanguardismo, cujas
portas o estudo da arquitectura abria-lhe, que podemos entender o papel de
Chanterene. (…) No que diz respeito à sua actividade como arquitecto, em
paralelo à sua carreira oficial de “imaginário” ou escultor (…), ela permite-nos
376
MOREIRA, Rafael. A arquitectura do Renascimento no sul de Portugal. A Encomenda Régia entre o
Moderno e o Romano, Lisboa, 1991, pp. 224-225.
377
GRILO, Fernando. Nicolau Chanterene e a afirmação da escultura do Renascimento na Península
Ibérica (c. 1511-1551), Lisboa, 2000.
176
captar momento a momento a própria transformação da cultura arquitectónica
nacional na sua busca do Renascimento.”378.
378
MOREIRA, Rafael. A arquitectura do Renascimento no sul de Portugal. A Encomenda Régia entre o
Moderno e o Romano, Lisboa, 1991, pp. 253-254.
379
“O quadro renascentista é uma janela aberta para o imaginário. foi o grande teórico do quattrocento
Leon Battista Alberti que o disse, no seu tratado De Pictura (1435): «em primeiro lugar, inscrevo na
superfície a pintar um rectângulo do tamanho que me aprouver, feito de ângulos rectos, e que é para mim
como uma janela aberta, através da qual observe a istória, e aí determina o tamanho que quer dar aos
homens da minha pintura»”: PEREIRA, Fernando António Baptista. O legado do Renascimento, Lisboa,
2000, p. 31.
380
SMITH, Paul; WILDE, Carolyn. A Companion to Art Theory, UK, 2002, pp. 53-54.
177
desta nova atitude tomada pela figura do “arquitecto”, que, recém-nascida, se
vai agora impor à do “mestre-de-obras”.”381.
178
começa o fator imaginação pelos moldes e capacidade criativa do artista na composição.
Aqui estão representados palácios, casas, galerias, varandas e pórticos que transparecem
as particularidades das habitações portuguesas, reportando-nos para cidades como
Lisboa ou Tomar, que tanto o pintor bem conhecia, todavia no corpo principal, circular,
“Pela forma arredondada, lembra um pouco (…) charola do convento de Cristo em
Tomar (…) irá representar em muitas das suas obras, mas que neste caso apresenta
significativas diferenças, quer pela quase medievalidade em termos arquitectónicos,
que pelo tipo de acesso lateral, feito por uma original escadaria circular de dois
lanços, elemento que dificilmente se vai encontrar em qualquer outro fundo de
arquitectura desta época, nem tão pouco da arquitectura real.”383 vê-se encontramos
referências a característica arquitetónicas renascentistas a par de pormenores goticistas,
pela presença de contrafortes exteriores e de janelas de mainel e tímpano, e no pórtico
principal deparamo-nos com um frontão em forma de concha, ladeado por figuras
alegóricas e, à esquerda, uma varanda apoiada por colunas jónicas, e que forma uma
galeria que origina o acesso ao exterior do palacete, e onde podemos observar diversas
janelas ogivais com vestígios da arquitetura gótica (fig. 234). Todo o conjunto fundeiro
compila uma série de referências: a igreja de São João Baptista, em Tomar, pela zona da
lanterna384 (figs. 235 e 236), a loggia do MNMC, em Coimbra (figs. 237 e 238), de
Terzi, ao gosto maneirista romano, ou à iluminura do Livro de Horas de D. Manuel (fig.
239), e os Meninos da Graça que o escultor Chanterene criou para o frontão da igreja da
Graça, em Évora, com os suas figuras “gigantes” (figs. 240 e 241), elementos esses
provenientes da tratadística, inspiradores do frontispício da igreja385 (fig. 242). Aqui, o
pintor, permite-se a evidenciar o plano fundeiro em relação à cena principal da
composição, onde o detalhismo e a profundidade das arquiteturas dos fundos se
destacam em jogos prospéticos. Assim, os fundos de arquitetura ou de paisagem
transmitem uma invulgar sensação de economia de espaço, numa inserção detetável de
um quadro inserido no outro, de uma forma delicada e rica em pormenores.
383
Idem, p. 137.
384
Remate de uma cúpula ou cobertura, que serve para iluminar o interior da igreja através dos seus vãos
laterais.
385
Edição de Vitrúvio, por Cesare Cesariano, 1521. PEREIRA, Paulo. Arte Portuguesa. História
Essencial, Lisboa, 2017, p. 528.
179
Neste desenrolar cénico predomina o estilo renascentista em todos os edifícios
desta composição detalhada e pitoresca proveniente de uma originalidade ímpar que
compreende a influência tal que esta representação fundeira poderá vir a deter numa
edificação na real, característica intrínseca na representação das arquiteturas nos planos
fundeiros da pintura do renascimento português.
180
representação da arquitetura na pintura do Renascimento português e na significação
morfológico dos novos modelos arquitetónicos que até então surgiram.
181
flamenga no gosto da clientela e no trabalho dos motores, coincidindo o seu auge com
o fulgurante período manuelino, foi decisiva a ponto de provocar um muito expressivo
fenómeno de descontinuidade. (…) a obra do Grão Vasco, na medida em que se
inscreve num circuito de produção e de consumo provincial - numa região do interior
do país relativamente isolada e sem qualquer tradição no domínio da pintura -, tem
ainda a possibilidade de testemunhar a notável abrangência geográfica desde
fulgurante movimento de renovação. (…) a matriz flamenga de que foi profundamente
subsidiário não o impediu de afirmar a sua individualidade e de incorporar outras
referências, é tendencialmente considerado pela historiografia da pintura portuguesa
do fundador como um dos pintores que mais precocemente contribuiu para a “escola
portuguesa de pintura”.”386 Segundo Reynaldo dos Santos, Vasco Fernandes “pela
imaginação, intenção expressiva das formas, panejamentos e carácter regional da
paisagem, [foi] o primeiro grande mestre da escola portuguesa no período do
renascimento quinhentista”387, já Adriano de Gusmão reitera “ainda tão brujense no
magnífico retábulo de Lamego (1506-1511) conservará sempre algo reservado e
distanciado, por temperamento e educação artística, da expressão referida pelos
pintores mais novos das oficinas de Lisboa, chefiadas por Jorge Afonso.”388.
386
RODRIGUES, Dalila. Grão Vasco, Lisboa, 2007, p. 35.
387
Idem, pp. 35-36.
388
Idem, p. 36.
389
POLICARPO, Isabel Ponce de Leão. Gregório Lopes e a “ut pictura architectura”: os fundos
arquitectónicos na pintura do Renascimento português, Coimbra, 1996, p. 101.
182
proporcionada pela utilização da perspetiva e do representar uma cidade ideal, situação
que interrelaciona o pensamento urbanístico-arquitetónico, isto é, permite-se que a ideia
compositiva se sobreponha à visualizada, ou seja, arquitetura pintada versus arquitetura
real.
Em virtude, deve ressalvar-se que a pintura italiana foi levada a cabo por uma
sucessão de experimentações que surgiram pela difusão das fontes disponíveis ao dispor
dos nossos pintores portugueses, tal como dos arquitetos, que alargaram o seu espetro
gramatical construtivo e ornamental através da tratadística, caminhando para a
modernização, o que influenciou a arquitetura representada nos fundos fundeiros da
pintura, ainda que estes modelos arquitetónicos, na sua maioria, revelam problemas
compositivos, todavia, com o decorrer dos anos, os pintores expandem as suas
capacidade artísticas, estilísticas e técnicas. Sendo assim, os arquitetos foram
influenciados a construir edificações reais de nova estética pelas representações
arquitetónicas experimentais e pintadas nos planos fundeiros, o que faz com que os
pintores detivessem uma visão privilegiada sob a idealização de construções meramente
ilusórias, seja através de uma arquitetura proposta ou determinada como utopia
arquitetónica, de “Cidade Ideal”.
183
Todavia, é de ressalvar, que a cultura renascentista e o surgimento de novas
formas, derivada do clássico e do all’antico, sucedeu, simultaneamente, não por acaso,
com a mudança do estatuto liberal do pintor, outrora um mero artesão mecânico,
alteração essa presenciada pela introdução da pintura no seio do panteão das artes
liberais:
“As artes ditas maiores, a pintura, a escultura e a arquitectura, sem dúvida que
a defesa da profissão, implicou, em particular a mudança de estatuto de artes
mecânicas para artes liberais. Esta passagem exigiu um processo intelectual,
desenvolvendo em pouco tempo um corpus de conhecimento que legitimou as
actividades do pintor, do escultor e do arquitecto como actividades liberais.
Artes liberais clássicas até ao Renascimento eram a lógica (ou dialética), a
gramática, a retórica, a aritmética (a teoria dos números), a música (a
aplicação prática da teoria dos números), a geometria (a teoria do espaço) e a
astronomia (a aplicação práctica da teoria do espaço). (…) As academias foram
as novas instituições que legitimaram as actividades artísticas como artes
liberais que promoveram, regulamentaram e prestigiaram esse processo, por
oposição às formas de organização anteriores dessas atividades: corporações,
grémios, irmandades, que ainda assim, continuaram ao longo de toda a idade
moderna a conviver com as academias, as oficinas e ateliers. A principal
diferença entre os grémios e as academias é o facto de estas terem passado a
tratar as artes como temas científicos, que se ensinavam tanto na teoria como
na prática, enquanto que nas corporações se conservavam as tradições
técnicas.”390.
Com estes novos conceitos a surgir sob o olhar atento do Humanismo, a pintura
e a escultura são colocadas ao mesmo nível da arquitetura, o que nos permite, hoje e
sempre, reunir na mesma linha de composição, diferentes frentes artísticas que gerem
uma inter-relação entre as artes no percurso pictórico.
390
ALMEIDA, Isabel Cruz; NETO, Maria João. Sphera Mundi: arte e cultura no tempo dos
descobrimentos, Lisboa, 2015, p. 167.
184
CONSIDERAÇÕES FINAIS
391
SERRÃO, Vítor. História da Arte em Portugal – O Renascimento e o Maneirismo, Lisboa, 2002, p.
77.
392
Idem, p. 78.
185
que resulta do reconhecimento da capacidade de representar o real, mas também, e
fundamentalmente, da noção de que a capacidade de arquiteturar uma composição
pictórica é planificada pelo pintor no sentido da sua globalidade, ou seja, o pintor sabe
rigorosamente o momento em que vai introduzir o espaço e a figura humana, e
consequentemente, como os vai articular.
186
flamengos. Paralelamente a estas fórmulas, os pintores demonstraram as suas
capacidades ao assimilarem as fórmulas renascentistas do Primeiro Maneirismo de
Antuérpia através de uma autonomia que se inseriu numa pintura marcada pela
utilização fantasiosa das arquiteturas, pelas poses rebuscadas das figuras e pelo gosto
pelos adereços ornamentados. Contudo, foi no reinado de D. Manuel I que se
proporcionou uma intensa produção artística e arquitetónica traduzindo-se num dos
períodos mais enriquecedores da arte portuguesa, pelo gosto particular do monarca e
estabelecimento de uma identidade visual e simbólica do novo ramo da dinastia de
Avis, a par de uma disponibilidade económica e importância política que a expansão
territorial deteve no nosso país e no interesse pelas formas renovadas de representação
artística através de diversas áreas distintas, e novas como a pintura, a produção
documental e o desenvolvimento da imprensa, de natureza religiosa, literária, técnica,
pedagógica e administrativa.
187
interessou perceber a evolução da arquitetura ao longo da centúria de Quinhentos “O
assunto dos «fundos na arquitetura» merece um enfoque autónomo, uma vez que se
trata da tradução plástica de elementos com valor não apenas cenográfico, mas
propriamente arquitetónico – o que parece uma redundância, mas não o é –, uma vez
que, em muitas circunstâncias, são os edifícios os protagonistas da ação, parte
integrante de uma sintaxe que permite dar a entender a narrativa – pese embora o facto
de muitos desses fundos serem tributários da gravura, sendo delas cópias ou
adaptações, mas não só.”394.
Havendo esta prática, o pintor teve ao seu dispor fonte de informação passível de
ser recolhida “A prática deve estar sempre fundada numa sólida teoria…”395. Esta
afirmação sumaria a proximidade entre as artes e ciência, como comprovativo da teoria
da arte renascentista, que se caracteriza, essencialmente pela formação teórica e,
posteriormente, neste caso, pelo atingir do domínio da prática da arquitetura e da pintura
numa base construtiva do campo pictural, onde a “arte da pintura é na verdade produto
de mentes livres e nobres intelectos”396.
Pelas pinturas aqui analisadas Menino Jesus entre os Doutores (1520-1530) (fig.
31), de Cristóvão de Figueiredo, Chegada das Relíquias de Santa Auta (c. 1522) (fig.
394
PIMENTEL, António Filipe. A arquitectura imaginária. Pintura, escultura, artes decorativas, Lisboa,
MNAA-INCM, 2012, p. 98.
395
CALADO, Margarida. Arte /Ciência - Criação /Investigação: reflexões sobre a Teoria da Arte no
Renascimento e Maneirismo. Faculdade de Belas Artes, da Universidade de Lisboa, Lisboa, 2010, p. 3.
396
Idem, ibidem.
188
34), de Gregório Lopes, Os Santos Mártires de Lisboa (1530) (fig. 55), de Garcia
Fernandes, Nossa Senhora da Misericórdia (1535-1536) (fig. 65), de André de Padilha,
Cristo em casa de Marta e Maria (1535-1540) (fig. 72), de Vasco Fernandes, e Martírio
de São Sebastião (1536-1538) (fig. 92), de Gregório Lopes, é possível caracterizar e
diferenciar as tipologias fundeiras. Paralelamente a isto, constituímos o conceito de
fundo de arquitetura figurada, imaginada e decorativa como o mais completo e onde se
inserem os casos de estudo, sob uma valorização espacial dos planos compositivos da
pintura portuguesa do Renascimento, ou seja, estas arquiteturas fundeiras coexistem a
par de estudos e de representações reais e imaginadas (capítulo 2.2). Os fundos
arquitetónicos reais permitem ser identificados através de documentação,
nomeadamente de tratadística, gravura e iluminuras (capítulos 1.3.1 e 1.3.2), e de
elementos característicos definidores de um local, como exemplo as obras Chegada das
Relíquias de Santa Auta, Os Santos Mártires de Lisboa, Cristo na Casa de Marta e
Maria e Martírio de São Sebastião. Nas representações ditas imaginadas Menino Jesus
entre os Doutores e Nossa Senhora da Misericórdia, o espaço arquitetónico é uma
idealização de uma arquitetura sugerida, sendo que estas construções constituem uma
unidade autónoma para o estudo da pintura e da arquitetura do Renascimento.
Ao mesmo tempo, a execução destes planos fundeiros terá de ser lido à luz das
gravuras e livros impressos (iluminuras) que ao tempo circulavam pelo espaço
peninsular e europeu, tornando-se, em regra geral, modelos visuais para a construção de
novos edifícios ou como resultado de inventividade e inspiração para a produção
pictórica, num laborioso trabalho fundeiro que acompanhava a composição (capítulo
1.3.1). De qualquer modo, não existem dúvidas de que Cristóvão de Figueiredo,
Gregório Lopes, Garcia Fernandes, Vasco Fernandes, Mestre de Abrantes (Cristóvão
189
Lopes?), Frei Carlos e Mestre da Lourinhã recorreram às fontes (tratados, gravuras e
iluminuras) para enriquecer o seu reportório formal e iconográfico, sendo que, também
é certo que os pintores o fizeram com uma enorme liberdade inventiva e de sentido
interpretativo.
Já, no que diz respeito, às representações fundeiras o pintor podia ainda auxiliar-
se da realidade das representações arquitetónicas ou refugiar-se, única e exclusivamente
da inventividade, como ideia de renovação construtiva alusiva à utopia de “Cidade
Ideal”. A inclusão destas microarquiteturas projetadas nos planos fundeiros, na arte
portuguesa, revelaram modernidade e novidade ao espaço compositivo, e não só pela
cena central da pintura, sendo que aqui os pintores procuravam representar fundos
arquitetónicos reais ou imaginados, todavia a inventio do artista imperava aqui, através
de uma idealização figurada dos modelos all’antico na idealização das construções
edificatórias ou parte delas.
A tipologia do real segue com os exemplos das seguintes obras: Chegada das
Relíquias de Santa Auta (figs. 36, 37, 38, 40, 46, 47, 49, 51), Os Santos Mártires de
Lisboa (figs. 58, 61, 62), Nossa Senhora da Misericórdia (figs. 67, 68 e 69), Cristo em
190
casa de Marta e Maria (figs. 76 e 80), Martírio de São Sebastião (figs. 96 e 100),
Casamento da Virgem (fig. 105), O Desembarque em Lisboa dos três Santos Mártires
Veríssimo, Máxima e Júlia (fig. 116), Aparecimento de Cristo à Virgem (fig. 127),
Investidura de um Mestre da Ordem de Santiago (figs. 138 e 142), A Virgem, o Menino
e Anjos (fig. 146), Apresentação de Jesus no Templo (figs. 157 e 161), São Pedro (fig.
166), Morte da Virgem (fig. 172), São Sebastião (fig. 182), Fuga para o Egipto (fig.
187), Santo António Pregando aos Peixes (figs. 195, 197, 199, 200 e 202), Ressurreição
de Lázaro (figs. 216, 217, 220, 221), Calvário (figs. 227 e 229), A Degolação de São
João Baptista (figs. 236, 238 e 241).
397
Idem, p. 5.
191
modernidade, e qual a sua preocupação de perspetiva nos fundos, fator relativo na
representação da figura humana.
Entendemos, em síntese, que nem todas as objeções traçadas nos são passíveis
de serem conclusivas. Porém, é nossa certeza que foi alcançado um olhar renovado
sobre a arquitetura na pintura portuguesa da década de vinte, trinta e quarenta do século
XVI, e sobretudo a forma de evidência que assumimos com as propostas de
entendimento que se oferecem como base objetiva para futuras progressões.
192
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ANEXOS
Fig. 1 - Iluminador Eugénio de Frias Serrão, Frontispício do Compromisso da Irmandade de São Lucas -
São Lucas pintando a Virgem, 1608, MNAA (in LIMA, Luís. «Naturezas-Mortas» antes da Natureza-
Morta: bases para o estudo e contemplação das formas preliminares da Natureza-Morta em Portugal, p.
31).
204
Fig. 2 - Casa dos Vinte e Quatro, Lisboa (in Casa dos 24 | Coisas para fazer | Avenida da
Liberdade/Príncipe Real, Lisboa (timeout.pt)).
Fig. 3 - Casa dos Vinte e Quatro, Lisboa (in Conheça as Casas dos 24 do Porto e de Lisboa (timeout.pt)).
205
Fig. 4 - Álvaro Pires de Évora, Bandeira de São Jorge, c. 1427-1430, Museu Hermitage, S. Petersburgo
(in São Jorge The State Hermitage Museum - Representações de São Jorge na pintura – Wikipédia, a
enciclopédia livre (wikipedia.org)).
206
Fig. 5 - Vasco Fernandes, pormenores da obra Cristo em casa de Marta e Maria, 1535-1540, MGV (in
Cristo em Casa de Marta - Gaspar Vaz — Google Arts & Culture).
Fig. 6 - Albrecht Dürer, gravura Melancolia I, 1514, Metropolitan Museum of Art (in Albrecht Dürer |
Melencolia I | The Metropolitan Museum of Art (metmuseum.org)).
207
Fig. 7 - Albrecht Dürer, gravura O Filho Pródigo, 1496, Coleção Privada (in O Filho Pródigo, c. 1496 de
Albrecht Dürer (meisterdrucke.pt)).
208
Fig. 8 - Diego de Sagredo, edição portuguesa do Tratado Medidas del Romano, 1541 (in Medidas del
Romano agora nueuamente impressas y añadidas de muchas pieças e figuras muy necessarias alos
officiales que quieren seguir las formaciones delas basas, colunas,capiteles, y otras pieças de los edificios
antiguos | Europeana).
Fig. 9 - Portal da Quinta do Bonjardim, Sintra (in Caminhando à Descoberta da Mata de Belas |
Caminhando).
209
Fig. 10 - Sebastiano Serlio, as cincos ordens arquitetónicas, (in WATERS, Michael J. A Renaissance
without Order Ornament, Single-sheet Engravings, and the Mutability of Architectural Prints, Institute of
Fine Arts, New York University, 2012, p. 502).
210
Fig. 11 - Leon Battista Alberti, Tratado De re aedificatoria, 1485 (in Na arte do edifício – HiSoUR Arte
Cultura Exposição).
211
Fig. 13 - As proporções do homem segundo Vitrúvio (in DELUMEAU, Jean. A civilização do
Renascimento, p. 95).
212
Fig. 15 - Igreja e Convento da Graça de Évora (in Igreja e Convento da Graça · História da Arquitetura
Portuguesa (hap.pt)).
Fig. 16 - (a) Aprendizes a preparar as tintas, (b) aprendiz a fazer esboços, (c) aprendiz a preparar a paleta
para o mestre (in Jan Collaert I | New Inventions of Modern Times [Nova Reperta], The Invention of Oil
Painting, plate 14 | The Metropolitan Museum of Art (metmuseum.org)).
213
Fig. 17 - Jan Collaert, aprendizes desenham busto e retrato a partir do natural, c. 1600, Metropolitan
Museum of Art (in Jan Collaert I | New Inventions of Modern Times [Nova Reperta], The Invention of
Oil Painting, plate 14 | The Metropolitan Museum of Art (metmuseum.org)).
Fig. 18 - Jan Collaert, gravura de oficina técnica em desenvolvimento da técnica a óleo, c. 1600,
Metropolitan Museum of Art (in Jan Collaert I | New Inventions of Modern Times [Nova Reperta], The
Invention of Oil Painting, plate 14 | The Metropolitan Museum of Art (metmuseum.org)).
214
Fig. 19 - Gregório Lopes, pormenor de arquitetura em Retábulo do Paraíso, Santa Margarida e Santa
Maria Madalena, c. 1520, MNAA. Fotografia de José Pessoa, 1995, DGPC.
Fig. 20 - Vasco Fernandes, pormenor de arquitetura da obra São Pedro, 1529, MNGV (in
https://artsandculture.google.com/asset/s-pedro-vasco-fernandes/0wHHnmIp5r79VA?avm=3).
215
Fig. 21 - Garcia Fernandes, pormenor de arquitetura da obra Santo António Pregando aos Peixes, do lado
direito, arcaria gótica, e ao fundo, um edifício renascentista, 1535-1540, MNAA. Fotografia de Mariana
Real.
Fig. 22 - Garcia Fernandes, pormenor da janela de gosto mudéjar da obra Santo António Pregando aos
Peixes, 1535-1540, MNAA. Fotografia de Mariana Real.
216
Fig. 23 - Frei Carlos, paisagem de símbolos: Assunção da Virgem, 1520-1530, MNAA (in Ficheiro:Frei
carlos, assunzione di maria, 1520-30 ca. 01.jpg – Wikipédia, a enciclopédia livre (wikipedia.org)).
217
Fig. 24 - Vasco Fernandes, paisagem fantástica de Cristo em Casa de Marta e Maria, 1535-1540, MNGV
(in GraoVasco.jpg (10068×9806) (wikimedia.org)).
Fig. 25 - Mestre da Lourinhã, paisagem ideal de São João Evangelista em Patmos, c. 1510-1520, Santa
Casa da Misericórdia da Lourinhã (in AZAMBUJA, Sónia Talhé. Plantas, Animais e Paisagem: da
iconografia à iconologia na pintura dos séculos XV e XVI em Portugal, p. 104).
218
Fig. 26 - António de Holanda (?), Livro de Horas da Condessa de Bertiandos (II), 1515-1530 (in
AZAMBUJA, Sónia Talhé. Plantas, Animais e Paisagem: da iconografia à iconologia na pintura dos
séculos XV e XVI em Portugal, p. 104).
219
Fig. 27 - Ofício dos Mortos (fólio 130), Livro de Horas de D. Manuel, MNAA, Lisboa, 1517-1551 (in
Uma outra representação da Rua Nova dos Mercadores, em Lisboa: a tábua do “martírio de S.
Sebastião”, de Gregório Lopes (openedition.org)).
220
Fig. 28 - Vasco Fernandes, políptico de Lamego [reconstituição], c.1506-1511, Museu de Lamego (in
Políptico da Capela-mor da Sé de Lamego – Wikipédia, a enciclopédia livre (wikipedia.org)).
Fig. 29 – Grão Vasco, Políptico da Capela-mor da Sé de Viseu (1501-1506), MNGV (in Políptico da
Capela-mor da Sé de Viseu (1501-1506) - Vasco Fernandes e Francisco Henriques — Google Arts &
Culture).
221
Fig. 30 - (1) Encontro na Porta Dourada e (2) Casamento da Virgem, 1495-1510, Políptico da Sé de
Évora, Museu de Évora (in 1 Políptico Évora IMG 2728 - Políptico da Sé de Évora – Wikipédia, a
enciclopédia livre (wikipedia.org)).
222
Fig. 31 - Cristóvão de Figueiredo, Menino Jesus entre os Doutores, 1520-1530, MNAA (in Cristóvão de
Figueiredo - Menino de Jesus entre os Doutores - Menino Jesus entre os Doutores (Cristóvão de
Figueiredo) – Wikipédia, a enciclopédia livre (wikipedia.org)).
Figs. 32 e 33 - Bancos com arcos venezianos (1) (in Cristóvão de Figueiredo - Menino de Jesus entre os
Doutores - Menino Jesus entre os Doutores (Cristóvão de Figueiredo) – Wikipédia, a enciclopédia livre
(wikipedia.org)) e (2) RES-322-V, BN, p. 37 [Liturgia e ritual
Hore intemerate Virginis marie secundu[m] usum Romanum cum pluribus oratio[n]ibus tam in gallico
q[uam] in latino. - Paris : par Thielman keruer imprimeur deluniuersite de Paris : pour Gillet Remacle
libraire demourant sur le pont Saint Michel a lenseigne de la Licorne, 1503. - [96] f. : il. ; 8º (19 cm)].
223
Fig. 34 - Gregório Lopes, Chegada das Relíquias de Santa Auta, c. 1522, MNAA (in Retábulo de Santa
Auta - Crotos (zone47.com)).
Figs. 35 e 36 - (1) Pormenor do portal manuelino da obra Chegada das Relíquias de Santa Auta (in
Retábulo de Santa Auta - Crotos (zone47.com)) e (2) Portal neomanuelino da fachada sul do MNAz (in
The Museu Nacional do Azulejo - Lisbon For 91 Days).
224
Figs. 37 e 38 - (1) Portal do antigo Convento da Conceição, em Leça da Palmeira (in Portais - Brasões -
Aldrabas - Tranquetas - Taramelas - Batentes - Caravelhos - etc...: Portal Manuelino - Quinta da
Conceição (manueljosecunha.blogspot.com)) e (2) Portal da Igreja Matriz da Golegã (in Igreja Matriz da
Golegã - Portugal | See where this picture … | Flickr).
Figs. 39 e 40 - Arco canopial (1) obra Chegada das Relíquias de Santa Auta (in Retábulo de Santa Auta -
Crotos (zone47.com)) e (2) Sé da Guarda (in sé da guarda – Arte Medieval (vmribeiro.net)).
225
Fig. 41 - Cogulho da obra Chegada das Relíquias de Santa Auta (in Retábulo de Santa Auta - Crotos
(zone47.com)).
Figs. 42 e 43 - (1) Motivos vegetalistas da obra Chegada das Relíquias de Santa Auta (in Retábulo de
Santa Auta - Crotos (zone47.com) e (2) Motivos vegetalistas D. Manuel I: o Venturoso, Arquivo
Nacional da Torre do Tombo, 2022 (in Apresentação do PowerPoint (dglab.gov.pt)).
226
Fig. 44 - Divisas de D. João II (pelicano) e de D. Leonor (camaroeiro) e, ao centro, o escudo português da
obra Chegada das Relíquias de Santa Auta (in Retábulo de Santa Auta - Crotos (zone47.com)).
227
Figs 45, 46 e 47 - Botaréus torsos encimados por coroas reais (1) obra Chegada das Relíquias de Santa
Auta (in Retábulo de Santa Auta - Crotos (zone47.com)); (2) Sé da Guarda (in sé da guarda – Arte
Medieval (vmribeiro.net)) e (3) Igreja Matriz da Golegã (in IGREJA DE NOSSA SENHORA DA
CONCEIÇÃO, GOLEGÃ, 2012 | FASCÍNIO DA FOTOGRAFIA (wordpress.com)).
Fig. 48 - Tondo Virgem e o Menino da obra Chegada das Relíquias de Santa Auta (in Retábulo de Santa
Auta - Crotos (zone47.com)).
228
Fig. 49 - Tondos semelhantes ao representado na obra Chegada das Relíquias de Santa Auta das oficinas
dos Della Robbia (1) Medalhão da Virgem com o Menino, MNAA, Fotografia de Mariana Real; (2)
Medalhão da Virgem com o Menino, National Gallery, Prague (in File:Andrea della Robbia - The Virgin
and Child.jpg - Wikimedia Commons) e (3) Medalhão da Virgem dos Lírios de Luca della Robbia, The
Walters Art Museuam, Baltimore, Maryland (in The Virgin of the Lilies | The Walters Art Museum).
229
Figs. 50 e 51 - Gárgulas pintadas versus originais do convento (1) (in Retábulo de Santa Auta - Crotos
(zone47.com)) e (2) (in BARREIRA, Catarina. Gárgulas: representações do feio e do grotesco no
contexto português. Séculos XIII a XVI. Dissertação de Doutoramento, Belas-Artes (Ciências da Arte),
Universidade de Lisboa, Faculdade de Belas-Artes, Vol. II, 2011, pp. 683-684).
Fig. 52 - Caravelas e rio Tejo da obra Chegada das Relíquias de Santa Auta (in Retábulo de Santa Auta -
Crotos (zone47.com)).
230
Fig. 53 - Vista do Convento da Madre de Deus (in Convento da Madre Deus - Paixão por Lisboa
(sapo.pt)).
Fig. 54 - Fachada principal da Igreja do Convento da Madre de Deus (in Convento da Madre Deus -
Paixão por Lisboa (sapo.pt)).
231
Fig. 55 - Garcia Fernandes, Os Santos Mártires de Lisboa, 1530, MCM. Fotografia do Centro de
Documentação do Museu Carlos Machado.
Fig. 56 - Garcia Fernandes, pormenor arquitetónico da obra Os Santos Mártires de Lisboa, 1530, MCM.
Fotografia do Centro de Documentação do Museu Carlos Machado
232
Fig. 57 - Pormenores arquitetónicas da obra Os Santos Mártires de Lisboa, 1530, MCM.
Fig. 58 - Alusão aos edifícios de Roma (1) Palácio Papal (in The Apostolic Palace - Vatican | The
Apostolic Palace is the… | Flickr), (2) Castelo de Sant’Angelo Nicolas Beatrizet, estudo arquitetónico,
1558-1577, British Museum (in print | British Museum) e (3) Panteão (in Wikipédia da História da Arte /
Panteão (pbworks.com)).
233
Figs. 59 e 60 - (1) Pormenor fundeiro da obra Os Santos Mártires de Lisboa, 1530, MCM, versus (2)
Pormenor da vista de Roma, Crónica de Nuremberga, fl. LXVIII (in BATORÉO, Manuel. Os
“Primitivos Portugueses” e a Gravura do Norte da Europa – A Utilização Instrumental de Fontes
Gráficas, p. 231).
234
Fig. 61 - (1) Pormenor fundeiro da obra Os Santos Mártires de Lisboa, 1530, MCM, versus Palais des
Papes, em Avinhão (in Avignon, Palais des Papes depuis Tour Philippe le Bel by JM Rosier - Palácio dos
Papas de Avinhão – Wikipédia, a enciclopédia livre (wikipedia.org)).
235
Figs. 62 e 63 - Pormenores arquitetónicas da obra Os Santos Mártires de Lisboa, 1530, MCM, versus (1)
Torre de Belém, Lisboa (in DIVAGAR SOBRE TUDO UM POUCO - Poemas, Flores, Pinturas, Férias:
Torre de Belém (algarve-saibamais.blogspot.com)) e (2) Paço da Ribeira, em Lisboa. Livro de Horas dito
de D. Manuel, atribuído a António de Holanda, 1517-1551. Lisboa, MNAA, N.º de Inv. 14/fl. 25v. (in
Paço da Ribeira, em Lisboa. Livro de Horas dito de D. Manuel, atribuído... | Download Scientific
Diagram (researchgate.net)) e
Fig. 64 - Paço da Ribeira, Lisboa, gravura em cobre, Georgius Braunius, Civitates Orbis Terrarum, 1572
(in A Viagem dos ArgonautasDIA DE LISBOA – Falemos desta luminosa urbe – por Carlos Loures).
236
Fig. 65 - André de Padilha, Nossa Senhora da Misericórdia, 1534, igreja da Misericórdia de Viana do
Castelo. Fotografia da Santa Casa da Misericórdia de Viana do Castelo.
237
Fig. 66 - Xilogravura do frontispício do Compromisso da Misericórdia de Lisboa, impresso por Hernão
de Campo, 1516 (in SERRÃO, Vítor. André de Padilha e a pintura quinhentista entre o Minho e a
Galiza).
238
Fig. 67, 68 e 69 - (1) Castelo do Lindoso, em Lindoso (in Lindoso - Aldeias de Portugal), (2) Castelo de
Doiras, em Doiras (in La obra para rehabilitar el castillo de Doiras se iniciará antes de que finalice el año
(elprogreso.es) e (3) Castelo de Pambre, em Pambre (in Castelo de Pambre (Lugo) - El turista tranquilo).
Fig. 70 - André de Padilha, pormenor fundeiro da obra Nossa Senhora da Misericórdia, 1534, igreja da
Misericórdia de Viana do Castelo. Fotografia da Santa Casa da Misericórdia de Viana do Castelo.
239
Fig. 71 - André de Padilha, pormenor fundeiro da obra Nossa Senhora da Misericórdia, 1534, igreja da
Misericórdia de Viana do Castelo. Fotografia da Santa Casa da Misericórdia de Viana do Castelo.
240
Fig. 72 - Vasco Fernandes, Cristo na Casa de Marta e Maria, 1535-1540, MNGV (in Cristo em Casa de
Marta - Gaspar Vaz — Google Arts & Culture).
241
Fig. 73 - Vasco Fernandes, retrato de D. Miguel da Silva da obra Cristo em casa de Marta e Maria, 1535-
1540, MNGV (in Cristo em Casa de Marta - Gaspar Vaz — Google Arts & Culture).
Fig. 74 - Plinto central decorado com as armas de D. Miguel da Silva (in Cristo em Casa de Marta -
Gaspar Vaz — Google Arts & Culture)).
242
Figs. 75 e 76 – (1) Pormenor da coluna da obra Cristo em casa de Marta e Maria, 1535-1540, MNGV (in
Cristo em Casa de Marta - Gaspar Vaz — Google Arts & Culture) e (2) Claustro da Sé de Viseu (in
Claustro da Sé de Viseu | VISEU (Portugal): Claustro da Sé c… | Flickr)
243
Figs. 77 e 78 - (1) Capitel da obra Cristo em casa de Marta e Maria, 1535-1540, MNGV (in Cristo em
Casa de Marta - Gaspar Vaz — Google Arts & Culture) e (2 e 3) Capiteis semelhantes ao representado na
obra, School of Jacopo Ripanda, column capitals, ink drawing, ca. 1512–17 (Oxford, Ashmolean Mu-
seum, KP668, fols. 1v–2r)
Figs. 79 e 80 - (1) Concha da obra Cristo em casa de Marta e Maria, 1535-1540, MNGV (in Cristo em
Casa de Marta - Gaspar Vaz — Google Arts & Culture) e (2) Concha da Igreja do Grilo, do Porto (in
Convento dos Grilos, Oporto, Portugal, 2012-05-09, DD 02 - Convento dos Grilos – Wikipédia, a
enciclopédia livre (wikipedia.org)).
244
Fig. 81 - Vasco Fernandes, pormenor da obra Cristo em casa de Marta e Maria, 1535-1540, MNGV (in
Cristo em Casa de Marta - Gaspar Vaz — Google Arts & Culture).
Figs. 82 e 83 - (1) Vasco Fernandes, pormenor da obra Cristo em casa de Marta e Maria, 1535-1540,
MNGV (in Cristo em Casa de Marta - Gaspar Vaz — Google Arts & Culture) e (2) Gravura “Filho
Pródigo” de Albrecht Dürer, 1496 (in O Filho Pródigo, c. 1496 de Albrecht Dürer (meisterdrucke.pt)).
245
Figs. 84 e 85 - (1) Vasco Fernandes, pormenor da obra Cristo em casa de Marta e Maria, 1535-1540,
MNGV (in Cristo em Casa de Marta - Gaspar Vaz — Google Arts & Culture) e (2) Gravura Melancolia I
(in Albrecht Dürer | Melencolia I | The Metropolitan Museum of Art (metmuseum.org)).
Fig. 86 – Pavimento da obra Cristo em casa de Marta e Maria, 1535-1540, MNGV (in Cristo em Casa de
Marta - Gaspar Vaz — Google Arts & Culture)
246
Fig. 87 - Arquitetura fundeira da janela da esquerda da obra Cristo em casa de Marta e Maria, 1535-
1540, MNGV (in Cristo em Casa de Marta - Gaspar Vaz — Google Arts & Culture).
Figs. 88 e 89 - (1) Pormenor da ponte da obra Cristo em casa de Marta e Maria, 1535-1540, MNGV (in
Cristo em Casa de Marta - Gaspar Vaz — Google Arts & Culture) e (2) Pormenor fundeiro da gravura
“The Return of the Prodical Son”, de Lucas van Leyden, c. 1510, Leiden University Library (in YAYLA,
Ayşegül. Representations of Architecture in Lucas van Leyden’s Prints, 2018, p. 3.).
247
Fig. 90 - Mestre de Abrantes (Cristóvão Lopes?) Circuncisão, c. 1540, MNAA. Fotografia de Mariana
Real.
Fig. 91 - Gravura do Mestre IAM de Zwolle (in BATORÉO, Manuel. Os “Primitivos Portugueses” e a
Gravura do Norte da Europa – A Utilização Instrumental de Fontes Gráficas, p. 87.
248
Fig. 92 - Gregório Lopes, Martírio de São Sebastião, 1536-1538, MNAA (in File:Gregório lopes,
martirio di san sebastiano, 1536-39, 01.jpg - Wikimedia Commons).
Fig. 93 - Vista geral da Charola, Convento de Cristo, Tomar. Fotografia de Mariana Real.
249
Fig. 94 - Reprodução fotográfica da obra Martírio de São Sebastião, na Charola do Convento de Cristo,
Tomar. Fotografia de Mariana Real.
250
Fig. 96 - Coliseu de Roma (in Coliseu - Wikiwand).
Fig. 97 - Gregório Lopes, representação arquitetónica do Coliseu de Roma na obra Martírio de São
Sebastião, 1536-1538, MNAA. Fotografia de Mariana Real.
251
Fig. 98 - Albrecht Dürer (e gravura em contraposto) (in BATORÉO, Manuel. Os “Primitivos
Portugueses” e a Gravura do Norte da Europa – A Utilização Instrumental de Fontes Gráficas, p. 250).
252
Fig. 99 e 100 - Comparação fundeira entre a obra Martírio de São Sebastião, Gregório Lopes, MNAA,
Fotografia de Mariana Real, e a obra Rua Nova dos Mercadores, em Lisboa. Autor desconhecido, c.
1570-1590. Londres, Kelmscott Manor Collection – Society of Antiquaries of London (in Visão | 'A
Cidade Global': Uma capital em modo de viragem (sapo.pt)).
253
Fig. 101 - Motivos all’antico da obra Martírio de São Sebastião, 1536-1538, MNAA, Fotografia de
Mariana Real.
Fig. 102 - Gravura de duas janelas manuelinas da Batalha, segundo o arquiteto Karl Albrecht Haupt,
1888, com a legenda “Batalha. Wohnhaus des Matheos Fernandes” (in REDOL, Pedro; ORLINDO,
Jorge. Arquitectura civil quinhentista da Batalha: Três peças notáveis, p. 294).
254
Figs. 103 - Gregório Lopes, Casamento da Virgem, 1527, MNAA (in Ficheiro:Casamento da Virgem -
Paraiso.jpg – Wikipédia, a enciclopédia livre (wikipedia.org)).
Figs. 104 e 105 - (1) Pormenor fundeiro da obra Casamento da Virgem, 1527, MNAA (in Fichei-
ro:Casamento da Virgem - Paraiso.jpg – Wikipédia, a enciclopédia livre (wikipedia.org)) e (2) Vista geral
da igreja manuelina do Convento de Cristo, Tomar (in PEREIRA, Paulo. Arte Portuguesa. História Es-
sencial, Lisboa, 2017, p. 450).
255
Fig. 106 - Garcia Fernandes, Casamento de Santo Aleixo, 1541, Museu de São Roque (in
Casamento de Santo Aleixo (1541) - Garcia Fernandes - Casamento de Santo Aleixo (Garcia Fernandes)
– Wikipédia, a enciclopédia livre (wikipedia.org)).
256
Fig. 107 - Vasco Fernandes, Pentecostes, 1534-1535, Mosteiro de Santa Cruz de Coimbra (in Grão
Vasco, Pentecostes, da capela da portaria do mosteiro de Santa Cruz de Coimbra, 1534-35, assinada
Velasco - Pentecostes (Grão Vasco) – Wikipédia, a enciclopédia livre (wikipedia.org)).
Fig. 108 - Vasco Fernandes, Última Ceia, 1535-1540, MNGV (in Thelastsupper - Última Ceia (Grão
Vasco) – Wikipédia, a enciclopédia livre (wikipedia.org)).
257
Figs. 109, 110 e 111 - Pormenores dos capitéis (1) Gregório Lopes, Adoração dos Magos, 1520-1523,
MNAA. Fotografia de Mariana Real. (2) Frei Carlos, Anunciação, c. 1523, MNAA (in Frei Carlos -
Anunciação - Frei Carlos – Wikipédia, a enciclopédia livre (wikipedia.org)). (3) Vasco Fernandes, Cristo
em Casa de Marta e Maria, c. 1535-1540, MNGV (in Última Ceia (Grão Vasco) – Wikipédia, a
enciclopédia livre (wikipedia.org)).
Figs. 112 e 113 - Ambos de Frei Carlos (1) O Bom Pastor, c. 1520, MNAA, Fotografia de José Paulo
Ruas, 2022, DGPC e (2) São João Evangelista, c. 1530 (in São João Evangelista - Frei Carlos - Frei
Carlos – Wikipédia, a enciclopédia livre (wikipedia.org)).
258
Fig. 114 - Garcia Fernandes, O Desembarque em Lisboa dos três Santos Mártires Veríssimo, Máxima e
Júlia, c. 1530, MCM. Fotografia do Centro de Documentação do Museu Carlos Machado.
259
Figs. 115 e 116 - (1) Pormenor fundeiro da obra O Desembarque em Lisboa dos três Santos Mártires
Veríssimo, Máxima e Júlia, c. 1530, MCM. Fotografia do Centro de Documentação do Museu Carlos
Machado; (2) Paço da Ribeira, em Lisboa. Livro de Horas dito de D. Manuel, atribuído a António de
Holanda, 1517-1551. Lisboa, MNAA, N.º de Inv. 14/fl. 25v. (in Paço da Ribeira, em Lisboa. Livro de
Horas dito de D. Manuel, atribuído... | Download Scientific Diagram (researchgate.net)).
Figs. 117, 118 e 119 - Ornamentação escultórica (1) Tondo, Gregório Lopes, Chegada das
Relíquias de Santa Auta. Fotografia de Mariana Real; (2 e 3) Escudo e concha, Vasco Fernandes, São
Pedro (in São Pedro de Grão Vasco, Museu Grão Vasco b - São Pedro (Grão Vasco) – Wikipédia, a
enciclopédia livre (wikipedia.org)).
260
Figs. 120 - Nicolau Chanterene, micro-arquiteturas em escultura (1) São Jerónimo tirando o espinho do
Leão e (2) São Jerónimo e os Mercadores (c. 1522), Mosteiro de São Marcos, Tentúgal (in FLOR, Pedro.
Imagens da Cidade – os fundos de arquitectura na escultura retabular em pedra do Renascimento em
Portugal (1500-1550), p. 152.
Fig. 121 - Gil Vicente, Custódia de Belém, exemplo do gosto pelas microarquiteturas, 1506, MNAA (in
Custódia de Belém | Museu Nacional de Arte Antiga (museudearteantiga.pt)).
261
Fig. 122 - Frei Carlos, Aparecimento de Cristo à Virgem, 1529, MNAA (in Aparecimento de Cristo à
Virgem - Frei Carlos — Google Arts & Culture).
262
Figs. 123, 124 e 125 - (1) Pormenor da coluna da obra Aparecimento de Cristo à Virgem, 1529, MNAA
(in Aparecimento de Cristo à Virgem - Frei Carlos — Google Arts & Culture); (2) Tratado Medidas del
Romano de Diego de Sagredo, de 1526, p. 37; (3) RES. 218 20 V., BN, p. 1 [RIBEI-
RO, Bernardim, 1482-1552, Trouas de dous pastores.s. Siluestre e Amador. / Feytas por Bernaldim [sic]
ribeyro. Nouamente empremidas Com outros dous romãces com suas grosas.... - [Lisboa: Germão Ga-
lharde], 1536. - [4] f.; 4º (22 cm)].
263
Figs. 126 e 127 - (1) Colunelo da obra Aparecimento de Cristo à Virgem, 1529, MNAA (in Aparecimento
de Cristo à Virgem - Frei Carlos — Google Arts & Culture) versus (2) Colunelo do retábulo da capela-
mor da Igreja do mosteiro de S. Marcos (1522-23), atribuído a Nicolau Chanterene (in Ficheiro:Retábulo
Nicolau Chanterene Mosteiro de S Marcos de Coimbra IMG 8353.JPG – Wikipédia, a enciclopédia livre
(wikipedia.org)).
264
Fig. 128 - Pormenor do putti com cartela da obra Aparecimento de Cristo à Virgem, 1529, MNAA (in
Aparecimento de Cristo à Virgem - Frei Carlos — Google Arts & Culture).
Fig. 129 - Pormenor da arcaria de influência renascentista da obra Aparecimento de Cristo à Virgem,
1529, MNAA (in Aparecimento de Cristo à Virgem - Frei Carlos — Google Arts & Culture).
265
Fig. 130 - Adão e Eva representados na obra Aparecimento de Cristo à Virgem, 1529, MNAA (in Apare-
cimento de Cristo à Virgem - Frei Carlos — Google Arts & Culture).
Fig. 131 - Tondi com a representação das figuras do Antigo Testamento: Abraão e Isaque na obra Apare-
cimento de Cristo à Virgem, 1529, MNAA (in Aparecimento de Cristo à Virgem - Frei Carlos — Google
Arts & Culture).
266
Fig. 132 - Domenichino, The Sacrifice of Isaac, 1627-1628, Museo del Prado, Madrid (in Domenichino /
'The Sacrifice of Isaac', 1627-1628, Italian School. Abraham. Painting by Domenico Zampieri -1581-
1641- - Pixels).
267
Fig. 133 - Pormenor dos capitéis da obra Aparecimento de Cristo à Virgem, 1529, MNAA (in Apareci-
mento de Cristo à Virgem - Frei Carlos — Google Arts & Culture).
Figs. 134 e 135 - (1) Capitel gótico da obra Aparecimento de Cristo à Virgem, 1529, MNAA (in Apare-
cimento de Cristo à Virgem - Frei Carlos — Google Arts & Culture) e (2) Portada gótica da obra Apare-
cimento de Cristo à Virgem, 1529, MNAA (in Aparecimento de Cristo à Virgem - Frei Carlos — Google
Arts & Culture).
268
Fig. 136 - Pormenores fundeiros: paisagem versus arquitetura da obra Aparecimento de Cristo à Virgem,
1529, MNAA (in Aparecimento de Cristo à Virgem - Frei Carlos — Google Arts & Culture).
269
Fig. 137 - Mestre da Lourinhã, Investidura de um Mestre da Ordem de Santiago, 1520-1525, MNAA.
Fotografia de Mariana Real.
Fig. 138 - Interior da igreja de Santiago - Castelo de Palmela (in Castelo de Palmela - Igreja de Santiago
(Retábulo da capela-mor) (perspectivasdoolhar.blogspot.com)).
270
Figs. 139 e 140 - (1) Pormenor da coluna da obra Investidura de um Mestre da Ordem de Santiago, 1520-
1525, MNAA. Fotografia de Mariana Real; (2 e 3) RES-329-V, BN, pp. 9-45 [Liturgia e ritual. Livro de
Horas. Ces presentes heures a lusaige de Rôme so[n]t au lo[n]g sa[n]s req[ue]rir.... - Paris : pour Symo[n]
vostre Libraire, demourant a la rue neuue nostre dame a leneigne sainct Jehan leuangeliste : par Philippe
pigouchet, [1502]. - [98] f. : muito il. ; 8º (23 cm)].
271
Figs. 141, 142 e 143 - (1) Pormenor decorativo do teto em caixotões da obra Investidura de um Mestre da
Ordem de Santiago, 1520-1525, MNAA. Fotografia de Mariana Real; (2) João de Castilho, teto de
caixotões, capela do Noviciado do Convento de Cristo, em Tomar (in Modelos - Convento de Cristo
(conventocristo.gov.pt)); (3) RES-329-V, BN, p. 61 [Liturgia e ritual. Livro de Horas. Ces presentes
heures a lusaige de Rôme so[n]t au lo[n]g sa[n]s req[ue]rir.... - Paris : pour Symo[n] vostre Libraire,
demourant a la rue neuue nostre dame a leneigne sainct Jehan leuangeliste : par Philippe
pigouchet, [1502]. - [98] f. : muito il. ; 8º (23 cm)].
272
Fig. 144 - Gregório Lopes, paisagem real da obra A Virgem, o Menino e Anjos, 1536-1539, MNAA (in
Gregório lopes, madonna col bambino e angeli, 1536-39 - A Virgem, o Menino e Anjos (Gregório Lopes)
– Wikipédia, a enciclopédia livre (wikipedia.org)).
273
Figs. 145 e 146 - (1) Gregório Lopes, paisagem real do pormenor da evocação do Convento de Cristo, na
mata dos Sete Monges, Tomar (?), da obra A Virgem, o Menino e Anjos, 1536-1539, MNAA. Fotografia
de Mariana Real; versus (2) Vista para o castelo de Tomar, Tomar. Fotografia de Mariana Real.
274
Fig. 147 - Fonte da obra A Virgem, o Menino e Anjos, 1536-1539, MNAA. Fotografia de Mariana Real;
versus (2) Vista para o castelo de Tomar, Tomar. Fotografia de Mariana Real.
Fig. 148 - Iluminura do Livro de Horas de D. Manuel, fol. 9v (in MARKL, Dagoberto. Livro de Horas de
D. Manuel, Imprensa Nacional Casa da Moeda, Lisboa, 1983).
275
Fig. 149 - RES-323-V, BN, p. 108 [Liturgia e ritual
Hore beate Marie Virginis ad usum Parisiensem totaliter ad lõgum sine require. - Paris: Thielman Kerver:
Gillet Remacle, 1502. - [132] f.: il.; 8º (17 cm)].
276
Figs. 150 e 151 - (1) Anjos da obra A Virgem, o Menino e Anjos, 1536-1539, MNAA (in Gregório lopes,
madonna col bambino e angeli, 1536-39 - A Virgem, o Menino e Anjos (Gregório Lopes) – Wikipédia, a
enciclopédia livre (wikipedia.org)) e (2) Anjos na iluminura do Livro de Horas de D. Manuel ((in
MARKL, Dagoberto. Livro de Horas de D. Manuel, Imprensa Nacional Casa da Moeda, Lisboa, 1983).
277
Fig. 152 - Garcia Fernandes, Apresentação de Jesus no Templo, 1538, MNAA (in
Garcia_fernandes,_presentazione_di_gesù_al_tempio,_1538,_01.jpg (2082×2838) (wikimedia.org).
278
Figs. 153, 154 e 155 - (1) Pórtico da obra Apresentação de Jesus no Templo, 1538, MNAA (in
Garcia_fernandes,_presentazione_di_gesù_al_tempio,_1538,_01.jpg (2082×2838) (wikimedia.org)); (2)
Francesco Colonna, gravura Hypnerotomachia Poliphili, 1499, Metropolitan Museum of Art (in
Francesco Colonna | Hypnerotomachia Poliphili | The Metropolitan Museum of Art (metmuseum.org));
(3) Desenho de pórtico do tratado Medidas del Romano de Diego de Sagredo, p. 6.
279
Figs. 156 e 157 - (1) Pormenor da coluna da obra Apresentação de Jesus no Templo, 1538, MNAA (in
Garcia_fernandes,_presentazione_di_gesù_al_tempio,_1538,_01.jpg (2082×2838) (wikimedia.org)); (2)
Coluna do retábulo da capela-mor da Igreja do mosteiro de S. Marcos (1522-23), atribuído a Nicolau
Chanterene (in Ficheiro:Retábulo Nicolau Chanterene Mosteiro de S Marcos de Coimbra IMG 8353.JPG
– Wikipédia, a enciclopédia livre (wikipedia.org)).
280
Figs. 158 e 159 - (1) Pormenor do capitel do portal central da obra Apresentação de Jesus no Templo,
1538, MNAA (in Garcia_fernandes,_presentazione_di_gesù_al_tempio,_1538,_01.jpg (2082×2838)
(wikimedia.org)) e (2) Desenho de capitel do tratado Medidas del Romano de Diego de Sagredo, p. 56.
281
Figs. 160 e 161 - (1) Portal da obra Apresentação de Jesus no Templo, 1538, MNAA (in
Garcia_fernandes,_presentazione_di_gesù_al_tempio,_1538,_01.jpg (2082×2838) (wikimedia.org)) e (2)
Arco de Constantino, em Roma (in ArcoCostLatoSud - Arco de Constantino – Wikipédia, a enciclopédia
livre (wikipedia.org)).
282
Fig. 162 - Vasco Fernandes, São Pedro, c. 1529, MGV (in São Pedro – Museu Nacional Grão Vasco
(museunacionalgraovasco.gov.pt)).
283
Fig. 163 - RES-329-V, BN, pp. 17-33 [Liturgia e ritual. Livro de Horas. Ces presentes heures a lusaige de
Rôme so[n]t au lo[n]g sa[n]s req[ue]rir.... - Paris: pour Symo[n] vostre Libraire, demourant a la rue neuue
nostre dame a leneigne sainct Jehan leuangeliste : par Philippe pigouchet, [1502]. - [98] f.: muito il.; 8º
(23 cm)].
284
Fig. 164 - RES-327-V, BN, p. 73 [Liturgia e Ritual. Livro de Horas
Ces presentes heures a lusage de Chalons toutes au long sa[n]s req[ue]rir: auec les figures et signes de
lapocalipse: les miracles nostre dame les accide[n]s de lho[m]me: et plusieurs austres hystoires.... - A
Paris: pour Symo[n] Vostre libraire, demeura[n]t a la rue neufue, pres la grant esglise, [1512]. - [98] p:
muito il. ; 8º (21 cm)].
285
Figs. 165 e 166 - Concha do trono da obra São Pedro, c. 1529, MGV (in São Pedro – Museu Nacional
Grão Vasco (museunacionalgraovasco.gov.pt)) versus motivo decorativo da igreja dos Grilos (in
File:Convento dos Grilos, Oporto, Portugal, 2012-05-09, DD 02.JPG - Wikimedia Commons).
286
Figs. 167 e 168 - (1) Pormenor dos braços do trono da obra São Pedro, c. 1529, MGV (in São Pedro –
Museu Nacional Grão Vasco (museunacionalgraovasco.gov.pt)) e (2) RES-329-V, BN, p. 23 [Liturgia e
ritual. Livro de Horas. Ces presentes heures a lusaige de Rôme so[n]t au lo[n]g sa[n]s req[ue]rir.... - Paris:
pour Symo[n] vostre Libraire, demourant a la rue neuue nostre dame a leneigne sainct Jehan leuangeliste :
par Philippe pigouchet, [1502]. - [98] f.: muito il.; 8º (23 cm)].
287
Fig. 169 - Lado esquerdo da composição fundeira da obra São Pedro, c. 1529, MGV (in São Pedro –
Museu Nacional Grão Vasco (museunacionalgraovasco.gov.pt)).
288
Fig. 170 - Lado direito da composição fundeira da obra São Pedro, c. 1529, MGV (in São Pedro – Museu
Nacional Grão Vasco (museunacionalgraovasco.gov.pt)).
289
Fig. 171 - Gregório Lopes, Morte da Virgem, 1527, MNAA (in Gregório lopes (o jorge leal), retablo del
paradiso, 1523 circa, 08 dormitio virginis - Lista de pinturas de Gregório Lopes – Wikipédia, a
enciclopédia livre (wikipedia.org)).
290
Fig. 172 - Nicolau Chanterene, Retábulo da Igreja do mosteiro de S. Marcos, 1522-23 (in
Ficheiro:Retábulo Nicolau Chanterene Mosteiro de S Marcos de Coimbra IMG 8353.JPG – Wikipédia, a
enciclopédia livre (wikipedia.org)).
291
Figs. 173 e 174 - (1) Pormenor escultórico da obra Morte da Virgem, 1527, MNAA (in Gregório lopes (o
jorge leal), retablo del paradiso, 1523 circa, 08 dormitio virginis - Lista de pinturas de Gregório Lopes –
Wikipédia, a enciclopédia livre (wikipedia.org)) e (2) RES-329-V, BN, p. 82 [Liturgia e ritual. Livro de
Horas. Ces presentes heures a lusaige de Rôme so[n]t au lo[n]g sa[n]s req[ue]rir.... - Paris : pour Symo[n]
vostre Libraire, demourant a la rue neuue nostre dame a leneigne sainct Jehan leuangeliste : par Philippe
pigouchet, [1502]. - [98] f. : muito il. ; 8º (23 cm)].
292
Fig. 175 - Hibridismo: praça flamenga com pormenores tipicamente italianos (nichos, estátuas, pilastras e
capitéis) da obra Martírio de São Sebastião, 1536-1538, MNAA. Fotografia de Mariana Real.
293
Fig. 176 - (1) Andrea Mantegna, Martírio de S. Sebastião, 1480, Museu do Louvre, Paris (in
Ficheiro:Andrea Mantegna - St Sebastian - WGA13975.jpg – Wikipédia, a enciclopédia livre
(wikipedia.org)); (2) Luca Signorelli, Martírio de S. Sebastião, 1498, Città di Castello, Pinacoteca
Comunale (in Ficheiro:Signorelli, Martyrdom of St Sebastian, città di castello.jpg – Wikipédia, a
enciclopédia livre (wikipedia.org)); (3) Hans Memling, Martírio de S. Sebastião, c. 1475, Musées Royaux
des Beaux-Arts, Bruxelas (in Hans_Memling_-_The_Martyrdom_of_St_Sebastian_-_WGA14853.jpg
(944×930) (wikimedia.org)).
294
Fig. 177 - Vasco Fernandes, São Sebastião, c. 1530, MNGV (in São Sebastião - Vasco Fernandes e
Gaspar Vaz — Google Arts & Culture).
295
Fig. 178 - Lado esquerdo da composição da obra São Sebastião, c. 1530, MNGV (in São Sebastião -
Vasco Fernandes e Gaspar Vaz — Google Arts & Culture).
Figs. 179 e 180 - (1) Porta de entrada da cidade da obra São Sebastião, c. 1530, MNGV (in São Sebastião
- Vasco Fernandes e Gaspar Vaz — Google Arts & Culture) e (2) Gravura de Lucas van Leyden, Ecce
Homo, 1510, Engraving, Rijksmuseum Amsterdam (in YAYLA, Ayşegül. Representations of Architec-
ture in Lucas van Leyden’s Prints, Early Modern Culture, 2018, p. 2).
296
Fig. 181 - Pormenor decorativo moçárabe da obra São Sebastião, c. 1530, MNGV (in São Sebastião -
Vasco Fernandes e Gaspar Vaz — Google Arts & Culture).
Fig. 182 - Catedral de Santa María de Medievilla, em Teruel (in El mudéjar de Teruel – Baúl del Arte
(wordpress.com)).
297
Fig. 183 - Gregório Lopes, Anunciação, c. 1539-1541, MNAA (in Anunciação (parte do Retábulo de
Santos-o-Novo) - Gregório Lopes — Google Arts & Culture).
298
Fig. 184 - Gregório Lopes, Fuga para o Egipto, c. 1523, MNAA (in
Gregório_lopes_(o_jorge_leal),_retablo_del_paradiso,_1523_circa,_07_fuga_in_egitto.jpg (2106×2934)
(wikimedia.org)).
299
Fig. 185 - Gregório Lopes, pormenor fundeiro da obra Fuga para o Egipto, c. 1523, MNAA. Fotografia
de Mariana Real.
Figs. 186 e 187 - (1) Pormenor fundeiro do aqueduto da obra Fuga para o Egipto, c. 1523, MNAA.
Fotografia de Mariana Real; (2) Aqueduto da Água da Prata, Évora (in Aqueduto da Água da Prata -
Portal Institucional (cm-evora.pt)).
300
Fig. 188 - Garcia Fernandes, obra Santo António Pregando aos Peixes, 1535-1540, MNAA. Fotografia de
Mariana Real.
301
Fig. 189 – Pormenor das janelas góticas da obra Santo António Pregando aos Peixes, 1535-1540, MNAA.
Fotografia de Mariana Real.
Fig. 190 - Portal renascentista da obra Santo António Pregando aos Peixes, 1535-1540, MNAA.
Fotografia de Mariana Real.
302
Fig. 191 - Torres do Norte da Europa da obra Santo António Pregando aos Peixes, 1535-1540, MNAA.
Fotografia de Mariana Real.
303
Figs. 192 e 193 - (1) Pormenor do plinto da obra Santo António Pregando aos Peixes, 1535-1540,
MNAA. Fotografia de Mariana Real; versus (2) Plinto ao jeito de Diogo de Sagredo (in SAGREDO,
Diego de. Medidas del Romano, Toledo, Remon de Petras, 1526, p. 46).
304
Fig. 194 e 195 - (1) Fachada central da obra Santo António Pregando aos Peixes, 1535-1540, MNAA.
Fotografia de Mariana Real; (2) Basilica di Sant’Andrea, em Mântua (in (7) Pinterest).
Figs. 196 e 197 - (1) Janela com ajimez mudéjar da obra Santo António Pregando aos Peixes, 1535-1540,
MNAA. Fotografia de Mariana Real; (2) Exemplo de janela com ajimez mudéjar (in ajimez – Glosario
ilustrado de arte arquitectónico (glosarioarquitectonico.com)).
305
Figs. 198, 199 e 200 - (1) Edifício circular da obra Santo António Pregando aos Peixes, 1535-1540,
MNAA. Fotografia de Mariana Real; (2) Iglesia de Santiago del Arrabal, em Toledo (in Iglesia de
Santiago del Arrabal (Toledo) - Wikipedia, la enciclopedia libre); (3) Mosteiro de Castro de Avelãs, em
Castro de Avelãs (in Igreja/Mosteiro de Castro de Avelãs | Rota da Terra Fria (rotaterrafria.com)).
Figs. 201 e 202 - (1) Edifício circular da obra Santo António Pregando aos Peixes, 1535-1540, MNAA.
Fotografia de Mariana Real; e (2) Torre octogonal flamejante da Catedral de Toledo (in La Catedral de
Toledo - Toledo: Información, tarifas, precios, entradas, cómo llegar, teléfono, horarios, mapa, fotos,
libros y guías, visitas guiadas y tours (inspain.org)).
306
Fig. 203 - Mestre de Arruda dos Vinhos, Visitação, c. 1550, Igreja Matriz de Arruda dos Vinhos (in
Visitação Políptico quinhentista da Matriz de Arruda dos Vinhos - Políptico da Matriz de Arruda dos
Vinhos (maneirista) – Wikipédia, a enciclopédia livre (wikipedia.org)).
Figs. 204 e 205 - Comparação fundeira entre a obra Santo António pregando aos Peixes, Garcia
Fernandes. Fotografia de Mariana Real; e a obra Visitação, Mestre de Arruda dos Vinhos (in Visitação
Políptico quinhentista da Matriz de Arruda dos Vinhos - Políptico da Matriz de Arruda dos Vinhos
(maneirista) – Wikipédia, a enciclopédia livre (wikipedia.org)).
307
Fig. 206 - Mestre de Arruda dos Vinhos, Encontro de Sant’Ana e S. Joaquim, c. 1550, Igreja Matriz de
Arruda dos Vinhos (in Encontro de Santa Ana e São Joaquim Políptico quinhentista da Matriz de Arruda
dos Vinhos - Políptico da Matriz de Arruda dos Vinhos (maneirista) – Wikipédia, a enciclopédia livre
(wikipedia.org)).
308
Fig. 207 - Gregório Lopes, Visitação, 1523, MNAA (in
Gregório_lopes_(o_jorge_leal),_retablo_del_paradiso,_1523_circa,_03_visitazione.jpg (1855×2596)
(wikimedia.org)).
309
Fig. 208 - Gregório Lopes, pormenor arquitetónico da obra Visitação, 1523, MNAA (in
Gregório_lopes_(o_jorge_leal),_retablo_del_paradiso,_1523_circa,_03_visitazione.jpg (1855×2596)
(wikimedia.org)).
Figs. 209 e 210 - (1) Iluminura do Livro de Horas de D. Manuel, fol. 56v (in MARKL, Dagoberto. Livro
de Horas de D. Manuel, Imprensa Nacional Casa da Moeda, Lisboa, 1983) e (2) 1369522, BN, p. 12
[MORE, Thomas, Santo, 1478-1535. De optimo reip. statu, deque nova insula Utopia, libellus vere
aureus, nec minus salutaris quàm festivus, clarissimi disertissimiq[ue] viri Thomae Mori inclytae civitatis
Londinensis civis & Vicecomitis. Epigrammata clarissimi disertissimiq[ue] viri Thomae Mori, pleraq[ue]
è Graecis versa. Epigrammata Des[iderii] Erasmi Roterodami. - Basileae: apud Joannem
Frobenium..., 1518. - 355, [1] p.: il.; 4º (22 cm).
310
Fig. 211 - Mestre de Abrantes (Cristóvão Lopes?), Adoração dos Reis Magos, c. 1540, MNAA.
Fotografia de Mariana Real.
Fig. 212 - Mestre de Abrantes (Cristóvão Lopes?), pormenores arquitetónicos da obra Adoração dos Reis
Magos, c. 1550, MNAA. Fotografia de Mariana Real.
311
Fig. 213 - Gregório Lopes, Adoração dos Magos, 1540-1545, MNAA (in Ficheiro:Gregório lopes, retablo
di santos-o-novo, 1540-45 ca. 05 adorazione dei pastori 1.jpg – Wikipédia, a enciclopédia livre
(wikipedia.org)).
312
Fig. 214 - Gregório Lopes, Ressurreição de Lázaro, c. 1540, Museu de Olivença (in Gregório Lopes
archivos - Museo de Olivenza).
313
Figs. 215, 216 e 217 - (1) Loggia da obra Ressurreição de Lázaro, c. 1540, Museu de Olivença (in
Gregório Lopes archivos - Museo de Olivenza); (2) Loggia do MNMC (in Fotos de Museu Nacional
Machado de Castro: Ver fotos e Imágenes de Museu Nacional Machado de Castro (expedia.com)); (3)
Loggia da Sé de Santarém (in Homilia – Diocese de Santarém (diocese-santarem.pt)).
Fig. 218 – Torreão circular da obra Ressurreição de Lázaro, c. 1540, Museu de Olivença (in Gregório
Lopes archivos - Museo de Olivenza).
314
Fig. 219 - Templo circular da obra Ressurreição de Lázaro, c. 1540, Museu de Olivença (in Gregório
Lopes archivos - Museo de Olivenza).
Figs. 220 e 221 - (1) Igreja de Santa Maria dos Olivais, em Tomar. Fotografia de Mariana Real; (2) Igreja
de Santa Clara, em Santarém (in Igreja de Santa Clara - Santarém | Guia para visitar em 2022 - oGuia
(guiadacidade.pt)).
315
Fig. 222 - Gregório Lopes, Natividade, 1523, MNAA (in Q96101319 - Wikidata).
316
Figs. 223 e 224 - (1) Pormenor fundeiro da obra Natividade, 1523, MNAA (in Q96101319 - Wikidata)
versus (2) Iluminura do Livro de Horas de D. Manuel, fol. 87 v (in MARKL, Dagoberto. Livro de Horas
de D. Manuel. Imprensa Nacional Casa da Moeda, Lisboa, 1983).
317
Fig. 225 - Gregório Lopes, Calvário, 1544, MNFMC (in MatrizNet (dgpc.pt)).
318
Figs. 226 e 227 - (1) Pormenor fundeiro da obra Calvário, 1544, MNFMC (in MatrizNet (dgpc.pt)) e (2)
Retábulo da Pena (in File:Sintra, Palácio Nacional da Pena, capela, retábulo do altar-mor.jpg - Wikimedia
Commons).
Figs. 228 e 229 - (1) Estrutural central e figuras alegóricas do templo da obra Calvário, 1544, MNFMC
(in MatrizNet (dgpc.pt)) e (2) Pormenor central e figuras alegóricas do Retábulo da Pena (in File:Sintra,
Palácio Nacional da Pena, capela, retábulo do altar-mor.jpg - Wikimedia Commons).
319
Fig. 230 - Claustro principal do convento de Cristo, Tomar. Fotografia de Mariana Real.
320
Fig. 232 - Ermida de N. Srª. da Conceição, Tomar (in Ermida da Conceição - Convento de Cristo
(conventocristo.gov.pt)).
321
Fig. 233 - Gregório Lopes, A Degolação de São João Baptista, 1538-1539, Igreja de S. João Baptista,
Tomar (in A Degolação de São João Baptista" por Gregório Lopes photo - Dias dos Reis photos at
pbase.com).
322
Fig. 234 - Gregório Lopes, plano fundeiro da obra A Degolação de São João Baptista, 1538-1539, Igreja
de S. João Baptista, Tomar (in "A Degolação de São João Baptista" por Gregório Lopes photo - Dias dos
Reis photos at pbase.com).
Figs. 235 e 236 - (1) Zona da lanterna da obra A Degolação de São João Baptista, 1538-1539, Igreja de S.
João Baptista, Tomar (in A Degolação de São João Baptista" por Gregório Lopes photo - Dias dos Reis
photos at pbase.com) e (2) igreja de São João Baptista, em Tomar (in "A Degolação de São João
Baptista" por Gregório Lopes photo - Dias dos Reis photos at pbase.com).
323
Figs. 237, 238 e 239 - (1 e 2) Loggia da obra A Degolação de São João Baptista, 1538-1539, Igreja de S.
João Baptista, Tomar (in A Degolação de São João Baptista" por Gregório Lopes photo - Dias dos Reis
photos at pbase.com) versus a loggia do MNMC (in Fotos de Museu Nacional Machado de Castro: Ver
fotos e Imágenes de Museu Nacional Machado de Castro (expedia.com)) e a (3) Iluminura do Livro de
Horas de D. Manuel, fol. 129 v. (in MARKL, Dagoberto. Livro de Horas de D. Manuel, Lisboa, 1983)
324
Figs. 240 e 241 – Figuras “gigantes” da obra A Degolação de São João Baptista, 1538-1539, Igreja de S.
João Baptista, Tomar (in A Degolação de São João Baptista" por Gregório Lopes photo - Dias dos Reis
photos at pbase.com) versus as figuras “gigantes” da igreja da Graça, em Évora (in Igreja e Convento da
Graça · História da Arquitetura Portuguesa (hap.pt)).
325
Fig. 243 - Mestre Desconhecido da Oficina de Lisboa, Pentecostes, c. 1520, MNAA (in
Ignoto_portoghese,_pentecoste,_1520_ca._01.jpg (1872×3066) (wikimedia.org)).
326
Fig. 244 - Mestre Desconhecido da Oficina de Lisboa, pormenor do vocabulário classista e emprego da
perspetiva na obra Pentecostes, c. 1520, MNAA. Fotografia de Mariana Real.
Fig. 245 - Gravura do Mestre monogramista “AG” (in BATORÉO, Manuel. Os “Primitivos Portugueses”
e a Gravura do Norte da Europa – A Utilização Instrumental de Fontes Gráficas, p. 87).
327
Fig. 246 - Colunas de mármore da obra Pentecostes, c. 1520, MNAA. Fotografia de Mariana Real.
Fig. 247 - Gregório Lopes, Adoração dos Magos, 1520-1525, MNAA (in File:Gregório lopes e jorge leal,
adorazione dei magi, 1520-25 ca. 01.jpg - Wikimedia Commons).
328
Fig. 248 - Gregório Lopes, pormenor das colunas sobre plinto, com capitéis coríntios, Adoração dos
Magos, 1520-1525, MNAA. Fotografia de Mariana Real.
329