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D I R E T O Ra de planejamento e
administraç ã o
Maria Emília Nascimento Santos
C O O R D E N A D O Ra - G ER AL DE pesq uisa ,
doc umentaç ã o e refer ência
Lia Motta
C O O R D E N A D O R - G E RAL DE PROMO ÇÃ O DO
P A T R I M Ô N I O CUL T U RA l
Luiz Philippe Peres Torelly
S u perintendente Regional em G oi ás ,
Mato Grosso e T ocantins
Salma Saddi Waress de Paiva
S u perintendente Regional Instituto do Patrimônio
no M ato Grosso do s u l
Maria Margareth E. Ribas Lima Histórico e Artístico Nacional
D EPARTAMENTO DO PATRIMÔNIO IMATERIAL
SBN Quadra 2 Edifício Central Brasília 1o andar
Cep: 70.040-904 - Brasília-DF
Telefones: (61) 3414-6135 , 3414 6137
www.iphan.gov.br - dpi@iphan.gov.br
coordenaç ã o de edi çã o
Natália Guerra Brayner
Rívia Ryker Bandeira de Alencar
PÁ G I N A 2
festa de S ão Jo ão .
C oru mbá - M S , 2 0 0 2 .
Foto: Francisco M . da
C osta.
PÁ G I N A 4
E xposiç ã o de Viola-
de- C ocho para venda
na porta da casa de
C aetano Ribeiro
C u iabá - M T , 2 0 0 7 .
F oto: Edilberto
F onseca.
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sumário
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APRESENTAÇÃO
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V iola-de-cocho é um
instrumento musical de
forma e sonoridade sui generis
sustentabilidade ecológica não
garante a preservação da viola-de-
cocho como instrumento musical.
relevantes desse universo que
devem ser compartilhados
e divulgados para ampliar
produzido na região da bacia do A garantia do acesso às matérias- o conhecimento sobre esse
Rio Paraguai – baixada cuiabana e primas e da reprodução artesanal patrimônio cultural.
adjacências – nos estados de Mato não são suficientes para sua Parafraseando um verso bem
Grosso e Mato Grosso do Sul. continuidade. Essas ações devem popular no cururu:
Destaca-se como um instrumento estar integradas à valorização da “Deixa estar, jacaré, que essa
fundamental nos gêneros musicais sonoridade desse instrumento e riqueza não vai acabar...”
cururu e siriri, cultivados, de suas funções nas rodas, festas
sobretudo, em manifestações e celebrações que animam a vida Luiz Fernando de Almeida
culturais ligadas à religiosidade e à social no Brasil Central. Presidente do Iphan
brincadeira. É produzida de modo É muito importante também
artesanal e, tradicionalmente, que a viola-de-cocho e sua música
com matérias-primas extraídas da sejam amplamente conhecidas
natureza – da fauna e da flora do e apreciadas pelo conjunto
pantanal e do cerrado. da sociedade brasileira, pois
A salvaguarda do processo expressam a identidade de
de fabricação artesanal do um universo cultural povoado
instrumento só é possível, de bichos, gente, santos, mitos,
portanto, se for ecologicamente lendas e histórias fundamentais
sustentável e fundada na relação para a manutenção da riqueza
harmoniosa e consciente simbólica de nosso país. Esse
dos artesãos com o meio oitavo volume da série Dossiê
ambiente. Entretanto, a mera Iphan traz a público aspectos
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Introdução
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P ÁGINA A o lado
Jo ão B atista R odrig ues .
C uiab á-MT, 1988.
F oto : E li zabeth
Travassos .
A BAI X O
D ETALHE DE VIOLA
D ESENHADA.
C OR UMB Á -MS, 2002.
F oto : F rancisco M. da
C osta .
A ntônio H élio.
Poconé - M T , 2 0 0 3 .
Foto: Francisco M . da
C osta.
J oã o G onç alo.
L ivramento -MT, 2003.
F oto : F rancisco M. da
C osta .
P ÁGINA A o lado
Mapa de M ato G rosso e
Mato G rosso do Su l .
Mapa do B rasil .
A O LADO
C ur uru eiros Manoel
S everino , C aetano
R ibeiro e J únior
C ésar , 2007.
F oto : C arla B elas .
O instrumento musical
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C ordas de nailon em
su bstit ui çã o à s de tripa
de animais .
C u iab á-MT, 2007.
F oto: Edilberto F onseca .
Coloca çã o do rastilho .
C uiab á-MT, 2003.
F oto: E dilberto F onseca .
E ntalhe do rastilho .
C uiab á-MT, 2003.
F oto: E dilberto F onseca .
C antoria de cur ur u,
S EU NHÓCA E SE U
A GRIPINO MAGALH Ã E S.
Coru mb á-MS, 2002.
Foto : F rancisco M. da
Costa .
V ista Pantanal.
C oru mbá - M S , 2 0 0 2 .
Foto: Francisco M . da
Costa.
obrigação. O sujeito pede e recebe, “No caso da viola-de-cocho, em direção ao Pantanal, o rio é
é milagre.” [Agripino Magalhães, quando as cordas são golpeadas com navegável; na direção contrária, o
89 anos, Corumbá, 2002] força, soma-se, ao som musical rio tem corredeiras que impedem a
A chamada viola caipira de 5 emitido, um leve ruído fricativo navegação. Entretanto, quando as
ou 6 cordas duplas, largamente que integra a sonoridade do expressões são usadas no contexto
conhecida em praticamente todo instrumento, individualizando-lhe do cururu e da viola-de-cocho,
o Brasil, também é utilizada o timbre.” (1981: 32) o ponto de referência passa a ser
em Mato Grosso, na música A viola pode ser também o município de Rosário Oeste.
das catiras1, das bandeiras de ponteada - tocada de forma De Rosário para baixo, incluindo
folia, e nas modas de viola2. Os dedilhada - funcionando como Cuiabá, a viola é tocada em
mato-grossenses chamam-na viola instrumento solista, mas nem andamento mais vivo. De Rosário
de pinho. Ninguém cogita usá- todos os cururueiros sabem usá- para cima (região de Nobres,
la no cururu, em substituição la dessa maneira. A execução Alto Paraguai, Diamantino),
à viola-de-cocho, já que esta de melodias é mais frequente é tocada mais lentamente, e,
última não é meramente uma no rasqueado, ritmo conhecido em consequência, o cururu
viola que se toca quando não na região do rio Paraguai e tem também andamento mais
há outro instrumento de muito comum nos bailes mato- moderado. As diferenças de
cordas disponível. Viola-de- grossenses e também na chamada andamento são acompanhadas
cocho e viola de pinho são dois “música caipira”. por maneiras diferentes de
instrumentos distintos por sua Frequentemente os violeiros dançar o siriri.
estrutura, afinação e timbre. referem-se aos sotaques rio-abaixo
A individualidade sonora da e rio-acima ou à viola-rio-baixana
viola-de-cocho foi ressaltada por e viola rio-acima, referências a
quantos a ouviram. Julieta de dois trechos do rio Cuiabá: da
Andrade observa: cidade de Cuiabá, descendo-se
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A viola-de-cocho
C osta.
Festa de S ão Joã o.
e o conjunto
C orumbá - M S , 2 0 0 2 .
Foto: Francisco M . da
instrumental C osta.
C om forma e sonoridade
singulares, a viola-de-cocho
integra um sistema musical sui
cururueiros, o ganzá se destaca
tanto no cururu como no siriri,
pela peculiaridade de seu timbre.
generis na região Centro-Sul, O tamboril está presente
especialmente nos estados de apenas na dança do siriri, sendo
Mato Grosso e Mato Grosso do um dos instrumentos que dão
Sul. O modo de fazer a viola-de- ritmo aos dançarinos. Trata-se
cocho está relacionado, também, de um pequeno tambor apoiado
ao fazer artesanal de um conjunto em pés de madeira (geralmente
de instrumentos que compõem cabos de vassoura), medindo
o complexo musical-poético- aproximadamente um metro
coreográfico do cururu e do siriri, de altura, sendo que o tambor
onde ela tem papel de destaque.
Os principais instrumentos que comprimento, é feito de taquara e
compõem o conjunto instrumental possui diversos cortes transversais
nessas manifestações, ao lado da a seu comprimento (um corte a
viola-de-cocho, são o ganzá, o cada meio centímetro). Para fazer
tamboril (ou tamborim), o mocho o instrumento soar, é necessário
e, também, o adufe. friccionar um pequeno pedaço
O ganzá é um instrumento de pau, osso ou pedra de cima
de percussão, uma espécie de para baixo e de baixo para cima,
reco-reco, sendo, em alguns no sentido do comprimento do
lugares, também conhecido instrumento. De volume mais
como cracachá ou caracachá. Com elevado do que as violas-de-
aproximadamente 50 cm de cocho e as próprias vozes dos
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abai xo
C onj unto instr u mental
do siriri : mocho , viola -
de- cocho e gan zá, na
casa de D ona M arcolina ,
bairro P edrig ão , F esta de
Nossa Senhora A parecida .
C uiab á-MT, 1987.
F oto: Lu iz I ti A be .
O ofício
Costa. M odelagem do tronco
com motosserra, Alcides
Ribeiro.
C u iabá - M T , 2 0 0 3 .
F oto: Francisco M . da
C osta.
D iferentemente de outros
instrumentos musicais de uso
popular (viola caipira, violão,
cavaquinho, numerosos instrumentos
de percussão, etc.), confeccionados
tanto por artesãos tradicionais
quanto por empresas, em escala
industrial, a viola-de-cocho é produto
exclusivamente artesanal, feito por
artesãos para uso próprio ou para
atender à demanda de pequenos
mercados locais constituídos por
músicos, pesquisadores, pessoas
ligadas ao cururu e siriri e, também,
turistas de um modo geral.
Os cururueiros costumam
reconhecer facilmente o fabricante de
uma viola-de-cocho graças a certas
características e marcas artesanais
que a individualizam.
A utilização atual da viola-de-
cocho, especificamente por parte de
músicos, tem demandado algumas
modificações na estrutura física do
instrumento. Isso se dá por requisição
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Oficina de produ ç ão de
viola, Mestre Severino
Moura.
Corumbá - M S , 2 0 0 2 .
Foto: Francisco M . da
C osta.
ao lado
I n á cio S o uz a B rand ão.
C orumb á-MS, 2002.
F oto: F rancisco M. da
Costa .
abaixo
F u ro do cavalete .
C uiab á-MT, 2007.
F oto: E dilberto F onseca .
preço de uma viola pode alcançar institucional para que possam fazer,
aproximadamente R$ 350,00. dessa atividade, uma profissão.
Porém, para os cururueiros que Além da pequena e tradicional
desejam comprar uma viola, os preços produção artesanal individualizada,
são menores e negociados, pois, observa-se em Cuiabá, na casa de
como lembra Alcides, “eles é que vão Caetano Ribeiro, um caso de processo
segurar um pouco mais a cultura”. coletivo familiar e doméstico, com
Os artesãos de viola que divisão de trabalho análoga a uma
mantiveram o saber vivo até hoje, linha de montagem, que proporciona
não obstante o desinteresse do poder aumento de produtividade e
público e do mercado de música atendimento de uma demanda
popular, têm expectativas de apoio maior e mais variada. Nesse casos,
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S uvenires de viola-de -
cocho, Pau lo Santos .
C uiabá - M T , 2 0 0 7 .
Foto: Carla Belas
alguns artesãos realizam o corte, violas-de-cocho dirigidas a novos São confeccionados, por exemplo,
outros escavam a viola enquanto mercados como os dos turistas, chaveiros e pequenas violas com
outros colaboram na lixação e colecionadores e apreciadores de inscrições pirografadas como “Viola-
acabamento final. arte popular. Manoel Severino de-Cocho – Cuiabá-MT”, além de
A produção de viola-de-cocho de Moraes, 76 anos, como outros frases solicitadas pelos compradores.
para o mercado, embora já não se artesãos antigos, afirma ter reunido, Feitas a partir de sobras de madeiras
vincule somente às necessidades somente entre 1974 e 1985, mil e da produção, esses suvenires são
dos cururueiros, é ainda um tanto trezentas notas de artesanato, isto é, confeccionados tanto por artesãos
incipiente. São poucos os artesãos notas de venda de violas-de-cocho em Mato Grosso do Sul, a exemplo
que ganham a vida confeccionando na Casa do Artesão de Cuiabá. de Everaldo Gomes, quanto em
violas-de-cocho, sem exercer outra Mesmo uma produção tão elevada de Mato Grosso, a exemplo de Paulo
profissão. João Batista Rodrigues, 130 violas por ano, em média, não Roberto dos Santos.
que participou da pesquisa feita pelo significou que Manoel Severino tenha
Centro e expôs na Sala do Artista deixado de trabalhar em profissões
Popular, em 1988, é um exemplo de como pedreiro ou carpinteiro, nem
artesão que dedicou todo seu tempo que as encomendas dos fregueses
à confecção de violas. tradicionais tenham cessado.
A Casa do Artesão (Fundação de A crescente revitalização do
Promoção Social Pró-Sol) e a Casa interesse pelas expressões associadas
da Cultura (Secretaria Municipal à viola-de-cocho fez aumentar a
de Educação de Cuiabá), órgãos demanda pela produção de suvenires
que promovem e comercializam o (chaveiros, porta-canetas e outros)
artesanato mato-grossense, vêm se para turistas, firmas e instituições
constituindo, há alguns anos, um diversas, para compradores de outros
espaço de estímulo à produção de estados e mesmo de fora do país.
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O processo de
fabricação
A confecção da viola-de-cocho
foi documentada por Francisca
Ferreira (1978) e por Julieta de
Andrade (1981), sendo que esta
autora descreve detalhadamente o
processo, identificando as matérias-
primas usadas. A descrição feita,
aqui, sobre o modo de fazer a viola-
de-cocho se apóia em dados colhidos
nas recentes pesquisas realizadas
junto aos artesãos das localidades
de Cuiabá, Várzea Grande,
Poconé, Barão de Melgaço, Santo
Antônio do Leverger, Jangadas,
Rosário Oeste, Diamantino,
Nobres, Livramento (MT), além de
Corumbá e Ladário (MS).
Várias madeiras são
tradicionalmente usadas na
construção da viola. Para o corpo
do instrumento, as preferidas são a
ximbuva, o sarã-de-leite e o cedro.
Mais fáceis de escavar, as madeiras
macias são as preferidas para o
corpo do instrumento, embora
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algumas, justamente por essa “Eu acredito muito na lua, bastante.” [Manoel Severino, 76
qualidade, sejam mais susceptíveis porque a gente já tinha aquele anos, Cuiabá, 2008]
ao ataque dos insetos. O corte da hábito na folia... dia... quando é O sarã-de-leite é uma madeira
madeira deve ser feito sempre na lua minguante, cheia, crescente. Eu encontrada nos baixadões, beiras de
minguante. Caso não seja cortada acredito que a lua boa pra tirar rio que passam grande parte do ano
na lua certa, a madeira pode ser madeira é a minguante, mas vi alagadas; ao contrário da ximbuva,
atacada por um tipo de cupim, o que na minguante tudo diminui, encontrada mais na terra firme. Na
caruncho, que esburaca toda a caixa. desde o som da viola diminui. falta das madeiras mais adequadas,
Além disso, há uma forma específica Agora, na cheia, tá tudo grande... vêm sendo empregadas hoje também
de fazer o corte, senão, como diz todo mundo de olho na lua cheia. a seriguela e a urucurana ou sangra
seu Manoel Severino, “a madeira dá Se tirar na cheia corre o risco de d´água, o jacote, o cajueiro, o
vento”, ou seja, trinca e dá fissura. perder a madeira ou ela bichar mandiocão e a mangueira. Alguns
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preparaç ã o,
colagem e fixa ç ã o
do tampo.
C uiabá - M T , 2 0 0 7 .
Fotos: Edilberto
Fonseca.
artesãos usam o cedro para o corpo difícil localização, reclama o artesão viola, que é tampada aqui, [que] não
do instrumento, embora esse tipo de Alcides Ribeiro. Outras madeiras tem buraco, tem mistério”.
madeira seja preferido para partes também podem ser utilizadas, tais Tradicionalmente, as madeiras
do instrumento que necessitam de como a catana e a sapopemba, e, mais são retiradas com machado, porém
maior resistência. As violas-de- recentemente, também a teca. Para o uso da motosserra tem
cocho feitas de cedro, pela própria as demais partes da viola, palheta otimizado o trabalho de corte e
qualidade da matéria-prima, são ou paiêta, cravelha e pestana, são beneficiamento da matéria-prima.
muito duráveis, podendo chegar, escolhidos o cedro e, em alguns casos, Com essa ferramenta podem ser
segundo contam, a mais de 100 anos. a taipoca. As violas podem apresentar- cortadas aproximadamente 10 violas
Para o tampo da viola é mais se com ou sem orifício no tampo. de um único tronco, ao passo que,
comumente usada a raiz da figueira, Damião de Almeida, de Rosário com o machado, de uma árvore
material que atualmente é de Oeste, diz que o povo fala que “a como o sarã, se ela for grossa, se
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ao lado
M odelagem do tronco.
Coru mbá - M S , 2 0 0 2 .
Foto: F rancisco M . da
C osta.
abai xo
C oloca ç ão das
cravelhas .
Cu iab á - M T , 2 0 0 7 .
Foto: E dilberto Fonseca.
í ndios G uatós
docu mentados por
M ax Schmidt.
iní cio do S éc ulo 2 0 .
Referências
históricas
“É porque foi meu avô que ensinou (1940), que descreveu brevemente
pro meu pai. Você sabe que, quando as festas religiosas de Cuiabá, onde
eu cheguei, nessa época já vinha se cantava o cururu. Segundo esse
daquele tempo todo. Agora, vamos lá autor, os instrumentos musicais do
saber de que geração veio isso, quem cururu cuiabano eram os seguintes,
fez isso... Eu mesmo não sei, foi meu cem anos atrás:
pai que me ensinou e o avô dele já
brincava, então é muito bom isso aí. • Koschó: descrito como um violino
Só sei é que é muito bom.” [Severino de cordas de tripa, feito de madeira
de Moura, 80 anos, Corumbá, 2002] de salgueiro;
• Krakaschá: pedaço de bambu ou
A s pesquisas bibliográficas
apontam referências ao uso
da viola-de-cocho e expressões
uma cuia comprida com entalhes,
que se toca com outro pedaço
Fora dos estados de Mato Grosso e de bambu;
associadas em Cuiabá (Von den Mato Grosso do Sul, • Adufe: pandeiro com moedas de
Steinen, 1940); Cuiabá, Rosário Rossini Tavares de Lima (1957) cobre como soalhas;
Oeste e região de Corumbá entre pesquisou o cururu em São Paulo, • Viola: descrita como violino de
os índios Guatós (Schmidt, 1942); encontrando referências sobre violas cordas de arame;
região do Rio das Garças (Brasileiro, feitas a partir da mesma técnica, em • Marimba dos Negros: usada às
1951); Cuiabá, Várzea Grande, pesquisas de campo em Piracicaba, vezes no cururu.
Jacitara, Santo Antônio do Leverger, Tietê, Laranjal, Conchas e Pereiras.
Nossa Senhora do Livramento, A notícia mais antiga sobre a A lista merece um breve
Poconé, Sesmaria do Rosilho, viola-de-cocho data de finais do comentário. A marimba dos
Chapada dos Guimarães, Santa século 19 e foi dada pelo cientista negros parece deslocada demais
Teresa, Mimoso (Andrade, 1981). alemão Karl von den Steinen no contexto de uma descrição do
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F oto de u ma viola
chamada “ mochinho ”
E M P UBLICA ÇÃ O DE 1947
I NTIT U LADA DO cumento
F olclórico P a ulista , de
A lce u M aynard de A raújo .
cururu cuiabano, ao menos se cientista teria feito menção a um parte dos presentes seguia o ritmo
tivermos em mente o cururu atual. arco que friccionasse as cordas do por meio de um pau que roçava
Teria o autor visto o instrumento koschó. A descrição de Steinen, na numa tripa de bambu, instrumento
atuando em outro gênero musical? verdade, suscita mais dúvidas do que denominam caracacha.Os
O trecho não esclarece, nem se que fornece certezas, mas permite dansarinos dispuseram-se em duas
compreende por que foi feita assegurar, pelo menos, que tanto filas e, depois, em círculo fechado.
a ressalva “às vezes”. A viola de cururu quanto viola-de-cocho Assim foi indo, cada vez mais
cordas de arame seria talvez eram comuns em Cuiabá há mais animadamente, até a madrugada,
semelhante a uma viola caipira, de um século. sendo apenas interrompido o
que hoje em dia não frequenta Max Schmidt, outro etnólogo movimento, de vez em quando,
o cururu mato-grossense. O alemão, viu a viola-de-cocho e o para se afinar os instrumentos
adufe, também chamado adufo, cururu em Mato Grosso em 1900/ de corda e dar aguardente aos
é mencionado modernamente 1901 (Schmidt, 1942). Em Rosário, cantores, o que lhes emprestava
por alguns informantes mato- no dia 31 de dezembro de 1900, novas forças.” (Schmidt, 1942: 11)
grossenses, que se recordam de descreve da seguinte forma a festa Schmidt não descreveu a viola,
tê-lo visto na roda de cururu; da Imaculada Conceição: mas fotografou um exemplar usado
aliás, aparece também no cururu pelos índios Guatós, habitantes
paulista, assim como a viola “...agrupou-se entorno do da região do pantanal próximo a
(Araújo, 1949). O krakaschá de altar certo número de dansantes, Corumbá, área que atualmente
bambu é o atual ganzá. Apesar de formando semicírculo para integra o estado de Mato Grosso
Steinen ter-se referido ao koschó ou começar a dansa do cururú, tão do Sul. O instrumento fotografado
cocho como violino, pode-se conhecida em Mato Grosso. Parte por Schmidt é praticamente
supor que o que ele observou era dos que dansavam acompanhava idêntico à viola-de-cocho atual,
um instrumento de cordas na viola os versos alí mesmo com 5 cordas simples, braço
dedilhadas; caso contrário, o improvisados pelos cantores. Outra bastante curto, orifício no tampo
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Oficina de violas-de -
cocho.
C orumbá - M S , 2 0 0 2 .
F oto: Francisco Moreira
da Costa,
de uma fotografia tirada por este caboclo, velho canturião, um cocho mão para ensinar História Sagrada
pesquisador, foi incluído em outra com cordas de tripa de mico, e que aos catequisados (...). Sem dúvida,
obra (Araújo, 1977: 135). Havia afina à moda de cavaquinho, ré-sol- o Cururu é a mais antiga e brasileira
também em São Paulo um certo si-ré.” (Araújo, 1949: 58, nota 15) de todas as danças populares; é
cocho de quatro cordas: Segundo o mesmo autor, paulista, piratiningana.” (Araújo,
acompanhado por Antônio Cândido 1949: 35-36)
“Conhecemos outro tipo de (1956), o cururu paulista seria uma O mesmo autor acreditava
cocho, feito como o anterior, mas dança bastante antiga, constituída no na difusão desse gênero, de São
usa quatro cordas. As cordas são processo de sincretismo Paulo para o oeste, acompanhando
de tripa de mico. Pedro Chiquito, a expansão bandeirante. Dessa
cururueiro, contou-nos que viu “luso-brasílico, inteligente forma o cururu teria chegado à
perto de Pereiras, na casa de um forma lúdica de que o jesuíta lançou região de Mato Grosso. Contudo,
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V italino Soares.
C oru mbá - M S , 2 0 0 2 .
Foto: Francisco M . da
C osta.
transporte de madeira
( sarã- de-leite ), A lcides
R ibeiro e M anoel
S everino .
C u iab á-MT, 2003.
F oto : F rancisco M. da
Costa .
P ÁGINA A o lado
C antoria de Cu ru ru.
rosá rio O este-mt , 2003.
F oto : F rancisco M. da
C osta .
abai x o
Gr upo de S iriri .
D iamantino -MT, 2003.
F oto : E dilberto F onseca .
A viola-de-cocho desempenha
papel central na sustentação
harmônica do canto no cururu e
e São João. Nelas, há sempre uma
roda de cururu que, composta de
um grupo de homens, dança em
anualmente as festas e convidam
um grupo de cururueiros para
cantar e dançar.
no siriri, como também na dança círculo e toca violas-de-cocho e As rodas de cantoria de cururu
de São Gonçalo, no boi-a-serra3 e ganzás, cantando suas louvações alternam momentos distintos que
no rasqueado, sendo que cada um ao santo homenageado, cuja se ordenam em uma sequência
desses gêneros possui peculiaridades imagem fica exposta em um altar. determinada. No primeiro deles
quanto à música, à poética e à Devotos de um determinado santo, observam-se as trovas compostas
dança. Não obstante a ameaça geralmente donos de uma imagem na forma versos + toadas. Os versos
constante de desaparecimento, as sua ou indivíduos a ele ligados por e toadas são específicos e dizem
manifestações tradicionais seguem força de promessa, organizam-se respeito a cada um dos momentos
acontecendo periodicamente. em irmandades que promovem da celebração. São trovas criadas
As cantorias têm lugar no
domínio doméstico, mas
principalmente nas rodas de
cururu e siriri que acontecem
em festividades locais, como dias
santos, casamentos e aniversários,
bem como naquelas organizadas
como pagamento de promessas. As
celebrações sagradas mais marcantes
e concorridas são as festas de São
Benedito, São Sebastião, São
Gonçalo, e aquelas ligadas ao ciclo
junino: São Pedro, Santo Antônio
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ao lado
Roda de C uru ru ,
F esta de S ão Joã o.
C oru mbá - M , 2 0 0 2 .
F oto: Francisco M . da
C osta.
abaixo
P rocissã o para
lavagem do santo
na beira do rio, na
festa de S ão Joã o.
C orumbá - M S , 2 0 0 2 .
F oto: Francisco M . da
C osta.
ao lado
violeiro da O rq uestra de
C âmara do E stado de M ato
Grosso , L eonardo Yu le .
C uiab á-MT, 2008
F oto: L úcia C arames
Sartorelli .
abai xo
V iola -de-cocho na
O rq uestra de Câ mara do
E stado de M ato G rosso
( detalhe ).
C uiab á-MT, 2008.F oto :
Lúcia C arames S artorelli .
apenas grupos de siriri se Mais recentemente, a viola- para o instrumento vêm sendo
apresentavam. Hoje, já na 6ª de-cocho passou a participar desenvolvidos por compositores,
edição, o festival promove também também dos círculos de música arranjadores e intérpretes locais que
a competição entre cururueiros. erudita com a inclusão de um fazem, assim, a relação entre a cultura
A prefeitura financia os prêmios naipe de instrumentos dentro da erudita e a popular tradicional.
e oferece, além de dinheiro aos Orquestra de Câmara do Estado Assim, através de iniciativas
primeiros colocados, a gravação de do Mato Grosso. Organizada um como estas, e depois de um longo
um CD com as músicas classificadas. ano antes, a orquestra, já em 2006, período de baixa expressividade
Esse investimento do governo se consolidava com uma turnê no cenário urbano, a viola-de-
local tem atraído para o festival um internacional e uma temporada cocho, o cururu e o siriri se veem
número crescente de dançantes, de 83 concertos em Mato Grosso. novamente valorizados como
com grupos concorrentes de todo Desde o início a orquestra chamou símbolos de identidade cultural da
o estado, contando com um grande a atenção pela sua singularidade região, passando a ocupar novos
público para as apresentações. em função da incorporação de espaços culturais. Entretanto, não
No âmbito da música popular, instrumentos característicos da podemos deixar de observar que se
violeiros como Roberto Corrêa, cultura popular local como: violas- os saberes (artesanato e a prática
Paulo Freire, Abel Santos, Ivan de-cocho, bruacas e ganzás. Em musical) relativos ao instrumento
Vilela e Daniel de Paula, entre relação, especificamente, à viola-de- estão vivos, sendo transmitidos e
tantos outros, têm, já há algum cocho, é a única orquestra do país reproduzidos, isso se deve, antes
tempo, utilizado a viola-de-cocho a possuir “um naipe ‘permanente’ de tudo, à responsabilidade e à
profissionalmente, dedicando ao de violeiros que atuam junto aos vontade dos cururueiros que,
instrumento inúmeras composições instrumentos clássicos tradicionais obstinados, encontraram meios de
que, gravadas em CD, têm como o violino, a viola clássica, o salvaguardar o que hoje o Estado
alcançado reconhecimento por violoncelo e o contrabaixo” (Falcão, reconhece como patrimônio
parte do público. 2007: 69). Composições e arranjos cultural do país.
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F esta de Sã o
S ebasti ã o.
Nossa S enhora do
L ivramento -MT, 2007.
F oto: C arla B elas .
O cururu
“Todos fizeram círculo, João das mãos nas diferentes partes do dinheiro para comprar sapato.
Caracará afinou a viola, alguns pratos corpo propícias para isso.” (Schmidt, Por isso, andava triste e chorava
serviam de pandeiros para as colheres 1942: 109-110) constantemente. Certo dia, um
e, logo depois, ouviram-se os gemidos Rossini Tavares de Lima, ao sapateiro de mau coração deu-lhe
das vozes que entoavam os versos pesquisar as origens da dança do um calçado, cujos pregos da sola se
uníssonos. O andar regularmente cururu no estado de São Paulo, achavam à mostra. Assim mesmo
ritmado em círculo era de momento relaciona estas às danças de São o santo calçou-o e quando andava
a momento interrompido por uns Gonçalo, recolhendo em entrevista dava uns passos e mancava. Com
pulos executados pelo nosso amigo a seguinte história: esse sapato, ele também dançava
Reginaldo, que ainda procurava mancando. Surgiu desse modo a
completar o ruído dos chamados “S. Gonçalo era um menino dança do Cururu, que nos seus
instrumentos, batendo com as palmas pobre. Vivia descalço, por não ter movimentos recorda o suplício de
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S. Gonçalo.” (Lima, 1957:12-13) catequização, sendo, por isso, grandes centros urbanos contam,
Quanto às origens do nome dançada diante da cruz. também, com a ajuda e a colaboração
cururu, Câmara Cascudo (1954), Tanto o cururu quanto o siriri de autoridades e pessoas ilustres. Já nas
citando Alceu Maynard Araújo, fazem parte do calendário anual cidades do interior, a maior parte dos
indica que provavelmente estaria de festividades das localidades recursos é obtida ainda somente junto
ligada à deturpação da palavra identificadas. Normalmente os à família do festeiro.
Cruz, em função do hábito, cururueiros estão ligados a um grupo Seguindo o calendário católico, as
entre os indígenas, da repetição e/ou irmandade que promovem as festas concentram-se, principalmente,
da última sílaba, o que teria festas nos dias consagrados aos santos nos períodos dos festejos juninos,
resultado em Cururu. Cascudo padroeiros, reunindo os recursos entre junho e agosto, sendo retomadas
explica que a dança foi trazida necessários. Algumas das principais no ciclo de final de ano, de dezembro
pelos colonizadores com fins de festas de cururu realizadas hoje nos a janeiro. Os períodos de março
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C rianç as na Festa de
S ão Pedro.
S anto Antônio do
Leverger- M T , 1 9 8 7 .
Foto: Eli z abeth
Travassos.
R e z a da ladainha no
altar na casa de D ona
Marcolina , bairro
P edrig ão , F esta de Nossa
S enhora A parecida .
C u iab á-MT, 1987.
F oto: Lu iz I ti A be .
Como costuma dizer Luiz rei, à imagem do santo padroeiro que está no altar, a bandeira, a
Marques, o cururu é como uma celebrado na festa. A rainha, à vela coroa e as demais imagens.
peça de teatro4 . No final da consagrada. O alferes, à bandeira. Formada a procissão, começa
tarde de sexta-feira têm início O capitão-do-mastro, ao mastro a chamada para que todos se
as atividades. Após o jantar, o e/ou à coroa. Os juízes e as juízas, encaminhem ao batente ou portão.
festeiro convoca os cururueiros aos ramos. Essas obrigações, Canta-se então para puxar a
para tomarem posição, em círculo, imagens, insígnias e objetos procissão até o batente, o que é
diante do altar, cuja arrumação sagrados vão variar dependendo feito em ritmo lento, com paradas a
dentro das casas, ou nos quintais, do padroeiro homenageado. cada cinco passos dados.
é uma das obrigações do festeiro. Assim, cantando e versejando,
Quem está do lado direito do altar os cururueiros vão orientando o Meus colega companheiro
inicia a função, e cada cururueiro reinado a pegar o santo padroeiro meus colega folião
vai cantar saudando o santo, o vão chegar até o batente
próprio altar e o dono da casa. com essa linda procissão
Em seguida, sempre cantando,
eles chamam os devotos formando Para passar pelo batente, é preciso
assim a procissão, o alferes de que cada cururueiro benza o corpo
bandeira e o capitão, que convidam a fim de poder puxar a procissão.
todo o reinado para acender as Em seguida, eles cantam para pular o
velas, base da iluminação. batente, seguidos do reinado.
O próximo passo é a cantoria
para que cada membro do reinado Com a entrega do menino
pegue sua obrigação. Cada um dos São José ficou contente
personagens do reinado relaciona- Convido essa procissão
se a um objeto em particular: o vamos pular esse batente
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Ou também,
É a hora de “experimetar”
a bandeira no mastro. Uma vez
aprovada, ela é retirada do mastro,
e canta-se para dar permissão a seu
encaixe no mastro:
Eu quero cantar meu verso Em seguida o rei é chamado na sepultura de Adão, um buraco
no meio dessa fileira para encaixar o cruzeiro no final assim chamado porque nele brotou
senhores e senhorita do mastro. Antes de se erguer o o ramo de oliveira. Em algumas
pode encaixar essa bandeira. mastro, é preciso que os cururueiros festas, primeiramente suspende-se o
cantem para que a procissão beije o mastro; em outras, reza-se para depois
Também para o encaixe são padroeiro e a bandeira. suspendê-lo, a fim de que a bandeira
toados, então, cantos apropriados: Chega o ponto culminante do também pegue a oração.
ritual, que é o levantamento do
Essa madeira foi tirada mastro, quase sempre em frente à casa Meus colega companheiro
onde existe terra boa do festeiro, para o que é fundamental é chegada a ocasião
Se o alferes encaixou a bandeira a presença dos cururueiros. Ao som de pode plantar essa semente
capitão encaixa a coroa. suas trovas, o mastro é então fincado na sepultura de Adão.
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C u r ur u, F esta de
S ã o Pedro .
S anto A ntônio do
L everger -MT, 1987.
F oto: Eli z abeth
T ravassos .
Além do mastro principal, Foi erguido esse mastro Tão bonito esse festejo
podem ser erguidos dois outros, no meio da multidão nessa linda ocasião
que simbolizam o momento do aonde nele está cravado pode apagar essas velas
sacrifício de Jesus Cristo e dos dois o filho de Conceição.
que se encontram em vossas mão.
ladrões. Além dessa versão para
a presença dos três mastros, João Fixado o mastro, a procissão
Finalmente despacha-se a
Gonçalo, do município de Nossa dá três voltas em torno dele, no
sentido horário, tendo à frente os procissão, e os cururueiros entoam
Senhora do Livramento, diz haver
cururueiros. Toma rumo, então, trovas de agradecimento ao dono
também uma relação simbólica
de volta ao altar, da mesma maneira da festa. Terminada essa etapa, os
com as estátuas de bronze que Deus
como veio: fazendo uma parada capelães, de pé ou sentados à mesa,
mandou Moisés construir.
a cada cinco passos. Depois de puxam as rezas, que são respondidas
Uma vez erguido o mastro, canta-
todos passarem pelo batente da pelas mulheres. As rezas têm sempre
se para o capitão colocar terra em sua
casa, os cururueiros cantam para relação com o santo homenageado
base, onde também se acendem três
serem assentados todos os santos e especificamente naquela ocasião,
velas, que representam a Santíssima
sendo que, dependendo da
Trindade. Já segundo João Gonçalo, imagens presentes.
localidade, elas podem ocorrer antes
são quatro velas, representando os
ou depois do cururu. Essas rezas e
quatro guardas que, enviados por Meu colega companheiro ladainhas, normalmente aprendidas
Herodes, guardaram o sepulcro de meus amante folião pelos devotos junto aos pais, podem
Jesus a fim de que seu corpo não
pode assentar o padroeiro durar mais de uma hora. Finalizada
fosse roubado. Pesquisas de campo
que está em vossa mão. essa parte, os cururueiros cantam
têm mostrado, no entanto que,
para arrodear a função e podem
muitas vezes, são acesas mesmo mais
Chega então a hora de cantar seguir nessa roda de cantoria de
do que quatro velas. Para finalizar,
para apagar a iluminação (as velas): cururu até o dia amanhecer.
termina-se com uma trova como
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O siriri
ao lado
S iriri.
Rosá rio Oeste-mt , 2 0 0 3 .
F oto: Francisco M . da
C osta.
abaixo
Renascer do Valo Verde
– V ídeo Siriri, C uru ru e
Re z a Cantada.
S anto Antônio do
L everger- M T , s /d.
ao lado
G r upo V iola -de-Cocho –
V í deo F estival S iriri
de Cuiab á.
C uiab á-MT, 2006.
Segundo ele, antigamente o A dança do siriri vem sendo “Nós quando era criança, que
siriri era usado como forma objeto de projetos sociais e nós era inda criança, nós não entrava
de aproximação entre os casais oficinas junto aos alunos das no cururu de gente grande de mais
devido à severidade da educação escolas públicas, onde homens e velho... não. Pai não deixava. Fica
dada pelos pais aos filhos. mulheres, conhecedores, ensinam só espiando. Eu aprendi fazer viola
Diferentemente do cururu, que as letras das cantigas e os passos só de ver meu pai fazer, eu aprendi
acontecia quase sempre nas salas, o mais tradicionais, como é o caso cantar cururu só de ver outro
siriri tinha lugar nos terreiros das de Domingas Leonor, do grupo cantando, eu pegava e ‘tum’. Ele
casas, e, sendo dança de par junto, Flor Ribeirinha, da comunidade não gostava de que nós pegava a viola
servia como uma forma de flerte de São Gonçalo Beira-Rio, em dele. Nós aprendemos assim de si
entre os casais. Cuiabá. Dessa maneira, várias próprio e vendo ele cantando, como
Tradicionalmente, as pessoas escolas públicas têm organizado ele fazia lá, isso aí foi entrando na
que participavam do cururu e do grupos de dança do siriri. Algumas minha idéia... Nós cantava entre nós
siriri nas festas, não usavam pessoas, por pertencimento criança, na estrada da roça, isso nós
nenhum tipo de uniforme ou roupa a famílias de cururueiros ou cantava. Aí quando chegava na festa,
especial. Elas apenas iam “com frequência de longa data em nós saímos fora, e alguém que falava:
uma roupa melhor” como conta festas tradicionais, já conhecem Venha fulano cantá! Nós ia mas tudo
seu Caetano Ribeiro. Hoje, no os passos da dança. Contudo, o mundo com vergonha, assim do mais
cururu, não é usado nenhum tipo aprendizado se dá tanto de maneira velho, né. Mas como ele chamava,
de uniforme especial, enquanto nos informal, durante os festejos, nós ia. Foi assim que eu aprendi. Eu
grupos de siriri seu uso é frequente. como também por meio de tinha vocação pra aprender e gosto
Os diversos grupos folclóricos ensaios organizados pelos grupos do cururu e do siriri. No baile,
fazem exibições públicas nas mais constituídos, como no caso do eu gosto de um rasqueado de uma
variadas situações, apresentando-se grupo Flor do Campo de Matilde dança no jeito...”[Angelo da Costa,
sempre uniformizados. da Silva, que atua desde 1984. Poconé, 2003]
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Dona Teresinha.
Nobres- M T , 2 0 0 3 .
Foto: Francisco M . da
Costa.
O reinado e
as festas
tradicionais
C olocaç ão da bandeira
na Festa de S ão
S ebastião .
Nossa Senhora do
L ivramento- M T , 2 0 0 7 .
F oto: Carla Belas.
C antoria de C ur ur u , Festa
de S ão Sebastião .
N ossa Senhora do
Livramento- M T , 2 0 0 7 .
Foto: Carla Belas.
A manhã de domingo é o
momento da missa, bem como do chá
com bolo, tradicional reunião que
acontece em diversas festas e ocasiões
sociais na região de Mato Grosso e
Mato Grosso do Sul. Em algumas
localidades o siriri começa após o chá
com bolo; em outras, os grupos só se
apresentam à tarde, após o almoço de
domingo. Segundo os depoimentos
colhidos, parece ser justamente a
complexidade da formulação de
trovas e a densidade ritual do cururu
que faz com que, atualmente, os
mais jovens só se interessem pela
dança do siriri, que tem uma
dimensão mais lúdica. Ainda no
domingo, tem lugar também a
descida do mastro, que dependendo
do festeiro, pode ocorrer pela
manhã ou mais no final da tarde,
sendo, contudo, fundamental a
presença dos cururueiros, que vêm
novamente entoar trovas especiais
para esse momento.
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A dinâmica da tradição
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PÁ G I N A Ao lado
M eninos com ganz á .
C u iabá - M T , 2 0 0 3 .
F oto: Francisco M . da
C osta.
abaixo
E veraldo Gomes.
C u iabá - M T , 2 0 0 7 .
F oto: Edilberto
F onseca.
industriais sem maiores danos para rodas tradicionais vêm perdendo “Eu acho que deve continuar
a integridade do instrumento, a espaço para outras manifestações assim... cada um indo de sua vez.
madeira ainda é empregada segundo culturais em decorrência das Você vai fazer uma brincadeira
técnicas tradicionais, para não pressões geradas pela cultura na sua casa, marca para um dia
provocar a descaracterização de massa. Em contextos sociais um e outro dia outro, que aí todo
completa de sua sonoridade. marcados pela tradição, já não mundo divertiu, todo mundo
Tendo em vista a legislação são tantas as brincadeiras sem gostou. Agora vai quem quiser,
ambiental que determina a tempo, sem hora para acabar. vai lá na festa do cururu quem
autorização para corte de árvores, Hoje, nas festas populares, as quiser, vai lá na festa do baile quem
muitas vezes os artesãos se veem rodas de cantoria se inserem na quiser, ninguém pode proibir,
na posição de ilegalidade por lógica dos espetáculos e dos shows no meu ver não pode, dono de
cortar madeira ou com ela de música popular, contando com festa e quem vai na festa, não pode
trabalhar sem esse licenciamento, cachês e se apresentando em meio proibir. Ah! Porque, o que fulano
dadas as dificuldades em obtê-lo a outras atrações. Perdem, assim, vai fazer? Não... A diversão é pra
junto às instituições ambientais um tipo tradicional de prazer todo mundo. Alegria... quem que
competentes. Existem, assim, lúdico, integração comunitária e não quer alegria, não é mesmo?”
alguns obstáculos à livre produção expressividade, posto que, nesses [Manoel Severino, 2003]
do instrumento pelos artesãos/ contextos, se acham desvinculadas Em meio à permanente ameaça
cururueiros que comprometem das motivações devocionais que de diluição dos significados das
a reprodução dos saberes originalmente as animavam. expressões tradicionais frente às
relacionados à sua fabricação A realização do baile ao som novas demandas colocadas pela
e execução musical. Por outro de música mecânica, na noite de cultura de massa, as rodas tradi-
lado, as pesquisas realizadas têm sábado, estabeleceu um outro cionais continuam acontecendo,
apontado que, nas festas onde a lugar para o cururu dentro das e a viola-de-cocho, amplamente
viola-de-cocho se faz presente, as festas tradicionais. conhecida e reconhecida, foi
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Francisco Sales.
Cu iabá - M T , 2 0 0 3 .
Foto : Francisco M . da
C osta .
tombada como patrimônio nos dois O projeto, idealizado e desenvolvido testemunhos significativos da
estados da federação, o que reafirma pelo Centro Nacional de Folclore e pluralidade cultural da nação.
seu papel de símbolo de identidade Cultura Popular junto aos artesãos O registro, além de ato oficial
cultural. A recente constituição da e cururueiros, com recursos da de reconhecimento e valorização
figura do registro patrimonial de Petrobras Distribuidora, contou com dos saberes relacionados ao bem
bens culturais de natureza imaterial as parcerias do governo do estado, cultural, agrega valor e poderá
no âmbito do Estado instituiu, Universidade Federal de estimular o desenvolvimento de
então, novos mecanismos de Mato Grosso do Sul, Ibama, Instituto políticas de preservação patrimonial
salvaguarda para o sistema cultural de Meio Ambiente Pantanal, além de pelos poderes públicos, com a
que compreende o instrumento. outras instituições locais. participação efetiva dos segmentos
Em Mato Grosso, o processo de Dessa forma, o que se observa da população, diretamente
tombamento foi deflagrado como hoje é a viola-de-cocho em envolvidos na produção desse bem.
reação a uma solicitação provisória de processo de adaptação a outras Em parceria com as
registro da marca “viola-de-cocho” matérias-primas e a outros Superintendências Regionais do
junto ao Inpi, por um estudioso contextos performáticos e de Iphan nos estados de Mato Grosso
de música de Cuiabá, na década interesses. Nesse contexto, o e Mato Grosso do Sul, o Centro
de 1990. Após ampla mobilização registro do modo de fazer a viola- Nacional de Folclore e Cultura
e protesto por parte dos setores de-cocho, como patrimônio Popular tem colaborado hoje com
ligados à cultura local, a solicitação imaterial, no Livro dos Saberes, as comunidades detentoras do
foi indeferida5, e o bem, em seguida, tem se mostrado hoje como modo de fazer a viola-de-cocho
tombado. Em Mato Grosso do Sul o mais uma ação complementar na formulação, implementação
tombamento veio como consequência aos esforços que vêm sendo e condução de um Plano de
de um projeto de fomento e empreendidos de coletar, Salvaguarda. Esse Plano vem
valorização da tradição artesanal e sistematizar, valorizar e salvaguardar sendo construído em conjunto
musical que estava invisível no estado. conhecimentos tradicionais, com entidades, instituições e
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Oficina de produ ç ã o de
viola, Mestre Severino
M ou ra.
C oru mbá - M S , 2 0 0 2 .
Foto: Francisco M . da
Costa.
V iola desenhada.
C oru mbá - M S , 2 0 0 2 .
Foto: Francisco M . da
C osta.
Associaç ão Centro de
Tradiç ões Nobrense
de C ururu e Siriri,
Nobres- M T , 2 0 0 3 .
Foto: Francisco M . da
C osta.
P antanal .
C orumb á-MS, 2002.
F oto : F rancisco M. da
C osta .
CASCUDO, Luís da Câmara. - Temporada 2007. Governo do LIMA, Rossini Tavares. Franquelo,
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PREFEITURA DE CUIABÁ.
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http://www.cuiaba.mt.gov.br/
noticia.jsp?id=6078.
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referendado por parecer técnico para o gado). Nesse cocho, já talhado no “A produção da viola-de-cocho é realizada
do Departamento de Patrimônio formato de viola, são afixados um tampo por mestres cururueiros, seja para uso
Imaterial, apresenta, de forma e, em seguida, as partes que caracterizam o próprio, seja para atender à demanda do
exemplar, a descrição da Viola-de- instrumento, como cavalete, espelho,rastilho mercado local, também constituída por
Cocho e o seu modo de fazer, além e cravelhas. A confecção, artesanal, cururueiros e mestres de dança do siriri.
de oferecer justificativa para seu determina variações observadas de artesão Os materiais utilizados tradicionalmente
registro como Patrimônio Cultural para artesão, de braço para braço, de para sua confecção são encontrados no
de Natureza Imaterial: forma para forma. A Viola-de-Cocho ecossistema regional, correspondendo a
é elemento presente e indispensável em tipos especiais de madeiras para o corpo,
“ A viola-de-cocho é um instrumento musi- várias manifestações e expressões da cultura tampo e demais detalhes do instrumento;
cal singular quanto à forma e sonoridade, popular dessa região, como o boi-a-serra, ao sumo da batata “sumbaré” ou, na falta
produzido exclusivamente de forma artesa- dança de São Gonçalo, folião, ladainha, desta, a um grude feito feito da vesícula
nal, com a utilização de matérias-primas rasqueado limpa banco (ou rasqueado natatória dos peixes (ou poca) para a
existentes na Região Centro-Oeste do cuiabano), e em festas religiosas tradicionais colagem das partes componentes; fios de
Brasil. É parte de uma realidade eco- realizadas por devotos associados em algodão revestidos de trastes (que, na
sociocultural construída historicamente irmandades, citadas e descritas no região, também são denominados pontos) e
pelos sucessivos grupos sociais que vêm processo. Destaca-se, no entanto, como tripa de animais para as cordas.”
ocupando os atuais estados do Mato Grosso instrumento integrante do complexo
e Mato Grosso do Sul, em suas relações de musical, coreográfico e poético do cururu “ As violas podem ser decoradas,
troca com o meio natural e com a sociedade e do siriri, juntamente com o ganzá (reco- desenhadas a fogo e pintadas, ou mantidas
envolvente. Seu nome deve-se à técnica de reco de taquara) e o tamborim ou mocho na madeira crua, envernizadas ou não. As
escavação da caixa de ressonância da viola (banco cujo assento de couro é percutido fitas coloridas amarradas no cabo indicam
em uma tora de madeira inteiriça, mesma com baquetas de madeira), cultivado por o número de rodas de cururu em que a viola
técnica utilizada na fabricação de cochos segmentos das camadas populares como foi tocada em homenagem a algum santo –
(recipientes em que é depositado o alimento diversão ou devoção a santos católicos”. que possui, cada qual, sua cor particular.”
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V iola-de- C ocho.
2002.
Foto: Francisco M . da
C osta.
“ A viola-de-cocho encontra-se em
processo de transformação e observa-se que
a preservação desse bem está diretamente
relacionada à transmissão permanente da
tradição musical: ao estímulo às novas gerações
de apreender e apreciar musicalidades diversas
e alternativas àquelas veiculadas pela indústria
do entretenimento. Além disso, relaciona-se à
transmissão permanente da tradição artesanal
que implica desenvolvimento continuado de
planos de manejo sustentável das espécies
vegetais que servem de matéria-prima, e
a substituição de outras matérias-primas,
tendo em vista a preservação do patrimônio A viola-de-cocho e essas cururu e do siriri. E que nos
ambiental da região.” manifestações musicais não devem planos de salvaguarda, sejam
ser dissociadas uma das outras por previstas oficinas de repasse do
Isso posto, acatamos o parecer se tratarem de bens relacionados conhecimento do “modo de fazer
técnico do Departamento de a um mesmo universo eco-socio- viola-de-cocho”, possibilitando
Patrimônio Imaterial e votamos cultural. sua permanência e difusão.
favoravelmente à inscrição do
MODO DE FAZER VIOLA-DE- Por esse motivo, recomendamos
COCHO, no livro de Registro dos que sejam realizados os estudos
Saberes, com a devida menção ao complementares que possibilitem
complexo musical, coreográfico e também a inscrição, no livro
poético do cururu e do siriri. das Formas de Expressão, do
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anexo 2
titulação
de patrimônio
cultural do
brasil
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anexo 3
Afinações
e toques
básicos da
Viola-de-Cocho
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C amilo de Lelis.
Nobres - M T , 2 0 0 3 .
Foto: Francisco M . da
Costa .
anexo 4
partituras
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O la i la
Mamãe olha carneiro
O la i la Sou filho de Mato Grosso
Carneiro dá, carneiro dá
O la i la Não nego meu natural
Carneiro quer me maiá
I la i la Sou filho de Mato Grosso
Carneiro dá, carneiro dá
I la i la Não nego meu natural
Oi la ai la
Marrequinha da lagoa Moro na cidade branca
Oi lai la
Tuiuiu do Pantanal Capital do Pantanal
O lai lai lai lai lai a
Marrequinha da lagoa Moro na cidade branca
Entra na cozinha
Que eu te espero na janela
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anexo 6
Capas de Discos
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V iola desenhada.
C oru mbá - M S , 2 0 0 2 .
Foto: Francisco M . da
C osta.
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ISBN: 978-85-7334-117-1